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PROCESSO PENAL Prof. Renato Brasileiro 1

Processo Penal- FBN

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Page 1: Processo Penal- FBN

PROCESSO PENAL

Prof. Renato Brasileiro

1

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PROCESSO PENAL.........................................................................................................................1

TEMA 1: QUESTÕES PREJUDICIAIS...............................................................................................9

1. CONCEITO.............................................................................................................................9

2. NATUREZA JURÍDICA DAS QUESTÕES PREJUDICIAIS...........................................................10

3. CARACTERÍSTICAS...............................................................................................................11

3.1 Anterioridade...................................................................................................................11

3.2 Essencialidade ou interdependência................................................................................12

3.3 Autonomia........................................................................................................................12

4. QUESTÕES PREJUDICIAIS E QUESTÕES PRELIMINARES......................................................12

5. SISTEMAS DE SOLUÇÃO DAS QUESTÕES PREJUDICIAIS......................................................12

5.1 Sistema da cognição incidental........................................................................................12

5.2 Prejudicialidade obrigatória.............................................................................................13

5.3 Prejudicialidade facultativa..............................................................................................13

5.4 Sistema eclético ou misto.................................................................................................13

6. CLASSIFICAÇÃO DAS QUESTÕES PREJUDICIAIS...................................................................13

6.1 Quanto à sua natureza.....................................................................................................13

6.2 Quanto à competência para sua apreciação....................................................................15

6.3 Quanto aos efeitos...........................................................................................................16

7. QUESTÕES PREJUDICIAIS HETEROGÊNEAS RELATIVAS AO ESTADO CIVIL DAS PESSOAS....16

7.1 Pressupostos....................................................................................................................16

7.2 Consequências..................................................................................................................17

7.3 Previsão legal....................................................................................................................18

8. QUESTÕES PREJUDICIAIS HETEROGÊNEAS NÃO RELACIONADAS AO ESTADO CIVIL DAS PESSOAS.....................................................................................................................................18

8.1 Pressupostos....................................................................................................................18

8.2 Consequências..................................................................................................................19

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8.3 Previsão legal....................................................................................................................20

9. OBSERVAÇÕES FINAIS.........................................................................................................20

TEMA 2: EXCEÇÕES.....................................................................................................................22

1. CONCEITO...........................................................................................................................22

2. EXCEÇÃO X OBJEÇÃO..........................................................................................................22

3. MODALIDADES DE EXCEÇÕES.............................................................................................23

3.1 Exceções dilatórias...........................................................................................................23

3.2 Exeções peremptórias......................................................................................................23

4. PROCEDIMENTO DAS EXCEÇÕES E SUSPENSÃO DO PROCESSO.........................................23

5. EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO....................................................................................................24

5.1 Causas de suspeição.........................................................................................................24

5.2 Causas de impedimento...................................................................................................25

5.3 Causas de incompatibilidade............................................................................................26

5.4 Procedimento da exceção de suspeição...........................................................................26

5.5 Suspeição do MP..............................................................................................................28

5.6 Suspeição da autoridade policial......................................................................................29

5.7 Suspeição dos jurados......................................................................................................29

6. EXCEÇÃO DE INCOMPETÊNCIA (DECLINATORIA FORI)............................................................31

7. EXCEÇÃO DE ILEGITIMIDADE..................................................................................................32

7.1 Recursos cabíveis..............................................................................................................34

8. EXCEÇÃO DE LITISPENDÊNCIA................................................................................................34

8.1 Lide no processo penal?...................................................................................................35

8.2 Litispendência no processo penal.....................................................................................35

8.3 Recursos cabíveis..............................................................................................................36

9. EXCEÇÃO DE COISA JULGADA.................................................................................................36

9.1 Conceito de coisa julgada.................................................................................................36

9.2 Coisa julgada formal x coisa julgada material...................................................................36

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9.3 Limites objetivos e subjetivos da coisa julgada................................................................37

TEMA 3: O PROCEDIMENTO COMUM........................................................................................41

1. O DIREITO INTERTEMPORAL...............................................................................................41

1.1 A regra do Direito Penal...................................................................................................41

1.2 A regra do Direito Processual Penal.................................................................................42

2. CLASSIFICAÇÃO DO PROCEDIMENTO COMUM..................................................................46

2.1 Introdução........................................................................................................................46

2.2 Concurso de crimes, qualificadoras, privilégios, causas de aumento e diminuição, agravantes e atenuantes........................................................................................................47

3. ANÁLISE DO ANTIGO PROCEDIMENTO ORDINÁRIO DOS CRIMES PUNIDOS COM RECLUSÃO48

4. NOVO PROCEDIMENTO COMUM ORDINÁRIO....................................................................48

4.1 Oferecimento da peça acusatória...............................................................................49

4.2 Rejeição da peça acusatória.......................................................................................49

4.3 Recebimento da peça acusatória................................................................................51

4.4 Citação do acusado.....................................................................................................54

4.5 Revelia........................................................................................................................64

4.6 Reação defensiva à imputação...................................................................................65

4.7 Oitiva do MP...............................................................................................................69

4.8 Absolvição sumária.....................................................................................................69

4.9 Designação da audiência............................................................................................73

4.10 Audiência una de instrução e julgamento..................................................................74

TEMA 4: O PROCEDIMENTO DO JÚRI.........................................................................................92

1. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO TRIBUNAL DO JÚRI......................................................92

1.1 Plenitude de defesa....................................................................................................92

1.2 Sigilo das votações......................................................................................................93

1.3 Soberania dos veredictos...........................................................................................95

1.4 Competência para julgamento dos crimes dolosos contra a vida.............................100

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2. PROCEDIMENTO ESCALONADO OU BIFÁSICO DO TRIBUNAL DO JÚRI..............................105

3. PRIMEIRA FASE DO PROCEDIMENTO DO JÚRI – JUDICIUM ACCUSATIONIS.....................107

3.1 Impronúncia.............................................................................................................109

3.2 Desclassificação........................................................................................................111

3.3 Absolvição sumária na 1ª fase do júri.......................................................................114

3.4 Pronúncia.................................................................................................................116

4. SEGUNDA FASE DO PROCEDIMENTO DO JÚRI - JUDICIUM CAUSAE.................................129

4.1 Ordenamento do processo.......................................................................................129

4.2 Composição do Tribunal do Júri...............................................................................130

4.3 Sessão de julgamento...............................................................................................134

4.4 Quesitação................................................................................................................146

4.5 Desclassificação........................................................................................................154

TEMA 5: PRINCÍPIO DA CORRELAÇÃO ENTRE ACUSAÇÃO E SENTENÇA...................................158

5.1 Introdução................................................................................................................158

5.2 Emendatio libelli.......................................................................................................158

5.3 Mutatio libelli...........................................................................................................160

5.4 Disposições comuns à emendatio e à mutatio libelli................................................165

TEMA 6: RECURSOS..................................................................................................................167

1. CONCEITO.........................................................................................................................167

2. FUNDAMENTOS................................................................................................................167

3. NATUREZA JURÍDICA........................................................................................................169

4. PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE RECURSAL (JUÍZO DE PRELIBAÇÃO)......................169

5. PRESSUPOSTOS OBJETIVOS DE ADMISSIBILIDADE RECURSAL..........................................171

5.1 Cabimento................................................................................................................171

5.2 Adequação................................................................................................................171

5.3 Tempestividade........................................................................................................172

5.4 Inexistência de fato impeditivo................................................................................180

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5.5 Inexistência de fato extintivo...................................................................................183

5.6 Regularidade formal.................................................................................................184

6. PRESSUPOSTOS SUBJETIVOS............................................................................................185

6.1 Legitimidade recursal...............................................................................................185

6.2 Interesse recursal.....................................................................................................189

7. PRINCÍPIOS GERAIS DOS RECURSOS.................................................................................191

7.1 Duplo grau de jurisdição...........................................................................................191

7.2 Taxatividade dos recursos........................................................................................191

7.3 Unirrecorribilidade...................................................................................................192

7.4 Fungibilidade............................................................................................................193

7.5 Convolação...............................................................................................................193

7.6 Voluntariedade.........................................................................................................193

7.7 Disponibilidade.........................................................................................................195

7.8 Non reformatio in pejus...........................................................................................196

7.9 Non reformatio in pejus indireta..............................................................................196

7.10 Reformatio in mellius...............................................................................................198

7.11 Dialeticidade.............................................................................................................198

7.12 Variabilidade............................................................................................................199

8. EFEITOS DOS RECURSOS...................................................................................................200

8.1 Efeito obstativo........................................................................................................200

8.2 Efeito devolutivo......................................................................................................200

8.3 Efeito suspensivo......................................................................................................200

8.4 Efeito regressivo, iterativo ou diferido.....................................................................201

8.5 Efeito extensivo........................................................................................................202

8.6 Efeito substitutivo....................................................................................................203

8.7 Efeito translativo......................................................................................................203

9. DIREITO INTERTEMPORAL E RECURSOS...........................................................................203

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10. CLASSIFICAÇÃO DOS RECURSO.....................................................................................204

10.1 Quanto à obrigatoriedade............................................................................................204

10.2 Quanto à fundamentação............................................................................................204

10.3 Quanto à extensão da matéria impugnada..................................................................205

10.4 Quanto aos pressupostos de admissibilidade recursal.................................................205

10.5 Quanto ao objeto imediato do recurso........................................................................206

11. AÇÕES DE IMPUGNAÇÃO.............................................................................................206

11.1 Revisão criminal........................................................................................................206

11.2 Habeas corpus..........................................................................................................211

TEMA 7: NULIDADES................................................................................................................215

1. TIPICIDADE PROCESSUAL E NULIDADES...........................................................................215

1.1 Tipicidade.................................................................................................................215

1.2 Nulidades..................................................................................................................215

2. ESPÉCIES DE IRREGULARIDADES.......................................................................................215

3. ESPÉCIES DOS ATOS PROCESSUAS....................................................................................216

4. NULIDADES.......................................................................................................................217

4.1 Conceito...................................................................................................................217

4.2 Espécies....................................................................................................................218

5. RECONHECIMENTO DAS NULIDADES...............................................................................221

6. PRINCÍPIOS REFERENTES ÀS NULIDADES..........................................................................222

6.1 Princípio do prejuízo.................................................................................................223

6.2 Princípio da instrumentalidade das formas..............................................................223

6.3 Princípio da eficácia dos atos processuais................................................................223

6.4 Princípio da restrição processual à decretação da ineficácia....................................224

6.5 Princípio da causalidade...........................................................................................225

6.6 Princípio da conservação dos atos processuais (princípio do confinamento das nulidades).............................................................................................................................225

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6.7 Princípio do interesse...............................................................................................226

6.8 Princípio da lealdade (ou princípio da boa-fé)..........................................................226

6.9 Princípio da convalidação.........................................................................................226

TEMA 8: MEDIDAS ASSECURATÓRIAS......................................................................................228

1. PREVISÃO LEGAL..............................................................................................................228

2. CONCEITO.........................................................................................................................228

3. JURISDICIONALIDADE.......................................................................................................228

4. PRESSUPOSTOS................................................................................................................229

5. CONTRADITÓRIO PRÉVIO.................................................................................................229

6. SEQUESTRO......................................................................................................................230

6.1 Conceito...................................................................................................................230

6.2 Procedimento do sequestro.....................................................................................231

6.3 Defesa.......................................................................................................................232

6.4 Levantamento do sequestro.....................................................................................234

7. ESPECIALIZAÇÃO E INSCRIÇÃO DA HIPOTECA LEGAL........................................................235

7.1 Conceito...................................................................................................................236

7.2 Legitimidade.............................................................................................................237

8. ARRESTO...........................................................................................................................237

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TEMA 1: QUESTÕES PREJUDICIAIS

1. CONCEITO

São questões que devem ser avaliadas pelo juiz, com valoração penal ou extrapenal, e devem ser decididas ANTES do mérito da ação principal.

Exemplo: bigamia.

  Bigamia

        Art. 235 - Contrair alguém, sendo casado, novo casamento:

        Pena - reclusão, de dois a seis anos.

        § 1º - Aquele que, não sendo casado, contrai casamento com pessoa casada, conhecendo essa circunstância, é punido com reclusão ou detenção, de um a três anos.

        § 2º - Anulado por qualquer motivo o primeiro casamento, ou o outro por motivo que não a bigamia, considera-se inexistente o crime.

Supondo que alguém esteja sendo processado pelo crime de bigamia, antes de decidir o mérito, deve o juiz resolver a questão incidente: se o primeiro casamento do réu for nulo, ex., não há que se falar em bigamia.

Exemplo 2: abandono material.

Abandono material

        Art. 244. Deixar, sem justa causa, de prover a subsistência do cônjuge, ou de filho menor de 18 (dezoito) anos ou inapto para o trabalho, ou de ascendente inválido ou maior de 60 (sessenta) anos, não lhes proporcionando os recursos necessários ou faltando ao pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada; deixar, sem justa causa, de socorrer descendente ou ascendente, gravemente enfermo: (Redação dada pela Lei nº 10.741, de 2003)

        Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos e multa, de uma a dez vezes o maior salário mínimo vigente no País. (Redação dada pela Lei nº 5.478, de 1968)

        Parágrafo único - Nas mesmas penas incide quem, sendo solvente, frustra ou ilide, de qualquer modo, inclusive por abandono injustificado de emprego ou função, o pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada. (Incluído pela Lei nº 5.478, de 1968)

Jogador de futebol está sendo processado por abandono material e, em sua defesa, diz que realmente deixou de pagar pensão, mas que ainda não foi provado que a criança era seu filho, havendo uma negatória de paternidade em curso no cível.

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2. NATUREZA JURÍDICA DAS QUESTÕES PREJUDICIAIS

Não obstante certa controvérsia na doutrina, a maioria entende que a questão prejudicial funciona como ELEMENTAR DA INFRAÇÃO PENAL.

A elementar está ligada à existência do crime.

        Art. 92.  Se a decisão sobre a existência da infração depender da solução de controvérsia, que o juiz repute séria e fundada, sobre o estado civil das pessoas, o curso da ação penal ficará suspenso até que no juízo cível seja a controvérsia dirimida por sentença passada em julgado, sem prejuízo, entretanto, da inquirição das testemunhas e de outras provas de natureza urgente.

        Parágrafo único.  Se for o crime de ação pública, o Ministério Público, quando necessário, promoverá a ação civil ou prosseguirá na que tiver sido iniciada, com a citação dos interessados.

Ao tratar das questões prejudiciais o legislador se refere a elas como requisito de existência da infração.

CONCURSO: qual é a diferença entre uma elementar e uma circunstância? ELEMENTARES são dados essenciais da figura típica básica cuja ausência pode produzir uma atipicidade absoluta ou relativa. CIRCUNSTÂNCIAS são dados periféricos que gravitam ao redor da figura típica básica. Podem aumentar ou diminuir a pena, mas não interferem no tipo básico do delito.

OBS.: atipicidade absoluta > a conduta não encontra tipificação na lei (a conduta não é crime); atipicidade relativa > desclassificação.

Cézar Bittencourt: se, em um raciocínio hipotético, suprimindo o objeto a figura se torna atípica (absoluta ou relativa), será elementar.

Ex.: prevaricação > o dado “funcionário público” é circunstância ou elementar? Elementar, pois suprimindo-se essa figura haverá atipicidade absoluta.

Prevaricação

        Art. 319 - Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal:

        Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.

        Art. 319-A.  Deixar o Diretor de Penitenciária e/ou agente público, de cumprir seu dever de vedar ao preso o acesso a aparelho telefônico, de rádio ou similar, que permita a comunicação com outros presos ou com o ambiente externo: (Incluído pela Lei nº 11.466, de 2007).

        Pena: detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano.

Ex. 2: peculato > o dado “funcionário público” é circunstância ou elementar? Elementar, pois suprimindo-se essa figura haverá atipicidade relativa (passará a ser crime de apropriação indébita).

Peculato

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        Art. 312 - Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio:

        Pena - reclusão, de dois a doze anos, e multa.

        § 1º - Aplica-se a mesma pena, se o funcionário público, embora não tendo a posse do dinheiro, valor ou bem, o subtrai, ou concorre para que seja subtraído, em proveito próprio ou alheio, valendo-se de facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário.

Ex. 3: furto qualificado pelo concurso > o dado “concurso” é circunstância ou elementar? Circunstância, pois suprimindo-se o concurso persistirá o delito.

Furto

        Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel:

        Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.

        § 1º - A pena aumenta-se de um terço, se o crime é praticado durante o repouso noturno.

        § 2º - Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor a coisa furtada, o juiz pode substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois terços, ou aplicar somente a pena de multa.

        § 3º - Equipara-se à coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra que tenha valor econômico.

        Furto qualificado

        § 4º - A pena é de reclusão de dois a oito anos, e multa, se o crime é cometido:

        I - com destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa;

        II - com abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza;

        III - com emprego de chave falsa;

        IV - mediante concurso de duas ou mais pessoas.

        § 5º - A pena é de reclusão de três a oito anos, se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior. (Incluído pela Lei nº 9.426, de 1996)

CONCURSO: pai comete furto contra filho, incidindo, por consequência a agravante de ser o crime cometido contra descendente. Todavia, em sua defesa, o pai alega que, não obstante ter preticado o furto, a vítima não era seu filho, estando tramitando no cível uma ação negatória de paternidade. É questão prejudicial? NÃO! Não incide sobre elementar, mas sim sobre circunstância.

3. CARACTERÍSTICAS

3.1 Anterioridade

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A questão prejudicial deve ser enfrentada antes do mérito principal.

3.2 Essencialidade ou interdependência

O mérito principal depende da resolução da questão prejudicial.

3.3 Autonomia

A questão prejudicial pode ser objeto de uma ação autônoma. A questão prejudicial tem existência independetemente do processo penal (ex.: independentemente do processo de bigamia, no cível já tramitava a anulação do casamento).

4. QUESTÕES PREJUDICIAIS E QUESTÕES PRELIMINARES

Conceito de questão preliminar: é o fato processual ou de mérito que impede que o juiz aprecie o fato principal ou a questão principal (litispendência e coisa julgada são exemplos de preliminares processuais; a prescrição é citada como preliminar de mérito).

OBS.: extinta a punibilidade pela prescrição não haverá sequer a apreciação do mérito. Por isso, a prescrição é citada pela maioria da doutrina como questão preliminar de mérito.

Questões prejudiciais Questões preliminares

- Estão relacionadas ao direito material; - Estão relacionadas ao direito processual, salvo no caso das preliminares de mérito;

- Natureza jurídica de elementares da infração;

- Estão relacionadas aos pressupostos processuais de existência e validade da relação processual;

- Têm existência autônoma, independentemente do processo penal;

- Estão vinculadas ao processo criminal;

- Podem ser analisadas pelo juízo penal ou extrapenal.

- Só podem ser analisadas pelo juízo penal.

5. SISTEMAS DE SOLUÇÃO DAS QUESTÕES PREJUDICIAIS

5.1 Sistema da cognição incidental

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É também conhecido como sistema do predomínio da jurisdição penal.

Conceito: o juiz penal será sempre competente para apreciar a questão prejudicial, ainda que ela pertença a outro ramo do Direito.

A grande vantagem deste sistema é a celeridade: a partir do momento em que tudo é decidido por um único juiz o processo será célere.

A crítica em relação a este sistema é que ele violaria o princípio do juiz natural, vez que o juiz penal teria de invadir uma competência alheia para resolver a questão prejudicial.

5.2 Prejudicialidade obrigatória

É também conhecido como sistema da separação jurisdicional absoluta.

Conceito: o juiz penal nunca será competente para apreciar questão prejudicial pertencente a outro ramo do Direito, nem mesmo de maneira incidental.

A vantagem deste sistema é o respeito ao princípio do juiz natural.

A grande crítica que recai sobre esse sistema é em relação à celeridade.

5.3 Prejudicialidade facultativa

Conceito: o juiz penal tem a faculdade de apreciar ou não as questões prejudiciais pertencentes a outro ramo do Direito.

A vantagem é deixar que o juiz penal decida se irá apreciar a questão prejucial caso a caso, a depender da complexidade da questão prejudicial.

5.4 Sistema eclético ou misto

Conceito: resulta da fusão do sistema da prejudicialidade obrigatória com o sistema da prejudicialidade facultativa.

É o sistema adotado pelo CPP: quanto ao art. 92 adota-se a prejudicialidade obrigatória; quanto ao art. 93, adota-se a prejudicialidade facultativa.

Em relação às questões prejudiciais que dizem respeito ao estado civil das pessoas, vigora o sistema da prejudicialidade obrigatória. Quanto às demais questões prejudiciais heterogêneas (pertencentes a outros ramos do Direito), vigora o sistema da prejudicialidade facultativa.

6. CLASSIFICAÇÃO DAS QUESTÕES PREJUDICIAIS

6.1 Quanto à sua natureza

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A. Questão prejudicial homogênea, comum ou imperfeita

É aquela que pertence ao mesmo ramo do Direito da questão prejudicada.

Ex.: delito de receptação.

Receptação

        Art. 180 - Adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime, ou influir para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte: (Redação dada pela Lei nº 9.426, de 1996)

        Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 9.426, de 1996)

No momento de condenar alguém por receptação, não basta demonstrar que a pessoa adquiriu a coisa; deve demonstrar que a pessoa adquiriu a coisa que sabia ser produto de crime. Ou seja: há uma prejudicialidade, mas que está dentro do próprio Direito Penal, ramo da questão prejudicada.

Ex. 2: lavagem de capitais.

Art. 1º Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de crime:

        I - de tráfico ilícito de substâncias entorpecentes ou drogas afins; (...)

Se a pessoa é pega com 500.000,00 na cueca é impossível concluir que se trate do delito de lavagem de capitais. Para concluir isso, é necessário investigar crime antecedente. É, assim, claramente uma questão prejudicial homogênea.

As questões prejudiciais homogênas NÃO são tratadaas pelo CPP nos artigos 92 e 93, que cuidam apenas das questões prejudiciais heterogêneas. É exatamente por não ter tratamento no CPP qua as questões prejudiciais homogêneas são chamadas de “imperfeitas”.

- Art. 92, CPP trata das questões prejudicias heterogêneas, mais especificamente das questões prejudiciais que dizem respeito ao estado civil das pessoas:

Art. 92.  Se a decisão sobre a existência da infração depender da solução de controvérsia, que o juiz repute séria e fundada, sobre o estado civil das pessoas, o curso da ação penal ficará suspenso até que no juízo cível seja a controvérsia dirimida por sentença passada em julgado, sem prejuízo, entretanto, da inquirição das testemunhas e de outras provas de natureza urgente.

- Art. 93, CPP trata das questões prejudiciais heterogêneas:

Art. 93.  Se o reconhecimento da existência da infração penal depender de decisão sobre questão diversa da prevista no artigo anterior (estado civil das pessoas), da competência do juízo cível, e se neste houver sido proposta ação para resolvê-la, o juiz criminal poderá, desde que essa questão seja de difícil solução e não verse sobre direito cuja prova a lei civil limite, suspender o curso do processo, após a inquirição das testemunhas e realização das outras provas de natureza urgente.

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Mas se o CPP trata apenas das questões heterogêneas, como resolver as questões homogêneas no Direito Processual Penal (ex.: delito receptação)? O CPP resolve este tipo de questão pelo instituto da CONEXÃO probatória ou instrumental. Art. 76, III, CPP:

Art. 76.  A competência será determinada pela conexão:

        III - quando a prova de uma infração ou de qualquer de suas circunstâncias elementares influir na prova de outra infração.

Detalhe em relação à conexão: caso os dois crimes sejam objeto do mesmo processo, o juiz julga primeiro o crime prejudicial e depois o crime prejudicado. Ex.: julga primeiro o crime anterior e depois a receptação. Todavia, se o primeiro crime não estiver sendo julgado no mesmo processo, o juiz deverá apreciá-lo apenas de maneira incidental, para que possa julgar o crime prejudicado. Nesse caso, a decisão incidental sobre o primeiro crime não faz coisa julgada material.

B. Questão prejudicial heterogênea, incomum, jurisdicional ou perfeita

É aquela pertencente a outro ramo do Direito. É quanto a essa questão prejudicial que o CPP se preocupa nos arts. 92 e 93. Ex.: furto.

Furto

        Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel:

Uma pessoa que está sendo processada por furto pode alegar, em sua defesa, que não substraiu coisa alheia, e sim, pagou por essa coisa. Nasce aí uma questão prejudicial heterogênea (patrimonial).

6.2 Quanto à competência para sua apreciação

A. Questão prejudicial não devolutiva

É sempre analisada pelo juiz penal (questões prejudiciais homogêneas).

“Não devolutiva”: a pessoa não é obrigada a devolver o conhecimento da questão a órgão jurisdicional diverso.

B. Questão prejudicial devolutiva

O juiz penal devolve o conhecimento da matéria ao juiz natural (questões prejudiciais heterogêneas). Há duas espécies:

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Devolutiva absoluta: é aquela que nunca poderá ser analisada pelo juiz penal, ou seja, são as heterogêneas relativas ao estado civil das pessoas (obrigatoriamente o juiz penal precisa devolver o conhecimento dessas questões ao juiz natural);

Devolutiva relativa: é aquela que pode, eventualmente, ser analisada pelo juiz penal, cabendo a ele decidir se irá apreciá-la ou não (são as questões prejudiciais heterogêneas desde que não relacionadas ao estado civil das pessoas). Exemplo acima do furto.

6.3 Quanto aos efeitos

A. Questão prejudicial obrigatória

É também chamada de questão prejudicial necessária ou em sentido estrito.

É aquela que sempre acarreta a suspensão do processo, pois o juiz penal NÃO tem competência para apreciá-la. São as questões prejudiciais heterogêneas relativas ao estado civil das pessoas (são devolutivas absolutas).

B. Questão prejudicial facultativa

É também chamada de questão prejudicial em sentido amplo.

É aquela que nem sempre acarreta a suspensão do processo, pois o juiz penal pode, eventualmente, enfrentá-las. São as questões prejudiciais heterogêneas não relativas ao estado civil das pessoas (são devolutivas relativas).

7. QUESTÕES PREJUDICIAIS HETEROGÊNEAS RELATIVAS AO ESTADO CIVIL DAS PESSOAS

7.1 Pressupostos

I) A questão prejudicial deve afetar o mérito principal (deve afetar uma elementar da infração penal);

Só poderá reconhecer a prejudicialidade quando a matéria afetar a existência do crime. Claro, pois a questão prejudicial acarreta a suspensão do processo e da prescrição. Dessa forma, questões de natureza secundária não podem autorizar a prejudicialidade.

II) A alegação deve ser séria e fundada;

Não se pode determinar a suspensão do processo por motivo fútil, infundado.

III) A prejudicial deve estar relacionada ao estado civil da pessoa.

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7.2 Consequências

I) Reconhecida a prejudicialidade, haverá a SUSPENSÃO DO PROCESSO e da PRESCRIÇÃO; Art. 92, CPP e art. 116, CP:

Art. 92.  Se a decisão sobre a existência da infração depender da solução de controvérsia, que o juiz repute séria e fundada, sobre o estado civil das pessoas, o curso da ação penal ficará suspenso até que no juízo cível seja a controvérsia dirimida por sentença passada em julgado, sem prejuízo, entretanto, da inquirição das testemunhas e de outras provas de natureza urgente.

Art. 116 - Antes de passar em julgado a sentença final, a prescrição não corre: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

I - enquanto não resolvida, em outro processo, questão de que dependa o reconhecimento da existência do crime; (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

II) A suspensão do processo e da prescrição será até o TRÂNSITO EM JULGADO da decisão no cível;

Art. 92.  Se a decisão sobre a existência da infração depender da solução de controvérsia, que o juiz repute séria e fundada, sobre o estado civil das pessoas, o curso da ação penal ficará suspenso até que no juízo cível seja a controvérsia dirimida por sentença passada em julgado, sem prejuízo, entretanto, da inquirição das testemunhas e de outras provas de natureza urgente.

CONCURSO: uma das consequências da prejudicial obrigatória é a suspensão do processo e da prescrição. Existem outros exemplos nos quais irá haver a suspensão do processo e da prescrição? Existem outros processos nos quais irá haver apenas a suspensão do processo e não da prescrição?

- Dispositivos legais que preveem a suspensão do processo e da prescrição:

1) Art. 366, CPP: acusado citado por edital que não comparece e nem constitui advogado;

Art. 366. Se o acusado, citado por edital, não comparecer, nem constituir advogado, ficarão suspensos o processo e o curso do prazo prescricional, podendo o juiz determinar a produção antecipada das provas consideradas urgentes e, se for o caso, decretar prisão preventiva, nos termos do disposto no art. 312.  (Redação dada pela Lei nº 9.271, de 17.4.1996) (Vide Lei nº 11.719, de 2008)

2) Art. 89, lei 9.099: suspensão condicional do processo;

Art. 89. Nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a um ano, abrangidas ou não por esta Lei, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo, por dois a quatro anos, desde que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime, presentes os demais requisitos que autorizariam a suspensão condicional da pena (art. 77 do Código Penal).

3) Art. 6º, da lei 12. 382 (modificou o art. 83 da lei 9.430): parcelamento do débito tributário.

Art. 6o  O art. 83 da Lei no 9.430, de 27 de dezembro de 1996, passa a vigorar acrescido dos seguintes §§ 1o a 5o, renumerando-se o atual parágrafo único para § 6o: 

“Art. 83.  ........................................................... 

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§ 2o  É suspensa a pretensão punitiva do Estado referente aos crimes previstos no caput, durante o período em que a pessoa física ou a pessoa jurídica relacionada com o agente dos aludidos crimes estiver incluída no parcelamento, desde que o pedido de parcelamento tenha sido formalizado antes do recebimento da denúncia criminal. 

§ 3o  A prescrição criminal não corre durante o período de suspensão da pretensão punitiva.  

§ 4o  Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos no caput quando a pessoa física ou a pessoa jurídica relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos, inclusive acessórios, que tiverem sido objeto de concessão de parcelamento.

Atenção: pela nova redação do art. 83, para que o parcelamento promova a suspensão do processo, o pedido de parcelamento deve ter sido formulado ANTES da denúncia.

- Dispositivo legal que prevê a suspensão do processo (sem suspensão da prescrição):

Art. 152: doença mental superveniente à infração penal.

Art. 152.  Se se verificar que a doença mental sobreveio à infração o processo continuará suspenso até que o acusado se restabeleça, observado o § 2o do art. 149.

III) Produção antecipada de provas urgentes;

IV) Nos crimes de ação penal pública deve o MP promover a ação civil referente à questão prejudicial, ainda que não tenha legitimação originariamente.

No cível o MP não tem legitimação ordinária. Por isso, poderia ocorrer de a parte legitimada não propor a ação no cível (claro, pois, desta forma, o processo criminal ficaria suspenso). Assim, mesmo o MP não tendo legitimação ordinária no cível, ele terá, no caso desta prejudicial obrigatória, legitimação para a ação cível.

7.3 Previsão legal

Art. 92.  Se a decisão sobre a existência da infração depender da solução de controvérsia, que o juiz repute séria e fundada, sobre o estado civil das pessoas, o curso da ação penal ficará suspenso até que no juízo cível seja a controvérsia dirimida por sentença passada em julgado, sem prejuízo, entretanto, da inquirição das testemunhas e de outras provas de natureza urgente.

        Parágrafo único.  Se for o crime de ação pública, o Ministério Público, quando necessário, promoverá a ação civil ou prosseguirá na que tiver sido iniciada, com a citação dos interessados.

8. QUESTÕES PREJUDICIAIS HETEROGÊNEAS NÃO RELACIONADAS AO ESTADO CIVIL DAS PESSOAS

8.1 Pressupostos

I) Deve ser uma elementar da infração penal;

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II) Deve ser de difícil solução (depende do caso concreto);

III) Não deve versar sobre o estado civil das pessoas (porque, caso contrário, seria devolutiva absoluta);

IV) Não deve o Direito Civil limitar a prova quanto à questão prejudicial;

Por que só pode suspender o processo penal e mandar para o cível se lá não houver limitações? No processo penal vigora a busca pela verdade, podendo a pessoa se valer de qualquer meio de prova. Já no cível, há algumas limitações, por exemplo, art. 227, CC:

Art. 227. Salvo os casos expressos, a prova exclusivamente testemunhal só se admite nos negócios jurídicos cujo valor não ultrapasse o décuplo do maior salário mínimo vigente no País ao tempo em que foram celebrados.

Por isso existe esse pressuposto número IV: só pode mandar para o cível se tiver liberdade probatória, pois, caso contrário, a pessoa ficaria prejudicada.

Isto é: se a lei civil limita a produção probatória quanto à questão prejudicial, o acusado estaria sendo prejudicado em virtude do reconhecimento da questão prejudicial, já que vigora, no processo penal, os princípios da busca pela verdade e da ampla liberdade quanto as meios probatórios.

V) A prejudicial deve ser da competência do juízo extrapenal (óbvio, se estamos falando de prejudicial heterogênea, estamos falando de questão em outro ramo que não o penal);

VI) Já deve ter sido proposta a ação no cível.

O juiz só pode suspender o processo pelo prejudicial facultativa se já tiver sido proposta ação no cível.

8.2 Consequências

I) Reconhecida a prejudicialidade, haverá a SUSPENSÃO do processo e da PRESCRIÇÃO;

II) O juiz criminal marca um prazo determinado para a suspensão (que pode ser prorrogado);

Art. 93.  Se o reconhecimento da existência da infração penal depender de decisão sobre questão diversa da prevista no artigo anterior, da competência do juízo cível, e se neste houver sido proposta ação para resolvê-la, o juiz criminal poderá, desde que essa questão seja de difícil solução e não verse sobre direito cuja prova a lei civil limite, suspender o curso do processo, após a inquirição das testemunhas e realização das outras provas de natureza urgente.

        § 1o  O juiz marcará o prazo da suspensão, que poderá ser razoavelmente prorrogado, se a demora não for imputável à parte. Expirado o prazo, sem que o juiz cível tenha proferido decisão, o juiz criminal fará prosseguir o processo, retomando sua competência para resolver, de fato e de direito, toda a matéria da acusação ou da defesa.

III) Expirado o prazo marcado pelo juiz criminal sem a decisão cível, o juiz penal retoma sua competência para apreciar a prejudicial incidentalmente;

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        § 1o  O juiz marcará o prazo da suspensão, que poderá ser razoavelmente prorrogado, se a demora não for imputável à parte. Expirado o prazo, sem que o juiz cível tenha proferido decisão, o juiz criminal fará prosseguir o processo, retomando sua competência para resolver, de fato e de direito, toda a matéria da acusação ou da defesa.

IV) Produção da prova urgente;

V) Nos crimes de ação pública, o MP deve intervir nos processos (cíveis) em andamento.

8.3 Previsão legal

Art. 93.  Se o reconhecimento da existência da infração penal depender de decisão sobre questão diversa da prevista no artigo anterior, da competência do juízo cível, e se neste houver sido proposta ação para resolvê-la, o juiz criminal poderá, desde que essa questão seja de difícil solução e não verse sobre direito cuja prova a lei civil limite, suspender o curso do processo, após a inquirição das testemunhas e realização das outras provas de natureza urgente.

        § 1o  O juiz marcará o prazo da suspensão, que poderá ser razoavelmente prorrogado, se a demora não for imputável à parte. Expirado o prazo, sem que o juiz cível tenha proferido decisão, o juiz criminal fará prosseguir o processo, retomando sua competência para resolver, de fato e de direito, toda a matéria da acusação ou da defesa.

        § 2o  Do despacho que denegar a suspensão não caberá recurso.

        § 3o  Suspenso o processo, e tratando-se de crime de ação pública, incumbirá ao Ministério Público intervir imediatamente na causa cível, para o fim de promover-lhe o rápido andamento.

       

9. OBSERVAÇÕES FINAIS

Da decisão que suspende o processo em virtude de questão prejudicial caberá RESE (art. 581, XVI, CPP);

Art. 581.  Caberá recurso, no sentido estrito, da decisão, despacho ou sentença:

XVI - que ordenar a suspensão do processo, em virtude de questão prejudicial;

Da decisão que NÃO suspende o processo NÃO há previsão legal de recurso (art. 93, §2º); no entanto, em favor da liberdade de locomoção pode ser utilizado o habeas corpus;

§ 2o  Do despacho que denegar a suspensão não caberá recurso.

A suspensão do processo em virtude de questão prejudicial pode ocorrer de ofício ou mediante provocação das partes;

Havendo questão prejudicial obrigatória, o processo será manifestamente NULO (nulidade absoluta – competência em razão da matéria) se o juiz criminal apreciar a prejudicial, pois não tem competência para tal;

A suspensão do processo em virtude de prejudicial NÃO acarreta na suspensão do inquérito;

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Tem força de coisa julgada na esfera penal a sentença cível que apreciar a questão prejudicial heterogênea, seja ela relativa ao estado civil das pessoas ou não, pouco importanto, ademais, se houve ou não a suspensão do processo criminal;

A decisão do juiz criminal sobre questão prejudicial devolutiva relativa NÃO faz coisa julgada na esfera civil, pois é apreciada apenas incidentalmente (exemplo acima do furto no qual a pessoa pagou pela coisa alheia que teria sido subtraída);

Princípio da suficiência da ação penal: em algumas situações, o processo penal é suficiente por si só para resolver toda a controvérsia; é o que ocorre com as questões prejudiciais heterogêneas não relativas ao estado civil das pessoas e que sejam de fácil solução (novamente o exemplo do furto acima).

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TEMA 2: EXCEÇÕES

1. CONCEITO

São procedimentos incidentais nos quais são alegados determinados fatos processuais, geralmente ligados a pressupostos processuais ou condições da ação, objetivando à extinção do processo ou sua simples dilação.

As exceções não atacam o mérito; atacam o próprio processo.

2. EXCEÇÃO X OBJEÇÃO

Exceção deve ser usada para se referir à espécie de defesa que só pode ser conhecida pelo juiz se arguída pelas partes. A exceção NÃO pode ser apreciada de ofício (exemplo clássico do processo civil > exceção de incompetência relativa – súmula 33 do STJ).

Atenção: de acordo com o STJ essa súmula pode ser usada também no processo penal, o que é um absurdo, vez que o juiz criminal, por óbvio, pode e deve reconhecer de ofício a incompetência relativa. Ex.: juiz criminal de SP recebe um processo de um delito cometido em Manaus. É claro que ele pode reconhecer a incompetência territorial.

Ao contrário, objeção se refere à matéria de defesa que pode ser reconhecida de ofício pelo magistrado. Ex.: incompetência absoluta.

Com base nessa distinção, vamos analisar o artigo 95, CPP:

        Art. 95.  Poderão ser opostas as exceções de:

        I - suspeição;

        II - incompetência de juízo;

        III - litispendência;

        IV - ilegitimidade de parte;

        V - coisa julgada.

Pergunta: o juiz criminal pode reconhecer de ofício essas matérias?

ATENÇÃO: o artigo 95 usa a palavra “exceção” de maneira INCORRETA, pois as matérias ali colocadas podem ser reconhecidas de ofício pelo magistrado. Tecnicamente, o que o artigo 95 chama de “exceções” são, na verdade, objeções.

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3. MODALIDADES DE EXCEÇÕES

3.1 Exceções dilatórias

São aquelas que visam apenas à procrastinação do processo. A ideia aqui é que quanto mais tempo o processo penal demorar, melhor ao acusado solto.

        Art. 95.  Poderão ser opostas as exceções de:

        I - suspeição;

        II - incompetência de juízo;

        III - litispendência;

        IV - ilegitimidade de parte;

        V - coisa julgada.

Quais são as exceções dilatórias?

- Suspeição, impedimento e incompatibilidade;

- Incompetência de juízo (no processo criminal a incompetência NÃO gera a extinção do processo; os autos são apenas remetidos ao juízo competente – o que gera a dilação do feito);

- Ilegitimidade ad processum (ex.: querelante menor – o juiz, ao menos em um primeiro momento, não extinguirá o processo; ele dará um prazo para a irregularidade seja sanada).

3.2 Exeções peremptórias

São aquelas que provocam a extinção do feito.

Quais são as exceções peremptórias?

- Litispendência;

- Coisa julgada;

- Ilegitimidade ad causam (ex.: MP oferece denúncia num crime de ação penal privada).

4. PROCEDIMENTO DAS EXCEÇÕES E SUSPENSÃO DO PROCESSO

Em regra, as exceções são processadas em AUTOS APARTADOS (petição autônoma > ex.: oferece a denúncia e, em peça separada, apresenta a exceção). Todavia, a forma de oposição da exceção não é uma formalidade essencial. Já que o juiz pode conhecer da matéria de ofício, ainda que seja oposta de forma irregular, será conhecida.

A oposição das exceções NÃO acarreta a suspensão do processo, salvo no caso da SUSPEIÇÃO, mas desde que haja concordância da parte contrária.

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Art. 111.  As exceções serão processadas em autos apartados e não suspenderão, em regra, o andamento da ação penal.

Art. 102.  Quando a parte contrária reconhecer a procedência da argüição, poderá ser sustado, a seu requerimento, o processo principal, até que se julgue o incidente da suspeição.

5. EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO

5.1 Causas de suspeição

Geralmente referem-se a uma relação externa ao processo que prejudica a imparcialidade do magistrado.

        Art. 254.  O juiz dar-se-á por suspeito, e, se não o fizer, poderá ser recusado por qualquer das partes:

        I - se for amigo íntimo ou inimigo capital de qualquer deles;

        II - se ele, seu cônjuge, ascendente ou descendente, estiver respondendo a processo por fato análogo, sobre cujo caráter criminoso haja controvérsia;o juiz poderia usar o processo para dar uma decisão que poderia, eventualmente, servir de paradigma para a decisão em relação ao processo contra o CAD

        III - se ele, seu cônjuge, ou parente, consangüíneo, ou afim, até o terceiro grau, inclusive, sustentar demanda ou responder a processo que tenha de ser julgado por qualquer das partes;

        IV - se tiver aconselhado qualquer das partes;

        V - se for credor ou devedor, tutor ou curador, de qualquer das partes;

        Vl - se for sócio, acionista ou administrador de sociedade interessada no processo.

CONCURSO: amizade com advogado é causa de suspensão? NÃO! Essa suspeição se dá em relação às partes e não ao advogado. Há, porém, doutrinadores que dizem que, diante de uma forte amizade com o advogado, o juiz pode se dar por suspeito por foro íntimo.

A. Consequências da decisão proferida por um juiz suspeito

A decisão proferida por juiz suspeito enseja NULIDADE ABSOLUTA, que deve, inclusive, ser reconhecida ab initio (a partir do primeiro momento em que o juiz suspeito teve contato com o feito).

Art. 564.  A nulidade ocorrerá nos seguintes casos:

I - por incompetência, suspeição ou suborno do juiz;

B. Ônus da prova da suspeição

O ônus da prova recai sobre o EXCIPIENTE (a pessoa que opôs a exceção).

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C. Suspeição por razões de foro íntimo

O juiz reconhece essa suspeição sem necessidade de declarar o motivo. Todavia, visando a evitar fraudes (ex.: juízes que se declaram suspeitos por razões de foro íntimo unicamente para evitar julgar processo difíceis ou extensos), o CNJ editou a Resolução n. 82:

RESOLUÇÃO Nº 82, de 09 de junho de 2009

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, no uso de suas atribuições,

CONSIDERANDO que durante Inspeções realizadas pela Corregedoria Nacional de Justiça foi constatado um elevado número de declarações de suspeição por motivo de foro íntimo;

CONSIDERANDO que todas as decisões dos órgãos do Poder Judiciário devem ser fundamentadas (art. 93, IX, da CF);

CONSIDERANDO que é dever do magistrado cumprir com exatidão as disposições legais (art. 35, I, da LC 35/1979), obrigação cujo observância somente pode ser aferida se conhecidas as razões da decisão;

CONSIDERANDO que no julgamento do relatório da Inspeção realizada no Poder Judiciário Estadual do Amazonas foi aprovada a proposta de edição de Resolução, pelo Conselho Nacional de Justiça, para que a as razões da suspeição por motivo íntimo, declarada pelo magistrado de primeiro e de segundo grau, e que não serão mencionadas nos autos, sejam imediatamente remetidas pelo magistrado, em caráter sigiloso, para conhecimento pelo Tribunal ao qual está vinculado;

CONSIDERANDO que a sistemática de controle é adotada, com êxito, há vários anos, por alguns Tribunais do País.

R E S O L V E:

Art. 1º. No caso de suspeição por motivo íntimo, o magistrado de primeiro grau fará essa afirmação nos autos e, em ofício reservado, imediatamente exporá as razões desse ato à Corregedoria local ou a órgão diverso designado pelo seu Tribunal.

Art. 2º. No caso de suspeição por motivo íntimo, o magistrado de segundo grau fará essa afirmação nos autos e, em ofício reservado, imediatamente exporá as razões desse ato à Corregedoria Nacional de Justiça.

Art. 3º. O órgão destinatário das informações manterá as razões em pasta própria, de forma a que o sigilo seja preservado, sem prejuízo do acesso às afirmações para fins correcionais.

Art. 4º. Esta resolução entrará em vigor na data de sua publicação.

Ministro GILMAR MENDES

Todavia, essa Resolução foi SUSPENSA pelo STF (MS 28.215). Há, ainda, uma ADI (4.260) visando a impugnar a Resolução.

5.2 Causas de impedimento

Referem-se a uma relação interna ao processo que prejudica a imparcialidade do juiz.

        Art. 252.  O juiz não poderá exercer jurisdição no processo em que:

        I - tiver funcionado seu cônjuge ou parente, consangüíneo ou afim, em linha reta ou colateral até o terceiro grau, inclusive, como defensor ou advogado, órgão do Ministério Público, autoridade policial, auxiliar da justiça ou perito;

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        II - ele próprio houver desempenhado qualquer dessas funções ou servido como testemunha; o juiz pode ser testemunha; só não pode testemunhar no processo que julga

        III - tiver funcionado como juiz de outra instância, pronunciando-se, de fato ou de direito, sobre a questão; diz respeito apenas a processo de natureza judicial (e não administrativa)

        IV - ele próprio ou seu cônjuge ou parente, consangüíneo ou afim em linha reta ou colateral até o terceiro grau, inclusive, for parte ou diretamente interessado no feito.

A. Consequências da decisão proferida por um juiz impedido

A decisão proferida por um juiz impedido é considerada como INEXISTENTE (é como se a decisão fosse proferida por um “não-juiz”).

5.3 Causas de incompatibilidade

Não há consenso na doutrina em relação a este tema.

Há doutrinadores que dizem que as causas de incompatibilidade são as previstas no artigo 253 do CPP:

        Art. 253.  Nos juízos coletivos, não poderão servir no mesmo processo os juízes que forem entre si parentes, consangüíneos ou afins, em linha reta ou colateral até o terceiro grau, inclusive.

Uma segunda corrente defende que incompatibilidade é o gênero do qual a suspeição e o impedimento são espécies.

Ainda, de acordo com uma terceira corrente, as causas de incompatibilidade são as previstas nas leis de organização judiciária (posição majoritária).

Independentemente da posição adotada, prevalece que a decisão contaminada por uma causa de incompatibilidade é NULA (nulidade absoluta).

5.4 Procedimento da exceção de suspeição

A primeira observação importante em relação à exceção de suspeição (e impedimento) é que, diferentemente das demais exceções, ela NÃO será apreciada pelo juiz, mas sim pelo Tribunal.

Ademais, a suspeição DEVE ser reconhecida de ofício pelo juiz. Todavia, não reconhecida de ofício pelo juiz, a suspeição deve ser arguída pela parte, por escrito*, na primeira oportunidade em que lhe couber falar nos autos, sob pena de preclusão.

*Todas as demais exceções podem ser aguídas oralmente; a suspeição (ou impedimento), apenas por escrito.

OBS.: se a arguição da suspeição for feita por advogado, requer poderes especiais.

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Qual é a primeira oportunidade para a acusação? A acusação irá opor a exceção de suspeição quando do oferecimento da PEÇA ACUSATÓRIA.

Qual é a primeira oportunidade para a defesa? A defesa irá opor a exceção de suspeição quando da RESPOSTA à acusação (art. 396-A, CPP).

        Art. 396-A.  Na resposta, o acusado poderá argüir preliminares (exceção é preliminar) e alegar tudo o que interesse à sua defesa, oferecer documentos e justificações, especificar as provas pretendidas e arrolar testemunhas, qualificando-as e requerendo sua intimação, quando necessário. (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

§ 1o  A exceção será processada em apartado, nos termos dos arts. 95 a 112 deste Código. (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

        § 2o  Não apresentada a resposta no prazo legal, ou se o acusado, citado, não constituir defensor, o juiz nomeará defensor para oferecê-la, concedendo-lhe vista dos autos por 10 (dez) dias. (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

ATENÇÃO: de acordo com a doutrina, ainda que não arguída na primeira oportunidade, é certo que decisão proferida por juiz suspeito viola o devido processo legal. Logo, nada impede que essa nulidade absoluta seja arguída em preliminar de futura e eventual apelação.

CONCURSO: e se depois do trânsito em julgado o advogado descobre que o juiz era marido da promotora? Na hipótese de haver uma sentença condenatória ou absolutória imprópria, a suspeição poderá ser arguída por meio da revisão criminal ou do habeas corpus (instrumentos postos à disposição da defesa).

Após oposta a suspeição, podem acontecer duas situações:

- Juiz concorda com o excipiente* > remessa dos autos para o Tribunal;

*Contra essa decisão NÃO cabe recurso.

- Juiz não acolhe o pedido > o juiz apresenta resposta por escrito > os autos serão remetidos ao Tribunal.

Quando os autos dão entrada no Tribunal, temos duas possibilidades:

- Indeferimento liminar > o Tribunal reconhece que as razões do excipiente são manifestamente improcedentes;

- Verificando uma verossimilhança nas alegações do excipiente, o Tribunal irá instruir a exceção e julgá-la.

Contra essa decisão do Tribunal cabe recurso? Artigo 581, CPP:

        Art. 581.  Caberá recurso, no sentido estrito, da decisão, despacho ou sentença:

        III - que julgar procedentes as exceções, salvo a de suspeição;

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Por que a suspeição é a única exceção em relação a qual não é cabível o RESE? Todas as exceções são julgadas pelo juiz de primeira instância, salvo as de suspeição. O RESE é recurso contra decisão de juiz de primeira instância. Dessa forma, como o juiz NÃO julga a exceção de suspeição, não caberá RESE contra a decisão do Tribunal que julgar procedente a suspeição.

Todavia, apesar de o CPP considerar a decisão inrrecorrível, na prática, há a possibilidade de interpor habeas corpus, mandado de segurança e, cumpridos os requisitos legais, também Recursos Extraordinários.

Artigos relativos ao procedimento de suspeição:

        Art. 98.  Quando qualquer das partes pretender recusar o juiz, deverá fazê-lo em petição assinada por ela própria ou por procurador com poderes especiais, aduzindo as suas razões acompanhadas de prova documental ou do rol de testemunhas.

        Art. 99.  Se reconhecer a suspeição, o juiz sustará a marcha do processo, mandará juntar aos autos a petição do recusante com os documentos que a instruam, e por despacho se declarará suspeito, ordenando a remessa dos autos ao substituto.

        Art. 100.  Não aceitando a suspeição, o juiz mandará autuar em apartado a petição, dará sua resposta dentro em três dias, podendo instruí-la e oferecer testemunhas, e, em seguida, determinará sejam os autos da exceção remetidos, dentro em vinte e quatro horas, ao juiz ou tribunal a quem competir o julgamento.

        § 1o  Reconhecida, preliminarmente, a relevância da argüição, o juiz ou tribunal, com citação das partes, marcará dia e hora para a inquirição das testemunhas, seguindo-se o julgamento, independentemente de mais alegações.

        § 2o  Se a suspeição for de manifesta improcedência, o juiz ou relator a rejeitará liminarmente.

        Art. 101.  Julgada procedente a suspeição, ficarão nulos os atos do processo principal, pagando o juiz as custas, no caso de erro inescusável; rejeitada, evidenciando-se a malícia do excipiente, a este será imposta a multa de duzentos mil-réis a dois contos de réis.

        Art. 102.  Quando a parte contrária reconhecer a procedência da argüição, poderá ser sustado, a seu requerimento, o processo principal, até que se julgue o incidente da suspeição.

CONCURSO: o assistente da acusação tem legitimidade para arguir a suspeição? Hoje entende-se que o assistente tem interesse não só patrimoniais, mas também na existência de um processo justo. Por isso, para a maioria da doutrina, o assistente poderá arguir a suspeição.

5.5 Suspeição do MP

Art. 258.  Os órgãos do Ministério Público não funcionarão nos processos em que o juiz ou qualquer das partes for seu cônjuge, ou parente, consangüíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive, e a eles se estendem, no que Ihes for aplicável, as prescrições relativas à suspeição e aos impedimentos dos juízes.

Todas as hipóteses de impedimento e suspeição que se aplicam aos juízes, também aplicam-se ao MP, tanto quando ele atua como fiscal da lei, quanto como parte.

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CONCURSO: o fato de o MP ter participado na investigação o torna suspeito para atuar no processo? NÃO! A atuação do MP na fase investigatória não acarreta em suspeição (ou impedimento). Aliás, o melhor promotor é aquele que atua na investigação (conhecerá melhor o processo).

STJ Súmula nº 234 - 13/12/1999 - DJ 07.02.2000Membro do Ministério Público - Participação na Fase Investigatória - Impedimento ou Suspeição - Oferecimento da Denúncia    A participação de membro do Ministério Público na fase investigatória criminal não acarreta o seu impedimento ou suspeição para o oferecimento da denúncia.

Qual é a consequência da atuação do promotor impedido ou suspeito no processo? O CPP não prevê qualquer nulidade em relação à atuação de promotor suspeito. Assim, para a doutrina majoritária, essa atuação não irá acarretar na invalidação do ato processual.

Quem decide a exceção de suspeição contra o promotor? Nos termos do CPP, a suspeição do MP é decidida pelo juiz de 1ª instância, sendo irrecorrível.

        Art. 104.  Se for argüida a suspeição do órgão do Ministério Público, o juiz, depois de ouvi-lo, decidirá, sem recurso, podendo antes admitir a produção de provas no prazo de três dias.

Para a prova do MP: o artigo 104 do CPP não foi recepcionado pela CRFB 88, sendo que a decisão cobre a suspeição do MP cabe a algum órgão superior do próprio MP, geralmente o Conselho Superior.

5.6 Suspeição da autoridade policial

        Art. 107.  Não se poderá opor suspeição às autoridades policiais nos atos do inquérito, mas deverão elas declarar-se suspeitas, quando ocorrer motivo legal.

5.7 Suspeição dos jurados

-Observação inicial: são convocados 25 jurados. Para que a sessão possa ser instalada há necessidade de um quórum mínimo de 15 jurados. Desses 15, participam efetivamente do julgamento apenas 7 jurados (Conselho).

As causas de suspeição estão previstas nos artigos 448 e 449 do CPP:

        Art. 448.  São impedidos de servir no mesmo Conselho: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        I – marido e mulher; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        II – ascendente e descendente; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        III – sogro e genro ou nora; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        IV – irmãos e cunhados, durante o cunhadio; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

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        V – tio e sobrinho; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        VI – padrasto, madrasta ou enteado. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        § 1o  O mesmo impedimento ocorrerá em relação às pessoas que mantenham união estável reconhecida como entidade familiar. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        § 2o  Aplicar-se-á aos jurados o disposto sobre os impedimentos, a suspeição e as incompatibilidades dos juízes togados. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        Art. 449.  Não poderá servir o jurado que: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        I – tiver funcionado em julgamento anterior do mesmo processo, independentemente da causa determinante do julgamento posterior; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        II – no caso do concurso de pessoas, houver integrado o Conselho de Sentença que julgou o outro acusado; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        III – tiver manifestado prévia disposição para condenar ou absolver o acusado. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

Além das causas acima, tudo o que se aplica em relação à suspeição dos juízes também se aplica em relação aos jurados.

O jurado deve reconhecer sua suspeição de ofício. Caso não o faça, as partes podem recusá-lo (recusa motivada). Obs.: as recusas motivadas podem ser usadas quantas vezes forem necessárias.

A recusa motivada do jurado em virtude da suspeição deve ser decidida de plano pelo juiz.

CONCURSO: tem-se 15 jurados (quórum mínimo). E se um deles se declarar suspeito? Ainda que o jurado se exclua ou seja excluído por suspeição, será computado para fins do quórum de instalação.

        Art. 451.  Os jurados excluídos por impedimento, suspeição ou incompatibilidade serão considerados para a constituição do número legal exigível para a realização da sessão. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

CONCURSO: qual é a consequência da participação de jurado impedido no julgamento? Antes da reforma de 2008, a votação no júri era feita até o 7º voto; por isso, se um jurado impedido participasse do julgamento era causa de nulidade relativa (deveria provar-se que a participação do jurado influiu no julgamento, ex.: todas as votações terminaram em 7x0 – a participação do jurado, obviamente, não foi decisiva). Com a reforma de 2008, o juiz para a votação quando completos 4 votos em uma direção (forma de preservar o sigilo das votações, sendo impossível determinar qual o grau de participação do jurado impedido no julgamento). Dessa forma, a consequência, agora, é a nulidade absoluta.

Ou seja: antes da lei 11.689, era causa de nulidade relativa, sendo obrigatória a comprovação do prejuízo, que só estaria presente se a votação terminasse em 4 x 3. Com a lei 11.689, a votação passa a ser interrompida quando forem atingidos 4 votos num sentido. Logo, como

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não será possível determinar o grau de influência do voto do jurado impedido, trata-se de nulidade absoluta.

6. EXCEÇÃO DE INCOMPETÊNCIA (DECLINATORIA FORI)

Por meio dessa exceção, pode-se arguir tanto a incompetência absoluta como a relativa.

Quanto ao procedimento devemos atentar para alguns pontos importantes:

- A incompetência (tanto a absoluta quanto a relativa) pode ser reconhecida de ofício pelo juiz:

        Art. 251.  Ao juiz incumbirá prover à regularidade do processo e manter a ordem no curso dos respectivos atos, podendo, para tal fim, requisitar a força pública.

Quando o artigo fala em “prover a regularidade”, daí a doutrina extrai que o juiz pode reconhecer sua própria incompetência.

- Quais os limites temporais para o reconhecimento da incompetência?

Absoluta: pode ser reconhecida de ofício pelo juiz enquanto não esgotada sua jurisdição (ou seja: até a prolação da sentença).

Relativa: pode ser reconhecida de ofício pelo juiz até o início da instrução probatória, respeitando-se, assim, o princípio da identidade física do juiz (não faz sentido o juiz instruir todo o processo para, ao final, reconhecer a incompetência relativa e não julgar). A incompetência relativa está sujeita à preclusão, por isso, se não reconhecida no devido momento, prorroga-se.

ATENÇÃO: a súmula 33 do STJ NÃO se aplica ao Processo Penal.

STJ Súmula nº 33 - 24/10/1991 - DJ 29.10.1991Incompetência Relativa - Declaração de Ofício    A incompetência relativa não pode ser declarada de ofício.

- Se a incompetência for reconhecida de ofício, caberá RESE:

Art. 581.  Caberá recurso, no sentido estrito, da decisão, despacho ou sentença:

        II - que concluir pela incompetência do juízo;

- Caso não haja o reconhecimento de ofício, as partes poderão opor exceção de incompetência (tanto para a absoluta quanto para a relativa, sendo que esta deve ser arguída no primeiro momento em que couber à parte falar nos autos, sob pena de preclusão).

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- Uma vez oposta a exceção qual é o recurso cabível?

Procedência da exceção de incompetência:

Art. 581.  Caberá recurso, no sentido estrito, da decisão, despacho ou sentença:

        III - que julgar procedentes as exceções, salvo a de suspeição;

Improcedência da exceção de incompetência: não há recurso específico contra essa decisão. Por isso, a matéria poderá ser arguída como preliminar de futura e eventual apelação, sem prejuízo dos remédios constitucionais (habeas corpus ou mandado de segurança).

Vale lembrar que, para a defesa, no caso de o acusado estar solto, não há pressa em reconhecer a incompetência absoluta, vez que, com a procrastinação do processo poderia ocorrer a prescrição.

OBS.: em relação à matéria, ver o caderno do intensivo 1.

7. EXCEÇÃO DE ILEGITIMIDADE

Ilegitimidade ad causam:

- É a pertinência subjetiva da ação;

- É uma condição genérica da ação;

- Sua violação dará ensejo a uma nulidade absoluta.

Ex.: ação penal privada interposta pelo MP.

Ilegitimidade ad processum:

- Pressuposto processual de validade;

- Sua violação dará ensejo a uma nulidade relativa;

Ex.: queixa crime oferecida por um menor de 18 anos. Ato que está sujeito à convalidação, bastando que o representante ratifique o ato praticado.

CONCURSO: delito de injúria racial praticado por Tício em detrimento de Mévio no dia 30 de agosto de 2009. Mévio oferece queixa crime em face de Tício no dia 30 de outubro de 2009. Os autos vão com vista ao MP para parecer.

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Art. 140 § 3o Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência: (Redação dada pela Lei nº 10.741, de 2003)

Pena - reclusão de um a três anos e multa. (Incluído pela Lei nº 9.459, de 1997)

Art. 145 - Nos crimes previstos neste Capítulo somente se procede mediante queixa, salvo quando, no caso do art. 140, § 2º, da violência resulta lesão corporal.

Parágrafo único.  Procede-se mediante requisição do Ministro da Justiça, no caso do inciso I do caput do art. 141 deste Código, e mediante representação do ofendido, no caso do inciso II do mesmo artigo, bem como no caso do § 3o do art. 140 deste Código. (Redação dada pela Lei nº 12.033.   de 2009)

O crime de injúria racial era de ação penal privada, mas, por conta da lei 12.033, passou a ser de ação penal pública condicionada à representação.

30 de agosto 30 de outubro

Data do fato Data da queixa crime

Ação penal PRIVADA Ação penal pública CONDICIONADA À REPRESENTAÇÃO

LEI Nº 12.033, DE29 DE SETEMBRO DE 2009.

