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1 UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ FLÁVIA BRUM A CONCESSÃO DE ISENÇÕES DE IMPOSTOS ESTADUAIS E MUNICIPAIS POR MEIO DE TRATADOS INTERNACIONAIS São José 2010

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ

FLÁVIA BRUM

A CONCESSÃO DE ISENÇÕES DE IMPOSTOS ESTADUAIS E

MUNICIPAIS POR MEIO DE TRATADOS INTERNACIONAIS

São José

2010

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FLÁVIA BRUM

A CONCESSÃO DE ISENÇÕES DE IMPOSTOS ESTADUAIS E

MUNICIPAIS POR MEIO DE TRATADOS INTERNACIONAIS

Monografia apresentada à Universidade do

Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito

parcial a obtenção do grau em Bacharel em

Direito.

Orientador: Prof. MSc. Ivori Luis da Silva Scheffer

São José

2010

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FLÁVIA BRUM

A CONCESSÃO DE ISENÇÕES DE IMPOSTOS ESTADUAIS E

MUNICIPAIS POR MEIO DE TRATADOS INTERNACIONAIS

Esta Monografia foi julgada adequada para a obtenção do título de bacharel e aprovada pelo

Curso de Direito, da Universidade do Vale do Itajaí, Centro de Ciências Sociais e Jurídicas.

Área de Concentração: Direito Internacional

São José, junho de 2010.

Prof. MSc. Ivori Luis da Silva Scheffer

UNIVALI – Campus de São José

Orientador

Prof. MSc. Sérgio Luiz Veronese Júnior

UNIVALI – Campus de Biguaçu

Membro 1

Prof. Esp. Carlos Alberto Luz Gonçalves

UNIVALI – Campus de São José

Membro 2

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Dedico este trabalho primeiramente a Deus, pelo dom da vida, determinação e perseverança.

Aos meus pais Ronaldo Martins Brum e Selma Brum, por todo o amor, carinho, exemplo de

vida, formação do meu caráter e pela oportunidade que me foi dada de poder ter feito um

curso superior.

À minha irmã, Débora Brum, pelo amor, carinho, apoio e incentivo.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, pelo dom da vida, pela saúde, pela força, superação de obstáculos, pela auto-

confiança e eterna determinação.

Ao meus queridos pais, pela educação e formação, sempre proporcionando todos os

meios possíveis para que eu chegasse onde estou.

À minha irmã, Débora, pela contribuição com material bibliográfico para ajudar na

conclusão do presente trabalho.

Às minhas avós, Gether Martins Brum e Ritta Lang, por todo o amor e incentivo, que

sempre confiaram no meu potencial.

Aos meus colegas de trabalho, pela compreensão quando das minhas ausências e

alterações de humor.

Aos meus amigos, pela paciência, pelo carinho, e por estarem sempre ali quando

deles precisei.

Ao professor MSc. Ivori Luis da Silva Scheffer, pelo acompanhamento de forma

sempre pontual, competente e interessado e, principalmente por ter acreditado na minha

capacidade de concluir este trabalho em tão pouco tempo.

A todos (as) os (as) professores (as) da Universidade do Vale do Itajaí e da

coordenação do curso de Direito, por todo o conhecimento transmitido ao longo do curso, que

me proporcionou além da formação acadêmica, crescimento pessoal e maturidade.

Aos colegas do curso, onde fiz muitas amizades, com os quais aprendi muito.

À Bete e à Magda, da biblioteca da Procuradoria-Geral de Justiça do Estado de Santa

Catarina, por não medirem esforços em me auxiliar na busca por material bibliográfico.

Por fim, agradeço a todos que fizeram parte da minha vida e que, direta ou

indiretamente, contribuíram para a concretização da minha caminhada rumo à graduação.

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É apenas com o coração que se pode ver direito;

o essencial é invisível aos olhos.

Antoine de Saint-Exupéry

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte

ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do Itajaí, a

coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de toda e qualquer

responsabilidade acerca do mesmo.

São José, junho de 2010.

Flávia Brum

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RESUMO

A presente monografia de conclusão de curso trata de investigar acerca da possibilidade de

concessão de isenções de impostos estaduais e municipais por meio de tratados internacionais.

Em face disso, é necessário entender a distribuição da competência tributária pela

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, porquanto a descentralização do

poder é o cerne do princípio federativo. A Constituição da República Federativa do Brasil de

1988 traz a vedação à União de instituir tributos da competência dos Estados-Membros,

Distrito Federal e Municípios, no artigo 151, III. Todavia, a doutrina e a jurisprudência

entendem que esta vedação se dirige à União como pessoa jurídica de direito público interno,

não à União que representa a República Federativa do Brasil quando celebra tratado

internacional. Quando o Presidente da República Federativa do Brasil subscreve um tratado

internacional, não o faz como Chefe de Governo da União, mas como Chefe de Estado da

República Federativa do Brasil. O Código Tributário Nacional foi recepcionado pela

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, como lei complementar e, portanto,

tem grau de hierarquia superior às leis ordinárias, podendo fazer prevalecer os tratados

internacionais em matéria tributária sobre as legislações da União, dos Estados-Membros e

dos Municípios.

Palavras-chave: Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, isenção

heterônoma, princípio federativo, tratados internacionais.

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ABSTRACT

The present course’s completion monograph is concerned with the possibility of the

concession of state and its municipalities tax exemptions by means of international treaties. In

view of this, it is necessary to comprehend the tributary competence distribution by the

Constitution of the Federative Republic of Brazil of 1998, whereas the power decentralization

is the pith of the federative principle. The Constitution of the Federative Republic of Brazil of

1998 brings the prohibition to the Union to institute exemptions from tributes within the

powers of the states, of the Federal District or of the municipalities, in the article 151, III.

However, the doctrine and the jurisprudence understand that this prohibition is applied to the

Union as a legal person of internal public law, not to the Union when it represents the

Federative Republic of Brazil when it concludes international treaties. When the President of

the Federative Republic of Brazil signs an international treaty, he does not act as the

Government Chief of the Union, but as the Chief of State of the Federative Republic of

Brazil. The National Tax Code was received by the Constitution of the Federative Republic of

Brazil of 1998, as supplementary law and so it is hierarchically superior to the ordinary law,

which allows it to make the international treaties on tributary matter prevail against the

legislations of the Union, the states and the municipalities.

Keywords: Constitution of the Federative Republic of Brazil of 1998, federative principle,

heteronymous exemption, international treaties.

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ROL DE ABREVIATURAS OU SIGLAS

ADI – Ação Direta de Inconstitucionalidade

AgR. – Agravo Regimental

Art. – Artigo

BA – Estado da Bahia

CRFB/88 – Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988

DF – Distrito Federal

GATT – General Agreements on Tariffs and Trade

HC – Habeas Corpus

ICMS – Imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e prestação de

serviços de transportes e de comunicação

IE – Imposto de exportação

IGF – Imposto sobre grandes fortunas

II – Imposto de importação

IOF – Imposto sobre operações financeiras

IPI – Imposto sobre produtos industrializados

IPTU – Imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana

IPVA – Imposto sobre a propriedade de veículos automotores

IR – Imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza

ISS – Imposto sobre serviços de qualquer natureza

ITBI – Imposto sobre a transmissão de bens imóveis e de direitos a eles relativos

ITCMD – Imposto sobre transmissão causa mortis e doação de quaisquer bens ou direitos

ITR – Imposto sobre a propriedade territorial rural

MC – Medida Cautelar

MERCOSUL – Mercado Comum do Sul

Min. – Ministro

ONU – Organização das Nações Unidas

RE – Recurso Extraordinário

RJ – Estado do Rio de Janeiro

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RS – Estado do Rio Grande do Sul

SC – Estado de Santa Catarina

SE – Estado do Sergipe

STF – Supremo Tribunal Federal

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ROL DE CATEGORIAS

Competência:

Competência é o poder de atuação com autoridade na esfera do seu domínio.1

Congresso Nacional:

Congresso Nacional é o órgão do Poder Legislativo que exerce a função legislativa do Estado

Federal e da União.2

Decretos:

Decretos são normas jurídicas editadas pelo Poder Executivo – Presidente, Governador ou

Prefeito. Servem para regulamentar o conteúdo das leis. Em matéria tributária, integram a

expressão “legislação tributária” contida no artigo 96, do Código Tributário Nacional.

Ademais, para que o decreto seja válido, deve ser referendado pelo Ministro de Estado.3

Decreto legislativo:

Os decretos legislativos são atos do Poder Legislativo que não se sujeitam à sanção

presidencial, não necessitando de quorum especial, ou seja, basta a maioria simples. Na área

tributária, serve como instrumento hábil para a aprovação de tratados, acordos ou atos

internacionais. Regulam matéria de competência do Congresso Nacional com efeitos

externos.4

Direito Internacional Público:

O Direito Internacional Público é um sistema jurídico autônomo onde são disciplinadas as

relações entre Estados soberanos.5

1 REZEK, José Francisco. Direito Internacional Público: Curso Elementar. 8. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 153. 2 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 29. ed. rev. e atual. (até a Emenda Constitucional n. 53, de 19.12.2006). São Paulo: Malheiros Editores, 2007. p. 509. 3 MARTINS, Sérgio Pinto. Manual de direito tributário . 5. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 51. 4 MARTINS, Sérgio Pinto. Manual de direito tributário . 5. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 51. 5 REZEK, José Francisco. Direito Internacional Público: Curso Elementar. 8. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 3.

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Hipótese de incidência:

Hipótese de incidência é a descrição conceitual, hipotética e abstrata de um fato.6

Imposto:

O imposto, uma das espécies contidas dentro do gênero tributo, é a exigência unilateral do

Estado por força de previsão legal, de certa quantia de dinheiro, do contribuinte.7

Lei Complementar:

A lei complementar, como aduz seu próprio nome, complementa a norma constitucional de

eficácia limitada. É norma geral destinada ao legislador ordinário. Também é aplicada a todos

os entes federados e não somente à União, por se tratar de lei nacional. Por ter quorum

especial de votação, para que a lei complementar seja aprovada, necessita da maioria absoluta

dos votos dos membros das duas Casas do Congresso Nacional.8

Lei Federal:

A lei federal é a editada pelo Congresso Nacional enquanto órgão legislativo da União e

obriga os jurisdicionados que estão a ela sujeitos, não invadindo o campo dos Estados-

Membros e Municípios.9

Lei Nacional:

A lei nacional é aquela editada pelo Congresso Nacional enquanto órgão legislativo do Estado

Federal, obrigando a todos os que estiverem no território nacional.10

Lei Ordinária:

A lei ordinária não precisa de quorum especial para sua aprovação. Assim, pode ser aprovada

a partir da votação por maioria simples. Ademais, quando a lei complementar é aprovada sem

que seja observado o requisito do quorum especial, ela é tida como lei ordinária. A lei

6 ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. São Paulo: Malheiros, 1992. p. 53. 7 ATALIBA, Geraldo. Sistema constitucional tributário brasileiro. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1968. p. 137. 8 MARTINS, Sérgio Pinto. Manual de direito tributário . 5. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 48. 9 ATALIBA, Geraldo. Sistema constitucional tributário brasileiro. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1968. p. 95. 10 ATALIBA, Geraldo. Sistema constitucional tributário brasileiro. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1968. p. 95.

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ordinária é a fonte formal básica do direito tributário e é o instrumento que origina a grande

maioria dos tributos existentes, salvo os criados por lei complementar.11

Obrigação tributária :

Obrigação tributária é o dever que o sujeito passivo tem para com o sujeito ativo, a partir do

momento em que o fato previsto na lei efetivamente ocorre.12

Pacta sunt servanda:

O pacta sunt servanda é o princípio que impõe o cumprimento daquilo que foi pactuado.13

Tributo :

O tributo é uma obrigação de conteúdo econômico, que não constitui sanção de ato ilícito,

onde o sujeito ativo, que é uma pessoa pública (ou delegado por esta), deve, para o sujeito

passivo, que é aquele qualificado pela lei, certa quantia pecuniária.14

11 MARTINS, Sérgio Pinto. Manual de direito tributário . 5. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 49. 12 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 30 ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros Editores, 2009. p. 121. 13 REZEK, José Francisco. Direito Internacional Público: Curso Elementar. 8. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 3. 14 ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. São Paulo: Malheiros, 1992. p. 32.

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SUMÁRIO

RESUMO..................................................................................................................................X

ABSTRACT............................................................................................................................XI

ROL DE ABREVIATURAS OU SIGLAS..........................................................................XII

ROL DE CATEGORIAS....................................................................................................XIV

INTRODUÇÃO.......................................................................................................................18

1 DISTRIBUIÇÃO DA COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA NACIONAL.. ........................21

1.1 PRINCÍPIO FEDERATIVO...............................................................................................21

1.2 CATEGORIAS ESPECIAIS DA TÉCNICA DE TRIBUTAÇÃO....................................23

1.2.1 Incidência tributária......................................................................................................23

1.2.2 Não-incidência tributária..............................................................................................24

1.2.3 Imunidade tributária.....................................................................................................25

1.2.4 Isenção.............................................................................................................................26

1.3 COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA......................................................................................28

1.3.1 Conceito...........................................................................................................................28

1.3.2 Espécies de competência tributária..............................................................................29

1.3.2.1 Competência privativa..................................................................................................30

1.3.2.2 Competência comum.....................................................................................................31

1.3.2.3 Competência concorrente..............................................................................................32

1.3.2.4 Competência residual....................................................................................................32

1.3.2.5 Competência especial....................................................................................................33

1.3.2.6 Competência cumulativa..............................................................................................34

1.3.3 Características das competências tributárias..............................................................35

1.3.3.1 Indelegabilidade............................................................................................................35

1.3.3.2 Irrenunciabilidade.........................................................................................................36

1.3.3.3 Inalterabilidade..............................................................................................................36

1.3.3.4 Incaducabilidade...........................................................................................................36

1.3.3.5 Facultatividade..............................................................................................................37

1.3.3.6 Privatividade.................................................................................................................37

1.4. DISTRIBUIÇÃO CONSTITUCIONAL DAS COMPETÊNCIAS TRIBUTÁRIAS.......38

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1.4.1 Competência tributária dos Estados............................................................................38

1.4.2 Competência tributária dos Municípios......................................................................39

1.4.3 Competência tributária do Distrito Federal................................................................39

1.4.4 Competência tributária da União.................................................................................40

2 OS TRATADOS E O DIREITO INTERNO.....................................................................42

2.1 A REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL E SUA INTEGRAÇÃO

INTERNACIONAL..................................................................................................................42

2.1.1 Soberania e Autonomia.................................................................................................42

2.1.2 Integração internacional do Brasil (artigo 4º, parágrafo único, da CRFB/88)........46

2.1.2.1 Independência nacional.................................................................................................47

2.1.2.2 Prevalência dos Direitos Humanos...............................................................................47

2.1.2.3 Autodeterminação dos povos........................................................................................48

2.1.2.4 Não-intervenção............................................................................................................49

2.1.2.5 Igualdade entre os Estados............................................................................................50

2.1.2.6 Defesa da paz................................................................................................................50

2.1.2.7 Solução pacífica de conflitos........................................................................................51

2.1.2.8 Repúdio ao terrorismo e ao racismo.............................................................................53

2.1.2.9 Cooperação entre os povos para o progresso da humanidade.......................................55

2.1.2.10 Concessão de asilo político.........................................................................................56

2.1.2.11 Integração dos povos na América Latina....................................................................57

2.2 O PODER DE CELEBRAR TRATADOS.........................................................................58

2.2.1 Conceito de tratado........................................................................................................60

2.2.2 O procedimento de celebração de tratados..................................................................61

2.2.2.1 Negociação....................................................................................................................61

2.2.2.2 Assinatura......................................................................................................................62

2.2.2.3 Referendo e ratificação.................................................................................................63

2.2.2.4 Promulgação e publicação............................................................................................64

2.2.3 Momento da entrada em vigor do tratado internacional...........................................65

2.3 RESPONSABILIDADE INTERNACIONAL....................................................................66

2.3.1 Por atos do Poder Judiciário.........................................................................................67

2.3.1.1 Recusa de acesso aos tribunais......................................................................................68

2.3.1.2 Recusa do Tribunal de julgar a questão de fundo.........................................................68

2.3.1.3 Retardamento exagerado no julgamento sem que haja uma justificação válida...........68

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2.3.1.4 Falta de diligência devida na perseguição ou prisão do autor de um delito praticado

contra um estrangeiro................................................................................................................69

2.3.1.5 Rapidez insólita no julgamento de um acusado estrangeiro, Prisão ou detenção ilegal

de um estrangeiro e Inexecução de uma sentença proferida a favor de um estrangeiro...........69

2.3.2 Sanções internacionais...................................................................................................69

2.3.2.1 Sanções Unilaterais.......................................................................................................70

2.3.2.2 Sanções Coletivas.........................................................................................................71

3 CONCESSÃO DE ISENÇÃO HETERÔNOMA POR TRATADO................................72

3.1 DIREITO INTERNACIONAL E DIREITO INTERNO....................................................72

3.1.1 Teorias Dualista e Monista............................................................................................72

3.2 POSIÇÃO HIERÁRQUICA DOS TRATADOS EM FACE DA LEGISLAÇÃO

INTERNA.................................................................................................................................74

3.2.1 Tratado e a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988......................75

3.2.2 Tratado sobre direitos humanos (artigo 5°, § 3º, da CRFB/88).................................76

3.2.3 Tratado e normas infraconstitucionais........................................................................76

3.2.4 Posição do STF...............................................................................................................77

3.3 PROIBIÇÃO CONSTITUCIONAL DE CONCESSÃO DE ISENÇÃO HETERÔNOMA

(artigo 151, III, da CRFB/88)....................................................................................................79

3.3.1 Previsão constitucional de isenção heterônoma (artigos 155, § 2º, XII,

"e", e 156, § 3º, II, da CRFB/88)............................................................................................82

3.4 O DISPOSTO NO ARTIGO 98, DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL..................87

3.5 CONCESSÃO DE ISENÇÃO HETERÔNOMA POR TRATADO..................................89

CONCLUSÃO.........................................................................................................................95

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..................................................................................97

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho de pesquisa tem por objeto a análise acerca da possibilidade

de concessão de isenções a impostos estaduais e municipais por via de tratados internacionais.

O tema investigado é de grande importância, porquanto a globalização estreitou os

laços econômicos entre os países, facilitando, assim, a realização de negócios, os quais são

feitos através de pactos. A pacificação do assunto abordado neste trabalho de pesquisa

consolidaria credibilidade e seriedade nas relações internacionais quando da celebração de

acordos. No âmbito interno, sanaria a questão dos conflitos de competência entre os entes

federados.

A pesquisa foi dividida em três capítulos. O primeiro cuida do Sistema Tributário

Nacional, onde inicialmente se verifica como a competência tributária é constitucionalmente

distribuída entre os entes federados, a partir do princípio federativo, cuja maior característica

é a descentralização do poder. Desta forma, a Constituição da República Federativa do Brasil

de 1988 repartiu a competência tributária entre os entes federados – União, Distrito Federal,

Estados-Membros e Municípios. Também serão analisadas as categorias da técnica de

tributação, como a incidência, não-incidência, imunidade e isenção, onde o conceito desta

última aborda o foco principal deste trabalho. A partir do estudo da distribuição da

competência tributária, será dado o seu conceito, suas espécies e características.

O segundo capítulo trata da relação entre os tratados internacionais e o

ordenamento jurídico interno, distinguindo soberania de autonomia e analisando cada um dos

princípios que regem a integração internacional da República Federativa do Brasil. Esta

última é soberana, ou seja, não se subordina aos poderes dos demais Estados soberanos. Por

outro lado, os entes federados, isonômicos entre si, são dotados de autonomia, que é a

capacidade de se autogovernar. Assim, só a República Federativa do Brasil pode manter

relações internacionais com outros países e, ao fazê-lo, deve observar os princípios elencados

no artigo 4°, da CRFB/88.

Também será analisado o poder de celebrar tratados, bem como o procedimento

de celebração e incorporação de um tratado internacional no ordenamento jurídico doméstico.

O procedimento da celebração dos tratados internacionais se inicia pela negociação dos

termos e condições nos quais se estabelecerá a obrigação. A seguir, após a adoção do texto, o

documento é assinado pelo Presidente da República e submetido à aprovação do Congresso

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Nacional, por meio de decreto legislativo. Caso este o aprove, o tratado será encaminhado ao

Presidente da República para que este manifeste o aceite definitivo, ou seja, ratifique-o. Por

conseguinte, os instrumentos de ratificação são depositados ou trocados. Por fim, o Presidente

da República promulga o tratado e expede um decreto ordenando a sua publicação do Diário

Oficial da União, em português.

Ao final do segundo capítulo, será estudada a responsabilidade internacional e as

conseqüências do não-adimplemento das obrigações contidas no acordo internacional pela

parte signatária. Os Estados são responsáveis internacionalmente por danos que causarem aos

demais Estados soberanos. Mas, para caracterizar, de fato, a responsabilização internacional,

deve haver o ato passível de responsabilidade, o dano, e o nexo de causalidade entre ambos. A

não-aplicação do tratado, devidamente incorporado, pelos juízes, também acarreta

responsabilidade internacional, porquanto atos dos magistrados são atos do Estado. Face ao

não-cumprimento das obrigações acordadas, o Estado lesado pode aplicar sanções a fim de

obter a reparação do dano causado.

O terceiro capítulo, por sua vez, cuida do tema central ao qual se propõe este

trabalho de pesquisa, que é o de investigar se tratado internacional, do qual a República

Federativa do Brasil faça parte, pode exonerar impostos estaduais e municipais. Para tanto,

será primeiramente abordado o entendimento das escolas de pensamento que discutem qual

ordem jurídica prevalece – a interna ou a internacional, que são as Teorias Dualista e Monista.

Em seguida, será averiguada qual a posição hierárquica ocupada pelos tratados internacionais

frente à Constituição da República Federativa do Brasil e às leis infraconstitucionais, levando

em conta o tratamento especial relativamente aos tratados que versam sobre direitos humanos,

pelo § 3°, do artigo 5°, da CRFB/88, inserido pela emenda constitucional n.° 45/2004. Após,

será estudado o entendimento do Supremo Tribunal Federal sobre a questão.

Por conseguinte, será explanado acerca da vedação e da previsão constitucional de

isenção heterônoma constantes, respectivamente, dos artigos 151, III; 155, § 2°, XII, e; e 156,

§ 3°, II, todos da Constituição da República Federativa do Brasil. A CRFB/88 veda

expressamente à União, no artigo 151, III, da CRFB/88, a concessão de isenções de impostos

que são da competência dos Estados-Membros e Municípios. A vedação é dirigida à União

enquanto pessoa jurídica de direito público interno. Em decorrência do princípio federativo,

um ente federado não pode invadir o âmbito de competência uns dos outros, porquanto só

pode isentar aquele que é competente para tributar, salvo se a CRFB/88 expressamente

permitir, que é o caso dos artigos 155, § 2°, XII, “e”, quanto ao ICMS, da competência dos

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Estados-Membros, e o 156, § 3°, II, referente ao ISS, cuja instituição é da competência dos

Municípios.

Por fim, estuda-se, fazendo uso da doutrina e jurisprudência quanto ao sentido e

alcance do artigo 98, do Código Tributário Nacional. O referido artigo atribui primazia aos

tratados internacionais em matéria tributária sobre a legislação tributária interna. Discute-se a

possibilidade da edição de normas gerais pelo Código Tributário Nacional. Acontece que ele

foi recepcionado pela CRFB/88 como lei complementar, logo, ele é lei complementar. O

objetivo do dispositivo em questão é conferir credibilidade e garantia aos países signatários,

de que as obrigações pactuadas serão efetiva e respeitosamente cumpridas.

No então trabalho de pesquisa foi empregado o método dedutivo, vez que se

estabeleceu uma formulação geral e, por conseguinte, foram examinadas as partes do

fenômeno a fim de sustentar a formulação geral.

O procedimento investigatório utilizado no presente trabalho foi o bibliográfico,

onde foi realizada pesquisa com base na doutrina, na legislação e na jurisprudência.

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1 DISTRIBUIÇÃO DA COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA NACIONAL

A relevância deste capítulo para o estudo do tema central deste trabalho de

pesquisa consiste em entender, a partir do conceito de princípio federativo, de que forma se dá

a distribuição constitucional das competências tributárias entre as pessoas jurídicas de direito

público interno que compõem a República Federativa do Brasil, bem como suas espécies e

características.

É através do estudo acerca da distribuição de competências que se verifica o que

cada ente político pode fazer dentro da esfera de atribuições conferidas pela Constituição da

República Federativa do Brasil de 1988.

