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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO PARANÁ CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL – JORNALISMO FERNANDA GIOTTO SERPA UM DINOSSAURO ENTRE FOCAS 7

Trabalho Científico - Mazza

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Trabalho baseado em entrevista com o jornalisto Geraldo Mazza

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO PARANÁ

CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS

CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL – JORNALISMO

FERNANDA GIOTTO SERPA

UM DINOSSAURO ENTRE FOCAS

CURITIBA

2008

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FERNANDA GIOTTO SERPA

UM DINOSSAURO ENTRE FOCAS

Projeto de pesquisa apresentado como requisito à obtenção de nota na disciplina de Teorias da Comunicação do Centro de Ciências Jurídicas e Sociais da Pontifícia Universidade Católica do Paraná.

Professora: Celina do Rocio Paz Alvetti.

CURITIBA

2008

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EPÍGRAFE

“O jornal, na minha época, era uma

coisa viva. Era um verdadeiro teatro. E você

não terminava na hora em que o pano

descia. Terminava o jornal, mas você

continuava. Você ia pra rua viver o jornal”.

Luiz Geraldo Mazza

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RESUMO

O jornalista Luiz Geraldo Mazza, com seus 56 anos de carreira, é um ícone do jornalismo no Paraná. Esteve presente em grandes acontecimentos e a história da sua vida confunde-se com a história do estado do Paraná. Melhor ainda, a história da sua vida faz parte da história do Paraná. Participou dos veículos relevantes e ao lado de outras grandes personalidades. Hoje ele trabalha na Folha de Londrina e na Rádio CBN. O assunto mais abordado por ele é a política. A formação em Direito contribui muito para o texto jornalístico político independente e crítico, sempre bem amarrado. Participou também da primeira transmissão de TV pelo canal 6. Mas o que ele não esquece é do jornalismo romântico. A literatura era muito viva. Hoje foi substituída por lead e sub-lead, mas Mazza nunca deixou de poetizar. Além do lado jornalista Mazza tem seu lado palhaço. Dança balé, conta piada, faz teatro e conversa. Conversa muito. Para ele lugar de jornalista é na rua. Telefone e e-mail são objetos práticos que tornam o jornalista acomodado. Encontrar o Mazza na rua não é uma missão difícil. A Boca Maldita nunca deixou de ser freqüentada por esse senhor com memória de elefante.

Palavras-chave: Luiz Geraldo Mazza. Jornalismo. História. Paraná.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ________________________________________________ 7

2 ASSIM QUE OS OLHOS BATERAM _______________________________ 9

3 UM POUCO DE TUDO, DE TUDO UM POUCO ______________________11

4 IMPOSSÍVEL NÃO FALAR DE POLÍTICA___________________________15

5 CONCLUSÃO _________________________________________________17

6 REFERÊNCIAS________________________________________________19

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1 INTRODUÇÃO

Quem entra no curso de Jornalismo dificilmente deixa de pensar no lado

romântico da profissão. Sair nas ruas atrás de matérias, dar um furo, escrever nos

trambolhos barulhentos que eram as máquinas de escrever, sujar as mãos com o

carbono, tomar vários cafezinhos um atrás do outro, fechar a edição do jornal de

madrugada, sentir a adrenalina correndo nas veias e pegar o jornal fresquinho.

Então era só colocá-lo embaixo do braço e ir discutir a edição nos bares. A base de

muito cigarro e bebida alcoólica eram isso que os jornalistas faziam. Óbvio que isso

não é exemplo que se siga.

Hoje existe prazo para fechar o jornal, computadores, máquinas digitais,

telefone, e-mail e muito individualismo. Existe o que a gente chama de “copia e

cola”. Não podemos tirar o mérito dos jornais, mas se formos realistas eles são

praticamente iguais. O estilo, a diagramação, as matérias e chamadas. Mas esse

não o exemplo que os focas1 querem seguir também. Falta alma de jornalista.

Com toda essa realidade, modernidade e tecnologia lembra-se então do

romantismo que ainda sobrevive nos jornais. Aqueles com cabelos brancos, rugas

profundas e mãos manchadas que entendem muito daquilo que a gente procura.

Adoram contar estórias, lembrar e sentir mais uma vez o gostinho do que foi o

passado.

