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JETHER BENEVIDES GAROTTI JNIOR
Csar Camargo Mariano,Cristvo Bastos e Gilson Peranzzetta:Uma anlise musical das tcnicas de acompanhamento pianstico
na msica popular brasileira no final do sculo XX.
Dissertao apresentada ao Curso deMestrado em Msica do Instituto de Artes daUNICAMP como requisito parcial para aobteno do ttulo de Mestre em Msica.
Orientador: Prof. Dr. Antonio Rafael dosSantos
Campinas2007
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FICHA CATALOGRFICA ELABORADA PELA
BIBLIOTECA CENTRAL DA UNICAMP
Bibliotecrio: Helena Joana Flipsen CRB-8 / 5283
Ttulo e subttulo em ingls: Csar Camargo Mariano, Cristvo Bastos e
Gilson Peranzzetta : a musical analysis of the techniques of pianisticaccompaniment in Brazilian popular music at the end of the 20th Century.
Palavras-chave em ingls (Keywords): Mariano, Csar Camargo. 2. Bastos,Cristvo, Peranzzetta, Gilson, Accompaniment, Musical, Piano, Music -Brazil.
rea de Concentrao: Fundamentos Tericos.
Titulao: Mestre em Msica.
Banca examinadora: Emerson de Biaggi, Gilmar Roberto Jardim.Data da Defesa: 23-02-2007.
Programa de Ps-Graduao em Msica.
Garotti Jnior, Jether Benevides.G19c Csar Camargo Mariano, Cristvo Bastos e Gilson
Peranzzetta : uma anlise musical das tcnicas de acompa-nhamento pianstico na msica popular brasileira no final dosc. XX / Jether Benevides Garotti Jnior. -- Campinas, SP :2007.
Orientador: Antonio Rafael dos Santos.
Dissertao (mestrado) - Universidade Estadual deCampinas, Instituto de Artes.
1. Mariano, Csar Camargo. 2. Bastos, Cristvo.3. Peranzzetta, Gilson. 4. Acompanhamento musical.5. Piano. 7. Msica - Brasil. I. Santos, Antonio Rafael dos.II. Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Artes.III. Ttulo.
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Dedico este trabalho minha esposa
Ariadne Junqueira Monteiro Garotti e aos
nossos filhos, Giovanni Garotti e Luigi
Garotti, seres nicos que me acompanham
nesta minha trajetria, ensinando-me a ser
um Homem Melhor a cada dia.
Professora Sofia Helena Freitas
Guimares de Oliveira, por ter me
acompanhado com amor e carinho nos
meus primeiros acordes.
Aos meus pais, Jether Benevides Garotti e
Maria de Lourdes Ribeiro Garotti, pela
oportunidade desta vida.
E ao meu Mestre, Dr. Celso Charuri, por
me ensinar a compreender os
acompanhamentos da VIDA com
RESPEITO e PRINCPIOS.
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AGRADECIMENTOS
Ao Prof. Dr. Rafael Carvalho dos Santos pela amizade e pela participao
como orientador neste trabalho, meu eterno agradecimento. Ao Instituto de Artes
da UNICAMP, na pessoa do seu diretor Prof. Dr. Jos Roberto Zan, onde tive a
oportunidade de dar um grande rumo ao meu crescimento cientfico e profissional.
cantora Zizi Possi, com quem trabalho h 17 anos como pianista,
acompanhador e sideman, por ter me dado a inspirao de fazer este trabalho. A
Csar Camargo Mariano, minha referncia pianstica desde a infncia. A Cristvo
Bastos, Gilson Peranzzetta e Leny Andrade, que prestaram valiosas informaes
para a realizao deste trabalho. Ao grande amigo Prof. Dr. Gilmar Jardim, por
tudo que aprendi com ele e pela presena nesta banca examinadora. Ao grande
amigo Prof. Dr. Emerson de Biaggi, pela amizade, pelo grande incentivo que tive
para desenvolver este trabalho e pela presena nesta banca examinadora. Ao
meu grande amigo Marcelo Mariano, pelo exemplo de msico que, com certeza,
ser uma das grandes referncias musicais por toda a minha vida. Ao amigo
Ricardo Luiz Marcelo, pelo carinho, amizade e grande contribuio. A minhagrande amiga Camila Flaborea pelo carinho, amizade e valoroza ajuda nesta
pesquisa. A Mariane Janikian pela estimada ajuda e profissionalismo, dignos de
Verdadeiros Amigos que trabalham para fazer desse mundo, um lugar melhor.E
a todas as pessoas e entrevistados que participaram contribuindo para a
realizao deste trabalho, direta ou indiretamente, meu agradecimento.
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"Temos por PRINCPIO evoluir o homem,
porque no acreditamos que o homem
seja produto do meio, mas sim que o meio
produto do Homem."
Dr. Celso Charuri
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RESUMO
A presente dissertao tem por propsito investigar os elementos
constituintes da elaborao do acompanhamento pianstico na msica popular
brasileira na segunda metade do sculo XX, atravs de anlises de entrevistas e
de peas de piano e voz, transcritas de gravaes feitas pela cantora Leny
Andrade com os pianistas Csar Camargo Mariano, Cristvo Bastos e com
Gilson Peranzzeta. Partindo do prprio conceito de acompanhamento, de sua
definio e exemplificao no cenrio musical, esta pesquisa procura mostrar
tambm seus desdobramentos no mercado de trabalho como a definio e
atuao do termo sideman nos dias de hoje. Aspectos comportamentais so
tambm analisados aqui e colocados frente prtica do acompanhamento
pianstico e de seus praticantes, na medida em que todos acionam processos
simultneos de influncia e respeito mtuos.
Dessa forma, as concluses desta pesquisa serviro para descrever de
maneira mais detalhada e minuciosa todo o processo que envolve essa atividade
musical, to interiorizada1
para muitos que a praticam e, ao mesmo tempo, tosuperficialmente compreendida por outros que tentam pratic-la.
1Discutiremos este termo mais a diante.
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ABSTRACT
The main purpose of the present dissertation is to investigate the
elements that constitute the development of pianistic accompaniment in Brazilian
popular music in the second half of the twentieth century. This will be carried out
through the analysis of interviews and pieces for piano and voice, transcribed from
recordings made by female singer Leny Andrade with pianists Csar Camargo
Mariano, Cristvo Bastos, and Gilson Peranzzeta. Based on the concept of
accompaniment and its definition and exemplification in the music scene, this study
aims also to show its extensions in the labor market like the definition for the term
sideman and the sidemans present role. Behavioral aspects are also analyzed
and applied to the practice of pianistic accompaniment and its performers, as all
carry out simultaneous processes of mutual influence and respect.
Therefore, the conclusions drawn from this study will help describe in
more detail and more thoroughly the whole process involved in this musical pursuit,
which for many performers is so internalized, albeit so superficially understood by
others who attempt to accomplish it.
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SUMRIO
INTRODUO 1
1 ASPECTOS CONCEITUAIS E AS VISES PARTICULARES
DE CSAR CAMARGO MARIANO, CRISTVO BASTOS
E GILSON PERANZZETTA 2
1.1 Aspectos conceituais 3
1.2 Os pianistas suas biografias 9
1.2.1 Csar Camargo Mariano 9
1.2.2 Cristvo Bastos 12
1.2.3 Gilson Peranzzetta 14
1.2.4 O acompanhamento pianstico a partir da viso de Csar Camargo
Mariano, Cristvo Bastos e Gilson Peranzzetta 16
2 A INVESTIGAO DOS ELEMENTOS NOS ACOMPANHAMENTOSPIANSTICOS. 29
2.1 Anlise das transcries 30
2.1.1 Voc vai ver Tom Jobim e Ana Jobim 31
2.1.2 Acontece Cartola 66
3 CONCLUSES 88
3.1 Sistematizao 90
3.2 Consideraes finais 94
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REFERNCIAS 97
ANEXO 1 ENTREVISTAS 100
Entrevista com Csar Camargo Mariano 101 Entrevista com Cristvo Bastos 111
Entrevista com Gilson Peranzzetta 120
Entrevista com Leny Andrade 130
Entrevistas Revista Backstage Sideman 139
Entrevista com amigos e colegas 143
ANEXO 2 TRANSCRIES E ANLISES 151
Voc vai ver verso de Tom Jobim 152
Voc vai ver anlise 154
Voc vai ver verso de Leny Andrade e Cristvo Bastos 157
Voc vai ver anlise 166
Voc vai ver verso de Leny Andrae e Csar Camargo Mariano 170
Voc vai ver anlise 180
Acontece - verso de Cartola 185
Acontece - anlise 187
Acontece verso de Leny Andrade e Gilson Peranzzetta 190
Acontece anlise 201
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INTRODUO
A presente dissertao tem com objetivo analizar as tcnicas deacompanhamento pianstico na msica popular brasileira do final do sculo XX,
atravs de transcries de gravaes feitas pela cantora Leny Andrade
acompanhada pelo pianista, arranjador e produtor Csar Camargo Mariano, num
arranjo pianstico de Voc vai ver, de Antonio Carlos Jobim, no LP Ns, de 1984,
da gravadora Velas; pelo pianista e arranjador Cristvo Bastos, num outro arranjo
pianstico do mesmo tema de Jobim para o LP Antnio Carlos Jobim Letra e
Msica, de 1995, da gravadora Lumiar e em outro projeto, acompanhada pelo
pianista e arranjador Gilson Peranzzetta em um arranjo pianstico de Acontece,
tema de Cartola no LP independente Cartola 80 Anos, gravado em 1987.
Atravs da anlise das transcries e de entrevistas com os msicos
citados, comparo seus processos individuais e coletivos de criao dos
acompanhamentos piansticos e, at mesmo atravs do relacionamento com a
cantora em questo seja ele profissional ou pessoal , procurando mostrar um
panorama da atuao do pianista acompanhador-arranjador no mercado detrabalho, em projetos de piano e voz nos dias de hoje.
Este projeto tem uma importncia especial por se tratar de um assunto
ainda pouco discutido por muitos dos msicos que exercitam essa prtica musical
no mercado de trabalho, bem como ajudar aos interessados em desenvolver essa
tcnica a ter elementos mais definidos e ordenados para desenvolverem seus
prprios trabalhos de acompanhamento pianstico com conscincia.
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CAPTULO I ASPECTOS CONCEITUAIS E AS
VISES PARTICULARES DE CSAR CAMARGO
MARIANO, CRISTVO BASTOS E GILSONPERANZZETTA.