1.1 PRINCÍPIO FEDERATIVO

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, doravante denominada

CRFB/88, adotou o federalismo como forma de organização político-administrativa,

caracterizado pela divisão de competências entre seus entes autônomos15. Estabelece em seu

primeiro artigo que a República Federativa do Brasil é formada pela união indissolúvel dos

Estados, Municípios e do Distrito Federal:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos.16

O princípio federativo deriva da forma como um Estado está estruturado e da

maneira como se organiza17. Como a República Federativa do Brasil adotou a forma

federativa de Estado, que tem por característica primordial a descentralização do poder18, é

que as competências foram partilhadas aos entes que compõem a federação19.

15 COELHO, Luiz Otávio Rodrigues. O estatuto da cidade frente ao princípio federativo e a repartição constitucional de competência. Interesse Público, v. 5, n. 24, mar./abr. 2004. p. 205. 16 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010. 17 CHIESA, Clélio. ICMS: Isenções de serviços e produtos destinados ao exterior. Revista dos Tribunais, v. 84, n. 721, Nov. 1995, Artigo. p. 226. 18 AGRA, Walber de Moura. Curso de direito constitucional. Rio de Janeiro: Forense, 2008. p. 97. 19 CARNEIRO, Sérgio Luiz de Souza. Possibilidade da concessão, pela União, de isenções de tributos estaduais e municipais, em decorrência de tratado internacional. Repertório IOB de Jurisprudência: tributário, constitucional e administrativo. n. 8. abr. 2001. p. 213.

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As regras de competência estão diretamente ligadas ao princípio federativo de

modo que, este não existe se o poder for todo centralizado na pessoa do Estado20. Com efeito,

o legislador constituinte originário decidiu que o poder fosse entregue às diversas pessoas

políticas21.

Ou seja, o Brasil é constitucionalmente um Estado Federal, uma vez que o

Congresso Constituinte, ao editar o artigo 60, § 4°, inciso I, da CRFB/88, visou à proteção da

forma federativa de Estado mediante edição de Emendas Constitucionais:

Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta: [...] § 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I - a forma federativa de Estado. 22

O referido artigo demonstra que o princípio federativo constitui cláusula pétrea,

mas não sendo passível de alteração nem por emenda constitucional23. O Congresso Nacional

não pode expedir decretos legislativos que visem à modificação dos termos das competências

dos entes federados, estabelecidos pela CRFB/8824.

Ainda, pelo princípio federativo, as pessoas políticas estão em um mesmo patamar

hierárquico, isto é, são isonômicas, não há supremacia de um sobre o outro25. Em face disso, é

defeso aos entes federados invadir o campo de competência uns dos outros26.

Enfim, a importância do princípio federativo se dá por constituir instrumento de

desenvolvimento nacional quando entrega competências tributárias e encargos públicos às

unidades federadas, implementando políticas públicas para concretizar os valores que servem

de alicerce ao Estado Democrático de Direito. Objetivou, o constituinte de 1988, garantir a

autonomia financeira dos entes federados quando conferiu atribuições de competência para

instituir e cobrar tributos, permitindo que participassem, também, na arrecadação de tributos

alheios.27

No que concerne aos entes federados, a maior parte de suas receitas advém dos

tributos, sendo que a cada ente cabe arrecadar determinadas espécies tributárias, constituindo

20 ÁVILA, Humberto. Sistema constitucional tributário, de acordo com a emenda constitucional n. 53, de 19-12-2006. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 139. 21 COELHO, Luiz Otávio Rodrigues. O estatuto da cidade frente ao princípio federativo e a repartição constitucional de competência. Interesse Público, v. 5, n. 24, mar./abr. 2004. p. 209. 22 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010. 23 COSTA, Regina Helena. Curso de direito tributário: Constituição e Código Tributário Nacional. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 58. 24 CONTE, Francesco. O tratado internacional e a isenção de tributos estaduais e municipais: breves reflexões. Revista Dialética de Direito Tributário, n. 35. ago. 1998. p. 37. 25 SABBAG, Maristela Miglioli. Competência tributária. Revista dos Tribunais, v. 85, n. 728. p. 686. 26 SABBAG, Maristela Miglioli. Competência tributária. Revista dos Tribunais, v. 85, n. 728. p. 687. 27 CONTI, José Maurício. Federalismo Fiscal. São Paulo: Manole, 2004. p. 159.

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isso, a própria distribuição de competência tributária. Todavia, antes de chegar a esse ponto,

torna-se necessário pesquisar como se dá a incidência tributária. É o que se faz a seguir.

1.2 CATEGORIAS ESPECIAIS DA TÉCNICA DE TRIBUTAÇÃO

Em direito tributário, os institutos da incidência, não-incidência, imunidade e

isenção têm significados próprios e devem ser bem compreendidos para que sejam

devidamente identificados.28

1.2.1 Incidência tributária

A formação de uma relação jurídica tributária depende da ocorrência de um fato

que seja coincidente com uma hipótese prevista na lei que instituiu o tributo29. Nessa relação,

o ente tributante figura como sujeito ativo30 e o devedor tributo, como o sujeito passivo31.

Primeiramente, deve existir a hipótese de incidência, ou seja, a descrição abstrata,

formulada pela lei, de um fato32. Enquanto este fato não ocorrer, não existe obrigação,

porquanto o que se tem é mera hipótese. Porém, quando ocorrer um fato concreto que

coincida com a situação hipotética descrita pela lei, ocorre a subsunção, isto é, a incidência

tributária que dará origem a uma obrigação tributária33.

A hipótese, então, delimita o âmbito de incidência da lei tributária, indicando em

que situações ela irá efetivamente incidir. Assim, incidência tributária é quando a hipótese de

incidência prevista na lei ocorre de fato, gerando a obrigação tributária.34

28 CASSONE, Vittorio. Direito tributário: fundamentos constitucionais, análise dos impostos, incentivos à exportação, doutrina, prática e jurisprudência. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2000. p. 120. 29 ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. São Paulo: Malheiros, 1992. p. 42. 30 Sujeito ativo da obrigação é a pessoa jurídica de direito público, titular da competência para exigir o seu cumprimento. (Art. 119 do CTN). 31 Sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade pecuniária. (Art. 121 do CTN). 32 ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. São Paulo: Malheiros, 1992. p. 55. 33 CASSONE, Vittorio. Direito tributário: fundamentos constitucionais, análise dos impostos, incentivos à exportação, doutrina, prática e jurisprudência. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2000. p. 137. 34 MARTINS, Sérgio Pinto. Manual de direito tributário . 5. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 151.

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Logo, incidência tributária é quando a hipótese descrita na lei encontra o fato, se

encaixando perfeitamente à previsão hipotética da lei35. Por exemplo, o artigo 43, do Código

Tributário Nacional, prevê o pagamento do imposto de renda para as pessoas que auferirem

renda36. Só incidirá o imposto do referido artigo para quem auferir pecúnia a título de renda.

1.2.2 Não-incidência tributária

Contudo, se a circunstância prevista na lei não se enquadrar ou no campo material

ou no territorial, não nascerá uma obrigação tributária37. Por exemplo, o fato gerador do

imposto sobre propriedade predial e territorial urbana, o IPTU, é o contribuinte ser

proprietário, possuidor ou ter domínio útil de imóvel localizado na zona urbana do

Município38. Se a pessoa possuir imóvel na zona rural do Município, não será compelida ao

pagamento referente ao IPTU, ou seja, o IPTU não incide sobre imóveis que se encontram

fora da zona urbana. O imposto incidente, neste caso, é o ITR39.

Também não incide imposto quando o fato não for correspondente ao campo

territorial próprio. Aproveitando o exemplo do IPTU, ele só pode ser cobrado pelo Município

onde está localizado o imóvel. Sendo assim, o Município de Florianópolis não é competente

para exigir o IPTU em relação a um imóvel localizado no Município de São José. Tampouco

o Estado de Santa Catarina é competente para exigir o ICMS40 em relação a um fato gerador

que venha a ocorrer no Estado do Rio Grande do Sul.

Logo, a não-incidência ocorre quando a hipótese prevista na norma tributária não

corresponder ao campo material ou territorial próprios, isto é, quando o fato não for abrangido

pela norma para que esta incida sobre ele.41

35 ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. São Paulo: Malheiros, 1992. p. 42. 36 BRASIL. Código Tributário Nacional, Lei n° 5.172 de 25 de outubro de 1966. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L5172.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010. 37 ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. São Paulo: Malheiros, 1992. p. 39. 38 Vide artigo 32, do Código Tributário Nacional. (BRASIL. Código Tributário Nacional, Lei n° 5.172 de 25 de outubro de 1966. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L5172.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010.) 39 O ITR é o imposto sobre a propriedade territorial rural e está previsto no artigo 29, do Código Tributário Nacional. (BRASIL. Código Tributário Nacional, Lei n° 5.172 de 25 de outubro de 1966. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L5172.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010.) 40 O ICMS é o imposto sobre a circulação 41 MARTINS, Sérgio Pinto. Manual de direito tributário . 5. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 151.

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A não-incidência, portanto, configura-se em face da própria regra de tributação e

seu objeto são todos os fatos não abrangidos pela definição legal da hipótese de incidência42.

Devido à não-ocorrência do fato gerador43, a norma tributária não incide, não há suporte

fático44.

1.2.3 Imunidade tributária

O instituto da imunidade é uma limitação constitucional à competência dos entes

federados de tributar e exigir o tributo45. A imunidade advém tão somente de previsão

constitucional porque como só à CRFB/88 cabe o poder de conferir a competência tributária

às pessoas políticas, só ela pode retirá-las ou limitá-las. Na imunidade, o crédito tributário

nem chega a existir, porquanto a própria CRFB/88 determina que em certas ocasiões a norma

tributária não incidirá46, ou seja, é imune aquele que não pode ser tributado47. A pessoa ou o

bem descrito pela CRFB/88, não pode sofrer tributação48.

Desta forma, a imunidade pode ser considerada uma forma qualificada de não-

incidência onde a lei tributária é impedida de incidir por força de norma superior – a

CRFB/8849. Em outras palavras, se fala em imunidade quando, por determinação

constitucional, a lei de tributação estiver proibida de incidir sobre determinados fatos50.

A finalidade da imunidade é proteger o interesse público a fim de promover o

desenvolvimento econômico. Pode-se concluir, assim, que ela consiste em uma limitação ao

42 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário . 24. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2004. p. 217. 43 NOGUEIRA, Ruy Barbosa. Curso de direito tributário . 15. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 1999. p.167. 44 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário . 24. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2004. p. 218. 45 BALEEIRO, Aliomar. Limitações constitucionais ao poder de tributar. 7. ed. rev. e compl. à luz da Constituição de 1988 até a Emenda Constitucional n° 10/1996. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p. 225. 46 MARTINS, Sérgio Pinto. Manual de direito tributário . 5. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 151. 47 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário . 24. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2004. p. 266. 48 CASSONE, Vittorio. Direito tributário: fundamentos constitucionais, análise dos impostos, incentivos à exportação, doutrina, prática e jurisprudência. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2000. p. 122. 49 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário . 24. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2004. p. 218. 50 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário . 24. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2004. p. 217.

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poder de tributar, visando à proteção dos valores considerados necessários e permanentes ao

bem comum.51

O artigo 150, VI, da CRFB/8852, proibiu que os entes federados instituíssem

impostos sobre o patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros; templos de qualquer culto;

patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades

sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins

lucrativos, atendidos os requisitos da lei; livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua

impressão.

Outra situação de imunidade é a previsão do artigo 153, § 3°, III, da CRFB53, de

que o IPI não incidirá sobre produtos industrializados destinados ao exterior. Igualmente é a

previsão do artigo 155, § 2º, XII, "e"54, que prevê que o ICMS não incidirá sobre operações

que destinem produtos industrializados ao exterior, ressalvados os semi-elaborados definidos

em lei complementar; e o 156, § 3º, II55, também da CRFB/88, que estabelece que a

competência para a instituição de impostos sobre serviços de qualquer natureza – o ISS – é

restringida por lei complementar no que tange à exclusão da sua incidência sobre exportações

de serviços para o exterior. Estes últimos dois casos de imunidade serão melhor estudados no

item 3.3.1, do Capítulo 3 deste trabalho de pesquisa.

1.2.4 Isenção

A lei também prevê a chamada isenção tributária. Parte da doutrina entende que a

isenção é a dispensa do pagamento de certos tributos, onde, apesar de subsistir o crédito

tributário, o contribuinte é exonerado de pagá-lo.56

Se para alguns doutrinadores, a isenção é uma dispensa legal de tributo devido,

para outros, como MACHADO, ela exclui o próprio fato gerador:

51 MARTINS, Sérgio Pinto. Manual de direito tributário . 5. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 150. 52 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010. 53 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010. 54 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010. 55 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010. 56 MARTINS, Sérgio Pinto. Manual de direito tributário . 5. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 151.

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Embora tributaristas de renome sustentem que a isenção é a dispensa legal de tributo devido, pressupondo, assim, a ocorrência do fato gerador da obrigação tributária, na verdade ela exclui o próprio fato gerador. A lei isentiva retira uma parcela da hipótese de incidência da lei de tributação. Isenção, portanto, não é propriamente dispensa de tributo devido57.

O autor entende que a isenção é uma exceção à regra jurídica de tributação, e não

dispensa legal.

O instituto da isenção sempre decorre de previsão legal e está diretamente ligado à

matéria de competência tributária, ou seja, só pode isentar quem é competente para instituir58.

É bem verdade que parte da doutrina assevera que a isenção só pode ser concedida por via da

lei da pessoa política, no exercício da competência que lhe foi outorgada pela CRFB/8859.

O artigo 17560, I, do Código Tributário Nacional estabelece que a isenção exclui o

crédito tributário. Desta forma, ocorre o fato gerador, porém não há a constituição do crédito

tributário, porquanto a lei desobriga o contribuinte do pagamento do tributo61.

O instituto da isenção tem o fito de incentivar o desenvolvimento econômico62.

Significa dizer que ela deve ser concedida observado o relevante interesse social ou

econômico regional, setorial ou nacional63. Ademais, a CRFB/88 autoriza expressamente no

artigo 151, I64, a concessão de incentivos fiscais a fim de promover o equilíbrio sócio-

econômico entre as diferentes regiões do país. E, a fim de averiguar se o empreendimento

incentivado está trazendo o efetivo retorno que justifique a isenção, o artigo 165, § 6°65, da

CRFB/88, exige que o Poder Executivo apresente um demonstrativo regionalizado do efeito

proveniente do benefício sobre as receitas e despesas.

A isenção não deve ser confundida com a imunidade ou com a não-incidência,

uma vez que na isenção ocorre o fato gerador e a incidência, ou seja, a circunstância prevista

57 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário . 24. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2004. p. 216. 58 CASSONE, Vittorio. Direito tributário: fundamentos constitucionais, análise dos impostos, incentivos à exportação, doutrina, prática e jurisprudência. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2000. p. 125. 59 BALEEIRO, Aliomar. Limitações constitucionais ao poder de tributar. 7. ed. rev. e compl. à luz da Constituição de 1988 até a Emenda Constitucional n° 10/1996. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p. 400. 60 BRASIL. Código Tributário Nacional, Lei n° 5.172 de 25 de outubro de 1966. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L5172.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010. 61 CASSONE, Vittorio. Direito tributário: fundamentos constitucionais, análise dos impostos, incentivos à exportação, doutrina, prática e jurisprudência. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2000. p. 125. 62 BALEEIRO, Aliomar. Limitações constitucionais ao poder de tributar. 7. ed. rev. e compl. à luz da Constituição de 1988 até a Emenda Constitucional n° 10/1996. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p. 426. 63 CASSONE, Vittorio. Direito tributário: fundamentos constitucionais, análise dos impostos, incentivos à exportação, doutrina, prática e jurisprudência. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2000. p. 124. 64 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010. 65 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010.

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na lei opera na prática, nascendo, assim, a obrigação tributária para o sujeito passivo, porém, a

lei dispensa o pagamento do tributo.66

No caso da imunidade, a CRFB/88 impossibilita a ocorrência do fato gerador

quando reduz a atribuição positiva da competência tributária.67

Por último, na não-incidência não existe o fato gerador, nem incidência e, por

conseqüência, também não surge obrigação tributária.

1.3 COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA

Visto que a CRFB/88, em virtude do princípio federativo, partilhou as

competências aos entes federados, resta estudar no que consiste a competência tributária.

A seguir, serão analisadas as espécies de competência tributária. Ocorre que,

quando a CRFB/88 distribuiu as atribuições, deixou tanto poderes exclusivos a cada um,

como poderes para legislar ao mesmo tempo sobre um mesmo fato. Também conferiu poder

para a União de instituir impostos de outros entes em caso de guerra ou calamidade pública,

entre outras.

Por fim, o poder de legislar sobre tributos tem características peculiares que serão

explicadas no item 1.3.3.

1.3.1 Conceito

Em decorrência da qualidade de soberano do Estado brasileiro e do princípio

federativo, como fundamento principal da forma federativa de Estado adotada pela CRFB/88,

o poder de tributar é repartido entre as esferas de governo, onde cada ente federativo exercerá

sua parcela de competência dentro dos limites estabelecidos68. A competência tributária é o

poder conferido pela CRFB/88 às pessoas políticas de direito público interno para legislar a

66 CASSONE, Vittorio. Direito tributário: fundamentos constitucionais, análise dos impostos, incentivos à exportação, doutrina, prática e jurisprudência. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2000. p. 122. 67 BALEEIRO, Aliomar. Limitações constitucionais ao poder de tributar. 7. ed. rev. e compl. à luz da Constituição de 1988 até a Emenda Constitucional n° 10/1996. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p. 400. 68 NOGUEIRA, Ruy Barbosa. Curso de direito tributário . 15. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 1999. p.119.

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respeito de tributos69. É a atribuição do poder outorgado pela CRFB/88 aos entes públicos

para instituir e arrecadar tributos que são da exclusiva responsabilidade destes70.

Pode-se dizer que a competência tributária é a aptidão que têm a União, os

Estados, o Distrito Federal e os Municípios, para criar tributos e definir seu alcance,

observando os critérios de repartição de competências estabelecidos pela CRFB/8871. É a

prerrogativa de que são portadoras as pessoas políticas de legiferar sobre a produção de

normas relativas a tributos72, limitada pelo poder fiscal73. É o campo de atuação válido que

cada ente político tem para exercer seus poderes no âmbito da atividade financeira74.

O fenômeno da partilha de competências tributárias é uma manifestação da

autonomia da pessoa política que a detém, sendo a ela defeso extravasar as limitações traçadas

pela CRFB/8875.

Assim, conclui-se que a competência tributária é a aptidão que os entes federados

têm para criar tributos, descrevendo, por meio de lei própria deles, as hipóteses de incidência.

Na República Federativa do Brasil, o veículo exclusivo de regulação das normas de

competências, inclusive tributárias, é a CRFB/88.76

1.3.2 Espécies de competência tributária

Conforme já abordado, a CRFB/88 repartiu, a cada pessoa tributante, as

competências legislativas a elas atinentes. Assim o fez a fim de garantir a autonomia dos entes

federados e, também, evitar conflitos de competência77. Para tanto, classificou a competência

tributária em espécies, cujo número não é harmônico na doutrina, mas, para a persecução do

69 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário . 30. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Malheiros Editores, 2009. p. 272. 70 GUSMÃO, Daniela Ribeiro de. Direito tributário . São Paulo: Saraiva, 2007. p. 2. 71 AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro . 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 93. 72 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário . 19. ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 236. 73 ICHIHARA, Yoshiaki. Direito tributário: atualizado de acordo com as Emendas Constitucionais nº 3, de 17-3-93, 10, de 4-3-96, 12, de 15-8-96, 17, de 22-11-97, e 21, de 18-3-99. 9. ed. São Paulo: Atlas, 2000, p. 64. 74 FERREIRO LAPATZA, José Juan. Direito tributário: teoria geral do tributo. São Paulo: Manole, 2007. p. 73. 75 SABBAG, Maristela Miglioli. Competência tributária. Revista dos Tribunais, v. 85, n. 728. p. 682. 76 COSTA, Regina Helena. Curso de direito tributário: Constituição e Código Tributário Nacional. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 35. 77 ATALIBA, Geraldo. Sistema constitucional tributário brasileiro. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1968. p. 111.

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propósito deste trabalho de pesquisa, menciona-se a privativa, comum, concorrente, residual,

especial e cumulativa, que serão detalhadamente explicados, a seguir.

1.3.2.1 Competência Privativa

A CRFB/88 disciplina a competência tributária privativa atribuindo a cada uma

das pessoas políticas de direito público interno o poder de instituir tributos78. Ela indica o

tributo que corresponderá, privativamente, a cada pessoa política79. No dizer de ATALIBA, a

cada ente federado é outorgada uma faixa privativa de impostos a exigir e que esta

prerrogativa se faz exclusiva àquela única pessoa, proibindo as demais80. Ou seja, na

competência privativa, somente o ente político ao qual foi constitucionalmente outorgado

determinado poder para tributar certo fato, é que pode fazê-lo, excluindo-se a competência

dos demais.81

Somente o ente federado ao qual foi constitucionalmente atribuído certo poder

para legislar e arrecadar determinado imposto é que poderá fazê-lo, sendo vedado este

exercício aos demais82. A competência é privativa quando a CRFB/88 confere a uma pessoa

política, com exclusividade, quais os tributos que serão cobrados pelo ente tributante83.

Significa dizer que, se a CRFB/88 conferiu aos Municípios a competência para

legislar sobre o ISS, nem os Estados-membros, tampouco a União podem legislar e arrecadas

tal imposto.84

Conforme já visto anteriormente, a parcela de competência referente a cada ente

federado está prevista na CRFB/8885, sendo que o artigo 153 dispõe sobre a competência

78 CASSONE, Vittorio. Direito tributário: fundamentos constitucionais, análise dos impostos, incentivos à exportação, doutrina, prática e jurisprudência. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2000. p. 99. 79 MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 22. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 832. 80 ATALIBA, Geraldo. Sistema constitucional tributário brasileiro. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1968. p. 106. 81 SABBAG, Maristela Miglioli. Competência tributária. Revista dos Tribunais, v. 85, n. 728. p. 683. 82 AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro . 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 95. 83 MARTINS, Sérgio Pinto. Manual de direito tributário . 5. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 144. 84 CASSONE, Vittorio. Direito tributário: fundamentos constitucionais, análise dos impostos, incentivos à exportação, doutrina, prática e jurisprudência. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2000. p. 99. 85 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010.

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privativa da União, o artigo 155, a dos Estados e do Distrito Federal e, finalmente, o artigo

156, trata da competência privativa dos Municípios86.

1.3.2.2 Competência Comum

A competência comum é aquela conferida constitucionalmente a todas as esferas

de governo (federal, estadual e municipal) para a instituição de taxas ou contribuições e

melhoria87, desde que preenchidos os requisitos para a sua incidência e sempre relacionados a

uma determinada atuação da máquina estatal.88

Desta forma, ocorrida uma prestação de certos serviços públicos ou o exercício

regular do poder de polícia (para o caso das taxas), ou uma realização de obras públicas que

tenham valorizado imóveis de particulares (para o caso das contribuições de melhoria),

atendidos os demais requisitos estabelecidos em lei, qualquer uma das pessoas jurídicas de

direito público poderá instituir as citadas exações.89

Por exemplo, o Estado realiza uma obra pública – pavimentação de estrada – o

que faz com que o contribuinte tenha seu imóvel valorizado. Em decorrência desta obra, o

contribuinte fica obrigado a pagar, ao ente federado que instituiu a contribuição de melhoria,

o tributo referente a esta obra, que pode ser o Estado-membro, a União, o Distrito Federal ou

o Município, por lei de sua competência.

A competência comum, então, se configura quando dois ou mais entes políticos

podem tributar o mesmo fato.90

86 Melhor exame a respeito da competência tributária de cada ente político será feito no item 1.4, deste Capítulo. 87 PAULSEN, Leandro. Curso de direito tributário . 2. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2008. p. 69. 88 AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro . 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 96. 89 PAULSEN, Leandro. Curso de direito tributário . 2. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2008. p. 69. 90 SABBAG, Maristela Miglioli. Competência tributária. Revista dos Tribunais, v. 85, n. 728. Artigo. p. 683.

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1.3.2.3 Competência Concorrente

A competência concorrente, por sua vez, é aquela onde mais de um ente federado

tem poder para tributar sobre determinadas matérias, podendo dispor destas

concorrentemente91. Ou seja, quando, por exemplo, a União não legislar sobre qualquer uma

das matérias elencadas nos incisos do artigo 24, da CRFB/8892, os Estados-membros ou o

Distrito Federal podem fazê-lo. Importante ressaltar que os Municípios não possuem

competência concorrente, porquanto o constituinte não quis que outro ente, que não o próprio

Município, legislasse sobre matéria de interesse estritamente local93.

