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Web-Revista SOCIODIALETO www.sociodialeto.com.br Núcleo de Pesquisa e Estudos Sociolinguísticos, Dialetológicos e Discursivos NUPESDD-UEMS Mestrado em Letras UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 Volume 6 Número 16 Julho 2015 1 A INFLUÊNCIA DE ADSTRATOS DO ESPANHOL NO LÉXICO DA LÍNGUA PORTUGUESA Patricia Damasceno Fernandes (UEMS) 1 [email protected] Miguél Eugenio Almeida (UEMS) 2 [email protected] Natalina Sierra Assêncio Costa (UEMS) 3 [email protected] RESUMO: Ao compararmos a língua portuguesa em dado período com a língua atual, verifica-se que ela passou por processos de transformação e mudança, tais processos são constantes e fundamentais para a renovação do léxico da língua. Os fatores desencadeadores de renovação partem diretamente das características e necessidades da sociedade. Quando línguas distintas ficam em contato, originando graus de influência diferenciados, nascem os denominados estratos, existindo três tipos: substrato, superestrato e adstrato. A presente pesquisa irá ater-se apenas aos adstratos que é quando duas línguas coexistindo num mesmo espaço geográfico ou em espaços contíguos, se influenciam mutuamente, mas de forma superficial e nenhuma delas é assimilada pela outra, mantendo suas individualidades. A língua portuguesa conviveu e ainda convive com a língua espanhola, uma vez que nossos países vizinhos são falantes do espanhol. É possível verificar a influência de palavras de origem espanhola no vocabulário da língua portuguesa em vários âmbitos, sendo que em nosso trabalho selecionamos os verbos para ilustrar tal influência. Pretende-se fazer uma abordagem histórica da língua portuguesa e espanhola, tratar sobre os empréstimos linguísticos adotados do espanhol para o português e o processo de integração de palavras estrangeiras em nossa língua. Por último, apresentamos uma análise de 100 adstratos da língua espanhola que foram incorporados pela língua portuguesa com suas respectivas definições, explorando critério fonológico de integração dos adstratos da amostra. Para isso utilizaremos os dicionários Houaiss (2001), Machado (1987) e Corominas (1980). A pesquisa se fundamentará em: Alves (1984), Coutinho (1976) e Câmara Jr. (1975), entre outros. Através de nossa pesquisa temos a intenção de contribuir para área de lexicologia, demonstrando que a renovação de uma língua é algo imprescindível para a sua própria manutenção e sobrevivência. PALAVRAS- CHAVE: Adstratos; Espanhol; Português; Perspectiva histórica. ABSTRACT: Comparing the Portuguese language in a given period with the current language, it turns out that she went through processes of transformation and change, such processes are constant and central to the renewal of the language lexicon. The triggers of renovation directly depart the characteristics and needs of society. When different languages are in contact, resulting in different degrees of influence, called strata are born, existing three types: substrato, superestrato and adstrato. This research will stick only to adstratos which is when two languages coexist in the same geographical area or in adjacent spaces, influence each other, but in a superficial way and none of them is assimilated by the other while maintaining their individuality. The Portuguese lived and still lives with the Spanish language, since our neighbors are Spanish speakers. You can check the influence of words of Spanish origin in the vocabulary 1 Mestranda em Letras pela Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS) 2 Docente do Programa de Mestrado da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS) 3 Docente do Programa de Mestrado da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS)

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A INFLUÊNCIA DE ADSTRATOS DO ESPANHOL NO LÉXICO

DA LÍNGUA PORTUGUESA

Patricia Damasceno Fernandes (UEMS)

1

[email protected]

Miguél Eugenio Almeida (UEMS)

2

[email protected]

Natalina Sierra Assêncio Costa (UEMS)

3

[email protected]

RESUMO: Ao compararmos a língua portuguesa em dado período com a língua atual, verifica-se que ela

passou por processos de transformação e mudança, tais processos são constantes e fundamentais para a

renovação do léxico da língua. Os fatores desencadeadores de renovação partem diretamente das

características e necessidades da sociedade. Quando línguas distintas ficam em contato, originando graus

de influência diferenciados, nascem os denominados estratos, existindo três tipos: substrato, superestrato

e adstrato. A presente pesquisa irá ater-se apenas aos adstratos que é quando duas línguas coexistindo

num mesmo espaço geográfico ou em espaços contíguos, se influenciam mutuamente, mas de forma

superficial e nenhuma delas é assimilada pela outra, mantendo suas individualidades. A língua portuguesa

conviveu e ainda convive com a língua espanhola, uma vez que nossos países vizinhos são falantes do

espanhol. É possível verificar a influência de palavras de origem espanhola no vocabulário da língua

portuguesa em vários âmbitos, sendo que em nosso trabalho selecionamos os verbos para ilustrar tal

influência. Pretende-se fazer uma abordagem histórica da língua portuguesa e espanhola, tratar sobre os

empréstimos linguísticos adotados do espanhol para o português e o processo de integração de palavras

estrangeiras em nossa língua. Por último, apresentamos uma análise de 100 adstratos da língua espanhola

que foram incorporados pela língua portuguesa com suas respectivas definições, explorando critério

fonológico de integração dos adstratos da amostra. Para isso utilizaremos os dicionários Houaiss (2001),

Machado (1987) e Corominas (1980). A pesquisa se fundamentará em: Alves (1984), Coutinho (1976) e

Câmara Jr. (1975), entre outros. Através de nossa pesquisa temos a intenção de contribuir para área de

lexicologia, demonstrando que a renovação de uma língua é algo imprescindível para a sua própria

manutenção e sobrevivência.

PALAVRAS- CHAVE: Adstratos; Espanhol; Português; Perspectiva histórica.

ABSTRACT: Comparing the Portuguese language in a given period with the current language, it turns

out that she went through processes of transformation and change, such processes are constant and central

to the renewal of the language lexicon. The triggers of renovation directly depart the characteristics and

needs of society. When different languages are in contact, resulting in different degrees of influence,

called strata are born, existing three types: substrato, superestrato and adstrato. This research will stick

only to adstratos which is when two languages coexist in the same geographical area or in adjacent

spaces, influence each other, but in a superficial way and none of them is assimilated by the other while

maintaining their individuality. The Portuguese lived and still lives with the Spanish language, since our

neighbors are Spanish speakers. You can check the influence of words of Spanish origin in the vocabulary

1 Mestranda em Letras pela Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS)

2 Docente do Programa de Mestrado da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS)

3 Docente do Programa de Mestrado da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS)

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of the Portuguese language in various fields, and in our work selected to illustrate verbs such influence. It

is intended to make a historical approach of the Portuguese and Spanish, handle on the loanwords adopted

from Spanish to Portuguese and the process of integration of foreign words in our language. Finally, we

present an analysis of 100 adstratos the Spanish language that have been incorporated by the Portuguese

with their respective definitions, exploring phonological criterion of integrating adstratos sample. For this

we will use the dictionaries Houaiss (2001), Machado (1987) and Corominas (1980). The research will

build on: Alves (1984), Coutinho (1976) and Hall Jr. (1975), among others. Through our research we

intend to contribute to lexicology area, demonstrating that the renewal of a language is something

essential for their own maintenance and survival.

