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1 JEFERSON MOREIRA DE CARVALHO A SUPREMACIA (IN) CONSTITUCIONAL DOS PODERES DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA E A TEORIA DA SEPARAÇÃO DOS PODERES. DIREITO.PONTÍFICIA UNIVERSIDADE CATÓLICA.PUC/SP.SÃO PAULO 2005.

A SUPREMACIA (IN) CONSTITUCIONAL DOS PODERES DO … MOREIRA... · conforme a idéia de Montesquieu, prevendo a existência dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, independentes

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JEFERSON MOREIRA DE CARVALHO

A SUPREMACIA (IN) CONSTITUCIONAL DOS PODERES DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA E A TEORIA DA SEPARAÇÃO DOS PODERES.

DIREITO.PONTÍFICIA UNIVERSIDADE CATÓLICA.PUC/SP.SÃO PAULO 2005.

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JEFERSON MOREIRA DE CARVALHO

A SUPREMACIA (IN) CONSTITUCIONAL DOS PODERES DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA E A TEORIA DA SEPARAÇÃO DOS PODERES.

DIREITO. PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA. PUC/SP. SÃO PAULO 2005. Tese apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Doutor em Direito, área Direito do Estado, sob a orientação da Professora Doutora Maria Garcia.

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A SUPREMACIA (IN) CONSTITUCIONAL DOS PODERES DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA E A TEORIA DA SEPARAÇÃO DOS PODERES.

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Dedico este trabalho ao Professor Doutor CELSO BASTOS,in memoriam,

reconhecendo sua inigualável defesa da Constituição Federal e pelo

agradecimento aos seus ensinamentos. Também dedico a Professora MARIA

GARCIA, que mesmo com sua cultura invejável mantém simplicidade de

comportamento e por isto a todos encanta. Devo também registrar sua

disponibilidade para transmitir conhecimentos e o respeito que dispensa aos seus

alunos.Muito obrigado!

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RESUMO O objetivo da tese que segue, é mostrar que mesmo tendo a Constituição Federal adotado a Teoria da Tripartição dos Poderes, conforme a idéia de Montesquieu, prevendo a existência dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, independentes e harmônicos, mas com certo tipo de controle de um para com o outro, com o fim de impedir a concentração de poderes em uma só pessoa ou um só órgão, de fato, a própria Constituição ao prever os poderes do Presidente da República permite que ele interfira nos demais Poderes, portanto, o posiciona em plano se supremacia em relação ao Legislativo e o Judiciário. Justifica-se o estudo diante da história do Brasil, em que se percebe que o Presidente da República, usando os poderes constitucionais que lhe são conferidos, legisla mais que o Poder Legislativo nomeia membros para Tribunal de Contas, que é órgão auxiliar do Legislativo com a função de fiscalizar as contas do Presidente.No tocante ao Poder Judiciário a história mostra a nomeação de integrantes dos Tribunais, de pessoas oriundas de partidos políticos, fato que não se admite no Poder Judiciário que não pode ter compromissos com ideologias partidárias. Ainda, a criação de um órgão de controle externo do Poder Judiciário o coloca em posição de inferioridade em relação aos demais Poderes, que não sofrem este tipo de controle, reconhecendo mais uma vez a interferência do Presidente da República que nomeia os integrantes do órgão de controle externo. Não se impõe o afastamento do presidencialismo, mais que esta forma de governo não permita o absolutismo presidencial. Partindo-se de teoria de Montesquieu e fazendo uma leitura da Constituição Federal chega-se à conclusão da necessidade de alterações no texto Constitucional para o fim de afastar a supremacia dos poderes do Presidente da República e posicionar os Três Poderes do Estado em um mesmo patamar constitucional, considerando-se que a experiência e a história mostram que as forças reais e vivas de poder que constituem o Estado Brasileiro não aceitam a concentração de poderes em uma só pessoa ou um só organismo.

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ABSTRACT

The purpose of the following thesis is to show that even the Federal Constitution had adopted the Theory of power’s division, as according to the idea of Montesquieu, foreseeing the existence of the Executive, Legislative and Judiciary, independents and harmonics, although with an certain control of each other to prevent the concentration of powers in only one person or only one organ, in fact the Constitution itself by preventing the power of the President allows him that he interferes on others powers, therefore, puts him in supremacy related to the Legislative and to the Judiciary. The study in front of the history in Brazil justifies itself, where is noted the

President, using the constitutionals powers that are given to him, legislates more than

the Legislative name members to the Audit Court, which is Legislative´s aid organ

with the function of inspect the President’s accounts. What is respected to the

Judiciary, the history shows the nomination of integrants of the Courts, who are

derived from political parties, fact that is not accepted by the Judiciary that members

have compromises with ideologies from a political party. Therefore, the creation of an

organ with outer control of the Judiciary, puts him in a lower position in relation to the

others powers, which not suffer this kind of control, once more recognizing the

interference of the President that name the members of the outer control.

Withdraw the presidential is not impose, also this form of government do not

allow the absolutism presidential.

Basing on Montesquieu´s theory and reading the Constitution there is the

conclusion of the necessity in modifications on the Constitutional Text in order to

repel the supremacy of powers from the president and locate the Three Powers of

the State on the same constitutional level, considering that the experience and the

history show that the real and alive forces of powers that constitutes the Brazilian

State do not accept the concentration of powers in only one person or only one

organism.

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SUMÁRIO

CAPITULO I. A CONSTITUIÇÃO E OS PODERES DO ESTADO . 1

1.1. Sociedade. 1

1.2. Estado. 6

1.3.Constituição. 11

1.3.1. Constitucionalismo e divisão de Poderes na visão de Canotilho. 16

1.4. Poderes do Estado. 18

CAPITULO II.

MONTESQUIEU E A TEORIA DA TRIPARTIÇÃO DOS PODERES. 28

2.1. Antecedentes a Montesquieu. 28

2.2. Tripartição das funções estatais. 35

2.3. A titularidade do exercício das funções. 47

2.3.1. Poder Legislativo. 48

2.3.2. Poder Executivo. 50

2.3.3. Poder Judiciário. 52

2.3.3.1. Órgãos do Poder Judiciário. 55

CAPITULO III. AS FUNÇÕES ESTATAIS NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS. 59

3.1. Constituição de 25 de março de 1.824. 59

3.2. Constituição de 24 de fevereiro de 1.891. 63

3.2.1. Emendas de 1926. 65

3.3. Constituição de 16 de julho de 1.934. 66

3.4. Constituição de 10 de novembro de 1.937. 70

3.5. Constituição de 18 de setembro de 1.946. 74

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3.6. Constituição de 24 de janeiro de 1.967. 78

3.7. Constituição de 05 de outubro de 1.988. 82

CAPITULO IV- DO PODER EXECUTIVO-

PARLAMENTARISMO/PRESIDENCIALISMO 89

4.1.Parlamentarismo. 90

4.2. Parlamentarismo racionalizado. 99

4.2.1. Vantagens do regime. 100

4.3. Presidencialismo. 102

4.3.1. O absolutismo presidencial. 106

4.3.2. Vantagens do regime. 109

CAPÍTULO V.

FUNÇÕES ATÍPICAS DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA. 111

5.1.Medidas Provisórias. 113

5.2.Leis Delegadas. 120

5.3.Nomeação ao Tribunal de Contas. 123

5.4.Nomeação ao Poder Judiciário. 126

5.4.1. Nomeação para o Supremo Tribunal Federal. 131

5.4.2. Nomeações para os Tribunais Superiores. 133

5.4.2.1. Outras nomeações para o Poder Judiciário. 136

5.5.Poder sobre os Poderes. 138

CAPÍTULO VI.

CONTROLE EXTERNO DOS PODERES DA REPÚBLICA. 141

6.1. Controle externo do Poder Judiciário. 142

6.1.1. Inconstitucionalidade da Emenda 45/2004. 148

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6.1.2. Conselho Nacional de Justiça. 153

6.2. Conselho Nacional do Legislativo. 156

6.3. Conselho Nacional do Executivo. 158

CAPÍTULO VII.

O EQUILÍBRIO DO PODER E A SOBERANIA POPULAR. 160

7.1.Extinção ou modificação das Medidas Provisórias. 163

7.2.Extinção ou modificação das Leis Delegadas. 165

7.3.Outro método de nomeação ao Tribunal de Contas. 166

7.4.Outro método de nomeação ao Poder Judiciário. 169

CAPÍTULO VIII. PROPOSTA DE ALTERAÇÃO CONSTITUCIONAL COM O FIM DE MANTER O

EQUILIBRIO ENTRE OS PODERES. 176

CONCLUSÕES. 186

BIBLIOGRAFIA. 189

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CAPITULO I

A CONSTITUIÇÃO E OS PODERES DO ESTADO.

Os estudiosos das mais diversas áreas das ciências há muito

tempo afirmam que o homem, além da necessidade de viver em sociedade,

também exige que esta sociedade seja organizada, a fim de que os direitos sejam

preservados e os deveres sejam cumpridos.

Qualquer estudo destinado a conhecer a Constituição do

Estado ou de seus Poderes se faz necessário partir do próprio Estado para que se

compreenda o funcionamento do sistema estatal e sua finalidade destinada ao

bem estar de seu povo.

1.1. Sociedade.

Antes do aparecimento do Estado, surgiu na vida humana, da

mesma forma que na vida dos outros animais, a sociedade, que deve ser

entendida como um agrupamento de pessoas que por idéias comuns acabaram se

unindo.

O ser humano, de início, vive no seio de sua família e, a partir

daí e dos anos, vai vivendo em outros grupos e por conseqüência em sociedade

e, portanto no Estado. O que nos interessa é a sociedade em que o ser humano

desenvolve seus vários papéis sociais, e fixando seu modo e de seus

semelhantes, fundam aquilo que é jurídico, a organização estatal.

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Sobre a sociabilidade do homem, CELSO BASTOS ensinou

que: “É um truísmo afirmar-se que o homem é um animal social. Com efeito, tem

sido esta sua situação em todos os tempos, a de viver em sociedade. Quer nos

parecer que nunca será possível identificar uma razão específica para a formação

da sociedade. Ela se confunde com o próprio evoluir do homem, perdendo-se,

portanto, nas origens da própria espécie humana.”1 Ensinou ainda que além da

responsabilidade pela sobrevivência individual surgiu a responsabilidade pela

solução dos problemas do grupo social, uma função voltada aos interesses da

coletividade, com problemas transpessoais, coletivos. Trata-se do aparecimento

político.

O evoluir do homem confunde-se com a formação da

sociedade. A mais antiga das sociedades, a única natural é a família, conforme

pensamento de ROUSSEAU: La plus ancienne de toutes les sociétés et la seule

naturelle est celle de famille.

La famille est donc si l´on veut le premier modèle des

sociétés politiques; le chef est l´image du père, le peuple est l´image des enfants,

et tous étant nés égaux et libres n´aliènent leur liberte que pour leur utilité.2

Sociedade é o conjunto de grupos fragmentários, de

“sociedades parciais”, em que, do conflito de interesses reinantes, só se pode

recolher a vontade de todos (volonté de tous).”, conforme mostra PAULO

BONAVIDES afirmado que “a sociedade vem primeiro; o Estado, depois. A

sociedade é algo interposto entre indivíduo e o Estado, é a realidade

intermediária, mais larga e extensa, superior ao Estado, porém inferior ainda ao

indivíduo, como medida de valor”.3

A sociedade assim é um instituto extremamente antigo que se

confunde com a evolução do homem. A sociedade mais antiga e a única natural,

modelo de sociedade política; é a família.

Ao nascer o ser humano integra-se em uma família sem sua

escolha. Trata-se de uma sociedade porque se deve obedecer a volontés de tous

posto que todos apresentam os mesmos objetivos e traçam a mesma trajetória.

1 BASTOS, Celso Ribeiro - Curso de Direito Constitucional, p. 3. 2 ROUSSEAU, Jean-Jacques- Du contrat social, p.46 – (Tradução livre do autor: “A mais antiga de todas as sociedades e a única natural é a família. A família é onde se vê o primeiro modelo de sociedade política; o chefe é a imagem do pai, o povo é a imagem dos filhos e todos nasceram iguais e livres não alienando a liberdade por sua utilidade”).

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Existe uma ordem de comando e os esforços são conjugados para a finalidade

comum.

Esta sociedade natural e as outras “sociedades parciais”

formam a Sociedade que é o conjunto de grupos fragmentários, apresentando-se

como um liame entre indivíduo e Estado, porque, representando interesses do

grupo, projeta-se no Estado para ocupar um espaço determinado e atingir a

finalidade comum.

Interessante perceber que a família é sociedade natural

porque se institui e se constitui de maneira diferente das outras.

A sociedade familiar nasce pelos sentimentos das pessoas

que lhe dão início, pela necessidade de procriação, pelo instinto e inúmeros outros

motivos, mas como os outros grupos, formados por interesses de defesa de

direitos ou para conquista, apresentam ao final a mesma finalidade, ou seja, o

bem estar de seus integrantes. Mesmo com a diferença para a formação o

comportamento é idêntico, porque ao final todas as “sociedades parciais” se unem

e aparecem para o Estado como um espelho, refletindo a vontade de seus

integrantes, e mais do que este reflexo, a sociedade impõe e exige o acatamento

da vontade de todos.

Como um todo, a sociedade apresenta-se perante o Estado

voltada aos interesses da coletividade, à resolução dos problemas que

transcendem o de seus integrantes considerados individualmente.

O interesse está voltado para a solução dos problemas

transpessoais, isto é, dos problemas coletivos.

Cada grupo fragmentário se une por interesses que lhes são

próprios, entretanto existem interesses que são próprios para todos os grupos, por

mais distintos que sejam, na formação, nos objetivos, no comportamento, na

trajetória, etc. O interesse de respeito aos princípios, aos direitos às conquistas

são de todos os grupos. Assim, o interesse da sociedade é um só para todos seus

integrantes.

Para cada sociedade formada, os interesses que brotam da

união dos grupos fragmentários e que se transformam em princípios e direitos são

interesses de todos, independente da vontade individual. Por isso esta sociedade

3 BONAVIDES, Paulo - Ciência Política, pp. 28/29.

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deve refletir e lutar para conquista, exercício e respeito aos seus princípios e seus

direitos.

Deste contexto resta verificar o que é a sociedade

doutrinariamente.

Sabe-se que vários filósofos estudaram a questão e várias

teorias e pensamentos surgiram. Entre as doutrinas temos do organicismo social e

as voluntaristas, como se verifica na obra de BENJAMIM DE OLIVEIRA FILHO,

nos termos que segue4.

Aceitando-se a teoria do organicismo social deve-se verificar

muitas questões e entender que a sociedade seria um organismo,um ser

vivo,verdadeira individualidade fisiológica, mas não de simples hipótese, de

imagem ou comparação ou analogia; trata-se de autêntica realidade. A sociedade

é um animal cujas células são os indivíduos.

O grupo não vive senão por seus membros em seus membros,

por conseqüência não pode viver senão para seus membros; portanto a questão

de saber se o indivíduo vive para a sociedade ou se a sociedade para o indivíduo,

pode-se responder que um vive para o outro, porque se a vida dos membros é

positiva a sociedade também é. Se a vida da sociedade for positiva a vida de cada

membro também será.

Se o indivíduo é sociedade enquanto tende para a sociedade,

enquanto a sociedade existe virtual e concretamente nele, enquanto ela constitui

seu meio próprio e natural, enquanto não pode existir indivíduo fora e

independente da sociedade, e como a sociedade não tem existência concreta

senão nos indivíduos que a compõem, os que possuem verdadeira personalidade,

dotados de consciência e vontade, pode-se concluir que indivíduo e a sociedade

existem concomitantemente, um para o outro.

Ao mesmo tempo porque o indivíduo surge na sociedade

natural, a família, e vive para a sociedade porque tende naturalmente para ela e a

sociedade vive para ele porque só o indivíduo tem a verdadeira personalidade.

Enfim, a sociedade corresponde a um organismo que

imprescinde de todos os seus integrantes, cada qual desenvolvendo seu papel

social para o bem estar de toda a sociedade. Do outro lado tem-se que o indivíduo

4 OLIVEIRA Fº, Benjamim - Introdução à Ciência do Direito, pp. 15/23.

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também necessita da sociedade, porque sua vida só se realiza se desenvolvida no

interior do grande grupo social.

Seguramente, pode-se pensar na existência de uma simbiose

entre sociedade e cada um de seus integrantes.

Para as teorias voluntaristas, a formação da sociedade deu-se

por processos meramente contratuais, tácitos ou expressos, tendo a natureza

humana como a causa primeira, todavia o assentimento do homem seria a causa

imediata. Também se coloca o contrato nas origens da sociedade, quando sua

formação se processou na noite impenetrável dos tempos, devendo-se antes

admitir a existência de um contrato, tácito ou expresso, mas incessantemente

renovado, entre os membros de determinada sociedade, pois a sociedade não

subsiste, de fato, senão pelo acordo constante de todos os seus membros.

ROUSSEAU, ao tratar do pacto social, mostra com clareza o

acordo constante de seus membros na defesa de interesses comuns, quando

afirmou que: “Or comme les hommes ne peuvent engendrer de nouvelles forces,

mais seulement unir et dirigir celles qui existent, ils n´ont plus d´autre moyen pour

se conserver, que de former par agrégation une somme de forces que puissu

l´emporter sur la resistance, de les mettre em jeu par um seul mobile et de les faire

agir de concert. Cette somme de forces ne peut naître que du concours de

plusieurs: mais la force et la liberté de chaque homme étant les premiers

instruments de sa conservation, comment les engagera-t-il sans se nuire, et sans

négliger les soins qu´il se doit? Cette dificulté ramenée à mon sujet peut

s`énoncer em ces termes. “ Trouve une forme d´association qui défend et protège

de toute la force commune la personne et les biens de chaque associé, et par

laquele chacun s`unissant à tous n´ obéisse pourtant qu` à lui-même et reste aussi

libre qu`auparavant?””5

Por fim, o que importa é que a sociedade existiu, existe e

existirá, talvez de outra forma, e que seus integrantes, por um assentimento tácito

ou expresso, estão juntos neste organismo vivo e real que atua para os seus

5 Op.cit. pp. 55/56 (Tradução livre do autor: “Então como os homens não podem engendrar novas forças, mas somente unir e dirigir as que existem, eles não têm outro meio de se conservar, senão que formar pela agregação uma soma de forças que permite triunfar sobre a resistência, de criar ações com um só fim e fazer agir de acordo. Esta soma de forças não pode nascer senão que do concurso de várias: mas a força e a liberdade dos homens sendo os primeiros instrumentos de conservação como os assumirá sem prejudicar e sem negligenciar os sonhos que eles se devem? Esta dificuldade retornou a meu pensamento e pode se exprimir nestes termos. “Achar uma

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membros como estes atuam para ela. Se a sociedade foi importante para as

conquistas de direitos, hoje ela é muito mais importante para que se mantenham

vivas as conquistas, porque a perda de um direito é mais prejudicial do que nunca

tê-lo conquistado.

Como todos os grupos sociais afirma GOFFREDO TELLES

JUNIOR, a sociedade política tem a idéia de assegurar as condições para

aproximar-se de seus respectivos fins.6

Por isso é certo afirmar que qualquer sociedade tem o mesmo

fim que é a felicidade de seus integrantes. ARISTÓTELES ensinando Nicômanos

afirmou “... a felicidade é algo final e auto-suficiente, e é o fim a que visam às

ações.”7

Seja na sociedade familiar seja na sociedade estatal a

felicidade deve ser a busca comum.

1.2. Estado.

Conceituar o Estado exige enxergá-lo como comunidade social

e como ordem jurídica. Exige-se porque a sua formação advém, primeiro de

movimentação social, para em seguida surgir juridicamente.

De acordo com a teoria tradicional o Estado, compõe-se de três

elementos: a população, o território e o poder, que é exercido por um governo

estadual independente. Estes elementos definidos juridicamente somente podem

ser apreendidos como vigência e domínio de vigência (validade) de uma ordem

jurídica.

O Estado da mesma forma que um ser vivo, nasce,

desenvolve-se, transforma-se e desaparece. O nascimento do Estado é um fato

forma de associação que defenda e proteja de toda a força comum a pessoa e os bens de cada sociedade, e pela qual qualquer um se unindo a todos se submete a ele mesmo e fica assim livre como antes?) 6 TELLES Júnior- Goffredo- O Povo e o poder, p.29. “ Como todos os grupos sociais, a sociedade política se constitui para realizar determinada idéia. Qual será a idéia em razão da qual a sociedade política existe? A resposta se encontra na definição de tal sociedade: grupo social cuja idéia a realizar consiste na de assegurar a condição necessária para que as entidades,que ela encerra, melhor possam aproximar-se de seus respectivos fins.” 7 ARISTOTELES - Ética a Nicômanos, p.24.

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histórico não jurídico, como preleciona HILDEBRANDO ACCIOLY8, expressando,

ainda, que diversos são os modos por que o Estado pode surgir.

Considerando-se o nascimento do Estado como fato histórico

tem-se que concluir que após sua formação, com os três elementos necessários,

é que surge a necessidade de organizar-se politicamente para ser considerado

também como ordem jurídica.

São várias as teorias que tentam justificar a origem do

Estado, mas pode-se constatar que todas elas mostram que o Estado surge de

movimentação social.

A movimentação social dá origem ao Estado e com esta

própria movimentação se percebe a necessidade imperiosa de organização.

A fim de perceber o Estado como ordem jurídica, deve-se

lembrar que a sociedade é um organismo vivo e real que atua para seus membros

e estes para ela, e ainda que a sociedade reflete os interesses dos indivíduos,

sendo um elo entre eles e o Estado.

A sociedade é viva e real dentro do instituto denominado

Estado. Ela vive e tem realidade no seio de uma organização jurídica chamada

Estado que foi criado exatamente para dar feição legal para uma organização

anterior, a própria sociedade.

Escreve DE PLÁCIDO E SILVA que Estado no sentido do

Direito Público, segundo conceito dado pelos juristas, é o agrupamento de

indivíduos, estabelecidos ou fixados em um território determinado e submetidos à

autoridade de um poder público e soberano, que lhe dá autoridade orgânica9.

Para OSVALDO FERREIRA DE MELO, Estado é uma

instituição destinada a manter a organização política de um povo e assegurar o

bem comum, utilizando mecanismos de controle coercitivo sobre toda a sociedade

e exercendo jurisdição sobre determinado espaço10.

Encontramos na doutrina francesa que: “Juridiquement, l’Etat

est une entité politique constituée par la réunion de trois éléments: un territoire,

une population, un governement. Le droit international em définit le statut. En

principe, l’Etat est souverain: à l’intérieur de ses frontières, il est libre d’agir comme

8 ACCIOLY, Hildebrando - Manual de Direito Internacional Público, p. 26. 9 SILVA, De Plácido - Vocabulário Jurídico, Forense, vol. II. 10 MELO, Osvaldo Ferreira - Dicionário de Direito Político.

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il l’entend; ses relations avec les autres membres de la société internationale sont

fondées sur une égalité évidemment théorique”.11

Por sua vez, HOBBES afirmou que “Diz-se que um Estado foi

instituído quando uma multidão de homens concordam e pactuam, cada um com

cada um dos outros, que a qualquer homem ou assembléia de homens a quem

seja atribuída pela maioria o direito de representar a pessoa de todos eles (ou

seja, de ser seu representante), todos sem exceção, tanto os que votaram a favor

dele como os que votarem contra ele, deverão autorizar todos os atos e decisões

desse homem ou assembléia de homens, tal qual como se fossem seus próprios

atos e decisões, a fim de viverem em paz uns com os outros e serem protegidos

dos restantes homens.”12

Não se pode deixar de consignar a posição de DUGUIT que

se expressa sobre a doutrina democrática do Estado, no sentido de que “ Nous

appelons démocratiques toutes les doctrines que placent l´origine du pouvoir

politique dans la volonté collective de la societé soumise à ce pouvoir est qui

enseignent que lê pouvoir politique, parce que est seulement parce qu´il este

instituié par la collectivité qu’ il regit.”13

Assim, podemos conceituar o Estado como a sociedade

politizada e devidamente organizada. Fixada em um território, havendo jurisdição

e poder de coerção por parte de um poder soberano, e também, como se verá a

diante à procura do bem de todos.

Pode-se concluir também que a sociedade é a base para a

formação do Estado, porque ela antecede o Estado.

Existe assim um poder soberano que é formado por

integrantes da própria sociedade que por sua vez deu origem ao Estado, e por

isso têm-se governantes e governados que surgem da atividade política. Aqueles

que assumem o controle do Estado tomam uma posição diferente na sociedade e

11 BARRILLON, R, et all - Dictionaire de la Constitution, p. 211 (Tradução livre do autor: Juridicamente o Estado é uma entidade política pela reunião de três elementos: um território, uma população, um governo. O direito internacional define o estatuto. Em principio o Estado é soberano: no interior de suas fronteiras, ele é livre para agir com entende; suas relações internacionais com outros membros da sociedade internacional são fundadas sobre uma igualdade evidentemente teórica.). 12 HOBBES - Clássicos da Política 1, p. 63. 13 DUGUIT, Leon – Manuel de Droit Constitutionnel, , p.18. (Tradução livre do autor. “ Chamamos democráticas todas as doutrinas que dão origem do poder político na vontade coletiva da sociedade submetida a este poder e que reconhece que o poder político é legitimo, porque somente por ele é instituído para a coletividade que ele rege.”

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tornam-se responsáveis pelo destino de todo o grupo social. O governante ou

governantes podem levar o Estado ao ponto desejado por todos ou ao caos,

quando então serão afastados das funções pelas forças políticas atuantes.

Da mesma maneira que a sociedade acompanha a evolução

do homem, pode-se dizer que o Estado acompanha a evolução da sociedade e

por isso o Estado contemporâneo é diferente do Estado de épocas passadas e

possivelmente será diferente no futuro.

Em razão desta evolução do homem, da sociedade e do

Estado, o conceito desta organização jurídica também vem evoluindo desde a

Antigüidade, a partir da Polis grega e da Civitas romana. A própria denominação

de Estado, com a exata significação que lhe atribui o direito moderno, foi

desconhecida até ao limiar da Idade Média, quando as expressões empregadas

eram rich, imperium, land, terrae etc. Teria sido a Itália o primeiro país a empregar

a palavra Stato, embora com uma significação muito vaga. A Inglaterra, no século

XV, depois a França e a Alemanha no século XVI, usaram o termo Estado com

referência à ordem pública constituída. Foi Maquiavel, criador do direito público

moderno, quem introduziu a expressão, definitivamente, na literatura científica14.

Com a evolução, temos um Estado moderno, mas preso à

teoria tradicional, que conforme MANOEL GONÇALVES FERREIRA FILHO, é

uma associação humana (povo), radicada em base espacial (território), que vive

sob comando de uma autoridade (poder) não sujeita a qualquer outra(soberana)15,

o que demonstra que as assertivas anteriormente mencionadas estão na mesma

linha de pensamento. Estes três elementos, povo, território e poder, só podem ser

definidos juridicamente e são mostrados por KELSEN.

Em sua conhecida Teoria Pura do Direito sob vários enfoques

se estudou o Estado, e pode-se extrair que o direito existente depende da forma

do Estado que vai produzir as normas de maneira estabelecida. Havendo um

dualismo de Estado e Direito este o afirma como uma entidade jurídica, ela (a

teoria) estrutura esta sua idéia considerando o Estado como sujeito de deveres

jurídicos e direitos, quer dizer, como pessoa, atribuindo-lhe ao mesmo tempo uma

existência independente da ordem jurídica. Pressupõe-se que o Estado é

independente do Direito e até preexiste o mesmo.Em sua missão, cria o Direito o

14 MALUF, Said -Teoria Geral do Estado, p. 35. 15 FERREIRA Fº, Manoel Gonçalves - Curso de Direito Constitucional, p. 45.

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“seu” Direito, e como entidade metajurídica é pressuposto do Direito e ao mesmo

tempo, sujeito jurídico que pressupõe o Direito porque está submetido, é por ele

obrigado e dele recebe direitos.

O Estado é transformado, de um simples fato de poder, em

Estado de Direito que se justifica pelo simples ato de fazer o Direito. Como

organização política, o Estado é uma ordem jurídica. Mas, nem toda ordem

jurídica é um Estado. Nem a ordem jurídica pré-estadual da sociedade primitiva,

nem a ordem jurídica internacional supra-estadual (interestadual) representam um

Estado. Para ser um Estado, a ordem jurídica necessita ter o caráter de uma

organização no sentido estrito da palavra, quer dizer, tem de instituir órgãos

funcionando, segundo o princípio da divisão do trabalho para criação e aplicação

das normas que a formam; ter de apresentar um certo grau de centralização. O

Estado é uma ordem jurídica relativamente centralizada.

Assim, para que haja um Estado como ordem jurídica,

precisa-se da criação desta ordem.

O próprio Estado que se formou cria a ordem a que ele

próprio fica subordinado.

A população que formou o Estado fica subordinada a este

ordenamento criado pelo Estado e ao poderes criados pela ordem jurídica.

Na verdade, há uma simbiose da população, do Estado e da

ordem jurídica, que fixados em determinado território vivem uma vida em comum,

mas formada por um Poder fundamentado na mesma ordem jurídica.

Criado o Estado juridicamente, surge a autovinculação, isto é, o

Estado fica vinculado ao Direito por ele próprio criado. O Direito não é criado para

os cidadãos apenas, e sim para o Estado também.

Formado um Estado em sua plenitude, surge para este

organismo político poderes previstos pela ordem jurídica e que devem ser

exercidos para manutenção da vida estatal perante os indivíduos e perante outros

Estados, por isso, para resumir, pode-se copiar o já citado MANOEL

GONÇALVES FERREIRA FILHO, para dizer que “o Estado é uma ordem jurídica

relativamente centralizada, limitada no seu domínio espacial e temporal de

vigência soberana e globalmente eficaz”.16

16 Op.cit. Curso de Direito Constitucional, p. 46.

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É importante lembrar que Estado e Governo não se

confundem, porque governo é o conjunto de cargos executivos do Estado, ou seja,

o conjunto de cargos que atuam decisória e temporariamente no campo político,

imprimindo os rumos e procedimentos da Administração Pública. O Estado é

perene, contínuo e permanente e o Governo é temporário; o Estado é geral e o

Governo particularizado; o Estado tem delegação permanente da Nação enquanto

o Governo tem delegação temporária de uma parte do eleitorado; o Estado tem

funções Administrativas, Legislativas e Judiciárias enquanto o Governo somente

exerce a função executiva. A estes ensinamentos de PAULO NAPOLEÃO

NOGUEIRA DA SILVA17, pode-se acrescer que o Estado é antes de tudo, uma

formação histórica enquanto o Governo é uma formação jurídica.

A importância do Estado é tão grande que ARISTÓTELES em

A Política já dizia que na ordem da natureza, o Estado se coloca antes da família

e antes de cada indivíduo, pois que o todo deve, forçosamente, ser colocado

antes da parte.18

1.3. Constituição.

Conceituar Constituição não é tarefa fácil diante da

complexidade da própria idéia.

O verbo constituir e o substantivo constituição aparecem em

todos os ramos do saber. Na vida se constitui elementos abstratos e concretos a

todo momento.

A constituição de algo corpóreo é, em regra, de fácil

percepção. A constituição de uma idéia pode ser dissecada, ampliada e alterada.

Tudo é constituído.

Quanto a Constituição de um Estado não podemos

simplesmente ter a idéia de um caderno escrito que contenha regras

extremamente abstratas, ou mesmo que seja uma simples idéia de como o Estado

é formado.

17 SILVA, Paulo Napoleão Nogueira da - Curso de Direito Constitucional, p. 38. 18 ARISTÓTELES - A Política, p. 19.

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Constituição de um Estado deve ser compreendida na sua

essência, deve ser vista e aceita como a demonstração de como o Estado está

estruturado e a que fim se dispõe. A Constituição de um Estado deve se ser

compreendida como sendo a vontade da Nação.

FERDINAND LASSALLE apresenta pensamento sociológico.

“... em síntese, em essência, a Constituição de um país: a soma dos fatores reais

do poder que regem uma nação”.19

Afirma o autor a relação desta Constituição com a

Constituição jurídica. A relação dos conceitos mostra que a união destes fatores

reais do poder postos em uma folha de papel ganham expressão escrita. A partir

deste momento, incorporados a um papel, não são simples fatores reais do poder,

mas sim verdadeiro direito- instituições jurídicas.

Qualquer atentado contra estes fatores reais do poder não

são mais simples atentados, mas atentados contra a norma jurídica, contra o

Direito.

De fato, antes de a Constituição ser um documento formal ou

mesmo costumeiro se apresenta como a união de todos os fatores de força que

regem os destinos de um povo.

Uma Nação é, sem dúvida, constituída por todos os

segmentos vivos que buscam o mesmo fim, e com esta vontade de constituir

formam o Estado e a Constituição política e jurídica.

Antes, da criação da Constituição como documento jurídico,

há a Constituição vista por Lassalle, como a união dos fatores reais do poder que

em razão da união formam ou constituem aquilo que vai gerar o Estado.

Se apresenta a Constituição em vários sentidos e na ótica

CELSO BASTOS em seus Comentários à Constituição do Brasil, temos o que

segue.

Constituição no sentido material de um Estado trata-se do

conjunto de forças políticas, econômicas, ideológicas etc., que conforma a

realidade social de um determinado Estado, configurando sua particular maneira

de ser.Embora mantenha relações com o ordenamento jurídico a ela aplicável,

esta realidade com ele não se confunde. Ela é do universo do ser, e não do dever

19 LASSALLE, Ferdinand- A Essência da Constituição, p.17.

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ser, do qual o direito faz parte.Ela se desvenda através de ciências próprias, tais

como a sociologia, a economia, a política, que formulam regras ou princípios

acerca do que existe, e não acerca do que deve existir como se dá com o direito.

No sentido material, então, a Constituição corresponde a

união dos fatores reais de poder, que são as forças políticas,econômicas,

ideológicas etc. A soma dos organismos sociais é que forma a Constituição no

sentido material de um Estado.

Este conjunto é que vai dotar o Estado de um estatuto, que

vai estabelecer a auto-organização e auto-regulação do próprio Estado.Assim, no

sentido material a Constituição de um Estado vai se conformando com o passar

do tempo à maneira em que mudar os fatores reais de poder.

Observa-se que de tempos em tempos as forças de uma

Nação transitam de grupos dominantes para grupos até então dominados. Grupos

em evidência vão para o ostracismo e outros surgem. Toda esta movimentação

dos grupos parciais vai modificando a Constituição material de um Estado.

Em seguida, no sentido substancial, é o conjunto de regras

ou princípios que têm por objeto a estruturação do Estado, a organização de seus

órgãos supremos e a definição de suas competências, ou ainda, é um complexo

de normas jurídicas fundamentais, escritas ou não, capaz de traçar linhas mestras

de um dado ordenamento jurídico.

A substância de Constituição é que mostra a formação do

Estado, sua administração e qual seu fim. O conteúdo sofre conseqüência e vai

ser alterado na medida em que houver alteração na Constituição material.

A mudanças nos fatores reais do poder faz alterar a

substancia constitucional.

Em sentido formal, trata-se de um conjunto de normas

legislativas que se distinguem das não-constitucionais em razão de serem

produzidas por um processo legislativo mais dificultoso, vale dizer, um processo

formativo mais árduo e mais solene.20Apresenta-se neste sentido como uma

garantia à Nação que os governantes não alteram a Constituição substancial

como se altera qualquer lei. Os direitos e garantias constitucionais reconhecidos

20 BASTOS, Celso Ribeiro et all – Comentários à Constituição do Brasil, pp.274/277.

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pelo Poder Constituinte Originário não podem ser relegados às mudanças

oriundas de simples vontade dos exercentes do Poder.

Reformar a Constituição é algo muito sério e por isto justifica

processo dificultoso e consulta popular. Escreveu SIEYÈS “que la nation est

toujours maitresse de réformer sa constitution”21, então como se tornou impossível

reunir a Nação para reformar sua Constituição, a maneira de se aproximar da

afirmação é a consulta popular por meio do referendo

ARISTÓTELES deixou seu pensamento que “A constituição

de um Estado é a organização regular de todas as magistraturas, principalmente

da magistratura que é senhora e soberana de tudo. Em toda parte o governo do

Estado é soberano. A própria constituição é o governo. Quero dizer que nas

democracias, por exemplo, é o povo que é soberano.” 22

Reconhece o filósofo a soberania do povo e quando afirmou

que a própria Constituição é o governo, afirmou que o governo não pode se

afastar da Constituição. O governo tem como limite o bem comum e alcançar o

bem significa cumprir a Constituição.

O governo é a Constituição e não a Constituição é o governo;

assim as ações governamentais só são legítimas e legais se conforme a

Constituição.

Para JORGE MIRANDA, “É o estatuto do Estado, seja este

qual for, seja qual for o tipo constitucional de Estado”23. É com este Estatuto que o

governo vai dirigir a vida da Nação, isto é, obedecendo-se às normas

constitucionais para alcançar os fins desejados pela Nação e positivados pelo

Estado.

Mostra também que qualquer Estado seja qual for o tipo

histórico envolve a institucionalização jurídica do poder e que as normas

fundamentais são o assentamento de todo o ordenamento; entretanto somente a

partir do século XVIII é que a Constituição passou a ser encarada como um

conjunto de regras jurídicas definidoras das relações do poder político, do estatuto

de governantes e governado, sendo este o alcance inovador do constitucionalismo

moderno.

21 SIEYÈS, Emmanuel – Qu´est-ce que le Tiers État? p.69 (tradução livre do autor: A nação é sempre a autoridade para reformar sua Constituição). 22 Op.cit. p. 112

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Então, a Constituição é documento político e jurídico que faz

relação entre o poder (governo) e a população. Considerando que as normas

constitucionais foram elaboradas por um poder constituinte é dever constitucional

do governo cumprir exatamente as disposições que lhes são impostas.

A Constituição deve ser o documento de garantia da

população que seus direitos fundamentais e escolhidos pelo poder constituinte,

conforme a vontade da Nação, sejam efetivamente respeitados.

O Estado e o governo têm direito, mas precedem os direitos

da população, porque é a população que funda o Estado e que por meio das

regras constitucionais concede o exercício do poder a determinadas pessoas.

Enfim, a Constituição é o estatuto do Estado e a Carta de

Direitos da população,não havendo Estado que não tenha Constituição, que deve

refletir sempre a vontade da Nação, sob pena de perder a legitimidade.

Importante é ter consciência que a Constituição de um país é

a prática e não o texto existente. Na obra atualizada de GERALDO ATALIBA

sobre República e Constituição, encontramos na Introdução que “para Tércio

Sampaio Ferraz Jr., “uma Constituição não apenas o seu texto, mas é

principalmente,uma prática”. Dizia Ruy Barbosa que, ainda que a Constituição

fosse tão perfeita como se tivesse sido baixada dos Céus, o país haveria de ser

julgado não pelo seu texto, mas sim segundo o modo pelo qual a pusesse em

prática. Importa,assim,conhecer a Constituição, para assegurar-lhe a

eficácia,realizando seus princípios como forma de tornar efetivos os desígnios que

– bem ou mal- o povo nela expressou.24

Conclui-se, por conseguinte, que em nosso país temos a

Constituição em texto que prevê a adoção da teoria de Montesquieu com três

Poderes independentes e harmônicos e temos na prática um Poder Executivo que

por competência do Presidente da República tem supremacia sobre os demais

afastando a independência propalada e querida pela Nação.

23 MIRANDA, Jorge - Manual de Direito Constitucional, p. 20. 24 ATALIBA,Geraldo- República e Constituição, p.16

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1.3.1. Constitucionalismo e divisão de poderes na visão de

Canotilho.25

Hoje, tende-se a considerar que a teoria da separação dos

poderes engendrou um mito. Consiste este mito a um modelo teórico com três

poderes rigorosamente separados, atribuindo-se a idéia a Montesquieu.

Por esta doutrina todo bom governo deve reger pelo princípio

de divisão dos poderes: legislativo, executivo e judiciário.

O executivo (o rei e seus ministros), o legislativo (1ª câmara e

2ª câmara, câmara alta e câmara baixa) e o judicial (corpo de magistrados). Cada

poder deve exercer sua função própria livre de qualquer interferência de qualquer

outro.

Consiste, portanto, a separação na independência de cada

um exercer sua função sem receber interferência de outro.

Canotilho mostra entendimento de que esta teoria de

separação dos poderes nunca existiu em Montesquieu, porque reconheceu-se o

direito do executivo interferir no legislativo, através do direito de veto do rei. De

outro lado o legislativo exercendo a vigilância sobre o executivo porque controla

as leis que votou podendo exigir prestação de contas aos ministros. Há a

interferência do legislativo no poder judicial quando julga os nobres pela Câmara

dos Pares, na concessão de anistias e nos processo políticos.

Na verdade não há separação, mas sim combinação dos

poderes: os juízes eram apenas a boca que pronuncia as palavras da lei; o poder

executivo e o legislativo distribuíam-se por três potências: o rei, a câmara alta

representando a nobreza e a câmara baixa representando a burguesia.

A questão essencial, portanto, é combinar os poderes, de

modo que não haja um favorecido em relação aos demais.

Não há efetivamente divisão de poderes, posto que o poder é

um só, e é da Nação. Mas, há e deve haver a divisão quanto ao exercício dos

poderes. Assim, a combinação dos poderes é primordial para que cada um seja

25 Op.cit. p.260/261

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reconhecido no mesmo grau constitucional, todavia a divisão no exercício é

essencial para que não haja um déspota agindo em nome de um dos poderes, em

detrimento dos demais e, em última análise, em detrimento dos direitos e

garantias fundamentais dos cidadãos.

Para que não haja favorecimento de um poder sobre o outros

as funções devem estar perfeitamente delineadas na Constituição; entretanto

prevendo e permitindo mecanismos de combinação, de modo que um poder não

seja mais favorecido mas que também um controle o outro.

Aliás, a Declaração dos Direitos do Homem e do cidadão de

26 de outubro de 1789 apresenta o art.16º como dogma, no sentido de que toda

sociedade a qual a garantia dos direitos não está assegurada, nem a separação

dos poderes determinada, não há constituição.Então, se não há expressamente a

determinação da separação dos poderes, entendendo separação do exercício,

não há que se falar em existência de constituição. Por sua vez, sem constituição

não há Estado.

Mas, não basta que a Constituição determine a separação

dos poderes formalmente, o que se exige é que a separação no exercício do

poderes seja real, seja de fato também.

Prevê a Constituição do Brasil a independência dos poderes,

entretanto leitura do texto faz perceber que o Executivo através do Presidente não

só limita a ação dos demais como uma maneira de controlar para se evitar

desmandos, mas sim interfere de maneira afrontosa exercendo diariamente a

função legislativa e formando os Tribunais com pessoas comprometidas com a

vida político-partidária.

Além de exercer a administração do Estado, o Presidente tem

força constitucional para exercer a função de legislar, bem como formar o poder

de julgar com pessoas adeptas ao seu modelo político-partidário e não

comprometidas com o ordenamento jurídico constitucional conforme a vontade da

sociedade.

Com a previsão constitucional da separação dos poderes cuja

redação está incluída como cláusula pétrea é possível afirmar que para este

Estado Brasileiro a separação dos poderes é um dogma; entretanto a

possibilidade constitucional atribuída ao Presidente da República em legislar,

nomear julgadores, inclusive o seu julgador, nomear o fiscalizador de suas contas

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acaba por trincar este dogma colocando o Poder Executivo através do Presidente

da República como um Poder privilegiado em relação aos demais.

1.4. Poderes do Estado.

O Estado como ente politicamente organizado é sujeito com

direitos e deveres que são estatuídos pela ordem jurídica estadual que para serem

exercidos precisa ele, o Estado, usar de seu Poder. Como a vida social se

desenvolve no Estado, temos o Poder Social, que é um fenômeno presente nas

mais diversas modalidades do relacionamento humano. Ele consiste na faculdade

de alguém impor a sua vontade a outrem, nos termos de CELSO BASTOS.26

Há o Poder Político que é exercitado pelo Estado, porque este

cuida da polis, cuida da organização estatal e dos direitos fundamentais de seus

cidadãos, e para isto se faz necessário um poder com autoridade e este encontra

fundamento na própria formação estatal.

Para cumprimento de seus deveres, o Estado precisa utilizar-

se de seu Poder.

Os deveres do Estado para com a sociedade são incontáveis

e entre eles pode-se catalogar o dever de dar a cada cidadão um Poder Judiciário

forte, independente, eficaz e rápido; em outras palavras, uma justiça verdadeira.

Todo cidadão que luta por seu direito com os instrumentos legais, luta pelo bem

da sociedade, porque cada qual é um lutador nato pelo direito, no interesse da

sociedade, como preleciona IHERING27.

Outro dever é manter um Poder Legislativo jurídico e de fato

independente, que exerça a função legiferante ouvindo os reclamos da população

e exercendo a função fiscalizatória das contas públicas sem nenhum tipo de

pressão.

Deve o Estado manter o Poder Executivo realizando tão

somente ações de administração e não se imiscuindo nas funções típicas dos

outros Poderes, como uma forma de mostrar o poder de mando.Deve o Estado

26 Op.cit. Curso de Direito Constitucional, p. 12. 27 IHERING, Rudolf Von - A Luta pelo Direito, p. 48.

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possibilitar que o Poder Executivo pratique atos de administração que são

exigidos pela população, com o fim de buscar melhores condições de vida.

O Poder Político deve dar condições para os Poderes

Legislativo, Executivo e Judiciário exerçam suas funções com a independência e o

controle necessário, sem privilegiar ou menosprezar este ou aquele Poder.

O Poder do Estado deverá sempre ser exercido no

cumprimento dos deveres e na exigência dos direitos, e, em última análise, o

exercício do Poder faz cumprir a função estatal de existir para o bem da

sociedade.

Nas palavras de PAULO BONAVIDES, o poder “é elemento

essencial constitutivo do Estado, o poder representa sumariamente aquela energia

básica que anima a existência de uma comunidade humana num determinado

território, conservando-a unidade, coesa e solidária”28.

O que se pode concluir com certeza é que o Estado tem seu

Poder e este representa a vida da sociedade, representa a vida que anima a

sociedade a cumprir suas obrigações e exigir seus direitos perante a organização

estatal. O Poder do Estado é essencial a sua formação e ao desenvolvimento de

seus objetivos, isto porque todo poder deve ter força de coerção para que se valha

como poder. Em uma sociedade, o Estado só consegue impor sua autoridade

através do poder que tem.

Modernamente é inconcebível a vida fora do Estado e para

esta vida a sociedade organizou-se e formou o Estado com o seu poder. A

necessidade do poder está demonstrada na individualidade de cada cidadão,

porque, mesmo vivendo no Estado, cada um tem sua vida própria, tem seus

objetivos, tem sua intimidade e sua crença, entretanto como a vida conjunta exige

uma reciprocidade de concessões e exige respeito ao direito e crença de cada

cidadão, somente o poder é que apresenta condições de organizar todo o sistema

e impor normas de condutas e normas de validade que afetem todos cidadãos de

maneira total.

O Poder de Estado como um todo deve ser entendido como

aquele capaz de organizar o Estado e impor normas de conduta e de validade que

atinjam todos os cidadãos, sem uma única exceção, atingindo inclusive o próprio

28 Op.cit. p. 59

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Estado que se auto-organiza, porque a criação do Estado pressupõe, por parte de

seus criadores, a formação de um ente organizado que também se subordine ao

direito posto. Inaceitável que uma população funde um Estado para não cumprir

as normas gerais e que somente esta população fique subordinada ao direito

Sendo o Estado uma organização política que tem como

elementos, povo, território e governo, deve ser considerado como organização

una, isto é, sem qualquer divisão. Não pode haver a divisão porque a cada divisão

que se faça, funda-se um novo Estado e se houver a falta de um dos elementos

não se tem Estado. Assim, este Estado indivisível apresenta como corolário um

Poder indivisível. Se o Estado é uno, seu Poder é uma unidade.

A essencialidade do Poder está demonstrada por

PAULO HAMILTON SIQUEIRA Jr, ao afirmar que “O direito e o poder encontram-

se ligados no âmbito da esfera estatal. A ordem jurídica surge do poder, e este é

ao mesmo tempo garantido pela ordem jurídica.Assim, costuma-se afirmar que o

Estado é a manifestação de um poder institucionalizado. A institucionalização do

Poder e a organização do próprio Estado surgem do denominado Poder

Constituinte”.29

O Poder é do Estado e ele o exerce conforme as normas de

sua organização, portanto há um único titular deste Poder, que é o próprio Estado.

Todavia, em última análise, o titular deste Poder é a Nação porque o Estado vive

para a Nação, e esta foi quem deu inicio ao Estado através do denominado Poder

Constituinte.

Entretanto, há titular para o exercício do poder, que são

aqueles órgãos investidos em função pública para exercitar a vontade do Estado.

