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CARACTERIZAÇÃO DE ACIDENTES COM MICROTRATORES NA AGRICULTURA FAMILIAR DE SANTA CATARINA Ricardo Kozoroski Veiga (UFSC) [email protected] Leila Amaral Gontijo (UFSC) [email protected] Larissa Maas (IFC) [email protected] Fabricio Campos Masiero (IFC) [email protected] Wilian Odorizzi (IFC) [email protected] A agricultura familiar catarinense representa importante papel na economia do estado. Produtos como milho, feijão, cebola e fumo tem suas produções centralizadas nas pequenas propriedades agrícolas que empregam a mão de obra familiar. O aumento de produtividade nessas pequenas glebas só foi possível com a utilização de maquinário agrícola versátil e de baixo custo. Os microtratores e motocultivadores foram instrumentos que permitiram esse avanço e de forma indireta mantiveram o agricultor no campo, reduzindo o êxodo rural. Mas a utilização intensiva dessas máquinas sem cuidados essenciais na sua operação pode trazer reflexos negativos para a saúde desses agricultores. O crescimento da frota de máquinas e a necessidade de ampliação da produção pode explicar o aumento do número de acidentes com essas máquinas nas últimas décadas. Esse número é pouco preciso e as causas desconhecidas, uma vez que não são computados nem como acidentes de trabalho e nem como acidentes de trânsito. Essa pesquisa busca caracterizar os acidentes com motocultivadores, identificando as máquinas, o perfil do acidentado e a circunstância em que ocorreu. Para isso foi utilizada pesquisa tipo levantamento (survey) através de questionários semi-estruturados respondidos por 79 agricultores familiares. A análise estatística empregada foi a correlação entre variáveis, pelo coeficiente de Pearson, para uma significância de 0,1 %. Foram investigadas correlações entre as seguintes variáveis: faixa etária do acidentado, causa genérica e causas específicas. Constatou-se que a faixa etária mais susceptível foi dos 10 aos 20 anos (21,7%), a causa genérica foi atitude insegura (42,0%) e as causas específicas mais citadas foram falta de atenção (28,0%), perda de controle em aclive/declie (23,3%), falha mecânica (12,7%), falta de proteção (11,3%) e operação da máquina em condições extremas (10,7%) . As correlações mais XXXV ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Perspectivas Globais para a Engenharia de Produção Fortaleza, CE, Brasil, 13 a 16 de outubro de 2015.

CARACTERIZAÇÃO DE ACIDENTES COM ... - ABEPRO

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CARACTERIZAÇÃO DE ACIDENTES

COM MICROTRATORES NA

AGRICULTURA FAMILIAR DE SANTA

CATARINA

Ricardo Kozoroski Veiga (UFSC)

[email protected]

Leila Amaral Gontijo (UFSC)

[email protected]

Larissa Maas (IFC)

[email protected]

Fabricio Campos Masiero (IFC)

[email protected]

Wilian Odorizzi (IFC)

[email protected]

