Upload
umberto
View
3.224
Download
1
Embed Size (px)
DESCRIPTION
CHAUÍ, Marilena A Cultura In; Convite à Filosofia 13 ed São Paulo; Ática, 2005 (Unidade 8, Cap 1, p 242-252 )
Citation preview
-l.-_
. >
!.
Marilena Chaui
ConviLe à Filosofia
N' CÓPIAS, ~)~~~S~~~~DATA: .-JJLJ.sd.JI:fiL .
------ •............•.. "'-"'--- ..
,.---. ~~:-·..~.~:..~:9~.~~-~~~~~-!;;-: \ --~I
I
.1
! /-:r· ..~':'~1·"·~'"·~L'::'.I •_ ,__...•...••_.'~
.'\ .
Sabe-se que os colonizadores europeus brancos, aoinstituírem a escravidão na América, escolheram os africa
nos como escravos preferenciais por considerarem que os
negros possuíam extraordinária força física. grande capa·
cidade de trabalho e muita inteligênCia para realizar tare·
fas com objetos técnicos, como o engenho de açúcar.
Se assim é, se a escravidão dos africanos foi instituI·
da por causa de sua grande capacidade e inteligência pa·
ra o trabalho da agricultura e do engenho de açúcar, como
fica a afirmação de que a natureza fez os negros indolen"
tes, preguiçosos e malandros?
Ora. os historiadores brasileiros mostram que a abo·
lição da escravatura (pela qual muitos negros lutarar" e
morreram) só foi realizada pelo Estado brasileiro quan:)a elite econômica considerou mais lucrativo o uso da r.:">:
de-obra imigrante para um certo tipo de agricultura (; c,·
fé) e para a Indústria nascente. Foi, portanto, por riEÔ0;
econômicas que a classe dominante brasileira do séc!.>l0
XIX admitiu a abolição da escravatura. o que acarretw a
substituição dos escravos africanos pelos imigrantes e 'l-
Em certas sociedades tribais,o sistema de alianças en"
tre as tribos, que determina as relações de parentesco que
organizam e conservam a comunidade, exige que, ao nas·
cer, a criança seja levada à irmã do pai, que deverá responsabilizar·se pela vida e pela educação da criança, Em ou·
tras, o sistema de parentesco exige que a criança seja
entregue à irmã da mãe. Nos dois casos, a relação princi·
pai da criança é eSlabelecida com a tia e não com a mãe
biológica, Se assim é, como fica a afirmação de que as mu
lheres amam naturalmente os seus filhos e que é desnaturada a mulher que não demonstra esse amor ficando comos filhos e cuidando deles?
Em certas sociedades, considera·se que a mulher é im
pura para lidar com a terra e com os alimentos. Por esse
motivo, o cultivo da terra, o preparo dos alimentos e oscul
dados com a casa são da responsabilidade dos homens,
cabendo às mulheres a guerra e o comando da comunida
de. Se assim é. como fica a frase que afirma que o homem
é forte, feito para o que exige força e coragem, para o co
mando e a guerra, enquanto a mulher foi feita para a ma·
ternidade, a casa, o trabalho doméstico, as atividades de
um ser frágile sensível? Ou seja, se os homens eas mulhe
res possuem certas características naturais, estas devem
ser obrigatoriamente necessárias e universais. e as mes
mas em todos os tempos e lugares (pois a natureza opera
em toda parte e em todo tempo sempre da mesma manei
ra), de sorte que será impossível que uma sociedade atri·
bua aos homens tarefas que uma outra sociedade consi
dere naturalmente femininas, e vice·versa, que atribua às
mulheres tarefas que uma outra sociedade considere naturalmente masculinas.
...••..
. -- ~..:
aratodoS. e uma natureza humana diferenciada por es,
Pédes, à maneira da diferença entre várias espécies de
:lantaS ou de animais: uma natureza feminina, uma mas·culina, uma brasileira, uma francesa, uma japonesa, uma
negra,uma branca, uma judaica, uma ariana, ete.Emoutras palavras, a natureza teria feito o gênero hu·
mono universal e as espécies humanas particulares, de mo·
doque certos sentimentos, comportamentos, Idéias e va·
lares seriam os mesmos para todo o gênero humano
(seriamnaturais para todos os humanos) enquanto outrosvariariam para cada espécie (ou sexo, ou raça, ou tipo, ou
grupO,ou classe social). Dizer que alguma coisa é naturaloupornatureza significa dizer que essa coisa existe neces
sariamente (ou seja, não pode deixar de existir nem pode
serdiferente do que é) e universalmente (em todos os tem·
pos e lugares) porque ela é efeito de uma causa necessá·ria e universal. Essa causa é a natureza. que é sempre a
mesmaem toda parte. Significa dizer, portanto, que tal cai·
sa,por ser natural. não depende da ação e intenção dos se
reshumanos e sim das operações necessárias e universais
realizadas pela natureza. Assim como é da natureza dos
corpos serem governados por uma lei natural, a lei da gra
vitação universal, como é da natureza da água ser campos'
ta por dois átomos de hidrogênio e um de oxigênio, ou co
mo é da natureza da abelha produzir mel e da roseira
produzir rosas, também seria por natureza que os homens
sentem. pensam e agem; e por isso haveria uma naturezahumana.Que aconteceria com as frases que mencionamos
acima se mostrássemos que, havendo uma natureza hu
mana. algumas delas são contraditórias e outras não cor·
respondem aos fatos da realidade?
Assim. por exemplo, dizer que "é natural chorar na tris
teza" entra em contradição com a idéia de que "homem
não chora". pois, se isso fosse verdade, o homem teria de
ser considerado um ser que não possui natureza humana
eque escapa das leis da natureza, já que chorar é conside·
rado natural. O mesmo se passa com as frases sobre o me
do e a coragem: nelas é dito que o medo é natural, mas que
uma certa pessoa é admirável porque não tem medo. Nes·
te caso. estamos diante de uma contradição. De fato, fala
se de uma coisa natural- o medo - e se diz que ele po
de deixar de existir ou de acontecer - uma pessoa
admirável não tem medo - mas isso é impossível, pois tu
do o que é natural é necessário. ou seja, acontece sempre
necessariamente. uma vez que o natural é o que não de·pende de uma intervenção ou de uma decisão dos seres
humanos. Além de ser contraditório dizer que o medo é na·
tural e que há pessoas que não têm medo, ainda parece·
mos ter admiração por quem, misteriosamente, escapa da
lei da natureza. que consegue não ter ou não sentir algo
natural, Isto ê; medo.
IiCom freqüência ouvimos dizer: "Os homens são fortes I'
e racionais, feitos para o comando e para a vida pública",: 'donde, como conseqüência, esta outra frase: "Fulana nem '
parece mulher. Veja como se veste! Veja o emprego que ar·_"
ranjou!". Não ê raro escutarmos que os negros são indO'"lentes por natureza, os pobres são naturalmente violentos, ", c,
os judeus são naturalmente avarentos, os árabes são na·. '
turalmente comerciantes espertos, os franceses são natu', •
ralmente interessados em sexo e os ingleses são, por na· "
tureza. fleumáticos. •••
Frases como essas, e muitas outras, pressupõem. por'
um lado. que existe uma natureza humana, a mesma em,.todos os tempos e lugares e, por outro, que existe uma di: 1f'ferença de natureza entre homens e mulheres. pobres e ri- ~
cos, negros, índios, judeus, árabes, franceses ou Ingleses.
