Ana Flávia Rodrigues Fernandes
DA PROTEÇÃO DOS EMBRIÕES EXCEDENTÁRIOS E O PRINCÍPIO
DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA
Centro Universitário Unitoledo
Araçatuba – SP
2018
Ana Flávia Rodrigues Fernandes
DA PROTEÇÃO DOS EMBRIÕES EXCEDENTÁRIOS E O PRINCÍPIO
DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Centro
Universitário Toledo de Araçatuba como requisito parcial para
obtenção do grau de Bacharel em Direito, orientado pela Prof.ª
Flávia Ferreira Lombardi.
Centro Universitário Unitoledo
Araçatuba – SP
2018
BANCA EXAMINADORA
Flávia Ferreira Lombardi
Jefferson Jorge da Silva
Leiliane Rodrigues da Silva Emoteo
Araçatuba, 20 de Junho de 2018.
É com muita honra e carinho que dedico este
trabalho primeiramente a Deus, a minha
família, meu pai amado, minha mãe, minha
riqueza e inspiração, e os meus irmãos, que
tanto amo, e em especial, minha verdadeira
razão de viver, meu verdadeiro motivo de
sorrir, levantar e persistir e jamais desistir,
minha amada filha Olívia.
À minha professora e orientadora Flávia
Ferreira Lombardi, pela dedicação, paciência,
carinho e pelo conhecimento que levarei
sempre comigo. Agradeço Imensamente o
Centro Universitário Unitoledo e seus ilustres
professores, mestres estes que me auxiliaram e
me proporcionaram anos inesquecíveis e
maravilhosos!
“Sem sonhos, a vida não tem brilho. Sem
metas, os sonhos não têm alicerces. Sem
prioridades, os sonhos não se tornam reais.
Sonhe, trace metas, estabeleça prioridades e
corra riscos para executar seus sonhos.
Melhor é errar por tentar do que errar por se
omitir!”
Augusto Cury.
RESUMO
O maior bem protegido pelo nosso ordenamento jurídico é a vida. Desse modo, diversas
teorias buscam apontar quando a mesma se inicia, para saber-se de fato a partir de quando
começa sua proteção. A evolução científica nos traz novidades constantemente. A fertilização
in vitro é uma delas, que, ao tomar grandes proporções sociais, merece um olhar atento quanto
algumas questões e, o número de embriões congelados é uma delas. Assim, o estudo tem por
objetivo demonstrar a proteção do embrião com base nos princípios constitucionais
fundamentais: direito a vida e a dignidade da pessoa humana. A metodologia aplicada foi de
revisão bibliográfica utilizando materiais eletrônicos, livros, artigos científicos e trabalhos
acadêmicos.
Palavras-chave: Embrião, Dignidade Humana, Direito à Vida.
ABSTRACT
The greatest asset protected by our legal system is life. In this way, several theories seek to
point out when it begins, to know itself from when it begins its protection. Scientific evolution
brings us news constantly. In vitro fertilization is one of them, which, when taking great social
proportions, deserves a close look at some issues and the number of frozen embryos is one of
them. Thus, the study aims to demonstrate the protection of the embryo based on the
fundamental constitutional principles: right to life and dignity of the human person. The
applied methodology was of bibliographical revision using electronic materials, books,
scientific articles and academic works.
Key words: Embryo, Human Dignity, Right to Life
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 9
I – BIOÉTICA E DIREITO ................................................................................................... 10
1.1 - Da Ética à Bioética: Início e Conceito de Bioética ................................................... 10
1.1.2 O Início e o Conceito de Bioética ..................................................................... 12
1.2 - Princípios Bioéticos: Autonomia, Beneficência, Não-Maleficência e Justiça e
Equidade ............................................................................................................................ 14
1.3 - Princípio da Autonomia ............................................................................................ 14
1.4 - Princípio da Beneficência ......................................................................................... 15
1.5 - Princípio da Não-Maleficência ................................................................................. 15
1.6 - Princípio da Justiça e Equidade: ............................................................................... 16
1.7 Noções de Direito: Conceito, Fundamentos e Princípios do Direito........................... 16
1.8 A Vinculação do Direito com a Bioética: O Papel da Bioética junto á Esfera Jurídica18
II - A APLICABILIDADE DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS AOS
EMBRIÕES LABORATORIAIS: DIREITO A VIDA E O PRINCÍPIO DA
DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA ................................................................................ 20
2.1- Direito à Vida............................................................................................................ 20
2.1.2- Evolução Histórica da Noção da Dignidade da Pessoa Humana ..................... 22
2.1.3- Conceito e Abrangência do Principio da Dignidade da Pessoa Humana ......... 23
2.1.4- Liberdade científica versus dignidade da pessoa humana ............................... 25
III - DA PROTEÇÃO DOS EMBRIÕES EXCEDENTÁRIOS ......................................... 27
3.1 – A proteção jurídica da vida humana no direito brasileiro ........................................ 27
3.1.1 - Teorias acerca do início da vida ...................................................................... 27
3.1.2 -Teoria Natalista ................................................................................................ 28
3.1.3 - Teoria da Nidação ........................................................................................... 28
3.1.4 - Teoria Gradualista ou Desenvolvimentista ..................................................... 29
3.1.5 - Teoria das Primeiras Atividades Cerebrais ..................................................... 29
3.1.6 - Teoria Concepcionista..................................................................................... 30
3.2 – Direitos do Embrião ................................................................................................. 32
3.2.1 - Conceituação de Embrião ............................................................................... 33
3.2.2 - Proteção Jurídica dos Embriões ...................................................................... 33
3.3 - O EMBRIÃO EXCEDENTÁRIO............................................................................. 35
3.3.1 - Embrião excedentário ..................................................................................... 35
3.3.2- Embriões Excedentários: Objeto ou Sujeito de Direitos? ................................ 35
3.3.3- Destinação dos embriões excedentários (Descarte, Doação, Utilização em
Pesquisa Científica) .................................................................................................... 37
CONCLUSÃO ......................................................................................................................... 53
REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 55
9
INTRODUÇÃO
No Brasil há milhões de embriões crioconservados. Embriões que se excederam do
processo de fertilização e por serem viáveis foram congelados para posterior utilização. Tal
realidade aponta uma preocupação: esses seres em potencial que denotam o início da vida
humana possuem proteção legal? São tidos como objeto ou sujeitos de direito? Ainda, quais
medidas são tomadas quando esses embriões não serão mais utilizados pelos progenitores?
Essa utilização respeita princípios constitucionais?
Diante desse cenário fez-se necessária a escolha do tema, de modo a buscar
compreender qual status jurídico do embrião perante o direito, para que apenas assim
possamos compreender qual proteção está a ele conferida. Justifica-se a escolha do tema pela
relevância social do mesmo, em pese que o início da vida é o maior bem tutelado dentro do
nosso ordenamento jurídico e a permissão da instrumentalização do embrião fere princípios
constitucionais.
O estudo demonstrou a correlação da bioética e o direito, apontou os princípios
constitucionais aplicados aos embriões laboratoriais, que são o direito à vida e a dignidade da
pessoa humana, entrou no campo da liberdade científica, teorias quanto o início da vida e
ingressou na problemática dos embriões excedentes, conceituando-os, apontando seus
fundamentos jurídicos protetivos, demonstrando a destinação desses embriões excedentários e
qual conclusão o presente trabalho chegou.
A metodologia utilizada para a construção do estudo foi de revisão bibliográfica no
qual foram utilizados livros, artigos científicos, trabalhos acadêmicos e pesquisas em sítios
eletrônicos.
10
I – BIOÉTICA E DIREITO
1.1 - Da Ética à Bioética: Início e Conceito de Bioética
Ao se falar em Bioética, automaticamente já relacionamos á ética, na sua mais pura
essência e, por conseguinte, interligamos a ética com a moral e com o direito. Para um
entendimento mais amplo e específico, faz-se necessária saber a diferença existente entre
esses três campos de conhecimentos que enquanto eles se distinguem, ao mesmo tempo
possuem grandes vínculos e ate mesmo sobreposições.
É na balança ética que se devem avaliar as diferenças de maneiras, hábitos, para
medir o direcionamento, a utilidade, a finalidade, e as consequências das ações
humanas (BITTAR, 2002, p. 3).
A bioética, como o próprio nome já diz, é a ética que se busca para as ciências
biomédicas. Foi à tomada de consciência da sociedade de forma geral, quanto à
necessidade de atualização da ética em relação à vida humana, quando a opinião
pública mundial teve conhecimento das intervenções desumanas realizadas por
médicos e pesquisadores, á época do regime nazista. As práticas abusivas praticadas
pelos médicos nazistas em nome da ciência, fez com que o mundo ocidental
formulasse um código para limitar esses tipos de abusos, baseado na ideia de que a
ciência não é mais importante do que o homem, e de que o progresso deve ser
controlado, respeitando a consciência da humanidade, e impedindo dessa forma, que
novas descobertas ficassem sujeitas a todo e qualquer tipo de interesse. (AFFONSO,
2014, pág. 01).
O nascimento de origem do termo ética, conforme doutrina Nalini (2008, p. 114), é o
vocábulo grego “ethos”, no qual significa “morada”, “lugar onde se habita”. Da mesma forma
pode ser interpretado como “modo de ser” ou “caráter”.
Nesse sentido, a ética carrega na sua natureza um conjunto de valores que guiam o
comportamento do homem em relação aos outros em busca da pacificação social.
De acordo com ensinamento de Korte (apud Bittar, idem, p. 10) a ética:
é um campo de conhecimento em que, à medida que avançamos, são feitas
descrições, constatações, hipóteses, indagações e comprovações [...] estudando as
relações entre o indivíduo e o contexto em que está situado. Ou seja, entre o que é
individualizado e o mundo a sua volta.
11
Entende-se então por ética, sendo uma esfera filosófica responsável pela busca de
princípios que norteiam o comportamento humano, referentes a normas, valores e prescrições
existentes em qualquer realidade social.
Em relação á moral, Bittar e Almeida (2010, p. 542) nos informa que a moral se:
“constitui por um processo acumulativo de experiências individuais, que vão ganhando
assentimento geral, até se tornarem regras e normas abstratas”.
Firma, ainda Bittar, que: “a moral é o conteúdo da especulação ética, pois se
trata do conjunto de hábitos e prescrições de uma sociedade; é a partir de experiências
conjunturais e contextuais que surgem os preceitos e máximas morais” (BITTAR, 2002,
p.10).
Assim sendo, a moral fica entendida por ser um conjunto de regras que são adquiridas
através de uma tradição, cultura, educação, pensamentos e filosofias que advêm do
comportamento humano.
Ou seja, o instrumento da ética é a moral, e se por um lado, a moral se mostra como
uma união de hábitos provenientes das práticas que, pela sua permanência, tornam-se normas;
por outro, a ética se define como a ciência que estuda o conteúdo das normas morais, ou seja,
o proceder moral dos homens em sociedade, como fez Kant (apud Nalini, 2008, p. 112), ao
fixar que: “a moral designa o conjunto dos princípios gerais, e a ética, sua aplicação
concreta”.
Nesse sentido, Bittar e Almeida (2010, p. 544) elencam que: “todo conteúdo de
normas morais tem em vista sempre o que a experiência registrou como bom e como mau,
como o que é capaz de gerar felicidade e infelicidade, como sendo o fim e a meta da ação
humana, como a virtude e o vício”.
Já em relação ao direito, cabe a existência de uma grande semelhança perante a moral,
pois, ambas são regimentadas pelo comportamento humano, possuindo a mesma fonte - as
relações sociais.
Entretanto, pode-se afirmar que possuem diferenças significativas, assim como afirma
o pensamento do jus filósofo Miguel Reale (2002, p. 41), ao se deparar com a diferença entre
Moral e Direito, dispondo que:
Encontramo-nos, agora, diante de um dos problemas mais difíceis e também dos
mais belos da Filosofia Jurídica, o da diferença entre a Moral e o Direito (...). Nesta
matéria, devemos lembrar-nos de que a verdade, muitas vezes, consiste em
12
distinguir as coisas, sem separá-las (...). Muitas são as teorias sobre as relações entre
o Direito e a Moral, mas é possível limitar-nos a alguns pontos de referência
essenciais, inclusive pelo papel que desempenharam no processo histórico.
O Direito caracteriza-se pela coercibilidade e imperatividade das normas, já a moral
pela liberdade de “escolha”.
Em aspectos gerais, a ética no Direito busca espelhar a relação entre: justiça e virtude,
justiça e igualdade, justiça e vontade, justiça real e equidade e a justiça e o justo. Explicando
não apenas os questionamentos sobre a eficácia dos princípios, como também sua estrutura
normativa.
Após essa pequena abordagem fundamental ao nosso entendimento sobre essas três
áreas de conhecimento, entra agora em questão a Bioética.
Se buscarmos a definição de origem em ralação a Bioética teremos como resultado
algo como “hábitos ou costumes da vida”, já que bio tem significado de vida, e ética, derivada
da palavra ethos em grego, significa costume, hábito.
Através do reconhecimento de deveres e obrigações em relação a todos os seres vivos,
e não apenas aos seres humanos, este termo “bioética” foi utilizado pela primeira vez num
artigo alemão chamado Kosmos pelo Fritz Jahr, em 1927, onde ele devidamente á qualifica
assim, onde posteriormente, no ano de 1970, Van Ressealer Potter, a caracterizou como a
“ciência da sobrevivência”. (Jahr, Kosmos 1927;24:2-4.)
Pode-se afirmar que o surgimento da Bioética trilhou o caminho pelas discussões da
medicina, ao longo do crescimento das aplicações da biologia, bioquímica e da própria
medicina.
1.1.2 O Início e o Conceito de Bioética
De acordo com a sociedade contemporânea em que nos encontramos, devido ao
grande e rápido desenvolvimento científico e tecnológico, surge uma amplitude de atos,
pensamentos e sobreposições nos quais se aumenta cada vez mais às necessidades de
acompanhar esse desenvolvimento que respinga em varias áreas de conhecimento. Seguindo
essa mesma linha de raciocínio aparece a Biociência, que traz consigo a Biotecnologia e esta
por sua vez tem o objetivo de melhorias e desenvolvimento para o moderno modo de vida,
13
visto que pensamentos e hábitos em massa giram ao redor da marca primordial da tentativa de
aperfeiçoamento e acrescentamento da vida.
Com isso, o uso de partes ou integridade de organismos vivos, em relação ao
desenvolvimento da biotecnologia encontra-se vigorosamente alheia à diversas opiniões.
Sendo assim, surge a Bioética no qual analisa ate que ponto pode usufruir desse tipo de
matéria-prima em produtos e argumentos industriais e científicos.
