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BOLETIM DA CNRD OUTUBRO/2016 A MAIO/2020 n o 1

BOLETIM DA CNRD...Rio de Janeiro, 1º de junho de 2020 Vitor Butruce Presidente da CNRD APRESENTAÇÃO 5 BOLETIM DA CNRD, Nº 1, OUT. 2016/MAI. 2020 Este primeiro número do Boletim

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BOLETIM DA CNRD, Nº 1, OUT. 2016/MAI. 20201

BOLETIMDA CNRDOUTUBRO/2016 A MAIO/2020

no 1

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Boletim da CNRD nº 1(outubro de 2016 a maio de 2020)

CÂMARA NACIONAL DE RESOLUÇÃO DE DISPUTAS

Membros TitularesVitor Butruce

Luiz Fernando RibeiroLiselaine Marques

Ana Beatriz MacedoRoberto de Palma Barracco

Membros SuplentesRaphael Donato

Vantuil GonçalvesCláudio Diniz

Alexandre Borba

PresidenteVitor Butruce

Coordenador-GeralRafael T. Fachada

Coordenador JurídicoRaphael Donato

Coordenador CientíficoRoberto de Palma Barracco

Coordenadora da Divisão Comercial e TrabalhistaRaquel Santos

Coordenadora da Divisão sobre Intermediação e RegulaçãoAmanda Guimarães

EstagiáriaMaria Eduarda Penna

Avenida Luís Carlos Prestes, 130, sala 217 – Barra da Tijuca– Rio de Janeiro – Brasil – CEP 22775-055

Tel.: +55 21 3572-1969E-mail: [email protected]

Design gráfico deste Boletim da CNRD:Elisa Guilherme

([email protected])

BOLETIM DA CNRD, Nº 1, OUT. 2016/MAI. 2020

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3 BOLETIM DA CNRD, Nº 1, OUT. 2016/MAI. 2020

Apresentação

Introdução

CNRD em números

Evolução de casos

Distribuição de casos por matéria

Os diferentes perfi s das disputas

Análise das partes

A escolha pela CNRD mediante convenção de arbitragem

Tempo de tramitação dos procedimentos

Acordos realizados

Sanções

O alinhamento entre a CNRD e as decisões judiciais a seu respeito

A jurisdição arbitral da CNRD diante de cláusula compromissória

Os efeitos de coisa julgada da decisão da CNRD se houver convenção de arbitragem

A competência trabalhista da CNRD

O diálogo entre a CNRD e o Poder Judiciário na execução de títulos extrajudiciais

A legitimidade da sanção de proibição de registro de novos atletas

Desafi os e metas para os próximos anos

O início da implementação de mudanças na CNRD

Organização Interna

Andamento processual

Diálogo com o mercado

4

5

6

6

9

10

11

12

13

15

16

18

18

19

21

25

26

31

33

33

34

34

35

36

38

40

40

40

41

Os principais entendimentos da CNRD

Competência

A competência trabalhista

Transferências

Relações de trabalho

Relações com intermediários

Inadimplência fi nanceira

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BOLETIM DA CNRD, Nº 1, OUT. 2016/MAI. 20204

É com grande satisfação que apresentamos o primeiro número do Boletim da CNRD.

Este material traz um panorama sobre as ati-vidades da CNRD no período entre outubro de 2016 e maio de 2020, cumprindo nosso compromisso de transparência com o merca-do do futebol brasileiro. Aqui se encontram números sobre os nossos procedimentos, es-timativas de tempo de tramitação processu-al, uma visão geral sobre nossa jurisprudên-cia e precedentes judiciais relativos à nossa atuação. Ao final, traz-se um diagnóstico dos pontos em que a CNRD considera que pode evoluir, traçando nossos principais desafios para o futuro.

Nesses primeiros três anos e oito meses de existência, a CNRD recebeu 560 casos, emi-tiu mais de 150 decisões, entre sentenças e medidas de urgência, e viu mais de 130 acor-dos celebrados. Dos clubes classificados para disputar o Campeonato Brasileiro em 2020, 100% dos clubes da Série A, 70% dos clubes da Série B, 45% dos clubes da Série C e 15% dos clubes da Série D atuam ou já atuaram em nossos procedimentos, além de escritó-rios de advocacia das cinco regiões do Bra-sil. Entre decisões condenatórias e acordos celebrados, mais de R$ 20 milhões voltaram a circular no mercado. E o Poder Judiciário tem invariavelmente reconhecido as compe-tências da CNRD e prestigiado a eficácia das suas decisões.

Estamos convictos de que o sucesso da CNRD é resultado direto do diálogo provei-toso que temos mantido com representantes das diferentes categorias de jurisdicionados, a quem registramos nossos agradecimentos: federações, clubes, atletas, intermediários e membros de comissão técnica.

O voto de confiança em nossas atividades manifestado pelos escritórios de advocacia tem sido igualmente fundamental – seja ao recomendar a eleição da CNRD nos contra-tos, ao mover pleitos dos seus clientes peran-

te a CNRD ou ao desbravar as possibilidades interpretativas do nosso Regulamento.

Também contamos com o apoio institucional permanente da CBF, que tem nos disponibili-zado toda a estrutura para desempenharmos nossos trabalhos com qualidade e indepen-dência. Registra-se aqui, portanto, o agrade-cimento a toda a Diretoria da CBF, o que faço nas pessoas do Presidente Rogério Caboclo, do Secretário-Geral Walter Feldman, do Di-retor de Comunicações Douglas Lunardi, do Diretor Financeiro Gilnei Botrel, do Diretor de Patrimônio Oswaldo Gentile, do Diretor de Tecnologia da Informação Fernando França e do Diretor de Recursos Humanos Marco Dalpozzo.

Agradecimentos especiais devem ser regis-trados ao Diretor de Registro, Transferência e Licenciamento de Clubes, Reynaldo Buzzoni, grande entusiasta dos nossos trabalhos, ao Diretor Jurídico Luiz Felipe Santoro e a todo o corpo jurídico da CBF, na pessoa do Vice--Presidente Jurídico Carlos Eugenio Lopes, um dos principais idealizadores da CNRD.

Por fim, reforço o reconhecimento e agrade-cimento pelo trabalho excepcional desenvol-vido pela Secretaria da CNRD, coordenada por Rafael Fachada, que tem sido o coração que bombeia nossos trabalhos, acompanha-do pelo engajamento de Amanda Guimarães e, mais recentemente, pela dedicação de Ra-quel Santos e Maria Eduarda Penna.

Esperamos que esse relatório sirva não ape-nas como ocasião para a CNRD prestar con-tas ao mercado do futebol brasileiro, mas também como ferramenta útil para tomada de decisão pelos seus atores e para balizar nossa busca constante por aprimoramento.

Rio de Janeiro, 1º de junho de 2020

Vitor ButrucePresidente da CNRD

APRESENTAÇÃO

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BOLETIM DA CNRD, Nº 1, OUT. 2016/MAI. 20205

Este primeiro número do Boletim da CNRD fornece um panorama sobre as atividades da CNRD no período entre outubro de 2016 e maio de 2020. Ele também define as prin-cipais pautas e desafios que a CNRD deve enfrentar ao longo dos próximos anos. Para tanto, ele se divide em três partes.

A primeira parte apresenta os principais nú-meros da CNRD nos seus primeiros três anos e oito meses: o total de casos distribuídos, o volume de decisões proferidas, estimativas de tempo de tramitação processual, infor-mações sobre acordos celebrados e sobre as sanções aplicadas por descumprimento de suas decisões.

A segunda parte consolida os principais en-tendimentos manifestados pela CNRD em suas decisões, e que formam o corpo de sua jurisprudência. Parte dessas decisões já foi

publicada mediante a 1ª edição do Ementá-rio da CNRD, disponível no Portal de Gover-nança da CBF1, e as demais o serão nos pró-ximos meses. Além disso, ela também traz uma compilação de decisões judiciais que dizem respeito à atividade da CNRD, e que mostram o invariável prestígio que o Poder Judiciário tem conferido à sua atuação – re-conhecendo a eficácia associativa das suas sanções, bem como a natureza arbitral das decisões proferidas nos casos em que as par-tes a elegem para tanto.

Por fim, a terceira parte apresenta um diag-nóstico dos pontos em que a CNRD conside-ra que pode evoluir e manifesta os caminhos que pretende seguir para vencer seu princi-pal desafio para o porvir: aumentar a cele-ridade dos seus procedimentos, combinada com a qualidade técnica das suas decisões.

INTRODUÇÃO

1 As decisões podem ser acessadas em: http://portaldegovernanca.cbf.com.br/decisoes.

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BOLETIM DA CNRD, Nº 1, OUT. 2016/MAI. 20206

A CNRD recebeu o seu primeiro caso em ou-tubro de 2016, pelo qual um intermediário cobrava R$ 1,3 milhões a título de comissão por serviços prestados a um atleta. A CNRD recebeu outros seis processos em 2016.

No primeiro semestre de 2017, a CNRD rece-beu outros 21 processos. Uma média de 3,5 casos novos por mês. O crescimento mais acelerado do número de casos se deu após o 1º Encontro com a CNRD, evento realizado em julho de 2017, que contou com a presen-ça de advogados, representantes de clubes, atletas e intermediários.

Como resultado, a CNRD recebeu 13 proces-sos novos somente no mês de julho de 2017. A CNRD fechou 2017 com um total de 84 processos desde sua inauguração, alcançan-do uma média superior a nove processos por mês no segundo semestre daquele ano:

Esse crescimento se manteve durante todo o ano de 2018, quando a CNRD recebeu 153 novos casos, em uma média superior a 12 ca-sos por mês:

2019 viu a consolidação institucional da CNRD, com 230 processos distribuídos no ano, uma média de quase 20 por mês:

Nos cinco primeiros meses de 2020, a CNRD já recebeu ainda 96 processos.

Assim, a CNRD alcançou um total de 560 processos em 31.5.2020, conforme demons-tra o Gráfico 4 a seguir.

CNRD EM NÚMEROS

GRÁFICO 1Processos distribuídos por mês (2017)

GRÁFICO 2Processos distribuídos por mês (2018)

GRÁFICO 3Processos distribuídos por mês (2019)

EVOLUÇÃO DE CASOS

0

4

7

11

14

Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez

03

2

64

6

13

4

12

810

9

Média/mês Processos novos

Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez0

5,5

11

16,5

22

9 1114

129

12 1013

15

22 21

5

Média/mês Processos novos

Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez

0

10

20

30

40

1216

9

25

6

2229

15

2934

1913

Média/mês Processos novos

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BOLETIM DA CNRD, Nº 1, OUT. 2016/MAI. 2020

SancionadorFormação

1º sem./2017 2º sem./2017 1º sem./2018 2º sem./2018 1º sem./2019 2º sem./2019 jan-mai/2020

Clube x Clube Empregado x Clube Total

2016

Intermediação

2 41 007 4 145 50

28 200 10

84

42

12

68

33 3018

1

150

51

111

47

422

235

163

68 64

822

325

238

90 96

1129

464

289

560

2912

111 119

7

GRÁFICO 4.1Evolução do número de processos na CNRD

(por semestre)

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BOLETIM DA CNRD, Nº 1, OUT. 2016/MAI. 2020

Clube x Clube

Intermediação

Empregado x Clube

Formação

Sancionador

Total

2016 2018 2019 2020

7

235

464

560

238

289

4

90

111

147

96

119

292

00

12

20170

84

42

10

111

20

12

51

224 11

29

GRÁFICO 4.2Evolução do número de processos na CNRD

(por ano)

8

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BOLETIM DA CNRD, Nº 1, OUT. 2016/MAI. 20209

DISTRIBUIÇÃO DE CASOS POR MATÉRIA

A CNRD distribui seus processos conforme as principais competências previstas no art. 3º do seu Regulamento: casos envolvendo intermediários (I), transferências (TRF), me-canismo de solidariedade (S), indenização por formação (F), pedidos de natureza tra-balhista (TRB) e procedimentos sanciona-dores (DRT). Há também uma categoria re-sidual, que comporta casos relativos a todas as outras competências regulamentares (O), a maior parte cuidando do descumprimen-to de obrigações financeiras pelos clubes, na forma do art. 64 do RNRTAF2.

O Gráfico 4 permite perceber que a maior parte dos casos sob gestão da CNRD, desde o início das suas atividades, se relaciona com a atuação dos intermediários.

Ainda, percebe-se que desde março de 2018 tem crescido o número de cobranças de atle-tas e treinadores contra clubes, seja de na-tureza trabalhista ou relativas ao reconheci-mento de inadimplência financeira à luz do art. 64 do RNRTAF. Hoje, processos desse feitio representam 17% dos casos da CNRD, sendo 43 de natureza trabalhista. Desses, 17 foram movidos em 2018, já após a entrada em vigor da Lei nº 13.497/2017, que acrescen-tou o art. 507-A à CLT. A CNRD recebeu ou-tros 15 em 2019 e 7 até 31.5.2020.

Veja-se abaixo a divisão de todo o acervo de processos da CNRD por categoria em 31.5.2020:

2 Os contornos dos requerimentos baseados no art. 64 do RNRTAF foram definidos no julgamento do Proc. 2017/O/014, um dos mais importantes de nossa jurisprudência.

GRÁFICO 5

Sancionadores5%

Solidariedade9%

Formação2%

Transferência5%

TRB8%

art. 64(entre empregados e clubes)

9%

art. 64 (entre clubes)11%

Intermediação52%

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BOLETIM DA CNRD, Nº 1, OUT. 2016/MAI. 202010

OS DIFERENTES PERFIS DAS DISPUTAS

Jurisdicionados de diferentes perfis econô-micos têm escolhido a CNRD para resolver suas disputas ao longo desses primeiros anos. Essa diversidade se verifica para além da multiplicidade de requerentes, e se reflete também nas diferentes escalas de valor fi-nanceiro das causas recebidas.

