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8032 | Livro de Atas do 1.o Congresso da Associação Internacional das Ciências Sociais e Humanas em Língua Portuguesa
GT 74
Desafios do ensino superior nos países lusófonos –
contributos para o desenvolvimento
Buscando indicadores do desempenho das universidades na
construção das sociedades sustentáveis¹
Marcelo Ximenes A. Bizerril²
Resumo: Diversos autores e acordos internacionais têm remetido à universidade o compromisso com a
sustentabilidade do planeta. Nesse debate são citadas diversas ações possíveis no âmbito das atribuições das
universidades, no entanto as iniciativas em orientar e acompanhar o desempenho das universidades nesse
setor ainda carecem de discussão. No presente trabalho é apresentado um conjunto de indicadores que podem
auxiliar a universidade a auto avaliar seu desempenho no campo da sustentabilidade, agrupados em quatro
categorias: (a) A sustentabilidade na gestão da instituição; (b) Ações formativas de sustentabilidade voltadas
aos estudantes; (c) Ações de sustentabilidade com impacto na sociedade; (d) Sustentabilidade nos
documentos norteadores da instituição. É apresentado também um exercício de aplicação dos indicadores no
campus da Universidade de Brasília na cidade de Planaltina, Distrito Federal, Brasil.
Palavras-chave: sustentabilidade global; educação ambiental; 3a missão da universidade; qualidade na
educação superior; instrumentos de avaliação.
1. Introdução
Especialmente a partir da década de 1970, movimentos sociais e políticos ganham força movidos pela
degradação ambiental e a percepção de que o desenvolvimento tecnológico e científico não havia trazido os
benefícios esperados em termos de redução das desigualdades sociais e aumento da qualidade de vida de
todos. Desde então, a questão ambiental foi se estabelecendo na agenda das lideranças mundiais, sobretudo
da Organização das Nações Unidas (ONU). Ainda que pouco tenha se concretizado em termos de mudanças
concretas no modelo econômico mundial, muitas conferências e acordos foram realizados, de modo que a
temática da sustentabilidade é hoje um dos principais temas de interesse em nossa sociedade.
Dentre as diversas formas de compreensão da problemática ambiental, a busca por sociedades sustentáveis é
a que mais se aproxima de uma abordagem complexa da questão, e que busca mudanças radicais em termos
éticos e de valores para a humanidade. O ‘Tratado da Educação Ambiental para as Sociedades Sustentáveis e
Responsabilidade Global’ é um documento elaborado por educadores ambientais de oito regiões do mundo,
que foi publicado em 1992 e se tornou referência para a Educação ambiental, sobretudo na América Latina.
Dividido em diversos princípios e propostas de ações, o tratado defende que a educação deva atuar na
mudança do modelo de civilização vigente e que, para isso acontecer, a participação individual é
fundamental:
1. Citação do artigo: Bizerril, M.X.A. Buscando indicadores do desempenho das universidades na construção das sociedades
sustentáveis. In: Livro de Atas do 1.o Congresso da Associação Internacional das Ciências Sociais e Humanas em Língua
Portuguesa, Universidade Nova de Lisboa, pp. 8032-8041, 2015. Disponível em
http://www.omeuevento.pt/Ficheiros/Livros_de_Actas_CONLAB_2015.pdf
2. O autor possui graduação em Ciências Biológicas, mestrado e doutorado em Ecologia. Trabalha com formação de educadores no
ensino superior desde 1996 e é professor da Universidade de Brasília desde 2006. Tem experiência nas áreas de: Gestão do Ensino
Superior, Educação Ambiental, Ensino de Ciências, Comunicação Comunitária, Ecologia. Atua no Programa de Pós-graduação em
Ensino de Ciências e no Programa de Pós-graduação em Meio Ambiente e Desenvolvimento Rural. Sua produção acadêmica em
ecologia e educação distribui-se em artigos em periódicos nacionais e internacionais. Foi diretor do campus da Universidade de
Brasília em Planaltina-DF (Faculdade UnB Planaltina) de 2007 a 2012.
