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o cinema dos roteiristas

o cinema dos roteiristas · No mesmo ano, Scarface – a vergonha de uma nação, com Paul Muni, direção de Howard Hawks. Em 1935, juntamente com o roteirista Charles

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o cinemados roteiristas

Roteiristas de cinema*Álvaro de Moya

Existem muitos livros sobre diretores. Mas não existe um livrosequer sobre roteiristas de cinema. Alguns grandes roteiristascomo John Howard Lawson, Dalton Trumbo, Cesare Zavattini eoutros escreveram sobre o texto cinematográfico. Porém, umaobra sobre os melhores, nenhuma.Há também a bíblia dos roteiristas brasileiros, o livreco de SydField – que jamais fez um roteiro de cinema – que ensina todosos chavões, clichês e lugares comuns dos filmes de Hollywood.Inclusive uma norma absurda, a reviravolta, jamais vista emclássico algum. Um completo equívoco. Tem gente por aqui queleva a sério...Os roteiristas de cinema e TV, neste ano [2001], ameaçaram umagreve geral caso o nome deles continuasse em plano inferior,exigindo o mesmo tratamento dado aos diretores. Conseguiram. Oroteirista Ernest Lehman foi homenageado, simbolizando osgrandes escritores norte-americanos, na festa da Academia, ele

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que roteirizou Intriga internacional, Amor sublime amor, Aembriaguez do sucesso, entre outros filmes importantes.Certos críticos de cinema também não ajudam. Só destacam osdiretores. Como se eles tivessem total liberdade de filmar ahistória que quisessem! É sabido que Michael Curtiz, numasexta-feira, recebia um comunicado interno dos chefões doestúdio para largar o filme que estava terminando e deveriarodar, a partir de segunda, outro filme. Nem lia os scripts!Muitos críticos – tal como Umberto Eco – não sabem separar oque é de interesse da produtora – e se ela é norte-americana,

Ernest Lehman e Alfred Hitchcock

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domina o mundo –, tampouco sabem o que é um argumento(escaleta), roteiro, diálogos, produção, direção, fotografia,bilheteria, marketing, promoção, divulgação, concessão ao gostopopular, efeitos especiais, interferência de Wall Street, dosbancos e picaretagem internacional.Por isso, embarcam em enganações, tipo Spielberg e GeorgeLucas. É preciso ver os clássicos da Sétima Arte que perduram ecomparar com filmes que, à sua época, impressionaram e hojeenvelheceram, ficaram datados e servem apenas para retrataros interesses de uma época. Há uma diferença fundamentalentre filme acadêmico e clássico.O mercado, os grandes estúdios, os produtores independentes,os astros da hora, os bancos, Wall Street, a Bolsa, o Oscar, ojudaísmo, o patriotismo, a guerra do momento, tudo isso é quedetermina uma realização.Por tentarem enganar os produtores e inserir qualidade nostextos, os roteiristas foram os mais perseguidos nomacarthismo. A maioria dos presos e figurantes na famosa listanegra era de escritores.Hollywood sabe daimportância do screenplay.Alguns dos melhoresroteiristas foram guindadosa diretores: Billy Wilder,John Huston, Joseph L.Mankiewicz, Robert Rossen,Richard Brooks, DanielTaradash, LawrenceKasdan...Roteiristas tiveram uma ououtra incursão na direção,como Ben Hecht e DaltonTrumbo, mas eram econtinuaram escritores.Ben Hecht foi um dos Dalton Trumbo

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maiores, senão o maior de todos. Jornalista de Chicago, na caçaàs bruxas, recebeu uma cotação do FBI de cinco estrelas Stalin,tal como Chaplin. Este foi expulso para a Inglaterra. Mas osprodutores não podiam prescindir de Hecht. Sua folha de serviçoinclui o primeiro Oscar de 1927/28, com o roteiro original dePaixão de Sangue, um dos primeiros filmes sobre gangsters,dirigido por Joseph Von Sternberg. Em 1931, um original seu,diversas vezes refilmado: A primeira página. No mesmo ano,Scarface – a vergonha de uma nação, com Paul Muni, direçãode Howard Hawks. Em 1935, juntamente com o roteirista CharlesMacArthur, ganhou o Oscar de história original com Thescoundrel (não exibido no Brasil), dirigido pelos dois. Depois, em1939, faria o belíssimo roteiro de O morro dos ventos uivantes,de William Wyler. Colaborou em diversas produções nãocreditadas, como E O vento levou. Este roteiro, assinado por

