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NOTAS REFLEXIVAS SOBRE O ATO DE FORMAR PROFESSORES
FERNANDES, Manuel José Pina1
Universidade Regional do Cariri – URCA
e-mail: [email protected]
JURUMENHA, Lindelma Taveira Ribeiro.2 Universidade Regional do Cariri – URCA
RESUMO
Este trabalho é o resultado obtido até esta data nas discussões analíticas realizadas no seio do Grupo de Estudo
sobre a Formação do Professor comandado pelo pesquisador, com a colaboração das alunas, graduandas do curso
de Pedagogia e apontadas na coautoria. Para o desenvolvimento dos trabalhos no Grupo de Estudo foram
selecionados quatro autores que, em suas linhas de estudo perseguem a melhoria dos cursos de formação
docente, são eles: António Nóvoa, José Carlos Libâneo, José Pacheco e Newton Duarte. Os trabalhos de estudo
tiveram início no começo do semestre letivo de 2014.1 e o nosso maior objetivo está sendo aprofundar
conhecimentos, através da leitura, que permitam discutir a formação docente que a URCA está oferecendo,
principalmente, no Curso de Pedagogia. A metodologia pode ser descrita como um diálogo constante entre as
pessoas envolvidas a partir conceitos e formulações mais gerais apontadas sobre a temática no desenvolvimento
do pensar desses autores. Como resultados, esperamos atingir um grau de conhecimento que nos permita sugerir
alterações significativas na matriz curricular do curso a ser realizada no ano de 2015. Como conclusão deste que
é um estudo recente, já podemos apontar para a necessidade de se rever a relação teoria prática que
hodiernamente está mais focalizada no aspecto teórico, em detrimento do prático.
PALAVRAS-CHAVE: Formação do Professor; Conceitos; Práxis; Qualidade Educacional;
Aproximação ao tema
Nóvoa, ao longo da teorização perceptível nos seus escritos resultantes de uma prática, nos
traz, de modo sistemático, a sua visão da “escola transbordante” como um processo a ser
ultrapassado para se atingir uma maior aproximação à escola com a qualidade que todos
almejamos. Partindo desta constatação inicial, necessário se faz esclarecer as desconexões que
podem ser percebidas quando busco fazer um paralelo entre o que seja a escola com oferta de
educação de qualidade e a escola transbordante, não esquecendo, no percurso, a análise da
melhor ou pior formação oferecida ao futuro docente que estará incumbido de desenvolver
suas atividades ora numa, ora na outra. Aliás, o meu objetivo é discutir uma formação
possível e o modelo de formação que estamos desenvolvendo na busca de atingirmos um grau
mais elevado de qualificação profissional.
1 Professor Dr. no Departamento de Educação da URCA. Coordenador do Grupo de Estudo sobre Formação do
Professor e líder do Núcleo de Pesquisa dos Movimentos Sociais e Educação – NUPEMSE. 2 Graduanda no Curso de Pedagogia da URCA e bolsista de IC/CNPq.
Vale, desde logo, admitir que ao longo dos séculos XVIII, XIX e XX nenhuma geração se
sentiu satisfeita com a escola que lhe foi oferecida, o que me faz afirmar que essa luta pela
qualidade na educação escolar é histórica e que não posso, por esse fato, negá-la. Os
questionamentos que ora levanto devem ser respondidos, após longa reflexão, por todos os
encarregados da formação docente, se houver a intenção de realizar mudanças no atual
cenário educacional. Que ensinamentos podem, neste caso, ser retirados dessa permanente
insatisfação? Que fatores poderão contribuir para a satisfação ou, por outras palavras, que
realidade nos ajudará a representar a qualidade educacional que desejamos? E para o século
XXI, que perspectivas vislumbramos?
Para este trabalho apresento as respostas que eu dou a esses questionamentos com base em
estudos realizados e parto, inicialmente, do pressuposto que o grau de insatisfação que as
populações têm manifestado “vis à vis” da educação que tem recebido pode ser analisado por
dois polos opostos: um lado que leva ao avanço e aquele outro lado que leva ao atraso. Assim,
por exemplo, quando a insatisfação me estimula a correr atrás de uma escola diferente, com
mais qualidade, é possível afirmar que essa insatisfação precisa ser vista como elemento de
avanço, pois ela é, além de tudo, a mola propulsora das ações reflexivas que me encaminham
à busca de melhorias significativas. Já, em contrapartida, quando a insatisfação me serve
apenas à desqualificação de determinada escola e visa à sua extinção só pode ser analisada
pelo lado que leva ao atraso.
