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Setor de Recursos Extraordinários e Especiais Criminais – Modelo da Tese nº 269 Pesquisa de Jurisprudência e Anotações – Perseu Gentil Negrão – 16/07/2003 OBS: Na jurisprudência citada, sempre que não houver indicação do tribunal, entenda-se que é do Superior Tribunal de Justiça. Índices Ementas – ordem alfabética Ementas – ordem numérica Índice do “CD” Tese 269 ARMA – USO PERMITIDO – NUMERAÇÃO RASPADA – EQUIPARAÇÃO A ARMA DE USO PROIBIDO OU RESTRITO A arma de fogo de uso permitido com numeração raspada se equipara, por força do art. 16, § único, do Estatuto do Desarmamento (Lei nº 10.826/2003), a arma de uso Compilação: Perseu Gentil Negrão 1

arma – uso permitido – numeração raspada

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Setor de Recursos Extraordinários e Especiais Criminais – Modelo da Tese nº 269

Pesquisa de Jurisprudência e Anotações – Perseu Gentil Negrão – 16/07/2003

OBS: Na jurisprudência citada, sempre que não houver indicação do tribunal, entenda-se que é do Superior Tribunal de Justiça.

Índices

Ementas – ordem alfabética

Ementas – ordem numérica

Índice do “CD”

Tese 269ARMA – USO PERMITIDO – NUMERAÇÃO RASPADA – EQUIPARAÇÃO

A ARMA DE USO PROIBIDO OU RESTRITO

A arma de fogo de uso permitido com numeração raspada se equipara,

por força do art. 16, § único, do Estatuto do Desarmamento (Lei nº

10.826/2003), a arma de uso proibido ou restrito.(D.O.E., 22/08/2007, p. 34)

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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR DESEMBARGADOR

PRESIDENTE DA SEÇÃO CRIMINAL DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE

JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

COLENDO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.

DIGNO MINISTRO RELATOR.

PRECLARA PROCURADORIA DA REPÚBLICA.

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O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO, pelo Procurador de Justiça infra-assinado, no uso de

suas atribuições legais, nos autos de Apelação Criminal Nº 872.313.3/4-0000-000, da Comarca de Sumaré, em que figura

como Apelante ANTONIO GOMES MACHADO, vem

respeitosamente ante Vossa Excelência, com fundamento

no art. 105, III, “a”, da Constituição Federal, art. 255, § 2o,

do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, art. 26,

da Lei nº 8.038/90, e art. 541, e Parágrafo único, do Código

de Processo Civil, interpor RECURSO ESPECIAL para o

Colendo SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, em face

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do v. acórdão de fls. 120/126, pelos motivos adiante

aduzidos:1. DO RESUMO DOS AUTOS

ANTONIO GOMES MACHADO foi condenado

pelo Juízo de Direito da 1ª Vara da Comarca de Sumaré, nos

autos de Processo Crime nº 1058/04, “como incurso nos artigos 12 e 16, parágrafo único, inciso IV, da Lei 10.826/03, c.c. artigo 69 do Código Penal, às penas de três anos de reclusão, em regime inicial semi-aberto, um ano de detenção, em regime inicial aberto, e vinte dias multa, calculados pelo valor unitário mínimo legal”, isso porque,

no dia 04 de julho de 2004, por volta de 21h50min, na R.

Aluísio Medeiros nº 90-A – fundos, Jardim Amanda I, no

município de Hortolândia, mantinha sob sua guarda duas

armas de fogo, de uso permitido, sendo uma carabina, cal.

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38, marca Rossi, com numeração raspada e, uma

cartucheira cal. 32, sem marca e numeração aparentes, assim

o fazendo sem registro e porte, portanto, sem autorização e

em desacordo com disposição legal (fls. 75/78).

Inconformado, interpôs Apelação (fls. 85 e 87).

O recurso foi recebido (fls. 95).

O Apelante apresentou suas Razões (fls. 88/94).

O recurso foi contrariado pelo MINISTÉRIO PÚBLICO (fls. 97/100).

A d. Segunda Procuradoria de Justiça, com a

subida dos autos, ofertou Parecer “pelo improvimento ao recurso de apelação” (fls. 107/109).

