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http://6cieta.org São Paulo, 8 a 12 de setembro de 2014. ISBN: 978-85-7506-232-6 A TERRITORIALIDADE DOS MOVIMENTOS SOCIAIS NA AMAZÔNIA: A REALIDADE DO MUNICÍPIO DE MARABÁ, NO SUDESTE PARAENSE Rogério Rego Miranda USP/UNIFESSPA [email protected] INTRODUÇÃO O espaço agrário amazônico é marcado pela concentração de terras, visualizada por meio dos latifúndios, dos quais muitos são produtos de grilagem, expropriação de indígenas, camponeses e da apropriação de terras devolutas de propriedade do Estado. Este fato ocorreu no Sudeste Paraense (ver figura 01), realidade em que os investimentos capitalistas se efetivaram com grande intensidade, culminando na abertura de estradas e em uma forte imigração, contribuindo para o aparecimento de uma grande massa de trabalhadores sem terra. Essa desigualdade sócioespacial é contestada por diversos movimentos sociais, com destaque ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST). Assim, torna-se importante a discussão da construção do território do MST, com destaque a sua configuração no Município de Marabá, processo que advém desde o final da década de 1990. A pesquisa apresenta uma grande relevância visto que analisa as formas de organização do MST, porém pelo prisma do território, entendido aqui, como produto da interação sociedade-espaço, a qual é mediada e delimitada por e a partir de relações de poder, em suas múltiplas dimensões. Nesse contexto, a nossa pesquisa visa analisar a ação desse movimento social no Município de Marabá, especialmente no que concerne as suas ações na construção e reprodução da luta territorial no assentamento 26 de Março. Para alcançarmos os resultados da pesquisa em andamento utilizamos como procedimentos metodológicos o levantamento de material bibliográfico e documental; observação sistemática; registros fotográficos; entrevistas semiestruturadas; questionários e produção cartográfica. 4002

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A TERRITORIALIDADE DOS MOVIMENTOSSOCIAIS NA AMAZÔNIA: A REALIDADE DO

MUNICÍPIO DE MARABÁ, NO SUDESTEPARAENSE

Rogério Rego Miranda

USP/UNIFESSPA

[email protected]

INTRODUÇÃO

O espaço agrário amazônico é marcado pela concentração de terras, visualizada

por meio dos latifúndios, dos quais muitos são produtos de grilagem, expropriação de

indígenas, camponeses e da apropriação de terras devolutas de propriedade do Estado. Este

fato ocorreu no Sudeste Paraense (ver figura 01), realidade em que os investimentos

capitalistas se efetivaram com grande intensidade, culminando na abertura de estradas e

em uma forte imigração, contribuindo para o aparecimento de uma grande massa de

trabalhadores sem terra.

Essa desigualdade sócioespacial é contestada por diversos movimentos sociais,

com destaque ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST). Assim, torna-se

importante a discussão da construção do território do MST, com destaque a sua

configuração no Município de Marabá, processo que advém desde o final da década de

1990. A pesquisa apresenta uma grande relevância visto que analisa as formas de

organização do MST, porém pelo prisma do território, entendido aqui, como produto da

interação sociedade-espaço, a qual é mediada e delimitada por e a partir de relações de

poder, em suas múltiplas dimensões. Nesse contexto, a nossa pesquisa visa analisar a ação

desse movimento social no Município de Marabá, especialmente no que concerne as suas

ações na construção e reprodução da luta territorial no assentamento 26 de Março. Para

alcançarmos os resultados da pesquisa em andamento utilizamos como procedimentos

metodológicos o levantamento de material bibliográfico e documental; observação

sistemática; registros fotográficos; entrevistas semiestruturadas; questionários e produção

cartográfica.

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Figura 1: Mesorregião do Sudeste Paraense.

