Sobre a História Da Lógica

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  • Sobre a histria da lgica, a lgica clssica e o surgimento das lgicas no-clssicas1

    tala Maria Loffredo DOttaviano Hrcules de Araujo Feitosa Centro de Lgica, Epistemologia e Histria da Cincia Departamento de Matemtica

    UNICAMP, CLE / IFCH UNESP, Faculdade de Cincias [email protected] [email protected]

    Introduo A lgica, cincia do raciocnio dedutivo, estuda a relao de conseqncia deduti-va, tratando entre outras coisas das inferncias vlidas; ou seja, das inferncias cujas conclu-ses tm que ser verdadeiras quando as premissas o so. A lgica pode, portanto, ser consi-derada como o estudo da razo ou o estudo do raciocnio. O objetivo da lgica consiste, ento, na meno e estudo dos princpios lgicos usa-dos no raciocnio dedutivo. Sob essa concepo, temos a lgica dedutiva. Podemos, entretanto, considerar uma outra lgica, a lgica indutiva, que se ocupa no das inferncias vlidas, mas das inferncias verossmeis. Consideremos o seguinte argu-mento:

    O sol tem nascido todos os dias. Logo, o sol nascer amanh.

    Obviamente este argumento no dedutivo e, portanto, no logicamente vlido. A(s) premissa(s), ainda que verdadeira(s), no implica(m) logicamente a concluso, embora esta possua uma certa plausibilidade. A lgica contempornea tem se convertido em disciplina matemtica, a lgica ma-temtica, com caractersticas prprias, dedutiva; o estudo do tipo de raciocnio feito pelos matemticos. Nesse sentido, para estudarmos o tipo de enfoque da lgica matemtica, devemos examinar os mtodos utilizados pelos matemticos. A lgica, particularmente sob a acepo dedutiva, constitui a cincia subjacente s investigaes no domnio do puramente racional. Porm, existe uma nica razo? Existe uma nica lgica? Um dos objetivos deste texto consiste em discutir essas duas questes. Faremos uma sntese, sucinta, sobre o desenvolvimento da lgica at o princpio do sculo XX. Discutiremos a crise dos paradoxos e o surgimento das lgicas no-clssicas. Os lgicos contemporneos edificam linguagens artificiais adequadas para lidar com a relao de conseqncia, linguagens essas que possuem duas dimenses relevantes: a sinttica e a semntica. Para trabalharmos numa teoria formal, necessrio explicitarmos sua linguagem: seus smbolos e as regras de combinao s quais esto sujeitos estes smbolos, para a cons-truo dos termos e frmulas (expresses bem formadas). Entre as frmulas bem formadas da linguagem so especificados os axiomas (leis bsicas). As regras independem do signifi-cado dos smbolos. Atravs dos axiomas e regras de deduo, so demonstrados os teore-mas da teoria.

    1 Este trabalho corresponde a uma verso, com pequenas alteraes, do texto produzido pelos auto-res para o mini-curso Histria da lgica e o surgimento das lgicas no-clssicas, ministrado pela professora tala no V Seminrio Nacional de Histria da Matemtica, ocorrido na UNESP, Rio Claro, em abril de 2003.

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    dimenso combinatria de uma linguagem, chamamos de dimenso sinttica. A dimenso semntica de uma linguagem leva em considerao os objetos extralin-gsticos, aos quais os smbolos e expresses da linguagem se referem, e o significado dos mesmos. Lida com os conceitos de estrutura, validade de frmulas e modelo. As teorias contemporneas, construdas sobre linguagens, axiomas lgicos, axiomas no-lgicos especficos e regras de deduo, so constitudas pela teoria formal axiomti-ca e pela semntica.

    Os resultados relativos completude, consistncia, decidibilidade, metateoremas im-portantes, estabelecem a relao entre essas duas dimenses.

    Entretanto, at princpios do sculo XX, havia uma nica lgica: pura, formal ou teri-ca, fundada por Aristteles (384 a 322 a. C.) e cujo sistematizador mais importante foi Frege (1848-1925). 1. Um pouco de histria e os paradoxos auto-referenciais

    Apresentamos nesta seo aspectos da histria da lgica e uma discusso de alguns dos famosos paradoxos auto-referenciais.

    1.1. De Aristteles ao final do sculo XIX e a sistematizao da lgica clssica A histria da lgica antiga inicia-se propriamente com Aristteles, no sculo IV a. C. (384-322 a. C.). Na antiguidade, os gregos foram preponderantes no cultivo, prtica e gosto pelo argumento. Entre os predecessores de Aristteles (Plato, sem dvida) devemos chamar a ateno para o trabalho dos sofistas, classe de tutores privados da Grcia antiga; e convm mencionarmos que paradoxos e argumentos falaciosos, argumentos que, de premissas apa-rentemente verdadeiras e por passos aparentemente vlidos, levam a concluses aparen-temente falsas, eram conhecidos na Grcia antiga. A maior parte da contribuio relevante de Aristteles, para a lgica, encontra-se no grupo de trabalhos conhecidos como Organon, mais especificamente nos Analytica Priora e no De Interpretatione. Aristteles criou a teoria do silogisimo e axiomatizou-a de diversas formas. Iniciou o desenvolvimento da lgica modal, lidando com as noes de necessidade, possibilidade e contingncia: uma sentena A contingente se A no necessria, porm no impossvel. famosa a questo dos futuros contingentes de Aristteles. Exemplo: Haver uma batalha naval amanh. 1.1.1. Teoria dos silogismos A teoria dos silogismos constitui um dos primeiros sistemas dedutivos j propostos. Filsofos e historiadores da lgica consideram a teoria do silogismo como a mais im-portante descoberta em toda a histria da lgica formal, pois no constitui apenas a primei-ra teoria dedutiva, mas tambm um dos primeiros sistemas axiomticos construdos. Modernamente, podemos interpret-la como um fragmento da lgica de primeira ordem, ou seja, do clculo de predicados de primeira ordem.

    Consideremos, de imediato, como intuitivamente claro em termos pr-formais, o uso de variveis e smbolos de predicados e o significado dos operadores lgicos para: existen-cial (, existe), universal (, para todo), negao (, no), conjuno (, e), disjun-o (, ou), condicional ( se ... ento), e bicondicional (, equivalente ou se, e somente se).

    A teoria dos silogismos, em sua linguagem, lida com termos (substantivos ou idias), que podem ser termos gerais, ou termos singulares; e com predicados. So exemplos de termos gerais: homem, nmero, etc; so exemplos de termos singulares: Scrates,

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    dois, etc; so exemplos de predicados: mortal, par, etc. A teoria dos silogismos trata de proposies categricas, no sentido de incondicio-

    nais; e de proposies singulares. Todo homem mortal um exemplo de proposio categrica; e Scrates mortal e Pedro um homem so exemplos de proposies singulares.

    H quatro tipos de proposies categricas, que diferem entre si em qualidade, pois afirmam ou negam; e em quantidade, pois so universais ou particulares. So os seguintes os quatros tipos de proposies:

    Afirmao universal: Todos os S so P. Notao: A

    Negao universal: Nenhum S P. Notao: E

    Afirmao particular: Alguns S so P. Notao: I

    Negao particular: Alguns S no so P. Notao: O

    Aristteles estabeleceu as relaes entre esses quatro tipos de proposies categri-cas atravs de seu famoso quadrado das proposies:

    A e O, e I e E so contraditrias. No podem ser ambas verdadeiras; e no podem ser ambas falsas.

    A e E so contrrias. No podem ser ambas verdadeiras; mas podem ser ambas falsas.

    I e O so subcontrrias. No podem ser ambas falsas; mas podem ser ambas verdadeiras.

    I subalterna de A e O subalterna de E.

    Se A verdadeira, ento I verdadeira. Se E verdadeira, ento O verdadeira.

    O que um silogismo? Um silogismo uma regra de inferncia que deduz uma proposio categrica a concluso a partir de duas outras, chamadas premissas. Cada uma das premissas contm um termo comum com a concluso o termo maior e o termo menor, respectivamente; e um termo comum com a outra premissa o termo mdio.

    Contrrias A E

    I

    Subalternas

    O

    Subalternas

    Sub-contrrias

    Contraditrias

    Contraditrias

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    Exemplo de silogismo: Todo animal mortal.

    (Premissa maior contm o termo maior (mortal) e o termo mdio (animal)) Todo homem um animal.

    (Premissa menor contm o termo menor (homem) e o termo mdio (animal)) Todo homem mortal.

    (Concluso contm o termo menor (homem) e o termo maior (mortal)).

    Observamos que mortal, o termo maior da premissa maior, o predicado da con-cluso; homem, o termo menor da premissa menor, o sujeito da concluso; e animal o termo mdio. Os silogismos esto divididos em figuras, de acordo com a colocao do termo m-dio nas premissas. So quatro as figuras possveis, sendo as trs primeiras devidas a Aristteles e a ltima acrescentada posteriormente:

    Figura 1 Figura 2 Figura 3 Figura 4

    M P P M M P P M S M S M M S M S S P S P S P S P

    Dentro de cada figura, os silogismos se dividem em modos, de acordo com a combi-nao, quantidade e qualidade, isto , de acordo com a presena das proposies cate-gricas A, E, I ou O. O exemplo acima um caso da Figura 1, modo A A A, ou, mais especificamente:

    M A P S A M S A P

    Segundo a interpretao do lgico e filsofo polons J. Lukasiewicz, na verdade, Aristteles lida com o silogismo como um condicional, cujo antecedente uma conjuno de duas proposies categricas e o conseqente uma terceira proposio categrica. A tradio diz que o silogismo um conjunto de trs afirmaes categricas, duas das quais so as premissas e a terceira a concluso. Assim sendo, um silogismo vlido pode ter premissas verdadeiras e concluso verda-deira; uma premissa falsa e concluso verdadeira; e uma premissa falsa e concluso falsa. Um silogismo, portanto, para ser vlido, no pode ter premissas verdadeiras e conclu-so falsa. Um exemplo clssico de silogismo vlido o seguinte: Todos os homens so mortais. Scrates homem. Logo, Scrates mortal. Apresentamos, a seguir, um exemplo de silogismo no vlido: Cada homem um ser vivo. Algum bpede um ser vivo. Nenhum homem um ser vivo.

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    Aristteles parece no ter percebido que sua silogstica pressupunha uma teoria lgi-ca mais geral, a das proposies. De fato, mencionava silogismos a partir de hipteses, parecendo referir-se a alguns princpios de lgica das proposies por ele no explicitados. 1.1.2. At Frege e Cantor Existem srios indcios para associarmos a origem da lgica das proposies a Theop-hrastus, com os megricos (escola de lgicos e dialticos socrticos do 4 sculo) e aos es-ticos. Theophrastus deu uma importante contribuio lgica das expresses substantivas (de Aristteles); mas foi Galeno, um dos dois maiores mdicos da Antigidade, quem deu a ltima e maior contribuio para a lgica das expresses substantivas na Antigidade, de-senvolvendo a teoria da propagao do silogismo. Galeno tem a importncia de ter sido o transmissor da lgica grega para os pesquisadores rabes dos primeiros tempos medievais. A escola megrica foi famosa por Eublides, crtico de Aristteles. Alguns paradoxos, como o do mentiroso, so devidos a essa escola: Um homem que diz que est mentindo, fala a verdade? Discutiram tambm sobre a veracidade da implicao, como um concei-to funcional de verdade. Entre os esticos, escola Stoa, com diferenas substanciais em relao ao Lyceum (Plato), encontram-se discusses sobre a conjuno, disjuno (exclusiva e no exclusiva), negao e esquema de inferncia. Parece, entretanto, que a lgica tem sido um produto exclusivo da cultura ocidental. Os rabes nada desenvolveram independentemente dos gregos. A lgica dos india-nos, comparada com a dos gregos, no significativa parece que a lgica das proposi-es foi antecipada por alguns lgicos budistas, sendo que a lgica das expresses substan-tivas foi mais firmemente desenvolvida, sem atingir, entretanto, o nvel da silogstica aristot-lica; a lgica indiana se desenvolveu independentemente da lgica grega, e foi severa-mente limitada pelo no uso de variveis. A lgica chinesa, nada relevante, lidou essenci-almente com questes relativas a dilemas morais e prticos, por um lado, e com interpreta-es msticas da vida, de outro no avanou alm do estgio alcanado pelos sofistas, no sculo V a. C. Durante os cinco sculos que se seguiram ao fim da Antigidade, pouco ou nada se fez, com significado, no campo da lgica. Como parte do curriculum bsico o trivium a lgica era tratada como um tpico subsidirio para estudantes de leis e teologia; juntamen-te com a gramtica e retrica, a lgica havia sido considerada parte das artes liberais na educao clssica, situada num grupo separado da aritmtica, geometria, astronomia e msica.

