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Milho 11 , CULTIVARES X HIBRIDOS , CONCEITOS BASICOS Ricardo Magnavaca 11 Sidney Netto Parentoni 2/ Ao observarmos uma planta de mi- lho, vemos que ela apresenta, em sua parte de reprodução, 6rgãos masculinos e femininos. O masculino é um pendão, comumente chamado de flecha, que pro- duz o põlen e que o agricultor costuma chamar de p6. A parte feminina é a espiga com os seus estilo-estigmas mais conheci- dos como cabelo. Sabemos que uma planta de milho produz grãos, que, quando plantados, produzem outra planta. Certamente, para que o grão seja produzido, é necessário haver cruzamento do pólen com a parte feminina, através dos cabelos da espiga. O vento leva o pólen de uma planta para o cabelo das espigas de outras plantas ou da mesma planta. Este põlen desce pelo ca- belo até onde ele se fixa no ovário, já no "sabugo", onde ocorre a fecundação dos 6vulos ar localizados para formação do grão. Cada cabelo corresponde a um fu- turo grão de milho e, se não ocorrem os cruzamentos, a espiga ficará falhada. Pelo explicado, dá para entender que o vento pode soprar o pólen de milho de uma planta para muito longe e cruzar com outras. Consideramos que o põlen produ- zido por uma lavoura pode atingir plantas de outra lavoura, a uma distância de até 400 metros. Pode-se verificar, também, que a quantidade de pólen produzida é muito maior do que o nümero de cabelos a ser fecundado na lavoura. Isto é impor- tante para a sobrevivência da espécie. Assim, um agricultor que tiver uma área isolada com mais de 400 m de outras la- vouras de milho e com plantas, por exem- plo, de uma variedade 'Cateto' pode co- lher espigas desta lavoura e plantar no- vamente na mesma área ou em outras áreas isoladas. Desta forma, ele estará mantendo a sua variedade livre de conta- minação ou cruzamento com outras va- riedades de milho. Este agricultor terá em mãos uma variedade pura que pode ser colhida e replantada no pr6ximo plantio. Observando esse e outros cuidados, muitos agricultores fizeram verdadeiros trabalhos de seleção em suas variedades e deixaram para a humanidade uma grande contribuição, selecionando milhares de variedades locais de milho, cada uma adaptada à condição específica de uma região. Porém, nem sempre uma varieda- de selecionada em um determinado local tem todas as características adequadas para a produção quando plantadas em outros locais diferentes. Mas o conjunto dessas variedades locais de milho, selecio- nadas por agricultores de toda a Terra, compõem o que chamamos de germo- plasmas de milho. Este é o instrumento de trabalho dos melhoristas de milho, ou se- ja, o profissional de Genética que vai uti- lizar esta variabilidade legada pelos agri- cultores, isto é, a variação de característi- cas entre as difetentes variedades locais, para criar outras variedades que chama- mos selecionadas, porque são fruto do trabalho de seleção artificial praticada pelos melhoristas. O trabalho de um melhorista de mi- lho é o trabalho de um engenheiro que vai construir uma nova planta de milho para 1/ Eng 9 Agr9, Ph.D. - EMBRAPA/CNPMS - Caixa Posta/151- CEP 35700 Sete Lagoas, MG. 21 Eng 9 Agr9 - EMBRAPA/CNPMS - Caixa Posta/151 - CEP 35700 Sete Lagoas, MG. Inf. Asropec., Belo Horizonte, v. 14, n. 165, p. 5-8, 1990 atender à condição de um ambiente espe- cífico ou de um ambiente mais amplo. Para tanto, ele precisa conhecer o clima da região para onde pretende adaptar a sua planta, as condições dó solo, o tipo de manejo que o agricultor utiliza, as prefe- rências dos agricultores quanto ao tipo e a cor do grão, altura da planta, além de ou- tros. Conhecido isto, ele planeja o tipo de planta que deseja, e, para montá-Ia, pre- cisa usar características que estão pre- sentes em diferentes variedades locais. Ele já sabe também que s6 pode trabalhar com características herdáveis, ou seja, que possam ser transmitidas para os descen- dentes geração ap6s geração. Para serem herdadas, as características devem estar guardadas, ou seja, codificadas nos cro- mossomos que existem nas células repro- dutivas e que se chamam genes. Se, por exemplo, em uma variedade de milho existem genes que codificam o tipo de grão (mole), os seus descendentes ou grãos obtidos desta lavoura, também te- rão tipo de grãos dentados (moles). Assim ocorre para muitas características, e a in- tensidade ou freqüência com que estes genes ocorrem em uma variedade pode ser alta, baixa ou intermediária. Esta fre- qüência ou intensidade dos genes para uma determinada característica que ocorre em uma variedade é muito impor- tante no trabalho dos melhoristas. A Pos- sibilidade de encontrar na natureza uma variedade que tenha genes em alta fre- qüência para características favoráveis como a alta produção de grãos é muito pequena. Em geral, freqüências altas en- contram-se distribuídas em diferentes variedades e para diferentes característi- cas. Cabe aos melhoristas identificar essas características, programar cruzamentos para ajuntá-Ias em uma mesma variedade e, a partir destes, começar a selecionar plantas que deixem descendentes com a maior freqüência possível daqueles genes que se deseja colocar juntos em uma mesma variedade. Algumas características, como pro- dução elevada de grãos em condições de cultivo adequado, envolvem milhares de genes. Dá para perceber que ninguém até hoje conseguiu selecionar a variedade ideal e talvez não consiga nunca, pois o 5