KEYWORDS: Adstratos; Spanish; Portuguese; Historical perspective.

1. Introdução

A língua e cultura do Império Romano foi levada para a Europa por motivos de

caráter geográficos e bélicos. A cada nova região dominada pelos romanos permanecia

por certo período o bilinguismo, ou seja, “situação linguística na qual os falantes são

levados a utilizar alternadamente, segundo os meios ou situações, duas línguas

diferentes” (DUBOIS, 1997, p.87).

Esse bilinguismo foi dando espaço aos poucos a uma relação de substrato, em

que o latim foi gradativamente se sobrepondo às línguas faladas nas regiões antes da

dominação, o que resultou na formação das línguas modernas como: o português, o

espanhol, o francês, o italiano etc.

Apesar do português e do espanhol terem como origem a mesma língua mãe, o

latim, são bem distintas uma da outra e isso se deve a fatores culturais, geográficos e

sociais.

O português e o espanhol foram línguas em contato na Península Ibérica e na

América do Sul, o que motivou o surgimento de empréstimos vocabulares,

principalmente nas regiões fronteiriças.

Os empréstimos vocabulares de línguas em contato podem ser incorporados aos

dicionários sem que haja uma sobreposição entre as línguas, e os vocábulos passam a

fazer parte do acervo lexical de ambas, formando os adstratos.

Primeiramente se abordará sobre a metodologia da pesquisa, onde se descreverá

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aspectos quanto à natureza e tipologia da mesma, os fundamentos teóricos, o corpus e

procedimentos realizados.

Dando continuidade, será tratado sobre a história da língua portuguesa e da

língua espanhola de forma breve, de seu surgimento até a chegada dos portugueses e

espanhóis no continente americano. Em seguida, se discorrerá sobre os empréstimos

linguísticos e os níveis de influências de línguas em contato com os chamados:

substratos, superestratos e adstratos.

Depois serão apresentados os critérios de integração necessários para que

elementos estrangeiros possam ser incorporados pela língua portuguesa, sendo eles: o

morfossintático, o fonológico e o semântico.

E por fim, uma análise será realizada a partir do corpus, apresentando

primeiramente o adstrato (palavra) em língua portuguesa, após em espanhol e

finalmente o significado em português, explorando o critério fonológico de integração

na amostra da pesquisa.

2. Metodologia

Esta pesquisa é de natureza qualitativa e do tipo bibliográfica que utiliza como

instrumentos para geração de dados a leitura de dicionários de língua portuguesa e

língua espanhola e também dicionários etimológicos.

A fundamentação teórica desta pesquisa se dará: aos empréstimos linguísticos

com Câmara Junior (1975); aos aspectos históricos da língua portuguesa com Coutinho

(1976) e Castilho (2009); aos aspectos históricos da língua espanhola com Resnick

(1981) e Lapesa (1980); e quanto ao processo de integração de palavras estrangeiras

utilizaremos Alves (1984).

O corpus da pesquisa foi selecionado por meio dos seguintes dicionários:

Houaiss (2001), Machado (1987) e Corominas (1980). Para explicitar as influências que a

língua espanhola deixou no acervo lexical da língua portuguesa, foi selecionada uma amostra de

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100 verbos dos dicionários listados acima.

O procedimento inicial foi a leitura dos dicionários. Em seguida, fizemos uma seleção

para que nosso corpus não ficasse muito extenso e então sistematizamos a amostra colocando as

palavras em português, depois em espanhol e seus respectivos significados dicionarizados em

língua portuguesa. Por fim, fizemos uma análise quanto ao critério fonológico no que diz

repeito ao processo de integração dos verbos de língua espanhola à língua portuguesa.

3. Breve Histórico da Língua Portuguesa e Espanhola

3.1 Língua portuguesa

De acordo com Coutinho (1976), nossa história começa com o Latim em Roma,

quando o idioma passa a ser utilizado como instrumento literário e adquire duas novas

vertentes: o Clássico e o Vulgar. É importante destacar que essas duas vertentes não

eram línguas diferentes, mas formas diferentes de realização da mesma.

Contemporaneamente, podemos dizer que o Latim Clássico era a variante de

prestígio: usada pela elite, estudiosos e escritores importantes. Já o Latim Vulgar era a

variante popular, usado pela grande massa que não possuía escolarização e bens. As

duas modalidades do Latim eram denominadas pelos romanos respectivamente como:

sermo urbanus e sermo vulgaris.

Coutinho assim conceitua as duas vertentes do Latim:

Diz-se Latim Clássico a língua escrita, cuja imagem está

perfeitamente configurada nas obras dos escritores latinos.

Caracteriza-se pelo apuro do vocabulário, pela correção gramatical,

pela elegância do estilo, numa palavra, por aquilo que Cícero

chamava, com propriedade, a urbanitas. [...]. Chama-se Latim Vulgar

o Latim falado pelas classes inferiores da sociedade romana,

inicialmente e depois de todo o Império Romano. Nestas classes

estava compreendida a imensa multidão das pessoas incultas que eram

de todo indiferentes às criações do espírito, que não tinham

preocupações artísticas e literárias, que encaravam a vida pelo lado

prático, objetivamente. (COUTINHO, 1976, p. 29-30).

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Após a ruína do Império Romano, o Latim Vulgar se expande livremente pelos

domínios das hordas bárbaras e é adotado como idioma comum de povos diversos,

originando diferentes romances e depois várias línguas neolatinas.

As línguas neolatinas são todas originadas do Latim, a relação entre aquelas e

este resultou em modificações regionais do Latim, das quais surgiram as línguas

Românicas.

As línguas Românicas são as línguas que conservaram em seu vocabulário,

morfologia e sintaxe, vestígios de filiação ao Latim. Sendo elas: o português, o

espanhol, o catalão, o francês, o italiano, o reto-romano, o dalmático, o romeno e o

sardo.

