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1 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO Promotoria de Justiça Cível de Linhares - Saúde _________________________________________________________________________________________________________________________________ Rua Argemiro Garcia Duarte, 818 B. Três Barras 29907-260 Linhares ES Tel.: 27 3264-7676 www.mpes.gov.br _________________________________________________________________________________________________________________________________ Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz de Direito da 3ª Vara Cível, Fazenda e Registro Público da Comarca de Linhares/ES. Ref. Inquérito Civil Público MPES n. 2016.0029.2121-05 O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO, através de seu órgão de execução, vem, com o devido respeito e acato, em defesa dos postulados norteadores da Administração Pública, artigos 4º e 5º da Lei 7.347/85 (LACP) e nos artigos 9º, 10 e 11 da Lei nº 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa), propor a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE COM PEDIDO LIMINAR DE INDISPONIBILIDADE DE BENS em face de 1) ASSUERIO MOREIRA, CPF n. 395.239.857-87, título de eleitor n. 5971231430, nascido em 22/12/1955, residente na Av. Joao Felipe Calmon, n. 1262, Centro, Linhares/ES, CEP 29.900-010; 2) ISMAIL PINHEIRO RAMALHO, CPF n. 195.815.137-87, título de eleitor n. 761061406, nascido em 25/11/1948, residente na Rua Izidro Benezath, n. 45, Enseada do Suá, Vitória/ES, CEP 29.050-300;

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Rua Argemiro Garcia Duarte, 818 – B. Três Barras – 29907-260 – Linhares – ES – Tel.: 27 3264-7676 – www.mpes.gov.br _________________________________________________________________________________________________________________________________

Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz de Direito da 3ª Vara Cível, Fazenda e

Registro Público da Comarca de Linhares/ES.

Ref. Inquérito Civil Público MPES n. 2016.0029.2121-05

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO,

através de seu órgão de execução, vem, com o devido respeito e acato, em defesa

dos postulados norteadores da Administração Pública, artigos 4º e 5º da Lei

7.347/85 (LACP) e nos artigos 9º, 10 e 11 da Lei nº 8.429/92 (Lei de Improbidade

Administrativa), propor a presente

AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE COM PEDIDO LIMINAR DE

INDISPONIBILIDADE DE BENS

em face de

1) ASSUERIO MOREIRA, CPF n. 395.239.857-87, título de eleitor n.

5971231430, nascido em 22/12/1955, residente na Av. Joao Felipe Calmon,

n. 1262, Centro, Linhares/ES, CEP 29.900-010;

2) ISMAIL PINHEIRO RAMALHO, CPF n. 195.815.137-87, título de eleitor n.

761061406, nascido em 25/11/1948, residente na Rua Izidro Benezath, n.

45, Enseada do Suá, Vitória/ES, CEP 29.050-300;

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Rua Argemiro Garcia Duarte, 818 – B. Três Barras – 29907-260 – Linhares – ES – Tel.: 27 3264-7676 – www.mpes.gov.br _________________________________________________________________________________________________________________________________

3) JOSE ZITENFELD CARDIA, brasileiro, CPF n. 299.159.707-06, título de

eleitor n. 6043111490, nascido em 31/05/1948, residente na Av. Joao Felipe

Calmon, n. 1115, Centro, Linhares/ES, CEP. 29.900-010; e

4) TELMO HENRIQUE FIOROTT, brasileiro, CPF n. 997.543.477-00, título de

eleitor n. 6029301422, nascido em 01/02/1968, residente na Av. Jones

Santos Neves, n. 1763, bairro Colina, Linhares/ES, CEP 29.900-393.

expondo, para tanto, os fatos e fundamentos jurídicos adiante externados.

I – FATOS

I. A) PARTE GERAL

Tramitou na 1ª Promotoria Cível o inquérito civil MPES n.

2014.0009.3002-84, através do qual se apurava o eventual descumprimento da

carga horária de médicos lotados no Hospital Geral de Linhares – HGL. Em

complemento aos documentos produzidos no aludido inquérito, o Ministério

Público, no final de 2015, recebera denúncias formais e informais de que a

dimensão do problema era muito maior do que se esperava.

De acordo com o ofício de fl. 15 (assinado em 06/01/2016), o HGL

possuía no quadro de servidores 115 médicos entre efetivos e contratados, o que

aparentemente daria efetividade às ações e serviços de saúde. Contudo, apesar do

número elevado de médicos e do pagamento de diversas gratificações por

produtividade, sabemos que o hospital é reiteradamente criticado pela extrema

demora e ausência de resolutividade nas demandas.

Neste passo, diante dos fortes indícios de descumprimento da carga

horária por um número expressivo de médicos, foi solicitado, através do ofício de

fls. 29/30, auxílio ao chefe do GAECO para viabilizar o monitoramento dos médicos

na parte interna e externa do hospital, tendo ele prontamente entendido a

gravidade da situação e disponibilizado policiais para acompanhamento durante o

período compreendido entre 06 a 16 de junho de 2016.

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Após 10 dias de acompanhamento e poucos meses de análise e

registro das provas produzidas, a Promotoria de Justiça recebeu o surpreendente

relatório de fls. 59/100, que revela o flagrante descumprimento da carga horária

por parte dos demandados.

Não obstante a prova técnica, foram ouvidas diversas testemunhas

(entre servidores e ex-servidores) para comprovar que a prática era contínua e

antiga, gerando um enorme prejuízo aos cofres públicos e prejudicando de maneira

substancial a qualidade da prestação do serviço.

PABLO FREDMAMM DE SOUZA – diretor do HGL quando do

monitoramento:

“... 24 – ISMAIL PINHEIRO RAMALHO: ... que muita gente reclamava do

atendimento dele, inclusive a equipe de enfermagem; que, além de não

cumprir quase nada da carga horária, tratava mal, além de residir em

Aracruz; ... 27 – TELMO HENRIQUE FIOROT: ... que recentemente ele foi

exonerado porque não atendia a demanda da unidade; que, a rigor, ele

deveria trabalhar 20 horas semanais, o que daria 10 horas para cada dia que

ele visitava o hospital (segundas e terças); que a função dele era de realizar as

endoscopias, porém se recusava a atender os pacientes não internados que

necessitavam do procedimento; que, em virtude disso, não fazia praticamente

nada no hospital; que a reclamação era geral de tal recusa; que acredita que

ele fazia aproximadamente 2 endoscopias por dia trabalhado, o que

correspondia a aproximadamente 1 hora; ... 31 – ASSUÉRIO MOREIRA:

pediatra cirurgião da SESA que possui vínculo para atendimento de 20 horas

semanais; que tal médico não trabalha e somente aparece no hospital para

‘bater ponto’; ... 36 – JOSÉ ZITENFELD CARDIA: .... que, a rigor, ele deveria

cumprir 4 horas por dia, porém só aparece um único dia para ‘bater o ponto’;

que somente trabalha quando é chamado por telefone; que, quando chamado,

cumpre com suas obrigações; que atualmente ele está de licença porque é

candidato a prefeito de Linhares; que o Dr. José Cardia possui um

consultório próprio e trabalha no Rio Doce”.

SAMIRA MONTEIRO MARIM – que na época trabalhava na assessoria

jurídica da direção hospital:

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“... 24 – ISMAIL PINHEIRO RAMALHO: ortopedista que trabalhava na época

de 15 em 15 dias por 48 horas; que ele é de Aracruz; ... 31 – ASSUÉRIO

MOREIRA: pediatra cirurgião da SESA que possui vínculo para atendimento

de 20 horas semanais; que tal médico somente aparecia no HGL para bater

ponto; que já presenciou tal situação por diversas vezes; ... 36 – JOSÉ

ZITENFELD CARDIA: urologista; que a equipe de enfermagem fala que ele

aparece apenas quando convém; que já viu várias vezes ele deixando uma

S10 prata estacionada na rampa do hospital (inclusive atrapalhando as

ambulâncias), com o único objetivo de registrar sua entrada, porém saía em

seguida para local ignorado; que no dia seguinte retornava tão somente para

registrar a saída, utilizando-se da mesma forma; que todos no hospital sabem

disso; que não sabe se ele atende as demandas quando solicitado; que sabe

que ele realiza cirurgias no Hospital Rio Doce;”

EDNA BATISTA RODRIGUES GOMES – que exerce a função de chefe

de divisão de RH no HGL:

“... Ismail Pinheiro Ramalho: ortopedista que trabalhava no Pronto Socorro;

que tal médico não era concursado, razão pela qual foi exonerado no período

de fechamento do Centro Cirúrgico; que tal médico fazia dois plantões

consecutivos a cada 15 dias; que, por tal razão, seu plantão durava 48 horas;

que o via com pouco frequência, até porque não visita muito o Pronto

Socorro; ...; Assuério Moreira: cirurgião pediatra; que há aproximadamente 1

ano ele apenas visita o HGL para registrar e entrada e a saída, não

permanecendo no hospital para trabalhar; que metade do mesmo vínculo ele

cumpre na USL 3; que o Dr. Assuério é servidor do Estado; que nem o diretor

ligando para ele aparecia para realizar as cirurgias; que ainda continua na

folha do HGL; Telmo Henrique Fiorot: médico gastroenterologista

contratado para fazer exames de endoscopia; que ele foi exonerado há poucos

meses; que tal médico aparecia para realizar alguns exames, procedendo de

tal forma conforme o agendamento; que o antigo AMA (atual CROSS) que

agendava os exames, porém acredita que o próprio médico que limitava o

número de agendamentos; que os exames só eram realizados no HGL se o

paciente estivesse internado ou nos casos de encaixes; e José Zitenfeld

Cardia: ...que somente visita o hospital quando chamado; que com o

fechamento do Centro Cirúrgico ele somente aparece quando algum servidor

da enfermagem liga relatando a necessidade; que acredita que sua demanda

seja muito baixa; que ele e outros escolhem um determinado dia para

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registrar a frequência e aguardar ser chamado; que tal prática é muito antiga,

porém conhece somente agora os detalhes porque está no RH”.