Haveria, assim, uma natureza humana universal. a mesma
o mundo da prática
A cultura
Natureza humana?
CAPITULO 1
E muito comum ouvirmos e dizermos frases do tipo
"Chorar ê próprio da natureza humana" e "Homem não
chora". Ou então "E da natureza humana ter medo do des·
conhecido" e "Ela é corajosa, não tem medo de nada". Tam"
bém é comum a frase "As mulheres são naturalmente frá
geis e sensíveis, porque nasceram para a maternidade",
bem como esta outra, "Fulana é uma desnaturada, pois nãotem o menor amor aos filhos".
:;jI,",,(~'I~
"
I,rI
•• to. '*!""'Tf".!!f.!"of" .'_'';~ I.'"..- ,I # ",
Quanto à cultura, dois são seus significados iniciais:
1. Vinda do verbo latino calere. que tem o sentido de "cul·
tlvar", "criar", "tomar conta" e "cuidar". cultura signifi
cava, na Antiguidade romana. o cuidado do homem com
a natureza - donde agricultura. Tinha o sentido talO'bém de "cuidado dos homens com os deuses" - dono
de a palavra culto para se referir aos ritos religiosos -.
e o de "cuidado com a alma e o corpo das crianças". com
sua educação e formação - donde a palavra puericul·
tura (em latim. puer significa "menino" e puera. "meni·
na"). Nessa última acepção, cultura era o cultivo ou a
educação do espírito das crianças para tornarem·semembros excelentes ou virtuosos da sociedade pelo
aperfeiçoamento e refinamento das qualidades naturais
(carãter,lndole. temperamento). Com esse sentido, cul·
tura correspondia ao que os gregos chamavam de pai·
dila, a formação ou educação do corpo e do espírito dos
membros da sociedade (de paidi/avem a nossa palavra
pedagogia).
Nessa primeira acepção a cultura era o aprimoramen·
to da natureza humana pela .educação em sentido amplo,
Isto é, como formação das crianças não s6 pela alfabetl·
zação mas também pela Iniciação à vida da coletividade
por meio do aprendizado da dança e da ginástica (para a
educação ou formação do corpo, preparando'o para as
mentos fixos entre as coisas, isto é, de relações de cau
salidade entre elas. Em outros termos, a natureza é a oro
dem e a conexão universal e necessária entre as coisas,
expressas em leis naturais. Trata-se da natureza tal como
estudada pelas ciências ditas naturais (fisica. química,
biologia, astronomia, ete.);
• tudo o que existe no Universo sem a intervenção da von
tade e da ação humanas. Nesse sentido. natureza ou na
tural opõe-se a artificial, artefato, artifício, técnico e tec
nol6gico. Natural é tudo quanto se produz e se desenvolve
sem nenhuma interferência humana;
• conjunto de tudo quanto existe e é percebido pelos hu·
manos como o meio ambiente no qual vivem. A natureza,
aqui, tanto significa o conjunto das condições flsicas em
que vivemos como as coisas que contemplamos com
emoção (a paisagem. o mar, o céu, as estrelas, terremo·
tos, eclipses, tufões, erupções vulcãnicas, etc.). A nature·za é o mundo visrvel como meio ambiente e como aquilo
que existe fora de n6s e que provoca Idéias e sentimentosemn6s;
• para as ciências contemporãneas, a natureza não é ape'
nas a realidade externa. dada e observada, percebida di
retamente por n6s, mas é um objeto de conhecimento
elaborado pelas operações científicas para explicar a rea·Iidade externa.Natureza e cultura
sa" como "destinada à massa", e o mesmo pode ser dito
.dacultura de elite. ou seja, pode significar "originada na
elite" ou "destinada à elite".
finalmente, a última frase que mencionamos como
exemploapresenta um sentido totalmente diverso dos ano
teriores no que toca à palavra cultura. fala·se agora na cul·
tura dos guaranis e esta aparece em duas manifestações:
a guerra e a religião (que. portanto, nada têm a ver com a
possede conhecimentos. com atividade artística ou com adivisãosocial entre massa e elite). Nessa última frase, a cul·
tura aparece não s6 como algo pr6prio dos guaranis. mas
também como alguma coisa que não se limita ao campo
dosconhecimentos e das artes, pois se refere à relação dos
guaraniscom o sagrado (a religião) e com o conflito e amor·
te (aguerra).
Vemos, assim, que passar da natureza à cultura quan
do ralamos dos seres humanos não resolve nossas dificul·
dadesde compreensão desses seres, uma vez que, agora,
precisamos perguntar o que queremos dizer quando afiromamos que os seres humanos são seres culturais, visto
quea palavra cultura possui muitos sentidos, alguns delescontradit6rios entre si.
A (ultura-
No pensamento ocidental, natureza possui vários sen·tidos:
• princfpio devida ou princfplo ativo que anima e movimen·
ta os seres. Nesse sentido, fala·se em Mdeixar agir a na·
tureza" ou "seguir a natureza" para significar que se tra
ta de uma força espontãnea, capaz de gerar e de cuidar
de todos os seres por ela gerados. ~este o sentido da pa·
lavra grega physis com a qual, como vimos, se Inicia a In·
vestigação filos6fica;
• essência pr6pria de um ser ou aquilo que um ser é neces·
sariamente em si mesmo. Nesse aspecto, a natureza de
alguma coisa é o conjunto de qualidades. propriedades
(: .:..t.-;~:;:.,:;;)qi.i\;: ~ dzfinem pr=;:,r!amtnt~ Nocasodosse
re~vivos. é sua lndole ou disposição Inata, espontãnea;
e, no caso dos seres h-manos, essa disposição Inata é
seu l.:mper~", ••~to ou seu carãter. Aqui, natural ou Inato
opõem·se ao que é acidental (o que pode ser ou deixar
de ser) e ao que é adquirido por costume ou pela re:J~ão
com o ambiente e com as circunstãnclas de vida;
• organização universal e necessãria dos seres segundo
uma ordem reglda por leis universais e necessãrlas. Nes·
se sentido a natureza se caracteriza pelo ordenamento
dos seres, pela regularidade dos fenômenos ou dos fa·
tos, pela freqüência, constãncla e repetição de encadea·
o mundo da priliq .-,J
fala·se em tere não tercultura, serou não ser culto. A pos-
se de cultura é vista como algo positivo, enquanto "Ser 111
culto" é considerado algo negativo. A segunda frase deÍlliIentrever que "ter cultura" habilita alguém a ocupar algum •. ;posto ou cargo, pois "não ter cultura" significa não estarpreparado para uma certa posição ou função. Nessas duas :.•
primeiras frases, a palavra cultura sugere também prestl. J
gio e respeito, como se "ter cultura" ou "ser culto" fosseo "
mesmo que "ser importante", "ser superior".