Livro de Atas do 1.o Congresso da Associação Internacional das Ciências Sociais e Humanas em Língua Portuguesa | 8033
Consideramos que são inerentes à crise a erosão dos valores
básicos e a alienação e a não-participação da quase totalidade
dos indivíduos na construção de seu futuro. É fundamental
que as comunidades planejem e implementem sua próprias
alternativas às políticas vigentes. Dentre essas alternativas está
a necessidade de abolição dos programas de desenvolvimento,
ajustes e reformas econômicas que mantêm o atual modelo de
crescimento, com seus terríveis efeitos sobre o ambiente e a
diversidade de espécies, incluindo a humana.
Considerando a forte demanda para que as universidades se envolvam mais aprofundadamente com as
questões sociais, diversos documentos e autores destacam a necessária contribuição que a universidade deve
dar à construção das sociedades sustentáveis (Toledo, 2000; Tauchen e Brandli, 2006; Sorrentino e
Nascimento, 2010). Dentre esses, podemos citar documentos no âmbito brasileiro como as Deliberações das
Conferências Nacionais do Meio Ambiente, o Programa Agenda Ambiental na Administração Pública (A3P)
do Ministério do Meio Ambiente, e a Política Nacional de Educação Ambiental, que incumbe às instituições
educativas, promover a educação ambiental de maneira integrada aos programas educacionais que
desenvolvem. No entanto, a demanda é também de caráter internacional, como visto na Declaração de
Talloires e na Carta Universitária para o Desenvolvimento Sustentável, que contém recomendações sobre as
responsabilidades para um campus universitário sustentável, elaborados e endossados por grande número de
universidades.
A ‘Declaração de Talloires para um Futuro Sustentável’ foi assinada em 1990, por reitores e líderes de 22
universidades representativas de todos os continentes, e propõe 10 ações para a promoção da sustentabilidade
que incluem educar para a sustentabilidade e cidadania, estabelecer uma cultura institucional e práticas de
sustentabilidade nas universidades e atuar fortemente para um futuro sustentável junto a sociedade, ao ensino
básico e às demais universidades. Em 2010, 421 universidades em 52 países haviam assinado a declaração.
Segundo Sáenz (2014), desde 1986 se realizam fóruns nacionais e subregionais a respeito da relação
universidade e ambiente nos países da América Latina.Em 2007 foi constituída a Aliança de Redes
Iberoamericanas de Universidades pela Sustentabilidade e o Ambiente (ARIUSA), com a missão de
promover e apoiar a cooperação acadêmica, científica e a coordenação de ações no campo ambiental entre as
universidades ibéricas, latinoamericanas e caribenhas. Em 2012 foi lançada a Aliança Mundial de
Universidades sobre Ambiente e Sustentabilidade (GUPES, em inglês), uma iniciativa do Programa das
Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) com o objetivo de promover a integração dos aspectos
ambientais e da sustentabilidade no ensino, na pesquisa, na participação comunitária e na gestão das
universidades, assim como aumentar e melhorar a participação dos estudantes em atividades voltadas ao
desenvolvimento sustentável dentro e fora das universidades.
Uma boa visão do estado da arte e dos desafios para a ambientalização das universidades Iberoamericanas
pode ser encontrada no livro “Visões e Experiências Iberoamericanas de Sustentabilidade nas
Universidades”, publicado em decorrência do 3o Seminário Internacional de Sustentabilidade na
Universidade, realizado em 2011. Em outro estudo, Tauchen e Brandli (2006) analisaram 42 universidades
localizadas no Reino Unido, Estados Unidos, Canadá, Portugal, Alemanha, Espanha, França e Nova
Zelândia, além de quatro estudos de caso no Brasil, a respeito das suas práticas de gestão ambiental. As
ações sustentáveis que mais apareceram foram o controle do consumo e reuso da água e o programa de
reciclagem-gestão de resíduos (22%), seguidos do treinamento e sensibilização dos alunos (19%), a auditoria
ambiental (16%) e o diagnóstico dos impactos significativos para o ambiente (16%).
