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1 1 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESPÍRITO SANTO Promotoria de Justiça Cumulativa de Conceição da Barra Rua Sete de Dezembro, nº. 121, Centro, Cep: 29.960-000 Conceição da Barra ES Tel: (27) 3762-1624 EXCELENTÍSSIMO (A) SENHOR (A) DOUTOR (A) JUIZ (A) DE DIREITO DA PRIMEIRA VARA DA COMARCA DE CONCEIÇÃO DA BARRA/ES Ref. GAMPES nº: 2015.0010.5877-63 O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO, por intermédio do Promotor de Justiça desta Comarca, no uso de suas atribuições legais, vem respeitosamente perante Vossa Excelência, com fulcro nos arts. 5.º, inc. XXXIII, 37, caput e § 3.º, inc. II, 127, 129, incs. II, III e IX, 216, § 2.º, da Constituição Federal, no artigo 25, inc. IV, da Lei Federal n.º 8.625/1993 e na Lei Federal n.º 12.527/2011, bem como nos elementos constantes no Procedimento Preparatório n° 2015.0010.5877-63, propor a presente: AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA em desfavor da: CÂMARA MUNICIPAL DE CONCEIÇÃO DA BARRA/ES, pessoa jurídica de direito público interno, representada pelo vereador ANDERSON KLEBER DA SILVA, brasileiro, nascido aos 09/11/1980, Presidente do Legislativo Municipal, que na

MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESPÍRITO SANTO Promotoria de … · MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESPÍRITO SANTO ... qual justificou, em maio de 2015, o atraso aproximado de 2 meses, para realizar

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EXCELENTÍSSIMO (A) SENHOR (A) DOUTOR (A) JUIZ (A) DE DIREITO DA

PRIMEIRA VARA DA COMARCA DE CONCEIÇÃO DA BARRA/ES

Ref. GAMPES nº: 2015.0010.5877-63

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO, por intermédio

do Promotor de Justiça desta Comarca, no uso de suas atribuições legais, vem

respeitosamente perante Vossa Excelência, com fulcro nos arts. 5.º, inc. XXXIII, 37,

caput e § 3.º, inc. II, 127, 129, incs. II, III e IX, 216, § 2.º, da Constituição Federal,

no artigo 25, inc. IV, da Lei Federal n.º 8.625/1993 e na Lei Federal n.º

12.527/2011, bem como nos elementos constantes no Procedimento Preparatório n°

2015.0010.5877-63, propor a presente:

AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C PEDIDO DE

ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA

em desfavor da:

CÂMARA MUNICIPAL DE CONCEIÇÃO DA BARRA/ES, pessoa jurídica de direito

público interno, representada pelo vereador ANDERSON KLEBER DA SILVA,

brasileiro, nascido aos 09/11/1980, Presidente do Legislativo Municipal, que na

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presente hipótese deve ser dada capacidade judiciária, em respeito à sua autonomia,

conforme se explica detalhadamente adiante, pelas razões de fato e de direito

adiante articuladas.

I - DOS FATOS

Constatou-se no bojo do Procedimento Preparatório Ministerial nº 2015.0010.5877-

63, em anexo, que a Câmara Municipal de Vereadores de Conceição da Barra, de

forma temerária, vem descumprindo, reiteradamente, as disposições da Lei

12.527/2011 (Lei de Acesso à Informação) e da Lei Complementar 131/2009 (Lei da

Transparência), esta última que inseriu dispositivos na Lei Complementar

no 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal).

Conforme apurado no procedimento suso referido, a Câmara Municipal de Conceição

da Barra não vem divulgando em seu portal de transparência, de maneira irrestrita,

incondicional e atualizada, todas as informações determinadas pela legislação em

referência.

Data máxima vênia, analisando-se melhor o procedimento preparatório,

verifica-se que a Requerida possui, apenas, formalmente, o sítio eletrônico

com tal finalidade, de modo que sonega dados e informações relevantes e

necessárias, por força de lei, bem como não atualiza o “portal de

transparência” no que diz respeito às poucas e seletivas informações que

lança.

Inicialmente, cumpre esclarecer que a Promotoria de Justiça Cumulativa de

Conceição da Barra tomou conhecimento, por meio de denúncia anônima registrada

junto ao canal de ouvidoria/MPES, acerca de dificuldades dos cidadãos

barrenses em acompanhar os gastos do Legislativo Municipal devido à

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demora na publicação das informações junto ao portal da transparência, impedindo

que os cidadãos, em tempo real, fiscalizem o legislativo.

Com efeito, notificado, o Presidente da Câmara, em abril de 2015, rechaçou os

termos da denúncia, consignando, em resumo, que o setor de Tecnologia da

Informação do Legislativo seria reformulado, com vistas a melhorar o atendimento

ao público e os serviços, possibilitando, assim, o préstimo de maiores informações,

sendo inverídica a alegação de que desde o ano de 2013 o sítio eletrônico se

encontrava desatualizado.

Após a resposta acima referida, foi certificado, nos autos do expediente

administrativo (fls.16), ainda, em abril de 2015, que as supostas atualizações NÃO

ESTAVAM SENDO REALIZADAS EM TEMPO REAL.

Novamente, a Câmara Municipal foi oficiada, por intermédio do seu Presidente, o

qual justificou, em maio de 2015, o atraso aproximado de 2 meses, para realizar as

atualizações no portal, em razão de um problema técnico no programa (software)

utilizado na Casa de Leis, problema este que teria sido supostamente corrigido.

Todavia, é possível perceber dos documentos de fls. 48/54 que as irregularidades do

Portal Transparência da Câmara Municipal, diferentemente do alegado, não tinham

sido superadas, chamando-se atenção para os documentos de fls. 53 e 54 do

procedimento preparatório.

Em outubro de 2015, outra vez, em razão da sonegação detalhada de dados nas

folhas de pagamentos dos vencimentos dos servidores da Casa, a Requerida foi

notificada para prestar informações, por intermédio do seu Presidente, o qual,

conforme se observa, às fls. 59/62, esclareceu que, simplesmente, a disponibilização

de tais dados não foi feita sob pena de comprometer a segurança,

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privacidade, imagem e a vida dos servidores. Na oportunidade, o gestor salientou

que poderia “realizar uma nova formulação dos dados apresentados no site oficial”,

sem, no entanto, apontar os respectivos nomes dos servidores.

Como se vê, apesar de ”alegar no papel” que “vem cumprindo” com as leis

aplicáveis ao caso concreto, a Câmara Municipal de Conceição da Barra-ES,

não só ignora, mas, adota uma postura de violar categoricamente as leis

da boa transparência administrativa.

Assaz importante destacar que, em abril de 2016, conforme se vê dos documentos

em anexo, cuja verificação pode ser feita com acesso à internet, quase um ano

depois das primeiras notificações ministeriais, a Câmara ainda não se

adequou às normas de regência, sendo que a situação não se resume à não

divulgação dos nomes e valores detalhados dos pagamentos promovidos

aos servidores, mas, envolve, também, dentre outros,

ausência/insuficiência de dados e informações alusivas à publicação dos

balancetes do ano de 2016, licitações, contratos administrativos, verbas de

diversas espécies, diferenciação de servidores ativos e inativos, além de

problemas relacionados à ouvidoria do órgão, existindo reclamações de

2015 sem qualquer atualização.