Fonte: www.bicopapagaioam.hpg.ig.com.br/mapas

Assim, entendemos que na relação entre o Estado e movimentos sociais, o

primeiro apresenta um papel ambíguo em suas intervenções, visto que por meio da

Constituição Federal de 1988, assegura que as terras devolutas deveriam ser para a reforma

agraria, reconhecendo a reivindicação histórica dos movimentos sociais. Por outro lado,

deve prezar pela propriedade privada da terra e, para esse fim, estabelece duas frentes de

atuação em relação a esses movimentos, ou seja, uma visando o processo de criminalização

deles; e outra, proporcionando políticas públicas, a exemplo do Pronaf (Programa de

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Fortalecimento da Agricultura Familiar), que em certa medida busca controlar/disciplinar e

diminuir o papel político desses movimentos. Como consequência, observamos o aumento

de desapropriações de terra por parte do Estado e a expansão do capital sobre o Sudeste

Paraense e, especificamente Marabá, materializado no agronegócio, realizando a pecuária

de corte e a produção de leite, com alto grau de cientificização do território (uso de

inseminação artificial, clonagem de gado de alto valor comercial etc.), além da plantação de

eucalipto (uso na produção de carvão para as siderúrgicas e para o setor de construção

civil). Muitas dessas empresas se associam com assentados, que, por sua vez, utilizam de

financiamentos provenientes do Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da

Agricultura Familiar) para viabilizar a criação e a manutenção de rebanho bovino, que

posteriormente é vendido aos frigoríficos das empresas do agronegócio. Entretanto esse

processo não se desenvolve sem resistências e contra-projetos de territorialização

existentes nos assentamentos do MST, buscando a sua territorialidade mediante a uma

organização política (luta pela reforma agrária e, consequentemente, pela socialização dos

recursos naturais, ou seja, a terra de trabalho), econômica (economia camponesa, baseada

na economia de excedentes) e cultural própria (construção de uma identidade particular).

Com efeito, evidencia-se uma maior territorialização do capital em Marabá, mas, por outro

lado, as ocupações, os acampamentos e assentamentos representam e propõem, de

maneira aberta e conflituosa, projetos territoriais diversos e contra hegemônicos.

Conflitos territoriais no espaço agrário do sudeste paraense

O território do sudeste paraense, na Amazônia brasileira, é disputado por

décadas entre indígenas, castanheiros, fazendeiros, grileiros, garimpeiros, posseiros,

empresas mineradoras, dentre outros, conferindo a subregião a condição de uma das áreas

mais conflituosas do Brasil, devido à alta concentração de terras na região.

De acordo com dados da CPT (Comissão Pastoral da Terra) de 2011, os conflitos

por terra – compreendidos como despejos, expulsões, ameaças de despejos e expulsões,

bens destruídos e pistolagem – apresentam o seguinte número de ocorrências, por região:

Centro-Oeste com 37 casos, envolvendo 3.597 famílias; Nordeste com 279 casos,

envolvendo 21.923 famílias; Norte com 234 casos; envolvendo 18.026 famílias; Sudeste com

61 casos, envolvendo 5.638 famílias; e Sul com 27 casos, envolvendo 766 famílias,

totalizando 638 casos e envolvendo 49.950 famílias em todo o Brasil. Com base nesses

dados percebemos que o Nordeste e o Norte ainda permanecem como as áreas de maiores

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conflitos no campo.

O Pará registrou no ano de 2011 a marca de 103 conflitos, com um total de

12.197 famílias. A mesorregião do sudeste paraense apresentou 47 conflitos, envolvendo

6.226 famílias. Marabá correspondeu ao município com maior ocorrência de conflitos com

um total de 8, abarcando 416 famílias (CPT, 2011).

Nesses conflitos participam diversos movimentos sociais, com destaque ao

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), cujos sujeitos uma vez

desterritorializados, devido à expropriação de suas terras, almejam uma reterritorialização

mais inclusiva, ou seja, a reforma agrária, visto que eles não possuem no presente momento

o direito de dispor de um pedaço de chão para se reproduzirem em suas mais variadas

formas.

O movimento em relevo e sua territorialidade se expressa por meio, por

exemplo, das ocupações de terras, acampamentos e assentamentos, apresentando

articulações com outros segmentos de luta social, como a Comissão Pastoral da Terra (CPT),

a Via Campesina, o Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR), a Federação dos

Trabalhadores na Agricultura do Estado do Pará (Fetagri -PA), dentre outros. Assim, torna-se

importante a discussão da construção do território do MST, com destaque a sua

configuração no Município de Marabá, processo que advém desde o início da década de

1990.