A Nação exercita o poder de escolha quando o povo por meio

do voto livre e secreto escolhe aqueles que vão escrever a Carta de

Direitos.Depois, com fundamento nesta Carta, escolhem aqueles que vão legislar,

administrar e exercer jurisdição, conforme as regras democraticamente

estabelecidas.

Aqueles que são investidos no Poder, ante a escolha direta

ou pelos meios previstos pelo ordenamento jurídico constitucional, são investidos

para exercitarem o Poder em nome do Estado.

29 SIQUEIRA Jr, Paulo Hamilton – O Estado e o Poder, p.24.

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Percebe-se que o poder é indivisível quanto a sua

titularidade, mas divisível quanto ao seu exercício, quanto às atividades básicas

da organização estatal.

Para verificarmos esta divisão do exercício, devemos

observar a obra de MONTESQUIEU, aqui com tradução de Pedro Vieira Mota

extraindo-se o que segue:

Em cada Estado há três espécies de poderes: o Legislativo;

o Executivo das coisas que dependem do Direito das Gentes; e o Executivo das

que dependem do Direito Civil. O primeiro poder faz leis, o segundo administra e o

terceiro julga.

A liberdade política do cidadão é uma tranqüilidade de

espírito, por isso quando, na mesma pessoa ou no mesmo corpo, o poder

Legislativo é reunido ao Executivo, não há liberdade, porque pode temer-se que o

mesmo executor faça leis tirânicas para executá-las tiranicamente. Também não

há liberdade se o Poder de Julgar não estiver separado do Legislativo e do

Executivo, porque inaceitável que o mesmo corpo que faz a lei julgue, ou o

mesmo que execute, julgue.

Tudo estaria perdido se um corpo, ou um homem exercesse

os três poderes: o de fazer leis; o de executar as resoluções públicas; e o de julgar

os crimes ou as demandas dos particulares. Com este trecho, Montesquieu

fundamenta a necessidade da divisão dos poderes, como conclui o tradutor

responsável pela obra.

Demonstrando a necessidade da separação dos poderes,

Montesquieu, ao escrever sobre o grande conselho de Veneza, assim integrado:

Legislação; o prégadi, a Execução; os quaranties e o Poder de Julgar expressou

que o mal é que esses diferentes tribunais são formados por Magistrados de um

mesmo corpo social; o que constitui quase um mesmo poder30.

Bem claro está que o Poder de Estado é único e com único

titular, o próprio Estado, mas que há uma divisão para o seu exercício, e que esta

divisão deve prevalecer para manter no cidadão a tranqüilidade de espírito

necessária para viver na organização política.

30 MONTESQUIEU - O Espirito das Leis (tradução de Pedro Vieira Mota) pp. 164/167.

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Mantendo-se o Poder nas mãos de um único corpo, ou de

uma só pessoa, a intranqüilidade passa a reinar, porque aquele que faz a lei será

o responsável pela administração e pelo julgamento. Em suma, estabelece regras,

acusa e decide.

A unidade no exercício do Poder fere os objetivos daqueles

que fundam o Estado, pois o que se pretende é uma organização com normas

para serem cumpridas por todos os integrantes, inclusive pelo próprio Estado, e

que o descumprimento por qualquer dos integrantes, aqui também o Estado,

receba a aplicação da justiça pronta e eficaz, o que significa que não pode haver

unidade no exercício.

Somente a divisão no exercício do poder atende aos

interesses dos cidadãos em ter vida equilibrada e justa, com respeito aos seus

princípios e direitos fundamentais.

Com PAULO BONAVIDES, pode-se citar o escrito no sentido

de que a “indivisibilidade do poder configura nota característica do poder estatal.

Significa que somente pode haver um único titular desse poder, que será sempre

o Estado como pessoa jurídica ou aquele poder social que em última instância se

exprime, segundo querem alguns publicistas pela vontade do monarca, da classe

ou do povo... Com a noção de unidade e indivisibilidade do poder, aufere o Estado

moderno um de seus postulados essenciais que, desprendendo o poder do

Estado do poder pessoal do governante, permite compreender a comunidade

regida fora das concepções civilistas do direito de propriedade, dominantes no

período medievo. ... O poder do Estado na pessoa de seu titular é indivisível; a

divisão só se faz quanto ao exercício do poder, quanto às formas básicas da

atividade estatal.”31

A partição no exercício de funções foi tratada também por

ARISTÓTELES que concluiu que “geralmente se pensa que as diversas funções

públicas podem ser acumuladas, e que um mesmo cidadão pode ser ao mesmo

tempo guerreiro, lavrador, artesão, senador e juiz; todos os homens proclamam

sua parte de capacidade política e julgam-se em condições de exercer a maior

parte das magistraturas. Mas não é possível que os indivíduos sejam ricos e

pobres ao mesmo tempo”.32

31 Op.cit. pp. 61/62 32 ARISTÓTELES – A Política. p. 236

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Como se vê, não é nenhuma novidade tratar da indivisibilidade

e unidade do Poder, que é divisível apenas para exercício de suas funções. A

tripartição de poderes ocorre porque não se pode ao mesmo tempo um só exercer

as funções básicas do Estado.

Não obstante o estudo não seja novo, a preocupação deve

ser constante com o fim de sempre mostrar a população, e de forma especial às

forças dominantes, que é inadmissível a concentração de poderes em um só

corpo ou uma só pessoa.

Esta questão da tripartição ou divisão dos poderes ou das

funções estatais será tratada adiante com visão Montesquieu e de seus

antecessores.

Os poderes do Estado só emergem porque surge o Estado

como uma forma de organização política que almeja encontrar o bem estar ou a

felicidade de seus membros.

Quando se pensa em elementos constitutivos do Estado

naturalmente vem à mente, população, território e governo, mas é interessante a

posição de L.CABRAL DE MONCADA que assim se expressa: “Não é preciso ser-

se um grande idealista para imediatamente reconhecer que o elemento ôntico

mais importante do Estado é a idéia desse Estado, e não a população ou o

território.”33

Partindo deste pensamento ensina que é a idéia ou conjunto

de idéias que os cidadãos de um Estado, fazem da realidade humana social que

eles constituem; isto é a idéia do porquê, do como e do para que do fato da sua

convivência.

Todas as pessoas que vivem em um Estado ou qualquer

grupo têm de maneira consciente ou até mesmo inconsciente um conjunto de

idéias, crenças, concepções e representações. Este conjunto diz respeito aos

interesses, fins e valores que justificam o agrupamento.

Para o Professor da Faculdade de Direito de Coimbra tudo

isto é a idéia, mas não em um sentido exclusivamente intelectual, mas também

vital e existencial; portanto uma idéia com características de concretude.

33 MONCADA, L.Cabral de – Filosofia do Direito e do Estado- II-Doutrina e Crítica-, p.168.

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33

Dissecando o Estado JOSÉ GERALDO BRITO FILOMENO

expressa como elementos materiais à população e o território, como elementos

formais o governo soberano (Poder) e ordenamento jurídico e o elemento final que

é o bem comum.34

Então, algumas palavras sobre os elementos população,

território, governo e bem comum são necessárias.

Como já exposto, a sociedade antecede o Estado, sendo

este a sociedade politicamente organizada; então para se formar o Estado há

necessidade da população.

“A população é o primeiro elemento formador do Estado, o

que independe de justificação. Sem essa substância humana não há que cogitar

da formação ou existência do Estado”35; assim SAHID MALUF começa tratando

os elementos constitutivos.A reunião da população com a idéia de fundar um

Estado é o primeiro passo para se concretizar o Estado real, que pode se

apresentar com unidade étnica; ou seja, grupos de uma mesma nação, ou ainda

formado de indivíduos de várias origens.

Então população corresponde ao conjunto de todos os

habitantes de determinado território, distinguindo-se do povo que é o conjunto de

cidadãos, pessoas ou parte da população que mantém vínculos de natureza

política com o Estado, além dos vínculos jurídicos.

A população deve estar fixada em um território que é um

espaço delimitado. HANS KELSEN afirmou que “O chamado território do Estado

apenas pode ser definido como o domínio espacial de vigência de uma ordem

jurídica estadual.”36 É o espaço de terra em que a população se assenta com

ânimo definitivo diante da idéia de fundar o Estado.

A essencialidade deste elemento constitutivo está em que a

ordem jurídica só é possível ser exercida desde que haja limite espacial de

imposição.

Uma Nação ou grupo de pessoas que tenha espaço territorial

não pode ser compreendido como Estado porque não há assentamento e,

portanto, local para imposição do ordenamento jurídico.

34 FILOMENO, José Geraldo Brito-Manual de Teoria Geral do Estado e Ciência Política, p.65. 35 MALUF, Sahid-Teoria Geral do Estado, p.39. 36 KELSEN, Hans – Teoria Pura do Direito, p.319.

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34

Não obstante, existirem defensores dos Estados Nômades ou

de Estados sem território, se não houver área geográfica a população está

ameaçada de dispersão e a imposição das regras jurídicas se torna impraticável.

Afirma MANOEL GONÇALVES FERREIRA FILHO que

território “é o domínio espacial de vigência de uma ordem jurídica estatal. É

também por ela definido, tanto no tocante às terras como às águas, tanto no

concernente às profundezas quanto às alturas. Não há dúvida que, na delimitação

do território, internacional”.37

Fixada em um território, a população precisa de um comando,

de uma ordem.Ensinando sobre o Estado como ordem jurídica o já citado HANS

KELSEN explica que para ser ordem jurídica o Estado precisa de organização no

sentido restrito da palavra. Deve ter órgãos funcionando segundo o principio da

divisão do trabalho para criação e aplicação de normas que a formam; tem de

apresentar um certo grau de centralização. Como comunidade social constituída

por uma ordem normativa, compõe-se de três elementos: a população, o território

e o poder.

Sobre o elemento poder, expressou que o poder do Estado

que é exercido por um governo (g.n.) sobre uma população residente dentro do

território do Estado não é simplesmente qualquer poder que qualquer indivíduo

tem sobre outro indivíduo, e que consiste em o primeiro ser capaz de conduzir o

segundo a observar uma conduta por aquele desejada.

“O chamado poder estadual é a vigência de uma ordem

jurídica estadual efetiva. Dizer que o governo estadual, que exerce o poder de

Estado, tem de ser independente, significa que ele não pode juridicamente ser

vinculado por qualquer outra ordem jurídica estadual, que a ordem jurídica

estadual só está subordinada à ordem jurídica internacional, se é que se

subordina a qualquer outra ordem jurídica”.38

O exercício do poder de Estado é uma manifestação de força

que o governo mostra através dos órgãos que exercem o poder.

O poder de Estado para ser exercitado exige a constituição do

governo, e este só existe e atua se houver poder; por isso preferimos adotar a

idéia de governo como um dos elementos clássicos. 37 Op.cit. Curso de Direito Constitucional, p.46 38 Op.cit. p.320

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35

Além dos elementos constitutivos do Estado já lembrados

desde o início aparece um outro de extrema importância.

A razão da criação do Estado só pode ser a procura da

felicidade ou do bem comum de todos os seus integrantes. O Estado não pode

viver para si ou para os governantes, deve viver para a Nação. O limite de toda

sua ação deve ser o bem comum.

Sobre bem comum JACY DE SOUZA MENDONÇA

expressa que “A idéia de fins da vida enquanto a vida é convívio corresponde à

idéia de bem comum, definível como o conjunto de situações ou condições de vida

individual ou social que asseguram a realização dos fins humanos.”39

Se bem comum é o conjunto de situações ou condições na

vida de todos que asseguram a realização dos fins humanos, é correto que o

Estado tenha como objetivo fundamental atingir o bem comum perseguido por sua

população.

Está o Estado tão vinculado a obrigação de atingir o objetivo

que o autor citado linhas atrás afirma que “Bem comum é uma força que limita a

tendência absorvente do Estado ditatorial, pois, no momento em que se faz o

aprisionamento indevido da liberdade do homem, impossibilitando-o de realizar os

valores, é o bem comum que está sendo agredido”.40

Com efeito, mesmo se não estiver positivado, deve ser

obrigação do Estado perseguir o bem comum, possibilitando desta forma atingir o

bem de todos, isto também porque deve haver uma harmonia entre os objetivos

do Estado e os objetivos da pessoa humana.

NICOLA MATTEUCCI em obra conjunta com Norberto Bobbio

e Gianfranco Pasquino ao tratar do bem comum expressa que “Toda atividade do

Estado quer política quer econômica, deve ter como objetivo criar uma situação

que possibilite aos cidadãos, desenvolverem suas qualidades como pessoas;

cabe aos indivíduos singularmente impotentes, buscar solidariamente em conjunto

este fim.”41

39 MENDONÇA, Jacy de Souza – O Curso de Filosofia do Direito do Professor Armando Câmara, p.219. 40 Nota anterior. 41 BOBBIO, Norberto et all-Dicionário de Política, p.106.

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36

Considera o autor bem comum, ao mesmo tempo, o princípio

edificador da sociedade humana e o fim para que ela deve se orientar do ponto de

vista natural e temporal. Como o bem comum busca a felicidade tem valor político

por excelência.

O bem comum é dos indivíduos por serem membros de um

Estado; trata-se de um valor comum que os indivíduos podem perseguir somente

em conjunto, na concórdia.

Só há bem comum porque os indivíduos vivem no Estado,

pois se não estivessem juntos só haveria o bem individual.

Aceitando o bem comum como um dos elementos

constitutivos do Estado é correto afirmar que toda ação estatal deve ser dirigida à

população com o fim de alcançar a felicidade de cada um, que é o bem

perseguido.

O tratamento que o governo deve dispensar a população não

pode estar eivado de desigualdade sob pena de se afastar do bem comum.

Em suma, os titulares do exercício do poder do Estado estão

atrelados a este elemento finalistico, o que impõe a obediência irrestrita à teoria

da tripartição dos poderes para que não se corra o risco de concentração de poder

em uma só pessoa ou um só órgão.

Deduz-se em término que os Poderes do Estado devem estar

precisamente previstos na Constituição escrita ou na mente das pessoas em

sendo Constituição costumeira; entretanto não se permite olvidar que a

Constituição é de fato uma prática e não um texto ou a consciência.

O mundo fenomênico é que demonstra como

verdadeiramente é a Constituição de um país, que deve aproximar-se o máximo

possível do texto ou da consciência da Nação porque refletem a vontade daqueles

que exerceram o ato de constituir o Estado.

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37

CAPÍTULO II

MONTESQUIEU E A TEORIA DA TRIPARTIÇÃO DOS PODERES

Antes de Montesquieu, os filósofos Platão e Aristóteles já

lançaram a idéia de que na vida em sociedade cada homem deveria exercer a

atividade para qual estava preparado, não devendo haver acumulação de

atividades, sob pena de não ser realizada a contento. Depois veio John Locke, já

na época de Montesquieu, com o mesmo pensamento.Cada homem deve estar

preparado para uma atividade.

2.1 Antecedentes a Montesquieu.

Dos diálogos que compõem a República de Platão vamos

encontrar a idéia de necessidade de se exercitar somente uma atividade.

Ao tratar do nascimento do Estado, encontramos que um

Estado nasce quando as pessoas não mais se auto-abastecem, sendo que

necessitam de muitas coisas.

Um homem se associa a outro por uma necessidade, com

outro por outra necessidade. Havendo necessidade de muitas coisas, chegam a

congregar-se em uma só morada, muitos homens, para associar-se e auxiliar-se.

Esta casa é o Estado.

Após estabelecer as necessidades, como alimentos, moradia,

vestimenta e outras, bem como que deve haver homens para realizá-las, surge a

pergunta: Um homem é apto para realizar uma tarefa e outro homem outra tarefa?

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38

A resposta com outra pergunta é: “será mejor que uno solo

ejercite muchos ofícios o que ejercite uno solo? Que ejercite uno solo.”42

De maneira enfática está que cada um exercendo suas

atribuições dentro da vida estatal deve exercitar um só oficio, ou uma só função,

ou ainda um só poder.

Adiante, no Capítulo III, ao tratar de música encontramos que:

“... en nuestro Estado el hombre no se desdobla ni se multiplica, ya que cada uno

hace uma sola cosa.”43

No Estado tratado na República, o sapateiro fabrica sapato

sem ser piloto além de sapateiro, o lavrador é lavrador e não juiz ao mesmo tempo

em que é lavrador, e o militar que é militar não é comerciante além de ser militar, e

assim acontece com todos os outros homens.

Por fim, tratando das qualidades do Estado, de artesanato, de

negócios e dinheiro encontramos que: “... cuando la misma persona trata de hacer

todas estas cosas a la vez, este intercambio y esta dispersión en multiples tareas,

creo, serán la perdición del Estado”.44

A idéia é firme no sentido de que o Estado será

desestruturado quando as funções se unirem sob a responsabilidade de uma só

pessoa ou só corpo.

O Estado para ser forte e defender as necessidades de

interesses fundamentais da população exige que suas funções sejam repartidas e

que cada um a exerça com exclusividade, não havendo possibilidade de um só

homem ou corpo realize todas as funções.

A concentração de poderes somente causa malefícios ao

Estado e ao final a Nação.

Platão deixou bem claro a necessidade da existência de

inúmeras funções que devem ser exercitadas no Estado com o fim de garantir o

bem estar da população, mas deixou também bem esclarecido que cada pessoa

tem aptidão e deve exercer uma única função.

42 Platão – República, p. 123 (Tradução livre do autor: Será melhor que um só exercite muitos ofícios ou que exercite um só? Que exercite um só.). 43 Nota anterior, p.168 (Tradução livre do autor: em nosso Estado o homem não se desdobra nem se multiplica, já que cada um faz uma só coisa.). 44 Nota 42 p.225 (Tradução livre do autor: quando a mesma pessoa trata de fazer todas estas coisas a sua vez, creio, será a perdição do Estado.).

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39

Transportando a idéia para o Estado atual temos que concluir

que o Executivo deve exercer a sua atividade, o Legislativo a sua atividade e o

Judiciário a sua atividade; isto, é cada qual deve exercer unicamente sua

atividade, porque a dispersão de múltiplas tarefas, acredita Platão, será a perdição

do Estado.

Com efeito, a concentração de poderes, seja de maneira

explícita ou mesmo engenhosa nas mãos de uma só pessoa, será a perdição do

Estado, como afirmou Platão. Ademais, é possível afirmar, com certeza, que as

forças reais do poder, os grupos fragmentários que constituem o Estado não

desejam os Poderes do Estado centralizados.

Em A Política, Aristóteles analisou a estrutura da sociedade.

Mostrou que o caráter essencial de qualquer organização é a divisão dos ofícios e

a convergência de esforços, além de estabelecer que o homem é um animal

social.

A essencialidade da divisão dos ofícios já indica a pensar que

na organização social, no Estado, as principais funções devem ser repartidas, não

ficando elas sob a responsabilidade de um único homem ou uma única instituição.

A cidade não é uma multidão de homens tomada ao acaso,

mas bastando-se a si mesma para as necessidades da vida. Se um elemento

faltar, é absolutamente impossível que tal associação se basta a si mesma. “Por

conseguinte é preciso, lavradores para fornecerem os víveres, artesãos, soldados,

ricos, padres e juízes encarregados de julgar sobre o direito dos cidadãos e sobre

o interesse geral do Estado”.45

Transportando para hoje, a sociedade e o Estado devem se

bastar, mas para isto exigem-se inúmeras funções que devem ser exercitadas por

pessoas diversas, sendo que cada qual deve exercer a sua e não a dos outros.

Mais uma vez aparece à indicação da necessidade de se

colocar na sociedade e no Estado uma certa que divisão de ofícios, a fim de que

seja possível se alcançar o bem comum.

Do pensamento de JOHN LOCKE, também se pode perceber

dos malefícios que estão presentes quando as três funções estatais - legislar,

administrar e julgar- estão concentradas em uma só pessoa ou em um só corpo.

45 Aristóteles – A Política, p. 170.

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40

No sistema presidencialista brasileiro, as funções não estão

explicitamente concentradas nas mãos do Presidente da República, no entanto, a

Constituição Federal permite ao Presidente interferir ou no mínimo influir nos

Poderes Legislativo e Judiciário, na medida em que legisla e nomeia integrantes

de órgão auxiliar do Poder Legislativo e quanto ao Poder Judiciário nomeia os

integrantes da Corte Constitucional e de outros órgãos.

No estado de natureza, o ser humano tem concentrado em si

o atributo da liberdade e por isto é o administrador, o legislador e o julgador. Cada

homem exerce pelo estado da natureza todas as funções exclusivamente em

defesa de si próprio.

Ao entrar para a sociedade civil, o homem renuncia a seus

poderes inclusive o de punir quem comete delitos. Esta renúncia causa a

transferência ao corpo político do poder de fazer leis, do direito do uso de força,

do direito de punir e do direito do uso de força para a execução dos julgamentos.

Para o autor, esta transferência é a origem dos Poderes

Legislativo e Executivo da sociedade civil, que julgam, segundo as leis vigentes,

em que medida devem ser punidos os delitos cometidos no meio social.

Pode-se afirmar então, para os dias de hoje, que a

transferência dos poderes da natureza de cada ser humano é a origem ou

fundamento dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário.

O estado de natureza difere da sociedade civil porque nesta o

homem transfere seus poderes ao corpo político e naquele estado o homem retém

todos os poderes em suas mãos. Em razão desta retenção de poderes a

monarquia absoluta é incompatível com a sociedade civil porque, como no estado

de natureza, concentra poderes.

“Pois supondo-se que ele enfeixe tudo, tanto o poder

legislativo como o poder executivo, unicamente em si próprio, não haverá nenhum

juiz nem haverá apelo algum possível para qualquer pessoa, capaz de decidir com

eqüidade, imparcialidade e autoridade, e de cuja decisão se possa esperar alívio e

reparação por qualquer injúria ou inconveniência causados pelo príncipe ou por

ordem deste”.46

46 LOCKE, John – Dois Tratados Sobre o Governo, p.461

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Ao tratar da extensão do poder legislativo, o escritor inglês

afirmou que não pode o legislativo transferir o poder de elaborar leis para outras

mãos, pois, não sendo ele senão um poder delegado pelo povo, aqueles que o

detém não podem transmiti-lo a outros. Uma vez que o poder do legislativo deriva

do povo, por uma concessão ou instituição positiva e voluntária, não pode ser ele

diverso do poder transmitido por tal concessão positiva, que é apenas o de

elaborar leis e não de fazer legisladores, de sorte que não pode ter o legislativo

nenhum poder de transferir sua autoridade de elaborar leis e colocá-la em mãos

de terceiro.47

A idéia é clara no sentido de que não se pode transmitir o

poder que não se tem. Assim, ao aceitar a teoria da tripartição dos poderes, o

Povo transfere a cada Poder as funções que lhes são próprias ou típicas, por isto

qualquer transmissão de função de um Poder para outro é um desvirtuamento no

exercício da representação.

O limite da ação legislativa, como de qualquer outra ação

estatal, é o bem público, e neste limite está inserido a proibição de transferir o

poder recebido.

Os Poderes estão expressos na Constituição e a teoria da

tripartição das funções foi aceita pelo constituinte originário; isto é, pelo povo,

assim, em razão disso não, é aceitável que o Presidente da República, no

exercício da função executiva, tenha concentrado em suas mãos o poder de

interferir ou influir nos Poderes Legislativo e Judiciário.

No decorrer das obras citadas, constata-se que os homens

são importantes, mas que cada qual deve exercer suas atividades e que é

necessário à existência e o exercício de atividades distintas.

As atividades não podem estar acumuladas em uma única

pessoa ou uma só instituição.

Aristóteles, tratando da virtude do homem de bem e do bom

cidadão, mostra o pensamento que se pode dizer que o cidadão é como uma das

pessoas que viajam a bordo de um navio. Estão em uma sociedade e cada um

tem valor diferente, visto que um é remador, outro piloto e outros com outras

47 Op.cit. p.513

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funções, no entanto, a salvação da equipagem depende da ocupação de todos

nas suas funções, e a salvação é o desejo de todos.

O navio não navega e não está salvo senão dependendo da

ação individual de cada um de seus tripulantes, sendo que cada qual tem sua

função muito bem definida, não havendo ingerência de um tripulante na função do

outro.

O Estado não caminha em direção a seu fim, o bem comum,

senão pelo exercício correto de seus poderes ou funções estatais, sendo que

cada um deve ter sua função bem definida e exercer sem a interferência do outro.

A indicação da pessoa do soberano tem que significar o Rei,

mas aquele que deve exercer a administração do Estado.

Encontramos que o soberano não é um juiz, um senador, ou

um membro da assembléia, isto é, o Presidente da República não é um Juiz e

nem um Legislador; logo não deve exercer a jurisdição e nem imiscuir-se no Poder

Judiciário. Não deve exercer a função legislativa e nem se intrometer no Poder

Legislativo.

O soberano deve ser a multidão, o povo, porque este tem um

poder maior. Só o povo através dos mecanismos constitucionais e legais pode e

deve interferir na composição de cada um dos Poderes do Estado.

O Poder é da Nação e um só, por isso, na titularidade de

exercício, deve haver posição de igualdade em âmbito constitucional. Igualdade

não admite diferença alguma entre aqueles que são iguais.

Havendo igualdade constitucional, cada Poder de Estado,

cada titular deve exercer sua titularidade sem supremacia em relação aos demais.

O que se vê em detrimento dos Poderes Legislativo e

Executivo é uma forma de absolutismo do Poder Executivo através das ações do

Presidente da República.

Chamou-se de monarquia absoluta aquela na qual o rei

dispõe de tudo segundo a sua vontade como senhor absoluto.

É contrário a natureza centralizar em uma só pessoa um

poder absoluto, porque o Estado é composto de pessoas iguais, por isso se a

todos estão incorporados os mesmos direitos e deveres de cidadania não pode

um ser senhor absoluto.

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É inaceitável que um dos Poderes ou seu representante seja

senhor absoluto do Estado exercitando a titularidade de todas as funções estatais,

ou influindo de maneira preponderante. O homem do Estado não aceita que uma

só pessoa dirija os comandos da Nação porque é preciso que haja equilíbrio nas

condutas, que não haja mistura de funções.

Necessário que haja objetivos definidos a serem perseguidos

pelo Estado, mas não é justo para a Nação que um só Poder ou um só titular

busque, como senhor absoluto, tais objetivos.

O absolutismo importa dar superioridade a quem o exerce e

dar superioridade ao homem é dá-la ao mesmo tempo ao homem e à fera.48

A fera não age com consciência e lucidez, mas sim por

impulso e vontade desenfreada.

Tratando das classes sociais após relatar sobre os tecelões,

os lavradores, os sapateiros, os pedreiros e outros, Aristóteles apresenta a sétima

classe.

Esta será aquela formada por aqueles que contribuem com a

sua fortuna para os diferentes serviços públicos e são os chamados ricos.

Na oitava classe estão os chefes, os administradores do

Estado e aqueles que exercem as diversas magistraturas. Restam ainda as

funções de deliberar sobre interesses gerais e a de resolver, em caso de disputa,

sobre o direito dos cidadãos.

Mostrou o filósofo a existência necessária de inúmeras

classes e funções, cada qual com suas denominações. A simples denominação

faz pensar na existência das particularidades de cada função, que exige de seu

titular comportamento diverso.

Afirmou que geralmente se pensa que as diversas funções

públicas podem ser acumuladas, e que um mesmo cidadão pode ser ao mesmo

tempo guerreiro, lavrador, artesão, senador, juiz.

Há uma idéia individual de capacidade no sentido de que

todos se julgam capazes de exercer todas as funções, o que não deve ser aceito,

porque cada função tem sua peculiaridade e importância. Cada um na sua função.

Esta é a medida correta para a organização social.

48 Aristóteles – A Política, p.144.

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2.2. Tripartição das funções estatais.

Para dar uma visão geral sobre a divisão ou tripartição dos

poderes na concepção de Montesquieu vamos nos socorrer na tradução de

PEDRO VIEIRA MOTA, deixando para depois o estudo da obra na sua versão

original.

Deve haver uma liberdade política que consiste a não ser

constrangido a fazer coisas que a lei não obrigue, ou não fazer as que a lei

permita. Também, é de se considerar que todo homem que tem Poder é levado a

abusar dele, vai até encontrar os limites.

No exercício do Poder, brota no homem, por ser inerente ao

ser humano, o ímpeto de agir cada vez mais. Não havendo limites, mesmo que

involuntário, o homem passa do ponto racional da ação e chega a praticar

condutas inaceitáveis.

O limite que deve ser imposto a quem exerce o Poder

configura-se como direito fundamental da população de um Estado.

Aliás, Aristóteles já afirmou que o poder assanha a ambição e

multiplica a cobiça49, portanto a limitação do Poder deve ter, também como meta,

conter a ambição e a cobiça daquele que pretende exercer sozinho o Poder do

Estado, porque do contrário, a Nação será sempre prejudicada em seus direitos.

Deste pensamento é que surge a necessidade da divisão dos

Poderes, a fim de que, no seu exercício, um impeça o outro de cometer os

inevitáveis abusos.

Na doutrina tripartida surge então os Três Poderes do Estado:

o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.

A função legislativa, ou seja, a elaboração de normas jurídicas

deve estar a cargo do Poder Legislativo.

49 Op.cit. A Política, p.242

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Cabe ao Poder Executivo ser o executor das leis. Administrar

o Estado e dotando de meios capazes de propiciar o bem comum.

Ao Poder Judiciário restou a função de julgar os casos

concretos, sempre com o fim de harmonizar a vida social; isto é, também

procurando atingir o bem comum.

Para o equilíbrio do três Poderes, conforme o tradutor

mencionado, Montesquieu prelecionou: Para formar um Governo Moderado,

precisa combinar os Poderes, regrá-los, temperá-los, fazê-los agir; dar a um

Poder, por assim dizer, um lastro, para pô-lo em condições de resistir a um outro.

É uma obra-prima de legislação, que raramente o acaso produz, e raramente se

deixa à prudência produzir.50

Os três Poderes cada qual com o estabelecimento de suas

funções, com regras a serem cumpridas e com contraposição dos outros devem

caminhar necessariamente juntos perseguindo os objetivos fundamentais do

Estado.

A fim de que haja a independência de cada Poder e cada um

tenha instrumentos para limitar o outro, é imprescindível que a Constituição

estabeleça garantias a cada Poder e àqueles que o exercem. Somente com

garantias constitucionais invioláveis e que não sejam preteridas é que o equilíbrio

dos Poderes se concretiza da teoria para a realidade.

O desequilíbrio gera desorganização estatal podendo até

fazer surgir o regime de ditadura constitucional, que ocorre quando o texto da

Constituição coloca os Poderes em patamares diferenciados, de superior para

inferior.

Esta anormalidade constitucional que ocorre no Brasil, tem

como efeito prejudicar a população porque ditadura seja constitucional ou não,

coloca o Poder sob a regência de uma só pessoa que manda e desmanda

conforme seus interesses pessoais.

A segurança para a população, que é elemento essencial na

formação do Estado, deve ser que cada Poder tenha sua função e que um não

exercite a função do outro.

50 Montesquieu-O Espírito Das leis, tradução Pedro Vieira Mota, p.25.

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Os Poderes devem ser independentes, não isolados, a fim de

que cada um possa exercer sua função conforme as regras previstas pelo Poder

Constituinte, que deve sempre refletir a vontade da Nação, que sabemos foge e

teme a ditadura.

Entretanto, a repartição, independência e equilíbrio não é tão

correta como deveria ser. A afirmação de MANOEL GONÇALVES FERREIRA

FILHO é certa que “Já se acentuou que esse equilíbrio está rompido em favor do

Executivo que assumiu em toda a parte uma insofismável preponderância”.51

A teoria é tratada por Montesquieu no Livro XI Capitulo VI em

De l´Espirit des lois com o título De la Constitution d`Anglaterre.

Em cada Estado há três tipos de poderes: dos assuntos

legislativos, dos assuntos executivos das coisas dos direitos das gentes, e dos

assuntos executivos das coisas que dependem do direito civil.

Pelo primeiro são feitas leis temporárias ou para sempre, bem

como corrige revoga as que estão feitas. Pelo segundo, se faz a guerra, envia e

recebe embaixadas, estabelece a segurança e previne invasões. Pelo terceiro se

pune os crimes e se julgam questões entre particulares. Ao último chamamos

poder de julgar e o segundo simplesmente Poder Executivo do Estado.

Então, temos os três Poderes: Poder Legislativo o que tem a

incumbência de fazer as leis, a função primordial de legislar. Poder Executivo que

unicamente deve administrar as coisas do Estado e Poder Judiciário que deve

exercer somente a função de julgar as questões litigiosas que lhes são

apresentados.

Observa-se que cada Poder tem uma função que não se

confunde com a do outro.

De maneira objetiva LUIZ ALBERTO DAVID ARAUJO e

VIDAL SERRANO JUNIOR expressam que “A independência e a harmonia entre

os Poderes do Estado indicam, como princípio, que cada um deles projeta uma

esfera própria de atuação, cuja demarcação tem por fonte a própria norma

constitucional”.52

Continuam no enfoque de a Constituição apresentar

desdobramentos que se apresentam como reflexos ao princípio da separação dos

51 FERREIRA Fº, Manoel Gonçalves Ferreira – Comentários a Constituição Brasileira (EC nº1/69) p.63. 52 ARAUJO, Luiz Alberto David et all – Curso de Direito Constitucional, p. 81.

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poderes. Citam as imunidades parlamentares, que, entre outras finalidades,

asseguram a função fiscalizatória do Poder Legislativo. Também, no mesmo

caminho, as prerrogativas funcionais dos membros do Poder Judiciário e citam até

do Ministério Público, que objetivam imunizar seus membros de injunções

externas incompatíveis com o exercício independente das funções. Ainda, a

prerrogativa do Poder Legislativo de sustar os atos normativos do Poder Executivo

que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa

(art.49,V, da Constituição Federal).

Mostram os autores que a divisão indica independência, mas

que não se trata de algo absoluto, ao contrário, o texto constitucional contém

normas que atenuam esta independência, criando o sistema de freios.

Para poder bem viver no Estado, o cidadão precisa ter

tranqüilidade de espírito e segurança no sentido mais amplo do vocábulo.

A liberdade política de cada cidadão é a tranqüilidade de

espírito que provém do pensamento quanto a sua própria segurança; e para ter

esta segurança é necessário que o governo seja tal que um cidadão não tema o

outro cidadão.

O cidadão só está seguro quando tem a tranqüilidade

espiritual que brotou do seu pensamento no sentido que o governo se comporta e

propicia acreditar que não há motivo para temer.

O governo deve passar a cada cidadão uma tranqüilidade de

espírito para que o cidadão não tenha medo viver naquele Estado.Deve o cidadão

estar seguro porque não deve ter o que temer.

“Lorsque, dans la même persone ou dans le même corps de

magistrature, la pusissance législative est réunie à la puissance exécutrice, il n`a

point de liberté; parce qu`on peut craindre que lê même monarque ou le même

sénat ne fasse des lois tyranniques pour les exécuter tyranniquement”.53

A afirmação é enfática. Quando na mesma pessoa ou no

mesmo corpo o Poder Legislativo está reunido ao Poder Executivo, não há ponto

de liberdade; porque as pessoas temem que a pessoa ou o corpo façam leis

somente tirânicas para que sejam executadas tiranicamente.

53 MONTESQUIEU – De l´Esprit dês lois, I , , p.328 (Tradução livre do autor: Quando na mesma pessoa ou no mesmo corpo de magistratura, o poder legislativo está reunido ao poder executivo não há ponto de liberdade;

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Também, “Il n´y a point enconre de liberté si la puissance de

juger n`est pas séparée de la puissance legislative et de l´executrice. Si elle était

jointe à la pusissance législative, le pouvoir sua la vie et la liberté des citoyens

serait arbitraire: car le juge serait legislateur. Si elle était joiente à la puissance

exécutrice, le juge pourrait avoir la force d´un oppresseur”.54

De maneira firme está claro que não há liberdade quando o

poder de julgar não está separado do poder de executar e do poder de legislar. Se

o poder de julgar estiver reunido com o poder de legislar, o poder sobre a vida e a

liberdade das pessoas será arbitrário. O juiz será o legislador, o que é inaceitável,

porque poderá fazer leis conforme sua vontade de julgar e não leis de caráter

geral destinada a todos os cidadãos.

De outro lado, se o poder de legislar estiver junto com o poder

de administrar, o juiz será um opressor, pois vai executar ou administrar suas

próprias decisões.

Os dois trechos transcritos mostram a essência da

necessidade da separação no exercício dos Poderes do Estado. Não há

combinação aceitável em por nas mãos de uma só pessoa ou mesmo um grupo

de pessoas, o exercício dos três Poderes.

As pessoas que constituem o Estado transferem seus

poderes do estado de natureza para a sociedade e não para uma só pessoa ou

uma só instituição. A transferência dos poderes para uma só pessoa seria uma

conduta de total aniquilamento de toda a população, situação de afronta a

natureza humana.

Ocorrendo esta anormalidade que pode ocorrer não de

maneira afrontosa e direta, mas com a aceitação de interferências nas mais

diversas modalidades, o cidadão que está longe do exercício do poder perde,

mesmo sem saber, sua liberdade política.

Nasceu o homem para ser livre e viver em sociedade

conforme as regras positivadas, mas submissas ao direito transcendental, que não

porque há o receio que o mesmo monarca ou o mesmo senado não faça senão leis tirânicas para as executá-las tiranicamente.). 54 Idem nota anterior (Tradução livre do autor: Não há então ponto de liberdade se o poder de julgar não estiver separado do poder legislativo e do executivo. Se está junto ao poder legislativo, o poder sobre a vida e a liberdade dos cidadãos será arbitrário: o juiz será legislador. Se o poder estiver junto ao poder executivo o juiz poderá ter a força de um opressor.).

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admite que um único ser humano fique submetido à vontade ilimitada de um outro

seu semelhante ou pequeno grupo.

O Estado deve ser administrado lato senso com fundamento

na Constituição e nas leis, mas tanto a norma fundamental como as outras

normas devem estar direcionadas pelas regras do direito natural do ser humano,

que como expresso, não admite a retirada da liberdade por vontade tirânica.

O ingresso no homem no Estado foi à procura de liberdade e

tranqüilidade, por isto não se pode admitir o desvirtuamento do Estado para

entregá-lo a um único comandante.

Tudo estará perdido, se o mesmo homem, ou o mesmo grupo,

seja de nobres ou do povo, exercer os três poderes: fazer as leis, executar as

disposições legais e julgar os crimes e as questões particulares.

Importante é notar a contundência do autor: Tudo estará

perdido.

A imprescindível liberdade política, aquela tranqüilidade de

espírito que emerge do pensamento, quanto à convicção de segurança, não se

acha senão nos governos moderados.

Escrevendo sobre a época, Século XVIII, Montesquieu

afirmou que na maior parte dos reinos da Europa os governos são moderados.

Mas na Turquia, onde os três poderes estão reunidos e sob a vontade do Sultão,

reina um abominável despotismo.

Nas repúblicas da Itália, onde os três poderes estão reunidos,

a liberdade é menor do que nas monarquias.

Veja como pode ser a situação de um cidadão destas

repúblicas. O mesmo corpo de magistrado (entendido aqui como quem exerce

funções do Estado) tem como executor das leis, todo o poder que ele lhe dá como

legislador. Ele pode destruir o Estado com suas vontades gerais, e como ainda

tem o poder de julgar, ele pode destruir cada cidadão com sua vontade particular.

Assim, todos que querem ser despotas começam por reunir

na sua pessoa todos os poderes.

Em Veneza, havia lê grand conseil para legislação, lê prégady

para execução e lês quaranties com o poder de julgar. Mas o mal era que estes

órgãos diferentes eram formados por pessoas do mesmo grupo social.

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50

O que se vê no Brasil, no momento histórico em que vivemos,

são pessoas oriundas do mesmo corpo social e políticos vindos do Poder

Executivo atuando no Poder Legislativo e no Poder Judiciário.

Membros do Legislativo aceitam cargos no Poder Executivo,

mas quando o Executivo pretende votar determinada matéria no Congresso

Nacional a pessoa retorna ao Legislativo para garantir a aprovação, e depois volta

ao cargo executivo. Outros, da mesma origem são nomeados para o Tribunal de

Contas, ou seja, vão apreciar e julgar as contas públicas de quem nomeia.

No Judiciário a situação não é diferente. A história tem

mostrado que pessoas oriundas de partidos políticos, com intensa atuação

político-partidária são beneficiadas com cargo vitalício no poder de julgar,

trazendo, portanto, alta de carga de compromisso partidário, e também porque

são nomeados pelo Chefe do Poder Executivo.

A situação brasileira não é diferente da contada como de

Veneza, por isso não se pode esquecer do pensamento de PINTO FERREIRA

que tratando do tema expressa: Tais órgãos são justamente o Legislativo, o

Executivo e o Judiciário, funcionando em regime de freios e contrapeso, que são

o suporte das liberdades...(g.n.).55

É necessário que seja o Poder Executivo que regule o tempo

de duração das assembléias legislativas. Se o Poder Executivo não tiver direito de

controlar as atividades do Legislativo este será despótico. Ele poderá lhe dar

todos os poderes que imaginar, ele destruirá a ponto de nada sobrar, aos outros

poderes.

Agora, a contundência é quanto aos Poderes todos nas mãos

do Legislador, porque o texto apresenta o verbo anéantir que é traduzido como

destruir ao ponto que não reste nada. “Si la puissance exécutrice n`a pas le droit

d´arrêter les entrepsises du corps législatif, celui-ci sera despotique; car, comme il

pourra se donner tout le pouvoir qu´il peut imaginer, il anéantira toutes les autres

puissances”.56

Podemos afirmar, para os dias de hoje, que uma maneira de

controle do Poder Executivo ao Legislativo se dá através do veto, em que o

55 FERREIRA, Pinto-Curso de Direito Constitucional, p.97.

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Presidente da República pode impedir leis casuísticas. Se dá através de

mobilização político-partidário para tentar impedir que as pessoas fiquem no

exercício do Poder por mais tempo, através de alterações constitucionais, para as

quais o povo não é consultado.

Mas o que se vê no Brasil é o inverso.

No passado recente foi o Poder Executivo forçando e

convencendo o legislador constituinte derivado a permitir a reeleição do

Presidente da República. Agora vivemos momento em que o Poder Executivo

atuou para que os Presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal

tivessem direito à reeleição.

Ficou evidente o interesse do Poder Executivo em formar a

chefia do Poder Legislativo conforme os seus interesses.

O controle deve existir, mas como meio de impedir

desequilibrio entre os Poderes, e nunca para interferir na composição e direção do

Legislativo.

No entanto, não é necessário que o Poder Legislativo tenha

reciprocamente a faculdade de parar ações do Poder Executivo. Quando as ações

são limitadas pela própria natureza é inútil limitar.

As ações do Poder Executivo acontecem a cada instante, é

um atuar constante.

Continua o texto afirmando que se em um Estado livre o

Poder Legislativo não deve ter o direito de limitar o Poder Executivo, ele tem o

direito, e deve ter a faculdade de examinar de qual maneira as leis que ele fez

estão sendo executadas.

Nos dias de hoje, temos a fiscalização do Poder Legislativo

que se dá através dos Tribunais de Contas, temos a fiscalização constante que

deve acontecer todos os dias pelos membros do Legislativo. Há ainda a

possibilidade de derrubada do veto, que é uma forma de limitar a ação.

O Poder Legislativo limita a ação do Poder Judiciário quando

toma para si a atribuição de também julgar. “Quoinqu´en général la puissance de

juger ne doive être unie à aucune partie de législative, cela est sujet à trois

56 Op.cit. p.336 (Tradução livre do autor: Se o poder executivo não tiver o direito de parar os empreendimentos do corpo legislativo, este será despótico: então, como ele poderá se dar todo o poder que imaginar, ele destruirá todos os outros poderes.)

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exceptions, fondées sur l´intérêt particulier de celui qui doit être jugé.”57 Assim,

após afirmar categoricamente que o poder de julgar não deve estar unido a

qualquer parte do Legislativo, prevê que há exceções no interesse particular de

quem vai ser julgado.

Os grandes estão sempre expostos a invejas e se julgados

pelo povo, eles poderiam estar em perigo, eles não teriam o privilégio que tem o

menor dos cidadãos, em um Estado livre, de ser julgado por seus pares.

Os nobres devem ser julgados pela parte do Legislativo

composta pelos nobres.

É possível que a lei seja clarividente e cega ao mesmo tempo,

sendo em certos casos muito rigorosa. Como os juízes da Nação são apenas a

boca que pronuncia a lei, seres inanimados que não podem moderar e nem forçar

a lei, neste caso parte do corpo legislativo pode em alguma situação ser um

tribunal a fim de moderar a lei em favor da própria lei, com um pronunciamento

menos rigoroso.

Também, é possível que qualquer cidadão dos negócios

públicos viole direitos povo, e pratiquem crimes que os magistrados em exercício

não possam ou não queiram punir.

Com estas três situações o Poder Legislativo atua julgando,

ou seja, atua em lugar do Poder Judiciário que tem a função jurisdicional. Esta

atuação judicial do Poder Legislativo é forma especifica de reter, de conter ou de

liminar o Poder Judicial.

Como já afirmado para a formação constitucional do Estado

brasileiro se adotou a teoria da Tripartição dos Poderes; então necessário uma

visão geral em relação à federação, mas sempre voltado para o objetivo do estudo

que é a supremacia constitucional dos poderes do Presidente da República.

De acordo com a vontade constituinte o Estado brasileiro se

apresenta como república federativa formada pela união indissolúvel dos Estados

e Municípios e do Distrito Federal, constituindo um Estado Democrático de Direito.

Consoante o ensinamento de NORBERTO BOBBIO, “O

princípio constitucional no qual se baseia o Estado federal é a pluralidade de

centros de poder soberanos coordenados entre eles, de modo tal que o Governo

57 Op.cit. p.337 (Tradução livre do autor: Em geral o poder de julgar não deve estar unido a qualquer parte do legislativo, estando sujeito a três exceções; fundadas no interesse particular do que deve ser julgado).

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federal, que tem competência sobre o inteiro território da federação, seja conferido

uma quantidade mínima de poderes, indispensáveis para garantir a unidade

política e econômica, e aos Estados federais, que tem competência cada um

sobre o próprio território, sejam assinalados os demais poderes”.58

Então, o Brasil com a pluralidade de centros de poder –

Estados federais, Municípios e Distrito Federal –autônomos e coordenados,

devem conferir a União competência em quantidade mínima com o fim de garantir

a unidade política e econômica; deixando as demais atribuições ao outros entes

federativos.

O que se vê é que o modelo escolhido pelo legislador

constituinte é oposto, em que a União através do Governo Federal com

competência máxima e, portanto com força arrecadadora de tributos ao ponto

máximo que se possa pensar.

O modelo federal deve dividir o poder soberano de base

territorial, por isso o equilíbrio constitucional para todos os entes da federação só

pode ser mantido com a primazia da Constituição em todos os poderes.

A Constituição como Carta de Princípios, e como Carta

Orgânica, deve respeito ao modelo adotado pela Nação; por isto deve conter

normas de equilíbrio dos entes federativos e dos Poderes de Estado.

É inerente ao Estado Federal que seus entes tenham

competência e, portanto mais ação do que a União ou Governo Federal. A fim de

que isto ocorra, é imprescindível o fortalecimento dos Poderes do Estado e dos

entes federativos, por meio de Constituição clara, objetiva e concisa.

Escrevendo sobre o necessário equilíbrio no Estado Federal,

o autor citado expressa que a autonomia do modelo se traduz em que o poder de

decidir não pertence ao governo central e nem ao governo dos Estados, mas sim

a um poder neutral que são os tribunais. Somente em virtude das próprias

decisões o poder judiciário é capaz de restabelecer o equilíbrio entre os poderes,

definido pela Constituição.

O que nos emana do escrito é que o Poder Judiciário que

atua aplicando as leis ao caso concreto, é o Poder que restabelece o equilíbrio

entre os Poderes.

58 BOBBIO, Norberto et all – Dicionário de Política, Vol.1, p.481.

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Se de fato as leis refletirem a vontade da Nação, é certo que

sua aplicação aos casos apresentados gera equilíbrio constitucional; por isso é

fundamental se manter o Poder Judiciário na condição neutral, que significa ser

formado por pessoas que não sejam oriundas da atividade político-partidário e por

isso sem compromisso com ideologias partidárias, mas tão somente em

comprometimento com a Constituição e o sistema normativo.

Depende o equilíbrio federativo também da eleição para o

Chefe de Estado e Chefe de Governo, bem como da formação de um Poder

Legislativo representando a comunidade federal bem como o povo de cada

federação.

Desta idéia temos a Câmara dos Deputados representando o

povo e o Senado Federal representando igualmente cada Estado Federal.