O Gráfico 6 demonstra que metade das de-mandas da CNRD versam sobre casos sem valor pecuniário ou cujo valor em disputa é inferior a R$ 100 mil. Além disso, vê-se que em aproximadamente 40% dos casos os plei-tos são inferiores a R$ 50 mil, de modo que as partes precisam recolher apenas R$ 1 mil a título de taxa de registro e administração para movê-los.

Assim, a CNRD considera que cumpre o seu dever de auxiliar o desenvolvimento do fute-bol brasileiro ao atender em larga escala clu-bes e atletas com menos recursos financei-ros, principais requerentes de causas desse feitio.

Por sua vez, mais de 100 casos em curso na CNRD envolvem valores acima de R$ 500 mil, o que representa 21% do total. Isso de-monstra que a CNRD também tem sido uma opção para casos de maior vulto financeiro, o que demonstra que cada vez mais os atores de maior potencial de investimento do setor têm buscado a via associativa para solução de suas disputas.

Em 31.5.2020, essa era a distribuição dos ca-sos da CNRD por valor da causa:

GRÁFICO 6

acima de R$ 1 milhão12%

de R$ 700 mila R$ 1 milhão

4%

de R$ 500 mila R$ 700 mil

5%

de R$ 300 mila R$ 500 mil

7%

de R$ 200 mila R$ 300 mil

8%

de R$ 100 mila R$ 200 mil

15%

de R$ 50 mila R$ 100 mil

12%

até R$ 50 mil29%

sem valorpecuniário

9%

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BOLETIM DA CNRD, Nº 1, OUT. 2016/MAI. 202011

ANÁLISE DAS PARTES

Desde o seu início, a CNRD busca servir como alternativa satisfatória e acessível para jurisdicionados dos mais diferentes perfis.

Um de nossos objetivos é permitir que clu-bes, atletas, membros de comissão técnica ou intermediários atuantes nas camadas de menor investimento possam pleitear e obter recursos financeiros a que têm direito de for-ma mais rápida e barata.

Pretende-se também servir como opção para que atores de maior expressão do mercado tenham suas disputas analisadas de modo célere, discreto e com enfoque nos aspectos fáticos e materiais em questão.

Nos dois gráficos a seguir, vê-se em quais di-visões atuam os clubes, atletas ou membros de comissão técnica que participam de pro-cessos na CNRD3.

Os dados analisados mostram que a CNRD tem alcançado essas metas: clubes que não disputam as três principais séries do Cam-peonato Brasileiro ajuizaram 32 das 51 co-branças de mecanismo de solidariedade, enquanto clubes que disputam a Série A res-ponderam a 47 pedidos desse perfil.

Acredita-se que o trâmite exclusivamente di-gital dos procedimentos permitiu esse aces-so amplo, que independe do local de base do requerente ou de seus assessores jurídicos.

Inclusive, acredita-se que o esforço de digita-lização empreendido pela CNRD desde seus primeiros anos contribuiu para que os atores do mercado já estivessem preparados para a mudança cultural exigida pelos impactos da covid-19 sobre o setor: a CNRD pode manter suas atividades em curso sem maiores difi-culdades mesmo durante a transição de todo o mercado para o trabalho remoto.

3 Os gráficos levam em consideração a divisão do Campeonato Brasileiro em que o clube, atleta ou membro de co-missão técnica atuava na data de propositura do requerimento. Jurisdicionados à época na Série D ou aqueles que disputavam apenas campeonatos estaduais foram classificados como “Outros” (O). Clubes estrangeiros, atletas ou membros de comissão técnica que estavam atuando fora do Brasil foram classificados como “Exterior”.

Séries do Autor

Exterior 7%

O37%

C5%

B18%

A32%

Séries do Réu

Exterior 6%

O9%

C6%

B29%

A50%

GRÁFICO 7Séries do Autor

GRÁFICO 8Séries do Réu

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BOLETIM DA CNRD, Nº 1, OUT. 2016/MAI. 202012

A ESCOLHA PELA CNRD MEDIANTE CONVENÇÃO DE ARBITRAGEM

A competência da CNRD para dirimir dispu-tas deriva de diferentes fontes. Ela pode de-correr de obrigações estatutárias assumidas por seus jurisdicionados ou de regras previs-tas em regulamentos aplicáveis àqueles que integram o sistema associativo do futebol brasileiro. E ela pode derivar também da es-colha das partes em seus contratos, median-te convenção de arbitragem.

Ao longo desses mais de três anos e meio de funcionamento, a CNRD verifica que o núme-ro de demandas baseadas em cláusulas arbi-trais vem crescendo progressivamente.

Disputas contratuais baseadas em cláusulas compromissórias superaram aquelas deriva-

das das competências regulamentares em outubro de 2018 – ou seja, quando a CNRD completou dois anos de operação. Desde en-tão, cada vez mais a CNRD se dedica a dirimir disputas entre partes que a elegeram para tanto. E essa constatação muito nos orgulha, pois sinaliza o voto de confiança – deposita-do por clubes, atletas, membros de comissão técnica, intermediários e seus assessores ju-rídicos – na capacidade da CNRD de realizar um trabalho satisfatório.

Atualmente, 62% das disputas contratuais submetidas à análise da CNRD contam com cláusulas compromissórias, como mostra o Gráfico 9:

Out-16 Jan-17 Abr-17 Jul-17 Out-17 Jan-18 Abr-18 Jul-18 Out-18 Jan-19 Abr-19 Jul-19 Out-19 Jan-20 Abr-20

Sem cláusula Com cláusula

0

75

150

225

300

GRÁFICO 9Evolução das disputas contratuais submetidas à CNRD

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BOLETIM DA CNRD, Nº 1, OUT. 2016/MAI. 202013

TEMPO DE TRAMITAÇÃO DOS PROCEDIMENTOS

A CNRD sabe que a celeridade está entre os principais anseios e preocupações dos jurisdicionados que optam pelos seus servi-ços – sejam os que formulam requerimentos com base nas competências previstas no seu Regulamento, sejam aqueles que a escolhem como instituição arbitral para dirimir confli-tos contratuais.

Nesses mais de três e anos e meio, a CNRD já emitiu 97 sentenças, sendo 95 de processos originariamente seus e 2 de processos absor-vidos do extinto CRL.

Dentre os já encerrados, o Proc. 2017/I/044 foi o mais célere, tendo durado 118 dias (4 meses) até a sentença, enquanto o Proc. 2017/DRT/011 foi o que mais tempo levou: 891 dias (30 meses) até sua sentença.

Em média, a CNRD tem levado 391 dias (13 meses) do recebimento do pedido até a pro-lação da sentença. E essa média varia de acordo com a natureza do procedimento, como se vê no Gráfico 10:

GRÁFICO 10

Trabalhistas Art. 64 Intermediários Solidariedade DRT

553

405

273

0

150

300

450

600

403364

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BOLETIM DA CNRD, Nº 1, OUT. 2016/MAI. 202014

A experiência desses primeiros anos mostra que cada tipo de processo exi-ge uma linha de instrução própria, que pode demandar mais ou menos tempo.

Os procedimentos sancionadores e alguns requerimentos envolvendo intermediários tendem a ser mais complexos e exigir instru-ção mais detalhada, o que influencia no seu tempo de tramitação. Nesses casos, não é raro que a CNRD tenha que oficiar a tercei-ros ou realizar audiências de instrução. Es-ses trâmites geram um acréscimo natural ao tempo do processo, o que não se verifica em requerimentos trabalhistas ou naqueles que orbitam a aplicação do art. 64 do RNRTAF, que, por natureza, se concentram na análise de documentos.

Ao analisar seu acervo, a CNRD verificou que o número de processos aumentou signi-ficativamente a cada ano: 91% de 2017 para 2018, 51% de 2018 para 2019. Naturalmente, esse acúmulo repercutiu no tempo necessá-rio para se chegar até as sentenças, como se pode ver no Gráfico 11, que mostra a média de dias que foram necessários para a CNRD emitir sentenças em cada ano:

A CNRD também tem observado como esse tempo se divide ao longo dos trâmites pro-cessuais. Para realizar esse cálculo, a CNRD se baseou na análise de diferentes processos,

de diferentes perfis, e que alcançaram em média 387 dias de tramitação4, desde o seu protocolo até a sentença – número próximo da média geral de 391 dias, portanto.

Por essa análise, nota-se que a CNRD inves-tiu aproximadamente 4 meses na instrução processual. Ainda, a CNRD precisou de ou-tros 7 meses para elaborar as atas de mis-são de cada caso. Por fim, a CNRD precisou, em média, de pouco menos de 2 meses para chegar a uma decisão e redigir os termos da sentença. Em termos percentuais, o tempo ficou assim distribuído:

Percebe-se, portanto, que o principal garga-lo a se enfrentar para diminuir o tempo de tramitação processual está na redução do intervalo entre a fase postulatória e a ata de missão. Para tanto, a CNRD tomou providên-cias que serão detalhadas adiante.

Por ora, a CNRD acredita que 2020 ainda apresentará um tempo médio de tramitação superior ao desejado, mas em proporção consideravelmente menor do que o aumento observado de 2018 para 2019.

A partir de 2021, a CNRD espera conseguir reduzir o tempo médio em relação a 2020 até que se alcance uma média de aproxima-damente dez meses de tramitação.

4 Os processos adotados para a análise foram os seguintes: 2017/I/049, 2018/O/088, 2018/TRB/091, 2018/I/106 e 2018/I/107.

GRÁFICO 11

GRÁFICO 12

2017 2018 2019 2020

496

287265

480

Tempo

InstruçãoElaboração da Ata de MissãoElaboração da Sentença

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BOLETIM DA CNRD, Nº 1, OUT. 2016/MAI. 202015

ACORDOS REALIZADOS

Desde o início de sua operação, a CNRD bus-ca criar um ambiente que permita a resolu-ção das disputas de forma rápida e consen-sual, sem que seja necessária a emissão de uma sentença condenatória. Tanto quanto possível, o objetivo dessa es-tratégia é permitir que as partes construam soluções que considerem satisfatórias.

Quando não se alcança o consenso, a CNRD ainda assim estimula que as partes discutam os termos e estabeleçam a forma de paga-mento da condenação, o que permite ao credor e ao devedor pautarem os prazos e quantidade de parcelas que lhes sejam mais convenientes.

Nesse sentido, a CNRD já homologou 138 acordos, o que, considerando os procedi-mentos de cobranças, significa uma taxa de acordos de 25%.

Em 2017, a CNRD homologou 19 acordos. Desses, 17 foram realizados antes da emis-são de sentença e outros 2 ocorreram após a decisão. O tempo médio de tramitação do processo até a homologação foi de 101 dias

quando a assinatura se deu antes da senten-ça e 238 dias quando o acordo se deu após a sentença.

Por sua vez, a CNRD homologou 48 acordos em 2018, dos quais 38 antes da sentença e 10 depois. O tempo médio de tramitação do processo até a homologação do acordo foi de 137 dias nos acordos celebrados antes da sentença e 325 dias quando o acordo se deu após a sentença.

Em 2019, a CNRD homologou 40 acordos – 36 antes da sentença e 4 depois. O tempo médio para que as partes chegassem a um acordo foi de 217 dias, nos casos que não dependeram de sentença, e 572 dias para os casos em que se aguardou a emissão de sen-tença.

Por fim, nos cinco primeiros meses de 2020, a CNRD homologou 28 acordos, dos quais 24 ocorreram antes da sentença e 4, após. Os acordos realizados antes da sentença ocor-reram com uma média de 352 dias de trami-tação processual, enquanto os que aguarda-ram sentença foram feitos em 640 dias, em média.

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BOLETIM DA CNRD, Nº 1, OUT. 2016/MAI. 202016

SANÇÕES

A CNRD aplicou a sua primeira sanção em 2.12.2016, nos autos do Proc. CRL 2013/S/013. Cuidou-se, no caso, de pena de advertência aplicada contra clube que havia descumpri-do condenação imposta pelo TAS relativa a cobrança de mecanismo de solidariedade. O pagamento foi efetuado e o processo se en-cerrou em fevereiro de 2017. Desde então, a CNRD aplicou mais de 60 sanções.

Em regra, duas razões podem levar a CNRD a aplicar uma sanção: (a) ao fim de um pro-cedimento sancionador, se a CNRD entender que o denunciado violou deveres previstos nos regulamentos pertinentes; ou (b) diante do descumprimento de decisão da CNRD.

Em 9 procedimentos sancionadores julgados até o momento, a CNRD aplicou 3 advertên-cias a clubes e 9 advertências a atletas, além de 9 multas a sete clubes diferentes.

Nos procedimentos relativos a cobranças, a CNRD aplicou 27 advertências, distribuídas entre onze clubes e um atleta. A CNRD tam-bém bloqueou um total de R$ 61.277,60 de dois clubes que tinham receitas a receber que circulam pela CBF, montantes que foram repassados diretamente aos credores.

Entre as principais penas aplicáveis pela CNRD, a proibição de registro de novos atle-tas é a que costuma causar maior impacto aos clubes devedores. Nesse período, a CNRD aplicou essa pena a 3 clubes diferentes, por dívidas relativas a 8 processos distintos.

No mais, a CNRD aplicou somente uma sus-pensão a atleta, proferida em 17.12.2019, pelo prazo de 60 dias. Após aplicada a sanção, o atleta saldou a dívida com seu credor.

Ao longo desses anos, a CNRD tem adota-do especial cautela na aplicação de sanções – buscando adotar parâmetros de razoabi-lidade na dosimetria e garantindo aos juris-dicionados todas as possibilidades de apre-sentarem os seus argumentos a cada etapa processual.

