PREFEITURA MUNICIPAL DE PIRAQUARA
SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO
ELABORAÇÃO
Adriane Ferreira
Alessandra Shereiber Antunes
Ana Paula Prestes Daneles
Andréa Gonçalves Foshesato
Carla Juliane dos Santos
Deborah Maria Mordaski
Dioneli Correa dos Santos Rodrigues
Dulcinéia Marcia Machado Raymundo
Eliete Pereira da Silva Castro
Halekessandra de Azevedo
Jocélia Maria Molari
Joselita Romualdo da Silva
Liliane Repinoski Franco
Luzia dos Reis
Luzia Saboreti Maschio
Maiza Cardoso dos Santos
Marcela Roberta Piatadosi
Maria Helena Pires Zeni
Mariz Sonaleo Piacentini de Carvalho
Neuza de Fátima Osório
Rosa Maria dos Santos
Rosenir de Paula Neves
Samira Smaka Ivanoski Pinto
Tatiana do Rocio Moreira
COLABORAÇÃOJaqueline Rosa
Luciana dos Santos
Luciana Fátima Gomes dos Santos
Rosangela Lino Gulado
ORGANIZAÇÃOCarla Juliane dos Santos
Tatiana do Rocio Moreira
CONSULTORIASônia Guariza Miranda
PIRAQUARA
1.3 FUNDAMENTOS TEÓRICOS DA EDUCAÇÃO ESPECIAL
Muitas vezes a discussões sobre a educação especial têm como
premissa o ponto de vista biológico, ou seja, as necessidades educacionais
especiais são vistas como condição inata do indivíduo. Assim, consideram-se
os aspectos relacionados com a aparência e a condição física e intelectual do
indivíduo como determinantes a qualquer trabalho que se possa realizar.
Quando essa visão torna-se prevalente, não há muito que se fazer do ponto de
vista da atuação educativa, pois nesta perspectiva o indivíduo é deficiente e
não há possibilidades de mudança.
O que se pretende ressaltar neste documento, é que não são as causas
biológicas que determinam a vida do indivíduo, mas ao contrário: a vida, onde
se destacam o processo de aprendizagem e o processo de mediação, é que
possibilita o seu avanço, com ou sem necessidades educacionais especiais,
desde que sejam oferecidas condições adequadas ao seu pleno
desenvolvimento.
As crianças com um desenvolvimento intelectual comprometido por
fatores diversos apresentam um ritmo de aprendizagem diferenciado em
relação às demais crianças, entretanto ao colocá-las em condições adequadas,
fazendo uso de mediações sociais instigadoras, muitas conseguem demonstrar
progressos notáveis e até superar sua condição inicial de aprendizagem. Para
tanto se faz necessário que o processo de aprendizagem no qual a criança é
envolvida seja desafiador em relação ao seu grau de dificuldade, uma vez que
a aprendizagem desempenha um papel próprio ao determinar o
desenvolvimento e não se limita a segui-lo. Este processo por sua vez é
diferente para cada indivíduo, pois poderá despertar diferentes processos, de
acordo com a experiência de vida de cada um. Esse aprendizado acontece a
todo o momento a partir de mediações com pessoas que fazem parte de um
mesmo contexto, não sendo possível prever “a priori” o percurso de cada um
dos educandos.
Portanto, no princípio apresentado por Vigotski, já indicado acima, não
se pode deixar de desafiar uma criança com aprendizagens decorrentes das
mediações sociais a partir de um pressuposto de que seu desenvolvimento
intelectual impede novas aprendizagens.
A relação entre aprendizagem e desenvolvimento é dinâmica, constante
e dialética, ou seja, a aprendizagem determina o desenvolvimento e as
relações cognitivas, embora o desenvolvimento por sua vez interfira na
aprendizagem e assim sucessivamente.
O indivíduo vive em constante aprendizagem e desenvolvimento, o seu
cérebro está sempre pronto a aprender, mesmo a pessoa com alguma lesão
cerebral apresenta essa capacidade, já que outras partes do cérebro assumem
a função da parte prejudicada. Desta forma, “... a criança não nasce com
órgãos preparados para cumprir funções que representam o produto de
desenvolvimento histórico do homem; estes órgãos desenvolvem-se durante a
vida da criança, derivam da apropriação da experiência histórica.” (LEONTIEV,
2004, p.72).
Outra questão que interfere diretamente no processo de aprendizagem e
de desenvolvimento dos educandos se refere à prática pedagógica do
professor em sala de aula, sejam estes com ou sem necessidades
educacionais especiais. De acordo com Hoffmann (2001, p. 100) é necessário
que os professores trabalhem com atividades diversificadas e diferenciadas.
Entende-se, conforme a autora, que atividades diversificadas são novas
possibilidades de reorganização dos conhecimentos pelos indivíduos e pelo
grupo: várias linguagens, tempos, aprofundamento e recursos. Já a atividade
diferenciada:
Significa planejar atividades de acordo com as necessidades e interesses de cada aluno de uma classe, através da observação permanente e continuada do professor. Significa fazer, ao longo do processo, encaminhamentos pedagógicos diferentes de acordo com os percursos individuais, sem deixar de dinamizar o grupo e de desenvolver o trabalho coletivo. (HOFFMANN, 2001, p. 101).
Um dos fatores que propiciam uma boa aprendizagem é o compromisso
que o professor, enquanto mediador tem que assumir no processo de ensino.
