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Origami
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JOSEFA MARIA COELHO MARQUES
ORIGAMI NA ARTE CONTEMPORNEA
BRASLIA, DEZEMBRO DE 2012.
JOSEFA MARIA COELHO MARQUES
ORIGAMI NA ARTE CONTEMPORNEA
Trabalho apresentado Faculdade de Artes
Dulcina de Moraes, como requisito parcial
obteno do ttulo de Licenciada em
Educao Artstica, com habilitao em
Artes Visuais, sob a orientao do professor
Carlos Ferreira da Silva.
BRASLIA, DEZEMBRO DE 2012.
ii
iii
Dedico esta monografia a minha me, Isilda
Coelho Nogueira, a meu marido, Romeo
Fensterseifer e a meus filhos, Isabel Cristina
Marques Fensterseifer e Guilherme Marques
Fensterseifer, que me apoiaram nesta
jornada, ouvindo minhas ideias, participando
das minhas atividades e dando opinies
valiosas.
iv
AGRADECIMENTOS
Agradeo aos professores da Faculdade de Artes Dulcina de Moraes que
contriburam para o meu crescimento pois com suas aulas me incentivaram a buscar novos
conhecimentos.
Agradeo ao professor Carlos Ferreira da Silva cuja pacincia e cuidadosas
orientaes permitiram transformar este tema numa monografia.
Agradeo aos colegas que percorreram este caminho comigo, em especial a Maria
Inez Brasil Cavalcante, Olga Celeste Itabora Rodrigues e Flvia Herenio Mota, com as
quais participei de vrios trabalhos e grupos de estudo, criando laos que permanecero
depois de terminado o curso.
Agradeo aos funcionrios da Faculdade de Artes Dulcina de Moraes que atenderam
durante nosso percurso na instituio, sempre com profissionalismo e ateno.
Agradeo o apoio contnuo de minhas amigas Luciana Sabino de Freitas Cussi,
Nadja Rodrigues Romero, Ana Maria Carvalho da Silva e Cleuza Takafuji que sempre me
apiam e estimulam a prosseguir em cada nova jornada.
Agradeo ao Grupo Origamigos de Braslia pelos encontros quinzenais que
permitiram que eu tivesse muito mais contato com o mundo do origami, pois dobrando
juntos fazemos peas que individualmente eu nunca pensaria em tentar.
Agradeo a Lus de Pessoa, presidente do Grupo Origamigos, com quem posso
partilhar o interesse pelo mundo do origami e suas novidades, que me estimulou a abraar o
tema desta monografia.
v
Todo origami comea quando pomos as mos
em movimento. H uma grande diferena entre
conhecer alguma coisa atravs da mente e
conhecer a mesma coisa atravs do tato.
Tomoko Fuse
vi
RESUMO
Este estudo investigou o origami como uma linguagem em que se utiliza papel para
criar figuras por meio de dobras. Nesta monografia examinamos o uso do origami nas obras
da arte contempornea. Para tanto, delimitamos o significado de arte contempornea e
traamos algumas de suas caractersticas. Examinamos obras que utilizam origami na sua
confeco (tridimensionais e instalaes) concluindo que elas tm como caractersticas
comuns a utilizao de material efmero, a manualidade, a tridimensionalidade e a
perspectiva etnogrfica. Parte das obras escolhidas apresenta tambm a ritualizao. No
conjunto de obras escolhidas, encontramos vrias caractersticas associadas arte
contempornea, tais como a apropriao, a utilizao de novas mdias, a perspectiva
ambiental, a crtica de circuito, o interesse pela memria e o registro fotogrfico da obra.
Conclumos que as obras de arte escolhidas, por atenderem condies e caractersticas que
so prprias do perodo contemporneo, se enquadram na arte contempornea.
Palavras-chave: arte contempornea, origami, tridimensionalidade, perspectiva etnogrfica,
ritualizao, manualidade, instalao, material efmero.
vii
ABSTRACT
This study analyzed the origami as a language in which paper is used to create
figures through the use of folds. In this monograph we examine the use of origami in the
works of contemporary art. For this purpose, we delimited the meaning of contemporary art
and traced some of its features. We studied works that use origami in their making (three-
dimensional works and installations) concluding that they have common characteristics,
such as the use of ephemeral materials, handicraft, three-dimensionality and ethnographic
perspective. Some of the chosen works also have ritualization. On the set of selected works,
we found several characteristics associated with contemporary art, such as appropriation, use
of new media, the environmental perspective, the critical circuit, interest in memory and the
photographic record of the work. We conclude that the chosen artworks meet conditions and
characteristics that are unique to the contemporary period and fit in contemporary art.
Keywords: contemporary art, origami, three-dimensionality, ethnographic perspective,
ritualization, handicraft , installation, ephemeral material.
viii
LISTA DE IMAGENS
Figura 1 - Ignacio de Zuloaga. Retrato de Miguel Unamuno. 1925. .................................... 15
Figura 2 - Formas bsicas dos mdulos Froebel. ................................................................ 16
Figura 3 - Soluo para dobrar o airbag. ............................................................................ 22
Figura 4 - Stent para correo de artrias posicionado no interior da veia. .......................... 23
Figura 5 - Stent para correo de artrias, fechado e expandido. ........................................ 23
Figura 6 - Monumento das Crianas Paz. Hiroshima, Japo. ............................................ 39
Figura 7 - Tomoko Fuse. Exposio Yorokobi (Grande alegria). 2009. .............................. 43
Figura 8 - Tomoko Fuse. Origamis da Exposio Yorokobi (Grande alegria). 2009. .......... 44
Figura 9 - Shipo Mabona. Peace ful Koi. 2009. .................................................................. 45
Figura 10 - Shipo Mabona. Instalao Plague (Praga). 2012. .......................................... 46
Figura 11 - Robert Lang. Viking Ship, opus 121. 1989. ....................................................... 48
Figura 12 - Romn Diaz. Goldfish. 2009. ........................................................................... 49
Figura 13 - Vik Muniz. O origamista. 2010. ....................................................................... 51
Figura 14 James Roper. Montagem da instalao Chaosmos II. 2010. .......................... 53
Figura 15 James Roper Instalao Chaosmos II. 2010 ............................................... 54
Figura 16 - James Roper. Devotion. 2005. .......................................................................... 55
Figura 17 - James Roper. Devotion (mandala). 2005. ......................................................... 55
Figura 18 - Ingrid Plum. Murmuration. 2006...................................................................... 57
Figura 19 Ingrid Plum. "Emergentes". 2007. ................................................................... 58
Figura 20 - Jacqui Symons. Instalao Juntos Somos Mais. 2010. ...................................... 60
Figura 21 - Mademoiselle Maurice. No. 2012. .................................................................... 61
Figura 22 - Detalhe dos origamis utilizados para a instalao. ........................................... 61
Figura 23 - Mademoiselle Maurice. Rainbow, 2012............................................................ 62
Figura 24 - Vik Muniz. Paper Cranes for Japan. 2011. ...................................................... 63
Figura 25 - Rivane Neuenschwander. Imprpria paisagem. 2002........................................ 65
ix
SUMRIO
INTRODUO ................................................................................................................. 11
1 ORIGAMI ................................................................................................................... 14
1.1 ORIGEM DO ORIGAMI...................................................................................... 14
1.2 O USO DO ORIGAMI NA EDUCAO E ARTETERAPIA .............................. 18
1.3 USO DE SOLUES COM ORIGAMI NAS CINCIAS.................................... 21
2 ARTE CONTEMPORNEA ..................................................................................... 24
2.1 BASES PARA A ARTE CONTEMPORNEA ................................................... 24
2.2 OS CINCO PARADOXOS DA MODERNIDADE .............................................. 28
2.3 ARTE CONTEMPORNEA SEGUNDO ANNE CAUQUELIN ........................ 32
2.4 CARACTERSTICAS DA ARTE CONTEMPORNEA .................................... 34
3 ORIGAMI NA ARTE CONTEMPORNEA .............................................................. 40
3.1 ARTE CONTEMPORNEA E O ORIGAMI ....................................................... 40
3.2 OBRAS TRIDIMENSIONAIS COM ORIGAMI .................................................. 43
3.2.1 Tomoko Fuse ................................................................................................ 43
3.2.2 Sipho Mabona ............................................................................................... 45
3.2.3 Robert Lang .................................................................................................. 47
3.2.4 Romn Diaz .................................................................................................. 49
3.2.5 Vik Muniz .................................................................................................... 50
3.3 RESUMO DAS CARACTERSTICAS DAS OBRAS TRIDIMENSIONAIS COM
ORIGAMI ...................................................................................................................... 52
3.4 INSTALAES COM ORIGAMI ....................................................................... 52
x
3.4.1 James Roper ................................................................................................. 53
3.4.2 Ingrid Plum ................................................................................................... 56
3.4.3 Jacqui Symons .............................................................................................. 59
3.4.4 Mademoiselle Maurice .................................................................................. 60
3.4.5 Vik Muniz .................................................................................................... 63
3.5 RESUMO DAS CARACTERSTICAS DAS INSTALAES COM ORIGAMI . 64
3.6 OBRA QUE USA ORIGAMI NA SUA ELABORAO ..................................... 65
CONSIDERAES FINAIS ............................................................................................. 68
REFERNCIAS ................................................................................................................ 70
ORIGAMI NA ARTE CONTEMPORNEA
INTRODUO
O tema desta monografia a presena de dobraduras (origami) na arte contempornea.
O objeto do estudo so obras de arte contemporneas que utilizam a linguagem do
origami na sua elaborao.
Temos notcia de vrias obras de arte realizadas com a utilizao da tcnica do
origami e pretendemos aprofundar o estudo para identific-las.
Examinaremos a utilizao do origami na arte contempornea, relacionando obras que
utilizam essa tcnica e verificando como elas se encaixam nas caractersticas da arte
contempornea. Para tanto vamos:
contextualizar o origami historicamente.
mostrar a utilizao do Origami para soluo de problemas em diversas reas do
conhecimento.
analisar a arte contempornea para identificar algumas de suas caractersticas.
abordar a utilizao do origami para a realizao de obras de arte e verificar como
elas se enquadram nas caractersticas da arte contempornea.
Assim, o problema que vamos abordar pode ser reduzido s seguintes perguntas:
Quais caractersticas da arte contempornea esto presentes nas obras realizadas com
utilizao do origami? H caractersticas comuns a vrias obras? Se h, quais so e como se
justifica essa afinidade?
