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Jurisprudência da Quarta Turma

Jurisprudência da Quarta Turma...JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA RECURSO EM HABEAS CORPUS N.2. 8.922 - SP (Registro nJ:!. 99.0069502-0) Relator: Ministro Aldir Passarinho Junior Recorrente:

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Jurisprudência da Quarta Turma

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA

RECURSO EM HABEAS CORPUS N.2. 8.922 - SP (Registro nJ:!. 99.0069502-0)

Relator: Ministro Aldir Passarinho Junior

Recorrente: Júlio César Moleti

Advogada: Leonilda Bob

309

Recorrido: Segundo Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo

Paciente: Júlio César Moleti

EMENTA: Penal e Civil - Habeas corpus denegado - Recurso ordinário - Alienação fiduciária - Devedor - Ameaça de prisão caso

não quitada a dívida - Constrangimento ilegal - Concessão da or­dem.

I - A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, firmada a partir de precedente da Corte Especial no EREsp n!!. 149.518-GO (ReI. Min. Ruy Rosado de Aguiar, julgado em 05.05.1999), é no sen­tido de afastar a ameaça ou ordem de prisão do devedor em caso de inadimplemento de contrato de alienação fiduciária em garan­tia.

II - Recurso ordinário provido. Concessão da ordem.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, à unanimidade, dar provimento ao recurso para afastar a cominação de prisão civil imposta ao paciente, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Participaram do jul­gamento os Srs. Ministros Sálvio de Figueiredo Teixeira, Barros Monteiro e Ruy Rosado de Aguiar. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha. Custas, como de lei.

Brasília-DF, 21 de setembro de 1999 (data do julgamento).

Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, Presidente.

Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, Relator.

Publicado no DI de 16.11.1999.

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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310 REVISTADO SUPERIOR TRIBUNALDE]USTIÇA

RELATÓRIO

o SR. MINISTRO ALDIR PASSARINHO JUNIOR: Aproveito a sín­

tese constante do parecer ministerial de fls. 69/70, litteris:

"1. Trata-se de recurso ordinário em habeas corpus, interposto

por Júlio César Moleti, contra o v. acórdão do Segundo Tribunal de

Alçada Civil do Estado de São Paulo, denegatório de ordem de

habeas corpus, impetrado pelo ora recorrente contra ato do MM. Juiz

de Direito da Trigésima Quarta Vara Cível de São Paulo.

2. BIG S/A - Banco Irmãos Guimarães promovera perante o Juízo de Direito da Trigésima Quarta Vara Cível da Comarca da Capi­

tal do Estado de São Paulo, ação de busca e apreensão contra Júlio Cé­sar Moleti, com respaldo no Decreto-Lei n J2 911, de 1 J2 de outubro de

1969, do veículo adquirido mediante contrato de mútuo com alienação

fiduciária em garantia, devidamente descrito na respectiva inicial.

3. Não localizado o veículo, requereu a autora a conversão da

demanda em ação de depósito, no que veio a ser atendida pelo magis­

trado.

Julgada procedente a ação de depósito, foi o réu, ora paciente, condenado à restituição da coisa, facultando-se-Ihe pagar o valor do

bem custodiado, sob pena de caracterização de infidelidade na guar­da, com a subseqüente prisão do depositário."

Impetrado habeas corpus junto ao egrégio Segundo Tribunal de Al­

çada Civil do Estado de São Paulo, o mesmo foi denegado, gerando o pre­

sente recurso ordinário.

Alega o recorrente que a avença celebrada com a instituição bancária

credora não configura típico contrato de depósito, salientando que o art. 5J2,

LXVII, da Carta Política vigente, ao excluir do texto magno anterior (art.

153, § 17), a expressão "na forma da lei", vedou a ampliação, pela legisla­ção ordinária, das hipóteses de prisão civil constitucionalmente previstas.

Daí, complementa, não foi recebida pela novel Carta possibilidade de pri­

são embasada no art. 4J2 do Decreto-Lei nJ2 911/1969 c.c. o art. 901, § 1J2,

do CPC, de sorte que a ameaça que pesa sobre ele deve ser afastada.

Aduz que a prisão, no caso, é instrumento que a doutrina considera

exageradamente rigoroso, salientando que já ofereceu bens em garantia.

RSTJ, Brasilia, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 311

Cita precedentes jurisprudenciais, inclusive do STJ.

Às fls. 68170, opina a douta Subprocuradoria Geral da República, pelo

Dr. Henrique Fagundes, no sentido da concessão da ordem.

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO ALDIR PASSARINHO JUNIOR (Relator): Como

visto do relatório, cuida-se de recurso ordinário em habeas corpus inter­

posto contra acórdão prolatado pelo Segundo Tribunal de Alçada Civil de

São Paulo, que denegou a ordem, rejeitando pedido que pretendia afastar

a ameaça de prisão imposta por sentença, caso não entregue pelo réu, ora

recorrente, em vinte e quatro horas, o veículo fiduciariamente alienado, ou

pago o valor do débito.

O ilustrado Subprocurador-Geral da República, em seu parecer de fls.

68170, cita precedente da colenda Corte Especial, de que foi Relator o emi­

nente Ministro Ruy Rosado de Aguiar, assim ementado:

"Alienação fiduciária. Prisão civil.

Não cabe a prisão civil de devedor que descumpre contrato ga­rantido por alienação fiduciária.

Embargos acolhidos e providos."

(EREsp n.Q. 149.518-GO, ReI. Min. Ruy Rosado de Aguiar, Cor­

te Especial, julgado em 05.05.1999).

Considerou-se, no aludido precedente, entre vários outros fundamen­

tos, que a prisão derivada da alienação fiduciária em garantia constitui sim­

ples forma de coagir o devedor inadimplente a pagar a dívida, portanto di­

ferenciando-se e refugindo à real condição de depositário, que se obriga a

restituir o bem na forma e condições avençadas ou quando solicitado, en­

quanto na espécie em comento se admite o pagamento do preço e a manu­

tenção da coisa em seu poder e titularidade.

Ante o exposto, dou provimento ao recurso para conceder a ordem,

determinando sejam feitas as comunicações de estilo no sentido de afastar

a ameaça de prisão.

É como voto.

RSTJ, Brasília, 3.12, (130): 307-383, junho 2000.

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312

Relator:

REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

RECURSO ESPECIAL N.2. 75.008 - MG (Registro n ll 95.0048262-2)

Ministro Aldir Passarinho Junior

Recorrente: Companhia Real de Investimento - Crédito Financiamento

e Investimento

Advogados:

Recorrida:

Advogados:

Edelberto Augusto Gomes Lima e outro

Maria Aparecida de Souza Valadares

Ricardo Drummond da Rocha e outros

EMENTA: Processual - Embargos de terceiro - Indevida penho­

ra sobre a meação da esposa do executado - Procedimento de inicia­

tiva exclusiva do oficial de justiça e contrário ao requerido pela

exeqüente e autorizado pelo juízo - Sucumbência descaracterizada

- Honorários advocatícios indevidos - CPC, art. 20.

I - Requerendo a exeqüente, expressamente, que a penhora

incidisse exclusivamente sobre a meação do cônjuge devedor, e nes­

ses exatos termos deferida a diligência pelo Juízo, inexiste respon­

sabilidade da credora se o Oficial de Justiça, indevidamente, proce­

de à constrição no todo do imóvel, alcançando a parte pertencente

à meeira. Caso, inclusive, em que após o acontecido, a autora ime­

diatamente concordou com o levantamento da penhora sobre a

meação da esposa.

11 - Desfigurada, assim, a sucumbência da exeqüente, indevida

é a sua condenação ao pagamento de honorários advocatícios.

111 - Recurso especial conhecido e provido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas,

decide a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, à unanimidade, co­

nhecer do recurso e dar-lhe provimento, na forma do relatório e notas

taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do

presente julgado. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Sálvio de

Figueiredo Teixeira, Barros Monteiro, Cesar Asfor Rocha e Ruy Rosado de

Aguiar. Custas, como de lei.

RST], Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA

Brasília-DF, 5 de outubro de 1999 (data do julgamento).

Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, Presidente.

Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, Relator.

Publicado no DI de 22.11.1999.

RELATÓRIO

313

O SR. MINISTRO ALDIR PASSARINHO JUNIOR: Tratam os autos

de embargos de terceiro à execução opostos por Maria Aparecida de Sou­

za Valadares em face da Cia Real de Investimentos, Crédito, Financiamen­

to e Investimento, visando excluir sua meação de imóvel penhorado em de­

corrência de aval prestado por seu marido.

O juízo de primeiro grau julgou procedentes os embargos, determinan­

do o resguardo da meação da embargante na penhora realizada no bem do

casal. Deixou de condenar a embargada nos ônus de sucumbência, por ter

esta requerido por ocasião da penhora que fosse respeitada a meação do

cônjuge do executado.

A embargante interpôs apelação.

A colenda Quinta Câmara Civil do Tribunal de Alçada do Estado de

Minas Gerais, por unanimidade, deu provimento à apelação. Entendeu que

a procedência dos embargos impõe a condenação da embargada ao paga­

mento das custas processuais e dos honorários advocatícios sob pena de,

assim não agindo, negar vigência ao art. 20 do Cpc.

Interpôs a Cia Real de Investimento - CFI recurso especial pelas le­

tras a e c do art. 105, lII, da Carta da República, em que aponta negativa

de vigência ao art. 20 do CPC e divergência com a jurisprudência do Su­

perior Tribunal de Justiça.

Ressalta que nos autos da execução, à fl. 29, pleiteou fosse observada

a meação da esposa do executado, mas que inobstante o pedido, o Oficial

de Justiça penhorou bem imóvel do casal.

Assinala, portanto que a pretensão da embargante já havia sido

requerida expressa e antecipadamente, não podendo portanto o ora recor­

rente ser penalizado com base em erro do Oficial de Justiça.

Requer seja excluída a condenação em honorários advocatícios de

sucumbência.

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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314 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

A recorrida apresentou contra-razões às fls. 160/161, afirmando que

inexiste violação de lei federal e que o dissídio não está devidamente de­

monstrado.

Juízo prévio de admissibilidade do especial no tribunal de origem às fls. 163/164.

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO ALDIR PASSARINHO JUNIOR (Relator): Insur­

ge-se a recorrente, com base nas letras a e c do permissivo constitucional,

contra acórdão prolatado pelo colendo Tribunal de Alçada do Estado de

Minas Gerais que, nos autos de embargos de terceiro, estabeleceu sua con­denação no pagamento das custas e verba honorária de 10% do valor atua­

lizado da causa.

Demonstrado o dissídio jurisprudencial e ventilado no aresto a quo o

art. 20 do Código de Processo Civil, admito o recurso e passo ao seu exa­me.

Reside a questão em saber se a exeqüente deve arcar com os honorá­

rios do advogado da embargante, quando a credora requereu que a penho­

ra do bem se fizesse apenas sobre a parte do devedor, e nem se opôs ao seu

desfazimento, quando verificado que ocorreu a maior.

A aplicação pura e simples do princípio da sucumbência, levaria à con­

denação da embargada (art. 20 do CPC). No entanto, a solução do presente

caso merece ser diferente.

É que se demonstra incontroversa, desde o ajuizamento da execução, a intenção da recorrente em resguardar o direito de meação da embargante,

como bem salientou o juiz de primeiro grau na sentença, litteris:

"Observa-se também à fl. 29 dos autos da ação de execução, que

a embargada realmente requereu que ao ser efetuada a penhora fosse

dessa excluída a meação do cônjuge do executado, fato este não obser­

vado pela senhora escrivã ao expedir o mandado de penhora, seguin­

do o erro o Sr. Oficial de Justiça que indevidamente, penhorou a to­talidade do bem sem excluir a meação do cônjuge, vez que o despacho

ordenando a penhora de bens do executado) constante de fi. 32 dos autos)

deferia o pedido de penhora nos termos da petição de fl. 29) onde a

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 315

exeqüente/embargada, expressamente requeria a citada exclusão." (desta­

quei).

Não se pode, portanto, penalizar a parte por falta do meirinho ou de serventuários do cartório, inclusive levando-se em conta não houve resis­

tência à pretensão da embargante e que a mesma poderia ter seu pleito aten­dido com uma simples petição nos autos principais.

HUIDberto Teodoro Júnior na sua obra Processo de Execução, lem­bra, com propriedade:

"O reconhecimento da procedência dos embargos de terceiro gera para o embargado os ônus da sucumbência (custas e honorários advocatícios), mesmo que não tenha contestado a ação ou tenha con­cordado com o levantamento da penhora (reconhecimento do pedido), na forma dos arts. 20 e 26 (52).

Se, porém, a penhora foi realizada por iniciativa apenas do Ofici­

al de Justiça, sem nomeação ou mesmo sem ciência do exeqüente, e este,

logo ao tomar conhecimento dos embargos, reconhece o direito do

embargante e pede o levantamento da penhora, não é justo imputar, em

tal circunstância, ao embargado o ônus da sucumbência, porquanto o in­

cidente decorreu de um ato judicial que não lhe pode ser imputado, a tí­

tulo algum. A falha, in casu, seria apenas do aparelhamento judiciário

e só o Poder Público há de responder por suas conseqüências (53).

Para obviar problemas como esse e mesmo para evitar inúteis ou desnecessários ajuizamentos de embargos de terceiros, de lege ferenda seria recomendável condicionar o manejo desse remédio pro­cessual a um prévio pedido de liberação do bem, formulado pelo ter­

ceiro através de simples petição, nos autos principais. Só quando o exeqüente não concordasse com a liberação sumária é que o terceiro estaria legitimado a propor a sua ação de embargos. Com isso, aten­der-se-ia ao princípio de economia processual, tão valorizado pelo di­reito formal de nossos tempos." (11 a edição, fls. 373/374 - grifei).

Sobre a matéria, assim tem-se guiado a jurisprudência desta Corte, verbis:

"Penhora sobre bens de terceiro, por iniciativa do Oficial de Jus­

tiça. Procedência dos embargos. Honorários advocatícios. Por eles não

responde o embargado, à míngua de objetiva derrota, ou porque, em

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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316 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

tal espécie, não dá causa ao processo. Recurso especial conhecido pelo

dissídio, mas não provido."

(Terceira Turma, REsp n"- 45. 727-0-MG, ReI. Min. Nilson Na­

ves, unânime, DJU de 13.02.1995).

"Processual Civil. Execução. Embargos de terceiro. Desconsti­

tuição de penhora. Bem imóvel pertencente a sócio de sociedade de

responsabilidade limitada. Irregularidade.

I - Penhora efetivada sobre bem imóvel de terceiro, que não é

parte no processo, por iniciativa exclusiva do Oficial de Justiça. A

desconstituição da penhora poderia ter sido postulada através de sim­

ples petição nos autos da execução; optando pela via dos embargos de

terceiro, deve arcar com as custas processuais, pelo manejo indevido

deste remédio processual. Descabível a condenação da embargada em

ônus da sucumbência, quando não resistida a pretensão.

II - Recurso não conhecido."

(Terceira Turma, REsp nll. 148.322-RS, ReI. Min. Waldemar

Zveiter, unânime, DJU de 11.05.1998).

Ante o exposto dou provimento ao recurso para afastar a sucumbência

imposta.

É como voto.

RECURSO ESPECIAL N2. 114.128 - MG (Registro n"- 96.0073642-1)

Relator:

Recorrentes:

Advogados:

Recorrido:

Advogados:

Ministro Cesar Asfor Rocha

Gláucia Silva Oda e outros

Roberto Matos de Brito e outros

Banco do Brasil S/A

Eliézer de Oliveira Felinto Melo e outros

Sustentação oral: Patrícia Netto Leão (pelo recorrido)

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 317

EMENTA: Processual Civil - Execução - Legitünidade passiva

do prestador de garantia hipotecária - Esc1areciUlento quanto à lei­tura do acórdão recorrido - Recurso especial - AdUlissibilidade Questão fática - DescabiUlento - ReexaUle da prova.

O recurso especial não se presta ao reexaUle da prova.

Se a execução vai atingir o beUl dado eUl garantia, os signatá­rios da hipoteca deveUl integrar a relação processual executiva. To­

davia, não é lícito ao credor exigir daquele que tão-soUlente entre­gou seu beUl eUl hipoteca, Ulais do que isso.

Recurso não conhecido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da

Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, não conhecer do re­curso. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Ruy Rosado de Aguiar, Aldir Passarinho Junior, Sálvio de Figueiredo e Barros Monteiro.

Brasília-DF, 23 de novembro de 1999 (data do julgamento).

Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, Presidente.

Ministro CESAR ASFOR ROCHA, Relator.

Publicado no DJ de 08.03.2000.

RELATÓRIO

o SR. MINISTRO CESAR ASFOR ROCHA: Cuida-se de recurso

especial, fundamentado nas alíneas a e c do permissivo constitucional, in­

terposto por Gláucia Silva Oda nos autos de embargos de devedor opostos à execução que lhe foi movida pelo ora recorrido.

A recorrente subscreveu, por meio de procuração outorgada a N orio

Oda, a constituição de "hipoteca cedular de primeiro grau do imóvel des­

crito, de sua propriedade, em garantia da obrigação assumida pelo emitente"

(fls. 10/11 do apenso) em cédula de crédito rural com garantia pignoratícia e hipotecária.

Nos embargos, alegou a sua ilegitimidade passiva porque teria firma­

do o título apenas na condição de interveniente para conferir outorga uxória

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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318 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

para a formalização do ônus hipotecário sem que tivesse assumido "o cum­

primento da obrigação da emitente, na qualidade de fiadora, avalista,

coobrigada ou qualquer outra figura que pudesse lhe colocar na posição de

devedora, solidária ou não." (fl. 3).

A r. sentença rejeitou a preliminar sob as considerações a seguir trans­

critas:

"A preliminar de ilegitimidade passiva de Gláucia Oda não pode

ser acolhida, haja vista que firmou a cédula rural, como se vê à fl. 12

da execução com fim de garantir a constituição da hipoteca cedular

sobre seus bens. Assim, tem ela interesse na causa, e sua exclusão cau­

saria cerceamento de seu próprio direito, haja vista que tem interesse

em defender seus bens, ante ao direito de seqüela da hipoteca (direi­

to real sobre coisas alheias). Assim, rejeito a preliminar." (fl. 53).

Assim também a egrégia Terceira Câmara do Tribunal de Alçada do

Estado de Minas Gerais, lançando os seguintes fundamentos:

"Alegam os embargantes ilegitimidade passiva da Sra. Gláucia

Silva Oda, vez que firmou o título apenas na condição de interveniente,

a fim de conferir outorga uxória para formalização da hipoteca sobre

imóvel, não assumindo pessoalmente o cumprimento da obrigação.

Ora, tendo assumido livre e espontaneamente a condição de ga­

rantidora solidária em outorga uxória pela constituição da hipoteca do

imóvel de sua propriedade, vinculou-se à obrigação contratada. Obri­

gada como os demais coobrigados, não pode ser excluída da lide, caso

em que ocorreria abuso que a exceção constitucional não autoriza.

Rejeito a preliminar de ilegitimidade passiva." (fls. 113/114).

O recurso especial insiste na ilegitimidade passiva, alegando ter o v.

aresto, "ao afirmar a legitimidade e solidariedade da mulher que se limi­

tou a firmar o título em outorga uxória pela constituição da hipoteca do

imóvel de sua propriedade", negado vigência aos arts. 568 do CPC e 896

do CC, bem como divergido de julgados desta Corte e do Tribunal de Al­

çada do Estado do Rio Grande do Sul que teriam limitado a responsabili­

dade do terceiro prestante de garantia real aos bens vinculados, sendo des­

cabida a citação para satisfação integral do débito.