A título exemplificativo, destaca-se que a folha de pagamento dos servidores do

Legislativo Municipal não é clara quanto às informações existentes, notadamente

porque não há nome de qualquer servidor, tampouco as deduções, acréscimos e

demais informações que, como cediço, devem constar em uma folha pagamento.

Pior ainda, sequer é possível saber se os valores que ali se encontram se referem a

vencimentos brutos ou líquidos.

A situação se agrava quando se tenta localizar no portal da Câmara

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informações concernentes ao quadro de servidores, ativos e inativos,

notadamente por ser impossível saber quem são e onde se encontram os

aludidos servidores! E isto porque não há no website destinado a

transparência do órgão espaço específico contendo a lista de servidores,

suas respectivas funções e a natureza do vínculo jurídico que os integram

ao Poder Legislativo Municipal (se estatutários, detentores de cargo em

comissão ou contratados), tampouco informações acerca da estrutura e

organização do órgão.

A hipótese fática em apreço, além de ser ilegal, tem o condão de impossibilitar que

qualquer cidadão e os demais órgãos competentes fiscalizem as atividades do

legislativo, de forma clara e célere, sendo extremamente necessária a regularização

judicial da questão, cabendo tão somente à Câmara Municipal de Conceição da

Barra-ES cumprir a Lei.

Não se pode olvidar, por seu turno, que o deslinde da presente ação pretende

permitir a natural fiscalização do Órgão, notadamente em razão da relevância das

informações e o notório interesse público em sua publicação, não havendo lógica

e tampouco respaldo jurídico relevante de que estas continuem guardadas

a “sete chaves” pela Casa Legislativa Municipal de Conceição da Barra.

Consigna-se, portanto, as seguintes irregularidades por ora constadas junto ao Portal

da Transparência da Câmara de Vereadores de Conceição da Barra. Vejamos:

a) O local destinado à publicação dos balancetes do ano de 2016, não

consta qualquer informação publicada;

b) O local destinado à publicação da estrutura da Câmara de

Vereadores, o qual deveria conter a estrutura organizacional da

Casa Legislativa, tais como, organograma dos setores, chefias e

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responsáveis, com seus respectivos contatos, não consta

informações publicadas;

c) O local destinado à publicação dos procedimentos licitatórios

(abertos, em andamento e a realizar) e os contratos administrativos

não consta qualquer informação publicada;

d) O local destinado à publicação de informações relacionadas aos

parlamentares e gabinetes, que deveria conter informações acerca

de repasses, verbas indenizatórias, cotas, subsídios, viagens e

demais despesas, não consta qualquer informação publicada,

tampouco link que redirecione o cidadão a outro local que

eventualmente contenha tais informações;

e) Não há local destinado à publicação do quadro de pessoal ativo e

inativo do órgão, impossibilitando que o cidadão saiba quem são e

em qual setor se encontram os servidores do Legislativo Municipal,

bem como se estes são concursados, comissionados, contratados

e/ou cedidos;

f) A folha de pagamento não faz menção ao nome do aludido servidor,

mencionando apenas se o salário percebido é decorrente de vínculo

em comissão ou estatutário, não havendo qualquer informação

pormenorizada acerca dos vencimentos (diárias, indenizações,

deduções, acréscimos etc);

g) Não informações acerca de eventuais convênios celebrados;

h) Todas as demandas registradas no canal de ouvidoria de legislativo

encontram-se pendentes de solução, havendo demanda registrada

no mês 10/2015.

Destarte, a correta observância da legislação de regência pressupõe, ainda, que as

informações acima indicadas sejam passíveis de importação, exportação, download,

transformação em outros formatos de documento (.xls e .pdf), devendo estar

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acompanhadas da respectiva documentação, digitalizada, como notas fiscais, notas

de empenho, ordens de pagamento, ordens de serviço e documentos referentes às

contratações (cópias dos editais; dos pareceres justificadores da dispensa ou

inexigibilidade, quando for o caso; das atas de julgamento; da documentação

relativa à habilitação dos licitantes; da documentação relativas às propostas, depois

de tornadas públicas estas; do resultado do julgamento das licitações; cópias dos

recursos administrativos interpostos e das decisões desses mesmos recursos; do ato

de homologação e da adjudicação do objeto licitado ao licitante vencedor; e dos

contratos administrativos firmados).

Como se vê pelos print screens anexos extraídos do sítio da Câmara

Municipal, que corroboram todas as irregularidades consignadas na

presente peça de ingresso, além de não atualizar o portal transparência,

não há a disponibilização mínima à sociedade das informações

determinadas pela Lei Federal n.º 12.527/2011. Data máxima vênia, o

portal aparenta existir apenas como uma mera formalidade administrativa,

e não num latente anseio da administração em zelar pela publicidade

administrativa, nos termos da lei.

Verifica-se, pois, que, não obstante a Lei de Acesso à Informação já se encontrar em

vigor desde maio de 2012, a Câmara de Vereadores de Conceição da Barra ainda

parece aguardar que uma ordem judicial bata às suas portas para que,

finalmente, venha a cumprir o que a Carta da República e a legislação

determinam, bem como o que toda a sociedade barrense reclama e espera.

Além de não fornecer as informações que a Lei de Acesso à Informação determina,

restou verificado também que o Portal da Transparência da Câmara de

Vereadores não dispõe sequer de requisitos e ferramentas que a legislação

em referência ordena, para o fim de análise, cópia e eventual cruzamento

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eletrônico das próprias informações disponibilizadas (cf. art. 8.º, § 3.º, da LAI).

Art. 8º É dever dos órgãos e entidades públicas

promover, independentemente de requerimentos, a

divulgação em local de fácil acesso, no âmbito de

suas competências, de informações de interesse

coletivo ou geral por eles produzidas ou

custodiadas.

[...]

§ 3º Os sítios de que trata o § 2º deverão, na forma de

regulamento, atender, entre outros, aos seguintes

requisitos:

I - conter ferramenta de pesquisa de conteúdo que

permita o acesso à informação de forma objetiva,

transparente, clara e em linguagem de fácil

compreensão;

II - possibilitar a gravação de relatórios em diversos

formatos eletrônicos, inclusive abertos e não proprietários,

tais como planilhas e texto, de modo a facilitar a análise

das informações;

III - possibilitar o acesso automatizado por sistemas

externos em formatos abertos, estruturados e legíveis por

máquina;

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IV - divulgar em detalhes os formatos utilizados para

estruturação da informação;

V - garantir a autenticidade e a integridade das

informações disponíveis para acesso;

VI - manter atualizadas as informações disponíveis para

acesso;

VII - indicar local e instruções que permitam ao

interessado comunicar-se, por via eletrônica ou telefônica,

com o órgão ou entidade detentora do sítio; e

VIII - adotar as medidas necessárias para garantir a

acessibilidade de conteúdo para pessoas com deficiência,

nos termos do art. 17 da Lei no 10.098, de 19 e dezembro

de 2000, e do art. 9o da Convenção sobre os Direitos das

Pessoas com Deficiência, aprovada pelo Decreto

Legislativo no 186, de 9 de julho de 2008.

2 - DO DIREITO

2.1. ESCLARECIMENTO PRELIMINAR: DA LEGITIMIDADE PASSIVA DA

CÂMARA VEREADORES

Como cediço, de regra, a pessoa jurídica existente (CC, art. 14, II) e com capacidade

jurídica e processual para estar em Juízo em lides que envolvam interesse de

qualquer dos Poderes locais é o Município, representado pelo Prefeito ou por

Procurador (CPC/2015, art. 75, III).