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Milho 11 ,CULTIVARES X HIBRIDOS,CONCEITOS BASICOS

Ricardo Magnavaca 11Sidney Netto Parentoni 2/

Ao observarmos uma planta de mi-lho, vemos que ela apresenta, em suaparte de reprodução, 6rgãos masculinos efemininos. O masculino é um pendão,comumente chamado de flecha, que pro-duz o põlen e que o agricultor costumachamar de p6. A parte feminina é a espigacom os seus estilo-estigmas mais conheci-dos como cabelo.

Sabemos que uma planta de milhoproduz grãos, que, quando plantados,produzem outra planta. Certamente, paraque o grão seja produzido, é necessáriohaver cruzamento do pólen com a partefeminina, através dos cabelos da espiga. Ovento leva o pólen de uma planta para ocabelo das espigas de outras plantas ou damesma planta. Este põlen desce pelo ca-belo até onde ele se fixa no ovário, já no"sabugo", onde ocorre a fecundação dos6vulos ar localizados para formação dogrão. Cada cabelo corresponde a um fu-turo grão de milho e, se não ocorrem oscruzamentos, a espiga ficará falhada.

Pelo explicado, dá para entender queo vento pode soprar o pólen de milho deuma planta para muito longe e cruzar comoutras. Consideramos que o põlen produ-zido por uma lavoura pode atingir plantasde outra lavoura, a uma distância de até400 metros. Pode-se verificar, também,que a quantidade de pólen produzida émuito maior do que o nümero de cabelosa ser fecundado na lavoura. Isto é impor-tante para a sobrevivência da espécie.

Assim, um agricultor que tiver uma áreaisolada com mais de 400 m de outras la-vouras de milho e com plantas, por exem-plo, de uma variedade 'Cateto' pode co-lher espigas desta lavoura e plantar no-vamente na mesma área ou em outrasáreas isoladas. Desta forma, ele estarámantendo a sua variedade livre de conta-minação ou cruzamento com outras va-riedades de milho. Este agricultor terá emmãos uma variedade pura que pode sercolhida e replantada no pr6ximo plantio.

