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7/23/2019 Girardi, Eduardo_Tese Doutorado
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UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTAFaculdade de Cincias e Tecnologia
EDUARDO PAULON GIRARDI
PROPOSIO TERICO-METODOLGICA DE UMACARTOGRAFIA GEOGRFICA CRTICA E SUA
APLICAO NO DESENVOLVIMENTO DOATLAS DA QUESTO AGRRIA BRASILEIRA
Tese: Doutorado
Presidente Prudente2008
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Eduardo Paulon Girardi
PROPOSIO TERICO-METODOLGICA DE UMA
CARTOGRAFIA GEOGRFICA CRTICA E SUA APLICAO NO
DESENVOLVIMENTO DO ATLAS DA QUESTO AGRRIA
BRASILEIRA
Orientador: Prof. Dr. Bernardo Manano Fernandes
Presidente Prudente
2008
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Eduardo Paulon Girardi
PROPOSIO TERICO-METODOLGICA DE UMA
CARTOGRAFIA GEOGRFICA CRTICA E SUA APLICAO
NO DESENVOLVIMENTO DO ATLAS DA QUESTO
AGRRIA BRASILEIRA
Tese apresentada ao Programa de Ps-Graduaoda Faculdade de Cincias e Tecnologia daUniversidade Estadual Paulista, campus dePresidente Prudente, para a obteno do ttulo deDoutor em Geografia.
Orientador: Prof. Dr. Bernardo Manano Fernandes
Presidente Prudente2008
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Girardi, Eduardo Paulon.G432p Proposio terico-metodolgica de uma cartografia geogrfica
crtica e sua aplicao no desenvolvimento do atlas da questoagrria brasileira / Eduardo Paulon Girardi. - Presidente Prudente :
[s.n], 2008347 f. : il.
Tese (doutorado) - Universidade Estadual Paulista, Faculdade deCincias e Tecnologia
Orientador: Bernardo Manano FernandesBanca: Arlete Aparecida Correia Meneguette, Clifford Andrew
Welch, Herv Thry, Ariovaldo Umbelino de OliveiraInclui bibliografia
1. Mapa. 2. Leitura desconstrucionista do mapa. 3. Cartografiageogrfica crtica. 4. Atlas. 5. Questo agrria brasileira. 6. Paradigmada questo agrria. I. Autor. II. Ttulo. III. Presidente Prudente -Faculdade de Cincias e Tecnologia.
CDD(18.ed.) 621.71
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Eduardo Paulon Girardi
PROPOSIO TERICO-METODOLGICA DE UMACARTOGRAFIA GEOGRFICA CRTICA E SUA APLICAO NO
DESENVOLVIMENTO DO ATLAS DA QUESTO AGRRIABRASILEIRA
COMISSO JULGADORA
Tese para obteno do ttulo de doutor
_______________________________
Prof. Dr. Bernardo Manano Fernandes
Presidente da Banca Orientador
(Fct/Unesp)
_______________________________
Prof. Dr. Herv Thry
1 Examinador (CNRS-Credal e USP)
_______________________________
Prof. Dr. Ariovaldo Umbelino de Oliveira
2 Examinador (USP)
_______________________________
Prof. Dr. Arlete A. C. Meneguette
3 Examinador (FCT/Unesp)
_______________________________
Prof. Dr. Clifford Andrew Welch
4 Examinador (FCT/Unesp)
Presidente Prudente, 18 de setembro de 2008
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Dedico este trabalho aos meus
amados pais Roque e Marli.
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Agradecimentos
Durante os quatro anos e meio em que este trabalho foi desenvolvido,
inmeras pessoas participaram da minha caminhada de forma positiva, seja na vida privada
ou na vida acadmica (que dificilmente posso dissociar). A essas pessoas ofereo minha
gratido e espero, sinceramente, que possa um dia retribuir.
Novamente, e em primeiro lugar, agradeo aos meus pais, Roque e Marli,
a quem dedico este trabalho, pelo apoio sentimental, moral e material, essencial para que
eu pudesse seguir meu caminho, na vida e na universidade. Minha querida irm Patrcia,
sempre presente, agradeo pelo incentivo.
Sirlei, minha amada companheira desde h tantos anos, que estevepresente em todos os momentos desta caminhada e compreendeu pacientemente minhas
ausncias. Prometo que tentarei recompens-la.
Valter Justo e Paulo Traldi, amigos de minha cidade natal aos quais sou
grato.
Dona Leonor, Nice, Thais, Ana, Tales e Catarina, que me acolheram como
membro da famlia.
Prof. Bernardo Manano Fernandes, orientador, que com seu pensamento
encorajador e desafiador mostrou os melhores caminhos a serem percorridos na pesquisa e,
ao mesmo tempo, incitou a abertura de novos horizontes, essenciais para o trabalho. Sua
contribuio para minha formao acadmica ser indelvel. Alm de orientador, um grande
amigo.
Prof. Arlete Meneguette, orientadora durante a graduao, membro da
banca de qualificao que indicou para o doutorado direto e da banca de defesa da tese. Da
mesma forma, referncia para minha formao acadmica e grande amiga.
Prof. Antnio Thomaz Jnior, tambm membro da banca de qualificao
do mestrado que indicou para o doutorado direto. Suas consideraes contriburam para a
estruturao da proposta de tese.
Prof. Philippe Waniez, a quem agradeo por ter elaborado e disponibilizado
de forma gratuita o Philcarto, programa amplamente utilizado no trabalho. Tambm
agradeo sua inteira disposio em me auxiliar quando comecei a trabalhar com o Philcarto.
Prof. Herv Thry, que me apresentou o Philcarto ainda em 2003 e se
tornou um grande colaborador nas atividades desenvolvidas durante o doutorado, em
especial o estgio de doutorado que realizei na Frana.
Prof. Cliff Welch, presente no NERA, professor de disciplinas que cursei na
ps-graduao, membro da banca de qualificao do doutorado e da defesa da tese. Como
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historiador que pesquisa a questo agrria em meio aos gegrafos, sua contribuio foi
importante para o direcionamento do trabalho.
Quero lembrar aqui todos os professores das disciplinas que cursei no
Programa de Ps-Graduao em Geografia da FCT/Unesp, alguns j citados: Prof. Antonio
Nivaldo Hespanhol, Prof. Cliff Welch, Prof. Delma Pessanha Neves, Prof. Eliseu Savrio
Sposito, Prof. Herv Thry, Prof. Joo Edmilson Fabrini, Prof. Marcos Aurlio Saquet, Prof.
Maria Aparecida de Moraes Silva, Prof. Maria Encarnao Beltro Sposito e Prof. Neli
Aparecida de Mello. Obrigado a todos.
Durante o estgio de doutorado de trs meses na Frana, realizado no
Institut des Hautes tudes de lAmrique Latine (IHEAL) Universit de Paris III Sorbonne
Nouvelle, tive o prazer de ter como tutora a Prof. Martine Droulers, a quem agradeo as
orientaes sobre os melhores caminhos a serem percorridos no curto perodo. Uma das
atividades do estgio foi a realizao de trabalhos de campo em estabelecimentos
agropecurios franceses, de forma que agradeo a todos os agricultores que me receberam
em seus estabelecimentos. Nos trs meses em que estive na Frana, vrias pessoas me
auxiliaram de diversas formas, sendo que no posso deixar de mencionar Prof. Martine
Guibert, Prof. Franois-Michel Le Tourneau, Prof. Pernette Grandjean, Prof. Marcel Bazin,
Porf. Celine Broggio, Porf. Enali de Biaggi, Prof. Bernard Bret, Prof. Joseph Garnotel,
Corinne Herv, Claude e Anne Riolon, Michel e Marie-Paule Deloire, Eve-Anne Bhler,
Claire Barbay, Walter Prysthon, Stphanie Nasuti e Guillaume Marchand. Pelas entrevistas
cedidas agradeo ao Sr. Nicolas Duntze e ao Sr. Patrick Ferrre. Agradeo a todos os
funcionrios da Maison du Brsil, onde residi durante o estgio, e a sua diretora, Sr. Inez
Machado.
Agradeo ao Prof. Wilder Robles que, atravs da CASID/ACEDI,
possibilitou que eu participasse de dois congressos da associao no Canad. Isso permitiu
contato com pesquisadores de desenvolvimento internacional e a realizao de
levantamento bibliogrfico em trs universidades canadenses.
Outras pessoas as quais agradeo por terem me auxiliado de vrias
maneiras so Prof. Neli Aparecida de Mello, Prof. Gerd Sparovek, Prof. Antnio Tadeu
Tomaselli, Suzana Rabelo, Fernando Paiva Scrdua, Angela Cristina Silva, Lauren Backer,
Cammeron Backer, Lindsay Gillanders, Frei Xavier Plassad, Suko Ceclia Uski e Ronaldo
Ramos Vasconcellos.
Este trabalho foi desenvolvido dentro do Ncleo de Estudos, Pesquisas e
Projetos de Reforma Agrria (NERA). Esse espao de pesquisa possibilitou discusses com
outros colegas graduandos, ps-graduandos e professores que tambm se dedicam ao
estudo do campo brasileiro, de forma que foi muito importante para atingirmos nossos
objetivos. No ncleo de estudos, durante todos esses anos de ps-graduao, estive
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envolvido na equipe de desenvolvimento do Banco de Dados da Luta Pela Terra (Dataluta),
uma das fontes de informaes para o desenvolvimento do Atlas. A participao nesse
projeto contribuiu para que compreendesse o papel da luta pela terra no Brasil. O NERA
tambm possibilitou outras atividades acadmicas importantes para minha formao, como
a organizao de eventos, participao em trabalhos de campo, coordenao da Revista
NERA e acompanhamento de estagirios.