A Língua Portuguesa veio do Latim Vulgar introduzido na Lusitânia pelos

romanos, região localizada ao ocidente da Península Ibérica.

Coutinho nos explica a Língua Portuguesa da seguinte forma:

Pode-se afirmar, com mais propriedade, que o português é o próprio

Latim modificado. É licito concluir, portanto, que o idioma falado

pelo povo romano não morreu, como erradamente se assevera, mas

continua a viver transformado, no grupo de línguas românicas ou

novilatinas. (COUTINHO, 1976, p 46).

Para saber sobre a origem do português é preciso conhecer sobre a história da

Península Ibérica.

1.1.1 A romanização da Península Ibérica

Por volta de 218 a.C os romanos invadem a Península Ibérica, que era habitada

por povos autóctones como: celtas, iberos, púnico-fenícios, lígures e gregos. O episódio

ficou conhecido como Guerras Púnicas e visava o controle do acesso ao Mediterrâneo

que até então pertencia aos cartagineses.

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Após a invasão e a derrota dos púnicos, o poder dos romanos e

consequentemente do Latim, passam a ser quase predominante. A região foi dividida a

princípio em duas partes: ao oriente da península, a Hispania Citerior e ao seu ocidente,

a Hispania Ulterior.

Formou-se uma cultura citadina, mais desenvolvida economicamente,

e mais isolada de Roma: para viajar à capital do Império, só de navio.

Em consequência, desenvolveu-se nessa região uma modalidade

conservadora do Latim Vulgar, particularmente na Bética, em que iria

surgir o Galego-Português. Esta língua românica, portanto, seria mais

conservadora no vocabulário, na fonética e na sintaxe, transformando

menos o Latim Vulgar. (CASTILHO, 2009, p. 06).

Diante desta mescla entre romanos e os povos que já viviam na Península, o

Latim fica cada vez mais distante do que era inicialmente o Latim imperial.

1.1.2 Os germânicos invadem a Península

Em 409 d.C. os romanos sofrem ataques de povos de origem germânica:

Vândalos, Suevos e Alanos, sendo somente os Alanos os que sobreviveram por muito

tempo e acabaram originando o reino da Gallaecia.

[...] com a chegada dos povos germânicos à península a

nomeadamente os suevos à Galiza visse como o Latim vai

tornar realmente numa língua franca entre galaicos-romanos

(provavelmente bilíngues em Latim e galaico-lusitano) e suevos com a

língua trazida do centro da Germânia, que distante entre si

buscassem no Latim o seu ponto de encontro. (BARBOSA, 2005. p.

3).

Os suevos são derrotados pelos visigodos e incorporam a Península a seu

território. Enquanto isso o Latim vai passando por mais transformações. A contribuição

dos visigodos para a Língua Portuguesa foi basicamente relacionada a nomes próprios

de pessoas e lugares.

Após a invasão germânica formou-se um sentimento nacional como nos diz

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Castilho:

A grande importância linguística da invasão germânica está em que

seu domínio libertou as potencialidades diferenciadoras da península

em relação a Roma, não mais considerada como metrópole. Formou-

se um sentimento nacional, e entre os sécs. VI e IX o Latim Vulgar

Hispânico, matizado pelos germanismos, começou a dialetar-se nos

diversos Romances de que surgiriam a partir do séc. X as línguas

românicas ibéricas. (CASTILHO, 2009, p. 19).

1.1.3 Os Árabes invadem a Península

Em 711 a Península foi invadida pelos árabes também chamados de mouros, que

derrotaram os visigodos. Após o ocorrido surge na região o desenvolvimento da ciência

e da arte.

O desenvolvimento literário foi muito intenso, a ponto de pensarem

alguns historiadores da literatura que a poesia lírica medieval da

Península Ibérica seja de origem árabe. Estudos linguísticos foram

cultivados, para as explicações do Alcorão. (CASTILHO, 2009, p.

22).

A herança árabe deixada para a Língua Portuguesa e espanhola foi a introdução

de inúmeras palavras para designar novos conhecimentos.

A dinastia de origem árabe Omíada comandou por muito tempo, sendo

derrubada em 1031, o que em 1117 resultou na invasão dos Almohadas. Em seguida os

Mouros foram sendo expulsos aos poucos para o Sul da Península, possibilitando a

formação de Portugal (séc. VII), Aragão e Castela até 1492. Quando Castela derrotou o

último estado árabe, se juntou com Aragão e formou a Espanha.

1.1.4 Galego-Português

Os cristãos foram para o Sul da Península para tomar a região dos Mouros que lá

estavam refugiados. O processo de invasão moura e derrota dos mesmos foram

responsáveis pela formação de três línguas peninsulares: o galego-português, a Oeste; o

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castelhano, no centro; e o catalão, a Leste. Nasce então, um Reino independente:

Portugal.

Adotada pelos moçárabes do país, por todos os elementos alógenos

participantes do repovoamento, assim como pelos muçulmanos que aí

haviam ficado, esta língua galego-portuguesa do Norte vai sofrer uma

evolução gradativa e transformar-se no português. (TEYSSIER, 2007.

p. 7).

As regiões tomadas dos mouros pelos cristãos ficavam despovoadas, então os

conquistadores cristãos as povoavam com pessoas vindas do Norte difundindo ainda

mais o Galego-Português por toda a parte central e meridional do território de Portugal.

O Galego-Português foi utilizado no território português desde sua consolidação

no início do séc. XII, quando se isolou do reino de Leão e Galícia.

1.1.5 Separação entre Portugal e Galícia

Portugal se torna cada vez mais consolidada e o Rei D. Afonso III se instala em

Lisboa. O centro cultural e político do país passa a girar em torno de Lisboa e Coimbra.

O isolamento entre Galícia e Portugal foi devido à fronteira entre os Reinos de

Leão e Castela, aumentando ainda mais com a expulsão dos mouros em 1249 e a derrota

dos castelhanos em 1385.

Com essa separação então Portugal e Galícia, Portugal se torna independente

dando oportunidade para a fixação definitiva do português, fortificando a unidade

nacional.

Foi de grande ajuda as traduções feitas por religiosos que já tinham entendido

que agora o Latim estava restringido a ser conhecido apenas pelo clérigo, ajudando a

promover o português pelo país. Em 1290, D. Denis torna a Língua Portuguesa, a língua

oficial do território.