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1.1 ASPECTOS CONCEITUAIS
Na msica popular ocidental do sculo XX, a melodia acompanhada temsido um dos gneros mais usados de composio. Neste contexto, percebe-se
uma crescente relao entre solistas e acompanhadores, onde a liberdade e o
dilogo criativo entre eles acaba criando uma variedade imensa de possibilidades
interpretativas. Essas possibilidades interpretativas e criativas acabam propiciando
ao msico acompanhador um destaque e um comportamento diferenciado em seu
meio de atuao.
O que acompanhar? De que maneira?
Em busca da significado do termo acompanhamento, percorreremos
antes algumas definies de diversas fontes.
Em Michaelis Moderno Dicionrio da Lngua Portuguesa2,
encontramos a definio de acompanhamento como o de fazer
companhia a, ir em companhia de. Tomar parte em
(acompanhamento ou cortejo): Acompanhar enterros. Escoltar:
Acompanhar um prisioneiro. Seguir a mesma direo de:
Acompanhe o trajetodo nibus. Imitar, seguir: Acompanhara moda.
Seguir com instrumento (a parte cantante da msica, ou o
instrumento principal). Conduzir cerimonialmente, seguir em sinal
de honra: Acompanhar o andorna procisso. Seguir com ateno,
com o pensamento ou com o sentimento (Missa). Ser da mesma
opinio, da mesma poltica. Viver na companhia de. Fazer
acompanhamento musical ao prprio canto. Cercar-se, rodear-se.
2ACOMPANHAMENTO. In: Michaelis Modernos Dicionrio da Lngua Portuguesa, disponvel em
www.uol2.com.br/michaelis . Acesso dia 25 de maro de 2003.
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Notamos que, aqui, o significado da palavra refere-se a um movimento
de duas aes paralelas, identificadas como sendo uma delas a ao primria ou
principal, e outra ao secundria, que sustenta e d suporte ao primria.
No Merriam-Webster OnLine Dictionary3 encontramos a definiomusical de acompanhamento como parte instrumental ou vocal designada a dar
suporte uma melodia. Aqui vemos o termo acompanhamento musical como
uma parte secundria na performance musical, com a responsabilidade de
sustentar a melodia principal.
Mas no livro Fundamentos da Composio Musical4 de Arnold
Schoenberg, que acredito ter encontrado a definio que, de um modo geral,
melhor corresponde ao que acontece no mbito musical. Schoenberg diz que oacompanhamento no deve ser uma mera adio melodia, deve ser o mais
funcional possvel e, nos melhores casos, atuar como complemento s essncias
de seu assunto: tonalidade, ritmo, fraseio, perfil meldico, carter e clima
expressivo. Deve revelar, tambm, a harmonia inerente ao tema, estabelecer um
movimento unificador, satisfazer s necessidades e explorar os recursos
instrumentais (SCHOENBERG, 1991, p. 107).
Aqui, encontramos um sentido de interao, parceria e cumplicidade
entre o solista e o acompanhador, valorizado pela sua responsabilidade. Ao se
preocupar em desenvolver o acompanhamento da pea musical com
competncia, colocando em destaque o solista, o acompanhador se valoriza,
percorrendo recursos de seu instrumento sem se tornar solista, destacando-se
sem perder o foco de sua funo. Como diz Peranzzetta, embelezar uma coisa
sem tomar para si. Na msica popular isso pode ter diversos desdobramentos
onde os acompanhadores acabam desempenhando funes at de diretores
musicais, arranjadores e maestros.
3ACOMPANHAMENTO. In: Merrian-Webster OnLine Dictionary. Disponvel em www.m-w.com.Acesso dia 26 de maro de 2003.4SCHONBERG, ARNOLD, Fundamentos da Composio Musical, So Paulo, Editora USP, 1991
(Coleo Ponta;v.3)
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Em entrevista Maria Fortuna publicada na Revista Backstage, Luciano
Alves diz que o msico acompanhador acaba se tornando um msico mais
completo, um maestro, que acompanha e que possui um status elevado de
profissional de apoio para o artista. Ele se torna um sideman (FORTUNA, 2003,pag 23).
Sideman termo que foi muito usado na msica popular americana na
poca das big bands:segundo o dicionrio Merriam-Webster Online5, este termo
significa membro de um grupo ou orquestra de jazzou swing. Outro dicionrio
on-line, The Free Dictionary6, refere-se a esse termo como um membro de um
grupo de jazz que no o lder, nem um solista convidado, ou seja, com uma
funo diferenciada dos demais membros do grupo. Mas, na enciclopdia on-lineWikipedia7, por exemplo, esse termo tem um significado mais abrangente: um
msico profissional que contratado para tocar ou gravar com um grupo de que
ele normalmente no faz parte como membro fixo. Eles so geralmente
requisitados pela capacidade de se adequar facilmente a diversos estilos
musicais. Com o tempo, muitos deles acabam investindo em seus prprios
trabalhos solo ou grupos.
Mas, para Maria Fortuna, na mesma entrevista, sideman o msico
que d suporte ao artista, a pessoa especializada em acompanhar solistas dos
mais diversos estilos em gravaes e, na maioria das vezes, faz os arranjos das
msicas.
Percebe-se aqui que, em certos contextos, o termo sideman est ligado
aspectos de disponibilidade musical, enquanto que, em outros contextos,
5
SIDEMAN.In: Merriam-Webster On Line disponvel em http://www.m-w.com . Acesso em 23 demaro de 2003.6SIDEMAN.In:The Free Dictionary. Disponvel em www.thefreedictionary.com. Acesso em 23 de
maro de 2003.7 SIDEMAN.In: Wikipedia Free Encyclopedia. Disponvel em http://en.wikipedia.org/wiki/Main_Page.Acesso em 23 de maro de 2003.
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relaciona-se aspectos de criatividade musical, o que cria uma certa divergncia
entre os msicos, dependendo de sua natureza e de seus objetivos profissionais.
Em entrevista concedida a esta pesquisa, Csar Camargo Mariano diz
que o sideman pau para qualquer obra, sabe ler msica e serve como suporteao artista. E ainda acrescenta: pode-se viver a vida toda como sideman e ser
realizado como eu, com muito orgulho e honra. Gilson Peranzzetta discorda. Eu
no No sou sideman... Eu sempre me considero um solista, sempre me
preparei para isso. Quando estou fazendo um trabalho de duo, como o trabalho
que fao h muito tempo com Mauro Senise, ali so dois solistas dividindo no
palco suas emoes. Ningum ali est acompanhando ningum. Para mim um
sideman est ali para apoiar o outro, mas no eu.Nota-se que existem vrias maneiras de se entender o termo sideman.
Para alguns, pode ter um significado at depreciativo, de submisso e
complemento, enquanto que, para outros, o mesmo termo significa um papel de
destaque, realizao e responsabilidade. De um lado, Mariano considera sideman
um profissional que realiza, que direciona, que participa da concepo dos
arranjos e que tem a responsabilidade de prover o projeto de todos os recursos
disponveis, enquanto que Peranzzetta - que tem um entendimento mais prximo
do real significado da palavra original na msica popular americana - considera
essa atividade atrelada a uma concepo j estabelecida, onde o msicocontribui
somente com aquilo que lhe requisitado, sem qualquer tipo de questionamento
ou possibilidade de contribuio esttica. Neste caso, o profissional requisitado
tem de ter, alm de tudo, uma facilidade de se adequar, de se disponibilizar a
realizar o projeto proposto por outros msicos ou intrpretes.
Atravs da minha observao da atividade do sideman no mercado de
trabalho, vou considerar para esta pesquisa o significado que Mariano d a estetermo, ou seja: um profissional que tem a qualidade de acompanhar e ao mesmo
tempo orquestrar, arranjar, proporcionar elementos e fazer com que o artista saiba
e reconhea que o resultado final aconteceu por causa do seu trabalho.
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Dessa forma acompanhar um artista contribuindo com ele e ajudando-o
a realizar suas idias estticas atravs de arranjos e orquestraes, acaba sendo
uma das caractersticas que mais diferenciam o sideman do arranjador tradicional
que, em muitas situaes, trabalha no arranjo a uma certa distncia do intrprete,entregando as partes prontas aos msicos dentro do estdio para a gravao da
base. Depois de ensaiados e/ou gravados esses arranjos, o mximo que pode
acontecer uma adequao do artista a toda a estrutura musical j pronta e
concebida pelo arranjador, permitindo ao intrprete, muitas vezes, somente a
possibilidade de aprovar ou reprovar o arranjo. No caso do sideman, h uma maior
proximidade, uma combinao de propostas musicais com o intrprete e at a
possibilidade de redirecionamento do trabalho em comum acordo.Essa proximidade chega a ser tamanha que, em certos casos, o que os
diferenciam o papel que cada um desempenha. Luciano Alves, na mesma
entrevista, considera que um sideman pode at ser tambm um artista
desenvolvendo um papel diferente. Diz ele: Isso no quer dizer que ele no possa
ser um artista tambm, mas enquanto ele esta trabalhando nessa funo, sua
obrigao atender aos desejos e expectativas do intrprete que o contratou. Ele
faz a msica acontecer usando todo o seu know-how de acordo com o solista
(FORTUNA, 2003, pag 23).
Fica cada vez mais claro que a grande caracterstica do sideman o
seu comportamento musical, aliado sua bagagem, criatividade e disponibilidade.
Toms Improta, na mesma entrevista, acrescenta que mais cedo ou
mais tarde, o sideman acaba desenvolvendo seu prprio trabalho. Se ele for
criativo, isso ser inevitvel. Isso faz com que ele possa atuar de vrias maneiras
no mercado de trabalho, tornando-se um profissional verstil e criativo,
entendendo a atitude certa no contexto certo. Essa a razo pela qual consideroo sideman, acima de tudo, como algum que tem uma atitude de compreenso de
sua atuao no meio, resultado da prtica do acompanhamento e da cumplicidade
e disponibilidade artstica.
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Segundo Mariano: antes de mais nada, acompanhar mais uma
atitude musical do que uma performance, uma arte, criar uma condio sonora
para que o solista ou cantor se sinta o mais confortvel possvel vestir o
interprete. como se fosse um alfaiate fazendo um terno sob medida, um vestidosob medida vamos dizer assim, uma roupagem de um determinado tema para
um determinado cantor ou cantora, ou solista, da maneira mais econmica
possvel, para que voc crie espao e no ocupe espao. E ainda conclui,
dizendo: Tem que se ter perseverana, pois no fcil ficar fazendo acorde aps
acorde... H uma cincia, por isso, alguns msicos se destacam estilo,
sonoridade, tcnica diferenciada, alm de uma postura sria diante da profisso. A
soma desses fatores que determina se ele mesmo um sideman.Assim sendo, percebemos a importncia da bagagem musical e da
experincia de atuao no meio musical adquirida pelo acompanhador como
sendo fator importantssimo para a elaborao e concepo do acompanhamento
pianstico.