A agricultura familiar catarinense representa importante papel na

economia do estado. Produtos como milho, feijão, cebola e fumo tem

suas produções centralizadas nas pequenas propriedades agrícolas

que empregam a mão de obra familiar. O aumento de produtividade

nessas pequenas glebas só foi possível com a utilização de maquinário

agrícola versátil e de baixo custo. Os microtratores e motocultivadores

foram instrumentos que permitiram esse avanço e de forma indireta

mantiveram o agricultor no campo, reduzindo o êxodo rural. Mas a

utilização intensiva dessas máquinas sem cuidados essenciais na sua

operação pode trazer reflexos negativos para a saúde desses

agricultores. O crescimento da frota de máquinas e a necessidade de

ampliação da produção pode explicar o aumento do número de

acidentes com essas máquinas nas últimas décadas. Esse número é

pouco preciso e as causas desconhecidas, uma vez que não são

computados nem como acidentes de trabalho e nem como acidentes de

trânsito. Essa pesquisa busca caracterizar os acidentes com

motocultivadores, identificando as máquinas, o perfil do acidentado e

a circunstância em que ocorreu. Para isso foi utilizada pesquisa tipo

levantamento (survey) através de questionários semi-estruturados

respondidos por 79 agricultores familiares. A análise estatística

empregada foi a correlação entre variáveis, pelo coeficiente de

Pearson, para uma significância de 0,1 %. Foram investigadas

correlações entre as seguintes variáveis: faixa etária do acidentado,

causa genérica e causas específicas. Constatou-se que a faixa etária

mais susceptível foi dos 10 aos 20 anos (21,7%), a causa genérica foi

atitude insegura (42,0%) e as causas específicas mais citadas foram

falta de atenção (28,0%), perda de controle em aclive/declie (23,3%),

falha mecânica (12,7%), falta de proteção (11,3%) e operação da

máquina em condições extremas (10,7%) . As correlações mais

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significativas foram entre a idade e a atitude insegura e a idade e falta

de atenção.

Palavras-chave: Motocultivador, Segurança, Agricultura Familiar

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1. Introdução

A agricultura familiar tem grande importância econômica e social do espaço rural brasileiro.

Segundo FAO/INCRA (1994), a agricultura familiar tem como característica básica a íntima

relação entre trabalho e gestão, onde a direção do processo produtivo é conduzida pelos

proprietários, com ênfase na diversificação produtiva, na durabilidade dos recursos e na

qualidade de vida. A utilização do trabalho assalariado, quando existente, se dá em caráter

complementar.

De acordo com a MDA (2010), na agricultura familiar o trabalho é desenvolvido pelos

membros da família, que detêm a posse da terra e dos instrumentos de trabalho tendo, pelo

menos, 80% da renda familiar proveniente da atividade agropecuária.

Assim como nos demais modelos agrícolas, a agricultura familiar buscou meios para tornar-se

mais eficiente. Para isso lançou mão da mecanização agrícola e uma das máquinas que

possibilitou esse avanço foi o motocultivador, também conhecido como trator de rabiças,

microtrator ou “tobatta”. Sua versatilidade, aliada a baixos custos de aquisição e operacional,

fez desta máquina o substituto da tração animal em pequenas propriedades. Em lado oposto à

redução do esforço físico do agricultor e seus ganhos econômicos estão os riscos ergonômicos

e de acidentes que essa máquina impõe ao seu operador. Embora de tamanho reduzido, o

motocultivador é potencialmente letal em caso de acidentes, a exemplo de capotamentos.

Esta pesquisa buscou elencar as principais causas de acidentes com motocultivadores na

região do Alto Vale do Itajaí, SC, e alertar a sociedade quanto aos riscos ergonômicos

associados à sua operação.

2. Revisão bibliográfica

As políticas de incentivo do governo federal e a instalação de fábricas de tratores no Brasil,

aliada a interiorização da agricultura, impulsionou nacionalização de máquinas agrícolas a

partir de 1950 (VIRGÍLIO, 2003). A exemplo do advento dos fabricantes de tratores de

grande porte, porém explorando os microtratores, a Kubotta Tekko do Brasil foi a marca de

maior expressão no contexto da agricultura familiar brasileira difundindo seu produto, o

Tobatta, que é referência entre os motocultivadores, mesmo atualmente.

Segundo ANFAVEA (2014), a produção de motocultivadores atingiu seu pico em 1986

quando foram comercializadas mais de 7 mil unidades. A partir dos anos 90 houve uma

estabilização no crescimento das vendas de motocultivadores, ficando em torno de 1500

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unidades por ano, ao passo que as de tratores continuaram a crescer. A Figura 1 apresenta a

produção nacional tratores e motocultivadores de 1961 a 2013.

Figura 1 - Produção nacional tratores e motocultivadores entre 1961 e 2013

Fonte: Anfavea (2014)

Segundo Veiga et al. (2014a), em estados com relevo acidentado, a exemplo de Santa

Catarina, os tratores de pequena potência e motocultivadores são largamente empregados,

especialmente em propriedades de até 20 hectares. Dados da ANFAVEA (2014) apontam que

20,95 % da produção nacional foram comercializadas para Santa Catarina, o que, por esses

números leva a uma frota superior a 20 mil motocultivadores neste estado.