Altera a redação do parágrafo único do art. 145 do Decreto-Lei 2848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, tornando pública condicionada a ação penal em razão da injúria que especifica.

OPRESIDENTEDAREPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1o Esta Lei torna pública condicionada a ação penal em razão de injúria consistente na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência.

Art. 2o O parágrafo único do art. 145 do Decreto-Lei 2848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 145. ......................................................................

Parágrafo único. Procede-se mediante requisição do Ministro da Justiça, no caso do inciso I do caput do art. 141 deste Código, e mediante representação do ofendido, no caso do inciso II do mesmo artigo, bem como no caso do § 3o do art. 140 deste Código.” (NR)

Art. 3o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Este texto não substitui o publicado no DOU de 30.9.2009 ESTA É A DATA DA PUBLICAÇÃO!!! Obs: se tiver vacatio não computa o dia do início e nem do final.

Quando o delito foi cometido, a ação penal era privada; todavia, quando o ofendido entrou com a queixa crime a ação penal já era pública condicionada à representação.

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Como resolver?

A primeira pergunta é: essa mudança tem natureza penal ou processual? Essa mudança tem natureza híbrida, pois repercute no direito de punir do Estado, restringindo a incidência de causas extintivas da punibilidade.

Quando um crime é de ação privada são quatro as causas de extinção de punibilidade (perdão, renúncia, perempção e decadência). Todavia, quando um crime é de ação penal pública condicionada à representação há apenas uma causa de extinção (decadência).

Claramente, a mudança ocorreu em prejuízo do réu (novatio legis in pejus). Dessa forma, aplica-se a lei da época do fato (e não a lei nova), admitindo-se, dessa forma, a ação penal privada.

Deve ser reconhecida a LEGITIMIDADE do querelante.

7.1 Recursos cabíveis

Se REJEITADA a peça acusatória por ilegitimidade caberá RESE (art. 581, I, CPP);

   Art. 581.  Caberá recurso, no sentido estrito, da decisão, despacho ou sentença:

        I - que não receber a denúncia ou a queixa;

Se o juiz ANULAR o processo em razão da ilegitimidade também caberá RESE (art. 581, XIII, CPP);

   Art. 581.  Caberá recurso, no sentido estrito, da decisão, despacho ou sentença:

        XIII - que anular o processo da instrução criminal, no todo ou em parte;

Se o juiz julga PROCEDENTE exceção, caberá RESE (art. 381, III, CPP);

        Art. 581.  Caberá recurso, no sentido estrito, da decisão, despacho ou sentença:

        III - que julgar procedentes as exceções, salvo a de suspeição;

Se o juiz julga IMPROCEDENTE a exceção, não caberá recurso específico, podendo a parte arguir a matéria como preliminar de eventual apelação, sem prejuízo dos remédios constitucionais (habeas corpus e mandado de segurança).

8. EXCEÇÃO DE LITISPENDÊNCIA

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8.1 Lide no processo penal?

O conceito clássico de lide é “conflito de interesse qualificado por uma pretensão resistida”. Para a maioria da doutrina NÃO há lide no processo penal, pois:

- Ao MP não interessa a condenação de um inocente (não há conflito de interesses);

- Independentemente da concordância do acusado, deverá sempre haver resistência por parte da defesa no processo penal (a resistência aqui é inerente ao processo).

8.2 Litispendência no processo penal

No processo civil, para se falar em litispendência, é necessário identidade de partes, pedido e causa de pedir.

Esse raciocínio, porém, não se aplica ao processo penal. A uma, porque o pedido é sempre genérico, de condenação (ou seja: é sempre o mesmo, não sendo, portanto, útil para identificar semelhanças entre dois processos). A duas, porque não interessa, no processo penal, ter as mesmas partes, mas sim, o mesmo ACUSADO. A três, porque não se fala em causa de pedir, mas em IMPUTAÇÃO.

No processo penal, então, para se falar em litispendência, é necessário mesmo acusado e mesma imputação.

Exemplo:

Processo 1 Processo 2

Autor da demanda: MP Autor da demanda: querelante (queixa subsidiária)

Acusado: Tício Acusado: Tício

Imputação: crime de furto, em 19.01, às 22hs Imputação: crime de furto, em 19.01, às 22hs

Classificação: art. 155, CP Classificação: art. 171, CP (estelionato)

Há litispendência entre o processo 1 e o processo 2?

- O acusado é o mesmo;

- A imputação é a mesma (o fato delituoso é o mesmo);

- Logo, há litispendência.

OBS.: a classificação não tem muita relevância, pois no processo penal o acusado se defende dos FATOS (e não da classificação).

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CONCURSO: há litispendência entre processo e IP? Não! É a citação válida que induz a listispendência (art. 219, CPC).

8.3 Recursos cabíveis

Se reconhecida DE OFÍCIO, cabe APELAÇÃO (art. 593, II, CPP);

Art. 593. Caberá apelação no prazo de 5 (cinco) dias:  (Redação dada pela Lei nº 263, de 23.2.1948)

        II - das decisões definitivas, ou com força de definitivas, proferidas por juiz singular nos casos não previstos no Capítulo anterior; (Redação dada pela Lei nº 263, de 23.2.1948)

Quando o juiz reconhece de ofício a listispendência, ele irá extinguir o processo. Essa decisão é definitiva, mas não está sujeita ao RESE. Para as decicões definitivas não sujeitas ao RESE, a lei prevê a apelação.

Se julgada PROCEDENTE a exceção, cabe RESE (art. 581, III, CPP);

Se julgada IMPROCEDENTE a exceção, não caberá recurso específico, podendo a parte arguir a matéria como preliminar de eventual apelação, sem prejuízo dos remédios constitucionais (habeas corpus e mandado de segurança).

9. EXCEÇÃO DE COISA JULGADA

9.1 Conceito de coisa julgada

É a decisão jurisdicional contra a qual não cabe mais recurso, seja por conta do esgotamento da via recursal, seja pela preclusão (ideia de segurança jurídica).

O efeito mais importante da coisa julgada diz respeito à imutabilidade da decisão judicial. Essa imutabilidade tem natureza absoluta ou relativa? Depende. Em se tratando de uma sentença condenatória ou absolutória imprópria transitada em julgado, admite-se REVISÃO CRIMINAL ou HABEAS CORPUS. Nesse caso, a coisa julgada tem natureza relativa. Já em se tratando de sentença absolutória própria, NÃO haverá recurso, pois no ordenamento pátrio NÃO se admite revisão criminal pro societate. Assim, diante de uma sentença absolutória própria, a coisa julgada terá natureza absoluta (de modo algum se admite a alteração da sentença). Quando a coisa julgada passa a gozar dessa natureza absoluta, é chamada pela doutrina de COISA SOBERANAMENTE JULGADA (está ligada ao ne bis in idem processual – CADH: art. 8º, n. 4).

4. O acusado absolvido por sentença transitada em julgado não poderá ser submetido a novo processo pelos mesmos fatos.

9.2 Coisa julgada formal x coisa julgada material

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CJF é a imutabilidade da decisão DENTRO do processo em que foi proferida. Exemplo: decisão de impronúncia (art. 414, CPP):

Art. 414.  Não se convencendo da materialidade do fato ou da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, o juiz, fundamentadamente, impronunciará o acusado. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        Parágrafo único.  Enquanto não ocorrer a extinção da punibilidade, poderá ser formulada nova denúncia ou queixa se houver prova nova. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

Se houver prova nova é plenamente possível nova denúncia.

Na CJM a imutabilidade da decisão projeta-se para FORA do processo em que foi proferida. A CJM pressupõe a CJF. Exemplo: absolvição sumária (art. 397, CPP):

        Art. 397.  Após o cumprimento do disposto no art. 396-A, e parágrafos, deste Código, o juiz deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar: (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008). (...)

Decisão dada por juiz incompetente faz coisa julgada? Para a doutrina majoritária e para os Tribunais Superiores, a decisão proferida por juiz incompetente é INVÁLIDA. Assim, decisão absolutória ou declaratória extintiva da punibilidade, ainda que proferida por juiz absolutamente incompetente é capaz de transitar em julgado, impedindo novo processo pela mesma imputação.

No caso de sentença condenatória ou absolutória imprópria, o acusado sempre terá à disposição o habeas corpus e revisão criminal.

OBS.: a professora Ada, em posição minoritária, diz que decisão dada por juiz absolutamente incompentente é inexistente.

9.3 Limites objetivos e subjetivos da coisa julgada

Os limites objetivos dizem respeito ao fato natural imputado ao acusado e objeto de posterior sentença, independentemente da classificação que lhe seja atribuída. A coisa julgada é formada em torno da IMPUTAÇÃO, pouco importando a classificação.

CONCURSO: se um cidadão foi absolvido como executor de um homicídio, ele pode ser processado novamente como partícipe? Num primeiro processo foi atribuída ao acusado a conduta de execução; em relação a essa conduta, os jurados entenderam ser o cidadão inocente. Todavia, pode ser que, em relação à conduta de partícipe os jurados entendam que o cidadão é culpado.

Caso o acusado seja absolvido da imputação de execução de um homicídio, nada impede que seja novamente processado como partícipe desse mesmo delito, já que as imputações são distintas. STF HC 82.980:

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EMENTA: HABEAS CORPUS. PROCESSO PENAL. HOMICÍDIO. JÚRI. CONCURSO DE PESSOAS. RÉUS DENUNCIADOS POR AUTORIA E PARTICIPAÇÃO. JULGAMENTO DESMEMBRADO. ABSOLVIÇÃO DO PARTÍCIPE. JULGAMENTO DO SEGUNDO RÉU, QUE, EM PLENÁRIO, INVERTE A ACUSAÇÃO INICIALMENTE POSTA NA DENÚNCIA, ASSUMINDO A PARTICIPAÇÃO NO EVENTO CRIMINOSO E IMPUTANDO AO PARTÍCIPE ABSOLVIDO A AUTORIA MATERIAL DO DELITO. ABSOLVIÇÃO. SEGUNDA DENÚNCIA EM CONFORMIDADE COM A NOVA VERSÃO DOS FATOS. ALEGAÇÃO DE AFRONTA À COISA JULGADA. INTELIGÊNCIA DO ART. 110, § 2º, DO CPP. VINCULAÇÃO OBRIGATÓRIA ENTRE PRONÚNCIA-LIBELO-QUESITAÇÃO. INAPLICABILIDADE DO ART. 384, CAPUT E PARÁGRAFO ÚNICO, NA SEGUNDA FASE DO RITO DO JÚRI (JUDICIUM CAUSAE). 1. A ofensa à coisa julgada exige a identidade de causa, caracterizada pela identidade do fato, sendo que esta não se verifica no caso de alteração de um dos elementos que o constitui (tempo, lugar, conduta imputada ao agente). 2. A absolvição, pelo Conselho de Sentença, da imputação de participação no crime de homicídio -- pela entrega da arma e auxílio à fuga -- não veda a possibilidade de nova acusação pela autoria material. Da mesma forma, a absolvição, pelo Júri, da imputação de autoria material do crime de homicídio não faz coisa julgada impeditiva de o acusado responder a nova ação penal (agora como partícipe) pelo mesmo crime cuja autoria material é imputada a outrem. Novas imputações que não passaram pelo crivo do Conselho de Sentença não configuram identidade de fato apta a caracterizar a coisa julgada (art. 110, § 2º, do CPP). Precedentes. 3. O procedimento do Júri, marcado por duas fases distintas e procedimentos específicos, exige a correlação obrigatória entre pronúncia-libelo-quesitação. Correlação, essa, que decorre não só da garantia da ampla defesa e do contraditório do réu -- que não pode ser surpreendido com nova imputação em plenário --, mas também da necessidade de observância à paridade de armas entre acusação e defesa. Daí a impossibilidade de alteração, na segunda fase do Júri (judicium causae), das teses balizadas pelas partes na primeira fase (judicium accusationis), não dispondo o Conselho de Sentença dos amplos poderes da mutatio libelli conferidos ao juiz togado. 4. Habeas corpus indeferido.

Os limites subjetivos dizem respeito àquele que ocupou o polo passivo da demanda.

OBS.: decisão absolutória em relação a um dos coautores do delito não faz coisa julgada em relação aos demais, salvo se reconhecida categoricamente a inexistência do fato delituoso.

Observações finais quanto à coisa julgada:

1) Crime continuado: caso uma primeira série de continuidade delitiva já tenha sido julgada, é plenamente possível que o acusado seja novamente processado por outra série de continuidade delitiva, ainda que praticada durante o mesmo lapso temporal (ex.: estelionato contra a Previdência Social: estelionatário cometeu 20 crimes contra o INSS; todavia, em um primeiro momento, foram descobertos e julgados apenas 5; é claro que quando os outros forem descobertos ele poderá por eles ser processado). Nesse caso, caberá ao juízo da execução posterior unificação das penas (art. 82, CPP):

        Art. 82.  Se, não obstante a conexão ou continência, forem instaurados processos diferentes, a autoridade de jurisdição prevalente deverá avocar os processos que corram perante os outros juízes, salvo se já estiverem com sentença definitiva. Neste caso, a unidade dos processos só se dará, ulteriormente, para o efeito de soma ou de unificação das penas.

2) Concurso formal: a decisão a respeito de um dos fatos delituosos não faz coisa julgada em relação aos demais, salvo se houver o reconhecimento categórico da inexistência da ação ou omissão.

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No concurso formal a pessoa pratica dois ou mais crimes mediante uma só ação ou omissão. Assim, se o juiz reconhecer a inexistência da ação ou omissão em relação a um dos delitos é claro que haverá coisa julgada em relação aos outros (que teriam sido, também, frutos da mesma ação ou omissão).

3) Duplicidade de sentenças condenatórias com trânsito em julgado em relação à mesma imputação: prevalece o entendimento de que apenas a decisão que primeiro transitou em julgado será válida (STJ HC 97.753). Entretanto, no HC 101.131 (informativo 622), o STF entendeu que deve prevalecer a condenação mais benéfica ao acusado, já que não se admite revisão criminal pro societate.

PENAL. PROCESSUAL PENAL.1. PACIENTE CONDENADO PELO CRIME DE ROUBO. APÓS O TRÂNSITO EM JULGADO, INICIADA NOVA AÇÃO PELOS MESMOS FATOS. CONDENAÇÃO. SUPERVENIÊNCIA. NOVO TRÂNSITO EM JULGADO. VIOLAÇÃO À COISA JULGADA DO PRIMEIRO PROCESSO. NULIDADE ABSOLUTA DO SEGUNDO PROCESSO. PROIBIÇÃO DE BIS IN IDEM. COISA JULGADA. VIOLAÇÃO. OCORRÊNCIA.2. ORDEM CONCEDIDA. 1. Havendo duas condenações em processos distintos, ambos com trânsito em julgado, que versam exatamente sobre os mesmos fatos delituosos, deve prevalecer a que primeiro transitou em julgado, anulando-se a segunda. Ainda que a violação à coisa julgada não tenha sido suscitada pelo paciente no curso do segundo processo, a sua nulidade é flagrante, impondo-se a sua anulação. 2. Ordem concedida para, exclusivamente em relação ao paciente, anular o processo de nº 2003.07.1.022336-7, desde o recebimento da denúncia, determinando-se, ainda, o trancamento definitivo do feito.

PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ROUBO CIRCUNSTANCIADO (ART. 157, § 2º, INCISO I, DO CÓDIGO PENAL). RECURSO ESPECIAL. DUPLO JULGAMENTO PELO MESMO FATO. SEGUNDA DECISÃO MAIS FAVORÁVEL AO RÉU. IMPOSSIBILIDADE DE REVISÃO PRO SOCIETATE COISA SOBERANAMENTE JULGADA MAIS BENÉFICA. IN DUBIO PRO REO. FALTA DE INSTRUMENTO LEGAL OU CONSTITUCIONAL PARA RESCINDIR JULGADO FAVORÁVEL AO DEMANDADO.1. A Violação da Coisa Julgada é matéria cognoscível de ofício, por isso que, mercê de não apreciada na instância inferior, a supressão de instância inocorre, porquanto a Corte Maior pode deferir a ordem de ofício.2. Deveras, a existência de duplo julgamento pelo mesmo fato, comprovada por prova pré-constituída, torna admissível o seu conhecimento de ofício na via estreita do habeas corpus.3. A Revisão, no Direito Processual Penal, é instrumento exclusivamente em favor do réu, sendo inadmissível a revisão pro societate.4. Quando o Estado exerce a persecutio criminis, a decisão sobre os fatos pelos quais o réu fora condenado só pode ser revista para abrandar a situação do sujeito passivo.5. In casu, o paciente fora processado e condenado duas vezes pelo mesmo fato. Com efeito, foi recebida, em 7/6/2005, denúncia no processo nº 2005.01.1.003315-4 imputando ao paciente a prática do crime de roubo circunstanciado (art. 157, § 2º, inciso I, do Código Penal), ocorrido no dia 28/11/2004, às 9h, em ferro velho entre a Divineia e a Metropolitana, na cidade satélite do Núcleo Bandeirante/DF.6. Consoante a denúncia (fls. 8/9), o paciente teria subtraído da vítima, mediante grave ameaça exercida com emprego de arma de fogo, uma bolsa preta contendo R$ 4,00 (quatro reais) e alguns objetos de uso pessoal. Posteriormente, em 7/7/2006, foi ajuizada contra o paciente outra ação penal (nº 2005.01.1.023628-0), por fato idêntico ao descrito na Ação Penal nº 2005.01.1.003315-4 (fls. e 37/38).7. A sentença, apesar de divergências doutrinárias, deve ser enxergada como norma jurídica, e, nessa categorização, como é sabido, no conflito entre duas normas de igual hierarquia e especialidade prevalece a mais recente sobre a mais antiga.8. A sentença posterior prevalece no Processo Penal, desde que mais favorável ao réu, em obediência à vedação da Revisão Criminal pro societate.9. O caso sub judice não reclama a solução de se considerar anulada a primeira sentença, visto que não incidiu em qualquer vício de juridicidade, e sim de revogá-la.10. Deveras, o pedido mediato merece concessão, qual seja, a declaração da prevalência da segunda coisa julgada.11. Ordem concedida.

4) Crime habitual e crime permanente: os limites objetivos da coisa julgada referem-se aos fatos ocorridos até o momento do oferecimento da peça acusatória, pois é nesse momento que a imputação é delimitada. Portanto, os fatos posteriores podem ser

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objeto de um novo processo. Ex.: MP ofereceu denúncia contra Marcola pelo delito de quadrilha. Mesmo após o trânsito em julgado, se se demonstra que ele continua associado àquela quadrilha (ainda que de dentro do presídio), o MP poderá oferecer nova denúncia (é como se houvesse um delito autônomo).

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TEMA 3: O PROCEDIMENTO COMUM

1. O DIREITO INTERTEMPORAL

1.1 A regra do Direito Penal

Art. 5º, XL, CRFB:

XL - a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu;

A lei penal não retroagirá, salvo se benéfica ao réu. É dizer: a lei penal mais benéfica é retroativa e ultrativa.

Exemplos:

a) Lei 12.234:

Art. 110 - A prescrição depois de transitar em julgado a sentença condenatória regula-se pela pena aplicada e verifica-se nos prazos fixados no artigo anterior, os quais se aumentam de um terço, se o condenado é reincidente. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

§ 1o  A prescrição, depois da sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação ou depois de improvido seu recurso, regula-se pela pena aplicada, não podendo, em nenhuma hipótese, ter por termo inicial data anterior à da denúncia ou queixa. (Redação dada pela Lei nº 12.234, de 2010).

Art. 109.  A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, salvo o disposto no § 1o

do art. 110 deste Código, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, verificando-se: (Redação dada pela Lei nº 12.234, de 2010).

VI - em dois anos, se o máximo da pena é inferior a um ano.

VI - em 3 (três) anos, se o máximo da pena é inferior a 1 (um) ano. (Redação dada pela Lei nº 12.234, de 2010).

No exemplo do art. 109, se o delito foi cometido ANTES da Lei 12.234, mas a peça acusatória foi oferecida após a Lei, NÃO haverá aplicação da nova Lei, que é claro exemplo de lex gravior, NÃO podendo retroagir.

b) Lei 12.433:

Art. 126.  O condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto poderá remir, por trabalho ou por estudo, parte do tempo de execução da pena. (Redação dada pela Lei nº 12.433, de 2011).

Essa lei, ao prever que a remissão poderá ser feita também pelo estudo, é BENÉFICA ao acusado, podendo, dessa forma, retroagir.

Art. 127.  Em caso de falta grave, o juiz poderá revogar até 1/3 (um terço) do tempo remido, observado o disposto no art. 57, recomeçando a contagem a partir da data da infração disciplinar. (Redação dada pela Lei nº 12.433, de 2011)

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Antes da Lei 12.433, ao praticar falta grave, o acusado perdia TODO o tempo remido. A Lei 12.433 prevê que a parte perderá apenas um terço do tempo remido. Sendo claramente mais BENÉFICA (lex mitior), essa lei retroage em favor dos condenados.

ATENÇÃO: devido a essa alteração, a súmula vinculante n. 9 perdeu sua validade:

Súmula Vinculante nº 9

"O disposto no artigo 127 da Lei 7.210/84 foi recebido pela ordem constitucional vigente e não se lhe aplica o limite temporal previsto no caput do artigo 58".

1.2 A regra do Direito Processual Penal

A doutrina costuma trabalhar com uma divisão das normas processuais:

A) Norma genuinamente processual: é aquela que cuida de procedimentos, atos processuais, técnicas do processo etc. Quanto a essa norma, o critério do Direito intertemporal é o chamado princípio da APLICAÇÃO IMEDIATA ou tempus regit actum (art. 2º, CPP):

Art. 2o  A lei processual penal aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da lei anterior.

B) Norma processual material (ou norma mista/híbrida): em relação aos conceito de “norma processual material” temos duas correntes:

1ª corrente (ampliativa): normas processuais materiais são aquelas que estabelecem condições de procedibilidade, meios de prova, liberdade condicional, espécies de prisão cautelar e de liberdade provisória, enfim, todas as normas processuais que repercutem no direito de liberdade do agente.

2ª corrente (restritiva): normas processuais materiais são aquelas que, apesar de previstas em diplomas processuais penais, dispõem sobre o conteúdo da pretensão punitiva, tais como as relativas ao direito de queixa, representação, prescrição, decadência, perdão e perempção.

Prevalece a 2ª corrente.

Como visto acima, vigora, em relação à lei processual penal, o princípio da aplicação imediata (tempus regit actum), segundo o qual, a lei processual nova será imediatamente aplicada aos processos em curso, ainda que o fato tenha sido anterior à sua entrada em vigor e que sua aplicação venha a prejudicar o réu.

Todavia, se a norma tiver natureza mista, independentemente da corrente adotada, prevalece a natureza penal sobre a processual, o que implica na aplicação do art. 2º, do CP. Assim, a lei de natureza mista mais benéfica ao réu irá retroagir, mas a novatio legis in pejus não poderá incidir imediatamente, devendo ser aplicada apenas aos FATOS ocorridos após sua vigência. Exemplo: lei que aumente o tempo de prisão temporária NÃO será aplicada aos processos em curso, mas tão somente àqueles processos futuros, derivados de FATOS POSTERIORES À LEI NOVA.

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Exemplos importantes:

1) Art. 90, Lei 9.099/95

Art. 90. As disposições desta Lei não se aplicam aos processos penais cuja instrução já estiver iniciada. (Vide ADIN nº 1.719-9)

Para o STF, as normas de Direito Penal inseridas na Lei 9.099/95 que tenham conteúdo mais benéfico aos acusados devem retroagir para beneficá-los, nos termos do art. 5º, XL, da CRFB/88 (ADI 1.719).

2) Lei 9.271/96 e a redação do art. 366, CPP:

Art. 366. Se o acusado, citado por edital, não comparecer, nem constituir advogado, ficarão suspensos o processo e o curso do prazo prescricional, podendo o juiz determinar a produção antecipada das provas consideradas urgentes e, se for o caso, decretar prisão preventiva, nos termos do disposto no art. 312.  ( Redação dada pela Lei nº 9.271 , de 17.4.1996) (Vide Lei nº 11.719, de 2008)

A grande novidade trazida pela redação dada pela Lei 9.271 foi exatamente a suspensão do processo e da prescrição.

Antes da Lei 9.271/96 Depois da Lei 9.271/96

Citação por edital > não comparecia > era decretada a REVELIA, prosseguindo-se o feito com a nomeação de defensor dativo.

Citação por edital > não comparece e não constitui defensor > são suspensos o processo e a prescrição.

Exemplo: cidadão praticou o delito em 1995, mas teve o processo instaurado em 1997. Como proceder nesse caso? A Lei é norma mista (natureza processual – suspensão do processo – e penal – suspensão da prescrição), e claramente mais gravosa ao réu (pois suspende a prescrição). Como, no caso de lei híbrida, prevalece o aspecto penal, NÃO haverá retroação. Portanto, o artigo 366 somente foi aplicado aos delitos cometidos APÓS a vigência da Lei 9.271/96.

3) Leis 11.689/08 e 11.719/08 e sua aplicabilidade imediata aos processos em andamento:

A 11.689/08 entrou em vigor no dia 09/08/08 e trouxe mudanças no procedimento do Júri. A lei 11.719/08 passou a vigorar no dia 22/08/08 trazendo mudanças no procedimento comum.

É possível aplicar essas leis, que alteram procedimentos, aos processos já em andamento?

A doutrina identifica três sistemas sobre o tema:

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- Sistema da unidade processual: apesar de se desdobrar em uma série de atos distintos, o processo apresenta uma unidade. Portanto, só pode ser regulamentado por UMA única lei, qual seja, a lei antiga.

- Sistema das fases processuais: cada fase processual pode ser disciplinada por uma lei distinta:

1ª fase: postulatória;

2ª fase: ordinatória;

3ª fase: instrutória;

4ª fase: decisória;

5ª fase: recursal.

Cada uma dessas fases pode ser regida por uma lei diferente.

- Sistema do isolamento dos atos processuais: a lei nova não atinge os atos processuais praticados sob a vigência da lei anterior, porém será aplicável aos atos processuais que ainda não foram praticados, pouco importando a fase em que o feito se encontrar.

Esse terceiro sistema é o adotado pelo CPP:

Art. 2o  A lei processual penal aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da lei anterior

STJ HC 123.492:

HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO. PRISÃO PREVENTIVA. EXCESSO DE PRAZO. PRONÚNCIA. APLICAÇÃO DA SÚMULA N. 21/STJ. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO.1. Nos termos do entendimento pacificado por esta Corte no enunciado da Súmula n. 21, a superveniência da decisão de pronúncia afasta o constrangimento ilegal suportado pelo paciente em razão do alegado excesso de prazo. DECRETO DE CUSTÓDIA CAUTELAR. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. PRONÚNCIA. NOVO TÍTULO NÃO SUBMETIDO À APRECIAÇÃO DO TRIBUNAL DE ORIGEM. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. NÃO CONHECIMENTO. 1. Tendo o remédio constitucional sido dirigido contra a decisão que ordenou a prisão preventiva e verificando-se a superveniente prolação de pronúncia, onde a custódia cautelar foi mantida, esvazia-se o objeto da impetração, uma vez que o encarceramento é agora decorrente de novo título judicial.2. A alegada possibilidade de concessão de liberdade provisória ao paciente pronunciado não foi objeto de análise pela Corte originária, pelo que não poderia ser analisada pelo STJ, a fim de se evitar indevida supressão de instância. APLICAÇÃO DA LEI PROCESSUAL PENAL NO TEMPO. PRINCÍPIO DO EFEITO IMEDIATO. INSTRUÇÃO REALIZADA DE ACORDO COM OS DISPOSITIVOS DA LEI N. 11.689/2008. NULIDADE. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL INEXISTENTE. HABEAS CORPUS PARCIALMENTE CONHECIDO, E NESTA PARTE DENEGADO. 1. No âmbito do direito processual penal a aplicação da lei penal do tempo é regrada pelo princípio do efeito imediato, representado pelo brocardo tempus regit actum, conforme estabelece o artigo 2º do Código de Processo Penal. 2. Ainda que o recebimento da denúncia tenha ocorrido antes do advento da Lei n. 11.689/2008, não há constrangimento ilegal na adoção do rito por esta introduzido no ordenamento jurídico, tendo em vista a impossibilidade da prática de todos os atos de acordo com a disciplina anterior.3. De acordo com o sistema da instrumentalidade das formas, adotado pela jurisprudência dos Tribunais Superiores, não se declara a nulidade do ato sem a demonstração do efetivo prejuízo para a parte em razão da inobservância da formalidade prevista em lei. Precedentes.4. Verificada a regularidade da instrução realizada de acordo com a Lei n. 11.689/2008, quedando-se a defesa a demonstrar eventual prejuízo suportado pelo paciente, imperiosa a manutenção do ato impugnado.5. Habeas corpus parcialmente conhecido, e, nesta parte, denegada a ordem.

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A Lei 11.719/08 estabeleceu que o interrogatório é, agora, o ÚLTIMO ato do processo.

Art. 400.  Na audiência de instrução e julgamento, a ser realizada no prazo máximo de 60 (sessenta) dias, proceder-se-á à tomada de declarações do ofendido, à inquirição das testemunhas arroladas pela acusação e pela defesa, nesta ordem, ressalvado o disposto no art. 222 deste Código, bem como aos esclarecimentos dos peritos, às acareações e ao reconhecimento de pessoas e coisas, interrogando-se, em seguida, o acusado. (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).

Vamos imaginar que, em 10/05/08, foi realizado o interrogatório do acusado (antes da vigência da lei – interrogatório foi o primeiro ato da instrução). A AIJ, para oitiva das testemunhas, foi marcada para o dia 30/10/08 (após a vigência da lei – o interrogatório passou a ser o último ato da instrução). Nesse caso, há necessidade de realização de um novo interrogatório? O ideal era que o juiz, ao final da instrução, facultasse ao acusado o direito de repetir o interrogatório. Ocorre que muitos juízes não fizeram isso. A matéria, então, chegou ao STF, que decidiu pela desnecessidade de novo interrogatório: se o acusado foi interrogado antes da vigência da Lei 11.719, encerrando-se a instrução criminal já na vigência dessa Lei, não há necessidade de realização de novo interrogatório ao final da AIJ (HC 104.555):

EMENTA: PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. LEI 11.719/2008 QUE DEU NOVA REDAÇÃO AO ART. 400 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. NOVO INTERROGATÓRIO. REALIZAÇÃO. PRETENSÃO. DESCABIMENTO. NULIDADE. ALEGAÇÃO. PREJUÍZO. INEXISTÊNCIA. ORDEM DENEGADA.

I – O interrogatório do paciente ocorreu em data anterior à publicação da Lei 11.719/2008, o que, pela aplicação do princípio do tempus regit actum, exclui a obrigatoriedade de renovação do ato validamente praticado sob a vigência de lei anterior.

II – Esta Corte já firmou entendimento no sentido de que não se declara a nulidade de ato processual se a alegação não vier acompanhada da prova do efetivo prejuízo sofrido pelo réu. Precedentes.

III – Ordem denegada.

(STF: HC 104.555, rel. Min. Ricardo Lewandowski, T1, 28.09.2010, DJE 14.10.2010)

4) Art. 4º, da Lei 11.689/08 e a extinção do protesto por novo júri:

Essa lei revogou um capítulo do CPP, que tratava do protesto por novo júri.

A Lei 11.689/08 entrou em vigor em 09/08/08.

Imagine que dia 05/06/08 uma pessoa cometeu um homicídio qualificado. Em 15/02/12, há o julgamento pelo Júri, e o acusado é condenado a uma pena de 23 anos de reclusão. Entre a data do cometimento do delito e a do julgamento entrou em vigor a Lei 11.689/08, revogando o protesto por novo júri. A lei se aplica?

1ª corrente: o artigo 4º a Lei 11.689/08 é exemplo de norma processual material, porquanto repercurte no direito de liberdade do agente. Logo, se o crime foi praticado até o dia 08/08/08, o cidadão terá direito ao protesto, ainda que seu julgamento ocorra após a entrada em vigor da Lei 11.689/08. LFG.

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2ª corrente: a lei que se aplica ao recurso não é aquela em vigor à época do crime, tampouco a vigente quando da interposição do recurso; a lei a ser aplicada ao recurso é aquela em vigor no momento em que a decisão recorrível foi preferida, pois é nesse momento que se adquire o direito às regras recursais então vigentes.

Prevalece a 2ª corrente.

Exemplo: uma pessoa foi absolvida sumariamente no júri, em decisão proferida no dia 08/08/08 (sexta-feira) – o recurso cabível era o RESE (antes da vigência da Lei 11.689). A interposição do recurso ocorreu em 11/08/08 (segunda-feira) – o recurso previsto na lei era a apelação (depois da vigência da Lei 11.689). Qual será o recurso a ser interposto no dia 11/08/08? A lei que se aplica ao recurso é aquela vigente quando a decisão foi proferida. O recurso a ser interposto é, então, RESE.

C) Norma processual heterotópica: não obstante prevista em diploma processual penal, esta norma possui conteúdo material. Logo, deve retroagir para beneficiar o acusado. Exemplo: normas relacionadas ao direito ao silêncio.

2. CLASSIFICAÇÃO DO PROCEDIMENTO COMUM

2.1 Introdução

Antigamente o procedimento era fixado de acordo com a natureza da pena (se de reclusão ou de detenção). Hoje o procedimento é fixado de acordo com a quantidade de pena.

O procedimento comum pode ser classificado em:

- Procedimento comum ordinário > aplicado aos crimes com pena máxima igual ou superior a 4 anos;

ATENÇÃO: não confundir o procedimento, que leva em conta a pena máxima IGUAL ou superior a 4 anos, com a prisão preventiva, que só pode ocorrer em caso de pena SUPERIOR a 4 anos. Exemplo: furto simples (pena de 1 a 4 anos) > será processado pelo procedimento comum ordinário, mas NÃO caberá preventiva.

- Procedimento comum sumário > aplicado aos crimes com pena máxima inferior a 4 anos e superior a 2 anos;

- Procedimento comum sumaríssimo > aplicado às infrações de menor potencial ofensivo (IMPOs – contravenções e crimes com pena máxima não superior a 2 anos, salvo as infrações envolvendo violência doméstica e familiar contra a mulher) da competência do JECRIM.

Qual é a consequência da não observância do procedimento correto? Eventual inobservância do procedimento correto é causa de nulidade RELATIVA (o prejuízo precisa ser comprovado).

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2.2 Concurso de crimes, qualificadoras, privilégios, causas de aumento e diminuição, agravantes e atenuantes

O concurso, as qualificadoras, os privilégios e as causas de aumento/diminuição são levados em consideração na fixação do procedimento.

O raciocínio que consta da súmula 723 do STF deve ser levado em conta no momento da fixação do procedimento:

STF Súmula nº 723 - 26/11/2003 - DJ de 9/12/2003, p. 1; DJ de 10/12/2003, p. 1; DJ de 11/12/2003, p. 1.Suspensão Condicional do Processo - Crime Continuado - Admissibilidade    Não se admite a suspensão condicional do processo por crime continuado, se a soma da pena mínima da infração mais grave com o aumento mínimo de um sexto for superior a um ano.

No mesmo sentido, súmula 243, STJ:

STJ Súmula nº 243 - 11/12/2000 - DJ 05.02.2001Suspensão do Processo - Concurso Material ou Formal ou Continuidade Delitiva - Somatório ou Incidência de Majorante - Limite Aplicável    O benefício da suspensão do processo não é aplicável em relação às infrações penais cometidas em concurso material, concurso formal ou continuidade delitiva, quando a pena mínima cominada, seja pelo somatório, seja pela incidência da majorante, ultrapassar o limite de um (01) ano.

Exemplo: a pessoa comete dois delitos, em concurso material, sendo que cada um tem pena de 3 anos. Aplicar-se-á o procedimento comum ordinário (e não o sumário!), pois é a soma que será levada em consideração (e não a pena prevista isoladamente para cada um dos delitos).

No caso das causas de aumento e diminuição, que, em geral, têm previsão de aumento/diminuição variável (exemplo: de um terço até a metade), devemos nos lembrar que o procedimento se regula pelo MÁXIMO de pena previsto para o delito. Dessa forma:

- Causa de aumento > utiliza-se o quantum que mais aumente a pena;

- Causa de diminuição > utiliza-se o quantum que menos diminua a pena.

Já em relação às agravantes e atenuantes é necessário esclarecer que elas NÃO são levadas em consideração para fins de fixação do procedimento. Por quê? A uma, porque no caso das agravantes/atenuantes não há um critério de aumento ou diminuição fixado pela legislação (impossível, pois, estabelecer-se o quantum abstratamente). A duas, porque as agravantes e atenuantes NÃO precisam constar da peça acusatória.

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Observação final:

Fixação do procedimento nos casos de conexão: para a doutrina majoritária, na hipótese de conexão, deve ser usado o procedimento MAIS AMPLO, ou seja, aquele que melhor assegure às partes o exercício de suas faculdades processuais.

3. ANÁLISE DO ANTIGO PROCEDIMENTO ORDINÁRIO DOS CRIMES PUNIDOS COM RECLUSÃO

O antigo procedimento se desenvolvia na seguinte ordem:

1) Oferecimento da peça acusatória;

2) Recebimento ou rejeição da peça;

3) Citação do acusado (pessoal ou por edital);

4) Interrogatório;

5) Defesa prévia;

6) Oitiva das testemunhas de acusação/defesa;

7) Fase de diligências (revogado art. 499, CPP);

8) Alegações finais (revogado art. 500, CPP);

9) Eventuais diligências ex officio;

10) Sentença.

4. NOVO PROCEDIMENTO COMUM ORDINÁRIO

1) Oferecimento da peça acusatória;

2) Recebimento (ou rejeição) da peça;

3) Citação do acusado;

4) Reação defensiva à imputação;

5) Oitiva do MP (se for o caso);

6) Absolvição sumária (se for o caso);

7) Designação da audiência;

8) Realização da audiência una de instrução e julgamento;

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9) Sentença.

4.1 Oferecimento da peça acusatória

Matéria do intensivo I.

Art. 41, CPP:

Art. 41.  A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas.

4.2 Rejeição da peça acusatória

“Rejeição” deve ser entedida como sinônimo de “não recebimento”.

Quais são os motivos que autorizam a rejeição da peça acusatória? Art. 395, CPP:

        Art. 395.  A denúncia ou queixa será rejeitada quando:  (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).

        I - for manifestamente inepta; (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

        II - faltar pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal; ou  (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

        III - faltar justa causa para o exercício da ação penal. (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

A) Inépcia da peça acusatória:

- Inépcia formal: ocorre quando não observados os requisitos obrigatórios da peça acusatória. Exemplo: descrição do fato (art. 395, I).

- Inépcia material: ocorre quando não há justa causa para o início do processo (art. 395, III).

Se o juiz não rejeitar a peça, cabe arguição da inépcia. Mas até quando pode essa inépcia ser arguída? Os Tribunais Superiores entendem que eventual inépcia deve ser arguída até a SENTENÇA, sob pena de preclusão (RHC 98.091).

B) Falta de pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal:

As condições foram estudadas no Intensivo I (exemplo: promotor que apresenta denúncia em relação a crime de ação privada).

Em relação aos pressupostos processuais:

- Pressupostos de existência:

Demanda veiculada pela peça acusatória;49

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Órgão investido de jurisdição;

Partes que possam estar em juízo.

- Pressupostos de validade:

Inexistência de vícios processuais;

Originalidade da demanda (inexistência de litispendência ou coisa julgada).

C) Falta de justa causa para o exercício da ação penal:

A expressão “justa causa” possui inúmeros significados no processo. Entretanto, como causa de rejeição de peça acusatória, pode ser definida como “o lastro probatório mínimo indispensável para a instauração de um processo penal”.

4.2.1 Rejeição parcial da peça acusatória

É possível a rejeição parcial da peça acusatória? SIM.

Exemplo: promotor faz denúncia em relação a dois crimes, um de ação penal privada e um de ação penal pública. É claro que em relação ao delito de ação penal privada haverá a rejeição, mas, relativamente ao crime de ação penal pública, estando presentes os demais requisitos, a peça deverá ser recebida.

4.2.2 Momento da rejeição da peça acusatória:

Qual é o momento da rejeição?

No procedimento comum ordinário, a rejeição se dá após o oferecimento da peça acusatória, sem que haja necessidade de manifestação da defesa.

Um primeiro juiz recebe a peça. Outro juiz, que entra depois no processo, rejeita a denúncia. É possível? E se o mesmo juiz recebe e depois rejeita?

A maioria entende que NÃO é possível (nenhum dos casos). Uma vez recebida a peça acusatória, não é possível ulterior rejeição pela mesmo juízo (preclusão pro judicato).

4.2.3 Recurso cabível contra a rejeição da peça acusatória:

Cabe o RESE, art. 581, I, CPP:

        Art. 581.  Caberá recurso, no sentido estrito, da decisão, despacho ou sentença:

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        I - que não receber a denúncia ou a queixa;

Na prática, o melhor é o oferecimento de uma nova denúncia (a rejeição faz coisa julgada formal, e não material).

CUIDADO!!! Na Lei dos Juizados o recurso nesse caso NÃO será RESE, mas apelação, a ser interposta no prazo de 10 dias.

Quando o Tribunal julga esse RESE, haverá contrarrazões da defesa? SIM, também aqui deve ser exercida a ampla defesa. Nesse caso, o juiz deve intimar, primeiramente, o acusado, e, se este não constituir advogado, aí sim deve mandar os autos à Defensoria.

Súmula 707, STF:

STF Súmula nº 707 - 24/09/2003 - DJ de 9/10/2003, p. 6; DJ de 10/10/2003, p. 6; DJ de 13/10/2003, p. 6.Nulidade - Falta de Intimação do Denunciado para Oferecer Contra-Razões ao Recurso Interposto da Rejeição da Denúncia - Nomeação de Defensor Dativo    Constitui nulidade a falta de intimação do denunciado para oferecer contra-razões ao recurso interposto da rejeição da denúncia, não a suprindo a nomeação de defensor dativo.

Quando o Tribunal dá provimento a este recurso, sua decisão JÁ VALE como RECEBIMENTO DA PEÇA ACUSATÓRIA, salvo quando reconhecida e nulidade da decisão de primeira instância (neste caso, o recebimento somente ocorrerá após a baixa dos autos à primeira instância).

A consequência prática é que no dia em que o Tribunal publica a decisão, já estará interrompido o curso prescricional.

Súmula 709, STF:

STF Súmula nº 709 - 24/09/2003 - DJ de 9/10/2003, p. 6; DJ de 10/10/2003, p. 6; DJ de 13/10/2003, p. 6.Acórdão que Provê o Recurso Contra a Rejeição da Denúncia - Validade como Recebimento    Salvo quando nula a decisão de primeiro grau, o acórdão que provê o recurso contra a rejeição da denúncia vale, desde logo, pelo recebimento dela.

4.3 Recebimento da peça acusatória

Quando o promotor faz a denúncia, o juiz tem duas opções: rejeitar ou receber.

Mas quando a peça acusatória deve ser recebida? Quando não houver causa de rejeição (interpretação a contrario sensu do art. 395).

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4.3.1 Momento do recebimento da peça acusatória:

O CPP faz menção ao recebimento em dois artigos distintos:

1ª corrente: art. 396 2ª corrente: art. 399

        Art. 396.  Nos procedimentos ordinário e sumário, oferecida a denúncia ou queixa, o juiz, se não a rejeitar liminarmente, recebê-la-á e ordenará a citação do acusado para responder à acusação, por escrito, no prazo de 10 (dez) dias. (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).

O recebimento ocorre imediatamente depois do oferecimento da peça acusatória, desde que não seja caso de rejeição.

Ou seja:

- O promotor oferece a denúncia;

- O juiz recebe.

Art. 399.  Recebida a denúncia ou queixa, o juiz designará dia e hora para a audiência, ordenando a intimação do acusado, de seu defensor, do Ministério Público e, se for o caso, do querelante e do assistente. (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).

De acordo com essa corrente:

- O promotor oferece a denúncia;

- O acusado é notificado para oferecer a defesa preliminar;

- Após a defesa, o juiz faz análise sobre uma possível absolvição sumária; e

- Não sendo caso de absolvição ou rejeição sumária, o juiz recebe a peça.

A 1ª corrente tem prevalecido na jurisprudência. Motivos:

- Embora a intenção dos autores do anteprojeto tenha sido a criação de uma defesa preliminar anterior ao recebimento da peça acusatória, houve alteração do projeto pelo Congresso Nacional, que, preocupado com a interrupção da prescrição, modificou a redação do art. 396 para ali inserir o recebimento da peça acusatória;

- Como o artigo 363 dispõe que o processo terá completada sua formação quando realizada a citação do acusado, não seria possível que o juiz determinasse essa citação sem antes receber a peça acusatória;

- Ademais, não é possível a absolvição sumária do acusado sem que antes tenha havido o recebimento da peça acusatória.

4.3.2 Necessidade de fundamentação do recebimento da peça acusatória:

É necessário fundamentar o recebimento da peça? Neste assunto, há uma clara divergência entre a doutrina e os Tribunais:

- Para a doutrina, é indispensável a fundamentação, sob pena de nulidade (art. 93, IX, CRFB). Todavia, os doutrinadores advertem que não deve haver excessos, evitando-se, assim, um pré-julgamento. A fundamentação deve apenas apontar a ausência das causas de rejeição;

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- Para os Tribunais, não há necessidade de fundamentação do recebimento da peça acusatória, que pode se dar inclusive implicitamente, quando o juiz determina a citação do acusado. STF HC 68.926:

"HABEAS CORPUS" - ESTUPRO - DENUNCIA - RECEBIMENTO TACITO - DEFENSOR QUE ADMITE A CONDENAÇÃO DO RÉU - ALEGAÇÃO DE CERCEAMENTO DE DEFESA - APLICAÇÃO DA PENA - CRITÉRIO TRIFASICO - FIXAÇÃO DE PENA-BASE ACIMA DO MINIMO LEGAL - FUNDAMENTAÇÃO - ANALISE DAS CIRCUNSTANCIAS JUDICIAIS (CP, ART. 59)- INVIABILIDADE - PEDIDO INDEFERIDO. - O oferecimento da denuncia pelo Ministério Público submete se, após a sua formalização, a estrito controle jurisdicional. Essa atividade processual do Poder Judiciario, exercida liminarmente no âmbito do processo penal condenatório, objetiva, em essencia, a propria tutela da intangibilidade do "status libertatis" do imputado. - O Código de Processo Penal não reclama explicitude ao ato DE recebimento judicial da peca acusatoria. O ordenamento processual penal brasileiro não repele, em consequencia, a formulação, pela autoridade judiciária, de um juízo implicito de admissibilidade da denuncia. - O mero ato processual do Juiz - que designa, desde logo, data para o interrogatorio do denunciado e ordena-lhe a citação - supoe o recebimento tacito da denuncia

Atenção: em um caso os Tribunais entendem necessária a fundamentação > nos procedimentos que preveem defesa preliminar anterior ao recebimento.

4.3.3 Consequências do recebimento:

- Ocorre a fixação da competência por prevenção. Art. 83, CPP:

        Art. 83.  Verificar-se-á a competência por prevenção toda vez que, concorrendo dois ou mais juízes igualmente competentes ou com jurisdição cumulativa, um deles tiver antecedido aos outros na prática de algum ato do processo ou de medida a este relativa, ainda que anterior ao oferecimento da denúncia ou da queixa (arts. 70, § 3o, 71, 72, § 2o, e 78, II, c).

- Interrupção da prescrição, se o recebimento foi proferido pelo juízo competente. STF HC 104.907/PE:

Trata-se de "habeas corpus", com pedido de medida liminar, impetrado contra decisão, que, emanada do E. Superior Tribunal de Justiça, restou consubstanciada, no ponto que interessa ao exame da causa, em acórdão assim do (fls. 140/144):"CRIMINAL. RESP. RECURSO MINISTERIAL. RECEBIMENTO DA DENÚNCIA POR AUTORIDADE INCOMPETENTE. ATO NULO. EFEITOS. MAJORAÇÃO DA PENA-BASE. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. NÃO CONHECIMENTO. CONTINUIDADE DELITIVA. AUMENTO EM FUNÇÃO DO NÚMERO DE INFRAÇÕES.AUMENTO DE PENA DECORRENTE DA OCUPAÇÃO DE CARGO DE CONFIANÇA. INCIDÊNCIA, À ESPÉCIE. RECURSO MINISTERIAL PARCIALMENTE CONHECIDO E PROVIDO.I. Hipótese que cuida de recursos interpostos pelo Ministério Público Federal e pelos réus condenados pela prática de crime de peculato no caso que ficou conhecido como ‘Escândalo da Mandioca’.II. O recebimento da denúncia, por autoridade incompetente, não produz efeitos, visto que é ato nulo. Somente o recebimento da peça exordial pela autoridade efetivamente competente para o julgamento do feito é capaz de interromper o fluxo do prazo prescricional. (...)

- Para a maioria da doutrina, o recebimento marca o início do processo. Art. 35, CPPM:

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Relação processual. Início e extinção

        Art. 35. O processo inicia-se com o recebimento da denúncia pelo juiz, efetiva-se com a citação do acusado e extingue-se no momento em que a sentença definitiva se torna irrecorrível, quer resolva o mérito, quer não.

4.3.4 Recurso cabível contra o recebimento da peça acusatória:

O recebimento da peça acusatória é uma decisão IRRECORRÍVEL. Entretanto, os Tribunais vem admitindo, excepcionalmente, o trancamento do processo por meio do habeas corpus, desde que haja risco à liberdade de locomoção, ou, subsidiariamente, por meio de mandado de sgurança.

O trancamento, sendo excepcional, apenas é admitido nas seguintes hipóteses:

- Manifesta atipicidade formal ou material;

- Presença de uma causa extintiva de punibilidade;

- Ausência de pressupostos processuais ou de condições da ação;

- Ausência de justa causa para o exercício da ação penal.

Cuidado! Não se deve falar nunca em trancamento da ação, e sim, em trancamento do processo.

4.4 Citação do acusado

A. Conceito:

A citação é o ato de comunicação mais importante do processo, por meio do qual se dá ciência ao acusado do recebimento da peça acusatória, chamando-o para se defender. A citação, então, possui dois objetivos fundamentais: ciência e chamamento à defesa.

A citação claramente funciona como um misto de dois princípios constitucionais: o contraditório (ciência) e a ampla defesa (chamamento à defesa).

Por ser um ato de comunicação tão importante, eventuais vícios da citação dão ensejo a uma nulidade absoluta.

Em regra, as nulidades absolutas são insanáveis. Contudo, a nulidade da citação pode ser sanada (convalidada) mediante o comparecimento espontâneo do acusado.

Art. 570.  A falta ou a nulidade da citação, da intimação ou notificação estará sanada, desde que o interessado compareça, antes de o ato consumar-se, embora declare que o faz para o único fim de argüi-la. O juiz ordenará, todavia, a suspensão ou o     adiamento do ato, quando reconhecer que a irregularidade poderá prejudicar direito da parte.

OBS.: a citação anulada é chamada de “circundução” ou “citação circunduta”.

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B. Finalidade da citação no procedimento comum:

Hoje, a finalidade da citação não é mais o interrogatório (como era antes da lei 11.719/08), e sim a apresentação de resposta à acusação:

        Art. 396.  Nos procedimentos ordinário e sumário, oferecida a denúncia ou queixa, o juiz, se não a rejeitar liminarmente, recebê-la-á e ordenará a citação do acusado para responder à acusação, por escrito, no prazo de 10 (dez) dias. (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).

        Parágrafo único.  No caso de citação por edital, o prazo para a defesa começará a fluir a partir do comparecimento pessoal do acusado ou do defensor constituído. (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).

Atenção: em alguns procedimentos especiais o acusado continua sendo citado para comparecer em juízo e ser interrogado. Ex.: procedimento do CPPM, procedimento da Lei de Drogas e procedimento originário dos Tribunais* (nesses procedimentos o interrogatório continua a ser o primeiro ato da instrução probatória).

*Cuidado com a decisão do STF no Agravo Regimental na AP 528: o STF, neste caso, entendeu que no procedimento originário dos Tribunais, se o interrogatório ainda não foi realizado, deverá ser feito de acordo com a sistemática introduzida pela Lei 11.719/08, ou seja, ao final da instrução probatória.

EMENTA: PROCESSUAL PENAL. INTERROGATÓRIO NAS AÇÕES PENAIS ORIGINÁRIAS DO STF. ATO QUE DEVE PASSAR A SER REALIZADO AO FINAL DO PROCESSO. NOVA REDAÇÃO DO ART. 400 DO CPP. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.I -O art. 400 do Código de Processo Penal, com a redação dada pela Lei 11.719/2008, fixou o interrogatório do réu como ato derradeiro da instrução penal. II -Sendo tal prática benéfica à defesa, deve prevalecer nas ações penais originárias perante o Supremo Tribunal Federal, em detrimento do previsto no art. 7º da Lei 8.038/90 nesse aspecto. Exceção apenas quanto às ações nas quais o interrogatório já se ultimou. III -Interpretação sistemática e teleológica do direito. IV -Agravo regimental a que se nega provimento.

NOTICIÁRIO de quinta-feira, 24 de março de 2011

Mantido interrogatório de acusados para o fim da instrução criminal

Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiram aplicar nova regra do Código de Processo Penal (CPP), modificada pela Lei 11.719/08, que alterou o momento de realização do interrogatório dos acusados para o fim da fase de instrução criminal. Por unanimidade dos votos, eles negaram provimento a um recurso (agravo regimental) interposto pelo Ministério Público Federal (MPF) na Ação Penal (AP) 528.

O MPF pedia para que os interrogatórios dos dois acusados fossem ultimados antes da apresentação da defesa prévia, destacando que um dos réus teria perdido o direito de exercer o ato de autodefesa justamente por não ter comparecido a audiência previamente designada em Belém (PA), apesar de devidamente citado. Afirma que o outro sequer foi encontrado naquela localidade, apesar de diversas tentativas do oficial de Justiça.

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No recurso, o MPF sustentava que os argumentos da norma especial – Lei 8.038/90, que mantém o sistema tradicional, prevalecem sobre a geral (CPP), que coloca o interrogatório do réu ao final da instrução.

A Ação Penal tem por objeto a condenação de dois acusados por suposto cometimento do crime de peculato, disposto no artigo 312, parágrafo 1º, do Código Penal. A denúncia foi recebida à unanimidade do Plenário do Supremo no dia 19 de novembro de 2009.

De acordo com o relator, ministro Ricardo Lewandowski, o Plenário do Supremo já iniciou a discussão se a mudança legislativa do CPP afeta a lei especial (Lei 8038/90), mas ainda não houve conclusão do debate. O Supremo sinalizou que o interrogatório é um instrumento de defesa do réu e, portanto, deve ser colocado ao final.

Assim, em vista da previsão da Lei 11719/08 que modificou o artigo 400 do CPP e transferiu o interrogatório para o final do processo, Lewandowski, no dia 20 de outubro de 2010, despachou na AP 528 no sentido de que os réus sejam interrogados ao final do processo, considerando a nova sistemática mais favorável à defesa. Isso porque, frisou, os interrogatórios até o momento não ocorreram tendo em vista o não comparecimento de um à audiência e uma vez que o outro não foi encontrado.

Voto

“Não se pode negar que se trata de um tema de altíssima relevância dado o reflexo que a referida inovação legal exerce sobre o direito constitucional, a ampla defesa, embora não tenha tido ainda o Supremo Tribunal Federal a oportunidade de posicionar-se definitivamente a respeito dele, nem mesmo em sede de questão de ordem”, avaliou o ministro Ricardo Lewandowski. Ele lembrou que o tema chegou a ser debatido pelos ministros na sessão plenária do dia 7 de outubro de 2010, em uma questão de ordem suscitada na AP 470, contudo, como naquela ação penal o interrogatório já havia sido realizado e a discussão prosseguiu.

Para o relator, a PGR não tem razão. “Parece-me relevante constatar que, se a nova redação do artigo 400, do CPP, possibilita ao réu exercer de modo mais eficaz a sua defesa, tal dispositivo legal deve suplantar o estatuído no artigo 7º, da Lei 8038, em homenagem aos princípios constitucionais que são aplicáveis à espécie”, afirmou.

Segundo Lewandowski, é mais benéfico à defesa possibilitar que o réu seja interrogado ao final da instrução, depois de ouvidas as testemunhas arroladas, bem como após a produção de outras provas como eventuais perícias. Nesse caso, conforme o relator, o acusado terá a oportunidade de esclarecer divergências “que não raramente afloram durante a edificação do conjunto probatório”.

Quanto à discussão sobre o aspecto formal, o ministro entendeu que o fato de a Lei 8038 ser norma especial em relação ao CPP (norma geral), “em nada influencia o que até aqui se assentou”. “É que, a meu sentir, a norma especial prevalece sobre a geral apenas nas hipóteses em que estiver presente alguma incompatibilidade manifesta insuperável entre elas, nos demais casos, considerando a sempre necessária aplicação sistemática do direito, cumpre cuidar para que essas normas aparentemente antagônicas convivam harmonicamente”, explicou Ricardo Lewandowski.

Dessa forma, o relator negou provimento ao agravo regimental interposto pelo MPF, entendendo que o interrogatório deve ocorrer no final do processo.

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C. Efeitos da citação válida:

Art. 363.  O processo terá completada a sua formação quando realizada a citação do acusado. (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).

O principal efeito da citação no processo penal é completar a formação do processo (o réu passa a integrar a relação processual).

No processo penal, não há que se falar que a citação torna prevento o juízo ou induz litispendência (como no processo civil), pois estes efeitos ocorrem quando do recebimento da peça acusatória. Além disso, no processo penal, a citação apenas interrompe a prescrição quando ordenada por juiz competente (diferentemente do que ocorre no processo civil).

D. Espécies de citação:

1ª) Real (ou pessoal): é aquela feita pessoalmente (cuidado para não confundir com processo civil: aqui a citação não pode ser feita a procurador ou representante, devendo ser feita sempre na pessoa do acusado). A citação pessoal pode ser feita:

Por mandado (por oficial de justiça - é a regra).

Situações especiais da citação por mandado:

Como fazer a citação por mandado da pessoa jurídica (crimes ambientais)? Neste caso, a citação deve ser feita na pessoa do representante legal da pessoa jurídica.

Como fazer a citação do por mandado inimputável? A citação será feita na pessoa do curador. Art. 149, §2º, CPP:

 Art. 149.  Quando houver dúvida sobre a integridade mental do acusado, o juiz ordenará, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, do defensor, do curador, do ascendente, descendente, irmão ou cônjuge do acusado, seja este submetido a exame médico-legal.

§ 2o  O juiz nomeará curador ao acusado, quando determinar o exame, ficando suspenso o processo, se já iniciada a ação penal, salvo quanto às diligências que possam ser prejudicadas pelo adiamento.

As restrições à citação por mandado previstas no art. 217 do CPC aplicam-se aqui? Não! As restrições à citação do Processo Civil não são aplicáveis ao Processo Penal.

        Art. 217.  Não se fará, porém, a citação, salvo para evitar o perecimento do direito:

        I - (Revogado pela Lei nº 8.952, de 1994)

        I - a quem estiver assistindo a qualquer ato de culto religioso;  (Renumerado do Inciso II pela Lei nº 8.952, de 1994)

        II - ao cônjuge ou a qualquer parente do morto, consangüíneo ou afim, em linha reta, ou na linha colateral em segundo grau, no dia do falecimento e nos 7 (sete) dias seguintes; (Renumerado do Inciso III pela Lei nº 8.952, de 1994

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        III - aos noivos, nos 3 (três) primeiros dias de bodas; (Renumerado do Inciso IV pela Lei nº 8.952, de 1994

        IV - aos doentes, enquanto grave o seu estado.  (Renumerado do Inciso V pela Lei nº 8.952, de 1994

Por precatória (acusado mora em Comarca diversa, em local certo e sabido);

Atenção ao caráter itinerante da carta precatória. Art. 355, §1º, CPP:

        Art. 355.  A precatória será devolvida ao juiz deprecante, independentemente de traslado, depois de lançado o "cumpra-se" e de feita a citação por mandado do juiz deprecado.

        § 1o  Verificado que o réu se encontra em território sujeito à jurisdição de outro juiz, a este remeterá o juiz deprecado os autos para efetivação da diligência, desde que haja tempo para fazer-se a citação.

A carta tem caráter itinerante e sua remissão a outro juízo independende de manifestação prévia da autoridade deprecante.

Por carta de ordem: quando um processo tramita perante um Tribunal e o acusado reside em uma Comarca distinta, o Desembargador expede uma carta de ordem para que a diligência seja cumprida pelo juiz de 1º grau da localidade onde reside o réu.

Por carta rogatória: é utilizada quando o acusado está no estrangeiro, desde que em local certo e sabido, independentemente da natureza do delito. Como nestes casos o cumprimento da carta demanda muito tempo, o próprio CPP prevê que haverá a suspensão da prescrição até o cumprimento da carta. Art. 368, CPP:

Art. 368. Estando o acusado no estrangeiro, em lugar sabido, será citado mediante carta rogatória, suspendendo-se o curso do prazo de prescrição até o seu cumprimento. (Redação dada pela Lei nº 9.271, de 17.4.1996)

Cuidado com o art. 222-A do CPP:

Art. 222-A.  As cartas rogatórias só serão expedidas se demonstrada previamente a sua imprescindibilidade, arcando a parte requerente com os custos de envio. (Incluído pela Lei nº 11.900, de 2009)

Este dispositivo está localizado no captítulo que trata da prova testemunhal. Dessa forma, NÃO se aplica à citação do acusado no estrangeiro (a imprescindibilidade da citação é presumida).

A citação por carta rogatória também é usada no caso das legações extrangeiras (embaixadas e consulados). Art. 369, CPP:

         Art. 369. As citações que houverem de ser feitas em legações estrangeiras serão efetuadas mediante carta rogatória.  (Redação dada pela Lei nº 9.271, de 17.4.1996).

Atenção: neste caso NÃO haverá suspensão da prescrição.58

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Ainda em relação à carta rogatória, é necessário lembrar que NÃO é possível citação por carta rogatória nos Juizados.