O Sudeste Paraense, de acordo com Souza (2002), apresenta três importantes

períodos de reordenação espacial. O primeiro na década de 1970, mediante a política de

distribuição de lotes, provocando um forte movimento migratório para a região. E nesse

contexto, algumas famílias permaneceram; outras foram obrigadas a abandonarem seus

estabelecimentos e se dedicarem a atividades não agrícolas; e muitas procuraram diferentes

frentes de trabalho. O segundo momento, refere-se à ocupação da área pela atividade

agropecuária com fortes incentivos estatais ao capital privado nacional e internacional; além

da exploração mineral, estimulando uma nova leva de força de trabalho, para atuar nas

obras de infraestrutura, acirrando os conflitos sociais, especialmente aqueles ligados a

posse da terra. Também se evidencia o garimpo, a exemplo de Serra Pelada. Por fim, no

terceiro momento, observa-se uma redução do incremento populacional; o fechamento de

garimpos; e a ausência de uma política pública que realizasse de fato a reforma agrária,

favorecendo o aparecimento de uma grande massa de sujeitos desterritorializados, que

passam a lutar pela permanência no território e a pressionar o Estado para atingir esse fim.

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A Amazônia no contexto supracitado recebe inúmeros incentivos ficais e

creditícios, porém esses foram direcionados aos empresários nacionais e estrangeiros e aos

grandes projetos, que concorreram para o aumento da concentração de terras,

especialmente no sudeste paraense, provocando, ao contrário do que o governo militar

propagandeava, um desenvolvimento da miséria e da pobreza, principalmente em função

da diminuição dos postos de trabalho oferecidos inicialmente; da expulsão dos índios de

suas reservas; do remanejamento de ribeirinhos, em decorrência do represamento do rio,

proporcionado pela construção da Usina Hidrelétrica de Tucuruí (UHT); da retirada violenta

dos posseiros existentes na área pela ação de grileiros e empresários.

Com a desterritorialização desses diversos grupos sociais e a entrada de muitos

migrantes que vão para o Sudeste Paraense e lá se territorializam precariamente,

trabalhando como agricultores, peões, rendeiros e garimpeiros, embora igualmente

destituídos da terra, entraram igualmente para movimentos sociais como uma alternativa

de realizar o desejo de acesso à terra (SOUZA, 2002).

E o MST nasce em meio ao enfrentamento e a resistência contra a esse modelo

desenvolvimentista e agropecuário instaurado durante o regime militar, e tem como

fundamento a luta contra a expropriação e exploração existente no processo de reprodução

do capitalismo. E a sua construção está assentada no bojo das discussões sobre democracia,

em que a classe trabalhadora conquista novos espaços no campo e na cidade. Momento em

que surgem diversos movimentos sociais. Logo, o MST inicia sua gestação em meio a uma

série de experiências de lutas populares enquanto estratégia político-cultural estabelecida

no seio destes sujeitos sociais, que iniciam ocupações de terra em vários estados. Essas

lutas mais localizadas ganham repercussão no país por meio da igreja e em menor parte

pela mídia, mas foi pela troca de experiências que a articulação em nível nacional desses

movimentos se estruturou, objetivando a superação do isolamento e a autonomia política.

Nesse contexto foram realizados encontros maiores reunindo lideranças estaduais por

intermédio da CPT, especialmente no Centro-Sul, e dessas iniciativas se fundou e organizou

um movimento dos camponeses sem-terra nacional, que lutaria por reforma agrária,

originando o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (FERNANDES, 1999)

No Sudeste Paraense, o MST surge com o intento de organizar os camponeses,

em sua grande maioria migrantes oriundos de outras regiões, que haviam sido expulsos ou

mesmo expropriados de suas terras. Mas igualmente resulta de movimentos locais que se

formam, por exemplo, a partir de organizações sociais impulsionadas pela igreja, mediante

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as Comunidades Eclesiais de Base (CEB`s) em Marabá, que fomentaram a criação de

Sindicatos de Trabalhadores Rurais (STR`s). Além de partidos políticos ditos de esquerda

(Partido Comunista do Brasil – PC do B – e Partido dos Trabalhadores – PT) e clandestinos

que vão incitar tal processo (ALMEIDA, 2006).