Eles sentiram os dedos batendo nas máquinas, o gosto do café requentado e

os jornais ainda quentes nas mãos. E a memória? Viva como nunca. É como se

tivesse acontecido ontem. A grande maioria lembra tudo o que aconteceu no

turbulento trabalho que é o Jornalismo.

A adaptação ao Jornalismo atual é necessária. Não se pode simplesmente

querer revolucionar o meio jornalístico e regredir. É uma contradição. Não é isso que

peço. Só não devemos perder o sonho. Não deixar o Jornalismo ser uma profissão

do bolso, do financeiro. Jornalismo é profissão de peito, raça. Usar os aparatos

tecnológicos é viável, dá agilidade e rapidez para o meio comunicacional.

1“Esse termo, usado como substantivo dos dois gêneros, e suas derivações sexológicas de hoje em dia, designa também o / a jornalista em começo de carreira, baseado nas redações dos jornais.[...] O foca é bandeiroso como a foca dos mares; talvez esta seja a chave para entendê-los. Mas o foca, foca mesmo, com os atributos que parecem negativos, é o que vai tornar-se o repórter que se preza, o jornalista de honra.” (SANT´ANNA, Romildo. O Foca. Disponível em: < http://www.triplov.com/romildo/foca.html >. Acesso em: 19 nov. 2007.)

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No mundo globalizado é assim que deve ser. A notícia chega rápido, entra

rápido e sai rápido. O ontem já foi, a preocupação é com o presente, o agora, já! O

pensamento deve seguir essa velocidade. O jornalista deve ser assim, estar sempre

um passo a frente, mas como eu já falei, ele deve ter peito e lutar por essa profissão.

Em meio a essas cabeças brancas de lutadores de peito encontramos Luiz

Geraldo Mazza, o Mazza. Que fala da profissão com paixão. Abraçou-a aos 20 anos

e desde então nunca mais a soltou. Formou-se em Direito e chegou a exercer a

profissão, mas agarrou-se ao Jornalismo. Sempre com a cabeça a mil e produzindo

muito ele se destacou. Trabalhou em vários meios de comunicação dentro do

Paraná, que serão citados no decorrer da pesquisa. Marcou seu território e dali não

saiu. Com 76 anos, sendo 56 destinados à carreira jornalística, Mazza já escreveu

muito, mas muitos já escreveram sobre ele.

Atitude é uma coisa que nunca lhe faltou na visão desses escritores: escreve,

fala, pensa, grita, exige, provoca, reage, briga, reflete, critica, bebe, xinga, sorri,

gesticula, torce, espera, apresenta, cumprimenta, brinca, polemiza, encanta, analisa,

abraça, politiza, telefona, conversa, atua, canta, exercita, insiste, disfarça, articula,

anima, contradiz, entrevista, discute, defende, acusa, ironiza, integra, respeita,

admira, inova, agradece, brilha, comenta, opina, arrisca, lê, acredita, racionaliza,

conscientiza, mostra, ensina, aconselha, poetiza, conforta, participa, faz, considera,

pretende, age, corre, digita, resolve, decide, reúne, comete, trabalha, ri, intitula,

confere, corrige, sabe, entende, memoriza e luta!2 Luta pelo Jornalismo.

Então é dele que iremos falar.

2 ASSIM QUE OS OLHOS BATERAM

2 Ações atribuídas ao jornalista Luiz Geraldo Mazza encontradas em meio às entrevistas concedidas por ele a alguns jornais. Estas entrevistas encontram-se arquivadas na Biblioteca Pública do Paraná na pasta nomeada “Luiz Geraldo Mazza”.

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O anel era chamativo. A mão ia para lá e para cá, mas era impossível não

prestar atenção no anel. Dourado com uma pedra vermelha no meio. Imponente. O

anel é de um procurador aposentado que fala muito. Gesticula, pensa e ri. A voz é

rouca e falha. Em meio ao grave as cordas vocais não ajudam e o som afina

chegando a sumir. As orelhas são de quem tem 76 anos, grandes. O nariz

acompanha a proporção. As rugas não acusam a idade. Mas são as rugas da testa

que ganham o prêmio das “mais marcantes”. E enfileiradas elas enrugam e relaxam

enquanto esse senhor fala. Mas são as sobrancelhas! Ah, as sobrancelhas! Os fios

em desordem amontoam-se acima dos olhos e brigam entre si pelo espaço. A

impressão é que ele enfrentou um vendaval e não arrumou o rebuliço acima dos

olhos.

