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3. AGRICULTURA URBANA

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3. AGRICULTURA URBANA

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O cultivo, o processamento e a distribuição de produtos vegetais e animais nas cidades trazem benefícios ambientais e sociais. Este tipo de agricultura inclui desde pequenas hortas nos quintais ou jardins de escolas a atividades mais intensivas, em terras comunitárias geridas por associações.

A agricultura inclui o cultivo e o processamento artificial de animais, plantas, fungos e outras formas de vida para alimentação, fornecimento de energia e matéria-prima para indústrias diversas, como fibras, vestuário, fármacos e cosméticos. A agricultura viabilizou a civilização humana sedentária, organizada de forma estratificada, com grupos sociais especializados em atividades diversificadas, complementares entre si. A agricultura constituiu-se em riqueza concentrada, merecedora de proteção, o que levou à fixação de nossos antepassados a um determinado território, passando da condição de caçadores-coletores, nômades ou seminômades, para agricultores, sedentários. A história da agricultura está, portanto, intimamente ligada ao nascimento dos assentamentos humanos e das cidades.

Ao longo de milhares de anos, desde a primeira planta domesticada, a agricultura teve seu desenvolvimento orientado e definido por diferentes climas, culturas e tecnologias. Os sistemas de produção e as técnicas agrícolas foram aperfeiçoados e se multiplicaram para manter e expandir as terras apropriadas para o cultivo e a pecuária. As sucessivas revoluções agrícolas e industriais geraram o forte processo de urbanização do planeta. Embora tenha ocorrido a separação operacional do campo e da cidade, sem a alta produtividade da agricultura para alimentar, vestir, cuidar da saúde e transportar pessoas, não teria ocorrido a rápida urbanização do mundo.

Paralelamente à agroindústria, porém, surgiu um movimento contracorrente de apoio à agricultura de pequena escala e sem pesticidas ou adubos sintéticos. As versões variam – agricultura orgânica, biodinâmica, sustentável, permacultura, agroecologia – porém o objetivo é um só: tornar a agricultura mais natural, reduzindo seus impactos ambientais e obtendo produtos mais saudáveis. E a força dessa agricultura tida como alternativa, paradoxalmente, vem dos consumidores urbanos, preocupados com a qualidade de vida.

Foto ao lado: O cafeeiro carregado dá vida ao monumento ao café, em plena av. 9 de Julho, no coração de São Paulo.

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Além da preocupação em reduzir a contaminação por pesticidas, hormônios ou conservantes, um dos preceitos da agricultura sustentável também é reduzir a distância percorrida pelo produto agrícola, desde as mãos do produtor até a mesa do consumidor. O consumo de artigos locais fortalece a comunidade, suas tradições e cultura, além de encurtar a cadeia de intermediários, reduzir a necessidade de estocagem e consumir menos combustível em seu transporte.

Tal preceito revigorou os cultivos em espaços intraurbanos e nas periferias urbanas, cuja finalidade costumava ser apenas gerar renda para grupos sociais carentes ou abastecer as cidades com produtos frescos. Mesmo quando não se trata de agricultura sem pesticidas e adubos químicos, a produção de pequena escala, nesses espaços, funciona como incentivo à reciclagem dos resíduos domésticos, à redução de desperdícios e ao melhor aproveitamento de recursos locais, ou seja, traz vantagens ambientais.

A definição de agricultura urbana sustentável, portanto, é aquela que cultiva, processa e distribui produtos vegetais e animais nas áreas urbanas e periurbanas – aquelas dentro ou imediatamente adjacentes à cidade –, com múltiplos benefícios ambientais. Podem ter várias escalas, desde pequenas hortas no quintal ou jardim da escola, a atividades mais intensivas em terras comunitárias, coordenadas por uma associação ou grupo de vizinhos.