Ben Hecht

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Sidney Howard, ganhou o Oscar de 1939. O dramaturgo JohnVan Druten e o escritor F. Scott Fitzgerald também colaboraram,sem que seus nomes constassem dos letreiros.Garson Kanin, dramaturgo, verteu para o cinema sua peçaNascida ontem (1950), que revelou Judy Holiday. Outro autorteatral, George Axelrod, teve obras vertidas para a tela,especialmente O pecado mora ao lado (1955), com MarilynMonroe, e Em busca de um homem (1957), com JayneMansfield. Neste filme, um editor popular de pocket books decidepublicar o clássico da literatura americana A letra escarlate, deNathanael Hawthorne, e prefere mudar o título para A adúltera. Oassessor, Tony Randall, revela que uma pesquisa demonstrouuma grande percentagem de norte-americanos que não sabia oque isso queria dizer. O editor desiste de publicar a obra...O escritor de ficção científica Ray Bradbury fez o roteiro do

William Faulkner

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clássico Moby Dick (1956) para John Huston. Mas OrsonWelles escreveu o sermão que interpretou, calcado no textooriginal de Herman Melville. John Steinbeck, Nobel deliteratura, escreveu Um barco e nove destinos, de Hitchcock, ea versão de sua novela O pônei vermelho. F. Scott Fitzgeraldnão deu certo na Meca do Cinema como roteirista, mas seusromances sempre foram bem, como O grande Gatsby e Suaveé a noite. William Faulkner se adaptou melhor como yes manem Hollywood, inclusive em Do destino ninguém foge, de1955, e em À beira do abismo (1946), de Howard Hawks, doromance policial de Raymond Chandler. Lillian Hellman eDashiell Hammett conseguiram manter seu nível literário epolítico nas produções em que participaram. Wladimir Nabokovtambém acertou, mas sem se meter em política. Gore Vidalcomeçou como roteirista de TV adaptando Smoke Barn, deWilliam Faulkner, e depois participou de diversos filmes comoBen-Hur (1959) e Calígula. Este foi o único filme a ter o nomedo escritor, até então (tal como Fellini em seus filmes), notítulo: Gore Vidal’s Caligula. Outros escritores, como NormanMailer, John Le Carré, Booth Tarkington, Upton Sinclair e IrwinShaw (Guerra e Paz, 1956), também trabalharam no cinema.O autor de Mas não se mata cavalos?, Horace McCoy, assinouo roteiro de Paixão de bravo, em 1952.Os dramaturgos Robert E. Sherwood (O libertador, 1939),Maxwell Anderson (A Floresta petrificada, 1936), William Inge,Robert Bolt, Arthur Miller (Os desajustados, 1961), ChristopherIsherwood, Clifford Odets (Conflito de duas almas, 1939, eApenas um coração soIitário, 1944; sua peça The big knife foidirigida em 1955 por Robert Aldrich, com roteiro de JamesPoe: A grande chantagem), Eugene O’Neill, Sam Shepard,Bertolt Brecht, todos colaboraram em scripts para Hollywoodnos bons tempos.Os autores de teleteatros clássicos ao vivo nos anos 1950,início da TV de Nova York, não fizeram feio, pelo contrário, aopartir para a telona. Paddy Chayefsky, ao verter sua telepeçaMarty (1955), ganhou o Oscar e, pela primeira vez, um filme