    Na lgica medieval podemos destacar trs ramos: os bizantinos, os rabes e os esco-lsticos, estes ltimos parecendo os mais frutferos. So encontradas verses das lgicas de expresses substantivas abandonaram o uso de variveis , lgicas das proposies e lgi-cas das expresses modais, as duas ltimas entre os escolsticos.

    O clima intelectual que se estabeleceu com o Renascimento e o Humanismo no propulsionou o desenvolvimento da lgica.

    A lgica moderna iniciou-se no sculo XVII, com Leibniz, e comeou a se desenvolver em parceria com a matemtica.

    Leibniz influenciou seus contemporneos e sucessores com seu programa ambicioso para a lgica, que para ele tinha deixado de ser uma diverso de pesquisadores e come-ara a tomar a forma de uma matemtica universal. Seu programa buscava a construo de uma linguagem universal, baseada em um alfabeto do pensamento.

    Leibniz, em seu Dissertatio de arte combinatria, publicado em 1666, introduz o projeto da construo de um sistema exato e universal de notao, uma linguagem simblica uni-versal baseada em um alfabeto do pensamento, a lngua characterica universalis, que de-veria ser como uma lgebra. Essa linguagem propiciaria um conhecimento fundamental de todas as coisas. Leibniz acrescentou a seu trabalho o projeto da construo de um calculus ratiocinator, ou clculo da razo.

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    Apesar do programa de Leibniz, na forma introduzida por ele, no ser teoricamente exeqvel, o calculus ratiocinatur constituiu um importante precursor da metodologia da lgica contempornea.

    Leibniz antecipou o uso dos quantificadores. E em vrios de seus trabalhos chamou a ateno sobre a lei da identidade (A A, ou todo A A) verdade primitiva da razo e da lei da (no-) contradio, parecendo consider-las suficientes para a demonstrao das verdades que independem da experincia, ou de todos os princpios da matemtica.

    Entretanto, as contribuies de Leibniz para a lgica permaneceram, na maioria, no publicadas durante sua vida, tendo ficado desconhecidas at o princpio do sculo XX. Par-te de sua obra foi publicada em Erdmann 1840 e Gerhardt 1890 (ver Gerhardt 1978) e, em 1903, Louis Couturat, filsofo da matemtica francs, publicou a obra Opuscules et frag-ments indits de Leibniz (ver Couturat 1903).

    Historicamente, apenas generalidades do programa de Leibniz teriam influenciado os lgicos que o sucederam.

    Se seus trabalhos tivessem sido publicados no sculo XVII, o reviver da lgica, que s ocorreu no final do sculo XIX, talvez tivesse ocorrido bem mais cedo.

    Immanuel Kant pouco contribuiu para a lgica, em sua obra, mas sua influncia foi grande, devido sua reputao em outros campos do conhecimento. No prefcio de seu Kritik der reinen Vernunft, edio de 1787, afirma explicitamente que a lgica no tinha da-do qualquer passo importante, para frente ou para trs, desde Aristteles, e parecia, sob toda aparncia, estar acabada e completa.

    Devemos mencionar, entre os precursores da lgica contempornea: Boole (1847) e De Morgan (1847 e 1860) em lgebra da lgica; Peirce, precursor da pesquisa moderna, que introduziu a definio de ordem simples, o primeiro tratamento do clculo proposicional como um clculo com dois valores de verdade e a definio de igualdade, tendo iniciado em 1881 o tratamento dos fundamentos da aritmtica; Schrder; e McColl que, em 1877, construiu o primeiro clculo de proposies.

    Os primeiros clculos da lgica, introduzidos por esses autores, no chegaram a consti-tuir sistemas no sentido da lgica moderna, mas clculos num sentido menos rigoroso.

    Apesar do trabalho precursor de Leibniz, Boole, de Morgan e Peirce, que j se contra-punham posio de Kant, o verdadeiro fundador da lgica moderna foi Gottlb Frege. O pensamento de Frege, praticamente desconhecido, foi descoberto por Bertrand Russel.

    Os passos essenciais para a introduo do mtodo logstico foram dados em 1879, no Begriffsschrift (Frege 1977). O livro contm, pela primeira vez, o clculo proposicional em sua forma logstica moderna, a noo de funo proposicional, o uso de quantificadores e a anlise lgica de prova por induo matemtica.

    O Begriffsschrift de Frege s comparvel, na histria da lgica, aos Analytica Priora de Aristteles.

    Frege foi um dos precursores da distino entre linguagem e meta-linguagem. Em 1884, Frege adota a tese logicismo de que a aritmtica um ramo da lgica,

    no sentido de que todos os termos da aritmtica podem ser definidos com o auxlio apenas de termos lgicos e todos os teoremas da aritmtica podem ser provados a partir dos axio-mas lgicos. Essa posio rigorosamente apresentada por Frege em 1893 (ver Frege 1879, 1890, 1893, 1966, 1977 e 1986).

    Em 1874, George Cantor publica seu primeiro trabalho sobre a denumerabilidade dos conjuntos infinitos. Constri uma nova teoria do infinito, onde uma coleo de objetos, mesmo que infinita, concebida como uma entidade completa.

    Em 1895 e 1897, Cantor publica seus principais trabalhos sobre nmeros ordinais e n-meros cardinais, resultado de trs dcadas de pesquisa (ver Cantor 1874, 1895 e 1897).

    Para Cantor, um conjunto era qualquer coleo de objetos num todo M, definidos e separados de nossa intuio ou pensamento. Intuitivamente, um conjunto seria uma sele-o de elementos satisfazendo uma dada propriedade.

    Essa aceitao ingnua de qualquer coleo como um conjunto propiciou, no co-meo do sculo XX, o aparecimento de paradoxos nos fundamentos da nascente teoria de

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    conjuntos. Com o paradoxo de Cantor, relativo ao maior nmero cardinal, Russell obteve o famo-

    so paradoxo de Russell e comunicou-o a Frege, em 1902. Como esse paradoxo pode ser obtido a partir dos axiomas lgicos por ele mesmo introduzidos, Frege acreditou que os fun-damentos de sua construo da aritmtica estivessem destrudos.

    Dedekind, que tambm trabalhava na poca nos fundamentos da aritmtica, sustou a publicao de seu livro.

    No Apndice do segundo volume do Grundgesetze der Arithmetik, publicado em 1903, Frege tratou de sugerir alteraes nos axiomas originalmente introduzidos, procurando evitar as inconsistncias, porm, no logrou solucionar os problemas. 1.2. Os paradoxos auto-referenciais

    Os paradoxos lgicos auto-referenciais so contradies que envolvem a lgica. En-tretanto, no contm nenhuma falha lgica bvia (ver DOttaviano 1990).

    Segundo Bertrand Russel, todos eles envolvem a auto-referncia, ou seja, incorporam falcias do tipo crculo vicioso.

    Os paradoxos lgicos podem ser semnticos ou sintticos. Os paradoxos sintticos envolvem apenas conceitos e notaes de teoria de conjun-

    tos, enquanto os paradoxos semnticos tambm fazem uso de conceitos como denotar, verdadeiro, adjetivos, etc, os quais no esto necessariamente na linguagem matem-tica usual.

    Indicamos alguns paradoxos bastante conhecidos. Outros podem ser encontrados em Whitehead & Russel 1973, p. 60. 1.2.1. Paradoxo de Cantor (Paradoxo sinttico, Cantor, 1899)

    O Paradoxo de Cantor envolve certos conhecimentos da teoria de nmeros cardinais. O nmero cardinal de um conjunto y, denotado por y , definido como o conjunto de

    todos os conjuntos x equipotentes a y, isto , os conjuntos x que esto em correspondncia biunvoca com y. Intuitivamente, o nmero cardinal de y corresponde ao nmero de ele-mentos de y.

    Dados dois conjuntos y e z, definimos que y z quando y equipotente a um sub-conjunto de z; e y < z , se y z e y z .

    Se y subconjunto de z, ento, y z . Seja P(y) o conjunto de todos os subconjuntos de y.

    Teorema de Cantor: Para qualquer conjunto y, y < )( yP .

    Teorema de Schrder-Bernstein: Se y e z so conjuntos, tais que y z e z y , ento y = z . Agora, seja V o conjunto universal. Como V o conjunto de todos os conjuntos, P(V)

    um subconjunto de V e, portanto, (V)P V ; por outro lado, pelo Teorema de Cantor, V < (V)P , o que uma contradio.

    1.2.2. Paradoxo de Russell (Paradoxo sinttico, Russell, 1902)

    Bertrand Russell procurou provar que havia uma falha na demonstrao de Cantor, no sentido de que no existe um cardinal maior que todos os outros; e uma falha no sistema de

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    Frege. Definiu o conjunto R, conhecido como conjunto de Russell, que deu origem ao Para-doxo de Russell.

    Considerando um conjunto como qualquer coleo de objetos, conjuntos podem ser elementos de conjuntos e podem existir conjuntos que so elementos de si mesmo.

    Consideremos o conjunto R, constitudo por todos os conjuntos x tais que x no ele-mento de si mesmo. Em notao contempornea de teoria de conjuntos:

    R = {x / x x}.

    Pela definio de R, se R for elemento de R, deve satisfazer propriedade definidora

    do conjunto R e, portanto, R R implica R R; por outro lado, se R no for elemento de R, no deve satisfazer propriedade que caracteriza os elementos de R e, portanto, R R im-plica R R. Assim sendo, R R equivalente a R R.

    O Paradoxo de Russell, na prpria linguagem dos trabalhos de Frege, f-lo duvidar dos

    fundamentos de seus trabalhos. 1.2.3. Paradoxo de Burali-Forti (Paradoxo sinttico, Burali-Forti, 1887)

    Este paradoxo semelhante ao Paradoxo de Cantor, e relativo ao conjunto On de todos os nmeros ordinais, na teoria de nmeros ordinais.

    Para a sua compreenso necessrio um conhecimento mnimo sobre os nmeros or-dinais. 1.2.4. Paradoxo do Mentiroso (Paradoxo semntico)

    Um homem diz: Eu estou mentindo. Se ele estiver mentindo, ento o que ele diz verdade e, portanto, ele no est men-

    tindo; se ele no estiver mentindo, ento o que ele diz verdade e, portanto, ele est men-tindo. Logo, ele est mentindo equivalente a ele no est mentindo.

