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1199500880
1111111111111111111111111111111111111111
FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS
ESCOLA DE ADMINIS"T:"RAÇÃO DE EMPRESAS DE SÃO PAULO
OS NOVOS MODELOS DE GESTÃO: ANÁLISE E
ALGUMAS PRÁTICAS EM EMPRESAS BRASILEIRAS
HEITOR JOSÉ PEREIRA
Orientador: Prof. Dr. Carlos Osmar Bertero
lf) (J) ....... ~ co co
Fundação Getulio Vargas Escola de Admillistração
V de Empresas de São Pau lo Biblioteca
1199500880
SÃO PAULO- 1995
FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS
ESCOLA DE ADMINISTRAÇÃO DE EMPRESAS DE SÃO PAULO
HEITOR JOSÉ PEREIRA
- , OS NOVOS MODELOS DE GESTAO: ANALISE E
, ALGUMAS PRATICAS EM EMPRESAS BRASILEIRAS
Tese apresentada ao Curso de
Doutorado em Administração de
Empresas da Escola de
Administração de Empresas de São
Paulo, da Fundação Getúlio Vargas,
Área de Concentração Organização
e Recursos Humanos, como parte
dos requisitos para obtenção do
título de Doutor em Administração.
Orientador:
Prof. Dr". Carlos Osmar Bertero
SÃO PAULO- 1995
OS NOVOS MODELOS DE GESTÃO: ANÁLISE E ,
ALGUMAS PRATICAS EM EMPRESAS BRASILEIRAS
Banca Examinadora ·
Prof. Dr. Carlos Osmar Bertero - Orientador
Prof8 Dr Maria Cecília Coutinho de Arruda
Prof8 Dr Ofélia Lanna de Sette Torres
Prof. Dr. Silvio Aparecido dos Santos
Prof8 Dr Suzana Braga Rodrigues
ii
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho aos meus pais,
Heitor e /rene, pela vida e pelas lições
de vida que me propiciaram; e à minha
esposa, Rita de Cássia, pelo amor e
dedicação.
Vida e amor . . . a essência do Ser
Humano!
r
iii
AGRADECIMENTOS
Para desenvolver um trabalho da envergadura de uma Tese de
Doutorado, não há dúvida de que muitas pessoas e organizações
concorrem para o atingimento de um resultado almejado. E, quando este é
conseguido de forma satisfatória, não há dúvida de que seus méritos (se
existem) devem ser compartilhados. Difícil é nominar todas as pessoas que
colaboraram para tal mérito. Assim ao fazer os agradecimentos de uma
forma abrangente, espero estar compartilhando com cada uma das pessoas
que contribuíram para o trabalho.
Inicialmente, devo agradecer à Escola de Administração de
Empresas de São Paulo, da Fundação Getúlio Vargas, pelo ambiente
acadêmico que me ofereceu durante os anos do Curso de Doutorado, tendo
ainda me propiciado a oportunidade de exercer, durante cinco anos, a
atividade de docente, a qual em grande parte foi responsável pelo
amadurecimento das idéias centrais deste trabalho.
No âmbito da EAESP-FGV, granjeei grandes amizades, tanto de
colegas Doutorandos quanto de professores e funcionários, cuja
convivência só tem enriquecido o meu lado humano, intelectual e
profissional.
Devo agradecer ao conjunto de várias empresas brasileiras, três das
quais destaquei neste estudo como organizações modelares na implantação
de várias práticas gerenciais inovadoras, cujas experiências (sucessos e
fracassos) foram de extrema importância no amadurecimento do trabalho
desenvolvido.
E, finalmente, uma gratidão especial à amiga Neide, que me .
propiciou todo o apoio logístico na preparação do relatório final da Tese,
trabalho anônimo, mas desenvolvido com extrema dedicação e '
responsabilidade profissional. \,
SUMÁRIO
CAPÍTULO 1
O PROBLEMA DA PESQUISA .
1.1.
1.2.
1.3.
1.4.