Fritz Jahr, em 1927, pela primeira vez trouxe à tona a palavra “bioética”
(bio+ethik) no qual havia publicado num artigo alemão chamado “Kosmos”, no qual Jahr
conceituou essa palavra como diagnóstico de deveres e étnicos não só apenas com relação ao
ser humano, mas sim também á todo ser vivo encontrado na Terra. (Jahr, Kosmos 1927;24:2-
4.)
Antes do artigo supramencionado ser encontrado por Rolf Löther, e divulgado por
Eve Marie Enge, quem era nomeado como criador do termo bioética em 1970, era Van
Rensselaer Potter, no qual havia publicado um artigo que classificava a bioética como a
ciência da sobrevivência, qualificando-a como Ponte na acepção de determinar uma
conexão entre a ciência e a humanidade que preservaria a perspectiva fortuna.
Eu proponho o termo Bioética como forma de enfatizar os dois componentes mais
importantes para se atingir uma nova sabedoria, que é tão desesperadamente
necessária: conhecimento biológico e valores humanos. (Potter V. R., Bioethics.
Bridge to the future. 1971).
Em 1998, Potter propôs que a Bioética encontra-se atualmente no seu terceiro
estágio de desenvolvimento. Caracterizou o primeiro estágio como sendo o da Bioética Ponte,
assim como já o vimos, o segundo como o da Bioética Global e o terceiro, e atual, como o
da Bioética Profunda.
No Brasil, a bioética surge na década de 1990 e em 1995 foi criada a Sociedade
Brasileira de Bioética, que mostra a necessidade de uma regulamentação mais profunda em
relação a experimentos em seres humanos ou parte deles e esse desejo foi alcançado quando o
CNS aprovou a Resolução 196/1996 no qual 16 anos depois foi restaurada em uma nova
resolução junto com todas as outras que gerenciavam a pesquisa em seres humanos, a
resolução 466/2012.
14
Hoje, a Bioética é entendida como uma interpelação transdisciplinar, que estimula
uma nova compreensão da realidade, humanista e apreensiva com os impactos que as
atividades humanas podem influenciar no meio ambiente e em sua própria saúde.
1.2 - Princípios Bioéticos: Autonomia, Beneficência, Não-Maleficência e Justiça e
Equidade
Para que se tenha uma visão inicial, vasta e bem-sucedida acerca da bioética, ou de
qualquer outro campo científico, se faz imprescindível à análise de seus princípios. No zona
da Bioética os princípios alegados por inúmeros autores servem para conceder o artefato
ideológico fundamental para entendimento dos padrões éticos buscados nesta ciência.
Com o Relatório Belmont (1979), surge a corrente principialista, com princípios
cruciais na chave dos impasses éticos surgidos na pesquisa com seres humanos. No mesmo
ano, Beauchamp & Childress exibiu a bioética sob o mesmo prisma.
Sendo assim, destaca-se como princípios bioéticos: - Princípio da Autonomia,
Princípio da Beneficência, Princípio da Não-Maleficência e Princípio da Justiça e Equidade.
1.3 - Princípio da Autonomia
1 - Faculdade que conserva um país conquistado de se administrar por suas
próprias leis.
2 - Liberdade moral ou intelectual.
3 - Independência administrativa. (Dicionário Aurélio Online, Abril, 19, 2018,)
No Brasil, o código de ética estabelece uma relação do profissional com seu
paciente, na qual o princípio da autonomia deve ser exercido, ao determinar que é
vedado ao médico efetuar qualquer procedimento médico sem o esclarecimento e
consentimento prévios do paciente ou responsável, salvo em situações de perigo
iminente de vida.
Autonomia significa autogoverno, autodeterminação da pessoa em tomar decisões
relacionadas a sua vida, sua saúde, sua integridade físico-psiquíca e suas relações
sociais. Pressupõe existência de opções, liberdade de escolha e requer que o
indivíduo seja capaz de agir de acordo com as deliberações feitas. O respeito à
autodeterminação fundamenta-se no princípio da dignidade da natureza humana,
acatando-se o imperativo categórico kantiano que afirma que o ser humano é um fim
em si mesmo. Algumas variáveis contribuem para que um indivíduo torne-se
autônomo, tais como condições biológicas, psíquicas e sociais. Podem existir
situações transitórias ou permanentes que uma pessoa pode ter uma autonomia
diminuída, cabendo a terceiros o papel de decidir. A autonomia não deve ser
15
confundida com individualismo, seus limites são estabelecidos com o respeito ao
outro e ao coletivo. (TORRES, 2007, pág. 01)
Autonomia é a prerrogativa de, livremente, traçar suas próprias condutas, sem
imposições externas, no qual requer que os indivíduos capacitados de ordenarem sobre suas
escolhas pessoais, devam ser tratados com respeito pela sua capacidade de decisão. Só a
ação com autonomia gera responsabilidade e cada ser deve ser responsável por sua própria
vida, por seu corpo e sua mente.
1.4 - Princípio da Beneficência
O Princípio da Beneficência não nos diz como distribuir o bem e o mal. Só nos
manda promover o primeiro e evitar o segundo. Quando se manifestam exigências
conflitantes, o mais que ele pode fazer é aconselhar-nos a conseguir a maior porção
possível de bem em relação ao mal. (FRANKENA, 1981, pág. 61,73)
Assim sendo, o Princípio da Beneficência possui o encargo de priorizar o paciente,
não só de modo individual, mas coletivo. Sustentar decisões, ciente que essa conduta
irá assegurar mais benefícios do que risco para o individuo, ou seja, maximizar o benefício e
minimizar o prejuízo.
1.5 - Princípio da Não-Maleficência
Alguns autores não formam distinções entre a beneficência e a não maleficência, mas
para Beauchamp e Childress “combiná-los obscurece distinções relevantes”. Já que as
deliberações de não causar danos ou prejudicar (como matar, roubar) são inteiramente
diferentes das obrigações de ajudar os outros.
Desta forma, conclui-se que o principio da não maleficência presume que é dever de
todos, proteger as pessoas contra alguns tipos e graus de danos, e mais ainda, evitar que danos
sejam causados. Ou seja, evitar qualquer situação ou procedimento que possa ocasionar
qualquer risco individual ou coletivo.
16
1.6 - Princípio da Justiça e Equidade:
O princípio da justiça está interligado à equidade, isto é, com o reconhecimento das
diferenças, das necessidades e do direito de cada um. Todos possuem mesmos diretos
independentes de situação financeira, raça ou cor.
Só há uma raça, a raça humana, e é a condição humana que deve nos mover ao
encontro do outro. Riscos e benefícios devem ser distribuídos igualmente.
1.7 Noções de Direito: Conceito, Fundamentos e Princípios do Direito
De acordo com o seu significado de origem, a palavra “direito” deriva do latim
de+rectu, no qual significa linha reta, visando um ideal nas ações humanas a ser seguido no
plano concreto, evoluindo gramaticalmente até a grafia atual “dereyto”
Trata-se de uma figura na qual o direito deve ser uma linha reta, ou seja, conforme a
norma, conforme a lei.
Segundo o jurista e filósofo Miguel Reale (REALE, 2001, pág. 28), o direito:
Aos olhos do homem comum o Direito é lei e ordem, isto é, um conjunto de regras
obrigatórias que garante a convivência social graças ao estabelecimento de limites à
ação de cada um de seus membros. Assim sendo, quem age de conformidade com
essas regras comporta-se direito; quem não o faz, age torto.
Para que se tenha uma vida em sociedade, requer-se a formulação de condutas e
regras que disciplinem entre as pessoas a interação com a intenção de alcançar o bem comum
e a organização social. Nesta mesma linha de pensamento, salienta, ainda Reale (2001 p. 29)
que:
O Direito corresponde à exigência essencial e indeclinável de uma convivência
ordenada, pois nenhuma sociedade poderia subsistir sem um mínimo de ordem, de
direção e solidariedade. É a razão pela qual um grande jurista contemporâneo, Santi
Romano, cansado de ver o Direito concebido apenas como regra ou comando,
concebeu-o antes como "realização de convivência ordenada”.
Onde destaca também que:
O Direito é, por conseguinte, um fato ou fenômeno social; não existe senão na
sociedade e não pode ser concebido fora dela. Uma das características da realidade
jurídica é, como se vê, a sua socialidade, a sua qualidade de ser social
17
Entende-se assim, que o direito constitui um conjunto de normas e condutas
estabelecidas para regular as relações sociais, com objetivo ao interesse geral, no qual
tratamos de bem comum e organização social.
Neste mesmo sentido, para Osvaldo Ferreira de Melo (2000, pg. 30), o Direito
consiste em um “complexo de princípios e normas comprometidos com os valores sociais,
que o Estado torna incondicionais e coercitivos para regular a convivência social”, o qual se
transforma no Ordenamento Jurídico daquele Estado.
É possível verificarmos os três elementos ou fatores básicos a qualquer experiência
jurídica diante dessa análise sobre a palavra Direito, conforme a teoria formulada por Reale,
chamada “Tridimensionalidade”, sendo: “um aspecto normativo (o Direito como ordenamento
e sua respectiva ciência); um aspecto fático (o Direito como fato, ou em sua efetividade social
e histórica) e um aspecto axiológico (o Direito como valor de Justiça).”
Portanto, a conduta só será jurídica se estiver envolvida de modo “fáticoaxiológico-
normativamente” na experiência social.
O Direito contemporâneo está cheio de princípios até as suas últimas ramificações.
Eles estão presentes na sua elaboração, interpretação, aplicação e integração. Dá pra se dizer
que os princípios são alicerces do Direito.
Assim como Reale (2001, p. 29,30) explica:
Os princípios se abrem num leque de preceitos fundamentais, desde a
intangibilidade dos valores da pessoa humana, vista como o fulcro de todo o
ordenamento jurídico, até os relativos à autonomia da vontade e liberdade de
contratar; à boa-fé como pressuposto da conduta jurídica; ao equilíbrio dos
contratos, com a condenação de todas as formas de onerosidade excessiva para um
dos contratantes; à exigência de justa causa nos negócios jurídicos; aos
pressupostos de responsabilidade Civil ou Penal, etc.
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 apresenta um conjunto de
regras e princípios básicos essenciais ao cidadão, nos quais são de suma importância o
Princípio da Liberdade; Princípio da Igualdade; Princípio da Ampla Defesa; Princípio da
Isonomia; Princípio da Dignidade da Pessoa Humana; Princípio do Contraditório; Princípio da
Simetria; Princípio da Proporcionalidade da Lei, dentre outros princípios que fazem parte das
demais áreas do Direito.
18
Considerados as principais normas fundamentais de conduta de um indivíduo
mediante leis já impostas, os princípios constitucionais além dos fundamentos para tratar uma
determinada situação, podem até ser classificados como a base do próprio Direito. A
Constituição Federal de 1988 é o livro que está hierarquicamente acima de todos os outros,
em nível de legislação no Brasil. A Constituição é a lei fundamental e os princípios
constitucionais são o que protegem os atributos fundamentais da ordem jurídica.
1.8 A Vinculação do Direito com a Bioética: O Papel da Bioética junto á Esfera Jurídica
Conforme mencionado até aqui, fica evidente que a sociedade atual vem vivenciando
uma abundância de grandes mudanças comportamentais, resultantes da inclusão de novas
tecnologias, nas mais diversas áreas do conhecimento. Hoje, o ser humano procura se
posicionar de uma forma mais independente, almejando mais a sua liberdade.
Surge então a bioética como resposta contemporânea às implicações morais das
tecnociências biomédicas, no qual se encontra no constitucionalismo brasileiro, pois atua
diretamente nos direitos humanos, revestidos, na Carta da República.
Em definição curta, de acordo com Pessini: “bioética é o estudo sistemático da
conduta humana no âmbito das ciências da vida e da saúde, enquanto essa conduta é
examinada à luz de valores e princípios morais [...]” (PESSINI; BARCHIFONTAINE, 1996,
p. 30)
Fica claro então que a Bioética busca compreender o significado e alcance dessas
descobertas, com a intenção de promover regras que possibilitem o melhor uso dessas novas
tecnologias, regras essas que são desprovidas de coerção, são apenas conselhos morais, para a
utilização eticamente correta das novas técnicas, abrindo então a entrada para atuação do
direito, nos quais estão expostos nos dispositivos que resguardam o direito à vida (Artigo 5o ,
caput), à dignidade (Artigo 1o , inciso III) e à saúde (Artigo 196), no preâmbulo da
Constituição Federal [de 1988], que institui o Estado democrático, destinado a assegurar o
exercício dos direitos sociais e individuais, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a
justiça, entre outros valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem
preconceitos, destacando também , o rtigo 128, da Constituição federal que obriga o Estado a
19
promover e incentivar o desenvolvimento científico, a pesquisa e a capacitação tecnológica,
tomada em sua acepção mais ampla.
De acordo com Sauwen; Hryniewicz (1997, p. 56), a função de: “normatizar os efeitos
da revolução biotecnológica sobre a sociedade em geral”
Constituição de 1988 destaca-o já no seu artigo 1º, inciso III, ao estabelecer, in verbis:
Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos
Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de
Direito e tem como fundamentos: I - a soberania;
II - a cidadania;
III - a dignidade da pessoa humana;
IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
V - o pluralismo político.
Portanto, fica claro que cabe ao Direito a análise e sobreposições a respeito às
múltiplas indagações produzidas pelas atividades biomédicas.
20
II - A APLICABILIDADE DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS AOS
EMBRIÕES LABORATORIAIS: DIREITO A VIDA E O PRINCÍPIO DA
DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA
2.1- Direito à Vida
Direito a vida, um direito natural, no qual nasce e morre com o homem, é protegido e
garantido no ordenamento jurídico, no qual o legislador se expressa claramente através da
Constituição Federal de 1988 em seu artigo 5º quanto sua inviolabilidade: “Todos são iguais
perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade (...)”, consagrando-o como basilar a todos os demais princípios
constitucionais.
Lima (2012) defende o direito a vida como fonte primária, requisito para a aquisição
dos demais direitos, tanto que, sua tutela encontra-se no caput do artigo 5º com status de
direito fundamental sem distinção de nacionalidade, sexo ou posição social. Essa proteção
constitucional se estende a toda manifestação da existência humana. Afirma Brito (2014, pag.
03)
Ao consagrar o direito à vida, o constituinte de 1988, não faz distinção entre a vida
intra e extra-uterina e nem faz um juízo de valor entre uma e outra, como acontece
na legislação infraconstitucional. Também a proteção constitucional à vida
compreende todas as formas de manifestação da existência humana, não
diferenciando a proteção à vida, que se inicia com a fecundação, se natural ou
artificial, e também não faz distinção quanto às etapas embrionárias.
