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CENTRO UNIVERSITÁRIO ADVENTISTA DE SÃO PAULO CAMPUS II TEOLOGIA LEONARDO HOLANDA E SILVA Ninrode: Uma proposta de caraterização ENGENHEIRO COELHO, SP 27 de Maio de 2015

Ninrode: Uma proposta de Caracterização

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CENTRO UNIVERSITÁRIO ADVENTISTA DE SÃO PAULO

CAMPUS II

TEOLOGIA

LEONARDO HOLANDA E SILVA

Ninrode: Uma proposta de caraterização

ENGENHEIRO COELHO, SP

27 de Maio de 2015

Resumo

O nome de Ninrode é citado em apenas 5 versículos da Bíblia (Gn. 10:8-9,11; 1

Cr. 1:10; Mq 5:6). As afirmações feitas como “E começou a ser grande na

terra”, “Poderoso caçador diante do Senhor”, e os sucessivos reinos cujo início

estão nele remetidos levantam instigações sobre mais informações sobre o

personagem. Mesmo sendo poucos versículos que a Bíblia oferece sobre

Ninrode, ainda assim surgiram então várias teorias sobre ele. O presente

estudo busca selecionar dentre essas teorias as mais plausíveis para se fazer

uma adequada caracterização deste personagem, sendo dentre elas qual suas

reais intenções com seus feitos, qual a sua possível visão de caráter e qual a

extensão de suas obras e a análise das expressões em que seu nome é

envolvido.

Palavras chave: Ninrode; Pós-dilúvio; Tabela das nações; Torre de Babel.

Breve análise de seu nome

É tido por vários comentaristas que o nome de Ninrode é uma derivação da

palavra rebelde. Unger (apud DILLMAN, 1956, p. 83) afirma que é sem dúvidas

que os israelitas enxergavam este significado. McNair (2005, p. 1517)

acrescenta também ser Ninrode um valente. De acordo com Champlin (2014,

p. 508) a ideia de seu nome significar rebelde vem da raiz egípicia mrd, que

significa rebelde. A ideia é reforçada por Tenney (2008, p. 513), que não

menciona que essa raiz venha exatamente do egípcio, mas que ainda diz ser

uma mera hipótese que seu nome tenha tal significado. Ele acrescenta também

a possibilidade de o nome ter uma origem acadiana, pois já que seu pai era

hamita ele poderia ter um nome não semita.

De acordo com o léxico de Davidson (2011, p. 514) esta raiz significa no

hebraico: rebelar, revoltar, causar sedição. O mesmo ponto de vista é obtido

através da análise do léxico de Holladay (2010, p. 303).

A derivação do nome de Ninrode vir desta raiz ou não tem tem um maior

impacto em sua análise se combinado e confirmado por suas ações e os

resultados destas. Com o objetivo de uma caracterização mais precisa essas

informações serão usadas como devem ser, meras hipóteses, mas que juntas

podem formar uma real opinião sobre o assunto.

A teoria do significado de “Poderoso”

No versículo 8 do décimo capítulo do livro de Gênesis encontra-se a afirmação:

“Cuxe gerou a Ninrode, o qual começou a ser poderoso na terra”. Segundo o

Comentário Bíblico Adventista em relação a expressão poderoso “Esta

expressão denota uma pessoa famosa por atos ousados e audaciosos.

Também pode incluir a conotação de ‘tirano’.” (NICHOLS, 2011, p. 267). Essa

posição também foi colocada por Westermann (apud SKINNER) que diz: “A

palavra [poderoso] expressa a ideia de violento, poder tirânico, como no árabe

gabbār.”1 (WESTERMANN, 1984, p. 516, tradução livre).

Em contra partida segundo Guthrie e Motyer (1970, p. 91, tradução livre) o

significado é afirmativamente “ele começou a se tornar um poderoso”2. De

acordo com Champlin (2014, p. 508) esta palavra em sua ocorrência tanto no

versículo oito, quanto no versículo nove tem somente o significado de que ele

era um caçador, matador e lutador habilidoso que ganhou fama por suas

proezas.