Do discurso à prática
Feitas algumas comparações sempre perigosas entre momentos distintos, não há como não
perceber a escola atual em melhores condições que aquela existente em séculos/décadas
passadas – mesmo deixando claro que esta poderia estar muito melhor sobre quase todos os
aspectos, para não generalizar –, pois sei que ela não está em condições de atender de modo
pleno a todas as necessidades do alunado, nem tampouco, de acompanhar a evolução
científica e tecnológica que acontece quase à velocidade da luz. Nessa comparação com a
escola de séculos/décadas passadas é possível afirmar que em poucos aspectos a escola atual
suplanta a escola criada lá no passado século XIX que pode ser caracterizada como sendo: a
escola na qual laborava um professor que ensinava vários alunos e era estruturada num
sistema de ensino que ainda hoje se mantem sem grandes transformações e onde apenas os
conteúdos variaram um pouco. Por esse motivo precisamos fazer com que a escola evolua e
passe a ser percebida não mais como o instrumento formador do homem em sua idade inicial
– a infância – mas pincipalmente como elemento capaz de realizar transformações que
marquem o ser humano ao longo do seu crescimento entre a fase da infância e a fase adulta –
isto é, deve atuar, também, na adolescência, na juventude e na fase adulta, para poder ser vista
como formadora de um ser social apto a enfrentar as situações diversas que a vida possa
apresentar-lhe. A escola não pode ser uma instituição limitada e limitadora, ela deverá
permanecer sempre à disposição de todo aquele que dela sinta necessidade a qualquer
momento. Isto implica dizer que a escola deverá permanecer constantemente aberta.
O conceito de “transbordamento”
A nossa escola, ou a escola atual, apresenta-se muito mais preocupada com as questões
sociais – e aí se encaixa o conceito de transbordamento apontado por Nóvoa (2006, p.115) –
impostas pelas políticas públicas assistencialistas e compensatórias das péssimas ações dos
governos nesse setor, que com as questões diretamente ligadas ao processo de aprendizagem.
Dessas ações sociais resultam muito mais consecutivas gerações de analfabetos funcionais
que seres preparados para atuarem de modo transformador na realidade social imposta e
criada pela atualidade do século XXI, considerada como sendo a sociedade do conhecimento,
a sociedade do futuro. São, também, de Nóvoa estas palavras que traduzem satisfatoriamente
a situação da atual escola: “A crítica principal que hoje se dirige à escola diz respeito à sua
incapacidade para promover as aprendizagens, respondendo assim aos desafios da sociedade
do conhecimento”. Mas não podemos simplesmente apagar de nossas memórias as imagens
do passado mais recente ou daquele mais remoto e projetar algo melhor para “a sociedade do
futuro”, sem pensarmos seriamente na realidade vivenciada no hoje, até porque, sempre
segundo Nóvoa (2009, p.181), “Pensar o futuro é um exercício arriscado e, muitas vezes,
fútil”. Só através do conhecimento e da faculdade de questionamento do presente poderemos
suplantar o passado e ir arquitetando as bases mínimas sobre as quais de erigirá o futuro a
partir da análise da realidade que nos for sendo possível ir transformando. A escola, a
educação desse tempo, deverá atentar para a construção de saberes necessários para se atingir
a compreensão plena dessa realidade vivencial e ao enfrentamento das situações problemas
que “o novo” certamente nos trará. A figura emblemática e romântica do Dom Quixote, em
combate com os moinhos de vento, precisa ser suplantada e substituída pela figura do homem
pensante capaz de agir transformadoramente sobre a realidade de tal forma que lhe seja
possível viver nela com dignidade.