A partir dessa experiência, a CNRD passou a adotar as seguintes etapas no processo de aplicação de sanções por descumprimento de obrigações pecuniárias:

(a) o credor deve comunicar o des-cumprimento de decisão ou de acor-do homologado, momento em que a CNRD abre prazo de dez dias para o devedor provar ter cumprido a obri-gação ou justificar a sua mora;

(b) decorrido o prazo sem que tenha havido o cumprimento da obrigação, a CNRD aplica ao devedor ao menos uma das sanções previstas no art. 40, § 1º, do RCNRD, com maior recorrên-cia de multas ou advertências, e lhe concede novo prazo de dez dias para cumprir a obrigação;

(c) se ainda assim o devedor não pa-gar a obrigação, a CNRD pode aplicar as sanções previstas no art. 42, § 1º, do seu Regulamento, considerando na dosimetria as justificativas apre-sentadas pelo devedor para seu ina-dimplemento; a experiência desses primeiros anos tem mostrado que, ao se chegar a essa situação, o bloqueio de receitas ou a proibição de registro de atletas tem sido o caminho mais eficaz para conduzir ao adimplemen-to das obrigações.

Em qualquer dessas etapas, desde que me-diante requerimento, a CNRD pode deferir programa de parcelamento da dívida, de modo a evitar ou suspender a aplicação de sanções mais gravosas, respeitada a capaci-dade econômica da parte. Ela também pode suspender condicionalmente a pena já apli-cada, se houver motivos razoáveis para tan-to, desde que alinhados com os interesses legítimos dos credores – o chamado sursis desportivo.

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BOLETIM DA CNRD, Nº 1, OUT. 2016/MAI. 202017

Dois clubes já foram beneficiados por essa medida, seja em razão da realização de acor-dos com seus credores, que autorizaram a suspensão condicional da pena, ou mediante o deferimento, pela CNRD, da faculdade de se efetuar o pagamento parcelado de deter-minadas dívidas em montantes razoáveis.

Até maio de 2020, não foi necessário aplicar sanções mais gravosas que as do art. 42, § 1º, do RCNRD.

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BOLETIM DA CNRD, Nº 1, OUT. 2016/MAI. 202018

A confidencialidade é um dos pilares dos procedimentos da CNRD. É um compromisso que a CNRD assume visando a preservar in-formações pessoais de seus jurisdicionados e manter discrição sobre aspectos específi-cos de contratos privados havidos entre os agentes do mercado do futebol.

Ao mesmo tempo, a CNRD considera impor-tante sinalizar seus principais entendimentos sobre as questões jurídicas que lhe são sub-metidas, de modo a trazer maior previsibili-dade e segurança a esse mercado.

Nesse sentido, a CNRD divulgou em 21.11.2019 a primeira leva de suas decisões, descaracteri-zando elementos que pudessem identificar ao público aspectos específicos das disputas. Um total de 17 documentos de 2017 foram publi-cados – entre medidas de urgência, sentenças e decisões sobre pedidos de esclarecimentos.

Seguindo esse compromisso, a CNRD deve publicar outros documentos, emitidos entre 2018 e 2019, ao longo dos próximos meses.

A CNRD espera com isso contribuir para a melhoria das negociações, cobranças e acor-dos realizados diretamente de parte a par-te. E, caso surja uma disputa, espera que a publicação de seus entendimentos sirva para que os advogados desenvolvam as suas es-tratégias com o máximo de informação dis-ponível.

Diversas questões foram submetidas à CNRD nesses primeiros três anos e oito meses. Entre as mais de 97 sentenças proferidas, algumas se destacaram pela relevância da matéria, merecendo breve exposição neste relatório por formarem a jurisprudência da Câmara.

COMPETÊNCIA

A competência da CNRD relativa a contra-tos anteriores à sua formação, ou com elei-ção de foro

A CNRD recebeu o seu primeiro processo em outubro de 2016, acerca de contrato ce-lebrado em 2015. Nos anos que se seguiram, algumas disputas também se referiam a con-tratos anteriores à instalação da CNRD. Esse foi, portanto, o primeiro tema de repercussão geral que a CNRD precisou enfrentar: os limi-

tes da sua competência para avaliar contra-tos anteriores à sua formação, ou que tives-sem cláusula de eleição de foro.

O entendimento da CNRD a esse respeito se fixou a partir do Proc. 2017/O/019, julgado em 27.11.2017, sob a relatoria do Dr. Luiz Fernan-do Ribeiro, em que se entendeu que, mesmo diante de cláusula de eleição de foro, a CNRD tem competência para apreciar as disputas que lhe são submetidas à luz do art. 64 do RNRTAF, pelos seguintes fundamentos:

“A CBF estabeleceu o dever dos clubes de cumprir tempestivamen-te as obrigações financeiras devi-das a outros clubes como parâme-tro de conduta associativa. Isso se deu na edição de 2016 do RNRTAF, mediante a criação do (então) art. 67 do RNRTAF, com os propósitos de encorajar o cumprimento dos contratos e criar desincentivos à rolagem de dívidas, prática ainda corrente entre os clubes. A regra foi renumerada na edição de 2017 do RNRTAF e hoje se encontra sob o art. 64.

E a CBF assim o fez com fundamen-to declarado no art. 12bis do FIFA RSTP e clara inspiração na experi-ência dos órgãos jurisdicionais da FIFA [...], bem como dos de outras associações nacionais, a quem é público e notório que os clubes bra-sileiros habitualmente se socorrem quando não há o adimplemento de obrigações financeiras por parte de clubes estrangeiros.

Vale dizer, como é de conhecimen-to e de costume no setor esportivo, que a cláusula de eleição de foro contida num contrato não afasta a aplicação das normas derivadas dos estatutos e regulamentos das entidades dirigentes, nem a com-petência sancionadora dos seus ór-gãos jurisdicionais, por possuírem caráter associativo e vinculante en-tre seus filiados registrados”.

OS PRINCIPAIS ENTENDIMENTOS DA CNRD

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BOLETIM DA CNRD, Nº 1, OUT. 2016/MAI. 202019

Em seguida, a CNRD fixou o entendimento de que a competência para apreciar disputas entre intermediários e seus clientes também independe da existência de cláusula compro-missória. Isso porque a CNRD sucedeu o ex-tinto CRL, cuja competência para avaliar es-sas disputas na esfera associativa já constava do Estatuto da CBF. Foi o que se afirmou no Proc. 2017/I/025, julgado em 9.5.2018, sob a relatoria da Dra. Liselaine Marques:

“À época da celebração do Con-trato, o Estatuto da CBF dispunha o seguinte: ‘Art. 67 - O Comitê de Resolução de Litígios tem por com-petência decidir qualquer litígio entre um jogador ou uma entidade de prática desportiva e um agente de jogadores, ou entre dois ou mais agentes de jogadores registrados na CBF. Poderá a CBF cobrar dos li-tigantes valores razoáveis para dar cumprimento ao que a respeito dis-põe o Regulamento de Agentes de Jogadores, da FIFA.’[...]Assim, em linha de princípio, o CRL tinha competência para avaliar li-tígios entre agentes registrados e clubes – em especial, com respeito às atividades dos agentes delimita-das no art. 1º do FIFA PAR, em vigor à época da celebração do Contra-to: apresentar atletas a clubes, com o propósito de negociar ou rene-gociar contratos de trabalho, ou apresentar um clube a outro, com o propósito de celebrar um contrato de transferência de atleta. O caso dos autos corresponde à primeira hipótese.[...]Portanto, pela anuência do Clube aos regulamentos da CBF, na forma dos estatutos da CBF e da Federa-ção, e em linha com as previsões constantes do RCNRD, entende-se, por unanimidade, que a CNRD tem competência para analisar este Re-querimento”.

Diante desses precedentes, a CNRD passou a aplicar a seguinte distinção nas disputas en-tre seus jurisdicionados:

(a) se o contrato submetido à análise tem convenção de arbitragem elegen-do a CNRD, a CNRD atua como tribunal arbitral e sua sentença tem a natureza de sentença arbitral;

(b) não havendo convenção de arbitra-gem, a CNRD atua nos limites da esfera associativa, de modo que sua decisão pode resultar na aplicação de sanções esportivas, mas não forma título exe-cutivo, nem produz os outros efeitos de uma sentença arbitral.

A competência trabalhista

Essa mesma lógica fez com que a CNRD fir-masse o entendimento de que a sua compe-tência para atuar em processos relativos a questões trabalhistas pode derivar de duas fontes e, por consequência, assumir duas fei-ções distintas: pode derivar de convenção de arbitragem ou da sua atribuição regulatória na esfera associativa.

Conforme o art. 3º, II e VII, do RCNRD, a CNRD somente tem competência para di-rimir litígios de natureza laboral se houver “comum acordo entre as partes”. Pelo inciso III, também é de sua competência resolver li-tígios entre clubes, e entre clubes e atletas, acerca da aplicação do art. 64 do RNRTAF, segundo o qual é dever dos clubes cumprir, tempestivamente, as obrigações financeiras devidas nos termos dos instrumentos forma-lizados. E o caput do art. 3º do RCNRD escla-rece que essas competências não prejudicam o direito de qualquer pessoa dirimir seus lití-gios de natureza laboral perante a Justiça do Trabalho, na forma da lei.

Diante disso, a CNRD verificou duas ques-tões jurídicas a superar acerca do art. 3º do RCNRD: definir quando se deve dar o “co-mum acordo” a que se referem os incisos II e VII, e traçar as diferenças entre os pleitos de “natureza laboral” a que se referem e os re-querimentos relativos à aplicação do art. 64 do RNRTAF, referidos no inciso III.

Nos processos 2017/TRB/039 e 2017/TRB/040, julgados em 15.5.2018 sob relatoria da Dra. Liselaine Marques, a CNRD entendeu que a existência de cláusula compromissó-ria disposta em contrato de trabalho entre membro de comissão técnica e clube preen-che o pressuposto do comum acordo, à luz do que exige o art. 3º, II e VII, do RCNRD. Assim, é desnecessária ratificação posterior:

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BOLETIM DA CNRD, Nº 1, OUT. 2016/MAI. 202020

“[...] o RCNRD não define o mo-mento em que deve ser colhida a concordância para que um litígio seja submetido à CNRD. O escopo regulamentar, como se percebe, é apenas o de garantir que seja fa-cultado às partes que suas disputas laborais sejam submetidas à CNRD, mediante consenso válido – sem, todavia, obrigá-las a tanto, poden-do optar por litigar mediante a via ordinária da Justiça do Trabalho.

E esse ‘comum acordo’ a que se re-fere o RCNRD pode ser obtido tan-to antes do surgimento da disputa (mediante a previsão de cláusula compromissória) como após (me-diante a celebração de compro-misso arbitral). Veja-se, inclusive, o critério adotado pelo Código de Arbitragem em Matéria Esportiva do Tribunal Arbitral do Esporte, que admite, por exemplo, a concor-dância prévia das partes em con-trato para admitir a propositura de arbitragens ordinárias de sua com-petência – exatamente como se dá neste caso. Assim, percebe-se que não há qual-quer exigência de que a convenção de arbitragem pela qual se subme-tem disputas laborais à jurisdição da CNRD deva ser ratificada após a propositura de requerimento, como parece sugerir o Clube. Bas-ta que essa convenção exista e que a disputa se atenha ao seu objeto, podendo ser firmada no início da relação contratual, durante, no ato da sua extinção ou após a instaura-ção de uma demanda”.

Esse entendimento foi posteriormente con-firmado no Proc. 2018/TRB/091.

Já nos casos em que não há comum acordo, ainda assim se pode buscar a CNRD com o propósito de obter o reconhecimento de que o clube violou as obrigações assumidas nos seus contratos, à luz do art. 64 do RNRTAF. O julgamento desses casos tem algumas

peculiaridades, como decidido no processo 2017/O/014, julgado em 15.12.2017, sob rela-toria do Dr. Guilherme Guimarães:

“[...] Assim, tratando-se de inadim-plemento contratual entre clube brasileiro e atleta, o papel da CNRD é averiguar se a obrigação existe prima facie e se o devedor traz aos autos alguma justificativa capaz de interromper ou colocar em dúvida sua exigibilidade. Não se desin-cumbindo desse ônus, o clube fica sujeito às sanções associativas pre-vistas no art. 64 do RNRTAF. Mas a decisão da CNRD a esse respeito não ultrapassa a esfera associativa – isto é: não induz litispendência, não interrompe a prescrição, não tem o efeito de afastar a compe-tência do juízo eleito pelas partes caso se queira declarar eventual nulidade da obrigação, por exem-plo, e assim por diante.

Logo, sendo o cumprimento das obrigações financeiras acertadas en-tre o clube e atleta um dever regula-mentar, a CNRD possui competência para verificar se o regulamento está sendo cumprido – ou seja, se é de-vida obrigação financeira e se houve pagamento”.

Esse entendimento, inclusive diante de cláu-sula de eleição de foro, foi confirmado nos processos 2017/O/019, 2017/O/060, entre outros.

A alternativa da sentença parcial declarató-ria de competência para mitigar o risco das custas

Em algumas disputas submetidas à CNRD, pode haver justificado receio dos autores sobre a competência da CNRD para apreci-á-las. Para que não se exija o recolhimento de custas integrais nessas circunstâncias, a CNRD passou a admitir o pedido de sentença parcial declaratória de competência, confor-me decidido pela Presidência da CNRD em 10.10.2017 no Proc. CNRD 2017/O/053:

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BOLETIM DA CNRD, Nº 1, OUT. 2016/MAI. 202021

“Registra-se que a adoção de sen-tenças parciais em matéria de competência é prática recorren-te na arbitragem comercial, tanto doméstica quanto internacional, e hoje se encontra expressamente autorizada pelo art. 23, § 1º, da Lei nº 9.307/1996, conforme alteração promovida pela Lei nº 13.129/2015. É também adotada com frequên-cia pela Corte Arbitral do Esporte, conforme autoriza a parte final do art. R55 do Code of Sports-related Arbitration.