Estudos recentes na América Latina e no Caribe permitem ver o papel da agricultura urbana na melhoria da gestão ambiental e da segurança alimentar dos setores mais pobres das cidades da região. Esta modalidade de agricultura proporciona ainda o aumento do porcentual de áreas verdes nas cidades, com mais sombreamento, mais solos permeáveis e temperaturas mais amenas. Não só representa uma melhor estética para ruas, bairros e cidades como também, sendo uma atividade

Em São Paulo, se-mear em viveiros

e plantar hortas faz parte das ati-

vidades de muitas escolas.

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agrícola bem planejada, serve como proteção contra a ação de ventos e chuvas, fornecendo abrigo e alimento para espécies da fauna nativa, capazes de se adaptar à proximidade com o homem. Além disso, continua a significar ocupação e renda para os envolvidos na atividade.

O êxito do desenvolvimento dessa agricultura depende do acesso à terra no ambiente urbano, de espaços assegurados para a comercialização dos produtos, e do manejo sustentável dos resíduos sólidos e líquidos, reciclados como adubos.

Agricultura ambientalmente correta

Diversos são os sistemas de produção agrícola que se opõem à agricultura dependente de agrotóxicos e adubos industrializados:

Agricultura biológica ou orgânica – não admite o uso de adubos ou pesticidas sintéticos, nem reguladores de crescimento para os animais domésticos. Também não usa organismos geneticamente modificados. O foco maior é o cuidado com o solo, que deve ser vivo, com insetos e micro-organismos benéficos para a reciclagem de nutrientes.

Agricultura biodinâmica – é uma variante da agricultura biológica, que segue os ensinamentos do austro-húngaro Rudolf Steiner (antroposofia) para nutrir o solo e as plantas.

Agricultura sustentável – busca conciliar conservação ambiental com produtividade e sustentabilidade econômica, se possível em comunidades agrícolas organizadas.

Agroecologia – é a agricultura familiar socialmente justa, economicamente viável e ecologicamente sustentável. Adota, por exemplo, o plantio de alimentos em consórcio ou à sombra de plantas nativas, imitando a natureza em busca das vantagens da biodiversidade, tais como polinização, controle de doenças e pragas pela fauna, e reciclagem natural de nutrientes.

Permacultura – criada pelos australianos Bill Mollison e David Holmgren, tem os mesmos ideais da agroecologia ampliados no tempo, como indica o próprio termo permacultura, derivado de permanent agriculture (agricultura permanente). A permacultura aos poucos se estendeu também às cidades. A ideia inicial de sustentabilidade ecológica se ampliou para sustentabilidade dos assentamentos humanos.

EM RESUMO

A agricultura urbana sustentável cultiva, processa e distribui alimentos e ervas medicinais nas áreas urbanas e periurbanas, com benefícios ao meio ambiente e à nutrição e saúde da população.

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Conhecimento reciclado e acesso a terraA América Latina abriga quatro das quinze megacidades do mundo – Cidade do México, São Paulo, Rio de Janeiro e Buenos Aires. Atualmente, vivem na região cerca de 126 milhões de pobres urbanos, muitas vezes excluídos do acesso à infraestrutura urbana e social. Até a metade do século XX, boa parte dessas populações ainda estava nas zonas rurais, tendo engrossado o processo de urbanização apenas nas últimas décadas.

Para sobreviver, os pobres urbanos se veem, frequentemente, obrigados a construir suas próprias moradias e a cultivar seus alimentos em zonas perigosas, frágeis, ou altamente contaminadas, causando fortes impactos nos ecossistemas em que se instalam e comprometendo sua qualidade de vida. Porém, há casos em que os governos locais incentivam a instalação da agricultura urbana de forma planejada, o que contribui para a conservação da biodiversidade, assim como para a melhoria da paisagem e da qualidade de vida das pessoas. Pesquisas recentes estão buscando verificar como se dá esse fato.

