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Infectologia INFECÇÕES CUTÂNEAS

INFECÇÕES CUTÂNEAS · 2020. 8. 31. · descolonização com mupirocina nasal e banhos de clorexidina. IMPETIGO O impetigo é uma infecção superficial da pele envolvendo apenas

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  • Infectologia

    INFECÇÕES CUTÂNEAS

  • VARICELA

    Infecção viral causada pelo vírus Varicela-Zoster (VZV) que geralmente acomete crianças e possui curso benigno. Sua transmissão ocorre através da via respiratória e após a replicação viral local (possivelmente na nasofaringe) ocorre a viremia, o que justifica a natureza disseminada da doença.

    É altamente contagiosa, possuindo taxa de ataque de até 90% em indivíduos susceptíveis. A transmissão ocorre desde 48h antes da formação das vesículas até o momento em que todas as lesões tornaram-se crostas.

    Clinicamente a varicela é representada por uma doença exantemática acompanhada de febre baixa e mal estar. As lesões surgem inicialmente no tronco e na face como máculas e evoluem rapidamente para outras áreas do corpo formando vesículas, pústulas e crostas. Caracteristicamente o paciente apresenta diversas lesões em estágios diferentes de evolução. Nos indivíduos mais jovens a doença apresenta um curso brando, com poucas lesões ao contrário daqueles que adquirem a doença na fase adulta. Os pacientes imunocomprometidos possuem maior chance de complicações viscerais com possibilidade de evolução para óbito.

    Em crianças, o SNC é o local de acometimento extracutâneo mais comum. A síndrome de ataxia cerebelar e sinais de irritação meníngea costumam aparecer 21 dias após o surgimento das vesículas. Outras manifestações podem ocorrer como Guillain-Barrè ou encefalite, porém são raras. Na maioria das vezes o acometimento do SNC é benigno e não exige nenhuma intervenção além de suporte.

    A complicação infecciosa mais comum é a infecção bacteriana secundária das lesões por S. aureus ou S. pyogenes. A pneumonia por varicela é a complicação mais grave e costuma acometer mais adultos do que crianças e tende a surgir 3-5 dias após o início da doença e sua resolução acompanha a melhora do exantema.

  • O tratamento nos indivíduos sadios se restringe a cuidados locais de higiene. Os antivirais (aciclovir, valaciclovir ou famciclovir) são indicados para adolescentes e adultos com < 24h de evolução devido a maior incidência de casos graves nesta faixa etária. Pode haver benefício também no início de antivirais para crianças < 12 anos quando iniciados nas primeiras 24h. Porém esta medida não é amplamente implementada. Devemos sempre lembrar de não indicar o uso de aspirina em crianças com Varicela devido ao risco de desenvolvimento da Síndrome de Reye.

    A varicela pode ser prevenida através da imunização dos indivíduos susceptíveis com a vacina contendo o vírus atenuado. As crianças podem ser imunizadas a partir de 1 ano de idade com a primeira dose aos 12-15 meses e um reforço aos 4-6 anos (no Brasil o calendário básico prevê apenas uma dose aos 15 meses). Adultos comprovadamente susceptíveis devem ser imunizados com 2 doses separadas por no mínimo 1 mês. Ressalte-se que por ser uma vacina de vírus vivo atenuado ela não pode ser aplicada em imunossuprimidos. A vacina também pode ser aplicada como forma de profilaxia pós-exposição em indivíduos susceptíveis em até 96h após o contato desde que não possuam contraindicação à vacinação.

    O uso de Imunoglobulina anti-Varicella-Zoster (VZIG) também é recomendado em alguns casos de profilaxia pós-exposição. Ela deve ser iniciada em até 96 horas após a exposição e está indicada para indivíduos não-imunes sob maior risco de desenvolver formas graves ou complicações:

    • Crianças imunocomprometidas susceptíveis • Gestantes susceptíveis • Neonatos cujas mães desenvolveram varicela 5 dias antes ou 48h após

    o parto • Neonatos prematuros >28 semanas hospitalizados cujas mães não

    possuem imunidade para varicela • Neonatos prematuros

  • Esses indivíduos devem receber a VZIG caso haja exposição significante, definida como:

    • Morar na mesma residência • Contato face-a-face em ambiente fechado (crianças brincando) • Hospitalar: mesma enfermaria de até 2-4 leitos; contato face-a-face

    com alguém da equipe de saúde ou paciente infectado; visita de uma pessoa infectada

    • Neonato com mãe apresentando varicela 5 dias antes ou 48h após o parto (Não está indicado no caso de Zoster)

    Os indivíduos que possuem contraindicação ao uso de vacina e já passaram das 96h de exposição para a realização de VZIG podem ser prescritos aciclovir por 7 dias como forma de profilixia pós-exposição.