Desde 2004, quando entrei no NERA como aluno da ps-graduao, tive a
oportunidade de conviver com vrios colegas que tambm desenvolviam suas dissertaes
e teses no ncleo. Dentre esses colegas esto Silvio Simione da Silva, Izabel Castanha Gil,
Noemia Vieira, Carina da Ponte Furini, Priscila Bagli, Munir Jorge Felcio, Nelson Rodrigo
Pedon, Eraldo Ramos e Eliane Mazzini. Mais recentemente, Janaina Francisca Souza
Campos, Elienai Constantino Gonalves, Claudia Pilar Lizrraga Aranibar e Carlos Alfredo
Vacaflores Rivero. Dois amigos estiveram presentes de forma mais quotidiana neste
perodo: Anderson Antnio da Silva e Matuzalem Bezerra Cavalcante, companheiros na vida
e na academia. Alm desses colegas da ps-graduao, devo mencionar Diego Vilanova,
que nos ltimos tempos tem se dedicado aos trabalhos do NERA. Neste perodo tambm
passaram pelo ncleo vrios alunos de graduao que contriburam para o desenvolvimento
do Dataluta. Agradeo imensamente a esses alunos que contriburam para o
desenvolvimento do banco de dados, amplamente utilizado na tese.
Agradeo a CPT e as inmeras pessoas que contribuem com a pastoral
coletando dados e informaes pelo Brasil, sem os quais seria impossvel expor neste
trabalho a violncia brutal deflagrada contra os camponeses e trabalhadores rurais
brasileiros. Em especial agradeo a Cssia Regina da Silva Luz, da secretaria nacional, meu
contato direto com a pastoral e que me ajudou durante todos esses anos com os dados.
Agradeo ao ensino pblico, responsvel por absolutamente toda minha
formao, desenvolvida em duas instituies: a E.E.P.S.G. Dr. Bento Ferraz, onde cursei
desde a pr-escola at o terceiro colegial, em Palestina-SP, minha cidade natal, e a
FCT/Unesp, onde fiz minha graduao e ps-graduao em Geografia, em Presidente
Prudente-SP. Agradeo a todos os professores que desde a pr-escola contriburam para
minha formao. Tambm agradeo aos funcionrios que possibilitam o andamento dessas
instituies.
Por fim, agradeo FAPESP que, desde 2001, tem apoiado meu
desenvolvimento na pesquisa com bolsas de iniciao cientfica, mestrado e doutorado
direto. Os resultados do trabalho certamente seriam outros se no tivesse recebido apoio
financeiro para realizar a pesquisa e me dedicar exclusivamente a ela.
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Este trabalho contou com o apoio da Fundao de Amparo
Pesquisa do Estado de So Paulo FAPESP
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O Atlas da Questo Agrria Brasileira est disponvel em:
www.fct.unesp.br/nera/atlas
http://www.fct.unesp.br/nera/atlashttp://www.fct.unesp.br/nera/atlas7/23/2019 Girardi, Eduardo_Tese Doutorado
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Resumo*
No movimento de renovao da Geografia brasileira, a Geografia Crticaatuou questionando os princpios e prticas da Geografia Tradicional e da Geografia
Pragmtica frente aos problemas sociais e props uma leitura de mundo direcionada aoentendimento e resoluo desses problemas. Contudo, a crtica radical s outras duascorrentes fez com que a Geografia Crtica desconsiderasse suas contribuies, como porexemplo, o desenvolvimento no campo da Cartografia. Como o mapa era amplamenteutilizado pelas correntes tradicionais e pragmticas, ele tambm foi negligenciado pelacorrente crtica. A Geografia Crtica confundiu a viso de mundo com os procedimentosmetodolgicos dessas correntes e com isso ignorou o potencial analtico e discursivo domapa como inerente ao discurso geogrfico. Com a difuso da Geografia Crtica comocorrente predominante na Geografia brasileira, o mapa passou a ser negligenciado.
Frente a esta constatao e, partilhando dos fundamentos da GeografiaCrtica, apresentamos nesta tese a proposta terico-metodolgica de uma CartografiaGeogrfica Crtica (CGC). O objetivo principal contribuir para o desenvolvimento daGeografia Crtica com a reparao deste equvoco em relao ao mapa, o que implica emvalorizar o uso do mapa e do mapeamento na corrente crtica. Desta forma, anlise ediscurso geogrfico podero ser potencializados para uma participao mais direta naproduo do espao. A CGC est alicerada em uma teoria crtica do mapa - sua leituradesconstrucionista - proposta por Harley (1989). Para que o processo de mapeamentoconsiga contemplar esta concepo crtica, trs abordagens cartogrficas so adotadascomo indissociveis na CGC: semiologia grfica, visualizao cartogrfica e modelizaogrfica. A crtica da CGC est na adoo da teoria crtica do mapa e em assumir osfundamentos da Geografia Crtica na nfase do uso do mapa para analisar desigualdades econtradies do espao geogrfico. Como forma de demonstrao, a partir da CGC,desenvolvemos o Atlas da Questo Agrria Brasileira.
A questo agrria tem sido estudada por pesquisadores de diversas reasdo conhecimento, inclusive da Geografia. Contudo, verificamos que no h nenhum trabalhoque realize uma anlise do problema de forma ampla e que tenha como base omapeamento. Assim, com a permanncia dos problemas da questo agrria, acreditamosque uma pesquisa desta natureza seja importante para o entendimento da configurao daquesto agrria no territrio brasileiro. A partir desta necessidade, elaboramos o Atlas daQuesto Agrria Brasileira. Para o desenvolvimento do Atlas tomamos como referncia oparadigma da questo agrria, que enfatiza as contradies e os conflitos no campo. Destaforma, alm de abordar temas relacionados configurao territorial, caractersticassocioeconmicas e a produo agropecuria, enfatizamos o conflito entre campesinato,latifndio e agronegcio; a forma concentrada e criminosa como a terra apropriada nopas; a desastrosa ocupao da Amaznia; a luta pela terra; a poltica de reforma agrria
atravs de assentamentos rurais; e a violncia contra camponeses e trabalhadores rurais.Atravs do mapeamento foi possvel identificar as principais configuraes da questoagrria no territrio e algumas de suas dinmicas e tendncias.
Palavras-chave: Mapa; Leitura desconstrucionista do mapa; Cartografia geogrfica crtica;Atlas; Questo agrria brasileira; Paradigma da questo agrria.
*
GIRARDI, Eduardo Paulon. Proposio terico-metodolgica de uma Cartografia GeogrficaCrtica e sua aplicao no desenvolvimento do Atlas da Questo Agrria Brasileira. 2008. Tese(Doutorado em Geografia) Faculdade de Cincias e Tecnologia, Universidade Estadual Paulista,Presidente Prudente, 2008.
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Abstract*
During the revisionist movement to renovate Brazilian Geography, the
Critical Geography school questioned the principles and practices of Traditional and
Pragmatic Geography, arguing that these schools were inadequate to the times and offering
a reading of the world directed at the understanding and resolution of social problems.
However, the radical critique of the two older currents caused the Critical Geography school
to underestimate some useful contributions of these approaches such as Cartography. In
fact, since maps were widely used by Traditional and Pragmatic Geography, Critical
Geography tended to dismiss their utility. Critical Geography seemingly confused the
worldview and methodology of these schools and thus ignored the analytical and discursive
potential of maps as inherent to geographical language. As Critical Geography became
predominant, maps became neglected in Brazilian geographical studies.Given this turn of events, yet consistent with the Critical Geography
approach, this dissertation defends a theoretical and methodological proposal to developCritical Geographic Cartography (CGC). The principal objective is to contribute to thedevelopment of Critical Geography by repairing the tendency to ignore maps, which meansvaluing the use of maps and the mapping process in the critical school. Geographic analysisand discourse will, in turn, be strengthened and have more direct participation in theproduction of space. CGC is rooted in a critical theory of the map, by the deconstructionistreading of space proposed by Harley (1989). In order to elaborate a critical conception of themap-making process, three distinct approaches to Cartography are adopted as inseparable.They are graphic semiology, cartographic visualization and graphic modeling. The critical ofCritical Geographic Cartography is in the adoption of critical map theory and in applying theperspectives of Critical Geography to the selection of research objects and an emphasis onthe use of the map to analyze inequalities and contradictions in geographic space.
As an example of how CGC can work, the thesis offers the BrazilianAgrarian Question Atlas. The agrarian question has been studied by researchers from adiversity of disciplines, including geography. However, the literature is devoid of broad
studies that analyze the problem using maps as their base of support. Given the continuity of
Brazils agrarian problems, an examination of this nature can be quite useful for
understanding the configuration of the agrarian question throughout Brazilian territory. To
develop the maps, the agrarian question paradigm, which emphasizes contradictions and
conflicts in the countryside, was used as conceptual reference. Thus, in addition to covering
topics related to territorial formation, socioeconomic statistics and productivity characteristics,
the approach taken here emphatically emphasizes conflict between the peasantry, latifundioand agribusiness; the criminal way in which land is appropriated and concentrated; the
disastrous occupation of Amazonia; the struggle for land; the consequences of an agrarian
reform policy of rural settlement implantation; and the violence perpetrated against peasants
and rural workers. Through mapping, it has been possible to identify the principal
configurations of the agrarian question in Brazilian territory as well as some of the questions
dynamics and tendencies.
Keywords: Map; Deconstructionist map reading; Critical geographic cartography; Atlas;Brazilian agrarian question; Agrarian question paradigm.
*
GIRARDI, Eduardo Paulon. Theoretical-methodological proposal for a Critical GeographicCartography and its employ to develop the Brazilian Agrarian Question Atlas. 2008. PhD thesisin Geography. Faculdade de Cincias e Tecnologia, Universidade Estadual Paulista, PresidentePrudente, 2008.
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Resumen*En el movimiento de renovacin de la Geografa brasilera, la Geografa
Crtica actu cuestionando los principios y practicas de la Geografa Tradicional y de la
Geografa Pragmtica frente a los problemas sociales y propone una lectura del mundodireccionada al entendimiento y resolucin de esos problemas. Con todo, la crtica radical alas otras dos corrientes hizo que la Geografa Crtica desconsiderase sus contribuciones,como por ejemplo, el desarrollo del campo de la Cartografa. Como el mapa eraampliamente utilizado por las corrientes tradicional y pragmtica, este fue tambinnegligenciado por la corriente crtica. La Geografa Crtica confundi la visin del mundo conlos procedimientos metodolgicos de esas corrientes y con eso ignor el potencial analticoy discursivo del mapa como inherente al discurso geogrfico. Con la difusin de la GeografaCrtica como corriente predominante en la Geografa brasilera, el mapa pas a sernegligenciado.