Em Havana, levantamentos realizados pela Fundação de Apoio à Ciência e Natureza (Funat), de Taubaté (SP), identificaram o cultivo urbano de espécies como a mandioca (para a produção de sagu), o inhame e o capuli (pequena árvore frutífera). Metade da agricultura do país vem das plantações urbanas. Muitas hortas são feitas no meio da cidade, em qualquer área vazia. Espécies de muita tradição na dieta cubana, que não são mais cultivadas nas zonas rurais, continuam sendo plantadas nos bairros populares da cidade.

Em Penápolis (SP), há mais de dez anos, a Prefeitura Municipal disponibiliza terrenos públicos, quase sempre localizados em áreas verdes legais, e os oferece para o uso de famílias cadastradas na produção de hortaliças, legumes e ervas medicinais.

Em Dakar, Senegal, um projeto de agricultura urbana, apoiado pela Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação (FAO), produz mais de 30kg de tomate por metro quadrado a cada ano, com cultivo contínuo em telhados verdes.

Os benefícios se materializam no acesso a uma quantidade maior de alimentos com maior valor nutritivo. Estudos da FAO apontam que moradores envolvidos com a agricultura urbana tendem a consumir uma maior quantidade de comida, chegando a 30% mais do que outras pessoas. Têm uma dieta mais diversificada, consumindo vegetais, frutas e carnes. Têm mais vitalidade e mais disposição para as atividades sociais e familiares.

Famílias cadas-tradas usam os

terrenos públicos de Penápolis

(SP) para plantar alimentos e ervas

medicinais.

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Mas ainda há muito a se desenvolver na agricultura urbana, de modo a tornar mais seguros a produção e o beneficiamento dos produtos agrícolas. Na maioria dos casos, esses produtos servem para o consumo próprio ou para a troca e comercialização no bairro, nem sempre sujeitos à inspeção sanitária. Por isso é preciso insistir na adequação dos métodos utilizados, de forma a garantir o (re)aproveitamento, eficiente e sustentável, dos recursos, da mão de obra e dos insumos locais.

A agricultura urbana deve incorporar os conhecimentos agrícolas ao novo ambiente de quintais, jardins, lotes vagos, áreas verdes, áreas institucionais, terrenos arrendados e até mesmo emprestados. Também se encontram praticantes de agricultura urbana em escolas, creches, institutos governamentais de assistência social e templos religiosos, que iniciam a produção para suprir a necessidade de alimentação e/ou como instrumento pedagógico para crianças e jovens, e acabam por gerar renda, segurança alimentar e sustentabilidade devido à opção por não utilizar insumos artificiais e industriais. Assim, ainda que iniciadas de maneira despretensiosa, tais atividades socioeconômicas não podem ser vistas isoladamente. Elas se inserem no contexto dos sistemas de gestão urbana, produção e distribuição de alimentos.

Gestão pública e combate à fomeSegundo dados do Centro de Estudos e Promoção da Agricultura de Grupo (Cepagro), a prática da agricultura dentro ou em volta das cidades e metrópoles é um fenômeno em expansão, particularmente nos países em desenvolvimento, onde os sistemas urbanos de suprimento de alimentos não são acessíveis a toda a população. A FAO destaca a necessidade de “políticas e planejamentos específicos” para administrar as questões ligadas à agricultura urbana. Enfatiza que não deve haver competição com a agricultura rural, “mas deve se concentrar em atividades nas quais ela tem uma vantagem comparativa, tal como na produção de alimentos perecíveis e frescos”.

A importância da agricultura urbana cresceu tanto que a FAO lançou um programa denominado Cidades Alimentando Cidades, no qual destaca o estabelecimento de hortas urbanas, a utilização de terrenos baldios para o cultivo de alimentos e, principalmente, o uso adequado da água nas cidades. Em muitos lugares, há um

EM RESUMO

A agricultura urbana deve ser adaptada aos espaços exíguos das zonas urbanas e aproveitar os resíduos e os recursos disponíveis de modo adequado, para garantir a segurança alimentar e ambiental, além de gerar renda.