Do pensamento de JEFFERSON temos que “A verdadeira

teoria de nossa Constituição é, seguramente, a mais sábia e a melhor, a de que

os Estados são independentes quanto a tudo dentro de si mesmos e unidos

quanto a tudo que diz respeito às nações estrangeiras. Limite-se o Governo Geral

tão-só aos negócios estrangeiros e fiquem nossas questões desemaranhadas das

de outras nações, exceto quanto ao comércio que os negociantes dirigirão melhor

se deixados livres para fazê-lo eles mesmos, e nosso Governo Geral poderá ficar

assim reduzido a uma organização muito simples e pouco dispendiosa, cujas

funções também simples serão exercidas por poucos funcionários”59

Quão diferente é nosso Brasil.

O Poder Executivo que exerce o Governo Federal não está só

responsável por questões estrangeiras, ao contrário atua em quase todas as

matérias que influem nos entes federativos. Em razão disto, a estrutura do

governo não é simples e sim numerosa demais e, portanto, dispendiosa.

Funções e cargos são criados aos milhares o que torna a

organização do Governo Federal como algo incontrolável.

O Poder Executivo Federal, além da interferência nos demais

Poderes do Estado, também dirige por meio da legislação, da arrecadação de

tributos, de posicionamentos políticos-partidários os Estados-membros, Municípios

e Distrito Federal.

59 JEFFERSON, Thomas-Jefferson Federalistas, Os pensadores, p.37.

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55

De fato, os demais Poderes e os entes da federação, todos

dependem do Poder Executivo da União, ou seja, do Presidente da República.

Enfim, o Estado brasileiro escarneceu da idéia de

Montesquieu que afirma ter adotado e a federação brasileira não se coaduna com

o federalismo que designa a teoria do Estado federal.

De uma maneira ou outra, os Poderes do Estado que estão

previstos na Constituição executam suas funções e, portanto há titulares para o

exercício. Titular do Poder é o povo, mas titular do exercício do Poder depende da

previsão constitucional.

Dispõe o art. 2º da Constituição Federal que são Poderes da

União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o

Judiciário.

Com efeito, são Poderes do Estado e não somente da União,

como leitura apressada pode indicar.

Seguindo assim a teoria tripartite o Estado brasileiro prevê em

sua Constituição os Poderes que devem ser independentes entre si; entretanto

harmônicos.

Sobre a independência já falamos, no sentido de mostrar que

o Poder Executivo tem se comportado, por ordem constitucional, como um Poder

que torna os demais não tão independentes.

Harmônicos entre si têm que significar que os três Poderes

devem, cada um, exercer sua função constitucional, buscando sempre o bem

comum da Nação.

O Estado existe para a Nação, por isso os três Poderes são

os instrumentos do Estado para o alcance do bem comum da Nação.

Comentando o artigo CELSO BASTOS, expressa que “Vale,

entretanto, notar que, qualquer que seja a forma ou o conteúdo dos atos do

Estado, eles são sempre fruto de um mesmo poder. Daí ser incorreto afirmar-se a

tripartição de poderes estatais, a tomar essa expressão ao pé da letra. É que o

poder é sempre um só, qualquer que seja a forma por ele assumida. Todas as

manifestações de vontade emanadas em nome do Estado, reportam-se sempre a

um querer único, que é próprio das organizações políticas estatais.”60

60 BASTOS, Celso at all – Comentários a Constituição do Brasil, 1º Volume, p.430.

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56

Claro então que há unidade de poder com separação em

titularidade de exercício para cada uma das funções; legislativa, executiva e

judicial.

2.3. A titularidade do exercício das funções.

Tripartida as funções é necessário fixar os titulares para o

exercício de cada uma em obediência a teoria adotada, no sentido de não

concentrar todas elas em uma só pessoa ou um só organismo.

A Constituição Federal fixa precisamente os titulares do

exercício para os Três Poderes, mas permite a ingerência, além do controle

necessário, do Presidente da República nos outros Poderes.

Em beneficio da Nação, os titulares devem exercitar suas

funções sempre em harmonia e com o fim voltado para o bem comum porque a

tripartição tem como fim dar segurança às pessoas de que não haverá condutas

tirânicas.

Aliás, CANOTILHO e VITAL MOREIRA apresentam

pensamento lapidar afirmando que “os titulares dos órgãos do poder devem

respeitar-se mutuamente e renunciar práticas de < guerrilha institucional>, de

abuso de poder, de retaliação gratuita ou de desconsideração grosseira. Na

verdade, nenhuma cooperação constitucional será possível, sem uma

deontologia política , fundada no respeito das pessoas e das instituições e num

apurado sentido de responsabilidade de Estado(statesmanship)”.61

Esclarecem os autores a exigência de ação combinada de

todos os titulares de órgãos do poder, o que deve ser compreendido que cada

titular deve exercer sua função sem a prática do abuso, sem guerrilha, sem

desconsideração; isto é cada titular deve exercer a função de seu Poder e não

imiscuir-se na função do outro.

Para que isto ocorra, não basta o comportamento dos

titulares. É imprescindível que a Constituição, que adota a teoria de Montesquieu,

61 CANOTILHO, J.J. Gomes et all – Os poderes do Presidente da República, p.71

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de fato estabeleça normas que possibilitem cooperação constitucional a

concretizar o bem comum, fazendo valer a teoria que se diz adotar.

No exercício das funções, devem os titulares dar atenção

ilimitada aos princípios fundamentais eleitos pela comunidade. O afastamento de

qualquer titular de exercício de poder dos princípios escolhidos pelo povo quebra

o relacionamento político que é fundamental para sustentação das condutas

públicas.

Os titulares do exercício devem aderir à vontade popular

porque sua ação deve corresponder à vontade imposta; todavia não é isto que

sempre ocorre. “A presente preocupação geral com os problemas institucionais

culmina, necessariamente, com a grave questão – mais sociológica que jurídica-

da eficácia constitucional. Não temos encontrado, ao longo do tempo,

generalizada adesão intelectual e afetiva às nossas instituições, em grau que leve

à sustentação sólida das mesmas. Se é verdade que os princípios fundamentais

têm da comunidade nacional, razoável adesão – embora não explícita,nem

consciente-, como é o caso de república,federação, autonomia

municipal,tripartição do poder e legalidade, as regras,entretanto,que lhes

asseguram a eficácia são ignoradas,desprezadas, mal cumpridas. E isto com

aquiescência de uns, a indiferença de outros, a complacência de muitos; com a

acomodação dos órgãos de promoção do Direito e a preocupação de poucos”.62

Não basta a adesão inconsciente da comunidade aos

princípios fundamentais, exige-se a adesão consciente a estes princípios daqueles

que exercem a titularidade dos Poderes do Estado, porque só assim a vontade da

Nação estará sendo cumprida.

2.3.1. Poder Legislativo.

No Estado Federal o Poder Legislativo é composto por dois

órgãos legislativos. O Senado Federal que atua como representante dos Estados-

membros e a Câmara dos Deputados que representa o povo.

62 idem nota 24.

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O sistema bicameral conforme J.CRETELLA JUNIOR “permite

assegurar significativa representação aos Estados-membros,elegendo, ao lado da

Câmara escolhida pela população,uma Câmara eleita pelos cidadãos de cada

estado, cada um destes representado pelo mesmo número de Senadores”.63

Assim no nosso caso os Estados são representados por um

mesmo número de Senadores havendo proporcionalidade de representação na

Câmara dos Deputados tomando por base a população de cada Estado-membro.

Estabelece a Constituição em seu art.45 e parágrafos que a

Câmara dos Deputados compõem-se de representantes do povo, eleitos pelo

sistema proporcional, em cada Estado, em cada Território e no Distrito Federal.

Lei complementar deve fixar o número total de deputados,

fazendo-se ajustes conforme a mudança da população, mas fixa a Constituição o

número mínimo de oito e máximo de setenta.

Cada Território elege quatro deputados.

O art.46 e parágrafos cuidam do Senado prevendo eleição

pelo princípio majoritário.

Cada Estado e o Distrito Federal elegem três Senadores, com

mandato de oito anos, que é o dobro do mandato dos Deputados Federais. A

renovação acontece de quatro em quatro anos, alternadamente por um e dois

terços.

Possibilita esta norma que os Estados e Distrito Federal

sempre estejam representados, em cada legislatura, por Senadores oriundos da

legislatura anterior, seja um ou sejam dois. Depende da renovação de um ou dois

terços.

Esta forma de composição tem seu lado positivo porque

permite que o Senador que ingressa em nova legislatura, vindo da anterior,

continue tratando dos interesses do Estado que representa sem que haja quebra

de continuidade, caso haja renovação total dos concorrentes.

A importância do Poder Legislativo está caracterizada pela

necessidade de um órgão próprio, que representando o povo e os Estados-

membros, exerça o processo legislativo. No Dicionário da Constituição Francesa

de R.BARRILON encontramos que “... le pouvoir législatif exercé par les

63 CRETELLA Jr, José – Elementos de Direito Constitucional, p.130.

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representants du peuple devait constituer l´elément essentiel, au sein de la

nouvelle répartion des compétences, entre les trois “pouvoirs”.64

Então, o Poder Legislativo que é exercido por representantes

do povo deve constituir o elemento essencial ao sentido da nova repartição de

competência entre os três Poderes, no caso foi considerado o espírito

revolucionário de 1789.

A essencialidade do Poder Legislativo exercendo sua função

sem intromissão é indiscutível, ficando estabelecido pela Constituição que a

assunção ao cargo de legislador se dá através da escolha popular e é temporário.

2.3.2. Poder Executivo.

A composição deste poder varia de acordo com o sistema de

governo. “Se levamos com consideração o parlamentarismo, teremos um

executivo dual, com o Primeiro Ministro chefe do governo e o Presidente da

República ou Monarca, chefe do Estado e seu representante. Ao considerarmos o

presidencialismo, teremos na mesma pessoa, a do Presidente da República, as

duas funções”, como escreve DIRCÊO TORRECILLAS RAMOS.65

A função do Executivo é aplicar a lei elaborada pelo

Legislativo.

“O Poder Executivo tem por principal desígnio constitucional a

realização da função administrativa.Nesse sentido, sua tarefa consiste em

aprimorar, em nível imediatamente infralegal, os comandos normativos. É um

aplicador da lei, na gerência dos negócios públicos”66, como afirma LUIZ

ALBERTO DAVID ARAÚJO.

No nosso caso o Poder Executivo é exercido pelo Presidente

da República, que é auxiliado pelos Ministros de Estado, nos termos da redação

do art.76.

64 BARRILON, R. et all- Dictionaire de la Constitution, p.271 (Tradução livre do autor: o poder legislativo exercido pelos representantes do povo deve constituir o elemento essencial, ao sentido na nova repartição das competências entre os três “poderes”.) 65 RAMOS, Dircêo Torrecilas-O Federalismo Assimétrico, p.127. 66 Op.cit. p.280

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Temos então o sistema presidencialista em que na pessoa do

Presidente da República está reunido a função de Chefe de Governo e a função

de Chefe de Estado, estando a seu cargo a responsabilidade pela Administração

Pública em nível federal e a representação do País perante à comunidade

internacional.

A eleição do Presidente e do Vice-Presidente da República

realiza-se simultaneamente, no primeiro domingo de outubro, em primeiro turno, e

no último domingo de outubro, em segundo turno, do ano anterior ao término do

mandato presidencial vigente.

Estabelece a Constituição a necessidade de segundo turno

quando nenhum candidato alcançar a maioria absoluta na primeira votação,

concorrendo os dois candidatos mais votados e considerando-se eleito aquele que

obtiver a maioria dos votos válidos.

A posse será sessão do Congresso Nacional.

O mandato que tem inicio em 1º de janeiro do ano seguinte ao

da eleição tem duração de quatro anos.

O art. 83 apresenta uma ação de controle do Poder

Legislativo ao Poder Executivo, porque o Presidente e o Vice-Presidente da

República não poderão, sem licença do Congresso Nacional, ausentar-se do País,

por período superior a quinze dias, sob pena de perda do mandato.

O administrador da coisa pública deve ser pessoa presente na

vida nacional, por isso o dispositivo se apresenta como uma forma de estancar a

vontade de ausência do País por longos períodos, o que certamente geram

problemas e até perda de identidade quanto a quem governa.

Em prazo inferior não há necessidade da licença do

Congresso Nacional, podendo então o Presidente ou o Vice-Presidente da

República ausentar-se do País livremente. Esta desnecessidade,nos mostra a

história, que em passado recente e também nos dias em que vivemos se tornou

conduta ordinária viajar incontáveis vezes para várias partes do Mundo.

Quanto ao exercício do poder, há que se lembrar que muito

se fala dos limites constitucionais que são impostos aos titulares; mas o que se

constata na Constituição Brasileira é que os limites impostos ao Presidente da

República como titular da função executiva está muito longe de ser alcançado,

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porque como sempre lembrado além de administrar legisla e faz a composição de

órgãos legislativo e judiciário.

Os limites constitucionais para o Presidente da República

praticamente inexistem.

2.3.3. Poder Judiciário.

O terceiro Poder é o que se apresenta com mais

complexidade, com uma estrutura diversificada e num grau de independência

discutível em relação aos demais.

Ao tratar sobre o papel tradicional do Judiciário JOSÉ

RENATO NALINI, ensina que: “Na repartição das funções estatais, reservou-se ao

Judiciário aquela de aplicar contenciosamente a lei. ... Essa a clássica função do

Judiciário, reafirmada por toda a doutrina, comprovada pela praxe e ainda

exercida pelo braço estatal que resolve conflitos e impõe sanções.No sistema de

controles recíprocos presentes na concepção de Montesquieu, cada poder estatal

tem delimitada a sua área de atuação. Campo em regra imune à interferência dos

demais poderes. Cada qual deles zeloso para que essa distância não se elimine,

nem se reduza”.67

No mesmo texto afirma, também, que sem perder a função

tradicional, com o advento da Constituição de 1988 o Poder Judiciário foi provido

de poderes de controlador da legitimidade, com feição moderadora.

O que enfatiza o autor, e aqui interessa, é que cada Poder

Estatal tem limitado sua área de atuação, cujo campo está imune à interferência

dos demais Poderes, sendo que cada qual zela para manter uma distância que

não se elimine e nem se reduza.

Em suma, cada Poder é zeloso para que seja mantida a

independência, que deve ser real e não apenas textual.

Para manter a independência e exercitar a função de aplicar

contenciosamente a lei o art. 92 dispõe os órgãos do Poder Judiciário.

67 NALINI, José Renato - O Judiciário e a Constituição de 1988 – in Constituição Federal de 1988, Dez Anos, p.314.

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São órgãos do Poder Judiciário, portanto instituições ou

pessoas que exercem a função jurisdicional: o Supremo Tribunal Federal; o

Superior Tribunal de Justiça; os Tribunais Regionais Federais; os Juízes Federais;

os Tribunais do Trabalho; os Juízes do Trabalho; os Tribunais Eleitorais; os Juízes

Eleitorais; os Tribunais Militares; os Juízes Militares; os Tribunais dos Estados e

do Distrito Federal e Territórios e os Juízes do Estados, do Distrito Federal e dos

Territórios.

Com a Emenda Constitucional 45,de 08 de dezembro de

2004, foi incluído entre os órgãos do Poder Judiciário o Conselho Nacional de

Justiça, órgão de controle e que não tem função jurisdicional; portanto um órgão

estranho as funções judicantes.

De maneira diversa aos demais Poderes, o cargo de

Magistrado é vitalício e assunção se dá por concurso público ou nomeação pelo

Chefe do Poder Executivo.

Justifica-se a vitaliciedade porque a sociedade deve ter a

segurança que suas questões serão julgadas por alguém, aquele que está

exercendo a titularidade do Poder, que não precisa fazer pender a balança da

Justiça para um ou outro lado, como uma forma de se manter no Poder.

A vitaliciedade antes de ser uma garantia ao Magistrado é

uma garantia da sociedade.

Assunção por concurso público tem sua justificativa porque

este Poder é técnico-jurídico. Evidente que tem sua feição política, mas a

capacidade técnica do julgador é essencial para que o direito positivo seja

fielmente aplicado aos casos postos em julgamento.

Quanto às nomeações por escolha do Chefe do Poder

Executivo não se encontra justificativa, a não ser sob a máscara de controle, uma

forma de se nomear pessoas de seu relacionamento.

A partir do art. 93, há uma série particularidades que regulam

a vida funcional dos Magistrados, mas nem todas interessam nesta oportunidade.

Descreve a Constituição uma carreira aos Magistrados que

ingressam após concurso público no cargo de Juiz Substituto e a seguir será

promovido de entrância para entrância pelos critérios de antiguidade e

merecimento, alternadamente.

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O acesso aos tribunais de segundo grau acontece da mesma

maneira, ou seja, promoção pelos critérios de antiguidade e merecimento.

Como maneira de prestar contas e permitir o controle dos atos

judiciais não só pelos demais Poderes, mas também por toda a sociedade,

determina o inciso IX do art.93 que todos os julgamentos serão públicos, e

fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade.

A nulidade dos julgamentos é atingida não só por falta de

fundamentação, mas também se houver a retirada da publicidade, com exceção

das previsões legais pelo interesse público.

Uma das maneiras de acesso ao Poder Judiciário

independente de concurso público e diretamente nos Tribunais, portanto sem o

exercício do cargo de Juiz nas entrâncias, é o chamado Quinto Constitucional.

Determina o art. 94 que um quinto dos lugares dos Tribunais

Regionais Federais, dos Tribunais dos Estados, e do Distrito Federal e Territórios

será composto de membros, do Ministério Público, com mais de dez anos de

carreira, e de advogados de notório saber jurídico e de reputação ilibada, com

mais de dez anos de efetiva atividade profissional, indicados em lista sextupla

pelos órgãos de representação das respectivas classes. Recebidas as indicações,

o Tribunal formará lista tríplice, enviando ao Poder Executivo, que, nos vinte dias

subseqüentes, escolherá um de seus integrantes para nomeação.

O que temos aqui é a ingerência do Chefe do Poder Executivo

nomeando pessoas para integrarem Tribunais Federais, dos Estados-membros,

do Distrito Federal e dos Territórios. Em suma, o Poder Executivo participa do

modo de formação do Poder Judiciário.

Pode-se pensar em inferioridade em relação aos demais

Poderes quando seus membros praticamente não sofrem nenhuma limitação na

vida particular, enquanto os Magistrados estão proibidos de exercer qualquer

outra função, salvo uma de magistério e nem dedicar-se à atividade política-

partidária.

Não obstante, a inferioridade é perfeitamente compreensível

às vedações porque dada à particularidade o Magistrado deve dedicar-se

integralmente a função estatal e sem pender para um ou outro partido-político. Em

contrapartida o Estado deve oferecer aos Magistrados as condições necessárias

para que possa haver de fato a dedicação integral.

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2.3.3.1. Órgãos do Poder Judiciário.

Diante da estruturação complexa do Poder Judiciário em

relação aos outros dois Poderes necessário se faz simples verificação de cada

órgão, mas sem afastar da idéia de demonstrar a intromissão do Presidente da

República.

O Supremo Tribunal Federal como órgão superior do Poder

Judiciário é composto por onze Ministros, escolhidos dentre cidadãos com mais de

trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos de idade, de notável saber

jurídico e reputação ilibada.

Estes Ministros são nomeados pelo Presidente da República,

depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal.

Percebe-se que a Corte que tem como competência

primordial defender a Constituição Federal é formada integralmente por pessoas

escolhidas pelo Presidente da República, com concordância do Senado Federal.

Não há nenhuma participação do Poder Judiciário na escolha

dos integrantes de seu órgão máximo.

Tem-se o Superior Tribunal de Justiça que é composto de

no mínimo por trinta e três Ministros. Da mesma forma que para o Supremo

Tribunal Federal serão nomeados pelo Presidente da República exigindo-se os

mesmos requisitos e a aprovação por maioria absoluta do Senador Federal.

Um terço será escolhido dentre Juízes dos Tribunais

Regionais Federais e um terço dentre Desembargadores dos Tribunais de Justiça,

indicados em lista tríplice elaborada pelo próprio Tribunal.

Outro terço, em partes iguais, dentre advogados e membros

do Ministério Público Federal, Estadual, do Distrito Federal e territórios,

alternadamente, indicados de forma idêntica ao quinto constitucional.

A redação do art. 104 permite a participação do Poder

Judiciário, mas mesmo assim a decisão final é do Presidente da República que

também faz ingressar no Superior Tribunal de Justiça, advogados e membros do

Ministério Público.

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Os Tribunais Regionais Federais são compostos de no

mínimo por sete Juízes nomeados pelo Presidente da República dentre brasileiros

com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos de idade.

Um quinto escolhido dentre advogados com mais de dez anos

de efetiva atividade profissional e membros do Ministério Público Federal com

mais de dez anos de carreira.

Os demais, mediante promoção de juízes federais com mais

de cinco anos de exercício, por antiguidade e merecimento alternadamente.

Em outro segmento, há a justiça especializada em nível

federal, que são: Justiça do Trabalho; Justiça Eleitoral e Justiça Militar, órgãos que

também sofrem a ação do Chefe do Poder Executivo.

O Tribunal Superior do Trabalho é composto por dezessete

Ministros, togados e vitalícios, escolhidos dentre brasileiros com mais de trinta e

cinco e menos de sessenta e cinco anos de idade, nomeados pelo Presidente da

Republica, após aprovação pelo Senado Federal, dos quais doze escolhidos

dentre juízes dos Tribunais Regionais do Trabalho, integrantes da carreira da

magistratura trabalhista, três dentre advogado e três dentre membros do Ministério

Público do Trabalho.

Listas tríplices são enviadas ao Presidente da República,

observando-se quanto ao advogados e membros do Ministério Público o que

consta para o quinto constitucional.

A situação não muda nos Tribunais Regionais do Trabalho

que são integrados por juízes do trabalho, escolhidos por promoção, pelos

critérios já mencionados, bem como por advogados e membros do Ministério

Público, também da forma já mencionada.

São, portanto, nomeados pelo Presidente da República.

Compõe-se o Tribunal Superior Eleitoral de, no mínimo, sete

membros.Três juízes, mediante eleição, pelo voto secreto, dentre Ministros do

Supremo Tribunal Federal e dois dentre os Ministros do Superior Tribunal de

Justiça. Por livre nomeação do Presidente da República dois juízes dentre seis

advogados de notável saber jurídico e idoneidade moral, indicados pelo Supremo

Tribunal Federal.

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Neste Tribunal há participação do Poder Judiciário, no

entanto, não se pode esquecer que os eleitos são nomeados pelo Presidente da

República com aprovação do Senado Federal.

A Presidência e a Vice-Presidência serão exercidas dentre os

Ministros do Supremo Tribunal Federal e a Corregedoria Eleitoral dentre os

Ministros do Superior Tribunal de Justiça.

Instalados na Capital de cada Estado-membro e no Distrito

Federal os Tribunais Regionais Eleitorais são compostos de dois juízes eleitos

pelo voto secreto dentre desembargadores do Tribunal de Justiça, de dois juízes

de direito escolhidos pelo Tribunal de Justiça.

Por nomeação do Presidente da República, dois juízes dentre

seis advogados de notável saber jurídico e idoneidade moral, indicados pelo

Tribunal de Justiça.Aqui a participação do Poder Executivo limita-se a nomeação

dos advogados.

Dentre os desembargadores serão eleitos o Presidente e o

Vice- Presidente.

O Tribunal Militar é composto de quinze Ministros vitalícios,

nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a indicação pelo

Senado Federal, sendo três dentre oficiais-generais da Marinha, quatro dentre

oficiais-generais do Exército, três dentre oficiais-generais da Aeronáutica, todos da

ativa e do posto mais elevado da carreira.

Cinco civis escolhidos pelo Presidente da República dentre

brasileiros maiores de trinta e cinco anos, sendo três dentre advogados de notório

saber jurídico e conduta ilibada, com mais de dez anos de efetiva atividade

profissional e dois, por escolha paritária, dentre juízes auditores e membros do

Ministério Público da Justiça Militar.

Por fim, tem-se o Conselho Nacional de Justiça que como

afirmado é órgão do Poder Judiciário, mas que não exerce a função jurisdicional.

Composto de quinze membros entre magistrados, membros

do Ministério Público, advogados e cidadãos todos nomeados pelo Presidente da

República após a aprovação por maioria absoluta do Senado Federal.

Assim, conforme a Constituição Federal a composição dos

Tribunais mencionados e do órgão de controle do Poder Judiciário depende da

vontade do Presidente da República com aprovação do Senado Federal.

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Como um Poder inferiorizado, o Judiciário executa sua função

sem que tenha a propalada independência dos Poderes para formar sua própria

composição. Está sua composição atrelada à vontade do Presidente da República

que por essencialidade do sistema político está vinculado aos compromissos de

ideologia partidária. Por isto, a composição do Poder Judiciário, por seus

membros, está carregada de ideologias político-partidárias emergentes de quem

faz a escolha dos magistrados.

A titularidade do exercício dos Poderes Legislativo e

Executivo independe de ingerência do Poder Judiciário, mas a titularidade de

exercício do Poder Judiciário, nos Tribunais, depende da ingerência dos Poderes

Legislativo e Judiciário.

Arremata-se com CELSO BASTOS quando afirmou que “O

traço importante da teoria elaborada por Montesquieu não foi o de identificar estas

três funções, pois elas já haviam sido abordadas por Aristóteles, mas o de

demonstrar que tal divisão possibilitaria um maior controle do poder que se encontra

nas mãos do Estado. A idéia de um “sistema de freios e contrapesos”, onde cada

órgão exerça as suas competências e também controle o outro, é que garantiu o

sucesso da teoria de Montesquieu.”68

68 BASTOS, Celso – Curso de Direito Constitucional, p. 159.

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CAPITULO III

AS FUNÇÕES ESTATAIS NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS

O Estado brasileiro já experimentou inúmeras transformações,

por isto é necessário verificar em cada época da história como as funções e os

Poderes estavam previstos nas respectivas Constituições.

A leitura de cada Constituição vai mostrar o quadro

constitucional para cada Poder preocupando-se basicamente na maneira de

assunção aos cargos e também a posição de cada Poder no formato

constitucional.

3.1. Constituição de 25 de março de 1.824.

Antecede a Constituição o Decreto de 13 de novembro de

1823 em que o Imperador expressa haver dissolvido no dia anterior a Assembléia

Geral Constituinte para em seguida criar um Conselho de Estado, formado por

seus seis Ministros mais quatro pessoas que nomeia com fim de apresentar um

projeto de Constituição.

A primeira Constituição foi outorgada pelo Imperador,

entretanto houve consulta às Câmaras Municipais de todo o país e só após o

decurso de certo prazo é que a mesma foi apresentada pela Comissão nomeada,

por isto, pode-se falar que houve algum consenso com o texto.

No ano de 1.824, o Brasil era um Império sendo conceituado

como associação política de todos os cidadãos brasileiros. Formam, expressa o

art. 1º da Carta de Lei de 25 de março, uma Nação livre e independente que não

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admite com qualquer outra laço algum de união ou federação, que se oponha à

sua independência.

Este artigo inicial da primeira Constituição, mostra a vontade

de que o Brasil seja sempre um Império e a preocupação com a soberania.

O Governo era monárquico hereditário, constitucional e

representativo.

Embora com monarquia hereditária, a Constituição começou

bem, pois se apresentou como regra primeira a ser obedecida. Estabeleceu

representatividade, o que supõe-se de algum modo à participação popular.

Antes mesmo antes de estabelecer os Poderes a

Constituição, em seu art. 9º, traça a divisão e a harmonia, pois expressa que a

divisão e a harmonia dos poderes políticos é o princípio conservador dos direitos

dos cidadãos e o mais seguro meio de fazer efetivas as garantias que a

Constituição oferece.

Já no Império Dom Pedro reconheceu que os poderes devem

ser divididos, mas harmônicos, que a divisão e a harmonia formam o principio

conservador dos direitos dos cidadãos. Os direitos e garantias constitucionais só

se efetivam se observado o principio conservador. Em suma, divisão e harmonia

dos Poderes se apresentam como garantia aos cidadãos de que seus direitos e

garantias constitucionais serão respeitados.

O art. 10 reconhece quatro poderes políticos, que em seguida

são considerados como delegações da Nação. São eles: o Poder Legislativo, o

Poder Moderador, o Poder Executivo e o Poder Judicial.

Com estes poderes políticos alguns afirmam a instauração do

sistema parlamentar de governo no Brasil, mas também há posicionamentos

contrários. As palavras de SERGIO RESENDE DE BARROS mostram posição

contrária: “O parlamentarismo não tem raiz entre nós. Alguns querem provar que

se praticou um governo parlamentarista no Brasil imperial. Na verdade, aí não

houve senão um atípico governo de gabinete, consentido pelo imperador, mas

submetido de tal modo ao seu poder, que mais de descaracterizou do que se

caracterizou como parlamentarismo”.69

69 BARROS, Sergio Resende – Parlamentarismo ou Presidencialismo? In Revista FMU, Ano 3, p.15.

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Se é que houve este parlamentarismo, chamado de bastardo

o mesmo não teve penetração histórica.

O Poder Legislativo é delegado à Assembléia Geral com a

sanção do Imperador. A Assembléia compõe-se de duas Câmaras; Câmara de

Deputados e Câmara de Senadores ou Senado.

Naquela época os membros do Poder Legislativo já gozavam

de imunidades durante o mandato porque eram invioláveis pelas opiniões que

emitissem no exercício da função, e se fossem pronunciados, o Juiz deveria

suspender todo o ulterior procedimento comunicando a respectiva Câmara, a qual

deveria decidir se o processo deveria continuar e o membro ser ou não suspenso

do exercício de suas funções.

Tinha a Assembléia Geral atribuições que influíam no Império

e no Poder Moderador, como, por exemplo, reconhecer o Príncipe Imperial,

nomear tutor ao Imperador, menor, caso seu pai o não tenha nomeado em

testamento, escolher nova dinastia em caso de extinção da Imperante.

Era atribuição privativa da Câmara dos Deputados a iniciativa

sobre escolha da nova dinastia no caso de extinção da Imperante. Também,

decidir sobre a admissibilidade de acusação contra Ministros de Estados e

Conselheiros de Estado.

O Senado, que era composto por membros vitalícios, ao

contrário da Câmara dos Deputados cujos mandatos eram temporários era

organizado por eleição provincial.

Além dos eleitos por província, os Príncipes da Casa Imperial

eram Senadores por direito e com assento ao Senado ao atingirem 25 anos de

idade, nos termos do art.46.

Como atribuição exclusiva podemos mencionar conhecer dos

delitos individuais cometidos pelos membros da Família Imperial, Ministros de

Estado, Conselheiros de Estado e senadores; e dos delitos dos Deputados

durante o período da Legislatura.

Causando desequilíbrio entre as duas Casas do Poder

Legislativo, os subsídios dos Senadores eram de tanto e mais metade, do que

tiverem os Deputados.

Dando uma conotação de superioridade a este Poder, o art.

98 expressa que o Poder Moderador é a chave de toda a organização política, e é

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delegado privativamente ao Imperador, como Chefe Supremo da Nação e seu

primeiro representante, para que, incessantemente vele sobre a manutenção da

independência, equilíbrio e harmonia dos mais poderes políticos.

Da disposição constitucional se percebe que a pessoa do

Imperador, e não o Poder, é a peça superior, porque ele é o Chefe Supremo da

Nação e seu primeiro representante. Se era Chefe Supremo estava acima dos

demais Poderes Políticos. Era de responsabilidade dele manter o equilíbrio e a

harmonia entre dos demais poderes políticos.

Sua supremacia está de forma categórica no art.99 que

expressa que a pessoa do Imperador é inviolável e sagrada, como se fosse um

ser divino. Não estava sujeito a nenhuma responsabilidade.

Exercendo o Poder Moderador, o Imperador podia prorrogar

ou adiar a Assembléia geral, bem como dissolver a Câmara dos Deputados, bem

como convocar outra para substituir.

Interferindo no Poder Executivo podia nomear e demitir

Ministros de Estado e no Poder Judicial podia suspender Magistrados. Ainda,

podia perdoar ou moderar penas impostas, além de conceder anistia.

Na verdade o Imperador não interferia no Poder Executivo

porque ele o exercitava através dos Ministros de Estado. Assim, o Imperador

exercitava o Poder Moderador e o Poder Executivo; tínhamos então em uma só

pessoa a reunião constitucional do exercício de dois Poderes do Império.

A função executiva tinha dentre as principais atribuições,

convocar nova Assembléia Geral ao terceiro ano da Legislatura existente e

nomear Magistrados.

Estabelecia a Constituição que o Poder Judicial é

independente e será composto de Juízes e Jurados.

Dispunha o art. 153 que os Juízes de Direito eram perpétuos;

o que, todavia, não impedia que fossem mudados de um lugar para outro pelo

tempo e maneira que a lei determinar.

O Imperador tinha o poder de suspender os Juízes por

queixas contra eles, mas somente por sentença podiam perder o lugar.

A simples leitura mostra que, no Império do Brasil, o

Imperador era constitucionalmente e de fato o Chefe Supremo.

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Inviolável e sagrado exercia o Poder Moderador e o Poder

Executivo. Podia adiar ou prorrogar a Assembléia geral, bem como dissolver a

Câmara dos Deputados e nomear outra.Nomeava e suspendia Magistrados.

Enfim, o Imperador era o Chefe Supremo.

3.2. Constituição de 24 de fevereiro de 1.891.

Antes da Constituição de 1.891 o Decreto nº 1, de 15 de

novembro de 1.889 proclama provisoriamente a República Federativa,

constituindo os Estados Unidos do Brasil.

Em 15 de junho de 1.890 o Governo Provisório chefiado pelo

Marechal Deodoro da Fonseca expediu o Decreto, nº 510, de 22 de junho de

1.890 apresentando uma nova Constituição, mas expressando que o Congresso a

ser eleito julgará a Constituição, no entanto vigorando de imediato e unicamente

no tocante à dualidade das Câmaras do Congresso, à sua composição, à sua

eleição e à função, que são chamadas a exercer, de aprovar a dita Constituição e

proceder em seguida na conformidade de suas disposições, nos termos de seus

três artigos.

O Congresso Constituinte, eleito na data de 24 de fevereiro de

1.891, apresenta, como representante do povo, uma outra Constituição, com o fim

de organizar um regime livre e democrático.

Nas disposições preliminares da Organização Federal dispõe

o art. 15 que São órgãos da soberania nacional o Poder Legislativo, o Executivo e

o Judiciário, harmônicos e independentes entre si.

Assim, a Constituição da República há pouco proclamada

reconhece que a soberana nacional exige os três clássicos Poderes, bem como a

harmonia e a independência.

Instala-se também com a proclamação da República o

sistema presidencialista que mereceu criticas da MEDEIROS DE ALBUQUERQUE

da Academia Brasileira, nos seguintes termos: “O regimem presidencial não foi

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73

instituído no Brasil depois de uma propaganda que tivesse mostrado suas

vantagens e desvantagens.Ele foi uma surpresa e um logro” 70.

O Poder Legislativo é exercido pelo Congresso Nacional com

a sanção do Presidente da República e composto de dois ramos: a Câmara dos

Deputados e o Senado Federal.

A Câmara dos Deputados formada por representantes do

povo e o Senado por representantes do Estado e do Distrito Federal.

Cabe a Câmara dos Deputados declarar sobre a procedência

ou improcedência da acusação contra o Presidente da República e Ministros de

Estado, nos crimes conexos com os do Presidente da República.

No art. 32 o Senado sofre ingerência direta do Poder

Executivo porque o Vice-Presidente da República é o Presidente do Senado.

Ao Senado, privativamente, compete julgar o Presidente da

República.

Ao Congresso incumbia, não privativamente, velar pela

guarda da Constituição, o que de certa forma lhe dava um caráter de Poder

Judiciário, cuja Corte Suprema deve velar como atribuição pela guarda da

Constituição Federal.

Nas Disposições Gerais a Constituição previa a instituição de

um Tribunal de Contas para liquidar as contas da receita e despesa e verificar sua

legalidade, antes de serem prestados ao Congresso. Os membros deveriam ser

nomeados pelo Presidente da República, após aprovação pelo Senado.

O Tribunal de Contas já se apresenta como um auxiliar do

Congresso Nacional, porque antes do Congresso receber as contas estas já

passavam por uma análise técnica.

O Poder Executivo é exercido pelo Presidente da República,

como chefe eletivo da Nação, como dispõe a redação do art.41.

Dentre as atribuições do Poder Executivo, compete

privativamente ao Presidente da República, dar conta anualmente da situação do

País ao Congresso Nacional, o que mostra que o administrador deve dar contas

ao povo.

70 ALBUQUERQUE, Medeiros e – Parlamentarismo e Presidencialismo no Brasil, p.11.

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Compete nomear os membros do Supremo Tribunal Federal e

os magistrados federais mediante proposta do Supremo Tribunal.

A redação constitucional dá ao Presidente da República o

poder de compor o Poder Judiciário, que então tem sua independência

chacoalhada.

O Presidente da Republica nomeia os magistrados federais

que são indicados pelo Supremo Tribunal, entretanto os membros de mencionado

Tribunal são nomeados pelo Presidente; assim o Poder Judiciário passa a ter sua

composição conforme a vontade e os compromissos do Presidente da República.

A mais alta Corte de Justiça depende do Presidente da

República para sua composição.

Tem o Presidente da República a garantia que nos crimes

comuns, se a Câmara dos Deputados entender procedente a acusação, ser

julgados pelos integrantes do Supremo Tribunal Federal, isto é, por aqueles

magistrados nomeados pelo Poder Executivo.

Dispõe o art.55 que o Poder Judiciário da União terá por

órgãos um Supremo Tribunal Federal e tantos Juízes e Tribunais Federais,

distribuídos pelo País, quantos o Congresso criar.

Evidente que a criação de cargos e tribunais compete ao

Congresso Nacional diante da dependência de lei, no entanto a verificação da

necessidade deve caber ao Poder Judiciário, pois é ele que tem conhecimento da

situação judicial.

Os membros do Supremo Tribunal Federal, em casos de

crimes de responsabilidade, eram julgados pelo Senado Federal, que então

exercia a função judicante.

Por fim, concedeu a Constituição o poder ao Congresso

Nacional, após a promulgação, de eleger o Presidente e o Vice-Presidente da

República, por maioria absoluta.

Quanto aos Juízes estabeleceu apenas a necessidade de

nomeações para a nova organização judiciária.

3.2.1. Emendas de 1.926.

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A Constituição de 24 de fevereiro sofreu emendas em 1926,

merecendo destaque o que segue.

O Governo Federal teve sua atuação limitada quanto à

intervenção nos Estados, mas permitindo para assegurar a independência e

harmonia dos poderes, a inamovibilidade, vitaliciedade e irredutibilidade de

vencimentos dos magistrados.

O texto coloca o governo federal como defensor dos demais

poderes em caso de sofrerem medidas que retirem as garantias constitucionais.

Ao Congresso Nacional foi dado a competência de organizar

a Justiça Federal, o que transfere atribuição de assunto interno de um Poder para

outro.

O que é preciso ressaltar é que a cultura de centralizar

poderes na União em detrimento dos Estados membros e dos Municípios, e

portanto em mãos do Presidente da República está sempre presente nas entre-

linhas constitucionais.

Aliás, MARIA GARCIA já reconheceu esta concentração

quando escreveu sobre a Constituição de 1891, afirmando que “a pessoa União

irá prevalecer, efetivamente nos textos constitucionais brasileiros, demonstrando a

sua prevalência, não obstante a declaração federativa...”. Enfatiza também a

autora que na cultura brasileira há subserviência ao poder central, acentuado pelo

sistema presidencialista de governo.71

3.3. Constituição de 16 de julho de 1.934.

Em 11 de novembro de 1.930 Getulio Vargas edita o Decreto

nº 19.398 e institui o Governo Provisório dos Estados Unidos do Brasil.

71 GARCIA, Maria – As Constituições Brasileiras, p.19 “A propósito da proclamação da União dos Estados, ressalta-se a figura do “Estado da União”, do modelo norte-americano, e a pessoa da União irá prevalecer, efetivamente, nos textos constitucionais brasileiros, demonstrando a sua prevalência, não obstante a declaração federativa, por todas as formas e meios e a despeito da Constituição –

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Dispõe o art. 1º que o Governo Provisório exercerá,

discricionariamente em toda sua plenitude as funções e atribuições, não só do

Poder Executivo, como também do Poder Legislativo, até que eleita a Assembléia

Constituinte, estabeleça a reorganização constitucional do País.

Agora se tem o afastamento e a reunião de dois Poderes em

um só órgão, o Governo Provisório.

Dispôs o art. 3º que o Poder Judiciário deveria continuar

sendo exercido na conformidade das leis em vigor, mas com as modificações que

vierem a ser adotadas de acordo com o Decreto que era editado.

Enfim, o Governo Provisório tinha nas mãos os três Poderes

reconhecidos pela Constituição anterior.

O Decreto chamado de lei em alguns seus artigos passou a

ser o documento jurídico máximo, pois todas as demais normas deviam

obediência às suas regras.

As garantias constitucionais foram suspensas, menos a

apreciação de casos pelo Poder Judiciário, mas conforme o Decreto e suas

modificações.

Posteriormente, agora pelos representantes do povo reunido

em Assembléia Nacional Constituinte, é promulgada a Constituição de 16 de julho.

Expressa o art. 3º que São órgãos da soberania nacional,

dentro dos limites constitucionais, os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário,

independentes e coordenados entre si.

Interessante observar que o texto coloca os Poderes

submissos aos limites constitucionais, estando, portanto, a Constituição como

norma reguladora dos Poderes.

Importante proibição está no parágrafo primeiro que veda aos

Poderes delegar suas atribuições. Assim, se cada Poder tem função que é

originária da teoria de Montesquieu, cada um deve exercer a sua sem delegar a

qualquer outro.

A delegação de atribuições significa postar aquele que delega

em posição de inferioridade, por isso cabe a Constituição precisamente definir as

como resquício do unitarismo estatal, de um certo vezo da cultura brasileira, de subserviência ao poder central, acentuado pelo sistema presidencialista de governo, adotado nessa oportunidade.”

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atribuições de cada um e impedir que haja delegação, seja de forma expressa ou

por meios indiretos.

Seguindo determina que o cidadão investido na função de um

Poder não poderá exercer a do outro, o que significa que também não deve por

meios ardilosos permitir que quem não é legislador legisle.

O desrespeito a estas duas imposições importa em causar

uma certa desorganização estatal, porque desvirtua o sistema de controle.

Nesta Constituição, certa ênfase é dada a Câmara dos

Deputados, porque o art. 22 expressa que o Poder Legislativo é exercido pela

Câmara dos Deputados com a colaboração do Senado Federal.

De acordo com a redação, o Senado colabora o que faz

concluir que não exerce por si.

Faculta à Câmara dos Deputados a convocar qualquer

Ministro de Estado para prestar informações sobre questões do respectivo

Ministério. A falta injustiçada importa em crime de responsabilidade.

Dentre as atribuições está a de julgar as contas do Presidente

da República, o que dispensa comentários posto que efetivamente o povo, através

de seus representantes deve efetivamente vistoriar e julgar o gasto público.

Dispõe o art. 51 que o Poder Executivo é exercido pelo

Presidente da República e dentre suas obrigações está a de prestar contas

anualmente da situação do País, à Câmara dos Deputados.

Em caso de julgamento, o Presidente da República será

processado e julgado nos crimes comuns pela Corte Suprema e nos crimes de

responsabilidade por um Tribunal Especial.

Esta Constituição não dá a todos os integrantes do Poder

Legislativo ou a todos os integrantes de uma Casa a competência privativa de

julgar o Presidente da República nos crimes de responsabilidade, diante da

composição de um Tribunal Especial. Este Tribunal tem como Presidente o da

Suprema Corte, três membros são do Senado Federal e três da Câmara dos

Deputados.

A exacerbação de poderes nas mãos do Presidente da

República é reconhecida por ANNA CANDIDA DA CUNHA FERRAZ ao dizer que

“Destarte, o Poder Executivo era novamente atribuído a uma só pessoa, investida

como presidente da República; a alteração de maior monta fica por conta do

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desaparecimento da figura do vice-presidente da República. De resto, a despeito

das críticas ao sistema presidencial de 1891, e ao exacerbamento do poder

pessoal do primeiro mandatário da República , e do quadro político europeu, de

composição tendencialmente parlamentar, voltava intacto o presidencialismo, e o

Poder Executivo vinha investido ainda de maiores poderes”. 72

Diante da redação do art. 63 o Poder Judiciário na

Constituição de 1934 tinha como órgãos: a Corte Suprema; os Juízes e Tribunais

Federais; os Juízes e Tribunais Militares e os Juízes e Tribunais Eleitorais.

Afastando os Juízes da vida político-partidária, a Constituição

proibia esta atividade, bem como o conhecimento de questões exclusivamente

políticas.

Os Magistrados, então, exerciam, como acontece hoje,

somente direitos políticos ativos, posto que votam, mas não podem receber votos.

A Corte Suprema era composta por onze juízes nomeados

pelo Presidente da República, com aprovação do Senado Federal, dentre

brasileiros natos de notável saber jurídico e reputação ilibada alistados eleitores,

não devendo ter, salvo os magistrados, menos de 35, nem mais de 65 anos de

idade.

Cumpre observar que a aposentadoria compulsória era aos

75 anos de idade.

Em caso da prática de crimes de responsabilidade, os

membros da Corte Suprema deveriam ser julgados pelo tribunal Especial

competente para julgar o Presidente da República.

Dentre sua competência estava processar e julgar

originariamente o Presidente da República nos crimes comuns, como já visto.

Ainda, cabia ao Presidente da República nomear os Juízes

Federais, depois de indicação da Suprema Corte na forma da lei e por escrutínio

secreto.

A Justiça Eleitoral era composta pelo Tribunal Superior de

Justiça Eleitoral, um Tribunal Regional na Capital de cada Estado, Território do

Acre e Distrito Federal, Juízes Singulares além de Juntas Especiais.

72 FERRAZ, Anna Cândida de Cunha – As Constituições Brasileiras, p.29

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O Tribunal Superior era composto de um terço, sorteado

dentre os Ministros da Corte Suprema, outro terço, sorteado dentre os

Desembargadores do Distrito Federal e o terço restante pelo Presidente da

República, dentre seis cidadãos de notável saber jurídico e reputação ilibada,

indicados pela Corte Suprema.

Em suma, o Presidente da República nomeava os Ministros

da Suprema Corte e depois os membros da Justiça Eleitoral.

A Constituição só trata do Senado Federal quando vai cuidar

da coordenação do Poderes; isto é, depois de regular os três Poderes.

O art.88 expressa que imcumbe ao Senado Federal, que é

composto por dois representantes de cada Estado e do Distrito Federal eleitos por

sufrágio universal, promover a coordenação dos Poderes Federais entre si,

manter a continuidade administrativa, velar pela Constituição, colaborar na feitura

de leis e praticar demais atos de sua competência.

Em linhas gerais, cabia ao Senado Federal coordenar os

Poderes, mantendo a continuidade administrativa que é uma função executiva,

velar pela Constituição que é uma função jurisdicional em última instância e

quanto à função legislativa apenas colaborar.

Dentre suas atribuições está a de aprovar as nomeações de

magistrados e dos Ministros do Tribunal de Contas, bem como a organização

judiciária federal.

Cabia propor ao Poder Executivo, mediante reclamação

fundamentada a revogação de atos das autoridades administrativas, quando

praticados contra a lei ou eivados de abuso de poder.

O Tribunal de Contas é mantido, devendo diretamente, ou por

delegações organizadas de acordo com a lei, acompanhar a execução

orçamentária e julgar as contas dos responsáveis por dinheiros ou bens públicos.

Seus Ministros eram nomeados pelo Presidente da República

com aprovação do Senado Federal.

Funcionando como auxiliar do Poder Legislativo, deveria dar

parecer prévio sobre as contas apresentadas anualmente pelo Presidente da

República à Câmara dos Deputados.

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3.4. Constituição de 10 de novembro de 1.937.

Agora o Presidente da República dos Estados Unidos do

Brasil, Getulio Vargas, com a justificativa de defender o País e a Nação da

infiltração comunista decreta uma nova Constituição. Sem legitimidade porque não

foi posta pelo Poder Constituinte Originário, mas sim pelo Chefe de um dos

Poderes e seus companheiros.

Dando atribuição legislativa ao Presidente da República, o art.

12 prevê a possibilidade dele expedir decretos-leis, desde que autorizado pelo

Parlamento.

No período de recesso parlamentar ou dissolução da Câmara

dos Deputados, diante de necessidade, livre estava para editar os decretos-leis

com exceção a algumas matérias, nos termos do art.13.

Nas matérias de organização do Governo, da Administração

Federal e o comando supremo e a organização das forças armadas o Presidente

da República não necessitava de autorização do Parlamento, devendo apenas

observar a Constituição e a dotação orçamentária.

