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 ESCOLA BRASILEIRA DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA CENTRO DE FORMAÇÃO ACADÊMICA E PESQUISA CURSO DE MESTRADO EM ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA QUALIDADE DE VIDA E TRANSPORTE PÚBLICO URBANO: ESTRATÉGIAS PARA MELHORAR A QUALIDADE DO SERVIÇO DE TRANSPORTE PÚBLICO URBANO POR ÔNIBUS KOFFI DJIMA AMOUZOU Rio de Janeiro, 2000

Qualidade no Transporte Coletivo Urbano – Ônibus.PDF

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artigo sobre transporte público coletivo

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  • ESCOLA BRASILEIRA DE ADMINISTRAO PBLICACENTRO DE FORMAO ACADMICA E PESQUISACURSO DE MESTRADO EM ADMINISTRAO PBLICA

    QUALIDADE DE VIDA E TRANSPORTE PBLICOURBANO: ESTRATGIAS PARA MELHORAR AQUALIDADE DO SERVIO DE TRANSPORTEPBLICO URBANO POR NIBUS

    KOFFI DJIMA AMOUZOU

    Rio de Janeiro, 2000

  • ii

    ESCOLA BRASILEIRA DE ADMINISTRAO PBLICACENTRO DE FORMAO ACADMICA E PESQUISACURSO DE MESTRADO EM ADMINISTRAO PBLICA

    QUALIDADE DE VIDA E TRANSPORTE PBLICO URBANO: ESTRATGIAS PARAMELHORAR A QUALIDADE DO SERVIO DE TRANSPORTE PBLICO URBANO POR

    NIBUS

    Dissertao de Mestrado Apresentada porKOFFI DJIMA AMOUZOU

    EAprovada em 06/07/2000Pela Comisso Examinadora

    ASSINATURA

    ENRIQUE JERONIMO SARAVIA Professor Titular da EBAP/FGV

    ASSINATURA

    VALDEREZ FERREIRA FRAGAS Dra. Em Educao

    ASSINATURA

    MOEMA MIRANDA SIQUEIRA Ps-Dra. Em Planejamento e Economia da Sade

  • iii

    RESUMO

    O transporte exerce sobre a sociedade uma influncia muito maior do que aquela

    comumente percebida. A grande mudana da urbanizao que vem ocorrendo no mundo,

    mostra no somente que maior nmero de pessoas vo morar e trabalhar em grandes

    cidades mas tambm, que o cidado vai precisar percorrer longas distncias para satisfazer

    suas necessidades econmicas, sociais e culturais no espao urbano.

    Contudo, o crescimento do nmero de pessoas que dependem de veculo particular

    em grandes cidades no Brasil est se tornando muito mais evidente. Isso ocasiona

    obstculos como congestionamento das estradas, que diminui a produtividade econmica do

    pas; aumento do nvel de consumo de energia e elevados custos socioeconmicos e

    culturais sobre a vida cotidiana na cidade.

    Outrossim, a operao do servio de transporte pblico urbano por nibus, uma das

    modalidades mais teis para a maioria da populao de baixa renda (por favorecer o contato

    entre pessoas, a mobilidade para o trabalho, o acesso educao, hospital, lazer, etc.)

    passa pelas mos de empresas privadas e sofre muito mais quanto qualidade do servio

    prestado.

    Deste modo, o presente estudo exploratrio constitui uma contribuio para a

    compreenso dos fenmenos de excluso social, um dos problemas socioeconmicos e

    culturais do deslocamento urbano, possibilitando examinar as caractersticas genricas do

    planejamento urbano com relao interdependncia entre cidade, sociedade, qualidade de

    vida e transporte pblico urbano, a partir do exemplo de duas cidades brasileiras: Rio de

    Janeiro e Curitiba.

  • iv

    ABSTRACT

    If urban planning is to support the equitable distribution of public goods and services,

    it must recognize and address the dismal condition of millions of poor people who are living in

    a city. The primary focus of contemporary planners and planning students should be on

    finding and advocating solutions that help eliminate the problems of todays cities. Any

    meaningful solution will need to be grounded in a thorough understanding of the social class

    inequities of citizens.

    With the rapid development of national economy and urbanization process in Brazil

    over the last two decades, the number of vehicles and their travels are dramatically

    increased. This is particularly evident in all large cities. Traffic congestion becomes more and

    more severe. Inadequate parking facilities often result in difficulty to find a parking space in

    large cities and many illegally parked vehicles can be seen on the crowed streets. These

    illegally parked vehicles further intensify traffic congestion and also pose a traffic safety

    hazard. The process of urbanization and motorization in Brazil is likely to continue in a rapid

    pace.

    The urban public passengers transport modes problems in large cities are likely to get

    even worse. There is an urgent need for the development of policy and criteria for public

    service of urban public passenger transport by bus in large cities. The purpose of survey is to

    develop policy guidelines for public transport services planning, design, construction and

    mobility management, that meet community needs for accessibility in large cities.

    So this thesis will present major comparative characteristics of urban mobility

    management, urban public passengers transport by bus services planning and the quality of

    social life in two towns of Brazil: Rio de Janeiro and Curitiba. The study case has been

  • vfocused on Rio de Janeiro and Curitiba because of the major different results of the survey

    presented by the two cities.

    The objectives of this thesis are: a) to analyze and discus existing urban mobility

    related accessibility and economic development problems in large cities; b) to provide an

    overview of the relationship within city quality of social life urban mobility in Rio and

    Curitiba; c) to analyze and discuss existing urban mobility management related public

    transport services in Rio and Curitiba; d) to analyze and discuss existing quality of bus public

    transport services problems in Rio. Some preliminary recommendations for mobility

    management policies will also be presented.

  • vi

    AGRADECIMENTOS

    Aos meus pais, Memu e Kodjo, ao estar to longe de vocs para buscar mais um objetivo da

    minha vida, h certas circunstncias que surgem, que proporcionam oportunidades raras

    para meditao e reflexo. Esta uma oportunidade preciosa.

    Ao meu orientador acadmico, Prof. Enrique Saravia, padrinho e amigo que me deu a

    oportunidade de definir o assunto e esclarecer minhas idias nos momentos crticos a fim de

    realizar o presente trabalho e que sempre me incentivou e tem parcela relevante na minha

    vida acadmica.

    A Profa. Deborah Moraes Zouain, Coordenadora do Curso de Ps-graduao e Chefe do

    Centro Acadmico da Escola Brasileira de Administrao Pblica da Fundao Getulio

    Vargas, por sua pacincia, e o apoio moral que sempre me incentivou e certamente tem

    parcela relevante na minha formao acadmica.

    A Profa . Valderez F. Fraga e Profa Moema M. Siqueira por aceitarem fazer parte da banca

    examinadora e por suas relevantes contribuies que tornaram este trabalho realizvel.

    A todos os professore(a)s da EBAP/FGV, por participarem da minha formao acadmica.

    Aos funcionrios da EBAP, especialmente meu irmo Joarez de Oliveira e da Biblioteca

    Mrio Henrique Simonsen da FGV pela pacincia que tiveram comigo, nos momentos

    difceis de comunicao com a lngua portuguesa.

    Ao Prof. Orrico Rmulo do Programa de Engenharia de Transporte da COPPE-PET/UFRJ,

    por indicar alguns livros sobre o tema deste trabalho.

    A todos meus colegas da EBAP/FGV e amigo(a)s, por seu apoio moral e especialmente as

    irms Elaine e Vnia Souza Da Silva, por dedicarem seu tempo a reviso deste trabalho.

    Ao Governo Brasileiro, especialmente CAPES, pela bolsa de estudo que me permitiu

    realizar as despesas necessrias durante o perodo do curso.

    A todos que de alguma forma, direta ou indireta, participaram da realizao deste trabalho.

  • vii

    Mais um dia mais um nibus que eu peguei no Rio

    /.../ o rap do 175 que eu peguei na Central

    E de repente o nibus comeou a encher / Entrou mais gente

    Houve um tumulto. / Mas a viagem prosseguiu

    E a raiva que subiu na cabea dos passageiros

    /.../ Esta triste situao t parecendo o fim do mundo

    Pra quem t de carro / Pra quem t de nibus

    E o pior de tudo que nessa grande viagem

    Nada disso do que aconteceu foi novidade

    Pro que acontece ao cidado brasileiro no seu cotidiano

    O revoltante retrato da vida urbana do brasil

    E eu no me refiro s ao 175 ou qualquer linha da Central

    GABRIEL o Pensador

    Autntico, 1993.

  • viii

    APRESENTAO

    Mesmo que este trabalho de dissertao para o ttulo de Mestre no seja do tipo a

    resolver, todos os problemas de excluso social ou de segregao espacial causados pelo

    crescimento da tecnologia dos meios de transporte urbano e da expanso espacial e

    temporal das cidades, ou que no me permita revelar totalmente todos os problemas

    socioeconmicos e culturais relevantes da interdependncia entre cidade, sociedade,

    qualidade de vida e deslocamento urbano, fico satisfeito e feliz da experincia e da

    oportunidade de mais uma conquista na minha formao acadmica.

    Porm, este trabalho, com certeza, est dando alguma contribuio humanidade e

    ao mesmo tempo, que contribui ao treinamento e amadurecimento da minha alma.

    Desenvolve-se, no presente trabalho, qualidade de vida e transporte pblico urbano:

    estratgias para melhorar a qualidade do servio de transporte pblico urbano por nibus

    uma abordagem de polticas pblicas da interdependncia entre cidade, sociedade,

    qualidade de vida e transporte pblico urbano.

    O primeiro captulo identifica o problema, coloca a relevncia do estudo, delimita o

    estudo e prope metodologia para alcanar o objetivo: identificar os elementos fundamentais

    genricos, que caracterizam um adequado funcionamento do servio de transporte pblico

    por nibus.

    Salienta-se no captulo 2 os fatores socioeconmicos e culturais do deslocamento

    urbano para analisar a interdependncia entre cidade sociedade, e deslocamento urbano

    com identificao do impacto dos meios de deslocamento sobre a qualidade de vida do

    usurio.

  • ix

    No captulo 3, fazem-se consideraes quanto a busca de alguns fatores de excluso

    social, do impacto da reestruturao do mercado de trabalho e outros indicadores

    socioeconmicos e culturais (como por exemplo, nmero de estabelecimentos escolares,

    comerciais, hospitalares, de centros culturais e de lazer por regio administrativa) sobre

    grupos sociais urbanas do Rio de Janeiro e de Curitiba.