Observando esse e outros cuidados,muitos agricultores fizeram verdadeirostrabalhos de seleção em suas variedades edeixaram para a humanidade uma grandecontribuição, selecionando milhares devariedades locais de milho, cada umaadaptada à condição específica de umaregião. Porém, nem sempre uma varieda-de selecionada em um determinado localtem todas as características adequadaspara a produção quando plantadas emoutros locais diferentes. Mas o conjuntodessas variedades locais de milho, selecio-nadas por agricultores de toda a Terra,compõem o que chamamos de germo-plasmas de milho. Este é o instrumento detrabalho dos melhoristas de milho, ou se-ja, o profissional de Genética que vai uti-lizar esta variabilidade legada pelos agri-cultores, isto é, a variação de característi-cas entre as difetentes variedades locais,para criar outras variedades que chama-mos selecionadas, porque são fruto dotrabalho de seleção artificial praticadapelos melhoristas.

O trabalho de um melhorista de mi-lho é o trabalho de um engenheiro que vaiconstruir uma nova planta de milho para

1/ Eng9Agr9, Ph.D. - EMBRAPA/CNPMS - Caixa Posta/151- CEP 35700 Sete Lagoas, MG.21 Eng9Agr9 - EMBRAPA/CNPMS - Caixa Posta/151 - CEP 35700 Sete Lagoas, MG.

Inf. Asropec., Belo Horizonte, v. 14, n. 165, p. 5-8, 1990

atender à condição de um ambiente espe-cífico ou de um ambiente mais amplo.Para tanto, ele precisa conhecer o climada região para onde pretende adaptar asua planta, as condições dó solo, o tipo demanejo que o agricultor utiliza, as prefe-rências dos agricultores quanto ao tipo e acor do grão, altura da planta, além de ou-tros. Conhecido isto, ele planeja o tipo deplanta que deseja, e, para montá-Ia, pre-cisa usar características que estão pre-sentes em diferentes variedades locais.Ele já sabe também que s6 pode trabalharcom características herdáveis, ou seja, quepossam ser transmitidas para os descen-dentes geração ap6s geração. Para seremherdadas, as características devem estarguardadas, ou seja, codificadas nos cro-mossomos que existem nas células repro-dutivas e que se chamam genes. Se, porexemplo, em uma variedade de milhoexistem genes que codificam o tipo degrão (mole), os seus descendentes ougrãos obtidos desta lavoura, também te-rão tipo de grãos dentados (moles). Assimocorre para muitas características, e a in-tensidade ou freqüência com que estesgenes ocorrem em uma variedade podeser alta, baixa ou intermediária. Esta fre-qüência ou intensidade dos genes parauma determinada característica queocorre em uma variedade é muito impor-tante no trabalho dos melhoristas. A Pos-sibilidade de encontrar na natureza umavariedade que tenha genes em alta fre-qüência para características favoráveiscomo a alta produção de grãos é muitopequena. Em geral, freqüências altas en-contram-se distribuídas em diferentesvariedades e para diferentes característi-cas. Cabe aos melhoristas identificar essascaracterísticas, programar cruzamentospara ajuntá-Ias em uma mesma variedadee, a partir destes, começar a selecionarplantas que deixem descendentes com amaior freqüência possível daqueles genesque se deseja colocar juntos em umamesma variedade.

Algumas características, como pro-dução elevada de grãos em condições decultivo adequado, envolvem milhares degenes. Dá para perceber que ninguém atéhoje conseguiu selecionar a variedadeideal e talvez não consiga nunca, pois o

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Milho 11

ep.

Esquema de obtenção de hrbridos simples, duplos e triplos de milho.

que é ideal em um ambiente pode não seadaptar bem em outros. Mas já houve.grandes avanços na seleção de variedadesde milho no Brasil quanto à capacidade deprodução de grãos, principalmente quan-do as condições de manejo, adubação econtrole de pragas é adequado. Nessascondições, existem variedades seleciona-das que produzem mais do dobro que asvariedades locais. Estas variedades sele-cionadas também se adaptam melhor a umnúmero de ambientes ou regiões.