Citação mediante requisição: art. 358 e art. 359 do CPP:

Art. 358.  A citação do militar far-se-á por intermédio do chefe do respectivo serviço.

Art. 359.  O dia designado para funcionário público comparecer em juízo, como acusado, será notificado assim a ele como ao chefe de sua repartição.

No caso do militar essa citação especial se justifica por questões de hierarquia (evitar constrangimentos em eventual citação de Comandantes, por exemplo). Já no caso dos funcionários públicos, a ideia é preservar a continuidade do serviço público.

Citação do acusado preso: deve ser sempre pessoal.

Art. 360, CPP:

Art. 360. Se o réu estiver preso, será pessoalmente citado. (Redação dada pela Lei nº 10.792, de 1º.12.2003)

Cuidado com a súmula 351 do STF:

STF Súmula nº 351 - 13/12/1963 - Súmula da Jurisprudência Predominante do Supremo Tribunal Federal - Anexo ao Regimento Interno. Edição: Imprensa Nacional, 1964, p. 153.Nulidade - Citação por Edital - Réu Preso na Mesma Unidade da Federação em que o Juiz Exerce a Sua Jurisdição    É nula a citação por edital de réu preso na mesma unidade da federação em que o juiz exerce a sua jurisdição.ULTRAPASSADA.

Diante da nova redação do art. 360 do CPP, a súmula 351 do STF está ULTRAPASSADA. Hoje, independetemente da unidade da federação em que o acusado estiver preso, deve ser citado pessoalmente.

ATENÇÃO: citação eletrônica: NÃO é admitida no processo penal.

Apesar de a Lei 11.419/06 prever, em seu art. 1º, que o processo eletrônico se aplica também ao processo penal, no caso da CITAÇÃO eletrônica, a própria lei, em seu art. 6º, dispõe que NÃO é possível em se tratando de processo penal.

Art. 1o  O uso de meio eletrônico na tramitação de processos judiciais, comunicação de atos e

transmissão de peças processuais será admitido nos termos desta Lei.

§ 1o  Aplica-se o disposto nesta Lei, indistintamente, aos processos civil, penal e trabalhista,

bem como aos juizados especiais, em qualquer grau de jurisdição.

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Art. 6o  Observadas as formas e as cautelas do art. 5o desta Lei, as citações, inclusive da

Fazenda Pública, excetuadas as dos Direitos Processuais Criminal e Infracional, poderão ser

feitas por meio eletrônico, desde que a íntegra dos autos seja acessível ao citando.

2ª) Presumida (ou ficta): pode ser por edital ou por hora certa.

Citação por edital: é uma medida excepcional, só devendo ser realizada após esgotados todos os meios de localização do acusado.

Atenção à súmula 366 do STF:

STF Súmula nº 366 - 13/12/1963 - Súmula da Jurisprudência Predominante do Supremo Tribunal Federal - Anexo ao Regimento Interno. Edição: Imprensa Nacional, 1964, p. 158.Nulidade - Citação por Edital - Indicação do Dispositivo da Lei Penal - Transcrição da Denúncia ou Queixa ou Resumo dos Fatos em Que se Baseia    Não é nula a citação por edital que indica o dispositivo da lei penal, embora não transcreva a denúncia ou queixa, ou não resuma os fatos em que se baseia.

Alguns doutrinadores diziam que o edital deveria transcrever a denúncia ou queixa. O STF entende que isso não é necessário, bastando que o escrivão, ao fazer o edital, indique o tipo penal o qual o acusado teria realizado.

Prazo de dilação do edital: 15 dias – art. 361, CPP:

Art. 361.  Se o réu não for encontrado, será citado por edital, com o prazo de 15 (quinze) dias.

Hipóteses de citação por edital:

- Quando o acusado estiver em local incerto e não sabido;

- Quando o acusado estiver em local inacessível (epidemia, guerra etc.) > aplicação subsidiária do CPC (art. 231, II).

Atenção: acusado oculta-se para não ser citado > antes da Lei 11.719/06 era citado por edital; depois da Lei 11.719/06, é citado por hora certa.

Art. 66, Lei 9.099: não se admite nos Juizados citação por edital.

Art. 66. A citação será pessoal e far-se-á no próprio Juizado, sempre que possível, ou por mandado.

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        Parágrafo único. Não encontrado o acusado para ser citado, o Juiz encaminhará as peças existentes ao Juízo comum para adoção do procedimento previsto em lei.

Ainda que o promotor do juízado já saiba que o réu encontra-se em local incerto ou insabido, ele não poderá mandar, de plano, para o juízo comum, devendo, antes, tentar encontrar o acusado.

Aplicação do art. 366, CPP: aplica-se o art. 366 à citação por edital.

        Art. 366. Se o acusado, citado por edital, não comparecer, nem constituir advogado, ficarão suspensos o processo e o curso do prazo prescricional, podendo o juiz determinar a produção antecipada das provas consideradas urgentes e, se for o caso, decretar prisão preventiva, nos termos do disposto no art. 312.  (Redação dada pela Lei nº 9.271, de 17.4.1996) (Vide Lei nº 11.719, de 2008)

- Direito intertemporal: a nova redação do art. 366, CPP, só foi aplicada aos delitos cometidos após a vigência da Lei 9.271/96, evitando-se, assim, a retroatividade maléfica.

Vejamos:

A grande novidade trazida pela redação dada pela Lei 9.271 foi a suspensão do processo e da prescrição:

Antes da Lei 9.271/96 Depois da Lei 9.271/96

Citação por edital > não comparecia > era decretada a REVELIA, prosseguindo-se o feito com a nomeação de defensor dativo.

Citação por edital > não comparece e não constitui defensor > são suspensos o processo e a prescrição.

Exemplo: cidadão praticou o delito em 1995 (antes da entrada em vigor da lei), mas teve o processo instaurado em 1997 (depois da vigência da lei). Como proceder nesse caso? A Lei 9.271/96 é norma mista (natureza processual – suspensão do processo – e penal – suspensão da prescrição), e claramente mais gravosa ao réu (pois suspende a prescrição). Como, no caso de lei híbrida, prevalece o aspecto penal, NÃO haverá retroação. Portanto, o artigo 366 somente foi aplicado aos delitos cometidos APÓS a vigência da Lei 9.271/96.

- Aplicação do art. 366, CPP na Justiça Militar: no CPPM não há previsão da matéria. Dessa forma, se se aplicar o art. 366 na Justiça Militar haverá analogia in malam partem (suspensão da prescrição). Portanto, o art. 366 do CPP NÃO é aplicado na Justiça Militar.

- Consequências do art. 366, CPP:

1ª) Suspensão do processo e da prescrição;

Por quanto tempo se dá a suspensão do processo e da prescrição?

Há divergência entre os Tribunais Superiores:

Para o STJ, a prescrição fica suspensa de acordo com o prazo da prescrição da pretensão punitiva abstrata. Findo esse prazo, o processo continuará suspenso, mas a prescrição voltará

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a correr (ex: furto simples – pena de 1 a 4 anos; prescrição da pretensão punitiva abstrata em 8 anos; durante 8 anos o processo fica “engavetado”. Após esse período, o processo continua parado, mas a prescrição recomeça a correr – evita-se, dessa forma, processos imprescritíveis). Súmula 415, STJ:

STJ Súmula nº 415 - 09/12/2009 - DJe 16/12/2009Período de Suspensão do Prazo Prescriciona - Pena Cominada    O período de suspensão do prazo prescricional é regulado pelo máximo da pena cominada.

Já o STF entende que o processo e a prescrição podem permanecer suspensos por prazo indeterminado* (RE 460.971).

*ATENÇÃO: o STF reconheceu a existência de repercussão geral no RE 600.851, no qual voltará a discutir a matéria e poderá modificar seu entendimento.

2ª) O juiz pode determinar a produção antecipada de provas urgentes;

Para o STJ essa produção antecipada de provas urgentes deve ser feita nos termos do art. 225 do CPP. O simples argumento de que “testemunha tem memória curta” não é suficiente por si só para autorizar a colheita de provas antecipadas. Ou seja: para que haja a produção antecipada de provas no caso do art. 366, CPP, é necessário fundamentação.

        Art. 225.  Se qualquer testemunha houver de ausentar-se, ou, por enfermidade ou por velhice, inspirar receio de que ao tempo da instrução criminal já não exista, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento de qualquer das partes, tomar-lhe antecipadamente o depoimento.

STJ Súmula nº 455 - 25/08/2010 - DJe 08/09/2010Produção Antecipada de Provas - Fundamentação - Periculum in Mora   A decisão que determina a produção antecipada de provas com base no art. 366 do CPP deve ser concretamente fundamentada, não a justificando unicamente o mero decurso do tempo.

3ª) Poderá ser decretada a prisão preventiva.

O art. 366 do CPP não criou uma hipótese de prisão preventiva obrigatória. Na verdade, sua decretação depende da presença dos pressupostos dos arts. 312 e 313, do CPP.

Citação por hora certa: art. 362, CPP.

        Art. 362.  Verificando que o réu se oculta para não ser citado, o oficial de justiça certificará a ocorrência e procederá à citação com hora certa, na forma estabelecida nos arts. 227 a 229 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 - Código de Processo Civil.  (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).

Pressupostos da citação por hora certa:

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- O acusado seja procurado por três vezes em seu endereço e não encontrado;

- Que haja citação suspeita de ocultação.

Procedimento da citação por hora certa:

Art. 227 e ss. do CPC:

Art. 227.  Quando, por três vezes, o oficial de justiça houver procurado o réu em seu domicílio ou residência, sem o encontrar, deverá, havendo suspeita de ocultação, intimar a qualquer pessoa da família, ou em sua falta a qualquer vizinho, que, no dia      imediato, voltará, a fim de efetuar a citação, na hora que designar.

Art. 228.  No dia e hora designados, o oficial de justiça, independentemente de novo despacho, comparecerá ao domicílio ou residência do citando, a fim de realizar a diligência.

§ 1o  Se o citando não estiver presente, o oficial de justiça procurará informar-se das razões da ausência, dando por feita a citação, ainda que o citando se tenha ocultado em outra comarca.

§ 2o  Da certidão da ocorrência, o oficial de justiça deixará contrafé com pessoa da família ou com qualquer vizinho, conforme o caso, declarando-lhe o nome.

Art. 229.  Feita a citação com hora certa, o escrivão enviará ao réu carta, telegrama ou radiograma, dando-lhe de tudo ciência.

Atenção: ao acusado citado por edital aplica-se o art. 366 do CPP, suspendendo-se o processo e a prescrição. Já ao acusado citado por hora certa que não apresentar resposta à acusação deve o juiz nomear advogado dativo, com o consequente prosseguimento do feito – não se pode beneficar aquele que tenta fugir à ação penal com a suspensão do processo (ou seja: NÃO se aplica o art. 366). Art. 362, parágrafo único do CPP:

        Parágrafo único.  Completada a citação com hora certa, se o acusado não comparecer, ser-lhe-á nomeado defensor dativo. (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

Compatibilidade da citação por hora certa com a Convenção Americana Sobre Direitos Humanos:

Se o acusado se oculta para não ser citado, não se pode premiar sua torpeza com a suspensão do processo e da prescrição. Portanto, não há qualquer violação à CRFB ou à CADH.

4.5 Revelia

Ocorre quando o acusado, citado ou intimado pessoalmente ou por hora certa, deixa de comparecer.

Cuidado para não confundir:

- Acusado citado por edital que não comparece e nem constitui advogado > não haverá revelia, aplicando-se o art. 366 do CPP (suspensão do processo e da prescrição). Protege-se o direito

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de defesa do acusado que, quando citado por edital, normalmente sequer toma conhecimento da existência do processo (ele não se furta à ação penal; sequer tem conhecimento da existência dela);

- Acusado citado por hora certa (presume-se que o acusado tomou conhecimento da existência do processo) ou pessoalmente (o acusado efetivamente tomou conhecimento do processo) > se não apresentar resposta à acusação será decretada a revelia.

     Art. 362.  Verificando que o réu se oculta para não ser citado, o oficial de justiça certificará a ocorrência e procederá à citação com hora certa, na forma estabelecida nos arts. 227 a 229 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 - Código de Processo Civil.  (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).

        Parágrafo único.  Completada a citação com hora certa, se o acusado não comparecer, ser-lhe-á nomeado defensor dativo. (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

Art. 367. O processo seguirá sem a presença do acusado que, citado ou intimado pessoalmente para qualquer ato, deixar de comparecer sem motivo justificado, ou, no caso de mudança de residência, não comunicar o novo endereço ao juízo. (Redação dada pela Lei nº 9.271, de 17.4.1996)

CONCURSO: quais são os efeitos da revelia no processo penal?

Não há presunção de veracidade dos fatos narrados na peça acusatória: no processo civil, em se tratando de direitos disponíveis, se o réu não contestar a ação reputam-se verdadeiros os fatos afirmados pelo autor. No processo penal NÃO há este efeito (mesmo o acusado sendo revel o MP continua tendo o ônus da prova).

Na prática, o único efeito da revelia no processo penal é a desnecessidade de intimação do acusado para a prática dos demais atos processuais. Atenção: o defensor continuará sendo intimado (a defesa técnica, no processo penal, é obrigatória). O processo continua andando com a presença apenas do advogado.

Cuidado: a intimação do acusado, mesmo que revel, será OBRIGATÓRIA no caso de sentença condenatória ou absolutória imprópria. Por quê? No processo penal o acusado pode interpor recursos mesmo sem seu advogado (capacidade postulatória autônoma). Desta forma, é imprescindível sua intimação quando da sentença.

Ou seja: o único efeito da revelia no processo penal é a desnecessidade de intimação do acusado para a prática dos demais atos processuais, SALVO nas hipóteses de sentença condenatória ou absolutória imprópria, nas quais o acusado deverá ser intimado para que, querendo, possa recorrer.

OBS.: o acusado deve ser intimado, inclusive, se for inimputável, pois pode ser que a inimputabilidade tenha se dado apenas à época do fato, tendo cessado quando do processo.

4.6 Reação defensiva à imputação

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Após a citação, este será o primeiro momento que o acusado terá para se defender.

Defesa prévia (não existe mais)

Defesa preliminar Resposta à acusação (procedimento comum)

Previsão legal: ESTAVA prevista na antiga redação do art. 395, CPP (“o réu ou seu defensor poderá, após o interrogatório ou no prazo de 3 dias, oferecer alegações escritas ou rol de testemunhas”);

Previsão legal: ESTÁ prevista apenas em alguns procedimentos especiais: na Lei de Drogas, no procedimento originário dos Tribunais, nos crimes funcionais afiançáveis (art. 514, CPP*), nos Juizados (pode ser apresentada oralmente), na Lei de Improbidade Administrativa (obs.: essa lei não tem natureza criminal) e no DL 201/67**;

Previsão legal: introduzida no CPP, com a Lei 11.719/08, no art. 396****.

Momento: era apresentada após o interrogatório, no prazo de 3 dias;

Momento: apresentada entre o oferecimento e o recebimento da peça acusatória;

Momento: deve ser apresentada após o recebimento da peça acusatória e depois da citação do acusado;

Finalidade: era o momento para a defesa arrolar testemunhas;

Finalidade: convencer o juiz acerca da presença de uma das hipóteses que autorizam a rejeição da peça acusatória (art. 395, CPP); busca-se evitar o recebimento da peça acusatória;

Finalidade: buscar uma possível absolvição sumária e especificar as provas pretendidas*****;

Legitimidade: podia ser apresentada tanto pelo acusado quanto por seu defensor;

Legitimidade: essa peça só pode ser apresentada por profissional da advocacia (ex.: promotores não podem apresentar essa peça – estão impedidos de exercer advocacia);

Legitimidade: essa peça só pode ser apresentada por profissional da advocacia (o acusado não teria conhecimentos técnicos suficientes para tal);

OBS.: prazo de 10 dias para apresentação da resposta à acusação, contados da efetiva INTIMAÇÃO, e não de sua juntada aos autos

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(súmula 710 do STF).

Consequência da ausência da peça: só havia nulidade se a defesa não fosse intimada para a apresentação dessa peça; a ausência da defesa prévia, em si, não acarretava qualquer nulidade.

A defesa prévia foi EXTINTA pela Lei 11.719/08.

Consequência da ausência da peça: prevalece no STJ e STF que a ausência da apresentação da peça se trata de nulidade relativa, e, portanto, deve ser arguida oportunamente, sob pena de preclusão, devendo, ainda, ser comporvado o prejuízo. STF HC 89.517 e HC 100.515.

ATENÇÃO: de acordo com o STJ, é desnecessária a defesa preliminar do art. 514 (funcionário público), quando a ação estiver instruída com IP. O STF é contrário a esse entendimento (HC 85.779), que está, inclusive, esposado na súmula 330, do STJ***.

Consequência da ausência da peça: prevalece na doutrina que a ausência da peça dará ensejo a uma nulidade ABSOLUTA (pois haverá violação ao princípio da ampla defesa).

Não apresentada a resposta à acusação, deve ser nomeado defensor dativo, que terá mais 10 dias para a apresentação da peça.

*Art. 514, CPP:

Art. 514.  Nos crimes afiançáveis, estando a denúncia ou queixa em devida forma, o juiz mandará autuá-la e ordenará a notificação do acusado, para responder por escrito, dentro do prazo de quinze dias.

        Parágrafo único.  Se não for conhecida a residência do acusado, ou este se achar fora da jurisdição do juiz, ser-lhe-á nomeado defensor, a quem caberá apresentar a resposta preliminar.

ATENÇÃO:

Com as mudanças de lei do ano passado, quais são os crimes funcionais afiançáveis? Antes da lei 12.403/11, quando a pena mínima do delito era superior a 2 anos, o crime era inafiançável. Assim, tínhamos delitos funcionais inafiançáveis. Com o advento da lei 12.403/11, porém, esta regra deixou de existir. Assim, não existem mais delitos funcionais inafiançáveis; os crimes funcionais são, todos, afiançáveis. São, hoje, infiançáveis racismo e grupos armados, nos termos dos arts. 323 e 324, CPP:

Art. 323.  Não será concedida fiança: (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

I - nos crimes de racismo; (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

II - nos crimes de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, terrorismo e nos definidos como crimes hediondos; (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

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III - nos crimes cometidos por grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático; (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

IV - (Revogado pela Lei nº 12.403, de 2011).

V - (Revogado pela Lei nº 12.403, de 2011).

Art. 324.  Não será, igualmente, concedida fiança: (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

I - aos que, no mesmo processo, tiverem quebrado fiança anteriormente concedida ou infringido, sem motivo justo, qualquer das obrigações a que se referem os arts. 327 e 328 deste Código; (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

II - em caso de prisão civil ou militar; (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

III - (Revogado pela Lei nº 12.403, de 2011).

IV - quando presentes os motivos que autorizam a decretação da prisão preventiva (art. 312). (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

**DL 201/67– art. 2º, I:

Art. 2º O processo dos crimes definidos no artigo anterior é o comum do juízo singular, estabelecido pelo Código de Processo Penal, com as seguintes modificações:

I – antes de receber a denúncia o Juiz ordenará a notificação de acusado para apresentar defesa prévia, no prazo de cinco dias. Se o acusado não for encontrado para a notificação, ser- lhe-á nomeado defensor, a quem caberá apresentar a defesa, dentro do mesmo prazo;

Cuidado: com a CRFB/88 o prefeito passou a ser julgado pelos TJs; portanto, hoje, NÃO se aplica mais este DL aos prefeitos. O prefeito, hoje, continua a ter direito à defesa preliminar, mas NÃO por conta deste DL e sim porque a lei dos procedimentos dos processos originários dos Tribunais – a qual se aplica aos prefeitos – que prevê esta defesa.

***Súmula 330 STJ:

STJ Súmula nº 330 - 13/09/2006 - DJ 20.09.2006Resposta Preliminar - Processo e Julgamento dos Crimes de Responsabilidade dos Funcionários Públicos - Ação Penal Instruída por Inquérito Policial    É desnecessária a resposta preliminar de que trata o artigo 514 do Código de Processo Penal, na ação penal instruída por inquérito policial.

Se a ação instiver instruída com IP, é desnecessária a defesa preliminar.

Crítica: a súmula contraria a isonomia (por que a defesa preliminar do funcionário público é a única desnecessária?).

Por que essa súmula foi editada? Normalmente, a ausência da defesa preliminar ocorre no caso do funcionário público (que é processado em Vara “comum” e não em uma Vara

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especializada e, portanto, mais acostumada com o procedimento - como, ex., ocorre no casos da Lei de Drogas). Por isso, o STJ editou essa súmula, a fim de evitar eventuais HCs para discutir irregularidades no caso de ausência da defesa.

****Procedimento comum > resposta à acusação:

        Art. 396.  Nos procedimentos ordinário e sumário, oferecida a denúncia ou queixa, o juiz, se não a rejeitar liminarmente, recebê-la-á e ordenará a citação do acusado para responder à acusação, por escrito, no prazo de 10 (dez) dias. (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).

        Parágrafo único.  No caso de citação por edital, o prazo para a defesa começará a fluir a partir do comparecimento pessoal do acusado ou do defensor constituído. (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).

***** Cuidado: se o advogado está convencido de que é muito provável a absolvição sumária, este é o momento para alegá-la. Caso contrário, porém, este momento talvez não seja o ideal. Ex.: excludente da ilicitude > é muito difícil que o juiz absolva sumariamente com base nisso (pois a instrução probatória ainda não foi desenvolvida). O problema é que se o advogado já antecipou a alegação de excludente da ilicitude na resposta à acusação, ele já “deu de bandeja” para a acusação seu principal argumento de defesa (a acusação trabalhará já “sabendo os próximos passos” da defesa).

Ainda em relação à finalidade da resposta à acusação, devemos atentar ao art. 394, §4º, CPP:

        § 4o  As disposições dos arts. 395 a 398 deste Código aplicam-se a todos os procedimentos penais de primeiro grau, ainda que não regulados neste Código. (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

O art. 395 trata das causas de rejeição da peça acusatória; o art. 396 fala que o juiz deverá citar o réu para apresentar resposta à acusação; o art. 396-A trata da resposta à acusação; e o art. 397 cuida da absolvição sumária.

O art. 394, §4º determina que todos esses artigos aplicam-se aos processos penais de 1º grau, ainda que não regulados pelo CPP. Naqueles procedimentos que preveem a defesa preliminar surge um problema: haveria uma defesa preliminar, que se daria em um primeiro momento, e haveria, também, uma resposta à acusação. Teríamos duas manifestações da defesa (o que não faz qualquer sentido e viola a celeridade).

Teríamos: oferecimento da peça > notificação do acusado para apresentação de defesa preliminar > recebimento da peça acusatória > citação do acusado para apresentação de resposta à acusação.

Não há como retirar a defesa preliminar da Lei de Drogas (estaríamos modificando o procedimento especial). Então, como resolver? Para Renato Brasileiro, o ideal é que o juiz, ao determinar a notifcação do acusado, o informe que ele deverá apresentar, conjuntamente com a defesa preliminar, também a resposta à acusação, nos termos do art. 394, §4º.

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4.7 Oitiva do MP

A oitiva do MP NÃO está prevista expressamente no procedimento comum. O STJ, inclusive, tem posição firme no sentido que essa oitiva, por não estar prevista na lei, não existiria.

Pela letra da lei: após apresentada a resposta à acusação os autos irão conclusos ao juiz, que analisará uma possível absolvição sumária. O problema é que o juiz poderá por fim ao processo absolvendo o acusado com base em documento que sequer tenha sido visto pelo MP.

Assim, de acordo com a doutrina, em observância ao princípio do contraditório, se a defesa juntar documentos dos quais o MP não tinha prévia ciência, deve ser ouvido o órgão ministerial, aplicando-se, subsidiariamente, o art, 409 do CPP. Ex.: o advogado, na resposta à acusação, junta documentos que comprovariam o pagamento do débito tributário e o juiz absolve sumariamente o acusado. Neste caso, se o MP não tiver acesso aos autos após a juntada dos documentos, e, por isso, haverá clara ofensa ao contraditório.

4.8 Absolvição sumária

- É chamada pela doutrina de “julgamento antecipado da lide”;

- Foi introduzida no procedimento comum pela Lei 11.719/08;

- Existia, antes da 11.719/08, em dois casos:

Art. 6º, da Lei 8.038/90 (lei que prevê o procedimento originário dos Tribunais):

Art. 6º - A seguir (depois de apresentada a defesa preliminar), o relator pedirá dia para que o Tribunal delibere sobre o recebimento, a rejeição da denúncia ou da queixa, ou a improcedência da acusação, se a decisão não depender de outras provas.   (Vide Lei nº 8.658, de 1993)

       § 1º - No julgamento de que trata este artigo, será facultada sustentação oral pelo prazo de quinze minutos, primeiro à acusação, depois à defesa.

       § 2º - Encerrados os debates, o Tribunal passará a deliberar, determinando o Presidente as pessoas que poderão permanecer no recinto, observado o disposto no inciso II do art. 12 desta lei.

No procedimento originário dos Tribunais sempre existiu o julgamento antecipado da lide: se o o Tribunal entendesse que a decisão não dependia de outras provas, já poderia, logo após a defesa preliminar, decidir pela improcedência da ação.

Art. 516, CPP:

Art. 516.  O juiz rejeitará a queixa ou denúncia, em despacho fundamentado, se convencido, pela resposta do acusado ou do seu defensor, da inexistência do crime ou da improcedência da ação.

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Mesmo antes da Lei 11.719 o funcionário público já tinha direito ao julgamento antecipado da lide.

Absolvição sumária no procedimento comum

Absolvição sumária no procedimento do Júri

Hipóteses: art. 397*, CPP:

- Causa excludente da ilicitude;

- Causa excludente da culpabilidade;

- Atipicidade da conduta (formal ou material);

- Causa extintiva da punibilidade;

Hipóteses: art. 415**, CPP:

- Provada a inexistência do fato;

- Provada negativa de autoria/participação;

- Provada atipicidade formal/material;

- Demonstrada causa excludente da ilicitude ou da culpabilidade;

Absolvição do inimputável: não é possível a absolvição sumária do inimputável do art. 26, caput, CP (pois para o inimputável a legislação reserva a medida de segurança, a qual pressupõe que seja reconhecida a prática de um fato típico e ilicíto e, portanto, necessita de um processo);

Absolvição do inimputável: é possível a absolvição sumária do inimputável do art. 26, caput, CP, desde que esta seja a única tese defensiva; o juiz, neste caso, deve determinar a aplicação de medida de segurança***;

Momento: antes da audiência una de instrução e julgamento (oferecimento da peça acusatória > recebimento > citação > resposta à acusação > absolvição sumária);

Momento: se dá ao final da 1ª fase do procedimento – depois da audiência (oferecimento da denúncia > recebimento > citação > resposta à acusação > audiência de instrução > pronúncia ou impronúncia ou desclassificação ou absolvição sumária).

Coisa julgada: faz coisa julgada formal e material;

Recurso: o recurso adequado para a impugnação da absolvição sumária será a apelação, salvo no caso da extinção da punibilidade (no qual caberá RESE - art. 581, VIII).

*Art. 397, CPP:

Art. 397.  Após o cumprimento do disposto no art. 396-A (resposta à acusação), e parágrafos, deste Código, o juiz deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar: (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).

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        I - a existência manifesta de causa excludente da ilicitude do fato; (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

        II - a existência manifesta de causa excludente da culpabilidade do agente, salvo inimputabilidade; (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

        III - que o fato narrado evidentemente não constitui crime; ou (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008). (atipicidade)

        IV - extinta a punibilidade do agente. (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

Em qualquer uma dessas hipóteses, para que a absolvição sumária seja possível, há necessidade de um JUÍZO DE CERTEZA.

Se houver dúvida sobre alguma excludente da ilicitude, por exemplo, poderá o juiz absolver?

Ex.: brigas no final da “balada”. Nestes casos, as testemunhas estão, normalmente, alcoolizadas; ou seja, sempre há dúvida quanto a quem deu início à agressão e, por consequência, quanto a quem agiu em legítima defesa. A dúvida, nesta situação, autoriza a absolvição? Depende do momento:

- A dúvida quanto a uma excludente da ilicitude NÃO enseja absolvição sumária (para que o acusado seja absolvido sumariamentre é necessária a certeza);

- A dúvida quanto a uma excludente da ilicitude AUTORIZA a absolvição do acusado no momento da SENTENÇA (art. 386, VI, CPP).

Art. 386.  O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça:

        VI – existirem circunstâncias que excluam o crime ou isentem o réu de pena (arts. 20, 21, 22, 23, 26 e § 1o do art. 28, todos do Código Penal), ou mesmo se houver fundada dúvida sobre sua existência; (Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008)

Vale lembrar que a dúvida capaz de autorizar a absolvição no momento da sentença deve sempre ser fundada.

Em relação às hipóteses de absolvição sumária urge, ainda, fazer uma observação:

A decisão que declara a extinção da punibilidade NÃO tem natureza absolutória, mas sim declaratória: quando o juiz declara extinta a punibilidade ele apenas declara que o Estado não pode levar adiante a pretensão punitiva, não adentrando no mérito. Sobre o assunto, súmula 18 do STJ:

STJ Súmula nº 18 - 20/11/1990 - DJ 28.11.1990Perdão Judicial - Efeitos da Condenação    A sentença concessiva do perdão judicial é declaratória da extinção da punibilidade, não subsistindo qualquer efeito condenatório.

Assim, tecnicamente, houve um equívoco da Lei ao colocar a extinção de punibilidade como hipótese de absolvição sumária.

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**Art. 415, CPP:

        Art. 415.  O juiz, fundamentadamente, absolverá desde logo o acusado, quando: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        I – provada a inexistência do fato; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        II – provado não ser ele autor ou partícipe do fato; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        III – o fato não constituir infração penal; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        IV – demonstrada causa de isenção de pena ou de exclusão do crime. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        Parágrafo único.  Não se aplica o disposto no inciso IV do caput deste artigo ao caso de inimputabilidade prevista no caput do art. 26 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, salvo quando esta for a única tese defensiva. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

Da mesma forma que ocorre no procedimento comum, a absolvição sumária no Júri demanda um JUÍZO DE CERTEZA.

Inciso I: exemplo > se a Elisa Samúdio aparece viva, será provada a inexistência do fato, permitindo, assim, a absolvição sumária;

Inciso III: exemplo > crime impossível (“ao atirar contra a vítima, esta já estava morta”).

No Júri, o legislador não colocou dentre as causas de absolvição sumária a extinção da punibilidade. O que deve o juiz fazer, então, se reconhecer extinta a punibilidade? O juiz, a qualquer momento, deverá declarar de ofício a extinção da punibilidade. Art. 61, CPP:

        Art. 61.  Em qualquer fase do processo, o juiz, se reconhecer extinta a punibilidade, deverá declará-lo de ofício.

***Uma das hipóteses de absolvição sumária no procedimento do júri é a absolvição do inimputável do art. 26, caput, CP, que poderá ocorrer desde que a inimputabilidade seja a ÚNICA TESE da defesa. Por que a lei trouxe esse requisito (ser a inimputabilidade a única tese defensiva)? Se o acusado inimputável invoca uma outra tese defensiva, será mais benéfico para ele ser submetido a julgamento perante o júri, pois, neste caso, poderá convencer os jurados acerca da procedência dessa outra tese, hipótese em que não será submetido ao cumprimento de medida de segurança.

Ex.: réu afirma ser inimputável e ter agido por legítima defesa > se fosse absolvido sumariamente seria submetido à medida de segurança. Todavia, se não for absolvido sumariamente e for a julgamento no júri, poderá, eventualmente, ser absolvido (por legítima defesa) e não submetido a medida de segurança.

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4.9 Designação da audiência

Acontecerá caso não houver ocorrido a absolvição sumária do acusado.

Haverá, neste ponto, a designação de QUAL audiência?

Podemos ter duas situações distintas:

- Designação da audiência una de instrução e julgamento, que deverá ser realizada em até 60 dias (obs.: no procedimento sumário o prazo será de 30 dias);

- Audiência para fins de aceitação de proposta de suspensão condicional do processo (art. 89 da Lei 9.099/95, aplicável aos crimes cuja pena mínima seja igual ou inferior a um ano).

Alguns autores dizem que suspensão condicional do processo deve ser feita antes da absolvição sumária (no momento em que o réu é citado ele já deveria se manifestar sobre a proposta de suspensão). Isso é um absurdo, pois o acusado só irá aceitar a proposta de suspensão se não for absolvido sumariamente (vez que a absolvição sumária é, para ele, muito mais vantajosa).

Outros autores falam que a suspensão condicional poderia ser aceita quando da AIJ. O problema é que se fizermos a suspensão na própria AIJ haveria desnecessário deslocamento e desgaste de todas as testemunhas e de todos aqueles que comparecem na AIJ (por volta de 17 pessoas).

Conclusão: havendo proposta de suspensão condicional do processo, uma vez rejeitado o pedido de absolvição sumária, deve ser designada audiência específica para que o acusado se pronuncie quanto à proposta. Sobre o assunto vide aula da Lei 9.099 (LPE).

4.10 Audiência una de instrução e julgamento

Essa audiência una de instrução e julgamento foi introduzida no procedimento comum pela Lei 11.719/08. Dentre os vários objetivos da reforma processual de 2008, estava a busca por uma maior celeridade (o grande problema do processo no Brasil, hoje, é a lentidão). O maior exemplo dessa busca por celeridade foi exatamente a criação dessa audiência UNA.

A. Princípio da oralidade:

A partir do momento em que o legislador passou a prever que tudo deve se dar em uma única audiência (tanto a instrução quanto o julgamento), ele claramente adotou o entendimento de que o princípio da oralidade passa a valer também no processo comum.

O princípio da oralidade, como o próprio nome indica, dá predominância à palavra oral. Temos, portanto, quatro consequências importantes deste princípio:

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- Concentração dos atos processuais: consiste na redução do procedimento a apenas uma ou a poucas audiências (obs.: antigamente o número de audiências poderia chegar a três);

- Imediatidade da relação do juiz com a prova: permite o contato direto do juiz com a prova. A partir do momento em que se reduz o procedimento a uma só audiência, na qual será feita não apenas o julgamento, mas também a instrução processual, o juiz terá um contato direto com a prova a ser produzida. Ex.: o depoimento reduzido a termo é muito diferente daquele prestado pessoalmente; no papel é impossível repoduzir a dúvida, a incerteza, o nervosismo etc.;

- Irrecorribilidade das decisões interlocutórias: pelo menos em regra, as decisões interlocutórias são irrecorríveis (caso contrário, o procedimento não “caminha”).

OBS.: eventuais decisões interlocutórias irrecorríveis proferidas no curso do processo, deverão ser prontamente impugnadas (o advogado deve pedir para constar seu “protesto” na ata da audiência), a fim de que sejam abordadas em preliminar de eventual apelação. Ex.: em audiência, o juiz indefere uma pergunta feita pelo advogado à testemunha. Não caberá recurso, mas o advogado deve manifestar seu protesto, para, no caso de eventual apelação, poder arguir, em preliminar, cerceamento de defesa.

- Princípio da identidade física do juiz: esse princípio sempre valeu para o processo civil, tendo sido introduzido no procedimento comum apenas quando da reforma de 2008 (Lei 11.719/08). Cuidado: esse princípio já existia no processo penal anteriormente à reforma (nos Juizados e no Plenário do Júri, mas não no procedimento comum). Hoje este princípio consta expressamente do art. 399, §2º, CPP:

        § 2o  O juiz que presidiu a instrução deverá proferir a sentença. (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

Este princípio está preocupado com a busca pela verdade: o magistrado que presidiu a instrução certamente possui mais conhecimento sobre a causa para tomar uma decisão mais acertada.

Ainda quanto a este princípio são necessárias algumas considerações:

O princípio da identidade física é compatível com a expedição de cartas precatórias? É compatível com a realização de atos processuais por meio de videoconferência? Pelo nome do princípio, parece que juiz e prova deveriam, fisicamente, estar presentes no mesmo local. Ocorre que vivemos em um país de dimensão continental. Por isso, é inviável exigir-se a presença física do acusado e do juiz no mesmo local (sob pena de violação à ampla defesa e contraditório). Portanto, esse princípio NÃO impede a expedição de cartas precatórias, rogatórias ou videoconferência.

A lei processual penal apenas consagrou o princípio, não cuidando de nenhuma exceção. O que acontece, então, nos casos de licença, férias, afastamentos etc.? Na

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omissão da lei penal processual, a doutrina e os Tribunais vêm entendendo que este princípio NÃO tem natureza absoluta.

Os Tribunais entendem que aplicam-se ao processo penal as exceções previstas no art. 132 do CPC:

Art. 132.  O juiz, titular ou substituto, que concluir a audiência julgará a lide, salvo se estiver convocado, licenciado, afastado por qualquer motivo, promovido ou aposentado, casos em que passará os autos ao seu sucessor. (Redação dada pela Lei nº 8.637, de 1993)

“Magistrado instrutor”: figura criada pela Lei 12.019/09 que designa um juiz ou desembargador convocado por Ministro do Supremo ou do STJ para fazer a instrução dos processos de competência originária desses Tribunais. Essa figura não viola a identidade física do juiz? É uma exceção ao princípio plenamente justificável. Exigir-se que os Ministros do STF e do STJ façam a instrução dos processos de sua competência originária é fazer com que o julgamento de todos os seus processos seja ainda mais lenta (a instrução pelos Ministros demandaria tempo excessivo, deslocamento desnecessário etc.). Por isso, essa exceção é justificável.

B. Ordem dos atos processuais da audiência una de instrução e julgamento:

1º) Colheita das declarações do ofendido;

2º) Inquirição das testemunhas de acusação e defesa*;

3ª) Esclarecimentos dos peritos (obs.: se for perito oficial, basta um; se forem peritos não oficiais são necessários dois);

4ª) Eventual acareação;

5º) Reconhecimento de pessoas e coisas;

6º) Interrogatório**.

*Vide tópico abaixo (B.1).

**A maioria entende que o interrogatório possui natureza jurídica de defesa do acusado, entendimento este que foi reforçado pela mudança legislativa que tirou este ato do início, colocando-o no final do procedimento.

CONCURSO: essa ordem pode ser invertida? Sim, ex.: delação premiada: a Lei de Proteção às Testemunhas (Lei 9.807) sofreu uma alteração no ano passado, com a Lei 12.843:

Art. 1o  A Lei no 9.807, de 13 de julho de 1999, passa a vigorar acrescida do seguinte art. 19-A:  

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“Art. 19-A.  Terão prioridade na tramitação o inquérito e o processo criminal em que figure indiciado, acusado, vítima ou réu colaboradores, vítima ou testemunha protegidas pelos programas de que trata esta Lei. 

Parágrafo único.  Qualquer que seja o rito processual criminal, o juiz, após a citação, tomará antecipadamente o depoimento das pessoas incluídas nos programas de proteção previstos nesta Lei, devendo justificar a eventual impossibilidade de fazê-lo no caso concreto ou o possível prejuízo que a oitiva antecipada traria para a instrução criminal.” 

Sempre que houver um corréu delator incluído na Lei de proteção de testemunhas a ordem deve ser invertida: antecipa-se a colheita do depoimento do delator – é uma previsão legal de prova antecipada obrigatória.

B.1 Procedimento da oitiva das testemunhas de acusação e defesa:

- Substituição de testemunhas:

Antes da Lei 11.719/08 a substituição estava prevista na antiga redação do art. 397 do CPP. Com a mudança trazida pela Lei 11.719, o art. 397 passou a tratar da absolvição sumária. Ou seja: hoje, no CPP, NÃO há dispositivo legal expresso quanto à substituição de testemunhas. Então, os Tribunais têm entendido que, não obstante a omissão legislativa, é possível a aplicação subsidiária do art. 408 do CPC no processo penal:

Art. 408.  Depois de apresentado o rol, de que trata o artigo antecedente, a parte só pode substituir a testemunha:

        I - que falecer;

        II - que, por enfermidade, não estiver em condições de depor;

        III - que, tendo mudado de residência, não for encontrada pelo oficial de justiça.

- Desistência da oitiva de testemunhas:

A desistência somente pode ocorrer ANTES do início da oitiva da testemunha. Além disso, a desistência é possível independentemente da concordância da parte contrária, salvo em relação às testemunhas do juízo.

O advogado pode arrolar as mesmas testemunhas que o promotor? Pode, até mesmo porque ele não pode correr o risco de o promotor desistir da oitiva da testemunha.

CUIDADO com o procedimento do Júri: instalada a sessão de julgamento, a desistência depende da concordância da parte contrária e do Juiz Presidente.

- Retirada do acusado da sala de audiências:

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A ampla defesa subdivide-se em defesa técnica e autodefesa. Esta, por sua vez, abrange três direitos que o acusado tem: direito de audiência (direito de ser ouvido pelo juiz), direito de presença (poder acompanhar a colheita da prova) e capacidade postulatória autônoma (em alguns momentos o acusado pode praticar atos processuais mesmo sem advogado, ex.: impetração de hc). Dessa forma, ao tratar do tópico “retirada do acusado da sala de audiências”, tratamos da questão da possibilidade de restrição do direito de presença. Pergunta-se: a retirada não seria uma ofensa a esse direito? Não! O direito de presença não é absoluto, podendo a retirada ser determinada sempre que a presença do acusado causar constrangimento ao ofendido ou às testemunhas. No entanto, deve o advogado permanecer no recinto, sob pena de violação à ampla defesa. CUIDADO: a retirada deve ser sempre fundamentada na ata da audiência. Art. 217, CPP:

        Art. 217.  Se o juiz verificar que a presença do réu poderá causar humilhação, temor, ou sério constrangimento à testemunha ou ao ofendido, de modo que prejudique a verdade do depoimento, fará a inquirição por videoconferência e, somente na impossibilidade dessa forma, determinará a retirada do réu, prosseguindo na inquirição, com a presença do seu defensor. (Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008)

        Parágrafo único. A adoção de qualquer das medidas previstas no caput deste artigo deverá constar do termo, assim como os motivos que a determinaram. (Incluído pela Lei nº 11.690, de 2008)

O juiz, primeiramente, deve tentar manter a presença do acusado na sala de audiências, realizando a inquirição da testemunha por videoconferência. Somente se não for possível, será usada, como medida residual, a retirada.

Em alguns processos, contudo, é até indicada a retirada do acusado, ex.: crimes sexuais contra vulnerável (neste caso, não é aconselhável colocar a criança frente a frente com seu estuprador).

Sobre o assunto, há, atualmente, uma colheita de prova inovadora, iniciada no RS, que tem sido usada em especial em crimes contra crianças. É o chamado “depoimento sem dano”. Neste procedimento, a criança é colocada em uma sala com brinquedos e na presença de um psicólogo, que está com um ponto eletrônico. O profissional vai recebendo, por meio do ponto, as perguntas feitas pelas partes/advogados/juiz que estão na sala de audiência, e vai “traduzindo” os questionamentos para uma linguagem infantil. Assim, o psicólogo extrai, de uma forma menos “agressiva”, as informações da criança.

- Colheita do depoimento:

Antes da Lei 11.690/08 o sistema utilizado era o chamado “sistema presidencialista”, no qual primeiro perguntava o juiz, e somente depois as partes faziam suas perguntas, sempre por intermédio do juiz. O problema é que este sistema não era bom para a colheita da prova: a uma, porque o juiz acabava por alterar as perguntas; a duas, porque, como as perguntas tinham de passar pelo juiz, a testemunha de má-fé tinha mais tempo para se esquivar.

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Com o advento da Lei 11.690/08 passou a vigorar o sistema do “exame direto e cruzado” (direct examination – cross examination), no qual o primeiro a fazer as perguntas à testemunha será a parte que a arrolou (“exame direto” – feito sempre pela parte que arrolou a testemunha), o segundo, a parte contrária (“exame cruzado” – feito pela parte contrária) e o terceiro, o juiz (que poderá complementar a inquirição quanto aos pontos não exclarecidos).

Segundo a doutrina que estuda o tema, o cross examination pode ser feito de duas formas: as to facts (relativa as fatos – a parte explora a testemunha da parte contrária, indagando-a com relação aos fatos) ou as to credit (relativa à credibilidade da testemunha – a parte irá questionar a própria testemunha da parte contrária, visando a colocar em dúvida sua credibilidade).

Tanto o MP quanto o defensor, no sistema atual, formulam as perguntas diretamente às testemunhas.

Este sistema é melhor que o antigo, vez que permite o contato das partes diretamente com a testemunha, e, ao mesmo tempo, reserva um papel susbsidiário ao juiz, que deverá fazer as perguntas ao final, em caráter tão somente residual/complementar. O juiz não será o protagonista na produção das provas; é sobre as partes que recai o ônus da produção probatória.

Art. 212, CPP:

        Art. 212.  As perguntas serão formuladas pelas partes diretamente à testemunha, não admitindo o juiz aquelas que puderem induzir a resposta, não tiverem relação com a causa ou importarem na repetição de outra já respondida. (Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008)

        Parágrafo único.  Sobre os pontos não esclarecidos, o juiz poderá complementar a inquirição. (Incluído pela Lei nº 11.690, de 2008)

E se o juiz ignorar este artigo? Qual a consequência? Durante anos vigorou o sistema presidencialista. Com a reforma, da “noite para o dia”, o juiz, que antes tinha um papel decisivo, passa a ter um papel meramente subsidiário ou complementar no que diz respeito à inquirição das testemunhas. Assim, muitos juízes não se “acostumaram” com a novidade legislativa. Nos Tribunais (tanto no STF quanto no STJ) têm prevalecido o entendimento de que a inobservância do art. 212 é causa de nulidade RELATIVA, que deverá ser arguída oportunamente pela parte (“protesto” na ata da audiência), comprovando-se o prejuízo. STF HC 103.525:

HABEAS CORPUS . CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO DE DROGAS. INVERSÃO NA ORDEM DE PERGUNTAS ÀS TESTEMUNHAS. PERGUNTAS FEITAS PRIMEIRAMENTE PELA MAGISTRADA, QUE, SOMENTE DEPOIS, PERMITIU QUE AS PARTES INQUIRISSEM AS TESTEMUNHAS. NULIDADE RELATIVA. NÃO ARGUIÇÃO NO MOMENTO OPORTUNO. PREJUÍZO NÃO DEMONSTRADO. ORDEM DENEGADA.1. A magistrada que não observa o procedimento legal referente à oitiva das testemunhas durante a audiência de instrução e julgamento, fazendo suas perguntas em primeiro lugar para, somente depois, permitir que as partes inquiram as testemunhas, incorre em vício sujeito à sanção de nulidade relativa, que deve ser arguido oportunamente, ou seja, na fase das alegações finais, o que não ocorreu.

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2. O princípio do pas de nullité sans grief exige, sempre que possível, a demonstração de prejuízo concreto pela parte que suscita o vício. Precedentes. Prejuízo não demonstrado pela defesa.3. Ordem denegada. (HC 103.525, Min. Cármen Lúcia, DJ 27.8.2010).No caso, observa-se que a defesa não impugnou o ato judicial na audiência de instrução nem nas alegações finais, vindo a se insurgir apenas em sede de apelação. Portanto,preclusa a matéria.

CUIDADO com o Júri: no procedimento do Júri, a colheita do depoimento das testemunhas é um pouco diferente. Art. 473, CPP:

        Art. 473.  Prestado o compromisso pelos jurados, será iniciada a instrução plenária quando o juiz presidente, o Ministério Público, o assistente, o querelante e o defensor do acusado tomarão, sucessiva e diretamente, as declarações do ofendido, se possível, e inquirirão as testemunhas arroladas pela acusação. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        § 1o  Para a inquirição das testemunhas arroladas pela defesa, o defensor do acusado formulará as perguntas antes do Ministério Público e do assistente, mantidos no mais a ordem e os critérios estabelecidos neste artigo. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        § 2o  Os jurados poderão formular perguntas ao ofendido e às testemunhas, por intermédio do juiz presidente. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        § 3o  As partes e os jurados poderão requerer acareações, reconhecimento de pessoas e coisas e esclarecimento dos peritos, bem como a leitura de peças que se refiram, exclusivamente, às provas colhidas por carta precatória e às provas cautelares, antecipadas ou não repetíveis. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

No Júri o Juiz Presidente ainda pergunta primeiro. Não obstante, há doutrinadores que entendem que mesmo no Tribunal do Júri deve ser aplicado o art. 212 (Pacelli e Renato Brasileiro).

- Inversão da ordem de oitiva das testemunhas:

Em regra, primeiro ouvem-se as testemunhas da acusação e depois ouvem-se as testemunhas da defesa. Podemos, no entanto, inverter a ordem da oitiva das testemunhas: quando houver a expedição de carta precatória, a ordem NÃO precisa ser observada (seria inviável).

CONCURSO: o que ocorre no caso de as oito testemunhas de acusação não comparecerem, mas as oito testemunhas da defesa estiverem presentes? O juiz deve primeiro perguntar ao Promotor se ele desiste das testemunhas arroladas. Se ele insistir na oitiva, deve o juiz perguntar ao advogado se ele aceita que a ordem seja invertida. Se o advogado concorda, ele estará “concorrendo para a nulidade” e, portanto, não poderá posteriormente arguí-la. Na prática, todavia, o advogado não concordará. Neste caso, o juiz NÃO poderá inverter.

Em suma: prevalece o entendimento de que não é possível a inversão da ordem de oitiva das testemunhas, salvo se houver concordância da defesa. Mas e se houver a inversão mesmo sem a concordância da defesa? A nulidade será absoluta ou relativa? Eventual inversão da ordem

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de oitiva das testemunhas ainda que sem concordância da defesa é causa de mera nulidade relativa. STF HC 75.345:

"TESTEMUNHAS - DEFESA E ACUSAÇÃO - INVERSÃO. Se, de um lado, é certo que as testemunhas da acusação devem ser ouvidas antes das da defesa, de outro não menos correto é que a nulidade decorrente da inobservância desta ordem pressupõe prejuízo."

- Indeferimento de provas pretendidas pelas partes:

Provas irrelevantes, impertinente ou pretelatórias podem (aliás, devem) ser indeferidas pelo juiz. Todavia, é necessário que o juiz, para o infererimento, se baseie em dados concretos. Ex.: advogado arrolou 8 testemunhas, mas na AIJ comparecem apenas duas, ambas meramente “abonatórias”. Ouvidas as testemunhas, o juiz pergunta ao advogado se as demais testemunhas possuem o “mesmo caráter” ou se elas têm “algo a mais” a acrescentar. Se o advogado responde que as outras testemunhas são também abonatórias, mas insiste em sua oitiva, aí sim o juiz, já sabendo da futura prova irrelevante, poderá indeferir a oitiva das outras seis testemunhas. Art. 400, §1º:

        § 1o  As provas serão produzidas numa só audiência, podendo o juiz indeferir as consideradas irrelevantes, impertinentes ou protelatórias. (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

C. Diligências:

Ao final da AIJ as partes poderão requerer diligências referentes a necessidades que surgiram durante o curso do processo. O juiz, no entanto, não é obrigado a deferir tais diligências. Art. 402, CPP:

        Art. 402.  Produzidas as provas, ao final da audiência, o Ministério Público, o querelante e o assistente e, a seguir, o acusado poderão requerer diligências cuja necessidade se origine de circunstâncias ou fatos apurados na instrução. (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).

Antigamente, a requisição de diligências era uma fase autônoma, “pós-audiência”. Com a reforma, as diligências passaram a ser requeridas ao final da audiência.

CUIDADO: a parte somente pode requerer diligências em relação a necessidades que surgiram durante o processo.

D. Alegações finais:

Trata-se de ato postulatório das partes apresentado ao final da instrução probatória, no qual deve ser pleiteado o reconhecimento de eventual nulidade, devendo ser feita ampla análise do conjunto probatório produzido com o objetivo de influenciar o convencimento do juiz no sentido da condenação ou absolvição do acusado.

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As “alegações” é o ato processual que antecede a sentença. Por isso, é o último momento que a defesa/acusação tem para tentar convencer o juiz.

Antes da Lei 11.719/08, as alegações finais eram apresentadas por escrito. Com a mudança legislativa, as alegações devem agora, em regra, ser apresentadas oralmente, em audiência (resultado da adoção do princípio da oralidade no procedimento comum). Cada parte terá o direito de se manifestar em vinte minutos, prorrogáveis por mais dez: não há, aqui, réplica e tréplica, que são exclusivas do procedimento do Júri.

Art. 403, CPP:

        Art. 403.  Não havendo requerimento de diligências, ou sendo indeferido, serão oferecidas alegações finais orais por 20 (vinte) minutos, respectivamente, pela acusação e pela defesa, prorrogáveis por mais 10 (dez), proferindo o juiz, a seguir, sentença. (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).

§ 1o  Havendo mais de um acusado, o tempo previsto para a defesa de cada um será individual. (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

        § 2o  Ao assistente do Ministério Público, após a manifestação desse, serão concedidos 10 (dez) minutos, prorrogando-se por igual período o tempo de manifestação da defesa. (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

        § 3o  O juiz poderá, considerada a complexidade do caso ou o número de acusados, conceder às partes o prazo de 5 (cinco) dias sucessivamente para a apresentação de memoriais. Nesse caso, terá o prazo de 10 (dez) dias para proferir a sentença. (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

§1º: para Renato, devrá ser feita uma interpretação conforme deste parágrafo > havendo mais de um acusado, o tempo previsto tanto para a defesa quanto para a acusação deverá ser individual (paridade de armas).

§2º: o assistente pornuncia-se sempre após o MP, e por dez minutos, sendo prorrogado, por igual tempo, o prazo para a defesa.

As alegações orais são, obviamente, apresentadas oralmente. Todavia, na prática, as alegações orais normalmente vêm de duas formas:

- Alegações “ditadas”: a defesa/acusação ditam as alegações e o escrivão vai digitando (o que é uma aberração, vez que descumpre totalmente o princípio da oralidade, tão prestigiado pela reforma legal) – não há necessidade de “ditar”; a ata da audiência conterá apenas um breve resumo, conforme o art. 405, CPP:

        Art. 405.  Do ocorrido em audiência será lavrado termo em livro próprio, assinado pelo juiz e pelas partes, contendo breve resumo dos fatos relevantes nela ocorridos. (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).

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- Alegações escritas: o advogado/promotor traz as alegações em um pen drive e pede para fazer constar da ata. É também uma aberração: a uma, porque são alegações escritas e não orais; a duas, porque as alegações já estavam prontas desde antes da audiência, não levando em conta todas as provas nela produzidas.

As alegações orais, no entanto, poderão ser substituídas por MEMORIAL, que nada mais é que uma peça escrita a ser apresentada em até 5 dias.

A substituição ocorrerá em duas situações: no caso de realização de diligências ou quando verificada a complexidade da causa. Art. 403, §3º:

        § 3o  O juiz poderá, considerada a complexidade do caso ou o número de acusados, conceder às partes o prazo de 5 (cinco) dias sucessivamente para a apresentação de memoriais. Nesse caso, terá o prazo de 10 (dez) dias para proferir a sentença. (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

Na prática o que normalmente ocorre é a realização de um acordo entre as partes (inclusive com a chancela do juiz): as partes acordam em, ao invés de apresentarem alegações orais, apresentarem memoriais.

O que ocorre no caso da ausência dos memoriais? A doutrina entende que a ausência dos memoriais por parte do MP deve ser interpretada como uma tentativa de “desistência”, o que NÃO é admitido. Dessa forma, deve o juiz aplicar o art. 28 do CPP. Todavia, sendo a ausência por parte da defesa, será causa de nulidade ABSOLUTA (as alegações finais da defesa são consideradas essenciais, sob pena de violação da ampla defesa). Nesse sentido, súmula 523, STF:

STF Súmula nº 523 - 03/12/1969 - DJ de 10/12/1969, p. 5933; DJ de 11/12/1969, p. 5949; DJ de 12/12/1969, p. 5997.Processo Penal - Falta ou Deficiência da Defesa - Nulidade e Anulabilidade    No processo penal, a falta da defesa constitui nulidade absoluta, mas a sua deficiência só o anulará se houver prova de prejuízo para o réu.

Então, o que o juiz deve fazer se o advogado não apresentar alegações finais? Diante da não apresentação de memoriais pelo advogado constituído, deve o acusado ser intimado para constituir novo advogado, sob pena de nomeação da Defensoria Pública ou de defensor dativo.

Na prática, nenhum juiz julgará sem a apresentação de memoriais da defesa. O que ocorre, portanto, é a apresentação de memoriais precários, deficientes ou “modelos” (memoriais que podem ser usados indistintamente a qualquer crime). Neste caso, deve o juiz considerar as alegações não feitas (será nulidade absoluta).

E. Sentença: (aula com LFG)

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E.1 Atos jurisdicionais

- Despachos: ato de mera movimentação do processo;

Quem despacha? Juiz ou servidor, por delegação.

Cabe recurso contra despacho? Em regra, não. Exceções: despacho abusivo e despacho tumultuário. Mas qual recurso? Correição parcial.

Cabe ED contra despacho ambíguo, omisso, contraditório? Não.

Despacho faz coisa julgada? Não, porque não tem conteúdo decisório.

- Decisões interlocutórias: são as decisões que não encerram o processo (não põem fim ao processo).

Temos três espécies de decisões interlocutórias no processo penal:

- Decisão interlocutória simples: é a decisão que: 1. Não encerra o processo; 2. Não conclui nenhuma fase do procedimento; e 3. Não julga o mérito de nenhum pedido incidental. Ex.: recebimento de uma denúncia. Cabe recurso? Não há, na lei, nenhum recurso previsto. No entanto, a prática consagrou como recurso, o HC. E se o juiz rejeita a denúncia? Neste caso, há previsão legal: cabe RESE.

- Mista não terminativa: é a decisão que: 1. Não termina o processo; e 2. Encerra uma fase do processo. Ex.: decisão de pronúncia. Qual recurso cabível contra a pronúncia? RESE.

- Mista terminativa (também chamada de mista terminativa incidental ou com força de definitiva ou definitiva em sentido estrito): é a decisão que julga o mérito de um pedido incidental sem extinguir o processo. Ex.: quando o juiz julga restituição de coisas; prisão preventiva.

- Sentença: decisão que encerra o processo, decidindo ou não o mérito da causa.

E.2 Espécies de sentença no processo penal:

Temos, pelo menos, seis espécies de sentenças:

- Sentença terminativa (ou sentença formal): encerra o processo sem julgamento do mérito do pedido (não absolve, nem condena). Trata-se de extinção por razões processuais. Ex.: exceção de coisa julgada. Ex. 2: impronúncia do réu (enquanto não extinta a punibilidade, se descobrirem novas provas poderá desarquivar o processo).

- Sentença condenatória: quando o juiz julga procedente o pedido de condenação. Detalhe: o MP pode pedir absolvição. Este pedido, contudo, não vincula o juiz.

- Sentença absolutória: temos, no Brasil, duas espécies de sentença absolutória, a saber: 1. Própria: o juiz julga improcedente o pedido condenatório e não impõe nenhuma medida

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contra o réu; e 2. Imprópria: o juiz absolve o réu mas impõe medida de segurança. Trata-se do réu inimputável ou, em alguns casos, semi-imputável.

- Sentença declaratória extintiva da punibilidade: não condena, não absolve, mas extingue a punibilidade. Exs.: prescrição, perdão judicial (súmula 18, STJ).

- Sentença que julga o mérito de uma açaõ autônoma (HC, MS e revisão criminal).

- Sentença constitutiva: constitui uma nova situação jurídica. Ex.: concessão de reabilitação penal.

Cuidado: há uma sentença peculiar no direito processual penal brasileiro que devemos conhecer. Trata-se da sentença que homologa transação penal.

E.3 Classificação das sentenças:

- Simples: é a sentença proferida por juiz monocrático. Ex.: sentenças proferidas pelos juízes de 1º grau;

- Sentença subjetivamente plúrima: emana de órgão colegiado (mais de um juiz). Ex.: acórdãos dos tribunais;

- Sentença subjetivamente complexa: envolve vários órgãos. Ex.: tribunal do júri (jurados + juiz);

- Sentença material: julga o mérito do pedido principal;

- Sentença formal: extingue o processo sem julgar o mérito do pedido;

CONCURSO: o que é sentença autofágica? É a sentença que reconhece o crime e a culpabilidade e, depois, extingue a punibilidade. Ex.: perdão judicial (ex.: pai que mata filho em acidente de trânsito).

No caso de prescrição retroativa a sentença é autofágica? Não, porque temos duas sentenças neste caso: uma, que condena o réu e a outra, que extingue a punibilidade.

- Sentença branca: é a que remete para o Tribunal o julgamento de uma questão internacional. É possível no Brasil? Não! No Brasil, o juiz deve decidir (princípio da indelegabilidade da jurisdição);

- Sentença vazia: destituída de fundamentação (e, portanto, inconstitucional);

- Sentença suicida (ou incoerente): o dispositivo não tem congruência com a fundamentação;

- Sentença executável: é a sentença absolutória. Absolveu, executa-se de imediato;

- Sentença não executável: é a sentença condenatória, até o trânsito em julgado.

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E.4 Natureza jurídica da sentença

A sentença declara o direito ou cria ou direito? Resposta clássica (Montesquieu): o juiz só declara o direito (vez que ele não é legislador). Resposta moderna: o juiz cria o direito.

Ex.: crime continuado:

        Art. 71 - Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subseqüentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

Coube aos juízes definir quais as condições de lugar e tempo que definem o crime continuado.

Neste caso, temos uma sentença aditiva, que é a que complementa um texto legal vago.

OBS.: sentença manipulativa ou substitutiva > o juiz, neste caso, efetivamente cria regra nova; ele inventa regra. Ex.: cabe denúncia em relação ao réu que descumpriu transação penal. Isso é mera criação dos juízes; não há nada na lei sobre o tema!

Uma sentença equivocada deve ser anulada ou reformada?

Se houver um error in procedendo, a sentença deve ser anulada (ex.: juiz que sentencia sem alegações finais da defesa). Se houver, todavia, error in judicando, haverá reforma (juiz que julga mal, que erra no julgamento).

