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Deficiência de Vitamina A em crianças em idade pré-escolar Publicação destinada aos Profissionais de Saúde • ano 5 • nº 14 • maio 2011 • São Paulo • ISSN 2176-8463 14 Nutrição em psiquiatria uma abordagem global do paciente A cozinha poética de Cora Coralina e Adélia Prado As maiores descobertas em nutrição dos últimos 40 anos Fome oculta O impacto no Brasil e no Mundo Anemia (deficiência de ferro) em crianças em idade pré-escolar Deficiência de Zinco na População Deficiência de Iodo em crianças em idade escolar

Publicação destinada aos Profissionais de Saúde • ano 5 … Bighetti sarrassini, ribeirão Preto-sP. ou neneira de Alientos e dou-tora e Cincia de Alientos Atual-ente sou rofessora

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Deficiência de Vitamina A em crianças em idade pré-escolar

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ano

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nº 1

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mai

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São

Pau

lo •

ISSN

217

6-84

63

14Nutrição em psiquiatria uma abordagem global do paciente

A cozinha poética de Cora Coralina e Adélia Prado

As maiores descobertas em nutrição dos últimos 40 anos

Fome ocultaO impacto no Brasil e no Mundo

Anemia (deficiência de ferro) em crianças em idade pré-escolar

Deficiência de Zinco na PopulaçãoDeficiência de Iodo em crianças em idade escolar

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nest

Ivan F. ZuritaPresidente da Nestlé Brasil

Direção Editorial: Ivan Zurita, Izael Sinem Jr. e Célia Suzuki

Consultor Editorial: Claudio Galperin

Colaboradores: Juliana Lofrese, Maria Helena Sato, Carla Silveira, Roberta Portes, Priscila Cassima

Editor: Claudio Galperin Jornalista-responsável: MTb 12.834 Assistente Editorial: Maria Fernanda Elias Llanos Assistente de Redação: Betina Galperin

Edição de Arte, Produção Gráfica e Pré-Media: D’Lippi Design+Print — (11) 3031.2900 — www.dlippi.com.br Edição de Arte: Rosalina Sasaki

Arte-final: Ricardo Lugo Fotografia: Fernanda Preto e Shutterstock Ilustração: Felix Reinners Capa: Shutterstock Revisão: Eliete Soares

Impressão: Nova Página Gráfica e Editora Tiragem: 40.000 exemplares

Nutrição, inovação e cultura

A revista Nestlé.Bio é um produto informativo da Nestlé Brasil destinado a promover pesquisas e práticas no campo da ciência da nutrição realizadas no país e no exterior, sob os cuidados de um criterioso processo editorial. Alinhada ao histórico papel da Nestlé no apoio à difusão da informação científica, a revista abre espaço para a diversidade de opiniões, que consideramos ser essencial para o intercâmbio de ideias e conceitos inovadores. As declarações expressas na revista não refletem necessariamente o posicionamento institucional da companhia com relação aos temas tratados.

editorial

A queda da desnutrição e o aumento da obesidade em diferentes grupos etários no Brasil ocorre ao mesmo tempo

em que um contingente significativo da população sofre de carências de micronutrientes.

Nesta edição da Nestlé.Bio, o Prof. Dr. José Fernando de Nóbrega, Presidente da Academia Brasileira de Pediatria;

e a nutricionista Andréa Ramalho, Professora-titular da Universidade Federal do Rio de Janeiro, nos falam, respec-

tivamente, sobre a importância do fenômeno de transição nutricional e da fome oculta no país.

A arte também está presente. Como fonte de prazer e ferramenta de transformação. De um lado, as cozinhas goia-

na e mineira protagonizam o encontro poético de Cora Coralina e Adélia Prado. De outro, na cidade de Santos (SP), a

professora Eliane Leandro Nogueira faz uso da música para promover educação alimentar no Ensino Fundamental.

Em termos de inovação, podemos apreciar como as pesquisas de ponta na área de probióticos e prebióticos per-

mitiram o desenvolvimento do mais novo produto da Nestlé destinado ao combate da diarreia aguda.

Esta edição nos permite ainda um mergulho nos motivos que levaram a Organização das Nações Unidas para a Edu-

cação, a Ciência e a Cultura (Unesco) a eleger a Dieta do Mediterrâneo como Patrimônio Cultural da Humanidade.

Não se trata de valorizar ingredientes isoladamente, mas um conjunto de práticas ancestrais que tornam a vida

de diferentes comunidades mediterrâneas mais saudável, longeva e feliz. De modo que a relação do homem com

a natureza, a prática de atividade física, a transmissão de conhecimento e o sentido gregário de cada refeição

produzam seus benefícios em perfeita sintonia com aquilo que se come.

A Nestlé, maior companhia de nutrição, saúde e bem-estar do mundo, se identifica plenamente com isso.

A todos, uma boa leitura.

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Aguardamos seus comentários e sugestões para o e-mail [email protected] ou para a caixa postal 11.177, CEP 05422-970, São Paulo (SP), com seu nome completo, registro profissional, local de trabalho e cidade de origem.

ÍNDICEintercâmbio ne

stlé

10sabor e saúdeA Dieta do Mediterrâneo torna-se Patrimônio Cultural da Humanidade pela Unesco. Sabor e estilo de vida a favor da saúde e do bem-estar.

17 ponto de vistaO Prof. Dr. Fernando José de Nóbrega, presidente da Academia Brasileira de Pediatria, discute o fenômeno de transição nutricional no Brasil.

04palavraA nutricionista Andréa Ramalho, Professora-titular da Universidade Federal do Rio de Janeiro, aborda o tema Fome Oculta no Brasil e no mundo.

18conhecerConheça algumas das maiores descobertas em nutrição dos últimos 40 anos.

24 dossiê bioAs nutricionistas Adriana Trejger Kachani e Marcela Salim Kotait, do Instituto de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, publicam a primeira parte do artigo Nutrição em Psiquiatria.

29qualidadeFiberMais Flora® é a inovadora combinação de probiótico com fibras solúveis como aliado ao combate da diarreia.

32nutrição e culturaO encontro poético de Adélia Prado e Cora Coralina, entre aromas e paladares das cozinhas de Minas e Goiás.

37focoAvanços na segurança, eficácia e estabilidade de probióticos tornam o iogurte, com seus mais de 5.000 anos de história, uma bebida ainda melhor.

41calendárioConfira os próximos encontros, congressos e simpósios voltados para temas ligados à nutrição.

42resultadoA música do grupo Palavra Cantada no centro de um premiado projeto de educação alimentar.

46leitura críticaDieta e asma: implicações nutricionais da prevenção ao tratamento e Ganho de peso na gestação como fator de risco isolado para excesso de peso e obesidade do recém-nascido na vida adulta. Confira estes temas na leitura crítica desta edição.

Parabéns pela revista Nestlé.Bio. O artigo Epigenética e Nutrição (edi-ção de número 13) é primoroso e in-centiva a pesquisa. Antonio Fortes de Pádua Filho, Médico, Professor-Adjunto da Universidade Federal do Piauí (UFPI), Teresina-PI.

Gostaria de parabenizar a Nestlé.Bio pela excelência dos artigos, pela qua-lidade gráfica e pelas informações relevantes e atuais dentro da área de saúde e alimentação. Henrique Cesar Lopes, médico endocrinologista, Araras- SP.

Sou nutricionista e professora de Nutrição da Unicamp, campus de Li-meira. Aproveito para parabenizá-los pela Nestlé.Bio. Os temas são atuais e interessantes. Adriane Elisabete Costa Antunes, Limeira-SP.

A Nestlé.Bio é de excelente qualidade. Sou docente do curso de nutrição da Universidade de Franca (Unifran) e sempre discuto o material da revista com meus alunos. Felicia Bighetti Sarrassini, Ribeirão Preto-SP.

Sou Engenheira de Alimentos e dou-tora em Ciência de Alimentos. Atual-mente sou professora de um curso de Nutrição e utiizo muitos textos da revista Nestlé.Bio em minhas aulas. Giovanna Pisanelli Rodrigues de Oliveira, São Paulo-SP.

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palavra

e n t r e v i s t a _ Maria Fernanda Elias Llanos

O relatório da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), divulgado em dezembro de 2010, salientou que a desnutrição já atinge mais de um bilhão de pessoas.

oculta

A palavra da Professora Dra. Andréa Ramalho

Fome

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Nas palavras do Dr. Jacques Diouf, diretor-geral da FAO, a fome perma-

nece a maior tragédia e o maior escândalo do mundo, sendo que o número de

pessoas subnutridas encontra-se inaceitavelmente alto [1]. De modo geral,

a desnutrição infantil resulta em retardo do crescimento, subdesenvolvimen-

to físico e mental e aumento da mortalidade. Entre os adultos, suas maiores

consequências são letargia, diminuição da capacidade física e reprodutiva,

declínio da função cognitiva e debilidade imunológica. Nesse sentido, a fome

e a desnutrição são fatores que impedem o desenvolvimento econômico e

social de comunidades e grandes nações [2].

A carência de micronutrientes, conhecida como fome oculta, afeta cer-

ca de um terço da população mundial e está relacionada principalmente à

deficiência de ferro, zinco, iodo e vitamina A [1]. A fome oculta recebe essa

nomenclatura por se instalar de forma silenciosa, sem sinais clínicos apa-

rentes. Entretanto, mesmo que o quadro não seja avançado, ela já é capaz de

causar danos relevantes à saúde, aos sistemas de saúde e à sociedade [3].

Os custos envolvidos no tratamento e no gerenciamento das consequên-

cias da desnutrição sejam eles medidos em termos humanos, fiscais ou eco-

nômicos são extremamente elevados. Por outro lado, os especialistas defen-

dem que os valores necessários para a prevenção da desnutrição são baixos.

As ações governamentais e os investimentos em nutrição são jus-

tificáveis, não apenas por questões morais, mas também pela redução de

despesas com saúde, aumento da produtividade e consequente crescimento

econômico e social [1,2].

A convite da Nestlé.Bio, a nutricionista Andréa Ramalho, professora-

-titular da Universidade Federal do Rio de Janeiro, coordenadora do Núcleo

de Pesquisa em Micronutrientes e autora do livro Fome Oculta: Diagnóstico,

Tratamento e Prevenção, compartilha seu conhecimento sobre o tema.

palavra 5

A carência de micronutrientes afeta cerca de um terço da população mundial

Anemia (deficiência de ferro) em crianças em idade pré-escolar

Categoria de significância para saúde pública (prevalência de anemia)n Normal (<5.0%) n Leve (5.0 - 19.9%) n Moderada (20.0 – 39.9%) n Severa (≥24.0%)

Não há dados disponíveis

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08 Baixa n Moderada n Alta

Deficiência de Zinco na População

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Como é definida a fome oculta (FO)?

A FO é uma carência não explícita de um ou mais micro-

nutrientes, em que há alterações fisiológicas mínimas,

não perceptíveis no exame clínico de rotina, sendo este

fato uma consequência da falta ou consumo marginal,

sobretudo, de micronutrientes. É o estágio anterior ao

surgimento dos sinais clínicos de carência detectáveis

e não está necessariamente associado a patologias cla-

ramente definidas, como as observadas na desnutrição

proteico-calórica. A FO já causa prejuízos à saúde, levan-

do a um maior risco de morbimortalidade, mesmo que

não evolua para os estágios terminais da deficiência.

Quais são as principais causas de FO no Brasil e no

mundo?

A FO é causada, tanto em nível mundial como nacional, por

razões econômicas, geográficas e/ou educacionais, nas

quais o indivíduo tem acesso a uma dieta básica pouco di-

versificada e, normalmente, deficiente em vários micronu-

trientes. Pode estar associada à pouca disponibilidade de

alimentos na natureza, aumento das demandas nutricio-

nais, restrições alimentares, situações patológicas instala-

das, desinformação sobre hábitos alimentares saudáveis

e exclusão (ou baixo consumo) de alimentos fonte de nu-

trientes em razão de preferências, crenças ou costumes re-

gionais. Ainda que a FO possa ocorrer por deficiência de um

micronutriente específico, frequentemente ocorre de forma

combinada a outras deficiências de vitaminas e minerais,

em razão da estreita associação entre fontes alimentares,

vias metabólicas e funções fisiológicas.

Quais nutrientes merecem destaque?

Tradicionalmente, vitamina A, iodo e ferro estão as-

sociados às maiores deficiências, consideradas de

elevado impacto social e priorizadas pela Organização

Mundial da Saúde (OMS) em todo o mundo. Entretanto,

desde o final da última década, deficiências de outros

micronutrientes passaram a ter destaque em nível de

saúde pública mundial. Dentre eles destacam-se a vita-

mina D, o zinco e o ácido fólico.

Considerando o Brasil, quais são as deficiências

mais significativas?

No país, as deficiências mais significativas são as de

ferro e de vitamina A. A prevalência de anemia está

em torno de 30% a 60% em crianças, principal grupo

afetado, juntamente com as gestantes e lactantes.

Estima-se que 25% delas estejam enquadradas como

portadoras de anemia grave, causada pela deficiência

de ferro e/ou ácido fólico. Com relação à vitamina A, es-

tudos mostram que 30% a 50% de crianças com menos

de 5 anos sofrem de algum grau de deficiência dessa

vitamina. O Brasil está entre os 60 países onde a defi-

ciência de vitamina A é, atualmente, um importante

problema de saúde pública. Todas as regiões do país

fazem parte do “mapa nacional” de hipovitaminose A.

E com relação ao iodo?

Dentre as carências de micronutrientes de elevado

impacto social, a deficiência de iodo é a em que o Bra-

sil se encontra em melhor situação, visto que o país já

obrigou à adição de iodo ao sal, por meio de lei, desde

1953. Aproximadamente 90% das famílias em todo o

país utilizam sal iodado.

Quais são os impactos dessas carências para a saúde?

As carências nutricionais exercem um efeito direto

no crescimento e desenvolvimento do ser humano,

bem como efeitos secundários que invariavelmente

se refletem na capacidade de trabalho e, consequen-

temente, na independência econômica e tecnológica

das nações. A deficiência de micronutrientes pode le-

var a um maior risco de morbimortalidade por compro-

metimento de vários processos metabólicos, mere-

cendo destaque as alterações observadas no sistema

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palavra 7

imune, nas defesas antioxidantes e no desenvolvi-

mento físico e mental dos indivíduos. Qualquer carên-

cia de macro ou micronutrientes tem múltiplos efeitos

deletérios, uma vez que o organismo necessita deles

para manter sua homeostase e integridade.

Quais são os grupos de risco para FO?

Os grupos mais vulneráveis à deficiência de micronu-

trientes são as gestantes, as nutrizes e os lactentes, pelo

aumento das demandas nutricionais nesses momentos

biológicos. O não atendimento de tais demandas acarre-

ta consequências para as gestantes e para o desenvol-

vimento fetal como, por exemplo, o comprometimento

da época de lactação num período em que as reservas

do recém-nascido são baixas. Há consenso universal de

que as crianças menores de seis anos também perten-

çam ao grupo de maior risco para FO, pois as suas neces-

sidades nutricionais são proporcionalmente maiores em

razão de seu rápido crescimento e da maior prevalência

de doenças infecciosas nesse grupo etário.

E quanto aos demais segmentos populacionais?

Os conhecimentos disponíveis da participação dos

micronutrientes em várias funções primordiais e o im-

pacto que eles exercem sobre o metabolismo interme-

diário têm despertado interesse da comunidade cientí-

fica pela investigação de outros grupos de indivíduos,

com o objetivo de subsidiar estratégias de intervenção.

As evidências acumuladas sugerem importante papel

da deficiência de micronutrientes como fator predispo-

nente e agravante na fisiopatologia de diversas doen-

ças crônicas não transmissíveis, como as cardiovascu-

lares, a hipertensão, o diabetes mellitus, a obesidade,

alguns tipos de câncer, a osteoporose, dentre outras.

Tais achados podem contribuir para a valorização des-

sa condição nutricional em outros segmentos popula-

cionais, além de apontar a necessidade de maior ênfa-

se no protocolo de atenção nutricional.

Existem estatísticas sobre a incidência de FO?

A FO afeta uma entre quatro pessoas no mundo. No

entanto, a magnitude da deficiência de micronu-

trientes em países em desenvolvimento, incluindo o

Brasil, é maior do que a princípio possa-se imaginar,

em grande parte em razão das formas menos visí-

veis da deficiência de micronutrientes.

Que medidas devem ser tomadas para combater a FO?

A situação da deficiência de micronutrientes no Bra-

sil tem levado à necessidade de se avaliar diferentes

alternativas para combater o problema, dentre elas a

suplementação e a fortificação de alguns alimentos

básicos. A suplementação e a fortificação de alimentos

no combate à deficiência de micronutrientes como um

compromisso político é uma história de sucesso em

diferentes países desenvolvidos e em desenvolvimen-

to, o que demonstra a importância das parcerias entre

o setor privado e o público no estabelecimento de me-

tas para a saúde pública. Tais medidas, somadas à pro-

moção de mudança de hábitos alimentares por meio

da educação nutricional, devem ser encorajadas, por

tratar-se de ações que se complementam.

Deficiência de Vitamina A em crianças em idade pré-escolar

Categoria de significância para saúde pública (prevalência de retinol sérico <0.70µmol/L)n Nenhuma (<2%) n Leve (≥2% - <10%) n Moderada (≥10% - <20%) n Severa (≥20%)

Não há dados disponíveisn PIB ≥US$ 15000 (países onde, presumidamente, a deficiência de vitamina A não apresenta significância para saúde pública)

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n Deficiência severa de iodo (<20µg/L) n Deficiência moderada de iodo (20 - 49µg/L) n Deficiência leve de iodo (50 – 99µg/L)

Níveis ótimos (100 - 199µg/L) Risco para hipertiroidismo induzido por iodo (200-299µg/L) Risco para consequencias adversas à saúde (>300 µg/L) Não há dados disponíveis

E por que a fortificação é tão eficaz?