Segundo o Antigo Testamento Interlinear Hebraico-Português a palavra

comumente traduzida por poderoso é “ר (FRANCISCO, 2012, p. 30) ”ִגבֹּ

transliterado por Gibbōr. E de acordo com a própria fonte é dito que o

significado de ר é valente (FRANCISCO, 2012, p. 30), mas vale notar que ִגבֹּ

este título também foi dado aos Nefilins antediluvianos, pessoas que até onde

se sabem foram tão perversas que Deus buscou eliminá-los da face da terra.

De acordo com o Léxico Analítico de Hebraico e Aramaico de Davidson (2011,

p. 30) a palavra ר é um adjetivo masculino singular que tem por sua raiz o ִגבֹּ

significado de forte, poderoso, valente. Sendo que a palavra raiz (גבר) em

alguns casos também pode ser usada na conotação de ser mais forte do que

alguém ou algo e de prevalecer contra. Embora esse uso somente seja

traduzido em casos em que ele é utilizado com outras palavras específicas ( ,מן

ר Segundo o léxico de Holladay (2010, p. 73, 74.) a palavra .(על significa viril ִגבֹּ

ou vigoroso e em relação a Ninrode significaria que ele era um déspota. Ao

analizar a palavra raiz (גבר) o autor diz que é um verbo que pode significar

sobrepujar, mostrar-se ou se fazer superior e elevar. Segundo Levin (2002, p.

351, tradução livre): “O substantivo ור poderia significar qualquer coisa de ִגבֹּ

"gigante" para "herói" para "homem poderoso" para "campeão" para "homem

de poder" para "potencializar", cada tradução chamando por seu próprio

conjunto de associações.”3

Quando se parte da análise de dicionários segundo Dinoto (1962, p. 65) esta

palavra pode significar também um cavalheiro, senhor respeitável, orgulhoso,

valente, robusto e forte. Já no dicionário de Berezzin (1995, p. 65) todas as

variantes da raiz tendem a ir para o lado de uma ideia crescente de poder,

tendo também uma tendência ao heroismo. Feyerabend (1961, p. 53) traz

significados as variações dessa raiz como a atitude de se tornar forte tanto

como de ela significar um guerreiro. Schuwantes (1983, p. 21) traz a raiz como

1 “The word express the idea of violent, tyrannical power, like the arab. gabbār”.

2 “He began to be a might one”.

3 “The noun ור could mean anything from "giant" to "hero" to "mighty man" to ִגבֹּ

"champion" to "man of power" to "potentate", each translation calling forth its own set of

associations.”

podendo significar ser forte, haver-se com soberba, ou então significar o

substantivo homem. Kilpp (et al, 1987, p. 36) traz não somente o significado

costumeiro de valente e guerreiro, mas também o significado de despota,

violento e influente. Schökel (1997, p. 127) traz os mesmos significados

costumeiros acrescidos de algumas especificações como arqueiro, campeão

ou capitão.

Há em vista das duas possibilidades pode-se ter então que ou ele foi uma

pessoa de cunho heroico, ou foi uma pessoa de cunho tirânico. Trazendo aqui

uma bifurcação que contribui para a caracterização.

A análise da expressão “Caçador”

No versículo nove do décimo capítulo de Gênesis temos a afirmação de que

Ninrode é um poderoso caçador. Segundo Matthew Poole (1974, p. 27) essa

expressão caçador não se referia somente a caçador de animais, Ninrode

também caçava homens. Segundo ele inicialmente Ninrode ganhou fama por

matar feras que ameaçavam a população de onde moravam e com esse

crescente respeito começou a angariar companhia dos mais jovens e fortes

homens para que pela sua ajuda ele estabelecesse uma tirania com poderes

absolutos sobre os homens. Ainda segundo Poole a intenção de Ninrode foi

essa desde o começo, e através do seu exército e poder “caçava” aqueles que

eram contra seu domínio. Tal ideia é parcialmente apoiada por Livingstone

(1969, p. 66) em que ele diz que “O rótulo de caçador parece fazer referência a

tendência de Ninrode de vitimizar pessoas e de explorar seus recursos

naturais.”4 (1969, p. 64, tradução livre). Ainda na mesma página ele faz

referência que o título caçador faz contraste com a palavra semítica “Pastor”

