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SOLIDÃO
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Solidão não é a falta de gente para
conversar, namorar, passear ou fazer
sexo... Isto é carência.
Solidão não é o sentimento que
experimentamos pela ausência de
entes queridos que não podem mais
voltar... Isto é saudade.
Solidão não é o retiro voluntário que a
gente se impõe, às vezes, para
realinhar os pensamentos... Isto é
equilíbrio.
Solidão não é o claustro involuntário
que o destino nos impõe
compulsoriamente para que revejamos
a nossa vida...
Isto é um princípio da natureza.
Solidão não é o vazio de gente ao nosso
lado... Isto é circunstância.
Solidão é muito mais do que isto.
SOLIDÃO
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Solidão é quando nos perdemos de nós
mesmos e procuramos em vão pela
nossa alma... As pessoas que amo,
minhas amizades mais antigas, já se
habituaram aos meus longos
silêncios,próprios de um sujeito
atarefado. Percebo que a mais recente
aquisição da minha alma ainda não.
Mas aproveito para dizer a todos os
amigos que, apesar do que se comenta,
não sumi porque me acho envolvido
romanticamente com alguém; afora
alguns sentimentos de outrora que
jamais se arrefecerão, e que as pessoas
estão fartas de conhecer como meu
tema favorito, na expressão divertida
que costumo utilizar. Já experimentei
de tudo nesta vida, desde uma paixão
avassaladora até aquele Amor, com
letra maiúscula, de eternidades.
Atualmente, porém, procuro apenas me
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deixar conduzir por mares calmos e
sem pressa, acolhendo a sugestão
daquela que me dizia, sempre, que eu
devia brincar de ser feliz. E a felicidade
dispensa atropelos, porque não é algo a
se forçar, alcançar ou procurar; e sim
um olhar novo sobre tudo à nossa volta.
Calhou de eu receber novamente o
texto acima, já um velho conhecido, no
mesmo instante em que parei para
responder a determinadas inquietações,
manifestadas em tantas mensagens a
mim endereçadas, inclusive de celular.
Nada é por acaso. Espero,
carinhosamente, que ele sirva de ponto
de partida para clarear alguns
pensamentos alheios. Mesmo exausto,
me dedico de corpo e alma a essa
tarefa; chateado, porque recebo agora
afirmações de abandono, impregnadas
de mágoa e de tristeza. Sendo que
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jamais olvidei quaisquer pessoas que
tenham se legitimado a fazerem parte
da minha vida.
A verdade é que pressinto o quanto a
assola o mesmo tipo de solidão que me
afligia antigamente. Não a solidão de
corpos ausentes, de não estar junto a
pessoas; porque você poderá encontrá-
las aos borbotões por aí, neste
mundinho superlotado. Falo de uma
espécie particular de solidão, que
ganha vida própria e se torna nossa
criatura doméstica e inacessível. E que
nós alimentamos sempre com ideias
equivocadas e distorcidas, não
existindo quem a mude ou a afugente
do coração. Há, de fato, alguns seres
especiais que servem de facilitadores
da nossa autodescoberta, fortalecendo-
nos para combater essa falsa e ridícula
sensação de pequenez diante de um
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universo ao redor sempre em expansão.
Pois o universo, não importa o quanto
ele cresça, estará sempre da largura do
abraço das almas seguras e
autoconscientes, que se sabem
extraordinárias no lugar e nas
condições em que estão. Alcancei a
força libertadora dessa compreensão
em circunstâncias especiais da minha
vida. Mas isso é uma conquista pessoal,
não que dependamos necessariamente
de alguém para isso.
Porém, um dos motivos de a minha
solidão ter nascido comigo, de eu ter
precocemente optado pelo
distanciamento emocional, que limitava
as possibilidades da minha experiência
de vida, era justamente o medo de
voltar a produzir inquietações na esfera
íntima de outrem. Demorei muito para
conciliar a oportunidade de aprendizado
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que os outros representam com a
responsabilidade espiritual por tudo
aquilo que projetamos, sendo que
acabei até reprisando a condição de
meus temores quando era mais jovem.
Quem me conhece não de perto, mas
intimamente, costuma dizer que eu sou
de produzir fortes apegos. E isso não
era muito prazeroso no passado, porque
cheguei a vivenciar apegos
extremados, exigentes e caprichosos, e
minha resposta acabava sendo a de
fazer o caminho inverso e me afastar,
provocando mágoa. Daí pode imaginar o
meu desconforto ao perceber essa sua
ansiedade excessiva e injustificável,
ainda nos primeiros passos da nossa
amizade, até fantasiando situações
inexistentes de esquecimento. Isso é
ruim e doloroso para você mesma. E
doloroso pra mim, que a quero tão bem
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e não desejo ser o vetor desse
sofrimento totalmente desnecessário.
Hoje eu me sinto liberto, pois aprendi a
me relacionar responsavelmente e sem
culpas. Mas eu permaneço nesse
cuidado vigilante de nunca acessar o
universo de alguém para restringi-lo, e
sim para ampliá-lo. Pois o que você ama
em mim, esse carisma que tanto
iluminou os seus olhos, é simplesmente
a porta convidativa que se abriu para o
horizonte de si mesma. Quero que você
me veja sempre assim, como alguém
que veio para ajudá-la a projetar o seu
melhor. E quando eu dispuser de um
tempinho, conversaremos sim. Sem
agonias de espera, pois há um mundo aí
que já era seu antes de eu existir nele;
e que apenas desbravaremos juntos em
momentos de amizade e alegria,
brindando e brincando de felicidade.
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FÁTIMA IRENE PINTO