A fortificação apresenta várias vantagens, dentre elas

a alta cobertura populacional, a não modificação dos

hábitos alimentares e o baixo risco de toxicidade. Em

geral, pode-se dizer que a fortificação dos alimentos é

uma forma segura de suplementar a dieta da popula-

ção, uma vez que a margem de inocuidade é muito alta.

Segundo o Banco Mundial, nenhuma outra tecnologia

oferece tão ampla oportunidade para melhorar o estado

nutricional dos indivíduos a um custo tão baixo e em

tão pouco espaço de tempo. Atualmente, os alimentos

fortificados no Brasil são o sal iodado, a água fluoretada

e as farinhas de trigo e milho com ferro e ácido fólico.

A fortificação de outros alimentos que não os básicos

também contribui para o aumento de micronutrientes?

Sim. Ainda que outros alimentos não apresentem um

consumo em larga escala e em grande quantidade, po-

derão contribuir para uma maior ingestão de micronu-

trientes em diferentes segmentos populacionais e em

momentos biológicos de maior demanda nutricional.

Existem outros nutrientes que deveriam ser con-

siderados?

Sim, sobretudo a fortificação com vitamina A. Alguns

alimentos de largo consumo podem ser considerados

como bons veículos para a fortificação, porém, dentre

algumas possibilidades, chamo a atenção para o arroz.

Até a segunda metade da década de 1980, a deficiência

de vitamina A causava preocupação apenas em relação

a seus sinais clínicos, que vão desde a cegueira notur-

na até a cegueira nutricional irreversível. Na segunda

metade dessa década, surgiram evidências, que se tor-

naram cada vez mais consistentes, de que a carência

subclínica da vitamina A, sem sinais como xero ftalmia,

mancha de Bitot e ceratomalacia, também pode con-

tribuir para a morbidade e mortalidade em crianças,

recém-nascidos e mulheres em idade fértil, puérperas

e nutrizes. Atualmente, sabe-se que, em razão de sua

atuação no sistema imunológico, a deficiência de vi-

tamina A pode tornar fatais doenças como diarreias e

o sarampo. De fato, a deficiência dessa vitamina pode

provocar quadros de imunodeficiência de origem exclu-

sivamente nutricional. Além disso, existem evidências

de que os programas de intervenção nutricional, ainda

que não integrados a outros programas de intervenção

em saúde e nutrição, podem evitar, a cada ano, a morte

de um número expressivo de indivíduos.

Seus projetos de pesquisa sempre tiveram a vitami-

na A como foco? Por quê?

Após analisar dados do período de 1990 a 1995, em que

as autoridades de saúde no Brasil consideraram que a

informação era insuficiente para definir a situação da ca-

rência de vitamina A no país, me senti motivada a traba-

8 palavra

Deficiência de Iodo em crianças em idade escolar

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referêNciAs[1] Food and Agriculture Organization of the United Nations. Food-based approaches for improving diets and raising levels of nutrition. Concept Note. Roma, Dec 2010. [2] Kennedy G, Nantel G, Shetty P. The scourge of “hidden hunger”: global dimensions of micronutrient deficiencies. Food, Nutrition and Agriculture 32: 8-16. [3] Ramalho A. Fome Oculta: Diagnóstico, Tratamento e Prevenção. Rio de Janeiro: Atheneu, 2008. [4] Ramalho RA, Flores H. Saunders C. Hypovitaminosis A in Brazil: a public health problem. Revista Panamericana de Salud Pública, Washington, v. 12, n. 2, p. 117-122, 2002. [5] Ramalho RA ; Saunders C, Natalizi D, Cardoso L, Accioly E. Níveis Séricos de Retinol em Escolares de 7 a 17 Anos no Município do Rio de Janeiro. Revista de Nutrição da PUCCAMP, São Paulo, v. 17, n. 4, p. 461-468, 2004. [6] Gomes MM, Saunders C, Ramalho A, Accioly E. Serum vitamin A in mothers and newborns in the city of Rio de Janeiro. International Journal of Food Sciences and Nutrition, v. 1, p. 01-08, 2007. [7] Ramalho RA, Paes C, Souza GG et al. Vitamin A Liver Store: A Case-Control Study. International Journal of Food Sciences and Nutrition, v. 12, p. 01-09, 2007. [8] Chaves GV, Souza GG, Matos AC et al. Serum Retinol and -carotene Levels and Risk Factors for Cardiovascular Disease in Morbid Obesity. Int J Vitam Nutr Res 2010 May; 80(3):159-67. [9] Pereira SE, Saboya C, Saunders C. Association between night blindness, vitamin A liver store and serum retinol in class III obesity group. Obesity Surgery, 2010.

palavra 9

lhar com esse micronutriente. Meu intuito foi o de contri-

buir para a avaliação dessa deficiência em seu contexto

epidemiológico, além de abordar a necessidade do em-

prego efetivo de todos os recursos humanos, científicos

e tecnológicos disponíveis para o seu combate — uma

estratégia vital para a sobrevivência das crianças e para

o desenvolvimento dos países afetados.

O Brasil tem evoluído no combate à FO?

O combate a deficiências nutricionais não só tem apre-

sentado resultados tímidos diante da grandeza do proble-

ma, como não tem conseguido impedir que o consumo de

nutrientes indispensáveis ao desenvolvimento orgânico

dos indivíduos atinja regiões consideradas fora do eixo

tradicional da miséria no Brasil. Tal fato explica-se uma vez

que o principal fator determinante da carência de micronu-

trientes na população é a baixa ingestão de alimentos fon-

te desses nutrientes. O fato está mais relacionado a ques-

tões culturais e a padrão de consumo alimentar do que a

fatores econômicos. Tal constatação aponta o aumento

do consumo de alimentos fonte de vitaminas e minerais

como a principal estratégia, no longo prazo, no combate

à FO. A fortificação e a suplementação são as medidas de

curto prazo. Os suplementos representam uma excelente

alternativa em casos nos quais a disponibilidade local de

alimentos fonte de nutrientes, aspectos culturais ou au-

sência de alimentos enriquecidos venham a comprometer

a ingestão adequada desses nutrientes.

Essas medidas são economicamente viáveis?

Calcula-se que o custo de não intervir adequadamen-

te seja muito maior do que o custo de programas de

intervenção. Mesmo assim, não é raro que os setores

envolvidos na busca de uma solução — a universidade,

os governos, a indústria, a mídia e a população — falem

linguagens diferentes. Precisamos, então, de interfaces

entre esses setores para permitir que o conhecimento

científico se traduza em ações e programas de interven-

ção nutricional de alcance social.

O que a senhora almeja com o resultado do seu trabalho?

A erradicação ou, pelo menos, a redução da FO no

Brasil. Só assim será possível reverter uma situação

que já está afetando as gerações futuras e compro-

metendo o desenvolvimento que se almeja para o

país. Um desenvolvimento que depende basicamen-

te da vitalidade de seu povo e, em última instância,

garante o passaporte para a nossa autonomia eco-

nômica, científica e tecnológica.

Conheça as pesquisas mais recentes sobre o impacto global da deficiência de micronutrientes, no workshop do Nestlé Nutrition Institute.

www.nestle.com.br/nestlenutrisaude/NestleBio.aspx

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sabor e saúde

Herança Cultural da Humanidade pela Unesco

Dietado Mediterrâneo

No Antigo Egito, quando o Nilo transbordava para além de suas margens ao final

de cada verão, trazia com ele a boa fortuna de minerais que tornavam o solo fecundo

para a agricultura e para a vida que emanava dela.

Muitos estudiosos defendem que a abundância de alimentos, dependente des-

sas cheias, tenha sido crucial para o extraordinário desenvolvimento da civilização

egípcia em praticamente todas as áreas do conhecimento.

Ao mesmo tempo, analisam que em anos de seca, com os baixos níveis do rio e o

solo mal preparado para o plantio, sobrevinha a fome e a morte.

Em uma região onde a água constitui um bem tão precioso quanto escasso, a

importância estratégica do Nilo chegou intacta aos séculos XX e XXI.

Assim, com o intuito de controlar seus níveis e sua vazão, o governo egípcio de-

cidiu construir, em meados da década de 1950, a represa Aswan Alta — sobre outra, já

obsoleta, erguida pelos ingleses entre 1889 e 1902.

p o r _ Claudio Galperin

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Embora tecnicamente bem fundamentada, a de-

cisão gerou vigorosa reação internacional, uma vez que

faria submergir os templos Abu Simbel (séc. 13 a.C.), te-

souros da história daquele país.

Diante disso, uma operação arqueológica sem pre-

cedentes foi concebida pela Conferência Geral da Organi-

zação das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a

Cultura (Unesco).

Em 1959, antes de abertas as comportas da repre-

sa, os imensos templos gêmeos, escavados em rocha,

foram desmontados para depois, em terreno seguro, se-

rem remontados peça por peça.

Essa ação, da qual participaram direta ou indire-

tamente 50 nações, foi precursora da Convenção para

Proteção da Herança Cultural e Natural do Mundo, criada

em 1972 pela Unesco.

Dinâmica, ela abriga atualmente 911 sítios, que in-

cluem desde a cidade histórica de Ouro Preto, em Minas Ge-

rais, no Brasil, até os monastérios de Haghpat e Sanahin,

na Armênia, passando por Veneza, na Itália, e seus lagos.

Foram necessárias mais três décadas, contudo,

para que a definição de herança cultural da humanidade

fosse compreendida para além da expressão física de fe-

nômenos naturais, monumentos e objetos preservados

ao longo do tempo. E passasse a incluir expressões vi-

vas, imateriais, transmitidas de geração a geração. Tra-

dições que marcam a identidade de comunidades e, co-

letivamente, registram a diversidade cultural do mundo.

Foi assim que, em novembro de 2010, o samba

de roda do Recôncavo Baiano, a expressão oral e gráfi-

ca dos wajãpis do norte da Amazônia, no Brasil; o canto

védico da Índia; a dança de cura dos tumbuka do Malaui;

e a impressão com tipos móveis de madeira da China ga-

nharam a companhia de uma prática milenar: a Dieta do

Mediterrâneo (DMT).

Estilo de vidaAo submeter à Unesco a candidatura da DMT como

patrimônio cultural intangível da humanidade, Espanha,

Grécia, Itália e Marrocos elegeram como representantes

quatro pequenas comunidades de seus territórios [1].

Todas elas praticam, é claro, a DMT. Mas em um

sentido que extrapola, em muito, a simples adoção de

ingredientes que povoam livros de receitas espalhados

pelas cozinhas do mundo.

Esta é a chave para se compreender como uma

mesma manta parece atravessar as fronteiras imaginá-

rias de Soria, Koroni, Cilento e Chafchaouen para acolher

azeitonas abatidas de centenárias oliveiras. Ou para se

admirar a coreografia semelhante das redes lançadas

por pescadores dos quatro cantos do mar.

A relação do homem com a natureza exerce gran-

de impacto sobre todas as etapas da DMT: da obtenção

do alimento à sua conservação e preparo. E cabe às

mulheres mais velhas transmitir às mais jovens os en-

sinamentos que se traduzem em texturas, sabores e

aromas — num diálogo transgeracional que se recria a

cada refeição.

sabor e saúde 11

Originária do grego, a palavra dieta, díata, significa estilo de vida.

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12 sabor e saúde

Assim, a DMT, enriquecida por diversas culturas,

manteve a mesma estrutura alimentar e as mesmas

proporções ao longo de séculos: óleo de oliva, cereais e

derivados, frutas frescas, vegetais, nozes e, em menor

quantidade, peixe e derivados lácteos. Além da presen-

ça essencial de condimentos e temperos e do consumo

moderado de vinho e chá durante as refeições.

Já nas longas mesas que reúnem a família e os ami-

gos — ou até mesmo grande parte de vilarejos e cidades,

por ocasião de festividades —, encontra-se outro ritual

marcante que integra a DMT: a tradição oral das conversas

que compartilham o presente e adivinham o futuro.

Primeiros estudosApesar do nome, a DMT não é típica da cozinha

mediterrânea como um todo. No Nordeste da Itália, por

exemplo, banha de porco e manteiga são amplamente

utilizadas para cozinhar, enquanto o óleo de oliva é nor-

malmente reservado para o tempero de saladas.

Já no Norte da África, os muçulmanos tradicio-

nalmente não consomem vinho, por motivos religiosos.

Naquela região, também, assim como em certos países

do Mediterrâneo Oriental e da Ásia Menor, é tradicional

o uso de manteiga fundida e de gordura proveniente do

rabo de ovelha [1].

A prática alimentar reconhecida contemporanea-

mente como DMT foi identificada pela primeira vez nos anos

1950, como parte de um estudo que investigava a saúde e

os hábitos de vida em sete países: Finlândia, Grécia, Itália,

Iugoslávia, Japão, Holanda e Estados Unidos [2].

Um de seus aspectos mais intrigantes foi o achado

de que habitantes de Creta e outras regiões da Grécia,

assim como os do Sudeste da Itália, exibiam maior lon-

gevidade e menor incidência de doenças cardiovascula-

res, a despeito de uma dieta rica em gordura e de limita-

da atenção médica [2].

Na voz do filósofo grego Plutarco: “Nós não sentamos à mesa para comer, mas para comer juntos”.

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sabor e saúde 13

Não resta dúvida de que a tradicional DMT, escas-

sa em carnes e açúcares e repleta de alimentos de ori-

gem vegetal e gorduras insaturadas (sobretudo do óleo

de oliva) tenha contribuído para a proteção cardiovas-

cular verificada.

O mesmo, porém, poderia se dizer da prática de

atividade física, do baixo índice de tabagismo e do peso

via de regra saudável exibidos por aquelas populações.

A herança genética, por sua vez, poderia ser um fator

preponderante também. Deste modo, a simples trans-

posição da dieta para outras populações frustraria a ex-

pectativa de se obter reais benefícios à saúde [3].

Ocorre, contudo, que a DMT, nas palavras do Dr.

Walter Willet, da Escola de Saúde Pública da Universidade

de Harvard e uma das maiores autoridades sobre o tema,

“mostrou-se benéfica tanto para um funcionário de escri-

tório de Iwoa (EUA) quanto para um agricultor grego”[4].

Tal afirmação recebe amplo suporte do U.S. Natio-

nal Institutes of Health — AARP Diet and Health Study,

um estudo longitudinal de longo prazo do qual participa-

ram 400 mil homens e mulheres. Nele, os indivíduos que

aderiram a um padrão alimentar que se aproximava da

DMT exibiram um risco 20% menor de morrer por doença

cardiovascular, câncer ou qualquer outra causa no perío-

do de 5 anos [5].

Significativamente, a DMT mostrou-se tão efeti-

va em tratar doenças cardíacas como em preveni-las.

No The Heart Institute of Spokane Diet Intervention and

Evaluation Trial (THIS-DIET), sobreviventes de infarto

agudo do miocárdio que adotaram esse padrão dietético

mostraram menor risco de um segundo evento, quando

comparados a indivíduos na mesma condição que se-

guiam uma dieta típicamente norte-americana [6].

Revisão sistemática Em 2008, pesquisadores da Universidade de Flo-

rença, na Itália, utilizaram um desenho de meta-análise

para avaliar os principais estudos de coorte que analisa-

vam a associação entre DMT, mortalidade e incidência

de doenças crônicas realizados de 1966 até então —

um total de 1.574.299 indivíduos, acompanhados por

períodos de tempo de 3 a 18 anos [7].

Para avaliar a aderência à dieta, os autores utili-

zaram uma escala específica, na qual, para cada tipo de

alimento, foi atribuído um valor que gerava um escore.

A análise final revelou que dois pontos a mais na

escala de aderência, em relação à média da população,

estavam associados à redução da mortalidade global e

por doenças cardiovasculares (9%), redução da incidên-

cia e mortalidade por câncer (6%) e menor incidência de

doença de Parkinson e Alzheimer (13%).

Reflexo do interesse que a dieta tem despertado

nos meios científicos, entre 2008 e 2010, sete novos

estudos prospectivos foram publicados: um para morta-

lidade em geral, três para incidência e mortalidade por

doenças cardiovasculares, um para incidência e morta-

lidade por câncer e dois para doenças neurológicas.

Significativamente, estes últimos incluíram dois

resultados esperados que não haviam sido previamente

estudados: comprometimento cognitivo leve e acidente

vascular cerebral.

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14 sabor e saúde

Levando em conta esses novos estudos, os pes-

quisadores da Universidade de Florença promoveram

uma atualização do trabalho original, publicando seus

resultados na edição de novembro de 2010 do American

Journal of Clinical Nutrition [8].

Para a nova meta-análise, foram selecionados 18

estudos de coorte, que, em conjunto, somaram uma po-

pulação de 2.190.697 indivíduos, acompanhada por um

período de 4 a 20 anos.

Os resultados referendaram os achados prévios,

apontando a aderência à DMT como associada à redu-

ção da mortalidade por qualquer causa (8%), redução da

mortalidade e/ou incidência de doenças cardíacas ou

cerebrovasculares (10%), redução de mortalidade e/ou

incidência de câncer (6%) e redução da incidência de

doenças neurodegenerativas (13%).

Uma das conclusões mais relevantes deste estudo

está na observação de que mesmo uma modesta adoção

da dieta (2 pontos na escala de aderência) está signifi-

cativamente associada à menor mortalidade e incidência

das principais doenças crônicas não transmissíveis [8].

