23
Rogério Borges MAJ MUSEU DE ARTE DE JONVILLE curadoria de Alena Marmo Jahn coordenadoria do museu: Helga Tytlic 4 de agosto a 18 de novembro 2018 Mitoplasmas

Mitoplasmas · Elifas Andreato, e outros escritores cujos livros passou a ilustrar. De Ruth Rocha guardou o ensinamento: “Não perca de vista o seu horizonte”. Aí também já

  • Upload
    others

  • View
    2

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: Mitoplasmas · Elifas Andreato, e outros escritores cujos livros passou a ilustrar. De Ruth Rocha guardou o ensinamento: “Não perca de vista o seu horizonte”. Aí também já

Rogério BorgesMAJ MUSEU DE ARTE DE JONVILLE

curadoria de Alena Marmo Jahncoordenadoria do museu: Helga Tytlic

4 de agosto a 18 de novembro 2018

Mitoplasmas

Page 2: Mitoplasmas · Elifas Andreato, e outros escritores cujos livros passou a ilustrar. De Ruth Rocha guardou o ensinamento: “Não perca de vista o seu horizonte”. Aí também já

Mitoplasmas

A relação do olho com o mundo é, em realidade, uma relação da alma com o mundo do olho.

(PANOFSKY in: DIDI-HUBERMAN, 2015)

realização

O conjunto apresentado por Rogério Borges funciona como uma arqueologia de seres inventados. E tais habitantes de seu imaginário parecem obstinadamente sufocar o ilustrador. A execução de cada um dos trabalhos, frutos da tentativa permanente de uma quebra de controle, acontece pela fusão de cores de tinta com materiais diversos que, a partir do auxílio da resina, e com uma certa autonomia dada pelo artista, viram um todo só pintura.

A construção destes trabalhos é fruto da subversão de seu banco mental imagético. Formado ao longo da vida, é dele que Borges resgata, reorganiza e recontextualiza elementos diversos, na criação de entidades atuantes em cenas que, internamente, fazem todo o sentido, embora aos olhos não façam sentido algum. E não precisam.

Isso acontece porque tais cenas se insinuam realidade, e a tentativa de entendimento por parte do observante, pela falta da resposta esperada, resulta em estranhamento, e pela beleza das formas, em encantamento. Tudo a um só tempo, e no tempo presente. Não é possível buscar referência no já conhecido, e nem projetar o que possa vir a ser. É aqui e é agora que a sua pintura se faz e permanece se refazendo.

São cenas desconexas, embora diferentes partes de uma mesma história cuja narrativa nos escapa. A atmosfera é de suspensão do tempo em um espaço outro, que não aquele habitado pela lógica do senso. A exposição de Rogério Borges não faz sentido, ela tem sentido: é a relação da alma com o mundo do olho.

Alena Rizi Marmo JahnCuradora

Design gráfico do catálogoJubal S Dohms

FotografiasAndré Sanches,Fernando Zanon Simone Sgorla

Agradecimentos

Iraçu de Borba (in memoriam), a primeira grande amizade

José Noguchi, pela atenção e generosidade

Jul Leardine, o start de tudo

Jubal Dohms, parceira e cumplicidade

Léo Polatti, incentivador

Ney Alvarez Vieira Netto, apoio logístico

Ozir Zotto, senhor da memória

MAJ MUSEU DE ARTE DE JOINVILLERua XV de novembro, 1400America Joinville

MitoplasmasRogério BorgesMAJ MUSEU DE ARTE DE JOINVILLE

curadoria de Alena Marmo Jahncoordenadoria do museu: Helga Tytlic

4 de agosto a 18 de novembro 2018

Page 3: Mitoplasmas · Elifas Andreato, e outros escritores cujos livros passou a ilustrar. De Ruth Rocha guardou o ensinamento: “Não perca de vista o seu horizonte”. Aí também já

O senhor das memórias2018MIXED MEDIAX INCHES

Page 4: Mitoplasmas · Elifas Andreato, e outros escritores cujos livros passou a ilustrar. De Ruth Rocha guardou o ensinamento: “Não perca de vista o seu horizonte”. Aí também já

