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ARTIGO ORIGINAL 235 0021-7557/01/77-03/235 Jornal de Pediatria Copyright © 2001 by Sociedade Brasileira de Pediatria Resumo Objetivo: conhecer características e associações entre idade materna e aspectos da gestação, parto e nascidos vivos de adolescen- tes e adultas jovens em Feira de Santana, Bahia. Métodos: estudo epidemiológico de corte transversal com nas- cidos vivos e mães adolescentes (10-16 e 17-19 anos) e adultas jovens (20-24 anos), através do Sistema de Informação de Nascidos Vivos (SINASC-1998), totalizando 5.279 nascimentos. As variáveis foram classificadas em sociodemográficas (idade, escolaridade e sexo do recém-nascido) e relacionadas a gestação, parto e condições dos recém-nascidos. Os dados foram processados usando a razão de prevalência e a análise multivariada. A regressão logística foi usada para controlar fatores de confusão (pré-natal e idade gestacional) e associar idade materna e peso de nascimento. Resultados: em 1998, 21,6% dos nascidos vivos no município foram filhos de adolescentes; a escolaridade de 51,2% das mães era 1 o grau incompleto; a razão de prevalência e a razão de risco ajustada apontaram maior prevalência de analfabetismo, não realização do pré-natal, peso insuficiente ao nascer e menor prevalência de peso adequado, na faixa de 10 a 16 anos, comparada às demais faixas estudadas. A regressão logística mostrou associação positiva entre idade materna e peso insuficiente, bem como associação negativa com peso adequado ao nascer. Verificou-se significativa falta de registros em alguns itens do SINASC. Conclusões: os resultados apontaram entre adolescentes alta prevalência de nascidos vivos e baixo nível de escolaridade, além do risco aumentado para analfabetismo, não realização de pré-natal, baixo peso e peso insuficiente do RN, principalmente na faixa de 10 a 16 anos, em comparação com as outras faixas estudadas. J Pediatr (Rio J) 2001; 77 (3): 235-42: gravidez na adolescência, nascidos vivos, indicadores de saúde. Abstract Objective: to identify characteristics and associations between maternal age and gestation, delivery, and livebirths of adolescent and young adult mothers in the city of Feira de Santana, state of Bahia, Brazil. Methods: we carried out a cross-sectional, epidemiological study with a population of livebirths and adolescent mothers (aged 10-16 and 17-19 years) and young adult mothers (aged 20-24 years). The information were obtained from the Livebirths Information System (SINASC-1998) for a total of 5,279 livebirths. Study vari- ables were classified into socio-demographic factors (age, schooling of the mother, sex of the newborn) and related to term, delivery, gestational age, birth weight, and Apgar score. Data were processed using prevalence ratio and multivariate analysis. Logistic regression was used to control confounding factors (prenatal and gestational age) and to establish an association between maternal age and birth weight. Results: in 1998, 21.6% of all livebirths in the city of Feira de Santana were from adolescent mothers; out of these mothers, 51.2% had not finished junior high or elementary school. Prevalence ratio and adjusted odds ratio for the 10-16 years of age group indicated increased prevalence of illiteracy, no prenatal examination, and low birth weight and a low prevalence of adequate weight of the newborn in comparison to other age groups studied. Logistic regression showed a positive association between maternal age and low birth weight. We also observed that the SINASC database lacked informa- tion in many different fields. Conclusions: our results indicated, for adolescent mothers, a high prevalence of livebirths and low schooling. Also, especially for the 10-16 years of age group, we observed increased risks for illiteracy, no prenatal examinations, low birth weight, and inad- equate weight of the newborn in comparison to other age groups. J Pediatr (Rio J) 2001; 77 (3): 235-42: pregnancy in adolescents, health indicators, newborns. Indicadores materno-infantis na adolescência e juventude: sociodemográfico, pré-natal, parto e nascidos-vivos Maternal–infantile indicators in adolescence and youth: socio-demographic, prenatal, delivery and newborns Maria Conceição O. Costa 1 , Carlos A.T. Santos 2 , Carlito L. Sobrinho 3 , Juliana O. Freitas 4 , Karine A.S.L Ferreira 4 1. Doutora em Pediatria, Prof. Titular da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS-Ba) e Pesquisadora do CNPq. 2. Mestre em Saúde Comunitária (Área - Estatística), Prof. Assistente da UEFS, Pesquisador do CNPq. 3. Mestre em Medicina Comunitária, Prof. Assistente da UEFS, Pesquisa- dor do CNPq. 4. Bolsistas CNPq / PIBIC-UEFS. Introdução No Brasil, a faixa etária adolescente representa um contingente populacional considerável. Conforme dados da Comissão Nacional de População e Desenvolvimento (CNPD), em 1996, o Brasil possuía uma população de