Sempre tivemos interesse por origami. Tal interesse nos fez procurar conhecer mais
sobre o assunto e por isso temos informaes sobre a utilizao do origami em vrios
contextos.
12
Matemticos1, cientistas
2 e engenheiros
3 descobriram que esta tcnica milenar uma
possvel soluo para problemas modernos como, por exemplo, dobrar de forma eficiente
objetos como um mapa rodovirio, um airbag e at telescpios espaciais gigantescos. O
origami tambm auxilia a demonstrao de teorias matemticas simples e complexas para
pessoas de todas as idades.
Tendo conhecimento de obras de arte realizadas com a utilizao do origami
pretendemos aprofundar o estudo sobre elas para identific-las e verificar quais caractersticas
da arte contempornea esto presentes nessas obras.
Para a realizao desta monografia utilizou-se a metodologia qualitativa com pesquisa
bibliogrfica e a consulta a sites da internet, especialmente sobre os artistas e suas obras.
No primeiro captulo apresentamos breve histria do origami e sua utilizao na
educao, na arteterapia e nas cincias. Apresentamos o conceito de origami mostrado por
Aschenbach (1993) e uma breve histria do origami conforme Carlos Genova (2001). Tal
histrico importante pois o origami uma arte milenar que se tornou patrimnio da cultura
japonesa.
No segundo captulo analisamos o significado de arte contempornea para fins desta
monografia, com os textos de David Thistlewood (2005), Arthur C. Danto (2006) e Hans
1 Em 1917 a The Open Court Publishing Company publicou a terceira edio de um livro intitulado
Geometric exercises in paper folding, de autoria de T. Sundara Rows (Indiano que colocou a data do prefcio do livro como 1893), constando que a traduo foi efetuada por Wooster Woodruff Beman, professor of mathematics in the University of Michigan and David Eugene Smith professor of
mathematics in Teachers College of Columbia University. J em 2008, foi publicado o livro ORIGAMICS Mathematical Explorations through paper folding, de autoria de Kazuo Haga (japons e professor da University of Tsukuba, Japo), com edio e traduo de Josefina C Fonacier,
professora da University of Philippines, Filipinas e Masami Isoda, professor da University of Tsukuba,
Japo, editada por World Scientific Publishing Co. Pte. Ltd. de Singapura. 2 In 2003, Zhong You e Kaori Kuribayashi ambos da University of Oxford desenvolveram um
origami stent para manter as veias desentupidas. Para isso utilizaram a base de origami chamada de bomba dgua, disponvel em http://www.origami-resource-center.com/origami-science.html# origamiDNA, acesso em 05/11/2012. 3Boletim do Lawrence Livermore National Laboratory apresenta artigo sobre o telescpio Hubble e
como foi possvel lev-lo ao espao. Disponvel em https://www.llnl.gov/str/March03/pdfs/ 03_03.2.pdf, acesso em 05/11/2012.
13
Belting (2012). Ainda mostramos a posio de Antoine Compagnon (2010) sobre os cinco
paradoxos da modernidade. Finalmentemostramos as diferenas, relativamente ao sistema da
arte, conforme Anne Cauquelin (2005), da arte moderna para a arte contempornea.
Relacionamos as caractersticas da arte contempornea com base nos textos dos autores j
citados, de Edward Lucie-Smith (2006) e Ktia Canton (2008) possibilitando a anlise de
quais delas so atendidas pelas obras que utilizam origami.
Conclumos que j no h mais estilos, no sentido de uma gramtica que obriga todos
os artistas, que a instalao, a performance, o happening e a interveno urbana so inerentes
arte contempornea, que no existe mais nenhum meio privilegiado e que h uma
perspectiva de onde se pode ver a obra.
No captulo 3 apresentamos e analisamos as obras de arte escolhidas que so obras
tridimensionais em origami, instalaes feitas com origami e uma obra que utiliza origami em
conjunto com outros materiais.
As principais caractersticas da contemporaneidade identificadas nas obras e
instalaes com origami so: utilizao de material efmero (papel), uma certa perspectiva
etnogrfica em que h apropriao da tradio, tridimensionalidade, participao do pblico,
utilizao de novas tecnologias e registro fotogrfico.
Esta uma pesquisa que pretendo continuar com enfoque na utilizao das obras
realizadas com origami para o ensino da arte contempornea.
1 ORIGAMI
A verdadeira, elegante e duradoura arte do origami
como um smbolo para a paz mundial.
Akira Yoshizawa
O origami uma linguagem em que se utiliza papel para criar figuras por meio
do emprego de dobras. Em portugus a tcnica chama-se dobradura, mas cada vez mais se
difunde a utilizao do nome japons.
Aschenbach, Fazenda e Elias (1993, p. 24) explicam o significado de origami,
informando que ORI, deriva do desenho de uma mo e significa dobrar; KAMI, deriva do
desenho de seda e significa papel. Quando pronunciadas juntas o k substitudo pelo g,
resultando origami.
A explicao est atrelada aos ideogramas japoneses, que apresentam mais de um
significado, e formam vrios novos sentidos conforme a juno que deles se faa.
1.1 ORIGEM DO ORIGAMI
provvel que o origami tenha comeado na China, que considerada o bero do
papel. Entretanto se difundiu de tal forma no Japo que considerado um patrimnio da
cultura japonesa.
Inicialmente, no Japo, o origami era utilizado nos rituais religiosos. Sua
dessacralizao ganhou terreno paralelamente reduo do custo do papel. Quando o acesso
ao papel ficou mais fcil a popularidade das dobraduras aumentou e as crianas passaram a
aprender com suas mes. As figuras representavam objetos da vida diria (bonecas, barcos,
etc.). Muitas dessas peas so dobradas at os dias de hoje.
15
Ilda Rafael (1999) publicou material para um curso de matemtica na internet4 onde
apresenta a histria das dobraduras e esclarece a situao da Europa, especialmente da
Espanha:
A difuso do Origami na Europa iniciou-se com os muulmanos que
praticavam esta arte e a levaram para a Pennsula Ibrica. A doutrina
islmica no permitia a criao de figuras e as dobras de papel eram utilizadas em estudos matemticos e astronmicos. Aps a sada dos
muulmanos do Reino de Granada esta arte continuou a ser desenvolvida sob
a designao de Papiroflexia, como conhecida em Espanha. A Parajita ou
Pra Pinta uma figura que representa uma ave e faz parte da cultura popular espanhola desde o sculo XVII. Um grande impulsionador desta
arte, em Espanha, nos finais do sculo XIX, foi Miguel Unamuno. Quando
visitou a Exposio Universal de Paris, em 1889, ficou maravilhado com uma exposio de Origami Japons (RAFAEL, 1999, p. 3).
Miguel de Unamuno5 (1864-1936), foi filsofo e escritor espanhol, considerado por
muitos como um dos pensadores espanhis mais destacados da poca moderna. Trabalhou na
Universidade de Salamanca onde foi catedrtico de grego e reitor. Seu envolvimento com a
papiroflexia to caracterstico que o retrato pintado por Ignacio de Zuloaga, em 1925,
mostra figuras de origami, com destaque especial para um modelo de pssaro criado por
Unamuno.
Figura 1 - Ignacio de Zuloaga. Retrato de Miguel Unamuno. 1925.
6
4 O texto da professora est disponvel no seguinte endereo http://www.apm.pt/files/_EM114_pp16-
22_4e6489d4d25fc.pdf, acesso em 30/10/2012. 5 A biografia est disponvel no site da Associao Espanhola de Papiroflexia, no seguinte endereo
http://www.pajarita.biz/modules.php?name=unamuno&file=biografia, acesso em 30/10/2012. L
tambm possvel ver outro retrato pintado por Gutirrez Solana, que tambm mostra figuras de
origami. 6 leo sobre tela. 105,5 x 121 cm. Encontra-se na Hispanic Society de Nova York. Imagem disponvel
em http://www.pajarita.biz/modules.php?name=unamuno&file=zuloaga, acesso em 30/10/2012.
16
Segundo o texto de Oliveira7 (2004, p. 2) as dobraduras tambm fizeram sucesso na
Europa, sendo ensinadas s crianas:
O uso de dobraduras no ensino no novo. Friedrich Froebel (1782-1852),
educador alemo, foi quem iniciou este uso. Ele foi o criador do
"kindergarten" (jardim da infncia), e na sua abordagem da dobradura dividia-as em 3 estgios:
Dobras de verdade: que trabalhavam com a geometria elementar com a inteno de que as crianas descobrissem por si s os princpios da
geometria Euclidiana. Dobras da vida: onde noes bsicas de dobradura tem como finalidade chegar s dobras tradicionais de pssaros e animais. Esse estgio no foi
muito levado a srio pelos seguidores de Froebel, por considerarem como apenas uma rgida sequncia de memorizao de dobraduras, sem nenhuma
explorao da criatividade infantil.
Dobras da beleza: a grande contribuio de Froebel, e cuja inteno levar criatividade e arte. As crianas eram encorajadas a guardarem suas colees de dobras em lbuns ou em caixas. Muitas colees datam do
sculo 19 e alguns desses lbuns podem ser encontrados em museus da
Europa.
O famoso educador alemo utilizou as dobraduras para estimular as crianas no ensino
infantil e valorizou a criatividade dos pequenos com um tipo de dobradura que permite a
variao dos modelos, com pequenos acrscimos, como mostra a figura a seguir.
Figura 2 - Formas bsicas dos mdulos Froebel.8
7
Origami: Matemtica e Sentimento, por Ftima Ferreira de Oliveira, disponvel em
http://educarede.homedns.org/educa/img_conteudo/File/CV_132/2004-10-18_-_Origami-
Matem_tica_ e_sensibilidade1.pdf, acesso em 25/10/2012. 8
Imagem disponvel em http://www.flickr.com/photos/londonlime/3423636191/sizes/m/in/ photostream/, acesso em 30/10/2012.
17
O modelo inicial das dobras chamado at os dias de hoje de mdulo Froebel. Ele
permite fazer vrias alteraes das dobras finais e uma grande variedade de acabamentos.
Genova (2001, p; 13) ainda nos esclarece que
No sculo XX a tradio de considerar o origami como somente uma
brincadeira para crianas comea a evoluir pelas mos de Isao Honda, no
Japo, e de Miguel Unamuno, na Espanha. Os dois autores, quase ao mesmo tempo, realizaram uma cruzada para conseguir a considerao das classes
mais cultas para o origami.