    Algumas experincias internacionais de implementao de gesto da mobilidade ao

    nvel regional e local para um planejamento urbano de transporte so identificadas no

    captulo 4, salientando-se a importncia e a grandeza do planejamento do servio de

    transporte coletivo e o modo de deslocamento das populaes do Rio de Janeiro e de

    Curitiba.

    O captulo 5 analisa a qualidade do servio de transporte por nibus propondo

    medidas ou estratgias serem tomadas para melhoria da qualidade do servio a partir da

    avaliao de oito indicadores de qualidade de servio de transporte pblico urbano.

    Finalmente, no captulo 6, em sntese, abordam-se consideraes especficas de

    qualidade de vida na estrutura da cidade explicitando que a trade pessoas espao e

    tempo formam a base para se compreender a dinmica existencial de um bom ambiente

    urbano, onde o primeiro conta para a percepo de se viver, com sentido de pertinncia e

    integrao numa cidade. Contudo, a qualidade de vida depende fundamentalmente de uma

    organizao social, pois, nas cidades a vida muito mais poltica, e as formas de gesto,

    materializadas em instituies concretas e em uma cultura administrativa, tornaram-se

    essenciais.

  • xFIGURAS E TABELAS

    Figura 2.1 Interdependncia: cidade sociedade deslocamento urbano e meios de

    transporte........................................................................................................ 38

    Tabela 3.1 Repartio dos estabelecimentos de educao, sade, lazer e cultura por

    regio administrativa....................................................................................... 77

    Mapa 1 Municpio do Rio e Janeiro Bairros 1997..................................................... 78

    Figura 3.1 Curitiba Diviso de Bairros e Regionais....................................................... 84

    Tabela 3.2 Indicadores de qualidade de vida em Curitiba................................................ 86

    Figura 4.1 Gerenciamento da mobilidade nvel regional urbano e nvel local........... 93

    Figura 4.2 Distribuio das viagens................................................................................. 102

    Tabela 4.1 Distribuio de deslocamentos por atividades socioeconmicas na RMRJ... 102

    Tabela 4.2 Fluxo de passageiros em horrio de pico....................................................... 103

    Tabela 4.3 Parcela das viagens de coletivos no pico matutino........................................ 103

    Figura 4.3 Modo de deslocamento da populao segundo a renda familiar mensal (R$)........... 108

    Figura 4.4 Repartio no transporte de passageiros da regio Metropolitana do Rio de

    Janeiro............................................................................................................ 109

    Tabela 4.4 Tipo de linhas e capacidade do nibus.......................................................... 113

    Tabela 5.1 Tempo mdio de viagem................................................................................ 127

    Tabela 5.2 ndice de passageiros por quilmetro............................................................ 132

  • xi

    SUMRIO

    INTRODUO............................................................................................................................ 14

    1.1 OBJETIVO FINAL............................................................................................................... 151.1.1 Objetivos intermedirios...................................................................................... 16

    1.2 DELIMITAO DO ESTUDO................................................................................................. 161.3 RELEVNCIA DO ESTUDO .................................................................................................. 171.4 METODOLOGIA ................................................................................................................ 19

    1.4.1 Tipo de pesquisa .................................................................................................. 191.4.1.1 Justificao dos fins da pesquisa .................................................................... 201.4.1.2 Justificao dos meios da pesquisa................................................................. 20

    1.5 JUSTIFICAO DA ELEIO DAS CIDADES DO RIO DE JANEIRO E DE CURITIBA PARA A ANLISE DECASO 201.6 COLETA DE DADOS........................................................................................................... 211.7 TRATAMENTO DOS DADOS................................................................................................. 221.8 LIMITAES DO MTODO .................................................................................................. 22

    TRANSPORTE NA CIDADE: UMA ANLISE SOCIOECONMICA DO CONCEITO DEDESLOCAMENTO URBANO E DOS IMPACTOS DE TRANSPORTE PBLICO URBANO....... 23

    2.1 INTRODUO................................................................................................................... 232.2 CONCEPES TERICAS DA MOBILIDADE E DE TRANSPORTE URBANO.................................... 24

    2.2.1 A percepo socioeconmica e filosfica da mobilidade urbana ..................... 242.2.1.1 Viso socioeconmica da mobilidade urbana................................................... 252.2.1.2 Viso filosfica da mobilidade urbana .............................................................. 25

    2.2.2 Polissemia do termo transporte urbano .......................................................... 262.2.2.1 Viso poltica do termo transporte ................................................................... 272.2.2.2 Socioeconomia de transporte urbano .............................................................. 27

    2.3 INDICADORES DE DEMANDA DE TRANSPORTE URBANO......................................................... 292.3.1 Espao-tempo ...................................................................................................... 29

    2.3.1.1 Agrupamentos de trabalho .............................................................................. 322.3.1.2 Agrupamentos de populao........................................................................... 34

    2.3.2 Produo de valores socioeconmicos pelo deslocamento urbano................. 362.4 PROBLEMAS DE TRANSPORTE NA CIDADE ........................................................................... 39

    2.4.1 Acidentes de trnsito ........................................................................................... 402.4.2 Congestionamento de trfego ............................................................................. 422.4.3 Contribuo para poluio do meio ambiente e uso de energia ....................... 442.4.4 Contribuo para as discriminaes socioeconmicas .................................... 46

    ANLISE DA ESTRUTURA URBANA E DOS INDICADORES DE QUALIDADE DE VIDA NOSMUNICPIOS DO RIO DE JANEIRO E DE CURITIBA................................................................. 49

    3.1 INTRODUO................................................................................................................... 493.2 ORIGENS DA ESTRUTURA URBANA E DAS CARACTERSTICAS SOCIOECONMICAS DO MUNICPIO DORIO DE JANEIRO......................................................................................................................... 50

    3.2.1 Ocupao e uso do solo no Municpio do Rio de Janeiro.................................. 513.2.1.1 Surgimento de Regies Administrativas no incio do sculo XX ....................... 523.2.1.2 Legislao urbanstica do Municpio do Rio de Janeiro .................................... 533.2.1.3 Os regulamentos de zoneamento .................................................................... 553.2.1.4 Impactos socioeconmicos do zoneamento sobre a estrura urbana................. 56

    3.2.2 Qualidade de vida e indicadores socioeconmicos das principais regiesadministrativas do municpio do Rio de Janeiro .............................................................. 59

    3.2.2.1 rea Central e Periferia do Centro................................................................... 603.2.2.2 Regies administrativas de Botafogo, Copacabana e Lagoa............................ 633.2.2.3 Regies administrativas do Rio Comprido, Tijuca e Vila Isabel ........................ 653.2.2.4 Regio Administrativa de Santa Teresa........................................................... 663.2.2.5 Regio administrativa de So Cristvo .......................................................... 673.2.2.6 Zona dos bairros ao longo da Estrada de Ferro Leopoldina ............................. 683.2.2.7 Regies administrativas do Mier, Engenho Novo, Iraj e Madureira............... 703.2.2.8 Regio administrativa de Anchieta................................................................... 71

  • xii

    3.2.2.9 Regio administrativa de Bangu, Campo Grande e Santa Cruz ....................... 723.2.2.10 Regio administrativa de Jacarepagu ............................................................ 743.2.2.11 Regio Administrativa da Ilha do Governador.................................................. 743.2.2.12 Regio administrativa da Barra da Tijuca......................................................... 753.2.2.13 Regio administrativa de Paquet ................................................................... 76

    3.2.3 Origens e caractersticas socioeconmicas de Curitiba .................................... 793.2.3.1 Zoneamento de uso do solo ............................................................................ 803.2.3.2 As princiapais divises administrativas e suas funes.................................... 813.2.3.3 Caractersticas socioeconmicas da cidade de Curitiba................................... 84

    GESTO DA MOBILIDADE E REGULAO DO TRANSPORTE COLETIVO POR NIBUS .... 87

    4.1 INTRODUO................................................................................................................... 874.2 CONCEITOS E APLICAES DA GESTO DA MOBILIDADE........................................................ 89

    4.2.1 Histrico do Gerenciamento da mobilidade ....................................................... 894.2.2 Teoria do gerenciamento da mobilidade............................................................. 91

    4.2.2.1 Gerenciamento da mobilidade no nvel urbano e regional................................ 914.2.2.2 Gerenciamento da mobilidade no nvel local.................................................... 924.2.2.3 Processo de aplicao do MM......................................................................... 944.2.2.4 Exemplo MM em nvel urbano: Mnster, Alemanha ...................................... 954.2.2.5 Exemplo de MM em nvel local: Leicester, Inglaterra ..................................... 97

    4.3 IDENTIFICAO E ANLISE DA SITUAO DO TRANSPORTE COLETIVO POR NIBUS NOS MUNICPIOSDO RIO DE JANEIRO E CURITIBA................................................................................................... 98

    4.3.1 Deslocamentos no espao urbano do Rio de Janeiro........................................ 994.3.1.1 Fluxos das linhas de nibus............................................................................. 994.3.1.2 Situao atual dos transportes urbanos por nibus no Rio de Janeiro ........... 1014.3.1.3 Situao dos nibus ...................................................................................... 1034.3.1.4 Fluxos de passageiros em horrios de picos ................................................. 1034.3.1.5 Problemas operacionais atuais do subsistema de nibus............................... 1044.3.1.6 nibus especiais........................................................................................... 1054.3.1.7 Qualificao do usurio de nibus especiais ................................................. 1074.3.1.8 Principais dificuldades do subsistema de nibus especiais ............................ 1074.3.1.9 Problemas setoriais de integrao intermodal no Rio de Janeiro ................... 1084.3.1.10 Quadro institucional de transporte coletivo do Rio de Janeiro ........................ 110

    4.3.2 A rede integrada de transporte coletivo (RIT) de Curitiba................................ 1114.3.2.1 Os componentes do sistema ......................................................................... 111

    4.3.2.1.1 As linhas .................................................................................................... 1124.3.2.1.2 Os terminais de integrao......................................................................... 1134.3.2.1.3 Linhas complementares ............................................................................. 114

    4.4 O PAPEL DAS AGNCIAS REGULADORAS .......................................................................... 116

    ESTRATGIAS DE MELHORIA DA QUALIDADE DO SERVIO............................................. 118

    5.1 INTRODUO................................................................................................................. 1185.2 INFORMAO NOS TRANSPORTES COLETIVOS POR NIBUS................................................ 120

    5.2.1 Informao Prvia ao Deslocamento ................................................................ 1205.2.2 Informao atualizada no percurso da viagem ................................................. 1215.2.3 As placas de sinalizao na cidade................................................................... 122

