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1 Q uando idealizamos a Revista RET-SUS, nos demos um prazo. Pensamos que tería- mos que exercitar a criatividade para elaborar as pautas de, pelo menos, os cinco ou seis números iniciais. Es- se foi o tempo que julgamos necessá- rio para a Revista ‘engrenar’ e as Es- colas começarem a se enxergar nela e a se mobilizar para mandar material. Surpresa: esta é a terceira edição e não param de chegar e- mails das ETSUS e de seus professores dando notícias, contando as novidades da sua Escola, colo- cando-se à disposição para enviar trabalhos e resultados de pesquisas que podem virar notícia para toda a Rede. Desde a Revista passada, temos sido obrigados a cortar ma- térias, pautar para os próximos números, para fechar a edição com 12 páginas. Temos recebido também vários e-mails de professores das ETSUS parabenizando pela Revista e agradecendo o envio. Mas há ainda uma notícia melhor: têm chegado mensagens de pessoas de diferentes lugares pedindo para serem incluí- das na mala direta da Revista, inclusive um aluno de uma Escola Técnica, público que pensávamos atingir só mais adiante. Ainda assim, se esta Revista é ou pretende ser o reflexo - e, ao mesmo tempo, mobilizadora - do que está acontecendo na Rede, continuamos contando com as su- gestões de todos que a recebem para as próximas pautas. A entrevista des- ta edição, por exemplo, foi indicada pela diretora da ETSUS de Assis, em São Paulo. A reportagem de capa, sobre a precarização do trabalho em saúde, foi uma demanda apontada por alguns grupos no último en- contro das Escolas, em Brasília. A matéria sobre os alunos cuja religião não permite que assistam às aulas foi um meio de colocar o debate na Rede, atendendo a uma solicitação da ETSUS do Mato Grosso do Sul. Por fim, gostaríamos de comentar o evento que criou o comi- tê executivo da Biblioteca Virtual em Educação Profissional em Saúde - BVS-EPS, no Rio de Janeiro. Isso porque o retorno que temos recebido dos professores em relação à Revista e o sucesso do encontro, que reuniu bibliotecários e pessoas que lidam com gestão da informação nas ETSUS, mostraram que a impor- tância do trabalho em rede está, exatamente, na articulação possível com os diferentes profissionais das Escolas e, no âmbito mais geral, com os diversos atores envolvidos na educação profissional em saúde. RET-SUS novembro de 2004 Editorial Renata Reis Renata Reis Renata Reis Renata Reis Renata Reis Secretaria Técnica da Rede de Escolas Técnicas do SUS

retsus revista 1 - bvsms.saude.gov.brbvsms.saude.gov.br/bvs/periodicos/retsus_revista_3.pdf · camos formar um auxiliar de enfermagem, 3 ... com as quais se relaciona, as implicações

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Quando idealizamos a RevistaRET-SUS, nos demos umprazo. Pensamos que tería-

mos que exercitar a criatividade paraelaborar as pautas de, pelo menos,os cinco ou seis números iniciais. Es-se foi o tempo que julgamos necessá-rio para a Revista ‘engrenar’ e as Es-colas começarem a se enxergar nelae a se mobilizar para mandarmaterial.

Surpresa: esta é a terceiraedição e não param de chegar e-mails das ETSUS e de seusprofessores dando notícias, contandoas novidades da sua Escola, colo-cando-se à disposição para enviartrabalhos e resultados de pesquisasque podem virar notícia para toda aRede. Desde a Revista passada,temos sido obrigados a cortar ma-térias, pautar para os próximosnúmeros, para fechar a edição com12 páginas.

Temos recebido tambémvários e-mails de professores das

ETSUS parabenizando pela Revistae agradecendo o envio. Mas há aindauma notícia melhor: têm chegadomensagens de pessoas de diferenteslugares pedindo para serem incluí-das na mala direta da Revista,inclusive um aluno de uma EscolaTécnica, público que pensávamosatingir só mais adiante.

Ainda assim, se esta Revistaé ou pretende ser o reflexo - e, aomesmo tempo, mobilizadora - doque está acontecendo na Rede,continuamos contando com as su-gestões de todos que a recebem paraas próximas pautas. A entrevista des-ta edição, por exemplo, foi indicadapela diretora da ETSUS de Assis, emSão Paulo. A reportagem de capa,sobre a precarização do trabalho emsaúde, foi uma demanda apontadapor alguns grupos no último en-contro das Escolas, em Brasília. Amatéria sobre os alunos cuja religiãonão permite que assistam às aulas

foi um meio de colocar o debate naRede, atendendo a uma solicitaçãoda ETSUS do Mato Grosso do Sul.

Por fim, gostaríamos decomentar o evento que criou o comi-tê executivo da Biblioteca Virtualem Educação Profissional em Saúde- BVS-EPS, no Rio de Janeiro. Issoporque o retorno que temos recebidodos professores em relação à Revistae o sucesso do encontro, que reuniubibliotecários e pessoas que lidamcom gestão da informação nasETSUS, mostraram que a impor-tância do trabalho em rede está,exatamente, na articulação possívelcom os diferentes profissionais dasEscolas e, no âmbito mais geral, comos diversos atores envolvidos naeducação profissional em saúde.

RET-SUS novembro de 2004

Editorial

Renata ReisRenata ReisRenata ReisRenata ReisRenata ReisSecretaria Técnica da Rede de

Escolas Técnicas do SUS

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Entrevista Terezinha Azerêdo Rios

‘Educar é um processo de construir

RET-SUS novembro de 2004

A educação foi entrando na vida de Terezinha Azerêdo Rios aos poucos. Na graduação, ela formou-se filósofa. Em seguida, deu um passo em direção da pedagogia e fez o mestrado em filosofia da educação. Por

fim, fez o doutorado em educação, na área de didática e teorias de ensino.Professora do Departamento de Teologia e Ciências da Religião e assessorada vice-reitoria acadêmica da PUC de São Paulo, seu nome foi sugerido pelaEscola Técnica paulista de Assis para a entrevista da Revista RET-SUS. Aqui,ela fala sobre temas como qualidade no ensino, formação para o trabalhoe competência.

O que significa ‘qualidade’ na edu-O que significa ‘qualidade’ na edu-O que significa ‘qualidade’ na edu-O que significa ‘qualidade’ na edu-O que significa ‘qualidade’ na edu-cação em geral e, mais especifica-cação em geral e, mais especifica-cação em geral e, mais especifica-cação em geral e, mais especifica-mente, na educação profissional,mente, na educação profissional,mente, na educação profissional,mente, na educação profissional,que precisa ‘ensinar uma profissão’?que precisa ‘ensinar uma profissão’?que precisa ‘ensinar uma profissão’?que precisa ‘ensinar uma profissão’?

cação em geral e, mais especifica-mente, na educação profissional,que precisa ‘ensinar uma profissão’?