Ora, quando passamos à terceira frase, a cultura já não'
parece ser uma propriedade que o indivíduo possa ter, mas' .
a qualidade de uma coletividade - franceses, alemães,·'
brasileiros. Também é interessante observ~r que a coleU.,••vldade aparece como um adJetiVOqualificativo para dislin. 'ft
guir tipos de cultura: a francesa, a alemã, a brasileira. Nes. ~sa frase, a cultura surge como algo que existe em si e por ..
si mesma e que pode ser comparada (cultura superior, cul· »;.
tura inferior). Ii~Além disso, na frase, cultura aparece representada por :.
uma atividade artística, a música popular. Isso permite es" .
tabelecerduas relações diferentes da terceira frase comas·' .
duas primeiras frases:
1. de fato, a terceira frase. como a primeira, identifica cul· ~
tura e artes (entender de arte e literatura. na primeira .;
frase; a música popular brasileira, na terceira); •
2. no entanto, algo curioso acontece quando passamos"
das duas primeiras frases à terceira, pois nas duas Prll·. _.
meiras "culto" e "inculto" surgiam como diferençass~,
cials. Num país como o nosso, dizer que alguém é Incul·: :
to porque é semi·analfabeto deixa transparecer que'
,,''''"•••'q',,""~'",,",,,"m",,,,,,.~·:sociais socialmente privilegiadas, enquanto a incultura liestá do lado dos não-privilegiados socialmente, portan·
to. do lado do povo e do popular. Entretanto, a terceira •
frase afirma que a cultura brasileira não é inferior à fran· iA'
cesa ou à alemã por causa de nossa música popular. Não l..estaríamos diante de uma contradição? Como poderia jti;
haver cultura popular (a música), se o popular é inculto? f'Já a quarta frase (a que se refere à conferência sobre 4i
cultura de massa) introduz um no,l.) :;ignificado para a pa'l
lavra cultura. Nela não se trata mai, de pessoas cultas ou .•
incultas nem de uma coletividade que possui uma ativida· . .:.de cultural que possa ser comparada à de outras. Agora,
estamos diante da idéia de que numa mesma coletividade iou numa mesma sociedade pode haver dois tipos de cul· : .
tura: a de massa e a de elite. "
A frase não nos diz oque é a cultura (seria posse de co:
nheclmentos ou seria atividade artística?). Entretanto, i·.frase nos informa sobre uma oposição entre formas de cul· .'!!"
tura, dependendo de sua origem e de sua destinação. pois'
cultura de massa tanto pode significar "originada na mas-
1
.""
ropeus. A abolição fez com que o mercado de trabalho fos·
se ocupado pelos trabalhadores brancos imigrantes e que
a maioria dos escravos libertados ficasse sem emprego,sem habitação, sem alimentação e sem nenhum direito so·
cial, econômico e político. Em outras palavras, os ex·escra·
vos foram impedidos de trabalhareomo trabalhadores li·
vres e foram mantidos como eram em estado de cativeiro,
isto é, sem direitos. Não houve preguiça natural nem indo·
lência natural e sim condições sociais e econômicas que
causaram desemprego, e falta de garantias para a sobrevi·
vência e impedimento de condições de vida dignas (mora'
dia, vestuário, alimentação, instrução escolar, etc.).
Poderíamos examinar muito do que dizemos ou ouvi·
mos em nosso cotidiano notando o quanto naturalizamos
os seres humanos, naturalizando seus comportamentos,
Idéias, valores, formas de viver e de agir. Veríamos então
como, em cada caso, os fatos desmentem tal naturaliza
ção. Veríamos como os seres humanos variam em conse·
qüêncla das condições sociais, econômicas, politicas, his
t6ricas em que vivem. Veríamos que somos seres cuja ação
determina nosso modo de ser, agir e pensar e que a Idéia
de um gênero humano natural e de espécies humanas na·
turais não possui fundamento na realidade. Veríamos que
a idéia de natureza humana como algo universal, intempo
ral e existente em si e por si mesma não se sustenta. Por
quê? Porque os seres humanos são culturais ou hist6ricos.
Culto, incrJto: cultura
"Pedro é muito culto, conhece várias línguas, entendede arte e de literatura."
"Imaginei ~ claro que o luís não pode ocupar o cargo
que pleíteia. Não tem cultura nenhuma. ~~emi·analfabeto!"
"Não creio que a cultura francesa 01.: alemã sejam suo
periores à b,asilelra. Você acha que há al;:uma coisa supe
rior à nossa música popular?"
"Ouvi urna conferência que criticava 3 cultura de mas·
sa, mas me pareceu que a conferencista defendia a cultu·
ra de elite. Por isso, não concordei inteiramente com ela."
"O livro de Silva sobre a cultura dos guaranis é bem In·
teressante. Aprendí que o modo como entendem a religião
e a guerra é multo diferente do nosso."
Essas frases e muitas outras que fazem parte do nos
so dia·a-dia indicam que empregamos a palavra cultura (ou
seus derivados, como culto, inculto) em sentidos muito di·
ferentes e, por vezes, contradit6rios.
Na primeira e na segunda frase que mencionamos aci·
ma. cultura é identificada com a posse de certos conheci·
mentos (línguas, arte, literatura, ser alfabetizado). Nelas,
llliP'"HJ,J':1
).'
'.i,I ~.
A história hegeliana
Platão e !\rlstóteles. divergindo quanto ao papel da
dialética no conhecimento. concordavam porém num pon
to: a dialética é o lógos (isto é. o pensamento e o discurso
expressos numa proposição ou num juízo) dividido em pre
dicados opostos ou contrários. como. por exemplo: "a co'
ragem é uma virtude" e"a coragem não é uma virtude"; "ohomem é um animal racional" e"o homem não é um ani·
mal racional". Ou seja. na dialética, o sujeito de uma pro
posição ou de um juízo aparece dividido internamente por
predicados contradit6rios - "a coragem é e não é uma vir·tude"; "o homem é e não é racional".
Ora. dizem dois fil6sofos. a realidade e a verdade obe·
decem ao princlpio de identidade e excluem a contradição.Esta é considerada irreal (do ponto de vista da realidade)
e impossível (do ponto de vista da verdade). pois ê irreal e
impossível que uma coisa seja e não seja ela mesma ao
mesmo tempo e na mesma relação. Em outras palavras. al
go é real e verdadeiro quando: 1) podemos conhecer o con·
junto de seus predicados positivos. Isto é. as qualidades e
propriedades que constituem sua essência; e 2) podemos
afastar os predicados negativos. que são contrários aos po·
sitivos e que, se estiverem presentes. destroem a identidade ou a essência da coisa. Em resumo. predicados positi
vos e negativos não podem estar juntos num mesmo
sujeito ou numa mesma coisa. pois essa união dos contrá·
rios é uma contradição e a contradição destr6i a realidadede uma coisa ou de uma essência.
Piatão e Arist6teles se enganaram. julga Hegel. Para
ele. a dialética éa única maneira pela qual podemos alcan
çar a realidade e a verdade não pela elimlnaçãa dos contraditórios, mos compreendendo que o real e o verdadeiro
nado mais são da que o movimento interno da contradi·
ção, pois. como lá dissera sabiamente Heráclito. a realido·de é o fluxo dos contraditórios. No entanto. diz Hegel. He
ráclito também se enganou porque julgara que 05 termv;
contradlt6rlos eram pares de termos positivos opo~:os
(quente-frio. seco-úmido. claro·escuro. doce·amargo. ~1
dio.doente, vivo-morto. etc.). Averdadelra contradição di]'
lética possui duas características principais:
1. Os termos contradlt6rios não slo dois termos positivo ~
contrários ou opostos. mas dois predlcados contradit.~-
dades racionais. A partir de então. a separação entre reino
da necessidade e reina da liberdade foi interpretada como
separação entre natureza e cultura.