Conforme a previsão, o Poder Legislativo é exercido pelo

Parlamento Nacional com a colaboração do Conselho da Economia Nacional e do

Presidente da República.

Demonstrando a vontade de agir no Parlamento, o Presidente

da República fez esta previsão, ou seja, atuar em outro Poder.

O Parlamento era composto de duas Câmaras: A Câmara dos

Deputados e o Conselho Federal.

Ordinariamente o Parlamento deveria funcionar por quatro

meses, e em caso de prorrogação ou convocação do Presidente da República

estava limitado a deliberar a matéria por ele indicada.

A Câmara era composta de representante do povo,

entretanto, por eleição indireta. Eram eleitos pelos vereadores às Câmaras

Municipais.

O Conselho Federal era composto de representantes dos

Estados e de dez membros nomeados pelo Presidente da República. Os

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representantes dos Estados eram escolhidos pelas Assembléias Legislativas, com

possibilidade de veto pelo Governador do Estado (Poder Executivo), que poderia

ser derrubado por dois terços da totalidade dos membros.

Cabia ao Conselho Federal aprovar as nomeações de

Ministros do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal de Contas.

A presidência do Conselho estava a cargo de um Ministro de

Estado nomeado pelo Presidente da República.

Quanto ao Executivo, é importante observar o caráter

individualista da Constituição porque não se trata do Poder Executivo, mas sim do

Presidente da República.

Tomando todo o Poder o art.73 expressa que O Presidente da

República, autoridade suprema do estado, coordena a atividade dos órgãos

representativos, de grau superior, dirige a política interna e externa, promove ou

orienta a política legislativa de interesse nacional, e superintende a administração

do País.

Como autoridade suprema cabia ao Presidente da República

coordenar as atividades dos órgãos representativos de grau superior, isto é, cabia

coordenar tudo.

Dentre suas prerrogativas estava dissolver a Câmara dos

Deputados, caso ele não aprovasse a medida de estado de emergência, o que

mostra o exercício ditatorial. Também de adiar e prorrogar o Parlamento,

cabendo-lhe então estabelecer o tempo de mandato.

No tocante a responsabilidade, o Presidente da República era

julgado pelo Conselho Federal, depois de declarada por dois terços de votos da

Câmara dos Deputados à procedência da acusação. Vale lembrar que o

Presidente da República nomeava dez membros para o Conselho e podia adiar ou

prorrogar o Parlamento.

Mais grave é que durante o exercício o Presidente da

República não podia ser responsabilizado por atos estranhos às suas funções.

A partir do art. 90 começa a Constituição a organizar o Poder

Judiciário estabelecendo seus órgãos: o Supremo Tribunal Federal, os Juízes e

Tribunais dos Estados, do Distrito Federal e territórios e os Juízes e Tribunais

Militares.

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Diversamente da Constituição de 1.934, agora não há

previsão da Justiça Eleitoral como órgão do Poder Judiciário e há a inclusão dos

Tribunais Estaduais.

O art. 94 veda o conhecimento por parte do Poder Judiciário

de questões exclusivamente políticas.

Trata o art. 96 da declaração de inconstitucionalidade de lei

ou de ato do Presidente da República, mas o parágrafo único dá força ao

Presidente da República e ao Parlamente de ignorarem a decisão jurídica do

Poder competente para a decisão.

Dispõe o parágrafo que declarada a inconstitucionalidade de

uma lei que, a juízo do Presidente da República, seja necessária ao bem estar do

povo, à promoção ou a defesa de interesse nacional de alta monta, poderá o

Presidente da República submetê-la novamente ao exame do Parlamento, e se

este confirmar por dois terços dos votos de cada uma das Câmaras, ficará sem

efeito a decisão do Tribunal.

Em suma, uma decisão exclusivamente política afasta

decisão jurídica.

Dispôs a Constituição sobre a composição do Supremo

Tribunal Federal com onze Ministros nomeados pelo Presidente da República,

com aprovação do Conselho Federal, dentre brasileiros natos de notável saber

jurídico e reputação ilibada, não devendo ter menos de trinta e cinco, nem mais de

cinqüenta e oito anos de idade.

No caso de crimes de responsabilidade, os Ministros do

Supremo Tribunal Federal deveriam ser processados e julgados pelo Conselho

Federal que como visto era formado por representantes dos Estados e mais dez

pessoas nomeadas pelo Presidente de República.

A competência do Supremo Tribunal Federal está exposta no

art. 101 e não consta julgar o Presidente da República e nem membros do

Parlamento.

Prevê o art. 114 o Tribunal de Contas composto por membros

nomeados pelo Presidente da República, com aprovação do Conselho Federal,

com o fim de acompanhar, diretamente ou por delegações organizadas de acordo

com a lei, a execução orçamentária, julgar as contas dos responsáveis por

dinheiros ou bens públicos e da legalidade dos contratos celebrados pela União.

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Nas disposições finais e transitórias, a Constituição

demonstrou a superioridade do Presidente da República com poderes

constitucionais escritos na Constituição, mas inconstitucionais perante a

Constituição filosófica porque com certeza, não refletiam a vontade da Nação em

concentrar poderes nas mãos de uma única pessoa.

Por primeiro foi renovado o mandato presidencial até

realização de plebiscito que não aconteceu.

Os Governadores poderiam ter seus mandatos confirmados

ou não pelo Presidente da República. Não confirmação importava em intervenção

no Estado.

Todo o Poder Legislativo da Federação foi dissolvido, ficando

o Presidente da República com o poder de expedir decretos-leis sobre todas as

matérias da competência legislativa da União.

Por fim declarou o estado de emergência que permitia a

suspensão de direitos fundamentais, nos termos do art. 166 e seguintes.

Com a despudorada prevalência do Poder Executivo, o

Legislativo e o Judiciário foram colocados em grau subalterno.

3.5. Constituição de 18 de setembro de 1.946.

Com a queda de Getulio Vargas, assumiu o Poder José

Linhares que editou lei providenciou a elaboração de nova Constituição.

A Lei Constitucional nº 13, de 12 de novembro de 1.945

expressou que os eleitos a 2 de dezembro de 1945 para a Câmara dos Deputados

e o Senado Federal reunir-se-ão no Distrito Federal, sessenta dias após as

eleições, em Assembléia Constituinte, para votar, com poderes ilimitados, a

Constituição do Brasil.

No Titulo I, Capítulo I, mas somente no art. 36 é que está

escrito que São Poderes da União o Legislativo, o Executivo e o Judiciário,

independentes e harmônicos entre si. Ainda, que o cidadão investido na função de

um deles não poderá exercer a do outro, salvo as exceções previstas na

Constituição, e também que é vedado à delegação de atribuições a qualquer dos

Poderes.

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A previsão constitucional mostra que a separação dos

Poderes no tocante ao exercício não é absoluta, porque impede que quem

exercite a função de um dos Poderes exerça a do outro, no entanto ressalva

disposições constitucionais em contrário.

O Poder Legislativo é exercido pelo Congresso Nacional, que

se compõe da Câmara dos Deputados e do Senado Federal.

O art.45 dá proteção aos membros do Poder Legislativo

porque só admite a prisão dos mesmos em flagrante de crimes inafiançáveis e só

podem ser processados criminalmente após a prévia licença de sua Câmara.

Ainda, havendo a prisão, cabia a respectiva Câmara decidir

por mantê-la ou não.

Dentre as atribuições estava julgar as contas do Presidente

da República.

Como já constava de Constituições anteriores, a Câmara dos

Deputados era composta de representantes do povo e o Senado Federal de

representes dos Estados e Distrito Federal.

Cabia privativamente a Câmara dos Deputados decidir sobre

a procedência ou improcedência da acusação contra o Presidente da República

tanto em crimes comuns como de responsabilidade. Também a iniciativa de

tomada de contas do Presidente da República quando não fossem prestadas no

prazo de sessenta dias a contar da abertura da sessão legislativa.

No tocante ao Senado Federal o Vice-Presidente da

Republica exercia a presidência, com voto de qualidade.

Competia privativamente julgar o Presidente da Republica nos

crimes de responsabilidade, bem como os Ministros do Supremo Tribunal Federal.

Também competia privativamente aprovar a escolha de

magistrados nos casos estabelecidos na Constituição.

Exercido pelo Presidente da República, o Poder Executivo

tinha, entre outras, atribuições prestar anualmente ao Congresso Nacional contas

relativas ao exercício anterior.

Quanto à responsabilidade do Presidente da República era

julgado pelo Senado Federal nos crimes de responsabilidade e pelo Supremo

Tribunal Federal quanto aos crimes comuns, diante de prévia aprovação da

Câmara dos Deputados quanto à procedência da acusação.

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Com a renúncia do Presidente da República, Jânio Quadros,

conta à história que uma das condições para que o Vice-Presidente da República

assumisse fosse a aceitação da instituição do sistema parlamentar de Governo.

Através da Emenda Constitucional nº 4, de 02 de setembro de

1.961 a Mesa da Câmara dos Deputados e Mesa do Senado instituíram o

Parlamentarismo no Brasil.

Por este sistema, o Presidente da República perdeu muito de

seus poderes.

Após estabelecer que o Poder Executivo é exercido pelo

Presidente da República e pelo Conselho de Ministros, cabendo a este a direção e

a responsabilidade da política do Governo, assim como da Administração Federal,

cuida a emenda de fixar as competências.

O art. 1º já deixa claro que ao Conselho cabe a direção e a

responsabilidade da política do governo além, da administração federal.

Percebe-se pela disposição do art. 3º que os atos do

Presidente estavam, na maioria, atrelados ao Congresso Nacional e ao Presidente

do Conselho de Ministros.

Competia ao Presidente da República nomear o Presidente

do Conselho de Ministros e por indicação deste os demais Ministros de Estado.

Celebrar tratados e convenções internacionais ad referendum

do Congresso Nacional; declarar a guerra depois de autorizado pelo Congresso

Nacional bem como fazer a paz; permitir, só depois de autorizado pelo Congresso

Nacional, que forças estrangeiras transitem ou permaneçam no território nacional;

exercer através do Presidente do Conselho de Ministros o comando das forças

aramadas.

Até para nomear ou exonerar o Prefeito do Distrito Federal e

membros do Conselho de Economia, o Presidente da República precisava de

aprovação, neste caso do Senado Federal.

Todos os atos do Presidente da República para sua validade

dependiam do referendo do Presidente do Conselho de Ministros e do Ministro da

respectiva área.

Interessante que o Presidente do Conselho e os Ministros

podiam participar das discussões em qualquer das Casas do Congresso, não

havendo esta previsão ao Presidente da República.

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O artigo 18 expressa que ainda compete ao Presidente do

Conselho: ter a iniciativa de leis do governo; manter relações com Estados

estrangeiros e orientar a política externa; exercer o poder regulamentar; decretar o

estado de sítio e intervenção federal; enviar a Câmara dos Deputados e proposta

de orçamento e prestar anualmente ao Congresso Nacional as contas relativas ao

exercício anterior.

Por fim, a emenda extinguiu o cargo de Vice-Presidente da

República.

Enfim, com a instituição do sistema parlamentar, os poderes

do Presidente da República se retraíram e ele passou a ter aprovação do Poder

Legislativo ou do Presidente do Conselho para muitos de seus atos, perdendo a

função da administração federal.

Os órgãos do Poder Judiciário são ampliados para constar:

Supremo Tribunal Federal, Tribunal Federal de Recursos, Juízes e Tribunais

Militares, Juízes e Tribunais Eleitorais e Juízes e Tribunais do Trabalho.

Mesmo em disponibilidade, aos Juízes ficou vedado exercer

outra função pública, salvo de magistério secundário e superior.Proibido também

exercer a atividade político-partidária.

Prevê o art. 98 a composição por onze Ministros, estes

nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pelo

Senado Federal, dentre brasileiros maiores de trinta e cinco anos, de notável

saber jurídico e reputação ilibada.

Em caso de crimes de responsabilidade deveriam ser

processados e julgados pelo Senado Federal.

Dentre a competência estava previsto processar e julgar o

Presidente da República nos crimes comuns.

Composto por nove juízes nomeados pelo Presidente da

República, depois da aprovação pelo Senado Federal, houve a previsão do

Tribunal Federal de Recurso. Dois terços deviam ser escolhidos entre magistrados

e um terço entre advogados e membros do Ministério Público, maiores de trinta e

cinco anos, de notável saber jurídico e reputação ilibada.

Quanto aos juízes e Tribunais Eleitorais, a composição se

dava por escrutínio secreto de dois juízes escolhidos pelo Supremo Tribunal

Federal, dente seus Ministros; dois juízes escolhidos pelo Tribunal Federal de

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Recurso, dentre seus juízes e um juiz escolhido pelo Tribunal de Justiça do

Distrito Federal dentre seus desembargadores.

Havia a participação do Presidente da República que

nomeava dois, dentre seis cidadãos de notável saber jurídico e reputação ilibada,

indicados pelo Supremo Tribunal Federal.

Nos Tribunais Regionais Eleitorais além dos membros

escolhidos entre Desembargadores e Juízes de Direito o Presidente da república

nomeava dois dentre seis cidadãos, indicados pelo Tribunal de Justiça do

respectivo Estado.

Pretendeu-se, com esta Constituição, restaurar o sistema

democrático de 1891 e 1934; entretanto, após o Golpe Militar de 1964, ela foi

muitas vezes ignorada a e Nação passou a ser governada pelos chamados Atos

Institucionais, forma que o Poder Executivo encontrou de governar à margem da

vontade constitucional.

3.6.Constituição de 24 de janeiro de 1.967.

Através do Ato Institucional nº 4, de 7 de dezembro de 1966 o

Presidente da República oriundo do regime militar implantado pela Revolução de

31 de março de 1964, convocou o Congresso Nacional para se reunir

extraordinariamente de 12 de dezembro de 1966 a 24 de janeiro de 1967 com o

fim de discutir, votar e promulgar o projeto de Constituição por ele apresentado,

fixando o dia 24 de janeiro para promulgação.

Posteriormente, em 17 de outubro de 1969, é promulgada

pelos Ministros Militares, que dias antes declararam vago os cargos de Presidente

e Vice-Presidente da República, em razão de enfermidade do primeiro, a Emenda

Constitucional nº 1 que apresenta redação integral para a Constituição de 1.967.

Seguindo a tradição, prescreve que são Poderes da União,

independentes e harmônicos, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.

Salvo previsão constitucional é vedado a qualquer dos

Poderes delegar atribuições, e quem for investido na função de um deles não

poderá exercer a do outro.

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O Poder Legislativo, exercido pelo Congresso Nacional, se

compõe da Câmara dos Deputados e do Senado Federal.

À Câmara dos Deputados compete privativamente declarar,

por dois terços dos seus membros, a procedência de acusação contra o

Presidente da República e proceder à tomada de contas quando o Presidente da

República não apresentar ao Congresso Nacional dentro de sessenta dias após a

abertura da sessão legislativa.

Ao Senado compete privativamente julgar o Presidente da

República e os Ministros do Supremo Tribunal Federal nos crimes de

responsabilidade.

Aprovar, previamente, por voto secreto, a escolha de

magistrados, nos casos determinados pela Constituição, bem como de membros

do Tribunal de Contas.

Tratando de espécies normativas, a Constituição previu as

leis delegadas e os decretos-leis.

Estas duas espécies normativas previstas no art.46 estão

compreendidas no processo legislativo, mas são elaboradas pelo Presidente da

República, o que importa concluir o Executivo exercendo a função do Legislativo.

Por meio de resolução do Congresso Nacional ao Presidente

da República, está previsto receber a delegação de elaborar leis; com exceção de

algumas matérias que são vedadas a delegação.

No caso dos decretos-leis, com fundamento em urgência ou

interesse público relevante e desde que não haja aumento de despesa, poderia o

Presidente da República expedi-los, mas somente em se tratando de segurança

nacional, finanças públicas, inclusive normas tributárias e criação de cargos

públicos e fixação de vencimentos, como dispõe o art.55.

Sobre este poder extraordinário de legislar, MANOEL

GONÇALVES FERREIRA FILHO comentando a Constituição de 1967 expressa

que: “O decreto-lei é um típico ato normativo primário e geral. Edita-o o Presidente

da República no exercício de uma competência que lhe vem, sem qualquer

intermediário, da Constituição. Manifesta assim a existência de um poder

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normativo primário, próprio do Presidente da República e independente de

qualquer delegação.”73

Exercido pelo Presidente da República, com auxilio dos

Ministros de Estado encontra-se o Poder Executivo. Dentre as atribuições está a

de prestar contas anualmente ao Congresso Nacional.

Pelos crimes comuns, estava sujeito a processo perante o

Supremo Tribunal Federal e pelos crimes de responsabilidade perante o Senado

Federal.

Seguindo as Constituições anteriores, o art.112 dispõe quais

órgãos do Poder Judiciário. Aqueles que exercem a jurisdição: Supremo Tribunal

Federal; Tribunais Federais de Recursos e Juízes Federais; Tribunais e Juízes

Militares; Tribunais e Juízes Eleitorais; Tribunais e Juízes do Trabalho e Tribunais

e Juízes Estaduais.

Posteriormente a Emenda Constitucional nº 7 incluiu como

órgão o Conselho Nacional da Magistratura, composto por membros do Supremo

Tribunal Federal.

Repete as vedações anteriores quanto ao exercício de outra

função pública, salvo uma de magistério e a atividade política-partidária.

O Supremo Tribunal Federal se apresenta composto por onze

Ministros nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha

pelo Senado Federal, dentre cidadãos maiores de trinta e cinco anos de idade, de

notável saber jurídico e reputação ilibada.

Ao Supremo Tribunal na Constituição de 1967 compete

processar e julgar originariamente, nos crimes comuns, o Presidente da

República, o Vice-Presidente da República, os Deputados e Senadores.

Nos crimes comuns e de responsabilidade, os membros dos

Tribunais Superiores da União e dos Tribunais de Justiça dos estados, dos

Territórios e do Distrito Federal, além dos Ministros do Tribunal de Contas.

Compõe-se o Tribunal Federal de Recursos de treze Ministros

vitalícios nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha

pelo Senado Federal, sendo oito entre magistrados e cinco entre advogados e

membros do Ministério Público.

73 FERREIRA Filho - Manoel Gonçalves - Comentários à Constituição Brasileira, p.264.

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A Emenda Constitucional nº 7 alterou o número de Ministros

para vinte e sete, nomeados pelo Presidente da república, sendo quinze dentre

Juízes Federais indicados em lista tríplice pelo próprio Tribunal, quatro dentre

membros do Ministério Público Federal, quatro dentre advogados e quatro dentre

magistrados ou membros do Ministério Público dos Estados e do Distrito Federal.

Os juízes federais são nomeados pelo Presidente da

República dentre os Juízes Federais Substitutos, alternadamente por antiguidade

e por escolha em lista tríplice de merecimento, organizada pelo Tribunal Federal

de Recursos.

Com a mencionada emenda, o art. 123 fez constar à

nomeação desses juízes pelo Presidente da República, escolhidos, sempre que

possível, em lista tríplice, organizada pelo Tribunal Federal de Recursos.

O Superior Tribunal Militar era composto por quinze Ministros

vitalícios, nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha

pelo Senado Federal, sendo três entre oficiais-generais da ativa da Marinha,

quatro entre oficiais-generais da ativa do Exército, três entre oficiais-generais da

ativa da Aeronáutica e cinco entre civis.

Os civis eram escolhidos pelo Presidente da República dentre

cidadãos maiores de trinta e cinco anos, sendo três de notório saber jurídico e

idoneidade moral, com prática forense de mais de dez anos e dois auditores e

membros do Ministério Público da Justiça Militar de comprovado saber jurídico.

O Tribunal Superior Eleitoral era composto mediante eleição,

pelo voto secreto, de três Juízes, entre Ministros do Supremo Tribunal Federal, de

dois Juízes entre os membros do Tribunal Federal de Recursos da Capital da

União. A emenda retirou “da capital da União”.

Completava a composição a nomeação pelo Presidente da

República de dois entre seis advogados de notável saber jurídico e idoneidade

moral, indicados pelo Supremo Tribunal Federal.

Seguindo a mesma linha de conduta a composição dos

Tribunais Regionais Eleitorais apresentava membros do Poder Judiciário

completada por nomeação de dois Juízes pelo Presidente da República, diante de

lista sextupla indicada pelo tribunal de Justiça.

O Tribunal Superior do Trabalho era composto por dezessete

Ministros, sendo onze togados e vitalícios nomeados pelo Presidente da república,

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depois de aprovada a escolha pelo Senado Federal. Sete entre magistrados da

Justiça do Trabalho, dois entre advogados no efetivo exercício da profissão e dois

entre membros do Ministério Público da Justiça do Trabalho.

Seis classistas e temporários em representação paritária dos

empregadores e dos trabalhadores, nomeados pelo Presidente da República.

3.7. Constituição de 05 de outubro de 1.988.

Em 27 de novembro de 1.985 foi promulgada a Emenda

Constitucional nº 26 da Constituição Federal de 1.967, que em seu artigo 1º

declarou: Os Membros da Câmara dos Deputados e do Senado Federal reunir-se-

ão, unicameralmente, em Assembléia Nacional Constituinte, livre e soberana, no

dia 1º de fevereiro de 1987, na sede do Congresso Nacional.

Assim, efetuada a passagem pelas Constituições do Brasil,

chegamos a que está em vigor, que não obstante ser classificada como rígida

apresenta seis emendas constitucionais de revisão nos termos do art.3º do Ato

das Disposições Constitucionais Transitórias e mais de quatro dezenas de

emendas, e ainda tramitando várias propostas.

Com efeito, a Constituição que foi promulgada em 1988 já não

existe e diante da facilidade como é reformada, já se antevê que em breve será

necessária a convocação de outra Assembléia Nacional Constituinte.

Dispõe o art. 2º que São Poderes da União, independentes e

harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.

Teoricamente, portanto, a Constituição adota a teoria da

tripartição dos Poderes como criada por Montesquieu.

Independência e harmonia não significam distanciamento

radical de um Poder em relação ao outro, mas sim que cada um exerça a sua

função de maneira independente e que ao mesmo tempo os três Poderes estejam

harmônicos na procura de alcance do bem comum, conforme a vontade e

objetivos da Nação.

Por uma questão de sistematização a composição e maneira

de composição dos Poderes do Estado na Constituição de 1988 foram tratadas no

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Capitulo anterior quando foi vista a teoria da separação dos poderes, com o fim de

constatar a situação do Estado Brasileiro; deste modo, agora, só resta verificar no

texto constitucional as atribuições de cada Poder.

O Poder Legislativo é exercido pelo Congresso Nacional, que

se compõe da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, como consta da

redação do art. 44.

As atribuições do Congresso Nacional, portanto, do Poder

Legislativo estão enumeradas no art. 48 e 49.

No primeiro enumera as atribuições legislativas porque no

caput expressa a necessidade de sanção do Presidente da República, para dispor

de matérias de interesse da União.

Já no art.49 há previsão de atribuições que demonstram um

controle sobre atos do Poder Executivo, tais como sustar atos normativos que

exorbitem o poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa; julgar

anualmente as contas prestadas pelo Presidente da República e apreciar os

relatórios sobre a execução de planos do governo; fiscalizar e controlar

diretamente, ou por qualquer de suas Casas, os atos do Poder Executivo,

incluídos os da administração indireta.

No art.50, há outra forma de controle de atos do Poder

Executivo porque permite a qualquer das Casas ou qualquer de suas comissões

convocarem Ministro de Estado ou quaisquer titulares de órgãos subordinados

diretamente à Presidência da República para prestarem, pessoalmente,

informações sobre assunto previamente determinado, importando em crime de

responsabilidade a ausência sem justificativa adequada; além da faculdade de

requisitarem informações por escrito.

A atribuição legislativa, função típica do Poder Legislativo,

através do Congresso Nacional está tratada a partir do art. 59, que adiante será

visto no tocante a interferência do Poder Executivo que toma para si a função de

legislar.

Em um só artigo está a atribuição da Câmara dos Deputados

que agora toma para si, o que é complementado pelo Senado Federal, parte de

função que seria do Poder Judiciário por tratar de ato de julgar.

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Compete privativamente a Câmara dos Deputados autorizar,

por dois terços de seus membros, a instauração de processo contra o Presidente

da República e o Vice Presidente da República e os Ministros de Estado.

Cabe observar que a competência privativa não especifica a

espécie de crime, por isto o processo por crime comum ou de responsabilidade

contra o Presidente da República, o Vice-Presidente da República e contra o

Ministro de Estado depende, primeiro, de autorização da Câmara dos Deputados.

Realizam os Deputados Federais um juízo de admissibilidade

com o fim de constatarem se há elementos que indicam justa causa para

instauração de um processo e que tenha, por conseguinte, possibilidade de

tramitação até seu termo final.

Este juízo de admissibilidade é ato judicial através de uma

decisão em que o Juiz profere recebendo ou não determinada ação. Neste juízo

se analisa os indícios existentes com o fim de aferir se há justa causa para

propositura da ação e se há elementos que possibilitem a tramitação processual

até o fim.

Na atribuição em comento o juízo de admissibilidade como

função da Câmara dos Deputados se mostra como um juízo político e jamais

técnico-jurídico.

Da previsão do art. 52, se percebe que o Senado Federal tem

competência constitucional para exercer efetivamente a função de julgar, entrando

assim na esfera do Poder Judicial.

Compete privativamente ao Senado Federal processar e

julgar o Presidente e o Vice-Presidente da República nos crimes de

responsabilidade, bem como os Ministros de Estado e os Comandantes da

Marinha, do Exército e da Aeronáutica nos crimes da mesma natureza conexos

com os praticados pelo Presidente e o Vice-Presidente da República.

Aqui a Constituição deu competência para julgar aqueles que

exercem o Poder Executivo, seus auxiliares diretos e até militares, não se

contentando o Constituinte em somente julgar quem exerce Poder.

O inciso II do mesmo artigo 52, expressa que compete

privativamente ao Senado Federal processar e julgar os Ministros do Supremo

Tribunal Federal, o Procurador Geral da República e o Advogado Geral da União

nos crimes de responsabilidade.

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Da mesma maneira, a competência para julgar extrapola

quem exerce Poder para atingir o Procurador Geral da República e o Advogado

Geral da União.

Depois de dispor sobre outras competências, que seriam até

discutíveis, mas não nesta oportunidade, o parágrafo único determina que nos

julgamentos funciona como Presidente o do Supremo Tribunal Federal, limitando-

se a condenação, que somente será proferida por dois terços dos votos do

Senado Federal, à perda do cargo, com inabilitação, por oito anos, para o

exercício de função pública, sem prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis.

O Senado Federal tem para si a função de julgar

determinadas pessoas ocupantes de cargos de Poder e outros, em crimes de

responsabilidade, no entanto, a Presidência dos trabalhos de julgamento é de

competência exclusiva do Presidente do Supremo Tribunal Federal, que não tem o

direito a voto, mas tão somente de conduzir os trabalhos decidindo as questões

divergentes.

Percebe-se então, o Poder Legislativo controlando atos do

Poder Executivo e exercendo atos do Poder Judiciário.

No sistema presidencialista, o Poder Executivo é exercido por

uma só pessoa, que como vimos exerce a função de Chefe de Governo e Chefe

de Estado. Talvez por isto a Constituição em seu art.84 tenha previsto as

atribuições do Presidente da República em detrimento de as atribuições do Poder

Executivo.

A atribuição não está prevista para o Poder Executivo, mas

sim para a pessoa que exerce o Poder Executivo. Comparando-se aos Poderes

Legislativo e Judiciário observa-se que para estes as atribuições são para os

Poderes e não para os exercentes dos cargos.

O texto mostra uma certa superioridade do Presidente da

República sobre os Legisladores e os Julgadores.

Da leitura se observa à função administrativa, mas também se

observa atribuição de influência dos demais Poderes.

É atribuição do Presidente da República, além da participação

no processo legislativo, nomear os Ministros do Tribunal de Contas que por força

do art.71 trata-se um órgão técnico auxiliar do Congresso Nacional, ou seja, do

Poder Legislativo.

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Lato senso é função do Tribunal de Contas apreciar

tecnicamente as contas do Poder Executivo a fim de que o Congresso Nacional

exercite o controle externo fiscal, contábil e orçamentário, no entanto, quem

nomeia seus integrantes é o Presidente da República.

Mais à frente voltaremos ao assunto.

Também, é atribuição do Presidente da República nomear,

após aprovação do Senado Federal, os Ministros do Supremo Tribunal Federal e

dos Tribunais Superiores.

Nesta disposição, o Presidente da República interfere no

Poder Judiciário. A história também tem mostrado que nomeação se transformou

em presente a amigos, que com compromissos políticos-partidários são galgados

ao Poder de Julgar.

No art.85 e seguintes cuidou a Constituição impor ao

Presidente da República certas regras para seu julgamento.

Nos crimes de responsabilidade, aqueles praticados em razão

do exercício da função, após a admissão da acusação por dois terços da Câmara

dos Deputados, ele será submetido a julgamento perante o Senado Federal.

Em caso da prática de infrações penais comuns, após a

admissão pela Câmara dos Deputados, ele será submetido a julgamento pelo

Supremo Tribunal Federal.

De qualquer forma, o Presidente da República para ser

julgado, precisa que os representantes do povo, reunidos na Câmara dos

Deputados, por dois terços admitam a acusação.

A função do Poder Judiciário, como se sabe, é a jurisdicional;

isto é dizer o direito aos casos concretos postos em julgamento.

Os diversos órgãos do Poder Judiciário exercem a mesma

função, com exceção do Conselho Nacional de Justiça, mas conforme a

competência de cada um fixado pela própria Constituição Federal.

O art. 102 da Constituição Federal expressa qual a

competência do órgão superior do Poder Judiciário, afirmando a competência

precípua de guardar a Constituição.

Assim, de acordo com a redação o Supremo Tribunal Federal

deve funcionar também como Corte Constitucional, isto é, a ele cabe apreciar e

julgar as questões suscitadas sobre constitucionalidade, e fazer sempre valer a

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supremacia da Constituição e jamais decidir em contrário às suas disposições,

seja qual for o argumento.

O inciso I expressa que lhe compete processar e julgar a ação

direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual e a ação

declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal.

Em seguida mostra outras matérias de sua competência,

incluindo o julgamento do Presidente, Vice-Presidente da República, membros do

Congresso Nacional, seus próprios Ministros e o Procurador Geral da República

nos crimes comuns.

Na esfera recursal é competente para julgar mediante recurso

extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a

decisão recorrida contrariar dispositivo da Constituição; declarar a

inconstitucionalidade de tratado ou lei federal e julgar válida lei ou ato de governo

local contestado em face da Constituição.

Compete ao Superior Tribunal de Justiça processar e julgar

originariamente nos crimes comuns, os Governadores dos Estados e do Distrito

Federal. Nos crimes comuns e de responsabilidade, os desembargadores dos

Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, os membros dos Tribunais

de Contas dos Estados e do Distrito Federal, os dos Tribunais Regionais federais,

dos Tribunais Regionais Eleitorais e do Trabalho, os membros dos Conselhos ou

Tribunais de Contas dos Municípios e os do Ministério Público da União que

oficiem perante os Tribunais.

Segue a Constituição com outras matérias de competência.

Aos Tribunais Regionais Federais e Juízes Federais cabe

destacar apenas a competência para processar e julgar originariamente os juízes

federais da área de sua jurisdição, incluídos os da Justiça Militar e da Justiça do

Trabalho, nos crimes comuns e de responsabilidade, e os membros do Ministério

Público da União, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral.

Aos juízes federais destaca-se a competência para processar

e julgar as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública

federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes,

exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral

e à Justiça do Trabalho.

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Compete à Justiça do Trabalho conciliar e julgar os dissídios

individuais e coletivos entre trabalhadores e empregadores, abrangidos os entes

de direito público externo e da administração pública direta e indireta dos

Municípios, do Distrito Federal, dos Estados e da União, e, na forma de lei, outras

controvérsias decorrentes da relação de trabalho, bem como os litígios que

tenham origem no cumprimento de suas próprias sentenças.

Quanto a Justiça Eleitoral dispõe o art. 121 que lei

complementar disporá sobre a organização e competência dos tribunais, dos

juízos de direito e das juntas eleitorais.

O que cabe a lei é organizar a competência eleitoral

distribuindo entre os órgãos previstos na Constituição.

A Justiça Militar compete processar e julgar os crimes

militares definidos em lei, conforme disposição da lei.

Cumpre observar que o Poder Executivo é centralizado na

pessoa do Presidente da República que, sem dúvida alguma, fortalece à pessoa

física que exerce o Poder porque suas ações praticamente independem do

concurso de vontades ou de alguma revisão interna do próprio Poder Executivo.

Diferentemente o Poder Legislativo é bicameral o que exige para o exercício da

função estatal o acordo de vontade a fim de que o ato legislativo emanado tenha

força como ato de Poder. Agora, de maneira bem mais diversa se posiciona o

Poder Judiciário que é formado por diversos órgãos, sendo que cada um tem sua

função delimitada pela Constituição e pelas leis, e ainda há a possibilidade que o

ato judicial seja revisto internamente,isto é, no próprio Poder por algum órgão

superior em questões jurisdicionais

Os três Poderes apresentam suas perceptíveis diversidades,

mas todos eles devem estar voltado ao cumprimento dos objetivos fundamentais

previstos pela Constituição Federal em sua parte inicial.

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CAPÍTULO IV

DO PODER EXECUTIVO-

PARLAMENTARISMO/PRESIDENCIALISMO

Está evidente que o Poder Executivo na pessoa do Presidente

da República é o que se apresenta com forte supremacia em relação aos demais.

Constata-se também que a própria figura do Presidente da República parece

posicionar-se em plano superior ao próprio Poder Executivo.

É inadmissível que a pessoa do Presidente da República,no

sistema organizacional do Estado,tenha posicionamento superior ao próprio Poder

que ele representa. Os Poderes aí estão a mostrar a vontade da Nação e que os

direitos de todos sejam respeitados, o que de fato só é possível se houver a

verdadeira tripartição no exercício das funções estatais.

Entretanto, não é só o Presidencialismo que se apresenta

como uma forma de governo. Dos ensinamentos de MARIA GARCIA tem-se

“Presidencialismo e parlamentarismo são formas de organização e

desenvolvimento de governo, ficando desde logo ressalvado que as duas formas

se compatibilizam com a ordem federativa de Estado: tanto no regime

presidencialista, quanto no parlamentarista as esferas de competência da

União,dos Estados e dos Municípios(no caso brasileiro) são delimitadas na

Constituição,bem como fica nesta definida a natureza das relações entre o

governo central e os governos locais.”74

Exige-se, então, estudo sobre os dois sistemas:

Parlamentarismo e Presidencialismo a fim de constatar suas particularidades.

74 GARCIA,Maria – Presidencialismo e Parlamentarismo in Parlamentarismo ou Presidencialismo?, p.118.

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Evidente que os dois sistemas de governo apresentam suas

vantagens e suas desvantagens, mas o que não pode ser esquecido é que cada

Poder tem sua função definida pela teoria da tripartição, por isso só se admite a

ingerência de um no outro, como forma de controle, no mínimo possível. No

momento em que um Poder passar a exercer a função do outro, o que se tem é a

usurpação de Poder e por conseqüência coloca os Poderes em um

escalonamento em que um fica em grau superior ao outro.

A usurpação afeta o equilíbrio desejado no exercício das

funções estatais. Deste modo, seja sistema Presidencialista ou seja sistema

Parlamentarista, o que se deve preservar é a independência de cada Poder

conforme a vontade da Nação.

4.1. Parlamentarismo.

Dos ensinamentos de NORBERTO BOBBIO podemos

aproveitar que as instituições parlamentares surgiram da estrutura policêntrica do

Estado medieval. A descentralização da autoridade, resultado da organização

feudal, fez surgir a necessidade da ação de um elemento unificador.

Inicialmente esta função pacificadora foi desempenhada pelo

próprio entourage do soberano, isto é, aquela assembléia bastante restrita de

feudatários leigos e eclesiásticos, que receberam o nome de cúria outras

consilium Regis até chegar a Parlamentum.

O século XIX se apresenta como o grande período do

desenvolvimento dos novos parlamentos. Na Inglaterra, na França, na Bélgica, na

Holanda e na Itália, o Parlamento constitui-se o centro do debate político,

estendendo progressivamente a sua influência ao Governo que até então era

expressão de poder Real.

Prossegue o pensador italiano expressando que a monarquia

constitucional cede lugar ao regime parlamentarista, que tem como fulcro a

responsabilidade do governo perante o Parlamento.

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Dentre suas funções, o Parlamento tem a representativa,

devendo funcionar como um órgão, entre o povo e os órgãos do Governo, por isso

a escolha de seus membros deve ser pelo método eletivo a fim de se tentar

impedir que os integrantes por um motivo ou outro fiquem dependentes do

Governo.

Formado por pessoas de origens e classes heterogêneas, o

Parlamento deve conseguir criar uma unicidade de objetivos para possibilitar

representar o povo nas suas aspirações.

Inserido na teoria da separação dos poderes ao Parlamento

está atribuído à função legislativa, no sentido de legislar normas gerais. Ao

Governo está atribuído à função executiva, ou seja, atender aos casos conforme

estabelecido pela legislação.

Esta separação de atribuições não apresenta a nitidez que

deveria. O Governo legisla na sua atividade de administrar e também quando

mantém um bloco ou base de apoio com maioria junto ao Parlamento, a normas

gerais acabam por serem elaboradas conforme sua vontade.

Além da função legislativa, como primordial ao Parlamento, o

controle que exerce sobre o Governo e seus órgãos é uma característica bem

definidora.

Exercendo a função de controle, o Parlamento pode declarar

a queda de confiança no Governo, o que vai exigir a substituição da cúpula

administrativa.

Mas, a forma mais comum e menos drástica está em tornar

notória e apontar à opinião pública, por meio de solicitação de explicações,

interpelações e inquéritos, a atuação do Executivo.

Diante desta visão ampla sobre o Parlamento e Sistema

Parlamentarismo é forçoso concluir que não basta a mera instituição do sistema,

devendo sim ser dotado de instrumentos jurídicos e políticos que permitam

realizar efetivamente a função parlamentar.

Para que tenha um papel significativo no Estado o Parlamento

deve ser o local onde se travam as grandes discussões e decisões nacionais. Os

temas nacionais não devem ser negociados entre Governo e sindicatos, entidades

corporativas, grandes empresas, mas sim na sede do Parlamento local em que

devem estar reunidos os representantes da Nação.

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A importância de um Parlamento forte está bem delineada

quando se afirma que é na sede do Parlamento que se devem discutir os grandes

problemas nacionais, bem como tomar as decisões que se exigem.Aqueles que

exercem as funções no Parlamento devem e podem fortalecer este órgão na

medida em que impeçam pressão do Governo – Poder Executivo -, bem como dos

diversos segmentos da sociedade e principalmente das entidades financeiras.

Evidente que o Parlamento não deve se portar como um

órgão ilhado, ao contrário, deve sim ouvir as forças vivas da Nação; mas apreciar,

discutir e decidir com independência e com fundamento na Constituição e nas leis

vigentes.

O Parlamento deve mostrar a vontade da Nação por suas

pessoas e seus Estados. Com o fim de administrar o Estado e haver uma relação

com a função legislativa surgiu o Parlamentarismo.

O sistema parlamentarista foi elaborado através dos tempos,

sendo, então um resultado histórico que apresenta hoje variações que dependem

do Estado em que está implantado; entretanto há um denominador comum capaz

de abranger as características gerais.

Enuncia ARTHUR MACHADO PAUPÉRIO que “baseia-se o

parlamentarismo, fundamentalmente, sobre a igualdade de prestigio dos dois

poderes do Estado, o Executivo e o Legislativo. Governo e Parlamento, em

colaboração íntima, dentro das atividades do Estado, passam a exercer, um sobre

o outro limitações recíprocas.”75

Estas limitações fundamentais ao sistema são obtidas através

de ação do Conselho de Ministros, que é órgão do Governo, mas em ação direta

com o Parlamento.

O Parlamento e o Governo devem estar presentes em todas

as funções estatais, em graus diversos, derivados da estrutura da cada um, que

passam, então, a influir diversamente nas funções do Estado.

Do enunciado pode-se afirmar que o parlamentarismo exige

um funcionamento correto das instituições. Exige que os dois Poderes, Executivo

e Legislativo, em colaboração, façam o cumprimento da Constituição, ou seja,

façam prevalecer o senso de legalidade.

75 PAUPÉRIO, Arthur Machado – Teoria Democrática do Poder, p.208.

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Deve haver então uma coincidência de vontades.

“Os poderes políticos, ou seja, o Executivo e o Legislativo,

ainda que de forma diferente, trabalham com a mesma matéria prima, participam

das funções de Estado que tratam dos mesmos problemas, embora sob ângulos

aparentemente contraditórios, mas de qualquer forma, diferenciáveis.”.Este é o

pensamento de PAULO BROSSARD.76 Mostra que os poderes devem atuar

juntos, logo, devem ter igualdade de prestígio. O Parlamentarismo Executivo e

Legislativo ocupam o mesmo patamar constitucional. Um controla o outro, mas um

não se sobrepõe ao outro.

Se trabalham ou atuam com a mesma matéria e há

necessidade de um consenso ao final, é certo concluir que a competência se dilui

o que, por conseqüência, faz gerar o equilíbrio entre os Poderes.

Mostrando as diferenças sobre o velho tema MANOEL

GONÇALVES FERREIRA FILHO ensina que “o parlamentarismo é caracterizado

como um sistema de colaboração de poderes. Há, distintos, Legislativo, Executivo

e Judiciário, mas apenas este último é independente em relação aos demais.

Legislativo e Executivo estão intimamente relacionados. O Executivo, em tudo o

que tange a seus poderes, é o gabinete que é criado pela maioria parlamentar e

vive enquanto goza de sua confiança. O Legislativo, em contrapartida, se pode

destituir o gabinete, pode ser dissolvido a pedido deste, para que o eleitorado,

pelo voto, resolva eventual conflito entre os poderes.” 77 Por esta afirmação, a

relação entre o Executivo e o Legislativo é extremamente sólida, como que se

formasse um bloco com funções distintas mas simultaneamente havendo um

embaralhamento.

Como não há nitidez na separação das funções, é certo que o

Parlamento tem funções legislativas, mas também tem executiva, quando, por

exemplo, decide sobre orçamento ou matéria não legislativa. Por sua vez, o

Executivo também acaba por ter alguma atuação legislativa, quando propõe

projeto de lei e participa na sua elaboração lato senso com a sanção e

promulgação.

76 BROSSARD, Paulo – Presidencialismo ou Parlamentarismo in Cadernos APAMAGIS 6, p.92. 77 FERREIRA Fº, Manoel Gonçalves - Presidencialismo “versus” Parlamentarismo-Considerações sobre um velho tema – idem nota anterior, p.111.

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Ao Governo entende-se como uma de suas principais, ou

mesmo a principal atribuição, a de convocar os eleitores para proceder à eleição

da parte eletiva do Parlamento, a de convocar, adiar, prorrogar e encerrar as

sessões parlamentares e, sobretudo, a de dissolver a parte eletiva do Parlamento

e convocar novas eleições.

A faculdade de dissolução do Parlamento por parte do

Governo tem, em contrapartida, a controle exercido pelo Parlamento sobre os atos

do Governo com poder de responsabilizar os Ministros. Ainda, se houver

desaprovação da política seguida pelo Governo, este deve renunciar.

O sistema de responsabilização no Parlamentarismo não

exige que o Chefe do Governo pratique uma conduta considerada criminosa. A

discussão está voltada para o acerto de sua linha política, a utilidade de sua

conduta; enfim é uma responsabilização de atos políticos e não criminal.

A fim de evitar o dever de renúncia pode o Gabinete, órgão

que representa o Governo, pedir ao Parlamento o voto de confiança e mudar a

linha política de ação.

No sistema Inglês o poder do rei, ou da rainha é inviolável e

irresponsável. Exerce atribuições jurídicas, enquanto o poder político está

concentrado nos Ministros e Gabinete de Ministros.

Surge a figura do Premier ou Primeiro Ministro porque o Rei

ou o Presidente está acima dos partidos políticos, sendo elemento permanente do

Governo. Os Ministros, sob a presidência do Primeiro Ministro, formam o Gabinete

e dirigem a política geral do País.

Então, no sistema parlamentarista vamos encontrar três

órgãos: Um Parlamento eleito; um Chefe de Estado politicamente irresponsável e

um Gabinete de Ministros responsável perante o Parlamento.

Como escrito anteriormente, o Parlamentarismo vai

apresentar suas variantes conforme o Estado em que esteja implantado.

O Parlamentarismo, a partir da Inglaterra, começou a se

espalhar pela Europa de depois para outras partes do Mundo. Acabou por ficar

registrado como duas formas: o Inglês e o estabelecido da França, sendo que

cada País o mantém com suas particularidades.

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Na Inglaterra há a máxima de que “O Rei não pode errar”,

sendo assim a unidade do Estado, representando a irresponsabilidade do

Executivo.

Os Ministros são sempre responsáveis pelos atos, de início

individualmente, mas com o decorrer dos anos esta responsabilidade passou a ser

solidária e politicamente perante a Câmara dos Comuns. Por isso, os atos reais

passaram ser referendados por Ministros.

Na conduta de colaboração com o Governo, o Parlamento

traça a diretriz política geral e o Ministério governa, autonomamente, dentro da

diretriz, cabendo, evidentemente, interpelações para se saber como o plano

orientativo está sendo seguido.

O que valoriza o Parlamentarismo Inglês é que todos os

assuntos de interesse nacional passam por ampla discussão, com conhecimento

de todos, portanto com observação da população.

Deve-se lembrar que seu surgimento se deu das correntes

ideológicas que movimentaram a civilização na luta contra o absolutismo. Assim, a

mudança do sistema precisava apresentar concretude, o que se mostrou com a

ampla discussão dos assuntos de interesse nacional.

Cabe deixar expresso que nos primeiros decênios do século

XIX houve o apogeu do parlamentarismo dualista que havia se desdobrado no

Século XIII: O Conselho de Ministros ou Gabinete eram responsáveis perante o rei

e as Casas do Parlamento (Câmara dos Lordes e a Câmara dos Comuns). Em

caso de conflito entre a Câmara dos Comuns e o Governo, deveria requerer ao

Rei que dissolvesse a Câmara a fim de que os eleitores decidissem.

A consolidação do sistema fez que, na atualidade, a influência

decisiva política seja da Câmara dos Comuns ao invés da Câmara dos Lordes.

Aquela é integrada por pessoas eleitas e esta por hereditariedade ou nomeação

da Coroa.

Interessante deixar consignado que a Câmara dos Lordes é o

mais alto órgão do Judiciário, que por força de tradição aprecia recursos na ordem

civil e criminal.

O que caracteriza efetivamente o parlamentarismo, nos

termos de obra citada de MARIA GARCIA é a distinção entre Chefe de Estado e

Chefe de Governo, sendo que o Chefe de Estado tem fundamentalmente funções

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de representação estando acima dos conflitos políticos. Indica o Chefe de

Governo que vai exercer o Poder Executivo. O Chefe de Governo, Primeiro

Ministro, tem responsabilidade política e exerce as funções sem mandato,

podendo ser afastado se perder a maioria parlamentar ou for aprovado o voto de

desconfiança pelo Parlamento. Outra característica é a possibilidade da

dissolução do Parlamento, quando o Primeiro Ministro conta com pequena maioria

e pretende ampliar mediante eleições gerais, ou ainda, quando o Chefe de

Governo solicita ao Chefe de Estado nova eleição justificando que o Parlamento

não corresponde mais à vontade popular.78

Agora, quanto ao Parlamentarismo Francês, que surgiu para

dar aperfeiçoamento à liberdade tão defendida por seu povo, houve mais

relevância em razão do temperamento francês ao contrário do inglês, marcado por

formas rígidas e frias.

A introdução do sistema foi por volta de 1.814 por Luiz XVIII

que observou o funcionamento do sistema criado da Inglaterra, onde estava

exilado, mas a estabilização só ocorreu a partir de 1871 com a queda da

monarquia.

Os poderes do Parlamento surgiram com amplitude, e

inicialmente, o Presidente da Republica era eleito por um período de sete anos por

um colégio eleitoral composto de membros do Parlamento, dos conselhos gerais e

das assembléias territoriais. Hoje, diante da redação do art.6º, o Presidente é

eleito por sete anos,pelo sufrágio universal direto.

Por sua vez, o Primeiro Ministro é nomeado pelo Presidente

da República, entretanto, depois da nomeação, o Presidente não pode

simplesmente tirá-lo do cargo, podendo o Parlamento impor sua manutenção.

De FORMERY tiramos que “... le président de la Republique

ne dispose pás constitutionnellement du pouvoir de révoquer le Premier ministre”.