Penso que é preciso ‘adjetivar ’ aqualidade quando nos referimos a ela,principalmente na educação. Usamos aexpressão ‘de qualidade’ para indicar algode caráter positivo. Assim, dizemos quequeremos uma educação ‘de qualidade’,uma escola ‘de qualidade’ etc. Ora,qualidade é um atributo presente emtodos os seres. ‘Azul’, ‘longo’, ‘honesto’,‘monótono’, ‘feio’ são qualidades decoisas e pessoas. Portanto, tenho dito queé preciso explicitar de que qualidadeestou falando. O que queremos, naverdade, é uma educação de boa qualidade.E temos necessidade de explicitar o quesignifica esse ‘boa’ com que ‘qualificamos’a qualidade. Isso se aplica a todos osâmbitos da educação. No caso daeducação profissional, talvez tenhamosque tomar um cuidado redobrado, namedida em que aí a idéia de qualidade àsvezes vem ligada à ‘qualidade total’, queé a expressão utilizada para designar umatendência que surge nos anos 50 doséculo XX no campo empresarial e quese sustenta em uma concepção quefunciona como base ideológica do sistemacapitalista e, portanto, é marcada pela

defesa do individualismo e dacompetição nas relações sociais. A boaqualidade, que queremos para nossaeducação, se revela no trabalho compe-tente, que tem como eixo fundamental adimensão ética, cujo horizonte é aafirmação do bem comum. A formação deboa qualidade será, então, aquela que criacondições para a construção cotidiana ecoletiva da cidadania e da felicidade.

A senhora diz que uma melhorA senhora diz que uma melhorA senhora diz que uma melhorA senhora diz que uma melhorA senhora diz que uma melhorqualidade para o ensino está na for-qualidade para o ensino está na for-qualidade para o ensino está na for-qualidade para o ensino está na for-mação de pessoas capazes de lermação de pessoas capazes de lermação de pessoas capazes de lermação de pessoas capazes de ler, es-, es-, es-, es-crever e contarcrever e contarcrever e contarcrever e contar, não só livros e, não só livros e, não só livros e, não só livros ehistórias, mas o mundo. No caso dahistórias, mas o mundo. No caso dahistórias, mas o mundo. No caso dahistórias, mas o mundo. No caso daeducação profissional de nível mé-educação profissional de nível mé-educação profissional de nível mé-educação profissional de nível mé-dio, como podemos conciliar essadio, como podemos conciliar essadio, como podemos conciliar essadio, como podemos conciliar essaidéia de qualidade com a formaçãoidéia de qualidade com a formaçãoidéia de qualidade com a formaçãoidéia de qualidade com a formaçãopara o mercado de trabalho?para o mercado de trabalho?para o mercado de trabalho?para o mercado de trabalho?

qualidade para o ensino está na for-mação de pessoas capazes de ler, es-crever e contar, não só livros ehistórias, mas o mundo. No caso daeducação profissional de nível mé-dio, como podemos conciliar essaidéia de qualidade com a formaçãopara o mercado de trabalho?

Educar é um processo de construir ahumanidade. Portanto, em qualquercampo educativo, é importante formarseres humanos inteiros (atenção: ‘inteiro’ nãoquer dizer ‘completo’ – seremos sempreincompletos e talvez seja isso que nosconstitui como seres utópicos, quebuscam sempre mais!). Temos que evitara fragmentação e, portanto, não restringira educação a um pequeno espaço doconhecimento. É claro que é preciso levarem conta a especificidade das áreas da

formação profissional, mas isso não podenos levar a um ‘especialismo’. Nósseremos tanto melhores especialistasquanto tivermos consciência da inserçãode nossa especialidade num contextomais amplo. Por isso, é mais importantefalar em educação para o trabalho do quepara o ‘mercado de trabalho’. Nãopodemos ignorar a existência desse‘mercado’, mas temos que prepararindivíduos críticos que percebam ascaracterísticas do mercado e nãosimplesmente se adaptem a ele, quepossam questioná-lo e transformá-lo, demaneira criativa e competente.

Na educação profissional e, espe-Na educação profissional e, espe-Na educação profissional e, espe-Na educação profissional e, espe-Na educação profissional e, espe-cialmente, na formação de adultos,cialmente, na formação de adultos,cialmente, na formação de adultos,cialmente, na formação de adultos,como se articulam o ‘sabercomo se articulam o ‘sabercomo se articulam o ‘sabercomo se articulam o ‘saber ’ e o’ e o’ e o’ e o‘agir‘agir‘agir‘agir ’? Nessa associação, como as’? Nessa associação, como as’? Nessa associação, como as’? Nessa associação, como asescolas devem selecionar os con-escolas devem selecionar os con-escolas devem selecionar os con-escolas devem selecionar os con-teúdos socialmente importantesteúdos socialmente importantesteúdos socialmente importantesteúdos socialmente importantespara formar cidadãos felizes epara formar cidadãos felizes epara formar cidadãos felizes epara formar cidadãos felizes eprofissionais preparados?profissionais preparados?profissionais preparados?profissionais preparados?

cialmente, na formação de adultos,como se articulam o ‘saber ’ e o‘agir ’? Nessa associação, como asescolas devem selecionar os con-teúdos socialmente importantespara formar cidadãos felizes eprofissionais preparados?

No agir das pessoas sempre se encontrapresente um saber. Melhor dizendo,muitos saberes! A tarefa de refletir sobreos saberes que devem estar presentesno currículo dos cursos e de selecioná-los e socializá-los, que cabe à escola, éextremamente complexa. Quando bus-camos formar um auxiliar de enfermagem,

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a humanidade’

RET-SUS novembro de 2004

devemos pensar não só sobre oconhecimento técnico – conceitual emetodológico – que ele deve dominar,mas sobre o que ele deve conhecer sobrea sociedade em que vive, as outras pessoascom as quais se relaciona, as implicaçõeséticas do trabalho que vai desenvolver.Minha tese é a de que o trabalhocompetente, de boa qualidade, é umtrabalho que faz bem, isto é, que fazemosbem, que faz bem para nós e para aquelescom os quais nos relacionamos. E épreciso lembrar que, por sermos sempreincompletos, não estamos preparados deuma vez por todas. A formação pro-fissional é contínua, não acaba no dia da‘formatura’, na escola.

Na RETNa RETNa RETNa RETNa RET-SUS, lidamos com edu--SUS, lidamos com edu--SUS, lidamos com edu--SUS, lidamos com edu-cação profissional em saúde, quecação profissional em saúde, quecação profissional em saúde, quecação profissional em saúde, queacontece em serviço, fora do espaçoacontece em serviço, fora do espaçoacontece em serviço, fora do espaçoacontece em serviço, fora do espaçoda escola, na maioria das vezes,da escola, na maioria das vezes,da escola, na maioria das vezes,da escola, na maioria das vezes,com professores que são profis-com professores que são profis-com professores que são profis-com professores que são profis-sionais dos serviços e alunossionais dos serviços e alunossionais dos serviços e alunossionais dos serviços e alunosadultos, também trabalhadores doadultos, também trabalhadores doadultos, também trabalhadores doadultos, também trabalhadores doSUS. Como conciliar as ‘neces-SUS. Como conciliar as ‘neces-SUS. Como conciliar as ‘neces-SUS. Como conciliar as ‘neces-sidades específicas’ dos educan-sidades específicas’ dos educan-sidades específicas’ dos educan-sidades específicas’ dos educan-dos, os objetivos macro da edu-dos, os objetivos macro da edu-dos, os objetivos macro da edu-dos, os objetivos macro da edu-cação e da saúde?cação e da saúde?cação e da saúde?cação e da saúde?

-SUS, lidamos com edu-cação profissional em saúde, queacontece em serviço, fora do espaçoda escola, na maioria das vezes,com professores que são profis-sionais dos serviços e alunosadultos, também trabalhadores doSUS. Como conciliar as ‘neces-sidades específicas’ dos educan-dos, os objetivos macro da edu-cação e da saúde?