Publicada a sentença, incide o princípio da imodificabilidade da sentença. Exceções:

- Quando da sentença constam inexatidões materiais (ex.: erro no local onde ocorreu o crime, na grafia do nome do réu etc.);

- Erro de cálculo;

- Quando há embargos de declaração;

- Quando advém lei penal nova mais favorável e o processo ainda está em primeira instância.

F. Coisa julgada

F.1 Conceito

É a garantia da imutabilidade da sentença e dos seus efeitos.

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Qual é a premissa básica da coisa julgada? É a preclusão das vias recursais.

F.2 Espécies

- Formal: é a garantia da imutabilidade da sentença dentro do processo. Ou seja: naquele processo não pode alterar aquilo que foi decidido.

- Material: é a garantia da imutabilidade da sentença que se projeta para fora do processo. Ou seja: o que ficou decidido não pode ser mudado em outro processo.

OBS. 1: é possível modificar uma sentença, mesmo em 1º grau, sem ofensa à coisa julgada. Quando? Naquelas hipóteses acima estudadas (erro material, erro de cálculo etc.). Neste caso, não há ofensa à coisa julgada, vez que o juiz pode alterar, inclusive de ofício.

F.3 Fundamento

Segurança jurídica.

F.4 Função negativa

A função negativa da coisa julgada é a seguinte: fato já julgado NÃO pode ser renovado, rediscutido. Essa é a garantia do ne bis in idem processual.

Exceção: revisão criminal, em que será revisto aquilo que já foi julgado.

OBS. 1: no Brasil, a revisão criminal é apenas pro reo (ou seja: apenas a defesa pode ingressar com a revisão criminal). Não existe, no Brasil, revisão criminal pro societate.

OBS. 2: pode alguém ser processado duas vezes pelo mesmo crime? Em regra, não. Exceção: situação de extraterritorialidade da lei penal brasileira (vide caderno intensivo I).

OBS. 3: a revisão criminal ofende a coisa julgada? Não, pois a revisão criminal é uma garantia superior à coisa julgada. Assim, quando a sentença condenatória é injusta, deve valer a garantia maior, qual seja, a revisão.

F.5 Coisa julgada absoluta e relativa

O instituto da coisa julgada é absoluto ou relativo? Em princípio, a coisa julgada não é absoluta, porque cabe revisão criminal. Ocorre que só a sentença condenatória ou absolutória

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imprópria é que admite revisão. Ou seja: se se trata de sentença absolutória a coisa julgada é absoluta (fala-se aí em “coisa soberanamente julgada”).

Ex. caso real: réu acusado de homicídio (foi pescar com um amigo e o amigo apareceu espancado, afogado e morto). O caso foi a júri e ele foi absolvido. Houve recurso e novo júri, que, novamente, absolveu. Uma semana depois, o réu deu uma coletiva de imprensa, em que confessou o crime. A partir da absolvição, contudo, “nem Deus condena o acusado”.

F.6 Recurso ex officio

Súmula 423, STF:

STF Súmula nº 423 - 01/06/1964 - DJ de 6/7/1964, p. 2183; DJ de 7/7/1964, p. 2199; DJ de 8/7/1964, p. 2239.Trânsito em Julgado - Sentença Omissa do Recurso "Ex-Officio" - Interposição "Ex-Lege"    Não transita em julgado a sentença por haver omitido o recurso "ex-oficio", que se considera interposto "ex-lege".

F.7 Coisa julgada e rebus sic stantibus

A sentença penal condenatória na fase executiva pode ser alterada em vários aspectos. Isso porque ela é rebus sic stantibus.

Ex.: progressão de regime > juiz define o regime fechado e o juiz da execução impõe o semiaberto.

Ex. 2: remissão de pena por trabalho ou estudo.

F.8 Limites objetivos da coisa julgada

O que é que passa em julgado? É o fato narrado e julgado. Logo, os fundamentos da sentença não fazem coisa julgada.

Sendo assim, devemos saber o que é o “fato”. O fato se indentifica por três itens:

- Mesmo pedido;

- Mesma causa de pedir; e

- Mesmas partes.

Isso se chama tríplice identidade. Preenchida a tríplice identidade, o fato é o mesmo. E fato idêntico NÃO pode ser objeto de mesmo processo.

Não importa qual foi a qualificação jurídica do fato. Fato narrado e julgado NÃO pode ser repetido.

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F.9 Casuística

Fato ocorrido Fato narrado e julgado

Coisa julgada Descobre-se a violência

Cabe novo processo?

Subtração com violência

Furto (o Promotor não sabia da ameaça com arma)

Furto Conduz ao roubo

Não! Neste caso, o fato narrado e julgado foi o furto.

A violência que se descobriu é uma circunstância do fato (não é fato novo).

Fato ocorrido Fato narrado e julgado

Coisa julgada Descobre-se a segunda morte

Cabe novo processo?

Acidente com duas mortes

Uma morte (o MP não sabia da segunda morte)

Uma morte Conduz ao concurso (formal)

Sim! A outra morte é um fato novo (e não mera circunstância).

Fato ocorrido Fato narrado e julgado

Coisa julgada Fato superveniente: a morte

Cabe novo processo?

Lesão corporal seguida de morte

Lesão corporal Lesão corporal A vítima morre Não! A morte é mera circunstância superveniente.

Fato ocorrido Fato narrado e julgado

Coisa julgada Descobre-se o estupro

Cabe novo processo?

Roubo com estupro

Roubo Roubo Concurso material de crimes

Sim! Trata-se de fato novo e não de mera

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circunstância.

Fato ocorrido Fato narrado e julgado

Coisa julgada Descobre-se o segundo sequestro

Cabe novo processo?

Dois sequestros Um sequestro Sequestro Depois que transitou em julgado o réu sequestrou a mesma vítima

Sim! Trata-se de fato novo e não de mera circunstância.

Fato ocorrido Fato narrado e julgado

Coisa julgada Descobre-se que a quadrilha continua

Cabe novo processo?

Quadrilha ou bando

Quadrilha ou bando

Quadrilha ou bando

Mesmo após o trânsito em julgado, a quadrilha continua reunindo-se

Não! Quadrilha é crime permanente. Não há, portanto, fato novo.

OBS.: Rogério entende de forma diferente!!!

Extrato do caderno de Penal do Intensivo II: imagine que A, B, C e D estejam reunidos em quadrilha. O MP denuncia os quatro por quadrilha ou bando. Depois da denúncia, percebe-se que a quadrilha não se desfez, permanecendo os quatro associados. Pode o MP oferecer nova denúncia por quadrilha ou bando ou seria bis in idem? De acordo com a jurisprudência dos Tribunais Superiores, a manutenção da associação criminosa após o oferecimento da denúncia ou da condenação constitui novo crime de quadrilha ou bando, não se cogitando de bis in idem na nova imputação. Isso porque, caso contrário, a denúncia ou condenação funcionariam como um salvo conduto para os quadrilheiros, permitindo que eles pratiquem novos crimes de quadrilha e saiam impunes.

Fato ocorrido Fato narrado e julgado

Coisa julgada Descobrem-se fatos anteriores

Cabe novo processo?

Exercício ilegal de medicina

Exercício ilegal Exercício ilegal O médico já exercia medicina

Não! Fatos antigos estão,

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(crime habitual) de medicina de medicina desde 2.004, mas a denúncia captou desde 2.006

implicitamente, abrangidos na sentença condenatória.

Fato ocorrido Fato narrado e julgado

Coisa julgada Descobre-se o quarto roubo

Cabe novo processo?

Quatro roubos em uma mesma noite (crime continuado)

Três roubos Três roubos Depois da coisa julgada descobre-se o quarto roubo

Sim! Esse quarto roubo é fato novo não narrado.

Ex. do filme duplo risco: mulher foi condenada à 10 anos de prisão pela morte do marido. Cumpriu a pena, mas depois descobriu-se que o marido não estava morto. Ela, então, sai da prisão e mata o marido. Pode ser condenada? Sim, se houver a anulação do processo anterior! Mas se condenada, pode computar os 10 anos já cumpridos? Não! Não existe crédito de pena para o futuro!

F.10 Limite subjetivo da coisa julgada

A coisa julgada alcança as partes.

Absolvido um corréu, pode o MP processar outro corréu, que agora foi descoberto? Depende do fundamento da absolvição. Se foi absolvido por ser fato atípico, não cabe novo processo contra o novo corréu. Se foi absolvido, contudo, por falta de provas, pode processar o novo réu (pode ser que contra o primeiro não havia provas, mas contra o novo sim).

OBS.: sentença condenatória contra um réu não pode ser executada contra terceiros. Isso porque os terceiros não fizeram parte do processo.

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TEMA 4: O PROCEDIMENTO DO JÚRI

1. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO TRIBUNAL DO JÚRI

        XXXVIII - é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados:

        a) a plenitude de defesa;

        b) o sigilo das votações;

        c) a soberania dos veredictos;

        d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida;

Por que o Tribunal do Júri consta do art. 5º?

Por um lado, a instituição do júri, por trazer a participação do povo ao Poder Judiciário, está ligado ao próprio regime democrático.

Por outro lado, não há como negar que, se o tribunal do juri não constasse do art. 5º, muito provavelmente ele já estaria extinto.

1.1 Plenitude de defesa

Qual é a diferença entre a plenitude de defesa e a ampla defesa? A ampla defesa, prevista no art. 5º, LV, é assegurada a todos os acusados, inclusive no júri. A plenitude de defesa, por sua vez, é assegurada apenas em relação ao acusado no júri (art. 5º, XXXVIII, a).

Plenitude de defesa é algo “maior” que a ampla defesa, englobando:

a) Plenitude de defesa técnica: no tribunal do júri, o advogado e o acusado não precisam se limitar a uma atuação exclusivamente técnica, podendo utilizar argumentos de caráter extrajurídico (razões de ordem social, emocional, de política criminal etc.);

Quando há um julgamento por um juiz de direito, a argumentação utilizada pelo acusado é estritamente técnica. No julgamento pelo júri, ao contrário, a argumentação utilizada envolve elementos de ordem social, emocional etc. Não há como argumentar da mesma forma em relação a um juiz, que possui todos os conhecimentos técnicos, e em relação ao júri, que é composto de pessoas “comuns”. Ex.: policiais que matam criminosos > a principal defesa será no sentido de apelar à indignação da população. Os advogados, buscam, no convencimento dos jurados, explicitar todas as qualidades negativas ou crimes cometidos pela vítima: o policial (“bonzinho”, que trabalha a favor da sociedade) matou o criminoso (“mau”, que cometeu diversos delitos) para proteger a sociedade.

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Se o Juiz Presidente considerar o acusado indefeso, deve dissolver o Conselho de Sentença e designar nova data para julgamento. Ex.: se, durante os debates, o advogado se limitar a dizer que o acusado é inocente, não explicitando quaisquer motivos, o Juiz Presidente, poderá dissolver o Conselho, se considerar que a defesa foi insuficiente.

Art. 497.  São atribuições do juiz presidente do Tribunal do Júri, além de outras expressamente referidas neste Código: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        V – nomear defensor ao acusado, quando considerá-lo indefeso, podendo, neste caso, dissolver o Conselho e designar novo dia para o julgamento, com a nomeação ou a constituição de novo defensor; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

b) Plenitude da autodefesa: o acusado é livre para apresentar em seu interrogatório tese defensiva distinta daquela apresentada pelo advogado, tese esta que deve ser obrigatoriamente quesitada aos jurados, sob pena de nulidade absoluta (STJ HC 150.985).

É raro, mas pode ser que o acusado, em seu interrogatório, apresente tese distinta daquela de seu advogado. Se isso ocorrer, os Tribunais entendem que as ambas as teses devem ser apresentadas aos jurados.

1.2 Sigilo das votações

Não é a votação em si que é sigilosa. O que realmente é sigiloso é o VOTO.

O que se entende por sigilo do voto? A ninguém é dado saber ou tomar conhecimento do sentido do voto do jurado. O jurado vota por meio de uma cédula.

Essa garantia visa a preservar a imparcialidade do jurado; visa a resguardar a liberdade do jurado em sua decisão: o jurado é uma pessoa do “povo”. Portanto, não possui as mesmas garantias constituicionais de um juiz. Assim, deve ser protegido por meio do sigilo de sua votação.

Algumas observações importantes sobre o sigilo:

- A “sala secreta” (“sala especial”):

De acordo com o art. 485, CPP, a votação feita pelos jurados ocorrerá dentro dessa sala secreta.

        Art. 485.  Não havendo dúvida a ser esclarecida, o juiz presidente, os jurados, o Ministério Público, o assistente, o querelante, o defensor do acusado, o escrivão e o oficial de justiça dirigir-se-ão à sala especial a fim de ser procedida a votação. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

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        § 1o  Na falta de sala especial, o juiz presidente determinará que o público se retire, permanecendo somente as pessoas mencionadas no caput deste artigo. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        § 2o  O juiz presidente advertirá as partes de que não será permitida qualquer intervenção que possa perturbar a livre manifestação do Conselho e fará retirar da sala quem se portar inconvenientemente. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

Para a sala especial vão todos os que estão no júri, exceto o público e o acusado.

Cuidado: há quem diga que o acusado poderá acompanhar a votação em uma hipótese, qual seja, quando o próprio acusado exerce sua defesa técnica.

A existência da “sala secreta” é um exemplo de publicidade restrita (exceção à regra constitucional da ampla publicidade). Essa publicidade restrita é plenamente compatível com a Constituição, vez que necessária para garantir proteção aos jurados (na sala secreta o jurado poderá exercer livremente sua função – não será coagido ou ameaçado pelo acusado ou pelo público).

        LX - a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem;

- Incomunicabilidade dos jurados:

Uma vez sorteados os jurados não poderão comunicar-se entre si ou com terceiros, nem manifestar sua opinião sobre o processo. Não é que o jurado não pode falar. Ele não pode é conversar com outro jurado ou com terceiros sobre o processo, sob pena de violação ao sigilo das votações. STF AO 1.046: neste julgado o jurado pegou o celular para ligar para sua família e avisar que havia sido sorteado, conversando ao celular na presença, inclusive, do Oficial de Justiça. Não há que se falar, in casu, de violação à incomunicabilidade.

Essa incomunicabilidade vigora até o julgamento do processo: a incomunicabilidade visa a preservar o jurado para a votação. Se ele já votou e se o processo já foi julgado não há mais que se falar em incomunicabilidade.

Eventual violação à incomunicabilidade é causa de NULIDADE ABSOLUTA.

- Votação unânime:

Antes da Lei 11.689/08, todos os votos eram contados. Logo, no caso de votação unânime (7 x 0), era possível saber o sentido do voto de cada um dos jurados (havia, dessa forma, uma violação ao sigilo das votações). A reforma legislativa trouxe uma mudança em relação a essa regra: hoje, quando forem atingidos quatro votos em um sentido a votação será interrompida.

Art. 483, §§1º e 2º:

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        § 1o  A resposta negativa, de mais de 3 (três) jurados, a qualquer dos quesitos referidos nos incisos I e II do caput deste artigo encerra a votação e implica a absolvição do acusado. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        § 2o  Respondidos afirmativamente por mais de 3 (três) jurados os quesitos relativos aos incisos I e II do caput deste artigo será formulado quesito com a seguinte redação: (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

OBS.: a doutrina estendeu a previsão legal para englobar TODOS os quesitos e não apenas aos dois primeiros.

1.3 Soberania dos veredictos

Um tribunal formado por juízes togados não pode modificar no mérito a decisão proferida pelo tribunal do júri, sob pena de usurpação de sua competência constitucional para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida.

Atenção: o que está protegido pela soberania dos veredictos é a decisão dos JURADOS. O que for decidido pelo Juiz Presidente NÃO será protegido.

Observações sobre o assunto:

- Cabimento de apelação contra decisões do júri:

Art. 593, III:

Art. 593. Caberá apelação no prazo de 5 (cinco) dias:  (Redação dada pela Lei nº 263, de 23.2.1948)

        III - das decisões do Tribunal do Júri, quando:  (Redação dada pela Lei nº 263, de 23.2.1948)

        a) ocorrer nulidade posterior à pronúncia; (Redação dada pela Lei nº 263, de 23.2.1948)

        b) for a sentença do juiz-presidente contrária à lei expressa ou à decisão dos jurados; (Redação dada pela Lei nº 263, de 23.2.1948)

        c) houver erro ou injustiça no tocante à aplicação da pena ou da medida de segurança; (Redação dada pela Lei nº 263, de 23.2.1948)

        d) for a decisão dos jurados manifestamente contrária à prova dos autos. (Redação dada pela Lei nº 263, de 23.2.1948)

Análise do artigo:

Juízo rescindente x juízo rescisório (revisório): o primeiro ocorre quando há a desconstituição ou cassação da decisão anterior; já o segundo acontece quando há prolação de nova decisão em substituição à decisão anterior.

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Ex.: apelação contra sentença de crime de furto. Quando o tribunal julga a apelação, ele irá fazer dois juízos: em um primeiro momento, ele afastará a decisão anterior (juízo rescindente); em seguida, o tribunal dará uma nova decisão, que substituirá a anterior (juízo rescisório).

No tribunal do júri, contudo, é necessário verificar as limitações existentes em relação a esses juízos.

A apelação no júri é um recurso de fundamentação vinculada. Ao apelar no tribunal do júri, a parte é obrigada a alegar uma das hipóteses previstas no art. 593. Além disso, o tribunal, ao julgar a apelação a julgará apenas em relação à hipótese alegada. Isto é: o tribunal não pode ampliar o efeito devolutivo do recurso. Ex.: se José apela apenas com base na hipótese “a”, o tribunal não pode conceder a apelação com base na hipótese “b”. Nesse sentido, súmula 713, STF:

STF Súmula nº 713 - 24/09/2003 - DJ de 9/10/2003, p. 6; DJ de 10/10/2003, p. 6; DJ de 13/10/2003, p. 6.Efeito Devolutivo da Apelação - Decisões do Júri - Fundamentos    O efeito devolutivo da apelação contra decisões do Júri é adstrito aos fundamentos da sua interposição.

Hipóteses de cabimento da apelação no júri:

a) Nulidade após a pronúncia:

Se a nulidade for anterior à pronúncia deverá ser impugnada no recurso interposto contra a pronúncia. Por isso que, ao tratar da apelação do art. 593, III, a, o CPP faz menção à nulidade APÓS a pronúncia. Um exemplo de uma nulidade posterior à pronúncia é a violação à incomunicabilidade.

Tanto a nulidade absoluta quanto a relativa podem ser impugnadas por meio da apelação do art. 593, III, a, com a ressalva de que a nulidade relativa deve ter sido arguída oportunamente, sob pena de já ter se operado a preclusão. Ex.: os tribunais entendem que a quesitação, não obstante sua importância, enseja tão somente uma nulidade relativa. Dessa forma, se não impugnada de pronto, haverá preclusão.

Em regra, ao julgar esta apelação, limita-se o tribunal a fazer mero juízo rescindente, ou seja, a desconstituir a decisão impugnada. O tribunal irá desconstituir a decisão anterior e submeter o acusado a novo julgamento (ele NÃO poderá julgar a questão).

b) Sentença do Juiz Presidente contrária à lei expressa ou à decisão dos jurados:

Exs.: os jurados reconheceram uma qualificadora e o juiz não a levou em conta quando da fixação da pena; o juiz fixou regime integralmente fechado para o crime de latrocínio.

Aqui, na verdade, o que está sendo impugnado é uma decisão do Presidente e não dos jurados. É dizer: não prevalece o princípio da soberania dos veredictos (a qual protege tão

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somente os jurados). Dessa forma, o tribunal, ao julgar essa apelação, poderá fazer tanto o juízo rescindente quanto o rescisório (cassa a decisão, substituindo-a por outra).

c) Erro ou injustiça no tocante à aplicação da pena ou de medida de segurança:

“Erro” está relacionado à ideia de um equívoco por ocasião da fixação da pena. Ex.: fixação da pena abaixo do mínimo legal.

“Injustiça” refere-se à inadequada individualização da pena (quando da dosimetria da pena o juiz comete alguma injustiça). Ex.: desconsideração de atenuantes ou agravantes.

Ao entrar com uma apelação com base neste inciso, impugna-se uma decisão do Juiz Presidente. Dessa forma, assim como ocorre em relação ao inciso b, poderá o tribunal realizar ambos os juízos (rescindente e rescisório). O tribunal não se limita a dizer, por exemplo, que o juiz exagerou na dosimetria. Ele irá, além disso, fixar uma nova pena, corrigindo o erro ou a injustiça.

CONCURSO: se houver uma injustiça em relação a uma agravante ou qualificadora pode o tribunal afastar a circunstância? Ex.: José foi condenado por homicídio qualificado por motivo fútil (ciúmes). Pode o tribunal afastar a qualificadora? O raciocínio é o seguinte: a matéria foi apreciada pelos jurados ou pelo Juiz Presidente? Qualificadoras, privilégios, causas de aumento e de diminuição de pena são apreciadas pelos jurados. Logo, gozam da proteção da soberania dos veredictos, não podendo, portanto, serem incluídas ou excluídas por ocasião do julgamento de eventual apelação. Com a Lei 11.689/08, as agravantes e atenuantes deixaram de ser quesitadas aos jurados. Logo, não gozam mais da proteção da soberenia dos veredictos. Assim, havendo erro ou injustiça na aplicação de agravante ou atenuante é possível que o Tribunal de Justiça faça os juízos rescindente e rescisório por ocasião do julgamento de apelação, visto que tal matéria é de competência do Juiz Presidente.

Ex.: caso Eloá > imagine que a juíza não tenha levado em consideração a atenuante da menoridade. O tribunal poderá, sem violar qualquer princípio, incluir a atenuante quando do julgamento da apelação.

d) Decisão dos jurados manifestamente contrária à prova dos autos

Ex.: quatro testemunhas foram ouvidas. Duas disseram que viram Renato no local do crime efetuando os disparos; as outras duas disseram que Renato estava no shopping no momento do crime. Renato foi condenado. A decisão será manifestamente contrária à prova dos autos?

Ex. 2: o acusado confessou em juízo que matou a vítima e os jurados o absolvem no quesito relativo à autoria. A decisão será manifestamente contrária à prova dos autos?

A palavra “manifestamente” é essencial.

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Decisão manifestamente contrária à prova dos autos é aquela que não encontra nenhum apoio no conjunto probatório constante do processo, ou, subsidiariamente, nos elementos informativos do inquérito policial. Ou seja: deve ser uma coisa absurda.

Se existem duas versões e ambas contam com provas nos autos (como no ex. 1), cabe aos jurados decidir em um dos sentidos. Não há que se falar, então, em decisão manifestamente contrária à prova dos autos.

Já no caso do exemplo 2, há, obviamente, decisão manifestamente contrária à prova dos autos.

Este inciso refere-se a uma decisão dos JURADOS, e, portanto, goza da proteção da soberania dos veredictos. Por isso, quando do julgamento do apelação, o tribunal poderá fazer apenas o juízos rescindente, sujeitando o acusado a novo julgamento perante o tribunal do júri.

ATENÇÃO: com base neste inciso só é cabível uma ÚNICA apelação, pouco importando quem a utilizou primeiro.

Art. 593, §§1º, 2º e 3º:

        § 1o  Se a sentença do juiz-presidente for contrária à lei expressa ou divergir das respostas dos jurados aos quesitos, o tribunal ad quem fará a devida retificação. (Incluído pela Lei nº 263, de 23.2.1948)

        § 2o  Interposta a apelação com fundamento no no III, c, deste artigo, o tribunal ad quem, se Ihe der provimento, retificará a aplicação da pena ou da medida de segurança. (Incluído pela Lei nº 263, de 23.2.1948)

        § 3o  Se a apelação se fundar no no III, d, deste artigo, e o tribunal ad quem se convencer de que a decisão dos jurados é manifestamente contrária à prova dos autos, dar-lhe-á provimento para sujeitar o réu a novo julgamento; não se admite, porém, pelo mesmo motivo, segunda apelação.  (Incluído pela Lei nº 263, de 23.2.1948)

- Cabimento de revisão criminal contra decisões do júri:

A revisão criminal é uma ação autônoma que apenas pode ser ajuizada após o trânsito em julgado da sentença condenatória.

Cabe revisão contra decisão do júri ou haveria violação à soberania dos veredictos? Caso possível, poderá o tribunal julgar fazendo ambos os juízos? É plenamente cabível o ajuizamento de revisão criminal contra as decisões do júri. Não há violação à soberania dos veredictos, pois a revisão vem ao encontro da proteção da liberdade do acusado. Além disso, prevalece o entendimento de que, por ocasião da revisão, o Tribunal de Justiça pode fazer o juízo rescindente e, desde já, o juízo rescisório. Este entendimento prevalece inclusive por uma importante questão prática: a revisão é cabível apenas após o trânsito em julgado, que, em geral, é extremamente demorado. Assim, seria inviável submeter o acusado a um novo julgamento anos depois.

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OBS.: posição minoritária entende que deve ser devolvido ao júri – Nucci.

- Princípio da non reformatio in pejus indireta e soberania dos veredictos:

Non reformatio in pejus: em recurso exclusivo da defesa, não se admite a reforma do julgado impugnado para piorar a situação do acusado, seja sob o ponto de vista qualitativo, seja sob o ponto de vista quantitativo, e nem mesmo para corrigir eventual erro material.

Este princípio é um grande estímulo ao recurso da defesa. Com o recurso exclusivo da defesa, ou a situação do acusado melhora ou continua a mesma. Ex.: STJ HC 176.320.

A non reformatio pode ser direta ou indireta. A primeira refere-se à proibição de o Tribunal proferir decisão mais desfavorável ao acusado em recurso exclusivo da defesa (está ligada ao julgamento feito pelo Tribunal, que não pode piorar a situação do réu). Já a segunda significa que se a sentença impugnada for anulada em recurso exclusivo da defesa o juiz que vier a proferir nova decisão em substituição à anterior também fica vinculado ao máximo da pena imposta na primeira decisão, não podendo agravar a situação do acusado.

Ex.: José foi condenado pelo delito de latrocínio:

- Sentença condenatória do juiz de primeira instância pelo crime de latrocínio: pena de 25 anos e regime aberto (erro do juiz);

- O promotor “comeu mosca”;

- Contra essa sentença condenatória houve uma apelação exclusiva da defesa;

- Quando o Tribunal de Justiça vai julgar o recurso, a ele não é dado piorar a situação do acusado (non reformatio direta). Ele não poderá, portanto, impor o regime fechado;

- Imagine, porém, que o Tribunal anule a sentença condenatória por violação à ampla defesa. Isso significa dizer que o Tribunal irá devolver o processo para o juízo de primeira instância;

- Quando o juiz receber novamente o processo, ele NÃO poderá corrigir seu erro inicial e condenar o acusado ao regime fechado (non reformatio indireta). Na nova decisão o juiz terá dois limites: a pena de 25 anos e a imposição de regime aberto.

Este efeito chama-se “prodrômico”: efeito de uma sentença que, apesar de anulada, continua gerando efeitos (limita a pena que será imposta pela nova decisão).

Reformatio e júri:

Ex.:

- O acusado foi denunciado por homício qualificado (motivo torpe);

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- O Tribunal do Júri proferiu um sentença condenatória por homicídio simples: pena de 6 anos;

- Contra essa sentença foi interposta apelação exclusiva da defesa;

- O Tribunal ad quem dá provimento à apelação, anulando a sentença condenatória;

- Os autos, então, retornam à primeira instância e o acusado será submetido a novo Júri;

- Neste novo julgamento aplica-se o princípio da non reformatio?

Por um lado, há a necessidade de proteção ao acusado pela non reformatio. Por outro lado, há a necessidade de se respeitar a soberania dos verdictos: se a denúncia versa sobre um homicídio qualificado, como é que podemos estabelecer uma limitação para o jurado no momento da votação? O jurado, em relação à qualificadora, teria de manter o voto do primeiro julgamento (ou seja: não poderia escolher seu próprio voto).

Ou seja: os jurados são soberanos. Portanto, em um segundo julgamento, podem reconhecer qualificadoras e/ou causas de aumento de pena que não foram reconhecidas no julgamento anterior. Todavia, se o resultado da votação no segundo julgamento for idêntico ao do primeiro o Juiz Presidente não pdoerá agravar a pena do acusado, sob pena de violação ao princípio da non reformatio in pejus indireta.

No exemplo acima: os jurados, se quiserem, poderiam reconhecer a qualificadora “motivo torpe” ainda que ela não tenha sido reconhecida no primeiro julgamento. Todavia, caso os jurados mantenham a classificação de “homicídio simples”, ao Juiz Presidente não é dado aumentar a pena (ele deverá se ater ao máximo de 6 anos, que foi estabelecido no primeiro julgamento).

CUIDADO: o STF, no HC 89.544, deu clara preponderância à non reformatio em prejuízo da soberania dos veredictos. O caso é o seguinte: um cidadão foi denunciado por homicídio qualificado e submetido a três julgamentos pelo júri. No primeiro, foi absolvido. Contra essa absolvição houve uma apelação do MP (decisão manifestamente contrária à prova dos autos). O Tribunal deu provimento à apelação. Houve, então, um segundo júri, que condenou o cidadão por homicídio simples a uma pena de 6 anos. Contra essa decisão houve apelação exclusiva da defesa (recorreu impugnando a quesitação). A apelação foi provida. Houve, assim, um terceiro júri. No terceiro júri o cidadão foi condenado por homicídio qualificado a uma pena de 12 anos.

Para a doutrina: no terceiro julgamento não haveria qualquer óbice ao reconhecimento de qualificadora pelos jurados (soberania dos veredictos). Assim, não há qualquer vedação à imposição dessa pena de 12 anos;

Para o STF: pelo fato de o terceiro julgamento só ter sido possível devido ao recurso interposto exclusivamente pela defesa, anulado o julgamento, a pena não poderia ultrapassar os 6 anos.

1.4 Competência para julgamento dos crimes dolosos contra a vida

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Previsão constitucional:

- Art. 5, XXXVIII, CRFB/88:

XXXVIII - é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados:

d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida;

Quais são os crimes dolosos contra a vida? Os crimes dolosos contra a vida são aqueles previstos nos arts. 121 a 126 do CP: homicídio, infanticídio, aborto e instigação ao suicídio.

A competência estabelecida na CRFB é uma competência mínima, que não pode ser suprimida nem mesmo por emenda constitucional – cláusula pétrea, que visa não só a manter o julgamento dos crimes dolosos contra a vida pelos seus semelhantes, como também a assegurar a participação do povo no Judiciário.

Embora não possa ser suprimida, é plenamente possível a ampliação da competência do júri por lei, como no caso de crimes conexos ou, ainda, no caso de continência, salvo se eleitorais ou militares (de competência da Justiça Eleitoral e Militar, respectivamente).

Não são julgados pelo Júri:

CONCURSO: quais são os crimes envolvendo a morte (dolosa) de uma pessoa que não vão para o júri?

1º) Latrocínio: não é crime doloso contra a vida, mas sim contra o patrimônio (roubo seguido de morte dolosa ou culposa) – súmula 603 do STF;

Súmula 603

A COMPETÊNCIA PARA O PROCESSO E JULGAMENTO DE LATROCÍNIO É DO JUIZSINGULAR E NÃO DO TRIBUNAL DO JÚRI.

OBS.: este mesmo raciocínio vale para outros crimes contra o patrimônio com o resultado morte, a exemplo da extorsão mediante sequestro seguida de morte.

2º) Atos Infracionais: menor de 18 anos fica sob a responsabilidade da Vara da Infância e Juventude;

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3º) Genocídio: o bem jurídico tutelado pelo genocídio não é a vida, mas sim a existência de grupo nacional, étnico, racial ou religioso. Logo, o crime de genocídio é de competência do juiz singular;

Se, porém, praticado mediante a morte de membros do grupo, o agente deve responder pelos crimes de homicídio perante o júri, que terá força atrativa em relação ao crime conexo de genocídio.

OBS.: o genocídio pode ser praticado de várias formas, ainda que indiretamente, como, por exemplo, dando anticoncepcional para as mulheres de uma tribo. Mas quem pratica o genocídio matando pessoas do grupo, responde tanto pelo crime de genocídio, quanto pelos homicídios cometidos.

4º) Foro por prerrogativa de função prevista na Constituição Federal : vigora, aqui, o princípio da especialidade;

OBS. 1: foro dos vereadores – como o foro dos vereadores só está previsto em Constituição Estadual (e não na CRFB), a competência neste caso é do Tribunal do Júri – Súmula 721 do STF.

Súmula 721

A COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL DO TRIBUNAL DO JÚRI PREVALECE SOBRE O FORO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO ESTABELECIDO EXCLUSIVAMENTE PELA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL.

OBS.. 2: deputado estadual – há grande polêmica no que tange à competência para julgar deputado estadual em crimes dolosos contra a vida: discute-se se consta da Constituição Federal ou Estadual. Há um julgado recente do STJ, dizendo que é competente o Tribunal de Justiça, uma vez que o foro do deputado estadual encontra-se na CRFB (e não exclusivamente na Constituição Estadual).

COMPETÊNCIA. CRIMES DOLOSOS CONTRA A VIDA. DEPUTADO ESTADUAL.

Cuida-se de conflito de competência cuja essência é saber a quem cabe julgar os crimes dolosos contra a vida quando praticados por deputado estadual, isto é, se a prerrogativa de função desses parlamentares está inserida na própria Constituição Federal ou apenas na Constituição do estado. A Seção, por maioria, entendeu que as constituições locais, ao estabelecer para os deputados estaduais idêntica garantia prevista para os congressistas, refletem a própria Constituição Federal, não se podendo, portanto, afirmar que a referida prerrogativa encontra-se prevista, exclusivamente, na Constituição estadual. Assim, deve prevalecer a teoria do paralelismo constitucional, referente à integração de várias categorias de princípios que atuam de forma conjunta, sem hierarquia, irradiando as diretrizes constitucionais para os demais diplomas legais do estado. Consignou-se que a adoção de um critério fundado na aplicação de regras simétricas reforça a relevância da função pública protegida pela norma do foro privativo. Ademais, a

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própria Carta da República institui, em seu art. 25, o princípio da simetria, dispondo que os estados organizam-se e se regem pelas constituições e leis que adotarem, observando-se, contudo, os princípios por ela adotados. Diante desses fundamentos, por maioria, conheceu-se do conflito e se declarou competente para o julgamento do feito o TJ. CC 105.227-TO, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 24/11/2010.

NOTAS DA REDAÇÃO

A competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida é do Tribunal do Júri, regra que está prevista na Carta Magna nos seguintes termos: Art. 5º, XXXVIII.

Pois bem. A questão em julgamento no CC 105.227 – TO, relatado pela Ministra Maria Thereza, cinge-se à determinação da competência para o julgamento de crime doloso contra a vida praticado por deputado estadual. No caso, a particularidade que tornou o fato discutível no Tribunal da Cidadania foi a existência de dispositivo previsto na Constituição estadual do TO sobre o foro de prerrogativa de função para estes membros do legislativo estadual.

O problema, como bem expôs a Ministra relatora, seria apontar qual regra prevaleceria: a norma constitucional sobre a competência do Tribunal do Júri para julgamento destes crimes ou a norma estadual que reconhece o privilégio do foro por prerrogativa de função. Sobre o assunto há enunciado da Súmula 721 do STF. 

Poder-se-ia concluir que a súmula encerraria a discussão proposta no presente Conflito de Competência. No entanto, cabe alertar para o seguinte: a Constituição Federal reserva aos deputados estaduais as mesmas prerrogativas previstas aos deputados federais - art. 27, §1º: Art. 27, § 1º. Será de quatro anos o mandato dos Deputados Estaduais, aplicando- sê-lhes as regras desta Constituição sobre sistema eleitoral, inviolabilidade, imunidades, remuneração, perda de mandato, licença, impedimentos e incorporação às Forças Armadas

Em outro dispositivo, o mesmo diploma legal prevê que os deputados federais gozam de foro por prerrogativa de função: Art. 53, 1º. Os Deputados e Senadores, desde a expedição do diploma, serão submetidos a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal.

Assim, embora a súmula tenha fixado entendimento de que a competência do Tribunal do Júri deve prevalecer, ela mesma mencionou que a regra vale para casos em que a prerrogativa de função seja estabelecida exclusivamente na Constituição estadual.

No caso julgado no presente CC, há menção na Constituição estadual, mas nas lições da Ministra, a regra aqui não está exclusivamente prevista na Constituição do TO, eis que, pelo princípio da simetria, no raciocínio acima exposto, o foro por prerrogativa de função decorre da própria Lei Maior.

Assim sendo, conclui-se que a regra inserta na súmula é aplicável aos casos em que não houver previsão constitucional sobre a prevalência do foro por prerrogativa de função em detrimento do júri, como seria a situação, por exemplo, de uma Constituição estadual atribuir foro por prerrogativa de função aos delegados civis.

No presente informativo de jurisprudência, no entanto, a Terceira Seção do STJ fixou entendimento de que a regra prevista nas Constituições estaduais para os deputados estaduais está de acordo com os preceitos constitucionais, logo, prevalece o foro por prerrogativa de função.

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5º) Crime político de matar o Presidente da República, do Senado, da Câmara dos Deputados e do STF: competência do juiz singular federal;

Se matar o presidente, e o fizer com motivação política, o delito deixa de ser tratado como um crime doloso contra a vida e passa a ser tratado de crime de natureza política. Logo, a competência não será do tribunal do júri.

Art. 29, Lei 7170/83:

Art. 29 - Matar qualquer das autoridades referidas no art. 26 (Presidente da República, do Senado, da Câmara e do STF).

Ex.: se José matar a presidente com motivação política, esse crime deve ser julgado por um juiz singular federal e não pelo júri.

6º) Militar da ativa que mata militar da ativa: esse crime será julgado pela Justiça Militar;

7º) Civil que comete homicídio doloso contra militar das Forças Armadas em serviço: o STF entendeu que o civil que pratica este delito deve ser julgado pela Justiça Militar da União – STF,HC 91003:

EMENTA: HABEAS CORPUS. CONSTITUCIONAL. PENAL MILITAR. PROCESSUAL PENAL MILITAR. CRIME DOLOSO PRATICADO POR CIVIL CONTRA A VIDA DE MILITAR DA AERONÁUTICA EM SERVIÇO: COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA MILITAR PARA PROCESSAMENTO E JULGAMENTO DA AÇÃO PENAL: ART. 9º, INC. III, ALÍNEA D, DO CÓDIGO PENAL MILITAR: CONSTITUCIONALIDADE. PRECEDENTES. HABEAS CORPUS DENEGADO. 1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é no sentido de ser constitucional o julgamento dos crimes dolosos contra a vida de militar em serviço pela justiça castrense, sem a submissão destes crimes ao Tribunal do Júri, nos termos do o art. 9º, inc. III, "d", do Código Penal Militar. 2. Habeas corpus denegado.

ATENÇÃO: deve ser, obrigatoriamente, militar das Forças Armadas; sendo militar estadual, a competência será do Tribunal do Júri.

OBS. 1: Tribunal do Júri só existe no âmbito federal e estadual; não existe na Justiça Militar e nem na Eleitoral.

8º) Tiro de Abate ou tiro de destruição – art. 9º, parágrafo único, do CPM (redação dada pela Lei 12.432/11):

 Art. 9º Consideram-se crimes militares, em tempo de paz:

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Parágrafo único.  Os crimes de que trata este artigo quando dolosos contra a vida e cometidos contra civil serão da competência da justiça comum, salvo quando praticados no contexto de ação militar realizada na forma do art. 303 da Lei n o   7.565, de 19 de dezembro de 1986 - Código Brasileiro de Aeronáutica

Se uma aeronave adentrar no território nacional não observando as providências previstas em lei, ela é considerada hostil, podendo ser abatida, destruída por um “tucano” da União.

Dessa forma, se quem vai ser responsável é a Força Aérea Brasileira, o tiro de abate deverá ser julgado pela Justiça Militar da União.

2. PROCEDIMENTO ESCALONADO OU BIFÁSICO DO TRIBUNAL DO JÚRI

Como o próprio nome sugere, o procedimento do Tribunal do Júri é composto de 2 fases:

- PRIMEIRA FASE: PROCEDIMENTO SUMÁRIO DA CULPA (JUDICIUM ACCUSATIONIS)

Aqui, só há a participação do processo pelo Juiz Sumariante; não há a presença de jurados.

A primeira fase tem início com o oferecimento da peça acusatória (queixa/denúncia).

CONCURSO: qual é a peça acusatória do Tribunal do Júri? É a denúncia, em regra. No entanto, devemos lembrar que é possível ação penal privada no Tribunal do Júri em duas situações, quais sejam:

- Ação penal privada subsidiária da pública: se o MP ficar inerte no prazo legal (15 dias), caberá ação privada subsidiária da pública;

- Conexão com crime de ação penal de iniciativa privada (o ideal, aqui, contudo, é separar os processos com base no art. 80, do CPP).

Essa primeira fase é concluída com a prolação de uma das seguintes decisões: impronúncia, desclassificação, absolvição sumária ou pronúncia.

CONCURSO: qual é o prazo para a conclusão da primeira fase?

A Lei 11.689/08 trouxe um prazo para a conclusão da primeira fase, qual seja, 90 dias (art. 412, do CPP), prazo este que pode ser usado tanto para o acusado preso quanto para o solto.

 Art. 412.  O procedimento será concluído no prazo máximo de 90 (noventa) dias. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

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E quais são as consequências da inobservância desse prazo? No tocante ao acusado preso, eventual excesso, desde que abusivo, autoriza o relaxamento da prisão. Em relação ao acusado solto, esse prazo acaba funcionado como um prazo impróprio, isto é, aquele cuja inobservância não acarreta nenhuma consequência.

- SEGUNDA FASE : JUÍZO DA CAUSA (JUDICIUM CAUSAE)

Essa fase conta, inicialmente, com a participação apenas do Juiz Presidente e, posteriormente, dos jurados.

Antes da Lei 11.689/08, a segunda fase tinha início com o oferecimento do libelo acusatório, o qual foi extinto com a advento da supracitada lei.

Com a extinção do libelo acusatório, a segunda fase passa a ter início após a preclusão da decisão de pronúncia, com a preparação do processo para julgamento em Plenário – arts. 421 e 422, CPP:

        Art. 421.  Preclusa a decisão de pronúncia, os autos serão encaminhados ao juiz presidente do Tribunal do Júri. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        § 1o  Ainda que preclusa a decisão de pronúncia, havendo circunstância superveniente que altere a classificação do crime, o juiz ordenará a remessa dos autos ao Ministério Público. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        § 2o  Em seguida, os autos serão conclusos ao juiz para decisão. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

Seção IIIDa Preparação do Processo para Julgamento em Plenário(Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        Art. 422.  Ao receber os autos, o presidente do Tribunal do Júri determinará a intimação do órgão do Ministério Público ou do querelante, no caso de queixa, e do defensor, para, no prazo de 5 (cinco) dias, apresentarem rol de testemunhas que irão depor em plenário, até o máximo de 5 (cinco), oportunidade em que poderão juntar documentos e requerer diligência. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

OBS.: Nucci, em posição isolada, entende que essa preparação do processo seria uma fase autônoma. Segundo ele, o júri é composto de três fases: sumário de culpa, preparação, e julgamento em plenário propriamente dito.

A conclusão desta fase dá-se com a sessão de julgamento no Plenário do Júri. Aqui, haverá a participação do Juiz Presidente, mais vinte cinco jurados, sete dos quais irão compor o Conselho de Sentença. O julgamento no Plenário pode culminar em uma sentença condenatória, absolutória ou em uma desclassificação.

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CONCURSO: qual é o prazo de conclusão da segunda fase do procedimento do Tribunal do Júri?

A lei é omissa, mas, a partir da leitura do art. 428, CPP, é possível extrair o prazo de seis meses, contados da preclusão da decisão de pronúncia, desde que a defesa não tenha concorrido para essa dilação.

O art. 428, CPP prevê que se o julgamento não for realizado no prazo de seis meses, ele deverá ser deslocado para outra comarca (desaforamento).

 Art. 428.  O desaforamento também poderá ser determinado, em razão do comprovado excesso de serviço, ouvidos o juiz presidente e a parte contrária, se o julgamento não puder ser realizado no prazo de 6 (seis) meses, contado do trânsito em julgado da decisão de pronúncia. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

3. PRIMEIRA FASE DO PROCEDIMENTO DO JÚRI – JUDICIUM ACCUSATIONIS

Procedimento comum ordinário:Oferecimento da peça acusatória recebimento / rejeição citação reação defensiva à imputação oitiva do MP (se for o caso) absolvição sumária (se for o caso) designação da audiência una de instrução e julgamento realização da audiência una de instrução e julgamento sentença.

A primeira fase do procedimento do júri é muito semelhante ao procedimento comum ordinário. Todavia, devem ser destacadas as seguintes diferenças:

- No judicium accusationis, há previsão expressa de oitiva do MP após a apresentação da resposta à acusação pela defesa – art. 409, CPP:

Art. 409.  Apresentada a defesa, o juiz ouvirá o Ministério Público ou o querelante sobre preliminares e documentos, em 5 (cinco) dias. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

- No procedimento comum ordinário, a absolvição sumária, prevista no art. 397, CPP poderá se dar imediatamente após a apresentação da resposta à acusação, logo, antes da audiência una de instrução e julgamento. Já na primeira fase do procedimento do júri, a absolvição sumária, prevista no art. 415, CPP, só poderá ocorrer ao final da audiência de instrução.

 Art. 397.  Após o cumprimento do disposto no art. 396-A (resposta à acusação), e parágrafos, deste Código, o juiz deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar: (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).

Art. 415.  O juiz, fundamentadamente, absolverá desde logo o acusado, quando: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

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- Na primeira fase do procedimento do júri, não há previsão legal expressa sobre o requerimento de diligências. Todavia, com base no princípio da busca da verdade (art. 156, II, CPP), nada impede que o juiz determine a realização de diligências. No procedimento comum ordinário, é plenamente possível a requisição de diligências.

- Na primeira fase do procedimento do júri não há previsão legal expressa acerca da substituição das alegações orais por memoriais. No procedimento comum, o juiz pode autorizar, por expressa previsão legal, essa substituição.

 Art. 411.  Na audiência de instrução, proceder-se-á à tomada de declarações do ofendido, se possível, à inquirição das testemunhas arroladas pela acusação e pela defesa, nesta ordem, bem como aos esclarecimentos dos peritos, às acareações e ao reconhecimento de pessoas e coisas, interrogando-se, em seguida, o acusado e procedendo-se o debate. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

 § 4o  As alegações serão orais, concedendo-se a palavra, respectivamente, à acusação e à defesa, pelo prazo de 20 (vinte) minutos, prorrogáveis por mais 10 (dez). (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

- No procedimento comum, alegações orais precárias ou sua ausência são causa de nulidade absoluta, por violação à ampla defesa (súmula 523, STF). Na primeira fase do procedimento do júri, no entanto, caso a defesa vislumbre a inevitabilidade da pronúncia não haverá nulidade se as alegações forem apresentadas de maneira resumida (por “negação geral”). Isso porque se trata de estratégia da defesa, que não tem interesse em antecipar sua tese defensiva (guardando-a para o Plenário). Ex.: o advogado afirma > “a defesa, neste momento, se limita a dizer que o réu é inocente e que provará sua inocência quando do Plenário do Júri”. É uma estratégia: o advogado guarda seus argumentos mais importantes para o principal momento de defesa, qual seja, o Plenário do Júri.

Súmula 523NO PROCESSO PENAL, A FALTA DA DEFESA CONSTITUI NULIDADE ABSOLUTA, MAS A SUA DEFICIÊNCIA SÓ O ANULARÁ SE HOUVER PROVA DE PREJUÍZO PARA O RÉU.

Quatro decisões podem ser prolatadas ao final da primeira fase:

- Impronúncia;

- Pronúncia;

- Desclassificação;

- Absolvição sumária.

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3.1 Impronúncia

O acusado deve ser impronunciado quando o juiz não estiver convencido da existência do crime ou de indícios suficientes de autoria ou participação.

A. Natureza jurídica/coisa julgada

Qual é a natureza jurídica da decisão de impronúncia?

A impronúncia é uma sentença? Art. 416, CPP:

Art. 416.  Contra a sentença de impronúncia ou de absolvição sumária caberá apelação. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

O CPP fala claramente em “sentença de impronúncia”. Todavia, a impronúncia NÃO é uma sentença; ela NÃO aprecia o mérito.

O ideal é dizer que, apesar do teor do art. 416, a impronúncia é, na verdade, uma decisão interlocutória mista terminativa.

- É decisão interlocutória, pois não aprecia o mérito: quando o acusado é impronunciado, o juiz não diz se é culpado ou inocente;

- É decisão mista, pois põe fim a uma fase procedimental: a impronúncia encerra a primeira fase do procediemnto do júri;

- É decisão terminativa, pois põe fim ao processo.

Qual é a espécie de coisa julgada formada em torno da decisão de impronúncia?

Antes da Lei 11.689/08, a impronúncia ocorria quando:

1º) O juiz não se convencia sobre a existência do crime e indícios de autoria/participação > coisa julgada formal;

2º) Provada a inexistência do fato > coisa julgada formal e material;

3º) Provada a negativa de autoria/participação > coisa julgada formal e material;

4º) Reconhecida a atipicidade formal ou material da conduta delituosa > coisa julgada formal e material.

A impronúncia que fazia coisa julgada formal e material era chamada de “impronúncia absolutória”.

Com o advento da Lei 11.689/08, as hipóteses 2, 3 e 4, que antes eram causas de impronúncia, passaram a autorizar a absolvição súmaria (art. 415, CPP). A Lei 11.689/08, então, EXTINGUIU a impronúncia absolutória.

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Hoje, portanto, temos apenas uma causa de impronúncia, qual seja, o não convencimento do juiz sobre a existência do crime e indícios de autoria/participação, que faz tão somente COISA JULGADA FORMAL. Dessa forma, surgindo provas formal ou substancialmente novas, é possível o oferecimento de outra peça acusatória contra o acusado.

ATENÇÃO: a CJF é a imutabilidade da decisão dentro do processo em que foi proferida. Assim, dentro do processo em que se deu a decisão de impronúncia, esta não poderá mais ser alterada. Dessa forma, caso surja prova nova, não há reabertura do mesmo processo; instaura-se um NOVO processo.

Prova formalmente nova x prova substancialmente nova:

Prova formalmente nova: é aquela que já era conhecida, mas que ganhou nova versão. Ex.: testemunha que havia sido ameaçada e que, por isso, havia prestado depoimento falso resolve corrigir seu depoimento.

Prova substancialmente nova: é a prova inédita, que estava oculta à época da decisão. Ex.: cadáver que estava em local incerto e foi encontrado.

Art. 414, CPP:

   Art. 414.  Não se convencendo da materialidade do fato ou da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, o juiz, fundamentadamente, impronunciará o acusado. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        Parágrafo único.  Enquanto não ocorrer a extinção da punibilidade, poderá ser formulada nova denúncia ou queixa se houver prova nova. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

B. Infrações conexas

Ex.: crime de porte ilegal de arma de fogo conexo com crime de homicídio > o acusado é impronunciado no delito de homicídio; o que fazer, então, com o crime de porte de arma? Preclusa a decisão de impronúncia, os crimes conexos serão remetidos ao juízo singular competente. A impronúncia NÃO atinge os crimes conexos.

C. Despronúncia

A despronúncia é uma decisão de pronúncia transformada em impronúncia em virtude da interposição do RESE: o acusado que foi pronunciado interpõe RESE, o qual é julgado favoravelmente a ele, transformando a decisão de pronúncia em impronúncia.

Qual é juízo responsável pela despronúncia? Tanto o juízo a quo (que se retrata da decisão) quanto o juízo ad quem.

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D. Recurso cabível

Antes da Lei 11.689/08, o recurso cabível era o RESE. Hoje o recurso previsto pela Lei é a APELAÇÃO.

Assim, qualquer decisão de impronúncia publicada a partir de 09/08/08 (data em que a Lei 11.689 entrou em vigor) será recorrível via apelação.

Partes interessadas em apelar contra a decisão de impronúncia:

- MP/querelante;

- Assistente da acusação (obs.: este recurso será meramente subsidiário em relação ao do MP; o assistente somente recorre se porventura o MP não o fizer);

- Acusado.

O acusado poderia recorrer? Em tese, sim. A impronúncia faz apenas coisa julgada formal. Dessa forma, poderá haver interesse da defesa no sentido de transformar a impronúncia em absolvição sumária, que faz coisa julgada não apenas formal, mas também material.

3.2 Desclassificação

Deve se dar quando o juiz sumariante concluir que a imputação não versa sobre crime doloso contra a vida. Ex.: o juiz conclui tratar-se de homicídio culposo.

OBS.: dolo eventual envolvendo acidentes de veículos automotores > o STJ vem mantendo a competência do júri.

No júri a desclassificação somente ocorre quando muda-se a classificação de um delito doloso contra a vida para um crime que não seja doloso contra a vida. Imagine, então, que a denúncia imputou à acusada o delito do art. 123, CP (infanticídio); contudo, quando da decisão final, o juiz entendeu que a gestante não estava influenciada pelo estado puerperal e que, portanto, não se trataria do delito de infanticídio, e, sim, de homicídio. Qual será, neste caso, a decisão do juiz? A decisão, aqui, não será de desclassificação, mas de PRONÚNCIA. Dessa forma, o juiz deverá pronunciar a acusada.

OBS. 1: a desclassificação pode ser feita para crime mais grave. Ex.: homicídio simples para latrocínio.

OBS. 2: desclassificação NÃO se confunde com a desqualificação: a desqualificação é a exlcusão de qualificadoras; é uma medida de natureza excepcional, sendo somente possível quando a qualificadora se mostrar manifestamente descabida.

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A. Nova capituação legal:

Quando o juiz faz a desclassificação, deve ele fazer a nova capitulação legal? O juiz sumariante não deve fixar expressamente a nova classificação do delito, sob pena de indevido pré-julgamento do acusado.

O ideal é que o juiz diga: “diante do conjunto probatório, entendo que o acusado não agiu com animus necandi, razão pela qual desclassifico a infração”.

B. Procedimento a ser observado pelo juízo competente

Imagine que os autos do processo estão com o juiz sumariante, que resolve declassificar. Os autos, então, são remetidos para o juízo competente (juízo singular comum). A questão é: qual é o procedimento a ser observado perante este juízo competente?

- Antes da 11.689/08, havia dipositivo expresso (art. 410) determinando que a oitiva da defesa era obrigatória – quando os autos davam entrada no juízo competente, o juiz era obrigado a ouvir a defesa. Oitiva esta que era obrigatória ainda que o juiz sumariante e o juiz singular fossem a mesma pessoa (o que ocorre nos locais de Vara Única);

- Com a lei, o CPP, hoje, não prevê expressamente a oitiva da defesa. Aí surge o problema: diante do silêncio da Lei 11.689/08, continua sendo obrigatória a oitiva da defesa? Parte da doutrina entende que o silêncio da lei deve ser interpretado como um “silêncio eloquente”, sendo desnecessária a oitiva da defesa. Todavia, o ideal, de acordo com Renato Brasileiro, é dizer que a oitiva da defesa continua sendo obrigatória. O novo juízo seria obrigado a renovar a instrução por conta do princípio da identidade física do juiz e da ampla defesa (Badaró).

C. Infração conexa

Imagine que o processo que está no Tribunal do Júri contenha dois crimes: homicídio + estupro. Quando do julgamento, o juiz sumariante entende que não houve o homicídio, fazendo a desclassificação e remetendo os autos ao novo juízo competente. O que vai ser feito em relação ao crime conexo de estupro? Ele também vai automaticamente para o juízo competente? Devemos nos lembrar que as quatro decisões tomadas no final da 1ª fase não estão preocupadas com o crime conexo, mas tão somente com a imputação do crime doloso contra a vida. Portanto, havendo desclassificação, o crime conexo seguirá o mesmo caminho, a mesma sorte do delito desclassificado. Se já não há mais crime doloso contra a vida, não há mais motivos para que o juiz sumariante julgue o crime conexo.

CONCURSO: o juízo competente, assim que receber os autos, já pode julgar os dois crimes? Antes do julgamento deve o juízo competente aguardar a decisão sobre eventual RESE interposto contra a desclassificação. A depender do julgamento do RESE as coisas poderão ser alteradas: se o Tribunal der provimento ao RESE, significa que não deveria ter ocorrido a

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desclassificação; o Tribunal, neste caso, estará pronunciando o acusado. Logo, tanto a imputação desclassificada quanto o crime conexo, serão remetidos ao Júri. Já se o Tribunal negar provimento ao RESE, aí sim deverá o juízo competente julgar ambos os crimes.

D. O acusado preso

A desclassificação, por si só, NÃO acarreta a soltura do acusado preso.

        Art. 419.  Quando o juiz se convencer, em discordância com a acusação, da existência de crime diverso dos referidos no § 1o do art. 74 deste Código e não for competente para o julgamento, remeterá os autos ao juiz que o seja. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        Parágrafo único.  Remetidos os autos do processo a outro juiz, à disposição deste ficará o acusado preso. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

Lembre-se que o juízo competente, ao receber os autos, deve se manifestar fundamentadamente quanto à necessidade de manutenção da prisão: a pessoa só pode ser mantida presa por ordem do juízo competente; se este juízo se omite, a prisão torna-se ilegal, passível de relaxamento.

E. Recurso cabível

O recurso a ser interposto contra a decisão de desclassificação é o RESE (art. 581, II, CPP).

Art. 581.  Caberá recurso, no sentido estrito, da decisão, despacho ou sentença:

        II - que concluir pela incompetência do juízo;

Quem pode interpor este RESE?

- MP/querelante/assistente*;

- Acusado/defensor (pois a desclassificação pode agravar a situação do acusado).

*Há quem entenda que o assistente tem apenas interesses patrimoniais, e, portanto, não poderia interpor RESE contra a mera decisão de desclassificação. A doutrina moderna, no entanto, é no sentido de que o assistente não tem apenas interesses patrimoniais, tendo, também, intesse na justa aplicação da lei penal, e, por isso, teria sim legitimidade para a inetrposição deste RESE.

F. Conflito de competência

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Imagine que nos autos do processo haja a imputação do delito de homicídio na direção de veículo automotor praticado com dolo eventual. O juiz sumariante entende pela desclassificação do delito, pois, para ele, não haveria dolo eventual e sim culpa consciente. Contra esta decisão é interposto RESE, o qual é apreciado por uma das Câmaras do TJ, que mantém a desclassificação, negando provimento ao RESE e devolvendo os autos para o juízo competente (juízo singular comum). Pergunta-se: o juiz singular, que acabou de receber os autos, é obrigado a aceitar essa competência ou pode suscitar um conflito?

1ª corrente (Mucio, Mirabete): ao juízo recipiente não é dado suscitar um conflito negativo de competência para tentar restabelecer a competência do Tribunal do Júri, porquanto teria havido preclusão. A partir do exato momento em que os autos chegam ao juiz já teria ocorrido a preclusão. É a posição que prevalece.

2ª corrente (Ada, Nucci): ao juízo recipiente é dado suscitar o conflito, seja porque se trata de incompetência absoluta, seja porque a decisão final acerca da competência não é de uma Câmara qualquer do Tribunal, mas sim, da respectiva Câmara Especial, a quem compete apreciar os conflitos de competência. Corrente a ser usada em uma prova de Defensoria ou Magistratura.

3.3 Absolvição sumária na 1ª fase do júri

A. Introdução

Essa absolvição NÃO se confunde com aquela do procedimento comum!

Art. 415, CPP:

Art. 415.  O juiz, fundamentadamente, absolverá desde logo o acusado, quando: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        I – provada a inexistência do fato; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        II – provado não ser ele autor ou partícipe do fato; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        III – o fato não constituir infração penal; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        IV – demonstrada causa de isenção de pena ou de exclusão do crime. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        Parágrafo único.  Não se aplica o disposto no inciso IV do caput deste artigo ao caso de inimputabilidade prevista no caput do art. 26 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, salvo quando esta for a única tese defensiva. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

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Momento dessa absolvição sumária: ao final da primeira fase, ou seja, APÓS a AIJ (diferentemente da absolvição sumária do procedimento comum, a qual ocorre no início do processo).

Inimputável do art. 26, caput: pode ser absolvido sumariamente, desde que a inimputabilidade seja sua única tese defensiva. Neste caso, teremos a chamada “absolvição sumária imprópria” (imposição do cumprimento de uma medida de segurança).

Crime conexo: a absolvição sumária também abrange o crime conexo? O crime conexo NÃO é abrangido pela absolvição sumária. Após o julgamento de eventual apelação interposta contra a absolvição sumária, o crime conexo deve ser remetido ao juízo competente.

B. Natureza jurídica/coisa julgada

A absolvição sumária funciona como uma verdadeira sentença absolutória, afinal, nela, há uma efetiva análise do mérito.

Essa decisão faz coisa julgada formal e material.

C. Recurso cabível

- Antes da Lei 11.689/08 era cabível o RESE;

- Hoje o recurso cabível é a APELAÇÃO (como sabemos, trata-se de verdadeira sentença).

Legitimados:

- MP/querelante/assistente;

- Acusado/defensor – a defesa pode ter interesse em mudar o fundamento da absolvição sumária, para que a decisão faça também coisa julgada no cível, ex.: o juiz sumariante absolveu o acusado com base em uma causa excludente da culpabilidade, a qual não faz coisa julgada no cível; o acusado pode entrar com apelação, demonstrando que visa a mudar o fundamento da absolvição sumária para reconhecer a legítima defesa própria, a qual faz coisa julgada também no cível.

D. Recurso de ofício (reexame necessário)

- Antes da Lei 11.689 o recurso de ofício era obrigatório nos casos de absolvição sumária;

- Com o advento da Lei, não há necessidade de reexame necessário nos casos de absolvição sumária. De acordo com a doutrina, a Lei 11.689 teria revogado tacitamente o art. 574, II do CPP:

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        Art. 574.  Os recursos serão voluntários, excetuando-se os seguintes casos, em que deverão ser interpostos, de ofício, pelo juiz:

        II - da que absolver desde logo o réu com fundamento na existência de circunstância que exclua o crime ou isente o réu de pena, nos termos do art. 411. (revogado tacitamente)

3.4 Pronúncia

A. Introdução

O acusado deve ser pronunciado quando o juiz estiver convencido da existência do crime e de indícios suficientes de autoria.

