EJA – EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
Paulo Freire
Falar em Paulo Freire junto a grupos de educação de adultos é sinônimo de estar engajado em um trabalho de jovens e adultos não escolarizados visando à transformação da realidade daqueles que socialmente se encontravam marginalizados de uma sociedade letrada e, na maioria dos casos, vivendoum processo de exclusão social.
Paulo Freire, pernambucano, nasceu em Recife, em 19 de setembro de 1921. De familia humilde, teve uma infancia marcada por dificuldades economicas e desde cedo conheceu a pobreza de perto. Foi alfabetizado em casa, por seus pais, escrevendocom gravetos, no chão de terra debaixo das mangueiras do quintal. Como gostava muito de estudar, assim que concluiu a escola secundaria, tornou-se professor. Formou-se em Direito, mas não exerceu a profissão. Optou por se engajar na formação de Jovens e Adultos trabalhadores e por atuar em projetos de alfabetização. A partir de sua pratica, com uma metodologia diferente, criou uma teoria epistemológica (estudo critico dos métodos empregados nas ciências) que o tornou conhecido internacionalmente.
No entanto, "tudo começou", no hoje denominado Perído das Luzes da Educação de Adultos - EDA (1959-1964), marcado pelo Congresso de EDA (1958) que se caracterizou pela "intensa busca de maior eficiencia metodologica e por inovações importantes neste terreno, pela reintrodução da reflexão sobre o social no pensamento pedagogico brasileiro e pelos esforços realizados pelos mais diversos grupos em favor da educação da população adulta". (FREIRE, 2001. p.17)
Participando intensamente desse momento turbulento, Paulo Freire nos traz varios debates sobre a pratica da alfabetização de adultos, numa proposta de pedagogia critico-libertadora que inclui elementos filosoficos fundamentais como a dialogicidade, a leitura da palavra não dissociada da leitura do mundo, a importancia do saber e da cultura do educando, o educando enquanto sujeito de sua historia e tantos outros que estas referencias acabaram por se transformar, no imaginario de muitos educadores, também em um metodo de alfabetizar o alduto.
Apesar do golpe militar de 1964 e de seu exilio, Paulo Freire continua sua luta por uma educação libertadora nas suas andanças pelo mundo e, no Brasil, nas décadas de 1960 a 1980, os movimentos populares e inumeros militantes continuam seus trabalhos de alfabetização de aldultos na clandestinidade. Momentos extremamente duros, mas que foram muito alimentados pelo ideário e pelas experiencias do grande educador, que mesmo longe não deixava de contribuir para a resistencia de um trabalho politico-social-educativo em um mundo que precisava ser transformado e humanizado.
A Constituição Federal de 1988 previa em seu artigo 208, inciso 1º, que o Ensino Fundamental fosse obrigatorio e gratuito, inclusive para os que a ele
não tiveram acesso em idade própria e, praticamente, da mesma forma. Em Educação de Jovens e Adultos, a figura do professor Paulo Freire representava para muitos, e principalmente para aqueles que se constituiram em grupos de resistencia às praticas educativas calcadas no ideario do Mobral, a possibilidade da definição de uma politica que incorporasse a importancia da educação de Jovens e Adultos na transformação social da cidade e não somente uma educação visando o processo produtivo do país.
Isso porque, "a pratica educativa", reconhecendo-se como "pratica politica", se recusa a deixar-se aprisionar na estreiteza burocratica de procedimentos escolarizantes; lidando com o processo de conhecer, a pratica educativa é tão interessada em possibilitar o ensino de conteúdos às pessoas quanto em sua conscientização.(FREIRE, 1983, p. 27)
Ao ser anunciado para Secretário de Educação o nome do professor Paulo Reglus Neves Freire- conhecido pela existência politica de varios dos movimentos existentes - a expectativa de todos os educadores tornou-se enorme. Os movimentos imediatamente se reuniram e, antes mesmo de iniciar a gestão, lideranças dos movimentos populares discutiam um projeto em que estes tivessem participação mefetiva no processo de Alfabetização de Jovens e Adultos.
A educação de jovens e adultos é um debate que se concentra na situação de miseria social, das precarias condiçoes de vida da maioria da população e nos resultados do sistema público regular de ensino, não existindo uma discussão consistente sobre qual educação é necessaria a esse segmento excluido do sistema escolar. [...] Então, qualquer educação oferecida a les já é considerada um dado significativo, usando-se a logica que, aos pobres, qualquer "educação" basta, principalmente dirigindo-se a adultos que pouca possibilidade de aprendizado apresentam. (FREIRE,1996)
Isto significava, na concepção politico-filosofica de Paulo Freire, uma educação que reconhecia a pluralidade de experiencias que o educando jovem e adulto traz de sua vida, articulando sua vivencia, detectando sua realidade e seus saberes, para a partir deles ampliálos, permitindo uma leitura critica do mundo e uma apropriação e criação de conhecimentos que melhor capacitem o educando à ação transformadora de sua realidade social.
Para tanto, o processo de formação não foi concebido como mais um trabalho voltado para educadores, mas construido e organizado coletivamente, em busca de uma pratica que avançasse na qualidade desse atendimento e na construção de uma educação pública democratica. Sua palavra chave foi participação, uma lição que os movimentos sabiam ensinar e ensinaram.
O Brasil deve a Paulo Freire a inclusão na categoria de lutadores sociais de milhões de brasileiros que compreenderam o que é ser sujeito de sua própria historia. Permitiu a um numero expressivo de pessoas que pertenciam aos " de baixo" enxergarem-se como agentes transformadores na busca por uma sociedade mais justa e igualitaria. Deu-lhes a chance de escolher seu proprio caminho, em vez de ficarem sempre presos às alternativas impostas
pelas elites para perpetuar sua dominação de classe e a brutal exclusão social que sofrem os trabalhadores no Brasil, e me toda periferia capitalista.
Já era de se esperar que os interessados em manter seus privilegios e o desinteresse pelas questões politicas e sociais do homem e da sociedade brasileira viram logo no seu "método" um perigo iminente a predominacia dominante do estado atual, uma ameaça sem precedentes a seus valores e instrumentos de dominação, uma verdadeira "revolta contra o poder constituido", pois se tratava não só de alfabetizar com rapidez e eficacia, mas, estimular o processo de conscientização. O medo das elites se agravava quantomais crescia a aceitação de sua metodologia. Freire se refere a este fenomeno afirmando que "se não tivesse sido interrompido pelo golpe de 64, naquele ano, deveria estar em funcionamente vinte mil circulos da cultura em todo país" (Freire, 1987).
Paulo Freire como intelectual organico e, mais do que isso, como militante politico, ao colocar seus conhecimentos em pratica, valorizando o homem do povo, aprendendo com a vida, formandoeducadores engajados e respeitadores da experiencia e da sabedoria popular, tranformava valores, atacava o sistema de acesso a cargos e posições sociais, o autoritarismo e a hierarquização nas relaçoes. Revoltava-se contra o poder constituido, do fascinio capitalista, valorizando o homem e a natureza.