IRINETE LEPPAUS – enfermeira que atua há quatro anos no Pronto

Socorro do HGL:

“...Ismail Pinheiro Ramalho: ortopedista do Pronto Socorro; que somente

encontrava com ele quando precisava de alguma assistência no corredor do

PS; que várias vezes pacientes solicitaram o comparecimento do médico

plantonista, pois não eram encontrados no consultório; que já aconteceu com

diversos médicos, inclusive com o Dr. Ismail; ...; Assuério Moreira: ... que

somente aparecia no hospital quando recebia ligações por parte dos

profissionais de saúde; que ele nunca realizou plantão presencial, porém

realizava algumas cirurgias na época em que o Centro Cirúrgico funcionava;

que não sabe se atualmente ele trabalha no HGL, porém tem mais de 6 meses

que não encontra com ele; que atualmente ele não mais realiza avaliações

pediátricas; que das últimas vezes que ligou para o médico ele esclareceu que

não atua mais nestas avaliações; que, por tal razão, as crianças são

encaminhas para o Hospital Infantil de Vitória; que não sabe se ele ainda

mantém vínculo com o HGL; ... José Zitenfeld Cardia: ... que geralmente

era o enfermeiro que solicitava o comparecimento dele no hospital após

pedido do médico clínico; que nunca viu o Dr. Cardia fazendo plantão

presencial; que em média aparecem uma ou duas demandas por dia para

avaliação do urologista; que quando ligava ele não passava um horário

específico para comparecimento; que poderia demorar 10 minutos a 12 horas;

que havia dia que ele sequer passava no HGL, motivo pelo qual os pacientes

não eram atendidos”.

KELLY JESUS MARTINELLI FARIAS – servidora do setor

administrativo do HGL:

“ ...Ismail Pinheiro Ramalho: ortopedista do Pronto Socorro que até ano

passado realizava uma escala de 48 horas a cada 15 dias; que o aludido

médico alegava que, por morar em Vitória, precisava cumprir a escala de uma

única vez; que tal médico foi exonerado, porém retornou em agosto do ano

passado como plantonista extra; que atualmente somente cumpre 24 horas;

que já viu o médico no final de semana; ...”.

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NELIANA DALLA BERNADINA MARSALHA – coordenadora da equipe

de enfermagem desde 2011:

“... 31 – ASSUÉRIO MOREIRA: que raramente encontra com este médico; que

acredita que ele só tem vínculo para fazer procedimento; que não encontra

com ele em nenhum dos períodos do dia; ... 36 – JOSÉ ZITENFELD CARDIA:

urologista; que ele fazia cirurgias e avaliações no Centro Cirúrgico; que

somente aparece no hospital quando solicitado ou quando fazia cirurgia; que

encontra com o aludido médico raramente”

CAROLINE SILVA SONEGHETTI – enfermeira do HGL:

“... que o Dr. Cardia aparecia no PS quando o clínico solicitava a avaliação de

um urologista; que a equipe ligava e solicitava seu comparecimento; que a

demora no atendimento variava muito; que algumas vezes ele aparecia

rápido porque já estava no hospital, outras demorava até horas após a

ligação”.

Observa-se, ainda, que as provas produzidas revelam que atualmente

existem dois sistemas de controle de frequência: o cartão e o controle biométrico de

ponto (fls. 134/139). O primeiro sistema é extremamente vulnerável, pois basta o

servidor deixar o cartão com um colega para que o registro seja efetivado. Com isso,

um procedimento específico será instaurado na Promotoria de Justiça com o

objetivo de aperfeiçoar a fiscalização.

Enfim, com apoio na vasta prova documental e testemunhal,

importante registrar as peculiaridades de cada um dos demandados:

ASSUÉRIO MOREIRA

Trata-se de médico pediatra cedido pela Secretaria Estadual de Saúde

– SESA ao Município de Linhares para exercer sua função no HGL, conforme termo

de cessão de fls. 304 a 307 e ficha financeira de fl. 289.

No relatório de fls. 59/110 consta que, durante os 10 dias de

monitoramento (06 a 16 de junho de 2016), o Dr. Assuério, escalado para os dias

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06 e 13 de junho de 2016 (segundas-feiras), deveria trabalhar em uma escala de 24

horas, das 07:00 às 07:00 horas do dia seguinte, conforme documento de fl. 141.

Não há informações quanto à visualização do médico no dia 06 de

junho (apesar de escalado), porém constam as seguintes informações dos dias 13 e

14 de junho:

13 de junho de 2016: 1) a equipe visualizou o veículo do médico estacionando nas

proximidades do hospital às 07h44min; 2) o médico saiu do HGL em seu veículo às

08h04min com destino ao Centro de Linhares/ES, onde estacionou às 08h08min; 3)

não foi visualizado retorno do médico após sua saída.

14 de junho de 2016: 1) a equipe visualizou o veículo do médico nas proximidades

do hospital às 08h20min; 2) o Dr. Assuério registrou o “ponto de saída” e partiu em

seu veículo às 08h28min.

Por sua vez, as testemunhas confirmam que ele aparecia no hospital

com o único objetivo de registrar a presença, o que foi confirmado pelo resultado do

monitoramento.

Em sua defesa de fls. 339/347, afirma, em síntese, que estaria no

regime de sobreaviso durante 30 dias por mês, uma prática que, segundo ele,

contava com a anuência da gestão municipal. No entanto, não há lei vigente

regulamentando o regime de sobreaviso, a carga horária e a remuneração recebida

não são compatíveis com o regime alegado, e a própria gestão municipal e a direção

do hospital que pediram e apoiaram a investigação do Ministério Público. Além

disso, a implantação do controle eletrônico de ponto foi um recado claro de que não

mais se admitiria o descumprimento presencial da carga horária. De qualquer

forma, o regime de sobreaviso será tratado com mais detalhes em tópico específico.

Também alega que presta serviços para a Unidade de Saúde 3 (bairro

Araçá) duas vezes por semana, o que superaria em muito sua carga horária de 20

horas semanais. No entanto, não apresentou qualquer documento que o autorize,

muito menos a comprovação de sua produtividade.

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Os vínculos e respectivos regimes até o momento identificados são:

Dr. Assuério

Mês de referência: Junho de 2016

Vínculo com o HGL: regime de plantão 24 horas

às segundas-feiras

Vínculo com o Hospital Rio Doce: sobreaviso de

segunda à sexta-feira (13 a 19 e 27 a 03/07/16)

Vínculo com a Unimed: sobreaviso de segunda à

sexta-feira (06 a 12 e 20 a 26/06/16)

Vínculo particular: sócio da CIRPED Clínica de

Cirurgia Pediátrica Ltda.

Como se vê, apesar de dizer que estaria disponível durante 30 dias por

mês, é sócio de uma clínica particular, além de trabalhar no regime de sobreaviso

para os hospitais Unimed e Rio Doce, inclusive no dia do plantão do HGL.

ISMAIL PINHEIRO RAMALHO

Médico ortopedista do Pronto Socorro contratado para uma carga

horária inicial de 20 horas semanais para o regime de plantão presencial (fl. 298).

O relatório revela que o Dr. Ismail, escalado para 10 de junho de 2016

(sexta-feira), deveria trabalhar em uma escala de 24 horas (20 + 4 horas extras),

das 07:00 às 07:00 horas do dia seguinte, conforme documento de fl. 143. No

entanto, o próprio demandado esclareceu, às fls. 357/362, que deveria cumprir

uma escala de 48 horas (como, inclusive, já confirmado por várias testemunhas), o

que significaria um trabalho das 07:00 horas do dia 10 às 07:00 horas do dia 12.

Seguem as informações registradas:

11 de junho de 2016: 1) a equipe visualizou o veículo do médico (que reside em

Vitória) estacionando nas proximidades do hospital às 07h57min; 2) às 17h45min o

Dr. Ismail foi visualizado saindo do HGL em seu veículo; 3) foi realizado

acompanhamento até a praça do pedágio da Concessionária ECO-101 (sentido

Vitória).

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Observa-se, assim, que ele somente foi visto no dia 11 de junho de

2016, confirmando-se, portanto, os depoimentos testemunhais, segundo os quais o

Dr. Ismail – que reside em Vitória – trabalhava muito menos do que deveria, até

porque, sob a justificativa de residir em outra cidade, realizava com frequência a

surpreendente escala de 48 horas a cada 15 dias.

Em sua defesa de fls. 357/362, além de reconhecer a escala de 48

horas, sustenta que teve problemas de saúde que justificou sua saída de Linhares

às 17:45 horas do dia 11. No entanto, além de não ter sido visto no dia anterior, as

testemunhas confirmam que a ausência do Dr. Ismail nos plantões não era

esporádica, até porque não dá para admitir uma escala de dois dias consecutivos.

JOSÉ ZITENFELD CARDIA

O relatório revela que o Dr. José Cardia – médico urologista –, escalado

para 08 e 15 de junho de 2016 (quartas-feiras), deveria trabalhar em uma escala de

24 horas como plantonista (20 + 4 horas extras), das 07:00 às 07:00 horas do

dia seguinte, conforme documento de fl. 141. De acordo com as testemunhas,

também teria ele a opção de trabalhar 4 horas por dia das segundas às sextas-

feiras.