Levou tempo para que se tomasse consciência do Português como

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uma nova língua. Tiveram importância nesse ofício duas instituições,

que agiram como centros irradiadores de cultura na Idade Média: os

mosteiros, onde se levavam a cabo traduções de obras latinas,

francesas e espanholas (Mosteiros de Santa Cruz e Alcobaça) e a

Corte, para a qual convergiam os interesses nacionais. Escreviam ali

fidalgos e trovadores, aprimorando a língua literária. (CASTILHO,

2009. p. 34)

A Língua Portuguesa no Brasil

Entre os séculos XV e XVI tem início o período das grandes navegações, a

colonização portuguesa começa efetivamente em 1532 quando a Língua Portuguesa

começa a ser transportada para o Brasil.

Aqui ela entra em contato com as línguas dos povos nativos que já viviam em

nosso país, os índios. De acordo com Guimarães (2005) pode-se dividir em quatro

etapas a relação da língua portuguesa com as outras línguas praticadas no Brasil.

A primeira se refere ao início da colonização até 1654 quando os holandeses

saíram de nosso país. Assim a Língua Portuguesa convive com as línguas indígenas que

eram cerca de 1175 conforme McCleary (2007), com as línguas gerais e com o

holandês.

As línguas gerais eram línguas tupis, que tinham a função de uma língua franca.

Eram faladas pela maioria da população e serviam para facilitar a comunicação entre

índios de tribos diferentes, entre índios e portugueses e seus descendentes. A Língua

Portuguesa efetivamente era usada apenas em documentos oficiais e praticada pelas

pessoas que estavam ligadas a administração da colônia.

A segunda etapa vai da saída dos holandeses do Brasil até a chegada da família

real no Brasil. “A saída dos holandeses muda o quadro de relações entre línguas no

Brasil na medida em que o português não tem mais a concorrência de outra língua de

Estado (o holandês)”. (GUIMARÃES, 2005, p.24).

A partir de agora a Língua Portuguesa irá concorrer com as línguas indígenas,

em especial, e as línguas africanas que vieram para o nosso país com os escravos nos

navios negreiros.

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Logo os colonizadores tomam medidas para estreitar ainda mais o uso de línguas

diversas na colônia e acabam com o uso das línguas gerais. Neste momento ficam em

nosso país um grande número de índios, portugueses vindos de diversas regiões de

Portugal e os escravos africanos. “Para se ter uma ideia, no século XVI foram trazidos

para o Brasil 100 mil negros. Este número salta para 600 mil no século XVII e 1,3

milhão no século XVIII”. (GUIMARÃES, 2005, p.24).

As línguas gerais foram proibidas nas escolas sendo permitido usar

exclusivamente a língua portuguesa. Em 1757 foi criado o Diretório do índio por

Marquês de Pombal que na época era ministro de Dom José I, proibindo o uso de língua

geral na colônia, somando tudo isso ao grande contingente de portugueses que

chegavam ao país, à língua portuguesa foi ficando cada vez mais predominante.

A terceira etapa começa com a chegada da família real ao Brasil devido a Guerra

com a França e vai até nossa independência. Em 1826 a questão da língua nacional do

Brasil foi criada no Parlamento brasileiro.

A chegada da família real ao nosso país possibilitou a realização de fatos

importantes, como a oficialização do Rio de Janeiro como capital do império, a criação

da imprensa e da Biblioteca nacional (mudando o quadro cultural brasileiro) e também a

grande circulação da Língua Portuguesa tanto escrita quanto falada.

A quarta etapa irá transformar a língua portuguesa em língua nacional, pois em

1827 realizaram-se várias discussões em torno do ensino da língua, sugerindo que os

professores ensinassem a ler e escrever usando a gramática da língua nacional. Foi

proposto que os diplomas dos médicos no Brasil fossem redigidos em linguagem

nacional.

Língua espanhola

A história da língua espanhola possui muitos pontos em comum a história da

língua portuguesa, a começar pela origem, pois o espanhol também é oriundo do latim

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vulgar trazido pelos romanos na conquista da Península Ibérica.

Antes da chegada dos romanos, a Península Ibérica era povoada por diferentes

comunidades, os primeiros habitantes modernos da Península são chamados Iberos.

Según una teoria, puesta en duda por muchos investigadores, pueblos

invasores obligaron a los iberos a retirarse a la relativa seguridad de

las montañas pirenaicas, donde sus descendientes los vascongados

permacen en la actualidad. Su lengua, el vasco o vascuence, no es

lengua indoeuropea. A pesar de los muchos esfuerzos por parte de los

linguístas y los historiadores para descubrir sus orígenes y establecer

una relación genética entre el vasco y otras lenguas del mundo, casi

nada se sabe de su prehistória. El origen de los vascos y su lengua, y

de los iberos, sigue un mistério. (RESNICK, 1981, p. 5)

No sul da Península os nativos estabeleciam relações comerciais com os

fenícios. No século VII a.C. os Celtas provenientes do Sul da Alemanha, invadiram a

península dominando a região de Galícia e Portugal e se misturaram com os Iberos

formando os Celtíberos, que se mantiveram no poder até a invasão dos cartagineses em

237 a.C..

Posteriormente os cartagineses forma expulsados pelos Romanos que iniciaram

sua conquista em 218 a.C..

A paz na Península é quebrada em 409 d.C. com a invasão de duas tribos

germânicas: a dos Vândalos e dos Suevos. Vinte anos depois tiveram que ceder a outra

tribo Germânia: a dos Visigodos. Os últimos acabaram por adotar a superior cultura

romana e a língua latina.

A última invasão estrangeira foi a dos árabes na península 711 d.C. ficando no

poder até1492 quando a ocorreu a reconquista.

La reconquisa empezó en el norte, en el território del dialecto romance

castellano. En el proceso de retomar España, los catellanos

diseminaron por casi toda España tanto su idioma castellano como su

influencia militar, desplazando a otros dialectos romances como el

asturiano e el mozarabe. (RESNICK, 1981, p. 6).

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Com o desenvolvimento da guerra de reconquista, os diferentes reinos

participantes do combate conseguiram reduzir a presença dos muçulmanos e conquistar

novas terras que trouxeram muitas riquezas para tais reinos.

Em 1469, a presença árabe (muçulmana) estava restrita ao Reino Mouro de

Granada. No mesmo ano, os territórios do Reino de Castela e Aragão foram unificados

devido ao casamento entre os monarcas cristãos, Isabel de Castela e Fernando de

Aragão. Depois disso, novos exércitos expulsaram os muçulmanos definitivamente e

tomaram o reino de Granada, no ano de 1492. A partir de então, o Reino unificado

passou a se fortalecer com o incentivo ao comércio marítimo.