Assim, como forma de facilitar e estimular o acesso à CNRD, enten-de-se que, diante de pedido decla-ratório para emissão de sentença parcial sobre competência, para o qual não se pode fixar valor pe-cuniário exato, os jurisdicionados podem recolher a Taxa de Regis-tro e Administração ao piso de R$ 1.000,00, na forma do item 2.1.1 do Regimento de Custas da CNRD.

Registre-se que, uma vez admiti-da a competência da CNRD, se for o caso, caberá ao jurisdicionado a complementação de custas com base no valor pecuniário dos pe-didos principais, sobretudo os de natureza condenatória, para que o processo siga para julgamento”.

TRANSFERÊNCIAS

Estabilidade contratual

A CNRD tem sido chamada a decidir sobre a liberação de vínculo desportivo entre atletas e clubes ou a manutenção da estabilidade con-tratual, sobretudo em medida de urgência.

Em algumas oportunidades, a CNRD foi acio-nada por atletas que não tinham contrato profissional nem contrato de formação, e de-sejavam se desvincular de seus clubes. Nes-sas situações, como se deu no Proc. CNRD 2017/TRF/017, a Presidência da CNRD tem decidido o seguinte:

“Conforme o art. 29 do Regulamen-to Nacional de Registro e Transfe-rência de Atletas de Futebol (RNR-TAF), ‘[os] atletas não profissionais são livres para escolher e vincu-lar-se a quaisquer clubes’. Sendo incontroverso que o Requerente é atleta não-profissional, não se lhe pode negar o direito de escolher treinar em outro clube, pelo que a probabilidade de êxito desse pleito no mérito é bastante razoável.

O perigo de dano significativo tam-bém está presente, pois o Atleta, aos 16 anos, passa por momento crucial na evolução da sua carrei-ra. Deixá-lo vinculado a clube no qual não deseja mais treinar, em si-tuação litigiosa, está longe de ser medida adequada, pois lhe retira oportunidades de desenvolvimen-to e remuneração, que talvez não surjam novamente, dada a enorme competição por espaço nas divi-sões de base do futebol brasileiro. Ainda, a liberação do Atleta não é ir-reversível: seus vínculos de trabalho e desportivo podem ser futuramente restabelecidos com o [Clube] me-diante acordo, assim como o Clube pode ser indenizado pelos investi-mentos efetuados, se requerer e de-monstrar no momento oportuno os requisitos previstos na regulamenta-ção aplicável”.

O entendimento foi renovado nos Procs. 2017/TRF/024, 2017/TRF/052 e 2018/TRF/102, nos quais também inexistia contrato de forma-ção ou profissional.

Em alguns casos, todavia, havendo pedido de liberação de atleta com contrato profis-sional ou de formação em vigor, a Presidên-cia da CNRD tem sido cautelosa no exame dos pedidos de urgência.

Foi o que se deu no Proc. 2017/TRB/078, em que um atleta, ao completar 16 anos, havia assinado com o clube contrato de trabalho

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BOLETIM DA CNRD, Nº 1, OUT. 2016/MAI. 202022

pelo prazo de cinco anos, e após o terceiro ano de vigência requereu à CNRD sua libe-ração, com base no art. 18.2 do FIFA RSTP. A Presidência da CNRD negou o pedido de liberação, em 15.1.2018, nos seguintes termos:

“[...] o art. 18.2 do FIFA RSTP pode ser confrontado com o regime espe-cífico do contrato de trabalho des-portivo sob a lei brasileira. Afinal, o art. 30 da Lei nº 9.615/98 admite ex-pressamente o prazo de cinco anos para os contratos de trabalho de atleta profissional, sem distinguir a idade do atleta signatário.

Por sua vez, havendo dúvidas razoáveis so-bre a existência do direito de o clube assinar o primeiro contrato profissional ou exercer a preferência para assinar a primeira renova-ção, na forma do art. 29 da Lei nº 9.615/1998, a Presidência da CNRD tem buscado equili-brar os interesses de parte a parte e exigir um fluxo de informações que garanta ao clu-be a oportunidade de oferecer sua proposta e eventualmente cobrir outras apresentadas ao atleta, preservando a possibilidade de exercer os direitos derivados da lei. É o que se vê na decisão de urgência do Proc. 2018/TRF/213, emitida em 12.11.2018:

“[...] parece prudente, em cognição sumária, adotar algumas cautelas aptas a proteger a posição jurídica que o Clube entende ter, aplican-do-se, com as devidas adaptações, o conjunto de medidas que a CNRD já adotou em outro precedente en-volvendo debate sobre a estabili-dade contratual: (a) fazer com que o Atleta dê conhecimento a clubes interessados em contratá-lo sobre a existência dessa disputa e (b) de-terminar que a CBF e a Federação somente permitam a transferência do Atleta uma vez que o potencial adquirente manifeste o conheci-mento acerca desse litígio.

Nota-se que essa tutela é reversível por natureza, uma vez que não im-pede o registro do Atleta, nem lhe causa dano significativo – afinal, a existência dessa disputa é um fato consumado, e exigir que se dê co-nhecimento dela a terceiros é algo compatível com o dever de boa-fé que se espera do Atleta ao encetar negociações com outros clubes”.

Desnecessidade do CCF para cobrar meca-nismo de solidariedade nacional

No processo 2017/S/046, julgado em 19.4.2018, sob relatoria da Dra. Liselaine Mar-ques, a CNRD entendeu que é desnecessário que um clube seja titular do certificado de clube formador para ter direito ao mecanis-mo de solidariedade nacional:

“O art. 29 da legislação ordinária trata da ‘entidade de prática des-portiva formadora’, garantindo-lhe basicamente o direito de firmar o primeiro contrato profissional com um atleta ou ser indenizada em caso de frustração, desde que se-jam cumpridos determinados re-quisitos, entre os quais possuir o CCF.

Trata-se, portanto, de um artigo que disciplina a relação existente entre clube e atleta no momento da sua formação e da sua profissio-nalização.

Diante desse potencial conflito, o art. 13 do RNRTAF 2017 parece ter adotado uma espécie de solução intermediária, admitindo a cele-bração de contrato de trabalho por cinco anos pelo atleta menor de 18 anos, como permite a legislação brasileira, ressalvando, contudo, que somente os primeiros três anos devem ser eficazes ‘em caso de li-tígio submetido a órgão da FIFA’.[...] Portanto, como se trata de requeri-mento de liberação de vínculo des-portivo perante a CNRD (que não é órgão da FIFA), e havendo expres-sa permissão na lei brasileira e no RNRTAF para que atleta e clube as-sinem contrato pelo prazo de cinco anos, parece prematuro antecipar eventual declaração de nulidade parcial do Contrato”.

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BOLETIM DA CNRD, Nº 1, OUT. 2016/MAI. 202023

O art. 29-A da mesma lei prevê às ‘entidades de prática desportivas que contribuíram para a formação do atleta o direito de receber um percentual do valor que dois clubes acertarem por uma transferência. A relação, como se vê, é entre clubes, não se cria direitos ou deveres ao atleta. Os direitos e deveres são dos clubes em receber e pagar um percentual calculado sempre de acordo com a certidão fornecida pela entidade nacional de adminis-tração do desporto’. Não há a dis-posição de requisitos, portanto”.

O entendimento foi confirmado nos Procs. 2017/S/058 e 2017/S/061.

Recolhimento do mecanismo de solidarie-dade nacional

No Proc. 2017/S/064, julgado em 22.2.2018, sob relatoria do Dr. Guilherme Guimarães, a CNRD definiu que, na ausência de dispo-sição contratual a respeito, o percentual de mecanismo de solidariedade nacional deve ser recolhido conforme o cronograma de pa-gamentos da transferência do atleta, e não mediante parcela única logo após a transfe-rência:

“Observa-se que o § 3º do art. 29-A da Lei nº 9.615/1998 fixa o prazo de ‘30 dias da efetiva transferência’ para que se distribuam proporcio-nalmente os valores pertinentes. Em linha semelhante, o art. 59 do RNRTAF estabelece que ‘[o] valor do mecanismo de solidariedade será pago pelo novo clube do atle-ta sem necessidade de solicitação por parte dos clubes formadores do atleta dentro dos 30 dias se-guintes à sua inscrição pelo novo clube’. Considerando que as partes optaram por diferir o pagamento da primeira etapa da transferência em diferentes parcelas, bem como atribuir ao [Clube A] responsabili-dade exclusiva por essa obrigação,

entende-se que o prazo de 30 dias para pagamento deve contar do depósito de cada parcela ajustada, e não da inscrição do Atleta pelo [Clube B]”.

Por sua vez, no Proc. 2018/S/165, julgado em 28.11.2019, sob relatoria do Dr. Luiz Fernando Ribeiro, a CNRD entendeu que, para se defi-nir o mecanismo de solidariedade nacional, a base de cálculo do tempo de formação do atleta deve considerar o período compreen-dido entre seus aniversários, e não as tem-poradas em que completou cada idade, de forma diversa do previsto no FIFA RSTP:

“A esse respeito, destaca-se que a Lei nº 9.615/1998 usa como base de cálculo o período compreendido entre os aniversários do atleta, e não as temporadas em que o atleta completou determinada idade, ao contrário do que prevê a regula-mentação da FIFA”.

Transferência-ponte

Um dos temas de maior expectativa desde a criação da CNRD é a definição de seus en-tendimentos sobre a vedação às transferên-cias-ponte.

A partir dos casos julgados, a CNRD firmou orientação de que a qualificação de uma transferência-ponte deve ser analisada em cada caso, com enfoque nas provas sobre a finalidade da transferência e as circunstân-cias entre os clubes envolvidos na operação.

No Proc. 2017/DRT/011, julgado em 15.8.2018, sob a relatoria da Dra. Ana Beatriz Macedo, a CNRD expôs o seu método para analisar a ocorrência de transferência-ponte:

“[O art. 34, § 1º, do RNRTAF] tra-balha com uma descrição geral do que pode vir a ser uma transferên-cia-ponte, sem tentar oferecer um conceito demasiadamente fecha-do – pois os conceitos fechados sempre trazem consigo o risco de contemplar mais ou menos condu-tas do que aquelas que se deseja regular. Nessa descrição, o elemen-to que se destaca é a falta de fina-

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BOLETIM DA CNRD, Nº 1, OUT. 2016/MAI. 202024

lidade esportiva na transferência – ou seja, esse é o indicativo mais relevante de que uma transferên-cia pode ser irregular. Além dele, deve-se perquirir se as partes visa-vam à obtenção de vantagem com a transferência-ponte.

Em paralelo, o § 2º lida com um conjunto de presunções relativas – isto é, consequências ‘que a lei tira de um fato conhecido, para admitir um desconhecido’ – que autorizam se concluir pela ausência de finali-dade esportiva. E essas presunções são relacionadas num rol exempli-ficativo. Desse modo, o intérprete recebe uma série de orientações sobre as questões de fato que deve ponderar, cuja presença lhe indica a prática da infração. Mas o § 3º confere aos denunciados a opor-tunidade de afastar essas presun-ções, mediante nove critérios obje-tivos, além da abertura para outros critérios que o intérprete considere aplicáveis.

Com isso, o art. 34 do RNRTAF ofe-rece um conjunto de pautas para a CNRD avaliar, caso a caso, a ocor-rência de infração: ela sabe quais são os principais elementos a inves-tigar; ela parte de presunções rela-tivas na presença de alguns elemen-tos de fato; ela tem um conjunto de critérios objetivos que lhe recomen-dam afastar essas presunções. Está--se diante de um exemplo notável, digno de elogios, do que a metodo-logia jurídica convencionou deno-minar raciocínio tipológico de pro-dução normativa, em substituição ao raciocínio conceitual abstrato.

Diante dessas pautas, a CNRD deve, então, verificar: (a) se havia finalida-de desportiva no registro dos atletas [...]; e (b) se os Denunciados visavam a obter vantagem, direta ou indireta, com as transferências”.

Com base nesses parâmetros, a CNRD ana-lisou um conjunto de casos sobre a matéria. No Proc. 2018/DRT/114, julgado em 15.8.2019, sob relatoria do Dr. Luiz Fernando Ribeiro, a CNRD entendeu que os clubes denunciados conseguiram demonstrar a finalidade esporti-va do registro do atleta – notadamente, a con-tratação para atuar em competição de curta duração, com seu empréstimo a outra equipe para ganhar ritmo de jogo, tendo o atleta se lesionado e não podendo ser aproveitado no retorno ao clube cedente:

“[...] há razoabilidade nos argu-mentos e provas que o Clube apre-sentou. Isso porque é plausível imaginar que o Clube tenha contra-tado o Atleta A e o Atleta B visando à sua utilização, o que não se con-cretizou em razão de um problema de saúde que o Atleta B enfrentou e que, para todos os fins, está com-provado nos autos mediante laudo médico que não foi impugnado”.

Já no Proc. 2018/DRT/113, que envolvia o mesmo clube denunciado, julgado também em 15.8.2019, sob a relatoria do Dr. Luiz Fer-nando Ribeiro, a CNRD entendeu em sentido diverso, uma vez que as provas não aponta-vam finalidade esportiva na transferência:

“[...] os Denunciados não apresenta-ram qualquer elemento capaz de afas-tar essa presunção, o que lhes cabia na forma do § 3º do art. 34 do RNRTAF.

O Clube basicamente argumenta que a transferência tinha finalidade des-portiva, mas que precisou contratar outro jogador para a função diante da demora para regularizar o Atleta, razão pela qual ele não seria mais uti-lizado e foi cedido temporariamente.

A esse respeito, a DRT da CBF infor-mou que o Clube iniciou a instrução no sistema FIFA TMS em 23.6.2017 e fina-lizou o registro do Atleta em 5.7.2017. Portanto, em menos de 15 dias.