Ele segura os óculos, coloca entre as orelhas, tira e larga na mesa. Várias

vezes. Bate na mesa, se joga para trás e estende-se na cadeira. Conta muitas

estórias e mostra para os novatos que realmente sabe.

Calça social, camisa social. Normal. Só na aparência. “Vamos sentar aqui

mesmo. Não tem outro lugar”. Um jeitão espontâneo que intimida no começo, mas

depois conquista.

Um copo de café outro de água. Ele vai bebericando o café aos poucos. A

vontade de falar deixa o café esfriar. Mas ele nem nota. Continua. Percebe nossos

olhos grudados e atenção total voltada para ele. Isso parece que o empolga. As

horas passam, mas ele nem sequer espiou no relógio. Não se importa. Ele gosta.

Mexe várias vezes nos jornais que estão espalhados pela mesa e fala deles

como se fossem “araras de tão coloridos”. Assim torna-se evidente que ele ainda é

um jornalista romântico, ele ainda quer sua máquina de escrever, não quer ter

horário para sair da redação, quer virar madrugadas fechando o jornal e comentar

mais tarde no bar.

Sinceramente a modernidade não lhe cai bem. Essa máquina do passado que

se adaptou ao futuro fica muito melhor em grandes mesas de madeiras, andando na

rua atrás de matérias e pensando como um romântico.

A risada é contagiante. Um típico vovô. Daqueles que não pára. Que pega no

colo, que conta piada, que faz cafuné e dá uns cascudos também. Um senhor

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simpático que não anda arcado, tem agilidade e mostra vontade de escalar um

mundo de novidades.

Destoa do grupo de trabalho. É a única cabeça branca que se vê no meio de

tantos jovens. Ele não parece se importar. Melhor ainda, ele parece gostar. E a

recíproca é verdadeira. Quem não gostaria, nessa profissão, de ter um gigante ao

seu lado? A longa experiência é característica única e marcante nesse senhor.

O vocabulário não é rebuscado, não carrega nenhuma máscara de

intelectualidade. Ele fala o que tem na cabeça e joga milhões de palavras na nossa

frente. O difícil é agarrar todas com unhas e dentes. Ele é polêmico quando fala, as

palavras não são soltas. Tudo o que fala tem uma relação.

Pode-se imaginar esse homem envolto em papéis, milhões deles.

Concentrado, pensando em palavras certas e acertando. Acertando sempre, dando

um xeque-mate no texto. Isso! Ele é um jogador de xadrez: pensa, analisa e reage.

A reação é sempre uma vitória.

Esse é o Luiz Geraldo Mazza. O Mazza num primeiro olhar, uma primeira

impressão. A silhueta de alguém que é difícil colocar em palavras por inteiro. É dele

que vamos falar sem notar as palavras passando, as virgulas pausando e os pontos

encerrando. Uma pena será quando o ponto final chegar.

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3 UM POUCO DE TUDO, DE TUDO UM POUCO

Quando se fala de Luiz Geraldo Mazza é difícil falar de básico. Mas nesse

capítulo é disso que vamos falar. Da onde ele veio, quando nasceu, quem é seu pai,

sua mãe, como ele começou e quais são as raízes desse personagem.

Ele nasceu em Paranaguá dia 10 de fevereiro de 1931. Filho de Arnaldo

Mazza Júnior e Nair Veiga Mazza. Avô materno era o senhor Rodolfo Gomes Veiga

que é irmão de Alberto Veiga. Avô paterno era Seu Arnaldo Mazza. E o que tudo

isso tem a ver com Luiz Geraldo Mazza além de parentesco consangüíneo? Muita

influência!