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1.2 OS PIANISTAS SUAS BIOGRAFIAS
1.2.1 CSAR CAMARGO MARIANO8
Nasceu em So Paulo em 1943. Aos 17 anos foi chamado por William
Furneaux para integrar sua orquestra, tornando-se msico profissional. Foi
convidado pelo maestro Enrico Simonetti para formar um grupo maior, constituindo
o que se tornou o mais importante conjunto de baile do Brasil: Trs Amricas.Com este grupo, trabalhou durante trs anos, adquirindo experincia em arranjo e
em acompanhar cantores da msica popular nacional e internacional.
Na dcada de 1960, integrou diversos conjuntos que se tornaram
famosos. Participou da gravao de um LP de Alade Costa (RGE), como pianista
e arranjador, com o grupo que se tornou mais tarde o Som Trs. Durante este
perodo, tambm foi chamado para tocar na casa noturna A Baica, importante
casa de jazz e msica brasileira de So Paulo, onde integrou o Quarteto Sab.
Em 1962, foi convidado pela gravadora Mocambo/RGE para produzir e
arranjar o lbum Claudette Dona da Bossa, de Claudette Soares. Ainda em
1962, formou com Airto Moreira e Humberto Clayber o Sambalano Trio, grupo
com o qual inaugurou o Joo Sebastio Bar, que viria a ser o novo "templo da
bossa nova" de So Paulo, na poca. Em 1967, apesar de no ter estudado
orquestrao, pesquisou e escreveu doze arranjos com grande orquestra para o
lbum de Marisa Gata Mansa.
Em seguida, gravou o lbum instrumental Octeto Csar Camargo
Mariano, tendo na base o Sambalano Trio. Esse octeto foi considerado um marco
8CSAR CAMARGO MARIANO. In: Dicionrio Cravo Albim de Msica Popular Brasileira.
Disponvel em http://www.dicionariompb.com.br. Acesso dia 30 de agosto de 2003.
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na fuso "jazz-bossa" no Brasil. Nesse mesmo ano, participou como pianista dos
LPs Os Trs Morais,Os Farroupilhase O Quarteto.
Em 1968, passou a ser o produtor, arranjador e diretor musical dos
shows de Wilson Simonal, acompanhando-o em excurses ao Mxico, Argentina,Peru, Venezuela, Itlia, Frana, Portugal e Inglaterra. Formou, tambm, o Som
Trs, grupo base do trabalho de Simonal, e assinou um contrato de msico e
arranjador com a TV Record, participando como jurado nos festivais realizados
pela emissora.
Gravou mais trs lbuns com o Som Trs para a RGE. Em 1969,
participou do Festival das Artes Negras, no Senegal, com a cantora Elizeth
Cardoso e o Som Trs.Com a dcada de 1970, iniciou-se uma nova fase em sua carreira. Em
1971, foi chamado por Elis Regina para dirigir, produzir e escrever os arranjos
para seu novo show e lbum, Elis. Produziu, arranjou e dirigiu espetculos de Elis
como Falso Brilhante, Transversal do Tempo e Saudade do Brasil.
Em 1978, produziu e dirigiu seu primeiro espetculo de msica
instrumental, So Paulo Brasil, em cartaz por dois meses no Teatro Bandeirantes,
em So Paulo. Nesse mesmo ano, especializou-se em msica para publicidade,
cinema e teatro.
Em 1981, gravou, ao lado de Hlio Delmiro, o consagrado disco
Samambaia. Ainda na dcada de 1980, realizou concertos solo pelo Brasil e
outros pases da Amrica do Sul, com a inteno de desenvolver sua tcnica
pianstica, ao mesmo tempo em que continuou seu trabalho como arranjador e
produtor para cantores da MPB como Gal Costa, Maria Bethnia, Simone e Rita
Lee, entre outros. Comps, ainda, a trilha sonora para a minissrie Avenida
Paulista (Rede Globo). Em setembro de 1985, foi contratado pela TV Globo paradirigir o Festival dos Festivais. No mesmo ano, gravou mais um lbum solo, Mitos,
a partir do qual criou a trilha da novela Mandala, da TV Globo.
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Em 1989, gravou o lbum Csar Camargo Mariano e fez a trilha para o
musical A Estrela Dalva, sobre a vida de Dalva de Oliveira.
Em seguida, apresentou-se novamente no Montreux Jazz Festival,
desta vez ao lado de Joo Bosco, e fez uma turn de dez concertos na Espanha,em trio formado tambm por Hlio Delmiro e Paulo Moura. Durante os concertos
na Espanha, num encontro com Leny Andrade, surgiu a idia de um novo dueto
piano e voz: o disco Ns, gravado em 1993. Em 1995, fez a trilha de um filme
para a televiso japonesa e voltou ao Brasil para co-produzir e fazer os arranjos
do lbum Perdidos de Amor, de Emlio Santiago.
Nas dcadas de 1980 e 1990, participou, dirigiu e comandou diversos
programas de TV, como Csar e convidados, Jazz Brasil Csars Special,Ensaio e A Todas as Amizades, na TV Cultura, Um Toque de Classe, na TV
Manchete, e Wrap Around the World, na TV Globo, entre outros.
Para o cinema, comps a trilha dos filmes Eu te Amo (1980), de
Arnaldo Jabor, Alm da Paixo (1982-1984), de Bruno Barreto, e Paixo Cigana
(1990), de Flvia Moraes. Fez ainda a trilha de dois filmes institucionais sobre o
Brasil para a CNN Internacional. Recebeu inmeros prmios ao longo de sua
carreira, entre eles o de melhor arranjador no 2 e 5 Prmios Sharp de Msica.
Em 2002, lanou, com o violonista e guitarrista Romero Lubambo, o CD
Duo. Tambm em 2002, dividiu o palco do Teatro Rival BR (RJ) com a cantora
Leny Andrade, para registrar o lanamento do CD Ns, gravado em 1994.
Em 2006, recebe o Latin Recording Academy Lifetime Achievement
Grammy Award, pelo conjunto de sua obra artstica.
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1.2.2 CRISTVO BASTOS9
Nasceu no Rio de Janeiro em 1947. Iniciou sua carreira profissional em
1961, tocando acordeon em uma casa noturna do Rio de Janeiro. Assinou
arranjos para shows e discos de seus parceiros Chico Buarque, Paulo Csar
Pinheiro, Paulinho da Viola, lton Medeiros, Aldir Blanc e Abel Silva, alm de
Nana Caymmi, Edu Lobo e Gal Costa.
Em 1992, lanou, com o violonista Marco Pereira, o CD Bons Encontros,
contendo as canes de Ary Barroso Na Baixa do Sapateiro, Aquarela Brasileira,
No Rancho Fundo (com Lamartine Babo), Luxo S, No Tabuleiro da Baiana e
Folhas Mortas, alm das msicas de Noel Rosa Feitio de Orao, Conversa deBotequim, Pra que Mentir e Feitio da Vila, todas com Vadico, As Pastorinhas
(com Joo de Barro) e Trs Apitos. O disco foi contemplado com o Prmio Sharp,
na categoria Melhor Disco Instrumental.
Em 1995, gravou com Leny Andrade o CD Antnio Carlos Jobim Letra
& Msica, contendo as canes Vivo Sonhando, Olha pro Cu, Luza, As Praias
Desertas, Fotografia, Ana Luza, Voc Vai Ver, Este seu Olhar, Lgia, Samba do
Avio, Esquecendo Voc, Corcovado, Wave, ngela, Outra Vez e guas de
Maro.
Em 1997, lanou seu primeiro disco solo, Avenida Brasil, contendo suas
composies Os Trs Chores, Mandacaru Serto do Caic, Um Choro pro
Valdir (com Paulinho da Viola), Rumo Zona Este, Todo Sentimento (com Chico
Buarque) e Avenida Brasil, alm das canes Tudo se Transformou(Paulinho da
Viola), Pianinho (Edu Lobo e Aldir Blanc), Round Midnight (Williams e Monk-
Hanighen) e Mistura e Manda (Nelson Alves).
Em 1998, sua parceria com Aldir Blanc foi registrada no CD Novos
Traos, de Clarisse Grova. Ainda nesse ano, destacou-se como compositor de
9CRISTVO BASTOS. In: Dicionrio Cravo Albim de Msica Popular Brasileira. Disponvel em
http://www.dicionariompb.com.br. Acesso dia 30 de agosto de 2003.
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Resposta ao Tempo (com Aldir Blanc), tema de abertura da minissrie Hilda
Furaco (Rede Globo), na interpretao de Nana Caymmi. A cano foi
contemplada com o Prmio Sharp na categoria Melhor Msica e encerrou a
retrospectiva das Melhores Canes do Sculo, selecionadas por Ricardo CravoAlbin dentro do acervo fonogrfico da EMI-Odeon.
Em 1999, foi responsvel pela direo e arranjos do show e do CD
duplo Gal Costa canta Tom Jobim, gravado ao vivo, e teve sua cano Raios de
Luz(com Abel Silva) registrada por Barbra Streisand no disco A Love Like Ours.
Tambm nesse ano, sua msica Suave Veneno (com Aldir Blanc), gravada por
Nana Caymmi, foi tema da novela de mesmo nome realizada pela Rede Globo.
No cinema, participou como arranjador das trilhas sonoras compostaspor Edu Lobo para os filmes Boca de Ouro e Guerra de Canudos; como
instrumentista da trilha sonora do filme O Homem Nu; e como compositor da
msica do filme Mau, o Imperador e o Rei.
Foi contemplado, como arranjador, com o Prmio Sharp pelos discos
Paulinho da Viola e Parceria, de Joo Nogueira e Paulo Csar Pinheiro, na
categoria Melhor Arranjo de Samba; Disfara e Chora, de Z Nogueira, na
categoria Melhor Arranjo Instrumental; Tantos Caminhos, de Carmen Costa, e
Resposta ao Tempo, de Nana Caymmi, na categoria Melhor Arranjo de MPB; e
Agnaldo Rayol, na categoria Melhor Arranjo de Cano Popular.
Em 2002, lanou, com o grupo N em Pingo d'gua, o CD Domingo na
Geral, contendo, de sua autoria, as canes Perspectivo e Amigo Bandolim, alm
da faixa-ttulo.
Constam da relao dos intrpretes de suas canes: Paulinho da Viola,
Mrcia, Alade Costa, Nana Caymmi, Mauro Senise, Paulinho Trompete, Z
Nogueira, Luciana Rabello, Joo Nogueira, Banda Black Rio, Demnios da Garoa,Raphael Rabello, Simone, gua de Moringa, Chico Buarque, Vernica Sabino,
Ney Matogrosso e Zez Gonzaga, entre outros.