Entendendo que todos os educandos são capazes de aprender, organizando
um planejamento coerente, atendendo as necessidades de todos e
principalmente respeitando, e interferindo, nos diferentes ritmos e tempos de
aprendizagem. Desta forma, os conteúdos trabalhados e a metodologia
utilizada pelo professor devem estimular a criatividade dos educandos,
instrumentalizando-os para a formação de conceitos, assim contribuindo para a
formação do sujeito crítico. Conforme Hoffmann:
... embora muitas situações de atendimento diferenciado aos alunos ocorram espontaneamente em sala de aula, elas precisam adquirir o status de uma ação refletida e intencionalmente planejada pelo professor ... O professor precisa ter mais tempo para observar o aluno em ação, para registrar, refletir, decidir-se por estratégias didáticas coerentes, planejar novas e diferentes atividades articuladas às anteriores que contemplem estudos e atividades complementares que venham a contribuir para o avanço de diferentes alunos em diferentes direções. (2001, p.103).
Entretanto, todos os encaminhamentos pedagógicos devem ser propostos
com o intuito de promover a aprendizagem considerando as diferenças e
necessidades individuais dos educandos.
1.3.1 PROGRAMAS DA EDUCAÇÃO ESPECIALA educação especial é uma das modalidades da educação escolar, que
se constitui num processo educacional, baseado em uma proposta pedagógica,
assegurando um conjunto de recursos e serviços educacionais especiais
organizados para apoiar, complementar e substituir (em alguns casos) os
serviços educacionais comuns. A seguir detalham-se os programas ofertados
no município dentro desta modalidade de ensino.
a) SALA DE RECURSOSÉ o atendimento especializado para crianças e adolescentes cujo
desenvolvimento educacional requer atendimento complementar, de forma a
subsidiar com metodologias, recursos diferenciados e diversificados as
defasagens presentes nos educandos no que se refere às áreas do
desenvolvimento (que serão detalhadas posteriormente neste documento).
Essa intervenção pedagógica específica dá-se individualmente, ou em
pequenos grupos com cronograma de atendimento pré-estabelecido, em
horário contrário à matrícula do educando no ensino comum. O atendimento
poderá estender-se a crianças de escolas próximas nas quais ainda não exista
esse atendimento, é de suma importância a interação entre o professor de
ensino comum e o professor da sala de recursos.
Este atendimento tem caráter transitório, isto é, assim que sejam
superadas as dificuldades nas respectivas áreas o educando poderá ser
dispensado deste atendimento especializado.
As crianças ou adolescentes encaminhados à sala de recursos são
aqueles que já frequentaram a escola ou classe especial e que estão incluídos
na escola comum. Como também aquele educando que nunca frequentou
estes programas, mas possui alguma defasagem nas áreas do
desenvolvimento comprovada através de avaliação pedagógica especializada e
psicológica.
b) CLASSE ESPECIALA classe especial é um atendimento especializado que ocorre em escola
de ensino fundamental (séries ou anos iniciais), que se destina a atender
educandos com dificuldades acentuadas de aprendizagem, diagnosticadas em
avaliação pedagógica especializada e psicológica.
As turmas possuem no máximo dez educandos, para que o professor
possa realizar um trabalho individualizado conforme as dificuldades
apresentadas pelos mesmos. O professor, especializado em educação
especial, utiliza metodologias e recursos pedagógicos diferenciados e
diversificados e, quando necessário, equipamentos e materiais didáticos
específicos (Mobiliário adaptado, lupas, Braille, Bengala, Reglete, Sorobã,
Punção, Máquinas perkins, DOS_VOX, entre outros), conforme a necessidade
educacional especial, para que o educando tenha acesso ao currículo da base
nacional comum.
É importante ressaltar que este atendimento tem caráter transitório. A
equipe pedagógica da escola, da Secretaria Municipal de Educação e a família
decidem conjuntamente, com base em avaliação diagnóstica, quanto ao
retorno do educando a classe comum.
Seu objetivo é a melhor adequação possível do ensino às necessidades
e ao ritmo de aprendizagem do educando, ao seu desenvolvimento e as suas
potencialidades.
c) ESCOLA ESPECIALEste atendimento é recomendado a aqueles educandos que apresentam
um grande comprometimento neurológico, como também a aqueles que
apresentam deficiências neurosensoriais (surdez e visão) e transtornos de
comportamento. Em algumas situações o educando apenas freqüentará este
programa por um período que pode variar de acordo com as mediações e
estimulações realizadas com cada um, e em outras permanecerá por toda vida.
O encaminhamento para este programa normalmente ocorre por setores
especializados em avaliação, onde equipes interdisciplinares compostas por
psicólogo, pedagoga, fonoaudióloga e médicos realizam a avaliação e após
análise de todos os dados decidem pelos encaminhamentos.
d) CENTRO MUNICIPAL DE ATENDIMENTO INTERDISCIPLINAR ESPECIALIZADO-CMAIE
Para um melhor atendimento dos educandos que possuem alguma
necessidade educacional especial é necessária a integração dos serviços
educacionais com os da área da saúde, trabalho e assistência social,
garantindo atendimento adequado ao desenvolvimento integral deste
educando. O Centro faz a aproximação destes educandos com a área da
saúde.
O CMAIE atende educandos encaminhados pelas escolas, Centros
Municipais de Educação Infantil da rede pública e pessoas que estão fora da
escola e que necessitam de avaliação e atendimento interdisciplinar nas áreas
de psicologia, pedagogia especializada, fonoaudiologia, fisioterapia e terapia
ocupacional. Fazendo os encaminhamentos necessários para: o neurologista,
oftalmologista, audiometria, otorrinolaringologista, psiquiatra, etc. As famílias
que necessitam, recebem acompanhamento do serviço social.