Com o intuito de combater a estrutura fundiária concentrada os movimentos

sociais, em especial o MST, instauram uma dinâmica de luta e uso de estratégias que

venham a questionar e colocar em xeque essa realidade, concorrendo para a ocorrência de

diversos conflitos por terra.

Entre os anos de 2006 a 2011, o Pará apresentou 606 áreas em conflito,

envolvendo 77.028 famílias, ocupando uma área de 6.982.002 hectares. Quase metade

desse número de conflitos está localizada no sudeste paraense, o qual concentra 284 casos

de conflitos (46,86% de todo o estado do Pará), envolvendo 43.933 famílias (57,03%) e

ocupando uma área de 2.743.867 hectares (39,29%). Em Marabá foram identificadas 42

áreas em conflito (6,93%), envolvendo 5.299 famílias (6,87%) e ocupando 96.285 hectares

(1,37%), entre os anos de 2006 a 2011. De acordo com o gráfico 1 abaixo, observamos que o

número de conflitos anuais são relativamente altos no município em relevo, apresentando 4

conflitos no ano de 2007; 6 conflitos nos anos de 2006, 2008, 2011; 7 conflitos no ano de

2010; e 13 conflitos em 2009.

Desse modo, para pressionar o governo pela reforma agrária e reivindicar o

direito de acesso a terra-território, os movimentos sociais realizam as chamadas ocupações,

que correspondem a “ações coletivas das famílias sem ter¬ra que, por meio da entrada em

imóveis rurais, rei¬vindicam terras que não cumprem a função social” (CPT, 2009, p.11).

Nesse sentido, a partir de dados da CPT (2011) observou-se que no Pará houve cerca de 342

ocupações registradas entre os anos de 1999 e 2009, com aproximadamente 47.178 famílias

envolvidas. Desse total o Sudeste Paraense apresentou 270 ocupações computadas

(78,94%), com 31.852 famílias (67,51%). O Município de Marabá no período de 1999 a 2011

teve registrado 60 ocupações (17,54% de todo o estado do Pará) e 7.033famílias

discriminadas (14,90%).

Uma outra estratégia desenvolvida são os acampamentos; que, segundo a CPT

(2009, p.11), são “espaços de luta e formação, fruto de ações coletivas, localizados no campo

ou na cidade, onde as famílias sem terra organizadas, reivindicam assentamentos”.

No Pará, de um total de 83 acampamentos desencadeados entre os anos de

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2002 e 2011, envolvendo 16.632 famílias, 68 localizaram-se no Sudeste Paraense (76,92%),

compreendendo 11.672 famílias nessa situação. Marabá no período mencionado acima

apresentou 14 acampamentos (16,86% de todos os acampamentos do estado do Pará), com

1.518 famílias no total (9,12%), cujos números podem ser observados ao longo dos anos no

gráfico 3, que identifica um aumento de acampamentos no ano de 2003, início do governo

do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, porém com uma redução nos anos subsequentes, e

uma retomada desses acampamentos a partir de 2010, começo da presidência de Dilma

Vana Rousseff, em decorrência dos impasses existentes entre os movimentos sociais a

política de reforma agrária estatal.

Essas ações dos movimentos sociais buscam a implementação dos Projetos de

Assentamentos (PA`s) que no Sudeste Paraense, segundo Magalhães (2009), não seguem o

modelo recorrente de implantação, a saber: acampamento-desapropriação-assentamento;

isso porque essa mesorregião apresenta uma situação particular. Aliás ela concentra grande

parte dos PA`s existentes no país, ou seja, o sudeste do Pará possui sozinho um total de

495 assentamentos, com uma área de 4.486.461,766 hectares, contendo 69.876 famílias

assentadas (SIPRA/INCRA-SR/27, 2011).