Frente a esta constatacin y, partiendo de los fundamentos de la GeografaCrtica, presentamos en esta tesis la propuesta terica-metodolgica de una CartografaGeogrfica Crtica (CGC). El objetivo principal es contribuir al desarrollo de la GeografaCrtica con la reparacin del equvoco en relacin al mapa, lo que implica valorizar el uso delmapa y del mapeamiento en la corriente crtica. De esta forma, anlisis y discursogeogrfico pueden ser potencializados para una participacin ms directa en la produccindel espacio. La CGC esta apoyada en una teora crtica del mapa - su lecturadeconstrucionista - propuesta por Harley (1989). Para que el proceso de mapeamientoconsiga contemplar esta concepcin crtica, tres abordajes cartogrficas son adoptadascomo indisociables en la CGC: semiolgica grfica, visualizacin cartogrfica y modelizatingrfica. La crtica de la CGC esta en la adopcin de la teora crtica del mapa y en asumir losfundamentos de la Geografa Crtica en la nfasis del uso del mapa para analizardesigualdades e contradicciones del espacio geogrfico. Como forma de demostracin, a
partir de la CGC desarrollamos el Atlas de la Cuestin Agraria Brasilera.La cuestin agraria ha sido estudiada por investigadores de diversas reasdel conocimiento, inclusive de la Geografa. Con todo esto, verificamos que no hay ningntrabajo que realice un anlisis del problema de forma amplia y que tenga como base elmapeamiento. As, con la permanencia de los problemas de la cuestin agraria, creemosque una investigacin de esta naturaleza es importante para comprender la configuracin dela cuestin agraria en el territorio brasilero. Para el desarrollo del Atlas tomamos comoreferencia el paradigma de la cuestin agraria, que enfatiza las contradicciones y losconflictos del campo. De esta forma, adems de abordar temas relacionados a laconfiguracin territorial, caractersticas socioeconmicas y la produccin agropecuaria,enfatizamos el conflicto entre campesinado, latifundio y agronegocio; la forma concentrada ycriminal de como la tierra es apropiada en el pas; la desastrosa ocupacin de la Amazonia;
la lucha por la tierra; la poltica de reforma agraria a travs de asentamientos rurales; laviolencia contra campesinos e trabajadores rurales. A travs del mapeo fue posibleidentificar las principales configuraciones de la cuestin agraria en el territorio y algunas desus dinmicas y tendencias.
Palabras Claves: Mapa; Lectura desconstruccionista del mapa; Cartografa geogrficacrtica; Atlas; Cuestin agraria brasilera, Paradigma de la cuestin agraria.
*
GIRARDI, Eduardo Paulon. Proposicin terica-metodolgica de una Cartografa GeogrficaCrtica y su empleo en el desarrollo del Atlas de la Cuestin Agraria Brasilera . 2008. Tesis(Doctorado en Geografa) Faculdade de Cincias e Tecnologia, Universidade Estadual Paulista,Presidente Prudente, 2008.
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Rsum*
Dans le mouvement de rnovation de la Gographie brsilienne, laGographie Critique a jou un rle en questionnant les principes et les pratiques de la
Gographie Traditionnelle et de la Gographie Pragmatique face aux problmes sociaux et apropos une lecture du monde dirige vers la comprhension et la rsolution de cesproblmes. Cependant, la critique radicale des deux autres courants a fait que la GographieCritique a laiss de ct certaines de ses contributions, comme par exemple, ledveloppement dans le champs cartographique. Comme la carte tait amplement utilise parles courants traditionnels et pragmatiques, elle a aussi t nglige par le courant critique.La Gographie Critique a confondu la vision du monde avec les procduresmthodologiques de ces courants et ainsi a ignor le potentiel analytique et discursif de lacarte comme inhrent au discours gographique. Avec la diffusion de la Gographie Critiquecomme courant prdominant dans la Gographie brsilienne, la carte a t laisse de ct.
Face cette constatation et, en partageant les fondamentaux de laGographie Critique, nous prsentons dans cette thse la proposition thorico-
mthodologique d'une Cartographie Gographie Critique (CGC). L'objectif principal est decontribuer au dveloppement de la Gographie Critique en rparant cette erreur vis vis dela carte, ce qui implique de valoriser l'usage de la carte et de la cartographie au sein ducourant critique. C'est ainsi que l'analyse et le discours gographique pourront tre renforcspour une participation plus directe dans la production de l'espace. La CGC est base sur unethorie critique de la carte - sa lecture dconstructiviste - propose par Harley (1989). Pourque le processus de cartographie russisse aboutir cette conception critique, troisapproches cartographiques sont adopts comme tant indissociable de la CGC: lasmiologie graphique, la visualisation cartographique et la modlisation graphique. Lacritique de la CGC est dans l'adoption de la thorie critique de la carte et dans le faitd'assumer les fondamentaux de la Gographie Critique dans la valorisation de l'usage de la
carte pour analyser les ingalits et les contradictions de l'espace gographique. Pourdmonstration, partir de la CGC, nous avons dvelopp l'Atlas de la Question AgraireBrsilienne.
La question agraire a t tudi par des chercheurs de divers domaines deconnaissance, y compris de la Gographie. Cependant, nous avons pu vrifier qu'il n'existeaucun travail qui ralise une analyse du problme de forme ample et qui ait comme base lacartographie. Ainsi, avec la persistance des problmes de la question agraire, nous croyonsqu'une recherche de cette nature est importante pour la comprhension de la configurationde la question agraire sur le territoire brsilien. A partir de cette ncessit, nous laboronsl'Atlas de la Question Agraire Brsilienne. Pour laborer lAtlas, nous avons commerference le paradigme de la question agraire, qui dmontre les contradictions et les conflitsdans le milieu rural. Ainsi, en plus d'aborder les thmes en lien avec la configuration
territoriale, les caractristiques socio-conomiques et la production agricole, nous rendonsvisible le conflit entre le paysannat, la grande proprit terrienne (latifndio) et l'agro-ngoce;la forme concentre et criminelle avec laquelle la terre a t approprie dans le pays, lesdsastreuses occupations de l'Amazonie, la lutte pour la terre, la politique de rforme agraire travers les assentamentos ruraux, et la violence contre les paysans et les travailleursruraux. Grce la cartographie, il a t possible d'identifier les principales configurations dela question agraire sur le territoire et quelques-unes de ses dynamiques et tendances.
Mots-clefs: Carte; Lecture dconstructiviste de la carte; Cartographie gographique critique;Atlas; Question agraire brsilienne; Paradigme de la question agraire.
*
GIRARDI, Eduardo Paulon. Proposition thorico-mthodologique d'une CartographieGographie Critique et sa utilisation au developpement de l'Atlas de la Question AgraireBrsilienne. 2008. Thse (Doctorat en Gographie) Faculdade de Cincias e Tecnologia,Universidade Estadual Paulista, Presidente Prudente, 2008.
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Lista de mapas
Pg.
MAPA 4.1 Mapa-mundi do tipo Beatus.......................................................... 62
MAPA 6.1 Soja: rea plantada 2006........................................................... 81
MAPA 6.2 Soja: evoluo da rea plantada 1990-2005............................. 83
MAPA 6.3 Territrio e territorializao da produo de soja.......................... 84
MAPA 9.1 Biomas.......................................................................................... 130
MAPA 9.2 Cobertura vegetal atual................................................................. 132
MAPA 9.3 Desflorestamento na Amaznia Legal.......................................... 135
MAPA 9.4 Desflorestamento na Amaznia Legal 2001-2006..................... 137
MAPA 9.5 Unidades de Conservao............................................................ 141MAPA 9.6 Terras indgenas........................................................................... 142MAPA 9.7 Vias de transporte......................................................................... 144MAPA 9.8 Potencialidade agrcola................................................................. 148MAPA 10.1 Predominncia de populao rural ou urbana 2000.................. 166MAPA 10.2 Rendimento da PEA do setor primrio 2000............................. 178MAPA 10.3 PEA agropecuria urbana 2000................................................. 179MAPA 10.4
Classificao dos municpios segundo a porcentagem da PEA e
do PIB nos setores primrio, secundrio e tercirio 2000......... 187MAPA 10.5 Tipologia dos municpios brasileiros rural-urbano 2000......... 192MAPA 11.1 ndice de Gini 2003.................................................................... 206MAPA 11.2 ndice de Gini 2003 (dados suavizados).................................... 207MAPA 11.3 rea dos imveis rurais pequenos, mdios e grandes 2003..... 211MAPA 11.4 Classificao das microrregies segundo a estrutura fundiria 2003.............................................................................................. 212MAPA 11.5 rea dos imveis rurais: evoluo 1992-2003.............................. 217MAPA 11.6
Nmero de imveis 2003 X nmero de estabelecimentos 2006.. 225
MAPA 11.7 rea dos imveis 2003 X rea dos estabelecimentos 2006......... 226MAPA 11.8 rea dos imveis de posse 2003............................................ 229MAPA 11.9 rea dos imveis de posse - 2003 (predominncia).................. 230MAPA 11.10 Posses e grilos 2003.................................................................. 231MAPA 11.11 Terras explorveis no exploradas 1998................................... 234MAPA 11.12 Terras explorveis no exploradas - 1998 (predominncia)........ 235MAPA 11.13 Uso da terra (predominncia) 2006........................................... 238MAPA 11.14 Uso da terra 2006...................................................................... 239MAPA 12.1 Tratores 2006............................................................................. 246MAPA 12.2 Soja: proporo na rea total de lavouras 2006........................ 257
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MAPA 12.3 Soja: evoluo da rea plantada - 1990-2006.............................. 258MAPA 12.4 Territrio e territorializao da produo de soja.......................... 260MAPA 12.5 Evoluo do rebanho bovino - 1990-2006.................................... 272MAPA 13.1 Famlias em ocupaes e famlias assentadas - 1988-2006........ 281MAPA 13.2 Imveis rurais e assentamentos rurais (Amaznia Legal)............ 285MAPA 13.3 Imveis rurais e assentamentos reformadores (Amaznia Legal) 285MAPA 13.4 Imveis rurais e assentamentos reformadores (Brasil)................ 286MAPA 13.5 Famlias assentadas e tipos de assentamento - 1988-2006........ 287MAPA 13.6 ndice de assentamento - 1988-2006........................................... 289MAPA 13.7 ndice de assentamento e famlias assentadas - 1988-2006........ 290MAPA 14.1 Trabalho escravo: naturalidade e libertao dos trabalhadoresescravizados - 1995-2006............................................................. 305MAPA 14.2 Trabalho escravo: libertao e destino dos trabalhadoresescravizados - 1995-2006............................................................. 306MAPA 14.3 Trabalho escravo: naturalidade e destino dos trabalhadoresescravizados - 1995-2006............................................................. 307MAPA 14.4 ndice de violncia contra pessoa no campo - 1996-2006............ 308MAPA 15.1 O Brasil agrrio............................................................................. 309
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Lista de pranchas
Pg.