Uma caracteristica do pensar e do agir, da maneira de se relacionar e aprender em Paulo Freire, diz respeito à forma como ele vê o outro. O aprender a ouvir, a valorização dos saberes que vêm da experiencia e da cultura popular, a abertura para o dialogo com os diferentes e com os adversarios para melhor apreenser os antagonismos, são caracteristicas essenciais do projeto educativo de Paulo Freire.
Por fim, fica claro que o educador sabe que no meio do carater coletivo, convivem elementos de bom senso na experiencia popular, ou seja, a participação exercida como senso comum de todos. Por outro lado, o dialogo, o aprendizado e o respeito ao saber popular, não podem levar o educador a uma visão copmplacente que não contribua para inflamar o debate e o despertar para descobertas fantasticas. Pois aprender com o outro, no dialogo com seus semelhantes nos faz perceber que "ninguem educa a ninguem, ninguem tampouco se educa sozinho, os homens e as mulheres se educam entre si, mediatizados pelo mundo". Freire (1993).
A presença de adolescentes na Educação de Jovens e Adultos (EJA) no
Ensino Fundamental é preocupante: quase 20% dos matriculados têm de 15 a
17 anos. O número de alunos dessa faixa etária na modalidade não tem sofrido
grandes variações nos últimos anos, apesar da queda no total de matrículas
(28,6%). Dados da Ação Educativa com base nos Censos Escolares indicam
que, em 2004, eram 558 mil estudantes e, em 2010, 565 mil. O cenário tem
chamado a atenção dos especialistas da área. Por que esses adolescentes
estão frequentando a modalidade, em vez de estar na Educação Básica
regular? São vários os motivos (leia na última página os depoimentos de 13
estudantes). Alguns extrapolam os muros da escola, enquanto outros têm a ver
diretamente com a qualidade da Educação, ou seja, envolvem o Ministério da
Educação (MEC), Secretarias Municipais e Estaduais, gestores e, é claro, os
professores que lecionam na modalidade.
Três grandes questões sociais fazem com que, todos os anos, muita gente
desista de estudar ou então deixe a sala de aula temporariamente:
- Vulnerabilidade Muitos estudantes enfrentam problemas como a pobreza
extrema, o uso de drogas, a exploração juvenil e a violência. "A instabilidade na
vida deles não permite que tenham a Educação como prioridade, o que os leva
a abandonar a escola diversas vezes. Quando voltam, anos depois, só resta a
EJA", diz Maria Clara Di Pierro, docente da Faculdade de Educação da
Universidade de São Paulo (USP).
- Trabalho A necessidade de compor a renda familiar faz com que muitos
alunos deixem o Ensino Fundamental regular antes de concluí-lo. O estudo
Jovens de 15 a 17 Anos no Ensino Fundamental, publicado este ano na série
Cadernos de Reflexões, do MEC, revela que 29% desse público que está
matriculado do 1º ao 9º ano já exerce alguma atividade remunerada, sendo que
71% ganham menos de um salário mínimo. A dificuldade de conciliar os
estudos com o trabalho faz com que mudar para as turmas da EJA, sobretudo
no período noturno, seja a única opção.
- Gravidez precoce A chegada do primeiro filho ainda na adolescência afasta
muitos da sala de aula, principalmente as meninas, que param de estudar para
cuidar dos bebês e, quando conseguem, retornam à escola tempos depois,
para a EJA. Assim, não estudam com colegas bem mais novos e concluem o
curso em um tempo menor. Segundo a Fundação Perseu Abramo, 20% dos
meninos que largaram os estudos tiveram o primeiro filho antes dos 18 anos.
Entre as mulheres, esse percentual é de quase 50%. Dessas, 13% se tornaram
mães antes dos 15 anos, 15% aos 16 anos e 19% aos 17 anos.
O sistema educacional e seus problemas
Os demais motivos que levam a garotada a se matricular na EJA têm a ver com
a falta de qualidade do sistema de ensino e suas consequências:
- Reprovação e evasão O estudo do MEC aponta que a repetência de 17,4%
na 7ª série e 22,6% na 8ª série só não é maior devido ao aumento da evasão
escolar. Em 2005, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais
Anísio Teixeira (Inep) divulgou que a taxa de evasão cresce continuamente ao
longo dessa etapa de Educação (na 1ª série é de 1%, na 5ª, de 8,3%, e na 8ª,
de 14,1%).
- Distância da escola no campo Reunir alunos da zona rural em uma só
escola núcleo é uma saída das redes para garantir que os professores
alcancem o número mínimo de aulas e reduzir os gastos com infraestrutura e
transporte. Isso, no entanto, nem sempre é positivo para muitos dos alunos: a
distância passa a ser mais um empecilho para que sigam estudando.
- Desmotivação Sem se interessar pelo que a escola oferece, vários
adolescentes deixam de frequentar as aulas e só tempos depois retornam,
cientes da importância dos estudos. Não só o currículo mas também a forma
como ele é trabalhado provocam o desinteresse. "Às vezes, frequentar a igreja
ou assistir à televisão são atividades mais atraentes do que o conteúdo das
disciplinas", diz Eliane Ribeiro Andrade, professora da Faculdade de Educação
da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UFRJ). Adequar as aulas às
necessidades dos alunos que têm mais de 15 anos e ainda estão no Ensino
Fundamental, e não esperar que o contrário ocorra, é um desafio. "Isso é
possível quando são propostas diferentes estratégias para ajudá-los a superar
as dúvidas e dificuldades do cotidiano", explica Cleuza Repulho, presidente da
União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) e secretária
de Educação de São Bernardo do Campo, na Grande São Paulo.
- Decisão do gestor Trata-se da atitude irresponsável de empurrar casos
considerados problemáticos para as turmas de EJA. Dessa forma, os diretores
buscam se livrar da indisciplina e evitar que os resultados da escola nas
avaliações externas piorem, o que impacta o cálculo do Índice de
Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb). Um verdadeiro processo de
higienização do Ensino Fundamental, que reconhece as turmas de EJA como
algo menor e sem importância. Para superar o problema, é preciso investir em
formação e conscientização dos gestores.
Estudantes da EJA explicam seus motivos
Trabalho "Comecei a trabalhar com 5 anos. Desisti de ir para a escola no 5º
ano. Hoje trabalho com uma carroça, mas já sei dirigir carro e moto. Já fui
pedreiro e vez ou outra faço uns bicos de ajudante. Vou terminar a escola para
ter um emprego melhor."
Geraldo Ribeiro do Nascimento, 15 anos, aluno do 3º ciclo da EJA (7ª e 8ª
séries), em Juazeiro do Norte, CE.
Distância da escola "Resolvi estudar à noite, na EJA, porque à tarde levo e
busco meus irmãos na escola, que fica a 4 quilômetros da nossa casa. A
prioridade é que eles, que são menores, não faltem nunca. Quando não tem
carona, ando 24 quilômetros por dia para levá-los, buscá-los e para eu mesmo
ir e voltar da escola."
João Paulo das Neves Martins, 16 anos, aluno do 4º ciclo da EJA (7ª e 8ª
séries), em Marabá, PA.
