Revista maçonica - 1

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    Volume 1, Número 1, jan/jun. 2013. ISSN 2318-0129

    MAÇONARIA E LAICISMO R EPUBLICANO NA IMPRENSA CATÓLICA CEARENSE 1910-1920

    Marcos José Diniz Silva

    OS EFEITOS PSICOLÓGICOS DA PRÁTICA DO R ITUAL MAÇÔNICO 

    Rafhael Guimarães

    PORQUE A MAÇONARIA ESTÁ PERDIDA: UMA ANÁLISE COMPARATIVA DA INFLUÊNCIA DOS DIFERENTES LEMAS SOBRE AS ATIVIDADES MAÇÔNICAS 

    Kennyo Ismail

    A MULHER , A MAÇONARIA E OS DIREITOS FUNDAMENTAIS 

    Hugo Garcez Duarte

    MAÇONARIA E EDUCAÇÃO NA CIDADE DE SOROCABA NA 2A. METADE DO SÉCULO XIX: UMA ANÁLISE A PARTIR  DAS R ELAÇÕES DE PODER  

    Ivanilson Bezerra da Silva

    O SIMBOLISMO NA MAÇONARIA (REVIEW )

    Nihad Faissal BassisParceiros:

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    Missão:Democratizar a produção acadêmico-

    científica sobre Maçonaria e seu acesso.

    Dados Catalográficos:ISSN 2318-0129

    Janeiro a Junho de 2013Volume 01.Número 01.

    Periodicidade:Semestral

    Conselho Editorial:Gabriel Castelo Branco

    Kennyo IsmailMax Stabile Mendes

    Nihad Faissal Bassis

    Contatos:

    Editor-Chefe: Kennyo [email protected]  

    Suporte Técnico: Nihad [email protected]

    Portal - www.cienciaemaconaria.com.br

    Parceiros:Loja Maçônica ―Flor de Lótus Nº38‖ 

    PKP – Public Knowledge Project  

    Aviso:Os artigos publicados são de inteira responsabilidade de seus autores e não exprimem, necessaria-mente, o ponto de vista da Revista Ciência & Maçonaria. Não é necessário solicitar prévia autoriza-ção para reproduzir parte do conteúdo publicado nesta revista, desde que sejam citados o autor e afonte.

    Imagem da Capa:―Amor Fraternal, Auxílio e Verdade‖, as três virtudesmaçônicas que compõem o lema maçônico original, queé tema abordado em um dos artigos publicados nestenúmero. Ilustração em carvão feita por Lee WoodwardZeigler. Tamanho Original: 17,2 cm x 14 cm. Reproduzidoa partir de uma chapa inserida após a página 2000, daobra ―A História da Maçonaria, as suas lendas e tradições,sua história cronológica‖, de Albert Gallatin Mackey.Publicado pela: The Masonic History Company , Nova York

    e Londres: 1906. Vol. 7.

    “A primeira revista acadêmico-científica brasileira com foco no estudo da Maçonaria” 

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    Sumário“A primeira revista acadêmico-científica brasileira com foco no estudo da Maçonaria” 

    Palavra do Editor 5-6

    Maçonaria e Laicismo Republicano na Imprensa Católica Cearense 1910-1920

    MARCOS JOSÉ DINIZ SILVA 

    7-19

    Os Efeitos Psicológicos da Prática do Ritual Maçônico

    RAFHAEL GUIMARÃES 

    21-28

    Porque a Maçonaria está Perdida: Uma Análise Comparativa da Influência dosDiferentes Lemas sobre as Atividades Maçônicas

    KENNYO ISMAIL 

    29-50

    A Mulher, a Maçonaria e os Direitos Fundamentais

    HUGO GARCEZ DUARTE 

    51-64

    Maçonaria e Educação na Cidade de Sorocaba na 2a. Metade do Século XIX: Uma

    Análise a partir das Relações de Poder

    IVANILSON BEZERRA DA SILVA 

    65-79

    O Simbolismo na Maçonaria (resenha) 

    NIHAD FAISSAL BASSIS 

    81-85

    Sobre a Revista “Ciência & Maçonaria”   87-88

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    Prezados leitores,

    A Maçonaria sempre se mostrou assuntointeressantíssimo, em especial pelo potencial detemas a serem explorados. Afinal de contas, sehá uma organização rodeada de mistérios, essaorganização é a Maçonaria, a começar por suaorigem. Ao longo dos séculos, as mais diferentesteorias têm surgido e sido contestadas, o quetem destacado a origem da Maçonaria como umdos assuntos mais discutíveis e debatidos napesquisa histórica.

    A atuação protagonista de maçons nasmais diferentes frentes pode ser verificada, porexemplo, na obra ―10.000 Maçons Famosos‖, quefornece uma pequena bibliografia de mais dedez mil líderes de todo o mundo que eram ousão declaradamente maçons. A 1ª edição foi pre-faciada por Harry S. Truman, ex-presidente dos

    EUA, na função de Past-Grão-Mestre da GrandeLoja do Missouri.

    Romeu e Valdés, em um artigo publicadoem 2011, destacam algumas personalidades his-tóricas que pertenceram à Maçonaria, entre elesGeorge Washington, Benito Juárez, Simón Bolívare José Martí, no século XIX, e Salvador Allende,Lazaro Cardenas e Winston Churchill, no séculoXX. Já Morel e Souza, em livro publicado em2008, acrescentam que não apenas líderes políti-cos passaram pelas fileiras maçônicas, apontan-do gênios como Mozart, Voltaire, Goethe e LouisPasteur. Já Hodapp, em seu ―Freemasons forDummies ‖, também contribui com o tema, indi-cando vários maçons que se destacaram em dife-rentes setores, como o ator John Wayne, o mági-co Harry Houdini. Entre empresários do entrete-nimento: Louis B. Mayer, fundador da MGM; JackL. Warner, fundador da Warner Brothers; Carl

    Laemmle, fundador da Universal Studios; e DarrylF. Zanuck, fundador da 20th Century Fox. Entreempreendedores: Henry Ford, fundador da FordMotor Company; Walter P. Chrysler, fundador daChrysler Corporation; Andre Citroen, fundador daCitroen; Charles Hilton, fundador dos Hotéis Hil-ton; David Sarnoff, fundador da NBC. Entre escri-tores: Alexander Pope, Oscar Wilde, Sir Arthur

    Conan Doyle e Mark Twain.Ao florescer no Brasil, em apenas 25 anosa Maçonaria alcançou seu intuito inicial, de lide-rar a independência do país, tendo promovido oDia do Fico, a convocação da constituinte, e ainiciação na Maçonaria de Dom Pedro I, que che-gou a ser eleito Grão Mestre. Mas a atuação daslideranças maçônicas no território nacional nãoparou na Independência, alcançando também aproclamação da República e toda a chamada Re-pública Velha, como observou Gomes, em seu

    livro ―1822‖ (2010), ao relatar que a República foiproclamada por um maçom, o marechal Deodoroda Fonseca, o qual tratou de criar uma equipecomposta apenas de ministros maçons, e que,dos 12 presidentes da chamada Primeira Repú-blica, oito eram maçons.

    Mas para compreender a razão dessa ins-tituição estar, durante séculos, atraindo os maisdistintos homens, até mesmo chefes de estado ede governo, deve-se, primeiramente, compreen-

    der o que ela realmente é. No entanto, até mes-mo isso mostra-se uma missão desafiadora, poisnão há uma definição que seja oficial da institui-ção ou mesmo que descreva satisfatoriamente oque realmente é a Maçonaria. Jay Kinney abor-dou bem isso em sua obra ―O Mito Maçôni-co‖ (2010) ao registrar que ―um sem-número dequestões legítimas se colocam quando alguémtenta compreender o que é a Maçonaria‖. 

    C&M | Brasília, Vol. 1, n.1, p. 5-6, jan/jun, 2013.

    Palavra do Editor

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    Enfim, essa ―pitada‖ de Maçonaria já servecomo indício de como sua origem, definição,participação ativa na história de vários países,incluindo o Brasil, os grandes personagens quepertenceram à Ordem, sua influência na políticae na sociedade, as questões religiosas relaciona-

    das a ela, sua filosofia e literatura, são alguns dostópicos ainda pouco explorados e extremamenterelevantes, não somente para os maçons, masprincipalmente para a comunidade acadêmica ea sociedade em geral.

    No entanto, esse vasto campo de pesqui-sa, apesar de já ter caído nas graças dos estudio-sos de outras terras, ainda não foi explorado noBrasil, não havendo sequer uma única revista es-pecializada em publicar estudos realizados com

    rigor metodológico sobre temas relacionados àMaçonaria.

    Com o intuito de atender essa demandareprimida e disponibilizar a produção acadêmico-científica de Maçonaria de forma gratuita, foicriada a revista ―Ciência & Maçonaria‖, a primeirarevista brasileira do gênero. Seu formato é exclu-sivamente eletrônico e com publicações semes-trais. Sua finalidade é publicar produção multi-disciplinar relacionada à Maçonaria de especialis-tas, professores e alunos de diversas universida-

    des.A Revista ―Ciência & Maçonaria‖ destina-

    se à publicação de textos inéditos na modalidadede artigos, ensaios e resenhas. Trata-se de umespaço aberto para professores, pesquisadores eestudantes que desejam publicar suas análises,reflexões e resultados de pesquisas realizadas. Arevista também está aberta ao público maçônicoem geral para suas contribuições. Considera-seainda, como principal requisito para publicação

    na Revista ―Ciência & Maçonaria‖, que a produ-ção apresente conteúdo analítico-interpretativo,de maneira coerente com rigor científico na áreade estudo das ciências humanas e sociais.

    Neste número inaugural, contamos comartigo de Marcos José Diniz Silva, apresentandoos ataques que a Igreja Católica realizou no Cea-rá contra a Maçonaria, nos primeiros anos do sé-

    culo passado, por essa defender os ideais de umEstado e ensino laicos.

    Já Rafhael Guimarães realiza exame dasimbologia e ritualística maçônica a partir da psi-cologia junguiana, avaliando os efeitos psicológi-

    cos da prática maçônica.Uma análise comparativa da influênciados lemas maçônicos original e latino sobre osprogramas filantrópicos e de pesquisa promovi-dos pelas Obediências Maçônicas é realizada pormeio de dois estudos distintos, conduzidos edescritos por Kennyo Ismail em seu artigo.