Os dignos Desembargadores que integram a Colenda Sétima Câmara Criminal do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, por maioria de votos, deram provimento parcial ao recurso.

O v. acórdão foi proferido nos seguintes termos:

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O v. acórdão impugnado, ao reconhecer que a

forma qualificada de porte, posse, aquisição, transporte, ou

fornecimento de arma de fogo com numeração, marca ou

qualquer outro sinal identificador raspado, suprimido ou

adulterado, como previsto no inc. IV, do Parágrafo único, do

art. 16, da Lei nº 10.826/03, somente se aplica a arma de fogo

de uso proibido, e não à de uso permitido, contrariou ou

mesmo negou vigência a essa lei federal, ensejando assim a

interposição do presente RECURSO ESPECIAL, com amparo

no art. 105, III, “a”, da Constituição Federal.

2. DA CONTRARIEDADE OU NEGATIVA DE VIGÊNCIA AO ART. 16, PARÁGRAFO ÚNICO, IV, DO ESTATUTO DO DESARMAMENTO.

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O art. 16, Parágrafo único, IV, do Estatuto do

Desarmamento, está assim redigido:

       “Art. 16. Possuir, deter, portar, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob sua guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou munição de uso proibido ou restrito, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar:

        Pena – reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa.

        Parágrafo único. Nas mesmas penas incorre quem: ...

        IV – portar, possuir, adquirir, transportar ou fornecer arma de fogo com numeração, marca ou qualquer outro sinal de identificação raspado, suprimido ou adulterado; ...”Quis o Estatuto do Desarmamento tratar de forma

diferenciada a conduta de possuir arma de fogo, de uso

permitido, ..., no interior de residência ou dependência desta,

ou, ainda no seu local de trabalho, desde que seja o titular ou

o responsável legal do estabelecimento ou empresa, nos

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termos do art. 12, da conduta de possuir arma de fogo, de uso

proibido ou restrito, como tratada no art. 16, caput.

À primeira, conduta menos grave, a lei comina

penas de detenção de 01 a 03 anos e multa, à segunda,

penas de reclusão de 03 a 06 anos e multa.

No entanto, indo além, quis ainda estabelecer

condutas equiparadas a esse crime mais grave, dentre elas, a

posse de arma de fogo, com numeração, marca ou qualquer

outro sinal de identificação raspado, como previsto no inc. IV,

do Parágrafo único, do art. 16.

Evidente, é vontade da lei tratar com maior rigor

a conduta daquele que possui arma de fogo, de uso

permitido, mas com numeração raspada, equiparando-a a

possuir arma de fogo de uso proibido ou restrito.

Encontrar-se a arma com numeração suprimida,

configura, por si, crime mais grave, diante da equiparação

expressamente prevista, e com razão, até porque, a arma

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com numeração suprimida, raspada que seja, é por si de uso

proibido.

Tanto é esse o sentido da lei que, se não for

assim, o quanto previsto no inc. IV, do Parágrafo único, do

art. 16, tornar-se-ia letra morta, afinal, possuir arma de fogo

de uso proibido ou restrito, já justifica aplicação de pena de

reclusão de 3 a 6 anos e multa e, as mesmas penas seriam

aplicadas se a arma possuída tiver numeração, marca ou

qualquer outro sinal de identificação raspado, suprimido ou

adulterado.

Ou se aplica o quanto previsto no inc. IV, do

Parágrafo único, também a arma de uso permitido, ou a

aplicação seria única e exclusivamente, quanto a arma de uso

proibido ou restrito, do quanto previsto no caput, do art. 16.

É a linha de pensamento traduzida por

FERNANDO CAPEZ, como delineado nos Votos dos vv.

acórdãos a seguir transcritos.