Reprovação "Fui reprovado três vezes por indisciplina. Minha avó também foi
aluna da EJA e me ajudou a mudar. Na sala, os alunos mais velhos são
comportados, mas são legais. A história de vida deles serve de exemplo para
quem é mais novo. Quero fazer um curso técnico de mecatrônica."
Jordan Germano Castelaci, 15 anos, aluno do 4º ciclo da EJA (7ª e 8ª série),
em Curitiba.
Decisão do gestor "Por nota, só repeti a 2ª série. Nos outros quatro anos, fui
reprovada porque sempre abandonava a escola. Era uma aluna problema,
brigava muito e matava várias aulas. Por isso, me mandaram para a EJA. Hoje,
continuo estudando porque quero melhorar minha vida."
Poliana Maria da Silva, 15 anos, aluna do 4º ciclo da EJA (7ª e 8ª séries), em
Juazeiro do Norte, CE.
Evasão "Entrava na escola e logo saía. Achava que não aprendia nada. Só
aos 15 anos comecei a levar os estudos a sério. Casei há dois anos e minha
sogra me incentivou a voltar. Para tudo nessa vida, tem de estudar. Hoje, se
estou com dificuldades, procuro o professor. Meu sonho é ser médica e vou
correr atrás disso."
Mari Taís da Silva, 19 anos, aluna do 3º ciclo da EJA (5ª e 6ª séries), em
Juazeiro do Norte, CE.
Trabalho "Saí da escola para tentar ser jogador de futebol no time do
Fortaleza. Passei na peneira, mas fui dispensado porque não estava
estudando. Perdi a grande chance da minha vida porque deixei a escola. Voltei
porque quero fazer administração."
Marcelo José da Silva, 16 anos, aluno do 3º ciclo da EJA (7ª e 8ª séries), em
Juazeiro do Norte, CE.
Decisão do gestor "Sempre trabalhei como pintor e repeti uma única vez. Este
ano, mudei de escola porque a diretora me mandou para a EJA. Na minha sala,
somos apenas oito alunos jovens. O restante da turma é formado só por
pessoas mais velhas. Sinto falta do colégio anterior, principalmente dos meus
amigos."
Cosme Monteiro da Silva, 15 anos, aluno do 4º ciclo da EJA (7ª e 8ª séries),
em Teresina, PI.
Reprovação "Faltava muito e por isso repeti o 2º ano, depois o 3º, o 4º e o 5º.
Quando fui reprovada no 6º, decidi ir para a EJA. Estava me sentindo velha,
meus colegas eram pequenos. Aqui sou a mais nova, mas me sinto à vontade.
Tem gente de todas as idades."
Taís Daniele Cardoso, 16 anos, aluna do 3º ciclo da EJA (5ª e 6ª séries), em
Sertãozinho, SP.
Trabalho "Durante o dia, trabalho em uma casa de família e à noite vou para a
escola. Prefiro frequentar as turmas da EJA porque as aulas são mais
tranquilas, não tem bagunça. A minha vontade é fazer faculdade de
administração de empresas e quero estudar até quando for possível."
Jessislane Rodrigues Aquino, 15 anos, aluna do 3º ciclo da EJA (5ª e 6ª
séries), em Marabá, PA.
Distância da escola "Morava na zona rural, minha casa ficava muito longe da
escola e não havia transporte. Durante seis anos, ajudei meu pai na roça. Este
ano, ele passou a trabalhar em uma fábrica aqui e comecei a estudar. Como
nunca havia frequentado a escola, recomendaram que eu fosse para a EJA."
Jackson Martins da Silva, 18 anos, aluno do 1º ciclo da EJA (1ª e 2ª séries),
em Sertãozinho, SP.
Gravidez precoce "Fiquei sem estudar por dois anos porque me casei, tive
bebê e meu ex-marido era muito ciumento. Perdi muito tempo, mas voltei mais
madura. Antes, só pensava em bagunçar. Aqui, na EJA, não tem isso. Só tenho
uma amiga, mas acho até bom porque me concentro mais. Quero logo tirar o
diploma e conseguir ser advogada."
Marciane Souza Dias, 18 anos, aluna do 4º ciclo da EJA (7ª e 8ª séries), em
Teresina, PI.
Desmotivação "Fiquei três anos fora do colégio porque achava estudar chato
demais. Cheguei a dizer para a minha mãe que ‘preferia morrer a voltar pra
escola’. Ela tem 60 anos e me convenceu a voltar quando ela própria se
matriculou. Hoje, estamos na mesma turma."
Solução para o problema está distante
Segundo Roberto Catelli Júnior, coordenador de projetos da Ação Educativa, a
procura dos adolescentes entre 15 e 17 anos por vagas na modalidade deve se
manter por um bom tempo, já que a taxa de conclusão do Ensino Fundamental
na idade correta é muito baixa. Para ter uma dimensão do problema, somente
seis em cada dez estudantes de 16 anos concluíram o 9º ano ou a 8ª série em
2009, segundo o movimento Todos pela Educação. "Os jovens que estão na
EJA hoje já passaram pela escola regular e ela, por sua vez, não deu conta de
garantir a eles a aprendizagem. Tempos depois, esses adolescentes retornam,
dando mais uma chance para a instituição, que não pode desperdiçá-la", diz
Cleuza.
Também podem estar entre os alunos da modalidade nos próximos anos
aqueles que estão fora da escola atualmente. O mais recente levantamento a
respeito feito pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) revela
que 570 mil meninas e meninos entre 7 e 14 anos estão excluídos do sistema
educacional brasileiro. Na população entre 15 e 17 anos, são cerca de 1,5
milhão.
Em 2007, o Conselho Nacional de Educação (CNE) discutiu a possibilidade de
elevar para 18 anos a idade mínima para o ingresso no Ensino Fundamental da
EJA (hoje, é exigido ter 15 anos). A medida, que tinha como objetivo proibir o
ingresso de adolescentes na modalidade, não foi aprovada pelo MEC. Para
Elaine, da UFRJ, a decisão foi acertada. "Em um mundo ideal, a proposta é
muito boa. Mas não podemos tirar a oportunidade de milhares de adolescentes
de estudar. Quanto mais possibilidades de atender essa população, maiores as
chances de garantir a permanência na escola e a conclusão dos estudos."
Assim, colocá-los muitas vezes em turmas em que estudam colegas idosos
não chega a ser um problema. Quando a gestão funciona, os professores são
bem formados e o currículo é organizado levando em conta a pluralidade de
idades, o clima pode ser harmonioso, e o contato com pessoas de idades
diferentes, positivo. Quando o jovem está sozinho em meio a colegas mais
velhos, no entanto, sente falta de se relacionar com pessoas da mesma faixa
etária. "Não há regra. O problema é que nem sempre os professores estão
preparados para resolver os problemas que surgem, como conflitos de opiniões
entre gerações diferentes", explica Maria Clara, da USP.