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americano venceu a Palma de Ouro em Cannes, na França,quebrando a hegemonia dos europeus. Depois escreveuoutros filmes premiados como Hospital, Oscar de 1971, eRede de intrigas, Oscar de 1976. Rod Serling verteu para ocinema sua peça de TV Réquiem para um lutador (1962).Adaptou o livro de Pierre Boule, o primeiro e único Planeta dosmacacos (1967). E, entre outros trabalhos, destaca-se a sériepara a telinha, depois filmes de episódios, Além daimaginação. Horton Foote, também oriundo da TV ao vivo,ganhou o Oscar em 1962, com O sol é para todos e, em 1983,com A força do carinho. Reginald Rose adaptou paraHollywood sua peça televisiva Doze homens e uma sentença(1957), estréia de Sidney Lumet na direção. J. P. Millertambém veio da TV.Dos quadrinhos, o assistente do Will Eisner, Jules Feiffer,escreveu Ânsia de Amar e Pequenos Assassinatos – ambosem 1971 – e Popeye, em 1980. Frank Miller, que revolucionouos comics com a versão Batman, o cavaleiro das trevas,influenciou o visual da série dohomem morcego nas telonas,mas foi menos feliz no veículocinema, roteirizando Robocop2, 3, etc.Charles Brackett era o parceirode Billy Wilder em 1945,quando ganhou o Oscar comFarrapo humano. E, em 1950,com Crepúsculo dos deuses.Sozinho, em 1953, levou aestatueta de roteiro comNáufragos do Titanic e, depois,um Oscar especial. Foi co-autor de Onze homens e umsegredo, primeira versão. BillyWilder, desde então, uniu-se Charles Brackett e Billy Wilder

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ao romeno ltak Domminici que usa o pseudônimo de I. A. L.Diamond e ganharam o Oscar com Se meu apartamento falasse,em 1960. Ele já tinha escrito sozinho Loucos de amor, um dosprimeiros filmes de Marilyn Monroe. Depois, se juntaram nacomédia clássica Quanto mais quente melhor, de 1959. O filmetermina com uma das mais famosas frases do cinema: “Ninguémé perfeito”.D. M. Marshman Jr. tinha ganhado o Oscar em 1950, como co-autor de Crepúsculo dos Deuses, usando seu conhecimento deex-jornalista. As grandes tiradas cínicas de William Holden sãodele. Ele e Daniel Fuchs tinham escrito o roteiro de umapequena obra-prima: O gângster (1947), última incursão nadireção de Gordon Wiles, diretor de arte premiado com o Oscarem Náufragos do Titanic (também fizera a direção de arte deVidocq e O retrato de Dorian Gray). Um dos primeiros filmes arelacionar gangsterismo com capitalismo. Daniel Fuchs ganhou oOscar em 1955 com Ama-me ou esquece-me.Já Budd Schulberg relacionou sindicalismo e gangsterismo emSindicato de ladrões, de Elia Kazan, Oscar de 1954. Esta obrafoi criticada, inclusive por Arthur Miller, por endeusar a delaçãonos tempos do macarthismo. Schulberg tinha escrito umromance contra os produtores de Hollywood: O que faz Sammycorrer?Hal Smith, juntamente com Nathan E. Douglas, ganhou o prêmioda Academia em 1958, com Acorrentados. Antes, escrevera, comKenneth Gamet, um pequeno grande filme: A Centelha, em 1948.Um trio no western: dois homens e uma mulher. E um cavalo,todos perdidos no deserto.Talvez o roteiro cinematográfico mais perfeito da história docinema seja de Art Cohn em Punhos de Campeão (1949), daRKO, inspirado num poema de Joseph Moncure Marsh. O tempode projeção da película, de 72 minutos, é igual ao tempo da açãodessa obra máxima sobre o boxe. Quando exibida na TV, éinterrompida pelos comerciais, e tudo se perde. Mas, além detodas as qualidades da produção, é uma eloqüente análise daviolência entre os homens. Seu final triste foi vaiado pelo