Vínhamos falando em formaçãocontinuada. Um dos aspectos dessaformação é a formação em serviço. Naeducação profissional, temos a presençade ‘educadores’ que não tiveramformação pedagógica, o que leva aoenfrentamento de muitos problemas.Muitos acreditam que basta ser um bomprofissional em sua área que será,conseqüentemente, um bom professor.Não é isso que se constata,freqüentemente. Por isso, há neces-sidade de uma formação pedagógica quese dá em serviço, na reflexão coletivasobre o significado da docência, na buscados saberes exigidos para ensinar eaprender. Se a Secretaria de Saúde, quepromove o ensino em sua área, tem umapreocupação com essa dimensão

pedagógica, na certa buscará trazer para otrabalho os elementos exigidos para a for-mação de um profissional competente.Em última instância, os objetivos dasáreas de educação e saúde se articulam,quando guardam referência ao bem, nosentido físico, social, ético, das pessoas,dos cidadãos.

No trabalho do professorNo trabalho do professorNo trabalho do professorNo trabalho do professorNo trabalho do professor, em sala, em sala, em sala, em salade aula ou nos serviços, quais asde aula ou nos serviços, quais asde aula ou nos serviços, quais asde aula ou nos serviços, quais asespecificidades do lidar com umespecificidades do lidar com umespecificidades do lidar com umespecificidades do lidar com umaluno adulto e trabalhador? Há al-aluno adulto e trabalhador? Há al-aluno adulto e trabalhador? Há al-aluno adulto e trabalhador? Há al-gumas pistas para um trabalho maisgumas pistas para um trabalho maisgumas pistas para um trabalho maisgumas pistas para um trabalho maisproveitoso?proveitoso?proveitoso?proveitoso?

O que a adoção do currículo porO que a adoção do currículo porO que a adoção do currículo porO que a adoção do currículo porcompetência muda de fato na edu-competência muda de fato na edu-competência muda de fato na edu-competência muda de fato na edu-

, em salade aula ou nos serviços, quais asespecificidades do lidar com umaluno adulto e trabalhador? Há al-gumas pistas para um trabalho maisproveitoso?

Não é demais repetir sempre que umtrabalho educativo terá melhoresresultados quanto mais levar emconsideração o contexto cultural ehistórico em que vivem os educandos esuas características específicas. Paulo Frei-re, fazendo a crítica ao texto de algumascartilhas de alfabetização de adultos emalgumas regiões do Brasil, dizia: “Sãolivros que falam de uvas e Evas parahomens que nunca viram uvas e conhe-cem muito poucas Evas”. Devemos levarem conta as necessidades concretas dosalunos com que trabalhamos para atin-girmos de maneira mais efetiva nossosobjetivos. Necessidades concretas nãosão necessidades imediatas, ditadas pelascontingências primeiras ou impostas pelamídia. São aquelas cujo atendimento vaiao encontro da realização do bem comum.Qualquer ensinamento tem maisressonância se vai ao encontro do que fazsentido para os educandos. Portanto,temos que passar do estágio de entregade informações para o da significação dosconhecimentos.

O que a adoção do currículo porcompetência muda de fato na edu-

cação e na educação profissional?cação e na educação profissional?cação e na educação profissional?cação e na educação profissional?cação e na educação profissional?O que isso pode acrescentar espe-O que isso pode acrescentar espe-O que isso pode acrescentar espe-O que isso pode acrescentar espe-cificamente para a área da saúde?cificamente para a área da saúde?cificamente para a área da saúde?cificamente para a área da saúde?O que isso pode acrescentar espe-cificamente para a área da saúde?

A referência à formação por competênciasé recente no nosso espaço educacional.Ela tem ganhado força principalmenteem virtude de estar presente nasorientações oficiais e nas discussões quese fazem nas escolas e entre oseducadores. Penso que está presente norecurso à idéia de ‘desenvolver com-petências’ algo que pode ter um caráterpositivo, na medida em que se procuratrazer um dinamismo à ação educadora,ao se apontar para uma ‘mobilização desaberes’. Entretanto, vejo, na prática, orisco de apenas se substituírem aspalavras e efetivamente não se trans-formar a ação. Onde antes tínhamossaberes, capacidades, habilidades, hojetemos competências. Portanto, é precisouma vigilância crítica para enfrentar ogrande desafio que é o de construir deverdade um espaço de ampliação eaprofundamento dos saberes, articuladosaos sentires, quereres etc, e caminhar nadireção de uma docência da melhorqualidade. Na área da saúde, esse desafiose configura no esforço de trazer para aformação o verdadeiro sentido de saúde,que não é apenas o de construção do bem-estar, mas do bem ser, para falar à moda dapolítica, articulada à ética.

Geral

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Perfil da educação profissional no Brasil

Estudo mostra situação da oferta de cursos técnicos no país

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A maior parte dos cursos técnicosem saúde está concentrada na região sudeste. A iniciativa

privada forma quase sete vezes maisprofissionais do que o setor público. Ea enfermagem é a área com maior de-manda na educação profissional. Essassão algumas das informações da pes-quisa “Tendências e situação atual daoferta do sistema educativo na área dasaúde”, desenvolvida pela Estação deTrabalho Observatório dos Técnicosem Saúde, da localizado na Escola Po-litécnica de Saúde Joaquim Venâncio(EPSJV) e pelo Núcleo de Estudos deSaúde Pública, da Universidade de Bra-sília (UnB). O estudo, que foi concluí-do este ano e se baseou nos dados doCenso Escolar de 2002, enfocou apenasa educação profissional.

Para se ter uma idéia, segundoa pesquisa, 80% dos cursos técnicospúblicos e privados estão nas regiõessul e sudeste, enquanto a região nortepossui apenas 2,5%, seguida pelocentro-oeste, com 5,1%, e nordeste,com 8,6%. O sudeste também con-centra o maior número de EscolasTécnicas do SUS, 13 ao todo:sete em São Paulo (seis es-taduais e uma municipal),três em Minas Gerais, duasno Rio de Janeiro (uma es-tadual e outra federal)e uma no EspíritoSanto. Das outrasETSUS em funcio-namento, sete estãono Nordeste, quatro nocentro-oeste, três no Sule apenas duas no Norte.Por enquanto, a regiãonorte só tem ETSUS noAcre e em Tocantins mas,no próximo ano, outras

quatro deverão começar suas ativi-dades no Amazonas, Amapá, Pará,Rondônia e Roraima. A maioria das no-vas unidades vai abrir as portas ofe-recendo cursos de Técnico em HigieneDental e Técnico em Agente Comu-nitário de Saúde, áreas que vêm sendoincentivadas pelo Ministério da Saúdeem virtude do investimento no Pro-grama Brasil Sorridente e no Programade Saúde da Família.

Mas a mudança de rumo noscursos técnicos está apenas enga-tinhando. Como mostra o estudo, asub-área de enfermagem ainda corres-ponde a 55% da demanda. SegundoJúlio Lima, coordenador da pesquisa,a procura pelo curso técnico emenfermagem tende a aumentar, já queessa qualificação detém 74,6% dospostos de trabalho. Simone Machado,coordenadora de Ações Técnicas doDepartamento de Gestão da Educaçãona saúde (Deges/SGTES/MS), concor-

da, mas destaca as novas apostas doMinistério: “A tendência em longoprazo é diminuir um pouco essa dis-paridade na procura por cursos téc-nicos, já que a política governamentalvisa estimular as necessidades locais.Mas a enfermagem vai continuar sen-do a principal demanda”.