    5.3 A CIRCULAO DOS NIBUS ............................................................................................ 1225.3.1 Melhoramento da velocidade comercial dos nibus e sua regulao ............. 1245.3.2 Promoo de circulao suave e mais satisfatria .......................................... 127

    5.4 A INTERMODALIDADE OU INTEGRAO DA REDE DE TRANSPORTE........................................ 1285.4.1 O sistema fsico.................................................................................................. 130

    5.5 O CONFORTO................................................................................................................ 1305.5.1 O conforto fsico ................................................................................................ 1315.5.2 O ambiente e o acolhimento reservado aos usurios ...................................... 133

    5.6 SEGURANA/ISENO DE PERIGO/CIVILIDADE/SADE......................................................... 1335.6.1 Fatores humanos e psicolgicos ...................................................................... 1355.6.2 Fatores ambientais............................................................................................. 1365.6.3 Comportamentos incmodos dos automobilistas ........................................... 1365.6.4 Sade.................................................................................................................. 137

  • xiii

    5.7 O NVEL DO SERVIO E DA OFERTA .................................................................................. 1375.7.1 Freqncia, amplitude e volume da oferta do servio ..................................... 138

    5.8 A ACESSIBILIDADE DAS PESSOAS COM MOBILIDADE REDUZIDA (PMR).................................. 1395.8.1 Inovao e readaptao das vias interurbanas ................................................ 1415.8.2 Servios especializados .................................................................................... 141

    5.9 TARIFAO E RELAO QUALIDADE/PREO NOS TRANSPORTES COLETIVOS POR NIBUS........ 1425.9.1 Inadaptao da tarifao do servio em alguns tipos de usurios ou declientela ............................................................................................................................ 1435.9.2 Compreenso do sistema tarifrio, das modalidades de venda e de controlepelos usurios.................................................................................................................. 144

    6 CONCLUSO E CONSIDERAES FINAIS..................................................................... 145

    BIBLIOGRAFIA ........................................................................................................................ 150

  • 14

    1 INTRODUO

    O transporte exerce sobre a sociedade uma influncia muito maior do que aquela

    comumente percebida. A grande mudana da urbanizao que vem ocorrendo no mundo,

    mostra no somente que maior nmero de pessoas vo morar e trabalhar em grandes

    cidades mas tambm, que o cidado vai precisar percorrer longas distncias para

    satisfazer suas necessidades econmicas, sociais e culturais no espao urbano.

    A maneira como as cidades enfrentam esse problema de demanda de

    deslocamento urbano, vem causando grandes impactos sobre o meio ambiente, a

    eficincia da economia e a dignidade humana nas grandes metrpoles. Tradicionalmente,

    as cidades costumam responder s demandas de viagens com aumento das ofertas de

    meios de transporte.

    Em pases desenvolvidos, isso provocou a construo de estradas para prover o

    crescente nmero de uso de veculos, criando assim uma forma moderna do espao

    urbano expandindo as metrpoles. Contudo, "o uso de veculos a motor oferece

    excelentes vantagens tais como a rapidez e o conforto" (Shalizi, 1994 p.16). Todavia, o

    crescimento do nmero de pessoas que dependem de carros em grandes cidades no

    mundo est se tornando muito mais evidente. Isso ocasiona obstculos,

    congestionamento das estradas que diminui a produtividade econmica, o alto nvel de

    consumo de energia com elevados custos econmicos, sociais e sobre o meio ambiente,

    o aumento das poluies do ar e sonora, acidentes de transito e a excluso social,

    conseqncia do desconforto do servio de transporte oferecido aos pobres.

    Estes problemas de transporte apresentam-se de vrias formas em todos os

    pases do mundo, mas tornam-se particularmente crticos nos pases em

    desenvolvimento, onde a populao urbana cresce rapidamente e a demanda de

    mobilidade por meio de transporte coletivo ultrapassa a oferta do servio.

  • 15

    Nesses pases, a organizao do sistema de transporte pblico urbano apresenta

    muita complexidade, pelo fato de que precisa integrar aspectos fundamentais tais como:

    a densidade da populao, a ineficincia dos transportes de massa, a insuficiente

    ateno prestada ao trfego no motorizado e aos pedestres, e a segurana pessoal.

    Porm, o transporte pblico um dos mltiplos servios que as autoridades municipais e

    governamentais precisam organizar para garantir o desenvolvimento econmico e social.

    Para tanto, as suas capacidades de gesto (explorao e manuteno) das diferentes

    modalidades deste setor so muito limitadas.

    De fato, a gesto do transporte pblico urbano por nibus, uma das modalidades

    mais teis para a maioria das populaes de baixa renda (por favorecer o contato entre

    pessoas, a mobilidade para o trabalho, o acesso educao e sade) passa pelas

    mos de empresas privadas e sofre muito mais quanto qualidade do servio prestado.

    Nesta perspectiva, faz-se necessrio que tal sistema, to importante para economia, seja

    vivel, conforme as regras do meio ambiente e socialmente adaptvel s exigncias das

    classes sociais urbanas.

    Assim, a questo que se pe como desencadeadora da pesquisa a ser levada a

    efeito : como solucionar os principais estrangulamentos da qualidade do servio de

    transporte pblico urbano por nibus?

    1.1 Objetivo final

    Este trabalho tem como objetivo final, identificar os elementos fundamentais

    genricos, que caraterizam um adequado funcionamento do servio pblico de transporte

    urbano por nibus.

  • 16

    1.1.1 Objetivos intermediriosa) Analisar o sistema moderno de servio pblico de transporte urbano por nibus

    referenciado na literatura. Especialmente aqueles fatores relacionados com a

    qualidade do desempenho.

    b) Analisar os novos conceitos de planejamento e controle de gesto de servio

    pblico referenciados na literatura.

    c) Analisar as variveis ambientais que afetam diretamente ou indiretamente a

    demanda do servio pblico de transporte por nibus de duas cidades: Curitiba

    e Rio de Janeiro.

    1.2 Delimitao do estudo

    Entre as inmeras variveis que podem revelar o grau de importncia de um

    planejamento estratgico de servio pblico de transporte por nibus, esse estudo estar

    centrado, fundamentalmente, naquelas relacionadas implementao de um sistema de

    gesto da mobilidade urbana.

    Deste modo, ser dada nfase a uma abordagem qualitativa de variveis referidas

    qualidade de servio do transporte pblico, tais como: a) o valor econmico e social do

    tempo de viagem; b) os impactos socioeconmicos dos meios de transporte sobre a

    qualidade de vida do usurio; c) a relao cidade sociedade qualidade de vida e

    deslocamento urbano; d) os fenmenos de excluso social; d) os tipos de deslocamento

    urbano.

    No que se refere aos aspectos sociais e culturais, uma abordagem qualitativa ir

    enriquecer os resultados do estudo, possibilitando examinar os impactos das variveis

    estudadas, sobre a qualidade de vida do usurio.

    Este estudo pretende elaborar um esboo de planejamento estratgico genrico

    que possa tambm ser aproveitado em pases da frica. Nele sero explicitadas os

    impactos socioeconmicos e culturais a partir de um estudo comparativo do caso do Rio

  • 17

    de Janeiro e de Curitiba. Neste ponto, ser possvel assumir uma postura

    fenomenolgica para explicitar o sentido do planejamento urbano esboado.

    Este trabalho concentra-se no contexto atualmente vigente no Brasil (relao

    usurio operador com a participao do Estado) e busca identificar oportunidades de

    melhoria do sistema atravs dos conceitos de sistema integrado de transporte pblico

    urbano.

    1.3 Relevncia do estudo

    Os governos dos pases em desenvolvimento enfrentam atualmente o desafio de

    se desenvolver e de buscar nveis de qualidade de vida similares aos dos pases

    economicamente avanados. Um tal desenvolvimento passa a ser produto de uma

    adequada qualidade de servios pblicos tais como: sade, educao, segurana,

    moradia e transporte coletivo. Este ltimo permite aos cidados cumprir em tempo real

    com liberdade e facilidades seus deveres cotidianos de trabalho, educao, atendimento

    hospitalar alm de permitir o seu lazer.

    Nessa direo, este estudo alm de realizar uma pesquisa acadmica que

    subsidie reflexes e aes governamentais de planejamento urbano, poder estimular os

    governos a promoverem pesquisas de opinio entre usurios em busca de necessidades

    e de sugestes que contribuam para a soluo e a antecipao de problemas de

    transporte urbano, por nibus.

    A realizao de atividades no tempo previsto um elemento fundamental da

    ativao do processo de desenvolvimento econmico, social e cultural. Nas grandes

    cidades dos pases em desenvolvimento, onde se concentram as atividades

    socioeconmicas e culturais do pas, fcil de constatar que o vasto nmero de

    deslocamentos dirios da populao feito por meio do servio de transporte pblico de

    massa. Ainda pode-se observar que nesses pases os cidados gastam mais tempo do

  • 18

    que os dos pases de economia avanada para chegar ao trabalho, escola e aos

    centros comerciais e de lazer.

    Segundo o socilogo Hermes Ferraz, a durao desse movimento produto de

    trs fatores inevitveis: espao percorrido, tecnologia empregada e liberdade de faz-lo

    na presena de outros. Mas do ponto de vista poltico e administrativo, a perda de tempo

    devida ausncia de polticas de planejamento estratgico de servio de transporte de

    massa e uso do solo. Para tanto, deve-se buscar um planejamento coerente ao

    crescimento demogrfico, urbano e econmico com o surgimento de novas

    oportunidades de trabalho e de atividades sociais e culturais num mercado globalizado.

    Essas por sua vez, exigem do cidado o deslocamento dirio entre dois pontos diferentes

    (casa e trabalho) em um determinado tempo.

    Para tentar resolver o problema de transporte urbano de massa nos pases em

    desenvolvimento, os administradores ao invs de analisar o problema a partir de

    pesquisas cientificas a serem feitas em parceria com as grandes Escolas de

    Administrao, tomam iniciativas sem embasamento cientfico, no alcanando as

    causas profundas do problema. Todos somos bem intencionados, mas boas intenes

    carentes de mtodos adequados a uma boa execuo, podem levar, conforme conhecido

    provrbio, ao caminho do inferno.

    O mtodo "Value Analysis" de Lawrence D. Miles, aplicado na General Eletric,

    que investiga a funo, demonstrou que melhores resultados so obtidos quando

    examinamos o que realmente est acontecendo e no o que pensamos estar se

    passando. A anlise de valor permite resultados melhores que simples estudos de

    melhoramento da qualidade, apresentao ou reduo de custos.