Sostenido2018MIXED MEDIAX INCHES

sostenido2018MIXED MEDIA40X28.5 INCHES

Page 5: Mitoplasmas · Elifas Andreato, e outros escritores cujos livros passou a ilustrar. De Ruth Rocha guardou o ensinamento: “Não perca de vista o seu horizonte”. Aí também já

passagem2013MIXED MEDIA32.5X2 INCHES

Page 6: Mitoplasmas · Elifas Andreato, e outros escritores cujos livros passou a ilustrar. De Ruth Rocha guardou o ensinamento: “Não perca de vista o seu horizonte”. Aí também já

volição2011 MIXED MEDIA 56.7X54.7 INCHES

Page 7: Mitoplasmas · Elifas Andreato, e outros escritores cujos livros passou a ilustrar. De Ruth Rocha guardou o ensinamento: “Não perca de vista o seu horizonte”. Aí também já

moto perpétuo2011MIXED MEDIA57.5X33 INCHES

Page 8: Mitoplasmas · Elifas Andreato, e outros escritores cujos livros passou a ilustrar. De Ruth Rocha guardou o ensinamento: “Não perca de vista o seu horizonte”. Aí também já

natureperambulante2011MIXED MEDIA40.5X29 INCHES

Page 9: Mitoplasmas · Elifas Andreato, e outros escritores cujos livros passou a ilustrar. De Ruth Rocha guardou o ensinamento: “Não perca de vista o seu horizonte”. Aí também já

casa própria2010MIXED MEDIA47X40 INCHES

Page 10: Mitoplasmas · Elifas Andreato, e outros escritores cujos livros passou a ilustrar. De Ruth Rocha guardou o ensinamento: “Não perca de vista o seu horizonte”. Aí também já

câmara de cultivo2010MIXED MEDIA40X28.5 INCHES

Page 11: Mitoplasmas · Elifas Andreato, e outros escritores cujos livros passou a ilustrar. De Ruth Rocha guardou o ensinamento: “Não perca de vista o seu horizonte”. Aí também já

alfândega2010MIXED MEDIA56X39 INCHES

Page 12: Mitoplasmas · Elifas Andreato, e outros escritores cujos livros passou a ilustrar. De Ruth Rocha guardou o ensinamento: “Não perca de vista o seu horizonte”. Aí também já

rapina delicata2009MIXED MEDIA40X28,5 INCHES

Page 13: Mitoplasmas · Elifas Andreato, e outros escritores cujos livros passou a ilustrar. De Ruth Rocha guardou o ensinamento: “Não perca de vista o seu horizonte”. Aí também já

o passeio de sibila2009MIXED MEDIA2X32 INCHES

Page 14: Mitoplasmas · Elifas Andreato, e outros escritores cujos livros passou a ilustrar. De Ruth Rocha guardou o ensinamento: “Não perca de vista o seu horizonte”. Aí também já

memórias da infância2009MIXED MEDIA52X40,5 INCHES

Page 15: Mitoplasmas · Elifas Andreato, e outros escritores cujos livros passou a ilustrar. De Ruth Rocha guardou o ensinamento: “Não perca de vista o seu horizonte”. Aí também já

visto de entrada2008MIXED MEDIA40X28,5 INCHES

Page 16: Mitoplasmas · Elifas Andreato, e outros escritores cujos livros passou a ilustrar. De Ruth Rocha guardou o ensinamento: “Não perca de vista o seu horizonte”. Aí também já

inde-pendência2008MIXED MEDIA51X40 INCHES

Page 17: Mitoplasmas · Elifas Andreato, e outros escritores cujos livros passou a ilustrar. De Ruth Rocha guardou o ensinamento: “Não perca de vista o seu horizonte”. Aí também já

ponto de controle2008MIXED MEDIA51X40 INCHES

Page 18: Mitoplasmas · Elifas Andreato, e outros escritores cujos livros passou a ilustrar. De Ruth Rocha guardou o ensinamento: “Não perca de vista o seu horizonte”. Aí também já

foz2008MIXED MEDIA40X28.5 INCHES

Page 19: Mitoplasmas · Elifas Andreato, e outros escritores cujos livros passou a ilustrar. De Ruth Rocha guardou o ensinamento: “Não perca de vista o seu horizonte”. Aí também já

arquehiumanologia2008MIXED MEDIA40X28.5 INCHES

Page 20: Mitoplasmas · Elifas Andreato, e outros escritores cujos livros passou a ilustrar. De Ruth Rocha guardou o ensinamento: “Não perca de vista o seu horizonte”. Aí também já

encefalodepatia2008MIXED MEDIA52X28.5 INCHES

Page 21: Mitoplasmas · Elifas Andreato, e outros escritores cujos livros passou a ilustrar. De Ruth Rocha guardou o ensinamento: “Não perca de vista o seu horizonte”. Aí também já

abraxas2008MIXED MEDIA55X25 INCHES

Page 22: Mitoplasmas · Elifas Andreato, e outros escritores cujos livros passou a ilustrar. De Ruth Rocha guardou o ensinamento: “Não perca de vista o seu horizonte”. Aí também já

A arte de Rogério Borges já me impressionava no fi-nal dos anos 60 quando, adolescentes, cursávamos o técnico de edificações, na então ETFPR – Escola Técni-ca Federal do Paraná, turma 431, uma confraria que ainda hoje se mantém.