    O Paradoxo do Cretense, conhecido na antiguidade (Paulo, Epstola a Tito, I: 12),

    semelhante ao Paradoxo do Mentiroso. O filsofo cretense Epimnides disse: Todo cretense mentiroso. Se o que Epimnides disse verdade, ento, como ele um cretense, falso o que ele disse e, portanto, existe um cretense que no mentiroso. Logo, se todo cretense mentiroso, ento existe um cretense que no mentiroso.

    Como o raciocnio acima no logicamente impossvel, o Paradoxo de Epimnides

    no um paradoxo genuno. 1.2.5. Paradoxo de Berry (Paradoxo semntico, Berry, 1906)

    Existe apenas um nmero finito de slabas na lngua inglesa. Portanto, existe apenas um nmero finito de expresses contendo menos que quarenta slabas. Logo, existe apenas um nmero finito de inteiros positivos que so denotados por uma expresso do Ingls contendo menos que quarenta slabas.

    Seja k the least positive integer which is not denoted by an expression in the English language containing fewer than forty syllables2.

    A frase grifada contm menos que quarenta slabas e denota o inteiro k.

    2 O menor inteiro positivo que no denotado por uma expresso do Ingls contendo menos que quarenta slabas.

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    1.2.6. Paradoxo de Grelling (Paradoxo semntico, Grelling, 1908)

    Um adjetivo chamado autolgico se a propriedade por ele denotada se verifica pa-ra ele prprio; chamado heterolgico, em caso contrrio.

    Como exemplo, temos o adjetivo polissilbico, que autolgico; e o adjetivo mo-nossilbico, que heterolgico.

    Consideremos o adjetivo heterolgico. Se ele for heterolgico, ento ele no hete-rolgico; se ele no for heterolgico, ento ele heterolgico. Ou seja, heterolgico ser heterolgico equivalente a no ser heterolgico. 1.2.7. Paradoxo do Barbeiro (Paradoxo Semntico)

    Em uma cidade vive um barbeiro que barbeia aqueles habitantes e apenas aqueles que no se barbeiam a si mesmos.

    Observamos que, se o barbeiro se barbeia a si mesmo, ento ele no se barbeia a si mesmo. E vice-versa.

    1.2.8. Mais alguns Paradoxos

    Pegue uma folha de papel. Em um lado, escreva: A sentena do outro lado do papel falsa. No outro, escreva: A sentena do outro lado verdadeira.

    Pegue outra folha de papel. Em um lado escreva: A sentena do outro lado deste pa-

    pel verdadeira. No outro lado: A sentena do outro lado falsa ou Deus existe. Deus existe?

    1.3. Teoria dos tipos e teorias dos conjuntos

    Em 1908, na abertura do IV Congresso Internacional de Matemtica, realizado em Roma, Poincar conclamou a comunidade matemtica para que fosse encontrada uma soluo para a crise dos paradoxos, que parecia abalar os fundamentos da matemtica (ver Atti del IV Congresso Internazionale dei Matematici, 1909, p. 182).

    Nessa ocasio, Zermelo e Russell j trabalhavam na busca de princpios fundamentais sobre os quais uma teoria consistente (que no permitisse contradies) pudesse ser constru-da.

    Entretanto, no se deve imaginar que o objetivo da axiomatizao fosse apenas evitar os paradoxos. Frege e Dedekind, que buscavam fundamentar a aritmtica, no estavam motivados pelos paradoxos.

    Russell e Whitehead, com a publicao dos Principia Mathematica em 1910, 1912 e 1913 (ver Whitehead & Russell 1973), inauguram um novo perodo na histria da lgica, solu-cionando o problema das antinomias semnticas e sintticas (ver DOttaviano 1990). Introdu-zem a teoria ramificada de tipos, um sistema que incorpora o esquema de notao lgica de Peano (1894-1908) e estabelece uma hierarquia de tipos e colees.

    A teoria dos conjuntos, nascente no comeo do sculo XX, teve suporte para resistir crise dos paradoxos. Dois sistemas de teoria de conjuntos evoluram dos trabalhos de Zerme-lo (1908), Fraenkel (1922), Skolem (1923), von Neumann (1925-1929), Bernays (1937-1954) e Gdel (1940): a Teoria de Conjuntos de Zermelo-Fraenkel (Teoria ZF) e a Teoria de Conjuntos von Neumann-Bernays-Gdel (Teoria GBN). O Sistema NF de Quine e a Teoria Tarski-Morse-Kelley surgiram posteriormente.

    As teorias de conjuntos (ver Halmos 1970, Di Prisco 1997 e Hrbacek & Jech 1978) apre-sentam soluo parcial para o problema dos paradoxos, eliminando os paradoxos sintticos da matemtica, e constituem sistemas potentes para a fundamentao da matemtica.

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    2. A lgica clssica

    A lgica clssica, na sua parte elementar, versa essencialmente sobre os chamados conectivos lgicos de negao, conjuno, disjuno, implicao e bicondicional, sobre os quantificadores existencial e universal e sobre o predicado de igualdade; e sobre algumas de suas extenses, como por exemplo, certos sistemas de teorias de conjuntos e certos cl-culos de predicados de ordem superior.

    Caracteriza-se como uma lgica de proposies, lgica sentencial com uma nica categoria semntica bsica.

    Na poro no elementar teoria de conjuntos investiga a noo de pertinncia e outras noes alternativas.

    A partir da obra de Frege, a lgica clssica adquiriu forma quase definitiva, extensa e consistente nos Principia Mathematica de Whitehead e Russell.

    No seu estado atual poderosa e encerra toda a velha silogstica aristotlica, conve-nientemente reformulada. Por outro lado, a matemtica tradicional, num certo sentido, po-de reduzir-se lgica clssica, pois pode ser toda definvel a partir da idia de conjuntos. Apresentamos aqui, de forma sucinta e do ponto de vista contemporneo, uma sn-tese da lgica aristotlica tradicional, hoje chamada lgica clssica. Em seus escritos, Aristteles caracteriza a lgica como uma cincia do raciocnio, posteriormente entendida como estabelecedora das formas vlidas de raciocnio [infern-cias vlidas], a qual repousava sobre trs princpios fundamentais: (i) Princpio da identidade - todo objeto idntico a si mesmo; (ii) Princpio da no contradio - uma proposio no pode ser verdadeira e falsa ao mesmo tempo; e (iii) Princpio do terceiro excludo - toda proposio verdadeira ou falsa, no havendo outra possibilidade. Na sua vestimenta contempornea, a lgica vista como sistema formal dedutivo, edificado sobre linguagem formal, a qual teria a incumbncia de eliminar dubiedades inter-pretativas. Assim sendo, veremos a lgica clssica, num primeiro momento, como o clculo proposicional clssico, um bonito e elegante, porm, limitado sistema dedutivo, que es-tendido para o clculo de predicados. Posteriormente, destacamos as teorias de primeira ordem, tal como na moderna lgica matemtica (como referncia, Mendelson 1964 e Sho-enfield 1967). 2.1. O clculo proposicional clssico Os elementos bsicos do clculo proposicional clssico (CPC) so as proposies, expresses escritas ou faladas, que admitem um valor de verdade: 0 falso, ou 1 verdadei-ro. A partir de proposies simples ou atmicas, podemos formar proposies compos-tas ou moleculares atravs do uso de conectivos lingsticos. So conectivos importantes para a lgica as expresses no, e, ou, se, ... ento, e se, e somente se. Como uma contra partida formal s proposies, usaremos as frmulas, que so ex-presses da linguagem formal subjacente lgica. Usaremos uma quantidade finita ou infi-nita e enumervel de variveis proposicionais, p1, p2, p3, ..., associadas s proposies at-micas. Assim, cada varivel proposicional uma frmula, denominada frmula atmica. A partir destes tomos, considerando que A e B so frmulas, temos as seguintes correspon-dncias formais para as proposies compostas: A (negao de A), AB (conjuno de A e B), AB (disjuno de A e B), AB (condicional de A para B) e AB (bicondicional entre A e B). A maneira mais simples e intuitiva de se atribuir uma semntica para o clculo propo-sicional atravs das funes de valorao. Uma valorao uma funo v que atribui para cada varivel proposicional p um

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    dos valores de verdade 0 ou 1, isto , v : {p1, p2, p3, ...} {0, 1}. Dada uma valorao v existe uma maneira nica de estender esta valorao para todas as frmulas do CPC, respeitando as tabelas seguintes, para cada um dos conectivos proposicionais:

    0 1 0 1 0 1 0 1

    0 1 0 0 0 0 0 1 0 1 1 0 1 0 1 0 1 0 1 1 1 1 1 0 1 1 0 1

    Assim, para cada valorao v , a sua extenso nica dada por: v(A) = v(A) v(AB) = v(A) v(B) v(AB) = v(A) v(B) v(AB) = v(A) v(B) v(AB) = v(A) v(B). Conhecidas as interpretaes dadas para os conectivos, podemos construir a tabela de verdade de uma forma proposicional qualquer, como no exemplo a seguir: Seja A a frmula (pq)(p), ento:

    p q pq p A 0 0 1 1 1 0 1 1 1 1 1 0 0 0 1 1 1 1 0 0

    Uma frmula A vlida (tautologia) quando, para toda valorao v, tem-se que v(A) = 1, ou seja, em sua tabela de verdade ocorre apenas o valor lgico verdadeiro 1. Indica-mos que A uma frmula vlida por A. Como exemplo, vejamos que pp uma tautologia, pois:

    p p pp 1 0 1 0 1 1

    Uma frmula A logicamente equivalente a uma frmula B se as respectivas tabelas de verdade so coincidentes. Uma frmula A implica logicamente uma frmula B, se B verdadeira (v(B) = 1) toda vez que A verdadeira (v(A) = 1). Com isso, A equivalente a B se, e somente se, AB uma tautologia, o que indi-cado por A B. E A implica B quando, e apenas quando, AB uma tautologia, indicado por A B. Proposio 2.1.1.: No CPC valem as seguintes equivalncias:

    (AB) (AB) (AB) ((AB)B) (AB) (AB)(BA). Dessa maneira, toda frmula equivalente a uma outra onde ocorrem apenas os

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    conectivos e . O CPC pode ser formalizado pelos seguintes axiomas e regra de deduo ou infe-rncia: Axiomas: Existe uma quantidade infinita de axiomas, especificados por meio de um dos trs seguintes esquemas de axiomas:

    Ax1 (A(BA)) Ax2 ((A(BC)) ((AB)(AC))) Ax3 ((B A) ((BA) B)). Regra de inferncia: A nica regra de inferncia a Regra de Modus Ponens (MP), que diz: se A e B so frmulas ento, de A e AB, obtemos B. Observao: no difcil verificar que todos os axiomas do CPC so tautologias. Uma demonstrao uma seqncia finita de frmulas A1, ..., An tal que, para 1 i n, Ai um axioma ou obtida de dois membros anteriores da seqncia pelo uso da Regra de Inferncia MP. Quando isto ocorre, a seqncia A1, ..., An uma demonstrao de An e a frmula An um teorema do CPC. Os axiomas tambm so teoremas e as suas demonstraes so seqncias de um nico membro. Quando A1, ..., An uma demonstrao, ento A1, ..., Ak, para k < n, tam-bm uma demonstrao e, portanto, Ak um teorema. Seja um conjunto de frmulas do CPC. Uma seqncia A1, ..., An de frmulas uma deduo a partir de se, para cada 1 i n, vale uma das seguintes condies: (i) Ai um axioma; (ii) Ai um membro de ; (iii) Ai segue a partir de dois membros prvios da seqn-cia por uma aplicao de MP.