Genova (2001, p. 12) conta que dos anos 50, vem a ideia de consenso na
representao grfica das dobras diferenciando, por exemplo, dobras vale e montanha.
Aps a disseminao dessa representao grfica os esquemas passo-a-passo usam
smbolos universais, permitindo que se acesse sites e livros de qualquer pas, pois o idioma
no uma barreira para se aprender o origami.
Segundo Peter Engel (1994), origamista norte-americano, nos anos 80 formam-se no
origami duas correntes: a japonesa e a ocidental. Engel afirma que na escola japonesa, o
origami praticado por artistas como filosofia e arte. A filosofia consiste em expressar,
sugerir, captar a essncia do que se quer representar com o mnimo de dobras e a figura
resultante no precisa ser anatomicamente perfeita. Do outro lado, afirma, na escola ocidental,
o origami tem sido praticado por matemticos, engenheiros, fsicos e arquitetos. Perseguindo
a exatido anatmica, as patas, antenas e asas dos animais so representadas em formas,
propores e nmeros exatos.
Jean-Claude Correia, fundador do Movimento Francs dos Dobradores de Papel,
prefaciando o livro de David Brill9 (2007), escreveu:
Dobradura de papel mais do que apenas um passatempo recreativo adotado
no Oriente longnquo com o nico objetivo de entreter nossas crianas.
Quando algum dobra um pedao de papel, deixa para traz um trao
permanente, nominalmente a dobra. Com o passar do tempo nossas alegrias, nossas desventuras, nossas paixes e nossos cuidados so sucessivamente
marcados em nossas faces; ns as chamamos de rugas. Planalto, vale,
montanha e depresso so algumas das palavras que usamos para descrever
9 O livro chama-se Origami Brilhante, editado em portugus, em 2007.
18
nossos arredores geogrficos. dentro das dobras e contornos do crebro
que nascem nossas ideias, e o contorno de nossas mos que nos permitem
acariciar nossos entes queridos. No discorreremos sobre as dobras do corao humano; elas ocultam uma parte secreta de ns, escondem o que
est dentro, velado aos outros. No desperdicemos isso (BRILL, 2007, p.
11).
Nessa fala podemos vislumbrar uma relao do origami com a vida, a poesia, a
memria, as diferentes culturas, a paisagem, enfim, a arte.
Pouco se sabe sobre a chegada do origami ao Brasil. Mas, pode-se dizer que a porta de
entrada, ou melhor, as portas de entrada tenham sido a Argentina, como herana da cultura
espanhola, e os japoneses que vieram no incio do sculo XX.
Quando viemos de j fazia uma caixa com papel retangular. Mas durante vrios anos
s havia algumas revistas e poucos livros sobre origami. Atualmente, com a universalizao
do conhecimento e a sociedade da informao, podemos achar muitos livros sobre origami e
encontrar vrios modelos e notcias sobre origami na Internet.
Neste item apresentamos sucintamente a histria do origami com destaque para o
Japo, a Espanha e a Alemanha. Tambm percebemos como chegaram ao Brasil as noes
dessa arte.
1.2 O USO DO ORIGAMI NA EDUCAO E ARTETERAPIA
Neste item vamos examinar como o origami pode ser utilizado para a educao e
tambm como recurso na arteterapia.
Tommasi e Minuzzo (2010) afirmam que
O contato com o origami desde a pr-escola propicia a aquisio e
interiorizao de conceitos como frao, dimenso, proporo e forma. Ao
observar como se faz, e fazer a dobradura, a criana comea a perceber as coisas, a natureza e os objetos sua volta. Ao mesmo tempo desenvolve a
autodisciplina, concentrao, memria, raciocnio lgico, psicomotricidade
fina, imaginao e a criatividade (TOMMASI e MINUZZO, 2010, p. 41/42).
19
O texto reala a importncia do origami para a educao infantil e fundamental.
Tratando-se de material concreto um instrumento facilitador para a apreenso de conceitos
matemticos e geomtricos. A prtica do origami ajuda o desenvolvimento das capacidades
de percepo, memorizao, concentrao, raciocnio lgico, capacidade motora fina,
imaginao e criatividade.
Segundo Drumond (2005) a arte do origami contribui para estimular e melhorar a
capacidade de concentrao, desenvolver a coordenao motora fina, melhorar a destreza
manual e a pacincia, reduzir o estresse e melhorar a viso espacial.
Como visto, a prtica do origami traz benefcios para crianas e jovens. Fazer navios,
leques, avies de papis j fez parte da infncia de muitas pessoas que hoje buscam no
origami uma maneira de reduzir o estresse, de se concentrar, de melhorar a memria, de
descansar no dia a dia.
Tommasi e Minuzzo (2010, p. 43) afirmam que para o adulto, a princpio um
passatempo fascinante e relaxante. Ao liberar a prpria criatividade, ele poder criar e recriar
modelos, buscar solues inditas para algumas formas. Tambm os adultos so beneficiados
pela prtica do origami, seja como descanso da mente, auxlio a atividades pedaggicas ou
mesmo pura diverso. Ainda possvel que a confeco de origamis traga idias criativas
aplicveis em reas do trabalho do praticante.
Na educao o origami utilizado para que os estudantes aprendam vrias disciplinas
alm de auxiliar em diversas atividades. A maior quantidade de artigos sobre educao que
localizamos na Internet tratam da utilizao do origami para o ensino, tanto no ensino
fundamental como no ensino mdio, das noes de matrias como a matemtica10
e a
10
A matemtica do origami Revista Galileu, disponvel em http://revistagalileu.globo.com/Galileu/
0,6993,ECT516776-2680,00.html, acesso em 30/10/2012; Origamtica: o origami no ensino aprendizagem da matemtica, disponvel em http://www.lume.ufrgs.br/handle/10183/18223, acesso
em 30/10/2012; Origami e matemtica as novidades do origami nas cincias, disponvel em http://www.dm.ufscar.br/cursos/grad/cartaz-008-p.pdf, acesso em 30/10/2012; Origami na educao bsica disponvel em http://www.matematicarecreativa.uac.pt/am0910.html, acesso em 30/10/2012.
20
geometria11
, mas tambm temos artigos que sugerem a utilizao do origami para o ensino de
cincias e biologia (confeco de animais12
e de molcula de DNA13
), de histria14
, para a
contao de histrias para crianas15
, a montagem de maquetes, alm das lembranas para
diversas finalidades (dia das mes, dos pais, etc.).
Tommasi e Minuzzo (2010) tambm tratam da prtica do origami por adultos,
especialmente quando doentes, afirmando:
Na rea da sade o origami ultrapassa as suas fronteiras, pois ao ser
executado favorece o equilbrio e a harmonia mental. O resultado final
enaltece a autoestima, estimula o riso e a alegria. A sensao de competncia e realizao domina o corpo, a mente e a alma. Pensamos que seja por isso
que os japoneses presenteiam os doentes com papel para dobradura
(TOMMASI e MINUZZO, 2010, p. 43).
O poder transformador de uma folha de papel que por meio de simples dobras passa a
mostrar flores, animais ou formas geomtricas imediato e provoca uma sensao de bem-
estar no doente, que est impossibilitado de fazer vrias coisas. O efeito psicolgico
benfico sade. Existem vrios voluntrios que ajudam doentes a fazer origamis em
hospitais para a melhora da situao geral do paciente.
Alm disso ainda temos o efeito benfico do origami sobre as conexes do crebro.
Tommasi e Minuzzo (2010) afirmam:
Cientistas comprovaram tambm que as clulas neuronais no param de
realizar conexes quando devidamente estimuladas. Portanto, acreditamos
que a prtica do origami, durante todas as fases da vida, benfica e atua de forma preventiva em relao s doenas do sistema nervoso (TOMMASI e
MINUZZO, 2010, p. 49).
11
Utilizao da arte do origami no ensino da geometria, disponvel em http://www.ime.unicamp.br/ erpm2005/anais/c3.pdf, acesso em 30/10/2012; Aprendendo geometria com origami, disponvel em
http://www.mat.ufmg.br/~espec/monografiasPdf/Monografia_Leroy.pdf, acesso em 30/10/2012. 12
Origami nas aulas de cincias do ensino fundamental com confeco de animais disponvel em http://www2.ibb.unesp.br/Museu_Escola/Ensino_Fundamental/Origami/Documentos/indice_origami_
educacao.htm, acesso em 30/10/2012. 13
Modelo para fazer a molcula de DNA, disponvel no seguinte endereo http://www.bioinfo.ufpb.br
/difusao/pdf/odnaemorigami.pdf, acesso em 30/10/2012. 14
Origamis no ensino de histria, disponvel em http://fabriciamfernandes.blogspot.com.br/
2012/09/oficina-de-origami-nas-aulas-de-historia.html, acesso em 30/10/2012. 15
Apostila de contao de histrias com origami, disponvel em http://aprendersempre.org.br/curso-historias-contadas-com-origamis-2/, acesso em 30/10/2012.
21
A ideia de que as clulas neuronais quando perdem suas conexes no tem mais
recuperao foi corrigida pela descoberta de que essas clulas podem criar novas conexes. O
origami um aliado ao estmulo do crebro a par de atividades como palavras cruzadas,
sudoko, etc.
Assim, vimos a importncia do origami para as atividades ligadas educao de
crianas e jovens, para a recreao e estmulo dos adultos, bem como, para a terapia de
pessoas que se encontram doentes.
1.3 USO DE SOLUES COM ORIGAMI NAS CINCIAS
Com o origami possvel dar soluo a problemas que afetam as mais diversas reas
da vida moderna. Sobre esse assunto, Robert Lang (2008), na palestra16
disponvel no
TED17
,aps apresentar vrias solues desenvolvidas a partir do origami diz que:
Quando se tem matemtica envolvida, problemas que se resolvem apenas
por valores estticos, ou para criar algo belo, transformam-se e acabam tendo uma aplicao no mundo real. E to estranho e surpreendente quanto isto
possa parecer, origami pode algum dia at mesmo salvar uma vida (LANG,
2008).
Na palestra, Robert Lang (2008) fala sobre a utilizao do origami como soluo para
o problema de transportar os espelhos de telescpios em foguetes, permitindo a reduo de
seu tamanho no transporte e a abertura quando o foguete chega ao seu destino.