        Art. 413.  O juiz, fundamentadamente, pronunciará o acusado, se convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

A pronúncia não significa condenação; ela deve ser compreendida como um juízo de admissibilidade da acusação de crime doloso contra a vida. A pronúncia nada mais é que a admissão, pelo juiz sumariante, para que a pessoa seja julgada pelo Júri.

A pronúncia existe, pois a decisão do Júri é imprevisível. Dessa forma, a pronúncia evita que um possível inocente seja levado ao Júri.

B. Natureza jurídica

A decisão de pronúncia é decisão interlocutória mista não terminativa.

- “Interlocutória”, pois não julga o mérito;

- “Mista”, pois encerra a primeira fase;

- “Não terminativa”, pois não põe fim ao processo.

C. Princípio aplicável no caso de dúvida

A doutrina majoritária entende que no caso da dúvida nesta fase deve ser aplicado o princípio do in dubio pro societate, devendo o juiz pronunciar o acusado.

Este entendimento, todavia, NÃO é corroborado pela lei processual penal:

        Art. 413.  O juiz, fundamentadamente, pronunciará o acusado, se convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

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Ao tratar da decisão de pronúncia o legislador é extremamente preciso, determinando que ela deve apenas ocorrer quando o juiz estiver CONVENCIDO da materialidade e de indícios suficientes de autoria/participação. Quanto à materialidade, a lei exige um juízo de CERTEZA. Ou seja, de acordo com a lei, a mera dúvida NÃO autoriza a pronúncia. Já quanto à autoria, a lei utiliza o termo “indício” como sinônimo de prova semiplena (prova de menor valor persuasivo – Antônio Magalhães Gomes Filho). Assim, em relação à autoria, a certeza é desnecessária, devendo, porém, ocorrer prova semiplena, juízo de PROBABILIDADE. Ex.: X aparece morta em seu apartamento. Uma testemunha vê Y entrando no apartamento de X logo antes do crime e saindo um pouco depois. Uma outra testemunha vê Y saindo do prédio com a blusa manchada de sangue. Claro juízo de probabilidade.

Conclusão: segundo o art. 413, mesmo por ocasião da pronúncia, continua prevalecendo o princípio do in dubio pro reo, sendo vedada a pronúncia no caso de dúvida.

Sobre o tema existem julgados nos dois sentidos: STF HC 81.646 e HC 95.068.

Na prova devemos adotar o entendimento doutrinário.

D. Fundamentação da pronúncia

A pronúncia, como toda e qualquer decisão judicial, por força da própria CRFB (art. 93, IX), deve ser fundamentada, sob pena de NULIDADE.

Não deve haver, porém, excesso na fundamentação, sob pena de caracterização da chamada “eloquência acusatória”, que é causa de nulidade absoluta da pronúncia.

O juiz sumariante não deve exagerar na pronúncia para não influenciar os jurados.

        Art. 413, § 1o  A fundamentação da pronúncia limitar-se-á à indicação da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, devendo o juiz declarar o dispositivo legal em que julgar incurso o acusado e especificar as circunstâncias qualificadoras e as causas de aumento de pena. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

STF HC 99.834: o juiz, ao pronunciar, afirmou que o acusado era o autor do delito, e o STF entendeu que, ao afirmar a autoria, o juiz cometeu a eloquência acusatória, anulando, assim, o processo.

STF HC 96.123: neste julgado, o Min. Marco Aurélio chama atenção para o inciso I do art. 478:

Art. 478.  Durante os debates as partes não poderão, sob pena de nulidade, fazer referências: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        I – à decisão de pronúncia, às decisões posteriores que julgaram admissível a acusação ou à determinação do uso de algemas como argumento de autoridade que beneficiem ou prejudiquem o acusado; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

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Antes da reforma legislativa, era muito comum que o promotor fizesse, durante os debates, a leitura da pronúncia para tentar convencer os jurados. A nova lei passou a prever que não é mais possível, durante os debates, fazer referência à pronúncia como argumento de autoridade para influenciar no convencimento dos jurados.

O Min. Marco Aurélio diz, neste julgado, que, com a mudança legislativa, o promotor já não pode mais ler a pronúncia, e, portanto, não há mais qualquer motivo para se declarar a nulidade da pronúncia nos casos de eloquência acusatória. Na sua opinião, a eloquência acusatória já não seria mais causa de nulidade.

Essa posição, porém, não é acertada. Parece que o Ministro teria se esquecido de um outro artigo, qual seja, o art. 472, p.ú. do CPP, que prevê que o jurado, imediatamente após prestar o compromisso, recebe cópia da pronúncia. Dessa forma, ainda que a pronúncia não seja lida durante os debates, o jurado a ela tem acesso. Portanto, um eventual excesso constante da pronúncia continua podendo influir no convencimento dos jurados.

A eloquência acusatória é causa de nulidade absoluta ou relativa? Nos manuais, escritos normalmente por promotores, encontramos o entendimento de que a nulidade seria relativa. Todavia, devemos entender que essa nulidade é ABSOLUTA, vez que é impossível provar qual o grau de influência que a leitura da pronúncia exerceu no jurado (que não fundamenta seu voto); é impossível mensurar o prejuízo causado pela eloquência acusatória.

Reconhecida a eloquência, o que fazer? Cuidado com o REsp 982.033, no qual o STJ entendeu pela eloquência acusatória, mas, ao invés de anular o processo, determinou o desentranhamento da pronúncia, ficando envelopada junto aos autos (para que o jurado não tivesse com ela qualquer contato). É óbvio que a decisão foi errada! O STF foi chamado a se pronunciar em relação a essa decisão do STJ, e, no HC 103.037, decidiu que esse desentranhamento NÃO pode ser feito; uma vez reconhecida a eloquência acusatória, a consequência será a anulação da pronúncia.

E. Conteúdo da pronúncia

- O juiz deve fazer a classificação do fato delituoso, indicando o artigo no qual o acusado está incurso;

- O juiz deve, também, fazer menção ao tipo penal por extensão, ex.: tentativa – art. 14, II, CP, omissão penalmente relevante (ex.: mãe que deixa de alimentar o filho) – art. 13, §2º, CP, concurso de pessoas – art. 29, CP;

- O juiz deve, ainda, fazer menção às qualificadoras e causas de aumento de pena.

NÃO deve constar da pronúncia:

- Causas de diminuição de pena, salvo a tentativa;

- Agravantes e atenuantes;

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- Concurso de crimes.

A ideia é simples: todas essas matéria podem ser sustentadas em plenário do Júri. Além disso, as agravantes e o concurso de crime são matérias do Juiz Presidente.

F. Constatação pelo juiz sumariante do envolvimento de outras pessoas

Art. 417, CPP:

Art. 417.  Se houver indícios de autoria ou de participação de outras pessoas não incluídas na acusação, o juiz, ao pronunciar ou impronunciar o acusado, determinará o retorno dos autos ao Ministério Público, por 15 (quinze) dias, aplicável, no que couber, o art. 80 deste Código.

O art. 417, CPP possui uma impropriedade técnica: o juiz abre vista dos autos ao MP 15 dias antes de proferir a decisão.

O MP, se constatar o envolvimento de outras pessoas, tem duas opções:

1ª) Aditamento da denúncia para incluir o coautor ou partícipe;

2ª) Oferecerecimento de nova denúncia, com a consequente separação dos processos.

Pode ser que o acusado que está sendo processado já esteja preso, então o aditamento retrocederia, podendo causar um excesso de prazo. Assim, a depender do caso concreto, e principalmente quanto tiver um acusado preso, a melhor opção é oferecer nova denúncia.

Art. 80, CPP – separação dos processos:

Art. 80.  Será facultativa a separação dos processos quando as infrações tiverem sido praticadas em circunstâncias de tempo ou de lugar diferentes, ou, quando pelo excessivo número de acusados e para não Ihes prolongar a prisão provisória, ou por outro motivo relevante, o juiz reputar conveniente a separação.

G. Efeitos da pronúncia

- Submissão do acusado a julgamento perante o Tribunal do Júri;

- Limitação da acusação em Plenário (correlação entre pronúncia e quesitação);

Se o acusado foi pronunciado por homicídio simples, por exemplo, na quesitação os jurados serão perguntados apenas sobre o homicídio simples; o MP não pode querer, em Plenário, incluir uma qualificadora.

- Preclusão das nulidades relativas não arguidas até a pronúncia;

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Ao contrário das nulidades absolutas, que podem ser arguidas a qualquer momento, as nulidades relativas devem ser arguidas oportunamente. Todas as nulidades relativas não arguidas até a pronúncia irão, pois, precluir.

        Art. 571.  As nulidades deverão ser argüidas:

        I - as da instrução criminal dos processos da competência do júri, nos prazos a que se refere o art. 406; (alegações orais)

- Interrupção da prescrição, ainda que haja posterior desclassificação pelos jurados;

A pronúncia é uma das causas interruptivas da prescrição, prevista no CP. Há uma preocupação excessiva do legislador quanto aos crimes dolosos contra a vida: tanto a pronúncia e quanto a decisão confirmatória de pronúncia interrompem a prescrição.

Sobre o tema: súmula 191, STJ:

- Preclusão da pronúncia e sua imodificabilidade (princípio da imodificabilidade da pronúncia);

Operada a preclusão da decisão de pronúncia esta não mais poderá ser alterada, salvo na hipótese de circunstâncias supervenientes que alterem a classificação do crime. Ou seja, a partir do momento em que não couberem mais recursos contra a decisão de pronúncia, esta não mais poderá ser modificada (exceto pela superveniência de novas circunstâncias fáticas). Ex.: o juiz pronunciou o acusado por homicídio simples c/c tentativa. Depois da preclusão da pronúncia, a vítima morre. Com a juntada da certidão de óbito nos autos, o caminho natural é que o juiz determine vista ao MP, que irá aditar a denúncia (homicídio consumado). Passa-se, então, à oitiva da defesa. Após, realiza-se uma nova instrução (vez que há nova imputação). E, finalmente, o juiz sumariante poderá proferir uma nova decisão de pronúncia.

CONCURSO: e se, no exemplo acima, a morte da vítima ocorrer no dia do julgamento? Haverá a dissolução do Conselho de Sentença (não haverá julgamento, vez que surgiu um fato novo que inviabiliza o julgamento naquele dia). Dissolvido o Conselho, segue-se o procedimento visto no exemplo acima.

E se a morte da vítima se der após o julgamento? Neste caso não há mais nada a ser feito. Processar novamente o réu é admitir bis in idem.

Art. 421, §1º:

        Art. 421.  Preclusa a decisão de pronúncia, os autos serão encaminhados ao juiz presidente do Tribunal do Júri. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        § 1o  Ainda que preclusa a decisão de pronúncia, havendo circunstância superveniente que altere a classificação do crime, o juiz ordenará a remessa dos autos ao Ministério Público. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

- Decretação da prisão preventiva ou de medidas cautelares diversas da prisão.

Neste ponto vale a pena atentar a algumas questões:119

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1ª) A prisão preventiva é automática? Pronunciado, o réu terá automaticamente sua prisão? NÃO! Hoje não existe prisão cautelar obrigatória ou automática!

Antes da Lei 11.689/08, a prisão preventiva era obrigatória se o acusado fosse reincidente ou tivesse maus antecedentes. A lei trabalhava com a ideia de presunção de fuga.

Hoje, pós-reforma, a prisão somente pode ser decretada ou mantida FUNDAMENTADAMENTE, se presentes seus pressupostos legais.

A partir de 2011, isso vale não só para a preventiva, mas também para as medidas cautelares diversas da prisão. Isto é: quando da pronúncia, para que seja decretada (ou mantida) uma medida cautelar diversa de prisão é necessário que estejam presentes os requisitos legais, e, além disso, que a decisão judicial seja devidamente fundamentada.

Art. 413, §3º, CPP:

        § 3o  O juiz decidirá, motivadamente, no caso de manutenção, revogação ou substituição da prisão ou medida restritiva de liberdade anteriormente decretada e, tratando-se de acusado solto, sobre a necessidade da decretação da prisão ou imposição de quaisquer das medidas previstas no Título IX do Livro I deste Código. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

2ª) Como fica a situação daquele que já se encontrava preso preventivamente? E daquele que respondia ao processo solto?

Se a pessoa permaneceu presa durante toda a primeira fase, é porque muito provavelmente o juiz entendeu que havia motivos para mantê-lo preso (não faz lógica que o acusado, que se encontrava preso durante todo o processo, seja solto exatamente quando da pronúncia). É necessário, contudo, que o juiz, quando da decisão de pronúncia, RENOVE a fundamentação da prisão.

Já se o réu estava solto, a ideia é que ele deva ser mantido solto. Pode ocorrer, no entanto, que, no momento da pronúncia, surja algum motivo que autorize a decretação da preventiva. Ex.: na audiência, as testemunhas ouvidas afirmam que o acusado estaria ameaçando-as. Neste caso, o juiz, fundamentadamente, deverá decretar a prisão.

Ou seja:

Se o acusado estava preso por ocasião da pronúncia, isso significa dizer que o juiz entendeu que estavam presentes os pressupostos da preventiva. Logo, esta prisão deve ser mantida, por meio de decisão fundamentada, salvo se desaparecerem seus pressupostos.

Se o acusado estava em liberdade por ocasião da pronúncia, isso significa dizer que o juiz entendeu que não estavam presentes os pressupostos da preventiva. Logo, o acusado deve ser mantido em liberdade, salvo se surgir alguma hipótese que autorize sua prisão preventiva.

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H. Intimação do acusado acerca da pronúncia

A intimação do acusado acerca da pronúncia é OBRIGATÓRIA, vez que, pronunciado, ele poderá exercer seu direito recursal (a autodefesa, no Processo Penal, é permitida – o réu pode interpor recurso, necessitando de advogado apenas para apresentar suas razões).

Como é feita essa intimação?

Antes da Lei 11.689/08 se o crime fosse inafiançável, não era possível a intimação por edital. Problema: quando o réu não era encontrado não podia ser intimado, o que dava origem à chamada “crise de instância” (o processo ficava paralisado, porém a prescrição não era suspensa). O juiz, nesse caso, decretava a prisão preventiva do acusado, por estar obstando o regular andamento do processo.

Depois da Lei 11.689/08, a REGRA continua sendo a intimação pessoal. No entanto, ocorrendo a hipótese de o réu não ser encontrado, passa a ser possível a intimação por edital, pouco importando a natureza do delito (afiançável ou inafiançável).

Art. 420, p.ú.:

        Art. 420.  A intimação da decisão de pronúncia será feita: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        I – pessoalmente ao acusado, ao defensor nomeado e ao Ministério Público; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        II – ao defensor constituído, ao (advogado do )querelante e ao (advogado do ) assistente do Ministério Público, na forma do disposto no § 1o do art. 370 deste Código. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008) (por publicação)

        Parágrafo único.  Será intimado por edital o acusado solto que não for encontrado. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

Três informações importantes sobre este artigo:

- Qual é o prazo deste edital? A lei é omissa, por isso, usamos o prazo de 15 dias (único prazo sobre edital expresso no CPP – art. 361).

        Art. 361.  Se o réu não for encontrado, será citado por edital, com o prazo de 15 (quinze) dias.

O edital deverá ser afixado e deixado por 15 dias, suspendendo-se, por este período, o processo.

- Essa mudança teve aplicação imediata, inclusive aos processos que estavam paralisados (todos os processos em “crise de instância” tiveram retomado seu curso normal).

Cuidado com os crimes cometidos antes da vigência da Lei 9.271/96: essa lei conferiu nova redação ao art. 366 do CPP, que prevê, hoje, que se o acusado, citado por edital, não comparecer nem constituir defensor, haverá a suspensão do processo e da prescrição.

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Se o crime foi cometido antes dessa lei, o art. 366 não é aplicável (a suspensão da prescrição é uma norma penal de natureza mais gravosa e que, portanto, não retroage). Assim, se o acusado, hoje, foi intimado da pronúncia por edital, isso significa que antes ele foi intimado pessoalmente (claro, pois se houvesse sido intimado por edital o processo estaria suspenso, nos termos do art. 366).

Portanto, para os crimes anteriories à Lei 9.271 tanto a doutrina quanto a jurisprudência entendem que, como não se aplica o art. 366, impossível também a intimação da pronúncia por edital, sob pena de violação à ampla defesa: o acusado, neste caso, terá sido intimado duas vezes por edital e poderá não ter tomado conhecimento de nenhuma das duas intimações. Sobre o tema: STJ HC 172.382.

I. Recurso adequado contra a pronúncia

O recurso cabível contra a pronúncia é o RESE:

        Art. 581.  Caberá recurso, no sentido estrito, da decisão, despacho ou sentença:

         IV – que pronunciar o réu; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

Letigimidade para a interposição do RESE:

- Acusado/defensor;

- MP (nos casos em que o juiz pronuncia o acusado por crime diverso e mais brando que aquele descrito na denúncia);

Em relação ao assistente da acusação:

- Para a doutrina, o assistente NÃO pode recorrer contra a pronúncia;

- Para o STF, contudo, o assistente é legitimado para recorrer da decisão da pronúncia. Nesse sentido: STF HC 84.022 (neste julgado, o assistente entrou com RESE para incluir qualificadoras na prónúncia).

OBS.: no caso do Júri, a introdução de qualificadoras é muito importante para a acusação, vez que as pessoas têm tendência de “clemência” (a ideia da acusação, aqui, é “denunciar no mais para ser pronunciado no menos”).

J. Desaforamento

- Conceito:

Deve ser compreendido como o deslocamento da competência territorial de uma Comarca para outra.

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No CPP o desaforamento é um instituto EXLCUSIVO do júri. Além disso, o que é desaforado é apenas o julgamento pelo júri (não atingindo a primeira fase).

No CPPM o desaforamento pode ocorrer em qualquer delito. Ex.: crime de Marinha cometido em Minas Gerais. Como o contingente da Marinha é muito pequeno em Minas, poderá haver o desaforamento, para, por exemplo, o Rio.

- Natureza jurídica:

Trata-se de verdadeira decisão de natureza judicial que altera a competência. NÃO é uma medida correicional (não cabe à Corregedoria, e sim à turma ou Câmara do TJ ou TRF)!

Art. 427, §1º:

        § 1o  O pedido de desaforamento será distribuído imediatamente e terá preferência de julgamento na Câmara ou Turma competente. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

- Legitimidade para requerimento do desaforamento:

MP;

Defesa;

Querelante;

Assistente da acusação;

Juiz, salvo na hipótese de excesso de prazo.

É obrigatória a oitiva da defesa!

Súmula 712 do STF:

- Momento para o desaforamento:

Após a preclusão da pronúncia. Afinal, se já não cabe mais recurso contra a pronúncia, o próximo passo será o julgamento pelo júri.

CONCURSO: é possível desaforamento depois do julgamento? NÃO, salvo se concorrerem duas circunstâncias: anulação do julgamento + ocorrência de fato que dê ensejo a desaforamento durante ou após o julgamento anulado.

Art. 427, §4º, CPP:

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        § 4o  Na pendência de recurso contra a decisão de pronúncia ou quando efetivado o julgamento, não se admitirá o pedido de desaforamento, salvo, nesta última hipótese, quanto a fato ocorrido durante ou após a realização de julgamento anulado. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

O que o artigo quer dizer é:

Em regra, o pedido de desaforamento deverá ser feito após a decisão de pronúncia;

Quando já efetivado o julgamento não será permitido o desaforamento SALVO quanto a fato ocorrido durante ou após a realização de julgamento anulado.

- Motivos que podem dar ensejo ao desaforamento:

1º) Interesse de ordem pública;

Geralmente, liga-se à paz e tranquilidade do julgamento (ex.: para garantir a incolumidade das testemunhas). STJ HC 85.707.

2º) Dúvida sobre a imparcialidade dos jurados;

A imparcialidade pode ocorrer tanto no sentido de querer condenar, quanto de querer absolver. Ex.: julgamento, em uma cidade de interior, de um ex-prefeito, no qual os jurados, em sua maioria, eram funcionários públicos por ele nomeados.

3º) Falta de segurança pessoal do acusado;

Ex.: risco de linchamento.

4º) Não realização do julgamento no prazo de seis meses após a preclusão da pronúncia, desde que a demora não tenha sido provocada pela defesa.

        Art. 428.  O desaforamento também poderá ser determinado, em razão do comprovado excesso de serviço, ouvidos o juiz presidente e a parte contrária, se o julgamento não puder ser realizado no prazo de 6 (seis) meses, contado do trânsito em julgado da decisão de pronúncia. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

CONCURSO: o que é aceleração de julgamento? Uma das causas de desaforamento é se, havendo excesso de serviço, o julgamento não for feito dentro de seis meses da preclusão da decisão de pronúncia. A aceleração é o contrário disso: não havendo excesso de serviço na Comarca poderá o Tribunal determinar a realização imediata do julgamento.

Art. 428, CPP:

        § 2o  Não havendo excesso de serviço ou existência de processos aguardando julgamento em quantidade que ultrapasse a possibilidade de apreciação pelo Tribunal do Júri, nas reuniões periódicas previstas para o exercício, o acusado poderá requerer ao Tribunal que determine a imediata realização do julgamento. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

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Cuidado: o §2º diz que apenas o acusado poderia requerer a aceleração do julgamento. No entanto, todas as partes têm interesse na aceleração (a razoável duração do processo não é uma garantia exclusiva do acusado). Portanto, a aceleração pode ser requerida também pelo MP, querelante e assistente da acusação.

Além disso, essa aceleração também vem sendo utilizada em processos envolvendo acusados presos.

Ex.: um estuprador está preso há três anos e sequer foi julgado na 1ª instância. A defesa pede excesso de prazo e o Desembargador, no HC, dá a ordem não para que o réu seja posto em liberdade (apesar do evidente excesso de prazo), mas sim para que ele seja imediatamente julgado.

- Crimes conexos e coautores:

O que acontece com os crimes conexos e com os coautores no momento do desaforamento? O julgamento dos crimes conexos e dos coautores também serão desaforados.

- Comarca para a qual o julgamento será desaforado:

Para qual Comarca o processo será desaforado? O julgamento será deslocado para outra Comarca da mesma região, onde não estejam presentes os motivos que acarretaram o desaforamento.

É possível o desaforamento para outro estado da federação? Na Justiça Estadual NÃO é possível o desaforamento para outro estado (um TJ não pode mandar processos para outro). Todavia, se o júri estiver sendo realizado na Justiça Federal, poderá ocorrer o desaforamento para outro estado, desde que localizado dentro da mesma região do estado de origem.

- Efeito suspensivo:

Como visto, o desaforamento é julgado por uma Turma ou Câmara. O Relator, verificando a verossimilhança das alegações e o periculum in mora, poderá determinar, fundamentadamente, a suspensão do julgamento pelo júri.

O desaforamento é, portanto, dotado de efeito suspensivo.

Art. 427, CPP:

        § 2o  Sendo relevantes os motivos alegados, o relator poderá determinar, fundamentadamente, a suspensão do julgamento pelo júri. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

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- Recurso adequado contra o desaforamento:

Cabe RESE?

O RESE só é cabível contra decisão proferida por juiz de primeira instância. Como o desaforamento é apreciado pelo Tribunal, ele NÃO será cabível.

O desaforamento é IRRECORRÍVEL. Todavia, os Tribunais Superiores admitem a utilização, em havendo risco à liberdade de locomoção, do habeas corpus.

Atenção: indeferido o pedido de desaforamento, como essa decisão é baseada na cláusula rebus sic stantibus, nada impede novo pedido. A decisão de indeferimento do desaforamento não transita em julgado. Portanto, alteradas as circunstâncias, poderá haver novo pedido.

Art. 110, CPPM:

Renovação do pedido

        Art. 110. O pedido de desaforamento, embora denegado, poderá ser renovado se o justificar motivo superveniente.

- Reaforamento:

É o retorno do processo desaforado à Comarca de origem.

Isso é possível? Esse reaforamento NÃO é admitido, mesmo diante do desaparecimento das causas do desaforamento. Isso, no entanto, não impede novo desaforamento para Comarca distinta.

K. Preparação do processo para julgamento em Plenário

Após a preclusão da pronúncia, o próximo passo é a preparação para o julgamento em Plenário. Essa preparação marca o ínicio da segunda fase do procedimento do júri.

Art. 422, CPP:

Seção IIIDa Preparação do Processo para Julgamento em Plenário(Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        Art. 422.  Ao receber os autos, o presidente do Tribunal do Júri determinará a intimação do órgão do Ministério Público ou do querelante, no caso de queixa, e do defensor, para, no prazo de 5 (cinco) dias, apresentarem rol de testemunhas que irão depor em plenário, até o máximo de 5 (cinco), oportunidade em que poderão juntar documentos e requerer diligência. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

Nesse preparação para julgamento haverá a intimação do:

- MP;

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- Querelante;

- Defensor;

- Advogado do assistente (apesar de não referida no artigo, também será necessária sua intimação).

Qual é o objetivo dessa intimação?

Esta intimação serve para que as partes, em 5 dias, requeiram provas, apresentando seu rol de testemunhas (em até cinco).

OBS.: o assistente também pode arrolar testemunhas, desde que respeitado o limite máximo de testemunhas da acusação. Ex.: MP apresenta três testemunhas e assistente apresenta duas. Se o promotor, contudo, já tiver arrolado as cinco testemunhas, a única possibilidade que o assistente tem é indicar testemunha para o juízo (o juiz, no Processo Penal, pode ouvir testemunhas de sua escolha como testemunhas do juízo).

Como esse rol deve ser apresentado?

Na apresentação das testemunhas, é aconselhável a presença da chamada “cláusula de imprescindibilidade”: se o advogado requerer a intimação por mandado e indicar o endereço da testemunha e ela NÃO comparecer ao julgamento, este deverá ser adiado.

Art. 461, CPP:

        Art. 461.  O julgamento não será adiado se a testemunha deixar de comparecer, salvo se uma das partes tiver requerido a sua intimação por mandado, na oportunidade de que trata o art. 422 deste Código, declarando não prescindir do depoimento e indicando a sua localização. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

Em regra, o julgamento NÃO será adiado pela ausência de uma testemunha. Com a cláusula de imprescindibilidade, no entanto, o julgamento poderá ser adiado.

4. SEGUNDA FASE DO PROCEDIMENTO DO JÚRI - JUDICIUM CAUSAE

4.1 Ordenamento do processo

Art. 423.  Deliberando sobre os requerimentos de provas a serem produzidas ou exibidas no plenário do júri, e adotadas as providências devidas, o juiz presidente: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        I – ordenará as diligências necessárias para sanar qualquer nulidade ou esclarecer fato que interesse ao julgamento da causa; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

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        II – fará relatório sucinto do processo, determinando sua inclusão em pauta da reunião do Tribunal do Júri. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

 

Trata-se de despacho saneador do Juiz-Presidente, que prepara o processo (coloca o processo “em ordem”) para julgamento em plenário.

O relatório (em amarelo) nada mais é que um resumo imparcial dos principais atos processuais. Esse relatório será entregue aos jurados - por isso é que deve ser feito de maneira imparcial (para que não haja qualquer influência na hora da votação).

Art. 472, p.ú.:

   Art. 472.  Formado o Conselho de Sentença, o presidente, levantando-se, e, com ele, todos os presentes, fará aos jurados a seguinte exortação: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        Em nome da lei, concito-vos a examinar esta causa com imparcialidade e a proferir a vossa decisão de acordo com a vossa consciência e os ditames da justiça.

        Os jurados, nominalmente chamados pelo presidente, responderão:

        Assim o prometo.

        Parágrafo único.  O jurado, em seguida, receberá cópias da pronúncia ou, se for o caso, das decisões posteriores que julgaram admissível a acusação e do relatório do processo. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

A. Ordem do julgamento

O art. 429, CPP traz uma ordem de julgamento a ser respeitada, salvo havendo motivo relevante:

        Art. 429.  Salvo motivo relevante que autorize alteração na ordem dos julgamentos, terão preferência: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        I – os acusados presos; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        II – dentre os acusados presos, aqueles que estiverem há mais tempo na prisão; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        III – em igualdade de condições, os precedentemente pronunciados. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

B. Habilitação do assistente no júri

Em regra, o assistente da acusação pode se habilitar a qualquer momento do processo. Sobre o assunto:

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        Art. 268.  Em todos os termos da ação pública, poderá intervir, como assistente do Ministério Público, o ofendido ou seu representante legal, ou, na falta, qualquer das pessoas mencionadas no Art. 31. (CADI)

EXCEÇÃO: querendo atuar no plenário do júri, deve o assistente requerer sua habilitação com 5 dias de antecedência.

        Art. 430.  O assistente somente será admitido se tiver requerido sua habilitação até 5 (cinco) dias antes da data da sessão na qual pretenda atuar. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

4.2 Composição do Tribunal do Júri

O Tribunal do júri será composto pelo Juiz-Presidente + 25 jurados, 7 dos quais irão compor o Conselho de Sentença.

CONCURSO: e o MP? Não integra o Tribunal do Júri? O MP, apesar de atuar no Tribunal do Júri, dele não faz parte. O mesmo ocorre em relação ao defensor.

A. Requisitos dos jurados

Art. 436, CPP:

Art. 436.  O serviço do júri é obrigatório. O alistamento compreenderá os cidadãos maiores de 18 (dezoito) anos de notória idoneidade. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        § 1o  Nenhum cidadão poderá ser excluído dos trabalhos do júri ou deixar de ser alistado em razão de cor ou etnia, raça, credo, sexo, profissão, classe social ou econômica, origem ou grau de instrução. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        § 2o  A recusa injustificada ao serviço do júri acarretará multa no valor de 1 (um) a 10 (dez) salários mínimos, a critério do juiz, de acordo com a condição econômica do jurado. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

Para ser jurado é necessário, primeiramente, ser cidadão brasileiro (nato ou naturalizado). Um segundo requisito é maioridade. Em terceiro, temos a notória idoneidade.

Não há idade limite para atuar no júri. Todavia, o cidadão maior de 70 anos, querendo, poderá requerer sua dispensa do serviço do júri. Senão vejamos: art. 437, IX, CPP:

        Art. 437.  Estão isentos do serviço do júri: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        IX – os cidadãos maiores de 70 (setenta) anos que requeiram sua dispensa; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

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O jurado, ainda, deverá residir na Comarca onde será realizado o julgamento. Apesar de a lei não dizer isso de forma expressa, este é um requisito que se extrai do sistema, vez que a ideia do júri é propiciar o julgamento do acusado por seus pares.

O jurado precisa ser alfabetizado? Sim! Como vimos acima, o juiz elabora um relatório e o entrega aos jurados que, para poder analisá-lo, por óbvio, deverão ser alfabetizados. Além disso, os jurados recebem cópias da pronúncia, de documentos importantes etc., e, ainda, votam por meio de cédulas escritas.

Cuidado com a interpretação do art. 436, CPP:

        § 1o  Nenhum cidadão poderá ser excluído dos trabalhos do júri ou deixar de ser alistado em razão de cor ou etnia, raça, credo, sexo, profissão, classe social ou econômica, origem ou grau de instrução. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

“Grau de instrução” refere-se à escolaridade. O que o artigo quer dizer é que é desnecessária a formação escolar, sendo imprescindível, entretanto, a alfabetização.

CONCURSO: podemos ter jurados surdos-mudos? Devemos lembrar que no júri vigora plenamente a oralidade. Ademais, sendo o jurado surdo, poderia haver uma “manipulação” dos fatos pelo intéprete, comprometendo o sigilo das votações.

Ou seja: apesar de a lei ser omissa, a doutrina entende impossível ser o jurado cego, surdo ou mudo.

Antes da reforma de 2008, tínhamos a figura do “jurado profissional”, que era aquela pessoa que vivia de ser jurado. A reforma de 2008 eliminou essa figura, assegurando, assim, uma participação mais democrática e imparcial no júri:

Art. 426, §4º:

        § 4o  O jurado que tiver integrado o Conselho de Sentença nos 12 (doze) meses que antecederem à publicação da lista geral fica dela excluído. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

B. Impugnação da lista dos jurados

Qual o instrumento a ser utilizado para impugnar a lista dos jurados? Sobre o tema, temos discussão doutrinária:

1ª corrente (majoritária): segundo parte da doutrina, utiliza-se, neste caso, o RESE (art. 581, XIV):

        Art. 581.  Caberá recurso, no sentido estrito, da decisão, despacho ou sentença:

        XIV - que incluir jurado na lista geral ou desta o excluir;

Cuidado que este RESE possui duas peculiaridades:

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- Possui prazo diferenciado, qual seja, 20 dias;

- Dever ser dirigido ao Presidente do Tribunal.

2ª corrente: com base no art. 426, §1º, outra parte da doutrina entende que o recurso cabível é a reclamação de qualquer do povo ao Juiz-Presidente do Tribunal do Júri.

Art. 426, §1º:

        Art. 426.  A lista geral dos jurados, com indicação das respectivas profissões, será publicada pela imprensa até o dia 10 de outubro de cada ano e divulgada em editais afixados à porta do Tribunal do Júri. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        § 1o  A lista poderá ser alterada, de ofício ou mediante reclamação de qualquer do povo ao juiz presidente até o dia 10 de novembro, data de sua publicação definitiva. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

Ou seja: há quem entenda que este §1º teria revogado o inciso XIV do art. 581, pois teria previsto um recurso específico para a impugnação da lista dos jurados.

C. Recusa injustificada ao serviço do júri

Em caso de recusa injustificada, a lei prevê pagamento de MULTA.

Art. 436, §2º, CPP:

        § 2o  A recusa injustificada ao serviço do júri acarretará multa no valor de 1 (um) a 10 (dez) salários mínimos, a critério do juiz, de acordo com a condição econômica do jurado. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

Art. 442, CPP:

        Art. 442.  Ao jurado que, sem causa legítima, deixar de comparecer no dia marcado para a sessão ou retirar-se antes de ser dispensado pelo presidente será aplicada multa de 1 (um) a 10 (dez) salários mínimos, a critério do juiz, de acordo com a sua condição econômica. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

A lei prevê que a recusa injustificada acarretará em multa. Pergunta-se: é possível, então, que o jurado seja responsabilizado criminalmente pelo delito de desobediência? Há um entendimento muito firme, principalmente na jurisprudência, segundo o qual quando a lei prevê determinada sanção (como no caso ora sob análise), mas não ressalva criminalmente a possibilidade de desobediência, não há que se falar em tal crime.

Ex.: ao tratar das testemunhas, o art. 219 do CPP deixa claro a possibilidade de condenação pelo delito de desobediência. Nesse caso, poderá a testemunha responder criminalmente por este crime.

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        Art. 219. O juiz poderá aplicar à testemunha faltosa a multa prevista no art. 453, sem prejuízo do processo penal por crime de desobediência, e condená-la ao pagamento das custas da diligência. (Redação dada pela Lei nº 6.416, de 24.5.1977)

Já cuidando dos jurados a lei não fez qualquer ressalva. Ou seja: NÃO é possível a responsabilização criminal do jurado faltoso pelo crime de deobediência.

D. Escusa de consciência

Art. 5º, VIII, CRFB:

VIII - ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei;

Aquele convocado para ser jurado que alegar escusa de consciência deverá cumprir prestação alternativa.

Antes da Lei 11.689/08 Depois da Lei 11.689/08

Não havia previsão legal de prestação alternativa.

Se a pessoa se recusasse ao serviço do júri por conta de convicções pessoais, ela acabava não sofrendo qualquer consequência.

Previsão de prestação alternativa, que consta do art. 438, §1º, CPP.

        Art. 438.  A recusa ao serviço do júri fundada em convicção religiosa, filosófica ou política importará no dever de prestar serviço alternativo, sob pena de suspensão dos direitos políticos, enquanto não prestar o serviço imposto. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        § 1o  Entende-se por serviço alternativo o exercício de atividades de caráter administrativo, assistencial, filantrópico ou mesmo produtivo, no Poder Judiciário, na Defensoria Pública, no Ministério Público ou em entidade conveniada para esses fins. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

4.3 Sessão de julgamento

A. Ausências injustificadas

A.1 Ausência do MP:

Antes da Lei 11.689/08 Depois da Lei 11.689/08

A lei previa a nomeação de um promotor ad A nomeação de promotor ad hoc não foi

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Page 133: Processo Penal- FBN

hoc. recepcionada pela CRFB, que prevê que as funções do MP só podem ser desempenhadas pelos integrantes da carreira.

Diante da ausência injustificada do promotor, portanto, a Lei 11.689/08 determina que deve ser redesignado o julgamento.

        Art. 455.  Se o Ministério Público não comparecer, o juiz presidente adiará o julgamento para o primeiro dia desimpedido da mesma reunião, cientificadas as partes e as testemunhas. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        Parágrafo único.  Se a ausência não for justificada, o fato será imediatamente comunicado ao Procurador-Geral de Justiça com a data designada para a nova sessão. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

OBS.: sessão de julgamento não se confunde com reunião: reunião é o período do ano no qual o júri se reúne para as sessões de julgamento.

A.2 Ausência do advogado de defesa:

- O julgamento não pode ser realizado sem a defesa técnica, sob pena de NULIDADE ABSOLUTA (súmula 523, STF);

- Ausente o advogado injustificadamente, deve ser designada nova data para o julgamento (observado, pelo menos, o prazo de 10 dias de antecedência – isso para permitir que tanto o novo advogado quando a Defensoria se preparem);

- O acusado deve ser intimado para constituir novo advogado (respeitando-se, assim, o direito que tem o acusado a escolher seu defensor técnico); e

- A Defensoria Pública já deve ser intimada para assumir a defesa do acusado na hipótese de nova ausência do advogado.

      Art. 456.  Se a falta, sem escusa legítima, for do advogado do acusado, e se outro não for por este constituído, o fato será imediatamente comunicado ao presidente da seccional da Ordem dos Advogados do Brasil, com a data designada para a nova sessão. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        § 1o  Não havendo escusa legítima, o julgamento será adiado somente uma vez, devendo o acusado ser julgado quando chamado novamente. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        § 2o  Na hipótese do § 1o deste artigo, o juiz intimará a Defensoria Pública para o novo julgamento, que será adiado para o primeiro dia desimpedido, observado o prazo mínimo de 10 (dez) dias. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

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A.3 Acusado solto:

Antes da Lei 11.689/08 Depois da Lei 11.689/08

Se o crime fosse inafiançável, era indispensável a presença do acusado.

Se o acusado, regularmente intimado, deixar de comparecer, o julgamento deverá ser realizado, pouco importando a natureza do crime.

Art. 457, CPP:

Art. 457.  O julgamento não será adiado pelo não comparecimento do acusado solto, do assistente ou do advogado do querelante, que tiver sido regularmente intimado. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

A.4 Acusado preso:

O acusado preso também tem direito de presença ao julgamento. Sendo assim, o Poder Público deve providenciar seu deslocamento e escolta.

Se, porém, o acusado preso não quiser comparecer ao julgamento (pouco importando a natureza do delito), poderá subscrever pedido nesse sentido, em conjunto com seu advogado.

Art. 457, §2º, CPP:

        § 2o  Se o acusado preso não for conduzido, o julgamento será adiado para o primeiro dia desimpedido da mesma reunião, salvo se houver pedido de dispensa de comparecimento subscrito por ele e seu defensor. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

A.5 Ausência do advogado do assistente:

Não é causa de adiamento da sessão:

Art. 457.  O julgamento não será adiado pelo não comparecimento do acusado solto, do assistente ou do advogado do querelante, que tiver sido regularmente intimado. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

O artigo está mal redigido. Na verdade, onde se lê “assistente” deve-se ler “advogado do assistente” (a lei não está preocupada com a presença do assistente, que não tem capacidade postulatória, mas com a presença de seu advogado).

A.6 Ausência do querelante:

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- Verificada a ausência do querelante na ação penal privada subsidiária da pública, o MP reassume o processo como parte principal (é a chamada “ação penal indireta”). LFG faz uma ressalva: pode ser que o Promotor, por acreditar no comparecimento do advogado do querelante, tenha vindo para a sessão de julgamento despreparado. Neste caso, de acordo com LFG, poderia haver um adiamento.

- Tratando-se de litisconsórcio ativo entre o MP e o querelante (ex.: delito de homicídio em concurso com crime contra a honra), a ausência do querelante acarreta na falta de pedido de condenação, o que causa perempção e consequente extinção da punibilidade (em relação ao crime de ação penal privada).

A.7 Ausência de testemunha:

- Se a testemunha não foi arrolada com a cláusula de imprescindibilidade, o julgamento será realizado normalmente.

- Se, porém, a testemunha foi arrolada com a cláusula de imprescindibilidade, requerendo a parte sua intimação por mandado com a indicação do endereço:

1º O juiz deverá determinar a condução coercitiva da testemunha (sem adiamento do julgamento). Em grandes cidades essa é uma hipótese difícil de ser executada, devido ao tempo de deslocamento que será demandado;

2º Não havendo como realizar a condução coercitiva, deve o juiz verificar possível desistência da oitiva da testemunha;

3º Não havendo a desistência, deve o juiz adiar o julgamento. ATENÇÃO: o julgamento será adiado apenas uma vez, devendo ser providenciada a condução coercitiva da testemunha para a nova data.

        Art. 461.  O julgamento não será adiado se a testemunha deixar de comparecer, salvo se uma das partes tiver requerido a sua intimação por mandado, na oportunidade de que trata o art. 422 deste Código, declarando não prescindir do depoimento e indicando a sua localização. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        § 1o  Se, intimada, a testemunha não comparecer, o juiz presidente suspenderá os trabalhos e mandará conduzi-la ou adiará o julgamento para o primeiro dia desimpedido, ordenando a sua condução. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        § 2o  O julgamento será realizado mesmo na hipótese de a testemunha não ser encontrada no local indicado, se assim for certificado por oficial de justiça. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

B. Verificação da presença de, pelo menos, 15 jurados

A partir do momento em que se verifica que todas as partes estão presentes, deve o juiz, por meio de uma chamada, comprovar a presença de, no mínimo, 15 jurados.

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CONCURSO: para o cômputo desse número de 15 jurados leva-se em consideração os jurados excluídos por impedimento ou suspeição? SIM!

Devemos nos lembrar, ainda, do chamado “empréstimo de jurados”: é a chamada de jurados pertencentes a outro plenário do júri para se atingir o número mínimo de 15 jurados. Tanto o STF quanto o STJ NÃO admitem tal instituto. Isso porque, para os Tribunais Superiores, para atender à ampla defesa, é necessário o conhecimento prévio dos 25 jurados convocados, o que permite ao advogado preparar suas recusas. Assim, o empréstimo de jurados acaba inviabilizando o direito à recusa, e, consequentemente, a ampla defesa. Nesse sentido: STF HC 88.801.

CONCURSO: depois do trânsito em julgado de uma sentença e a condenação do réu, descobre-se que houve, quando do julgamento, o empréstimo de jurados. Poderá haver a anulação do julgamento? Os Tribunais entendem que o empréstimo é causa de nulidade ABSOLUTA, que, como tal, pode ser arguída inclusive após o trânsito em julgado da sentença condenatória, seja por meio de HC seja por meio de revisão criminal.

C. Impedimento, suspeição e incompatibilidade dos jurados

Arts. 448 e 449, CPP:

Art. 448.  São impedidos de servir no mesmo Conselho: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        I – marido e mulher; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        II – ascendente e descendente; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        III – sogro e genro ou nora; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        IV – irmãos e cunhados, durante o cunhadio; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        V – tio e sobrinho; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        VI – padrasto, madrasta ou enteado. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        § 1o  O mesmo impedimento ocorrerá em relação às pessoas que mantenham união estável reconhecida como entidade familiar. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        § 2o  Aplicar-se-á aos jurados o disposto sobre os impedimentos, a suspeição e as incompatibilidades dos juízes togados. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        Art. 449.  Não poderá servir o jurado que: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        I – tiver funcionado em julgamento anterior do mesmo processo, independentemente da causa determinante do julgamento posterior; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)*

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        II – no caso do concurso de pessoas, houver integrado o Conselho de Sentença que julgou o outro acusado; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        III – tiver manifestado prévia disposição para condenar ou absolver o acusado. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

*Súmula 206, STF:

Súmula 206É NULO O JULGAMENTO ULTERIOR PELO JÚRI COM A PARTICIPAÇÃO DE JURADO QUE FUNCIONOU EM JULGAMENTO ANTERIOR DO MESMO PROCESSO.

CONCURSO: um mesmo jurado pode vir a julgar um mesmo acusado duas vezes? SIM, desde que em processos distintos.

Antes do sorteio dos jurados, então, deve ser feita uma leitura desses artigos, sendo aberta à possibilidade de o jurado se declarar suspeito. Se o jurado não o fizer, incumbe às partes arguir, oralmente, sua suspeição. Nesse caso, devem ser comprovadas de plano a suspeição, impedimento ou incompatibilidade.

Não haverá suspensão nem adiamento da sessão.

ATENÇÃO: a participação de jurados impedidos no mesmo Conselho é causa de nulidade ABSOLUTA, pois não é possível identificar o grau de influência do voto desse jurado para o resultado final.

D. Formação do Conselho de sentença

D.1 Realização do sorteio;

D.2 Recusas.

As recusas podem ser de duas espécies:

- Recusas motivadas: são aquelas baseadas em causas de impedimento, suspeição ou incompatibilidade. Podem ser utilizadas tantas quantas necessárias.

- Recusas imotivadas (ou peremptórias): é aquela em que não há necessidade de motivação. Cada parte tem direito a três recusas peremptórias.

Art. 468.  À medida que as cédulas forem sendo retiradas da urna, o juiz presidente as lerá, e a defesa e, depois dela, o Ministério Público poderão recusar os jurados sorteados, até 3 (três) cada parte, sem motivar a recusa. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        Parágrafo único.  O jurado recusado imotivadamente por qualquer das partes será excluído daquela sessão de instrução e julgamento, prosseguindo-se o sorteio

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para a composição do Conselho de Sentença com os jurados remanescentes. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

Cuidado: quem fala primeiro no momento das recusas é a DEFESA.

Além disso, quem exerce as recusas pela acusação é o MP (não pode o assistente da acusação recusar jurados).

E no caso de haver mais de um acusado? Quantas recusas poderão ser usadas? Havendo mais de um acusado cujas defesas técnicas sejam patrocinadas pelo mesmo advogado, serão, no máximo, três recusas. Havendo mais de um acusado, cada um com um advogado distinto, se houver acordo entre eles, serão apenas três recusas; caso não haja acordo, cada advogado terá direito a três recusas.

Ainda em relação às recusas, é necessário fazermos uma comparação entre dois momentos: antes e depois da Lei 11.689/08.

ANTES DA LEI 11.689/08:

Advogado A Advogado B MP Resultado

Jurado 1 Aceita > isso significa que o jurado 1 pode julgar o acusado A.

Recusa > isso siginifica que, teoricamente, B não poderia ser julgado pelo jurado 1 (o que provocaria a separação dos processos).

Recusa > isso porque o MP sempre visa a fazer apenas um julgamento (nunca quer separar os processos). Assim, neste caso, o jurado 1 não poderia julgar o acusado A (vez que recusado pelo MP).

Recusado

Jurado 2 Recusa Aceita Recusa Recusado

Jurado 3 Aceita Recusa Recusa Recusado

Jurado 4 Aceita Recusa O MP já não é mais ouvido, pois já gastou sua três recusas.

Isso significa que o A, que aceitou, será submetido a julgamento, e o B, que recusou, não.

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Conclusão: antigamente quem definia o acusado que seria julgado primeiro era o MP, que era o último a se pronunciar:

- Se o MP aceitasse o jurado, haveria o julgamento;

- Se o MP não aceitasse, o julgamento não se realizaria.

Ex.: MP verifica que a estratégia dos advogados é separar os julgamentos e decide que quer julgar primeiro A. Neste caso é simples: bastava que o MP direcionasse sua recusa peremptória. Senão vejamos:

Advogado A Advogado B MP Resultado

Jurado 1 Recusa Aceita Recusa Recusado

Jurado 2 Recusa Aceita Recusa Recusado

Jurado 3 Aceita Recusa Aceita Aceito (neste caso, A seria julgado antes de B, exatamente como o MP queria).

DEPOIS DA LEI 11.689/08:

Art. 468, p.ú.:

        Parágrafo único.  O jurado recusado imotivadamente por qualquer das partes será excluído daquela sessão de instrução e julgamento, prosseguindo-se o sorteio para a composição do Conselho de Sentença com os jurados remanescentes. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

Agora, a partir do momento em que o jurado for excluído por uma das partes não é mais necessário perguntar às outras se o aceitam ou o recusam.

Advogado A Advogado B MP Resultado

Jurado 1 Aceita Recusa > isso siginifica dizer que o jurado 1 está automaticamente excluído do julgamento, não

- Recusado

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sendo mais necessário perguntar ao MP sobre sua aceitação.

Jurado 2 Recusa - - Recusado

Jurado 3 Aceita Aceita Recusa Recusado

Antigamente o MP não tinha, normalmente, direito à plena recusa, vez que esta era direcionada no sentido de buscar evitar a separação de processos (não poderia recusar quem quisesse).

Com essa nova lei, o MP passa a pode exercer plenamente seu direito de recusa. Além disso, ele não é mais o responsável por definir quem será julgado primeiro. Havendo a separação dos julgamentos, a própria lei passou a dispor quem será julgado em primeiro lugar. Vejamos:

Art. 469, §2º:

        § 2o  Determinada a separação dos julgamentos, será julgado em primeiro lugar o acusado a quem foi atribuída a autoria do fato ou, em caso de co-autoria, aplicar-se-á o critério de preferência disposto no art. 429 deste Código. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

Interessa à sociedade muito mais o julgamento do autor do fato delituoso que do partícipe. Por isso, ele é o primeiro a ser julgado.

Em caso de coautoria, interessa o julgamento de ambos, seguindo-se, logo, o critério legal:

        Art. 429.  Salvo motivo relevante que autorize alteração na ordem dos julgamentos, terão preferência: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        I – os acusados presos; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        II – dentre os acusados presos, aqueles que estiverem há mais tempo na prisão; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        III – em igualdade de condições, os precedentemente pronunciados. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

Ainda em relação às recusas: o que ocorre no caso de não haver jurados suficientes para julgar o acusado?

Imagine que tenhamos o número mínimo de 15 jurados e 3 acusados. Neste caso, temos:

Advogado A Advogado B Advogado C MP Resultado

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Jurado 1 Recusa - - - Recusado

Jurado 2 Recusa - - - Recusado

Jurado 3 Recusa Aceita Recusa - Recusado

Jurado 4 Não fala mais porque já usou as três recusas

Recusa Recusado

Jurado 5 Recusa Recusado

Jurado 6 Recusa Recusado

Jurado 7 Recusa Recusado

Jurado 8 Recusa - Recusado

Jurado 9 Recusa - Recusado

Neste caso, cada advogado gastou suas três recusas, ou seja, nove jurados foram recusados. Ocorre que, como haviam 15 jurados, recusados 9 sobraram apenas 6. É o chamado “estouro de urna”.

Estouro de urna: ocorre quando, em virtude das recusas motivadas e imotivadas não é possível atingir-se o número mínimo de 7 jurados para compor o Conselho de Sentença.

Consequência: teoricamente, deve ser designada outra data ou, em caso de separação de processos, deve ser observado o art. 429, CPP.

E. Leitura de peças

Antes da Lei 11.869/08, as partes podiam requerer a leitura de qualquer peça dos autos durante o julgamento (como forma de convencimento dos jurados). O problema era que as partes acabavam exercendo esse direito de uma forma abusiva (liam as peças, muitas vezes extensas, no intuito de “cansar” os jurados).

Hoje, somente é possível a leitura de provas colhidas por precatória, antecipadas e não repetíveis.

Art. 473, §3º:

        § 3o  As partes e os jurados poderão requerer acareações, reconhecimento de pessoas e coisas e esclarecimento dos peritos, bem como a leitura de peças que se refiram, exclusivamente, às provas colhidas por carta precatória e às provas cautelares, antecipadas ou não repetíveis. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

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E os elementos informativos do inquérito policial? Podem ser usados? Não se pode pedir ao juiz a leitura de elementos colhidos no IP, pois a lei é muito clara (art. 473, §3º): só é possível leitura de provas colhidas por precatória, antecipadas e não repetíveis. Mas pode o advogado, durante os debates, utilizar qualquer elemento constante dos autos, seja um elemento informativo produzido em IP, seja uma prova judicial. Assim, podem os elementos informativos do IP serem usados, mas não lidos em julgamento.

F. Uso de algemas

É possível utilizar algemas no Plenário do Júri?

Trata-se de medida excepcional, que somente pode ser adotada em duas situações, a saber:

- Risco de fuga; ou

- Risco de agressão contra as autoridades, contra terceiros ou contra si mesmo.

O uso de algemas, vez que medida excepcional, deve ser sempre fundamentado pela autoridade, sob pena de nulidade do julgamento.

A respeito: súmula vinculante n. 11:

STF Súmula Vinculante nº 11 - Sessão Plenária de 13/08/2008 - DJe nº 157/2008, p. 1, em 22/8/2008 - DO de 22/8/2008, p. 1Uso de Algemas - Restrições - Responsabilidades do Agente e do Estado - Nulidades   Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado.

G. Debates

O debate nada mais é que a sustentação oral da pretensão das partes.

É nos debates que a parte tem a oportunidade de formar a convicção dos jurados.

Em relação ao tempo para os debates, basta observarmos o art. 477:

Art. 477.  O tempo destinado à acusação e à defesa será de uma hora e meia para cada, e de uma hora para a réplica e outro tanto para a tréplica. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

Ou seja:

1h30 para cada parte;

+ 1h para réplica;142

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+ 1h para tréplica.

Cuidado com o §1º:

        § 1o  Havendo mais de um acusador ou mais de um defensor, combinarão entre si a distribuição do tempo, que, na falta de acordo, será dividido pelo juiz presidente, de forma a não exceder o determinado neste artigo. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

Normalmente, temos MP e assistente da acusação. Neste caso, o tempo continua o mesmo, e o MP deverá dividir seu tempo com o assistente.

E no caso de haver mais de um acusado?

        § 2o  Havendo mais de 1 (um) acusado, o tempo para a acusação e a defesa será acrescido de 1 (uma) hora e elevado ao dobro o da réplica e da tréplica, observado o disposto no § 1o deste artigo. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

Se houverem três acusados, o acréscimo continua apenas de 1h? Sem dúvida, a melhor interpretação é no sentido de entender que, para cada acusado a mais que se tenha, ganhe-se mais uma hora. Essa é a interpretação que garante, de forma plena, o contraditório e a ampla defesa.

Ainda sobre os debates, devemos atentar às figuras da réplica e tréplica. A primeira pertence à acusação e a segunda à defesa.

Encerrada a exposição da defesa, o juiz pergunta à acusação se ela deseja ir à réplica. Caso o MP não queira, ele deverá responder apenas “não”. Se ele, ao responder que não quer replicar, tecer algum comentário sobre a defesa (ex.: “tendo em vista que a defesa não conseguiu provar, de forma cabal, a inocência do réu, o MP nada a mais tem a dizer”), haverá, automaticamente, réplica, e, consequentemente, direito à tréplica.

A réplica e tréplica NÃO são obrigatórias.

Inovação da teses defensivas por ocasião da tréplica:

Pode a defesa inovar sua tese por ocasião da tréplica? P.ex.: a defesa sustentou, durante os debates, a negativa de autoria. No momento da tréplica, contudo, o advogado de defesa traz a tese da legítima defesa (sabendo que o MP não mais poderá se pronunciar sobre o assunto).

Sobre o tema, há, na doutrina, três posições distintas:

1ª corrente: à defesa não se defere a possibilidade de inovar na tréplica, sob pena de violação do contraditório.

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2ª corrente: por força da plenitude de defesa, é possível a inovação da tese defensiva na tréplica, sem que haja necessidade de manifestação da acusação. Corrente a ser usada em provas de Defensoria.

3ª corrente: é possível a inovação defensiva na tréplica. Todavia, em respeito ao princípio do contraditório, a acusação deve ser ouvida na sequência. Esta é a posição de Renato Brasileiro, que entende que, adotando-se essa corrente, preserva-se a plenitude de defesa, e, ao mesmo tempo, o interesse da sociedade, representado pelo MP, em rebater o novo argumento lançado pela defesa.

Exibição de documentos e objetos no Plenário do Júri:

Pode o promotor exibir, por exemplo, a arma utilizada no crime? Se o objeto já tiver sido juntado aos autos, pode ser livremente exibido aos jurados. Se o objeto não estava nos autos, deve haver a juntada com três dias úteis de antecedência, sob pena de nulidade absoluta.

        Art. 479.  Durante o julgamento não será permitida a leitura de documento ou a exibição de objeto que não tiver sido juntado aos autos com a antecedência mínima de 3 (três) dias úteis, dando-se ciência à outra parte. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

Esse artigo refere-se à matéria de fato e não de direito. Matéria de direito (ex.: jurisprudência, doutrina etc.) pode ser livremente utilizada, lida durante o julgamento.

Aparte:

É uma breve interrupção na sustenção oral da parte contrária.

É regulamentado pelo art. 497, XII:

        Art. 497.  São atribuições do juiz presidente do Tribunal do Júri, além de outras expressamente referidas neste Código: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        XII – regulamentar, durante os debates, a intervenção de uma das partes, quando a outra estiver com a palavra, podendo conceder até 3 (três) minutos para cada aparte requerido, que serão acrescidos ao tempo desta última. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

Acusado indefeso:

Se o juiz notar que o réu está indefeso durante os debates, não poderá, por óbvio, permitir essa situação.

Mas quando isso ocorre?

1º Ausência de defesa técnica;

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2º Quando a somatória da desídia do devedor revelar verdadeira ausência de defesa técnica (STJ: HC 88.919);

3º Colidência de defesas técnicas. Como sabemos, dois ou mais acusados podem ser defendidos pelo mesmo advogado. Ocorre que, se a tese defensiva de um dos acusados é no sentido de acusar o outro, por óbvio, não poderão ser defendidos pelo mesmo advogado. Assim, se um mesmo advogado representar dois ou mais acusados com teses antagônicas, haverá a colidência de defesa técnica.

Consequência: o Conselho de Sentença deve ser dissolvido, sendo designada nova data para outra sessão de julgamento.

Sociedade indefesa:

É uma atuação deficiente do MP no Plenário do Júri.

Neste caso, de acordo com a doutrina, aplica-se o princípio da obrigatoriedade. Da mesma forma que o promotor é obrigado a oferecer a denúncia, ele é obrigado a intervir no processo de forma satisfatória.

Consequência: o juiz deve determinar a dissolução do Conselho de Sentença e a designação de nova data, sem prejuízo de comunicar o fato ao Procurador Geral de Justiça, que poderá adotar providências de cunho disciplinar em relação ao Promotor desidioso.

4.4 Quesitação

Quesitos são perguntas formuladas aos jurados para que se manifestem quanto à materialidade, autoria, possível absolvição, causas de diminuição e aumento de pena e qualificadoras.

A. Modelos de quesitação

Sistema francês: por meio desses sistema, vários quesitos são apresentados aos jurados (são quesitados sobre praticamente tudo).

Sistema anglo-americano: por esse sistema, quesita-se os jurados apenas em relação à culpa ou inocência do réu.

Antes da Lei 11.869/08, o CPP adotava o sistema francês.

Com o advento da nova lei, o legislador optou por inserir um quesito genérico:

Art. 483, §2º:

        Art. 483.  Os quesitos serão formulados na seguinte ordem, indagando sobre: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

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        I – a materialidade do fato; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        II – a autoria ou participação; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        III – se o acusado deve ser absolvido; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        IV – se existe causa de diminuição de pena alegada pela defesa; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        V – se existe circunstância qualificadora ou causa de aumento de pena reconhecidas na pronúncia ou em decisões posteriores que julgaram admissível a acusação. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        § 2o  Respondidos afirmativamente por mais de 3 (três) jurados os quesitos relativos aos incisos I e II do caput deste artigo será formulado quesito com a seguinte redação: (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        O jurado absolve o acusado?

Agora, além de prever vários quesitos, teremos um quesito genérico, que se aproxima muito do sistema anglo-americano.

Assim, a doutrina vem entendendo que, com o advento da Lei 11.689/08, o legislador teria optado por um sistema MISTO.

B. Fonte dos quesitos

Os quesitos são extraídos da pronúncia, ou, a depender do caso concreto, de decisões posteriores que julgaram admissível a acusação.

Além disso, o Juiz Presidente, ao elaborar os quesitos, deve levar em consideração o interrogatório e os debates.

C. Leitura dos quesitos

Art. 484:

Art. 484.  A seguir, o presidente lerá os quesitos e indagará das partes se têm requerimento ou reclamação a fazer, devendo qualquer deles, bem como a decisão, constar da ata. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        Parágrafo único.  Ainda em plenário, o juiz presidente explicará aos jurados o significado de cada quesito. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

O juiz faz a leitura dos quesitos e pergunta se há alguma reclamação a ser feita pelas partes. Essa leitura é crucial, pois eventual nulidade relativa deve ser arguída neste momento, sob pena de preclusão: imediatamente após a leitura dos quesitos, cabe à parte impugnar eventual nulidade relativa na quesitação.

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D. Ordem dos quesitos

É tema controvertido na doutrina. Estudaremos a posição que prevalece.

1º) Materialidade do fato delituoso;

Em se tratando de homicídio consumado, este quesito deve ser desdobrado em duas perguntas, a primeira relacionada à existência da lesão corporal e a segunda pertinente ao nexo causal. Vejamos:

- Em relação à primeira pergunta:

Ex.: “no dia 16/05 a vítima foi atingida por disparo de arma de fogo sofrendo as lesões corporais descritas no laudo de fls. 12?”

Consequência do “sim” > a resposta positiva de mais de três jurados faz prosseguir a votação;

Consequência do “não” > a resposta negativa de mais de três jurados implica a absolvição do acusado, pois reconhecida a inexistência do fato.

- Em relação à segunda pergunta:

Ex.: “essas lesões corporais foram a causa eficiente da morte da vítima?”