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  • Jornal de Pediatria - Vol. 77, N3 , 2001 235

    ARTIGO ORIGINAL

    235

    0021-7557/01/77-03/235Jornal de PediatriaCopyright 2001 by Sociedade Brasileira de Pediatria

    ResumoObjetivo: conhecer caractersticas e associaes entre idade

    materna e aspectos da gestao, parto e nascidos vivos de adolescen-tes e adultas jovens em Feira de Santana, Bahia.

    Mtodos: estudo epidemiolgico de corte transversal com nas-cidos vivos e mes adolescentes (10-16 e 17-19 anos) e adultas jovens(20-24 anos), atravs do Sistema de Informao de Nascidos Vivos(SINASC-1998), totalizando 5.279 nascimentos. As variveis foramclassificadas em sociodemogrficas (idade, escolaridade e sexo dorecm-nascido) e relacionadas a gestao, parto e condies dosrecm-nascidos. Os dados foram processados usando a razo deprevalncia e a anlise multivariada. A regresso logstica foi usadapara controlar fatores de confuso (pr-natal e idade gestacional) eassociar idade materna e peso de nascimento.

    Resultados: em 1998, 21,6% dos nascidos vivos no municpioforam filhos de adolescentes; a escolaridade de 51,2% das mes era1o grau incompleto; a razo de prevalncia e a razo de risco ajustadaapontaram maior prevalncia de analfabetismo, no realizao dopr-natal, peso insuficiente ao nascer e menor prevalncia de pesoadequado, na faixa de 10 a 16 anos, comparada s demais faixasestudadas. A regresso logstica mostrou associao positiva entreidade materna e peso insuficiente, bem como associao negativacom peso adequado ao nascer. Verificou-se significativa falta deregistros em alguns itens do SINASC.

    Concluses: os resultados apontaram entre adolescentes altaprevalncia de nascidos vivos e baixo nvel de escolaridade, alm dorisco aumentado para analfabetismo, no realizao de pr-natal,baixo peso e peso insuficiente do RN, principalmente na faixa de 10a 16 anos, em comparao com as outras faixas estudadas.

    J Pediatr (Rio J) 2001; 77 (3): 235-42: gravidez na adolescncia,nascidos vivos, indicadores de sade.

    AbstractObjective: to identify characteristics and associations between

    maternal age and gestation, delivery, and livebirths of adolescent andyoung adult mothers in the city of Feira de Santana, state of Bahia,Brazil.

    Methods: we carried out a cross-sectional, epidemiologicalstudy with a population of livebirths and adolescent mothers (aged10-16 and 17-19 years) and young adult mothers (aged 20-24 years).The information were obtained from the Livebirths InformationSystem (SINASC-1998) for a total of 5,279 livebirths. Study vari-ables were classified into socio-demographic factors (age, schoolingof the mother, sex of the newborn) and related to term, delivery,gestational age, birth weight, and Apgar score. Data were processedusing prevalence ratio and multivariate analysis. Logistic regressionwas used to control confounding factors (prenatal and gestationalage) and to establish an association between maternal age and birthweight.

    Results: in 1998, 21.6% of all livebirths in the city of Feira deSantana were from adolescent mothers; out of these mothers, 51.2%had not finished junior high or elementary school. Prevalence ratioand adjusted odds ratio for the 10-16 years of age group indicatedincreased prevalence of illiteracy, no prenatal examination, and lowbirth weight and a low prevalence of adequate weight of the newbornin comparison to other age groups studied. Logistic regressionshowed a positive association between maternal age and low birthweight. We also observed that the SINASC database lacked informa-tion in many different fields.