    Apresentamos também as diferentes argu-mentações jurídicas acerca do veto do ingressode mulheres na Maçonaria à luz dos direitos fun-damentais, análise feita por Hugo Garcez Duarte.

    Ainda, Ivanilson Bezerra da Silva nos pre-senteia com uma interessante discussão sobre aatuação social da Maçonaria em prol da educa-ção, durante a segunda metade do século XIX nacidade de Sorocaba-SP.

    E por fim, o livro ―O Simbolismo na Maço-naria‖, de Colin Dyer, é destrinchado e analisadopor Nihad Faissal Bassis.

    Como se pode observar, são artigos que

    enveredam por diferentes ciências, como Admi-nistração, Direito, História, Psicologia e Sociolo-gia, abordando questões econômicas, históricas,políticas, psicológicas, religiosas e sociais, e que,de certa forma, estão entrelaçadas entre si peloslaços da fraternidade maçônica.

    Esperamos que cada leitor encontre naspáginas dessa revista a mesma alegria com queos autores as escreveram e que nós, orgulhosa-mente, sentimos em publicá-las.

    Sincera e Fraternalmente,

    Kennyo Ismail

    C&M - PALAVRA DO EDITOR

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    MAÇONARIA E LAICISMO REPUBLICANO NA IMPRENSA CATÓLICA CEARENSE

    ENTRE OS ANOS DE 1910 E 1920

    Marcos José Diniz Silva¹ 

    Resumo

    Este trabalho enfoca as relações entre maçonaria, república e laicismo estabelecidas pela imprensacatólica do Ceará nas primeiras décadas do século XX, expressando o conflituoso no campo dasideias e com repercussões no terreno religioso. Destaca-se o caráter de denúncia católica à presen-ça de maçons nos regimes republicanos, também em países como Portugal, França e México, comoconspiradores, promotores do anticlericalismo e de governos irreligiosos ou ateus. Na contraface,manifestam-se os maçons e correntes espiritualistas, através da imprensa leiga, na defesa dos pre-ceitos laicos e da liberdade de pensamento e religião.

    Palavras-chaves: Maçonaria, República, Laicismo, Imprensa

    Recebido em: 10/05/2013Aprovado em: 12/06/2013

    Abstract

    This work focuses on the relationship between Freemasonry, republic and secularism estab-

    lished by the Catholic Press of Ceará in the first decades of the twentieth century, expressingconflicting ideas in the field and with repercussions on religious grounds. Noteworthy is theCatholic character of the complaint to the presence of Freemasons in republican regimes, alsoin countries such as Portugal, France and Mexico, as conspirators, prosecutors anticlericalismand governments or irreligious atheists. In counterface manifest themselves Freemasons andspiritual currents through the lay press in defense of secular principles and freedom of thoughtand religion.

    Keywords Freemasonry, Republic, Secularism, Press 

    ¹ Marcos José Diniz Silva é graduado e especialista em História, além de Mestre e Doutor em Sociologia. Professor daUniversidade Estadual do Ceará, lotado no Curso de História da Faculdade de Educação, Ciências e Letras do SertãoCentral – FECLESC/UECE. É autor do livro No compasso do progresso: a maçonaria e os trabalhadores cearenses. Forta-leza: NUDOC/UFC, 2007 (Coleção Mundos do Trabalho). Tem artigos publicados sobre Maçonaria, Espiritismo e IgrejaCatólica no Ceará.

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    Introdução

    As relações entre Maçonaria e Igreja cató-lica no Brasil tiveram seu ponto de estrangula-mento histórico na conhecida Questão Religiosa,

    no início da década de 1870 (VIEIRA, 1980; BA-RATA, 1995; 1999). Embora, as restrições e con-denações católicas à Maçonaria remontem aoinício do século XVIII, o estabelecimento e con-solidação do Estado nacional brasileiro, entre osanos de 1820 e 1850, sob o domínio hegemônicodos liberais nas suas várias vertentes, sobretudopela presença dominante da Maçonaria comosociabilidade política fundamental (BARATA,2006; MOREL, 2001/2; 2005), conferiram um mo-delo imperial assentado no padroado com seve-

    ras restrições às ordens religiosas e à expansão eatualização - diga-se romanização tridentina - doclero secular.

    Desse modo, as relações entre padres eMaçonaria no Império davam-se, majoritariamen-te, em caráter ostensivo e amigável, haja vista aconsiderável presença de sacerdotes católicos navida política imperial e em movimentos revoluci-onários liberais no Brasil da primeira metade doséculo XIX. Contudo, o advento do movimento

    de romanização a partir da década de 1860, so-bretudo com a Syllabus , do papa Pio IX (1864),estabelecem-se as contradições fundamentaisentre os interesses católicos e a filosofia e práti-cas maçônicas.

    Com a implantação da República no Brasilem 1889, a secularização do Estado e a implanta-ção dos preceitos laicos da Constituição de 1891,com acentuada coloração positivista, abre-se umnovo flanco aos embates entre católicos e ma-çons.

    No âmbito católico incrementa-se a roma-nização com a expansão dos seminários, dioce-ses e construção das alianças do clero romaniza-do com as elites oligárquicas autonomistas da jovem república federativa brasileira. A separaçãoIgreja-Estado, embora considerada afrontosa pa-ra o clero no primeiro momento, cedo se apre-

    sentou à hierarquia católica como medida deabolição frente ao padroado e aos grilhões libe-rais impostos pela elite imperial marcadamenteiluminista e maçônica.

    Portanto, frente ao seu processo doutriná-rio e político de construção institucional no Bra-sil, pelas vias político-oligárquica, patrimonial,educacional junto às classes alta e média e à suapermanência hegemônica como instrumento delegitimação-sacralização da ordem social(BOURDIEU, 2004; MICELI, 1988; AZZI, 1994), aIgreja católica encetara, também, sistemáticacampanha pública pela supressão dos preceitoslaicos vigentes, alinhando entre seus inimigos ospositivistas, espíritas, protestantes e, especial-

    mente, a Maçonaria, considerada a mãe dos des-mandos morais e religiosos do modernismo e daexpansão dos regimes republicanos e seu laicis-mo.

    Nesse intuito, desenvolve-se também umaimprensa periódica católica que, por um lado,desempenhará papel relevante como instrumen-to de difusão de um novo etos católico cada vezmais intimista, doutrinário e disciplinador dastradições do catolicismo popular e, por outro la-do, se colocara como trincheira do combate àsdemais religiões, ao laicismo da Constituição e àMaçonaria. E é esse segundo aspecto, que serátratado nesse trabalho, através da atuação de pe-riódicos católicos cearenses de Fortaleza(Cruzeiro do Norte e O Nordeste ) e de mais trêsmunicípios do interior do estado, Baturité(Santelmo ), Sobral (Correio da Semana ) e Aracati(O Rosário ), entre as décadas de 1910 e 1920.Na contraface vê-se, também, a ostensiva pre-sença da Maçonaria - em grande parte com per-tença espírita e teosofista -, expandindo suas Lo- jas na capital e interior do estado, com forte in-serção na imprensa leiga, na política e nos grê-mios literários, defendendo os preceitos laicosrepublicanos, a perspectiva intelectual iluministae doutrinas de reforma moral-espiritual comosolução para a ―questão social‖. (Cf. SILVA, 2010).

    SILVA, M. J. D. MAÇONARIA E LAICISMO REPUBLICANO NA IMPRENSA CATÓLICA CEARENSE...

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    Tabela 1. Relação de Lojas do GOB no Ceará até 1927.

    Aqui se quer considerar também o caráterdas fontes documentais utilizadas. Ou seja, em setratando do presente trabalho, sustentado empublicações da imprensa periódica, salienta-se aconcordância quanto aos desenvolvimentos his-toriográficos recentes que tratam a imprensa nãomais apenas como uma linguagem, mas tambémenquanto fonte para o estudo histórico. Assim,passando da história da imprensa, da história pormeio da imprensa, chegou-se à imprensa comoobjeto histórico (DE LUCA, 2008).

    Nesses termos, configura-se a imprensaperiódica cearense do referido período como umfonte histórica fundamental, aqui tomada tantocomo corpus documental, quanto como locus  privilegiado de ação desses agentes (objeto),pois reveladoras do campo das ideias, das lutassimbólicas e das condições econômicas e sociaisvigentes, em concordância com a afirmação de

    Cruz e Peixoto (2007, p. 260): 

    A Imprensa é linguagem constitutiva dosocial, detém uma historicidade e peculia-ridades próprias, e requer ser trabalhada ecompreendida como tal, desvendando, acada momento, as relações imprensa/ sociedade, e os movimentos de constitui-ção e instituição do social que esta relaçãopropõe.

    Depreendem-se empiricamente essas con-dições estruturais e estruturantes do papel da

    imprensa, quando se observa no interior do esta-do sua proliferação exatamente nos municípioseconomicamente mais relevantes e os elementossociais destacados e seus pertencimentos ideoló-gicos que as criavam e mantinham com razoávellongevidade. Disso deduzindo-se que essa im-prensa católica, na capital e no interior cearensecumpria um papel não apenas militante, mas in-formativo das condições materiais de vida, dos

    SILVA, M. J. D. MAÇONARIA E LAICISMO REPUBLICANO NA IMPRENSA CATÓLICA CEARENSE...

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    Lojas Maçônicas do Ceará sob Jurisdição do GOB até 1927

    Loja Fundação Desativação Cidade

    Fraternidade Cearense 1859 1916 Fortaleza

    Igualdade 1882 - Fortaleza

    Caridade III 1882 1896 Fortaleza

    Liberdade IV 1901 - Fortaleza

    Lealdade II 1901 1910 Maranguape

    Amor e Caridade III 1905 1906 Fortaleza

    Porangaba 1905 - Fortaleza

    Deus e Baturité 1905 1911 Baturité

    Deus, Pátria e Liberdade 1905 1910 Senador Pompeu

    Liberdade II 1906 - Maranguape

    Ordem e Justiça 1918 1926 Quixadá

    Caridade e Justiça* 1916 - Quixadá

    Deus e Camocim 1921 - Camocim

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    níveis de circulação das ideias e das relações depoder estabelecidas.