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público na noite de estréia no Cine Bandeirantes, no Largo doPaissandu, em São Paulo. Art Cohn morreu num desastre deavião, junto com o produtor Michael Todd, sobre o qual escreviauma biografia. Deve ter tido uma participação não creditada em Avolta ao mundo em 80 dias, Oscar de 1956.Cidadão Kane foi injustiçado no Oscar de 1941. Ouviram-sealguns “buuus” quando o filme foi anunciado como indicado paramelhor filme, fotografia, música, ator, diretor etc. Só levou omelhor roteiro original, de Welles e Herman Mankiewicz (irmãode Joseph L. Mankiewicz). Orson jamais foi buscar essaestatueta. O jornalista Paulo Duarte, de O Estado de S. Paulo,viu-a como peso para manter uma porta aberta da Cinematecade Nova York.Uma mulher roteirista, Francis Marion, levou dois Oscars emseguida, em 1929/30 e 1931/32, respectivamente com Opresídio e O campeão, do mestre King Vidor (devidamentemassacrado por Franco Zefirelli em 1979). Marion Parsonnetproduziu um roteiro brilhante para Gilda (1946). Segundo oestudioso francês Georges Sadoul, esse sucesso de bilheteriade Charles Vidor teria dupla leitura. O vilão George McReady éapaixonado pelo mocinho Glenn Ford e joga sua esposa RitaHayworth nos braços dele. O dono do cassino introduz seunovo assistente nos aposentos particulares e luxuosos epergunta para Gilda: “Are you decent?”Frances Goodrich sempre trabalhou com seu marido, AlbertHackett. Vindos da Broadway, escreveram brilhantementediversos musicais, entre eles, talvez, o melhor de todos: O pirata(1948). Já Cantando na chuva (1952) foi roteirizado por BettyComden e Adolph Green. Joan Harrison, além de produtora dosprimeiros filmes americanos de Hitch, como Rebeca (1940),colaborou em seus roteiros.Sonya Levien co-adaptou O corcunda de Notre Dame (1939), deWilliam Dieterle, com Charles Laughton. E ganhou o Oscar de1955 com Melodia interrompida. Eleanore Griffin escreveuImitação da vida, de 1959. As escritoras Anita Loos e Booth

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Tarkington colaboraram em vários de seus livros adaptados parao écran, assim como Claudine West.Edmund H. North fez o roteiro da ficção científica O dia em que aTerra parou (1951), drama pacifista de antevisão de avançostecnológicos, alguns até hoje sem descoberta, como a cura docâncer e a ressurreição. Eugene Solow adaptou para o cinema,em 1939, a primeira versão de Ratos e homens, de JohnSteinbeck – e Horton Foote fez a honesta versão da mesma obraem 1992, dirigida por Gary Senise. John Twist escreveu diversosroteiros brilhantes, mesclando aventura e comédia, comoSinbad, o marujo, de 1946.Daniel Taradash, que tinha ganhado o Oscar de 1953 com Aum passo da eternidade, desafiou a caça às bruxasescrevendo O despertar da tormenta, no qual Bette Davis fazuma bibliotecária que enfrenta a censura tentando banir livrossubversivos de sua biblioteca. Em 1954, Philip Yordan levou aestatueta em A lança partida. O excelente James Poecolaborou em A volta ao mundo em 80 dias, Oscar 1956. E fezos roteiros de dois grandes filmes de Robert Aldrich: A grandechantagem (1955), e Morte sem glória, adaptado da peçateatral Fragile fox, ambos com Jack Palance. O Pentágonorejeitou colaborar com esta obra antibélica.Carl Foreman escreveu Matar ou morrer em 1952, sabendo queia para a lista negra. Então colaborou no roteiro de A ponte doRio Kwai tendo seu nome cortado dos créditos. Lamar Trottilevou o Oscar de 1944 com Wilson. Abby Mann escreveu Ojulgamento de Nuremberg, Oscar em 1961. Steve Tesich, em1979, escreveu – e levou para casa a estatueta – o delicado epolítico O vencedor.A Academia fez jus ao premiar Mark Peploe, em 1977, com Oúltimo imperador. Ele voltaria a brilhar em Os imperdoáveis, deClint Eastwood, desmistificando o western. Também acabou como mito do herói americano tipo Frank Capra, em Herói poracidente (1992), interpretado por Dustin Hoffman.Richard Matheson é um injustiçado. Escreveu, em 1971,