PRANCHA 10.1 ndice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDH-M)........... 152
PRANCHA 10.2 Taxa de analfabetismo 2000.................................................. 153
PRANCHA 10.3 Insegurana alimentar 2004................................................... 155PRANCHA 10.4 Populao total e densidade demogrfica................................. 158PRANCHA 10.5 Populao urbana...................................................................... 161PRANCHA 10.6 Populao rural.......................................................................... 164PRANCHA 10.7 Migrantes na populao 2000................................................. 170PRANCHA 10.8 Taxa de masculinidade 2000.................................................. 171PRANCHA 10.9 PIB e PEA 2000...................................................................... 174PRANCHA 10.10 PIB e PEA - 2000 (predominncia dos setores)........................ 176PRANCHA 11.1 ndice de Gini - 1992 e 1998...................................................... 205PRANCHA 11.2 Imveis rurais 2003................................................................. 208PRANCHA 11.3 Imveis rurais: evoluo 1992-2003.......................................... 216PRANCHA 11.4 Estabelecimentos agropecurios: evoluo 1996-2006............ 222PRANCHA 11.5 Uso da terra............................................................................... 237PRANCHA 12.1 Pessoal ocupado....................................................................... 243PRANCHA 12.2 Mo-de-obra familiar e assalariamento 2006......................... 244PRANCHA 12.3 Valor da produo 2006.......................................................... 252PRANCHA 12.4 Lavouras temporrias - 2006 (prancha A)................................. 255PRANCHA 12.5 Lavouras temporrias - 2006 (prancha B)................................. 256PRANCHA 12.6 Lavouras permanentes 2006.................................................. 262PRANCHA 12.7 Extrativismo vegetal 2006....................................................... 265PRANCHA 12.8 Silvicultura 2006...................................................................... 267PRANCHA 12.9 Rebanhos 2006....................................................................... 269PRANCHA 12.10 Leite e ovos 2006.................................................................... 271PRANCHA 13.1 Ocupaes, assentamentos e perodos de governo - 1995-2006........................................................................................... 277PRANCHA 13.2 A luta pela terra - 1998-2006..................................................... 278PRANCHA 13.3 A conquista da terra - 1988-2006.............................................. 279PRANCHA 14.1 Violncia contra camponeses e trabalhadores rurais - 1986-2006........................................................................................... 296PRANCHA 14.2 Violncia contra posse e propriedade de camponeses etrabalhadores rurais - 1986-2006............................................... 297PRANCHA 14.3 Trabalho escravo....................................................................... 303
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Lista de figuras
Pg.
FIGURA 4.1 Mapa da Repblica Unida da Soja............................................. 63
FIGURA 5.1 As variveis visuais segundo Jacques Bertin............................... 68FIGURA 5.2 Cubo de MacEachren................................................................... 71FIGURA 5.3 Coremas propostos por Roger Brunet.......................................... 74FIGURA 5.4 Exemplos de modelos elementares do Brasil............................... 76FIGURA 9.1 Desflorestamento em forma de espinha de peixe na Amaznia 136
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Lista de grficos
Pg.
GRFICO 9.1 Desflorestamento na Amaznia - 1988-2007............................... 134
GRFICO 10.1 Evoluo da populao total - 1950-2000.................................... 156GRFICO 10.2 Evoluo da densidade demogrfica regional - 1950-2000......... 157GRFICO 10.3 Evoluo da populao urbana regional - 1950-2000.................. 160GRFICO 10.4 Evoluo da populao rural regional - 1950-2000...................... 163GRFICO 10.5 Migrao interestadual nas dcadas de 1980 e 1990.................. 169GRFICO 10.6 Evoluo da participao dos setores da economia no PIB -1990-2005..................................................................................... 172GRFICO 10.7 PIB primrio regional 2000........................................................ 173GRFICO 10.8 PEA primria regional 2000....................................................... 174GRFICO 10.9 PEA do setor primrio por classe de rendimento......................... 177GRFICO 11.1 Estrutura fundiria 2003............................................................. 209GRFICO 11.2 Evoluo do nmero e da rea dos imveis rurais por UF -1992-2003..................................................................................... 215GRFICO 11.3 Evoluo do nmero e da rea dos estabelecimentosagropecurios por UF - 1996-2006............................................... 221GRFICO 12.1 Agricultura no mercado mundial................................................... 251GRFICO 13.1 A luta pela terra e sua conquista - 1979-2006.............................. 277GRFICO 14.1 Assassinatos, ameaas de morte e tentativas de assassinato decamponeses e trabalhadores rurais - 1986-2006......................... 295GRFICO 14.2 Despejos e expulses da terra - 1986-2006................................. 297GRFICO 14.3 Trabalho escravo no campo brasileiro - 1986-2006..................... 302
Lista de quadros
Pg.
QUADRO 7.1 Elementos estruturais do agronegcio e do campesinato............ 120
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Lista de tabelas
Pg.
TABELA 10.1CLASSIFICAO - Comportamento da populao e dadensidade demogrfica nos grupos.............................................. 188
TABELA 10.2 TIPOLOGIA RURAL-URBANO - Comportamento da PEA nostipos............................................................................................... 190TABELA 10.3 TIPOLOGIA RURAL-URBANO - Comportamento do PIB nostipos............................................................................................... 190TABELA 10.4 TIPOLOGIA RURAL-URBANO - Comportamento da populaoe da densidade demogrfica nos tipos......................................... 191TABELA 10.5 TIPOLOGIA RURAL-URBANO - Distribuio dos municpios,
rea territorial e populao nos tipos............................................ 195TABELA 10.6 TIPOLOGIA RURAL-URBANO - Distribuio da PEA nos tipos.. 196TABELA 10.7 TIPOLOGIA RURAL-URBANO - Distribuio do PIB nos tipos.... 196TABELA 11.1 ndice de Gini 1992-1998-2003 e evoluo 1992-2003................ 204TABELA 11.2 Estrutura fundiria e ndice de Gini - 1992-1998-2003................. 209TABELA 11.3 Evoluo da estrutura fundiria - 1992-2003................................ 213TABELA 11.4 Evoluo do nmero e da rea dos imveis rurais por UF -1992-2003..................................................................................... 215TABELA 11.5
Evoluo do nmero e da rea dos estabelecimentos
agropecurios por UF - 1996-2006............................................... 220
TABELA 11.6 Imveis rurais (2003) X estabelecimentos agropecurios (2006) 223TABELA 11.7 Terras explorveis 1998............................................................ 233TABELA 11.8 Evoluo do uso da terra - 1996-2006.......................................... 236TABELA 12.1 Pessoal ocupado segundo grupo de rea total 1996................ 245TABELA 12.2 Agronegcio brasileiro 2006...................................................... 250TABELA 12.3 Lavouras temporrias................................................................... 254TABELA 12.4 Lavouras permanentes................................................................. 261TABELA 12.5 Extrativismo vegetal...................................................................... 264TABELA 12.6 Silvicultura..................................................................................... 266TABELA 12.7 Rebanhos e produo animal....................................................... 268TABELA 13.1 A luta pela terra e sua conquista - 1979-2006.............................. 276TABELA 13.2 Tipos de assentamentos rurais - 1988-2006................................ 282TABELA 13.3 Assentamentos no reformadores e assentamentosreformadores e perodos de governo............................................ 283
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Lista de abreviaturas
ACP Anlise de Componentes Principais
AFC Anlise Fatorial de Correspondncias
AMAP Association pour le Maintien dune Agriculture Paysanne
ASI Anti-Slavery International
CASID/ACEDICanadian Association for the Study of Internation Development /Association Canadienne dtudes du Dveloppement International
CF Constituio Federal
CGC Cartografia Geogrfica Crtica
CHA Classificao Hierrquica AscendenteCONF Confdration Paysanne
CPT Comisso Pastoral da Terra
DATALUTA Banco de Dados da Luta pela Terra
DDT Dicloro-Difenil-Tricloroetano
DETER Deteco de Desmatamento em Tempo Real
EMPAER Empresa Matogrossense de Pesquisa, Assistncia e Extenso Rural
EMPBRAPA Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuria
EUA Estados Unidos da AmricaFAO Organizao das Naes Unidas para a Agricultura e Alimentao
FCT Faculdade de Cincias e Tecnologia
FMI Fundo Monetrio Internacional
FNSEA Fdration Nationale des Syndicats dExploitants Agricoles
GETRAF Grupo Executivo de Represso ao Trabalho Forado
IBAMA Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renovveis
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica
IDH ndice de Desenvolvimento HumanoIDH-M ndice de Desenvolvimento Humano Municipal
IHEAL Institut des Hautes tudes de lAmrique Latine
IIRSA Iniciativa de Integrao da Infra-estrutura Regional Sul-americana
INCRA Instituto Nacional de Colonizao e Reforma Agrria
INPE Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
ITERRA Instituto Tcnico de Capacitao e Pesquisa da Reforma Agrria
MMA Ministrio do Meio Ambiente
MP Medida ProvisriaMST Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra
MTE Ministrio do Trabalho e Emprego
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NFU National Farmers Union
OCDE Organizao para a Cooperao e Desenvolvimento Econmico
OIT Organizao Internacional do Trabalho
PAC Poltica Agrcola Comum da Unio EuropiaPAC Plano de Acelerao do Desenvolvimento (Brasil)
PAM Produo Agrcola Municipal
PCA Paradigma do Capitalismo Agrrio
PEV Produo Extrativa Vegetal
PNRA Plano Nacional de Reforma Agrria
PPM Pesquisa Pecuria Municipal
PQA Paradigma da Questo Agrria
PRODES Programa de Clculo do Desflorestamento da AmazniaREGIC Regies de Influncia das Cidades
SIDRA Sistema IBGE de Recuperao Automtica
SIG Sistema de Informaes Geogrficas
SIT Secretaria de Inspeo do Trabalho
TDR Territorializao-Desterritorializao-Reteritorializao
UF Unidade da Federao
UNESP Universidade Estadual Paulista
ZEE Zoneamento Ecolgico-Econmico
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SUMRIO
Pg.
