UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO VEZ DO MESTRE
MATERIAIS E TÉCNICAS – CO-PARTÍCIPES NA AUTO-DESCOBERTA?
Por: Carolina Maria Guimarães Gomes Lopes
Orientador:
Professora Fabiane Muniz
Rio de Janeiro
Março/2004
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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO VEZ DO MESTRE
MATERIAIS E TÉCNICAS – CO-PARTÍCIPES NA AUTO-
DESCOBERTA?
Apresentação de monografia à Universidade Cândido Mendes como condição prévia para a conclusão do Curso de Pós-Graduação “Lato Sensu” em Arteterapia em Educação e Saúde. Por: Carolina Maria Guimarães Gomes Lopes.
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AGRADECIMENTOS
À Deus, sem o qual nada seria possível.
À minha família, base do que sou.
Ao meu namorado, Osvaldo, por todos os nossos
momentos.
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DEDICATÓRIA
À todos que fazem da Arteterapia uma profissão e que diariamente fazem-na ser reconhecida.
À todos que não se cansam de buscar continuamente novos materiais e técnicas para que o seu trabalho seja melhor desenvolvido.
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EPÍGRAFE
Auto-aceitação (Osho, do livro TakeEasy)
“Ouvi contar: Um rei foi a seu jardim e encontrou árvores,
arbustos e flores definhando e morrendo. O carvalho disse que estava morrendo porque
não podia ser tão alto quanto o pinheiro. Voltando-se para o pinheiro, descobriu que
estava murchando porque era incapaz de dar uvas como a parreira.
E a parreira estava morrendo porque não podia desabrochar como a roseira.
Então ele encontrou uma planta, o amor-perfeito, florida e viçosa como nunca.
Indagando, recebeu essa resposta: ‘Assumi que quando você me plantou, você
queria um amor-perfeito. Se quisesse um carvalho, uma parreira ou uma roseira você as teria plantado’.
Então pensei: ‘Como não posso ser outro além de mim mesmo, tentarei sê-lo da melhor maneira possível’.
Você está aqui porque esta existência necessita de você tal como você é, senão outra pessoa estaria aqui. Você está preenchendo algo muito essencial, muito fundamental, como você é. Ele o criou.
Veja só o respeito que o Universo tem por você. Você foi escolhido. Você está aqui para contribuir com a sua fragrância para a existência.
Simplesmente olhe para você mesmo. Você só pode ser você mesmo... não há possibilidade de ser outra pessoa.
Você pode apreciar isso e florescer, ou condenar isso e definhar”.
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RESUMO
Esta monografia aborda a utilização de vários materiais e técnicas que podem
ser utilizados em Arteterapia, mostrando a co-participação deles junto ao
arteterapeuta e ao indivíduo atendido pelo mesmo. É uma pesquisa bibliográfica, mas
clara e concisa.
O trabalho começa abordando a Arte e sua história, incluindo o momento em
que foi utilizada para trabalhar o fazer artístico na psicopatologia.
É possível encontrar neste trabalho, a partir dos materiais e das técnicas, suas
respectivas histórias e seus valores terapêuticos, não deixando de especificar os três
tipos (gráficos, plásticos e cênicos) existentes. Colagem, pintura, desenho,
modelagem, escultura, sucata, papier machê, expressão corporal, psicodrama, teatro,
contos de fada, mitologia e música são os materiais e técnicas que fazem a parte
principal desta monografia.
Não podendo deixar de acrescentar um assunto que é de fundamental
importância no desenvolvimento arteterapêutico, a Criatividade, pode e deve ser
desenvolvida em qualquer idade, pois em Arteterapia não existe o certo ou errado, o
belo ou feio, o que existe é arte e a partir dela trabalhamos com a Educação e com a
Saúde.
Com esta monografia é possível perceber que cabe ao arteterapeuta trazer ao
encontro de seu cliente as diversas possibilidades de desenvolvimento do trabalho e
que sempre é possível encontrar novas possibilidades. Só a partir da testagem de
materiais e técnicas será possível alcançar o objetivo da Arteterapia, ou seja, a auto-
descoberta do sujeito, enquanto ser único que é, atingindo seu equilíbrio.
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METODOLOGIA
Baseada no enfoque teórico, considerando idéias e conceitos, fundamentados
a partir do levantamento de referências bibliográficas em livros, reportagens, sites e
comprovação real na prática arteterapêutica.
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SUMÁRIO INTRODUÇÃO 9
CAPÍTULO I - A ARTE E SUA HISTÓRIA 11
CAPÍTULO II - OS MATERIAIS E TÉCNICAS, SUAS HISTÓRIAS E SEUS
VALORES TERAPÊUTICOS 13
CAPÍTULO III – CRIATIVIDADE – UMA ARTE SEM IDADE 47
CONCLUSÃO 50
BIBLIOGRAFIA 53
9
INTRODUÇÃO
O tema deste trabalho é o uso das artes enquanto possibilitador da cura, que
remonta ao final do século XIX. Desde então, vários profissionais no Brasil e no
mundo, vêm utilizando o “fazer artístico” dos seus pacientes como referência para o
diagnóstico.
A integração arte e ciência permitem a atuação ampla junto às pessoas
interagindo emoção e razão, intuição e percepção, permitindo uma profunda atuação,
onde os indivíduos “mergulham” no seu eu mais íntimo e trazem à tona o material a
ser trabalhado.
A Arteterapia é um processo terapêutico que utiliza vários recursos de
expressão artística e corporal para auxiliar as pessoas a se conhecerem e conhecerem
o mundo em que vivem, tendo em vista alcançar a harmonia, a integridade da
personalidade, a maturidade psíquica através da experiência emocional e sensória.
Com estas informações é possível oportunizar transformações numa visão holística,
ou seja, do ser humano por inteiro.
Ela pretende ativar a criatividade de maneira livre, mas direcionada ao
crescimento e desenvolvimento. Trabalhando a criatividade, o indivíduo entra num
mundo sem fronteiras e limites de maneira livre e espontânea. A arte aqui não requer
uma preocupação estética, o objetivo é somente o de possibilitar e facilitar a
comunicação, o que importa na Arteterapia é o significado do que se faz, o
simbólico. É o indivíduo que dá o seu próprio resultado. Um símbolo é uma forma de
energia psíquica que se manifesta através das imagens. A energia que está contida no
símbolo vem do inconsciente e, através das técnicas expressivas, é trazida para o
consciente onde é trabalhada.
A palavra tem significado exato, mas o símbolo não é óbvio, ele traz alguma
coisa viva, intensa e enigmática. São difíceis de serem verbalizados, porque se
expressam por pontos de semelhança entre coisas diferentes. As imagens fazem essa
ponte. Para que as imagens se tornem conscientes, diversos materiais e técnicas
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expressivas são utilizados para facilitar a compreensão do significado do símbolo.
Por eles, as imagens simbólicas vão ganhando significado e este processo vai
permitir que cada indivíduo que experencie, viva mais plenamente, através de um
processo de individuação. Para Jung (s.d.), processo de individuação é a capacidade
que uma pessoa tem de tornar-se si mesma, inteira, única, indivisível e distinta de
outras pessoas.
Cada manifestação artística mostra quem a produziu, como o fez, o que
pensa, sente, deseja ou sofre. É um trabalho que eleva a auto-estima, a concentração,
diminui a fadiga e aumenta a interação entre as pessoas.
Empresas e comunidades, também aplicam as técnicas da Arteterapia como
agente agregador nos processos das relações humanas, promovendo o crescimento
intra e interpessoal, encontrando um amplo uso na prevenção, recuperação, expansão
da saúde e educação.
O objetivo deste trabalho é mostrar através da utilização de materiais e
técnicas diversificados, que o indivíduo consegue descobrir o seu íntimo mais
profundo de forma criativa e melhorando automaticamente o seu bem-estar físico,
psíquico e mental.
11
CAPÍTULO I A ARTE E SUA HISTÓRIA
A arte sempre gerou um fascínio em todas as civilizações. Ela é criação
humana com valores estéticos de beleza, equilíbrio, harmonia e revolta, que
sintetizam as suas emoções, sua história, seus sentimentos e sua cultura. Apresenta-
se de várias formas como a plástica, a música, a escultura, o cinema, o teatro, a
dança, a arquitetura, etc. Pode ser vista ou percebida pelo homem de três maneiras:
visualizadas, ouvidas ou mistas (audiovisuais), sendo que hoje em dia muitas obras
de arte permitem que o apreciador participe dela. O artista precisa da arte e da
técnica para comunicar-se.
O homem criou objetos para satisfazer as suas necessidades práticas, como
ferramentas para cavar a terra e os utensílios de cozinha. Outros objetos foram e são
criados por serem interessantes ou possuírem caráter instrutivo. O homem cria a arte
como meio de vida, para que o mundo saiba o que pensa, para divulgar as suas
crenças ou a dos outros, para estimular e distrair a si mesmo e aos outros, para
explorar novas formas de olhar e interpretar objetos e cenas.
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O que vemos quando admiramos uma arte depende da nossa experiência, do
nosso conhecimento, da nossa disposição no momento, da imaginação e daquilo que
o artista pretendeu mostrar.
O mundo moderno ainda não dedica tempo suficiente para a criação e por isso
perde uma ótima oportunidade de estruturar o pensamento e desenvolver a
consciência, através das imagens e formas criadas, deixando de usufruir uma
excelente forma de comunicação, libertadora e propulsora, desperdiçando muitos
potenciais.
A arte possibilita o acesso a estados alterados de consciência, propiciando que
o indivíduo, entre num estado de entrega e se conecte a uma força maior, a energias
criativas e curativas, e assim, livre das defesas do ego e traga à tona conteúdos
adormecidos, emoções conflituosas que se despotencializam ao tomarem forma. As
emoções se refletem em cada célula do nosso corpo e por isso as imagens simbólicas
ativadas podem mexer no sistema celular, o que pode fazer com que a mente, num
estado alterado de consciência esteja mais receptiva a novos insights1. Ativando e
reforçando por um período essas experiências curativas, podemos transformar nossos
bloqueios físicos, medos, traumas e pensamentos limitadores ampliando nossa
criatividade e talentos.
O recurso da arte aplicada à psicopatologia originou-se quando Jung passou a
trabalhar com o fazer artístico, em forma de atividade criativa e integradora da
personalidade. “Arte é a expressão mais pura que há para a demonstração do
inconsciente de cada um. É a liberdade de expressão, é sensibilidade, criatividade, é
vida” (Jung, 1920).
1 Compreensão repentina, em geral intuitiva, de suas próprias atitudes e comportamentos, de um problema, de uma situação.
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CAPÍTULO II
OS MATERIAIS E TÉCNICAS, SUAS HISTÓRIAS E
SEUS VALORES TERAPÊUTICOS
Sonhos...
Eu me conto em segredo, em verdades ocultas que sempre soube, mas que não podia saber.
E neste jogo ardiloso, vou descobrindo, surpreso e perplexo, aquilo que sou, mas não podia ser.
Mas sempre fui sem poder saber! Eu sonho!