Hegel. no entanto. compreendeu essa separação demaneira bastante diversa. Para acompanharmos seu pen
samento precisamos. por um momento, retomar a noção
de dialética. que vimos em outras Unidades deste livro.
..•..
.'
Com Kant. consolida·se a idéia de que a natureza é o
reino da causalidade ou da necessidade enquanto a cultu·
ra é o reino da vontade humana. da ação dotada de finali·
dade e da liberdade. tais como se exprimem na ética, na
politlca. nas artes. nas ciências e na filosofia.
Em outras palavras. Kant distinguiu entre o reino danatureza - isto é, das coisas submetidas às leis naturais
de causalidade. que são universais enecessárias - e o rei·
na da morol - ou seja, das ações humanas realizadas por
uma escolha voluntária ou por liberdade e segundo finali-
~ura
Cultura e história
À medida que este segundo sentido foi prevalecendo.
alémde civilização. cultura passou também a significar a
relação que os seres humanos socialmente organizados
(Istoé. civilizados) estabelecem com o tempo e com o es
paço,com os outros seres humanos e com a natureza. re·laçõesque se transformam no tempo evariam conforme ascondiçôesdo meio ambiente. Agora. cultura torna-se sinô·
nimo de história.
Adlstlnçlo entre natureza e cultura passa. então, ale·
varem conta a maneira como o tempo se realiza: na natu·
reZao tempo é repetição (o dia sempre sucede a noite. as
estações do ano se sucedem sempre da mesma maneira.
asespécies vegetais e animais se reproduzem sempre da
mesmamaneira. os astros realizam sempre os mesmos mo·
vimentos. etc.); o tempo da cultura, o da transformação (is·
to é.das mudanças nos costumes, nas leis. nas emoções,
noSpensamentos. nas técnicas. no vestuário. na alimenta·
ção,na linguagem. nas Instituições sociais e políticas. etc.).Para vários fil6sofos e historiadores. a cultura surge
quando os homens produzem as primeiras transformaçõesnanatureza pela ação do trabalha. Com o trabalho. os se·
res humanos produzem objetos inexistentes na natureza
(casa,utensRios. instrumentos). organizam·se socialmen·
te para realizá·lo. dividindo as tarefas entre homens e mu·lheres. adultos e crianças. Para aumentar os recursos pro
duzidos. instituem a familia e as relações de parentesco.
as aldeias e vilas. Para protegê·las. inventam as armas e a
guerra. Para conseguir sempre condições favoráveis para
o trabalho e para a melhoria do que produzem. invocam e
adoram forças divinas. instituindo a religião. Os vários
agrupamentos humanos. nascidcs do trabalho e dos siste·
mas de parentesco. trocam entre si produtos de seus tra
balhos.lnvpntando o comércio. As desigualdades surgem
quando uma parte da comunidade toma para si. como pro·
priedade privada. terras. animais. águas: começa a divisão
social de onde surgirão as classes sociais e os conflitos e.
destes. a instituição do poder.
omundOd.~'cios. as artes, a religião. as ciências, a filosofia. a vida .",
moral e avida política ou o Estado. Torna·se sinônimo de ~.
civilização porquc os pcnsadores julgavam que os re- ~;I:,sultados da formação·educação se manifestam com', :maior clareza e nitidez nas formas de organização da vi-.,'
da social e política ou na vida civil. pois a palavra CiVIl'"
vem do latim cives, que quer dizer "cidadão". de onde J.
vem civitas. a cidade·Estado. donde civilização. j.
Nessa scgunda acepçáo tem inicio a separação e. poSo,teriormente, a oposição entre natureza e cultura. Os peq. 'I'sador~s consideram que há entre o homem e a natureza ';~,
uma .d~ferença essencial: esta opera por causalidade ne- G.cessaria ou de acordo com leis nec~' .arias de causa eefei- ~
to, mas o homem é dotado:o ::uerdade e razão, agindo por, !,
escolha, de acordo com valores e fins estabelecidos porele ~
pr6prio. Porconseguinte a natureza é o campo da necessi- .~
dade causal O~J de séries ordenadas de causas e efeitos que ioperam por SImesmos, sem derender da vontade de ai· :\t
gu.m agente; ~m contrapartida, a cultura ê o campo insti- ~!tUldo pela açao dos homens. que agem escolhendo livre- ';I)mente seus atos. dando a eles sentido. finalidade e valor "tporque instituem as distinções 0nexistentes na natureza) :~
entre bom e mau, verdadeiro e falso, útil e nocivo. justo e Rinjusto. belo e feio, legítimo e ilegítimo, possível e impos- "
sivel, sagrado e profano.
atividades da guerra). e de exercícios mentais, com o
aprendizado de gramática. poesia, orat6ria ou eloqüên·
cia. história. cíênc ias e filo>ofi,l (para,' educação ou for·
mação da espírita. preparando-o pare,as atividades da
política). A pessoa culta era a pessoa fisicamente bem preparada, moralmente virtuosa. politicamente consciente e
participante. intelectualmente desenvolvida pelo conhe·cimento das ciências, das artes e da filosofia.
Podcmos observar quc.nessc primeiro scntldo, cul·
tura e natureza não se opunham. Os humanos são con·
siderados seres naturais, embora dife, '.:,les dos animais
e das plantas porque são dota: , de linguagem e de
pensamento. isto é. porque possuem espírito. Sua na·
tureza, porém. não pode ser deixada por conta pr6pria,
porque tenderá a ser agressiva, destrutiva. ignorante.
precisando por isso ser educada, formada, cultivada deacordo com os ideais de sua sociedade. A cultura é uma
segunda natureza que a educação e os costumes acres
centam à natureza de cada um, isto é. uma natureza ad·
quirida, que melhora. aperfeiçoa e desenvolve a natureza inata de cada um.
I AJém~ conquistado diredoaovoto terr.inno.o moIIirnentosutragistaproporcionouumavanr<'oà condiçãoda mulhernaSOCiedadebrasileira,de perliJpalriarcaI. "Y"
2. A partir do século XVIII. cultura passa a significar os re·
sultadas e as conseqüências daquela formação ou edu
cação dos seres humanos, resultados expressos em
obras, feitos, ações e instituições: as técnicas e os ofi-
- .-- '1-:;]'""'4-:;6"' •••• 11••1, ••" ••,,, ••,;"'.·
Cultura e antropologia
O tempo, portanto, é vida do Espírito, o modo como o
Espírito se põe a si mesmo e se desenvolve. O tempo cultu
ral é o tempo das obras e instituições humanas - religião,
artes, ciências, filosofia, Instituições sociais, Instituições po
líticas. A cada período de sua temporalidade o Espírito se
apresenta na forma de uma cultura determinada, que expri·
me o estágio de desenvolvimento espiritual ou racional da
humanidade e na qual cada cultura particular se exprime
com um caráter próprio que é negado e ultrapassado pelos
estágios seguintes, num progresso contínuo.