OBJETIVO GERAL Avaliar os educandos das escolas e Centros Municipais de Educação
Infantil da rede pública de ensino que apresentam dificuldades acentuadas
na aprendizagem e pessoas com necessidades educacionais especiais
(física, auditiva, visual e intelectual) que estão fora do sistema escolar,
proporcionando atendimento interdisciplinar especializado quando
necessário.
OBJETIVOS ESPECÍFICOS Orientar os pais quanto à necessidade dos atendimentos especializados e o
seu papel neste processo;
Estabelecer contato com as escolas municipais e centros municipais de
educação infantil, para que seja agilizado o processo avaliativo informando-
os quanto ao andamento das avaliações e dos atendimentos;
Inserir os casos avaliados em programas de atendimentos interdisciplinares,
bem como, encaminhar aos serviços adequados o educando cujas
necessidades específicas ultrapassem as propostas deste centro;
Ofertar atendimento psicológico, fonoaudiológico, fisioterápico e de terapia
ocupacional aos educandos que necessitarem;
Disponibilizar um profissional do serviço social para acompanhar as famílias
indicadas pelos especialistas, a fim de orientá-las quanto aos seus direitos e
deveres na sociedade;
Ofertar avaliação e atendimento de pedagogia especializada aos
educandos que apresentem necessidades educacionais especiais, que
estão excluídos ou não do sistema escolar.
e) INCLUSÃO A inclusão exige transformações profundas onde a sociedade se adapta
para atender todas as pessoas com deficiência e, com isso, se torna mais
atenta às necessidades de todos. Defende o direito de todas as pessoas, com
e sem deficiência.
Esta visa uma nova postura da escola comum, que propõe ações que
favoreçam a interação social no seu projeto político-pedagógico, no currículo,
na metodologia de ensino e na avaliação dos educandos que apresentam
algum tipo de necessidade educacional especial, sendo-lhes garantido no
decreto nº 3298, de 20 de dezembro de 1999, artigo 24,§ 1º. Entende-se o
processo educacional definido em uma proposta pedagógica, assegurando um
conjunto de recursos e serviços educacionais especiais, organizados
institucionalmente para apoiar, complementar e, em alguns casos, substituir os
serviços educacionais comuns, de modo a garantir a educação escolar e
promover o desenvolvimento das potencialidades dos educandos que
apresentam necessidades educacionais especiais, em todos os níveis, etapas
e modalidades da educação.
Consideramos educandos incluídos da Educação Especial aqueles
oriundos de escolas e classes especiais, ou ainda aqueles que possuem uma
deficiência sensorial (visual ou auditiva) e/ou física.
Os educandos que possuem deficiência sensorial ou física necessitam
ter suas particularidades respeitadas, precisando muitas vezes de adaptações
no espaço físico e até mesmo nos recursos utilizados (cadernos, material
visual, lápis, entre outros), para que ocorra a aprendizagem.
Educandos com necessidades educacionais especiais devem ser
tratados como os demais, desde questões simples como regras e limites até os
encaminhamentos metodológicos e aprofundamento dos conteúdos
trabalhados.
Os educandos incluídos receberão o mesmo ensino que os demais e
cabe à educação especial o encaminhamento para atendimentos especiais
complementares, quando necessário, tais como: psicologia, fonoaudiologia,
psiquiatria, etc.
É importante ressaltar que a inclusão esta garantida desde a Lei
4024/61, que determina que a educação dos excepcionais (termo utilizado pela
Lei, hoje em desuso) deve no que for possível, enquadrar-se no sistema geral
de educação, a fim de integrá-los na comunidade, sendo reafirmada na Lei de
Diretrizes e Bases 9394/96, a qual assegura aos educandos com necessidades
educacionais especiais a educação escolar preferencialmente na rede regular
de ensino.
Cabe a escola realizar a contextualização, problematização e
reelaboração dos conteúdos trabalhados. É necessário que o professor
tenha compromisso profissional e que acredite na sua capacidade de
ensinar e na do aluno aprender. A avaliação precisa ser diagnóstica,
contínua e permanente, onde tem que considerar todos os avanços dos
alunos, respeitando suas limitações.
Um dos atendimentos prestados aos educandos incluídos é o da
coordenação pedagógica da educação especial, cuja atuação se dá
diretamente nas escolas que tem matriculados alunos com necessidades
educacionais especiais. Sua função é a de orientar o coordenador pedagógico
da escola sobre o encaminhamento metodológico adequado a ser utilizado com
estes educandos.
1.3.2 ÁREAS DO DESENVOLVIMENTODe acordo com os fundamentos já abordados neste texto, defendemos
que a aprendizagem determina o desenvolvimento, desta forma, o professor
enquanto mediador tem papel fundamental. O professor precisa saber os
objetivos que pretende atingir com todos os educandos, direcionando a
aprendizagem de forma que esta propicie novo desenvolvimento e assim
sucessivamente.
A seguir detalhamos as áreas do desenvolvimento a fim de
instrumentalizar os docentes para que trabalhem com estas áreas com todos
os educandos e não somente com aqueles que possuem necessidades
educacionais especiais. Cabe ressaltar, que os conteúdos abaixo elencados
fazem parte do currículo das classes especiais e salas de recursos, sendo que
os mesmos devem ser articulados com os conteúdos de todas as áreas do
conhecimento. Por opção metodológica os conteúdos estão organizados em
quatro áreas separadas, no entanto devem ser trabalhadas simultaneamente,
entendendo que toda atividade deve ser organizada de forma que através da
aprendizagem o processo de desenvolvimento seja impulsionado.
1.3.2.1 ÁREA SOCIALO principio básico do trabalho dos profissionais da Educação Especial, é
acreditar que todos são capazes de aprender, mesmo sabendo que o
educando chega à escola “rotulado”, sendo alvo de preconceitos, motivos estes
que interferem diretamente na aquisição de sua aprendizagem.