Seguem as informações registradas:

08 de junho de 2016: a equipe não visualizou o médico nem obteve informações de

que ele teria comparecido;

15 de junho de 2016: 1) a equipe recebeu a informação – que foi confirmada pelas

imagens das câmaras interna e externa – de que o veículo do médico estaria

estacionado na rampa de acesso ao hospital, em frente à entrada, onde está

localizado o equipamento de autenticação biométrica, às 14h45min; 2) a equipe o

visualizou saindo do HGL em seu veículo às 14h53min, tendo iniciado o

acompanhamento; 3) ao sair do hospital o médico parou no Banco Banestes

localizado no Centro de Linhares/ES, onde permaneceu até às 15h10min; 4) em

seguida, prosseguiu ao Posto Ipiranga Camatta para abastecimento (15h22min às

15h29min); 5) prosseguiu até o CENTROLAB, entrando em seguida no prédio do

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CENTRO MÉDICO ESPECIALIZADO, onde permaneceu até às 15h55min; 6) de lá

deslocou-se para o CEMITÉRIO SÃO JOSÉ, chegando às 16h05min, onde

permaneceu até às 16h22min; 7) após sair do cemitério, retornou ao mesmo

estacionamento do CENTROLAB às 16h35min, retornando ao CENTRO MÉDICO

ESPECIALIZADO, onde permaneceu até às 17h45min; 8) às 18:00 horas seguiu para

uma residência situada à Rua Carijós, Lagoa do Meio, Linhares/ES.

16 de junho de 2016: 1) a equipe visualizou o retorno do médico ao HGL para

autenticação biométrica às 10h53min; 2) o veículo do Dr. Cardia permaneceu

estacionado na rampa de acesso do HGL entre 10h53min às 10h57min; 3) Após o

registro saiu para local ignorado, não retornando ao hospital.

Portanto, o resultado do monitoramento, os documentos e as

testemunhas comprovam que o Dr. Cardia não cumpre a carga horária integral.

Segundo as testemunhas, ele, quando chamado por telefone, nem sempre

comparece e, quando isso ocorre, muitas vezes demora até horas chegar ao

hospital.

Em sua defesa de fls. 348/356, afirma, em síntese, que estaria no

regime de sobreaviso durante 30 dias por mês, uma prática que, segundo ele,

contava com a anuência da gestão municipal. No entanto, não há lei vigente

regulamentando o regime de sobreaviso, a carga horária e a remuneração recebida

não são compatíveis com o regime alegado, e a própria gestão municipal e a direção

do hospital que pediram e apoiaram a investigação do Ministério Público. Além

disso, a implantação do controle eletrônico de ponto foi um recado claro de que não

mais se admitiria o descumprimento presencial da carga horária. De qualquer

forma, o regime de sobreaviso será tratado com mais detalhes em tópico específico.

Apenas para exemplificar a distorção entre a carga horária exigida com

a cumprida, nos 10 dias de monitoramento os policiais não viram o médico

atendendo um paciente sequer. Ademais, o Dr. Cardia trabalha no Centro Médico

Especializado no horário em que deveria estar no hospital.

Os vínculos e respectivos regimes até o momento identificados são:

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Dr. José Cardia

Mês de referência: Junho de 2016

Vínculo com o HGL: regime de plantão de 20

horas às quartas-feiras, cujo acréscimo de 4 horas

resulta no pagamento de uma gratificação

prevista em lei municipal

Vínculo com a Unimed: sobreaviso sexta, sábado

e domingo, variando a escala

Vínculo com o Hospital Rio Doce: 24 horas em

regime de sobreaviso às sextas-feiras

Exerceu o cargo de vereador até se candidatar a

prefeito de Linhares

Vínculo particular: sócio da UROCARD Serviços

Médicos Ltda.

Como se vê, o exercício adequado de suas atividades mostra-se

totalmente incompatível com os vínculos que possui em outras unidades de saúde.

TELMO HENRIQUE FIOROTT

O relatório revela que o Dr. Telmo, escalado para 06 e 13 de junho de

2016 (segundas-feiras), deveria trabalhar em uma escala de 24 horas como

plantonista (20 + 4 horas extras), das 07:00 às 07:00 horas do dia seguinte,

conforme documento de fl. 144. Contudo, o demandado esclareceu, às fls.

308/324, que trabalha às segundas e terças-feiras (fato confirmado pelas

testemunhas), ficando em regime de sobreaviso enquanto ausente do HGL.

Por sua vez, a equipe do GAECO registrou que o Dr. Telmo possui a

prática de chegar em horários diversos durante a manhã, permanecendo no

hospital por apenas 1 hora, senão vejamos:

06 de junho de 2016: primeiro dia do trabalho dos policiais, não havendo

notícias da localização do médico;

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13 de junho de 2016: 1) a equipe visualizou o médico estacionando seu

veículo nas proximidades do hospital às 07h20min; 2) de acordo com os

registros de imagens das câmeras internas, o médico realizou a autenticação

biométrica de saída às 08:04 horas, o que foi confirmado pela equipe pelo

fato de seu veículo não ter sido mais visualizado no estacionamento às 08:10

horas;

14 de junho de 2016: 1) a equipe visualizou o médico estacionando seu

veículo nas proximidades do hospital às 08h50min; 2) o Dr. Telmo saiu do

HGL em seu veículo às 10h22min para local ignorado.

Em sua defesa de fls. 308/324, afirma, em síntese, que sua função era

realizar exames de endoscopia digestiva alta, exclusivamente aos pacientes

internados no hospital, e prestar atendimento às urgências endoscópicas. Sustenta

que comparecia no hospital no início das manhãs das segundas e terças-feiras,

permanecendo sob o regime de sobreaviso – que será tratado no próximo tópico –

enquanto ausente do hospital até o encerramento de seu plantão, às 17:00 horas de

terça, já que não havia atendimento noturno na segunda.

Às fls. 331/336 consta um relatório do registro de atendimentos

realizados de janeiro a agosto de 2016, que revela que o Dr. Telmo, em junho de

2016, realizou apenas 8 procedimentos.

Ademais, a ficha funcional de fl. 265 revela que o médico possui outro

vínculo com o Município de Linhares, obrigando-se, portanto, ao cumprimento de

outras 20 horas semanais como médico clínico-geral, lotado na Unidade Sanitária

Araçá.

No entanto, a declaração de fl. 129 indica um novo descumprimento

da carga horária, já que, no dia 16 de agosto de 2016, o paciente chegou às 13:18

horas para uma consulta marcada às 13:00 horas, porém foi informado que o Dr.

Telmo já havia saído. Também acrescentou que seria comum a marcação de

consultas no mesmo horário e que o médico já havia atendido 2 pessoas em menos

de 18 minutos. Por fim, registrou sua indignação porque precisava fazer um

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acompanhamento a cada 6 meses, no entanto já havia quase um ano da última

consulta.

Como se vê, apesar do médico alegar que está sempre à disposição do

Município, não retornou à Unidade para atender os pacientes que chegaram poucos

minutos atrasados, demonstrando, ainda, que suas consultas são marcadas para o

mesmo horário e extremamente rápidas.

No que tange aos demais vínculos do Dr. Telmo, o documento de fl.

245 comprova que ele também atendia no ambulatório da Unimed nas terças-feiras

(dia do plantão no HGL), das 09:00 às 11:00 horas.

Portanto, o resultado do monitoramento, os documentos e as

testemunhas comprovam que o Dr. Telmo não cumpre a carga horária, já que,

quando comparece ao hospital (segundas e terças-feiras), trabalha por

aproximadamente 1 hora, o que não atinge sequer metade de sua carga horária.

Ademais, em seu outro vínculo (Unidade de Saúde do bairro Araçá) já foi flagrado

não permanecendo sequer 18 minutos para cumprimento de suas obrigações.

I.B) REGIME DE SOBREAVISO – INAPLICABILIDADE EM FAVOR DO

DEMANDADOS

Os demandados Telmo, Cardia e Assuério alegam que estariam

submetidos ao regime de sobreaviso, o qual, de acordo com o §2º do art. 244 da

Consolidação das Leis do Trabalho, configura-se quando o empregado permanece,

em sua própria casa (“estado de disponibilidade”), aguardando a qualquer momento

o chamado para o serviço, limitando-se cada escala de sobreaviso a 24 horas, que

são contadas, para todos os efeitos, à razão de um terço do salário normal.

O Tribunal de Contas da União1, ao se manifestar a respeito da

legalidade da implantação do regime de sobreaviso a servidores regidos pela Lei

8.112/90, decidiu:

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“não há impedimento legal para a instituição de regime de sobreaviso para o

servidor estatutário, desde que esse regime esteja disciplinado em

regulamento próprio do órgão dotado de autonomia administrativa e

financeira como uma das formas de cumprimento da jornada de trabalho,

considerado os limites fixados pelo art. 19 da Lei nº 8.112, de 1990, bem

como, para fins de registro em banco de horas, seja observada, por analogia,

a proporção estabelecida no art. 244, § 2º, da Consolidação das Leis do

Trabalho (CLT) como limite máximo de equivalência da hora de

sobreaviso em relação à hora trabalhada”

Neste passo, apesar da possibilidade de implantação do regime de

sobreaviso, necessário que essa forma de prestação de serviço esteja prevista em lei

específica que descreva, de maneira clara e precisa, os direitos e deveres das partes.