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Sabe-se que o entendimento da jurisprudência e da doutrina é no sentido de que,

regra geral, no litígio que envolva atos administrativos ou interesses da Câmara de

Vereadores – ou, no caso do Estado, da Assembleia Legislativa, do Tribunal de

Justiça, do Tribunal de Contas ou do Ministério Público –, enquanto agentes da

Administração Pública, a ação deve ser movida contra ou pelo Estado, a pessoa

jurídica de direito público existente.

Ora, a exceção a esta regra, admitida pela jurisprudência, existe em ações em que

haja conflito institucional entre tais órgãos do Poder Estatal, como, por exemplo, nas

demandas em que se discute repasse de duodécimos, ou quando estiver em causa

questão ligada diretamente à discussão da autonomia do ente.

Então, nessas hipóteses, excepcionalmente, admite-se capacidade processual à

instituição ou Poder, o que temos como aplicável ao caso dos autos, dado ser

inconcebível na situação ora tratada deixar a cargo do advogado do Poder Executivo

– que inclusive é contratado precariamente, subordinado ao Prefeito, pois não há

Procuradoria Municipal institucionalizada – a defesa da Câmara de Vereadores.

Nessa linha, segue jurisprudência:

“(...) 2. Entendimento deste Tribunal de que as câmaras municipais

possuem capacidade processual limitada à defesa de seus direitos

institucionais, ou seja, aqueles vinculados à sua independência,

autonomia e funcionamento. 3. Por versar a presente demanda

sobre a exigibilidade de contribuição previdenciária dos agentes

políticos municipais, a Câmara recorrida é parte ilegítima ativa ad

causam. 4. Nesse sentido, a linha de pensar de ambas as Turmas

que compõem a Primeira Seção do STJ: - A Câmara de

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Vereadores não possui personalidade jurídica, mas apenas

personalidade judiciária, de modo que só pode demandar em

juízo para defender os seus direitos institucionais,

entendidos esses como sendo os relacionados ao

funcionamento, autonomia e independência do órgão. -

Referido ente não detém legitimidade para integrar o pólo ativo de

demanda em que se discute a exigibilidade de contribuições

previdenciárias incidentes sobre a remuneração paga aos exercentes

de mandato eletivo no Município. Precedentes. (REsp 730.979/AL,

Rel. Min. Castro Meira, DJ de 2/9/2008). - A despeito de sua

capacidade processual para postular direito próprio (atos interna

corporis) ou para defesa de suas prerrogativas, a Câmara de

Vereadores não possui legitimidade para discutir em juízo a validade

da cobrança de contribuições previdenciárias incidentes sobre a folha

de pagamento dos exercentes de mandato eletivo, uma vez que

desprovida de personalidade jurídica, cabendo ao Município figurar

no pólo ativo da referida demanda (REsp 696.561/RN, Rel. Min. Luiz

Fux, DJ de 24/10/2005). 5. Recurso especial provido.” (STJ – Resp

1109840/AL, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA

TURMA, julgado em 02/06/2009, DJe 17/06/2009) [Destacamos].

“(...) 1. A Câmara Legislativa do Distrito Federal é órgão da

Administração Direta do Distrito Federal, não possuindo, portanto,

personalidade jurídica, mas apenas personalidade judiciária. -

Significa que pode estar em juízo apenas para a defesa de

suas prerrogativas institucionais, concernentes à sua

organização e funcionamento. (...) 3. Recurso especial não

conhecido." (STJ – Resp 608.798⁄DF, 5ª Turma, Rel. Min. Arnaldo

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Esteves Lima, julgado em 01.03.2007, DJ de 19.03.2007 p. 381) [

Destacamos].

STJ: "(…) 4. A Câmara Municipal possui apenas personalidade

judiciária para defender seus interesse perante o Poder

Judiciário, e não personalidade jurídica capaz de figurar no

pólo passivo da denominada "execução contra fazenda

pública". Precedentes. 5. Recurso especial conhecido e provido."

(STJ – Resp 591.220⁄RJ, 5ª Turma, Rel. Ministra Laurita Vaz, julgado

em 14.08.2007, DJ de 24.09.2007 p. 355) [Destacamos].

“PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. SERVIDOR

PÚBLICO. ENQUADRAMENTO. CÂMARA MUNICIPAL. ILEGITIMIDADE

AD CAUSAM. PERSONALIDADE JUDICIÁRIA. MANDADO DE

SEGURANÇA. INTIMAÇÃO DO PROCURADOR DO MUNICÍPIO.

DESNECESSIDADE. AGRAVO IMPROVIDO. 1. A Câmara Municipal

de São Paulo é órgão da Administração Direta, não

possuindo, portanto, personalidade jurídica, mas apenas

personalidade judiciária. Significa que pode estar em juízo

apenas para a defesa de suas prerrogativas institucionais,

concernentes ao seu funcionamento e independência. 2. In

casu, o mandado de segurança foi impetrado contra ato do

Presidente da Câmara que determinou o enquadramento de servidor

público. Destarte, a legitimidade para interpor eventual recurso é do

Município de São Paulo. (...) 4. Agravo regimental improvido." (AgRg

no AgRg no Ag 818.739⁄SP, 5ª Turma, Rel. Min. Arnaldo Esteves

Lima, julgado em 12.06.2007, DJ de 06.08.2007 p. 650)

[Destacamos].

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No caso concreto, em suma, tem-se como evidente que é uma prerrogativa da

Câmara de Vereadores defender-se autonomamente nesta demanda, não podendo,

em nome da independência do Legislativo, ficar sob a tutela da defesa judicial de

advogado contratado pelo Município e subordinado precariamente ao Chefe do

Executivo.

Portanto, eis a razão por que se defende a concessão de capacidade postulatória à

Câmara de Vereadores para atuar neste feito, reconhecendo-se, assim, sua

legitimidade passiva.

2.2. DO DIREITO FUNDAMENTAL DO ACESSO À INFORMAÇÃO

Como cediço, o Legislador Constituinte Originário elevou o direito de acesso à

informação à condição de princípio/direito fundamental, inserto no art. 5.º, inc.

XXXIII, da Constituição Federal, segundo o qual todos têm direito a receber dos

órgãos públicos informações de interesse particular, coletivo ou geral, ressalvando-

se, apenas, aquelas informações cujo sigilo seja imprescindível à segurança da

sociedade e do Estado, senão vejamos:

Art. 5.º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de

qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos

estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito

à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à

propriedade, nos termos seguintes:

[...]

XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos

informações de seu interesse particular, ou de interesse

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coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob

pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo

seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado;

Não bastasse, a Constituição Federal reitera no bojo do art. 216, § 2.º, a obrigação

de a Administração Pública – nela compreendidas as órbitas federal, estadual e

municipal – permitir a realização, por tantos quantos necessitarem, de consulta à

documentação governamental, devendo determinar as providências para viabilizar

tais consultas:

Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens

de natureza material e imaterial, tomados individualmente

ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à

ação, à memória dos diferentes grupos formadores da

sociedade brasileira, nos quais se incluem:

[...]

§ 2º - Cabem à administração pública, na forma da lei, a

gestão da documentação governamental e as providências

para franquear sua consulta a quantos dela necessitem.

Demais disso, em reforço ao direito fundamental em comento, o Legislador

Constituinte Reformador, por meio da Emenda Constitucional n.º 19, introduziu

diversas mudanças no art. 37 da Carta Constitucional, o qual, como cediço,

estabelece diretrizes gerais cuja obediência é imposta à Administração Pública direta

e indireta de todos os entes federados.