INTRODUO GERAL.................................................................................................. 25
1 ESPAO GEOGRFICO E TERRITRIO: CONCEITOS-CHAVEPARA A GEOGRAFIA................................................................................... 29
1.1 O espao geogrfico.................................................................................. 29
1.2 O territrio................................................................................................... 35
PARTE A
CARTOGRAFIA GEOGRFICA CRTICA: UMA PROPOSTATERICO-METODOLGICA......................................................................................... 42
INTRODUO............................................................................................... 43
2 QUAL CARTOGRAFIA GEOGRFICA?...................................................... 45
3 A CARTOGRAFIA GEOGRFICA BRASILEIRA......................................... 51
4 LEITURA DESCONSTRUCIONISTA DO MAPA........................................... 57
5 ABORDAGENS CARTOGRFICAS............................................................. 65
5.1 Semiologia grfica...................................................................................... 65
5.2 Visualizao cartogrfica............................................................................ 69
5.3 Modelizao grfica ou coremtica............................................................ 72
6 PROPOSTA TERICO-METODOLGICA DA CARTOGRAFIAGEOGRFICA CRTICA................................................................................ 78
PARTE B
ATLAS DA QUESTO AGRRIA BRASILEIRA.......................................................... 86
INTRODUO............................................................................................... 87
7 A QUESTO AGRRIA................................................................................ 90
7.1 A questo agrria na Geografia Agrria..................................................... 907.2 Questo agrria e campesinato................................................................. 91
7.3 A atualidade da questo agrria................................................................. 109
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8 A AGRICULTURA NA OCUPAO DO TERRITRIO BRASILEIRO......... 123
9 CONFIGURAO TERRITORIAL................................................................. 129
9.1 Os meios naturais e sua antropizao....................................................... 129
9.1.1 Ocupao predatria da Amaznia......................................................... 132
9.2 Unidades de conservao e terras indgenas............................................ 140
9.3 Vias de transporte...................................................................................... 144
9.4 Potencialidade agrcola.............................................................................. 148
10 CARACTERSTICAS SOCIOECONMICAS GERAIS................................. 150
10.1 Indicadores sociais...................................................................................... 150
10.2 Populao................................................................................................... 15610.2.1 Populao total........................................................................................ 156
10.2.2 Populao urbana................................................................................... 159
10.2.3 Populao rural....................................................................................... 162
10.2.4 Populao urbana e rural........................................................................ 165
10.2.5 Migrao.................................................................................................. 168
10.3 Produo e ocupao................................................................................. 172
10.4 O rural e o urbano...................................................................................... 179
10.4.1 As principais abordagens tericas sobre o rural e o urbano.................. 180
10.4.2 Proposta de tipologia para os municpios brasileiros............................. 183
10.4.2.1 Metodologia e elaborao................................................................... 185
11 ESTRUTURA FUNDIRIA............................................................................. 200
11.1 Posses e grilos........................................................................................... 226
11.2. Utilizao da terra....................................................................................... 232
12 AGROPECURIA.......................................................................................... 242
12.1 Pessoal ocupado........................................................................................ 242
12.2 Tratores...................................................................................................... 245
12.3 Produo agropecuria.............................................................................. 246
12.3.1 Lavouras temporrias............................................................................. 253
12.3.2 Lavouras permanentes........................................................................... 260
12.3.3. Extrativismo vegetal............................................................................... 263
12.3.4. Silvicultura.............................................................................................. 266
12.3.5. Pecuria e produo animal................................................................... 267
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13 A LUTA PELA TERRA E SUA CONQUISTA................................................ 274
14 VIOLNCIA NO CAMPO............................................................................... 293
15 A CONFIGURAO DA QUESTO AGRRIA BRASILEIRA.................... 309
CONCLUSES GERAIS................................................................................................ 319
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS.............................................................................. 322
APNDICES................................................................................................................... 333
APNDICE 01................................................................................................................. 334
APNDICE 02................................................................................................................. 347
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____________________________________________________________Introduo geral 25
INTRODUO GERAL
m 2004, quando esta pesquisa foi iniciada como dissertao de mestrado,
nosso objetivo era elaborar um atlas sobre a questo agrria brasileira a partir
de uma abordagem crtica. Para isso, alm das leituras sobre a questo
agrria, buscamos bibliografia sobre o mapa e a Cartografia Geogrfica que
subsidiassem sua utilizao na anlise da questo agrria. Dessas pesquisas bibliogrficas
resultaram duas questes essenciais sobre o mapa e a Cartografia Geogrfica: a) na
Geografia brasileira, de forma geral, o mapa e o mapeamento so negligenciados e sua
potencialidade para a anlise geogrfica pouco explorada; b) no havia uma elaborao
terico-metodolgica que contemplasse nossas concepes sobre a importncia do mapa
para a anlise geogrfica crtica. Por isso, alm de desenvolver o Atlas da Questo Agrria
Brasileira, passamos a nos preocupar com a elaborao de respostas a essas duas
questes, para o qu pesquisamos bibliografia nacional e estrangeira. Em um primeiro
momento, essas respostas seriam direcionadas especificamente fundamentao do uso
do mapa na anlise da questo agrria brasileira, contudo, associando as prticas na
elaborao do Atlas s leituras sobre o mapa e a Cartografia Geogrfica, tivemos a
necessidade e a possibilidade de apresentar uma proposta mais ampla: a Cartografia
Geogrfica Crtica (CGC). Desta forma, o objetivo do projeto havia sido ampliado e passou a
compreender, alm do Atlas, a proposio da CGC. Em 2006 o trabalho foi indicado para o
doutorado direto e passou a ser desenvolvido como tese de doutorado. O resultado
completo do trabalho est disponvel em www.fct.unesp.br/nera/atlas.
E
Por envolver Cartografia Geogrfica e Geografia Agrria, a organizao
deste trabalho particular. Esta particularidade reafirma seu objetivo de difundir o
mapeamento como processo de interesse comum s diversas especialidades da Geografia.
O trabalho iniciado com o captulo espao e territrio: conceitos-chave para a Geografia,
no qual apresentamos nossas referncias sobre esses dois conceitos, que so utilizados
tanto na proposta da CGC quanto na anlise da questo agrria. Em seguida, na parte A,
apresentamos a proposta terico-metodolgica da Cartografia Geogrfica Crtica e, na parte
B, est oAtlas da Questo Agrria Brasileira, desenvolvido a partir das proposies da
CGC. A proposta da CGC e o Atlas da Questo Agrria Brasileira, desenvolvidos
paralelamente, esto intimamente relacionados. A CGC surgiu das necessidades inerentes
ao desenvolvimento do Atlas e este, por sua vez, foi desenvolvido e constantemente
remodelado segundo as proposies da CGC.A CGC uma proposta terico-metodolgica baseada na leitura
desconstrucionista do mapa, uma teoria crtica proposta por J. Brian Harley (1989). Essa
http://www.fct.unesp.br/nera/atlashttp://www.fct.unesp.br/nera/atlas7/23/2019 Girardi, Eduardo_Tese Doutorado
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____________________________________________________________Introduo geral 26
leitura revisa a concepo de base positivista do mapa, que o assume como inquestionvel
e exato. Na teoria crtica do mapa so admitidos seus aspectos retricos e textuais, o que
permite reconhec-lo como indispensvel na anlise geogrfica e para o discurso
geogrfico. Na CGC, assumimos que esta concepo crtica s contemplada no processo
de mapeamento com a adoo, de forma associada, de trs abordagens cartogrficas: a
semiologia grfica, a visualizao cartogrfica e a modelizao grfica. Alm da adoo da
teoria crtica do mapa, a crtica de nossa proposta terico-metodolgica est em assumir os
fundamentos da Geografia Crtica e, por isso, enfatizar o uso do mapa para a anlise das
desigualdades e contradies do espao geogrfico e dos diferentes territrios. Desta forma,
embora tenha sido desenvolvida paralelamente ao Altas da Questo Agrria Brasileira, a
CGC pode ser adotada nas diversas especialidades da Geografia; uma proposta terico-
metodolgica para a Geografia. No desenvolvimento da CGC, alm da leitura
desconstrucionista do mapa e das trs abordagens cartogrficas, realizamos discusses
sobre a natureza da Cartografia Geogrfica e a situao atual do mapa na Geografia
brasileira, em especial na corrente crtica. Com a CGC, esperamos contribuir para a
compreenso do potencial analtico e discursivo do mapa e para a difuso do seu uso,
permitindo maior participao do gegrafo na produo do espao. Tambm esperamos que
esta proposta levante debates sobre a atual situao da Cartografia Geogrfica brasileira e
seus rumos na Geografia Crtica.
