12
Universidade Estadual de Maringá 07 a 09 de Maio de 2012 1 LUTAS CAMPONESAS E A EDUCAÇÃO DO CAMPO NO BRASIL MOURA, Kethlen Leite de (UEM) OLIVEIRA, Caroline Mari de (UEM) CECÍLIO, Maria Aparecida (UEM) SILVA, Irizelda Martins de Souza e (UEM) Agência Financiadora: CAPES Introdução A apresentação analítica que empreendemos neste artigo se origina tanto das atividades científico-acadêmicas, quanto da inserção da temática no debate de políticas públicas para a Educação do Campo. Sob tal aspecto, este estudo se fundamenta num conjunto de trabalhos de pesquisa consoantes ao Grupo de Estudos e Pesquisa em Políticas Públicas e Gestão Educacional (GEPPGE/CNPq). Articulando a construção e reconstrução das bases teórico-científicas das relações entre homem, trabalho e natureza. Aproximar-se da história da política educacional brasileira legada aos camponeses é, empreender o exame de textos, documentos, relatórios e outros recursos, a fim de, buscar respostas nos acontecimentos anteriores que auxiliam na compreensão da reforma educacional brasileira. Apreender a história educacional brasileira é mergulhar no passado levando expectativas e deparar-se com a riqueza da história de fatos que nunca nos foi contado (VIEIRA; FREITAS, 2003). A História das populações camponesas no Brasil. A investigação realizada à luz da teoria que possibilita o acesso ao discurso das políticas educacionais para a Educação do Campo a partir dos anos 1990 enfatiza o acesso ao conhecimento para o desenvolvimento social do homem do campo. Segundo Gohn (2009) no final da década de 1980 e inicio da década de 1990, novos sujeitos sociopolíticos formaram-se em movimentos sociais organizados a fim de lutar contra o regime civil-militar vigente e pela redemocratização do Estado, direitos e justiça social.

LUTAS CAMPONESAS E A EDUCAÇÃO DO CAMPO NO BRASIL … · Entre os objetivos propostos, buscou-se analisar a educação do e no campo como resultado relevante de uma trajetória histórica

Embed Size (px)

Citation preview

Universidade Estadual de Maringá 07 a 09 de Maio de 2012

1

LUTAS CAMPONESAS E A EDUCAÇÃO DO CAMPO NO BRASIL

MOURA, Kethlen Leite de (UEM)

OLIVEIRA, Caroline Mari de (UEM)

CECÍLIO, Maria Aparecida (UEM)

SILVA, Irizelda Martins de Souza e (UEM)

Agência Financiadora: CAPES

Introdução

A apresentação analítica que empreendemos neste artigo se origina tanto das

atividades científico-acadêmicas, quanto da inserção da temática no debate de políticas

públicas para a Educação do Campo. Sob tal aspecto, este estudo se fundamenta num

conjunto de trabalhos de pesquisa consoantes ao Grupo de Estudos e Pesquisa em

Políticas Públicas e Gestão Educacional (GEPPGE/CNPq). Articulando a construção e

reconstrução das bases teórico-científicas das relações entre homem, trabalho e

natureza.

Aproximar-se da história da política educacional brasileira legada aos

camponeses é, empreender o exame de textos, documentos, relatórios e outros recursos,

a fim de, buscar respostas nos acontecimentos anteriores que auxiliam na compreensão

da reforma educacional brasileira. Apreender a história educacional brasileira é

mergulhar no passado levando expectativas e deparar-se com a riqueza da história de

fatos que nunca nos foi contado (VIEIRA; FREITAS, 2003). A História das populações

camponesas no Brasil.

A investigação realizada à luz da teoria que possibilita o acesso ao discurso das

políticas educacionais para a Educação do Campo a partir dos anos 1990 enfatiza o

acesso ao conhecimento para o desenvolvimento social do homem do campo. Segundo

Gohn (2009) no final da década de 1980 e inicio da década de 1990, novos sujeitos

sociopolíticos formaram-se em movimentos sociais organizados a fim de lutar contra o

regime civil-militar vigente e pela redemocratização do Estado, direitos e justiça social.