A história em Marx
Marx, que também concebe a cultura como história,
critica a concepção hegelíana, ou o idealismo espiritualis
ta de Hegel. Para ele, a cultura não é manifestação do Es
pírito e sim o modo como, em condições determinadas e
não escolhidas por eles, os homens produzem material
mente (pelo trabalho, pela organização econômica) sua
existência e dão sentido a essa produção material. A histó
ria não narra o movimento temporal do Espírito, mas as lu
tas reais dos seres humanos reais que produzem e repro
duzem suas condições materiais de existência, isto é,
produzem e reproduzem as relações sociais, pelas quais
se distinguem da natureza e nas quais são Instituídas asdivisões sociais, isto é, as classes sociais contraditórias.
Cada cultura exprime a maneira como nela se definem a
propriedade e a divisão social do trabalho, se organizam
as instituições sociais e políticas que visam à conservação
da forma existente da propriedade e são produzidas as
idéias com que as classes sociais explicam para si mesmas
o sentido da formação social em que vivem.
As diferentes formações sociais são determinadas pe·
10modo de produção e de reprodução da vida material dos
homens; essas formaçôes sociais são constituídas porcon
tradições internas entre os homens divididos em classes
sociais contrárias e em luta. O movimento da hist6ria-cul·
tura, portanto, é realizado pela luta das classes sociais pa
ra manter ou para vencer formas de exploração econômi
ca, opre;:;;;ü social, dominação política. O fim dessas lutas
e das contradições dependerá da capacidade de organiza
ção política e de consciência da última classe social explo
rada (o proletariado. produzido pelo capitalismo IndustrlaQ
para eliminar a desigualdade e injustiça históricas.
A palavra antropologia é composta de duas palavras
gregas: antrapas, que significa "homem", e logra, Mestu-
~lura
montanha, não existe em si, mas existe paro mim, isto é, pos
suium sentido em minha experiência. Ou seja, não vemos a
naturezadar nomes a si mesma e às coisas naturais. Somos
n6sque as nomeamos, dizendo como existem para nós.
Suponhamos agora que eu pertença a uma comunida
de cuja religião seja politeísta, que acredite que os deuses,
superiores aos homens, mas dotados de forma humana, habitam os lugares altos. Para mim, agora, uma montanha não
ê mais uma simples coisa, mas a morada sagrada dos deu
ses.Ou, então, imaginemos que somos uma empresa capi
talista exploradora de minérios e que haja uma jazida de fer
ronamontanha. (omo empresários, compramos a montanha
paraexplorá-Ia. Novamente, ela deixou de ser uma simplescoisanatural para tomar·se propriedade privada, local de tra
balho e capital. Imaginemos. por fim, que somos pintores e
quevamos pintar a montanha. Nessecaso, ela não é nem mo
radados deuses, nem propriedade privada capitalista, nem
localde trabalho, mas forma, cor,volume ,linhas, profundida
de - um campo de visibilidade.
Sob essas quatro formas - "isto é uma montanha",
"morada dos deuses", "jazida de minério de ferro/proprieda
de privada/capital" e "campo de visibilidade a ser pintado"
-, a montanha como coisa natural desapareceu, foi negada
como mera coisa pela consciência. Tornou-se não-coisa por
quetornou·se montanha ·para ·nós, significação, um ente cul·
tural. Em termos hegelianos, o Espírito negou-se como natu·
rezatransformando-se na não-natureza, isto é, na cultura.
A natureza é o serem si.,a negação efetuada pela cons
ciência a transformou em ser para n6s ou ser para a cons
ciência.Visto quea consciência é reflexiva, isto é, consciên
ciade si ou um saber sobre si, ela é para si. Podemos dizer
que o movimento temporal de negação realizado pelo Es
pírito é a passagem do em si ao para si e que essa passa·
gem é o movimento que leva o Espírito da natureza à cul·
tura. Devemos compreender que a negação dialética não
significa a destruição empírica ou material de coisas (a
igua, o ar, a terra, o fogo, a matéria, a energia, os corpos
naturais continuam existindo), e sim a destruição de seu
sentida imediato que ésuperado por um sentido novo, por
um significado novo que elas passam a ter para n6s, signi
ficado que é posto pelo pr6prio Espírito como consciência,
Ao reconhecer-se como movimento inteillo ae posição,negação e supressão de seus predicados contraditórios
(natureza e não-natureza ou consciência; consciência e
não-consciência ou natureza), o Espírito se reconhece co
mo suJeito que se produz a si mesmo e que ele não é senão
o movimento de autoprodução de si mesmo. Esse movi
mento em que o Espírito se exterioriza na natureza e se in
terioriza na cultura é a história não como seqüência tem
poral de acontecimentos e de causas e efeitos, mas como
vida do Espírito.
o mundo da pri~-paz de reflexão, isto é, de voltar·se sobre si mesmo e de.onhecer-se a si mesmo.
O que é essa reflexão? O movimento no qual o Espíri.to se coloca a si mesmo corno espfrito, produzindo o tem••
po e a história.
O Espírito começa seu percurso temporal como um su- .
jeito do qual a natureza é um predicado contraditório. Ou
seja, o Espírito é interioridade e não·interioridade. Como·não·inlerioridade ele é natureza, o não-Espírito. No Infeio
do percurso histórico-temporal, portanto, o Espírito é não- .
Espírito, pois é natureza ou pura exterioridade. Aexteriori_ .
zação do Espírito como natureza é obra sua, mas essa obra.
é sua negação como Espírito porque ele. que é imateria~ .
se apresenta na pura materialidade da natureza ou como ••
o conjunto das coisas naturais. O Espírito inicia sua mar. j;cha temporal pondo-se a si mesmo como coisa (substãn. ,
cia, qualidade, quantidade, relações de causa e efeito, jetc.). Ele é terra, água, ar, fogo, céu, astros, mares, mine- ,t
rais, vegetais, animais. '1~
Paraconservar-se vivo, cada ser natural (ou cada coisa) .' .
precisa consumir os seres que o rodeiam: os animais conso-'.
mem água, plantas, outros animais, ar, calor, luz; as plantas .'
consomem calor, água, luz; os astros consomem energia e Imatéria, ete. Ora, isso significa que o Espirito enquanto na- .1tureza nega·se a si mesmo consumindo·se a si mesmo. ••
Essa negação de si d,l natureza pelo consumo nãoêl
transformadora, pois ela se realiza apenas para conservar'
as coisas naturais. Entretanto, o Espírito não manifesta
apenas seu predicado negativo, a não-interioridade ou na·tureza, mas também manifesta um outro predicado, o pre· .dicado da não exterioridade, que nega a exterioridade da
natureza. Esse predicado da não-exterioridade é a cons·
ciência com que o Espírito põe-se a si mesmo como Inte
rioridade ou não-exterioridade. Como natureza, o Espírito "
é a interioridade que se afirma como não·interioridade ou
pura exterioridade; como consciência, o Espírito é a não
exterioridade ou negação da exterioridade natural. (omo
natureza, o Espírito nega sua interioridade, existindo sob
a forma dos corpos naturais; como consciência, afirma·se .