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BOLETIM DA CNRD, Nº 1, OUT. 2016/MAI. 202025

Diante disso, a CNRD entende não ter havido demora anormal no pro-cedimento de registro do Atleta, so-bretudo a ponto de justificar a con-tratação de outro jogador”.

A CNRD também já entendeu ser desne-cessário verificar a ocorrência de vantagem financeira para caracterizar uma transferên-cia-ponte. A esse respeito, vale mencionar a decisão do Proc. 2017/DRT/011, de relato-ria da Dra. Ana Beatriz Macedo, emitida em 15.8.2019:

“A CNRD entende que a DRT está correta ao apontar a prática de transferência-ponte no caso. Isso porque, a partir do momento em que o Clube A e o Clube B se uti-lizaram do acesso do Clube C ao sistema FIFA TMS para contratarem atletas que clubes sem acesso ao sistema não conseguiriam, eles ob-tiveram vantagem em relação a ou-tros clubes na mesma condição.

Nesse sentido, ainda que não te-nham sido comprovados quaisquer pagamentos em favor do Clube C ou de seu operador de TMS, é possí-vel verificar que o Clube A e o Clube B alcançaram vantagem pela ope-ração, o que se deu unicamente em razão de ação deliberada do Clube C – mesmo que por cortesia, o que há de repercutir na dosimetria da sanção.

Por sua vez, o Clube C contribuiu di-retamente para a vantagem obtida pelo Clube A e pelo Clube B, tendo participado da prática da infração. Deve, igualmente, sofrer sanções em decorrência dessa conduta.

Assim como os Clubes, os Atletas também obtiveram vantagem na realização das transferências, uma vez que, sem o procedimento ve-dado, não teriam conseguido que o Clube A e o Clube B os registras-sem. Contudo, a CNRD entende que

a responsabilidade dos Atletas não pode ser equiparada à dos Clubes, que são os responsáveis por ge-renciar o sistema FIFA TMS – o que igualmente há de repercutir na dosi-metria da sanção”.

O conteúdo da obrigação de contratar se-guro nas transferências temporárias.

No Proc. 2018/O/147, relativo a transferên-cia temporária de atleta, a CNRD analisou cláusula contratual acerca da obrigação de o clube cessionário contratar seguro de vida e acidentes pessoais do atleta, tendo como beneficiário o clube cedente. Discutia-se no caso se o risco a ser segurado deve se limitar aos riscos da profissão, ou se também de-vem contemplar outros riscos, como aciden-te automobilístico. Em julgamento realizado em 24.10.2019, sob a relatoria do Dr. Roberto Barracco, e considerando as cláusulas con-tratuais, a CNRD entendeu que o risco a ser coberto não estava limitado àqueles deriva-dos da relação de trabalho, pois visavam a proteger o valor econômico do atleta, dife-rentemente do seguro a que se refere o art. 45 da Lei nº 9.615/1998:

“[...] o texto da Cláusula 6.4 não restringe a cobertura do seguro às atividades relacionadas à prática desportiva, nem se relaciona ex-pressamente com o art. 45 da Lei nº 9.615/1998. Diante disso, cabe à CNRD interpretar o Contrato para tentar buscar o sentido e o alcan-ce da obrigação fixada entre as Partes, à luz dos parâmetros legais para tanto. [...] o seguro do art. 45 da Lei nº 9.615/1998 cobre os interesses rela-tivos à carreira do jogador, em be-nefício de si ou de seus dependen-tes, cujos riscos se relacionam com a relação de trabalho; já o seguro combinado entre os clubes cobre os interesses relacionados ao valor econômico do jogador, em benefí-cio do cedente – que perde esse va-lor ainda que o atleta sofra alguma lesão ou acidente significativo fora das suas relações de trabalho”.

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BOLETIM DA CNRD, Nº 1, OUT. 2016/MAI. 202026

RELAÇÕES DE TRABALHO

Em matéria trabalhista, questão recorrente tem sido a discussão sobre a aplicação dos arts. 467 e 477, § 8º, da CLT aos procedimen-tos da CNRD.

No Proc. 2018/TRB/091, cuja sentença foi emitida em 28.1.2019, sob relatoria da Dra. Ana Beatriz Macedo, a CNRD entendeu que a multa prevista no art. 467 da CLT não é devida quando as partes estabelecem multa própria no distrato para casos de seu inadim-plemento.

O entendimento foi reforçado no Proc. 2018/TRB/121, também sob relatoria da Dra. Ana Beatriz Macedo, cuja sentença foi proferida em 31.10.2019:

“A esse respeito, a CNRD destaca que as Partes livremente negocia-ram os valores e as condições que entendiam razoáveis para o paga-mento das verbas decorrentes da relação havida até a assinatura do Distrato. Dentre as várias condi-ções, verifica-se que há a previsão de multa em caso de atraso, cons-tante na Cláusula 3ª.

Por esse motivo, a CNRD indefere a aplicação da multa do art. 467 da CLT, em linha com julgamento an-terior e com o que a própria Justiça do Trabalho aplica em casos seme-lhantes”.

Por sua vez, a CNRD deferiu a multa previs-ta no art. 477, § 8º, da CLT nos Procs. 2017/TRB/039 e 2017/TRB/040, cuja sentença foi emitida em 14.5.2018, sob a relatoria da Dra. Liselaine Marques. O entendimento foi chan-celado posteriormente no Proc. 2018/TRB/181.

RELAÇÕES COM INTERMEDIÁRIOS

Grande parte dos procedimentos da CNRD envolvem relações entre intermediários e seus clientes. Portanto, os principais temas tratados nessas disputas merecem destaque.

Regulamentos aplicáveis às relações envol-vendo intermediários no tempo

Diante da sequência de regulamentos, da FIFA ou da CBF, acerca das relações envol-vendo intermediários, a CNRD delimitou no Proc. 2017/I/049 como se dá a incidência dos diferentes diplomas ao longo do tempo. Em sentença proferida em 16.10.2018, sob re-latoria do Dr. Luiz Fernando Ribeiro, assim se esclareceu:

“É incontroverso nos autos que a vigência do Contrato teve início em 24.5.2015. Assim, no entendi-mento unânime da CNRD, a regu-lamentação aplicável à época da assinatura do Contrato consistia, a nível nacional, no Regulamento de Agentes de Jogadores da CBF (o ‘RAJ CBF’), que entrou em vigor em 8.10.2001 e só foi revogado ex-pressamente pelo RNI de 2015; e, a nível internacional, no Regulations on Working with Intermediaries da FIFA (o ‘FIFA RWI), em vigor des-de 1.4.2015, que revogou expressa-mente o FIFA PAR 2008.

Deve-se esclarecer que o RNI de 2015 entrou em vigor mediante a RDP nº 05/2015 da CBF, publicada no site da CBF em 27.4.2015. As-sim, apesar de constar no art. 41 do RNI de 2015 que sua vigência teria início em 24.4.2015, a CNRD considera que não estava em vigor àquela altura, pois não estava pu-blicado. Por isso, no entendimen-to da CNRD, a data que deve ser considerada como marco inicial da entrada em vigor do RNI de 2015 é 27.4.2015, data da sua publicação, e não 24.4.2015.

Logo, não estando em vigor o RNI de 2015 em 24.4.2015, data de as-sinatura do Contrato, a regulamen-tação nacional que lhe era aplicável era ainda o RAJ CBF”.

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BOLETIM DA CNRD, Nº 1, OUT. 2016/MAI. 202027

Caráter meramente sugestivo do percentual de 3% de comissão previsto no no art. 7.3 do FIFA RWI

Em 11.10.2018, a CNRD proferiu sentença nos processos 2017/I/068 e 2017/I/069, de rela-toria do Dr. Luiz Fernando Ribeiro, nos quais entendeu que a referência à limitação dos valores de comissão por intermediação a 3% da operação, constante no FWI e em edições iniciais do RNI, tem natureza sugestiva, e não cogente:

“[...] é possível perceber a liberda-de franqueada às Partes para acor-dar o valor a ser pago pelo servi-ço de intermediação, não havendo efetiva limitação por parte do RNI, nem pelo FIFA RWI. Isto é: a FIFA e a CBF não criam qualquer tipo de limitação ou teto para a comissão dos intermediários – como inclusi-ve já entendeu esta CNRD em caso pretérito.

O art. 7.3 do FIFA RWI prevê ex-pressamente que como uma reco-mendação os clubes podem seguir alguns parâmetros para remune-rarem os intermediários, entre os quais um percentual que não exce-da a 3%. O art. 19 do RNI de 2015 traz recomendação semelhante, conforme já decidido pela CNRD”.

A decisão confirma entendimento em mes-ma linha direcionado ao art. 20, § 4º, do FIFA PAR, tido no Proc. 2017/I/025, julgado em 9.5.2018, sob a relatoria da Dra. Liselaine Marques, e posteriormente também nos pro-cessos 2017/I/067 e 2018/I/131.

A adoção da teoria da causa efetiva para a cobrança de comissões por intermediários

Nas matérias referentes à intermediação, destaca-se o entendimento da CNRD sobre o intermediário ter que provar que prestou serviços em uma operação para ter direito a receber a respectiva comissão.

Trata-se de entendimento que a CNRD cons-truiu desde o início de suas análises e que se encontra em linha com entendimentos do TAS. O tema se encontra bem delimitado no Proc. 2017/I/051, de relatoria da Dra. Ana Be-atriz Macedo, julgado em 11.9.2019:

“[...] o intermediário deve compro-var que a sua participação foi de-terminante na conclusão do negó-cio para que tenha direito a receber comissões que lhe sejam relativas. Ou seja, ‘[é] preciso, em especial, que o intermediário efetivamente atue na transferência ou no contra-to de trabalho negociado’. Trata-se de perspectiva que já vinha sendo adotada pelo extinto Comitê de Re-solução de Litígios da CBF e que é compartilhada pela jurisprudência do TAS, a que se convencionou de-nominar effective cause doctrine. E o ônus de demonstrar essa atuação efetiva compete à Intermediária, conforme o art. 16, § 2º, do RCNRD.

Sobre isso, [...], é possível perceber nas provas apresentadas que a In-termediária não foi determinante para a concretização do negócio, mesmo porque não demonstra ter apresentado qualquer proposta formal do Clube ao Atleta. A CNRD observa que a Intermedi-ária participou de reuniões e tro-cas de e-mails com representante do Clube somente durante o mês de julho – o que, inclusive, é incon-troverso. Apesar disso, percebe-se pelas mensagens trocadas com o Atleta que a Intermediária passou a dedicar a sua atenção a outras ne-gociações, que não se mostraram concretas, deixando à margem as tratativas com o Clube.

Tal postura, inclusive, fez com que o Clube contatasse diretamente o Atleta, que negociou as condições para assinar um pré-contrato em novembro, cerca de quatro meses

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BOLETIM DA CNRD, Nº 1, OUT. 2016/MAI. 202028

após o Clube ter procurado o Atleta e conversado com a Intermediária, portanto.

Nesse sentido, a CNRD entende que a Intermediária não se desincumbiu do ônus de demonstrar sua atuação determinante, causal, para o fecha-mento do contrato de trabalho en-tre o Atleta e o Clube. Logo, não lhe há fundamento jurídico para rece-ber comissão por contrato que não prospectou, para o qual não foi re-levante para o prosseguimento das tratativas – e que, aparentemente, sequer entendia que devia ser con-cluído, uma vez que, pelas provas apresentadas, parece ter buscado constantemente afastar os repre-sentantes do Clube e se dedicar a supostas propostas vindas de [ou-tro país]”.

A multa por quebra de exclusividade

A CNRD também tem analisado com frequ-ência debates sobre multas por extinção de contratos de intermediação por quebra de exclusividade.

Seu entendimento a respeito teve início a par-tir do Proc. 2017/I/044, cuja sentença foi emi-tida em 20.12.2017, sob relatoria do Dr. Guilher-me Guimarães. Deixou-se claro que o art. 412 do Código Civil não impede que as multas te-nham valor superior ao das comissões que o intermediário tem direito a receber:

“[...] a análise sobre a obrigação principal no contrato de interme-diação não pode se limitar ao cál-culo das comissões devidas sobre os salários em vigor, pois a presta-ção a que o intermediário se obri-ga compreende um fazer contínuo, que requer planejamento, dedica-ção e diligência, e que se destina a proporcionar ao atleta remune-rações que podem alcançar enor-me monta no futuro – tendo valor econômico de difícil mensuração. E todos esses fatores devem ser levados em consideração, à luz do

caso concreto, no momento de se verificar o cumprimento parcial da obrigação e a abusividade, despro-porcionalidade ou o excesso no va-lor da multa”.

Esse entendimento foi confirmado nos pro-cessos 2017/I/073 e 2018/I/106.

Outra questão recorrente nas disputas entre intermediários e seus clientes é a redução de multas potencialmente excessivas.

Ao aplicar a legislação sobre a matéria, a CNRD tem buscado adotar um conjunto de critérios para realizar essa tarefa em cada caso, como se registrou no Proc. 2017/I/073, de relatoria do Dr. Luiz Fernando Ribeiro, sentenciado em 24.6.2019:

“É sabido que o Direito brasileiro estabelece limites à autonomia pri-vada na fixação de multas contra-tuais. Na hipótese específica dos contratos entre atletas e intermedi-ários, tanto a lei geral quanto a lei especial impõem ao julgador verifi-car se os valores das multas respei-tam determinados critérios, numa análise que se deve fazer caso a caso.

A esse respeito, o art. 412 do Códi-go Civil define que o ‘valor da co-minação imposta na cláusula penal não pode exceder o da obrigação principal’. Já o art. 413 do Código Civil estabelece que a penalidade ‘deve ser reduzida equitativamente pelo juiz se a obrigação principal ti-ver sido cumprida em parte, ou se o montante da penalidade for mani-festamente excessivo, tendo-se em vista a natureza e a finalidade do negócio’.