Universidade Estadual de Maringá 07 a 09 de Maio de 2012

2

A conjuntura econômico-política do Brasil foi alterando e modelando novos

contextos, que oportunizaram o surgimento de redes de mobilizações civis e

movimentos sociais, tais como: movimentos sociais ao redor da questão urbana;

movimentos identidários e culturais: gênero, etnia, gerações, imigrantes; movimentos de

demandas na área dos direitos; movimento ao redor da questão da fome; mobilizações e

movimentos sociais: área do trabalho; movimentos decorrentes de questões religiosas;

mobilizações e movimentos sociais rurais; movimentos sociais no setor das

comunicações e movimentos sociais globais (GOHN, 2010).

Dentre os movimentos sociais e redes de mobilizações civis relacionados

anteriormente, objetivou-se estudar neste artigo, os movimentos sociais voltados ao

campo, compreendendo sua grande importância na luta pela educação do homem e da

mulher do campo, respeitando seus processos históricos e culturais na construção da

vida.

A educação dos sujeitos camponeses foi intencionada desde a formação do

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), no final da década de 1970 e

início da década de 1980 que, além da luta ao direito da terra, a luta pelo direito a

educação foi sua bandeira.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) n.º 5.692 de 11 de

agosto de 1971, apontava alguns resquícios a respeito da educação voltada para o

âmbito rural, vejamos: “§ 2º Na zona rural, o estabelecimento poderá organizar os

períodos letivos, com prescrição de férias nas épocas do plantio e colheita de safras,

conforme plano aprovado pela competente autoridade de ensino” (BRASIL, 1971, p.1).

No entanto, viabilizado como direito previsto e reconhecido pelo Estado a partir da Lei

de Diretrizes e Bases da Educação, n.º 9.394, de 20 de dezembro de 1996. O Artigo 28

apresenta a seguinte orientação:

Na oferta da educação básica para a população rural, os sistemas de ensino promoverão as adaptações necessárias à sua adequação às peculiaridades da vida rural, e de cada região, especialmente: I – conteúdos curriculares e metodologias apropriadas às reais necessidades e interesses dos alunos da zona rural; II – organização escolar própria, incluindo adequação do calendário às fases do ciclo agrícola e às condições climáticas;

Universidade Estadual de Maringá 07 a 09 de Maio de 2012

3

III – adequação à natureza do trabalho na zona rural (BRASIL, 1996, p. 16).

A partir da aprovação do Art. 28 na LDB 9.394/96, o MST teve mais elementos

para articular os debates com o Estado em relação às políticas públicas para a Educação

do Campo que vai ao encontro das peculiaridades de seus sujeitos. Caldart (2005, p. 24)

nos explica que pensar e projetar a educação do campo na política e pedagogicamente

abrange,

[...] desde os interesses sociais, políticos, culturais de um determinado grupo social. [Trata-se de] pensar a educação (processo universal) desde uma particularidade, ou seja, desde sujeitos concretos que se movimentam dentro de determinadas condições sociais de existência em um dado tempo histórico.

Durante a pesquisa, percebeu-se que, embora o debate entre o Estado e o MST

sobre Educação do Campo fosse possibilitado, principalmente no Estado do Paraná, as

políticas que são ofertadas aos camponeses, ainda, são políticas compensatórias.

De acordo com Guhur (2010) as políticas compensatórias enfraquecem a luta

dos trabalhadores vinculados ao MST, essas ações são silenciadas fazendo com que as

classes populares naturalizem a condição de dominados e passem a contentar-se com a

miséria proveniente do ideário neoliberal, que causa elevadas taxas de desigualdade

social. Para explicitar esse fenômeno, Marx (1987, p. 30) afirma que “não é a

consciência dos homens que determina o seu ser, mas, ao contrário, é o seu ser social

que determina sua consciência”. Portanto, é influenciada pelo meio político, social e

econômico capitalista que engendra suas forças alcançando violentamente a todos os

brasileiros, principalmente os menos favorecidos economicamente.