1.5.
CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES
OBJETIVO DO ESTUDO
JUSTIFICATIVA DO ESTUDO
O MODELO DA PESQUISA
1.4.1 Os métodos da pesquisa
DEFINIÇÃO DOS TERMOS
CAPÍTULO 2
O CENÁRIO HISTÓRICO DA ORIGEM E EVOLUÇAO DOS
"MODELOS" DE GESTÃO
2.1. AS GRANDES "ONDAS"DE TRANSFORMAÇÃO E SEUS
IMPACTOS NAS ORGANIZAÇÕES
2.2. A EVOLUÇÃO DAS ERAS EMPRESARIAIS
2.2.1. A Era da Produção em Massa
2.2.2. A Era da Eficiência
CAPÍTULO 3
O ESGOTAMENTO DOS "MODELOS DE GESTÃO" DA SOCIEDA
DE INDUSTRIAL
3.1. A TRANSIÇÃO DA SOCIEDADE INDUSTRIAL PARA A SO
CIEDADE DO CONHECIMENTO
02
04
05
07
11
14
17
25
29
34
37
i v
Pág.
3.2. AS MEGATENDÊNCIAS: AMEAÇAS E OPORTUNIDADES PA-
RA AS ORGANIZAÇÕES
3.3 AS NOVAS ERAS EMPRESARIAIS NA SOCIEDADE DO
CONHECIMENTO
3.4 AS CARACTERÍSTICIAS E OS DESAFIOS DA GESTÃO NA
EMPRESA BRASILEIRA
CAPÍTULO 4
OS NOVOS MODELOS DE GESTÃO: PRINCIPAIS ABORDAGENS
E SUAS CARACTERÍSTICAS
4.1. ADMINISTRAÇÃO JAPONESA
43
58
64
71
4.1.1. Origens e evolução da administração japonesa 72
4.1.2. Práticas e instrumentos da adminsitração japonesa 81
4.1.3. Análise da aplicabilidade da administração japonesa 98
4.2. ADMINISTRAÇÃO PARTICIPATIVA 104
4.2.1. Origem da gestão participativa 104
4.2.2. O funcionamento da gestão participativa: conceitos e práticas 107
4.2.3. Etapas para implantação da gestão participativa 112
4.2.4. Aspectos críticos na aplicabilidade da gestão participativa 113
4.3. ADMINISTRAÇÃO EMPREENDEDORA
4.3.1. Origens da administração empreendedora
4.3.2. Características e principais práticas da gestão empre
endedora
4.3.2.1. Características de uma organização empreen
dedora
4.3.2.2. Características dos "intrapreneurs"
4.3.2.3. Aspectos organizacionais da gestão empreen
dedora
114
115
123
125
129
134
v
4.3.2.4. Políticas de recursos humanos para estimular
o espírito empreendedor
4.4. APLICABILIDADE DO MODELO DE ADMINISTRAÇÃO
EMPREENDEDORA
4.5. ADMINISTRAÇÃO HOlÍSTICA
4.5.1 A visão holítica na Administração
4.5.2. Práticas da Administração Holística
4.5.3. Condições para uma empresa adotar o modelo holísti-
co de gestão
4.6. CORPORAÇÃO VIRTUAL
4.6.1. Origem da corporação virtual
4.6.2. Principais práticas gerenciais na corporação vurtual
4.6.3. Aplicabilidade das práticas gerenciais na corporação
virtual
4.7. A TRANSIÇÃO DOS "MODELOS TRADICIONAIS" PARA
OS "NOVOS MODELOS" DE ADMINISTRAÇÃO
CAPÍTULO 5
ESTUDOS DE CASO
vi
140.