que designava um governador mantêm em seu coração a preocupação do bem

estar do seu povo. Pensamento que entra em acordo com o pensamento de

Champlin (2014, p. 508) que diz que esse título é dado em contraste com a

visão de um rei pastor que é apresentada em outros locais da Bíblia (ver 2 Sm

5:2; 7:7; Ap 2:27; 19:15). Segundo este autor esse contraste é dado, pois um

caçador se satisfaz às custas de suas vítimas, ao contrário do pastor que

demonstra cuidado e carinho com seus animais. Segundo Clive e Graham

(2012, p. 38) os reis mais antigos da Mesopotâmia eram considerados reis

pastores.

Matthew Henry (2010, pgs. 68,69) faz algumas afirmações muito interessantes

sobre a profissão de Ninrode e suas intenções:

“Ele estava decidido a se sobressair acima de seus vizinhos,

não só para ser importante entre eles, mas para dominá-los. O

mesmo espírito que agiu nos gigantes antes do dilúvio [...].

4 “The label Hunter (9) seems to refer to Nimrod’s tendency to victimize people and to

exploit natural resources.”

Alguns pensam que ele fez o bem com sua caçada, servindo

ao seu país livrando-se dos animais selvagens que o

infestavam, e assim conseguindo a afeição dos seus vizinhos,

e conseguiu ser o príncipe deles. [...] Outros acham que sob o

pretexto de caçar, ele reunia os homens sob seu comando,

procurando um outro jogo que ele tinha que jogar, que era

fazer-se senhor do país e trazê-los à sujeição. Ele era um

caçador poderoso, isto é, ele era um invasor violento dos

direitos e propriedades de seus vizinhos, e um perseguidor de

homens inocentes, carregando tudo que estivesse diante de si,

e tentando se apropriar de tudo pela força e pela violência.”

Embora muito dramatizada esta visão ainda serve para provar que não estão

sozinhos os que acham que Ninrode era mal intencionado, e de que ele além

de ser um tirano se apropriava dos recursos de outrem.

Ao olhar novamente o texto em hebraico é notado que a expressão poderoso

caçador que se encontra no versículo 9 tem em seu original escrito como “ ַצִיד

ר O significado segundo o próprio autor diz que .(FRANCISCO, 2012, p. 30) ”ִגבֹּ

esta expressão significa um “valente de caçada”. Novamente foi utilizado o

adjetivo ר denotando assim um forte indício de conexão com a definição de ,ִגבֹּ

poderoso vista anteriormente. Já segundo o léxico de Davidson (2011, p. 641,

644) a palavra ַצִיד se define por um substantivo masculino singular que deriva

da palavra raiz צוד, que significa entre várias coisas: caçador ou como uma

metáfora para caçar ou perseguir homens. A definição dada por Holladay

(2010, p. 432, 434) é primariamente caçador, porém a raiz (צוד) também pode

significar caçar ou emboscar homens. Segundo Dinoto (1972, p. 363), esta raiz

realmente significa caça, caçada ou até mesmo provisão. Já em Berezzin

(1995, p. 552) a palavra parece não ter de acordo com ele mais o significado

de um caçador, mas sim de caça, ou alimento. Feyerabend (1961, p. 285) inclui

para esta palavra a possibilidade de significar também perseguição.

Schuwantes (1983, p. 110) traz os significados para essa palavra como sendo

ou de caça ou de caçador. Kilpp (et al, 1987, p. 205) não traz nenhum

significado além do costumeiro como caçador. Schökel (1997, p. 560) traz a

ideia de um caçador intrépido, mas além dessa não traz nenhuma outra

definição fora do comum.

A teoria da expressão “Perante o Senhor”.