Outro problema que se identifica em relação à educação do campo, são suas

propostas curriculares que foram construídas para atender a formação de um homem

urbanizado, respondendo às necessidades criadas a partir do processo de

industrialização no intuito de atender ao sistema de produção, no qual a sociedade está

inserida. Sapelli, Gatti e Napoli (2009, p. 20) explicam que:

Universidade Estadual de Maringá 07 a 09 de Maio de 2012

4

a história do pensamento pedagógico e das políticas de educação no campo têm nexos com os padrões de desenvolvimento socioeconômico do meio rural, marcados por quase quatro séculos de escravidão e por acentuada concentração fundiária que levou a população trabalhadora a uma trajetória de expulsão e de expropriação, contra a qual ela desenvolveu estratégias de resistência.

Nesse contexto, a educação do campo está intimamente ligada às questões da

reforma agrária, a qual ultrapassa a compreensão de ocupação de terras, mas consiste

em um projeto que viabiliza o desenvolvimento do campo em relação à tecnologia, a

saúde, a educação, a modernização da agricultura por meio da agroecologia, a

infraestrutura, a cultura, a prática sociopolítica contra o capital que visa o controle dos

territórios do campo.

A educação do sujeito do campo vai na contramão do poder do mercado e do

capital. Estabelece uma educação que atenda as necessidades dos que trabalham,

residem ou dependem, direta ou indiretamente, do trabalho do e no campo. A educação

do campo não deve ser subsidiada por programas e projetos pensados por uma elite que

desconhece a realidade local, as demandas imediatas e fundamentais, a carga horária, as

formas presenciais, as formas de avaliação, os horários de estudo e o conteúdo

programático, se tornando totalmente inviáveis à condição social e política dos

trabalhadores do campo.

Discussões norteadoras: Educação no e do Campo

Para iniciar a discussão proposta por meio desse texto é necessário explicitar

quem são as populações que compõem a educação do campo. Para tanto, autores como

Brandão (2006), Cecílio, Hirose, Silva (2010) afirmam que a educação do campo

envolve os sujeitos do campo, como os assalariados rurais temporários; meeiros;

vileiros rurais; povos da floresta; posseiros; arrendatários; atingidos por barragens;

caiçaras; extrativistas; pescadores; faxinalenses, quilombolas; assentados; acampados;

reassentados; agricultores familiares; ilhéus; pescadores, ribeirinhos e os grupos étnicos

que vivem no campo, como os indígenas.

Universidade Estadual de Maringá 07 a 09 de Maio de 2012

5

Essas populações retratam a diversidade sociocultural existente no Brasil,

priorizam a educação do campo para fomento do desenvolvimento local e sustentável, a

partir dos interesses dos povos que nele vivem, ao qual por meio de sua história

contada, apenas, por uma vertente não se priorizou a presença dessas populações nas

discussões sobre educação e políticas públicas oficiais voltados a essa demanda social.

Ao tratar das questões do campo, muitas interpretações são contraditórias. São

feitas referências equivocadas sobre a identificação dessa parcela da sociedade, que

muitas vezes é apontada com expressões pejorativas tais como: ignorante, iletrado, sem

cultura, caipira, jeca, atrasado. Obrigado a lidar com o cabo da enxada e tendo no

trabalho braçal seu sustento, são percebidos como desprovidos de qualquer contribuição

à sociedade letrada (CECÍLIO; HIROSE; SILVA, 2010).

Ao contrário dessa concepção, percebe-se que os sujeitos do campo têm muito a

ensinar sobre sua cultura peculiar relacionados com a natureza que os rodeiam.

Perpassando o trabalho na e com a terra, a organização das atividades produtivas,

mediante mão-de-obra dos membros da família, valores que enfatizam as relações

familiares e de vizinhança, valorização das festas comunitárias, celebrações de

colheitas, vínculo com uma rotina de trabalho que nem sempre segue o relógio

mecânico. Trabalho esse que é o princípio educativo dessa população.