Para Magalhaes (2009) esses assentamentos são produto de ocupações

desenvolvidas desde o final da década de 1970 e ao longo de 1980, momento de diversos

conflitos fundiários. Entretanto, os PA`s representam uma ação tardia do Estado em

reconhecer uma situação de reforma agrária proporcionada pelos próprios camponeses,

visto que o assentamento não lhes proporcionou o acesso à terra. Pelo contrário, esse fato

só ocorreu pela organização e luta coletiva travada pelos mesmos. Desse modo, os PA`s

compreendem a um direito adquirido pelos pequenos produtores, mediante a posse e o

trabalho na terra desenvolvido há anos, independente e muitas vezes contra o Estado. Logo,

o direito à terra pouco tem haver com as regras formais de propriedade, ao passo que o

projeto de assentamento é consequência de várias iniciativas sociais que venham a lhes

garantir melhorias, e é resultado de um processo jurídico-político, cuja elaboração é

efetuada por instituições ou organizações externas ao mundo camponês.

Em Marabá essa condição não é diferente, apenas por meio de diversas

ocupações realizadas no passado, é que hoje existem 77 assentamentos, com uma área

total de 398.486,2306 hectares e 6.793 famílias (SIPRA/INCRA-SR/27, 2011). Projetos esses

que são oriundos de ações de posseiros em castanhais e do próprio MST, fato que

contribuiu para que em 1998 e 1999 houvesse a criação de 38 PA`s e mais 21 de 2000 a

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2003. Entretanto, os dados indicam uma diminuição expressiva no número de PA`s, tendo

ocorrido 3 em 2004, 2 em 2005 e apenas 1 em cada ano de 2006 a 2009 e nenhum

assentamento foi criado nos anos de 2010 e 2011, denotando uma redução drástica da

política de reforma agraria do governo federal, o que explica o aumento de ocupações e

acampamento nos últimos anos conforme foi indicado acima.

Com relação a esses assentamentos e acampamentos, o MST é responsável

diretamente no Pará por 13 assentamentos e 12 acampamentos; no sudeste paraense por 7

assentamentos e 8 acampamentos; e em Marabá por 1 assentamento (26 de Março) e 1

acampamento (Helenira Rezende), de acordo com os dados do próprio movimento social no

ano de 2009 (ver quadro 01).

Quadro 1 – Relação dos assentamentos e acampamentos assessorados pelo MST no estado do Pará– 2009

Mesorregião Nº SituaçãoFundiária

Nome Município Área (ha)

N° deFamílias

Sudeste Paraense 1 Assentamento 26 de Março Marabá 9.774 206

2 Assentamento Palmares I e II Parauapebas 14.921 517

3 Assentamento Onalicio Barros Parauapebas 1.770 68

4 Assentamento 17 de Abril Eldorado do Carajás 18.000 690

5 Assentamento Cabanos Eldor do Carajás 3.426 85

6 Assentamento Canudos Eldorado do Carajás 2.836 62

7 Assentamento 1° de Março São João do Araguaia 10.960 338

Sudoeste Paraense

8 Assentamento Chico Mendes II Pacajá 5.250 66

9 Assentamento 08 de Março Pacajá 1.500 30

Nordeste Paraense

10 Assentamento Chico Mendes I Baião 3.050 42

Metropolitana de Belém

11 Assentamento João Batista Castanhal ----- 157

12 Assentamento Mártires de Abril Mosqueiro/Belém ----- 87

13 Assentamento Paulo Fontelles Mosqueiro/Belém ----- 68

Sudeste Paraense 14 Acampamento Helenira Resende Marabá ----- 300

15 Acampamento Lourival Santana Eldorado do Carajás ----- 383

16 Acampamento Dalcídio Jurandir Eldorado do Carajás ----- 350

17 Acampamento Dina Teixeira Canaã dos Carajás ----- 700

18 Acampamento João Canuto Xinguara ----- 130

19 Acampamento Wladimir Maiakóvisk

Xinguara ----- 380

20 Acampamento Negra Madalena Tucumã ----- 70

21 Acampamento Bom Jesus Tucumã ----- 20

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Confluência do Nordeste paraense, Sudoeste paraense e Baixo Amazonas.