Tem início então as expansões marítimas e para conseguir alcançar os mercados

como as lucrativas especiarias orientais, na Índia, os espanhóis precisavam encontrar

uma rota alternativa à dos portugueses. Para isso, os Reis Católicos contrataram o

navegante genovês Cristóvão Colombo.

A língua espanhola na América

O espanhol da América também foi trazido por meio da colonização. Os

espanhóis chegaram à América no ano de 1492. O continente ficou isolado do velho

mundo por milhares de anos.

Porém havia sociedades e civilizações na América vivendo sua própria história,

até a chegada dos navios de Cristóvão Colombo, como os astecas, maias e incas. Todas

foram conquistas pelos espanhóis. A viagem de Colombo tinha por objetivo o

enriquecimento e descobrir um novo caminho para as Índias.

Após a conquista, começa a colonização da América e com isso a língua

espanhola passa a estar em contato com línguas indígenas dos povos que viviam lá antes

da chegada dos espanhóis. A partir daí o espanhol influenciou as línguas indígenas de

povos nativos. “Existen fenômenos y problemas de superstrato, influjo de la lengua

dominante sobre la dominada; en nuestro caso, penetración de hispanismos en el nahua,

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en zapoteco, en el quéchua, en guarani.” (LAPESA, 1980, p. 539-540).

Houve também problemas de adstrato, existindo uma mútua influência das

línguas coexistentes. O processo de adstrato ocorreu de duas formas: pelo bilinguismo

que existia inicialmente na América espanhola e posteriormente por questões de

fronteira com outras áreas. “Entran aquí desde el simple trasvase de elementos,

fonéticos, morfosintácticos, o léxicos de uma lengua a outra, hasta la formación de

lenguas híbridas.” (LAPESA, 1980, p. 540).

As influências que a língua portuguesa teve da língua espanhola estão inseridas

nos adstratos principalmente por questões de fronteira, e esse contato entre as línguas

fronteiriças se deve a questões comerciais, políticas e históricas.

Mais um fator de semelhança do português e do espanhol é que em ambos pode-

se verificar a influência de línguas indígenas devido aos povos colonizados. Nesse

processo de línguas em contato, faz-se necessário ressaltar que muitas línguas indígenas

tanto da América espanhola quanto a portuguesa sofreram o processo de substrato, ou

seja, muitas línguas indígenas foram extintas. No entanto influenciaram o idioma

eliminador, no caso o português e o espanhol.

Empréstimos linguísticos

De acordo com Dubois, assim pode-se conceituar os empréstimos linguísticos:

“Há empréstimo linguístico quando um falar A usa e acaba por integrar uma unidade ou

um traço linguístico que existia precedentemente num falar B e que A não possuía; a

unidade ou traço empregado são, por sua vez, chamados empréstimos.”(DUBOIS, 1997,

p 209).

Câmara Junior, em seu Dicionário de linguística e gramática (1977, p. 111)

define empréstimos linguísticos: “ação de traços linguísticos diversos dos do sistema

tradicional”.

Câmara Junior (1977) ainda nos diz que a condição para existirem esses

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empréstimos é social, neste caso, o contato entre povos de línguas diferentes, podendo

ser por coincidência ou contiguidade geográfica e ainda a distância (por intercâmbio

cultural).

De acordo com Bloomfield (1933 apud Câmara Junior, 1977 p. 104-105) a

coincidência e a contiguidade geográfica constitui os empréstimos íntimos que vão

gerar às línguas a que é feito o empréstimo o substrato, superstrato e o adstrato. Já os a

distância, por intercambio cultural, constituem os empréstimos externos.

Câmara Junior (1975, p. 198) sistematiza os níveis de influências das línguas:

Substrato: “quando uma população conquistada adquire a língua dos

dominadores”;

Superstrato: “quando os dominadores adotam a língua dos vencidos”;

Adstrato: “quando duas línguas coexistem lado a lado e criam um

constante bilinguismo”.

A partir disso, verifica-se que o nível mais harmônico é o adstrato, pois nenhuma

das línguas que estão em contato é absorvida pela outra, existindo influência mútua.

Elas passam a compartilhar palavras que começam a fazer parte do léxico tanto de uma

como de outra.

Processo de integração de palavras estrangeiras

Alves (1984) afirma que ocorre empréstimo linguístico quando um elemento

estrangeiro passa a ser utilizado numa dada língua e a ser codificado por ela.

Em seu artigo A integração dos neologismos por empréstimo ao léxico

português, Alves utiliza os pressupostos de Guilbert (1971) que distingue o elemento

externo à língua em dois tipos: um estrangeirismo ou um empréstimo.

Um estrangeirismo seria nomes próprios, patronímicos, termos que exprimem

realidades sem correspondência na língua receptora. Já os empréstimos, os elementos já

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integrados pelo sistema linguístico adotante.

Alves ressalta que existe um processo de transição, chamada peregrinismo, em

que em certo período de difusão o elemento estrangeiro será adotado ou não pelo idioma

receptor.

A adoção deve obedecer alguns critérios que são: morfossintático, semântico e

fonológico.

Morfossintático:

Quando o lexema estrangeiro constitui a base de uma derivação ou de

uma composição de acordo com a morfossintaxe de uma língua, ele

está se integrando ao léxico desse sistema. Assim, podemos afirmar

que um termo emprestado faz parte de uma comunidade linguística

desde que seja susceptível de derivação e de composição, tal como os

elementos autóctones. (ALVES, 1984, p.121).

Ou seja, para que um elemento estrangeiro se integre ao sistema da língua

adotante ele precisa ser suscetível a derivação ou composição assim como os elementos

naturais já pertencentes à língua adotante.

Semântico: “Segundo critério semântico, a instalação do termo

estrangeiro ocorre quando tal elemento introduzido na língua receptora

com um único significado torna-se polissêmico.” (Alves, 1984, p.123).

Logo, neste critério, o elemento estrangeiro é incorporado com apenas um

sentido e com o passar do tempo pode passar a adquirir novos.

Fonológico:

Segundo este critério, um termo estrangeiro começa a fazer parte do

léxico de uma língua à medida que se integra fonologicamente a ele.

Na verdade, o elemento estrangeiro tende a adaptar-se ao sistema

fonemático da língua receptora. (Alves, 1984, p.124).

Assim, o empréstimo recebe uma pronúncia de acordo com o sistema fonológico

desse idioma adotante.

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Além de se adequar a algum desses critérios, de acordo com Alves (1984), a

inserção de uma palavra ao acervo lexical de uma dada língua irá depender da

aceitação dessa palavra pela sociedade e essa aceitação é evidenciada pelo seu uso por

parte dos falantes.