Para conseguir esses avanços, o me-lhorista de milho utiliza técnicas especiaisonde se avaliam famílias de uma mesmavariedade em seleção, em diferentes lo-cais, deixando que se cruzem entre si so-mente aquelas famílias que deixam des-cendentes superiores, ou seja, que tenhamfreqüência mais elevada daqueles genesque se deseja. Este trabalho é contínuo,no sentido de que o que se obtém em umciclo de seleção serve de base para a sele-ção de famílias para o próximo ciclo, eassim sucessivamente. Com isto, a cadaciclo de seleção, a freqüência destes genesque se procura aumentar é modificada,esperando-se pequenos e contínuos ga-·nhos na seleção. É, portanto, muito im-portante que os produtores possam obtersementes básicas dos novos ciclos de sele-ção da variedade para aproveitarem-sedos ganhos da seleção que os melhoristasnão param nunca de fazer.

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o ganho que se tem na seleção deuma variedade de milho é lento para ca-racteres complicados como produção degrãos, que envolve milhares de genes, po-dendo no entanto, ser rápido para outrosmenos complexos, mas não menos im-portantes, como altura de planta e espiga,empalhamento da espiga, resistência aacamamento, número de espigas porplanta, cor de grãos, número de fileiras degrãos na espiga e florescimento. Portanto,estas características podem não só sermodificadas mais rapidamente como tam-bém ser transferidas mais rapidamenteaos agricultores.

Este processo de engenharia namontagem de uma variedade envolvetambém muita arte dos melhoristas. Abeleza de plantas e espigas de uma varie-dade é fundamental na sua aceitação pelosagricultores. Há vários aspectos de estéti-ca, que devem ser considerados na sele-ção, como forma da espiga, alinhamentodos grãos em fileiras, formato de palha,cor de grão, verde mais intenso das fo-

. lhas, cor de pendão e cabelo. Há tambémaspectos importantes de uma variedadeque o agricultor só percebe quandoocorrem problemas que afetam a lavoura.Por exemplo, algumas variedades de mi-lho já são selecionadas para resistência adoenças foliares, tolerância à seca, tole-rância à toxidez de alumínio, melhor utili-zação dos nutrientes aplicados. Isto faz

com que as plantas destas variedadesapresentem melhor resistência a estesproblemas ou eficiência e, conseqüente-mente maior produção em ambientes ad-versos. O importante é que apesar de istoser uma característica das variedades se-lecionadas, o agricultor, ao comprar a se-mente, não paga mais para ter estas van-tagens.

Pelo que foi explicado até então, umavariedade de milho pode ser melhoradacontinuamente, e desde que plantada emárea isolada de outras variedades de mi-lho, elas podem manter a sua pureza. Po-dem-se colher os grãos oriundos desteplantio isolado e plantar novamente semperda de produção. No entanto, é neces-sária a obtenção de sementes básicas denovos ciclos de seleção da mesma varie-dade para trazer os avanços da seleçãodos melhoristaspara o campo do agricul-tor. A obtenção, por~to, dessas semen-tes básicas a cada quatro anos é sempredesejável. Porém, um grão oriundo deuma variedade mantida pura só será boasemente, se o processo de seleção deespí-ga, classificação e armazenamento até oplantio for feito cuidadosamente, paraque se preserve a germinação e o vigordas sementes.

Outro tipo de sementes de milho sãoos chamados híbridos.

Uma dúvida muito freqüente entre aspessoas que lidam diretamente com acultura do milho é a diferença que existeentre um híbrido e uma variedade.

O fenômeno do vigor híbrido é umato muito comum na natureza e vem sen-:do explorado há centenas de anos pelohomem. Primeiramente, em animais e,mais recentemente, em plantas. Umexemplo clássico é o cruzamento entre umreprodutor bovino de raça holandesa comuma vaca zebu. O produto deste cruza-mento será um animal "híbrido" entre asduas raças e que alia a característica deprodutividade do holandês com a rustici-dade do zebu.

