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1 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESPÍRITO SANTO Procuradoria-Geral de Justiça Rua Proc. Antonio Benedicto Amâncio Pereira, 350, Santa Helena - 29.050-265 - Vitória ES - Tel.: 27.3194.4500 www.mpes.mp.br O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO, na pessoa do Procurador-Geral de Justiça, Dr. Eder Pontes da Silva e dos Exmos. Srs. Drs. Promotores de Justiça do Meio Ambiente e do Urbanismo, no exercício das atribuições previstas nos artigos 127, 129, II, III, VI da Constituição Federal, 120, § 1º, 11 da Constituição Estadual e artigo 27, parágrafo único, inciso IV, da Lei nº 8.625/93 Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, vem posicionar acerca dos eventos de escassez hídrica que ultimamente tem mobilizado a sociedade capixaba, no seguinte sentido: DO CENÁRIO DE CRISE O Brasil, apesar de abrigar aproximadamente 12% (doze por cento) da água doce disponível no globo, 18 % das águas superficiais, apresentar vazões médias de quase 180 milhões de litros por segundo e localizar 50 dos rios mais caudalosos do mundo, vem enfrentando o dilema da escassez hídrica, situação compartilhada pelo Estado do Espírito Santo. Ainda em 2012, o Ministério Público do Estado do Espírito Santo, após registrar índices de precipitação bem inferiores à média histórica, chamou atenção do Governo do Estado do Espírito Santo para a necessidade da adoção de providências em relação ao então cenário, que já se podia traduzir como sendo de crise. DADOS PLUVIOMÉTRICOS - 01 de novembro de 2009 a 11 de fevereiro 2010 REGIÃO PRECIPITAÇÃO (mm) Média histórica do período Média do período Anomalia Grande Vitória 663,6 265,6 -398,0 (-60) Norte 634,2 314,1 -320,0 (-50) Nordeste 675,0 263,6 -411,4 (-61) Noroeste 659,4 274,5 -384,9 (-58) Serrana* 793,0 523,1 -269,9 (-34) Sul 708,6 221,2 -487,4 (-69) *Na região serrana houve concentração de chuvas no início de dezembro, por isso a anomalia foi menor. Contudo, a situação da agricultura é tão grave quanto nas demais regiões.

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO DO ... · Ainda em 2012, o Ministério Público do Estado do Espírito Santo, após registrar índices de precipitação bem inferiores

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O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO,

na pessoa do Procurador-Geral de Justiça, Dr. Eder Pontes da Silva e dos

Exmos. Srs. Drs. Promotores de Justiça do Meio Ambiente e do

Urbanismo, no exercício das atribuições previstas nos artigos 127, 129,

II, III, VI da Constituição Federal, 120, § 1º, 11 da Constituição Estadual

e artigo 27, parágrafo único, inciso IV, da Lei nº 8.625/93 – Lei Orgânica

Nacional do Ministério Público, vem posicionar acerca dos eventos de

escassez hídrica que ultimamente tem mobilizado a sociedade capixaba,

no seguinte sentido:

DO CENÁRIO DE CRISE

O Brasil, apesar de abrigar aproximadamente 12% (doze por cento) da água doce

disponível no globo, 18 % das águas superficiais, apresentar vazões médias de quase 180

milhões de litros por segundo e localizar 50 dos rios mais caudalosos do mundo, vem

enfrentando o dilema da escassez hídrica, situação compartilhada pelo Estado do Espírito

Santo.

Ainda em 2012, o Ministério Público do Estado do Espírito Santo, após registrar índices

de precipitação bem inferiores à média histórica, chamou atenção do Governo do Estado

do Espírito Santo para a necessidade da adoção de providências em relação ao então

cenário, que já se podia traduzir como sendo de crise.

DADOS PLUVIOMÉTRICOS - 01 de novembro de 2009 a 11 de fevereiro 2010

REGIÃO

PRECIPITAÇÃO (mm)Média

histórica do período

Média do período Anomalia

Grande Vitória 663,6 265,6 -398,0 (-60)

Norte 634,2 314,1 -320,0 (-50)

Nordeste 675,0 263,6 -411,4 (-61)

Noroeste 659,4 274,5 -384,9 (-58)

Serrana* 793,0 523,1 -269,9 (-34)

Sul 708,6 221,2 -487,4 (-69)

*Na região serrana houve concentração de chuvas no início de dezembro, por isso aanomalia foi menor. Contudo, a situação da agricultura é tão grave quanto nas demaisregiões.