Além disso, há todo um trabalho feito por uma equipe de lexicógrafos que irão

decidir se determinada palavra pode ou não ser incorporada ao idioma. No entanto

eles analisam exatamente a relação de uso da palavra pela sociedade falante desse

idioma.

A consagração da inserção de palavras a uma determinada língua é feita então

a partir do momento que essa palavra passa a constar no dicionário dessa língua.

Nesta pesquisa, utilizamos palavras dicionarizadas, isto é, que já foram

incorporadas e consagradas pelo uso dos falantes da língua, mesmo que pertencentes

a períodos diferentes dos da atualidade. Certo dia entendeu-se que tais vocábulos

deveriam fazer parte da língua portuguesa devido ao grande uso por parte da

sociedade.

Análise dos dados

A tabela abaixo contêm a relação de verbos encontrados em nossa pesquisa e

seus respectivos significados:

Verbo Significado

abarrotar [esp. abarrotar.] V. t. d. Encher de barrotes. Encher em demasia.

abichar [esp. Plat. abichar.] V. int. Bras. Criar bicheira (o animal).

abombar [esp. plat. abombar.] V. t. d. por imperícia. V. t. ind. Suspender. Bras. S.

e GO. Fatigar (o animal) por falta de habilidade ao fazê-lo marchar, trotar

ou correr.

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achicar [esp. achicar.] V. t. d. Bras. RS. Tornar pequeno; diminuir.

acoquinar [esp. plat. acoquinar.] V. t. d. e pron. Bras. S. Intimidar-(se); acovardar-

(se).

alambrar [esp. plat . alambrar.] V. t. d. Cercar com arame.

alumbrar [esp alumbrar.] V. t. d. e pron. Iluminar-(se); deslumbrar-(se);

maravilhar-(se); inspirar-(se).

amistar [esp. amistar.] V. t. d. e pron. Tornar-(se) amigo; conciliar-(se).

anonadar [esp. plat. anonadar.] V. t. d. Reduzir a nada; aniquilar.

apanhar [esp. apañar.] V. t. d. Colher, recolher; tomar; segurar. Roubar, furtar.

Contrair doença. Levar pancada; perder em luta.

aperar [esp. plat. aperar.] V. t. d. Bras. S. Por os aperos. Encilhar com bons

arreios. Vestir-se bem.

aplastar [esp. aplastar.] V. t. d. e pron. Fatigar-(se); cansar-(se); esfalfar-(se).

apressurar [esp. apresurar.] V. t. d . e Pron. apressar-(se).

aquerenciar [esp. amer. aquerenciar.] V. t. d. Bras. RS. Acostumar o animal a

determinado lugar que não é seu pouso habitual. V. Pron. Habituar-se

(animal ou pessoa) a certo lugar.

arranhar [esp. arañar.] V. t. d. Raspar de leve. Ferir de leve. Conhecer pouco uma

língua. Tocar mal um instrumento. Ferir alguém com as unhas.

arreglar [esp plat. arreglar.] V. t. d. Bras. RS. Ajustar, combinar, concertar. Pôr em

ordem.

arrinconar [esp. plat. arrinconar.] v. t. d. e pron. Bras. Arrincoar; pôr em lugar

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estreito e sem saída; acantoar-se.

arrocinar [esp. plat. arrocinar.] V. t. d. Bras. S. Tirar as manhas do cavalo;

preparando-o para o serviço.

assolear [esp. plat. asolearse.] V. int. e pron. Bras. S. Cansar-se o animal e, por

extensão, a pessoa, por haver andado muito ao sol.

atochar [esp. atochar.] V. t. d. e int. Fazer entrar com força; encher com excesso;

atulhar.

blasonar [esp. blasonar.] V. t d. e int. ostentar; alardear.

bojar [esp. bojar.] V.t. d. Tornar bojudo; enfunar. Int. Apresentar bojo.

bolear [esp. plat. bolear.]. V. t. d. Dar forma de bola; arredondar.

carchear [esp plat. carchear.] V. t. d. Bras. RS. Roubar; Apropriar-se

indevidamente de animais ou coisas a pretexto de guerra.

cargosear [esp. plat. Cargosea .] V. int. Bras. RS. Discutir; teimar; gabar-se.

carnear [esp. plat. carnear.] V. int. Bras. S. Abater o gado e preparar as carnes

para secar; charquear. V. t. d. Abater o boi e esquartejá-lo

cerdear [esp. plat. cerdear.] V. t. d. Bras. RS. Tosquiar.

chairar [esp. plat. chairar.] V. t. d. Bras. S. Afiar com chaira.

changar [esp. plat. changar.] V. t. d. Bras. RS Fazer changa.

charquear [esp. plat. charquear.] V. t. d. e int. Bras. Preparar a carne para o

charque.

cinchar [esp. plat. cinchar.] V. t. d. Bras. S. Prender o animal pelo laço à cincha.

courear [esp. plat. cuerear.] V. t. d. Bras. RS. Extrair couro dos animais.

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desarrolhar [esp. desarrollar.] V. t. d. Bras. RS. Espalhar o gado que se acha

arrolhado.

deslumbrar [esp. deslumbrar.] V. t. d. Ofuscar. Int. Causar deslumbramento.

desmoronar [esp. desmoronar.] V. t. d. Fazer vir abaixo; derribar, demolir. Pron. Vir

abaixo; desabar.

despojar [esp. despojar.] V. t. d. Roubar; saquear; privar da posse.

embromar [esp. plat. embromar.] V. t. d. Bras. Protelar. Bras. Calotear. Bras.

Zombar. Int. Bras. Contar falsidades; blasonar. Bras. Prometer muito e

não cumprir. Andar devagar.

empacar [esp. empacar.] V. t. d. P. us. Empacotar. Bras. Emperrar (o cavalo ou o

burro). Bras. Fam. Não continuar, não conseguir.

empalar [esp. empalar.] V. t. d. Submeter ao suplício da empalação.

empaquetar-se [esp. empaquetarse.] V. pron. Bras. RS. Vestir-se com luxo;

endomingar-se.

empardar [esp. plat. empardar.] V. t. d. Bras. S. Reunir em parelhas ou pares;

igualar; irmanar.

empilchar [esp. plat. empilchar.] V. t. d. Bras. RS. Cobrir de pilchas ou adornos.

empolhar [esp. empollar.] V. t. d. Chocar (o ovo). Fazer germinar.

empurrar [esp. empujar.] V. t. d. impelir com violência; empuxar. ; impingir.

encalhar [esp. encallar.] V. t. d e int. Fazer dar em seco a embarcação. Não ter

seguimento. Bras. Não vender, não ter saída. Bras. Pop. Ficar solteiro por

não ter achado casamento, ficar para tia.