Um dos exemplos europeus destacados pelos autores é o projeto Ecocampus³, que é um sistema de
gerenciamento ambiental direcionado às IES, que permite que faculdades e universidades sejam
reconhecidas por suas práticas de sustentabilidade ambiental. Alguns dos exemplos-chave da
sustentabilidade, considerados pelo projeto, são: contribuir para o desenvolvimento da ética sustentável;
controlar os transportes dentro do campus; primar pelo bem estar, saúde e segurança; reduzir os desperdícios;
aprimorar as atividades ambientais curriculares; monitorar o consumo de água e energia; e motivar a
3. Site do Projeto ligado à Universidad Autonoma de Madrid: http://www.uam.es/servicios/ecocampus/especifica/
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participação da comunidade local e regional (Tauchen e Brandli, 2006).
Outros exemplos pontuais de ações que tem sido desenvolvidas em termos da ambientalização da instituição
são as edificações sustentáveis (como é o caso, por exemplo, da Tongji University, na China4) e a gestão de
resíduos (por exemplo o programa USP Recicla, da Universidade de São Paulo5). Mas um importante desafio
ainda é a inclusão da sustentabilidade como eixo transversal nos cursos de graduação (Layrargues e
Dourado, 2011) e nas ações da gestão das universidades, sobretudo nas dimensões da democracia,
participação e diálogo interdisciplinar (Toledo, 2000). Nesse sentido, ao pensar o papel das universidades na
viabilização da sustentabilidade, Sorrentino e Nascimento (2010) sugerem ações em termos de ensino,
pesquisa, extensão e gestão, com destaque para o papel formador da instituição:
Nesses processos de formação, permanentes e continuados, a
Educação Ambiental nas Instituições de Ensino Superior pode
cumprir dois papéis: o de educar a própria instituição, para ela
incorporar a questão ambiental no seu cotidiano – a
ambientalização da Instituição, presente em todas as suas
atividades de ensino, pesquisa, extensão e gestão; e o de
contribuir para educar ambientalmente a sociedade – um
projeto ambientalista de país e as ações educadoras com ele
comprometidas (p.25).
Um reforço a esse ponto de vista é a já citada “Declaração de Taillores sobre os Papeis Cívicos e
Responsabilidade Social do Ensino Superior”, que reconhece e defende aspectos essenciais a cidadania
planetária como:
As universidades têm a responsabilidade de promover entre
seu corpo docente, alunos e funcionários o senso de
responsabilidade social e um compromisso com o bem social,
o qual, acreditamos, é a base para o sucesso de uma sociedade
democrática e justa. (...) A universidade deve usar o processo
de educação e pesquisa para responder às, servir e fortalecer
suas comunidades para a cidadania local e global. A
universidade tem a responsabilidade de participar
efetivamente do processo democrático e dar voz aos menos
privilegiados.
No presente trabalho é apresentado um conjunto de indicadores que visam auxiliar a universidade a auto
avaliar seu desempenho no campo da sustentabilidade. É apresentado também um exercício de aplicação dos
indicadores no campus da Universidade de Brasília na cidade de Planaltina, Distrito Federal, Brasil.
2. Proposta de indicadores para a sustentabilidade na universidade
A partir de um conceito amplo de sustentabilidade (que inclui aspectos econômicos, sociais, ecológicos,
culturais e políticos), foram elaborados 39 indicadores distribuídos em quatro aspectos: a. A sustentabilidade
na gestão da instituição; b. Ações formativas de sustentabilidade voltadas aos estudantes; c. Ações de
sustentabilidade com impacto na sociedade; d. Sustentabilidade nos documentos norteadores da instituição.
Com o objetivo de promover a reflexão dos papéis das universidades e das ações realizadas e potenciais em
termos de sustentabilidade, o questionário parte da percepção dos gestores a respeito do desempenho
institucional nos diversos itens propostos. Para cada subitem foi solicitado que os gestores assinalassem a
intensidade com a qual o tema é tratado em sua instituição: fraca, média, forte. Ao final de cada aspecto
havia espaço para considerações diversas que explicassem as opções assinaladas.