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 319

Em contra-razões, o banco pugna pelo desprovimento do recurso

sustentando a incidência das Súmulas nnli 5 e 7 deste Tribunal e a ausência

de prequestionamento.

O recurso foi admitido na origem.

É O relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO CESARASFOR ROCHA (Relator): O recurso não

reúne condições de admissibilidade.

O v. acórdão recorrido, ao assentar a legitimidade passiva da recorren­

te, lançou os seguintes fundamentos:

"Alegam os embargantes ilegitimidade passiva da Sra. Gláucia

Silva Oda, vez que firmou o título apenas na condição de interveniente,

a fim de conferir outorga uxória para formalização da hipoteca sobre

imóvel, não assumindo pessoalmente o cumprimento da obrigação.

Ora, tendo assumido livre e espontaneamente a condição de ga­

rantidora solidária em outorga uxória pela constituição da hipoteca do

imóvel de sua propriedade, vinculou-se à obrigação contratada. Obri­

gada como os demais coobrigados, não pode ser excluída da lide, caso

em que ocorreria abuso que a exceção constitucional não autoriza.

Rejeito a preliminar de ilegitimidade passiva." (fls. 113/114).

Incontornável, assim, a necessidade do reexame dos fatos e das provas

para o acolhimento da pretensão recursal no sentido de não ser a recorrente

parte passiva legítima.

No recurso especial, como cediço, não se reexamina prova, devendo as

circunstâncias da causa serem tidas na versão do acórdão recorrido que, so­

beranamente, decide a respeito delas.

Em verdade, "eventual equívoco do acórdão, relativamente a matéria

de fato, não pode ser corrigido em recurso especial", conforme correta co­

locação do eminente Ministro Eduardo Ribeiro, in Ag n"'- 4.277-SP - AgRg,

DJ de 19.11.1990.

A leitura que a recorrente faz do acórdão não é a mesma que juridi­

camente se impõe. Cumpre, portanto, um simples esclarecimento.

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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320 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

É certa a distinção preconizada pela recorrente entre a anuência à en­trega do bem de sua propriedade em garantia de dívida e a assunção do total da dívida como "devedor", emitente, fiador ou avalista.

A ação real hipotecária se exerce executivamente apenas contra os bens hipotecados que, por meio da venda forçada, irão satisfazer monetariamente o credor.

Como se trata de direito real e não pessoal, não há de se cogitar em decorrente solidariedade na obrigação principal, como no caso do aval ou da fiança.

Mas, considerando-se a garantia em si, ou seja, no caso dos autos, a hipoteca firmada pelo casal, os cônjuges-garantes são solidários, estando ambos vinculados a essa obrigação hipotecária. Daí o afirmado pelo Tribunal a quo.

O título em execução é uma cédula de crédito rural com garantia pignoratícia e hipotecária. Essa hipoteca, subscrita pela ora recorrente, juntamente com seu marido, de imóvel de propriedade comum, por si só, já constitui título executivo extrajudicial, nos termos do artigo 585, inciso IH, do Código de Processo Civil, tornando a recorrente parte passiva legí­

tima para a execução desse título.

Se a execução vai atingir o bem dado em garantia, obviamente os seus proprietários e signatários da hipoteca devem integrar a relação processual executiva.

Nesse sentido os REsps n illi 87.853-MA, ReI. eminente Min. Carlos Alberto Menezes Direito; 107.1 08-RS, ReI. eminente Min. Waldemar Zveiter; 36.581-CE, ReI. eminente Min. Eduardo Ribeiro; 7.230-RS, ReI. eminente Min. Barros Monteiro.

Todavia, não é lícito ao credor exigir daquele que tão-somente entre­gou seu bem em hipoteca, mais do que isso.

A inicial da execução não faz qualquer distinção ou referência ao que estaria sendo cobrado de quem.

Os embargos, por seu turno, não demonstram que o valor da dívida exeqüenda seja superior ao valor do bem hipotecado, para se concluir com certeza que se estaria cobrando da recorrente mais do que o devido.

Por isso, feitas essas observações, nenhuma mudança cabe ser opera­da no v. acórdão, persistindo a legitimidade da recorrente no pólo passivo da execução no tocante à efetivação da garantia que prestou.

Destarte, não conheço do recurso.

RST}, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 321

VOTO-VOGAL

O SR. MINISTRO RUY ROSADO DE AGUIAR (Presidente): Srs.

Ministros, acompanho o voto do eminente Ministro-Relator, uma vez que

a mulher, tendo outorgado autorização ao marido para firmar hipoteca em

garantia da dívida, há ela de figurar no pólo passivo da execução.

Se não for assim, como disse bem o Sr. Ministro-Relator, poderia re­

clamar da ausência da sua citação.

Registro que não se está, no caso, decidindo sobre a existência de hi­

poteca da meação da mulher, ora recorrente.

RECURSO ESPECIAL N.Q. 115.064 - MG (Registro nQ 96.0075812-3)

Relator:

Recorrente:

Advogados:

Recorridos:

Advogados:

Ministro Sálvio de Figueiredo

Condomínio do Edifício Santo Elias

Paulo Roberto Roque Antônio Khouri e outros

Casa Americana S/A - Comércio Indústria e Represen­

tações e outro

Celso Barbi Filho e outros

Sustentação oral: Paulo Roberto Roque Antônio Khouri (pelo recorrente)

e Estefânia Souza de Viveiros (pelos recorridos)

EMENTA: Execução - Execução de obrigações de fazer ou não

fazer - Multa - Pena coercitiva indireta - Astreinte - Imposição nas

instâncias ordinárias - Termo a quo da sua exigência - Imprescindi­

bilidade da citação no processo executivo (CPC, arts. 632/633, 642/

643 e 644) - Inocorrência de violação aos arts. 535, 610/611, CPC -

Não caracterização do dissídio.

1. Nas obrigações de fazer ou não fazer, vale-se o juiz, COlll au­

torização legal, da imposição de meio coercitivo indireto, as chama­

das astreintes, para forçar o devedor a cumprir a obrigação, nos ter­

mos em que foi condenado no processo de cognição.

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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322 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

2. Essa pena pecuniária deverá ser determinada no título judi­cial. Omissos a sentença e/ou o acórdão do processo de cognição em relação à unidade temporal dessa multa (dia, semana ou mês) e a data a partir de quando devida, caberá ao juiz da execução fixá­los (CPC, art. 644). Imprescindível, no entanto, a instauração do processo executivo pela citação para a sua exigência, mesmo que

eventualmente tenha incidência anterior a essa citação, por força do decidido na decisão trânsita em julgado do processo de conhe­cimento.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, prosseguindo no julgamen­to, acordam os Srs. Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, não conhecer do recurso, sendo que os Srs. Ministros-Re­latores, Barros Monteiro e Cesar Asfor Rocha retificaram seus votos ante­riores. O Sr. Ministro Bueno de Souza não participou da votação por au­sência ocasional à sessão do dia 11.02.1999.

Brasília-DF, 7 de abril de 1999 (data do julgamento).

Ministro BARROS MONTEIRO, Presidente.

Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO, Relator.

Publicado no D} de 03.11.1999.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO SÁLVIO DE FIGUEIREDO: 1. Ajuizou O recor­rente contra os recorridos "ação cominatória", cujo pedido foi julgado im­procedente na sentença.

O Tribunal de Alçada de Minas Gerais, sendo Relator o hoje Desem­bargador Sérgio Rezende, deu provimento à apelação do autor, "para jul­gar procedente o pedido feito à fi. 6-TA (primeiro pedido ou anterior) em sua totalidade, com inversão dos ônus da sucumbência".

Esse pedido, integralmente acolhido, foi assim manifestado:

"A condenação dos réus transgressores, compelindo-os a desfaze­rem as obras de lanchonete, restaurante e bar na loja 01 (n.Q. 76), do

RSTJ, Brasilia, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 323

Edifício Santo Elias, compreendendo-se subsolo, térreo e sobreloja, no

prazo de trinta dias, a contar da intimação da sentença, assim como a

absterem-se da prática das atividades de bar, lanchonete, restaurante

ou qualquer outra transgressora da Lei, da Convenção, do Consenso

majoritário e do acordo de vontade da maioria composta por 2/3 das

frações ideais e da última alteração da convenção, inclusive antes do

trânsito em julgado da sentença; tudo sob a cominação de multa cor­

respondente a quatro pisos nacional de salário por dia, vigentes no país,

e sem prejuízo de ficar assegurado ao síndico a autorização para man­

dar desmanchar tais obras, à custa dos réus transgressores, se estes não

as desfazê-las no prazo determinado em sentença; sendo, concomitante­mente, acumulado o pagamento das perdas e danos, conforme se apu­

rar em liquidação de sentença."

Os embargos declaratórios oferecidos por um dos apelados foram par­

cialmente acolhidos, para excluir da condenação as perdas e danos.

Os recursos especiais interpostos pelos réus foram inadmitidos em

decisão atacada por agravos endereçados a este Tribunal e desprovidos pelo

Ministro Dias Trindade, quando integrava esta Quarta Turma.

2. A sentença de liquidação, por sua vez, expressou:

"O que pretendem os requeridos é se verem desobrigados do pa­

gamento da multa diária pedida nesta ação cominatória, ou pelo me­

nos, que venha ela incidir somente após a citação, que pretendia, do

réu para desocupar o imóvel.

Como o imóvel foi desocupado, sem a pretendida citação, querem,

então o não pagamento da pena cominada.

Não lhes assiste razão, data venia.

O v. acórdão de fl. 412 é muito claro, ao concluir: 'Assim, dá-se

provimento ao apelo para julgar-se procedente o pedido feito à fl. 6-

TA (primeiro pedido ou anterior) em sua totalidade, com inversão dos

ônus da sucumbência'.

O pedido de fl. 6-TA compreende, na letra a, primeiro pedido ou

anterior, como mencionado no acórdão: O desfazimento das obras de

lanchonete, restaurante e bar no prazo de trinta dias, a contar da sen­

tença; a abstenção da prática das atividades de bar, lanchonete, restau­

rante ou qualquer outra transgressora da Lei da Convenção, inclusive

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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324 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

antes do trânsito em julgado da sentença, tudo sob a cominação de

multa correspondente a quatro pisos nacionais de salário por dia, sem

prejuízo de se desmanchar tais obras à custa dos réus, se estes não as

desfazê-las no prazo determinado em sentença, e mais perdas e danos

a serem apuradas em liquidação de sentença.

A sentença de primeira instância foi desfavorável ao autor, mas

se viu ela modificada pelo acórdão de fls. 409/412, do qual foi excluí­

da, através dos embargos de fl. 413, a condenação a perdas e danos.

Assim, a sentença a que faz menção o pedido do autor, à fl. 6-TA,

é o acórdão de fl. 409, que foi publicado no dia 21.10.1992 (fl. 413).

A partir daí, os requeridos tinham trinta dias para cessar suas atividades

no prédio e desfazerem as obras destinadas ao funcionamento do res­

taurante e bar.

Como não o fizeram, devem responder pela pena cominada, de

quatro salários mínimos por dia, não cabendo aqui se discutir sobre a

decisão do egrégio Tribunal de Alçada que, julgando procedente em

sua totalidade o pedido de fl. 6-TA, com a exclusão, posteriormente,

tão-somente à indenização por perdas e danos, determinou que a pena

fosse paga a partir da publicação da sentença, como requerido."

A apelação dos réus-devedores foi desprovida em acórdão tomado por

maioria de votos. Do voto-vencido, colhe-se:

"Ao que tenho, salvo melhor juízo, sacratíssima que seja, a COl­

sa julgada não tem o alcance de dispensar o ajuizamento do processo

de execução. Entendê-lo dispensável implica em subtrair à ré o tam­

bém sagrado direito ao devido processo legal, com todas as prerroga­

tivas daí advinhas, como, por exemplo, o direito de opor embargos.

Então, citada para a execução de sentença e deixando de satisfazê­

la, estaria a executada sujeita à multa, calculada esta, aí sim, desde a

intimação do acórdão, que é o título executivo.

O que se me revela impossível é pedir-se a liquidação e subse­

qüente execução da multa, que é uma pena, sem, antes, se ter pedido

a execução da obrigação que, se descumprida e só descumprida, é que

a tornaria devida.

Sem citação, não há processo de execução; sem o processo de

execução devidamente instaurado, não está aquele a quem se impôs

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 325

uma obrigação obrigado a cumpri-la, salvo se o queria fazer esponta­

neamente.

Assim sendo, com pedido de vênia ao douto juiz-relator, dou pro­

vimento à apelação."

Dos embargos infringentes acolhidos, extrai-se do voto-condutor, da

lavra do Juiz Francisco Bueno:

"No caso, data venia, a conceituação de intimação ganha maior

relevo pois a multa, que não tem fim em si mesma, se apresenta como

meio coercitivo e se torna exigível pela mora, que somente se apura

com a intimação pessoal ou citação daquele que deva fazer ou se abster

de fazer alguma coisa.

Impossível confundir-se a multa com pena, ou com perdas e da­

nos, tanto que a astreinte não se limita, podendo alcançar cifra supe­

rior ao das perdas e danos, somente cessando sua incidência, ou com

o cumprimento da obrigação ou quando se tornar impossível seu cum­

primento.

Desta forma, a meu sentir, a intimação adotada pelo v. acórdão

que apreciou o processo de conhecimento abrangeu aquela pessoal da

parte, não se restringindo à intimação do representante advogado que

não se obriga a cumprir ou deixar de cumprir ato exclusivo do litigante.

Há um acórdão do colendo Superior Tribunal de Justiça, profe­

rido em recurso especial oriundo de Minas Gerais que esclarece a

questão, diz sua ementa: 'Obrigação de fazer. Execução. Multa. A exe­

cução de obrigação de fazer começará pela citação do devedor para que

cumpra o julgado, no prazo fixado. Decorrido este, incide a multa que

houver sido cominada' (REsp n ll 6.644-MG, ReI. Min. Eduardo Ribei­

ro, in Revista do STJ 19/550).

No caso em tela não se compeliu o embargante a cumprir o jul­

gado, pena de incorrer na multa fixada, tratou-se logo de reclamar seu

valor, desde a publicação do acórdão, que vale para os advogados,

como se se cuidasse de reparação de danos, adrede fixados.

Sem a indispensável intimação para cumprimento do acórdão

impossível liquidar-se a multa cuja razão determinante de sua incidên­

cia não foi exigida da parte devedora.

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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326 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Assim exposto, dentro de minhas notórias limitações e da singe­

leza como vejo a questão, pedindo licença aos eminentes juízes auto­

res do voto majoritário, empresto minha adesão ao voto minoritário, acolhendo os embargos infringentes."

Os embargos declaratórios, oferecidos pelo condomínio vencido, res­taram rejeitados.

3. Insurgiu-se o credor, interpondo o recurso especial estribado nas

alíneas a e c do autorizativo constitucional, apontando violação aos arts.

535, I e 11,610, 611 e 644, CPC, além de dissídio interpretativo. Sua irresig­nação foi por ele resumida nestes termos:

"Ao propor os embargos de declaração, o fez o recorrente medi­

ante demonstração clara de que os votos majoritários foram omissos e contraditórios, pois decidiram a demanda como se inexistisse o acór­

dão de fls. 409/412 dos autos, que constitui coisa julgada, determinou

como deveria ser aplicada a multa (CPC, art. 644), que a citação só

deveria ser aplicada à multa (CPC, art. 644), que a citação só deveria

ser realizada após a liquidação (CPC, art. 611) e que o acórdão, que constitui coisa julgada, jamais poderia ser alterado na fase de liquida­

ção (CPC, art. 610).

Nada obstante, a maioria persistiu em não suprir os defeitos do

julgamento embargado.

Com isso, violou o aresto o artigo 535, I e 11, do Código de Pro­

cesso Civil.

Se haviam omissões e contradições, claro é que a Câmara

Julgadora não poderia deixar de saná-las, sem ultrajar o preceito do

artigo 535, I e 11, do Código de Processo Civil.

Assim, em preliminar, torna-se, pois, cabível o recurso especial

para sanar a frontal ofensa perpetrada contra o artigo 535, I e 11, do

Código de Processo Civil, com a cassação do julgado e determinação de que outro seja proferido, com o exame das questões argüidas atra­

vés dos embargos de declaração.

Se esse co lendo Superior Tribunal de Justiça entender que estão prequestionadas as matérias e que estão elas repelidas, implicitamen­

te, pelo acórdão proferido nos embargos de declaração, pede o recor­

rente seja dado provimento ao recurso para que, reformando-se o

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 327

acórdão proferido nos embargos infringentes, seja restabelecido e man­tido o acórdão proferido na apelação cível.

o Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais deferiu, em sua integralidade, o primeiro pedido ou anterior, acima transcrito, confor­

me decisão de fls. 409/412. Julgou, pois, procedente o pedido feito pelo recorrente no sentido de que os ora recorridos fossem condena­dos a desfazer a obra no prazo de 30 (trinta) dias a contar da intimação da sentença - no caso, do acórdão - inclusive antes do trânsito de jul­

gado do mesmo, sob pena de pagamento de quatro pisos nacionais de salário por dia vigentes no país a partir do 31.Q. (trigésimo primeiro)

dia subseqüente à intimação da decisão.

Mesmo após o 3F (trigésimo primeiro) dia subseqüente à

intimação do acórdão que proferiu o mencionado pedido, continuaram os recorrentes, normalmente, no estabelecimento, como se nada tivesse acontecido; descumpriram, pois, por sua conta e risco, a decisão judi­cial de fls. 409/412.

Portanto o 3F (trigésimo primeiro) dia subseqüente à intimação

da decisão (acórdão), passaram os recorrentes a responder pela multa cominatória diária, na forma deferida pela decisão proferida por esse egrégio Tribunal, na Apelação Cível n.Q. 140.417-9.

Por sua vez, no Direito Brasileiro, o artigo 644 é expresso em determinar que 'se a obrigação consistir em fazer ou não fazer, o credor poderá pedir que o devedor seja condenado a pagar uma pena

pecuniária por dia de atraso do cumprimento, contado a prazo da data estabelecida pelo juiz'.

A data estabelecida pelo juiz, no caso dos autos, foi aquela deter­minada pelo acórdão, exatamente à fl. 412 dos autos, ou seja: foi aque­la requerida na petição inicial no primeiro pedido ou anterior, acima

transcrito, qual seja, a partir do 3F (trigésimo primeiro) dia subse­qüente à intimação da decisão do Tribunal de Alçada de Minas Gerais, mesmo antes do trânsito em julgado da mesma.

Havendo a intimação da sentença ocorrido, como deve ocorrer, na

pessoa do advogado, e não tendo os ora recorridos obedecido ao acór­dão de fls. 409/412, no prazo deferido, passou a correr multa comina­tória a partir do 31.Q. (trigésimo primeiro) dia subseqüente à intimação

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328 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

da decisão, como expressamente deferido pelo acórdão desse egrégio

Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais".

"Além desta realidade, o acórdão proferido nos embargos infrin­

gentes violou, também, o artigo 611 do Código de Processo Civil,

como se inexistente fosse, pois em lugar de acolher a sua letra, que

determina que 'julgada a liquidação, a parte promoverá a execução ci­

tando pessoalmente o devedor', inverteu o procedimento legal afirman­

do que a citação, no caso dos autos, deveria antecipar a liquidação.