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Encurralado, estréia de Steven Spielberg no cinema. Criou oterror em A casa da noite eterna e seu romance Em algum lugardo passado estourou nas bilheterias. Em geral, seus roteirossuperam a direção. Já escritores de renome em sua épocasumiram e perderam o prestígio, mesmo tendo escrito para JohnFord, como Philip Dunne, James Agee, Sidney Bohem, NunnalyJohnson, Dudley Nichols e outros.Calder Willingham adaptou para Stanley Kubrick Glória feita desangue e, para a bela e única direção de MarIon Brando, owestern original A face oculta.Os escritores da “fábrica dos sonhos” sempre foramdiscriminados. No restaurante dos estúdios da Metro ficavamisolados, sugestivamente à esquerda. Durante a Guerra Fria,diversos roteiristas foram presos ou para lista negra. MichaelWilson morava na casa do autor de A ponte do Rio Kwai, seuamigo Pierre Boule, e colaborou sem ter crédito. Em 1951,Wilson vencera o Oscar com Um lugar ao sol, baseado no livroUma tragédia americana, de Theodore Dreiser. Em 1956, seunome foi cortado dos letreiros de Sublime tentação. Em 1963, nalista negra, escreveu um filme marginal produzido pelos mineirosdo Novo México, Sal da Terra. Foi dirigido por outro banido,Herbert Biberman, cuja esposa, a atriz Gale Sondergaard, nãoencontrava trabalho.Ring Lardner Jr., filho do grande escritor Ring Lardner, sóconseguiu assinar em 1970, ganhando o Oscar com MASH.Dalton Trumbo conseguira, apelando para a Corte Suprema,restaurar seu nome em Hollywood. Tinha ganhado o Oscarusando o testa-de-ferro Ian McLellan Hunter no filme A princesae o plebeu, em 1953. Ganhou outro Oscar com Arenassangrentas com o falso nome de Robert Rich. No ano de 1961,Dama por um dia. Em 1965, Adeus às ilusões. Trumbo tinha umromance: Johnny got his gun. Convidou Buñuel para dirigir aversão fílmica, mas o espanhol não pôde. Então Dalton mesmorealizou Johnny vai à guerra. Sua lista de filmes importantes éimensa. Escreveu Kitty Foyle para Sam Wood, em 1940.

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Em 1950, O cúmplice das sombras, para Joseph Losey. Em1960, diversos filmes: Exodus, de Otto Preminger, Spartacus, deStanley Kubrick, e Sua última façanha, de David Miller. Em 1965,Havaí, de George Roy Hill, e em 1968, O homem de Kiev, deJohn Frankenheimer. Quando Trumbo estava atrás das grades,encontrou J.Parnell Thomas, o inquisidor de Hollywood,condenado por se apropriar de verbas do senado. Este era opatriota que julgava os antiamericanos.Waldo Salt voltou do olvido com Perdidos na noite, ganhando oOscar em 1969. Em 1978, de novo vencedor com Amargoregresso. Stanley Shapiro ganhou o Oscar em 1959 comConfidências à meia-noite e roteirizou Anáguas a bordo (1959).Quando a Associação dos Roteiristas fez uma cerimônia parahomenagear os perseguidos de então, Shapiro estava Iá. E, nodia seguinte, morreu num acidente de carro.Os escritores que tiveram problemas, entre outros, foram

Ring Lardner Jr. acende o cigarro de seuadvogado, durante depoimento ao Comitêde Atividades Antiamericanas, emWashington (1947).

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Dashiell Hammett e Lillian Hellman, sua companheira, Hal Smith,Alvah Bessie, Albert Maltz (Alma torturada, de Frank Tuttle,1942; Rumo a Tóquio, de Delmer Daves, 1943; O grandesegredo, de Fritz Lang, 1946; e Cidade nua, de Jules Dassin,1948), Samuel Ornitz, Lester Cole e John Howard Lawson(Bloqueio, de William Dieterle). O caso curioso é de HowardKoch, que roteirizara A guerra dos mundos, o famoso programade rádio de Orson Welles. Tinha escrito Casablanca (com afamosa frase: “play it, Sam”) e Carta de uma desconhecida,adaptado de Stefan Zweig. Ia para Nova York trabalhar numroteiro quando o chefão do estúdio, Jack L. Warner, encomendoua ele um filme de boa vizinhança sobre o heroísmo dos parceirosna luta contra o nazismo, o Exército soviético. Koch objetou quenão teria tempo. O chefão contratou uma secretária para eleditar o roteiro no trem Los Angeles-Nova York. O roteiristaacabou se casando com a secretária. Na caça às bruxas, Jack L.Warner denunciou Howard Koch por ter feito um filmeglorificando os comunistas. Muy patrão!Recentemente, levantou-se a hipótese de haver um ranço deanti-semitismo, pois a maioria dos perseguidos era de judeus.Esse período da lnquisição passou. Agora, nem é maisnecessário usar forças externas. Wall Street domina a indústriado entretenimento e quer ver apenas lucros e o Oscar é usadonão mais para premiar grandes filmes, diretores ou roteiristas esim para auferir mais lucros. Hollywood da Fábrica dos Sonhosvirou fabriquinha de imprimir dólares.A primeira fita européia a ganhar um Oscar na categoriaroteiro original foi suíça, revelando o escritor RichardSchweizer: Maria Luiza.A ltália tem alguns dos melhores roteiristas do mundo. CesareZavattini é um deles. Mestre do neo-realismo, junto com o diretorVittorio De Sica desde Vítimas da tormenta (Oscar 1947),passando por Ladrões de bicicleta (Oscar 1949), continuandocom Milagre em Milão (1950), O teto (1955), Umberto D, Duasmulheres (Oscar de 1961 para Sophia Loren), até O jardim dos