A ementa ficou assim redigida:

SUMÁRIO: TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO. CONSULTA ACERCA DA

LEGALIDADE DA IMPLANTAÇÃO DO REGIME DE SOBREAVISO A

SERVIDORES REGIDOS PELA LEI 8.112/1990, COM

CONTRAPRESTAÇÃO PECUNIÁRIA. CONHECIMENTO. RESPOSTA AO

CONSULENTE. COMUNICAÇÕES.

- É ilegal a instituição do regime de sobreaviso aos servidores regidos

pela Lei 8.112/1990, com contraprestação pecuniária, sem que exista lei

específica que dê suporte à existência do referido instituto, bem como à

forma de sua remuneração.

Como visto, firmou-se o entendimento no sentido de que as regras da

CLT podem ser utilizadas por analogia, razão pela qual a remuneração daqueles

submetidos ao regime de sobreaviso equivaleria a um terço das horas efetivamente

trabalhadas, sendo, portanto, natural e óbvia a distinção remuneratória entre os

tipos de serviço.

1 TCU. Processo TC nº 001.728/2015-6. Acórdão nº 784/2016 – Plenário. Relator: Ministro Vital do Rêgo

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Por sua vez, a Resolução CFM nº 1.834/2008 (Publicada no D.O.U.,

de 14 de março de 2008, Seção I, pg. 195) regulamentou a disponibilização médica

em sobreaviso:

“Art. 1º Definir como disponibilidade médica em sobreaviso a atividade do

médico que permanece à disposição da instituição de saúde, de forma não-

presencial, cumprindo jornada de trabalho preestabelecida, para ser

requisitado, quando necessário, por qualquer meio ágil de comunicação,

devendo ter condições de atendimento presencial quando solicitado em

tempo hábil”.

“Art. 6º Compete ao diretor técnico e ao Corpo Clínico decidir as

especialidades necessárias para disponibilidade em sobreaviso, de acordo

com a legislação vigente”.

Na exposição de motivos da aludida resolução, o Conselheiro relator,

Dr. Antônio Gonçalves Pinheiro, esclarece:

“(...) Há resoluções outras sobre o assunto − tais como as do CRM-RJ, CRM-

CE, CRM-SP, CRM-PR e CRM-ES − que, pelo exposto, possibilitam verificar

que a disponibilidade em sobreaviso é uma realidade nacional e tem o condão

de suprir as necessidades de diferentes localidades no tocante à assistência

médica. No entanto, sua regulamentação deve estar sujeita a normas

rígidas e claras, não apenas para evitar eventual omissão de socorro e

prejuízo no atendimento à população, mas também para a segurança e

garantia do próprio médico.”

Em 28 de outubro de 2014 o Sindicato dos Médicos no Estado de

Goiás – SIMEGO, através dos advogados Marun Kabalan, Flávia Fernandes e Jayme

Freitas, emitiu um parecer jurídico acerca do tema:

“O plantão de sobreaviso ou à distância é caracterizado pela

disponibilidade de especialistas, fora da unidade de saúde, que

permanecem alcançáveis quando acionados para atender pacientes que

lhes são destinados, conforme dispõe artigo 1º citado.

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O médico "de sobreaviso" encontra-se obrigado a se locomover até a unidade

de saúde, tão logo seja acionado, para atender casos de emergência, realizar

cirurgias, procedimentos diagnósticos e internações clínicas, fazendo jus à

remuneração correspondente a este serviço, inclusive no serviço de saúde

mantido pelo Poder Público, quando este houver legalmente instituído

este tipo de serviço”.

“não é lícito o estabelecimento de plantão médico em regime de

sobreaviso no serviço público local (estadual ou municipal), sem que

antes haja a previsão desta forma de prestação de serviços pelo médico

servidor público numa lei estadual ou municipal, não sendo

recomendado que o médico atue no serviço público ao alvedrio do gestor

da unidade de saúde, posto que tanto ele quanto o seu superior

hierárquico poderão responder processos administrativos e judiciais para

apuração de atos de improbidade administrativa, com consequências e

reflexos em suas carreiras funcionais e até pessoais”.

“Diante dos questionamentos feitos pelo consulente, temos a informar que se

o médico servidor público federal, estadual ou do Município de Goiânia tiver

que executar suas funções numa carga horária de 20 (vinte) ou 40 (quarenta)

horas semanais, isto é, na forma exigida pela Administração Pública desde a

publicação do Edital do Concurso Público para admissão ao serviço público,

ele terá, de fato, que cumprir esta jornada de trabalho de forma presencial

em seu posto e local de desempenho de sua função pública, não sendo

lícita a prestação de serviços apenas em escala de sobreaviso sem que

haja a edição de uma lei que autorize esta forma de labor médico no

serviço público, seja federal, estadual ou municipal e sem que haja

deliberação por partes dos gestores da Saúde Pública em adotar esta

forma de prestação de serviços.”

O Tribunal de Justiça de Rondônia já decidiu caso semelhante:

APELAÇÃO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE. CONTRATO

ADMINISTRATIVO. SERVIÇO. ATENDIMENTO MÉDICO. ORTOPEDISTA.

REGIME DE EXECUÇÃO. JORNADA DE TRABALHO. PLANTÕES DE 24 E 12

HORAS. DESCUMPRIMENTO. REGIME DE SOBREAVISO. NÃO PREVISÃO

CONTRATUAL. ADMINISTRADOR. PROFISSIONAL MÉDICO. CULPA

CONCORRENTE. SERVIDOR SEM CAPACIDADE DECISÓRIA. SEM

RESPONSABILIZAÇÃO. PROVIMENTO PARCIAL. Qualquer profissional

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contratado pelo estado que não cumpre de forma integral o regime de

execução estabelecido no contrato administrativo e que venha a receber

a contrapartida avençada como se o tivesse feito, enriquece ilicitamente

em detrimento do erário, fato que, nos termos da Lei nº 8.429, se

consubstancia em ato de improbidade administrativa, devendo então

ressarcir os valores percebidos além do que efetivamente fez jus, além de

vir a sofrer outras sanções previstas. O administrador só pode fazer o

que é previsto na Lei e o contrato administrativo faz Lei entre as partes,

não cabendo interpretações diversas do que nele é estipulado ao bel

prazer das partes, pois tal fato enseja o não atendimento do interesse

público, ferindo então os direitos basilares da população diretamente

necessitada de tais préstimos. Tal prática vem em rota de colisão aos

princípios constitucionais que norteiam a administração pública em todos os

seus âmbitos, responsáveis pela segurança jurídica e o bom andamento dos

serviços públicos, o que enseja a responsabilização solidária com aquele que

tenha enriquecido ilicitamente. O servidor público que auxilia sem qualquer

capacidade decisória nos atos administrativos, cuja atividade auxiliar

consista na simples feitura de expedientes administrativos e que não incorra

em qualquer conduta dolosa ou culposa não deve ser responsabilizado por

qualquer ato ímprobo praticado por seus superiores. (TJRO; Apl 0001022-

22.2010.8.22.0013; Rel. Des. Oudivanil de Marins; Julg. 19/12/2013; DJERO

15/01/2014; Pág. 44)

Logo, apesar de possível a implantação do regime de sobreaviso, uma

lei específica deverá regulamentá-lo, especialmente porque o servidor só pode fazer

o que a lei expressamente autoriza (princípio da legalidade). Logo, não poderá ser

instituído a critério do próprio servidor, até porque a remuneração e a carga

horária têm que ser distintas para os regimes de plantão presencial e de

sobreaviso.

Ademais, o médico tem que estar disponível nos plantões

previamente regulamentados de sobreaviso, não podendo assumir outras

funções durante o período regulamentado, justamente para não o impedir de

atender a demanda de maneira eficiente e imediata. Neste ponto, a Resolução

CFM nº 1.834/2008, em seu art. 1º, diz que ele deve ter “condições de

atendimento presencial quando solicitado em tempo hábil”.

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Contudo, na hipótese dos autos o Dr. Assuério somente aparecia no

hospital para registrar o ponto, sequer comparecendo ao hospital quando chamado

(fls. 53, 57 e 161). Já o Dr. Telmo se recusava a atender pacientes não internados,

o que reduzia drasticamente sua demanda (fls. 53 e 161/162). Por fim, o Dr.

Cardia muitas vezes demorava horas para aparecer depois da ligação, outras vezes

sequer aparecia (fls. 57, 164 e 169).

De qualquer forma, inexiste legislação específica regulamentando o

regime de sobreaviso. Pelo contrário, a implantação do controle eletrônico de ponto

foi um recado claro da exigência do cumprimento da carga horária pela gestão

municipal, que inclusive pediu a apuração do caso pelo Ministério Público.

Enfim, o Ministério Público não se opõe ao regime de sobreaviso,

porém este tipo de serviço deve estar sujeito a regras claras e rígidas, a fim de

garantir o atendimento à população e a segurança do próprio médico.

I.C) GRATIFICAÇÕES INSTITUÍDAS PELA LEI MUNICIPAL N. 3.203, DE 29 DE

JUNHO DE 2012

Os demandados Cardia (fls. 270/272) e Telmo (fls. 294/296) recebem

duas gratificações instituídas pela Lei Municipal n. 3.203/12: GDPM – Gratificação

de Desempenho e Produtividade Médica e GEAPST – Gratificação de Especialidade

na atenção Primária, Secundária e Terciária – GEAPST. Por sua vez, o Dr. Ismail

(fls. 299/301), além das duas gratificações, recebe a GAPM - Gratificação de

Adicional de Plantão Médico.