Aos professores – e não só, mas aos educadores de um modo geral, depois do estado – está
destinada a grande missão de tentar redirecionar e redimensionar a instituição escolar para a
sua função precípua, ou seja, para as questões da aprendizagem, mesmo que não se descarte
abruptamente a satisfação das necessidades sociais enfrentadas pelos aprendentes, pois estas
são, numa análise primária, o fator determinante da e para a ação do conhecimento. As
rupturas bruscas podem ser traumáticas, do mesmo modo que as transformações, no longo
prazo, podem padecer de descontinuidade por falta de encadeamento de ações.
A escola pública tem, na nossa sociedade, um papel relevante na socialização da maioria da
população despossuída de maiores bens financeiros e que representa, apesar disso, a mola
mestra do processo produtivo que “alimenta” o capital. Mas não se pode deixar de deitar um
olhar crítico sobre a existência, concomitante, da escola particular que é, a meu ver, uma
instituição segregadora social e, por que ter medo de afirma-lo, preconceituosa e racista, na
medida em que os pais preferem que sua prole permaneça, segundo eles por questões de
segurança, entre “os de mesma origem social”, de credo idêntico, da mesma elite social, que
entre os pobres, desprotegidos e oriundos de famílias desestruturadas. Assim começou na
Grécia antiga, assim se mantém nos dias atuais. A educação constitui, assim, um título de
legitimação do «status» do indivíduo de importância crescente (MACHETE,1969).
Essa dualidade escolar não é promotora de igualdade social e muito menos se propõe atender
ao preceito da “escola para todos” que, a meu entender e no contexto deste estudo preferiria
transformar, em perfeita harmonia com Nóvoa numa “escola onde todos aprendam”. Esta
mudança implica, entre outras coisas, compreender que não basta a universalização da
educação; é preciso oferecer a possibilidade garante da qualidade em aprendizagem e não
apenas nas ações compensatórias e/ou assistencialistas. Dentro dessa estrutura necessitamos
empreender uma outra luta, na qual o papel de guerreiro principal recai sobre o professor. Mas
antes de discutir a formação do professor em maior profundidade cabe apontar os seis
elementos que, segundo Nóvoa (2006, p.116) podem ser fundadores de uma nova concepção
política da educação:
1.º – Em vez de um centralismo legislador e reformador, políticas localizadas nas
escolas e nos seus lugares sociais de inserção;
2.º – Em vez da lógica desenvolvimentista do “capital humano”, uma Escola da
cultura, do conhecimento e da ciência;
3.º – Em vez de programas e modelos uniformes, a liberdade de organização e de
gestão das escolas, a diversidade curricular e a diferenciação pedagógica;
4.º – Em vez de programas e planos de emergência, um investimento sustentado e
coerente nas escolas, nos professores e nas redes de aprendizagem;
5.º – Em vez de processos burocráticos de recrutamento docente, uma escolha dos
melhores professores, baseada nas suas qualificações e nos projetos educativos das
escolas;
6.º – Em vez de um funcionamento às cegas, práticas regulares de auto avaliação e
de avaliação externa dos alunos, dos professores, das escolas e das políticas.
Não pretendo criar nenhum livro de receitas capazes de modificar, como num passe de
mágica, o ranço de séculos de práticas educacionais causado pela falta da constância na
atualização dos métodos de aprendizagem. Não quero, tão pouco, aplicar a fórmula como a
salvação das mazelas que a educação vem enfrentando. Não suponho apenas que este seja o
olhar certo a colocar sobre a realidade educacional. Não. O que pretendo é chamar para a
discussão dos problemas que são elencados e provocar a todos os envolvidos no processo até
que uma reação ao exposto seja posta em prática. Cada um destes seis elementos deverá nos
propiciar a oportunidade de uma discussão isolada – apenas para fins de compreensão – dos
demais. São seis propostas para que se faça uma reflexão que deverá estar na base da
reestruturação de um sistema educacional que se vem mostrando falido, incapaz de
proporcionar ao país o tipo de homem que ele necessita para alavancar a arrancada rumo ao
futuro que o século XXI representa. Para Nóvoa (2006, p. 113) “Temos de reinventar a Escola
se quisermos que ela cumpra um papel relevante nas sociedades do século XXI”.
Qual professor em qual escola?