A maioria dos motocultivadores utilizam motores monocilíndricos refrigerados a água,

movidos a diesel e com potência inferior a 18 Cv. A cilindrada varia entre 250 e 500

centímetros cúbicos com um regime de funcionamento máximo entre 2000 e 3500 rotações

por minuto (MÁRQUEZ, 2011). São compostas por um único eixo e um par de rodas. O

operador caminha na parte traseira, direcionando-a através de comandos situados suas rabiças.

Grande parte destas máquinas no sul do Brasil é empregada no transporte de carga e pessoal,

através da adaptação de carreta que possibilita a condução na posição sentada.

Esse crescimento da frota de máquinas, nos diversos modelos de exploração econômica da

agricultura, incrementou o número e a gravidade dos acidentes no campo. Segundo Debiasi et

al. (2004), a maior parte dos acidentes com tratores é causada por atitudes inseguras, sendo

que a principal é a perda de controle em aclive ou declive, seguida da operação do trator em

condições extremas. Veiga et al.,(2014b) analisando os motocultivadores (comumente

denominados “Tobattas”), constataram que estes apresentam uma característica singular

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chamada “inversão dos comandos”, o que potencializa o risco de acidente. Na subida, ao

acionar-se a embreagem da roda esquerda o veículo direciona-se para a esquerda. Já na

descida, ao acionar-se a embreagem esquerda o veículo movimenta-se para a direita. Tal

característica se alinha com o exposto por Debiasi et al. (2004), quando declara que a

principal causa de acidente é a perda de controle em aclives ou declives.

De acordo com a Organização Internacional do Trabalho, OIT (2004), a agropecuária está

entre as três atividades com maior índice de acidentes no mundo, sendo muitos destes fatais, e

para cada três acidentes ocorridos no meio rural, um causa a incapacidade permanente do

trabalhador. Estudo realizado por Monteiro et al. (2010) concluiu que 55% dos acidentes

graves ocorridos na zona rural do oeste paulista foram com máquinas agrícolas e dentre estas

o trator foi a que causou 65% dos acidentes graves. A tomada de potência do trator foi

responsável por 37% dos acidentes e a falta de atenção durante a operação foi a causa de 50%

dos acidentes.

A operação de máquinas agrícolas, em especial o trator, exige uma carga mental elevada uma

vez que são executados diversos processos que necessitam ajustes e regulagens específicas.

Vilagra (2009) comenta que a operação de um trator agrícola consiste numa atividade

extenuante, com sobrecarga física não destituída de sobrecarga mental o que eleva esta

atividade a uma grande preocupação da ergonomia. Márquez (1990) também considera que o

esforço físico e mental leva à fadiga, que diminui a capacidade de concentração do operador,

aumentando, em consequência, a ocorrência de acidentes de trabalho.

As condições climáticas (como temperatura e precipitação pluviométrica) e ambientais (como

solo e vegetação) e suas variações repentinas adicionam fator de risco de acidentes a esta

atividade. Fatores como ruído, vibração e disposição espacial do posto de trabalho também

têm influência na operação segura da máquina. Pawar (1978) e Veiga et al. (2014a) destacam

que a excessiva vibração e nível de pressão sonora são deficiências importantes nos projetos

de motocultivadores. Singh e Kaul (1972) observaram que a vibração e ruído contribuíram

com 5 a 7 % da demanda total de energia humana para operar um motocultivador. Mitarai et

al. (2008a) analisando 76 operadores de motocultivador, onde predominavam as marcas

Kubota e Iseki, apontam que a necessidade de melhoria do design do assento foi relatada por

47,4% dos operadores entrevistados. Mitarai et al.(2008b), em estudo realizado nas Filipinas

com 124 operadores de motocultivadores em operações agrícolas na posição em pé constatou

que dentre os principais problemas mencionados pelos operadores, o excessivo ruído do

motor foi apontado por 48,4 % dos entrevistados. Bidgoli et al. (2005) destacam que