Ora. O artigo 611 do CPC é expresso em dispor que só após o

julgamento da liquidação, que constitui fase que antecede à fase de

execução, é que seria promovida a citação dos ora recorridos. Jamais antes, durante a liquidação."

4. Foi também interposto pela mesma parte recurso extraordinário, no qual aponta violação aos arts. 5)2, XXXV e XXXVI e 93, IX, da Constitui­

ção.

Contra-arrazoados, foi admitido o recurso especial e inadmitido o ex­

traordinário, com manifestação de agravo endereçado ao Supremo Tribunal

Federal.

5. É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO SÁLVIO DE FIGUEIREDO (Relator): A matéria

debatida no recurso se acha implicitamente prequestionada. O aresto impug­

nado, ao determinar o termo a quo da multa, adotou tese que exclui, au­

tomaticamente, o posicionamento defendido pelo recorrente.

A irresignação logra prosperar, uma vez caracterizada a violação dos

arts. 610, 611 e 644, CPC.

Ao proferir voto como Relator do REsp nJl.. 11.368-DF (DJ de

16.12.1991), versando a matéria aqui em debate, acentuei:

"Em primeiro plano, não conheço do recurso pelo dissídio por­

que simples ementas não se prestam ao confronto, segundo uniforme entendimento. Ademais, no caso as próprias ementas não se ajustam à

tese do recorrente.

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 329

Também não conheço do recurso pela alínea a do permissivo

constitucional.

A propósito, rezam os artigos 632 e 644 do Código de Processo Civil:

'Art. 632. Quando o objeto da execução for obrigação de fazer, o devedor será citado para cumprir o julgado no prazo que

o juiz lhe assinar, se outro não estiver já determinado.'

'Art. 644. Se a obrigação consistir em fazer ou não fazer, o credor poderá pedir que o devedor seja condenado a pagar uma

pena pecuniária por dia de atraso no cumprimento, contado o prazo da data estabelecida pelo juiz.'

Em face da pouca clareza da lei, busca a doutrina a melhor ori­entação sobre o termo a quo da incidência desse 'meio coercitivo in­

direto' (AlTIaral Santos), inovação do Código de 1973 e que corres­ponde às astreintes do direito francês.

Segundo AlTIílcar de Castro, no dizer preciso de Frederico Marques, o maior dos nossos juristas em execução, 'o efeito retroa­tivo não se harmoniza com a natureza da astreinte, que não é 'pena' pelo que não foi feito, mas 'meio de coação' para que se faça ou não deixe

de ser feito. Supõe-se que o devedor que cumpre dentro do prazo as­

sinado cumpre sem multa; e só aquele que cumpre depois de esgota­do o prazo é que cumpre com multa ... até cumprir'. (Comentários ao art. 644, nJ.l. 251, RT, 2a edição). No mesmo sentido, relacionando

doutrinadores, Araken de Assis, Manual do Processo de Execução, Le Jur, 1987, § 50, nJ.l. 160.3.

De igual forma vinha o Supremo Tribunal Federal entendendo, na vigência do sistema constitucional anterior, na condição, então, de

guardião do direito federal infraconstitucional (cf. RE nJ.l. 85.573, RTJ

79/348) .

Mendonça LilTIa, ao versar o tema (Comentários, Forense, 4a

edição), ensina (nJ.l. 1.802):

'Cabe ao juiz marcar: do trânsito em julgado da sentença; da

citação para a execução; de um acontecimento qualquer, etc.'.

E, adiante, em divergência, orienta (nJ.l. 1.807):

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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330 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

'É evidente que a pena somente poderá ser cobrada a par­

tir da data em que a sentença transitar em julgado ou, mesmo

pendendo recurso, se for permitida a execução provisória. Mas,

sempre retroagirá à 'data estabelecida pelo juiz', ex vi da parte

final do art. 644. O juiz poderá determinar, porém, que a data

seja, inclusive, após o trânsito da sentença.'

Nesta trilha, segue Paulo Furtado (Execução, Saraiva, 1991, nQ.

134, p. 192).

Sem adentrar ao tema da retroatividade ou não, escreve Theodoro Júnior (Comentários, ao art. 644, nll 257, Forense, 1'1 edição):

'A exigência da pena, todavia, só se dá a partir do término

do prazo assinado na citação executiva, se outro termo não foi

fixado na sentença.'

Frederico Marques, por sua vez, doutrina, também sem ingres­

sar na referida polêmica (Manual, Saraiva, 1980, 4ll vol., nll 840):

'A pena pecuniária vem fixada na sentença com que se jul­

gou e se encerrou o processo de conhecimento (art. 645); e sua

imposição vem pedida no processo executivo, como instrumento,

meio e modo de forçar o devedor a cumprir obrigação de fazer

ou de não fazer'."

A ementa desse acórdão restou assim redigida:

"Processo Civil. Execução. Obrigação de fazer. Pena pecuniária.

CPC, arts. 287, 632, 644 e 645. Termo a quo. Recurso não conheci­

do.

I - Inexistindo avença, o Judiciário deve estabelecer o momento

inicial para o cumprimento do julgado nas obrigações de fazer.

11 - À sentença cabe marcar esse termo: preferencialmente, se do

trânsito em julgado ou da citação executiva.

IH - Omissa a sentença, é de entender-se a citação executiva

como o termo a quo da astreinte a que se referem os arts. 287, 632,

644 e 645 do Código de Processo Civil."

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 331

De outra parte, no voto-vogal que lancei no julgamento do REsp nQ

35.308-SP (DI de 11.12.1995), ao referir-me àquele julgado assim resumi o entendimento nele expresso:

"No que diz respeito à multa, o Código de 1973 adotou, como sabido, o sistema das astreintes, quer dizer, a previsão de multa para coagir o devedor ao cumprimento da obrigação de fazer ou não fazer, que não tem um caráter de sanção mas, sim, consoante lição de Moacyr Axnaral Santos, meio coercitivo indireto para forçar o de­vedor ao cumprimento da obrigação. Em assim sendo, não é razoável nem jurídico que se impute essa cominação a partir da citação inici­al, inclusive coagindo indiretamente a parte-ré a não apresentar a sua defesa em juízo.

Esta Turma tem precedente na matéria (REsp n Q 11.368-DF), segundo o qual à sentença incumbiria fixar o momento inicial da im­posição dessa multa. Na omissão da sentença, o que se deveria enten­der é que o termo a quo seria o momento da citação na execução. Den­

tro dessa linha de raciocínio, a reforma que ora se processa no Códi­go de Processo Civil modificou os arts. 644 e 645, estabelecendo que quem fixa essa multa é juiz da execução."

No caso vertente, a sentença, ou melhor, o acórdão do Tribunal de Al­çada que a substituiu (CPC, art. 512), ao acolher o "primeiro pedido", fi­xou o termo a quo da multa na data da sua intimação aos réus. Destarte, descabe, nesta altura, quando já se busca a execução do julgado, cogitar do acerto ou desacerto desse entendimento, cumprindo, portanto, atender ao critério nela estabelecido no tocante ao valor da multa diária e ao seu ter­mo a quo, em respeito ao disposto nos arts. 610, 644/645, em sua redação anterior.

A divergência jurisprudencial, por seu lado, restou evidenciada, parti­cularmente em relação ao REsp n Q 11.368-DF, a cujo teor me referi.

Pelo exposto, conhecendo do recurso pelos dois fundamentos, dou-lhe provimento para reformar o r. acórdão e determinar o cômputo da multa diária a partir da intimação do acórdão que substituiu a sentença, com in­versão dos ônus da sucumbência.

VOTO-VISTA

o SR. MINISTRO BARROS MONTEIRO: 1. O "Condomínio do

RST], Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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332 REVISTADO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Edifício Santo Elias" ajuizou ação cominatória contra "Casa Americana SI A - Comércio Indústria e Representações e contra Lamonier Mendonça, a qual foi julgada improcedente em primeiro grau.

O Tribunal de Alçada de Minas Gerais deu provimento ao apelo inter­posto pelo autor para julgar procedente o primeiro pedido em sua totalida­de, invertidos os ônus da sucumbência.

Eis os termos do pleito acolhido:

"A condenação dos réus transgressores, compelindo-os a desfaze­rem as obras de lanchonete, restaurante e bar na loja 01 (n!l. 76), do Edifício Santo Elias, compreendendo-se subsolo, térreo e sobreloja, no prazo de trinta dias, a contar da intimação da sentença, assim como a absterem-se da prática das atividades de bar, lanchonete, restaurante ou qualquer outra transgressora da Lei, da Convenção, do Consenso majoritário e do acordo de vontade da maioria composta por 2/3 das frações ideais e da última alteração da convenção, inclusive antes do trânsito em julgado da sentença; tudo sob a cominação de multa cor­respondente a quatro pisos nacionais de salário por dia, vigentes no país, e sem prejuízo de ficar assegurado ao síndico a autorização para mandar desmanchar tais obras, à custa dos réus transgressores, se es­tes não as desfazê-las no prazo determinado em sentença; sendo, concomitantemente, acumulado o pagamento das perdas e danos, con­forme se apurar em liquidação de sentença." (fi. 6-TA).

Os declaratórios foram acolhidos, em parte, para excluir a condena­ção relativa às perdas e danos.

Requerida a liquidação pertinente à multa por cálculo do contador, o MM. Juiz de Direito homologou-o, firmando a posição de que o termo ini­cial da penalidade é contado a partir da intimação da sentença, no caso, da intimação do v. acórdão que julgou procedente a demanda.

Manifestada a apelação pelos réus, o mesmo egrégio colegiado negou­lhe provimento, por maioria de votos, vencido o Sr. Juiz-Revisor, que di­vergia tocante ao termo a quo da multa, fixando-a a partir da citação para a execução do julgado.

Este pronunciamento minoritário veio a prevalecer quando da aprecia­ção dos embargos infringentes, cujo voto-condutor concluiu que "sem a in­dispensável intimação para cumprimento do acórdão impossível liquidar-se a multa cuja razão determinante de sua incidência não foi exigida da parte devedora" (fi. 643-TA).

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 333

Daí o recurso especial manejado pelo autor, com alegação de ofensa

aos arts. 535, I e II, 610, 611 e 644 do CPC, além de dissídio jurispru­

dencial.

Na assentada anterior, conforme já registrado, o Sr. Ministro-Relator

conheceu do recurso e deu-lhe provimento para reformar o v. acórdão e de­

terminar o cômputo da multa diária a partir da intimação do julgado de fls.

409/412, que substituiu a primitiva sentença de improcedência.

2. A presente controvérsia diz com a determinação do termo inicial da

multa: se ela é devida a contar da intimação da sentença (no caso, do v.

acórdão de fls. 409/412) ou se da citação dos réus para os termos da exe­

cução.

Em primeiro lugar, penso que se encontra satisfeito o requisito do

prequestionamento, pois a referida questão jurídica vem sendo versada desde

a decisão de primeira instância que homologou o cálculo de liquidação.

Segundo o disposto no art. 610 do Código de Processo Civil, "é de­

feso, na liquidação, discutir de novo a lide, ou modificar a sentença, que a

julgou" .

É induvidoso o dispositivo do v. acórdão que, reformando a sentença

prolatada no processo de conhecimento, concluiu pelo acolhimento do pri­

meiro pedido em sua totalidade. Remetida que se acha a leitura atenta da

postulação agasalhada pelo egrégio Tribunal, tem-se que o termo a quo da

multa em tela já restara desde logo estabelecido: fora, com efeito, requeri­

do o desfazimento das obras no prazo de trinta dias, a contar da intimação

da sentença, tudo sob a cominação da multa. O autor, a título de reforço e

explicitação, fez menção de que a condenação incidiria antes mesmo do

trânsito em julgado da sentença.

Claro está, portanto, como assinalado, que o acórdão exeqüendo dei­

xou firmado o termo inicial da multa, não podendo agora ser ele objeto de

tergiversações. Se nada tivesse sido estabelecido naquela ocasião, razão aí

sim assistiria aos ora recorridos: o prazo seria contado da citação instau­

radora da execução.

À espécie incide o estatuído no artigo 644 do Código de Processo Civil

em sua redação anterior à Lei nll. 8.953, de 1994: "Se a obrigação consis­

tir em fazer ou não fazer, o credor poderá pedir que o devedor seja conde­

nado a pagar uma pena pecuniária por dia de atraso no cumprimento, con­

tado o prazo da data estabelecida pelo juiz".

RST], Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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334 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Na hipótese sub judice, a astreinte, ou seja, o meio coercitivo indi­reto, ficou de imediato definida pelo v. acórdão de fls. 409/412, pelo que não há como alterar-se o dies a quo da pena pecuniária cominada. Tal como o eminente Ministro-Relator, considero como vulnerados na espécie os arts. 610 e 644 do CPC, a par de configurado quantulD satis o dissenso pretoriano. Aliás, o paradigma invocado pelo recorrente (REsp nQ 11.368-

DF, in RSTJ vol. 30, pp. 465/4700) amolda-se às inteiras ao caso em exa­me, conforme deflui da substanciosa e sólida motivação inserta no voto-con­dutor do acórdão, da lavra do Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo, assim como de sua expressiva ementa, que reproduzo a seguir:

"Processo Civil. Execução. Obrigação de fazer. Pena pecuniária. CPC, arts. 287, 632, 644 e 645. Termo a quo. Recurso não conheci­do.

I Inexistindo avença, o Judiciário deve estabelecer o momento inicial para o cumprimento do julgado nas obrigações de fazer.

n - À sentença cabe marcar esse termo: preferencialmente, se do trânsito em julgado ou da citação executiva.

In - Omissa a sentença, é de entender-se a citação executiva como o termo a quo da astreinte a que se referem os arts. 287, 632, 644 e 645 do Código de Processo Civil."

3. Ante o exposto, acompanhando voto proferido pelo Sr. Ministro­Relator, conheço do recurso por ambas as alíneas do admissor constitucional e dou-lhe provimento para reformar o v. acórdão ora recorrido e determi­nar o cômputo da multa diária a partir da intimação do decisório de fls. 409/412, que substituiu a primitiva sentença de improcedência da deman­da.

É o meu voto.

VOTO-VISTA

O SR. MINISTRO RUY ROSADO DE AGUIAR: 1. O recurso espe­

cial foi assim relatado pelo eminente Min. Relator (Leu).

Trata-se de estabelecer a data inicial para a contagem da multa diá­

ria de 4 salários mínimos imposta à ré, para o caso de desatender à ordem de demolição das obras feitas para a instalação de uma lanchonete no con­

domínio autor.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 335

2. O r. acórdão desta Quarta Turma, no REsp nil. 11.368-DF, indica­do pelo recorrente, por ementa, como paradigma, versou sobre um caso em que a ré, vencida na ação cominatória para a apresentação dos documentos necessários para lavrar escritura pública de compra e venda de imóvel, fora intimada pessoalmente para cumprir o julgado, demorando seis meses de­pois disso para cumprimento da ordem.

No nosso caso, não houve essa intimação pessoal, razão pela qual o pre­cedente só por isso já não serve para conhecimento do recurso especial.

Naquele julgado, o eminente Ministro Sálvio de Figueiredo examinou duas alternativas: "A sentença fixou o prazo de 30 dias, mas não estabele­

ceu o momento inicial, se do trânsito em julgado ou da citação executiva. Omissa a sentença nesse ponto, mas correto fixar o termo a quo a partir do momento estabelecido para o cumprimento do julgado transitado em julga­

do, uma vez que a liquidação se processou por simples cálculo, o que correspondeu à citação executiva".

Como se vê, a opção de contagem da multa desde a publicação da sen­

tença, como quer o recorrente e lhe foi deferido no voto do eminente Relator, não foi examinada no precedente. Também por isso, inviável a in­vocação daquele r. acórdão para amparar a pretensão do recorrente.

Ainda afirma o condomínio ser absolutamente dispensável nova cientificação do réu vencido na cominatória, para cumprimento do julgado

e contagem dos dias-multa. No entanto, no referido precedente, ficou assim explicitado no voto do eminente Bueno de Souza: "A citação, penso, há de ser para que o executado, em determinado prazo, diligencie o que for mister

e pratique o ato; caso não o pratique, decorrido o prazo que o mandado fi­xar, então incorrerá na multa".

Como se vê, o paradigma versou sobre situação processual diversa (ha­via intimação pessoal), com duas alternativas propostas à egrégia Turma que

não correspondem à que foi agora aceita (contagem da multa desde a sen­tença), e onde ficou expressamente dito que somente depois da citação para cumprimento do ordenado na sentença é que incorreria o devedor em multa.

3. O fundamento do voto do eminente Relator, para acolher o recurso está em que, aceito o pedido do autor, assim como exposto na petição ini­

cial, estava também fixado o termo a quo da multa desde a data da publi­

cação do acórdão. Se não houvesse essa manifestação, seria da citação para

a execução.

Ocorre que o r. acórdão da egrégia Sexta Câmara Civil do Tribunal

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336 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

de Alçada, que reformou a sentença e deu pela procedência da ação, não se manifestou especificamente sobre o valor da multa e seu termo a quo, li­mitando-se a acolher o pedido expresso na inicial, sob o título "primeiro pe­dido", assim vazado:

"A condenação dos réus transgressores, compelindo-os a desfaze­rem as obras de lanchonete, restaurante e bar na loja 01 (n!l. 76), do

Edifício Santo Elias, compreendendo-se subsolo, térreo e sobreloja, no prazo de trinta dias, a contar da intimação da sentença, assim como a absterem-se da prática das atividades de bar, lanchonete, restaurante

ou qualquer outra transgressora da Lei, da Convenção, do Consenso majoritário e do acordo de vontade da maioria composta por 2/3 das

frações ideais e da última alteração da convenção, inclusive antes do trânsito em julgado da sentença; tudo sob a cominação de multa cor­respondente a quatro pisos nacionais de salário por dia, vigentes no

país, e sem prejuízo de ficar assegurado ao síndico a autorização para mandar desmanchar tais obras, à custa dos réus transgressores, se es­

tes não as desfazê-las no prazo determinado em sentença; sendo, concomitantemente, acumulado o pagamento das perdas e danos, con­

forme se apurar em liquidação de sentença." (fl. 6)

Ali não ficou dito que estava dispensada a intimação pessoal da sen­

tença, que o prazo correria a partir da simples publicação do acórdão no jornal oficial. Logo, exigir essa providência, assim como o fez o r. acórdão ora recorrido, não confronta como o que fora antes decidido, nem destoa do precedente desta Quarta Turma, onde nunca se dispensou o conhecimento pessoal da parte para o cumprimento do ato cominado na sentença, pois se

trata de conduta pessoal exigida do réu, que para isso há de ser cientificado. Ainda que se possa dispensar tal exigência em certos casos, a verdade é que

a sua formulação, assim como posta no r. acórdão, não viola nenhum dos

artigos indicados:

- não se está modificando o dito no acórdão executado, pois este nada

disse sobre a dispensa de intimação do réu; logo, incólume ficou o art. 610

do CPC;

- não foi dispensada a citação na execução (art. 611);

- não se determinou a contagem do prazo em data diversa da estabe-

lecida pelo juiz (art. 644, antiga redação), pois o acórdão - acolhendo o que constava do pedido - limitara-se a determinar a contagem a partir da "inti­

mação da sentença".