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BALANÇO HÍDRICO

No âmbito do Fórum Estadual de Recursos Hídricos, espaço que, sob a liderança do

Ministério Público do Estado do Espírito Santo, reunia organizações não governamentais,

comitês de bacia hidrográfica, entidades públicas ligadas às políticas de recursos hídricos

a exemplo das concessionárias de serviços de saneamento básico, do Instituto Estadual

de Recursos Hídricos (IEMA), Secretaria Estadual de Meio Ambiente (SEAMA),

Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural (INCAPER) dentre

outros, foram estabelecidas ações de curto, médio e longo prazo.

Em relação às ações de curto prazo, foram assinados muitos termos de ajustamento de

conduta com os produtores rurais, por meio dos quais foram fixadas regras de controle de

irrigação, abertura de caixas secas, plantio de cinturões verdes etc., diversas ações civis

públicas e termos de ajustamento de conduta referentes à recuperação de degradações

ambientais e ocupações irregulares em áreas de preservação permanente; exigibilidade

formal e existencial das áreas de reservas legais, além de sugestões em torno das ações

de médio e longo prazo que, ora, reiteraremos, haja vista a importância fundamental para

a efetivação do conceito de direito fundamental ao meio ambiente.

Assim é que, RECONHECENDO a Declaração de Meio Ambiente e Desenvolvimento

(Rio 92), fruto da Conferência das Nações Unidas sobre o meio ambiente que reafirmou

a Declaração das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, realizada em

Estocolmo (1972), e estabeleceu que “os seres humanos estão no centro das

preocupações com o desenvolvimento sustentável. Têm direito a uma vida saudável e

produtiva, em harmonia com a natureza”; que “O direito ao desenvolvimento deve ser

exercido de modo a permitir que sejam atendidas equitativamente as necessidades de

desenvolvimento e de meio ambiente das gerações presentes e futuras”; que “Para

alcançar o desenvolvimento sustentável, a proteção ambiental constituirá parte

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integrante do processo de desenvolvimento e não pode ser considerada isoladamente

deste”; e

RECONHECENDO que a Agenda 21é um programa de ação que constitui a mais

abrangente tentativa realizada de promover, em escala planetária, um novo padrão de

desenvolvimento, denominado “desenvolvimento sustentável” e que ela propõe, dentre

outras atividades:

a) Formular planos de ação nacional e programas de investimento com custos

calculados e metas fixadas;

b) Integrar medidas de proteção e conservação de fontes potenciais de abastecimento

de água doce, entre elas o inventário dos recursos hídricos, com planejamento do

uso da terra, utilização de recursos florestais, proteção das encostas de montanhas

e margens de rios e outras atividades pertinentes de desenvolvimento e

conservação;

c) Desenvolver bancos de dados interativos, modelos de previsão, modelos de

planejamento e métodos de manejo e planejamento hídrico, incluindo métodos de

avaliação do impacto ambiental;

d) Otimizar a alocação de recursos hídricos sob limitações físicas e

socioeconômicas;

e) Implementar as decisões de alocação por meio do manejo de demandas,

mecanismos de preço e medidas regulamentadoras;

f) Combater enchentes e secas, utilizando análises de risco e avaliação do impacto

social e ambiental;

g) Promover planos de uso racional da água por meio de conscientização pública,

programas educacionais e imposição de tarifas sobre o consumo de água e outros

instrumentos econômicos;

h) Mobilizar os recursos hídricos, particularmente em zonas áridas e semiáridas;

i) Promover a cooperação internacional em pesquisas científicas sobre os recursos

de água doce;

j) Desenvolver fontes novas e alternativas de abastecimento de água, tais como

dessalinização da água do mar, reposição artificial de águas subterrâneas, uso de