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Vittorio De Sica e Cesare Zavattini

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Finzi Contini, que levou o Oscar de 1971. Também roteirizouQuando a mulher erra e Ontem hoje e amanhã.Com outros diretores, escreveu O coração manda (1942), deBlasetti; Trágica perseguição (1947), de De Santis; É primavera(1949), de Castellani; Três dias de amor (1949), de RenéClément; O capote, versão do conto de Nicolai Gogol, paraLattuada, em 1952; e Adeus às armas, versão de Hemingwaypara Charles Vidor, em 1958. Zavattini teve participaçãoimportante na era de ouro do cinema italiano.No mesmo nível, Sergio Amidei: do início do neo-realismo até omoderno Casanova e a revolução. Foi um dos roteiristas deRoma, cidade aberta, de 1945, e colaborou em diversos filmesimportantes desse período. Ontem, hoje e amanhã abiscoitou oOscar de 1964 como melhor filme estrangeiro. Tambémcolaborou em Vítimas da tormenta, de De Sica, Paisà, deRossellini em 1946 e, com o mesmo diretor, Die Angst (1954) eEra noite em Roma (1961).Um grupo de roteiristas italianos conseguiu furar a barreiraprotecionista do Oscar, saindo do gueto.

Sergio Amidei

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Grandes escritores como Alberto Moravia, Mario Soldati,Mario Camerini, Tulio Pinelli e Ennio Flaianno (A trapaça),Franco Solinas (Queimada, com Marlon Brando), Ugo Pirri(Investigação sobre um cidadão acima de qualquer suspeita),Patroni-Griffi, Massimo Mida e Furio Scarpelli assinaramobras no cinema da ltália. Luciano Vincenzoni é autor dediálogos brilhantes.E a maior roteirista do mundo é Suso Cecchi D’Amico, quetrabalhava com Luchino Visconti. Todos esses e outros fazemdo soggetto e da sceneggiatura uma base internacional docinema autoral.

Suso Cecchi D’Amico

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A França, tal coma a ltália, tem grandes roteiristas e escritores. Opoeta Jean Cocteau realizou A bela e a fera, em 1946. Osescritores Marcel Aymé, Jacques Companeez, Sacha Guitry, AndréMalraux, Marcel Pagnol, todos beneficiados com o apoio que aFrança dá a seus intelectuais, puderam escrever e dirigir filmes.Até Pablo Picasso trabalhou em roteiros de filmes. E Salvador Dalicolaborou no primeiro filme de Buñuel: Um cão andaluz.Marc Allégret foi roteirista até virar diretor para lançar BrigitteBardot. Jean Aurenche, dos mais prolíficos escritores da França,roteirizou Sinfonia pastoral para Jean Dellanoy. Em 1936 escreveuO demônio da Algéria para Julien Duvivier. No ano seguinte, Umcarnet de baile para o mesmo diretor. Em 1938, Hotel do Norte,para Marcel Carné; Fan-Fan La Tulipe, em 1952, para Christian-Jacque; e O mordomo, para Delannoy em 1964. Em 1965, paraClément, Paris está em chamas? Para Clément tinha escritoGervaise, a flor do lodo, de Emile Zola. A parceria com Pierre Bostcomeçou em 1942, com Lettres d’Amour; em 1946, escreveram oclássico Sinfonia pastoral e trabalharam para o prestigiado diretorClaude Autant-Lara em Adúltera (1947) e em O vermelho e onegro, o clássico romance moderno de Stendhal. Em 1950 Deusnecessita de homens e, em 1952, outro grande filme, Brinquedoproibido. Em 1956 A travessia de Paris. E escreveram para BrigitteBardot Amar é minha profissão, em 1958.Jean-Claude Carrière roteirizou os últimos filmes de Buñuel naFrança, inclusive O diário de umacamareira e A bela da tarde. JeanLouis Richard roteirizou paraFrançois Truffaut. MargueriteDuras, antes de dirigir, escreveuHiroshima, meu amor para AlainResnais. E do mesmo diretor, Oano passado em Marienbad, doescritor Alain Robbe-Grillet,criador do nouveau roman.