A saber, o que difere a competência comum da concorrente é que, naquela, os

entes tributantes podem legislar concomitantemente, enquanto nesta última, uma vez que um

o fez, os outros ficam impedidos de fazê-lo.

1.3.2.4 Competência Residual

Residual é a competência constitucional e exclusivamente94 conferida à União

para poder criar, mediante lei complementar, impostos que não sejam cumulativos e não

possuam a mesma base de cálculo e o mesmo fato gerador de outros já previstos95. É a

competência da alçada específica da União, para criar novos impostos96. Ou, seja, ela não

pode instituir impostos que já estejam especificamente previstos97. Logo, a União pode

91 COELHO, Luiz Otávio Rodrigues. O estatuto da cidade frente ao princípio federativo e a repartição constitucional de competência. Interesse Público, v. 5, n. 24, mar./abr. 2004. p. 207. 92 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010. 93 COELHO, Luiz Otávio Rodrigues. O estatuto da cidade frente ao princípio federativo e a repartição constitucional de competência. Interesse Público, v. 5, n. 24, mar./abr. 2004. p. 208. 94 Na acepção de ICHIHARA, “cabe somente à União a competência supletiva ou residual para instituir e cobrar novos impostos não previstos na Constituição”. (ICHIHARA, Yoshiaki. Direito tributário: atualizado de acordo com as Emendas Constitucionais nº 3, de 17-3-93, 10, de 4-3-96, 12, de 15-8-96, 17, de 22-11-97, e 21, de 18-3-99. 9. ed. São Paulo: Atlas, 2000, p. 64.) 95 MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 22. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 839. 96 JESUS, Ricardo Henrique de. Representatividade e competência do tratado tributário. Revista Magister de Direito Empresarial, Concorrencial e do Consumidor. v. 2, n. 7. fev./mar. 2006. p. 22. 97 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário . 30. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Malheiros Editores, 2009. p. 295.

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tributar sobre quaisquer outros fatos, com a ressalva dos já instituídos pelos outros entes

federados98.

É a determinação do artigo 154, I, da CRFB/88, in verbis:

Art. 154. A União poderá instituir: I - mediante lei complementar, impostos não previstos no artigo anterior, desde que sejam não-cumulativos e não tenham fato gerador ou base de cálculo próprios dos discriminados nesta Constituição.99

Desta feita, por via de lei complementar, a União pode criar impostos sobre

situações ainda não descritas na CRFB/88100. Entretanto, há que se observar que estes novos

impostos não podem ser cumulativos nem ter fato gerador ou base de cálculo próprios de

outros já discriminados antes pelo constituinte de 1988101. As bases econômicas deste tributo

devem ser tão novas quanto ele102.

Via de regra, os tributos são instituídos mediante lei ordinária de cada ente

federado. No entanto, o imposto residual só poderá ser instituído por lei complementar e não

por lei ordinária103.

1.3.2.5 Competência Especial

A competência especial, também chamada de extraordinária, trazida pelo artigo

154, inciso II, da CRFB/88, confere à União o poder de instituir impostos em casos especiais

como na situação de iminência ou no caso de guerra externa, compreendidos ou não na sua

competência:

Art. 154. A União poderá instituir: [...] II - na iminência ou no caso de guerra externa, impostos extraordinários, compreendidos ou não em sua competência tributária, os quais serão suprimidos, gradativamente, cessadas as causas de sua criação.104

98 SABBAG, Maristela Miglioli. Competência tributária. Revista dos Tribunais, v. 85, n. 728. p. 683. 99 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010. 100 AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro . 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 95. 101 SCAFF, Fernando Facury. Aspectos financeiros do sistema de organização territorial do Brasil. Revista Dialética de Direito Tributário . n. 112. jan. 2005. p. 19. 102 PAULSEN, Leandro. Curso de direito tributário . 2. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2008. p. 69. 103 MARTINS, Sérgio Pinto. Manual de direito tributário . 5. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 145. 104 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010.

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Os impostos extraordinários ou de guerra, poderão ser instituídos mediante lei

ordinária. Porém, uma vez cessadas as causas que levaram à sua instituição, o referido

imposto deverá ser gradativamente suprimido.

A fim de atender serviços de grande importância nacional, como calamidade

pública, guerras ou investimentos de caráter de urgência, a CRFB/88 autorizou à União a

instituir impostos que seriam originariamente da competência dos outros entes políticos. 105

Também pode criar impostos extraordinários para enfrentar os prejuízos

ocasionados por guerra externa ou iminência de guerra. Porém, a guerra da qual se trata é

aquela onde a República Federativa do Brasil participe. É necessário haver problemas ao

equilíbrio econômico-social do país para justificar a instituição do imposto extraordinário.106

Ademais, os impostos extraordinários são obrigatoriamente temporários. Assim

que não persistirem mais os motivos que ensejaram a sua criação pela União, devem ser

gradativamente abolidos.107

1.3.2.6 Competência Cumulativa

A competência cumulativa está prevista no artigo 147, da CRFB/88, e se refere à

União, no que tange aos impostos estaduais de eventuais Territórios, e ainda, aos impostos

municipais dos Territórios, caso esses não sejam divididos em Municípios, in verbis:

Art. 147. Competem à União, em Território Federal, os impostos estaduais e, se o Território não for dividido em Municípios, cumulativamente, os impostos municipais; ao Distrito Federal cabem os impostos municipais.108

É a competência que tem a União para criar impostos estaduais em Território

Federal, e, se o Território não for dividido em Municípios, impostos municipais,

cumulativamente. Refere-se, ainda, ao Distrito Federal, quanto aos impostos municipais, já

que aquele não pode se dividir em Municípios, conforme § 1º do artigo 32, da CRFB/88:

Art. 32. O Distrito Federal, vedada sua divisão em Municípios, reger- se-á por lei orgânica, votada em dois turnos com interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços da Câmara Legislativa, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição.

105 JESUS, Ricardo Henrique de. Representatividade e competência do tratado tributário. Revista Magister de Direito Empresarial, Concorrencial e do Consumidor. v. 2, n. 7. fev./mar. 2006. p. 22. 106 CONTI, José Maurício. Federalismo Fiscal. São Paulo: Manole, 2004. p. 50. 107 MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 22. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 840. 108 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010.

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§ 1º - Ao Distrito Federal são atribuídas as competências legislativas reservadas aos Estados e Municípios.109

Hodiernamente, o único ente que exerce a competência cumulativa é o Distrito

Federal. Primeiro, porque não existem mais Territórios Federais110. Segundo, porque a

CRFB/88 proíbe que o Distrito Federal se divida em Municípios, consoante o artigo

supracitado.

1.3.3 Características das competências tributárias

As pessoas políticas, no exercício de suas competências tributárias, deverão

observar rigorosamente as normas constitucionais. São estas que prevêem, especificamente, as

limitações ao poder de tributar, com a consagração de princípios e imunidades, cujas

características são a privatividade, indelegabilidade, incaducabilidade, inalterabilidade,

irrenunciabilidade e facultatividade no exercício111.

1.3.3.1 Indelegabilidade

A competência tributária é indelegável, ou seja, a pessoa jurídica detentora da

competência constitucionalmente atribuída a ela para a instituição de determinado tributo não

pode transferi-la. Somente seria admitida a delegação de competência tributária pelo

ordenamento jurídico brasileiro, caso houvesse autorização da própria Constituição para tal.112

O artigo 7° do Código Tributário Nacional assim dispõe:

Art. 7º A competência tributária é indelegável, salvo atribuição das funções de arrecadar ou fiscalizar tributos, ou de executar leis, serviços, atos ou decisões administrativas em matéria tributária, conferida por uma pessoa jurídica de direito público a outra, nos termos do § 3º do artigo 18 da Constituição.113

109 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010. 110 ICHIHARA, Yoshiaki. Direito tributário: atualizado de acordo com as Emendas Constitucionais nº 3, de 17-3-93, 10, de 4-3-96, 12, de 15-8-96, 17, de 22-11-97, e 21, de 18-3-99. 9. ed. São Paulo: Atlas, 2000, p. 64. 111 MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 22. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 832. 112 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário . 30. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Malheiros Editores, 2009. p. 273. 113 BRASIL. Código Tributário Nacional, Lei n° 5.172 de 25 de outubro de 1966. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L5172.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010.

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A indelegabilidade é corolário da qualidade de rigidez da CRFB/88 porquanto o

sistema de distribuição das competências tributárias é essencialmente constitucional. Ao

legislador infraconstitucional é vedado dispor sobre a questão.

1.3.3.2 Irrenunciabilidade

Assim como é vedada a livre disposição das competências tributárias, também o é

a renúncia das mesmas, no todo ou em parte114. As pessoas políticas não podem recusar duas

atribuições, por força da indisponibilidade do interesse público115.

1.3.3.3 Inalterabilidade

Outro aspecto da competência tributária é a inalterabilidade, qualidade que veda

às pessoas políticas modificar os termos e condições das competências que lhes foram

atribuídas pela norma constitucional116.

A única forma possível de alteração da competência tributária é a edição de

emenda constitucional. Qualquer outro ato legislativo não dispõe de autoridade para tanto.117

1.3.3.4 Incaducabilidade

A competência tributária não perece no tempo. Ela pode ser exercida a qualquer

tempo, pois não lhe foi condicionado prazo decadencial.118

114 SABBAG, Maristela Miglioli. Competência tributária. Revista dos Tribunais, v. 85, n. 728. Artigo. p. 690. 115 COSTA, Regina Helena. Curso de direito tributário: Constituição e Código Tributário Nacional . São Paulo: Saraiva, 2009. p. 43. 116 COSTA, Regina Helena. Curso de direito tributário: Constituição e Código Tributário Nacional. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 43. 117 SABBAG, Maristela Miglioli. Competência tributária. Revista dos Tribunais, v. 85, n. 728. p. 690. 118 PAULSEN, Leandro. Curso de direito tributário . 2. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2008. p. 57.

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As pessoas políticas não correm o risco de perder a possibilidade de exercer suas

competências porque não perecem com o decurso do tempo119. Uma vez que a CRFB/88 não

estipulou limitação temporal para seu exercício, o poder de instituir impostos permanece no

tempo, não acarretando efeito extintivo do seu não exercício120.

Enquanto não existir emenda constitucional que altere as condições da

competência dos entes políticos, a que está vigente sempre existirá e poderá ser exercitada

quando for da conveniência daqueles.121

1.3.3.5 Facultatividade

A competência tributária conferida pela CRFB/88 não é uma imposição aos entes

políticos, mas um exercício facultativo do seu titular.122

As pessoas políticas são livres para exercer ou não suas atribuições conferidas123.

Elas poderão ou não criar tributos, conforme seu próprio juízo de conveniência e

oportunidade124.

1.3.3.6 Privatividade

Também é qualidade das competências tributárias dos entes federados a

privatividade, que veda a eles o exercício de competências alheias bem como os obriga a não

ter as suas praticadas pelos demais125.

Todavia, a privatividade comporta uma exceção, qual seja a da competência

extraordinária da União prevista no artigo 154126, inciso II, da CRFB/88, tratada mais adiante.

119 COSTA, Regina Helena. Curso de direito tributário: Constituição e Código Tributário Nacional. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 43. 120 NABAIS, José Casalta. O dever fundamental de pagar impostos. Coimbra: Almedina, 1998. p. 303. 121 SABBAG, Maristela Miglioli. Competência tributária. Revista dos Tribunais, v. 85, n. 728. p. 691. 122 SABBAG, Maristela Miglioli. Competência tributária. Revista dos Tribunais, v. 85, n. 728. Artigo. p. 691. 123 COSTA, Regina Helena. Curso de direito tributário: Constituição e Código Tributário Nacional. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 43. 124 SABBAG, Maristela Miglioli. Competência tributária. Revista dos Tribunais, v. 85, n. 728. p. 691. 125 SABBAG, Maristela Miglioli. Competência tributária. Revista dos Tribunais, v. 85, n. 728. p. 691. 126 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010.

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1.4. DISTRIBUIÇÃO CONSTITUCIONAL DAS COMPETÊNCIAS TRIBUTÁRIAS

A CRFB/88, em regra, não institui tributos, mas distribui competências entre os

entes federados, exigindo que seja observado o princípio da reserva legal127. Esta distribuição

é rígida e dirigida tão somente aos poderes legislativos de cada ente político, que deverão

legiferar sobre a instituição dos tributos que lhe competem128.

Ao partilhar o poder tributário entre os entes que integram a Federação, a

CRFB/88 se utiliza das técnicas de atribuição e denegação. Se, de um lado, lhes é atribuído

poder para elaborar tributos, por outro, há normas que subtraem a abrangência deste poder,

modelando a competência constitucionalmente delimitada.129

No que tange aos impostos, a CRFB/88 enumerou taxativa e privativamente as

competências tributárias dos entes federados.130

1.4.1 Competência tributária dos Estados

Conforme previsão do artigo 155, da CRFB/88, os Estados-membros são

privativamente competentes para instituir impostos sobre a transmissão causa mortis e

doações - ITCMD, impostos sobre operações relativas à circulação de mercadorias e prestação

de serviços de transportes e de comunicação – ICMS, e impostos sobre a propriedade de

veículo automotor - IPVA:

Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: I - transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos; II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior; III - propriedade de veículos automotores.131

127 MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 22. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 830. 128 SABBAG, Maristela Miglioli. Competência tributária. Revista dos Tribunais, v. 85, n. 728. p. 683. 129 BALEEIRO, Aliomar. Limitações constitucionais ao poder de tributar. 7. ed. rev. e compl. à luz da Constituição de 1988 até a Emenda Constitucional n° 10/1996. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p. 14. 130 MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 22. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 840. 131 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010.

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1.4.2 Competência tributária dos Municípios

Os Municípios receberam competência para instituir o imposto sobre a

propriedade predial e territorial urbana - IPTU, imposto sobre serviços de qualquer natureza –

ISS, e imposto sobre a transmissão de bens imóveis, em sua incidência inter vivos – ITBI,

conforme preceitua o artigo 156, da CRFB/88:

Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: I - propriedade predial e territorial urbana; II - transmissão "inter vivos", a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição; III - serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar.132

1.4.3 Competência tributária do Distrito Federal

O artigo 32, § 1°, da CRFB/88, estabelece, in verbis:

Art. 32. O Distrito Federal, vedada sua divisão em Municípios, reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos com interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços da Câmara Legislativa, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição. § 1º - Ao Distrito Federal são atribuídas as competências legislativas reservadas aos Estados e Municípios.

Ou seja, a CRFB/88 outorgou ao Distrito Federal poder para legislar sobre as

mesmas matérias que os Estados e Municípios133. Em matéria tributária, o artigo 155, também

da CRFB/88, expressamente prevê que “compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir

impostos sobre [...]”134. Ou seja, no que tange à competência tributária, o Distrito Federal

pode instituir os mesmos impostos que os Estados-membros.

132 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010. 133 LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 13. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 318. 134 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010.

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1.4.4 Competência tributária da União

A parcela de competência tributária conferida privativamente à União está

elencada nos incisos do artigo 153, da CRFB/88. Ela pode instituir impostos sobre a

importação - II, exportação - IE, renda e proventos de qualquer natureza - IR, produtos

industrializados - IPI, operações financeiras - IOF, propriedade territorial rural – ITR, e

grandes fortunas - IGF:

Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre: I - importação de produtos estrangeiros; II - exportação, para o exterior, de produtos nacionais ou nacionalizados; III - renda e proventos de qualquer natureza; IV - produtos industrializados; V - operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores mobiliários; VI - propriedade territorial rural; VII - grandes fortunas, nos termos de lei complementar.135

Além da competência privativa, a União também possui competência excepcional

para criar novos impostos por via de lei complementar, desde que cumpridos os requisitos do

artigo 154, I, da CRFB/88; e extraordinária, no caso de iminência ou de guerra externa, por

força do inciso II, do mesmo artigo, ressaltando que estes últimos impostos são

obrigatoriamente temporários, devendo ser suprimidos tão logo não persistir as razões de sua

instituição136:

Art. 154. A União poderá instituir: I - mediante lei complementar, impostos não previstos no artigo anterior, desde que sejam não-cumulativos e não tenham fato gerador ou base de cálculo próprios dos discriminados nesta Constituição; II - na iminência ou no caso de guerra externa, impostos extraordinários, compreendidos ou não em sua competência tributária, os quais serão suprimidos, gradativamente, cessadas as causas de sua criação.137

Ademais, a União é privativamente competente para instituir empréstimos

compulsórios, por via de lei complementar, conforme disposição do artigo 148, da CRFB/88,

in verbis:

Art. 148. A União, mediante lei complementar, poderá instituir empréstimos compulsórios: I - para atender a despesas extraordinárias, decorrentes de calamidade pública, de guerra externa ou sua iminência;

135 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010. 136 MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 22. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 840. 137 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010.

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II - no caso de investimento público de caráter urgente e de relevante interesse nacional, observado o disposto no art. 150, III, "b". Parágrafo único. A aplicação dos recursos provenientes de empréstimo compulsório será vinculada à despesa que fundamentou sua instituição.138

A técnica legislativa usada no Brasil para estabelecer um sistema tributário desce

do nível constitucional até o da lei ordinária de modo que, em regra, à CRFB/88 coube a

tarefa de distribuir as competências entre os entes tributantes, à lei complementar federal

instituir as normas gerais de direito tributário, especificando os fatos geradores, e à lei

ordinária criar os tributos. Conclui-se, então, que o sistema de distribuição de competências é

corolário do princípio federativo139.

138 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010. 139 BALEEIRO, Aliomar. Limitações constitucionais ao poder de tributar. 7. ed. rev. e compl. à luz da Constituição de 1988 até a Emenda Constitucional n° 10/1996. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p. 134.

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2 OS TRATADOS E O DIREITO INTERNO

A relevância deste capítulo para o estudo do tema central deste trabalho de

pesquisa consiste em estudar a relação do Direito Interno com o Direito Internacional, mais

especificamente quanto à celebração de tratados internacionais.

Primeiramente será feita a distinção entre soberania e autonomia, de onde se

verificará quem pode manter relações internacionais e quem tão-somente tem voz interna.

A seguir, será estudado sobre os princípios regentes da integração internacional da

República Federativa do Brasil, os quais devem ser observados quando da celebração de

tratados internacionais; ainda, o poder de celebrar tratados internacionais e a forma como eles

incorporam no ordenamento jurídico pátrio.

Por último, será feito um estudo acerca da responsabilidade internacional e

eventuais sanções cabíveis quando do descumprimento das obrigações pactuadas no tratado

internacional celebrado entre Estados soberanos.

2.1 A REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL E SUA INTEGRAÇÃO

INTERNACIONAL

Para o desenvolvimento deste trabalho, é necessário, num primeiro momento,

fazer distinção entre soberania e autonomia, importante para compreender a quem compete o

papel de celebrar os tratados internacionais.

2.1.1 Soberania e Autonomia

A República Federativa do Brasil, como pessoa política de direito público, tem

soberania, isto é, detém o monopólio do uso legítimo da força pública, exercendo todas as

competências de ordem legislativa, administrativa e jurisdicional em seu território, não

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enfrentando a concorrência de outra ordem soberana140. Seu poder é ilimitado, do ponto de

vista jurídico, não sofrendo subordinação, ou seja, não tendo a obrigação de obedecer a

nenhum outro Estado141. A qualidade de soberana consiste no principal fundamento da

República Federativa do Brasil, porquanto representa o povo como nação constituída em sua

supremacia142.

A CRFB/88, no artigo 1°, I, consagrou a soberania como um dos fundamentos

basilares da República Federativa do Brasil, in verbis:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania.143

A soberania é o poder originário, que um Estado tem, de governar uma nação e de

impor a esta uma ordem jurídica e um governo. Este poder não sofre interferência de nenhum

outro poder soberano.144

O exato momento do surgimento da figura do Estado, na História, se deu quando

certos monarcas, como os franceses, recusaram sujeição quer ao Papado ou ao Império, se

dizendo detentores do mais alto poder145. O Estado só é verdadeiramente Estado se o seu

poder for soberano, se sua ordem estatal não se submeter a outra ordem da mesma espécie146,

organizando-se juridicamente, fazendo valer na extensão do seu território a totalidade de suas

decisões nos limites dos fins éticos de convivência147.

Assim, a soberania consiste no fundamento que faz a República Federativa do

Brasil manter, nas suas relações internacionais, os princípios da independência nacional, da

autodeterminação dos povos, da não-intervenção, da igualdade entre os Estados e da

cooperação entre os povos para o progresso da humanidade, elencados no artigo 4°, incisos I,

III, IV, V e IX, da CRFB/88148, que serão melhor estudados no item 2.1.2 deste Capítulo.

140 REZEK, José Francisco. Direito Internacional Público: Curso Elementar. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 154. 141 GUSMÃO, Daniela Ribeiro. A vedação constitucional à isenção heterônoma no âmbito dos tratados internacionais e a questão da soberania. Revista de Direito Tributário , n. 72. p. 209. 142 JESUS, Ricardo Henrique de. Representatividade e competência do tratado tributário. Revista Magister de Direito Empresarial, Concorrencial e do Consumidor. v. 2, n. 7. fev./mar. 2006. p. 22. 143 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010. 144 GUSMÃO, Paulo Dourado de. Introdução à Ciência do Direito. 7. ed. Rio/SP: Forense, 1960. p. 414. 145 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de direito constitucional. 34. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 51. 146 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de direito constitucional. 34. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 50. 147 REALE, Miguel. Teoria do Direito e do Estado. 2. ed. São Paulo: Martins Editora, 1940. p. 127. 148 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010.

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Já, os entes que compõem a República Federativa do Brasil – União, Estados-

membros, Distrito Federal e Municípios - situam-se em um mesmo patamar hierárquico.

Enquanto a República Federativa do Brasil é soberana, os entes que a compõem são dotados

de autonomia, que é a parcela de soberania conferida a cada um deles, pela CRFB/88, a fim

de que atuem no âmbito de suas próprias competências. Formam vários centros autônomos de

poder que executam, harmônica e simultaneamente, ações públicas do governo federal com o

estadual.149

Os Estados-membros são regidos por uma Constituição rígida, abdicando de sua

soberania em favor do Estado Federal. E, justamente por serem estados federados, sem

personalidade jurídica de direito internacional público, não podem exprimir voz e vontade

próprias no âmbito internacional.150

Então, a autonomia nada mais é do que poder se autogovernar, possuindo

atribuições como a capacidade orçamentária, administrativa, legislativa, financeira e,

principalmente, tributária.151

Na doutrina, a distinção entre soberania e autonomia é bem esclarecedora nos

dizeres de ALMEIDA quando aduz que

os Estados-membros da Federação não gozam de soberania, isto é, daquele poder de autodeterminação plena, não condicionada por nenhum outro poder externo ou interno. A soberania passa a ser apanágio exclusivo do Estado federal. [...] Desfrutam os Estados-membros, isto sim, de autonomia, ou seja, de capacidade de autodeterminação dentro do círculo de competências traçado pelo poder soberano, que lhes garante auto-organização, autogoverno, autolegislação e auto-administração, exercitáveis sem subordinação hierárquica dos Poderes estaduais aos Poderes da União152.

Em outras palavras, significa dizer que a autonomia consiste na capacidade de

cada ente de poder se autodeterminar conforme lhes foram repartidas as competências153 para

editar, cada um, suas próprias normas organizadoras e constituintes do seu ordenamento154. É

poder governar-se dentro dos limites impostos por um poder maior, qual seja o soberano155.

149 GUSMÃO, Daniela Ribeiro. A concessão, pela União, de isenções de tributos estaduais e municipais: possibilidade no âmbito dos tratados internacionais. Revista de Direito Administrativo, n. 216. abr/jun. 1999. p. 111. 150 REZEK, José Francisco. Direito Internacional Público: Curso Elementar. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 225. 151 AGRA, Walber de Moura. Curso de direito constitucional. Rio de Janeiro: Forense, 2008. p. 97 152 ALMEIDA, Fernanda Dias Menezes de. Competências na Constituição de 1988. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 25. 153 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de direito constitucional. 34. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 55. 154 HORTA, Raul Machado. Direito Constitucional. 3. ed. rev. atual. e ampl. Belo Horizonte: Del Rey, 2002. p. 363. 155 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de direito constitucional. 34. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 68.

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Todavia, para a existência real da autonomia, a previsão de recursos deve ser

suficiente e não sujeita a condições, senão ela será meramente fictícia e os entes federados

não serão capazes de desempenhar suas atribuições. Este problema da repartição de rendas

resolve-se com a divisão horizontal de competências, onde é reservada certa matéria tributável

a um poder que aufere seus próprios recursos.156

Os Estados-membros, Distrito Federal e Municípios são entes dotados de

personalidade jurídica de direito público interno, atuantes como núcleos autônomos de poder,

uma vez que possuem legislação, governo e jurisdição próprios157. Autônomos, pois cada um

exerce atribuições que lhes são conferidas como sendo de suas competências, as quais são

fixadas pela CRFB/88.