água de pouca qualidade, aproveitamento de águas residuais e reciclagem da água;

k) Integrar o manejo da quantidade e qualidade de água (inclusive dos recursos

hídricos subterrâneos e de superfície);

l) Promover a conservação da água por meio de planos melhores e mais eficientes

de aproveitamento da água e de minimização do desperdício para todos os

usuários, incluindo o desenvolvimento de mecanismos de poupança de água;

m) Apoiar os grupos de usuários de água para otimizar o manejo dos recursos hídricos

locais;

n) Desenvolver técnicas de participação do público e implementá-las nas tomadas de

decisão, fortalecendo em particular o papel da mulher no planejamento e manejo

dos recursos hídricos;

o) Desenvolver e intensificar, quando apropriado, a cooperação, incluindo

mecanismos onde sejam adequados, em todos os níveis pertinentes, a saber:

p) No nível pertinente mais baixo, delegando o manejo dos recursos hídricos, em

geral, para esse nível, de acordo com a legislação nacional, incluindo a

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descentralização dos serviços públicos, passando-os às autoridades locais,

empresas privadas e comunidades;

q) No plano nacional, planejamento e manejo integrado de recursos hídricos, no

quadro do processo de planejamento nacional e, onde adequado, estabelecimento

de regulamentação e monitoramento independentes da água doce, baseados na

legislação nacional e em medidas econômicas;

r) No plano regional, considerando, quando apropriada, a possibilidade de

harmonizar as estratégias e programas de ação nacionais;

s) No plano mundial, melhor delineamento das responsabilidades, divisão de

trabalho e coordenação de organizações e programas internacionais, facilitando as

discussões e a partilha de experiências em áreas relacionadas ao manejo de

recursos hídricos;

t) Difundir informação, inclusive de diretrizes operacionais, e promover a educação

dos usuários de água, considerando a possibilidade de as Nações Unidas

proclamarem um Dia Mundial da Água;

RECONHECENDO também a Agenda 21 que é um instrumento de planejamento

participativo de um determinado território e que, em âmbito local, envolve a implantação

de um Plano Local de Desenvolvimento Sustentável, que estrutura prioridades locais por

meio de projetos e ações de curto, médio e longo prazos, além de definir os meios de

implementação e as responsabilidades do governo e dos demais setores da sociedade civil,

e

CONSIDERANDO que a Constituição Federal de 1988, art. 225, caput, afirma o direito

fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, essencial à sadia qualidade

de vida e por isso impõe ao Poder Público e à coletividade o dever de defende-lo e

preservá-lo para as presentes e futuras gerações:

CONSIDERANDO que a Lei da Política Nacional de Recursos Hídricos (lei 9.433/97),

art. 1°, II, III e IV, afirma que a água é um recurso natural limitado dotado de valor

econômico; devendo priorizar em situações de escassez, o seu uso prioritário ao consumo

humano e à dessedentação de animais e que a gestão dos recursos hídricos deve sempre

proporcionar o uso múltiplo das águas;

CONSIDERANDO que, segundo dados do Instituto Trata Brasil

(http://www.tratabrasil.org.br/saneamento-no-brasil#ES) no Espírito

Santo, o saneamento apresenta o seguinte perfil: Rede de água: 80,90; Coleta de

esgoto: 41,82; Tratamento de esgoto: 32,36; Perdas de água: 34,39;

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Na qualidade de agentes políticos, integrantes da carreira do Ministério

Público no Estado do Espírito Santo, a quem, por missão constitucional,

incumbe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses

sociais e individuais indisponíveis, com destaque pelo zelo do efetivo

respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos

direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias

a sua garantia, apresentamos a presente MOÇÃO AMBIENTAL,

destacando AGENDAS POSITIVAS que se mostram fundamentais à

solução da escassez hídrica vivenciada pelo Estado do Espírito Santo:

1. ESTRUTURAÇÃO DA POLÍTICA NACIONAL E ESTADUAL DE

RECURSOS HÍDRICOS E DE SANEAMENTO BÁSICO

O planejamento é pressuposto para a efetivação do direito fundamental ao meio ambiente.

Nesse sentido, considerando as limitações orçamentárias que orientam a realização dos

direitos fundamentais, a Administração Pública deve priorizar os instrumentos de

planejamento estabelecidos nas Políticas Nacional e Estadual de Recursos Hídricos, de

modo a assegurar uma igualdade de condições materiais no acesso ao recurso hídrico.