É preciso insistir na ideia de que só é possível alcançar uma escola com educação de
qualidade com a presença de um professor bem preparado para o desempenho de sua função
docente. É questão de um passado bem recente, para minha infelicidade, o pensamento que
diz que para ser professor basta conhecer algumas teorias pedagógicas (ROSA &
SCHNETZELER, 2003, p. 27). Por esse raciocínio tacanho o conhecimento do conteúdo não
é importante e não deve ser valorizado. Mas quem é “da arte” sabe que para ensinar bem, com
qualidade, é necessário saber mais e melhor. Sendo assim, a formação inicial do professor
precisa ser o alvo principal de um cuidado específico e ter como ponto de maior capacidade
formativa um curso que seja voltado para essa finalidade e no qual a objetividade seja
preparar pessoas para se dedicarem ao magistério.
A formação do nosso pedagogo está muito mais propensa ao atendimento das necessidades de
outros setores – por exemplo, o empresarial – que o educacional, entendido como aquele
praticado no chão da escola. Mas não só. Hoje entendo muito melhor uma crítica que escutei
um dia – não recordo mais aonde, me perdoem o lapso de memória – em que era dito que o
maior erro das universidades que formam professores é o fato de não os acompanhar nos
primeiros anos de magistério do novo formado – tal qual a residência médica está para os
formados em medicina (CHAGAS, 1980). Os meus parceiros formadores que me respondam:
“Que é feito de nossos ex-alunos”? Ou ainda: “O que fazem, atualmente, esses formados”?
Não posso deixar de me inquietar permanentemente ante tal situação e questionar: “Se eles
estão inseridos no processo educacional, o que ensinam”? Não sabemos! Permitam-me fazer
uma imagem grotesca: Os recém-formados são jogados às feras tendo apenas como arma de
defesa a improvisação e a obediência cega a práticas viciadas que já encontram nos locais
onde são admitidos. E aquele famoso “professor crítico”? Perguntam bem...
Uma formação deformada
O nosso diploma, nos moldes da atual formação da qual participo, nada mais é que um bilhete
de acesso ao espetáculo, tal como qualquer outro bilhete para assistir o show de Jorge &
Mateus ou um jogo de futebol entre Flamengo e Vasco. No primeiro caso, as músicas dos
artistas são introjetadas pela via da repetição quase exaustiva, pelas “estações repetidoras”, à
qual somos submetidos e pelas rimas fáceis que dizem “exatamente” o que precisamos ouvir
ou assim imaginamos; no segundo caso, agimos mais por alienação – que pode beirar o
fanatismo perigoso – à qual somos levados como forma de esquecer problemas mais graves
que poderiam ocupar nossas mentes. Estamos, neste caso, mergulhados em um enorme dilema
– o dilema sendo aqui visto como qualquer coisa que não tem resposta certa e pronta ou
resposta errada (NÓVOA, 2007, p. 5) – o dilema é isso mesmo, uma dúvida que pode ser
argumentada nos dois sentidos. Por isso que lhes apresento a minha visão sobre a formação do
professor e fica imediatamente facultada a vossa interpretação desse conceito básico, desde
que percebam o conceito de formação como um dilema, ou seja, sem afirmações que mostrem
que esta ou aquela visão está mais certa ou mais errada que a outra: trata-se, a bem da
verdade, da necessidade de refletir sem maquineísmos sobre a temática e fazer os ajustes que
se julguem necessários à elevação da qualidade da formação que aí temos implantada.