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 337

Sendo assim, também pela alínea a não pode ser conhecido o especial.

Somente o seria se no acórdão estivesse disposto que o réu incorreria em multa a partir da publicação do acórdão no jornal oficial. Essa assertiva

evidentemente que não foi feita, assim também como não se pode extrair da

decisão da r. Câmara do egrégia Tribunal de Minas Gerais a idéia de que

a multa correria a partir de uma nota dirigida ao conhecimento dos advo­

gados, não destinada a intimar as partes para a prática de algum ato, espe­

cialmente quando se tratava de acatar e cumprir a obrigação imposta em

sentença proferida na ação cominatória, e em valores que correspondem a

quantia muitas vezes superior ao valor do imóvel.

Reproduzo, porque irrepreensível, a fundamentação constante do voto do eminente Dr. Francisco Bueno:

"No caso, data venia, a conceituação de intimação ganha maior

relevo pois a multa, que não tem fim em si mesma, se apresenta como

meio coercitivo e se torna exigível pela mora, que somente se apura

com a intimação pessoal ou citação daquele que deva fazer ou se abster de fazer alguma coisa.

Impossível confundir-se a multa com pena, ou com perdas e da­

nos, tanto que a astreinte não se limita, podendo alcançar cifra supe­

rior ao das perdas e danos, somente cessando sua incidência, ou com

o cumprimento da obrigação ou quando se tornar impossível seu cum­primento.

Desta forma, a meu sentir, a intimação adotada pelo v. acórdão

que apreciou o processo de conhecimento abrangeu aquela pessoal da

parte, não se restringindo à intimação do representante advogado que

não se obriga a cumprir ou deixar de cumprir ato exclusivo do litigante.

Há um acórdão do colendo Superior Tribunal de Justiça, profe­

rido em recurso especial oriundo de Minas Gerais que esclarece a

questão, diz sua ementa: 'Obrigação de fazer. Execução. Multa. A exe­cução de obrigação de fazer começará pela citação do devedor para que

cumpra o julgado, no prazo fixado. Decorrido este, incide a multa que houver sido cominada' (REsp nQ 6.644-MG, ReI. Min. Eduardo Ribei­

ro, in Revista do STJ 19/550)." (fl. 642).

Por isso, com a máxima vênia, não conheço do recurso, mantendo o r.

acórdão recorrido, que fez boa aplicação da lei e não divergiu do precedente indicado.

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338 REVISTADO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

RETIFICAÇÃO DE VOTO

o SR. MINISTRO SÁLVIO DE FIGUEIREDO (Relator): 1. Após

proferir voto como Relator, conhecendo do recurso e dando-lhe provimen­

to, em votos-vista, seguidos, de igual forma votaram os Srs. Ministros Bar­

ros Monteiro e Cesar Asfor Rocha.

Após vista dos autos, também se manifestou o Sr. Ministro Ruy Rosado

de Aguiar, concluindo diversamente, todavia, não conhecendo do recurso.

Valendo-me de dispositivo regimental, solicitei vista para novo exame

da espécie.

2. Após rever os autos, tenho por equivocado o entendimento que

externei na primeira oportunidade, levando a erro, s.m.j., os eminentes pares

que a seguir me acompanharam.

A uma, porque efetivamente não caracterizado o dissídio, dado que

diversas as situações confrontadas, como assinalou o Sr. Ministro Ruy

Rosado de Aguiar, cujos fundamentos ora incorporo. Ademais, no para­

digma (REsp n.>!. 11.368-DF), trazido à colação por ementa, do qual in­

clusive fui também Relator, bem diversa era a espécie, discutindo-se ali

as astreintes e o momento inicial para o cumprimento do julgado nas

obrigações de fazer ou não fazer, se omissa a sentença/acórdão, enquanto

o que se discute no recurso em tela é a necessidade ou não de prévia ci­

tação executiva para a incidência da pena pecuniária como medida co­

ercitiva indireta.

A duas, porque não vulnerados os preceitos normativos declinados.

Em primeiro lugar, porque não se rediscutiu a lide no âmbito da li­

quidação (art. 610, CPC), mas apenas se observou da impossibilidade da sua

antecipação à citação executiva em se cuidando de obrigações de fazer ou

não fazer, dado que somente a partir de então se poderia cogitar da inci­

dência da multa, mesmo que eventualmente retroativa (a propósito, CPC,

arts. 632/633, 642/643).

Em segundo lugar, porque inocorreu no caso a citação (CPC, arts. 611

e 644).

Em terceiro lugar, porque o acórdão dos infringentes apreciou a es­

pécie no essencial, inocorrendo a apontada violação do art. 535, CPC.

Em conclusão, após o reexame da espécie, convencido fiquei de que

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 339

o apelo não está a merecer acolhida, até porque bem distinta a situação

retratada nos autos dos precedentes que assentaram o entendimento jurispru­

dencial deste Tribunal, dentre os quais ainda é de mencionar-se o referido

no voto-condutor do acórdão impugnado (REsp n.Q. 6.644-MG, RSTJ 19/

550), já consignado no relatório.

Não conheço do recurso.

RETIFICAÇÃO DE VOTO

O SR. MINISTRO BARROS MONTEIRO: Srs. Ministros, bem com­

preendida a posição do Sr. Ministro-Relator, creio que a S. Exa. assiste ra­

zão. A estipulação da astreime pelo v. acórdão (imposição da pena pecuniária

caso a obrigação de fazer não se cumpra no prazo de trinta dias, a contar

da intimação da sentença) pressupõe que o executado tenha sido citado para

os termos da execução propriamente dita.

A incidência da multa não se opera automaticamente; antes, a impo­

sição da referida penalidade depende da citação do executado para cumprir

a sentença. Este o sistema adotado pela lei processual civil.

Portanto, aderindo ao voto de S. Exa. e ao que houvera sido proferi­

do anteriormente pelo Sr. Ministro Ruy Rosado de Aguiar, retificando mi­

nha posição anterior, também não conheço do recurso.

RETIFICAÇÃO

O SR. MINISTRO CESAR ASFOR ROCHA: Sr. Presidente, revejo

minha posição anterior, para acompanhar o Sr. Ministro-Relator que, recon­

siderando o seu judicioso voto, não conheceu do recurso.

Na verdade, o que se está, agora, a dizer é que a obrigação de pagar

a astreinte tem seu termo inicial com a citação feita na execução do julga­

do, e aquela multa estabelecida na sentença de conhecimento fica diferida,

para quando for feita a citação no processo de execução, já que a hipótese

cuida da obrigação de fazer.

Com essas considerações e, aderindo inteiramente ao voto agora pro­

ferido pelo eminente Ministro Sálvio de Figueiredo, também não conheço

do recurso.

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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340 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

RECURSO ESPECIAL N.I!. 122.159 - SP (Registro n"'- 97.0015642-7)

Relator: Ministro Barros Monteiro

Recorrente: Eliza Rodrigues Teixeira (espólio)

Representada por: Daniel Luiz Rodrigues de Oliveira

Advogados: Bension Coslovsky e outro

Recorrido: José Andreto (espólio)

Advogada: Maria Amélia Santiago da Silva

Recorridos: Silvino Pereira da Silva e outros

Advogados: Tomáz de Aquino Pereira Marins e outros

Recorrido: Waldomiro Canuto da Paixão

EMENTA: Assistência judiciária - Substituição do autor faleci­

do - Beneficiário da Justiça gratuita pelo espólio - Benefício lllanti­do.

- Segundo a jurisprudência da Quarta Turllla, o espólio está elll

juízo pela cOlllunidade dos herdeiros. Ocorrendo a substituição pro­cessual (art. 43 do CPC), cabe-lhe forlllular o pleito de lllanutenção

do benefício da assistência judiciária.

Recurso especial conhecido e provido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas,

decide a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe provimento, na forma do relatório e notas taquigráficas precedentes que integram o presente julgado. Votaram com o

Relator os Srs. Ministros Cesar Asfor Rocha, Ruy Rosado de Aguiar e Aldir Passarinho Junior.

Brasília-DF, 2 de setembro de 1999 (data do julgamento).

Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, Presidente.

Ministro BARROS MONTEIRO, Relator.

Publicado no DJ de 13.12.1999.

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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JURISPRUDENCIA DA QUARTA TURMA 341

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO BARROS MONTEIRO: O espólio de Eliza Rodrigues Teixeira, nos autos da ação reivindicatória movida contra Silvino Pereira da Silva e outros, interpôs agravo de instrumento contra decisão do

MM. Juiz da Segunda Vara do Foro Regional de Itaquera que julgou deserta a apelação.

A Quinta Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo negou provimento ao agravo em acórdão cujos fundamentos se resu­mem na seguinte ementa:

"Agravo. Reivindicatória. Deserção. Autora beneficiária da assis­tência judiciária. Falecimento. Pedido de assistência judiciária formu­

lado pelo herdeiro, mas, depois da deserção. Intempestividade mani­festa. Manutenção do decidido. Recurso ativo improvido." (fl. 132).

Inconformado, o espólio-agravante manifestou o presente recurso es­

pecial com arrimo nas alíneas a e c do permissor constitucional, apontan­do afronta aos arts. 236, § 1.1\ 12, V, e 991, I, do CPC, 10 da Lei nll. 1.060/ 1950, além de dissídio interpretativo. Afirmou que a então autora, Eliza Rodrigues Teixeira, obteve o benefício da justiça gratuita em 14.04.1994.

Pouco antes do encerramento da instrução processual, veio a falecer, tendo seu único filho promovido a abertura do inventário. Aduziu que o pedido de substituição processual não chegou a ser deferido, sendo certo que a sen­tença, em nenhuma passagem, menciona o espólio, mas somente o nome da autora. Pela sentença, a autora foi julgada carecedora de ação. Os declara­tórios foram acolhidos para condená-la nas custas e honorários advocatícios.

Disse que nas publicações no DJ, tanto da sentença quanto dos declaratórios, não figurou o espólio, mas apenas o nome da finada. Asseverou que, ao ofe­recer as razões de apelação, o espólio requereu expressamente a conces­

são do benefício da Justiça gratuita. Por fim, sustentou que o termo "her­deiro" só deve ser utilizado após a efetivação da partilha e adjudicação dos

bens.

Contra-arrazoado, o apelo extremo foi admitido.

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO BARROS MONTEIRO (Relator): Tanto o julgador

RST], Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

Page 36: Jurisprudência da Quarta Turma...JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA RECURSO EM HABEAS CORPUS N.2. 8.922 - SP (Registro nJ:!. 99.0069502-0) Relator: Ministro Aldir Passarinho Junior Recorrente:

342 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

singular de primeiro grau como o v. acórdão recorrido conferiram uma in­

terpretação meramente literal ao art. 10 da Lei nQ l.060, de 05.02.1950, a qual, por isso mesmo, não deve subsistir.

Pouco antes de encerrar-se a instrução, a autora faleceu. Incumbia ao Magistrado, assim, suspender o processo nos termos do disposto no art. 265, inc. I, do Código de Processo Civil. Não o fez, porém, tendo sido prolatada a r. sentença como se viva fosse a demandante. O MM. Juiz de Direito, nes­sa ocasião, apenas ordenou ao cartório que regularizasse os nomes das partes nos registros, sendo que no pólo passivo figurasse o espólio de Eliza Rodri­gues Teixeira (fi. 58).

Certo é que, a despeito de não se operar a suspensão do feito, o es­pólio de Eliza Rodrigues Teixeira, uma vez proferida a sentença, comple­mentada pela decisão dos aclaratórios, compareceu aos autos, pleiteando a exoneração do recolhimento das custas por ser beneficiário da Justiça gra­tuita. O Juiz de Direito, no entanto, indeferiu o pleito, sob o fundamento de que o benefício concedido a Eliza Rodrigues Teixeira se extinguira com a sua morte (art. 10 supramencionado).

Tal decisão não chegou a ser publicada pela imprensa. Adveio a ape­lação do espólio, requerendo, preliminarmente, a dispensa da obrigação de recolher as custas em face do benefício da assistência judiciária. O Magis­trado desatendeu-o, declarando deserta a apelação, decisório este mantido pelo egrégio Tribunal a quo sob o fundamento central de que, extinta a gratuidade em virtude da morte da beneficiária, era de rigor novo requeri­mento por parte do herdeiro, pouco importando a postulação a respeito for­mulada pelo espólio à fi. 73, desde que faz ele referência ao citado espó­lio e não ao herdeiro (fi. 133).

Claro está que, se a autora falecida foi substituída por seu espólio no pólo ativo da lide, a assistência judiciária haveria de estender-se ao seu su­cessor, o mesmo espólio e não o herdeiro. O vocábulo "herdeiros" empre­gado na parte final do indigitado art. 10 da Lei n Q l.060/1950 é de ser en­tendido em compreensão ampla, abrangendo também o espólio quando for o caso de este suceder a parte falecida, conforme, aliás, prevê às expressas o art. 43 do CPC.

Só por tratar-se de espólio, não se vê ele impedido de pleitear a

concessão da gratuidade da Justiça. Nessa hipótese, a verificação acerca da alegada miserabilidade recairá - evidente - sobre os herdeiros e o patrimônio deixado. Vale lembrar que mesmo essa providência, em prin­

cípio, ter-se-ia como prescindível, à consideração de que, para obter o

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 343

benefício, à parte bastaria afirmar que não se acha em condições de ar­car com as despesas do processo (art. 4>!. da Lei n>!. 1.060, de 1950).

Em verdade, o espólio, como parte formal, está em juízo pela comu­nidade dos herdeiros. Isto é o que tem reiteradamente decidido esta colenda Turma, embora a propósito de outros temas. Confiram-se os REsps n>!.s 7.482-SP, Relator Ministro Athos Carneiro; 28.817-8-SP e 40.114-3-SP, ambos por mim relatados.

Deve ser-lhe deferido, pois, o benefício oportunamente requerido, ou seja, antes do oferecimento da apelação, com a reiteração feita no momen­to em que interposta esta última. Conseqüentemente, malferido o art. 10 invocado no REsp, não pode prevalecer o decreto de deserção confirmado pela segunda instância. Apenas não se configura o dissenso interpretativo no caso, até porque o paradigma colacionado é oriundo do próprio colegiado prolator da decisão recorrida (Súmula n>!. 13-STJ).

Do quanto foi exposto, conheço do recurso pela alínea a do permissor constitucional e dou-lhe provimento, a fim de conceder ao apelante a Jus­tiça gratuita e, por via de conseqüência, afastando a deserção, determinar que o apelo seja processado como de direito.

É o meu voto.

RECURSO ESPECIAL N~ 136.550 - MG (Registro n>!. 97.0041723-9)

Relator:

Recorrente:

Advogados:

Recorrido:

Advogado:

Ministro Cesar Asfor Rocha

Município de Governador Valadares

Humberto Theodoro Júnior e outros

Esporte Clube Democrata

Reinaldo RibeirQ da Silva

EMENTA: Processual Civil - Art. 515, § 22., CPC - Pedido COlll dois fundalllentos - Sentença que acolheu o prillleiro deles selll se

lllanifestar sobre o segundo - Apelação do réu - Efeito devolutivo -Dever do Tribunal de, rejeitando o fundalllento acolhido pela sen­

tença, conhecer dos delllais.

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344 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

o efeito devolutivo da apelação não se restringe às questões re­solvidas na sentença, compreendendo também as que poderiam ter sido decididas, seja porque suscitadas pelas partes, seja porque conhecíveis de ofício (§ 22 do art. 515 do CPC).

Se o juízo de primeiro grau examina apenas um dos dois fun­damentos do pedido do autor para acolhê-lo, a apelação do réu de­volve ao Tribunal o conhecimento de ambos os fundamentos, ainda que o autor não tenha apresentado apelação adesiva ou contra-ra­zões ao apelo do réu, daí porque pode o Tribunal, estando a lide em condições de ser apreciada, reformar a sentença e acolher o pedido do autor pelo outro fundamento que o juiz de primeiro grau não che­gou a apreciar.

Recurso especial parcialmente conhecido e nesta parte pro­vido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer em parte do recurso, e nessa parte, dar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Mi­nistro-Relator. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Ruy Rosado de Aguiar, Aldir Passarinho Junior, Sálvio de Figueiredo e Barros Monteiro.

Brasília-DF, 23 de novembro de 1999 (data do julgamento).

Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, Presidente.

Ministro CESAR ASFOR ROCHA, Relator.

Publicado no DJ de 08.03.2000.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO CESAR ASFOR ROCHA: Recolho do relatório do

v. acórdão recorrido os seguintes excertos:

"Cuida-se de pedido (precedido da cautelar inominada, em apen­so) de anulação de ato de doação de imóvel, feita pelo próprio doa­dor, Município de Governador Valadares, na gestão anterior à do atual Prefeito, ao réu, Esporte Clube Democrata. Segundo o suplicante, a

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 345

doação ainda não poderia ter sido implementada com a lavratura da escritura, porque a Lei nl2 3.658/1992, que a autorizou, ainda não ha­via entrado em vigor, porque não publicada. Além disso, salienta que a doação é manifestamente imoral, porque se trata de imóvel de grande valor, localizado no centro da cidade de Governador Valadares, ante­riormente doado ao réu, que, indevidamente, a alienou, pelo que, meio de ação popular, foi revertida ao domínio do Município, mas que, não obstante esse fato, nova doação foi feita ao mesmo réu. Esse ato - afir­ma - foi praticado pelo então Prefeito, no dia imediato à sanção da lei e no último de sua gestão, como presente àqueles que o ajudaram a se eleger, mas sem que a referida lei tivesse entrado em vigor, constitu­indo assim ato ilegal e lesivo ao patrimônio público municipal.

( ... ) Impugnada a contestação e ouvido o MP, o douto juiz jul­gou a lide antecipadamente, por meio da r. sentença de fls. 150/153, acolhendo o pedido, à consideração de que, quando foi lavrada a es­critura de doação, a lei que a autorizava, ainda não havia entrado em vigor. Acolheu, pela mesma, sentença a cautelar inominada em apenso." (fls. 211/212).

Entendendo que, no dia em que lavrada a escritura de doação, a lei autorizativa já estava em vigor, o egrégio Tribunal de origem acolheu a ape­lação do réu, julgando improcedente o pedido, investidos os ônus da sucumbência, recusando, nesse mesmo acórdão, o exame da imoralidade da doação. Nesse ponto assentou o voto-condutor do julgado:

"No mérito, o inusitado, no caso, é que a Administração, ao in­vés de publicar a lei e convalidar a doação (já que ela não é diretamen­te atacada), quer anulá-la, pela alegada falta de eficácia da lei, na data em que a escritura foi lavrada.

Todavia, são dois os motivos invocados, na inicial: a ineficácia da mencionada lei e a imoralidade da doação.

Anota-se que o douto Julgador acolheu o pedido pelo primeiro motivo, não chegando a tocar no segundo, e que a apelação, como não podia deixar de ser, impugnou somente o que foi decidido na senten­ça. Disso resulta que o recurso só pode ser apreciado nos limites es­pecificados pelo próprio recorrente. Por isso, não apreciada a questão da imoralidade da doação, não pode ser objeto de apreciação na segun­da instância, porque, para tanto, não foi provocada. Somente poderia o Tribunal se pronunciar se se tratasse de matéria que devesse conhe­cer de ofício, o que não é o caso." (fls. 213/214).