A lei municipal assim dispõe:

Da Gratificação de Desempenho e Produtividade Médica – GDPM:

“Art. 3º A GDPM será paga com base em critérios de medição de

produtividade, a serem fixados no Contrato de Gestão firmado entre a

Direção da Unidade e a Secretaria Municipal de Saúde, mediante Termo de

Adesão, cujas cláusulas podem ser revistas sempre que necessário,

observando-se: I - a avaliação do desempenho institucional, que visa aferir o

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desempenho coletivo no alcance dos objetivos organizacionais, devendo ser

considerados os projetos e atividades prioritárias e as condições especiais de

trabalho, além de outras características específicas de cada unidade ou

setor; e II - a avaliação do desempenho individual, que visa aferir o desempenho

do servidor no exercício das atribuições da competência, com foco na contribuição

individual para o alcance dos objetivos organizacionais.

Art. 4º A produtividade será aferida de acordo com o estabelecido nos Anexos

de I a V desta Lei.”

Nos anexos constam os requisitos necessários para o recebimento do

benefício:

Produtividade máxima para médicos em geral (exceto especialistas) com

jornada de 20 horas semanais (anexo I): “15 (quinze) a 18 (dezoito)

consultas por dia, perfazendo 320 consultas por mês, o servidor fará jus a

Gratificação mensal de 75% (setenta e cinco por cento) dos seus vencimentos

básicos”.

Produtividade máxima para médicos especialistas com jornada de 20 horas

semanais (anexo II): “10 (dez) a 13 (treze) consultas por dia, perfazendo

220 consultas por mês, o servidor fará jus a Gratificação mensal de 75%

(setenta e cinco por cento) dos seus vencimentos básicos”.

Médico plantonista (todas as especialidades) com jornada de 20 + 4 horas

extras (anexo IV): Ortopedista – “Plantão presencial de 24 horas no Setor

de Pronto Socorro, com atendimento a demanda espontânea oriunda da porta

de entrada e/ou demanda encaminhada, o servidor fará jus a Gratificação

mensal de 75% (setenta e cinco por cento) dos seus vencimentos básicos”.

Médicos em geral com jornada de 20 horas semanais: médico responsável por

realização de exames e procedimentos (eletivos ou de urgência - anexo V) –

“Cumprimento da meta mínima especificada ao Setor por Grau de

Complexidade, o servidor médico fará jus a Gratificação mensal de 75%

(setenta e cinco por cento) dos seus vencimentos básicos”.

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Neste passo, para o recebimento da gratificação em 75% (setenta e

cinco por cento) mostra-se imprescindível a observância da produtividade médica,

não alcançável pelo regime de sobreaviso alegado, muito menos pelas horas

efetivamente trabalhadas:

ISMAIL PINHEIRO RAMALHO: ortopedista do Pronto Socorro que deveria

realizar o plantão presencial de 24 horas para fazer jus à gratificação;

JOSÉ ZITENFIELD CARDIA: médico especialista que deveria realizar de 10 a

13 consultas por dia, perfazendo 220 consultas por mês;

TELMO HENRIQUE FIOROTT: médico endoscopista que deveria cumprir

meta mínima especificada pelo setor por grau de complexidade.

No que tange à Gratificação de Adicional de Plantão Médico – GAPM,

dispõe a lei:

Art. 13 Fica instituída a Gratificação de Adicional de Plantão Médico - GAPM

- devida aos servidores ocupantes do cargo de Médico e suas especialidades,

que prestarem serviços de atendimento médico no Pronto Socorro, CTI –

Centro de Tratamento Intensivo e Centro Cirúrgico do Hospital Geral de

Linhares (HGL), em regime de plantão. § 1º Os valores atribuídos à GAPM

estão discriminados no Anexo IX de acordo com as respectivas especialidades,

para plantões ininterruptos de 24 (vinte e quatro) horas. § 2º O valor da

GAPM referente a plantões de 12 (doze) horas será equivalente a 50%

(cinquenta por cento) daquele previsto no parágrafo anterior.

No anexo IX consta:

Médicos plantonistas com jornada de 24 horas semanais nas seguintes

especialidades: Clínico Socorrista, Pediatra Socorrista, Cirurgião Geral e

Ortopedista – “Servidores Médicos que prestarem serviços no Pronto Socorro

do Hospital Geral de Linhares, em plantões ininterruptos de 24 (vinte e

quatro) horas, farão jus a Gratificação por plantão no valor de R$ 350,00

(trezentos e cinquenta reais)”.

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Assim, o recebimento da GAPM pelo Dr. Ismail também se apresenta

incompatível com as horas efetivamente trabalhadas, lembrando que, por morar em

Vitória, realizava dois plantões consecutivos de 48 horas, não permanecendo

sequer um dia inteiro na unidade.

Por fim, importante observar o que determina o art. 20 da Lei

Municipal n. 3.203/12, constante nas disposições gerais e finais:

Art. 20 Para fazer jus ao recebimento integral da gratificação, além de

preencher os requisitos do artigo anterior, o profissional médico deverá

observar as seguintes obrigações funcionais: ... II - ter prestado os serviços

médicos à população, cumprindo integralmente a jornada de trabalho

estabelecida no Termo de Adesão à Gratificação de que trata o inciso anterior.

III - assiduidade; IV - pontualidade; V - cumprimento dos parâmetros de

desempenho e produtividade, a serem definidos em Portaria da Secretaria

Municipal de Saúde. (...)

Logo, o recebimento das gratificações é evidentemente incompatível

com a realidade demonstrada, pois não há cumprimento integral da jornada de

trabalho, muito menos assiduidade, pontualidade e cumprimento de desempenho e

produtividade.

Enfim, os demandados enriqueceram-se ilicitamente com o

recebimento dos benefícios, em flagrante prejuízo ao erário e violação aos princípios

que regem a Administração Pública.

II - FUNDAMENTOS JURÍDICOS

Afigurando-se indiscutível a legitimidade ativa do Ministério Público

(artigos 127, caput2 e 129, III, ambos da CF/883; artigos 1º, inciso V, e 5º4 da Lei nº

2 “art. 127 – O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.” 3 “art. 129 - ... III – promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos” 4 “art. 5º. A ação principal e a cautelar poderão ser propostas pelo Ministério Público, pela União, pelos Estados e Municípios” – negritos nossos.

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7.347/85), inclusive com respaldo jurisprudencial uníssono5, impende registrar a

necessidade de emissão de provimento jurisdicional tendente ao reconhecimento da

prática de atos de improbidade administrativa em desfavor dos demandados, a eles

impondo as medidas de castigo previstas na Lei nº 8.429/92.

A partir de previsão constitucional acerca dos princípios magnos da

Administração Pública, foi estampada a questão da improbidade administrativa no

§4º do artigo 37 da CF/886, surgindo, a partir de então, a Lei nº 8.429/92 com o

escopo de estabelecer o disciplinamento da matéria, gizando, de forma reiterativa,

em seu artigo 4º, que “Os agentes públicos de qualquer nível ou hierarquia são

obrigados a velar pela estrita observância dos princípios de legalidade,

impessoalidade, moralidade e publicidade no trato dos assuntos que lhe são afetos.”

Neste contexto, talhada de maneira exemplificativa uma gama de

condutas, punições e procedimentos, apresenta-se a Lei de Improbidade

Administrativa como diploma normativo eficaz para a punição de condutas

ímprobas dos agentes públicos.

É sabido que são três as modalidades de atos ímprobos esculpidos

pela Lei nº 8.429/927: os que causam enriquecimento ilícito (art.9º), os que trazem

5 “EMENTA: RECURSO ESPECIAL - PROCESSO CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA - DEFESA DO PATRIMÔNIO PÚBLICO E SOCIAL - ART. 129, III, CF/1988 - LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO – Conforme alguns precedentes desta Corte, é legítimo ao Ministério Público propor Ação Civil Pública visando a proteção do Patrimônio Público, uma vez que o Texto da CF/1988 (ART. 129, III) ampliou o campo de atuação do MP, colocando-o como Instituição de substancial importância na defesa da Cidadania” (STJ, Resp nº 0098648/MG, Reg. STJ nº 00068659 – Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca – public. DJU de 28.04.1997, pág. 15890) 6 “os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.” 7 Abordando mais especificadamente os artigos 9º, 10 e 11 da referida lei, não é demais dar atenção aos ensinamentos do Prof. MANOEL GONÇALVES FERREIRA FILHO, afirmando que “há três tipos de corrupção que, salvo melhor juízo, corresponderiam aos três grandes grupos de atos de improbidade administrativa definidos na lei n. 8.429/92, a saber: a corrupção-suborno, que é uma corrupção por meio de retribuição material e que estaria configurada nas condutas do art. 9º (atos de improbidade administrativa que importem enriquecimento); a corrupção-favorecimento, que é a corrupção que resulta privilegiamento do privado em detrimento do público e que corresponde às condutas descritas no art. 10 (atos de improbidade administrativa que causam prejuízo ao erário); e a corrupção-solapamento, que atinge ao próprio fundamento último da legitimidade e que estaria consubstanciado nas fórmulas de conduta do art. 11 ( atos de improbidade administrativa que atentam contra os princípios da Administração Pública)” - in “A corrupção como fenômeno social e político”, Revista de D. Administrativo, nº 185, resumido por Mário Chila Freyesleben, in Revista Jurídica de Direito Privado - Jul/94 - edição especial nº 17.

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dano ao erário público (art. 10) e aqueles que atentam contra os princípios

administrativos (art. 11).