    Neste caso, An deduzido de ou uma conseqncia de . Se A o ltimo membro de uma deduo a partir de , escrevemos A.

    Teorema 2.1.2.: (Teorema da Deduo) Seja {A, B} um conjunto de frmulas. Se {A} B, ento A B. Usualmente denotamos {A} B por , A B e, em geral, {A1, ..., An} B, por , A1, ..., An B. Teorema 2.1.3.: (Teorema da Correo) Cada teorema uma frmula vlida. Teorema 2.1.4.: (Teorema da Completude Fraca) Se a frmula A uma tautologia, ento um teorema. Corolrio 2.1.5.: (Teorema da Adequao) A frmula A um teorema se, e somente se, A uma tautologia. Um conjunto de frmulas consistente se, para nenhuma frmula A ocorre que A e A sejam deduzidas a partir de , ou seja, no temos A e A. Caso contrrio, inconsistente. Vamos entender o CPC como o conjunto de todos os seus teoremas. Proposio 2.1.6.: O clculo proposicional clssico (CPC) consistente.

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    Sejam v uma valorao e A uma frmula do CPC. A valorao v um modelo para A ou v satisfaz A, quando v(A) = 1. Indicamos isto por v A. Uma valorao v um modelo para um conjunto de frmulas quando v(B) = 1, para cada frmula B . Isto denotado por v . A frmula B conseqncia semntica da frmula A, quando todo modelo de A tambm modelo de B e escrevemos {A} B. A frmula B conseqncia semntica de , quando todo modelo de tambm modelo de B, o que denotamos por B. Proposio 2.1.7.: Se A, ento B. Corolrio 2.1.8.: Se tem modelo, ento consistente. Teorema 2.1.9.: Se consistente, ento tem modelo. Corolrio 2.1.10.: (Teorema da Completude Forte) Se A, ento A. Proposio 2.1.11.: Se A, ento existe um subconjunto finito 0 , tal que 0 A. Um sistema formal S decidvel se para toda frmula A de S podemos determinar se A um teorema de S ou se A no um teorema de S. Proposio 2.1.12.: O CPC decidvel. 2.2. O clculo de predicados de primeira ordem O CPC um sistema bastante simples e elegante, mas no consegue dar conta de dedues muito ingnuas, como a seguinte: Todos os animais so mortais (1) premissa Alguns rpteis so animais (1) premissa Alguns rpteis so mortais (1) concluso. Certamente este argumento vlido, mas no CPC teramos que indicar as premissas, por exemplo, por A e B e a concluso por C. Contudo, no verdadeiro que AB C. Introduzimos o clculo de predicados de primeira ordem, indicado por , que esten-de o clculo proposicional CPC e caracteriza ambientes apropriados para a construo e discusso de uma grande quantidade de teorias matemticas relevantes e que no podem ser abordadas no ambiente proposicional. Embora semelhantes, os desenvolvimentos sintticos de so mais gerais do que no CPC. O alfabeto de determinado pelo seguinte:

    (1) uma quantidade enumervel de variveis: v1, v2, ..., vn, ...; (2) conectivos lgicos: e ; (3) quantificador universal: ; (4) smbolos auxiliares: ) e (; (5) relao binria de igualdade: =;

    Para I, J e K e * = {0}, (6) smbolos relacionais {Ri}iI, junto com uma funo T0: I * que caracteriza, para

    cada i I, a aridade T0(i) de Ri; (7) smbolos funcionais {fi}jJ, junto com uma funo T1: J * que caracteriza, para

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    cada j J, a aridade T1(j) de fj; (8) constantes individuais {ak}kK.

    Os smbolos de (1) a (5) so os smbolos lgicos presentes em todas as teorias de pri-meira ordem. J os smbolos no lgicos, indicados de (6) a (8), so particulares para cada teoria tratada. Os smbolos de uma teoria podem no ocorrer em outra.

    Os termos de so as seguintes concatenaes de smbolos: (i) todas as variveis e constantes individuais so termos; (ii) se fj um smbolo funcional de aridade T1(j) = n e t1, ..., tn so termos, ento fj(t1, ..., tn)

    tambm um termo; (iii) os termos so gerados exclusivamente pelas regras (i) e (ii).

    As frmulas atmicas de so definidas por:

    (i) se t1 e t2 so termos, ento t1 = t2 uma frmula atmica denominada igualdade; (ii) se Ri um smbolo relacional com aridade T0(j) = n e t1, ..., tn so termos, ento Ri(t1, ...,

    tn) uma frmula atmica; (iii) as frmulas atmicas so geradas exclusivamente pelas regras (i) e (ii).

    A linguagem de predicados pode no contar com um smbolo para a relao de igualdade, mas neste caso, faz-se necessrio pelo menos um outro smbolo relacional para a gerao das frmulas atmicas. As frmulas de so definidas por:

    (i) toda frmula atmica uma frmula; (ii) se A e B so frmulas, ento (A) e (AB) so frmulas; (iii) se A uma frmula e x uma varivel, ento (xA) uma frmula; (iv) as frmulas so geradas exclusivamente pelas regras (i) - (iii).

    Os smbolos , e so definidos da mesma maneira que no CPC. O quantificador existencial definido da seguinte maneira:

    (x)A =df (x)A. Ocorrncia livre e ligada de uma varivel: se A uma frmula atmica e x ocorre em A, ento x ocorre livre em A. Se x ocorre livre em A e x y, ento x ocorre livre em (y)A. Se x ocorre livre em A, ento x ocorre livre em A, AB e BA. Quando x no ocorre livre em A, ento x ocorre ligada em A. Quando escrevemos (y)A dizemos que A est no escopo do quantificador (y). Uma varivel x est ligada em (x)A ou no livre em (x)A. Se y uma varivel distinta de x, ento y livre [ligada] em (x)A se ela livre [ligada] em A. Uma varivel x pode ocorrer livre e ligada em uma mesma frmula. Na frmula (x)(y)R(x, y) (y)R(x, y), a primeira ocorrncia de x ligada, ao passo que a segunda livre. As duas ocorrncias da varivel y so ligadas. Quando desejamos destacar algumas das variveis livres de A, indicamos isto por A(x1, x2, ..., xn). Isto no significa que x1, x2, ..., xn so todas, nem que no existam outras vari-veis livres em A. Com isto, de maneira semelhante ao CPC, se desejamos substituir todas as ocorrncias das variveis livres x1, x2, ..., xn pelos termos t1, t2, ..., tn em A, escrevemos A(t1, t2, ..., tn). A substituio de uma varivel x por um termo t em A, indicada por A[x/t], dada por:

    (i) se A atmica, ento A[x/t] resulta da permuta de todas as ocorrncias de x em A pelo termo t;

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    (ii) (A)[x/t] =df A[x/t]; (iii) (AB)[x/t] =df A[x/t] (B)[x/t]; (iv) (x)A [x/t] =df (x)A [sem alteraes] e

    (y)A[x/t] =df (y)A[x/t], para cada varivel y distinta de x. Sejam A uma frmula e t um termo de . O termo t livre para x em A se nenhuma ocorrncia livre de x em A est no escopo de qualquer quantificador (y), quando y uma varivel de t. Exemplos: (a) O termo y livre para x em R1(x), mas y no livre para x em (y)R1(x). (b) Se T1(2) = 2, T0(1) = 1 e T0(2) = 2, o termo f2(x, z) livre para x em (y)R2(x, y) R1(x), mas no livre em (z)(y)(R2(x, y)R1(x)), pois z uma varivel de f2(x, z) e ocorre no escopo do quantificador (z) e, portanto, (z). Uma sentena uma frmula sem variveis livres. Em , so as sentenas que sero interpretadas como verdadeiras ou falsas. Quando A, B e C so frmulas quaisquer de , o clculo de predicados com igual-dade determinado pelo seguinte conjunto de axioma e regras. Axiomas (i) Proposicionais: Ax1 (A(BA)) Ax2 ((A(BC)) ((AB)(AC))) Ax3 ((B A) ((BA) B)) (ii) Quantificacionais: Ax4 (x)(AB) (A(x)B), x no ocorre livre em A Ax5 (x)AB, B A(x/t), isto , B obtida de A pela substituio de toda ocorrncia livre de x em A por um termo t livre para x (iii) Da igualdade: Ax6 (x)(x = x) Ax7 x = y (A(x, x)A(x, y)), onde A(x, y) vem de A(x, x) pela substituio de algu-ma, mas no necessariamente todas, ocorrncia livre de x por y e tal que y livre para as ocorrncias de x as quais ele substitui. Regras de inferncia MP A, AB B Gen A (x)A. Os conceitos de deduo, demonstrao, teorema, consistncia e inconsistncia coincidem com os do CPC. Proposio 2.2.1.: (Teorema da Deduo) Sejam , A B uma deduo e x uma varivel livre para A. Se na deduo de B a partir de {A}, a Regra de Generalizao (x)Ci no aplicada em qualquer frmula Ci que depende de A, ento AB. Corolrio 2.2.2.: Se uma deduo , A B no envolve quantificaes sobre variveis livres de A, ento AB.

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    Corolrio 2.2.3.: Se A uma sentena e , A B, ento AB. Teorema 2.2.4.: O clculo de predicados consistente. Para outros metaresultados precisamos da semntica de primeira ordem. Deixaremos a mera manipulao de smbolos e criamos ambientes de trabalho sobre os quais os mate-mticos usualmente desenvolvem os seus trabalhos. Estes ambientes so denominados de estruturas matemticas e so particularmente caracterizados por suas: constantes, relaes e funes. Dada uma linguagem de primeira ordem, uma estrutura A associada a esta lingua-gem determinada pela seguinte qudrupla:

    (i) um conjunto no vazio A, denominado o universo ou domnio de A; (ii) uma famlia {RiA}iI, para cada i I, onde RiA uma relao definida sobre A, de ari-

    dade T0(i), ou seja, T0(i) = n e RiA An; (iii) uma famlia {fjA}jJ, para cada j J, onde fjA uma funo definida sobre A, de arida-

    de T1(j), ou seja, T1(j) = n e fjA: AnA; (iv) uma famlia {ajA}kK de constantes de A.

    Usamos as letras A, B, C, ... para indicar as estruturas e as letras A, B, C, ... para os res-pectivos universos. Indicamos uma estrutura por A = (A, {RiA}iI, {fjA}jJ, {ajA}kK). Consideremos uma linguagem de primeira ordem L e A = (A, {RiA}iI, {fjA}jJ, {ajA}kK) uma estrutura para L. Uma interpretao de L em A uma funo tal que: : {Ri}iI = {RiA}iI (Ri) = RiA : {fj}jJ = {fjA}jJ (fj) = fjA : {ak}kK = {akA}kK (ak) = akA. A funo leva elementos simplesmente sintticos, ou formais, da linguagem L em elementos de um universo um pouco mais concreto, onde damos significado ou interpreta-mos os entes sintticos. Por exemplo, consideremos a aritmtica e a interpretemos na estrutura algbrica dada por = ( , +, . , 0, 1), em que o domnio o conjunto dos nmeros naturais, a adio e a multiplicao so as operaes usuais sobre os nmeros naturais e as constantes 0 e 1 so interpretados pelos nmeros 0 e 1 dos naturais. Agora queremos considerar uma frmula de uma certa teoria e saber quando esta pode ser validada em uma estrutura. Fazendo um paralelo com o clculo proposicional, gostaramos de saber quando a frmula verdadeira ou quando ela vlida. Desde que no clculo de predicados temos tambm a figura dos termos, precisamos entend-los dentro das estruturas semnticas. Sejam a1, ..., an A e consideremos que o conjunto das variveis livres e ligadas de um termo t(v1, ..., vn) esteja contido em {v1, ..., vn}. O valor do termo t em a1, ..., an :

    (i) t(a1, ..., an) = ai , quando t = vi; (ii) t(a1, ..., an) = akA , quando t = ak; (iii) t(a1, ..., an) = fjA(t1(a1, ..., an), ..., tm(a1, ..., an)), quando t = fj(t1, ..., tm).