Um dia sonhei que era EU e quando acordei descobri que
vivia um NÂO-EU Mas, em que enrascada danada eu tinha me metido, pois
vivia no sonho e sonhava na vida”. Victor R. C. da Silva Dias (s.d.)
Dar forma a sentimentos, percepções, sensações, fantasias, desejos e
pensamentos tornam possível o trabalho arteterapêutico. Através de sua criação, o
paciente pode revelar seus segredos, seus medos, partilhar e elaborar suas percepções
e sentimentos. Para isso é necessário estar de frente com o material produzido e
consigo mesmo, tendo o arteterapeuta como seu companheiro de descoberta, o
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paciente vai se dando conta dos seus conteúdos mais internos. É possível integrar e
estruturar sua própria experiência, criando seu próprio eu e participando de sua cura.
“A arteterapia usa a arte como meio de expressão pessoal para comunicar
sentimentos, em vez de ter como objetivo produtos finais esteticamente agradáveis a
serem julgados segundo padrões externos... essa forma de usar a arte pode ser
importante para muitas pessoas, estejam elas mergulhadas em problemas sérios ou
apenas desejando explorar a si mesmas e a seus sentimentos, usando a arte como
meio” (Liebmann, 2000).
Segundo Philippini (s.d.), “o processo arteterapêutico é um trajeto, marcado
por símbolos2, que assinalam e informam sobre estágios da jornada da individuação
de cada um”.
O estudo do material e da técnica é muito importante no atendimento em
Arteterapia. Qualquer que seja o material usado no setting3terapêutico - secos ou
úmidos - têm propriedades que mobilizam emoções e sentimentos de maneiras
diversificadas em cada indivíduo, podendo-se obter a partir da apresentação dos
grafismos uma significação quanto ao tipo de linha e da consistência do traçado ou
alguns sinais, como elementos indicativos de estados emocionais internos. De acordo
com Eliezer (s.d.), “cada atividade, cada material, cada cor, forma, movimento, som
tem uma possibilidade de atuação no sujeito”.
O material elaborado não tem por finalidade duplicar o mundo real. O
paciente cria uma realidade alternativa, que através da transformação em “objeto de
arte”, pode ser compartilhada com outras pessoas. A limpeza ou a sujeira surgida na
produção constitui-se em provocações excelentes, a manifestação de sentimentos
pessoais de ajuste a situações complexas de adaptação ao instrumento, e
conseqüentemente ao meio cultural.
2 É a energia psíquica que existe em nosso inconsciente em estado adormecido. 3 Local onde se faz o atendimento em Arteterapia.
15
É muito importante que o arteterapeuta saiba analisar o valor terapêutico do
material e da técnica para cada cliente, pois eles podem penetrar de maneira mais
rápida nos conflitos internos e inconscientes do indivíduo. É imprescindível que o
arteterapeuta tenha experiência no manuseio dos materiais e técnicas oferecidos para
que o material específico possa ser facilitador para cada situação. Conhecer diversos
recursos plásticos possibilita dar base às escolhas do indivíduo, evitando
desnecessárias frustrações.
Ao selecionar ou sugerir o material ou a técnica, deve-se levar em conta a
importância dele para a intenção criativa do paciente e a habilidade necessária para o
manuseio com sucesso. Cada material/técnica tem suas próprias potencialidades e
limitações na maneira de utilizá-los e o seu manuseio tende a manifestar
determinados sentimentos e reações. É importante estar atento às potencialidade
simbólicas dos materiais, pois elas respondem cognitivamente e emocionalmente.
Deve-se estar atento às dimensões variáveis dos materiais (complexidade na
execução, atividade estruturada ou não, resistência ou fluidez dos materiais, se
precisam ser mediados ou não, entre outros fatores) e com relação à interação com os
materiais/técnicas, se eles se situam predominantemente no nível sensório/motor, no
perceptual/afetivo ou no cognitivo/simbólico e como pode a criatividade estar
presente e ser incentivada em cada um desses níveis.
A execução do trabalho está ligada diretamente às características físicas dos
materiais e técnicas, mas não restritos a elas. O arteterapeuta deve ser capaz de usar
sua criatividade e poder propor novas formas de uso. É necessário saber quando dar
instruções e quando deixar e/ou incentivar o paciente a fazer suas descobertas. O
ambiente físico e psicológico deve ser propício para que a liberdade se torne
verdadeiramente possível, encorajando a experimentação, sem que o sujeito se
preocupe com críticas e culpas sobre o que é expresso, a fim de que a experiência
seja a mais enriquecedora possível.
É essencial ajudar o paciente a descobrir e desenvolver seu estilo pessoal e
desenvolvendo com isso sua noção de ego. O arteterapeuta não deve interferir na
evolução do processo criativo e valorizar a autenticidade da obra. Ele deve ser
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presença facilitadora, respeitando o paciente, seu mundo e seu trabalho de arte como
extensão dele.
Conhecendo a forma, poderemos observar o grau de organização, a clareza, a
originalidade, a apropriação para a idade, a estrutura: linhas, formas, cores, ocupação
do espaço, o movimento, o equilíbrio. Esses elementos serão considerados em termos
de desenvolvimento, estilo pessoal e significado simbólico para o sujeito que criou.
Não basta só olhar para a obra, mas ela precisa ser vista dentro do contexto em que
foi criada, a seqüência em que foi realizada, as associações verbais e não verbais, a
linguagem corporal expressa pelo indivíduo, cada aspecto é rico em mensagens e
deve ser levado em consideração para conhecer o paciente. Privilegiando a
linguagem da forma, a descrição atenta e sincera do que é visto, a fim de que quem
produziu a obra possa ter insights, sendo capaz de integrar e dar significado aos
conteúdos emergentes.
Às vezes um trabalho menos estruturado é mais facilitador para o processo
terapêutico, em outras o trabalho dirigido focaliza determinados aspectos,
envolvendo-o numa atividade com importância para si.
Segundo Urrutigaray (2003), “as múltiplas possibilidades encontradas agem
de maneira estruturante, fazendo de quem se utiliza desses materiais à aquisição de
experiências libertadoras, por retirar bloqueios fornecedores de inibições,
preconceitos, isolamentos. Promovendo a busca pelo aprimoramento em direção ao
autoconhecimento, em função de se ater ao resgate dos valores essenciais ao homem,
agentes de sua transformação, como sentido de aprendizagem”.
O arteterapeuta deve ser observador, visando a sugerir caminhos apropriados
à cada pessoa, cuidando para que a experiência seja livre e enriquecedora,
possibilitando a conscientização e apropriação do seu modo de agir e do seu
processo.
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É a combinação de fazer e sentir que dá o poder à Arteterapia. Utiliza os dois
hemisférios do cérebro, a sensação, percepção, intuição, sentimento e pensamento,
dizendo respeito ao indivíduo como um todo, possibilitando integração e síntese.
2.1. Gráficos
Referente à grafia, representado por desenhos ou formas.
2.1.1. Colagem
A história da arte da colagem em suas origens e antecedentes, é talvez tão
antiga quanto a civilização chinesa. Ela foi desenvolvida na China e posteriormente
difundida para o Ocidente. É difícil prever o seu início, mas sabe-se que uma das
primeiras experiências foi a utilização de elementos da natureza como por exemplo a
pedra inserida em outra superfície.
No séc. XV os pintores portugueses desta época também exploraram esta
técnica, assim como os alemães do séc. XVI e os ingleses do séc. XVIII, que
realizaram calendários e trajes postais em relevo. No séc. XIX eram utilizadas
aplicações de colagem sobre fatos de personagens teatrais com vestes antigas.
Na primeira metade do séc. XX, a colagem reapareceu e desenvolveu-se
juntamente com o nascimento das escolas de pintura e foi experimentada nas terapias
em saúde mental.
Segundo Max Ernest4 (s.d.), considerado um mago da visão, a colagem é um
instrumento hipersensível e rigorosamente exato, semelhante a um sismógrafo, capaz
de registrar a quantidade exata das possibilidades de felicidade humana em qualquer
época.
Em Arteterapia, essa técnica é estruturante, que pode ser realizada por
materiais diversos. É um recurso rico, pois o indivíduo planeja, analisa, fica atento,
4 Artista alemão integrante dos movimentos Dadaísta e Surrealista. Criou na pintura um processo equivalente à escrita automática por meio da “frottage”, decalcando texturas de tecidos, folhas, madeira,etc., completando-as na forma de paisagens e de seus estranhos (1891-1976).
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concentrado, integrado e paciente, além de ser divertida e ajudar a liberar a
imaginação. Permite o integrar, o organizar e o agregar. Desenvolve a análise, a
atenção, concentração e organização, possibilitando a estruturação pessoal e o
reasseguramento. Classifica-se como material de vínculo. É vinculado ao
pensamento, elemento ar. Estimula a racionalidade. Figuras recortadas de revistas e
coladas de uma outra forma, geram novas imagens, com novo significado. Rasgar,
recortar, colar e sobrepor transformam esta técnica em uma atividade multiplicadora.
Para Urrutigaray (2003), “o trabalho com colagem feito através da escolha de
imagens selecionadas em revistas, jornais, ou em outros, acrescido da tarefa da
ordenação das mesmas, pode trazer para o ambiente arteterapêutico um bom clima
para o estabelecimento de vínculos mais firmes para com as futuras tarefas realizadas
com outros materiais. Pois por se tratar de uma tarefa pela qual ‘o atuar como um
artista’ fica como que simulado, a ansiedade por não se considerar um artista reduz-
se, possibilitando uma entrega mais confiante ao trabalho proposto”.
A partir da grande quantidade de imagens utilizadas numa mesma criação
pode-se perceber o grau de defesas utilizadas pelo indivíduo.
Oaklander (1980), diz que “a colagem pode ser utilizada como experiência
sensorial e também como manifestação emocional. A colagem é sentir e ver figuras”.
“A sua arte conta o que você sente, vê e sabe. Você pode formar uma figura
daquilo que sente” (OAKLANDER, 1980).
Constitui numa técnica que também atua sobre o padrão: ordem constituída
no cultural e coletivo (a figura escolhida) – recorte do que interessa, a
particularização ou subjetivação (foco especial da atenção) – destruição do antigo e
coletivo, mas sendo a construção inerente a uma necessidade e interesse de um
sujeito – para uma nova forma como interpretação individual dos aspectos culturais.
Refazendo-se o esquema de ordem, desordem e nova ordem (URRUTIGARAY,
2003).
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Materiais para suporte da colagem são papelão, folha A3, isopor, papel pardo,
E.V.A., caixas, cerâmicas, madeiras, papel toalha, papel higiênico, ofício, cortiça,
tecidos...
Materiais para colagem e a execução são papéis variados, fotos, gravuras de
revistas, papel de pão, jornal, filtro de papel, retalhos de tecido, botões, palitos de
picolé, folhas secas, lantejoulas, algodão, E.V.A., lã, barbante, fitas, flores, forminha
de docinho, grãos, purpurina, farinha colorida, cola, tesoura...
2.1.2. Pintura
Segundo Pain (2001), no curso da história, o homem nunca deixou de pintar.
Essa continuidade mostra que a arte é sempre reflexo de sua época e de suas
preocupações.