4. A Universidade se apresenta como um “campus verde” - http://www.tongji.edu.cn/english/
5. O programa é coordenado pela Superintendência de Gestão Ambiental da USP, e atua em 6 campi da USP - http://www.sga.usp.br/
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O primeiro grupo de indicadores foi composto por 12 itens associados a ideia de sustentabilidade na gestão,
o que incluiu investimentos tecnológicos e de infraestrutura adequados ao uso racional dos recursos naturais,
como também aspectos da organização da universidade como uma comunidade democrática em que se
pressupõe a participação e a realização humana no trabalho. Os indicadores foram os seguintes:
a. A sustentabilidade na gestão da instituição
a.1. Uso sustentável de energia
a.2. Uso sustentável de água
a.3. Compras sustentáveis
a.4. Edificações sustentáveis
a.5. Tratamento de resíduos
a.6. Conservação da biodiversidade no campus
a.7. Democracia na tomada de decisões
a.8. Estímulo à participação
a.9. Fortalecimento do senso de pertencimento a uma comunidade
a.10. Qualidade de vida no trabalho
a.11. Condições de trabalho
a.12. Satisfação dos trabalhadores
O segundo grupo de indicadores também foi composto por 12 itens, todos associados a ideia de
sustentabilidade nos processos de formação dos discentes, tanto por meio do acesso à temática
sustentabilidade no currículo e na participação em projetos, quanto por meio da vivência de experiências
promotoras do fortalecimento da cidadania plena. Os indicadores foram os seguintes:
b. Ações formativas de sustentabilidade voltadas aos estudantes
b.1. Presença da temática sustentabilidade nos cursos
b.2. Presença da temática sustentabilidade nas disciplinas
b.3. Qualidade de vida do estudante
b.4. Acesso a participação em projetos ambientais
b.5. Estímulo à participação na gestão universitária
b.6. Estímulo à autonomia
b.7. Estímulo à responsabilidade
b.8. Prática da interdisciplinaridade
b.9. Prática do diálogo da ciência com outros saberes
b.10. Tratamento da realidade local
b.11. Tratamento da realidade regional
b.12. Tratamento da realidade global
O terceiro grupo de indicadores também foi composto por 12 itens associados a ideia de sustentabilidade
com impacto na sociedade, considerando as relações que a universidade estabelece com diversos setores da
sociedade, como também o esforço na execução de projetos e publicações que aproximem a sociedade da
universidade. Os indicadores foram os seguintes:
c. Ações de sustentabilidade com impacto na sociedade
c.1. Projetos ambientais de pesquisa e extensão no âmbito local
c.2. Projetos ambientais de pesquisa e extensão no âmbito regional
c.3. Organização/participação em atividades comunitárias
c.4. Relação com escolas
c.5. Relação com produtores rurais
c.6. Relação com movimentos sociais
c.7. Relação com empresas
c.8. Relação com populações tradicionais
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c.9. Relação com governo
c.10. Relação com ONGs
c.11. Relação com instituições públicas
c.12. Produção de publicações de acesso ao público leigo
O quarto e último grupo de indicadores foi composto por apenas 3 itens associados a ideia da presença da
sustentabilidade como tema orgânico da instituição. Foram consideradas a presença do tema nos documentos
que orientam a filosofia de trabalho do campus como também as condições da estrutura administrativa para
viabilizar ações de sustentabilidade. Os indicadores foram os seguintes:
d. Sustentabilidade nos documentos norteadores da instituição.
d.1. Presença da sustentabilidade no Projeto Político Pedagógico Institucional ou Estatuto
d.2. Destaque dado à sustentabilidade dentre as missões da instituição
d.3.Existência de estruturas administrativas voltadas à sustentabilidade no organograma
A proposta da pesquisa foi apresentada aos gestores da Faculdade UnB Planaltina, diretor e vice-diretora, e o
formulário foi entregue para que fosse respondido em um período de 10 dias. Diretor e vice-diretora
responderam o formulário separadamente. No momento da devolução do formulário foi realizada uma
entrevista de avaliação do processo na qual foram discutidos aspectos do instrumento de auto avaliação
proposto e da opinião dos gestores a respeito do papel da atividade em promover a reflexão sobre a
sustentabilidade na instituição.