Consequência do “sim” > a resposta positiva faz seguir a votação;

Consequência do “não” > a resposta negativa equivale a dizer que a morte não resultou da lesão corporal provocada pelo acusado. Logo, a votação deve prosseguir para que os jurados analisem a intenção do agente, se mera lesão corporal ou tentativa de homicídio.

2º) Autoria/participação;

“Tício foi quem efetuou os disparos referidos no quesito anterior?”

A resposta negativa implica a absolvição do acusado, pois reconhecida a negativa de autoria, ao passo que a resposta positiva determina o prosseguimento da votação.

OBS.: o quesito é feito para pessoas leigas, do “povo”. Por isso, deve sempre ser formulado sobre matéria de fato e não de direito. Ex.: não pode perguntar: “o réu é autor do fato?” ou “o réu é partícipe do fato?” (são termos técnicos).

3º) Eventual quesito sobre tentativa ou desclassificação para outro crime da competência do júri;

Lendo apenas os incisos do art. 483, parece que o quesito da absolvição viria sempre após a autoria. Todavia, o §5º ressalva essa regra.

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Assim, em relação ao 3º quesito, devemos analisar o art. 483 conjuntamente com seu §5º:

   Art. 483.  Os quesitos serão formulados na seguinte ordem, indagando sobre: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        I – a materialidade do fato; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        II – a autoria ou participação; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        III – se o acusado deve ser absolvido; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        IV – se existe causa de diminuição de pena alegada pela defesa; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        V – se existe circunstância qualificadora ou causa de aumento de pena reconhecidas na pronúncia ou em decisões posteriores que julgaram admissível a acusação. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

        § 5o  Sustentada a tese de ocorrência do crime na sua forma tentada ou havendo divergência sobre a tipificação do delito, sendo este da competência do Tribunal do Júri, o juiz formulará quesito acerca destas questões, para ser respondido após o segundo quesito. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

- Tentativa: “Tício, assim agindo, deu início à execução de um homicídio que não se consumou por circunstâncias alheias à sua vontade, consistente na intervenção dos policiais que passavam pelo local?”

Neste caso, a resposta negativa de mais de três jurados implica o reconhecimento de crime de lesão corporal, com o consequente deslocamento da competência ao Juiz-Presidente. A resposta positiva faz prosseguir a votação.

- Desclassificação: “Tícia agiu sob a influência do estado puerperal, matando o próprio filho durante ou após o parto?” (isto é: desclassifica-se de homicídio para infanticídio).

Tanto no caso da resposta positiva quanto no caso da negativa, a votação irá prosseguir, pois mantida a competência do júri.

4º) Absolvição;

“O jurado absolve o acusado?”

Essa é a grande novidade trazida pela lei 11.689/08 no tocante à quesitação.

Resposta positiva > absolvição;

Resposta negativa > segue-se a quesitação.

OBS. 1: tem prevalecido o entendimento de que se trata de quesito obrigatório, pouco importando se a tese defensiva já tenha sido negada pelos jurados nos dois primeiros

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quesitos. Em minoria, há doutrinadores que entendem que este quesito apenas deve ser feito se a defesa alegar causa excludente.

OBS. 2: havendo duas ou mais teses defensivas, há controvérsias na doutrina quanto à redação desse quesito. Uma corrente minoritária (LFG) defende que os quesitos devem ser individualizados. Para a corrente majoritária, contudo, os quesitos não precisam ser individualizados, pois eventual sentença absolutória não fará coisa julgada no cível.

5º) Causas de diminuição de pena;

As teses favoráveis à defesa (causas de diminuição de pena) devem ser quesitadas antes das favoráveis à acusação (qualificadoras e causas de aumento).

Súmula 162, STF:

STF Súmula nº 162 - 13/12/1963 - Súmula da Jurisprudência Predominante do Supremo Tribunal Federal - Anexo ao Regimento Interno. Edição: Imprensa Nacional, 1964, p. 88.Nulidade do Julgamento pelo Júri - Quesitos da Defesa Não Precedem aos das Circunstâncias Agravantes    É absoluta a nulidade do julgamento, pelo júri, quando os quesitos da defesa não precedem aos das circunstâncias agravantes.

Este quesito obrigatoriamente deve ser individualizado ao caso concreto. A pergunta não é: “existe causa de diminuição?”, e sim: “o crime foi cometido por relevante valor moral consubstanciado na eutanásia?”

ATENÇÃO: a única causa de diminuição de pena que não é quesitada neste momento é a tentativa, que já foi quesitada anteriormente.

É possível a existência do homicídio qualificado-privilegiado? SIM, desde que a qualificadora tenha natureza objetiva. Se os jurados reconhecerem a existência de homicídio privilegiado (art. 121, §1º, CP), estarão automaticamente prejudicados os quesitos atinentes às qualificadoras de natureza subjetiva.

6º) Qualificadoras e causas de aumento de pena.

Devem ser individualizadas. Ex.: “o acusado praticou o crime por motivo fútil, consistente em uma briga de trânsito?”

Esssas qualificadoras ou causas de aumento devem ter constado da pronúncia ou de decisões posteriores que julgaram admissível a acusação (princípio da correlação entre pronúncia e

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quesitação > a defesa não pode se ver surpreendida no momento da quesitação por uma nova qualificadora).

QUESTÕES DIVERSAS RELATIVAS À QUESITAÇÃO:

- Absolvição imprópria:

É a aplicada ao inimputável (art. 26, caput, CP).

O inimputável do art. 26, caput, vai a júri ou é absolvido sumariamente antes? Segundo o CPP, o inimputável pode ser absolvido sumariamente, desde que a inimputabilidade seja sua única tese defensiva.

Art. 415, p.ú.:

     Art. 415.  O juiz, fundamentadamente, absolverá desde logo o acusado, quando: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        I – provada a inexistência do fato; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        II – provado não ser ele autor ou partícipe do fato; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        III – o fato não constituir infração penal; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        IV – demonstrada causa de isenção de pena ou de exclusão do crime. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        Parágrafo único.  Não se aplica o disposto no inciso IV do caput deste artigo ao caso de inimputabilidade prevista no caput do art. 26 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, salvo quando esta for a única tese defensiva. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

Se a absolvição sumária só é possível quando for a única tese defensiva, a contrario sensu, conclui-se que o inimputável será submetido a julgamento perante o júri quando possuir alguma outra tese defensiva.

Problema: se os jurados absolvem com base nessa outra tese defensiva (ex.: legítima defesa), a absolvição será própria (não haverá imposição de medida de segurança); já se for com base na inimputabilidade, a absolvição será imprópria (com imposição de medida de segurança). Mas como o juiz saberá qual tipo de absolvição a ser aplicada, se ele sequer sabe qual é o fundamento dos jurados (que não fundamentam suas decisões)?

Como resolver?

Segundo a doutrina, a quesitação do inimputável deve seguir a seguinte ordem:

- “O jurado abolve o acusado?”

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OBS.: o Juiz-Presidente deve explicar aos jurados que este primeiro quesito fica resservado para as teses defensivas diversas da inimputabilidade.

Se os jurados responderem “não” a este quesito deve ser feita a seguinte indagação:

- “O acusado era, ao tempo da ação, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se de acordo com este entendimento em virtude de doença mental?”

Respondendo afirmativamente, o Juiz-Presidente saberá que se trata de absovição imprópria.

- Falso testemunho em Plenário:

Deve ser feito um quesito acerca do falso testemunho.

Mas quem irá pedir a inclusão deste quesito? Apenas as partes podem requerer a inclusão deste quesito.

O juiz não pode pedir, sob pena de violar sua imparcialidade (ao pedi-lo, deixará claro a todos que desconfia do testemunho).

O jurado também não, sob pena de violar o sigilo das votações (pois, se pedir o quesito, deixará claro, nas entrelinhas, que desconfia daquele testemunho).

Se quanto ao quesito do falso testemunho os jurados votarem “sim”, a testemunha será encaminhada à autoridade policial.

Art. 211, p.ú., CPP:

        Parágrafo único.  Tendo o depoimento sido prestado em plenário de julgamento, o juiz, no caso de proferir decisão na audiência (art. 538, § 2o), o tribunal (art. 561), ou o conselho de sentença, após a votação dos quesitos, poderão fazer apresentar imediatamente a testemunha à autoridade policial.

- Agravantes e atenuantes:

São quesitadas aos jurados?

Antes da Lei 11.689/08, agravantes e atenuantes eram quesitadas aos jurados. Além disso, era obrigatória a inclusão de um quesito sobre atenuantes genéricas. Assim, ainda que a defesa não sustentasse qualquer atenuante, o Juiz era obrigado a quesitar sobre a possível existência de alguma atenuante genérica, sob pena de nulidade absoluta.

Súmula 156, STF:

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STF Súmula nº 156 - 13/12/1963 - Súmula da Jurisprudência Predominante do Supremo Tribunal Federal - Anexo ao Regimento Interno. Edição: Imprensa Nacional, 1964, p. 85.Nulidade do Julgamento pelo Júri - Falta de Quesito Obrigatório    É absoluta a nulidade do julgamento, pelo júri, por falta de quesito obrigatório.

Com o advento da lei, agravantes e atenuantes passaram a ser apreciadas pelo Juiz-Presidente.

        Art. 492.  Em seguida, o presidente proferirá sentença que: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        I – no caso de condenação: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        b) considerará as circunstâncias agravantes ou atenuantes alegadas nos debates; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

Há uma aparente antinomia entre o art. 385, CPP e o art. 492, I, b, CPP:

- De acordo com o art. 492, I, b, o Juiz somente poderá conhecer das agravantes e atenuantes alegadas nos debates;

- Já o art. 385 fala sore a possibilidade de o juiz reconhecer agravantes de ofício.

        Art. 385.  Nos crimes de ação pública, o juiz poderá proferir sentença condenatória, ainda que o Ministério Público tenha opinado pela absolvição, bem como reconhecer agravantes, embora nenhuma tenha sido alegada.

Sobre o assunto tem havido uma certa polêmica na doutrina, mas prevalece que o termo “debates” do art. 492 refere-se não apenas aos debates, mas também o interrogatório (a ampla defesa abrange não apenas a defesa técnica, mas a autodefesa).

Pode o Juiz-Presidente aplicar a agravante do motivo fútil, se alegada pela acusação?

Art. 61, CP:

Circunstâncias agravantes

        Art. 61 - São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem ou qualificam o crime:(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        I - a reincidência; (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        II - ter o agente cometido o crime: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        a) por motivo fútil ou torpe;

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De acordo com este artigo, o Juiz-Presidente poderia reconhecer da agravante do motivo fútil, desde que alegada pela acusação.

Como sabemos, o motivo fútil é uma das qualificadoras do delito de homicídio. Assim, se o motivo fútil consta como uma qualificadora do homicídio ele deve entrar como qualificadora e não como agravante.

Conclusão: não é possível o reconhecimento de circunstância agravante simples alegada pela acusação quando esta constar do CP como qualificadora do crime de homicídio (STF HC 90.265).

- Concurso de crimes e homicídio simples praticado em atividade típica de grupo de extermínio:

Os jurados são perguntados sobre concurso de crimes? Concurso de crimes, que NÃO é matéria de fato (mas diz respeito à aplicação da pena) NÃO é quesitado aos jurados.

O “homicídio simples praticado em grupo de extermínio” também NÃO é quesitado aos jurados (não é qualificadora, não é causa de aumento de pena).

4.5 Desclassificação

A. Desclassificação própria x imprópria

Própria: ocorre quando o Conselho de Sentença desclassifica a imputação para crime que não é de sua competência, mas não especifica qual seria o delito. Ex.: desclassificação para uma possível lesão corporal > os jurados irão negar a intenção de matar, mas não irão dizer qual teria sido a lesão (leve, grave ou gravíssima). Neste caso, o Juiz-Presidente assume total capacidade decisória, podendo, inclusive, absolver o acusado.

Imprópria: ocorre quando o Conselho de Sentença desclassifica a imputação para crime que não é de sua competência, mas especifica o crime praticado pelo acusado. Neste caso, prevalece o entendimento de que o Juiz-Presidente á obrigado a acatar a decisão dos jurados, condenando, assim, o acusado. Ex.: desclassificação para homicídio culposo.

OBS.: há quem entenda que mesmo na desclassificação imprópria a competência decisória seria do Juiz-Presidente (Renato Brasileiro), que poderia, inclusive, absolver o acusado.

B. Desclassificação e IMPO

Imagine que o acusado estivesse no júri por ter cometido tentativa de homicídio simples. No momento do quesito pertinente à tentativa os jurados declassificam para lesão leve (IMPO).

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Diante dessa desclassificação, a quem compete aplicar o procedimento da Lei dos Juizados? Segundo o texto da lei, é o próprio Juiz-Presidente que aplica o procedimento da Lei 9.099.

Art. 492, §1º, CPP:

        § 1o  Se houver desclassificação da infração para outra, de competência do juiz singular, ao presidente do Tribunal do Júri caberá proferir sentença em seguida, aplicando-se, quando o delito resultante da nova tipificação for considerado pela lei como infração penal de menor potencial ofensivo, o disposto nos arts. 69 e seguintes da Lei no 9.099, de 26 de setembro de 1995. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

Há quem entenda que este dispositivo seria inconstitucional, vez que a competência dos Juizados seria de natureza absoluta. Todavia, o ideal é dizer que a competência dos Juizados NÃO possui natureza absoluta (tanto faz onde o crime está sendo julgado; o que realmente interessa é se o acusado poderá se beneficiar dos dispositivos despenalizadores da Lei 9.099).

Além disso, como sabemos, a lesão corporal leve depende, em regra, de representação. Diante dessa desclassificação, portanto, como é que fica o prazo para o oferecimento da representação?

Em regra, o prazo decadencial de 6 meses começa a fluir a partir do conhecimento da autoria. Neste caso, porém, o prazo decadencial para o oferecimento da representação começa a fluir apenas a partir da desclassificação (a vítima deixou de oferecer a representação anteriormente não por desídia, mas por acreditar que não seria necessária, vez que o delito seria o de homicídio tentado; portanto, ainda que decorridos os 6 meses a partir da ciência da autoria, não haverá decadência, cujo o prazo somente fluirá a partir da desclassificação).

C. Desclassificação e crimes conexos

Em um exemplo simples e muito comum em prova, imagine que alguém tenha sido levado a júri pela prática de homicídio simples + estupro (crime conexo). Imagine, ainda, que, no momento da quesitação, haja uma desclassificação do homicídio (para homicídio culposo). Neste caso, por quem deverá ser apreciado o homicídio culposo? Pelo Juiz-Presidente. Mas diante dessa classificação quanto ao homicídio quem é que irá apreciar a imputação pertinente ao crime conexo de estupro? Também será julgado pelo Juiz-Presidente, vez que cessada a competência do júri.

Art. 492, §2º, CPP:

        § 2o  Em caso de desclassificação, o crime conexo que não seja doloso contra a vida será julgado pelo juiz presidente do Tribunal do Júri, aplicando-se, no que couber, o disposto no § 1o deste artigo. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

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Imagine, agora, que, no exemplo acima, quanto ao homicídio doloso o acusado tenha sido absolvido. Quem é que irá julgar o crime conexo? Se os jurados implicitamente reconheceram sua competência, o crime conexo continua sendo por eles apreciados.

Em suma:

- Quando se dá a classificação, os jurados reconhecem sua incompetência, por isso, caberá ao Juiz-Presidente apreciar o crime conexo;

- Já quando se dá a absolvição, os jurados, implicitamente, reconhecem sua competência, por isso, caberá a eles julgar o crime conexo.

Resumo do procedimento do júri:

PRIMEIRA FASE: PROCEDIMENTO SUMÁRIO DA CULPA (JUDICIUM ACCUSATIONIS)

Oferecimento da peça acusatória recebimento / rejeição citação reação defensiva à imputação oitiva obrigatória do MP (5 dias) realização da audiência una de instrução e julgamento sentença: pronúncia (há PEC + ISA, RESE), impronúncia (falta PEC + ISA, CJF, apelação), desclassificação (não houve crime doloso contra a vida, RESE) ou absolvição sumária (CJM, apelação).

Prazo: 90 dias.

SEGUNDA FASE : JUÍZO DA CAUSA (JUDICIUM CAUSAE)

Preclusão da decisão de pronúncia ordenamento do processo: preparação para julgamento intimação: MP, querelante, defensor e advogado do assistente requisição de provas e apresentação do rol de testemunhas (5 dias) sessão de julgamento (presença partes e jurados; impedimentos e suspeições; formação do Conselho de sentença – sorteio, recusas; debates; quesitação; declassicação).

Prazo: 6 meses, desde que a defesa não tenha contribuído para sua dilação.

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TEMA 5: PRINCÍPIO DA CORRELAÇÃO ENTRE ACUSAÇÃO E SENTENÇA

5.1 Introdução

Por conta desse princípio, o acusado NÃO pode ser processado e julgado por fato diverso daquele que lhe foi imputado na peça acusatória.

À diferença do processo civil, no processo penal, o pedido não é relevante (pois há sempre um pedido genérico de condenação). O que realmente interessa no processo penal é o fato da vida cuja a prática foi atribuída ao acusado (é o que foi narrado nos autos).

Ex.: atribuindo-se nos autos a Renato a conduta de furto simples, o juiz somente pode condená-lo a furto simples, jamais a furto qualificado ou a algum outro delito.

5.2 Emendatio libelli

A. Conceito

Ocorre quando o juiz, sem modificar a base fática da imputação, a ela atribui classificação diversa, ainda que mediante aplicação de pena mais grave.

O que acontece na emendatio é uma classificação mal feita: o promotor ou o querelante fazem uma classificação errada e o juiz é obrigado a corrigi-la.

Ex.: imagine uma denúncia na qual a imputação diga respeito ao crime de furto qualificado pela fraude, que possui pena de 2 a 8 anos. No momento da classificação, porém, o promotor imputa o delito de estelionato, que tem pena de 1 a 5 anos. Quando da sentença, portanto, deverá o juiz fazer a emendatio, prolatando uma sentença condenatória pelo art. 155, §4º, II (e não pelo art. 171).

Vigoram aqui os brocardos iuria novit curia (o juiz conhece o direito) e narra mihi factum dabo tibi ius (narra-me o fato e te darei o direito). Dessa forma, pouco importa a classificação; se o juiz entender que ela foi feita incorretamente, poderá corrigi-la.

Nos casos de emendatio NÃO há necessidade de aditamento nem de oitiva da defesa. Isso porque o acusado defende-se do fato narrado e não do crime a ele imputado; assim, não havendo qualquer alteração na narração, não há que se falar em aditamento.

B. Formas de emendatio

A emendatio pode ser feita de três formas distintas:

- Por defeito de capitulação: classificação equivocada;

Ex.: narra delito de estupro e imputa crime de peculato

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- Por interpretação distinta: situações em que normalmente há discussão na doutrina/jurisprudência;

Ex.: juiz entende que houve estupro e o promotor oferece denúncia por estupro de vulnerável.

- Por supressão de elementar ou circunstância.

Ex.: denúncia pelo delito de roubo qualificado pelo emprego de arma de fogo, sendo que ao final do processo o emprego da arma não fica provado.

CUIDADO: na mutatio ocorre o acréscimo de uma elementar ou circunstância; na emendatio, a supressão.

C. Momento

Corrente majoritária: deve ser feita apenas por ocasião da sentença. Fundamento: a emendatio está prevista no art. 383, CPP, que está localizado no título XII, o qual trata da sentença. Dessa forma, o momento para usar o instituto é quando da prolação da sentença.

Além disso, essa corrente majoritária entende, ainda, que ao juiz não é dado alterar a classificação do fato delituoso por ocasião do recebimento da peça acusatória.

Há, contudo, uma corrente minoritária (Antonio Scarance Fernandes, Gustavo Badaró) que entende que, a depender do caso concreto, uma classificação mal feita pode ser muito danosa a um acusado. Ex.: imagine que Raquel, que foi pega com um cigarro de maconha, seja denunciada por tráfico de drogas. Há, neste caso, claro excesso da denúncia, sendo que, em havendo a desclassificação, a situação de Raquel mudará completamente. Por isso, impossível deixar a emendatio apenas para o momento da sentença. A corrente minoritária defende, então, que quando houver excesso da acusação privando o acusado de institutos despenalizadores ou de liberdade provisória, é possível, no liminar do processo, uma desclassificação incidental e provisória.

D. Emendatio libelli e necessidade de oitiva das partes

Há necessidade de oitiva das partes na emendatio?

        Art. 383.  O juiz, sem modificar a descrição do fato contida na denúncia ou queixa, poderá atribuir-lhe definição jurídica diversa, ainda que, em conseqüência, tenha de aplicar pena mais grave. (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).

Nada diz a lei quanto à necessidade de oitiva das partes. Assim, segundo a corrente majoritária, não há necessidade de ouvi-las (o acusado defende-se dos fatos narrados; não havendo qualquer alteração quanto aos fatos não há por que ouvi-lo).

Nesse sentido: STF AP 461 AgR terceiro.

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Há, porém, uma corrente minoritária (Aury Lopes Jr., Gustavo Badaró) que entende que o contraditório aplica-se tanto às questões de fato quanto às de direito, sendo, portanto, imprescindível a oitiva das partes quando da emendatio.

E. Emendatio libelli nas diferentes espécies de ação penal

A emendatio pode ser feita tanto na ação penal pública (seja condicionada ou incondicionada) como também na ação penal privada (seja exclusivamente privada, seja a personalíssima, seja a subsidiária da pública).

F. Emendatio libelli na segunda instância

O tribunal pode fazer a emendatio, DESDE QUE que respeitado o princípio da non reformatio in pejus:

        Art. 617.  O tribunal, câmara ou turma atenderá nas suas decisões ao disposto nos arts. 383, 386 e 387, no que for aplicável, não podendo, porém, ser agravada a pena, quando somente o réu houver apelado da sentença.

5.3 Mutatio libelli

A. Conceito

Ocorre quando, durante o curso da instrução probatória, surge prova de elementar ou circunstância não contida na peça acusatória. Neste caso, como há uma alteração da base fática da imputação, há necessidade de aditamento da peça acusatória com posterior oitiva da defesa.

Imagine que a denúncia tenha imputado ao acusado um delito de furto simples. Durante a instrução probatória, contudo, as testemunhas afirmam que teria havido emprego de violência contra a vítima. Surge, portanto, a prova de elementar do roubo não contida na denúncia, o que significa que o réu a ela não teve acesso. Por isso, não pode o juiz condená-lo pelo roubo, devendo proceder à mutatio libelli, sob pena de violação ao contraditório, à ampla defesa e ao próprio sistema acusatório. Neste caso, os autos deverão ser encaminhados ao MP, que fará um aditamento à peça acusatória, imputando ao acusado o delito de roubo e sendo ouvida, na sequência, a defesa.

B. Elementares e circunstâncias

Elementares são dados essenciais à figura típica cuja ausência pode acarretar a atipicidade absoluta (a conduta passa a ser atípica) ou relativa (ocorre a desclassificação).

Ex.: subtrair coisa alheia móvel > “coisa alheia móvel” é elementar do delito de furto.158

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Já circunstâncias são dados periféricos que gravitam em torno da figura típica básica. Podem aumentar ou diminuir a pena, mas não interferem no crime, que permanece o mesmo.

Ex.: qualificadoras, causas de aumento e diminuição de pena etc.

CUIDADO: em relação às agravantes não há que se falar em mutatio libelli.

Art. 385, CPP:

        Art. 385.  Nos crimes de ação pública, o juiz poderá proferir sentença condenatória, ainda que o Ministério Público tenha opinado pela absolvição, bem como reconhecer agravantes, embora nenhuma tenha sido alegada.

A doutrina critica duramente este artigo, mas o STF, no HC 93.211, entendeu pela plena validade do dispositivo, dizendo que as agravantes, ao contrário das qualificadoras, sequer precisam constar da denúncia para serem consideradas pelo juiz.

Podendo ser consideradas de ofício pelo juiz, às agravantes não há necessidade de se aplicar a mutatio.

C. Fato novo x fato diverso

Fato novo ocorre quando os elementos de seu núcleo essencial constituem acontecimento criminoso completamente distinto daquele resultante dos elementos do núcleo essencial da imputação. Nesse caso, o fato novo nada agrega à imputação inicial, mas a substitui por completo. Aqui, como não há qualquer relação com o fato inicialmente imputado ao acusado, NÃO se aplicando a mutatio libelli. Na verdade, deve ser instaurado novo processo criminal.

Fato diverso ocorre quando os elementos de seu núcleo essencial correspondem parcialmente aos do fato da imputação originária, porém, com o acréscimo de alguma elementar ou circunstância que a modifique. É para o fato diverso que se reserva a mutatio libelli.

D. Necessidade de aditamento

Surgindo prova de elementar ou circunstância não contida na peça acusatória, deve ser feito o aditamento, pouco importando o quantum de pena cominado à imputação diversa.

        Art. 384.  Encerrada a instrução probatória, se entender cabível nova definição jurídica do fato, em conseqüência de prova existente nos autos de elemento ou circunstância da infração penal não contida na acusação, o Ministério Público deverá aditar a denúncia ou queixa, no prazo de 5 (cinco) dias, se em virtude desta houver sido instaurado o processo em crime de ação pública, reduzindo-se a termo o aditamento, quando feito oralmente. (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).

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E. Aditamento provocado e aditamento espontâneo

Antes da Lei 11.719/08 era o juiz quem baixava o processo a fim de que o MP aditasse a peça acusatória. Era o chamado “aditamento provocado”.

Depois da lei 11.719/08, o artigo 384, caput, fala que o MP deverá aditar a denúncia ou queixa. O promotor, portanto, já não é mais provocado pelo juiz, configurando o denominado “aditamento espontâneo”.

Se o MP não fizer o aditamento espontaneamente, deve o juiz remeter os autos ao PGJ, nos termos do art. 28, CPP:

        Art. 384, § 1o  Não procedendo o órgão do Ministério Público ao aditamento, aplica-se o art. 28 deste Código. (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

O PGJ tem, ao receber os autos, duas opções:

- Fazer o aditamento (ou designar outro órgão do MP para fazê-lo) > nesse caso, o processo segue seu curso normal; ou

- Não fazer o aditamento (discorda do juiz) > nesse caso, ao juiz não restará outra opção senão julgar o acusado com base na imputação originária.

OBS.: a uma doutrina minoritária (Badaró) entende que este §1º seria inconstitucional.

F. Procedimento da mutatio

- Imagine que foi imputado ao cidadão o delito de roubo simples (art. 157, caput);

- Todavia, durante a instrução surge a prova de que teria havido o emprego de arma;

- Os autos vão para o MP, que deverá fazer o aditamento (“aditamento espontâneo”), imputando ao acusado o crime de roubo do art. 157, CP;

Atenção: esse aditamento pode ser feito oralmente (na própria audiência una de instrução e julgamento) ou por escrito (em até 5 dias).

- Ouve-se, em 5 dias, a defesa (antes do recebimento do aditamento);

        Art. 384, § 2o  Ouvido o defensor do acusado no prazo de 5 (cinco) dias e admitido o aditamento, o juiz, a requerimento de qualquer das partes, designará dia e hora para continuação da audiência, com inquirição de testemunhas, novo interrogatório do acusado, realização de debates e julgamento. (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

Da mesma forma que a denúncia, o aditamento também deve ser recebido pelo juiz. Por isso, a defesa deve ser ouvida antes mesmo do recebimento do aditamento. Há, aqui, um misto de defesa preliminar com resposta à acusação.

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Aqui, a defesa tenta convencer o juiz de que está presente ao menos uma das causas de rejeição da peça acusatória (art. 397, CPP), buscando, ainda, uma possível absolvição sumária (art. 397, CPP).

- O magistrado efetuará um juízo de admissibilidade do aditamento, podendo rejeitá-lo ou recebê-lo;

§ 5o  Não recebido o aditamento, o processo prosseguirá. (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

- Recebido o aditamento, será realizada uma nova instrução processual, sendo que o juiz designará nova audiência una de instrução e julgamento.

        § 4o  Havendo aditamento, cada parte poderá arrolar até 3 (três) testemunhas, no prazo de 5 (cinco) dias, ficando o juiz, na sentença, adstrito aos termos do aditamento. (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

E se as partes disserem que não têm provas a produzir? Ainda assim é necessário a realização da audiência? Sim, pois neste caso será obrigatória a realização de novo INTERROGATÓRIO, vez que ao acusado foi imputado um novo fato delituoso.

G. Recuso cabível contra a rejeição do aditamento feito por conta da mutatio

- Se a rejeição ocorrer por meio de uma decisão interlocutória > o recurso cabível será o RESE (art. 581, I, CPP):

        Art. 581.  Caberá recurso, no sentido estrito, da decisão, despacho ou sentença:

        I - que não receber a denúncia ou a queixa;

- Se a rejeição ocorrer na própria audiência una de instrução e julgamento com posterior prolação de sentença > o recurso adequado será a APELAÇÃO.

H. Mutatio libelli nas diferentes espécies de ação penal

Ao contrário da emendatio, que pode ser feita em qualquer espécie de ação, a mutatio não. Vejamos:

   Art. 384.  Encerrada a instrução probatória, se entender cabível nova definição jurídica do fato, em conseqüência de prova existente nos autos de elemento ou circunstância da infração penal não contida na acusação, o Ministério Público deverá aditar a denúncia ou queixa, no prazo de 5 (cinco) dias, se em virtude desta houver sido instaurado o processo em crime de ação pública, reduzindo-se a termo o aditamento, quando feito oralmente. (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).

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O termo “desta” refere-se à queixa. Portanto, de acordo com a redação do artigo (abraçada pela doutrina majoritária) a mutatio só pode ser feita em crimes de ação penal pública (incondicionada ou condicionada) e em crimes de ação penal privada subsidiária da pública.

Há uma corrente minoritária (Badaró) que defende que a mutatio é também cabível nos crimes de ação exclusivamente privada e privada personalíssima, desde que observado o prazo decadencial. O professor concorda.

Ex.: a Maria é imputado o delito de calúnia; só que durante a instrução probatória descobre-se que o crime teria sido praticado pela internet, que é um meio que facilita sua divulgação e autoriza o aumento da pena (art. 141, III, CP). Por que não seria possível a realização da mutatio? Não há motivo!

I. Mutatio libelli na segunda instância

Se a mutatio fosse feita na segunda instância haveria uma grave problema: não teria como a defesa apelar dessa decisão.

Assim, NÃO é possível a realização da mutatio na segunda instância, pois haveria violação ao duplo grau de jurisdição diante da supressão de instância.

Sobre o tema: súmula 453, STF:

STF Súmula nº 453 - 01/10/1964 - DJ de 8/10/1964, p. 3646; DJ de 9/10/1964, p. 3666; DJ de 12/10/1964, p. 3698.Aplicabilidade à Segunda Instância - Possibilidade de Nova Definição Jurídica a Fato Delituoso - Circunstância Elementar na Denúncia ou Queixa    Não se aplicam à segunda instância o Art. 384 e parágrafo único do Código de Processo Penal, que possibilitam dar nova definição jurídica ao fato delituoso, em virtude de circunstância elementar não contida, explícita ou implicitamente, na denúncia ou queixa.

Essa súmula foi feita antes da reforma que incluiu os §§ do art. 384, CPP. Por isso, não se refere a eles. Logo, ainda que omissa, deve se aplicar a todos os §§ do art. 384.

CUIDADO: o não cabimento da mutatio em segunda instância NÃO impede que o tribunal anule o processo em face da inobservância do art. 384, CPP. Uma vez anulado o processo pelo Tribunal, os autos retornarão à primeira instância, e lá então poderá ser aplicado o procedimento da mutatio.

J. Imputação superveniente e possibilidade de condenação do acusado quanto à imputação originária

Imagine que tenha havido a mutatio e, consequentemente, o aditamento. Com o aditamento passamos a ter duas imputações: originária (que constou da denúncia) e superveniente (que constou do aditamento).

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Ex.: roubo simples é a imputação originária; roubo qualificado é a imputação superveniente.

Antes da Lei 11.719/08, diante do aditamento recebido, o juiz era livre para condenar o acusado tanto pela imputação originária quanto pela superveniente. Tratava-se de imputação alternativa admitida pelo nosso ordenamento.

Depois da Lei 11.719/08, diante da nova redação do art. 384, §4º, uma vez recebido o aditamento o juiz estará adstrito à imputação superveniente, sendo a ele vedado condenar o acusado pela imputação originária, salvo nas seguintes situações:

- No caso de imputação por um crime simples, para posterior inclusão de elemento especializante;

Ex.: oferecimento de denúncia por roubo simples, aditada por um elemento especializante (emprego de arma). Ainda que o juiz entenda que houve o emprego de arma, ele poderá condenar por roubo simples, já que o acusado, ao defender-se do roubo com emprego de arma, já se defendeu, logicamente, do roubo simples.

- No caso de crime complexo.

Ex.: furto que é aditado para roubo.

Nesse caso, acrescenta-se a violência. Por isso não há como negar que o acusado já teria se defendido da imputação de furto (que prescinde da violência).

        Art. 384 § 4o  Havendo aditamento, cada parte poderá arrolar até 3 (três) testemunhas, no prazo de 5 (cinco) dias, ficando o juiz, na sentença, adstrito aos termos do aditamento. (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

5.4 Disposições comuns à emendatio e à mutatio libelli

A. Mudança de competência

Pode ser que por conta da emendatio ou mutatio ocorra a mudança de competência. Nesse caso, os autos serão remetidos ao juízo competente, não havendo prorrogação da competência.

        Art. 383.  § 2o  Tratando-se de infração da competência de outro juízo, a este serão encaminhados os autos. (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

B. Transação penal e suspensão condicional do processo

Há doutrinadores (Nucci) que dizem que a suspensão jamais pode ser dada quando da sentença. Por isso, eles entendem que a transação e a suspensão do processo jamais poderiam ocorrer em caso de emendatio ou mutatio (que só acontecem na sentença).

Sem razão, todavia.

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Ex.: imagine que a pessoa estivesse sendo processada por furto qualificado, mas tenha havido aditamento no sentido de imputar a ela furto simples, em relação ao qual é cabível a suspensão condicional do processo. O fato de estar na sentença seria capaz de privar o acusado de tamanha benesse? NÃO!

Súmula 337, STJ:

STJ Súmula nº 337 - 09/05/2007 - DJ 16.05.2007Cabimento - Suspensão Condicional do Processo na Desclassificação do Crime e na Procedência Parcial da Pretensão Punitiva    É cabível a suspensão condicional do processo na desclassificação do crime e na procedência parcial da pretensão punitiva.

Nesse caso, porém, não pode o juiz proferir uma sentença condenatória. Ele deverá dar uma decisão inetrlocutória dizendo que não há prova quanto à qualificadora e abrindo a possibilidade de o promotor negociar com o acusado, seja em relação à suspensão, seja em relação à transação.

Art. 383, §1º:

        § 1o  Se, em conseqüência de definição jurídica diversa, houver possibilidade de proposta de suspensão condicional do processo (ou de transação penal), o juiz procederá de acordo com o disposto na lei. (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

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TEMA 6: RECURSOS

1. CONCEITO

O recurso é um instrumento processual voluntário de impugnação de decisões judiciais, previsto em lei, utilizado antes da preclusão e na mesma relação jurídica processual objetivando a reforma, a invalidação, a integração ou o esclarecimento da decisão judicial impugnada.

- Voluntário: como representa para a parte um ônus, é sempre voluntário;

- Utilizado antes da preclusão e dentro da mesma relação jurídica: a maioria da doutrina (ex.: Ada) vê no recurso um simples desdobramento do direito de ação. Essa característica diferencia os recursos das ações de impugnação, tais como o habeas corpus, a revisão criminal e o mandado de segurança;

- Objetivando a reforma, invalidação, integração ou esclarecimento da decisão: no recurso sempre se busca o reexame da decisão impugnada.

2. FUNDAMENTOS

A doutrina entende que a existência do recurso tem vários motivos:

- Falibilidade humana;

O juiz, como ser humano, pode errar. Além disso, o simples fato de o juiz saber que sua decisão poderá ser revista funciona como um incentivo ao aprimoramento da decisão judicial.

- Inconformismo das pessoas;

A doutrina entende que, em relação às decisões que lhes são desfavoráveis, as pessoas tendem a se inconformar.

- Duplo grau de jurisdição.

Consiste na possibilidade de reexame integral da decisão proferida pelo juízo a quo, a ser conferida a um órgão jurisdicional diverso daquele que a proferiu e geralmente em hierarquia superior.

O recurso que concretiza o duplo grau, por excelência, é a apelação, a qual devolve ao juiz ad quem o conhecimento de toda a matéria, seja de fato, seja de direito, seja probatória.

Há uma certa controvérsia quanto à previsão do duplo grau: estaria ele previsto na CRFB? No processo penal a doutrina é quase unânime em entender que o princípio estaria previsto de forma implítica na Constituição: no devido processo legal, como consectário ao contraditório ou ampla defesa ou, ainda, no próprio sistema hieráquico de jurisdição previsto na CRFB (que é dividido em primeira e segunda instância).

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Independentemente da discussão em relação à previsão ou não do princípio na CRFB, o STF o tem referendado na CADH: art. 8º, n.2, h:

2. Toda pessoa acusada de um delito tem direito a que se presuma sua inocência, enquanto não for legalmente comprovada sua culpa. Durante o processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às seguintes garantias mínimas:

h) direito de recorrer da sentença a juiz ou tribunal superior.

Cuidado com os acusados com foro por prerrogativa de função: há um famoso precedente (RHC 79.785) em que o STF discutiu se um promotor (condenado por ter matado sua esposa), julgado pelo TJ (por prerrogativa de função), teria direito ao duplo grau. Há quem entenda (LFG) que caberia ao próprio STF funcionar como segundo grau. O problema é que não há qualquer previsão constitucional nesse sentido. O que ficou decidido, na verdade, foi que, como o promotor já é julgado originalmente pelo TJ, ele não teria direito ao duplo grau. O que não significa que ele não possa recorrer: ele pode entrar, por exemplo, com um REsp ou um RE. Esses recursos, no entanto, NÃO são duplo grau, pois, quando utilizados, a pessoa não consegue devolver ao Tribunal o conhecimento da matéria de fato e de direito.

I. Duplo grau de jurisdição no Direito brasileiro, à luz da Constituição e da Convenção Americana de Direitos Humanos.1. Para corresponder à eficácia instrumental que lhe costuma ser atribuída, o duplo grau de jurisdição há de ser concebido, à moda clássica, com seus dois caracteres específicos: a possibilidade de um reexame integral da sentença de primeiro grau e que esse reexame seja confiado à órgão diverso do que a proferiu e de hierarquia superior na ordem judiciária.2. Com esse sentido próprio - sem concessões que o desnaturem - não é possível, sob as sucessivas Constituições da República, erigir o duplo grau em princípio e garantia constitucional, tantas são as previsões, na própria Lei Fundamental, do julgamento de única instância ordinária, já na área cível, já, particularmente, na área penal.3. A situação não se alterou, com a incorporação ao Direito brasileiro da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de São José), na qual, efetivamente, o art. 8º, 2, h, consagrou, como garantia, ao menos na esfera processual penal, o duplo grau de jurisdição, em sua acepção mais própria: o direito de "toda pessoa acusada de delito", durante o processo, "de recorrer da sentença para juiz ou tribunal superior".4. Prevalência da Constituição, no Direito brasileiro, sobre quaisquer convenções internacionais, incluídas as de proteção aos direitos humanos, que impede, no caso, a pretendida aplicação da norma do Pacto de São José: motivação. II. A Constituição do Brasil e as convenções internacionais de proteção aos direitos humanos: prevalência da Constituição que afasta a aplicabilidade das cláusulas convencionais antinômicas.1. Quando a questão - no estágio ainda primitivo de centralização e efetividade da ordem jurídica internacional - é de ser resolvida sob a perspectiva do juiz nacional - que, órgão do Estado, deriva da Constituição sua própria autoridade jurisdicional - não pode ele buscar, senão nessa Constituição mesma, o critério da solução de eventuais antinomias entre normas internas e normas internacionais; o que é bastante a firmar a supremacia sobre as últimas da Constituição, ainda quando esta eventualmente atribua aos tratados a prevalência no conflito: mesmo nessa hipótese, a primazia derivará da Constituição e não de uma apriorística força intrínseca da convenção internacional.

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2. Assim como não o afirma em relação às leis, a Constituição não precisou dizer-se sobreposta aos tratados: a hierarquia está ínsita em preceitos inequívocos seus, como os que submetem a aprovação e a promulgação das convenções ao processo legislativo ditado pela Constituição e menos exigente que o das emendas a ela e aquele que, em conseqüência, explicitamente admite o controle da constitucionalidade dos tratados (CF, art. 102, III, b).3. Alinhar-se ao consenso em torno da estatura infraconstitucional, na ordem positiva brasileira, dos tratados a ela incorporados, não implica assumir compromisso de logo com o entendimento - majoritário em recente decisão do STF (ADInMC 1.480) - que, mesmo em relação às convenções internacionais de proteção de direitos fundamentais, preserva a jurisprudência que a todos equipara hierarquicamente às leis ordinárias.4. Em relação ao ordenamento pátrio, de qualquer sorte, para dar a eficácia pretendida à cláusula do Pacto de São José, de garantia do duplo grau de jurisdição, não bastaria sequer lhe conceder o poder de aditar a Constituição, acrescentando-lhe limitação oponível à lei como é a tendência do relator: mais que isso, seria necessário emprestar à norma convencional força ab-rogante da Constituição mesma, quando não dinamitadoras do seu sistema, o que não é de admitir. III. Competência originária dos Tribunais e duplo grau de jurisdição.1. Toda vez que a Constituição prescreveu para determinada causa a competência originária de um Tribunal, de duas uma: ou também previu recurso ordinário de sua decisão (CF, arts. 102, II, a; 105, II, a e b; 121, § 4º, III, IV e V) ou, não o tendo estabelecido, é que o proibiu.2. Em tais hipóteses, o recurso ordinário contra decisões de Tribunal, que ela mesma não criou, a Constituição não admite que o institua o direito infraconstitucional, seja lei ordinária seja convenção internacional: é que, afora os casos da Justiça do Trabalho - que não estão em causa - e da Justiça Militar - na qual o STM não se superpõe a outros Tribunais -, assim como as do Supremo Tribunal, com relação a todos os demais Tribunais e Juízos do País, também as competências recursais dos outros Tribunais Superiores - o STJ e o TSE - estão enumeradas taxativamente na Constituição, e só a emenda constitucional poderia ampliar. 3 .À falta de órgãos jurisdicionais ad qua, no sistema constitucional, indispensáveis a viabilizar a aplicação do princípio do duplo grau de jurisdição aos processos de competência originária dos Tribunais, segue-se a incompatibilidade com a Constituição da aplicação no caso da norma internacional de outorga da garantia invocada.

3. NATUREZA JURÍDICA

Temos, sobre o tema, várias discussões na doutrina:

Uma primeira corrente entende que o recurso funciona como uma nova ação dentro do mesmo processo (posição minoritária);

Há quem entenda que o recurso possui natureza jurídica de recurso (instrumento destinado a obter o reexame da decisão);

O posicionamento que prevalece é o de que o recurso funciona como um desdobramento do direito de ação.

4. PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE RECURSAL (JUÍZO DE PRELIBAÇÃO)

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Em regra, sua presença é aferida tanto pelo juízo a quo quanto pelo ad quem.

Cuidado para não confundir o juízo de admissibilidade recursal com o juízo de mérito recursal. No primeiro, o Tribunal irá verificar a presença dos pressupostos, os quais, se presentes, autorizam o conhecimento do recurso. Já no segundo, o Tribunal analisa sobre o provimento ou não do recurso. No primeiro, ambos os juízos verificam os pressupostos, mas quem dá a última palavra em relação à admissibilidade é o juiz ad quem. No segundo, por sua vez, analisa o mérito, em regra, apenas o juízo ad quem.

Em suma:

Juízo de admissibilidade Juízo de mérito

Conhecimento do recurso; Provimento do recurso;

Juiz a quo: provisória; juiz ad quem: definitiva.

Juízo ad quem;

OBS: “mérito” é a matéria devolvida ao conhecimento do Tribunal, que não é, necessariamente, apenas a discussão sobre a condenação ou não do réu.

Ex.: pode discutir-se, no mérito, a existência de alguma nulidade.

O juízo de admissibilidade é extremamente importante, pois a partir do momento em que houve o conhecimento do recurso opera-se o chamado “efeito substitutivo”:

Art. 512. O julgamento proferido pelo tribunal substituirá a sentença ou a decisão recorrida no que tiver sido objeto de recurso.

Ainda que o Tribunal negue provimento ao recurso, se ele foi conhecido, há uma substituição da decisão impugnada pela do Tribunal.

A importância disso se dá em relação à competência para julgamento de eventual revisão criminal ou HC: tendo o Tribunal conhecido o recurso, ele passa a ser a autoridade coatora.

A revisão criminal é sempre uma ação autônoma de impugnação da competência dos Tribunais (exceção: Turma Recursal do Juizado, que julga a revisão de seus juízes e de seus próprios julgados), que pressupõe o trânsito em julgado de uma sentença condenatória.

Exemplo:

- Decisão de juiz estadual de 1ª instância de MG > revisão criminal será julgada pelo TJMG;

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- Acórdão condenatório do TJMG > revisão criminal será julgada pelo TJMG (os Tribunais julgam as revisões criminais em relação às sentenças proferidas pelos juízes a eles subordinados ou às suas próprias decisões);

- Acórdão condenatório do TJMG contra o qual foi interposto RE para o STF > se o RE não tiver sido conhecido, não terá se operado o efeito substitutivo, e, portanto, a revisão deverá ser apreciada pelo TJMG. Se, contudo, o RE tiver sido conhecido, a competência será: 1. Do próprio STF, desde que o objeto da revisão criminal tenha sido por ele apreciado no julgamento do RE; ou 2. Do TJMG, caso a revisão criminal tenha por objeto matéria que não foi apreciada pelo Supremo no julgamento do RE.

Por quê?

O RE é um recurso de fundamentação vinculada: só se devolve para o STF o conhecimento de matéria constitucional. Assim, ainda que ele tenha sido conhecido, a competência para o julgamento da revisão está diretamente ligada ao seu objeto: pode ser que a matéria discutida em sede de revisão não seja matéria constitucional (que, portanto, não foi devolvida ao STF). Nesse caso, a competência não poderá ser do STF. Nesse sentido: art. 263, p.ú., RI do STF.

Sobre o tema: STJ revisões criminais 717 e 319.

5. PRESSUPOSTOS OBJETIVOS DE ADMISSIBILIDADE RECURSAL

5.1 Cabimento

É a previsão legal da existência de recurso contra a decisão.

Como sabemos, nem todas as decisões estão submetidas a recurso. Assim, sempre que se for interpor um recurso, o primeiro passo é verificar se contra a decisão a ser impugnada a lei prevê algum.

No processo penal vigora a ideia (ou princípio) da irrecorribilidade das decisões interlocutórias: em regra, as decisões interlocutórias, no processo penal, são irrecorríveis, salvo se porventura listadas no art. 581, CPP.

Todavia, por mais que determinada decisão seja irrecorrível, tal decisão poderá ser impugnada em preliminar de futura e eventual apelação. Ex.: alegação de nulidade da decisão devido ao indeferimento da oitiva de prova testemunhal.

Além disso, no processo penal, se admite o uso do HC e do MS, podendo a parte, ainda, cogitar da correição parcial (no caso de error in procedendo).

5.2 Adequação

É a utilização da impugnação correta para se buscar o reexame da decisão.169

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É necessário, ao entrar com o recurso, que a parte verifique se o instrumento utilizado é o adequado, correto para impugnar aquela decisão.

Princípio da fungibilidade e mitigação da adequação: desde que não evidenciada a sua má-fé, o recorrente não ficará prejudicado pela interposição de um recurso por outro (“se você interpor o recurso errado, irei conhecê-lo como o correto”).

Art. 579, CPP:

        Art. 579.  Salvo a hipótese de má-fé, a parte não será prejudicada pela interposição de um recurso por outro.

        Parágrafo único.  Se o juiz, desde logo, reconhecer a impropriedade do recurso interposto pela parte, mandará processá-lo de acordo com o rito do recurso cabível.

A aplicação da fungibilidade depende da boa-fé do recorrente. Assim, a doutrina lista duas situações em que tal princípio não se aplica, vez que se caracteriza a má-fé:

- Quando não for observado o prazo previsto em lei para o recurso adequado;

- Quando houver erro grosseiro.

Ou seja: só é possível usar a fungibilidade quando houver dúvida objetiva sobre o recurso adequado. Ex.: suspensão condicional do processo > há quem entenda que caberia RESE e há quem entenda ser cabível apelação.

Uma vez aplicada a fungibilidade, o recurso equivocadamente interposto deverá ser conhecido e processado como o adequado (art. 579, p.ú.). Ex.: entra com apelação, mas era RESE > o recurso é processado de acordo com o rito do RESE (ex.: vai ter de baixar os autos à primeira instância para que o juízo a quo possa fazer sua retratação).

5.3 Tempestividade

A. Introdução

O recurso deve se interposto no prazo previsto em lei, sob pena de preclusão temporal. Por isso, é sempre importante que o recorrente atente para o início (dies a quo) e término do prazo (dies ad quem).

Observações importantes:

- O que interessa para aferir a tempestividade é a data do protocolo (ou data em que o recurso for entregue ao diretor), não podendo a parte sofrer qualquer prejuízo por falta dos funcionários;

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        Art. 575.  Não serão prejudicados os recursos que, por erro, falta ou omissão dos funcionários, não tiverem seguimento ou não forem apresentados dentro do prazo.

Sobre o tema:

STF Súmula nº 428 - 01/06/1964 - DJ de 6/7/1964, p. 2183; DJ de 7/7/1964, p. 2199; DJ de 8/7/1964, p. 2239.Prejudicialidade - Apelação Entregue em Cartório no Prazo Legal - Despachada Tardiamente    Não fica prejudicada a apelação entregue em cartório no prazo legal, embora despachada tardiamente.

- No processo penal, alguns recursos contra decisão de juiz de 1ª instância podem ser interpostos separadamente: a parte pode primeiro entrar com a chamada “petição de interposição”, apresentando, apenas depois, as razões recursais. Ex: RESE, agravo em execução e apelação.

Ex.: apelação – interposição em 5 dias; razões em 8 dias.

- Qual é o prazo que, inobservado, acarreta a intempestividade? O prazo para interposição ou o para as razões? A tempestividade deve ser aferida segundo a data de interposição de recurso. Na visão dos Tribunais, a apresentação de razões recursais fora do prazo é mera irregularidade.

B. O início do prazo recursal

Art. 798, CPP:

        Art. 798.  Todos os prazos correrão em cartório e serão contínuos e peremptórios, não se interrompendo por férias, domingo ou dia feriado.

        § 1o  Não se computará no prazo o dia do começo, incluindo-se, porém, o do vencimento.

Primeiramente, devemos atentar que o prazo recursal é prazo de natureza processual. Portanto, o dia de início não é levado em consideração: o prazo começa a fluir no primeiro dia útil subsequente à intimação.

        § 2o  A terminação dos prazos será certificada nos autos pelo escrivão; será, porém, considerado findo o prazo, ainda que omitida aquela formalidade, se feita a prova do dia em que começou a correr.

        § 3o  O prazo que terminar em domingo ou dia feriado considerar-se-á prorrogado até o dia útil imediato.

        § 4o  Não correrão os prazos, se houver impedimento do juiz, força maior, ou obstáculo judicial oposto pela parte contrária.

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Em seguida, devemos nos lembrar que o dies ad quem sempre deverá ocorrer em dia útil, sendo que, se cair em dia não útil, deve-se aguardar o primeiro dia útil subsequente.

Além disso, o prazo começa a fluir, em regra, a partir da intimação:

        § 5o  Salvo os casos expressos, os prazos correrão:

        a) da intimação;

A intimação pode ser:

- Intimação pessoal:

- MP/Defensor Público;

- Defensor dativo;

- Acusado.

- Mediante publicação:

- Defensor constituído do acusado;

- Advogado do querelante;

- Advogado do assistente.

Ex.: imagine que uma sentença condenatória tenha sido proferida, mas que o cartório tenha se esquecido de intimar pessoalmente o Defensor Público. Nesse caso, não havendo recurso, o trânsito em julgado será nulo, devendo ser rescindido, dando-se oportunidade para o conhecimento de uma apelação.

Intimação por precatória:

STF Súmula nº 710 - 24/09/2003 - DJ de 9/10/2003, p. 6; DJ de 10/10/2003, p. 6; DJ de 13/10/2003, p. 6.Processo Penal - Contagem de Prazo    No processo penal, contam-se os prazos da data da intimação, e não da juntada aos autos do mandado ou da carta precatória ou de ordem.

Cuidado com a publicação nos finais de semana:

Quando a publicação é feita no fim de semana, é como se ela fosse feita no primeiro dia útil subsequente (se ocorreu em um sábado é como se tivesse sido feita na segunda, e o prazo apenas começa a contar na terça).

STF Súmula nº 310 - 13/12/1963 - Súmula da Jurisprudência Predominante do Supremo Tribunal Federal - Anexo ao Regimento Interno. Edição: Imprensa Nacional, 1964, p. 138.

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Intimação ou Publicação com Efeito de Intimação na Sexta-Feira - Início do Prazo Judicial    Quando a intimação tiver lugar na sexta-feira, ou a publicação com efeito de intimação for feita nesse dia, o prazo judicial terá início na segunda-feira imediata, salvo se não houver expediente, caso em que começará no primeiro dia útil que se seguir.

Além disso, o prazo pode começar a fluir a partir da audiência ou sessão de julgamento em que for proferida a decisão, se a parte estiver presente:

 § 5o  Salvo os casos expressos, os prazos correrão:

b) da audiência ou sessão em que for proferida a decisão, se a ela estiver presente a parte;

CUIDADO: atenção aos arts. 443 e 529 do CPPM:

Leitura da sentença em sessão pública e intimação

        Art. 443. Se a sentença ou decisão não fôr lida na sessão em que se proclamar o resultado do julgamento, sê-lo-á pelo auditor em pública audiência, dentro do prazo de oito dias, e dela ficarão, desde logo, intimados o representante do Ministério Público, o réu e seu defensor, se presentes.

    Interposição e prazo

        Art. 529. A apelação será interposta por petição escrita, dentro do prazo de cinco dias, contados da data da intimação da sentença ou da sua leitura em pública audiência, na presença das partes ou seus procuradores.

No Tribunal do Júri, quando a pessoa é julgada, o Juiz-Presidente, ao final, não só proclama o veredicto, como também profere, desde já, a decisão. O julgamento no Justiça Militar é semelhante ao júri, mas a lei prevê que o juiz pode publicar a decisão no dia do julgamento ou no prazo de 8 dias. Assim, se o juiz não ler a decisão no dia do julgamento o prazo recursal não começa a fluir ainda (o prazo começa a fluir do dia em que a decisão for lida, e não em que o resultado for proclamado). Nesse sentido: STF HC 91.206.

Por fim, o prazo pode, ainda, começar a correr do dia em que a parte manifestar nos autos ciência:

         § 5o  Salvo os casos expressos, os prazos correrão:

       c) do dia em que a parte manifestar nos autos ciência inequívoca da sentença ou despacho.

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C. Prazo recursal da defesa

O processo penal possui uma peculiaridade que o diferencia do civil: o acusado possui legitimidade e capacidade postulatória autônoma para recorrer, independentemente de seu advogado.

        Art. 577.  O recurso poderá ser interposto pelo Ministério Público, ou pelo querelante, ou pelo réu, seu procurador ou seu defensor.

        Parágrafo único.  Não se admitirá, entretanto, recurso da parte que não tiver interesse na reforma ou modificação da decisão.

Tanto o acusado quanto seu advogado podem interpor recursos, sendo que aquele apenas pode interpô-los na primeira instância. Isso porque essa capacidade está ligada aos recursos nos quais pode a parte interpor e depois apresentar as razões. Não pode, portanto, o acusado apresentar razões, o que é ato privativo de advogado, que possui conhecimentos técnicos para tal.

Tendo os dois capacidade postulatória, ambos devem ser intimados da sentença condenatória (e não apenas o advogado), sendo irrelavante qual dos dois é intimado primeiramente.

Se os dois são intimados, pode ser que o advogado tenha perdido seu prazo, o que não acarretará prejuízos ao recurso do acusado.

A intimação do acusado apenas é importante quando ele possui capacidade postulatória. Assim, de um acórdão condenatório, por exemplo, não haveria necessidade de intimação do acusado (salvo nos casos de competência originária dos Tribunais, no qual existem julgados entendendo que seria sim necessária tal intimação – STJ HC 74.550).

CRIMINAL. HC. INJÚRIA CONTRA FUNCIONÁRIO PÚBLICO. FORO PRIVILEGIADO.

CONDENAÇÃO PELA CORTE ESTADUAL. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO PESSOAL DA PACIENTE E DO SEU DEFENSOR. ADVOGADO INTIMADO VIA IMPRENSA OFICIAL.

IRRELEVÂNCIA. OFENSA À AMPLA DEFESA. ART. 392 DO CPP. APLICAÇÃO NO TOCANTE À SENTENÇA DE 1º GRAU. ACÓRDÃO QUE SE EQUIVALE À DECISÃO MONOCRÁTICA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL CONFIGURADO. ORDEM CONCEDIDA.

Hipótese na qual a paciente foi condenada pela Corte Estadual, em virtude de possuir foro privilegiado, não tendo sido intimada pessoalmente da sentença, tampouco seu defensor, havendo somente publicação do acórdão via imprensa oficial.

É pacífica a jurisprudência desta Corte no sentido de que o princípio da ampla defesa impõe a intimação do réu, pessoalmente ou por edital, conforme o caso, e de seu defensor, constituído ou dativo, do teor da sentença condenatória, sob pena de nulidade.

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Precedentes.

O fato de a sentença condenatória ter sido proferida por órgão colegiado do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais não retira do acórdão o caráter de decisão final de primeiro grau, pois este se equivale à sentença proferida pelo Juízo monocrático, em virtude de ser o primeiro decisum e não reexame de condenação.

As regras dispostas no art. 392 do CPP devem se aplicadas ao caso, pois não se trata de julgamento de segundo grau, no qual é abrandada a obrigatoriedade de intimação pessoal do réu e de seu defensor para que a publicação do acórdão ocorra na imprensa oficial.

Deve ser suspensa a execução da pena imposta à acusada e anulada a certidão de trânsito em julgado da condenação, para que seja realizada sua intimação pessoal do decreto condenatório, bem como a de seu defensor, abrindo-se prazo para a interposição de eventual recurso.

Ordem concedida, nos temos do voto do Relator.

(HC 74.550/MG, Rel. Ministro GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em 17/05/2007, DJ 29/06/2007 p. 681)

D. Início do prazo recursal do MP

STF HC 83.255: o prazo do MP deve começar a fluir quando os autos derem entrada no setor administrativo do órgão, independentemente da data em que o promotor resolver apor seu “ciente” nos autos.

PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO CULPOSO. APELAÇÃO. MINISTÉRIO PÚBLICO. TERMO INICIAL. ENTRADA DO PROCESSO NA INSTITUIÇÃO. PRECEDENTES. INTEMPESTIVIDADE RECURSAL. ORDEM CONCEDIDA.I. É assente a jurisprudência desta Corte no sentido de que, com o julgamento do HC 83.255/SP pelo Supremo Tribunal Federal, o início do prazo recursal para o Ministério Público deve ser contado da entrada dos autos na instituição ministerial. Precedentes.II. No presente feito, recebido o processo no Ministério Público do Estado de São Paulo em 30 de março de 2004, o último dia para interposição do apelo criminal era 4 de abril de 2004, porém, sendo um domingo, prorrogou-se o prazo para o primeiro dia útil subsequente, 5 de abril. Interposta a apelação em 6 de abril de 2004, esta encontra-se intempestiva.III. Ordem concedida para anular o acórdão proferido pelo Tribunal a quo e restabelecer a sentença absolutória, estendendo-se a presente, de ofício, ao corréu Givaldo das Neves Costa.

E. Prazos recursais diversos

- 48 horas: carta testemunhável: quando juiz denega recurso ou nega seguimento a outro recurso:

               Art. 639.  Dar-se-á carta testemunhável:

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        I - da decisão que denegar o recurso;

        II - da que, admitindo embora o recurso, obstar à sua expedição e seguimento para o juízo ad quem.

Art. 640.  A carta testemunhável será requerida ao escrivão, ou ao secretário do tribunal, conforme o caso, nas quarenta e oito horas seguintes ao despacho que denegar o recurso, indicando o requerente as peças do processo que deverão ser trasladadas.

Cuidado com a apelação: quando a apelação é denegada cabe RESE (e não carta testemunhável).

A carta é dirigida ao escrivão (diretor de secretaria) no prazo de 48 horas. Mas cuidado: o prazo só será contado em horas se constar do mandado a hora da intimação.

- 2 dias: embargos de declaração (na primeira e segunda instância) e embargos de declaração em matéria penal no STJ (art. 263, RI STJ).

OBS.: em se tratando de matéria cível o prazo dos embargos de declaração no STJ será de 5 dias.

- 5 dias: apelação, RESE, embargos de declaração nos Juizados, embargos de declaração no STF, recurso ordinário para o STJ e STF contra decisões denegatórias de HC, correição parcial, agravo em execução (art. 197, LEP c/c súmula 700, STF) e protesto por novo júri (revogado pela 11.689/08 – continuaria valendo, para uma minoria, para os crimes praticados antes de sua revogação).

- 10 dias: embargos infringentes e de nulidade (cabíveis contra decisões não unânimes em apelação, RESE e agravo em execução dos TJ’s e TRF’s) e apelação nos Juizados Especiais Criminais.

- 15 dias: RE, REsp e recurso ordinário para o STJ contra as decisões denegatórias do MS (art. 33, Lei 8.038/90).

- 20 dias: RESE contra a lista geral dos jurados (obs.: há doutrinadores que entendem que este recurso teria sido tacitamente revogado pela lei 11.689/08).

F. Prazo em dobro

Defensor Público da União, DF e estados > art. 44, I, LC 80/94.