A pintura é sempre uma questão de escolha que se faz ao nível da
composição, das linhas, dos ritmos, das cores dominantes, dos valores, dos
contrastes, do movimento, do estilo, por um lado ligados à época e, por outro, à
personalidade de seu autor. Entretanto, a técnica apresenta no mínimo três
obstáculos: o limite das superfícies, o limite da valoração das tonalidades e o das
cores.
“Recordar-se que um quadro... é, essencialmente, uma superfície plana recoberta de cores reunidas em uma certa ordem”.
M. Denis sobre os princípios estéticos de Gauguin (1890)
“É interessante observar em uma pintura a posição dos personagens uns em
relação aos outros, a composição que liga seus gestos e/ou seus olhares, como os
objetos, ligados ou não entre eles por outros elementos” (Pain, 2001)
Cada técnica terapêutica possui suas leis próprias, o seu valor terapêutico
especial. A pintura não tem por objetivo dialogar com o pincel. Quando a pintura
flui, ocorre o mesmo com a emoção e os sentimentos, pois a técnica é libertadora. A
esfera afetivo-emocional está mais abrangente, pois as pinceladas lembram o fluxo
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respiratório, a vida. O material é fluído, pastoso, líquido, rígido. Por ser fluído e
expansivo, favorece a liberação, o soltar-se e a ultrapassar limites e barreiras
internas.
De acordo com a tipologia junguiana e as funções reguladoras da consciência,
a pintura é sentimento, elemento água. Na relação dos sentidos e as funções da
consciência, o sentimento está relacionado à audição.
Pintar é criar uma superfície (Pain, 2001). A cor, a tonalidade e a fluidez se
prestam muito bem a estados de sentimento.
As tintas geralmente utilizadas são guache, aquarela, anilina, óleo, acrílica e
nanquim e pintura a dedo. A tinta guache exige maior controle de movimentos, libera
emoções e incentiva a imaginação. A aquarela, devido a sua leveza, e o uso
obrigatório da água, mobiliza ainda mais o lado afetivo, sendo indicada para pessoas
muito racionais e com dificuldade afetiva, contra-indicada para deprimidos. É de
difícil manuseio e impossível de serem consertados os erros surgidos por seu uso.Por
apresentar característica de ser transparente, não oferece poder de cobertura, mas
fornece efeitos interessantes de luz, sombra e transparência.É a quantidade de água
presente no pincel que determinará a variação dos tons, dos mais suaves aos mais
fortes. Segundo Urrutigaray (2003), “psiquicamente, poder retirar o excesso de
conteúdo investido na projeção, (como imagem criada), proporciona uma regressão
de libido necessária ao movimento de introspecção e de reintegração da emoção
exteriorizada. Facilitando a compreensão mais próxima de um controle da quantidade
de energia descarregada, que seja favorável à interação com a situação apresentada.
A possibilidade de poder reparar e de ter como contornar um erro estabelecido pelo
material, reabastece o sujeito de estímulos positivos e renovadores de expectativas
mais favoráveis a sua estima pessoal. A aprendizagem decorrente auxilia e estimula o
seu desenvolvimento. Amenizar os erros é um estímulo a aceitação de dificuldades
pessoais, aprendendo a conviver com elas”.
Devido à dificuldade de fazer figuras por ser muito aguda, a anilina é ótima
para pessoas que tem medo de perder o controle das coisas. A tinta óleo, é
21
recomendada para pessoas com depressão, pois possibilita maior equilíbrio da
situação. O nanquim, quando puro é de fácil controle, mas exige agilidade e
sensibilidade. Quando usado com água, é mais fluída, exigindo muito mais
habilidade, atenção e concentração.
A pintura a dedo é bem líquida. Segundo Oaklander (1980), “a pintura com os
dedos e o trabalho com argila possuem ambos qualidades táteis e cinestésicas
semelhantes. A pintura com os dedos é uma dessas atividades que infelizmente estão
restritas a crianças de pré-escola. Ela possui muitas qualidades boas. É calmante,
fluente. Dá a possibilidade de fazer desenhos e figuras e logo em seguida apagá-los.
Não experencia o fracasso e nem necessita habilidade”. Por apresentar-se com uma
textura grossa é um material de uma excelente performance tátil, pois possibilita o
ajuste ou coordenação motora necessária frente à dosagem a ser usada no trabalho,
de maneira que a quantidade de tinta saída do recipiente esteja em acordo com o
resultado pretendido (URRUTIGARAY, 2003). É um material que favorece o
retorno a estados regressivos.
Assim como a pintura com os dedos provocam algumas sensações
importantes, a pintura com os pés também permitem novas sensibilidades, pois os
pés são muito sensíveis, sendo que na maior parte do tempo eles encontram-se
aprisionados dentro de sapatos, onde não podem sentir nada. É uma experiência
relaxante, sensual e prazeirosa, além de proporcionar sensação de calma e prazer.
Quanto mais expressão, mais autoconhecimento e mais autoconfiança. Com a
pintura, trabalha-se a estruturação e a área afetiva emocional, chegando ao equilíbrio
das emoções. E quanto mais diluída for a tinta, mais emocional é o resultado.
Em Arteterapia, o arteterapeuta, nunca deve fazer a técnica ao mesmo tempo
em que os pacientes. Durante todo o tempo, o arteterapeuta deve seguir os diferentes
processos de elaboração das imagens e perceber as atitudes de cada um, assim como
escutar monólogos e diálogos dos mesmos. A pintura, assim como o desenho, pode
ser livre, de cópia, ou dirigida.
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A consigna5 de pintura livre é pouco explícita, pois a liberdade é uma
condição que se conquista passo a passo e mantém-se com muito esforço e
vigilância. A própria demanda de ser repentinamente mestre é contraditória em si e
compreende-se facilmente que pode surpreender e mesmo gerar a angústia. O
arteterapeuta observa como cada um responde à primeira consigna, seja executando
uma pintura abstrata, uma imagem estereotipada como a reprodução de uma
caricatura, ou cenários geométricos. Sendo encorajados e tranqüilizados, os pacientes
poderão sentir prazer desde o início, o que é específico desta técnica. A variação
entre o desejo de expressão e a realização está ligada aos problemas de
representação.
Para as pessoas mais resistentes podem-se propor exercícios de “corte da
realidade”, dando a consigna de isolar um lugar, trabalho feito através de uma
pequena janela feita com papel, depois representar o espaço escolhido sobre a folha.
Espaço este que será relativamente restrito, se a “janela” for suficientemente
distanciada do olhar. Os resultados bastante impressionantes das composições assim
obtidas, mesmo pelos iniciantes, podem provocar o interesse pelos problemas da
composição.
Com a pintura o sujeito será capaz de expressar ansiedade, solidão,
frustração, autodepreciação, confusão sexual e medo.
2.1.3. Desenho
“Desenhar é deixar uma marca, enquanto pintar é criar uma superfície”
(PAIN, 2001), logo a forma está ligada ao movimento, enquanto a cor é somente
sensação. A forma evoca o gesto, constitui o objeto. Partindo da necessidade de
deixar essa marca, o homem, no curso da sua história, nunca cessou de desenhar e
pintar. Mesmo que os objetivos perseguidos possam parecer ter variado no tempo, a
arte reflete uma época e seus questionamentos. A cor pode faltar, mas não se pode
evitar ter uma forma, visto que tem sempre um limite.
5 Estabelecido, determinado.
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Segundo Eliezer (s.d.), “a técnica do desenho inicialmente utilizada apenas
projetivamente, tem na terapia pela arte papel de desenvolver a esfera cognitiva, o
logus6, além da capacidade de abstração”.
Classifica-se por material duro e dependendo do material, pode ser de
transição (giz de cera seco e lápis aquarela). É vinculado ao pensamento, elemento
ar. Estimula a racionalidade.
O desenho é ordenador e esta é a melhor forma de representação da imagem.
É usado em quase todas as técnicas arteterapêuticas. O que é valorizado é o
significado e não a forma. Por ser mais restritivo ajuda na ordenação, na disciplina,
na concentração e no limite.
Através do desenho acontece a expressão dos sentimentos e respostas em
curvas e linhas. É um treino para que a pessoa se solte, expressando os sentimentos
que a oprimem, para deixar emergir os bons sentimentos.
Para Urrutigaray (2003), “ao transmitir segurança reforça a sensação de
equilíbrio e de bem estar facilitando o encontro com o material projetado”.
No desenho com pincel atômico, as cores encantam, pois são vibrantes, mas é
preciso segurança, pois não pode haver erro nos traços ou nas linhas. Permite
traçados diferenciados. Para Urrutigaray (2003), “constitui uma técnica onde suas
cores por serem transparentes, dão uma impressão de formas diluídas. ... material que
expande e libera afetos e impulsos, também mantém sobre controle pessoal a sua
utilização, os seus resultados, dando uma orientação à manifestação dos afetos e
impulsos arquetípicos”.
No desenho com giz de cera, os gizes de cera também são usados a propósito
de relaxamento. São extremamente facilitadores, podendo até ser utilizados em telas.
Suas cores realçam qualquer trabalho sem muito esforço. “Relativamente fácil de
manusear, de controlar, constitui-se num excelente material a ser utilizado com
6 O princípio de inteligibilidade, a razão.
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crianças por ser resistente, assim como também com adultos, por lhes proporcionar
mais firmeza e segurança no seu manuseio. Por ter grande capacidade de amolecer
com o calor das mãos de quem o utiliza, este material transforma-se num meio de
fusão de forças. E apesar de sua aparência dura e firme, ele se ajusta à intenção e a
pressão de seu condutor; dotando-o simbolicamente de sensações de domínio do
real” (URRUTIGARAY, 2003). Esta técnica pode ser mais elaborada,
acrescentando-se ao desenho uma tinta; o que poderá mobilizar o desenhista a
aperfeiçoar seu trabalho. Os pacientes têm a escolha de utilizarem os gizes de cera
com ou sem tinta, de acordo com seu ritmo, seu momento.
No desenho com nanquim alguns pacientes encontram prazer em desenhar
com caneta de pena. É preciso que haja uma adaptação à caneta e à pena e uma
adequação aos gestos bem como à pressão da mão e dos dedos.
O desenho em quadrinhos é a história em imagens, na qual os heróis e
cenários se transformam. Pequenos textos ajudam a comentar a história contada em
cenas seqüenciais.
O trabalho à distância com aquarela é uma proposta bem interessante, porque
trabalhar à distância, com as folhas no chão, utilizando pincéis grossos colocados na
ponta de longos bastões, libera os movimentos, pois o desenho não requer precisão.
Pode-se propor um trabalho com modelo natural diante do objeto a ser tratado com
as folhas no chão, utilizando-se duas tonalidades. Com a mesma técnica podem ser
sugeridos outros temas como o traço das próprias iniciais do nome. Para tornar essas
tarefas bem interessantes é necessário que se tente várias vezes, o que permitirá
analisar os processos pelos quais o paciente vem passando para expressar-se.