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ençampar [esp. enzampar] V. t. d. Bras. MG e SP. Pop. Enganar; lograr; embair;

intrujar.

enfrenar [esp. enfrenar.] V. t. d. Bras. S. Enfrear.

escarchar [esp. escarchar.] V. t. d. Cobrir com escarcha. Adoçar com muito açúcar

até cristalizar. Tornar áspero.

escodar [esp. escodar.] V. t. d. lavrar e alisar com a escoda.

escorchar [esp. escorchar.] V. t. d. Tirar a casca, tirar a pele; roubar, despojar;

cobrar preço exorbitante; onerar; esfolar.

escovilhar [esp. escobillar.] V. t. d. Limpar de impurezas (ouro ou prata).

esquilar [esp. plat. esquilar.] V. t. d. Bras. RS. Tosquiar.

garrar [esp. garrar.] V. int. Soltar-se da âncora a embarcação.

gozar [esp. gozar.] V. t. d. Desfrutar; fruir. Bras. Achar graça; rir de alguém.

Bras. Chulo. Atingir o orgasmo.

granear [esp. plat. granear.] V. int. Bras. RS. Granar; criar grão o trigo.

guapear [esp. plat. guapear.] V. int. Bras. RS. Mostrar-se guapo; demonstrar

ânimo, ousadia.

lunanquear [esp. plat. lunanquear.] V. int. Bras. RS. Tornar-se lunanco. V. t. d.

Causar esse defeito.

machucar [esp. machucar.] V. t. d. Esmagar, triturar, esmigalhar. Amarrotar;

Amarfanhar; Melindrar; Ofender; Ferir.

manear [esp. plat. manear.] V. t. d. Bras. Prender com maneia ou corda.

manguear [esp. plat. manguear.] V. t. d. Bras. RS. Guiar o gado para passar um rio a

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nado. Tentar enganar com manhas e artifícios.

manotear [esp. plat. manotear.] V. t. d. e int. Bras. RS. Dar manotaços (o cavalo).

maturranguear [esp. plat. maturranguear.] V. int. Bras. RS. Fazer coisa de maturrango.

medrar [esp. medrar.] V. int. Crescer.

mermar [esp. plat. mermar.] V. t. d. e int. Bras. S e ant. Perder em valor; diminuir.

necear [esp. necear.] V. int. Dizer necedades; tolices.

palear [esp. plat. palear.] V. int. Trabalhar com pá.

patalear [esp. plat. patalear.] V. int. Bras. RS. Dar com as patas; patear; espernear.

pealar [esp. plat. pealar.] V. t. d. Bras. RS. Prender animais atirando-lhes o

pealo. Fig. Armar cilada; enganar.

pechar [esp. plat. pechar.] V. t. d. e int. Bras. S. Dar encontrão; abalroar. Pedir

dinheiro. Esbarrar; encontrar-se.

pelear [esp. plat. pelear.] V. int. Bras. SC, RS. Brigar; lutar; pelejar.

pertrechar [esp. pertrechar.] V. t. d. Prover de pertrechos; preparar aparelhos;

aperceber.

picanear [esp. plat. picanear.] V. t. d. Bras. RS. Ferir o boi com a picana; aguilhoar;

aferretear.

pinchar [esp. pinchar.] V. t. d. e int. Impelir; empurrar, derrubar; arremessar;

atirar; lançar com força; saltar; pular.

pujar [esp. pujar.] V. t. d. Superar; suplantar; subrepujar.

putear [esp. plat. putear.] V. t. d. Bras. RS. Chulo. Descompor com palavras

obcenas, em geral ofensivas à mãe da vítima.

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quinchar [esp. plat. quinchar.] V. t. d. Bras. RS. Fazer cobertura ou quincha.

rajar [esp. rayar.] V. t. d. Estriar, listrar, raiar.

rebusnar [esp. rebuznar.] V. int. Des. Zurrar.

regozijar [esp. regocijar.] V. t. d. e int. Causar regozijo a; alegrar; alegrar-se;

congratular-se.

relumbrar [esp. relumbrar.] V. int. Resplandecer; reluzir.

remanchar [esp. remanchar.] V. t. d. Fazer borda com o maço na bigorna em

fundo de panela ou semelhante.

renguear [esp. plat. renguear.] V. int. Bras. S. Tornar-se rengo ou coxo (o cavalo);

claudicar; coxear.

repechar [esp. plat. repechar.] V. t. d. e int. Bras. PR e RS. Galgar (uma ladeira, um

cerro. Elevar-se.

reslumbrar [esp. reslumbrar.] V. int. Dar passagem à luz; transparecer; transpirar;

transluzir.

resvalar [esp. resbalar.] V. t. d. e ind. Escorregar; fazer escorregar ou cair.

retouçar [esp. retozar.] V. int. Correr; fazer travessuras; traquinar. Pastar.

retovar [esp. plat. retobar.]. V. t. d. Bras. RS. Cobrir com retovo.

revisar [esp. revisar.] V. t. d. Visar novamente. Fazer inspeção ou revisão. Tip.

Ler prova tipográfica.

rumbear [esp. plat. rumbear.] V. int. Bras. S. Rumar.

sampar [esp. plat. zampar.] V. t. d. e i. Bras. S. Arremessar; atirar; aplicar.

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saludar [esp. saludar.] V. t. d. .Curar por meio de rezas. Benzer para curar.

sangrar [esp. sangrar.] V. t. d. e int. Tirar sangue; tirar líquido; esvaziar; esgotar;

extorquir; tirar à força; enfraquecer. Tip. Recolher. Bras. N.E. Entalhar

madeira para produzir ressaltos. Pop. Pedir dinheiro emprestado, sem

intenção de pagar. Aceder a pedido de dinheiro.

sofrenar [esp. plat. sofrenar.] V. t. d. Sofrear o cavalo para fazê-lo parar ou recuar.

temblar [esp. templar ‘moderar, temperar’, confundido com temblar ‘tremer’.] V.

t. d. Bras. Afinar uns instrumentos pelos outros.

tosquiar [esp. ant. tosquilar, hoje trasquilar.] V. t. d. Cortar rente pêlo, lã ou

cabelo; tonsurar.

trampear [esp. plat. trampear.]. V int. Bras. RS e ant. Trapacear; calotear.

tronchar [esp. tronchar.] V. t. d. Cortar rente; mutilar.

vislumbrar [esp. vislumbrar.] V. t. d. Alumiar frouxamente; entrever; conjeturar;

começar a surgir.

zampar [esp. zampar.] V. t. d. Comer muito com pressa e voracidade. Encher

muito o estômago.

zumbar [esp. zumbar.] V. int. Fazer grande ruído; zoar; zumbir.