Além disso, o art. 27-C da Lei no 9.615/1998 reputa nulas de pleno direito as cláusulas contratuais fir-madas entre atleta e seu ‘agente desportivo’ que ‘estabeleçam obri-gações consideradas abusivas ou desproporcionais’ (inciso IV).

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BOLETIM DA CNRD, Nº 1, OUT. 2016/MAI. 202029

Uma síntese dessas regras, por-tanto, impõe à CNRD verificar se as multas previstas nos contratos de representação são compatíveis com as obrigações de parte a par-te, ou se são abusivas, despropor-cionais ou manifestamente excessi-vas; exige também que se analise se as obrigações foram cumpridas ao menos em parte – tudo isso sem descurar da natureza e da fi-nalidade do negócio. Vale lembrar, ainda, que o ônus de demonstrar a ocorrência dessas circunstâncias incumbe ao Atleta, na forma do art. 16, § 2º, do RCNRD”.

Além disso, a CNRD considera que a finalida-de da multa por quebra de exclusividade é proteger interesses legítimos do intermedi-ário, à luz dos esforços que ele emprega em prol do seu cliente, o que deve servir de bali-za em eventual redução de multa contratual. Isso se registrou no mesmo Proc. 2017/I/073:

“Especificamente no que diz respei-to à multa por quebra antecipada de contratos de intermediação, sa-be-se que os danos dela derivados são de difícil prova e quantificação, notadamente por se aproximarem das categorias dos lucros cessan-tes ou da perda de chance. Por esse motivo, não é incomum que esses contratos contenham cláusulas de exclusividade acompanhadas de multas específicas, destinadas a liquidar contratualmente a indeni-zação devida ao intermediário. É o caso dos autos, inclusive.

Importante anotar, ainda, que é co-mum a atividade do intermediário contemplar todo um planejamento para a carreira do cliente, especial-mente na representação de jovens talentos (como é o caso dos autos) – o que por vezes envolve a passa-gem progressiva por clubes de di-ferentes patamares, em busca de melhores oportunidades de expo-sição, ou o aguardo pelo momento certo de integrar o plantel principal de um clube de grande projeção e negociar contrato de longo prazo. Assim, nem sempre o investimento

de tempo e esforço do intermediá-rio se remunera imediatamente no primeiro contrato negociado: pode ser necessário aguardar tempo considerável para que, após uma ou duas transferências, uma ou duas temporadas, o atleta alcance desempenho e projeção capazes de, em conjunto com o intermedi-ário, realizar a sonhada transferên-cia para clubes de ponta do Brasil ou do exterior. A extinção abrupta do contrato tende a frustrar esse in-vestimento, de difícil recuperação.

Acrescenta-se que, a depender das circunstâncias concretas, o inter-mediário pode fazer jus a comis-sões incidentes sobre períodos que ultrapassem a própria relação de intermediação. É o caso do inter-mediário que, no seu segundo ano de assessoria ao cliente, prospec-ta contrato de trabalho por cinco anos; em casos tais, como regra, o intermediário faz jus às comissões incidentes sobre as remunerações recebidas pelo atleta nos anos sub-sequentes ao término do contrato de representação”.

A responsabilidade do atleta pela assinatura de documentos sem as devidas cautelas

Em linha com entendimentos manifestados pelos órgãos judicantes da FIFA, a CNRD já teve a oportunidade de registrar que os atle-tas são responsáveis pelos documentos que assinam sem ler. Em sentença emitida em 23.8.2017 no Proc. CRL 2015/I/011, sob rela-toria do Dr. Luiz Fernando Ribeiro, e adotan-do entendimento do DRC da FIFA no caso nº 03132169, a CNRD assim pontuou:

“A solução reconhecida pelas esfe-ras esportivas em situações desse perfil, como se sabe, é a de reco-nhecer que ‘uma parte que assina um documento de importância legal sem o conhecimento preciso do seu conteúdo o faz sob sua própria res-ponsabilidade’. E nesse caso se vê que o Atleta faltou com diligência capaz de evitar o resultado incomum da sua transferência para o Clube”.

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A CNRD manteve essa orientação no Proc. 2017/I/065, cuja sentença foi emitida em 19.11.2019, sob relatoria do Dr. Luiz Fernando Ribeiro:

“O Atleta não nega que assinou o Terceiro Contrato de Represen-tação e tampouco aponta haver qualquer fraude ou vício de con-sentimento a seu respeito. Ade-mais, o Atleta não demonstra que o Intermediário tenha se recusado a entregar o Terceiro Contrato de Re-presentação após instado a fazê-lo. E, como a CNRD tem entendido, os atletas são responsáveis pelos do-cumentos que assinam”.

A multa prevista somente em favor do inter-mediário não se aplica igualmente em favor do atleta, se não houver previsão contratual

Uma vez que o descumprimento do con-trato de representação gera consequências distintas para o intermediário e para o atle-ta, eventual multa prevista para extinção por descumprimento do atleta não pode ser in-vocada a favor do atleta, se o contrato assim não previr. A CNRD expôs seu entendimento a respeito no Proc. 2017/I/051, cuja senten-ça foi proferida em 11.9.2019, sob relatoria da Dra. Ana Beatriz Macedo:

“[...] a multa fixada nos contratos de representação em favor do in-termediário, sobretudo por quebra de exclusividade, tem por objetivo mitigar o risco de que eventual re-presentação do seu cliente por ou-tros intermediários prejudique os esforços envidados na obtenção de propostas. Nota-se, inclusive, que esse raciocínio está cristalizado na Cláusula 5.3 do Contrato, cuja par-te final expressamente menciona o propósito da cláusula de indeni-zar a Intermediária ‘em razão do tempo de trabalho despendido da equipe da Intermediária para aten-der o Atleta’.

Mas os atletas não sofrem esses mesmos riscos – e, por consequên-cia, o descumprimento dos deveres e obrigações pelos intermediários não devem estar sujeitos necessa-

riamente à mesma consequência jurídica. Devem os atletas fazer constar nos contratos cláusulas ex-pressas com multas em seu favor ou, não o fazendo, pleitear a repa-ração dos danos sofridos na forma da lei”.

A restituição em dobro de comissão já paga exige prova da má-fé na cobrança

A CNRD já analisou por diversas vezes pedi-dos de restituição em dobro de valor já pago e indevidamente cobrado, à luz do art. 940 do Código Civil. Em linha com a jurisprudên-cia brasileira, a CNRD adota o entendimento de que é preciso provar a má-fé do requeren-te para que o contrapleito tenha êxito.O Proc. 2016/I/005, cuja sentença foi lavrada em 23.10.2017, sob relatoria do Dr. Luiz Fer-nando Ribeiro, enuncia essa orientação:

“[...] o entendimento consolidado no Direito brasileiro a respeito do art. 940 do Código Civil recomen-da cautela do julgador ao analisar pedido contraposto de cobrança em dobro de valores já pagos. Essa parcimônia já era visível na Súmula nº 151 do Supremo Tribunal Federal, de 1963, segundo a qual ‘cobrança excessiva, mas de boa--fé, não dá lugar às sanções do art. 1.531 do Código Civil [correspon-dente ao atual 940]’, e continua sendo exercida pela jurisprudên-cia do Superior Tribunal de Justi-ça, firme no entendimento de que ‘a incidência da sanção prevista no art. 940 do CC⁄02 depende da de-monstração concreta de má-fé do exequente’.

Assim, considerando que a boa-fé se presume e a má-fé depende de prova robusta [...], não parece reco-mendável imputar o atributo da má--fé à própria inicial, in re ipsa, não havendo outro elemento de prova sobre atuação dolosa do Intermedi-ário com este Requerimento”.

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Essa mesma orientação foi confirmada no Proc. 2017/I/025, cuja sentença foi publicada em 9.5.2018, sob relatoria da Dra. Liselaine Marques:

“Em síntese, a CNRD firmou os en-tendimentos de que (a) a sanção a que se refere o art. 940 do Código Civil requer a prova da má-fé do cre-dor ao efetuar a cobrança (isto é: de que ele sabia ou deveria saber, em-pregando diligência razoavelmente esperada, estar cobrando dívida já paga); e (b) a mera cobrança de va-lor já pago, mas sobre o qual haja razoável dúvida ou controvérsia, não é suficiente para atrair a aplica-ção da regra invocada”.

Vale mencionar que, no caso Proc. 2016/I/005, a CNRD considerou inexistir prova da má-fé, ao passo que foi convencida da má-fé do requerente no Proc. 2017/I/025, deferindo, portanto, a compensação de par-te do valor pleiteado em favor do clube re-querido.

Uso de intermediário não registrado

À luz do RNI, os clubes, atletas e treinado-res não podem utilizar serviços de interme-diação prestados por pessoa não registrada na CBF. A esse respeito, a CNRD já sancio-nou todas as partes envolvidas numa opera-ção por infração à regra aplicável, conforme sentenças dos Procs. 2016/DRT/002 e 2016/DRT/003, de relatoria da Dra. Liselaine Mar-ques, prolatadas em 11.12.2017:

“Assim, mesmo que o Clube não tenha celebrado contrato com o Intermediário ou tenha recebido seu auxílio direto durante a nego-ciação, fato é que esteve conscien-temente envolvido em negociação que se desenvolveu com a atuação de intermediário irregular.

A propósito, reitera-se que os pre-postos do Clube tinham conheci-mento, ou deveriam ter, de que a

negociação desenvolvida teve a participação de uma pessoa que o RNI não permite, por não ser inter-mediário regularmente cadastrado na CBF. Vale mencionar que a lis-ta dos intermediários cadastrados é de fácil acesso para pesquisa no site da CBF.

Percebe-se, portanto, que o Atleta efetivamente fez uso dos serviços do Intermediário, de forma ativa, socorrendo-se de seu auxílio; en-quanto o Clube, por sua vez, partici-pou conscientemente da assinatura de um contrato fruto dos serviços de intermediário não cadastrado”.

INADIMPLÊNCIA FINANCEIRA

Questão que rotineiramente aparece nos procedimentos em curso perante a CNRD é a necessidade de emissão de notas fiscais para que uma obrigação se torne exigível, na for-ma dos contratos.

A esse respeito, no Proc. 2018/I/143, julgado em 26.7.2019, sob a relatoria do Dr. Luiz Fer-nando Ribeiro, a CNRD decidiu o seguinte:

“[...] a CNRD entende que, da mes-ma forma que as Partes negociaram e estabeleceram o valor a ser pago em razão dos serviços prestados, também estabeleceram que a Inter-mediária deveria emitir a nota fis-cal e indicar a conta bancária para receber os valores. E isso parece ter razão de ser: o envio das notas ficais e dos dados bancários pare-ce ter sido previsto como etapa ne-cessária para o pagamento, o que é habitual em transações comerciais, pois é o credor quem deve arcar com o ônus de efetuar os cálculos e descontos tributários previstos, por ter interesse em receber, sem que com isso transmita ao devedor a in-cumbência de verificar qual seria o valor líquido devido para proceder aos pagamentos com as retenções aplicáveis.

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BOLETIM DA CNRD, Nº 1, OUT. 2016/MAI. 202032

Ainda que considerada a notifica-ção enviada ao Clube, em nenhum momento a Intermediária informa que haveria uma condição suspen-siva à obrigatoriedade do envio da nota fiscal, consistente numa práti-ca do mercado que contraria o tex-to expresso da Cláusula Segunda.

E para essas situações, Pontes de Miranda ensina que ‘não se pré-ex-clui o julgamento da procedência da demanda; apenas se condena o demandado a prestar simultanea-mente, ao receber a prestação’.

Portanto, a consequência da fal-ta de emissão da respectiva nota fiscal é a inexistência de atraso de pagamento por parte do Clube, por não ter a Intermediária praticado a conduta prévia que o Contrato lhe exige, o que afasta a incidência da

multa e dos juros de mora pactua-dos na cláusula 1.3 do Contrato so-bre o montante devido.

Isso não significa, todavia, que a pretensão da Intermediária deva ser julgada improcedente. Afinal, como o próprio Clube invoca a seu favor a exceção de contrato não cumprido, sabe-se que, de acordo com os especialistas, o seu acolhi-mento não acarreta a improcedên-cia do pedido, mas tão somente a suspensão da exigibilidade da obri-gação do devedor.

Logo, uma vez que a Intermediária apresente formalmente o docu-mento ao Clube, a cobrança há de ser eficaz”.

O entendimento é resultado de outros jul-gamentos, como os dos Procs. 2017/O/014 e 2017/I/067.

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A CNRD tem acompanhado diferentes mani-festações do Poder Judiciário acerca de suas competências e decisões.

O que se nota, invariavelmente, é o alinha-mento entre os precedentes judiciais e a vi-são da CNRD a respeito de seus trabalhos: na presença de convenção de arbitragem elegendo a CNRD para dirimir determinado conflito, a CNRD atua como tribunal arbitral e sua sentença tem a natureza de sentença arbitral; não havendo convenção de arbi-tragem, a CNRD atua nos limites da esfera associativa, de modo que sua decisão pode resultar na aplicação de sanções esportivas, mas não forma título executivo, nem produz os outros efeitos de uma sentença arbitral.

A JURISDIÇÃO ARBITRAL DA CNRD DIANTE DE CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA

Ainda no início de 2018, em decisão em agra-vo de instrumento correndo sob segredo de justiça, a CNRD foi considerada “juízo arbitral competente” para apreciar questões deriva-das de contrato que tinha cláusula compro-missória a elegendo para dirimir seus litígios.

Essa mesma visão foi adotada pela 17ª Câ-mara Cível do TJRJ, em maio de 2018, em decisão acerca de contrato com cláusula compromissória elegendo o extinto CRL, su-cedido pela CNRD, extinguindo o processo sem julgamento de mérito:

“Restou incontroverso que no con-trato havia previsão de cláusula de arbitragem. [...] Ora, se a Câmara passou a funcionar com as mesmas finalidades do Comitê, cabe a ela analisar a matéria aqui discutida, já que as partes assim convenciona-ram em contrato” 5.