No âmbito mais amplo, no que se refere à gestão do sistema, os governos
municipal, estadual e federal precisam atuar em conjunto com as Secretarias
de Educação para atacar os problemas relacionados à vulnerabilidade, à
gravidez na adolescência e ao ingresso precoce no mercado de trabalho. E as
Secretarias, em parceria com as escolas, devem trabalhar para reduzir o
tamanho das turmas para atender todos de modo adequado, assegurar o
transporte escolar, selecionar material didático específico e garantir a formação
dos professores. Este ano, há mais de 18 mil vagas em cursos para quem
leciona para EJA, diz Carmem Gatto, coordenadora da modalidade no MEC.
Ignorar a urgência dessas tarefas só vai fazer com que a situação piore e
comprometa as poucas boas notícias da área, como a pequena taxa atual do
analfabetismo entre 15 e 18 anos, cerca de 1,5%.
Alfabetização
Ana Teberosky é uma das pesquisadoras mais respeitadas quando o tema é
alfabetização. A Psicogênese da Língua Escrita, estudo desenvolvido por ela e
por Emilia Ferreiro no final dos anos 1970, trouxe novos elementos para
esclarecer o processo vivido pelo aluno que está aprendendo a ler e a
escrever. A pesquisa tirou a alfabetização do âmbito exclusivo da pedagogia e
a levou para a psicologia. "Mostramos que a aquisição das habilidades de
leitura e escrita depende muito menos dos métodos utilizados do que da
relação que a criança tem desde pequena com a cultura escrita", afirma. Para
ela, os recursos tecnológicos da informática estão proporcionando novos
aprendizados para quem inicia a escolarização, mas as práticas sociais, cada
vez mais individualistas, não ajudam a formar uma comunidade alfabetizadora.
Doutora em psicologia e docente do Departamento de Psicologia Evolutiva e da
Educação da Universidade de Barcelona, ela também atua no Instituto
Municipal de Educação dessa cidade, desenvolvendo trabalhos em escolas
públicas.
De quem é a culpa quando uma criança não é alfabetizada?
Ana Teberosky - A responsabilidade é de todo o sistema, não apenas do
professor. Quando a escola acredita que a alfabetização se dá em etapas e
primeiro ensina as letras e os sons e mais tarde induz à compreensão do texto,
faz o processo errado. Se há separação entre ler e dar sentido, fica difícil
depois para juntar os dois.
Como deve agir o professor especialista ao deparar com estudantes de 5ª
a 8ª série não alfabetizados?
Ana Teberosky - Todo educador precisa saber os motivos pelos quais a
alfabetização não ocorre. Sou contra usar rótulos como alfabetizado e não-
alfabetizado, leitor e não-leitor. Quando se trata de conhecimento, não existe o
"tudo ou nada". Uma criança que tenha acabado as quatro primeiras séries,
apesar de dominar os códigos da língua, pode ter dificuldade em compreender
um texto e não estar habituada a estudar. Algumas apresentam resistência a
tudo o que se refere à escola por motivos vários. Outras têm mesmo
dificuldades e, por não saber superá-las ou não contar com alguém para
ajudar, evitam contato com textos. Cada caso exige atenção e tratamento
diferentes.
A atitude positiva do professor tem impacto na alfabetização da turma?
Ana Teberosky - Acreditar que o aluno pode aprender é a melhor atitude de
um professor para chegar a um resultado positivo em termos de alfabetização.
A grande vantagem de trabalhar com os pequenos é ter a evolução natural a
seu favor. Se não existe patologia, maus-tratos familiares ou algo parecido,
eles são máquinas de aprender: processam rapidamente as informações, têm
boa memória, estão sempre dispostos a receber novidades e se empolgam
com elas. Um professor que não acha que o estudante seja capaz de aprender
é semelhante a um pai que não compra uma bicicleta para o filho porque esse
não sabe pedalar. Sem a bicicleta, vai ser mais difícil aprender!
Os defensores do método fônico culpam o construtivismo, base dos
Parâmetros Curriculares Nacionais, pelos problemas de alfabetização no
Brasil. O que a senhora pensa disso?
Ana Teberosky - Para afirmar se a culpa é ou não de determinada maneira de
ensinar, seria necessário ter um estudo aprofundado das práticas pedagógicas
dos alfabetizadores em todo o país. Uma coisa é o que eles declaram fazer,
outra é o que eles executam de fato. Quem afirma que uma forma de
alfabetizar é melhor que a outra está apenas dando sua opinião pessoal já que
não existe nenhuma pesquisa nessa linha. A dificuldade em alfabetizar no
Brasil é histórica e já existia mesmo quando o método fônico estava na moda.
O bom desempenho de alguns países nas avaliações internacionais pode ser
atribuído à utilização do método fônico?
Ana Teberosky - Não dá para comparar um país com outro, porque não é
somente a maneira de ensinar que muda. Outros fatores aliás,
importantíssimos influenciam no processo de aquisição da escrita, como as
características de cada idioma. É muito mais fácil alfabetizar em uma língua em
que há correspondência entre o sistema gráfico e o sonoro ou naquelas em
que as construções sintáticas são simples, por exemplo.
O método fônico e a psicogênese da língua escrita são incompatíveis?
Ana Teberosky - A psicogênese não é método, e sim uma teoria que explica o
processo de aprendizagem da língua escrita. Nesse contexto, defendemos a
integração de várias práticas pedagógicas. Mas o importante é que se leve em
conta, além do código específico da escrita, a cultura e o ambiente letrados em
que a criança se encontra antes e durante a alfabetização. Não dá para ela
adquirir primeiro o código da língua e depois partir para a compreensão de
variados textos. Nós acreditamos que ambos têm de ocorrer ao mesmo tempo,
e aí está o diferencial da nossa proposta.
Como o processo de alfabetização deve ser avaliado?
Ana Teberosky - O professor deve se basear no momento inicial de
aprendizagem de cada aluno, verificando o que ele conquistou em determinado
período. Além do mais, a avaliação passa pela análise do próprio trabalho: o
professor tem condições materiais e estruturais para ensinar? Ele criou um
ambiente alfabetizador favorável à aprendizagem e necessidades de usar a
língua escrita?
O que é um ambiente alfabetizador?
Ana Teberosky - É aquele em que há uma cultura letrada, com livros, textos
digitais ou em papel , um mundo de escritos que circulam socialmente. A
comunidade que usa a todo momento esses escritos, que faz circular as idéias
que eles contêm, é chamada alfabetizadora.
Nós vivemos em uma comunidade alfabetizadora?
Ana Teberosky - Cada vez menos a sociedade auxilia a alfabetização por não
promover situações públicas em que seja possível a circulação de escritos,
debates, discussões e reuniões em que todos sintam necessidade e vontade
de usar a palavra. O individualismo vai contra a formação de leitores e
escritores. Há uma tese brasileira que mostra como os sindicatos, durante sua
história, desenvolveram uma cultura alfabetizadora entre seus membros. Como
os líderes tinham de convencer os filiados sobre determinadas teses,
buscavam informações para embasar seus argumentos, levantavam questões
e respondiam às apresentadas. Os sindicalizados, por seu lado, também
precisavam ler documentos, participar de reuniões, colocar suas dúvidas e
opiniões para decidir.
Quais atividades o professor alfabetizador deve realizar?