Dados sobre os egressos dos cur-sos técnicos mostram também que, nasaúde, para cada aluno formado pelasescolas públicas, quatro vêm da ini-ciativa privada. Segundo o estudo, dospouco mais de 68 mil alunos que con-cluíram cursos técnicos em saúde em2002, pouco mais de13% saíram dasescolas públicas e quase 87% das par-ticulares. E como o SUS é o maior em-pregador da saúde, a maioria dessesprofissionais vai trabalhar nos serviços.“Não podemos mais acreditar que osetor público será capaz de suprir todaa nossa demanda de profissionais. Porisso, o Ministério da Saúde vem es-tabelecendo uma aproximação tam-

bém com as escolas privadas,desde o Profae”, conta

Simone. Mas como ga-rantir, então, umaformação pautadapelos princípios do

SUS? “As EscolasTécnicas do SUSdevem ativar ocontato com asescolas parti-culares na suaregião, mapear osespaços de edu-cação profissio-

nal. Devem sermobilizadoras do

compromisso do pri-vado com o SUS”,responde.

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CapaOnde o trabalho, a educação e a

saúde se encontramO que é precarização do trabalho e como ela afeta a sua vida

Lembra do tempo em que vocêestudava, conseguia um emprego de carteira assinada

ou prestava concurso público, tinhatodos os direitos trabalhistas e era felizpara sempre? Tudo indica que essetempo passou. Desemprego, trabalhoinformal, vínculos fracos ou ine-xistentes e ausência de direitos são oretrato de uma época que vive umacrise no mundo do trabalho, aquilo quevem sendo chamado de ‘precarização’.

Mas onde você, diretor, coor-denador ou professor de uma EscolaTécnica do SUS entra nessa história?A primeira resposta é óbvia: você é umtrabalhador. A segunda também: vocêforma trabalhadores. Mas se esse é umproblema do mundo do trabalho, queafeta todos os setores, por que essetema virou prioridade no campo dasaúde? Primeiro porque, no Brasil, aSaúde tem, tradicionalmente, movi-mentos sociais fortes e organizados.Segundo, e mais importante, porque aprecarização do trabalho interferediretamente no cumprimento dealguns princípios e diretrizes do SUS.Como garantir a atenção integral, porexemplo, com profissionais de saúdeque não ficam no cargo nem o temposuficiente para conhecer a populaçãoque atendem? “A precarização dotrabalho na saúde afeta a tão desejadahumanização dos serviços e compro-mete a relação entre trabalhadores eusuários do SUS”, diz Isabel Brasil,vice-diretora de ensino da EscolaPolitécnica de Saúde Joaquim Ve-nâncio – EPSJV, no Rio de Janeiro. Porfim, como têm a proposta de formaçãoem serviço, as ETSUS funcionam comprofessores que são, em sua maioria,profissionais do SUS e as Secretariasde Saúde a que a maior parte das Es-

colas é ligada, vivem com dificuldadepara encontrar um meio legal de pagara hora-aula.

Por que precarização?Isabel Brasil explica que, no

trabalho precarizado, que é uma ten-dência da organização econômicaatual, os trabalhadores perdem direitosque foram conquistas de movimentossindicais, políticos e sociais. Segundoela, no mesmo pacote, vem o de-semprego estrutural, situação quetorna o trabalhador vulnerável, comescolhas e poder de negociação cadavez mais reduzidos. Ou seja, a pre-carização acaba sendo ‘vendida’ comoa solução para o desemprego, mais oumenos como aquela história de ‘melhorter um na mão do que dois voando’. “Opior é que isso é tratado como ine-vitável, como uma espécie de pequenopedágio que seria preciso pagar para seter acesso aos benefícios da moder-nização acelerada e violenta do capi-talismo”, critica. E completa: “O custohumano não entra na contabilidade,não são levados em consideração osofrimento, a angústia e a incertezaque isso causa no trabalhador”.

É considerada precária todaatividade que acontece sem direitostrabalhistas e de proteção social. Masa amplitude dessa definição podevariar. No mais recente embate jurídiconacional sobre questões trabalhistasna Saúde, por exemplo, o Ministério

Público do Trabalho está exigindo queos gestores municipais façam concursopúblico para contratação de agentescomunitários de saúde. O MP reco-nhece irregularidade mesmo nos muni-cípios em que o ACS tem vínculovínculovínculovínculovínculo detrabalho indireto, com todos os direitostrabalhistas, porque entende quequem exerce uma atividade per-manente e essencial para o sistemadeve ser integrado ao serviço público.

Segundo o documento queapresenta a agenda positiva doDegerts, de 2004, a única forma decontratação não-precária é a via CLT,desde que não seja temporário. Orelatório destaca ainda que algumasrelações de trabalho são legais mas,mesmo assim, não atendem às neces-sidades do sistema de saúde. É o casodas modalidades de contrato detrabalho por prazo determinado etemporário, no caso do setor privado, eda contratação por tempo determinadopor excepcional interesse público, quelimita-se a situações de epidemia,como tem acontecido, por exemplo, nossurtos de dengue.

Esse é um cenário geral, queaponta para um prejuízo da qualidadede vida do trabalhador. Mas muitos es-tudiosos do tema vêm dizendo que osprocessos de precarização afetam tam-bém, a longo prazo, a eficiência e, nocaso das empresas privadas, a lucra-tividade, porque podem fazer com queos trabalhadores fiquem menos com-

Formas de vinculação ao trabalho: regime jurídico único, CLT, cargoscomissionados, contratação temporária de excepcional interesse público, cessão,triangulação via cooperativas gerenciais, terceirização via cooperativas de profissionais,terceirização de serviços clínicos pela via de empresas privadas, contratação deparceria com organizações sociais, e, ainda, informalização pela via de bolsas detrabalho, pró-labore ou outras formas de bolsas. A lei limita a contratação temporáriaàs necessidades de combate a epidemias.

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prometidos com o resultado das suasações. No caso da saúde pública, aprecarização das relações de trabalhotem sido identificada há algum tempocomo um obstáculo para o desen-volvimento do SUS. Para tentar comba-ter e reverter essa situação em âmbitonacional, a atual gestão do Ministérioda Saúde criou, na sua estrutura, o De-partamento de Gestão e da Regulação

do Trabalho em Saúde – Degerts, liga-do à Secretaria de Gestão do Trabalhoe da Educação na Saúde – SGTES.

O que dizem os númerosDados do Ministério da Saúde

mostram que cerca de 30% dos traba-lhadores da saúde no Brasil estão preca-rizados, o que representa cerca de 600mil pessoas. Segundo o estudo ‘Traba-lhadores Técnicos em saúde: formaçãoprofissional e mercado de trabalho’, daEstação Observatório dos Técnicos emSaúde, uma pequena parte do total detrabalhadores terceirizados ou infor-mais diz respeito ao setor público. Combase na Pesquisa Assistência Médico-Sanitária, do IBGE, de 1999, o estudomostra que, dos trabalhadores de níveltécnico ou auxiliar do setor público,87,1% têm vínculo diretamente como estabelecimento de saúde para o qualtrabalham; 8,7% têm o chamado vín-culo intermediário, que pode garantiros direitos trabalhistas mas via proces-sos como terceirização; e apenas4,2% têm outro tipo de vínculo, queconfigura uma provável situaçãode precarização. Quando se pas-sa para o nível superior, o vín-culo intermediário sobe para9,3% e o de trabalho precá-rio vai para 7,7%.