É importante notar, ainda, a existência de estudos

relevantes de coorte que associam a DMT à perda de peso

no combate à obesidade [9], ao melhor controle do diabe-

tes tipo 2 [10, 11] e a um menor risco de depressão [12].

Significativa, também, é a associação positiva

entre a DMT e a prevenção primária e secundária da

síndrome metabólica e seus componentes individuais

— observada em meta-análise de 50 estudos epidemio-

lógicos com mais de meio milhão de pessoas e publica-

da semanas atrás no Journal of the American College of

Cardiology [12].

Sem diminuir a importância dos resultados de

meta-análise, é preciso, contudo, levar em conta cer-

tas limitações dessa ferramenta. Seu uso para avaliar

o efeito protetor de um padrão alimentar em relação à

ocorrência de múltiplas doenças pode levar a resulta-

dos superestimados [8].

Mecanismos de açãoO papel protetor atribuído à DMT em relação a en-

fermidades crônicas como a doença arterial coronaria-

na deve-se, em grande medida, a seus elevados teores

de gordura monoinsaturada — oriunda, principalmen-

te, do óleo de oliva.

Isto se dá por meio de uma melhora do perfil lipídi-

co, da redução da oxidação lipídica e do DNA, da diminui-

ção da resistência à insulina e da modulação de estados

crônicos de inflamação sistêmica de baixa intensidade.

Recentemente, sugeriu-se, ainda, que a dieta po-

deria reduzir o dano e a disfunção endotelial, fundamen-

tais para a progressão da doença aterosclerótica [13].

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sabor e saúde 15

É de grande interesse, portanto, analisar o poten-

cial efeito da DMT sobre a expressão de genes pró-atero-

gênicos e pró-inflamatórios.

Nesse sentido, em estudo clínico controlado e

randomizado de 2010 observou-se que a DMT diminuiu

a expressão de genes associados a inflamação como

interferon gama, receptor de interleucina 7, receptor

adrenérgico beta 2 e Rho GTPase-activating protein 15.

Curiosamente, a DMT com azeite de oliva com reduzida

quantidade de polifenóis não alterou a expressão des-

ses genes em relação ao grupo-controle [14].

Recentemente, também, em estudo clínico com

pacientes de elevado risco para doença arterial corona-

riana, verificou-se que a DMT, suplementada com óleo de

oliva, reduziu a expressão de outros genes envolvidos

em processos inflamatórios como os da ciclo-oxigena-

se-1 e da proteína quimiotática para monócitos e de ge-

nes associados à formação de gordura — como aquele

da proteína relacionada a receptor de LDL — quando

comparada ao grupo controle.

A DMT suplementada com nozes, por sua vez, au-

mentou especificamente a expressão do gene do inibi-

dor da via do fator tecidual, associado à trombose [15].

Em seu conjunto, ambos os estudos destacam a

importância dos polifenóis do azeite de oliva e sugerem

que a DMT pode modular ativamente a expressão de ge-

nes associados à doença arterial coronariana —, invocan-

do um mecanismo de ação mediado pela nutrigenômica.

QUAL é A DIETA DO MEDITERRâNEO, AFINAL?

A resposta costuma frustrar pacientes que esperam uma cartilha rígida de

orientações: “Não existe algo como a Dieta do Mediterrâneo.” Há quem a

siga, sem sequer se dar conta disso. Suas características gerais são [16]:

n 4 ou mais porções de hortaliças por dia

n Uma porção é igual a 1/2 copo de hortaliças cruas ou cozidas

n 1 copo de folhas verdes ou 1/2 copo de suco de vegetais

n 4 ou mais porções de frutas por dia

n Uma porção é igual a 1/2 copo de fruta fresca, congelada ou em lata,

1/4 de copo de fruta seca ou 1/2 copo de suco de fruta

n 6 ou mais porções de cereais— principalmente integrais — por dia

n Uma porção é igual a 1 copo de cereal matinal, 1/2 copo de cereal cozido,

arroz ou macarrão, ou uma fatia de pão

n 2 ou mais porções de peixe por semana

n Uma porção é igual a 113 g

n 1 porção de iogurte ou queijo por dia

n 1 porção de feijões ou oleaginosas por dia

n Para feijões cozidos, uma porção é igual a 1/2 copo

n Para oleaginosas, uma mão cheia (ao redor de 40 g)

n Até 1 dose (para mulheres) ou 2 doses (para homens) por dia de bebida

n Uma dose é igual a aproximadamente 150 ml de vinho, 350 ml de cerveja

ou 45 ml de licor

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[1] Nomination form in: http://www.unesco.org/culture/ich/en/RL/00394. [2] Keys, Ancel. Seven Countries: A Multivariate Analysis of Death and Coronary Heart Disease. Harvard University Press. 1980. [3] Willett WC. The Mediterranean diet: science and practice. Public Health Nutr. 2006;9(1A):105-10. [4] Eat, Drink, and Be Healthy: The Harvard Medical School Guide to Healthy Eating. By Walter C. Willett. Free Press. 2005. [5] Mitrou PN, Kipnis V, Thiébaut AC, et al. Mediterranean dietary pattern and prediction of all-cause mortality in a US population: results from the NIH-AARP Diet and Health Study. Arch Intern Med 2007;167(22):2461-8. [6] Tuttle KR, Shuler LA, Packard DP, et al. Comparison of low-fat versus Mediterranean-style dietary intervention after first myocardial infarction (from The Heart Institute of Spokane Diet Intervention and Evaluation Trial). Am J Cardiol. 2008;101(11):1523-30. [7] Sofi F, Cesari F, Abbate R, et al. Adherence to Mediterranean diet and health status: meta-analysis. BMJ 2008;337:a1344. [8] Francesco Sofi, Rosanna Abbate, Gian Franco Gensini and Alessandro Casini. Accruing evidence on benefits of adherence to the Mediterranean diet on health: an updated systematic review and meta-analysis. Am J Clin Nutr 2010;92:1189–96. [9] Shai I, Schwarzfuchs D, Henkin Y, et al. Weight loss with a low-carbohydrate, Mediterranean, or low-fat diet. N Engl J Med 2008; 359 (3): 229–241. [10]Salas-Salvadó J, Bulló M, Babio N, et al. Diabetes Care. 2011;34(1):14-9. Reduction in the incidence of type 2 diabetes with the Mediterranean diet: results of the PREDIMED-Reus nutrition intervention randomized trial. [11] Hodge AM, English DR, Itsiopoulos C, et al. Mediterranean diet reduce the mortality risk associated with diabetes: Evidence from the Melbourne Collaborative Cohort Study. Nutr Metab Cardiovasc Dis. 2010 Dec 29. [Epub ahead of print]. [12] Kastorini CM, Milionis HJ, Esposito K et al. The effect of mediterranean diet on metabolic syndrome and its components a meta-analysis of 50 studies and 534,906 individuals. J Am Coll Cardiol. 2011;57(11):1299-313. [13] Marin C, Ramirez R, Delgado-Lista J et al. Mediterranean diet reduces endothelial damage and improves the regenerative capacity of endothelium. Am J Clin Nutr. 2011;93(2):267-74. [14] Konstantinidou V, Covas MI, Muñoz-Aguayo D, et. al. In vivo nutrigenomic effects of virgin olive oil polyphenols within the frame of the Mediterranean diet: a randomized controlled trial. FASEB J. 2010;24(7):2546-57. [15] Llorente-Cortés V, Estruch R, Mena MP et. al. Effect of Mediterranean diet on the expression of pro-atherogenic genes in a population at high cardiovascular risk. Atherosclerosis. 2010;208(2):442-50. [16] The Harvard Medical School Family Health Guide. In: http://www.health.harvard.edu/fhg/updates/Mediterranean-diet-sails-well-in-the-USA.shtml. [17] Nelson, J. and Zeratsky, K. The new Mediterranean Diet Pyramid. Mayo Clinic, Nutrition and healthy eating, 2009. In: http://www.mayoclinic.com/health/mediterranean-diet-pyramid/my00663.

referêNciAs

Pirâmide alimentar A Pirâmide Alimentar da DMT, introduzida em

1993, foi atualizada em 2008, a fim de melhor refletir

os estudos mais recentes.

De modo geral, todos os alimentos de origem

vegetal – frutas, hortaliças, cereais, leguminosas, se-

mentes, azeitonas, oleaginosas, azeite de oliva – foram

agrupados, constituindo a parte mais larga da pirâmide.

Ervas e especiarias fazem parte da pirâmide por-

que, além de adicionarem sabor e aroma, reduzem a

necessidade de gordura e sal na cozinha.

Peixes e crustáceos são recomendados, pelo me-

nos, duas vezes por semana.

A pirâmide enfatiza, ainda, a prática de atividade

física e o hábito de fazer refeições com outras pessoas

como a base de um estilo de vida saudável, e o uso de

óleo de oliva para cozinhar, assar e como tempero de sa-

ladas e vegetais — lembrando que o azeite extravirgem

de oliva é aquele que apresenta os maiores teores de

gorduras monoinsaturadas e fitonutrientes.

Formas menos processadas de alimentos de ori-

gem vegetal (p.ex. grãos integrais, frutas frescas e ve-

getais levemente cozidos) devem ser priorizados por

preservarem melhor fibras e nutrientes. Finalmente, a

pirâmide recomenda moderação no consumo de queijos

e iogurtes (favorecendo as versões com baixos teores

de gordura) e o consumo mais frequente de frango, res-

tringindo a ingestão de carne vermelha magra para ape-

nas algumas vezes por mês [17].

Em um momento em que cada vez mais buscamos

compreender a interação funcional entre os componentes

dos alimentos e o genoma, a DMT desponta como ícone da

prevenção e do tratamento de doenças crônicas por meio

da alimentação. Notavelmente, ela pode ser adotada por

diferentes grupos populacionais, com substancial relação

de custo-benefício, em programas de saúde pública.

Como disse certa vez Adele Davis, uma das pionei-

ras da ciência da nutrição: “Somos muito mais do que

aquilo que comemos, mas aquilo que comemos ajuda a

nos transformar em algo muito mais do que somos.”

Aprecie o belo vídeo da candidatura da Dieta do Mediterrâneo enviado à Unesco.

www.nestle.com.br/nestlenutrisaude/NestleBio.aspx

16 sabor e saúde

George Middleton ©2009 Oldways Preservation and Exchange Trust www.oldwayspt.org

Carnes e Doces – Menor frequência

Vinho – com moderação

Frango e Ovos – Porções moderadas a cada dois dias ou semanalmente

Queijo e Iogurte – Porções moderadas diariamente ou semanalmente

Peixe e Frutos do Mar – Frequentemente, pelo menos duas vezes por semana

Frutas, verduras, cereais (de preferência integrais), azeite de oliva, feijões, oleaginosas,

legumes, sementes, ervas e temperos – Estes devem ser os principais alimentos presentes

em todas as refeições

Seja fisicamente ativo. Aprecie suas refeições junto a outras pessoas

Beba água

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ponto de vista

FERNANDO JOSÉ DE NÓBREGAPresidente da Academia Brasileira de Pediatria

Diretor-executivo da International Society of Pediatric Nutrition

Professor-titular de Pediatria da Escola Paulista de Medicina-Universidade Federal de São Paulo

Coordenador de Nutrição Humana do Núcleo de Ensino e Pesquisa do Hospital Israelita Albert Einstein – São Paulo

Transição Nutricional (TN) é o fenômeno que

ocorre quando em uma cidade, estado ou país obser-

va-se a queda da desnutrição e o aumento da obesidade

em diferentes grupos etários. É o que ocorre em nosso

país. Para que haja a presença da TN, há necessidade da

existência de algumas situações, como transições inter-

-relacionadas com tecnologia, economia, demografia e

saúde, que, juntas, ajudam a definir o desenvolvimento

industrial do século vinte em países com acelerado pro-

cesso de urbanização e industrialização como o nosso.

Inicialmente, em sociedades que se moder-

nizam, os grupos mais abastados são os primeiros

atingidos pela oferta de alimentos com alto valor

energético e por bens de consumo que propiciam o

sedentarismo, como automóveis, televisões, videoga-

mes e outros, começando a ocorrer, portanto, nesse

grupo, aumento da prevalência da obesidade. Por

outro lado, esse contingente da população passa a

ser influenciado pela necessidade de ter hábitos ali-

mentares e estilos de vida mais saudáveis e começa,

então, a controlar o seu peso corporal.

Paralelamente, os alimentos industrializados

e os bens de consumo que levam ao sedentarismo

tornam-se mais baratos e, consequentemente, mais

acessíveis aos extratos mais pobres da população. Até

que a informação adequada atinja também esse grupo

e promova mudanças comportamentais, leva algum

tempo, e essas camadas apresentam maiores taxas de

excesso de peso e de doenças associadas a ele.

O Brasil encontra-se em estágio intermediário

dessa transição, isto é, excesso de peso em ascensão

coexiste com a desnutrição em declínio.

A literatura brasileira é rica em trabalhos que

demonstram que o excesso de peso passou a ser um

importante fator negativo para a população brasileira

em todos os grupos etários, e, contrariamente, a des-

nutrição vem caindo de maneira acentuada.

O panorama nutricional no Brasil (2008) é

caracterizado pelo abandono de práticas saudáveis:

média de aleitamento materno exclusivo 2,17 me-

ses; crianças ingressam muito cedo nos hábitos ali-

mentares do adulto: 22% entre 4-6 meses recebem

alimentação da família, havendo alta prevalência de

distúrbios nutricionais. Assim se consegue entender

a inversão da pirâmide alimentar no Brasil.

Em todo o mundo, observa-se nítida preva-

lência do excesso de peso, com predominância nas

Américas e Europa, em todos os grupos etários. Tal

situação condiciona mudança no ensino da pediatria

e no atendimento à criança brasileira, uma vez que se

constata o aparecimento de altos níveis

de doenças inexistentes no passado na

faixa pediátrica, como obesidade, disli-

pidemias, hipertensão arterial, diabetes

tipo II, entre outras. Além disso, há ne-

cessidade de mudança na formação do

pediatra e, nesse item, a Sociedade Bra-

sileira de Pediatria propõe que a residência seja reali-

zada em três anos, visando atender à nova realidade,

à atualização do conhecimento anterior e ao preparo

para receber o grande volume de conhecimentos ge-

rados pelo mundo científico.

Diante dessa nova realidade, devemos dar

prioridade para a formação adequada do pediatra e

para a prevenção e o tratamento das doenças exis-

tentes, entre as quais se destaca a obesidade, que

é responsável pelas doenças crônicas não transmis-

síveis como dislipidemias, hipertensão arterial, dia-

betes tipo II e problemas oncológicos resultantes de

alimentação inadequada.

Lembrar sempre de que a prevenção do excesso

de peso é mais fácil, mais barata e mais eficiente do

que o tratamento da obesidade e de suas comorbida-

des já plenamente desenvolvidas.

Transição nutricional no Brasil

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conhecer

P o r _ Claudio Galperin

As maiores

Os 100 melhores filmes de todos os tempos, os 10 livros que você levaria

para uma ilha deserta, os melhores aplicativos para iPhone, os mais bem-vesti-

dos (e malvestidos) na cerimônia do Oscar, as melhores reportagens da sema-

na, os 3 gols mais bonitos da rodada, os melhores poemas do século, os lugares

mais românticos do mundo, as comidas mais exóticas do planeta.

Listas e rankings, sobre tudo e sobre todos, crescem aqui e ali feito ca-

pim. E, se por um lado geram certo entretenimento, mais frequentemente do que

não provocam boas doses de indignação. “Como fulano tem a ousadia de colocar

Graciliano à frente de Machado?!” “Madonna atrás de Lady Gaga?! Jamais!”

Seja no universo da cultura pop, das artes ou das fofocas da província, há

um verdadeiro fetiche quando se trata desses concursos de popularidade. Sua

mais absoluta inutilidade, é fácil argumentar, reside no fato de que são franca-

mente ancorados no gosto pessoal e, para dizer o mínimo, numa considerável

dose de subjetividade.

Em se tratando de uma lista com as maiores descobertas em nutrição,

digamos dos últimos 40 anos, a questão acompanha o raciocínio geral. Mas ga-

nha, também, contornos específicos.

descobertas recentes em nutrição

A primeira metade do século XX testemunhou descobertas marcantes em nutrição. E, até 1948, todas as vitaminas essenciais já haviam sido descobertas e sintetizadas.

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conhecer 19

Pródigo século XXA primeira metade do século XX testemunhou descobertas

marcantes em nutrição. O último aminoácido encontrado em proteí-

nas de alimentos, a treonina, foi isolado em 1935. E, até 1948, todas

as vitaminas essenciais já haviam sido descobertas e sintetizadas

[1,2]. Nesse século, ainda, foram descobertas as funções dos mine-

rais essenciais da dieta, bem como dos mineirais-traço [2].

Fruto disso, inúmeros Prêmios Nobel foram outorgados.

O que nos leva à questão fundamental deste artigo: mais recente-

mente, no período entre 1971 e 2011, quais descobertas merecem

uma posição de destaque?

Terapia de reidratação Oral Embora o emprego da terapia de reidratação oral (TRO) re-

monte à década de 1950, seu uso era então restrito a profissionais

especializados. O marco que consagrou sua utilidade e autorizou

seu emprego rotineiro por familiares e agentes de saúde ocorreria

tempos mais tarde, há exatos 40 anos [3].

Com a utilização de TRO por pessoas leigas no tratamento

de pacientes com cólera durante a Guerra de Independência de

Bangladesh, verificou-se uma queda dramática e sem precedentes

de mortalidade.