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motocultivadores, além de executarem as operações agrícolas, estão envolvidos no transporte

de carga e passageiros. Apesar de seu ruído, os efeitos adversos sobre os condutores e

transeuntes não foram investigados de forma adequada. Quanto à disposição dos comandos

no posto de trabalho (alavanca de troca de marchas, embreagem e freio), para as principais

marcas de motocultivadores, constata-se que elas excedem as distâncias ideais e máximas

orientadas por Iida (2005), Grandjean (1998) e Dul & Weerdmeester (2012), o que torna mais

difícil a condução da máquina, pois exige o deslocamento para frente e perda de apoio lombar

do operador.

Veiga et al. (2014b) avaliaram a usabilidade de um trator e um motocultivador e compararam

o índice de erros de acionamento dos comandos para o desvio de um obstáculo. A simulação

mostrou que o erro de acionamento do motocultivador foi de 49,1% enquanto que para o

trator foi de 5,7%.

Em estudo realizado na microrregião de Ituporanga, SC, Poletto (2009), verificou que as

situações de risco são ignoradas pelos trabalhadores, pois fazem parte da sua rotina de

trabalho. Em relação às doenças relacionadas ao trabalho, verificou-se que as maiores queixas

são relatos de dor na coluna lombar e cervical, ocasionadas pela postura adotada nas

atividades e pela sobrecarga física destes trabalhadores. Foram relatados acidentes, de

moderados a graves, pelos agricultores, como cortes em mãos, dedos, perna, situações estas

vistas como normais por eles, que atribuem estas ocorrências à distração, à falta de atenção

com a tarefa e à falta de equipamento de proteção individual. A pesquisadora observou em

todas as famílias estudadas que os problemas de acidentes de trabalho acontecem com

freqüência.

Os referencial teórico apresentado reforça a importância de se realizarem estudos visando a

melhoria dos projetos de motocultivadores e a necessidade de alertar a sociedade quanto aos

riscos associados à utilização desta máquina.

3. Métodos

Este trabalho caracteriza-se como uma pesquisa de natureza exploratória e descritiva

suportada por um levantamento tipo survey. A pesquisa de natureza exploratória, segundo Gil

(2002) tem o objetivo de proporcionar maior familiaridade com o problema para torná-lo mais

explícito ou a de constituir hipóteses. Já a descritiva, segundo o mesmo autor, possibilita o

estabelecimento de relações entre variáveis. Assim, o estudo permeia entre as duas naturezas,

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uma vez que se buscou conhecer o mundo do trabalho agrícola mecanizado e a posteriori

buscou-se associação e correlação entre variáveis.

Utilizou-se o levantamento (survey) para melhor conhecimento do perfil dos acidentados, das

máquinas e condições em que ocorreram esses acidentes. O questionário semi-estruturado

abordou o campo sócio-cultural e também a qualificação profissional do operador de

motocultivador.

O levantamento utilizou plano amostral probabilístico possibilitando inferência dos resultados

para a população. Dados quantitativos foram tratados por correlação linear e os qualitativos

através da análise de conteúdo.

Foram distribuídos 100 questionários à membros da agricultura familiar das regiões do Alto

Vale do Itajaí e Serra catarinenses. Os entrevistados foram informados sobre o tema, os

objetivos e os compromissos éticos da pesquisa, tendo sido assinado, por todos os que

responderam o questionário, o termo de consentimento livre e esclarecido. O índice de

rejeição foi de 21%. O retorno de 79 questionários permitiu o desenvolvimento da pesquisa.

4. Resultados e discussões

As cidades com maior expressão foram Salete, São Joaquim, Alfredo Wagner, Rio do Campo,

Ituporanga, Trombudo Central, Witmarsum, Chapadão do Lageado, Paranduva e Urupema, as

demais apresentaram apenas um ou dois relatos de acidentes. A maior parte dos municípios

pertence as regiões do Alto Vale do Itajaí e Serra catarinense. A Figura 2 apresenta o número

de casos relatados por cidade.