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346 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Rejeitados os declaratórios, o Município ingressou com recurso espe­

cial fundamentado na alínea a do permissivo, por negativa de vigência ao

artigo 515, § 2l1., do Código de Processo Civil, uma vez que, decidindo que a primeira causa de pedir haveria de ser afastada, era dever do Tribunal de

segundo grau prosseguir no exame da segunda causa petendi, relativa à

imoralidade da doação, mesmo sem o recurso da parte vencedora que, na

hipótese, careceria de interesse. O recorrente aduz, ainda, a ofensa ao arti­

go 131, também do Código de Processo Civil, o qual admitiria "possa o

juiz decidir segundo seu 'livre convencimento', mas nunca arbitrariamente

e sem apoio na prova dos autos", sendo que a documentação oficial cons­

tante dos autos demonstraria a não publicação da lei municipal e o acórdão

teria afirmado a afixação da lei na sede da Prefeitura.

Respondido, o recurso foi inadmitido na origem, ascendendo em vir­

tude de agravo de instrumento por mim acolhido.

Parecer do douto Ministério Público Federal pelo conhecimento e pro­

vimento do recurso.

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO CESARASFOR ROCHA (Relator): O Município

de Governador Valadares, ora recorrente, na sua inicial, pediu a nulidade da

doação de bem público feita ao réu tanto porque a escritura resl?ectiva te­

ria sido lavrada sem que fosse publicada a lei autorizativa, como porque a

doação seria manifestamente imoral e lesiva ao patrimônio público.

A sentença não chegou a examinar a questão da imoralidade, acolhendo

o pedido pelo primeiro fundamento diante da falta de publicação da lei

autorizativa da doação.

O acórdão ora recorrido, por sua vez, entendeu que a lei havia sido

publicada e julgou improcedente o pedido sem examinar a argüição de imo­

ralidade porque essa questão não teria sido analisada pela sentença, nem

portanto impugnada na apelação a cujos limites impugnativos estaria ads­

trito.

Daí o recurso especial afirmando a negativa de vigência ao artigo 515,

§ 2l1., do Código de Processo Civil, uma vez que, decidindo que a primeira

causa de pedir haveria de ser afastada, era dever do Tribunal de segundo

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 347

grau prosseguir no exame da segunda causa petendi, relativa à imoralidade

da doação, mesmo sem o recurso da parte vencedora que, na hipótese, ca­receria de interesse.

Com razão o recorrente.

É certo que, nos termos do artigo 515, caput, do Código de Proces­so Civil, "a apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria im­pugnada". Não menos certo, contudo, é o preconizado pelo § 2ll desse mes­mo artigo, verbis: "quando o pedido ou a defesa tiver mais de um funda­mento e o juiz acolher apenas um deles, a apelação devolverá ao tribunal o conhecimento dos demais."

o próprio Tribunal reconheceu que o pedido do autor tinha dois fun­damentos e que o juiz teria acolhido apenas um deles, mas recusou o exa­me do outro fundamento porquanto ausente impugnação a respeito.

Se ele não foi sequer examinado pela sentença, não poderia o réu

impugná-lo, muito menos ao autor, vencedor na demanda, caberia interpor apelação para vê-lo apreciado.

O efeito devolutivo da apelação não se restringe às questões resolvi­das na sentença, compreendendo também as que poderiam ter sido seja por­que suscitadas pelas partes ou porque conhecíveis de oficio.

Se o juiz examina e acolhe apenas um dos dois fundamentos do pedi­do do autor, a apelação do réu devolve ao tribunal o conhecimento de am­bos, ainda que o autor não tenha apresentado apelação adesiva ou contra­razões.

Pertinente reproduzir sobre o tema o escólio doutrinário, trazido pelo recorrente, do magistério de Barbosa Moreira:

"Se o autor invocara dois fundamentos para o pedido, e o juiz o julgou procedente apenas por um deles, silenciando sobre o outro, ou repelindo-o, a apelação do réu, que pleiteia a declaração da improce­dência, basta para devolver ao tribunal o conhecimento de ambos os fundamentos. (Comentários ao CPC, 6a ed., Forense, v. V, n ll 244, p. 397)."

"Em nenhuma dessas hipóteses precisa a parte vencedora inter­por, por sua vez, apelação, quer independente, quer adesiva, para in­sistir no fundamento do pedido ou da defesa que tenha sido rejeitado, ou a cujo respeito haja silenciado a sentença. A apelação, aliás, seria inadmissível, por falta de interesse. Tampouco é necessário que a parte

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348 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

insista expressamente no fundamento desprezado, ao arrazoar o re­

curso do adversário; a devolução produz-se de qualquer maneira, ex vi legis (ob. cit., nll. 244, p. 398)."

Assim também na jurisprudência desta Corte:

"Apelação. Efeito devolutivo.

Se, no julgamento da apelação, rejeita-se o fundamento acolhido

pela sentença, para julgar procedente a ação, deve o órgão julgador

prosseguir nos demais fundamentos do pedido, ainda que não tenham

sido examinados em primeiro grau, por força de amplíssima devolu­

ção decorrente do § 2ll. do artigo 515 do CPC. Recurso conhecido e

provido." (REsp nll. 68.488-PR, ReI. eminente Ministro Costa Leite,

RSTJ 100/153).

Neste sentido, ainda, os REsps nll.s 110.101-MG e 54.538-2-PE, rela­

tados pelo Min. Barros Monteiro.

Por fim, anoto que a ofensa ao artigo 131, CPC, o qual admitiria "possa

o juiz decidir segundo seu 'livre convencimento', mas nunca arbitrariamente

e sem apoio na prova dos autos", imprescinde do reexame fático-probatório,

convocando a incidência do Verbete nll. 7 da Súmula desta Corte.

Diante de tais pressupostos, conheço apenas em parte do recurso e

nesta parte lhe dou provimento, determinando que o egrégio Tribunal de

origem integre o acórdão examinando e decidindo acerca dos demais fun­

damentos do pedido vestibular.

Relator:

RECURSO ESPECIAL N.Q. 142.954 - SP (Registro nll. 97.0054869-4)

Ministro Barros Monteiro

Recorrente: Comércio de Artigos para Festas Tekinho Ltda

Gevalci Oliveira Prado Advogado:

Recorrido:

Advogado:

Teka Tecelagens Kuehnrich SI A

João Batista Colletti Neto

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 349

EMENTA: Propriedade industrial - Marca - Exclusividade de

uso - Princípio da especificidade.

- O direito de exclusividade de uso de marca, decorrente do

seu registro no INPI, é limitado à classe para a qual é deferido, não

sendo possível a sua irradiação para outras classes de atividades.

Aplicação do princípio da especificidade. Precedentes do STJ.

- Inexistência, ainda, da possibilidade de confusão a induzir em

erro o consumidor.

Recurso especial conhecido e provido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas,

decide a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,

conhecer do recurso e dar-lhe provimento, na forma do relatório e notas

taquigráficas precedentes que integram o presente julgado. Votaram com o

Relator os Srs. Ministros Ruy Rosado de Aguiar, Aldir Passarinho Junior e

Sálvio de Figueiredo.

Brasília-DF, 21 de setembro de 1999 (data do julgamento).

Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, Presidente.

Ministro BARROS MONTEIRO, Relator.

Publicado no DJ de 13.12.1999.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO BARROS MONTEIRO: "Teka Tecelagem Kuehn­

rich S/A" ajuizou ação ordinária de abstenção de ato com preceito comi­

natório contra "Comércio de Artigos para Festas Tekinho Ltda."

Julgada improcedente a ação em primeiro grau, o Tribunal de Justiça

de São Paulo, por unanimidade, deu provimento ao apelo da autora em

acórdão assim fundamentado, no que ora interessa:

"Inobstante a excelência da fundamentação fática da respeitável

sentença apelável, entende-se que ocorre, na espécie, violação ao di­reito da apelante de utilização exclusiva da marca 'Teka', nos moldes do registro da mesma no Instituto Nacional de Propriedade Industrial,

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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350 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

estando garantida pelo artigo 59 e seu parágrafo único da Lei n.!.l

5.772/1971, que a protege, pouco importando que as atividades de ambas sejam diversas, diante da possibilidade de confusão, já que a proteção legal abrange não só o uso da marca de papéis e impressos,

como também até mesmo serviços, ainda que de classes diversas como ocorre na espécie.

A apelante produz, e é por demais conhecido, produtos têxteis que levam a marca 'Teka', e a apelada ao utilizar o diminutivo desse mesmo

nome, usurpa-lhe o conceito e aproveita-se da publicidade feita daque­

les produtos, eis que o objetivo social não se limita apenas ao 'comércio de artigos para festas', mas também 'demais mercadorias de utilidades para o lar em geral' (fl. 71, cláusula terceira), e, pois, os produtos têx­

teis da apelante são destinados 'ao lar em geral' (confira-se os certi­ficados de fls. 22, 23, 24, 26, 28, etc.).

Não há apropriação de nome de fantasia 'Teka' pela apelada, mas seu nome comercial possibilita a confusão, pelo que deve abster-se de sua utilização, por violação a um direito garantido pelo Código de Propriedade Industrial, e o nome comercial, sem registro no INPI, por si só e pelo fato de registrar os estatutos no registro comercial peculiar

não lhe garante o direito de uso, contra o nome registrado no INPI" (fl. 169).

Inconformada, a ré manifestou o presente recurso especial com fulcro nas alíenas a e c do permissor constitucional, apontando negativa de vigên­

cia do art. 59 da Lei n.!.l5.772/1971, além de dissídio interpretativo com julgados desta Corte. Sustentou que, com o registro da marca perante o Ins­

tituto Nacional de Propriedade Industrial, o seu titular deterá a exclusivi­

dade de uso em todo o território nacional, na classe correspondente à sua atividade. Ressaltou que tal proteção se restringe à(s) c1asse(s) em que a marca foi registrada. Asseverou que não restou provado nos autos ser a re­corrida titular de marca na classe 16 do Ato Normativo n.!.l 0051, de

27.01.1981, a qual contempla os produtos comercializados pela recorren­te. Por fim, argumentou que o acórdão recorrido concedeu à recorrida, sem qualquer amparo legal, a notoriedade prevista no art. 67 da Lei n.!.l 5.7721

1971.

Contra-arrazoado, o apelo extremo foi admitido, subindo os autos a

esta Corte.

É o relatório.

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 351

VOTO

O SR. MINISTRO BARROS MONTEIRO (Relator): Eventual con­flito entre a marca registrada pela autora e a denominação social empregada pela ré há de ser resolvido pelo princípio da especificidade, conforme tem decidido de modo reiterado esta colenda Quarta Turma. Quando do julga­mento do REsp n.Q. 14.367-PR, sob a relatoria do eminente Ministro Athos Carneiro, por sinal, o primeiro paradigma colacionado no apelo excepcio­nal interposto, este órgão fracionário decidiu sob a seguinte ementa:

"Propriedade industrial. Direito de marca. Pretensão à exclusi­vidade. Arts. 59 e 65, 17 da Lei n.Q. 5.772, de 21.12.1971.

O direito à exclusividade ao uso de marca, em decorrência de seu registro no INPI, é limitado à classe para a qual foi deferido, não abrangendo pois produtos outros, não similares, enquadrados em ou­tras classes, excetuadas as hipóteses de marcas 'notórias'.

O registro da marca 'Glória', para laticínios, em geral, classe

31.10, não impede que outra firma continue utilizando idêntica mar­ca, aliás desde muitos e longos anos, para biscoitos e massas alimen­tícias, classe 32.10.

Recurso especial não conhecido."

O direito de exclusividade de uso de marca, decorrente do registro no INPI, é limitado à classe de atividade para a qual foi deferido (REsp n.Q. 9.380-SP, Relator Ministro Dias Trindade).

Ora, as empresas litigantes possuem objetivos sociais nitidamente dis­tintos. Enquanto a autora opera no ramo têxtil, a ré, conforme denota a sua própria denominação, tem a sua atividade dirigida ao comércio de artigos para festas. Não importa que a demandante possua o registro da marca "Teka" em várias classes: era preciso que se demonstrasse, de modo espe­cífico, o registro na mesma classe em que a ré exerce a sua atividade prin­cipal. Nem tampouco obteve a autora, até o momento, o registro de marca notória, mas, mesmo que venha consegui-lo, seria de rigor que se eviden­ciasse a possibilidade de confusão quanto à origem dos produtos ou, ain­da, que resultasse prejuízo à reputação da marca (art. 67 da Lei n.Q. 5.772, de 21.12.1971).

Aliás, de relevo para a solução da espécie em apreciação é a possibi­lidade de confusão entre as expressões utilizadas pelas partes. Tal não ocorre

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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352 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

no caso, consoante mostrou à saciedade a decisão de primeira instância. As expressões não são iguais, nem semelhantes. A expressão usada pela ré não é diminutivo daquela adotada pela autora: o diminutivo seria "Tekinha" e não "Tekinho". Inexistente, pois, semelhança gráfica e fonética que justifi­que a impugnação formulada pela autora.

Em suma, por qualquer ângulo que se aprecie a hipótese sub judice, não se verifica a possibilidade de confusão que acaso tenha o efeito de in­duzir em erro o consumidor. Entendendo, como entendeu, o acórdão recor­rido que a proteção legal alcança a marca independentemente da classe para a qual o registro foi concedido, pouco relevando que as atividades de ambas as empresas sejam diversas, contrariou ele não somente o art. 59 do Códi­go de Propriedade Industrial, como ainda dissentiu ao menos do primeiro aresto-modelo trazido a exame pela recorrente.

Do quanto foi exposto, conheço do recurso por ambas as alíneas do permissivo constitucional e dou-lhe provimento para restabelecer a sen­tença.

É como voto.

Relator:

Recorrente:

Advogado:

Recorrido:

Advogados:

Recorrida:

Advogado:

RECURSO ESPECIAL N.2. 144.353 - RJ (Registro n'" 97.0057580-2)

Ministro Cesar Asfor Rocha

Luiz Damião da Silva

José Alves Machado

Augusto Sérgio Pinto Guimarães

Paulo César Gonçalves da Silva e outro

Sul América Bandeirantes Seguros S/A

Nílton Pereira da Silva

EMENTA: Processual Civil - Apelação protocolizada dentro do

prazo legal - Endereçamento equivocado ao juízo da Trigésima Ter­ceira Vara quando o correto seria ao da Trigésima Sexta Vara - Tem­pestividade.

O equívoco quanto ao número da Vara Judicial a que designada,

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 353

não faz, pelas peculiaridades da espécie, intempestiva a apelação

protocolizada dentro do prazo legal, mas que somente ingressou nos autos após remetidos ao Tribunal.

Recurso conhecido e provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da

Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso e

dar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Votaram

com o Relator os Srs. Ministros Ruy Rosado de Aguiar, Aldir Passarinho

Junior, Sálvio de Figueiredo Teixeira e Barros Monteiro.

Brasília-DF, 18 de novembro de 1999 (data do julgamento).

Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, Presidente.

Ministro CESAR ASFOR ROCHA, Relator.

Publicado no DI de 21.02.2000.

RELATÓRIO

o SR. MINISTRO CESAR ASFOR ROCHA: Luiz Damião da Silva, ora recorrente, propôs ação indenizatória, pela morte de sua esposa, vítima

de atropelamento, contra Augusto Sérgio Pinto Guimarães que denunciou da lide a seguradora ·Sul América Bandeirantes Seguros S/A.

A r. sentença julgou improcedente o pedido inicial, extinguindo o de denunciação.

A seguradora denunciada apelou pretendendo o reconhecimento a seu favor da prescrição ânua.

O egrégio Tribunal de Alçada Cível do Estado do Rio de Janeiro aco­

lheu o apelo, decidindo pela prescrição do direito de ação regressiva por parte do denunciante/segurado contra a denunciada.

Antes de publicado o acórdão, o autor peticionou noticiando que tam­bém havia interposto apelação (fls. 188 e seguintes). Todavia, por inexati­

dão material, o seu recurso foi endereçado ao Juízo da Trigésima Terceira

Vara Cível, quando o correto seria o da Trigésima Sexta. Localizada a peti­ção e juntada aos autos, requereu a baixa para o processamento respectivo.

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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354 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

o ilustre Desembargador-Relator determinou a baixa (fl. 188), suspen­dendo os efeitos do acórdão (fl. 199).

O réu pediu a reconsideração, no que foi atendido por despacho do seguinte teor:

"Reconsidero fl. 188, não pelas razões expostas - fls. 200/203,

mas, porque efetivamente, a remessa dos autos à Vara de origem para que o juízo apreciasse a admissibilidade ou não do recurso de apela­

ção endereçado pelo próprio apelante à Vara errada, em nada modifi­caria o resultado do julgamento já realizado.

O peticionário de fls. 188 e seguintes, terá o recurso próprio em outra sede, já que esta Câmara está impedida de rever meritoriamen­te seu próprio mérito." (fl. 208).

O autor ingressou com agravo regimental que foi improvido sob as seguintes e únicas considerações:

"Se já existe acórdão dessa Câmara provendo o recurso da denun­ciada, reconhecendo em seu prol a prescrição ânua, e, tendo o agra­vante endereçado seu recurso à Vara errada, que não foi despachado no

prazo legal, a meu juízo este recurso, muito embora tenha sido protocolado no prazo, é intempestivo." (fl. 238).

Daí o recurso especial, fundamentado na alínea c do permissivo, afir­mando, além do malferimento aos artigos 496, I, 449, 506, parágrafo úni­co, 508 e seguintes, CPC, o dissídio com os julgados indicados, dentre eles o REsp nJ:!. 20.399, ReI. eminente Ministro Cláudio Santos, quando se de­cidiu que "o endereçamento judicial diverso daquele cujo ocupante presi­

diu o processo, não acarreta a perda do prazo apelatório", e a Apelação Cível nJ:!. 15.442 do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, apresentado em cópia, do qual se extrai "a não entrega da defesa, oportunamente recebida ao Car­

tório do feito, mas a outro subordinado ao mesmo Juízo, importou em 'erro

material' que não exclui a nem afastava a inequívoca manifestação do ape­lante em defender-se e para não justificar a rejeição sumária dos embargos

que, ora, são recebidos e com devolução dos autos a instância de origem para

o julgamento do seu mérito."

Respondido, o recurso foi admitido na origem.

É o relatório.

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 355

VOTO

O SR. MINISTRO CESAR AS FOR ROCHA (Relator): 1. Conheço do recurso uma vez demonstrada a divergência interpretativa pertinente aos artigos 506, parágrafo único, e 508, CPC, pelo não reconhecimento da tempestividade da apelação protocolada dentro do prazo na hipótese de equívoco no endereçamento retardar a sua juntada aos autos.

2. O recorrente apelou da sentença que julgou improcedente o seu pe­dido indenizatório. E o fez dentro do prazo, consoante inclusive expressa­mente consignado pelo v. acórdão recorrido (fi. 238), utilizando-se do pro­tocolo geral do fórum, comum às duas Varas.

Todavia, por tê-la endereçado ao juízo da Trigésima Terceira Vara Cível da Comarca do Rio de Janeiro, quando o correto seria ao juízo da Tri­gésima Sexta Vara da mesma comarca, a sua apelação só veio aos autos após ter o egrégio Tribunal de origem julgado o apelo da denunciada, ficando todo esse tempo, conforme alegado pelo recorrente, no Cartório da Vara errada sem que tivesse ocorrido a sua restituição à corregedoria para ser reencaminhada.