CUIDADO: o art. 9º da Lei 10.259/01 (Juizados Especiais Federais) prevê que não haverá prazo diferenciado para a prática de qualquer ato processual nos JEF. Há uma enorme discussão se essa vedação também seria aplicável à Defensoria nos JEF: alguns entendem que a DP não é pessoa jurídica de direito público, e que, por isso, a ela não se aplicaria este prazo; outros afirmam que a lei 10.259, por ser LO não poderia alterar a previsão da LC 80; prevalece, contudo, que a DPU NÃO tem prazo em dobro no Juizado Especial Federal.

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MP e defensor dativo NÃO têm prazo em dobro no processo penal; eles têm apenas direito à intimação pessoal.

G. Férias forenses

A EC 45 trouxe uma mudança sobre o tema:

Art. 93, XII, CRFB:

XII a atividade jurisdicional será ininterrupta, sendo vedado férias coletivas nos juízos e tribunais de segundo grau, funcionando, nos dias em que não houver expediente forense normal, juízes em plantão permanente; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)

Apesar de a CRFB dizer que não haverá férias, a própria lei da JF prevê recesso entre o dias 20 de dezembro e 6 de janeiro. A resolução n. 08 do CNJ confirma a validade desse recesso.

H. Interposição de recursos via fax e meios eletrônicos

Cuidado com a lei 9.800/99:

Art. 2o A utilização de sistema de transmissão de dados e imagens não prejudica o cumprimento dos prazos, devendo os originais ser entregues em juízo, necessariamente, até cinco dias da data de seu término.

        Parágrafo único. Nos atos não sujeitos a prazo, os originais deverão ser entregues, necessariamente, até cinco dias da data da recepção do material.

        Art. 4o Quem fizer uso de sistema de transmissão torna-se responsável pela qualidade e fidelidade do material transmitido, e por sua entrega ao órgão judiciário.

        Parágrafo único. Sem prejuízo de outras sanções, o usuário do sistema será considerado litigante de má-fé se não houver perfeita concordância entre o original remetido pelo fac-símile e o original entregue em juízo.

Entende-se, hoje, que o prazo de 5 dias para a juntada dos autos ao original deverá ser contado do fim do término do prazo de recurso.

Em relação à utilização dos meios eletrônicos é necessário atentar à Lei 11.419:

Art. 1o  O uso de meio eletrônico na tramitação de processos judiciais, comunicação de atos e transmissão de peças processuais será admitido nos termos desta Lei.

§ 1o  Aplica-se o disposto nesta Lei, indistintamente, aos processos civil, penal e trabalhista, bem como aos juizados especiais, em qualquer grau de jurisdição.

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Art. 2o  O envio de petições, de recursos e a prática de atos processuais em geral por meio eletrônico serão  admitidos mediante uso de assinatura eletrônica, na forma do art. 1o desta Lei, sendo obrigatório o credenciamento prévio no Poder Judiciário, conforme disciplinado pelos órgãos respectivos.

Art. 6o  Observadas as formas e as cautelas do art. 5o desta Lei, as citações, inclusive da Fazenda Pública, excetuadas as dos Direitos Processuais Criminal e Infracional, poderão ser feitas por meio eletrônico, desde que a íntegra dos autos seja acessível ao citando.

O uso de meio eletrônico é autorizado em processo penal, exceto quanto à citação.

5.4 Inexistência de fato impeditivo

Como o próprio nome sugere, alguns fatos podem impedir o conhecimento do recurso. Esses fatos impeditivos sempre irão ocorrer antes da interposição do recurso.

Quais são os fatos impeditivos?

A. Renúncia ao direito de recorrer

Ocorre quando a parte abre mão do direito de recorrer. É sempre ANTERIOR à interposição do recurso.

O princípio mais básico do recurso é a voluntariedade: o recurso é sempre voluntário (ninguém é obrigado a recorrer). Assim, a renúncia nada mais é que um desobramento lógico do princípio da voluntariedade.

Mas a renúncia é sempre possível?

- O MP pode renunciar ao direito de recorrer?

1ª corrente (Pacelli): o MP não pode renunciar, sob pena de violação do princípio da indisponibilidade do interesse público;

2ª corrente (Denílson Feitosa): o MP pode renunciar, já que ele não é obrigado a recorrer (princípio da voluntariedade), em virtude de sua independência funcional. É a corrente com a qual o professor concorda.

- No processo penal, como sabemos, há legitimidade autônoma do acusado e do defensor para a interposição de recurso. Diante da renúncia feita pelo acusado, pode o defensor recorrer?

A renúncia de um não prejudica o recurso interposto pelo outro. Sobre o tema: súmula 705, STF:

STF Súmula nº 705 - 24/09/2003 - DJ de 9/10/2003, p. 6; DJ de 10/10/2003, p. 6; DJ de 13/10/2003, p. 6.

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Renúncia do Réu ao Direito de Apelação - Conhecimento da Interposta pelo Defensor    A renúncia do réu ao direito de apelação, manifestada sem a assistência do defensor, não impede o conhecimento da apelação por este interposta.

O acusado, não obstante tenha poder postulatório, não pode, sem advogado, apresentar razões. Ou seja: não pode o acusado ficar sem advogado. O que ocorre, então, se, durante a tramitação do recurso, o advogado morrer ou tiver de suspender/cancelar sua OAB? Se durante a tramitação do recurso o advogado renuncia aos seus poderes, deve o juiz intimar o acusado para que constitua novo advogado, sob pena de nomeação de dativo:

STF Súmula nº 708 - 24/09/2003 - DJ de 9/10/2003, p. 6; DJ de 10/10/2003, p. 6; DJ de 13/10/2003, p. 6.Nulidade do Julgamento da Apelação - Posterioridade - Manifestação nos Autos da Renúncia do Único Defensor - Intimação Prévia do Réu para Constituir Outro    É nulo o julgamento da apelação se, após a manifestação nos autos da renúncia do único defensor, o réu não foi previamente intimado para constituir outro.

B. Preclusão

O processo é uma marcha para frente; trabalha-se com a ideia de que o procedimento caminha rumo a uma decisão final. Daí a importância da preclusão, que funciona como um fato impeditivo destinado a garantir a marcha processual.

A preclusão repercute no direito recursal:

- Preclusão temporal: ocorre devido ao não exercício de determinada faculdade processual no prazo determinado. Ex.: não interposição da apelação no prazo de 5 dias da intimação.

- Preclusão lógica: decorre da incompatibilidade da prática de um ato processual com relação a outro já praticado. Ex.: o acusado que renunciar ao seu direito de recurso não pode, posteriormente, interpor recurso.

- Preclusão consumativa: provoca perda de uma faculdade processual pelo fato de já ter havido o exercício válido dessa faculdade. Ex.: interposição de uma apelação, em dois dias, delimitando a matéria, e uma segunda interposição de apelação, depois de um dia, aumentando o matéria devolvida.

C. Recolhimento do acusado à prisão nos casos previstos em lei

ATENÇÃO: HOJE JÁ NÃO É MAIS FATO IMPEDITIVO, mas, ainda assim, é necessário estudarmos.

O revogado art. 594, CPP (confirmado pelo súmula 09 do STJ) exigia o recolhimento do acusado à prisão para apelar, desde que não fosse primário nem tivesse bons antecedentes:

STJ Súmula nº 9 - 06/09/1990 - DJ 12.09.1990 SUPERADAPrisão Provisória - Apelação - Presunção de Inocência

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    A exigência da prisão provisória, para apelar, não ofende a garantia constitucional da presunção de inocência.

Esse entendimento começa a se modificar no julgamento do HC 88.420, no qual o STF, afirmando a importância do duplo grau de jurisdição (art. 8º, §2º, h, CADH), decide pela inconstitucionalidade do art. 594, CPP.

Após essa emblemática decisão, o próprio STJ também altera seu entendimento e edita outra súmula, a 347:

STJ Súmula nº 347 - 23/04/2008 - DJe 29/04/2008Conhecimento de Recurso de Apelação do Réu - Dependência - Prisão    O conhecimento de recurso de apelação do réu independe de sua prisão.

Isso não significa, contudo, que o juiz não possa mandar prender o réu. Pode sim, desde que presente ao menos uma das hipóteses previstas no CPP.

Posteriormente entra em vigor a Lei 11.719/08, que encampa o entendimento jurisprudencial e, de maneira expressa, revoga o art. 594, CPP e traz uma importante mudança no art. 387, p.ú., in fine, do CPP, em que passa a constar que o conhecimento da apelação independe do recolhimento à prisão:

        Parágrafo único.  O juiz decidirá, fundamentadamente, sobre a manutenção ou, se for o caso, imposição de prisão preventiva ou de outra medida cautelar, sem prejuízo do conhecimento da apelação que vier a ser interposta. (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

Cuidado: da mesma forma que o art. 594 previa que o recurso não seria conhecido em não havendo o recolhimento à prisão, o também revogado art. 595 determinava a extinção do recurso caso o acusado fugisse durante sua tramitação. Este artigo, que já vinha sendo considerado inconstitucional pelos Tribunais, com o advento da Lei 12.403/11 é expressamente revogado.

Há, contudo, várias leis especiais que continuam prevendo a necessidade do recolhimento do acusado à prisão para apelar. No entendimento do professor, todos os dispositivos foram tacitamente revogados e, ainda que se entendesse pela não revogação, tais artigos ofenderiam a CADH. Exs.: art. 31, Lei 7.492/86 (crimes contra o sistema financeiro), art. 27, §2º, Lei 8.038/90 (regula o procedimento originário dos Tribunais), art. 2º, §3º, Lei 8.072/90 (crimes hediondos), art. 9º, Lei 9.084/95 (lei das organizações criminosas), art. 59, Lei 11.343/06 (lei de drogas) e art. 527, CPPM. TODOS eles hoje já não têm mais validade.

5.5 Inexistência de fato extintivo

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Pela própria termininologia percebe-se que o fato extintivo, ao contrário do impeditivo, ocorre durante a tramitação do recurso.

Verificando-se a superveniência de um fato extintivo, produz-se a EXTINÇÃO ANÔMALA do recurso.

A. Desistência

Diferencia-se da renúncia por ocorrer durante a tramitação do recurso.

A desistência sempre pode ocorrer? NÃO!

- O MP não pode desistir de recurso que haja interposto:

        Art. 576.  O Ministério Público não poderá desistir de recurso que haja interposto.

Cuidado com a hipótese em que um promotor interpõe e outro apresenta razões. Neste caso, há alguma discussão na doutrina: pode ser que o segundo promotor não concorde com o inconformismo do primeiro. Há doutrinadores que entendem que o segundo é obrigado a apresentar razões no mesmo sentido; há, porém, quem defenda que, em virtude da independência funcional, o segundo será obrigado a apresentar razões, mas não necessariamente no sentido entendido pelo primeiro.

- Desistência por parte do advogado: tendo em vista a capacidade postulatória do acusado, antes de extinguir o recurso é interessante que o juiz colha a manifestação do acusado (intime o acusado da petição de desistência do advogado).

- Possibilidade ou não de desistência por Defensor Público ou dativo: para a prova de Defensoria é necessário dizer que a desistência é impossível, vez que o Defensor público exerce munus público, não podendo dispor do processo. Entretanto, nas demais provas, devemos falar que, devido à voluntariedade, pode o Defensor desistir do recurso, se entender que tal ato coaduna-se com o melhor interesse do acusado (há situações que a tramitação recurso pode causar mais danos que benefícios ao acusado). Nesse sentido: STF HC 93.120:

HC N. 93.120-SCRELATOR: MIN. JOAQUIM BARBOSAEMENTA: HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. AUSÊNCIA DE INTERPOSIÇÃO DE APELAÇÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. RÉUS E DEFENSOR CONSTITUÍDO REGULARMENTE INTIMADOS DA SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA. NECESSIDADE DO MANDADO DE INTIMAÇÃO DE SENTENÇA SER ACOMPANHADO DE TERMO DE APELAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. ORDEM DENEGADA. 1. Os réus e o defensor constituído foram regularmente intimados da sentença penal condenatória. 2. A não interposição de apelação não equivale à ausência de defesa, porquanto o defensor constituído ofereceu embargos de declaração à sentença penal condenatória em tempo hábil. Ausência de recurso que se situa no âmbito da estratégia de defesa delineada pelo defensor constituído, dada a voluntariedade

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recursal. 3. Não há qualquer dispositivo legal que determine a necessidade de o mandado de intimação de sentença condenatória ser acompanhado de um termo de apelação. Ausência de constrangimento ilegal. 4. Negado provimento ao writ.

A própria LC 80, em seu art. 45, VII, ao tratar dos deveres do Defensor, diz que ele tem o dever de recorrer “sempre que encontrar fundamentos na lei, jurisprudência ou prova dos autos”. Imaginando um hipótese em que não haja fundamento, não há por que não se admitir a renúncia ou desistência do Defensor, sempre intimando, claro, o acusado.

B. Deserção

A deserção também acarreta a extinção anômala do recurso, e pode acontecer em duas situações:

- Por falta de preparo;

Quem é obrigado a realizar o preparo no processo penal?

Art. 806, CPP:

Art. 806.  Salvo o caso do art. 32 (pobre), nas ações intentadas mediante queixa, nenhum ato ou diligência se realizará, sem que seja depositada em cartório a importância das custas.

        § 2o  A falta do pagamento das custas, nos prazos fixados em lei, ou marcados pelo juiz, importará renúncia à diligência requerida ou deserção do recurso interposto.

O artigo 806, §2º prevê que a falta do pagamento das custas acarretará na deserção do recurso interposto. Mas essa necessidade do preparo aplica-se a todos? NÃO! A necessidade do preparo aplica-se apenas às ações penais exclusivamente privadas ou personalíssima.

Aplica-se tanto ao querelado quanto ao querelante? NÃO! A exigência do preparo aplica-se apenas ao recurso do querelante, ressalvada a hipótese de comprovada pobreza.

- Deserção em virtude da fuga do acusado:

Era prevista no revogado art. 595, CPP. Portanto, hoje, NÃO mais existe a deserção em virtude da fuga.

5.6 Regularidade formal

Cuida da forma de interposição do recurso e da motivação.

Quanto à forma de interposição, no primeiro grau de jurisdição, a grande maioria dos recursos no processo penal pode se dar mediante termo nos autos ou por meio de petição, senão vejamos:

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        Art. 578.  O recurso será interposto por petição ou por termo nos autos, assinado pelo recorrente ou por seu representante.

§ 1o  Não sabendo ou não podendo o réu assinar o nome, o termo será assinado por alguém, a seu rogo, na presença de duas testemunhas.

O que é esse “termo”? É a manifestação inequívoca da parte quanto a sua vontade de recorrer. Ex.: o acusado, no momento de sua intimação no presídio, demonstra, para o Oficial de Justiça, seu inconformismo. O Oficial deve registrar esse inconformismo, que será considerado “termo nos autos”.

Em relação às decisões de segundo grau, contudo, não se admite a interposição por termo, havendo forma determinada. Ex.: recurso extraordinário pressupõe apresentação conjunta das razões.

A ideia da motivação está ligada aos recursos de fundamentação vinculada: há certos recursos em que a fundamentação se limita aos casos previstos em lei (a exemplo dos recursos extraordinários). Faltando essa motivação, portanto, haverá violação à regularidade formal.

Cuidado com as hipóteses em que haja a necessidade de formação de instrumento (ex.: agravo de instrumento): nesses casos, o ônus é do recorrente, que, se não formar o instrumento corretamente, não terá seu recurso conhecido por ausência de regularidade formal. Nesse sentido: súmula 115 do STJ:

STJ Súmula nº 115 - 27/10/1994 - DJ 07.11.1994Instância Especial - Recurso - Advogado sem Procuração    Na instância especial é inexistente recurso interposto por advogado sem procuração nos autos.

O STF entende que essa súmula aplica-se no processo penal, com um cuidado: existe a possibilidade de constituir o advogado por procuração ou, ainda, no ato da audiência:

        Art. 266.  A constituição de defensor independerá de instrumento de mandato, se o acusado o indicar por ocasião do interrogatório.

Nesses casos, deverá ser juntada não a procuração (que inexiste), mas sim cópia da ata de audiência.

6. PRESSUPOSTOS SUBJETIVOS

6.1 Legitimidade recursal

A. Legitimação ampla

Art. 577, CPP:

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        Art. 577.  O recurso poderá ser interposto pelo Ministério Público, ou pelo querelante, ou pelo réu, seu procurador ou seu defensor.

Essa legitimidade do art. 577 é denominada pela doutrina de “legitimação ampla”: são os legitimados gerais, que podem interpor qualquer recurso.

Vale lembrar que, no processo penal, tanto o acusado quanto seu defensor são dotados de capacidade postulatória.

Quanto ao acusado, devemos nos lembrar que a ampla defesa no processo penal se subdivide em duas:

- Defesa técnica; e

- Autodefesa:

- Direito de presença: possibilidade de o réu acompanhar os atos instrutórios;

- Direito de audiência: possibilidade de ser ouvido pelo juiz;

- Capacidade postulartória autônoma: possibilidade de interpor recursos ainda que sem advogado (cuidado: o acusado pode interpor recursos, mas não apresentar razões).

Por outro lado, no processo penal, o defensor possui uma legitimação autônoma para interpor recursos. Isso porque ele não é um mero representante processual do acusado; ele exerce um verdadeiro munus público. Assim, ainda que o acusado não tenha interesse em impugnar a decisão, seu advogado poderá fazê-lo (ainda que contra a sua vontade).

B. Legitimação restrita e subsidiária do assistente da acusação

Quem é o assistente? Na verdade, o assistente é a vítima ou seus sucessores (CADI).

O assistente só aparece, portanto, na ação penal pública (na ação penal privada a vítima não é mais assistente; é querelante).

Art. 268, CPP:

        Art. 268.  Em todos os termos da ação pública, poderá intervir, como assistente do Ministério Público, o ofendido ou seu representante legal, ou, na falta, qualquer das pessoas mencionadas no Art. 31. (CADI)

“Legitimação restrita”: o próprio CPP tem previsão expressa de recurso do assistente apenas nas seguintes hipóteses:

Art. 584, §1º:

        § 1o  Ao recurso interposto de sentença de impronúncia ou no caso do no VIII do art. 581 (julga extinta a punibilidade), aplicar-se-á o disposto nos arts. 596 e 598.

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Art. 598:

        Art. 598.  Nos crimes de competência do Tribunal do Júri, ou do juiz singular, se da sentença não for interposta apelação pelo Ministério Público no prazo legal, o ofendido ou qualquer das pessoas enumeradas no art. 31, ainda que não se tenha habilitado como assistente, poderá interpor apelação, que não terá, porém, efeito suspensivo.

A lei prevê o cabimento de recurso por parte do assistente apenas nessas restritas hipóteses:

- RESE contra a extinção da punibilidade;

- Apelação contra a impronúncia;

- Apelação contra a sentença absolutória (absolvição sumária).

Pode o assistente, contudo, interpor, por exemplo, carta testemunhável? Sim! A lei prevê apenas esses três recursos, mas quaisquer dos outros poderão ser utilizados em desdobramento a esses. Ex.: interpõe RESE, que é denegado > pode interpor carta testemunhável.

Prova disso é a súmula 210 do STF:

STF Súmula nº 210 - 13/12/1963 - Súmula da Jurisprudência Predominante do Supremo Tribunal Federal - Anexo ao Regimento Interno. Edição: Imprensa Nacional, 1964, p. 104.Assistente do Ministério Público - Recursos em Apelação e Recurso em Sentido Estrito    O assistente do Ministério Público pode recorrer, inclusive extraordinariamente, na ação penal, nos casos dos arts. 584, parágrafo 1º e 598 do Código de Processo Penal.

Hoje há uma tendência de crescente importância do papel do assistente do MP no processo penal. Se antigamente o papel do assistente era limitado à obtenção de uma sentença condenatória, os Tribunais entendem que, hoje, o papel do assistente é obter uma sentença que seja justa e proporcional. Por isso, encontramos vários julgados que ampliam a legitimação prevista no CPP. Exemplos:

- Recurso do assistente contra sentença condenatória objetivando agravamento da pena;

- RESE do assistente contra pronúncia objetivando inclusão de qualificadora;

Cuidado com as mudanças produzidas pela lei 12.403/11, que deu nova redação a vários dispositivos, dentre os quais se destaca o art. 311 do CPP:

        Art. 311.  Em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, caberá a prisão preventiva decretada pelo juiz, de ofício, se no curso da ação penal,

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ou a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por representação da autoridade policial. (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

O assistente pode, agora, requerer a decretação da prisão preventiva.

Com essa nova redação, a súmula 208 do STF está ULTRAPASSADA:

STF Súmula nº 208 - 13/12/1963 - Súmula da Jurisprudência Predominante do Supremo Tribunal Federal - Anexo ao Regimento Interno. Edição: Imprensa Nacional, 1964, p. 103.Assistente do Ministério Público - Recurso Extraordinário - Decisão Concessiva de Habeas-Corpus    O assistente do Ministério Público não pode recorrer, extraordinariamente, de decisão concessiva de habeas-corpus.

“Legitimação subsidiária”: a atuação recursal do assistente depende da inércia do MP. O assistente da acusação apenas poderá interpor sua impugnação se o MP não o fizer.

        Art. 598.  Nos crimes de competência do Tribunal do Júri, ou do juiz singular, se da sentença não for interposta apelação pelo Ministério Público no prazo legal, o ofendido ou qualquer das pessoas enumeradas no art. 31 (CADI), ainda que não se tenha habilitado como assistente, poderá interpor apelação, que não terá, porém, efeito suspensivo.

Cuidado: ainda que o MP tenha recorrido, tratando-se de recurso parcial, poderá o assistente recorrer.

Ex.: imagine que a denúncia impute ao acusado o delito de homicídio qualificado consumado e que o juiz condene o réu apenas por tentativa de homicídio simples. O MP, então, recorre pedindo a qualifcadora. O assistente poderá recorrer pedindo o conhecimento da consumação.

Além disso, ainda que o MP recorra de toda a matéria, poderá o assistente apresentar razões.

        Art. 271.  Ao assistente será permitido propor meios de prova, requerer perguntas às testemunhas, aditar o libelo e os articulados, participar do debate oral e arrazoar os recursos interpostos pelo Ministério Público, ou por ele próprio, nos casos dos arts. 584, § 1o, e 598.

Ademais, o recurso do ofendido independe de sua prévia habilitação como assistente no processo (basta que faça prova de sua condição de vítima).

C. Prazo recursal

Qual é o prazo recursal do assistente?

- Se habilitado: 5 dias;

- Se não habilitado: 15 dias;

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Contados a partir do término do prazo do MP.

Sobre o assunto:

STF Súmula nº 448 - 01/10/1964 - DJ de 8/10/1964, p. 3646; DJ de 9/10/1964, p. 3666; DJ de 12/10/1964, p. 3698.Prazo para Recurso do Assistente do Ministério Público - Termo Inicial    O prazo para o assistente recorrer, supletivamente, começa a correr imediatamente após o transcurso do prazo do Ministério Público. (Revisão Preliminar pelo HC 50417-RTJ 68/604*)

6.2 Interesse recursal

Art. 577, p.ú.:

        Parágrafo único.  Não se admitirá, entretanto, recurso da parte que não tiver interesse na reforma ou modificação da decisão.

A doutrina costuma dizer que o interesse recursal deriva da sucumbência, compreendida como a situação de desvantagem jurídica oriunda da emergente decisão.

Não demonstrada a sucumbência o recurso sequer será conhecido.

Temos várias situações interessantes em que a doutrina discute se há ou não interesse recursal:

A. Sentença absolutória e interesse recursal da defesa

1ª situação: absolvição imprópria

A absolvição imprópria é aquela que se aplica ao inimputável do art. 26, caput, CP.

Essa sentença absolutória imprópria resulta na aplicação da medida de segurança, ou seja, o acusado estará sendo submetido a uma internação. Portanto, aqui, é claro o interesse recursal da defesa.

2ª situação: absolvição própria

Nesse caso, doutrina e jurisprudência entendem que pode haver interesse da defesa na mudança do fundamento da absolvição, de modo a fazer coisa julgada na esfera cível.

Explica-se. A depender do fundamento da absolvição, há repercussão ou não no cível: as absolvições por ausência de provas ou pela aplicação do in dubio pro reo, por exemplo, não fazem coisa julgada no cível. Já as absolvições pela inexistência do fato ou pelo reconhecimento de causa real de exclusão da ilicitude, fazem coisa julgada também no cível, afastando a possibilidade de cobrança de indenização.

Assim, pode ser que o acusado, mesmo que absolvido, tenha interesse em recorrer.

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B. Extinção da punibilidade e interesse recursal da defesa na apreciação do mérito

No Brasil, não é raro que, devido à morosidade da Justiça, ocorra a extinção da punibilidade pelo advento da prescrição.

Será que mesmo diante da extinção da punibilidade pode o acusado recorrer para buscar uma análise do mérito? NÃO! O acusado, aqui, não possui interesse processual. Entende-se que a extinção da punibilidade é matéria de ordem pública, que, logo, precede a análise do mérito. Além disso, quando há a extinção da punibilidade, para todos os efeitos, o acusado é considerado inocente. Nesse sentido: STJ REsp 908.863.

RECURSO ESPECIAL. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. EFEITOS PENAIS. INEXISTÊNCIA. FALTA DE INTERESSE RECURSAL. MÉRITO PREJUDICADO.

1. O Superior Tribunal de Justiça firmou compreensão no sentido de que, consumando-se o lapso prescricional (prescrição subsequente ou superveniente) na pendência de recurso especial, deve-se declarar, preliminarmente, a extinção da punibilidade, com prejuízo do exame do mérito da causa.

2. Com efeito, uma vez declarada extinta a punibilidade, nos termos do art. 107, IV, do Código Penal, mostra-se patente a falta de interesse dos recorrentes em obter a absolvição em face da suposta atipicidade da conduta, em razão dos amplos efeitos do reconhecimento deste instituto.

3. Recursos especiais prejudicados, em face do reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva.

(REsp 908.863/SP, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEXTA TURMA, julgado em 08/02/2011, DJe 25/04/2011)

C. Divergência entre o interesse recursal do acusado e de seu defensor

Acusado x defensor público ou dativo:

Sendo ambos dotados de legitimidade autônoma e de capacidade postulatória, prevalece a vontade de quem tem interesse em recorrer.

A súmula 705, STF confirma isso:

STF Súmula nº 705 - 24/09/2003 - DJ de 9/10/2003, p. 6; DJ de 10/10/2003, p. 6; DJ de 13/10/2003, p. 6.Renúncia do Réu ao Direito de Apelação - Conhecimento da Interposta pelo Defensor    A renúncia do réu ao direito de apelação, manifestada sem a assistência do defensor, não impede o conhecimento da apelação por este interposta.

D. Sentença condenatória/absolutória e interesse recursal do MP

Quais são os limites da atuação do MP?

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É necessário analisarmos o art. 127, caput da CRFB:

Art. 127. O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.

Pela dicção deste artigo ao MP incumbe a tutela dos interesses individuais indisponíveis, dentre os quais está a liberdade de locomoção.

Assim, o MP não tem interesse na condenação de um inocente. Por isso, ainda que o tenha denunciado, pode o MP pedir sua absolvição. Logo, desde que tenha havido sucumbência, o MP pode recorrer contra sentença condenatória, objetivando a absolvição do acusado.

Esse recurso do MP pode acontecer seja quando ele atua como parte, seja quando atua como fiscal da lei.

Na ação penal exclusivamente privada ou personalíssima, se o querelante não recorrer contra sentença absolutória NÃO se admite recurso do MP. Nesse caso os Tribunais entendem que vigora o princípio da disponibilidade: pode o querelante, se quiser, abrir mão de sua ação penal.

7. PRINCÍPIOS GERAIS DOS RECURSOS

7.1 Duplo grau de jurisdição

Já trabalhado na primeira aula.

Em suma:

- Para alguns doutrinadores estaria previsto de forma implícita na CRFB. Além disso, está expresso no art. 8º, §2º, h, da CADH.

- STF RHC 79.785: acusados com foro por prerrogativa de função não têm direito ao duplo grau.

7.2 Taxatividade dos recursos

Há necessidade de se verificar a previsão legal de recurso contra a decisão a ser impugnada.

É preciso equilíbrio: deve-se garantir o direito de a parte inconformada impugne a decisão; contudo, é necessário assegurar a razoável duração do processo, evitando a recorribilidade ad infinitum.

Além disso, a previsão do recurso deve estar em lei federal. Art. 22, I, CRFB:

Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:

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I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho;

CUIDADO: o fato de haver a necessidade de taxatividade não exclui a interpretação extensiva. Ex.: rol do art. 581, CPP.

  Art. 581.  Caberá recurso, no sentido estrito, da decisão, despacho ou sentença:

        V - que conceder, negar, arbitrar, cassar ou julgar inidônea a fiança, indeferir requerimento de prisão preventiva ou revogá-la, conceder liberdade provisória ou relaxar a prisão em flagrante; (Redação dada pela Lei nº 7.780, de 22.6.1989)

O artigo, por ser antigo, não engloba expressamente as medidas cautelares diversas de prisão. Todavia, sendo cabível RESE para contestar a decisão que indefere a preventiva, é óbvio que ele também poderá ser interposto contra a decisão que indeferir o requerimento dessas medidas.

7.3 Unirrecorribilidade

A cada decisão recorrível corresponde um único recurso.

Ex.: art. 593, §4º, CPP:

        § 4o  Quando cabível a apelação, não poderá ser usado o recurso em sentido estrito, ainda que somente de parte da decisão se recorra.  (Parágrafo único renumerado pela Lei nº 263, de 23.2.1948) princípio da consunção

A apelação tem o condão de absorver o RESE.

CUIDADO com as exceções a esse princípio (decisões em relação as quais seria cabível mais de um recurso):

- Protesto por novo júri quanto à condenação a pena igual ou superior a 20 anos e apelação quanto ao crime conexo > ERA hipótese bastante comum; não existe mais, vez que o protesto por novo júri foi EXTINTO pela lei 11.689/08;

- Cabimento simultâneo de RE e REsp;

Nesse sentido: art. 27, Lei 8.038/90:

§ 5º - Na hipótese de o relator do recurso especial considerar que o recurso extraordinário é prejudicial daquele em decisão irrecorrível, sobrestará o seu julgamento e remeterá os autos ao Supremo Tribunal Federal, para julgar o extraordinário.

        § 6º - No caso de parágrafo anterior, se o relator do recurso extraordinário, em despacho irrecorrível, não o considerar prejudicial, devolverá os autos ao Superior Tribunal de Justiça, para o julgamento do recurso especial.

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- Embargos infringentes e de nulidade contra a parte não unânime da decisão e RE ou REsp contra a parte unânime: apesar de ser muito citado pela doutrina, no âmbito do STJ esse exemplo não tem sido muito utilizado, pois o Tribunal entende que se aplica ao processo penal o art. 498, CPC (REsp 785.669):

Art. 498. Quando o dispositivo do acórdão contiver julgamento por maioria de votos e julgamento unânime, e forem interpostos embargos infringentes, o prazo para recurso extraordinário ou recurso especial, relativamente ao julgamento unânime, ficará sobrestado até a intimação da decisão nos embargos. (Redação dada pela Lei nº 10.352, de 26.12.2001)

Percebe-se que, aplicando o CPC, não haverá mais exceção à unirrecorribilidade.

7.4 Fungibilidade

Art. 579, caput:

        Art. 579.  Salvo a hipótese de má-fé, a parte não será prejudicada pela interposição de um recurso por outro.

7.5 Convolação

Uma impugnação adequada pode ser conhecida como se fosse outra.

Cuidado para não confundir com a fungibilidade! Nesta, o recorrente entra com o recurso errado e o Tribunal conhece como se fosse o correto. Naquela, o recorrente entra com o recurso correto, mas o Tribunal o conhece como se fosse outro, por ser mais vantajoso.

Ex.: José foi condenado por sentença transitada em julgado e está preso. Ocorre que a sentença foi prolatada por um juiz absolutamente incompetente. O advogado, então, entra com uma revisão criminal. O Tribunal conhece a revisão como se fosse um pedido de HC, que, in casu, será muito mais vantajoso ao réu, que poderá, inclusive, ser posto em liberdade por eventual concessão de liminar.

7.6 Voluntariedade

A existência de um recurso depende da manifestação da vontade da parte.

A parte não é obrigada a recorrer; recorre se quiser.

Será que para o MP e para a DP o recurso também é voluntário?

A jurisprudência entende que o recurso é voluntário para todos, inclusive MP e DP. A respeito: STF HC 93.120.

HC N. 93.120-SCRELATOR: MIN. JOAQUIM BARBOSA

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EMENTA: HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. AUSÊNCIA DE INTERPOSIÇÃO DE APELAÇÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. RÉUS E DEFENSOR CONSTITUÍDO REGULARMENTE INTIMADOS DA SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA. NECESSIDADE DO MANDADO DE INTIMAÇÃO DE SENTENÇA SER ACOMPANHADO DE TERMO DE APELAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. ORDEM DENEGADA. 1. Os réus e o defensor constituído foram regularmente intimados da sentença penal condenatória. 2. A não interposição de apelação não equivale à ausência de defesa, porquanto o defensor constituído ofereceu embargos de declaração à sentença penal condenatória em tempo hábil. Ausência de recurso que se situa no âmbito da estratégia de defesa delineada pelo defensor constituído, dada a voluntariedade recursal. 3. Não há qualquer dispositivo legal que determine a necessidade de o mandado de intimação de sentença condenatória ser acompanhado de um termo de apelação. Ausência de constrangimento ilegal. 4. Negado provimento ao writ.

CUIDADO com o chamado “recurso de ofício” (“reexame necessário”):

São aquelas situações em o que o juiz se vê obrigado a recorrer contra sua própria decisão. O juiz profere uma decisão e a submete ao reexame (remete os autos ao Tribunal).

Há quem entenda pela incompatibilidade desse instituto com o sistema acusatório, alegando sua não recepção pela CRFB/88. O STF, porém, entendeu ser o reexame necessário compatível com a Constituição.

O ideal, contudo, é não denominá-lo de “recurso de ofício”, já que, tecnicamente falando, sua natureza jurídica NÃO é de recurso, vez que falta-lhe a característica da voluntariedade.

O reexame necessário funcionaria como uma condição necessária à preclusão ou ao trânsito em julgado de determinada decisão.

Sobre o tema:

STF Súmula nº 423 - 01/06/1964 - DJ de 6/7/1964, p. 2183; DJ de 7/7/1964, p. 2199; DJ de 8/7/1964, p. 2239.Trânsito em Julgado - Sentença Omissa do Recurso "Ex-Officio" - Interposição "Ex-Lege"    Não transita em julgado a sentença por haver omitido o recurso "ex-oficio", que se considera interposto "ex-lege".

Esse reexame:

- Não tem prazo;

- Não tem razões e contrarrazões;

- Será obrigatório, ainda que haja recurso voluntário das partes.

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Quando a lei prevê o recurso de ofício, o Tribunal, apreciando esse recurso, pode conhecer de qualquer matéria? SIM! No reexame necessário devolve-se ao Tribunal o conhecimento de TODA a matéria, o conhecimento integral da causa, podendo ser melhorada ou piorada a situação do acusado.

Prova disso é o teor da súmula 160, STF:

STF Súmula nº 160 - 13/12/1963 - Súmula da Jurisprudência Predominante do Supremo Tribunal Federal - Anexo ao Regimento Interno. Edição: Imprensa Nacional, 1964, p. 87.Decisão do Tribunal - Nulidade - Argüição de Nulidade no Recurso da Acusação - Acolhimento - Recurso de Ofício - Ressalva    É nula a decisão do tribunal que acolhe, contra o réu, nulidade não argüida no recurso da acusação, ressalvados os casos de recurso de ofício.

Vale lembrar, ainda, que o reexame necessário só é cabível contra decisões de juiz de primeira instância.

Quais são as hipóteses previstas em lei em que é necessário o reexame?

- Sentença que conceder HC (art. 574, I, CPP);

- Decisão que conceder a reabilitação (art. 746, CPP);

- Absolvição em crimes contra a economia popular ou contra a saúde pública, ou quando for determinado o arquivamento do IP (art. 7º, Lei 1.521/51) – obs.: o tráfico de drogas não está incluso aqui (em relação a ele há lei especial);

- Sentença que conceder o MS (art. 14, §1º, Lei 12.016/09);

CUIDADO: a absolvição sumária no júri antigamente era tratada pela lei como uma hipótese de reexame. A doutrina entende, contudo, que essa hipótese foi tacitamente revogada pela Lei 11.689/08.

7.7 Disponibilidade

É consectário do princípio da voluntariedade. Pelo princípio da voluntariedade a parte não é obrigada a recorrer. Pela disponibilidade, a parte não é obrigada a prosseguir com o recurso

Limitação quanto ao MP: o MP não pode desistir de recurso que haja interposto.

Art. 576, CPP:

        Art. 576.  O Ministério Público não poderá desistir de recurso que haja interposto.

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7.8 Non reformatio in pejus

Em recurso (ou HC) exclusivo da defesa não se admite a reforma do julgado para piorar a situação do acusado.

É um estímulo para a utilização da impugnação pelo acusado, que já sabe, de antemão, que, em recurso seu exclusivo, não sofrerá prejuízo.

STF HC 83.545: não pode o juiz nem mesmo corrigir um erro material para piorar a situação do réu (ex.: refazer a soma das penas impostas ou corrigir regime inicial de cumprimenrto imposto erroneamente, agravando-o).

Não é que o Tribunal não possa piorar a situação do réu. Ele não pode fazê-lo quando há recurso exlcusivo da defesa. Poderá, entretanto, em caso de reexame necessário ou recurso da apelação (restrito à matéria devolvida, claro).

Art. 617, CPP:

        Art. 617.  O tribunal, câmara ou turma atenderá nas suas decisões ao disposto nos arts. 383, 386 e 387, no que for aplicável, não podendo, porém, ser agravada a pena, quando somente o réu houver apelado da sentença.

7.9 Non reformatio in pejus indireta

Reformatio direta: o Tribunal não pode agravar a situação do acusado em recurso exclusivo da defesa.

Reformatio indireta (efeito prodrômico): se a decisão impugnada no recurso exclusivo da defesa for anulada, o juiz que vier a proferir nova decisão não poderá agravar a situação do acusado.

Enquanto na direta é o Tribunal que não pode decidir piorando a situação do réu, na direta é o juiz de primeira instância (o qual deverá proferir nova sentença tendo em vista a anulação da antiga) que não poderá agravar a pena, regime etc.

Non reformatio in pejus indireta e incompetência absoluta:

Ex.: imagine que o cidadão tenha sido julgado por um juiz estadual que o condene pelo crime de moeda falsa (o qual, como sabemos, é de competência da justiça federal), aplicando-lhe uma pena de 3 anos. Houve recurso exclusivo da defesa alegando a nulidade da decisão por conta da incompetência absoluta. No momento em que o TJ for julgar o caso, deverá anular a decisão e remeter os autos à JF. O juiz federal, ao proferir sua decisão, está submetido à pena fixada pelo juiz estadual? Isto é: aplica-se a non reformatio indireta?

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1ª corrente (tradicional: Pacelli e Tourinho Filho): o juiz natural não pode sofrer uma restrição em seu poder decisório em virtude de uma decisão proferida por um juízo absolutamente incompetente. Ou seja: neste caso, não se aplica a reformatio indireta.

2ª corrente (Tribunais Superiores): se houve recurso exclusivo da defesa o acusado não pode ser prejudicado. Aplica-se, portanto, a non reformatio indireta. Nesse sentido: STJ HC 105.384:

PRINCÍPIO NE REFORMATIO IN PEJUS.

 O paciente foi condenado pela Justiça estadual, devido à prática de tráfico internacional de entorpecentes, à pena de quatro anos de reclusão. Por meio de recurso exclusivo da defesa (a acusação não recorreu), o TJ reconheceu, de ofício, nulidade absoluta consubstanciada na incompetência da Justiça estadual para o processo e julgamento do feito, determinando a remessa dos autos à Justiça Federal. Já na Vara Criminal Federal, o magistrado impôs ao paciente a pena de cinco anos e quatro meses de reclusão, residindo nesse fato, a alegação de reformatio in pejus indireta. Para o Min. Relator, nos julgamentos deste Superior Tribunal, há precedentes com entendimentos distintos. Uns afirmam que, por se tratar de nulidade absoluta, portanto passível de ser reconhecida a qualquer tempo, até mesmo de ofício, não haveria proibição quanto ao agravamento da situação do acusado em eventual condenação pelo juízo competente. Em outras palavras, não estaria a nova decisão limitada ao máximo da pena aplicada na sentença anulada. Esse entendimento baseia-se na premissa de que o juiz natural, cuja competência decorre da própria Constituição, não pode ficar subordinado aos limites da pena fixada em decisão absolutamente nula. Outros, contrariamente, dizem ser impossível que o juiz natural da causa imponha pena mais grave ao acusado, ainda que o decreto condenatório seja anulado por incompetência absoluta do juízo, sob pena de reformatio in pejus indireta. Diante disso, o Min. Relator posicionou-se no sentido de que a nova condenação deve limitar-se, como teto, à pena estabelecida pelo magistrado primevo. Deveras, não obstante irrepreensível o reconhecimento pela autoridade coatora da incompetência da Justiça estadual para o julgamento da ação penal, ainda que em sede de apelação exclusiva da defesa, visto que se trata de vício de natureza absoluta, impõe-se que a nova condenação pelo Juiz natural da causa não exceda quatro anos de reclusão, tal como estabelecido pelo Juízo da Vara Criminal, em observância ao princípio ne reformatio in pejus. Assim, a Turma concedeu parcialmente a ordem para determinar que o juiz da Vara Criminal Federal redimensione a pena do paciente na ação penal, tendo como parâmetro o teto estabelecido pela sentença anulada, devendo, ainda, reavaliar, se for o caso, a possibilidade de substituição da sanção corporal por medidas restritivas de direitos e ainda de eventual fixação de regime menos gravoso. Precedente citado: HC 76.686-PR, DJe 10/11/2008. HC 105.384-SP, Rel. Min. Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ-CE), julgado em 6/10/2009.

Non reformatio in pejus indireta e soberania dos veredictos:

A soberania dos veredictos aplica-se aos jurados; a reformatio in pejus, ao Juiz Presidente.

Os jurados são soberanos, por isso, podem, em um segundo julgamento, reconhecer causas de aumento e qualificadoras que não tenham sido reconhecidas em um primeiro.

Contudo, se a decisão dos jurados no segundo julgamento for idêntica à do primeiro o Juiz Presidente deverá ater-se à pena aplicada no julgamento anterior, não podendo agravar a situação do acusado.

Cuidado com o HC 89.544 (STF): no primeiro julgamento o acusado foi absolvido. O MP interpôs apelação e ganhou. No segundo julgamento o acusado foi condenado por homicídio

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simples a uma pena de 6 anos de reclusão. A defesa interpôs apelação e ganhou. No terceiro julgamento o acusado foi condenado por homicídio qualificado a 12 anos. O STF entendeu que nesse caso deveria ser fixada a pena de 6 anos. Isso é no mínimo estranho, vez que o STF não respeita a decisão dos jurados, os quais, no julgamento final, reconheceram a qualificadora.

7.10 Reformatio in mellius

Em recurso exclusivo da acusação ou mesmo que a questão não tenha sido impugnada no recurso da defesa, admite-se a melhora da situação do acusado.

No processo penal, portanto, o Tribunal não pode prejudicar a defesa. Sempre pode, contudo, melhorar a situação do acusado: ainda que não tenha sido pedida, o desembargador pode, por exemplo, aplicar uma atenuante.

O princípio da reformatio in mellius funciona como mitigação ao efeito devolutivo dos recursos no processo penal, já que o Tribunal pode conhecer de matéria que sequer foi alegada pela defesa.

Previsão legal: art. 617, CPP, interpretado a contrario sensu:

        Art. 617.  O tribunal, câmara ou turma atenderá nas suas decisões ao disposto nos arts. 383, 386 e 387, no que for aplicável, não podendo, porém, ser agravada a pena, quando somente o réu houver apelado da sentença.

Além disso, no processo penal os Tribunais podem conceder HC de ofício:

Art. 654, §2º:

        § 2o  Os juízes e os tribunais têm competência para expedir de ofício ordem de habeas corpus, quando no curso de processo verificarem que alguém sofre ou está na iminência de sofrer coação ilegal.

Isso porque a liberdade de locomoção é um bem indisponível.

7.11 Dialeticidade

Está diretamente relacionado ao contraditório e à ampla defesa.

Por conta do princípio da dialeticidade, todo e qualquer recurso deve ser dotado dos fundamentos de fato e de direito pelos quais se pretende o reexame da decisão.

Sem fundamento não há como o Tribunal entender o motivo do inconformismo e nem a outra parte apresentar contrarrazões.

Atenção aos arts. 589 e 601, CPP:

        Art. 589.  Com a resposta do recorrido ou sem ela, será o recurso concluso ao juiz, que, dentro de dois dias, reformará ou sustentará o seu despacho, mandando instruir o recurso com os traslados que Ihe parecerem necessários.

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        Art. 601.  Findos os prazos para razões, os autos serão remetidos à instância superior, com as razões ou sem elas, no prazo de 5 (cinco) dias, salvo no caso do art. 603, segunda parte, em que o prazo será de trinta dias.

Esses artigos permitem que o recurso suba para a instância superior sem as razões recursais. É realmente possível? Os Tribunais entendem que sim (STF HC 91.251, RHC 91.070). Isso, contudo, é duramente criticado pela doutrina.

Para a doutrina, se o promotor não apresentar as razões deve ser aplicado o princípio da devolução (art. 28, CPP), remetendo-se os autos ao Procurador Geral. Se for o advogado de defesa constituído, intima-se o acusado, pedindo para que constitua novo advogado (sob pena de nomeação de defensor dativo).

Cuidado com o art. 610, p.ú., CPP:

        Parágrafo único.  Anunciado o julgamento pelo presidente, e apregoadas as partes, com a presença destas ou à sua revelia, o relator fará a exposição do feito e, em seguida, o presidente concederá, pelo prazo de 10 (dez) minutos, a palavra aos advogados ou às partes que a solicitarem e ao procurador-geral, quando o requerer, por igual prazo.

O problema é que esse dispositivo prevê que no momento da sustentação oral quem fala primeiro é o advogado e depois, se quiser, o procurador de justiça. O STF (HC 87.926), em Plenário, entendeu que se se trata de recurso da defesa, por óbvio deve ela falar primeiro. No entanto, tratando-se de recurso da acusação, a sustentação oral do MP deve ser feita antes do advogado ainda que o procurador invoque a qualidade de custos legis.

No caso dos embargos de declaração, vale lembrar que, em regra, NÃO há necessidade de contrarrazões. Todavia, no caso dos embargos de declaração com efeitos infringentes, deve haver intimação da parte contrária para apresentação de contrarrazões.

Os ED com efeitos infringentes são aqueles nos quais, na sua apreciação, pode haver mudança no sentido da decisão (ao sanar a omissão o juiz pode mudar o sentido e o teor da decisão). Ex.: pedido de reconhecimento de prescrição que não foi apreciado na decisão. Se os ED forem acolhidos mudar-se-á completamente o teor da decisão. Dessa forma, tendo-se em vista o contraditório e a ampla defesa, deve-se, nesses embargos, intimar a parte contrária.

7.12 Variabilidade

A parte pode variar de recurso, ou seja, pode interpor novo recurso em substituição a outro anteriormente interposto, desde que o faça dentro do prazo legal.

A maioria da doutrina entende que esse princípio NÃO se aplica no âmbito do processo penal tendo em vista a preclusão consumativa.

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8. EFEITOS DOS RECURSOS

8.1 Efeito obstativo

A interposição de todo e qualquer recurso tem o efeito de impedir a preclusão temporal e o consequente trânsito em julgado.

8.2 Efeito devolutivo

Consiste na devolução do conhecimento da matéria impugnada ao órgão jurisdicional.

É o chamado tantum devoluntum quantum apelatum: a matéria a ser conhecida pelo juízo ad quem dependerá da impugnação.

No processo penal, é mitigado pelo princípio da reformatio in mellius: se for para melhorar a situação do acusado o Tribunal pode conhecer da matéria que não tenha sido devolvida.

Quando é que se limita o efeito devolutivo? A delimitação do recurso é feita na petição de interposição. Os Tribunais entendem que não havendo a delimitação na petição de interposição entende-se que houve impugnação quanto a tudo (devolve-se ao juízo ad quem o conhecimento integral da matéria em relação à qual houve sucumbência).

Cuidado com os recursos de fundamentação vinculada (aquele recurso em que a parte só pode recorrer se a fundamentação estiver de acordo com a previsão legal ou constitucional): nesse caso, há a obrigação de apontar os fudamentos do recurso. Dessa forma, não feito na interposição, obrigatoriamente será feito nas razões, sob pena de não conhecimento do recurso.

8.3 Efeito suspensivo

Consiste na impossibilidade de a decisão impugnada produzir seus efeitos regulares enquanto não houver a apreciação do recurso interposto.

Apesar de a doutrina tradicionalmente dizer que é a interposição que teria efeito suspensivo, na verdade, não é bem assim. É que, se considerássemos que é a interposição que suspende a eficácia da decisão, a decisão, até a interposição do recurso, teria todos os seus efeitos. Assim, a melhor doutrina é a que ensina que o que suspende a eficácia da decisão é o simples fato de uma decisão estar submetida a um recurso que preveja o efeito suspensivo. A pessoa já sabe, de antemão, que aquela decisão não irá produzir seus efeitos até findo o prazo para a interposição do recurso ou até sua decisão.

A apelação contra sentença absolutória NÃO tem efeito suspensivo. Assim, ainda que o MP recorra, a decisão judicial irá produzir seus efeitos desde já. Se o réu estiver preso, portanto, e vier uma decisão absolutória, deverá ele, imediatamente, ser posto em liberdade.

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Já a apelação contra sentença condenatória possui efeito suspensivo. Por isso, tal decisão não produz seus efeitos imediatamente.

Devemos lembrar que, no processo penal, independentemente de a lei prever ou não efeito suspensivo, vigora o princípio da presunção de inocência, do qual derivam duas regras fundamentais:

- Regra probatória: recai sobre a acusação o ônus de provar os fatos imputados ao acusado;

- Regra de tratamento: o acusado deve ser tratado como inocente durante todo o processo penal, só podendo ser considerado culpado após o trânsito em julgado da decisão condenatória.

Pergunta-se: o fato de a lei não prever efeito suspensivo significa dizer que diante de uma sentença condenatória poderá o réu ser recolhido à prisão?

Analisemos dois importantes artigos:

Art. 27, §2º, Lei 8.038/90 (regulamenta o procedimento originário dos tribunais):

        § 2º - Os recursos extraordinário e especial serão recebidos no efeito devolutivo.

Art. 637, CPP:

        Art. 637.  O recurso extraordinário não tem efeito suspensivo, e uma vez arrazoados pelo recorrido os autos do traslado, os originais baixarão à primeira instância, para a execução da sentença.

O que esses dispositivos estabelecem é que os recursos extraordinários não são dotados de efeito suspensivo. Por isso, durante anos, adimitia-se a “execução provisória” da pena, ainda que estivesse tramitando um recurso de natureza extraordinária. O Supremo, contudo, no julgamento do HC 86.078, entendeu que a pessoa, em regra, apenas pode ser recolhida à prisão após o trânsito em julgado. É o chamado efeito suspensivo indireto, o qual deriva da presunção da inocência. Tal entedimento é reafirmado pelo art. 283, com a redação dada pela Lei 12.403/11:

        Art. 283.  Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva. (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

8.4 Efeito regressivo, iterativo ou diferido

Consiste na devolução da matéria impugnada ao reexame do mesmo órgão jurisdicional que prolatou a decisão recorrida.

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Trata-se do famoso “juízo de retratação”.

Quais são os recursos que preveem esse efeito?

- Carta testemunhável;

- RESE;

- Agravo em execução (observa o mesmo procedimento do RESE).

Atenção para o art. 589, CPP:

        Art. 589.  Com a resposta do recorrido ou sem ela, será o recurso (RESE) concluso ao juiz, que, dentro de dois dias, reformará ou sustentará o seu despacho, mandando instruir o recurso com os traslados que Ihe parecerem necessários.

Se o RESE subir para o Tribunal sem que o magistrado tenha exercido o juízo de retratação, os autos devem ser baixados em diligência.

        Parágrafo único.  Se o juiz reformar o despacho recorrido, a parte contrária, por simples petição, poderá recorrer da nova decisão, se couber recurso, não sendo mais lícito ao juiz modificá-la. Neste caso, independentemente de novos arrazoados, subirá o recurso nos próprios autos ou em traslado.

Imagine que o MP tenha interposto um RESE contra a extinção da punibilidade. O MP apresenta razões, a defesa, contrarrazões, e os autos vão ao juiz, que reforma sua decisão. Nesse caso, contra essa nova decisão caberá novo RESE, a ser interposto por uma simples petição, dispensada a interposição de novas razões.

Imagine agora que o juiz sumariante tenha pronunciado o acusado. A defesa entra com RESE e o juiz retrata-se. Nesse caso, não pode o MP valer-se do p.ú., vez que não cabe RESE contra a decisão de impronúncia. O MP será obrigado a interpor uma apelação.

8.5 Efeito extensivo

Art. 580, CPP:

Art. 580.  No caso de concurso de agentes (Código Penal, art. 25 art. 29), a decisão do recurso interposto por um dos réus, se fundado em motivos que não sejam de caráter exclusivamente pessoal, aproveitará aos outros.

Nada mais é que um desdobramento da isonomia: se o crime foi praticado em concurso de agentes, a decisão de caráter objetivo deve ser a todos estendida.

A lei não exige que todos estejam no mesmo processo, mas apenas que haja concurso.

Ex.: a insignificância não favorece apenas aquele que recorreu, mas todos os acusados.

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Caso o juiz ou o Tribunal esqueçam-se desse feito, pode a defesa, por meio de HC, pedi-lo.

8.6 Efeito substitutivo

O julgamento proferido pelo juízo ad quem substituirá a decisão recorrida no que tiver sido objeto do recurso.

Ainda que o Tribunal confirme integralmente os termos da decisão (ou seja: negue provimento ao recurso), incidirá o efeito substitutivo.

Tal efeito é importante, por exemplo, para estabelecer a autoridade coatora, no caso de impetração de HC: se a decisão do Tribunal substitui a sentença do juiz, torna-se ele a autoridade coatora.

Art. 512, CPC:

Art. 512. O julgamento proferido pelo tribunal substituirá a sentença ou a decisão recorrida no que tiver sido objeto de recurso.

8.7 Efeito translativo

Consiste na devolução ao juízo ad quem de toda matéria não atingida pela prescrição.

Será que esse efeito existe em algum recurso do processo penal? Apesar de não ser tecnicamente um recurso, esse efeito existe nas hipóteses do reexame necessário. Nesse sentido:

STF Súmula nº 160 - 13/12/1963 - Súmula da Jurisprudência Predominante do Supremo Tribunal Federal - Anexo ao Regimento Interno. Edição: Imprensa Nacional, 1964, p. 87.Decisão do Tribunal - Nulidade - Argüição de Nulidade no Recurso da Acusação - Acolhimento - Recurso de Ofício - Ressalva    É nula a decisão do tribunal que acolhe, contra o réu, nulidade não argüida no recurso da acusação, ressalvados os casos de recurso de ofício.

A súmula deixa claro o entendimento de que nos casos de reexame necessário o Tribunal é livre para conhecer de qualquer matéria, seja ela benéfica, seja ela contrária aos interesses do acusado.

9. DIREITO INTERTEMPORAL E RECURSOS

Qual é a lei que se aplica ao recurso?

Exemplo:

Data do fato Data da publicação da decisão Data da interposição do

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recurso

Lei x Lei Y Lei W

Exemplo real: imagine que o fato delituoso tenha sido praticado em 10/03/08, quando ainda existia o protesto por novo júri. O julgamento pelo Tribunal do júri ocorreu em 20/10/11, quando tal recurso já não mais existia (foi extinto pela 11.689, que entrou em vigor em 22/08/08). Irá caber o protesto por novo júri? Há doutrinadores que entedem que sim (LFG e Tourinho Filho). Todavia, a maioria da doutrina afirma que não, pois a lei que se aplica ao recurso é aquela em vigor na data em que publicada a decisão (no exemplo acima, a lei Y). Isso porque matéria recursal é processual, aplicando-se, portanto, o brocardo tempus regit actum.

10. CLASSIFICAÇÃO DOS RECURSO

10.1 Quanto à obrigatoriedade

Recurso voluntário: recurso cuja existência está submetida à manifestação de vontade do sucumbente.

Recurso de ofício: a lei impõe o reexame necessário, independentemente da manifestação de vontade das partes. Para muitos doutrinadores não seria propriamente um recurso, extamente por não possuir a característica da voluntariedade. Seria, na verdade, uma condição de eficácia objetiva da decisão.

10.2 Quanto à fundamentação

Recurso de fundamentação livre: o recorrente tem ampla liberdade no tocante às matérias a serem alegadas em sua fundamentação. Ele pode devolver ao conhecimento do Tribunal qualquer matéria, seja ela de fato, de direito ou de questões probatórias. É a regra nos recursos. Ex.: apelação.

Recurso de fundamentação vinculada: o recorrente não é livre para alegar qualquer matéria que desejar, devendo invocar apenas os fundamentos previstos em rol taxativo constante da lei ou da Constituição. Ex.: RE/REsp (súmula 279, STF) e apelação contra decisões do júri (art. 593, III, CPP c/c súmula 713, STF).

Súmula 279, STF:

STF Súmula nº 279 - 13/12/1963 - Súmula da Jurisprudência Predominante do Supremo Tribunal Federal - Anexo ao Regimento Interno. Edição: Imprensa Nacional, 1964, p. 127.Simples Reexame de Prova - Cabimento - Recurso Extraordinário    Para simples reexame de prova não cabe recurso extraordinário.

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Art. 593, III, CPP:

        Art. 593. Caberá apelação no prazo de 5 (cinco) dias:  (Redação dada pela Lei nº 263, de 23.2.1948)       

III - das decisões do Tribunal do Júri, quando:  (Redação dada pela Lei nº 263, de 23.2.1948)

        a) ocorrer nulidade posterior à pronúncia; (Redação dada pela Lei nº 263, de 23.2.1948)

        b) for a sentença do juiz-presidente contrária à lei expressa ou à decisão dos jurados; (Redação dada pela Lei nº 263, de 23.2.1948)

        c) houver erro ou injustiça no tocante à aplicação da pena ou da medida de segurança; (Redação dada pela Lei nº 263, de 23.2.1948)

        d) for a decisão dos jurados manifestamente contrária à prova dos autos. (Redação dada pela Lei nº 263, de 23.2.1948)

Súmula 713, STF:

STF Súmula nº 713 - 24/09/2003 - DJ de 9/10/2003, p. 6; DJ de 10/10/2003, p. 6; DJ de 13/10/2003, p. 6.Efeito Devolutivo da Apelação - Decisões do Júri - Fundamentos    O efeito devolutivo da apelação contra decisões do Júri é adstrito aos fundamentos da sua interposição.

10.3 Quanto à extensão da matéria impugnada

Recurso total: é aquele que engloba todo o conteúdo passível de impugnação (todo o objeto que gerou a sucumbência). Ex.: promotor pediu furto qualficado e a aplicação da reincidência. O juiz condenou por furto simples e não aplicou a reincidência.

Recurso parcial: é aquele que devolve apenas parte do objeto da sucumbência.

10.4 Quanto aos pressupostos de admissibilidade recursal

Recurso genérico: basta a simples demonstração do inconformismo da parte, sem que haja necessidade do preenchimento de qualquer requisito específico. Ex.: apelação contra sentença de juiz singular.

Recuso específico: é aquele que possui requisitos próprios para sua interposição (além dos requisitos exigidos para todo e qualquer recurso). Ex.: RE (necessita do prequestionamento – súmula 356, STF – e da repercussão geral – QO AI 664.567: a repercussão geral também vale em matéria criminal).

Súmula 356, STF:

STF Súmula nº 356 - 13/12/1963 - Súmula da Jurisprudência Predominante do Supremo Tribunal Federal - Anexo ao Regimento Interno. Edição: Imprensa Nacional, 1964, p. 154.

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Ponto Omisso da Decisão - Embargos Declaratórios - Objeto de Recurso Extraordinário - Requisito do Prequestionamento    O ponto omisso da decisão, sobre o qual não foram opostos embargos declaratórios, não pode ser objeto de recurso extraordinário, por faltar o requisito do prequestionamento.

10.5 Quanto ao objeto imediato do recurso

Recurso extraodinário: é aquele recurso que existe com o objetivo de proteger o direito e, apenas de maneira indireta, o interesse da parte.

Recurso ordinário: objetiva proteger o interesse do sucumbente (e, de maneira indireta, assegurar a correta aplicação do direito).

11. AÇÕES DE IMPUGNAÇÃO

11.1 Revisão criminal

A. Conceito

É uma ação penal de natureza constitutiva de competência originária dos Tribunais, cujo objetivo é a revisão de decisão condenatória ou absolutória imprópria transitada em julgado eivada de erro judiciário.

B. Natureza jurídica

Apesar de colocada no CPP dentro do capítulo dos recursos, trata-se de ação autônoma de impugnação.

À diferença dos recursos, em que a relação jurídica estende-se no mesmo processo, a revisão criminal dá origem a nova relação processual.

C. Coisa julgada e rescisão da sentença

A proteção da coisa julgada está relacionada à segurança jurídica; a rescisão da sentença transitada em julgada está ligada ao valor justiça. Há, portanto, uma ponderação de valores, e, nesse caso, prevalece a justiça.

ATENÇÃO: só existe revisão criminal em favor do acusado (não existe, no Brasil, revisão criminal por societate).

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Cuidado para não confundir a revisão criminal com a ação rescisória: elas se aproximam em alguns pontos, mas possuem alguns diferenciais:

Ação rescisória Revisão criminal

Sujeita ao prazo preclusivo de 2 anos; Pode ser ajuizada a qualquer tempo, depois do trânsito em julgado de sentença condenatória;

No cível, pode ser ajuizada por qualquer das partes e por terceiros juridicamente prejudicados.