2.2. Plásticos
Relativos à arte de plasmar, isto é, modelar, que tem a propriedade de adquirir
determinadas formas; matéria sintética, dotada de grande maleabilidade e facilmente
transformável. Para Urrutigaray (2003), “os materiais tridimensionais constituem-se
de um poderoso recurso para a manifestação de experiências interiores,
25
principalmente os mais maleáveis. A possibilidade de fazer emergir algo que está
plasmado de modo bidimensional traz a criação para um estado de concretização
visual distinta e necessária para a compreensão de significados”.
2.2.1. Modelagem
Em modelagem o principal material usado é a argila, também chamada de
barro. Foi empregada desde sempre, em quase todas as partes do mundo, na forma de
remédio e por vezes, mesmo como alimento. A argila tem um forte poder de
absorção de energias maléficas. Terra curativa de dom purificador, vivificante e
compensador, propriedade essencial da natureza. Podemos chamá-la de Mãe Terra,
com a qual o contato restabelece e realça a alegria de viver, a capacidade de se tomar
consciência do processo atual de vida, tanto ao nível físico como psíquico, do mundo
consciente e do universo inconsciente. As coisas vêm à tona, sobem para a superfície
e se concretizam na modelagem.
Mediante a modelagem, a obra nasce do nada. Apenas com as mãos o
indivíduo vai dando forma a uma figura. É um volume sem forma sobre o qual as
mãos, os dedos do criador dão voltas, gesticulam, às vezes apertam, outras parecem
acariciar. Pouco a pouco surge uma forma indefinida, depois vão aparecendo os
detalhes.
A argila está ligada a nosso universo cotidiano. Ela é símbolo de nascimento,
de vida e de morte, classificando-se por material regenerador. É vinculado à
sensação, elemento terra que é estrutural, o qual ajuda no processo de estruturação do
sujeito, mostrando através das formas criadas o conteúdo simbólico das suas
dificuldades. Estimula os sentidos (visão, olfato, audição, tato e paladar).
Quando construímos modelos, estruturamos nossos pensamentos. Um modelo
é sempre um molde de alguma coisa e por isso possui um propósito.
Com a argila nossos afetos se projetam muito mais espontaneamente que em
qualquer outro material modelável tal como os materiais sintéticos. Ela é um suporte
a nossos afetos, é estruturadora e por ela é possível dar forma concreta ao nosso
26
inconsciente. A flexibilidade, maleabilidade e versatilidade permitem maior
expressão. Aproxima a pessoa de seus sentimentos, oferecendo uma ponte entre seus
sentidos e sentimentos. Dá forma ao imaginário, sendo importante analisar como o
indivíduo se comporta diante dela. É por tudo isso que inicialmente é necessário
manusear a argila sem nenhuma pretensão, apenas criando um contato, observando
suas reações quando manifestada livremente. Quando há esta relação com material, o
processo de modelagem, propriamente dito, ocorrerá sem dificuldade. O sujeito
aproveita a experiência anterior adaptando a um trabalho livre, arriscando-se até na
criação de personagens, animais, etc.
A manipulação deste material provoca no sujeito diversas posturas, desde a
mais profunda rejeição, dada às questões regredidas que o material aporta, ligadas
aos aspectos referentes ás sujeiras internalizadas, adquiridas tanto pela dimensão
cultural como àquelas resultantes de experiências pessoais tidas como inaceitáveis,
não adequadas, desprezíveis, insuportáveis, e odiosos. Como pode ao contrário
provocar estados de profundo alívio e prazer pela possibilidade de exteriorizar
sentimentos, quanto por permitir o manuseio de uma matéria tão próxima as nossas
raízes simbólicas (URRUTIGARAY, 2003).
Cabe ao arteterapeuta, após a observação, tornar consciente ao sujeito, a sua
resistência diante desta atividade. O arteterapeuta através desta técnica propõe o
afinamento da percepção das sensações táteis e a utilização de instrumentos somente
enquanto ajuda a um trabalho elaborado. Ele conduz o sujeito a confrontar-se com o
“princípio da realidade”. Diante daquilo que foi fabricado e o que foi imaginado, o
arteterapeuta sustenta as leis da matéria, seja ele argila, massa de modelagem, massa
caseira, enfim qualquer outro tipo. Para que esta construção aconteça, o arteterapeuta
precisa intervir antes do término da sessão. Do mesmo modo, a ajuda ao sujeito que
se coloca diante do material e até mesmo de sua tentativa de criação, deverá
acontecer em tempo que ele possa realizar uma peça que recomponha este
sentimento antes do término da sessão.
A modelagem supõe a construção de elementos com materiais diferenciados,
obtidos a partir da coordenação entre alguns gestos, em geral, repetidos, e seus
27
resultados bem definidos. Consiste em uma construção de representações complexas
realizadas a partir da combinação dos elementos não-significativos, mas
significantes.
Na modelagem o paciente projeta sobre seu próprio corpo, fragmentado,
imaginário, desequilibrado. A imagem da massa corresponde à imagem do objeto
total, permite todas as possibilidades que um objeto tem de fazer-se ver. Esta
atividade poderia ser definida como aquela de um corpo que faz um outro corpo.
A marca do gesto é menos precisa, a função da imagem não está diretamente
ligada à forma, mas à composição das formas e das sobreposições das trajetórias.
Segundo Eliezer (s.d.), “a modelagem permite estimulação tátil, o trabalho
muscular, a estruturação postural assim como a capacidade de concretizar e de
planejar”.
A função da mão não predominante é de projetar a peça nos movimentos mais
energéticos da outra mão. Neste jogo podemos ver as funções das relações paternas e
maternas. Podemos trabalhar outros materiais na modelagem além da argila. A massa
plástica ou a plastilina são difíceis de serem usadas quando estão frias, necessitam de
mais trabalho das mãos para que fiquem mais maleáveis, tendem a grudar nas mãos e
é mais difícil de ser lavada. São bastante indicadas para crianças.
A massa de farinha pode ser comprada ou fabricada. Este material oferece um
tipo diferente de sensação para o tato, mas não substitui a argila. Pode ser trabalhada
utilizando instrumentos para modelar. Oferece boas experiências táteis e sensoriais.
A modelagem possibilita ao paciente uma relação direta da atividade com si
mesmo, pois ambos estão se transformando. Ele busca a forma na argila que
identifique a sua própria forma ou a que deseja.
Na realização da modelagem o paciente tem que respeitar o material,
antecipando os riscos, apurando sua concentração para adequar a técnica a seus
28
movimentos, organizando a sua construção. Tem liberdade de colocar os problemas
técnicos, isto demanda pedir ajuda ao mesmo tempo admitindo suas próprias falhas.
No processo criativo da modelagem, o paciente tem que observar e dispor de
tempo para a realização da escolha, o investimento prioritário. A evolução do
processo de construção possibilita a autocrítica e a se submeter à crítica de outras
pessoas. Nas atividades em que as possibilidades de participação, de transação, bem
como dos conflitos correspondentes aos participantes do grupo, são mais facilmente
trocados e discutidos entre eles, sendo melhor observado pelo arteterapeuta.
A modelagem permite que o interno se externalize e que o externo seja
trabalhado para que se internalize de modo diferente.
2.2.2. Escultura
Denomina-se escultura não somente a arte de modelar o barro, a cera, esculpir
madeira, pedra, fundir metal, construir em metal ou plástico, mas também aos
produtos finais de tal arte, uma das mais antigas praticadas pelo homem e uma das
mais disseminadas pelo mundo, desde épocas muito remotas. Escultura é a arte de
esculpir, imprimir, gravar. Surgida desde os tempos pré-históricos, a escultura teve
importante papel em todas as civilizações, tendo origens religiosas com a
representação de divindades e ídolos. A mentalidade primitiva tinha por crença o fato
que a representação de objetos ou mesmo seres vivos significava a posse desse objeto
ou ser, assim como a participação de seus poderes e até mesmo a submissão do
objeto ou ser à vontade do criador de sua escultura.
É técnica de representar seres e objetos, reproduzindo-lhes as formas em
materiais sólidos e em três dimensões. Esses volumes obedecem à lei da gravidade,
achando-se em oposição a outros volumes, alternam-se com vazios, são dinâmicos ou
estáticos, conforme a vontade e o talento do escultor. A escultura deve ser concebida,
sobretudo como arte do tato e a emoção que uma estátua provoca tem raízes no
prazer de acariciar.
29
Classifica-se por material regenerador, sendo vinculado à sensação, elemento
terra. Estimula os sentidos (visão, olfato, audição, tato e paladar). Possibilita a
estruturação e a construção ao acrescentar e o desapego ao retirar partes. Libera
agressividade.
A escultura como concepção artística quer ser reprodutora de fins puramente
estéticos. Enquanto técnica arteterapêutica é facilitadora que visa mais uma forma de
estabelecimento de uma comunicação através de símbolos que são produzidos pelos
pacientes. Não busca a confecção de padrões (peças) belos esteticamente, mas sim
maneiras simples, criativas de expressão.
O paciente entra em contato com seus conteúdos mais internos e a partir daí
imprime, ou seja, marca o material oferecido.
A principal contribuição da escultura para o paciente é que por meio da
concepção de símbolos, ele não se sente tão ameaçado para expressar seus conteúdos
mais internos e que por vezes encontra-se bloqueado. O paciente faz uma
transferência através do símbolo que foi produzido, para expressar sentimentos,
frustrações, confusão, ansiedade, enfim, todos os seus conflitos que são pertinentes à
etapa que se encontra em sua vida. No momento em que ocorre esta liberdade de
expressão, ele começa a sentir-se mais confiante, mais aberto e em condições para o
crescimento.
Para a escultura deve ser usado o material em bloco, como por exemplo,
sabão em barra, sabonete, vela, argila ou esponja floral. Ao retirar partes do bloco
trabalha-se o desapego, o transformar, a frustração e a concentração. O erro pode ser
criativo.
2.2.3. Sucata
São objetos sem uso, aglomerados agora fora do contexto para o qual foram
criados, em uma nova forma, com uma nova função e um novo significado. É
vinculado à sensação, elemento terra e estimula os sentidos.
30
O trabalho com a sucata estimula a reconstrução, a criatividade, as
percepções, a atenção, a construção, a transformação, o concreto, o tridimensional e a
mudança.
A inovação a partir de algo já criado, com uma formatação já atualizada em
outra modalidade presente primeiro apenas no imaginário, para depois ser
materializada em outra forma, provoca estados de profunda virtualidade e de
criatividade. Onde as dimensões: caos – ordem – desordem – nova ordem conseguem
interagir sem provocar sensações de recusas, decorrentes das pressões de eliminação
de um determinado objeto, de destruição, de aniquilamento, viabilizando a projeção
destes conteúdos sombrios, provocadores de intensos abismos sentidos no interior da
psique, através da percepção de novas configurações surgidas a partir da
transformação, não destruição, do material original. Permitindo a experiência de que
tudo tem uma continuidade e, de que neste processo, algumas peças são removidas
por não serem mais necessárias no presente. Mas que aquilo tido como essencial no
momento da criação ainda pode ser mantido (URRUTIGARAY, 2003).
É um material transformador, pois permite uma nova utilidade ao que antes
era lixo. É a mudança através do concreto, é a busca de transformação e do
reaproveitamento.