Tambm apresenta a soluo dada para a colocao de airbag nos carros, que utiliza
um certo tipo de dobragem. Dias e Croce disseram
O problema dobre e corte foi solucionado por Erik Demaine (MIT), que
aplica essa tcnica na Alemanha, no design de airbags para automveis.
16
A palestra apresenta diversas solues com origami e chama-se Robert Lang: The math and magic of origami- Disponvel em http://www.ted.com/talks/robert_lang_folds_way_new_origami.html, acesso em 30/10/2012, com transcrio da palestra em portugus. 17
O TED um site em que esto disponveis diversas palestras de interesse de vrias reas, mas especialmente para educao. O endereo http://www.ted.com/.
22
Demaine tambm pesquisa os dobramentos de protenas com as tcnicas de
dobras. Acredita-se que as protenas possuem uma seqncia correta de
dobras na sua formao e que dobras ruins so responsveis por certas doenas. (DIAS e CROCE, 2012, p. 2)
Figura 3 - Soluo para dobrar o airbag.18
Nesta imagem vemos a representao esquemtica da soluo para dobrar o airbag
desenvolvida pelo jovem cientista Erik Demaine19
.
Quase ao final da palestra Robert Lang (2008) mostra a soluo dada por Zhong You,
para endoprteses expansveis para o tratamento de vrias doenas relacionadas com o
bloqueio e enfraquecimento dos vasos do corpo humano, com a utilizao de dobras que
permitem a reduo do tamanho da estrutura para seu transporte nas veias e a sua expanso no
local onde necessrio corrigir o problema.
Como se ver nas imagens seguintes a prtese, geralmente chamada por stent,
transportada fechada pelo corpo (nas veias) e expandida no local onde necessrio corrigir
o problema de entupimento da veia, geralmente causado por acmulo de gordura.
18
Imagem disponivel em http://www.origami-resource-center.com/origami-science.html, acesso em
30/10/2012. 19
Eric Demaine em entrevista Revista Superinteressante, de setembro de 2003, disse: uma das primeiras questes que resolvi conhecida como Problema do Dobre e Corte. Basicamente, o que fiz foi encontrar um algoritmo para provar que qualquer forma poligonal, seja ela uma simples estrela
ou um complexo drago, pode ser feita ao dobrar um pedao quadrado de papel e depois fazer apenas
um nico corte retilneo. Basta saber dobrar o papel do jeito certo. O resultado desse problema j est sendo aplicado no design de airbags desenvolvidos na Alemanha. Disponvel em http://super.abril.com.br/ciencia/matematico-diversao-444074.shtml, acesso em 06/11/2012. Em 2003,
data da entrevista Revista Superinteressante, Erik Demaine estava com 22 anos de idade e era o mais jovem professor do MIT.
23
Figura 4 - Stent para correo de artrias posicionado no interior da veia.20
Figura 5 - Stent para correo de artrias, fechado e expandido. 21
em relao a este assunto que Robert Lang (2008) diz que origami pode algum dia
at mesmo salvar uma vida. A estrutura do stent construda com a utilizao de uma das
formas bsicas difundidas por todo o mundo do origami: a base da bomba dgua
(waterbomb base).
Com a razo o fsico e origamista Robert Lang (2008) quando diz que problemas que
envolvem matemtica acabam tendo uma aplicao no mundo real.
Com este tpico ficou claro que o origami utilizado com sucesso na soluo de
problemas diversos nas cincias, especialmente quando envolvem raciocnio matemtico e
geomtrico.
20
Imagem disponvel em http://www-civil.eng.ox.ac.uk/people/zy/old/research/stent.pdf, acesso em
30/10/2012. 21
O dimetro varia de 12 mm fechado a 23 mm aps a expanso. Imagem disponvel em http://www-civil.eng.ox.ac.uk/people/zy/old/research/stent.pdf, acesso em 30/10/2012.
2 ARTE CONTEMPORNEA
O fim permanente pertence ao ritmo de acelerao
do breve ciclo da assim chamada modernidade.
Talvez, diferentemente do que se pensa, seja apenas o fim de um episdio no turno tranquilo de
um percurso histrico mais longo.
Hans Belting
Vrios artistas produzem obras com a utilizao de origami. Neste trabalho
examinamos obras dos seguintes artistas: Tomoko Fuse, Shipo Mabona, Robert Lang, Romn
Diaz e Vik Muniz, que fizeram exposies tridimensionais de origamis; James Roper, Ingrid
Plum, Jacqui Symons, Mademoiselle Maurice e Vik Muniz que fizeram instalaes com
origamis; e, Rivane Neuenschwander que utilizou origami em uma de suas obras.
A apresentao e anlise das obras est no Captulo 3 deste trabalho e nesse exame
relacionamos as caractersticas da arte contempornea presentes nessas obras.
Entretanto para fazer essa anlise necessrio examinar a arte contempornea e suas
caractersticas. Logo, a primeira coisa que delimitamos o que arte contempornea: qual a
base que ser adotada nesta monografia e principais caractersticas.
2.1 BASES PARA A ARTE CONTEMPORNEA
Nesta monografia examinamos a utilizao do origami nas obras de arte
contempornea, assim, de imediato se afigura necessrio saber o que arte contempornea.
David Thistlewood (2005, p. 114), esclarece como a arte contempornea, indicando a
prtica corrente a arte que est empenhada no aqui e no agora passa para a histria da arte
como arte moderna, pois interpretaes crticas e tericas da arte contempornea tornam-na
paulatinamente mais acessvel para diferentes fraes do pblico.
O autor apresenta sua posio nos seguintes termos:
25
De modo similar, o termo contemporneo normalmente indica a prtica corrente a arte que est empenhada no aqui e no agora. O limiar entre a arte moderna e a contempornea mais difcil de ser estabelecido, mas o termo contemporneo usualmente aplicado para a arte que ainda no originou opinies assentadas. Esta no vista claramente como a moderna pois ainda no foi suficientemente trabalhada por crticos e tericos.
Interpretaes crticas e tericas da arte contempornea tornam-na paulatinamente mais acessvel para diferentes fraes do pblico, e esta
propagao transforma-a em algo tangvel e real para uma significativa
parcela da populao. Entretanto, ela ainda reconhecida por exigir esforos de seu futuro apreciador (THISTLEWOOD, 2005, p. 115/116).
Nesse texto o autor defende que a arte contempornea aquela que os nossos
contemporneos esto fazendo e s depois de se tornar de mais fcil compreenso que vai se
juntar arte moderna. Mas havia a ideia de que todos somos modernos, como afirmou Danto
(2006).
Esta era a posio adotada pelos tericos da arte: a arte feita por nossos
contemporneos vai se incorporar arte moderna aps ter sido mais explicitada pelos crticos
e absorvida pelo pblico.
Danto (2006) fala sobre a diferena entre moderno e contemporneo esclarecendo:
Da mesma forma que moderno no simplesmente um conceito temporal, significando, digamos, o mais recente, tampouco contemporneo um termo temporal, significando tudo o que esteja acontecendo no presente
momento. [...] Por muito tempo, creio eu, arte contempornea teria sido apenas a arte moderna que est sendo feita agora. O moderno, apesar de tudo, implica uma diferena entre o agora e o ainda h pouco: a expresso no teria qualquer utilidade se as coisas permanecessem sempre e em ampla
medida as mesmas. Isso implica uma estrutura histrica e tem um sentido mais forte do que o termo mais recente. Contemporneo, em seu sentido mais bvio, significa simplesmente o que est acontecendo agora: a arte
contempornea seria a arte produzida por nossos contemporneos. [...] Mas como a histria da arte evoluiu internamente, a contempornea passou a
significar uma arte produzida dentro de certa estrutura de produo jamais
antes vista em toda a histria da arte creio eu (DANTO, 2006, p. 12).
Realmente, usamos o termo moderno no sentido do que est acontecendo agora, que
mais recente. Contemporneo tem a mesma significao. Como citado, se considerava que a
arte contempornea a que est sendo praticada agora pelos nossos contemporneos. A arte
moderna um rtulo que indica o perodo histrico que se inicia em meados do sculo XIX
com a crise do academismo. Courbet e Manet na pintura seriam os primeiros modernos,
26
seguidos pelos impressionistas e simbolistas, por Czanne e Mallarm, pelos cubistas,
surrealistas etc (COMPAGNON, 2010, p. 10).
Sobre o mesmo assunto Belting (2012, p. 30) esclareceu que a modernidade vivia da
oposio de dois modelos, que se voltavam ora para o futuro ora para a tradio, e por isso
encontrava em si mesma uma resistncia necessria contra as suas prprias utopias.
Belting est se referindo ao desejo da modernidade de inovao, novidade, mas logo
se aceita essa novidade, que passa a se incorporar tradio. Em seguida vem a vanguarda,
questionando a tradio que se instalou, desejando um futuro diferente.
Lucie-Smith (2006, p. 6) diz que a arte da primeira metade do sculo XX tinha suas
razes em uma rebelio contra as normas sociais, rebelio essa que passou a integrar o mito
que os artistas das dcadas seguintes herdaram de seus predecessores.
As vanguardas traziam novas formas de fazer a arte, rebelando-se contra o status quo.
A ideia de progresso inerente narrativa histrica faz com que os artistas herdem o que j foi
trabalhado pelos antecessores.
Thistlewood (2005, p. 115) explica que insignificantes quantidades de informao a
respeito da arte de vanguarda tero sido absorvidas pelo conhecimento do pblico, e esta a
principal razo para a sua grande dificuldade de apreenso. Lembra ainda que a arte de
vanguarda est envolvida na conquista de novos conceitos, na linha-de-frente da experincia
esttica.
Os autores esto se referindo s vanguardas que caracterizaram a arte da primeira
metade do sculo XX. So os chamados ismos: expressionismo, construtivismo,
suprematismo, futurismo, dadasmo, fauvismo, cubismo, surrealismo e abstracionismo.
Ocorre que houve uma mudana, por volta das dcadas de 1960 e 1970, que s se
tornou mais clara na dcada de 80, quando os tericos da arte passam a tratar sobre o fim da
arte (DANTO, 2006) e o fim da histria da arte (BELTING, 2012).