Segundo o Comentário Bíblico Adventista, a LXX traz este termo como “contra

o Senhor”. E logo após afirma que os atos de Ninrode eram um desafio a Deus

(NICHOLS, 2011, p. 267). Visão considerada plausível segundo Westermann

(1984, p. 516) que afirma que a colocação de palavras pode tanto demonstrar o

favor de Deus como um desafio para com Deus. A expressão que se encontra

no original hebraico (FRANCISCO, 2012, p. 30) ִלְפֵני que segundo a definição

do próprio tradutor tem o significado de ser perante o SENHOR mesmo. Porém

de acordo com o léxico analítico de Davidson (2011, p. 399, 446, 627) a

expressão significa uma junção da preposição ל (que significa para, até, em

direção de) com o adjetivo masculino plural que vem da palavra raiz (פנה) que

significa entre muitas coisas: anterior, frente, em frente. Porém também ocorre

ela significar: ser contra alguém ou algo. Embora seja um caso bem específico.

Já a visão da palavra raiz (פנה) segundo Holladay (2010, p. 416) lampeja

algumas possibilidades que apoiam a teoria apresentada por Nichols, sendo os

possíveis significados como: voltar as costas, virar-se, tomar uma direção.

Segundo Dinoto (1962, p. 343) há alguma pequena possibilidade no sentido de

que na raiz desta palavra haja o significado tanto de avistar como o de dar as

costas, porém essa é uma construção diferente do que aparentemente é a

visível no texto. Berezzin (1995, p. 531) traz que a palavra encontrada no texto

significa cara ou rosto, mas também pode significar ira. Feyerabend (1961, p.

271) traz, além dos significados vistos anteriormente como o de face e de se

virar as costas, o significado de fugir. Schuwantes (1983, p. 104) traz também

os significados de se afastar. Kilpp (et al, 1987, p. 195) traz tantos os

significados de virar as costas e ir embora, quanto o de rosto e feição. Schökel

(1997, p. 537-541) traz as mesmas definições já vistas anteriormente.

Ao encerrar a análise dessa última expressão vê-se que não houve uma

grande definição, já que foram abertas várias bifurcações. Porém com o

objetivo de conseguir estabelecer uma caracterização mais precisa, serão

analisados todos os fatos que podem ser ligados a esta personagem.

A torre de Babel

Unger (1956, p. 83) afirma que Ninrode seria o primeiro imperador encontrado

na história, e também o caracteriza como um vilão. Como visto em Gênesis

capítulo 10 versículo 10 é visível que ele foi responsável pelo início do reino de

Babel. Segundo alguns comentaristas, principalmente Henry (2010, p. 69) a

figura de Ninrode está intrinsicamente ligada à construção da torre de Babel,

visto que pelo episódio encontrado no capítulo 11 do livro de Gênesis (v. 9) por

causa da torre o local tomou o nome de Babel e no capítulo 10 (v. 10) diz que o

início do reino de Ninrode foi Babel. A ideia de que ele foi o principal construtor

vem desta relação. Sendo este local a origem do reino de Babilônia

(CHAMPLIN, 2013, p. 508).

Segundo House (apud MANN, 2009, p. 88) a Torre de Babel foi feita “com o

objetivo expresso de honrar a si mesmos e furtar ao mandamento divino de

encher e dominar a terra.”. Schultz (1995, p. 16) enxerga do mesmo modo,

para ele a Torre de Babel é “um desafio à ordem divina de ser populada a

terra”. Pode se então com base nessas opiniões, fazer uma ligação com a ideia

de que Ninrode estava em oposição a Deus e Sua lei em semelhante relato.

Sem as provas anteriores poderia se tomar então que tal atitude fosse somente

um descuido, porém, visto as análises anteriores esta se constitui em mais uma

prova de que Ninrode não somente tratava Deus com indiferença, mas

também, O desafiava. Segundo Unger (1956, p. 100-101) a torre de Babel era

um desafio direto a Deus, e pelo espírito de vanglória e rebeldia que seus

construtores possuíam trouxe a eles as bases da idolatria.