A consciência afetiva é a forma pela qual o psiquismo emerge de vida orgânica: é na relação com o ambiente social, que se garante o acesso ao simbólico da cultura, elaborado e acumulado pelo homem ao longo da história. É desta forma que a criança toma posse dos instrumentos para atividade cognitiva. (inpud SEED/1999; Wallon, 1992, p. 87)
É necessário que os professores tenham esta sensibilidade ao enxergar o
educando na sua totalidade, trabalhando e desenvolvendo o seu potencial,
intervindo positivamente nas construções de conceitos inter e intrapsíquicos.
Vale ressaltar a importância da relação entre pais/responsáveis,
professores e profissionais neste processo dando uma maior atenção ao
emocional das crianças, construídas durante sucessivas mediações. Não há
separação entre cognição e emoção, o desenvolvimento do ser humano é
biológico e social e, todo o conhecimento formal se constitui integrando as
aquisições feitas durante uma vida em sociedade.
É a partir das mediações e das significações que o outro dá as ações da
criança que ela forma o seu sistema emocional. As experiências emocionais
por sua vez podem ser positivas ou negativas sendo expressas pelo corpo e/
ou pela verbalização.
É fundamental que o professor no papel de mediador organize
atividades com significação social que desafiem e estimulem seus educandos
despertando nestes o gosto para aprender. É necessário também que a
relação professor/educando, se estabeleça num clima de vínculo afetivo
saudável, proporcionando assim, o prazer de estar com o outro, aprendendo
com ele.
1.3.2.2 ÁREA PERCEPTIVO-MOTORA
a) PERCEPÇÃO SENSORIAL:
Entende-se a percepção como um processo ativo, que pressupõe a
busca de informações sobre um determinado objeto ocorrendo em níveis
gradativos. Pode-se verificar que este processo inicia-se pela análise da
estrutura percebida, a qual é codificada ou sistematizada e então é inserida nos
sistemas correspondentes. É devido a esse movimento de seleção e síntese
que o processo é visto como ativo, porque está diretamente relacionado às
atividades que o indivíduo se depara. Portanto, pode-se dizer que a percepção
humana é um complexo processo de codificação do material percebido.
Os órgãos dos sentidos são instrumentos que, através das suas células
receptoras, recebem, transformam e transmitem estímulos e informações sobre
o ambiente. Milhares de neurônios recebem e propagam estas informações
que então são chamados de impulsos nervosos, estes se propagam através de
estruturas funcionais denominadas sinapses. De sinapse em sinapse as
informações sobre o ambiente são transferidas para o cérebro, onde finalmente
serão integradas às demais informações provenientes do mesmo ambiente.
Cabe aqui lembrar que a percepção recebe influência do contexto social
no qual o indivíduo está inserido. Sendo necessário ainda observar se existe
realmente uma diferença na função perceptiva (biológica ou fisiológica) ou se a
diferença se encontra apenas na interpretação de estímulos.
As percepções podem ser definidas como: tátil, olfativa, gustativa, visual
e auditiva. As quais serão descritas a seguir.
b) PERCEPÇÃO TÁTIL:
A pele é o órgão responsável pela percepção tátil. É através dela que
nosso corpo fica protegido e que conseguimos ter contato com diferentes
sensações tais como: temperatura (frio, calor, quente, gelado, morno, fervendo,
etc.), textura (áspero, liso, rugoso, seco, molhado, úmido, etc.), consistência
(mole, duro, pastoso, liquido, etc.), espessura (grosso, fino, etc.), espécie dos
objetos (madeira, pedra, vegetal, animal, etc.), formas dos objetos (geométricos
tipo e formato).
Devemos oportunizar às crianças atividades que desenvolvam sua
percepção tátil e sua coordenação visomotora e que impliquem na integração
entre a visão e os movimentos do corpo. Quando a criança não consegue
coordenar esses movimentos apresenta dificuldade para correr, chutar, saltar,
escrever, reproduzir e elaborar letras, palavras ou figuras.
c) PERCEPÇÃO OLFATIVA
Através do olfato as pessoas interagem com o ambiente, e descobrem
diferentes odores que a cercam.
Para ocorrer o desenvolvimento dessa área, é necessário estimular os
educandos a descobrir e identificar o cheiro de acordo com a espécie (o cheiro
é de...), intensidade (cheiro forte, cheiro fraco, suave, etc.) e tipo (ruim, bom,
desagradável, etc.).
d) PERCEPÇÃO GUSTATIVAPercepção gustativa é a forma pela qual o “indivíduo” percebe diferentes
paladares. A hora da alimentação proporciona o contato com diferentes
sabores, temperaturas e texturas de alimentos.
Nas atividades que trabalham a percepção gustativa, os educandos
devem ser levados: a discriminação de sabores (salgado, doce, azedo,
amargo), reconhecerem substâncias semelhantes na cor, textura e paladar,
perceber a temperatura de alimentos (frio, quente, morno). E está intimamente
ligada à percepção olfativa.
e) PERCEPÇÃO AUDITIVAÉ a capacidade de perceber e diferenciar os sons e sua intensidade.
Contribui para a compreensão e identificação dos sons quanto a: espécie (sons
da fala, natureza, ambiente, instrumentos musicais, etc.), duração (som curto,
longo), direção (procedência do som) e memória auditiva (reproduzir sons
conhecidos) de acordo com Caldas In Ferreira (1992, p.79) tais fatores também
levam o indivíduo a desenvolver a discriminação e a memória auditiva,
discriminar sons diversos (não vocais e vocais), discriminar sons em palavras e
desenvolver a pronúncia correta das palavras. Conforme Luria:
A linguagem humana dispõe de todo um sistema de códigos sonoros, a base dos quais se constroem os seus elementos significantes: as palavras. Para distinguir os sons do discurso ou fonemas não basta possuir um ouvido agudo, para percebê-los é necessário efetuar um complexo trabalho de discriminação dos indícios essenciais do som.” (LURIA, ano 1991 p.91, volume II).