Figura 2 – Número de acidentes por cidade catarinense

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Nos municípios estudados, predomina a agricultura familiar, que se desenvolve em pequenas

propriedades (até 10 hectares). Os produtos mais relevantes são cebola, fumo, milho, feijão e

a horticultura. As máquinas pequenas, como os microtratores e motocultivadores são as

principais fontes de potência nessa categoria de exploração agrícola.

Causas gerais segundo os entrevistados

Para 42% dos entrevistados, o acidente relatado ocorreu por atitude insegura do trabalhador.

Neste caso, mesmo conhecendo o risco da operação, o trabalhador se expõem e ocorre o

acidente. Para 37% dos entrevistados a falha ocorreu por condição insegura, ou seja,

deficiências no ambiente ou na máquina levaram à ocorrência do acidente. Já 21% não

souberam distinguir qual foi a causa geral do acidente. O resultado é expresso na Figura 3.

Figura 3. Causas gerais de acidentes com motocultivador

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A análise isolada das causas gerais não permite concluir sobre a principal causa geradora do

acidente, pois é muito próxima a porcentagem entre atitude e condição inseguras e o índice de

pessoas que não identificaram a causa é muito expressivo. Porém se comparada às causas

específicas mais citadas, obtém-se uma maior confiabilidade deste resultado.

Correlação entre idade do acidentado e causa geral “atitude insegura”.

Para a análise das causas gerais (e també nas específicas), foram descartadas as faixas etárias

de 0 a 10 anos por considerar qua a vítima do acidente não tem clara distinção sobre os riscos

e por isso não pode ser considerada atitude insegura. Também foram excluídos, nesta análise,

questionários com dados de idade imprecisos ou não divulgados. Pode-se destacar a grande

quantidade de casos cujo acidentado tinha entre 10 e 20 anos, foram 9 casos, ou seja 28% dos

acidentes. Esse número leva a crer que muitos menores de 18 anos estão operando

motocultivadores. Também analisando outras faixas e aplicando-se análise estatística

constata-se que os jovens correm mais risco por se exporem através de atitudes inseguras

(Figura 4).

Figura 4. Acidentes por faixa etária, para atitude insegura

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Correlação entre idade do acidentado e a causa geral “condição insegura”.

Analisando ocorrência de acidentes cujo entrevistado julgou como condição insegura, não

identifica-se uma tendência quando comparada à faixa etária dos acidentdos. As faixas 20 a

30 e 30 a 40 anos destacam-se por apresentar mais da metade dos relatos. A Figura 5

apresenta a distribuição de acidentes por faixa etária. O coeficiente de correlação não

apresentou significância a 1%.

Figura 5 - Acidentes por faixa etária, para condição insegura

Causas específicas

As causas específicas mais expressivas foram: falta de atenção, perda de controle em

aclive/declive, falha mecânica, falta de proteção e utilização em condições extremas. A

Figura 6 apresenta as causas mais citadas.

Figura 6. Causas específicas mais citadas

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As duas primeiras causas estão ligadas a fatores humanos e cognitivos, assim como a carga de

trabalho. A falta de atenção (28,0%) pode estar associada ao excesso de carga mental,

conforme Marquéz (1990) ou assumida pelo entrevistado, por sentir-se culpado pelo acidente,

como explica Poletto (2009) . A perda de controle em aclive/declive (23,3%), como segunda

causa, corrobora com Veiga et al (2014b) que apresenta a peculiaridade da inversão dos

comandos aumentando a possibilidade de erro de acionamento em um motocultivador em

relação a um trator. A carcterística de relevo da região avaliada, com áreas de grande

declividade, também pode contribuir para a ocorrência do acidente. A falha mecânica (12,7%)

pode estar associada à idade das máquinas presentes na região (ano de fabricação entre 1970 e