Ainda, Em effet, le départ du Premier ministre, comme as nominations, doit être

envisagé em relation avec as responsabilité devante lê

78 Op.cit. Parlamentarismo ou Presidencialismo,p.126. “Cabe observar que a partir dessas características decorrem outros sistemas que são variações do parlamentarismo inglês: ora admitindo-se ao Chefe de Estado algumas funções políticas(forma dualista,em oposição à forma monista tradicional),ora como um regime de Gabinete quando o sistema é como que um representante da maioria do Parlamento- hipótese que corresponde ao regime parlamentar bipartidário. O denominado regime de Assembléia,quando o Chefe de Governo “é uma espécie de delegado do Parlamento e atua de comum acordo com ele, o que seria típico do parlamentarismo num sistema pluripartidário.”

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Parlement(v.art.20).Lorsque le Premier ministre est le chefe d`une majorité em

désacord avec le presidente(situation de < cohabitiation> réalisée em 1986,em

1993,puis en 1997),le Parlement pourrait, em fait, imposer son maintien.”79

Então, o Presidente da República é a unicidade do Estado e o

Primeiro Ministro, que se torna seguro no cargo, é ator que governa, e por isso é

responsável perante o Parlamento que pode mantê-lo no cargo contra a vontade

do Presidente da República, situação esta denominada pelos franceses com

situação de coabitação.

Os demais Ministros são nomeados diante de proposição de

seus nomes pelo Primeiro Ministro, mas o Conselho de Ministros é presidido pelo

Presidente da República.

Na sua ação de controle, o Presidente da República pode,

após consulta ao Primeiro Ministro e dos Presidentes das Assembléias, pronunciar

a dissolução da Assembléia Nacional, que junto com o Senado formam o

Parlamento.

O regime parlamentar francês da Constituição de 1958 está

sob a forma de um equilíbrio entre o Governo (não o Executivo) que determina a

política da Nação e o Parlamento diante do qual ele, Governo, é responsável.

O art.49 da Constituição Francesa apresenta disposições

referentes à responsabilidade do Primeiro Ministro perante o Parlamento.

São quatro hipóteses:

A primeira exige que o Primeiro Ministro, após deliberação do

Conselho, peça a Assembléia Nacional a aprovação de seu programa ou de uma

declaração de política geral. É o pedido do voto de confiança.

Pode também, a Assembléia Nacional apresentar uma moção

de censura ao Governo, o que deve ser entendido como uma repreensão sobre a

política geral ou sobre uma conduta que está sendo tomada.

A terceira hipótese se dá quando o Primeiro Ministro, após a

deliberação do Conselho de Ministros, assume expressamente a responsabilidade

do governo perante a Assembléia Nacional sobre o voto de um texto. Neste caso

79 FORMERY, Simon-Louis- La Constitution Commentée Article par Article,Hachette,p.27 (Tradução livre do autor: ...o presidente da República não dispõe constitucionalmente do poder de destituir o Primeiro Ministro. Com efeito, a demissão do Primeiro Ministro, como a nomeação, deve ser considerada em relação com a responsabilidade diante do Parlamento (art.20). Quando o Primeiro Ministro é o chefe de uma maioria em

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o texto é considerado como adotado, salvo se houver uma moção de censura. A

Assembléia Nacional não é chamada a discutir ou pronunciar sobre o texto, ela

somente dispõe, se não concordar com o texto, em retorná-lo ao Governo votando

uma moção de censura. Última hipótese é quando o Governo requer ao Senado a

aprovação de uma declaração de política geral. Esta hipótese funciona apenas

como um reforço à ação do Governo, porque não há na Constituição nenhuma

conseqüência em caso de decisão desfavorável.

Por fim, quando a Assembléia Nacional adotar uma moção de

censura ou desaprovar o programa ou uma declaração de política geral do

Governo, o Primeiro Ministro deve remeter ao Presidente da República a

demissão do Governo.

A responsabilidade política do Governo perante o Parlamento

é a característica do Parlamentarismo. HUGUES PORTELLI ensina que “Le

regime parlamentaire repose sur la confiance accordée par le parlement au

gouvernement.Cette confiance est à l`origine de sa constitution mais doit être

également vérifiée par la suíte”.80

Exige o sistema parlamentar que haja confiança entre o

Parlamento e o Governo, sendo, portanto, a confiança a origem da instituição do

sistema, que deve sempre ser mantida para a continuidade.

A quebra da confiança faz desmoronar o sistema, exigindo a

queda do Governo ou a dissolução do Parlamento, dependendo das regras

estabelecidas.

Não é demais lembrar da Itália que depois do período de

Mussolini retornou ao parlamentarismo e basicamente se apresenta da seguinte

forma:

O Parlamento é bicameral, sendo que as duas Câmaras estão

em situação de igualdade no tocante ao processo legislativo, à definição do

orçamento, à tomada de contas e ao controle da Administração. Ambas podem

ser dissolvidas pelo Presidente da República.

desacordo com o presidente (situação de coabitação vivida em 1986,em 1993 depois em 1997) o Parlamento poderá, de fato, impor sua manutenção.) 80 PORTELLI, Hugues-Cours Droit Constitutionnel, Dalloz, p. 66 (Tradução livre do autor: O regime parlamentar repousa na confiança aceita pelo Parlamento ao Governo. Esta confiança é a origem de sua constituição, mas deve ser igualmente constatada sempre.).

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O Executivo é dual, integrado pelo Presidente da República e

pelo Parlamento que tem representantes de cada Região.

O Governo é composto do presidente do Conselho e dos

Ministros, que, em conjunto, constituem o Conselho de Ministros, sendo que ao

Presidente da República cabe dirigir a política geral do Governo e nomear o

Presidente do Conselho que indica os demais Ministros.

O Presidente da República desempenha suas atribuições,

mas com referendo de um Ministro; portanto não administra isoladamente. É o

Governo que administra.

Por sua vez o Judiciário não foge ao modelo Ocidental, sendo

que completa a Corte Constitucional com a competência do julgamento de

constitucionalidade, conflitos de atribuição e crimes cometidos pelo Presidente da

República ou pelos Ministros de Estado.

4.2. Parlamentarismo racionalizado.

A partir do Parlamentarismo Inglês e do Francês, espalhou-se

o sistema pela Europa que no decorrer do tempo veio, a se firmar em um

parlamentarismo racionalizado.

Racionalização do parlamentarismo significa que o sistema

deve estar fincado em bases bastante explícitas, a fim de afastar quaisquer

dúvidas de seu funcionamento.

Em linhas gerais, a composição dos órgãos essenciais, a

confiança, a moção de censura, a queda do Governo e a dissolução do

Parlamento são matérias que devem estar bem explicitadas pela exigência da

racionalização.

Quanto à legislação, a racionalização exige que fique bem

esclarecido o domínio da lei, no sentido de que a norma é produto do Parlamento,

possibilitando alguma atuação do Governo mas, de forma preponderante, é o

Parlamento quem deve exercer a função legislativa.

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Deve estar bem definida a iniciativa na propositura das leis,

prevendo também sobre as normas que afetam mais o Executivo do que o

Parlamento, como é o caso das leis que tratam do orçamento.

Enfim, o parlamentarismo racionalizado que prevalece é

aquele que bem define os seus órgãos, suas funções e especialidades, buscando

assegurar a estabilidade do Gabinete ou Conselho para garantir a necessária

eficiência governamental.

Em seminário sobre o tema, o Deputado WALDIR PIRES fez

comentários que mostram que o parlamentarismo moderno é o racionalizado, isto

é, aquele que bem define as funções de cada Poder. Após expressar que deve

haver uma reformulação no conceito de separação de poderes, “salvo para a

realização de tarefas e missões que correspondam especificamente a um e a

outro mostrou de forma objetiva a necessidade de normas bem definidas.À

medida que toda sociedade puder participar, pelo exercício da cidadania, nas

regras do processo democrático, poderemos constituir um Estado definindo seus

deveres, seus limites; um Estado que respeite a representação e possa conviver

com a estabilidade. Nesse particular, parece-me desejável a idéia de um

parlamentarismo que o mundo, nesta segunda metade do século XX, começa a

construir, um parlamentarismo que não parta de pressupostos rígidos e

preestabelecidos, que inclua, por exemplo, a figura de um presidente da República

como a grande personalidade interlocutora da Nação, análoga ao que foi

inicialmente o nascimento do parlamentarismo nos regimes monárquicos, em que

havia a figura do príncipe ou rei, assentada em direitos divinos, com todos os seus

privilégios.”81

Refere o pensamento à idéia de que o parlamentarismo

contemporâneo não pode estar arraigado às suas origens de maneira radical, mas

sim um sistema que privilegie o exercício da cidadania e não imacule o Presidente

da República; ou seja, um sistema que posicione os Poderes em mesmo patamar

e privilegie a Nação que é soberana, a titular de todos os Poderes.

4.2.1. Vantagens do regime.

81 PIRES, Waldir- Debate sobre o tema Modelos de Presidencialismo e Parlamentarismo in Presidencialismo ou Parlamentarismo, p.116.

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A partir das características do parlamentarismo, pode-se

concluir quais as suas vantagens.

O órgão que de fato administra, o Ministério, para agir deve

ter a confiança do Parlamento, porque se houver a perda da confiança deve haver

a demissão. Essa questão é importante, porque só se mantém na administração

um Ministério que tenha respaldo político.

Ser o Executivo dual, com Chefe de Estado e Chefe de

Governo permite ao administrador da coisa pública dispensar toda sua ação

efetivamente na questão administrativa, sem outra preocupações.

Não obstante a esta particularidade, o parlamentarismo

apresenta a divisão funcional clássica, distinguindo o Executivo, o Legislativo e o

Judiciário. Executivo e Legislativo são interdependentes, na medida em que o

Conselho de Ministros, que de fato exerce as funções executivas depende do

apoio da maioria parlamentar para ser constituído, e depois se manter. Se perder

o apoio deve deixar o Poder.

Em contrapartida, o Chefe de Estado pode dissolver o

Parlamento pondo fim aos mandatos, mas convocando novas eleições.

O Judiciário está separado do Executivo e do Legislativo,

posto que estes combinam a atuação.

Há quem sustente que a possibilidade da queda do Governo

gere instabilidade e que isto seja prejudicial ao regime; entretanto MEDEIROS E

ALBUQUERQUE pensa exatamente ao contrário ao afirmar que “O regimem

parlamentar tem exatamente a vantagem de permitir, por um lado, a permanência

no poder “enquanto bem servirem”, por tempo indefinido, e “ sem período algum”

dos bons governos; por outro lado a eliminação dos maus”.82

O que é visto como desvantagem é pelo autor apontado como

vantagem o que pode ser aceito, porque, para o Estado e para a Nação, é

importante poder afastar os maus governantes a partir do momento em que o

afastamento se justifica.

82 Op.cit.p.50

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Manter os maus governantes por um período certo e

determinado é apenar o titular do Poder que deve impor sempre sua vontade.

De outro lado se o Governo é bom é vantajoso que continue a

exercer a função que lhe cabe, não justificando uma data certa para deixar a

função.

4.3. Presidencialismo.

A leitura do art. 76 e seguintes da Constituição Federal mostra

que o Estado Brasileiro continuou adotando a partir de 05 de outubro de 1988 o

sistema presidencialista.

Posteriormente, o plebiscito realizado em 7 de setembro de

1993, por ordem do 3º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, firmou

o que o povo decidiu: República com o sistema de governo presidencialista.

Temos então um sistema presidencialista que a leitura da

Constituição mostra ser um presidencialismo exagerado, o que, aliás, é o mote

desta tese.

Nos livros e obras de Direito Constitucional e matérias afins

encontramos a origem do sistema presidencialista na Constituição Americana de

17 de setembro de 1.787, tendo sido idealizado na Convenção de Filadélfia. Deste

modo tem-se um sistema que foi modelado nos e para os Estados Unidos e

depois se alastrou para outros Estados.

Neste alastramento acabou por surgir duas formas de

presidencialismo: o puro e o misto.

Presidencialismo puro é o americano em que o Presidente

não tem iniciativa de projetos de lei e os Ministros não comparecem ao

Parlamento. Misto é o brasileiro em que o Presidente, além de ter iniciativa ao

processo legislativo, o mesmo de fato legisla, no caso das Medidas Provisórias e

Leis Delegadas, contrariando a idéia de Montesquieu. Além disso, os Ministros do

Poder Executivo podem ser convocados pelo Parlamento para prestarem

informações. Difere do Parlamentarismo, que como vimos corresponde a um

resultado histórico.

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O rompimento das Colônias com o Reino da Inglaterra fez

surgir um sistema novo em que o Governo foi depositado nas mãos de uma

pessoa para atuar como executivo, ou seja, administrando o novo Estado que

estava nascendo.

Surge, então, o sistema presidencialista como se observa no

pensamento de ALEXANDER HAMILTON a necessidade de um Poder Executivo

forte e com unidade. Defendeu que a energia do Poder Executivo é um dos

principais caracteres de uma boa Constituição. O vigor do Poder Executivo é que

mantém e segura a liberdade contra o furor das facções e contra os projetos da

ambição. Poder Executivo sem força supõe fraca execução das leis e do governo

e execução fraca é o mesmo que má execução. A energia do Poder Executivo

consiste na sua duração, na sua unidade, na suficiente extensão dos seus

poderes, nos meios de prover suas despesas e as suas necessidades. Afirmou

que Os homens mais hábeis, os jurisconsultos mais célebres pela exatidão e

firmeza de seus princípios, todos concordam em exigir unidade do Poder

Executivo, apesar de não terem dúvida em deixar a autoridade legislativa a um

grande número de pessoas.83

Naquela oportunidade, nascimento do presidencialismo, o

sistema foi visto como a salvação e também como uma forma de rompimento ao

sistema da Inglaterra, de quem se separava.

Só foram enxergado pontos positivos no Poder Executivo forte

através de competências ou atribuições ao Presidente. Não houve o pensamento

de supor que o Presidente, com excesso de poderes e considerando sua unidade,

poderia extrapolar e passar a agir como se ele fosse o Poder.

A crítica ao sistema ou ao Presidente já recebeu em Portugal,

como relata CANOTILHO vários rótulos: “Embora nas Constituições de 1911

tivesse havido uma forte corrente contra a existência de um Presidente da

República -<instituição desarmônica com a natureza do regime democrático>, <

título sem poder real>, <simulacro coroado>, <dignidade sem autoridade>,

<caminho directo para a ditadura e para a tirania> - reconheceu-se a

necessidade de, na estrutura do poder político, haver um elemento

<coordenador>”.84 (g.n.)

83 ALEXANDER Hamilton – O Federalista – O Pensadores, Abril Cultural, p.156. 84 CANOTILHO, J.J.Gomes –Direito Constitucional, Almedina, p.322.

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Então, esta maneira de administrar importa em conceder ao

Presidente o poder de escolher, por vontade única e exclusiva sua, a política de

governo, bem como administrar o Estado como lhe aprouver.

O Estado vai mostrar sua feição política interna e

externamente variando com a vontade e objetivos do Presidente, considerando

que as Constituições são documentos que permitem esta acomodação, desde que

se justifique com os fundamentos e objetivos que se pretendem alcançar.

Neste sistema, o Presidente, em regra deve, ser eleito, seja

por modo direto ou não. Se coloca em plano de igualdade com o Poder

Legislativo, pois recebem um mandato a ser cumprido e exercido temporariamente

conforme as regras constitucionais.

Na sua atribuição, o Presidente pode constituir seu Ministério

independente da vontade do Parlamento, tendo então liberdade; pode ter iniciativa

no processo legislativo, sendo que tem iniciativa exclusiva para determinadas

matérias que digam respeito preponderante ao Executivo e, também no processo

legislativo, tem poder de veto quanto a projetos de lei.

Somente estas condutas não ferem a independência do Poder

Legislativo; no entanto, somadas às outras condutas que vão surgindo nas

Constituições, acabam por dar primazia ao Presidente da República em prejuízo

ao Poder Legislativo.

O já citado MANOEL GONÇALVES FERREIRA FILHO, no

trabalho mencionado sobre os dois sistemas em comento ensina que o

presidencialismo se confunde com o próprio sistema de separação de poderes. E

não é para menos, já que em seu nascedouro a Convenção de Filadélfia em 1787

foi montada como o governo que Locke teorizara, substituíndo o monarca de

direito divino por um monarca temporário. Com efeito, no presidencialismo, os três

poderes: Legislativo, Executivo e Judiciário são independentes entre si. Cada um

tem sua função e a deve exercer, em princípio, sem a interferência de outro.

É certo que a atuação dos poderes se inter-relaciona, mas o

que não pode ser aceito é que um deles, em regra o Poder Executivo, invada

tanto a atuação de outro ou até mesmo dos outros dois, a ponto de relegá-los a

notável grau de inferioridade.

Continuando, o autor expressa que na época presente o

Executivo tem inegável primazia sobre o Legislativo. Contudo, nos Estados

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Unidos, como revela a história contemporânea, não esmaga o Congresso, que

continua com o poder de controlá-lo, sobretudo em matéria financeira, que serve

de contrapeso. E, o Judiciário, a seu turno assegura a guarda da Constituição, que

interpreta evolutiva e construtivamente.

Em suma, há o presidencialismo que é um sistema que dá

ênfase ao Presidente, que é a pessoa que exercita as funções do Poder

Executivo. Difere do Parlamentarismo em que o Executivo e o Legislativo são

poderes colaboradores enquanto no Presidencialismo esses dois Poderes são

forças antagônicas.

ORLANDO SOARES enfatiza que “sob o sistema

presidencialista, verifica-se acentuada predominância do Poder Executivo, em que

os ministros de Estado são de livre escolha do presidente da República, enquanto

sob o sistema parlamentarista os ministros que compõem o Gabinete, ou

Conselho de Ministros, são escolhidos dentre os membros do Parlamento, com

variantes em cada país, que adota tal sistema”.85

Esta acentuada predominância do Poder Executivo, e como

pensamos do Presidente, também se pode extrair dos ensinamentos de PINTO

FERREIRA que, após afirmar que o sistema deve ser definido como a forma de

governo em que o presidente da República orienta com independência a vida

política nacional, expressa: “Pode-se conseguir uma compreensão mais exata do

seu conteúdo pelo contraste com o governo parlamentar, porque no regime

parlamentarista o governo é uma dependência da maioria congressual do

Parlamento, sendo revocável pela vontade deste. Ao contrário, no regime

presidencialista, o governo independe da maioria congressual, que não poderá

mediante uma moção de desconfiança, destituí-lo de suas funções políticas”.86

A mencionada predominância pode ser entendida como a

independência necessária para o exercício de suas funções, o que é o desejável;

no entanto, como se constata de todo o texto a independência ou acentuada

predominância tem colocado o Presidente da República em situação de

superioridade aos demais Poderes.

Aliás, críticas ao sistema presidencialista não é novidade,

AFONSO ARINOS mostra que “Em 1788 Hamilton escrevia no Federalista que

85 SOARES, Orlando-Comentários a Constituição ad República Federativa do Brasil, p. 417. 86 FERREIRA, Pinto – Curso de Direito Constitucional, p.421.

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nenhuma parte da organização política do seu país tinha encontrado tantas

dificuldades quanto a Presidência da República”.87

4.3.1. O absolutismo presidencial.

O que se percebe é que o sistema presidencial acaba por dar

ênfase especial ao Presidente, colocando-o até em uma situação privilegiada em

demérito ao Poder Executivo, do qual deve ser representante.

Cabe observar, no nosso caso, que a Constituição Federal

fixa a competência do Poder Legislativo e de suas Casas. Quanto ao Poder

Judiciário estabelece o que compete a cada órgão, entretanto, ao tratar do Poder

Executivo não expressa o que cabe ou compete ao Poder, mas sim o que cabe ou

qual é a atribuição do Presidente da República. Há desta forma confusão entre

Poder Executivo e Presidente da República. O representante do Poder se

confunde com o próprio Poder. O presidencialismo se apresenta assim como um

sistema que organiza constitucionalmente o governo pessoal e não a função do

Poder. Há um exagero presidencial e nas palavras de MANOEL GONÇALVES

FERREIRA FILHO “surge o absolutismo presidencial”88; há uma supremacia

pessoal.

Temos, então, um sistema em que a figura do Presidente da

República, como é a nossa situação, se apresenta constitucionalmente na

Constituição formal como uma figura que prepondera sobre os Poderes Legislativo

e Judiciário. Até se prepondera sobre o Poder Executivo porque a Constituição

não estabelece a competência ou atribuição do Poder Executivo, mas sim do

Presidente da República.

87 FRANCO, Afonso Arinos de Melo – Estudo de Direito Constitucional, Forense, p.34. “Os críticos tinham exagerado descompassadamente e as afirmações sobre os excessos de autoridade e sobre as práticas ditatoriais. Tinha afirmado que um Executivo enérgico é incompatível com o governo republicano. Mas tinham esquecido as vantagens da unidade de comando,de energia e rapidez do poder; assim como tinham esquecido que a Federação era o freio necessário aos excessos do presidencialismo,era a defesa e a garantia da liberdade;como também,que a temporariedade dos mandatos e a responsabilidade do Presidente (impeachment) diminuíam consideravelmente os riscos do seu autoritarismo( Le Féderaliste,trad.fr.,introduções de Jèze e Esmein, 1902,págs.432,559,572,582,583).” 88 Vide nota 77, p.110.

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O presidencialismo brasileiro, com segurança impõe, o

absolustimo presidencial, porque são inúmeras as interferências nos Poderes

Legislativo e Judiciário como será visto adiante.

Além de exercer as funções do Poder Executivo, o Presidente

da República legisla e faz a composição de órgão auxiliar do Poder Legislativo.

Quanto ao Poder Judiciário faz a composição dos Tribunais Superiores.

Concentrado em uma só pessoa, constitucionalmente, há o

poder de exercitar a função administrativa, há o poder de interferir na função

legislativa quando legisla e quando faz a composição de órgão fiscalizador e há o

poder de fazer a composição dos órgãos judiciais que julgam as questões

constitucionais, eleitorais, trabalhistas e militares.

Além disto, no sistema presidencial, se exige de uma pessoa

que seja o representante de seu partido político e ao mesmo tempo o

representante da Nação. É representante da parte e do todo.

Ao contrário do Parlamentarismo, neste sistema, o Presidente

da República concentra as atribuições de Chefe de Estado e Chefe de Governo, e

acaba por ter função política quando, por exemplo, decreta estado de sítio ou

intervém nos Estados; exerce função legislativa quando edita medidas provisórias;

exerce função administrativa quando faz a gestão dos negócios públicos e ainda

tem a atribuição representativa quando, constitucionalmente, representa o país

interna e externamente.

O absolutismo presidencial pode chegar a manobras de

governo tirano, porque a concentração dos Poderes, seja de forma explicita ou por

sutilezas constitucionais, encaminha ao ser humano a tentar tomar para si todo o

comando da Nação.

Não se pode afirmar, categoricamente, que no Brasil, o

Presidente da República tenha em suas mãos os Três Poderes, mas certamente é

possível dizer que, além exercitar a função do Executivo, ele participa em excesso

junto aos Poderes Legislativo e Judiciário.

As palavras de JAMES MADISON são que “a acumulação dos

poderes Legislativo, Executivo e Judiciário nas mãos de um só indivíduo, onde

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uma só corporação, seja por efeito de conquista ou de eleição, constitui

necessariamente a tirania”.89

A concentração dos Três Poderes nas mãos de um só

indivíduo ou possibilitar que, este indivíduo, influa de maneira que importa nos

demais Poderes, que não o Executivo, leva ao sistema tirânico.

O Presidente não deve ser visto como um soberano que

encarna o próprio Estado, mas tão somente como representante de um dos

órgãos de soberania estatal.

O mesmo MANOEL GONÇALVES FERREIRA FILHO em

outra obra já afirmou que “Outro mal do presidencialismo encontra-se na tentação

do abuso, própria à natureza humana, que acha terreno propício num sistema que

atribui tamanho poder a um homem só.”90

Situação concreta e reconhecida é que o Poder Executivo tem

sob sua responsabilidade o volume de dinheiro do Estado, então, com o capital

em mãos o Presidente da República tem como subjugar os demais Poderes.

Aliás, NELSON JOBIM em debates sobre Parlamentarismo e

Presidencialismo expressou a idéia de que os poderes do Presidente não podem

ser reduzidos e que ele manda porque tem os recursos em mãos. Afirmou que “É

evidente que a discussão não é teórica, é discussão de poder, porque se

privilegiarmos os municípios e os governadores, estaremos evidentemente

reduzindo o poder do presidente da República. O problema tributário, a repartição

das receitas e das funções, não é questão meramente técnica. É questão de

poder.Manda quem tem recursos”.(g.n.).91

A afirmação é cristalina em mostrar que o Presidente da

República é o todo poderoso porque tem em mãos os recursos públicos. Permite o

regime concentrar, na pessoa do Presidente da República, a Chefia do Estado, a

Chefia do Governo, legislar, nomear para o Poder Legislativo para o Poder

Judiciário e ainda controlar todos os recursos públicos.

Há quem não enxergue o absolutismo presidencial e até

conclua por uma igualdade de Poderes.

89 Idem nota 83, p.124. 90 FERREIRA Filho, Manoel Gonçalves – O Parlamentarismo, p.15. 91 JOBIM,Nelson- Presidencialismo ou Parlamentarismo, p.112.

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O presidencialista MARCO MACIEL afirmou que “Temos um

novo presidencialismo, caracterizado por uma equipotência de

poderes,concebido pela Constituição de 1988, que foi avanço, porque temos pela

primeira vez um presidencialismo moderno”.92

O equívoco da afirmação só é justificável por ser seu autor

defensor do presidencialismo. Não há a chamada equipotência de poderes,

quando o Presidente atua ou influi nos três Poderes em detrimento das funções

legislativas e judiciárias.

O presidencialismo concebido pela Constituição de 1988 não

tem modernidade; ao contrário apresenta ranço do passado. Basta constatar o

abuso na edição das Medidas Provisórias, bem como a nomeação de pessoas

comprometidas com ideologias político-partidárias para integrar o Poder Judiciário.

A Constituição de 1988 neste ponto é mais para imperial do

que moderna e leva ao absolutismo presidencial.

No passado DUGUIT, embora sobre o parlamentarismo, já

afirmava que “ Le président de la Republique personnifie le gouvernement”93 , o

que mostra que o Poder Executivo concentra em uma só pessoa uma série de

poderes que leva a uma situação de equipotência.

4.3.2. Vantagens do regime.

Com efeito, o presidencialismo como o parlamentarismo

apresenta suas vantagens e desvantagens, encontrando-se, então, um ou outro

sistema que traga bons resultados ao Estado e a Nação.

No estudo sobre o tema com mais facilidade se encontra

posicionamentos contrários ao sistema, chegando até a afirmativa de ditadura

legal.

92 MACIEL, Marco – Presidencialismo ou Parlamentarismo, 98. 93 Op.cit. p.501 . Tradução livre do autor- “ O presidente da República personifica o governo.”

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Não há dúvida de que em questões de grande relevância e

que exija tomada de decisões rápidas, a presteza somente aparece de maneira

imediata quando um só órgão tem a competência para decidir.

A concentração do Poder Executivo nas mãos do Presidente

da República pode ser um bom sistema quando as ações são tomadas sem abuso

de poder e sem preocupações pessoais.

A seu favor argumenta-se. Mostra DALMO DE ABREU

DALLARI, “com a rapidez com que as decisões podem ser tomadas e postas em

prática.”94

Entretanto, como regra, o presidencialismo leva ao chamado

absolutismo que é extremamente prejudicial a Nação e ao Estado. O titular passa

a agir como um ditador, isto é, sem estar atrelado as regras e aos limites.

Durante os debates travados na Assembléia Constituinte de

1946 o então Senador Luiz Carlos Prestes afirmou que o “presidencialismo no

Brasil tem sido sinônimo de ditadura, alertando que isso continuaria, a julgar pelo

Projeto de Constituição, que manteria o presidencialismo atribuindo ao presidente

da República uma vasta gama de competências, tais como: a nomeação dos

Ministros do Supremo Tribunal Federal, dos Tribunais de Recursos, juízes da

Justiça Eleitoral; o poder de veto, com dificuldades enormes para ser rejeitado

pelo Congresso Nacional; a intervenção nos Estados-membros da Federação, em

boa parte entregue ao Chefe do Executivo, e encarregado de nomear, livremente

os interventores; a nomeação dos cargos públicos, e assim por diante”, como

relata ORLANDO SOARES.95

Como se constata não há dificuldades em encontrar críticas

ao presidencialismo porque nota-se uma tendência a abusos por parte de quem

exerce o poder quando tudo se concentra em um único titular.

Enfim, é possível um sistema presidencial que apresente bons

resultados que deve ser aquele que não admita o absolutismo, ou seja, reconheça

posição de independência dos Poderes do Estado.

94 DALLARI, Dalmo de Abreu – Elementos da Teoria Geral do Estado,p.244. “Além disso, cabendo ao Presidente da República decidir sozinho, sem responsabilidade política perante o parlamento,existe unidade de comando, o que permite um aproveitamento mais adequado de possibilidades do Estado, sem a necessidade de transigências e adaptações que deformam qualquer diretriz política. Por último,alega-se que o presidencialismo assegura maior energia nas decisões,pois sendo o responsável pela política e tendo os meios para aplicá-la, o Presidente da República naturalmente interessado no êxito de sua política, tudo fará para que o Estado atue com o máximo de suas possibilidades.”

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CAPÍTULO V

FUNÇÕES ATIPICAS DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA.

É de fácil percepção na Constituição Federal, com simples

leitura, que funções atípicas reservadas ao Presidente da República têm como

condão a ingerência no Poder Legislativo, bem como no Poder Judiciário.

Na esfera do Poder Legislativo, esta interferência consiste

exatamente na função típica do Poder, pois a Constituição permite ao Presidente da

República legislar.

Não obstante, o exercício desta atividade seja posto como

exceção, o que a história tem mostrado é uma atividade desenfreada com extremo

abuso da concessão constitucional.

Na medida em que o Presidente da República passa a ser um

legislador ordinário, está presente sua interferência efetiva no Poder Legislativo. De

fato o poder constitucional de legislar se mostra como uma usurpação do Poder. A

Constituição Federal retira função típica do Poder Legislativo e transfere ao

Presidente da República como função atípica. Esta usurpação enfraquece o Poder

Legislativo.

Interfere também quando nomeia as pessoas que vão integrar o

Tribunal de Contas, que apesar de ser órgão de auxilio do Poder Legislativo para

fiscalizar tecnicamente as contas da Administração Pública, de forma especial do

Poder Executivo, sua composição depende da vontade do Presidente da República.

Enfim, o Presidente da República faz a composição de órgão auxiliar do Poder

Legislativo.

No tocante ao Poder Judiciário, a Constituição concede ao

Presidente da República o poder de nomear os membros do Supremo Tribunal

Federal além de outros Tribunais. Linhas atrás já mostramos posição totalmente

95 Op. cit. p.342

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contrária, de Luiz Carlos Prestes, quanto a este poder do Presidente da República

que o torna um ditador.

Não tem o Presidente da República nenhum instrumento

constitucional que lhe dê o poder de julgar, no entanto a história também tem

mostrado, que não obstante a capacidade jurídica, grande parte dos nomeados, seja

para a mais alta Corte de Justiça seja para outros Tribunais, são pessoas vinculadas

ao Presidente por laços de amizade-partidária.

Tem-se percebido que alguns nomeados são pessoas oriundas

de partidos políticos e cargos eletivos, que por um motivo ou outro são presenteados

com cargos no Poder Judiciário.

Esta maneira de nomeação desvirtua o critério objetivo que deve

inspirar a nomeação de qualquer julgador.

A atividade político-partidária exige da pessoa a necessária e

responsável parcialidade aos objetivos do partido político, o que não combina com o

Poder Judiciário, que ao contrário exige a necessária e responsável imparcialidade

que empurra o julgador à obediência somente aos preceitos constitucionais e legais

existentes.

A nomeação de um ativista político para um cargo de Julgador

exige um rompimento brusco da parcialidade para a imparcialidade, comportamento

quase que impossível ao ser humano.

Aquele que está comprometido com ideologia partidária não

consegue de um dia para outro despir suas idéias de parcialidade e passar a ter

comportamento imparcial, esquecendo-se de toda a carga direcionada e de seu

passado. Este julgador comprometido com partido político,traz sérios perigos para a

Nação.

Estando o Presidente da República com o poder de compor

Poder Judiciário, é evidente que está interferindo e por isto mostrando sua

supremacia.

O que mais agrava é que a visível supremacia nem é do Poder

Executivo, mas sim do Presidente da República, ou seja, de uma só pessoa.

Destoando do Poder Constituinte que criou três Poderes e afirmou que são

independentes e harmônicos.

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É certo que o Poder Executivo se encarna na pessoa do

Presidente da República porque é o único dos Poderes, conforme nossa

Constituição Federal, que é exercido por uma só pessoa.

A redação em relação aos outros Poderes vem mostrar as

atribuições e competências de cada Poder mas, quando trata do Poder Executivo a

Constituição não prevê as atribuições ou competências do Poder Executivo, mas sim

do Presidente da República.

Não se trata apenas de questão de redação, e sim de posicionar

uma pessoa acima dos Poderes da República, inclusive do próprio Poder que

representa.

Deste modo, deve ficar afirmado que a Constituição formal

prevê a existência dos Três Poderes e dispensa um tratamento de supremacia ao

Presidente da República que é o representante de um dos Poderes. A redação

constitucional mostra a adoção do sistema presidencialista carregado de

característica absolutista.

5.1. Medidas Provisórias.

Precede a Medida Provisória a espécie normativa que foi

denominada por Decreto-lei como se observa da Constituição de 1967 em seu

art.49,V ao tratar do Processo Legislativo e que já mereceu atenção.

Esta espécie normativa foi muito criticada sob o argumento de

que o Presidente da República abusava de sua edição não obedecendo às

exigências constitucionais, sendo por isso o País governado pelo Decreto-lei.

No art.58 consta que o Presidente da República, em casos de

urgência ou se de interesse público relevante e desde que não cause aumento

de despesa, poderá expedir decretos com força de lei(g.n).

A redação deixa bem assentado que a faculdade estava

vinculada a urgência ou interesse público, no entanto cabia ao Presidente da

República decidir quando estava presente a urgência ou o interesse público, ficando

assim à sua vontade editar o Decreto-lei.

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O texto proibia o decreto causasse aumento de despesa e nos

incisos enumerava somente suas matérias suscetíveis de tratamento pela norma:

segurança nacional e finanças públicas.

Assim, não obstante prevalecesse à vontade do Presidente da

República a norma só podia tratar das matérias previstas pela Constituição.

Publicado o texto a vigência era imediata e a função do

Congresso Nacional, Poder Legislativo, era somente de aprovar ou rejeitar, sendo

considerado aprovado se em sessenta dias não houvesse deliberação.

A Constituição de 1967 chegou ao ponto de proibir o Poder

Legislativo de legislar, não admitindo emendas no texto do Decreto-lei.

Apesar de tudo isto a Constituição Federal de 1988 continuou

permitindo a usurpação de função, ao dar ao Presidente da República mais poderes

com a previsão da Medida Provisória como uma verdadeira transferência da função

legislativa.

As mesmas críticas do abuso na edição dos Decretos-leis

surgiram com a Medida Provisória, constatando que o abuso é maior,

principalmente, como veremos diante da ausência de fixação de matérias.

Dispõe o art. 59 que o processo legislativo compreende a

elaboração, entre outras espécies normativas primárias, das leis delegadas e das

medidas provisórias.

Afirmou CELSO BASTOS que o legislador constituinte houve

por bem retirar das mãos do Presidente da República um instrumento de poder

extremamente forte como era o decreto-lei, no entanto não o deixou de mãos

atadas, pois em caso de relevância e urgência poderá editar medidas provisórias.

Disse que “a medida provisória, embora seja ato normativo com força de lei, não

pode ser considerada lei em sentido formal, já que não é ato nascido no Poder

Legislativo.”96

A afirmativa deixa enfatizado que Medida Provisória, embora

seja ato típico da função legislativa não é espécie normativa que provém do Poder

Legislativo, mas sim do Presidente da República.

96 Op.cit. Curso de Direito Constitucional, p.360

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Em suma, o Presidente da República perdeu um instrumento

forte, mas ganhou outro, mais poderoso porque consegue legislar em praticamente

todos os temas nacionais. Legisla e administra.

Dispõe o art. 62 da Constituição Federal que em caso de

relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias,

com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional, que,

estando em recesso, será convocado extraordinariamente para se reunir no prazo de

cinco dias.

“Constitui espécie normativa. Compõe o processo previsto no

art. 59 da Lei Maior: Tem força de lei. É ato normativo primário”, assim LUIZ

ALBERTO DAVID ARAUJO e VIDAL SERRANO NUNES JÚNIOR iniciam os

ensinamentos sobre Medida Provisória.97

A partir do texto constitucional e dos ensinamentos pode-se

conceituar Medida Provisória como a espécie normativa primária que integrante do

processo legislativo é editada pelo Presidente da República, com força de lei,

quando houver necessidade diante de relevância e urgência.

O reconhecimento por parte do Presidente da República dos

requisitos constitucionais deve estar atrelado ao principio da proporcionalidade, com

a constatação da indispensabilidade na edição da medida, porque, como afirma

HUMBERTO BERGMANN ÁVILA a “a atuação só é legítima quando nenhuma outra,

menos restritiva, possa ser adotada”.98

Como ato oriundo do Poder Público que tem o dever de agir

como determina a lei a Medida Provisória também é passível de controle

jurisdicional.

97 Op.cit. p.328. 98 ÁVILA,Humberto Bergmann- Medida Provisória na Constituição de 1988, p.49. “Conexo ao princípio do Estado de Direito, e como limite à atuação legislativa do Poder Executivo,está o princípio do proporcionalidade que, entre outras determinações,impõe a atuação que seja absolutamente indispensável, e a escolha do meio menos restritivo, dentre os abstratamente disponíveis. Nesse sentido, a atuação legislativa do Poder Executivo só é legítima quando nenhuma outra,menos restritiva possa ser adotada.Quanto ao conteúdo do princípio da proporcionalidade,afirma Gonzáles: “ El principio de proporcionalidad de la actuación obliga aqui a proceder según un doble objetivo: a) elección de instrumentos jurídicos adequados a la situación de hecho, para la consecución del determinado fin previsto em la norma. Con esta operación se pretende principalmente, aislar y desechar aquelos médios inadecuados, que no guardan una justa correspondência, proporcionalidad y congruencia com los hechos y el fin concurrentes en el caso concreto; b) elección del médio más idóneo y de menor restricción posible,de entre los vários instrumentos adecuados para la obtención de un fin.”

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É certo que os pressupostos constitucionais da relevância e

urgência são discricionários ao Presidente da República e por isto submissos a

subjetividade, como se verá adiante. Todavia o que não pode gerar dúvida é estar a

medida afetada pelo controle do Poder Judiciário, conforme a teoria da tripartição

dos Poderes.

Afirmou CELSO BASTOS que “o controle jurisdicional das

medidas provisórias no Brasil pode ocorrer em três níveis: a) primeiro um controle

dos pressupostos de habilitação (se afinal estão ou não presentes); b) depois, um

controle da matéria tratada pela medida provisória (se suporta regramento legislativo

provisório ou não); c) finalmente, um controle da constitucionalidade da matéria

propriamente dita (se atende, não sob a ótica formal, mas sim substancial, as

normas e princípios adotados pelo constituinte”.99

Percebe-se que cabe ao Presidente da República decidir

quando há relevância e urgência o que lhe dá a possibilidade de agir com ampla

liberdade, o que tem sido mostrado pela história.

Diante deste poder deve ser justificada a edição de toda e

qualquer Medida Provisória quando houver motivo fático e jurídico relevante; isto é

que exija providências por um ato normativo. Concomitantemente deve ser

justificado pela urgência na edição da medida, o que significa que o País não pode

esperar o ordinário procedimento de elaboração de uma lei para regular aquela

matéria. Os fatos exigem edição imediata.

A subjetividade de relevância e urgência tem sido a responsável

pela edição de inúmeras Medidas Provisórias que se afastam da exigência

constitucional.

A edição das Medidas Provisórias à vontade do Presidente da

República tem gerado a situação esdrúxula do Executivo invadir de vez a esfera do

Legislativo e legislar mais do que este Poder e ainda em situações que não se

apresentam como urgentes.

O jornal o Estado de São Paulo fez publicar matéria em que

mostra que no primeiro ano de mandato Presidente da República Fernando

Henrique Cardoso editou 30 Medidas Provisórias e o Presidente da República Luiz

Inácio Lula da Silva no primeiro ano editou 57.

99 Op.cit. Curso de Direito Constitucional, p.364.

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Na mesma matéria está exposto a supremacia do Presidente da

República sobre o Poder Legislativo. A maioria parlamentar do governo Lula no

Congresso não é tão ampla, mas o resultado final das votações confirma o poder do

Palácio do Planalto:o Legislativo gasta a maior parte do seu tempo e de seu

esforço trabalhando para o Executivo.O que mais contribui para tornar pesada

esta carga de trabalho é a edição de medidas provisórias pelo presidente Luiz

Inácio Lula da Silva. (g.n).100

Também na mesma matéria há manifestação do Parlamentar

Renato Casagrande no sentido de que há um desequilíbrio no processo legislativo

porque efetivamente o Executivo legisla mais do que o Legislativo.

Em outra edição do mesmo jornal, o Presidente do Congresso

Nacional Senador José Sarney afirmou que o excesso de Medidas Provisórias

inflaciona o Legislativo. O Senador Jefferson Perez chegou a afirmar que “o poder

de legislar do Congresso foi usurpado pelo Poder Executivo com a omissão e a

cumplicidade do Congresso e que É uma hemorragia de MPs, sendo que 90%

delas não atendem aos princípios de relevância e urgência” (g.n.).101

Se a grande maioria das Medidas Provisórias não atendem as

exigências da relevância e urgência, elas são inconstitucionais e por isto deveriam

ser rejeitadas de plano pelo Congresso Nacional.

Está evidente que a espécie normativa vem sendo editada de

acordo com a vontade única do Presidente da República. A relevância e urgência é

definida por uma pessoa.

No mesmo caminho a Revista Veja, apresenta artigo intitulado A

Ágil Caneta do Presidente e no primeiro parágrafo está escrito: “Lula acaba de bater

um incômodo recorde: nunca um presidente da República, desde a Constituição de

1988, fez uso tão intensivo de Medidas Provisórias, as MPs- papeluchos que,

basta o presidente assinar e mandar ao Congresso Nacional, passam a ter

força de lei como se o chefe do Executivo fosse, sozinho, a personificação de

594 deputados e senadores.”(gn)102

Na mesma matéria está mostrado que o uso abusivo na edição

da Medida não é conduta exclusiva do atual Presidente. Fernando Collor editou

100 Jornal o Estado de S. Paulo,Nacional, Edição de domingo, 30 de maio de 2004, p.A8. 101 Jornal o Estado de S.Paulo, Nacional, edição de Quarta-Feira,31 de março de 2004, p.A6. 102 Revista Veja, Editora Abril, edição 1884, ano 37, edição de 15 de dezembro de 2004, p.46

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Medida provisória para comprar automóvel para o Vice. Fernando Henrique Cardoso

assinou Medida para comprar latas de goiabada.

Exemplo de inconstitucionalidade está no pronunciamento do

Procurador Geral da República CLAUDIO FONTENELES que afirmou ser

inconstitucional a Medida provisória 207, que deu status de Ministro ao Presidente

do Banco Central, Henrique Meirelles, garantindo-lhe foro privilegiado. Concluiu o

Procurador em seu parecer que a medida é casuística porque foi tomada no

momento em que o beneficiado estava sendo investigado e por isto afronta o

princípio da moralidade pública.103 Não obstante, a demonstração da

inconstitucionalidade o Congresso Nacional aprovou essa Medida Provisória.

Inúmeros são os posicionamentos mostrados pela Imprensa

contra o uso abusivo das Medidas Provisórias, mas o que se vê é a falta de vontade

política do Poder Executivo em respeitar a Constituição Federal e a inércia do

Congresso Nacional que aceita a conduta do Presidente da República.

A questão é tão grave que chegou ao Supremo Tribunal

Federal.

Embora não deva ser a regra discutir no Poder Judiciário a

existência dos pressupostos necessários, isso é possível. Na ação direta da

inconstitucionalidade 1753, de 16 de abril de 1998, do Distrito Federal, tendo como

Relator o Ministro Sepúlveda Pertence, consta da ementa: “1. Medida provisória:

excepcionalidade da censura jurisdicional da ausência dos pressupostos da

relevância e urgência à sua edição”.

Em outra ação direta de inconstitucionalidade, esta de 04 de

fevereiro de 2002, de nº 2213 o Ministro Celso de Mello fez constar que a “edição de

medidas provisórias, pelo Presidente da República, para legitimar-se juridicamente,

depende, dentre outros requisitos, da estrita observância dos pressupostos

constitucionais da urgência e relevância(CF,art.62, “caput”). Os pressupostos da

urgência e relevância, embora conceitos jurídicos relativamente indeterminados e

fluidos, mesmo expondo-se, inicialmente, à avaliação discricionária do Presidente da

República, estão sujeitos, ainda que excepcionalmente, ao controle do Poder

Judiciário, porque compõem a própria estrutura constitucional que disciplina as

103 Jornal o Estado de S. Paulo, Edição de 09de novembro de 2004, p.A5

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medidas provisórias, qualificando-se como requisitos legitimadores juridicamente

condicionantes do exercício, pelo Chefe do Poder Executivo, da competência

normativa primária que lhe foi outorgada, extraordinariamente, pela Constituição da

República.”

Portanto, conforme nossa estrutura constitucional com o sistema

de controle de um poder em relação ao outro, o excesso de edição de Medidas

Provisórias que usurpa a função do Poder Legislativo e a edição sem que haja os

pressupostos constitucionais de relevância e urgência, são passíveis de apreciação

pelo Poder Judiciário, embora não se apresenta como questão simples, mas ao

contrário de enorme complexidade.

O poder de legislar conferido constitucionalmente ao Presidente

da República é excepcionalíssimo, por isso seu exercício deve ser comedido e com

a estrita observância aos pressupostos constitucionais de relevância e urgência.

O excesso na edição mostra que o Poder Executivo cria a

urgência e relevância para os temas que têm interesse, desvirtuando desta forma a

razão da espécie normativa e praticando com freqüência atos inconstitucionais.

Os pressupostos não podem ser criados pelo Presidente da

República, eles devem emergir da própria questão a ser tratada.

Em outra ação, agora com redação um pouco mais restritiva, o

Ministro Ilmar Galvão expressou que os requisitos de relevância e urgência para

edição de medida provisória são de apreciação discricionária do Chefe do Poder

Executivo, não cabendo, salvo os casos de excesso de poder, seu exame pelo

Poder Judiciário (Ação 2150, 11/09/2002).

Em resumo, é permitido concluir que o Poder Legislativo já

observou que o Presidente da República está legislando mais do que o Congresso

Nacional e que, em muitos casos as Medidas Provisórias, são editadas sem os

pressupostos constitucionais. Também, mesmo em caráter de exceção, é permitido

ao Poder Judiciário apreciar se determinada Medida está amparada pelo texto

constitucional.

De fato, então, o comportamento do Presidente da República

com a edição de Medidas Provisórias da maneira que lhe é permitido, causa uma

real usurpação de função, porque legisla mais que o legislador. Desta forma, uma

pessoa, o Presidente da República, passa a legislar em detrimento de um Poder, o

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Legislativo. Ao ser editadas as Medidas Provisórias entram em vigor e por isto

passam a surtir efeitos, ressalvada disposição constitucional em contrário.

De imediato devem ser submetidas ao Congresso Nacional e

conforme a redação do § 5º do art.62 da Constituição Federal, a deliberação de cada

uma das Casas do Congresso Nacional sobre o mérito das medidas provisórias

dependerá do juízo prévio sobre o atendimento de seus pressupostos

constitucionais.

Assim, a primeira atitude técnica de cada Casa do Congresso

Nacional é de verificar se estão presentes os pressupostos constitucionais da

relevância e urgência.

Por isto, sem analisar o mérito, cada Casa pode rejeitar a

Medida Provisória posta em apreciação, se entender que não estão presentes os

pressupostos constitucionais.

Em conclusão, se muitas Medidas Provisórias foram editadas

sem que houvesse a relevância e a urgência e tramitaram no Congresso Nacional e

responsabilidade é de cada Casa que assim o permitiu.

É de se lembrar o questionamento do cientista político

FERNANDO ABRUCIO da Fundação Getulio Vargas: “Com a restrição do uso de

MPs, os parlamentares terão de aprovar mais leis e com mais rapidez. Será que eles

querem isso? Pelo visto, não”.104

Cabe lembrar o que consta em linhas atrás, que há um poder do

Palácio do Planalto sobre o Congresso Nacional.