O Atlas da Questo Agrria Brasileira apresenta uma anlise da questo
agrria que tem o mapa como principal instrumento analtico. Para desenvolver o Atlas,
tomamos como referncia o paradigma da questo agrria, que enfatiza as contradies e
os conflitos no campo. A partir deste paradigma, estabelecemos nossos referenciais tericos
e posicionamentos, condutores de nossa anlise da questo agrria. No Atlas, alm de
temas da configurao territorial, caractersticas socioeconmicas e produo agropecuria,
enfatizamos o conflito entre campesinato e latifndio/agronegcio, a forma concentrada e
criminosa como a terra apropriada no pas, a desastrosa ocupao da Amaznia, a luta
pela terra, a poltica de assentamentos rurais e a violncia contra camponeses e
trabalhadores rurais. As investigaes foram principalmente no sentido de contextualizar os
temas analisados com o processo de desintegrao do campesinato e as conseqncias
perversas ocasionadas pelo latifndio e pelo agronegcio no campo brasileiro. Outro
aspecto central na anlise foi o papel desempenhado pelo Estado na soluo, manuteno
ou agravamento dos problemas da questo agrria. Por fim, foi possvel identificar as
principais configuraes da questo agrria no territrio e algumas de suas dinmicas e
tendncias. O Atlas est disponvel na internet (www.fct.unesp.br/nera/atlas) e, com ele,
esperamos fornecer informaes para pesquisadores das diversas reas do conhecimento
http://www.fct.unesp.br/nera/atlashttp://www.fct.unesp.br/nera/atlas7/23/2019 Girardi, Eduardo_Tese Doutorado
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____________________________________________________________Introduo geral 27
que se dedicam ao estudo do campo brasileiro e para os diversos seguimentos da
sociedade, em especial os movimentos socioterritoriais camponeses.
Um dos objetivos da tese chamar a ateno para o potencial analtico e
discursivo do mapa e, com isso, ampliar o seu uso na Geografia brasileira. O Atlas consiste
tambm em um exemplo desta potencialidade do mapa e, alm de demonstrar o seu
emprego, acreditamos ser necessrio fornecer ao leitor um material didtico sobre os
aspectos tcnicos e metodolgicos do mapeamento desenvolvido no trabalho. Por isso, no
apndice 02-A est o manual de utilizao do programa de cartomtica Philcarto, utilizado
no desenvolvimento do Atlas. O manual, alm de um guia tcnico para utilizar o programa,
tambm comporta explicaes sobre os princpios e a utilidade dos diversos tipos de
mapeamento, o que permite ao usurio desenvolver seus prprios ensaios de mapeamento.
A anlise da questo agrria brasileira foi desenvolvida principalmente
atravs do mapeamento, anlise de dados e leituras de obras referenciais. Desta forma,
embora grande parte da pesquisa tenha sido desenvolvida em gabinete, realizamos alguns
trabalhos de campo que contriburam para nossas anlises. Um foi para o Rio Grande do
Sul, onde conhecemos a produo fumageira, a vitivinicultura, projetos de assentamentos
cooperativos e o ITERRA. O oeste do Paran tambm foi visitado para conhecer para as
estratgias cooperativas do MST. Como caso emblemtico do agronegcio brasileiro, o
estado de Mato Grosso foi o destino de um terceiro trabalho de campo. L, visitamos os
municpios de Nova Mutum, Lucas do Rio Verde, Sorriso e Sinop, que se destacam pela
produo de gros, especialmente a soja. Nesses municpios, realizamos entrevistas com
representantes de empresas do agronegcio, madeireiras, autoridades do poder pblico
local, sindicato dos trabalhadores rurais, grandes e pequenos agricultores (inclusive
integrados cadeia de produo de aves) e coordenadores da EMPAER. Tambm,
durante o perodo de desenvolvimento da tese, participamos de vrios trabalhos de campo
na regio do Pontal do Paranapanema, estado de So Paulo, para a visita de
acampamentos e assentamentos rurais. Todos esses trabalhos de campo, embora no
tenham sido diretamente utilizados na tese atravs de relatos, foram indispensveis para
compreender os principais temas da questo agrria brasileira, de forma que, sem eles,
provavelmente alguns de nossos posicionamentos em relao questo agrria no fossem
possveis.
Outra atividade que contribuiu para o desenvolvimento de nossas anlises
e proposies foi a realizao de um estgio de doutorado na Frana. O estgio foi sediado
no Institut des Hautes tudes de lAmrique Latine (IHEAL) Paris III Sorbonne Nouvelle.
Foram dois os objetivos: a) analisar o estado da arte da Cartografia Geogrfica na Frana e
b) conhecer a agricultura de base familiar desse pas desenvolvido que uma potncia
agrcola e que, de forma geral, ilustra bem o caso da Unio Europia. Para esses dois
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____________________________________________________________Introduo geral 28
objetivos, procedemos com um levantamento bibliogrfico exaustivo sobre Cartografia (em
especial Cartografia Geogrfica) e agricultura francesa e europia na biblioteca do Institut de
Gographie de la Sorbonne. Especificamente para o segundo objetivo, conhecer o campo
francs, realizamos trabalhos de campo para seis regies francesas, onde foram visitados
treze estabelecimentos agropecurios de diversos tamanhos e orientaes produtivas e uma
usina de acar. Alm de entrevistar todos os agricultores, realizamos duas entrevistas que
contriburam para entender a agricultura francesa: com Nicolas Duntze, um dos
coordenadores nacionais da Confderation Paysanne, e com Patrick Ferrre, diretor
nacional da FNSEA. Assim, como resultado, o estgio permitiu: a) acesso s principais
obras, clssicas e recentes, da bibliografia francesa sobre a Cartografia Geogrfica,
possibilitando contextualizar a proposta da CGC no estgio atual da Cartografia Geogrfica
na Frana e b) consolidar ou repensar algumas de nossas concepes sobre a agricultura
em pases desenvolvidos.
Com relao ao levantamento bibliogrfico, alm das bibliotecas da
FCT/Unesp, USP, do Nera e do Institut de Gographie, tambm tivemos a oportunidade de
pesquisar em bibliotecas de trs universidades canadenses: University of Toronto, York
University (Toronto) e University of Saskatchewan (Saskatoon). Nessas trs bibliotecas a
pesquisa foi direcionada principalmente Cartografia Geogrfica. A vasta bibliografia a
consultada e coletada foi determinante para verificarmos a validade da proposio da CGC
em um contexto mais amplo da Cartografia Geogrfica que fosse alm da Geografia
brasileira. As principais obras teis ao trabalho foram utilizadas diretamente na tese e,
juntamente com o restante da bibliografia que nos serve como referncia indireta, merecer
nossa ateno em releituras para desenvolvimentos futuros de nossa proposta.
O trabalho associado com a Cartografia Geogrfica e a Geografia Agrria
nos impeliu reflexes sobre a teoria e o uso do mapa nas pesquisas geogrficas, de forma
que nesta pesquisa o mapa objeto de estudo e instrumento para anlise. Isso foi
determinante para a proposio da CGC. Os conceitos de espao geogrfico e territrio so
bases importantes para trabalhar com essas duas especialidades em conjunto, sendo que
nossas referncias conceituais sobre eles so apresentadas a seguir, no captulo 1.
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1. ESPAO GEOGRFICO E TERRITRIO: CONCEITOS-CHAVE
PARA A GEOGRAFIA
objetivo neste captulo definir as concepes de espao geogrfico e
territrio adotadas no trabalho. Apresentar essas definies em primeiro
lugar permite que nossas exposies sejam mais claras aos leitores quando
utilizamos esses dois conceitos, pois ambos do suporte proposta da
Cartografia Geogrfica Crtica e s anlises da questo agrria brasileira.
O1.1. O espao geogrfico
A abordagem do conceito de espao pela filosofia e pela fsica ponto de
partida para a maioria dos autores que contriburam para o estabelecimento do conceito de
espao geogrfico. Na busca por um objeto particular de estudo, as construes
epistemolgicas em Geografia tm sido desenvolvidas no sentido de construir um conceito
abrangente de espao geogrfico que compreenda a diversidade das pesquisas
Geogrficas.
Nosso ponto de partida, assim como o de diversos autores gegrafos que
trabalharam na construo do conceito de espao geogrfico, o trabalho de Henri Lefebvre
The production of space (La production de lespace) (1992 [1974]). A essncia desse
trabalho a proposio do espao socialcomo produto das relaes sociais de produo e
reproduo e, ao mesmo tempo, como suporte para que elas aconteam. Lefebvre trabalha
com espao social e os autores gegrafos utilizaram este conceito para, a partir de uma
interpretao geogrfica, propor o conceito de espao geogrfico. Esses dois conceitos
(espao social e espao geogrfico) so elaborados a partir da compreenso dos mesmoselementos da realidade; o que os diferencia a forma como as relaes sociais e os objetos
so enfatizados. Vejamos as principais proposies de Lefebvre quanto ao conceito de
espao social.
Para Lefebvre (1992 [1974]) o espao (social) um produto (social)
(p.26). Este espao compreende as relaes sociais e no pode ser resumido ao espao
fsico; ele o espao da vida social. Sua base a natureza ou espao fsico, o qual o
homem transforma com seu trabalho. Lefebvre afirma que a natureza no produz, ela cria;
somente o homem capaz de produzir atravs do trabalho. A natureza prov recursos parauma atividade criativa e produtiva (p.70) desempenhada pelo homem. O espao social para
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Lefebvre contm dois tipos de relaes a partir das quais o homem interage/modifica a
natureza: 1) as relaes sociais de reproduo, isto , as relaes bio-psicolgicas entre os
sexos e entre os grupos etrios, junto com a organizao especfica da famlia e 2) as
relaes de produo, ou seja, a diviso do trabalho e sua organizao na forma de funessociais hierrquicas. (p.32). Lefebvre prope que a produo do espao ocorre partir de
trs elementos: 1) prtica social(espaopercebido pelos indivduos), 2) representaes do
espao (espao concebido por cientistas, engenheiros, planejadores etc.) e 3) espao
representacional (espao diretamente vivido pelos indivduos).