Podemos constatar que a imagem dessas populações expressa sofrimento,

calosidades nas mãos, envelhecimento provocado pela exposição demasiada ao sol,

visão prejudicada e pele queimada. Contudo, a identidade, a cultura e o trabalho dessas

populações não podem ser desconsiderados. Deve ser fomentada a educação formal e

digna como objeto que compreenda o contexto que ocorre no campo e construa, a partir

desse, uma Educação do e no Campo, assegurada por políticas públicas nacionais,

previstas e contempladas em leis federais, estaduais e municipais. Na garantia desses

direitos há de se superar o descompasso histórico em relação ao campo e reconhecer o

diferente e o diverso, em oposição a homogeneização e tolerância à essa parcela da

sociedade (CECÍLIO, HIROSE, SILVA, 2010).

Entre os objetivos propostos, buscou-se analisar a educação do e no campo como

resultado relevante de uma trajetória histórica no Brasil. Para tanto, fez-se necessário

explicitar alguns conceitos referentes ao campo de estudo da Educação do Campo.

Universidade Estadual de Maringá 07 a 09 de Maio de 2012

6

Conforme Sapelli, Gatti, Napoli (2009) a educação do campo supera a

concepção de educação rural, cuja referência é o campo somente como lugar de

produção de mercadoria e não como espaço de vida. Ainda, segundo as autoras, o

conceito de campo busca ampliar e superar a visão do rural como local de atraso, e

espaço onde as pessoas não precisam estudar, basta uma educação precária e aligeirada.

Esta concepção vem sendo disseminada desde o período colonial da história do Brasil,

no qual se entendia que o trabalhador dos espaços agrícolas não precisaria de qualquer

saber escolar, além do manejar os instrumentos rudimentares de trabalho, tais como a

enxada e o facão.

Diante disso, confirma-se a diferença estabelecida pelo processo de

industrialização e pelo processo da divisão social do trabalho, cuja lógica se baseia no

entendimento que o saber científico é destinado às classes dominantes e não aos

dominados. Dito de outra forma, a classe trabalhadora que vende sua produção para que

os dominantes desfrutem dos lucros. Quanto a educação pensada à classe trabalhadora,

percebe-se que esta muitas vezes voltada como mecanismo de controle social ,

disciplinamento para o convívio social harmônico com os cidadãos semelhantes.

A educação proposta à classe trabalhadora seria (e ainda é) o pressuposto da

instrução para ordem e moral da nação. Nesse sentido, a educação era somente para

formação e produção da mercadoria para o trabalho e para o desenvolvimento à

sociedade industrial no Brasil.

Sapelli, Gatti e Napoli (2009), constatam que todo projeto de educação do

campo está vinculado a um projeto de campo , o qual afirma que a nomenclatura

“educação rural” refere-se à relação deste com o projeto do agronegócio, atendendo à

uma concepção reprodutivista, na qual exclui os que não se incluem na lógica da

produtividade capitalista.

A educação é pensada a partir do modo urbano, para atender as necessidades do

mercado de trabalho. Em conformidade, as políticas educacionais são pensadas como

políticas de caráter compensatório como foi dito e, os sujeitos do campo são tratados

como “jecas tatu”, não valorizando a sua cultura e identidade que foi construída por

meio da e na terra.

Universidade Estadual de Maringá 07 a 09 de Maio de 2012

7

A nomenclatura “Educação do Campo” refere-se à relação deste com as lutas

sociais interligadas aos movimentos sociais, objetivando o desenvolvimento do campo

na perspectiva de inclusão dos trabalhadores, ou seja, luta por projeto popular que

inclua os trabalhadores organizados pelo MST. Nesta perspectiva, o campo é concebido

como espaço de vida e resistência dos camponeses que lutam para terem acesso e

permanência na terra que é espaço de construção de identidades “[...] nesse sentido as

políticas educacionais são vistas como políticas para formação humana” (SAPELLI;

GATTI; NAPOLI, 2009, p.145). A educação do campo é pensada a partir das

especificidades e do contexto do campo e de seus sujeitos. Deve-se então, superar a

visão de campo como lugar de atraso na busca de compreensão que o campo é um,

[...] espaço rico e diverso, ao mesmo tempo produto e produtor de cultura. É essa capacidade produtora de cultura que o constitui um espaço de criação do novo e do criativo e não quando reduzido meramente ao espaço de produção econômica, como o lugar de atraso, da não cultura. O campo é, acima de tudo, o espaço da cultura (BRASIL, 2004, p.33).