Nessa linha, destacamos:

a) A elaboração dos Planos de Recursos Hídricos, Estadual e de bacias hidrográficas,

qualificados como planos diretores que visam a fundamentar e orientar a

implementação da Política Nacional de recursos hídricos e o seu gerenciamento;

b) A efetiva cobrança pela utilização do recurso hídrico, tornando gestão local viável

pelos Comitês de Bacia Hidrográfica;

c) O enquadramento dos corpos de água, segundo os usos preponderantes;

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d) A implantação de um sistema público de outorga, preferencialmente, eletrônico,

transparente e que considere toda a Bacia Hidrográfica, com objetivo de assegurar

o controle quantitativo e qualitativo dos usos da água e o efetivo exercício dos

direitos de acesso à água;

e) A implantação do sistema de informações sobre recursos hídricos, em âmbito

estadual;

f) A criação e estruturação das agências de água, a quem competirá a função de

secretaria executiva do respectivo Comitê de Bacia Hidrográfica.

g) A contratação ou elaboração de estudo voltados à identificação das reservas

hídricas capixabas, identificação dos aquíferos, suas vazões, capacidade de

recarga, dentre outros.

É também sabido que a escassez hídrica está diretamente relacionada à ausência de

políticas públicas de recuperação e tratamento da qualidade hídrica. Nesse viés,

destacamos o necessário avanço no planejamento em torno das Políticas Municipais e

Estadual de Saneamento Básico e Licenciamento Ambiental por meio de:

h) Elaboração e implementação dos planos de saneamento básico nos municípios,

mediante apoio do Estado do Espírito Santo;

i) Observância irrestrita do cronograma de ampliação e universalização das ações

estabelecidas nos planos de saneamento básico dos Municípios, bem como,

investimento significativo em ações de manutenção das redes que evitem os

desperdícios;

j) Estruturação do órgão ambiental estadual de outorga, ou seja, da Agência Estadual

de Recursos Hídricos.

2. ESTRUTURAÇÃO DOS ÓRGÃOS AMBIENTAIS

O atual cenário de escassez hídrica em muito se deve às ações humanas de degradação

ambiental e à diminuição sistemática de cobertura florestal ao longo nos anos no Estado

do Espírito Santo. Tal fato pode ser verificado através da sobreposição dos mapas de

índices pluviométricos e de cobertura florestal no Estado, onde se observa a importância

do microclima de cada região. As regiões mais protegidas ambientalmente, apesar de

afetadas pela escassez, não apresentaram problemas decorrentes da crise hídrica na

mesma ordem daquelas ambientalmente devastadas.

Para que não haja comprometimento ainda maior do remanescente florestal e hídrico do

Estado e para que se logre aumentar sua proteção, é imperioso o trabalho de fiscalização

e orientação realizado pelos órgãos ambientais.

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Diante de tal premissa, é urgente que seja pensada e realizada a estruturação desses

órgãos, já que é cediço que o trabalho realizado por muitos de seus setores estão

ineficientes e, por vezes, sucateados (seja pela falta de estrutura física adequada, seja pela

falta de pessoal, seja pela falta de tecnologia e treinamento que levam à excelência do

trabalho desenvolvido).

Ressalte-se que as ações emergenciais para contratação de pessoal sempre surgem nos

momentos de crise, mas as ações de longo prazo são esquecidas assim que o estado

emergencial se aplaina, olvidando-se tanto o planejamento estratégico dos órgãos

ambientais, quanto o pensar e agir para os casos futuros.

Assim, podem ser destacadas as seguintes ações como necessárias à estruturação dos

órgãos ambientais:

a) A realização de estudo de lotação ideal a fim de perquirir a real necessidade do

quadro de pessoal para cada setor responsável, visando alcançar a eficiência na

Administração Pública;

b) O estabelecimento de cronograma de realização de concurso público, valendo

destacar que os servidores concursados são essenciais ao órgão ambiental para

a manutenção do ativo de conhecimento no âmbito do órgão e o desenvolvimento

de ações a longo prazo;

c) O estabelecimento de programa de valorização de servidores com vistas à sua

manutenção nos quadros da Administração Pública Municipal;

d) A estruturação física dos órgãos ambientais (sejam os centralizados, sejam os

escritórios locais e regionais), visto que imperiosa a necessidade de melhorias dos

meios de trabalho (material de escritório, ar condicionado, hardwares e softwares

eficientes e modernos, automóvel e combustível para as ações fiscalizatórias e

educativas, etc).