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Sobre o tema o Egrégio Tribunal de Justiça do

Estado de Minas Gerais assim já se pronunciou:

“APELAÇÃO - Porte ilegal ARMA de fogo com numeração RASPADA - Art. 16, parágrafo único, inc. IV, da Lei 10.826/03 - ARMA de USO PERMITIDO - Irrelevância . O simples porte da ARMA de fogo, com a numeração suprimida, configura o delito do art. 16, parágrafo único, da Lei 10.826/03, sendo irrelevante se a ARMA é de USO PERMITIDO ou proibido . Recurso conhecido e desprovido.” (grifamos)(Apelação Criminal n° 1.0024.04.255026-9/001 – Comarca de Belo Horizonte – Apelante: FLAVIO PEREIRA LIMA – Apelado: MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADO MINAS GERAIS – Rel. Des. GUDESTEU BIBER)

O v. acórdão foi assim redigido:

“ACÓRDÃO

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Vistos etc., acorda, em Turma, a 1ª CÂMARA CRIMINAL - UG do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, EM NEGAR PROVIMENTO, À UNANIMIDADE.

Belo Horizonte, 18 de outubro de 2005.

(a) DES. GUDESTEU BIBER – Relator”

Consta do respectivo Voto:

“O SR. DES. GUDESTEU BIBER:

VOTO

FLÁVIO PEREIRA LIMA, já qualificado, foi condenado como incurso nas sanções do art. 16, parágrafo único inciso IV da Lei nº 10.826/03, apenado com 03 (três) anos de reclusão, em regime aberto, e 20 (vinte) dias-multa, substituída a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direito, consistentes em prestação de serviços à comunidade pelo período de três anos, e restrições de finais de semana pelo mesmo período, porque no dia 25 de janeiro de 2004, por volta das 22:30 horas, durante uma ‘blitz’ policial, o

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mesmo portava um revólver marca Taurus, calibre 38, de USO PERMITIDO, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar, sendo que a mesma ainda encontrava-se com numeração suprimida, além de 15 (quinze) cartuchos intactos e um cartucho picotado e não deflagrado.

Irresignado, apela, pedindo a desclassificação do art. 16, parágrafo único inciso IV da Lei nº 10.826/03 para o art. 14 da mesma Lei, vez que a ARMA é de USO PERMITIDO e que não estava com a numeração RASPADA. Alega, ainda, que não utilizou a ARMA de fogo (fls. 151/153).

Em contra-razões recursais, o representante ministerial se bate pelo improvimento do recurso (fls. 155/160). No mesmo sentido é o entendimento da douta Procuradoria de Justiça, através do parecer da lavra do ilustre Procurador Ronaldo César de Faria (fls.165/168).

É, em síntese, o relatório.

Conheço do recurso, próprio, tempestivo e regularmente processado.

No caso em testilha, inexiste qualquer dúvida de que o ora apelante portava a ARMA apreendida, no interior do seu veículo, sendo, inclusive, confessado por ele (fls. 52/54).

A materialidade delitiva encontra-se positivada pelo auto de apreensão de fl.17 e laudo de eficiência da ARMA, à fl.102, demonstrando tratar-se de ARMA de fogo com

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numeração RASPADA, capaz de ofender a integridade física de alguém.

Ao contrário do que alega a defesa, o laudo foi bastante preciso ao atestar que o revólver apreendido encontrava-se ‘sem marca e número de série aparentes’. Logo se não estavam aparentes, ocorreu a supressão do número de ARMA. Tal conclusão é bastante óbvia, não merecendo maiores indagações.

Ademais, o próprio apelante declarou que a sua ARMA estava com numeração RASPADA, sendo irrelevante a autoria da raspagem parte do acusado (fls. 52/54).

Improsperável o pedido de desclassificação do delito para o previsto no art. 14 da Lei 10.826/2003, sob a alegação da ARMA apreendida ser de USO PERMITIDO.

Ora, tal alegação, também, é de simples desate.

O fato da ARMA ser de USO PERMITIDO não afasta a tipicidade do delito pelo qual ele foi condenado, vez que o simples fato da ARMA encontrar-se com a numeração suprimida, já configura o crime em tela. Irrelevante ser de USO PERMITIDO , pois a ARMA com numeração RASPADA é de USO proibido . (grifamos)

Conforme os ensinamentos de Fernando Capez, lembrado pelo ‘Parquet’:

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‘O legislador dispôs no parágrafo único do art. 16 diversas condutas típicas, as quais recebem o idêntico tratamento penal dispensado à posse ou ao porte ilegal de ARMA de fogo. Convêm notar que, embora as figuras do parágrafo único em estudo constem do art. 16, isso não quer dizer que o objeto material se restrinja às armas de fogo, aos acessórios ou às munições de USO restrito. Na realidade, tais figuras foram equiparadas à posse ou porte ilegal de ARMA de fogo de USO restrito apenas para efeitos de incidência da mesma sanção penal. Assim, admite-se, por exemplo, que na conduta prevista no inciso I (supressão ou alteração de identificação de ARMA de fogo ou artefato), o objeto material seja a ARMA de fogo de USO PERMITIDO.’ (Estatuto do Desarmamento, Comentários à Lei nº. 10.826, de 22-12-2003, São Paulo, Saraiva, 2005, p. 128)

Por fim, à alegação de inexistência de provas de que o acusado teria utilizado a referida ARMA, mais uma vez, é de toda descabida. Desnecessário tal prova nesse sentido, basta que a ARMA possua eficiência, conforme comprovado no laudo pericial, podendo vir a ser utilizada para ofender a integridade física de alguém.

Destarte, a r. sentença hostilizada merece ser mantida.  

Isto posto, acolhendo o parecer da douta Procuradoria de Justiça, NEGO PROVIMENTO ao recurso.

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Custas, na forma da lei.

Votaram de acordo com o(a) Relator(a) os Desembargador(es): EDELBERTO SANTIAGO e MÁRCIA MILANEZ.

SÚMULA :      À UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO.

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 1.0024.04.255026-9/001”

_______________________________________________________________________

“APELAÇÃO CRIMINAL - PORTE DE ARMA DE FOGO COM NUMERAÇÃO RASPADA - ART. 16, PARÁGRAFO ÚNICO, INC. IV, DA LEI 10.826/03 - AUTORIA E MATERIALIDADE SUFICIENTEMENTE DEMONSTRADAS - DESCLASSIFICAÇÃO DA CONDUTA PARA A DO ART. 14 DA LEI 10.826/03 - IMPOSSIBILIDADE - ARMA DE USO PERMITIDO -

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IRRELEVÂNCIA - CONDENAÇÃO MANTIDA - Para a configuração do delito previsto no art. 16, parágrafo único, inciso IV, da Lei 10.826/03, basta o simples porte da ARMA de fogo, com a numeração suprimida, sendo irrelevante que a ARMA seja de USO PERMITIDO . PENA - SUBSTITUIÇÃO DA CORPORAL POR DUAS RESTRITIVAS DE DIREITOS - PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA - CRITÉRIOS PARA SUA FIXAÇÃO - Satisfeitos os requisitos objetivos e subjetivos para a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos consistente em prestação pecuniária, na fixação do "quantum" deverá o julgador guardar equivalência com a situação econômica do réu, observados os limites estabelecidos pelo art. 45, §1º, do Código Penal. - Recurso conhecido e parcialmente provido.” (grifamos)(Apelação Criminal n° 1.0479.05.098240-0/001 – Comarca de Passos – Apelante: EDNALDO DA SILVA MELO - Apelado: MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADO MINAS GERAIS – Rel. DESª. MÁRCIA MILANEZ)O v. acórdão foi assim redigido:

“ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 1ª CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, EM DAR PROVIMENTO PARCIAL, À UNANIMIDADE.

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Belo Horizonte, 21 de novembro de 2006.

(a) DESª. MÁRCIA MILANEZ – Relatora”

Consta do respectivo Voto:

“A SRª. DESª. MÁRCIA MILANEZ:

VOTO

EDNALDO DA SILVA MELO, qualificado nos autos, foi denunciado pela prática delitiva tipificada no art. 16, parágrafo único, inciso IV, da Lei 10.826/2003.

Consta da inicial acusatória (fls. 02/03) que, na madrugada de 05 de agosto de 2005, por volta das 04h24min, na Avenida Juca Stockler, nº 515, Bairro Belo Horizonte, Comarca de Passos, o denunciado foi surpreendido por policiais militares portando um revólver marca "HO", calibre 32, com numeração RASPADA, sem autorização e em desacordo com a determinação legal ou regulamentar.

Após regular instrução, o d. Sentenciante julgou procedente a ação penal, condenando o denunciado nos termos da exordial, impondo-lhe a pena de 03 (três) anos de reclusão, em regime aberto, e o pagamento de 10 (dez) dias-

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multa, substituindo a corporal por duas penas restritivas de direitos, de prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária de 02 salários mínimos, em favor de entidade pública denominada de Fundo da Infância e Adolescência do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente sediada na Comarca. (fls. 65/71).