22 Acampamento Salvador Allende Baião/Pacajá/Portel ----- 160

Nordeste Paraense

23 Acampamento Luis Carlos Prestes Irituia ----- 70

24 Acampamento Carlos Lamarca Capitão Poço ----- 60

25 Acampamento Olga Benário Acará ----- 55

Total de famílias

8.094

Fonte: Secretaria Estadual do MST-PA/2009

Embora numericamente a ação do MST pareça não ser significativamente

expressiva, especialmente em Marabá, segundo Ondetti et all (2010), esse movimento foi o

principal responsável por mobilizar e organizar as ações de ocupação de terras no sudeste

paraense, inovando em termos de táticas de ocupação e auxiliando inclusive os STR`s locais,

apesar de muitas divergências e conflitos.

O MST inicia a sua atuação junto ao sudeste paraense por volta de 1991 e se

articula com outras entidades locais, especialmente os STR`s, com o intuito de começar os

trabalhos de base, os quais começaram em Marabá, mediante ao cadastramento de três mil

famílias. A primeira decisão foi a ocupação da Fazenda Ponta de Pedras em São João do

Araguaia, a qual não pode ocorrer devido a intervenção da Polícia Militar (P.M.), da Polícia

Federal (P.F) e Polícia Civil (P.C.) de Marabá que fechou a sede do MST, sem ao menos um

mandato judicial, fato esse que culminou na prisão de sete dirigentes do referido

movimento social. Nesse mesmo contexto os fazendeiros resolvem agir de maneira

antecipada as ações do MST, pois antes atuavam com intensa violência contra os posseiros

de maneira individual e fragmentada, mas no caso do movimento sem-terra, esse se

organizava nacionalmente e avançava em todos os estados e com uma estratégia de luta

desconhecida para os fazendeiros (GOMES, 2009).

Com a desmobilização da primeira ocupação o movimento em relevo recebe

ajuda de pessoas do maranhão ligadas a ele e a partir de um novo trabalho de base se

ocupa uma área denominada de “cinturão verde” em Parauapebas no dia 26 de Junho de

1994, com cerca de 1.500 famílias. A área em questão havia sido cedida pelo governo federal

a Companhia Vale do Rio Doce, e para provocar pressão sobre o governo, as famílias

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acamparam em frente ao INCRA, em Marabá, durante cinco meses, e embora não tenham

conseguido a terra no local supracitado a luta dos militantes possibilitou a criação de um

projeto de assentamento com a desapropriação da fazenda Rio Branco, a partir desse

momento outras ocupações foram sendo realizadas e outros assentamentos são

organizados com base na logica do MST (GOMES, 2009).

Entretanto a ocupação que mais ganhou repercussão nacionalmente foi a do

Complexo Macaxeira que resultou no Massacre de Eldorado de Carajás (área em questão

fazia parte do polígono dos castanhais, que sediava o processo produtivo da

castanha-do-pará, baseado principalmente na mão de obra escrava. No local, após o

referido período, houve o investimento na criação de animais de grande porte e na venda

ilegal de madeira) que resultou na criação do P.A. 17 de Abril, fazendo referencia a data de

17/ 4/1996, em que houve o conflito com a Policia Militar e que gerou 19 mortes de sem

terras (GOMES, 2009).

Um dessas ações pode ser visualizada no caso específico do assentamento P.A.

26 de Março, que teve sua origem com a ocupação da fazenda Cabaceira de propriedade da

família Mutran, que foi ocupada a partir de uma estratégia estabelecida pelo MST, a qual

previa uma manifestação pública por emprego, no dia 26/03/1999, mas que em verdade

tinha por intuito desvirtuar o verdadeiro objetivo do ato, que era ocupar a área citada

anteriormente e para essa ação o MST organizou os trabalhos de base três meses antes e

com aproximadamente 50 militantes e outros assentados que se prontificaram em ajudar

(GOMES, 2009).