    Conclusions: our results indicated, for adolescent mothers, ahigh prevalence of livebirths and low schooling. Also, especially forthe 10-16 years of age group, we observed increased risks forilliteracy, no prenatal examinations, low birth weight, and inad-equate weight of the newborn in comparison to other age groups.

    J Pediatr (Rio J) 2001; 77 (3): 235-42: pregnancy in adolescents,health indicators, newborns.

    Indicadores materno-infantis na adolescncia e juventude:sociodemogrfico, pr-natal, parto e nascidos-vivos

    Maternalinfantile indicators in adolescence and youth:socio-demographic, prenatal, delivery and newborns

    Maria Conceio O. Costa1, Carlos A.T. Santos2, Carlito L. Sobrinho3,Juliana O. Freitas4, Karine A.S.L Ferreira4

    1. Doutora em Pediatria, Prof. Titular da Universidade Estadual de Feira deSantana (UEFS-Ba) e Pesquisadora do CNPq.

    2. Mestre em Sade Comunitria (rea - Estatstica), Prof. Assistente daUEFS, Pesquisador do CNPq.

    3. Mestre em Medicina Comunitria, Prof. Assistente da UEFS, Pesquisa-dor do CNPq.

    4. Bolsistas CNPq / PIBIC-UEFS.

    IntroduoNo Brasil, a faixa etria adolescente representa um

    contingente populacional considervel. Conforme dadosda Comisso Nacional de Populao e Desenvolvimento(CNPD), em 1996, o Brasil possua uma populao de

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    156,7 milhes de habitantes, dos quais 34,2 milhes eramadolescentes de 10 a 19 anos de idade1. No Municpio deFeira de Santana, Bahia, a faixa etria adolescente repre-senta 24,5% (110.528) do total de 450.487 habitantes domunicpio2.

    Quanto aos aspectos relacionados fecundidade naadolescncia, sabe-se que um dos importantes determinan-tes do seu aumento nos ltimos 30 anos diz respeito iniciao sexual precoce nos diferentes contextos socio-econmicos e freqente associao deste comportamentocom o desconhecimento ou conhecimento inadequado deadolescentes sobre sade reprodutiva e anticoncepo,aliado pouca participao da famlia, escolas e servios desade na educao para a sexualidade. Na adolescncia, aprincipal fonte de informao sobre sexualidade so osprprios colegas e, embora ainda estejam em plena fase decrescimento e desenvolvimento, os adolescentes tm parti-cipado de forma efetiva no aumento dos ndices de partos enascimentos, em diferentes pases3,4.

    No Brasil, Pesquisa Nacional sobre Sade e Demogra-fia, realizada pela Sociedade Civil Bem-Estar Familiar(BEMFAM), em 1996, demonstrou que, nos ltimos 10anos, a fecundidade tem diminudo em todas as faixasetrias, em torno de 30%, com exceo da faixa adolescen-te. A pesquisa sobre Sade Familiar no Nordeste, realizadapela BEMFAM, mostrou que, no Estado da Bahia, cerca de25% das mulheres em idade frtil so adolescentes, de cadacinco adolescentes uma considerada sexualmente ativa,sendo que 13% possuem filhos5,6.

    Nos pases em desenvolvimento, a gestao e a mater-nidade na adolescncia, assim como as altas taxas demortalidade perinatal e infanti,l encontram-se inseridasnum contexto social mais amplo, conseqncia das prec-rias condies de vida e sade da maioria da populao.Pesquisas relacionadas gestao e maternidade entreadolescentes demonstram que a baixa escolaridade e apouca profissionalizao, assim como o abandono do par-ceiro ou da famlia constituem situaes de risco para ocomprometimento do estado de sade da adolescente e doseu(s) dependentes(s), principalmente na ausncia de su-porte pr-natal7-9.