Para Ferreira (1992, p.79) o trabalho para desenvolver a percepção
auditiva deve iniciar com sons vocais, corporais, sons de brinquedos,
instrumentos musicais e finalmente chegar aos sons verbais.
Através desta percepção o sujeito compreende os diferentes estímulos
auditivos captados do meio exterior, sendo o ouvido o órgão responsável por
esta percepção.
Assim o som tornará, no fenômeno neuro-sensorial significados
especiais e valor informativo, sendo integrado no nível psico-intelectual tendo
valor significativo para o indivíduo.
f) PERCEPÇÃO VISUALÉ uma das várias formas de percepção associada aos sentidos. É a
capacidade de utilizar a visão com a finalidade de interpretar os estímulos
recebidos. Por meio da visão somos capazes de perceber de uma só vez a
imagem completa de um objeto. De acordo com Morais (2006, p.41-43) esta
capacidade se divide em: a) percepção, discriminação de semelhanças e
diferenças – perceber as semelhanças e diferenças de tamanho, forma, cor,
posição e detalhes internos entre os estímulos apresentados; b) constância de
percepção de forma e tamanho - perceber que um determinado objeto
permanece inalterado, apesar da posição que ocupa no espaço -se esta perto
ou longe- ou independente do ângulo que é percebido; c) percepção de figura-
fundo - perceber objetos no primeiro plano (como figura) e no segundo plano
(como fundo) e diferenciá-los significativamente (VALETT, 2002, p. 204) e; d)
memória visual - reter uma série de estímulos visualmente. A memória visual
está ligada à atenção e com a figura-fundo. Se há confusão quanto à
discriminação de figura-fundo e atenção, não há como acontecer à
memorização.
A percepção visual desempenha papel fundamental para a
representação dos objetos na sua totalidade, possibilita a discriminação dos
detalhes (cor, tamanho, forma), e através dele é possível realizar a análise dos
objetos. Através da percepção visual, podemos através da cor (identificar cores
primárias, secundárias, terciárias, tonalidades, etc.), forma (identificar objetos,
animais, vegetais, móveis, concreto, gravuras), discriminação visual (identificar
semelhanças e diferenças quanto a cor, forma, tamanho, posição, detalhes,
etc.), figura-fundo (as atividades têm por objetivo aumentar a capacidade do
individuo de fixar a atenção num objeto em determinada situação), análise-
síntese (decomposição do todo em partes, identificando as partes, e voltar a
compor as partes num todo.
g) PERCEPÇÃO E ORIENTAÇÃO ESPACIALEmbora percepção e orientação espacial sejam conceitualmente
diferentes, resolveu-se neste documento, englobá-las num único texto por
entender que ambos os processos acontecem concomitantemente. É
importante ressaltar que a percepção, de modo geral, refere-se à reprodução
daquilo que se observa no mundo físico e que, portanto é individual, e a
orientação refere-se à localização no espaço.
O conceito de espaço é desenvolvido no Sistema Nervoso e permite ao
indivíduo orientar-se, vendo-se e vendo as coisas no espaço em relação a si
próprio e em relação a outros objetos do ambiente. Este processo que começa
quando o indivíduo nasce continua por toda vida por meio de revisões de seus
conceitos espaciais.
Quando se fala em orientação espacial, é necessário fazer a
diferenciação entre posição no espaço e relações espaciais. Segundo Frostig e
outros, citado por Morais (1997, pg.45), a posição espacial é “... a relação entre
um objeto e o observador”. A posição espacial refere-se ao indivíduo que
percebe a posição que os objetos ocupam usando como ponto de referência o
próprio corpo. Desta forma consegue discriminar as diferentes posições
espaciais que os objetos ocupam, compreender e assimilar os diferentes
conceitos relacionados com a posição espacial, tais como atrás, à frente,
esquerdo, direito, em cima, embaixo, etc.
Já as relações espaciais, dizem respeito à capacidade que um
observador tem para perceber a posição de dois ou mais objetos em relação a
si próprio e na relação de uns com os outros. Este conceito implica perceber
que um lápis está tanto ao meu lado esquerdo (corpo como referência) como
ao lado esquerdo de um caderno (objeto como ponto de referência). Para se
adquirir o conceito de relação espacial é necessário ter adquirido o conceito de
posição espacial. “A percepção de espaço não se limita, portanto, a percepção
da profundidade. Uma parte essencial dela é constituída pela percepção das
disposições dos objetos em relação uns aos outros” (LURIA, ano 1991 p.83,
volume II).
Para Luria o espaço percebido tem caráter assimétrico, onde a posição
dos objetos é decisiva para o observador. A orientação nesse espaço
assimétrico é tão complexa, sendo que são necessários mecanismos
suplementares: “... antes de tudo a distinção da mão direita “principal” com cujo
apoio o homem faz uma análise complexa do espaço anterior e do sistema de
representação espaciais abstratas (direita - esquerda), que como mostraram
observações psicológicas, é de origem histórico-social” (LURIA, ano 1991 p.84,
volume II).
Segundo José (2001, p. 79), “orientar-se no espaço é ver-se e ver as
coisas no espaço em relação a si próprio, é dirigir-se, é avaliar os movimentos
e adaptá-los no espaço. Estabilizar o espaço vivido e dessa forma poder situar-
se e agir correspondentemente. Enfim, é a consciência da relação do corpo
com o meio”.