A ocupação da fazenda em destaque começou com 950 famílias e findou com

400, cuja quantidade de pessoas ultrapassava a área destinada ao assentamento, desta

forma ficaram apenas 206 famílias e as demais foram remanejadas para outras áreas de

acampamento. Com efeito o assentamento hoje apresenta 206 lotes com 50 hectares cada,

organizados em seis núcleos de moradia, que comportam cada um entre vinte e cinquenta

famílias (ver figura 2) e uma área de 174 hectares para cedida para a Escola Agrotécnica

Federal de Marabá (GOMES, 2009).

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Figura 2: Assentamento 26 de Março – Identificação dos Núcleos de Moradia.

O P.A. 26 de Março recebeu em 2009 políticas públicas que correspondem

aquelas que estão em forma de lei (norma de execução/ nº79/DD de 26 de dezembro de

2008) e são obrigatórias, devendo ser executadas pela seção regional do INCRA (SR-27) no

momento de implantação do assentamento, logo ficou ao seu encargo a demarcação da

área total e dos lotes de cada agricultor, da construção das casas, das estradas e de fomento

a agricultura, muito embora tenha sido identificado uma associação na aplicação de políticas

públicas entre o INCRA, governo estadual e municipal.

CONCLUSÕES

De uma maneira geral, no sudeste paraense existiu uma forte territorialização

de agentes econômicos, a exemplo dos castanheiros, comerciantes no inicio do século XX e,

mais recentemente, de empresas mineradoras e/ou agropecuárias e fazendeiros, que

viabilizaram expropriação, ou seja, introduziram formas de apropriação dos recursos, que

desterritorializam populações tradicionais, como os indígenas e camponeses. Embora, em

determinadas condições desenvolvam a territorialização do capital (Oliveira, 2002), entrando

em consórcio com os pequenos produtores e/ou assentados, subjugando-lhes a sua renda

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da terra.

Esse processo, no entanto, não deve obscurecer a ação concreta dos

movimentos sociais que se territorializam e apresentam formas outras de (re)produção,

irredutíveis a uma dimensão econômica. Além de construírem no seio das suas lutas

coletivas projetos alternativos, flexíveis e em estruturação constante, ambicionando uma

certa emancipação. Desse ponto de vista, concordamos com Gonçalves (2006), ao

compreender que os movimentos sociais apresentam uma expressão territorial, cuja análise

deve, metodologicamente, considerar alguns pressupostos, a saber: 1. Os conflitos

apresentam uma feição dialética e aberta dos processos instituintes; 2. O conflito territorial

deve ser analisado em suas diferentes escalas geográficas; 3. Por fim, os movimentos sociais

possuem a capacidade de trazer a tona as contradições marcadas no território, não apenas

mostrando a sua realidade atual, mas sugerindo outras possibilidades inscritas no real,

sendo portador de uma outra ordem, que implica em novas posições e reações socialmente

produzidas.

Tal interpretação é parcialmente compartilhada por Alentejano (2008), que

critica o conceito de “movimentos socioterritoriais” de Fernandes (2008), para o qual os

movimentos gozariam de uma maior autonomia, já que possuem o próprio território como

trunfo, a exemplo dos acampamentos, considerados espaços de luta, resistência e

socialização política. Todavia, para Alentejano (2008) essa autonomia deveria ser

relativizada, em virtude da atuação de outros mecanismos de subordinação, isto é, o

trabalho e a posse da terra fazem parte das relações de trabalho, mas não se referem a sua

totalidade. Portanto, deve-se inegavelmente avaliar os condicionantes e disciplinamentos

impostos pelo Projeto de Assentamento.

De uma maneira geral, ao se analisar a realidade do espaço agrário e a ação dos

movimentos sociais, especialmente em uma região de fronteira, como é o caso de nosso

locus de pesquisa, pauta-se ainda na ideia de frente pioneira, que exprime um movimento

social cujo resultado imediato é a incorporação de novas regiões pela economia de mercado

(MARTINS, 1975). Havendo a “modernização” das relações e inserindo-as em uma lógica do

mercado capitalista. Não estamos negando esse processo, mas como Martins (1997) nos

chama atenção, a fronteira é marcada pelo encontro e desencontro de temporalidades,

representativas de tempos sociais que embora “nascidas” em momentos históricos

diferentes, coexistem entre si assimetricamente, numa relação de “descompasso e

desencontro”. Essas temporalidades, e porque não dizer territorialidades, reconstroem

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concepções de sociedade que entram em disputa entre si, criando projetos territoriais que

possuem naturezas diferenciadas, mas articuladas.