    O Sistema de Informao sobre Nascidos Vivos (SI-NASC) faz parte do Grupo de Estatsticas Vitais do Minis-trio da Sade (MS), oficializado em maro de 1990. OSINASC tem como instrumento a ficha de Declarao deNascido Vivo, que contm algumas informaes sociode-mogrficas sobre as mes, alm de outras variveis relaci-onadas gestao, parto e condies de nascidos vivos,permitindo o conhecimento do perfil epidemiolgico decondies materno-infantis em diferentes localidades epossibilitando ao Sistema de Sade viabilizar polticas eaes voltadas s reais necessidades e demandas de cadagrupo populacional.

    A Declarao de Nascido Vivo consta de trs vias, dasquais uma encaminhada Diretoria Regional de Sade eas outras duas entregues me para registro civil em

    cartrio e apresentao no Servio de Sade na 1 consultada criana. Compreende-se assim que o SINASC, alm defornecer dados estatsticos maternos e de nascidos vivos,fornece informaes necessrias ao cartrio civil para oregistro da criana e ao Sistema de Sade para matrcula deme e filho no Servio. Em Feira de Santana, o SINASC foiimplantado em 1996; entretanto, apenas a partir de 1998 osdados encontravam-se sistematizados de acordo com asInstituies, o que possibilitou a realizao desta pesquisapara o conhecimento de indicadores de sade do municpio.

    O objetivo deste estudo foi conhecer as caractersticase associaes simples e mltiplas entre faixa etria maternae aspectos da gestao, parto e nascidos-vivos de adoles-centes e adultas jovens em Feira de Santana, Bahia.

    MtodosEsta pesquisa consiste em um estudo epidemiolgico de

    corte transversal da populao total de nascidos-vivos erespectivas mes adolescentes de 10 a 19 anos e adultasjovens de 20 a 24 anos, no Municpio de Feira de Santana,em 1998, a partir de dados do SINASC-1998, totalizando5.279 nascidos-vivos. Neste estudo, a populao total foiconsiderada como amostra e, dessa forma, foram aplicadostestes de inferncia estatstica, com o objetivo de generali-zar os dados do municpio de Feira de Santana para outraslocalidades de caractersticas semelhantes.

    A populao de mes foi subdividida em grupos porfaixa etria, considerando adolescentes as faixas de 10-16anos e de 17-19 anos, e adultas jovens de 20-24 anos10. Asadolescentes foram subdivididas em dois grupos, apsverificar-se que o perfil da faixa at 16 anos contrastavacom a faixa etria acima deste limite, conforme a literatu-ra11-13.

    As variveis do estudo foram classificadas em sociode-mogrficas (faixa etria, escolaridade das mes e sexo dosRN) e relacionadas gestao (freqncia ao pr-natal), aoparto (tipo de parto) e s condies de nascimento (peso,idade gestacional e apgar do 5o minuto de nascimento).Para a escolaridade, as mes foram classificadas em analfa-beta, 1 grau incompleto, 1 grau completo e 2 grau. Ainsero ao pr-natal foi avaliada pelo nmero de consultas,considerando 3 categorias: no realizao do pr-natal, pr-natal insuficiente (com menos de 6 consultas) e pr-natalsuficiente (acima de 6 consultas), segundo recomendaodo Ministrio da Sade14. O parto foi classificado em 3tipos: natural, operatrio e frceps. Quanto idade gesta-cional, os RN foram classificados em prematuros (36 e 42semanas), conforme classificao de Capurro15. Quanto aopeso de nascimento, os RN foram classificados em baixopeso (< 2.500 g), peso insuficiente (2.501 3000g) e pesoadequado (>3.000 g), conforme recomendao da OMS16.O ndice de apgar do 5 minuto de vida foi classificado porescore de pontos 7 17.

    Indicadores materno-infantis na adolescncia... - Costa MCO et alii

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    Os dados foram coletados por pesquisadores treinadosda equipe do NEPA, a partir da ficha de declarao denascidos vivos do SINASC-1998 e processados nos progra-mas EPI-INFO 6.0 e SPSSWIN 9.0.