Só pode ser ajuizada em favor do acusado.

Art. 5º, LXXV, CRFB:

LXXV - o Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença;

Ao ajuizar a revisão, pode a parte buscar também uma reparação patrimonial.

D. Legitimidade

Legitimidade ativa:

- Acusado e seu defensor;

- CADI;

Art. 623, CPP:

        Art. 623.  A revisão poderá ser pedida pelo próprio réu ou por procurador legalmente habilitado ou, no caso de morte do réu, pelo cônjuge, ascendente, descendente ou irmão.

- Se a revisão criminal já estiver tramitando e o acusado morrer, a lei prevê a nomeação de um curador:

        Art. 631.  Quando, no curso da revisão, falecer a pessoa, cuja condenação tiver de ser revista, o presidente do tribunal nomeará curador para a defesa.

- Pode o MP ajuizar a revisão criminal? O MP pode interpor recurso em benefício do acusado, impetrar HC em favor do acusado, logo, é óbvio que poderá, desde que em favor do acusado, ajuizar a revisão. Isso porque não interessa ao MP a condenação de um inocente ou a manutenção de um erro judiciário.

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Legitimidade passiva: Estado (deve, portanto, haver a intervenção do MP – obs.: se ele próprio ajuizar, serão dois procuradores distintos).

E. Interesse de agir (adequação, necessidade e utilidade)

Só se pode ajuizar a revisão quando estiver diante de uma sentença condenatória ou absolutória imprópria com trânsito em julgado.

Não há necessidade de esgotamento de toda a via recursal na instância ordinária.

F. Hipóteses legais de cabimento da revisão criminal

- Manifesta contrariedade ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos;

“Lei penal” engloba a lei penal, a lei processual penal e também a Constituição Federal.

Sobre o tema:

STF Súmula nº 343 - 13/12/1963 - Súmula da Jurisprudência Predominante do Supremo Tribunal Federal - Anexo ao Regimento Interno. Edição: Imprensa Nacional, 1964, p. 150.Cabimento - Ação Rescisória - Ofensa a Literal Dispositivo Baseado em Texto Legal de Interpretação Controvertida nos Tribunais    Não cabe ação rescisória por ofensa a literal dispositivo de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais.

Apesar de a súmula falar em rescisória, a doutrina entende aplicar-se também à revisão criminal.

Cuidado: ainda que haja uma interpretação controvertida, se, depois de um tempo, pacificar-se o entendimento em um sentido, será possível o ajuizamento da revisão. Ex.: durante anos prevaleceu o entendimento de que era possível que o acusado fosse privado do duplo grau pelo fato de não ter se apresentado à prisão. Hoje essa interpretação mudou: ainda que o réu não seja primário nem tenha bons antecedentes, tem ele direito ao duplo grau. Assim, aquele que foi condenado na vigência do antigo entendimento terá direito à revisão criminal: pedirá para que o Tribunal rescinda o trânsito em julgado, para que o acusado tenha direito à apelação.

- Presença de depoimentos, exames ou documentos comprovantemente falsos como fundamento da sentença;

A falsidade pode ser provada no bojo da própria revisão criminal, ou, ainda, em justificação.

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Atenção: para que seja cabível a revisão a prova falsa deve, efetivamente, servir de fundamento à sentença. Não tendo sido a prova falsa relevante para o decreto condenatório não caberá a revisão.

- Existência de provas novas em favor do acusado.

“Prova nova” não é apenas aquela que não teria constado do processo; pode ser uma nova análise de uma prova que já tenha sido produzida. Ex.: exame de DNA.

A revisão criminal não se presta ao reexame do conjuto probatório. É necessária efetiva prova nova ou efetivo motivo para que haja reanálise de prova produzida (ex.: inovações tecnológicas). Nesse sentido: REsp 763.283:

PENAL E PROCESSO PENAL. REVISÃO CRIMINAL. ROUBO. PRELIMINAR. INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL POR AUSÊNCIA DE AMPARO LEGAL. REJEIÇÃO. MÉRITO. JULGAMENTO CONTRÁRIO À EVIDÊNCIA DOS AUTOS. SENTENÇA BASEADA EM PROVAS FALSAS. EXISTÊNCIA DE PROVA NOVA. SIMPLES DECLARAÇÃO UNILATERALMENTE PRODUZIDA. IMPROCEDÊNCIA.1. ADMITIR-SE-Á AÇÃO DE REVISÃO CRIMINAL QUANDO, DO TEXTO DA PETIÇÃO INICIAL, DEPREENDER-SE PELO MENOS UMA DAS HIPÓTESES PREVISTAS NO ART. 621, E INCISOS, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. PRELIMINAR REJEITADA.2. SE A PROVA PRODUZIDA EM INSTRUÇÃO REGULAR ENSEJOU DECRETO CONDENATÓRIO DO REQUERENTE, EM DECISÃO QUE REFORMOU SENTENÇA ABSOLUTÓRIA, EM SEDE DE APELAÇÃO, NÃO PODE A REVISÃO CRIMINAL CONSTITUIR UM SEGUNDO RECURSO DA MESMA NATUREZA (PRECEDENTE STJ, RESP 763.283/SC, REL. MINISTRA LAURITA VAZ, DJU, 6-2-2006 P. 305). 3. SIMPLES DECLARAÇÃO UNILATERALMENTE PRODUZIDA NÃO TEM O CONDÃO DE OBUMBRAR DEPOIMENTOS DAS VÍTIMAS QUE ESTIVERAM SOB A MIRA DE ARMAS PORTADAS PELOS ASSALTANTES, ESTANDO ESTES DE 'CARA LIMPA', SENDO A AUTORIA ATESTADA, DE FORMA SEGURA, POR TESTEMUNHA QUE RECONHECEU O REQUERENTE COMO O MOTORISTA QUE TRANSPORTOU OS PERTENCES DAS OFENDIDAS NO VEÍCULO DESTAS. 4. PEDIDO REVISIONAL IMPROCEDENTE.

Art. 621, CPP:

        Art. 621.  A revisão dos processos findos será admitida:

        I - quando a sentença condenatória for contrária ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos;

        II - quando a sentença condenatória se fundar em depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos;

        III - quando, após a sentença, se descobrirem novas provas de inocência do condenado ou de circunstância que determine ou autorize diminuição especial da pena.

G. Desnecessidade de recolhimento à prisão

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O ajuizamento da revisão criminal NÃO depende do recolhimento do acusado à prisão. Mesmo foragido tem o acusado direito à apreciação de sua revisão.

STF Súmula nº 393 - 03/04/1964 - DJ de 8/5/1964, p. 1239; DJ de 11/5/1964, p. 1255; DJ de 12/5/1964, p. 1279.Revisão Criminal - Recolhimento à Prisão    Para requerer revisão criminal, o condenado não é obrigado a recolher-se à prisão.

H. Inexistência de prazo preclusivo

A revisão criminal pode ser ajuizada a qualquer momento, inclusive após a morte do acusado.

I. Competência

Competência originária dos Tribunais, pelo menos em regra.

Atenção: no âmbito dos Juizados Especiais Criminais, apesar de não se admitir rescisória, admite-se revisão criminal, que, neste caso, deverá ser apreciada pela Turma Recursal.

J. Ônus da prova

Do princípio da presunção de inocência deriva a regra porbatória segundo a qual a acusação deve provar a culpa do acusado. Tal princípio, todavia, vigora apenas até o trânsito em julgado da decisão. Dessa forma, não há que se falar, aqui, em presunção da inocência.

Assim, o ônus da prova na revisão criminal recai sobre o acusado. A respeito: STF HC 68.437.

K. Efeito suspensivo

Em regra, a revisão criminal não é dotada de efeito suspensivo. Ou seja: o ajuizamento da revisão criminal não tem o condão de suspender a execução da sentença condenatória.

Cuidado: nas situações gritantes, em que evidente o erro judiciário (ex.: a suposta vítima de um homicídio reaparece viva), o ideal é conjugar a revisão com o habeas corpus.

L. Recursos cabíveis

Não há recurso ordinário contra a revisão criminal.

Cabem embargos infringentes e de nulidade? NÃO! Só são cabíveis em julgamento não unânime em RESE, apelação e agravo em execução.

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São cabíveis, contudo, os recursos extraordinários, desde que preenchidos os requisitos, e também os embargos de declaração.

Havendo indeferimento pelo Relator, caberá também o agravo regimental.

M. Indenização pelo erro judiciário

Como sabemos, vigora, hoje, a regra da responsabilidade civil objetiva do Estado.

Sobre o tema, devemos prestar atenção ao art. 630, CPP:

        Art. 630.  O tribunal, se o interessado o requerer, poderá reconhecer o direito a uma justa indenização pelos prejuízos sofridos.

        § 1o  Por essa indenização, que será liquidada no juízo cível, responderá a União, se a condenação tiver sido proferida pela justiça do Distrito Federal ou de Território, ou o Estado, se o tiver sido pela respectiva justiça.

        § 2o  A indenização não será devida: (deve ser lido à luz da CRFB/88)

        a) se o erro ou a injustiça da condenação proceder de ato ou falta imputável ao próprio impetrante, como a confissão ou a ocultação de prova em seu poder;

        b) se a acusação houver sido meramente privada.

Letra “a”: a culpa exclusiva da vítima afasta a responsabilidade civil objetiva do Estado. Por óbvio, se o acusado foi, ex., torturado e confessou, caberá a revisão.

Letra “b”: não for recepcionada pela CRFB/88. O fato de a acusação ser privada jamais poderá afastar a responsabilidade do Estado.

11.2 Habeas corpus

A. Fundamento constitucional

Art. 5º, LXVIII, CRFB:

LXVIII - conceder-se-á "habeas-corpus" sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder;

Pela própria dicção da CRFB, o HC funciona como uma garantia destinada à tutela da liberdade de locomoção.

B. Natureza jurídica

Trata-se de ação autônoma de impugnação.

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O HC é mais amplo que a revisão criminal, pois pode ser ajuizado a qualquer tempo, inclusive durante as investigações e mesmo após o trânsito em julgado.

Além disso, os Tribunais hoje têm admitido o HC para trancamento do processo e do IP. Assim, mesmo que a pessoa esteja solta, a mera tramitação de um IP, que representa uma potencial ofensa à sua liberdade de locomoção, pode dar ensejo à impetração de um HC.

C. Espécies de HC

Preventivo: risco potencial (mas concreto) à liberdade de locomoção. Busca-se a expedição de um salvo-conduto.

Liberatório: já houve o constragimento contra a liberdade de locomoção. Busca-se a expedição de um alvará de soltura.

D. Transgressões disciplinares

Art. 142, §2º, CRFB:

§ 2º - Não caberá "habeas-corpus" em relação a punições disciplinares militares.

Os Tribunais leem esse parágrafo no seguinte sentido: não cabe HC para discutir o mérito, sendo, porém, plenamente cabível para discutir a legalidade da punição (ex: autoridade incompetente, excesso de prazo etc.).

E. Interesse de agir

A impetração do HC depende da demonstração de que haja algum risco à liberdade de locomoção do acusado.

Sobre o tema:

STF Súmula nº 693 - 24/09/2003 - DJ de 9/10/2003, p. 5; DJ de 10/10/2003, p. 5; DJ de 13/10/2003, p. 5.Cabimento - Habeas Corpus Contra Pena de Multa ou Pecuniária    Não cabe habeas corpus contra decisão condenatória a pena de multa, ou relativo a processo em curso por infração penal a que a pena pecuniária seja a única cominada.

STF Súmula nº 694 - 24/09/2003 - DJ de 9/10/2003, p. 5; DJ de 10/10/2003, p. 5; DJ de 13/10/2003, p. 5.Cabimento - Habeas Corpus Contra Exclusão de Militar, Perda de Patente ou Função Pública    Não cabe habeas corpus contra a imposição da pena de exclusão de militar ou de perda de patente ou de função pública.

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STF Súmula nº 695 - 24/09/2003 - DJ de 9/10/2003, p. 5; DJ de 10/10/2003, p. 5; DJ de 13/10/2003, p. 5.Cabimento - Habeas Corpus - Pena Privativa de Liberdade Extinta    Não cabe habeas corpus quando já extinta a pena privativa de liberdade.

F. Legitimidade

Legitimidade ativa: o HC pode ser impetrado por qualquer pessoa, independentemente de ser ou não advogado, inclusive por pessoa jurídica. Além disso, pode ser concedido de ofício.

Art. 654, §2º, CPP:

        § 2o  Os juízes e os tribunais têm competência para expedir de ofício ordem de habeas corpus, quando no curso de processo verificarem que alguém sofre ou está na iminência de sofrer coação ilegal.

Apenas pode ser paciente a pessoa física.

Legitimidade passiva: o HC pode ter como autoridade coatora tanto um particular quanto uma autoridade pública. Ex.: manutenção de uma pessoa presa em um hospital por não ter pago a conta.

G. Competência

Súmula 690, STF: ULTRAPASSADA

STF Súmula nº 690 - 24/09/2003 - DJ de 9/10/2003, p. 5; DJ de 10/10/2003, p. 5; DJ de 13/10/2003, p. 5.Competência Originária - Habeas Corpus Contra Turma Recursal de Juizados Especiais Criminais    Compete originariamente ao Supremo Tribunal Federal o julgamento de habeas corpus contra decisão de turma recursal de juizados especiais criminais. (Não Prevalência pelos HC 86834-DJ de 9/3/2007, HC 89378 AgR-DJ de 15/12/2006 e HC 90905 AgR-DJ de 11/5/2007 - Determinam Competência para Tribunais de Justiça dos Estados)

HC contra decisão de Turma Recursal é julgado pelo Tribunal respectivo (TJ ou TRF).

Súmula 691, STF:

STF Súmula nº 691 - 24/09/2003 - DJ de 9/10/2003, p. 5; DJ de 10/10/2003, p. 5; DJ de 13/10/2003, p. 5.Competência - Conhecimento de Habeas Corpus Contra Indeferimento de Liminar em HC Impetrado em Tribunal Superior    Não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de habeas corpus impetrado contra decisão do Relator que, em habeas corpus requerido a tribunal superior, indefere a liminar. (Conhecimento na Hipótese de Flagrante Constrangimento Ilegal - HC 85185, HC 86864 MC-DJ de 16/12/2005 e HC 90746-DJ de 11/5/2007)

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Em regra, não cabe HC contra a decisão do Relator (que ainda não representa a opinião da Câmara). Cuidado: o próprio STF vem relativizando essa súmula, entendendo que contra decisões absurdas indeferindo a liminar poderá ser impetrado HC. Nesse sentido: STF HC 87.468.

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TEMA 7: NULIDADES

1. TIPICIDADE PROCESSUAL E NULIDADES

1.1 Tipicidade

No Direito Penal:

- Sob o ponto de vista formal, a tipicidade para o Direito Penal nada mais é que a subsunção perfeita da conduta praticada pelo agente ao modelo abstrato previsto na Lei Penal.

No Processo Penal:

- O ato processual deve ser praticado em consonância com a CRFB e com as leis processuais penais.

Existe para assegurar um processo justo – segurança jurídica.

1.2 Nulidades

No Direito Penal:

Art. 121 – “matar alguém” > se X mata Y, a conduta por ele praticada adequa-se ao tipo penal abstratamente previsto (tipicidade penal);

Pena: reclusão, de 6 a 20 anos. Por que existe uma pena para o tipo penal incriminador? O tipo penal possui pena porque o legislador tenta dissuadir o agente a praticar o crime. A pena funciona como meio de “atemorizar” o agente.

No Processo Penal:

No Direito Penal temos a pena como uma sanção prevista para a prática delituosa. Aqui, temos as NULIDADES.

A teoria das nulidades é extremamente importante, pois a nulidade nada mais é que uma sanção processual aplicada ao ato defeituoso, privando-o da aptidão de produzir seus efeitos regulares.

A nulidade é o instrumento que irá compelir as partes ao cumprimento da tipicidade processual. Da mesma forma que o agente cumpre a Lei Penal “por medo” da sanção, o juiz e as partes cumprem o modelo traçado pela lei “por medo” da nulidade. Ex.: o juiz realiza o interrogatório do acusado apenas ao final da instrução, pois teme a nulidade.

2. ESPÉCIES DE IRREGULARIDADES

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Temos vários tipos de irregularidades:

A. Irregularidades sem consequências

Trata-se de irregularidades que não acarretam qualquer consequência processual. Trabalha-se com o princípio da instrumentalidade das formas (a forma existe apenas para atingir determinada finalidade; assim, atingido esse fim, mesmo em havendo eventual irregularidade, não há que se falar em nulidade).

Ex.: art. 169, §1º, CPC:

§ 1o  É vedado usar abreviaturas. (Incluído pela Lei nº 11.419, de 2006).

A utilização de abreviatura é um exemplo de irregularidade sem consequências.

B. Irregularidades que acarretam sanções extraprocessuais

Neste caso, o vício é mais grave, sendo capaz de produzir sanção, ainda que extraprocessual.

Ex.: art. 265, CPP:

        Art. 265.  O defensor não poderá abandonar o processo senão por motivo imperioso, comunicado previamente o juiz, sob pena de multa de 10 (dez) a 100 (cem) salários mínimos, sem prejuízo das demais sanções cabíveis. (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).

O abandono produz apenas sanção extraprocessual (pena de multa).

OBS.: tramita no STF uma ADI que contesta esse artigo, interposta pela OAB, que argumenta que o juiz não possui competência para aplicar essa multa; a competência seria apenas da própria OAB.

C. Irregularidades que podem acarretar a invalidade do ato processual

Temos, aqui, uma irregularidade que atenta contra o interesse público ou contra o interesse das partes.

Ex.: sentença desprovida de fundamentação.

D. Irregularidades que acarretam a inexistência jurídica

Nestes casos, o vício é tão grave que teremos, em verdade, um “não ato”.

Ex: decisão dada por um juiz impedido.

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3. ESPÉCIES DOS ATOS PROCESSUAS

A partir da presença ou não de irregularidades, a doutrina costuma fazer uma classificação dos atos processuais:

A. Ato perfeito

É aquele praticado em consonância com o modelo típico. Por isso, é plenamente válido e eficaz.

B. Ato meramente irregular

É aquele ato dotado de irregularidades sem consequência ou irregularidades com sanções extraprocessuais. Como não representa lesão ao interesse público ou ao interesse das partes, é válido e eficaz.

Sobre o assunto:

STF Súmula nº 366 - 13/12/1963 - Súmula da Jurisprudência Predominante do Supremo Tribunal Federal - Anexo ao Regimento Interno. Edição: Imprensa Nacional, 1964, p. 158.Nulidade - Citação por Edital - Indicação do Dispositivo da Lei Penal - Transcrição da Denúncia ou Queixa ou Resumo dos Fatos em Que se Baseia    Não é nula a citação por edital que indica o dispositivo da lei penal, embora não transcreva a denúncia ou queixa, ou não resuma os fatos em que se baseia.

C. Ato nulo

Devido à inobservância do modelo típico, sua nulidade poderá ser reconhecida.

D. Ato inexistente

A inexistência representa um defeito que antecede qualquer consideração sobre a validade do ato processual.

Ex.: sentença sem dispositivo.

O vício que acarreta a inexistência jamais será convalidado (sanado).

4. NULIDADES

4.1 Conceito

O primeiro significado (majoritário) de nulidade é sanção processual de ineficácia, aplicada ao ato defeituoso (praticado em desacordo com o modelo).

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Alguns doutrinadores trazem também um segundo significado, também usando a palavra “nulidade” como sinônimo de defeito do ato processual. Seria uma característica do ato. Ex.: “essa audiência é nula”.

4.2 Espécies

São duas as espécies de nulidade:

Nulidade absoluta Nulidade relativa

O prejuízo é PRESUMIDO (doutrina).

OBS.: trata-se de uma presunção relativa, que pode ser afastada pela parte contrária (à parte contrária incumbe provar a ausência do prejuízo).

Conforme o STF, porém, o prejuízo DEVE SER PROVADO, tanto nas hipóteses de nulidade absolutas quanto nas relativas (pas de nullité sans grief). RHC 110.623.

O prejuízo DEVE SER PROVADO pela parte interessada (doutrina + Tribunais Superiores).

Arguição a QUALQUER MOMENTO.

As nulidades absolutas podem ser arguidas inclusive após o trânsito em julgado de sentença condenatória ou absolutória imprópria, seja por meio de habeas corpus, seja por meio de revisão criminal.

Ex.: crime militar julgado pela Justiça Federal.

Deve ser arguida no MOMENTO OPORTUNO (art. 571, CPP), sob pena de preclusão.

Ex.: nulidades relativas deverão ser arguidas na leitura dos quesitos do Tribunal do Júri (vide última aula).

Hipóteses:

- Quando houver violação de normas da CRFB ou CADH, ainda que essa nulidade não conste do art. 564, CPP (ex.: decisão sem fundamentação);

- Nulidades cominadas no art. 564, CPP, que não estiverem sujeitas à convalidação (art. 572, CPP)*.

Hipóteses:

- Quando houver violação de norma infraconstitucional protetiva de interesse das partes (ex.: não comunicação à parte do local da perícia**) – sobre o tema: súmulas 155 STF e 273, STJ;

- Nulidades cominadas no art. 564 que estiverem sujeitas à convalidação.

*Art. 564 c/c art. 572, CPP:

        Art. 564.  A nulidade ocorrerá nos seguintes casos:

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        I - por incompetência, suspeição ou suborno do juiz;

        II - por ilegitimidade de parte;

        III - por falta das fórmulas ou dos termos seguintes:

        a) a denúncia ou a queixa e a representação e, nos processos de contravenções penais, a portaria ou o auto de prisão em flagrante;

        b) o exame do corpo de delito nos crimes que deixam vestígios, ressalvado o disposto no Art. 167;

        c) a nomeação de defensor ao réu presente, que o não tiver, ou ao ausente, e de curador ao menor de 21 anos;

        d) a intervenção do Ministério Público em todos os termos da ação por ele intentada e nos da intentada pela parte ofendida, quando se tratar de crime de ação pública; (nulidade relativa)

        e) a citação do réu para ver-se processar, o seu interrogatório, quando presente, e os prazos concedidos à acusação e à defesa; (nulidade relativa)

        f) a sentença de pronúncia, o libelo e a entrega da respectiva cópia, com o rol de testemunhas, nos processos perante o Tribunal do Júri;

        g) a intimação do réu para a sessão de julgamento, pelo Tribunal do Júri, quando a lei não permitir o julgamento à revelia; (nulidade relativa)

        h) a intimação das testemunhas arroladas no libelo e na contrariedade, nos termos estabelecidos pela lei; (nulidade relativa)

        i) a presença pelo menos de 15 jurados para a constituição do júri;

        j) o sorteio dos jurados do conselho de sentença em número legal e sua incomunicabilidade;

        k) os quesitos e as respectivas respostas;

        l) a acusação e a defesa, na sessão de julgamento;

        m) a sentença;

        n) o recurso de oficio, nos casos em que a lei o tenha estabelecido;

        o) a intimação, nas condições estabelecidas pela lei, para ciência de sentenças e despachos de que caiba recurso;

        p) no Supremo Tribunal Federal e nos Tribunais de Apelação, o quorum legal para o julgamento;

        IV - por omissão de formalidade que constitua elemento essencial do ato. (nulidade relativa)

        Parágrafo único.  Ocorrerá ainda a nulidade, por deficiência dos quesitos ou das suas respostas, e contradição entre estas.  (Incluído pela Lei nº 263, de 23.2.1948)

        Art. 572.  As nulidades previstas no art. 564, Ill, d e e, segunda parte, g e h, e IV, considerar-se-ão sanadas:

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        I - se não forem argüidas, em tempo oportuno, de acordo com o disposto no artigo anterior;

        II - se, praticado por outra forma, o ato tiver atingido o seu fim;

        III - se a parte, ainda que tacitamente, tiver aceito os seus efeitos.

**Noticiário do dia 20/06/12 e súmulas 155, STF e 273, STJ:

STF Súmula nº 155 - 13/12/1963 - Súmula da Jurisprudência Predominante do Supremo Tribunal Federal - Anexo ao Regimento Interno. Edição: Imprensa Nacional, 1964, p. 85.Nulidade do Processo Criminal - Falta de Intimação - Expedição de Precatória para Inquirição de Testemunha    É relativa a nulidade do processo criminal por falta de intimação da expedição de precatória para inquirição de testemunha.

STJ Súmula nº 273 - 11/09/2002 - DJ 19.09.2002Intimação da Defesa - Expedição da Carta Precatória - Intimação da Data da Audiência    Intimada a defesa da expedição da carta precatória, torna-se desnecessária intimação da data da audiência no juízo deprecado.

20/06/2012 Nulidade de atos processuais depende da efetiva demonstração de prejuízo da parte interessada A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve decisão que considerou que a ausência de ciência às partes a respeito do local e data de realização de perícia não importa, necessariamente, em nulidade. O entendimento, por maioria, se deu no julgamento de embargos de divergência interpostos pela BMW do Brasil Ltda.

A BMW recorreu de decisão da Terceira Turma do STJ que, além de não anular o laudo pericial, por não ter ficado demonstrada a existência de prejuízo, não inabilitou o perito responsável, pelo prazo de dois anos, por estar respondendo por desvio de conduta verificado em outro processo.

A empresa alegou que seus advogados e assistente técnico jamais foram intimados da data em que se iniciara a prova pericial, como determina o artigo 431-A do Código de Processo Civil (CPC). Por isso, a decisão da Terceira Turma, ao rejeitar o pedido de declaração de nulidade, por entender não ter havido demonstração de efetivo prejuízo, teria contrariado aquele artigo, divergindo do posicionamento adotado pela Segunda Turma no julgamento do Agravo Regimental no Recurso Especial (AgRg no REsp) 1.070.733.

Segundo a empresa, a prevalecer a tese contida na decisão da Terceira Turma, ela seria punida duas vezes. “Primeiro, pelo fato de não ter sido cientificada da realização da prova pericial. Segundo, pelo fato de ser obrigada a demonstrar os prejuízos que experimentou na produção de uma prova pericial da qual jamais participou, se quiser anulá-la”, afirmou.

Nulidade relativa

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Em seu voto, o relator, ministro Arnaldo Esteves Lima, lembrou que o acompanhamento, desde o primeiro momento, das tarefas técnicas desenvolvidas pelo perito confere ampla transparência e lisura ao processo e permite a produção de laudo pericial que retrate os fatos da forma mais fidedigna possível, a fim de dar suporte adequado ao magistrado, no exercício da atividade jurisdicional.

“A inobservância dessa intimação ocasiona, em regra, nulidade se a parte havia indicado assistente técnico para o acompanhamento da produção pericial. Entretanto, essa nulidade não é absoluta. Deve ser analisada à luz da demonstração de prejuízo efetivo à parte interessada, segundo o disposto no artigo 249 do CPC, de modo que tão somente na análise do caso concreto é capaz de ser declarada”, afirmou o ministro.

Segundo o relator, o STJ tem se posicionado reiteradamente no sentido de que a decretação de nulidade de atos processuais depende da efetiva demonstração de prejuízo da parte interessada.

No caso, o ministro Esteves Lima aplicou a Súmula 7, uma vez que a BMW pretendia o reexame dos fatos, o que é impossível em recurso especial e, por extensão, em embargos de divergência.

Danos materiais

A Nett Veículos Ltda. ajuizou ação de indenização por danos materiais contra a BMW, resultantes da rescisão de contrato de concessão comercial de veículos automotores. Em execução provisória de sentença foi nomeado perito judicial, tendo as partes indicado assistentes técnicos e formulado quesitos.

Apresentado o laudo pericial, a BMW sustentou a nulidade da perícia, alegando a suspeição do perito, bem como por não ter sido seu assistente técnico previamente intimado sobre data e local das diligências realizadas.

O juízo da execução não conheceu da impugnação apresentada pela BMW. Inconformada, a empresa recorreu ao Tribunal de Justiça de São Paulo, que deu provimento apenas para determinar que o juiz da execução apreciasse a impugnação aos quesitos apresentados e que fosse definido o valor pelo qual deveria ser cumprida a sentença. A BMW recorreu, então, ao STJ.

5. RECONHECIMENTO DAS NULIDADES

A. Na primeira instância

As nulidades podem ser reconhecidas mediante requerimento das partes, sendo que, se relativa, deve ser arguída no momento oportuno, sob pena de preclusão.

Podem ser reconhecidas de ofício? SIM, tanto no caso da nulidade absoluta quanto no caso da relativa.

Sobre o assunto:

Art. 251, CPP:

        Art. 251.  Ao juiz incumbirá prover à regularidade do processo e manter a ordem no curso dos respectivos atos, podendo, para tal fim, requisitar a força pública.

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O juiz tem a obrigação de zelar pela regularidade do feito; por isso, ao visualizar uma nulidade, seja ela absoluta, seja ela relativa, deverá reconhecê-la de ofício.

Art. 423, I, CPP:

        Art. 423.  Deliberando sobre os requerimentos de provas a serem produzidas ou exibidas no plenário do júri, e adotadas as providências devidas, o juiz presidente: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

        I – ordenará as diligências necessárias para sanar qualquer nulidade ou esclarecer fato que interesse ao julgamento da causa; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

“Qualquer nulidade”, seja absoluta, seja relativa.

B. Na segunda instância

Ao julgar determinado recurso, o juízo ad quem fica vinculado ao objeto da impugnação – tantum devolutum quanto appelatum (efeito devolutivo + inércia da jurisdição).

A respeito:

STF Súmula nº 160 - 13/12/1963 - Súmula da Jurisprudência Predominante do Supremo Tribunal Federal - Anexo ao Regimento Interno. Edição: Imprensa Nacional, 1964, p. 87.Decisão do Tribunal - Nulidade - Argüição de Nulidade no Recurso da Acusação - Acolhimento - Recurso de Ofício - Ressalva    É nula a decisão do tribunal que acolhe, contra o réu, nulidade não argüida no recurso da acusação, ressalvados os casos de recurso de ofício.

Conseguimos extrair três conclusões da súmula 160:

- Nos casos de recurso de ofício o tribunal é livre para reconhecer qualquer nulidade, seja ela favorável ou prejudicial ao acusado, pois o reexame necessário devolve ao juízo ad quem o conhecimento integral da causa;

- No recurso da acusação o tribunal é livre para reconhecer qualquer nulidade em prejuízo do acusado, desde que o conhecimento desse vício tenha sido devolvido à apreciação do juízo ad quem;

- No julgamento do recurso da acusação ou da defesa, o tribunal é livre para reconhecer qualquer nulidade em favor do acusado, ainda que tal matéria não tenha sido expressamente devolvida ao tribunal, haja vista o princípio da reformatio in mellius.

6. PRINCÍPIOS REFERENTES ÀS NULIDADES

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6.1 Princípio do prejuízo

Pas de nullité sans grief: não haverá nulidade sem prejuízo.

A forma funciona apenas como um meio para se atingir determinada finalidade. Portanto, ainda que a forma não tenha sido observada, não havendo prejuízo, não haverá que se falar em nulidade.

Esse princípio é aplicável em relação a ambas as nulidades (absolutas e relativas). A diferença é que, segundo a doutrina, na absoluta o prejuízo é presumido e na relativa deve ser comprovado.

Sobre o tema:

        Art. 563.  Nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa.

Ex.: inversão da ordem de oitiva das testemunhas > se o juiz inverter a ordem de oitiva das testemunhas, em não havendo prejuízo, caracteriza-se mera irregularidade e não nulidade.

        Art. 566.  Não será declarada a nulidade de ato processual que não houver influído na apuração da verdade substancial ou na decisão da causa.

Se o ato defeituoso não influencia no resultado final do processo não há por que declarar a nulidade.

6.2 Princípio da instrumentalidade das formas

Toda forma prescrita em lei visa proteger algum interesse ou atingir determinada finalidade. Portanto, se o ato processual for praticado em desacordo com o modelo típico, a nulidade não deve ser reconhecida caso a finalidade tenha sido atingida.

Esse princípio, segundo a doutrina, é aplicável tanto às nulidades absolutas quanto às relativas.

Ex.: art. 570, CPP: como sabemos, eventuais vícios em relação à citação dão ensejo a uma nulidade absoluta. Não obstante, mesmo havendo defeito da citação se o acusado tomar ciência do processo e comparecer, o vício estará convalidado.

        Art. 570.  A falta ou a nulidade da citação, da intimação ou notificação estará sanada, desde que o interessado compareça, antes de o ato consumar-se, embora declare que o faz para o único fim de argüi-la. O juiz ordenará, todavia, a suspensão ou o     adiamento do ato, quando reconhecer que a irregularidade poderá prejudicar direito da parte.

6.3 Princípio da eficácia dos atos processuais

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A nulidade do ato processual defeituoso não é automática, estando seu reconhecimento condicionado à existência de pronunciamento judicial nesse sentido.

É dizer, o ato processual juridicamente existente é considerado válido e eficaz enquanto não proclamada sua nulidade.

Ao contrário do que ocorre no direito privado, em que a nulidade é de pleno direito (automática), no processo penal, a nulidade deve sempre ser proclamada, por mais grave que seja. Portanto, ainda que havendo nulidade absoluta, enquanto não proferida, o ato produz todos os seus efeitos.

Ex.: mandado de prisão sem fundamentação idônea > enquanto o acusado não conseguir, por meio de HC, cassar a decisão, a prisão poderá ocorrer.

6.4 Princípio da restrição processual à decretação da ineficácia

A invalidação de um ato processual defeituoso somente pode ocorrer se houver instrumento adequado e desde que o momento ainda seja oportuno.

Ex.: uma nulidade absoluta pode ser arguída depois do trânsito em julgado da sentença?

Para responder essa pergunta, primeiramente, devemos analisar se existe algum instrumento capaz de servir para contestar essa nulidade. Qual seria essa instrumento? Neste caso, teríamos o HC e a revisão criminal, que poderiam ser usados em caso de sentença condenatória ou absolutória imprópria.

Todavia, estando diante de uma sentença absolutória própria eivada de nulidade absoluta (ex.: juiz federal que absolve sujeito que comete crime militar), não há que se falar em reconhecimento posterior de nulidade (pós trânsito em julgado), vez que inexiste instrumento adequado para tal fim (a revisão criminal é sempre pro reu, nunca pro societate).

Atenção ao art. 571, CPP: marco temporal para a arguição da nulidade relativa:

        Art. 571.  As nulidades deverão ser argüidas:

        I - as da instrução criminal dos processos da competência do júri, nos prazos a que se refere o art. 406; (até as alegações orais)

        II - as da instrução criminal dos processos de competência do juiz singular e dos processos especiais, salvo os dos Capítulos V e Vll do Título II do Livro II, nos prazos a que se refere o art. 500;

        III - as do processo sumário, no prazo a que se refere o art. 537, ou, se verificadas depois desse prazo, logo depois de aberta a audiência e apregoadas as partes;

        IV - as do processo regulado no Capítulo VII do Título II do Livro II, logo depois de aberta a audiência;

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        V - as ocorridas posteriormente à pronúncia, logo depois de anunciado o julgamento e apregoadas as partes (art. 447);

        VI - as de instrução criminal dos processos de competência do Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais de Apelação, nos prazos a que se refere o art. 500;

        VII - se verificadas após a decisão da primeira instância, nas razões de recurso ou logo depois de anunciado o julgamento do recurso e apregoadas as partes;

        VIII - as do julgamento em plenário, em audiência ou em sessão do tribunal, logo depois de ocorrerem.

6.5 Princípio da causalidade

O reconhecimento da nulidade de um ato processual provoca a invalidação dos atos dele decorrentes.

Nulidade originária (ato 1) > nulidade derivada (ato 2): se entre dois atos processuais há uma relação de dependência, sendo o primeiro ato declarado nulo, a nulidade acaba por contaminar o segundo.

O exemplo clássico é o da citação: havendo vício de citação (ato 1) os atos seguintes (ex.: constituição de advogado, oitiva das testemunhas etc.) serão contaminados, e o juiz será obrigado a anular não apenas a citação, mas toda a cadeia de atos dela decorrentes.

Sobre o tema: art. 573, §1º, CPP:

        § 1o  A nulidade de um ato, uma vez declarada, causará a dos atos que dele diretamente dependam ou sejam conseqüência.

Cuidado: essa relação de dependência não é meramente cronológica (nem todos os atos processuais subsequentes serão, necessariamente, nulos).

6.6 Princípio da conservação dos atos processuais (princípio do confinamento das nulidades)

Deve ser preservada a validade dos atos processuais que não dependam de ato anterior declarado inválido.

Não havendo relação de dependência não há motivo para declarar a nulidade.

Ex.: sentença em que o juiz deixa de fundamentar apenas a fixação do regime inicial de cumprimento. Não há justificativa para se anular a sentença como um todo; o tribunal deve se limitar a declarar a nulidade da sentença apenas em relação à fixação do regime.

Art. 248, CPC:

Art. 248. Anulado o ato, reputam-se de nenhum efeito todos os subseqüentes, que dele dependam; todavia, a nulidade de uma parte do ato não prejudicará as outras, que dela sejam independentes.

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6.7 Princípio do interesse

Nenhuma parte pode arguir nulidade relativa referente à formalidade cuja observância interesse apenas à parte contrária. Art. 565, CPP:

        Art. 565.  Nenhuma das partes poderá argüir nulidade a que haja dado causa, ou para que tenha concorrido, ou referente a formalidade cuja observância só à parte contrária interesse.

Cuidado:

- Esse princípio NÃO se aplica ao MP, que pode arguir nulidade relativa em favor do acusado;

- Esse princípio NÃO se aplica às nulidade absolutas.

Ou seja: o réu não pode arguir nulidade relativa referente a formalidade que só interesse à acusação.

Ex.: ausência do promotor à audiência de instrução > a defesa NÃO pode arguir a nulidade da audiência devido à ausência do MP.

6.8 Princípio da lealdade (ou princípio da boa-fé)

Nenhuma parte pode arguir nulidade para a qual tenha concorrido.

Cuidado: segundo a doutrina que prevalece o princípio seria aplicado apenas em relação às nulidades relativas. Art. 565, CPP:

        Art. 565.  Nenhuma das partes poderá argüir nulidade a que haja dado causa, ou para que tenha concorrido, ou referente a formalidade cuja observância só à parte contrária interesse.

Ex.: como sabemos, as peguntas, conforme o art. 212, devem ser feitas pelas próprias partes diretamente para as testemunhas e, somente depois, pelo juiz (exame direto e cruzado). Tem acontecido, todavia, de o juiz fazer as perguntas em primeiro lugar. Neste caso, ele indaga as partes quanto à possibilidade de perguntar primeiro e registra a resposta em ata. Se as partes concordam com a nulidade (violação ao art. 212), não poderão, posteriormente, alegá-la.

6.9 Princípio da convalidação

A palavra “convalidar” significa remover o defeito; sanear o vício. Assim, por conta desse princípio, um ato processual inicialmente imperfeito poderá ser considerado válido, se, de alguma forma, for possível sanear seu defeito.

A doutrina enumera algumas causas de convalidação que merecem atenção especial:

- Suprimento: completa-se uma parte omissa do ato (ex.: aditamento);

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Art. 569, CPP:

        Art. 569.  As omissões da denúncia ou da queixa, da representação, ou, nos processos das contravenções penais, da portaria ou do auto de prisão em flagrante, poderão ser supridas a todo o tempo, antes da sentença final.

- Ratificação: confirma-se um ato anteriormente praticado;

Ex.: art. 568, CPP:

        Art. 568.  A nulidade por ilegitimidade do representante da parte poderá ser a todo tempo sanada, mediante ratificação dos atos processuais.

Imagine que uma queixa tenha sido oferecida por um menor de 18 anos, vítima de crime de ação penal privada. Neste caso, havendo ratificação posterior por seu representante não há que se falar em nulidade.

- Preclusão: perda de um direito ou faculdade por seu não exercício no tempo (preclusão temporal – ex.: não alega a nulidade relativa no prazo), por conta da incompatibilidade de um ato processual em relação a outro já praticado (preclusão lógica – ex.: renunciado o direito ao recurso, não pode a parte depois recorrer) ou por conta de seu exercício (preclusão consumativa – ex.: já interposto o recurso não pode ser novamente interposto);

- Prolação da sentença (Paulo Rangel): por mais que haja uma nulidade, se visualiza-se que já é possível proferir uma sentença de mérito em favor da parte prejudicada não há por que declará-la. Ex.: inépcia da peça acusatória;

Art. 249, §2º, CPC:

§ 2o Quando puder decidir do mérito a favor da parte a quem aproveite a declaração da nulidade, o juiz não a pronunciará nem mandará repetir o ato, ou suprir-lhe a falta.

Isso também é chamado de “teoria da causa madura”.

- Coisa julgada: forma uma imutabilidade em torno da decisão; portanto, a partir do momento em que há o trânsito em julgado o defeito já não mais poderá ser questionado.

Cuidado: a coisa julgada como preclusão máxima vale apenas nos casos de sentença absolutória própria, vez que na sentença condenatória e na absolutória imprópria será possível, mesmo após o trânsito em julgado, impugnar uma nulidade absoluta, seja por meio de HC, seja pela revisão criminal.

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TEMA 8: MEDIDAS ASSECURATÓRIAS

1. PREVISÃO LEGAL

As medidas assecuratórias estão tratadas a partir do art. 125 do CPP, no capítulo VI “Das medidas assecuratórias”, que está dentro do título dos procedimentos incidentais.

2. CONCEITO

São medidas cautelares de natureza patrimonial cujo objetivo é assegurar o confisco como efeito da condenação, garantir a futura indenização ou reparação do dano causado à vítima da infração penal, o pagamento das despesas processuais ou das penas pecuniárias, sendo úteis, ademais, para fins de se evitar que o acusado se enriqueça ilicitamente com o produto da prática delituosa.

Arts. 91, CP:

   Efeitos genéricos e específicos

        Art. 91 - São efeitos da condenação: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        I - tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime; (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        II - a perda em favor da União, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) (confisco)

        a) dos instrumentos do crime, desde que consistam em coisas cujo fabrico, alienação, uso, porte ou detenção constitua fato ilícito;

        b) do produto do crime ou de qualquer bem ou valor que constitua proveito auferido pelo agente com a prática do fato criminoso.

O grande problema dos efeitos da condenação é que eles só serão levados adiante após o trânsito em julgado da condenação, o que, como sabemos, demora muitos anos. Assim, o que normalmente ocorre é que o acusado dilapida todo seu patrimônio, exatamente visando resguardar-se de uma possível obrigação de indenizar pelo delito. É aqui que visualizamos a importância das medidas assecuratórias, que asseguram que o patrimônio do réu esteja protegido para garantir os efeitos genéricos da condenação.

3. JURISDICIONALIDADE

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As medidas assecuratórias só podem ser decretadas pela autoridade juridiciária competente: o poder cautelar é inerente à atividade jurisdicional. Por isso, quem pode conceder medidas cautelares é apenas o Poder Judiciário.

A própria CRFB, em seu art. 5º, LIV, enuncia que a privação da liberdade e dos bens apenas pode ocorrer em havendo o devido processo legal:

LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;

Além disso, essas medidas assecuratórias NÃO podem ser decretadas por CPI. A CPI pode até decretar quebra de sigilos; todavia, nunca terá competência para decretar a indisponibilidade de bens particulares, que não faz parte do poder investigativo inerente à CPI, sendo um procedimento cautelar. Nesse sentido: STF MS 23.466.

É possível a decretação de ofício das medidas cautelares? Na verdade, as medidas cautelares só podem ser decretadas de ofício na fase JUDICIAL. É que, nos mesmos moldes que a prisão preventiva e das demais medidas cautelares diversas da prisão, o juiz deve se abster de decretar medidas na fase investigatória, sob pena de violar o própio sistema acusatório. Assim, na fase investigatória, as cautelares só podem ser decretadas pelo juiz mediante provocação.

4. PRESSUPOSTOS

As medidas assecuratórias, como visto, são medidas cautelares de natureza patrimonial. Como toda e qualquer medida cautelar, elas estão condicionadas à presença do fumus boni iures (fumus comissi delicti) e do periculum in mora (periculum libertatis).

Sobre o tema: art. 126, CPP:

        Art. 126.  Para a decretação do seqüestro, bastará a existência de indícios veementes da proveniência ilícita dos bens.

Temos, neste artigo, claramente, a necessidade do fumus comissi delicti. Interessante perceber que o dispositivo nada fala quanto ao perigo. Todavia, a doutrina é uníssona: não obstante o artigo referir-se apenas ao fumus, para a decretação da cautelar, também o periculum deve ser evidenciado.

5. CONTRADITÓRIO PRÉVIO

No CPP, quando observamos as medidas assecuratórias (art. 125 ao art. 144) devemos ter o seguinte cuidado: quanto às medidas assecuratórias patrimoniais, nada diz a lei em relação ao contraditório prévio. Por isso, a doutrina costuma entender que o contraditório, nesses casos, seria diferido (o acusado só teria ciência da medida após sua decretação).

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Todavia, o professor discorda. Isso porque em 2011 entrou em vigor a Lei 12.403, que alterou a prisão e passou a prever o §3º do art. 282, CPP, o qual instituiu o contraditório prévio quanto às medidas cautelares de natureza pessoal:

§ 3o  Ressalvados os casos de urgência ou de perigo de ineficácia da medida, o juiz, ao receber o pedido de medida cautelar, determinará a intimação da parte contrária, acompanhada de cópia do requerimento e das peças necessárias, permanecendo os autos em juízo. (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).

Dessa forma, o contraditório em relação às medidas cautelares de natureza pessoal, que antes era diferido, passa a ser prévio.

Assim, se o legislador previu o contraditório prévio em relação às medidas pessoais, essa previsão também se estenderia às da natureza patrimonial.

A regra, portanto, será o contraditório prévio, salvo se houver risco de ineficácia da medida.

6. SEQUESTRO

6.1 Conceito

O sequestro é uma medida cautelar patrimonial fundada no interesse privado do ofendido na reparação do dano causado pelo delito e no interesse público de ulterior perdimento de bens como efeito da condenação que recai sobre bens ou valores adquiridos pelo investigado com os proventos da infração, podendo incidir sobre bens móveis e imóveis, ainda que em poder de terceiros.

A palavra “sequestro” não é usada de forma muito técnica pelo CPP, já que o sequestro recai sobre o produto indireto da infração penal: bens e valores adquiridos pelo acusado com o dinheiro proveniente da infração penal.

Se estivermos diante do produto direito da infração penal a medida correta é a apreensão.

Ex. 1: o traficante de drogas mantém em sua casa 500.000,00, valor este que é o produto direto da infração e, como tal, deve ser objeto de apreensão (a qual pode ser determinada pelo juiz ou até mesmo pela autoridade policial – ex.: o policial que encontra dinheiro na casa do traficante pode mandar apreender).

Ex. 2: o traficante compra um carro de 500.000,00 com o produto do tráfico. Trata-se, claramente, de produto indireto da infração penal, o qual deve ser objeto, portanto, de sequestro.

Atenção à característica da referibilidade: apenas é possível decretar o sequestro em relação a bens e valores que estejam, de algum modo, relacionados à prática criminosa; o bem sequestrado deve ser sempre produto indireto do crime.

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O sequestro pode recair sobre bens móveis ou imóveis:

- Em se tratando de bens imóveis deve haver a inscrição no registro de imóveis para se evitar uma venda fraudulenta.

        Art. 128.  Realizado o seqüestro, o juiz ordenará a sua inscrição no Registro de Imóveis.

- Recaindo o sequestro sobre bens móveis é possível, a depender do caso concreto, o registro em órgãos próprios (ex.: Detran).

Em relação ao bem de família vale lembrar que a Lei 8.009/90 determina que sua impenhorabilidade não se opõe caso o bem tenha sido adquirido com o produto de crime:

Art. 3º A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido: (situações em que não incide a impenhorabilidade)

VI - por ter sido adquirido com produto de crime ou para execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens.

O sequestro pode recair inclusive sobre bens que já tenham sido transferidos a terceiros. Prova disso é o art. 125, CPP:

        Art. 125.  Caberá o seqüestro dos bens imóveis, adquiridos pelo indiciado com os proventos da infração, ainda que já tenham sido transferidos a terceiro.

A Lei de Lavagem de Capitais prevê ainda a possibilidade de nomeação de um administrador de bens.

6.2 Procedimento do sequestro

Legitimidade para requerer o sequestro:

- MP;

- Ofendido;

- Autoridade policial;

Apesar do silêncio legal, a doutrina também inclui aqui o assistente da acusação: o assistente pode requerer a decretação de cautelares de natureza pessoal – se pode requerer o mais, não há motivo para não poder requerer o menos.

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        Art. 127.  O juiz, de ofício (só na fase judicial), a requerimento do Ministério Público ou do ofendido, ou mediante representação da autoridade policial, poderá ordenar o seqüestro, em qualquer fase do processo ou ainda antes de oferecida a denúncia ou queixa.

Momento:

- Durante as investigações; e

- No curso do processo penal.

Ação controlada:

Consiste no retardamento da intervenção policial para que se dê no momento mais oportuno. A ação controlada não vale apenas para a prisão, podendo também ser adotada em relação às medidas asecuratórias.

Neste ponto, devemos prestar atenção ao art. 60, §4º, da Lei de Drogas e ao art. 4º-B da Lei de Lavagem:

§ 4o  A ordem de apreensão ou seqüestro de bens, direitos ou valores poderá ser suspensa pelo juiz, ouvido o Ministério Público, quando a sua execução imediata possa comprometer as investigações.

Art. 4o-B.  A ordem de prisão de pessoas ou as medidas assecuratórias de bens, direitos ou valores poderão ser suspensas pelo juiz, ouvido o Ministério Público, quando a sua execução imediata puder comprometer as investigações.  (Incluído pela Lei nº 12.683, de 2012)

6.3 Defesa

A. Embargos do acusado

O único fundamento que o acusado pode utilizar nos embargos é o de que os bens fruto do sequestro não são produtos indiretos da infração penal. Isto é: o acusado deve provar que os bens foram adquiridos de forma lícita.

Neste caso, o ônus da prova quanto à licitude da aquisição dos bens recai sobre o acusado, pelo menos durante o curso do processo (não havendo que se falar em violação à presução da inocência).

        Art. 130.  O seqüestro poderá ainda ser embargado:

        I - pelo acusado, sob o fundamento de não terem os bens sido adquiridos com os proventos da infração;

Nesse sentido: STJ RMS 28.627: nesse julgado, o bem havia sido adquirido pelo acusado em 1.987, mas o crime havia sido cometido apenas em 2.002. O acusado, então, por meio dos

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embargos, provou a inexistência da característica da referibilidade, demonstrando, pela incompatibilidade cronológica, que o bem não era produto indireto do crime.

Atenção: duas leis exigem o comparecimento pessoal do acusado como condição para a oposição dos embargos, a saber:

- Lei de Lavagem: art. 4º, §3º

§ 3o  Nenhum pedido de liberação será conhecido sem o comparecimento pessoal do acusado ou de interposta pessoa a que se refere o caput deste artigo, podendo o juiz determinar a prática de atos necessários à conservação de bens, direitos ou valores, sem prejuízo do disposto no § 1o. (Redação dada pela Lei nº 12.683, de 2012)

- Lei de Drogas: art. 60, §3º

§ 3o  Nenhum pedido de restituição será conhecido sem o comparecimento pessoal do acusado, podendo o juiz determinar a prática de atos necessários à conservação de bens, direitos ou valores.

O legislador, neste ponto, andou bem, vez que, nesses dois crimes, em regra, são encontrados os bens, mas o acusado é foragido. Assim, a lei impõe o comparecimento pessoal do acusado, como forma de “forçá-lo a aparecer”.

Sobre os embargos é importante ressaltar que eles só poderão ser julgados após o trânsito em julgado da sentença condenatória. Isso para que as meidas assecuratórias possam efetivamente resguardar o confisco e a reparação do dano.

        Art. 130. Parágrafo único.  Não poderá ser pronunciada decisão nesses embargos antes de passar em julgado a sentença condenatória.

B. Embargos de terceiro estranho à infração penal

Estamos diante de um terceiro completamente estranho à infração que tem seu bem sequestrado, p. ex.: um condômino, um sócio etc.

Art. 129, CPP:

        Art. 129.  O seqüestro autuar-se-á em apartado e admitirá embargos de terceiro.

Art. 1.046, CPC:

Art. 1.046. Quem, não sendo parte no processo, sofrer turbação ou esbulho na posse de seus bens por ato de apreensão judicial, em casos como o de penhora, depósito, arresto, seqüestro, alienação judicial, arrecadação, arrolamento, inventário,

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partilha, poderá requerer Ihe sejam manutenidos ou restituídos por meio de embargos.

Esses embargos de terceiro serão apreciados pelo juiz criminal (que foi quem decretou o sequestro).

Além disso, nada diz a lei quanto ao momento para sua apreciação, mas a doutrina entende que esses embargos devem ser apreciados após o encerramento de sua instrução probatória. Isso porque não faz sentido que um terceiro completamente estranho à infração tenha seus bens sequestrados até o trânsito em julgado da sentença condenatória.

C. Embargos do terceiro que adquiriu onerosamente o bem do acusado, tendo o feito de boa-fé

Não se trata mais de um terceiro completamente estranho, mas de uma pessoa que, não obstante não tenha participado diretamente da infração, teve algum tipo de contato com os bens produto do crime.

O terceiro deverá demonstrar 1. Que a transmissão do bem se deu a título oneroso; e 2. Que a aquisição se deu de boa-fé* (o adquirente deve provar que não sabia da prática delituosa).

*Tendo o terceiro conhecimento quanto a origem ilícita do bem que lhe foi transferido (ausência de boa-fé) é óbvio que o bem poderá ser objeto de sequestro.

        Art. 130.  O seqüestro poderá ainda ser embargado:

        II - pelo terceiro, a quem houverem os bens sido transferidos a título oneroso, sob o fundamento de tê-los adquirido de boa-fé.

Esses embargos (assim como os do acusado) só serão apreciados após o trânsito em julgado da sentença condenatória.

Além desses três instrumentos de defesa, a doutrina costuma apontar a possibilidade de utilização da apelação e de impetração de mandado de segurança (no caso de decisão judicial contra a qual haja previsão de recurso que não tenha efeito suspensivo).

6.4 Levantamento do sequestro

“Levantamento” significa a perda da eficácia da medida constritiva. Ou seja: o sequestro, por algum motivo, perde sua eficácia depois de decretado.

Mas qual é esse “motivo”?

- Se a ação penal não for ajuizada no prazo de 60 dias;232

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        Art. 131.  O seqüestro será levantado:

        I - se a ação penal não for intentada no prazo de sessenta dias, contado da data em que ficar concluída a diligência;

Trata-se, contudo, de prazo de natureza relativa, que pode ser prorrogado em casos complexos.

Cuidado com a Lei de Lavagem de capitais, que determina um prazo de 120 dias (e não de 60).

- Admissão judicial de caução prestada por terceiro;

O terceiro presta uma caução para substituir o bem sequestrado.

        Art. 131.  O seqüestro será levantado:

        II - se o terceiro, a quem tiverem sido transferidos os bens, prestar caução que assegure a aplicação do disposto no art. 74, II, b, segunda parte, do Código Penal (art. 91, II, b, segunda parte, CP);

- Extinção da punibilidade ou absolvição do acusado.

        Art. 131.  O seqüestro será levantado:

        III - se for julgada extinta a punibilidade ou absolvido o réu, por sentença transitada em julgado.

Cuidado: a lei diz que essa sentença absolutória precisa transitar em julgado. Todavia, a sentença absolutória produz seus efeitos de maneira imediata. Dessa forma, não há por que exigir o trânsito em julgado para que seja feito o levantamento.

Ex.: imagine que o juiz tenha decretado o sequestro de um carro que teria sido adquirido com o produto de um furto. Se o acusado é absolvido na primeira instância, aquela decisão já possui seus efeitos de imediato (a apelação contra a sentença absolutória não é dotada de efeito suspensivo). Portanto, a constrição que recaía sobre o veículo deve ser levantada e ele deve ser restituído.

Atenção: nem a sentença absolutória por ausência de provas nem a extinção da punibilidade NÃO fazem coisa julgada no cível. Nesses casos, continua sendo possível que a vítima busque a reparação no âmbito cível.

- Prodecência dos embargos.

Também acarreta no levantamento.

7. ESPECIALIZAÇÃO E INSCRIÇÃO DA HIPOTECA LEGAL

7.1 Conceito

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A hipoteca é um direito real de garantia instituído sobre imóvel alheio de modo a assegurar o cumprimento de obrigação de cunho patrimonial, sem que ocorra a transferência da posse do bem gravado para o credor.

A hipoteca pode ser:

- Convencional;

- Judicial;

- Legal: resulta de lei, que a institui em favor de determinadas pessoas, em virtude de situação peculiar em que se encontram.

Ao processo criminal interessa a hipoteca legal, e apenas aquela prevista no art. 1.489, III, CC:

Art. 1.489. A lei confere hipoteca:

III - ao ofendido, ou aos seus herdeiros, sobre os imóveis do delinqüente, para satisfação do dano causado pelo delito e pagamento das despesas judiciais;

A lei presume que a vítima do crime obterá a reparação do dano. Por isso, ela, desde já, confere direito à vítima sobre os bens do delinquente.

O antigo CC previa uma hipoteca legal dada à FP sobre os imóveis do acusado. Ocorre que, com o advento do novo CC, essa hipótese NÃO mais existe.

A inscrição da hipoteca legal, à diferença do sequestro, visa proteger apenas o interesse privado.

Além disso, ao contrário do sequestro que recai sobre bens móveis e imóveis adquiridos com o produto do crime, a inscrição da hipoteca legal recai apenas sobre os bens imóveis do autor do delito, por ele adquiridos licitamente.

A inscrição da hipoteca legal é uma medida subsidiária à apreensão e ao sequestro: primeiramente busca-se a apreensão; depois o sequestro, e, só na impossibilidade, utiliza-se a hipoteca.

A inscrição da hipoteca legal NÃO pode recair sobre bens de terceiro.

Cuidado com as pessoas jurídicas: é muito comum encontrarmos bens do acusado que são transferidos a uma pessoa jurídica. Neste caso, evidenciada a confusão patrimonial, a inscrição pode recair sobre o bem da pessoa jurídica pertencente ao acusado.

O bem de família pode ser objeto de inscrição de hipoteca legal (art. 3º, VI, 8.009/90).

A hipoteca legal só pode ser decretada durante a fase judicial. Assim, caso haja risco da ineficácia da medida pode ser requerido o arresto prévio:

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        Art. 136.  O arresto do imóvel poderá ser decretado de início, revogando-se, porém, se no prazo de 15 (quinze) dias não for promovido o processo de inscrição da hipoteca legal. (Redação dada pela Lei nº 11.435, de 2006).

7.2 Legitimidade

Recai percipuamente sobre:

- Ofendido;

- Representante legal;

- Sucessores.

Especial atenção deve ser dispensada ao art. 142, CPP:

        Art. 142.  Caberá ao Ministério Público promover as medidas estabelecidas nos arts. 134 (inscrição da hipoteca legal) e 137, se houver interesse da Fazenda Pública, ou se o ofendido for pobre e o requerer.

Este artigo deve ser divido em duas partes:

Legimidade do MP para requerer a hipoteca legal:

- Em favor da Fazenda Pública;

Os Tribunais entendem que é possível. Parte minoritária da doutrina defende que a primeira parte do art. 142 não teria sido recepcionada pela CRFB. O professor entende que essa parte do artigo não é mais válida, pois: 1. Não cabe mais ao MP representar os interesses da FP: se a FP tem interesse na hipoteca legal, ela que venha ao processo; e 2. O antigo CC dava hipoteca à FP, o que o novo CC não faz.

- Em favor da vítima pobre (e desde que não haja na Comarca Defensoria Pública);

Continua sendo possível. Devemos dar a mesma interpretação dada ao art. 68, CPP: inconstitucionalidade progressiva > nas comarcas em que não há Defensoria, o MP ainda pode agir em favor da vítima pobre (até que a DP seja implantada em todo o país).

8. ARRESTO

Pode ser prévio (art. 136) ou subsdiário (art. 137):

        Art. 136.  O arresto do imóvel poderá ser decretado de início, revogando-se, porém, se no prazo de 15 (quinze) dias não for promovido o processo de inscrição da hipoteca legal. (Redação dada pela Lei nº 11.435, de 2006).

        Art. 137.  Se o responsável não possuir bens imóveis ou os possuir de valor insuficiente, poderão ser arrestados bens móveis suscetíveis de penhora, nos

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termos em que é facultada a hipoteca legal dos imóveis. (Redação dada pela Lei nº 11.435, de 2006).

        § 1o  Se esses bens forem coisas fungíveis e facilmente deterioráveis, proceder-se-á na forma do § 5o do art. 120.

        120 § 5o  Tratando-se de coisas facilmente deterioráveis, serão avaliadas e levadas a leilão público, depositando-se o dinheiro apurado, ou entregues ao terceiro que as detinha, se este for pessoa idônea e assinar termo de responsabilidade.

        § 2o  Das rendas dos bens móveis poderão ser fornecidos recursos arbitrados pelo juiz, para a manutenção do indiciado e de sua família.

O que é o arresto subsidiário de bens móveis?

Funciona como medida cautelar semelhante à inscrição da hipoteca legal, porém recai sobre bens móveis do acusado por ele obtidos de maneira lícita, a ser adotada quando os bens imóveis não forem suficientes para resguardar a reparação do dano causado pelo delito.

Ex.: homicídio que tenha causado prejuízo de 100.000,00: busca-se, primeiramente, a hipoteca legal. Todavia, não tendo o acusado qualquer imóvel, ou o tendo em valor inferior à dívida, utiliza-se este arresto.

Em se tratando de bens facilmente deterioráveis e fungíveis, poderão ser objeto de alienação antecipada. Nesse caso, o bem é levado a leilão público e o dinheiro fruto da alienação fica guardado em depósito.

Aplica-se ao arresto subsidiário o estudado em relação à inscrição da hipoteca legal.

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