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potencial latente para a agricultura urbana, quase sempre ignorado. Na cidade de Chicago, EUA, por exemplo, foram contabilizados 70 mil terrenos baldios. Em Rosario, Argentina, um mapeamento apontou que 35% do território do município era composto de terras vazias ou parcialmente vazias. Com um programa que envolveu vários setores, 10 mil famílias tiveram acesso a essas terras e aumentaram sua oferta de alimento.

Estudos também mostram o efeito regenerativo da transformação desses terrenos baldios: de espaços esquecidos, sujos e perigosos para jardins ou hortas bem cuidados, vistosos, que alimentam o corpo e o espírito comunitário das pessoas.

No Rio de Janeiro, em agosto de 2010, o Centro Municipal de Segurança Alimentar, vinculado à Secretaria Municipal de Assistência Social, realizou a primeira ação de incentivo à agricultura familiar, em Barra de Guaratiba. Além de visitas guiadas, cursos e oficinas sobre hortas domésticas, foram realizadas avaliações nutricionais e palestras sobre segurança alimentar e agricultura urbana para a população carioca.

Enquanto a informação sobre o papel da agricultura urbana cresce, a atividade se mantém, em grande medida, na informalidade, sem ser amplamente integrada às políticas de agricultura e planejamento urbano. Isso compromete seu potencial de redução da pobreza e inclusão social. Para que se desenvolva de maneira ordenada, é preciso aplicar políticas públicas direcionadas à agricultura urbana, o que requer a participação e o comprometimento ativo dos governos locais e o envolvimento das comunidades.

Produção de alimentos para consumo próprio ou comunitárioA horticultura urbana e a periurbana incluem uma grande variedade de legumes, cereais, flores, árvores ornamentais, ervas medicinais, plantas aromáticas e cogumelos. Os tipos de produtos cultivados variam de acordo com a região, influenciados pela cultura e tradição locais. Nas cidades, as plantas de ciclo curto são as preferidas, enquanto nas periferias, as culturas de ciclos mais longos tomam lugar, por exemplo, em pomares.

Considerando os métodos de produção e as restrições existentes nas cidades, algumas técnicas já foram adaptadas à situação urbana. É o caso da produção de hortícolas em áreas edificadas, utilizando a parte superior do telhado, compostagens biológicas e a água enriquecida com nutrientes da produção hidropônica.

Com a mobilização comunitária, em especial com o apoio das prefeituras, um número considerável de cidades já implementou hortas, lavouras, viveiros, pomares, canteiros

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de ervas medicinais, criações de pequenos animais, unidades de processamento/beneficiamento agroalimentar, feiras do produtor e mercados públicos. Os alimentos produzidos são destinados ao autoconsumo, ao abastecimento de restaurantes populares, às cozinhas comunitárias e à venda de excedentes no mercado local.

Na Grande Florianópolis (SC), 11 grupos de agricultura urbana são assessorados pelo Cepagro. No entorno do bairro Monte Cristo, a ação é articulada entre a creche, a escola e uma instituição beneficente. Espaços públicos – como terrenos de escolas – e os reduzidos quintais de algumas famílias já estão tomados pelas hortaliças produzidas sem adubos industrializados ou pesticidas sintéticos. Na creche há uma horta didática e, na instituição beneficente, uma horta comunitária para a subsistência das famílias participantes e abastecimento da cozinha da entidade.

Em Minas Gerais, a Secretaria de Agricultura e Abastecimento de Lavras distribui mudas frutíferas para as pessoas residentes no município, no âmbito do programa Pomar Doméstico. A ação já beneficiou 300 pessoas, entre produtores rurais e moradores da cidade, totalizando 4.200 mudas até o final de 2010.