3. DA RECUPERAÇÃO DOS ESPAÇOS DE RESERVAÇÃO HÍDRICA

O pesquisador José Galizia Tundisi, do Instituto Internacional de Ecologia – IIE,

apresentando palestra do terceiro encontro do Ciclo de Conferências 2014 do Programa

BIOTA-FAPESP Educação, alertou que o desmate da vegetação das bacias hidrográficas

impacta sobre a qualidade da água, elevando em 100 vezes o tratamento para torná-la

potável, além de haver alteração do ciclo de chuvas, prejuízo da recarga de aquíferos

subterrâneos, causando redução de recursos hídricos disponíveis para o abastecimento

humano.

Afirmou o pesquisador que “Em áreas com floresta ripária [contígua a cursos d'água] bem

protegida, basta colocar algumas gotas de cloro por litro e obtemos água de boa qualidade

para consumo. Já em locais com vegetação degradada, como o sistema Baixo Cotia [bacia

hidrográfica do rio Cotia, na Região Metropolitana de São Paulo], é preciso usar

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coagulantes, corretores de pH, flúor, oxidantes, desinfetantes, algicidas e substâncias para

remover o gosto e o odor. Todo o serviço de filtragem prestado pela floresta precisa ser

substituído por um sistema artificial e o custo passa de R$ 2 a R$ 3 a cada mil metros

cúbicos para R$ 200 a R$ 300. Essa conta precisa ser relacionada com os custos do

desmatamento”.

Assegurou que a taxa de evapotranspiração é mais alta quando a cobertura vegetal na

bacia hidrográfica é adequada, incluindo não apenas as florestas ripárias, mas também

matas de áreas alagadas e demais mosaicos de vegetação nativa. Explicou que o processo

erosivo diminui quando o escoamento da água das chuvas ocorre mais lentamente e que

parte da água se infiltra no solo por meio dos troncos e raízes funcionando como biofiltros

e recarrega os aquíferos garantindo a sustentabilidade dos mananciais.

Lembrou que “Em solos desnudos, o processo de drenagem da água da chuva ocorre de

forma muito mais rápida e há uma perda considerável da superfície do solo, que tem como

destino os corpos d’água. Essa matéria orgânica em suspensão altera completamente as

características químicas da água, tanto a de superfície como a subterrânea”.1

As áreas de preservação permanente e de reserva legal, assim como os denominados topos

de morro compõe áreas extremamente relevantes do ponto de vista das funções

ecossistêmicas que prestam. Segundo consta da doutrina “A compreensão da definição

de função ecológica ou ecossistêmicas é relevante porque, por meio delas, dá-se a

geração dos chamados serviços ecossistêmicos, ou seja, dos benefícios diretos e indiretos

obtidos pelo ser humano a partir dos ecossistemas, como, por exemplo, a provisão de

alimentos, a regulação climática, a formação do solo etc”2.

A argumentação em torno da alteração do antigo Código Florestal, Lei n. 4771/65, ao

menos levada a efeito pela bancada ruralista, sempre girou em torno da necessidade de

ampliação das terras agricultáveis e voltadas à produção agropecuária.

A contribuição dada pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, in Código

Florestal e a ciência: contribuições para o diálogo, afirma que

“Reduzir APP ou RL para aumentar a área plantada não seria a prioridade para

aumentar a produção agrícola. Ao contrário, é necessário reforçar as políticas públicas

voltadas à intensificação do uso das terras já utilizadas através da adoção de tecnologias

adequadas, tais como integração lavoura – pecuária, recuperação de pastos e adoção de

plantio direto de qualidade, todas elas com alta capacidade de reduzir as emissões de

CO2 e aumentar o estoque de carbono, a manutenção de remanescentes de vegetação

nativa nas propriedades e na paisagem transcende uma discussão puramente

ambientalista e ecológica, vislumbrando-se, além do seu potencial econômico, a

sustentabilidade da atividade agropecuária”.

1 http://agencia.fapesp.br/desmatamento_eleva_em_100_vezes_o_custo_do_tratamento_da_agua/19036/

Acesso 06 MAI 2015 2 VALERA, Carlos Alberto; ELLOVITCH, Mauro da Fonseca. Manual Novo Código Florestal. Minas

Gerais: Revista do Ministério Público do Estado de Minas Gerais, 2013, p. 05.

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É preciso ainda destacar que, segundo o estudo, a taxa de lotação das pastagens ainda é

baixa, cerca de 1 cabeça/ha, conforme Censo Agropecuário de 2006, devendo-se trabalhar

com a hipótese de adoção de mecanismos mais eficientes que visem ao aumento da

produtividade (confinamento ou semiconfinamento), ao invés da ampliação das áreas de

pastagens.