Seguindo essa tendência, e em linha com o princípio da competência-competência, o Juízo da 4ª Vara Cível do Foro Central de São Paulo entendeu em junho de 2019 que, dian-te de cláusula compromissória elegendo a CNRD, é a própria CNRD quem deve avaliar sua competência para apreciar eventual dis-puta acerca do contrato:

“Impõe-se a extinção do feito sem resolução de mérito, porquanto presente pressuposto processual negativo, consistente em cláusula compromissória arbitral. [...] Nesses termos, necessário observar o prin-cípio da ‘competência-competência’ basilar ao instituto da arbitragem, de tal sorte que o Ordenamento Jurídico confere ao Juízo Arbitral a prerrogativa de decidir sobre sua própria competência (artigos 8º e 20 da Lei de Arbitragem) – onde fala que a CNRD é competente para analisar a sua competência, diante da cláusula compromissória” 6.

Mais recentemente, em abril de 2020, foi a vez de o 7º Juizado Especial Cível de Brasília extinguir processo sem resolução de mérito diante da existência cláusula compromissó-ria elegendo a CNRD:

“Considerando que a parte requerida suscitou a existência de convenção de arbitragem, a jurisdição estatal não restou prorrogada, conforme in-teligência do artigo 337, inciso X e § 6°, do CPC, tornando-se vinculativa a competência do juízo arbitral para a resolução da controvérsia instaurada, decorrente do contrato celebrado en-tre as partes” 7.

O ALINHAMENTO ENTRE A CNRD E AS DECISÕES JUDICIAIS A SEU RESPEITO

5 TJRJ, 17ª Câmara Cível, AC nº 0280532-13.2016.8.19.0001, j. 16.5.2018.6 TJSP, 4ª Vara Cível do Foro Central da Comarca da Capital, Processo nº 1015827-64.2019.8.26.0100, j. 19.6.2019.7 TJDFT, 7º Juizado Especial Civel de Brasília, Processo nº 0732961-69.2019.8.07.0016, j. 17.4.2020.

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BOLETIM DA CNRD, Nº 1, OUT. 2016/MAI. 202034

OS EFEITOS DE COISA JULGADA DA DECI-SÃO DA CNRD SE HOUVER CONVENÇÃO DE ARBITRAGEM

Como a presença de cláusula compromissó-ria define os contornos da atuação da CNRD, os efeitos das suas decisões também se dis-tinguem a partir desse critério.

Assim, em novembro de 2016, a 6ª Câmara Cível do TJPR considerou que, ausente cláu-sula compromissória válida indicando o ex-tinto CRL para apreciar certa disputa, sua decisão se limitava a ter efeito administra-tivo, não produzindo coisa julgada material:

“[...] tem-se que não se pode to-mar a singela expressão ‘as partes elegem o Foro da FIFA [...]’ como cláusula compromissória, nos ter-mos do art. 853 do Código Civil e arts. 4º e seguintes da Lei de Arbi-tragem. [...] Conclui-se, destarte, que as decisões emanadas do Co-mitê de Resolução de Litígios da CBF ostentam manifesto caráter administrativo, como bem obser-vou a juíza sentenciante. [...] Por conseguinte, não procede a tese do apelante no sentido de se con-ferir natureza de sentença arbitral à decisão proferida no bojo daquela representação, razão pela qual dela não decorre a eficácia da coisa jul-gada material” 8.

Por sua vez, a 36ª Câmara de Direito Privado do TJSP reconheceu em julho de 2017 a juris-dição arbitral e os efeitos de coisa julgada derivados de decisão do extinto CRL basea-da em contrato com cláusula compromissó-ria o elegendo, em acórdão assim ementado:

“Ação de cobrança. Contrato de re-presentação firmado com jogador de futebol. Existência de cláusula compromissória no contrato que impõe sejam as divergências re-solvidas no Juízo Arbitral. Questão submetida ao Comitê de Resolução

de Litígios da CBF, que reconheceu a prescrição. Coisa julgada. Extin-ção do processo sem apreciação do mérito. Recurso desprovido” 9.

A COMPETÊNCIA TRABALHISTA DA CNRD

Os tribunais trabalhistas também já começa-ram a se manifestar favoravelmente à com-petência da CNRD.

Em outubro de 2019, a 2ª Vara do Trabalho de Campinas reconheceu a CNRD como ór-gão competente para analisar conflito tra-balhista entre atleta e clube, diante de dis-trato que tinha cláusula elegendo a CNRD para dirimir suas disputas:

“No caso dos autos, no distrato fir-mado em 20/07/2018, foi estabe-lecida por livre manifestação das partes a cláusula compromissória elegendo a ‘CNRD’ para dirimir conflitos de natureza trabalhista.

Ora, não há como presumir, no caso dos atletas profissionais, especial-mente no caso do Reclamante, que ao longo do contrato recebeu valo-res vultosos e era representado por pessoa jurídica, que a arbitragem aderida pelos contratos individu-ais implicou em renúncia a direitos, mesmo porque são realizadas pelas federações esportivas (Câmara Na-cional de Resolução de Disputas – CNRD da Confederação Brasileira de Futebol – CBF), que são as maiores interessadas no resguardo de tais competições e servem para dirimir conflito trabalhista desportivo” 10.

A 9ª Vara do Trabalho de Campinas também adotou o mesmo entendimento em maio de 2020, acrescentando que o art. 507-A da CLT superou a exigência de acordo ou con-venção coletiva prevista no art. 90-C da Lei nº 9.615/1998, autorizando a instauração de arbitragem mediante cláusula compromissó-ria firmada entre clube e empregado:

8 TJPR, 6ª Câmara Cível, AC nº 0015217-11.2013.8.16.0001, j. 29.11.2016.9 TJSP, 36ª Câmara de Direito Privado, AC nº 1005880-85.2015.8.26.0565, j. 27.7.2017.10 TRT-15, 2ª Vara do Trabalho de Campinas, Processo nº 0011418-64.2018.5.15.0032, j. 27.10.2019.

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“[...] ainda que os contratos ence-tados entre as partes sejam regidos por regramento específico do Di-reito Desportivo em função da pe-culiar natureza da relação jurídica havida entre a entidade e o atleta profissional (Lei 9.615/98), certo é que a Lei 13.467/17 permitiu que as partes instituíssem consensualmen-te desde a contratação a submissão de eventual impasse a órgão arbi-tral institucional ou a entidade es-pecializada.

De se notar que o artigo 90-C da Lei do Desporto (9.615/98) exigia para a arbitragem norma coletiva para tanto. Contudo, o novel art. 507-A inserido pela Reforma Tra-balhista dispensou a participação sindical a qualquer contrato de tra-balho, exigindo, tão somente, o pa-tamar salarial do trabalhador e sua anuência escrita como condição sine qua non.

Outrossim, não há que se falar como argumentou o reclamante em razões finais de que não houve iniciativa do autor em instituir a ar-bitragem ou concordância expressa a essa modalidade na medida em que sua concordância se mostra patente no item 12.3 do contrato de trabalho bem como no distrato, sem qualquer indício que infirmas-se sua validade e eficácia.

Ainda, nenhuma analogia se vis-lumbra com o contrato de adesão de que trata o Código de Defesa do Consumidor ou ainda o § 2º do art. 4º da Lei de Arbitragem como ven-tilou o autor.

No que concerne à ausência de le-gitimidade da CNRD como assevera o atleta, não há controvérsia diante do Regulamento da CNRD de que indigitado órgão integra a Confe-deração Brasileira de Futebol. Con-tudo, referida entidade tem por

finalidade a gestão do futebol bra-sileiro e portanto nenhuma ilegali-dade se vislumbra” 11.

O DIÁLOGO ENTRE A CNRD E O PODER JUDICIÁRIO NA EXECUÇÃO DE TÍTULOS EXTRAJUDICIAIS

Diante da potencial jurisdição arbitral atribu-ída à CNRD pela presença de cláusula com-promissória, é natural que todo o conjunto de mecanismos e estratégias desenvolvidos pela arbitragem comercial comecem a ser explora-dos também pela advocacia esportiva.

Nessa linha, merece destaque a obtenção, em outubro de 2018, de medida de arresto requerida por intermediária, preparatória à instauração de procedimento na CNRD, e de-ferida pelo Juízo da 52ª Vara Cível do Rio de Janeiro, incidente sobre verbas que um clube teria a receber de transferência de atleta seu:

“[...] a garantia de medida acaute-latória prévia judicial, já que se tra-ta de medida constritiva, cuja atri-buição falece ao Juízo arbitral, é medida que se impõe por força do disposto no artigo 22-A da Lei da Arbitragem. [...] Por todo o expos-to, e, ainda, considerando-se que a decisão não importará em perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão, defiro o pedido, para de-terminar o arresto cautelar inaudita altera parte [...]” 12.

Esse diálogo também pode ocorrer em caso de execução de título extrajudicial. Em linha com precedente da 2ª Seção do STJ, os tribu-nais têm por vezes apontado que, havendo obrigação líquida e exigível em título exe-cutivo extrajudicial, a presença de cláusula compromissória não impede a propositura de ação de execução13. Nesse caso, eventuais embargos do devedor devem resultar na sus-pensão do processo e instauração da arbitra-gem, na qual se deve discutir o mérito da de-fesa do devedor; encerrada a arbitragem, os atos executórios passam a correr sob a ação judicial.

11 TRT-15, 9ª Vara do Trabalho de Campinas, Processo nº 0011456-24.2018.5.15.0114, j. 4.5.2020.12 TJRJ, 52ª Vara Cível da Comarca da Capital, Processo nº 0248001-97.2018.8.19.0001, j. 20.10.2018. 13 Sobre o assunto, cf. STJ, 2ª Seção, Conflito de Competência nº 150.830/PA, j. 10.10.2018.

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Esse mesmo raciocínio já foi empregado diante de contrato com cláusula elegendo a CNRD, conforme decisão da 10ª Vara Cível de Santos (até o momento, mantida monocrati-camente pelo Des. Álvaro Torres Júnior, da 20ª Câmara de Direito Privado do TJSP), nos seguintes termos:

“[...] as partes elegeram a ‘Câmara Nacional de Resolução de Dispu-tas (CNRD) da CBF como compe-tente para dirimir qualquer dúvida ou controvérsia’, decorrente de mencionado contrato. Em face dos termos de referida cláusula não é dado ao Judiciário avançar sobre o tema.

[...] Ainda assim, não é o caso de extinção dos feitos, em especial da execução. Como sabe, aos árbitros não se abriu a possibilidade de ma-nejo de medidas executivas. Daí que não estão os credores, porta-dores de títulos executivos, impe-didos do ajuizamento de ações de execução. O que ocorre é que, se o fizerem e, por conta da execução, travar-se discussão sobre o alcance do débito, em especial se existente ou não, deverá ela – a execução – ser suspensa até que as partes ob-tenham a solução da controvérsia por meio do árbitro eleito” 14.

O tema, contudo, ainda suscita controvérsias no contexto da arbitragem comercial, inclusi-ve conforme recente decisão da 3ª Turma do STJ15. Não por acaso, essa controvérsia tam-bém se reproduz em casos esportivos, como se observa em recente decisão da 4ª Vara Cível de Campinas, que extinguiu execução, sem julgamento de mérito, diante da presen-ça de cláusula compromissória elegendo a CNRD:

“Conforme previsão contratual, contida na cláusula ‘11.1’, as partes pactuaram cláusula compromis-sória de arbitragem, elegendo a

Câmara Nacional de Resolução de Disputas (CNRD) da CBF, como único órgão competente para diri-mir quaisquer controvérsias oriun-das do instrumento negocial. [...] Nesse sentido, cabe a extinção do feito nos termos do artigo 485, VII do Código de Processo Civil” 16.

A LEGITIMIDADE DA SANÇÃO DE PROIBI-ÇÃO DE REGISTRO DE NOVOS ATLETAS

Por fim, vale registrar que a CNRD já teve a aplicação de suas sanções levada à aprecia-ção do Poder Judiciário, que confirmou sua regularidade em decisões eloquentes.

No caso, a CNRD emitira em janeiro de 2019 sentenças nos Procs. CNRD 2018/O/090 e 2018/TRB/091, movidos por atleta contra seu ex-clube, conforme contratos com cláusulas elegendo a CNRD para dirimir suas disputas. Seguindo os trâmites exigidos pelo art. 42 do RCNRD, a CNRD concedeu prazo para o clu-be comprovar o cumprimento das decisões, sem o qual lhe aplicou advertência pelo des-cumprimento. Em seguida, a CNRD deferiu plano de parcelamento do débito, não tendo o clube efetuado qualquer pagamento. Dian-te disso, a CNRD lhe aplicou em dezembro de 2019 a sanção de bloqueio de registro de novos atletas, na forma do art. 42, § 1º, II, do RCNRD.

Insatisfeito com a decisão, o clube optou por mover ação perante o Poder Judiciário. Ao negar a liminar requerida pelo clube, o Juí-zo da 2ª Vara Cível da Barra da Tijuca teceu diversas considerações sobre o desenrolar do procedimento, que merecem transcrição, com destaque para o reconhecimento da le-galidade da sanção de proibição de registro de novos atletas:

“Fato é que o autor tinha plena ci-ência – com ou sem parcelamento – que iria pagar. E aparentemente não se mobilizou, já que há lapso de quase um ano entre o primeiro requerimento e a decisão que apli-

14 TJSP, 10ª Vara Cível de Santos, Processo nº 1009221-89.2019.8.26.0562, j. 3.7.2019.15 STJ, 3ª Turma, Recurso Especial nº 1.717.677/PR, j. 19.11.2019.16 TJSP, 4ª Vara Cível de Campinas, Processo nº 1035532-06.2019.8.26.0114, j. 10.1.2020.

