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TÓPICO ESPECIAL 10 de março de 2017
Tópico Especial
O ajuste assimétrico do mercado de trabalho José Luciano da Silva Costa
O desempenho recente da economia tem indicado um processo mais prolongado de ajuste que o
antecipado inicialmente, e uma das razões por trás dessa dinâmica é o elevado nível de indexação de
parte dos salários. O mercado de trabalho manteve o ritmo de contração do emprego formal acima do
esperado ao longo do terceiro e quarto trimestres do ano passado, e frustrou as expectativas de melhora
que vários indicadores de confiança apontavam. Por outro lado, parte do ajuste esperado dos salários
tem sido anulada pelo elevado processo de indexação, em especial para os trabalhadores formais. A
consequência dessa rigidez de parte dos salários é a necessidade de ajuste maior da ocupação para
compensar a inflexibilidade dos rendimentos. O objetivo desse tópico é discutir esse processo de ajuste
assimétrico do mercado de trabalho e avaliar qual a trajetória futura de emprego considerando nossa
expectativa de recuperação da atividade nos próximos dois anos.
A rigidez salarial dos empregos formais implica em ajuste maior da ocupação da economia. Um modelo
simples para a dinâmica salarial mostra que os salários são determinados pelo equilíbrio entre a oferta e
a demanda por trabalho¹, como pode ser visto no gráfico 1. Nesse modelo estilizado de funcionamento
do mercado de trabalho, uma mudança da demanda por trabalho, que poderia ser resultante de um
choque recessivo sobre a economia, deveria resultar num deslocamento paralelo da curva de demanda
de trabalho. Considerando que a oferta de trabalho é relativamente constante, isso implicaria em um
novo equilíbrio de salários reais mais baixos e menor ocupação. Essa dinâmica levaria o mercado de
trabalho para o novo equilíbrio descrito pelo ponto B, no gráfico 2. Contudo, a rigidez salarial dos
trabalhadores formais não permite essa correção dos salários reais e, portanto, a queda da ocupação
deverá ser maior para acomodar essa inflexibilidade dos salários. Assim, o ajuste ocorrerá com o
aumento do ritmo de demissões e a elevação rápida da taxa de desemprego. Uma característica adicional
do mercado de trabalho no caso brasileiro é a elevada participação de trabalhadores informais, o que
determina um ajuste desigual nos salários e na ocupação entre os trabalhadores.
¹ Ehrenberg, Ronald G. e Smith, Robert Stewart (2012). Modern Labor Economics: Theory and Public Policy. Addison Wesley, 11th edition.
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A dinâmica recente do mercado de trabalho confirma a presença de elevada inflexibilidade de parte dos
salários. Os trabalhadores podem ser divididos em dois grupos de acordo com sua ocupação: os
empregados formais² (com carteira) e os empregados informais (sem carteira). Os trabalhadores do setor
formal estão em tese mais protegidos da perda inflacionária devido às renegociações salariais, o que
implica em elevada rigidez salarial. Os sinais dessa rigidez podem ser vistos no comportamento dos
rendimentos nominais desse grupo, que estão flutuando em torno de 8,0% ao ano de ganho nominal.
Após um período no início de 2016 no qual os salários nominais desaceleram e atingiram 6,0% de alta em
termos anuais em junho do ano passado, houve uma clara aceleração dos rendimentos dos trabalhadores
formais e os salários atingiram alta de 9,4% de ganho nominal em novembro do ano passado.
Uma consequência dessa rigidez salarial é elevar o peso do ajuste dos rendimentos sobre os
trabalhadores informais menos protegidos da aceleração inflacionária. Isso pode ser visto na dinâmica
salarial dos empregados sem carteira, que tiveram os ganhos salariais nominais desacelerando para 4,0%
em abril do ano passado, o que representou a perda real de 4,8% dos salários. Os dados mais recentes
indicam alguma recuperação dos salários, mas em patamar bastante aquém dos trabalhadores formais, o
Fonte: BRAM
Gráfico 1: Salário x Ocupação Gráfico 2: Salário x Ocupação
Fonte: IBGE, BRAM
² A ocupação sem carteira ou informal será constituída pelo (i) emprego no setor privado sem carteira, (ii) trabalhador doméstico sem carteira, (iii) empre-
gado do setor público sem carteira, (iv) empregadores, (v) ocupações por conta própria e (vi) trabalhadores familiares auxiliares.
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que resulta em perda real de 0,7% em janeiro desse ano. Por outro lado, os trabalhadores com carteira
voltaram a acumular ganho real de 1,6% dos salários nesse mesmo período.