    Ouro aspecto relevante a considerar co-mo chave analítica desse trabalho, é que essa im-prensa declaradamente voltada à propaganda

    dos princípios e valores do catolicismo, cumprin-do seu objetivo de defesa do monopólio da dis-pensa dos bens de salvação (BOURDIEU, 2004),num mercado religioso recém-aberto pela secu-larização republicana, constrói sua crítica à ma-çonaria e ao laicismo republicano pautando-seduas características: em primeiro lugar, notician-do fatos ligados à maçonaria ocorridos em ou-tras regiões do país, mas especialmente em ou-tros países; em segundo lugar, tratando essesacontecimentos num esquema discursivo infor-

    me-denúncia-ataque. Assim, falando do outro  distante, isentava-se o clero das reações locaisdesses seus adversários, enquanto desenvolviaseu combate demarcando espaços e pretensõesmonopolistas.

    “Um bom jornal vale mais que um bom pre-gador” 

    Orientados doutrinariamente de modo areconhecerem no Estado laico um modelo de or-

    ganização política capaz de favorecer suas pers-pectivas racionalistas, iluministas, evolucionistas,cientificistas, enfim modernistas, da autotransfor-mação dos indivíduos e sua irradiação benéficaao todo social, maçons, espíritas, positivistas, te-osofistas e outras correntes compuseram verda-deiras redes de ideias (MALLIMACI, 2004) no en-frentamento ao tradicionalismo católico, reorça-do pela maré ultramontana. Desses grupos, des-tacam-se os maçons por sua maior tradição, soli-dez institucional, eficientes redes de comunica-

    ção e, especialmente, por congregar livres pensa-dores e a pluralidade religiosa, não deixando em

    diversas situações de agregar libertários em di-versos países, inclusive no Brasil (FERRER BENI-MELI, 2001; SILVA, 2012a).

    Demonstrar as diversas situações em queos adeptos do tradicionalismo católico se colo-cam em ataque ao laicismo e à República no Bra-

    sil, como também em países como França, Portu-gal e México, assim como as reações dos ma-çons, permitirá aquilatar o nível de complexidadedos embates locais em torno da problemáticarelação entre religião e política nos primeirosanos do século XX, a partir da experiência do Ce-ará.

    Foram muitas as ocasiões em que, tantoos periódicos católicos quanto a imprensa leigaem geral difundiam, por um lado, notícias sobre

    a impropriedade e malignidade da legislação re-publicana e as resistências dos religiosos e suasinstituições e, por outro lado, notas otimistas so-bre os avanços da República, seus progressos e aimperiosa necessidade da manutenção dos pres-supostos da laicidade. Nota-se que essas argu-mentações públicas extrapolavam a mera polê-mica religiosa para configurarem um espaço pú-blico de disputas de âmbito mais amplo e de re-percussões sociais e políticas mais profundas queas aparências poderiam revelar.

    Esse debate, como já mencionado, extra-polava os limites da capital cearense, de tal mo-do que em algumas cidades de maior destaque,mais ou menos distantes de Fortaleza, se produ-ziam e reproduziam discursos engajados sobre ovalor da república, da monarquia e as relaçõesdo Estado com a religião. Destacam-se os jornaisSantelmo , de Baturité²; O Rosário , periódico ca-tólico de Aracati³, e o Correio da Semana , perió-dico católico de Sobral´.

    Em Baturité, no final de 1910, o mensárioSantelmo   faz inicialmente uma ponderada análi-

    SILVA, M. J. D. MAÇONARIA E LAICISMO REPUBLICANO NA IMPRENSA CATÓLICA CEARENSE...

    ² Município serrano do Sertão Central cearense, distante 100 Km de Fortaleza. Origina-se do aldeamento jesuítico deMissão de Nossa Senhora da Palma, em 1755. Contava com uma loja maçônica, a ―Deus e Baturité‖, entre 1905 e 1911.

    ³ Município litorâneo, distante 150 Km de Fortaleza. Desenvolveu-se no final do século XVIII como polo comercial e pe-cuarista, sobretudo com a indústria do charque. È possível afirmar que a Vila do Aracati tenha sido lugar das primeirasLojas Maçônicas do Ceará, entre as décadas de 1820 e 1830 (Cf. ABREU, 2009).

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    se refugiam frágeis mulheres arrancadas àsilusões do mundo, matar sacerdotes ilus-tres, saquear conventos, aprisionar criatu-ras indefesas, e cantar a Marselhesa [...]não é proclamar repúblicas e sim ironica-mente anarquizar o país, convulsionar apátria, feri-la no mais íntimo do coração.⁹ 

    Segundo a articulista, a autoridade políticae a tradição religiosa estariam abaladas na terrade Camões, ao ponto em que indaga ironica-mente: 

    Expulsas as ordens religiosas, confiscadosos bens das congregações, dispersas asfreiras e sem asilo na face da terra, os pa-triotas à frente do governo improvisado,irá Portugal gozar a liberdade   sonhada, aigualdade  e a fraternidade  das verdadeiras

    repúblicas? 10(Grifo nosso).

    Quase finalizando o artigo, lamenta:―Pobre Portugal! Arrancaram-te o teu Deus, o teuRei, tua liberdade, tua paz, republicanizaram-teàs pressas, e ainda por cima cantam a Marselhesa[...]”. Ora, os desdobramentos laicizantes da im-plantação da república portuguesa em 1910, dra-máticos para o clero católico e seus fiéis, podemser vistos nesta síntese do historiador português

    Fernando Catroga:

    De facto, o Governo Provisório da Repúbli-ca promulgou, imediatamente após o 5 deoutubro, um conjunto de decretos-leisque, tendo como ponto de referência jurí-dica o que as repúblicas do Brasil e deFrança haviam decidido sobre essa maté-ria, visavam dar cumprimento às reivindi-cações laicistas da fase de propaganda. Odecreto de 20 de Abril de 1911 –  lei daseparação das Igrejas do Estado –  dispu-

    nha que a religião católica, apostólica, ro-mana deixava de ser religião de Estado, eque todas as Igrejas ou confissões religio-sas eram autorizadas, como legítimasagremiações particulares, desde que nãoofendessem a moral púbica, nem os prin-

    cípios do direito público português. Aomesmo tempo, confirmava a tradição dobeneplácito ao interditar a publicação debulas, pastorais e outras determinações daCúria, dos prelados ou outras autoridadeseclesiásticas, e remetia o culto para a esfe-ra da privacidade; [...] Consequentemente,

    esta lei pode ser considerada como vérticede um conjunto de outras promulgadascom o mesmo fito laicizador e donde sedeve destacar as seguintes: a que confir-mou a legislação congregacionista anteri-or, [...] voltou a expulsar as ordens religio-sas (18 de Fevereiro de 1911); a que reco-nheceu o divórcio (25 de Dezembro de1910); a que introduziu o registo civil obri-gatório (18 de Fevereiro de 1911); a queimpôs a aconfessionalidade do ensino (29de Março de 1911); a que extinguiu a Fa-culdade de Teologia (14 de Novembro de

    1910): e a que aboliu os juramentos religi-osos (19 de Outubro de 1910) (CATROGA,2000, p. 206-207).

    Então, naquele mesmo número, o jornalcatólico noticia o desembarque frustrado de reli-giosos portugueses no Brasil, por proibição dogoverno. A acusação recai sobre ―o anticlericalis-mo do sr. Nilo Peçanha‖, presidente da Repúblicae Grão Mestre da Maçonaria: ―O ato iníquo, arbi-trário e ilegal do governo passado proibindo o

    desembarque em nossa pátria de padres e religi-osos expulsos do infeliz Portugal [...].‖  O jornalcita, ainda, diversas manifestações de desagravo,mensagens do episcopado, telegramas dos reli-giosos e documentos das ―senhoras da CapitalFederal‖, onde figurava a ―consorte do eminenteestadista Ruy Barbosa‖.11  Dentre os telegramasenviados merece destaque o do vigário cearenseTabosa Braga: 

    TELEG. Do revd. Sr. P. Antonio Tabosa Bra-ga Sobrinho, zeloso Vigário de Pendência(Pacoty) desta Diocese. Baturité 

    Eu e os paroquianos todos, protestamosenergicamente contra o ato do governo

    SILVA, M. J. D. MAÇONARIA E LAICISMO REPUBLICANO NA IMPRENSA CATÓLICA CEARENSE...

    ⁹ Liberdade? O Rosário. Aracati-CE, 5 nov. 1910. 

    10 Idem.11 O desembarque de religiosos estrangeiros no Brasil. O Rosário. Aracati-CE, 5 nov. 1910.

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    Nilo proibindo o desembarque dos religio-sos estupidamente expulsos pelo maçonis- mo português.  Protestamos também con-tra a adesão nojenta da bancada cearense .Viva a religião católica! Viva a liberdadevilmente conspurcada pela força bruta! 12

    (Grifo nosso).

    Vê-se na expressão ―maçonismo portu-guês‖, do vigário Tabosa, o sinal inequívoco deque, para o clero, República e Maçonaria era amesma coisa e, portanto, inimigos de Deus e daIgreja. Não menos significativa é a indignação dopároco com o apoio da ―nojenta bancada cea-rense‖, no parlamento nacional, àquela medidaanticlerical. Outro elemento a indicar ainda umahegemonia liberal e laica naquele contexto polí-

    tico brasileiro, ou seja, numa república que insis-tia na separação entre Igreja e Estado, emboracom a aproximação crescente entre governantese o alto clero.