Por poder aliá-lo à pintura, à colagem e à modelagem, é uma atividade rica e
complexa, que mobiliza o conteúdo interno e já o transforma, reaproveitando-o de
forma benéfica. O arteterapeuta deve ficar atento, para que nenhum detalhe escape,
pois é um trabalho de muita sutileza.
Materiais diversos devem ser utilizados como plásticos, vidros, papéis,
madeira, tecidos, etc, de forma livre ou dirigida.
Os pacientes têm muitas preocupações que às vezes são difíceis de serem
compartilhadas com outras pessoas. Através do trabalho com a sucata, o indivíduo
poderá expor todas as suas angústias de forma bastante criativa.
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2.2.4. Papier maché
Através da aparente fragilidade do papier mâché, esconde-se um material
resistente e versátil que pode ser usado de diversas maneiras. O papier mâché, do
francês, papel macerado, esmagado, picado é o nome para uma das técnicas básicas
fundamentais na utilização artística do papel, sendo resultado da preparação de uma
massa misturada com cola.
Transcrito para o português tornou-se papel machê. Segundo Marques (2002),
“alcançou seu apogeu entre os séculos XVI e XIX, mas suas primeiras aplicações
remontam à era em que o próprio papel foi inventado, na China, no século II a.C”.
Os chineses o usavam na fabricação de capacetes e lemes de barcos de guerra,
além de recipientes para líquidos com impermeabilizações laqueadas. Nos séculos
que se seguiram, foram justamente os povos orientais os que mais aplicaram o papel
machê na manufatura de pratos, espelhos, caixas de provisões, etc, objetos esses que
acabaram chegando à Europa através dos mercadores.
No continente europeu, a França foi o primeiro país a transformar o papel
machê em trabalhos de valor artístico. Os artesãos franceses aprenderam as técnicas
encontradas nos produtos do oriente e a aperfeiçoaram tanto que tornaram-se
famosos pela elaboração de relevos decorativos para tetos, candelabros, porta-jóias,
armações, rodapés, brinquedos e bijuterias.
Há, inclusive, pitoresca e famosa história verdadeira de uma igreja que foi
inteiramente construída em papel machê, na cidade de Berghen, na Noruega, e que se
manteve de pé, em ótimas condições, durante 37 anos, até que foi finalmente
demolida.
A durabilidade e solidez dos produtos elaborados com papel machê são
altamente superiores ao que tradicionalmente estabeleceu a crítica popular que
sempre associou a uma idéia errada de inconsistência, fragilidade e pouca resistência.
32
Peças construídas há 300 ou 400 anos chegaram aos nossos dias em perfeitas
condições de manutenção. Nenhum outro material foi tão experimentado até nossos
dias de uma forma tão gigantesca nas artes decorativas.
É um material frio e viscoso que oferece retorno, ainda que não tenha os
efeitos da argila por não ser um produto natural primitivo. Considerando que a massa
depois de ser trabalhada nas mãos, vai endurecendo e ganhando firmeza, trabalha-se
o controle e a resistência.
2.3. Cênicos
Referente à cena, ao palco teatral, ao espaço de representação, à arte
dramática, a cada uma das unidades de ação duma peça, ao acontecimento dramático
ou cômico.
2.3.1. Expressão corporal
“Alguns já disseram que o corpo não mente. Mais que isso, ele conta muitas estórias e em cada uma delas há um sentido a descobrir. Como o significado dos acontecimentos, das doenças ou do prazer que anima algumas de suas partes. O corpo é nossa memória mais arcaica. Nele, nada é esquecido. Cada acontecimento vivido, particularmente na infância e também na vida adulta, deixa no corpo sua marca profunda”.
Jean-Yves Leloup7(s.d.)
Tudo no universo se move, percorrendo caminhos, exercitando trajetórias,
assim apresenta-se o movimento ou o princípio da expressão corporal. É uma forma
de expressão tão antiga quanto à própria civilização e, que independente da idade ou
condição física, está ao alcance de todos.
A linguagem do corpo é chamada de comunicação não-verbal. Hoje em dia
existe grande preocupação para esse assunto, pois se percebeu a enorme quantidade
de informações que são transmitidas ou podem ser obtidas pela expressão corporal. O
timbre de voz ou um simples olhar podem provocar uma impressão mais forte do que
7 Teólogo, filósofo e padre da igreja ortodoxa, nascido em 1950.
33
palavras ditas. Pode-se mentir com palavras, mas é difícil mentir com o corpo porque
ele fala por si mesmo. A linguagem corporal não pode ser usada para enganar, se o
observador souber lê-la. Ainda que o sujeito tente omitir seus verdadeiros
sentimentos atrás de atitudes ou posturas artificiais, seu corpo denunciará o
fingimento através do estado de tensão criado. Ninguém consegue controlar seu
corpo completamente e por isso que os detectores de mentira são tão eficazes para
distinguir a verdade da mentira. Quando uma mentira é contada, ocorre o
tensionamento refletido na pressão sangüínea, na taxa de batimentos cardíacos e na
capacidade de condução elétrica da pele. Através do tom de voz e sua ressonância
também é possível captar verdades e mentiras.
Cada aspecto da expressão corporal revela quem somos, muito mais ainda
nosso corpo revela quem somos por inteiro. Pela expressão corporal decidimos se
confiamos ou não em determinada pessoa. As impressões subjetivas do corpo do
paciente percebidas pelo terapeuta são dados muito relevantes para o
desenvolvimento de um trabalho direcionado. Podemos considerar também que
existe uma memória essencial, ou seja, a memória verdadeira do que somos. Por isso
existe o chamado anamnese8 essencial à arte e a prática de lembrar-se do Ser, através
das memórias do corpo físico, porque o corpo humano se recorda de todos os
momentos que atravessou e viveu, mas às vezes essas lembranças são bloqueadas
pelas memórias do corpo e do psiquismo.
O arteterapeuta trabalha com a liberação do potencial criativo e por isso
importa-se mais com a produção de imagens do que pela produção verbal. Essas
produções são capazes de revelar conteúdos do inconsciente, difíceis de serem
traduzidos em palavras. Todos os acontecimentos vão deixando marcas e modelando
nosso corpo. Acabamos fazendo sempre igual por medo de fazer diferente, o que
acarreta enrijecimento do corpo. A sociedade acaba por determinar modelos de
comportamento. Nós acabamos por deixar de ver a beleza de nosso corpo, em seus
movimentos, deixamos de prestar atenção em cada uma de suas partes, em seus
significados mais profundos.
8 Significa o conjunto de informações recolhidas pelo terapeuta sobre o paciente.
34
O corpo é como um livro aberto que conta nossa história. Classifica-se por
material de vínculo, trabalha a liberação através dos movimentos, o reforço da auto-
estima, a reconciliação com as partes sofridas, a comunicação sem palavras e a
comemoração com a dança.
“Crescimento psicológico sem consciência do corpo é como uma árvore sem raízes”.
Arnold Mindell(s.d.)
2.3.1.1 Dança
Dança é uma seqüência de gestos, passos e movimentos corporais com ritmo
musical que expressa estados afetivos. Desde a Antigüidade, a humanidade já tinha
na expressão corporal, através da dança, uma forma de se comunicar. Havia danças
de guerra, de amor, de religião e outras, nascendo delas vieram as danças rituais,
mágicas, religiosas, bélicas, artísticas... Cada cultura transporta seu conteúdo às mais
diferentes áreas, dentre estas, as danças absorvem grande parte desta transferência,
pois sempre foi de grande importância nas sociedades através dos tempos, seja como
uma forma de expressão artística, como objeto de culto aos deuses ou como simples
entretenimento. Em tempos remotos, o sentido da dança tinha um caráter místico,
pois era muito difundida em ritos religiosos e raramente era dançada em festas
comemorativas. O Renascimento cultural dos séculos XV/XVI trouxe também
diversas mudanças no campo das artes, cultura, política, dentre outras. Neste
contexto, a dança também sofreu mudanças profundas que vinham se arrastando
através dos anos. Ela começou a ter um sentido social, isto é, agora era dançada pela
nobreza apenas como entretenimento e como recreação. Desde então a dança social
foi se transformando e aos poucos tornou-se acessível às camadas menos
privilegiadas da sociedade que já estava desenvolvendo outro tipo de dança: as
danças populares.
A dança é uma forma de expressão corporal e é fundamental para o ser
humano, fazendo com que se aperfeiçoe a coordenação motora, flexibilidade, ritmo,
alinhamento postural trazendo ao cotidiano uma grande paz de espírito e quando
efetuada em grupo proporciona a convivência social saudável. Desenvolve a auto-
35
estima e o autoconhecimento. A dança, como manifestação espontânea no espaço,
propõe a liberdade de expressão através do corpo que se movimenta no cotidiano,
oportunizando ao indivíduo desenvolver sua personalidade de forma mais consciente,
harmoniosa, livre e criativa. Dançar causa uma sensação de alívio, de bem estar, de
alegria, no entanto é complexo explicar através de palavras como a expressão
corporal pode trazer tantos benefícios. Pode ser usada como atividade física, lúdica,
educativa, sociabilizante, terapêutica, mas sem perder sua função como arte. Como
arte trabalha diretamente com a criatividade, não só corporal na forma de
movimentos e expressões, mas intelectual, através de exercícios de memória e
composição. Cada passo, cada movimento, transporta nossas sensações, nosso estado
de espírito e pode determinar a facilidade com que transpomos certos obstáculos.
Dançar traz grande entusiasmo e proporciona melhora expressiva na qualidade de
vida.
De acordo com Eliezer (s.d.), “a dança além de sua excelência na projeção
das imagens internas permite a exploração e o uso adequado do espaço”.
2.3.2. Psicodrama
“Um encontro de dois: olhos nos olhos, face a face. E quando estiveres perto, arrancar-te-ei os olhos e colocá-los-ei
no lugar dos meus; E arrancarei meus olhos para colocá-los no lugar dos teus;
Então ver-te-ei com os teus olhos e tu ver-me-ás com os meus Assim, até a coisa comum serve ao silêncio
E o nosso encontro permanecerá a meta sem cadeias: Um lugar indeterminado, num tempo indeterminado
Uma palavra indeterminada para um homem indeterminado”. Jacob Levi Moreno (1978)
“Drama” significa ação em grego. Psicodrama pode ser definido como via de
investigação da alma humana mediante a ação. Foi criado pelo psiquiatra Jacob Levi
Moreno em 1920 na Áustria (Viena), mas o Psicodrama faz parte de algo mais
amplo: a Socionomia, que é a ciência das leis sociais e das relações e é caracterizada
fundamentalmente por seu foco na interseção do mundo subjetivo, psicológico e do
mundo objetivo, social, contextualizando o indivíduo em relação às suas
circunstâncias. Divide-se em três ramos: a Sociometria, a Sociodinâmica e a
Sociatria, que guardam em comum a ação dramática como recurso para facilitar a
36
expressão da realidade implícita nas relações interpessoais ou para a investigação e
reflexão sobre um tema específico.
A Sociometria mede as escolhas dos indivíduos e expressa-as através de
gráficos representativos das relações interpessoais, proporcionando a compreensão
da estrutura grupal. A Sociodinâmica investiga a dinâmica do grupo, as redes de
vínculos entre os componentes do grupo. A Sociatria propõe a transformação social,
a terapia da sociedade.