Escutei recentemente a afirmativa que “os nossos ex-alunos estão fazendo bonito na
administração das escolas municipais”! Estas palavras foram proferidas por uma docente do
curso em que trabalho e que faz objeto de tantos dos meus questionamentos. Acredito, até por
também ter participado da formação desses novos professores, mas é sempre salutar
questionar: “o quão bonito eles estão fazendo? E em relação a quê, ou a qual situação”? Não
esqueçamos que, apenas para exemplificar, uma péssima administração pode ser considerada
uma obra prima em meio ao caos geral; ela poderá ser mesmo considerada revolucionária,
ouso dizer! Há que estabelecer critérios mínimos de qualidade para que possamos fazer a
nossa avaliação e, posteriormente, executar medidas necessárias à adequação do nosso
formar. Se o meu parâmetro é o caos, qualquer resultado sofrível me parecerá suficiente. É
nesse caso que devemos, entendo assim e assim pretendo discutir, elevar a nossa fasquia para
um nível mais elevado, a tal ponto que possamos pensar em competir para vencer e não
apenas para não sermos os últimos. Mesmo se a ilusão nos faz acreditar que estamos no
caminho certo, nada nos impede de parar para refletir. A falsa certeza de que estamos bem,
mesmo se temporária e localmente, é nossa inimiga e nos tolda o olhar crítico com o qual
dizemos formar nossos alunos. Como podemos formar para a criticidade estando nós distantes
dessa prática? Cabe bem, neste ponto, a afirmação de Martins (2010) sobre a mutilação dos
conteúdos em detrimento da forma na preparação dos futuros docentes.
As metodologias desenvolvidas durante a formação deste “virar de século” têm priorizado, no
dizer de Duarte (2010), um eixo neoescolanovista sob a capa do pós-modernismo, quase
invisível, e das teorias do aprender a aprender.
Apesar de longa, a citação das palavras de Nóvoa (2006, p.p. 117-8) nos parece de extrema
relevância pelo panorama geral que elas traçam da questão formativa do professor, e pelo
modo impregnado de realismo que muito nos ajuda a melhor discutir um processo que está
carente desse tipo de debate. Diz ele:
Tradicionalmente, insistiu-se na necessidade do professor ser detentor de um
conhecimento específico (de uma disciplina) e de um conhecimento pedagógico.
Julgo que ninguém negará a importância destes dois tipos de conhecimento: não é
possível ensinar aquilo que não se sabe e não é suficiente dominar uma determinada
matéria para ser capaz de a ensinar bem. Mas nem sempre se tem compreendido a
importância de um terceiro tipo de conhecimento, que podemos designar de
conhecimento profissional. Trata-se de um conhecimento que se constrói a partir das
intuições dos professores, das suas reflexões sobre a prática e da sua capacidade de
deliberar-em-ação. É um conhecimento difícil de definir, pois contém uma dimensão
teórica, mas não é só teórico, contém uma dimensão prática, mas não é só prático,
contém uma dimensão experiencial, mas não é apenas produto da experiência.
Acredito que estamos perante uma nova fronteira de sentido da profissão docente.
Infelizmente, os programas de formação de professores não têm prestado a devida
atenção a este aspecto, não têm dado aos professores os instrumentos necessários
para a análise das práticas, não lhes têm despertado esta necessidade que vai muito
para além de um esforço individual e que insere o conhecimento profissional num
esforço de debate e de partilha com os outros. A reflexão de cada um sobre o seu
trabalho é absolutamente essencial. Mas esta reflexão tem de ser continuada por um
diálogo com os colegas, na escola e noutros espaços de trabalho. Temos falado
muito da formação de professores, mas raramente nos temos interrogado sobre o
colectivo docente, sobre essa “competência colectiva” que é mais do que a soma das
“competências individuais”.
Falar desse novo conhecimento que Nóvoa sinaliza e ao qual denomina de “conhecimento
profissional”, apesar da indecisão que ele apresenta para conceitua-lo, é, no nosso entender,
falar de futuro, de novos fazeres necessários ao acompanhamento evolutivo da mente social
que se vem desenvolvendo de forma acelerada em função do contato com as novas
tecnologias e, principalmente, com a liberdade de pensar e externar os seus pensamentos
livremente. O nosso aluno que adentra a sala de aula pela primeira vez na sua vida não é mais
o mesmo aluno de séculos passados, este já é portador de saberes que estão mais ou menos
consolidados e aprendidos nem sempre da melhor maneira. É aí onde a intuição do professor
se faz necessária – o saber de profissão – para saber lidar com a diversidade e a ideologia que
impregna esse “saber” que o aluno carrega. Para tanto, o professor necessita ter plena
consciência de que seu ato pedagógico também representa uma ideologia. Nesse sentido,
precisa compreender que para construir uma consciência que se quer histórica precisamos
voltar nosso olhar com certa frequência para o passado de onde planejamos o presente no qual
pressagiamos o futuro que desejamos que a história possa vir a contar um dia.