5.2. Leis Delegadas.

104 Idem nota 102.

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Com o poder de legislar através da edição de Medidas

Provisórias, sem que haja necessidade de autorização legislativa, o Presidente da

República de fato não faz uso da espécie normativa denominada Lei Delegada.

De acordo com PINTO FERREIRA, a lei delegada “é um ato

normativo elaborado e editado pelo presidente da República, devidamente

autorizado pelo Poder Legislativo e nos limites por este estatuído, ou ainda por

comissão especial do Congresso e por comissão de qualquer das Casas

legislativas”.105

Em suma, a elaboração desta espécie de lei implica na

delegação de poderes atribuída ao Congresso Nacional ao Presidente da República.

Está evidente que muito mais fácil ao Presidente da República

legislar por Medida Provisória do que por Lei Delegada pois, para a última ele

precisa solicitar autorização ao Poder Legislativo e para a primeira a própria

Constituição Federal já o autoriza legislar independente de solicitação.

Mesmo diante da necessidade da delegação para que o

Presidente da República elabore e edite uma Lei Delegada, há uma certa

interferência sua no Poder Legislativo.

Já afirmamos que “esta espécie demonstra uma certa amplitude

na ação do Poder Executivo, que além de ter a iniciativa para os projetos de lei,

ainda tem o poder de legislar sem atuação conjunta com o Poder Legislativo. Basta

simples delegação e o Poder Executivo investe-se também na função legislativa”.106

A previsão constitucional faz outra vez o reconhecimento da

supremacia do Presidente da República. O Parecer nº 69, de 1978 do Senado

Federal, sendo Relator o Senador Wilson Gonçalves, contém citação de José Afonso

da Silva que já concluía pelo fortalecimento do Poder Executivo diante da Lei

Delegada e da iniciativa. Consta que o fortalecimento do Executivo, aliás, é um fato

incontestável do Estado contemporâneo, em todos os sentidos... .107

Agora, diante de todo o conteúdo que está exposto, podemos

afirmar que a amplitude de ação é do Presidente da República. Além de exercer o

Poder Executivo investe-se também na função legislativa.

105 Op.cit. p. 388. 106 CARVALHO, Jeferson Moreira de – Leis Complementares, p.19 107 GONÇALVES, Wilson – Parecer 69/78, Processo Legislativo, p.113

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Nos termos do art. 68 as Leis Delegadas serão elaboradas pelo

Presidente da República, que deverá solicitar a delegação ao Congresso Nacional.

Cumprindo as regras todas do mencionado dispositivo

constitucional, ao final, se houver determinação da Resolução que concede a

delegação, o Presidente da República deve enviar o projeto ao Congresso Nacional

para sua aprovação ou rejeição e dispõe o parágrafo 3º, na parte final, que é vedada

qualquer emenda.

O constituinte proibiu o Poder Legislativo de legislar, proibiu de

exercer a sua função típica. A Constituição Federal retirou do Poder Legislativo sua

função de legislar.

A aprovação ou rejeição deve ser em bloco não podendo o

Poder que deve exercer a função legislativa emendar um único artigo. Aceita o texto

imposto ou rejeita.

Com efeito, não obstante haja a delegação, a supremacia

presidencial está presente, porque transfere ao Presidente da República o poder de

legislar em detrimento do Poder Legislativo que fica proibido de legislar aquela

matéria naquele projeto.

A Lei Delegada pode ser útil porque permite a elaboração de um

texto de lei sem a burocracia exigível no Congresso Nacional, com discussão nas

Comissões e nas duas Casas; entretanto retirar do Poder Legislativo sua função

típica é dar ao Presidente da República o poder de exercitar a função executiva e a

legislativa.

É certo que a separação dos Poderes não se apresenta de

forma rígida, mas no caso de delegação ocorre a transferência da função típica, o

que descaractriza todo os sistema que se diz adotar.

Sobre a separação dos Poderes J. CRETELLA JUNIOR é bem

enfático em afirmar que Montesquieu faz desse princípio o instrumento ideal para

garantir a segurança do cidadão.

“Sabendo-se que as funções do Estado são três, a de fazer a lei,

a de aplicar a lei para a solução dos litígios, quer espontaneamente que por

provocação, Montesquieu entendia que se cada órgão exercesse sua própria

função,“ o poder controlaria o poder”, evitando o arbítrio, pois o legislador não

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adaptaria a lei ao caso concreto que surgisse, nem o administrador modificaria

o texto, de acordo com as circunstâncias do momento” (g.n.).108

Em tese, com a delegação o Presidente da República pode

legislar de acordo com as circunstâncias do momento e por em vigor lei casuística.

Agindo assim, fica demonstrado o fortalecimento do Presidente

da República e o desrespeito ao princípio da separação dos Poderes, com

enfraquecimento da segurança do cidadão, que foi uma das preocupações de

Montesquieu.

5.3. Nomeação para o Tribunal de Contas.

A redação do art.70 da Constituição Federal mostra a atividade

de fiscalização do Poder Legislativo, que ao lado da função de legislar deve ser

entendida também como função essencial.

A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e

patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à

legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de

receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo

sistema de controle interno de cada Poder.

Decorre do texto que a questão nuclear é a fiscalização quanto

ao uso dos recursos públicos, pois a operação é contábil, financeira, orçamentária e

patrimonial.

O Congresso Nacional exerce a fiscalização auxiliado pelo

Tribunal de Contas da União, como dispõe o art. 71 da Constituição Federal, sendo

este o chamado controle externo das contas públicas.

A conclusão é simples no sentido de que a função fiscalizatória

é exercitada pelo Congresso Nacional, isto é, pelo Poder Legislativo.

108 CRETELLA Jr. J. Elementos de Direito Constitucional, p124

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Exerce, então, o Poder Legislativo fiscalização financeira e

orçamentária quanto aos atos do Poder Executivo, que significa em última análise

apreciar prestação de contas daqueles que tratam com o dinheiro público.

Toda administração pública está sujeita a este controle,

entretanto, é evidente que a fiscalização se mostra mais preponderante quanto ao

Poder Executivo porque é este que administra o Caixa do Estado.

O Poder Executivo ou o Presidente da República é quem tem a

chave do cofre, portanto o gasto do dinheiro público está sob a responsabilidade do

Presidente da República.

Conforme dispõe a Constituição Federal, o controle se dá por

meio interno e externo.

Sobre o controle externo da obra de HELY LOPES MEIRELLES

tiramos que “visa comprovar a probidade da Administração e a regularidade da

guarda e do emprego de bens, valores e dinheiros públicos, assim como a fiel

execução do orçamento. É, por excelência, um controle político de legalidade

contábil e financeira, o primeiro aspecto a cargo do Legislativo; o segundo, do

Tribunal de Contas.”109

Do texto se conclui que em última análise, todo o controle é do

Poder Legislativo, pois este o realiza diretamente ou com o auxilio do Tribunal de

Contas.

Estudando o órgão, ALEXANDRE DE MORAES mostra o

conceito, conforme citações que faz, na idéia de que “o Tribunal de Contas é órgão

auxiliar e de orientação do Poder Legislativo, embora a ele não subordinado,

praticando atos de natureza administrativa, concernentes, basicamente, à

fiscalização.”110

O Tribunal de Contas é órgão técnico de fiscalização e que,

exercendo atos de natureza administrativa, auxilia o Poder Legislativo. Não está

subordinado hierarquicamente ao Poder Legislativo, mas a nomeação de seus

membros depende da vontade deste Poder e do Presidente da República que deve

ser extraneu em relação as funções do Legislativo.

Dispõe o art. 73 da Constituição Federal que o Tribunal de

Contas da União é integrado por nove Ministros. Um terço dos integrantes são

109 MEIRELLES, Hely Lopes – Direito Administrativo Brasileiro, p.670 110 MORAES, Alexandre de - Curso de Direito Constitucional, p.376

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escolhidos pelo Presidente da República com aprovação do Senado Federal. Não

obstante seja um número pequeno, três Ministros, a interferência do Presidente da

República no colegiado, e em última análise, no Poder Legislativo está presente.

Se o Tribunal de Contas é um órgão com autonomia, mas com

função constitucional de auxiliar o Poder Legislativo, e se esta função é

preponderante para fiscalizar as contas do Poder Executivo, não tem fundamento

que o fiscalizado escolha o fiscalizador.

O fato da exigência de aprovação do Senado Federal, portanto

somente de uma das Casas do Congresso, e de que os escolhidos devem ser a

partir de uma lista tríplice do próprio Tribunal dentre seus auditores e membros do

Ministério Público junto ao Tribunal, não afasta a interferência do Presidente da

República.

Como já afirmado, a função constitucional do Tribunal de Contas

é de auxilio ao Poder Legislativo, por isto em obediência à teoria da separação dos

Poderes e em obediência à independência dos Poderes como cânone constitucional,

a escolha pelo Presidente da República é perfeita ingerência.

O que se percebe é que o Presidente da República tem

participação ativa em todos os segmentos políticos do Estado. Além de exercer a

função administrativa, está entranhado na estrutura do Poder Legislativo, bem como

do Poder Judiciário.

Com esta situação temos um mal decorrente do

presidencialismo brasileiro, consistente em permitir a intromissão direta do

Presidente da República em órgão do Poder que deve fiscalizar tecnicamente suas

contas.

Aliás, em obra de Maria Garcia encontramos frase de RUY

BARBOSA com a seguinte ênfase sobre o presidencialismo: “o poder dos poderes, o

grande eleitor, o grande nomeador, o grande contratador, o poder da bolsa, o poder

dos negócios, o poder da força”.111

O Presidente da República, como grande nomeador, não

nomeia somente no Poder Executivo, mas sim nomeia no Poder Legislativo e no

Poder Judiciário.

111 GARCIA, Maria – Presidencialismo e Parlamentarismo in Parlamentarismo ou Presidencialismo?, p.133

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5.4. Nomeação para o Poder Judiciário.

A situação em relação ao Poder Judiciário é mais gravosa

porque, além de compor o órgão Supremo, nomeia nos demais Tribunais e em toda

a Justiça Federal, além do Conselho Nacional de Justiça.

Ao nomear integrantes do Poder Judiciário, o Presidente da

República efetivamente compõe os órgãos deste Poder exclusivamente conforme a

sua vontade.

Estas nomeações, em muitos casos, tem gerado dúvidas quanto

à imparcialidade exigível de todo Julgador, fazendo com que Imprensa questione as

decisões.

Em ações de cunho nacional com grandes repercussões e

também as de matéria eleitoral têm possibilitado a Imprensa fazer prognósticos dos

Votos a partir dos antecedentes do Julgador como, por exemplo, sua atividade

político-partidária e qual Presidente da República o nomeou.

Se a Imprensa tem feito estes questionamentos é evidente que

a população também faz, pois a Imprensa, livre como deve ser, também reflete o

pensamento da sociedade, pois, como afirmou RUI BARBOSA “A imprensa é a vista

da nação.”112

Há uma preocupação de que as nomeações para o Supremo

Tribunal Federal, bem como para os Tribunais Superiores seja fundada apenas no

relacionamento de amizade.

O tema já foi por nós tratado quando da eleição Presidencial de

2002, diante de questionamentos da e na Imprensa, no sentido de que toda

reclamação de determinado candidato era aceita enquanto a de outro, o da oposição

não. Isto em relação ao Tribunal Superior Eleitoral. 113

112 BARBOSA, Rui – Discursos, Orações e Conferências, A Imprensa, Vol.1, p.29 – “ A imprensa é a vista da nação. Por ela é que a nação acompanha o que lhe passa ao perto e ao longe, enxerga o que lhe malfazem, devassa o que lhe ocultam e tramam, colhe o que lhe sonegam, ou roubam, percebe onde lhe alvejam,ou nodoam, mede o que lhe cerceiam,ou destroem, vela pelo que lhe interessa, e se acautela do que a ameaça.” 113 CARVALHO, Jeferson Moreira de- Escolha na Corte in Revista Eletronica Consultor Jurídico, 03/11/2002. “Não é bom para o Estado e para a Nação que o Supremo se transforme numa Casa de Justiça integrada somente por ex-ocupantes de cargos eletivos, comprometidos por natureza com ordens partidárias, de direita, de esquerda, centro-direita, seja lá o que for. O integrante de partido político por questão de fidelidade deve sempre estar atrelado as diretrizes partidárias, o que não pode ocorrer

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Pode-se pensar em justificar as nomeações para dar

legitimidade ao Poder Judiciário; entretanto a legitimidade encontra respaldo na

Constituição Federal.

Considerando que a composição do Poder Judiciário carece da

vontade popular expressa através das urnas, ao contrário dos demais Poderes, é

importante deixar consignado que a legitimidade democrática do Poder Judiciário é

real, o que afasta qualquer pensamento da necessidade de participação do

Presidente da República para as nomeações previstas pela Constituição Federal.

Tratando sobre a Democratização do Poder Judiciário, CELSO

BASTOS mostra parte da lição de Konrad Hesse, após afirmar que o Poder

Judiciário passa a ser, sem dúvida, o intérprete da lei, mas aliado a vetores que o

meio social lhe impõe, porque o magistrado não deixa de captar estes fluidos

dominantes no meio social que são indispensáveis para o exercício da sua atividade,

no sentido de que “La Constitución se compone de normas. Estas contienen

requerimentos dirigido a la conducta humana, no aún condutcta humana misma; lãs

normas non son más que letra muerta sin eficácia alguna cuando el contenido de

tales requerimentos no se incorpora a la conducta humana. El Derecho

constitucional en este sentido, no puede ser desvinculado de la actuación y em dicha

actuación resulta `realizado`, alcanza el mismo la realidad de un orden vivido,

formador y conformador de realidade histórica, pudiendo cumplir su função em la

vida de la Comunidad.”

Seguindo, conclui que “Sem dúvida nenhuma reside neste

particular um dos mais salientes aspectos do caráter democrático do Poder

Judiciário.”114

Mais à frente, o autor ainda enfatiza que a evolução do direito e

do Estado liberal, que também é social, acabou por trazer o Poder Judiciário para

dentro do jogo político. Então, seu compromisso não pode deixar de ser

com o Magistrado, que afastado das paixões políticos-partidárias, deve estar atrelado a Constituição, às leis e aos fins sociais a que se destinam, sem preocupação com idéias partidárias. No sistema brasileiro não combina parcialidade de partido político, que deve existir para defender suas posições, com imparcialidade dos magistrados, que é imprescindível para decidir para a sociedade”. 114 BASTOS, Celso – A Democratização do Poder Judiciário e a Democratização do Direito in Democracia, Hoje , p. 185 ( Tradução livre do autor: A Constituição se compõe de normas. Estas contem requerimentos dirigidos à conduta humana, não há uma mesma conduta humana; as normas não são mais que letra morta sem eficácia alguma quando o conteúdo de tais requerimentos não se incorporam à conduta humana. O Direito constitucional, neste sentido, não pode ser desvinculado da atuação e em dita atuação resulta “realizado”, alcança a mesma realidade de uma ordem vivida, formadora e conformadora da realidade histórica, podendo cumprir sua função na vida da Comunidade).

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democrático, na medida em que aplica a Constituição e as leis, como acontece com

o Estado brasileiro que é um Estado democrático de Direito. Assim, a ação judicial,

em sua independência, constitui a fonte de legitimação democrática do Poder

Judiciário.

DALMO DE ABREU DALLARI afirma que “superados o

feudalismo e o absolutismo, os juízes se tornaram agentes do povo” 115. Na condição

agentes do povo, evidente, o juízes agem em nome deste mesmo povo; por isto a

legitimidade do Poder Judiciário é indiscutível.

Se os juízes são agentes do povo, e a magistratura tem parcela

desse poder soberano, evidente a legitimidade democrática do Poder Judiciário.

Na obra Tribunal e Jurisdição Constitucional, ANDRÉ RAMOS

TAVARES também se preocupa com o tema e dedica o Capítulo IV116 para provar a

existência da legitimidade democrática do Tribunal Constitucional, portanto

socorrendo de seus ensinamentos transporta-se para todo o Poder Judiciário a

essência do que ministra.

A primeira idéia é que todos os nomeados pelo Presidente da

República para composição de Tribunais, assim o são com fundamento no poder

recebido pelo Presidente através das urnas que expressou a vontade popular. De

forma indireta, o povo está fazendo a composição dos Tribunais, seja o

Constitucional, os Superiores ou os Regionais. Esta idéia dá suporte para o

processo de nomeação previsto pela Constituição Federal e legitima o Poder

Judiciário.

115 DALLARI, Dalmo de Abreu – O Poder dos Juízes, p. 88. –“No momento em que foram superados o feudalismo e o absolutismo, os juízes deixaram de ser agentes do rei ou de aristocratas poderosos para se tornarem agentes do povo. Isso ficou definitivamente claro com o aparecimento das Constituições escritas, no século dezoito. Foi transferida para o Estado a soberania, que antes era um atributo pessoal do rei, e se consagrou a tripartição do poder do Estado, entregando-se a magistratura uma parcela desse poder soberano, essencialmente político. Esse é um ponto importante, que não tem sido suficientemente considerado e que pode explicar inclusive,certas divergências teóricas: as decisões judiciais fazem parte do exercício da soberania do Estado,que,embora disciplinada pelo direito, é expressão do poder político.” 116 TAVARES, André Ramos – Tribunal e Jurisdição Constitucional, p.71/94.- “Assim, esse ato de soberania popular, ou mais precisamente sua manifestação ( o poder constituinte),caracteriza-se como uma potência criadora por excelência, pelo que tudo que vier a se instituir se reveste da necessária legitimidade, que sob esse ponto de vista é considerada como uma legitimidade direta.” (...) “Francisco Rezek lembra que “ Para proverbial escândalo- hoje um tanto mais discreto- dos pregoeiros do dogma de que numa democracia não há forma alguma de legitimidade sem o suporte das urnas, ensinaram o mundo os norte-americanos que uma parcela do poder público deve, por sua própria natureza,revestir cidadãos independentes do sufrágio político, e comprometidos tão só com a ordem legal- cuja composição de resto, não lhe imcumbe, mas aos órgãos de representação popular.”

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Ao nosso ver, outros são os fundamentos para a

legitimidade democrática e por que, com estas nomeações, o Presidente da

República se transforma em uma pessoa com super poderes.

Conforme LASSALLE, já citado117, em essência a Constituição é

a soma dos fatores reais do poder que regem uma Nação, por isto a questão que

surge é saber se os fatores reais, se o povo quer entregar o Poder do Estado nas

mãos de uma só pessoa. A história tem mostrado que não.

Com este pensamento a supremacia dos poderes do Presidente

da República seria inconstitucional ao viés da Constituição, entendida como a soma

dos fatores reais do Poder. Estando o poder concentrado nas mãos de uma só

pessoa não há como pensar em soma dos fatores reais.

As outras idéias que dão suporte à afirmativa de que há

legitimidade democrática ao Poder Judiciário, todas elas encontram validade no

sistema constitucional.

No exercício do Poder Constituinte Originário, os representantes

do povo, escolhidos de forma democrática, escreveram a Constituição e nela fizeram

inserir a maneira de ingresso do Poder Judiciário, que deve ser através de concurso

público118, diante da necessidade de pessoas com conhecimentos jurídicos e

políticos.

Todos os Poderes do Estado são democráticos, na medida que

os Três estão previstos na mesma Constituição.

A legitimidade democrática do Poder Judiciário emerge da

legitimidade do legislador constituinte originário, escolhido pelo povo; assim no

momento em que este legislador fez a previsão do Poder Judiciário a legitimidade se

fez presente. Em suma, o juiz recebe do povo, através da Constituição a

legitimidade119, que dá, portanto, validade popular às suas decisões.

117 Nota 19 118 Art.93 da CF: “ O ingresso na carreira,cujo cargo inicial será o de juiz substituto, mediante concurso de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as fases,exigindo-se do bacharel em direito, no mínimo,três anos de atividade jurídica e obedecendo-se, nas nomeações,à ordem de classificação;” 119 DALLARI, Dalmo, citado por André Ramos Tavares – Tribunal e Jurisdição Constitucional. p.76, nota 99. “O juiz recebe do povo, através da Constituição, a legitimação formal de suas decisões, que muitas vezes afetam de modo extremamente grave a liberdade,a situação familiar, o patrimônio, a convivência na sociedade e toda uma gama de interesses fundamentais de uma ou de muitas pessoas. Essa legitimação deve ser permanente complementada pelo povo, o que só ocorre quando segundo a convicção predominante, os guises estão cumprindo seu papel constitucional, protegendo eficazmente os directos e decidindo com justiça. Essa legitmação tem especial importância pelos efeitos políticos e sociais que podem ter as decisões judiciais.”

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Tudo o que está previsto na Constituição tem fundamento

democrático, porque o constituinte só agiu em razão da escolha popular que lhe

delegou poderes para escrever a nova Constituição dando formato jurídico ao novo

Estado.

Composto o Poder Judiciário, sua legitimidade democrática

também se realiza através da sujeição dos Magistrados à Constituição e às leis que

emanaram da vontade popular; assim tem-se uma composição conforme a vontade

popular que está sujeita a aplicar e respeitar o ordenamento jurídico que também

emanou da vontade popular. A legitimidade democrática está, portanto,

consubstanciada no texto constitucional conforme à vontade do legislador

constituinte que agiu com fundamento na representatividade popular recebida

através das urnas.

Por fim, o autor, André Ramos Tavares, tratando de decisões

democráticas, mostra que estas dependem de sua conformação com as próprias

razões do principio democrático.

Expressa que “Aqui a questão entronca com a necessidade de

pessoas aptas a decidir, pessoas melhor qualificadas para manter o sistema

democrático como tal. Despontam, assim, os Tribunais Constitucionais, e os

magistrados que os compõem. Como pretende a Constituição brasileira, na mesma

linha de outras tantas, devem ser especializados. Daí a importante condição de que

contem com “notável saber jurídico”.120

De todo o estudo pode-se concluir com segurança que todo o

Poder Judiciário está investido da legitimidade democrática que se exige para

qualquer dos Poderes do Estado; deste modo não há motivo constitucional e

democrático para que o Presidente da República tenha o poder de intromissão no

Poder Judiciário.

O comportamento, como já exposto, afasta a independência

como cânone constitucional e transforma o Presidente da República como um Poder

acima do Judiciário.

A legitimidade democrática do Poder Judiciário encontra

embasamento na própria previsão constitucional do Poder e na sujeição dos

120 Vide nota 116

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membros do Poder ao ordenamento constitucional e legal elaborado conforme a

vontade popular por meio de seus representantes diretamente escolhidos.

O Poder Judiciário exerce sua função por meio dos juízes

conforme a emanação popular escrita na Constituição, portanto coberta da

legitimidade democrática.

Enfim, Poder Judiciário e Democracia formam um par perfeito,

exigindo um a presença do outro a fim de se alcançar os fins pretendidos. Por isto

correta a afirmação de ANTOINE GARAPON de que “A justiça passa a ser o

instrumento de emancipação e o último recurso contra a implosão da democracia”.121

5.4.1. Nomeação para o Supremo Tribunal Federal.

De acordo com o art. 92 da Constituição Federal, o Supremo

Tribunal Federal é órgão da cúpula do Poder Judiciário, com sede na Capital Federal

e jurisdição em todo território nacional.

Sua competência precípua, por ordem do art. 102 da

Constituição é a guarda da própria Constituição.

Assim, a Constituição Federal está entregue ao Supremo

Tribunal Federal para que ele a guarde, isto é, faça impor em todo o território

nacional, para todas pessoas e para todos os Poderes, todos os princípios e regras

insculpidos na Carta Constitucional.

Atua o Supremo Tribunal Federal como o guardião, o curador da

Constituição por vontade do constituinte originário.

A concretização da Constituição Federal exige ação firme,

pronta, rápida e descompromissada do Supremo Tribunal Federal, cujo único

compromisso exigível é com a própria Constituição.

Em razão desta competência constitucional é que o “Tribunal

tem, portanto, a natureza de Corte Constitucional, a par das competências ordinárias

especificas, como expressa PAULO NAPOLEÃO NOGUEIRA DA SILVA”.122

121 GARAPON, Antoine - O Juiz e a Democracia- O guardião das Promessas, p.173. 122 SILVA, Paulo Napoleão Nogueira da – Curso de Direito Constitucional, p.241

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Tem o Supremo Tribunal Federal a importância de ser a Corte

Constitucional, o que deve ser encarado como atribuição de relevante importância

para o Estado de Direito e para a democracia, porque só havendo um órgão que

exija respeito a Constituição, é que teoricamente vamos ter a segurança jurídica

desejada.

Sua importância está enfatizada por ANDRÉ RAMOS TAVARES

quando afirma que “sobreleva, pois a importância de um órgão fiscalizador da exata

compreensão do Texto Magno quando de sua aplicação, bem como do respeito a

ele pelo Poder Público, quando do exercício de suas atividades. E dentre todas as

atividades atribuídas ao Tribunal Constitucional brasileiro, destaca-se em função da

importância enquanto revelador dos valores constitucionais, a competência para

exercer o controle da constitucionalidade”.123

Dos ensinamentos podemos afirmar que o Supremo Tribunal

Federal é o órgão de cúpula do Poder Judiciário que tem a competência

estabelecida na Constituição Federal, a qual lhe dá a natureza de Corte

Constitucional, mas atuando também em questões ordinárias.

Ao tratar da composição o art.101, da Constituição Federal

dispõe que o Supremo Tribunal Federal compõe-se de onze Ministros escolhidos

dentre cidadãos com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos de

idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada. Os Ministros do Supremo

Tribunal Federal serão nomeados pelo Presidente da República, depois de

aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal (g.n.).

Então, a Corte Constitucional é composta por pessoas de

agrado do Presidente da República, desde que esteja na faixa etária permitida,

tenha notável saber jurídico e reputação ilibada.

É permitido, então, que seja nomeado para Ministro da Corte

Constitucional qualquer pessoa que esteja ocupando um cargo eletivo,que esteja

como deve ser, verdadeiramente compromissado e vinculado com posições político -

partidárias.

123 Op. cit, p.16

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Se a justiça não pode se colocar no lugar da política124, com

muito mais razão a política não pode ser colocada no lugar da justiça, porque abre o

caminho para decisões e comportamentos afastados do compromisso com a

Constituição e direito vigente em privilégio as ideologias e compromissos partidários.

A substituição da justiça pela política retira toda a segurança

que o povo precisa para bem viver a vida estatal.

Com efeito, é pouco pensar que há uma interferência do

Presidente da República no Poder Judiciário quando ele, Presidente, faz as

nomeações.Não há uma simples interferência, há sim uma atuação direta do

Presidente da República no Poder Judiciário, porque ele compõe o Poder conforme

a sua vontade pessoal.

Presente a sua supremacia quando se percebe que a Corte

Constitucional órgão de cúpula do Poder Judiciário tem seus Ministros nomeados

sem que haja a mínima participação no processo do próprio Poder Judiciário.

Em resumo, a cúpula do Poder Judiciário é composta de acordo

com a vontade do Presidente da República, sem nenhuma participação do próprio

Poder, o que mostra que a independência não é tão real como deveria ser.

5.4.2. Nomeação para os Tribunais Superiores.

Na organização do Poder Judiciário, como visto, temos o

Supremo Tribunal Federal, que como a própria denominação já indica está em

posição superior em relação aos demais órgãos. A Constituição também prevê

Tribunais Superiores para decidirem questões especificadas e de âmbito nacional,

dando também ao Presidente da República o poder de compor estes órgãos.

Expressa o art. 104 da Constituição Federal que o Superior

Tribunal de Justiça compõem-se de, no mínimo, trinta e três Ministros.

124 Vide nota 121, p.53- “A justiça não pode se colocar no lugar da política; do contrário, arrisca-se a abrir caminho para uma tirania das minorias, e até mesmo para uma espécie de crise de identidade. Em resumo o mau uso do direito é tão ameaçador para a democracia como seu pouco uso.”

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Os Ministros do Superior Tribunal de Justiça serão nomeados

pelo Presidente da República, dentre brasileiros com mais de trinta e cinco e menos

de sessenta e cinco anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada,

depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta Senado Federal.

Percebe-se aqui a mesma redação quando a Constituição

Federal trata do Supremo Tribunal Federal, no entanto, os incisos do artigo

mencionado mostra, agora sim, a interferência do Presidente da República, porque

sua vontade já não é livre e exclusiva quando nomeia para a Corte Constitucional.

Um terço deve ser nomeado dentre juízes dos Tribunais

Regionais Federais e outro terço dentre desembargadores dos Tribunais de Justiça,

indicados em lista tríplice elaborada pelo próprio Tribunal.

Assim a nomeação destes dois terços vincula o Presidente da

República a nomear dentre aqueles que integram a lista tríplice elaborada pelo

Superior Tribunal de Justiça. Agora, há a participação do Poder Judiciário na

nomeação, que embora não tenha o Tribunal o poder de decisão ou de escolha, há

uma participação efetiva.

O outro terço é nomeado pelo Presidente da República entre

advogados e membros do Ministério Público Federal, Estadual, do Distrito Federal e

Territórios, alternadamente, conforme indicação dos respectivos órgãos de classe.

Em resumo, a nomeação para o Superior Tribunal de Justiça

recebe influência decisiva do Presidente da República porque, em última análise o

escolhido vai depender de seu ato de nomeação.

A partir do art.111, a Constituição Federal passa a tratar da

Justiça do Trabalho, cuja jurisdição é exercida em todo o território nacional, pois a

Justiça do Trabalho é órgão do Poder Judiciário Federal. Assim, os Estados-

membros não podem decidir judicialmente as questões trabalhistas, como afirma

AMAURI MASCARO NASCIMENTO.125

O Tribunal Superior do Trabalho é o órgão máximo da

Justiça do Trabalho. Estabelece o art. 111-A que o Tribunal Superior é composto de

vinte e sete Ministros escolhidos dentre brasileiros com mais de trinta e cinco e

menos de sessenta e cinco anos, nomeados pelo Presidente da República, após

aprovação pelo Senado Federal.

125 NASCIMENTO, Amauri Mascaro - Iniciação ao Direito do Trabalho, p.395

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Um quinto dos Ministros deve ser escolhido dentre advogados

com mais de dez anos de efetiva atividade profissional e membros do Ministério

Público do Trabalho com mais de dez anos de efetivo exercício.

Os demais dentre juízes dos Tribunais Regionais do Trabalho,

oriundos da magistratura de carreira, indicados pelo próprio Tribunal Superior.

Quanto a nomeação dos juízes, ficou o Presidente da República

vinculado a indicação pelo Tribunal Superior, o que mostra pequena participação de

órgão do Poder Judiciário para nomeação de membros que vão integrar o próprio

Poder Judiciário.

No tocante a Justiça Eleitoral, a Constituição Federal fixa no art.

118, o Tribunal Superior Eleitoral como órgão máximo.

É este, então, o Tribunal Superior para dirimir questões

eleitorais e funciona como um terceiro grau de jurisdição, como já exposto, e em

regra suas decisões não devem chegar ao Supremo Tribunal Federal como mostra

PINTO FERREIRA ao afirmar que o “Tribunal Superior Eleitoral constitui o

coroamento máximo da Justiça Eleitoral, daí a irrecorribilidade das suas decisões

como regra geral.”126 , o que é extraído da interpretação do art.121, § 3º da

Constituição Federal.

Sua composição está regrada pelo art. 119 da Constituição

Federal que expressa a composição mínima de sete membros.

Três juízes são escolhidos mediante eleição, pelo voto secreto,

dentre os Ministros do Supremo Tribunal Federal, portanto, por via indireta, tem-se a

atuação do Presidente da República, porque ele foi quem escolheu os Ministros do

Supremo Tribunal Federal à sua vontade, como já sustentado anteriormente.

Dois juízes são escolhidos mediante eleição, pelo voto secreto,

dentre os Ministros do Superior Tribunal de Justiça, que mostra outra vez a atuação

presidencial, porque os Ministros do Superior Tribunal de Justiça são escolhidos e

nomeados pelo Presidente da República.

Por fim, dois juízes são nomeados diretamente pelo Presidente

da República, dentre seis advogados de notável saber jurídico e idoneidade moral,

indicados pelo Supremo Tribunal Federal.

126 FERREIRA, Pinto- Código Eleitoral Comentado, p.54

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145

Está claro na composição do órgão máximo da Justiça Eleitoral

que o Presidente da República tem sua vontade explicita e contida na forma de

escolha, e mais diretamente quando escolhe dentre os Advogados.

Em suma, o Presidente da República faz a composição do

Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça. Depois, estes

nomeados por ele integram a composição do Tribunal Superior Eleitoral que se

completa com sua participação direta ao nomear dois juízes.

Cabe registrar ainda que o mandato é temporário, por dois anos,

nos termos do art. 121, § 2º da Constituição Federal.

Ao dispor sobre a Justiça Militar o art.122 da Constituição

Federal prevê o Superior Tribunal Militar como órgão máximo.

O Tribunal deve ser composto de quinze Ministros vitalícios

nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a indicação pelo

Senado Federal.

Três são nomeados dentre oficiais-generais da Marinha, quatro

dentre oficiais-generais do Exercito e três dentre oficiais-generais da Aeronáutica,

todos da ativa e do posto mais elevado da carreira.

São nomeados também cinco civis, sendo três dentre

advogados de notório saber jurídico e reputação ilibada, com mais de dez anos de

efetiva atividade profissional e dois, por escolha paritária, dentre juízes auditores e

membros do Ministério Público da Justiça Militar.

Não havendo diferença das nomeações dos outros Tribunais, o

Presidente da República exerce sua supremacia escolhendo os integrantes da

Justiça Militar.

Resumindo o Presidente da República faz a composição da

Corte Constitucional e dos Tribunais Superiores do Estado brasileiro conforme a sua

vontade, havendo em determinadas hipóteses a vinculação de sua vontade à lista

apresentada.

5.4.3. Outras nomeações para o Poder Judiciário.

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146

O legislador constituinte não se contentou em dar ao Presidente

da República o poder de nomear para a Corte Constitucional e Tribunais Superiores.

Verifica-se, na Constituição Federal, o poder de também nomear para Tribunais

Regionais quando se trata da Justiça Federal.

É incompreensível a idéia porque os Tribunais Regionais estão

inseridos na estrutura do Poder Judiciário, por isto as nomeações devem ser atos do

Poder Judiciário e não do Presidente da República que encarna o Poder Executivo.

É nebuloso enxergar a independência de um Poder quando é o

Chefe de outro Poder que faz as nomeações.

Os Tribunais Regionais Federais são compostos de no mínimo

sete juízes nomeados pelo Presidente da República dentre brasileiros com mais de

trinta e cinco e menos de sessenta anos de idade.

Um quinto de seus membros deve ser escolhido dentre

advogados com mais de dez anos de efetiva atividade profissional e membros do

Ministério Público com mais de dez anos de carreira. Os demais serão mediante

promoção de juízes federais.

Consoante dispõe o art.115 da Constituição Federal, os

Tribunais Regionais do Trabalho são compostos de no mínimo sete juízes nomeados

pelo Presidente da República.

Um quinto dentre advogados com mais de dez anos de efetiva

atividade profissional e membros do Ministério Público do Trabalho com mais de dez

anos de efetivo exercício.

Os magistrados serão escolhidos por promoção.

Os Tribunais Regionais Eleitorais,conforme a redação do art

120, compor-se-ão, mediante eleição e voto secreto de dois desembargadores e

dois juízes de direito escolhidos pelo Tribunal de Justiça do Estado e Distrito

Federal.

Um juiz do Tribunal Regional Federal com sede na Capital do

Estado ou no Distrito Federal.

Dois dentre seis advogados de notável saber jurídico e

idoneidade moral, nomeados pelo Presidente da República.

A participação e interferência do Presidente da República é

notada porque ele faz as nomeações dos dois advogados, devendo ser considerado

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147

também que o juiz do Tribunal Regional Federal que for escolhido, foi nomeado para

este Tribunal por ato anterior do Presidente da República.

Concluindo, a Corte Constitucional, os Tribunais Superiores e os

Tribunais Regionais Federais, bem como os Tribunais especializados têm sua

composição vinculada à participação direta do Presidente da República.

5.5. Poder sobre os Poderes.

Não é demais mencionar novamente RUI BARBOSA com a

idéia de que, no presidencialismo, o Presidente passa a ter ou ser “o poder dos

poderes, o grande eleitor, o grande nomeador, o grande contratador, o poder de

bolsa, o poder dos negócios, o poder da força”.127

Como já afirmado anteriormente, o Poder Executivo encarna a

pessoa do Presidente da República. Em razão disto, o exercente do cargo se

posiciona como uma pessoa super poderosa. Neste contexto quem tem poder sobre

os demais Poderes não é o Poder Executivo, mas sim o Presidente da República

que, além de administrar o Poder para o qual foi eleito, intromete-se de maneira

preponderante no Poder Legislativo e Poder Judiciário.

A permissão constitucional para o Presidente da República

legislar por Medida Provisória utilizando de pressupostos subjetivos e também a

possibilidade de legislar através de Lei Delegada, sem a possibilidade de alteração

do texto por parte do Poder Legislativo, que tem a função primordial de legislar,

mostra a escandalosa supremacia.

O poder de nomear integrantes para o Tribunal de Contas, que

basicamente fiscaliza as contas do Presidente da República, porque o Presidente

tem em suas mãos o Tesouro Nacional, é dar poder para o fiscalizado nomear o

fiscalizador, o que mostra a hipertrofia.

127 Idem nota 74, p.133

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148

Com o forte poder de legislar e nomear Ministros em órgão de

auxílio do Poder Legislativo, se torna evidente o Poder Presidencial ou o

absolutismo presidencial.

Então, quanto ao Poder Legislativo, que muitos sustentam ser o

Poder mais forte porque tem a função legislativa, o Presidente da República usurpa

a função quando legisla desmedidamente por meio de Medida Provisória e também

enfraquece o Poder porque escolhe e nomeia Ministros para o órgão fiscalizador.

O poder presidencial também se mostra hipertrofiado em

relação ao Poder Judiciário, na medida em que mesmo, sendo pessoa estranha ao

Judiciário, é ele quem faz a composição do Tribunal de cúpula, dos Tribunais

Superiores e dos Tribunais Regionais; além de nomear os integrantes do órgão de

controle.

Seu necessário comprometimento político-partidário não dá

isenção para escolher e nomear integrantes de órgão judicial.

Esta conduta também usurpa função porque cada Chefe de

Poder deve ter a atribuição de nomear para o Poder que representa.

A independência do Poder Judiciário está atrelada à vontade do

Presidente da República em escolher e nomear os membros do Supremo Tribunal

Federal, que é o órgão de cúpula do Judiciário Nacional e que ainda exerce a função

de Corte Constitucional.

Fazer a composição dos Tribunais Superiores e até mesmo de

Tribunais Regionais, mostra o Chefe do Poder Executivo fazendo a composição do

Poder Judiciário, o Poder que tem como missão nacional julgar os casos concretos

que são apresentados sem qualquer tipo de parcialidade, com compromisso apenas

com a Constituição Federal e as leis vigentes.

Este poder de escolha e nomeação mostra o absolutismo

presidencial incontestável e injustificável.

Não se quer dizer com isto que o sistema presidencial de

governo seja prejudicial ou que deva ser afastado, mas tão somente que o sistema

brasileiro precisa ser revisto para estabelecer, de forma clara e objetiva, a

competência de cada Poder de Estado e fazer valer a independência de modo que

cada Poder respeitando a Constituição tenha vida própria.

A independência constitucional dos Três Poderes não pode ser

apenas textual, deve ser real, efetiva e perceptível. Se houver permissão para que

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um Poder ou o Chefe de um Poder controle os demais teremos uma ditadura, que

não é o desejo da Nação.

A legitimidade democrática dos Três Poderes provém da

Constituição Federal, por isto o sistema se desorganiza quando uma só pessoa

passa a impor sua vontade em todos os Poderes.

Em resumo, conforme a redação constitucional, não há dúvida

que o Presidente da República exerce poder sobre os Poderes, o que levou

SERGIO VICTOR TAMER a afirmar que o presidencialismo brasileiro é sistema de

concentração de poderes no âmbito do executivo.128

De obra de GEORGES BURDEAU também se pode concluir

que o afastamento da independência e a hipertrofia do Executivo faz gerar o Poder

sobre os Poderes. Ensina o autor que o principio da separação dos Poderes se

compõe de duas regras distintas: regra da especialização e regra da independência,

que em combinação dão o resultado sonhado: a liberdade.

Sobre a especialização ensina que “ Dans une version

forte de la doctrine, on considere que chaque autorité ou organe est investi d´un

pouvoir spécifique, nécessaire à l´exercice de sa fonction et on le désignera par le

nom de ce pouvoir. Il y aura donc um pouvoir législatif, um pouvoir exécutif,um

pouvoir judiciaire” . Quanto a regra da independência afirma categoricamente que

autoridade de um Poder não pode nomear em outro Poder: “ Il faut donc que les

autorités ou organes soient mutuellement indepéndents, ce qui signifie em

pratique que lês individus qui composent chacune de ces autorités ne doivent pás

être nommés par lês autres organes et surtout qu´ils ne doivent pás être

discrétionnairement révocables par ex.”129

128 TAMER, Sergio Victor – Fundamentos do Estado Democrático e a Hipertrofia do Executivo no Brasil, p. 252. “O certo é que, com a enorme expansão das faculdades do Estado, sobretudo em face da complexidade atual da ordem econômica, e a despeito da formação política autoritária de nossa República, o Poder Executivo fortaleceu-se de tal maneira que hoje coloca-se em questão o princípio da separação dos poderes.” 129 BURDEAU,George set all – Droit constitutionnel, L.G.D.J., p.102 ( Tradução livre do autor: “ Uma versão firme à doutrina, considera que cada autoridade ou orgão está investido de um poder específico, necessário ao exercício da sua função e será designado pelo nome do poder. Haverá então um poder legislativo, um poder executivo e um poder judiciário.” “ É necessário que as autoridades ou órgãos sejam mutuamente independentes, que significa, na prática, que pessoas investidas em qualquer destas autoridades não devem ser nomeadas por outros órgãos, e sobretudo que elas não devem ser discricionariamente dispensadas por aqueles outros órgãos.”

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150

CAPITULO VI-

CONTROLE EXTERNO DOS PODERES DA REPÚBLICA

O chamado sistema de freios e contrapesos, conseqüência da

teoria de Montesquieu, como afirma SERGIO TAMER, pode ser visto como uma

forma de controle externo porque permite que um Poder controle o outro.130

A existência deste tipo de controle dispensa qualquer outro

porque gera a interdependência, o que faz com que cada Poder exerça sua função

de maneira não ilimitada, mas sim controlada pela própria conduta dos demais. Em

suma o Poder controla o Poder.

Diante da situação atual, em que a Emenda Constitucional

45/2004 instituiu um órgão de controle no Poder Judiciário, que embora inserido na

sua estrutura orgânica, na verdade se apresenta como órgão externo porque em

parte é composto por pessoas estranhas e oriundas também de vontades externas,

é de se exigir também, aceitando-se sua constitucionalidade, que os demais poderes

da República experimentem o mesmo tipo de controle.

Constitui tremenda falácia afirmar que o Poder Executivo e o

Poder Legislativo são controlados externamente através do voto, porque a história

tem mostrado que o povo brasileiro não tem condições e meios de exercer o controle

da conduta dos eleitos. Em diversas situações políticos renunciam a seus cargos

para se livrarem de processo de cassação; entretanto em eleições futuras o povo

novamente os elegem para os mesmos cargos. O carente povo brasileiro não tem

condições culturais para o exercício desta forma de controle.

É oportuno lembrar pensamento de WALDEMAR

ZVEITTER do ano de 1993, no item que trata de Independência e Autonomia entre

130 TAMER, Sergio – O controle externo e a separação do poderes in www.jornalpequenonet/ - “ ... sendo que o princípio de Montesquieu acabou por dar origem ao conhecido “sistema de freios e contrapesos”2 pelo qual os atos gerais, praticados exclusivamente pelo Poder Legislativo,consistente na emissão de regras gerais e abstratas,limitam o Poder Executivo que só pode agir mediante atos especiais,decorrentes da norma geral. Para

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151

os Poderes do Estado, afirmando que a independência dos poderes no Estado

moderno, envolve, necessariamente, responsabilidade e mutua limitação, mas o

controle deve ser estabelecido sem que haja quebra na necessária autonomia.131

Deste modo, se não há conformismo com o sistema de freios e

contrapesos para que o controle dos Poderes da República seja efetivo, a criação do

Conselho Nacional de Justiça exige que seja criado, também, o Conselho Nacional

do Legislativo e o Conselho Nacional do Executivo.

Em última análise, o sistema de controle dos Poderes é um

sistema de auto-controle do Estado, que deve sofrer limitação em seu poder a fim de

que o direito de liberdade do povo seja efetivamente reconhecido e respeitado. E,

sobre a limitação dos Poderes do Estado, DUGUIT expressa que “ Ce n’est pas lê

pouvoir exécutif ou le pouvoir legislatif qui sont limites par le droit, c’este je le repete,

l´Etat lui-même, qu´il manifest son action par la loi ou par um acte d´administration

ou um acte jurisdictionnel.” 132

6.1. Controle externo do Poder Judiciário.

O controle externo do Poder Judiciário independente da criação

do Conselho Nacional de Justiça é fato que se realiza todos os dias por pessoas e

coibir a exorbitância de qualquer dos poderes de seus limites e competências,dá-se a ação fiscalizadora do Poder Judiciário.” 131 ZVEITTER,Waldemar – O Controle do Poder Judiciário in Informativo Jurídico da Biblioteca Ministro Oscar Saraiva do Superior Tribunal de Justiça, p.30. “Há de se reconhecer a procedência da assertiva que a independência dos poderes, no Estado moderno, envolve,necessariamente, sua responsabilidade e mútua limitação. E, desde que sofre o Legislativo o controle do Judiciário, que invalida leis tidas como inconstitucionais,submetendo-se, ainda, ao controle do Executivo pelo direito de veto e de iniciativa, certo que este, por sua vez, tem a legalidade de seus atos também controlada pelo Judiciário,vendo,ainda, sua atuação disciplinada pelo Legislativo, e esse controle não se há de imunizar o Judiciário como estranhável e injustificada exceção,quando nos países democráticos dispõem-se de formas de controle, como soe acontecer com o Executivo e o Legislativo.Contudo,penso, esse controle há de ser estabelecido sem a quebra da sua necessária autonomia e com a preservação da soberania jurisdicional, indispensáveis para o desempenho de sua missão constitucional.” 132 DUGUIT, Leon – Leçons de Droit public général, E.de Boccard,Editeur, p.254. Tradução livre do autor- “ Não é o poder executivo ou o poder legislativo que são limitados pelo direito, e eu repito, o Estado mesmo que manifesta sua ação pela lei, ou por um ato administrativo ou um ato jurisdicional.” . Ainda, “Falando de uma regra que limite os poderes do Estado, não espero falar de uma regra fixando um limite ao poder de certos órgãos do Estado, mas sim uma regra que restrinja os poderes do Estado nele mesmo, qualquer que seja de seus órgãos agindo.”

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instituições que estão vinculadas às ações em tramitação, além de outras formas

previstas pela Constituição Federal.

Ao escrever sobre o tema, LUIZ FLÁVIO GOMES mostra

argumentos favoráveis a instalação do controle externo: “afirmam que o juiz não é

controlado por ninguém, que está isento de freios, que no Estado de Direito nenhum

órgão pode ficar sem controle etc.”133

Em entrevista, ALVARO LAZZARINI, quanto ao

controle externo do Poder Judiciário e sumula vinculante respondeu: “Quanto à

súmula vinculante sou favorável, mas contrário ao controle externo. A corregedoria,

o Conselho Superior da Magistratura e o órgão especial do Tribunal de Justiça são

atuantes. Não há razão para o controle externo. Por que não há controle externo na

OAB, no Ministério Público? Não interessa aos governantes um Poder Judiciário

forte?134

Em artigo conciso e objetivo, SAULO RAMOS conta como a

idéia nasceu no Brasil e o que ocorreu na França. “Um advogado irritou-se com a

lentidão do andamento de suas poucas causas perante determinado juiz federal de

São Paulo. Dias depois, ficou furioso porque uma de suas jovens estagiárias foi

maltratada pelo mesmo juiz. Corria o ano de 1990. O Plano Collor inundava o

Judiciário federal de ações e mais ações. Dez mil processos, por dia, para cada

magistrado. Mas o nobre colega queria saber das“suas”causas e da “sua”estagiária.