A rigidez dos salários dos trabalhadores formais tem levado ao ajuste maior da ocupação total da
economia. O processo de ajuste da ocupação havia dado sinais de moderação na primeira metade de
2016. Entretanto, a ocupação voltou a acelerar sua contração para o ritmo de 2,6% em termos anuais até
outubro do ano passado, após ter moderado para 1,5% na média do segundo trimestre na comparação
anual. Em janeiro desse ano, a contração da ocupação ainda permaneceu elevada e houve sinais de
precarização adicional do emprego com a ocupação com carteira contraindo fortemente, como discutido
mais à frente.
Uma outra evidência que a inflexibilidade dos salários reais resultou no ajuste maior da ocupação é a
decepção com a geração de vagas formais ao longo do segundo semestre de 2016. Considerando os
dados de geração de vagas fornecido pelo CAGED, a média móvel de três meses registrou fechamento
líquido de 107 mil e 80,4 mil vagas no fechamento do terceiro e quarto trimestres de 2016,
respectivamente. Em janeiro deste ano, houve nova frustração com manutenção do ritmo de
fechamento de vagas em 70 mil postos de trabalho em termos dessazonalizados. Essa trajetória do
Fonte: IBGE, BRAM
Fonte: IBGE, BRAM
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emprego contrariou as expectativas de emprego contidas nas diferentes pesquisas de confiança do
consumidor, da indústria e do comércio. As expectativas setoriais de emprego são resumidas pelo
indicador antecedente de emprego (IAEmp) calculado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Como pode
ser visto no gráfico abaixo, o indicador de emprego (IAEmp) adiantado três meses tem uma correlação
elevada com o saldo líquido de vagas de trabalho do CAGED. Segundo o indicador de emprego, o ritmo de
contração de vagas deveria moderar para a faixa de 50 a 100 mil ao longo do terceiro trimestre desse ano
e passar a ser positiva no início de 2017. Considerando a trajetória do emprego até dezembro, na qual
houve fechamento líquido de quase cem mil vagas, há um elevado grau de frustração dessas
expectativas. Uma provável explicação para esse desempenho ruim pode ser o ajuste assimétrico da
ocupação ao longo desse ciclo, em especial no período mais recente.
O emprego informal foi mais resiliente com relação à ocupação formal no início do ciclo de ajuste do
mercado de trabalho, mas essa tendência mudou nos últimos meses. A ocupação sem carteira teve um
comportamento distinto do emprego formal a partir de 2015, quando a taxa de desemprego começou a
subir. No início do processo de piora da ocupação, o emprego informal passou a crescer como sinal que a
perda do emprego formal poderia ser compensada pela ocupação sem carteira (em especial, o emprego
por conta própria). Entre dezembro de 2014 e dezembro de 2015, quando o emprego informal atinge o
maior patamar nesse ciclo, houve o aumento de 540 mil postos de trabalho sem carteira. Durante esse
período, a ocupação com carteira recuou 1,2 milhão de postos. Entretanto, com a continuidade da
desaceleração da atividade, esse tipo de trabalho também passou a deteriorar e passou a ser negativo a
partir de junho do ano passado. O ritmo de contração da ocupação sem carteira acelerou rapidamente
nos últimos meses e atingiu queda anual de 2,4% em outubro de 2016 e se aproximou da velocidade de
redução do emprego formal, que contraiu 2,8%. Recentemente, a ocupação total manteve a intensidade
de queda em patamar elevado de 1,9% na comparação anual e, paralelamente, um sinal preocupante foi
a precarização do emprego com a contração do emprego com carteira e diminuição da queda do
emprego informal, como pode ser visto no gráfico abaixo. Segundo nossas estimativas, o percentual de
trabalhadores informais superou pela primeira vez a participação de trabalhadores com carteira desde
2012, quando a série passou a ser calculada pela nova pesquisa de emprego do IBGE.
Fonte: FGV, MTE, BRAM
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A deterioração das condições do mercado de trabalho resultou no efeito desalento, o que limitou a
piora da taxa de desemprego. Com a piora da situação do mercado de trabalho, ocorreu a saída
substancial de pessoas do mercado de trabalho, ou seja, ocorreu a desistência de procurar emprego por
parte dos trabalhadores desempregados, caracterizando um quadro mais grave de desalento. Esse efeito
fica mais evidente quando se espera que a perda de trabalho juntamente com a contração da renda
familiar deveria resultar no aumento do número de pessoas procurando emprego e, portanto, a elevação
da taxa de desemprego. O desalento fica claro no aumento da participação da população fora do
mercado de trabalho em relação à população em idade ativa (PIA), que representa o estoque total de
trabalhadores disponíveis. O efeito desalento poderá amortecer a deterioração do mercado de trabalho
no curto prazo, mas deverá limitar a velocidade de melhora da taxa de desemprego no momento de
recuperação da economia, pois a tendência é a volta das pessoas ao mercado de trabalho quando as
condições melhorarem.