Portanto, é de se considerar que a alternativa não passa, pois, pela supressão ou

diminuição das áreas ambientalmente protegidas.

Conforme laudo técnico elaborado no âmbito do Centro de Apoio de Meio Ambiente do

Ministério Público do Estado do Espírito Santo, pelo Agente Técnico e Engenheiro

Agrônomo Luiz Pedrosa Aragão e pelo Físico Dr. Luiz Carlos Baldissero Molion tais

funções cumprem serviços e funções relevantes:

Função ambiental da propriedade tem como objetivo justamente a manutenção do equilíbrio ecológico

enquanto interesse de todos, beneficiando tanto a sociedade quanto aquele que a exerce. Nicoletto, R. L..

A função ambiental da propriedade rural: uma análise da constituição federal brasileira acerca do

exercício do direito de propriedade. Pubblicato in Diritto brasiliano il 18/10/2007

Função ambiental: função de preservar recursos hídricos, paisagens, estabilidade geológica,

biodiversidade e fluxo gênico (transferência de genes de uma população para outra) de fauna e flora, além

de proteger o solo e assegurar o bem estar das populações humanas que vivem no local.

SERVIÇOS AMBIENTAIS3

3 Os serviços ambientais ou serviços ecossistêmicos são bens e serviços providos pelo ambiente que

contribuem direta ou indiretamente para o bem estar humano. Podem ser divididos em:

Serviços Regulação: Capacidade dos ecossistemas naturais e semi-naturais de regular processos ecológicos essenciais de suporte

de vida através de ciclos biogeoquímicos e outros processos da biosfera.

Exemplos:

· Sequestro de carbono – florestas

· Proteção ciclo da água

· Ciclagem de nutrientes

· Controle de erosão

Serviços de Produção:

A definição de serviços ambientais ou serviços ecossistêmicos é simples: trata-se dos benefícios que as

pessoas obtêm da natureza direta ou indiretamente, através dos ecossistemas, a fim de sustentar a vida no

planeta. A Avaliação Ecossistêmica do Milênio da ONU, publicada em 2005, criou uma classificação para

os serviços ambientais, dividindo-os da seguinte forma:

(1) Serviços de Provisão: os produtos obtidos dos ecossistemas. Exemplos: alimentos, água doce, fibras,

produtos químicos, madeira.

(2) Serviços de Regulação: benefícios obtidos a partir de processos naturais que regulam as condições

ambientais. Exemplos: absorção de CO2 pela fotossíntese das florestas; controle do clima, polinização de

plantas, controle de doenças e pragas.

(3) Serviços Culturais: São os benefícios intangíveis obtidos, de natureza recreativa, educacional, religiosa

ou estético-paisagística.

(4) Serviços de Suporte: Contribuem para a produção de outros serviços ecossistêmicos: ciclagem de

nutrientes, formação do solo, dispersão de sementes.

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Dada a íntima relação entre reservação/conservação hídricas e preservação florestal,

destacamos a importância de:

a) Ampliação do conceito de ‘topos de morro” vez que a alteração levada a efeito

pela Lei 12.651/12 diminuiu, sensivelmente, as proteção dessas áreas no Espírito

Santo;

b) Priorização dos processos de reflorestamento em torno das matas ciliares e dos

topos de morros a fim de evitar o processo de erosão e enchentes, mediante o

aumento no nível de permeabilidade dos solos, em especial dessas duas áreas, haja

vista a importância que tem na manutenção do fluxo hídrico dos rios e também no

não carreamento de terra das zonas mais elevadas para as mais baixas;

c) Aumento na fiscalização dos licenciamentos ambientais, especialmente,

relacionados ao lançamento de efluentes não tratados, naturais ou não, no âmbito

dos corpos hídricos;

d) Obrigatoriedade nos licenciamentos ambientais de fixar como condicionante

ambiental o tratamento dos respectivos efluentes, independentemente da

capacidade de resiliência do corpo hídrico;

Fonte: http://www.oeco.org.br/dicionario-ambiental/28158-o-que-sao-servicos-ambientais

Nutrientes captados pelos autótrofos que é convertida em energia, dióxido de carbono, água e nutrientes

que são então utilizados pelos produtores secundários para criar uma variedade ainda maior de biomassa

viva.