Ana Teberosky - Formar grupos menores para as crianças terem mais
oportunidade de falar e ler para elas são estratégias fundamentais! É preciso
compartilhar com a turma as características dos personagens, comentar e fazer
com que todos falem sobre a história, pedir aos pequenos para recordar o
enredo, elaborar questões e deixar que eles exponham as dúvidas. Se nos 200
dias letivos o professor das primeiras séries trabalhar um livro por semana, a
classe terá tido contato com 35 ou 40 obras ao final de um ano.
É correto o professor escrever para os alunos quando eles ainda não
estão alfabetizados?
Ana Teberosky - Sim. A atuação do escriba é um ponto bastante importante
no processo de alfabetização. O estudante que dita para o professor já ouviu
ou leu o texto, memorizou as principais informações que ele contém e com isso
consegue elaborar uma linha de raciocínio. Ao ver o que disse escrito no
quadro-negro, ele diferencia a linguagem escrita da falada, seleciona as
melhores palavras e expressões, percebe a organização da escrita em linhas, a
separação das palavras, o uso de outros símbolos, como os de pontuação. A
criança vê o seu texto se concretizar.
O computador pode ajudar na alfabetização?
Ana Teberosky - O micro permite aprendizados interessantes. No teclado, por
exemplo, estão todas as letras e símbolos que a língua oferece. Quando se
ensina letra por letra, a criança acha que o alfabeto é infinito, porque aprende
uma de cada vez. Com o teclado, ela tem noção de que as letras são poucas e
finitas. Nas teclas elas são maiúsculas e, no monitor, minúsculas, o que obriga
a realização de uma correspondência. Além disso, quando está no computador
o estudante escreve com as duas mãos. Os recursos tecnológicos, no entanto,
não substituem o texto manuscrito durante o processo de alfabetização, mas
com certeza o complementam. Aqueles que acessam a internet lêem
instruções ou notícias, escrevem e-mails e usam os mecanismos de busca.
Ainda não sabemos quais serão as conseqüências cognitivas do uso do
computador, mas com certeza ele exige muito da escrita e da leitura.
Emoções na Aprendizagem
Entre 1995 e 2000, o chileno Juan Casassus esteve à frente de um ambicioso
estudo da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a
Cultura (Unesco), sobre a qualidade da Educação na América Latina. A
pesquisa, realizada em 14 países - incluindo o Brasil - e publicada no livro A
Escola e a Desigualdade, analisou fatores que favorecem o bom desempenho
dos estudantes.
Docentes com formação sólida, avaliação sistemática, material didático
suficiente, prédios adequados e famílias participativas apareceram como
características importantes. Mas um aspecto lhe chamou a atenção: ter um
ambiente emocional adequado, gerado pelo bom relacionamento entre
professor e aluno, também é fundamental. "Essa descoberta me surpreendeu.
Com base nela, direcionei meu foco para entender melhor o papel das
emoções na vida em geral e na aprendizagem em especial."
Para transmitir o gosto pelo conhecimento, diz o filósofo e sociólogo
especialista em Educação, um professor precisa dominar os conteúdos de sua
disciplina - e também saber acolher as turmas, identificando e trabalhando
interesses e sentimentos. De seu escritório em Santiago, ele falou por telefone
com NOVA ESCOLA sobre o assunto.
Como surgiu sua curiosidade pelo papel das emoções na aprendizagem?
JUAN CASASSUS Comecei a prestar atenção no assunto quando fui
encarregado de dirigir o Primeiro Estudo Comparativo em Linguagem,
Matemática e Fatores Associados para Alunos de Terceira e Quarta Séries do
Ensino Fundamental (Peic). Foi um programa da Unesco realizado entre 1995
e 2000 em 14 países da América Latina que incluiu uma análise comparativa
dos currículos, entrevistas com pais e professores e aplicação de provas de
Linguagem e Matemática a 54 mil estudantes. O objetivo era compreender os
fatores que influem no desempenho dos alunos.
O que essa pequisa descobriu?
CASASSUS O achado mais surpreendente foi a importância do ambiente
favorável à aprendizagem na escola - mais especificamente, a necessidade de
um clima emocional adequado dentro da sala. Nas instituições em que os
alunos se dão bem com os colegas, não há brigas, o relacionamento
harmonioso predomina e não há interrupções nas aulas, eles se saem melhor.
Verificamos que o desempenho deles chegou a ser superior em 36% na nota
média da prova de Linguagem e 46% na de Matemática.
Qual o peso do clima emocional em relação aos outros fatores ligados à
aprendizagem?
CASASSUS Muito grande. Na nossa pesquisa, ele teve uma importância maior
do que todos os demais fatores somados. E veja que examinamos mais de 30
variáveis, como condições de trabalho, salário, experiência e formação dos
professores, o número de livros em casa e na biblioteca, o tempo que os pais
passam diariamente com os filhos e o total de alunos por classe.
De que forma o ambiente emocional pode favorecer o aprendizado?
CASASSUS Quando os estudantes se sentem aceitos, os músculos se
distendem e o corpo relaxa. O ref lexo disso é que eles se tornam mais
seguros. Assim, o medo se reduz, as crianças ficam mais espontâneas e
participativas e sem temor de cometer erros - quero sublinhar que o
mecanismo da tentativa e erro é fundamental para aprender. Confiantes, elas
são capazes de mostrar até mesmo o momento em que o interesse pelo
assunto tratado em sala desaparece - e o porquê de isso ter ocorrido. Construir
uma relação assim pode demorar, mas certamente nunca será desperdício de
tempo.
http://revistaescola.abril.com.br/fundamental-1/literatura-eja-leitura-filhos-ou-netos-hora-dormir-
640938.shtml. Acesso em 14/007/2012.
Observações:
Programa do Governo Federal – Brasil Alfabetizado
Programa do Governo do Estado: Todos Podem Ler
Fórum da Educação de Jovens de Adultos
Agenda Territorial da EJA
Planejamento
Literatura na EJA: leitura para os filhos ou netos na
hora de dormir
Objetivos
- Oferecer aos alunos da Educação de Jovens e Adultos (EJA) a
possibilidadede serem leitores de narrativas literárias para crianças;
- Desenvolver os seguintes comportamentos leitores:
- compartilhar com o ouvinte os efeitos que os textos produzem;
- confrontar interpretações e pontos de vista;
- relacionar o texto com outros conhecidos;
- observar a beleza de certas expressões ou fragmentos de um texto;
- localizar o lugar em que a leitura foi interrompida;
- recordar os últimos acontecimentos narrados, podendo inclusive reler alguns
parágrafos se achar conveniente;
- antecipar o que segue no texto e controlar as antecipações de acordo com o
desenrolar da narrativa;
- adequar a modalidade de leitura aos propósitos que se perseguem;
- voltar atrás para recuperar aspectos relevantes do relato para compreender
melhor uma situação ou ao descobrir que não se prestou atenção a uma
informação importante;
- comparar com outros personagens, outras versões, outros textos do gênero,
outros autores etc.;
- reconhecer certos recursos linguísticos próprios de um autor ou de uma
versão;
- identificar recursos linguísticos adequados a determinadas situações
comunicativas.