1995), ou seja, com tempo de uso entre 20 a 45 anos. Outro fator pode ser o nível de

manutenção, principalmente a preventiva, pouco praticada pelos agricultores destas

localidades avaliadas. A falta de proteção (11,3%) pode ser evidenciada em situações de

trabalho típicas dessas regiões, onde nas operações agrícolas são raros os operadores de

máquinas que utilizam proterores auriculares, luvas ou botas. O seu uso, salvo excessão, não

evita o acidente, mas reduz a extensão das lesões. Assim, pode ser interpretado como causa da

lesão que levou ao afastamento do trabalho. A quinta colocação ficou para a utilização do

motocultivador em condições extremas (10,7%). Nessa circunstância inclui-se o excesso de

carga, de velocidade ou implementos inadequados que ocasionam o desgaste prematuro da

máquina ou dificultam a dirigibilidade do mesmo. É considerado ato inseguro ao passo que o

operador tem consciência que está atuando no limite do equipamento. As demais causas

somaram 14,0% e foram, em ordem decrescente: aproximação excessiva da máquina ligada,

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permissão de carona, engate inadequado, entrada brusca do trator em movimento, entrada

involuntária do trator em movimento e outros (2,7%).

Com base tanto nas causas gerais como específicas foram investigadas as correlações entre

estas e a idade dos acidentados. O objetivo é saber se aspectos como a experiência e o

condicionamento físico contribuem para a ocorrência de determinado tipo de acidente.

Correlações entre a idade e as causas gerais

A primeira análise foi entre a faixa etária e as causas gerais. O cálculo do coeficiente de

correlação de Pearson demonstrou uma tendência de correlação fortemente negativa entre a

faixa etária e a atitude insegura, ou seja, quanto maior a idade, menor o número de acidentes.

Essa tendência é reforçada pelo fato de que a média de idade dos agricultores familiares, para

a região estudada, é de 48,9 anos (com desvio-padrão de 14,4 anos), segundo Poletto (2009).

A faixa etária e a condição insegura apresentou correlação negativa fraca, porém para α=0,1%

não foi significante. Os valores dos coeficientes estão dispostos na Tabela 1.

Tabela 1 – Correlações entre idade e as variáveis atidude insegura e condição insegura

Correlações entre a idade e as causas específicas

Com relação as causas específicas, foram compatadas as cinco mais citadas com a faixa etária

dos acidentados. Todas apresentaram correlação moderada ou forte e foram significantes para

α=0,1%. Os valores dos coeficientes estão dispostos na Tabela 2.

Tabela 2 – Correlações entre idade e as variáveis falta de atenção, perda de controle, falha mecânica, falta de

proteção e condições extremas

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Correlação entre faixa etária e falta de atenção:

A correlação negativa forte pode ser explicada pela pouca experiência que leva o operador à

subestimar os riscos aos quais estão expostos na operação do motocultivador. A falta de

cuidados em momentos com a partida, trocas de marcha, frenagem e uso do motocultivador

como fonte de potência estacionária podem levar à acidentes de grandes proporções. O estado

de conservação da máquina, assim como as peças utilizadas em manutenções também podem

levar à erros pois alteram a condição dinâmica da máquina e muitas vezes a tornam uma

excessão, ou seja, naquela máquina o acionamento ocorre de forma diferente da maioria.

Correlação entre faixa etária e perda de controle em aclive/declive:

A correlação negativa moderada, similarmente como ocorre com a falta de atenção, pode estar

associada a pouca experiência que leva o operador à submeter a máquina à condições de

declividade potencialmente perigosa. O motocultivador não possui dispositivo que indique o

ângulo limite ao qual pode operar com segurança (inclinômetro). Também, é prática comum

na região avaliada, a aquisição de carreta tracionada que transforma o motocultivador em

máquina com tração nas quatro rodas. Esse implemento permite manobras em terrenos mais

inclinados, porém o projeto da máquina não está preparado para suportar cargas elevadas e

inclinações dessa natureza. A inversão dos comandos quando se passa de um aclive para

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declive e vice-versa constitui outro fator de risco de acidentes. Mesmo operadores com

experiência relatam serem surpreendidos pela reação da máquina nestas condições.