Charles Spaak

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Charles Spaak foi, provavelmente, o roteirista mais importantedo cinema francês. Começou em 1930 com La petite Lise e, em1934, Pension Mimosas; então o clássico A bandeira, em 1935.No mesmo ano, A quermesse heróica e Camaradas. Em 1937, oclássico A grande ilusão. E a série de roteiros para Cayatte sobrea (in)justiça: começando com Direito de matar (1950), incluindoSomos todos assassinos. Pai da atriz Catherine Spaak,descoberta por Lattuada.Em 1947, Jean-Paul Sartre verteu Les jeux son faites para ocinema e, em 1957, fez o roteiro da versão francesa da peçateatral de Arthur Miller As feiticeiras de Salem, dirigido porRaymond Rouleau. Seu roteiro para Freud, além da alma,dirigido por John Huston, foi recusado.O autor de bandes dessinées René Goscinny já tinha morridoquando a sua criação virou a superprodução Astérix. Mas

Jean Cocteau

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trabalhou em diversos roteiros divertidos, seja em longas-metragens seja em desenho animado.O poeta Jacques Prevert começou em 1935 com Le crime deMonsieur Lage. No ano seguinte, Jenny e, em 1937, Famíliaexótica. No ano posterior, O mistério do colégio. Nesse mesmoperíodo, Cais das sombras. Em 1939, Trágico amanhecer. De1939, terminado em 1941, Águas tempestuosas. Em 1942,Lumière d’été mais o clássico Os visitantes da noite, e suacontinuação (1944/45) O boulevard do crime. Em 1949, Osamantes de Verona. Em 1950escreveu e narrou oscomentários de Bim, filme deAlbert Lamorrise.Jorge Semprún, escritorespanhol banido por Franco,radicado na França, roteirizouo filme político Z (1968), deCosta-Gavras e, juntostambém, Estado de sítio(1973), além do filme de AlainResnais A guerra acabou.Na Inglaterra o prêmio NobelGeorge Bernard Shaw ganhouo Oscar, em 1938, por teradaptado sua peça teatralPigmalião. Anos depois, em1964, sua versão musicalMinha bela dama levou oitoestatuetas. Quando GBSrecebeu o Nobel, em 1925,com sua ironia de sempre,declarou que naquele ano nãotinha escrito nada.Acrescentou ter entendido aindireta, mas continuava a

Jorge Semprún

T. E. B. Clarke

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escrever suas peças desagradáveis mesmo assim.Os ingleses Graham Greene, Noel Coward e Terence Rattingan(O príncipe encantado) colaboraram com o cinema. Destaquepara o dramaturgo Harold Pinter que roteirizou os filmes inglesesde Joseph Losey (Estranho acidente, O mensageiro e O criado),na melhor fase desse diretor após ter sido banido de Hollywood.O cinema britânico deve muito a T.E.B. Clarke – que ganhou oOscar em 1952 com O mistério da torre, revelando AlecGuinness –, numa série de comédias excepcionais com umhumor que só os ingleses sabem fazer. As produções da Ealingemplacaram uma plêiade de comédias, As oito vítimas (1949),dirigida por Robert Hammer, onde Alec Guinness fazia oitopapéis diferentes. E, dirigido por Mackendrick, O homem dotemo branco (1951). A série terminou com O quinteto da morte(1955), também dirigido por Mackendrick.Emeric Pressburger ganhou, nos EUA, a estatueta da Academiacom a história original lnvasão de bárbaros, em 1942.