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1.2.3 GILSON PERANZZETTA10
Nasceu no Rio de Janeiro em 1946. Iniciou sua carreira profissional em
1964 acompanhando diversos artistas como Simone, Ftima Guedes, Gal Costa,Elizeth Cardoso, Gonzaguinha, Joanna, Edu Lobo e Ivan Lins, com quem atuou
tambm, durante dez anos, como arranjador, diretor e produtor musical.
Apresentou-se em shows e gravaes no Japo, nos Estados Unidos e
na Europa. Morou durante trs anos na Espanha, trabalhando e estudando tcnica
de interpretao com Petri Palau de Claramount. Nesse pas, apresentou-se no
espetculo Trs Pianos de Cauda, dividindo o palco com o espanhol Tete Montoliu
e o argentino Emilio de La Pea, na comemorao do Quinto Centenrio de Madri.Atuou como orquestrador com Nana Caymmi, Edu Lobo, Toquinho, Tito
Madi, Billy Blanco, Leny Andrade, Guinga e Ftima Guedes, e com artistas
internacionais como Dionne Warwick e Lucho Gattica.
A partir de 1993, comeou a desenvolver um trabalho com o conjunto
Rio Cello Ensemble, registrado no CD Sorrir, que teve seu concerto de
lanamento na Sala Ceclia Meirelles, no Rio de Janeiro.
Na rea da msica de concerto, comps a sute Miragem, para
orquestra sinfnica e piano, executada em primeira audio pelo instrumentista e
a Jazz Sinfnica de So Paulo, durante a Semana Guiomar Novaes, em 1997.
Comps, tambm, a sute Metamorfose, para piano e violoncelo, apresentada em
primeira audio no IV Encontro Internacional de Violoncelos, realizado no Museu
Villa-Lobos (Rio de Janeiro), em 1998.
Foi contemplado com o Trofu Brahma como Melhor Instrumentista e
Melhor Arranjador, em 1988 e 1989, e com trs Prmios Sharp de Msica, na
categoria Melhor Arranjador, em 1989, e nas categorias Melhor Compositor eMelhor Intrprete, em 1998.
10GILSON PERANZZETTA. In: Dicionrio Cravo Albim de Msica Popular Brasileira. Disponvel
em http://www.dicionariompb.com.br. Acesso dia 30 de agosto de 2003.
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Ao longo de sua carreira, lanou os discosGilmony, Tema Trs, Juntos,
Portal dos Magos, Paisagem Brasileira, Jobim 60 Anos, Seiva, Tom e Villa,
Preldios e Canes de Amor de Cludio Santoro, Cantos da Vida, Lado a Lado,
Afinidades, Reflections (gravado no Japo em duo com o violonista SebastioTapajs), Uma Parte de Ns, Vera Cruz, Gilson Peranzzetta, Sorrir, Sebastio
Tapajs e Maurcio Einhorn, Fonte das Canes, Encontro de Solistas, Alegria de
Viver e Rua Marari; este ltimo, primeiro lanamento de seu selo Marari Discos,
criado em 1999. Ainda nesse ano, atuou como solista, maestro e arranjador para o
especial 100 Anos de Msica, produzido pela Rede Globo. Tambm em 1999,
participou de uma srie de concertos com o Quinteto Villa-Lobos, trabalho
registrado em dois CDs do grupo, lanados pelo selo RioArte Digital.Em 2000, assinou a direo musical e participou como msico, ao lado
de Leny Andrade e Guilherme de Brito, do show O Pranto do Poeta, segundo da
srie de quatro espetculos dedicados a Nlson Cavaquinho, escritos e dirigidos
por Ricardo Cravo Albin e apresentados no Centro Cultural Banco do Brasil (Rio
de Janeiro). Lanou, nesse mesmo ano, o CD Cano da Luae, em 2001, o CD
Metamorfose.
Em 2002, gravou o CD Cristal. Nesse mesmo ano, apresentou-se na
Sala Baden Powell (Rio de Janeiro), em show de lanamento do disco. O
espetculo contou com a participao de Mauro Senise, Paulo Russo, Robertinho
Silva, Joo Cortez e David Chew. Foi citado por Quincy Jones como um dos cinco
melhores arranjadores do mundo, em entrevista concedida a Jos Maurcio
Machline.
Em 2003, lanou, com Mauro Senise, o CD Frente a Frente. Em 2005,
lanou o CD Manh de Carnaval Brazilian Standards, tendo a seu lado o baixista
Paulo Russo e o baterista Joo Cortez.Constam da relao dos intrpretes de suas canes artistas brasileiros
como Rildo Hora, Rio Cello Ensemble, Djavan, Leila Pinheiro, Cris Delanno, Alade
Costa, Dori Caymmi, Leny Andrade, Edu Lobo, Z Luiz Mazziotti, Clia Vaz, Vox
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Quatro, Ftima Guedes, Ftima Regina, Ivan Lins, Nana Caymmi, Ivan Lins, Joo
Nogueira, Quarteto em Cy, MPB-4, Joyce, Danilo Caymmi, Sandra vila, Faf de
Belm e Emlio Santiago; e internacionais como Sarah Vaughn, Shirley Horn,
Dianne Schurr, George Benson, Jack Jones, Terence Binachard, Patty Austin,Toots Thielemans, Quincy Jones, Take Six e Lucho Gattica.
1.2.4 O ACOMPANHAMENTO PIANSTICO A PARTIR DA VISO DE CSAR
CAMARGO MARIANO, CRISTVO BASTOS E GILSON PERANZZETTA.
Em entrevista com Csar Camargo Mariano, Cristvo Bastos e Gilson
Peranzzetta, foram levados em considerao seis aspectos importantes do
acompanhamento pianstico:
1) O conceito de acompanhamento.
2) As necessidades bsicas para se acompanhar.
3) Os processos individuais.4) A relao entre o acompanhamento pianstico e o arranjo.
5) A importncia da letra para o trabalho do acompanhador.
6) O acompanhamento pianstico de vozes masculinas e vozes femininas.
A respeito do conceito e do entendimento sobre o ato de acompanhar,
Mariano, Bastos e Peranzzetta deixam clara a necessidade da integrao entre
acompanhador e acompanhado no desenvolvimento de um trabalho de piano e
voz, onde so mantidas, nas devidas propores, a esttica do acompanhado e a
assinatura musical do acompanhante. Mariano coloca a prtica do
acompanhamento como sendo uma arte, atravs da qual criam-se condies
sonoras para que o solista ou cantor se sinta o mais confortvel possvel, ...
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como se fosse um alfaiate fazendo um terno sob medida, um vestido sob medida,
vamos dizer assim...uma roupagem de um determinado tema para um
determinado cantor ou cantora, ou solistada maneira mais econmica possvel
para que voc crie espao e no ocupe espao. Bastos diz que acompanhar, emprimeiro lugar, ser capaz de ouvir o que o outro est fazendo. adequar o seu
toque quilo que est acontecendo.
Essa adequao acontece, mas nunca da mesma forma entre os
pianistas, pois a bagagem e experincia musical de cada um fator decisivo no
resultado final. Como diz Peranzzetta: acompanhar, na verdade, voc
embelezar uma coisa sem tomar para si. Voc tem que fazer com que as coisas
andem com a melodia, embelezando cada vez mais a melodia e no tomar para siesse acompanhamento como um solo. voc sacar sua funo ali e
desempenh-la com assinatura.
Nota-se que o termo embelezarutilizado por Gilson vem ao encontro do
que cada um deles considera como beleza, de acordo com os seus gostos
particulares e com a experincia de cada um como msico. Tanto Mariano quanto
Bastos colocam suas performances piansticas de acompanhamento num plano
de adequao ao que o intrprete prope, complementando e ao mesmo tempo
interagindo. Peranzzetta, no entanto, prefere adequar o intrprete ao
acompanhamento, depois de j ter percorrido algumas deliberaes estruturais e
harmnicas.
Com relao s necessidades bsicas da prtica do acompanhamento,
Bastos comenta a capacidade de ouvir o todo, escutar para poder entender os
planos, entender onde esto as coisas principais para poder us-las e trabalhar
com elas. Entende-se por todo um universo sonoro delimitado que est
relacionado com a pea original (suas primeiras intenes estticas e estruturais)e a espacialidade onde a nova montagem est sendo trabalhada, atravs de
processos de experimentao por ambas as partes (acompanhador e
acompanhado).
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Essa experimentao consiste em tocar o tema original vrias vezes de
formas diferentes, analisando seus elementos motivos, frases, encadeamentos
harmnicos e estruturais, etc. Procedendo dessa forma, percebendo suas
nuances, encadeamentos harmnicos, cantos e contra-cantos e at a letra queest sendo cantada ou seja, seu significado potico Bastos prope vasculhar
os elementos que so importantes segundo o seu ponto de vista esttico, e que
podero ser utilizados no novo trabalho como, por exemplo, na criao de
introdues, pontes, rearmonizaes e codas.
Peranzzetta tambm considera importante uma percepo musical
apurada e atenta, e ainda cita uma das possibilidades de treinamento dessa
percepo no prprio mercado de trabalho: tocando na noite, fazendo bailes outocando em grupos musicais diversos. E ter uma certa facilidade de trabalhar e
levar as harmonias para outros caminhos, ou seja rearmonizar. Segundo ele, o
fato de um pianista participar de trabalhos de diversas formaes em vrios estilos
ajudam a melhorar sua performance e sua percepo musical, baseando se no
de quea msica popular exige do profissional nos dias de hoje grande agilidade e
versatilidade de racioccio.
Um pianista atuando como acompanhador, ao trabalhar com diversos
tipos de intrpretes, em diversas formaes, adquire condies para desenvolver
a percepo e uma prtica musical verstil como por exemplo, o domnio da
rearmonizao e da reestruturao musical que se refletem na maneira como
ele trabalha seus acompanhamentos e arranjos. Mariano, no entanto, valoriza a
percepo e a versatilidade na performance musical, mas conjugadas aos
estmulos que tanto o acompanhador quanto o acompanhado possam provocar
um no outro, buscando criar uma proximidade maior com o acompanhado: cada
acompanhador vai criar um acompanhamento com elementos diferentes,dependendo de sua bagagem musical e do estmulo que o acompanhado causar
nele, pelo fato de se tratar de uma parceria. Mesmo criando um acompanhamento
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predeterminado, ou em cima da hora, essa parceria faz com que um provoque
reaes musicais no outro e vice-versa.
Essa parceria qual Mariano se refere acaba ditando uma das direes
do trabalho, em que tanto a maneira do acompanhado interpretar a letra da peaquanto a maneira do acompanhador direcionar toda essa cortina sonora so
mutuamente influenciados, pois a parceria acontece quando um reage aos
estmulos do outro num sistema de influncia mtua.