O processamento do apelo foi denegado pela egrégia Câmara julgadora pelas seguintes e únicas considerações:

"Se já existe acórdão dessa Câmara provendo o recurso da denun­ciada, reconhecendo em seu prol a prescrição ânua, e, tendo o agra­vante endereçado seu recurso à Vara errada, que não foi despachado no prazo legal, a meu juízo este recurso, muito embora tenha sido protocolado no prazo, é intempestivo." (fi. 238).

O julgamento da apelação da denunciada, definindo-se a relação jurí­dica entre esta e o denunciante, em nada prejudica o julgamento da apela­ção do autor que busca o reexame da sentença no pertinente a relação ju­rídica entre ele e o réu/denunciante.

De outra parte, o infortúnio, fruto de ignóbil erro material, que se ve­rificou nos presentes autos, não transforma, data venia, o recurso interposto dentro do prazo em intempestivo, amputando-se o postulado acesso ao du­plo grau de jurisdição.

Nesse sentido a jurisprudência desta Corte:

"Processual Civil. Apelação. Prazo.

O endereçamento à Vara Judicial diversa daquela cujo ocupante

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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356 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

presidiu o processo não acarreta a perda do prazo do recurso apela­tório." (REsp n,!;'. 20.399-SP, DJ de 19.04.1993, Relator Ministro Cláu­dio Santos).

"Processo Civil. Contestação. Equívoco no endereçamento. Tempestividade.

Contestação tempestivamente apresentada, mas que, em virtude de equívoco no endereçamento, somente deu entrada no cartório da vara em que corre o feito após a fluência do prazo legal.

Sacrificar a garantia do contraditório, permitindo que se produ­zam os graves efeitos da revelia, sem que tenha havido inatividade pro­cessual e não se vislumbrando a possibilidade de má-fé, por tratar-se da mesma comarca, não se conforma a visão moderna do processo.

Recurso não conhecido." (REsp n,!;'. 56.240-PR, RSTJ 71/376, Relator Ministro Costa Leite).

Com efeito, cumpre prestigiar os princípios processuais, notadamente o da instrumentalidade.

O recorrente dirigiu-se dentro do prazo ao protocolo correto.

O erro foi quanto à indicação numérica da Vara destinatária, como se, por exemplo, fossem protocolados nesta Corte embargos declaratórios ou agravo regimental endereçados a um Ministro diverso do Relator do re­curso, ocasionando tal fato o encaminhamento da petição à 'Subsecretaria de Turma diversa e a demora na sua juntada aos autos.

A seguir-se o raciocínio do v. acórdão recorrido, sempre que, por qual­quer imprecisão no endereçamento, a juntada do recurso aos autos ocorrer após extrapolado o prazo recursal, ele seria intempestivo, desconsiderando­se completamente o tempestivo e correto protocolo judicial e, por conse­guinte, o contido na legislação processual vigente.

Posto isso, dou provimento ao recurso para, reconhecendo a tempes­tividade da apelação, retornar os autos ao juízo de primeiro grau para o seu regular processamento.

Relator:

RECURSO ESPECIAL N.2. 156.404 - SP (Registro n,!;'.97.0084717-9)

Ministro Sálvio de Figueiredo

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 357

Recorrente: V álter Roberto Palmieri

Advogados: José Luiz Matthes e outros

Recorrido: Banco de Desenvolvimento do Estado de São Paulo S/A -

Badesp

Advogados: Corbiniano Amaral Netto e outros

Interessada: IQS Industrial e Distribuidora Ltda (massa falida)

EMENTA: Processo Civil - Execução - Praça - Art. 687, CPC -

Inocorrência de violação - Intimação pessoal ao devedor frustrada,

após reiteradas tentativas - Validade da intimação por edital - Art.

686, V, CPC - Omissão do edital quanto a recurso pendente de jul­

gamento - Nulidade não cominada - Não demonstração de prejuízo

- Omissão irrelevante - Recurso desacolhido.

I - Não encontrados os devedores, após efetivas diligências,

prescindível é a sua intimação via mandado para ciência da reali­

zação da hasta pública (art. 687, CPC).

II - A menção a recurso pendente de julgamento (art. 686, V,

CPC) tem a principal finalidade de cientificar os licitantes da exis­

tência de ônus e/ou impedimentos sobre o bem que intencionam ar­

rematar.

III - A anulação da praça por omissão do edital em relação à

menção referida no art. 686, V, CPC, depende da demonstração de

prejuízo, já que se trata de nulidade não cominada, nos moldes dos

arts. 244 e 250, CPC.

IV - Dessemelhantes as situações de fato entre o. aresto para­

digma e o acórdão impugnado, não se caracteriza a divergência para

fins de instaurar-se o acesso à instância especial.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da

Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos

e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, não conhecer do re­

curso. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Barros Monteiro, Ruy Ro­

sado de Aguiar e Aldir Passarinho Junior. Ausente, justificadamente, o Sr.

Ministro Cesar Asfor Rocha.

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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358 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Brasília-DF, 25 de outubro de 1999 (data do julgamento).

Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, Presidente.

Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO, Relator.

Publicado no DI de 13.12.1999.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO SÁLVIO DE FIGUEIREDO: Contra a decisão de primeiro grau que declarou nula a praça de um imóvel e de uma linha te­

lefônica, nos autos da execução movida pelo recorrido contra IQS Indus­trial e Distribuidora Ltda, Válter Roberto Palmieri e Maria Anézia S.

Palmieri, o exeqüente manifestou agravo de instrumento, que restou provido pelo Primeiro Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, em acórdão assim

ementado:

"Preclusão. Decisão judicial, anteriormente prolatada, que apre­ciou questão alusiva à impenhorabilidade do imóvel. Rededução pre­

clusa. Recurso provido.

Arrematação. Praça. Imóvel pendente de julgamento de recurso. Fato não consignado no edital. Omissão irrelevante. Inexistência de prejuízo aos executados, pois que arrematado o imóvel, pelo próprio credor, por seu preço real. Hipótese em que descabe falar-se em nu­lidade da hasta pública ou da arrematação efetivadas. Precedente. Re­

curso provido.

Intimação. Praça. Devedores que, não localizados à intimação pessoal nas várias diligências do meirinho, são intimados por edital. Admissibilidade. Precedente. Hipótese em que descabe pretender-se descumprida a regra do § 3.\l. do art. 687 do CPC, que, inclusive, des­

tina-se ao licitante e não ao executado. Validade da praça realizada pela via editalícia. Nulidade não proclamada. Recurso provido."

Os executados interpuseram recurso especial, apontando divergência

jurisprudencial e violação dos arts. 686, V, e 687, § 3.\l., CPC, na redação anterior à vigência da Lei n.\l. 8.953/1994. Sustentam os recorrentes ser obri­gatória a menção, no edital de praça, da existência de "recurso pendente de

julgamento", por expressa determinação legal, e que a intimação dos deve­

dores, para a praça, deve ser feita por mandado, e não, por edital.

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 359

Contra-arrazoado, foi o recurso admitido na origem, apenas em rela­

ção ao executado Válter Roberto Palmieri, uma vez inexistente procuração

dos outros dois ao subscritor da peça recursal.

O Ministério Público Federal opina pelo sobrestamento do feito, por

se tratar de recurso retido, nos moldes do art. 542, § 3'", CPC, com a re­

dação dada pela Lei n'" 9.756/1998.

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO SÁLVIO DE FIGUEIREDO (Relator): 1. Quan­

to ao ponto suscitado no parecer do Ministério Público Federal, é de re­

gistrar-se que o recurso especial somente deve permanecer retido quando

interposto contra decisão interlocutória em processo de conhecimento,

cautelar ou embargos à execução, hipóteses às quais não se amolda a espé­

cie, que trata de agravo em execução.

2. No que diz respeito à alegada ofensa ao art. 687, § 3'", CPC,

corresponde o dispositivo ao atual § 5Q. do mesmo artigo, após a vigência

da Lei n'" 8.953/1994. No particular, afirmou o acórdão que a intimação

pessoal dos devedores restou "sem resultado [ ... ], pelas diligências com que

o meirinho, em várias oportunidades, se dirigiu à localização dos devedo­

res, inclusive aos sábados e domingos, sem os encontrar em sua residência"

(fi. 168).

Esta Corte firmou entendimento no sentido de que, "não encontrado

o devedor, apesar das diligências efetuadas, é cabível a sua intimação por

edital para ciência da praça ou leilão" (REsp nQ. 46.149-SP, DI de

22.08.1994, Relator o Ministro Torreão Braz).

Outra não foi a orientação preconizada no AgRg no Ag n'" 5.424-GO

(DI de 04.03.1991), de que fui Relator, com esta ementa:

"Processo Civil. Arrematação. Hasta pública. Executado não lo­

calizado. Intimação via edital. Orientação jurisprudencial. Recurso

desprovido.

Não sendo o devedor encontrado após efetivas diligências, admis­

sível é a sua intimação via edital para ciência da realização da hasta

pública (CPC, art. 687, § 3'")."

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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360 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

o Supremo Tribunal Federal, na vigência do anterior regime consti­

tucional, também esposava essa linha de raciocínio, a exemplo do que ocor­

reu no julgamento do RE n.!l. 81. 798-PR (RTJ 83/878), de que foi Relator

o Ministro Soares Munoz, cuja ementa consigna:

"Devedor que embora citado pessoalmente se manteve revel du­rante a execução e que não foi intimado pessoalmente do dia e hora

para a realização da praça, por se ter mudado para local ignorado. A aplicação do art. 687, § 3.!l., por edital, seria inútil a repetição. O edital da praça, com ampla publicidade, era o bastante para esse efeito."

A respeito, confira-se, ainda, o REsp n.!l. 84.788-SC (DJ de 21.09.1998),

de que fui relator, assim ementado:

"Processo Civil. Execução. Intimação da praça ao devedor pes­soalmente intimado da penhora e que mudou de endereço sem comu­

nicar ao juízo da execução. Validade da intimação por edital. Inocorre

violação do art. 687, § 5.!l., CPC, pela concretização da intimação

editalícia antes do retorno da precatória negativa se nenhum prejuízo concreto é alegado pelo devedor. Recurso desacolhido.

I - Não viola o disposto no art. 687, § 5.!l., CPC, a intimação por

edital do devedor, para a ciência do dia e hora da praça ou leilão de seus bens penhorados na execução, se não é ele encontrado no ende­

reço em que fora pessoalmente intimado da penhora, tendo o Oficial de Justiça colhido nesse local a informação de que ele ali não mais re­sidia, não tendo havido comunicação ao juízo da execução do seu novo endereço.

II - A concretização da intimação editalícia antes do retorno da

precatória negativa não impõe a nulidade da arrematação, posto que o devedor não foi efetivamente encontrado, não tendo, ademais, invocado

qualquer irregularidade formal no edital intima tório ou qualquer pre­

juízo processual concreto que lhe teria advindo da duplicidade das vias

intimatórias."

3. Quanto à apontada afronta ao art. 686, V, CPC, sustenta o recorrente

que o edital de praça não fez menção à existência de recurso pendente de

julgame.nto. Com efeito. O "recurso pendente" consiste no agravo interposto

pelo próprio devedor-recorrente contra a decisão que excluiu a impenhora­

bilidade do imóvel. A par disso, o credor recorrido é que arrematou o bem

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 361

na praça que veio a ser anulada, pelo preço real, "nenhum prejuízo se po­dendo, de conseqüência, inferir ou avaliar em detrimento dos devedores" (acórdão, fi. 167).

A finalidade de que se faça constar do edital a menção a recurso pen­dente de julgamento reside em cientificar os licitantes da possibilidade de alteração da situação jurídica da arrematação efetuada, de modo que, pos­teriormente à aquisição do bem, não seja o arrematante surpreendido com a existência de ônus ou pendências sobre o imóvel. Em breves termos, a norma se dirige aos licitantes, aos candidatos a adquirir o bem praceado. E, no caso, o adquirente foi o credor, evidentemente ciente do recurso referente ao imóvel. Quanto ao destinatário do edital, expressa Am.ílcar de Castro:

"N a lição de Carnelutti, o edital não passa de declaração recep­

tícia, porque sua eficácia não aparece senão no momento em que seja conhecida por alguém; como é destinado principalmente a levar uma notícia ao conhecimento de pessoas indeterminadas, os possíveis com­pradores, desconhecidos do vendedor, que é o juiz, e como além dis­so, é meio de notificação a todos os interessados na venda, não pode deixar de ser redigido, publicado e notificado de forma tal que garanta o efetivo, ou pelo menos presumido, conhecimento daqueles que de­vem receber a notícia." (Comentários ao Código de Processo Civil, 2a

edição, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1976, nJ.l. 389, pp. 288-289).

Nessa mesma linha, ao anotar o art. 686, V, CPC, Theotonio Negrão:

"O arrematante, e só ele, tem legitimidade para pleitear a anu­lação da arrematação por infringência a este dispositivo (Lex-JTA, 139/44)." (Código de Processo Civil e Legislação Processual em Vi­gor, 30a edição, São Paulo, Saraiva, 1999, nota 8 ao art. 686, p. 683).

Por outro lado, a anulação da praça por causa da falta da menção re­ferida no art. 686, V, CPC, depende da demonstração de prejuízo, já que se trata de nulidade não cominada, nos moldes dos arts. 244 e 250, CPC. Esta a lição de Pontes de Miranda:

"As infrações do art. 686, I, como as dos outros incisos (II, III, IV e V), importam nulidade não cominada, devendo-se aplicar os prin­

cípios gerais e especiais sobre as nulidades processuais, notadamente o art. 244." (Comentários ao Código de Processo Civil, tomo X, Rio de Janeiro, Forense, 1976, p. 366).

RST], Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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362 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

E, ainda, Celso Neves, ao comentar o art. 686, CPC:

"Todos esses dados são relevantes e de sua omissão pode resul­tar nulidade da arrematação, quando se demonstre prejuízo, segundo as regras dos arts. 243-250." (Comentários ao Código de Processo

Civil, volume VII, nÇ. 48, p. 98).

Na espécie, não logrou o recorrente demonstrar o prejuízo advindo da realização da praça. Ao contrário, afirmou o acórdão a não ocorrência de prejuízo e a arrematação do bem pelo valor real.

Destarte, não ocorreu violação do direito federal, no particular.

4. O dissídio pretoriano, de seu turno, não restou caracterizado, em face da dessemelhança fática entre o REsp nÇ. 15.003-SP (DJ de 22.11.1993), apontado paradigma, e o acórdão impugnado. O paradigma refere-se à pos­sibilidade de aplicação subsidiária do Código de Processo Civil às execu­

ções fiscais e afirma a necessidade de que o devedor seja intimado do lei­lão, sem descrever as peculiaridades de fato que se identifiquem ou se as­semelhem com o caso em pauta.

5. À luz do exposto, não conheço do recurso especial.

Relator:

Recorrente:

Advogados:

Recorrido:

Advogados:

RECURSO ESPECIAL N.!1. 210.076 - RJ (Registro nÇ. 99.0031445-0)

Ministro Barros Monteiro

Restaurante A Marisqueira Ltda

Carlos Henrique de Carvalho Froes e outros

Café Elvas Ltda

Leopoldo Peres e outros

EMENTA: Marca registrada - Palavra comum - Sua utilização

pela ré em nome de fantasia - Inadmissibilidade.

- Registrada uma marca, não pode outra empresa industrial, comercial ou de serviços utilizá-la na composição de seu nome co­mercial, em havendo similitude de atividades. Precedentes da Quar­

ta Turma.

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 363

Recurso especial conhecido e provido parciahnente.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe provimento parcial, na forma do relatório e notas taquigráficas precedentes que integram o presente julgado. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Cesar Asfor Rocha e Aldir Passarinho

Junior.

Brasília-DF, 28 de setembro de 1999 (data do julgamento).

Ministro CESAR ASFOR ROCHA, Presidente.

Ministro BARROS MONTEIRO, Relator.

Publicado no DJ de 13.12.1999.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO BARROS MONTEIRO: Cuida-se de ação ordiná­ria proposta por "Restaurante A Marisqueira Ltda" contra" Café Elvas Ltda", pretendendo que a ré se abstenha do uso do nome "Marisqueira", pois ela - autora - é titular do registro da referida marca desde 1 0.06.1975.

Julgado improcedente o pedido em primeiro grau, a Décima Pri­meira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, por una­nimidade, negou provimento ao apelo da autora em acórdão assim fun­damentado:

"Alega a apelante que a apelada usa indevidamente nome comer­

cial e marca de sua propriedade, que se acha registrada no Instituto Nacional de Propriedade Industrial com o nome de 'A Marisqueira'.

Já o apelado sustenta que a expressão marisqueira usada em seu estabelecimento é denominação de uso genérico, indicando que no lo­cal também se vendiam mariscos, e que as denominações marcas uti­lizadas pelas partes são diferentes e não se prestam a confusão, pois enquanto a autora, ora apelante, usa a expressão Restaurante A

Marisqueira O apelado usava a denominação Marisqueira e Café Elvas,

cuja única coincidência era o termo genérico marisqueira empregado diferentemente.

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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364 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

o ilustre Juiz a quo acolheu tese sustentada pelo réu ora apela­do, e julgou improcedente a ação a meu sentir, acertadamente.

Pelo que consta dos autos a apelada usava a expressão Marisqueira

e Café Elvas sendo certo, a meu juízo, que queria dizer que o Café Elvas também vendia mariscos, empregando o termo genericamente,

não se prestando esta denominação a qualquer confusão com a marca

registrada pela apelante, dada a evidente diferença das duas atividades, uma, um restaurante especializado em frutos do mar e outro um café no qual eram vendidos mariscos.

Não vislumbro, também, a existência de qualquer prejuízo para o apelante no uso da ·expressão de que se diz proprietária, tendo em vista a disparidade existente de serviços.

O objetivo da lei é evitar a confusão nos nomes que possam in­

duzir o consumidor a erro. No caso em exame, não me parece que tal confusão possa ocorrer, dada à finalidade específica de cada um deles, o apelante, restaurante especializado em frutos do mar e o apelado, um

café que eventualmente vende mariscos, e que por isto tem a denomi­nação genérica de marisqueira.

N ego, pois, provimento ao recurso." (f!. 107).

Rejeitados os declaratórios, a autora manifestou o presente recurso es­

pecial com fulcro nas alíneas a e c do permissor constitucional, apontan­

do negativa de vigência dos arts. 59 da Lei nQ 5.772/1971 e 129 da Lei n Q

9.279/1996, além de dissídio interpretativo. Sustentou que o registro da marca perante o Instituto Nacional de Propriedade Industrial confere ao seu titular o direito de propriedade e uso exclusivo em todo o território nacio­

nal, impedindo terceiros de fazerem uso de marca igualou semelhante, que se destine a assinalar artigos ou serviços idênticos, similares ou afins.

Contra-arrazoado, o apelo extremo foi admitido, subindo os autos a esta Corte.

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO BARROS MONTEIRO (Relator): A ré utiliza-se, na composição de seu nome de fantasia, a palavra comum" Marisqueira",

contra o que se insurge a autora sob a alegação de ser a titular do registro da marca.

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

Page 59: Jurisprudência da Quarta Turma...JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA RECURSO EM HABEAS CORPUS N.2. 8.922 - SP (Registro nJ:!. 99.0069502-0) Relator: Ministro Aldir Passarinho Junior Recorrente:

JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 365

Tocante ao registro, o ponto é incontroverso nos autos. Discute-se aqui se, empregando o termo "Marisqueira", de cunho genérico, a ré está a in­fringir o direito de uso exclusivo da marca pela autora em todo o territó­rio nacional.