27
Belting (2012) assim se manifesta sobre o fim da narrativa histrica na arte:
Se a arte atinge seu objetivo no espelho de todos os gneros em que durante
muito tempo dela foi realizada, agora possvel identificar o que move os
nimos. Aqui o progresso, que sempre manteve as artes particulares vivas no prprio mdium, enfraquece como necessidade no sentido que deteve at
agora. O progresso trocado pela palavra de ordem remake. Faamos
novamente o que j foi feito. A nova verso no melhor, mas tambm no
pior e, em todo caso, uma reflexo sobre a antiga verso que ela (ainda) no poderia empregar. Os gneros, que sempre ofereceram o enquadramento
slido que a arte necessitava, se dissolvem. A histria da arte era um
enquadramento de outro tipo, que fora escolhido para ver em perspectiva o acontecimento artstico. Por isso, o fim da histria da arte o fim de uma
narrativa: ou porque a narrativa se transformou ou porque no h mais nada
a narrar no sentido entendido at ento (BELTING, 2012, p. 46).
V-se que Belting (2012) defende a ideia de que no mais possvel aplicar a
narrativa histrica, como era feita, arte contempornea.
Danto (2006, p. 12/13) explicita que da mesma forma que o moderno veio a denotar
um estilo e mesmo um perodo o contemporneo designa o que acontece depois que no h
mais perodos em alguma narrativa mestra da arte.
O autor chama os estilos de arte de narrativa mestra da arte e entende que a arte
contempornea no pode ser considerada como um estilo, pois designa o que acontece depois
que os estilos acabaram.
Danto (2006, p. 15) afirma que apesar do contemporneo se constituir de certa
perspectiva em um perodo de desordem informativa tambm um perodo de impecvel
liberdade esttica. Hoje no h mais qualquer limite histrico. Tudo permitido. Prossegue
dizendo:
(...) E os artistas, liberados do peso da histria, ficavam livres para fazer arte
da maneira que desejassem, para quaisquer finalidades que desejassem ou
mesmo sem nenhuma finalidade. Essa a marca da arte contempornea, e no para menos que, em contraste com o modernismo, no existe essa
coisa de estilo contemporneo (DANTO, 2006, p. 18).
Fica claro que no mais possvel pensar a arte contempornea como um estilo que
enquadra todos os artistas em determinadas condies, mas assinala um novo perodo em que
cada artista pode seguir sua prpria pesquisa.
28
Assim, neste trabalho vamos considerar a arte contempornea no s como a arte
realizada na atualidade, por nossos contemporneos, mas como a que integra um novo
conceito, com caractersticas prprias, diferentes da arte moderna.
2.2 OS CINCO PARADOXOS DA MODERNIDADE
Neste item nos referimos ao livro de Antoine Compagnon (2010) chamado Os cinco
paradoxos da modernidade. Nele o autor lembra que se utiliza a expresso tradio moderna
(The Modern Tradition) para
(...) designar, do ponto de vista de sua esttica, o perodo histrico que se
inicia em meados do sculo XIX com a crise do academismo. Baudelaire e
Flaubert na literatura, Courbet e Manet na pintura seriam os primeiros modernos, seguidos pelos impressionistas e simbolistas, por Czanne e
Mallarm, pelos cubistas e surrealistas etc (COMPAGNON, 2010, p. 10).
Compagnon (2010) explicita o perodo histrico da tradio moderna que se ope
tradio clssica, lembrando que a justaposio da tradio com o clssico aceitvel, j o
termo moderno justaposto tradio evoca a traio da tradio.
O autor est esclarecendo que durante muito tempo o moderno se ops ao tradicional.
Moderno era o que rompia com a tradio. E o tradicional resistia modernizao. Assim, a
juno das expresses formando tradio moderna constitui um paradoxo. Se cada gerao
rompe com o passado, a prpria ruptura torna-se a tradio. Uma tradio de rompimentos e
recomeos.
Compagnon (2010, p. 11/12) lembra que a tradio moderna comeou com o
nascimento do novo como valor e relaciona os cinco paradoxos que vai examinar: a
superstio do novo, a religio do futuro, a mania terica, o apelo cultura de massa e a
paixo da negao.
O captulo 1 trata do prestgio do novo e nele Compagnon (2010, p. 26) diz que a
modernidade , assim, conscincia do presente como presente, sem passado, nem futuro; ela
29
s tem relao com a eternidade. Ainda apresenta os traos da modernidade, a partir da
opinio de Baudelaire sobre Guys, destacando: 1 o no acabado; 2 o fragmentrio; 3 a
insignificncia ou a perda de sentido; e, 4 a autonomia, a reflexividade ou a circularidade.
O captulo 2 trata da religio do futuro. Nele Compagnon (2010, p. 39) lembra que os
primeiros modernos no procuravam o novo num presente voltado para o futuro e que
carregara consigo a lei de seu prprio desaparecimento, mas no presente, enquanto presente.
Esclarece que os primeiros modernos no imaginavam que representassem uma vanguarda.
Sobre as vanguardas diz que deve-se distinguir duas vanguardas, uma poltica que quer, em
suma, utilizar a arte para mudar o mundo e outra, esttica, que quer mudar a arte estimando
que o mundo a seguir (2010, p. 43). O texto est apresentando a estrutura das vanguardas
que olham para o futuro.
No captulo 3, Compagnon (2010, p. 63) alude que um outro trao, tambm ele
contraditrio, se liga, para ns, tradio moderna: seu terrorismo terico. Esclarece que os
primeiros modernos como Baudelaire ou Manet, ou, ainda, Czanne o foram a despeito
deles mesmos (...) eles no se viam como revolucionrios, nem como tericos. Lembra que
havia vantagem em distinguir os valores do novo e do futuro, pois assim se separam, esttica
e filosoficamente, duas noes muitas vezes confundidas: a modernidade e a vanguarda
(COMPAGNON, 2010, p. 64). Trata da libertao da forma do contedo, da chegada ao
abstracionismo e lembra que Kandinski, Mondrian e Malevitch chegaram abstrao por vias
muito diferentes, mas todos sentiram a necessidade de justificar sua pintura atravs de uma
teoria que a tornasse aceitvel aos olhos do pblico, assim como para eles mesmos
(COMPAGNON, 2010, p. 70).
Abstracionismo refere-se s formas de arte no regidas pela figurao e pela imitao
do mundo. A decomposio da figura, a simplificao da forma, os novos usos da cor, o
30
descarte da perspectiva e a rejeio do uso convencional da sombra e luz, so traos
recorrentes das diferentes orientaes abrigadas sob esse rtulo.
No captulo 4, Compagnon assim formula o quarto paradoxo:
(...) enquanto a tradio moderna, desde a metade do sculo XIX e,
sobretudo, desde que as vanguardas histricas do incio do sculo XX
reagiram contra a excluso da arte em relao vida moderna, contra a religio da arte, qualificada como burguesa, porque sacraliza o gnio e
venera a originalidade na produo de um objeto nico, autnomo e eterno,
essa mesma tradio, longe de alcanar a cultura de massa e a arte popular,
se isolou, sem dvida cada vez mais, no universo do que se chama em ingls o connaisseurship, ou seja, o meio elitista e confinado dos museus e das
universidades, da crtica e das galerias. A tradio moderna no aboliu, pois,
a distino corrente em ingls entre o que se chama high e low art, a arte de elite e a arte de massa, a grande arte e a arte menor, o formalismo e o kitsch;
paradoxalmente, ela reforou essa oposio at o aparecimento de formas
como a arte pop, nos anos 60, encenando a morte da arte, quer dizer aproveitando o domnio do mercado para fazer a completa identificao
entre as obras de arte e os bens de consumo. Ento, com efeito, a distino
entre arte de elite e arte de massa se aboliu, mas a que preo
(COMPAGNON, 2010, p. 85/86).
Neste captulo refere-se trajetria de Pollock at o expressionismo abstrato e observa
que o grande perodo de Pollock corresponde, justamente, rejeio da imagem e
substituio mais exata do processo ao objeto (COMPAGNON, 2010, p. 92). Longe de se
retirar da tela, Pollock fica nela. Com o expressionismo abstrato valoriza-se o processo no
caso de Pollock praticamente uma performance. O autor apresenta tambm a arte pop e
observa que ela abolia a distino entre arte de elite e arte de massa: a arte pop lucrou com o
fim da arte (COMPAGNON, 2010, p. 95). Observa que a sociedade dos anos 60 exigia uma
arte de consumo mais rpido no que foi atendida pela Pop arte. Ainda trata sobre Duchamp e
compara-o com a pop arte. Conclui com a seguinte assertiva: a arte pop revelou a natureza
elitista e esotrica da tradio moderna e desnudou a dependncia de toda arte para com o
mercado (COMPAGNON, 2010, p. 103). Assim, a tradio moderna chegou ao pop, com
um ceticismo radical em relao arte.
31
No captulo 5, tratando do quinto paradoxo a paixo da negao, introduz o tema da
ps-modernidade, analisando a ps-modernidade na arquitetura, na literatura e na arte.
Afirma:
Se a modernidade foi a paixo do presente e a vanguarda uma aventura da
historicidade, a intencionalidade ps-moderna, que recusa ser pensada em
termos histricos, parece, pois menos hostil modernidade que vanguarda. A menos que se trata de sua variante cnica e comercial o ltimo avatar do kitsch , o ps-modernismo no se ope modernidade baudelairiana, ela prpria sempre trada pelo vanguardismo, mas idolatria do progresso e dos
excessos, tpica das vanguardas histricas. No sem razo, alis, que a pintura contempornea, que serve de linguagem formal resultante do
movimento moderno, mas no mais com esperana de que essa linguagem
conduza onde quer que seja, chama-se ps-vanguarda (COMPAGNON, 2010, p. 121).
O autor aduz que se deve distinguir entre o ps-modernismo americano dos anos 60 e
o ps-modernismo generalizado dos anos 80. Este o texto que esclarece este tema:
A arte ps-moderna do incio (Rauschenberg e Jasper Johns, na pintura e William Burroughs, na literatura) em reao contra o modernismo doravante
integrado, ensinado nas universidades e instalado nos museus, representava
ainda um movimento de vanguarda. [...] Os dois traos discordantes da
vanguarda, o iconoclasmo e a utopia, estavam presentes, determinando uma nova etapa no questionamento da instituio artstica: o repdio ao museu,
ltimo refgio, at mesmo para Duchamp, da arte de elite. O desejo de reunir
a arte e a vida, o otimismo tecnolgico e a valorizao da cultura de massa, o projeto crtico, enfim, tudo isto concordava com a tradio vanguardista
europia. O ps-modernismo, como vanguarda americana dos anos 60,
conclui a aventura das vanguardas internacionais do sculo XX.