diferente da natureza e nega a exterioridade natural. O Es·
pírito produz assim a contradição entre a sua existência como coisa e sua existência como consciência,
Como os seres natur,lis, a consciência também busca
conservar-se. mas o faz não pelo simples consumo dascol
sas naturais, mas pela negação da mera naturalidade de
las. O que é essa negação? ·i.Quando digo "Isto é uma montanha", tenho a impressão _.
de que me refiro a uma coisa natura~ diferente de mim,.'tente em si mesma e com características positivas pr6prlas,
Entretanto, o simples fato de que eu chame uma coisa de
"montanha" indica que ela, enquanto montanha ou como
.~
rios do mesmo sujeito e que só existem negando um ao
outro. Em lugar de dizer quente-frio, seco-úmido, doce·
amargo, material-espiritual. natural-cultural, devemos
compreender que, di,1/etiúll11fnte, é preciso dizer: quen·
te'não quente, frio· não frio, doce·não do.:e, amargo-não
amargo, material-não material, espiritual·não espiritual,
natural·não natural, cultural-não cultural;
2. o negativo (o não de não·doce, não·frio, não-material,
não·cultural, etc.), portanto, não é um termo positivo con·
trário a outro positivo, mas é verdadeiramente o negati·
vo de um positivo. Se eu disser, por exemplo, "o caderno
não é a árvore", esse não não é um verdadeiro negativo,
pois o caderno e a árvore continuam como dois termos
positivos. Essenão, simplesmente, significa que ocader·
no e a árvore são duas coisas diferentes, cada qual com
suas propriedades e qualidades prówias, cada qual exis
tindo perfeitamente um sem o outro. Essenão,diz Hegel,
é mera negação externa, na qual qualquer coisa pode ser
a negação de qualquer outra (o caderno não é: a árvore,
a mesa, a bola, o menino, João, a porta, etc.), pois cada
coisa pode ser percebida e pensada positivamente sem
as outras. Na noção externa dizemos que "A" não é "B",
"C" ou "O", e cada um desses termos é um outro com re
lação aos demais. Overdadeiro negativo é uma negação
Interna, na qual o termo negado não é um outro qualquer,
mas o outra do sujeito ou o seu outro. Na negação inter
na dizemos que "A" é ao mesmo tempo e na mesma re
lação "A e não-A". Por exemplo, sabemos que um cader
no é feito de papel e que o papel vem das árvores;
dialetlcamente, não diremos "o caderno não é a árvore"
e sim que "o caderno é uma não árvore".
Na negação interna há contradição propriamente dita
e a dialética, que constitui o tempo e a história, é o movi
mento pelo qual há posição, supressão e superação das
contradições. Em outras palavras, em lugar da contradição
ser a destruição pura e simples de um sujeito, ela é o mo
vimento de sua realização verdadeira.
A contradição dialética nos revela que em lugar de to·
marmos dois sujeitos contrários, cada qual com seus pre
dicados positivos próprios, e examinarmos a oposição en
tre eles, devemos compreender que um só e mesmo sujeito
é constituído por predicados contraditórios, por uma afir
mação e uma negação Interna, e que o trabalho que o su
Jeito realiza para superar essa contradição é o movimento
do próprio tempo, é a própria história.
Quem é esse sujeito que realiza o movimento da posi
ção e superação de predicados contraditórios ou das con
tradições? Hegel o chama de o Esprrito. Por que o sujeito
dos predicados contraditórios é o Espírito? forque o movi
mento da história é reflexivo e somente um espírito é ca-
. ···---j24BI'i1,,!iU':1
iI.III
GIMI"22lj
A Filosofia e as
manifestações culturais
de no decorrer do tempo. A esse sentido amplo podemos
acrescentar um outro, restrito. proveniente do antigo sen
tido de cultivo do espírito: a cultura como criação de obras
da sensibilidade e da imaginação - as obras de arte - e
como criação de obras da inteligência e da reflexão - as
obras de pensamento, isto é, a ciência e a filosofia.
~ esse segundo sentido que leva o senso comum a
identificar cultura e escola (educação formal). de um lado,
e. de outro, a Identificar cultura e belas-artes (música, pino
tura. escultura. dança, literatura. teatro. cinema. etc.). ~
também esse sentido que leva à distinção entre cultos e in·
cultos. entendida respectivamente como "escolarmente
Instruídos" e "sem instrução escolar".
A Filosofia se Interessa por todas as manifestações cul·
turals, pois. como escreveu o filósofo Montalgne. "nada do
que é humano me é estranho".
Estrela-de-da·A. simbolo judaiCO, em sinagoga de Budapeste, Hungria, em 1979
~tura
,~·,P:;".,:-
dade e formas de relação com o poder. etc.). aos acon·
tecimentos (significado da guerra. da peste. da fome. do
nascimento e da morte. obrigação de enterrar os mar·
tos. etc.);
2. criação de uma ordem simbólica da sexualidade, da lin·
guagem, do trabalho. do espaço. do tempo. do sagrado e
do profano. do visivel e do invisível. Os símbolos surgem
tanto para representar como para interpretar a realidade,
dando·lhe sentido pela presença do humano no mundo;
3. conjunto de pr6ticas, comportamentos. ações e institui
ções pelas quais os humanos se relacionam entre si e
com a natureza e dela se distinguem. agindo sobre ela
ou através dela. modificando-a (rituais do trabalho, ri·
tuais religiosos. construção de habitações. fabricação
de utensflios e Instrumentos, culinãria. tecelagem. ves
tuário, formas de guerra e de paz, dança, música. pintu·
ra. escultura, formas de autoridade. etc.).
Na realidade. não existe a cultura. no singular, mas cul·
turas, no plural. pois os sistemas de proibição e permissão.
as instituições sociais. religiosas. políticas. os valores. as
crenças. os comportamentos variam de formação social pa
ra formaçlo social e podem variar numa mesma socleda·
•...
ô:·,>
Omundoda~
A cultura é instituída no momento em que os humanos
determinam para si mesmos regras e normas de condutaque asseguram a existência e conservação da comunida.
de e por isso devem ser obedecidas sob pena de punição(que pode irdesde um castigo ou a expulsão para longe dogrupo de origem até a morte).
O que é a lei hum.II1.1?fllt'i humana é um mandamen.
to social que organiza tod,) a vida dos Individuos e da co.
munidade. tanto porque determina o modo de estabeleci.
mento dos costumes e de sua transmissão de geração ageração como porque preside as ações que criam as insti.
tuições sociais (religião. famllia. formas de trabalho. guer.
ra e paz. distribuição das tarefas. formas de poder. etc.). Alei não é uma simples proibição para certas coisas e abri.
gação para outras. mas é a afirmação de que os humanos
são capazes de criar uma ordem de existéncia que não ésimplesmente natural (fisica. biológica). Essaordem éaor.dem simbólica.
Aordem simbólica consiste na capacidade humana pa.
ra dar às coisas um sentido que está além de sua presen.
ça material. isto é. na capacidade de atribuir significaçõese valores às coisas e aos homens. distinguindo entre bem
e mal. verdade e falsidade. beleza e feiúra; determinando
se uma coisa ou uma ação é justa ou injusta. legítima ouilegítima. possível ou impossível. ~ essa dimensão simbó.
Iica que é instituída com a lei da proibição do incesto e a leida proibição do cru.