3. Aplicação do instrumento e o caso da Faculdade UnB Planaltina
A Universidade de Brasília (UnB) foi fundada em 1961, associada ao processo de construção de Brasília, a
nova capital do país. Em 2005 foi publicada uma proposta preliminar de expansão da universidade em três
novos campi, a serem construídos em um raio de cerca de 50 km do campus central. O campus da UnB na
cidade de Planaltina se chama Faculdade UnB Planaltina (FUP) e teve seus trabalhos iniciados em 2006, com
apenas dez professores contratados e dois cursos de graduação em funcionamento. Atualmente abriga 100
professores, cerca de 100 funcionários, e atende a mais de 1400 estudantes, ocupando uma área construída
aproximada de 11.500 m² em meio à vegetação savânica de cerrado.
A FUP apresenta uma organização matricial, onde todos os professores e servidores técnico-administrativos
são vinculados à faculdade, não havendo departamentos. Os professores são agrupados em cinco áreas de
conhecimento (Ciências Exatas, Ciências da Vida e da Terra, Educação e Linguagens, Ciências Sociais e
Humanas, Ciências Sociais Aplicadas e Tecnologia), cada uma expressa por um fórum, e podem atuar
livremente em mais de um dos quatro cursos oferecidos pela unidade, todos de caráter interdisciplinar:
Licenciatura em Ciências Naturais (diurno e noturno), Licenciatura em Educação do Campo, Bacharelado
em Gestão Ambiental e Bacharelado em Gestão do Agronegócio.
O processo de instalação do campus e da sua estrutura administrativa e pedagógica é descrito em mais
detalhes por Bizerril e Le Guerroué (2012) e Bizerril (2013, 2014).
As respostas ao questionário revelaram uma percepção positiva de atuação da FUP no campo da
sustentabilidade por parte de seus gestores, com 54% (n=78) de indicações de “forte” para a atuação da
instituição (fig. 1). As indicações de atuação fraca foram citadas em 13% dos casos, associados aos temas
gestão, relações com a sociedade e documentos institucionais (fig. 2). As opiniões dos gestores variaram em
relação aos quesitos, mas de modo pouco discrepante. Em 36% dos itens os gestores fizeram marcações
idênticas, e diferenças extremas, ou seja, quando um considerou a atuação forte e o outro, fraca no mesmo
item, ocorreram apenas em três ocasiões (7%).
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Fig. 1. Totalização da percepção dos gestores em relação aos 39 indicadores de sustentabilidade em sua
instituição.
Fig. 2. Totalização da percepção dos gestores em relação aos indicadores de sustentabilidade em sua
instituição, em cada um dos quatro grupos temáticos.
Os gestores compreendem que o campus apresenta condições favoráveis para a sustentabilidade em
decorrência da sua estrutura de cursos e do perfil da equipe de profissionais existente. No entanto,
reconhecem a necessidade de melhorar a articulação entre as ações existentes, sobretudo no que diz respeito
à formação dos estudantes e as relações com a sociedade. Fortalecer a já existente coordenação ambiental é
uma ação destacada.
A estrutura básica do instrumento foi aprovada pelos gestores, com sugestões específicas para o
aprimoramento, especialmente no que diz respeito à inclusão de explicações mais detalhadas no conceito de
sustentabilidade que orienta o questionário. Ambos concordam que o questionário foi eficiente em provocar
a reflexão sobre os rumos do campus nos diversos setores relacionados à sustentabilidade.
Um aspecto destacado foi a constatação da necessidade de fortalecer a perspectiva interdisciplinar e de
autonomia aos trabalhos dos servidores técnico-administrativos. Outro ponto recorrente na fala dos gestores
é a discussão sobre as condições de trabalho e os entraves da gestão pública na universidade como, por
exemplo, a falta de autonomia: “A sustentabilidade requer compromisso e o compromisso requer condições
que superem os entraves na forma como a gestão pública é hoje. Há uma carga muito grande sobre os
acadêmicos que estão na gestão, sem estrutura adequada de apoio.”