Compreende-se que a vida é o lapso temporal entre o começo e o fim da mesma, no
qual ainda perduram diversas teorias sobre quando se inicia, no qual será aprofundado no
momento adequado. Operadores do direito e operadores da área biomédica não chegaram a
um consenso acerca desse estágio inicial, uma vez que tal questão envolvem diferentes esferas
do conhecimento humano, em que religião, ciência, conhecimento biológico e técnico
convivem em pé de igualdade. Assim, a vida, como muitos doutrinadores afirmam, é aquilo
21
que não está morto. Na biologia, pondera-se a dificuldade em definir o conceito vida, no qual
se pautam a informar que organismos vivos possuem atributos que objetos inanimados não
possuem. (COSTA, 2015)
Doutrinadores relacionam-se suas conclusões acerca da temática do direito a vida,
assim, Russo (2009, pag. 91) relaciona que o “direito à vida é o bem mais relevante de todo
ser humano e a dignidade da pessoa humana é um fundamento da República Federativa do
Brasil e não há dignidade sem vida”.
A existência humana é o pressuposto elementar de todos os demais direitos e
liberdades disposto na Constituição e que esses direitos têm nos marcos da vida de
cada individuo os limites máximos de sua extensão concreta. O direito a vida é a
premissa dos direitos proclamados pelo constituinte; não faria sentido declarar
qualquer outro se, antes, não fosse assegurado o próprio direito estar vivo para
usufruí-lo. O seu peso abstrato, inerente à sua capital relevância, é superior a todo
outro interesse. (BRANCO, 2010, pág. 441).
Alexandre Moraes (2003) compreende o fundamentalismo do direito a vida entre
todos os direitos, no qual preceitua ser pré-requisito à existência e exercício de todos os
demais direitos. Ainda, na mesma obra destaca o seguinte pensamento:
O início dessa preciosa garantia individual deverá ser dado pelo biólogo, cabendo ao
jurista, tão somente, dar-lhe o enquadramento legal, e, “do ponto de vista biológico,
não há dúvida de que a vida se inicia com a fecundação do óvulo pelo
espermatozóide, resultando um ovo ou zigoto. Assim o demonstram os argumentos
colhidos na Biologia. A vida viável começa, porém, com a nidação, quando se inicia
a gravidez...e assegura, ninguém pode ser privado arbitrariamente de sua vida. Esse
direito, que é o primeiro da pessoa humana, tem em sua concepção atual conflitos
com a pena de morte, as práticas abortivas e a eutanásia como posteriormente
analisados (2003, pag. 88).
Tavares (2010, pág. 569) recorda-nos que:
O Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu artigo 7º estabelece: “a criança e o
adolescente têm direito a proteção à vida e à saúde, mediante a efetivação de
políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e
harmonioso, em condições dignas de existência”.... A criança e o adolescente, como
qualquer outro ser humano, gozam da proteção à vida é receito constitucional
explícito. Contudo, o que torna o dispositivo de interesse para meditação mais ampla
é a imposição de políticas “que permitam o nascimento” sadio e harmonioso. Aqui,
o objeto da tutela jurídica é, pois, o próprio ser em concepção.
Assim, Branco (2010, pág. 445):
O elemento decisivo para se reconhecer e se proteger o direito à vida é a verificação
de que existe vida humana desde a concepção, quer ela ocorra naturalmente, que in
vitro. O nascimento é um ser humano. Trata-se, indisputavelmente, de um ser vivo,
distinto da mãe que o gerou, pertencente à espécie biológica do homo sapiens. Isso é
22
bastante para que seja titular do direito à vida – apanágio de todo ser que surge do
fenômeno da fecundação humana
Portanto, a vida humana trata-se do bem mais importante tutelado em nossa
Constituição, tornando-se indispensável ao indivíduo, afirma-se tal direito no principio da
dignidade a vida, que será discorrido nos tópicos a seguir.
2.1.2- Evolução Histórica da Noção da Dignidade da Pessoa Humana
Faz-se mister apontar a evolução histórica da dignidade da pessoa humana antes de
adentrar na análise da mesma, desenvolvendo algumas notas sobre o histórico conceito que
incorporou-se ao ordenamento jurídico pátrio.
São Tomas de Aquino (1225 – 1274) foi o primeiro a cunhar a expressão dignitas
humanas, afirmando que a dignidade é inerente ao homem, a sua espécie, no qual seu
intelecto, racionalidade e semelhança com Deus geram essa dignidade. (FACHIN, 2009).
Com o passar o tempo e a concepção do jusnaturalismo sob percepção do pensamento
laico, nos séculos XVII e XVIII, Kant (1724 – 1804) baseia suas ideias de que todo ser
humano é um fim em si mesmo e que o valor humano deveria ser fundamento indiscutível do
Estado. Assim, as coisas possuem preço ou dignidade; aquilo que possui preço é substituível e
há equivalentes, portanto, as pessoas possuem dignidade e as coisas preços. (RENNER,
2017).
Sob ótica Kantiana a dignidade afasta qualquer hipótese de disponibilização da pessoa
humana, sendo violada sempre que tratada como coisa, perdendo sua posição de sujeito para
objeto. Desse modo, a dignidade humana é a proteção contra qualquer tratamento
discriminatório, odioso, degradante, assegurando condições materiais mínimas para que o
indivíduo viva.
Bobbio (2004, pág. 49) “somente depois da 2ª. Guerra Mundial é que esse problema
passou da esfera nacional para a internacional, envolvendo – pela primeira vez na história –
todos os povos”, partindo desse cenário o esforço da reconstrução dos direitos humanos, que o
nazismo e o fascismo destruíram e promoveram barbaridades em nome da “lei”. Após a
segunda guerra mundial passou-se a considerar valores éticos e humanos como paradigma e
referencial a orientar a ordem internacional jurídica.
23
A concepção dos direitos humanos, portanto, é fruto do movimento de
internacionalização dos direitos humanos, o qual é extremamente recente na história,
surgindo a partir do pós-guerra, como resposta às atrocidades e aos horrores
cometidos durante o nazismo, levando em consideração que o Estado foi o grande
violador de direitos humanos.( RENNER, 2017, pág. 03)
Contudo, essencial informar que a proteção internacional dos direitos humanos
iniciou-se com a assinatura da Carta das Nações Unidas. Em 10 de dezembro de 1948, a
Declaração Universal dos Direitos Humanos foi aprovada unanimemente em Assembleia
Geral das Nações Unidas, abrangendo quase todos os países sob o forte fundamento de que
todos são iguais em dignidade e direito e todos os homens nascem livres. (FACHIN, 2009)
Por fim, nesse conceito histórico evolutivo, destacam-se os pactos internacionais de
Direitos Civis e Políticos (criado em 1966, entrou vigor em 1976) e o Pacto Internacional de
Direitos Econômicos, Sociais e Culturais ( aprovado em 1966, entrou em vigor 1976). 40 anos
após a assinatura da Declaração Universal dos Direitos Humanos, foi realizada a conferência
de Viena (1993) de modo a reafirmar os termos universais da Declaração, em que mais de 180
países presentes consagraram e ratificaram seu compromisso com universal com a dignidade
da pessoa humana.
2.1.3- Conceito e Abrangência do Principio da Dignidade da Pessoa Humana
Nossa Constituição Federal/88 preceitua que o Estado democrático de direito tem por
fundamento a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CF/88), sendo a prerrogativa de todo
indivíduo ser respeitado, não ser prejudicado (corpo, saúde, vida) e de subsistir em um âmbito
existencial próprio.
A dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta
singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que
traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se
em um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que,
somente excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos
fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas
as pessoas enquanto seres humanos. (MORAES, 2002, pág. 128).
O ser humano é o centro e o fim do direito, sob a ótica da dignidade da pessoa humana
como valor basilar do Estado, é um princípio irremovível, máximo, de valor absoluto. Para
conceituar e compreender o que é o princípio da dignidade da pessoa humana, faz-se
24
necessário entender a existência e criação do próprio Estado. O Estado foi criado para regular
e atender os interesses dos homens, que ao viverem em seu estado natural, perceberam que
seria impossível viver em sociedade sem uma regulamentação que os protegesse dos outros
indivíduos. Dessa forma o homem abre mão de parte de sua autonomia e a confere ao Estado,
para que esse o beneficie. Entretanto, o Estado ao controlar e deter o poder há limitações
impostas quanto a sua atuação, para que não ofenda a natureza de quem o criou.
É justamente neste sentido que assume particular relevância a constatação de que a
dignidade da pessoa humana é simultaneamente limite e tarefa dos poderes estatais
e, no nosso sentir, da comunidade em geral, de todos e de cada um, condição dúplice
esta que também aponta para uma paralela e conexa dimensão defensiva e
prestacional da dignidade. (SARLET, 2002, pág. 47).
Assim, compreende-se a ligação da dignidade da pessoa humana com o seu estado
natural, uma vez que cada ser nasce com a sua, pois ele é detentor de capacidade e raciocínio,
ponto chave de diferenciação dos demais seres vivos. Todo ser humano é igual em dignidade.
A dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta
singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que
traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se
em um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que,
somente excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos
fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas
as pessoas enquanto seres humanos. (MORAES, 2002, pág. 128).
A conceituação precisa do princípio da dignidade da pessoa humana torna-se
impossível diante de tantos significados, complexidade, posições filosóficas, religiosas,
morais, que se alteram com o tempo, espaço e época, mas, todas elas possuem o mesmo
embasamento, do entendimento de seu valor absoluto e inalterável. Sarlet (2002, pág. 45)
sabiamente conclui sendo “cada ser humano é humano por força de seu espírito, que o
distingue da natureza impessoal e que o capacita para, com base em sua própria decisão,
tornar-se consciente de si mesmo”.
A dignidade da pessoa humana é um conceito extremamente abrangente1, desta
forma, existe uma grande dificuldade de se formular um conceito jurídico a respeito.
Sua definição e delimitação são amplas, haja vista englobar diversas concepções e
significados. Seu sentido foi sendo criado e compreendido historicamente como
valor, preexistiu ao homem.
Nesse sentido, podemos afirmar que nunca houve uma época em que o homem
esteve separado de sua dignidade, mesmo que ainda não a reconhecesse como um
atributo ou como uma qualidade inata da pessoa.
25
A dignidade é um atributo humano sentido e criado pelo homem; por ele
desenvolvido e estudado, existindo desde os primórdios da humanidade, mas só nos
últimos dois séculos percebido plenamente. Contudo, apesar de que quando o ser
humano começou a viver em sociedades rudimentares organizadas a honra, a
honradez e a nobreza já eram respeitadas por todos do grupo, o que não era
percebido e entendido concretamente, mas geravam destaque a alguns membros.
(LEMISZ, 2010, pág. 01).
Desse modo, conclui-se que a dignidade da pessoa humana é o valor máximo
conferido aos indivíduos, que, já nascem com ele, inerentes ao ser humano. Fundamento do
Estado democrático de direito que possibilita a participação da pessoa no Estado, como
cidadão. Abrange todas as pessoas, sem distinção de sexo, cor, idade, origem, status e
capacidade de entendimento, sendo um princípio fundamental de eficácia plena.
2.1.4- Liberdade científica versus dignidade da pessoa humana
A liberdade científica está proclamada na Constituição Federal de 1988 no artigo 5ª,
IX, como direito fundamental dizendo “é livre a expressão da atividade intelectual, artística,
científica e de comunicação, independente de censura ou licença”. Porém, tal liberdade não é
absoluta e comporta limitações, pois se assim o fosse, outros bens tutelados como o direito a
vida, privacidade, integridade, seriam facilmente afetados por um amontoado de pesquisas
científicas. (KALABAIDE, 2002).
Portanto, embora se reconheça a legitimidade da investigação científica e se
propugne que esta seja eficazmente impulsionada tanto pelos poderes públicos,
quanto pela iniciativa privada, esta liberdade - como qualquer outra liberdade -tem
seus limites. Limites que nos recordam a necessidade que sejam determinados e de
que devem ser estabelecidos uma vez mais, tanto nos interesses individuais como
nos coletivos. (KALABAIDE, 2002, pág. 15)
Desse modo, o limite da liberdade e investigação científica se encontra no ser humano,
no momento em que o procedimento médico ou científico infringir os direitos tutelados ao
indivíduo, entrando em conflito esses bens protegidos, porém, os direitos fundamentais do ser
são intransponíveis. O ser humano é um fim em si mesmo e mesmo que a desejada pesquisa
tenha por escopo obter benefícios a terceiros ou a uma coletividade, a pessoa sempre será
preservada, com base no princípio da dignidade da pessoa humana e seu valor absoluto e
fundamental.
26
Esta conciliação de interesses e de respeito aos direitos humanos é a mais adequada
para a categoria da liberdade de pesquisa que, como direito fundamental, encontra
aprovação na Constituição Brasileira de 1988, e por isso que as limitações devem ser
estabelecidas quando se confronte com outros direitos fundamentais ou bens
jurídicos constitucionalmente protegidos. (KALABAIDE, 2002, pág. 15)
Observa-se, portanto, uma colisão entre dois direitos fundamentais: o de liberdade de
atividade científica e o da dignidade da pessoa humana. E por que há colisões? Justamente por
serem “abertos” e “ilimitáveis”, não possuindo sua antemão fixada. Andrade apud Kalaibe
(2002, pág. 24) preceitua:
haverá colisão ou conflito sempre que se deva entender que a Constituição protege
simultaneamente dois valores ou bens em contradição concreta (...) O problema
agora é outro: é o de saber como vai dar solução ao conflito entre bens, quando
ambos (todos) se apresentam efetivamente protegidos como fundamentais.
Larenz (1997, pág. 575) diz:
Os direitos, cujos limites não estão fixados de uma vez por todas, mas que em cena
medida são 'abertos', 'móveis', e, mais precisamente, esses princípios podem,
justamente por esse motivo, entrar facilmente em colisão entre si, porque sua
amplitude não está de antemão fixada.
Mesmo entendendo que a dignidade serve como fundamento para o sistema
constitucional em um todo e que o mesmo se sobressairia se posto em conflito diante da livre
expressão científica, teria o embrião, objeto de estudo do presente artigo, personalidade
jurídica? Seria ele considerado nascituro? Andorno (1997, pág. 74) debate que o status
jurídico do embrião é interminável, uma vez que diversas teorias são apresentadas com
embasamentos em todas as esferas da sociedade, porém, “enquanto não se prova que ele é
uma coisa (o embrião), devemos presumir que ele é uma pessoa”, tema no qual será debatido
posteriormente.
Vislumbra-se, portanto, que o direito fundamental quanto à liberdade científica está
positivado na Carta Magna no qual se trata de grande interesse e valia para a sociedade em u
todo. Porém, suas limitações encontram-se no ser humano, toda vez que ela gerar malefícios
ao mesmo, tendo por pilar o princípio da dignidade da pessoa humana, que preexiste ao
direito. Sendo norte do sistema jurídico, não poderá ser desconsiderado em nenhum ato.