No Ceará, merece destaque a iniciativa do Conjunto Palmeira, um bairro popular com 30 mil moradores, situado na zona sul da capital Fortaleza. Quase todas as mulheres beneficiadas pelo projeto eram analfabetas e não tinham treinamento profissional. Únicas responsáveis por suas famílias, muitas eram mães solteiras e algumas eram dependentes de drogas.

Elas se beneficiaram do apoio assistencial e aproveitaram a experiência agrícola de moradores da vizinhança. Algumas começaram a criar pequenos animais, como galinhas, cabras e porcos, cercados nos quintais ou soltos pelas ruas do bairro. As famílias decidiram então iniciar um projeto em seus próprios quintais, mas organizadas em redes. E hoje, cada quarteirão se especializou em um tipo específico de colheita, incrementando a escala de produção.

Em São Paulo (SP), o Programa de Agricultura Urbana e Periurbana (Proaurp), sob gestão da Prefeitura Municipal, combate a fome, além de aproximar os produtores dos consumidores, eliminando o atravessador e baixando os preços dos alimentos. No início de 2011, já eram 256 hortas; um projeto-piloto de Merenda Orgânica mais

Mudas do projeto Pomar Doméstico prontas para a entrega a produ-tores urbanos, em Lavras (MG).

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cursos e oficinas que atendem 300 pessoas por ano, entre agricultores familiares, grupos comunitários da terceira idade, jovens, crianças, desempregados e moradores de rua.

No Rio Grande do Norte, na cidade de Ceará Mirim, a experiência positiva veio através do programa Compra Direta, do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS). Mais de 150 famílias fornecem seus produtos para a prefeitura, que distribui gratuitamente os alimentos para entidades de assistência a deficientes e dependentes de drogas, eliminando atravessadores por meio da agricultura urbana.

Os produtos urbanos ainda têm potencial em nichos de mercado, como os restaurantes gourmet. Em um evento itinerante chamado Nordeste Bahia Gourmet 2010 – Agricultura familiar, cozinha global, realizado em 2010, em São Paulo, os melhores chefes de cozinha se uniram a agricultores locais para negociar produtos com apelo gastronômico – como queijos, carnes, dentre outros. Negócios foram fechados sem intermediários com restaurantes e bares, com vantagens para todos.

Teto verde produtivoPara a constante falta de espaço das cidades, uma alternativa promissora é a adoção de telhados verdes. Trata-se de cobrir o telhado – parcial ou completamente – com vegetação, plantada sobre uma membrana impermeabilizante. O sistema pode também incluir camadas adicionais, tais como uma barreira de raiz e de drenagem e sistemas de irrigação, ou mesmo pequenos lagos artificiais utilizados para tratar águas servidas (águas cinzas) com plantas aquáticas.

A técnica implica na busca de soluções arquitetônicas e estruturais adequadas a cada região, considerando-se o índice e a frequência de chuvas, a exposição ao sol e a inclinação de cada telhado, bem como o direcionamento da água excedente e o acesso às plantas para manutenção e eventual colheita.

Os telhados verdes – também conhecidos como ecotelhados, telhados com vegetação, telhados vivos e tetos verdes – podem se restringir a ervas rasteiras ou prever plantas mais altas e mesmo árvores, nas coberturas de casas e edifícios,

EM RESUMO

A produção de alimentos nas cidades deve aproximar produtores e consumidores, eliminando intermediações e baixando os preços dos alimentos. Também pode ser uma ótima alternativa para restaurantes gourmet, com ganhos em qualidade e preço.

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comerciais ou residenciais. Tudo depende dos sistemas de impermeabilização e drenagem da edificação.

Em regiões de alta urbanização, o telhado verde contribui para amenizar o calor, melhorando o conforto térmico no interior da edificação. Ajuda também a reduzir a poluição ambiental e até a sequestrar o carbono pela fotossíntese das plantas. As vantagens também incluem o conforto acústico, reduzindo a entrada do ruído da cidade na edificação. E, com o revestimento verde, ampliam-se as poucas opções de pouso, abrigo e alimentação para animais silvestres. Dependendo da superfície coberta por telhados vivos e do microclima em seu entorno, pode-se aumentar a umidade relativa do ar nas áreas próximas.