    A amostra foi descrita pelas variveis sociodemogrfi-cas e pelas variveis relacionadas gestao, parto econdies de nascimento dos RN. Atravs da anlise esta-tstica bivariada (Razo de Prevalncia RP), obtiveram-seassociaes entre faixa etria materna e as outras variveis(escolaridade, tipo de parto, realizao de pr-natal, idadegestacional e peso ao nascer do RN). Para a anlise multi-variada utilizou-se a Regresso Logstica, expressando osresultados em termos de razo de chances. Dessa forma,obteve-se a fora da associao entre a varivel causa (faixaetria materna) e as variveis efeito (baixo peso, pesoinsuficiente e peso adequado do RN), ajustada para osfatores de confuso (realizao do pr-natal e idade gesta-cional), mantidos no modelo18. O nvel de significnciaestabelecido nos testes estatsticos foi de 5% ou p

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    Os dados do peso de nascimento (Tabela 3) apontaram55,8% de RN com peso adequado(>3000g), com maiorprevalncia entre as adultas jovens (20-24 anos). No que serefere ao baixo peso (3.000g Ignorado Total

    N % N % N % N % N %

    10 16 68 11,5 211 35,8 271 45,9 40 6,8 590 11,217 19 169 10,5 482 30,1 863 53,8 89 5,5 1.604 30,420 24 276 8,9 820 26,6 1.811 58,7 178 5,8 3.085 58,4

    Total 513 9,7 1.514 28,7 2.945 55,8 307 5,8 5.279 100

    Tabela 3 - Distribuio do peso dos recm-nascidos (RN) de adolescentes e adultas jovens segundo faixa etria materna,Feira de Santana, Ba, 1998

    Fonte: SINASC-1998.

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    de 17 a 19 e 20 a 24 anos, respectivamente, com diferenasestatisticamente significantes.

    O resultado do escore de Apgar do 5o minuto de vida dosRN mostrou que 27% apresentaram escore acima de 7;entretanto, a anlise e o clculo das associaes simples emltiplas ficou prejudicada, tendo em vista que 68,2%desta varivel no se encontrava registrada nas fichas doSINASC.

    A distribuio dos RN por sexo mostrou 51,5% do sexomasculino e 48,4% do feminino, com propores seme-lhantes entre as faixas etrias.

    DiscussoA maternidade precoce tem sido identificada como um

    fator de afastamento e dificuldade de retorno da meadolescente aos estudos; entretanto, sabe-se que outrosfatores sociais e econmicos podem interferir no processode escolarizao e formao profissional nos diferentesnveis socioeconmicos7,8,11.

    Neste estudo, a alta prevalncia (56%) do 1o grauincompleto observada entre as adolescentes de 17 a 19 anoscontraria os limites etrios estabelecidos pelo Ministrio daEducao e Cultura MEC: para a escolaridade de 1o grau,os limites so de 7 a 14 anos, e para a de 2o grau, so de 15a 19 anos. Estes resultados concordam com os de outrosestudos, que observaram ndices superiores a 70% da esco-laridade de 1o grau incompleto entre gestantes e mesadolescentes10,11,19. Em relao escolaridade, ainda importante ressaltar o alto percentual da inexistncia deinformaes verificada na presente pesquisa, apontando anecessidade de sensibilizar profissionais de sade quantoao registro correto de dados nos Sistemas Vitais de Infor-maes, os quais revelam demandas sociais e subsidiamestratgias de interveno.

    O pr-natal amplamente reconhecido como um dosprincipais determinantes da evoluo gestacional normal.Segundo o Programa Assistncia Integral a Sade da Mu-lher PAISM (MS), a assistncia pr-natal adequada devegarantir o mnimo de 6 consultas; entretanto, vale a penaressaltar que a qualidade desta assistncia inclui incioprecoce, acompanhamento das curvas de peso e alturauterina, avaliao peridica de parmetros vitais, entreoutros requisitos indispensveis, os quais exigem capacita-o tcnica e entrosamento entre a equipe14,20,21. Os resul-tados desta pesquisa concordam com os de outros estudos,que verificaram alta proporo de ingresso tardio e ausn-cia ao pr-natal entre adolescentes12,20,23.

    Diferentes fatores so apontados para explicar a ausn-cia ou insero tardia de adolescentes ao pr-natal, entreeles destacam-se as dificuldades de assumir a gestao,conflitos familiares, assim como desconhecimento da im-portncia desta assistncia, situao que agravada napresena de abandono da famlia e/ou do parceiro4,7,8,22.