Há ainda uma hipótese segundo Guthrie e Motyer (1970, p. 91) que diz que a

Torre poderia ser um forte ou até mesmo uma torre-templo chamada de

ziggurat. A maioria dos autores como Livingston (1969, p. 66) diz que embora

não seja possível afirmar que a torre seria uma ziggurat, não se pode negar

certa cota de paganismo. Ainda nesse quesito Comentário Bíblico Adventista

ainda apoia que exista a possibilidade de que a torre fosse um templo que era

dedicado para a idolatria e ainda no mesmo relato diz que precisamente a ideia

de uma torre que fosse até os céus era um quesito de proteção contra o que

Deus pudesse fazer contra eles (NICHOLS, 2011, p. 278). A referência nesse

caso de uma rebelião aberta a Deus está feita. Talvez esta seja então a última

prova que marque o caráter e intenções do personagem Ninrode. Sendo

Ninrode neto de Cão (Gn. 10:6-8), que participou do dilúvio, temos aqui uma

evidência de que ele não só se rebelou contra Deus assim como

provavelmente esteve ligado com a criação ou desenvolvimento das primeiras

religiões pagãs, visto que segundo Harrison (2005, p. 39) uma zigurat era um

templo dedicado a divindades cujo formato se assemelhava a um pequeno

monte. Segundo Clive e Graham (2012, p. 34) as zigurates eram templos em

formas de montanhas com um topo no qual habitava a principal divindade, ou o

único deus superior.

Segundo Keiter (apud ELIEZER, 2013, p. 202) o desafio contra Deus era tão

grande e a determinação das pessoas envolvidas tão fortes que se uma

pessoa caísse da construção e morresse ela não seria notada, porém se o

mesmo acontecesse com um tijolo as pessoas chorariam. Estaria então aberta

uma possibilidade de que o culto pagão se tivesse iniciado em Babel, vendo

que todas as características apontam para Ninrode como sendo uma

personagem portador de grande rebelião contra Deus e o iniciador do primeiro

templo de adoração a outros deuses.

Análise segundo a arqueologia ligado os reinos e cidades de Ninrode

O relato de Gênesis também apresenta uma série de locais que teriam sido

fundados por Ninrode. O primeiro deles é o reino da Babilônia. Segundo Saggs

(1965, p. 182) o sistema religioso da Babilônia era composto de milhares de

deuses que faziam cada um a sua parte para garantir o funcionamento do

universo e de seus vários compartimentos. Cada cidadão escolhia

aproximadamente somente de 5 a 6 deuses para adorar pessoalmente e assim

procurar ajuda para sua vida diária, protege-lo de ataques de demônios, de

feitiçaria, da injustiça das mãos de seus companheiros ou para avisá-lo de

algum perigo iminente.

Ainda segundo Saggs (1965, p. 182, tradução livre):

Havia uma grande dose de superstição na vida dos povos

antigos da Babilônia, e na verdade ainda há na vida das

pessoas modernas. No entanto, uma diferença notável entre a

superstição no mundo antigo e em nossos tempos é que agora

ela é condenada pela religião oficial. No mundo antigo a

superstição longe de ser condenado pela religião oficial, era

uma parte da própria religião.5

Os demônios tinham parte proeminente na superstição. Seus lugares de

espreita favoritos eram cemitérios e construções em ruínas. Eram comumente

ligados a doenças e a mortalidade infantil. Demônios poderiam também tomar

todo tipo de forma. Mas além dos demônios também haviam pessoas que

gostavam de trazer mal as pessoas, estes eram chamados de bruxas ou

bruxos, que poderiam infligir doenças ou má sorte por meio de feitiços. Mas

todos esses poderes malignos, tanto de demônios quanto de bruxos ou bruxas

poderia ser sobrepujado por meios mágicos e haviam uma grande classe de

sacerdotes/magos que estavam sempre prontos (por certo preço) para prover

esta assistência. Havia também certa crença de que existiam fantasmas que

poderiam ser bons ou ruins, normalmente isso dependia do modo que foram

conduzidas suas ofertas no funeral, trazendo assim uma certa empatia da parte

das autoridades do Submundo e poderiam então ser invocados. Provando

haver uma ideia de alma imortal separada do corpo (SAGGS, 1965, p. 182-

188).