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ca a sanção, após obviamente não cumprir a determinação de pagar.

Por isso fora aplicada a sanção, na forma do artigo 40, § 3º, I a V, do RCNRD: a proibição, por tempo mí-nimo (6 meses) de registrar novos atletas.

E não há ilegalidade nisso, como forçadamente a autora quer con-vencer. Aqui não se discute a sus-pensão da própria entidade des-portiva, prevista na Lei Pelé (lei 9.615/98), que só poderia se dar pela Justiça Desportiva, mas sim a proibição temporária, com na-tureza coercitiva para pagamento de dívida, de contratação de novos atletas” 17.

A decisão ainda prossegue ao reconhecer que não cabe a rediscussão em juízo do mé-rito da aplicação de determinada sanção pela CNRD, estando ela compatível com os proce-dimentos formais necessários para tanto:

“[...] O artigo 40, § 3º, prevê várias modalidades de sanções, com cará-ter coercitivo e também satisfativo. Mas aparece o argumento de que a proibição de contratação de novos atletas, aplicada nas vésperas de um recesso da instituição, saben-do-se que o campeonato se inicia-rá antes do seu regresso, estando o clube sem o número ideal de jo-gadores, seria a menos indicada, sendo melhor o bloqueio de verbas que o clube teria direito pela pró-pria CBF.

Contudo, há aqui (assim como na análise de tudo que não diga res-

peito à legalidade em si) um pro-blema: o Judiciário não controla o mérito administrativo da decisão, mas tão somente a legalidade.

E o que se pretende, nesse tópico – já ultrapassados os demais que tem algum grau de discussão de legali-dade – é debate unicamente sobre o mérito da decisão que aplicou a san-ção: trata-se de ato administrativo discricionário (o Regulamento im-põe a possibilidade do agente apli-car, dentre as sanções, aquela que, dentro dos motivos determinantes, lhe parecer a mais adequada).

Ou seja: quer que o Judiciário passe a apreciar o mérito da aplicação da sanção, se é a mais ou menos ade-quada, e que passa a substituí-la.

Como já dito, a sanção de proibição de contratação de atletas é uma das sanções previstas no Regula-mento. Nada de ilegal há”.

Ao apreciar o agravo interposto pelo clube, a 10ª Câmara Cível do TJRJ manteve a decisão, também reforçando a validade da sanção de bloqueio de registro de novos atletas:

“[...] não merece prosperar o argu-mento de que houve aplicação de sanção não prevista na Lei Pelé, já que não se discute a suspensão da própria entidade desportiva, pre-vista na Lei Pelé (lei 9.614/98), que só poderia se dar pela Justiça Des-portiva, mas sim a proibição tem-porária, com natureza coercitiva para pagamento de dívida, de con-tratação de novos atletas, confor-me expôs o Juízo a quo” 18.

17 TJRJ, 2ª Vara Cível da Barra da Tijuca, Processo nº 0000158-10.2020.8.19.0209, j. 7.1.2020.18 TJRJ, 10ª Câmara Cível, AI nº 0000449-55.2020.8.19.0000, j. 13.1.2020.

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BOLETIM DA CNRD, Nº 1, OUT. 2016/MAI. 202038

A CNRD acredita que esses primeiros três anos e oito meses representam uma trajetó-ria bem-sucedida. E esse sucesso é fruto do diálogo mantido entre a CNRD e seus princi-pais interlocutores: representantes de fede-rações, atletas, intermediários, membros de comissão técnica, clubes, seus departamen-tos jurídicos e escritórios de advocacia.

O principal desafio enfrentado pela CNRD em seus primeiros anos foi o de se firmar como instituição capaz de atender aos anseios do mercado do futebol brasileiro. Esse propó-sito foi atingido, como se permite ver pelas conclusões extraídas das seções anteriores:

(a) o crescimento rápido e consistente no número de processos surpreendeu a CNRD e lhe demandou adaptações ao planejamento inicial;

(b) a CNRD recebe demandas dos mais variados perfis econômicos e de clubes e atletas das mais variadas divi-sões do futebol brasileiro e do exterior, o que lhe exige uma atuação capaz de atender a esses diferentes perfis;

(c) o mercado dá sinais de que con-fia e acredita na administração dos processos pela CNRD, o que pode ser extraído a partir do número crescente de contratos que são elaborados com cláusula compromissória elegendo-a para dirimir seus conflitos;

(d) o tempo de tramitação dos pro-cessos na CNRD aumentou considera-velmente ao longo desses anos, pro-porcionalmente ao crescimento do número de processos;

(e) o principal gargalo que a CNRD en-contra para imprimir velocidade à tra-mitação de seus procedimentos se con-centra no acúmulo de casos represados para elaboração de ata de missão;

(f) a CNRD tem tido êxito considerável ao criar um ambiente que estimula as partes a realizarem acordos, embora haja indícios que o aumento no tempo de tramitação possa estar gerando de-sincentivos aos acordos;

(g) a maioria das sanções que a CNRD aplicou até aqui foram advertências, o que mostra que, em geral, essa sanção tem sido suficiente para incentivar de-vedores a cumprirem as suas obriga-ções;

(h) as sanções mais graves, como a proibição de registros, apesar de usa-das em alguns momentos, se restrin-gem a um pequeno grupo de deve-dores para os quais a advertência não surtiu efeito;

(i) ao longo desse tempo, a CNRD já construiu uma jurisprudência sólida, a partir de entendimentos em vários te-mas de interesse do mercado; e

(j) a CNRD tem construído um modelo de administração e apreciação de pro-cessos que têm recebido reconheci-mento e prestígio do Poder Judiciário.

A hora agora é de a CNRD encarar as dores do crescimento e prosseguir na construção coordenada dos seus próximos passos com o mercado a quem se destina, com quem com-partilha uma série de novos desafios.

A celeridade na tramitação processual pre-cisa ser retomada. Embora a média atual de 16 meses para emitir sentenças possa ser considerada bastante satisfatória se compa-rada com o padrão da arbitragem comercial brasileira, a CNRD considera que o mercado do futebol espera intervalos menores.

DESAFIOS E METAS PARA OS PRÓXIMOS ANOS

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Afinal, a cada seis meses os clubes se en-volvem em negociações para reforçar seus caixas e plantéis durante as janelas de trans-ferências internacionais. Nesse mesmo perí-odo, atletas que atuam no Brasil podem se transferir para o exterior. Por isso, um dos objetivos da CNRD é que os seus procedi-mentos passem pelo mínimo de janelas de transferência.

Por isso, nossa meta é progressivamente au-mentar a capacidade de entrega e chegar a uma média de até 10 meses para emitir sen-tenças até o final de 2021.

Para tanto, a Secretaria da CNRD tem como metas reduzir o tempo de elaboração das atas de missão pela metade até o fim de 2020 e aumentar em pelo menos 50% o nú-mero de sentenças emitidas no 2º trimestre de 2020, em relação ao mesmo período de 2019.

Dar maior consistência à aplicação de san-ções por descumprimento de decisões por clubes é outro desafio que deve se intensifi-car ao longo de 2020.

Com os procedimentos tramitando de forma mais célere e a emissão de mais sentenças, mais obrigações tendem a se tornarem exigí-veis. Além disso, pode-se esperar que as difi-culdades derivadas da pandemia de covid-19 tendem a gerar novas ondas de inadimplên-cia financeira no setor.

A CNRD também espera que a criatividade da advocacia explore o potencial de instru-mentos ainda pouco utilizados, como o sursis desportivo – medida que a CNRD pretende intensificar. Afinal, a imposição de condições para evitar ou suspender sanções gravosas tende a alinhar os interesses de credores te-rem perspectivas sérias de recebimento, sem afetar em demasia a capacidade de os clu-bes seguirem suas atividades, desde que me-diante gestão financeira responsável. No mais, a CNRD acredita ser a hora de di-vulgar seus entendimentos de modo mais frequente.

Esse esforço já teve início em 2019, com a divulgação do 1º Ementário da CNRD, e será complementado ainda em 2020, quando di-vulgaremos todas as decisões emitidas até 2019.

Além disso, a CNRD também tem como obje-tivo aumentar o número de sentenças sobre procedimentos sancionadores – uma vez que eles tendem a manifestar orientações juris-prudenciais sobre a interpretação ou apli-cação de diversas regras do RNRTAF ou do RNI.

Por isso, a CNRD tem como meta emitir, em média, ao menos uma decisão em processos sancionadores a cada mês até o fim de 2020, envolvendo casos relativos a transferências--ponte, uso de intermediário não registrado e operações relativas a cessão de direitos econômicos.

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A CNRD acredita que os três desafios pro-postos dependem fundamentalmente da sua capacidade de gestão do seu trabalho. Dian-te deles, expõem-se a seguir algumas mu-danças planejadas ou já em implementação, baseadas em um tripé: reforço na organiza-ção interna; ajustes procedimentais e manu-tenção do diálogo com o mercado.

ORGANIZAÇÃO INTERNA

O primeiro grupo trata de ações que tendem a adequar a atuação da CNRD ao número de processos que atualmente administra.

Essas ações já vêm sendo implementadas desde o início de 2020: a CNRD mudou a sua estrutura física para um espaço reservado destinado exclusivamente à sua Secretaria e acrescentou duas novas integrantes à sua equipe, Raquel Santos e Maria Eduarda Pen-na, que se unem a Rafael T. Fachada e Aman-da Guimarães na equipe com dedicação ex-clusiva da CNRD.

Além disso, a CNRD segmentou os processos sob sua administração em quatro divisões:

(a) Divisão sobre Intermediação: en-globa todos os procedimentos que tra-tam de disputas entre intermediários e seus clientes, relativas a operações de intermediação. Por representarem me-tade das demandas trazidas à CNRD, acredita-se ser oportuno que esses ca-sos sejam coordenados de modo con-centrado.

(b) Divisão Trabalhista: dedicada aos procedimentos trabalhistas, os rela-tivos ao cumprimento do art. 64 do RNRTAF envolvendo atletas ou mem-bros de comissão técnica contra clu-

bes, e procedimentos relativos à es-tabilidade contratual. Acredita-se que esses casos mereçam tramitação espe-cialmente célere, recebendo coordena-ção própria.

(c) Divisão Comercial: concentra as de-mandas entre clubes, como as cobran-ças de mecanismo de solidariedade, as violações ao art. 64 do RNRTAF entre clubes e requerimentos de indeniza-ção por formação. Em sua maioria, são casos cujas discussões tendem a se concentrar em aspectos documentais, também merecendo coordenação de-dicada para lhes dar maior celeridade.

(d) Divisão sobre Regulação: abarca os procedimentos sancionadores e os procedimentos de aplicação de san-ção por descumprimento de decisões da CNRD. Embora sejam menores em número, são procedimentos que mere-cem análise particularmente cautelosa, o que sugere análise coordenada.

Nesse primeiro momento, essa organização se dá no âmbito da Secretaria e não há qual-quer modificação no conjunto de membros julgadores. Mas há estudos destinados a ve-rificar a viabilidade de que essa divisão seja refletida na estrutura decisória da CNRD, passando ela a contar com órgãos fracioná-rios com dedicação temática. A forma, com-posição e atuação de cada divisão natural-mente será discutida com o mercado.

ANDAMENTO PROCESSUAL

De forma a imprimir maior celeridade ao an-damento dos processos, para além da contra-tação de novas pessoas, a CNRD também re-visou alguns de seus atos para redesenhá-los.

O INÍCIO DA IMPLEMENTAÇÃO DE MUDANÇAS NA CNRD

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A partir de junho de 2020, as reuniões para discussão da ata de missão ficam restritas a casos em que haja indicação de possibilida-de de acordo ou em que, a critério do rela-tor, se vislumbre a necessidade de discussão mais profunda sobre os próximos passos do procedimento. Para casos mais simples, não havendo objeção das partes, a submissão dos termos da ata passa a se dar por troca de e-mails.

A CNRD também está em conversas com os departamentos pertinentes da CBF para dis-ponibilizar sistema de pagamento de cus-tas processuais pelo qual as partes possam requerer os boletos sem a necessidade de interlocução com a Secretaria da CNRD, de modo a diminuir burocracia.

No plano da tramitação processual, a CNRD está elaborando um guia de procedimento com o objetivo de instruir os advogados sobre o passo a passo para abertura de processos na CNRD e submissão de documentos em forma-to a facilitar os trâmites internos da CNRD, com respostas a algumas dúvidas frequentes.

DIÁLOGO COM O MERCADO

A CNRD busca sempre desenvolver um bom diálogo com o mercado, permitindo-o apre-sentar suas impressões sobre o que a CNRD tem feito e compartilhar experiências de par-te a parte.

Iniciativa importante a esse respeito foi a re-alização de um conjunto de reuniões entre a CNRD e representantes de todas as cate-gorias de jurisdicionados, capitaneadas pelo membro Vantuil Gonçalves. Essas reuniões resultaram em diversas sugestões acolhidas pela CNRD. Pretende-se continuar com en-contros desse perfil.

Outra importante ferramenta para tanto é a divulgação de decisões descaracterizadas. Pretende-se divulgar as decisões referentes aos anos de 2018 e 2019 entre até o fim de julho de 2020.

Para tanto, a CNRD organizou uma força-ta-refa para descaracterizá-las, com o apoio do Grupo de Estudos em Direito Desportivo da UFRJ (GEDD-FND/UFRJ) e do Grupo de Es-tudos de Direito Desportivo da USP (GEDD/USP), a quem a CNRD agradece imensamen-te pela colaboração.

Outra ferramenta de divulgação a ser adota-da é a publicação de uma série de relatórios periódicos trazendo, em especial, números em geral e entendimentos recentes da CNRD, além de outras informações de interesse ge-ral, em linha com os conhecidos relatórios emitidos no contexto do FIFA TMS.

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