A seguir seguem algumas definições a serem consideradas, das quais
dependem a percepção e orientação espacial:
Imagem e esquema corporal - Imagem corporal é a impressão que o
indivíduo tem do seu próprio corpo sendo indispensável para formação do eu.
A criança percebe-se e percebe o mundo a partir do seu próprio corpo e este
conhecimento do corpo, consciente e intelectual, vai além das funções de seus
órgãos. A criança que não desenvolve bem o seu esquema corporal pode ter
dificuldades, dentre outras, em orientação espacial.
Lateralidade - é o domínio de um dos hemisférios cerebrais sobre o outro, com
relação a determinadas funções, nos níveis da força e precisão dos
movimentos, é o uso preferencial de um lado do corpo para realização das
atividades. A lateralidade é definida a partir da preferência neurológica que se
tem por um lado do corpo, no que diz respeito à mão, pé, olho. As dificuldades
na lateralidade estão relacionadas com a orientação espacial levando às
posturas inadequadas que incidem diretamente sobre a escrita da criança (por
exemplo: escrita especular ou “escrita em espelho” que interferirão de forma
negativa na associação entre letras e sons).
h) PERCEPÇÃO TEMPORALA Percepção temporal é o desenvolvimento da capacidade de percepção
em relação a uma sucessão de acontecimentos, duração de intervalos, o
caráter irreversível do tempo e a renovação de certos períodos como hora, dias
da semana, meses do ano, estações, etc.
Para compreender o tempo é necessário levar em consideração dois
aspectos: o tempo próprio de cada indivíduo e o tempo externo ao qual ele
deve se adaptar.
De acordo com Morais (2006, p.38) quando se fala em tempo, sempre
se engloba dois conceitos fundamentais: duração e sucessão. Todos os fatos
que ocorrem no tempo, apresentam certa duração (curta, longa ou média) e
uma determinada sucessão, ou seja, uns acontecem antes e outros depois.
Além de a criança precisar captar e discriminar a duração e a sucessão
de sons, ela deve também dominar determinados conceitos temporais, tais
como: ontem, hoje, amanhã, dias da semana, meses, anos, hora, estações do
ano, etc. A apropriação destes conceitos vai permitir que a criança se oriente
no tempo durante a realização das atividades propostas.
As experiências com a percepção temporal permitirão que a criança
situe-se em acontecimentos ocorridos e a percepção daquilo que pode ser
projetado a um futuro, permitindo-lhe que projete na sua vida pessoal,
desenvolvendo, entre outras coisas, desde o planejamento de ações simples
relacionadas a um tempo curto como de ações mais complexas, relacionadas a
um tempo mais longo.
O ritmo está relacionado com o fator tempo, pois o ritmo consiste numa
sucessão de elementos sonoros no tempo e que obedecem a uma determinada
duração. A atividade rítmica desempenha um papel fundamental e serve de
base para aprendizagem da leitura e da escrita.
1.3.2.3 ÁREA SENSÓRIO-MOTORAA área sensório-motora é construída a partir da percepção e dos
movimentos que através dos órgãos dos sentidos (visão, audição, tato, olfato e
paladar) permitem a interação com o meio exterior e suas sensações internas
(dor, prazer, excitação e relaxamento).
A coordenação visomotora é a integração entre os movimentos do corpo
(globais e específicos) e a visão. A coordenação motora global coloca em ação
vários grupos musculares amplos, enquanto a coordenação motora fina
envolve habilidades manuais, como a preensão, que são essenciais para o
desenvolvimento do grafismo e da escrita.
O corpo é a via de acesso ao mundo. Maior ou menor autonomia
corporal depende em grande parte, da quantidade e da qualidade de
experiências motoras vivenciadas pela criança no dia-a-dia. Cabe a escola
trabalhar atividades que ampliem as possibilidades lúdicas e afetivas da
criança, favorecendo gradativamente sua autonomia e o convívio social. Ou
seja, através de jogos, brincadeiras e outras atividades que levem ao respeito
mútuo e à cooperação.
Se a criança não tiver consciência do corpo, de como se situa no espaço
ou não perceber a relação de distância, posição dos objetos em relação a si
mesma, não dominará movimentos de forma harmônica. Isto poderá resultar
em certo desajeitamento, falta de coordenação motora, lentidão na escrita,
letras mal grafadas etc.
1.3.2.4 ÁREA CONCEITUAL
a) CONHECIMENTO LÓGICO- MATEMÁTICOPensar matemática hoje é pensar em uma ciência estruturada por um
corpo de conhecimentos organizados e com historicidade, gerada a partir de
situações problemas. Além disso, a matemática é também ferramenta de
aplicação em outras áreas do conhecimento, é jogo lúdico e linguagem para a
comunicação e a interpretação da realidade.
A matemática comporta um amplo campo de relações, regularidades e
coerências que despertam a curiosidade e instigam a capacidade de
generalizar, projetar, prever e abstrair, favorecendo a estruturação do
pensamento e do conhecimento lógico. “O conhecimento lógico-matemático é
um bem cultural em constante construção e elaboração. É produzido na
relação do homem com a natureza e no interior das relações sociais, como
forma de resposta às necessidades humanas” (p. 8, 1999 SIEDEL).
O conhecimento matemático é um instrumento para se apropriar da
construção do saber científico e responsável pela capacidade de deduzir,
induzir e prever ações ou reações futuras em determinados contextos.