    “A Maçonaria é um tumor: é preciso vazá-lo”13

    Em Fortaleza, entre 1906 e 1914, publicava-se o Cruzeiro do Norte , “órgão católico hebdo-madário‖, de propriedade de Rufino Mattos. Operiódico também se coloca como denunciante

    ―da propaganda maçônica anticlerical‖ como, porexemplo, através da reportagem intitulada―Maçonaria repelida na Bélgica‖. Nela o jornalreproduz notícias da Bélgica onde o governoproíbe a presença de maçons no exército ao de-clarar ―com energia de ferro que daí para diantecada oficial do exército terá que escolher entre oseu uniforme e o avental maçônico‖. Apresenta,também, na matéria, as denúncias do governobelga às intervenções daqueles maçons nosacontecimentos - ―solidariedade da maçonaria

    internacional no combate contra igreja‖ -, que

    fizeram rebentar a ―revolução em Portugal‖, diga-se proclamação da república.14

    Em Sobral, o jornal Correio da Semana ,fundado em março de 1918 pelo bispo dom JoséTupinambá, tendo como diretor padre Leopoldo

    Fernandes e como redator padre José de LimaFerreira, também sustenta uma recorrente con-tenda com a ―malsã política‖ e com os ―corrifeusda impiedade‖. Na edição de abril daquele ano,por ocasião do envolvimento do Brasil na Primei-ra Guerra Mundial, o semanário católico desta-cando as relações entre ―patriotismo e religião‖pondera que, após a queda da monarquia dera-se a separação da Igreja do Estado, não comoconsequência lógica, ―pois não há incompatibili-dade entre o regime republicano e a religião ca-

    tólica. Haja vista o belo exemplo da RepúblicaArgentina [...].‖15 

    Nesse caso, do ―belo exemplo da Repúbli-ca Argentina‖, ocorreu que: 

    A Constituição de 1853 obrigou o Estado aapoiar   a religião católica sem professá-la .[...] Embora fosse garantida tolerância atodas as fés, essas, obviamente, não eramtodas iguais. O catolicismo era considera-do a religião tradicional da nação, e suaposição majoritária fora reforçada nessesanos pela massa de imigrantes oriundos

    da Europa católica (LYNCH, 2001, p. 456-457).

    Já no caso do Brasil, esclarece o Correioda Semana : “Essa brutal imposição ao povo bra-sileiro, genuinamente católico, foi a consequên-cia da orientação maçônica positivista a que seentregou o povo completamente bestificado‖ . 16

    A razão para a defesa e exaltação da cita-da compatibilidade, no artigo em questão, estava

    na autorização, pelo Ministério da Marinha, da

    SILVA, M. J. D. MAÇONARIA E LAICISMO REPUBLICANO NA IMPRENSA CATÓLICA CEARENSE...

    12 O Rosário. Aracati-CE, 5 nov. 1910.13 O Nordeste. Fortaleza-CE, 12 ago. 1925 (Epígrafe).14 A Maçonaria repelida na Bélgica. Cruzeiro do Norte. Fortaleza-CE, 17 maio 1913.15 Patriotismo e religião. Correio da Semana. 24 abr. 1918. A consolidação e desenvolvimento do modelo de ―monopóliocatólico‖, na Argentina, se dariam entre as décadas de 1930 e 1980. A revisão constitucional de 1994 eliminou a cláusulasegundo a qual o presidente da república deveria ser católico. (Cf. ORO, URETA, 2007, p. 288).16 Patriotismo e religião. Correio da Semana. Sobral-CE, 24 abr. 1918 (Grifo do autor).

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    introdução de capelão e ofício católico nos quar-téis e junto à força naval enviada ao teatro daguerra, que ―partirão levando a bordo de seusnavios a cruz que aplaca o ódio e restitui a paz; abordo irá o ministro de Deus, mensageiro da ver-dade, da luz puríssima do Evangelho [...].‖17 

    Em 1922 aparece o jornal O Nordeste ,porta-voz da arquidiocese de Fortaleza, congre-gando clérigos e leigos num empreendimentointelectual que terá vida longa e papel funda-mental na difusão do pensamento católico emseu projeto de rearmamento ideológico, especi-almente no combate sistemático ao estatuto lai-co da República, à maçonaria e às demais religi-ões. No centro de suas críticas está o laicismopositivista do regime republicano, ao menos até

    os primeiros anos da década de 1930.Esse periódico católico também dará re-

    forço à prática de noticiar embates do catolicis-mo com a maçonaria no exterior. Na matéria ―Omomento político-religioso na França‖, analisa o―governo Herriot‖18, dominado pela “maçonariaradical‖ e sua política laicista, e tomando―medidas vexatórias para com os católicos‖,substituindo-os no serviço público ―por inaptosque sejam maçons‖; finalizando a notícia com omovimento de resistência dos católicos france-

    ses.19 

    Na França, a lei de separação entre Igrejase Estado foi promulgada em 11 de dezembro de1905, incorporando entre outras as perspectivaslaicas a da Maçonaria, como demonstra Danièle Hervieu-Leger:

    No novo regime religioso que se instauraem 1905, a religião é considerada um as-sunto privado: a liberdade religiosa faz

    parte das liberdades públicas. O Estadogarante a cada cidadão a liberdade deprofessar uma religião, se ele tiver uma, esão previstas penas severas para os quetentassem fazer obstáculo ao exercícionormal da vida cultual. Mas a religião é um

    assunto estritamente pessoal e opcional. ARepública, quanto a ela, ‗não reconhece,nem assalaria, nem subvenciona qualquerculto‘ (art. 2 da lei de 1905). [...] Dois ele-mentos jogaram neste sentido. O primeiroé que a própria lei constitui um texto decompromisso entre várias concepções de

    laicidade. O sistema instaurado pela lei de1905 une, com um objectivo pacificador,as diferentes tradições do campo laico: oespírito da Luzes de Voltaire, Diderot ouCondorcet; o positivismo cientista de Au-guste Comte; as diferentes correntes dafranco-maçonaria. Ele responde igualmen-te às expectativas das minorias protestan-tes e judaica, profundamente desconfiadasdas pretensões da religião dominante. [...]O segundo elemento é que no decurso doséculo XIX o povo católico se ligou pro-gressivamente, na sua imensa maioria, ao

    regime republicano (HERVIEU-LEGER,2005, p. 209-211). 

    Em outras ocasiões, O Nordeste   traz ma-térias sobre o laicismo no Brasil, de modo a arti-cular o republicanismo ao ataque à religião, olaicismo ao ateísmo. Assim o disse Soares d‘Aze-vedo, médico psiquiatra cearense, residente noRio de Janeiro, em ―matéria especial‖: 

    O Brasil - nem podia deixar de ser [...] - foium dos países que mais se apressaram,com a implantação da República, a aceitara odiosa ditadura de uma Constituinte em-briagada pela a vitória, que atirou paracima do lombo as mais descabidas exigên-cias e para cima da consciência as maisodiosas afrontas. E assim é que tivemos olaicismo nas escolas. Ora, os cardeais earcebispos de França acabam de expor arespeito, e mais uma vez, a iniludível dou-trina da Igreja [...] As leis laicas são injustasporque contrariam os direitos de Deus.

    Procedem do ateísmo e conduzem ao ate-ísmo. Impõem o menosprezo de Cristo edo seu Evangelho. Tendem a substituir overdadeiro Deus por ídolos (liberdade, so-lidariedade, humanidade, ciência).20

    SILVA, M. J. D. MAÇONARIA E LAICISMO REPUBLICANO NA IMPRENSA CATÓLICA CEARENSE...

    17 Patriotismo e religião. Correio da Semana. Sobral-CE, 24 abr. 1918. 

    18 Édouard Herriot (1872-1957), primeiro-ministro francês do governo do presidente Gaston Doumergue.19 O momento político-religioso na França. O Nordeste. Fortaleza-CE, 18 fev. 1925.

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    Estas palavras permitem perceber que,mais de trinta anos passados da implantação daRepública, ainda persistia uma questão geradorade grandes divergências: a barreira do laicismo

    nas relações Estado/religião. Contudo, mais queà lei republicana positivista, deve-se notar comofator de manutenção desses preceitos jurídicos, aatuação da classe política nacional herdeira tam-bém do anticlericalismo e do liberalismo dos pri-meiros tempos da República. Veja-se, então, quenão fora algo meramente circunstancial ou forçade expressão, a afirmativa supracitada, do vigárioTabosa Braga, sobre a  ―adesão nojenta‖ classepolítica cearense à proibição da entrada de reli-giosos estrangeiros.

    Essa resistência dos adeptos do Estadolaico, com apoio de ampla rede de pensamentoque agregava maçons, espíritas, positivistas, teo-sofistas, libertários e protestantes, pode ser per-cebida na atuação do jornal O Ceará , de proprie-dade do professor, jornalista e também maçomJúlio de Matos Ibiapina.

    Fazendo uma análise do percurso do lai-cismo no Estado republicano, o editorialista pon-tifica a questão polêmica, referida anteriormente:

    ―A orientação positivista que presidiu à elabora-ção de nosso pacto fundamental  criou para o pa-ís uma série de problemas que interessam muitode perto o futuro da nacionalidade‖.21  Em se-guida, o autor esclarece qual é esse problema:

    Inspirados em Augusto Comte, cujo espíri-to liberal levou-o a julgar possível umaaliança de seu ateísmo com a intolerânciados representantes do Papa, os fundado-res da república brasileira limitaram-se a

    incorporar à constituição o princípio daliberdade de cultos, sem, contudo, tomarmedidas práticas que colocassem a Igrejacatólica no mesmo pé de igualdade comas demais  que, com esse país de imigraçãocomo o nosso, se viessem a instituir. 22

    Portanto, para o jornalista faltaram―medidas práticas‖ que evitassem ―uma situaçãoprivilegiada dos católicos‖ na nova arena das re-ligiões que se instalaria com a imigração. Tais

    ―medidas práticas‖ foram tentadas no alvorecerconstitucional, pelo republicanismo liberal e pe-los positivistas ―científicos‖, através da expropria-ção dos bens da Igreja, como as leis de mão-morta. Sua derrota contou com decisiva interven-ção dos positivistas do Apostolado junto ao go-verno e à Constituinte.

    Observe-se que, mesmo tendo o rastilhode cientificismo adentrado certos grupos de pro-fissionais liberais, militares e políticos que, demodo superficial, se tornaram propagadores des-sa ideia; essas pessoas diferiam dos verdadeiroscultores e conhecedores da filosofia positivista.Assim, embora a separação entre Igreja e Estadofosse um princípio de honra do positivismo, apreservação da plena liberdade religiosa para to-dos os credos, sempre foi defendida pelo Apos-tolado Positivista, tendo à frente Teixeira Mendese Miguel Lemos, sempre ressaltarem os vínculosmorais passados e futuros entre catolicismo(como sinônimo de cristianismo) e positivismo,

    para a regeneração da humanidade, como defen-dera o mestre (Cf. COSTA, 1956). A despeito dis-so, a hierarquia católica manteve o combate sis-temático à doutrina positivista.