Rogério é filho do falecido Álvaro Borges – o primeiro artista que conheci pessoalmente – um dos grandes nomes da pintura moderna do Paraná. Que coinci-dentemente também viveu uma jornada dupla, com a publicidade. Rogério tem no ilustrador o seu duplo.

Cedo, ele teve contato com as técnicas, os materiais, o “clima” da arte. Em sua casa, rotineiramente reu-nia-se um grupo de artistas para degustar e debater arte. Ali aconteciam projeções de slides dos grandes museus, dos mestres e suas obras. Rogério às vezes adormecia no sofá da sala, embalado ao som dos pincéis, do grafite, do carvão com que seu pai traba-lhava na tela, no papel.

O colega Rogério fazia caricatura dos professores e diariamente rabiscava imagens que nos encanta-vam. Já produzia charges para a revista TV Progra-mas, que era sucesso naqueles tempos de televisão preto e branco. Ele também já estava desenhando suas próprias histórias em quadrinhos, que nasciam muito pelo apoio e o carinhoso incentivo de dona Ondina, sua mãe – artes estas que permaneceram por décadas com o colega Ozir, seu fiel depositário.

Na escola, Rogério deixou suas marcas. Venceu dois concursos. Um pelo desenho do novo uniforme, ou-tro pela criação da marca da instituição, cujo prêmio foi imediatamente empregado na aquisição do dese-jado LP de capa branca dos Beatles – importado, era o único exemplar da loja.

Na passagem para os anos 70, ouviu a indicação do

Rogério Borgesrborg.com.br

[email protected](41) 3209-1951

(41) 99181-2210

di illustratori brasiliani per ragazzi pela Comune di Roma.

Mais recentemente, A Arte de Ilustrar Livros para Crianças e Jovens no Brasil – Brazil Counteless Thre-ads Counteless Tales em 2014, em Bolonha na Itália e em Gotemburgo na Suécia pela FNLJI – Brazilian IBBY e foi um dos nove ilustradores brasileiros sele-cionados para a Bienal Internacional de Bratislava.

Alguns premiações: da APCA Associação Paulista dos Críticos de Arte; prêmio Altamente Recomendável de Imagem pela FNLIJ; prêmio FNLIJ Melhor Ilustração para o livro – Você Lembra Pai?, da editora Global; Unesco Prize for Children and Young People´s Litera-ture pelas ilustrações da obra Meu Avô Apolinário e o cobiçado Prêmio Jabuti de Ilustração para a obra A Formiguinha e a Neve, da Editora Moderna.

As ilustrações para o livro As Cores da Escravidão, Edi-tora FTD, foram selecionadas para o catálogo White Ravens 2014 da International Jugendbibliothek, se-diada em Munique.

Participação no catálogo da FNLIJ, A Arte de Ilustrar Livros para Crianças e Jovens no Brasil, na feira de Bogotá, Colômbia, em 2016.

Rogério também é autor de livros infantis e infan-to-juvenis, como O Último Broto, Editora Moderna; Ganga Zumba e Hug Dug e a Noite Misteriosa, Edito-ra do Brasil, entre outros.

Ainda mais que sua arte, o que realmente me im-pressiona é o artista Rogério Borges, um ser que persegue sua imago dei. “Não houve dia em que não desenhei”, “A melhor meditação é a pintura”, “A arte exige foco, disciplina e sacrifícios”, são algumas de suas afirmações. É assim que, exercendo sua arte como ofício de fé, Rogério vai plasmando seus mitos,

colega Léo: “se eu tivesse o seu talento, desenhasse como você, iria tentar a vida em São Paulo, nem que fosse para servir cafezinho na Editora Abril”. Não foi o que aconteceu. Logo ele estava ilustrando publica-ções de sucesso, como a Vila Sésamo da TV Cultura, os clássicos da da Hanna-Barbera, da Disney, Luluzi-nha e Bolinha da Marge (Marjorie Henderson Buell). E convivendo com profissionais do gabarito de Ruth Rocha, Ricardo Azevedo, Ignácio de Loyola Brandão, Pedro Bandeira, Sonia Robatto, Ana Maria Machado, Elifas Andreato, e outros escritores cujos livros passou a ilustrar. De Ruth Rocha guardou o ensinamento: “Não perca de vista o seu horizonte”. Aí também já es-tava na FAAP – Fundação Armando Álvares Penteado, cursando Comunicação Visual.