Espécie semelhante à presente já foi apreciada por este órgão fra­cionário, na qual se questionava o uso da palavra comum" Cidade". Refi­ro-me ao REsp n Q 7.259-CE, de que foi Relator o eminente Ministro Athos Carneiro. Ali fora objeto de registro, como marca de serviço, a expressão "Rádio-Cidade" e, precisamente em virtude de tal registro, obstou-se a uti­lização da marca por terceiro.

Eis o elucidativo voto-condutor do v. acórdão:

"2. De mérito, põe-se como fato basilar para a compOSlçao da lide o de que a expressão 'Rádio-Cidade' foi registrada pela autora como marca de serviço, a teor do artigo 61, 3, da Lei n Q 5.772, de 21.12.1971 - Código de Propriedade Industrial, para a especificação de seus serviços de 'radiodifusão', e isso 'sem direito ao uso exclusi­vo da expressão 'Rádio'" (fls. 11/12). A validade de tal registro, ques­tionada ante o uso de palavra comum como 'Cidade' foi impugnada na via jurisdicional pela ora ré 'TV Cidade de Fortaleza Ltda', e, como vimos, resultou ao final mantido o registro.

Ora, mantido o registro, incide a norma do artigo 59 da citada Lei nQ. 5.772/1971, pela qual 'será garantida no território nacional a propriedade da marca e o seu uso exclusivo àquele que obtiver o re­gistro de acordo com o presente Código, para distinguir seus produ­tos, mercadorias ou serviços, de outros idênticos ou semelhantes, na classe correspondente à sua atividade' (grifos nossos).

Registrada uma marca, não pode, pois, outra empresa industrial, comercial ou de serviços, utilizá-la na composição de seu nome co­mercial, em havendo similitude de atividades (Lei nQ. 4.726, de 13.07.1965, art. 49), ou para 'todas as classes', em se cuidando de marca notória (CPI, art. 67). E a proteção aplica-se no território na­cional, como está no próprio texto da lei, embora quiçá, lege ferenda, tal ampla proteção possa ser em certos casos menos adequada em país de dimensões continentais. Esta observação, contudo, é menos perti­nente no caso concreto, em que a autora expande sua rede de emisso­ras no território nacional, como se vê de fls. 13 e 15.

O v. aresto, destarte, contrariou os artigos 159 e 65, nQ. 17, do Código de Propriedade Industrial."

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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366 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Nesses termos, de acordo com a lei (art. 129 da Lei nJ.l. 9.279, de 14.05.1996), a autora é proprietária da marca "Marisqueira" em face do registro regularmente expedido, sendo-lhe assegurado o uso exclusivo em todo o território nacional. É certo que a exclusividade de utilização da mar­ca, em decorrência do registro no INPI, se cinge à classe para a qual foi conferida. Mas, bem de ver que na espécie ambas as litigantes se dedicam ao comércio no setor de alimentação, especificamente com a venda do pro­duto "marisco", prestando-se, pois, o emprego da palavra "Marisqueira" a uma confusão que certamente a ora recorrente quer evitar.

Tenho, pois, como contrariado no caso o referido art. 129 da Lei nJ.l. 9.279, de 14.05.1996, apenas não se configurando o conflito interpretativo à falta de observância mínima dos requisitos legais imprescindíveis à sua demonstração. A recorrente não identificou sequer o precedente desta Tur­ma carreado como paradigma.

A ação é julgada procedente, em parte, para o fim de restar a ré con­denada a abster-se do uso da marca "Marisqueira" e, bem assim, a modifi­car o título de seu estabelecimento, mediante a substituição do referido vo­cábulo por outro, sob pena de responder pela multa diária de R$ 3.000,00 (três mil reais), a partir de 60 dias contados da intimação pessoal da parte e depois do trânsito em julgado desta decisão. Ficam arredadas as perdas e danos por não comprovadas na fase cognitiva, consoante diretriz de há muito traçada por esta Casa.

Do quanto foi exposto, conheço do recurso pela alínea a do admissor constitucional e dou-lhe provimento parcial, a fim de julgar procedente, em parte, a ação intentada, na forma acima disposta. A ré arcará com as custas do processo (art. 21, parágrafo único, do CPC), assim como com os hono­rários de advogado da parte contrária, estes últimos arbitrados em 10% so­bre o valor atualizado da causa.

É o meu voto.

RECURSO ESPECIAL N~ 214.680 - SP (Registro nJ.l. 99.0042832-3)

Relator: Ministro Ruy Rosado de Aguiar

Recorrentes: Baptista Marconi Netto e outros

Advogado: Flávio Marques Alves

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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Recorrida:

Advogado:

JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA

Sônia Fochi Sanita

Marcos Tadeu Saes

367

EMENTA: Condomínio - Área comum - Prescrição - Boa-fé.

Área destinada a corredor, que perdeu sua finalidade com a al­teração do projeto e veio a ser ocupada com exclusividade por al­guns condôminos, com a concordância dos demais. Consolidada a situação há mais de vinte anos sobre área não indispensável à exis­tência do condomínio, é de ser mantido o statu quo. Aplicação do princípio da boa-fé (suppressio).

Recurso conhecido e provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe provimento. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Aldir Passa­rinho Junior, Sálvio de Figueiredo, Barros Monteiro e Cesar Asfor Rocha.

Brasília-DF, 10 de agosto de 1999 (data do julgamento).

Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, Presidente e Relator.

Publicado no DI de 16.11.1999.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO RUY ROSADO DE AGUIAR: Sônia Fochi Sani­ta, condômina do Edifício Negrelli, ajuizou ação cominatória contra Baptista Marconi Netto e outros, também condôminos, atribuindo aos réus a indevida ocupação do hall de circulação de seus respectivos apartamentos, infringindo a lei e a convenção por se tratar de área de uso comum.

O Dr. Juiz de Direito julgou improcedente a ação.

Ao apelo da autora, a egrégia Primeira Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo deu-lhe provimento, com a seguinte ementa:

"Condomínio. Áreas comuns. Utilização exclusiva dos réus. Cir­cunstância que não os autoriza a alterar o uso comum em benefício

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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368 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

próprio e exclusivo. Infração ao art. 3,ü da Lei n,ü 4.591/1964 e à con­

venção. Falta de consentimento de todos os condôminos, quando da

alteração. Rejeitadas as preliminares. Recurso provido." (fi. 230).

Rejeitados os embargos de declaração, os réus interpuseram recurso

especial pelas alíneas a e c do permissivo constitucional, indicando afron­

ta aos arts. 12, inciso IX, do CPC, 3,ü e 25 da Lei n,ü 4.591/1964 e 1,ü e 6,ü

da LICC, além de dissidência jurisprudencial.

Sustentam que a propositura da ação competia ao condomínio, repre­

sentado na forma da lei pelo síndico, não tendo a autora demonstrado in­

teresse na ação, haja vista que não sofreu nenhum prejuízo. Também have­

ria ilegitimidade passiva, pois é o síndico quem responde às ações contra

o condomínio. Reiteraram a tese de usucapião, decorrente de posse da área

há mais de 20 anos. No mérito, pedem o restabelecimento da sentença de

improcedência da ação. Alegam que não se trata de área comum, porquan­

to desde a modificação do projeto originário os proprietários puderam uni­

ficar as unidades contíguas, tendo havido matrícula única. A assembléia

aprovou a ocupação exercida pelos autores, não se exigindo unanimidade

para tal decisão. Por fim, lembram que a Lei n,ü 4.591/1964 é posterior ao

lançamento do empreendimento imobiliário, por isso inaplicável.

Ofertadas as contra-razões, o recurso foi admitido.

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO RUY ROSADO DE AGUIAR (Relator): 1. Não

aceitas as alegações dos recorrentes sobre a lei aplicável e a legitimidade

ad causalll:

a) a Lei n,ü 4.591/1964 entrou em vigor antes da convenção e da

formalização da propriedade das partes, razão pela qual é aplicável à hipó­

tese, regulando os atos praticados na sua vigência;

b) o condômino tem legitimidade para promover ações que ofendam

o interesse do condomínio. Embora caiba ao síndico a representação do con­

domínio, nada impede que o co-proprietário atue na defesa do interesse

comum quando o síndico se omite, como aconteceu no caso dos autos, em

que houve prévia notificação pela ora autora, sem qualquer efeito;

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 369

c) OS condôminos que praticaram os atos contrários à lei ou à conven­

ção respondem pela conduta e, por isso, estão legitimados passivamente para

a demanda em que se lhes imputa a ocupação de área do corredor.

2. Têm razão os recorrentes, porém, quanto à extinção do direito de

promover a ação. É certo que a prescrição não pode ser invocada por um

condômino contra o outro quando se trata de área destinada ao uso comum

e indispensável à existência do condomínio, conforme a lição doutrinária

invocada nos autos (Benedito Silvério Ribeiro, Tratado de Usucapião, Editora Saraiva, 1/286). No caso em tela, contudo, os réus e ora recorren­

tes passaram a ocupar a parte do corredor que leva aos seus apartamentos,

porque houve alteração no próprio projeto de construção do prédio, com incorporação de unidades, de tal sorte que o final do corredor dos seus

apartamentos perdeu a razão de ser, e o espaço que lhes correspondia trans­

formou-se em área morta, sem qualquer utilidade para o condomínio, per­mitindo a colocação da porta de entrada no lugar onde hoje se encontra.

Logo, não se trata de área indispensável à existência do condomínio e pos­

sível o reconhecimento da prescrição.

Essa situação excepcional e característica daquele prédio é que levou

os réus a usarem a área com exclusividade, com a plena concordância dos

demais condôminos, os quais ratificaram tal estado de coisas em assembléia,

assim permanecendo por trinta anos. As condições do prédio eram tais que

nunca houve qualquer reclamação; antes, o expresso consentimento. A situa­ção poderia ser modificada se demonstrada a alteração das circunstâncias,

surgindo razão ponderável de interesse comum a justificar a retomada da

área para a sua destinação inicial, que desaparecera desde a unificação das

unidades habitacionais.

A única solução justa recomendada para o caso é a manutenção do

statu quo.

Para isso pode ser invocada a figura da suppressio, fundada na boa­

fé objetiva, a inibir providências que já poderiam ter sido adotadas há anos

e não o foram, criando a expectativa, justificada pelas circunstâncias, de que

o direito que lhes correspondia não mais seria exigido. A suppressio tem sido considerada com predominância como uma hipótese de exercício inad­

missível do direito (Menezes Cordeiro, Da Boa-fé no Direito Civil, II,

810) e pode bem ser aplicada neste caso, pois houve o prolongado compor­

tamento dos titulares, como se não tivessem o direito ou não mais quises­sem exercê-lo; os condôminos ora réus confiaram na permanência desta si­

tuação pelas fundamentadas razões já explicadas; a vantagem da autora ou

RST], Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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370 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

do condomínio, que ela diz defender, seria nenhuma, e o prejuízo dos réus,

considerável. Penso que, no caso, se pode fazer boa aplicação do princípio.

Não afastaria a idéia de surgir, nesse entretempo, uma nova, forte e legítima razão de interesse comum, a justificar pretensão contrária. Porém, o único fato novo que se conhece é que a presente demanda foi intentada pela condômina depois de derrotada na ação promovida pelo condomínio para impedi-la de alterar a fachada do prédio. Ação por tais motivos, somen­te lembrada trinta anos depois, esbarra no princípio ético de respeito às re­lações definidas por décadas de convívio.

Além disso, e para não fugir do texto legal, deve ser lembrada, além da prescrição longa do art. 177 do Código Civil, também a regra da pres­crição extintiva do direito de intentar ação por ofensa ao direito de proprie­dade, do art. 178, § 10, IX, do CC.

Posto isso, conheço do recurso, por indevida a aplicação do disposto no art. 3.12 da Lei nQ 4.591/1964, e lhe dou provimento, para restabelecer a r. sentença.

É o voto.

RECURSO ESPECIAL N~ 218.701 - RS (Registro nQ 99.0051243-0)

Relator:

Recorrente:

Advogados:

Recorrido:

Advogados:

Ministro Ruy Rosado de Aguiar

Banco Mercantil do Brasil S/A

André Luiz Barata de Lacerda e outros

Fernando Luiz Bernardes Coelho Silva

Giuliano Correa de Barros Nunes e outros

EMENTA: Contrato de abertura de crédito - Nota promissória - Novação.

A emissão de nota promissória pelo valor do saldo devedor,

apurado mediante os lançamentos unilateralmente feitos pelo cre­dor, não impede o exame da legalidade daqueles lançamentos. Em primeiro lugar, porque não se cuida de novação; em segundo, por­que se novação fosse, incidiria o disposto no art. 1.007, primeira par­te, do Código Civil.

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 371

Juros. LiInite. SÚlllula nU 596-STE Capitalização. SÚlllula n!!. 121-

STE

Recurso conhecido elll parte e parciallllente provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer em parte do recurso e, nessa parte, dar-lhe provimento parcial, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Aldir Pas­sarinho Junior, Sálvio de Figueiredo, Barros Monteiro e Cesar Asfor Ro­cha.

Brasília-DF, 7 de outubro de 1999 (data do julgamento).

Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, Presidente e Relator.

Publicado no DI de 16.11.1999.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO RUY ROSADO DE AGUIAR: Fernando Luiz Bernardes Coelho Silva propôs ação de revisão de contrato de abertura de crédito contra o Banco Mercantil do Brasil S/A, alegando que se viu obri­gado a utilizar o limite do seu cheque especial e, posteriormente, com o intuito de cobrir esse saldo, foi emitida nota promissória, cujo valor eviden­cia a cobrança de juros abusivos.

A ação foi julgada procedente, declarada a inexistência do débito. O apelo do banco foi improvido pela egrégia Quarta Câmara Cível do Tribunal de Alçada do Rio Grande do SuL

Daí os recursos extraordinário e especial do banco. N o apelo a esta Corte (art. 105, lII, a e c, da CF), o recorrente sustenta violação aos arts. 2Q

, 3Q e 4 Q da Lei n Q 4.595/1964, 999, I, do CC, e 2Q, § 1 Q, da LICC, além

de divergência jurisprudencial, especialmente com a Súmula n Q 596-STE Diz que ao limitar os juros remuneratórios em 12% a.a., capitalizados ape­nas anualmente, e ao desconsiderar a existência de novação, o acórdão afrontou a Lei n Q 4.595/1964, vez que o Decreto n Q 22.626/1933 não se aplica às instituições financeiras. Outrossim, não se configurou na espécie a condição puramente potestativa de que trata o art. 115 do CCB, e, ainda

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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372 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

que se admitisse a inexistência de ânimo de novar, a segunda obrigação (nota promissória) confirmaria a primeira, nos termos expressos do art. 1.000, CCB. Acrescenta que descabe cogitar-se do Código de Defesa do Consumidor porque não se trata de relação de consumo.

Inadmitidos os recursos, com as contra-razões, determinei a subida do recurso mediante o Ag nll. 212.657-RS.

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO RUY ROSADO DE AGUIAR (Relator): 1. A re­novação dos contratos bancários, com a confissão da dívida ou emissão de título extrajudicial, com ou sem renegociação de cláusulas e condições, não significa a perda do direito de ir a juízo discutir a eventual ilegalidade do que foi contratado. Isso fica ainda mais nítido quando se trata de contratos de adesão, com cláusula de prorrogação. O direito à declaração de inva­lidade de cláusula contratual não se extingue com o pagamento da presta­ção nele prevista, pois muitas vezes o obrigado cumpre a sua parte exata­mente para poder submeter a causa a juízo, ou, o que é mais freqüente, para evitar o dano decorrente da inadimplência, com protestos, registros no SPC, Serasa e outros efeitos. A emissão de uma nota promissória não significa novação, apenas a consolidação da dívida até ali formada pelos inúmeros lançamentos unilateralmente feitos durante o tempo de execução do contra­to de crédito. Ainda que novação fosse, não validaria cobranças abusivas (art. 1.007, primeira parte, do Código Civil).

Por isso, não há razão para limitar o exercício jurisdicional na revi­são de contratos sucessivamente renovados, mesmo no caso de emissão de título, porque a dívida que serve de ponto de partida para o cálculo do dé­bito resulta da aplicação de cláusulas previstas em contratos anteriores, em um encadeamento negociaI que não pode ser visto isoladamente.

2. No que tange à limitação dos juros remuneratórios, a jurisprudên­cia pacificada neste Tribunal permite às instituições financeiras a cobran­ça de juros acima do limite estabelecido no Código Civil e na Lei de Usura, nos termos de autorização do Conselho Monetário Nacional, que recebeu

competência, por delegação ainda hoje vigente, para limitar as taxas de ju­ros praticadas no mercado financeiro (art. 4ll., inciso IX, da Lei n.Q. 4.595/ 1964). Incide a Súmula nll. 596-STF: "As disposições do Decreto n.Q. 22.626 de 1933 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas, que integram o

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 373

Sistema Financeiro Nacional". Nesse sentido são os precedentes, que me limito a citar pelos números (REsps nilS. 169.440, 163.791, 128.938, 149.477 e 164.935).

A questão infra constitucional foi enfrentada pela egrégia Câmara, daí a possibilidade de ser conhecido o recurso especial.

Observo que nada foi dito quanto à exigência de prova de autorização para a cobrança de juros acima do limite legal.

3. Quanto à capitalização, este Tribunal vem reiteradamente procla­mando que a capitalização dos juros somente é permitida nos casos previstos em lei, como ocorre nos créditos rurais, comerciais e industriais, com re­gime legal próprio. Para as demais situações, inclusive para as que se re­ferem a contrato de financiamento para capital de giro, que é a hipótese dos autos, entende-se que prevalece a disposição da Súmula nll 121-STF.

Assim, no REsp n ll 27.935-PR, Quarta Turma, Relator Ministro Fon­tes de Alencar, não se admitiu a capitalização em débito resultante de sal­do de conta-corrente; no REsp n ll 47.508, da minha relatoria, em financia­mento para capital de giro; no REsp n ll 47.961, Relator eminente Ministro Fontes de Alencar, no contrato de abertura de crédito; no REsp n ll 50.717, Relator eminente Ministro Barros Monteiro, no financiamento para capital de giro; no REsp n ll 53.935, de minha relatoria, idem, para capital de giro; no REsp n ll 54.056, de minha relatoria, para saldo em conta-corrente; no REsp n ll 56.604-RS, Relator eminente Ministro Barros Monteiro, em che­que ouro.

A argumentação expendida sobre o CDC e o art. 115 do Código Ci­vil não interessam para o julgamento do apelo.

4. Portanto, conheço em parte do recurso, e nessa parte lhe dou par­cial provimento, para autorizar a cobrança dos juros remuneratórios, devi­dos na vigência dos contratos, nos termos permitidos pelo Conselho Mo­netário Nacional.

É o voto.

RECURSO ESPECIAL N.2. 221.578 - MG (Registro n ll 99.0058970-0)

Relator: Ministro Ruy Rosado de Aguiar

Recorrente: José Fernandes Cabral

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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374

Advogados:

Recorrido:

Advogados:

REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Ildeu da Cunha Pereira Sobrinho e outros

Banco do Estado de Minas Gerais S/A - Bemge

Saulo Pires Correa e outros

EMENTA: Execução - Substituição de penhora - Título da dívi­da pública (um conto de réis) - Decreto de 1926 - Indeferimento.