    Meses depois, noutro editorial, voltaria OCeará   denunciando atitudes do clero católicoque considerava desrespeitosas à Constituiçãobrasileira, argumentando uma situação tão extre-mista quanto aquela apontada pelo católico Soa-res d‘Azevedo em O Nordeste  páginas atrás. ParaO Ceará : “Entre nós, a ingenuidade dos fundado-

    res da República entregou a direção moral e in-telectual da sociedade brasileira aos clérigos que,nacionais ou estrangeiros, são, de fato, os men-tores dos governos e do povo‖.23

    SILVA, M. J. D. MAÇONARIA E LAICISMO REPUBLICANO NA IMPRENSA CATÓLICA CEARENSE...

    20 Notas Cariocas: Perante o Laicismo. O Nordeste. Fortaleza-Ce, 7 ago. 1926.21 O laicismo do governo da República. O Ceará. Fortaleza-Ce, 11 abr. 1928 (Grifo nosso).22 Idem.

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    Contudo, prossegue o editorial em suadelenda clericalista, apontando algumas situa-ções em que as relações entre religião e políticase mostram crescentemente tempestuosas. O jornal cobra do Estado brasileiro rigor fiscal so-bre os bens e terras da Igreja Católica, denuncia

    as queixas pretensiosas do clero dirigidas ao―presidente Washington Luiz [que] inspirado noespírito de laicidade imposta pela Constituiçãonão manda feriar os dias de festas religiosas‖,dentre outras coisas. E, finalizando, adverte o jor-nal do professor Ibiapina:

    Que os padres explorem a crendice popu-lar, canalizando para as suas bolsas o di-nheiro do povo, já é um grande mal, mastolerável. Que tenham audácia de propa-

    gar o desrespeito à Constituição e o des-prestígio das autoridades é forte demais.24

     

    Uma quinzena após a publicação desseeditorial, o diário católico, também com a oficia-lidade do editorial, respondia com outra leiturada prática da laicidade. Segundo O Nordeste , RuiBarbosa, ―em página memorável‖, teria feitooportuna distinção entre as ―duas hermenêuti-cas‖ constantes do princípio de laicidade: a―francesa‖ e a ―americana‖. ―A primeira serve-seda lei para hostilizar a Religião, para oprimir osentimento de fé que palpita n‘alma do povo [...].A segunda, praticada com sincero respeito àsconvicções religiosas dos cidadãos [...].‖25  Estasegunda perspectiva, para O Nordeste , teria sidoa ―que inspirou os autores de nossa carta políti-ca‖. O mais seria obra de políticos sem escrúpu-los, ―como sucede nos países onde as sociedadessecretas  empolgam o poder”.26

    Mais uma vez, a ala católica identifica o

    laicismo e o anticlericalismo dos republicanos àhegemonia das ―sociedades secretas‖ (leia-se:

    Maçonaria). Assim, a vertente francesa do laicis-mo seria patrocinada pelo ―maçonismo‖, comoalternativa política de eliminação da religião oude ―descristianização‖. 

    A resistência ao “complô maçônico” em proldo laicismo republicano

    Nesse mesmo diapasão o periódico católi-co intercala suas críticas ao laicismo da Repúblicabrasileira com o noticiário estrangeiro, com des-taque para os casos de opressão à ―consciênciacatólica‖. Assim, denunciam ―os desumanos per-seguidores dos católicos mexicanos‖, reproduzin-do artigo do cônego Xavier Pedrosa, do Diário daManhã   (Recife), dividido em cinco edições d’ONordeste .

    Para aquele religioso, a gênese da criseentre Estado e Igreja Católica no México, residiana ―Constituição dos Estados Unidos Mexicanos‖,de 1917: ―Em todos os seus artigos se vê o pro-pósito satânico de ferir a religião. E foi por issoque a consciência católica se levantou, ferida vis-ceralmente nos seus mais sagrados direitos‖.27 

    O articulista informa, ainda, os artigos daConstituição mexicana que proíbem o ensino re-ligioso no país, quer nas escolas públicas, quer

    particulares, a expropriação dos bens da Igreja, ocontrole governamental sobre a imprensa católi-ca, dentre outras medidas, agravadas pelo códi-go penal de 1926, aprovado pelo presidente―bolchevista Elias Calles‖.

    Merece atenção, na matéria, a detalhadadenúncia das perseguições e arbitrariedades co-metidas pelos representantes do ―satânico‖ go-verno mexicano contra os sacerdotes e pratican-tes do catolicismo, como também das resistên-

    cias de grupos da sociedade civil, religiosos edos movimentos de massa organizados por es-tes. Era oportuno informar aos católicos brasilei-

    SILVA, M. J. D. MAÇONARIA E LAICISMO REPUBLICANO NA IMPRENSA CATÓLICA CEARENSE...

    23 O desprezo do clericalismo pela Constituição. O Ceará. Fortaleza-Ce, 26 jun.1928.24 O desprezo do clericalismo pela Constituição. O Ceará. Fortaleza-Ce, 26 jun.1928.25 Espírito de laicidade. O Nordeste. Fortaleza-CE, 10 jul.1928.26 Idem.27 Perseguição religiosa no México. O Nordeste. Fortaleza-Ce, 11 maio 1928.

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    ros, naquele contexto de questionamento do lai-cismo, os exemplos vindos do México com seusataques ―contra a fé, contra o culto, contra a Reli-gião da quase totalidade do seu país‖.28 

    Na década de 1920, a república mexicana

    seria abalada por forte onda de reação clerical,denominada guerra dos ―Cristeros‖, às medidaslaicas radicais do presidente Elias Calles, com ba-se na Constituição de 1917. Assim,

    Nas relações entre a Igreja e o Estado, Cal-les tomou uma posição anticlerical extre-mada. O povo reagiu com violência, e foientão que rebentou a guerra dos Cristeros,conhecida como a Cristiada. Foi uma terrí-vel guerra do povo comum que se levan-tou contra o Estado e seu exército. Conti-

    nha todos os elementos de uma guerrarevolucionária e de um conflito anticoloni-al, embora se tenha afirmado na épocaque o governo era o representante da‗esquerda‘ e os insurretos, a‗contrarevolução‘ (...). O nome Cristeros foidado pelo governo, depois que ouviram ogrito de guerra dos insurretos: ‗Viva cristoRei! Viva a Virgem de Guadalupe!‘ De umtotal de vinte mil homens em julho de1927, seu contingente cresceu para 35 milem março de 1928, distribuídos por trezeEstados. A grande ofensiva que o governo

    lançou contra eles, em 1928/1929, foi umfracasso. Em junho de 1929, o movimentoestava no auge, com 25 mil soldados trei-nados e 25 guerreiros irregulares. Foi nes-se momento que o Estado decidiu assumirum compromisso com a Igreja a fim deresgatar a situação que rapidamente sedeteriorava [...] (MEYER JR., 2002, p. 206-207). 

    Ainda naquele mês O Nordeste   lança oeditorial ―A obra da República‖. Ainda no climados noticiários da crise mexicana, logo nas pri-meiras linhas afirmam:

    No Brasil, a obra da República não tem

    sido outra que desatar todos os liamesque prendem o homem ao seu Criador. (...)A República, portanto, desde que se põe aserviço do Laicismo, é um sistema de de-sorganização infalível de todos os departa-mentos de governo, é um elemento dedissolução do caráter de um povo.29

    O combate ao laicismo constitucional nãoarrefece, embora naquele contexto já sejam sig-nificativos os avanços organizacionais da Igrejacatólica e de sua presença nos serviços religiososda República, especialmente junto aos governosoligárquicos estaduais. Porém, a legislação laicaainda incomodava e permanecia, em seu enten-dimento, diretamente identificada com a maço-naria.

    Assim, argumentam nesse editorial que oscatólicos devem se manter ―em guarda contra osgovernos populares‖, que a Maçonaria procuraestabelecer. E concluem: ―Quando nos responde-rem que a isso é levada a seita internacionalista  pelo desejo de servir à Liberdade, mostremos osresultados práticos evidentes da influência daslojas   nas administrações por eles democratiza-das‖.30

    Outra perspectiva desses mesmos aconte-

    cimentos, como resposta ao diário católico apa-rece no matutino O Povo , do maçom DemócritoRocha, que estampa a voz do governo mexicanoconcitando os rebeldes ao acolhimento da anis-tia ―extraordinariamente generosa‖. Dizendomais, ―o presidente‖, que:

    [...] o seu governo está devidamente cienteda manobra que os políticos clericais con-tinuam desenvolvendo clandestinamente[...]. Adianta que estão sendo dinamitadostrens, assaltadas fazendas e povoaçõesindefesas ao grito de ―Viva o Cristo Rei‖ eque, na maioria dos casos, os elementosaprisionados pelas autoridades militares ecivis, resultam simples instrumentos dachamada ―liga de defesa religiosa‖. 31 

    SILVA, M. J. D. MAÇONARIA E LAICISMO REPUBLICANO NA IMPRENSA CATÓLICA CEARENSE...

    28 Perseguição religiosa no México. O Nordeste. Fortaleza-Ce, 11 maio 1928.29 A obra da República. O Nordeste. Fortaleza-Ce, 24 maio 1928.30 Idem. (Grifo nosso)

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    Esse tipo de vinculação do Estado laicocom a irreligião, com a descristianização e, inva-riavelmente tendo a Maçonaria como mentoraintelectual, alimentava as teses clericais dos com-plôs destinados a abalar os altares e os tronos.Responder a essas investidas dos grupos religio-sos tradicionais tornou-se uma necessidade táti-ca e uma obrigação moral dos maçons e seus ali-ados, que não admitiam o epíteto de ateus, bol-chevistas, materialistas e anticristãos.

    Nessa linha, não faltaram manifestaçõesde esclarecimento e afirmação de novos princí-pios. Da prolífera coluna de crônicas do jornalistamaçom-espírita Teodoro Cabral (Políbio), redatordo jornal Gazeta de Notícias  é possível encontrar

    diversas dessas polêmicas em que se julgam asrelações entre religião e Estado. Numa ocasião,Políbio se refere à matéria veiculada na Gazeta ,por seu colega Américo Palha que ―exulta‖ pelacolocação da imagem do Cristo no salão do Tri-bunal do Júri do Rio de Janeiro. Reconhece omaçom que, com a decisão:

    O princípio constitucional da liberdade decultos não fica desrespeitado. Jesus, consi-derado Deus ou profeta, é a máxima figura

    moral da humanidade. A sua influênciareformadora, regeneradora não se circuns-creve ao âmbito de qualquer das religiõescristãs ou ao cristianismo que a todas elasincorpora.32

    Contudo, reconhecendo a possibilidadede aposição de qualquer outra imagem de gran-des legisladores da humanidade, Políbio desen-volve seu raciocínio a partir de outra base deprincípio. Ou seja, o de que ―o poder educativo e

    regenerador de Jesus nunca se fez sentir pormeio de imagens‖. Demonstra que Jesus não uti-lizou imagens materiais, como o fizera tambémMoisés, convidando seus seguidores a o adora-

    rem ―em espírito e verdade‖. O cronista lembraque Jesus repeliu essas imagens que, ―se podemter a vantagem de servir de ponto aos espíritos jovens, facilitando-lhe a concentração, para quese elevem até a espiritualidade, constituem po-derosos veículos de idolatria e superstição‖. 