Exemplos:

· Produção de alimentos

· Produção de fibras

· Produção de água (proteção de nascentes – projeto produtor de água)

Serviços de Informação Fornecem uma função essencial de referência, contribuindo para a manutenção da saúde humana,

proporcionando oportunidades para a reflexão, enriquecimento espiritual, o desenvolvimento cognitivo,

recreação e experiências estéticas.

Exemplos:

Sentido de lugar

Paisagístico

Território – pertencimento

Religiosos

Patrimônio cultural

Serviços de Habitat Ecossistemas que fornecem refúgio e habitat para a reprodução das plantas selvagens e animais,

contribuindo para a conservação in situ da diversidade biológica e genética e dos processos evolutivos, a

sua manutenção é essencial para garantir os outros serviços. Se não houver habitat para manter os

organismos que promovem esses serviços, os mesmos não serão oferecidos.

Fonte: http://www.cpact.embrapa.br/eventos/2010/met/palestras/26/261010_PALESTRA4_LILIAN_SO

SINSKI.pdf

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e) Educação Ambiental voltada à fiscalização em torno da abertura de poços

escavados;

f) Regulamentação da abertura e manutenção de poços escavados que considere a

propriedade rural como um todo, inclusive, no tocante à manutenção de áreas de

recarga hídrica, a exemplo, das áreas de reserva legal e áreas de preservação

permanente, com observância dos usos a eles relacionados;

g) Proibição e fiscalização em torno da abertura de poços artesianos nos locais

servidos por rede de abastecimento público, conforme disposto na Lei 11.445/07;

h) Zoneamento Ecológico Econômico específico da silvicultura a fim de identificar

os limites de ampliação dessa fronteira agrícola, considerando o impacto

sinérgico, especialmente verificado em relação à utilização de água.

4. DA PREVENÇÃO e RESERVAÇÃO EM RELAÇÃO A ESCASSEZ

HÍDRICA OU EVENTOS CATASTRÓFICOS

No tocante aos mecanismos de prevenção e reservação hídrica, sugerimos, ainda:

a) Consideração, nos processos de parcelamento do solo urbano, especialmente,

localizados nas regiões metropolitanas, da ampliação dos índices urbanísticos

relativos à permeabilidade do solo, a fim de evitar situações de enchentes e outros

transtornos;

b) Ampliação do Programa de Pagamento por Serviços Ambientais favorecendo a

adesão de outros produtores rurais que optem por proteger suas florestas,

reconhecendo a importância que têm no processo de preservação;

c) Fomento, por meio de incentivos creditícios, fiscais e tributários, à adoção de

tecnologias mais adequadas para irrigação, à exemplo das irrigações por aspersão

por irrigações por gotejamento;

d) Fomento a que o setor produtivo se organize e planeje investir em técnicas de

reutilização de água, inclusive, mediante investimento em processos de

dessalinização que deverão ser contabilizados como externalidades ambientais

dos processos produtivos;

e) Análise sinérgica no âmbito do licenciamento ambiental de empreendimentos que

lancem em corpos hídricos efluentes tratados ou não;

f) Construção de barragens e barraginhas visando à reservação hídrica.

g) Exigência, no âmbito do processos de aprovação de empreendimentos,

comerciais, residenciais e industriais, localizados em zonas urbanas, da adoção de

mecanismos de reutilização da água.

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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESPÍRITO SANTO

Procuradoria-Geral de Justiça

Rua Proc. Antonio Benedicto Amâncio Pereira, 350, Santa Helena - 29.050-265 - Vitória –ES - Tel.: 27.3194.4500 —

www.mpes.mp.br

h) Exigência, no âmbito do licenciamento de empreendimentos localizados em zona

rural, da adoção de mecanismos de reutilização de água.

Todas essas ações têm o condão de no curto, médio e longo prazo de, senão solucionarem,

ao menos diminuírem sensivelmente o desgaste social e ambiental em torno da escassez

hídrica. Desde já, o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO,

ator fundamental na defesa dos direitos e garantias fundamentais, coloca-se à disposição

da sociedade civil e do Estado, justificando desde logo as ações e medidas judiciais ou

extrajudiciais que serão adotadas em prol do reestabelecimento do equilíbrio hídrico

capixaba.

Vitória (ES), 15 de outubro de 2015.