    Seja A uma frmula cujo conjunto de variveis livres e ligadas esteja contido em {v1,

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    ..., vn} e a1, ..., an A. A estrutura A satisfaz a frmula A se vale o seguinte: (Caso 1) A frmula A atmica: (i) se A do tipo t1 = t2, ento a1, ..., an satisfaz A na estrutura A quando t1(a1, ..., an) = t2(a1, ..., an); (ii) se A do tipo Ri(t1, ..., tk), T0(i) = k e t1(v1, ..., vn), ento a1, ..., an satisfaz A em A se RiA (t1(a1, ..., an), ..., tm(a1, ..., an)). Denotamos a relao de satisfao, neste caso, por: A (t1 = t2)(a1, ..., an) t1(a1, ..., an) = t2(a1, ..., an) A Ri(t1, ..., tk)(a1, ..., an) RiA(t1(a1, ..., an), ..., tm(a1, ..., an)). (Caso 2) (i) A do tipo B: A A(a1, ..., an) A B(a1, ..., an); (ii) A do tipo BC: A A(a1, ..., an) see A B(a1, ..., an)ou A C(a1, ..., an). (Caso 3) (i) A do tipo (vi)B, 1 i n: A A(a1, ..., an) A B(a1, ..., ai-1, a, ai+1, ..., an), para todo a A. Com esta definio, sabemos quando uma frmula de uma linguagem de primeira ordem satisfeita em uma dada estrutura. Assim, a frmula A(v1, ..., vn) satisfatvel quando existem uma estrutura A e (a1, ..., an) An tal que A A(a1, ..., an). Tambm dizemos que A um modelo para A(v1, ..., vn). A frmula A(v1, ..., vn) vlida quando quaisquer que sejam a estrutura A e (a1, ..., an) An, temos que A A(a1, ..., an). Teorema 2.2.5.: (Teorema da Completude de Gdel - 1930) Seja A uma frmula de . Ento A um teorema se, e somente se, A uma frmula vlida. Teorema 2.2.6.: O clculo de predicados de primeira ordem (clssico) indecidvel. 2.3. Teorias de primeira ordem Agora estamos prontos para estender os clculos estritamente lgicos para sistemas mais gerais, onde podemos analisar e discutir as teorias matemticas. Uma teoria de primeira ordem ou teoria de um conjunto consistente T de senten-as de . Uma teoria T fechada se, sempre que T A, ento A T, ou seja, T contm todas as suas conseqncias. Denotamos o conjunto das sentenas de T por Sent(T). A teoria T completa se {A Sent(T) / T A} maximal e consistente. Uma teoria T* uma subteoria de T se T* T. Neste caso, tambm dizemos que T uma extenso de T*. Um conjunto de axiomas para T um conjunto de sentenas de com as mesmas conseqncias de T. A teoria T finitamente axiomatizvel se T tem um conjunto finito de axiomas no lgicos. Podemos observar que T sempre um conjunto de axiomas para T. O conjunto vazio um conjunto de axiomas para os teoremas de . Agora, apresentamos formalmente algumas importantes teorias matemticas. Como

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    algumas dessas teorias advm de anteriores pelo acrscimo de novos axiomas, indicamos este acrscimo pelo smbolo +. (a) Teoria das ordens parciais Consideremos uma linguagem de primeira ordem com um smbolo relacional binrio . Os axiomas seguintes determinam a teoria das ordens parciais: OP1 (x) (x x) OP2 (xy) ((x y y x)(x = y)) OP3 (xyz) ((x y y z)(x z)). (b) Teoria das ordens lineares ou totais Mesma linguagem da teoria de ordem parcial, com: OP1 - OP3 + OL4 (xy) (x y y x). (c) Teoria das ordens lineares densas Mesma linguagem, com: OP1 - OP3 + OL4 + OLD5 (xy) ((x y x y) (z)(x z z y x z z y)). (d) Teoria das relaes de equivalncia Consideremos uma linguagem de primeira ordem com um smbolo relacional binrio e os axiomas: EQ1 (x) (x x) EQ2 (xy) ((x y)(y x)) EQ3 (xyz) ((x y y z)(x z)). Um modelo para uma teoria de primeira ordem uma estrutura de primeira ordem na qual todos os teoremas da teoria so satisfatveis. Teorema 2.3.1.: (Teorema da Completude Forte) Sejam T uma teoria de primeira ordem e A um conjunto de sentenas de T. Ento, T A see T A. Corolrio 2.3.2.: A teoria T consistente se, e somente se, T tem modelo. Finalmente, introduzimos uma ltima e importante teoria de primeira ordem. (e) Teoria dos nmeros ou Aritmtica Ar Consideremos uma linguagem de primeira ordem com igualdade, acrescida de dois smbolos funcionais + e ., para a adio e multiplicao; um smbolo funcional s, para a fun-o sucessor; e duas constantes 0 e 1, com os axiomas: A1 (x)(s(x) 0) A2 (xy)(s(x) = s(y) x = y) A3 (x)(x + 0 = x) A4 (xy)(x + s(y) = s(x + y)) A5 (x)(x.0 = 0) A6 (xy)(x.s(y) = (x.y) + x) A7 (Esquema de axiomas para cada A) Seja A(x0, x1, ..., xn), na qual x0 no ocorre ligada. Ento:

    (x1...xn)[((A(0, x1, ..., xn) (y)(A(y, x1, ..., xn)A(s(y), x1, ..., xn))) A(y, x1, ..., xn)]. O modelo natural ou standard para a aritmtica determinado pelo conjunto de todos os nmeros naturais, junto com as operaes de adio e multiplicao de naturais, a

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    operao de sucessor, bem como as constantes 0 (zero) e 1 (um). Alm do interesse intrnseco desta teoria matemtica, observamos que o seu modelo natural o ambiente elementar e necessrio para o desenvolvimento de quase tudo em matemtica. Apesar disso, os resultados seguintes impem limites considerveis no processo recursivo axiomtico que vimos tratando at aqui. Existem mais informaes no modelo do que podemos obter no sistema formal correspondente. Teorema 2.3.3.: (Primeiro Teorema de Incompletude de Gdel - 1931) Se Ar consistente, ento existe uma frmula C indecidvel em Ar. Teorema 2.3.4.: (Segundo Teorema de Incompletude de Gdel) Se Ar consistente, ento no possvel demonstrar a consistncia de Ar dentro do sistema.

    Assim, no podemos obter uma demonstrao da consistncia de Ar com recursos prprios do sistema Ar. Isto no significa que Ar seja inconsistente, ou mesmo que no se possa demonstrar a sua consistncia atravs de outros mtodos, o que, alis, o caso. Mas, estas demonstraes de consistncia devem fazer uso de outros dispositivos alm daqueles dispostos em Ar, ou dos procedimentos finitrios pretendidos. 2.4. Primeiros passos na lgica Indicamos, na bibliografia, textos clssicos, alguns textos introdutrios publicados em Portugus e alguns outros mais especficos. Para estudantes iniciantes e ainda com dificuldades na leitura em Ingls, os seguintes textos poderiam ser pontos de partida: Castrucci 1975, Alencar Filho 1986 e Daghlian 1988 so recomendados para leitores que preferem as exatas; Nolt 1991 e Salmon 1984 so indi-cados para filsofos e oriundos de outras disciplinas das humanidades. Um recente e bom texto introdutrio de lgica, em Portugus, Mortari 2001. Para os que pretendem estudar lgica mais seriamente, indicamos: Kleene 1952, Mendelson 1964, Shoenfield 1967 e Bell & Machover 1977. So clssicos. So ainda bons textos para lgica matemtica Hamilton 1978 e Ebbinghaus, Flum & Thomas 1984. 3. As lgicas no-clssicas Discutimos, nesta seo, o florescer das lgicas no-clssicas, destacando algumas das principais classes de tais lgicas. 3.1. O ambiente matemtico no sculo XIX e a lgica do sculo XX

    Neste pargrafo, utilizando da Costa 1992, apresentamos algumas consideraes so-bre a matemtica do sculo XIX, que muito influenciou a cultura e o pensamento em geral do sculo XX e contribuiu, direta ou indiretamente, para o surgimento da lgica matemtica e, principalmente, das lgicas no-clssicas.

    O sculo XIX foi um dos perodos ureos da matemtica. Um dos marcos fundamentais foi o surgimento das geometrias no-euclidianas geometrias distintas da geometria clssi-ca com os trabalhos de Lobachevski e Blyai e, posteriormente, com os de Riemann.

    Segundo da Costa, o surgimento das geometrias no-euclidianas talvez tenha sido um dos maiores acontecimentos na histria da cultura e, at hoje, tais geometrias so motiva-es heursticas ou analgicas para a construo das lgicas no-clssicas. Vasiliev e Luka-siewicz, na construo de seus sistemas no-clssicos, declararam-se motivados pelo surgi-mento das geometrias no-euclidianas.

    Quanto geometria de Riemann, deve-se considerar no apenas a formalizao

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    usual da geometria riemanniana, mas tambm a teoria geral dos espaos de Riemann, com a concepo riemanniana de espao, que mudou radicalmente a noo de espao e constitui uma modificao to radical quanto aquela provocada pela geometria de Lo-batchevski e Blyai.

    Outra criao importante do sculo XIX foi a construo e desenvolvimento da geo-metria projetiva; com os trabalhos de Desargues, Poncelet e Chasles entre outros, uma ge-ometria mais geral que a euclidiana e que se afasta da noo usual de espao.

    Todos os historiadores da matemtica, que se interessam pelos princpios da geometri-a, consideram que o desenvolvimento da geometria projetiva pode ser comparado ao im-pacto, ainda que com menor intensidade, da geometria de Euclides; principalmente quan-do a geometria projetiva passou a desenvolver-se num plano puramente abstrato. O fato de que a geometria derivava de certos axiomas puramente formais no era claro na poca.

    Pela mesma poca do surgimento das geometrias no-euclidianas, criada a geo-metria a um nmero qualquer de dimenses, principalmente por Grassmann e Cayley. Esta geometria desenvolveu-se de forma abstrata, podendo tornar-se independente da geome-tria fsica, que a cincia que estuda o espao fsico real.

    Houve ainda uma grande revoluo na rea da lgebra, com a construo, por Ha-milton, das lgebras no-comutativas.

    A partir da criao do primeiro sistema matemtico no qual a operao de multipli-cao no comutativa, Hamilton e toda a escola inglesa passaram a conceber a lgebra como algo abstrato. Ao mesmo tempo, Grassmann criou toda a lgebra linear, com a teoria dos espaos vetoriais.

    Nesse sentido, com Hamilton e Grassmann efetuou-se uma mudana radical na ma-neira de se encarar a matemtica, que passou a se tornar abstrata, comeando a separar-se das cincias naturais, especialmente da fsica. A matemtica francesa tardou a adquirir essa viso da matemtica, que para os alemes j era bastante clara, pois no incio do s-culo XX, com Poincar e outros, a matemtica era algo difcil de se separar da fsica.