    De fato, a falta de um planejamento estratgico do sistema de transporte afeta a

    produtividade do trabalhador na economia global do pas, o rendimento do estudante e a

  • 19

    criatividade cotidiana que so considerados pelos analistas de pensamento econmico

    como fatores determinantes de crescimento e de desenvolvimento de um pas.

    Contudo, um estudo que d um tratamento especial questo da qualidade do

    servio de transporte pblico urbano por nibus, certamente contribuir para um

    desenvolvimento permanente e aumentar a qualidade de vida nos pases em

    desenvolvimento.

    1.4 Metodologia

    A histria do desenvolvimento da Europa e da Amrica do Norte no sculo XIX e a

    do Leste asitico no fim do sculo passado demostrou as recompensas econmicas da

    formao de um setor pblico efetivo. A edificao de instituies privadas para um setor

    de transporte pblico de massa imensamente difcil como relata o relatrio 1997 do

    Banco Mundial.

    A evidncia oriunda de um leque de pases demostrou que uma burocracia quefunciona bem pode promover o crescimento e reduzir a pobreza. Pode oferecerslidos insumos normativos e oferecer, ao menor custo, bens e servios pblicosessenciais. (World Development Report, 1997 p.35).

    Mesmo nos casos em que existam incentivos para melhorar o desempenho do

    setor de transporte pblico por nibus, formidveis limitaes de informao e

    capacidade muitas vezes frustram a tentativa. Considerando assim essas dificuldades, a

    metodologia pretende, ento, descrever as limitaes quanto aos meios e fins a serem

    utilizados para uma credibilidade do objetivo final da pesquisa.

    1.4.1 Tipo de pesquisa

    Considerando-se o critrio de classificao de pesquisa proposto por Vergara

    (1990), quanto aos fins, a pesquisa foi especificamente, explicativa e descritiva. Quando

    aos meios, ela foi bibliogrfica, documental e de anlise de caso.

  • 20

    1.4.1.1 Justificao dos fins da pesquisa

    Quanto aos fins a pesquisa foi:

    a) Descritiva, porque pretende identificar as caractersticas de um sistema

    eficiente e efetivo de prestao de servio de transporte pblico urbano por

    nibus.

    b) Explicativa, porque tenciona explicar a interdependncia entre cidade,

    sociedade, qualidade de vida e deslocamento urbano formulao e

    coordenao de novas polticas de gesto da mobilidade e da integrao do

    sistema de servio de transporte pblico urbano.

    1.4.1.2 Justificao dos meios da pesquisa

    Quanto aos meios a pesquisa foi:

    a) Bibliogrfica, porque para a fundamentao terica e metodolgica do trabalho,

    foram realizadas investigaes sobre a modernizao do sistema de transporte

    pblico urbano referenciado na literatura.

    b) Documental, porque foi feito uso de documentos de trabalho e relatrios de

    consultorias privadas, no disponveis para consultas pblicas.

    c) Anlise de caso, porque privilegia duas cidades: Curitiba e Rio de Janeiro.

    1.5 Justificao da eleio das cidades do Rio de Janeiro e de Curitibapara a anlise de caso

    Um aspecto importante a se considerar na anlise das caractersticas da

    demanda de transporte para organizao da prestao do servio que os critrios,

    segundo os quais ela feita, variam conforme as diferenas urbanas e scio-econmicas

    das cidades brasileiras.

    notrio que as cidades do Rio de Janeiro e de Curitiba se estruturam do ponto

    de vista urbano, com diferenas de uso e ocupao do solo, com conseqncias na

    distribuio da populao e das atividades econmicas. De fato, os padres de

    deslocamento, os resultados operacionais, derivados da prestao do servio de

  • 21

    transporte pblico por nibus e sua rentabilidade, so, na maioria das vezes,

    diferenciados.

    A cidade de Curitiba especialmente eleita neste estudo por ser uma cidade

    moderna, segundo as regras das organizaes internacionais de urbanizao e por ter

    um sistema de transporte urbano moderno, conforme as regras de planejamento urbano.

    No caso da cidade do Rio de Janeiro, a evoluo nos meios de transporte pblico

    tem uma forte ligao com a dinmica de urbanizao. De fato, o Estado do Rio de

    Janeiro sempre desempenhou funes de regio central, tendo sido capital do Imprio e

    da Repblica por quase 140 anos; necessitando, assim, de um sistema de transportes

    condizentes.

    At o incio do sculo XIX o deslocamento urbano da populao era realizado a

    partir do uso da energia animal (carros de boi e cavalos) e da energia humana (leiteiras

    carregadas por escravos e a p). Em 1808, com a vinda da famlia real para a cidade do

    Rio de Janeiro, os deslocamentos urbanos ganhariam novas tecnologias, com a

    introduo de veculos a roda, que tiveram forte expanso at 1849, com linhas para

    Botafogo, Tijuca, Jardim Botnico e So Cristvo.

    As duas cidades apresentam, ento, todos os elementos fundamentais que

    caracterizam uma estrutura urbana velha (Rio de Janeiro) e nova (Curitiba), para um

    estudo genrico da qualidade de servio de transporte pblico urbano por nibus.

    1.6 Coleta de dados

    A coleta de dados foi da seguinte forma:

    a) Pesquisa bibliogrfica em livros, em revistas especializadas, em relatrios de

    rgos especializados e em jornais com dados pertinentes ao transporte

    pblico urbano. Foram levantadas as principais caractersticas de um sistema

    moderno de transporte coletivo por nibus, a fim de que sejam identificados e

  • 22

    analisados os elementos fundamentais para o adequado desempenho do

    sistema de transporte pblico urbano.

    b) Pesquisa documental nos arquivos do Instituto Brasileiro de Administrao

    Municipal, da Confederao Nacional de Transporte (CNT), do Instituto de

    Pesquisa e Planejamento de Curitiba (IPPUC), da Associao Nacional de

    Transporte Pblico (ANTP), da Secretria de Transporte do Estado do Rio de

    Janeiro e de Curitiba, da Secretria Nacional de Trnsito, etc.

    1.7 Tratamento dos dados

    Para melhorar a qualidade do servio de transporte pblico urbano por nibus os

    dados foram tratados de forma qualitativa, para analisar os dados bibliogrficos e as

    sugestes de alguns especialistas de transporte urbano, e dos usurios de transporte

    coletivo para avaliar a gesto racional e participativa do servio integrado de transporte

    pblico urbano.

    1.8 Limitaes do mtodo

    O mtodo escolhido para a pesquisa, apesar de nos parecer o mais adequado

    para apresentar solues para os estrangulamentos do sistema de transporte pblico

    urbano por nibus, apresenta como qualquer outro, algumas dificuldades referidas

    coleta e ao tratamento dos dados.

    Acreditamos que a primeira dificuldade esteja relacionada amostra escolhida.

    Havia a impossibilidade de realizarmos pesquisa direta com usurios, pois isso a tornaria

    abrangente demais, correndo-se o risco de no terminar no prazo previsto ou implicar

    perda de profundidade. Recorremos, ento, a artigos de jornais que contemplassem

    apenas opinies pblicas de usurios de transporte coletivo por nibus resultantes de

    alguns fatos pertinentes ocorridos no trnsito.

  • 23

    2 Transporte na cidade: uma anlise socioeconmica do conceito dedeslocamento urbano e dos impactos de transporte pblico urbano

    2.1 Introduo

    Observando a mobilidade humana, podemos concluir que existem duas vises

    fundamentais do fenmeno de deslocamento quotidiano. A primeira a da felicidade,

    cada vez mais rara, baseada no cumprimento da democracia, na criatividade social,

    cultural e econmica. A segunda a viso pessimista que faz da cidade um lugar de

    poluio, de excluso e de mal-estar social.

    Enquanto o avano da tecnologia de informao, sob a forma de teleservio,

    teletrabalho, teleconferncia, telepresena etc., est acabando com a noo de espao e

    tempo, fazendo retornar a cidade na sua forma original de Cidade Compacta, os

    cidados continuam majoritariamente sentindo a necessidade de deslocar-se.

    O transporte urbano, cuja concepo est inseparavelmente ligada da cidade,

    est exposto tambm a duas caractersticas distintas. O automvel, instrumento de

    liberdade, est acusado de todos os pecados urbanos (Amar Georges, 1998): poluente,

    individualista e devorador de espao, torna-se o smbolo de embolia e de egosmo

    urbano. O transporte coletivo, que deveria estar fora deste tipo de acusao, suspeito

    de provocar a dissociao e a extenso espacial da cidade, de promover distncias

    geogrficas e sociais sem oferecer eqidade e qualidade de vida.

    A irregularidade da maior parte das concepes da cidade est na maneira como

    tratam da ligao cidade - transporte ou da significao do transporte na cidade.

    Segundo o urbanista francs Amar Georges, porque no se pensa a cidade como

    sendo um sistema de movimento onde se difcil tratar de problemas de deslocamento

    urbano.

  • 24

    Partindo da concepo da cidade como um sistema de movimento, este captulo

    pretende abordar, a partir de um estudo exploratrio, os aspectos sociais, culturais e

    econmicos do deslocamento quotidiano, possibilitando examinar as caractersticas da

    demanda de transporte coletivo para a qualidade de vida dos usurios.

    2.2 Concepes tericas da mobilidade e de transporte urbano

    Durante muito tempo, a cidade foi considerada um conjunto de atividades

    econmicas localizadas no espao e o transporte, um elemento ativo de sua extenso.

    Atualmente, o zoning, ou plano urbano, mostra a cidade sob a forma de uma tabela na

    qual as diversas atividades so enumeradas de maneira distinta. Residncias, indstrias,

    comrcio, escolas, pontos de lazer so dispostos em forma de plano geogrfico. Assim, o

    transporte aparece tanto como conseqncia deplorvel quanto como condio inevitvel

    do crescimento da cidade e distribuio espacial das atividades, funes e servios que a

    constituem.

    Desta forma, est claro a existncia de uma interao entre mobilidade humana e

    transporte urbano. Assim, desenvolveremos, nessa parte, a teoria da mobilidade e de

    transporte urbano, possibilitando analisar as diferentes percepes do conceito de

    movimento ou deslocamento quotidiano em uma cidade.

    2.2.1 A percepo socioeconmica e filosfica da mobilidade urbana

    Partindo de uma anlise descritiva do contato do homem sujeito mvel com seu

    prprio movimento no espao e no tempo, ser considerado nessa percepo, a

    causalidade do dinamismo e das transformaes do movimento para dar um sentido

    socioeconmico e filosfico mobilidade.