27
III - DA PROTEÇÃO DOS EMBRIÕES EXCEDENTÁRIOS
3.1 – A proteção jurídica da vida humana no direito brasileiro
Piovesan (2004) entende que a Constituição da República Federativa do Brasil de
1988 se trata do marco jurídico da institucionalização dos direitos e garantias fundamentais ao
indivíduo, podendo ser constatada tal afirmação já no preâmbulo da Constituição
Federal/1988 que se inicia construindo o Estado democrático de direito ao assegurar a
igualdade, liberdade, bem-estar, desenvolvimento, justiça, a segurança e o exercício dos
direitos sociais e individuais.
Nesse cenário encontra-se a proteção jurídica da vida humana, ao ser relacionado no
artigo 5º da CF/88 a inviolabilidade do direito à vida garantida ao brasileiro e ao estrangeiro
residente no Brasil.
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito
à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes (...)”.
Nesse linear, o Código Civil de 2002 se expressa de modo a informar em seu artigo 2º
que a capacidade do ser inicia-se com seu nascimento com vida, no qual adquirirá
personalidade jurídica. Porém, coloca a salvo todos os direitos ao nascituro.
Com a evolução científica e social, faz-se mister o debate do início da vida humana do
ponto de vista jurídico, sendo indispensável tal definição para passível proteção jurídica, para
compreender a partir de quando haverá a tutela do direito à vida. Porém, com intensa divisão
doutrinária sobre o conceito de vida e seu início, será explanado a seguir as teorias existentes
que tratam do assunto, no qual será apontada a teoria que embasa o presente estudo.
3.1.1 - Teorias acerca do início da vida
Diante de diversas teorias quanto ao início da vida para o embrião, é indispensável
tecer as existentes para embasar a defesa do estudo em apreço. Ressalta-se que independente
da teoria adotada há no embrião a expectativa de vida, o que não pode ser ignorado pela lei,
28
no qual deve salvaguardar seus direitos. Vale apontar que entre os direitos tutelados, o artigo
7º do Estatuto da Criança e do Adolescente, lei nº 8.069/90, preceitua o direito ao nascimento:
“A criança e o adolescente tem direito à proteção à vida e à saúde, mediante a
efetivação de políticas públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e
harmonioso em condições dignas de existência”. (BRASIL, 1990).
Com isso faz-se necessário realizar considerações quanto o início da vida humana.
3.1.2 -Teoria Natalista
Teoria natalista fundamenta-se que o pressuposto para adquirir personalidade opera-se
a partir do nascimento com vida do ser humano. Dessa forma, segundo a teoria natalista a
personalidade inicia-se no parto, entretanto, apenas se houver vida. Assim, o embrião ou
nascituro são serem com expectativas de direitos, pois para que haja proteção deve haver o
nascimento com vida, não sendo considerado o embrião, portanto, pessoa. (BOLZAN, 2016).
“(...) para os natalistas, o nascituro não é considerado pessoa, ele apenas tem, desde
sua concepção, uma expectativa de direitos, que está sob a condição do nascimento com
vida.” (BOLZAN, 2016, pág. 7).
Entende-se então que para os natalistas que o embrião não possui personalidade
jurídica, tão pouco capacidade de direito, no qual será protegido pela lei após o pressuposto
explicitado: nascer com vida.
3.1.3 - Teoria da Nidação
Teoria intensamente defendida por profissionais da ginecologia, a nidação diz respeito
ao momento em que o embrião se fixa na parede do útero, no qual ocorre no 4º (quarto) dia de
fecundação. Os ginecologistas defendem tal teoria sob o fundamento de que o embrião de
laboratório morre se não for implantado na mulher, no qual com base nesse fato, não possui
relevância jurídica. “Como o início da vida ocorre com a implantação e nidação do ovo no
útero materno, não há nenhuma vida humana em um embrião fertilizado em laboratório e,
29
portanto não precisa de proteção como pessoa humana.” (BOLZAN, 2016, pág. 5). Scarparo
(1991, pág. 42) complementa dizendo que “Não seria viável falar de vida humana enquanto o
blastócito ainda não conseguiu a nidação, o que se daria somente no sétimo dia, quando passa
a ser alimentado pela mãe”.
Portanto, para os defensores dessa corrente, apenas com o fenômeno da nidação o
embrião adquire vida, sendo apenas com a implantação na mulher que o ovo adquire
viabilidade e determina o estado gravídico, antes disso, pela teoria, o embrião seria apenas um
aglomerado de célula sem a nidação.
3.1.4 - Teoria Gradualista ou Desenvolvimentista
A teoria gradualista ou desenvolvimentista, em seu nome já denuncia seu significado:
é o desenvolvimento paulatino, progressivo. Para essa corrente o ser humano passa por
diversas fases, e são elas: o pré-embrião, o embrião e o feto, no qual cada uma delas apresenta
características distintas.
Desse modo, defende que não há vida desde a concepção, pois aos defensores o
embrião não possui caráter humano, sendo um aglomerado celular. Meirelles (2000, p. 114)
pontua: “Entendem os adeptos da referida teoria, que o embrião humano, nas etapas iniciais
do seu desenvolvimento, não apresenta ainda caracteres suficientes a individualizá-lo e, desse
modo, identificá-lo como `pessoa´”.
Assim, para os desenvolvimentistas a vida humana merecerá respeito e respaldo legal
na medida de seu progresso, sendo gradativo, conforme o desenvolvimento do embrião e feto.
(BOLZAN, 2016).
3.1.5 - Teoria das Primeiras Atividades Cerebrais
Resguarda essa teoria que se a vida se encerra com o fim das atividades cerebrais, faz
sentido dizer que se inicia com a primeira atividade cerebral. Salienta Barroso (2006, pág.27):
30
Se a vida humana se extingue, para a legislação vigente, quando o sistema nervoso
para de funcionar, o início da vida teria lugar apenas quando este se formasse, ou,
pelo menos, começasse a se formar. E isso ocorre por volta do 14º dia após a
fecundação, com a formação da chamada placa neural.
Entretanto, há divergência dentro dessa teoria, pois a doutrina não é unânime quanto
ao momento exato que se iniciaria a formação encefálica no feto.
3.1.6 - Teoria Concepcionista
Essa corrente salienta que a vida humana começa com a concepção. A concepção,
segundo a ciência, se dá na fecundação do óvulo pelo espermatozoide. Assim, desde a
concepção do zigoto até sua transformação em embrião, deverá haver a proteção de seus
direitos, uma vez que garantida as condições naturais, haverá o desenvolvimento da condição
humana.
A Constituição Federal e o Código Civil garantem a proteção ao desenvolvimento e
evolução do embrião, pois se entende que como pessoa em potencial, o mesmo merece
respeito e integridade, que é dado a qualquer indivíduo. (BOLZAN, 2016).
Teoria da concepção no qual se fundamenta o presente estudo relaciona-se a embasar a
proteção jurídica do embrião e garantir sua dignidade humana, já que como discorrido acima,
os direitos salvaguardados na Carta Magna e na legislação civil iniciam-se desde a concepção,
que se dá na fecundação do óvulo com o espermatozoide, originando o zigoto e
posteriormente o embrião. Jérome Lejeune (1986) apud Wider (2015, pág. 1) mundialmente
conhecido quanto seus estudos de genética humana observa quanto ao início da vida:
Cada ser humano tem um começo único, que ocorre no momento da concepção.
Embrião: …Essa a mais jovem forma do ser… Pré-embrião: essa palavra não existe.
Não há necessidade de uma subclasse de embrião a ser chamada de pré-embrião,
porque nada existe antes do embrião; antes de um embrião, existe apenas um óvulo e
o esperma; quando o óvulo é fertilizado pelo espermatozóide a entidade assim
constituída se transforma em um zigoto; e quando o zigoto se subdivide torna-se em
embrião. Desde a existência da primeira célula todos os elementos
individualizadores (tricks of the trade) para transformá-lo num ser humano já estão
presentes. Logo após a fertilização, o estágio de três células, “um pequeno ser
humano já existe”. Quando o óvulo é fertilizado pelo espermatozóide, o resultado
disso é “a mais especializada das células sob o sol”; especializada ao ponto de vista
de que nenhuma outra célula jamais terá as mesmas instruções na vida do indivíduo
que está sendo criado. Nenhum cientista jamais opinou no sentido de que um
31
embrião seja um bem (property). No momento em que é concebido, um homem é
um homem.
Após a fecundação o embrião se auto-governa, está claro que esta formação vital
possui características e qualidades de ser humano, sendo entendível, portanto, que desde o
zigoto, material celular humano, já é merecedor de toda proteção jurídica pelo o que é e pelo o
que será. (WIDER, 2015). “A vida começa desde a concepção, ou seja, avida te m seu início a
partir da fecundação do óvulo pelo espermatozoide, gerando um ovo ou zigoto”
(ALBERTON, 2001. p. 35).
Maria Helena Diniz (2002, p. 113):
“O embrião, ou o nascituro, tem resguardados, normativamente, desde a concepção, os
direitos, porque a partir dela passa a ter existência e vida orgânica e biológica própria,
independente da de sua mãe. Se as normas o protegem é porque tem personalidade jurídica.”
Os que defendem teses contrárias à teoria concepcionista alegam que o embrião e a
mãe/mulher que o gerará são um só. Entretanto, insta constar que são seres individualizados,
uma vez que o embrião apenas necessita de algumas condições que a mulher disponibiliza em
seu útero para seu desenvolvimento e, além do mais, o embrião é formado por 23
cromossomos do pai e 23 cromossomos da mãe, o que já demonstra sua distinção através da
carga genética, caindo por terra à teoria de ser um só pelo fato de que o embrião necessita do
útero para seu desenvolvimento. (GONÇALVES, 2015).
Abdalla (2000, pág. 35) determina que se apenas pessoas são sujeitos de direitos e a lei
coloca a salvo os direitos do nascituro desde sua concepção, ou seja, desde embrião, não há
que se falar sobre não ser considerado dotado de personalidade jurídica, vejamos:
Segundo a escola concepcionista, a personalidade civil do homem começa a partir
da concepção, ao argumento de que tendo o nascituro direitos, deve ser considerado
pessoa, uma vez que só a pessoa é sujeito de direitos, ou seja, só a pessoa tem
personalidade jurídica.
Desse modo, segundo essa corrente, confere-se ao nascituro desde sua concepção,
desde embrião, amparo jurídico quando coloca a salvo seus direitos, pois entende-se que o
embrião sendo um ser humano em potencial merece respeito e dignidade.
32
3.2 - DIREITOS DO EMBRIÃO
Louise Joy Brown, no final da década de 70, mais precisamente em 05 de julho de
1978, nasceu na Inglaterra e foi o primeiro bebê de proveta do mundo. Tal situação, que até
então era apenas experimental, tomou proporções mundiais ao mostrar-se possível a
possibilidade de concepção de um ser humano in vitro. Desse modo a técnica extracorpórea
para reprodução humana passou cada dia mais fazer parte do dia-dia, no qual de um lado
trouxe a solução para casos inférteis e do outro intensos questionamentos jurídicos, muitos
que até hoje permanecem sem resposta. (BARBOSA, 2002).
Se a problemática relativa ao início da vida já atormentava o universo jurídico, a
fertilização in vitro potencializou as dificuldades de definição, trazendo, além disso, outros
questionamentos importantes, como por exemplo, a terminologia “embrião”. Na biologia, é
considerado embrião a partir do momento que ele é implantado no útero, sendo anterior a isso,
o óvulo fecundado denominado zigoto. Então, os primeiros quatorzes dias após a fertilização
temos o zigoto, após a implantação no útero da mulher até a oitava semana após a fecundação,
o embrião e a partir da nona semana, o feto, tendo essa designação até nascer. Entretanto,
considera-se o critério utilizado para a denominação de “embrião” todas as fases do
desenvolvimento do zigoto desde sua concepção, pois havendo a fertilização in vitro, há a
distinção, nesses termos, do nascituro do embrião, uma vez que o primeiro trata-se de um ser
já em gestação. (BARBOSA, 2002)
Deve estender-se ao embrião os mesmos cuidados que com os adultos e crianças...
Nunca pode ser usado como meio para outro fim. Deve ser proibida cada
intervenção sobre os embriões que possa causar algum dano. Precisa-se voltar para o
princípio de veneração e ter a capacidade de experimentar alguma maravilha com
essa existência humana pequenina, misteriosa, invisível mas sempre grande e
importante. Precisa-se reformular considerações ontológicas: o embrião é homem
em ato porque o seu patrimonio genético já está completo. Somente a proteção
juridica não é suficiente porque o embrião ainda é invisível; por isso precisa-se do
princípio da contemplação. É a contemplação que faz visível o invisível. Hoje
precisamos de um direito que esteja enraizado na contemplação; nós juristas estamos
chamados a construir uma sociedade capaz de contemplar. (TERRE, 1970, pág. 170
apud AFFONSON, 2014, pág. 3/4)
Nessa linha, o início da vida embrionária tem suscitado debates entre os diversos
ramos de conhecimento, sendo de grande relevância jurídica, pois como bem assinala
Almeida (2000) a posição tomada pelo jurista importa em grandes consequências, pois quem
33
afirma a personalidade jurídica, afirma os seus direitos e obrigações e é nesse campo que o
trabalho entrará a seguir.
3.2.1 - Conceituação de Embrião
Sob fundamento conceitual, embrião humano é a fusão de gameta masculino com
gameta feminino (espermatozoide e óvulo), no qual determina a união de seus núcleos em
uma única célula chamada zigoto, em um processo de fecundação. Desse modo, através da
fecundação transmite-se ao novo ser características genéticas de seus genitores, produzindo
um ser único quanto as suas características genéticas, nascendo aí a identidade biológica do
embrião. Constituído o zigoto, as multiplicações celulares iniciam-se e começa a desenvolver
o crescimento contínuo do embrião, que não há como negar, trata-se de um ente vivo da
espécie humana. (PIMENTEL, 2003).
Biologicamente o embrião é o acúmulo de células capazes de desenvolver um ser
humano. Há o embrião após a fecundação, no qual somarão em suas características genéticas
46 cromossomos provenientes de seus progenitores (23 da mãe e 23 do pai) vocacionados à
vida autônoma. Assim sendo, após a fecundação temos o zigoto que perdura por 14 dias
multiplicando suas células e desenvolvendo o pré-embrião, como muitos doutrinadores e
cientistas denominam. Após isso, com a implantação no útero da mulher o embrião perdura-se
até a oitava semana, no qual posteriormente será denominado como feto até seu nascimento.