    Outro processo fundamental foi a evoluo do mtodo axiomtico, graas ao traba-lho pioneiro de Peano e sua escola e de vrios matemticos alemes, coroado na obra de Hilbert. O grande mrito da concepo genial e revolucionria de Hilbert est claro em um clebre discurso de 1900, em que afirma que no verdadeiro mtodo axiomtico se deveria tratar de todas as possibilidades lgicas existentes.

    necessrio ainda mencionar o processo, de origem principalmente alem, de arit-metizao da anlise.

    At meados do sculo XX, os matemticos franceses em geral concebiam a matem-tica como algo de natureza intuitiva, uma espcie de cincia fsica. Os matemticos ale-mes, principalmente a partir da influncia de Cantor, conceberam a matemtica como uma cincia puramente abstrata, assumindo que era necessrio reconstru-la logicamente, o que causou impactos srios, j por ns discutidos.

    Finalmente, temos a obra de Cantor, o criador da teoria de conjuntos, com a modifi-cao definitiva de paradigma que ela ocasionou.

    Considera-se que s existem duas coisas que se comparam obra de Cantor: a edifi-cao da matemtica grega e a criao da anlise infinitesimal por Leibniz e Newton.

    A grande lio de Cantor resume-se em uma frase clebre: A essncia da matemti-ca radica na sua completa liberdade. Ou seja, possvel desenvolv-la em plano total-mente independente do mundo fsico real.

    O sculo XIX nos legou a viso abstrata cantoriana e a viso concreta francesa de Po-incar, Borel, Lesbegue, etc.

    A matemtica e a lgica de hoje so espcies de snteses da posio francesa e da alem.

    Da Costa finaliza seu artigo resumindo alguns aspectos da histria da matemtica que influenciaram a criao da lgica atual e das lgicas no-clssicas: as geometrias no-euclidianas sugeriram a possibilidade de lgicas diferentes da clssica; a geometria projeti-va contribuiu para que se concebesse a lgica de maneira formal e abstrata; as obras de

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    Cayley, Grassmann e Hamilton corroboraram a importncia dos desenvolvimentos provo-cados pelo impacto das geometrias no-euclidianas; o cantorismo conduziu s axiomatiza-es da teoria de conjuntos e formulao das chamadas lgicas abstratas; e a concep-o matemtica de Poincar e de outros matemticos franceses desembocou no construti-vismo contemporneo das lgicas intuicionistas. 3.2. Sculo XX: a lgica clssica e o surgimento das lgicas no-clssicas

    A teoria de conjuntos usual, sobre a qual se pode fundamentar a aritmtica (e, portan-to, toda a matemtica tradicional), mantm a lgica clssica, com seus princpios bsicos as leis bsicas do pensamento Aristotlico , como lgica subjacente.

    Entretanto, os paradoxos da teoria de conjuntos e questes no solucionadas sobre o conceito de infinito deixavam ainda aos lgicos problemas relativos fundamentao da matemtica.

    O programa de Hilbert, a partir de 1902, tinha por objetivo provar que tais dificuldades podiam ser superadas, mediante uma formalizao adequada que permitisse a demonstra-o metateortica da consistncia da aritmtica e, portanto, da matemtica. Hilbert & Ber-nays 1934 (segunda edio em 1939) um tratado de lgica moderna e contm as idias de Hilbert sobre os fundamentos da matemtica, caracterizando a distino entre lingua-gem objeto e metalinguagem (na terminologia de Hilbert, entre matemtica e metamate-mtica).

    Entretanto, os famosos Teoremas de Incompetude de Gdel, publicados em 1931, destruram o programa de Hilbert: (Primeiro Teorema) Se a aritmtica, Ar, consistente, ento existe uma frmula C, na lin-guagem de Ar, tal que nem C, nem tampouco C podem ser demonstradas em Ar. (Segundo Teorema) Se o sistema formal Ar consistente, ento no possvel demonstrar a sua consistncia dentro do sistema Ar. Uma conseqncia desses resultados que qualquer sistema formal, por mais bem construdo que seja, se satisfaz certas condies essenciais da aritmtica dos nmeros natu-rais, ento admite sentenas verdadeiras, porm no demonstrveis no sistema.

    J no final do sculo XIX, alguns trabalhos pioneiros, buscando solues no-aristotlicas para algumas questes lgicas, foram precursores das lgicas no-clssicas em geral, como os de MacColl.

    Nas primeiras dcadas do sculo XX, vrios filsofos e matemticos, motivados por questes e objetivos algumas vezes distintos, criaram novos sistemas lgicos, diferentes da lgica aristotlica.

    Podemos afirmar que as lgicas no-clssicas diferenciam-se da lgica clssica por:

    (i) Poderem estar baseadas em linguagens mais ricas em formas de expresso; (ii) Poderem estar baseadas em princpios inteiramente distintos; ou (iii) Poderem ter uma semntica distinta.

    Haack 1974 considera duas categorias principais de lgicas no-clssicas: as que so

    apresentadas como complementares da clssica e as lgicas alternativas a ela. As do primeiro tipo no infringem os princpios bsicos da lgica clssica e no questi-

    onam sua validade universal, apenas ampliam e complementam o seu escopo. Em geral, a linguagem clssica enriquecida com a introduo de novos operadores. So exemplos de lgicas complementares, as lgicas modais, com os operadores modais de possibilidade e necessidade; as lgicas denticas, com os operadores denticos proibido, permitido, indife-rente e obrigatrio; as lgicas do tempo, com operadores temporais, relevantes para os fundamentos da fsica e para a lingstica; as lgicas epistmicas, lgicas imperativas, etc.

    As lgicas heterodoxas (alternativas, desviantes), rivais da lgica clssica, foram con-cebidas como novas lgicas, destinadas a substituir a lgica clssica em alguns domnios do

  • Sobre a histria da lgica, a lgica clssica e o surgimento das lgicas no-clssicas

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    saber. Derrogam princpios bsicos da lgica clssica. As lgicas heterodoxas nas quais no vale a lei reflexiva da identidade, so chamadas

    lgicas no-reflexivas, como, por exemplo, a lgica quntica. Alguns sistemas no-reflexivos fortes englobam a lgica clssica.

    Nas lgicas paracompletas no vlido o princpio do terceiro excludo, ou seja, pode existir frmula A tais que nem A e nem a negao de A no so teoremas. So lgicas pa-racompletas as lgicas intuicionistas e as lgicas polivalentes.

    Uma soluo radical para o problema dos paradoxos foi defendida por Brouwer e sua escola intuicionista, considerando que os paradoxos no podem ser derivados e, portanto, no tm significado, se obedecermos s estruturas intuicionistas. De fato, na poca do sur-gimento da lgica intuicionista no se tinha ainda a garantia ltima de que no se podia derivar paradoxos nesse sistema, tinha-se apenas a expectativa de que dada as peculiari-dades dos sistemas intuicionistas, a consistncia da aritmtica intuicionista fosse mais facil-mente verificada.

    Nas lgicas polivalentes as proposies podem assumir outros valores de verdade en-tre o verdadeiro (1) e o falso (0).

    O princpio da (no-) contradio derrogado nas lgicas relevantes e na maioria das lgicas paraconsistentes.

    Nas lgicas relevantes, introduzidas em Ackermann 1956 e especialmente desenvolvi-das em Anderson & Belnap 1976, a idia bsica a obteno de uma implicao (entail-ment ou implicao relevante) livre dos chamados paradoxos da implicao material.

    Uma teoria consistente se no existe uma frmula A de sua linguagem tal que A e a negao de A sejam teoremas; inconsistente, em caso contrrio; e trivial se toda frmula de sua linguagem teorema.

    Toda teoria dedutiva baseada na lgica clssica inconsistente se, e somente se, trivial.

    Uma lgica dita paraconsistente se pode ser usada como a lgica subjacente para teorias inconsistentes e no triviais, que so chamadas teorias paraconsistentes.

    A grande relevncia das teorias paraconsistentes, no que concerne aos paradoxos, que eles podem ser naturalmente absorvidos pela teoria, sem quebra da fora lgica, ou seja, sem trivializao.

    Existem vrios outros tipos de lgicas no-clssicas como, por exemplo, as lgicas difu-sas (lgicas fuzzy).

    No podemos tambm deixar de mencionar certos sistemas interessantes, com simul-taneamente vrias das caractersticas de algumas das lgicas citadas.

    A lgica moderna evoluiu muito e, com relao a alguns tipos de lgica, seria difcil poder identific-las como complementares da clssica, ou heterodoxos.

    O surgimento das lgicas heterodoxas deu origem, sem dvida, a importantes proble-mas filosficos. Porm, seu significado parece ainda no ter sido debatido em profundida-de.

    Apresentamos, a seguir, consideraes especficas sobre o surgimento das lgicas po-livalentes, intuicionistas, modais e paraconsistentes. 3.3. Lgicas polivalentes

    Jan ukasiewicz (1876-1956) introduziu seus sistemas de lgicas polivalentes como uma tentativa de investigar as proposies modais e as noes de possibilidade e necessidade intimamente relacionadas com tais proposies.

    Durante a idade mdia, entretanto, podemos encontrar sinais de abordagens poliva-lentes nos trabalhos de Duns Scotus, William de Ockham e Peter de Rivo. No final do sculo XIX, algumas tentativas de construes trivalentes aparecem em MacColl e Peirce.

    ukasiewicz, professor de filosofia na Universidade de Varsvia, em 1910 publicou um li-vro, em polons, na srie Studium Krytyczne e, em alemo, um artigo no Bulletin International de l'Acadmie des Sciences de Cracovie, ambos sobre o princpio da (no-) contradio

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    em Aristteles. Nesses trabalhos, ukasiewicz discute a relevncia e necessidade de se provar o prin-

    cpio da (no-) contradio e analisa os argumentos construdos para esclarec-lo. No artigo, traduzido para o ingls em 1971, na Review of Metaphysics, apresenta uma

    exposio historicamente crtica das trs formulaes aristotlicas do princpio da (no-) contradio e tambm critica, conclusivamente, as tentativas de Aristteles para justific-las.

    ukasiewicz finalmente rejeita a viso aristotlica de que o princpio da (no-) contra-dio o ltimo e maior dos princpios lgicos. E conjectura que, como no caso das geome-trias no-euclidianas, uma reviso fundamental das leis bsicas da lgica de Aristteles poderia, talvez, levar a novos sistemas no-aristotlicos de lgica, caracterizando-se assim como um dos precursores das lgicas no-clssicas em geral.

    Os argumentos utilizados por ukasiewicz so analisados, em detalhe, em Priest & Rou-tley 1989 e discutidos em DOttaviano 1990a.

    De acordo com Wolenki 1989, os trabalhos de ukasiewicz sobre o princpio da (no-) contradio despertaram muito interesse entre jovens estudantes e filsofos poloneses, ten-do desencadeado frutferas discusses sobre a possibilidade da criao de lgicas no-aristotlicas, e tendo sido escritos vrios trabalhos sobre o conceito de existncia, a veraci-dade de sentenas envolvendo a noo de futuro, sobre determinismo, indeterminismo, o princpio da (no-) contradio e o princpio do terceiro excludo.

    ukasiewicz, apesar de ter publicado, ainda em 1910, um outro artigo sobre o princpio do terceiro excludo, manteve-se silencioso sobre essas questes at 1916, quando, ao pu-blicar seus comentrios a respeito de um livro de Zaremba sobre aritmtica terica, voltou a enfatizar que a preciso em matemtica era usualmente medida pelas regras da lgica tradicional, porm que isso tinha se tornado insuficiente.

    Em 1918, quando se afastava temporariamente da Polnia, em seu discurso de des-pedida, ukasiewicz mencionou, sem divulgar detalhes, que tinha construdo um sistema de lgica trivalente.