Graças à linguagem e ao trabalho. os seres humanos
tomam consciência do tempo e das diferenças temporais(passado. presente. futuro). tomam consciência da morte
e lhe dão um sentido; organizam o espaço. humanizando.
o Osto é. dando sentido ao próximo e ao distante, ao alto e
ao baixo. ao grande e ao pequeno). ao visível e ao invisivel.
A diferenciação temporal e espacial permite que os sereshumanos se relacionem com o ausente diferenciando não
só o presente do passado e do futuro e o próximo do dis·
tante mas também distinguindo o sagrado e o profano, osdeuses e os homens.
Podemos. então. definir a cultura como tendo três sen·
tidos principais:
1. criação da ordem simbólica da lei. isto é. de sistemas de
interdições e obrigações estabelecidos a partir da atri·
buição de valores às coisas (boas. más. perigosas, sa·
gradas. diabólicas), aos humanos e suas relações (dife
rença sexual. significado da virgindade. fertilidade,
virilidade; diferença etária e forma de tratamento das
crianças. dos mais velhos e mais jovens; formas de tra·
tamento dos amigos e dos inimigos; formas de autorl·
i250'1I''''tul':1
,-" ,
do" (palavra derivada de 16gos. que significa ·pensamen·
to ou razão". "linguagem ou discurso"). A antropologia es·
tuda os seres humanos na condição de seres culturais. O
antropólogo procura. antes de mais nada. determinar em
que momento e de que maneira os humanos instituem sua
diferença em relação à natureza. fazendo assim surgir omundo cultural.
Os filósofos. a partir do século XVIII. consideraram queos humanos diferem da natureza graças ao pensamento. àIinguo'gern. ao lIolb.,lho 'oà ação voluntãria Iivr\!.
Os antropólogos. a partir do século XX. sem negar a
afirmação dos filósofos. procuram aquela ação com a qual
os seres humanos instituem a cultura propriamente dita.
Ou seja. como os filósofos. os antropólogos também con·
sideram que as condições para que haja cultcra são o peno
samento. a linguagem. o trabalho e a ação voluntária. po·
rém Julgam que não basta apontar essas condições e que
é preciso dizer que ação os homens praticara" ou que de.
cisão tomaram que os fizeram passar da pos.;ibilidade dacultura à realidade efetiva dela.
Se. para muitos historiadores. essa ação foi o traba·
lho. para muitos antropólogos a cultura foi instituída quan·
do os humanos marcaram simbolicamente sua diferença
com relação à natureza, decretando uma lei que não pode.
ria ser transgredida e. se o fosse. a comunidade exigiria re·
paração com a morte do transgressor. A diferença entre ho.
mem e natureza. que dá origem à cultura. surge com a lei
da proibição do incesto. lei inexistente entre os animais.
Essalei dá início à sexualidade propriamente humana. quenão é apenas a satisfação imediata de uma r ecessidade
biológica. mas é definida por regras que insWuem o proi.
bido e o permitido na expressão do desejo. Os "eres huma.nos dão sentido à sexualidade.
Para alguns antropólogos. além dessa lei. a diferença
entre homem e natureza também é estabelecida quando
os humanos definem uma outra lei que. se transgredida.
causa a ruína da comunidade e do indivíduo: a lei que se·para o cru e o cozido. lei também inexistente entre os ani.
mais. A separação entre o cru e o cozido e a exigência de
que os humanos comam alimentos que passaram pelo fo.gocolocam a culinária no ponto inicial da cultura. Assim co.
mo a sexualidade humana. também a alimentação huma.
na não é apenas a satisfação de uma necessidade biológica
de sobrevivência. mas está ligada a regras que lhe dão umsentido propriamente humano.
Essas duas primeiras leis estruturam o mundo huma.
no a partir da oposição entre puro (permitido) e impuro(proibido). oposição inexistente para todo o restante da na.
tureza. Sexualidade e culinária introduzem a dimensão sim.bólica da vida humana.
IJ
I'"
;11
III ;
I
,., '
::,,".
A palavra religiãa vem do latim religio, formada pelo
prefixo re ("outra vez, de novo") e o verbo ligare ("ligar. unir,
vincular"). A religião é umvínculo. Quais as partes vincula
das? O mundo profano e o mundo sagrado, isto é, a natu
reza (água, fogo, ar, animais, plantas. astros, pedras, me
tais, terra, humanos) e as divindades que habitam a
natureza ou um lugar separado da natureza.
Nas várias culturas. essa ligação é simbolizada no mo
mento de fundação de uma aldeia, vila ou cidade: o guia
religioso traça figuras no châo (círculo. quadrado, triãngu
10) e repete o mesmo gesto no ar (na direção do céu. ou do
mar, ou da floresta, ou do deserto). Esses dois gestos deli
mitam um espaço novo, sagrado (no ar) e consagrado (no
solo). Nesse novo espaço erguem'se o santuário (em latim,
templum, "templo") e à sua volta 05 edifícios da nova comunidade.
Como se acredita que a fundação do espaço coletivo
foi feita pelos ancestrais guiados por deuses protetores. ovínculo se estabelece não só entre 05 homens e os deuses
mas também entre os descendentes e os antepassados. os
fundadores. Por esse motivo, em inúmeras religiões há cul
tos não só para as divindades mas também para os ances
trais, que vivem uma vida num outro mundo e podem in
terceder Junto aos deuses em nome de seus descendentes.
A cerimônia da ligação fundadora aparece, por exem
plo. na religião judaica. quando Jeová doa ao povo o lugar
onde deve habitar - aTerra Prometida -. indica o espaço
onde o templo deverá ser ediflcado. orienta a maneira co
mo deve ser edificado e determina sua finalidade. isto é,
nele serão feitos os sacrifícios e nele será colocada a Arca
ga. agnos (puro) eagios (intocável), e na rama".:. 5(}t ('r(,kdicado à divindade) e sanctus (inviolável) constituem a es
fera do sagrado.
Sagrado é, pois, a qualidade excepcioo1al- boa ou má.
benéfica ou maléfica, protetora ou ameaçadora - que um
ser possui e que o separa e distingue de todos os outros.
embora. em muitas culturas, todos 05 seres possuam algo
sagrado, pelo que se diferenciam uns dos outros.
O sagrado pode suscitar devoção e amor, repulsa eódio. Esses sentimentos suscitam um outro: o respeito fei
to de temor. Nascem. aqui, o sentimento religioso e a ex
periência da religião.
A religiâo pressupõe que, além do sentimento da dife
rença entre natural e sobrenatural. haja o sentimento da
separação entre os humanos e o sagrado, mesmo que este habite nos humanos e na natureza.
___________ A_ religião
...••....
~ja do sagrado e a instituiçao da religjão.
vamente a um determinado ser quanto algo que ele pode
possuíre perder, n~o tere adquirir. O sagrado éa ex~er~ênda simbólica da diferença entre os seres, da supenonda
de de alguns sobre outros, do poderio de alguns sobre ou·
trOS- superioridade e poder sentidos como espantosos,misteriosos, desejados e temidos.