Em debates acerca da Educação do Campo em meios científicos (ou fora dele)

tem-se muitas vezes o entendimento, que os pesquisadores deste campo de pesquisa

defendem a segregação ou querem distanciar a educação do campo e os sujeitos a quem

se destina. Entretanto, o nosso entendimento é que a educação deve servir como

instrumento de socialização do conhecimento e saber científico e de construção da

crítica social, fornecendo ao homem do campo condições de decidir em que espaço quer

se desenvolver e permanecer, sem perder suas raízes culturais. Nesse sentido, Freire

(1998) explica que a educação tem que partir do contexto social do sujeito, mas, não

pode jamais ficar restrita a ele.

Em geral, tem-se a visão restrita da identidade da Educação do Campo,

compreendendo-a como uma educação voltada, somente, para o pequeno agricultor que

vive no campo, porém, ela é muito mais abrangente. Embora o entendimento que a

educação do campo seja limitada ao pequeno agricultor, que vive no campo, é preciso

‘alargar’ tal visão. A educação do campo é muito mais abrangente destinada aos seus

sujeitos: agricultores familiares; assalariados; assentados; ribeirinhos e entre outros.

Universidade Estadual de Maringá 07 a 09 de Maio de 2012

8

Ademais, existem escolas urbanas que são caracterizadas como do campo, uma

vez que seus sujeitos sobrevivem de atividades realizadas no campo, pois, existem

municípios que têm tanto a área urbana quanto rural, marcadas pela mesma cultura, ou

seja, a cultura do campo. Tal fato tem sido ignorado.

Fernandes (2008) aponta que ser do campo não é um atributo meramente geográfico,

mas consiste em um espaço territorial, cuja terra é o lócus em que todos os bens são

produzidos promovendo a existência e o desenvolvimento humano de seus sujeitos.

Além de compreender as limitações da educação rural e do campo é necessário ir

além, pois a identidade da escola do campo é definida a partir dos sujeitos a quem se

destina. O direito a Educação no Campo, muitas vezes negado. Escolas foram e

continuam sendo fechadas, professores e alunos submetidos a utilização de transportes

que os levam a escola urbana. A Educação do Campo é adaptada ao modelo urbano.

Sendo assim, faz-se necessário tanto discutir a educação no campo como do campo.

Dessa forma, Caldart (2002) apresenta que o projeto educacional de educação do

campo, envolve os sujeitos pertencentes a luta camponesa, pois tem no campo o seu

espaço de vida e de luta, tendo o direito de frequentar a escola no seu lugar de origem.

Para nós pesquisadores definir e concretizar o conceito de Educação do Campo é

extremamente necessário. Os homens e mulheres do campo buscam uma pedagogia

crítica, dialética, com formação de uma consciência não alienada. Valorizando os

sujeitos do campo por meio da cultura e identidade, compreendendo seu trabalho como

algo que os edifica enquanto sujeitos históricos e não meramente objeto de uso

mercadológico do capital.