Segundo a pes-quisa, no setor privadoa precarização de traba-lhadores de nível médioé ainda menor (4,2 %com vínculo interme-diário e 3% com outro tipode vínculo), mas aumentaconsideravelmente no casodos profissionais graduados:45,1% têm vínculo próprio,14,3% intermediário e40,7% estão precarizados.O estudo conclui quemuitos profissionais de ní-vel superior achammais vantajoso fi-nanceiramente serterceirizado e manteruma condição de auto-nomia no mercado detrabalho, principalmen-te devido aos baixos

salários do emprego formal. Sinal dostempos, como explica Isabel Brasil:“Com a precarização, ao invés de termais tempo livre, o trabalhador precisater dois ou três empregos para garantiro mesmo padrão de vida do passado.Isso significa mais cansaço e desgastefísico e emocional”. Os professores dasEscolas Técnicas do SUS — que pre-cisam ter, no mínimo, nível superior— são um exemplo desses profissio-nais que desenvolvem mais de uma ati-vidade: nos serviços e na sala de aula.

Em relação aos trabalhadorestécnicos em saúde, o estudo afirmaque, de forma geral, prevalece avinculação formal. No setor público,mais de 80% dos trabalhadores detodas as profissões e ocupações têmvínculo direto. Na iniciativa privada,estão no mesmo patamar os técnicos eauxiliares de enfermagem, técnicos emhigiene dental e auxiliares de consul-tório dentário, técnicos e auxiliares de

Pagamento de hora-aula

A integração com os serviços é um dosprincípios das Escolas Técnicas do SUS. Daía opção por trabalhar com professores quejá atuem como profissionais do sistema. Maso que nasceu como uma estratégia peda-gógica, marcando um diferencial dasETSUS, tem virado um tormento adminis-trativo. O problema é que as Escolas preci-sam fazer malabarismos para conseguir pa-gar a hora-aula dos seus professores, em espe-cial aqueles que são funcionários públicos.

Vera Lucia Ferreira, diretora do Ceforde Natal, explica que existe uma instruçãonormativa emitida pelo Ministério da Fa-zenda que proíbe o pagamento de servidorde qualquer nível — municipal, estadualou federal — com recursos repassados viaconvênio. A maior ou menos rigidez paraencontrar uma brecha depende, fundamen-talmente, dos Tribunais de Contas dosestados.

Vera conta que no Rio Grande doNorte, por exemplo, nenhum servidor podereceber do governo estadual por prestaçãode serviço. A saída que a Escola tem en-contrado é repassar o dinheiro para umafundação que, aí sim, pode pagar os profes-sores. Mas esse processo não é nada simples.“É muito trabalhoso, temos que abrir lici-tação e fragmentar os recursos para pagartaxas administrativas”, reclama Vera. Outroproblema é que, dependendo da instituiçãoque for fazer o repasse da hora-aula, o pro-fessor só pode receber por, no máximo, trêsmeses seguidos porque mais do que isso con-figuraria vínculo empregatício. “Ainda nãodemos início ao curso de THD porque nãoconseguimos encontrar o melhor caminhopara pagar os professores”, conta Vera.

A Escola encaminhou à consultoriageral do estado um pedido para que seja so-licitada ao legislativo uma proposta de leique regulamente o pagamento de hora-aulano caso específico da ETSUS. E, de fato,não existe, até agora, caminho para uma so-lução nacional, já que essa autorização de-pende da legislação estadual ou municipal.O estado de São Paulo, por exemplo, emitiu,em 1997, um decreto que permite que osservidores recebam por, no máximo, 40 horasmensais de aula.

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farmácia, de nutrição e de dietética,em reabilitação, em vigilância sani-tária e ambiental e os agentes de sanea-mento. Já os técnicos e auxiliares depatologia clínica, hematologia/hemo-terapia e os técnicos em citologia, cito-técnica, radiologia médica e equipa-mentos médicos são os trabalhadorescom vínculos mais fracos.

O estudo conclui que os maio-res índices de precarização afetamquem tem mais autonomia profissio-nal. Nesse caso, os trabalhadores tra-dicionalmente mais reconhecidos pelo‘ato de cuidar’ e pelo maior contadocom os usuários, como enfermeiros, au-xiliares e técnicos de enfermagem, es-tariam menos expostos a vínculos fra-cos. Isso explicaria, inclusive, a menorprecarização dos trabalhadores de nívelmédio em relação aos de nível superior.

Por essa lógica, os prejuízos daprecarização do trabalho para o SUSseriam minimizados. Mas um primei-ro problema é que estudiosos, profis-

sionais e movimentos sociais estão ca-da vez mais convencidos de que a preo-cupação com a humanização do siste-ma e o acolhimento ao paciente deveser compromisso de toda a equipe enão apenas de alguns profissionais.Uma segunda questão, mais recente,é que, como a Revista RET-SUS noti-ciou na edição passada, atualmente oprofissional cuja situação de precari-zação mais tem chamado atenção e ge-rado debate é o agente comunitário desaúde – ACS, exatamente aquele queé responsável pelo maior vínculo coma população na estratégia do Programade Saúde da Família.

O PSF, aliás, tem sido o princi-pal foco de concentração das relaçõesprecárias ou desiguais de trabalho.Como diz o relatório do SeminárioNacional sobre Política de Despre-carização das relações de trabalho noSUS: “As cooperativas, modelo que es-tá sendo condenado pelo MinistérioPúblico do Trabalho em todo o país,

em relação àquelasque se configuramcomo fraude à lei,vêm se impondo co-mo alternativas pararesponder à neces-sidade de criar umincentivo à dedi-cação integral demédicos e enfer-meiros e até mesmotécnicos, possibili-tando o estabeleci-mento de níveis deremuneração deduas a três vezesmaior do que é rece-bido por outros pro-fissionais da rede,que trabalham emambulatórios e hos-pitais, com a mesmacarga horária, acar-retando sérios con-flitos entre as duasmodalidades de vín-culos trabalhistas”.

As discus-sões sobre a preca-rização do trabalhoem saúde mexem

com os humores de profissionais egestores, dentre outras coisas, porqueenvolvem cifras altas. Segundo dadosdo Conselho Nacional dos Secretáriosde Saúde – Conass, juntas, as se-cretarias estaduais de saúde do Brasilgastam 5,3 bilhões de reais por ano compessoal, entre ativos e inativos. Os gas-tos com trabalhadores em atividaderepresentam 45,7% do total das des-pesas com saúde realizadas em 2002.Com o processo de descentralização,previsto nas diretrizes do SUS, os servi-ços de atenção básica ficam cada vezmais a cargo dos municípios e a contra-tação de pessoal para essa finalidadetambém. Com isso, outro fator que pe-sa sobre o ombro dos gestores é a lei deresponsabilidade fiscal, segundo a qualum município não pode gastar maisde 60% do seu orçamento com pessoal.“Há situações de gestores que não têmoutra forma de lidar com isso porque,na verdade, a questão da precarizaçãodeveria ser tratada como política macrode governo”, diz Isabel.