Tal emenda alterou o § 3.º do referido artigo 37, acrescentando ao mesmo três

incisos, dentre os quais merece realce o inciso II, por sua pertinência ao tema em

debate, uma vez que assegura aos usuários da Administração Pública o acesso aos

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registros administrativos e aos atos do governo, note-se:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de

qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito

Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de

legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e

eficiência e, também, ao seguinte:

[...]

§ 3º A lei disciplinará as formas de participação do usuário

na administração pública direta e indireta, regulando

especialmente:

[...]

II - o acesso dos usuários a registros administrativos e a

informações sobre atos de governo, observado o disposto

no art. 5º, X e XXXIII;

Assim, com o desiderato de regulamentar os preceptivos inscritos nesses dispositivos

constitucionais, especialmente aquele albergado no art. 5º, inc. XXXIII, do qual

todos os outros retiram seu fundamento de existência, e garantir-lhes plena

efetividade, veio a lume a Lei Federal n.º 12.527, de 18/11/2011, intitulada “Lei de

Acesso à Informação” (LAI), lei de caráter nacional, aplicável à Administração Pública

direta e indireta de todos os entes federados.

A referida lei representa um marco para o Sistema Democrático Brasileiro, na medida

em que impulsiona a eficiência na gestão pública, notadamente quanto à aplicação

dos recursos públicos, bem como possibilita a participação efetiva dos usuários na

Administração, além de uma maior fiscalização por parte dos órgãos de controle.

Fortalece-se, pois, a democracia, e, mais do que isso, prestigia-se,

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sobremaneira, o princípio da publicidade (art. 37, caput, da CF) e a política

pública da transparência, os quais devem sempre nortear a atuação

administrativa.

Com o escopo de concretizar o direito de acesso à informação, a Lei Federal

n.º12.527/2011 aumentou os mecanismos de obtenção de informações e de

documentos pelos administrados e órgãos de controle, efetivando a norma

constitucional segundo a qual a permissão de acesso é a regra e o sigilo das

informações é a exceção (arts. 5º, inc. XXXIII, da CF e 3.º, inc. I, da Lei Federal n.º

12.527/2011).

De acordo com a mencionada lei, afora as informações reputadas de caráter sigiloso,

somente não poderão ser objeto de divulgação informações de caráter

exclusivamente pessoais (art. 6º, inc. III, da Lei Federal n.º 12.527/2011),

primando-se, noutro vértice, pela ampla, irrestrita e atualizada divulgação das

informações sobre as quais recaia o interesse público.

Com efeito, os arts. 3.º, inc. II, e 8.º, caput, da Lei Federal n.º 12.527/2011,

obrigam a Administração a divulgar as informações de interesse público,

independentemente de solicitações ou requerimentos, determinando, ainda,

o art. 6.º, incs. I e II, do mesmo diploma, a observância de uma gestão transparente

das informações, às quais deve ser propiciado amplo acesso, devendo ser garantida

sua disponibilidade, senão vejamos:

Art. 3º Os procedimentos previstos nesta Lei destinam-se

a assegurar o direito fundamental de acesso à informação

e devem ser executados em conformidade com os

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princípios básicos da administração pública e com as

seguintes diretrizes:

[...]

II - divulgação de informações de interesse público,

independentemente de solicitações;

Art. 8º É dever dos órgãos e entidades públicas promover,

independentemente de requerimentos, a divulgação em

local de fácil acesso, no âmbito de suas competências, de

informações de interesse coletivo ou geral por eles

produzidas ou custodiadas.

Art. 6º Cabe aos órgãos e entidades do poder público,

observadas as normas e procedimentos específicos

aplicáveis, assegurar a:

I - gestão transparente da informação, propiciando amplo

acesso a ela e sua divulgação;

II - proteção da informação, garantindo-se sua

disponibilidade, autenticidade e integridade;

Por oportuno, deve-se ressaltar que, além da divulgação completa das informações

de interesse da sociedade, constitui preceito basilar da Lei de Acesso à Informação

que tais informes sejam atualizados (cf. art. 7.º, inc. IV).

Art. 7º O acesso à informação de que trata esta Lei

compreende, entre outros, os direitos de obter:

[...]

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IV - informação primária, íntegra, autêntica e

atualizada;

[...]

In casu, não há dúvidas de que a Câmara Municipal de Conceição da Barra-

ES, vem malferindo os dispositivos supracitados ao simplesmente não

disponibilizar o acesso às informações determinadas pela legislação em

referência, ou, ainda, agindo com total desleixo quanto à obrigação de

proceder à sua atualização.

Merece destacar que não há na Lei nº 12.527/2011 qualquer dispositivo que permita

à Administração Pública negar ou condicionar o fornecimento das informações

públicas de caráter geral ou coletivo, as quais devem, como já ressaltado, estar

amplamente divulgadas e acessíveis a todos os interessados.

Ora, é de se ponderar que informações adjetivadas como públicas, só por assim o

serem, não admitem restrição, por qualquer forma, de sua divulgação.

Ademais, oportuno destacar que não podem sobejar dúvidas quanto ao caráter

público das informações relativas à remuneração dos servidores públicos e aos

membros do Poder Legislativo. Isso porque o servidor, enquanto tal, é parte

integrante da Administração, é peça da máquina administrativa, e, bem

por isso, não se pode furtar à sujeição aos princípios aplicáveis à

Administração, no caso, notadamente o princípio da publicidade (art. 37,

caput, CF/88).

Sob esse ângulo, insta destacar que não é pertinente perquirir acerca de eventual

mitigação do direito fundamental à vida privada, pois as informações atinentes à

remuneração dos servidores não dizem respeito à sua individualidade enquanto seres

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humanos, mas, sim, à sua condição mesma de agente público, como já decidido pelo

Supremo Tribunal Federal, no bojo do Agravo regimental na Suspensão de

Segurança nº 3.902.

No mencionado julgamento, a Corte Suprema deixou assente que a divulgação de

lista nominal dos servidores públicos acompanhada da remuneração por eles

percebida concretiza o princípio da publicidade, norteador da atuação administrativa,

e prestigia a supremacia do interessa público – e, ao nosso ver, também o princípio

da indisponibilidade do interesse público perante o interesse privado.

Nesse viés, colaciona-se o referido precedente da lavra do SUPREMO TRIBUNAL

FEDERAL:

Ementa: SUSPENSÃO DE SEGURANÇA. ACÓRDÃOS QUE

IMPEDIAM A DIVULGAÇÃO, EM SÍTIO ELETRÔNICO

OFICIAL, DE INFORMAÇÕES FUNCIONAIS DE

SERVIDORES PÚBLICOS, INCLUSIVE A RESPECTIVA

REMUNERAÇÃO. DEFERIMENTO DA MEDIDA DE

SUSPENSÃO PELO PRESIDENTE DO STF. AGRAVO

REGIMENTAL. CONFLITO APARENTE DE NORMAS

CONSTITUCIONAIS. DIREITO À INFORMAÇÃO DE ATOS

ESTATAIS, NELES EMBUTIDA A FOLHA DE PAGAMENTO

DE ÓRGÃOS E ENTIDADES PÚBLICAS. PRINCÍPIO DA

PUBLICIDADE ADMINISTRATIVA. NÃO

RECONHECIMENTO DE VIOLAÇÃO À PRIVACIDADE,

INTIMIDADE E SEGURANÇA DE SERVIDOR PÚBLICO.