154
156
158
159
161
162
163
166
169
169
ESTUDO DE CASO 1: LOCALIZA RENT A CAR 17 4
ESTUDO DE CASO 2: MÉTODO ENGENHARIA 224
ESTUDO DE CASO 3: INEPAR S.A. ELETROELETRÔNICA 247
CAPÍTULO 6
CONCLUSÕES DO ESTUDO E RECOMENDAÇÕES 270
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 278
vi i
QUADROS
Quadro 1- COMPARAÇÃO DE SUPOSIÇÕES BÁSICAS NAS
SOCIEDADES INDUSTRIAL E DO CONHECIMENTO 42
Quadro 2- CARACTERÍSTICAS DA EMPRESA BRASILEIRA 67
Quadro 3- CARACTERÍSTICAS GERENCIAIS DAS EMPRESAS
JAPONESAS E AMERICANAS 102
Quadro 4- COMPARAÇÃO DE PERFIS ORGANIZACIONAIS: OR-
GANIZAÇÃO CONCORRENCIAL x EMPREEDEDORA 128
vi i i
FIGURAS
Figura 1- O MODELO DE PESQUISA: QUADRO TEÓRICO RE-
FERENCIAL DE SUPORTE 09
Figura 2- ERAS EMPRESARIAIS x RELAÇÃO EMPRESA-CLIEN-
TE 28
Figura 3- FATORES DETERMINANTES DA COMPETITIVIDADE
DE UMA EMPRESA 61
Figura 4- O FLUXOGRAMA DE MELHORIA DA QUALIDADE DE
EDWARDS DEMING 77
Figura 5- AVALIAÇÃO DO GRAU DE PARTICIPAÇÃO DA EQUI-
PE NO PROCESSO DECISÓRIO 111
Figura 6- VARIEDADE DE COMPORTAMENTO ESTRATÉGICO
E OPERACIONAL 122
Figura 7- CONTEXTO DO AMBIENTE EXTERNO E INTERNO DE
UMA ORGANIZAÇÃO EMPREENDEDORA 126
Figura 8- CARREIRA EM "Y" 149
,·
. .;:-··
CAPÍTULO 1
O PROBLEMA DA PESQUISA
2
1.1. CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES.
Inovação Qualidade Competitividade Parceria
Reengenharia ... estas são apenas algumas das diversas palavras que têm
se incorporado nos últimos anos na linguagem da gestão empresarial.
Embora a maioria delas já estivesse presente nos dicionários e até
frequentasse o vocabulário empresarial, na realidade passaram a ter
conotações diferentes e mais específicas nos últimos anos.
O que estaria provocando o surgimento de tais palavras novas no
dia-a-dia das organizações? "Palavras são palavras", diria o poeta,. mas até
que ponto elas deixam de ser meras abstrações literárias e passam a
representar (novas) práticas gerenciais nas operações rotineiras de uma
empresa? Será que todas as organizações serão ( óu estão sendo) afetadas
por estas no_vas palavras? Não estariam tais palavras indicando a
proximidade da definição de um (novo) modelo ideal (e definitivo) de gestão
empresarial?
Nenhuma destas questões (e outras delas decorrentes) terá
certamente respostas determinísticas e nem é objetivo deste estudo chegar
a elas. Neste sentido, a linha a ser aqui seguida buscará muito mais
levantar e avaliar as características peculiares às novas práticas de gestão
empresarial, hoje dispersas na literatura e nas pesquisas acadêmicas na
área de Administração, visando analisá-las dentro de um contexto histórico
de sua evolução e de sua relação com o conjunto de outras práticas
gerenciais.
O contexto histórico diz respeito ao fato de que as novas prátic.as de
gestão empresarial, surgidas principalmente a partir dos anos 70, são
decorrentes ou provocadas por mudanças macro-ambientais que tornaram
obsoletas as práticas até anteriormente utilizadas: assim, ocorre uma
quebra de paradigma que precisa ser avaliada do ponto de vista da
evolução dos novos modos de se administrar uma organização.