Considerações

Como algo positivo podemos destacar a mediação política entre a Secretaria de

Estado e Educação do Paraná - SEED e os movimentos sociais do campo. Em 2003 foi

instituída a Coordenação Estadual de Educação do Campo como espaço de atendimento

às demandas educacionais do campo. A primeira tarefa da Coordenação foi o

reconhecimento legal da Escola Itinerante atuante como prática institucional, pelo

Parecer n° 1033, datado de 08/12/2003, do Conselho Estadual de Educação do Paraná, o

Universidade Estadual de Maringá 07 a 09 de Maio de 2012

9

qual reconheceu as Escolas Itinerantes como experiência pedagógica baseada nas

experiências educativas do Rio Grande do Sul, em 1996 (BAHNIUK, 2008). Em

setembro de 2003, antes mesmo da aprovação do Parecer nº 1033, houve a inauguração

da Escola Itinerante Chico Mendes no acampamento José Abílio dos Santos. Contudo,

somente em 2004, as Escolas Itinerantes tiveram autorização para o início oficial de

seus anos letivos espalhadas em cinco acampamentos do MST no Paraná.

A segunda tarefa foi a reformulação das Diretrizes Curriculares da Rede Pública

de Educação Básica do Campo no Paraná (2006), permeando a discussão sobre a

necessidade de inserção de conteúdos específicos do campo nas disciplinas dos

currículos escolares da rede estadual. Neste mesmo ano, uma das principais tarefas foi a

formação de duzentos educadores e educadoras itinerantes, bem como a participação na

revisão do Plano Nacional de Educação e implantação das diretrizes curriculares da

Educação do Campo no Paraná.

Alguns passos têm sido dados no entendimento que, a educação do campo “é

direito e não esmola” é público, um direito subjetivo universal, portanto, dever do

Estado.

Os projetos, leis, diretrizes educacionais voltados à Educação do Campo não

podem continuar seguindo os parâmetros educacionais urbanos, ou serem meras

adaptações destes espaços. O respeito à diversidade cultural é fator determinante para a

não dicotomia entre campo e cidade.

A reivindicação por direito a ter direito a educação é uma luta inconclusa. No

campo existem muitos problemas como: evasão escolar, desinteresse pelo estudo e pelo

processo de aprendizagem. Mas a indagação é feita a partir dos dados mencionados em

diversas pesquisas do MST (2001) , cujo resultado mostra a existência de 1.800 escolas

públicas de ensino fundamental no Brasil e só no Paraná 584 escolas do campo. Com

esses dados, compreendemos que a demanda é existente e não justifica o fechamento de

muitas escolas, como vem ocorrendo no Paraná. No entanto, onde estão as políticas

públicas que garantem uma educação de qualidade para “todos”?

Por que não estudar as experiências vivenciadas no passado para iluminar o

presente, a opressão, negação de direitos, expropriação, precisam fornecer elementos

críticos para uma leitura do presente visando a solidificação do coletivo na luta por

Universidade Estadual de Maringá 07 a 09 de Maio de 2012

10

direitos, tais como cidadania e educação? Por que fechar estabelecimentos de ensino

que priorizam a construção de identidades, de formação crítica, pensante buscando

alternativas para além do capital?

A educação do campo está em processo de resistência e reconstrução de seus

conteúdos e formas de educar. Deve ser priorizada nos programas e projetos

governamentais, além de conter sua pauta nas agendas políticas dos movimentos sociais

do campo. Observa-se também que as práticas políticas, pedagógicas e educacionais

diversificadas devem respeitar as diferenças culturais do homem do campo.

É importante ressaltar, que na busca de um projeto de educação nacional para o

campo, o MST sempre elevou a identidade de seus sujeitos. O campo e suas políticas

sociais contribuem para o debate sobre as formas de organização social voltada para os

processos de mudança onde a educação possa ser um dos fatores de transformação,

justiça social, emancipação humana e autonomia dos sujeitos em tela.

É nesse sentido, que procuramos neste artigo contrapor a uma parte da história

do homem do campo expressada negativamente pela mídia. A luta dos movimentos

sociais do campo na construção de um país pautado na real democracia, no

desenvolvimento local, no desenvolvimento de potencialidades, produção cooperativa e

coletiva, desenvolvimento da agricultura familiar, preservação de sua identidade e

cultura. Pensar no direito à educação desses sujeitos é ir além da escolarização é

alcançar a emancipação humana.