É ao redor dessa época, também, a descrição mais acurada

dos mecanismos de transporte de água, glicose e eletrólitos atra-

vés da mucosa intestinal, o desenvolvimento de uma formulação

padrão e sua recomendação pela Organização Mundial da Saúde

(OMS) [3].

Indispensável ao tratamento da doença diarreica, credita-se à

TRO ter salvo milhões de vidas em todo o mundo nas últimas décadas.

Prevenção de malformações do tubo neural pelo ácido fólico

A suspeita de que a deficiência de ácido fólico contribui para

a maior parte dos casos de malformações do tubo neural (MTN)

data de, pelo menos, 40 anos atrás. Achados conclusivos, porém,

ocorreriam em meados da década de 1980 e início dos anos 1990

[4]. Nesse período, múltiplos estudos controlados, randomizados,

demonstraram uma redução entre 50%-70% de MTN, com a admi-

nistração preventiva de ácido fólico

antes da gestação [5].

Diante dessa constatação, po-

líticas de fortificação de alimentos

como a farinha de trigo ganharam o

mundo, reduzindo de maneira subs-

tantiva a causa mais comum de mal-

-formações congênitas [5].

efeito dos ácidos graxos trans na saúde humana

Os ácidos graxos (AG) trans alcançaram papel de destaque

na dieta humana dos últimos cem anos, particularmente na se-

gunda metade do século XX, com o substancial aumento no consu-

mo de alimentos industrializados. Embora presentes em alimentos

de origem animal, como a carne e o leite, seu teor é consideravel-

mente pequeno.

O processo de hidrogenação que gera os AG trans, cuja pa-

tente data de 1902, consiste em converter óleos vegetais líquidos

em gorduras sólidas ou semissólidas, utilizadas na fabricação de

produtos como margarinas, gordura para fritura, massas, sorvetes,

entre outros.

A suspeita de que os AG trans industriais estariam associa-

dos a uma maior incidência de doença arterial coronariana (DAC)

data de meados dos anos 1950. A questão, porém, não foi apro-

fundada até o início da década de 1990, quando múltiplos estudos

confirmaram este efeito [6].

Desde então, esta descoberta tem moldado políticas públicas

de saúde em todo o mundo e profunda reestruturação da indústria

de alimentos. A substituição de óleos parcialmente hidrogenados

por óleos não processados deve responder por uma substancial

queda no risco de infarto do miocárdio.

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20 conhecer

Tecido gorduroso como um órgão endócrinoAté muito recentemente, acreditava-se que o tecido adiposo

não passava de um sítio para armazenamento de energia. A mudan-

ça de paradigma em favor de um órgão com funções imunoneuro-

endócrinas, com efeito regulador sobre o balanço energético, teria

início em 1994 com a descoberta da leptina.

Produzida predominantemente por adipócitos, a leptina es-

timula o gasto energético e a saciedade, e contribui para restaurar

estados de glicemia normal. Na maioria dos casos de obesidade,

seus níveis circulantes encontram-se aumentados, embora uma re-

sistência a ela pareça limitar tais efeitos [7,8].

Em contraste com a leptina, a adiponectina, produzida exclu-

sivamente por adipócitos, apresenta-se frequentemente diminuí-

da na obesidade. Atua promovendo um aumento da sensibilidade à

insulina, da oxidação de AG e do gasto energético, além de reduzir

a produção hepática de glicose [7,8].

Menos estudado, o aumento da expressão de resistina e da

proteína-4 ligadora de retinol está intimamente relacionado com a

adiposidade e parece implicado no desenvolvimento de resistên-

cia à insulina [7,8].

Mais recentemente, descobriu-se que macrófagos repre-

sentam uma parte importante da função secretora do tecido

adiposo, atuando como principal fonte de citocinas pró-inflama-

tórias como TNF-a e IL-6. O aumento de seus níveis circulantes na

obesidade é capaz de induzir a um estado de inflamação crônica

de baixa intensidade que tem sido associado à resistência à insu-

lina e ao diabetes [7,8].

Em seu conjunto, a descoberta desses mediadores hormonais

muda de maneira categórica nossa visão do tecido gorduroso, colo-

cando em evidência seu papel crítico para a homeostase energética.

Além disso, fornece importantes subsídios para linhas de pesquisa

que investigam o vínculo entre obesidade e doenças como o diabe-

tes tipo 2, a aterosclerose e a síndrome metabólica [1].

Água duplamente marcada para medida do gasto energético

Este método é realizado a partir da ingestão de água que

contém isótopos estáveis de hidrogênio e oxigênio. O declínio de

suas concentrações é então medido em algum fluido do corpo,

como a urina [9].

A diferença entre a taxa de perda de ambos os isótopos é

utilizada para estimar a produção de dióxido de carbono e o gasto

energético. E, como o indivíduo pode manter suas atividades nor-

mais durante o teste, a avaliação espelha com maior precisão o

que ocorre na realidade [9,10].

Utilizada em animais desde os anos 1950, o emprego da

água duplamente marcada (ADM) em seres humanos só foi vali-

dado em 1986 — provocando uma mudança radical no estudo da

obesidade.

Até então, debatia-se o aparente paradoxo de que quanto

mais obesa a pessoa, menos alimentos parecia ingerir. Por conta

disso, chegou-se a postular que indivíduos obesos teriam um gas-

to energético inferior ao de pessoas eutróficas.

Com o advento da ADM, foi possível constatar que um alto

consumo, e não um menor gasto, era a causa do desequilíbrio ener-

gético. Em outras palavras, verificou-se que métodos tradicionais

como recordatório alimentar apresentavam um bias que era pro-

prorcionalmente maior ao aumento de gordura corporal [10].

Desde então, o teste tem sido aplicado com outras finalida-

des como, por exemplo, medida da demanda energética decorrente

de doenças crônicas e de atividade física, estudo das consequên-

cias da desnutrição e validação de outros métodos que avaliam o

gasto energético total.

Prevenção do diabetes pela mudança do estilo de vida

O conhecimento de que fatores ambientais estão associados a

um maior risco para o desenvolvimento do diabetes tipo 2 (DM 2) an-

tecede o escopo de tempo adotado neste artigo.

Curiosamente, a constatação de que mudanças de estilo de

vida são altamente eficazes na prevenção da doença só ocorreria

com grandes estudos longitudinais realizados a partir dos anos

1990 [11].

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conhecer 21

Quando avaliados em conjunto, esses estudos demonstram,

de forma inequívoca, o impacto positivo (i) da restrição no consu-

mo de carboidratos refinados e gorduras, e o aumento da ingestão

de fibras; (ii) da prática de exercício físico por 30-40 minutos ao

dia, pelo menos 5 vezes por semana; (iii) da restrição do consumo

excessivo de álcool; e (iv) da perda de peso por indivíduos obesos.

Digno de nota é que os estudos sublinham a relevância des-

sas mudanças de estilo de vida para indivíduos com maior risco de

DM2, como aqueles com tolerância diminuída à glicose e intolerân-

cia à glicose de jejum [11].

O DM2, assim como a obesidade, atingiu proporções epidê-

micas em grande parte do mundo. Além de efetiva, a adoção de

pequenas mudanças no estilo de vida provaram ser altamente

seguras, com notável custo-benefício. O desafio atual reside em

transformar esta descoberta em programas de prevenção de am-

plo alcance.

O papel do meio ambiente sobre a obesidadeAté recentemente, a busca por alterações metabólicas e ge-

néticas em pessoas obesas ocupava o centro de gravidade das

pesquisas sobre o ganho excessivo de peso. Além disso, esses

indivíduos eram rotulados pela pouca força de vontade para comer

menos e se exercitar mais (1).

Embora influências biológicas e comportamentais possam

determinar certas variações da gordura corporal entre pessoas

que vivem em um dado ambiente, essas influências não explicam

o fenômeno na população em geral.

Do ponto de vista de saúde pública, o reconhecimento de que

a obesidade traduz uma reação normal do organismo a um ambien-

te anormal, obesogênico, representa um avanço importante e uma

mudança no paradigma tradicional de que esta é uma enfermidade

individual que necessita de tratamento (11). A pandemia de obe-

sidade que assola hoje grande parte do mundo ocorre ao mesmo

A constatação de que mudanças de estilo de vida são altamente eficazes na prevenção do diabetes tipo 2 só ocorreria com grandes estudos longitudinais realizados a partir dos anos 1990

tempo em que aumenta o conhecimento, a concientização e a edu-

cação sobre temas como a própria obesidade, nutrição e exercício

físico. De fato, a promoção individual de mudança dietética ou da

prática de atividade física, assim como a instituição de programas

focados em mudança individual de comportamento, parecem pro-

mover resultados apenas limitados (12).

A história nos ensina que o controle de epidemias costuma

lograr êxito apenas depois que mudanças ambientais tenham sido

implementadas. No que diz respeito à prevenção e ao controle da

obesidade, essas medidas parecem incluir a criação de um ambien-

te escolar mais saudável e o planejamento racional das cidades (1).

efeito dos ácidos graxos ômega-3 na doença arterial coronariana

O efeito de AG marinhos sobre a redução da mortalidade por

DAC tem sido motivo de renovado interesse desde o início dos anos

1970 — quando se observou uma baixa incidência da doença em

esquimós das regiões árticas do Canadá, do Alasca e da Groenlân-

dia, apesar do elevado teor de gordura de sua dieta [13].

No rastro dessa observação, seguiram-se múltiplas investiga-

ções clínicas e epidemiológicas apontando para o papel protetor dos

ácidos graxos poli-insaturados (PUFA) ômega-3.

Entre os mecanismos mais ativamente estudados, destaca-se

uma ação anti-inflamatória mediada por seus derivados (como resolvi-

nas e protectinas), com possível estabilização da placa aterosclerótica.

Hoje, a associação entre AG ômega-3 e a diminuição dos níveis

de triglicérides continua sendo validada pelo rigor dos estudos mais

recentes. No entanto, seu papel na redução da mortalidade, morte

súbita, arritmias, infarto agudo do miocárdio e insuficiência cardíaca

ainda não pôde ser estabelecido [13].

Ácidos graxos ômega-3

ALA

ePA

DHA

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22 conhecer

Modulação de lipídeos plasmáticos pela dieta Em meados dos anos 1970, início da década de 1980,

modelos animais consagraram a ação redutora promovida pe-

los ácidos graxos saturados da dieta sobre as concentrações

plasmáticas de LDL-colesterol (LDL-C) e, consequente-

mente, sobre o risco de DAC [14,15]. Tais modelos

ressaltavam o papel dos receptores hepáticos de

LDL-C na mediação desse efeito.

Estudos recentes aprofundaram esta descoberta, revelan-

do que os PUFAs da dieta regulam os níveis plasmáticos de LDL-C

aumentando a afinidade, a abundância de RNAm e a expressão

de seu receptor [15].

Com resultados ainda inconclusivos, outros mecanismos

continuam a ser investigados. Avanços em biologia molecular

têm permitido investigar o envolvimento de pelo menos 4 famí-

lias de fatores de transcrição: PPARs (receptores ativados por

proliferadores de peroxissoma), LXR (Receptor hepático X), fator

nuclear do hepatócito-4 (HNF-4) e proteína de ligação ao elemen-

to de resposta a esterol (SREBP) [15].

Como veremos a seguir, a modulação de receptores de LDL-

-C e dos níveis de lipídeos por AG da dieta é uma descoberta que

pertence a uma ampla moldura de estudos.

regulação da transcrição gênica pela dietaOs estudos de sequenciamento de DNA iniciados na déca-

da de 1990 se desenvolveram com impressionante dinamismo,

tornando conhecido, em pouco tempo, o genoma humano inteiro.

Este avanço inaugurou uma extraordinária nova era dedicada a

investigar de que maneira respondemos a estímulos ambientais

como, por exemplo, à dieta.

Hoje em dia, não apenas transcriptômica mas proteômica

e metabolômica fazem parte do nosso vocabulário diário. Nutri-

genética e nutrigenômica buscam ativamente identificar genes

cuja expressão pode ser modificada por componentes alimenta-

res. A epigenética, por sua vez, amplia a busca por estratégias nu-

tricionais para prevenção de doenças investigando alterações do

material genético que não afetam a sequência de nucleotídeos

— como, por exemplo, certos padrões de metilação do DNA [16].

É este mecanismo que dá suporte à tese de “progra-

mação fetal”, segundo a qual o aporte inadequado de nu-

trientes no período crítico do desenvolvimento está associado

a um risco aumentado de doenças crônicas na vida adulta [17].

Se nosso conhecimento sobre a regulação gênica pela dieta

avança com velocidade exponencial é forçoso admitir a existên-

cia de um enorme contingente de perguntas que apenas começa

a ser respondido. Esta área encerra, a um só tempo, algumas das

mais relevantes descobertas dos últimos 40 anos e alguns dos

maiores desafios nas décadas por vir.

em tempoUm considerável número adicional de descobertas pode-

ria, ou deveria, integrar a lista compilada acima. Para reduzir

minimamente algumas omissões, vale a pena lembrar que a

ação multissistêmica da vitamina D, para além de sua ação no

metabolismo ósseo, é cada vez mais aceita. A maior parte dos

dados disponíveis deriva, contudo, de estudos observacionais

epidemiológicos, úteis para a geração de hipóteses, mas limita-

dos para provar causalidade [18].

A descoberta do gene da hemocromatose, por sua vez, em

meados dos anos 1990, desencadeou uma série de outras, rela-

cionadas com o metabolismo do ferro. Incluindo a interação da

proteína produzida por ele com o receptor da transferrina 1 e com

o hormônio hepticidina, descoberto no ano 2000 [19].

No início da década de 1990, estudos como o Age-Related

Eye Diseases Study [20] observaram que altas doses combina-

das de vitamina C, vitamina E, betacaroteno e zinco diminuíam

o risco de progressão da degeneração macular relacionada com

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referêNciAs

a idade em até 25% dos pacientes com doença intermediária ou

avançada. Embora não haja dados suficientes para justificar seu

uso em estratégias de prevenção primária, a descoberta tem auto-

rizado sua indicação para pacientes em risco imediato da doença

e para aqueles portadores da condição em estágio avançado [21].

Produtos enriquecidos com estanóis vegetais provaram ser

seguros e efetivos como estratégia nutricional para a redução do

colesterol em aproximadamente 60 estudos clínicos publicados ao

longo dos 16 anos em que estão no mercado [22]. Pacientes com

fitosterolemia (homozigóticos) constituiriam a exceção, uma vez

que absorvem exageradamente estanóis vegetais, desenvolvendo

xantomas e aterosclerose.

A tradicional redução de 10% de LDL-C obtida com a inges-

tão de 2 g/dia de esteróis vegetais mostrou, recentemente, ser

dose dependente: 9 g/dia promovem uma redução de até 17% de

LDL-C, sem efeitos colaterais.

A despeito desse benefício e de uma possível melhora da

função endotelial, é importante notar, contudo, que não existem

estudos que avaliem desfechos cardiovasculares relacionados

com a DAC ou outras doenças cardiovasculares [22].

Nas últimas décadas, ficou demonstrado, ainda, que o

álcool — possivelmente, mesmo em pequenas doses, como um

drinque ao dia [23] — e a obesidade são os fatores dietéticos que

mais contribuem para elevar o risco de câncer, em particular o de

mama [24, 25]; e que o álcool, por outro lado, em doses pequenas

ou moderadas, pode reduzir o risco de DAC [25].

Finalmente, como nos lembram Katan e cols. [1], a desco-

berta dos receptores do cheiro em 1991, que rendeu um Prêmio

Nobel a Richard Axel e Linda Buck, pode não figurar como uma

descoberta no campo da nutrição. Não há como negar, entretan-

to, sua importância para este campo de estudo.

Produtos enriquecidos com estanóis vegetais provaram ser seguros e efetivos como estratégia nutricional para a redução do colesterol em cerca de 60 estudos clínicos publicados nos 16 anos em que estão no mercado

conhecer 23

A substituição da manteiga por margarina enriquecida com estanóis vegetais foi uma das estratégias nutricionais concebidas para reduzir a hipercolesterolemia

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dossiê bio

NUTrIçãO EM PSIqUIATrIA

Em razão da importância e da extensão deste tema, o artigo foi dividido em duas partes. Nesta edição, ele prioriza a avaliação do paciente. Na próxima edição da Nestlé.Bio, ele discutirá, em detalhes, aspectos ligados à terapia nutricional.

NOTA DO eDiTOr

introduçãoDesde os primórdios das civilizações, a ali-

mentação é algo fundamental para a sobrevivência

humana e um ato inscrito na cultura do homem.

A alimentação caracteriza-se por ser um fenômeno

de extrema complexidade, que envolve aspectos psi-

cológicos, fisiológicos e socioculturais. O alimento, e

tudo o que o rodeia, envolve a história de cada pessoa,

suas lembranças, sentimentos, fantasias conscientes

e inconscientes [1]. O homem tem uma importante

relação emocional e social com o alimento, que fica

evidenciada no ato de participar de refeições em con-

junto, celebrar datas em torno de uma mesa, servir

alimentos para visitas, no crescente interesse pela

culinária e gastronomia, entre outros [2].

Dessa forma, é difícil separar a alimentação

da afetividade, e tudo aquilo que se vive e que se

sente pode interferir no comportamento alimen-

tar. O alimento é cheio de simbolismos e envolve

muito mais do que comer: o alimento pode ser um

refúgio, uma carícia, um vício [3]. Alguns autores

acreditam que o corpo pode ser a expressão de um

caráter, revelado pela maneira pela qual o indiví-

duo se alimenta. Nesse sentido, compreender o

comportamento alimentar torna-se essencial para

a apreensão da dinâmica pessoal do indivíduo [4].