O Degerts foi criado exata-mente para dar o tratamento de polí-tica nacional a esse problema. A funçãodesse departamento é propor, in-centivar, acompanhar e elaborar polí-ticas de gestão, planejamento e regu-lação do trabalho em saúde em todo oBrasil. Para atingir esses objetivos, aagenda positiva do Degerts elencoucomo prioridade para 2004 a criaçãode um Plano de carreira, cargos e salá-rios – SUS; do Programa Nacional deDesprecarização do Trabalho no SUS;da Câmara de Regulação do Trabalhoem Saúde, um espaço para discutir erecomendar ao Ministério normas sobrea regulação do exercício profissional ea definição da regulação de novas ocu-pações da saúde; das Mesas de Nego-ciação Permanente do SUS, em quetrabalhadores, empregadores, gestorese representantes do governo discuteme propõem mudanças em aspectoscomo jornada e condições de trabalho,salário e carreira; e o apoio à gestão dotrabalho e da educação nas secretariasestaduais e municipais de saúde.

Aconteceu nas ETSUS

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Adventistas do Sétimo Dianão querem aula no sábadoETSUS de Assis e do Mato Grosso do Sul tentam resolver o impasse

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O trabalho das ETSUS tem a ver com crenças religiosas?As experiências recentes da

Rede mostram que sim. Estudantesdas Escolas de Assis, em São Paulo, ede Mato Grosso do Sul — todosadventistas do sétimo dia — recusam-se a freqüentar as aulas de sexta à noitee sábado. O horário dos cursos, porém,é escolhido para atender à maioria dosalunos trabalhadores do SistemaÚnico de Saúde. As aulas acontecemde segunda a sexta à noite, com estágiosupervisionado no sábado. Mas, se-gundo a religião adventista, o sábado éum dia sagrado e deve ser usado para odescanso. Para justificar essa atitude,eles citam a bíblia, em Êxodo 20:8-11: “Lembra-te do dia de sábado, para osantificar. Seis dias trabalharás e farás todaa tua obra. Mas o sétimo dia é o sábado doSenhor, teu Deus; não farás nenhumtrabalho, nem tu, nem o teu filho, nem a tuafilha, nem o teu servo, nem a tua serva, nemo teu animal, nem o forasteiro das tuas portaspara dentro; porque, em seis dias, fez oSenhor os céus e a terra, o mar e tudo o queneles há e, ao sétimo dia, descansou; por isso,o Senhor abençoou o dia de sábado e osantificou”.

Sem freqüentar as aulas nasexta e no sábado, os alunos ultra-passam o limite de 25% de faltas deter-minado pela Lei nº 9.394/96, doMinistério da Educação. No Cefor deAssis, em São Paulo, uma aluna de 64anos, do curso do Profae, ao ser in-formada de que seria reprovada porfalta, entrou com uma ação na justiçacontra a Escola. A diretora da ETSUS,Maria Cecília Arantes, pediu uma

consulta à Secretaria de Estado daEducação que, com base na Legislaçãode Ensino Fundamental e Médio e naConstituição Federal, que forneceu oparecer CNE nº 15/99, segundo o qual:“não há amparo legal para o abono defaltas a estudantes que, com base emsuas convicções religiosas, deixam decomparecer às aulas em certos dias dasemana”. Além disso, se a instituiçãode ensino apresentar um calendárioprévio, o aluno não pode contestá-lodepois do início das aulas. Com isso, aEscola ganhou a ação, mas a aluna nãoconcluiu o curso. “Tentamos convencê-la pelo diálogo, mas como ela se mos-trou irredutível, recorremos à legis-lação”, diz Cecilia.

O Cefor de Mato Grosso do Sulpassou pelo mesmo problema recen-temente. No início do curso, aoperceber que as faltas dos alunos ad-ventistas eram constantes, a coor-denadora do curso técnico em radio-logia, Lúcia Oliveira, chamou os trêsestudantes para uma conversa e ex-plicou que eles seriam reprovados casonão obtivessem o mínimo de presençaexigido pela lei. “Nós demos a opçãode eles cursarem as duas disciplinasda sexta-feira nas turmas de auxiliarde enfermagem e de técnico em higie-ne dental, já que são disciplinasbásicas, mas eles não procuraram assecretarias desses cursos”, contaLúcia. Segundo Washington Gon-çalves, que já é técnico em enfer-magem e está cursando o módulo 2 docurso técnico em radiologia, a posiçãoda Igreja é clara e não há como “ir

contra a vontade de Deus”. “Eu nãovou às aulas. Isso é fato consumado.Para mim, é mais importante ser fiel aDeus”, diz. Washington, no entanto,não se recusa a trabalhar aos sábados.Segundo ele, esse dia pode ser usadopara o bem, como diz Jesus em Mateus12:11-12: “Qual dentre vós será o homemque, tendo uma só ovelha, se no sábado elacair numa cova, não há de lançar mão dela,tirá-la? Ora, quanto mais vale um homemdo que uma ovelha! Portanto, é lícito fazerbem nos sábados”. “Eu não posso deixarde atender os meus pacientes.Ninguém escolhe quando vai ficardoente”, diz o aluno.

Quanto ao curso, a estratégiado estudante é cumprir todas asdisciplinas e cursar as que faltarem emuma escola particular. A coordenadorade ensino da Escola PolitécnicaJoaquim Venâncio, Isabel Brasil,explica que a troca de escola élegalmente possível, mas há uma perdapedagógica. “Acho que nós, educadores,defensores da escola pública laica equalificada, devemos refletir sobre co-mo qualquer prática religiosa pode a-trapalhar um processo educativo.Certamente a formação desse profis-sional será prejudicada”, opina Isabel.

Como ser democrático sem setornar excludente? Como ofereceu umensino de qualidade sem ferir crençasindividuais? Essa polêmica está naRede para que as ETSUS discutam,reflitam e ajudem as outras a decidirseus impasses. Afinal, sua Escola podepassar por isso a qualquer momento.

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A Escola Politécnica de Saúde JoaquimVenâncio (EPSJV), no Rio de Janeiro, e asETSUS do Acre, Rio Grande do Norte eBlumenau vão produzir, juntas, material didáticode apoio que será oferecido aos professores docurso técnico de agente comunitário de saúdeem todo o Brasil.

A série de livros será produto de umprojeto de pesquisa elaborado por profissionaisda EPSJV e aprovado pelo Programa de De-senvolvimento Tecnológico em Saúde Pública– PDTSP-SUS, uma linha de financiamentointerno da Fundação Oswaldo Cruz. O objetivodo trabalho conjunto, potencializando a or-ganização em Rede, é produzir material queapóie a formação técnica do ACS e sistematizeuma bibliografia norteada por diretrizesnacionais.

O grupo convidou uma Escola de cadamacroregião brasileira — Nordeste, Amazôniae Centro-Sul, considerando-se uma divisãogeoeconômica — para integrar o trabalho. AsETSUS vão indicar profissionais envolvidos naformação do ACS para participar de oficinas locaisjunto com a equipe de pesquisa e agentescomunitários da região.

A integração com as ETSUS tem tambémo objetivo de articular as diretrizes nacionais àsrealidades locais. Porque, além de abrir espaçopara que os atores que fazem a formaçãoparticipem da produção desse material, a parceriacom as ETSUS vai possibilitar que os textosreflitam as principais especificidades de cadauma dessas macroregiões. Juntando isso numprojeto nacional, espera-se que a coletânea queas quatro Escolas vão construir possa contribuircom um conhecimento mais universal, semperder a perspectiva regional, capaz de subsidiaras bases curriculares da formação do ACS.