Na perspectiva dos gestores, uma parte significativa do tempo é dedicada à gestão do cotidiano e ao
enfrentamento da burocracia, restando menos tempo que o desejado para discussões estratégicas sobre o
papel da universidade e a inovação na gestão.
fraco
médio forte
0
5
10
15
20
25
30
Forte
Média
Fraca
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4. Considerações
O ensino superior está, na atualidade, diante de grandes desafios, marcadamente o de redefinição de suas
missões e o de organizar o repentino processo de expansão, sem precedentes na história, decorrentes da
necessidade de todos os países em se inserirem na “sociedade do conhecimento” (Bernheim e Chauí, 2008;
Mello, 2011). Como é destacado por Sobrinho & Goergen (2006, apud Mello, 2011):
a formação profissional [em nível superior] não pode limitar-
se a uma simples capacitação técnica, nem ser um meio de
progresso individual de propriedade privada, nem tampouco
uma adesão acrítica das urgências do mercado ou um
instrumento de ‘economização’ da sociedade, [mas deve
conter] um valor público como parte da formação integral das
pessoas e, por isso, tem de orientar-se à construção e
realização da vontade e dos objetivos centrais de uma
sociedade democrática (p. 127-28).
Do quadro de expansão e aumento da complexidade da educação superior no contexto mundial emerge a
discussão a respeito da qualidade e das formas de sua aferição e controle.Há diversas formas de estabelecer
critérios de avaliação de qualidade. No caso das universidades, os rankings, por exemplo, despertam tanto
interesse quanto controvérsia ao servirem de maneiras de classificar as instituições de ensino superior. Os
críticos desses rankings contestam as diferenças nos pesos dados a determinadas funções das universidades
(por exemplo, publicações em periódicos internacionais) em detrimento de outras (por exemplo, o impacto
social das universidades). Na América Latina, os métodos de acreditação são também criticados pela sua
conotação política e de imposição de ideologias, por representarem, na maioria dos casos, um viés norte-
americano e eurocêntrico.Verifica-se que ainda que haja algum consenso em torno da necessidade de haver
um processo de assegurar a qualidade nas universidades, há diversas controvérsias a respeito dos modos de
estabelecer essa avaliação, a ponto de alguns documentos afirmarem “a impossibilidade de se chegar a um
único conjunto de critérios padronizados de ‘qualidade’ aplicável a todos os países e localidades” (Mello,
2011, p.139).
Para muitos, o resultado prático mais contundente dos rankings é o fortalecimento de uma cultura de
competição, onde as instituições passam a ter como meta o aumento na pontuação em detrimento da
discussão sobre quais as metas e ações que a instituição e a comunidade acadêmica desejam ver
estabelecidas. Assim, a instituição passa a almejar (e comemorar) um posto mais destacado no ranking,
aceitando passivamente os critérios impostos. A ausência dessa crítica faz com que a universidade invista
mais tempo buscando adequar as ações da instituição para o atendimento aos rankings, do que provocando
reflexões internas que visem transformações para a melhoria do atendimento da universidade às suas
próprias missões. Essa análise encontra fundamentação na discussão que Lima (2005) estabelece a respeito
do processo de subordinação que a educação se encontra em relação à economia, no modelo neoliberal:
A educação passa a integrar-se numa indústria de serviços,
num mercado de fornecedores em competição. Espera-se, que
em termos de resultados e de processos de gestão a educação
possa, finalmente, adaptar-se cabalmente à “economia do
conhecimento” e enfrentar com sucesso os requisitos da
competitividade internacional. Para esse efeito é necessário
que ensine a competir, o que só será possível se, ela mesmo,
aprender a competir através da prática da competição. A
emulação e a rivalidade são os valores centrais, a partir de
uma base individual e psicológica que é transferida e
generalizada para as organizações, os países e as instituições
internacionais (Lima, 2005, p.81).