Irresignado, apelou o sentenciado (fls. 77). Nas razões, apresentadas às fls. 78/82, requer a defesa a reforma da sentença para que seja o acusado absolvido da imputação. Argumenta, em síntese, que é injusta a condenação proferida, uma vez que o apelante, pessoa honesta e trabalhadora, pretendia tão-somente entregar a ARMA encontrada às autoridades, na chamada campanha do desarmamento. Alternativamente, requer a desclassificação da infração para a do art. 14 da lei 10.826/03, sustentando que a ARMA não é de USO restrito. Ainda como pedido alternativo, busca a redução da prestação pecuniária e seu parcelamento, afirmando que o sentenciado está desempregado e não tem condições de quitar a pena imposta.

Nas contra-razões recursais, o Órgão Ministerial manifesta-se pelo conhecimento e desprovimento do apelo (fls. 83/87), opinando, no mesmo sentido, nesta instância, a douta Procuradoria-Geral de Justiça, através do parecer de fls. 92/93.

É, em síntese, o relatório.

Conheço da apelação, presentes os requisitos objetivos e subjetivos de admissibilidade.

Compilação: Perseu Gentil Negrão 26

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Inexistentes quaisquer preliminares suscitadas ou nulidades argüíveis de ofício, passo ao exame do mérito.

Consta dos autos que, na madrugada de 05 de agosto de 2005, o acusado foi flagrado por policiais militares portando uma ARMA de fogo, marca ‘HO’, calibre 32, com numeração RASPADA.

Pelo que se apurou, os policiais foram acionados para atender à ocorrência de um suposto furto. Dirigiram-se ao local denominado ‘Padaria Nutrimais’, situado na Avenida Juca Stockler, nº 515, na Comarca de Passos, e assim que chegaram, perceberam a apreensão do acusado, pelo que resolveram submetê-lo à busca pessoal, encontrando, na sua cintura, a ARMA referida.

A materialidade está devidamente comprovada através do auto de apreensão de fls. 13, bem como pelo laudo pericial de eficiência de fls. 21/22.

A autoria delitiva também não consente dúvidas e está satisfatoriamente provada pela confissão do apelante, tanto na fase do inquérito (fl. 08), quanto em juízo (fl. 36/37), bem como pelos depoimentos prestados pelo policial Alex Sandro dos Reis (fl. 05 e 52), que contou, em juízo, o seguinte:

‘(...) Que o depoente foi atender a uma ocorrência de difamação envolvendo um dos funcionários da panificadora Nutri Mais; Que lá chegando ao olhar

Compilação: Perseu Gentil Negrão 27

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para o denunciado, este se assustou e tentou esconder algo; Que o depoente achou que ele estivesse com alguma coisa na cintura, pelo que resolveu abordá-lo; Que ao abordá-lo localizou uma ARMA na cintura do denunciado; Que trata de um revólver calibre 32; Que a ARMA estava municiada; ... Que os fatos aconteceram por volta das quatro horas da madrugada;...’. (sic)

As declarações prestadas pelo condutor do flagrante irradiam autenticidade e verossimilhança e foram corroboradas pelos depoimentos das testemunhas Donário Divino de Assis Reis (fl. 53) e Emerson Reis Januário (fls. 54), que estavam presentes no momento da prisão do réu e que foram ouvidos em juízo, sob o crivo do contraditório e mediante advertência e compromisso legal, sem qualquer oposição da defesa, oportunidade em que confirmaram expressa e inteiramente a narrativa apresentada na fase inquisitória.

Portanto, o conjunto probatório mostrou-se suficiente à comprovação da autoria delitiva, não lhe socorrendo o fato de ser honesto, trabalhador e de boa conduta.

Por outro lado, não é crível que o apelante iria entregar a ARMA às autoridades, pois a portava na via pública, em plena madrugada, circunstância que, a meu sentir, deixa claro que não tinha ele intenção alguma de colaborar com a chamada campanha do desarmamento.