No plano internacional, o Brasil é representado pela União nas suas relações com

as demais nações, ao passo que, no âmbito interno, governa todos os indivíduos que se

encontram no seu território158. Ou seja, há a União, ente central, formada pela reunião dos

entes federados pelo pacto federativo e, de outro lado, há a República Federativa do Brasil,

esta formada pela União, Estados-membros, Distrito Federal e Municípios, pessoas jurídicas

de direito público interno, autônomos159.

No exercício de sua soberania, o Estado exige que os indivíduos lhe forneçam os

recursos de que necessita. Para tanto, o constituinte atribuiu a cada ente federado a

competência para instituir tributos. O poder que o Estado detém de distribuir competências

tributárias consiste em um aspecto derivado da sua qualidade de soberano.160

Decorrente do exercício do poder de tributar, o Estado faz emanar para os seus

cofres, parte do patrimônio das pessoas que estão sob a sua jurisdição, que são os tributos,

divididos em impostos, taxas e contribuições161. O poder tributário – enquanto atributo da

soberania da qual o Estado é dotado – tem, na República Federativa do Brasil, o seu exercício

regulado total e rigidamente pela CRFB/88 162. O Estado brasileiro, na sua qualidade de

156 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de direito constitucional. 34. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 68. 157 BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 722. 158 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário . 24. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2004. p. 42. 159 LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 13. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 299. 160 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário . 24. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2004. p. 43. 161 NOGUEIRA, Ruy Barbosa. Curso de direito tributário . 15. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 1999. p.29. 162 BARRETO, Aires. Imunidades tributárias: limitações constitucionais ao poder de tributar. São Paulo: Dialética, 1999. p. 9.

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soberano, ao repartir aos entes federados competência para tributar, assegurou, assim, a

autonomia destes163.

Conclui-se assim, que, soberania é a qualidade de um poder de ser tido como

supremo, ou seja, acima do qual não se admite outro e autonomia é o poder de

autodeterminar-se, podendo ser exercido de forma independente, limitado pela lei estatal

superior164. Desta forma, tem-se que, os Estados-membros são autônomos, do ponto de vista

interno e o Estado Federal é soberano, na ótica da esfera internacional.

2.1.2 Integração internacional do Brasil (artigo 4°, parágrafo único, da CRFB/88)

Visto que a República Federativa do Brasil tem personalidade jurídica de direito

internacional público, somente ela é que tem capacidade para se relacionar com os demais

Estados soberanos. Para tanto, deve observar o mandamento do artigo 4°, da CRFB/88, que

relaciona os princípios que regem o país nas suas relações internacionais, in verbis:

Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios: I - independência nacional; II - prevalência dos direitos humanos; III - autodeterminação dos povos; IV - não-intervenção; V - igualdade entre os Estados; VI - defesa da paz; VII - solução pacífica dos conflitos; VIII - repúdio ao terrorismo e ao racismo; IX - cooperação entre os povos para o progresso da humanidade; X - concessão de asilo político. Parágrafo único. A República Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações.165

A seguir, será estudado cada um dos princípios elencados nos incisos do artigo 4°,

da CRFB/88, a começar pelo princípio da independência nacional.

163 GUSMÃO, Daniela Ribeiro. A vedação constitucional à isenção heterônoma no âmbito dos tratados internacionais e a questão da soberania. Revista de Direito Tributário , n. 72. p. 216. 164 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de direito constitucional. 34. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 51. 165 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010.

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2.1.2.1 Independência Nacional

Na maior parte da doutrina166, a independência nacional é conceituada como

sendo a qualidade que o Estado brasileiro tem de traçar suas diretrizes e determinar

livremente suas metas políticas e sociais a fim de promover seu desenvolvimento econômico,

social e cultural. Ser independente é não estar sujeito a qualquer outra ordem jurídica

externa.167

Todavia, há doutrinadores como POLETTI, que entendem que a redação do

primeiro dos dez incisos consagrados no artigo 4º da CRFB/88 não faz referência à

independência interna do Brasil. Ou seja, para ele, o princípio sugere que o Brasil deva

observar a independência dos outros Estados e não a sua própria.168

2.1.2.2 Prevalência dos Direitos Humanos

O princípio da prevalência dos direitos humanos aduz que o respeito aos direitos

humanos se faz requisito essencial para que o Estado possua legitimidade na sociedade

internacional169.

No anseio de buscar a integração das normas de direito internacional às do direito

interno de cada Estado soberano, a República Federativa do Brasil já consagrou, no artigo 5°,

§ 2°, da CRFB/88170, que os tratados internacionais de direitos humanos, em que o Estado

brasileiro seja parte, terão plena vigência neste ordenamento jurídico.171

166 Neste mesmo viés é o raciocínio de HUSEK ao dizer que a independência nacional “deve ser vista como independência de atuação, principalmente independência econômica. (HUSEK, Carlos Roberto. Curso de direito internacional público. 3. ed. São Paulo: LTr, 2000. p. 101.) 167 JESUS, Ricardo Henrique de. Representatividade e competência do tratado tributário. Revista Magister de Direito Empresarial, Concorrencial e do Consumidor. v. 2, n. 7. fev./mar. 2006. p. 23. 168 POLETTI, Ronaldo. Constituição anotada. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 13. 169 PEIXINHO, Manoel Messias; GUERRA, Isabella Franco. NASCIMENTO FILHO, Firly. Os princípios da Constituição de 1988. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris, 2001. p. 195. 170 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010. 171 DALLARI, Pedro. Constituição e relações exteriores: prefácio de Celso Lafer. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 162.

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2.1.2.3 Autodeterminação dos Povos

O princípio da autodeterminação dos povos está previsto, também, nos artigos

1º172 e 55 da Carta das Nações Unidas173 e 53174 da Convenção de Viena sobre o Direito dos

Tratados175. Ele estabelece que os povos e nacionais têm direito à livre determinação e que ela

é pressuposto para o efetivo exercício de todos os direitos humanos fundamentais176.

Os povos e os nacionais têm direito à autodeterminação, sendo, portanto, livres

para se estabelecer, ordenar e decidir, mas ela não deve se pautar no nacionalismo exagerado

nem servir para excluir grupos dos povos unidos por um passado comum e por uma única

cultura. Deve, sim, favorecer o desenvolvimento dos povos e não ser uma precária

fragmentação de estados nacionais, sem condições materiais de existência.177

Ao adotar políticas neoliberais e de privatização, os governos brasileiros devem

observar o conteúdo deste princípio, em que a sujeição a políticas de interesse externo

desrespeita o princípio da autodeterminação, na medida em que priva o povo de seus meios de

sobrevivência.178

172 Os propósitos das Nações Unidas são: 1. Manter a paz e a segurança internacionais e, para esse fim: tomar, coletivamente, medidas efetivas para evitar ameaças à paz e reprimir os atos de agressão ou outra qualquer ruptura da paz e chegar, por meios pacíficos e de conformidade com os princípios da justiça e do direito internacional, a um ajuste ou solução das controvérsias ou situações que possam levar a uma perturbação da paz; 2. Desenvolver relações amistosas entre as nações, baseadas no respeito ao princípio de igualdade de direitos e de autodeterminação dos povos, e tomar outras medidas apropriadas ao fortalecimento da paz universal; 3. Conseguir uma cooperação internacional para resolver os problemas internacionais de caráter econômico, social, cultural ou humanitário, e para promover e estimular o respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais para todos, sem distinção de raça, sexo, língua ou religião; e 4. Ser um centro destinado a harmonizar a ação das nações para a consecução desses objetivos comuns. (BRASIL. Nações Unidas no Brasil. Carta das Nações Unidas. Disponível em: <http://www.onu-brasil.org.br/documentos_carta.php>. Acesso em: 19 maio 2010.) 173 A Carta das Nações Unidas foi assinada em São Francisco, a 26 de junho de 1945, após o término da Conferência das Nações Unidas sobre Organização Internacional, entrando em vigor a 24 de outubro daquele mesmo ano. O Estatuto da Corte Internacional de Justiça faz parte integrante da Carta. (BRASIL. Nações Unidas no Brasil. Carta das Nações Unidas. Disponível em: <http://www.onu-brasil.org.br/documentos_carta.php>. Acesso em: 19 maio 2010.) 174 Tratado em Conflito com uma Norma Imperativa de Direito Internacional Geral (jus cogens): É nulo um tratado que, no momento de sua conclusão, conflite com uma norma imperativa de Direito Internacional geral. Para os fins da presente Convenção, uma norma imperativa de Direito Internacional geral é uma norma aceita e reconhecida pela comunidade internacional dos Estados como um todo, como norma da qual nenhuma derrogação é permitida e que só pode ser modificada por norma ulterior de Direito Internacional geral da mesma natureza. 175 BRASIL. Ministério das Relações Exteriores. Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados. Disponível em: <http://www2.mre.gov.br/dai/dtrat.htm>. Acesso em: 19 maio 2010. 176 MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. 7 ed. atualizada até a EC nº 55/07. São Paulo: Atlas, 2007. p. 84. 177 POLETTI, Ronaldo. Constituição anotada. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 14. 178 PEIXINHO, Manoel Messias; GUERRA, Isabella Franco. NASCIMENTO FILHO, Firly. Os princípios da Constituição de 1988. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris, 2001. p. 196.

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Ademais, pode-se extrair deste princípio a idéia de que cada nação deve

representar um Estado soberano179.

2.1.2.4 Não-Intervenção

O princípio da não-intervenção preconiza que um Estado não deve imiscuir-se nos

assuntos internos dos demais Estados180. Em outras palavras, ele consiste em um dos

princípios basilares do direito internacional e traz, em seu texto, vedação a um Estado de

interferir nos negócios de outro181. Tal intervenção constitui uma violação à independência do

Estado e não observa a qualidade de soberano que o direito das gentes lhes confere182.

De outro lado, indaga POLETTI acerca da natureza absoluta deste princípio:

Como resolver a questão do princípio da não-intervenção e sua compatibilização com o sonho da solidariedade universal e uma ordem mundial justa, fundada em um governo legítimo para todo o planeta, capaz de resolver os problemas do ecúmeno, como os da energia nuclear, da exploração do espaço, da proteção do meio ambiente, da exploração dos oceanos, da fome, do uso pacífico da Antártida?183

Ou seja, para o doutrinador acima citado, para o desenvolvimento e o progresso

da ordem mundial ha que existir a intervenção, porém na medida certa. Não pode um impor

suas vontades sobre o outro. Precisa-se compatibilizar o princípio da não-intervenção quando

da busca pela proteção do patrimônio comum da humanidade, como o meio ambiente;

problemas sociais como a fome; e exploração de recursos, em conjunto, como o espaço, os

oceanos, a Antártida, entre outros.

179 HUSEK, Carlos Roberto. Curso de direito internacional público. 3. ed. São Paulo: LTr, 2000. p. 101. 180 HUSEK, Carlos Roberto. Curso de direito internacional público. 3. ed. São Paulo: LTr, 2000. p. 101. 181 PEIXINHO, Manoel Messias; GUERRA, Isabella Franco. NASCIMENTO FILHO, Firly. Os princípios da Constituição de 1988. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris, 2001. p. 197. 182 PEIXINHO, Manoel Messias; GUERRA, Isabella Franco. NASCIMENTO FILHO, Firly. Os princípios da Constituição de 1988. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris, 2001. p. 197. 183 POLETTI, Ronaldo. Constituição anotada. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 14.

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2.1.2.5 Igualdade entre os Estados

O princípio da igualdade entre os Estados está expressamente previsto no § 1º184

do artigo 2º da Carta da ONU185.

O propósito do inciso que trata do princípio da igualdade entre os Estados é de

evitar que as desigualdades geradas pelas expressões de poder deles se institucionalizem186.

Ou seja, a igualdade da qual se fala é a econômica, mediante a qual os Estados possam vir a se

relacionar com a mesma força187.

Os Estados soberanos, no direito internacional, são juridicamente iguais,

inexistindo uma entidade central que imponha o cumprimento das obrigações e lhes aplique as

devidas sanções diante do descumprimento delas. O que há é uma estipulação contratual,

onde, por meio de tratados ou convenções internacionais é que os países estabelecem as

obrigações e as respectivas sanções.

2.1.2.6 Defesa da Paz

A CRFB/88 traz o compromisso com a manutenção da paz e a solução pacífica de

conflitos188, enquanto a anterior proclamava a negociação direta, arbitragem e demais meios

pacíficos para a solução de conflitos, proibindo a guerra de conquista e contando com a

cooperação das organizações internacionais189.

O princípio da defesa da paz também encontra guarida na Carta da ONU190, em

seu artigo 1, item 1, in verbis:

Artigo 1 Os propósitos das Nações unidas são: 1. Manter a paz e a segurança internacionais e, para esse fim: tomar, coletivamente, medidas efetivas para evitar ameaças à paz e reprimir os atos de agressão ou outra

184 A Organização e seus Membros, para a realização dos propósitos mencionados no Artigo 1, agirão de acordo com os seguintes Princípios: 1. A Organização é baseada no princípio da igualdade de todos os seus Membros. 185 BRASIL. Nações Unidas no Brasil. Carta das Nações Unidas. Disponível em: <http://www.onu-brasil.org.br/documentos_carta.php>. Acesso em: 19 maio 2010. 186 POLETTI, Ronaldo. Constituição anotada. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 14. 187 HUSEK, Carlos Roberto. Curso de direito internacional público. 3. ed. São Paulo: LTr, 2000. p. 101. 188 POLETTI, Ronaldo. Constituição anotada. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 15. 189 POLETTI, Ronaldo. Constituição anotada. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 14. 190 BRASIL. Nações Unidas no Brasil. Carta das Nações Unidas. Disponível em: <http://www.onu-brasil.org.br/documentos_carta.php>. Acesso em: 19 maio 2010.

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qualquer ruptura da paz e chegar, por meios pacíficos e de conformidade com os princípios da justiça e do direito internacional, a um ajuste ou solução das controvérsias ou situações que possam levar a uma perturbação da paz.

Desta forma, a defesa da paz envolve determinados comportamentos do Estado,

não só nos seus relacionamentos com outros Estados, mas na sua própria ordem interna

mediante a criação de políticas que visam à elevação da qualidade de vida da população e o

resguardo dos direitos humanos191.

A fim de concretizar a primazia da paz, há que criar meios capazes de inviabilizar,

antecipadamente, situações potenciais de conflito, ou, pelo menos, atenuar o grau de

lesividade delas, principalmente com o advento da energia nuclear que não se pode negar a

existência da possibilidade do seu uso para fins bélicos.192

2.1.2.7 Solução Pacífica de Conflitos

O princípio da solução pacífica de conflitos vem sendo explicitamente amparado

desde a Constituição Federal de 1946193, no artigo 4°194, também na de 1967195, artigo 7°196

191 PEIXINHO, Manoel Messias; GUERRA, Isabella Franco. NASCIMENTO FILHO, Firly. Os princípios da Constituição de 1988. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris, 2001. p. 199. 192 DALLARI, Pedro. Constituição e relações exteriores: prefácio de Celso Lafer. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 172. 193 BRASIL. Constituição dos Estados Unidos do Brasil, de 18 de setembro de 1946. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Constitui%C3%A7ao46.htm>. Acesso em: 19 maio 2010. 194 O Brasil só recorrerá à guerra, se não couber ou se malograr o recurso ao arbitramento ou aos meios pacíficos de solução do conflito, regulados por órgão internacional de segurança, de que participe; e em caso nenhum se empenhará em guerra de conquista, direta ou indiretamente, por si ou em aliança com outro Estado. 195 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1967. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Constitui%C3%A7ao67.htm>. Acesso em: 19 maio 2010. 196 Os conflitos internacionais deverão ser resolvidos por negociações diretas, arbitragem e outros meios pacíficos, com a cooperação dos organismos internacionais de que o Brasil participe. Parágrafo único - É vedada a guerra de conquista.

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mantido o mesmo texto no artigo 7°197 da Constituição198 de 1969199. Nas Constituições de

1891 e 1934, o princípio encontrava-se implícito200.

A CRFB/88 não mais veda explicitamente a guerra de conquista201, mas outorga à

União competência para declarar a guerra e celebrar a paz202, legislar sobre a requisição de

civis e militares em tempos de guerra203 e decretar estado de defesa204, o que, na visão de

POLETTI, parece ser “uma possível conseqüência do estado de beligerância205”.

A Carta da ONU preconiza no artigo 2 que

Artigo 2 A Organização e seus Membros, para a realização dos propósitos mencionados no Artigo 1, agirão de acordo com os seguintes Princípios: 3. Todos os Membros deverão resolver suas controvérsias internacionais por meios pacíficos, de modo que não sejam ameaçadas a paz, a segurança e a justiça internacionais; 4. Todos os Membros deverão evitar em suas relações internacionais a ameaça ou o uso da força contra a integridade territorial ou a dependência política de qualquer Estado, ou qualquer outra ação incompatível com os Propósitos das Nações Unidas.206

E o artigo 33 do mesmo documento recomenda que as partes busquem, antes de

tudo, entrar em um consenso quando da existência de conflitos entre elas, evitando colocar em

risco a paz e a segurança internacionais:

Artigo 33 1. As partes em uma controvérsia, que possa vir a constituir uma ameaça à paz e à segurança internacionais, procurarão, antes de tudo, chegar a uma solução por negociação, inquérito, mediação, conciliação, arbitragem, solução judicial, recurso a entidades ou acordos regionais, ou a qualquer outro meio pacífico à sua escolha.

197 Art. 7º Os conflitos internacionais deverão ser resolvidos por negociações diretas, arbitragem e outros meios pacíficos, com a cooperação dos organismos internacionais de que o Brasil participe. Parágrafo único. É vedada a guerra de conquista. 198 Vale dizer que em 17 de outubro de 1969, a Constituição Federal de 1967 sofreu alterações em seu texto com a emenda constitucional n. 1, outorgada pela junta militar que assumiu o poder na época em que o Presidente Costa e Silva estava doente. Para a doutrina majoritária, a EC n. 1 de 1969 é considerada, na verdade, uma nova Constituição. 199 BRASIL. Emenda Constitucional nº 1, de 17 de outubro de 1969. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/Emc_anterior1988/emc01-69.htm>. Acesso em: 19 maio 2010. 200 DALLARI, Pedro. Constituição e relações exteriores: prefácio de Celso Lafer. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 173. 201 POLETTI, Ronaldo. Constituição anotada. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 15. 202 Vide art. 21, II, CRFB/88. (BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010.) 203 Vide art. 22, III, CRFB/88. (BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010.) 204 Vide art. 21, V, CRFB/88. (BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010.) 205 POLETTI, Ronaldo. Constituição anotada. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 15. 206 BRASIL. Nações Unidas no Brasil. Carta das Nações Unidas. Disponível em: <http://www.onu-brasil.org.br/documentos_carta.php>. Acesso em: 19 maio 2010.

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Ante todo o exposto, observa-se que o princípio da solução pacífica de

controvérsias não está somente consolidado na história constitucional brasileira, mas também

na ordem internacional contemporânea207.

2.1.2.8 Repúdio ao Terrorismo e ao Racismo

A primeira manifestação de repressão ao terrorismo foi a Convenção de 1937,

celebrada em Genebra. O direito internacional veio a dar maior importância ao tema, nas

décadas de 60 e 70, com a intensificação de ações terroristas208. Para tanto, foram celebrados

tratados internacionais como a Convenção sobre a Prevenção de Delitos contra Pessoas

Internacionalmente Protegidas, em Nova York, ano de 1973; a Convenção Internacional

contra a tomada de Reféns, em Nova York, ano de 1979; Convenção de Tóquio sobre

Infrações e outros atos cometidos a bordo de aeronaves, em 1963; Convenção de Haia sobre

Repressão do apoderamento ilícito de aeronaves, em 1970; de Montreal sobre a Repressão de

atos ilícitos contra a segurança da aviação, em 1971.

A Conferência Mundial dos Direitos Humanos, de 1993, no § 17 da Declaração e

Programa de Ação dispõe que:

Os atos, métodos e práticas terroristas em todas as suas formas e manifestações, bem como os vínculos existentes entre alguns países e o tráfico de drogas, são atividades que visam à destruição dos direitos humanos, das liberdades fundamentais e da democracia e que ameaçam a integridade territorial e a segurança dos países, desestabilizando Governos legitimamente constituídos. A comunidade internacional deve tomar as medidas necessárias para fortalecer a cooperação na prevenção e combate ao terrorismo.

Na mesma direção do entendimento da ordem internacional, a ordem interna

também manifesta repúdio ao terrorismo quando o inciso XLIII do artigo 5° da CRFB/88

considera a prática do terrorismo como crime inafiançável e insuscetível de graça ou anistia:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...]

207 PEIXINHO, Manoel Messias; GUERRA, Isabella Franco. NASCIMENTO FILHO, Firly. Os princípios da Constituição de 1988. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris, 2001. p. 200. 208 PEIXINHO, Manoel Messias; GUERRA, Isabella Franco. NASCIMENTO FILHO, Firly. Os princípios da Constituição de 1988. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris, 2001. p. 200.

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XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem.209

O racismo é considerado crime de grave violação aos direitos humanos e

liberdades fundamentais além de ameaça à paz e segurança internacionais. A discriminação

fere uma das bases fundamentais do respeito aos direitos humanos.210

A Carta das Nações Unidas estabelece, no item 3, do artigo 1, que um dos

propósitos da Organização é a promoção do “respeito aos direitos humanos e às liberdades

fundamentais para todos, sem distinção de raça, sexo, língua ou religião”.211

O direito a não-discriminação em virtude de qualquer condição, é igualmente

amparado pela Declaração Universal dos Direitos Humanos212, no artigo I, quando prevê que

“todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos” e que “são dotadas de razão

e consciência e devem agir em relação umas às outras com espírito de fraternidade”. O artigo

II assegura que os direitos e as liberdades estabelecidos no referido documento devem ser

gozados por todas as pessoas “sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo,

língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza,

nascimento, ou qualquer outra condição”.

A Convenção Internacional sobre a Eliminação de todas as formas de

Discriminação Racial213, no primeiro artigo que consta do Tratado, preliminarmente conceitua

o que

a expressão "discriminação racial" significará toda distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada em raça, cor, descendência ou origem nacional ou étnica que tenha por objeto ou resultado anular ou restringir o reconhecimento, gozo ou exercício em um mesmo plano (em igualdade de condição) de direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural ou em qualquer outro campo da vida pública.

A prática do racismo é considerada pela CRFB/88 como crime inafiançável e

imprescritível:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade

209 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010. 210 PEIXINHO, Manoel Messias; GUERRA, Isabella Franco. NASCIMENTO FILHO, Firly. Os princípios da Constituição de 1988. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris, 2001. p. 202. 211 BRASIL. Nações Unidas no Brasil. Carta das Nações Unidas. Disponível em: <http://www.onu-brasil.org.br/documentos_carta.php>. Acesso em: 19 maio 2010. 212 BRASIL. Ministério da Justiça. Declaração Universal dos Direitos Humanos. Disponível em: <http://portal.mj.gov.br/sedh/ct/legis_intern/ddh_bib_inter_universal.htm>. Acesso em: 19 maio 2010. 213 Convenção adotada pela Resolução n. 2.106-A (XX) da Assembléia Geral das Nações Unidas, em 21 de dezembro de 1965 e ratificada pelo Brasil em 27 de março de 1968.

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do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei.214

A República Federativa do Brasil reprova toda e qualquer manifestação das

práticas de racismo e terrorismo, aderindo aos repúdios internacionais relativos a elas. No que

tange ao racismo, o povo brasileiro rejeita qualquer tipo de discriminação, até porque o

Estado brasileiro é formado por uma miscigenação.215

2.1.2.9 Cooperação entre os Povos para o Progresso da Humanidade

O propósito da edição do inciso IX, do artigo 4°, da CRFB/88, é o de promover a

fraternidade universal e o progresso por meio do trabalho e do conhecimento.216

O artigo 56 da Carta da ONU217 dispõe que, para a realização dos propósitos

enumerados no artigo 55, todos os Membros da Organização se comprometem a agir em

cooperação com esta, em conjunto ou separadamente.