    Em 1920, finalmente, ao retornar Polnia, ukasiewicz proferiu duas conferncias em vov, uma sobre o conceito de possibilidade e outra sobre a lgica trivalente, na qual intro-duziu uma matriz-base para a descrio dos conectivos do sistema.

    interessante observarmos que ukasiewicz, ao assumir a existncia de sentenas s quais deveria ser atribudo um terceiro valor de verdade, distinto dos clssicos verdadeiro ou falso, no rejeitou os princpios lgicos da (no-) contradio ou do terceiro excludo, tendo, entretanto, conectado sua soluo com a negao do princpio metalgico da bivalncia.

    As proposies modais investigadas por ukasiewicz so proposies construdas tendo como modelo uma das seguintes expresses: possvel que p, no possvel que p, poss-vel que no-p ( contingente que p) e no possvel que no-p ( necessrio que p).

    A frase possvel que p foi tomada como primitiva e ukasiewicz expressou seu signi-ficado atravs de trs asseres modais, por ele consideradas como bsicas, por razes intuitivas e histricas. E explicou que no seria possvel dar uma interpretao, atravs das tbuas de verdade clssicas, para o operador de possibilidade, compatvel com as trs propriedades bsicas por ele enunciadas.

    Baseando-se nesse resultado, ukasiewicz concluiu que, para que fosse possvel dar uma interpretao da tbua de verdade para o conectivo proposicional de possibilidade, seria necessrio considerar uma semntica para o clculo proposicional na qual as proposi-es pudessem admitir mais valores de verdade que os clssicos verdadeiro e falso.

    Como est explicado em ukasiewicz & Tarski 1930, ukasiewicz escolheu os valores de verdade possveis, inspirado numa passagem de Aristteles 1978 - Captulo IX, sobre os futu-ros contingentes e determinismo.

    Assim sendo, para proposies p do tipo haver uma batalha naval amanh, uka-siewicz atribuiu um valor de verdade v(p) intermedirio entre a verdade (1) e o falso (0), o qual foi denotado por .

    ukasiewicz introduziu seu clculo proposicional trivalente L3 atravs da matriz M = ({0,

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    , 1}, {1}, , ), em que {0, , 1} o conjunto dos valores de verdade, {1} o conjunto de valores distinguidos de verdade e os operadores (de negao) e (de implicao) defi-nidos atravs das seguintes tabelas de verdade:

    p p 0 10 1 0 1 1 1 1 11 0 1 0 1

    O conectivo de possibilidade M definido por:

    M(p) =df p p,

    tendo como tbua correspondente:

    p Mp 0 0 1 1 1

    Os conectivos de disjuno, conjuno, necessidade e equivalncia so definidos a partir dos anteriores.

    Em 1922, ukasiewicz generalizou seu clculo proposicional trivalente para uma lgica com qualquer nmero finito de valores lgicos. E, a seguir, generalizou-a para clculos com nmero infinito de valores de verdade. Definiu uma famlia Ln de sistemas polivalentes com n valores de verdade, n = 2, 3, .... 0, 1.

    Independentemente de ukasiewicz e motivado por propriedades formais das propo-sies, Post 1921 tambm introduziu uma hierarquia de clculos finitovalentes, os sistemas Pn, n 3, distintos dos sistemas Ln, n 3.

    Uma exposio detalhada dos sistemas polivalentes de ukasiewicz foi publicada em ukasiewicz & Tarski 1930 (ver Tarski 1956 e Borkowski 1970).

    importante observarmos que o clculo proposicional bivalente de ukasiewicz coin-cide com o clculo proposicional clssico; e todas as lgicas n-valentes de ukasiewicz, com n finito ou infinito, so subsistemas do clculo proposicional clssico (quando entendi-dos como conjuntos de teoremas).

    ukasiewicz havia conjecturado quais seriam as axiomticas adequadas para seu cl-culo trivalente L3 e para seu clculo 0-valente L0. As axiomticas para os clculos L3 e Ln (com n finito) foram introduzidas por Wajsberg 1931 e 1935.

    Wajsberg 1935 mencionou ter provado a conjectura de ukasiewicz relativa axioma-tizao do clculo L0, porm sua demonstrao nunca apareceu publicada.

    A primeira demonstrao publicada da conjectura de ukasiewicz foi a de Rose & Rosser 1958.

    Como referncia bibliogrfica para o estudo das lgicas polivalentes em geral, indi-camos Malinowski 1993. 3.4. Lgicas intuicionistas e modais

    O fundador do chamado intuicionismo o matemtico holands L. E. Brouwer (1881 -1966). No incio do sculo XX apresentou a idia de que qualquer verdade matemtica o resultado de uma construo intelectual baseada na intuio mental da srie de nmeros. Uma conseqncia dessa suposio filosfica que pode acontecer que no tenhamos

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    uma construo (uma prova) nem para a proposio A e nem para sua negao no-A. Segue-se ento que a chamada Lei do Terceiro Excludo A ou no-A deve ser rejeitada, no podendo ser usada como um instrumento em demonstraes matemticas. Dada sua atitude mentalstica, Brouwer era crtico em relao ao uso do formalismo lgico, mas seu aluno A. Heyting apresentou, em 1930, um clculo formal que igual ao clssico com a o-misso da Lei do Terceiro Excludo. Kolmogorov, em 1925, j havia introduzido, entretanto, a primeira axiomatizao para a lgica intuicionista (ver Kolmogorov 1977).

    A lgica intuicionista de Heyting um subsistema (enquanto conjunto de teoremas) da lgica clssica, ao passo que as lgicas modais so extenses lingsticas e axiomticas de-la. A lgica modal era um ramo altamente desenvolvido das lgicas antiga e medieval e, assim, cham-la de no-clssica soa como uma injria no intencional sua venervel tradio. No entanto, quando a lgica foi reconstruda, no sculo XIX, como uma cincia rigorosa, no havia espao para um tratamento lgico de conceitos modais, ou seja, para as noes de necessrio, possvel, impossvel e contingente.

    C. I. Lewis (1883 - 1964), o pai da lgica modal contempornea, dirigiu seu ataque lgica matemtica no tanto pela proposta desta de reduzir a lgica modal teoria da quantificao, mas por seu questionvel tratamento da implicao. Como bastante co-nhecido, a implicao russelliana o condicional material de fato reduz toda sentena da forma se A, ento B para a disjuno no-A ou B, com o resultado paradoxal de que se um destes disjuntos verdadeiro, a implicao como um todo tambm verdadeira. Lewis conjeturou que a interpretao correta de se p, ento q : impossvel que p seja ver-dadeiro e q falso, empregando assim essencialmente a noo modal de possibilidade. Para axiomatizar a noo de implicao em um sentido estrito, Lewis introduziu no um, mas cinco diferentes sistemas, com poderes crescentes (S1 S5), introduzindo dessa maneira, pela primeira vez, a inquietante pluralidade de sistemas lgicos dedicados a axiomatizar a mes-ma noo. Infelizmente, mesmo sendo capaz de provar que seus cinco sistemas eram distin-tos, ele no forneceu procedimentos de deciso para esses sistemas.

    No final dos anos 50, vrios lgicos Hintikka, Kanger, Montague, Kripke conseguiram associar uma semntica a sistemas modais fortes e fornecer um procedimento de deciso para eles.

    3.5. Lgicas paraconsistentes

    Nas lgicas paraconsistentes, o escopo do princpio da (no-) contradio , num cer-

    to sentido, restringido. Podemos mesmo dizer que, se a fora desse princpio restringida num sistema lgico, ento o sistema pertence classe das lgicas paraconsistentes.

    De fato, nas lgicas paraconsistentes o princpio da (no-) contradio, na forma (AA), no necessariamente no vlido, porm, em toda lgica paraconsistente, de uma frmula A e sua negao A no possvel, em geral, deduzir qualquer frmula B.

    Apesar da filosofia oriental ter sido, em geral, mais tolerante com a inconsistncia que a ocidental, abordagens paraconsistentes no foram to excepcionais na Antigidade cls-sica, tendo sido assumidas por diversas escolas filosficas, como, por exemplo, pelos sofistas, megricos e esticos.

    Podemos dizer, entretanto, que o pensamento paraconsistente comea no ocidente com Herclito de feso.

    Desde Herclito, diversos filsofos, entre eles Hegel, Marx, Engels e os materialistas dia-lticos contemporneos tm proposto a tese de que as contradies so fundamentais pa-ra a compreenso da realidade.

    No comeo do sculo XX, a paraconsitncia foi, definitivamente, descoberta por v-rios estudiosos, todos eles trabalhando independentemente.

    Em 1910, alm da publicao do artigo e livro de ukasiewicz, temos a publicao do primeiro artigo de Vasiliev sobre lgicas no-clssicas, e a segunda edio revisada do texto bsico da teoria dos objetos de Meinong.

    A teoria de objetos de Meinong inclua objetos contraditrios, os quais, devido sua

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    natureza, tm caractersticas contraditrias e so susceptveis de tratamento lgico. A teoria de Meinong parece ter influenciado o trabalho de ukasiewicz em sua fase i-

    nicial. Meinong trabalhou dentro da lgica tradicional e nenhum deles, Meinong, ukasiewicz

    ou Vasiliev usou lgica moderna simblica. Podemos afirmar, entretanto, que os dois verdadeiros precursores da lgica paracon-

    sistente so J. ukasiewicz e N. Vasiliev. Vasiliev era mdico, professor de filosofia na Universidade de Kazan, Rssia. Parece

    no ter tido conhecimento dos trabalhos de ukasiewicz de 1910, mas seus argumentos so-bre a possibilidade da construo de lgicas no-aristotlicas so muito semelhantes. inte-ressante ter ele tambm argumentado que a lei do terceiro excludo aparecia na mente de Aristteles com o objetivo de refutar seus adversrios, e no por razes lgicas.

    Entre 1910 e 1913 (ver Arruda 1990) publicou, em russo, uma srie de quatro artigos, nos quais apresentou suas idias sobre a possibilidade de derrogao de algumas formas da lei do terceiro excludo e da lei da (no-) contradio.

    Arruda 1977 apresenta trs abordagens diferentes s idias intuitivas de Vasiliev, relati-vas sua lgica imaginria de dimenso 3, obtendo em cada caso uma lgica paraconsis-tente. Arruda afirma acreditar que qualquer possvel formalizao da lgica imaginria de Vasiliev deveria conduzir necessariamente a uma lgica paraconsistente, e no a uma lgi-ca polivalente, como aparece em Church 1936 e Kline 1965, entre outros.

    Jakowski, um dos discpulos de ukasiewicz, motivado por diversos problemas relativos a contradies, particularmente os concernentes a raciocnios convincentes que levam a duas concluses contraditrias, construiu o primeiro sistema de lgica paraconsistente. Seus dois artigos foram publicados em 1948 e 1949, em polons, tendo a primeira traduo para o ingls, de Jakowski 1948, aparecido apenas em Jakowski 1969.

    De acordo com Arruda 1989, as principais motivaes de Jakowski para a constru-o de seu sistema so as seguintes: o problema da sistematizao de teorias que contm contradies, como ocorre na dialtica; o estudo de teorias nas quais existem contradies causadas pela vaguidade; e o estudo direto de algumas teorias empricas cujos postula-dos ou princpios bsicos so contraditrios.

    Jakowski salientou claramente a diferena entre sistemas contraditrios, que incluem duas teses tais que uma contradiz a outra, e sistemas supercompletos, nos quais todas as frmulas so teses, e considerou que a lgica clssica no adequada para o estudo de sistemas contraditrios porm no super-completos.