Dispõe o artigo 9º da Lei nº 8.429/92:

“Constitui ato de improbidade administrativa importando

enriquecimento ilícito auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial

indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou

atividade nas entidades mencionadas no art. 1° desta lei, e

notadamente”

Neste passo, considerando que os demandados receberam a

remuneração sem a necessária contraprestação integral dos serviços, observa-se, a

toda evidência, que se enriqueceram ilicitamente, na medida em que deveriam

trabalhar de acordo com a carga horária exigida, em especial porque lidam

geralmente com pessoas carentes que já se encontram em situação vulnerável e

sem possibilidade de escolha pelos profissionais de saúde.

Ademais, as provas apontam que não se trata de fato isolado, e sim de

conduta reiterada que afeta de maneira substancial a qualidade da prestação do

serviço, apesar do Município gastar aproximadamente 35% de recursos próprios na

área de saúde.

Em mais um campo de atuação, a conduta dos demandados atinge a

previsão do artigo 10 da Lei nº 8.429/92, já que o ente público, apesar de cumprir

sua obrigação ao pagar em dia a remuneração dos servidores, foi lesionado porque

não recebera a contraprestação devida: o trabalho.

A conduta delineada nos autos também está inserida no art. 11,

caput8, da Lei nº 8.429/92, que dispõe sobre a desobediência aos princípios

8 “art. 11.. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e, notadamente:

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constitucionais da Administração Pública, porquanto malferidos a legalidade,

eficiência e moralidade administrativa (artigo 37, caput9, da CF).

Afigura-se suficiente a violação aos princípios constitucionais previstos

como “camisa-de-força” para a Administração Pública, desaguando a conduta dos

demandados no caput do artigo 11 da Lei nº 8.429/92, nuança, como se sabe, que

independe de qualquer demonstração de enriquecimento ilícito ou má utilização de

recursos públicos.

Importante observar, à guisa de esclarecimentos, a lição de EMERSON

GARCIA, afirmando, com lucidez, que “O art. 11 da Lei nº 8.429/92 é normalmente

intitulado de ‘norma de reserva’, o que é justificável, pois ainda que a conduta não

tenha causado danos ao patrimônio público ou acarretado o enriquecimento ilícito do

agente, será possível a configuração da improbidade sempre que restar demonstrada

a inobservância dos princípios regentes da atividade estatal”10.

Verifica-se, na situação apresentada, o evidente descumprimento dos

princípios constitucionais da legalidade, eficiência e moralidade, pois o

cumprimento da carga horária é requisito básico para a adequada prestação do

serviço. Ademais, a conduta dos demandados colocou em xeque a credibilidade do

Município e do hospital de Linhares, além de naturalmente afetar a eficiência dos

serviços prestados.

No caso, os demandados violaram frontalmente a Lei Complementar

Estadual n. 46/94, que regulamenta o regime jurídico dos servidores públicos do

Estado do Espírito Santo (aplicável por analogia aos servidores de Linhares):

“Art. 220. São deveres do servidor público: I - ser assíduo e pontual ao

serviço; II - guardar sigilo sobre assuntos da repartição; III – tratar com

urbanidade os demais servidores públicos e o público em geral; IV - ser

leal às instituições constitucionais e administrativas a que servir; V -

exercer com zelo e dedicação as atribuições do cargo ou função; VI -

9 “artigo 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:”

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observar as normas legais e regulamentares; (...) XII – manter conduta

compatível com a moralidade pública; (...)”

Por sua vez, dispõe o Código de Ética Médica:

“Art. 8º: Afastar-se de suas atividades profissionais, mesmo

temporariamente, sem deixar outro médico encarregado do atendimento

de seus pacientes internados ou em estado grave”.

“Art. 9º: Deixar de comparecer a plantão em horário preestabelecido ou

abandoná-lo sem a presença de substituto, salvo por justo impedimento.

Parágrafo único. Na ausência de médico plantonista substituto, a direção

técnica do estabelecimento de saúde deve providenciar a substituição”.

Em caso semelhante assim decidiu o Tribunal de Justiça do Estado do

Espírito Santo11:

“ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. MÉDICO.

DESCUMPRIMENTO DA JORNADA DE TRABALHO. FALTA DE ZELO NO

DESEMPENHO DAS FUNÇÕES. DESÍDIA. NÃO CUMPRIMENTO DAS METAS

DE ATENDIMENTO. PROVA PERICIAL. INDEFERIMENTO. SANÇÕES DE

MULTA CIVIL, SUSPENSÃO DOS DIREITOS POLÍTICOS E PROIBIÇÃO DE

CONTRATAÇÃO COM O SERVIÇO PÚBLICO. CONFORMAÇÃO COM OS

POSTULADOS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. 1. O

descumprimento de carga horária por servidor público pode gerar penalidades

no campo administrativo e judicial. 2. Quando o descumprimento da carga

horária é reiterado, fazendo-se prática que importa no desatendimento

das metas postas pela administração, o prejuízo ao serviço público deixa

de ser presumido e passa a ser concreto. 3. Se, mesmo após a notificação

por escrito e adoção de demais medidas por parte do superior

hierárquico, o servidor público continua a descumprir sua carga horária,

esse ato passa a ser configurado como ímprobo. 4. A prática desidiosa por

parte de outros servidores públicos não implica escusa para o servidor repetir

o ato. Não existe proteção jurídica de igualdade com o ilícito ou conduta

moralmente reprovável. Ninguém estará autorizado a fazer algo errado,

10 In “IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA, 2ª edição, Lúmen Juris Editora, p. 288.

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porque outros o fazem. Ninguém poderá praticar ato ímprobo ao argumento

de que outros praticam. A única igualdade protegida pela constituição é a que

usa, como paradigma, comportamentos lícitos e moralmente aceitáveis. É um

absurdo pensar em sentido contrário. 5. As penas aplicadas em ação de

improbidade devem respeitar os parâmetros estipulados pelos postulados da

proporcionalidade e razoabilidade”.

A respeito do princípio da legalidade, Emerson Garcia e Rogério

Pacheco Alves 12ensinam:

“O princípio da legalidade, no entanto, pode ser concebido em uma

perspectiva dicotômica: a) como uma relação de compatibilidade do ato com a

lei, resultando na não-contrariedade dos preceitos normativos; ou b) como

uma relação de conformidade do ato com a lei, o que somente legitimaria a

atuação estatal em havendo previsão normativa e na medida em que os atos

praticados se mantivessem adstritos aos limites desta.” (pág. 79)

“Como consectário lógico da organização política da República Federativa do

Brasil, o princípio da legalidade encontra previsão expressa no art. 37, caput,

da Constituição, sendo cogente sua observância por parte da administração

pública de qualquer dos Poderes. O tratamento dispensado pelo sistema

constitucional ao referido princípio denota claramente que, regra geral, deve

existir uma relação de conformidade entre os atos administrativos e a

lei. A atividade estatal deve adequar-se ao princípio da legalidade em uma

dupla vertente: pressupõe a antecedência da lei e deve ser conforme a ela e

sob os prismas formal e material.

A subordinação da atividade administrativa à lei é concebida em um

sentido negativo, sendo o princípio da legalidade o limite a que estará

sujeita a administração, contendo a atuação desta, em um sentido

positivo, somente podendo a administração fazer o que por lei seja

consentido. Neste último sentido, constata-se a relação de conformidade

que deve existir entre o ato e a lei”. (págs. 80/81).

“Estatuído o princípio da legalidade e sedimentada a concepção de que a

existência do Estado se destina à consecução do bem-estar geral, tornou-

11 TJES; AC 24080155112; Quarta Câmara Cível; Rel. Des. Samuel Meira Brasil Junior; Julg. 14/05/2012; DJES 24/05/2012; Pág. 50 12 Emerson Garcia e Rogério Pacheco Alves. Improbidade Administrativa. 5ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010.

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se incontroverso que o princípio da autonomia da vontade é inaplicável

aos atos dos agentes públicos”. (pág. 83)

“No direito privado, é permitido aos particulares a prática de todos os atos

que não lhe sejam por lei vedados. No direito público, porém, somente

serão válidos os atos praticados em conformidade com a tipologia legal,

sendo imprescindível a existência de norma autorizadora.” (pág. 83)

“Sobre outra ótica, constata-se que os atos dissonantes do princípio da

legalidade, regra geral, sempre importarão em violação à moralidade

administrativa, concebida como o regramento extraído da disciplina

interna da administração. (...)” Pág. 93

Por sua vez, Maria Sylvia Zanella Di Pietro 13 acrescenta:

“Não é preciso penetrar na intenção do agente, porque do próprio objeto

resulta a imoralidade. Isto ocorre quando o conteúdo de determinado

ato contrariar o senso comum de honestidade, retidão, equilíbrio,

justiça, respeito à dignidade do ser humano, à boa-fé, ao trabalho, à

ética das instituições.”

“Todavia, também é possível falar em legalidade em sentido amplo, para

abranger não só a obediência à lei, mas também a observância dos

princípios e valores que estão na base do ordenamento jurídico.

Quando a Lei Fundamental da República Federal da Alemanha, de 1949,

pioneira nessa tendência ampliadora do princípio da legalidade, exige

obediência à lei e ao direito (art. 20, § 3º), está consagrado o principio da

legalidade no duplo sentido assinalado (cf. Di Pietro, 1991:30). Ao falar

em obediência à lei, está exigindo conformidade com a lei formal; ao

falar em obediência ao direito, está exigindo conformidade não só com a

lei formal, mas também com a moral, a ética, o interesse público, enfim,

com todos os princípios e valores que decorrem implícita ou

explicitamente da Constituição.”

E José dos Santos Carvalho Filho conclui:

13 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo, 15ª edição. São Paulo: Atlas, 2003, pág. 671.