AGRAVOS DESPROVIDOS. 1. Caso em que a situação

específica dos servidores públicos é regida pela 1ª parte

do inciso XXXIII do art. 5º da Constituição. Sua

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remuneração bruta, cargos e funções por eles

titularizados, órgãos de sua formal lotação, tudo é

constitutivo de informação de interesse coletivo ou geral.

Expondo-se, portanto, a divulgação oficial. Sem que a

intimidade deles, vida privada e segurança pessoal e

familiar se encaixem nas exceções de que trata a parte

derradeira do mesmo dispositivo constitucional (inciso

XXXIII do art. 5º), pois o fato é que não estão em jogo

nem a segurança do Estado nem do conjunto da

sociedade. 2. Não cabe, no caso, falar de intimidade ou de

vida privada, pois os dados objeto da divulgação em causa

dizem respeito a agentes públicos enquanto agentes

públicos mesmos; ou, na linguagem da própria

Constituição, agentes estatais agindo “nessa qualidade” (§

6º do art. 37). E quanto à segurança física ou corporal dos

servidores, seja pessoal, seja familiarmente, claro que ela

resultará um tanto ou quanto fragilizada com a divulgação

nominalizada dos dados em debate, mas é um tipo de

risco pessoal e familiar que se atenua com a proibição de

se revelar o endereço residencial, o CPF e a CI de cada

servidor. No mais, é o preço que se paga pela opção por

uma carreira pública no seio de um Estado republicano. 3.

A prevalência do princípio da publicidade administrativa

outra coisa não é senão um dos mais altaneiros modos de

concretizar a República enquanto forma de governo. Se,

por um lado, há um necessário modo republicano de

administrar o Estado brasileiro, de outra parte é a

cidadania mesma que tem o direito de ver o seu Estado

republicanamente administrado. O “como” se administra a

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coisa pública a preponderar sobre o “quem” administra –

falaria Norberto Bobbio -, e o fato é que esse modo

público de gerir a máquina estatal é elemento conceitual

da nossa República. O olho e a pálpebra da nossa

fisionomia constitucional republicana. 4. A negativa de

prevalência do princípio da publicidade administrativa

implicaria, no caso, inadmissível situação de grave lesão à

ordem pública. 5. Agravos Regimentais desprovidos. (SS

3902 AgR segundo, Relator(a): Min. AYRES BRITTO,

Tribunal Pleno, julgado em 09/06/2011, DJe-189 DIVULG

30-09-2011 PUBLIC 03-10-2011 EMENT VOL02599-01 PP-

00055 RTJ VOL-00220- PP-00149).

O posicionamento foi reiterado pelo Ministro Ayres Britto, na época Presidente do

Supremo Tribunal Federal, em decisão monocrática proferida no âmbito da

Suspensão de Liminar nº 630/RS, cujas valiosas lições merecem ser transcritas:

Decisão: vistos, etc.

Trata-se de pedido de suspensão dos efeitos de liminar

deferida nos autos da Ação Ordinária nº

001/1.12.0152707-5. Pedido formulado pelo Município de

Porto Alegre, com fundamento no art. 4º da Lei nº

8.437/1992. 2. Argui a requerente que o “Sindicato dos

Municipários de Porto Alegre – SIMPA propôs ação de

procedimento ordinário com o intento de suspender a

divulgação nominal dos vencimentos, salários e subsídios

brutos percebidos mensalmente pelos agentes públicos

deste Município”. Isto sob a alegação de afronta ao

princípio constitucional da inviolabilidade da privacidade.

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Alega que o Juízo da 4ª Vara Federal/DF deferiu a liminar

para que o Município “suspenda, no prazo de 24 horas,

até decisão final, a divulgação nominal dos vencimentos,

salários e subsídios brutos percebidos pelos agentes

públicos municipais integrantes da categoria ora

representada”. Pelo que o Município de Porto Alegre

protocolou, perante o Presidente do Tribunal de Justiça do

Estado do Rio Grande do Sul, pedido de suspensão.

Pedido, no entanto, indeferido. 3. Aponta o autor a

existência de grave lesão à ordem pública. É que “a

decisão atacada lança grande instabilidade nas

Administrações Públicas e fomenta a insurgência de

servidores quanto às deliberações dos gestores públicos

quanto ao tema da transparência”. Segundo o requerente,

“o ato da Administração Pública Municipal segue os

parâmetros utilizados pelos Tribunais Superiores, pelo

Governo Federal, pelo Conselho Nacional de

Justiça, entre outros (…), e não subsiste razão para

restringir a divulgação de uma parcela ínfima de agentes

públicos (apenas os representados pelo Sindicato

demandante), sob pena de grave violação à ordem pública

e ao princípio constitucional da isonomia”. Daí requerer a

suspensão dos efeitos da liminar deferida nos autos da

Ação Ordinária nº 001/1.12.0152707-5. 4. Feito esse

aligeirado relato da causa, passo à decisão. Fazendo-o,

pontuo, de saída, que o pedido de suspensão de

segurança é medida excepcional prestante à salvaguarda

da ordem, da saúde, da segurança e

da economia públicas contra perigo de lesão. Lesão, esta,

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que pode ser evitada, “a requerimento de pessoa jurídica

de direito público interessada ou do Ministério Público”,

mediante decisão do “presidente do tribunal ao qual

couber o conhecimento do respectivo recurso”. Daqui já

se percebe que compete a este Supremo Tribunal Federal

apreciar somente os pedidos de suspensão de liminar e/ou

segurança quando em foco matéria constitucional (art. 25

da Lei nº 8.038/90). Mais: neste tipo de processo, esta

nossa Casa de Justiça não enfrenta o mérito da

controvérsia, apreciando-o, se for o caso, lateral ou

superficialmente. 5. Ora, no caso dos autos, é evidente

estar-se diante de matéria constitucional, devido a que as

decisões impugnadas versam o tema do direito

fundamental de acesso à informação pública (inciso XXXIII

do art. 5º, inciso II do § 3º do art. 37 e § 2º do art. 216,

todos da Constituição Federal), de parelha com o princípio

igualmente constitucional da publicidade da atuação

administrativa (caput do art. 37 da CF). Princípio que,

para além da simples publicidade do agir de toda a

Administração Pública, propicia o controle da atividade

estatal até mesmo pelos cidadãos. Donde a facilitada

conclusão de que decisões judiciais contrárias a tais

normas constitucionais de proa geram grave lesão à

ordem pública. 6. Como ainda se faz de facilitada

percepção, a remuneração dos agentes públicos constitui

informação de interesse coletivo ou geral, nos exatos

termos da primeira parte do inciso XXXIII do art. 5º da

Constituição Federal.

(...)

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8. Por fim, registro que, quando da entrada em vigor da

recente Lei nº 12.527/2011 (Lei de Acesso à Informação

Pública), esta nossa Corte decidiu “divulgar, de forma

ativa e irrestrita, os subsídios dos ministros e a

remuneração dos servidores do quadro de pessoal do

Supremo Tribunal Federal, assim como os proventos dos

ministros aposentados, dos servidores inativos e dos

pensionistas”. O que se deu na quarta sessão

administrativa, realizada em 22 de maio de 2012, por

unanimidade. 9. Ante o exposto, defiro o pedido para

suspender os efeitos da liminar concedida nos autos da

Ação Ordinária nº 001-1.12.0152707-5, até o trânsito em

julgado do processo. (Suspensão de Liminar n. 630/RS.