Segundo Kami (2000, p.15) o conhecimento lógico-matemático consiste
na coordenação de relações onde a base fundamental deste conhecimento é a
própria criança. No processo cognitivo, o conhecimento lógico matemático se
dá por meio da interpretação, construção de ferramentas conceituais e criação
de significados, sensibilização para perceber os problemas quanto saber
equacioná-los ou resolvê-los, ou ainda “... resulta das relações que o sujeito
estabelece com ou entre objetos, ao agir sobre eles” (TOLEDO, p.18, 1997).
Já o raciocínio é uma forma de pensar por meio do qual ensaiamos
simbolicamente soluções para um ou vários problemas. É evidente que esta
não é a única maneira do homem resolver problemas. Quando estamos
aprendendo ensaiamos, erramos, tornamos a ensaiar até conseguir uma
sequência certa de respostas. O raciocínio deve ser entendido como uma série
de passos seguidos na resolução mental de um problema. De acordo com
Dorin (1978, p. 129-130) o raciocínio pode ser classificado da seguinte forma:
a) discordância: o indivíduo, em virtude de um motivo, é conduzido a um
problema, a um obstáculo; b) diagnóstico: ele percebe a origem do problema;
c) hipótese: faz várias suposições para resolver o problema; d) dedução: deduz
uma conseqüência, uma forma para resolvê-lo; e) verificação: na prática,
através da experiência, ele compara a conseqüência com a realidade e tem a
demonstração se seu pensamento estava correto.
Para acompanhar a sequência desses passos e a resolução de um
problema, um individuo irá utilizar-se de algumas formas de raciocínio dedutivo
e indutivo. O raciocínio dedutivo é aquele que parte do conhecimento do
conjunto para as partes de um objeto. Já o raciocínio indutivo se utiliza das
partes para compreender o conjunto. Entretanto, é bom frisar que essa forma
de raciocinar não resulta em um conhecimento completo de uma situação,
como também a forma dedutiva não o faz. Utilizamos ambos os raciocínios
para estabelecer relações com o ambiente, produzindo novos conhecimentos.
b) CONSTRUÇÃO DA LINGUAGEM LINGUAGEM COMPREENSIVA:
É a forma pela qual se avalia a memória auditiva, através da
compreensão e interpretação de mensagens recebidas. A linguagem pode ser
definida como um sistema multissensorial, que envolve as áreas do
desenvolvimento, a afetividade e a socialização, pois a mesma é adquirida
através de experiências significativas e das relações estabelecidas.
Para Luria (1987), a linguagem é um sistema de códigos que possui sua
estrutura e a sua lógica.
No documento da SEED/Pr (1999) ela é classificada como linguagem
interior, linguagem falada (receptiva e expressiva), linguagem escrita (receptiva
e expressiva) e linguagem quantitativa.
Segundo Morais (2006), a linguagem falada receptiva está diretamente
ligada à compreensão da expressão vivenciada. Nesta fase os objetos que
adquiriram significado para a criança são associados ao seu nome.
O processo de compreensão decorre da absorção de informações que
irão fazer refletir sobre a mensagem recebida para então se concluir a respeito.
Nesse processo é necessário que a informação tenha um significado. Isso
ajudará na apropriação das idéias. Coelho (2006, p.76) diz ainda que:
O ser humano apresenta basicamente três sistemas verbais: auditivo (palavra falada), visual (palavra lida), e escrito. O primeiro que ele adquiriu foi o auditivo, porque é o mais fácil de aprender e também o que exige menos maturidade psiconeurológica. O mesmo não ocorre com a palavra lida e escrita.
A aprendizagem da fala, porém requer o que Johnson e Myklebust
chamam de linguagem interna: “... o significado da palavra precisa ser
adquirido antes que as palavras possam ser usadas como tais. Para que uma
palavra tenha significado, ela precisa representar uma determinada unidade de
experiência. Os processos de linguagem interna são aqueles que permitem a
transformação da experiência em símbolos”.
Precisamos ainda considerar as outras formas da linguagem a serem
adquiridas, que são a recepção e a expressão. De acordo com Coelho (2006,
p.76) a recepção antecede a expressão, no que diz respeito à palavra falada;
em termos do sistema visual, significa que a leitura antecede a escrita.“A compreensão da linguagem parece preceder a compreensão da fala, pois a
criança se comunica através de gestos, olhares e mímica antes de poder se expressar oralmente. Ela também compreende muitas palavras num estágio bem anterior aquele em que adquire capacidade para articulá-la”. (COELHO, p.35,2006)
LINGUAGEM EXPRESSIVA:Pela necessidade de se comunicar de uma forma diferente do animal e
que caracterize a sua espécie, o homem produziu a linguagem que possibilitou
a este a capacidade de fazer generalizações e abstrações do mundo exterior,
isto é, ter a capacidade de operar na ausência de objetos.
A abstração é uma fuga mental da realidade, sendo uma característica
plenamente humana. Portanto, tanto a consciência como a linguagem humana
são processos históricos, não são inatos no homem, não foram dados pela
natureza, mas construídos ao longo de sua história. Segundo Vigotski:
A linguagem se constitui primeiramente no plano do funcionamento comunicativo, envolvendo regulamentações recíprocas entre crianças e outros elementos desse processo: da interação emissor-receptor que caracteriza a função comunicativa, nasce uma relação do sujeito com sua própria escrita (Vygotsky, apud Almeida, 2000, p.9).
As características dos processos nervosos superiores surgem com o
desenvolvimento da linguagem. Quando a criança aprende a ler, a escrever, a
fazer contas, quando aprende os fundamentos da ciência, assimila uma
experiência humano-social alcançada pela interação direta com o ambiente.