Compilação: Perseu Gentil Negrão 28

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De qualquer forma, o prazo para entrega voluntária das armas, previsto pelo Estatuto, não lhe conferia o direito provisório ao porte ilegal de armas de fogo, ainda mais com numeração RASPADA, como ocorreu na presente hipótese. Ademais, medida provisória não pode legislar sobre direito penal e, a entender como quer o apelante, todo e qualquer cidadão poderia portar na cintura uma ARMA de fogo carregada, enquanto durasse o prazo, que se encerrou no dia 23 de outubro de 2005.

A propósito, trago à colação a decisão do c. Superior Tribunal de Justiça:

‘'HABEAS CORPUS'. PORTE DE ARMA. LEI ANTERIOR. CONFLITO. ESTATUTO DO DESARMAMENTO. PRETENSÃO DE 'ABOLITIO CRIMINIS'. INOCORRÊNCIA. FATO TÍPICO. AUMENTO DE PENA. REINCIDÊNCIA. RETROATIVIDADE. IMPOSSIBILIDADE. O fato de a Lei n.º 10.826/03 (Estatuto do Desarmamento) prever a possibilidade de o cidadão entregar a ARMA ao poder público não autoriza pressupor a existência de 'abolitio criminis', sobretudo quando o agente foi colhido em situação totalmente diversa da previsão legal e a sua intenção não era a de cumprir o sentido do benefício legal. Sendo a lei nova mais gravosa, não pode retroagir para regular o fato pretérito. Ordem denegada’ (STJ - HC 41620/MG - 5ª Turma - Rel. Min. JOSÉ ARNALDO DA FONSECA - DJ 11.04.2005 p. 352).

Compilação: Perseu Gentil Negrão 29

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Quanto à tese do apelante, no sentido de que a conduta deve ser desclassificada para a do art. 14 da Lei 10.826/03, não merece prosperar.

Dispõe o art. 16 do mencionado diploma:

‘Art. 16. Possuir, deter, portar, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob sua guarda ou ocultar ARMA de fogo, acessório ou munição de USO proibido ou restrito, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar:

Pena - reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa

Parágrafo único. Nas mesmas penas incorre quem:

.... IV - portar, possuir, adquirir, transportar ou

fornecer ARMA de fogo com numeração, marca ou qualquer outro sinal de identificação raspado, suprimido ou adulterado;’.

Da leitura do dispositivo legal em exame, conclui-se que é irrelevante que a ARMA apreendida seja de USO PERMITIDO , pois o que se proíbe é o porte da ARMA com numeração RASPADA . (grifamos)

Segundo leciona Fernando Capez:

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‘O legislador dispôs no parágrafo único do art. 16 diversas condutas típicas, as quais recebem o idêntico tratamento penal dispensado à posse ou ao porte ilegal de ARMAde fogo. Convém notar que, embora as figuras do parágrafo único em estudo constem do art. 16, isso não quer dizer que o objeto material se restrinja às armas de fogo, aos acessórios ou às munições de USO restrito. Na realidade, tais figuras foram equiparadas à posse ou porte ilegal de ARMA de fogo de USO

restrito apenas para efeitos de incidência da mesma sanção penal. Assim, admite-se, por exemplo, que na conduta prevista no inciso I (supressão ou alteração de identificação de ARMA de fogo ou artefato), o objeto material seja a ARMA de fogo de USO PERMITIDO" (Estatuto do Desarmamento, Comentários à Lei nº. 10.826, de 22-12-2003, São Paulo, Saraiva, 2005, p. 128).

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Assim, o simples porte da ARMA que tenha a numeração RASPADA configura o inciso IV do parágrafo único do art. 16 da Lei 10.826/03, pelo que impossível a desclassificação pretendida. (grifamos)

Este entendimento é pacífico nesta Corte, consoante julgado abaixo transcrito:

‘APELAÇÃO - Porte ilegal ARMA de fogo com numeração RASPADA - Art. 16, parágrafo único, inc. IV, da Lei 10.826/03 - ARMA de USO PERMITIDO - Irrelevância. O simples porte da ARMA de fogo, com a numeração suprimida, configura o delito do art. 16, parágrafo único, da Lei 10.826/03, sendo irrelevante se a ARMA é de USO PERMITIDO ou proibido. Recurso conhecido e desprovido.’ (Apelação nº 1.0024.04.255026-9/001, Desembargador Gudesteu Biber, pub. 26/10/2005).