Os telhados vivos de grandes construções – indústrias, shoppings, postos de combustíveis, condomínios – contribuem para a absorção e a retenção das águas de chuva e proporcionam isolamento térmico, ao ponto de combater os efeitos da impermeabilização do solo e das ilhas de calor. Entre os efeitos visíveis já registrados em diversos países estão:

redução de enxurradas e enchentes;

limpeza (filtragem) da água pluvial;

melhoria de pelo menos 10% da temperatura interna;

manutenção ou recuperação da biodiversidade, em associação com ecossistemas próximos;

aumento da durabilidade da edificação;

oportunidade de convívio com a natureza e embelezamento da paisagem;

pontuação de certificações sustentáveis, como LEED (certificação norte-americana atribuída a edifícios sustentáveis, sobretudo quanto à eficiência energética e ambiental. A sigla significa Leadership in Energy and Environmental Design ou Liderança em Desenho Ambiental e Energético).

Ao planejar um telhado verde, é importante prestar atenção a dois aspectos fundamentais:

1. Dimensão da vegetação: plantas de porte baixo, perenes, de baixa manutenção e grande poder de resistência necessitam de menos manutenção.

2. Finalidade da vegetação: a densidade da vegetação influencia o conforto térmico e acústico no interior dos ambientes com telhados verdes, assim como a capacidade de evapotranspiração de todo o sistema. O porcentual de cobertura verde elimina ou reduz a reflexão dos raios de sol e diminui o aquecimento em prédios vizinhos, além de aumentar a geração de oxigênio (fotossíntese).

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É importante ter em mente que as plantas necessitam de sol (para alguns tipos), ar e água (para todos os tipos). Embora as espécies que se prestam à cobertura verde devam ter alta resistência a extremos climáticos (de excesso de umidade a secas, frio e calor), a vegetação só ficará bonita e vistosa se bem tratada.

Na prática, existem dois tipos de telhados verdes: os intensivos, mais grossos, que suportam ampla variedade de plantas, porém são mais pesados e exigem mais manutenção, e os extensivos, mais leves, cobertos apenas por uma leve camada de vegetação.

Quanto aos sistemas de suporte para as coberturas verdes e os jardins suspensos, são três os tipos disponíveis no mercado, para instalação em diversas construções:

Sistema Modular – É composto por módulos já vegetados, colocados lado a lado sobre uma membrana isolante de raízes e uma membrana para a retenção de nutrientes. É de fácil e rápida instalação e proporciona excelente conforto térmico. Cada placa de vegetação pesa cerca de 50 kg/m2 , já saturada (de água e nutrientes). Pode ser colocado sobre praticamente qualquer tipo de telhado ou laje (ilustrações 1 e 2). A vegetação deve se constituir preferencialmente de plantas adaptadas a solos rasos, resistentes à estiagem e de baixa manutenção, como as plantas suculentas. Não é recomendável usar grama por sua alta exigência de água. Em geral, os módulos já vêm com a vegetação, pesam pouco, exigem baixa manutenção, têm boa retenção de água, adequada aeração das raízes, excelente qualidade de drenagem em enxurradas e o substrato nutritivo é protegido de compactação e erosão.

Módulo ecotelhado vegetado

Cantoneiraem alumínio

Membrana de retenção de substrato

Manta de Pead oumanta asfáltica antiraízes

Telha existenteParafuso de fixaçãoda cantoneira na telhaEspelho em madeira

SISTEMA MODULAR SOBRE TELHA

Casa

Módulo ecotelhado vegetado

Cantoneira “U”galvanizada

Membrana de retenção de substratoManta de Pead oumanta asfáltica antiraízes

Assoalhode madeira

Espelho em madeira(7cm acima do piso)