(PIMENTEL, 2003)
3.2.2 - Proteção Jurídica dos Embriões
A legislação pátria adota a teoria natalista para determinar o inicio da personalidade
jurídica do indivíduo, umas que ao estipular no artigo 2º do Código Civil vigente que a
personalidade jurídica inicia-se com o nascimento com vida. Entretanto, a lei põe a salvo
todos os direitos inerentes ao nascituro desde sua concepção, como pessoa em potencial,
quando expressa isso também no citado artigo.
34
Tal mistura de corrente cria um leque de posições doutrinárias passíveis de defesa,
uma vez que ao determinar proteção legal ao ser desde sua concepção, e entendendo que a
concepção se dá no momento da fusão do espermatozoide e o óvulo, produzindo assim células
embrionárias, estende-se tal proteção legal também ao embrião. Como também há a
possibilidade de defesa da teoria concepcionista quando a lei põe a salvaguardados os direitos
desde a concepção do ser humano.
Com base no acima exposto, Diniz (2005) expõe:
Embora a vida se inicie com a fecundação, e a vida viável, com a gravidez, que se dá
com a nidação, entendemos que o início legal da personalidade jurídica é o momento
da penetração do espermatozoide no óvulo, mesmo fora do corpo da mulher, pois os
direitos da personalidade, como o direito à vida, à integridade física e à saúde,
independem do nascimento com vida.
Ainda, sob o mesmo pensamento, Lombardi Vallauri defende:
Deve estender-se ao embrião os mesmos cuidados que com os adultos e crianças:
Nunca pode ser usado como meio para outro fim. Deve ser proibida cada
intervenção sobre os embriões que possa causar algum dano. Precisa-se voltar para o
princípio de veneração e ter a capacidade de experimentar alguma maravilha com
essa existência humana pequenina, misteriosa, invisível, mas sempre grande e
importante. Precisa-se reformular considerações ontológicas: o embrião é homem
em ato porque o seu patrimônio genético já está completo. Somente a proteção
jurídica não é suficiente porque o embrião ainda é invisível; por isso precisa-se do
princípio da contemplação. É a contemplação que faz visível o invisível. Hoje
precisamos de um direito que esteja enraizado na contemplação; nós juristas estamos
chamados a construir uma sociedade capaz de contemplar.
Portanto, a defesa de que o embrião é pessoa de direito por estar a ele conferido
amparo legal é muito plausível, uma vez que as brechas legais possibilitam que hajam
caminhos diferentes a serem compreendidos. A legislação pátria protege o embrião em
diversos dispositivos, que serão abaixo relacionados:
A Constituição Federal de 1988 estabelece em seu artigo 5º a igualdade de todos
perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, tanto aos brasileiros, quanto aos
estrangeiros residentes no país, no qual torna-se inviolável o direito a vida, liberdade,
igualdade, segurança e a propriedade.
Como explícito acima, o Código Civil de 2002 em seu artigo 2º coloca a salvo os
direitos ao ser desde sua concepção;
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O Estatuto da Criança e do Adolescente em seu artigo 7º determina que as crianças e
os adolescentes possuem direito a vida e ao nascimento e desenvolvimento.
Constata-se que a maior proteção legal tutelada ao embrião trata-se do direito a vida,
já que ao determinar no CC/2002 os direitos ao nascituro desde sua concepção, o legislador
incluiu o embrião nesse patamar. Nesse contexto, o direito a vida é o pré-requisito essencial
para usufruir dos demais direitos postos ao indivíduo, entendendo, portanto, que a violação de
tal prerrogativa é ilegal e viola todos os demais automaticamente. Insta salientar que o
tratamento protetivo legal ao embrião deve ser harmônico com os princípios constitucionais,
no qual na ausência de determinações específicas legais quanto ao embrião humano, veda-se e
condena-se toda prática contrária aos princípios constitucionais.
3.3 - O EMBRIÃO EXCEDENTÁRIO
3.3.1 - Embrião excedentário
Embrião excedentário é todo aquele que após passar pelo procedimento de fecundação
in vitro não foi implantado na mulher para gestação, sendo aquele que sobrou do processo de
fertilização em laboratório. Esses embriões excedentes são congelados, no qual atualmente há
milhões em todo Brasil na forma criopreservada. (BOLZAN, 2016).
A crioconservação ou criopreservação é a técnica aplica no congelamento do embrião
(ou pré-embrião, como alguns defendem) excedente do processo de fertilização, com a média
de -196º nas clínicas de reprodução humana, com a finalidade de conservação do material
viável para posterior utilização, de modo a não perder a estrutura, funcionalidade e
propriedades biológicas quando forem descongelados. (CLAUDINO, 2010).
3.3.2- Embriões Excedentários: Objeto ou Sujeito de Direitos?
Diante todo exposto observa-se que não há consenso claro quanto uma única definição
do embrião, pois os autores acerca do tema conceituam utilizando o período embrionário que
defendem. Em suma, o embrião é o concepto nas suas primeiras semanas de vida. Nesse
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linear, apresenta-se a figura do embrião crioconservado, em que após uma fertilização em
laboratório excederam-se embriões, no qual passam a ser preservados para futura destinação.
O que se trata aqui é sobre a o status jurídico do embrião excedentário, ele é um
sujeito passível de direitos ou apenas um objeto? Para resolução de tal questionamento é
necessário invocar as teorias quanto ao início da vida e qual utilizada no sistema jurídico
brasileiro, além do mais, qual posicionamento a legislação toma quanto a personalidade da
pessoa e quando começa. Assim, no artigo 2º do Código Civil de 2002 lemos “Art. 2o A
personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a
concepção, os direitos do nascituro.”. Responde-se tal questão ao interpretar a primeira parte
do citado artigo, a personalidade apenas inicia-se com o nascimento com vida, restando
entender que o embrião criopreservado não é tido como sujeito de direitos.
Visualiza-se, portanto, que na lei não há proteção ao embrião, porém, como já exposto
anteriormente no estudo, à utilização do termo “desde sua concepção” abre brechas ao
enquadramento do embrião, no qual trata-se de um ser em potencial, possui vida humana e
não um objeto inanimado.
Sendo assim, mesmo não existindo legislação que ampare e determine sobre o status
jurídico que se encontra o embrião preservado, a nossa Constituição Federal foi construída em
cima constitucionalização dos direitos civis, no qual coloca a pessoa como o inicio e o fim,
não sendo razoável objetificar a vida humana, o ser em potencial, o início da vida.
(BARBOSA, 2002).
Fabriz (2003, pág. 268-269) fundamenta da seguinte forma:
O direito à vida, não obstante a vida ser encarada de formas diversas pelas diferentes
culturas, deve ser interpretado da maneira mais ampla possível e jamais de maneira
restritiva, levando-se apenas em consideração tão somente a vida biológica, baseado
na dicotomia vida e morte.
Assim, o correto é interpretar o conceito de vida de forma ampla e não restritiva. Silva
(2002, pág. 27) preleciona:
(...) a concepção do ser humano é definida como o primórdio da vida em seu sentido
mais amplo. É o momento em que o homem é gerado nas entranhas maternas ou
numa placa de petri, embora ainda não tenha nascido. O nascimento também é um
início, mas não o início, ou seja, é apenas o início da vida que dá à luz, mas não o
início da vida humana.
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Dessa maneira, não há como concluir que o inicio da vida humana trata-se de objeto.
Além do que a interpretação abrangente da lei possibilita englobar os embriões. O que é certo
é que o embrião deve ser respeitado seguindo os ditames principiológicos fundamentais
anexados na nossa Carta Magna, pois na ausência de normas específicas, o tratamento deverá
ser harmônico aos princípios constitucionais e vedar qualquer prática contrária ao mesmo.
(BARBOSA, 2002).
3.3.3- Destinação dos embriões excedentários (Descarte, Doação, Utilização em Pesquisa
Científica)
Após todo o exposto, faz-se fundamental discorrer aqui as possibilidades quanto à
destinação dos embriões excedentários, quais sejam: o descarte, a doação ou a utilização em
pesquisa científica. O estudo versa a apresentar que com a crença que a vida em potencial
merece todo respaldo jurídico, o descarte e utilização em pesquisa científica seriam formas de
agredir esse início de vida. Assim, breve síntese das possibilidades acima elencadas.
O descarte dos embriões está respaldado na Resolução da CFM nº 2013/13, no qual
diz que os embriões criopreservados há mais de 3 anos podem ser descartados se essa for a
vontade dos pacientes. Importante salientar que tal resolução não possui força de lei, o que
demonstra que no Brasil não há regulamentação específica quanto à permissão ou vedação ao
descarte. (BOLZAN, 2016).
A Lei Federal de Biossegurança (nº11.105/2005) permite a utilização do embrião em
pesquisa científica, como se segue, por também trata-se de um direito fundamental positivado
na Constituição Federal, no qual traz benefícios a sociedade em um todo:
ART. 5º, DA LEI FEDERAL DE BIOSSEGURANÇA Nº 11.105/2005
Art. 5o É permitida, para fins de pesquisa e terapia, a utilização de células-tronco
embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro e não
utilizados no respectivo procedimento, atendidas as seguintes condições:
I – sejam embriões inviáveis; ou
II – sejam embriões congelados há 3 (três) anos ou mais, na data da publicação
desta Lei, ou que, já congelados na data da publicação desta Lei, depois de
completarem 3 (três) anos, contados a partir da data de congelamento.
§ 1o Em qualquer caso, é necessário o consentimento dos genitores.
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§ 2o Instituições de pesquisa e serviços de saúde que realizem pesquisa ou terapia
com células-tronco embrionárias humanas deverão submeter seus projetos à
apreciação e aprovação dos respectivos comitês de ética em pesquisa.
§ 3o É vedada a comercialização do material biológico a que se refere este artigo e
sua prática implica o crime tipificado no art. 15 da Lei no 9.434, de 4 de fevereiro de
1997.
Ressalta-se ainda que a ADIN 3510 que discutia a constitucionalidade sobre a
pesquisa científica com embriões, foi dada como improcedente, pois o STF entendeu que
inexiste a violação do direito a vida ao submeter células troncos embrionárias às pesquisas
científicas, conforme abaixo se segue:
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI DE BIOSSEGURANÇA.
IMPUGNAÇÃO EM BLOCO DO ART. 5º DA LEI Nº 11.105, DE 24 DE MARÇO
DE 2005 (LEI DE BIOSSEGURANÇA). PESQUISAS COM CÉLULAS-TRONCO
EMBRIONÁRIAS. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO DIREITO À VIDA.
CONSITUCIONALIDADE DO USO DE CÉLULAS-TRONCO EMBRIONÁRIAS
EM PESQUISAS CIENTÍFICAS PARA FINS TERAPÊUTICOS.
DESCARACTERIZAÇÃO DO ABORTO. NORMAS CONSTITUCIONAIS
CONFORMADORAS DO DIREITO FUNDAMENTAL A UMA VIDA DIGNA,
QUE PASSA PELO DIREITO À SAÚDE E AO PLANEJAMENTO FAMILIAR.
DESCABIMENTO DE UTILIZAÇÃO DA TÉCNICA DE INTERPRETAÇÃO
CONFORME PARA ADITAR À LEI DE BIOSSEGURANÇA CONTROLES
DESNECESSÁRIOS QUE IMPLICAM RESTRIÇÕES ÀS PESQUISAS E
TERAPIAS POR ELA VISADAS. IMPROCEDÊNCIA TOTAL DA AÇÃO. I - O
CONHECIMENTO CIENTÍFICO, A CONCEITUAÇÃO JURÍDICA DE
CÉLULAS-TRONCO EMBRIONÁRIAS E SEUS REFLEXOS NO CONTROLE
DE CONSTITUCIONALIDADE DA LEI DE BIOSSEGURANÇA.
Declina o trabalho a demonstrar as disposições gerais e preliminares da Lei de
Biossegurança abaixo, uma vez que a mesma estabelece normas de segurança e mecanismo de
fiscalização para mecanismos geneticamente modificados e seus derivados:
CAPÍTULO I DISPOSIÇÕES PRELIMINARES E GERAIS
Art. 1
o Esta Lei estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização sobre
a construção, o cultivo, a produção, a manipulação, o transporte, a transferência, a
importação, a exportação, o armazenamento, a pesquisa, a comercialização, o
consumo, a liberação no meio ambiente e o descarte de organismos geneticamente
modificados – OGM e seus derivados, tendo como diretrizes o estímulo ao avanço
científico na área de biossegurança e biotecnologia, a proteção à vida e à saúde
humana, animal e vegetal, e a observância do princípio da precaução para a proteção
do meio ambiente. § 1
o Para os fins desta Lei, considera-se atividade de pesquisa a realizada em
laboratório, regime de contenção ou campo, como parte do processo de obtenção de
OGM e seus derivados ou de avaliação da biossegurança de OGM e seus derivados,
o que engloba, no âmbito experimental, a construção, o cultivo, a manipulação, o
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transporte, a transferência, a importação, a exportação, o armazenamento, a
liberação no meio ambiente e o descarte de OGM e seus derivados. § 2
o Para os fins desta Lei, considera-se atividade de uso comercial de OGM e seus
derivados a que não se enquadra como atividade de pesquisa, e que trata do cultivo,
da produção, da manipulação, do transporte, da transferência, da comercialização, da
importação, da exportação, do armazenamento, do consumo, da liberação e do
descarte de OGM e seus derivados para fins comerciais. Art. 2
o As atividades e projetos que envolvam OGM e seus derivados, relacionados
ao ensino com manipulação de organismos vivos, à pesquisa científica, ao
desenvolvimento tecnológico e à produção industrial ficam restritos ao âmbito de
entidades de direito público ou privado, que serão responsáveis pela obediência aos
preceitos desta Lei e de sua regulamentação, bem como pelas eventuais
conseqüências ou efeitos advindos de seu descumprimento. § 1
o Para os fins desta Lei, consideram-se atividades e projetos no âmbito de
entidade os conduzidos em instalações próprias ou sob a responsabilidade
administrativa, técnica ou científica da entidade. § 2
o As atividades e projetos de que trata este artigo são vedados a pessoas físicas
em atuação autônoma e independente, ainda que mantenham vínculo empregatício
ou qualquer outro com pessoas jurídicas. § 3
o Os interessados em realizar atividade prevista nesta Lei deverão requerer
autorização à Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio, que se
manifestará no prazo fixado em regulamento. § 4
o As organizações públicas e privadas, nacionais, estrangeiras ou internacionais,
financiadoras ou patrocinadoras de atividades ou de projetos referidos
no caput deste artigo devem exigir a apresentação de Certificado de Qualidade em
Biossegurança, emitido pela CTNBio, sob pena de se tornarem co-responsáveis
pelos eventuais efeitos decorrentes do descumprimento desta Lei ou de sua
regulamentação. Art. 3
o Para os efeitos desta Lei, considera-se:
I – organismo: toda entidade biológica capaz de reproduzir ou transferir material
genético, inclusive vírus e outras classes que venham a ser conhecidas; II – ácido desoxirribonucléico - ADN, ácido ribonucléico - ARN: material genético
que contém informações determinantes dos caracteres hereditários transmissíveis à
descendência; III – moléculas de ADN/ARN recombinante: as moléculas manipuladas fora das
células vivas mediante a modificação de segmentos de ADN/ARN natural ou
sintético e que possam multiplicar-se em uma célula viva, ou ainda as moléculas de
ADN/ARN resultantes dessa multiplicação; consideram-se também os segmentos de
ADN/ARN sintéticos equivalentes aos de ADN/ARN natural; IV – engenharia genética: atividade de produção e manipulação de moléculas de
ADN/ARN recombinante; V – organismo geneticamente modificado - OGM: organismo cujo material genético
– ADN/ARN tenha sido modificado por qualquer técnica de engenharia genética; VI – derivado de OGM: produto obtido de OGM e que não possua capacidade
autônoma de replicação ou que não contenha forma viável de OGM; VII – célula germinal humana: célula-mãe responsável pela formação de gametas
presentes nas glândulas sexuais femininas e masculinas e suas descendentes diretas
em qualquer grau de ploidia; VIII – clonagem: processo de reprodução assexuada, produzida artificialmente,
baseada em um único patrimônio genético, com ou sem utilização de técnicas de
engenharia genética; IX – clonagem para fins reprodutivos: clonagem com a finalidade de obtenção de
um indivíduo; X – clonagem terapêutica: clonagem com a finalidade de produção de células-tronco
embrionárias para utilização terapêutica;
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XI – células-tronco embrionárias: células de embrião que apresentam a capacidade
de se transformar em células de qualquer tecido de um organismo. § 1
o Não se inclui na categoria de OGM o resultante de técnicas que impliquem a
introdução direta, num organismo, de material hereditário, desde que não envolvam
a utilização de moléculas de ADN/ARN recombinante ou OGM, inclusive
fecundação in vitro, conjugação, transdução, transformação, indução poliplóide e
qualquer outro processo natural. § 2
o Não se inclui na categoria de derivado de OGM a substância pura,
quimicamente definida, obtida por meio de processos biológicos e que não contenha
OGM, proteína heteróloga ou ADN recombinante. Art. 4
o Esta Lei não se aplica quando a modificação genética for obtida por meio
das seguintes técnicas, desde que não impliquem a utilização de OGM como
receptor ou doador: I – mutagênese; II – formação e utilização de células somáticas de hibridoma animal; III – fusão celular, inclusive a de protoplasma, de células vegetais, que possa ser
produzida mediante métodos tradicionais de cultivo; IV – autoclonagem de organismos não-patogênicos que se processe de maneira
natural. Art. 5
o É permitida, para fins de pesquisa e terapia, a utilização de células-tronco
embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro e
não utilizados no respectivo procedimento, atendidas as seguintes condições: I – sejam embriões inviáveis; ou II – sejam embriões congelados há 3 (três) anos ou mais, na data da publicação
desta Lei, ou que, já congelados na data da publicação desta Lei, depois de
completarem 3 (três) anos, contados a partir da data de congelamento. § 1
o Em qualquer caso, é necessário o consentimento dos genitores.