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“A Constituição referiu-se expressamente ao princípio da moralidade no art.

37, caput. Embora o conteúdo da moralidade seja diverso do da legalidade, o

fato é que aquele está normalmente associado a este. Em algumas ocasiões, a

imoralidade consistirá na ofensa direta à lei e aí violará, ipso facto, o princípio

da legalidade. Em outras, residirá no tratamento discriminatório, positivo ou

negativo, dispensado ao administrado; neste caso vulnerado estará também o

princípio da impessoalidade, requisito, em última análise, da legalidade da

conduta administrativa.”

Dessa maneira, permite-se a incursão dos demandados nas raias dos

artigos 9º, 10 e 11, caput, ambos da Lei nº 8.429/92, gerando a aplicação, por

interpretação do art. 37, §4º, da CF/88, das sanções previstas no art. 12, incisos I,

II e III, da mesma lei, independentemente das esferas criminal e administrativa e de

maneira cumulativa ou não.

III – PEDIDO LIMINAR DE INDISPONIBILIDADE DE BENS DOS DEMANDADOS

O art. 7º da Lei nº. 8.429/9214 prevê a possibilidade de determinação

da indisponibilidade de bens do agente processado por ato de improbidade

administrativa, a fim de se assegurar o ressarcimento dos danos causados aos

cofres públicos.

A Constituição Federal, em seu art. 37, § 4o, também prevê que os atos

de improbidade administrativa “importarão a suspensão dos direitos políticos, a

perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na

forma e gradação prevista em lei, sem prejuízo da ação penal cabível”.

A ordem de imposição do gravame judicial, por caracterizar medida

essencialmente drástica, deve estar fundada na existência de fumus boni iuris e

periculum in mora, de forma a evitar o constrangimento desnecessário dos bens do

interessado.

14 Art. 7º. Quando o ato de improbidade causar lesão ao patrimônio público ou ensejar enriquecimento ilícito, caberá a autoridade administrativa responsável pelo inquérito representar ao Ministério Público, para a indisponibilidade dos bens do indiciado. Parágrafo único. A indisponibilidade a que se refere o caput deste artigo recairá sobre bens que assegurem o integral ressarcimento do dano, ou sobre o acréscimo patrimonial resultante do enriquecimento ilícito.

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O artigo 7º da Lei 8.429/92, ao regulamentar os atos de improbidade

administrativa, contempla a hipótese de decretação da indisponibilidade dos bens

sempre que houver fortes indicativos da prática de ato de improbidade causadora

de lesão ao patrimônio público ou que enseje enriquecimento ilícito do servidor,

entendendo o Superior Tribunal de Justiça que a decretação de indisponibilidade de

bens não se condiciona à comprovação de dilapidação efetiva ou iminente de

patrimônio, bastando a verificação da gravidade dos atos atribuídos ao agente

público:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.

IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. INDISPONIBILIDADE DE BENS.

COMPROVAÇÃO DE EFETIVA DILAPIDAÇÃO PATRIMONIAL.

DESNECESSIDADE. PRECEDENTES.

1. No acórdão recorrido, o voto divergente que se sagrou vencedor entendeu

ser imprescindível o perigo de dilapidação do acervo patrimonial dos agentes

tidos como ímprobos para a decretação da indisponibilidade de seus bens.

2. A Primeira Seção do STJ (REsp 1.319.515/ES, Rel. Min. Napoleão Nunes

Maia Filho, Rel. p/ acórdão Min. Mauro Campbell, DJe 21.9.2012) firmou a

orientação de que a decretação de indisponibilidade de bens não se

condiciona à comprovação de dilapidação efetiva ou iminente de

patrimônio, porquanto tal medida consiste em "tutela de evidência, uma

vez que o periculum in mora não é oriundo da intenção do agente

dilapidar seu patrimônio e, sim, da gravidade dos fatos e do montante do

prejuízo causado ao erário, o que atinge toda a coletividade".

3. No específico caso dos autos, a indisponibilidade visava assegurar a

recomposição de prejuízo ao Erário municipal estimado em R$ 199.644,81, de

modo que, estando dispensada a prova da dilapidação patrimonial ou de sua

iminência, o registro da presença do fumus boni iuris pela instância a quo é

suficiente para autorizar a medida constritiva. 4. Violação dos arts. 7º e 16 da

Lei 8.429/92 reconhecida. 5. Recurso Especial provido". (REsp 1373705/MG,

Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em

03/09/2013, DJe 25/09/2013).

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO

EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL

PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. INDISPONIBILIDADE DE BENS.

NATUREZA INFRINGENTE. INADMISSIBILIDADE IN CASU. PROTELAÇÃO.

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MULTA. 1. O acórdão recorrido asseverou que a decretação

de indisponibilidade dos bens não se condiciona à comprovação de

dilapidação efetiva ou iminente de patrimônio, porquanto visa,

justamente, a evitar dilapidação patrimonial. (periculum in mora

implícito). 2. Logo, o decisum foi expresso ao abordar os motivos pelos

quais a indisponibilidade de bens merecia deferimento in casu, amparado

em precedentes análogos do STJ. 3. Os embargos de declaração constituem

recurso de rígidos contornos processuais, exigindo-se, para seu acolhimento,

os pressupostos legais de cabimento. O inconformismo dos embargantes

busca emprestar efeitos infringentes, manifestando nítida pretensão de

rediscutir o mérito do julgado, o que é incabível nesta via recursal. 4.

Embargos de declaração rejeitados. (STJ; EDcl-REsp 1.280.826; Proc.

2011/0202414-5; MT; Segunda Turma; Rel. Min. Herman Benjamin; DJE

28/11/2014)

Ademais, conforme entendimento consolidado pelo Superior Tribunal

de Justiça, a medida deve incidir sobre bens suficientes a garantir o integral

ressarcimento do prejuízo ao erário, levando-se em conta ainda o potencial valor da

multa civil15:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO

EM RECURSO ESPECIAL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ART. 7º DA LEI

8.429/92. INDISPONIBILIDADE DE BENS. VALOR DO DANO AO ERÁRIO,

ACRESCIDO DO VALOR DE POSSÍVEL MULTA CIVIL. POSSIBILIDADE.

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE ORIGEM EM CONSONÂNCIA COM A

JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. SÚMULA 83/STJ. AGRAVO INTERNO

IMPROVIDO. (...) III. Com efeito, "o Superior Tribunal de Justiça, ao

interpretar o art. 7º da Lei nº 8.429/92, tem decidido que, por ser

medida de caráter assecuratório, a decretação de indisponibilidade de

bens, ainda que adquiridos anteriormente à prática do suposto ato de

improbidade, deve incidir sobre quantos bens se façam necessários ao

integral ressarcimento do dano, levando-se em conta, ainda, o

potencial valor de multa civil" (STJ, AgRg no REsp 1.260.737/RJ, Rel.

Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, DJe de 25/11/2014). No

15 cf. REsp 1161049 / PA; Primeira Turma, Rel. Ministro Sérgio Kukina, DJe de 29/09/2014; AgRg no REsp 1414569 / BA, Segunda Turma, Rel. Ministro Humberto Martins, DJe de 13/05/2014; TRF1, AG

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mesmo sentido: STJ, MC 24.205/RS, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS,

SEGUNDA TURMA, DJe de 19/04/2016; REsp 1.313.093/MG, Rel. Ministro

HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 18/09/2013; STJ, AgRg no

REsp 1.299.936/RJ, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES,

SEGUNDA TURMA, DJe de 23/04/2013. IV. O acórdão de 2º Grau - em

conformidade com a jurisprudência dominante desta Corte - deu provimento

ao Agravo de Instrumento do Parquet estadual, para ampliar a decretação da

indisponibilidade de bens dos réus, a fim de alcançar o valor de eventual

multa civil. (...) (AgInt no AREsp 913.481/MT, Rel. Ministra ASSUSETE

MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA, DJe 28/9/2016)

Analisando um caso concreto de descumprimento de carga horária, o

Tribunal Regional Federal da 1ª Região16 decidiu:

“(...) No que se refere ao periculum in mora, a Primeira Seção do Superior

Tribunal de Justiça no julgamento do REsp 1366.721/BA, sob a sistemática

dos recursos repetitivos (art. 543-C do CPC Buzaid), consolidou o

entendimento de que o decreto de indisponibilidade de bens em ação

civil pública por ato de improbidade administrativa constitui tutela de

evidência e dispensa a comprovação da dilapidação iminente ou efetiva

do patrimônio do legitimado passivo, uma vez que o periculum in mora

está implícito no art. 7º da Lei 8.429/1992. Confira-se: REsp

1366721/BA, Primeira Seção, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho Rel.

p/ Acórdão Ministro OG Fernandes, julgado em 26/02/2014, DJe

19/09/2014; e AgRg no REsp 1407616/SC, Segunda Turma, Rel. Ministro

Mauro Campbell Marques, DJe de 02/05/2014. Dessa forma, presente o

fumus boni iuris e estando o periculum in mora implícito ao comando

normativo do art. 7º da Lei 8.429/92, há que ser decretada a medida de

indisponibilidade de bens do agravado. Conforme reiterados precedentes

jurisprudenciais do colendo Superior Tribunal de Justiça e desta Corte, a

medida de indisponibilidade de bens deve incidir sobre os bens de modo

suficiente a garantir o integral ressarcimento de eventual prejuízo ao

Erário, levando-se em conta, ainda, o potencial valor de multa civil (cf.