    HERPES- ZOSTER

    Infecção viral também causada pelo VZV, que acomete principalmente imunossuprimidos e idosos. Decorre da reativação do vírus que se mantém latente nos gânglios das raízes dorsais após a primo-infecção.

    Clinicamente caracteriza-se por uma erupção vesicular em apenas um dermátomo (podendo ocorrer em mais de um dermátomo nos pacientes imunossuprimidos – herpes zoster disseminado) associada à dor intensa. Manifestações específicas são: (1) Herpes-zoster oftálmico quando ocorre acometimento do ramo oftálmico do nervo trigêmeo podendo levar à amaurose; (2) Síndrome de Ramsay Hunt, caracterizada pelo surgimento de dor e das lesões no canal auditivo externo associada a perda de paladar e paralisia facial periférica ipsilateral relacionados ao acometimento do gânglio geniculado do ramo sensorial do nervo facial.

    Os pacientes com Herpes-Zoster podem transmitir a doença para indivíduos soronegativos, levando ao desenvolvimento de Varicela.

  • A complicação mais comum é a dor debilitante (neuralgia pós-herpética) que ocorre mais frequentemente nas pessoas > 50 anos. Alterações no SNC podem ocorrer como Meningoencefalite e Angeíte Granulomatosa. Esta última se apresenta como uma hemiplegia contralateral e pode ser diagnosticada através de arteriografia cerebral. Na maioria dos casos as alterações liquóricas são benignas e não apresentam qualquer representação clínica.

    O tratamento pode ser feito com antivirais (aciclovir, valaciclovir e fanciclovir) havendo benefício demonstrado pela resolução mais rápida das lesões e da dor. Nos pacientes imunocomprometidos os casos leves podem ser tratados com medicação VO, contudo nos pacientes com doença disseminada (mais de um dermátomo) ou herpes-zoster oftálmico a terapêutica venosa está indicada.

    SÍNDROME DA PELE ESCALDADA

    Esta síndrome é causada por uma toxina esfoliativa (ETA ou ETB) produzida pelo S. aureus, sendo responsável pela ruptura dos desmossomos o que leva a principal característica do quadro clínico.

    Crianças e recém-nascidos são mais acometidos e a doença é autolimitada podendo variar desde formação de bolhas localizadas (com conteúdo límpido) até esfoliação difusa, com as mucosas sendo poupadas (diferencial com Necrólise Epidérmica Tóxica - NET). A infecção pode ser acompanhada de sinais sistêmicos como febre, letargia e irritabilidade. Em algumas ocasiões ocorre de forma epidêmica em berçários.

    O tratamento é feito com curativos antissépticos, reposição hidroeletrolítica, descolonização da equipe de saúde local e antimicrobianos (tabela).

  • FURUNCULOSE

    É uma extensão da foliculite, costumando afetar as áreas pilosas e com maior umidade no corpo como face, pescoço, axilas e nádegas. Inicialmente apresenta-se como um nódulo eritematoso doloroso que evolui rapidamente para uma lesão avermelhada, endurada, quente e dolorosa com uma possível área de drenagem espontânea no centro.

    O tratamento pode ser com medidas locais e drenagem cirúrgica sem necessidade de antibióticos. No entanto, o tratamento antimicrobiano deverá ser iniciado caso o paciente apresente múltiplas lesões ou uma lesão maior que 2,0 cm; celulite extensa ao redor da lesão; comorbidades associadas ou imunossupressão; presença de próteses ortopédicas, vasculares ou marcapasso; sinais sistêmicos de infecção como febre, taquicardia (> 90 bpm), leucocitose ou leucopenia ou taquipneia. Além disso, furúnculos localizados no trígono perigoso da face, ou seja, acometendo a região das narinas ou lábios superiores, podem evoluir com complicações graves como tromboflebite de seio cavernoso, devendo ser tratado com antibiótico venoso (tabela).

    Quando não ocorre melhora após a terapia inicial devemos considerar a possibilidade da infecção por MRSA e trocar o esquema para algum antimicrobiano que cubra este germe. Algumas opções são Sulfametoxazol-Trimetoprim, Clindamicina e Doxiciclina.

    Algumas pessoas podem apresentar furunculose recorrente. Nesses casos devemos pesquisar cistos pilonidais, hidradenite supurativa ou corpo estranho. Os abscessos recorrentes devem ser drenados e enviados para cultura, que guiará o tratamento adequado por 7-10 dias. Nesses pacientes com abscessos recorrentes por S. aureus, é necessário considerar um curso de 5 dias de descolonização com mupirocina nasal e banhos de clorexidina.