Lefebvre considera que o modo de produo vigente em cada sociedade
determinante para a produo do espao. Cada modo de produo tem como resultado uma
produo espacial diferente, de forma que o espao produzido pelo processo de produo
e, ao mesmo tempo, d suporte ao seu desenvolvimento. O espao social agrupa as coisas
produzidas e envolve suas inter-relaes; ele permite aes de produo e consumo. O
espao social inclui objetos naturais e sociais, os quais so tambm relaes. Os objetos
possuem formas, mas o trabalho social os transforma, reorganizando suas posies dentro
das configuraes espao-temporais sem afetar necessariamente suas materialidades, seus
estados naturais. (p.76), ou seja, altera sua funo sem alterar sua forma. Tempo e espao
so inseparveis [..], espao implica em tempo e vice versa (p.118).
Quanto anlise do espao social, Lefebvre afirma que
metodologicamente e teoricamente relacionada a trs conceitos gerais: forma, estrutura e
funo (p.147), sendo que a anlise formal e funcional no elimina a necessidade de
considerar escala, proporo, dimenso e nvel. Isso tarefa da anlise estrutural, a qual
relacionada com relaes entre o todo e as partes, entre os nveis micro e macro. (p.158).
Em Espacio y Poltica (1976) Lefebvre afirma que
Do espao no se pode dizer que seja um produto como qualquer outro, umobjeto ou uma soma de objetos, uma coisa ou uma coleo de coisas, umamercadoria ou um conjunto de mercadorias. No se pode dizer que sejasimplesmente um instrumento, o mais importante de todos os instrumentos, opressuposto de toda produo e de todo o intercmbio. Estaria essencialmentevinculado com a produo das relaes (sociais) de produo. (p.34).
Em suma, podemos identificar as seguintes proposies em Lefebvre
(1992 [1974]) que contribuem para a formulao do conceito de espao geogrfico: a) o
espao no algo dado, ele produzido pelo homem a partir da transformao da natureza
pelo seu trabalho; b) as relaes sociais so constituintes do espao e a partir delas que o
homem altera a natureza; c) as relaes sociais de produo, consumo e reproduo
(social) so determinantes na produo do espao; d) o espao deve ser estudado a partir
das formas, funes e estruturas, e e) novas relaes podem dar funes diferentes para
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formas preexistentes, pois o espao no desaparece, ele possui elementos de diferentes
tempos.
Os gegrafos encontraram nessas proposies de Lefebvre a base para a
construo do conceito de espao geogrfico (objeto de estudo da Geografia) quepermitisse a insero e consolidao da Geografia como cincia social. Para o
estabelecimento do conceito de espao geogrfico foi necessrio geografizar essas
proposies de Lefebvre, ou seja, operacionaliz-las no contexto das teorias e prticas
prprias da Geografia. Milton Santos, na obra A natureza do espao (2002 [1996]),
apresenta a proposta de uma teoria geogrfica do espao que comporta elementos
propostos por Lefebvre, porm no se limita a eles. Santos (2002 [1996]) traz esses
elementos para a Geografia e apresenta o conceito de espao geogrfico que adotamos
neste trabalho.
Milton Santos (2002 [1996]) prope que o espao geogrfico formado
por um conjunto indissocivel, solidrio e tambm contraditrio, de sistemas de objetos e
sistemas de aes, no considerados isoladamente, mas como o quadro nico no qual a
histria se d. (p.63, grifo nosso). Para o autor, a natureza a origem, ela prov as coisas,
as quais so transformadas em objetos pela ao do homem atravs da tcnica. No
princpio, tudo eram coisas, enquanto hoje tudo tende a ser objeto, j que as prprias
coisas, ddivas da natureza, quando utilizadas pelos homens a partir de um conjunto de
intenes sociais, passam, tambm, a ser objetos. (p.65). Para Milton Santos, a tcnica a
principal forma de relao entre o homem e a natureza e definida como um conjunto de
meios instrumentais e sociais, com os quais o homem realiza sua vida, produz e, ao mesmo
tempo, cria espao. (p.29). Em Santos (2002 [1982]) o autor destaca a contradio do
processo de produo do espao: o espao que, para o processo produtivo, une os
homens, o espao que, por esse mesmo processo produtivo, os separa. (p.33).
Santos (2002 [1996]) ressalta que as tcnicas no devem ser analisadas
isoladamente, mas sim como um fenmeno tcnico funcionando como sistemas que
marcam as diversas pocas em que o humano e o no-humano so inseparveis.
(p.24). No se trata, pois, de apenas considerar as chamadas tcnicas da produo [...]
como um meio de realizar este ou aquele resultado especfico. S o fenmeno tcnico na
sua total abrangncia permite alcanar a noo de espao geogrfico. (p.37, grifo nosso).
As tcnicas sopropagadas de forma desiguale implantadas de forma seletiva no espao.
Os subsistemas tcnicos de diferentes perodos combinam-se nos diferentes territrios e
determinam as formas de vida ali possveis. (SANTOS, 2002 [1996]). Os sistemas tcnicos
envolvem formas de produzir energia, bens e servios, formas de relacionar os homens
entre eles, formas de informao, formas de discurso e interlocuo. (p.177). O principal a
ser compreendido na noo de tcnica de Milton Santos que ela um conjunto de
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instrumentos que a sociedade utiliza para alterar a natureza e criar o espao geogrfico;
a tcnica que une os sistemas de aes e os sistemas de objetos; ela permite a relao
homem-natureza e homem-homem e, desta forma, a produo do espao geogrfico.
Os objetos, que em conjunto com as aes formam o espao geogrfico,so tudo o que existe na superfcie da terra, toda herana da histria natural e todo
resultado da ao humana que se objetivou. Os objetos so esse extenso, essa
objetividade, isso que se cria fora do homem e se torna instrumento material de sua vida.
(p.75). So exemplos cidades, barragens, estradas, plantaes, florestas. Os objetos devem
existir como sistemas e no como colees; eles so teis aos grupos humanos, podendo
ser simblicos ou funcionais e s tm sentido se associados s aes e vice versa. A ao
um fato humano, pois depende do objetivo e da finalidade com a qual praticada, e nisso
o homem nico. As aes humanas no se restringem aos indivduos, incluindo, tambm,
as empresas, as instituies. (p.82). As necessidades naturais ou criadas so origem das
aes, as quais levam s funes. Essas funes, de uma forma ou de outra, vo
desembocar nos objetos. Realizadas atravs de formas sociais, elas prprias conduzem
criao e ao uso de objetos. (p.83). Sistemas de objetos e sistemas de aes interagem.
De um lado, os sistemas de objetos condicionam a forma como se do as aes e, de outro
lado, o sistema de aes leva criao de objetos novos ou se realiza sobre objetos
preexistentes. (p.63).
Os objetos so as formas espaciais e as aes so o contedo social. Ao
alterar o espao a sociedade altera a si mesmo. As formas de um determinado momento do
passado podem perder sua funo original e passar a ter outra funo no espao. Isso
chamado por Milton Santos de rugosidade. As rugosidades so o que fica do passado
como forma, espao construdo, paisagem; o que resta do processo de supresso,
acumulao, superposio, com que as coisas se substituem e acumulam em todos os
lugares. [Elas] se apresentam como formas isoladas ou como arranjos. (p.140). A
rugosidade o espao como acmulo desigual de tempos. (SANTOS, 2002 [1996]).
Como categorias analticas do espao geogrfico, Santos (2002 [1996])
prope a paisagem, a configurao territorial [ou configurao espacial], a diviso territorial
do trabalho, o espao produzido ou produtivo, as rugosidades e as formas-contedo. H
tambm a necessidade de estudar os recortes espaciais a partir de temas como o da regio
e do lugar, o das redes e das escalas. (p.22).
A categoria configurao espacial (ou configurao territorial) muito til
s nossas elaboraes. Ela diz respeito ao espao-materialidade, aos sistemas de objetos
onde a ao dos sujeitos, ao racional ou no, vem instalar-se para criar um espao.
(p.294). A configurao espacial foi proposta por Santos (1996 [1988]), quando o autor
concebe o espao a partir das relaes sociais e da configurao territorial. A definio de
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configurao territorial muito prxima quela utilizada pelo autor para definir os sistemas
de objetos, proposto por Santos (2002 [1996]). Porm, mesmo com esta nova proposio,
do espao formado por um conjunto indissocivel de sistemas de aes e sistemas de
objetos, Milton Santos no abre mo da categoria configurao territorial. Talvez seja pelomotivo do termo evocar de forma mais clara os sistemas naturais existentes em um dado
pas ou numa dada rea e [os] acrscimos que os homens superimpuseram a esses
sistemas naturais. (p.62). Nesse sentido, utilizamos a categoria configurao territorial em
nossas proposies como referncia aos sistemas de objetos.
Santos (2002 [1996]) diferencia o espao social dos socilogos (que
diferente do espao social proposto por Lefebvre, embora tambm possa ter bases na sua
teoria) e o espao geogrfico. No espao geogrfico, as aes e os objetos so
indissociveis e no podem ser considerados separadamente, pois desta forma no tm
sentido. O espao social est contido no espao geogrfico. Os objetos s tm sentido a
partir da ao humana, a qual resulta nos objetos e realizada sobre eles.
Milton Santos trabalhou para estabelecer uma teoria geogrfica social
crtica e por isso se dedicou principalmente s elaboraes tericas, de forma que enfatizou
o resgate de conceitos, categorias e proposio de outros autores. O trabalho de Santos
(2002 [1996]) extremamente complexo e amplo, de forma que pode contemplar, como
referncia terica, grande parte da diversidade de estudos geogrficos. Em nosso trabalho
no pretendemos contemplar todas as elaboraes de Milton Santos e nem desenvolver
uma leitura estritamente miltoniana, diretamente atrelada aos conceitos e categorias
apresentados pelo autor. Nosso objetivo utilizar a proposio essencial de espao
geogrfico de Milton Santos na conduo geral de nossas elaboraes e anlises.