(COMPAGNON, 2010, p. 121/122)
O autor defende que o ps-modernismo dos anos 60 ainda era um movimento de
vanguarda. A ltima manifestao das vanguardas internacionais.
O ps-modernismo generalizado de aps 1970 muito diferente. Ele
claramente ps-vanguardista, ou transvanguardista, (...) Tudo continuamente acessvel, dizem os transvanguardistas, sem mais categorias temporais e hierrquicas de presente e passado, tpicas da
vanguarda que sempre viveu o tempo voltando-lhe as costas. A citao ainda a figura fundamental, mas no desempenha mais um papel crtico
como na colagem cubista ou na montagem surrealista ou construtivista. A
subjetividade do artista e o prazer do espectador so exaltados. O culto do
inautntico triunfou sobre o da originalidade, e o ecletismo se exibe como superao, de modo a prevenir a acusao de neoacademismo
(COMPAGNON, 2010, p. 122).
32
Agora estamos no ps-modernismo. O ps-modernismo resulta de uma crise de
legitimidade dos ideais modernos de progresso, de razo e superao.
Finaliza o captulo concluindo que haja um ps-modernismo conservador natural,
mas no se deveria dissimular que a conscincia ps-moderna, refutando o historicismo e o
dogma do progresso, retoma tambm as origens da modernidade (COMPAGNON, 2010, p.
127/128).
Compagnon (2010) defende que o ps-modernismo faz exatamente o que o moderno
fazia, estabelece uma ruptura com o que lhe precedeu, o prprio modernismo.
Compagnon (2010, p. 131) apresenta uma concluso onde diz que a arte alcanou a
verdadeira autossuficincia, at ento proclamada, aboliu toda a fronteira entre o que
aceitvel e o que no , suprimiu toda definio do objeto artstico.
O autor diz que a liberdade do artista no lhe atribui mais responsabilidade social. E
conclui que com a ps-modernidade recuperamos o atraso do pensamento em relao arte
desde Baudelaire. (COMPAGNON, 2010, p. 132).
A ps-modernidade no apenas uma crise a mais, o mais recente episdio de revolta
do modernismo contra si mesmo, antes um desenlace. Com o fim da crena no progresso
preciso achar uma maneira diferente de pensar as relaes entre a tradio e a inovao, a
imitao e a originalidade.
2.3 ARTE CONTEMPORNEA SEGUNDO ANNE CAUQUELIN
Sobre a arte contempornea e sua distino da arte moderna recorremos ao texto de
Anne Cauquelin (2005) que trata especificamente sobre este tema.
33
Cauquelin (2005, p. 14) afirma que h de fato um sistema da arte, e o conhecimento
desse sistema que permite apreender o contedo das obras. Aduz que esse sistema, em seu
estado contemporneo que vai apresentar no livro.
Cauquelin (2005) observa que o divrcio entre a arte contempornea e seu pblico tem
sido estudado sob trs ngulos de abordagem: 1 a noo de modernidade se a arte
contempornea continuidade ou ruptura em relao arte moderna; 2 o mercado de arte
discusso das funes e agentes envolvidos; e, 3 a recepo analisar onde a arte
contempornea vista.
A autora ainda esclarece: para ns, o passado, no que diz respeito arte, foi ontem,
a arte que dizemos moderna e sobre a qual achamos que fazemos justas apreciaes, que
reconhecemos como arte verdadeira bastante orgulhosos, por sinal, de possuir suficiente
cultura para tal (CAUQUELIN, 2005, p. 19). Aduz que essa arte moderna que nos impede
de ver a arte contempornea, pois nela queremos incluir as manifestaes atuais.
Apresentamos uma tabela em que resumimos as caractersticas do sistema da arte
apresentadas por Cauquelin (2005) relativamente arte moderna e arte contempornea.
ARTE MODERNA ARTE CONTEMPORNEA
Gosto pela novidade, recusa do passado
qualificado de acadmico, posio ambivalente
de uma arte ao mesmo tempo da moda (efmera) e substancial (a eternidade).
As noes de originalidade, de concluso, de
evoluo das formas ou de progresso em direo
a um ideal no so mais aplicveis.
Perodo econmico da era industrial com
desenvolvimento para a sociedade de consumo
Sociedade da comunicao
REGIME DE CONSUMO
O valor do progresso (cientfico, tcnico e na escala social) concorre para desenhar um
modelo com posies claramente definidas:
REDE
Os diversos canais esto ligados entre si:
telefonia, audiovisual ou informtica e
inteligncia artificial. Os papis podem ser desempenhados por todos envolvidos nesta rede.
Produtor: Artista O sistema aberto, funciona como uma rede, se
espalha, inclusive por meios que no so considerados artsticos.
Intermedirio: Marchand, crtico e curador.
Consumidor: Colecionador e pblico em geral.
A obra como produto e o pblico distanciado
dela. A obra em uma instituio de arte, como
um Museu, uma galeria ou uma universidade.
Supe pblico de massa e tenta aes educativas, mas o pblico continua ausente.
A arte democratizada. Muitas obras dependem
da participao do pblico. A obra pode estar em
todos os lugares, no museu, na rua, na internet. O
pblico est confuso onde est a arte? Onde est o artista? H distanciamento.
34
A primeira distino aponta que as noes de originalidade, concluso, evoluo das
formas ou de progresso em direo a um ideal no se aplicam mais.
Em seguida, vemos que na arte contempornea estamos vivendo na sociedade da
comunicao e no mais na era industrial, valorizando mais a informao e permitindo-se que
os papis possam ser exercidos por qualquer dos envolvidos (artista, marchand, crtico,
curador, colecionador ou pblico) enquanto antes os papis eram claramente definidos. Por
fim, a arte democratizada, algumas at dependem da participao do pblico. Apesar da
obra estar na rua, na Internet e poder ser encontrada em qualquer lugar, o pblico est
confuso. H distanciamento do pblico.
Cauquelin (2005, p. 161) agrupou assim as constataes: a arte contempornea mal
apreendida pelo pblico, que se perde em meio aos diferentes tipos de atividade artstica mas
, contudo, incitado a consider-la um elemento indispensvel sua integrao na sociedade
atual.
A autora explica que em uma sociedade de comunicao, a criao artstica a
atividade mais requisitada e possivelmente a nica capaz de assegurar o funcionamento das
redes em seu aspecto exclusivo de redes.
Assim compreendemos que h diferenas cruciais entre o sistema que abrangia a arte
moderna e o atual que rege a arte na contemporaneidade, especialmente por causa da mudana
de sociedade industrial para sociedade de comunicao.
2.4 CARACTERSTICAS DA ARTE CONTEMPORNEA
Como vimos at aqui, houve uma alterao no sistema da arte por volta da metade do
sculo XX (CHIPP, 1996) ou por volta da dcada de 60/70 (DANTO, 2006 e BELTING,
35
2012) ou, ainda, por volta da dcada de 80 (COMPAGNON, 2010). O que importa que
estamos agora na arte contempornea e no mais na arte moderna.
De imediato preciso lembrar que no h mais estilos, como afirmou Danto (2006).
Agora cada artista est realizando sua prpria pesquisa, de acordo com seus prprios desejos,
livre para fazer o que entender melhor, sem ser obrigado a atender a nenhuma norma imposta
por motivos inexplicveis. Determinadas condies so prprias do contemporneo, como
instalaes22
, happening23
, performance24
e intervenes urbanas25
que so inerentes arte
contempornea e a perspectiva de onde se pode ver a obra.
Lucie-Smith (2006) lembra que os artistas, que sempre foram fascinados pela
tecnologia, esto com a ateno voltada para a fotografia, imagens digitalizadas, vdeo e
filme, que por sua vez, apresentam-se vinculados a vrias formas de arte ambiental e de
instalao. Aduz que o que isso quer dizer que, alm de no haver meios de expresso
22
Segundo a Enciclopdia Ita Cultural o termo instalao incorporado ao vocabulrio das artes visuais na dcada de 1960, designando assemblage ou ambiente construdo em espaos de galerias e museus. (...) Para a apreenso da obra preciso percorr-la, passar entre suas dobras e aberturas, ou
simplesmente caminhar pelas veredas e trilhas que ela constri por meio da disposio das peas,
cores e objetos. Disponvel em http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_ic/index.cfm?fuseaction=termos_texto&cd_
verbete=3648, acesso em 19/12/2012. 23
Segundo a Enciclopdia Ita Cultural o termo happening criado no fim dos anos 1950 pelo americano Allan Kaprow para designar uma forma de arte que combina artes visuais e um teatro sui
generis, sem texto nem representao. Nos espetculos, distintos materiais e elementos so orquestrados de forma a aproximar o espectador, fazendo-o participar da cena proposta pelo artista
(nesse sentido, o happening se distingue da performance, na qual no h participao do pblico). Disponvel em
http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_ic/index.cfm?fuseaction=termos_texto&cd_verbete=3647, acesso em 19/12/2012. 24
Segundo a Enciclopdia Ita Cultural Performance Forma de arte que combina elementos do teatro, das artes visuais e da msica. Nesse sentido, a performance liga-se ao happening (os dois
termos aparecem em diversas ocasies como sinnimos), sendo que neste o espectador participa da
cena proposta pelo artista, enquanto na performance, de modo geral, no h participao do pblico. Disponvel em
http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_ic/index.cfm?fuseaction=termos_texto&cd_
verbete=3646, acesso em 19/12/2012. 25
Segundo a Enciclopdia Ita Cultural como prtica artstica no espao urbano, a interveno pode ser considerada uma vertente da arte urbana, ambiental ou pblica, direcionada a interferir sobre uma dada situao para promover alguma transformao ou reao, no plano fsico, intelectual ou sensorial.
Trabalhos de interveno podem ocorrer em reas externas ou no interior de edifcios. Disponvel em http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_ic/index.cfm?fuseaction=termos_texto&cd_verbete=8882, acesso em 19/12/2012.
36
artstica especialmente privilegiados, a escolha deste ou daquele meio especfico no tem a
menor importncia (LUCIE-SMITH, 2006, p. 3).
Assim, no mais se fala em pintura e escultura. Na arte contempornea tem pintura,
tem escultura, tem obras tridimensionais, tem instalaes, tem vdeo, tem fotografia, tem
qualquer coisa com que o artista resolva trabalhar na sua pesquisa.