Quanto à pena, um pequeno reparo merece a r. decisão

recorrida.

Embora o MM. Juiz tenha observado atentamente os critérios dos arts. 59 e 68 do Código Penal na fixação da corporal, estabelecendo a básica no mínimo legal, ao substituí-la por duas restritivas de direitos, a teor do que dispõe o §2º do

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art. 44 do mesmo diploma, exagerou na prestação pecuniária, fixando-a em 02 salários mínimos.

Conforme salienta Celso Delmanto (‘Código Penal Comentado’, 5ª ed. atualizada, pág. 86) ‘a prestação pecuniária tem natureza penal e seu valor será fixado pelo juiz entre 01 (um) e 360 (trezentos e sessenta) salários mínimos; em caso de condenação em ação de reparação civil, o valor pago como prestação pecuniária será reduzido desde que coincidentes os beneficiários. Quanto ao critério de fixação do seu valor, há duas posições; a) - deve ser suficiente para a prevenção e reprovação do delito, levando-se em consideração a situação econômica do condenado e a extensão dos danos sofridos pela vítima (Luiz Flávio Gomes, Penas e Medidas Alternativas à Prisão, ed. RT 1999, p. 132); b) - deve ser considerado o valor do prejuízo da vítima, em face da natureza reparatória da prestação pecuniária (Damásio E. Jesus, ob cit. p. 139). Entendemos mais acertada a primeira posição’.

No caso específico, com a devida vênia, houve uma flagrante desproporcionalidade na substituição da pena. Por considerar favoráveis ao réu as circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal, o ilustre Sentenciante fixou a pena privativa de liberdade no mínimo legal de três anos de reclusão. Contudo, ao proceder à substituição da pena corporal, desconsiderou o critério anterior para estabelecer o valor da prestação pecuniária, fixando-a no dobro do mínimo legal.

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Acentue-se, ainda, a existência de certa equivalência de critérios entre a fixação da pena de multa e a pena substitutiva de prestação pecuniária, porquanto dispõe o art. 60 do Código Penal ‘que na fixação da pena de multa o juiz deve atender, principalmente, à situação econômica do réu’.

Na hipótese, os autos noticiam ser o apelante um indivíduo de parcos recursos, para quem seria difícil saldar o pagamento de dois salários mínimos, que hoje representam R$700,00 (setecentos reais).

ISTO POSTO, pedindo vênia ao douto Procurador de Justiça, dou parcial provimento ao recurso para reduzir o valor da prestação pecuniária para um salário mínimo, mantendo, quanto ao mais, a r. sentença recorrida.

Custas, ‘ex lege’.

Votaram de acordo com o(a) Relator(a) os Desembargador(es): EDUARDO BRUM e EDELBERTO SANTIAGO.

SÚMULA: À UNANIMIDADE, DERAM PROVIMENTO PARCIAL.”

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Diante desse quadro, torna-se evidente que o v.

acórdão recorrido não deu a interpretação correta ao art. 16,

Parágrafo único, IV, do Estatuto do Desarmamento,

contrariando ou mesmo negando vigência a essa lei federal.3. DO PEDIDO.

Ante o exposto, demonstrado fundamentadamente a contrariedade ou negativa de vigência ao art. 16, Parágrafo único, IV, do Estatuto do Desarmamento aguarda o Recorrente seja DEFERIDO o processamento do presente RECURSO ESPECIAL

por essa Egrégia Presidência, bem como seja oportunamente CONHECIDO e PROVIDO pelo Colendo SUPERIOR TRIBUNAL DE Compilação: Perseu Gentil Negrão 35

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JUSTIÇA, para, cassando o v. acórdão impugnado, restabelecer a condenação do Recorrido às penas de 03 anos de reclusão, em regime inicial aberto, e 10 dias-multa, no valor diário mínimo, mesmo considerando crime único.

São Paulo, 02 de maio de 2007.

= LUIZ ANTONIO CARDOSO =

Procurador de Justiça

Índices

Ementas – ordem alfabética

Ementas – ordem numérica

Índice do “CD”

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