  • IMPETIGO

    O impetigo é uma infecção superficial da pele envolvendo apenas a epiderme, causada pelo Streptococcus pyogenes (grupo A). O Staphylococcus aureus também pode estar implicado nesta infecção, porém é mais comum nos casos de impetigo bolhoso (que é uma forma de síndrome da pele escaldada localizada).

    As crianças são mais acometidas e a infecção parece estar relacionada à condições de higiene inadequadas. As lesões acometem principalmente a face e os membros inferiores e iniciam-se como pápulas avermelhadas que evoluem para pústulas que se rompem formando lesões crostosas que podem coalescer formando lesões em “favo de mel”. Não há presença de sintomas sistêmicos, e seu surgimento denota complicação do quadro.

    O diagnóstico desta afecção é clinico, porém algumas referências recomendam a realização de cultura de material aspirado da lesão para avaliar a presença de S. aureus. A pesquisa de anticorpos contra S. pyogenes não é recomendada. A anti-estreptolisina O (ASLO) possui baixa sensibilidade nesses casos. Por outro lado, anti-DNase B e anti-hialuronidase podem ser positivas e ajudar nos casos de investigação de glomerulonefrite pós-estreptocóccica.

    O tratamento de escolha é com a Penicilina Benzatina IM ou penicilina V VO. Como o S. aureus vem ser tornando um agente cada vez mais comum, a Cefalexina pode ser uma alternativa.

    A principal complicação do impetigo é a Glomerulonefrite pós-estreptocócica. É importante ressaltar que a infecção de pele pelo Strepto do grupo A não está relacionada ao desenvolvimento de febre reumática, ao contrário do que se observa na faringite por este agente.

  • ERISIPELA

    A erisipela é uma infecção da pele e dos tecidos subcutâneos causada pelo Streptococcus pyogenes. A penetração desse germe ocorre através de soluções de continuidade da pele (picada de inseto, feridas, intertigo, etc.).

    A lesão é quente, eritematosa brilhante e com limites bem definidos e costuma acometer mais a região malar e os membros inferiores (principalmente naqueles indivíduos que realizaram safenectomia ou HPP de trombose venosa ou linfedema crônico). O aspecto em “casca de laranja” pode estar presente e reflete o acometimento dos vasos linfáticos locais. Sinais sistêmicos como febre e taquicardia são comuns.

    O tratamento é feito com Penicilina G IV, ceftriaxone, cefazolina, cefalexina, amoxicilina-clavulanato ou outras opções, a depender da gravidade da doença.

    CELULITE

    A celulite é uma infecção dos tecidos cutâneos mais profundos e por este motivo sua lesão caracteristicamente possui limites imprecisos. Os principais agentes são o Staphylococcus aureus ou S. pyogenes, que penetram na pele através de soluções de continuidade, como descrito acima.

    Clinicamente, a lesão é eritematosa, quente e dolorosa e acompanhada de febre.

    O tratamento é feito com Oxacilina IV nos casos graves ou cefalexina VO nos casos brandos. Naqueles pacientes em que não há melhora inicial após o início do tratamento adequado, deve-se suspeitar de infecção por S. aureus resistente a Meticilina (MRSA), possivelmente CA-MRSA. Sendo assim, o esquema deve ser mudado para Sulfametoxazol-Trimetoprim ou Clindamicina VO (observe que no Brasil o CA-MRSA possui melhor perfil de sensibilidade ao

  • SMX-TMP que à clindamicina) nos casos leves ou por Vancomicina IV nos casos Graves que necessitam de terapia venosa.

    FASCIITE NECROTIZANTE

    A Fasciite Necrotizante (ou Gangrena estreptocócica hemolítica) acomete tecidos mais profundos que a celulite e a erisipela: a fáscia superficial e profunda que revestem os músculos. A porta de entrada para a infecção são soluções de continuidade da pele ou o trato gastrointestinal (neste caso ocorrendo bacteremia com posterior inoculação na fáscia). O principal agente é o Streptococcus pyogenes, contudo, nos casos em que o TGI é a fonte, a infecção polimicrobiana é possível (Bacterioides fragilis, estreptococos anaeróbios e gram-negativos).

    O início é agudo com dor intensa local, febre e aparência toxêmica. Ao exame físico, observa-se inicialmente leve eritema local associado a hiperestesia que progridem para piora da vermelhidão local e edema. Pode ocorrer anestesia local com a evolução do quadro, indicando infarto dos nervos cutâneos.

    A abordagem cirúrgica com drenagem e desbridamento é fundamental para o sucesso terapêutico. A antibioticoterapia feita com Penicilina IV + Clindamicina nos casos confirmados de etiologia estreptocócica. A terapia empírica nos pacientes graves deve ser feita com Vancomicina + (Ceftriaxone + Metronidazol) ou (Carbapenêmico) ou (Piperacilina-Tazobactam).