A diferença entre o Psicodrama e o Sociodrama consiste em que no primeiro
o trabalho dramático focaliza o indivíduo, embora sempre visto como um ser em
relação, e no segundo o foco é o próprio grupo.
O Psicodrama se baseia no jogo de faz-de-conta que surge naturalmente no
ser humano, ou seja, é uma dramatização espontânea. A natureza oferece a
oportunidade de realizarmos ações simbólicas.O Psicodrama é uma teoria
psicológica e um método psicoterapêutico que tem como instrumento central a ação
simbólica, o jogo de faz-de-conta ou a dramatização onde tudo é possível. Pode-se
viver qualquer tipo de emoção, qualquer situação próxima à realidade ou as fantasias
mais complexas ou absurdas, pode-se matar ou morrer (MORENO, 1959). Não se
interpreta, mas procura criar condições para que o fenômeno ocorra no aqui e agora.
Para Moreno (1959), “o psicodrama representa o ponto decisivo da passagem
do tratamento do indivíduo isolado para o tratamento do indivíduo com métodos
verbais para o tratamento com métodos de ação”.
A filosofia que hoje embasa o Psicodrama foi sendo configurada através da
observação do potencial criativo do ser humano. É um método de pesquisa e
intervenção nas relações interpessoais, nos grupos, entre grupos ou de uma pessoa
consigo mesma. Mobiliza para vivenciar a realidade a partir do reconhecimento das
diferenças e dos conflitos e facilita a busca de alternativas para a resolução do que é
revelado, expandindo os recursos disponíveis. Propicia expressão dos impedimentos
37
e conflitos envolvendo tensão, agressividade e principalmente, o reconhecimento e o
acolhimento da dor psíquica.
Esta prática em suas muitas modalidades, começa pelo envolvimento das
pessoas com o tema ou coma experiência a ser vivenciada através de lembranças ou
histórias do cotidiano dos indivíduos e/ou das organizações. É facilitador da
manifestação de idéias, dos conflitos sobre um tema, dos dilemas morais,
impedimentos e possibilidades de expressão em determinada situação.
Fundamentado na teoria do momento e no princípio da espontaneidade, promove a
participação livre de todos e estimula a criatividade na produção dramática e na
catarse9 ativa. O principal objetivo da ação dramática é favorecer aos membros do
grupo a descoberta da riqueza inerente em vivenciar plenamente o status nascendi10
da experiência grupal, participando com maior honestidade possível no momento.
Assim, os participantes recriarão no grupo seus modelos de relacionamento,
confrontando e sendo confrontados com as diferenças individuais que é a condição
necessária para apreenderem a distinção entre sua experiência emocional e a dos
outros, sendo cada um deles agente transformador dos demais. Encerra-se com os
comentários, primeiramente dos participantes da cena e depois do grupo,
identificando a realidade que acaba de ser vivenciada e com o levantamento de
soluções possíveis para as questões abordadas.
O Psicodrama é um processo terapêutico de alcance profundo, uma vez que
trabalha os campos intrapsíquico e inter-relacional, utilizando recursos não só
verbais, mas principalmente de ação. A ação dramática permite insights profundos
por parte do protagonista e do grupo a respeito do significado dos papéis assumidos.
2.3.3. Teatro
Temos notícia de que a civilização egípcia fazia teatro. Cerca de 200 a.C. já
existiam representações teatrais.
9 Efeito salutar provocado pela conscientização de uma lembrança fortemente emocional e/ou
traumatizante, até então reprimida. 10
A situação de nascimento do grupo.
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Fazer teatro sempre foi uma atividade de caráter religioso, isto é, ligado ao
culto às divindades que cada povo possuía, com o objetivo de exaltar a glória e o
poder dessas divindades.
É importante ressaltar que o teatro tomou um grande destaque na Grécia. As
procissões louvando e narrando a vida do deus Dionísio, reuniam milhares de
pessoas num ritual/cerimônia onde estavam presentes a dança, a música e
“imitações” desse deus. No local de sacrifício, onde a multidão se reunia ao final da
procissão, um grupo de pessoas (os “sátiros”), entoava cantos, inicialmente
improvisados, depois compostos por poetas. O teatro grego conheceu grande
progresso cerca de 534 a.C. quando o governo do ditador Psístrato organizou um
concurso de peças teatrais, no gênero da época: a tragédia. Ao lado desse gênero,
surgiu um outro: a comédia. Enquanto a tragédia exaltava as virtudes e os
sentimentos nobres, a comédia satirizava os excessos, a dissipação, a falsidade, o
embuste, os sentimentos mesquinhos. E sendo o avesso da tragédia, não pretendia
comover, mas fazer rir.
O homem desde a Antigüidade “teatralizou” suas formas de vida. Ele tinha
uma imensa capacidade de imitar primeiro os seus deuses, depois os outros seres
humanos, os animais, etc. Imitando assumia a personalidade, as qualidades, a vida do
imitado. Ao “imitar”, o homem se desfazia por alguns momentos de si mesmo,
deixando lugar ao imitado, encarando em si uma outra personalidade, força ou
qualidade. Representar/imitar faz parte do ser humano, pois é uma capacidade
própria da gente.
Segundo Valladares (s.d.), “o teatro terapêutico é a continuação do brincar de
faz-de-conta da criança, que dá asas à imaginação e vida aos personagens, explora as
emoções, fantasias e reconstitui o sonho. Ajuda no desenvolvimento da capacidade
de expressão, diverte, ajuda a compreender melhor a si (auto-imagem) e aos outros e
a ganhar novas visões do mundo, tornando o sujeito mais crítico, organizado,
questionador, criativo, responsável e aberto ao mundo que o cerca”.
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Provoca um distanciamento do Eu e da situação, permitindo que o indivíduo
possa observar a si mesmo através de uma dramatização ou de uma troca de
personagens em sua história, ele pode conseguir os insights necessários para ajudar
na sua autodescoberta, portanto atendendo corretamente aos objetivos do trabalho
arteterapêutico.
Segundo Oaklander (1980), “o drama torna-se um instrumento natural para
ajudá-los a encontrar e dar expressão às partes ocultas perdidas de si mesmas, e com
isso desenvolver força e identidade nos jogos dramáticos criativos... No sentido de
interpretar o mundo à sua volta e transmitir idéias, ações, sentimentos e expressões,
eles mobilizam todos os recursos que podem reunir dentro de si: audição, paladar,
tato, olfato, expressão facial, movimento corporal, fantasia, imaginação, intelecto”.
No teatro terapêutico tudo é simbólico. Esta técnica utiliza gestos, atitudes,
movimentos como fatores de importância, não sendo necessário o uso da linguagem
verbal. O indivíduo se comunica não apenas por meio da palavra, mas da mímica, do
gesto, da expressão corporal (postura, olhar e movimentos). Segundo Valaladares
(s.d.), “trabalha bastante o corpo, abrangendo os seus sentidos, a sua sensibilização, a
consciência corporal, a expressão corporal do espaço interno e externo, com sons,
ritmos, gestos, etc”.
“Fazer falar o corpo seria fazer falar o inconsciente”.
Pujade e Renaud (1990)
O arteterapeuta estimulará o paciente a trabalhar o corpo, objetivando o
afastamento das ansiedades, culpas e inibições, valorizando o sentimento de soltura,
a sensação de liberdade e a descoberta, dentro de si, de um ser inteiro vivo e dotado
de respostas espontâneas. Esta prática cultivará um corpo mais primitivo, natural,
animal, profundo, autêntico (aparecimento verdadeiro do corpo), contra a
cotidianeidade e a repressão, a censura sobre ele exercida, o corpo estilizado, erudito,
com tabus, possessivos (Valladares, s.d.).
2.3.4. Contos de fada
40
É quase impossível precisar a data da origem dos contos de fadas, mas há
registros de contos encontrados em colunas e papiros gravados por babilônios,
hititas, cananeus, que datam de 300 a.C., onde os temas básicos não mudaram muito.
Alguns autores afirmam ainda que existem indícios de que certos temas principais se
reportam a 2500 a.C, mantendo-se praticamente inalteradas.
Até os séculos XVII e XVIII, os contos eram contados tanto para adultos
como para crianças como espécies de ocupação espiritual essencial. Na Europa eram
usados como forma de entreter a população agrícola na época do inverno.
Foi a partir do século XVIII que se iniciou o interesse científico pelos contos
de fadas. Havia indícios de que continham fragmentos de uma velha crença há muito
enterrada, expressa nos símbolos. Nessa época o neopaganismo11 começou a se
movimentar na Alemanha, período em que havia uma certa insatisfação com os
ensinamentos cristãos e a aspiração por uma sabedoria mais vital, os irmãos Jacob e
Wilhelm Grimm na busca religiosa por alguma coisa que estava faltando nos
ensinamentos cristãos oficiais, começaram a colecionar contos folclóricos, depois
passaram a escrever estes contos de acordo como as pessoas contavam.
Os contos de fada são a expressão mais pura e simples dos processos
psíquicos do inconsciente coletivo12. Segundo Grinberg (2003), “o inconsciente
coletivo é a camada mais profunda do inconsciente e corresponde a uma imagem do
mundo que levou eras e eras para se formar. Eles representam os arquétipos13 na sua
forma mais simplificada, plena e concisa. Nesta forma pura, as imagens arquetípicas
fornecem as melhores pistas para a compreensão dos processos que se passam na
psique coletiva. Nos contos de fada existe um material cultural consciente menos
específico e, conseqüentemente, eles espelham mais claramente as estruturas básicas
da psique”.
Para Bettelheim (1988), “é a partir deles que os processos internos são
externalizados tornando-se compreensíveis, enquanto representados pelas figuras, 11
Nova religião pagã; Conjunto dos que não foram batizados. 12 Herança potencialmente presente em todos os indivíduos (Jung, Símbolos, prefácio à 2ª ed., 1924). 13
Modelo de seres criados. Padrões, modelo, protótipo.
41
peripécias, etc. Através desses recursos, os contos de fadas acabam realizando uma
espécie de tratamento psíquico, através da catarse. É possível encontrar um caminho
como o herói das estórias e, como ele, também enfrentar dificuldades. É um
tratamento, sobretudo terapêutico por representarem conflitos internos que parecem
incompreensíveis, mas são sempre representados, ao final, por uma solução feliz”.
Classifica-se por material de vínculo. Está ligado à intuição, elemento fogo.
Estimula a criatividade. A estrutura do conto ilustra a psique humana, por isso tem
função terapêutica.
A pessoa que está familiarizada com os contos de fadas compreende que estes
falam na linguagem dos símbolos e não da realidade cotidiana. O “era uma vez”,
“num certo país”, “há tempos atrás”, simboliza estar deixando o mundo concreto da
realidade, sem se dar conta de que o inconsciente leva de volta aos tempos mais
remotos da vida. Os lugares mais estranhos, distantes ou antigos, sugerem uma
viagem ao interior da nossa mente. Mesmo fazendo esta viagem à um outro mundo, o
final da história nos devolve à realidade de forma mais reasseguradora.
