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Acordo nuclear com Irã azeda relações entre EUA e Israel () Ivan Sant'Anna Especial para o UOL 16/04/2015 06h00 Ouvir texto Imprimir Comunicar erro Nos últimos tempos, Estados Unidos e Israel vêm se estranhando. Barack Obama não gostou nem um pouco da ida do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu para falar em uma sessão conjunta das duas casas do Congresso americano. Gostou menos ainda da vitória de Netanyahu nas eleições parlamentares israelenses. Na verdade, o líder israelense foi ao Capitólio fazer política interna. O pronunciamento sobre o risco que um Irã nuclearizado representaria para o mundo, e para Israel em particular, aconteceu duas semanas antes das eleições para o Knesset (parlamento), nas quais o partido conservador Likud, de Bibi - como Netanyahu é chamado por seus seguidores - obteve 23% dos votos e assim pôde montar uma coalizão para governar o país. Historicamente, as relações diplomáticas entre os Estados Unidos e Israel sempre giraram em torno da criação de um Estado palestino, impasse que se arrasta há 67 anos. Só que agora o cenário mudou. O assunto mais sério e mais ameaçador para os israelenses é o programa nuclear iraniano. Na primeira semana de abril, representantes de Estados Unidos, Rússia, China, Grã-Bretanha, França, Alemanha e Irã assinaram, em Lausanne, na Suíça, um acordo através do qual o governo iraniano se compromete a não seguir adiante com seu projeto nuclear, que o governo de Teerã diz ter fins unicamente pacíficos. Declaração essa na qual ninguém acredita, afinal, por que diabos um país rico em petróleo como o Irã precisaria de usinas atômicas? Na capital persa, a multidão saiu às ruas e comemorou ruidosamente a assinatura do tratado pois, se tudo correr conforme o combinado, os países ocidentais retirarão as sanções econômicas que estão em vigor contra o Irã e isso permitirá o crescimento do país. O problema é que o populacho iraniano, em meio aos gritos de apoio ao acordo assinado na Suíça, gritou também "morte a Israel", nação cuja existência o país se recusa a reconhecer. Nem sempre as relações entre israelenses com iranianos foram inamistosas. Muito pelo contrário, entre 1948, ano de criação do estado judeu, e 1979, quando a vitoriosa revolução islâmica comandada pelo aiatolá Khomeini depôs o xá Mohammad Reza Pahlavi, dando lugar ao sistema teocrático que prevalece até hoje, o xá sempre manteve relações amistosas, embora não muito explícitas, com Tel Aviv. A partir da revolução, o Irã se tornou inimigo mortal de Israel, pregando sua destruição. Como o regime dos aiatolás (Khomeini morreu em 1989, mas o sistema de governo teocrático que ele implantou prevalece até hoje) pregava ao mesmo tempo "morte ao Grande Satã" (Estados Unidos), nada mais natural do que mais essa aliança entre israelenses e americanos.

Acordo Nuclear Com Irã Azeda Relações Entre EUA e Israel - Notícias - UOL Opinião

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Page 1: Acordo Nuclear Com Irã Azeda Relações Entre EUA e Israel - Notícias - UOL Opinião

Acordo nuclear com Irã azedarelações entre EUA e Israel

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Ivan Sant'AnnaEspecial para o UOL

16/04/2015 06h00

m n o H { Ouvir texto J Imprimir F Comunicar erro

Nos últimos tempos, Estados Unidos e Israel vêm se estranhando. Barack Obama

não gostou nem um pouco da ida do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu para

falar em uma sessão conjunta das duas casas do Congresso americano. Gostou

menos ainda da vitória de Netanyahu nas eleições parlamentares israelenses.

Na verdade, o líder israelense foi ao Capitólio fazer política interna. O

pronunciamento sobre o risco que um Irã nuclearizado representaria para o mundo,

e para Israel em particular, aconteceu duas semanas antes das eleições para o

Knesset (parlamento), nas quais o partido conservador Likud, de Bibi - como

Netanyahu é chamado por seus seguidores - obteve 23% dos votos e assim pôde

montar uma coalizão para governar o país.

Historicamente, as relações diplomáticas entre os Estados Unidos e Israel sempre

giraram em torno da criação de um Estado palestino, impasse que se arrasta há 67

anos. Só que agora o cenário mudou. O assunto mais sério e mais ameaçador para

os israelenses é o programa nuclear iraniano.

Na primeira semana de abril, representantes de Estados Unidos, Rússia, China,

Grã-Bretanha, França, Alemanha e Irã assinaram, em Lausanne, na Suíça, um

acordo através do qual o governo iraniano se compromete a não seguir adiante com

seu projeto nuclear, que o governo de Teerã diz ter fins unicamente pacíficos.

Declaração essa na qual ninguém acredita, afinal, por que diabos um país rico em

petróleo como o Irã precisaria de usinas atômicas?

Na capital persa, a multidão saiu às ruas e comemorou ruidosamente a assinatura

do tratado pois, se tudo correr conforme o combinado, os países ocidentais retirarão

as sanções econômicas que estão em vigor contra o Irã e isso permitirá o

crescimento do país.

O problema é que o populacho iraniano, em meio aos gritos de apoio ao acordo

assinado na Suíça, gritou também "morte a Israel", nação cuja existência o país se

recusa a reconhecer.

Nem sempre as relações entre israelenses com iranianos foram inamistosas. Muito

pelo contrário, entre 1948, ano de criação do estado judeu, e 1979, quando a

vitoriosa revolução islâmica comandada pelo aiatolá Khomeini depôs o xá

Mohammad Reza Pahlavi, dando lugar ao sistema teocrático que prevalece até

hoje, o xá sempre manteve relações amistosas, embora não muito explícitas, com

Tel Aviv.

A partir da revolução, o Irã se tornou inimigo mortal de Israel, pregando sua

destruição. Como o regime dos aiatolás (Khomeini morreu em 1989, mas o sistema

de governo teocrático que ele implantou prevalece até hoje) pregava ao mesmo

tempo "morte ao Grande Satã" (Estados Unidos), nada mais natural do que mais

essa aliança entre israelenses e americanos.

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Barack Obama e Benjamin Netanyahu têm exatamente o mesmo objetivo final:

impedir que o Irã fabrique armas atômicas. Mas os dois chefes de governo usam

estratégias diferentes. Netanyahu quer manter pressão econômica contra o inimigo

e, se preciso, bombardear suas instalações nucleares, tal como Israel fez com um

reator iraquiano, em 1976. Obama prefere a via da negociação, como aconteceu

agora em Lausanne.

Israel tem muito mais a temer do que os Estados Unidos. Em um cochilo de seu

sistema de defesa, uma eventual bomba atômica iraniana poderia atingir seu

pequeno território, não havendo a menor chance de o Irã atacar com sucesso os

Estados Unidos, a dez mil quilômetros de distância.

O Irã não tem mísseis nem tecnologia para isso. Já Israel fica a menos de mil

quilômetros do Irã. Por isso, Bibi tem a impaciência dos guerreiros, e Obama, a

fleuma dos negociadores diplomáticos. Já os iranianos, não raro, se pautam pela

inconsequência dos fanáticos.

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IVAN SANT'ANNA74 anos, autor de "O Terceiro Templo - os conflitos árabe-israelenses e os choques do petróleo"(Objetiva) e outros 13 livros ()

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