Transtornos psiquiátricos e sua repercussão clínica-nutricional

A psiquiatria pode definir-se firmemente

como a especialidade que emprega as ferramentas

tradicionais da medicina (diagnóstico, tratamento,

estabelecimento de prognóstico e medidas preven-

tivas) para abordar manifestações mentais e padrões

de comportamento variantes em relação à experiên-

cia humana habitual [5]. No entanto, o diagnóstico

dos transtornos psiquiátricos assume características

particulares em relação à grande maioria das espe-

cialidades médicas uma vez que a subjetividade e o

ADriANA Trejger KAcHANiNutricionista responsável pelo Programa da Mulher Dependente química do

Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da

Faculdade de Mediciana da Universidade de São Paulo

(PrOMUD - IPq - HC - FMUSP)

Mestre e Doutoranda da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

Autora e organizadora do livro Nutrição em

Psiquiatria.

MArceLA sALiM KOTAiTNutricionista do Programa

de Transtornos Alimentares do Instituto de Psiquiatria

do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (AMBULIM - IPq - HC -

FMUSP)Aprimoramento em

Transtornos Alimentares do AMBULIM

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estreitamento da aliança terapêutica são necessários

para a correta elaboração diagnóstica. Ao contrário

de outras especialidades em que o diagnóstico é

elaborado a partir de achados laboratoriais e exames

físicos, os transtornos psiquiátricos baseiam-se em

critérios diagnósticos clínicos, e requerem o reco-

nhecimento de sinais e sintomas [6].

Atualmente, dois sistemas permitem a univer-

salização diagnóstica dos transtornos psiquiátricos.

Um deles é a Classificação Internacional de Doen-

ças (CID-10), elaborada pela Organização Mundial

da Saúde [7], que apresenta no seu quinto capítulo

os transtornos mentais e comportamentais. O se-

gundo sistema é o Diagnostic and Statistical Manu-

al of Mental Disorders (DSM), elaborado pela Asso-

ciação Psiquiátrica Americana [8], o mais utilizado

pela comunidade científica internacional.

A seguir, a fisiopatologia e aspectos clínicos

de alguns transtornos psiquiátricos que discutire-

mos neste artigo.

Transtornos Alimentares (TA)

Os TAs têm etiologia multifatorial presumida,

isto é, uma pluralidade de fatores interagem entre

si de modo complexo para produzir e/ou perpetuar

a doença [9]. Esses fatores podem ser classificados

como predisponentes (p. ex.: traços de personali-

dade, risco para desenvolvimento de obesidade),

precipitantes (p. ex.: dieta, proximidade da menar-

ca, evento estressor que desorganiza a rotina) e os

mantenedores (p. ex.: alterações fisiológicas e psico-

lógicas produzidas pela desnutrição e pelos constan-

tes episódios de compulsão, tais como diminuição

da cognição, insatisfação e/ou distorção da imagem

corporal e aumento da depressão determinam se o

transtorno vai ser perpetuado ou não) [9,10].

A anorexia nervosa caracteriza-se por perda de peso intensa à custa de

dietas restritivas na busca incansável pela magreza, distúrbios de imagem

corporal e irregularidades menstruais. Já a bulimia nervosa caracteriza-se

por grande e rápida ingestão de alimentos com sensação de perda de contro-

le – episódios bulímicos –, acompanhados de métodos compensatórios ina-

dequados para controle de peso, como vômitos autoinduzidos, uso de me-

dicamentos (laxantes, diuréticos, inibidores de apetite) e exercícios físicos.

Nessas pacientes, a excessiva preocupação com o peso e a forma corporais

está invariavelmente presente [11]. O transtorno da compulsão alimentar

periódica, comumente referido como um TA, encontra-se no apêndice do

DSM-IV [8] e caracteriza-se por episódios compulsivos, mas sem medidas

compensatórias restritivas e ou purgativas como na bulimia nervosa [12].

Transtornos de Humor

Os principais transtornos de humor são os transtornos depressivos e

aqueles do espectro bipolar, nos quais ocorrem episódios de mania (carac-

terizados pela euforia, verborragia, agitação psicomotora, ideias de grande-

za e fácil irritabilidade) ou hipomania (caracterizados pela presença de hu-

mor expansivo, elevado ou irritável), comumente em alternância com um

ou mais episódios depressivos [5]. Tanto os sintomas de depressão como

os de mania devem ser diferenciados da tristeza e da alegria – respostas

humanas normais a situações desagradáveis ou felizes da vida.

Os transtornos de humor estão associados a um alto custo pessoal,

social e físico. Entre os custos físicos, podem-se encontrar as alterações

do apetite [13]. Esses sintomas são tão importantes que a alteração do

peso – sem estar em dieta – de mais de 5% no mês é critério diagnóstico

para a depressão [8]. Além da alteração no peso, a depressão ainda é as-

sociada a problemas endocrinológicos, tais como hipo e hipertireoidismo,

hiperparatireoidismo, síndrome de Cushing, entre outros [14].

dossiê bio 25

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Transtornos de ansiedade

O transtorno de ansiedade generalizada é ca-

racterizado por sintomas de ansiedade persistentes

que afetam grande parte dos comportamentos do

indivíduo. As manifestações podem variar, incluem

sintomas de tensão motora, hiperatividade autonô-

mica e sintomas de hipervigilância [5,15]. Nos pa-

cientes com transtornos de ansiedade, alterações

de apetite ou do padrão de consumo alimentar não

são sintomas centrais para o diagnóstico, mas sua

presença não é rara, trazendo grande prejuízo [15].

É importante salientar que os estados de an-

siedade estão associados a alterações fisiológicas

ligadas à atividade de sistemas neurobiológicos de

defesa e resposta ao estresse, que podem repercu-

tir tanto na imunidade como em funções metabóli-

cas como apetite e termogênese [16].

Dependência química

Substâncias psicoativas são todas aquelas com

propriedade de alterar o psiquismo. Uma ampla

variedade dessas substâncias é passível de consu-

mo abusivo, com desenvolvimento de tolerância e

abstinência, dois critérios importantes para o diag-

nóstico de dependência. As substâncias psicoativas

podem ser classificadas em depressoras do sistema

nervoso central - SNC (álcool, benzodiazepínicos,

barbitúricos, opioides, etc.), estimulantes do SNC

(cocaína, anfetamina, crack, nicotina, etc.) e alu-

cinógenas (maconha, ácido lisérgico, etc.), e seus

efeitos adversos vão depender da droga consumida,

da frequência e do tempo de utilização [17].

O uso frequente de substâncias psicoativas

pode comprometer o estado nutricional dos usuá-

rios, uma vez que repercute na ingestão de alimen-

tos e água, assim como no metabolismo, peso e comportamento alimen-

tar. As deficiências nutricionais são comuns, normalmente causadas pelo

aumento das necessidades de nutrientes para desintoxicar ou metabolizar

a droga, pela inativação de vitaminas e coenzimas necessárias para a me-

tabolização de energia, pelos danos no epitélio intestinal e fígado e pelo

aumento da perda de nutrientes com a diurese e diarreia decorrentes do

consumo de substâncias psicoativas [18].

Transtorno Obsessivo-compulsivo (TOc)

O Transtorno Obsessivo-compulsivo é caracterizado pela intrusão de

pensamentos súbitos e indesejados ou de imagens desprazerosas. Muitas

vezes, essas obsessões são acompanhadas por profundo temor ou urgência

para realizar determinadas compulsões para se aliviar. As compulsões são

atos repetitivos e estereotipados que o indivíduo é compelido a realizar

mesmo que tenha a percepção de que são excessivos [19].

Alguns pensamentos obsessivo-compulsivos do indivíduo com TOC

podem ser direcionados para a alimentação, causando assim inadequa-

ções no consumo, padrão e comportamento alimentares, além de diversas

crenças e tabus equivocados sobre a alimentação. Esses pacientes cos-

tumam temer que as preparações tenham sido elaboradas por indivíduos

sem o conhecimento suficiente sobre a higiene e o cuidado com objetos e

alimentos possivelmente “contaminados”, fazendo com que deixem de ir a

restaurantes, festas e outros eventos que incluam refeições, o que muitas

vezes causa brigas com familiares e isolamento social [20].

Avaliação nutricionalA avaliação nutricional em psiquiatria envolve alguns desafios que

merecem especial atenção. Talvez o maior deles esteja relacionado ao fato

26 dossiê bio

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Você percebeu alguma variação do peso e apetite nas últimas semanas?

Você tem estado mais guloso, sempre procurando alimentos doces pela casa?

Você se levanta no meio da noite para comer?

Você consegue identificar se come porque tem fome ou se é por outra motivação?

Você se sente culpado depois de comer alguma coisa que gosta?

Você divide os alimentos em bons-saudáveis e ruins?

Alguma vez você comeu uma quantidade enorme de comida da qual tem até vergonha de contar?

Você faz alguma coisa para aliviar a culpa de ter comido tanto?

Você costuma beber ou usar algum tipo de droga? Qual tipo e com que frequência?

Quando usa alguma dessas substâncias, costuma ficar longos períodos sem comer? E, depois que o efeito delas passa, como se alimenta?

Você já usou álcool-drogas propositalmente para não comer?

Você está feliz com seu corpo? Já deixou de ir a lugares, ou vestir determinadas roupas porque está infeliz com sua forma física?

Como você higieniza seus alimentos? Você tem receio de consumir alimentos preparados por outras pessoas?

Na sua casa, costuma utilizar sempre os mesmos pratos e talheres?

Você possui algum ritual alimentar?

Você costuma ingerir substâncias incomuns?

Sua alimentação muda antes e/ou durante a menstruação?

Você faz atividade física? Quanto?

de que cada transtorno tem suas particularidades,

que devem ser consideradas no momento da ava-

liação. De qualquer forma, independentemente do

problema psiquiátrico, a avaliação nutricional deve

ser detalhada e incluir os quatro grandes quesitos:

anamnese, exame físico, exames bioquímicos e an-

tropometria [21].

Algumas particularidades na avaliação do

paciente psiquiátrico não podem ser esquecidas.

Na anamnese, não podemos nos esquecer de que a

maioria dos medicamentos utilizados no tratamen-

to costuma levar a um aumento de peso, que pode

ser um fator de risco para comorbidades clínicas,

tais como hipertensão, diabetes mellitus tipo 2,

dislipidemias, doenças cardiovasculares, entre

outras, além da diminuição da qualidade de vida

e da autoestima [22,23]; Aronne, 2003). O medo

do ganho de peso pode prejudicar a adesão e au-

mentar o risco de recaídas [23]. Dessa forma, ava-

liar o padrão alimentar, ou seja, a frequência das

refeições, suas características, a presença ou não

de compulsões alimentares e jejuns prolongados,

entre outros, é importante, mas o comportamento

alimentar é fundamental. Conhecer a relação com

a comida pode trazer informações importantes so-

bre o paciente, uma vez que o ato de comer é um

sintoma que condensa muito bem os afetos e suas

representações [1]. Algumas perguntas que não

podem faltar na anamnese do paciente psiquiátrico

estão destacadas na Figura 1.

Em relação ao exame físico, é importante lem-

brar que alguns sinais são indicadores de sintomas

importantes, por exemplo, o sinal de russel (calo

na mão), os dentes manchados e/ou corroídos, as

parótidas aumentadas são característicos de quem

Figura 1. Perguntas que não podem faltar na anamnese

dossiê bio 27

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provoca vômitos – comum em pacientes com buli-

mia nervosa. Cortes e queimaduras de cigarro pelo

corpo, falhas nos pelos e pequenas feridas na pele

podem indicar, respectivamente, automutilação, tri-

cotilomania, e skin peacking, sintomas relacionados

aos transtornos do impulso. Uma vez que a desnu-

trição é frequente nos pacientes psiquiátricos, seus

sinais físicos também devem ser observados [21].

Apesar de os exames bioquímicos serem úteis

para avaliar alguns danos causados pela medicação

psicotrópica [22], eles podem detectar também a

desnutrição causada por certas doenças como ano-

rexia nervosa e dependência química, bem como

apontar consumo alimentar inadequado nos qua-

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dros de pica (ingestão persistente de substâncias não nutritivas) ou ainda

purgações como uso de laxantes e vômitos na bulimia nervosa. É importante

lembrar que carências nutricionais podem favorecer a manifestação de irre-

gularidades na saúde física, mas também na saúde mental, gerando, entre

outros sintomas, ansiedade, apreensão, irritabilidade, nervosismo excessivo,

agitação, hiperatividade, humor lábil ou deprimido, tristeza, o que pode até

piorar o quadro psiquiátrico [24].

Já a antropometria deve ser realizada de maneira delicada. Uma vez que

a alteração do peso é critério diagnóstico para certas doenças como os trans-

tornos de humor e a preocupação com o corpo e peso são o core dos trans-

tornos alimentares, esse momento pode causar muita angústia, ansiedade e

expectativa. Em alguns casos, deve-se pesar o paciente de costas (para que

não saiba seu peso) apesar deste comportamento estar sendo muito questio-

nado nos trabalhos mais atuais [25].

28 dossiê bio

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qualidade

A diarreia aguda infantil de etiologia infecciosa representa um grave problema

de saúde pública. Estatísticas mostram que no início dos anos 1980 ela foi respon-

sável pelo óbito de cerca de 4,6 milhões de crianças com idade inferior a cinco anos

em todo o mundo [1,2].

Uma década mais tarde, este índice recuou para a cifra ainda muito expressiva

de 3,3 milhões por ano — atribuída, em grande medida, à implementação rotineira da

terapia de hidratação oral preconizada pela Organização Mundial da Saúde.

No presente, estima-se em cerca de 2,5 milhões o número de crianças que vão

a óbito, anualmente, por diarreia aguda — o que equivale a 15% de todas as causas de

mortalidade por razões específicas em crianças com menos de cinco anos de idade.

Em países em desenvolvimento, a reincidência da doença, vinculada à desnu-

trição e à falta de uma rede sanitária e de esgotos adequada, contribui adicionalmen-

te para a morbimortalidade.

E, se em países desenvolvidos a morte por diarreia aguda é rara, seu impacto

econômico ainda é muito elevado. Nos Estados Unidos, por exemplo, são relatados

25 milhões de casos de diarreia aguda por ano em crianças com menos de cinco

anos de idade, levando a 200.000 admissões hospitalares (4% de todas as interna-

ções hospitalares nesta faixa etária) a um custo de US$ 2.307 por internação [1].

MicrOBiOTA iNTesTiNALAs bactérias que habitam nosso trato gastrintestinal (TGI) compõem o que se

convencionou chamar, modernamente, de microbiota intestinal (MI)[3].

Em condições normais, a MI divide-se em dominante (109 a 1012 unidades for-

madoras de colônias por mL de conteúdo luminal [CFU/mL]), subdominante (107

a 108 CFU/mL) e residual(107 CFU/mL). Nos dois primeiros grupos encontram-se,

respectivamente, Bifidobacterium e Lactobacillus, denominados simbiontes por sua

reconhecida ação benéfica ao organismo. No último grupo, encontram-se os pato-

biontes, bactérias com potencial patogênico como Clostridium, Pseudomonas, Kleb-

siella, Veilonella e Enterobacter.

Do ponto de vista funcional, a hemostasia da MI

é fundamental no que diz respeito a proteção, imuno-

modulação e nutrição do organismo. Seu equilíbrio,

contudo, pode ser rompido, por exemplo, por infecção

de etiologia bacteriana e viral. No curso da diarreia

aguda, ocorre uma nítida redução de simbiontes e

aumento de bactérias potencialmente patogênicas,

principalmente as produtoras de urease.

ArseNAL TerAPêUTicONão há dúvida que o enfrentamento dessa doen-

ça passa pela fundamental melhoria das condições sa-

nitárias e de higiene, lado a lado com a implementação

de programas educacionais.

O uso judicioso de hidratação oral e intravenosa,

assim como a manutenção da amamentação, encon-

tra-se entre as medidas mais efetivas. E o emprego de

antibióticos pode ser necessário em condições de maior

gravidade, como certos quadros causados por Shiguella

ou cólera. Recentemente, vacinas orais contra agentes

infecciosos como Vibrio cholerae e Rotavírus têm sido

testadas com resultados promissores [1].

Nesse cenário, o uso de probióticos, fibras solú-

veis, prebióticos e simbióticos tem recebido cada vez

maior atenção, até conquistar um lugar definido no ar-

senal terapêutico contra a diarreia aguda.

Probióticos, prebióticos e simbióticos no combate da diarreia

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PrOBiÓTicOs

Pelo menos estudos de quatro meta-análises avaliaram a eficácia dos probióticos

na diarreia aguda, especialmente infantil [4-7]. Em síntese, os resultados apontam uma

redução de 24 horas na duração da diarreia, em particular aquela causada por rotavírus.

Em uma recente revisão Cochrane (63 estudos, totalizando 8.014 pacientes), o uso de

probióticos diminuiu o risco de duração da diarreia por quatro ou mais dias em 59% [8].

Três mecanismos principais justificam o uso de probióticos na diarreia aguda [2]:

1. ANTAgONisMO DireTO: micro-organismos probióticos secretam moléculas e

peptídeos bioativos, que exercem ação antimicrobiana, e bacteriocinas, que protegem

o organismo de translocação bacteriana e disseminação sistêmica da infecção. Dignos

de nota, os probióticos podem antagonizar ou interferir na produção de toxinas.

2. eXcLUsÃO: os probióticos podem criar um ambiente hostil para agentes pa-

togênicos ao promoverem aumento de bactérias simbiontes, redução do pH colônico,

incremento da barreira intestinal, interferência na ligação entre o patógeno e a célula

epitelial, competição por consumo de nutrientes e estimulação de fatores de prote-

ção como IgA secretora, mucina, defensinas e Hsp 27.