  • 25

    2.2.1.1 Viso socioeconmica da mobilidade urbana

    Segundo o francs Pierre Lassave, especialista em questes urbanas, o

    conhecimento das prticas e dos significados do deslocamento no espao e seus

    determinantes constituem, sem dvida, o eixo mais visvel e o mais durvel de pesquisa

    em socioeconomia de transporte. Os problemas encontrados neste campo giram,

    essencialmente, em torno de uma nica idia central: a da mobilidade. Ela constitui um

    objeto especfico e consubstancial ao campo dos transportes.

    Assim, grandes pesquisadores da socioeconomia do transporte perceberam

    quatro fenmenos fundamentais da mobilidade ligados aos conceitos de espao e tempo.

    a) Em uma viso marxista, a mobilidade interpretada como um instrumento

    de mobilizao da mo-de-obra. Esta percepo foi encontrada nos

    estudos realizados sobre a cidade de Dunquerque, na Frana;

    b) Segundo a Escola Escandinava de Geografia, a mobilidade percebida

    como um instrumento de realizao de um programa de atividades

    localizadas no espao e no tempo;

    c) Sob o ponto de vista econmico, a mobilidade percebida em termos de

    modo de vida e de diviso social do espao;

    d) Os socilogos possuem uma viso psicolgica ou psicanaltica da

    mobilidade, a qual determina o comportamento e o sentimento do

    indivduo submetido ao deslocamento.

    2.2.1.2 Viso filosfica da mobilidade urbana

    Filosoficamente analisando, a mobilidade constitui um conceito produtivo que

    integra o mvel e o imvel, o movimento e o repouso ou a tranqilidade do esprito. Esta

    observao do filosofo Deleuze coloca em questo duas dimenses opostas: o

  • 26

    movimento e a tranqilidade. Considere tambm o acontecimento de um fato de

    produo.

    Desta forma, a mobilidade transforma-se em produo. Ela no envolve mais

    somente o conceito temporal ou espacial, mas tambm o de produtividade ou de

    produo. A mobilidade chega ento a questo de criao de valor para todos os nveis:

    material, fsico, poltico, cultural, econmico e outros.

    Este aspecto da mobilidade como um dinamismo de produo nasceu de uma

    concepo americana do progresso, que segundo a qual reside na motorizao que

    permite o crescimento do potencial das atividades dos indivduos.

    Na Europa, especialmente na Sua, Frana, Inglaterra e Alemanha, o tema da

    mobilidade tomou um lugar importante nos programas nacionais de pesquisas sobre

    cidade e transporte por meio de estudos relativos ao tratamento dos custos sociais da

    mobilidade e da no mobilidade. Sob este prisma, permitida ento uma articulao

    entre a oferta e a demanda de transporte.

    2.2.2 Polissemia do termo transporte urbano

    Pesquisas em socioeconomia de transporte mostram que h dificuldades de

    interpretao na difuso dos conhecimentos neste setor notavelmente pelos

    responsveis polticos. O socilogo Alain Bieber revela que tudo que faz uma diferena

    de tratamento social dos grupos na rea de transporte no uma mercadoria fcil para

    vender (Alain Bieber, 1998).

    Esta confuso poltica da difuso e interpretao dos conhecimentos sobre o

    transporte dificulta muito a metodologia de pesquisa nesta rea.

  • 27

    importante ento analisar a polissemia ou o sentido negativo, dado por

    interpretaes polticas, e o sentido positivo, considerado pela socioeconomia do termo

    transporte, a fim de possibilitar as limitaes da pesquisa.

    2.2.2.1 Viso poltica do termo transporte

    Durante uma anlise cientifica sobre o transporte, o pesquisador precisa tomar

    conscincia do fato de que as instituies da rea de transporte s podem perceber os

    resultados simples, no por no terem capacidade intelectual de analis-los, mas por

    estarem na obrigao de traduzir estes resultados em termos polticos. Outrossim, uma

    transformao dos resultados impe uma simplificao considervel da realidade.

    De outro lado, preciso lembrar que na rea de transporte o modo de introduo

    de dados estatsticos na cena poltica no anedtico porque alguns so simplesmente

    esquecidos ou interpretados no sentido doloso.

    Quando os eleitos lem que a poro de carro no mercado de 95%, este dadovai reforar a potncia de carro na sua percepo e quando um relatrio depesquisa revela que uma modalidade forte, esta informao torn-la muito maisforte ainda e quando se diz que ela fraca, ela se torna muito mais fraca. (AlainBierber, 1998).

    2.2.2.2 Socioeconomia de transporte urbano

    As literaturas sobre o transporte mostram, alm da dimenso poltica que dificulta

    as delimitaes do estudo, diversas dimenses muito mais abrangentes que abordam o

    aspecto socioeconmico ou positivo do termo transporte. Esta viso aquela percebida e

    comentada por gegrafos, socilogos, antroplogos e urbanistas que revelam a

    importncia do transporte como um fator determinante na eqidade e na qualidade de

    vida do cidado.

    Neste sentido, existem vrias definies de transporte em relao s atividades e

    funes de uma cidade que foram percebidas, por vrios pesquisadores em

    socioeconomia de transporte:

  • 28

    a) O transporte o que liga as funes urbanas ao centro e periferia;

    b) Os transportes, como novas tcnicas de comunicao, constituem uma

    tentativa de criar novas interaes, de criar novos modos de relao entre

    as infra-estruturas estticas. uma tentativa desesperada de colocar o

    espao em movimento, de tornar o espao dinmico;

    c) Os transportes so um meio de comunicao das classes sociais;

    d) Os transportes so uma pequena sociedade que oscila durante um

    movimento determinado e que empenha uma negociao permanente de

    si com outros;

    e) Os transportes so um meio de socializao que permite passar de um

    modo de vida a um outro, de uma forma de civilidade a uma outra forma de

    civilidade;

    f) Os transportes esto no centro da organizao da vida familiar; eles esto

    no lao de uma dupla jornada de trabalho para as mulheres;

    g) Os transportes articulam no somente o centro e a periferia, mas tambm

    so uma passarela entre o interior e o exterior; esta distino cobre o

    espao privado e o pblico;

    h) Os transportes interpretam a evoluo dos valores individuais e coletivos.

    Todas estas definies de transporte, em geral, colocam em questo a dimenso

    social da vida humana. E quando se pensa em transporte, se pensa ento em um lugar

    e em algum ou alguma coisa que vai de um lugar a outro. Segundo a sociloga Sylvia

    Ostrowetsky, toda nossa reflexo reside, parece-me, na capacidade de mexer com a

    polissemia e a manter os dois plos de significado das formas espaciais e sociais (Sylvia

    Ostrowetsky, 1998).

  • 29

    2.3 Indicadores de demanda de transporte urbano

    A partir da anlise anterior, podemos concluir que a teoria de transporte e de

    mobilidade urbana envolve, principalmente, os conceitos de espao e tempo, que so

    fatores constitutivos da vida social e das relaes humanas de uma cidade.

    A mobilidade espacial exprime mais do que um modo de uso dos espaos, um

    deslocamento de atividade atividade, de origem desatinao. Ela assinala as

    hierarquias sociais, os reconhecimentos, as convivncias identitrias que do fora e

    poder ao espao urbano. Ela revela as modalidades de inscrio do conjunto das

    populaes no espao urbano. Nesta inscrio esto ameaadas as ordens e hierarquias

    sociais estabelecidas.

    O estudo de transporte urbano que envolve a mobilidade urbana nos convida a

    uma antropologia do movimento que precisa tomar conta, simultaneamente, de trs

    nveis de relaes espao-tempo que caracterizam a mobilidade: os deslocamentos de

    proximidade, expresso dos ritmos sociais de quotidianeidade e incentivadores

    permanentes do vnculo social especfico; as mudanas de casa no interior do espao de

    acolhimento ou de recepo, no tempo de uma existncia, e a extenso das vizinhanas

    e de fidelidade identitria.

    Essa antropologia do movimento nos conduz a uma reviso de conceitos que a

    teoria de transporte e de mobilidade urbana envolve, com os indicadores da demanda de

    transporte.

    2.3.1 Espao-tempo

    As primeiras pesquisas aprofundadas sobre a mobilidade quotidiana realizadas na

    dcada de 50 em grandes cidades como Paris, Londres, Nova York e outras s tomavam

    conta dos deslocamentos de trabalho com a inteno de reduzi-los. Mas nesta poca,

  • 30

    tudo se passava como se o horizonte fosse o da sociedade sedentria, cada um no seu

    bairro, e o nvel da mobilidade era quase inexistente. Logo no incio da dcada de 60,

    duas representaes se acrescentaram e finalmente se confundiram: o mito histrico de

    bairro e o mito moderno de racionalizao econmica da densa povoao das cidades.

    Os deslocamentos quotidianos aumentavam, diversificavam-se e alongavam com o

    desenvolvimento funcional das cidades; o impulso da periferia urbana amplificou tanto

    bem quanto mal. Da vem a idia de organizao territorial e dos transportes coletivos

    nas sociedades onde o deslocamento tornou-se importante. Os administradores pblicos

    comearam a pensar de maneira autnoma sobre o deslocamento, o movimento, os

    meios de mobilidade com relao estabilidade na manuteno do espao urbano. Mas,

    de fato, o que representa ento um espao-tempo na dimenso urbanstica?

    O espao urbano primeira vista considerado um espao de passagem, de

    muito trnsito, do viajante; um espao onde indivduos embora no se conheam, podem

    coabitar (Sylvia Ostrowetsky, 1998). O espao urbano percebido ento como um lugar

    de encontro, de pluralidade e no de circulao e conexo ao sentido estrito. Portanto,

    nossa anlise pretende pensar o espao-tempo na sua dimenso urbanstica com relao

    sociedade de consumo.

    Na sociedade de consumo, os indivduos, as famlias e os grupos sociais no

    pedem somente os bens e os servios pelo uso que deles fazem, mas tambm porque

    so signos de prestgios e de distino de classe social. Esse ponto de vista esclarece a

    atual ocupao do espao urbano e da repartio dos deslocamentos quotidianos que

    no podem mais ser explicados pela teoria da necessidade.

    Nesta sociedade anteriormente citada, a necessidade estrita existe somente

    quando a execuo ou realizao de uma atividade depende de um deslocamento.