Conteúdo
- Linguagem oral e escrita
- Gêneros literários
- Leitura de textos literários em voz alta
- Conhecimento sobre alguns autores
- Coerência e coesão
- Pensamento lógico
- Autoestima, autoconceito e autoimagem positiva
- Relacões humanas
Introdução
Esta sequência de atividades pretende resgatar o hábito e reafirmar a
importância de ler histórias para as crianças na hora de dormir, tanto pela
relevância para quem lê - que pode criar novos mundos e promover a aventura
literária com emoção, força e sabedoria -, como para quem ouve, já que este
viverá uma experiência pessoal, desenvolvendo exercícios de reflexão e
contemplação. E, para ambos, visto que uma relação afetiva será criada e os
tornarão cúmplices das histórias compartilhadas.
É importante lembrar que ler histórias é diferente de contar histórias. Ambas as
situações são interessantes, mas cumprem objetivos e têm resultados distintos.
Esta proposta prioriza a leitura de diferentes contos e "causos".
Quais são os melhores tipos de contos para trabalhar com os alunos jovens e
adultos? Os textos adequados são aqueles de qualidade. E quais são os textos
de qualidade? São aqueles que não subestimam seus leitores, que os
aproximam da linguagem que se usa para escrever, com vocabulário realmente
literário e não aqueles que tentam aproximar a escrita da fala com vocabulários
restritos, simplificados ou empobrecidos.
O que se aprende quando se ocupa o lugar daquele que lê para outros
Ler em voz alta é uma prática que exige várias habilidades. É preciso ser capaz
de decodificar as marcas gráficas do texto e construir para elas um significado,
o que equivale a dizer que é preciso ser capaz de ler o texto. Além disso, para
que esse ato de leitura cumpra a função de comunicar o texto a algum ouvinte,
é preciso que o leitor seja também capaz de oralizar o texto de maneira a
envolver esse ouvinte e captar a sua atenção: é necessário observar tanto
características do texto que será lido, quanto características da própria leitura.
Em relação à escolha do texto que será lido, é importante selecionar aqueles
que correspondam às possibilidades do ouvinte: o tempo de duração da leitura,
a presença ou não de elementos fantásticos (que costumam chamar a atenção
das crianças), a presença de ilustrações (já que ler um livro ilustrado é
diferente de ler livros que não contenham imagens, pois exige que o leitor
realize ou não pausas para que esses recursos gráficos sejam aproveitados), a
linguagem utilizada no texto que tornará mais rica a relação do ouvinte com o
conteúdo do texto. A seleção cuidadosa do texto a ser lido é fundamental e
aprender a fazer tal escolha, levando em conta os critérios que favoreçam a
interação do ouvinte com o texto, faz parte dos objetivos didáticos que esta
sequência permite construir.
Uma condição didática: leitura habitual do professor para os alunos
A realização da leitura pelo professor de narrativas literárias é condição
didática necessária para que esta sequência ocorra de maneira adequada.
Normalmente essa leitura tem como objetivo colocar os alunos em contato com
diversas histórias, permitindo uma experiência comum do grupo, que assim
poderá compartilhar impressões, discutir significados e interpretações, em
suma, aprender a apreciar literatura.
Além disso, com a leitura diária os alunos podem compartilhar procedimentos e
comportamentos leitores do professor, por exemplo: ouvir o professor comentar
a justificativa de sua escolha, comentar partes do texto que mais apreciou, se
emocionar com o que lê, emitir opiniões etc.
Desenvolvimento
1a etapa: Reflexão do professor sobre a importância da leitura para
crianças
A primeira etapa desta sequência consiste no momento destinado ao professor
analisar e compreender a importância da leitura dos alunos jovens e adultos
para as crianças (seus filhos, irmãos menores ou outra criança próxima).
Basicamente, a leitura de um adulto para uma criança na hora de dormir é
fundamental por dois motivos: quem lê tem a oportunidade de construir
estratégias específicas próprias da prática de leitura em voz alta; e quem ouve
passa a ter situações em que a escrita deixa de ser somente marcas gráficas e
passam a ter sentido, e isso ocorre por meio de um leitor que traz, além de
tudo, a magia e a afetividade da relação de cumplicidade proporcionada pela
leitura em conjunto.
2a etapa: Apresentação da proposta aos alunos
Em um dos dias de leitura habitual, suscite uma discussão sobre o prazer de
ouvir histórias. Comente experiências pessoais sobre a leitura que ouviu
quando criança, ou já adulto, pode falar de seus sentimentos, das passagens
que mais gostava ou desgostava, das que davam medo e faziam sentir
calafrios, daquelas sensações de estar na presença dos seres imaginários, de
ter chorado e rido com as situações, da beleza dos cenários que se
apresentavam em sua mente, das boas lembranças e dos momentos passados
com alguém querido que havia, com tanto carinho, lhe preparado e lido uma
história.
Deixe que os alunos também falem sobre suas experiências. Na maioria das
vezes, os jovens e adultos da EJA têm poucas lembranças de alguém lendo
histórias, mas com certeza têm recordações de pessoas conhecidas que
contavam histórias. Aproveite essas experiências e comente que muitas
histórias de tradição oral foram organizadas por autores que as transcreveram,
como é o caso dos Irmãos Grimm e Perrault, que compilaram os contos de
fadas que eram contados de geração a geração, como Branca de Neve,
Chapeuzinho Vermelho.
No Brasil, o escritor Câmara Cascudo fez um trabalho parecido ao organizar
histórias que se contavam nos diversos rincões do país. É interessante verificar
que muitos desses contos compilados por ele trazem traços de semelhança
com contos de fadas, como o caso de Bicho de Palha, que se parece com Pele
de Asno, de Perrault, e também com a história de Cinderela.
Indicar brevemente a sequência das atividades: escolha de um conto de fadas
para ser lido; ensaio da leitura; leitura para as crianças, comentários de como
foi; análise de modelos de leitura; seleção de outro tipo de narrativa literária,
considerando alguns critérios discutidos no grupo a partir da experiência vivida
e novas leituras. O que se pretende é que, no decorrer desta sequência, a
atividade de leitura para as crianças na hora de dormir se torne um hábito para
os alunos da EJA.
3a etapa: Contato com bons modelos de leitura (e leitores) em voz alta
Para que os alunos tenham oportunidade de refletir sobre o que garante uma
boa leitura em voz alta, é importante que participem de situações em que
observem pessoas experientes realizando essa prática. Isso pode acontecer de
várias maneiras e é importante que essas oportunidades sejam numerosas e
realizadas em situações intercaladas às situações de suas leituras, pois
contribui para que os alunos tenham mais elementos para auto-regular sua
própria leitura.
Algumas atividades aqui sugeridas propiciam tanto esse contato com bons
modelos de leitores como também dão ensejo a conversas entre os alunos, nas
quais procuram identificar as posturas que contribuem para enriquecer a
leitura.