Lucie-Smith (2006) lembra que a arte contempornea adotou o efmero, que nas
ltimas dcadas do sculo XX, o que se denominava arte contempornea passou a ser
genuinamente universal (LUCIE-SMITH, 2006, p. 4). Observa que universal no
uniformidade, pois cada cultura tendeu a mesclar seus prprios elementos locais com outros.
A combinao dos dois itens anteriores permite dizer que tambm prprio do
contemporneo o uso de qualquer material, que costuma-se chamar de novos materiais.
Belting (2012, p. 122) lembra que a arte universal que pertence a todos e a ningum,
no institui nenhuma identidade, pois esta nasce apenas do sentimento de pertencimento,
assim a chamada arte universal s adequada para uma cultura que possui uma histria
comum, mas as minorias no se sentem representadas corretamente em sua prpria cultura, a
qual no mais percebida por elas no interior de uma histria comum.
claro que as minorias no se sentem representadas pela arte da classe dominante. Por
isso cada vez mais se vem obras que pretendem dar visibilidade ao que no se via: situao
da mulher, questes de gnero (masculino/feminino/homossexualismo), etc.
O mesmo autor (2012) assim se manifesta sobre as manifestaes artsticas que
defendem uma causa:
(...) Atualmente mais importante diante do que o artista toma posio do
que a forma como o faz. Entraram em voga hoje aqueles artistas que
assumem uma posio (adressissues) diante do racismo, do sexismo e da Aids, surgindo assim uma relao secreta entre a censura do lado
conservador e a autocensura no meio artstico (BELTING, 2012, p. 93/94).
37
Alm de se posicionar quanto a assuntos da ordem da contemporaneidade, como os
citados no texto, o mais importante aquilo que j comentamos, no importa mais a forma
como o faz. O artista est livre para utilizar o que entender conveniente para fazer a sua obra.
Vrios temas so utilizados pelos artistas na contemporaneidade. Ktia Canton (2009)
publicou uma coleo de pequenos livros com o ttulo Temas da arte contempornea onde
declara que em vez de trabalhar com movimentos e datas, nesta coleo apresentamos uma
viso panormica da arte contempornea a partir de temas como as narrativas enviesadas, o
tempo e a memria, o corpo, a identidade e o erotismo, o espao, as micropolticas
(CANTON, 2009, p. 49).
interessante ver os temas escolhidos pela professora. Todos esto fortemente
ligados contemporaneidade.
Segundo Archer (2012), depois dos anos sessenta, houve uma diluio do sistema de
classificao e ampliou-se muito o espectro das articulaes artsticas. O interesse pelo
corriqueiro, o acaso, a conquista do espao e da luz, os aspectos desanimadores da vida, o tom
cido das crticas e ironias ao social, as renncias formais e pictricas, o reconhecimento do
monocromtico, do mnimo, do impessoal, do biogrfico, dos objetos apropriados do
cotidiano ou modificados, seriam algumas das muitas possibilidades que viriam superar as
propostas modernistas. Neste campo expandido
A consequncia do afrouxamento das categorias e do desmantelamento das
fronteiras interdisciplinares foi uma dcada, da metade dos anos 60 a meados
dos anos 70 em que a arte assumiu muitas formas e nomes diferentes: Conceitual, Arte Povera, Processo, Anti-forma, Land, Ambiental, Body,
Performance e Poltica (...) houve tambm uma crescente facilidade de
acesso e uso das tecnologias de comunicao: no apenas a fotografia e o filme, mas tambm o som com a introduo do cassete de udio e a disponibilidade mais ampla de equipamento de gravao e o vdeo, seguindo o aparecimento no mercado das primeiras cmaras padronizadas
individuais (ARCHER, 2012, p.61).
Reala assim, as novas tecnologias que colocadas ao alcance do pblico no podem
deixar de interessar ao mundo da arte, que se aproveita desses novos meios e os explora para
38
novas criaes. A tecnologia no pra de trazer novidades, mais memria, mais pixels, mais
capacidade de transmisso, telas de alta qualidade que podem ser penduradas em qualquer
parede, enfim, temos um mundo tecnolgico a ser explorado.
Podemos ainda lembrar vrios temas: o atravessamento do tempo (eu vi os olhos que
viram...); o estranhamento; as produes de cunho ertico e/ou psicolgico; a utilizao de
avanos da cincia; a desconstruo de imagens; questes de espao-tempo; o abjeto, exibio
de fludos; a exposio do invisvel; a documentao, vida privada, fotos e dirios pessoais;
carter autobiogrfico; congelamento do movimento; fragmentos que no se vem
normalmente; abordagem etnogrfica; abordagem de gnero; carter ritualstico; efemeridade;
trabalhar a memria; habitar a obra; trnsito entre a imagem e o texto; instalaes sonoras;
apropriaes; deslocamentos; citao; retomada da figurao; fazer discurso com a obra;
utilizao de luzes, vdeo e som; presena x ausncia; trabalhar conceitos; simulacro;
tridimensionalidade; autorretratos contemporneos; suspenso do tempo; lugar e no-lugar;
fetiche; cotidiano; objetos perdidos/encontrados; percursos; radicalizao do corpo como
suporte; crtica de circuitos (poltica institucional); ao poltica e etc.
Neste item relacionamos vrias das caractersticas e dos temas que encontramos na
arte contempornea. Compreendemos que h condies que so prprias da arte
contempornea como a inexistncia de estilos, as instalaes, a perspectiva de onde se v a
obra, a inexistncia de meios privilegiados e a importncia de novas tecnologias.
Tambm vimos que a arte contempornea tem um vis universal, mas isso no impede
que as minorias expressem seus prprios problemas, memrias, anseios, etc. Por fim, vimos
que as obras de arte na contemporaneidade tem um nmero infindvel de temas sobre os quais
o artista pode se debruar para atingir sua finalidade.
Neste captulo analisamos a transio da arte moderna para a atualidade examinando
as ideias de que a arte acabou, de que a histria da arte acabou e ainda de que a arte moderna
39
ainda no acabou. Ficamos com a posio de a arte contempornea tem condies e
caractersticas prprias que a distinguem da arte moderna.
Pensamos sobre os cinco paradoxos da modernidade apresentados por Antoine
Compagnon (2010) que aprecia caractersticas que se desencadeiam durante a modernidade e
vo at a ps-modernidade e comparamos os sistemas da arte moderna e da arte
contempornea, seguindo o esquema traado por Anne Cauquelin (2005).
Procuramos relacionar caractersticas das obras da contemporaneidade, concluindo
que no h mais estilos, que a instalao, o happening, a performance e a interveno urbana
so inerentes arte contempornea, que no existe mais nenhum meio privilegiado e que h
uma perspectiva de onde se pode ver a obra.
3 ORIGAMI NA ARTE CONTEMPORNEA
Neste captulo examinamos quais as caractersticas que pensamos ser aplicveis s
obras realizadas com a utilizao do origami e focamos as obras realizadas com a utilizao
do origami, agrupadas em trs conjuntos.
No primeiro conjunto examinamos exposies que os artista fizeram com obras
tridimensionais realizadas com origami.
No segundo conjunto apreciamos instalaes feitas com emprego de origamis, simples
ou modulares, e em quantidade significativa para permitir adequada visibilidade obra.
No terceiro conjunto vemos a obra da artista brasileira Rivane Neuenschwander, que
utilizou um determinado origami para compor a referida obra.
Nesse exame relacionamos as caractersticas da arte contempornea presentes nessas
obras.
3.1 ARTE CONTEMPORNEA E O ORIGAMI
Neste item examinamos quais as caractersticas que pensamos ser aplicveis s obras
realizadas com a utilizao do origami.
De imediato temos que pensar que uma linguagem tradicional que representa um
aspecto importante da cultura japonesa.
A linguagem incorpora um conjunto de significaes que lhe so prprias. O
significado33
do tsuru34
, da tartaruga35
, do sapo36
, da borboleta37
, so aspectos da cultura
japonesa que so difundidos junto com o origami.
33
Significados disponveis em http://www.comofazerorigami.com.br/historia/, acesso em 08/11/2012. 34
O tsuru o smbolo da boa sorte, felicidade e sade. 35
A tartaruga significa longevidade.
41
Assim, com a utilizao da linguagem origami est presente um desdobramento
etnogrfico, com a apropriao de uma tradio exgena.
Como j salientamos, no h meios de expresso privilegiados. Assim, a linguagem do
origami pode ser utilizada sem maiores problemas. Alm disso, a arte contempornea adotou
o efmero, tanto na prpria obra (instalaes e performances) quanto nos materiais. Assim, os
papis, cuja durao bastante limitada se comparada a materiais tradicionais, esto
compreendidos nessa efemeridade.
Nas obras realizadas com origami, notamos que, em geral, elas tendem a ser
tridimensionais, espalhando-se pelo espao, tanto ocupando-o como criando o vazio entre
seus elementos, para aprofundar a relao da obra com o espao.
Outra caracterstica presente nas obras elaboradas com origami a relevncia do fazer.
A linguagem exige uma atividade manual para a realizao dos origamis. Cada origami tem
que ser dobrado mo, ainda que haja auxlio na confeco dos modelos. H casos em que o
artista apresenta a obra informando quantas dobras foram feitas para a sua realizao. Assim,
h uma manualidade que se impe.
H uma ideia subjacente ao origami de que em sua confeco pode-se desejar algo,
que esse desejo ser atendido de alguma forma. Por esse motivo temos a relevncia dada ao
tema dos 1.000 tsurus. Trata-se de uma lenda em que a pessoa que fizer 1.000 tsurus, com
um firme propsito, ser atendida.
Essa lenda passou a ser mais difundida depois da morte de uma menina que, nascida
em Hiroshima, tinha dois anos de idade quando houve a exploso da bomba atmica e
sobreviveu exploso, mas acabou falecendo de cncer, 10 anos depois da exploso, quando
tinha 12 anos de idade. Em razo dela, se construiu um Monumento das Crianas Paz e
36
O sapo representa o amor e a fertilidade. 37
Utilizada nos casamentos representando a unio dos noivos smbolo de uma nova vida.
42
para l so enviados muitos conjuntos de 1.000 tsurus, dobrados por vrias pessoas. Essa
histria est disponvel em vrios endereos da Internet38
.
Figura 6 - Monumento das Crianas Paz. Hiroshima, Japo.39
As dobras acabam tendo um carter ritualstico, pois conforme se fazem as dobras e se
deseja alguma coisa, acredita-se que tal coisa ser conseguida.