A fantasia pode dominar um pouco, desde que não fique preso a ela
permanentemente. A pessoa que só ouve estórias realistas, isto é, falsa para sua
realidade interna, pode concluir que muito de sua realidade interna é inaceitável para
os outros, daí a importância de ler para os outros os contos de fadas.
Os contos de fadas mostram de que modo pode se personificar desejos
destrutivos em uma figura, obter satisfação em outra, identificar-se com uma terceira,
ter ligações ideais com outras, dependendo das necessidades momentâneas. No conto
de fada nunca somos confrontados diretamente, mas sempre ajudados pela
imaginação (BETTELHEIM, 1988).
2.3.5. Mitologia
Antes do surgimento de qualquer ciência, os primórdios do mundo e da
sociedade eram explicados pela mitologia. A palavra mito é freqüentemente
42
interpretada erradamente como ficção, algo que nunca aconteceu, uma história
inventada ou conto de fadas. O mito é na realidade uma maneira de entender o
passado, contando apenas aquilo que realmente aconteceu. Isto não quer dizer que os
mitos explicam os fatos corretamente. Eles sugerem que por trás da explicação existe
uma realidade que não pode ser conhecida e/ou examinada.
A criação de mitos, assim como a superstição, não é apenas propriedade de
pessoas que viveram há milhares de anos atrás, ela persiste através da história.
Tradicionalmente, a criação de mitos e lendas, olha para o passado para tentar fazer o
presente ter sentido. Ao invés disso, alguns mitos modernos olham para o futuro.
Os mitos tentam responder muitas questões, além de tentarem explicar
costumes e rituais de uma determinada sociedade, explicam as origens da agricultura
e a fundação de várias cidades, sendo usados para justificar o modo de vida de uma
sociedade. Várias famílias em muitas civilizações antigas justificavam o seu poder
através de lendas que descreviam suas origens como sendo divinas.
Os mitos não se originaram na forma escrita, mas se desenvolveram
lentamente, como uma tradição oral que era passada de geração em geração, entre
pessoas que estavam tentando entender o mundo ao seu redor. Tentavam imaginar
como foi o surgimento da existência. Fascinados pela pequena porção da Terra que
eles conheciam e pelos céus que eles viam acima, indagavam que tipo de poder
poderia ser responsável por tudo aquilo. Fora isso, as indagações pareciam contrastar
enormemente com a natureza humana e suas tendências destrutivas.
Membros de uma tribo ou clã que eram considerados sábios ponderavam
sobre o que eles viam e tiravam suas próprias conclusões sobre o que devia ter
acontecido. Tinham que explicar tudo o que tinha acontecido desde o início do
mundo até seu tempo. Essas explicações, passadas em forma de estórias, eram
finalmente aceitas como uma verdade tradicional. Muito tempo depois estas estórias
foram escritas.
43
Os mitos não tratam apenas da aparência da Terra e dos céus, mas também do
começo de tudo, plantas, animais, casamento, família, trabalho, doença, morte, mal e
em alguns casos, dos próprios deuses. Os mitos e seus relatos tornaram-se parte dos
rituais religiosos da vida diária, uma vez que eles eram relacionados a todas as
ocorrências comuns e repetidas: estações do ano, o plantio e colheita das lavouras, o
nascimento de uma criança ou a morte de um adulto. Tentavam explicar também o
fim da vida e o fim do mundo. O ato de relembrar as origens fazia com que
acreditassem que haveria uma esperança de renascimento ou revitalização.
Mitos sobre o fim do universo são integrados com crenças sobre a morte e o
destino da humanidade a seguir. Em muitas mitologias, a morte podia ser
considerada como recompensa ou punição. Era inconcebível para a maioria dos
povos antigos que os humanos não sobreviveriam de alguma forma após o fim.
Os monstros representavam as forças do mal, sendo a vitória sobre eles um
dos temas mais explorados, onde muitas vezes, um herói solitário realizava
arriscadas façanhas pelo único motivo de conseguir a vitória do bem. Na maioria dos
mitos, depois de superar obstáculos quase impossíveis, os super-heróis eram
elevados a uma classe de seres semidivinos.
O acontecimento do mito é singular, ao passo que o do conto de fadas é
comum, podendo acontecer com qualquer pessoa, não apenas por heróis, apesar das
situações inusitadas. ... a diferença mais significativa entre os dois gêneros é o final
das estórias: o do mito é trágico e o do conto de fadas é feliz. O primeiro é pessimista
e o segundo é otimista (BETTELHEIM, 1988).
Segundo Moura (s.d.), “os mitos fazem parte da humanidade e são
representados através de manifestações arquetípicas”. Os arquétipos são estruturas
fundamentais características, sem conteúdos específicos e herdados desde os tempos
mais remotos, portanto igualados à categoria dos mitos. Os arquétipos são
possibilidades que existem no inconsciente coletivo que têm por objetivo nos
humanizar, mostrando que aprendemos a ser humanos através dos mitos. Mitos são
aquilo que os seres humanos têm em comum, são histórias de nossa busca da
44
verdade, de sentido, de significação, através dos tempos, são metáforas da
potencialidade espiritual do ser humano e os mesmos poderes que animam nossa
vida animam a vida do mundo.
Os mitos nada mais são do que uma forma de expressão dos arquétipos,
falando daquilo que é comum aos homens de todas as épocas, porque falam dos
valores eternos da condição humana. Eles explicam, auxiliam e promovem as
transformações psíquicas que se passam tanto no nível individual, como no coletivo
de uma cultura.
Temos herança enquanto seres humanos, com vivências e sentimentos
comuns. Alguém em algum lugar já terá passado por determinada situação que
podemos estar passando, portanto o mito poderá nos dar pistas de como solucionar
tal situação. Isso não quer dizer que estamos livres de qualquer tipo de sofrimento ou
desagrado, mas podemos encontrar um sentido, uma maneira de enfrentar e suportar
os conflitos que nos atingem.
De acordo com Savaris (s.d.), “toda mitologia utilizada na Arteterapia é de
alguma forma uma tomada de consciência, é o poder ver através de outra perspectiva,
é ter um elemento para se identificar, é encontrar um valor, é nos ensinar sobre nós
mesmos”.
“Além disso, não precisamos correr sozinhos o risco da aventura,
pois os heróis de todos os tempos a enfrentaram antes de nós. O labirinto é conhecido em toda a sua extensão. Temos apenas de seguir a trilha do herói, e lá, onde temíamos encontrar algo abominável, encontramos um deus. E lá, onde esperávamos matar alguém, mataremos a nós mesmos. Onde imaginávamos viajar para longe, iremos ter ao centro da nossa própria existência. E lá, onde pensávamos estar sós, estaremos na companhia do mundo todo”.
Joseph Campbell (do livro O poder do mito, 1990)
2.3.6. Música
Há muito tempo os sons da natureza fascinaram o ser humano. A utilização
da música na prevenção e tratamento de algumas doenças tem origem nas raízes da
sabedoria milenar das mais variadas civilizações. O Homem, desde as mais remotas
45
épocas, já notava as sensações e os efeitos inexplicáveis, gerados pelos sons que
sempre exerceram forte influência sobre o seu comportamento. Existem importantes
referências sobre a música como terapia ou sobre a conexão entre ela e as
transformações do estado de espírito.
Segundo a ciência que estuda de que maneira o ser humano processa em sua
mente os sons, a Psicoacústica, o homem moderno carece de sons da natureza. Esses
sons são essenciais para o seu equilíbrio, como por exemplo, o canto dos pássaros, o
ruído da chuva, o barulho do vento varrendo folhas, um riacho correndo sobre as
pedras. Essa ausência gera uma carência que faz aflorar uma “saudade” que surge no
subconsciente (SIQUEIRA, s.d.)
Música é um hábito saudável e necessário à vida de qualquer pessoa. O
antropólogo Alan Merrian (1964), identificou os usos e funções da música em
diferentes sociedades e sinalizou a expressão emocional, o prazer estético,
entretenimento, comunicação, representação simbólica, resposta corporal,
conformidade a normas sociais, validação de instituições e rituais religiosos,
continuidade e estabilidade da cultura e integração social. Os indivíduos trazem no
íntimo sensações, sentimentos, diferentes vivências que são difíceis de serem ditas
com palavras comuns e que podem ser facilmente comunicados através da música.
Buscando na história, pode-se perceber que desde a civilização egípcia, a
música tem sido utilizada para a internalização de certos valores. Entre os gregos,
Platão recomendava que os jovens deveriam cultivar apenas as músicas que
desenvolvessem o sentimento do homem valente e do homem sereno. Na Idade
Média, música era sinônimo de devoção. No período da Reforma, as crianças
cantavam hinos religiosos para a salvação de suas almas. No Brasil do século XVI, a
Companhia de Jesus traduziu para o Tupi o catecismo católico e os utilizava nos
Autos Religiosos com o fim específico de catequizar os indígenas, sendo este uso
para a incorporação de valores morais e espirituais.
A música na terapia vem melhorar a qualidade de vida das pessoas afetadas
pelas tensões do dia-a-dia. A longo prazo, isso causará danos importantes como o
46
desequilíbrio das ondas cerebrais, que provoca insônia e perda de memória, além da
pressão alta, má digestão e dor de cabeça.
Com a utilização da música na Arteterapia, pode-se cuidar da saúde, do bem-
estar físico, mental e espiritual, proporcionando relaxamento e diminuindo as
tensões, favorecendo a concentração e aliviando os sintomas da ansiedade e da
insônia, além de provocar viagens mentais. Nesse caso, a música passa a ser um
veículo, um fio condutor que leva o sujeito e sua mente para o mundo dos sons,
sendo viagens realizadas pela imaginação manifestações que só acontecem no
hemisfério direito do cérebro. Quando acontece a viagem mental, o indivíduo
exercita o lado da criatividade e descansa o lado esquerdo, responsável pela
racionalidade.
A imagem sonora faz entrar em contato com seu eu mais profundo, energiza
os campos astrais-etéricos e cria, de acordo com as diferentes melodias, ritmos que
segundo a orientação terapêutica, equilibram e harmonizam o sujeito (ELIEZER,
s.d.).
É vinculado ao sentimento, elemento água. Estimula o sentimento. Através de
seus elementos, som, ritmo, melodia e harmonia, em um processo destinado a
facilitar e promover comunicação, relacionamento, aprendizado, mobilização,
expressão, organização a fim de atender às necessidades físicas, mentais, sociais e
cognitivas. Ajuda a desenvolver potenciais e/ou restaurar funções do indivíduo para
que alcance uma melhor organização intra e/ou interpessoal e, conseqüentemente,
uma melhor qualidade de vida, através da prevenção, reabilitação ou tratamento.
47
CAPÍTULO III
CRIATIVIDADE - UMA ARTE SEM IDADE
O ser humano tem condições de desenvolver todo potencial que nele existe.
Sendo impulsionado por forças instintivas e inconscientes, tem a capacidade de
tomar consciência e influenciar este processo, que embora, às vezes, possa ser lento,
ajudará na criação de condições favoráveis. Criar é inerente ao homem (FRANÇA,
1998). O homem mais simples é capaz de registrar, conceber com suas mãos criações
artísticas, ignorando regras e teorias, através de imagens oriundas do seu
inconsciente, dando formas a seus sentimentos, seu cotidiano, com total
espontaneidade, deixando fluir conteúdos até então desconhecidos, misteriosos,
exercitando de forma sadia o seu potencial expressivo.