Correlação entre faixa etária e falha mecânica:

A correlação positiva forte pode ser justificada pelo excesso de confiança na máquina

associado à uma manutenção precária. A idade do equipamento também pode influir na falha,

que pode ser chamada de manutenção corretiva, quando o elemento mecânico só é substituído

quanto colapsa, muitas vezes, sem sinal prévio. O precário estado de conservação foi

evidenciado pelos autores, a exemplo da Figura 7.

Figura 7. Estado de conservação de motocultivador

A falta de cuidados em momentos com a partida, trocas de marcha, frenagem e uso do

motocultivador como fonte de potência estacionária podem levar à acidentes de grandes

proporções. O estado de conservação da máquina, assim como as peças utilizadas em

manutenções também podem levar à erros pois alteram a condição dinâmica da máquina e

muitas vezes a tornam uma excessão, ou seja, naquela máquina o acionamento ocorre de

forma diferente da maioria

Correlação entre faixa etária e falta de proteção:

A correlação negativa moderada indica que quanto maior a idade do operador menor foi a

ocorrência de acidentes. Talvez o uso de equipamentos de proteção individual tenha reduzido

o efeito do acidente, ou seja, a lesão à ponto desta não se caracterizar como acidente, mas sim

um quase acidente ou apenas incidente crítico. As partes do corpo lesionadas mais citadas

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foram mãos, pés, cabeça e tórax. As mãos relacionam-se às operações de partida, acoplamento

e desacoplamento de implementos, limpeza e manutenção da máquina. O uso de luvas de

couro poderia reduzir os danos em grande parte dos acidentes. Os pés estão relacionados à

subida e descida da máquina e sua operação, como demonstra a Figura 8. O uso de botas de

borracha minimiza as lesões leves, ocasionadas por objetos cortantes e o uso de botas com

biqueira de aço também previnem danos contra quedas de objetos pesados.

Figura 8: Uso do motocultivador na cultura do arroz, evidenciando a não-utilização de equipamentos de proteção

individual

Correlação entre faixa etária e condições extremas:

A correlação negativa fraca pode ser explicada pela inexperiência do operador e intenção de

aumento de produção, levando a máquina à limites críticos de velocidade, rotação, carga ou

declividade ou até mesmo associando dois fator simultaneamente. Modificações na máquina

ou na carreta não são raras, aumentando o risco de perda de controle ou capotamento do

motocultivador, a exemplo da Figura 9.

Figura 9. Carreta tracionada modificada para ampliação da capacidade de carga

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5. Conclusões

Além do trator, o motocultivador é a máquina mais presente nas propriedades rurais avaliadas.

Sua operação impõe severo risco de acidentes e as lesões provocadas em caso de acidente vão

de leve a grave, inclusive levando a óbitos.

A principal causa dos acidentes é a atitude insegura. Como causas específicas, em ordem

decrescente, estão a falta de atenção, perda de controle em aclive/declive, falha mecânica,

falta de proteção e uso da máquina em condições extremas.

O estudo demonstra a importância da conscientização dos riscos da utilização dos

motocultivadores, principalmente para os jovens, que estão sendo os mais afetados pelo uso

inadvertido desta máquina.

REFERÊNCIAS

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Anuário da Indústria Automobilística Brasileira. São Paulo, 2014. 154 p.

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Prediction Models of a Power Tiller Noise, Pulling a Trailer at Rural Asphalt Road. Journal of Science and

Technology of Agriculture and Natural Resources, 2005, Vol.8(4), p.225.

DEBIASI, H.; SCHLOSSER, J.F; WILLES, J.A. Acidentes de trabalho envolvendo conjuntos tratorizados

em propriedades rurais do Rio Grande do Sul, Brasil. Ciência Rural, v.34, n.3, Santa Maria, mai./jun. 2004.

DUL, J.; WEERDMEESTER, B. Ergonomia Prática . São Paulo: Edgard Blucher, 2012.

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