Decisão Monocrática do Ministro Presidente Carlos Ayres

Britto. Julgamento em 30/07/2012).

Destaque-se, por oportuno, que as instâncias ordinárias, como não poderiam deixar

de ser, vêm seguindo o posicionamento adotado pelo STF, como se extrai de

julgados, inclusive, do Tribunal de Justiça de São Paulo:

Ementa: Indenização por danos morais Município de São

Paulo Divulgação de vencimentos de servidores públicos

em site na internet Lei Municipal n.º 14.720/08 e Decreto

n.º 50.070/08 Gestão de transparência Garantias

individuais Aparente conflito de normas Prevalência do

princípio da supremacia do interesse público sobre o

interesse privado Não configuração da violação das

garantias individuais da intimidade e privacidade, posto

que o servidor é elemento que compõe a Administração

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Pública e se submete aos ditames a ela inerentes

Precedente do STF. Recurso dos autores não provido.

Provido o da Municipalidade. (TJSP. 2ª Câmara de Direito

Público. Apelação cível n. 0043589-34.2010.8.26.0053.

Rel. Des. Renato Delbianco. Julgamento em 11/12/2012).

Ementa: INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.

SERVIDORES PÚBLICOS MUNICIPAL, PUBLICAÇÃO DE

NOMES, CARGOS E REMUNERAÇÃO BRUTA DOS

SERVIDORES. Insurgência do autor, servidores públicos

no Município de São Paulo, contra a divulgação de suas

remunerações em endereço eletrônico. Conduta

administrativa pautada nos princípios da moralidade,

publicidade e transparência. Entendimento externado

pelo E. STF, no julgamento da SS 3902. Ação julgada

improcedente na origem. Sentença mantida. Recurso não

provido. (TJSP. 3ª Câmara de Direito Público. Apelação

cível n. 0001123-88.2011.8.26.0053. Rel. Des. Ronaldo

Andrade. Julgamento em 13/11/2012).

Corretamente, como se vê, o entendimento do Pretório Excelso, desde o ano de

2012, é pela divulgação da remuneração dos servidores da administração pública.

E, atualmente, de igual modo, o SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL,

reiteradamente, interpreta e decide da mesma forma, conforme se vê alhures:

Vistos etc. Contra o acórdão prolatado pelo Tribunal de

origem, maneja recurso extraordinário, com base no art.

102, III, da Lei Maior, a Assembléia Legislativa do Estado

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de São Paulo. Aparelhado o recurso na violação dos arts.

2º, 5º, XXXIII, 27, § 3º, e 37, § 3º, II, da Constituição

Federal. É o relatório. Decido. Preenchidos os

pressupostos extrínsecos. Da detida análise dos

fundamentos adotados pelo Tribunal de origem, por

ocasião do julgamento do apelo veiculado na instância

ordinária, em confronto com as razões veiculadas no

extraordinário, concluo que nada colhe o recurso. O

entendimento adotado no acórdão recorrido não

diverge da jurisprudência firmada no âmbito deste

Supremo Tribunal Federal, razão pela qual não se

divisa a alegada ofensa aos dispositivos

constitucionais suscitados. Nesse sentido: “

SUSPENSÃO DE SEGURANÇA. ACÓRDÃOS QUE

IMPEDIAM A DIVULGAÇÃO, EM SÍTIO ELETRÔNICO

OFICIAL, DE INFORMAÇÕES FUNCIONAIS DE

SERVIDORES PÚBLICOS, INCLUSIVE A

RESPECTIVA REMUNERAÇÃO. DEFERIMENTO DA

MEDIDA DE SUSPENSÃO PELO PRESIDENTE DO

STF. AGRAVO REGIMENTAL. CONFLITO APARENTE

DE NORMAS CONSTITUCIONAIS. DIREITO À

INFORMAÇÃO DE ATOS ESTATAIS, NELES

EMBUTIDA A FOLHA DE PAGAMENTO DE ÓRGÃOS E

ENTIDADES PÚBLICAS. PRINCÍPIO DA

PUBLICIDADE ADMINISTRATIVA. NÃO

RECONHECIMENTO DE VIOLAÇÃO À PRIVACIDADE,

INTIMIDADE E SEGURANÇA DE SERVIDOR

PÚBLICO. AGRAVOS DESPROVIDOS. 1. Caso em que

a situação específica dos servidores públicos é regida pela

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1ª parte do inciso XXXIII do art. 5º da Constituição. Sua

remuneração bruta, cargos e funções por eles

titularizados, órgãos de sua formal lotação, tudo é

constitutivo de informação de interesse coletivo ou

geral. Expondo-se, portanto, a divulgação oficial. Sem

que a intimidade deles, vida privada e segurança pessoal

e familiar se encaixem nas exceções de que trata a parte

derradeira do mesmo dispositivo constitucional (inciso

XXXIII do art. 5º), pois o fato é que não estão em jogo

nem a segurança do Estado nem do conjunto da

sociedade. 2. Não cabe, no caso, falar de intimidade ou de

vida privada, pois os dados objeto da divulgação em causa

dizem respeito a agentes públicos enquanto agentes

públicos mesmos; ou, na linguagem da própria

Constituição, agentes estatais agindo “nessa qualidade” (§

6º do art. 37). E quanto à segurança física ou corporal dos

servidores, seja pessoal, seja familiarmente, claro que ela

resultará um tanto ou quanto fragilizada com a divulgação

nominalizada dos dados em debate, mas é um tipo de

risco pessoal e familiar que se atenua com a proibição de

se revelar o endereço residencial, o CPF e a CI de cada

servidor. No mais, é o preço que se paga pela opção por

uma carreira pública no seio de um Estado republicano. 3.

A prevalência do princípio da publicidade

administrativa outra coisa não é senão um dos

mais altaneiros modos de concretizar a República

enquanto forma de governo. Se, por um lado, há um

necessário modo republicano de administrar o Estado

brasileiro, de outra parte é a cidadania mesma que tem o

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direito de ver o seu Estado republicanamente

administrado. O“como” se administra a coisa pública a

preponderar sobre o “quem” administra – falaria Norberto

Bobbio -, e o fato é que esse modo público de gerir a

máquina estatal é elemento conceitual da nossa

República. O olho e a pálpebra da nossa fisionomia

constitucional republicana. 4. A negativa de

prevalência do princípio da publicidade

administrativa implicaria, no caso, inadmissível

situação de grave lesão à ordem pública. 5.

Agravos Regimentais desprovidos.” (SS 3902 AgR-

segundo, Relator (a): Min.AYRES BRITTO, Tribunal Pleno,

julgado em 09/06/2011, DJe-189 DIVULG 30-09-2011

PUBLIC 03-10-2011 EMENT VOL-02599-01 PP-00055 RTJ

VOL-00220- PP-00149) “(...) (STF - RE: 783476 SP,

Relator: Min. ROSA WEBER, Data de Julgamento:

26/03/2014, Data de Publicação: DJe-063 DIVULG

28/03/2014 PUBLIC 31/03/2014)

Importante ressaltar que a tese consagrada pela jurisprudência pátria nos julgados

supra encontra-se enraizada na Lei Federal n.º 12.527/2011, que, em seu art. 7.º,

determina que o direito de acesso à informação compreende o direito de obter

informações pertinentes à utilização dos recursos públicos, não excepcionando dessa

regra quaisquer recursos.