    Os resultados referentes ao parto natural, da presentepesquisa, concordam com os de outros estudos, que noapontaram diferenas quanto a esta caracterstica entreadolescentes e adultas sob as mesmas condies de vida22,23.Algumas pesquisas verificaram ndices que variam de 36 a63% de parto vaginal entre adolescentes8,11,24. Em relaoao parto operatrio, importante destacar que, emboranesta pesquisa o ndice tenha ultrapassado o limite conside-rado adequado pela OMS (15%), este resultado est deacordo com estimativas nacionais como a Pesquisa Nacio-nal de Demografia e Sade, que apontou o aumento dondice de cesariana de 31,6% para 36,4% na dcada de 1986a19965.

    Em relao ao peso de nascimento, os achados desteestudo concordam com os de outras pesquisas, que verifi-caram maior proporo de baixo peso e de peso insuficiente

    Faixa Razo de Prevalncia (RP)etria Analfabeto 1 grau No realizao Baixo peso Peso Prematuridadematerna incompleto de pr-natal insuficiente

    10 16 1,23 [0,91-1,66] 1,10 [1,02-1,19]* 1,07[0,82-1,40] 1,09[0,84-1,43] 1,19[1,04-1,36]* 1,05[0,68-1,64]17 1910 16 1,31[0,99 1,72] 1,32 [1,23-1,42]* 1,28 [1,05-1,57] a 1,33[0,99-1,77] 1,34[1,19-1,52]* 1,07 [0,71-1,62]20 24

    Tabela 4 - Razo de Prevalncia (RP) de dados maternos (analfabetismo, 1o grau incompleto e no realizao de pr-natal) e de recm-nascidos (baixo peso e peso insuficiente), segundo faixa etria materna (10 a 16 comparadass de 17 a 19 e de 20 a 24 anos), Feira de Santana, Ba, 1998

    * Estatisticamente significante a nvel de 5%.

    Indicadores materno-infantis na adolescncia... - Costa MCO et alii

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    Faixa etria Baixo peso Peso insuficiente Peso adequado

    10 1617 19 0,97 [0,68-1,38] 1,38 [1,12-1,17] 0,75 [0,61-0,92]10 1620 24 1,18 [0,84-1,66] 1,61 [1,34-1,99] 0,61 [0,50-0,73]

    Tabela 5 - Razo de chance ajustada*, do baixo peso, peso insuficiente e pesoadequado de recm-nascido (RN), segundo faixa etria materna (10 a 16comparadas s de 17 a 19 e 20 a 24 anos), Feira de Santana, Ba, 1998

    * Pr-natal e idade gestacional Estatisticamente significante a nvel de 5%

    entre RN de adolescentes na faixa etria at 16 anos. NosEUA, StevensSimon & McAnarney, 198825, verificaram13,8% de baixo peso entre adolescentes da faixa at 15anos, 9,3% na faixa de 17 a 19 e 5,8% naquelas de 25 a 29anos; em Campinas, SP, Bicalho-Mariotoni & e BarrosFilho, 199526, apontaram entre RN de adolescentes, 16,6%de baixo peso na faixa at 15 anos e 11,4% at 19 anos; emBelm, Costa et al, 199911, verificaram que a proporo debaixo peso somado a peso insuficiente foi superior (51,6%) proporo de peso adequado (48,4%), entre RN de ado-lescentes com idade at 16 anos.

    Nas duas ltimas dcadas, estudos tm buscado esclare-cer a interferncia de diferentes fatores nos resultadosneonatais. Pesquisas tm mostrado que RN de adolescentesapresentam caractersticas antropomtricas semelhantes aosfilhos de adultas, nas mesmas condies de vida. Entretan-to, os RN de adolescentes da menor faixa etria (10 a 16anos) apresentam maior prevalncia de peso insuficiente(2.501-3.000g) e baixo peso (3.000g), quando comparados comos de mes adultas nas mesmas condies de vida. Entre osfatores apontados destacam-se o baixo peso materno ante-rior gestao, o ganho ponderal insuficiente e as intercor-rncias gestacionais associadas aos conflitos familiares ecom o parceiro, as quais interferem no autocuidado com asade8,28. Outros fatores apontados so o incompleto cres-cimento fsico (composio corporal, rgos da reprodu-o) e a baixa idade ginecolgica verificada entre adoles-centes da faixa at 15 anos, podendo interferir na transfe-rncia de nutrientes para o feto, pela insuficincia tero-placentria12,28,29.