No caso do milho, existem basica-mente quatro tipos de híbridos diferentes:o ,híbrido intervarietal e os chamados hí-bridos de linhagens (híbrido simples, hí-brido duplo e híbrido triplo). O chamadohíbrido intervarietal é resultado do cruza-mento de duas variedades de milho. O queseria então um híbrido de linhagem? Parase esclarecer este ponto, deve-se voltar aalguns fatos já citados no início do texto.

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Milho 11.

Campo de cruzamento de milho.Produção de híbridos.

mitissem reproduzir sempre o mesmo hí-brido. Para obter estas matrizes, o me-lhorista tira o pólen de uma planta e leva-o até a boneca desta mesma planta (auto-fecundação). A espiga colhida desta for-ma é plantada e repete-se o mesmo pro-cedimento. Com cerca de cinco geraçõesde autofecundação, o melhorista obtém oque chamamos de linhagem, ou seja,plantas de milho geneticamente idênticas.Normalmente 'as linhagens são poucoprodutivas e pouco vigorosas, porque foi -"contrariada" a tendência natural da cul-tura do milho, que é a fecundação cruzadaentre plantas.

Quando são cruzadas duas linhagens,obtém-se um híbrido simples. O cruza-mento de uma linhagem com um híbrido'simples é chamado híbrido triplo (veio detrês linhagens), e o cruzamento entre doishíbridos simples é chamado híbrido duplo.A maior parte das sementes híbridas dis-

Milho tropical moderno. Cultivar de milho utilizada pelos agricultores no inícioda década de 60.

Como já Ioi dito, o milho 05 umaplanta l}u<:possui a parte masculina (pcn-

dão) e a Icminina (boneca) situadas CI1l lo-cais separados da planta. Esta caracterfs-tica, aliada ao pouco peso dos grãos depólen ou V6) que saem do pendão, fazcom que normalmente uma boneca queesteja numa determinada planta recebapólen de diversas plantas à sua voltada.Este processo, ocorrendo ao longo demilhares de anos, tornou o milho umaplanta essencialmente de fecundação cru-zada (alógama). Uma variedade de milhoseria então um conjunto de plantas comcaracterísticas comuns (altura de planta,altura de espiga, tipo de planta, tipo de

espiga, tipo de grão etc.) que se reproduzisoladamente ao longo do tempo, ou seja,que não recebe mistura de sementes deoutras origens e também não é contami-nada pelo pólen de outros tipos de milho.

Pelo discutido até aqui, vimos quequase todo grão de milho é provenientedo cruzamento de duas plantas diferentes.Deste modo, a planta que se. originardeste grão terá algumas características da"planta-mãe" e outras da "planta-pai",mas não será exatamente idêntica a ne-nhum dos pais.

O primeiro passo na obtenção dochamado "híbrido de linhagens" seriaobter matrizes puras (linhagens) que per-

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poníveis no mercado brasileiro são de hí-bridos duplos.

Nem todo cruzamento entre linha-gens produz bons híbridos. O trabalhomais difícil do melhorista de plantas éidentificar, entre os milhares de cruza-mentos possíveis, aquele que produz omelhor híbrido, Surge então a pergunta: oque é melhor para o agricultor, o híbridoou a variedade?

A resposta é que cada um deles émais indicado para determinada situação.Numa agricultura altamente tecnificada,com grande uso de insumos (adubos, in-seticidas, herbicidas etc.), com colheitamecânica, e onde os níveis de produtivi-

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Milho 11

dade têm que ser muito elevados para co-brir os custos de produção, não há dúvidade que se devem usar sementes de um hí-brido.

Para o nível de produtividade nor-malmente considerado bom pelo agricul-tor brasileiro; que seria de cinco a seis milquilos de grãos/ha, existem as chamadasvariedades melhoradas, que seriam tãoprodutivas quanto qualquer híbrido.