Aqui, o interessante que surgiram aspectos complementares em todas
as respostas: Bastos descreve o elemento principal de um acompanhador (a
percepo e ateno dentro da performance musical ), Peranzzetta descreve o
mesmo elemento, e fala da maneira de como ele trabalhado (tocando em vrioslugares com formaes, repertrios e estilos diferenciados), e Mariano, que
tambm fala do mesmo elemento de Bastos e da prtica mencionada por
Peranzzetta, associa um elemento a mais que o aspecto da parceira entre
acompanhador e acompanhado. Para ele, Mariano, estes elementos tm de estar
atrelados a uma troca de estmulos na criao e na conduo do
acompanhamento.
Com relao ao processo de criao de um acompanhamento, h uma
unanimidade a respeito da escolha da tonalidade da nova montagem como sendo
sempre o primeiro passo. Ela sempre determinada pelo acompanhado, por
questes de tessitura e pelas intenes interpretativas que ele deseja
desenvolver. No caso de um(a) cantor(a), parte-se do desejo de interpretar ou
colorir sua voz segundo o tema que est descrevendo, levando em considerao
tambm a letra e a maneira como deseja contar determinada histria.
Mesmo assim, a partir desse ponto, nota-se que Peranzzetta, Mariano e
Bastos tomam direes diferentes na maneira de trabalhar. Bastos diz que aprimeira coisa que faz tocar muito a msica, para entender todas as dobradias
da pea, as intenes tudo isso fica mais claro quando voc toca muito a pea.
Interiorizar o tema para depois exteriorizar a sua viso dele. Quanto mais a gente
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toca, mais a gente sente as respiraes, os fraseados, as estruturas... ou seja,
explorar o tema original, observando e experimentando elementos que sero
usados no acompanhamento, percebendo como o intrprete se coloca nessa nova
montagem e como ele prope suas idias. Mariano utiliza o mesmo processo queBastos, mas de uma forma a perceber mais o intrprete, como ele se comporta,
para depois poder contribuir com suas idias de acompanhamento: vou tocando
uma vez e da em diante eu vou percebendo o cantor, fico prestando ateno na
maneira de como e canta, como ele divide, como ele suinga, como ele adianta as
frases, como ele atrasa, de que forma ele interpreta a letra em questo, de que
forma ele resolve as tenses, quais as notas em que ele sai um pouco da
afinao, dependendo da melodia do tema, em qual regio ele brilha mais, emqual regio ele vai muito grave, aspectos da interpretao dele. Vou criando uma
maneira de conhecer o cantor e visualizar os espaos que ele ocupa e de que
forma. Da em diante, comea o processo de criao estrutural do
acompanhamento ou do arranjo.
Dessa forma, Mariano deixa o intrprete vontade para posteriormente
adequar suas idias de acompanhamento pianstico. Por outro lado, Peranzzetta
preocupa-se em criar, antes de mais nada, uma assinatura musical pessoal no
acompanhamento, antes mesmo de estar com o intrprete: Eu comeo sempre
fazendo uma introduo o que eu curto logo de primeira e depois comear a
trabalhar na harmonia, parte integrante da minha assinatura musical. O pianista
tem de conduzir sua performance de maneira autoral, colocando o mximo da sua
personalidade musical antes de adequar a atuao do intrprete. Da em diante,
as modificaes acontecem.
Sendo assim, Peranzzetta j determinou a direo a seguir. Dessa
forma notamos que Bastos e Mariano trabalham mais prximos ao intrprete,experimentando caminhos e buscando em conjunto decises e resolues
musicais, mas com uma diferena: o ponto de ateno de cada um . Enquanto
Bastos se preocupa em entender as chamdas dobradias da pea durante a
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experimentao, ele acaba achando as melhores resolues piansticas enquanto
observa e interage com o intrprete. Acaba sendo uma observao do
acompanhado atravs da busca do acompanhamento, dividindo seu ponto de
ateno. J Mariano coloca o ponto de ateno primeiramente no acompanhado,procurando observ-lo e conhec-lo, para depois poder propor idias e seguir na
montagem do acompanhamento.
Dessa forma, ele saber como propor suas idias de acompanhamento
como, por exemplo, a melhor conduo rtmica e harmnica, elementos que
possam ajudar o acompanhado a resolver melhor sua interpretao,
rearmonizaes que possam valorizar a letra, introdues, pontes e codas que
possam ser as mais adequadas, segundo seu ponto de vista esttico, para aquelesolista cantando aquela pea especfica.
Peranzzetta trabalha primeiramente a introduo, rearmonizaes, e
mudanas estruturais antes mesmo do contato com o acompanhado. No mximo,
o acompanhado determina a tonalidade em que a pea ser trabalhada e quais as
suas idias gerais de interpretao. Mas, certamente, seu campo criativo estar
limitado, cabendo-lhe apenas a possibilidade de pequenas alteraes em uma
estrutura j concebida pelo acompanhador. Neste caso, a meu ver, dependendo
da maleabilidade da personalidade do acompanhador e do acompanhado, a busca
dessa assinatura musical pode ser um elemento prejudicial ao rapport e ao
processo criativo. Mas, se nenhum dos dois no encontrar problemas em se
colocar numa situao como esta, ela ocorrer naturalmente sem grandes
problemas, como foi o caso da gravao analisada neste trabalho, em que Leny
Andrade descreve o processo de trabalho com Peranzzeta da seguinte forma: Eu
falei alguma coisa do Acontece e o resto do projeto ficou tudo na mo dele, no
falei nada... ele me mostrava... e eu adorava (risos).Tudo depende de como orapport estabelecido entre eles.
Todos eles concordam num aspecto importante: o fato de que seus
trabalhos de acompanhamento pianstico so arranjos, partindo do conceito de
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que arranjo uma reelaborao de uma composio, normalmente feita para uma
combinao sonora diferente da original11. Segundo Fanuel Maciel de Lima Jnior
em sua dissertao de mestrado12, a diferena entre um arranjo e uma
composio a presena da concepo da idia ou ainda, do insight, mas issono sigifica que elementos composicionais no possam estar presentes em partes
do arranjo. Para Fanuel, tanto o arranjo como a composio tm que lidar com
questes tais como planejamento formal, tratamento textural, uso de tcnicas de
variao, explorao adequada no meio escolhido, etc., com a mesma
proficincia (LIMA JNIOR, 2003 p.12), mas na composio que encontramos
a prerrogativa do compositor enquanto atribuio a concepo da idia. Essa
idia pode ser trabalhada no arranjo justamente nos trechos de maiorpossibilidade autoral por parte do arranjador como, por exemplo, introdues,
pontes ou intermezzos, contracantos e coda, como veremos mais detalhadamente
no captulo seguinte.
Sobre a relao entre o acompanhamento e o arranjo, Bastos diz que
quando toca muitas vezes a msica que vai acompanhar, e que o
acompanhamento vira um arranjo: Voc passa por todo aquele processo que ns
estvamos falando antes, de entender os meandros da msica que voc est
trabalhando, aquela coisa toda. De tanto tocar, voc fica com uma linha de
raciocnio um tanto quanto definida. Peranzzetta acrescenta que medida que vai
deliberando suas idias, aquilo vai se ordenando num arranjo de piano e voz. J
Mariano comenta que o acompanhamento pode ser o incio ou um microcosmo de
um arranjo; uma verso reduzida de um arranjo para banda, e pode ser o arranjo
em si, com um acompanhamento totalmente preparado, pensado, coerente
conforme a interpretao do cantor ou solista.
11SADIE, Stanley. Dicionrio Grove de Msica. Editora Jorge Zahar.So Paulo.2005.
12LIMA JNIOR, Fanuel Maciel de, A elaborao de arranjos de canes populares para violosolo, Campinas SP: [s.n.], 2003
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Neste ponto, Mariano percorre vrias possibilidades onde o
acompanhamento pode ser trabalhado, alm de um arranjo, uma adaptao
transformao menos elaborada de uma obra musical para ajust-la a uma nova
finalidade13 ou uma transcrio adaptao de uma obra musical a um outroinstrumento ou grupo instrumental, diferente dos da verso original14 ou at
mesmo uma reduo adaptao para um piano de uma partitura originalmente
escrita para vrias partes (vozes, instrumentos)15.
No meu ponto de vista, o importante aqui o teor criativo que o
acompanhador possa ou queira imprimir, dependendo da proposta do trabalho.
Dessa forma, classifico os tipos de acompanhamentos segundo o grau
de participao criativa do acompanhador:
Processos Conceitos ParticipaoCriativa
REDUOAdaptao para piano de uma
partitura originalmente escrita paravrias partes (vozes, instrumentos).
O acompanhador no temnenhuma participao criativa.
TRANSCRIOAdaptao de uma obra musical a
um outro instrumento ou grupoinstrumental diferente dos da verso
original.
O acompanhador participa naadequao da pea para seu
instrumento.
ADAPTAO
Transformao menos elaborada
de uma obra musicalpara ajust-la a uma nova
finalidade.
O acompanhador participa
sugerindo poucas modificaes,dependendo da necessidade.
ARRANJOReelaborao deuma composio
O acompanhador participaativamente no processo criativo.
13 ADAPTAO.In:Dicionrio Houaiss de Lngua Portuguesa disponvel em:http://houaiss.uol.com.br/busca.jhtm. Acesso em 25 de outubro de 2006.14 TRANSCRIO.In:Dicionrio Houaiss de Lngua Portuguesa disponvel em:http://houaiss.uol.com.br/busca.jhtm. Acesso em 25 de outubro de 200615 REDUO.In:Dicionrio Houaiss de Lngua Portuguesa disponvel em:http://houaiss.uol.com.br/busca.jhtm. Acesso em 25 de outubro de 2006.
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Pelo fato da reduo ser uma formatao de uma partitura de vrios
instrumentos para o piano, a possibilidade de interveno criativa por parte do
instrumentista completamente descartada pelo fato da necessidade da fidelidade
composicional pea original. Esse processo permite a execuo dedeterminadas peas de formao complexa como combos, orquestras e corais
adequadas execuo pianstica. J a transcrio permite que o pianista possa
experimentar algumas alternativas tcnicas no seu instrumento para que a pea
original seja executvel, muitas vezes modificando alguns aspectos. Na
adaptao, modificaes mais pessoais podem acontecer, pois muitas vezes as
peas originais ficam subordinadas a uma inteno diferenciada, ou seja, elas
podem sofrer algum tipo de alterao em funo de uma proposta ou atividade,por exemplo, a adaptao de vrios temas num musical. No arranjo propriamente
dito, o instrumentista tem mais liberdade para modificar a pea original.