Abreviaturas e siglas:

ant. = antigo

bras. = brasilerismo

esp. = espanhol

fam.= familiar

GO = Goiás

int. = intransitivo

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lus. = lusitanismo

MG = Minas Gerais

N.E. = Nordeste (Brasil)

plat. = platino

pop. = popular

PR = Paraná

pron. = pronome

prov. = provincianismo

p. us. = pouco usado

RS = Rio Grande do Sul

S. = Sul (Brasil)

SC = Santa Catarina

SP = São Paulo

t. d. = transitivo direto

t. d. e ind. = transitivo direto e indireto

t. ind. = transitivo indireto

Tip. = Tipografia

v. = verbo

Ao analisar a tabela acima é possível verificar que muitos verbos conhecidos

como: vislumbrar, tosquiar, revisar, arranhar etc., são oriundos do espanhol e

incorporados pela língua portuguesa.

Há verbos que por outro lado parecem estranhos, no entanto, isso se justifica,

porque são verbos restritos a alguns estados, se referindo a atividades particulares.

A amostra também apontou que há verbos oriundos do espanhol da América e

do espanhol da Europa. Isso acontece, porque em todas as línguas está presente essa

diferenciação diatópica, ou seja, “variantes regionais ou normas regionais”.

(CARVALHO, 1998, p.15).

Quanto ao critério fonológico de integração dessas palavras de origem espanhola

à língua portuguesa, pôde-se verificar que algumas palavras tiveram modificações

formais para serem integradas a língua portuguesa, já outras permaneceram intactas.

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Quanto aos processos dentro do critério analisado podemos destacar que:

Em geral as palavras que são escritas com “c” antes de “e” e “i” no espanhol,

quando passam para o português o “c” será substituído pelo “z” como, por exemplo:

regocijar (esp)~ regozijar (port) onde ocorreu um vozeamento/ sonorização na troca do

fonema /s/ pelo /z/, o mesmo fenômeno ocorre também com sampar (port)~ zampar

(esp).

Palavras estritas com, “ç” em português quando passam para o espanhol são

substituídas do “z” como em: retozar (esp.) ~ retouçar (port), ocorrendo justamente o

contrário do exemplo anterior um desvozeamento/surdorização na troca do fonema /z/

pelo /s/.

A palavra apañar (esp) ~ apanhar (port) não diferencia na pronúncia das

palavras no espanhol e no português, mas quanto à representação gráfica sim, em

espanhol se utiliza o “ñ” e em português o “nh”, a representação fonética é igual para

ambas às línguas /ɲ/ sendo um fonema português e espanhol, nasal palatal sonoro.

Em espanhol não temos o dígrafo “ss” então em palavras como: Asolearse (esp)

~ assolear (port), a palavra em espanhol perde um “s”, ocorrendo uma redução.

Algumas vezes o “y” espanhol corresponde o “j” no português, “y” junto a

vogais possui som semelhante “j”, podemos observar isso com a palavra rayar (esp) ~

rajar (por).

Há situações em que a pronúncia das palavras é a mesma no espanhol e no

português, no entanto a grafia se modifica como em: empollar (esp) ~ empolhar (port),

neste caso o fonema / λ / representa o ll no espanhol e lh no português, sendo oral,

lateral aproximante, sonoro e palatal.

A troca da fricativa “v” pela oclusiva “b” do espanhol para português também é

comum como podemos verificar em: retobar (esp) ~ retovar (port) e resbalar (esp) ~

resvalar (port).

Há palavras em que a pronúncia do “j” em espanhol é igual à pronúncia do / ṝ/

em português, por isso algumas palavras como: empujar (esp) ~ empurrar (port), é feita

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a troca do “j” pelo “rr”, no entanto o fonema representante é o /R/ para as duas línguas.

Observa-se que em muitos dos verbos da amostra a grafia das palavras é a

mesma no português e no espanhol, porém, mesmo assim o critério fonológico continua

agindo sobre as palavras, porque apesar de serem escritas da mesma forma, existe uma

diferenciação na pronúncia dos fonemas do português para espanhol, logo, pode ocorrer

um aportuguesamento das palavras, sem que para isso seja necessário mudanças

formais.

Assim, pode-se afirmar, em se tratando de fonologia, na passagem do espanhol

para o português, algumas palavras são grafadas igualmente e podem ter pronúncias

diferentes e ainda ser grafadas de maneira diferente e ter a mesma pronúncia.

Considerações Finais

Por meio da presente pesquisa, verificou-se, com o pequeno recorte de 100

verbos, as influências de palavras da língua espanhola no léxico da língua portuguesa.

Procurou-se explorar apenas essa classe gramatical; no entanto, é importante dizer que

não apenas verbos foram incorporados ao português, mas também substantivos e

adjetivos.

Os acréscimos à língua são motivados pelas próprias necessidades da sociedade.

Então, se o falante precisar nomear novas realidades, objetos ou situações e não

encontrar no acervo de sua língua materna um vocábulo adequado, ele com certeza

buscará nos empréstimos algo que se encaixe perfeitamente dentro desse contexto.

Através da trajetória desta pesquisa, conheceu-se sobre a história da língua

portuguesa e espanhola na Península Ibérica e também na América, entendendo-se,

dentro da perspectiva da história das línguas, as influências que espanhol exerce sobre a

língua portuguesa. Devido ao contato entre os povos, nenhuma das línguas foi

dominada pela outra, formando os adstratos.

Quanto ao processo de integração dos empréstimos linguísticos, foram

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apresentados quais são os possíveis critérios a que os termos estrangeiros devem se

submeter para serem incorporados pela língua adotante. E para a amostra desta pesquisa

o critério predominante foi o fonológico.

Com a análise dos processos fonológicos de alguns verbos, conclui-se que

podem ocorrer mudanças formais ou não na passagem do espanhol para o português e

que muitas vezes mesmo não ocorrendo mudanças formais, a pronúncia pode se

modificar de uma língua para outra.

E finalmente, pode-se compreender que estudar os adstratos espanhóis na língua

portuguesa possui um rico campo de estudo, mostrando para a sociedade o quão

fundamental são os empréstimos linguísticos para as línguas.

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Recebido Para Publicação em 28 de junho de 2015.

Aprovado Para Publicação em 10 de setembro de 2015.