Seu Alberto Veiga era um dos empresários mais importantes de Paranaguá e

o avô de Mazza, Rodolfo Gomes Veiga era gerente dessa empresa. Essa parceria

de irmãos deu autonomia para a cidade em relação às lojas de departamentos. Além

disso, seu avô era amigo do compositor Heitor Villa Lobos, que era gerente de uma

fábrica de fósforos em Paranaguá que produzia fósforos de duas cabeças. A visão

da economia muda dando mais opções para o consumidor.3

Toda essa tradição familiar na cidade de origem, que trazem recordações do

contato com o mar e natureza, criou em Mazza um amor pela cidade natal aflorado

na pele. Quando tocamos no assunto de sua cidade ele se mostra indignado por não

haver menção alguma ao primeiro concerto de Villa Lobos que aconteceu na cidade

histórica de Paranaguá. “É uma cidade de raiz, histórica, colonial. As pessoas não

dão muita importância pra isso. Isso não faz parte só do conhecimento brasileiro, é

um conhecimento mundial” 4 enfatiza Mazza. Na edição do dia 14 de novembro de

2007, Luiz Geraldo Mazza faz uma crítica a esse esquecimento por parte dos

parnanguaras no caderno de Turismo e brinca: “Se eles não escutarem meu alerta

eles terão muita dor de cabeça” 5.

A influência do avô paterno está no campo político. Seu Arnaldo Mazza tinha

um outro tipo de alinhamento. Era seguidor dos maximalistas que foram

3 MAZZA, Luiz Geraldo. A irredutível consciência crítica do Paraná. Indústria e Comércio, Paraná, 7 jul.1993. Inquéritos I&C. Entrevista concedida a David Campos.4 MAZZA, Luiz Geraldo. Entrevista concedida aos alunos do 1° ano de Jornalismo da Pontifícia Universidade Católica do Paraná: Amanda Pimentel, Fernanda Giotto Serpa, Marcos Vinícius da Silva. Curitiba, 14 nov.2007.5 Ibid.

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responsáveis pelas grandes greves ocorridas no Paraná na primeira década do

século XX.6

Mazza não só puxou o lado grevista do avô como também o jornalista. Seu

avô abriu um jornal sindical em Ponto Grossa, que só foi recuperado através das

pesquisas de duas professoras gaúchas. Mazza não sabia, mas a surpresa foi boa.

“Esses meus avôs foram muito interessantes”.7

Aos 9 anos esse parnanguara veio conhecer a capital. A família subiu a serra

em 1940. O futebol era seu esporte preferido e foi a partir dele que deu sua primeira

“palhinha” nos jornais. Ele explica:

Colaborações, desde 1949! Eu considero assim porque era o tempo dos times de futebol e um dos orgulhos que a gurizada tinha era de ver a notícia publicada no jornal. Tinha até um clichê, a gente dizia que ‘depois de uma partida repleta de lances emocionantes entre as aguerridas equipes, sagrou-se vitoriosa a tal’. Nós fazíamos essas notinhas e tínhamos um orgulho tremendo, uma vaidade incrível de ver aquilo impresso.8

Quando Mazza deu seus primeiros passos o jornalismo tinha características

profundamente literárias. Ele mesmo define isso como uma espécie de projeto

frustrado da literatura.9 A regra da época era “quem não faz literatura, quando morre

não viveu”. Segundo Mazza essa era a visão.10

Era também um jornalismo de vida boêmia, desinteressado. Os jornalistas

ficavam meses sem receber. O Brasil ainda não era uma sociedade de consumo e

não havia ambição. Não se pagava imposto de renda; os jornalistas tinham o direito

de descontar 50% em passagens de avião, que era uma forma do governo “agradar”

os jornalistas; existia a isenção da cobrança da Cisa, para conseguir casa-própria. O

jornalista se agarrava a essas mordomias rasas para trabalhar. Mas nem por isso

Mazza desistiu da profissão. Começou no Diário do Comércio de Paranaguá e no

Diário da Tarde em Curitiba. Jornada dupla, trabalho duplo e satisfação dupla dos

leitores.11

6 Cf. Indústria e Comércio, Paraná, 7 jul.1993. Entrevista concedida a David Campos. 7 Ibid.8 Mazza, Luiz Geraldo. Os meandros da imprensa no Paraná. Voz do Paraná, Paraná, caderno Roda Viva, 17 a 23 julho 1977. p. 5. Entrevista concedida a Hélio Teixeira. 9 Ibid.10 Mazza, Luiz Geraldo. Jornalista ou escritor? Gazeta do Povo, Paraná, Caderno G, 2 set 1999. Entrevista concedida a Valêncio Xavier.11 Mazza, Luiz Geraldo. Professor de Deus. Quarto Poder, Paraná, caderno Entrevista, set 1996. p. 6-7. Entrevista concedida a Everson Bressan.

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Ele começou a escrever Á porta do Café, que eram crônicas baseadas no

cotidiano do jornal Diário da Tarde. E por aí Mazza foi infiltrando-se na literatura.