Outro aspecto importante citado pelos entrevistados foi a questo da
interpretao da letra e sua influncia na criao do acompanhamento. Segundo
Mariano, a letra a conduo principal de tudo, deixando claro que a letra
determina aspectos importantes como andamento, carter, movimentos rtmicos e
harmnicos, densidades, texturas e at ajuda a determinar qualquer
reestruturao formal o acompanhador queira propor. A ateno que o
acompanhador mantiver na interpretao do acompanhado definir muitos dos
elementos importantes do acompanhamento, mas que sejam ponderados numa
certa medida e bom gosto como cita Bastos: importante voc ler a letra da
msica que voc est trabalhando... No que voc vai tentar refor-la, fazer uma
coisa caricata, completamente over, no precisa fazer isso. A letra importante
pra voc estar dentro do clima da msica... Fazer o arranjo ao p da letra tem
limite, o que precisamos sempre bom senso. O que Bastos coloca a diferenade contar uma histria criar uma ambientao sorona, acompanhando a letra -
e de ilustrar a histria uma forma mais caricata de musicar o que est sendo
cantado. Num trabalho de criao de um arranjo ou acompanhamento, tudo que o
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pianista fizer servir para dar suporte letra e ao que est sendo cantado,
cabendo ao acompanhador criar uma cena, um contexto para isso; e se esse
processo no for trabalhado da forma adequada, o resultado ser caricatural e
descritivo. Bastos cita uma experincia dele nesse sentido:
Uma vez eu escutei um arranjo que mostrava que nem sempre
vale a pena voc tentar mostrar na msica tudo aqui que est na
letra. Era um arranjo antigo, me lembro de um detalhe, que numa
hora que a letra falava de estrelas no cu, o arranjador colocou
violinos no agudo fazendo pizzicatos no arranjo plim plim plim
ou seja, uma coisa caricata, completamente over... No precisava
fazer isso, mostrar as estrelas musicalmente, sabe? Fazer o
arranjo ao p da letra tem limite n? O que precisamos sempre na
msica bom senso.
Peranzzeta comenta um outro aspecto: a relao da melodia com a
letra. As duas tm que ser trabalhadas juntas pelo fato de se complementarem
com relao interpretao da pea. Trabalh-las em separado poder direcionar
a montagem para resolues distintas e, por vezes, opostas ao seu contedo.
Peranzzetta cita uma experincia nesse sentido:
Uma vez eu recebi uma encomenda de arranjo. Recebi uma
melodia com cifra de um samba sem letra pra fazer o arranjo. A
pessoa s cantava lalalala e eu fui fazer o arranjo. E eu fiz um
arranjo assim, super feliz, em cima daquilo que eu estava
ouvindo. Quando cheguei no estdio, a letra era muito triste. No
tinha nada a ver o que tinha escrito com o que a pessoa cantava.
A tive que refazer tudo em funo da letra, porque a pessoa dizia
coisas muito tristes e atrs rolava a maior festa... Ficou estranho,
entendeu... Ento a letra conduz a colocao da melodia, o ritmo,
as harmonias, os grooves, o andamento, as dinmicas do que
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voc vai fazer. Seno, acontece o que aconteceu comigo: voc
faz uma coisa super feliz para uma letra muito triste. A melodia
sozinha pode levar para um lado e a letra, para outro. Vira uma
guerra.
Com relao diferena do acompanhamento de vozes masculinas e
femininas, Peranzzetta diz: nunca observei isso. Eu vou pelo esprito da msica e
como ele ou ela interpreta, independente de ser cantor ou cantora. Bastos j diz
que a nica diferena o timbre do solista. O importante tomar cuidado com as
freqncias, por exemplo: acompanhando um bartono voc toma cuidado em
tocar nas regies graves do instrumento, com uma soprano voc toca mais nas
regies mdio-graves do instrumento, coisas assim. Mas Mariano acrescenta um
aspecto importante. Para ele, so duas coisas completamente diferentes:
Primeiro, a letra que mostra um certo contexto cantada por uma
mulher, mostra outro contexto completamente diferente cantada
por um homem. Mudam todas as entonaes, as referncias
poticas... Mudam as polaridades, as aes e reaes... outra
histria, com uma polaridade diferente. Muda a interpretao, o
que conseqentemente muda o meu comportamento como
acompanhador. Muda a trilha sonora que est sendo feita. Da
vm os aspectos tcnicos que tambm mudam, por exemplo, a
tessitura, a tonalidade, a regio onde a melodia se situa,
conseqentemente a regio onde a minha performance vai se
concentrar, as temperaturas das harmonias... Muda tudo.
Isso demonstra o grau de ateno que o acompanhador pode
desenvolver, observando ao mximo os elementos que o acompanhado pode
dispor para o desenvolvimento do acompanhamento. Na verdade, Mariano se
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refere a elementos que se polarizam16 a determinadas intenes de interpretao
do acompanhado entonaes, referncias poticas, aes e reaes que
reagem diretamente no acompanhamento tonalidade, regio da melodia,
interpretao da letra com a melodia, regio predominante de performance e ocritrio das alteraes harmnicas e estruturais.
Percebemos aqui que o processo de criao de um acompanhamento
pianstico gira em torno de 3 elementos essenciais: a verso referencial da
pea17 (dados da verso da pea), o acompanhado (intrprete e suas
caractersticas) e o acompanhador (instrumentista, no caso pianista, e suas
informaes). A pea original traz em si elementos que determinam a melodia,
harmonia, andamento, instrumentao, carter, estilo, a letra e a sua interpretaopor parte do autor no caso de uma gravao.
O acompanhado traz definies como a tessitura vocal detectada dentro
de uma classificao vocal, pertinente aos seus limites e caractersticas vocais ,
intenes interpretativas como aspectos de polaridade e interpretao da letra, o
destaque de regies vocais de maior importncia dependendo da linha meldica
que levar tambm a uma definio da tonalidade a ser trabalhada.
J o acompanhador traz ao projeto dados como instrumentao (piano),
sua bagagem musical adquirida com a experincia e vivncia como profissional no
mercado de trabalho, sua inteno interpretativa aquilo que ele gostaria de fazer
durante a sua performance e um comportamento que possibilite o contato e a
troca de informaes com o acompanhado (postura de sideman). Depois disso,
o acompanhado analisa os dados da pea original e do acompanhador segundo o
seu ponto de vista e compreenso, enquanto que o acompanhador tambm
16POLARIZAO - atrao volta de, ou em direo a um ou mais plos, pontos, temas, opiniesetc.In:Dicionrio Houaiss de Lngua Portuguesa disponvel em:
http://houaiss.uol.com.br/busca.jhtm. Acesso em 25 de outubro de 2006.17Essa verso pode ser uma regravao do tema, ou at o prprio tema original executado pelo
compositor. Mas para no criar polmicas em torno do aspecto pea original, consideraremoscomo sendo a verso referencial de onde acompanhado e acompanhador se utilizam para iniciaraelaborao do trabalho, que por sua vez, poder tambm se tornar tambm verso referncial paraoutro projeto, etc.
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analisa os dados da pea original e do acompanhado da mesma forma. Isso faz
com que, por exemplo, cada um deles tenha entendimentos diferentes das
informaes que o tema original traz, e da inteno de concepo do outro
participante. E a comea o contato musical, o processo de experimentaomtua, em que acompanhador e acompanhado manuseiam a pea original com os
dados de ambos.
Atravs dessa experimentao, ambos estabelecem definies e
formataes e chegam ao resultado final da releitura da pea original. Este seria
uma proposta de sistematizao do processo de criao de um acompanhamento
pianstico, resultado da adequao de informaes, intenes e comportamentos,
reunidos num resultado comum a ambas as partes envolvidas.
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CAPTULO II A INVESTIGAO DOS ELEMENTOS
NOS ACOMPANHAMENTOS PIANSTICOS
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2.1 ANLISE DAS TRANSCRIES
Para analisar os resultados dos processos de acompanhamento
pianstico citados no captulo anterior, utilizei da prtica da transcrio pararegistrar em partitura, com o mximo de fidelidade possvel, a execuo pianstica
e vocal de registros fonogrficos da participao dos entrevistados.
Foram escolhidos dois registros fonogrficos gravados por Csar
Camargo Mariano e Cristvo Bastos, acompanhando a cantora Leny Andrade no
tema original de autoria de Antonio Carlos Jobim e Ana Jobim, intitulado Voc vai
ver, do lbum Terra Brasilis18 de 1980. Optei justamente por esta pea para
comparar os processos criativos dos pianistas e o comportamento de Leny diantede dois pianistas de formaes musicais diferentes, trabalhando num mesmo
tema musical e em situaes quase idnticas de produo conhecendo a pea
praticamente dentro da sala de gravao do estdio. Leny e Mariano gravaram a
faixa Voc vai ver no lbum Ns19, de 1984, enquanto que Bastos gravou com
Leny o mesmo tema onze anos depois, no lbum Antnio Carlos Jobim Letra &
Msica Leny Andrade e Cristvo Bastos20, de 1995.
Pelo fato de no ter encontrado o mesmo tema trabalhado por Leny e
Peranzzetta, questionei Leny na ocasio de sua entrevista para esta pesquisa a
respeito de alguma gravao que pudesse me revelar aspectos semelhantes - ou
no - dos que encontrei com os outros pianistas. Ela mencionou o tema de Cartola
18JOBIM, A.C. Voc vai ver. Intrprete: Tom Jobim e Ana Jobim.In: Terra Brasilis. [36.138/9]:WEA, Brasil, p1980. Faixa 9.19JOBIM, A.C. Voc vai ver. Intrprete: Leny Andrade.In: Ns. [11-V009]: Velas, p1984. Brasil.Faixa 4.20 20 JOBIM, A.C. Voc vai ver. Intrprete: Leny Andrade. In: Antnio Carlos Jobim Letra &Msica Leny Andrade e Cristvo Bastos. [LD-06/95]: Lumiar Discos, p1995. Brasil. Faixa 6.
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chamado Acontece, originalmente gravado em 1974 no lbum Cartola21, e
trabalhado em 1988 por Leny e Gilson Peranzzetta no lbum Cartola 80 anos22.
Neste processo de transcrio, analisei os acompanhamentos
piansticos, transcrevendo os movimentos de cada mo dos pianista primeiro amo esquerda, depois a mo direita, montado as cifras dos acordes e depois
transcrevi a interpretao vocal de Leny nos compassos das estruturas montadas.
Dessa forma, consegui ter uma visualizao formal e harmnica dos
acompanhamentos, partindo da observao das fundamentais dos acordes (mo
esquerda), dos acordes propriamente ditos (mo esquerda e direita), das
extenses harmnicas e contracantos (mo direita) e da melodia (voz), o que me
permitiu comparar as formas de acompanhamento de cada pianista.