    Enquanto no houver viagem quotidiana, no haver trabalho; enquanto no houver

    deslocamento escolar, no h escola, no havendo deslocamento para lazer, no h

  • 31

    diverso, no existindo deslocamento para o supermercado, no haver compras, no se

    fazendo deslocamento hospitalar, no existir consulta do doente e assim por diante.

    Este nvel de embarao existe sempre, com suas sanes imediatas, mas isso no

    permite explicar os deslocamentos dependentes das estratgias de consumo ou de

    constituio de capital cultural e social. As compras em um supermercado X em vez de Y,

    ir escola X ao em vez de Y, visitar um cento de lazer X ao em vez de Y. Nestes casos,

    so os deslocamentos que dependem dos objetivos e desejos que os indivduos fixam.

    No mbito da planificao como atitude profissional, o elemento humano

    habitualmente considerado como algo que apenas necessita ser alojado e deslocar-se do

    e para o trabalho e para as compras. Estas tornam-se cada vez mais concentradas em

    supermercados gigantes, raramente acessveis seno de automvel, configurando o

    desaparecimento da forma tradicional de abastecimento em pequenas lojas de bairro,

    substituda pelo mtodo impessoal de venda e retalho ao estilo das linhas de montagem.

    Na cidade do Rio de Janeiro, grande parte da planificao sofre os efeitos

    profundos de no levar em considerao que a comunidade carioca no apenas

    constituda por indivduos de classe alta e mdia, que podem dispor de grande nmero

    de prprio meio de deslocamento para seu acesso ao trabalho e lazer. Mas tambm por

    crianas, mulheres que trabalham principalmente em casa ou cuja carreira se reparte

    entre perodos fora de casa, desempregados, pessoas idosas e impossibilitadas, pessoas

    para quem o acesso a todo o tipo de atividade socioecomica e cultural no espao urbano

    depende de transporte pblico coletivo.

    Como se passa com a habitao, as polticas de transporte pblico tambm pouco

    consideram os efeitos que podem ter sobre a qualidade de vida do usurio. Assim, uma

    boa rede de transporte coletivo permite mais opes, quer aos usurios, quer aos no

    usurios de automvel (que sero as mesmas pessoas em horas diferentes); reduz o

    congestionamento de trnsito e diminui os danos ecolgicos; facilita o escoamento das

  • 32

    mercadorias e liberta os utentes e outros viajantes de uma certa presso psicolgica

    (Itopkin e Pickup, 1985).

    O tempo, to fundamental quanto o espao, encerra a essncia e toda a realidade

    da vida; constitui uma durao que estabelece uma consonncia entre o tempo do

    homem material e concreto, com o tempo natural, tornando-se uma quantidade e, como

    no pode ser separado da vida, esta se submete s suas regras (Elul, 1968, pp. 335-

    336), pois ao contrato do espao sobre o qual se pode atuar, o tempo caminha

    inexoravelmente, fugindo ao controle do homem (Hermes, 1998, p.11).

    Na atual organizao da vida urbana industrial, em que o homem exerce suas

    atividades econmicas em lugares diferentes, trabalhar e morar, ele se desloca

    diariamente entre esses dois pontos dentro de um determinado tempo e a durao desse

    movimento produto de trs fatores inevitveis: o espao percorrido, a tecnologia

    empregada e a liberdade de faz-lo na presena de outros (Hermes, 1998, p.11).

    Partindo dessa observao de Hermes, consideraremos o conceito de espao-

    tempo como indicador de demanda de transporte, e a seguir, analisaremos, dois

    principais fatores que explicam a heterogeneidade das origens e destinos dos

    deslocamentos urbanos da populao: os agrupamentos de trabalho determinados pelo

    espao econmico e os agrupamentos de populao determinados pelo espao social

    residencial.

    2.3.1.1 Agrupamentos de trabalho

    Os agrupamentos de trabalho so definidos como: nmero de centros comerciais,

    industriais, escolares e de lazer, considerados aqui como um conjunto de espao

    econmico.

  • 33

    Contrrio cidade histrica, o espao urbano hoje funcionalmente dividido em

    grandes distritos por diferentes uso, tais como residenciais, educacionais, comerciais, de

    lazer e de cultos.

    Na verdade, a constituio de agrupamentos de trabalho, por fins econmicos ou

    no, exige a reunio de seus integrantes presidentes, diretores, chefes, auxiliares,

    trabalhadores, estudantes, professores, fregueses, domsticos de qualquer idade em

    um dado local e em uma determinada hora, procedentes de todos os locais, dispersos

    por toda a rea urbana. Essa reunio tem incio nas primeiras horas do dia e seus

    componentes servem-se de todos os meios de transporte colocados sua disposio:

    metr, nibus, barcas, txis, bondes, caminhada a p, e carros particulares no caso da

    cidade do Rio de Janeiro.

    Tais meios, nesta hora, exercem uma ao centralizadora provocando

    congestionamentos e perdas de tempo. Segundo uma pesquisa da conjuntura

    econmica, nas grandes cidades brasileiras a perda de tempo chega at 1.400 horas por

    ano e no Rio, por exemplo, uma viagem em nibus do Centro da cidade a Copacabana,

    que nos anos 80 podia ser concluda em 15 minutos, estende-se atualmente por mais de

    45 minutos ou uma hora, dependendo das condies de trnsito nas praias do Flamengo

    e Botafogo e na avenida Atlntica. (Teixeira, 1999, pp. 35-38).

    Os agrupamentos de trabalho dissolvem-se nas ltimas horas do dia, utilizando-se

    dos mesmos meios de transporte que ento exercem funes integrantes pelos diversos

    locais de suas moradias.

    evidente que cada agrupamento de trabalho no tem seus objetivos voltados

    para si mesmo, porm, todos eles atuam em relaes uns com os outros, mtuo

    relacionamento esse que, para ser eficaz, deve ser levado a efeito no mesmo tempo.

  • 34

    2.3.1.2 Agrupamentos de populao

    Nesse caso, os agrupamentos de populao so definidos pelo nmero de

    residncia por bairro, com equipamento de unidade de vizinhana1, tratando-se de uma

    repartio geogrfica da populao urbana.

    Dando prioridade s necessidades bsicas humanas tais como sade e abrigo, no

    que concerne implementao do modelo racionalista e generalista, outras

    necessidades humanas foram ignoradas no planejamento urbano da cidade do Rio de

    Janeiro. Nas cidades modernas, industrializadas, onde o homem vive sem amigos,

    annimo e s na multido, em permanente estado de estresse, torna-se um introvertido

    para aliviar suas tenses (Ferrari, 1979, p. 299). Essa introverso, em forma extrema,

    origina a esquizofrenia. O individualismo acentuado do urbanista, caracterizado pelo

    cada um para si e Deus para todos na desenfreada luta pela vida, , pois, uma

    inevitvel conseqncia do processo de urbanizao. O sonho suburbano de morar em

    casas isoladas, amplas, em locais afastados da cidade uma fuga realidade e uma

    forma de introverso que pode ser o incio de uma liberdade.

    Desde os meados da dcada de 30, os planejadores urbanos, pretendendo

    restituir cidade os grupos primrios2, imaginaram fazer dela um somatrio de

    pequenas comunidades criadas base da idia de vizinhana. Surge ento a cidade

    polinucleada, que, imitando o crescimento dos tecidos vivos, sadios, deve crescer sempre

    1 Inspirada em EBENEZER HOWARD, a idia de unidade de vizinana foi, pela primeira vez,explicitamente proposta por Clarence A. Perry, em 1923.2 A sociologia distingue entre os diversos grupos humanos ebsicos: primrio ou comunidade esecundrio ou sociedade. O primrio um agregado social em nmero relativamente reduzido,cujos membros esto intimamente relacionados e que se caracteriza por um intenso grau decooperao e associao. Este grupo caracterizado pela homogeneidade cultural entre seuscomponentes e um gnero de vida caracterstico.O grupo secundrio um aglomerado social cujos componentes, em elevado nmero, associam-se em virtude de interessados, instrumentais e impesseais e, muitas vezes indiretos, hheterogeneidade cultural entre seus componentes. So exemplos de agrupamentos depopulaes definidos de acordo com os critrios sociais.

  • 35

    pela agregao de novas clulas (novos ncleos urbanos) e no pela inchao ou

    crescimento ilimitado de uma nica clula original.

    Dos escales urbanos, a unidade de vizinhana (U.V.), neihbourhood unit por

    assimilar-se, estruturalmente, ao tradicional bairro e por comportar, at certo ponto, uma

    vida autnoma, tornou-se o ncleo bsico da cidade polinucleada.

    A U.V. predominantemente residencial, sendo definida e delimitada por seu

    equipamento bsico: a escola primria (que comporta crianas de 7 a 14 anos). Outro

    equipamento importante da U.V. o comrcio local representado modernamente pelo

    shopping center. O arquiteto americano Perry A. Clarence em sua obra Housing for the

    machine age em 1929, delimitava e dimensionava a U.V. em funo da escola primria

    e, consequentemente, da capacidade fsica de a criana locomover-se com segurana e

    sem cansar-se, para alcan-la. Fixava a distncia mxima de qualquer ponto da U.V.

    escola, em torno de 800m a 1.200m, o que lhe daria uma rea mxima oscilando entre

    200 e 450 hectares. Para dar segurana caminhada da criana rumo escola,

    recomendava que vias de trnsito de passagem no adentrassem a U.V., devendo

    apenas tangenci-la. Segundo ainda Perry A. Clarence, a U.V. deveria ter, alm da

    escola primria, um centro comunal para uso das crianas e adultos, composto de: clube,

    cinema, biblioteca, casa paroquial, recreao, etc.

    O equipamento de uma U.V. funo de seu tamanho, dos hbitos sociais da

    comunidade e de sua distncia ao centro do escalo imediatamente superior ou da

    cidade. Se est prxima de um centro que tenha cinemas, biblioteca, postos de sade,

    etc., no ser necessrio que possua tambm esses equipamentos. Naturalmente,

    excluem-se da U.V. os equipamentos que exigem para seu pleno funcionamento

    populaes maiores que a sua, tais como: teatro, museus, colgios, escola superior,

    estdio esportivo, grandes lojas, comrcio especializado etc.

  • 36

    No h populao tima para a U.V., pois deve ser tal que permita, no mnimo, a

    instalao de uma escola primria cujo tamanho excessivo no provoque sua

    desintegrao, pela duplicao de equipamentos comunais.

    As dimenses espaciais da mobilidade adquirem uma significao social quando

    se analisa o movimento que conduz dia-a-dia pessoas da periferia ao centro.