    Políbio desenvolve sua crítica às práticastradicionais do catolicismo, com seus usos deimagens, crucifixos, rosários, escapulários, benti-nhos, etc., identificando entre seus usuários umamaioria de ―fanáticos‖, ―hipócritas‖ e ―tartufos‖,que ―sufocam uma reduzida elite de ingênuossinceros‖. O autor convoca o leitor aos exemplosde ―Judas de Kerioth‖ para quem não foi sufici-ente nem a presença, em pessoa, do próprio Je-sus; e dos ―heróis do cristianismo‖ que se deixam

    matar pelo ideal supremo, ―quem os sustenta?Serão as imagens?‖.

    Portanto, tomando como mote a preser-vação dos fundamentos do Estado laico, o cro-nista acrescenta pedagogicamente: ―Não só oBrasil, como os demais países, como toda a hu-manidade, necessita abeirar-se, cada vez mais, datrilha da espiritualidade‖.33 Por fim, lança seu ve-redito sobre a polêmica, configurando uma posi-ção não apenas pessoal:

    Mas o que importa, para a edificação mo-ral, para o crescimento espiritual, não é acolocação da imagem do Cristo, nem nassalas dos júris, nem nos recessos dos lares,nem sobre o peito de cada homem; o queimporta - só o que importa - é a entroni-zação do Cristo em nossos corações [...].34

    Assim, ao tempo que afirma sua condiçãoespiritualista, como antídoto às acusações deateísmo dos adversários católicos, o autor ponti-

    fica a compreensão sua e de seus pares do queseria uma ―espiritualidade‖ renovada (Cf. SILVA,2011; 2012b).

    SILVA, M. J. D. MAÇONARIA E LAICISMO REPUBLICANO NA IMPRENSA CATÓLICA CEARENSE...

    31 Uma proclamação do governo do México. O Povo. Fortaleza-Ce, 18 fev. 1929.32 Ecos e Fatos. Gazeta de Notícias. Fortaleza-Ce, 23 fev. 1929.33 Idem.34 Idem.

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    Confrontavam-se esses grupos, então, nosfinais da década de 1920, despontando vivamen-te a presença católica que, além do uso intensivoda imprensa, aproximava-se da elite política re-publicana e mantinha instituições de―enquadramento ideológico‖, como a revista A

    Ordem  e o Centro D. Vital, que mediavam as re-lações entre a Igreja e o campo intelectual(MICELI, 1979) nas tomadas de posição sobrequestões temporais, numa ação mobilizatóriasem precedentes na história do catolicismo bra-sileiro.

    Já na vertente maçônica, adensava-se oconflito político interno no Grande Oriente doBrasil, que levaria à grande cisão de 1927(LINHARES, 1997), ao mesmo tempo em que a

    tradição liberal-democrática achava-se crescen-temente questionada e atacada pelo avanço dofascismo e seus regimes ditatoriais e corporati-vistas na Europa e, em breve, no Brasil com aderrocada do regime liberal-oligárquico e ascen-são de Getúlio Vargas a partir de 1930.

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    OS EFEITOS PSICOLÓGICOS DA PRÁTICA DO RITUAL MAÇÔNICO

    Rafhael Guimarães ¹ 

    Resumo

    O presente artigo visa realizar análise comparativa da psicologia junguiana com a simbologia maçô-nica, mais especificamente com os símbolos contidos em uma Loja Maçônica do Rito Escocês Anti-go e Aceito e em suas práticas ritualísticas, além de observar os efeitos psicológicos da prática daritualística do referido rito maçônico sobre seus adeptos.

    Palavras-chaves: psicologia junguiana; simbologia; maçonaria.

    Recebido em: 02/06/2013Aprovado em: 21/06/2013

    Abstract

    This paper aims to conduct a comparative analysis of Jungian psychology with Masonic symbol-

    ism, more specifically with the symbols contained in a Lodge of the Ancient and Accepted Scot-tish Rite and its ritual practices, in addition to observing the psychological effects of the practiceof ritualistic on the practitioners of that masonic rite.

    Keywords Jungian psychology, symbology, Freemasonry.

    ¹ Rafhael Guimarães é Mestre Maçom, membro da GLMEES; e Maçom do Real Arco, filiado ao SGCMRAB. Além de per-tencer a outras Ordens Iniciáticas, ministra cursos e palestras sobre Cabala, Astrologia e Tarô.

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    Introdução

    A definição mais comum de Maçonaria é ade que Maçonaria é ―um belo sistema de morali-dade velado em alegoria e ilustrado por símbo-los‖ (ZELDIS, 2011). Isso já diz muito sobre a ins-

    tituição e seu modo de ensino e aprendizagem,que ocorre por meio de rituais repletos de alego-rias e expressões simbólicas. No entanto, entre odesdobramento do ritual e o comportamentomoral de seus praticantes há um mecanismo psi-cológico que não pode ser ignorado e cuja com-preensão pode colaborar um melhor entendi-mento da razão da Maçonaria atrair ao longo dosséculos o interesse de tantos distintos homens ea ira de tão perigosos inimigos, como os nazis-tas, papas e o Comintern –  Comitê Comunista

    Internacional (ROBERTS, 1969).Este estudo tem por objetivo analisar as

    influências psicológicas que a prática ritualísticamaçônica, suas falas, movimentos, símbolos, dra-mas e alegorias, pode ter sobre seus praticantes.

    Muitos talvez possam julgar os rituais ma-çônicos como ingênuos, ultrapassados, estranhosou até mesmo supersticiosos. Serão apresenta-dos neste estudo indícios de que tanto os rituaiscomo a mitologia possuem as mesmas fontes de

    origem —  o inconsciente (CAMPBELL, 2007;JUNG, 2005).

    Há, sem dúvida, inúmeras diferenças entreas religiões e mitologias da humanidade, e todasessas, de uma forma ou de outra, podem ser en-contradas em alguma medida, representadas nasalegorias maçônicas (MAXENCE, 2010).

    Foi em 1900 que Sigmund Freud apresen-tou ao mundo sua teoria do Inconsciente, naobra ―A interpretação dos sonhos‖   (FREUD,

    1972). O conceito de Inconsciente já existia dealguma forma desde a Grécia Antiga, contudo foisomente com Carl Gustav Jung que tal teoria en-controu sua plenitude, alcançando um sentidomais amplo, quando o mesmo diferenciou a atu-

    ação do inconsciente de uma camada mais pro-funda, que chamou de Inconsciente Coletivo, quesão formas ou imagens de natureza coletiva quese manifestam praticamente em todo o mundocomo constituintes dos mitos e, ao mesmo tem-po, como produtos individuais de origem incons-ciente, que influenciam toda nossa psique (JUNG,2011c).

    Ao contrário da escola freudiana, que afir-ma que os mitos estão profundamente enraiza-dos dentro de um complexo do inconsciente, pa-ra Jung, a origem atemporal dos mitos residedentro de uma estrutura formal do inconscientecoletivo. Torna-se assim uma diferença conside-rável para Freud, que nunca reconheceu a auto-nomia congênita da mente e do inconsciente,

    enquanto que, para Jung havia uma dimensãocoletiva inata e com autonomia energética.

    As ideias apresentadas por Jung foram oembasamento científico que o estudioso das Re-ligiões e Mitologias Comparadas, Joseph Camp-bell, adotou para sustentar as similaridades exis-tentes entre todas as religiões e mitologias dahistória. Tal conceito chamado anteriormente de― Monomito‖   ²  por Jaymes Joyce, foi esmiuçadopor Campbell, que mostrou todo o roteiro damanifestação arquetípica do herói, que se encon-trava representado em todo o mundo como umarquétipo do Inconsciente Coletivo (JUNG, 2010;JUNG, 2011a).

    Assim, será com base nas obras de Camp-bell e Jung o desenvolvimento deste artigo, quevisa comparar e reapresentar o simbolismo ma-çônico sob a ótica científica da Psicologia Jun-guiana e da Ciência das Religiões.

    Análise Comparativa da Psicologia Junguianacom o Simbolismo Maçônico

    O que é um Símbolo? ³ 

    Os símbolos são, em síntese, metáforas ecompêndios de um conhecimento sensivelmente

    GUIMARÃES, Rafhael. OS EFEITOS PSICOLÓGICOS DA PRÁTICA DO RITUAL MAÇÔNICO

    ² O termo “Monomito” é de autoria de James Joyce, da obra “Finnegans Wake”.

    ³ O conceito adotado nesta obra de símbolo é o da Psicologia Junguiana, que difere do conceito semióco de símbolo instuído

    por Ferdinand de Saussure, pai da linguísca, bem como também difere parcialmente de certas análises Psicanalícas de Freud.

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    elevado (CAMPBELL, 2007), mas que em outraspalavras, são manifestações exteriores dos ar-quétipos. Os arquétipos só podem se expressaratravés dos símbolos em razão de se encontra-rem profundamente escondidos no inconscientecoletivo, sem que o indivíduo os conheça oupossa vir a conhecer (JUNG, 2011b). Dessa forma,em nosso nível comum de consciência, paracompreendermos um elevado sentimento conti-do no Inconsciente Coletivo, necessitamos dossímbolos, gestos existentes desde o início da hu-manidade (CAMPBELL, 2008; JUNG, 2011a).

    Essas afirmações precedentes necessitamde um exemplo hipotético: O amor da mãe paracom seu filho jamais seria compreendido por pa-lavras ou descrições objetivas, como números ou

    letras. Em vez disso, podemos, ao invés de escre-ver sobre tal amor, apenas apresentar o conheci-do símbolo do coração. Deste modo, mesmo queparcialmente, a noção que teremos a respeito doamor de uma mãe para com seu filho, será muitomais próxima do que as expressadas por meraspalavras (JUNG, 2011d).