    Os resultados deste estudo concordam com dados daliteratura, tanto no que se refere prevalncia de pesoinsuficiente e de peso adequado quanto idade gestacionalde termo e de pr-termo9,12,14,26,28. Em Campinas, SP,dados do SINASC de 199526 mostraram ndice geral deprematuridade de 6,2%, sendo 7,6% filhos de adolescentes

    e, entre as mes de RN de baixo peso e prematuros, 22,8%e 25,9%, respectivamente, eram adolescentes, no sendoobservado risco aumentado associado idade materna.

    Em relao varivel Apgar de 5 minuto, 68,2% dosdados no apresentavam registro, o que dificultou a anlisedos dados. Este resultado aponta a pouca importncia dadaao preenchimento da declarao de nascidos vivos pelosprofissionais de sade, nas maternidades, atitude esta quevai de encontro ao consenso geral quanto importncia daassistncia perinatal, no que se refere diminuio dosndices de mortalidade, assim como do registro de dadosvitais que, na condio de indicadores, servem de subsdiospara o sistema de sade no redimensionamento de suasprticas voltadas melhoria da assistncia materno-infan-til. O preenchimento adequado do Sistema de Registro deNascidos Vivos fonte importante de informao sobre asade da gestante e do recm-nascido e sobre a assistnciaprestada pelos Servios de Sade.

    A inexistncia de dados aponta para a necessidade desensibilizar os profissionais de sade quanto importnciadestes dados e quanto interferncia no processo de inter-pretao e anlise de dados vitais que podem subsidiarpolticas pblicas e aes fundamentais sade da me e dofilho na gestao, no parto e no puerprio.

    Concluses do estudoOs resultados do estudo apontaram, entre adolescentes

    das duas faixas etrias, alta prevalncia de nascidos vivos,analfabetismo, escolaridade de 1 grau e no realizao depr-natal.

    Os recm-nascidos de adolescentes de 10 a 16 anosapresentaram maior prevalncia e chance de peso insufici-ente e menor prevalncia e chance de peso adequado,quando comparados aos filhos das outras faixas etriasestudadas.

    Indicadores materno-infantis na adolescncia... - Costa MCO et alii

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    Consideraes sobre o mtodo estatstico e os resultadosEm relao ao delineamento, cabe considerar a relao

    de determinao, atravs de estudo de corte transversal;entretanto, neste estudo, a falta de dimenso temporal foiparcialmente superada pela caracterizao de anterioridadeda gestao em relao ao parto e ao nascido vivo.

    Outro aspecto que merece considerao refere-se consistncia cientfica dos achados, relacionado ao contro-le dos fatores de confuso, realizado atravs da anlisemultivariada e que coincide com dados da literatura revisa-da.

    Consideraes sobre propostas de intervenoSo as seguintes as propostas que emanam dos resulta-

    dos deste estudo: necessidade de sensibilizao dos profissionais de sa-

    de quanto importncia do preenchimento adequado daficha do SINASC;

    investimento dos Servios de Sade em aes especfi-cas de captao precoce e insero da me adolescenteao pr-natal, acompanhamento ps-parto e planejamen-to familiar;

    implementao de aes de sensibilizao da popula-o adolescente pelos Sistemas de Educao e de Sadequanto responsabilidade de prevenir a gestao preco-ce e no planejada e quanto s suas conseqncias.

    Agradecimento EspecialAo Prof Dr Balmukund Niljay Patel, pela valiosa con-

    tribuio na correo do abstract e sugestes no mtodoestatstico.

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    Indicadores materno-infantis na adolescncia... - Costa MCO et alii

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    Endereo para correspondncia:Dra. Maria Conceio Oliveira CostaAvenida Euclides da Cunha 475, ap.1602 - GraaCEP 40150-120 Salvador, BahiaFone/Fax: (71) 237.1584 e 235.8753E-mail: [email protected] e [email protected]

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