2.1.1 VOC VAI VER TOM JOBIM E ANA JOBIM
A primeira pea a ser analisada o tema de Tom Jobim Voc vai ver.
Na verso original, Tom Jobim desenvolve a pea na tonalidade de F Maior como
mostra a transcrio abaixo:
21CARTOLA. Acontece. Intrprete: Cartola. In: Cartola. [MPL 9302]: Marcus Pereira Brasil, p1974.Faixa 4.22 CARTOLA. Acontece. Intrprete: Leny Andrade. In: Cartola 80 anos. [S.I.]: independente,Brasil, p1988. Faixa 6.
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Dessa forma, ele estrutura a pea da seguinte maneira:
Podemos observar a partir da figura acima que a gravao original
comea com uma introduo instrumental de 8 compassos (do compasso 1 ao
compasso 8), seguida por uma parte denominada A1 de 16 compassos (do
compasso 9 ao compasso 24), em que ele repete o mesmo trecho com umasegunda letra (A2) e uma parte denominada B de 8 compassos (do compasso 26
ao compasso 33). Logo aps, a parte A1 repetida como solo instrumental de 16
compassos, depois repete-se a parte A2com a voz cantando a segunda parte da
letra em 16 compassos, uma repetio da parte B em 8 compassos e a coda
instrumental de 16 compassos, com elementos da introduo (do compasso 33
at o final). Em suma, a gravao original toca o tema duas vezes, sendo que na
segunda vez a voz canta somente a segunda parte da letra, deixando a primeira
parte para um trecho instrumental.
Cristvo Bastos relata o processo de trabalho e gravao deste tema
com Leny:
Ns havamos tocado juntos h muitos anos atrs e naquele
projeto ns nos reunimos e gravamos tudo em trs dias, sem
respirar. O Chediak Almir Chediak, produtor do projeto estava
com estdio marcado e com pressa de gravar, e ns no
pudemos fazer o trabalho com calma. Foi um trabalho feito muito
s pressas, nenhuma das introdues foi pensada e quando eu
ouo o projeto novamente, isso me impressiona. Ns estvamos
dentro do estdio e falvamos: Vamos tocar essa msica? A
Intro A1 A2 B CodaA1 A2 B
VoltaVozVozInstrumental InstrumentalInstrument
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gente se olhava e comeava. Depois, quando eu ouvia o CD, eu
falava: Poxa, mas como pode ter sado essa intro? A gente nem
teve tempo de passar....
Com toda essa presso do projeto em gravar este tema de uma forma
gil, Bastos opta por usar a mesma estrutura formal de Tom Jobim no seu
acompanhamento, com dois diferenciais importantes: trabalha na tonalidade de R
Maior por indicao de Leny e adiciona parte B um trecho de 4 compassos
da mesma parte B (do compasso 75 ao compasso 78).
Este trecho denominado extenso do B, e parte integrante da parte
B estendida, trecho que vai do compasso 69 at o compasso 78, como mostra a
figura abaixo:
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Dessa maneira, a estrutura formal que Bastos desenvolve em seu
acompanhamento pianstico : uma introduo instrumental de 6 compassos (do
compasso 1 ao compasso 6), uma parte denominada A1 de 16 compassos (do
compasso 7 ao compasso 22), uma parte denominada A2de 12 compassos (docompasso 23 ao compasso 34), uma parte denominada B de 6 compassos (do
compasso 35 ao compasso 40), uma parte de improviso instrumental de piano de
16 compassos (do compasso 41 ao compasso 56), um retorno parte A2de 12
compassos (do compasso 57 ao compasso 68), uma parte B estendida de 10
compassos (do compasso 69 ao compasso 78) e uma coda instrumental de 5
compassos (do compasso 79 ao compasso 82), como mostra a figura:
Mariano conta que quando estava gravando o lbum Ns com Leny, ele
ficou conhecendo o tema de Tom na cantina do estdio. Ele conta:
Estvamos gravando o projeto em estdio e paramos uma hora
para tomar caf. Da a Leny me mostrou o Voc vai ver. Eu adorei
a msica e pedi para gravarmos. Entramos no estdio e comecei
e esboar algumas coisas, experimentamos outras, testamos
algumas coisas e gravamos. Assim pela afinidade de estar com
ela, pela afinidade com a msica, o arranjo foi ficando pronto.
Nessa pea em questo, eu criei uma intro, e entro no A da
msica com uma levada quase de violo na mo direita e com os
baixos em movimentos que intuam a levada de um surdo, mas
fao isso pianisticamente. E quando eu retorno ao A novamente,
Intro A1 A2 B CodaA1 A2
SoloPianoVoz
VoltaVoz
Bestendido
PianoPiano
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eu torno a levada quase de um groove e vou lembrando de linhas
de baixo que ouo muito nos trabalhos do Luizo Maia, no
Marcelo Mariano e vou incorporando esses desenhos na minha
levada. Entra uma parte de improviso de piano, onde eumantenho a conduo e gravo uma outra pista de piano solo,
justamente para no perder a conduo queria mesmo manter o
mesmo trem andando (risos) e voltamos e acabamos a msica
em fade out. Sem muita inveno, simples.
Por indicao de Leny, Csar trabalha na tonalidade de R Maior e
utiliza a mesma estrutura formal de Cristvo, adicionando um trecho de improviso
vocal denominado de A2 do compasso 65 ao compasso 76 onde a voz atuacom caractersticas improvisatrias at o final da parte B estendidano compasso
85. Dessa maneira, Mariano cria a seguinte estrutura: uma introduo instrumental
de 9 compassos (do compasso 1 ao compasso 9), uma parte denominada A1 de
16 compassos (do compasso 10 ao compasso 25), uma parte denominada A2de
12 compassos (do compasso 26 ao compasso 37), uma parte denominada B
estendida de 10 compassos (do compasso 38 ao compasso 47), uma parte de
improvisos de 38 compassos (do compasso 48 ao compasso 85), divididos da
seguinte forma: 16 compassos de improviso instrumental (A1) e 22 compassos de
improviso vocal (A2e B estendido), uma parte A2de 12 compassos, onde a voz
volta a cantar a segunda parte da letra (do compasso 86 ao compasso 97), uma
parte B estendida de 10 compassos (do compasso 98 ao compasso 107) e uma
coda instrumental de mais de 14 compassos23. Sendo assim, a estrutura do
acompanhamento de Mariano fica a seguinte:
23O fato de a gravao ter sido editada com o efeito de fade outimpossibilita a contagem precisa
de compassos da parte final.
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De maneira geral, tanto Mariano como Bastos no alteram muito a
estrutura original de Tom Jobim: introduo, apresentao do tema,
reapresentao do tema e coda. Na verdade, o prprio Tom utiliza-se de uma
forma estrutural muito usada no jazz americano como no bebop e no cool jazz,
que d abertura aos instrumentistas para apresentarem o tema e improvisaremsobre ele vrias vezes e de vrias formas at que o tema reapresentando e
encerrado com a coda. Essa forma teve grande influncia na bossa nova, em
grupos instrumentais e vocais, tanto na harmonia como na forma, como mostra o
quadro a seguir:
Partindo desta estrutura, podemos encontrar e analisar elementos
importantes que cada pianista props como acompanhamento pianstico para a
pea de Tom Jobim.
Na introduo (compasso 1 ao compasso 6), percebe-se que Bastos
trabalha o motivo da introduo da gravao original de Jobim logo no primeiro
compasso, desenvolvendo uma resposta no compasso seguinte e uma outra
variao do mesmo motivo no compasso 3, deixando em suspenso o acorde de
Gm79 para a entrada de Leny. Bastos, alm de indicar elementos estticos que
sero usados nos decorrer da pea, sinaliza a tonalidade para a cantora,
IntroApresentao
do tema CodaReapresentao do
temaImprovisao
Intro A1 A2 BEst. A1
SoloPianoVoz
A2
SoloVoz
BEst. A2B
Est. Coda
VoltaVoz
Pian
Pian
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acabando a introduo num acorde suspenso (IVm79) no compasso 5, explorando
muito os pedais e ressonncias harmnicas do piano atravs de fermatas e notas
sustentadas, como mostra a figura a seguir:
No trabalho de Mariano, ele cita exatamente o motivo do tema principal
de Jobim nos compassos 1 e 2, cria uma resposta para ele nos compassos 3 e 4,
faz uma variao do mesmo motivo nos compassos 5 e 6 e faz nova resposta at
o acorde de A7(b9) no compasso 9, onde prepara a funo de V7(b9) para a
cantora, como mostra a figura a seguir:
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Aqui, Mariano opta por um outro tipo de piano o Yamaha CP70
eletroacstico por ser um instrumento de uma ressonncia harmnica diferente
do piano acstico e que permite melhor resposta a execues rtmicas complexas
caracterstica predominante em sua performance. Com isso, ele consegue umaleveza de execuo que indicar o comportamento do acompanhamento pianstico
no decorrer da pea.
Bastos, na apresentao do tema partes A1, A2 e B que compreende
os compassos de 7 a 20 , opta por um comportamento rubato ao piano,
amparando harmonicamente Leny com acordes sem muita movimentao, e com
contracantos que deixam a cantora vontade em sua interpretao.
Aqui ele assume uma postura mais pianstica do que na verso original,caracterizada ritmicamente pela conduo de bossa nova. Nesta parte, Bastos
procura ouvir o que Leny est fazendo, adequando o seu toque quilo que est
acontecendo, ou seja, praticando o seu prprio conceito de acompanhamento
como vimos no captulo anterior e criando contracantos nas pausas da melodia
da cantora, como mostra a transcrio abaixo:
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Csar j opta em sintetizar o ritmo da bossa nova ao piano na
apresentao do tema que vai do compasso 10 ao 47 , predominando na mo
esquerda a conduo do baixo sincopado e na mo direita uma execuo
parecida com a do violo de bossa nova que na verdade so motivos estilizados
a partir das acentuaes rtmicas do tamborim, predominantes no samba
(GARCIA, 1999, p.22), permeada por uma linha meldica de notas longas que
acompanha a melodia principal. Ele assume as divises rtmicas da bossa nova
como principal elemento condutor do acompanhamento numa regio grave do
instrumento, deixando Leny com liberdade para sua interpretao, como mostra a
transcrio o abaixo. Em sua entrevista ele cita: O que eu trouxe da pea original
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de Tom foi a bossa, o groove de bossa nova e a bossa que Tom tinha conseguido
naquela gravao. Acho que foi isso:
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Observando a transcrio da parte vocal de Leny nas gravaes com
Bastos e Mariano, percebe-se que ela tem posturas interpretativas quase idnticas
nas duas verses, mesmo com a diferena de conduo dos acompanhadores,
ela acaba optando por manter quase que as mesmas entradas antecipadas efinais de frase, divises rtmicas, andamentos, timbres vocais nos limites da sua
tessitura e a interpretao da letra.