Harold Pinter

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Ben Barzrnan roteirizou o grande filme Cristo no concreto. O cinemainglês continua com sua tradição em comédias de fino humor.O escritor alemão Erich Maria Remarque teve seu romancepacifista Sem novidade no front, filmado em Hollywood porLewis Milestone em 1931.O cinema japonês teve Kaneto Shindo como co-roteirista, juntocom Matsubaro Kawaguchi, de um dos maiores filmes da históriado cinema, Contos da lua vaga, antes de se tornar diretor deobras-primas corno a Ilha nua (premiado em Moscou), Onibaba eoutros grandes filmes. Shinobu Hashimoto escreveu Os setesamurais, de Akira Kurosawa, que foi também vertido para ocenário western em Hollywood. Takeshi Shimura, Hideo Oguni eoutros roteiristas ajudaram os diretores japoneses a adquirirem umgrande prestígio no Ocidente.

Álvaro de Moya é escritor, produtor e diretor de cinema e televisão e professoraposentado da USP. Escreveu, entre outros, os livros Shazam! (Ed.Perspectiva, 1970), História da história em quadrinhos (Ed. Brasiliense, 1993) e

O mundo de Walt Disney (Geração Editorial, 1996).

*Texto ampliado a partir do original publicado no Caderno de Cultura da Gazeta

Mercantil. Essas observações têm o sentido de subsídio às reflexões ligadas à

elaboração do roteiro cinematográfico, questões que o Centro Cultural São Paulo

pretende levantar em programações na Sala Lima Barreto durante o ano de 2006.

Kaneto Shindo

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dia 14 - terça16hCrepúsculo dos deuses(Sunset Boulevard, 1950)18hAdaptação (Adaptation, 2002)20hPalestraRoteiristas de Cinema,com Álvaro de Moya

dia 15 - quarta16hScarface - a vergonha deuma nação (Scarface, 1932)18hAmor sublime amor(West side story, 1961)20h45O morro dos ventosuivantes(Wuthering heights, 1939)

dia 16 - quinta16hO pecado mora ao lado(The seven year itch, 1955)18hMoby Dick (1956)

20hA noite dos desesperados(They shoot horses, don’tthey?, 1969)

dia 17 - sexta16hRede de intrigas(Network, 1976)18h15O planeta dos macacos(The planet of the apes, 1968)20h15Doze homens e umasentença(12 angry men, 1957)

dia 18 - sábado16hÂnsia de amar(Carnal knowledge, 1971)18hQuanto mais quente melhor(Some like it hot, 1959)20hPunhos de campeão (The set-up, 1949)

O cinema dos roteiristas14 a 26 de fevereiro de 2006Sala Lima Barreto - Centro Cultural São Pauloentrada franca

agradecimentos: Cinemateca Brasileira

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dia 19 - domingo16hCidadão Kane(Citizen Kane, 1941)18hGilda (1946)20hCantando na chuva(Singin’ in the rain, 1952)

dia 21 - terça16hMatar ou morrer(High noon, 1952)18hOs imperdoáveis(Unforgiven, 1992)20hGlória feita de sangue(Paths of glory, 1957)

dia 22 - quarta16hUm lugar ao sol(A place in the sun, 1951)18h15MASH (M*A*S*H, 1970)20h15Johnny vai à guerra(Johnny got his gun, 1968)

dia 23 - quinta16hLadrões de bicicletas(Ladri di biciclette, 1948)18hCasanova e a revolução(La nuit de Varennes, 1982)20hQueimada (Queimada!, 1969)

dia 24 - sexta16hA bela da tarde(Belle de jour, 1967)18hZ (1967)20h15O leopardo(Il gattopardo, 1963)

dia 25 - sábado16hO quinteto da morte(The ladykillers, 1955)18hContos da lua vaga(Ugetsu monogatari, 1953)20hOs sete samurais(Shichinin no samurai, 1954)

dia 26 - domingo16hQuero ser John Malkovich(Being John Malkovich, 1999)18hAdaptação20hCrepúsculo dos deuses

núcleo de cinema e vídeotel.: 3277-3611 - ramal 216

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