Forçoso concluir que não é cabível ao intérprete excepcionar do dispositivo em

questão aqueles recursos destinados ao pagamento da folha de pessoal, à

celebração de contratos, à dispensa de procedimentos licitatórios, diárias etc., sob

pena de imiscuir-se na função legislativa, e, consequentemente, afrontar a separação

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dos Poderes prestigiada pelo art. 2.º da Constituição Federal.

Ressalte-se que essa situação somente existe por falta de transparência da Câmara

Municipal quanto à publicidade de seus atos, o que a Lei de Acesso à Informação

veio, de maneira definitiva, a solucionar.

No entanto, de nada servirá a vigência da Lei se a Casa Legislativa Municipal tenta

contornar a sua amplitude.

Assim, por todos os prismas sob os quais se analise a questão, é premente a

ilegalidade e a inconstitucionalidade perpetrada pela Câmara Municipal de Conceição

da Barra, impondo-se sua condenação em obrigação de fazer consistente na

publicação irrestrita, incondicional e atualizada, independentemente de

prévio cadastro, requerimento ou “identificação do requerente”, em todos

os meios de comunicação de que dispuser, especialmente no seu site, de

todas as informações determinadas pela Lei Federal n.º 12.527/2011, a

partir do mês de agosto de 2012.

3. DA ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA

A concessão da medida liminar afigura-se perfeitamente possível, nos moldes, da

Lei da Ação Civil Pública, no caso concreto, como forma de garantir o resultado

prático do processo, dotando-o de efetividade, havendo a necessidade de estarem

presentes os requisitos autorizativos, quais sejam, o fumus boni iuris e o periculum in

mora.

Ensina o professor HUGO NIGRO MAZZILI que:

“Para evitar que o dano provocado pela violação de

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direito seja agravado pela demora da prestação

jurisdicional definitiva (periculum in mora), o

Direito admite provimento jurisdicional de caráter

acautelatório, mediante o qual, havendo base

razoável para a pretensão (fumus boni iuris), pode

o juiz conceder de forma antecipada a prestação

jurisdicional pretendida.” (A defesa dos interesses

difusos em Juízo, 14ª Ed, São Paulo, Saraiva, 2002, pág.

215)

In casu, o novo Código de Processo Civil, também, não fugiu dessa regra. Vejamos:

Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando

houver elementos que evidenciem a probabilidade do

direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil

do processo.

(...)

§ 2o A tutela de urgência pode ser concedida

liminarmente ou após justificação prévia.

§ 3o A tutela de urgência de natureza antecipada não será

concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos

efeitos da decisão.

Com efeito, as provas carreadas aos autos juntamente com esta exordial, constantes

do Procedimento Preparatório Ministerial nº 2015.0010.5877-63, constituem os

elementos que evidenciam a probabilidade do direito autoral, e, mais que isso,

constituem prova incontroversa.

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Isso porque a matéria fática passível de prova no presente caso se resume

especialmente à efetiva disponibilização ou não das informações determinadas pela

Lei Federal n.º 12.527/2011 relativamente aos atos, contratos, licitações, gastos,

lotacionograma, remunerações dos servidores e vereadores da Câmara Municipal de

Conceição da Barra/ES.

Ademais, existem diversos registros, em anexo, de que o website da

Câmara não é atualizado em tempo real, bem como diante da escusa ilegal na

publicação dos dados relativos aos servidores (nome na folha de pagamento,

deduções, acréscimos, vencimentos brutos e líquidos etc).

Por outro lado, também se encontra preenchido o requisito consistente no periculum

in mora, afinal, o dano renova-se dia a dia, não se podendo, simplesmente,

aguardar a final solução da demanda, que pode durar meses ou, talvez, anos,

devido a realidade da comarca, assolada de processos.

É importante considerar, ainda, que a não divulgação de forma irrestrita, atualizada e

incondicional das informações a cargo da Câmara Municipal gera grave lesão à

ordem pública e um dano à sociedade como um todo, na medida em que

impede a concretização da política pública da transparência, impedindo, outrossim, o

controle dos gastos públicos pelos cidadãos e prejudicando, inclusive, o controle

realizado pelo próprio Ministério Público.

Veja-se que as cobranças de transparência quanto à Câmara de Vereadores de

Conceição da Barra, é uma constante por parte dos cidadãos e dos órgãos de

fiscalização não governamental da sociedade, conforme denúncias registradas no

canal de ouvidoria do MPES que também seguem anexas à presente.

Com efeito, os gastos públicos da Câmara Municipal de Conceição da Barra, estão

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sendo promovidos mês a mês, dia a dia, não sendo possível, atualmente, fiscalizá-

los na mesma medida em que efetivados justamente por não ter havido a publicação

irrestrita, incondicional e atualizada das informações determinadas por lei, o que

acarreta um receio de dano irreparável à sociedade, já que gastos supostamente

irregulares poderão ser perpetuados ao arrepio do conhecimento público.

De outro vértice, insta frisar, ad argumentandum tantum, que acaso

denegada a tutela requerida, deixando-se de sanear de imediato a atitude

ilegal perpetrada pela Câmara Municipal, outros órgãos municipais

poderão sentir-se à vontade para proceder ao descumprimento da Lei de

Acesso à Informação nos mesmos moldes aqui vergastados, obtendo-se,

daí, um efeito multiplicador, capaz de comprometer, in totum, a

efetividade da Lei Federal n.º 12.527/2011.

Ademais, destaca-se que a tutela ora requerida em caráter antecipatório é, de um

todo, reversível, pois o retorno ao status quo anterior à concessão da medida poderá

ser efetivado mediante simples modificação do site da Câmara Municipal.

Assim, pugna-se que, uma vez preenchidos os requisitos para antecipação dos

efeitos da tutela, seja ela deferida, inaudita altera parte, para o fim de determinar à

Câmara Municipal de Conceição da Barra, por intermédio do seu Presidente, que, no

prazo de 15 (quinze) dias úteis, se outro Vossa Excelência não entender por bem,

divulgue de forma irrestrita, incondicional e atualizada, independentemente de

“identificação dos requerentes” ou do preenchimento de qualquer tipo de formulário

ou cadastro, em todos os meios de comunicação de que dispuser, especialmente no

seu site:

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(a) as folhas de pagamento contendo o nome completo do servidor, a

respectiva remuneração, com todos os acréscimos, deduções,

indenizações e de seus vereadores (de maneira detalhada);

(b) as diárias pagas aos servidores e vereadores sejam detalhadas no

portal transparência, apontando as razões de sua concessão (data,

motivo da viagem e valor pago), incluindo os respectivos valores

na própria folha de pagamento de cada servidor;

(c) informações detalhadas sobre todos os procedimentos licitatórios

(inclusive editais e resultados e as que se pretende realizar) e

contratos celebrados;

(d) respostas para as perguntas mais frequentes da sociedade,

inclusive para as que se encontram pendentes de resposta no

canal de ouvidoria;

(e) registro das competências, estrutura organizacional, quadro de

cargos, salários, nome de todos os servidores ativos e inativos,

funções exercidas pelos servidores, endereços e telefones das

respectivas unidades e horários de atendimento ao público;

(f) registros de quaisquer repasses ou transferências de recursos

financeiros, bem como registros de todas as suas despesas (cf. art.

8.º da LAI), sem prejuízo de todas as demais informações

determinadas pela Lei Federal n.º 12.527/2011, a partir do mês de

agosto de 2012.