Sendo assim, Leny nos mostra que a sua interpretao no tem grandes
alteraes quando est sendo acompanhada por pianistas diferentes neste
mesmo tema. Ela acaba adaptando sua interpretao do acompanhador apenas
nos aspectos que ela considera necessrio, mantendo sua concepo pessoal da
pea, como ela mesma cita em sua entrevista para esta pesquisa: Sim, passotodos esses sentimentos para que eles - os pianistas - percebam o que vai
acontecer comigo e a gente possa incendiar e emocionar juntos. Alguns msicos
s vezes no entram fcil nessa viagem, uma coisa muito sensvel; outros
entram sem eu falar, pois eles olham a letra e entendem as mesmas coisas que
eu.
Vale a pena destacar que esse procedimento tambm acontece com os
pianistas, como disse Bastos: preciso tocar muito a msica para voc
interiorizar o tema, para depois exteriorizar a sua viso. J Mariano diz que vai
criando uma maneira de conhecer o cantor e visualizar os espaos que ele ocupa,
e de que forma. Da em diante, comea o meu processo de criao estrutural do
acompanhamento ou do arranjo, com meus elementos. E Peranzzetta diz que,
depois de criar uma introduo personalizada, ele retrabalha a harmonia de forma
que fique clara a sua assinatura musical, que tem a ver com tudo aquilo que eu j
ouvi, com aquilo que aprendi, com aquilo que gosto, com aquilo que sei que d
certo e com aquilo que sempre quis experimentar. Tudo isso faz parte dabagagem da gente, conseqentemente da nossa assinatura musical.
Dessa forma, podemos observar que as relaes de proximidade e de
troca de idias entre acompanhado e acompanhador so delimitadas por reas de
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contato e reas sem contato, definidas entre eles, como exemplificado na figura
abaixo:
No caso acima, podemos ver o que Leny adaptou de sua concepoartstica para cada acompanhador e o que cada um manteve inalterado reas de
contato e reas sem contato. nas reas de contato que acontecem as trocas e
as influncias mtuas, enquanto nas reas sem contato, aspectos de interpretao
e concepo de cada um suas preferncias estticas, sua assinatura musical,
etc. so preservados de qualquer influncia externa. Essas duas reas esto
diretamente ligadas no s condio de condutibilidade da performance da
pea, mas tambm predisposio de interao entre eles, mas tambm
possibilidade de cada um manter alguns elementos interpretativos inalterados.
Neste ponto surge uma questo: Quais so esses elementos que so inaterveis
em contatos como este? A individualidade de cada um, o imutvel de cada um, a
bagagem e os aspectos esttico-musicais de cada um s reas sem contato:
Acompanhamento deMariano
Acompanhamento deBastos
Interpretao de Leny
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Sendo assim, quando acompanhado e acompanhador se juntam paracriar uma releitura de uma pea, criam-se dois plos que exercem foras atrativas,
tanto a favor do acompanhado como a favor do acompanhador, o que propiciar
uma espcie de polaridade que determinar a conduo da pea:
Quando o plo do acompanhado exerce uma fora atrativa maior que a
do plo do acompanhador, isso afasta a liderana da performance do
acompanhador de seu plo, fazendo com que ele aceite a conduo por parte do
acompanhado. o acompanhado que mostrar elementos interpretativos
importantes que conduziro a performance, compreendidos na medida certa pelo
acompanhador, como mostra o exemplo abaixo:
Acompanhador
Acompanhado
rea sem contato
rea de contato
rea sem contato
Acompanhador
Acompanhado
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No caso inverso, o plo do acompanhador que exercer uma foraatrativa maior sobre o plo do acompanhado, fazendo com que este aceite e se
adapte o suficiente conduo estabelecida pelo acompanhador.
Na verdade, o que acontece durante toda a performance uma
constante variao de foras atrativas entre acompanhado e acompanhador,
alternando a conduo entre um e outro. Como diz Csar, um dilogo de
perguntas e respostas, de provocaes e de reaes, de cantos e contracantos... sem dvida uma atividade de comunicao mutual e de intensa densidade que,
quando feito na medida certa, faz com que no tenha papel principal ou
secundrio: os dois so importantes e os dois servem de estmulo para ambos.
Acompanhador
Acompanhado
Acompanhador
Acompanhado
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Dessa forma, para que haja uma integrao plena e satisfatria para
ambas as partes, necessrio que se faa a presena e a ausncia de contato na
medida certa entre acompanhador e acompanhado, trocando e interagindo e, ao
mesmo tempo, no interferindo e respeitando a concepo de cada um.Voltando anlise das transcries, vemos que no improviso instrumental
de Bastos do compasso 41 ao compasso 56 , ele muda o carter pianstico
adicionando conduo elementos rtmicos mais de bossa-nova, como sncopas
na mo esquerda e linhas meldicas em sncopas e tercinas na mo direita.
Depois disso ele muda a conduo do acompanhamento aps o solo instrumental,
adquirindo caractersticas mais rtmicas que na exposio do tema, limitando seus
contracantos e valorizando os baixos e sncopas da bossa nova de uma formadiferente de Mariano, como mostra a transcrio abaixo:
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Mariano j mantm a conduo anterior e grava um solo adicional sobre
essa base, com outro timbre de piano recurso de gravao em estdio chamado
de overdub no perdendo a textura rtmica criada, at o final da gravao, que
termina em fade out. Com isso, ele mantm a diviso de bossa-nova durante todaa pea, no mudando seu tipo de acompanhamento com o solo instrumental. Logo
aps, Mariano convida Leny para um solo vocal do compasso 64 ao compasso
85 trazendo a voz mais perto de um comportamento instrumental do que
propriamente vocal, com a execuo livre de melodias improvisadas com o uso de
melismas, sem letra.
Mariano, aps os solos instrumental e vocal, volta ao comportamento
inicial de acompanhamento, promovendo figuras rtmicas de bossa nova compequenas variaes, mas mantendo a condutibilidade pianstica
predominantemente rtmica, caracterstica principal de sua performance. Na coda
Instrumental, Mariano fica repetindo os acordes D7+9 e G7413 nas funes de
I7+9 e V74/bVII at o final o fade out24, convidando Leny a variar pequenos
motivos da ultima frase da letra.
Dentre todos os pianista, Mariano o nico que opta por essa
finalizao, buscando uma pouco mais de interao com Leny, enquanto que
Bastos e Peranzzetta, optam por uma finalizao da pea.
Segue abaixo a performance de Csar com Leny:
24 Recurso muito usado em estdios para finalizaes das faixas gravadas, fazendo com que ovolume seja reduzido gradativamente at o silncio total, para que a outra faixa possa comear.
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Vale ressaltar tambm que tanto Bastos, quanto Mariano no fazem
grandes mudanas harmnicas em seus acompanhamentos com relao pea
original, ou seja, nada de significativo constatado em relao a novas
tonicizaes25 ou rearmonizaes. Levando em considerao as condies emque eles gravaram essa pea, descritas por eles nas entrevistas, ambos optaram
mais pela modificao de condutibilidade do acompanhamento, do que por uma
modificao formal ou harmnica.
2.1.2 ACONTECE CARTOLA
Analisaremos agora a pea Acontece de Cartola, composta
originalmente em Mi Maior para violo e voz, em que ele cria uma introduo
instrumental de 2 compassos (do compasso 1 ao compasso 2), uma parte
denominada A1 de 12 compassos (do compasso 3 ao compasso 14), uma parte
denominada B de 4 compassos (do compasso 15 ao compasso 18), uma parte
denominada A2de 9 compassos (do compasso 19 ao compasso 27), uma parte
denominada Cde 6 compassos (do compasso 28 ao compasso 36), e uma coda
instrumental de 3 compassos (do compasso 34 ao compasso 36):
25tonicizao o tratamento de uma tonalidade qualquer no sendo a tnica como sendo
uma tonalidade tnica temporria na composio. In Wikipedia, The Free Encyclopedia.Disponvel em: http://en.wikipedia.org. Acesso em 11 de dezembo de 2006.
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Segue a forma estrutural da pea acima citada:
Peranzzetta descreve o processo de produo deste trabalho:
Fizemos o repertrio com o Paulinho Albuquerque, escolhemos o
repertrio, ela veio aqui em casa. Eu conhecia, eu tinha para esse
projeto todas as msicas do Cartola aqui em casa, todas originais.
E a fui trabalhando em cima e tal, ns tiramos os tons e, da, eu
fiquei com a msica para trabalhar. Da, comeou aquele processo:
peguei a msica, comecei a ouvir: aqui pode pr isso, ali pode pr
aquilo, posso trocar esse acorde por esse, aquele por outro,
introduo vai ser assim... Ento, esse processo foi o que
aconteceu e, especialmente, o que eu mais gosto de fazer... Da
marquei com ela, fomos para o estdio e gravamos. Mexemos em
algumas coisas, sim, isso supernatural. Foi a que ns dosamos
os condimentos; uma adequao das idias.
Dessa forma, a estrutura dessa nova montagem de Leny e Peranzzetta
do tema de Cartola : uma introduo instrumental de 10 compassos (do
compasso 1 ao compasso 10), uma parte denominada A1 de 12 compassos (docompasso 11 ao compasso 22), uma parte denominada B de 4 compassos (do
compasso 23 ao compasso 26), uma parte denominada A2de 8 compassos (do
compasso 27 ao compasso 34), uma parte denominada Cde 8 compassos (do
Intro A1 B C Coda
Voz
A2
violo violo
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compasso 35 ao compasso 42), depois Gilson improvisa a reapresentao de A1
e de B (do compasso 43 ao compasso 54) , reapresenta a parte A2 em 8
compassos (do compasso 55 ao compasso 62), reapresenta a parte C em 6
compassos (do compasso 63 ao compasso 68) e uma coda instrumental de 19compassos (do compasso 69 ao compasso 87). Dessa maneira, Peranzzetta
executa a msica duas vezes, iniciando a reapresentao com um improviso
instrumental, com Leny voltando a cantar nas partes A2e Ce encerrando a pea
numa grande coda instrumentalcom elementos de improvisao pianstica.
Percebe-se que Peranzzetta transforma a estrutura formal de Cartola na
mesma estrutura que Bastos, Mariano e Tom usaram: apresentao do tema,
reapresentao do tema instrumental e vocal e coda, ou seja, ele