    Baseado nessas idias, Jakowski props o problema da construo de um clculo proposicional com as seguintes propriedades:

    (i) Quando aplicado a sistemas contraditrios no levaria sempre sua supercompletu-

    de; (ii) Deveria ser suficientemente rico para permitir inferncias prticas; (iii) Deveria ter uma justificativa intuitiva.

    Jakowski construiu sua prpria soluo, apenas no nvel proposicional, obtida a partir

    do sistema modal S5, conhecida como lgica discussiva ou discursiva e denotada por D2. A lgica discussiva compreendida como uma formalizao da lgica do discurso e,

    alm de ser paraconsistente, tambm no-adjuntiva. As idias subjacentes construo do sistema D2 so bastante interessantes e conec-

    tam as lgicas discussivas com outras classes de lgicas no-clssicas recentemente estu-dadas, como, por exemplo, as lgicas doxsticas e as lgicas no-monotnicas, estas lti-mas de interesse para a cincia da computao. 3.5.1. Newton Carneiro Affonso da Costa

    Apesar de Jakowski ter construdo um clculo proposicional paraconsistente, pode-

  • Sobre a histria da lgica, a lgica clssica e o surgimento das lgicas no-clssicas

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    mos dizer que o brasileiro N. C. A. da Costa o verdadeiro fundador da lgica paraconsis-tente.

    Nos anos 50, sem conhecer os trabalhos de Jakowski sobre o sistema D2, da Costa comeou a desenvolver suas idias sobre a importncia do estudo das teorias contradit-rias.

    Em 1958 e 1959, da Costa publicou, em portugus, seus primeiros trabalhos Uma nota sobre o conceito de contradio e Observao sobre o conceito de existncia em mate-mtica. Da Costa 1958 prope o seguinte Princpio de Tolerncia em Matemtica:

    do ponto de vista sinttico e semntico, toda teoria aceitvel, desde que no seja trivial. As idias de da Costa estavam completamente desenvolvidas em 1963 (ver da Costa

    1963 e 1963a), quando comeou a publicar uma srie de artigos, contendo suas hierarquias de lgicas de primeira ordem para o estudo de teorias inconsistentes e no-triviais. Da Costa 1963 introduz os sistemas Cn, 1 < n < e comea com as seguintes palavras:

    Falando sem rigor, a idia central deste artigo a seguinte: um sistema formali-zado baseado na lgica clssica (ou lgica intuicionista, ou algumas lgicas po-livalentes...), se inconsistente trivial, no sentido de que todas as suas proposi-es so demonstrveis; ento, deste ponto de vista, ele no tem nenhum inte-resse matemtico. Entretanto, por muitas razes, como por exemplo, a anlise comparativa com sistemas consistentes, e para uma anlise metamatemtica adequada do princpio em considerao, conveniente estudar 'diretamente' os sistemas inconsistentes. Mas para tal estudo necessrio construir novos tipos de lgica elementar apropriados para lidar com tais sistemas. Uma viso geral dos resultados publicados entre 1963 e 1974 est em da Costa 1974. Da Costa construiu inicialmente uma hierarquia de clculos proposicionais Cn, 1 n

    , satisfazendo as seguintes condies:

    (i) O princpio da contradio, na forma (AA), no deveria ser vlido em geral; (ii) De duas premissas contraditrias A e A, no deveramos deduzir qualquer frmula B; (iii) Eles deveriam conter os mais importantes esquemas e regras da lgica clssica com-

    patveis com as duas primeiras condies. A seguir, da Costa estendeu os Cn a uma hierarquia de clculos de predicados de

    primeira ordem Cn*, 1 n ; de clculos de predicados de primeira ordem com igualdade Cn=, 1 n ; de clculos de descries Dn, 1 n ; e de teorias de conjuntos NFn, 1 n , inconsistentes porm aparentemente no-triviais.

    Da Costa, seus discpulos e colaboradores, em especial Arruda (entre 1964 e 1983), tm pesquisado vrios sistemas paraconsistentes, tendo obtido resultados relativos decidi-bilidade dos sistemas, estruturas algbricas a eles correspondentes, teoria de modelos, signi-ficado filosfico e relaes com outros tipos de lgicas no-clssicas.

    Com colaboradores poloneses, discpulos de Jakowski, da Costa axiomatizou e de-senvolveu resultados relativos ao sistema D2 de Jakowski e outras lgicas discussivas.

    Desde 1964 as lgicas de da Costa tm sido largamente estudadas por muitos lgicos de vrios pases, como Austrlia, Bulgria, Itlia, Polnia, Rssia e Estados Unidos, tendo mui-tos autores contribudo para o desenvolvimento dessas lgicas e da lgica paraconsistente em geral.

    O primeiro livro enciclopdico sobre lgica paraconsistente Priest, Routley & Norman 1989.

    Em julho de 2003 realizou-se em Toulouse, Frana, o III World Congress on Paraconsis-tency. O primeiro realizou-se em Ghent, Blgica, em 1997; o segundo, em Juquehy, So Sebastio, So Paulo, organizado pela Sociedade Brasileira de Lgica e pelo Centro de L-

  • Sobre a histria da lgica, a lgica clssica e o surgimento das lgicas no-clssicas

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    gica, Epistemologia e Histria da Cincia da Unicamp, em 2000 (ver Carnielli, Coniglio & DOttaviano 2002). Consideraes finais

    Com a crise dos paradoxos, no incio do sculo XX, a publicao dos Principia e a cri-ao das teorias de conjuntos, a cincia acabada de Kant passou por significativas trans-formaes, que desencadearam em grande desenvolvimento, com a criao de vrias reas de pesquisa, e caracterizaram-na sob certos aspectos como disciplina da matemti-ca.

    O desenvolvimento das lgicas no-clssicas em geral tem aberto vrias reas de pesquisa e propiciado a soluo de importantes questes da matemtica, dos fundamentos da fsica e da cincia da computao.

    Vrias aplicaes das lgicas polivalentes tm sido estudadas e desenvolvidas, tais como teoria de circuitos eltricos, lingstica, programao de computadores e teo-ria das probabilidades, tendo Reichenbach tentado utiliz-las nos fundamentos da mecni-ca quntica.

    Porm, nos dias atuais, o interesse pelas lgicas polivalentes est crescendo rapida-mente, devido principalmente s suas recentes aplicaes inovadoras no tratamento da informao em condies de incerteza e aos problemas que da se originam, inclusive de computabilidade e complexidade. Para o estudo dessas aplicaes, o tratamento algbri-co imprescindvel. Como referncia, indicamos Cignoli, DOttaviano & Mundici 1995 e 2000.

    Um dos avanos recentes da lgica modal que merece ser mencionado a lgica dinmica, ou seja, a lgica que representa processos de computao.

    A lgica dinmica pode ser vista como uma aplicao da lgica modal informti-ca, e oferece um exemplo significativo da incrvel fertilidade da semntica de Kripke. As aplicaes mais penetrantes da semntica modal podem, porm, ser encontradas no cam-po da lingstica. De fato, vrios fragmentos do discurso comum tm sido analisados por meio de instrumentos derivados das lgicas modais: basta mencionar os tempos verbais (vi-de as lgicas do tempo tense logics) e os modos (vide as lgicas dos condicionais sub-juntivos, a lgica imperativa, as lgicas interrogativas). Podemos tambm lembrar que o complicado mecanismo da chamada gramtica de Montague um subproduto da se-mntica modal.

    A lgica paraconsistente est intimamente ligada a outros tipos de lgicas no-clssicas, especialmente lgica dialtica, lgica relevante, lgicas polivalentes e intuicio-nistas, lgica difusa, teoria geral da vaguedade e teoria dos objetos de Meinong, bem como s teses lgicas do ltimo Wittgenstein.

    O estudo das lgicas paraconsistentes, alm de permitir a construo de teorias para-consistentes, torna possvel o estudo direto dos paradoxos lgicos e semnticos, sem tentar evit-los; o estudo de certos princpios em toda sua fora, como o princpio da compreen-so na teoria de conjuntos; e talvez ele nos permita uma melhor compreenso do conceito de negao.

    Entretanto, uma anlise profunda e completa do significado filosfico e conseqn-cias filosficas da lgica paraconsistente parece ainda no ter sido realizado.

    Trabalhos recentes conectam a lgica paraconsistente com o estudo de teorias base-adas em linguagens semanticamente fechadas, com os fundamentos da mecnica qunti-ca e do clculo infinitesimal.

    Entre as aplicaes da lgica paraconsistente esto seu uso em tica, lgica doxsti-ca e teoria das probabilidades.

    Como afirma Carnielli 1992, geralmente aceito que a obra de Frege tenha sido res-ponsvel por separar definitivamente a Lgica da Filosofia, e tambm da Matemtica. A nova cincia, com mtodos exatos como os da Matemtica e interesses to amplos co-mo os da Filosofia, que lhe conferiam um carter abstrato e idealizado, dedicava-se s con-

  • Sobre a histria da lgica, a lgica clssica e o surgimento das lgicas no-clssicas

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    seqncias mais profundas de grandes simplificaes universais. Criava-se para os lgicos a formidvel tarefa de reorganizar os fundamentos da Matemtica.

    Com o surgimento das lgicas no-clssicas, houve o interesse e a possibilidade da formalizao de universos de discurso mais complexos que o domnio matemtico.

    O amadurecimento da teoria da computabilidade colocou ainda em evidncia dois fatos fundamentais: nem todos os procedimentos matemticos so computveis, e nem todos os que podem ser em princpio computveis podem ser computados na realidade. Na verdade, dentre a grande quantidade de problemas reais de interesse tecnolgico, poucos podem ser tratados computacionalmente de maneira factvel, dentro das limitaes huma-nas e mecnicas.

    Surgiu, ento, uma questo de grande relevncia: estudar rigorosamente a intelign-cia humana e os processos cognitivos, e formalizar a criatividade e o processo humano de deciso.

    No difcil perceber, portanto, alm de novos e imprevistos usos da lgica clssica, a conexo entre as lgicas no-clssicas e a inteligncia artificial, que tem como um de seus interesses os processos de raciocnio que podem ser formulados e controlados no universo matemtico computvel e, naturalmente, deve basear-se na lgica.

    Estamos vivendo uma nova revoluo da lgica, com o surgimento de novos para-digmas ligados ao advento dos computadores e de novas reas da cincia.

    As lgicas paraconsistentes, entendidas como teorias formais que suportam teorias in-consistentes, porm, no triviais, constituem uma soluo natural para o tratamento da questo da tolerncia a falhas: um sistema inteligente tem que trabalhar sob impreciso de linguagem, de especificaes de todo tipo, e inclusive imprecises de consistncia. Outras solues tm sido propostas, baseadas sempre em algum tipo de adaptao das regras lgicas, como o caso, por exemplo, das lgicas no-monotnicas.

    Outra classe importante de lgicas no-clssicas, sob o ponto de vista de tolerncia a falhas, a classe das lgicas difusas, ou fuzzy logics, hoje utilizadas com grande sucesso na tecnologia de ponta, principalmente na indstria japonesa.

    A teoria das lgicas difusas iniciou-se em Zadeh 1965, com a introduo da primeira teoria de conjuntos difusos. O grande interesse nas lgicas difusas, tanto terico quanto pr-tico, tem gerado extensa literatura, porm podemos dizer que uma teoria das lgicas difusas ainda est pouco estruturada e estudada do ponto de vista matemtico.

    Hoje, vrios sistemas ditos multilgicos, envolvendo nuances da racionalidade humana como crena, conhecimento,