Os probióticos podem ainda (i) aumentar a atividade de enzimas da borda em

escova, (ii) sintetizar niacina, ácido pantotênico, biotina, ácido fólico e vitaminas C,

K e B12 e (iii) interagir com o sistema nervoso entérico, atenuando a diarreia secre-

tora, a hipercontratilidade e a sensibilidade visceral.

iMUNOMODULAÇÃO: probióticos podem exercer efeitos imunomoduladores ao

participarem na rede de interações entre ligantes microbianos denominados MAMPs

(microbial-associated molecular patterns) e receptores transmembrana presentes

em células imunológicas como macrófagos, células dendríticas e células epiteliais

denominados TLRs (toll-like receptors). Probióticos podem também reduzir citocinas

pró-inflamatórias como fator TNF-α e induzir citocinas anti-inflamatórias como IL-10.

LAcTOBAciLLUs reUTeriPara alcançarem o status de probiótico os micro-organismos devem preencher

uma série de pré-requisitos associados à sua segurança e efetividade.

No caso do Lactobacillus reuteri, cepa ATCC 55730, confirmou-se que é de origem

humana e seguro. De fato, mais de 1 bilhão de doses diárias de 1x108 UFC de L. reuteri

foram consumidas nos últimos dez anos, inclusive por prematuros, neonatos e lacten-

tes, sem relatos de efeitos adversos [16]. Verificou-se, ainda, que o L. reuteri é resis-

tente ao ácido e à bile, adere ao epitélio intestinal e coloniza com eficiência o TGI [17].

Além disso, observou-se que o L. reuteri produz reuterina, substância com vigoro-

sa ação antimicrobiana, que age contra E. coli, Salmonella, Shigella, Proteus, Pseudo-

monas, Clostridium, Staphylococcus e H. pylori, entre outros patógenos.

Na dose de 107 CFU, L. reuteri foi capaz de reduzir

em 50% a frequência de diarreia no 2º dia de tratamen-

to, com melhores índices à medida que a concentração

foi aumentada [18].

Estudos adicionais apontam, ainda, um impacto

positivo do L. reuteri cepa ATCC 55730 (107 CFU) na

redução da atividade de urease nas fezes de crianças

com diarreia, sobretudo aquelas causadas por Rotaví-

rus [18, 19].

Weizman et al., por sua vez, avaliaram os efeitos

preventivos do consumo de probióticos em um es-

tudo randomizado, duplo-cego e placebo-controlado.

Ao todo, 201 crianças entre 4 e 10 meses de idade fo-

ram recrutadas em 14 creches em Israel [20].

No fim de 12 semanas, os dois grupos que rece-

beram probióticos (B. lactis e L. reuteri) apresentaram

menos episódios de febre e de diarreia e menos dias

com diarreia. Entretanto, o grupo L. reuteri apresentou

menos dias com febre, menor número de consultas mé-

dicas, menos faltas na creche e menos prescrição de

antibióticos do que os grupos controle e B. lactis.

Digna de nota, ainda, a associação do L. reuteri

com a inulina foi recomendada por Stewart e cols. por

ser a combinação que demonstrou melhor perfil de cur-

va de fermentação, sem “picos” de fermentação, o que

implica menor produção de gases e menos desconforto

abdominal [21].

fiBrAs sOLÚVeis e PreBiÓTicOs Ácidos graxos de cadeia curta (AGCC) como o bu-

tirato, produzidos a partir da fermentação de fibras so-

lúveis e prebióticos no cólon, são capazes de estimular

a diferenciação da célula epitelial, contribuir para ma-

nutenção da integridade da mucosa e para aumentar

a proteção contra bactérias patogênicas [24, 25, 26].

Entre as fibras solúveis, a goma guar parcial-

mente hidrolisada (GGPH) tem sido particularmente

empregada no tratamento da diarreia. Em crianças de

30 qualidade

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qualidade 31

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Acesse mais informações sobre as propriedades do FiberMais Flora.

www.nestle.com.br/nestlenutrisaude/NestleBio.aspx

4-18 meses de idade, quando adicionada à solução de hidratação oral, foi associa-

da a uma significativa redução no tempo de duração da diarreia e redução no volu-

me diário de perda fecal. O mesmo benefício foi observado em crianças entre 5 e 24

meses de idade com diarreia persistente [9]. Estudos clínicos (como doses entre

25 g/l ou 50 g/l) e experimentais com cólera apontam ainda uma ação benéfica no

que diz respeito à redução do peso fecal [10,11].

A ação da GGPH é explicada principalmente por geração de AGCC, maior absor-

ção epitelial de sódio e água, inibição da secreção colônica de cloreto mediada por

AMP-cíclico e lentificação no tempo de trânsito colônico [11,12].

Por sua vez, prebióticos como a inulina favorecem o crescimento de Bifidobac-

terium e Lactobacillus e a redução de patobiontes. Seu emprego também foi associa-

do a um aumento de IgA secretora fecal [13].

É interessante notar que a associação de inulina com um probiótico configu-

ra uma interessante abordagem na prevenção e no tratamento da diarreia infantil.

Trabalhos recentes com o uso de simbióticos versus controle destacam significativa

redução na duração da doença em crianças entre 1-3 anos [14] e entre 3 e 12 meses

de idade [15].

siMBiÓTicOsRecentemente, o uso combinado de prebióticos e probióticos (simbióticos)

tem sido observado com resultados animadores. Seu emprego para restauração da

MI e para a prevenção de infecção em grupos de pacientes internados em unidades

de terapia intensiva constitui um relevante exemplo disso; sobretudo quando os re-

sultados mostram-se mais promissores do que aque-

les obtidos pelo emprego de prebióticos e probióticos

isoladamente (22, 23).

Diante da importante morbimortalidade da diarreia

aguda, a Nestlé desenvolveu FiberMais Flora: uma inova-

dora combinação de probiótico com fibras solúveis como

aliado no combate da diarreia por meio da regeneração

da MI e regulação da atividade intestinal. Para isso, sua

composição reflete parte substancial do conhecimento

mais recente adquirido nesta área: 1x108 UFC de Lacto-

bacillus reuteri, 60% de GGPH e 40% de inulina.

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nutrição e cultura

Descascar laranjas-da-terra e cortar cada uma em quatro pétalas, sem que as

partes se separem. Depois, retirar cuidadosamente o bagaço, lavar bem e ferver por

dez minutos. Deixá-las de molho, recebendo água da biquinha debaixo da casa por dois

ou três dias, até eliminar o amargor. Preparar uma calda e espargir cravos-da-índia jun-

tamente com as pétalas, sem que se quebrem. Cozinhar até que elas fiquem macias,

e deixá-las dormir em calda. No dia seguinte, retirá-las uma a uma com escumadeira e

colocá-las sobre uma peneira de taquara para que escorram da calda. Estendê-las em

tabuleiros, juntando as pétalas duas a duas e deixando-as ao sol para secar.

Uma receita com sabor de poesia. Que termina quando se deita o doce de laranja pron-

to sobre um papel de seda, no abrigo de uma caixa segura e adornada por um laço de fita.

Como quem brinca de despetalar flores e encontra bem-quereres, Cora Coralina,

já idosa, fazia doces para vender em Goiás, sua terra natal, para onde voltou em 1956,

após ter vivido por 45 anos entre cidades do interior de São Paulo e a capital.

Poesia ela fez durante a vida toda, não só com palavras, mas com alimentos. Es-

crevendo sobre a infância de um tempo em que o cozinhar – a comida doce ou a salgada

– era o que despertava aquele sentimento delicioso que costumam chamar de felicidade.

Pétalas na

O encontro poético de Adélia Prado e Cora Coralina entre aromas e paladares de Minas e Goiás

cozinhap o r _ Julia Alquéres

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cozinhaSobre esse mesmo tempo e também sobre laranjas escre-

veu a poetisa Adélia Prado, que nasceu em 1935, na cidade de

Divinópolis, interior de Minas Gerais, onde ainda vive.

Na minha cidade, nos domingos de tarde,

as pessoas se põem na sombra com faca e laranjas.

Tomam a fresca e riem do rapaz de bicicleta,

A campainha desatada, o aro enfeitado de laranjas:

‘Eh bobagem!’ (...)

Em cidadezinhas interioranas, domingo não era ape-

nas dia de missa, mas de gula. As pessoas permitiam-se o

ritual de descascar laranja e saboreá-la vendo a vida pas-

sar pelo aro das bicicletas. De perder-se nos gomos da fru-

ta e esquecer que o tempo, como eles, é efêmero. E rumo

ao poente, fim do poema Para comer depois:

(...) Daqui a muito progresso tecno-ilógico,

quando for impossível detectar o domingo

pelo sumo das laranjas no ar e bicicletas,

em meu país de memória e sentimento,

basta fechar os olhos:

é domingo, é domingo, é domingo.

nutrição e cultura 33

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Tal qual a vizinha, Adélia Prado rememora a mãe no fo-

gão atiçando as brasas para a família e o contentamento da

filha ao comer:

(...) uma vez banqueteando-se, comeu feijão com arroz

mais um facho de luz.

Com toda fome.

Também a mãe alegrava-se na cozinha. Nos poemas da

mineira, as mulheres não se sentem inferiores aos homens e

tampouco são assim tratadas. Não há submissão, e trabalhar

na cozinha é tão valoroso quanto trabalhar fora de casa. Em

Solar, Adélia Prado conta:

Minha mãe cozinhava exatamente:

arroz, feijão-roxinho, molho de batatinhas.

Mas cantava.

Não é qualquer feijão, mas o roxinho; nem qualquer mo-

lho, mas o de batatinhas. Apesar da falta de carne, caracterís-

tica da região, a refeição é imaginada e preparada delicada-

mente pela mãe, que pensa nos sabores e nas cores do prato,

canta e faz da casa um verdadeiro solar: castelo e luz.

34 nutrição e cultura

Contra os malquereres da passagem do tempo, escreve-

ram e cozinharam Cora Coralina e Adélia Prado. A infância na

cozinha é a primeira lembrança das duas. No poema O Prato

Azul-Pombinho, Coralina conta sobre um prato herdado pela

bisavó e estimado por todos:

(...) Pesado. Com duas asas por onde segurar.

Prato de bom-bocado e de mães-bentas.

De fios de ovos. De receita dobrada de grandes pudins,

recendendo a cravo,

nadando em calda (...).

Açúcar, coco, queijo, ovo, leite, farinha de trigo, fermento

em pó, ingredientes simples deixavam farta a mesa da família

e os doces enlouqueciam a meninada, que, em dia de festa,

traquinava comendo com as mãos e provando as raspas do

tacho em grandes dedadas.

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Para Adélia, assim como para a menina do poema Ensina-

mento, a cozinha foi um espaço para aprender sobre as relações

humanas para, mais tarde, apreender a vida:

Minha mãe achava estudo

a coisa mais fina do mundo.

Não é.

A coisa mais fina do mundo é o sentimento.

Aquele dia de noite, o pai fazendo serão,

ela falou comigo:

“Coitado, até essa hora no serviço pesado”.

Arrumou pão e café, deixou tacho no fogo com água quente.

Não me falou em amor.

Essa palavra de luxo.

O gesto de cuidar da refeição do marido trabalhador com

afinco denuncia aquele sentimento, sem que fosse preciso

nomeá-lo. Deixando as definições de amor para a vida adulta.

Depois de perder muito cedo a mãe e anos mais tarde o

pai, a filósofa, professora e poeta Adélia Prado, já casada e mãe

de cinco filhos, descobriria o amor como palavra de luxo.

Sentimento forte tinha Cora Coralina não só pelas pes-

soas, mas por seus tachos, antigos vasos largos de barro ou

de ferro que substituíam as panelas. Coralina sempre com-

prava quando alguém oferecia, usava-os muito e, quando os

séculos de uso os comprometiam, ela levava os tachos aos

ciganos mestres na solda, que os consertavam.

A doceira e poetisa, que sofreu com a escassez de co-

mida, dizia que um dia queria dar um tacho seu para cada fi-

lho e cada neto, como legado de seu trabalho. Em tempos de

pobreza, a família da doceira regulava a comida e as crian-

ças muitas vezes fugiam do regulamento comendo laranjas

e bananas escondido. Depois se ajoelhavam no oratório e

pediam que não morressem por terem conquistado uma fe-

licidade clandestina.

Privação também passava Cora Coralina quando podia

comer apenas uma fatia do bolo assado na panela, caso con-

trário a irmã mais velha ralhava com ela. O doce tinha de ficar

guardado para as visitas:

(...) Era só olhos e boca e desejo

daquele bolo inteiro.

Minha irmã mais velha

governava. Regrava.

Me dava uma fatia,

tão fina, tão delgada...

E fatias iguais às outras manas.

E que ninguém pedisse mais! (...)

Meios para burlar as regras dessa vez não existiam,

já que o bolo ficava guardado em um armário alto e fechado.

Restava a fantasia:

(...) E sonhava com o imenso armário

cheio de grandes bolos

ao meu alcance. (...)

nutrição e cultura 35

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Sorte da menina do poema A Boca, de Adélia Prado, que

podia se esbaldar com feijão e arroz do prato dos pais, que

se privaram “da metade do prato para me engordar”. É certo

que na infância à mesa as crianças Cora e Adélia aprenderam

a felicidade, talvez sem nomeá-la, mas já entendendo que

também ela, como o amor, é palavra de luxo. É este mesmo

sentimento que as duas poetisas procuram ter não apenas

memorando a infância, mas vivendo.

Depois da morte do marido, Cora Coralina passou por difi-

culdades financeiras e teve de trabalhar muito para manter os

filhos até decidir voltar para sua terra e estabelecer-se como

doceira. Conseguiu. Sem jamais se sujar. Dizia ela que uma boa

doceira só deveria lambrecar dois dedos, o indicador e o pole-

gar, de uma mão. No poema Estas Mãos, Coralina conta:

(...) Minhas mãos doceiras...

Jamais ociosas.

Fecundas, imensas e ocupadas.

Mãos laboriosas.

Abertas sempre para dar, ajudar,

unir e abençoar. (...)

Também as mãos de Adélia, em poesia e em vida, não permitem

que o tempo escape:

Há mulheres que dizem:

Meu marido, se quiser pescar, pesque,

mas que limpe os peixes.

Eu não. A qualquer hora da noite me levanto,

ajudo a escamar, abrir, retalhar e salgar.(...)

Adélia parece lembrar-se bem dos ensinamentos da

mãe, e aquela palavra de luxo talvez seja mais bem com-

preendida por ela agora:

(...) É tão bom, só a gente sozinhos na cozinha,

de vez em quando os cotovelos se esbarram,

ele fala coisas como ‘este foi difícil’

‘prateou no ar dando rabanadas’

e faz o gesto com a mão

O silêncio de quando nos vimos a primeira vez

atravessa a cozinha como um rio profundo.

Por fim, os peixes na travessa,

vamos dormir.

Coisas prateadas espocam:

somos noivo e noiva.

O amor e a limpeza dos peixes misturam-se no poema

Casamento, e o sentimento é mesmo a coisa mais fina do

mundo, nos sussurra Adélia.

Leia na íntegra alguns dos mais belos poemas de Cora Coralina e Adélia Prado. E confira os livros de ambas em novas edições.

www.nestle.com.br/nestlenutrisaude/NestleBio.aspx

36 nutrição e cultura

Coralina, que viveu 96 anos, costumava dizer que era

mais doceira que poeta e escreveu que morreria tranquila-

mente dentro de um campo de trigo ou milharal. Adélia Prado

pede a Deus, em poesia, para trabalhar na cozinha, porque

está cansada de ser poeta. Talvez seja mais doloroso tratar

do tempo em poesia — há os malquereres todos — do que

entregar-se aos prazeres da cozinha e sentir a felicidade.

Eterna, por enquanto, apenas a biquinha da Casa da Ve-

lha Ponte, por onde há séculos escorre a água pura, usada por

Cora Coralina para tirar o amargor da laranja-da-terra. Efême-

ra, a felicidade é como o tempo e os gomos de laranja. E tem a

espessura de uma pétala de flor, de bem-querer.

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foco

Conquistar a Mongólia e vencer a Grande Muralha da China foram grandes êxitos de Gengis Khan, um dos co-

mandantes militares mais bem-sucedidos da história da humanidade. Considerado herói máximo e pai da nação

Mongol, Gengis Khan atribuía parte de suas glórias ao fato de que seus soldados permaneciam fortes e saudáveis ao

consumirem um alimento muito nutritivo chamado airag. Era mandatório que todo o seu exército, dos grandes gene-

rais aos mais baixos escalões, bebesse o poderoso elixir. Segundo dados históricos, o próprio comandante adorava o

sabor desse alimento, que era preparado à base de leite acidificado e fermentado [1].

Iogurtepara uma vida longa e saudável

Com os avanços da ciência e da tecnologia de alimentos, o que era muito bom ficou ainda melhor

p o r _ Maria Fernanda Elias Llanos

Existem muitos registros e lendas que permeiam

a origem e a história do iogurte. As maiores evidências

sugerem que o preparado nasceu por acidente, ao re-

dor de 5.000 anos a.C. Naquela época, os povos da

Mesopotâmia carregavam o leite da ordenha em

bolsas produzidas com o estômago de animais.

As condições precárias de armazenamento,

aliadas às altas temperaturas, permitiam

que colônias de bactérias presentes no leite,

em contato com a renina – enzima natural-

mente presente no estômago de alguns ani-

mais –, iniciassem o processo de fermenta-

ção, transformando o líquido, em poucas horas,

em queijo ou iogurte. Não demorou muito para

que notassem a maior vida útil desses alimentos

em relação ao leite [1,2].