O direito internacional contemporâneo preza pela cooperação entre as entidades

iguais e soberanas pela criação e atuação das organizações internacionais, na persecução da

proteção dos direitos humanos, do meio ambiente, da utilização consciente dos recursos

naturais, entre outros, culminando com a idéia de patrimônio comum da humanidade.218

O princípio da cooperação entre os povos para o progresso da humanidade

evidencia a contradição que recai sobre a ausência de referência às organizações

internacionais, uma vez que são elas que materializam o sistema de ajuda mútua no plano

externo.219

214 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010. 215 POLETTI, Ronaldo. Constituição anotada. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 16. 216 POLETTI, Ronaldo. Constituição anotada. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 16. 217 BRASIL. Nações Unidas no Brasil. Carta das Nações Unidas. Disponível em: <http://www.onu-brasil.org.br/documentos_carta.php>. Acesso em: 19 maio 2010. 218 PEIXINHO, Manoel Messias; GUERRA, Isabella Franco. NASCIMENTO FILHO, Firly. Os princípios da Constituição de 1988. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris, 2001. p. 203. 219 DALLARI, Pedro. Constituição e relações exteriores: prefácio de Celso Lafer. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 179.

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2.1.2.10 Concessão de Asilo Político

A CRFB/88 é a primeira das constituições brasileiras que incluiu expressamente o

direito de asilo político no rol dos princípios constitucionais que regem as relações exteriores

do país220.

O asilo político, instrumento do direito internacional221, é um mecanismo de

grande importância para a proteção da pessoa humana e a sua instituição como princípio de

política externa evidencia a preocupação do legislador constituinte com a prevalência dos

direitos humanos222. A competência para a sua concessão é do Presidente da República223.

Conceder asilo político é o ato de receber, no país, uma pessoa que está sendo

alvo de perseguição de caráter ideológico ou político, nos cômodos de uma missão

diplomática ou de uma dependência consular estrangeira224. Ou seja, o instituto do asilo

político representa um mecanismo de solidariedade internacional operado pelos regimes

democráticos225.

A Convenção de Caracas sobre Asilo Diplomático, no artigo II, estabelece que

“todo Estado tem o direito de conceder asilo, mas não se acha obrigado a concedê-lo, nem a

declarar por que o nega.” E o artigo I, da Convenção de Caracas sobre Asilo Territorial, prevê

que “todo Estado tem direito, no exercício de sua soberania, de admitir dentro de seu território

as pessoas que julgar conveniente, sem que, pelo exercício desse direito, nenhum outro Estado

possa fazer qualquer reclamação.”226

220 DALLARI, Pedro. Constituição e relações exteriores: prefácio de Celso Lafer. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 180. 221 POLETTI, Ronaldo. Constituição anotada. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 16. 222 PEIXINHO, Manoel Messias; GUERRA, Isabella Franco. NASCIMENTO FILHO, Firly. Os princípios da Constituição de 1988. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris, 2001. p. 205. 223 A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal vem atribuindo esta competência ao Presidente da República, uma vez que ela não vem instituída na Constituição Federal nem na legislação infraconstitucional. (BESTER, Gisela Maria. Direito constitucional: fundamentos teóricos. v. 1. São Paulo: Manole, 2005. p. 310.) 224 SEITENFUS, Ricardo Antônio Silva; VENTURA, Deisy de Freitas Lima. Introdução ao Direito Internacional Público. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999. p. 128. 225 DALLARI, Pedro. Constituição e relações exteriores: prefácio de Celso Lafer. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 182. 226 Ambas as Convenções mencionadas possuem caráter regional e foram celebradas no ano de 1954, na cidade de Caracas.

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O artigo XIV, item 1, da Declaração Universal dos Direitos Humanos227 garante

que “toda pessoa, vítima de perseguição, tem o direito de procurar e de gozar asilo em outros

países”.

Por outro lado, o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos nada menciona

a respeito do direito de asilo228.

2.1.2.11 Integração dos Povos na América Latina

O Tratado de Montevidéu criou a ALALC (Associação Latino-Americana de

Livre Comércio), em 15 de fevereiro de 1960229, que foi substituída pela ALADI (Associação

Latino-Americana de Integração), no ano de 1980230. Em 1988, os governos do Brasil e da

Argentina assinaram o Tratado de Integração, Cooperação e Desenvolvimento, no qual se

estabelecia a criação de um mercado comum, dentro de dez anos, sendo que o acordo ficava

aberto a todos os demais Estados da região231. No dia 26 de março de 1991, na cidade de

Assunção, um novo tratado, o Tratado de Assunção, assinado entre Brasil, Argentina, Uruguai

e Paraguai que, a partir de então ficou criado o mercado comum entre os países signatários232.

Este mercado comum entre os quatro Estados é o MERCOSUL233, promulgado

pelo Decreto n° 350, de 21 de novembro de 1991, cujo objetivo é a realização progressiva de

um mercado comum entre os países dele signatários.234

Quando o constituinte editou o parágrafo único do artigo 4° da CRFB/88,

pretendeu uma integração em outros âmbitos que não só o econômico235. O fundamento desta

227 Convenção adotada e proclamada pela resolução 217 A (III), da Assembléia Geral das Nações Unidas, em 10 de dezembro de 1948. 228 PEIXINHO, Manoel Messias; GUERRA, Isabella Franco. NASCIMENTO FILHO, Firly. Os princípios da Constituição de 1988. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris, 2001. p. 204. 229 POLETTI, Ronaldo. Constituição anotada. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 17. 230 POLETTI, Ronaldo. Constituição anotada. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 17. 231 POLETTI, Ronaldo. Constituição anotada. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 17. 232 POLETTI, Ronaldo. Constituição anotada. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 17. 233 BRASIL. Decreto nº 350, de 21 de Novembro de 1991. Promulga o Tratado para a Constituição de um Mercado Comum entre a República Argentina, a República Federativa do Brasil, a República do Paraguai e a República Oriental do Uruguai (TRATADO MERCOSUL). Disponível em: <http://www.receita.fazenda.gov.br/legislacao/acordosinternacionais/acordoscooperacaoaduaneira/mercosul/dec35091.htm>. Acesso em: 20 maio 2010. 234 SEITENFUS, Ricardo Antônio Silva; VENTURA, Deisy de Freitas Lima. Introdução ao Direito Internacional Público. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999. p. 194. 235 PEIXINHO, Manoel Messias; GUERRA, Isabella Franco. NASCIMENTO FILHO, Firly. Os princípios da Constituição de 1988. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris, 2001. p. 206.

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integração não é meramente econômico ou comercial, mas também cultural236. Ele quis

salientar a identidade histórica dos povos latino-americanos, porquanto todos têm traços

semelhantes no que concerne às expropriações sofridas por eles à época da colonização.237

No tocante à última parte da redação do parágrafo único do artigo 4°, da

CRFB/88, que dispõe que “a República Federativa do Brasil buscará a integração econômica,

política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma

comunidade latino-americana de nações”238, recai a discussão sobre o que seria a formação de

uma comunidade latino-americana de nações. POLETTI indaga se o dispositivo se refere a

um novo ser político supranacional que excederia o atributo de soberania dos Estados239.

Entende ele que a criação de uma nova estrutura política latino-americana poderia trazer,

como resultado, o fim do Estado concebido com os predicados de soberania, territorialidade e

nacionalidade240.

2.2 O PODER DE CELEBRAR TRATADOS

Para o melhor entendimento acerca do estudo da competência para celebrar

tratados internacionais, é importante fazer a distinção entre a capacidade dos Estados para

celebrar tratados, o treaty-making capacity, do poder para celebrá-los, o treaty-making

power241.

A Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, de 23 de maio de 1969, em

seu artigo 6°, possui o seguinte texto: “Todo Estado tem capacidade para concluir tratados”,

ou seja, a capacidade para firmar tratados é um atributo derivado da sua qualidade de ente

soberano. O mesmo artigo não traz, em sua redação, nenhuma ressalva ao exercício desta

capacidade.

Já, o artigo 46 do mesmo documento estabelece que

um Estado não pode invocar o fato de que seu consentimento em obrigar-se por um tratado foi expresso em violação de uma disposição de seu direito interno sobre competência para concluir tratados, a não ser que essa violação fosse manifesta e dissesse respeito a uma norma de seu direito interno de importância fundamental.

236 POLETTI, Ronaldo. Constituição anotada. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 17. 237 BESTER, Gisela Maria. Direito constitucional: fundamentos teóricos. v. 1. São Paulo: Manole, 2005. p. 310. 238 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010. 239 POLETTI, Ronaldo. Constituição anotada. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 16. 240 POLETTI, Ronaldo. Constituição anotada. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 17. 241 MEDEIROS, Antônio Paulo Cachapuz de. O poder de celebrar tratados. Porto Alegre: Fabris, 1995. p. 136.

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59

O Supremo Tribunal Federal, ao julgar a ADI n. 1480 MC/DF, assim entendeu:

No sistema jurídico brasileiro, os tratados ou convenções internacionais estão hierarquicamente subordinados à autoridade normativa da Constituição da República. Em conseqüência, nenhum valor jurídico terão os tratados internacionais, que, incorporados ao sistema de direito positivo interno, transgredirem, formal ou materialmente, o texto da Carta Política. O exercício do treaty-making power, pelo Estado brasileiro - não obstante o polêmico art. 46 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados (ainda em curso de tramitação perante o Congresso Nacional) -, está sujeito à necessária observância das limitações jurídicas impostas pelo texto constitucional242. (grifo nosso)

Entretanto, o Estado necessita de indivíduos para formar e declarar sua vontade

para assumir compromissos internacionais. Estes indivíduos que agem como órgãos do

Estado, investidos de poder para expressar a vontade deste, possuem competência para agir

em seu nome quando da celebração de tratados internacionais243.

A CRFB/88, em seu artigo 84, VIII, confere ao Presidente da República

competência privativa para celebrar tratados.

Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República: [...] VIII - celebrar tratados, convenções e atos internacionais, sujeitos a referendo do Congresso Nacional.244

E à União, no artigo 21, I, competência para manter relações com Estados

estrangeiros.

Art. 21. Compete à União: I - manter relações com Estados estrangeiros e participar de organizações internacionais.245

Vale ressaltar que o Presidente da República, quando estiver exercendo o que lhe

compete por força do artigo 84, VIII, estará atuando como chefe do governo da República

Federativa do Brasil, não apenas do governo da União.246

Ante o exposto, NATANAEL MARTINS sintetiza:

[...], compete à União manter relações com os Estados (art. 21, I), representada pelo Presidente da República (art. 84, VII), a quem foi cometida a faculdade de celebrar tratados, convenções e atos internacionais (art. 84, VIII), ad referendum do

242 BRASIL. Supremo Tribunal Federal (Tribunal Pleno). ADI n. 1480 MC, do Distrito Federal. Relator(a): Min. Celso De Mello, julgado em 04 de setembro de 1997. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/util/obterPaginador.asp?numero=1480&classe=ADI-MC >. Acesso em: 28 abr.2010. 243 MEDEIROS, Antônio Paulo Cachapuz de. O poder de celebrar tratados. Porto Alegre: Fabris, 1995. p. 137. 244 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010. 245 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010. 246 CARNEIRO, Sérgio Luiz de Souza. Possibilidade da concessão, pela União, de isenções de tributos estaduais e municipais, em decorrência de tratado internacional. Repertório IOB de Jurisprudência: tributário, constitucional e administrativo. n. 8. abr. 2001. p. 213.

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Congresso Nacional (art. 49, I). Por fim, cabe ao Supremo Tribunal Federal, na qualidade de guardião da Constituição, em última instância, julgar a constitucionalidade de tratados internacionais (art. 102, III, b)247.

Constitucionalmente, o Presidente da República é quem tem voz externa, o Poder

Executivo é o responsável pela negociação, ratificação e promulgação quando da celebração

de tratados internacionais e o Congresso Nacional é quem tem competência exclusiva para

apreciar e referendar, ou não, tratados que representem compromissos gravosos para o

patrimônio público brasileiro248.

Vale dizer que o referendo do Congresso Nacional não transforma o tratado em lei

interna. Tal ato consiste em uma prévia aprovação para que depois o Presidente da República

possa ratificá-lo.

Porém, antes de entrar na discussão acerca do procedimento de sua celebração,

assunto que será tratado no item 2.2.2., deste trabalho de pesquisa, é importante conceituar

tratado internacional.

2.2.1 Conceito de tratado

A Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, de 1969, internacionalmente

em vigor desde 1980249, no artigo 2, define tratado internacional250 como sendo “um acordo

internacional celebrado por escrito entre Estados e regido pelo direito internacional, quer

conste de um instrumento único, quer de dois ou mais instrumentos conexos, qualquer que

seja sua denominação particular.”

O tratado internacional é, lato sensu, o acordo de vontades firmado entre dois ou

mais sujeitos de direito internacional, podendo estes ser Estados ou organizações

internacionais, onde anuem sobre determinadas matérias fixadas em cláusulas que passam a

247 MARTINS, Natanael. Tratados internacionais em matéria tributária. Cadernos de Direito Tributário e Finanças Públicas, v. 3, n. 12, p. 194. 248 GRUPENMACHER, Betina Treiger. Tratados internacionais em matéria tributária e ordem interna. São Paulo: Dialética, 1999. p. 74. 249 SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento e Hildebrando Accioly. Manual de direito internacional público. 15. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 28. 250 A expressão “tratado internacional”, neste trabalho de pesquisa, será utilizada de forma genérica, a fim de abarcar também os acordos, as declarações, as convenções, os compromissos e os outros atos internacionais dos quais a República Federativa do Brasil faça parte.

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viger no ordenamento jurídico interno das partes signatárias, conforme procedimento de

recepção no direito interno de cada um.251

Outrossim, tratado internacional pode ser conceituado como ato jurídico mediante

o qual o acordo de vontades entre duas ou mais pessoas internacionais é manifestado.252

Ademais, dentre as fontes do Direito Internacional, o tratado é considerado a mais

importante e mais democrática. Importante, porque as matérias de maior relevância são

regulamentadas por eles, e democrática, devido à participação direta dos Estados quando da

sua elaboração253.

Entendido o que significa o tratado internacional, passa-se para a etapa da

descoberta de como se dá sua celebração.

2.2.2 O procedimento de celebração de tratados

O procedimento de celebração de tratados passa por cinco etapas: negociação,

assinatura, referendo e ratificação, promulgação e publicação.

2.2.2.1 Negociação

Os tratados internacionais nascem de propostas de negociações preliminares entre

os Estados. Estes se reúnem com a intenção de firmar o acordo. Geralmente, tratados

bilaterais se desenvolvem entre o Ministro do Exterior ou seu representante e o agente

diplomático estrangeiro, devidamente assessorados por técnicos nos assuntos em negociação.

Os multilaterais são negociados em grandes conferências e congressos.254

Então, a primeira etapa do procedimento de celebração dos tratados internacionais

é a negociação dos termos e condições com a elaboração preliminar do texto, o qual é 251 JESUS, Ricardo Henrique de. Representatividade e competência do tratado tributário. Revista Magister de Direito Empresarial, Concorrencial e do Consumidor. v. 2, n. 7. fev./mar. 2006. p. 24. 252 SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento e Hildebrando Accioly. Manual de direito internacional público. 15. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 28. 253 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de direito internacional público. 12. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Renovar, 2000. p. 200. 254 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de direito internacional público. 12. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Renovar, 2000. p. 213.

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democraticamente discutido, porquanto o tratado nada mais é do que um acordo de vontades.

A adoção do texto de tratados multilaterais deve observar a exigência de haver a maioria de

dois terços dos Estados presentes votantes, a não ser que a mesma maioria estipule regra

diversa. 255

A negociação culmina, depois da adoção do texto nos termos em que será firmado

o tratado, com a assinatura dos instrumentos internacionais pelo Presidente, ou seu

representante.

2.2.2.2 Assinatura

A assinatura do tratado internacional é um ato considerado precário porque está

sujeita à confirmação pelo Presidente, na fase da ratificação, o qual será, então, o aceite

definitivo256. Isto é, após o Estado ter assinado o tratado, proceder-se-á à ratificação ou

aprovação deste ato, a partir do qual nasce uma obrigação de boa fé em não praticar atos que

frustrem o objeto do acordo.257

A Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados prevê, em seu artigo 18, que

o Estado se obriga a não frustrar o objeto e a finalidade do tratado antes da sua entrada em

vigor pela assinatura ou expressão de consentimento:

Artigo 18: Obrigação de Não Frustrar o Objeto e Finalidade de um Tratado antes de sua Entrada em Vigor Um Estado é obrigado a abster-se da prática de atos que frustrariam o objeto e a finalidade de um tratado, quando: a) tiver assinado ou trocado instrumentos constitutivos do tratado, sob reserva de ratificação, aceitação ou aprovação, enquanto não tiver manifestado sua intenção de não se tornar parte no tratado; ou b) tiver expressado seu consentimento em obrigar-se pelo tratado no período que precede a entrada em vigor do tratado e com a condição de esta não ser indevidamente retardada.

255 SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento e Hildebrando Accioly. Manual de direito internacional público. 15. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 31. 256 HUSEK, Carlos Roberto. Curso de direito internacional público. 3. ed. São Paulo: LTr, 2000. p. 58. 257 BROWNLIE, Ian. Princípios de direito internacional público. Lisboa: Fundação Calouste Gulberkian, 1997. p. 630.

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2.2.2.3 Referendo e ratificação

A ratificação é um ato unilateral, discricionário e irretratável258, de natureza

internacional, ou seja, dirigido às partes signatárias259.

Nesta etapa, ocorre o aceite definitivo, a confirmação, por meio do qual o

Presidente da República engaja definitivamente a nação no cenário internacional

relativamente às obrigações contidas naquele tratado internacional. A ratificação é o “ato

administrativo mediante o qual o chefe de Estado confirma tratado firmado em seu nome ou

em nome do Estado, declarando aceito o que foi convencionado pelo agente signatário.260”

Há doutrinadores que defendem a dispensa da ratificação, que ocorre quando:

[...] o próprio tratado assim disponha; nos acordos celebrados para cumprimento ou interpretação de tratado devidamente ratificado; nos acordos sobre assuntos puramente administrativos que prevêem eventuais modificações, como no caso de acordos de transporte aéreo; nos modus vivendi que têm por finalidade deixar as coisas no estado em que se acham ou estabelecer simples bases para negociações futuras. Nos tratados sobre o meio ambiente tem surgido a prática de assinar tratados-base (umbrella treaties) que traçam as grandes linhas e que devem ser completados por protocolos ou pela modificação de anexos em que a ratificação pode ser dispensada.261

Consiste então, a ratificação, em um “ato do Poder Executivo, exigindo ou não a

prévia autorização do Poder Legislativo.” 262

Assim, conforme já estudado no item 2.2, por força do artigo 84, VIII, o

Presidente da República é quem tem a competência privativa para celebrar tratados. Ainda,

este mesmo inciso estabelece que os tratados internacionais estão sujeitos a referendo do

Congresso Nacional, in verbis:

Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República: [...] VIII - celebrar tratados, convenções e atos internacionais, sujeitos a referendo do Congresso Nacional.263

258 Por força do pacta sunt servanda (os acordos devem ser cumpridos), mesmo que o tratado ainda não tenha entrado em vigor. (REZEK, José Francisco. Direito internacional público: curso elementar. 10 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 52.) 259 HUSEK, Carlos Roberto. Curso de direito internacional público. 3. ed. São Paulo: LTr, 2000. p. 58. 260 SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento e Hildebrando Accioly. Manual de direito internacional público. 15. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 34. 261 SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento e Hildebrando Accioly. Manual de direito internacional público. 15. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 34. 262 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de direito internacional público. 12. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Renovar, 2000. p. 217. 263 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010.

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Há duas correntes que cuidam da questão da submissão dos tratados ao Poder

Legislativo, no Brasil. A primeira acredita na dispensa da aprovação de determinados acordos

pelo Congresso Nacional. A segunda corrente sustenta que todos os acordos devem passar

pelo crivo do Legislativo antes da sua ratificação.264

Outrossim, a CRFB/88 traz, no artigo 49, I, que os tratados, acordos ou atos

internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional

serão submetidos a referendo do Congresso Nacional:

Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional: I - resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional.265

De fato, não há dispositivo constitucional compelindo a intervenção formal do

Parlamento. O que existe, é o mandamento de que, caso o compromisso internacional seja

gravoso ao patrimônio nacional, então o Congresso Nacional deve resolver definitivamente

sobre este266. Ou seja, no Brasil, a ratificação de tratados internacionais cujo teor envolva

acordos ou condições onerosas ocorrerá depois que o Congresso Nacional aprovar a

assinatura dos instrumentos internacionais pelo Presidente, por ser o órgão interno

representativo da vontade popular que detém a competência exclusiva para referendar tratados

internacionais267.

2.2.2.4 Promulgação e publicação

Ratificado o tratado internacional, os instrumentos de ratificação são trocados ou

depositados, o que torna o tratado eficaz, por enquanto, apenas no plano interno.268

O próximo passo é a expedição de decreto, pelo Chefe de Estado, o que traz como

conseqüência, três efeitos, que são a promulgação, a publicação oficial do texto e a

executoriedade do ato internacional, o que o torna norma obrigatória para o Estado. 269

264 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de direito internacional público. 12. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Renovar, 2000. p. 224. 265 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010. 266 HUSEK, Carlos Roberto. Curso de direito internacional público. 3. ed. São Paulo: LTr, 2000. p. 59. 267 SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento e Hildebrando Accioly. Manual de direito internacional público. 15. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 34. 268 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de direito internacional público. 12. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Renovar, 2000. p. 228.

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Conclui-se, então que, o procedimento de celebração de tratados começa com a

negociação pelos sujeitos internacionais do texto que conterá suas condições e termos. Por

conseguinte, após a adoção do texto, o chefe de Estado assinará o acordo. Após a assinatura, o

tratado é submetido ao crivo do Poder Legislativo, que é o referendo do Congresso Nacional.

Porém, a questão acerca do referendo é polêmica. A doutrina discute sobre sua

obrigatoriedade. Se seu teor versar sobre assunto que envolva condições onerosas ou

compromissos gravosos ao patrimônio nacional, que é o caso dos tratados em matéria

tributária, o artigo 49, I, da CRFB/88 exige sua submissão à prévia aprovação do Congresso

Nacional. Em seguida, o tratado é confirmado pela ratificação do Presidente da República, o

que irá comprometer definitivamente a nação com as disposições pactuadas.270

Devidamente ratificado o tratado internacional, o Presidente da República expede

decreto para que o texto do tratado internacional seja publicado no Diário Oficial da União,

no idioma nacional, e sua execução será ordenada.271 A publicação, última etapa da

celebração dos tratados internacionais, é adotada por todos os países, e consiste em requisito

essencial para sua efetiva aplicação no âmbito interno272.

2.2.3 Momento da entrada em vigor do tratado internacional

O artigo 24, números 1 e 2, da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados,

de 1969, assim dispõe acerca do momento que um tratado internacional entra em vigor:

Artigo 24: Entrada em vigor 1. Um tratado entra em vigor na forma e na data previstas no tratado ou acordadas pelos Estados negociadores. 2. Na ausência de tal disposição ou acordo, um tratado entra em vigor tão logo o consentimento em obrigar-se pelo tratado seja manifestado por todos os Estados negociadores.

269 BRASIL. Supremo Tribunal Federal (Tribunal Pleno). ADI n. 1480 MC, do Distrito Federal. Relator(a): Min. Celso De Mello, julgado em 04 de setembro de 1997. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/util/obterPaginador.asp?numero=1480&classe=ADI-MC >. Acesso em: 28 abr.2010. 270 LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 13. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 437. 271 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de direito internacional público. 12. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Renovar, 2000. p. 228. 272 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de direito internacional público. 12. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Renovar, 2000. p. 229.

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A forma e a data em que o tratado internacional entra em vigor no ordenamento

jurídico interno de um Estado são determinadas pelas disposições contidas no mesmo273.

Todavia, se não houver esta cláusula, prevalece a presunção da sua entrada em vigor no

momento em que todos os Estados participantes derem o seu consentimento em se vincular

pelo tratado274, ou seja, pela simples troca de instrumentos, assinatura dos representantes ou

qualquer outro meio275 que expresse claramente a vontade em se comprometer276.

2.3 RESPONSABILIDADE INTERNACIONAL

A responsabilidade internacional pode ser conceituada como a “verdadeira

obrigação de reparar os danos oriundos de violação de norma do Direito Internacional277”. Por

isso que REZEK afirma que “o Estado responsável pela prática de um ato ilícito segundo o

direito internacional deve ao Estado a que tal ato tenha causado dano uma reparação

adequada.278”

Ademais, para que a responsabilidade se configure, a doutrina afirma que deve

haver a reunião de três elementos essenciais, que são o suporte fático279, o nexo causal280 entre

o fato e o responsável por ele, e o dano281.