    As mitologias e sentimentos são comu-mente manifestados por meio de símbolos egestos. Do mesmo modo, a Maçonaria atua atra-vés da ritualística das suas iniciações e instru-ções. Os símbolos e gestos atuam como um ca-talizador de sentimentos de seus praticantesatravés do mito trabalhado pelo grupo-cultura(CAMPBELL, 2008). O avanço moral que a Maço-naria proporciona a seus adeptos é, além deconsciente, educativo e ético, também um refor-ço psicológico.

    A diferença crucial entre símbolo e arqué-tipo é que o primeiro pode ser visto e em algunscasos também tocado e sentido, ao passo que o

    segundo pode ser apenas sentido, e mesmo as-sim, somente por intermédio do primeiro. Por-tanto, para que haja símbolos, deve antes haverarquétipos, pois aqueles são a manifestação des-tes em menor escala (JUNG, 2011d; JUNG, 2012). 

    Contrariamente a esta teoria junguiana agoraapresentada, observamos na psicanálise de Freud

    outra visão dos arquétipos, que se encontra cen-trada nos três arquétipos relativos ao chamado―Complexo de Édipo‖, que, por suas característi-cas peculiares, possui proximidades com a antro-pologia e com a linguística, ao passo que a visãoapresentada neste artigo, Junguiana, possui pro-ximidades com os conceitos do Inconsciente Co-letivo sustentados pelo sociólogo francês ÉmileDurkheim, um dos pais da Sociologia Moderna,onde em sua obra o define como o conjunto decrenças e sentimentos autônomos de uma socie-dade (DURKHEIM, 2004). Suas teorias tambéminfluenciaram Freud, mas com devido efeito,acham-se proficuamente delineadas nas obras deJung. 

    O Templo Maçônico do Rito Escocês e a Psi-que Humana

    Os maçons são unanimes em dizer que oTemplo Maçônico´ é simbólico, e como já vimos,o símbolo é muito mais do que mera ornamenta-ção artística para representar algo (JUNG, 2012).Importante registrar que o templo maçônico nãoé uma réplica do Templo de Salomão, se nãoapenas simbolicamente inspirado no Templo deSalomão, mas contendo muitas outras influên-

    cias, de acordo com o Rito adotado (ISMAIL,2012). No caso do presente estudo, refere-se aum templo do Rito Escocês Antigo e Aceito.

    Portanto, toda a ornamentação e divisãodo templo não é fruto do acaso, a começar pelaSala dos Passos Perdidos, mais adiante o Átrio, aCâmara ou Caverna de Reflexões, e finalmente oTemplo em si. Todos estes compartimentos sãoestágios há muito tempo utilizados para separaro sagrado do profano (VAN GUENNEP, 2011).

    Nesse contexto, o ritual tem por objetivo arealização da passagem de um estado de consci-ência para outro, estados esses chamados maço-nicamente de profano e sagrado, e em últimaanálise, o templo com suas divisões simboliza oestado de consciência em que nos encontramos.Desta forma, o templo em si representa um esta-

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    ´ O termo “templo maçônico” é comumente usado nos ritos maçônicos de origem lana. Os de origem anglo -saxônica costumam

    chamar o local de reuniões de “Sala da Loja”.

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    do intransponível de pureza e santidade paraseus membros. As funções-cargos expressas noritual e as disposições do templo são personifica-ções simbólicas das leis psicológicas que atuamna psique (CAMPBELL, 2007; MAXENCE, 2010),conforme será demonstrado neste estudo. 

    Rituais ou simples gestos simbólicos iden-tificam nossa consciência com o campo essencialde ação. O soldado que retorna da guerra, aopassar pelo Arco do Triunfo, um rito de passa-gem, acaba deixando a guerra para trás. Da mes-ma forma, ao passarmos pela sala dos passosperdidos e posteriormente pelo átrio, sabemosque estamos em um local consagrado para aprática do bem, o Templo Maçônico. Assim, assalas que antecedem o templo, cumprem a fun-

    ção psicológica de devidamente introduzir oadepto em um local que, por meio de seus sím-bolos, colabora para o ingresso a um estado daconsciência necessário para que o ritual cumpraseu dever cognitivo de forma efetiva (JUNG,1978; VAN GUENNEP, 2011).

    De acordo com a psicologia analítica deCarl G. Jung, a psique divide-se em três níveis: Aconsciência, o inconsciente pessoal e o inconsci-ente coletivo (HALL & NORDBY, 2010). Conformese segue abaixo, tais divisões se conciliam emsignificados e funções com os cômodos de umaLoja Maçônica do Rito Escocês Antigo e Aceito,ou seja, sala dos passos perdidos, átrio e templo,sendo que na parte interior, teremos o ocidentee o oriente.

    Nível 1 – Consciência: Sala dos Passos Perdidos  

    A consciência é a única parte da psique aqual conhecemos direta e objetivamente (HALL& NORDBY, 2010), e nela tudo ocorre geralmen-te de forma racional e lógica. Da mesma forma,isso também ocorre antes de adentrarmos aotemplo, pois é na sala dos passos perdidos quetudo ainda ocorre de forma desprovida de ques-tões oníricas, sem sinais ou gestos simbólicos.

    O significado psicológico de persona, paraJung, é aquela parte da personalidade desenvol-

    vida e usada em nossas interações mundanas, ouprofanas, no vocabulário maçônico. É nossa faceexterna consciente, nossa máscara social, comoveículo não de nossa real vontade, mas da nossanecessária aceitação (JUNG, 1978; HALL & NOR-DBY, 2010). Assim que, nas iniciações maçônicas,o gesto dos candidatos serem despidos de todosos metais, e iniciarem todos exatamente da mes-ma forma, significa que, naquele momento, o in-divíduo despe-se de suas personas. Esse des-prendimento se faz necessário visto que, confor-me Jung, no nível do inconsciente pessoal – quecitaremos logo adiante – não há persona, a qualse manifesta apenas no nível consciente.

    O crescimento psicológico ocorre, deacordo com Jung, quando alguém tenta trazer o

    conteúdo-conhecimento do inconsciente, para onível consciente, e estabelecer uma relação entrea vida consciente e o nível arquetípico da exis-tência humana (JUNG, 1978; JUNG, 2011b). O ho-mem que assim o fizer, haverá de reconhecer asorigens de seus problemas no próprio inconsci-ente, pois a pessoa que não torna consciente su-as limitações e defeitos, acaba por projetar sobreos outros tais  percepções negativas (HALL &NORDBY, 2010).  Fazendo o devido paralelo, ocrescimento na senda maçônica somente ocorre

    quando se aplica no chamado mundo profano oque se estuda e aprende no mundo maçônico,que é neste quadro comparativo o referido in-consciente pessoal, e assim tem-se a oportunida-de de transformar o conhecimento em sabedoria.

    Nível 2 - Pré-consciência: Átrio  

    Para Freud, a consciência humana se sub-divide em três níveis, chamados de Consciente,Pré-Consciente e Inconsciente. O estado inter-

    mediário entre a Consciência, abordada no Nível1, e o Inconsciente, que será abordado no Nível3, é o de Pré-consciência, o qual tem por caracte-rística uma experiência munida de relativo equilí-brio entre um material perceptível e um materiallatente (FREUD, 1972).

    Dessa forma, tem-se o átrio do templo

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    maçônico como representativo desse estado depré-consciência, visto o átrio, apesar de muitasvezes interpretado como sendo uma extensão dotemplo, é fisicamente um cômodo intermediárioentre a sala dos passos perdido e o templo ma-çônico. Nele ocorre o momento de transição en-tre os estados psicológicos, em que os maçonsse concentram, geralmente com as luzes apaga-das, para se desvencilharem dos problemas epensamentos do chamado ―mundo profano‖ eadentrarem ao interior do templo. Assim, o átriose assemelha em correspondência com o pré-consciente na medida em que ambos não possu-em uma natureza específica, mas sim transitória.Portanto, este estado intermediário tem por ob- jetivo introduzir o personagem no recinto oníricoe simbólico seguinte.

    Nível 3 –  O Inconsciente Pessoal: O TemploMaçônico

    Todas as experiências que se têm, mesmoaquelas consideradas esquecidas, mas que toda-via não deixaram de existir, são armazenadas noinconsciente pessoal. É nesse nível que ocorremos sonhos quando se está dormindo, e como to-dos sabem, tais eventos sonhados são dotados

    de acontecimentos surreais e ilógicos perante anossa realidade objetiva (JUNG, 2005).

    Assim o Inconsciente Pessoal encontracorrespondência com o templo maçônico, ondea ritualística e os símbolos alcançam a totalidadedos trabalhos, e estes retratam bem o estado fic-tício e mítico do drama maçônico, estado esteque – paralelamente – também é encontrado nossonhos, com seus símbolos abstratos, passagensilógicas e surreais, onde tanto no estado oníricocomo na ritualística, pode-se viajar do Oriente ao

    Ocidente com alguns poucos passos, e do ama-nhecer ao pôr do sol, vai-se em alguns minutos,semelhante ao que ocorre nos sonhos, pois nonível do inconsciente pessoal não há uma limita-ção objetiva. Da mesma forma o simbolismo daritualística não possui um senso lógico. Ambaslinguagens (sonhos e ritualística) são figuradas.

    Assim como o ritual maçônico não é literale tem por objetivo transmitir instruções morais,os sonhos também não o são e, segundo Jung(2011d), o crescimento e amadurecimento moralsão a real e efetiva finalidade dos sonhos. Des-tarte, em ambos os casos perde-se o efeito dológico e racional, para com isso, trabalhar o sim-bólico e onírico. Sendo assim, interpretar o ritualmaçônico de forma literal é um erro lastimável,ao passo que o sonho, inexoravelmente, tambémdeve ser interpretado de forma não literal (JUNG,2012).

    Os conceitos de Anima e Animus foramtalvez as duas mais importantes descobertas deJung. Ambos são aspectos inconscientes de umindivíduo. O inconsciente do homem encontra

    ressonância com o arquétipo feminino, chamadode Anima, enquanto que a mulher associa-secom o arquétipo masculino, chamado de Animus.Cabe notar que quando se fala de masculino efeminino, em se tratando de Animus e Anima,está se referindo às expressões e características,e não algo literal (JUNG, 2011b; JUNG, 2012),pois, como supramencionado, o inconsciente re-side em um nível atemporal, inteiramente psico-lógico, portanto não material.