O que se almeja é construir coletivamente uma educação que compreenda a

identidade camponesa, as políticas e as diretrizes da educação do campo.

A luta dos movimentos sociais do campo continua passando por

desmistificações a cada dia. Propor uma educação que rompa com ideários dominantes

neoliberais almejando a formação social e humanizadora de sujeitos coletivos é

enfrentar inúmeras dificuldades, entre as quais, o cuidado em desvelar a verdade sobre

os movimentos sociais do campo, ocultada e satanizada pelos meios de comunicação em

massa.

Universidade Estadual de Maringá 07 a 09 de Maio de 2012

11

REFERÊNCIAS

BRANDÃO, E. C. Educação do Campo: pedagogia da sobrevivência. In: CECÍLIO, M. A.: BRANDÃO, E.C. (orgs.) Educação: campo e cidade – territórios do saber. Editora de Maringá: PR: Massoni, 2006. BRASIL. Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo. Brasília: MEC, 2002. ______. Referenciais para uma política nacional de educação do campo. Brasília: MEC, 2004. ______. LDB, Lei 9394/96. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília: Corde, 1996. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9394.htm>. Acesso em: 24 out. 2010. ______. LDB, Lei 5692/71. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília, 1971. Disponível em: < http://www.pedagogiaemfoco.pro.br/l5692_71.htm >. Acesso em: 28 out. 2010. CALDART, R. S. Por uma Educação do Campo: traços de uma identidade em construção. In: KOLLING, E. J. et. al. (orgs.). Educação do Campo Identidade e Políticas Públicas. Coleção Por uma Educação do Campo, v. 4. Brasília: DF: Articulação Nacional Por uma Educação do Campo, 2002. p. 18-25. CALDART, R. S. Elementos para a Construção do Projeto Político e Pedagógico da Educação do Campo. In: PARANÁ. Cadernos temáticos: educação do campo. Secretaria de Estado da Educação (SEED). Superintendência da Educação. Departamento de Ensino Fundamental. Curitiba: SEED, 2005. p. 23-34. CECILIO, M. A.; HIROSE, K.; SILVA, I. M. S. e. Educação do campo: políticas e diretrizes. In: CARVALHO, E. J. G.; FAUSTINO, R. C. (Org.). Educação e diversidade cultural. Maringá: EDUEM, 2010. FERNANDES, B. M.; Questão agrária: conflituosidades e desenvolvimento territorial. In: BUAINAIN, A. (Org.). Luta pela terra, reforma agrária e gestão de conflitos no Brasil. Campinas: UNICAMP, 2008. FREIRE, P. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. 36 ed. São Paulo: Cortez, 1998. GOHN, M. G. Movimentos sociais e redes de mobilizações civis no Brasil contemporâneo. Petrópolis, RJ: Vozes, 2010.

Universidade Estadual de Maringá 07 a 09 de Maio de 2012

12

______. Movimentos sociais e educação. 7.ed. São Paulo: Cortez, 2009. GUHUR, D. M. P. Contribuição do diálogo de saberes à educação profissional em agroecologia no MST: desafios da educação do campo na construção do projeto popular. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Estadual de Maringá – Maringá, 2010, 267 fls. MARX, K. Manuscritos econômicos-filosóficos e outros textos escolhidos. Tradução de José Carlos Bruni, José Arthur Gianotti e Edgard Malagodi. 4 ed. São Paulo: Nova Cultural, 1987. PARANÁ. Secretaria de Estado da Educação. Diretrizes Curriculares da Educação do Campo no Paraná. Curitiba: SEED, 2006. SAPELLI, M. L. S.;GATTI, S.; NAPOLI, A. P. Pedagogia do campo: a serviço de quem? In: CZERNISZ, E. C. S.; PERRUDE, M. R. S.; AOYAMA, A. L. F. (Org.). Política e gestão da educação: questões em debate. Londrina: UEL, 2009. VIEIRA, S. L. V.; FREITAS, I. M. S. de. Política Educacional no Brasil: introdução histórica. Brasília: Plano Editora, 2003.