Quanto à relação de cada uma das novas práticas gerenciais
analisadas com outras práticas inovadoras de gestão, justifica-se pelo fato
de que as empresas bem sucedidas não aplicam modelos únicos ou
3
exclusivos de gestão: na realidade, constata-se uma combinação destas
novas idéias e práticas gerenciais. Assim, é comum encontrar nestas
empresas práticas de Gestão da Qualidade Total, parcerias com
fornecedores, participação dos empregados nos lucros ou resultados, entre
outras ferramentas inovadoras de administração.
A motivação para desenvolver este estudo partiu da constatação de
que as empresas brasileiras, de forma crescente nos últimos anos,
passaram a se conscientizar da importância da revisão dos seus modelos
tradicionais de gestão, que já não garantem mais a sua sobrevivência e a
sua capacidade competitiva no mercado e estão freneticamente à busca de
novas idéias e práticas de gestão empresarial. De outro lado, estas novas
idéias e práticas gerenciais são apresentadas geralmente como a solução
definitiva dos problemas de gestão e, geralmente, recebidas pelo meio
empresarial como "modismos". Assim, é preciso desmistificar idéias e
práticas novas, como Qualidade Total, Reengenharia, Gestão Participativa e
outras.
Dentro da mesma motivação acima, outra questão importante é
avaliar até que ponto estas novas práticas gerenciais, geralmente
originadas em outros países com culturas bem diferentes da nossa
realidade econômica e social, se adequam ao perfil do empresário e do
trabalhador brasileiro. Não são poucos os registros de fracasso de
organizações brasileiras, tanto privadas como públicas, que tentaram
implementar algumas destas práticas sem alcançar os resultados esperados
ou provocando maiores conflitos internos, seja na relação capital-trabalho
ou na relação com agentes externos (clientes, fornecedores e outros).
Finalmente, uma questão que tem angustiado o meio empresarial e
acadêmico: o mundo não está apenas mudando (como sempre ocorreu
desde a pré-história): a velocidade das mudanças é o fator mais importante
neste final de século. Assim, as pessoas, as organizações e até os países
estão sendo afetados de forma diferenciada, mas os efeitos são
desestruturadores para todos: é preciso se antecipar ou, pelo menos, reagir
e se adaptar âo "novo mundo". Portanto, no caso das organizações, todas
as regras, práticas e modelos que as orientavam até os anos 80 passam a
se tornar instrumentos obsoletos e arcaicos, que já nao permitem a
sobrevida das mesmas na economia competitiva e globalizada dos nos 90.
4
Mais uma vez, portanto, é oportuno repensar os modelos de gestão e avaliar
a sua aplicabilidade no contexto ambiental de cada organização.
1.2 OBJETIVOS DO ESTUDO
O objetivo geral deste estudo é analisar os novos modelos de gestão
empresarial e avaliar como algumas empresas brasileiras estão praticando
alguns conceitos, técnicas e instrumentos propugnados por estes modelos.
Para atingir este objetivo geral, são definidos os seguintes objetivos
específicos:
1 °) Analisar o contexto histórico da evolução da gestão
empresarial a nível mundial e brasileiro.
Com este objetivo, pretende-se mostrar que existe um "pano de
fundo" na evolução da gestão empresarial: assim, as várias correntes do
pensamento administrativo, desde a Escola Clássica de Taylor e Fayol até
as abordagens de vanguarda que anunciam a emergência da corporação
virtual na virada do próximo milênio, estão vinculadas a grandes fatos
históricos que têm provocado o processo de evolução econômica e social
da civilização humana.
2°) Analisar as origens, características e principais instrumentos
dos novos modelos de gestão empresarial surgidos nas últimas décadas,
em decorrência da exaustão dos modelos tradicionais de gestão.
Com este objetivo, pretende-se sistematizar o conjunto de novas
práticas de gestão empresarial, cada vez mais aplicadas pelas empresas
inovadoras que buscam sobreviver através da competitividade. Neste
sentido, este conjunto de novas práticas gerenciais será analisado a partir
de cinco linhas estruturadas que constituem a base de novos modelos de
gestão, cada um com suas características peculiares.