Leitura do professor
Numa das situações em que o professor realiza a leitura diária, ele deve pedir a
seus alunos que prestem atenção não somente à história contada, mas
também ao modo como lê, àquilo que lê, pois isso ajuda a tornar aquela leitura
mais envolvente. Dessa maneira, o olhar dos alunos se voltará para aquilo que
é preciso cuidar, enquanto se lê, para favorecer a atenção dos ouvintes. O
professor pode inclusive propor que os alunos estejam atentos ao modo como
ele realiza sua leitura, para que discutam ao final se é ou não uma boa leitura e
como poderão justificar essa opinião. Ao terminar o texto, o professor discute o
que os alunos analisaram e pode também lançar as seguintes questões: a
leitura permitiu que a história fosse apreciada? A leitura permitiu que os alunos,
de fato, se interessassem pela história? Em caso afirmativo, o que contribuiu
para esse interesse?
Enquanto os alunos colocam suas opiniões, é interessante que o professor
anote as conclusões (por exemplo: os alunos podem dizer que o professor
procurou ler numa altura que fizesse sua voz audível, sem precisar gritar;
podem perceber que em alguns momentos o professor leu mais rápido ou mais
pausadamente e que isso estava relacionado àquilo que acontecia naquele
momento da história; podem comentar sobre a preocupação com o ambiente e
a organização da classe de modo que todos pudessem ver as ilustrações etc.).
Essa lista que os alunos vão levantando a partir de suas impressões pode se
transformar num cartaz de "dicas" para uma boa leitura em voz alta. Uma
sugestão é que essa lista não se encerre de uma vez, pois ela poderá ser
incrementada em outros momentos em que os alunos voltem a refletir sobre as
características de uma boa leitura.
Ouvindo uma história em CD
Para preparar a leitura dos alunos, utilize também a análise de histórias em
CD-livro. Ouvir contos, causos ou outras narrativas gravados em CD é, em si,
uma atividade interessante (e pode acontecer várias vezes para enriquecer
esta sequência didática). Para favorecer a reflexão sobre os recursos de que
se servem os leitores para valorizar suas leituras, proponha aos alunos que,
além da audição, acompanhem em sua própria cópia do texto aquilo que está
sendo narrado.
Como exemplo de uma possibilidade de análise de história ouvida em CD,
sugerimos que você providencie cópias do texto "A moça tecelã", de Marina
Colasanti (livro "Doze reis e a moça no labirinto do vento", Editora Nórdica) e
coloque o conto em CD para que possam acompanhar a leitura da autora.
Recebendo um convidado que irá realizar uma leitura em voz alta
Com o intuito de propiciar mais situações de aprimoramento para a leitura dos
alunos, o professor poderá planejar a vinda de um convidado que irá ler para a
classe e que servirá como modelo de leitura em voz alta. Com base na análise
de como o convidado efetuou a leitura, os alunos poderão novamente retomar
a lista de "Dicas para a Leitura" e reorganizá-la e melhorá-la.
Explique aos alunos por que você achou interessante que tal atividade
acontecesse na classe. Oriente-os a acompanhar a leitura atentamente,
dizendo que depois eles terão espaço para colocar suas impressões.
Depois da leitura, é interessante que os alunos possam fazer perguntas ao
convidado para que este explicite como foi o processo de preparação: O que o
levou a escolher aquela história? O que fez para se preparar? Leu várias
vezes? Leu para outra pessoa antes? Foi difícil ler para a classe? Costuma ler
para outras pessoas? Gosta de ler para crianças? Quando costuma fazer isso?
Com base nas respostas do leitor convidado, novas conclusões sobre a leitura
em voz alta podem ser tiradas e isso deve alimentar o cartaz de dicas que
começou a ser elaborado a partir da leitura do professor.
4a etapa: Escolha e preparação dos textos a serem lidos pelos alunos às
crianças
Para a escolha do conto a ser lido, o professor deverá deixar disponível aos
alunos os livros "Os contos de Grimm" (tradução de Tatiana Belinky, Edições
Paulinas) e "Contos de Perrault" (tradução de Regina Regis Junqueira, Editora
Villa Rica). Para esta atividade, o professor necessita providenciar certa
quantidade de exemplares de modo a disponibilizar um livro para cerca de três
ou quatro alunos. Assim que os grupos estiverem organizados, o professor
pode sugerir a leitura dos seguintes contos:
Contos de Perrault:
- Cinderela
- As fadas
- Contos de Grimm:
- Rapunzel
- Branca de Neve
Em seguida, solicite que escolham qual eles gostariam de ler para as crianças,
orientando-os a ler o sumário dos livros. Neste momento, as leituras devem se
restringir a esses dois livros por serem obras de qualidade literária
reconhecida. Feita a escolha, peça que eles realizem uma leitura silenciosa e
depois combinem que um aluno de cada grupo faça a leitura em voz alta, que
será preparada com o auxílio do professor e dos outros colegas. Cada aluno lê
para seu grupo e seus parceiros analisam e dão sugestões de como aprimorar
a leitura, a partir da lista de dicas já elaborada. Após a análise dos pequenos
grupos, o professor pode questionar se alguém gostaria de ler seu conto para
toda a classe.
Após essa preparação, os alunos irão ler o conto que escolheram para as
crianças na hora de dormir, mas ao mesmo tempo deverão ficar atentos a
alguns pontos que poderão ser discutidos e analisados no retorno à sala,
como:
- Como foi a recepção do ouvinte?
- A criança pôde manipular o livro?
- Ela se encantou com as ilustrações?
- Ela gostou ou não da história?
- Que justificativas podem ser levantadas para isso?
5a etapa: Comentários sobre a leitura
Depois de os alunos terem feito a leitura em casa, proponha uma situação em
que relatem como foi essa atividade.
Organize com eles uma lista de critérios para nova seleção de contos a serem
lidos para as crianças. Nessa etapa, é possível discutir sobre a adequação dos
textos à idade, considerando, por exemplo, a extensão dos contos, pois com
crianças muito pequenas os textos longos não são os mais adequados, ou em
capítulos, o que com crianças maiores acaba sendo bom, pois elas são
capazes de rememorar as passagens dos textos.
6a etapa: Nova seleção de contos e preparação
Levando em consideração a lista de critérios para seleção de histórias a serem
lidas para as crianças, cada aluno escolherá um novo conto. Nesse momento,
amplie o acervo de títulos disponíveis. Como sugestão, indicamos as seguintes
obras:
- Sete contos russos, recontados por Tatiana Belinky, Editora Companhia das
Letrinhas
- Histórias para aprender a sonhar, de Oscar Wilde, Editora Companhia das
Letrinhas
- A volta ao mundo em 52 histórias, organizado por Neil Philip, Editora
Companhia das Letrinha
- Histórias Maravilhosas de Andersen, Editora Companhia das Letrinhas
- História do Cisne, H. C. Andersen, Editora Companhia das Letrinhas
-Histórias da Carochinha (vol. 1, 2 e 3), Editora Ática
-Histórias Brasileiras, Editora Companhia das Letrinhas
- Histórias para acordar, Diléa Frate, Editora Companhia das Letrinhas
-Contos de fadas ingleses, Editora Landy
- Meu primeiro livro de contos de fadas, Editora Companhia das Letras
- Meu 1o primeiro Larousse dos Contos de Fadas, Larousse Júnior
- Novas histórias antigas, Rosane Pamplona e Dino B. Júnior, Brinque-book
- Outras histórias antigas, Rosane Pamplona e Dino B. Júnior, Brinque-book
Em um dos momentos de escolha do conto a ser lido, faça uma visita à
biblioteca (da escola ou da cidade). Será uma boa maneira de mostrar para os
alunos como são arquivados e organizados os acervos de livros, além de
conhecerem uma variedade de livros que apresentam narrativas literárias e de
terem a oportunidade de manipular diversos livros.