“Era uma visão absolutamente melodramática. E é uma coisa da qual o Brasil não se

libertou até hoje”.12

Nas crônicas estão presentes os tipos populares, mas nota-se que Mazza já

queria resolver os problemas universais. Misturava acontecimentos mundiais com a

vida das pessoas comuns. Fazia relações que mexiam com a consciência das

pessoas. “Isso antigamente era muito mais fácil, Curitiba era mais humana”.13

Influência Mazza recebeu também do Direito, curso que escolheu por estar

mais próximo da literatura. Conta que no curso ele encontrou muitos literatos que

como ele adoravam fazer o tipo pessimista. Era o clima que eles assumiam e era

bonito ser pessimista.

A consciência político adveio desse ambiente também. A Guerra Fria uniu

esses homens da lei contra os EUA. Segundo Mazza eles caíram no maniqueísmo.

Achavam que se envolviam com os problemas mundiais e que eram o centro das

atenções. Doce ilusão. Mazza conta um acontecimento interessante para

exemplificar essa situação:

Para se ter uma idéia de como era a nossa participação, essa idéia de que se está envolvido nos problemas mundiais, quando o casal Rosenberg foi acusado de traição (foram condenados e eletrocutados nos EUA), nós fomos para uma assembléia no Centro Acadêmico Hugo Simas. Varamos a madrugada com aquela vitória...Veja o que é quixotismo. Nós saímos da sala achando que tínhamos ganhado uma batalha, como esses sindicalistas quando invadem a Ultrafértil. De repente o sujeito pensa que está no centro dos acontecimentos. E nós fomos contra a execução. Mandamos um telegrama pedindo a comutação da pena. Veja o que é loucura, o imaginário do ser humano.14

Como o próprio Mazza diz, eles eram Dom Quixotes atrás dos moinhos de

ventos. Em dias atuais esse direito de ser ingênuo é vetado do ser humano. A

sociedade é materialista. O consumo acabou com o romantismo jornalístico. O

Diário do Paraná de certa forma também.

O auge desse jornal é marcado pelas mudanças técnicas impostas pelos

meios de comunicação nacionais. Mazza viveu tudo isso. Os textos adjetivados,

retóricos e ornamentais começaram a serem riscados dos textos. A linguagem

precisava ser objetiva, concisa, direta. A linguagem precisa ser lead, sub-lead e

12 Cf. Indústria e Comércio, Paraná, 7 jul.1993. Entrevista concedida a David Campos.13 Cf. Gazeta do Povo, Paraná, Caderno G, 2 set.1999. Entrevista concedida a Valêncio Xavier.14 Cf. Indústria e Comércio, Paraná, 7 jul.1993. Entrevista concedida a David Campos.

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pirâmide invertida. “A imprensa da época no Paraná era acostumada a abrir a notícia

com um comentário, por exemplo: ‘Há muito tempo verberamos...’ daí vinha a

notícia. É o chamado nariz de cera ou nariz de folha”.15 A emoção era geral, todos os

jornalistas ficaram de boca-aberta com as novas modas de diagramação. Colunas,

fotos, escrever a matéria e ver ela totalmente pronta eram coisas nunca vistas.

Os jornalistas tradicionais viram os jornais paranaenses aflorarem ali –

processo por processo. E a alegria era incontrolável:

Era um oba-oba, um ficava cutucando o outro. Preocupação em fechar o jornal? A madrugada existia para isso. Todos viravam a madrugada com bom humor e queriam pegar o jornal quentinho, como se fosse um pão para levar para casa. Mas a gente não ia pra casa e sim para o bar. Ficava discutindo política e a edição fresquinha. A moda era também ir para as boates. Eu não era disso, mas alguns jornalistas tinham orgulho de ter uma amante Argentina de boate. (Risos)

Apesar de ser um clichê é verdade que atrás de todo homem existe uma

grande mulher. E esse foi o papel paciente de sua esposa. Ele chegava

amanhecendo o dia e mesmo assim as brigas foram poucas. Quando esse senhor

fala de relacionamentos você nota a tristeza que ele sente ao falar dos “jovens de

hoje em dia”:

Uma mulher hoje não agüentaria o que a minha mulher agüentou. O que eu sou hoje devo muito a ela pelo passado. Os relacionamentos me parecem muito banais. Antigamente pegar na mão da namorada era um acontecimento. Nos bailes, nós apenas trocávamos olhares e sorrisos. Uma dança com muito respeito às vezes acontecia. Mas só. Hoje a responsabilidade do casamento assusta e quando acontecem são curtos.16

Mas ele acredita que o período universitário é importante para o

desenvolvimento das pessoas. A liberdade é extrema, coisa que ele não teve e

lembra muito bem, principalmente quando foi afastado dos jornais pela ditadura.