No mesmo raciocínio relativamente a não-observância do disposto no tratado

internacional ocasionar ao Estado desobediente um dever de reparação ou indenização ao

Estado prejudicado, MACHADO destaca que

273 HUSEK, Carlos Roberto. Curso de direito internacional público. 3. ed. São Paulo: LTr, 2000. p. 60. 274 BROWNLIE, Ian. Princípios de direito internacional público. Lisboa: Fundação Calouste Gulberkian, 1997. p. 635. 275 O artigo 11 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados estabelece que “o consentimento de um Estado a estar vinculado por um tratado pode manifestar-se pela assinatura, a troca de instrumentos constitutivos de um tratado, a ratificação, a aceitação, a aprovação ou adesão, ou por outro meio convencionado.” 276 HUSEK, Carlos Roberto. Curso de direito internacional público. 3. ed. São Paulo: LTr, 2000. p. 60. 277 RAMOS, André de Carvalho. Responsabilidade internacional por violação de direitos humanos: seus elementos, a reparação devida e sanções possíveis: teoria e prática do direito internacional. Rio de Janeiro: Renovar, 2004. p. 69. 278 REZEK, José Francisco. Direito internacional público: curso elementar. 10 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 269. 279 O suporte fático, também denominado ato ilícito, é a norma internacional violada. (MELLO, Celso D. de Albuquerque. Responsabilidade internacional do Estado. Rio de Janeiro: Renovar, 1995. p. 32.) 280 Deve haver uma relação entre o ato ilícito e o sujeito de Direito Internacional que o praticou, ou seja, a imputabilidade. (MELLO, Celso D. de Albuquerque. Responsabilidade internacional do Estado. Rio de Janeiro: Renovar, 1995. p. 34.) 281 Há uma divergência doutrinária quanto à necessidade da existência do dano para a configuração da responsabilidade internacional de um Estado. (MELLO, Celso D. de Albuquerque. Responsabilidade internacional do Estado. Rio de Janeiro: Renovar, 1995. p. 34.) Porém, não será feito um estudo aprofundado sobre esta questão, haja vista ela não ser o foco deste trabalho.

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O entendimento do Supremo Tribunal Federal ressalva as conseqüências do descumprimento do tratado no plano internacional, o que quer dizer admitir a responsabilidade do Brasil pela edição de lei com inobservância do tratado. Em outras palavras, o prejudicado teria direito a uma indenização pelos danos decorrentes da inobservância do tratado pelo Estado brasileiro. O prejudicado poderia promover contra a União ação de indenização. Se o tratado garantia uma isenção, que foi excluída pela lei interna, terá direito a uma indenização, que se tiver o seu valor bem fixado corresponderá, pelo menos, ao valor da isenção que deixou de ter assegurada282.

Por fim, a responsabilidade internacional nasce no momento da violação, ou seja,

do não cumprimento da obrigação convencionada283, surgindo assim, o dever do sujeito de

direito internacional para com o sujeito lesado, de reparação, sempre que a este for causado

um prejuízo. 284

2.3.1 Por atos do Poder Judiciário

O tratado internacional, devidamente incorporado ao ordenamento jurídico

interno, deve ser aplicado pelos magistrados em concordância com o direito interno. Como os

atos dos juízes são também atos do Estado, a não-aplicação do direito internacional por

aqueles, gera a responsabilização internacional do Estado.285

O Poder Judiciário, por ser um órgão do Estado ao lado dos demais poderes,

também tem parte na responsabilidade internacional ao praticar um ato ilícito, que a doutrina

chama de denegação de justiça286.

As formas mais comuns de denegação de justiça, que ocorrem tanto para os

nacionais como para os estrangeiros287, são: recusa de acesso aos tribunais, recusa do Tribunal

de julgar a questão de fundo, retardamento exagerado no julgamento sem que haja uma

justificação válida, falta de diligência devida na perseguição ou prisão do autor de um delito

praticado contra um estrangeiro, rapidez insólita no julgamento de um acusado estrangeiro,

282 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário . 30. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Malheiros Editores, 2009. p. 86. 283 SEITENFUS, Ricardo Antônio Silva; VENTURA, Deisy de Freitas Lima. Introdução ao Direito Internacional Público. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999. p. 81. 284 MIRANDA, Jorge. Sobre a responsabilidade internacional. Revista da Fundação Escola Superior do Ministério Público do Distrito Federal e Território s. v. 10, n. 20. jul./dez. 2002. p. 305. 285 VARELLA, Marcelo D. Direito internacional público. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 369. 286 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Responsabilidade internacional do Estado. Rio de Janeiro: Renovar, 1995. p. 131. 287 VARELLA, Marcelo D. Direito internacional público. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 373.

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prisão ou detenção ilegal de um estrangeiro, inexecução de uma sentença proferida a favor de

um estrangeiro288, que serão tratados a seguir.

2.3.1.1 Recusa de acesso aos tribunais

A denegação de justiça stricto sensu ocorre quando o Estado não dispõe de

tribunais para resolver certos litígios ou impede que o estrangeiro tenha acesso aos

tribunais289.

2.3.1.2 Recusa do Tribunal de julgar a questão de fundo

O tribunal não recebe a reclamação apresentada por um estrangeiro alegando ser

incompetente para o julgamento da questão290. As autoridades judiciárias se negam a conhecer

as causas propostas não garantindo, muitas vezes, ao estrangeiro, direito de ação291.

2.3.1.3 Retardamento exagerado no julgamento sem que haja uma justificação válida

A demora na prolação da decisão, já aceita pela jurisprudência internacional como

forma de denegação de justiça292, impede a utilidade e eficácia da prestação jurisdicional293.

288 MELLO apud NASCIMENTO, Antônio Benedito do. O juiz nacional em face do direito internacional. Revista dos Tribunais, v. 86, n. 735, jan. 1997. p. 24-25. 289 VARELLA, Marcelo D. Direito internacional público. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 373. 290 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Responsabilidade internacional do Estado. Rio de Janeiro: Renovar, 1995. p. 134. 291 VARELLA, Marcelo D. Direito internacional público. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 373. 292 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Responsabilidade internacional do Estado. Rio de Janeiro: Renovar, 1995. p. 134. 293 RAMOS, André de Carvalho. Responsabilidade internacional por violação de direitos humanos: seus elementos, a reparação devida e sanções possíveis: teoria e prática do direito internacional. Rio de Janeiro: Renovar, 2004. p. 176.

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2.3.1.4 Falta de diligência devida na perseguição ou prisão do autor de um delito praticado

contra um estrangeiro

Quando um tribunal se recusa a perseguir o autor de um crime praticado contra

um estrangeiro, demora anos para prendê-lo e, quando o prende, aplica uma pena insuficiente,

incorre, igualmente, em denegação de justiça294.

2.3.1.5 Rapidez insólita no julgamento de um acusado estrangeiro, Prisão ou detenção ilegal

de um estrangeiro e Inexecução de uma sentença proferida a favor de um estrangeiro

O que se pretende, ao examinar as formas de denegação de justiça, é buscar uma

política não discriminatória entre estrangeiros e nacionais, concedendo a todos um tratamento

igualitário.

2.3.2 Sanções Internacionais

Ao Estado lesado é conferida a prerrogativa de reagir a uma violação do Direito

Internacional de forma tanto coercitiva quanto substitutiva Há medidas de coerção que podem

ser tomadas a fim de que o Estado ofensor seja coagido a reparar o dano causado ou medidas

de execução forçada, de caráter substitutivo.295

Primeiramente, os interessados em ver o dano reparado devem acionar a justiça do

Estado responsável e, se o tribunal interno não reconhecer a responsabilidade e tendo sido

esgotadas todas as instâncias internas, é que poderá recorrer às instâncias internacionais. Em

alguns casos, todavia, admite-se que se recorra às instâncias internacionais diretamente.296

294 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Responsabilidade internacional do Estado. Rio de Janeiro: Renovar, 1995. p. 135. 295 RAMOS, André de Carvalho. Responsabilidade internacional por violação de direitos humanos: seus elementos, a reparação devida e sanções possíveis: teoria e prática do direito internacional. Rio de Janeiro: Renovar, 2004. p. 83. 296 VARELLA, Marcelo D. Direito internacional público. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 390.

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A sanção não tem o propósito meramente punitivo, seu intento é coagir o Estado

infrator a reparar o dano que causou297, até porque não se admite o uso da força para obrigar

Estados a cumprirem seus deveres, porquanto a coerção atenta contra a soberania298.

A doutrina elenca dois tipos de sanção: um, de natureza coercitiva, e outro,

substitutiva ou repressiva. O primeiro tipo é o que visa compelir o Estado ao cumprimento da

norma internacional enquanto o segundo é considerado uma punição para o Estado que tenha

violado a obrigação internacional.299

O que difere uma da outra é que a punitiva está voltada para o passado e persegue

uma vingança; já, a coercitiva olha para o futuro em busca da garantia da ordem jurídica.300

No Direito Internacional também existe a chamada sanção moral, utilizada para

criar constrangimento moral a um Estado com o intuito de obter o comportamento

desejado301.

2.3.2.1 Sanções Unilaterais

Como já visto anteriormente, a regra é a proibição do uso da força. No entanto, o

direito internacional o admite, em determinadas situações, como no caso das contramedidas.

As contramedidas, também conhecidas por sanções unilaterais, são instrumentos usados pelos

Estados ou organizações internacionais para exigir de outros sujeitos do direito internacional a

adoção de certas condutas, que podem ser lícitas ou não.302

297 RAMOS, André de Carvalho. Responsabilidade internacional por violação de direitos humanos: seus elementos, a reparação devida e sanções possíveis: teoria e prática do direito internacional. Rio de Janeiro: Renovar, 2004. p. 84. 298 SEITENFUS, Ricardo Antônio Silva; VENTURA, Deisy de Freitas Lima. Introdução ao Direito Internacional Público. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999. p. 151. 299 RAMOS, André de Carvalho. Responsabilidade internacional por violação de direitos humanos: seus elementos, a reparação devida e sanções possíveis: teoria e prática do direito internacional. Rio de Janeiro: Renovar, 2004. p. 315. 300 RAMOS, André de Carvalho. Responsabilidade internacional por violação de direitos humanos: seus elementos, a reparação devida e sanções possíveis: teoria e prática do direito internacional. Rio de Janeiro: Renovar, 2004. p. 65. 301 RAMOS, André de Carvalho. Responsabilidade internacional por violação de direitos humanos: seus elementos, a reparação devida e sanções possíveis: teoria e prática do direito internacional. Rio de Janeiro: Renovar, 2004. p. 321. 302 VARELLA, Marcelo D. Direito internacional público. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 454.

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Em outras palavras, as sanções unilaterais são aquelas que os Estados e

organizações internacionais aplicam em reação a prévia violação de obrigação

internacional.303

As contramedidas são classificadas em duas espécies: retorsão e represália.

Porém, esta qualificação é meramente didática, sendo que, na prática, usa-se genericamente a

expressão contramedida para se referir às sanções internacionais.304

2.3.2.2 Sanções Coletivas

Por sua vez, as sanções coletivas são aquelas provenientes das organizações

internacionais, que foram criadas para garantir que a paz e a segurança sejam mantidas305, a

fim de fazer com que os Estados cumpram com suas obrigações internacionais306.

303 RAMOS, André de Carvalho. Responsabilidade internacional por violação de direitos humanos: seus elementos, a reparação devida e sanções possíveis: teoria e prática do direito internacional. Rio de Janeiro: Renovar, 2004. p. 316. 304 VARELLA, Marcelo D. Direito internacional público. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 454. 305 SEITENFUS, Ricardo Antônio Silva; VENTURA, Deisy de Freitas Lima. Introdução ao Direito Internacional Público. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999. p. 142. 306 RAMOS, André de Carvalho. Responsabilidade internacional por violação de direitos humanos. Revista do Centro de Estudos Judiciários, v. 9, n. 29, jun. 2005. p. 60.

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3 CONCESSÃO DE ISENÇÃO HETERÔNOMA POR TRATADO

Neste capítulo será estudado o problema central deste trabalho de pesquisa, que

tem como objeto a possibilidade de concessão de isenção de impostos estaduais e municipais,

pela União, mediante disposição de tratado internacional.

Por se tratar de um problema de antinomia, importante se faz analisar,

primeiramente, as duas escolas de pensamento – o Dualismo e o Monismo, que discutem qual

ordem jurídica deve prevalecer quando do surgimento de conflitos entre o direito

internacional e a norma interna dos Estados soberanos. A seguir, será investigada a posição

hierárquica que os tratados assumem diante das normas internas, tanto face à CRFB/88,

quanto às normas infraconstitucionais, na acepção da doutrina e no entendimento do Supremo

Tribunal Federal.

Por conseguinte, será feita a análise dos artigos 151, III; 155, § 2º, XII, "e"; e 156,

§ 3º, II, da CRFB e do artigo 98, do Código Tributário Nacional.

Finalmente, será realizado estudo com base na doutrina e na jurisprudência, a fim

de tentar elucidar o problema central para o qual este trabalho de pesquisa se propõe.

3.1 DIREITO INTERNACIONAL E DIREITO INTERNO

3.1.1 Teorias Dualista e Monista

As duas escolas de pensamento que discutem a relação entre o direito

internacional e o direito interno são o Dualismo e o Monismo. A questão teórica que se busca

responder é, se há a prevalência do direito internacional ou do direito interno quando da

ocorrência de conflitos normativos entre estas ordens.307

O dualismo de Carl Henrich Triepel, da Alemanha, e Dionísio Anzilotti, da Itália,

trata o direito internacional e o direito interno de cada Estado como sendo “sistemas

307 BROWNLIE, Ian. Princípios de direito internacional público. Lisboa: Fundação Calouste Gulberkian, 1997. p. 44.

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rigorosamente independentes e distintos, de tal modo que a validade jurídica de uma norma

interna não se condiciona à sua sintonia com a ordem internacional”.308

No mesmo sentido, BARROS aduz que o dualismo “parte do pressuposto da

existência de duas ordens jurídicas independentes, que jamais se sobrepõem: a do Direito

Internacional e a do Direito Interno.309” Ou seja, para os dualistas, há duas ordens jurídicas

separadas que não se confundem.

Assim, as normas de direito internacional não se sobrepõem às do direito interno

do Estado. Ao serem devidamente recepcionadas e incorporadas ao ordenamento jurídico

deste, transformam-se em regras de direito interno, desaparecendo, então, qualquer

possibilidade de colisão entre ambas as ordens jurídicas.310

Os defensores da teoria dualista apontam que a diferença fundamental entre o

direito internacional e o direito interno é que regulam objetos diferentes. O primeiro disciplina

as relações entre Estados soberanos e o segundo, a relação dos seus cidadãos entre si e com o

Poder Executivo311. Entendem que uma ordem jurídica não dita regras à outra. E no caso de

conflito entre ambas, os dualistas entendem que o tribunal nacional é que irá aplicar o direito

interno para o caso concreto312.

De outro lado, a teoria monista, que preza pela unicidade da ordem jurídica para a

qual o direito internacional e o direito interno formam um mesmo sistema jurídico313, é

dividida em duas vertentes – o monismo internacionalista de Hans Kelsen, que prima pela

prevalência do direito internacional, e o monismo nacionalista, que defende a primazia do

direito interno de cada Estado soberano314.

Uma das linhas de pensamento da escola monista, defendida por Hersch

Lauterpacht, no Reino Unido, adota a supremacia do Direito Internacional sobre o Direito

308 REZEK, José Francisco. Direito internacional público: curso elementar. 10. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 4. 309 BARROS, José Fernando Cedeño de. Monismo e Dualismo: tratados internacionais e o direito interno brasileiro à luz da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal: interpretação do art. 98 do CTN. Cadernos de Direito Tributário e Finanças Públicas, v. 7, n. 27. abr./jun. 1999. p. 84. 310 ARAÚJO, Luis Ivani de Amorim. Curso de direito internacional púbico. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 2000. p. 46. 311 BROWNLIE, Ian. Princípios de direito internacional público. Lisboa: Fundação Calouste Gulberkian, 1997. p. 44. 312 BROWNLIE, Ian. Princípios de direito internacional público. Lisboa: Fundação Calouste Gulberkian, 1997. p. 44. 313 ARAÚJO, Luis Ivani de Amorim. Curso de direito internacional público. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 2000. p. 46. 314 REZEK, José Francisco. Direito internacional público: curso elementar. 10. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 4.

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Interno, mas BROWNLIE pensa que esta teoria reduz o Direito Interno ao estatuto de ordem

jurídica residual do Direito Internacional315.

Já, a vertente do pensamento de Kelsen se apóia em uma relação de

interdependência entre as duas ordens jurídicas e não de hierarquia entre elas. Sendo assim,

ambas as ordens receberiam sua validade e conteúdo através de uma operação intelectual

realizada a partir de uma norma fundamental316.

Na doutrina de ARAÚJO,

se colocam em dois campos opostos – uns defendem o primado do Direito Internacional e outros afirmam a primazia do Direito Interno. Os que pelejam a favor da prioridade do Direito Internacional se bifurcam – uns não admitem que uma norma de Direito Interno vá de encontro a um preceito Internacional, sob pena de nulidade (KELSEN), enquanto os mais moderados (VERDROSS) negam tal falta de validade, embora afirmem que tal lei constitui uma infração que o Estado lesado pode impugnar exigindo ou a sua derrogação ou a sua inaplicabilidade, responsabilizando o infrator a indenizar os prejuízos decursivos. Os que defendem o primado do Direito Interno, com fulcro na doutrina hegeliana do Estado – poder absoluto sobre a terra – o Direito das Gentes é parte do Direito do Estado, uma conseqüência da lei interna do Estado317.

Para ele, a primazia do direito internacional sobre o direito interno é condição

indispensável para a manutenção das relações entre as nações, cuja superioridade encontra

respaldo na jurisprudência internacional318.

3.2 POSIÇÃO HIERÁRQUICA DOS TRATADOS EM FACE DA LEGISLAÇÃO

INTERNA

A seguir, será estudada a relação de hierarquia entre os tratados internacionais e a

legislação interna.

315 BROWNLIE, Ian. Princípios de direito internacional público. Lisboa: Fundação Calouste Gulberkian, 1997. p. 44. 316 BROWNLIE, Ian. Princípios de direito internacional público. Lisboa: Fundação Calouste Gulberkian, 1997. p. 45. 317 ARAÚJO, Luis Ivani de Amorim. Curso de direito internacional público. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 2000. p. 46. 318 ARAÚJO, Luis Ivani de Amorim. Curso de direito internacional público. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 2000. p. 48.

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3.2.1 Tratado e a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988

No direito internacional, não existe norma que determine a primazia do direito das

gentes sobre o direito interno319. Portanto, cada Estado soberano busca preservar a autoridade

de sua própria constituição nacional, eis que sua lei fundamental é que assegura a estabilidade

da ordem jurídica interna320.

Ou seja, a CRFB/88 não disciplinou a respeito da posição hierárquica dos tratados

internacionais. Deixou para a doutrina e a jurisprudência a resolução deste problema.321

A CRFB/88 se opõe ao princípio pacta sunt servanda, ou seja, ao confrontá-la

com as normas de direito internacional, a Lei Fundamental da República Federativa do Brasil

prevalece.322

Assim, decidido pela prevalência da CRFB/88 sobre tratados internacionais, foi

garantida a autoridade da Lei Fundamental, em que pese isto represente a prática de um ilícito

pelo qual a República Federativa do Brasil deve responder.323

319 REZEK, José Francisco. Direito internacional público: curso elementar. 10. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 96. 320 REZEK, José Francisco. Direito internacional público: curso elementar. 10. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 97. 321 MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Direito internacional público: parte geral. 4. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 81. 322 O primado da Constituição, no sistema jurídico brasileiro, é oponível ao princípio pacta sunt servanda, inexistindo, por isso mesmo, no direito positivo nacional, o problema da concorrência entre tratados internacionais e a Lei Fundamental da República, cuja suprema autoridade normativa deverá sempre prevalecer sobre os atos de direito internacional público. Os tratados internacionais celebrados pelo Brasil - ou aos quais o Brasil venha a aderir - não podem, em conseqüência, versar matéria posta sob reserva constitucional de lei complementar. É que, em tal situação, a própria Carta Política subordina o tratamento legislativo de determinado tema ao exclusivo domínio normativo da lei complementar, que não pode ser substituída por qualquer outra espécie normativa infraconstitucional, inclusive pelos atos internacionais já incorporados ao direito positivo interno. (BRASIL. Supremo Tribunal Federal (Tribunal Pleno). ADI n. 1480 MC, do Distrito Federal. Relator(a): Min. Celso De Mello, julgado em 04 de setembro de 1997. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/util/obterPaginador.asp?numero=1480&classe=ADI-MC >. Acesso em: 28 abr.2010.) 323 REZEK, José Francisco. Direito internacional público: curso elementar. 10. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 97.

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3.2.2 Tratado sobre direitos humanos (artigo 5°, § 3º, da CRFB/88)

Ao incorporarem o ordenamento jurídico brasileiro, os tratados internacionais de

qualquer natureza têm força de lei ordinária324. Todavia, a CRFB/88 traz, no § 3° do artigo 5°,

introduzido pela emenda constitucional n. 45/2004, que os tratados e convenções

internacionais, cuja matéria versar sobre direitos humanos, devidamente aprovados em cada

Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos

membros, serão incorporados no ordenamento jurídico brasileiro com status de emenda

constitucional:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] § 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.325

Uma vez que a CRFB/88 não estabeleceu se prevalece a lei interna ou o direito

internacional, pelo menos quanto aos tratados internacionais de direitos humanos, ela deixou

claro sua primazia326, desde que atendidas as exigências do parágrafo supracitado, aos

tratados internacionais cujo teor discorra sobre direitos humanos é conferido o status de

emenda constitucional.

3.2.3 Tratado e normas infraconstitucionais

O artigo 49, I, da CRFB/88 traz a regra de que o Congresso Nacional é o órgão

que deve resolver sobre tratados internacionais, sendo que o artigo 84, VIII, confere ao

Presidente da República a competência privativa para a celebração de tratados, convenções e

atos internacionais. Eles deverão ser previamente referendados pelo Congresso Nacional, por 324 A relação entre os tratados e as normas infraconstitucionais será tratada no item 3.2.3. 325 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010. 326 MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Direito internacional público: parte geral. 4. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 81.

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intermédio de decreto legislativo, caso seu teor contiver matéria consistente em condições

onerosas ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional.327

A partir da expedição do referido decreto, pelo Congresso Nacional, o documento

volta ao Presidente da República, que o ratifica. Em seguida, como já mencionado

anteriormente no item 2.2.2.4, ocorre a promulgação, depois a publicação e, em seguida, a

executoriedade do tratado internacional, que é quando ele se vincula efetivamente ao

ordenamento jurídico interno328. Ao vincular-se no plano interno, integrará o ordenamento

interno com força de norma infraconstitucional, com validade, eficácia e autoridade das leis

ordinárias329.

Em virtude de o tratado internacional ter sido recepcionado no ordenamento

jurídico interno mediante decreto legislativo é que ele encontra-se no mesmo nível

hierárquico das demais normas infraconstitucionais primárias.330

Relativamente à matéria tributária, o Código Tributário Nacional traz, no artigo

98331, norma garantidora dos compromissos externos celebrados pela República Federativa do

Brasil, onde os tratados em matéria tributária também receberam grau de hierarquia

diferenciado dentro do ordenamento jurídico interno. Porém, esta questão será estudada de

forma detalhada no item 3.4, deste Capítulo.

3.2.4 Posição do STF

A partir do RE 80.004/SE332, julgado no ano de 1977, o Supremo Tribunal Federal

passou a entender que o tratado internacional não prepondera mais sobre a lei federal. Diante

327 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010. 328 LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 13. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 437. 329 LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 13. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 437. 330 URSAIA, Maria Lúcia Lencastre. Vigência e eficácia da norma convencional na ordem jurídica brasileira. Revista do Centro de Estudos Judiciários, v. 7, n. 20. mar. 2003 p. 100. 331 BRASIL. Código Tributário Nacional, Lei n° 5.172 de 25 de outubro de 1966. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L5172.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010. 332 Inteiro teor disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/util/obterPaginador.asp?numero=80004&classe=RE>. Acesso em: 28 abr.2010.

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disto, pode-se dizer que o entendimento do Supremo Tribunal Federal reflete a concepção

monista moderada333.

Ademais, na ocasião, os Ministros julgaram que as normas oriundas de tratados

internacionais são infraconstitucionais, porquanto estão sujeitas ao controle de

constitucionalidade. Outrossim, concluíram por decidir que, desde então, passariam a ter o

mesmo nível de hierarquia que têm as leis ordinárias e seriam suspensas pelas que

sobrevierem.