REsp 1161049 / PA; Primeira Turma, Rel. Ministro Sérgio Kukina, DJe de

0021187-11.2014.4.01.0000/GO; Terceira Turma, Relatora Desembargadora Federa Mônica Sifuentes, e-DJF1 de 31/10/2014, p. 899 16 TRF1, Agravo de instrumento n. 00658559620164010000, Relator DESEMBARGADOR FEDERAL MÁRIO CÉSAR RIBEIRO, decisão de 16/02/2017, publicada em 02/03/2017

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29/09/2014; AgRg no REsp 1414569 / BA, Segunda Turma, Rel. Ministro

Humberto Martins, DJe de 13/05/2014; TRF1, AG 0021187-

11.2014.4.01.0000/GO; Terceira Turma, Relatora Desembargadora Federa

Mônica Sifuentes, e-DJF1 de 31/10/2014, p. 899). Sobre o valor estimado do

suposto dano, há que se considerar que "(...) A extensão do dano e mesmo

sua ocorrência é matéria a ser discutida na instrução da ação. Ao autor

incumbe apenas realizar estimativa na inicial do valor do suposto dano,

mesmo porque só ao final da ação é que se poderia, eventualmente, ter

como certo o alegado dano, bem como sua extensão." (...)”.

No caso em análise, mais do que provada que a conduta dos

demandados está descrita nas disposições do art. 9º, 10 e art. 11, caput, da Lei nº

8.429/92, impondo-lhes a obrigação de reparar o dano causado ao patrimônio

público, nos exatos termos do art. 12, incisos I, II e III, do diploma legal citado.

Com espeque na norma constitucional e uma vez provada a

responsabilidade dos demandados, impõe-se a decretação da indisponibilidade

dos bens, tendo em vista a necessidade de restituir ao erário o valor do dano

causado, além de assegurar a aplicação da multa civil.

Importante registrar que, até que a decisão final seja proferida, o

patrimônio dos demandados permanecerá sob sua guarda, mas protegido de

alienações fraudulentas com o intuito de fugir à responsabilidade de ressarcir ao

erário o prejuízo causado.

Demais disso, nos casos de improbidade administrativa, a regra geral

sobre providências acautelatórias está no art. 7º da Lei nº 8.429/92, que dispõe

sobre a indisponibilidade dos bens dos envolvidos, repetindo, aliás, o mandamento

constitucional do § 4o do art. 37. Isso significa a impossibilidade de alienação de

bens, podendo se concretizar por diversas formas, tais como o bloqueio de contas

bancárias, aplicações financeiras, o registro da inalienabilidade imobiliária,

desconto em folha de pagamento, depósito em conta judicial remunerada etc. (cf.

MARINO PAZZAGLINI, in IMPROBIDADE ADMINISTRASTIVA, Ed. Atlas S/A, 34.

ed., p.191).

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Assim, o fumus boni iuris, vertido na chamada plausibilidade do

direito, salta aos olhos e resta sobejamente evidenciado ante a narrativa dos fatos e

nos fundamentos jurídicos já expostos.

QUANTIFICAÇÃO DOS VALORES PARA EFEITO DE INDISPONIBILIDADE

ASSUÉRIO MOREIRA – Devolução Integral da Remuneração a partir de

2016

Na hipótese de descumprimento total da carga horária (como no caso

do Dr. Assuério), a aferição do prejuízo se apresenta viável, bastando a devolução

de todo o valor recebido. Por outro lado, não se mostra razoável exigir o pagamento

anterior a 2016 porque as testemunhas Pablo e Samira assumiram os cargos de

direção do HGL no final de 2015, razão pela qual relataram os fatos de 2016 em

diante. Por sua vez, a testemunha Edna esclarece que já havia aproximadamente 1

ano que ele apenas registrava o ponto. Logo, apesar do Ministério Público não

acreditar que este padrão de descumprimento da carga horária fosse muito

diferente nos anos anteriores, impossível aferir a quantidade exata de horas

trabalhadas até o final de 2015.

Assim, considerando que recebeu R$ 80.537,90 no ano de 2016,

temos uma média mensal de R$ 6.711,00. Com isso, somado o valor total de 2016

com os quatro primeiros meses de 2017, alcançamos um total de R$ 107.380,00.

ISMAIL PINHEIRO RAMALHO, JOSÉ ZITENFIELD CARDIA e TELMO

HENRIQUE FIOROTT – Devolução das Gratificações Incompatíveis com a

Jornada de Trabalho

Como visto, os demandados Cardia (fls. 270/272) e Telmo (fls.

294/296) recebiam duas gratificações instituídas pela Lei Municipal n. 3.203/12:

GDPM – Gratificação de Desempenho e Produtividade Médica e GEAPST –

Gratificação de Especialidade na atenção Primária, Secundária e Terciária –

GEAPST. Por sua vez, o Dr. Ismail (fls. 299/301), além das duas gratificações,

recebia a GAPM - Gratificação de Adicional de Plantão Médico.

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Em tópico específico ficou esclarecido que o recebimento da GDPM e

GAPM é incompatível com a carga horária efetivamente cumprida, já que os

requisitos eram, em especial, a produtividade e a presença no plantão de 24 horas.

Assim, considerando a comprovação de que os três jamais cumpriram

a carga horária presencial e integral, é certo que o recebimento das gratificações

desde sua implantação (29 de junho de 2012) foi ilegal.

Neste passo, seguem os cálculos para indisponibilidade:

1. ISMAIL PINHEIRO RAMALHO:

R$ 1.750,00 de GAPM x 42 meses (01/13 [nomeação] a 06/16 [exoneração]) = R$

73.500,00

R$ 1.792,00 de GDPM x 42 meses = R$ 75.264,00

TOTAL = R$ 148.764,00

2. JOSÉ ZITENFELD CARDIA:

R$ 2.178,43 de GDPM x 56 meses (08/12 a 04/17) = R$ 121.992,08

3. TELMO HENRIQUE FIOROTT:

R$ 1.792,20 de GDPM x 47 meses (08/12 a 07/08 [exoneração]) = R$

84.233,40

Os cálculos são apenas um parâmetro para efeito de indisponibilidade,

sem prejuízo de serem melhor apurados em fase de liquidação.

IV - REQUERIMENTOS FINAIS

Ante o exposto, requer o Ministério Público do Estado do Espírito

Santo:

1) A aplicação do rito ordinário, nos termos do art. 17, caput, da Lei n.º

8.429/92;

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2) Seja dispensado o pagamento de custas, emolumentos e outros encargos, na

forma do artigo 18 da Lei nº 7.347/85, aplicado subsidiariamente;

3) Seja determinado, liminarmente, nos termos do art. 37, § 4o, da CF, dos

arts. 5o e 7o da Lei nº 8.429/92, do art. 84, § 3o, da Lei n°. 8.078 (Código de

Defesa do Consumidor) c/c arts. 12 e 21 da Lei nº 7.347/85 e do art. 300 do

novo Código Processual Civil, a indisponibilidade sobre os bens

necessários ao integral ressarcimento do dano (conforme cálculos

acima), levando-se em conta, ainda, o potencial valor da multa civil;

4) A notificação dos demandados para se manifestarem, querendo, no prazo de

15 dias, findo o qual deverá ser exercido um juízo positivo de

admissibilidade, recebendo a presente ação para prosseguimento regular,

nos termos dos §§ 7º e 9º do art. 17 da Lei n° 8.429/92;

5) Após o recebimento da ação, a citação dos demandados para, querendo,

apresentarem peça contestatória no prazo de lei, sob pena de revelia;

6) A citação do Município de Linhares e do Estado do Espírito Santo para,

querendo, atuarem processualmente no polo ativo da presente demanda, na

condição de assistentes do Ministério Público, ou se absterem, conforme

artigo 17, §3º, da Lei nº 8.429/92 (LIA) e art. 6º, §3º, da Lei nº 4.717/65

(Ação Popular);

7) Seja, ao final, julgada procedente a pretensão do Ministério Público para

condenar os demandados nas sanções civis previstas no art. 12, I, II e III, da

Lei nº 8.429/92, tendo em vista a prática dos atos de improbidade descritos

nos artigos 9º, 10 e 11 do mesmo diploma legal;

8) Seja o valor da condenação em ressarcimento fixado da seguinte forma: 1)

Assuério Moreira: devolução de toda remuneração recebida desde janeiro de

2016 até hoje; 2) Ismail Pinheiro Ramalho: devolução das gratificações

denominadas GAPM e GDPM desde sua instituição até o último dia de sua

exoneração; 3) José Zitenfeld Cardia: devolução da gratificação denominada

GDPM desde sua instituição até a presente data; 4) Telmo Henrique

Fiorott: devolução da gratificação denominada GDPM desde sua instituição

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até o último dia de sua exoneração; todos devidamente acrescido de juros e

correção monetária;

9) Sejam os valores da condenação em ressarcimento e de multa revertidos em

proveito das entidades públicas lesadas (Município de Linhares e Estado do

Espírito Santo), a teor do art. 18 da LIA;

10) Após o trânsito em julgado da sentença, seja expedido ofício ao Tribunal

Regional Eleitoral e ao Tribunal Superior Eleitoral para o fim previsto no

artigo 20 da Lei nº 8.429/92;

11) A condenação dos demandados no ônus da sucumbência;

Por fim, protesta pela produção de outras provas admitidas em direito

e necessárias à elucidação dos fatos, anexando-se desde logo todos os documentos

colhidos durante a instrução do inquérito civil público n. MPES 2016.0029.2121-

05.

Dá-se à causa o valor de R$ 500.000,00.

Linhares/ES, 15 de maio de 2017.