Segundo Crouzet (1993, p. 228-230) os mortos recebiam um cuidado todo

especial em seu funeral, era deixado também uma provisão de comida, que se

ignorada poderia levar o morto a virar um espírito errante que trazia desgraça

para as pessoas. O autor cita também que era notável uma crença de vida

após a morte, porém diferente dos padrões bíblicos a morte era causada sem

nenhum motivo justo, mas somente como um destino cruel que as divindades

ligaram à humanidade quando esta foi por eles criada. Ao falar sobre as

tumbas encontradas em Uruk do período aproximado de 3000 a.C o autor cita:

Todos os cadáveres, efetivamente, estão sepultados com um

mobiliário terrestre, desde a grosseira cerâmica para os mais

pobres, colocados diretamente na terra, sem ataúde, até os

objetos preciosos para os grandes do mundo, que repousam

em sepulturas de tijolos cuidadosamente construídas. Lá estão

os carros, bem como armas de luxo, punhais e elmos de ouro

5 “There was a great deal of superstition in the life of the ancient people of Babylonia, as indeed there

still is in the life of modern people. However, one notable difference between supertition in the ancient

world and in our own times is that now it is condemned by official religion. In the ancient world

superstition far from being condemned by official religion, was a part of religion itself.”

maciço, cintos de prata, baixela trabalhada pela ourivesaria,

ornamentos, objetos de toilette, jóias e até mesmo

instrumentos musicais. Mas ainda, os cadáveres de animais,

de guardas, de serviçais de ambos os sexos continuam a

constituir, após a morte, como já o tinham feito em vida, o

cortejo necessário ao esplendor do senhor desaparecido,

destinado, evidentemente, a prosseguir, num mundo do além,

para cujo conhecimento não nos legaram indicações, uma

existência ilimitada.

Segundo Clive e Graham (2012, p. 34) os reis no Oriente próximo (o que vale

também para a região de Uruk, Babilônia e os outros locais que são

mencionados neste estudo) eram considerados como mediadores entre os

humanos e os deuses, sendo que o rei poderia ser visto também como um

deus, porém era mais frequente que ele servisse somente como um sacerdote.

Sendo sempre participante das atividades religiosas. Na região da

mesopotâmia segundo Crouzet (1993, p. 231) o medo fazia parte da devoção,

o fiel não pensa em queixar-se, no máximo chega a mostrar surpresa em frente

a algum revés que acaba por sofrer. Não ter medo seria um sinônimo de

pecado. Levando isto em conta não é de surpreender que também houvesse

extrema reverência e submissão aos que estavam no poder por serem eles

uma espécie de ponte de conexão para os deuses, quando não eram

considerados deuses. Tal pensamento daria ainda mais poder e reverência aos

tiranos ou monarcas locais, evitando assim revoltas sociais e apoio total em

qualquer tipo de regime de impostos ou mesmo em conflitos desnecessários.

Segundo Nichols (2011, p. 267) a cidade citada como Ereque se refere a

cidade babilônica de Uruk, sendo ela uma das cidades mais antigas ainda em

existência. Nesta cidade de acordo com as lendas babilônicas foi o local onde

ocorreram os poderosos feitos de Gilgamés, que era uma espécie de divindade

que se assemelha ao personagem de Ninrode. Os sítios arqueológicos que

compreendem a cidade Uruk datam de um período muito importante do início

dos povos da mesopotâmia e têm uma data aproximada de 3500-3000 a.C. A

ocupação desse local foi feita pelos sumérios e fazem referência a um sistema

monárquico (SCHUWANTES, 1965, p. 20). A cidade de Uruk era então uma

cidade estado (CLIVE; GRAHAM, 2012, p. 30) que tinha um sistema teocrático,

em que cujo período ápice, reconhecido como idade do bronze (CLIVE;

GRAHAM, 2012, p. 31), a escrita sumério e cuneiforme foi criada

(SCHUWANTES, 1965, p. 21-22).

Conclusão

A figura de Ninrode é então vista através deste estudo mais aprofundado como

tendo um nome ligado a palavra rebelião. Seus feitos mostram extrema atitude

violenta, sendo um dos primeiros tiranos que o mundo já conheceu. Pode se

ver também que foi o criador do primeiro templo pagão do mundo e talvez

tenha lançado ele mesmo sua imagem para ser adorada. De certa forma a

Bíblia faz poucos relatos sobre ele, mas seu legado mostra que realmente suas

intenções eram completamente danosas e podendo até mesmo nos trazer

consequências graves nos dias de hoje.

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