O que importa é que ele conseguiu voltar, voltou com tudo, não parou e não

vai parar: “A redação é o lugar da minha alegria, é meu playground, minha vida”.

4 IMPOSSÍVEL NÃO FALAR DE POLÍTICA

15 Cf. Entrevista concedida à Amanda Pimentel, Fernanda Giotto Serpa, Marcos Vinícius da Silva. Curitiba, 14 nov.2007.16 Ibid.

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Falar de Luiz Geraldo Mazza e não falar de política é uma questão

contraditória. Na ditadura respondeu por atuação política e sindical. Também

pudera! Esse vozeirão cheio de ordem, mandos e desmandos e os textos cheios de

críticas inteligentes e ardidas conseguiu e continua conseguindo chamar a atenção.

Ele furava a censura interna e externa. Um bom suborno era suficiente. E lá

estava estampada a matéria na capa, a matéria contra a linha do jornal. Uma dessas

matérias caiu na mão de Assis Chateaubriand, o dono do jornal Diário do Paraná, no

qual Mazza trabalhava. Assis estava nos EUA recuperando-se de um AVC, mas

Aderbal Stresser foi até ele. O resultado? Mazza longe do jornal.17

A greve de 63 também é memorável. Ele frisa que ele não fez a greve, porque

ninguém faz greve sozinho. Ele apenas levantou a idéia na assembléia e ela vingou.

Os jornalistas saíram pedindo melhorias. Mazza assume que para a maioria dos

jornalistas essa ação só trouxe conseqüências. Os reajustes foram mínimos ou

nulos e muitos foram punidos. Mas eles chamaram a atenção. Os jornais do Brasil

inteiro pararam e abraçaram a causa.

Aqui na capital em meio ao tumulto Mazza foi também o porta-voz da greve:

Nesse tumulto alguém falou que tinha uma missão mais importante do que apenas ficar na bagunça. Deram-me a função de falar na Rádio Independente, que era uma rádio forte na época. O programa era Repórter Petrobrás. Corri atrás de um telefone e achei numa churrascaria ali perto. Eu contei 5,4,3,2,1 e já entrei no ar gritando ‘Milhares de pessoas assistem estarrecidas a situação dos jornalistas...’. Era muita emoção para mim. Sem falar que chamávamos mais atenção ainda.18

Outras greves voltaram a ocorrer, mas nada tão simbólico como a de 1963.

Alguns jornais pararam por algumas horas e operações tartarugas aconteceram. Em

meio a entrevista ele lembra de uma paralisação no Estado do Paraná. Durou

apenas três horas, logo todo mundo voltou as suas determinadas funções.

Os chamados tubarões, donos dos jornais, eram na sua grande maioria de

direita. Os jornalistas eram de esquerdas. Mazza conta que as vezes levantava-se

uma animosidade, mas isso era normal. Afinal política era a discussão preferida

dessa turma de românticos.

17 Cf. Entrevista concedida à Amanda Pimentel, Fernanda Giotto Serpa, Marcos Vinícius da Silva. Curitiba, 14 nov.2007.

18 Ibid.

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A Boca Maldita é o ponto de encontro. Senhores engraxando sapatos, com

jornais embaixo do braço, cafezinho e muita política envolta na fumaça dos cigarros.

Gesticulam muito, batem o pé e falam alto. Mazza sai, pensa e sabe o que escrever

quando se trata de política. Não se pode afirmas que a opinião dele é única e toda

poderosa. Mas ele escreve o que pensa e assume a posição que bem entende.