SISTEMA MODULAR SOBRE PEAD

Casa

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SISTEMA GALOCHAPingadeira de pedraou chapa galvanizada

Vegetação rasteiraSubstrato leve ecotelhado (variável)

Módulo Galocha ecotelhado (8cm)Película de água

Membrana deretenção denutrientes

Membrana Anti-raízes

Proteção mecânicaManta asfáltica

Camada de regularizaçãoLaje de concreto pré-existente

Casa

Sistema Galocha – É uma evolução dos sistemas modulares de telhado verde, com muito mais retenção de água. É o sistema de melhor custo-benefício existente no mercado (ilustração 3). Tem encaixe para facilitar o transporte. Pode ser adquirido completo, pronto para instalação, ou apenas com substrato e sem vegetação, para que se possa escolher as plantas e desenhar os arranjos.

Sistema Laminar – Caracteriza-se por utilizar uma lâmina d’água sob um piso elevado feito de módulos de sustentação (ilustração 4). Essa lâmina garante um suprimento de água de até 40 litros por metro quadrado. Só deve ser utilizado em telhados completamente planos. Amplifica os benefícios da retenção pluvial e o conforto térmico no interior da edificação. No total, o sistema tem 16 cm de espessura e pesa 120 kg/m2 quando saturado, variando de acordo com o volume de vegetação. É ideal para telhado de grama, pois mantém a umidade ideal na lâmina d’água. Pode utilizar vasta variedade de forrações e pequenos arbustos. Permite também a purificação de águas cinzas com posterior reutilização no prédio. A água dos chuveiros e das pias é filtrada num reservatório e então bombeada até o telhado para a rega da grama, responsável por nova filtragem. A água filtrada, então, escoa para o sistema laminar, que a redireciona para as descargas, nos banheiros.

Até o final de 2010, os telhados verdes instalados em território nacional somavam cerca de 55 mil metros quadrados.

SISTEMA LAMINAR

Lâmina d’águaVegetação rasteira, como grama

Bombeamentode águas cinzas

Sistemalaminaralimentadescargasdo banheiro

Filtragem noreservatório

EM RESUMO

Os telhados verdes aumentam o conforto térmico dentro das edificações e também combatem as ilhas de calor nas imediações. Quando possível, o sistema deve incluir o reúso da água servida no edifício para manutenção das plantas cultivadas nos telhados.

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Arborização com frutíferas: o pomar em locais públicos e privadosUm pedaço de terra no quintal, um terreno baldio, um trecho na calçada e algumas noções básicas de agronomia ou experiência agrícola bastam para iniciar a arborização de espaços urbanos, inclusive com perspectiva de renda e como alternativa alimentar. A garantia da colheita de frutos sem agrotóxicos e amadurecidos no pé ainda pode ter caráter educativo e de integração para a comunidade local, eventualmente incluindo até o resgate cultural de tradições esquecidas.

Para isso, é crucial a escolha de espécies frutíferas adequadas para as áreas destinadas, considerando as necessidades de manutenção, espaço e manejo das plantas, prevendo o tamanho que atingirão quando adultas. Na arborização com frutíferas é indispensável conhecer as limitações de cada espécie, suas necessidades e sua sazonalidade. O planejamento adequado evita acidentes e sacrifício, tanto para o homem como para a planta.

Outro detalhe importante é a poda adequada. A finalidade da poda é equilibrar a quantidade de ramada em função das raízes existentes. Uma poda mal feita, com o objetivo de moldar a árvore à passagem de fios elétricos ou à conveniência dos vizinhos pode prejudicar a planta de forma irreversível. É preferível não realizar a poda a fazê-la incorretamente.

De modo geral, todas as orientações necessárias à implantação e manutenção de pomares domésticos podem ser obtidas junto às Casas de Agricultura, às cooperativas e aos órgãos competentes nas prefeituras, que ainda dispõem dos insumos necessários e mudas de frutíferas, nativas e florestais.