§ 2o Instituições de pesquisa e serviços de saúde que realizem pesquisa ou terapia
com células-tronco embrionárias humanas deverão submeter seus projetos à
apreciação e aprovação dos respectivos comitês de ética em pesquisa. § 3
o É vedada a comercialização do material biológico a que se refere este artigo e
sua prática implica o crime tipificado no art. 15 da Lei no 9.434, de 4 de fevereiro de
1997. Art. 6
o Fica proibido:
I – implementação de projeto relativo a OGM sem a manutenção de registro de seu
acompanhamento individual; II – engenharia genética em organismo vivo ou o manejo in vitro de ADN/ARN
natural ou recombinante, realizado em desacordo com as normas previstas nesta Lei; III – engenharia genética em célula germinal humana, zigoto humano e embrião
humano; IV – clonagem humana; V – destruição ou descarte no meio ambiente de OGM e seus derivados em
desacordo com as normas estabelecidas pela CTNBio, pelos órgãos e entidades de
registro e fiscalização, referidos no art. 16 desta Lei, e as constantes desta Lei e de
sua regulamentação; VI – liberação no meio ambiente de OGM ou seus derivados, no âmbito de
atividades de pesquisa, sem a decisão técnica favorável da CTNBio e, nos casos de
liberação comercial, sem o parecer técnico favorável da CTNBio, ou sem o
licenciamento do órgão ou entidade ambiental responsável, quando a CTNBio
considerar a atividade como potencialmente causadora de degradação ambiental, ou
sem a aprovação do Conselho Nacional de Biossegurança – CNBS, quando o
processo tenha sido por ele avocado, na forma desta Lei e de sua regulamentação; VII – a utilização, a comercialização, o registro, o patenteamento e o licenciamento
de tecnologias genéticas de restrição do uso. Parágrafo único. Para os efeitos desta Lei, entende-se por tecnologias genéticas de
restrição do uso qualquer processo de intervenção humana para geração ou
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multiplicação de plantas geneticamente modificadas para produzir estruturas
reprodutivas estéreis, bem como qualquer forma de manipulação genética que vise à
ativação ou desativação de genes relacionados à fertilidade das plantas por indutores
químicos externos. Art. 7
o São obrigatórias:
I – a investigação de acidentes ocorridos no curso de pesquisas e projetos na área de
engenharia genética e o envio de relatório respectivo à autoridade competente no
prazo máximo de 5 (cinco) dias a contar da data do evento; II – a notificação imediata à CTNBio e às autoridades da saúde pública, da defesa
agropecuária e do meio ambiente sobre acidente que possa provocar a disseminação
de OGM e seus derivados; III – a adoção de meios necessários para plenamente informar à CTNBio, às
autoridades da saúde pública, do meio ambiente, da defesa agropecuária, à
coletividade e aos demais empregados da instituição ou empresa sobre os riscos a
que possam estar submetidos, bem como os procedimentos a serem tomados no caso
de acidentes com OGM. (BIOSSEGURANÇA, 2005)
No capítulo II trata do Conselho Nacional de Biossegurança, no III da Comissão
Técnica de Biossegurança, no IV dos Órgãos e Entidades de Registro e Fiscalização, V
discorre quanto Comissão Interna de Biossegurança, VI do Sistema de Informações em
Biossegurança, no VII das responsabilidades, civil e administrativa, VIII dos Crimes e das
Penas e finalmente no IX das Disposições Finais e Transitórias.
CAPÍTULO II
Do Conselho Nacional de Biossegurança – CNBS
Art. 8o Fica criado o Conselho Nacional de Biossegurança – CNBS, vinculado à
Presidência da República, órgão de assessoramento superior do Presidente da
República para a formulação e implementação da Política Nacional de
Biossegurança – PNB.
§ 1o Compete ao CNBS:
I – fixar princípios e diretrizes para a ação administrativa dos órgãos e
entidades federais com competências sobre a matéria;
II – analisar, a pedido da CTNBio, quanto aos aspectos da conveniência e
oportunidade socioeconômicas e do interesse nacional, os pedidos de liberação para
uso comercial de OGM e seus derivados;
III – avocar e decidir, em última e definitiva instância, com base em
manifestação da CTNBio e, quando julgar necessário, dos órgãos e entidades
referidos no art. 16 desta Lei, no âmbito de suas competências, sobre os processos
relativos a atividades que envolvam o uso comercial de OGM e seus derivados;
IV – (VETADO)
§ 2o (VETADO)
§ 3o Sempre que o CNBS deliberar favoravelmente à realização da atividade
analisada, encaminhará sua manifestação aos órgãos e entidades de registro e
fiscalização referidos no art. 16 desta Lei.
§ 4o Sempre que o CNBS deliberar contrariamente à atividade analisada,
encaminhará sua manifestação à CTNBio para informação ao requerente.
Art. 9o O CNBS é composto pelos seguintes membros:
I – Ministro de Estado Chefe da Casa Civil da Presidência da República, que o
presidirá;
II – Ministro de Estado da Ciência e Tecnologia;
III – Ministro de Estado do Desenvolvimento Agrário;
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IV – Ministro de Estado da Agricultura, Pecuária e Abastecimento;
V – Ministro de Estado da Justiça;
VI – Ministro de Estado da Saúde;
VII – Ministro de Estado do Meio Ambiente;
VIII – Ministro de Estado do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior;
IX – Ministro de Estado das Relações Exteriores;
X – Ministro de Estado da Defesa;
XI – Secretário Especial de Aqüicultura e Pesca da Presidência da República.
§ 1o O CNBS reunir-se-á sempre que convocado pelo Ministro de Estado Chefe
da Casa Civil da Presidência da República, ou mediante provocação da maioria de
seus membros.
§ 2o (VETADO)
§ 3o Poderão ser convidados a participar das reuniões, em caráter excepcional,
representantes do setor público e de entidades da sociedade civil.
§ 4o O CNBS contará com uma Secretaria-Executiva, vinculada à Casa Civil da
Presidência da República.
§ 5o A reunião do CNBS poderá ser instalada com a presença de 6 (seis) de
seus membros e as decisões serão tomadas com votos favoráveis da maioria
absoluta.
CAPÍTULO III
Da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio
Art. 10. A CTNBio, integrante do Ministério da Ciência e Tecnologia, é
instância colegiada multidisciplinar de caráter consultivo e deliberativo, para prestar
apoio técnico e de assessoramento ao Governo Federal na formulação, atualização e
implementação da PNB de OGM e seus derivados, bem como no estabelecimento de
normas técnicas de segurança e de pareceres técnicos referentes à autorização para
atividades que envolvam pesquisa e uso comercial de OGM e seus derivados, com
base na avaliação de seu risco zoofitossanitário, à saúde humana e ao meio
ambiente.
Parágrafo único. A CTNBio deverá acompanhar o desenvolvimento e o
progresso técnico e científico nas áreas de biossegurança, biotecnologia, bioética e
afins, com o objetivo de aumentar sua capacitação para a proteção da saúde humana,
dos animais e das plantas e do meio ambiente.
Art. 11. A CTNBio, composta de membros titulares e suplentes, designados
pelo Ministro de Estado da Ciência e Tecnologia, será constituída por 27 (vinte e
sete) cidadãos brasileiros de reconhecida competência técnica, de notória atuação e
saber científicos, com grau acadêmico de doutor e com destacada atividade
profissional nas áreas de biossegurança, biotecnologia, biologia, saúde humana e
animal ou meio ambiente, sendo:
I – 12 (doze) especialistas de notório saber científico e técnico, em efetivo
exercício profissional, sendo:
a) 3 (três) da área de saúde humana;
b) 3 (três) da área animal;
c) 3 (três) da área vegetal;
d) 3 (três) da área de meio ambiente;
II – um representante de cada um dos seguintes órgãos, indicados pelos
respectivos titulares:
a) Ministério da Ciência e Tecnologia;
b) Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento;
c) Ministério da Saúde;
d) Ministério do Meio Ambiente;
e) Ministério do Desenvolvimento Agrário;
f) Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior;
g) Ministério da Defesa;
h) Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca da Presidência da República;
i) Ministério das Relações Exteriores;
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III – um especialista em defesa do consumidor, indicado pelo Ministro da
Justiça;
IV – um especialista na área de saúde, indicado pelo Ministro da Saúde;
V – um especialista em meio ambiente, indicado pelo Ministro do Meio
Ambiente;
VI – um especialista em biotecnologia, indicado pelo Ministro da Agricultura,
Pecuária e Abastecimento;
VII – um especialista em agricultura familiar, indicado pelo Ministro do
Desenvolvimento Agrário;
VIII – um especialista em saúde do trabalhador, indicado pelo Ministro do
Trabalho e Emprego.
§ 1o Os especialistas de que trata o inciso I do caput deste artigo serão
escolhidos a partir de lista tríplice, elaborada com a participação das sociedades
científicas, conforme disposto em regulamento.
§ 2o Os especialistas de que tratam os incisos III a VIII do caput deste artigo
serão escolhidos a partir de lista tríplice, elaborada pelas organizações da sociedade
civil, conforme disposto em regulamento.
§ 3o Cada membro efetivo terá um suplente, que participará dos trabalhos na
ausência do titular.
§ 4o Os membros da CTNBio terão mandato de 2 (dois) anos, renovável por até
mais 2 (dois) períodos consecutivos.
§ 5o O presidente da CTNBio será designado, entre seus membros, pelo
Ministro da Ciência e Tecnologia para um mandato de 2 (dois) anos, renovável por
igual período.
§ 6o Os membros da CTNBio devem pautar a sua atuação pela observância
estrita dos conceitos ético-profissionais, sendo vedado participar do julgamento de
questões com as quais tenham algum envolvimento de ordem profissional ou
pessoal, sob pena de perda de mandato, na forma do regulamento.
§ 7o A reunião da CTNBio poderá ser instalada com a presença de 14 (catorze)
de seus membros, incluído pelo menos um representante de cada uma das áreas
referidas no inciso I do caput deste artigo.
§ 8o (VETADO)
§ 8o-A As decisões da CTNBio serão tomadas com votos favoráveis da maioria
absoluta de seus membros. (Incluído pela Lei nº 11.460, de 2007)
§ 9o Órgãos e entidades integrantes da administração pública federal poderão
solicitar participação nas reuniões da CTNBio para tratar de assuntos de seu especial
interesse, sem direito a voto.
§ 10. Poderão ser convidados a participar das reuniões, em caráter excepcional,
representantes da comunidade científica e do setor público e entidades da sociedade
civil, sem direito a voto.
Art. 12. O funcionamento da CTNBio será definido pelo regulamento desta Lei.
§ 1o A CTNBio contará com uma Secretaria-Executiva e cabe ao Ministério da
Ciência e Tecnologia prestar-lhe o apoio técnico e administrativo.
§ 2o (VETADO)
Art. 13. A CTNBio constituirá subcomissões setoriais permanentes na área de
saúde humana, na área animal, na área vegetal e na área ambiental, e poderá
constituir subcomissões extraordinárias, para análise prévia dos temas a serem
submetidos ao plenário da Comissão.
§ 1o Tanto os membros titulares quanto os suplentes participarão das
subcomissões setoriais e caberá a todos a distribuição dos processos para análise.
§ 2o O funcionamento e a coordenação dos trabalhos nas subcomissões setoriais
e extraordinárias serão definidos no regimento interno da CTNBio.