A mente separa o homem de seus semelhantes e da natureza e separa as
emoções do corpo. Separado de si mesmo o homem gera emoções destrutivas. A
freqüência de conflitos emocionais determina a intensidade do sofrimento psíquico e
físico, bloqueando nossa energia, gerando tensões e distanciamento da nossa
essência.
48
Segundo Tavares (s.d.), “a criatividade é um atributo da natureza humana. A
toda hora estamos reinventando nossa realidade, adaptando-nos a situações
inesperadas, transformando a dor e encarando novos desafios”.
Para França (1998), “a realidade expressa na arte (espelho da alma) muito
pode comunicar, exercendo uma função no processo terapêutico, principalmente
quando outros meios, o pensamento, a palavra estão em desordem ou falham. Por
outro lado a arte é pelo menos durante sua execução – uma significativa mudança do
padrão em que nos encontrávamos”.
Precisamos ser criativos e originais para conquistarmos nosso espaço e
atendermos as demandas do momento em que vivemos. No ato de criar convidamos
nossa energia a se expressar e transformar a vida, estimulando diferentes respostas,
outras atitudes e novas direções.
Talvez no espaço arteterapêutico seja o único espaço em que se pode “tudo”.
Na medida que nos libertamos de condicionamentos e preconceitos é que podemos
nos aproximar da qualidade artística; ela não se limita ao resultado estético, nem a
padrões culturais ou morais. A maneira original de se expressar é a essência da arte
(FRANÇA, 1998).
A possibilidade de brincar, romper com padrões pré-estabelecidos,
materializar fantasias, trabalhando de forma livre e permitindo que forças vindas do
inconsciente brotem, proporciona a recuperação da espontaneidade, a inocência,
além de ajudar a ordenar, distencionar e expandir o potencial criativo.
O processo de desenvolvimento é um processo de aprendizagem, onde a
criatividade é muito importante, pois possibilita uma melhor integração da pessoa em
todos os seus aspectos e com relação ao meio.
O processo criativo das pessoas se desenvolve a partir da livre expressão de
diversas possibilidades. Pela Arteterapia objetiva-se que o paciente desenvolva sua
49
capacidade de fluência, flexibilidade, elaboração e originalidade. No início no
trabalho para depois ampliá-la na vida.
Csikszentmihalyi (1988) diz que “se quisermos entender a criatividade,
devemos procurá-la além dos limites do sujeito humano, de seus processos e
produtos: devemos investigar seu meio social, seus valores e hábitos, enfim sua
cultura. É importante que busquemos compreender o processo de criar com base em
uma nova dimensão, na qual se articulam aspectos referentes ao campo social, ao
domínio específico de cada campo e ao indivíduo que organiza os dados herdados
das instâncias anteriores”.
As características apresentadas pela pessoa criativa são: fluência e
flexibilidade de idéias, idéias originais e inovadoras, sensibilidade desenvolvida,
fantasia e imaginação, abertura a novas experiências, independência de julgamentos,
idéias enriquecidas e elaboradas, motivação, curiosidade, espontaneidade e confiança
em si mesmo. Apoderando-se de sua capacidade criadora, pelo processo terapêutico,
o ser humano desenvolve contato rico com o seu imaginário e aprende a utilizar-se
de outras formas de conhecimento, além do conhecimento racional, aprende a utilizar
o intuitivo e sensorial.
Encoraja-se o paciente a usar sua capacidade de seleção, escolha, organização
e síntese. Procura-se promover o desenvolvimento da habilidade de observação: o
olhar e o refletir sobre o processo e os trabalhos, transpondo os processos para a vida.
“Criar é tão difícil ou tão fácil como viver. E é do mesmo modo
necessário... A criatividade é a essencialidade do humano no homem. Ao exercer seu potencial criador, trabalhando, criando em todos os âmbitos do seu fazer, o homem configura a sua vida e lhe dá um sentido”.
Fayga Ostrower (do livro Criatividade e processos de criação, 1989)
É através do imaginar, do criar, do realizar, do refletir, do modelar a sua
existência, que a Arteterapia possibilita a transformação, o renascimento. A arte
nunca subtrai, apenas acrescenta.
50
CONCLUSÃO
Nosso corpo é energia, é sensação, é consciência e inconsciência. Freud disse
que tudo o que não está na consciência tem força. Existe um material que vai para a
consciência (libido) e outro que não vai. Os materiais que não vão para a consciência
é que são “perigosos”, pois o inconsciente é um sistema que processa de forma
“distorcida” estes materiais, que tem causa e efeitos específicos. No inconsciente é o
lugar onde está o material recalcado que, quando cresce e cria força, produz nos
indivíduos os sintomas.
Existe em nós um mundo a ser percebido e sentido. Quando esse mundo não é
compreendido por nós, perdemo-nos dentro dele, tendendo ao desequilíbrio. “O
corpo fala o tempo todo”, apontava Reich, dissidente de Freud. Reich estudou a
fundo a repressão sexual. Ele dizia que fomos reprimidos e manipulados pelo poder
da família e da sociedade, repressão essa que gera uma grande culpa. Podemos
mentir com as palavras, mas nunca com a expressão.
O mundo hoje é voltado para o materialismo (poder, status e capitalismo),
que sempre conduz o homem a entrar num processo de culpabilização e segregação:
porque o poder que dita as regras de consumo, nos leva a mudanças de valores.
Vivemos uma época em que o interior do homem não é tão valorizado, mas sim, o
quanto ele pode produzir e dar lucros para a empresa e para o comércio. O existente
no interior do indivíduo (subjetividade), existe nos vários níveis sociais, pois ele
assume e vive particularmente essa subjetividade numa relação que oscila entre a
alienação e a opressão, sem questionamentos. É preciso se expressar e criar para
reapropriar-se de suas próprias potencialidades, produzindo um processo de
singularização, superando os antagonismos sociais, políticos e abrindo brechas para
explorar o campo da economia, do desejo e da subjetividade. Sócrates, patrono da
Filosofia, ao dizer “sei que nada sei”, procurava a essência e a verdade das coisas.
Ele propunha aos homens que antes que quisessem persuadir os outros, cada um
deveria primeiro conhecer-se a si mesmo, por isso disse “conhece-te a ti mesmo”.
51
A Arteterapia valoriza a mente, o interior do homem e por isso seu corpo. O
corpo deve ser a nossa casa, e a nossa mente, o governante dela. Para nos
conhecermos, temos que fechar os olhos, meditar e perceber, através do exercício
proposto, nosso mundo interior que envolve respiração, sensação até que se possa
atingir o prazer de estarmos dentro de nós mesmos e buscarmos o autoconhecimento.
Sem prazer e autoconfiança ficamos distantes de nós mesmos. O melhor caminho é o
que vai para o nosso interior, assim chegamos à auto-descoberta e atingimos o
equilíbrio.
“...Quem olha para fora sonha; quem olha para dentro desperta!...”
Carl Gustav Jung (s.d.)
As dificuldades sentidas por alguns indivíduos frente à sua falta de destreza
no trabalhar as modalidades plásticas podem provocar um certo distanciamento ao
trabalho proposto em Arteterapia, dificultando o surgimento de uma interação entre o
sujeito e o material/técnica por temer sua exposição. Cabe, portanto ao arteterapeuta
trabalhar esta dificuldade e apresentar todos os materiais e técnicas disponíveis para
o trabalho, não deixando de estar sempre pesquisando novas possibilidades.
A inclusão de outros materiais e técnicas como cristais de rocha, sementes,
palhas, fibras de vegetais, lãs, cera de abelha, barbante, tecelagem, fotografias,
máscaras e todas as outras possibilidades não abordadas neste trabalho, devem ser
feitos com a consciência de suas propriedades diante do sujeito nas sessões
arteterapêuticas. Cada pressuposto deve ser considerado apenas com uma hipótese a
ser confirmada ou não pelo sujeito.
Reconstruir, recomeçar, partindo do que realmente somos e daquilo que nos
dá prazer. Por isso a Arteterapia trabalha desde o físico (sensório motor), o mental
(processos cognitivos), até o emocional, a imaginação, o mundo das idéias, o mundo
dos sonhos e a memória, novamente nos colocando frente a um campo vasto e
profundo.
Se o indivíduo se mostra aberto à relação, a princípio com a matéria (os
materiais artísticos), com o som, com o movimento, com a cor ou com a forma,
52
passará a uma relação consigo próprio, com seus potenciais e com sua vida através
da arte. Existe aí nesta relação, um trabalhar num mesmo instante, a concretude e a
fluidez, o ser e o não ser, o estar e o não estar, o se deixar levar e o realizar, onde se
perde a noção de tempo e onde quem trabalha torna-se o próprio trabalho. Existe um
diálogo ser humano-matéria-energia que flui tanto do ser humano como da matéria,
que flui da natureza e do universo, onde o indivíduo e a matéria são partes
integrantes desse todo maior.
“Não importa o que fizeram com você, o que importa é o que você faz com
o que fizeram com você”. Jean-Paul Sartre (s.d.)
53
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57
ÍNDICE FOLHA DE ROSTO 2
AGRADECIMENTOS 3
DEDICATÓRIA 4
EPÍGRAFE 5
RESUMO 6
METODOLOGIA 7
SUMÁRIO 8
INTRODUÇÃO 9
CAPÍTULO I - A ARTE E SUA HISTÓRIA 11
CAPÍTULO II - OS MATERIAIS E TÉCNICAS, SUAS HISTÓRIAS E SEUS
VALORES TERAPÊUTICOS 13
2.1. GRÁFICOS 17
2.1.1. COLAGEM 17
2.1.2. PINTURA 19
2.1.3. DESENHO 22
2.2. PLÁSTICOS 24
2.2.1. MODELAGEM ·25
2.2.2. ESCULTURA 28
2.2.3. SUCATA 29
58
2.2.4. PAPIER MACHÊ 31
2.3. CÊNICOS 32
2.3.1. EXPRESSÃO CORPORAL 32
2.3.1.1. DANÇA 34
2.3.2. PSICODRAMA 35
2.3.3. TEATRO 37
2.3.4. CONTOS DE FADA 39
2.3.5. MITOLOGIA 41
2.3.6. MÚSICA 44
CAPÍTULO III – CRIATIVIDADE – UMA ARTE SEM IDADE 47
CONCLUSÃO 50
BIBLIOGRAFIA 53
ÍNDICE 57
ANEXOS 59
FOLHA DE AVALIAÇÃO 63
59
ANEXOS
60
61
62
63
FOLHA DE AVALIAÇÃO
Nome da Instituição: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
Título da Monografia: MATERIAIS E TÉCNICAS - CO-PARTÍCIPES DA
AUTO-DESCOBERTA?
Autor: CAROLINA MARIA GUIMARÂES GOMES LOPES.
Data da entrega:
Avaliado por: Conceito:
Avaliado por: Conceito:
Avaliado por: Conceito:
Conceito Final:
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