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O iogurte também tem suas raí-

zes associadas com os nômades das

montanhas caucasianas da Rússia,

onde é conhecido como kefir: “bom

sentimento” ou “sentir-se bem”. Con-

siderado um presente dos deuses,

alcançou tal reputação por restabe-

lecer a saúde de pessoas enfermas.

Por isso, a colônia de bactérias uti-

lizada para o seu preparo era guar-

dada a sete chaves pela família real.

Diz a lenda que essa situação perdu-

rou até que uma linda dama, depois

de seduzir o príncipe, tomou posse de

uma colônia e a entregou à Sociedade

Médica Russa. A jovem anônima teria

sido a responsável pela disseminação

e popularidade do kefir pelo império e,

consequentemente, pelo mundo [1].

Entretanto, foi apenas no início do século 20 que o iogurte

ganharia, de fato, atenção mundial. Mais especificamente quan-

do o Prêmio Nobel de Medicina, Ilya Metchnikov, propôs que a sua

ingestão em grandes quantidades poderia explicar a longevidade

incomum dos búlgaros [1,3].

Em 1905, o médico e microbiologista búlgaro Stamen Grigo-

rov descobriu que uma cepa específica de bacilos era responsável

pela formação do iogurte natural. Como reconhecimento, a comu-

nidade científica batizou os micro-organismos com o nome de

Lactobacillus bulgaricus, atualmente denominados Lactobacillus

delbrueckii subspecies bulgaricus [1].

Das farmácias para o mercadoPor algum tempo, o iogurte foi considerado um medicamen-

to e era vendido apenas em farmácias. Com o passar dos anos,

seu consumo se generalizou graças ao desenvolvimento indus-

trial, tecnológico e, sobretudo, científico [2].

O Codex Alimentarius define iogurte como “leite coagulado ob-

tido por fermentação lática devido à ação das bactérias Lactoctoba-

cillus delbrueckii substp. bulgaricus e Streptococcus thermophilus

sobre o leite pasteurizado e concentrado, com ou sem adição de leite

em pó”. Em diversos países, assim como no Brasil, outras culturas

de bactérias podem ser adicionadas às culturas de base [4].

Uma diversidade de estudos reconhece as múltiplas virtu-

des nutricionais do iogurte e a presença de fatores multidimen-

sionais implicados em promoção da saúde humana. Seu perfil

de nutrientes está diretamente relacionado com a composição

nutricional do leite que o originou, assim como as espécies de

bactérias utilizadas em sua fermentação [5].

Os derivados lácteos constituem importante fonte de cálcio,

fósforo, proteínas de alto valor biológico e vitaminas A, D e B2. O Guia

Alimentar para a População Brasileira recomenda a ingestão diária de

três porções de alimentos desse grupo, sendo que crianças, adoles-

centes e gestantes saudáveis devem preferir a versão integral [5].

De modo geral, os iogurtes costumam ser mais bem-aceitos

do que o leite por indivíduos que apresentam intolerância à lac-

tose. A explicação se dá tanto pela menor concentração de lactose

como pela presença de lactase — que promove a lise de lactose em

monossacarídeos —, produzida por bactérias como as próprias

L. delbrueckii substp. bulgaricus e S. thermophilus [6,7,8].

Mas o que realmente desperta o interesse dos pesquisa-

dores são as características funcionais do iogurte expressas

por uma série de componentes como o ácido linoleico conjuga-

do (ALC), esfíngolipídeos, ácido butírico, peptídeos bioativos e

bactérias probióticas [9, 10].

Propriedades funcionaisA composição lipídica dos produtos fermentados apresenta

teor aumentado de ALC quando comparada ao leite que originou o

seu processamento. Foi demonstrado que o aumento do consumo

de gorduras lácteas está associado com a elevação das concentra-

ções de ALC no tecido adiposo e no leite humano [11]. Evidências

científicas sugerem que o ALC apresenta ação imunoestimulante

e anticarcinogênica. Um estudo publicado no Journal of Nutrition

concluiu que a propriedade anticarcinogênica pode estar relacio-

nada com a habilidade de alguns isômeros do ALC de inibir a ex-

pressão das ciclinas e, consequentemente, impedir o progresso

do ciclo celular da fase G1 para a S [12]. Outro estudo publicado

no mesmo periódico demonstrou que o tratamento das células do

O que realmente desperta o interesse dos pesquisadores são as características funcionais do iogurte expressas por uma série de componentes

38 foco

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câncer de cólon humano com isômero

sintético (10t,12c) aumentou substan-

cialmente a expressão proteica e o acú-

mulo de RNA mensageiro do CDK inibidor

p21 (CIP1/WAF1) e diminuiu a fosforila-

ção da proteína retinoblastoma, fatores

que provocaram a parada do ciclo celu-

lar na fase G1. Não houve mudanças no

comportamento da ciclina A, ciclina D,

ciclina E e das CDK2 e CDK4, ciclinas de-

pendentes da kinase 2 e 4 [13]

Estudos em ratos sugerem que os esfingolipídios do iogur-

te — uma classe de lipídeos envolvida nas sinapses — podem

exercer ação protetora contra o câncer de cólon ao reduzir o po-

tencial metastático e o crescimento de linhagens de células can-

cerosas [10].

Já a presença do ácido butírico nos alimentos lácteos parece

reforçar o efeito protetor contra o câncer de cólon. Estudos in vitro

indicaram inibição da proliferação celular e indução da apoptose.

O ácido está associado com a inativação da expressão da onco-

gênese, a inibição da ação invasiva da doença e da metástase.

Os resultados de estudos em animais fortalecem o possível efeito

protetor do ácido butírico contra o câncer de cólon [14,15].

Os peptídeos funcionais do iogurte são produzidos pela fer-

mentação da caseína e outras frações proteicas do leite. Esses

compostos são resistentes a hidrolise e produzem efeito fisioló-

gico local, no trato gastrintestinal, ou sistêmico, após absorção.

As classes mais estudadas são as que apresentam ação opioide,

antiopioide, carreadora de minerais, imunoestimulante, anti-hiper-

tensiva e antitrombótica (Figura 1). Os estudos clínicos, contudo,

são raros e o maior conhecimento sobre os efeitos biológicos des-

ses peptídeos vem de pesquisas in vitro e com animais [9,16,17].

Um veículo para probióticos Culturas de bactérias associadas com a produção do io-

gurte são, sem dúvida, objetos do maior número de pesquisas

e publicações. Para efeito de estudo, consideram-se tanto as

espécies envolvidas no processo de fermentação como aquelas

acrescentadas como probióticos [10].

O termo probiótico significa “pró-vida” e foi originalmente

cunhado para descrever “organismos vivos que, quando inge-

ridos em quantidade determinada, exercem efeito benéfico no

balanço da microbiota intestinal do hospedeiro”. Atualmente, a

definição aceita é “suplemento alimentar microbiano vivo que

afeta de forma benéfica seu receptor através da melhoria do

balanço microbiano intestinal” [10, 18].

Uma série de benefícios para a saúde tem sido atribuída

a eles, sobretudo no que diz respeito à manutenção da saúde

e ao tratamento adjuvante de doenças que afetam o trato gas-

trintestinal (Tabela 2) [19].

Peptídeo Bioativo Proteína Precursora Bioatividade

Casomorfinas α, b-caseína Opioide

Casoquininas α, b-caseína Anti-hipertensivo

Casoxinas k-caseína Opioide - antagonista

Casoplatelinas k-caseína Antitrombótico

Imunopeptidases α, b-caseína Imunoestimulante

Caseinofosfopeptídeos α, b-caseína Carreador de minerais

A propriedade anticarcinogênica pode estar relacionada com a habilidade de alguns isômeros do ALC de inibir a expressão das ciclinas

foco 39

Um número progressivamente maior de estudos aponta, ain-

da, uma possível relação entre o uso de probióticos e a redução dos

níveis de triglicérides e de colesterol, ação anticancerígena, melhora

da condição imunológica no idoso, prevenção de infecções urogeni-

tais e prevenção e tratamento de eczema atópico [20].

Indicações de probióticos em gastroenterologia

Intolerância à lactose

constipação intestinal

Prevenção e tratamento da diarreia aguda

Prevenção da diarreia pós-antibiótico

Prevenção da diarreia do viajante

Prevenção da osteoporose pelo aumento da absorção colônica de cálcio

Doenças inflamatórias intestinais (Crohn, Retocolite ulcerativa)

Prevenção de infecções gastrintestinais (e respiratórias) em creches

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Nestlé research centerO Nestlé Research Center (NRC), ou Centro de Pesquisas

Nestlé, foi um dos pioneiros a estudarem a interação molecular

das bactérias probióticas com as células intestinais. Em um es-

tudo colaborativo, pesquisadores do NRC observaram que as bac-

térias da microbiota intestinal materna são transferidas, via ama-

mentação, para o intestino do bebê. E esta microbiota transportada

auxilia a colonização do intestino da criança e contribui para o de-

senvolvimento do sistema imune [19].

Os cientistas do NRC examinaram também os efeitos de de-

terminadas espécies de probióticos na incidência e severidade de

diarreia em crianças e adultos. Os estudos demonstraram que o

Lactobacillus GG antagoniza a diarreia por rotavírus, mas foi inefi-

caz contra diarreia bacteriana. Por outro lado, em um estudo rando-

mizado, duplo-cego, demonstrou-se que o Lactobacillus paracasei

ST11 apresentou benefício clínico significativo no gerenciamento

da diarreia bacteriana, mas foi ineficiente contra a diarreia por ro-

tavírus. Concluiu-se que os probióticos podem ser considerados

uma intervenção útil na redução da incidência e severidade de

diarreia viral e bacteriana [19].

A segurança, a eficácia e a estabilidade das espécies de bac-

térias têm sido amplamente investigadas por cientistas da Nestlé

em pesquisas pré-clínicas e clínicas. Cada probiótico potencial é

cuidadosamente avaliado por meio de tecnologia molecular de

ponta e sequenciamento de genoma. Como resultado, consegue-se

obter uma melhor caracterização das espécies de bactérias, assim

como seus mecanismos de ação [19].

O Lactobacillus johnsonii La1, por exemplo, já teve suas

características probióticas amplamente estudadas, dentre elas:

[1] Clark S, Costello M, Drake M, Bodyfelt F. The Sensory Evaluation of Dairy Products. Springer, 2nd edition, 2009. [2] Coyle LP. The World Encyclopedia of Food. Facts On File Inc., 1982 [3] The Official Website of The Nobel Prize. Disponível em: http://nobelprize.org/nobel_prizes/medicine/laureates/1908/ [01 mar 2011]. [4] Chandan RC. Manufacturing yogurt and fermented milks. Wiley-Blackwell, 2006. [5] Philippi ST. Pirâmide dos alimentos. Fundamentos básicos da nutrição. Barueri: Manole; 2008. [6] Rosado JL, Solomons NW, Allen LH. Lactose digestion from unmodified, low-fat and lactose-hydrolyzed yogurt in adult lactose maldigesters. Eur J Clin Nutr 1992;46:61–7. [7] Vesa TH, Marteau P, Korpela R. Lactose intolerance. J Am Coll Nutr 2000;19:165S–75S. [8] Kolars JC, Levitt MD, Aouji M, Savaiano DA. Yogurt—an autodigesting source of lactose. N Engl J Med 1984;310:1–3. [9] Spadoti LM, Moreno I. Peptídeos bioativos de produtos lácteos. Revista Funcionais e Nutracêuticos; 81. Ed. Insumos. [10] Oskar Adolfsson O, Meydani SN, Russell RM. Yogurt and gut function. Am J Clin Nutr 2004;80:245–56. [11] Whigham LD, Cook ME, Atkinson RL. Conjugated linoleic acid: implications for human health. Pharmacol Res 2000;42:503–10. [12] Kemp MQ, Jeffy BD, Romagnolo DF. Conjugated linoleic acid inhibits cell proliferation through a p53-dependent mechanism: effects on the expression of G1-restriction points in breast and colon cancer cells. J Nutr 2003;133:3670–7. [13] Cho H J; Kim E J; Lim S S; Kim M K; Sung M K; Kim J S; Park J H. Trans-10, cis-12, not cis-9, trans-11, conjugated linoleic acid inhibits G1-S progression in HT-29 human colon cancer cells. J Nutr; 136(4): 893-8, 2006. [14] Parodi PW. Conjugated linoleic acid and other anticarcinogênica agents of bovine milk fat. Journal of Dairy Science 1999; 82, 1339±1349. [15] Schmelz E M; Bushnev A S; Dillehay D L; Liotta D C; Merrill A H. Suppression of aberrant colonic crypt foci by synthetic sphingomyelins with saturated or unsaturated sphingoid base backbones. Nutrition and cancer 1997;28(1):81-5. [16] Shah, N. Effects of Milk-derived bioactives: an overview. British Journal of Nutrition. 2000; 84. Suppl. 1. S3-310. [17] Meisel H. Multifunctional peptides encrypted in milk proteins. Biofactors. 2004, 21(1-4):55-61. [18] Nestlé Research Center. Protection: Focus on Probiotics. Science in Action. [19] Damião AOMC. Prebióticos, probióticos e simbióticos: aplicações clínicas. Revista Nestlé.Bio, ano 1, no.1. [20] Dobrogosz WJ, Peacock TJ, Hassan HM. Evolution of the probiotic concept from conception to validation and acceptance in medical science. Adv Appl Microbiol. 2010;72:1-41. [21] Pridmore RD, Berger B, Desiere F et al. The genome sequence of the probiotic intestinal bacterium Lactobacillus johnsonii NCC 533. PNAS. 2004, vol. 101 no. 8; 2512–2517. [22] Neeser J, Granato D, Rouvet M et al. Lactobacillus johnsonii La1 shares carbohydrate-binding specificities with several enteropathogenic bacteria. Glycobiology. 2000, vol.10, no. 11; 1193-1199.

referêNciAs

40 foco

(a) não ser patogênico; (b) ser resistente ao ácido e à bile; (c)

aderir ao epitélio intestinal promovendo maior interação com o sis-

tema imunológico; (d) colonizar o trato gastrintestinal; (e) exercer

atividade antimicrobiana [21, 22].

Com o objetivo de aprofundar o conhecimento sobre sua fi-

siologia e identificar os genes potencialmente envolvidos em inte-

rações com o hospedeiro, pesquisadores do NRC sequenciaram e

analisaram o genoma do L. johnsonii (La1). A conclusão do trabalho

foi um marco no entendimento dos mecanismos de ação do probió-

tico no nível molecular e culmina com o lançamento de produtos de

qualidade e benefícios comprovados pela ciência [19, 21,22].

Conheça o 67º Workshop do Nestlé Nutrition Institute, realizado no Marrocos entre 16-20 de março de 2010, sobre o tema Leite e seus derivados na nutrição humana.

www.nestle.com.br/nestlenutrisaude/NestleBio.aspx

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calendário>>Ao patrocinar e divulgar encontros científicos na área de Nutrição, a Nestlé espera contribuir para que os profissionais de saúde possam debater e compartilhar suas experiências a partir da produção acadêmica mais recente. Confira alguns dos principais eventos focados em nutrição e saúde que vão ocorrer entre junho e setembro de 2011.

jun.XI Jornada de Nutrição de Botucatu (JONUB) >> 2 a 4

A Universidade Estadual Paulista “Júlio

de Mesquita Filho” (UNESP) promove

palestras, minicursos e atividades culturais

complementares à nutrição. O evento ocorre

na Faculdade de Medicina de Botucatu

(FMB) e no Instituto de Biociências (IBB).

Para a programação e a inscrição, acesse:

www.ibb.unesp.br/eventos/jonub/index.php

set.33rd ESPEN Congress >> 3 a 6Nutrition in translation – bridging science and

practice é o tema que a European Society for

Clinical Nutrition escolheu para o evento deste ano.

O cenário das palestras e cursos será a cidade de

Gotemburgo, na Suécia, considerada modelo de

qualidade de vida. Para mais detalhes, visite:

www.espen.org/congress/gothenburg2011/default.html

jul.XVI Congresso Brasileiro Multidisciplinar em Diabetes >> 29 a 31

Promovido pela Associação Nacional de Assistência ao Diabético

(ANAD), o evento aborda todos os aspectos do diabetes. A

programação deste ano inclui 46 simpósios e, aproximadamente,

200 palestras. Realiza-se em São Paulo, na Universidade Paulista

(UNIP). www.anad.org.br/congresso/16_Congresso_Site/

ago.V Jornada de Atualização em Nutrição Pediátrica >> 25 a 27 Concomitantemente ao encontro, ocorre o III Simpósio Internacional de

Alergia Alimentar. Realiza-se em São Paulo, no Centro de Convenções do Hotel

Matsubara. Informações sobre o envio de trabalhos e palestrantes confirmados

podem ser obtidas no site do Grupo de Apoio a Portadores de Necessidades

Nutricionais Especiais (Instituto Girassol): www.girassolinstituto.org.br

IV Congresso Brasileiro de Nutrição

Integrada e GANEPÃO >> 15 a 18

Simultaneamente, ocorrem o XXXIV Curso

Internacional de Nutrição Parenteral e Enteral e

o XIII Fórum Paulista de Pesquisa em Nutrição

Clínica e Experimental. O tradicional encontro

tem sede no Centro Fecomercio de Eventos,

em São Paulo, e apresenta como tema central:

Caminhando para o Equilíbrio Nutricional

http://ganep.com.br/ganepao/

Encontro de Atualização em

Pediatria >> 16 e 17A Sociedade Brasileira de Pediatria promove o

evento, que será realizado em Campos do Jordão

(SP), no Orotour Garden Hotel. Informações

sobre a programação científica e inscrições

serão adicionadas em breve no endereço:

www.spsp.org.br/spsp_2008/agenda.asp?id=631

11° Congresso Nacional da Sociedade Brasileira

de Alimentação e Nutrição >> 20 a 23Nutrição Baseada em Evidência será o tema

dessa nova edição do congresso. O assunto

será discutido por meio de debates, colóquios

e votação eletrônica. A Praia de Iracema, em

Fortaleza (CE), foi escolhida para abrigar o

evento. As normas para envio de trabalhos e

outras informações podem ser obtidas em

www.sban.org.br/congresso2011/home.asp

XV Congresso Brasileiro de

Nutrologia >> 21 a 23A cidade de São Paulo será a sede do

encontro anual organizado pela Associação

Brasileira de Nutrologia (ABRAN). O tema do

evento, a grade de programação e os prazos

para envio de trabalhos serão divulgados no

site da associação: www.abran.org.br

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resultado

Embalados pela música do grupo Palavra Cantada, estudantes do Ensino Fundamental descobrem o prazer de comer bem

No lugar de bater palmas, pais e filhos acompanham

o ritmo da música batendo colheres de pau. E cantam, res-

pondendo à pergunta com estrofes nutritivas: “Será que tem

espinafre? Será que tem tomate? Será que tem feijão? Será

que tem agrião?” E se divertem com outras menos apetitosas

e mais engraçadas: “Será que tem mandioca? Será que tem

minhoca? Será que tem jacaré? Será que tem chulé?”