Movido por esta fúria, descobriu no “sebo”, velhos livros franceses com a receita do

remédio: o controle externo do Judiciário.135

133 GOMES,Luiz Flávio- A questão do controle externo do Poder Judiciário, p.33. “ Que seu controle precisa ser aprimorado e democratizado parece muito evidente. Mas não é correto afirmar que ele não em controle. O primeiro e fundamental controle do juiz consiste em que ele só pode aplicar a legislação aprovada pelo Poder Político. O juiz, desse modo,decide os conflitos que lhe apresentam e acordo com as pautas jurídicas traçadas em outro âmbito de poder. Tudo que invocar como fundamento da decisão tem que encontrar apoio no ordenamento jurídico vigente,sob pena de perda da sua legitimidade democrática. O orçamento da Magistratura, de outro lado, não é elaborado e executado imediatamente por ela: só depois de aprovado pelo Legislativo é que pode ser executado. A autonomia financeira do Judiciário é limitada por orçamentos elaborados em conjunto com os demais poderes. As unidades administrativas do Judiciário estão sujeitas à fiscalização contábil, financeira,orçamentária,operacional e patrimonial dos Tribunais de Contas,que são órgãos auxiliares do Poder Legislativo.No concurso de ingresso para a carreira de Juiz há a obrigatória e salutar participação da Ordem dos Advogados do Brasil. De todos os Tribunais, um quinto de seus ocupantes são oriundos das classes dos Advogados e do Ministério Público. Do Tribunal do Júri participam juízes leigos. Os Ministros do Supremo Tribunal Federal, órgão de cúpula do Poder Judiciário, são nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pelo Senado Federal. Um terço do Superior Tribunal de Justiça é composto de Advogados e membros do Ministério Público.” 134 LAZZARINI, Alváro- A reforma de que o Judiciário precisa é a do processo in Informativo InterAção, p.4/5. 135 RAMOS, Saulo- renault e reynald, controle externo pelo lado de dentro in diálogos & debates, p.18.

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Continuando, afirma que o controle externo na França era

exercido pelo Conselho Superior da Magistratura composto de políticos e

magistrados, incluindo-se o Ministério Público. No entanto, em razão do desastre,

política e politicalha tomaram conta do processo de controle, apadrinhamentos,

perseguições, bajulações, revoltas - tudo menos eficiência, a composição foi

alterada a fim de afastamento dos políticos ficando a composição somente de

magistrados. Esta situação fática se sobrepôs a qualquer fundamento jurídico ou

político de sustentação da idéia para o tipo de controle criado.

Tratando especificamente do assunto, LUIZ FLÁVIO GOMES

mostra que a experiência estrangeira de controle externo amargou séria decepção

porque os Conselhos mais parecem órgão do Governo do que órgão de governo da

Magistratura, por instrumentalizar o processo de movimentação dos Magistrados.136

O texto esclarece que, na França, em 1988 e 1990, o Poder Político aprovou leis de

anistia de todos os delitos cometidos para o financiamento ilegal das campanhas

eleitorais. Na Itália a situação não foi diferente. Em 20 de novembro de 1991, o

Conselho Superior Italiano foi impedido de discutir a independência do Ministério

Público em relação ao Poder Executivo, porque o Presidente da República proibiu a

discussão. Acompanhou a reunião por sistema de TV e mandou policiais ao local.

Efetivamente, o Estado de Direito não suporta a criação de um

Conselho que permite ao Presidente da República controlar, a fim de anistiar crimes

de políticos e proibir a discussão de um tema.

De acordo com o que já foi afirmado anteriormente, o Poder

Judiciário é o Poder mais controlado da República. Controle diário e de vários

segmentos. O Judiciário não está submisso a um órgão de controle, mas sim a

vários mecanismos, que até formam um sistema de controle. O controle é

perceptível sob vários enfoques137, como mostra SERGIO TAMER; de sorte que

136 Idem nota 133, p.23 . “Mais que órgão de Governo da Magistratura, os Conselhos externos, na verdade, mais parecem órgãos do Governo na Magistratura, com a função de instrumentalizar o controle tanto do acesso, da promoção,da aposentadoria etc. dos juízes, como da inteira política judicial. Essa foi a forma encontrada para que o Poder Executivo continue exercendo seu controle sobre o Poder Judiciário, seja de forma direta ( no que se relaciona com parte econômica e muitas vezes administrativas),seja de forma indireta (através dos Conselhos Superiores externos). E quando altos interesses do Poder Político entram em jogo é que se nota mais claramente o quanto é pernicioso para o verdadeiro e igualitário Estado Democrático de Direito esse controle externo partidarizado dos juízes e da Magistratura.”. 137 Op.cit. O controle externo e a separação de poderes. “ Convém lembrar,dentro desse panorama,que o Judiciário já é o mais controlado dos poderes pois a Constituição de 88 estabeleceu pelo menos seis mecanismos de controle: o ingresso na carreira mediante concurso público,com a participação da OAB; os julgamentos públicos públicos e as decisões fundamentadas para expor o ato judicial ao acompanhamento

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além do controle diário praticado pelas partes em litígio,pelos Advogados que as

representam, pelo Ministério Público e pela publicidade das audiências e sessões, a

Constituição Federal prevê mecanismos específicos para atividade de controle.

Afora todos estes enfoques e mecanismos há o controle

processual que é aquele exercido pelas partes litigantes ou interessados.

É garantia de cada cidadão que julgada a questão que não lhe

atenda os interesses, há a possibilidade de um segundo julgamento, agora por

juízes de outro grau, isto é, com mais experiência e sempre por uma turma

julgadora.

A decisão de primeiro grau, dependendo da vontade da parte

sucumbente, sofre um controle judicial e passa por reexame em um colegiado.

O principio de recorribilidade também se apresenta como um

tipo de controle, na medida em que analisa constitucionalidade e legalidade dos atos

processuais porque “as lides ajuizadas devem submeter-se a exames sucessivos,

como garantia de boa solução”138 , conforme J.C.BARBOSA MOREIRA.

Exames sucessivos significam que as decisões estão sendo

controladas,ou seja, a função jurisdicional também experimenta este tipo de controle.

Com todo este sistema de controle a previsão de mais um

mecanismo externo tem o caráter de desequilibrar o mandamento constitucional de

independência dos Poderes,considerando que o Judiciário vai perdendo sua

autonomia.

A redação do art.2° da Constituição Federal induz a concluir que

o Poderes do Estado estão em mesmo plano constitucional139 por vontade do Poder

Constituinte originário, por isto qualquer mudança ou interpretação exige redobrada

cautela, a fim de que a ordem do Povo seja respeitada.

A primeira observação é que a Constituição determina são

Poderes, o que força concluir que estão no mesmo patamar de importância

constitucional, no sentido de que um Poder não está acima do outro, devendo todos

público; a destinação de 1/5 dos lugares em Tribunais de 2° grau a profissionais oriundos do Ministério Público e da advocacia; o controle do orçamento pelo Executivo e inspeção pelo Tribunal de Contas que também pode realizar inspeções e auditorias nas unidades administrativas do Judiciário; a indicação dos ministros do Supremo Tribunal Federal pelo Executivo e aprovação dos seus nomes pelo Legislativo”. 138 MOREIRA, J.C.Barbosa- Comentários ao Código de Processo Civil, p.270. 139 Art.2° da CF. – “ São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.”

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eles, cada um agindo na sua função constitucional, procurar atingir o bem comum da

Nação.

Com a idéia de concretizar esta importância e igualdade

constitucional, o texto afirma que são independentes e harmônicos entre si.

Dando enfoque ao princípio da independência de cada Poder,

nos termos da Constituição originária, se percebe a ausência de combinação com

controle externo. Independência e controle externo estão em posições opostas.

A necessária independência advém da teoria da tripartição dos

poderes, que não admite que um Poder fique subjugado ao outro; todavia admite e

até impõe que um Poder controle o outro através do exercício da função típica de

cada um conforme o ordenamento constitucional. Esta independência se projeta

numa esfera própria de atuação, cuja fonte é a Constituição Federal.140

Escrevendo sobre a posição jurídico-constitucional dos

Tribunais, J.J.GOMES CANOTILHO afirma que a “função jurisdicional deve constituir

< monopólio> dos juízes, pelo que jurisdição e magistratura são conceitos

relacionados e reciprocamente considerados. A função jurisdicional exige

determinadas características aos magistrados: independência, inamovibilidade

(cfr.art.218.°).Do mesmo modo, a decisão jurisdicional caracteriza-se pela

imparcialidade e estrita juridicidade dos juízos”.141

No exercício da função jurisdicional, o magistrado deve se portar

e sentir-se independente das influências de órgãos internos do Poder Judiciário e

com mais razão de órgãos externos, sob pena de estar ameaçada a defesa dos

interesses e direitos protegidos dos cidadãos, violando a legalidade democrática e

os princípios fundamentais impostos pelo direito transcendental.

Como se verá adiante, a Emenda Constitucional nº 45 encontrou

uma fórmula de confundir independência interna com independência externa, porque

140 Vide nota 52. 141 Op.cit. 758. “A independência dos juízes,constitucionalmente assegurada, pressupõe: (1) uma independência externa,isto é, independência em relação a órgãos ou entidades estranhas ao < poder judicial>;(2) uma independência interna, ou seja independência perante os órgãos ou entidades pertencentes à organização judicial.” (...) “ Exige-se, por isso: (1) existência de várias instâncias judiciais e de recursos legalmente definidos(cfr.art.211.°); (2) a possibilidade da intervenção de juízes sociais no julgamento de questões de trabalho, de infracções contra a saúde pública e de pequenos delitos(CRP,art.210°/2); (3) fundamentação das decisões dos tribunais(cfr.208.°1). A exigência da < motivação de sentenças> excluo o carácter voluntaristico e subjetivo do exercício da actividade jurisdicional,possibilita o conhecimento da racionalidade e coerência da argumentação do juiz e permite as partes interessadas invocar perante as instâncias competentes os eventuais vícios e desvios das decisões dos juízes.”

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instalou um órgão na estrutura do Poder Judiciário, mas inseriu na sua composição

membros estranhos ao Poder Judiciário.

Encontrou-se uma maneira de fraudar a independência que é

violada por um órgão que se diz interno, mas que é composto por estranhos e

nomeados pela atuação político-partidária.

A independência não pode ser textual, deve ser real.

Sobre a necessária independência do Poder Judiciário,

BURDEAU expressa que a inamovibilidade dos magistrados não é suficiente para

assegurar a independência, sendo que há risco de pressão do poder político: “ Mais

l´inamovibilité n´est pas une garantie suffisante por assurer l´indépendance dês

magistrates. En effet ceux-ci,comme lês autres fonctionnaires, ont vocation à faire

une carrière, c’est-a-dire à occuper dês post plus em plus eleves à l´intérieur de la

hiérarchie judiciaire. Le risque existe donc que le pouvoir politique tente de faire

pression sur les magistrats, et en particulier sur les magistrats du si`ege, em leur

promettant des promotions interessantes et rapides”;142 então, é reconhecida a

possibilidade de pressão política nos magistrados que são nomeados pelo

Presidente da República, e que diante dos sistema existente possam receber algum

tipo de promoção.

A existência desta pressão política já restringe a independência,

por isso é inaceitável outros mecanismos que diminuam ainda a mais a idealizada e

necessária independência.

Conclusão objetiva que se tira é que a teoria de Montesquieu

está fundamentada na repartição quanto ao exercício das funções estatais, de modo

que no exercício típico os Poderes se interdependem, o que impede que se

estabeleça um órgão paralelo que cause o surgimento de alguma espécie de

dependência.

Assim, a previsão de órgão de controle externo, somente para o

Poder Judiciário, importa no afastamento de sua independência, causando

desequilíbrio entre os Poderes do Estado. Só se admite esse afastamento de

142 Op.cit, p.685 Tradução livre do autor – “A inamovibilidade não é uma garantia suficiente para assegurar a independência dos magistrados. Com efeito, eles como os outros funcionários,com vocação a fazer uma carreira, quero dizer, ocupar os cargos mais e mais elevados no interior da hierarquia judiciária. O risco existe de que o poder político tente fazer pressão sobre os magistrados, e em particular sobre os juízes, prometendo promoções interessantes e rápidas”

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independência do Poder Judiciário se houver a previsão de mecanismos

semelhantes para os outros Poderes.

6.1.1. Inconstitucionalidade da Emenda 45/2004.

De início cabe afirmar que o conceito de emenda contém a idéia

de alteração parcial, como mostra GUILHERME CALMON NOGUEIRA DA GAMA143,

então tem por fim promover uma alteração parcial na Constituição e de modo que

não modifique a estrutura básica na organização do Estado, porque do contrário cria

uma outra Constituição, um outro Estado e uma outra organização, o que foi

concretizado pela Emenda 45/2004, como se verá.

Não obstante, a decisão do Supremo Tribunal Federal que

julgou improcedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 3.367-1 proposta pela

Associação dos Magistrados Brasileiros, considerando constitucional a criação do

Conselho Nacional de Justiça e sua composição através de emenda constitucional,

em sede de estudos, como a presente tese, é cabível a discussão sobre o tema.

A Constituição Federal ao fazer previsão do Poder Constituinte

derivado, ou Poder de reforma tem o cuidado de eleger determinadas matérias como

de competência exclusiva do Poder Constituinte originário.

Cuidou a Constituição Federal de impor limites à ação do

legislador ordinário que se investe na função reformadora,com o fim de manter

intacta a estrutura do Estado e a segurança do povo.

O art.60, § 4º, III da Constituição Federal apresenta redação

categórica quanto à proibição de se tentar por emenda constitucional abolir a

separação dos Poderes.144. Com efeito, a leitura com mais afinco permite a

interpretar que a Constituição veda a deliberação de proposta que reduza a

143 GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da – Alterações Constitucionais e Limites do Poder de Reforma, Ed.Juarez de Oliveira, p.46. “ A emenda pode ser uma das espécies de reforma da Constituição, mas pode também ter um sentido mais genérico,que abarque o que seria o objeto de revisão.O conceito de “emenda”contém a idéia de alteração parcial, mas não vinculado a menor importância ou reflexo da alteração.” 144 Art.60, § 4°,III da CF. “ Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: III- a separação dos Poderes;”

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separação dos Poderes, quando expressa tendente a abolir; isto porque por fim à

separação dos Poderes começa-se pela redução desta separação.

Da leitura se percebe a importância que se deu ao tema porque

proíbe a deliberação da emenda,isto é, está proibida a discussão e votação de

emenda que verse sobre determinados e fechados temas.Em seguida, ratifica-se a

importância quando impõe a proibição não da emenda que cause a separação dos

poderes, mas da emenda que apenas demonstre a tendência da separação.

Deste modo, qualquer emenda em que se perceba a tendência

de afastar a separação dos Poderes, como criando controle do Poder Judiciário de

forma externa, é inconstitucional porque afronta o citado art.60 que faz a proibição.

Contudo, o entendimento do Supremo Tribunal Federal é

diverso do que pensamos, com argumentos sólidos constantes no Voto do Ministro

Cezar Peluso que decidiu pela improcedência da Ação Direta de

Inconstitucionalidade 3.367-1 proposta pela Associação dos Magistrados Brasileiros-

AMB, que tinha por fim o reconhecimento da inconstitucionalidade de criação do

Conselho Nacional de Justiça e sua atuação.

Expressou o Ministro CEZAR PELUSO antes de aprofundar-se

na questão que: “Não renuncio às minhas reservas cívicas, nem me retrato das

críticas pré-jurídicas à extensão e à heterogeneidade da composição do Conselho”,

isto em razão de sua oposição viva a um órgão de controle, quando era integrante

do Tribunal de Justiça de São Paulo, para em seguida expressar que julga a causa

perante a Constituição da República.

A preocupação legítima demonstrada na ação é a regra da

separação dos Poderes com o corolário da independência e por isto consta do Voto

que a separação está guardada pela Constituição da República, e que sob o prisma

constitucional não se vê como a criação do Conselho Nacional de Justiça possa

ofender o sistema de separação, porque o Conselho se trata de órgão do próprio

Poder Judiciário.145

145 PELUSO,Cesar – Voto na ADIN 3.367-1. “ Retomarei logo mais o tema, bastando por ora reavivar esta inconcussa verdade político-jurídica: é na exata medida em que aparece como nítida e absolutamente necessária a garantir a imparcialidade jurisdicional, que a independência do Judiciário e da magistratura guarda singular relevo no quadro da separação dos Poderes e, nesses limites, é posta a salvo pela Constituição da República. De modo que todo ato, ainda quando de cunho normativo de qualquer escalão, que tenda a romper o equilíbrio constitucional em que se apóia esse atributo elementar da função típica do Poder Judiciário, tem de ser prontamente repelido pelo Supremo Tribunal Federal,como guardião de sua inteireza e efetividade.” (...) “ Sob o prisma constitucional brasileiro do sistema de separação dos Poderes, não se vê a priori como possa ofendê-lo a criação do Conselho Nacional de Justiça. À luz da estrutura que lhe deu a

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Nos termos do Voto, o poder constituinte derivado não profanou

os limites constitucionais da independência do Judiciário ao outorgar ao Conselho

Nacional de Justiça o proeminente papel de fiscal das atividades administrativas e

financeiras. Expressou que são antigos os anseios da sociedade pela instituição de

um órgão superior, capaz de formular diagnósticos, tecer críticas construtivas e

elaborar programas que dêem respostas dinâmicas e eficazes aos múltiplos

problemas comuns em que se desdobra a crise do Poder.

Não se pode esquecer que o Conselho criado integra

constitucionalmente o Poder Judiciário; entretanto não tem função jurisdicional e é

integrado também por pessoas que não são Magistrados; além da nomeação partir

do Presidente da República e da indicação do Senado Federal, que certamente tem

caráter político-partidário.

Incluir o Conselho na estrutura do Poder Judiciário foi o jeito

encontrado para se afirmar que não se trata de controle externo; afinal é órgão do

Judiciário, restando estranho sua composição por pessoas que não são Magistrados

e não exercer a função jurisdicional. Enfim, um órgão do Poder Judiciário que não

exerce a função do Poder Judiciário.

Quanto aos membros estranhos ao Poder Judiciário o Voto

apresenta a afirmação de que serve para erradicar o corporativismo.146

Enfim, o Voto mostra a constitucionalidade, de acordo com o

entendimento de seu Relator, do Conselho Nacional de Justiça, órgão integrante do

Poder Judiciário, que não exerce a função jurisdicional, com membros nomeados

pelo Presidente da República e parte deles estranhos à carreira da Magistratura.

Do assunto, em sede doutrinária. tratou IVES GANDRA DA

SILVA MARTINS em artigo de onde se tira que o “Poder Legislativo, o Poder

Emenda Constitucional n°45/2004,trata-se de órgão próprio do Poder Judiciário (art.92,I-A),composto, na maioria, por membros desse mesmo Poder (art.103-B),nomeados sem interferência direta dos outros Poderes, dos quais o Legislativo apenas indica, fora de seus quadros e, pois sem laivos de representação orgânica,dois dos quinze membros.” 146 Idem nota anterior- “Longe, pois de conspirar contra a independência judicial, a criação de um órgão com poderes de controle nacional dos deveres funcionais dos magistrados responde a uma imperfeição contigente do Poder, no contexto do sistema republicano de governo.Afinal, “regime republicano é regime de responsabilidade. Os agentes públicos respondem por seus atos. E os mesmos riscos teóricos de desvios pontuais, que se invocam em nome justas preocupações, esses já existiam no estado precedente de coisas, onde podiam errar, e decerto em alguns casos erraram, os órgãos corregedores. Nem embaraça a conclusão, o fato de que tenham assento e voz, no Conselho, membros alheios ao corpo da magistratura. Bem pode ser que tal presença seja capaz de erradicar um dos mais evidentes males dos velhos organismos de controle, em qualquer país do mundo: o corporativismo, essa moléstia institucional que obscurece os procedimentos investigativos,debilita as medidas sancionatórias e desprestigia o Poder.”

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Executivo, o Poder Judiciário, o Ministério Público e a Advocacia Pública e a Privada

compõem o leque que Montesquieu defendeu para que, na separação do poderes, o

poder controlasse o poder”.147

Evidente na afirmação que o controle foi instaurado por

Montesquieu, mas no sistema de freios e contrapesos e não com mecanismo que

estabeleça a dependência de um dos Poderes em relação aos demais.

LUIZ FLÁVIO GOMES faz a pergunta e em seguida responde:

“Caso ocorresse violação do limite material imposto pelo art.60,§ 4º da CF, por

emenda ou até mesmo pela revisão constitucional, seria possível declarar a

inconstitucionalidade daquela ou do ato da revisão? A resposta é, sem sombra de

dúvida, positiva. Uma vez que a revisão constitucional está sujeita a limites (formais

e materiais), a não observância, pelo poder de revisão (ou pela emenda), dos limites

estabelecidos na Constituição, coloca-nos, consoante Gomes Canotilho, “perante o

problema da desconformidade constitucional das leis de revisão, problema esse que

não é substancialmente diferente do problema da inconstitucionalidade das leis

ordinárias, dado que o poder de revisão é um poder constituído e não uma novação

do poder constituinte.”148

Entende-se por desconformidade constitucional a apresentação,

discussão e votação de emenda constitucional que esteja em desconformidade com

a Constituição. A desconformidade constitucional apresenta substancialmente o

mesmo problema da inconstitucionalidade, isto é, existência de norma contrária aos

ditames constitucionais.

A questão dos limites da revisão constitucional foi enfrentada

por JORGE MIRANDA com a idéia de que deve-se garantir a intangibilidade de

certos princípios, porque é de princípios que se trata,não de preceitos avulsos. “Os

princípios garantem a essência da Constituição.”149 Os limites constitucionais de

147 MARTINS, Ives Gandra da Silva- Separação de poderes e controle externo na administração da justiça in Carta Forense, p.4. “O controle externo do Ministério Público, portanto, seria tão inconstitucional,como seria o controle externo do Poder Judiciário ou do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil- que agrega advogados privados e os advogados da Advocacia Geral da União, os procuradores do Estado e do Município e as defensorias públicas.” 148 Op.cit. p.54/55 “ A teoria de que existem normas(emendas) constitucionais inconstitucionais ,difundida pelo jurista alemão Bachof, acaba aliás,de ser reconhecida uma vez mais pelo Supremo Tribunal Federal,que julgou inconstitucional a emenda Constitucional que havia criado o IPMF.” 149 Op.cit. p.180,185/186- “Por detrás destas divergências, o sentido fundamental revela-se contudo, o mesmo:garantir, em revisão, a intangibilidade de certos princípios – porque é de princípios que se trata,não de preceitos avulsos (os preceitos poderão ser eventualmente modificados,até para clarificação ou reforço de princípios , o contrário seria absurdo)(2).Mesmo quando a Constituição proíbe a revisão de artigos sobre a

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revisão se apresentam, do mesmo modo que a separação dos Poderes, como

garantia da liberdade do cidadão. A única segurança que o povo tem que a estrutura

orgânica de seu Estado não será modificada são as cláusulas pétreas previstas pelo

Poder Constituinte originário.

Continua explanando sobre a doutrina no sentido de que o

poder de revisão, porque criado pela Constituição e regulado por ela quanto ao

modo de se exercer, porque poder constituído tem, necessariamente, de se

compreender dentro dos seus parâmetros; não lhe compete dispor contra as opções

fundamentais do poder constituinte originário. A faculdade de reformar a

Constituição é a faculdade de substituir uma ou várias regras constitucionais por

outras, no pressuposto de que fiquem garantidas a identidade e a continuidade da

Constituição considerada como um todo.

A faculdade do poder de revisão não é de fazer uma nova

Constituição, mas sim defendê-la na sua estrutura e alterar os preceitos que podem

ser alterados. As bases constitucionais não podem ser afetadas pelo poder de

revisão, sob pena deste extrapolar o poder que lhe foi confiado.

O que não pode o poder de revisão é mover os princípios

fundamentais.

Então, pode-se afirmar que a inconstitucionalidade não só atinge

as normas infraconstitucionais, mas também as emendas constitucionais que

oriundas do Poder derivado deve subordinar-se ao Poder originário.

Os representantes da Nação não podem agir além dos poderes

que receberam pela via democrática. Se estão investidos no poder reformador,

devem observar as regras e limites estabelecidos pelo poder inicial conforme

estabelecido no momento em que se previu este poder secundário.

Admitir a possibilidade de se afastar dos limites materiais é

também admitir a possibilidade de se afastar do procedimento imposto, por isso

revisão,são os princípios que visa defender,proventura aparelhando um mecanismo mais complexo para o efeito.” (…) “ Partindo do pressuposto da inalterabilidade do artigo, foi dito que < com isto não são apenas as conquistas revolucionárias do povo trabalhador que ficam consagradas na Constituição.Ficam também consagradas como principios fundamentais e esencia da própria Constituição, na medida em que são insuscetóveis de revisão constitucional(…)>(4) e que < se(…) todos os Srs.Deputados votaram de coração puro e sem qualquer espécie de pensamento reservado esse artigo sobre os limites materiais da revisão em Portugal terminou qualquer possibilidade de se dar um golpe de Estado constitucional.>(1).” “ Mais mitigadamente disse-se também que aquelas sucesivas alíneas < definem aquilo que é para nós o conteúdo esencial da Constituição,aquilo que marca a sua estrutura fundamental,aquilo que não pode ser alterado sob pena de esta Constituição deixar de ser a mesma Constituição.Eventualmente,poderia haver uma modificação formal deste precepto, mas nesse caso deixaria de ser a mesma Constituição em sentido material>.”

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poderemos ter emenda constitucional votada em um só turno ou aprovada com

maioria absoluta ou até mesmo simples, ao invés de 3/5.

Os princípios da soberania popular, o democrático e o da

legalidade exigem que os representantes da Nação só possam emendar a

Constituição com a obediência restrita às condições estabelecidas no pacto

fundante.

O processo de elaboração da Emenda Constitucional nº 45/2004

contrariou frontalmente a Constituição Federal e conforme dispõe o art. 60,§ 4º não

deveria ser objeto de deliberação; entretanto o legislador constituinte derivado

extrapolando seu poder, ignorando a vontade do poder fundante, alterou a

Constituição na sua essência.

Com a promulgação da Emenda, na essência o que temos hoje

é uma nova Constituição, em que o Poder Judiciário está subjugado a um órgão

superior de controle.

O resultado foi a inserção, no art.92 da Constituição Federal,

como um dos órgãos do Poder Judiciário, o Conselho Nacional de Justiça com sede

na Capital Federal, da mesma maneira que o Supremo Tribunal Federal e os

Tribunais Superiores.

6.1.2. Conselho Nacional de Justiça.

No art.103-B a Constituição Federal passou a tratar do Conselho

Nacional de Justiça prevendo sua composição e competência.150

O Conselho assim está composto: um Ministro do Supremo

Tribunal Federal; um Ministro do Superior Tribunal de Justiça; um Ministro do

Tribunal Superior do Trabalho; um desembargador de Tribunal de Justiça; um juiz

estadual;um juiz do Tribunal Regional Federal;um juiz federal;um juiz de Tribunal

Regional do Trabalho e um juiz do Trabalho.

150 Art.103-B da CF. “ O Conselho Nacional de Justiça compõe-de de quinze membros com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e seis anos de idade, com mandato de dois anos,admitida uma recondução,sendo:” - § 4°. “ Compete ao Conselho o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes, cabendo-lhe, além de outras atribuições que lhe forem conferidas pelo Estatuto da Magistratura:”

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Cabe lembrar que o Ministro do Supremo Tribunal Federal; do

Superior Tribunal de Justiça; do Tribunal Superior do Trabalho; o juiz do Tribunal

Regional Federal e o juiz do Tribunal Regional do Trabalho, para estes cargos já

foram nomeados pelo Presidente da República.

Completa-se com um membro do Ministério Público da União,

um membro do Ministério Público Estadual, dois advogados e mais dois cidadãos

um indicado pela Câmara dos Deputados e outro pelo Senado Federal.

A inconstitucionalidade da emenda é muito clara, porque se

insere no Poder Judiciário pessoas oriundas do Ministério Público, que de certa

forma são dependentes do Poder Executivo. Depois advogados e pessoas de livre

escolha das Casas do Congresso Nacional.

Inadmissível integrar o Poder Judiciário pessoas de instituições

que não exercem poder e não receberam parcela da soberania e por isto não estão

investidas constitucionalmente da função jurisdicional.

Através destas pessoas nomeadas pelo Presidente da

República, estranhas ao Poder Judiciário, instituiu-se o controle externo do Poder

Judiciário que se apresenta inconstitucional por retirar a independência, que é um

dos princípios norteadores do equilíbrio que deve existir entre os Poderes do Estado.

No contexto, a nomeação pelo Presidente da República

demonstra a continuidade de sua supremacia sobre o Poder Judiciário, e como

afirma RICARDO CUNHA CHIMENTI, pode suscitar indagação acerca da violação

ao princípio da separação dos poderes.151

Compete ao Conselho o controle da atuação administrativa e

financeira do Poder Judiciário, além do cumprimento dos deveres funcionais dos

juízes.

Está incluído em suas atribuições, verificar legalidade dos atos

administrativos praticados por membros ou órgãos do Poder Judiciário, podendo

desconstituí-los ou revê-los, além fixar prazo para que providências sejam tomadas.

Ferindo drasticamente a autonomia dos Estados, um dos pilares

do pacto federativo e afirmado no art. 18 da Constituição Federal, cabe receber e

151 CHIMENTI,Ricardo Cunha at all- Curso de Direito Constitucional, p.369. “Questão que já assume grande importância diz com a norma do § 2° do art.103-B,que confere ao Presidente da República a competência para a nomeação dos membros do Conselho Nacional de Justiça,após aprovação pela maioria absoluta do Senado Federal. Por se tratar de um órgão de controle do Poder Judiciário, a nomeação de seus integrantes pelo Presidente da República pode suscitar indagação acerca da violação ao principio da separação dos poderes.”

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conhecer das reclamações contra membros ou órgãos do Poder Judiciário, podendo

avocar processos disciplinares em curso e determinar a remoção, a disponibilidade

ou a aposentadoria. Também, rever de ofício ou mediante provocação, os processos

disciplinares de juízes e membros de tribunais julgados há menos de um ano.

Retomando o Voto do Ministro Cezar Peluso, encontramos que

o pacto federativo não se desenha nem expressa, em relação ao Poder Judiciário,

posto que tem caráter nacional.Trata-se de poder com unicidade e o mesmo

tratamento orgânico.152

O pacto federativo se impõe como convenção essencial da

República Brasileira, por isso os todos os Poderes do Estado estão a ele

subjugados. A unicidade do Poder Judiciário está centralizada na ação jurisdicional

que está submissa ao mesmo sistema jurídico; entretanto a União e cada Estado-

membro tem sua organização judiciária própria com fundamento na autonomia

constitucional.

A emenda, quanto ao Conselho, apresenta dois aspectos de

inconstitucionalidade.

A primeira, como visto, quebra a separação dos Poderes e por

isto afasta a independência do Poder Judiciário, impondo um controle externo com

aparência de órgão interno, que vai controlar a atuação administrativa, financeira e

disciplinar do Poder Judiciário, com o drástico poder de afastar juízes de suas

funções.

O afastamento da autonomia dos Estado quebra o pacto

federativo. O Conselho pode interferir em qualquer Estado-membro e determinar

afastamento de magistrado estadual, aprovado por concurso público.

O mesmo art.60, agora no inciso I do §4º, expressa que não

será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir a forma

federativa de Estado. Este modelo escolhido pelo legislador constituinte originário

mostra a verdadeira intenção de conceder aos Estados-membros o poder de se

auto-organizar e por isto ter vida própria com fundamento constitucional. A

152 Idem nota 134. “O pacto federativo não se desenha nem expressa, em relação ao Poder Judiciário, de forma normativa idêntica à que atua sobre os demais Poderes da República. Porque, a Jurisdição, enquanto manifestação da unidade do poder soberano do Estado, tampouco pode deixar de ser uma e indivisível, é doutrina assente que o Poder Judiciário tem caráter nacional, não existindo senão por metáforas e metonímias, “Judiciários estaduais” ao lado de um “Judiciário federal”.”

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pluralidade de centros de poder soberanos caracteriza o Estado Federal.153 Mais

esta interferência da União, que deveria ter quantidade mínima de poderes,

desrespeita a ordem constitucional.

Tem-se, com a competência do Conselho, um órgão federal,

portanto da União, intervindo nos Estados-membros, como que a União estivesse

em posição hierárquica superior frente aos demais entes federativos, quando neste

sistema, como aponta ANDRÉ RAMOS TAVARES, não se pode falar em hierarquia

entre os organismos de estrutura do modelo.154

Em resumo, de tudo que foi exposto a partir de teoria de

Montesquieu que teoricamente foi adotado pelo Poder Constituinte Originário de

1988, a Emenda Constitucional nº 45/2004 se apresenta em desconformidade com a

Constituição, portanto, inconstitucional, e por isto não deveria ter sido objeto de

deliberação porque centraliza o Poder, e de forma arrogante rompe a separação dos

Poderes ao subjugar o Poder Judiciário a um órgão integrado por pessoas estranhas

e também repugna o pacto federativo quando permite a este órgão atuar contra a

autonomia dos Estados-membros, interferindo no poder regional.

6.2. Conselho Nacional do Legislativo.

A idéia de controle está, evidentemente, ligada aos limites que

são impostos a cada Poder. Órgão controlado é órgão limitado.

Para o Legislativo, o pensamento que segue é importante: “O

Poder Legislativo é limitado e limitador dos demais poderes. Limitado pela

Constituição, porque só pode elaborar leis constitucionais; limitador porque no

153 Vide nota 58. 154 TAVARES,André Ramos- Curso de Direito Constitucional, p 784 e 808. “ Havia grande preocupação por parte dos autores da Constituição dos E.U.A.,observa Bernard Schwartz,de que “ o Governo nacional que estavam criando não fosse tão poderoso que, na pratica,tragasse os estados(...) procuraram conseguir isto limitando o Governo Federal a uma lista especifica de poderes enumerados(...) ao mesmo tempo que reservavam todo o resto de autoridade aos estados.” (...) “O constituinte realizou uma opção pela descentralização do poder(arts.22,23,24,25 e 30 da CF).Não por outro motivo se pode afirmar que o Estado brasileiro é federativo(art.18 da CF). A adoção desse modelo estrutural implica a admissão de autonomia para as entidades integrantes da federação.Portanto, não se pode falar em hierarquia entre tais organismos estruturantes do modelo federativo nacional.”

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estado de direito não há um poder que possa decidir a não ser de conformidade com

o dispositivo de uma lei anterior” 155, conforme J.PINTO ANTUNES.

O Poder Legislativo como os demais Poderes sofre limitações

impostas pelas regras constitucionais e além disto sofre limitação oriunda do

exercício da função típica do Executivo e do Judiciário.

A teoria da Tripartição dos Poderes fez surgir o controle de um

Poder sobre o outro por meio do exercício das funções, o que impede o

estabelecimento de outras formas de controle porque acabam por desequilibrar o

posicionamento dos órgãos e extingue, ou ao menos, diminui a necessária

separação dos Poderes.

Em um mesmo plano Constitucional, diante da regra do art.2° da

Constituição Federal, que prevê a independência dos Poderes, se há a instituição de

um mecanismo de controle externo para um dos Poderes para o outro deve

haver,também, a instituição de algo semelhante.

Diante da Emenda Constitucional 45/2004 que inseriu na

estrutura do Poder Judiciário, o Conselho Nacional de Justiça em obediência ao

mencionado art.2° impõe a criação do Conselho Nacional do Legislativo.

Com a adequação necessária ao §4° do art.103-B da

Constituição Federal, a este Conselho caberia o controle da atuação administrativa e

financeira do Poder Legislativo e do cumprimento dos deveres funcionais dos

legisladores.

Afastado da função típica de legislar, o Conselho poderia

determinar que o legislador federal cumpra a Constituição fazendo elaborar as

inúmeras normas infraconstitucionais necessárias a dar efetividade às normas

constitucionais sem eficácia plena. Poderia convocar membros de CPI para

explicação sobre os motivos de estardalhaços na imprensa sobre o fato que se

apura.

A fim de afastar o alegado corporativismo poderia avocar

processos disciplinares contra legislador; enfim exercer funções que não sejam

típicas do Legislativo.

155 ANTUNES, J.Pinto – Da Limitação dos Poderes, p.25/26. “Até mesmo o Poder Legislativo é sujeito à lei elabora. Pode derrogá-la ou abrogá-la e até substituir a lei antiga por uma lei nova;mas enquanto ela existe,está submetido ao seu império,não podendo tomar decisão que seja contrária ao seu mandamento. A lei limita,pois,até o Poder Legislativo, que é o seu poder criador.”

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Com composição híbrida e formado por quinze membros

escolhidos com a participação do Chefe dos Três Poderes o Conselho Nacional do

Legislativo, integrado na estrutura constitucional do Poder Legislativo, faz cumprir a

ordem constitucional de posicionar os Poderes em um plano de igualdade.

6.3. Conselho Nacional do Executivo.

Como o Poder que detém em suas mãos o poder financeiro do

Estado e como função típica à administração, o Poder Executivo na pessoa do

Presidente da República é o que mais justifica, aceitando sua constitucionalidade,

ser controlado por um órgão externo.

A hipertrofia do Poder Executivo tem a seu lado a hipertrofia da

União quem em razão de ter o poder econômico sob seu controle exerce uma

ditadura política156 sobre os demais entes da federação, o que seria mais uma

justificativa para instituição de um órgão superior de controle externo.

Atuando em todo o território nacional, o Conselho Nacional do

Executivo, de composição híbrida, integrado por quinze pessoas escolhidas por

atuação dos Chefes do Três Poderes, poderia fiscalizar as obras públicas, os

programas sociais de distribuição de dinheiro e questões federativas.

Poderia convocar o Chefe do Poder Executivo e Ministros de

Estado para que expliquem contratações dispensadas de concurso público e que

beneficiam pessoas do mesmo partido-político.

Caberia indagar por que não há a nomeação de interventor após

o Poder Judiciário determinar a intervenção estadual por falta de cumprimento de

normas constitucionais.

156 Vide nota anterior., p.161 “ A autonomia é fundamenalmente econômica;sem autonomia econômica não há autonomia política. É o caso brasileiro onde a Federação está de fato desaparecendo porque a União exerce uma verdadeira ditadura econômica sôbre os Estados-membros.” (...) “ A ditadura econômica da União condiciona e leva à ditadura política.”

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Controlar a oportunidade e a conveniência das ações do

Executivo é o grande desafio157,ou seja, saber e entender por que houve a

construção de uma área de lazer quando naquele local a população carece de

escola, mas mesmo assim o Conselho poderia apurar os motivos determinantes e

depois dar conhecimento ao povo e ainda tomar as medidas cabíveis.

Desta forma, criado o Conselho Nacional do Executivo existiriam

inúmeras atribuições que poderiam ser reservadas e desta maneira os três Poderes

se equilibrariam.

Maneira de abandonar o controle pelo sistema dos freios e

contrapesos e manter os Poderes no mesmo nível constitucional é criar Conselho só

para um dos Poderes, o mais fraco politicamente. Aquele que não tem o poder

financeiro e nem o poder de legislar.

A situação não é simples como pode parecer porque no futuro

alguns poderão pensar em criar Conselhos para controlar os Conselhos existentes.

Se isto vier ocorrer, em razão do absolutismo presidencial

presente no Brasil, certamente o Chefe de um Conselho Maior será o Presidente da

República.

Enfim, para se adotar de maneira real e não somente textual a

independência e harmonia dos Poderes, conforme a vontade popular, é premente

que seja observado a ordem do constituinte originário e, para tanto, seja inserido em

cada respectiva estrutura o Conselho Nacional do Legislativo e o Conselho Nacional

do Executivo para atuarem ao lado do Conselho Nacional de Justiça.

Um Governo que é legítimo diante de escolha popular deve se

pautar por condutas harmonizadas com a mesma vontade popular e insertas no

Texto Maior, pois conforme GOFFREDO TELLES JÚNIOR “a Governo legítimo só

compete declarar o Direito natural, ou seja, o Direito harmonizado com a

ordenação ética,sonhada e querida pelo povo.”158

157 Vide nota 155, p.44 –“ O controlo da oportunidade, da conveniência da ação do Poder Executivo é, ainda hoje, o grande problema para a garantia das liberdades. Há, somente, meios indiretos de conter o discricionarismo do Presidente da República quando dele discorda o povo.”

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169

CAPÍTULO VII

O EQUILÍBRIO DO PODER E A SOBERANIA POPULAR.

Como constatado e afirmado várias vezes o Poder é do povo. A

teoria da Tripartição, além da identificação das funções, fixa o campo de atuação de

cada um e permite o controle de um Poder sobre o outro.

A teoria,apesar de sua complexidade é muito bem delineada o

que não determina dificuldade em sua compreensão e aplicação.

O equilíbrio entre os Poderes, a separação entre eles, a

independência e harmonia sucede da vontade popular, porque o povo, através do

Poder Constituinte Originário, elegeu a teoria de Montesquieu para organizar os

Poderes e assim organizar o Estado conforme a redação do art. 2º da Constituição

Federal.

A Nação é soberana, a vontade do povo deve ser respeitada,

por isto os Poderes não podem se posicionar em patamares diferentes, ao contrário,

devem estar no mesmo plano constitucional, e muito menos o Presidente da

República, que não é Poder, mas sim exerce um dos Poderes.

A soberania deve ser sempre observada e presente

porque está arraigada da vontade popular, aliás, já afirmamos em outra

oportunidade que soberania existe em razão da vontade popular.159

No exercício das funções, aqueles que exercem o poder

indivisível do Estado não podem se afastar da vontade popular, porque esta é

soberana. A vontade popular que está inserida na Constituição impõe que seja

158 Op.cit, p.66. “Ao Governo legítimo,deve repugnar a promulgação dos Direito artificial, isto é, a promulgação de mandamentos em conflito com a normalidade ambiente; de mandamentos que sejam a contrafação do Direito,embora levem,muitas vezes, o rótulo de Direito.” 159 CARVALHO, Jeferson Moreira de – Poder Constituinte, Funções e Limites, p. 20. “O Estado moderno abandonou, salvo algumas exceções, as teorias teocráticas, por isso deve-se concluir que a soberania existe em razão da vontade popular, que é a fonte de criação do Estado,do poder do Estado e portanto da soberania. Se esta fonte é a vontade dos cidadãos,eles são titulares da soberania do Estado, e a soberania é imposta pela vontade firme dos cidadãos,por intermédio daqueles que exercem o poder indivisível do Estado”.

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mantida a independência dos Poderes, não estando, portanto, um sujeito à vontade

do outro, seja na função típica, seja no sistema de composição, seja através de um

controle diverso do admissível.

Não deve ser admitido que o Presidente da República no

exercício de sua função constitucional pratique atos que efetivamente interferem nos

Poderes Legislativo e Judiciário porque em cada conduta com esta força, afasta a

independência constitucional abandonando de vez a vontade popular.

Manter o equilíbrio entre os três Poderes significa que cada um

exerça sua função sem o medo de influências externas de qualquer outro;

precisamente significa possibilitar que o Poder Legislativo e o Poder Judiciário

exerçam suas funções sem a interferência do Presidente da República.

No entendimento de ANTONIO JOSÉ MIGUEL FEU ROSA

sobre o equilíbrio entre os Poderes, a Constituição Federal de 1988 causou um

enfraquecimento do Poder Executivo e do Poder Judiciário em comparação com a

Constituição de 1967. Após identificar as várias condutas do Poder Executivo que

exige aprovação do Poder Legislativo, expressa que a “nova Constituição, como

demonstram os textos analisados, trouxe inegavelmente, um espantoso

enfraquecimento do Executivo, não apenas em comparação ao que gozava pela

Carta revogada, mas mesmo em relação à de 1946”.160

Ao tratar do enfraquecimento do Poder Judiciário mostra que

este sofreu ação do Poder Executivo e do Poder Legislativo.Mostra o

enfraquecimento, como por exemplo, na forma de listagem do quinto constitucional

que agora é elaborada pelos órgãos de classe, a ausência de verdadeira autonomia

financeira além de imposições diretas as pessoas dos magistrados 161 e concluiu que

160 ROSA,Antonio José Miguel Feu- Direito Constitucional, p.310 – “ Acabada a Segunda Guerra Mundial, com a vitória das democracias contra o totalistarismo, o vento liberalismo voltou a soprar, e as Constituições de então,inclusive a nossa,de 1946, retrataram essa tendência.A esta altura,alguns passaram a defender até mesmo o fim do Estado, definido como “ uma grande ficção,através do qual todo mundo se esforça para viver às custas de todo mundo.Nossa Constituição atual, findo o período autoritário em que vigorou o modelo “ De Gaullista” de governo, com um Executivo forte, promove notório enfraquecimento do Executivo, que perde muitas de suas atribuições,sem ganhar nenhuma.” 161 Art.95, Parágrafo único da CF. “ Aos juízes é vedado: I- exercer, ainda que em disponibilidade,outro cargo ou função,salvo uma de magistério; II- receber, a qualquer título ou pretexto,custas ou participação em processo; III- dedicar-se a atividade político-partidária; IV- receber, a qualquer título ou pretexto, auxílios ou contribuições de pessoas físicas, entidades públicas ou privadas,ressalvadas as exceções previstas em lei; V- exercer a advocacia no juízo ou tribunal do qual se afastou,antes de decorridos três anos do afastamento por aposentadoria ou exoneração.” - Art.36 da Lei Complementar 35/79 . “ É vedado ao magistrado: I- exercer o comércio ou participar de sociedade comercial,inclusive de economia mista, exceto como acionista ou quotista; II -exercer

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a Constituição Federal trouxe um ostensivo enfraquecimento ao Poder Judiciário,

que perdeu atribuições e sofreu invasões em sua esfera de competência exclusiva.

Com a Constituição Federal de 1988 o Poder Judiciário só perdeu.162

A nosso ver, como é possível constatar do conteúdo do trabalho,

o Poder Executivo não teve enfraquecimento.

Com relação ao Poder Judiciário, não há dúvida que hoje

é um Poder enfraquecido em relação ao Poder Executivo precisamente em relação

ao Presidente da República. Em relação ao Poder Legislativo, na verdade a situação

do Judiciário não é tão diferente, pois este, na função reformadora da Constituição

Federal, legisla sem que haja participação ativa do Judiciário.

Por fim, se o povo fez uma escolha, esta deveria ser observada

porque a segurança do povo é a suprema lei, como ensina MARIA GARCIA ao falar

sobre o pensamento de Hobbes.163 A segurança do povo deve sim estar assentada

na suprema lei, na medida em que esta só foi elaborada por determinados

constituintes em razão da escolha eletiva pela vontade do povo.

Então, o respeito a vontade do povo exige o equilíbrio dos

poderes e não a supremacia de um deles ou do Presidente da República em

detrimento dos demais. A segurança do povo está na tripartição do Poder do qual é

titular e no equilíbrio que deve haver entre os Poderes resultantes da tripartição.

Para que isto possa ocorrer, alterações constitucionais devem

ser propostas com o fim de adequar atribuições e competências para melhor

posicionar os Poderes e permitir que o controle de um sobre o outro seja

cargo de direção ou técnico de sociedade civil, associação ou fundação, de qualquer natureza ou finalidade, salvo de associação de classe, e sem remuneração; III- manifestar, por qualquer meio de comunicação,opinião sobre processo pendente de julgamento,seu ou de outrem,ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças,de órgãos judiciais,ressalvada a crítica nos autos e em obras técnicas ou no exercício do magistrado.” 162 Op.cit. p.312/315. “O Legislativo, em sua tarefa demolidora do equilíbrio que deve reinar entre os três Poderes do Estado, açoitou-se impiedosamente, e o Executivo cortando-lhe competências, e prerrogativas a torto e a direito, não se esqueceu, por outro lado, de arrancar algumas das já reduzidas atribuições do Judiciário.”(...) “d) A alegada “ autonomia financeira” consistirá na elaboração, pelos tribunais,de suas propostas orçamentárias, “ dentro dos limites estipulados conjuntamente com os demais Poderes na lei de diretrizes orçamentárias”,e “o encaminhamento da proposta” será feito ao Poder Legislativo, que,naturalmente, a aprovará,ou não.”(...)“ Houve, incontestavelmente ,ostensivo enfraquecimento do Judiciário, que perdeu atribuições, sofreu invasões na área de sua competência exclusiva e ganhou pouco, nada ou quase nada na nova Constituição.” 163 GARCIA, Maria – Desobediência Civil , p.130. “A segurança do povo é a suprema lei(...) tal como a segurança do povo dita a lei através da qual os príncipes aprendem qual é o seu dever, também ela lhes ensina uma arte que haverá de proporcionar benefícios a eles próprios; pois o poder dos cidadãos é o poder da cidade,isto é, daquele que tem a suprema regra da cidade.”

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efetivamente exercido conforme a construção de Montesquieu e não com o

absolutismo do Presidente da República.

7.1. Extinção ou modificação das Medidas Provisórias.

Seria simples propor uma emenda constitucional que previsse a

extinção das Medidas Provisórias; entretanto esta pode não ser a solução porque é

sabido que a morosidade do Poder Legislativo em legislar pode causar sérios danos

às questões nacionais de relevância.