Assim, conclumos que as obras com origami tendem a apresentar as seguintes
caractersticas, que so decorrentes da prpria linguagem: desdobramento etnogrfico com
apropriao da tradio, efemeridade relativamente ao material, tridimensionalidade,
manualidade e carter ritualstico.
A utilizao de material efmero, a tridimensionalidade e a apropriao so
caractersticas da arte contempornea, o que por si s j encaixa essas obras no conjunto da
arte contempornea.
38
Considero este o endereo da Internet em que a histria de Sadako Sasaki est melhor apresentada:
http://www.asiashop.com.br/custom.asp?IDLoja=7773&arq=Origami_Tsuru.html. 39
O Monumento das Crianas Paz foi inaugurado em maio de 1958. A imagem est disponvel em http://www.hiroshima-is.ac.jp/index.php?page=sadako-story, acesso em 07/11/2012.
43
3.2 OBRAS TRIDIMENSIONAIS COM ORIGAMI
Vamos examinar primeiro obras tridimensionais feitas com papel dos seguintes
artistas: Tomoko Fuse, Shipo Mabona, Robert Lang, Romn Dias e Vick Muniz.
3.2.1 Tomoko Fuse
A foto a seguir de uma exposio de Tomoko Fuse40
realizada na Galeria de
Origami, em Freising, na Alemanha, em 2009.
Figura 7 - Tomoko Fuse. Exposio Yorokobi (Grande alegria). 2009.41
Nesta exposio, a origamista apresenta basicamente dois tipos de origami: um
conjunto em forma de slidos geomtricos e outro constituindo espirais que se sustentam
penduradas ou no em um suporte.
40
Tomoko Fuse japonesa, formada em biologia, mas vem se dedicando h muitos anos ao origami.
Possui mais de 70 livros publicados sobre origami, em japons. Vrios de seus livros foram traduzidos
para ingls, francs, italiano e russo. J visitou o Brasil duas vezes, para eventos ligados ao origami,
sendo que a segunda vez veio para um evento que foi realizado em Braslia, em 2010. 41
Exposio de origami de Tomoko Fuse. Galeria de Origami em Freising, Alemanha. Imagem disponvel em http://www.origami-galerie.de/yorokobi/index.htm, acesso em 20/09/2012.
44
Figura 8 - Tomoko Fuse. Origamis da Exposio Yorokobi (Grande alegria). 2009.42
Como podemos ver, so peas com aparente simplicidade. Para o pblico mais
informado sobre o origami e a artista, o impacto ainda maior pois a origamista trabalha seus
origamis que formam slidos geomtricos juntando, geralmente, 30 mdulos de papel, que
so montados com o emprego de um sistema de travamento composto por abas e bolsos, sem
uso de cortes ou cola, e, apesar disso, sua peas no se desmontam.
Quanto s espirais, vemos sua presena em origamis cujo formato mais geomtrico e
tambm em peas mais orgnicas, como o caramujo e a concha marinha. As espirais, que tm
significado simblico de elevao, tanto se apresentam sustentadas por um suporte quanto se
elevam sem outro apoio que no o das prprias dobras.
O papel escolhido em razo do tipo de dobra que ser realizada, tem gramatura variada
e mostra a tcnica apurada da origamista. As cores tambm so uma nota marcante nesta
exposio.
Como vimos no captulo anterior esto presentes as caractersticas dadas pela prpria
linguagem: desdobramento etnogrfico com apropriao da tradio, efemeridade
relativamente ao material, tridimensionalidade e manualidade.
42
Tomoko Fuse. Origamis na Galeria de Origami em Freising, Alemanha. Imagem disponvel em http://www.origami-galerie.de/yorokobi/index.htm, acesso em 20/09/2012.
45
3.2.2 Sipho Mabona
Sipho Mabona43
identifica seus origamis como esculturas em papel. Fez vrias
exposies e vende suas esculturas por intermdio da Internet. Tem modelos utilizados em
propaganda.
Alm da criao de modelos muito detalhados em origami, com os quais faz as
instalaes, pode-se ver vrios vdeos com animaes feitas com papel na sua pgina na
Internet.44
Para esta monografia escolhi duas instalaes: um cardume de carpas e uma revoada
de gafanhotos.
Figura 9 - Shipo Mabona. Peace ful Koi. 2009.45
43
Nasceu e foi criado na Sua. Sua me sua e o pai Sul Africano. 44
http://www.mabonaorigami.com/de/videos/origami-rhino-unfolding.html 45
Cada carpa tem 18 x 22 cm. Imagem disponvel em http://www.mabonaorigami.com/en/galleries /installations.html, acesso em 20/09/2012.
46
Escolhi esta instalao pela modulao na cor e disposio dos origamis. Este modelo
de carpa uma de suas criaes em origami. As esculturas possuem um mecanismo especial
para suspenso no espao. As carpas so elaboradas com papel de aquarela previamente
pintado com tinta acrlica na cor escolhida.46
O artista costuma instalar este modelo como um
cardume prximo a alguma parede. Alm do peixe ter semelhana com o natural, a
montagem em conjunto das carpas apresenta dinamismo. A colocao de um cardume de
carpas contra a parede pode causar certo estranhamento pois o cardume de peixes est
nadando no ar.
A outra obra que vamos apresentar foi chamada de Praga. Trata-se de uma instalao
que se compe de vrios origamis de gafanhotos, formando uma revoada.
Figura 10 - Shipo Mabona. Instalao Plague (Praga). 2012.47
A instalao da revoada de gafanhotos tem como caractersticas:
compe-se de muitos origamis do mesmo modelo colocados em formato de revoada;
46
Informaes retiradas do seguinte endereo: http://www.etsy.com/listing/77988613/colored-koi-
installation. 47
Revoada de Gafanhotos com Nota de Dlar. Japanese American National Museum, de Los Angeles.
Imagem disponvel em http://www.yatzer.com/assets/Article/2865/images/Mabona-Origami-yatzer-3.jpg.
47
a revoada causa sensaes contraditrias. Enquanto plasticamente variada e com
dinamismo, evoca a destruio que um conjunto de gafanhotos pode causar numa
regio;
os gafanhotos foram dobrados com notas de dlar americano numa clara referncia
hegemonia americana, que engole as economias dos demais pases.
O prprio artista declarou sobre sua instalao48
:
Dinheiro o nosso principal significante de ambio e perdio. O dinheiro
deixou de ser um meio fundamental de cmbio pra ser um meio de
explorao: uma nuvem colossal de dinheiro quente vibra acima da
economia global, quase como um enxame bblico de gafanhotos. Assim, o dinheiro a nossa desgraa. No entanto, o dinheiro por si s, quando se olha
para algo to simples como uma nota de dlar, sempre mantm a sua
capacidade bsica para funcionar como uma unidade pragmtica de contabilizao de bens e servios. Portanto, o dinheiro tambm uma
bno.
A instalao tem um carter de crtica poltica, olhando para a economia mundial e
colocando os Estados Unidos no foco da discusso, em razo da utilizao da nota de dlar
americano para realizar os gafanhotos.
As obras apresentadas deste artista, tm as caractersticas da utilizao de material
efmero, da manualidade, da tridimensionalidade, da ritualizao e da perspectiva etnogrfica,
com apropriao de uma tradio exgena a que j nos referimos no captulo anterior e mais a
de crtica poltica.
3.2.3 Robert Lang
Robert Lang49
j foi citado neste trabalho em razo da palestra sobre a utilizao de
solues baseadas no origami. Como j visto, o artista consegue representar qualquer coisa
num papel quadrado com auxlio de um programa de computador desenvolvido por ele.
48
Texto disponvel em http://cascoobjetos.com.br/sipho-mabona-faz-enxame-de-origamis-em-dolar/, acesso em 30/10/2012.
48
Alm das exposies de origamis que criou, tem peas utilizadas em propagandas.
Para representar a obra de Lang, embora ele tenha muitos modelos, escolhi o origami a seguir
que feito com uma nica folha de papel, sem cortes.
Figura 11 - Robert Lang. Viking Ship, opus 121. 1989.50
Esse modelo de barco viking bastante impressionante pois o autor consegue dobr-lo
com uma nica folha de papel e criar 12 pontas. Alm disso, ainda tem a cabea e vrios
detalhes no corpo do navio. Esse modelo foi publicado por Robert Lang em um livro51 de
1988, permitindo que outros origamistas possam reproduzir a sua criao.
Este trabalho apresenta as caractersticas j salientadas no captulo anterior de
utilizao de material efmero, da manualidade, da tridimensionalidade e perspectiva
etnogrfica com apropriao de uma tradio exgena, decorrentes da prpria linguagem do
origami.
49
Ele fsico e tem atuao em diversas frentes. Usa seu conhecimento de origami para solues
como a dobragem do telescpio para ser levado ao espao e desdobrado aps sair do foguete que o transportou. Tambm tem obras utilizadas em propaganda. 50
7 polegadas (17,78 cm). Imagem disponvel em http://www.langorigami.com/art/gallery/gallery.php ?tag=objects&name=viking_ship, acesso em 20/09/2012. 51
The complete book of origami, com 37 modelos.
49
3.2.4 Romn Diaz
Romn Diaz52
tambm um criador de origami de extraordinria competncia. Tem
livros publicados tanto de origami complexo, como de modelos mais simples.
Embora tenha criado vrios origamis, dos quais acho que o mais difundido no Brasil
um modelo de gato que aproveita a sobra da folha de papel A4, quando dela se retira um
quadrado, preferi apresentar o origami peixinho dourado (Goldfish) porque considero que
esse modelo mostra uma nova gerao do origami, sendo um modelo limpo mas que
representa perfeitamente o que se deseja.
Figura 12 - Romn Diaz. Goldfish. 2009.53
Como vemos, realmente um peixinho dourado. O modelo parece simples e tem
formas arredondadas que do sensao de leveza. O prprio autor54
disse que as escamas so
apenas marcas de dobras, pois ele no quer complicar o modelo incorporando escamas. Ele
entende que essas marcas funcionam muito bem e assim o modelo definitivamente adequado
para todas as faixas etrias.
52
Romn Diaz uruguaio e mora em Montevido. 53
Imagem disponvel em http://dosisdiaria.blogspot.com.br/2009/04/apto-todo-publico.html, acesso
em 20/09/2012. 54
Comentrios no blog do autor em http://dosisdia