- Havendo fundada dúvida sobre a liquidez de título da dívida pública emitido há mais de setenta anos, tanto que o executado que

o possui não conseguiu até hoje cobrá-lo, não é de ser deferida a

substituição da penhora incidente sobre imóvel para transferi-la a uma apólice emitida nos termos do Decreto n!!. 17.499/1926, no va­

lor de um conto de réis. Nulidade processual inexistente.

Recurso não conhecido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, não conhecer do re­

curso. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Aldir Passarinho Junior, Sálvio de Figueiredo e Barros Monteiro. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha.

Brasília-DF, 21 de setembro de 1999 (data do julgamento).

Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, Presidente e Relator.

Publicado no DI de 03.11.1999.

RELATÓRIO

o SR. MINISTRO RUY ROSADO DE AGUIAR: José Fernandes Cabral agravou da decisão que, nos autos da execução que lhe move o Ban­co do Estado de Minas Gerais, indeferiu o pedido de substituição da penho­

ra incidente sobre imóvel para transferi-la a um título da dívida pública, emitido nos termos do Decreto nll. 17.499, de 30.10.1926, com valor nomi­nal de um conto de réis (fi. 256).

A egrégia Terceira Câmara Cível do TAMG negou provimento ao re­curso.

RSTJ, Brasília, a. 12, (130): 307-383, junho 2000.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 375

Inconformado, José Fernandes Cabral interpôs recurso especial (art.

105, III, a e c, da CF). Primeiramente, alega a nulidade da decisão do ma­

gistrado por falta de fundamentação. Insiste na substituição do imóvel pe­

nhorado por títulos da dívida pública, porque a execução há de ser feita da

forma menos gravosa para o executado e, embora de demorado recebimento,

o título não é ilíquido; outrossim, na gradação do art. 655 do CPC, os tí­

tulos estão em terceiro lugar, enquanto 'os imóveis se acham na quinta po­

sição. Aponta violação aos arts. 165,620,655, III, 672 e 673, do CPC, além de divergência jurisprudencial.

Admitido o recurso, com as contra-razões, vieram-me os autos.

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO RUY ROSADO DE AGUIAR (Relator): A regra

do art. 165, segunda parte, do Código de Processo Civil, é a aplicável para o caso de decisão de indeferimento da substituição da penhora. Sua inter­pretação deve ser feita em conformidade com o disposto no art. 154 do

mesmo diploma, exigindo-se do ato, apenas, que "de forma idônea alcance seus objetivos, seguindo a regra de liberdade de forma", como constou do

r. acórdão recorrido. Na espécie, o executado não teve nenhuma dificulda­

de para compreender a razão da negativa, pois era bem evidente que se tra­tava de título de duvidosa liquidez, e a falta de explicitação daquela deci­são indeferitória não dificultou ao interessado a interposição do recurso de agravo, em que expôs a sua pretensão, nem ao Tribunal apreciar a questão

e dar ao caso esclarecedora solução, com o que ficou bem satisfeita a exi­

gência de fundamentação das decisões judiciais. Anular aquele primeiro ato,

depois da motivada manifestação do egrégio Tribunal, seria mero apego ao

formalismo. Além disso, o julgamento proferido pelo egrégio Tribunal subs­tituiu a decisão, suprindo eventual falta de fundamentação (art. 512, CPC).

Quanto ao pedido de substituição por título da dívida pública, já as­sim votei no AgRg no Ag n Q

• 25.657-SP:

"A disposição do artigo 655, inciso III, do Código de Processo Civil deve ser interpretada dentro do sistema legal onde está inserida,

relativo à execução judicial dos débitos. Nesse sistema, vigora o prin­cípio de que o credor tem direito de obter do Estado, através do juiz, a execução forçada da dívida e receber o seu crédito em moeda, com

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376 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

a alienação dos bens extraídos do patrimônio do devedor. Nessa pers­pectiva, não viola a lei a decisão judicial que deixa de aceitar a nomea­ção à penhora de títulos da dívida agrária ainda não vencidos e, por­tanto, não exigíveis.

Isto posto, nego provimento."

No caso dos autos, o título apresentado em substituição foi emitido nos termos do Decreto n.Q. 17.499, do ano de 1926, pelo valor de face, "um conto de réis", sem qualquer segurança quanto à sua liquidez. Depois de

mais de onze anos de processo executivo, transferir a constrição para um título cujo pagamento o executado não foi capaz de obter, embora velho de mais de setenta anos, seria conduzir o processo de modo. extremamente gravoso para o credor.

Por isso, nas circunstâncias dos autos, assim como retratadas no r. acórdão, "não se sabendo se haverá valor nominal e até mesmo real", a se­gurança do juízo justificava a denegação do pedido de liberar o bem imó­vel penhorado, pois a ordem estabelecida pelo art. 655, IIl, do CPC, não é absoluta.

A divergência não ficou demonstrada, pois inexiste esclarecimento su­ficiente sobre a similitude de natureza dos títulos sobre os quais versaram os precedentes.

Posto isso, não conheço.

É o voto.

RECURSO ESPECIAL N.2. 221.835 - DF (Registro n.Q. 99.0059317-0)

Relator: Ministro Sálvio de Figueiredo

Recorrente: Expand Importação Exportação e Comércio Ltda

Advogados: João Batista Brito Pereira e outros

Recorrido: Supermercado Panelão Hortigrangeiro Ltda

Advogados: Samir Jorge Caire e outro

EMENTA: Comercial - Habilitação de crédito em falência - De­monstração da origem do crédito - Decreto-Lei n.\!. 7.661/1945, art.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 377

82 - Cheque - Abstração e autonomia - Causa debendi - Discussão

- Excepcionalidade - Precedentes - Recurso provido.

I - A discussão da relação jurídica subjacente à emissão de che­

que é permitida se houver sérios indícios de que a obrigação foi cons­

tituída em flagrante desrespeito à ordem jurídica ou se configurada

a má-fé do possuidor do título.

H - A falta de causa que justifique a exigência do título pode

ser alegada e provada pelo devedor que participou diretamente do negócio jurídico realizado com credor.

IH - A demonstração da origem do crédito, exigida pelo art. 82 do Decreto-Lei n!!. 7.661/1945, deve ajustar-se à abstração e autono­

mia do cheque. Se, de um lado, o título representa, por si só, o dé­

bito e já denota a obrigação do falido, de outra ponta a verificação

dos créditos, na falência, tem por objetivo aferir a legitimidade dos

mesmos, de modo a impedir fraudes e abusos.

IV - Na espécie, não havendo indícios de desrespeito à ordem

jurídica, nem alegação, da parte do devedor, de falta de causa, mos­

tra-se descabida a exigência de que o credor declare a origem do ne­gócio que travou com falido e que ocasionou a emissão dos cheques.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da

Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso e

dar-lhe provimento. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Barros Mon­

teiro, Ruy Rosado de Aguiar e Aldir Passarinho Junior. Ausente, justifica­

damente, o Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha.

Brasília-DF, 21 de setembro de 1999 (data do julgamento).

Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, Presidente.

Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO, Relator.

Publicado no DI de 03.11.1999.

RELATÓRIO

o SR. MINISTRO SÁLVIO DE FIGUEIREDO: A recorrente ajuizou

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378 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

execução contra o recorrido, com base em quatro cheques por este emiti­

dos, no valor total, em maio de 1995, de R$ 26.596,00 (vinte e seis mil, quinhentos e noventa e seis reais). Nomeado bem à penhora, pelo devedor,

foram os autos remetidos à Vara de Falências, em face da decretação da que­

bra do recorrido.

Convolada a execução em habilitação de crédito, o juiz de primeiro

grau julgou improcedente o pedido, tendo o Tribunal de Justiça do Distri­to Federal desprovido a apelação da credora em acórdão com esta ementa:

"Comercial. Falência. Habilitação de crédito representado por

cheque. Recusa de clara indicação da origem da dívida. Pedido inde­

ferido. Improvimento da apelação.

1. Os princípios da autonomia e abstração dos títulos de crédito

sofrem limitações, em se tratando de habilitação em falência, sendo

exigência legal inafastável a comprovação da origem da dívida (LF, art. 82), merecendo prestigiada a sentença que, ante a recusa do habi­

litante, recusa o pedido.

2. Apelo improvido."

Contra esse acórdão a habilitante interpôs recurso especial, apontan­do divergência jurisprudencial e violação dos arts. 82 da Lei de Falências,

1 J\ item 2Q, da Lei Uniforme Relativa ao Cheque (promulgada pelo Decreto

nQ 57.595/1966), e 1Q, lI, 13 e 15, da Lei nQ 7.357/1985 (Lei do Cheque).

Sustenta a recorrente que:

a) o cheque, por si só, é suficiente para demonstrar a origem do cré­dito, nos termos da exigência da lei falimentar, sendo dispensável a prova

do negócio que lhe deu origem;

b) o título possui autonomia e abstração em relação à causa debendi;

c) os cheques que instruíram a habilitação de crédito já eram obje­

to de execução antes da decretação da falência, nunca tendo sido questio­

nada a legitimidade desses títulos.

Indica como paradigmas os REsps n illi 37.686-RS (DJ de 24.03.1997)

e 4.643-MG (DJ de 29.10.1990), ambos no sentido da inviabilidade, "em

princípio", de se discutir o negócio subjacente.

Sem as contra-razões, foi o recurso especial admitido na origem.

É o relatório.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 379

VOTO

O SR. MINISTRO SÁLVIO DE FIGUEIREDO (Relator): 1. Dispõe o art. 82 da Lei de Falências (Decreto-Lei nQ. 7.661/1945), no que interes­

sa:

"Art. 82. Dentro do prazo marcado pelo juiz, os credores comer­ciais e civis do falido e, em se tratando de sociedade, os particulares dos sócios solidariamente responsáveis, são obrigados a apresentar, em cartório, declarações por escrito, em duas vias, com a firma reconhe­cida na primeira, que mencionem [ ... ] a importância exata do crédi­to, a sua origem, a classificação que, por direito, lhes cabe, as garan­

tias que lhes tiverem sido dadas, e as respectivas datas, e que especi­fiquem, minuciosamente, os bens e títulos do falido em seu poder, os

pagamentos recebidos por conta e o saldo definitivo na data da decla­ração da falência [ ... ]."

A controvérsia reside na suficiência ou não dos cheques para esclare­cer a origem do crédito da recorrente, na necessidade ou não de explicitação do negócio que deu causa à emissão dos títulos. No caso, a legitimidade e a higidez dos cheques não foram impugnadas pelo devedor, permanecendo íntegros na sua eficácia de títulos executivos. Em outras palavras, não se questionou a relação jurídica subjacente à emissão dos cheques.

Sobre o ponto, esta Corte se pronunciou, no REsp nJ:!. 18.995-SP (DJ de 03.11.1992), Relator o Ministro WaldemarZveiter, assim ementado:

"Civil. Concordata preventiva. Habilitação. Cheque. Ordem de pagamento. Eficácia de título de crédito. Art. 82 do Decreto-Lei nJ:!. 7.661/1945.

I - Consoante afirma a doutrina, 'deve a declaração conter a ori­gem do crédito. Essa exigência é de suma importância e se acha con­sagrada nas legislações falimentares. É um meio fácil de controlar a legitimidade dos créditos. O credor que não explica satisfatoriamen­

te a causa ou origem do seu crédito, ou lhe atribui causa diversa, deve ser excluído'.

II - Tem-se que, no caso, o cheque permaneceu com sua nature­

za e eficácia de título de crédito íntegra, eis que, na fase instrutória, não logrou o recorrente desnaturá-la. Razão suficiente para que, como ordem de pagamento de efeito cambiário, fosse habilitado."

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380 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Em doutrina, anota Trajano de Miranda Valverde:

"Por 'origem' se entende, em princípio, o negócio, o fato ou as circunstâncias de que provém a obrigação do falido. É a causa efici­ente (causa efficiens), a causa certa, como diz o art. 120, lII, do Código Comercial, da qual deriva a obrigação. Daí ser necessário, ain­da mesmo para aqueles créditos que se materializam nos documentos,

que lhe servem de forma legal (letras de câmbio, notas promissórias), a denúncia da causa que provocou o seu nascimento." (Comentários à

Lei de Falências, volume lI, Rio de Janeiro, Forense, 1948, nll. 556, p. 14).

2. Por outro lado, é de salientar-se que "a abstração é característica intrínseca do cheque, em função da qual os direitos de crédito decorrentes

do título dele se apartam e tomam independência, ou seja, o cheque vale por si mesmo, desgarrando-se de sua causa precursora", conforme assinalei no REsp nll. 122.088 (DJ de 24.05.1999), ao proferir voto, como Relator. No

tema, a lição de João Eunápio Borges:

"Como salienta Ascarelli, a relação fundamental - compra e ven­da, mútuo, desconto, etc. - permanece imóvel entre as partes que nela

intervieram: o que circula é exclusivamente o título, portador do di­reito cartular no qual, ao adquirir o título, cada possuidor se investe, de modo originário, autônomo e independente." (Títulos de Crédito, 2" edição, Rio de Janeiro, Forense, 1971, nll. 8, p. 16).

Na mesma linha, a doutrina de Fran Martins:

"Abstratos são os direitos incorporados no título que não se li­gam ou dependem do negócio que deu lugar ao nascimento do mes­mo título. Natural é que, para ser criado um título de crédito, haja

anteriormente um negócio jurídico, a que no direito creditório se dá também o nome de relação fundamental. Mas, em certas espécies de

títulos, esse negócio ou relação fundamental se desprende do do­cumento que, uma vez criado e posto em circulação, passa a valer por

si mesmo." (Títulos de Crédito, volume I, 5" edição, Rio de Janeiro,

Forense, 1987, nll. 8, p. 29).

A respeito, expressa a Lei n" 7.357/1985 que "as obrigações contraídas do cheque são autônomas e independentes" e que "o emitente garante o

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 381

pagamento, considerando-se não escrita a declaração pela qual se exima

dessa garantia" (arts. 13 eIS).

3. Sob outra perspectiva, há que se considerar que não se trata de prin­

cípio absoluto. A mesma lei prevê, nos arts. 35 e 36, a possibilidade de re­

vogação do pagamento do cheque ou sustação, desde que o emitente indi­

que "as razões motivadoras do ato" ou que a oposição se funde "em rele­

vante razão de direito".

Quanto à relatividade de se discutir a relação causal na execução

fundada em cheque, esta Corte tem se pronunciado no sentido de que so­

mente é possível nos casos em que a obrigação se constituiu em flagrante

desrespeito à ordem jurídica e nas hipóteses de má-fé (REsp nl!. 137.944-

PR, DI de 05.10.1998) do possuidor da cártula, que poderia motivar a oponibilidade de exceções pessoais com o emitente. A propósito, o REsp n!2

37.686-RS (DI de 24.03.1997), de que fui Relator, trazido pela recorren­

te para fins de comprovação do dissídio, com esta ementa, no particular:

"I - Em razão da abstração e da autonomia do cheque, inviável

discutir, em princípio, a sua causa debendi, a não ser que estejam

presentes sérios indícios de que a obrigação foi constituída em flagran­

te desrespeito ao sistema jurídico."

o voto que proferi, na oportunidade, menciona o REsp n!2 4.643-MG

(DI de 24.03.1997), da Terceira Turma, com o mesmo entendimento, assim

ementado:

"Execução. Cheque. Causa debendi. Inadmissibilidade de inves­

tigação em princípio. Divergência indemonstrada. Recurso não conhe­

cido.

- Não se conhece de recurso especial em execução lastreada com

cheque, cuja investigação de causa debendi, em princípio, é afasta­

da."

Ainda da Terceira Turma, e para demonstrar a inclinação do Tribunal em admitir o exame da causa debendi em se tratando de lide entre as partes

ongmanas, o REsp n!2 111.154-DF, da relatoria do Ministro Menezes Di­

reito (DI de 19.12.1997), com esta ementa:

"Cheque. Embargos de devedor. Garantia. Investigação da causa.

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382 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

1. Reconhecendo embora a divergência doutrinária e jurispru­

dencial, não é razoável juridicamente admitir-se o cheque como cau­

ção, como garantia, e negar-se a relação entre a garantia e a sua cau­sa. Essa posição permitiria toda sorte de abusos, ocasionando o enri­

quecimento sem causa, como no presente caso, no qual se ofereceu em

garantia um cheque de valor muito maior do que o efetivamente com­

prometido.

2. Se a praxe no mercado aceita o cheque em garantia, vedar, em

tese, a investigação da causa debendi propiciaria um desequilíbrio na

relação jurídica entre partes, uma das quais, em casos de extrema ne­

cessidade, ficaria a depender do arbítrio da outra. Se o cheque ganhou

essa dimensão, fora do critério legal, que tanto não regulou, é impe­

rativo extrair a conseqüência própria, específica. Por essa razão, é que deve ser admitida a investigação da causa debendi.

3. Recurso especial conhecido, mas não provido."

4. Nesse passo, a exigência do art. 82 da Lei de Falências, de que o

credor demonstre a "origem do crédito", deve ajustar-se a essa abstração e

autonomia do cheque. Se, de um lado, o título representa, por si só, o dé­

bito e já denota a obrigação do falido, de outra ponta a verificação dos cré­ditos na falência tem por objetivo aferir a legitimidade dos mesmos, de

modo a impedir fraudes e abusos. A respeito, a lição de Salllpaio de Lacerda:

"Sua função [a da verificação de créditos] é a de não só estabe­

lecer quais sejam os credores, como por que somas, quais as garanti­as reais, quais os créditos simples ou quais os subordinados a condi­

ção ou termo. Por isso Bolaffio afirmava que a verificação de crédi­

tos poderia ser considerada como um instituto de interesse público,

como o que visasse a impedir fraudes e abusos, que diretamente atin­gem a moralidade pública, mas que, evidentemente, visa mais de per­

to o interesse da massa de credores." (Manual de Direito Falimentar, 121\ edição, Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1985, n Q 125, pp. 180-181).

Na espécie, todos os cheques foram emitidos um ano antes de decre­

tada a quebra, tendo a execução por título extrajudicial, fundada nesses tí­tulos, iniciado quatro meses após a data da emissão. Ademais, como já as­

sinalado, não houve impugnação da higidez dos cheques, nem se apontou

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 383

qualquer indício de fraude por parte do devedor. Neste sentido, o REsp n J2

122.088-SP (DJ de 24.05.1999), de minha relatoria:

"I - A discussão da relação jurídica subjacente à emissão de che­que é permitida se houver sérios indícios de que a obrigação foi cons­

tituída em flagrante desrespeito à ordem jurídica ou se configurada a

má-fé do possuidor do título.

II - A falta de causa que justifique a exigência do título pode ser

alegada e provada pelo devedor que participou diretamente do negó­cio jurídico realizado com o credor."

In casu, não havendo indícios de desrespeito à ordem jurídica, nem alegação de falta de causa, de parte do devedor, mostra-se descabida a exi­

gência de que o credor declare a origem do negócio que travou com o fa­

lido e que ocasionou a emissão dos cheques.

5. À luz do exposto, conheço do recurso especial e dou-lhe provimento para julgar procedente o pedido de habilitação do crédito da recorrente,

determinando sua inclusão no quadro geral de credores da massa falida.

VOTO-VOGAL

O SR. MINISTRO RUY ROSADO DE AGUIAR: Srs. Ministros, tam­bém estou de acordo com a fundamentação expendida pelo eminente Relator, no sentido de que não há indício de emissão fraudulenta ou sem causa do

título apresentado.

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