O projeto tem duração de 18 meses. Otrabalho propriamente dito vai começar emmarço de 2005 e a expectativa é que todo omaterial esteja pronto para disponibilização emmarço de 2006. A verba destinada ao projetonão inclui impressão, mas, quando os textosestiverem terminados, o grupo procurará fontesde financiamento para a sua publicação. Inde-pendentemente disso, o material estaráacessível para todas as instituições que esti-verem participando da formação do ACS.

Para divulgar esse material produzido pelaRede, o grupo espera contar com a BibliotecaVirtual de Educação Profissional em Saúde –BVS-EPS e, principalmente, com a articulaçãoda RET-SUS.

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Mostra de Saúde da Família no CearáEscola de Saúde Pública comemora uma década do Programa

ficidades. Lá, por exemplo, os ACS sãopagos pelo governo estadual e não pelomunicípio. O Ceará foi também oestado que criou o curso de tecnólogo,de nível superior, para essesprofissionais.

Márcia Valéria Morosini, querepresentou a Escola Politécnica deSaúde Joaquim Venâncio no evento,destaca a grande participação dosserviços apresentando suas experiên-cias. “O que me impressionou foi ver oquanto os profissionais dos serviços es-tão refletindo sobre a sua prática”, diz.

Apesar do foco na celebraçãolocal, o evento não ficou restrito aoslimites do Ceará e teve, inclusive,participação internacional. Uma dasmesas-redondas do encontro apre-sentou a experiência de Saúde daFamília em Cuba, Chile, El Salvador eBrasil. “Percebemos o quanto o Saúdeda Família é estruturante da atençãoprimária e o quanto a atenção primáriaé importante para a organização dosistema de saúde desses países”,comenta Márcia. E completa: “Tantonessas falas quanto nas experiênciasapresentadas ao longo do evento, ficouclaro que a base da atenção básica nãosão as tecnologias duras — para usaruma classificação do Emerson Mehry—, mas sim a força de trabalho emsaúde. E o trabalhador de nível médio,principalmente o ACS, é fundamentalpara o sucesso do PSF. Esse é oprincipal desafio imposto àsinstituições formadoras e às ETSUSem particular”.

A Escola de Saúde Pública doCeará promoveu, nos dias 3 e 4 denovembro deste ano, um evento quereuniu a ‘I Mostra de Saúde da Família’e o ‘II Seminário Internacional emSaúde da Família’. Com a participaçãode cerca de 700 pessoas, o encontrocomemorou os dez anos do PSF noCeará, com apresentação de vídeo,mesas-redondas, oficinas de trabalhoe relatos de experiências.

A trajetória do Ceará representaum marco para a história do Saúde daFamília no Brasil. Lá começou, há umadécada, um trabalho que inspirou oPrograma de Agentes Comunitários deSaúde (PACS) e, por conseqüência, oPSF, que hoje é considerado a principalestratégia de organização da atençãobásica no país.

Nesse tempo, o PSF ganhou todoo território nacional, mas até hoje oCeará mantém algumas especi-

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Aconteceu nas ETSUS

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Pernambuco promove curso de UTI Comunidade recebeatendimento odontológico

A ETSUS Tocantins estácumprindo seu papel pedagógico esocial. Por iniciativa própria, a Escolafez uma parceria com o OdontoSesc -ônibus que contém quatroconsultórios odontológicos - paraproporcionar o estágio supervisionadopara seus alunos do curso técnico dehigiene dental. Os estudantesaplicaram seus conhecimentosteóricos com a supervisão de dentistasda Escola e do Sesc. Dentre suasatividades estavam os trabalhos deprevenção e promoção da saúdebucal.

Além dos alunos, a sociedadetambém ganhou. O atendimentoodontológico é uma carência da regiãoe a equipe do PSF não tem dentista.Com essa parceria, durante doismeses, os 60 alunos do curso e osquatro dentistas, atenderam cerca de400 pessoas da comunidade ARSO41, que fica no entorno da Escola.

ERRAMOSNa página 8, da 1ª edição da revista,

de outubro, na notícia “Cefor de Goiáscria biblioteca móvel para cursosdescentralizados”, a van não foi doadapelo Ministério dos Transportes, comonoticiado, e sim pelo Ministério daSaúde.

Na edição nº 2, página 10, na nota“SUS ganha oito novas EscolasTécnicas”, a ETSUS Tocantins começouo curso técnico em higiene dental nodia 14 de junho e não em julho, como foinoticiado.

A ETSUS Pernambuco é aprimeira Escola da Rede aoferecer o curso em Uni-dade de Terapia Intensiva(UTI) para Auxiliares eTécnicos de Enfermagemem In-fecção Hospitalar eVigilância Sanitária. Par-ticipam do curso 850 profissionais dossete maiores hospitais de Recife. Aprimeira turma, com 103 alunos,concluiu o curso no dia 5 denovembro.

As aulas foram ministradas porenfermeiros do SUScapacitados pedagogica-mente pela Escola. Oobjetivo do curso, de 280horas, que recebeu recur-sos da Agência Nacionalde Vigilância Sanitária

(Anvisa), é melhorar o atendimentodos pacientes de UTI, evitandocontaminação e infecções hospita-lares. A ETSUS promete abrir novasturmas em janeiro do ano que vem.

ETSUS Tocantins inaugura biblioteca

Fazer pesquisa ficou mais fácilpara alunos, professores efuncionários da EscolaTécnica do SUS de Tocan-tins. A Escola inaugurou, nodia 25 de outubro, na suasede, em Palmas, uma bi-blioteca com 600 títulos. O acervo écomposto com publicações das áreas

de nutrição, radiologia, psicologia,odontologia, enfermagem,hemoterapia e outros. Alémdos livros, que foram adqui-ridos com recursos do Minis-tério da Saúde, a bibliotecatambém possui três compu-

tadores conectados à Internet parainserir a Escola no mundo digital.

Cefor de Pariquera-Açu concorre a Prêmio

O governo do estado de São Pauloestá estimulando a qualificação derecursos humanos da saúde pública.Para isso, criou o Prêmio Gestão SãoPaulo – inovação em gestão pública,do qual a ETSUS Pariquera-Açu estáparticipando. A premiação acontecerádia 22 de novembro.

O Centro Formador de Pariquera-Açu é uma das escolas finalistas doprêmio por sua iniciativa em oferecero curso técnico em radiologia para osfuncionários da Faculdade deMedicina da Universidade Estadualde São Paulo (Unesp) de Botucatu,atendendo a um pedido dainstituição.

A Unesp solicitou que a ETSUSmontasse um curso para atender 22funcionários que trabalhavam, semformação, no raio-X do hospitaluniversitário. A Escola então montouo projeto, selecionou o corpo docentee ficou responsável pela supervisão docurso de radiologia, realizado emBotucatu. A formatura dos técnicosserá dia 19 de dezembro.

Se o prêmio vier, você vai ler napróxima edição da revista. Mas aindicação já é um sucesso. “Estamosmuito felizes por sermos consideradosuma Escola de utilidade pública”,comemora Ruth Bundesen, diretorado Cefor.