Art. 14. Compete à CTNBio:
I – estabelecer normas para as pesquisas com OGM e derivados de OGM;
II – estabelecer normas relativamente às atividades e aos projetos relacionados
a OGM e seus derivados;
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III – estabelecer, no âmbito de suas competências, critérios de avaliação e
monitoramento de risco de OGM e seus derivados;
IV – proceder à análise da avaliação de risco, caso a caso, relativamente a
atividades e projetos que envolvam OGM e seus derivados;
V – estabelecer os mecanismos de funcionamento das Comissões Internas de
Biossegurança – CIBio, no âmbito de cada instituição que se dedique ao ensino, à
pesquisa científica, ao desenvolvimento tecnológico e à produção industrial que
envolvam OGM ou seus derivados;
VI – estabelecer requisitos relativos à biossegurança para autorização de
funcionamento de laboratório, instituição ou empresa que desenvolverá atividades
relacionadas a OGM e seus derivados;
VII – relacionar-se com instituições voltadas para a biossegurança de OGM e
seus derivados, em âmbito nacional e internacional;
VIII – autorizar, cadastrar e acompanhar as atividades de pesquisa com OGM
ou derivado de OGM, nos termos da legislação em vigor;
IX – autorizar a importação de OGM e seus derivados para atividade de
pesquisa;
X – prestar apoio técnico consultivo e de assessoramento ao CNBS na
formulação da PNB de OGM e seus derivados;
XI – emitir Certificado de Qualidade em Biossegurança – CQB para o
desenvolvimento de atividades com OGM e seus derivados em laboratório,
instituição ou empresa e enviar cópia do processo aos órgãos de registro e
fiscalização referidos no art. 16 desta Lei;
XII – emitir decisão técnica, caso a caso, sobre a biossegurança de OGM e seus
derivados no âmbito das atividades de pesquisa e de uso comercial de OGM e seus
derivados, inclusive a classificação quanto ao grau de risco e nível de biossegurança
exigido, bem como medidas de segurança exigidas e restrições ao uso;
XIII – definir o nível de biossegurança a ser aplicado ao OGM e seus usos, e os
respectivos procedimentos e medidas de segurança quanto ao seu uso, conforme as
normas estabelecidas na regulamentação desta Lei, bem como quanto aos seus
derivados;
XIV – classificar os OGM segundo a classe de risco, observados os critérios
estabelecidos no regulamento desta Lei;
XV – acompanhar o desenvolvimento e o progresso técnico-científico na
biossegurança de OGM e seus derivados;
XVI – emitir resoluções, de natureza normativa, sobre as matérias de sua
competência;
XVII – apoiar tecnicamente os órgãos competentes no processo de prevenção e
investigação de acidentes e de enfermidades, verificados no curso dos projetos e das
atividades com técnicas de ADN/ARN recombinante;
XVIII – apoiar tecnicamente os órgãos e entidades de registro e fiscalização,
referidos no art. 16 desta Lei, no exercício de suas atividades relacionadas a OGM e
seus derivados;
XIX – divulgar no Diário Oficial da União, previamente à análise, os extratos
dos pleitos e, posteriormente, dos pareceres dos processos que lhe forem
submetidos, bem como dar ampla publicidade no Sistema de Informações em
Biossegurança – SIB a sua agenda, processos em trâmite, relatórios anuais, atas das
reuniões e demais informações sobre suas atividades, excluídas as informações
sigilosas, de interesse comercial, apontadas pelo proponente e assim consideradas
pela CTNBio;
XX – identificar atividades e produtos decorrentes do uso de OGM e seus
derivados potencialmente causadores de degradação do meio ambiente ou que
possam causar riscos à saúde humana;
XXI – reavaliar suas decisões técnicas por solicitação de seus membros ou por
recurso dos órgãos e entidades de registro e fiscalização, fundamentado em fatos ou
45
conhecimentos científicos novos, que sejam relevantes quanto à biossegurança do
OGM ou derivado, na forma desta Lei e seu regulamento;
XXII – propor a realização de pesquisas e estudos científicos no campo da
biossegurança de OGM e seus derivados;
XXIII – apresentar proposta de regimento interno ao Ministro da Ciência e
Tecnologia.
§ 1o Quanto aos aspectos de biossegurança do OGM e seus derivados, a decisão
técnica da CTNBio vincula os demais órgãos e entidades da administração.
§ 2o Nos casos de uso comercial, dentre outros aspectos técnicos de sua análise,
os órgãos de registro e fiscalização, no exercício de suas atribuições em caso de
solicitação pela CTNBio, observarão, quanto aos aspectos de biossegurança do
OGM e seus derivados, a decisão técnica da CTNBio.
§ 3o Em caso de decisão técnica favorável sobre a biossegurança no âmbito da
atividade de pesquisa, a CTNBio remeterá o processo respectivo aos órgãos e
entidades referidos no art. 16 desta Lei, para o exercício de suas atribuições.
§ 4o A decisão técnica da CTNBio deverá conter resumo de sua fundamentação
técnica, explicitar as medidas de segurança e restrições ao uso do OGM e seus
derivados e considerar as particularidades das diferentes regiões do País, com o
objetivo de orientar e subsidiar os órgãos e entidades de registro e fiscalização,
referidos no art. 16 desta Lei, no exercício de suas atribuições.
§ 5o Não se submeterá a análise e emissão de parecer técnico da CTNBio o
derivado cujo OGM já tenha sido por ela aprovado.
§ 6o As pessoas físicas ou jurídicas envolvidas em qualquer das fases do
processo de produção agrícola, comercialização ou transporte de produto
geneticamente modificado que tenham obtido a liberação para uso comercial estão
dispensadas de apresentação do CQB e constituição de CIBio, salvo decisão em
contrário da CTNBio.
Art. 15. A CTNBio poderá realizar audiências públicas, garantida participação
da sociedade civil, na forma do regulamento.
Parágrafo único. Em casos de liberação comercial, audiência pública poderá ser
requerida por partes interessadas, incluindo-se entre estas organizações da sociedade
civil que comprovem interesse relacionado à matéria, na forma do regulamento.
CAPÍTULO IV
Dos órgãos e entidades de registro e fiscalização
Art. 16. Caberá aos órgãos e entidades de registro e fiscalização do Ministério
da Saúde, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e do Ministério
do Meio Ambiente, e da Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca da Presidência
da República entre outras atribuições, no campo de suas competências, observadas a
decisão técnica da CTNBio, as deliberações do CNBS e os mecanismos
estabelecidos nesta Lei e na sua regulamentação:
I – fiscalizar as atividades de pesquisa de OGM e seus derivados;
II – registrar e fiscalizar a liberação comercial de OGM e seus derivados;
III – emitir autorização para a importação de OGM e seus derivados para uso
comercial;
IV – manter atualizado no SIB o cadastro das instituições e responsáveis
técnicos que realizam atividades e projetos relacionados a OGM e seus derivados;
V – tornar públicos, inclusive no SIB, os registros e autorizações concedidas;
VI – aplicar as penalidades de que trata esta Lei;
VII – subsidiar a CTNBio na definição de quesitos de avaliação de
biossegurança de OGM e seus derivados.
§ 1o Após manifestação favorável da CTNBio, ou do CNBS, em caso de
avocação ou recurso, caberá, em decorrência de análise específica e decisão
pertinente:
I – ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento emitir as
autorizações e registros e fiscalizar produtos e atividades que utilizem OGM e seus
46
derivados destinados a uso animal, na agricultura, pecuária, agroindústria e áreas
afins, de acordo com a legislação em vigor e segundo o regulamento desta Lei;
II – ao órgão competente do Ministério da Saúde emitir as autorizações e
registros e fiscalizar produtos e atividades com OGM e seus derivados destinados a
uso humano, farmacológico, domissanitário e áreas afins, de acordo com a
legislação em vigor e segundo o regulamento desta Lei;
III – ao órgão competente do Ministério do Meio Ambiente emitir as
autorizações e registros e fiscalizar produtos e atividades que envolvam OGM e seus
derivados a serem liberados nos ecossistemas naturais, de acordo com a legislação
em vigor e segundo o regulamento desta Lei, bem como o licenciamento, nos casos
em que a CTNBio deliberar, na forma desta Lei, que o OGM é potencialmente
causador de significativa degradação do meio ambiente;
IV – à Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca da Presidência da República
emitir as autorizações e registros de produtos e atividades com OGM e seus
derivados destinados ao uso na pesca e aqüicultura, de acordo com a legislação em
vigor e segundo esta Lei e seu regulamento.
§ 2o Somente se aplicam as disposições dos incisos I e II do art. 8
o e
do caput do art. 10 da Lei no 6.938, de 31 de agosto de 1981, nos casos em que a
CTNBio deliberar que o OGM é potencialmente causador de significativa
degradação do meio ambiente.
§ 3o A CTNBio delibera, em última e definitiva instância, sobre os casos em
que a atividade é potencial ou efetivamente causadora de degradação ambiental, bem
como sobre a necessidade do licenciamento ambiental.
§ 4o A emissão dos registros, das autorizações e do licenciamento ambiental
referidos nesta Lei deverá ocorrer no prazo máximo de 120 (cento e vinte) dias.
§ 5o A contagem do prazo previsto no § 4
o deste artigo será suspensa, por até
180 (cento e oitenta) dias, durante a elaboração, pelo requerente, dos estudos ou
esclarecimentos necessários.
§ 6o As autorizações e registros de que trata este artigo estarão vinculados à
decisão técnica da CTNBio correspondente, sendo vedadas exigências técnicas que
extrapolem as condições estabelecidas naquela decisão, nos aspectos relacionados à
biossegurança.
§ 7o Em caso de divergência quanto à decisão técnica da CTNBio sobre a
liberação comercial de OGM e derivados, os órgãos e entidades de registro e
fiscalização, no âmbito de suas competências, poderão apresentar recurso ao CNBS,
no prazo de até 30 (trinta) dias, a contar da data de publicação da decisão técnica da
CTNBio.
CAPÍTULO V
Da Comissão Interna de Biossegurança – CIBio
Art. 17. Toda instituição que utilizar técnicas e métodos de engenharia genética
ou realizar pesquisas com OGM e seus derivados deverá criar uma Comissão Interna
de Biossegurança - CIBio, além de indicar um técnico principal responsável para
cada projeto específico.
Art. 18. Compete à CIBio, no âmbito da instituição onde constituída:
I – manter informados os trabalhadores e demais membros da coletividade,
quando suscetíveis de serem afetados pela atividade, sobre as questões relacionadas
com a saúde e a segurança, bem como sobre os procedimentos em caso de acidentes;
II – estabelecer programas preventivos e de inspeção para garantir o
funcionamento das instalações sob sua responsabilidade, dentro dos padrões e
normas de biossegurança, definidos pela CTNBio na regulamentação desta Lei;
III – encaminhar à CTNBio os documentos cuja relação será estabelecida na
regulamentação desta Lei, para efeito de análise, registro ou autorização do órgão
competente, quando couber;
IV – manter registro do acompanhamento individual de cada atividade ou
projeto em desenvolvimento que envolvam OGM ou seus derivados;
47
V – notificar à CTNBio, aos órgãos e entidades de registro e fiscalização,
referidos no art. 16 desta Lei, e às entidades de trabalhadores o resultado de
avaliações de risco a que estão submetidas as pessoas expostas, bem como qualquer
acidente ou incidente que possa provocar a disseminação de agente biológico;
VI – investigar a ocorrência de acidentes e as enfermidades possivelmente
relacionados a OGM e seus derivados e notificar suas conclusões e providências à
CTNBio.
CAPÍTULO VI
Do Sistema de Informações em Biossegurança – SIB
Art. 19. Fica criado, no âmbito do Ministério da Ciência e Tecnologia, o
Sistema de Informações em Biossegurança – SIB, destinado à gestão das
informações decorrentes das atividades de análise, autorização, registro,
monitoramento e acompanhamento das atividades que envolvam OGM e seus
derivados.
§ 1o As disposições dos atos legais, regulamentares e administrativos que
alterem, complementem ou produzam efeitos sobre a legislação de biossegurança de
OGM e seus derivados deverão ser divulgadas no SIB concomitantemente com a
entrada em vigor desses atos.
§ 2o Os órgãos e entidades de registro e fiscalização, referidos no art. 16 desta
Lei, deverão alimentar o SIB com as informações relativas às atividades de que trata
esta Lei, processadas no âmbito de sua competência.
CAPÍTULO VII
Da Responsabilidade Civil e Administrativa
Art. 20. Sem prejuízo da aplicação das penas previstas nesta Lei, os
responsáveis pelos danos ao meio ambiente e a terceiros responderão,
solidariamente, por sua indenização ou reparação integral, independentemente da
existência de culpa.
Art. 21. Considera-se infração administrativa toda ação ou omissão que viole as
normas previstas nesta Lei e demais disposições legais pertinentes.
Parágrafo único. As infrações administrativas serão punidas na forma
estabelecida no regulamento desta Lei, independentemente das medidas cautelares
de apreensão de produtos, suspensão de venda de produto e embargos de atividades,
com as seguintes sanções:
I – advertência;
II – multa;
III – apreensão de OGM e seus derivados;
IV – suspensão da venda de OGM e seus derivados;
V – embargo da atividade;
VI – interdição parcial ou total do estabelecimento, atividade ou
empreendimento;
VII – suspensão de registro, licença ou autorização;
VIII – cancelamento de registro, licença ou autorização;
IX – perda ou restrição de incentivo e benefício fiscal concedidos pelo governo;
X – perda ou suspensão da participação em linha de financiamento em
estabelecimento oficial de crédito;
XI – intervenção no estabelecimento;
XII – proibição de contratar com a administração pública, por período de até 5
(cinco) anos.
Art. 22. Compete aos órgãos e entidades de registro e fiscalização, referidos no
art. 16 desta Lei, definir critérios, valores e aplicar multas de R$ 2.000,00 (dois mil
reais) a R$ 1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil reais), proporcionalmente à
gravidade da infração.
§ 1o As multas poderão ser aplicadas cumulativamente com as demais sanções
previstas neste artigo.
§ 2o No caso de reincidência, a multa será aplicada em dobro.
48
§ 3o No caso de infração continuada, caracterizada pela permanência da ação ou
omissão inicialmente punida, será a respectiva penalidade aplicada diariamente até
cessar sua causa, sem prejuízo da paralisação imediata da atividade ou da interdição
do laboratório ou da instituição ou empresa responsável.
Art. 23. As multas previstas nesta Lei serão aplicadas pelos órgãos e entidades
de registro e fiscalização dos Ministérios da Agricultura, Pecuária e Abastecimento,
da Saúde, do Meio Ambiente e da Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca da
Presidência da República, referidos no art. 16 desta Lei, de acordo com suas
respectivas competências.
§ 1o Os recursos arrecadados com a aplicação de multas serão destinados aos
órgãos e entidades de registro e fiscalização, referidos no art. 16 desta Lei, que
aplicarem a multa.