Outro gegrafo que apresenta contribuies para o estudo do espao
geogrfico Roger Brunet. Este autor, no mesmo sentido de Milton Santos, porm no
contexto da Geografia francesa, apresenta na obra Le dchiffrement du monde (2001
[1990]), uma proposio de estruturao conceitual e metodolgica para a Geografia. Suas
proposies se diferenciam por inclurem, alm das reflexes tericas, a nfase na
operacionalidade dos conceitos; ele constri seu trabalho a partir de um exerccio de
elaborao terica e demonstrao, o que inclui o mapa. Uma das principais proposies do
autor a coremtica1, uma proposta terico-metodolgica para a anlise do espao
geogrfico com a qual o autor vem trabalhando desde a dcada de 1980. A concepo de
espao geogrfico apresentada por Brunet semelhante quela apresentada por Milton
Santos: o homem produz (ou cria) o espao a partir da alterao da natureza por meio de
1 Aprofundamos as discusses sobre a coremtica (ou modelizao grfica) na seo 5.2.
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seu trabalho. Brunet define o espao como produto que se torna condio de existncia de
seu prprio produtor. (p.18).
Para Brunet (2001 [1990]) o espao geogrfico formado pelo conjunto
de populaes, por suas obras, suas relaes localizadas, pelo seu meio de vida [...]. Eleno pode ser confundido com os objetos que o povoam [...]. Ele nasce com o trabalho das
sociedades e s tem fim com ele. (p.15). O autor afirma que a proposta de um espao
geogrfico traz como originalidade a realidade dos lugares diferenciados, tomados no
conjunto de suas relaes e de suas interaes, e o funcionamento de leis prprias
extenso, ao espaamento, distncia e gravitao. (p.16). Para Brunet a extenso (no
sentido de superfcie) indispensvel para compreender o espao porque permite a
localizao e a distncia. A diferenciao espacial fundamental para Brunet. O espao
geogrfico um lugar da diferena fundadora. Ele nasce da diferenciao dos lugares e de
sua comunicao. (p.113). Brunet destaca que o espao possui a propriedade de ser
localizvelatravs dos diferentes lugares, os quais so nicos. O espao geogrfico no
nem o espao abstrato, homogneo, isotrpico, contnuo e infinito das teorias econmicas,
nem o espao fsico (dito natural). Ele deve ser visto como produto, atravessado por
campos de foras, constitutivamente anisotrpico e mesmo fundamentalmente
dessimtrico. (p.15).
Brunet considera cinco domnios de ao fundamentais das sociedades no
espao:habitar(abrigar, alojar), apropriar(possuir), explorar(produzir), trocar(comunicar) e
organizar (gerir). Esses domnios so encontrados em todas as sociedades (antigas e
modernas) e a partir deles a sociedade produz o espao. Para Brunet o conceito de
produo do espao no deve ser confundido com o conceito de produo no sentido
econmico; deve ser entendido em seu sentido amplo, filosfico. O autor escreve que a
humanidade produz sentido, pensamento, obras e eventos da mesma forma que bens e
mercadorias. Se produz tambm espao. (p.20).
De acordo com Brunet (2001 [1990]) o espao no nada sem seus
criadores, que so ao mesmo tempo seus usurios (p.33); ele produzido por um conjunto
de atores que possuem interesses convergentes ou divergentes, so cooperativos ou
concorrentes. Cada ator possui sua estratgia, interesse e representao na produo do
espao. Seus objetivos se cruzam e so fonte de conflitos. Esses atores tm poderes
desiguais e uma avaliao adequada dos pesos respectivos e das interaes dos atores
necessria para compreender um espao. (p.59). Seis grandes categorias de atores so
listadas por Brunet: o indivduo (e/ou a famlia), os grupos, as coletividades locais, o Estado,
a autoridade supranacional e as empresas. Os atores formam o sistema de atores que
mantm trocas e tenses em dois nveis: entre atores da mesma natureza e entre atores de
natureza diferente. (p.53). Na produo do espao, os sistemas de foras resultantes da
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interao entre os diferentes tipos de atores cria formas espaciais especficas, as quais
Brunet denomina figuras geogrficas. sobre a anlise dessas figuras geogrficas que o
autor vai estabelecer sua metodologia de anlise espacial - a coremtica (ver seo 5.2).
O conceito de espao geogrfico apresentado por Roger Brunet semelhante quele proposto por Milton Santos. Brunet apresenta elementos de anlise
importantes s nossas proposies, e, assim como as proposies de Milton Santos, os
utilizaremos na conduo de nossas anlises e proposies.
O conceito de espao geogrfico contribui para o avano da Geografia por
englobar simultaneamente o concreto e abstrato a partir de uma abordagem relacional. Esta
concepo busca fundir as vertentes geogrficas que compreendem o espao estritamente
como materialidade e aquelas que buscam explicaes exclusivamente sociais. Como
afirma Dollfus (1970), o espao geogrfico se faz e evolui a partir de conjuntos de relaes,
mas essas relaes se estabelecem em um quadro concreto, aquele da superfcie da Terra.
(p.6). Tanto as relaes sociais quanto os elementos fsicos so importantes na anlise
geogrfica do espao. Outro aspecto importante que confere geograficidade ao conceito de
espao geogrfico a diferenciao espacial, ou seja, o espao formado por um conjunto
de lugares diferentes, resultado de interaes particulares entre objetos e relaes. A
compreenso das causas, caractersticas e conseqncias desta diferenciao um dos
principais objetivos da Geografia.
As concepes apresentadas nesta seo contribuiro para a estruturao
terica e nas anlises em nosso trabalho. O espao geogrfico, conceito amplo, como j
afirmamos, requer para sua anlise outros conceitos ou categorias analticas, dos quais
alguns j foram relacionados e definidos. O territrio um dos conceitos que auxiliam na
anlise do espao geogrfico, pois mais operacionalizvel. Ele tambm amplo e diverso
e, em alguns casos, muito semelhante ao conceito de espao geogrfico. Por isso, em
nosso trabalho consideramos que os conceitos de espao geogrfico e territrio so
indissociveis na anlise geogrfica. Na prxima seo apresentamos nossas
consideraes sobre o conceito de territrio e a sua indissociabilidade do espao geogrfico.
1.2. O territrio
Nesta seo, nosso objetivo contextualizar e definir as formas como o
territrio utilizado no trabalho, visto a diversidade de usos do conceito. Partimos do
princpio de que para a anlise geogrfica essencial compreender os conceitos de espaogeogrficoe territrio como indissociveis, pois o territrio formado a partir do espao. A
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anlise geogrfica atravs do conceito de territrio pressupe analisar o espao a partir de
relaes de poder.
Diversos autores da Geografia se debruam sobre o conceito de territrio,
sendo recorrentes nos trabalhos a anlise etimolgica, das razes filosficas e da biologia. consensual que o territrio indissocivelda noo de podere que limitante conceb-lo
unicamente como os limites poltico-administrativos dos pases. O territrio deve ser
estudado tomando como referncia o espao, pois ele formado a partir do espao
geogrfico, da a indissociabilidade entre os dois. Cada autor apresenta uma viso particular
de territrio, sendo ela influenciada pela realidade estudada, por seus objetivos e por sua
concepo de espao.
A obra Por uma Geografia do poder, de Claude Raffestin (1993 [1980]),
uma importante referncia para a construo do conceito de territrio na Geografia.
Contudo, encontramos limitaes na utilizao das proposies de Raffestin (1993 [1980]).
O autor conceber o espao como algo dado, ponto de partida, o que diferente de nossa
concepo de espao geogrfico. Raffestina considera o espao como receptculo, o
espao , de certa forma, dado como se fosse uma matria-prima. Preexiste a qualquer
ao. Local de possibilidades, a realidade material preexistente a qualquer conhecimento
e a qualquer prtica. (p.144).
No utilizar a concepo de territrio apresentada por Raffestin (1993
[1980]) no quer dizer que no possamos dialogar com o autor e utilizar algumas de suas
proposies. A principal contribuio de Raffestin a proposio de uma abordagem
relacionaldo territrio, na qual ele indissocivel dopoder. Tomando esta proposio como
referncia, partimos do princpio de que toda relao de poder desempenhada por um
sujeito no espao produz um territrio. A intensidade e a forma da ao de poder nas
diferentes dimenses do espao originam diferentes tipos de territrios. Souza (2003)
enfatiza a dominao e a influncia para o entendimento do territrio e prope que
essencial saber quem domina ou influencia e como domina ou influencia esse espao? [e
tambm] quem influencia ou domina quem nesse espao, e como?. (p.79). Desta forma,
assumimos que, dependendo dos objetivos do sujeito que produz o territrio, a ao de
poder pode configurarapropriao2, dominao ou influncia.
Compreendemos que essas relaes de poder so desempenhadas pelos
sujeitos que produzem o espao e tm objetivo de criar territrios, aos quais denominamos
sujeitos territoriais. Esses so os mesmos sujeitos apresentados por Brunet (2001 [1990]): o
2
Apropriao diz respeito propriedade, vivncia e representao do espao por um grupo, o que levaria elaboraode um territrio no sentido de espao vivido. Sobre isso, Lefebvre (1992 [1974]) afirma que apropriao referente aum espao natural modificado para servir s necessidades e possibilidades do grupo pelo qual tenha sido apropriado.Propriedade no sentido de posse , na melhor das hipteses, uma precondio necessria, e mais geralmente um meroepifenmeno, de uma atividade apropriadora, da qual a maior expresso a obra de arte. (p.165).
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indivduo (e/ou a famlia), os grupos, as coletividades locais, o Estado, a autoridade
supranacional e as empresas. Ao exercerem seu poder no espao para a criao de
territrios, os sujeitos promovem o processo de territorializao-desterritorialilzao-
reterritorializao (TDR). Para caracterizar a disputa entre os sujeitos no processo de TDRpodemos utilizar a noo depoderproposta por Raffestin (1993 [1980]), que a define como
um processo de troca ou de comunicao quando, na relao que se estabelece, os dois
plos fazem face um ao outro ou se confrontam. As foras de que dispem os dois parceiros
(caso mais simples) criam um campo: o campo do poder. (p.53).
Com base nas proposies de Fernandes (2005a e 2005b) sobre territrios
materiais