Através da generalização verbal, a criança possui um novo fator de
desenvolvimento – aquisição da experiência humano-social – que se converte
rapidamente no fator fundamental da sua formação mental. Para Luria: “A
função da generalização é a função principal da linguagem, sem a qual seria
impossível adquirir a experiência das gerações anteriores. Mas a linguagem
não é apenas um meio de generalização e sim, ao mesmo tempo, a base do
pensamento”. (2003, p. 80).
Quando a criança assimila a linguagem, consegue organizar de nova
maneira a percepção e a memória; assimila formas mais complexas de reflexão
sobre os objetos do mundo exterior; adquire a capacidade de tirar conclusões
das suas próprias observações, de fazer deduções; conquista todas as
potencialidades do pensamento.
A atividade verbal além de ser um meio de generalização é uma fonte de
pensamento e também um meio para regular o comportamento. A linguagem
expressiva nesta perspectiva é a forma significativa e compreensiva de
interação entre os sujeitos. Assim a atividade verbal pode-se revelar através da
escrita, da oralidade, dos gestos e movimentos (dramatização, expressão facial
entre outras).
PENSAMENTO SIMBÓLICOGrande parte da representação e comunicação humana de
conhecimentos ocorre através de sistemas de símbolos, ou seja, sistemas de
significado culturalmente projetados que captam formas importantes de
informação. Linguagem, desenho, matemática são apenas três dos sistemas
de símbolos que se tornaram importantes no mundo para a sobrevivência. O
pensamento é uma atividade mental organizada, com alto grau de liberdade,
não limitada ao mundo físico. É um processo organizado de representação
neural que forma um modelo mental para o planejamento, definição de
estratégias, previsões e soluções de problemas. Este processo envolve a
correlação e a integração de eventos críticos no tempo e no espaço.
O pensamento simbólico parte da idéia que a cabeça pode pensar sobre
algo sem precisar vê-lo à sua frente. Implica representação de um objeto
ausente, visto sem comparação entre um elemento dado e um elemento
imaginado e uma representação fictícia. É na primeira infância que ocorrem as
genes simbólicas que permitirão ao indivíduo dialogar com o mundo, com os
outros e consigo mesmo. Segundo Cunha (2004, p. 40) “este diálogo só é
possível porque cada um pode utilizar um instrumento individual maravilhoso,
pode imaginar através de símbolos.” Neste sentido a imaginação é a poderosa
ferramenta que, ao sustentar o sentir, sustenta o raciocínio e, por ambos, cria o
sonho.
Quando é iniciado o pensamento simbólico e sistemático o ser humano
começa a desenvolver as relações com o mundo. Isso é possível perceber
quando lembra das pessoas pela voz ou presença e reage. A criança, nesta
fase, passa bom tempo manipulando objetos, explorando seus sentidos, isso
acontece também por meio dos jogos simbólicos, onde a criança desenvolve
seus pensamentos começando a planejar as ações. Os objetos podem sofrer
grandes mudanças por meio da imaginação, a criança se utiliza dos jogos
simbólicos, que se expressam na brincadeira de faz-de-conta, durante a qual a
“cabeça” passa a dar significados a objetos e pessoas. (BEE, 1996)
Através da capacidade de simbolizar abrem-se novos mundos na
conquista do conhecimento pela criança, pois permite um tipo de ação
fisicamente não visível: a imaginação, a representação mental. Cunha (2004, p.
40) destaca que “... a criança passa a brincar e, jogando com a imaginação
aprende a falar, a desenhar, pular, cantar, modelar, dançar e pintar, criando
assim suas estruturas cognitivas e emocionais que lhe permitem,
simultaneamente, no ato de organizar a sua subjetividade, a organização
objetiva do mundo a sua volta”.
Uma das primeiras formas de linguagem que a criança adquire é o
gesto. Nessa aquisição, um movimento, inicialmente sem significado, na
interação desse sujeito com outros sujeitos sociais mais experientes passa a
ter sentido, neste movimento então é instituído o gesto.
Conforme Vigotski (1994- P.141) “O gesto é o signo visual inicial que
contém a futura escrita da criança, assim como uma semente contém um futuro
carvalho.” Sendo assim pode-se dizer que há uma estreita relação entre os
gestos e a construção da escrita, ambos são forma de representação e o gesto
poderá dar o suporte para compreensão mais tarde de que a escrita também é
uma maneira de representar/expressar o mundo.
A fala é um tipo de linguagem cuja função primordial é a comunicação
social e a interação entre as pessoas. Portanto, pode-se dizer que a fala é
essencialmente uma forma de representação construída socialmente e que tem
como uma de suas funções, a organização do pensamento. Quando a criança
pequena começa a desenvolver a oralidade, ela, juntamente com o adulto,
encontra um campo comum de significação e passa a utilizar um sistema
simbólico. O aparecimento da capacidade de representação simbólica,
evidenciado particularmente pela aquisição da linguagem, marca um salto
qualitativo no processo de desenvolvimento do ser humano.
O ato de desenhar é também uma forma de representação. Este põe
forma e sentido ao pensamento e ao conhecimento dominado. Uma vez que a
realidade pode ser simbolicamente representada, é importante que leve a
criança à compreensão das diversas formas de representação dessa realidade.
O desenho se configura como a primeira representação gráfica usada pela
criança.
Segundo Lima (2003. P. 16 e 17) “Uma das funções do desenho, no
desenvolvimento infantil, é ser uma situação complexa e muito rica de criação e
apropriação do símbolo, que fica então “gravado” no suporte e, assim, se
oferece ao processamento visual. A criança tem diante de si um produto final
de seu exercício simbólico.” Neste sentido, desde pequena a criança deve ter
acesso a diferentes materiais e suportes, tendo a oportunidade de ter diversas
experiências.
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