Um ponto importante na decisão doagricultor em utilizar sementes de híbri-dos ou de variedades é a possibilidade dereutilizar a semente desta última, o quenão é recomendável quando se utiliza umhíbrido.

Quando o agricultor planta a chama-da "semente de paiol", ou seja, os grãoscolhidos de um híbrido no ano anterior,normalmente ocorre uma queda de pro-dutividade de no mínimo 20%. Isto se de-ve à chamada "perda do vigor híbrido"(depressão por endogamia), que é o mes-mo que ocorre quando se cruzam dois ho-vinos mestiços. O produto é 'sempre infe-rior aos pais.

Como o agricultor não tem acesso àslinhagens que deram origem àquele híbri-do, já que elas são propriedade da em-presa que comercíalíza aquele material,é impossível produzir sua pr6pria semen-te.

No caso da variedade, tal fato nãoocorre, podendo o agricultor reutilizara semente colhida sem nenhuma perda deprodutividade. Deve-se lembrar, entre-tanto, que a produção de sementes exigecondições adequadas, como boa armaze-nagem e controle de pragas, visando obterum material com bom vigor e alto poderde germinação.

Dessa forma, como já existem nomercado variedades melhoradas altamenteprodutivas, c havendo na comunidade asnoções de como produzir uma semente deboa qualidade, é perfeitamente viável aoagricultor produzir sua pr6pria semente.

SEMENTES DE VARIEDADES DEMILHO X PEQUENOS

AGRICULTORES BRASILEIROSNicolau Miguel Schaun.l!.

INTRODUÇÃO

Dentre os agricultores brasileiros queproduzem milho, 72% têm área total de1 a 50 ha, plantam milho em áreas infe-riores a 10 ha e produzem 56% da produ-ção brasileira (IBGE Senso de 1980).Esses pequenos produtores, que nemsempre possuem terra, capital, conheci-mento formal e acesso a informações tec-nol6gicas mais modernas, têm na sementedos grãos que produzem o seu mais im-portante insumo, pelo seu caráter de in-dispensabilidade. Por outro lado, eles ge-ralmente s6 conhecem dois tipos de se-mentes de milho: a híbrida e a de "paiol",

que eles retiram daqueles grãos que forarnarmazenados para consumo na fazenda eaproveitam para plantar na safra seguinte.

A semente híbrida tornou-se, porém,de cinco anos para cá, impossível de con-tinuar sendo utilizada por muitos dessespequenos produtores, devido ao seu ele-vado preço. Basta lembrar que a-capaci-dade de troca do milho grão em relaçãoao milho semente está, hoje, numa relaçãoque varia entre 11 e 15 para 1, isto é, paraque um produtor adquira 1 kg de semen-tes ele precisará dispor de 11 a 15 kg degrãos. Ora, isto inviabiliza a aquisição dasemente híbrida, porque se o produtor,para cada quilo de semente híbrida adqui-rida, tiver que vender 11 a )5 kg degrãos, ele não conseguirá alimentar seus

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1/ Eng9 Agr'2,M.Sc. - EMBRAPA/CNPMS - Caixa Posta/151 - CEP 35700 Sete Lagoas, MG.

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animais até a pr6xima safra porque vai,invariavelmente, faltar milho no seu paiol.

O advento do milho hfbrido no Bra-sil, cuja intensidade de estudo e propa-ganda se acentuou a partir da década de40, determinou alguns fatos que devemser mencionados:

1) As vantagens aparentes do uso desementes de milho híbrido inicialmentepercebidas também pelos pequenos pro-dutores, levaram-nos ao arrefecimento douso de variedades melhoradas como a'Asteca' e a 'Maya', que eram introduzi-das periodicamente, bem como das varie-dades locais. Este fato contribuiu maisfortemente ainda para a perda de purezados materiais utilizados, principalmentedo ponto de vista genético. Evidente-