§ 2o Os órgãos e entidades fiscalizadores da administração pública federal
poderão celebrar convênios com os Estados, Distrito Federal e Municípios, para a
execução de serviços relacionados à atividade de fiscalização prevista nesta Lei e
poderão repassar-lhes parcela da receita obtida com a aplicação de multas.
§ 3o A autoridade fiscalizadora encaminhará cópia do auto de infração à
CTNBio.
§ 4o Quando a infração constituir crime ou contravenção, ou lesão à Fazenda
Pública ou ao consumidor, a autoridade fiscalizadora representará junto ao órgão
competente para apuração das responsabilidades administrativa e penal.
CAPÍTULO VIII
Dos Crimes e das Penas
Art. 24. Utilizar embrião humano em desacordo com o que dispõe o art.
5o desta Lei:
Pena – detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.
Art. 25. Praticar engenharia genética em célula germinal humana, zigoto
humano ou embrião humano:
Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.
Art. 26. Realizar clonagem humana:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.
Art. 27. Liberar ou descartar OGM no meio ambiente, em desacordo com as
normas estabelecidas pela CTNBio e pelos órgãos e entidades de registro e
fiscalização:
Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.
§ 1o (VETADO)
§ 2o Agrava-se a pena:
I – de 1/6 (um sexto) a 1/3 (um terço), se resultar dano à propriedade alheia;
II – de 1/3 (um terço) até a metade, se resultar dano ao meio ambiente;
III – da metade até 2/3 (dois terços), se resultar lesão corporal de natureza grave
em outrem;
IV – de 2/3 (dois terços) até o dobro, se resultar a morte de outrem.
Art. 28. Utilizar, comercializar, registrar, patentear e licenciar tecnologias
genéticas de restrição do uso:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.
Art. 29. Produzir, armazenar, transportar, comercializar, importar ou exportar
OGM ou seus derivados, sem autorização ou em desacordo com as normas
estabelecidas pela CTNBio e pelos órgãos e entidades de registro e fiscalização:
Pena – reclusão, de 1 (um) a 2 (dois) anos, e multa.
CAPÍTULO IX
Disposições Finais e Transitórias
Art. 30. Os OGM que tenham obtido decisão técnica da CTNBio favorável a
sua liberação comercial até a entrada em vigor desta Lei poderão ser registrados e
comercializados, salvo manifestação contrária do CNBS, no prazo de 60 (sessenta)
dias, a contar da data da publicação desta Lei.
49
Art. 31. A CTNBio e os órgãos e entidades de registro e fiscalização, referidos
no art. 16 desta Lei, deverão rever suas deliberações de caráter normativo, no prazo
de 120 (cento e vinte) dias, a fim de promover sua adequação às disposições desta
Lei.
Art. 32. Permanecem em vigor os Certificados de Qualidade em Biossegurança,
comunicados e decisões técnicas já emitidos pela CTNBio, bem como, no que não
contrariarem o disposto nesta Lei, os atos normativos emitidos ao amparo da Lei
no 8.974, de 5 de janeiro de 1995.
Art. 33. As instituições que desenvolverem atividades reguladas por esta Lei na
data de sua publicação deverão adequar-se as suas disposições no prazo de 120
(cento e vinte) dias, contado da publicação do decreto que a regulamentar.
Art. 34. Ficam convalidados e tornam-se permanentes os registros provisórios
concedidos sob a égide da Lei no 10.814, de 15 de dezembro de 2003.
Art. 35. Ficam autorizadas a produção e a comercialização de sementes de
cultivares de soja geneticamente modificadas tolerantes a glifosato registradas no
Registro Nacional de Cultivares - RNC do Ministério da Agricultura, Pecuária e
Abastecimento.
Art. 36. Fica autorizado o plantio de grãos de soja geneticamente modificada
tolerante a glifosato, reservados pelos produtores rurais para uso próprio, na safra
2004/2005, sendo vedada a comercialização da produção como semente. (Vide
Decreto nº 5.534, de 2005)
Parágrafo único. O Poder Executivo poderá prorrogar a autorização de que trata
o caput deste artigo.
Art. 37. A descrição do Código 20 do Anexo VIII da Lei no 6.938, de 31 de
agosto de 1981, acrescido pela Lei no 10.165, de 27 de dezembro de 2000, passa a
vigorar com a seguinte redação:
Art. 39. Não se aplica aos OGM e seus derivados o disposto na Lei no 7.802, de
11 de julho de 1989, e suas alterações, exceto para os casos em que eles sejam
desenvolvidos para servir de matéria-prima para a produção de agrotóxicos.
Art. 40. Os alimentos e ingredientes alimentares destinados ao consumo
humano ou animal que contenham ou sejam produzidos a partir de OGM ou
derivados deverão conter informação nesse sentido em seus rótulos, conforme
regulamento.
Art. 41. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 42. Revogam-se a Lei no 8.974, de 5 de janeiro de 1995, a Medida
Provisória no 2.191-9, de 23 de agosto de 2001, e os arts. 5
o, 6
o, 7
o, 8
o, 9
o, 10 e 16 da
Lei no 10.814, de 15 de dezembro de 2003.
Brasília, 24 de março de 2005; 184o da Independência e 117
o da República.
Desse modo, a legislação de biossegurança vem com o intuito de regular a o
relacionamento social e as atividades de interesse público a serem priorizadas, Frota (2006,
pág. 02) diz:
(...) especificamente no aspecto da biossegurança nacional, assunto de grande
interesse público, é a Lei 11.105/2005 que estabelece normas de segurança e
mecanismos de fiscalização para as atividades que envolvem organismos
geneticamente modificados.
A referida Lei, em seu art. 1º, discrimina sobre quais atividades recaem essas normas
de segurança e mecanismos de fiscalização. Dispõe-se sobre quatorze modalidades
de atividades, as quais passam a estar liberadas no país dentro dos limites dispostos
na Lei e regulamentados pelos órgãos competentes.
As atividades abrangidas pela Lei 11.105/2005 no uso de organismos geneticamente
modificados são: construção, cultivo, produção, manipulação, transporte,
50
transferência, importação, exportação, armazenamento, pesquisa, comercialização,
consumo, liberação no meio ambiente e descarte de organismos geneticamente
modificados e seus derivados.
Ampliou-se, assim, o rol das atividades abrangidas pela anterior Lei nº 8.974/1995, a
qual não contemplava as atividades de produção, transferência, exportação,
armazenamento e pesquisa de organismos geneticamente modificados e seus
derivados.
Outrossim, quanto às diretrizes da Lei, também dispostas no seu art. 1º, observa-se
que, além de acolherem o princípio da precaução, destacam o estímulo ao avanço
científico na área de biossegurança e biotecnologia, bem como a proteção à vida e à
saúde humana, animal e vegetal.
Tais diretrizes apontam a preocupação do legislador: vida e saúde humana, animal e
vegetal, sendo essas suas prioridades. Porém, infelizmente, ao destacar especialmente as
pesquisas científicas em biossegurança e biotecnologia, estimulou o tratamento
instrumentalizado, objetificado de uma vida em potencial em seu artigo 5ª, que, como tratado
acima, ao ser apreciado pelo Supremo Tribunal Federal na Ação Direta de
Inconstitucionalidade n. 3510, não foi tida como inconstitucional.
Finalmente, o estudo defende a posição de doação dos embriões excedentes, por
respeito à vida e dignidade humana, pela interpretação abrangente da legislação civil que
coloca a salvo os direitos do ser desde a concepção e por entender que uma vida em potencial
não pode ser objetificada.
Assim, as doações dos embriões excedentes seriam uma forma de resolver, de forma
mais humana, em respeito aos princípios constitucionais o destino desses embriões. A Ação
Direta de Inconstitucionalidade n. 3510/DF, proposta em 16 de maio de 2005 no qual foi
julgada improcedente, permitindo a instrumentalização do embrião para pesquisas científicas.
Na falta de medida legal que regule a doação de embriões, aplica-se analogicamente a
proteção conferida ao embrião, o qual foi tratado anteriormente no trabalho. O Estatuto da
Criança e Adolescente leciona o direito ao nascimento, por exemplo.
Admitir ser o embrião uma potencialidade de pessoa é aceitar que, entre o que é hoje
e o homem e que ele será, no futuro, há uma distância a ser percorrida. O ser
concebido deve ser visto, isto sim, como uma pessoa humana in fieri, ou pessoa
humana com um potencial. Assim ele próprio sinalizará o reconhecimento de sua
dignidade e a proteção de sua pessoa. O direito do embrião deve harmonizar-se com
outros direitos, talvez menos fundamentais que a dignidade. Além do mais, é preciso
ressaltar a impropriedade do postulado, para pensar que o caráter contínuo do
desenvolvimento do fenômeno vital torna improvável o corte da vida, desde a
concepção à morte, em categorias submetidas, cada uma delas, a um direito diferente
[...]. (BERTI, 2008, P.90-91).
51
É nesse sentido que se deve destinar os embriões excedentes, contemplando um
caminho ao mesmo que possibilite e respeite o principio do direito a vida e a dignidade.
Sob esse aspecto de se destinar a terceiros os embriões que ultrapassaram a
quantidade necessária à implantação, outra solução apontada é a adoção dos
mesmos. Ao tempo que afasta o caráter de coisa daquele que seria objeto de negócio
translativo gratuito, a possibilidade de adotar embriões aproxima-se das pessoas
nascidas, outorgando àqueles tal qual a essas a proteção que deriva do procedimento
adotivo. (MEIRELLES, 2000, p.199).
Apesar de instrumentalizar a vida humana, a Conselho Federal de Medicina dispõe em
seu capítulo IV a possibilidade de doação:
IV - DOAÇÃO DE GAMETAS OU EMBRIÕES 1 - A doação nunca terá caráter
lucrativo ou comercial. 2 - Os doadores não devem conhecer a identidade dos
receptores e vice-versa. 3 - A idade limite para a doação de gametas é de 35 anos
para a mulher e 50 anos para o homem. 4 - Obrigatoriamente será mantido o sigilo
sobre a identidade dos doadores de gametas e embriões, bem como dos receptores.
Em situações especiais, as informações sobre doadores, por motivação médica,
podem ser fornecidas exclusivamente para médicos, resguardando-se a identidade
civil do doador. 5 - As clínicas, centros ou serviços que empregam a doação devem
manter, de forma permanente, um registro de dados clínicos de caráter geral,
características fenotípicas e uma amostra de material celular dos doadores, de acordo
com a legislação vigente. 6 - Na região de localização da unidade, o registro dos
nascimentos evitará que um(a) doador(a) tenha produzido mais que duas gestações
de crianças de sexos diferentes, numa área de um milhão de habitantes. 7 - A escolha
dos doadores é de responsabilidade da unidade. Dentro do possível, deverá garantir
que o doador tenha a maior semelhança fenotípica e imunológica e a máxima
possibilidade de compatibilidade com a receptora. 8 - Não será permitido ao médico
responsável pelas clínicas, unidades ou serviços, nem aos integrantes da equipe
multidisciplinar que nelas prestam serviços, participarem como doadores nos
programas de - É permitida a doação voluntária de gametas, bem como a situação
identificada como doação compartilhada de oócitos em RA, onde doadora e
receptora, participando como portadoras de problemas de reprodução, compartilham
tanto do material biológico quanto dos custos financeiros que envolvem o
procedimento de RA. A doadora tem preferência sobre o material biológico que será
produzido.
Meirelles se posiciona da seguinte maneira:
Ao se admitir ao embrião a natureza de ser humano, impõe-se reconhecer a
necessidade de sua proteção jurídica, assegurando-lhe o direito à vida e o respeito à
sua dignidade. Não se trata de fixar normas especiais sobre cada hipótese a ser
solucionada (até porque o distanciamento com a realidade tão velozmente alterada
pela evolução científica seria inevitável), mas de adequar as normas existentes no
sentido de respeitar a dignidade e a vida dos seres embrionários em todos os
desdobramentos fáticos oriundos do emprego das técnicas biocientíficas.
(MEIRELLES, 2000, p.177).
52
Desse modo, compreendendo que o embrião deve ser tratado com a extensão dos
princípios constitucionais, sendo a realidade do embrião excedentário intensa no Brasil, um
método para protegê-los e destiná-los de maneira mais humana, no qual merecem, seria a de
doação dos mesmos.
53
CONCLUSÃO
Diante de todo exposto, vislumbra-se que se trata de uma realidade o grande número
de embriões excedentes no Brasil. Através disso e compreendendo que o embrião é um ser em
potencial, pois é o início da vida, o estudo discorreu no sentido de apresentar os princípios
fundamentais que tutelam o embrião, ainda, em apresentar as teorias acerca do início da vida.
Entre as teorias demonstradas, defende-se a aplicação concepcionista, uma vez que a
ciência compreende que a concepção inicia-se com a fecundação do óvulo com o
espermatozoide. Desse modo, se o maior bem a ser tutelado no universo jurídico trata-se da
vida e essa dar-se início com o fenômeno da concepção em seu estágio mais inaugural, a
corrente mais viável a ser defendida trata-se da citada, de maneira a garantir o
desenvolvimento do ser humano até que nasça.
Vale dizer que as teorias explanas, como a natalista, em que advoga no sentido de
argumentar que a vida inaugura com o nascimento com vida do ser, os defensores da mesma
ignoram a vida em seus estágios iniciais, não respeitando o direito ao desenvolvimento e
direito ao nascimento, no qual já é preceituado na legislação pátria. Ainda, quanto à teoria
gradualista e da nidação, compreende a primeira que a vida deve ser entendida e tutelada
paulatinamente conforme seu progresso e a segunda apenas após o embrião se fixar na parede
do útero da mulher, o que não é viável, tendo por entendimento que sempre que se tratar de
vida humana, a proteção deve ser estendida e não diminuída. Por fim, o estudo entende que a
teoria das primeiras atividades cerebrais também não se aplica aos embriões excedentários, já
que a entre os próprios defensores há grande incoerência sobre quando há de fato a primeira
atividade cerebral.
Mesmo com toda doutrina divergindo em quanto à problemática acima exposta, o que
não pode ficar sem apreciação é o embrião, dotado de vida e individualidade, passível de
objetificação. Dessa maneira, conclui-se com extensão interpretativa da legislação civil que o
embrião humano possui os mesmos direitos do nascituro, já que a lei protege desde sua
concepção, momento inicial da vida. Ainda, que o embrião deve ser tutelado com base
harmônica nos princípios constitucionais tutelados em nossa Carta Magna.
Com a falta de legislação que regulamente especificamente a destinação dos embriões
excedentes e sob forte fundamento demonstrado no trabalho, se finda posicionando quanto à
54
medida de doação dos embriões excedentes como maneira mais viável a tratar o ser humano
em potencial respeitando sua integridade, dignidade e direito a vida.
55
REFERÊNCIAS
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https://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/8272/Direitos-do-nascituro-e-do-embriao.
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