5 CONCLUSÃO

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Sim, ele formou-se em Direito. Como já foi dito é um procurador

aposentado. Já foi Paraninfo e é muito querido por alunos e professores. Já liderou

greves, já parou jornais. Já escreveu sobre cachorro que falava “mamãe” e já

mostrou para focas que uma boa pauta está debaixo dos próprios pés, como uma

rua cheia de buracos ou uma calçada que atrapalha os idosos. É dono de uma

cadeira na Academia Brasileira de Letras. Os cabelos branquinhos e ralos mostram

quanto os neurônios desse homem já funcionaram e ainda funcionam com muita

categoria. Não consegue mexer com o “bicho”, nome querido que ele deu ao seu

computador e assume sem problemas o fato de “levar um banho” dos netos quando

se trata de tecnologia.

Considera-se um “dinossauro” no meio dos jovens. E gosta de ajudar e dar

palpites no trabalho dos focas. Gosta também de ser ajudado. Admira os jovens que

se preocupam com o literário e com o clássico. A alegria é importante. Gosta de

brincar e já dançou muito balé com Benjamin – a esgrima com réguas de

diagramação encima das mesas num ritmo de dança – para comemorar o fim de

uma edição. Joga muito futebol, faz bagunça, é quase que uma esculhambação

saudável.

Parar? Jamais! Ele se diz vampiro. Quer influenciar todas as cabecinhas

jovens que estão a sua volta. Ele faz com prazer, com amor. Faz da rotina, da

mesmice algo renovado. Ele enriquece o cotidiano, não abre mão e quer fazer ainda

muitas palhaçadas. Agora pode não estar em forma para plantar bananeira ou

dançar balé, mas se alguém quiser aprender ele está disposto a ensinar.

Rádio, TV, jornal impresso, revista. Ele “traça” tudo. As pessoas o conhecem.

Pela voz, pelo texto ou pelas feições. As pessoas fazem da sua voz a dele. Param-

no no ônibus, na rua, na entrada do jornal. Reconhecem o tom grave das cordas

vocais e fazem seus pedidos. Ele está ali para isso e não se importa em escutar e

tentar ajudar.

Mazza ensina jornalismo com a alma. É uma criança madura. Está sempre de

braços abertos e fazem as cabeças jovens sonhar. Ele faz nascer a vontade de

amar o jornalismo. Olhar para as rugas é olhar para história e conseqüentemente ter

vontade de ouvi-las.

Temo tornar-me repetitiva, mas quero deixar claro o que é conhecer um

jornalista veterano que tem muita bagagem. E vou levar essa bagagem para

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Page 17: Trabalho Científico - Mazza

sempre, acrescentar na minha vontade de ser jornalista a mesma vontade que ele

teve.

Percorrer histórias, viver e fazer parte delas é coisa do Mazza. Paraná,

jornalismo e Mazza combinam. Bagunça, risada e Mazza também combinam. Mazza

é um misto de opiniões imutáveis, risadas extravagantes, poemas românticos e um

texto bom.

Ele é o poeta, polêmico e político.

“O jornalismo talvez seja a atividade pela maneira de como vivo e vejo que

coloca uma visão mais visceral do chamado processo existencial”.19

REFERÊNCIAS

19 Cf. Quarto Poder, Paraná, caderno Entrevista, set 1996. p. 6-7. Entrevista concedida a Everson Bressan.

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SANT´ANNA, Romildo. O Foca. Disponível em: <http://www.triplov.com/romildo/foca.html>. Acesso em: 19 nov. 2007.

MAZZA, Luiz Geraldo. A irredutível consciência crítica do Paraná. Indústria e Comércio, Paraná, 7 jul.1993. Inquéritos I&C. Entrevista concedida a David Campos.

MAZZA, Luiz Geraldo. Entrevista concedida aos alunos do 1° ano de Jornalismo da Pontifícia Universidade Católica do Paraná: Amanda Pimentel, Fernanda Giotto Serpa, Marcos Vinícius da Silva. Curitiba, 14 nov.2007.

Mazza, Luiz Geraldo. Os meandros da imprensa no Paraná. Voz do Paraná, Paraná, caderno Roda Viva, 17 a 23 julho 1977. p. 5. Entrevista concedida a Hélio Teixeira.

Mazza, Luiz Geraldo. Jornalista ou escritor? Gazeta do Povo, Paraná, Caderno G, 2 set 1999. Entrevista concedida a Valêncio Xavier.

Mazza, Luiz Geraldo. Professor de Deus. Quarto Poder, Paraná, caderno Entrevista, set 1996. p. 6-7. Entrevista concedida a Everson Bressan.

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