Asacralidade introduz uma ruptura entre natural e so
brenatural. mesmo que 05 seres sagrados sejam naturais
(comOa água, o fogo, o vulcão): é sobrenatural a força ou
potência para realizar aquilo que 05 humanos julgam im
possível efetuar contando apenas com as forças e capacidades humanas. Assim, por exemplo, em quase todas as
culturas. um guerreiro cuja força, destreza e invencibilida
de são espantosas, é considerado habitado por uma po·
têncla sagrada. Um animal feroz, astuto. veloz e invencível
também é assim considerado. Por sua forma e ação miste
riosas, benévolas e malévolas. o fogo é um dos principais
entes sagrados. Em regiões desérticas, a sacralização con
centra-se nas águas, raras e necessárias.
O sagrado opera o encantamento do mundo. habita
do por forças maravilhosas e poderes admiráveis que agem
magicamente. Criam vínculos de simpatia·atração e de an
tipatia-repulsão entre todos os seres, agem a distância, en
laçam entes diferentes com laços secretos e eficazes.
Todas as culturas possuem vocábulos para exprimir o
sagrado como força sobrenatural que habita o mundo. As
sim. nas culturas da Polinésia e da Melanésia, a palavra que
designa o sagrado é mana (e suas variantes). Nas culturasdas tribos norte-americanas fala-se em orenda (e suas va·
rlantes), referindo-se ao poder mágico possuído por todas
as coisas, que Ihes dá vida, vontade e ação, força que se
pode roubar de outras coisas para si, que se pode perder
quando roubada por outros seres, que se pode impor a outros mais fracos.
Entre as culturas dos índios sul-americanos, o sagrado é
designado por palavras como tunpa e aigres. Nas africanas,
há centenas de termos, dependendo da língua e da relaçãomantida com o sobrenatural. mas o termo fundamental, em
bOíd tOm _J; iü.ntes de p:vnúnc:a, ~ n~u.Mforça universal em
que coincidem aquilo que é e aquilo que existe".
Na cultura hcbralca. dois termos designavam o sagra
do: qados e he'em, significando aqueles seres ou coisas
que são separados por Deus pam seu culto, serviço. sacri
fício. e também as que são separadas de toaa~ as outras
para receber uma punição. Por serem coisas separadas por
Deus, não podem ser tacadas pelo homem para seu uso e
s6 podem ser tacadas ritualmente por aqueles que Deusautoriza ou autorizou. Assim, a Arca da Alíança. onde esta
vam guardados os textos sagrados, era qados e. portanto,
intocâveL Também os prisioneiros de uma guerra santa per
tenciam a Deus. sendo declarados herem. Na cultura gre·
o sagrado
o mundo da pr~
+t',.t.
Quando i,,<!íc.lInos os principais tra~os da cultura. ob.
servamos que nela e por ela 05 homens fazem a descober.
ta do tempo. ou têm a experiência do tempo. isto é. de uma
diferenciação no interior de sua vida com respeito ao quejá aconteceu e ao que está acontecendo. Vimos também
que um outro aspecto fundamental da cultura é a ativida.de do trabalho. Ora. ao trabalhar. 05 homens se relacionam
com um tempo que não é o presente e sim o futuro. poisotrabalho ê feito em vista de algo que ainda não existe no
presente e que virá a existir no futuro.
Vimos também, ao estudarmos a memória. que ela é
responsável pelo sentimento da identidade pessoal e da
continuidade de uma vida que transcorre no tempo. A per
cep~ão do tempo. o trabalho e a memória fazem com que05 homel1:>:>ejalll capazes de estabelecer relações com o
ausente: o passado lembrado. o futuro esperado.
Se reunirmos numa única experiéncia o sentimento do
tempo e o da identidade pessoal notaremos que 05 huma.
nos são conscientes de que há seres e coisas que desapa.
recem no tempo e outras que surgem no tempo, e que eles
permanecem durante um certo tempo porque são capazes
de ligar passado. presente c futuro, isto é, são capazes de
perceber que existem e que possuem identidade. Mas tam
bém são conscientes de que podem desaparecer um dia.Ou seja. sabem que morrem.
Ora. o fato de que somos conscientes do tempo como
uma presença (o presente) situada entre duas ausências
(o passado e o futuro) e que somos conscientes de nossa
Identidade e da identidade de nossos semelhantes nos le
va a conceber a permanência dessa identidade num tem
po futuro. isto é. a conceber uma existência futura, num ou
tro lugar ou num outro mundo. para onde vamos após a
morte. Esseoutro mundo tanto pode ser um lugar separa
do, existente noutro espa~o e noutro tempo, como pode
ser a parte invbível deste nosso mundo. Acrença numa vi
da futura explica por que uma das primeiras manifestaçõesreligiosas em todas as culturas são os rituais fúnebres, o
cuidado com os mortos (que não devem ser deixados sem
sepultura). que asseguram sua entrada na vida futura .•• a
busca de meios para comunkal·se com eles.
Acrença em divindades e numa outra vida após a mor
te define o núcleo da religiosidade e se exprime na expe
riência do sagrado.
O sagrado é a experiência da presença de uma potên·
cia ou de uma força sobrenatural que habita algum ser
planta. animal. humano, coisas. ventos, águas. fogo. Essa
potência é tanto um poder que pertence própria e definiti-
CAPiTULO 2
lI, ri il1.í!"lis campos filosóficos relativos às manifesta,
~0e, cultulais são: a Filosofia das ciências (que vimos na teo,ria do conhecimento). da religião. das artes. da existência éti·
ca edavida política. Além disso. a Filosofia ocupa·setambêm
com a crítica das ideologias que se originam na vida politica.
mas se estendem para todas as manifesta~ões da cultura.
A experiência do sagrado e aInstituição da religião
Se excetuarmos as atividades culturais ligadas direta·
mente à sobrevivência do indivíduo e da espécie (coleta e
preparo de alimentos. proteção contra as intempéries. cui
dado com os recém-nascidos. instrumentos simples para a
luta contra inimigos). podemos dizer que a religião é a ativi·
dade cultural mais antiga e que.existe em todas as culturas.
Porquê?
Porque descobrimos que somos humanos quando te·
mos a experiência de que somos conscientes das coisas,
dos outros e de nós mesmos. Se a consciência é a desco·
berta de nossa humanidade, se a descobrimos porque nos
diferenciamos dos outros seres da natureza, graças à lin
guagem e ao trabalho. podemos atribuir ao fato de sermos
dotados de consciência a condição e a causa primordial do
sursimento da religiosidade.
De fato. desde muito cedo os seres humanos perce·
bem regularidades na natureza e sabem que não são a cau·
sa delas; percebem também que há na natureza coisas
úteis e nocivas. boas e ameaçadoras e reconhecem que
também não são os criadores delas. A percepção da reali·
dade exterior como algo independente da a~ão humana,
de uma ordem externa e de coisas de que podemos nos
apossar para o uso ou de que devemos fugir porque são
destrutivas nos conduz à crença em poderes superiores ao
humano e à busca de meios para omunicar·nos com eles
para que sejam propicias à nossa v:da humana. Nasce, as
sim. a crença na(s) divindade(s).
A consciência também é respo lsável pela descoberta
da morte. Um filósofo disse que Sl·mente os seres huma
nos sabem que são mortais e um (Iutro escreveu: "O ani
mal acaba, mas o homem morre". () que isso quer dizer?