Na acepção de MAZZUOLI, o julgamento do Recurso Extraordinário 80.004/SE

afronta o artigo 27 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados. Segundo o artigo, os

Estados soberanos estão proibidos de invocar disposições do seu direito interno como

desculpa para não cumprir com as obrigações pactuadas.334

Eis a ementa da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 1480 MC/DF:

Os tratados ou convenções internacionais, uma vez regularmente incorporados ao direito interno, situam-se, no sistema jurídico brasileiro, nos mesmos planos de validade, de eficácia e de autoridade em que se posicionam as leis ordinárias, havendo, em conseqüência, entre estas e os atos de direito internacional público, mera relação de paridade normativa. [...] No sistema jurídico brasileiro, os atos internacionais não dispõem de primazia hierárquica sobre as normas de direito interno. A eventual precedência dos tratados ou convenções internacionais sobre as regras infraconstitucionais de direito interno somente se justificará quando a situação de antinomia com o ordenamento doméstico impuser, para a solução do conflito, a aplicação alternativa do critério cronológico ("lex posterior derogat priori") ou, quando cabível, do critério da especialidade335.

A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal equipara a norma

infraconstitucional brasileira à norma proveniente de tratado internacional. Nesse viés, o

eventual conflito entre elas se resolve pelo mecanismo Lex posterior derogat legi priori, ou

seja, a lei ordinária superveniente, não revoga a lei ordinária oriunda do tratado internacional,

mas suspende sua eficácia.336

No tocante à posição hierárquica dos tratados internacionais sobre direitos

humanos, no julgamento do Habeas Corpus n. 96772, em que pese a CRFB/88 já tenha feito

essa ressalva no seu artigo 5°, § 3°, o Supremo Tribunal Federal julgou pela atribuição de

validade e eficácia de emenda constitucional:

333 MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Direito internacional público: parte geral. 4. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 83. 334 MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Direito internacional público: parte geral. 4. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 83. 335 BRASIL. Supremo Tribunal Federal (Tribunal Pleno). ADI n. 1480 MC, do Distrito Federal. Relator(a): Min. Celso De Mello, julgado em 04 de setembro de 1997. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/util/obterPaginador.asp?numero=1480&classe=ADI-MC >. Acesso em: 28 abr.2010. 336 VELLOSO, Carlos Mário da Silva. Os tratados na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Revista de Informação Legislativa, v. 41, n. 162. p. 43.

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TRATADOS INTERNACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS: AS SUAS RELAÇÕES COM O DIREITO INTERNO BRASILEIRO E A QUESTÃO DE SUA POSIÇÃO HIERÁRQUICA. - A Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Art. 7º, n. 7). Caráter subordinante dos tratados internacionais em matéria de direitos humanos e o sistema de proteção dos direitos básicos da pessoa humana. - Relações entre o direito interno brasileiro e as convenções internacionais de direitos humanos (CF, art. 5º e §§ 2º e 3º). Precedentes. - Posição hierárquica dos tratados internacionais de direitos humanos no ordenamento positivo interno do Brasil: natureza constitucional ou caráter de supralegalidade? - Entendimento do Relator, Min. CELSO DE MELLO, que atribui hierarquia constitucional às convenções internacionais em matéria de direitos humanos337.

No julgamento do Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n. 601832, a

Segunda Turma decidiu que “a Emenda Constitucional 45/04 atribuiu aos tratados e

convenções internacionais sobre direitos humanos, desde que aprovados na forma prevista no

§ 3º do artigo 5º da Constituição Federal, hierarquia constitucional”.338

3.3 PROIBIÇÃO CONSTITUCIONAL DE CONCESSÃO DE ISENÇÃO HETERÔNOMA

(artigo 151, III, da CRFB/88)

Conforme já foi estudado no item 1.2.4, do Capítulo 1, só pode isentar aquele que

é competente para tributar339. Antes de tudo, é necessário fazer distinção entre a isenção

autônoma, a heterônoma e a convencional340. Quando o ente que exonera é o mesmo que

tributa, se está diante de uma isenção autônoma. Mas quando o ente que isentar é diverso

daquele que a CRFB/88 outorgou poder para criar o imposto em questão, o caso é de isenção

heterônoma. Já, a isenção convencional é a que decorre de cláusula de tratado

internacional341, que é o objeto deste trabalho de pesquisa.

337 BRASIL. Supremo Tribunal Federal (Tribunal Pleno). HC n. 96772, de São Paulo. Relator(a): Min. Celso De Mello, julgado em 09 de junho de 2009. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/util/obterPaginador.asp?numero=96772&classe=HC>. Acesso em: 28 abr.2010. 338 BRASIL. Supremo Tribunal Federal (Tribunal Pleno). AI 601832 AgR, de São Paulo. Relator(a): Min. Joaquim Barbosa, julgado em 17 de março de 2009. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/util/obterPaginador.asp?numero=601832&classe=AI-AgR>. Acesso em: 28 abr.2010. 339 CASSONE, Vittorio. Direito tributário: fundamentos constitucionais, análise dos impostos, incentivos à exportação, doutrina, prática e jurisprudência. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2000. p. 125. 340 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de direito tributário brasileiro . Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 634. 341 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de direito tributário brasileiro . Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 634.

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No processo de análise acerca da possibilidade de concessão de isenções de

tributos através de tratados internacionais, há que se observar a regra prevista no artigo 151,

inciso III, da CRFB/88, que assim estabelece:

Art. 151. É vedado à União: [...] III - instituir isenções de tributos da competência dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios.342

E é em virtude deste artigo que existe tanta controvérsia a respeito da relação

entre os tratados internacionais e o ordenamento jurídico brasileiro, no tocante às isenções

heterônomas343.

Entretanto, o intuito do referido artigo é impedir a ocorrência de conflito de

competências no âmbito interno por parte dos entes federados, isto é, proibir que a União

estabeleça a isenção de um tributo que seja da competência dos Estados-Membros, Distrito

Federal ou dos Municípios344, porquanto ela atua como pessoa jurídica de direito público

interno e não internacional. A regra trazida pelo artigo 151, III, da CRFB/88, é dirigida para o

plano interno, não para o internacional.345 Ou seja, a vedação a que se refere o artigo 151, III,

é dirigida à União de modo que ela não institua exonerações de tributos, quer sejam impostos,

contribuições especiais, contribuições de melhoria ou taxas cuja competência para sua criação

é dos Estados-Membros, Distrito Federal e dos Municípios346.

Não se confunde a República Federativa do Brasil com União, pois esta última

não é sujeito de direito internacional, assim como também não o são os Estados-membros e os

Municípios. A isenção que advém de tratado internacional não é concedida pela União, como

ente federado, mas pela própria República Federativa do Brasil, representada pela União, a

teor da CRFB/88. Quem celebra tratado e faz parte de organizações internacionais é a

República Federativa do Brasil e não a União, que somente a representa na execução da sua

política internacional.347

342 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010. 343 TÔRRES, Heleno Taveira. Tratados e convenções internacionais em matéria tributária e o federalismo fiscal brasileiro. Revista Dialética de Direito Tributário, n. 86, nov. 2002, p. 46. 344 PAULSEN, Leandro. Curso de direito tributário . 2. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2008. p. 114. 345 CARNEIRO, Sérgio Luiz de Souza. Possibilidade da concessão, pela União, de isenções de tributos estaduais e municipais, em decorrência de tratado internacional. Repertório IOB de Jurisprudência: tributário, constitucional e administrativo. n. 8. abr. 2001. p. 214. 346 PAULSEN, Leandro. Curso de direito tributário . 2. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2008. p. 115. 347 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de direito tributário brasileiro . Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 640.

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Portanto, o disposto no artigo 151, III, da CRFB/88 é destinado à União, ente

federado, e não à União, representante da República Federativa Brasileira na condução da

política externa. Quem se obriga quando firma um compromisso internacional, é o poder

soberano estatal, representando toda a nação.348

Ou seja, quando o artigo 151, III, da CRFB/88, veda à União o direito de isentar

tributos que são da competência dos Estados-membros e dos Municípios, não está impedindo

a República Federativa do Brasil de celebrar acordos internacionais que envolvam gravames

estaduais e municipais, mas apenas proibindo, internamente, a concessão de isenções

heterônomas349. Ou seja, aos tributos que ela não é competente para instituir, não pode lhes

atribuir isenções. Só pode conceder isenções aquele que tem o poder para tributar350.

A CRFB/88 atribuiu à União competência para representar o Estado brasileiro nas

relações com Estados estrangeiros, sendo ela, portanto, ente de direito público interno,

desprovido de personalidade jurídica de direito internacional público. Assim sendo, a União

não tem poderes para celebrar tratados internacionais. A competência para celebrar acordos

internacionais é privativa do Presidente da República. A União é competente para manter

relações internacionais, ato em que representa a República Federativa do Brasil351.

A União, por ser pessoa jurídica de direito público interno, não tem legitimidade

para atuar no âmbito externo. A República Federativa do Brasil, esta sim, é que pode dispor

livremente dos seus interesses sem sofrer a vedação do artigo 151, III, da CRFB/88.352

Na ordem jurídica internacional, a União representa o Estado brasileiro, uno e

indivisível, mas para o ordenamento jurídico doméstico, ela figura como simples pessoa

jurídica de direito público interno, ao lado dos Estados-membros e Municípios.353

Quando a União firma um compromisso internacional, não é o ente federado que

o faz, mas a União, representante do Estado soberano é que faz. Assim, quando a CRFB/88

proíbe a concessão de isenção heterônoma, é ao ente federado que ela se refere354 em relação

348 CAMINHA, Maria do Carmo Puccini. Os tratados internacionais tributários e a eficácia de suas normas no ordenamento jurídico brasileiro. Revista Tributária e de Finanças Públicas, v. 9, n. 41. nov./dez. 2001, p. 50. 349 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de direito tributário brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 631. 350 POLETTI, Ronaldo. Constituição anotada. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 416. 351 BARRAL, Welber e PRAZERES, Tatiana Lacerda. Isenção de Tributos Estaduais por Tratados Internacionais. Revista Dialética de Direito Tributário, n. 70, jul. 2001. p. 142. 352 BARRAL, Welber e PRAZERES, Tatiana Lacerda. Isenção de Tributos Estaduais por Tratados Internacionais. Revista Dialética de Direito Tributário, n. 70, jul. 2001. p. 143. 353 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de direito tributário brasileiro . Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 630. 354 VELLOSO, Carlos Mário da Silva. Os tratados na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Revista de Informação Legislativa, v. 41, n. 162. p. 41.

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aos demais entes que formam a República Federativa do Brasil e não entre estes e o Estado

brasileiro que a eles se sobrepõe355.

Não obstante a regra seja a vedação constitucional às isenções heterônomas

concedidas pela União, a própria CRFB/88 prevê duas exceções que serão estudadas a seguir.

3.3.1 Previsão constitucional de isenção heterônoma (artigos 155, § 2º, XII, "e", e 156, §

3º, II, da CRFB/88)

A CRFB/69 trazia no artigo 19, § 2°, disposição contrária àquela contida no então

artigo 151, III, da CRFB/88, onde aquela permitia que lei complementar dispusesse sobre

isenções a tributos estaduais ou municipais, desde que visando a relevante interesse nacional

ou econômico, in verbis:

Art. 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: [...] § 2º A União, mediante lei complementar e atendendo a relevante interêsse social ou econômico nacional, poderá conceder isenções de impostos estaduais e municipais.356

O que a CRFB/69 previu foi a possibilidade de a União conceder isenção a

impostos estaduais e municipais por meio de lei complementar. A atual Constituição, em

certas medidas, autoriza a lei complementar a excluir, de determinadas situações, a incidência

de tributo estadual ou municipal, que estão expressamente estabelecidas nos artigos 155, § 2º,

XII, "e", e 156, § 3º, II.

Na acepção de AMARO, o legislador constituinte não precisava ter editado norma

em contrário ao disposto no artigo 19, § 2°, da CRFB anterior357, mas poderia ter apenas se

omitido, vez que, para ele, mesmo que o artigo 151, III, da CRFB/88 não existisse, “a

proibição de isenções heterônomas seria mera decorrência do sistema constitucional de

partilha de competência358”. Uma vez que a CRFB/88, por força do princípio federativo359,

355 MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Eficácia e aplicabilidade dos tratados internacionais em matéria tributária no direito brasileiro. Revista da Ajuris, v. 34, n. 107. set. 2007, p. 281. 356 BRASIL. Emenda Constitucional nº 1, de 17 de outubro de 1969. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/Emc_anterior1988/emc01-69.htm>. Acesso em: 19 maio 2010. 357 AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro . 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 185. 358 AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro . 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 186. 359 CARNEIRO, Sérgio Luiz de Souza. Possibilidade da concessão, pela União, de isenções de tributos estaduais e municipais, em decorrência de tratado internacional. Repertório IOB de Jurisprudência: tributário, constitucional e administrativo. n. 8. abr. 2001. p. 213.

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distribui as competências aos entes federados e proíbe a intervenção de um sobre os outros360,

já se faz suficiente para entender que a União não poderá instituir isenções a tributos que são

da competência dos outros entes. Até porque, como já visto anteriormente, não pode um ente

conceder isenção a tributo que ele não é competente para criar361.

O artigo 155, § 2º, XII, "e", da CRFB/88 assim dispõe:

Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: [...] § 2.º O imposto previsto no inciso II362 atenderá ao seguinte: [...] XII - cabe à lei complementar: [...] e) excluir da incidência do imposto, nas exportações para o exterior, serviços e outros produtos além dos mencionados no inciso X, "a".363

O dispositivo prescreve que cabe à lei complementar excluir da incidência do

imposto, nas exportações, serviços e outros produtos, além daqueles já mencionados na alínea

“a” do inciso X364, que prevê que o ICMS não incidirá sobre operações que destinem produtos

industrializados ao exterior, com a exclusão dos semi-elaborados definidos em lei

complementar.

Na acepção de CHIESA, a utilização dos termos usados pelo constituinte quando

da edição dos dispositivos acima tratados é imprópria. Para ele, a expressão que consta do

inciso X, “não incidirá”, é uma previsão de imunidade, pois cria uma limitação ao âmbito da

competência dos Estados para tributar acerca das operações que destinem produtos

industrializados ao exterior.365

Relativamente ao emprego da expressão “excluir da incidência”, constante do

artigo 155, § 2°, XII, “e”, CHIESA também entende ser inadequado para a hipótese de

isenção, porquanto não é possível existir uma norma que incide e, logo após, outra que exclui

a hipótese subsumida. As normas não dispõem de uma ordem cronológica para incidir, elas

simplesmente incidem no mesmo instante.366

360 SABBAG, Maristela Miglioli. Competência tributária. Revista dos Tribunais, v. 85, n. 728. Artigo. p. 683. 361 CASSONE, Vittorio. Direito tributário : fundamentos constitucionais, análise dos impostos, incentivos à exportação, doutrina, prática e jurisprudência. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2000. p. 125. 362 II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior. 363 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010. 364 § 2.º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte: [...] X - não incidirá: [...] a) sobre operações que destinem mercadorias para o exterior, nem sobre serviços prestados a destinatários no exterior, assegurada a manutenção e o aproveitamento do montante do imposto cobrado nas operações e prestações anteriores. 365 CHIESA, Clélio. O conteúdo e alcance da norma contida no art. 155, parágrafo 2, XII, “e” da Constituição Federal. Cadernos de Direito Constitucional e Ciência Política, v. 3, n. 12, jul./set. 1995, p. 133. 366 CHIESA, Clélio. O conteúdo e alcance da norma contida no art. 155, parágrafo 2, XII, “e” da Constituição Federal. Cadernos de Direito Constitucional e Ciência Política, v. 3, n. 12, jul./set. 1995, p. 134.

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O dispositivo evidencia que o interesse nacional está acima do interesse estadual

ou municipal, “a projetar para a exegese dos tratados internacionais uma visão ampla em

favor dos interesses do Estado brasileiro, enquanto totalidade jurídica e política perante o

concerto das nações.367”

No mesmo sentido, segue abaixo, ementa do Recurso Extraordinário n. 212637:

CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. ICMS: PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS DESTINADOS AO EXTERIOR: IMUNIDADE. OPERAÇÕES E PRESTAÇÕES DE SERVIÇO: DISTINÇÃO. C.F., art. 155, II, § 2º, IV, X, a, XII, e. I. - ICMS: hipóteses de incidência distintas: a) operações relativas à circulação de mercadorias; b) prestações de serviço interestadual e intermunicipal e de comunicações: C.F., art. 155, II. II. - A Constituição Federal, ao conceder imunidade tributária, relativamente ao ICMS, aos produtos industrializados destinados ao exterior, situou-se, apenas, numa das hipóteses de incidência do citado imposto: operações que destinem ao exterior tais produtos, excluídos os semi-elaborados definidos em lei complementar: art. 155, § 2º, X, a. III. - Deixou expresso a C.F., art. 155, § 2º, XII, e, que as prestações de serviços poderão ser excluídas, nas exportações para o exterior, mediante lei complementar. IV. - Incidência do ICMS sobre a prestação de serviço de transporte interestadual, no território nacional, incidindo a alíquota estabelecida por resolução do Senado Federal: C.F., art. 155, § 2º, IV. V. - R.E. conhecido e provido.368

No tocante à possibilidade de concessão de isenção do ICMS sobre as operações

com serviços e outros produtos destinados ao exterior, mediante lei complementar, CHIESA

entende que a edição da lei complementar estabelecida no artigo 155, § 2°, XII, “e”, é de

competência do Congresso Nacional369, como órgão legislativo do Estado brasileiro e não da

União370. Quando o Poder Legislativo edita uma emenda constitucional ou lei complementar

de normas gerais de direito tributário, está legislando normas a serem dirigidas à nação e não

só para a esfera federal371. Mesmo porque, a CRFB/88 atribui, à lei nacional, amplo poder

para regular matérias específicas em toda a extensão do território brasileiro, ao passo que a lei

federal, por sua vez, só obriga os jurisdicionados da União372.

367 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de direito tributário brasileiro . Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 631. 368 BRASIL. Supremo Tribunal Federal (Tribunal Pleno). RE 212637, do Estado de Minas Gerais. Relator(a): Min. Carlos Velloso, julgado em 25 de maio de 1999. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/util/obterPaginador.asp?numero=212637&classe=RE>. Acesso em: 28 abr.2010. 369 CHIESA, Clélio. O conteúdo e alcance da norma contida no art. 155, parágrafo 2, XII, “e” da Constituição Federal. Cadernos de Direito Constitucional e Ciência Política, v. 3, n. 12, jul./set. 1995, p. 134. 370 CHIESA, Clélio. O conteúdo e alcance da norma contida no art. 155, parágrafo 2, XII, “e” da Constituição Federal. Cadernos de Direito Constitucional e Ciência Política, v. 3, n. 12, jul./set. 1995, p. 135. 371 AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro . 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 187. 372 ATALIBA, Geraldo. Sistema constitucional tributário brasileiro. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1968. p. 94.

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Ademais, no plano internacional, quem legisla é o Congresso Nacional, editando

normas que integram o direito tributário brasileiro e não, restritamente, o direito sobre tributos

federais373.

Ao confrontar o artigo 151, inciso III, com o 155, § 2°, XII, “e”, ambos da

CRFB/88, cogita-se estar diante de um conflito de normas. Aquele estabelece que a União

está proibida de conceder isenção heterônoma e este autoriza o Congresso Nacional a fazê-lo

mediante lei complementar, em determinada hipótese, qual seja a do ICMS sobre produtos e

serviços destinados ao exterior. Contudo, trata-se apenas de uma antinomia aparente, uma vez

que a regra prevista no artigo 151, III, comporta uma vedação dirigida tão somente à União,

enquanto pessoa jurídica de direito público interno, enquanto o disposto no artigo 155, § 2°,

XII, “e”, é atribuído ao Congresso Nacional, como órgão legislativo da República Federativa

do Brasil, e não da União.374

O artigo 156, § 3º, II, da CRFB/88 assim dispõe:

Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: [...] § 3º Em relação ao imposto previsto no inciso III375 do caput deste artigo, cabe à lei complementar: [...] II - excluir da sua incidência exportações de serviços para o exterior.376

O artigo acima aduz que a competência para a criação de impostos sobre serviços

de qualquer natureza é restringida por lei complementar no tocante à exclusão da sua

incidência sobre exportações de serviços para o exterior377.

A expressão “excluir da sua incidência”, no artigo supracitado, também é um caso

de imunidade tributária porque tal regra está estabelecida na CRFB/88. Na imunidade, a

qualidade de fato gerador é retirada do próprio fato concreto, ao passo que na isenção, embora

tenha ocorrido a situação enquadrada no fato gerador, apenas ocorre o afastamento da

obrigação do contribuinte de pagar o valor referente aquele imposto.378

Nas disposições dos artigos 155, § 2º, XII, "e", e 156, § 3º, II, da CRFB/88, o que

se tem é um mecanismo unilateral a fim de disciplinar a não-incidência de tributos estaduais e

municipais que poderiam incidir na exportação de bens e serviços. Mas eles não servem como

373 AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro . 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 188. 374 CHIESA, Clélio. O conteúdo e alcance da norma contida no art. 155, parágrafo 2, XII, “e” da Constituição Federal. Cadernos de Direito Constitucional e Ciência Política, v. 3, n. 12, jul./set. 1995, p. 135. 375 III - serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar. 376 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010. 377 ÁVILA, Humberto. Sistema constitucional tributário, de acordo com a emenda constitucional n. 53, de 19-12-2006. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 142. 378 SILVA, José Afonso da. Comentário contextual à Constituição. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 677.

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argumento para justificar a inconstitucionalidade, admitida por muitos doutrinadores, do

afastamento de dispositivos tributários nacionais por tratados internacionais, uma vez que eles

só podem ser firmados pela União, em nome do Estado brasileiro. Se um tratado afastar,

reduzir ou condicionar a aplicação de uma lei tributária estadual ou municipal vale o preceito

do tratado sobre a lei infraconstitucional, porquanto esta não tem validade quando sua

pretensão for o afastamento de disposições de tratados internacionais. Ou seja, o tratado

anterior ou posterior à lei estadual ou municipal que definir a incidência aplica-se às situações

nele previstas, em detrimento da lei local.379

O Congresso Nacional não tem competência para dispor sobre tributos estaduais,

distritais e municipais, em virtude da rígida distribuição constitucional de competências380.

Porém, excetuando à regra ditada pelo artigo 151, III, da CRFB/88, havendo o tratado

internacional sido devidamente ratificado, a União pode, através de lei complementar,

exonerar os contribuintes do ICMS e do ISS, de competência dos Estados-membros e dos

municípios, respectivamente, por força e nos termos dos artigos 155, § 2º, XII, "e", e 156, §

3º, II, da CRFB/88.

Contudo, não se está fazendo prevalecer o primado dos tratados internacionais

sobre a lei interna, mas promovendo a eficácia do tratado internacional por ser o único

modelo legislativo idôneo para firmar normas de conduta entre o Estado brasileiro e outros

Estados soberanos381.

Por fim, conclui-se que o decreto legislativo que ratificar tratado internacional que

infringir as regras de competência tributária outorgadas pela CRFB/88 aos Estados-membros,

Municípios e Distrito Federal, estará eivado de inconstitucionalidade382. Bem como constitui

violação da lei fundamental do Estado federativo a não-observância das regras de distribuição

de competências383.

379 AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro . 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 188. 380 URSAIA, Maria Lúcia Lencastre. Vigência e eficácia da norma convencional na ordem jurídica brasileira. Revista do Centro de Estudos Judiciários, v. 7, n. 20. mar. 2003 p. 103. 381 AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 188. 382 URSAIA, Maria Lúcia Lencastre. Vigência e eficácia da norma convencional na ordem jurídica brasileira. Revista do Centro de Estudos Judiciários, v. 7, n. 20. mar. 2003 p. 103. 383 KELSEN, Hans. Jurisdição constitucional: introdução e revisão técnica Sérgio Sérvulo da Cunha. São Paulo: Martins Fontes, 2003. p. 183.

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3.4 O DISPOSTO NO ARTIGO 98, DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL

O Código Tributário Nacional, por sua vez, regula a forma como integram as

normas que advém dos tratados internacionais ao Sistema Tributário Nacional.384 Ao editar o

artigo 98 e introduzi-lo ao ordenamento jurídico brasileiro como lei complementar385, o

legislador visou à preservação do cumprimento das obrigações externas pactuadas, impedindo

que lei ordinária386 suspenda-os no plano interno, pelo menos em matéria tributária387.