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RET-SUS epela Secre-taria Execu-tiva da BVS-EPS, os parti-cipantes, pro-fissionais dasETSUS, visi-taram as insta-lações das Bi-bliotecas deManguinhos,da Escola Na-cional de Saú-de Pública e

da EPSJV e conheceram asbibliotecas virtuais geradas nessasunidades. Além disso, foramapresentados aos conceitos e àestrutura de uma BVS pelospalestrantes Miriam Piazza,bibliotecária da Bireme, SarahTavares e Regina Cardoso, da BVS-EPS. Os participantes tambémforam orientados quanto aoconteúdo e aos procedimentospara disponibilizar materiais nabase de dados bibliográficos dessaBiblioteca.

A expectativa é que os parti-cipantes do evento sejam multi-plicadores de informação, difun-dindo o conhecimento sobre o te-ma nas Escolas em que trabalham.Segundo Bernadete de LemosCarvalho, representante da EscolaTécnica de Saúde Pública dePernambuco, os materiais forne-cidos durante o encontro serão ú-teis e o apoio à BVS-EPS será recí-proco. “Há assuntos variados or-

ETSUS se reúnem para compor comitê executivo daBiblioteca Virtual de Educação Profissional em Saúde

Estreitar os laços com osrepresentantes das EscolasTécnicas do SUS de todo

o país e, assim, torná-los parceirosna organização e desenvolvimentode dados e referências biblio-gráficas sobre educação profissio-nal em saúde. Esses foram algunsdos objetivos do 1º Encontro doComitê Executivo da BibliotecaVirtual de Saúde de Educação Pro-fissional em Saúde (BVS-EPS),realizado na Escola Politécnica deSaúde Joaquim Venâncio, no Riode Janeiro, de 16 a 18 de novem-bro. O evento foi resultado deuma parceria da EPSJV com oCentro de Informação Científicae Tecnológica (Cict/Fiocruz), oCentro Latino-Americano e doCaribe de Informação em Ciênciasda Saúde (Bireme) e a Secretariade Gestão do Trabalho e da Edu-cação na Saúde/ MS.

Durante o Encontro, organi-zado pela Secretaria Técnica da

ganizados no site da Biblioteca epoderemos fazer muita pesquisa.E também temos trabalhos denossos alunos e professores quepoderão ser incluídos como in-formações. É uma troca. Nós a-judamos a construir a BVS e, poroutro lado, ela nos ajuda”, ressal-tou. Para a diretora do Cefor dePariquera-Açu, Ruth Bundesen, aBVS vai ampliar os horizontes dosalunos e professores das ETSUS.“A biblioteca virtual traz materialde qualidade para pesquisa e po-de ajudar na qualificação docen-te. Isso vai mudar a formaçãotécnica do Brasil”, disse.

Para a coordenadora daSecretaria Técnica da RET-SUS,Renata Reis, a BVS é mais umaperspectiva concreta de se tra-balhar em rede. “Acho que esteencontro reforçou ainda mais oselos e as trocas entre as Escolas.O movimento dessas instituiçõesde se reconhecerem enquantoum elo da RET-SUS é um pro-cesso que tem tido avanços a cadadia. Acho que a participação dosprofissionais das ETSUS nesseevento tende a reforçar e ampliaressa articulação”, destaca.

Bibliotecários da RET-SUS se encontram no Rio de Janeiro

Aconteceu nas ETSUS

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ETSUS Acre leva curso de auxiliar deenfermagem a índios

Enfermeira trabalha em comunidade só acessível por barco

O acesso à região é difícil. Para se chegar a Santa Rosa do Purus, que fica a 850 Km de

Rio Branco, é preciso navegar duranteoito dias, rio a cima, nos meses da es-tiagem de chuvas (de março a setem-bro). Lá está a enfermeira Franciscada Silva, única profissional de nívelsuperior que trabalha no posto de saú-de do município. A pedido dela, aETSUS Acre, utilizando recursos doProfae e a ajuda da Funasa, está ofe-recendo o curso de auxiliar de enfer-magem para 39 pessoas. Dentre os a-lunos, estão 13 índios da etniakaxinauá.

Os índios que participam doprojeto foram escolhidos por sua al-deia e já fizeram o curso de agentesindígenas de saúde (AIS), oferecidopela Funasa (Fundação Nacional deSaúde). Mas, segundo Francisca, é im-portante que eles complementemseus conhecimentos do curso de auxi-liar de enfermagem. “Como as aldeiasficam muito longe de postos de saúde,é preciso que os primeiros socorrospossam acontecer no próprio local. Osauxiliares de enfermagem têm essacompetência”, diz a enfermeira.

Os alunos passam duas sema-nas no curso e o restante do mês emsuas aldeias. O gasto com hospe-dagem e transporte dos índios é cus-teado pela Funasa. Por enquanto, asaulas práticas são ministradas no pe-queno posto de saúde de Santa Rosado Purus. Mas, de acordo com Fran-cisca, o estágio supervisionado teráduas etapas: uma nas próprias aldeiasindígenas e outra no hospital do mu-nicípio de Sena Madureira, maiorcidade da região, distante 700 Km dolocal das aulas.

No primeiro momento, Fran-cisca, única professora do curso,abordará questões relativas à saúde

indígena e aproveitará a ocasião pararealizar um perfil epidemiológico decada aldeia. “Na comunidade indí-gena, quero ter uma resposta práticado que o aluno aprendeu na teoria. Oobjetivo é trazer para a realidade deleso que foi ensinado em sala de aula.Além disso, vou fazer o levantamentodas principais doenças indígenas ecriar uma estratégia de aprofun-damento do conhecimento do auxi-liar de enfermagem na área”, diz Fran-cisca. Em Sena Madureira, os alunosterão a supervisão de enfermeiros daFunasa. “Em um grande hospital, elesconhecerão procedimentos cirúrgicose saberão como é o dia-a-dia de umauxiliar de enfermagem de uma ci-dade grande”, explica a enfermeira.

O curso de auxiliar de enfer-magem começou em junho deste anoe está previsto para terminar no meiodo ano que vem. Apesar da dedicaçãode Francisca, existem alguns obstácu-los que precisam ser vencidos para obom andamento do curso. Um delesé a deficiência no entendimento dalíngua portuguesa, caso da maioriados alunos. Para solucionar o pro-

blema, três alunos do curso sedisponibilizaram a dar um reforçoescolar para seus colegas. As aulas deportuguês acontecem depois da aula,durante uma hora. “A maioria dosalunos conclui o ensino fundamentalem curso supletivo de baixa quali-dade. Por isso, o entendimento do con-teúdo do curso de auxiliar está com-prometido. Minha esperança é que noreforço escolar eles possam melhoraro aproveitamento”, diz Francisca.

Lutando contra a adversidade,em prol de minorias excluídas, a en-fermeira especializada em saúde pú-blica, faz seu trabalho em Santa Rosado Purus há três anos, quando fez aopção de sair da capital. “As opor-tunidades em Rio Branco são melho-res, mas eu queria colocar em práticameus conhecimentos”, explica Fran-cisca, que antes trabalhava na Casado Índio. Essa história, da enfermeirae da Escola do Acre que levam o SUSàs comunidades mais distantes, é umexemplo de como a educação e a saúdepodem estar a serviço das neces-sidades locais.

RET-SUS novembro de 2004

Santa Rosa do Purus: índios assistem aulas a 850 Km de Rio Branco