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Há duas contradições em estabelecer indicadores mensuráveis de sustentabilidade para universidades. O
primeiro diz respeito aos argumentos apresentados nos parágrafos anteriores, pois a sustentabilidade seria
vista como mais um item a promover a competição entre as universidades, e a inibi-las a exercer sua
liberdade acadêmica e autonomia institucional, características essenciais à manutenção da importância das
universidades nas sociedades. Darcy Ribeiro, fundador da Universidade de Brasília, sugere o papel almejado
para a universidade pública brasileira a partir de diversas expressões que utiliza no livro “Universidade para
que?” quando se refere à universidade tais como: “Casa da Consciência Crítica”, “Casa dos Saberes”,
“Centro de Cultura”, “Casa em que a nação se pensa a si mesma como problema e como projeto”,
“instituição que possa ousar pensar diferente que os governos”, e até mesmo,“repensar outra vez tudo (...)
como só uma universidade pode fazer.” (Ribeiro, 1986).
Da extensa análise feita por Mello (2011) a respeito do papel das universidades na sociedade contemporânea,
pode ser destacado o trecho em que defende que:
Não seria exagerado afirmar que o principal desafio
universitário, na atualidade, será aquele de encontrar pontos
de equilíbrio entre as demandas do setor produtivo e da
economia e as demais oriundas de outros setores da sociedade,
sem abdicar, em quaisquer dos casos, da autonomia relativa
que, como corporação (no sentido constitutivo de sua
especificidade), deve manter diante de seus legítimos
interlocutores (Mello, 2011, p. 151).
Nesse sentido, Pedrosa (2014) entende a autonomia como a capacidade de decidir livremente sobre uma
missão específica e organizar a universidade adequadamente para atendê-la. Assim, as estratégias, estruturas,
interrelações e processos que melhor apoiem determinada missão institucional devem ser escolhidos e
ajustados pela própria estrutura de governança das universidades, com o apoio e participação da comunidade
acadêmica e da sociedade. Enfim, a opção da universidade pela sustentabilidade deve figurar dentre as
formas de exercer sua autonomia como resposta às demandas sociais da atualidade, e não no simples
atendimento de regras pré-estabelecidas por agências reguladoras da qualidade do ensino superior.
A segunda contradição diz respeito ao próprio significado da sustentabilidade no mundo contemporâneo. A
construção dos significados atribuídos a ideia de sustentabilidade vem sendo feita sobretudo fundada na ideia
de reestruturação ou ruptura com o modelo vigente, pautado na competição, no individualismo, na busca por
vantagens, na falta de envolvimento com os projetos coletivos, na desigualdade, modelo este que nos levou a
atual situação de calamidade socioambiental. De outro lado, busca-se na sustentabilidade outro modelo em
que a participação, o envolvimento, o diálogo e o sentido de pertencimento comunitário e responsabilidade
global sejam preponderantes nas decisões sobre um futuro comum a todos (Sorrentino et al., 2014). Nesse
contexto, a universidade precisaria optar pela sustentabilidade como forma de ser agente da transformação
que se deseja para o planeta. Agindo assim, a universidade promoveria, nos sujeitos que dela participam, o
sentimento e as condições para, como aponta Freire (2002), compreender o mundo e suas contradições para
poder transformá-lo, e não apenas constatá-lo.
Qualquer uma das duas análises nos leva à conclusão que a sustentabilidade na universidade precisa ser
estimulada, pensada e realizada a partir das condições e características de cada instituição, e não meramente
aferida ou quantificada para fins de avaliação.
Nesse trabalho a opção por autoavaliar é consciente e sustentada pelos diversos argumentos associados às
contradições impostas pelos sistemas de aferição de qualidade na educação superior e às contradições entre a
ideia de aferição e a prática da sustentabilidade. A diversidade de indicadores serve para promover a reflexão
sobre a complexidade do tema, mas também oferecer possibilidades de ação para as universidades com as
condições que dispõem. Essas ações incluem tanto as imediatas quanto as que devem ser planejadas a médio
e longo prazos. Outrossim, é reconhecido que o tema requer reflexão e que a proposta apresentada no
presente estudo constitui-se em um ponto de partida ainda carecendo de amadurecimento para sua aplicação
em escala mais ampla.
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5. Referências bibliográficas
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