Entre as regiões, a deterioração da ocupação tem sido distinta e o efeito desalento é maior na região
Nordeste. A taxa de desemprego média atingiu 12,0% no Brasil em dezembro do ano passado. A
tendência de piora da taxa de desemprego é comum a todas as regiões, entretanto, a velocidade de
deterioração da desocupação é mais acentuada nas regiões Sudeste e Nordeste, que atingiram níveis de
Fonte: IBGE, BRAM
Fonte: IBGE, BRAM
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desemprego de 12,3% e 14,4%, respectivamente, em dezembro. Apesar dessas duas regiões
apresentarem os maiores aumentos da taxa de desocupação ao longo do ano passado, a natureza dessa
piora é claramente distinta entre essas regiões. Enquanto na região Sudeste, a deterioração da ocupação
é acompanhada pelo aumento da procura por emprego, na região Nordeste, a perda de emprego não
gerou o aumento das pessoas buscando trabalho. Na região Sudeste, observou-se a diminuição de 288
mil postos de trabalho no quarto trimestre desse ano na comparação anual, o que foi seguido pelo
aumento da força de trabalho, que se deveu a maior procura por emprego, de 1,1 milhão de pessoas.
Esse aumento da procura por emprego resultou no aumento da taxa de participação, ou seja, a razão
população economicamente ativa e população em idade ativa se elevou. Assim, a piora da taxa de
desemprego foi resultado da menor ocupação e da maior entrada de trabalhadores no mercado de
trabalho.
Na região Nordeste, a dinâmica do emprego e da procura por trabalho é distinta, o que conteve a
deterioração do desemprego até esse momento do ciclo. A ocupação também teve forte piora na
região Nordeste, com a diminuição de 1,2 milhão de postos de trabalho no quarto trimestre na
comparação anual. Porém, a procura por trabalho não aumentou e foi registrada a saída de 311 mil
pessoas do mercado de trabalho no quarto trimestre na mesma base de comparação, pois não estavam
em busca de emprego. O efeito desalento é mais presente nessa região, o que fica claro no
comportamento da taxa de participação que teve forte recuo de 1,6 p.p. no quarto trimestre frente ao
mesmo período do ano passado na região Nordeste. Essa dinâmica difere da observada na região
Sudeste, que registrou o maior aumento entre as regiões da taxa de participação, com alta de 1,0 p.p. na
comparação anual do quarto trimestre. Caso a taxa de participação da região Nordeste tivesse
permanecido estável, a taxa de desemprego da região subiria para 17,3%, e assim a taxa média nacional
seria 0,8 p.p. maior e atingiria 12,8%. A normalização da procura por emprego nessa região deverá
ocorrer com a recuperação da economia e essa tendência de aumento da busca do trabalho deverá ser
uma força que impedirá a queda mais rápida da taxa de desemprego ao longo de 2017 e 2018.
Fonte: IBGE
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A expectativa de recuperação lenta da economia para 2017 ainda resultará em queda da ocupação e
aumento da taxa de desemprego. A retomada do emprego é historicamente defasada em um trimestre
com relação ao crescimento do PIB, como pode ser visto no gráfico abaixo. Considerando a nossa
expectativa de recuperação, a ocupação da economia ainda deverá recuar 1,0% neste ano. O emprego
formal deverá contrair no primeiro semestre desse ano em termos dessazonalizados, e somente a partir
do quarto trimestre deverá ocorrer geração líquida de empregos. Ao longo de 2017, o emprego formal
deverá contrair em 500 mil vagas. Nesse contexto, a taxa de desemprego deverá seguir em elevação
devido ao crescimento da procura por emprego combinado com a contração da ocupação. A taxa de
desemprego deverá atingir o patamar de 13,6% em meados desse ano e encerrar o ano em 12,8%. Essas
projeções indicam que a retomada da atividade deverá ser acompanhada no seu início pela continuidade
da deterioração do mercado de trabalho. Entretanto, a consolidação do crescimento em 2018 deverá
permitir uma dinâmica mais positiva do emprego, com expectativa de geração líquida de 400 mil vagas
formais e a taxa de desemprego 11,2% ao final de 2018.
Fonte: IBGE
Fonte: MTE, IBGE
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10 de março de 2017
Tel.: 3847-9171 [email protected]
As opiniões, estimativas e previsões apresentadas neste relatório constituem o nosso julgamento e estão sujeitas a mu-
danças sem aviso prévio, assim como as perspectivas para os mercados financeiros, que são baseadas nas condições
atuais de mercado. Acreditamos que as informações apresentadas aqui são confiáveis, mas não garantimos a sua exati-
dão e informamos que podem estar apresentadas de maneira resumida. Este material não tem intenção de ser uma ofer-ta ou solicitação de compra ou venda de qualquer instrumento financeiro. BRAM - Bradesco Asset Management é a em-
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Material produzido em 10/03/2017 às 10h00
Outras edições estão disponíveis no Site: www.bradescoasset.com.br,
MARCELO CIRNE DE TOLEDO
Economista Chefe [email protected]
ANA PAULA DE ALMEIDA ALVES
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