Foi isso o que se viu anos atrás, no Estádio do Ibirapue-

ra em São Paulo, durante uma apresentação do conhecido

grupo comandado por Sandra Peres e Paulo Tatit .

Um dos maiores sucessos do Palavra Cantada em seus

mais de dez anos de carreira, a música chamou a atenção

de Eliane Leandro Nogueira, professora da Escola Municipal

General Clóvis Bandeira Brasil, em Santos, no litoral paulista.

Em 2010, ela colocaria a canção no centro de um premiado

projeto de educação alimentar.

Que que tem na sopa do neném?

p o r _ Alfaro Dantasc o l a b o r a ç ã o _ Teodoro Holck

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Que que tem na sopa do neném?

Era uma vez...Tudo começou a partir de uma publicação que a Unifesp

(ex-Escola Paulista de Medicina) distribuiu entre professores

com dicas sobre como melhorar a alimentação dos alunos e

do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), que,

como prevê a lei, visa “atender às necessidades nutricionais

dos alunos durante sua permanência em sala de aula, contri-

buindo para o crescimento, o desenvolvimento, a aprendiza-

gem e o rendimento escolar dos estudantes, bem como pro-

mover a formação de hábitos alimentares saudáveis”.

É nesse último quesito, dos hábitos alimentares para a

boa saúde, que hortaliças costumam figurar nas receitas da

merenda escolar.

Se parecem, a princípio, pouco atraentes ao apetite

dos alunos, ganham textura, cor, forma e até sabor mais in-

teressantes nas estrofes da música do Palavra Cantada. Seria

possível utilizá-la para vencer a resistência das crianças a

ingredientes saudáveis, que cantados parecem muito melhor

do que ingeridos?

A professora Eliane entendeu que sim. E tinha razão,

embora o início não tenha sido fácil. Um de seus alunos, ao

provar pela primeira vez um rabanete, disparou que ele era

“ardido como a água do mar”.

Colocando a mão na massaDesde seu início, o projeto incorporou uma série de ati-

vidades lúdicas associadas à letra, que bem poderia ser cha-

mada de receita, da música Sopa do neném.

Eliane e seus alunos fizeram cartazes com os nomes

dos ingredientes, criaram o hábito de passear pela horta do

colégio e produziram réplicas dos vegetais com massinha de

modelar. Também foi fundamental a participação dos pais no

processo, que, aos poucos, incorporaram os ingredientes aos

pratos que cozinhavam para os filhos em casa.

“Primeiro, eles degustaram todos os ingredientes da

sopa, para tomar gosto, querer experimentar”, contou a pro-

fessora à Nestlé.Bio. “O tomate eles já comiam na merenda

da escola, o feijão a mesma coisa. Depois fui mostrando para

eles alguns ingredientes que eles nem conheciam, como a

berinjela e o agrião.”

sandra Peres e Paulo Tatit, do grupo

Palavra cantada, criadores da música

que embala o projeto concebido pela

professora eliane Leandro Nogueira.

resultado 43

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Da música para o fogãoEmbora a escolha dos ingredientes e sua ordem tenham

sido concebidos pelo Palavra Cantada para um melhor desem-

penho sonoro e da composição musical, a letra também se

presta para cozinhar uma sopa bastante nutritiva. Com o aval

de uma nutricionista, a lista de ingredientes da sopa musical

não demorou a ser aprovada para a merenda escolar. “A diretora

aprovou o cardápio”, lembra Eliane. “É mesmo uma delícia!”

Com maior ou menor entusiasmo, alunos se acostuma-

ram a comer uma diversidade de verduras, frutas e legumes

da música. E, além de disso, estreitaram a convivência com

esses novos conhecidos por meio de outras disciplinas do

currículo escolar.

Se português serviu para aprender a escrever os nomes

dos ingredientes, matemática se prestou a contar, calcular e

pesar as receitas. Já na aula de artes, usaram massinha de

modelar para construir réplicas dos itens da sopa, aprender

noções de cor, forma e proporção. “Eles ficaram encantados

com a cor, com a textura da berinjela e a mudança dela quan-

do a gente corta”, lembra a professora.

Como nem o clima nem a época do ano eram adequados

para cultivar todos os ingredientes que compõem a letra da

música, apenas alguns deles cresceram na terra plantada pe-

los alunos. O restante foi comprado em feiras livres da cidade.

Um a um, tomate, espinafre, berinjela, alho-poró e suas

companheiras hortaliças passaram de mão em mão, em ro-

das de discussão. Alunos apalparam, cheiraram, tocaram,

cortaram e experimentaram, enquanto conversavam sobre a

importância de cada um deles.

Ao longo do trabalho, Eliane Nogueira se deparou com

uma surpreendente constatação: o prestígio do agrião entre

as crianças. Segundo a professora, foi o campeão da sopa,

e requisitado até mesmo em casa, fora da merenda e longe

da escola. “Na feira, eles falam para as mães: ‘Compra (sic)

agrião’”, lembra Eliane. E reforça: “É bem isso, a ideia é levar a

criança a querer experimentar. Experimentando, ela pode gos-

tar. E, se gostar, pode pedir aos pais.”

Um a um, tomate, espinafre, berinjela, alho-poró e suas companheiras hortaliças

44 resultado

passaram de mão em mão, em rodas de discussão.

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Brincar é coisa sériaO projeto “Sopa de neném” foi merecidamente reconhe-

cido com um dos prêmios Educador Santista de 2010. Sua

essência toca em um dos pontos centrais ligados à promoção

da saúde na infância: o papel da escola na formação da esco-

lha alimentar.

Uma questão que ganha contornos ainda mais relevan-

tes quando levado em conta o estágio de transição nutricio-

nal pelo qual passa o Brasil — em que um aumento na pre-

valência da obesidade coexiste com a queda da desnutrição.

A iniciativa da professora Eliane Nogueira encontra

substrato em diferentes estudos da literatura. Como, por

exemplo, o trabalho publicado por um grupo de pesquisadores

do Departamento de Nutrição da Faculdade de Saúde Pública

da Universidade de São Paulo, em 2006 [1]. Nele, buscou-se

identificar a preferência dos alunos pelos alimentos comer-

cializados na cantina ou distribuídos pelo PNAE.

Dos 384 estudantes que cursavam as 7as e 8as séries

de uma escola pública, 81,51% compravam alimentos da

cantina: doces (74,14%), salgados (54,17%), salgadinhos

(28,39%) e refrigerantes (22,14%). Entre os principais mo-

tivos citados para não consumirem a merenda escolar esta-

vam a falta de vontade ou ausência de fome (22,4%) e o fato

de não gostarem dela (15,63%).

Ao discutirem seus achados, os autores chamam a

atenção para as consequências danosas em termos do ren-

dimento escolar dos alunos. E apontam para a necessidade

premente de que profissionais capacitados incentivem o con-

sumo de uma merenda nutricionalmente balanceada.

No livro Reflexões sobre o brinquedo, a criança e a edu-

cação [2], o filósofo e sociólogo Walter Benjamin associa o

ato de brincar à produção de subjetividades, fundamental

para a construção de um espaço de criação e, também, para

o processo de transmissão educacional.

Na horta, na sala de aula e na cozinha da Escola Mu-

nicipal General Clóvis Bandeira Brasil, pitadas de nutrição,

pedagogia e filosofia temperam um bem-sucedido processo

integrado de educação alimentar no qual a brincadeira e a di-

versão falam mais alto do que a coerção.

[1] Ochsenhofer, K., Quintella, L.C.M; Silva, E.C., et al. O papel da escola na formação da escolha alimentar: merenda escolar ou cantina? Nutrire Rev. Soc. Bras. Aliment. Nutr;31(1):1-16, 2006. [2] Walter Benjamin. In: Reflexões sobre o brinquedo, a criança e a educação. Ed. 34, 2009.

referêNciAs

Assista ao embalo de crianças e adultos com a música do Palavra Cantada

www.nestle.com.br/nestlenutrisaude/NestleBio.aspx

resultado 45

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leitura crítica

Está bem documentado na literatura que o excesso de peso e a obesidade representam importante problema de Saúde Pública no Bra-sil e no mundo. Além de estarem diretamente associados a doenças crônicas não transmis-síveis (DCNT), como hipertensão, dislipidemia, síndrome de resistência à insulina e diabetes, sua incidência vem aumentando, ano após ano, entre adultos e crianças.

Não é de estranhar, portanto, o número também crescente de pesquisas que buscam desvendar seus mecanismos etiológicos e fi-siopatológicos e, também, estratégias efetivas de prevenção.

Por mais de uma década, evidências científicas indicaram que mulheres que ad-quirem peso excessivo durante a gestação tendem a gerar filhos mais pesados e com maior risco de se tornarem pessoas obesas ao longo da vida (1). Até recentemente, contudo, não existiam evidências de que esta propensão resulta do ganho de peso em si e não de outros fatores como o genético e condições ambien-tais compartilhadas entre a criança e sua mãe.

ganharam mais de 24 kg tiveram cerca de duas vezes mais chance de apresentar peso maior que 4 kg ao nascer.

A conclusão dos pesquisadores foi de que o ganho de peso durante a gestação aumenta o peso da criança ao nascer, independentemente de fatores genéticos. Tendo em vista a aparente associação entre peso ao nascer e peso na vida adulta, além de que o excesso de peso ao nas-cer aumenta o risco de DCNT na vida adulta, o estudo ressalta a importância do empenho em se manter uma condição saudável antes mes-mo do nascimento.

Nesse sentido, a saúde da criança parece depender de maneira crítica da orientação e do acompanhamento nutricional da mãe durante a fase pré-natal; de sorte que ela mantenha os ganhos de peso sugeridos por protocolos ado-tados internacionalmente. Segundo eles, as gestantes devem adquirir de 12,7 a 18,1 Kg, se engravidam com baixo peso; de 11,3 a 15,8 Kg, se forem eutróficas; de 6,8 a 11,3 Kg, se apre-sentarem excesso de peso; e de 4,9 a 9,1 Kg se estiverem obesas (3).

Se por um lado esse estudo não diminui o peso do impacto da herança genética como fator etiológico do excesso de peso e da obe-sidade, por outro reforça como a aderência de gestantes a uma adequada orientação nutricio-nal pode contribuir de modo singular para a sua saúde e a do seu filho. Não apenas ao nasci-mento, como também na vida adulta.

(1) Martorell R, Stein A, Schroeder D. Early Nutrition and Later Adiposity. J Nutr. 2001;131:874S-80S. (2) Ludwig DS, Currie J. The association between pregnancy weight gain and birthweight: a within-family comparison. Lancet. 2010:376(9745):984-90. (3) Institute of Medicine of the National Academies. Weight Gain During Pregnancy: Reexamining the Guidelines.Washington, DC: National Academies Press; 2009.

Helen c. Laura é Mestre em epidemiologia, responsável pelo sistema de Vigilância Nutricional comunitário, sistema Nacional de informação em saúde, Ministério de saúde e esporte-Bolívia e Membro do international epidemiology Association.

Com o apoio do US National Institutes of Health, um grupo de pesquisadores do Children’s Hospital Boston (EUA) conduziu um estudo de coorte no qual foram examinados os prontuários de mais de um milhão de nasci-mentos nos hospitais das cidades de Michigan e New Jersey, entre os anos de 1989 e 2003.

No estudo publicado em setembro, no Lancet, o grupo identificou mulheres que conceberam dois ou mais filhos, possibilitan-do a comparação entre gestações da mesma mãe (2). Foram excluídas da amostra crian-ças pré-termo e pós-termo, assim como aque-las nascidas com menos de 500 g ou mais de 7 kg. As mães com diabetes e cujos prontuá-rios apresentavam ausência de informação também foram excluídas do grupo amostral.

A análise apontou associação consis-tente entre ganho de peso na gestação e peso ao nascer. Crianças cujas mães acumularam mais de 24 kg durante a gravidez nasceram com aproximadamente 149 g a mais do que as crianças geradas por mães que adquiriram de 8 a 10 kg. Além disso, os filhos de mulheres que

ganho de peso na gestação como fator de risco isolado para excesso de peso e obesidade do recém-nascido na vida adulta

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Marcia regina Vitolo é Professora-Adjunta do Departamento de Nutrição da Universidade federal de ciências da saúde de Porto Alegre (UfcsPA). coordenadora do Núcleo de Pesquisa em Nutrição (NUPeN) da UfcsPA.fenanda rauber é Doutoranda do Programa de Pósgraduação em ciências da saúde da UfcsPA.

A etiologia da asma é fundamentada em controvérsias, provavelmente por ter causas multifatoriais que incluem fatores genéticos, ambientais e alimentares. A maioria dos estu-dos que buscam esclarecer os determinantes dessa doença crônica é transversal e, portanto, de baixo valor de evidência. Estudos longitudi-nais que incluem os hábitos alimentares e os fatores de risco desde o início da vida, inclusive durante a gestação, são os mais indicados para esclarecer os mecanismos que estão envolvi-dos no desenvolvimento da asma.

O estudo1 de revisão publicado recen-temente no Journal of the American Dietetic Association ressalta os aspectos dietéticos relacionados com a prevenção e o tratamento da asma, principalmente no período gestacio-nal e nos primeiros anos de vida. Foram utili-zados artigos publicados durante o período de 1950 a 2009 relacionados com os sintomas de asma, os parâmetros fisiológicos e os diversos termos dietéticos, focando os antioxidantes, os ácidos graxos poli-insaturados (PUFAS) e

leitura crítica 47

[1] Keith, A. Graham, D. (2011). Diet and Asthma: Nutrition Implications from Prevention to Treatment. Am Diet Assoc 111(2):258-268.[2] Strassburger, S.Z. Vitolo, M.R. Bortolini, G.A. Pitrez, P.M. Jones M.H. Stein R.T. (2010). Erro alimentar nos primeiros meses de vida e sua associação com asma e atopia em pré-escolares. J Pediatr 86(5):391-399.

Dieta e asma: implicações nutricionais, da prevenção ao tratamento

a vitamina D. O estudo relata os achados rela-cionados com as possíveis causas do aumento da prevalência de asma. Tanto a redução como o aumento do consumo de antioxidantes pela população, a ingestão de ácidos graxos poli-in-saturados (redução do consumo de w3 e o au-mento do consumo de w6), a suplementação precoce e/ou a deficiência de vitamina D foram associados com o aumento da prevalência de asma. Contudo, os resultados dos estudos são contraditórios e apresentam diferentes viéses. Assim, não há evidências conclusivas de que o consumo desses nutrientes esteja associado ao aumento da prevalência e/ou severidade da asma na população mundial.

A segunda parte do artigo aborda a in-fluência da alimentação nos primeiros anos de vida na etiologia da asma. Os estudos que relacionaram a ingestão materna de antioxi-dantes, como selênio e zinco, e de ácidos gra-xos poli-insaturados, como w3 e w6, durante a gestação mostraram resultados contraditórios em relação ao desenvolvimento de asma em

crianças. Já os resultados referentes à vita-mina D e a asma possuem baixas evidências, considerando-se que nenhum dos estudos me-diu os níveis corporais da vitamina, mas ape-nas a ingestão dietética. Apesar de o estudo concluir que existe associação entre a alimen-tação e o desenvolvimento de asma, há outros fatores que devem ser tomados em conta para responder à proposta inicial do estudo.

Pesquisa longitudinal, recentemente pu-blicada no Jornal de Pediatria2, mostrou que a introdução precoce do leite de vaca foi impor-tante fator de risco para o desencadeamento de sintomas da asma aos 4 anos de idade. Além disso, o aleitamento materno por período su-perior a 6 meses também foi associado com a proteção contra o desenvolvimento de atopia. Assim, observou-se potencial de ingerência para diminuir o impacto da asma por meio de intervenções dietéticas no primeiro ano de vida. Ressalta-se, ainda, a história familiar como um fator de risco para o desenvolvimento da asma que deve ser considerado.

O estudo1, alvo dessa leitura crítica , ape-sar de intensa revisão, não apresenta poder de evidência, pois não constitui uma revisão sis-temática de fato. Entretanto, a compilação de vários estudos remete o leitor à enorme com-plexidade do tema e às lacunas existentes para o desenvolvimento de estudos futuros na área.

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