Se bem cuidados, os pomares domésticos contribuem para a melhoria da dieta e para o aumento da renda do grupo familiar. Nas mais remotas regiões, seus frutos são colhidos e vendidos na comunidade, feiras livres e até seguem para cooperativas voltadas para a produção de polpas, doces e iguarias. Este sistema surgiu espontaneamente, sem interferência ou incentivos dos serviços oficiais de agricultura, o que indica sua adequação às condições e aos habitantes de cada região.

Em alguns casos, o incentivo parte de grupos de moradores organizados, com o propósito de valorização cultural, como acontece no bairro Cambuci, da cidade de São Paulo, nomeado em homenagem a uma árvore frutífera da Mata Atlântica do Sudeste. Muito saboroso e próprio para a fabricação de doces, licores e geleias, o cambuci havia desaparecido dos quintais do bairro, mas já começa a ser plantado novamente, inclusive em praças públicas, graças às campanhas pró-memória da Revista do Cambuci.

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59CAPÍTULO 3 AGRICULTURA URBANA

Na Amazônia, muitos pequenos agricultores ribeirinhos plantam várias espécies de árvores, perto de suas casas. O pomar tem acesso por terra ou água (rio, lago, igarapé) e sua composição varia de uma propriedade para outra, até mesmo quando situadas no mesmo local e tipo de solo. Além do plantio de muitas árvores frutíferas diferentes, os produtores mantêm soltos aves (galinhas, gansos e patos) e porcos.

Depois da fase de instalação, o pomar se parece com uma floresta natural, com vegetação densa, de muitas espécies distintas, e distribuição irregular no terreno. A substituição das árvores frutíferas é decidida caso a caso e acaba por aumentar a variabilidade de árvores e idades, aproximando ainda mais o pomar de uma floresta natural. Em solos pobres de terra firme, o pomar caseiro é a única forma de agricultura tradicional, em que a terra produz ininterruptamente durante dezenas de anos.

Com a urbanização da Amazônia, tais pomares “florestais” são eventualmente reproduzidos nas cidades, conferindo aspecto silvestre a alguns bairros e mesmo a instituições de pesquisa instaladas em amplos espaços, como o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), em Manaus (AM).

Em suma, a implantação de pomares deve obedecer a regras técnicas, dependendo da espécie a plantar e da região. Uma das dificuldades, sem dúvida, é conseguir mudas de boa qualidade. Há poucos viveiros para produção de mudas saudáveis, sobretudo as de espécies nativas. A maioria ainda trabalha na informalidade, sem maiores investimentos em qualidade. Porém há exceções, graças ao trabalho de organizações não governamentais comprometidas com a recuperação do verde, como a Associação Mata Ciliar, em Pedreira (SP) ou o Instituto Floresta Viva, no Sul da Bahia. Além de ajudar na escolha do local, das espécies, das variedades, do espaçamento e da adubação, esses ambientalistas e viveiristas oferecem a oportunidade de valorização das espécies nativas também na agricultura urbana.

Nos quintais amazônicos, são misturadas árvo-res frutíferas de diversas espécies e tamanhos, imi-tando a floresta.

CONSULTE O KIT PEDAGÓGICO

ESTE CAPÍTULO SE COMPLEMENTA COM O ROTEIRO DE TRABALHO 2 E AS FICHAS 6, 7 E 8.

+ PARA SABER MAIS

• Centro de Estudos de Promoção de Agricultura de Grupo (Cepagro)

• Agricultura urbana – http://www.cepagro.org.br/agricultura-urbana/

• Cartilha de agricultura urbana com enfoque agroecológico – http://www.cepagro.org.br/publicacoes-do-cepagro/

• Programa Mata Ciliar – Governo do Estado do Paraná – Perguntas mais frequentes – http://www.mataciliar.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=10

• Ecotelhado – Blog com notícias e esclarecimento de dúvidas sobre tetos verdes – http://ecotelhado.blog.br