7a etapa: A continuidade
Esta sequência poderá ser realizada durante várias semanas, com a repetição
da escolha do texto a ser lido, a preparação, a análise da leitura em sala,
análise de modelos de leitores, a leitura em casa, os comentários sobre a
leitura e novamente a escolha e assim por diante...
O ideal e o esperado é que a atividade de leitura do aluno jovem ou adulto para
as crianças na hora de dormir se torne um hábito. Para isso, sugerimos que
você realize semanalmente (em uma aula) uma atividade habitual que
chamamos de "Roda de Histórias para Hora de Dormir", em que os alunos
compartilham com o grupo as impressões e experiências vividas nas situações
em que lêem para as crianças em casa, isto é, que compartilhem experiências
como leitores de histórias em voz alta.
Ao avançar na leitura de histórias, incentive os alunos a ler para as crianças
textos um pouco maiores (dependendo da idade), ou seja, contos que, por sua
extensão, sejam lidos aos poucos a cada dia. A seguir, algumas sugestões:
- Perde quem fica zangado primeiro, de Ítalo Calvino, Editora Companhia das
Letrinhas
- A cortina da Tia Bá, de Virgínia Wolf, Editora Ática
- O Teatro de Sombras de Ofélia, de Michael Ende, Editora Ática
- O pequeno papa-sonhos, de Michael Ende, Editora Ática
- A vassoura encantada, Chris Allsburg, Editora Ática
- Odisséia, contado por Ruth Rocha, Editora Companhia das Letrinhas
- Histórias de avô e avó, Arthur Nestrovsky, Editora Companhia das Letrinhas
- Menino do Rio Doce, Ziraldo, Editora Companhia das Letrinhas
- Romeu e Julieta, adaptação de Nicole Cinquetti, Editora Ática
- O jardim da Bruxa, Lídia Postma, Editora Ática
A possibilidade de ler um texto em capítulos permitirá aos alunos vivenciarem
procedimentos leitores, como decidir o melhor momento para realizar a pausa,
pensando na mesma proposta utilizada por Sherazade em As mil e uma noites,
e mais recentemente nas novelas que escolhem um momento de clímax para
criar uma expectativa de continuidade da história no dia seguinte.
Como já vimos, os critérios de escolha das histórias a serem lidas para as
crianças precisam levar em conta, entre outras coisas, a idade e o gosto dos
ouvintes. Para as crianças muito pequenas (na faixa de 1 a 4 anos), é
importante considerar a adequação da extensão do texto, a qualidade da
história e também das ilustrações. Abaixo, segue uma lista com sugestões de
bons livros para essa faixa etária:
- O rei bigodeira e sua banheira, de Audrey Wood, Editora Ática
- A bruxa Salomé, Audrey Wood, Editora Ática
- A Casa Sonolenta, Audrey Wood, Editora Ática
- Meus Porquinhos, Audrey Wood, Editora Ática
- O caso do bolinho, Tatiana Belinky, Editora Moderna
- O grande rabanete, Tatiana Belinky, Editora Moderna
- Todo mundo vai ao circo, Gilles Eduar, Editora Companhia das Letrinhas
- Historinhas de contar, Natha Caputo e Sara Cone Bryant, Editora Companhia
das Letrinhas
- Maneco Caneco Chapéu de Funil, Luis Camargo, Editora Ática
- A verdadeira história dos 3 porquinhos, Jon Scieszka, Editora Companhia das
Letrinhas
- Da pequena toupeira que queria saber quem tinha feito cocô na cabeça dela,
Werner Holzwarth, Editora Companhia das Letrinhas
E ainda, para os maiores, sugestões de títulos com histórias que podem
ser lidas durante vários e vários dias:
- Pinóquio, Carlo Collodi, Editora Iluminuras
- Contos da Rua Brocá, Pierre Gripari, Editora Martins Fontes
- A fantástica fábrica de chocolate, Roald Dahl, Editora Martins Fontes
- Peter Pan e Wendy, J. M. Barrie, Editora Companhia das Letrinhas
- A história sem fim, Michael Ende, Editora Martins Fontes
- Luna Clara e Apolo Onze, Adriana Falcão, Editora Salamandra
- A estranha Madame Mizu, Thierry Lenain, Editora Companhia das Letrinhas
Fonte
Adaptação da sequência publicada pelo Programa Escola que Vale, uma parceira entre
Comunidade Educativa CEDAC e Fundação Vale.
Coerência e coesão
Coerência e coesão textuais são dois conceitos importantes para uma melhor compreensão do texto e para a melhor escrita de trabalhos de redação de qualquer área.
A coesão trata basicamente das articulações gramaticais existentes entre as palavras, as orações e frases para garantir uma boa sequenciação de eventos. A coerência, por sua vez, aborda a relação lógica entre ideias, situações ou acontecimentos, apoiando-se, por vezes, em mecanismos formais, de natureza gramatical ou léxico lexical, e no conhecimento compartilhado entre os usuários da língua.
Pode-se dizer que o conceito de coerência está ligado ao conteúdo, ou seja, está no sentido constituído pelo leitor.
Definição Especifica
-Coesão - É a conexão, ligação, harmonia entre os elementos de um texto. Percebemos tal definição quando lemos um texto e verificamos que as palavras, as frases e os parágrafos estão entrelaçados, um dando continuidade ao outro.
-Coerência - É a relação lógica entre as ideias, pois essas devem se complementar; é o resultado da não contradição entre as partes do texto, fazendo referência a termos e expressões anteriormente empregados. Resumindo, a coerência é o sentido do texto e a coesão é o sentido da frase.
Objeto do discurso
Para garantir a coerência de um texto é preciso identificar o objeto do discurso.
"A Coesão é a manifestação linguística da coerência, que advém da maneira como os conceitos e relações subjacentes são expressos na superfície textual. Responsável pela unidade formal do texto, a coesão constrói-se através de mecanismos gramaticais (pronomes anafóricos, artigos, elipse, concordância, correlação entre os tempos verbais e conjunções) e lexicais." (COSTA VAL)
Pode-se dizer portanto, que o conceito de coesão está ligado aos elementos constituintes do texto.
A coerência de um texto é facilmente deduzida por um falante de uma língua, quando não se encontra nenhum sentido lógico entre as proposições de um enunciado oral ou escrito. É a competência linguística, tomada em sentido lato, que permite a esse falante reconhecer de imediato a coerência de um discurso. A competência linguística combina-se com a competência textual para possibilitar certas operações simples ou complexas da escrita literária ou não literária: um resumo, uma paráfrase, uma dissertação a partir de um tema dado, um comentário a um texto literário, etc.