Mas não é o profissional, sozinho, quem tem que construir essa consciência, os programas
formadores devem estar em concordância com estas diretrizes, estar aptos a instrumentalizar o
futuro docente para a superação desse antigo paradigma da quase imutabilidade dos métodos
formativos para que se justifique a nomenclatura de “professor reflexivo”. Essa tem que ser
uma prática resultante da permanente discussão dos modelos e métodos de formação para a
compreensão de um mundo em constante transformação.
O espaço concedido para este trabalho não comporta toda a análise que é possível fazer
apenas desta longa, porém necessária citação, quanto menos ainda a explanação e discussão
da obra grandiosa de Nóvoa. Nesse sentido e fugindo de estereótipos, não podemos concluir
este trabalho e dar por encerrada a questão. Ao contrário, tal como o próprio autor nos
convida, deixemos as portas escancaradas à reflexão, ao diálogo entre pares e entre nós e a
sociedade que também tem sua palavra a dizer, seja na escola ou fora dela, pois a educação
jorra por todos os poros do tecido social.
À guisa de considerações finais
Quem desejar fazer uma análise pessoal mais aprofundada sobre esta temática palpitante e
jamais concluída poderá buscar a leitura de autores como José Carlos Libâneo, Newton
Duarte, José Pacheco (Escola da Ponte), Iria Brzezinsk, Lauro de Oliveira Lima... para citar
apenas estes que são a minha base para as reflexões que venho produzindo nesta área.
Aqui eu deixo registrado o momento inicial de uma reflexão que promete prolongar-se por
muito tempo, por mais que eu tenha plena consciência da urgência de se fazer diferente no
quesito formação inicial do professor se desejarmos, no mais curto espaço de tempo possível
atingir um nível mais elevado de educação capaz de alavancar a arrancada final do país rumo
ao pleno desenvolvimento.
Não se trata de uma transplantação de modelo simples e curta, pois, a educação em Portugal
também padece do mesmo mal imposto pelo capital (a formação aligeirada para não ser
questionadora). Trata-se muito mais de aproveitar as reflexões propositivas que Nóvoa nos
traz e que na sua grande maioria encontram eco em diversos autores brasileiros, mas não,
infelizmente, nos “fazedores de políticas educacionais”.
A discussão precisa ser aprofundada e prosseguida para se tentar sensibilizar o maior número
possível de agentes formadores de professores para que eles tomem consciência da missão
que lhes é dada a desempenhar.
Referências Bibliográficas
CHAGAS, Valnir. O ensino de 1º e 2º graus: antes, agora e depois? (2. ed.) São Paulo:
Saraiva, 1980.
MACHETE. Rui. A origem social dos estudantes portugueses. In: A universidade na vida
portuguesa. Lisboa: I.S.C.E.F –Vol I – 1969.
MARTINS, L. M. O legado do século XX para a formação dos professores. IN: MARTINS,
Lígia Márcia, DUARTE, Newton. Formação de professores: limites contemporâneos e
alternativas necessárias. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2010.
NÓVOA, A. Educação 2021: Para uma história do futuro. Revista OEI - Revista
Iberoamericana de Educación - Número 49, Jan/Abr 2009. Acessada em 20/03/2014, no site:
http://www.rieoei.org/rie49.htm
_________ . Desafios do trabalho do professor no mundo contemporâneo. Palestra no
SINPROsp. São Paulo, 2007.
__________ . Entrevista concedida a Henrique Manuel S. Pereira e Maria Cristina Vieira.
Revista Saber e Educar nº 11, 2006, pp. 111–126.
PEREIRA, Henrique Manuel S. e VIEIRA, Maria Cristina. Entrevista: pela Educação, com
António Nóvoa. Porto/PT: Repositório da Escola Superior de Educação de Paula Frassinetti:
Revista Saber (e) Educar nº11, 2006 (pp. 111 a 126).
ROSA, Maria Inês de Freitas Petrucci dos Santos & Schnetzler, Roseli Pacheco. A
investigação-ação na formação continuada de professores de ciências. Revista Ciência &
Educação, v. 9, n. 1, p. 27-39, 2003.