Assim está redigido o artigo 98, do Código Tributário Nacional, in verbis:

Art. 98. Os tratados e as convenções internacionais revogam ou modificam a legislação tributária interna, e serão observados pela que lhes sobrevenha.388

Em que pese a redação do dispositivo mencionar a palavra “revogam”, não cuida

de revogação propriamente dita, mas de inoperância parcial daquilo que está regrado

diversamente pela legislação interna389. Não há que se falar em revogação, vez que, aos países

não signatários do tratado, a norma tributária interna continua vigendo na sua totalidade e,

para os países que dele são parte, só deixa de ter validade nas situações nele previstas.390

Os tratados internacionais em matéria tributária têm supremacia sobre a lei

interna, por força do artigo 98, do Código Tributário Nacional. Todavia, este dispositivo não

cuida de revogação, tal qual indica seu texto, mas de derrogação, visto que ele só suspende a

eficácia da lei perante aquelas pessoas e situações envolvidas no tratado internacional

enquanto, para o direito interno, continua eficaz.391

384 CAMINHA, Maria do Carmo Puccini. Os tratados internacionais tributários e a eficácia de suas normas no ordenamento jurídico brasileiro. Revista Tributária e de Finanças Públicas, v. 9, n. 41. nov./dez. 2001, p. 38. 385 O Código Tributário Nacional é considerado Lei Complementar, não obstante tenha sido aprovado na forma de Lei Ordinária. A Lei 5.172/66, na época da vigência da CRFB/67, foi elevado à categoria de Lei Complementar, porquanto tratava de matéria por ela determinada. Ademais, o Supremo Tribunal Federal reconhece a ele a natureza de Lei Complementar. A CRFB/88 também acabou por recepcionar o CTN como Lei Complementar porque ele regula matérias que são privativas de Lei Complementar. (MARTINS, Sérgio Pinto. Manual de direito tributário . 5. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 50.) 386 A Lei Ordinária é a fonte formal básica do direito tributário e se diferencia da Lei Complementar pelo fato de esta ter quorum especial para sua votação. A Lei Ordinária é aprovada no Congresso Nacional por maioria simples. (MARTINS, Sérgio Pinto. Manual de direito tributário . 5. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 50.) 387 CAMINHA, Maria do Carmo Puccini. Os tratados internacionais tributários e a eficácia de suas normas no ordenamento jurídico brasileiro. Revista Tributária e de Finanças Públicas, v. 9, n. 41. nov./dez. 2001, p. 37. 388 BRASIL. Código Tributário Nacional, Lei n° 5.172 de 25 de outubro de 1966. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L5172.htm>. Acesso em: 18 mar. 2010. 389 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de direito tributário brasileiro . Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 628. 390 AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro . 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 179. 391 XAVIER, Alberto. Direito Tributário Internacional do Brasil. 6. ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2005. p. 131.

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Há quem entenda que o artigo 98 represente uma circunstância de derrogação, ou

seja, os tratados e convenções internacionais se sobrepõem à legislação tributária interna,

derrogando os dispositivos incompatíveis e se colocam acima da legislação posterior392.

Em matéria tributária, os tratados internacionais têm primazia sobre o direito

interno, a eles sendo atribuído o status de supralegais, por poderem derrogar ou modificar a

legislação tributária interna.393

A “legislação tributária interna” a que se refere o artigo 98, do Código Tributário

Nacional, é tanto a federal quanto a estadual e municipal. Ele trata a respeito de como as leis

fiscais devem ser aplicadas e interpretadas e sua previsão confere credibilidade e garantia aos

terceiros países pactuantes.394

Outrossim, o artigo 98 encontra-se em perfeita consonância com as regras de

direito internacional público que não admitem que a parte invoque as disposições de seu

direito interno como forma de justificar o descumprimento ou não execução de um tratado395.

Ele também não se opõe às normas constitucionais, pelo contrário, as complementa,

preenchendo suas lacunas, pretendendo dissolver eventuais contradições entre as leis

tributárias infraconstitucionais396.

Importante ressaltar que o Código Tributário Nacional recebe o tratado

internacional como fonte de direito interno, que passará a incorporá-lo como tal. A ele,

também é conferida a possibilidade de suspender e modificar a legislação tributária interna e a

garantia de ser respeito pela mesma.397

A lei complementar, como o próprio nome já aduz, complementa a CRFB/88, a

qual lhe confere eficácia plena.398 Desta forma, tendo sido o Código Tributário Nacional

recepcionado pela CRFB/88 como lei complementar, assim ele o é, só podendo ser alterado

por outra lei complementar.399

392 MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Eficácia e aplicabilidade dos tratados internacionais em matéria tributária no direito brasileiro. Revista da Ajuris, v. 34, n. 107. set. 2007, p. 277. 393 MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Eficácia e aplicabilidade dos tratados internacionais em matéria tributária no direito brasileiro. Revista da Ajuris, v. 34, n. 107. set. 2007, p. 275. 394 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de direito tributário brasileiro . Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 632. 395 É o que estabelece o artigo 27 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, de 1969. 396 CAMINHA, Maria do Carmo Puccini. Os tratados internacionais tributários e a eficácia de suas normas no ordenamento jurídico brasileiro. Revista Tributária e de Finanças Públicas, v. 9, n. 41. nov./dez. 2001, p. 51. 397 JESUS, Ricardo Henrique de. Representatividade e competência do tratado tributário. Revista Magister de Direito Empresarial, Concorrencial e do Consumidor. v. 2, n. 7. fev./mar. 2006. p. 27. 398 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de direito tributário brasileiro . Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 632. 399 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de direito tributário brasileiro . Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 632.

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Com base em tudo o que foi apreciado neste trabalho de pesquisa, com o conluio

de material doutrinário e jurisprudencial, resta fazer uma análise final a fim de investigar se é

possível ou não tratado, em que a República Federativa do Brasil seja parte, em matéria

tributária, exonerar contribuintes de impostos estaduais e municipais.

3.5 CONCESSÃO DE ISENÇÃO HETERÔNOMA POR TRATADO

Existe muita controvérsia no que tange à concessão de isenção heterônoma por via

de tratados internacionais. Na visão de CONTE, “somente em casos excepcionais,

expressamente catalogados no texto constitucional, é que a União poderá conceder isenções

de tributos estaduais e municipais.400” Para ele, com exceção do disposto nos artigos 155, §

2°, XII, “e” e 156, § 4°, II, não podem os entes políticos firmar tratados internacionais, o que

seria inconstitucional, isto é, estariam eles agindo sem observar as regras de competência

impostas pela CRFB/88401.

O argumento de que a proibição de isenção heterônoma é inconstitucional não

deve servir como impedimento para que a República Federativa do Brasil disponha sobre bens

e serviços tributados pelo ICMS e ISS, decorrentes de tratados internacionais402.

Nas relações internacionais, a União atua como pessoa jurídica de direito

internacional público. Na ocasião, exprime a voz da República Federativa do Brasil. Pelo

princípio federativo, a CRFB/88 vedou que os Estados-Membros e Municípios mantivessem

relações com Estados soberanos e organizações internacionais. A União é que é o ente

responsável por representar os interesses da República Federativa do Brasil no plano

internacional.403

Assim, a limitação constante do artigo 151, III, da CRFB/88, só tem validade no

âmbito interno, proibindo a concessão de isenções heterônomas, ou seja, que um ente

400 CONTE, Francesco. O tratado internacional e a isenção de tributos estaduais e municipais: breves reflexões. Revista Dialética de Direito Tributário, n. 35. ago. 1998. p. 39. 401 CONTE, Francesco. O tratado internacional e a isenção de tributos estaduais e municipais: breves reflexões. Revista Dialética de Direito Tributário, n. 35. ago. 1998. p. 38. 402 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de direito tributário brasileiro . Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 633. 403 XAVIER, Alberto. Direito Tributário Internacional do Brasil. 6. ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2005. p. 152.

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federado conceda exonerações tributárias a contribuintes de impostos da competência de

outros entes.404

Se lei de caráter nacional estabeleceu a proeminência dos tratados de natureza

tributária sobre as leis, neles reconheceu o caráter de fonte normativa nacional. Entretanto,

eles não expressam ato normativo emanado da União, como mera ordem central, mas da

União, ordem total e, como tal, endereçado a todos os brasileiros.405

A fim de procurar saber qual o posicionamento do Supremo Tribunal Federal

acerca da matéria, serão estudadas as ementas das decisões abaixo:

DIREITO TRIBUTÁRIO. ISENÇÃO DE TRIBUTO MUNICIPAL POR MEIO DE TRATADO. INOCORRÊNCIA DE ISENÇÃO HETERÔNOMA. 1. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 229.096/RS, rel. para o acórdão Min. Cármen Lúcia, unânime, DJe 11.04.2008, firmou entendimento de que são legítimas as isenções de tributos municipais instituídas por meio de tratado. 2. Agravo regimental improvido.406

O Supremo Tribunal Federal, ao negar provimento ao recurso de Agravo

Regimental n. 254406, interposto para atacar decisão que negou seguimento ao Recurso

Extraordinário, concluiu que a instituição de isenção de tributos municipais mediante tratado

não viola o artigo 151, III, da CRFB/88. A Segunda Turma votou pela manutenção da decisão

pelos seus próprios fundamentos, ou seja, que o artigo 151, III não cuida de caso de isenção

heterônoma, pois, a União, no âmbito externo, age em nome da República Federativa do

Brasil e não como ente federado. O provimento ao recurso foi negado por unanimidade.

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS. ICMS. NÃO INCIDÊNCIA. IMPORTAÇÃO DE BACALHAU. ISENÇÃO DE TRIBUTO ESTADUAL PREVISTA EM TRATADO INTERNACIONAL FIRMADO PELA UNIÃO. INCISO III DO ART. 151 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. NÃO CARACTERIZAÇÃO DE ISENÇÃO HETERÔNOMA. 1. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 229.096, firmou entendimento de ser legítimo à União, no campo internacional, dispor sobre a isenção de impostos da competência estadual. 2. Agravo regimental desprovido.407

404 XAVIER, Alberto. Direito Tributário Internacional do Brasil. 6. ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2005. p. 153. 405 BRASIL. Supremo Tribunal Federal (Tribunal Pleno). RE n. 229096, do Rio Grande do Sul. Relator(a): Min. Ilmar Galvão, julgado em 16 de agosto de 2007. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/util/obterPaginador.asp?numero=229096&classe=RE >. Acesso em: 28 abr.2010. 406 BRASIL. Supremo Tribunal Federal (Tribunal Pleno). RE 254406 AgR, do Rio de Janeiro. Relator(a): Min. Ellen Gracie, julgado em 02 de março de 2010. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/util/obterPaginador.asp?numero=254406&classe=RE-AgR>. Acesso em: 28 abr.2010. 407 BRASIL. Supremo Tribunal Federal (Tribunal Pleno). RE 234662 AgR, da Bahia. Relator(a): Min. Carlos Britto, julgado em 13 de outubro de 2009. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/util/obterPaginador.asp?numero=234662&classe=RE-AgR>. Acesso em: 28 abr.2010.

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Na decisão acima, o Supremo Tribunal Federal julgou pelo direito à isenção do

ICMS – Imposto de Circulação de Mercadorias e Serviços, na importação de bacalhau

proveniente de país signatário do GATT408 – General Agreement on Tariffs and Trade

(Acordo Geral de Tarifas e Comércio).409

Na ocasião, também foi negado provimento ao Agravo Regimental por entender, a

Primeira Turma, em sessão presidida pelo Ministro Carlos Ayres Britto, não ter havido

configuração de isenção heterônoma, uma vez que a União, na esfera internacional,

evidentemente, na condição de representante do Estado total, tem legitimidade para dispor

acerca da isenção de tributos de competência estadual, que é o caso do ICMS.

EMENTA: DIREITO TRIBUTÁRIO. RECEPÇÃO PELA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DE 1988 DO ACORDO GERAL DE TARIFAS E COMÉRCIO. ISENÇÃO DE TRIBUTO ESTADUAL PREVISTA EM TRATADO INTERNACIONAL FIRMADO PELA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. ARTIGO 151, INCISO III, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. ARTIGO 98 DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL. NÃO CARACTERIZAÇÃO DE ISENÇÃO HETERÔNOMA. RECURSO EXTRAORDINÁRIO CONHECIDO E PROVIDO. 1. A isenção de tributos estaduais prevista no Acordo Geral de Tarifas e Comércio para as mercadorias importadas dos países signatários quando o similar nacional tiver o mesmo benefício foi recepcionada pela Constituição da República de 1988. 2. O artigo 98 do Código Tributário Nacional "possui caráter nacional, com eficácia para a União, os Estados e os Municípios" (voto do eminente Ministro Ilmar Galvão). 3. No direito internacional apenas a República Federativa do Brasil tem competência para firmar tratados (art. 52, § 2º, da Constituição da República), dela não dispondo a União, os Estados-membros ou os Municípios. O Presidente da República não subscreve tratados como Chefe de Governo, mas como Chefe de Estado, o que descaracteriza a existência de uma isenção heterônoma, vedada pelo art. 151, inc. III, da Constituição. 4. Recurso extraordinário conhecido e provido.410

No Recurso Extraordinário n. 229096 é discutido o acolhimento do GATT –

General Agreement on Tariffs and Trade (Acordo Geral de Tarifas e Comércio) pela

CRFB/88, em face do artigo 151, III, no que tange à concessão de tributo estadual – o ICMS –

a produto importado quando seu similar nacional dela seja beneficiário.

408 Redigido pela Conferência de Havana e assinado por 23 (vinte e três) países, o Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (General Agreement of Tariffs and Trade), foi um acordo comercial multilateral dinâmico que regulamentava os procedimentos para as relações comerciais entre os Estados signatários. Ele visava à promoção da diminuição das barreiras alfandegárias e às medidas de proteção de mercados. (SEITENFUS, Ricardo Antônio Silva; VENTURA, Deisy de Freitas Lima. Introdução ao Direito Internacional Público. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999. p. 168.) Em 1995 foi criada a Organização Mundial do Comércio, onde, atualmente há 150 (cento e cinquenta) membros, que incorporou todos os documentos negociados no âmbito do GATT. (VARELLA, Marcelo D. Direito internacional público. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 293.) 409 O STF admite a preeminência do GATT sobre as leis tributárias dos Estados-membros conforme os julgados RE 113.150, Min. Carlos Madeira, RE 113.701 e RE 114.950, Min. Moreira Alves. 410 BRASIL. Supremo Tribunal Federal (Tribunal Pleno). RE 229096, do Rio Grande do Sul. Relator(a): Min. Ilmar Galvão, julgado em 16 de agosto de 2007. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/util/obterPaginador.asp?numero=229096&classe=RE>. Acesso em: 28 abr.2010.

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O Tribunal conheceu e deu provimento ao recurso, por unanimidade, admitindo

que, tratados que versam sobre isenções tributárias, qual seja o caso do GATT, não trazem

ofensa ao artigo 151, III, da CRFB/88. Simplesmente porque entendeu que o referido artigo

faz menção à União enquanto pessoa jurídica de direito público interno, conforme trecho da

decisão, constante das folhas 1013-1014, in verbis:

[...], nada impede que o Estado Federal brasileiro celebre tratados internacionais que veiculem cláusulas ou exoneração tributária, em matéria de ICMS, pois a República Federativa do Brasil, ao exercer o seu treaty-making power, estará praticando ato legítimo que se inclui na esfera de suas prerrogativas como pessoa jurídica de direito internacional público, que detém – em face das unidades meramente federadas – o monopólio da soberania e da personalidade internacional.411

Assim, o Tribunal deu provimento ao Recurso Extraordinário fundamentando sua

decisão na não configuração de isenção heterônoma quando tratado internacional conceder

exoneração tributária a produto importado oriundo de país signatário do mesmo. O artigo 98

do CTN possui caráter nacional, com eficácia para a União, Estados-membros e os

Municípios e o Presidente da República não subscreve tratados como Chefe de Governo, mas

como Chefe de Estado, descaracterizando a vedação constante do artigo 151, III, da CRFB/88.

EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL. ICMS. ACORDO GERAL DE TARIFAS E COMÉRCIO - GATT. RECEPÇÃO PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. COMPETÊNCIA DO CHEFE DE ESTADO PARA FIRMAR TRATADOS INTERNACIONAIS. ISENÇÃO HETERÔNOMA. NÃO-OCORRÊNCIA. A decisão agravada está em conformidade com o entendimento firmado pelo Plenário desta Corte no julgamento do RE 229.096 (rel. orig. min. Ilmar Galvão, rel. p/ acórdão min. Cármen Lúcia, Pleno, DJ de 11.04.2008), no qual foi dado provimento a recurso extraordinário interposto contra acórdão que entendera não-recepcionada pela Constituição federal de 1988 a isenção de ICMS relativa à mercadoria importada de país signatário do Gatt, quando isento o similar nacional. Entendeu a Corte que a limitação prevista no art. 151, III, da Constituição (isenção heterônoma) não se aplica às hipóteses em que a União atua como sujeito de direito na ordem internacional. Agravo regimental a que se nega provimento.412

Ao recurso de Agravo Regimental foi negado provimento, por unanimidade, com

base no julgamento do Recurso Extraordinário n. 229096, já visto anteriormente.

Diante do que foi estudado neste trabalho, percebe-se que, parte da doutrina

entende não ser possível a União conceder isenções de tributos estaduais e municipais por

meio de tratados internacionais. Fosse este o entendimento majoritário, inviabilizaria a

411 BRASIL. Supremo Tribunal Federal (Tribunal Pleno). RE 229096, do Rio Grande do Sul. Relator(a): Min. Ilmar Galvão, julgado em 16 de agosto de 2007. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/util/obterPaginador.asp?numero=229096&classe=RE>. Acesso em: 28 abr.2010. 412 BRASIL. Supremo Tribunal Federal (Tribunal Pleno). AI 223336, do Rio de Janeiro. Relator(a): Min. Joaquim Barbosa, julgado em 21 de outubro de 2008. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/util/obterPaginador.asp?numero=223336&classe=AI-AgR>. Acesso em: 28 abr.2010.

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consolidação de qualquer processo de integração para a obtenção de vantagens recíprocas no

comércio internacional413. Impediria o país de manter relações de ordem econômica com os

demais países414.

Exemplos do exposto acima são a construção da usina de Itaipu415 e do gasoduto

Brasil-Bolívia. O Tratado de Itaipu, firmado em 26 de abril de 1980, entre a República

Federativa do Brasil e a República do Paraguai, trouxe na redação da letra “b”, do artigo XII,

vedação da cobrança de impostos, taxas e empréstimos compulsórios que viessem a onerar a

Itaipu Binacional – onde houve concessão de isenção heterônoma pela União416. No caso do

Tratado de Montevidéu, firmado em 12 de agosto de 1980 (Gasoduto Brasil-Bolívia), o

Acordo de Alcance Parcial sobre Promoção de Comércio entre Brasil e Bolívia417

(Fornecimento de Gás Natural) feito entre o Governo da República Federativa do Brasil e o

Governo da Bolívia, estipulou no artigo 1°, isenções de tributos federais, estaduais e, também,

municipais, visando à estimulação do desenvolvimento de novas fontes gasíferas na Bolívia e

o fortalecimento da participação do gás natural na matriz energética brasileira, o que, por

consequência, criaria novas oportunidades de investimentos produtivos e geração de

empregos418.

Em que pese o entendimento de diversos doutrinadores e da jurisprudência

minoritária, não há que se falar em inconstitucionalidade dos tratados internacionais

celebrados pela República Federativa do Brasil que contenham cláusulas que se destinam a

conceder isenção a impostos que os Estados-membros, Distrito Federal e Municípios são

competentes para instituir, porque, como já foi estudado no item 3.3, deste Capítulo, a

vedação constante do artigo 151, III, da CRFB, se refere tão somente à União enquanto

413 BARRAL, Welber e PRAZERES, Tatiana Lacerda. Isenção de Tributos Estaduais por Tratados Internacionais. Revista Dialética de Direito Tributário, n. 70, jul. 2001. p. 149. 414 GUSMÃO, Daniela Ribeiro. A vedação constitucional à isenção heterônoma no âmbito dos tratados internacionais e a questão da soberania. Revista de Direito Tributário , n. 72. p. 209. 415 BRASIL. Decreto Legislativo nº 23, de 30 de maio de 1973. Aprova os textos do tratado para o aproveitamento hidroelétrico dos recursos hídricos do Rio Paraná, pertencentes em condomínio aos dois países, desde e inclusive o salto Grande de Sete Quedas ou salto de Guaíra ate a foz do rio Iguaçu, e de seus anexos, firmado entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República do Paraguai, em Brasília, a 26 de abril de 1973, bem como os das notas então trocadas entre os Ministros das Relações Exteriores dos dois países. Disponível em: <http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaTextoIntegral.action?id=97413>. Acesso em: 19 maio 2010. 416 GUSMÃO, Daniela Ribeiro. A concessão, pela União, de isenções de tributos estaduais e municipais: possibilidade no âmbito dos tratados internacionais. Revista de Direito Administrativo, n. 216. abr/jun. 1999. p. 110. 417 BRASIL. Decreto nº 681, de 11 de Novembro de 1992. Dispõe sobre a execução do Acordo de Alcance Parcial sobre Promoção de Comércio entre Brasil e Bolívia (Fornecimento de Gás Natural). Disponível em: <http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaTextoIntegral.action?id=114631>. Acesso em: 19 maio 2010. 418 GUSMÃO, Daniela Ribeiro. A concessão, pela União, de isenções de tributos estaduais e municipais: possibilidade no âmbito dos tratados internacionais. Revista de Direito Administrativo, n. 216. abr/jun. 1999. p. 111.

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pessoa jurídica de direito público interno. E, sendo a República Federativa do Brasil quem

firma tratado internacional, pode-se falar em concessão de isenções de impostos estaduais e

municipais por via daqueles419.

419 JESUS, Ricardo Henrique de. Representatividade e competência do tratado tributário. Revista Magister de Direito Empresarial, Concorrencial e do Consumidor. v. 2, n. 7. fev./mar. 2006. p. 39.

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CONCLUSÃO

O presente trabalho de pesquisa cuidou da possibilidade de concessão de isenções

de impostos estaduais e municipais por meio de tratados internacionais.

Como consequência da forma federativa de Estado, o poder é constitucionalmente

distribuído entre os entes federados. A CRFB/88 delimitou o âmbito de competências deles,

inclusive as tributárias, que consiste no poder de instituir tributos por meio de sua lei própria,

decorrente da autonomia que têm os entes federados, qual seja o poder de se autodeterminar,

de se autogovernar.

Já, quem tem soberania é a República Federativa do Brasil, que é a qualidade de

não sofrer subordinação ao poder de nenhum outro Estado soberano, ou seja, de deter o poder

supremo dentro do seu território. Em virtude dessa qualidade, só ela pode manter relações

internacionais. Entretanto, ela dispõe de um representante ao qual foi constitucionalmente

atribuída a competência privativa para celebrar tratados internacionais, por força do artigo 84,

VIII - o Presidente da República.

Assim que o tratado internacional é devidamente incorporado ao ordenamento

jurídico interno brasileiro, passa a valer como norma interna, devendo ser cumprido.

Consoante o princípio internacional pacta sunt servanda, previsto no artigo 26 da

Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, de 1969, todo o acordo deve ser cumprido.

Portanto, ante a inobservância do referido princípio, o Estado incorre em responsabilidade

internacional.

Há doutrinadores que entendem que a prática da desoneração de contribuintes de

impostos estaduais e municipais por meio de dispositivo de tratado internacional é

inconstitucional por violar o artigo 151, III, da CRFB/88 e o princípio federativo. Todavia, o

referido artigo é dirigido à União, ente federado, autônomo, pessoa jurídica de direito público

interno, para assegurar a não ocorrência de conflitos entre os entes federados quando da

instituição de tributos. Decorrente do princípio federativo, o ente competente para instituir

determinado tributo é o único que pode conceder isenção àquele mesmo tributo, salvo se a

própria CRFB/88 dispuser de forma diferente.

Ademais, quem tem personalidade jurídica de direito internacional é a República

Federativa do Brasil, ou seja, ela é quem firma tratados internacionais, representada pelo

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Presidente da República. Desta forma, o artigo 151, III, da CRFB/88, não proíbe que a

República Federativa do Brasil celebre tratados internacionais que contenham cláusulas de

isenções a impostos estaduais e municipais, porque, ao firmá-los, ela está se valendo da

personalidade jurídica de direito internacional que tem por ser ente soberano.

A partir de toda a pesquisa que se fez, parece que a República Federativa do

Brasil pode, seja pela posição hierárquica que tem o artigo 98, do Código Tributário Nacional

que o permite, acima das leis ordinárias, fazer prevalecerem os tratados internacionais, seja

pelo argumento da doutrina ou entendimento jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal,

que firmou o entendimento de que, quando o Estado Federal brasileiro celebra um tratado que

contiver cláusulas de exoneração tributária, estará agindo como pessoa jurídica de direito

internacional.

Ademais, quando o Presidente da República assina um tratado internacional, não

o faz como Chefe de Governo da União, mas como Chefe de Estado, da República Federativa

do Brasil.

A prática da desoneração de impostos por via de tratados internacionais não viola

o princípio federativo, configurando inconstitucionalidade, porquanto o artigo 151, III, da

CRFB/88, se refere à União enquanto pessoa jurídica de direito público interno, preservando a

não ocorrência de conflitos de competência no âmbito interno.

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REFERÊNCIAS

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