    2.3.2 Produo de valores socioeconmicos pelo deslocamento urbano

    Ao lado do tempo e das prticas culturais, o trabalho uma tarefa de primeiro

    plano no comportamento humano, visto que representa um tempo comprometido, com

    seus efeitos induzidos pelos transportes. O trabalho representa tambm a expresso de

    compromisso social atravs dos pequenos chefes, do patro, da folha de pagamento, do

    medo de desemprego (Franois Lapoix, 1991, p.122).

    Bem recentemente, pesquisadores mostraram que todos os cansaos do ser

    humano eram da mesma natureza e tenham uma dimenso social. Porm, o indivduo

    mais cansado durante um processo de produo aquele que depende de um trabalho

    mal- remunerado e que usurio de transporte coletivo de longa distncia porque, alm

    de tudo, mora na periferia.

    Os transportes tm uma influncia importante, muitas vezes ignorada, sobre as

    questes socioeconmicas. No ponto de vista econmico, o sistema de transporte urbano

    o aparelho respiratrio e circulatrio do rgo econmico urbano porque contribui para

    a distribuio da mo-de-obra, dos bens e servios nos centros industriais e comerciais

    do espao econmico.

    Assim, o acesso aos transportes coletivos, como evidente, tem uma grande

    influncia nas distncias para o trabalho nos centros industriais, comerciais e, por

    conseguinte, nas possibilidades de trabalho para as pessoas que vivem em zonas

  • 37

    perifricas, embora, em si mesma, a mobilidade do trabalho no espao econmico faz

    com que um grupo de pessoas desloquem-se livremente do local onde se encontram

    para o stio onde trabalham. Portanto, na realidade, as pessoas ponderam com cuidado

    as perdas decorrentes das deslocaes do trabalho para casa, especialmente quando se

    trata de um novo trabalho sem garantia de segurana. Isso indica claramente que a

    mobilidade da mo-de-obra necessria como um fator de produo de valor

    socioeconmico.

    Na cidade do Rio de Janeiro por exemplo, a populao das periferias urbanas e

    dos subrbios trabalha no Centro da cidade e depende em sua totalidade de transporte

    coletivo por nibus. E ao fio do tempo, empregos de fabricao e de servios foram

    criados nas periferias, em proximidade s estaes das diversas redes de transportes

    coletivos mas, mesmo assim, isso no suscitou uma diminuio notvel da mobilidade de

    trabalho.

    Pressionada pelas tarifas excessivas e pelo prolongado tempo de viagem, a

    populao mais carente ocupa as reas de risco de propriedade estatal ou indefinidas

    mais prximas dos centros comerciais. "No Rio de Janeiro, muitas pessoas dormem na

    rua porque a passagem entre o local de trabalho e o de moradia absorveria grande parte

    do salrio (Saravia, 1997 p. 72).

    Simultaneamente, acontece um fenmeno inverso: nas regies metropolitanas do

    Brasil h um crescimento assustador de uso de carros prprios ocasionado pelo aumento

    da renda familiar do brasileiro de classe mdia, no incio do plano real, em 1994, pelo

    comportamento de liberdade do povo brasileiro ao dispor de seu prprio meio de

    deslocamento e pela m qualidade do servio de transporte coletivo por nibus. H

    tambm, uma degradao do uso de transporte coletivo por nibus no Rio de Janeiro,

    bem como aumento do congestionamento, que favorece um desperdcio de tempo e de

    energia de trabalho.

  • 38

    A mobilidade considerada por alguns autores como resultante de um estado de

    desenvolvimento, um consumo final devido aos recursos disponveis que se medem por

    meio de indicadores tipo PIB ou um fator de desenvolvimento atravs da funo de

    cmbio.

    Uma anlise sociolgica leva a pensar que os deslocamentos dos trabalhadores

    so mais penalizados pelo tempo do que pelo gasto operado sobre o oramento familiar.

    O desenvolvimento econmico de um pas medido pela rapidez e densidade de

    deslocamento das pessoas, dos bens e servios no seu organismo. Este deslocamento

    pressupe que um esforo e certa durao entre o momento de partida e o de chegada

    requerem um custo, chamado custo de transferncia, que deve ser tomado em conta na

    produtividade.

    A palavra produo, no sentido econmico, envolve toda atividade que gere

    utilidade e, por conseqncia, cria um valor. A funo principal do transporte mover

    passageiros ou bens do local onde esto para onde preferem estar ou para onde seu

    valor relativo alto. Esta anlise dos diferentes aspectos socioeconmicos do transporte

    ou do deslocamento na cidade poder ser resumida da seguinte forma na figura 2.1.

    Figura 2.1 Interdependncia: cidade - sociedade - deslocamento urbano e meios de transporte

    Cidade

    TRANPORTE OUDESLOCAMENTO

    URBANO

    Sociedade

    A PBICICLETACARRONIBUSTXIMETRBARCASTRENSHELICPTERO

    TRABALHOLAZERESCOLAHOSPITALCULTOCOMPRASVISITASFAMILIARES

    VALORECONMICO

    VALOR SOCIAL

    TEMPOESPAO

    (DISTNCIA)

    CLA

    SS

    ES

    OC

    IAL

  • 39

    2.4 Problemas de transporte na cidade

    O objetivo tcnico e a tarefa bsica de um sistema de transporte deslocar

    pessoas e cargas de um lugar a outro (Hermes Ferraz, 1998). No mbito de transporte

    pblico urbano por nibus, esta finalidade assume uma importncia singular na medida

    em que atende parcela significativa da populao urbana que cativa deste transporte

    para realizar os seus deslocamentos entre moradia e trabalho.

    Segundo Antonio L. Lindau, professor da Escola de Engenharia da UFRGS3, o

    setor de transportes de passageiros tem grande dependncia do Estado na medida em

    que este fixa polticas, certifica, estabelece contratos, normas, procedimentos e tarifas,

    gerencia e at mesmo opera vrios sistemas de transporte pblico. No setor de

    transporte pblico urbano por nibus, percebe-se uma gama de problemas que leva

    deteriorao dos nveis de servio ofertados aos usurios e que influencia negativamente

    tanto a qualidade de vida do cidado quanto os nveis de produo econmicos, sociais e

    culturais. Nos pases em desenvolvimento, as mltiplas facetas da m qualidade do

    transporte pblico incluem a manuteno imprpria do material rodante, a falta de

    cumprimento de horrios, a pavimentao deficiente e insuficiente das rotas por onde

    circulam as linhas de nibus etc.

    O enfoque de uma pesquisa de qualidade precisa ento ser muito detalhado. Faz-

    se mister detectar, por exemplo, o que os diferentes grupos de usurios tm como

    expectativa ao transitarem pelos vrios trechos de uma determinada linha operada por

    uma empresa privada ou estatal. Como afirma Creighton (1970, p. 6): "at any given time,

    then, we can fairly define transportation problem as the summation of the things which

    people dont like about transportation", em outras palavras em qualquer momento

    oportuno podemos amplamente definir, o problema de transporte como a soma de todas

    as coisas que as pessoas no gostam do transporte.

  • 40

    Assim a seguir sero analisados de forma genrica, alguns destes problemas

    inerentes qualidade do servio de transporte pblico urbano por nibus.

    2.4.1 Acidentes de trnsito

    No mundo inteiro, o acidente de trnsito considerado como o pior dos problemas

    de transporte. Em 1993, cerca de 885.000 pessoas morreram de acidente de trnsito4. A

    maioria das mortes ocorrem nos pases em desenvolvimento e "o acidente de trnsito a

    causa mais importante da morte no grupo da populao economicamente ativa do

    mundo" (Alan Ross and Mukami Mwiraria, 1992, p.4). Em geral, o ndice de acidentes de

    trnsito e de pedestres continua sendo mais alto nos pases em desenvolvimento (Alan,

    1992, p.1). Segundo um relatrio do Banco Mundial na ndia, por exemplo, a taxa de

    morte nas estradas (por 1.000 veculos) 18 vezes mais alta do que a do Japo,

    aproximando 60.000 mortes por ano5.

    A cada ano, na Unio Europia, 55.000 pessoas morrem, 1,7 milhes ficam

    feridas e 150.000 tornam-se permanentemente incapacitadas por causa dos acidentes de

    trnsito.6

    Nas ltimas dcadas, o ndice de acidente de trnsito tem crescido muito nas

    reas urbanas da frica Ocidental. Assim confirma uma pesquisa feita pela revista Jeune

    Afrique Economie: "La route en Afrique tue davantage que le SIDA, voire le paludisme."7

    (Ali Biyo, 1998, p.24). Ainda a mesma pesquisa revela que no Senegal 2.825 pessoas

    morreram de acidente de trnsito em 1995. Porm, neste pas o nmero de vtimas

    3 Por referncia da UFRGS: Universidade Federal do Rio Grande do Sul4 WORLD HEALTH ORGANIZATION (WHO). The World Health organization report 1995:

    Bridging the Gaps. Geneva WHO, 1995, p. 19.5 THE WORLD BANK. India Transport sector: Long Term Issues. Report N 13192- In

    infrastruture Operations Division, Country Department II, Washington, D.C., the World Bank,1995, p.iv.

    6 ORGANIZATION FOR ECONOMIC CO-OPERATION AND DEVELOPMENT (OECD) AND THEEUROPEAN CONFERENCE OF MINISTERS OF TRANSPORT (ECMT). Urban Travel andSustainable Development. Paris, OECD and ECMT, 1995, p.31

  • 41

    multiplicou-se ao longo dos anos. Desde o dia 19 de maro de 1958, data do primeiro

    acidente registrado, o nmero de 778 mortes passou para mais de 13.000 em 1994. Em

    1996, a freqncia chegou a mais de sete acidentes registrados por dia. Em Benin, em

    1996, 412 pessoas morreram de acidente de trnsito, contra 321 no ano anterior e o

    nmero de feridos passou de 1.406 para 2.251 no mesmo perodo. Togo o pas que

    registra maior nmero de acidentes de trnsito por ano, cerca de 3.000 a 4.000, com

    maior nmero de mortes.

    No Brasil, apesar dos esforos de responsabilidade administrativa dos governos

    de Estados e Chefes de Municpio, o ndice de acidentes de trnsito continua sendo alto.

    Segundo um relatrio da ANTP8, em 1994, o Departamento Nacional de Trnsito

    registrou mais de 22 mil mortes e mais de 330 mil feridos no trnsito do pas inteiro. Nas

    grandes cidades, o maior nmero de mortes, cerca de 60%, est na condio de

    pedestres, "atestando assim a violncia do trnsito brasileiro"9.