Então veio o período monástico. Foram 8 anos dedi-cados às práticas espirituais. Claro, sem abandonar a arte. Só para a revista Planeta, em edições de Luis Pellegrini, fez mais de 80 capas.

O reconhecimento chegava com os salões e as pre-miações:

Clube de Ilustradores do Brasil no MASP, na Expo-sição dos Ilustradores de Arte Fantástica, Museu da Imagem e do Som MIS, São Paulo; exposição indi-vidual de ilustrações para livros na galeria da União Cultural Brasil-Estados Unidos; A Ilustração e seus processos no Salão de Mostras do Sesc; participação no 51º Salão Paranaense no MAC, Curitiba e Os Qua-tro Borges – em homenagem a seu pai Álvaro Borges, junto com seus irmãos, no Solar do Rosário em 1995.

Participou de algumas mostras internacionais: Expo-sição de Ilustradores e Designers Gráficos em Frank-furt – Das Kinderbuch in Brasilien, e na Bolonha: Brasil – A bright blend of colors, e também na exposi-ção Brasile! Una brillante mescola di colori – mostra

com pincéis, espátulas, tintas e com todo material que a sensibilidade de seu olhar reconheça a be-leza – nas formas, texturas, estados de mutação e desintegração. Suas obras são elaboradas ao som de muita música: Bach, Beatles, Apocaliptica, Radio Head, Muse; além da luxuosa companhia da gata Nanquim.

Rogério vive momentos especiais. A chegada dos netinhos gêmeos, Gabriel e Pedro, transformaram seu outono em primavera. O artista, que vinha cul-tivando uma solidão produtiva, talvez pautado pela afirmação “A arte precisa de solidão...”, do escritor francês Alexandre Dumas (filho), sentiu brotarem rosas de Simone em seu coração e aí começou uma relação afetiva, interativa, criativa. Percebe-se que, o ex- lobo-solitário tem suas arestas sendo polidas, que o ego está cedendo espaço para descobertas tão importantes quanto “carinho, é melhor dar do que receber”.

Grato pelo percurso de seus vínculos afetivos, Ro-gério costuma externalizar seu agradecimento às esposas. Companheiras de longos trechos, Joace-ri (in memoriam), Rosana e Patrícia que, mais do que suportar as lascas de sua busca da arte, deram bases para desenvolver a experiência de trabalho que hoje vivencia. Também fala de sua gratidão aos filhos, Bernardo, Bianca e Bárbara, pela presença, pelas visitas ao estúdio, as longas conversas, a con-fiança. Com os filhos, a companheira e os amigos, a busca essencial: atenção plena, consciência a cada passo.

Jubal Sergio DohmsEditor, jornalista, artista gráfico, poeta

Plasmando mitos

Page 23: Mitoplasmas · Elifas Andreato, e outros escritores cujos livros passou a ilustrar. De Ruth Rocha guardou o ensinamento: “Não perca de vista o seu horizonte”. Aí também já

Há alguns anos conheci as pinturas do artista plástico Rogério Borges. Anteriormente já conhecia os excelentes trabalhos dele como ilustrador, seu domínio das técnicas e formas foram sempre impecáveis. Porém, seu trabalho pessoal, diferente do compromisso profissional como ilustrador, seguindo o mesmo refinamento técnico, é tratado com uma forma livre de expressão apenas comprometida com seu próprio imaginário e seu imenso repertório interior.

Quando comentei que seus trabalhos possuíam qualidades visionárias ele ficou intrigado. Expliquei o conceito dizendo que o visionário se referia não a uma qualidade profética, nem mesmo a um estilo específico, mas a representação plástica de visões internas do artista, que poderiam, inclusive, se aproximar dos sonhos como os surrealistas propunham, sendo que eu percebia uma qualidade onírica em suas pinturas, além de um contato com um universo arquetípico, também explorado pelos visionários, que aparecem muitas vezes nos trabalhos de modo vivo e intuitivo.

Os fundos escuros, ao contrário do pressuposto de parecerem como algo pesado e triste, na verdade proporcionam um clima de profundo silêncio e mistério, típicos de certas experiências visionárias. As figuras em cores neutras em geral, borradas com frequência, lembram chamas bruxuleantes em alguns momentos e que nos fazem viajar em suas aparições. Em outros trabalhos surgem objetos deformados como que pelas distorções causadas pelo reflexo de um espelho do tempo, contribuindo sobremaneira para esse ambiente que nos remete aos sonhos lúcidos, tais como usados por bruxos e xamãs em seus voos místicos.

Mesmo que o artista não busque essas representações de modo explícito ou recorrente, a associação é inevitável.

José Eliézer MikoszArtista plástico, professor e pesquisador