Requer-se, ainda, que seja determinado que, em cumprimento ao disposto no art.

8.º, § 3.º, da LAI, o site da Câmara de Vereadores de Conceição da Barra:

(a) contenha ferramenta de pesquisa de conteúdo que permita o

acesso à informação de forma objetiva, transparente, clara e em

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linguagem de fácil compreensão;

(b) possibilite a gravação de relatórios em diversos formatos

eletrônicos, inclusive abertos e não proprietários, tais como planilhas e

texto, de modo a facilitar a análise das informações;

(c) possibilite o acesso automatizado por sistemas externos em

formatos abertos, estruturados e legíveis por máquina;

(d) divulgue em detalhes os formatos utilizados para estruturação da

informação;

(e) mantenha atualizadas as informações disponíveis para acesso;

(f) adote as medidas necessárias para garantir a acessibilidade de

conteúdo para pessoas com deficiência, nos termos do art. 17 da Lei no

10.098, de 19 de dezembro de 2000, e do art. 9º da Convenção sobre

os Direitos das Pessoas com Deficiência, aprovada pelo Decreto

Legislativo no 186, de 9 de julho de 2008.

Seja fixada a multa diária em caso de descumprimento no montante de R$ 5.000,00

(cinco mil Reais) por dia de atraso.

Pelas razões de fato e de direito acima expostas, o atual pedido de liminar

conta com o pleno respaldo, ainda, do previsto no art. 12 da Lei Federal n.º

7.347/1985 (Lei da Ação Civil Pública).

4. DOS PEDIDOS PRINCIPAIS

Ante o exposto, o Ministério Público requer:

a) seja deferida a antecipação dos efeitos da tutela, inaudita altera pars, para

o fim de determinar à Câmara Municipal de Conceição da Barra, através de

seu Presidente, que divulgue, no prazo de 15 (quinze) dias úteis, ou outro

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fixado por Vossa Excelência, de forma irrestrita, incondicional e atualizada,

independentemente de “identificação do requerente” ou do preenchimento de

qualquer tipo de formulário ou cadastro, em todos os meios de comunicação

de que dispuser, especialmente no site da Câmara Municipal:

(i) as folhas de pagamento contendo a remuneração de todos os seus

servidores (concursados, contratados, empregados) e seus vereadores

(de maneira detalhada);

(ii) informações detalhadas sobre todos os procedimentos licitatórios

(inclusive editais e resultados) e contratos celebrados;

(iii) respostas para as perguntas mais frequentes da sociedade,

inclusive as que se encontram pendentes de resposta junto ao canal de

ouvidoria do portal transparência da câmara;

(iv) registro das competências e estrutura organizacional, endereços e

telefones das respectivas unidades e horários de atendimento ao

público, (v) registros de quaisquer repasses ou transferências de

recursos financeiros, bem como registros de todas as suas despesas

(cf. art. 8.º da LAI), sem prejuízo de todas as demais informações

determinadas pela Lei Federal n.º 12.527/2011, a partir do mês de

agosto de 2012;

(vi) disponibilize em sua homepage ferramentas de pesquisa de

conteúdo que permita o acesso à informação de forma objetiva,

transparente, clara e em linguagem de fácil compreensão;

(vii) possibilite a gravação de relatórios em diversos formatos

eletrônicos, inclusive abertos e não proprietários, tais como planilhas e

texto, de modo a facilitar a análise das informações;

(viii) possibilite o acesso automatizado por sistemas externos em

formatos abertos, estruturados e legíveis por máquina;

(ix) divulgue em detalhes os formatos utilizados para estruturação da

informação;

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Rua Sete de Dezembro, nº. 121, Centro, Cep: 29.960-000 – Conceição da Barra – ES – Tel: (27) 3762-1624

(x) mantenha atualizadas todas as informações disponíveis

para acesso;

(xi) adote as medidas necessárias para garantir a acessibilidade de

conteúdo para pessoas com deficiência, nos termos do art. 17 da Lei no

10.098, de 19 de dezembro de 2000, e do art. 9o da Convenção sobre

os Direitos das Pessoas com Deficiência, aprovada pelo Decreto

Legislativo no 186, de 9 de julho de 2008, no valor de R$ 5.000,00

(cinco mil reais), por dia de atraso no cumprimento da obrigação de

fazer estabelecida;

b) a citação do demandado, para, querendo, oferecer resposta à presente demanda

no prazo legal, sob pena de revelia e confissão quanto à matéria de fato;

c) seja julgada PROCEDENTE a atual demanda no sentido de condenar o demandado

na obrigação de fazer consistente na divulgação, por parte da Câmara Municipal, no

prazo de 15 dias úteis, ou outro fixado por Vossa Excelência, de forma irrestrita,

incondicional e atualizada, independentemente de “identificação do requerente” ou

do preenchimento de qualquer tipo de formulário ou cadastro, em todos os meios de

comunicação de que dispuser, inclusive no site da Câmara Municipal:

(i) as folhas de pagamento contendo a remuneração de todos os seus

servidores (concursados, contratados, empregados) e seus vereadores

(de maneira detalhada);

(ii) informações detalhadas sobre todos os procedimentos licitatórios

(inclusive editais e resultados) e contratos celebrados;

(iii) respostas para as perguntas mais frequentes da sociedade,

inclusive as que se encontram pendentes de resposta junto ao canal de

ouvidoria do portal transparência da câmara;

(iv) registro das competências e estrutura organizacional, endereços e

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telefones das respectivas unidades e horários de atendimento ao

público, (v) registros de quaisquer repasses ou transferências de

recursos financeiros, bem como registros de todas as suas despesas

(cf. art. 8.º da LAI), sem prejuízo de todas as demais informações

determinadas pela Lei Federal n.º 12.527/2011, a partir do mês de

agosto de 2012;

(vi) disponibilize em sua homepage ferramentas de pesquisa de

conteúdo que permita o acesso à informação de forma objetiva,

transparente, clara e em linguagem de fácil compreensão;

(vii) possibilite a gravação de relatórios em diversos formatos

eletrônicos, inclusive abertos e não proprietários, tais como planilhas e

texto, de modo a facilitar a análise das informações;

(viii) possibilite o acesso automatizado por sistemas externos em

formatos abertos, estruturados e legíveis por máquina;

(ix) divulgue em detalhes os formatos utilizados para estruturação da

informação;

(x) mantenha atualizadas as informações disponíveis para acesso;

(xi) adote as medidas necessárias para garantir a acessibilidade de

conteúdo para pessoas com deficiência, nos termos do art. 17 da Lei no

10.098, de 19 de dezembro de 2000, e do art. 9o da Convenção sobre

os Direitos das Pessoas com Deficiência, aprovada pelo Decreto

Legislativo no 186, de 9 de julho de 2008, sob pena de multa), no valor

de R$ 5.000,00 (cinco mil Reais), por dia de atraso no cumprimento da

obrigação de fazer estabelecida;

Embora já tenha apresentado o Ministério Público prova pré-constituída de todo o

alegado, requer-se, outrossim, a produção de prova documental, testemunhal,

pericial, e, até mesmo, inspeção judicial, que se fizerem necessárias ao pleno

conhecimento dos fatos, inclusive no transcurso do contraditório que se vier a formar

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com a apresentação de contestação.

Atribui-se à causa o valor de R$ 1.000,00 (hum mil reais), embora sejam os bens em

questão de valor inestimável.

Conceição da Barra/ES, 07 de abril de 2016.