    De maneira geral, dois fatores podem explicar a causa dos problemas de

    acidentes de trnsito: a questo da irresponsabilidade administrativa dos governos e a

    questo da falta de conscientizao coletiva dos motoristas e pedestres. A

    responsabilidade administrativa se demonstra pela incapacidade financeira e as

    carncias de todas as ordens dos pases em desenvolvimento: a falta de infra-estruturas

    rodovirias adequadas ou submetidas a uma degradao acelerada; a velhice da

    tecnologia empregada especialmente na frica; impossibilidade de controle de alto nvel;

    falta de coordenao das aes entre pases; falta de rigor no controle das polticas de

    preveno e de represso; falta de dispositivos mais sofisticados de sano; falta de

    sensibilizao pontual e provavelmente falta de vontade dos governos em fazer da

    segurana rodoviria um elemento-chave da poltica de modernizao.

    7 Isto quer dizer que, na frica, as estradas matam mais do que o HIV e muito mais que a dengue.Tirado do Jeune Afrique Economie, du 19 jan au 1 fev. 1998. P.168 Por referncia a ANTP: Associao Nacional de Transporte Pblico. ( No Brasil)

  • 42

    Alm da contingncia devido responsabilidade administrativa, o comportamento

    humano ligado ao elemento de conscientizao dos motoristas e pedestres muito

    relevante. Os motoristas so freqentemente submetidos a horrios exorbitantes de

    trabalho. Enquanto que o servio baseado na solicitao dos clientes, nos pases da

    frica, por exemplo, um motorista passa 18 horas por dia ao volante (Paye Moussa,

    1998, p.26). preciso lembrar que nestes pases os motoristas de veculos de transporte

    coletivos no tm a oportunidade de participarem de programas de treinamento e de

    aprendizagem regulares.

    2.4.2 Congestionamento de trfego

    O congestionamento de trfego uma das manifestaes mais visveis das falhas

    do planejamento de transporte urbano, seja nos pases economicamente avanados ou

    nos economicamente atrasados. O congestionamento enfraquece ento a finalidade do

    uso do automvel: facilitar o contato entre pessoas e o livre acesso aos bens e servios.

    As estradas congestionadas ou lotadas de automveis afetam negativamente a

    produtividade econmica, alm de agravar a poluio do ar e sonora.

    Nos pases economicamente avanados, o congestionamento das grandes e

    pequenas cidades muito semelhante. Um estudo das cidades dos pases do OECD

    mostra que o movimento de trfego nos centros comerciais diminuiu dramaticamente

    desde a dcada de 70 (Peter Midgley, 1994, p.15). Em 1990, nos distritos comerciais de

    grandes cidades tais como: Manchester, no Reino Unido; Milo, na Itlia e Utsunomiya,

    no Japo, a velocidade do trnsito no perodo de intenso movimento pela manh era de

    20 quilmetros ou menos por hora.10

    9 Ver relatrio ANTP 1997, p.21.10 OECD & ECMT. Urban Travel and Sustainable Development. Paris, 1995, p 31.

  • 43

    No caso dos pases da frica Ocidental, o congestionamento aumentou

    dramaticamente a partir da dcada de 90 devido ao boom dos carros usados

    importados da Europa e falta de uma infra-estrutura adequada e de um cdigo

    adequado de trnsito.

    No Brasil, assim como em vrios pases da Amrica Latina, so incontveis as

    horas desperdiadas por dia nos deslocamentos em relao ao que seria possvel com

    um adequado e eficiente sistema de trnsito. No caso externo da Regio Metropolitana

    de So Paulo, estima-se que sejam desperdiadas cerca de 2,4 milhes de horas por dia

    nos deslocamentos (Rogrio Belda, 1997, p. 96). O exemplo mais notvel da sia o de

    Bangkok, onde a velocidade de trfego nos centros urbanos baixou at dois quilmetros

    por hora todos os anos. Como resultado, em Bangkok, o tempo desperdiado no trfego

    por cada carro estimado em mdia de 44 dias por ano (Peter Midgley, 1995, p.16).

    O impacto econmico e social do congestionamento avaliado em funo do

    custo das operaes ou atividades que poderiam ser feitas durante o tempo

    desperdiado. A dimenso do problema de um grande desastre. O congestionamento

    freqentemente considerado como resultado de um insuficiente network de estradas. De

    fato, mesmo um menor nmero relativo de carros pode causar engarrafamento. E,

    mesmo assim, uma expanso do network de estradas raramente uma soluo.

    Do ponto de vista econmico, em muitos pases em desenvolvimento, a melhoria

    da qualidade de trnsito vai alm das capacidades financeiras. De fato, a construo de

    novas estradas requer espao desocupado. Em vrias cidades da frica, especialmente

    nas capitais, a construo de novas infra-estruturas rodovirias exige a destruio dos

    imoveis existentes e transferncias sociais informais.

  • 44

    2.4.3 Contribuo para poluio do meio ambiente e uso de energia

    A degradao do meio ambiente um dos problemas importantes que a

    humanidade enfrenta como conseqncia de suas atividades socioeconmicas em reas

    urbanas. Uma deciso internacional sobre a degradao do meio ambiente (Framework

    Convention on Climate Change)11 promulgou uma lei para reduzir e estabilizar a emisso

    do bixido de carbono - CO2 no meio ambiente. Entretanto, nos pases em

    desenvolvimento esta poltica no entra intensivamente nos programas de proteo do

    meio ambiente, especialmente nos pases da frica.

    Os diferentes meios de transporte automotor das grandes regies urbanas so

    considerados como a principal origem da emisso de poluentes. A poluio do ar ocorre

    pela emisso de materiais poluentes, como produto final da transformao de energia

    consumida pelo parque automobilstico e mquinas industriais. "O monxido de carbono

    representa a metade dos poluentes do ar nos Estados Unidos" (Zachary A. Smith, 1994

    p.68).

    O uso de veculos de transporte requer uma grande quantidade de energia. Uma

    pesquisa do Departamento Internacional de Energia mostrou que 20% de toda a energia

    produzida no mundo usada para o setor de transporte e que 60% a 70% dela

    destinada ao deslocamento de pessoas e o restante para cargas12. Nos pases da OECD,

    segundo a mesma pesquisa, o sistema de transporte usou cerca de 31% de toda a

    energia produzida em 1991.

    O consumo de energia pelo setor de transporte tem crescido nos pases

    desenvolvidos tanto quanto nos pases em desenvolvimento na ltima dcada da virada

    do milnio devido ao aumento do uso de carros prprios. Segundo um relatrio de World

    11 Ver, Intergovernnamentel Panel on Climate Change (IPCC), World Meteorological Organization(WMO) and United Environment Programme (UNEP).

  • 45

    Energy Council, de 1971 a 1992 a quantidade mundial de energia usada, no setor de

    transporte cresceu cerca de 2,7% por ano, mais rpido do que o setor da industria e

    outros.13

    Este consumo de energia contribui para a poluio do ar do meio ambiente local e

    global e, ainda, representa um custo econmico especialmente alto para pases

    importadores de energia. Um estudo do Departamento Tcnico Africano do Banco

    Mundial mostrou que, nos centros urbanos, em perodo de movimento intenso de trfego,

    o congestionamento responsvel por 90% a 95% da emisso de monxido de carbono,

    80% a 90% de oxido de nitrognio e uma grande quantidade de partculas poluentes,

    ameaando assim a sade humana e os recursos naturais.14

    Nos pases desenvolvidos, a emisso de poluentes pelos carros tem a maior

    ameaa sobre a qualidade do ar. Nos Estados Unidos por exemplo, em 1993, os meios

    de transporte foram responsveis por 77% da emisso de bixido de carbono, 45% de

    xido de nitrognio, 36% de partculas orgnicas volteis e 22% de outras partculas15.

    Na Unio Europia, a Comisso Europia do Meio Ambiente iniciou medidas de controle

    de poluio nos 20 ltimos anos para reduzir o nvel de emisso de poluentes de

    automotores, mas os resultados foram malsucedidos por causa do nmero crescente de

    usurios de carros particulares.16 No Reino Unido, por exemplo, a quantidade de bixido

    12INTERNATIONAL ENERGY AGENCY. world Energy. Outlook, 1995 . Paris, OECD, 1995,p.24813WORLD ENERGY COUNCIL. Energy for Tomorrows World: the realities, the real options,

    and the Agenda for Achievement. Kogan Page. New York, London and St. Martins Press,1993, p.51

    14THE WORLD BANK. Nairobi Action Plan for Urban Mobility and Non-Motorized Transport.In Proceedings of the SSATP Seminar on Urban Mobility and Non-MotorizedTransport in Sub-saharan Africa. Africa Technical Department. Nairobi, Kenya, the WorldBank, 1994, p.20

    15 U.S ENVIRONMENTAL PROTECTION AGENCY (U.S EPA). National Air Quality andEmissions. Trends Report, 1993. Washington, D.C., U.S. EPA, 1994, p.2, 6, 46, 52.

    16COMISSION OF THE EUROPEAN COMMUNITIES. The state of the Environment in theEuropean Community: Overview. Belgium, Brussels, Commission of the EuropeanCommunities, 1992 Vol.3, p.17

  • 46

    de nitrognio emitida cresceu 35% no perodo de 1986 a 1991, como resultado do

    aumento do uso de veculos prprios.17

    No caso dos pases em desenvolvimento, a poluio de ar em grande parte um

    problema devido ao aumento de trfego nas grandes reas urbanas. Assim, "nos

    importantes centros urbanos tais como: Cidade do Mxico, Bangkok e Lagos, a poluio

    de ar , um problema crucial" (Asif Faiz and Surhid Gautam, 1994, pp.20-21).

    2.4.4 Contribuo para as discriminaes socioeconmicas

    A expanso geogrfica rpida do espao econmico das grandes cidades,

    possibilitada pelo crescimento do nmero de automveis privados, discrimina muito as

    populaes perifricas e suburbanas de baixa renda. Esta discriminao social

    apresenta-se sob vrias formas como as limitaes de acesso, as oportunidades de

    trabalho para populaes pobres das periferias urbanas proporcionalmente ao alto custo

    das viagens. Este tipo de fenmeno socioeconmico presente tanto em pases

    desenvolvidos quanto em pases em desenvolvimento, apesar de as causas e os sinais

    apresentam-se de diferentes formas.

    Mesmo assim, a discriminao cada vez maior nas grandes cidades que

    apresentam vrios segmentos de grupos sociais de baixa renda, pelo fato de as

    oportunidades de emprego, de edu