Com o fim de preservar a função típica do Poder Legislativo e

lhe restituir o prestígio que deve ter, a extinção das Medidas Provisórias é a

providência mais justa, devendo ser considerado também como já foi esplanado o

abuso na edição desta espécie normativa.

Deve ser relevado, também, a dificuldade no controle dos

requisitos constitucionais, porque o requisito de relevância mais se aproxima de um

entendimento subjetivo do que objetivo, tornando-se difícil a verificação da

configuração objetiva, conforme conclui HUMBERTO BERGMANN ÁVILA ao fazer

comparações entre o antigo Decreto-lei e a Medida Provisória.164

O interessante a ser observado é que o Poder Legislativo, que

tem em mãos o Poder Constituinte derivado, não toma nenhuma providência para

barrar os abusos cometidos pelo Presidente da Republica.

No momento histórico atual, os próprios governistas afirmam

que há abuso, mas não tomam providências legais.

O Senador ALOISIO MERCADANTE (PT-SP) líder do governo

no Senado Federal protestou contra votações a toque de caixa de seis medidas

provisórias que estavam prestes a perder a validade, reclamando: “Como vou ser

líder do governo nesta condição? Mostrou o líder governista um relatório minucioso

para informar que das 65 Medidas Provisórias assinadas pelo Presidente da

164 Op. cit. p.29. “No que concerne aos requisitos materiais para edição, o decreto-lei podia ser expedido em casos de urgência ou de interesse público. A alternatividade dos requisitos deflagradores da competência para a edição do decreto-lei, se comparada à sistemática adotada pela CF para a expedição das medidas provisórias, demonstra diversidade atinente aos requisitos materiais. A edição da medida provisória depende da verificação

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República no ano de 2004, apenas 31 foram consideradas indispensáveis. Afirmou

ainda: Chegamos ao limite e a situação está insustentável”. 165

A indignação está fundamentada no abuso consistente em

considerar qualquer assunto relevante e urgente, o que em tese justifica até ação

perante o Supremo Tribunal Federal com o fim de coibir a conduta, mas sem

esquecer que “a regra é a não apreciação pelo Supremo da urgência mas,em casos

flagrantementes não urgentes, há prestação jurisdicional para reconhecer a

inconstitucionalidade da espécie em comento.166

Pensamos que o correto é a extinção da espécie normativa por

simples emenda constitucional restituindo assim o poder de legislar a quem deve

efetivamente exercê-lo, entretanto se aceitarmos a necessidade de certa

maleabilidade, o instituto da Medida Provisória deve de fato ser encarado como algo

excepcional e não como uma regra de conduta do Presidente da República.

Para se tornar exceção e afastar o abuso nas edições, deve

haver emenda constitucional que estabeleça taxativamente quais as matérias podem

ser tratadas pelas Medidas Provisórias e não como consta da redação do art. 62, §

1º que veda a edição para determinadas matérias.167

Estabelecido o campo de atuação ou as matérias que podem

ser tratadas, o Presidente da República já tem delimitado sua conduta.

Também, é importante que haja emenda constitucional

afastando o direito de reedição, isto é, admitir somente uma única edição.

Legislar é atribuição do Poder Legislativo, por isto as Medidas

Provisórias retiram este poder do Legislativo e transferem ao Presidente da

não só de um requisito material de difícil configuração objetiva(relevância),como também de um requisito temporal(urgência).” 165 MERCADANTE, Aloisio -Jornal O Estado de S. Paulo, Sexta feira,26/11/2004, p.A10- Nacional. 166 Idem nota 97 . “O Presidente da República diante de urgência e relevância,pode expedir medidas provisórias, que possuem força de lei pelo período de sessenta dias.A questão da urgência,em regra, fica a cargo da decisão do Poder Executivo, deixando o Supremo Tribunal Federal de apreciar a matéria. No entanto, em caso de evidente inexistência da alegada urgência,o Pretório Excelso adentra em sua análise e reconhece a inconstitucionalidade da utilização da medida provisória em face da carência de urgência. Assim, a regra é a não-apreciação pelo Supremo da urgência, mas,em casos flagrantemente não urgentes, há prestação jurisdicional para reconhecer a inconstitucionalidade da espécie em comento.” 167 Art.62, § 1° da CF. “ É vedada a edição de medidas provisórias sobre matéria: I- relativa a: a) nacionalidade,cidadania,direitos políticos, partidos políticos e direito eleitoral; b) direito penal, processual penal e processual civil; c) organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, a carreira e a garantia de seus membros; d) planos plurianuais, diretrizes orçamentárias,orçamento e créditos adicionais e suplementares,ressalvado o previsto no art.167,§ 3°; II- que vise a detenção ou seqüestro de bens, de poupança popular ou qualquer outro ativo financeiro; III- reservada a lei complementar; IV- já disciplinada em projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional e pendente de sanção ou veto do Presidente da República.”

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República, que sem nenhum constrangimento se torna o maior legislador no território

brasileiro.

Manter o Poder Legislativo com seu prestígio, dar-lhe a função

que lhe pertence e cumprir a vontade popular significa retirar do Presidente da

República o poder de legislar de maneira ilimitada, ou, se entender que há

necessidade de o Presidente legislar, sua conduta deve ser excepcional, portanto,

somente para matérias previamente fixadas e por uma única vez de maneira

provisória.

7.2. Extinção ou modificação das Leis Delegadas.

Esta espécie normativa primária não alcançou êxito porque ao

Presidente da República é muito mais prático legislar por Medida Provisória com o

poder que lhe é dado pela Constituição Federal do que solicitar delegação ao

Congresso Nacional para elaborar a norma.

Da praticidade na expedição da Medida Provisória, a Lei

Delegada se tornou inútil e também porque para elaborar um projeto de lei

ordinária,como anotado por VICENTE PAULO, o Presidente da República não

necessita de delegação, haja vista já possuir delegação ampla.168

Se não tem utilidade, o melhor que se faz é simplesmente

expurgar a espécie normativa do processo legislativo.

O que se vê é que o Presidente da República tem em mãos

duas espécies para legislar, o que mostra sua supremacia e forte ingerência na

função legislativa.

Entretanto, com a mesma idéia, se há necessidade de se

manter a espécie a mesma precisa seja modificada para permitir que o Congresso

Nacional ao receber o texto da lei possa fazer emendas.

168 PAULO,Vicente et all- Aulas de Direito Constitucional, p.319. “Ora, essa previsão constitucional,em verdade é dotada de pouca utilidade, haja vista, que, para elaborar um projeto de lei e submetê-lo à apreciação do Congresso Nacional, o Presidente da República não necessita de delegação, haja vista já possuir legitimação ampla, fixada no art.61 da Constituição Federal. A nosso ver, a vantagem desse procedimento,por meio de

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Dispõe o art. 68, § 3º da Constituição Federal que se a

resolução determinar a apreciação do projeto pelo Congresso Nacional, este a fará

em votação única, vedada qualquer emenda.

Esta disposição constitucional chega a ponto de impedir que o

Poder Legislativo exerça sua função típica: legislar. Entretanto, para coibir eventual

extrapolação do Presidente da República, cabe ao Congresso rejeitar in totum o

texto apresentado ou sustar a referida lei delegada, “paralisando seus efeitos

normais” como indica ALEXANDRE DE MORAES.169

Como uma maneira de não expurgar do Poder

Legislativo a função que é essencial à sua existência, deve-se reconhecer o direito

de, na sessão única, fazer emendas ao texto apresentado pelo Presidente da

República.

Desta forma, se mantém o controle de um Poder em relação ao

outro e não afasta o Poder Legislativo de sua função primordial que é legislar.

Se de fato há necessidade de se prever uma espécie normativa

que produza efeito rápido, basta extinguir a Medida Provisória e manter a Lei

Delegada com fixação de prazo exíguo para a edição de Resolução e depois, se o

caso, apreciação do texto elaborado.

É evidente que muitas idéias surgem para alterar o Texto Maior

e podem com outros mecanismos aperfeiçoar as espécies normativas da Medida

Provisória e da Lei Delegada, entretanto o que importa é que deve haver, por parte

do legislador constituinte, uma tomada de posição e fazer valer a vontade popular.

7.3. Outro método de nomeação para o Tribunal de Contas.

delegação legislativa atípica,seria a impossibilidade de apresentação de emenda parlamentar ao projeto de lei delegada, elaborado pelo Executivo.” 169 Op.cit. p.545. “Dessa forma, extrapolando o Presidente da República os limites fixados na resolução concedente da delegação legislativa, poderá o Congresso Nacional, através da aprovação de decreto-legislativo, sustar a referida lei delegada,paralisando seus efeitos normais. A sustação não será retroativa,operando,portanto,ex nunc, ou seja, a partir da publicação do Decreto Legislativo,uma vez que não houve declaração de nulidade da lei delegada,mas sustação de seus efeitos.”

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Como visto, além de atuar como legislador, o Presidente da

República também interfere no Poder Legislativo quando nomeia os Ministros do

Tribunal de Contas que é órgão de auxílio do Legislativo, com a função principal de

tomar as contas do Presidente da República, ou seja, ele nomeia quem vai fiscalizar

o gasto público.

Dispõe o art. 73 da Constituição Federal que o Tribunal de

Contas da União é integrado por nove Ministros, sendo que um terço será escolhido

pelo Presidente da República e dois terços pelo Congresso Nacional.

Adequar a escolha de modo a manter o equilíbrio entre os

Poderes e afastar a interferência do Presidente da República depende da ótica que

se tenha da questão.

Havendo entendimento de que o Tribunal de Contas é órgão

auxiliar do Poder Legislativo, conforme se extrai da redação do art.71 da

Constituição Federal, com objetivo de exercer o controle externo na fiscalização

contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial. Então, a fim de manter

a independência seus membros, deveriam ser escolhidos somente pelo Poder

Legislativo, ou seja, pelo Senado Federal e pela Câmara dos Deputados.

Deste modo, com um raciocínio lógico o Poder Legislativo deve

escolher e nomear os integrantes deste órgão que lhe é auxiliar, e também porque,

mesmo não sendo um Poder, o Tribunal de Contas deve ter sua independência

funcional reconhecida e preservada.

Leciona JOSÉ F.F.TAVARES que “toda a actividade de gestão

exige, para sua eficácia, um bom sistema de controlo, podendo, mesmo considerar-

se indissociáveis os sistemas de gestão e de controlo”. Mesmo havendo o sistema

de controle interno “foi surgindo a necessidade dos Estados, de criar um órgão de

controlo financeiro externo e independente.” 170

Agora, com o entendimento de que, embora sendo, o Tribunal

de Contas, um órgão auxiliar do Poder Legislativo, mas que exerce a função da

tomada de contas dos Três Poderes o princípio da igualdade dá fundamento para

que os Ministros deste Tribunal sejam escolhidos com a participação do Poder

Legislativo, Executivo e Judiciário.

170 TAVARES, José F.F. – O Tribunal de Contas, p.22.

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Para fundamentar esta idéia, tem-se a lição de CASTRO

NUNES, citado por Orlando Soares, que embora sobre a Constituição de 1946, pode

ter aplicação perante a Constituição de 1988, no sentido de que o Tribunal de

Contas está entre os Poderes, não pertencendo a nenhum deles.171

Está definido pela Constituição e pela legislação

infraconstitucional como deve ser o controle orçamentário de todos os Poderes do

Estado, portanto, considerando que os Poderes estão no mesmo patamar

constitucional, os Três devem participar da escolha dos membros do órgão auxiliar.

Em resumo, a escolha deve ficar somente a cargo do Poder

Legislativo porque é o Poder que tem também a função de fiscalizar ou deve ficar a

cargo dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, porque os Três são

fiscalizados e estão na mesma posição constitucional.

Não se encontra motivo que justifique a permissão ao

Presidente da República de interferir na nomeação de órgão auxiliar do Poder

Legislativo, quando o Poder Judiciário que também é fiscalizado não faz nenhuma

escolha.

A primazia do Presidente da República desequilibra os Poderes,

estando evidente que mesmo cumprindo os requisitos constitucionais ele age de

acordo com sua conveniência, não se olvidando de que, como salienta HELIO SAUL

MILESKI172, em comparação com o sistema constitucional anterior houve uma

evolução com natureza democrática diante da participação do Executivo e do

Legislativo. Assim, a evolução só se completa com a participação também do

Judiciário.

171 Op.cit. p.405. “Na opinião de Castro Nunes, o Tribunal de Contas, estruturado nos moldes da Carta Política de 1946, é órgão autônomo e independente e não como Delegação do Parlamento, aduzindo que dito órgão está entre os Poderes, “a nenhum deles pertence propriamente, nem ao Judiciário nem à administração como jurisdição subordinada, porque já então seria absurdo que pudesse fiscalizar-lhe os atos financeiros; nem mesmo ao Legislativo,com o qual mantém maiores afinidades”(Teoria e Prática do Poder Judiciário,p.25). 172 MILESKI, Helio Saul – O Controle da Gestão Pública, p.216. “ Como se vê, a escolha dos membros do Tribunal de Contas evoluiu para um aspecto de natureza democrática,com a participação do Executivo e do Legislativo, cabendo ao Parlamento, de forma justa, o maior número de indicações, por ser este, na qualidade de representante de todos os segmentos sociais, o detentor do controle externo. Contudo, há também um indubitável realce do caráter técnico, uma vez que a escolha deve ocorrer entre Auditores e membros do Ministério Público, profissionais qualificados,com ingresso mediante concurso público; ou entre pessoas que

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7.4. Outro método de nomeação para Poder Judiciário.

Além de nomear integrantes de órgão auxiliar do Poder

Legislativo, o Presidente da República tem o poder nomear integrantes do próprio

Poder Judiciário como amplamente mostrado anteriormente.

Esta concentração de poder nas mãos do Presidente da

República o coloca em posição superior aos três Poderes, sendo certo que ele

encarna o Poder Executivo que já experimenta hipertrofia.

Para manter o equilíbrio esperado pela Nação, não se admite

que o Poder Judiciário tenha cargos para que o Presidente da República presenteie

amigos vinculados a partidos políticos e que usem do Poder Judiciário como um

trampolim e retorno posterior às atividades partidárias, como mostra a imprensa.

Exige-se uma mudança radical a fim de manter a imparcialidade

e a independência do Poder Judiciário que vai resultar no equilíbrio tão desejado.

Como órgão de cúpula e Corte Constitucional, o Supremo

Tribunal Federal representa todo o Poder Judiciário perante a ordem interna e

externa. De certa forma representa a Justiça Federal e a Justiça dos Estados

membros.

Nesta condição não se pode admitir que sua formação seja de

vontade do Presidente da República com simples homologação do Senado Federal,

como nos mostra a história.

A redação do art. 101 da Constituição Federal173 assegura ao

Presidente da República o exercício da sua vontade.

Na prática, o Presidente da República escolhe alguém que

preencha os requisitos da idade, capacidade jurídica e honestidade e o nomeia para

integrar outro Poder, que de acordo com a Constituição Federal é independente.

Manter o equilíbrio entre os Poderes e fazer valer a

independência impõe-se que os nomeados para o Supremo Tribunal Federal sejam

pessoas oriundas da classe da Magistratura Federal e Estadual.

sejam detentoras de formação profissional adequada e possuam experiência comprovada no exercício dessas atividades...” 173 Art.101 da CF. “ O Supremo Tribunal Federal compõe-se de onze Ministros,escolhidos dentre cidadãos com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos de idade,de notável saber jurídico e reputação ilibada.

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Os juízes federais e estaduais, de maneira bem mais acentuada

os estaduais, são pessoas com experiência de julgar questões locais e, portanto

sabem a necessidade das pessoas simples do povo. São pessoas com experiência

nas atividades correicionais de cartórios, delegacias de polícia, entidades que

abrigam menores, etc.

Estes magistrados vivem as dificuldades financeiras do próprio

Poder, das pessoas que procuram o Judiciário e das diversas entidades.

Com efeito, ao julgarem questões nacionais, esta experiência

vivida por dezenas de anos vai influenciar em aplicar a legislação com justiça e

equidade.

Não obstante a mais alta capacidade jurídica do nomeado,

permite a Constituição Federal que o Presidente da República escolha uma pessoa

que não tenha tido nenhuma experiência de julgar e, portanto não experimentou os

efeitos de sua decisão na vida das pessoas nas grandes e pequenas cidades e

também aquelas decisões de efeitos nacionais.

Não basta impor ao Judiciário um Ministro de mais alto

conhecimento técnico, mas sim também deve ter tido a experiência de ser julgador.

Diferente de outros sistemas jurídicos o órgão máximo do Poder

Judiciário no Brasil atua também como Corte Constitucional, por isto a nomeação de

seus membros apresenta maior complexidade e exige satisfazer as necessidades do

Judiciário e da Corte Constitucional.

Encontramos na Constituição da República Portuguesa que o

Tribunal Constitucional é composto por treze juízes, mas havendo uma combinação

do requisito técnico com o político, porque seis de seu membros, obrigatoriamente

são oriundos da carreira da Magistratura.174

Esta disposição constitucional permite ao Poder Judiciário a

participação na vida política e organizacional do Estado.

Parágrafo único. Os Ministros do Supremo Tribunal Federal serão nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal. 174 Art.224° da Constituição da República Portuguesa. “1. O Tribunal Constitucional é composto por treze juízes,sendo dez designados pela Assembléia da República e três cooptados por estes. 2. Seis entre os juízes designados pela Assembléia da República ou cooptados são obrigatoriamente escolhidos dentre juízes dos restantes tribunais e os demais entre juristas”.

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Para CANOTILHO, a composição do Tribunal Constitucional é

problema central da organização do Estado e envolve transparência política e

legitimação.175

Na Espanha a situação não é diferente. O Poder Judiciário tem

sua participação na formação do Tribunal Constitucional conforme a redação do art.

159.

O Tribunal Constitucional é formado por doze membros

nomeados pelo Rei, com participação do Congresso, do Senado, do Governo e do

Conselho Judicial, devendo ainda a nomeação recair também entre magistrados.176

A participação do Poder Judiciário na escolha e nomeação dos

integrantes da mais alta Casa de Justiça, com efeito, significa cumprir a teoria da

Tripartição do Poderes, reconhecendo independência e equilíbrio entre os Poderes.

É certo, entretanto, que o Conselho é órgão híbrido, mas deve se considerar que a

Espanha está regida pelo sistema parlamentarista.

Há que se transportar a teoria para a realidade e dar efetividade

na separação do Poder Judiciário em relação ao Poder Legislativo e Poder

Executivo sob pena de não haver respeito à liberdade conforme afirmou

Montesquieu: il n’ y a point de liberté si la puissance de juger n’ est pas separée de

la puisance législatife et de l’ executrice.

Em palestra na Associação Paulista de Magistrados o Senador

PATRICE GÉLARD da República Francesa afirmou que “tenho receio em relação

175 Op.cit. Direito Constitucional, p.765. “A composição de um tribunal constitucional, dadas as funções jurídico-políticas a ele atribuídas, é sempre problema central da organização do Estado, independentemente das dimensões acentuadas na escolha concreta dos juízes( preparação técnica, capacidade funcional do órgão, função de integração da jurisprudência constitucional,representação das várias <sensibilidades políticas>,distanciação perante os poderes político-partidários, exigência de legitimação democrática. De um modo geral, em todos os tribunais constitucionais criados no após guerra teve-se em conta a necessidade de legitimação democrática dos juízes através da participação dos órgãos de soberania directa ou indirectamente legitimados, na eleição ou escolha de seus membros. A favor desta <transparência política> argumenta-se com o facto de ser preferível emanarem os juízes constitucionais de órgãos democraticamente legitimados,embora com indiscutível cunho político, do que de outros órgãos com uma mundividência política também irrecusável, mas disfarçada num aparente <apartidarismo institucional>. Assente a necessidade de uma legitimação democrática, o problema desloca-se para este outro campo: o modus de escolha dos juízes constitucionais. Este deve corresponder ao padrão político-organizatório constitucionalmente consagrado.O equilíbrio e interdependência dos órgãos de soberania terá de encontrar expressão adequada na composição do órgão considerado como o <arco de volta> da estrutura organizatória da Constituição.” 176 Artigo 159 da Constitución española .- Tradução livre do autor- “ 1. O Tribunal Constitucional compõe-se de 12 membros nomeados pelo Rei, sendo quatro por proposta do Congresso por três quintos de seus membros, quatro por proposta do Senado com idêntica maioria; dois por proposta do Governo e dois por proposta do Conselho Geral do Poder Judicial. 2. Os membros do Tribunal Constitucional deverão ser nomeados entre Magistrados e Fiscais, Professores de Universidade, funcionários públicos e Advogados, todos eles juristas de reconhecida competência com mais de quinze anos de exercício profissional.

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aos Tribunais Constitucionais cujos membros são nomeados pelo Presidente da

República”.177, porque o hábito é a nomeação de pessoas com comprometimento ao

nomeador.

A afirmação mostra que a preocupação também acontece em

outros sistemas, mas que se assemelha ao nosso, como se extrai do texto de

PIERRE AVRIL e JEAN GICQUEL expondo que “ conformément au modele

européen, lesjuges constitutionnels ne son pás de magistrats de carrière. Au nombre

de neuf,ils sont designes par dês autorités politiques: le Président de la Republique,

le président du Sénat et le président de l´Assemblée nationale(art.56 de la

Constitution) (C).”178

O temor se estende quando a nomeação não é somente ao

Supremo Tribunal Federal como Tribunal Constitucional, mas sim para todos os

Tribunais Superiores, além da Justiça Federal.

Da preocupação do Senador francês se observa que o zelo

deve ser em manter a independência da Corte Constitucional em relação aos demais

Poderes; para nós o objetivo é maior, porque se funda em manter a independência

de todo o Poder Judiciário e não somente da Corte Constitucional

Para se manter a independência, o equilíbrio e afastar qualquer

influência do Presidente da República no Poder Judiciário, importa em que os

nomeados para o Supremo Tribunal Federal o sejam pelo Presidente do próprio

Supremo Tribunal Federal após receber a listagem de nomes.

A fundamentalidade da proposta está em manter a

independência do Poder Judiciário na medida em que ele escolhe seus integrantes,

observando-se evidentemente os requisitos constitucionais.

177 GÉLARD, Patrice – Transformações do Direito Constitucional na sociedade contemporânea in Tribuna da Magistratura, p.24. “Atualmente não existe Constituição Moderna que não possua uma jurisdição constitucional assegurando a proteção a esses direitos. No entanto, é preciso estar muito atento à leitura do texto Constitucional, é preciso zelar para que o Tribunal Constitucional seja efetivamente independente em vista dos outros órgãos do poder, o que não é sempre o caso. Tenho receio em relação aos Tribunais Constitucionais cujos membros são nomeados pelo Presidente da República porque sabemos que quando se nomeia,não temos o hábito de nomear pessoas que nos são advsersários ou hostis.” 178 AVRIL, Pierre et al – Lê Conseil constitutionnel, Montchrestien, p.66 ( Tradução livre do autor. “ Conforme o modelo europeu, os juízes constitucionais não são magistrados de carreira. Ao número de nove, eles são designados por autoridades políticas: O Presidente da República, o presidente do Senado e o presidente da Assembléia nacional” . Ainda, “ Eles atuam colegialmente e não em câmara distinta como na Alemanha. Entretanto sua origem foi posta em consideração, em matéria contenciosa de eleições paralemtares: O Conselho forma, para sua função, três seções de instrução,composta de três membros designados por à sorte entre os escolhidos por alguma das autoridades nominadas. Mas o Conselho julgará cada caso, em formação plenária, para tomar a decisão.”

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Surge a complexidade se a escolha for recair em somente em

integrantes da Magistratura Nacional, o que exigiria, talvez, a edição de lei

complementar para prestigiar a justiça federal e a estadual bem como as regiões do

País.

Também, pode-se pensar em nomeação com a participação dos

três Poderes sob o argumento de que a Corte Constitucional exige conhecimentos

técnicos-jurídicos, mas também conhecimento de política interna e externa.

Esta idéia considera que o Supremo Tribunal Federal tem como

competência precípua a guarda da Constituição, mas também que é obrigação dos

demais Poderes respeitar e fazer respeitar a Constituição.

Considerando que a nomeação é para integrar a Corte

Suprema, caberia ao Presidente da República indicar lista tríplice, e aquela

escolhendo um nome indicaria ao Senado Federal que faria a audiência pública

prevista pela Constituição.

Aprovado o nome o Supremo Tribunal Federal, seria

comunicado, e seu Presidente providenciaria a nomeação.

Por esta forma, os três Poderes, independentes e harmônicos,

estariam participando da formação do órgão de cúpula do Poder Judiciário que

também atua como Corte Constitucional.

Haveria a união do poder técnico-político que é o Judiciário, do

poder administrador-político: o Executivo, e do poder estritamente político, o

Legislativo (Senado) que representa os Estados, e em última análise o povo

também.

Outra maneira seria aproveitar o procedimento atual alterando

apenas o poder de escolha.

Caberia ao Supremo Tribunal Federal, como faz hoje o

Presidente da República escolher os nomes; por isto poderia a escolha recair em

pessoas fora da carreira da Magistratura Federal ou Estadual ou poderia recair

obrigatoriamente dentre os integrantes do Superior Tribunal de Justiça.

Em escolha livre, o Supremo Tribunal Federal teria conduta

semelhante a atual do Presidente da República. Mas se a escolha estiver vinculada

aos integrantes do Superior Tribunal de Justiça teremos um fortalecimento do Poder

Judiciário.

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Ainda, inspirado na Constituição Portuguesa e na Constituição

Espanhola, a origem dos indicados e nomeados poderia ser de parte estranha a

Magistratura e outra parte de integrantes da Magistratura Federal e Estadual.

Com esta origem binária se prestigia a Magistratura e os

Juristas estranhos ao Poder Judiciário, com uma combinação técnica-política.

Várias maneiras existem para a alteração do texto

constitucional, de modo que seja afastada a ingerência do Presidente da República

e ainda mostrar a população de que fato o Poder Judiciário é independente.

A segurança política e jurídica do povo, que no momento

histórico em que vivemos está abalada, como mostra SILVANA DE FREITAS no

jornal Folha de São Paulo: Por sua vez, Jobim encerrou a cerimônia deixando claro

que Lula contará, nos próximos dois anos, com uma espécie de aliado político no

principal cargo do Judiciário179 , precisa ser readquirida a fim de cumprir a ordem

constitucional de separação dos Poderes.

O Presidente do Supremo Tribunal Federal não poder ser aliado

político do Presidente da República, deve ser somente aliado da Constituição e das

leis.

Sofre o Poder Judiciário a crise da descrença por este e por

outros motivos, como lentidão, por exemplo. Por isto tudo, o que leva aumentar esta

descrença deve ser afastado, porque o ideal é manter os três Poderes equilibrados e

fortes, com o fim de dar liberdade à Nação.

Consta do Editorial do Boletim da Associação dos Advogados de

São Paulo que “Entre nós, como é público e notório, há um sem-número de

disposições constitucionais que não passam de meras declarações pomposas. E

disso não passam porque, desrespeitadas, o Poder Judiciário não as faz valer. São

peças de ficção.” 180

O que leva a este e outros entendimentos é o sistema. Portanto,

para que haja o equilíbrio e a crença de independência e harmonia, a forma de

nomeação exige que seja revista.

Se não há justificativa para o Presidente da República nomear

os Ministros do Supremo Tribunal Federal, muito menos estão presentes para a

179 FREITAS, Silvana de – Jobim defende Lula de ataque da OAB ao assumir o Supremo in Folha on line, 04/06/2004. 180 Boletim da Associação dos Advogados de São Paulo, p. 1.

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nomeação de outros magistrados. Os órgãos judiciais que exercem e realizam a

jurisdição são afetados pelo sistema jurídico em seu aspecto técnico; deste modo a

preponderância na escolha destes magistrados deve se fundar na combinação

jurídico-política,o que impõe que a atribuição de escolha e nomeação deva ser do

Poder Judiciário e não do Presidente da República.

Por fim, resta a nomeação para o Quinto Constitucional.

Não cabe neste estudo a análise sobre a justificativa da

necessidade do Quinto Constitucional, consignando apenas o que consta da lição de

MANOEL GONÇALVES FERREIRA FILHO que com isto se pretendeu injetar nos

tribunais o fruto da experiência haurida em situações outras que a do juiz.181

O art.94 da Constituição Federal emite a ordem de que um

quinto dos membros dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais do Estados, e

do Distrito Federal e Territórios devem ser compostos por integrantes do Ministério

Público,e de Advogados, que são nomeados pelo Presidente da República ou

Governador.182

Nesta hipótese, a interferência não é só do Presidente da

República, mas também do Governador do Estado e do Distrito Federal.

A existência do Poder Judiciário como órgão independente por

ordem da Constituição, impõe que seus membros, incluindo-se os oriundos do

Quinto Constitucional, sejam nomeados pelo Chefe do Judiciário. No âmbito dos

Estados-membros, a atribuição de nomeação deve recair sobre o Presidente do

respectivo Tribunal de Justiça.

Não há justificativa para que o Governador do Estado ou do

Distrito Federal tenha esta atribuição diante das normais pressões partidárias que

recebe, detalhe que não se coaduna com assuntos judiciais.

Manter o equilíbrio e a independência importa em que o Poder

Judiciário Federal e Estadual adquira ou resgate o seu direito e poder natural de

nomear todos os seus integrantes incluindo, portanto, os magistrados oriundos da

classe dos advogados e do Ministério Público.

181 FERREIRA Fº, Manoel Gonçalves - Comentários à Constituição Brasileira de 1988, Vol.2, p.200. 182 Art.94 da CF. “Um quinto dos lugares dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais dos Estados, e do Distrito Federal e Territórios será composto de membros do Ministério Público, com mais de dez anos de careira, e de advogados de notório saber jurídico e de reputação ilibada, com mais de dez anos de efetiva atividade profissional, indicados em lista sêxtupla pelos órgãos de representação das respectivas classes. Parágrafo único- Recebidas as indicações, o tribunal formará lista tríplice,enviando-a ao Poder Executivo,que,nos 20 dias subseqüentes,escolherá um de seus integrantes para nomeação.”

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CAPÍTULO VIII

PROPOSTA DE ALTERAÇÃO CONSTITUCIONAL COM O FIM DE

MANTER O EQUILÍBRIO ENTRE OS PODERES.

De tudo o que foi exposto desde o início do texto ao seu final,

está bem claro a idéia de que o País vive no estado do chamado absolutismo

presidencial que colide frontalmente com a teoria da tripartição dos Poderes ou das

funções.

Não há dúvida de que a teoria não pode ser adotada em sua

rigidez; entretanto a flexibilização necessária deve ser a mínima, com o objetivo

único de um poder controlar o outro em defesa dos interesses da Nação, mas

inadmissível, que um Poder ou o Chefe de um Poder se posicione em patamar

constitucional superior aos demais poderes.

A maneira de corrigir esta distorção e estabelecer a Constituição

Federal de acordo com os seus fundamentos, principalmente com a disposição do

art.2º, que com todo o conjunto dos Princípios Fundamentais funcionam como

vetores para todas as demais regras constitucionais, é alterar a redação dos artigos

que estão conflitando com a máxima “São Poderes da União, independentes e

harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.”

Com o objetivo de garantir o prestigio do Poder Legislativo, a

proposta de alteração atinge as Medidas Provisórias e as Leis Delegadas, bem

como altera o procedimento de nomeação dos Ministros do Tribunal de Contas.

A fim de garantir a independência do Poder Judiciário, a redação

concentra as nomeações dos Magistrados na pessoa do Presidente do Supremo

Tribunal Federal, isto é, transfere do Presidente da República para o Presidente do

Judiciário.

Com todos os fundamentos que foram apresentados segue a

redação, porque como previu MONTESQUIEU “quando na mesma pessoa ou no

mesmo corpo de magistratura, o poder legislativo está reunido ao poder executivo

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não há ponto de liberdade; porque há o receio que o mesmo monarca ou o mesmo

senado não faça senão leis tirânicas para as executá-las tiranicamente.”183

DA ORGANIZAÇÃO DOS PODERES

Art.44. O Poder Legislativo é exercido pelo Congresso Nacional e é composto pelos

seguintes órgãos: Câmara dos Deputados, Senado Federal e Conselho Nacional do

Legislativo.

Art.44-A. O Conselho Nacional do Legislativo compõe-se de quinze membros com

mais de trinta e cinco e menos de sessenta e seis anos de idade, com mandato de

dois anos, admitida uma recondução, sendo:

I- um Deputado Federal, indicado pela respectiva casa;

II- um Senador, indicado pela respectiva casa,

III- um Deputado Estadual indicado pelo Congresso Nacional;

IV- um vereador de Capital indicado indicado pelo Congresso Nacional;

V- um vereador indicado pelo Congresso Nacional

VI- um Deputado Distrital indicado pelo Congresso Nacional;

VII- um membro da Câmara Legislativa do Distrito Federal indicado pelo

Congresso Nacional;

VIII- um membro do Ministério Público da União, indicado pelo Procurador

Geral da República;

183 Vide nota 53.

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IX- um membro do Ministério Público Estadual, escolhido pelo Procurador

Geral da República dentre os nomes indicados pelo órgão competente de

cada instituição estadual;

X- dois advogados indicados pelo Conselho Federal da Ordem dos

Advogados do Brasil;

XI- dois cidadãos,de notável saber de direito público e reputação ilibada

indicados pelo Supremo Tribunal Federal;

XII- dois cidadãos ,de notável saber de direito público e reputação ilibada

escolhidos pelo Poder Executivo.

§ 1º - O Conselho será presidido pelo Deputado Federal que votará em caso de

empate, afastando das atividades na Câmara dos Deputados.

§ 2º- Os membros do Conselho serão nomeados pelo Presidente da

República,depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado

Federal.

§ 3º - Não efetuadas, no prazo legal, as indicações previstas neste artigo, caberá

a escolha ao Congresso Nacional.

§ 4º - Compete ao Conselho o controle da atuação administrativa e financeira do

Poder Legislativo e do cumprimento dos deveres funcionais dos congressistas,

cabendo-lhe além de outras atribuições que forem conferidas por lei

complementar:

I- zelar pela autonomia do Poder Legislativo e pelo cumprimento das normas

que regulamentam a atividade parlamentar, podendo expedir atos

regulamentares, no âmbito de sua competência, ou recomendar

providências;

II- zelar pela observância do art.37 e apreciar, de ofício ou mediante

provocação, a legalidade dos atos administrativos praticados por membros

ou órgãos do Poder Legislativo, podendo desconstituí-los, revê-los ou ficar

prazo para que se adotem as providências necessárias ao exato

cumprimento da lei, sem prejuízo da competência do Tribunal de Contas

da União e do Poder Judiciário;

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III- receber e conhecer das reclamações contra membros ou órgãos do Poder

Legislativo, inclusive contra seus serviços de atendimento ao

público,contra todas suas secretárias, gabinetes e todos os órgãos que

atuem em serviços auxiliares, incluindo o Tribunal de Contas, sem prejuízo

da competência disciplinar e correicional das Mesas ou Comissões do

Congresso Nacional, da Câmara dos Deputados e Senado

Federal,podendo avocar processos ou procedimentos disciplinares em

curso e determinar a remoção, a suspensão, ou a aposentadoria com

subsídios ou proventos proporcionais ao tempo de serviço, havendo o

tempo mínimo como determinado em lei, e aplicar outras sanções

administrativas, assegurada ampla defesa.

IV- Representar ao Ministério Público, no caso de crime contra a

administração pública ou de abuso de autoridade;

V- rever,de ofício ou mediante representação,os processo disciplinares de

parlamentares julgados há menos de um ano.

VI- Elaborar semestralmente relatório estatístico sobre projetos de lei

apresentados, por unidades da Federação, incluindo os Municípios;

VII- Elaborar relatório anual,propondo as providências que julgar

necessárias,sobre a situação do Poder Legislativo no País e as atividades

do Conselho, o qual deve integrar mensagem do Presidente do Congresso

Nacional a ser remetida ao Poder Executivo e Supremo Tribunal

Federal,por ocasião da abertura no ano judiciário.

§ 5º- O Senador exercerá a função de Senador-Corregedor e ficará

afastado de suas funções do Senado Federal, conferindo além das atribuições que

lhe forem conferidas por lei complementar,as seguintes:

I- receber as reclamações e denúncias,de qualquer interessado, relativas ao

membros do Poder Legislativo e aos seus serviços;

II- exercer as funções executivas do Conselho,de inspeção e de correição

geral;

III- requisitar e designar parlamentares delegando atribuições no Conselho, e

requisitar servidores de qualquer órgão do Poder Legislativo, inclusive nos

Estados, Distrito Federal e Territórios.

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§6º- Junto ao Conselho oficiarão o Procurador Geral da República e o Presidente do

Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil.

§7º- A União, inclusive no Distrito Federal e nos Territórios, criará ouvidorias

legislativas,competentes para receber reclamações e denúncias de qualquer

interessado contra membros ou órgãos do Poder Legislativo, ou contra seus serviços

auxiliares, incluindo o Tribunal de Contas,representando diretamente no Conselho

Nacional do Legislativo.

Art.59. O processo legislativo compreende a elaboração de:

I- emendas à Constituição;

II- leis complementares;

III- leis ordinárias;

IV- leis delegadas;

V- decretos legislativos;

VI- resoluções

Art. 62 (revogado).

Art.68. …

§ 3º Elaborado o projeto será encaminhado ao Congresso Nacional para sua

discussão, apreciação e votação em única sessão no prazo de 30 dias.

I- Não havendo a votação como determinado o Presidente da República promulgará

o texto legal.

Art.73 Os Ministros do Tribunal de Contas da União serão escolhidos:

I- um terço pelo Presidente da República e um terço pelo Presidente do

Supremo Tribunal Federal, com aprovação do Senado Federal, sendo dois

alternadamente dentre auditores e membros do Ministério Público junto ao

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Tribunal,indicados em lista tríplice pelo Tribunal, segundo critérios de

antiguidade e merecimento.

II- um terço pelo Congresso Nacional.

Art.76. São órgãos do Poder Executivo, o Presidente da República, que o exerce

com auxilio dos Ministros de Estado e o Conselho Nacional do Executivo.

Art.76 A. O Conselho Nacional do Executivo compõe-se de quinze membros com

mais de trinta e cinco e menos de sessenta e seis anos de idade, com mandato de

dois anos, admitida uma recondução, sendo:

I- dois Ministros de Estado escolhidos pelo Presidente da República.

II- um Deputado Federal, indicado pela respectiva casa;

III- um Senador, indicado pela respectiva casa,

IV- um Deputado Estadual indicado pelo Congresso Nacional;

V- um Governador de Estado escolhido pelo Presidente da República.

VI- um Prefeito de Capital escolhido pelo Presidente da República;

VII- O governador do Distrito Federal

VIII- um Prefeito Municipal.

IX- um membro do Ministério Público da União, indicado pelo Procurador Geral

da República;

X- um membro do Ministério Público Estadual, escolhido pelo Procurador Geral

da República dentre os nomes indicados pelo órgão competente de cada

instituição estadual;

XI- dois advogados indicados pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados

do Brasil;

XII- dois cidadãos de notável saber de direito público e reputação ilibada

indicados pelo Supremo Tribunal Federal;

§ 1º - O Conselho será presidido por um dos Ministros de Estado que votará em

caso de empate.

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§ 2º- Os membros do Conselho serão nomeados pelo Presidente da

República,depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado

Federal.

§ 3º - Não efetuadas, no prazo legal, as indicações previstas neste artigo, caberá

a escolha ao Presidente da República.

§ 4º - Compete ao Conselho o controle da atuação administrativa e financeira do

Poder Executivo e do cumprimento dos deveres funcionais dos agentes políticos

do Poder Executivo, cabendo-lhe além de outras atribuições que forem

conferidas por lei complementar:

VIII- zelar pela autonomia do Poder Executivo e pelo cumprimento das normas

que regulamentam a atividade administrativa, podendo expedir atos

regulamentares, no âmbito de sua competência, ou recomendar

providências;

IX- zelar pela observância do art.37 e apreciar, de ofício ou mediante

provocação, a legalidade dos atos administrativos praticados por membros

ou órgãos do Poder Executivo, podendo desconstituí-los, revê-los ou fixar

prazo para que se adotem as providências necessárias ao exato

cumprimento da lei, sem prejuízo da competência do Tribunal de Contas

da União e do Poder Judiciário;

X- receber e conhecer das reclamações contra membros ou órgãos do Poder

Executivo, inclusive contra seus serviços de atendimento ao público,contra

todos seus Ministérios, suas secretarias, departamentos e todos os órgãos

que atuem em serviços auxiliares, sem prejuízo da competência disciplinar

e correicional do Presidente da República,podendo avocar processos ou

procedimentos disciplinares em curso e determinar a remoção, a

suspensão, ou a aposentadoria com subsídios ou proventos proporcionais

ao tempo de serviço, sendo o caso, e aplicar outras sanções

administrativas, assegurada ampla defesa.

XI- representar ao Ministério Público, no caso de crime contra a administração

pública ou de abuso de autoridade;

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XII- rever,de ofício ou mediante representação,os processo disciplinares de

agentes politicos julgados há menos de um ano.

XIII- elaborar semestralmente relatório estatístico sobre as atividades

administrativas, por unidades da Federação, incluindo os Municípios;

XIV- elaborar relatório anual,propondo as providências que julgar

necessárias,sobre a situação do Poder Executivo no País e as atividades

do Conselho, o qual deve integrar mensagem do Presidente da República

a ser remetida ao Congresso Nacional na instalação da sessão legislativa

e Supremo Tribunal Federal,por ocasião da abertura no ano judiciário.

§ 5º- Um Ministro de Estado exercerá a função de Ministro-

Corregedor , conferindo além das atribuições que lhe forem conferidas por lei

complementar,as seguintes:

IV- receber as reclamações e denúncias,de qualquer interessado, relativas ao

membros do Poder Executivo e aos seus serviços;

V- exercer as funções executivas do Conselho,de inspeção e de correição

geral;

VI- requisitar e designar funcionários da União delegando atribuições no

Conselho, e requisitar servidores de qualquer órgão do Poder Executivo,

inclusive nos Estados, Distrito Federal e Territórios.

§6º- Junto ao Conselho oficiarão o Procurador Geral da República e o Presidente do

Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil.

§7º- A União, inclusive no Distrito Federal e nos Territórios criará ouvidorias

executivas,competentes para receber reclamações e denúncias de qualquer

interessado contra membros ou órgãos do Poder Executivo, ou contra seus serviços

auxiliares,representando diretamente no Conselho Nacional do Executivo.

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Art.94. ...

Parágrafo único. Recebidas as indicações, o tribunal no prazo de 20 dias fará a

nomeação.

Art.101. ...

Parágrafo único. Os Ministros do Supremo Tribunal Federal serão nomeados pelo

Presidente do respectivo tribunal, depois de aprovada a escolha pela maioria

absoluta do Senado Federal.

Art.104. ...

Parágrafo único. Os Ministros do Superior Tribunal de Justiça serão nomeados pelo

Presidente do Supremo Tribunal Federal, dentre brasileiros com mais de trinta e

cindo e menos de sessenta e cinco anos, de notável saber jurídico e reputação

ilibada,depois de aprovada a escolha absoluta do Senado Federal.

Art. 107 Os Tribunais Regionais Federais compõem-se de, no mínimo, sete juízes,

recrutados,quando possível, na respectiva região e nomeados pelo Presidente do

Supremo Tribunal Federal dentre brasileiros com mais de trinta e menos de sessenta

e cinco anos, sendo:

Art.111A. O Tribunal Superior do Trabalho compor-se-á de vinte e sete Ministros,

escolhidos dentre brasileiros com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco

anos,nomeados pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal após aprovação pela

maioria absoluta do Senado Federal, sendo:

Art.115. Os Tribunais Regionais do Trabalho compõem-se de, no mínimo, sete

juízes, recrutados,quando possível, na respectiva região, e nomeados pelo

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Presidente do Tribunal Superior do Trabalho dentre brasileiros com mais de trinta e

cinco anos e menos de sessenta e cinco anos,sendo:

Art.119. O Tribunal Superior Eleitoral compor-se-á, de sete membros escolhidos.

II-.por nomeação do Supremo Tribunal Federal, dois juízes dentre seis advogados

de notável saber jurídico e idoneidade moral.

Art.120. Haverá um Tribunal Regional Eleitoral na Capital de cada Estado e no

Distrito Federal.

II- por nomeação do Presidente do Tribunal Superior Eleitoral de dois juízes

dentre seis advogados de notável saber jurídico e idoneidade moral,

indicados pelo Tribunal de Justiça.

Art.123. O Superior Tribunal Militar compor-se-á de quinze Ministros vitalícios,

nomeados pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal,depois de aprovada a

indicação pelo Senado Federal, sendo três dentre oficiais-generais da

Marinha,quatro dentre oficiais generais do Exercito,três dentre oficiais da

Aeronáutica, todos da ativa e do,posto mais elevado da carreira, e cinco dentre civis.

Parágrafo único. Os Ministros civis serão escolhidos pelo Presidente do Supremo

Tribunal Federal dentre brasileiros maiores de trinta e cinco anos, sendo: . . .

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CONCLUSÕES

1.- O Poder Constituinte originário elegeu a Teoria de Montesquieu para organizar

o Estado brasileiro quanto aos seus Poderes, como se vê da redação do art.2° da

Constituição Federal; entretanto de todo o conteúdo constitucional se percebe que

o Poder Executivo, encarnado na pessoa do Presidente da República, está

resguardado por uma expressa hipertrofia, na medida que suas atribuições

extrapolam, em regra, as atribuições do Poder Executivo.

2.- O poder do Presidente da República em legislar, nomear para o Tribunal de

Contas, nomear para o Tribunal Constitucional e outros órgãos do Poder Judiciário

reduz a independência do Poder Legislativo e do Poder Judiciário, porque retira

destes Poderes atribuições que, por idéia lógica da teoria adotada, a eles

deveriam ser reservadas

3.- O modo de respeitar a teoria da tripartição impõe ao afastamento das

ingerências extrapoladas do Presidente da República no Poder Legislativo e no

Poder Judiciário. O afastamento destas ingerências não causa desprestigio ao

Presidente da República, porque tão somente organiza a conduta de cada Poder.

4.- Exigência constitucional e mesmo natural é que os Poderes sejam limitados, o

que importa afirmar que um Poder deve controlar o outro, a fim de impedir

desmandos e hipertrofia de um em prejuízo dos demais; por isto é essencial que

os limites fiquem estabelecidos,bem como o controle de um Poder sobre o outro.

As próprias funções típicas, quando exercidas, já operam o controle de um Poder

sobre os demais.

5.- Aceitando que os Três Poderes estão em um mesmo patamar constitucional, a

forma de um controle adotada para um Poder deve ser a mesma adotada para os

outros; guardadas evidentemente as particularidades de cada um. O sistema de

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controle deve ser constitucional, isto é, não se admite que por meio do controle

haja o enfraquecimento ou desprestigio de qualquer um dos Poderes. A

organização estatal só vai funcionar equilibradamente quando os Três Poderes

estiverem, cada um, individualmente exercendo suas funções sem ingerência do

outro.

6.- O Conselho Nacional de Justiça, como criado, é inconstitucional porque surgiu

através do Poder Constituinte derivado e por isto causa uma ruptura na

necessária separação de Poderes, na medida em que seus integrantes são

nomeados pelo Presidente da República e parte é estranha ao Poder Judiciário.

Inconstitucional também, porque afasta o pacto federativo ao excluir a autonomia

dos Estados-membros, quando lhe é permitido intervir no Poder Judiciário

Estadual. Os argumentos de constitucionalidade mais se afinam a questões

políticas do que ao texto constitucional.

7.- Havendo aceitação da constitucionalidade do Conselho Nacional de Justiça,

órgãos semelhantes devem ser criados para o controle do Poder Legislativo e do

Poder Executivo, os correspondentes Conselho Nacional do Legislativo e

Conselho Nacional do Executivo. A teoria não prestigia um Poder em relação aos

outros; deste modo o tratamento deve ser igualitário, e foi desta forma que decidiu

o Constituinte originário.

8.- Exige também a igualdade constitucional que a Constituição Federal seja

reformada a fim de que o Poder Legislativo recupere sua função típica de legislar

e sua atribuição de nomear integrantes para seu órgão auxiliar na função

fiscalizadora, e que seja reformada para que o Poder Judiciário conquiste sua

independência quanto à nomeação de seus integrantes. A força de cada Poder

para o exercício de sua função típica está assentada na independência que deve

ter.

9.- A supremacia constitucional do Presidente da República não se adequa à

Constituição considerada como a soma de fatores reais do Poder, porque de fato

o povo não suporta a concentração de poderes em uma só pessoa ou um só

organismo; por isto com relação a este conceito de Constituição, a supremacia

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presidencial se apresenta inconstitucional e por conseqüência desconsidera a

teoria de tripartição dos Poderes que foi eleita como um dos Princípios

Fundamentais do República Federativa.

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