    A Anima manifesta-se na psique de formaemocional, passiva e intuitiva, por outro lado, oAnimus manifesta-se de forma racional, ativa eobjetiva. Jung costuma relacionar Anima ao deusgrego Eros, o deus do Amor, ao passo que Ani-mus é relacionado com o termo Logos, que sig-nifica verbo, razão (JUNG, 1978). No templo ma-çônico tal equilíbrio dual é conhecido pelas duascolunas, Boaz e Jaquim. No Rito Escocês, osAprendizes Maçons tomam assento do lado dacoluna Boaz, e ali são instruídos sobre a educa-ção moral, espiritualidade e ética maçônica, con-ceitos perfeitamente associados ao arquétipo deAnima. Já do lado da coluna Jaquim tomam as-sentos os Companheiros Maçons, que, ao contrá-rio dos aprendizes, possuem suas instruções vol-tadas para as artes ou ciências liberais, bem co-mo para algum conhecimento esotérico, que sãocaracterísticas de Animus. Ao Oriente vê-se o Sole a Lua, que são símbolos conhecidos do Animus

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    e da Anima. 

    Desta forma, Boaz e Jaquim, representamAnima e Animus, e a consecução entre ambascolunas representa o Casamento Alquímico, atotalidade do ser, ou seja, o Equilíbrio Perfeito, o

    Mestre. Aquele que caminha com tal união, andapelo caminho ou câmara do meio (CAMPBELL,2008), no nosso caso, o Mestre Maçom. 

    Nível 3 –  Inconsciente Coletivo:  Sólio do Ori- ente

    Teoria proposta pela Psicologia Analítica,o inconsciente coletivo difere do inconscientepessoal, visto que não se trata de experiênciasindividuais, mas, como o nome sugere, são expe-

    riências coletivas (JUN, 1978). Trata-se de umaespécie de reservatório de imagens, essas cha-madas de imagens arquetípicas. Tais imagens econcepções são herdadas pelo homem de formainconsciente através do inconsciente pessoal. Oinconsciente coletivo estimula no homem desdeo nascimento um comportamento padrão pré-formado. Assim, recebemos a forma do mundoem uma imagem virtual e essa imagem transfor-ma-se em realidade consciente quando, durantea vida, identificamos os símbolos a ela corres-

    pondentes (JUNG, 2011b).Os conteúdos do inconsciente coletivo

    são denominados de arquétipos. Um arquétipo écompreendido como um modelo original queconforma outras coisas do mesmo tipo, seme-lhante a um protótipo (JUNG, 2011b). Tanto oinconsciente coletivo como o arquétipo se con-fundem com aquilo que chamamos de egrégora.

    Jung acreditava que tanto a experiênciaquanto a prática religiosa eram fenômenos que

    tinham sua fonte no inconsciente coletivo (JUNG,2011c). O céu, o inferno, o Jardim do Éden, oOlimpo, são interpretados pela psicologia jun-guiana e freudiana como símbolos do inconsci-ente (JUNG, 2011c; FREUD, 1972), e se enqua-dram ao simbolismo do dossel e do sólio no Ori-ente, localizado a sete degraus acima do nívelonde se encontram os Aprendizes, Companhei-

    ros e Mestres, onde se encontra o chamado Tro-no de Salomão e que possui estampado o olhoque tudo vê no Rito Escocês Antigo e Aceito.

    Assim como o inconsciente coletivo dis-põe da pré-formação psíquica da psique (JUNG,

    1978), o direcionamento dos trabalhos vem doOriente da Loja, além de que as informações ori-ginais da Loja, presentes na carta constitutiva,também se localizam na região do sólio.

    Os efeitos e sinais da Ritualística Maçônica noInconsciente

    Os rituais praticados e todas as suas repe-tições centram o indivíduo dentro dos propósitosdo mito, pois o ritual é a simples representação

    do mesmo. Ao participar de um ritual, vivencia-se sua mitologia. Assim, tais gestos e movimen-tos transcendem os adeptos (CAMPBELL, 2008),como, por exemplo, na execução mito de HiramAbiff, que ocorre no grau de Mestre Maçom. Tor-nar-se Mestre Maçom é o mesmo que Jung cha-mava de processo de individuação para realiza-ção do Si mesmo (MAXENCE, 2010).

    Quanto à ritualística e seu potencial psico-lógico, Jung (2011b), discorre sobre a psicologiaanalítica e as formas de atuar no inconscientepessoal do indivíduo:

    Outra forma de transformação é alcançadaatravés de um ritual usado para este fim. Em vezde se vivenciar a experiência de transformaçãomediante uma participação, o ritual é intencio-nalmente usado para produzir tal transformação.(...) Se recebe um novo nome e uma nova alma,ou ainda passa-se por uma morte figurada,transformando-se em um ser semidivino, comum novo caráter e um destino metafísico trans-

    formado. (Os Arquétipos e o Inconsciente Coleti-vo, CARL GUSTAV JUNG, 2011, p. 231)

    Desta forma, o indivíduo que vivencia oritual, as iniciações, elevações e exaltações, acabapor se transformar, seja pelas convicções consci-entes ou pela influência do inconsciente (JUNG,1978).

    GUIMARÃES, Rafhael. OS EFEITOS PSICOLÓGICOS DA PRÁTICA DO RITUAL MAÇÔNICO

    C&M | Brasília, Vol. 1, n.1, p. 21-28, jan/jun, 2013.

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    Os maçons devem, portanto, realizar refle-xões da simbologia maçônica. Ao executar umritual de alto valor cultural, com gestos e passa-gens incomuns à sociedade, o qual, sob um olharcético e profano, pode ser considerado como in-fantil e ingênuo, deve o maçom analisar tais mo-vimentos a nível psicológico, onde reside suamaior força e resultado. Ademais, abordar o ritu-al maçônico ou qualquer outro ritual sem um en-tendimento psicológico e simbólico do seu signi-ficado, é como ver animais nas nuvens, ou seja,um exercício de vontade e imaginação sem mai-ores resultados.

    Conhecendo a antropologia das socieda-des primitivas, Jung comparou a vida com a tra- jetória do sol em um dia. A primeira parte, do

    nascimento para a sociedade, é semelhante aoamanhecer do sol. A segunda parte, da participa-ção efetiva no mundo e na sociedade, é seme-lhante ao meio dia. E, enquanto o desafio da pri-meira metade da vida é a própria vida, o desafioda segunda metade é a própria morte, represen-tada pelo anoitecer (CAMPBELL, 2008; JUNG,2005).

    Para o primitivo não bastava ver o Solnascer e declinar. Esta observação exterior cor-respondia a um acontecimento anímico, isto é, oSol representava em sua trajetória o destino deum Deus. Todos os acontecimentos mitologiza-dos da natureza, tais como o verão, inverno,amanhecer, meio dia e por do sol, as fases da lua,as estações, não são alegorias destas experiên-cias objetivas, mas sim, expressões simbólicas dodrama interno e inconsciente da alma, que aconsciência humana consegue apreender atravésda dramatização dos rituais maçônicos (JUNG,2011b).

    Outro detalhe ritualístico curioso relativoao sol é a circulação em sentido horário, tambémchamada de dextrocentrica . Uma prática tão anti-ga quanto a Maçonaria. Os gregos e romanostinham o lado direito como favorável, visto queeste, de forma geral, favorece mais seu dono doque o esquerdo. Relacionaram tal procedimentoao aparente movimento que o Sol faz diariamen-

    te em torno da Terra. Assim, essas civilizações,tendo sempre o aparente movimento do Sol co-mo referência, adotavam a circulação em sentidohorário, tendo altares, fogueiras, totens ou sacri-fícios como eixo de seus templos (ISMAIL, 2012).

    A função psicológica da ritualística maçô-nica é a de restaurar um equilíbrio psicológicopor meio do sistema mitológico proposto pelainstituição, de modo a produzir um material oní-rico no inconsciente de seus membros (JUNG,2005). Desta forma, o conhecimento da Maçona-ria retrata um estudo do inconsciente, tanto doinconsciente pessoal, através dos efeitos diretosda ritualística, como do inconsciente coletivo,através do estudo da Mitologia Maçônica. 

    Nos rituais tribais de iniciação os mem-

    bros recebem uma marca, que nos tempos atuaisfigura como simbólica (VAN GUENNEP, 2011), eque distinguem o iniciado dos não iniciados. Nainiciação no Rito Escocês isso ocorre com umachancela no peito esquerdo. Seja uma marcaçãofísica ou apenas simbólica, tais atos ritualísticosoperam igualmente no inconsciente (JUNG,2005).

    A prática de diferentes termos linguísticostambém é usada para separar o sagrado do pro-

    fano nos grupos religiosos (VAN GUENNEP,2011). Este exemplo é um dos diferenciais da ri-tualística maçônica, onde uma linguagem própriaé comumente adotada. Inúmeros são os exem-plos disso no Rito Escocês, como justo e perfeito,tronco, Huzzé, sólio, pálio, veneralato e muitosoutros. 

    Conclusões

    Em síntese, a mitologia pode ser entendi-

    da, sob a ótica da Psicologia Junguiana, comoum sonho coletivo, sintomático dos impulsos ar-quetípicos existentes no interior das camadasprofundas da psique humana (JUNG, 1978), ou,numa visão religiosa, como a revelação de Deusaos seus filhos. Tanto a mitologia como os seussímbolos são metáforas reveladoras do destinodo homem e nas diversas culturas são retratadas

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    de diferentes formas (CAMPBELL, 2007). Sendoassim, a vivência do drama de um mito nadamais é do que uma ferramenta de compreensãoe promoção do crescimento psicológico do indi-viduo, sendo esta a função principal do mito(CAMPBELL, 2008). Assim, a análise para todaquestão mitológica, como também, este estudoda ritualística maçônica em questão, é, por derra-deiro, o estudo da psique humana.

    Em várias sociedades e cultos primitivos, aprática religiosa consistia em vivenciar a Mitolo-gia de forma direta, pois o mito poderia influen-ciar o executor da prática religiosa de forma indi-reta no decorrer das cerimônias, por intermédiodo inconsciente. Assim o crescimento e a finali-dade da Mitologia acontec