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A TERRITORIALIDADE DOS MOVIMENTOS SOCIAIS NA AMAZÔNIA: A REALIDADE DO MUNICÍPIO DE MARABÁ, NO SUDESTE PARAENSE

EIXO 2 – Dinâmicas e conflitos territoriais no campo e desenvolvimento rural

RESUMO

O espaço agrário amazônico é marcado pela concentração de terras oriunda da grilagem, da

expropriação de territórios indígenas, camponesas e da apropriação de terras devolutas de

propriedade estatal. No Sudeste Paraense isso ocorre devido aos investimentos capitalistas se

efetivaram com grande intensidade, culminando na abertura de estradas e no investimento de

grandes projetos agropecuários e mineradores, concorrendo para a valorização e apropriação

empresarial da terra, por outro lado, promove também uma forte imigração, contribuindo para o

aparecimento de uma grande massa de trabalhadores sem terra. Essa desigualdade sócioespacial

é contestada por diversos movimentos sociais, com destaque ao Movimento dos Trabalhadores

Rurais Sem-Terra (MST). A sua territorialidade se expressa por meio das ocupações de terras,

acampamentos e assentamentos. Assim, torna-se importante a discussão da construção do

território do MST, com destaque a sua configuração no Município de Marabá, processo que advém

desde o final da década de 1990. Desta feita, a pesquisa apresenta uma grande relevância visto

que analisa as formas de organização do MST, porém pelo prisma do território, entendido aqui,

como produto da interação sociedade-espaço, a qual é mediada e delimitada por e a partir de

relações de poder, em suas múltiplas dimensões. Assim, a pesquisa visa analisar a ação das

políticas públicas sobre o território camponês no espaço agrário do Município de Marabá,

especialmente no que concernem as atuações governamentais junto aos assentamentos

provenientes de lutas do MST, com destaque ao assentamento 26 de Março. Para alcançarmos os

resultados da pesquisa em andamento utilizamos como procedimentos metodológicos o

levantamento de material bibliográfico e documental; observação sistemática; registros

fotográficos; entrevistas semiestruturadas; questionários e produção cartográfica. Assim,

entendemos que nessa relação entre o Estado e movimentos sociais, o primeiro apresenta um

papel ambíguo em suas intervenções, visto que por meio da Constituição de 1988, assegura que

as terras devolutas deveriam ser para a reforma agraria. Por outro lado, deve prezar pela

propriedade privada da terra, estabelecendo duas frentes de atuação em relação aos movimentos:

uma visando o processo de criminalização deles; e outra, proporcionando políticas públicas, a

exemplo Programa de Fortalecimento da Agricultura Familiar, que em certa medida busca

controlar/disciplinar e diminuir o papel político dos movimentos sociais. Consequentemente,

eleva-se as desapropriações de terra e a expansão do capital sobre o Sudeste Paraense e,

especificamente, Marabá, materializado no agronegócio, realizando a pecuária de corte e a

produção de leite, com alto grau de cientificização do território, além da plantação de eucalipto

usado nas siderúrgicas. Muitas dessas empresas do agronegócio se associam aos assentados,

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que, por sua vez, utilizam de financiamentos provenientes do Pronaf para viabilizar a criação de

gado, que posteriormente é vendido aos frigoríficos dessas empresas. Entretanto, esse processo

não se desenvolve sem resistências, existentes nos assentamentos de atuação do MST, buscando

a sua territorialidade mediante a uma organização política, econômica e cultural própria. Com

efeito, evidencia-se uma maior territorialização do capital em Marabá, mas, por outro lado, as

ocupações, os acampamentos e assentamentos representam e propõem, de maneira aberta e

conflituosa, projetos territoriais diversos e contra hegemônicos.

Palavras-chave: Amazônia; Marabá; MST; Pronaf.

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