3°) Analisar, através do estudo de caso, três empresas que
notoriamente incorporaram na sua prática administrativa vários instrumentos
5
gerenciais inovadores e são consideradas empresas bem sucedidas no seu
setor de atuação.
Embora ainda estes novos modelos sejam pouco conhecidos e
aplicados no setor empresarial brasileiro, já é possível identificar e avaliar
um conjunto de organizações (privadas e públicas) que já vêm
implementando uma série de inovações gerenciais que podem ser avaliadas
como um esforço em busca de uma nova maneira de administrar os seus
negócios.
4°) Propor um conjunto de recomendações às empresas
brasileiras, no sentido de se adequarem nos próximos anos aos novos
modelos de gestão, visando assegurar a sua sobrevivência e
competitividade no mercado.
Estas recomendações serão especificadas ao nível dos dirigentes,
gerentes, colaboradores, entidades empresariais e agências
governamentais relacionadas ao desenvolvimento econômico e empresarial
do país.
Ao mesmo tempo, serão elaboradas recomendações direcionadas às
Escolas de Administração, visando provocá-las a repensar a sua missão
diante do novo mundo organizacional que se vislumbra nos próximos anos e
da formação dos administradores profissionais que estarão conduzindo as
mudanças nas empresas.
1.3 JUSTIFICATIVA DO ESTUDO
À medida que a sociedade mundial vai evoluindo para se tornar a
"aldeia global", imaginada pelo cientista canadense Macluhan nos anos 50,
as organizações são intensamente afetadas pelas mudanças ambientais
decorrentes das grandes transformações de natureza política, econômica,
social, tecnológica, cultural, legal e espiritual. Assim, novos valores passam
a orientar a gestão empresarial e a própria missão destas organizações:
ecologia, ética, qualidade de vida, parceria, visão social, auto-realização
6
pessoal e outros valores passam a permear o dia-a-dia das atividades
organizacionais. Como resultados; as empresas estão assistindo a exaustão
dos seus métodos tradicionais de trabalho, baseados em posturas rígidas e
centralizadas de gestão e estão à busca de novas formas que respondam
às novas exigências ambientais.
Neste sentido, é preciso buscar novos instrumentos que orientem a
empresa para a satisfação total do cliente, cada vez mais exigente com
relação à sua qualidade de vida, garantida pelos produtos e serviços que
consome; é preciso também desenvolver novas formas de relações com os
empregados, os quais buscam na empresa não apenas a sua sobrevivência
econômica, através do salário, mas sobretudo a sua auto-realização pessoal
e profissional como projeto de vida; é preciso ainda criar novos formatos de
relacionamento com outras empresas que orbitam em torno das atividades
do empreendimento, como fornecedores, distribuidores e prestadores de
serviços de apoio; é necessário inovar nas relações com a comunidade
onde a empresa está inserida, sem contar os novos padrões éticos que
devem orientar suas relações com os sindicatos, agências governamentais,
entidades empresariais e outras instituições relacionadas às atividades
empresariais.
Diante deste novo e complexo sistema de relações
interorganizacionais, as empresas encontram grandes barreiras para se
adaptarem às novas situações decorrentes das novas relações
estabelecidas: tais barreiras estão geralmente localizadas no próprio âmbito
interno destas empresas, ou seja, são os seus métodos de gestão.
No entanto, desde os anos 70, diversas empresas que operam a nível
internacional já estão rompendo com as filosofias e práticas tradicionais de
gestão e iniciam a implantação de novos instrumentos gerenciais, a
princípio em caráter tentativa, mas posteriormente aperfeiçoados e
consolidados. Assim, nos. anos 90, já é possível avaliar e sistematizar o
conjunto destas novas práticas gerenciais, rompedoras das Escolas
tradicionais de administração e talvez semeadoras das novas Escolas que
orientarão a gestãó empresarial nas próximas décadas ou, quando multo,
nos próximos anos, já que a velocidade das mudanças tornará obsoletas/
estas práticas em prazos muito rápidos.
7
Ao mesmo tempo, focando a realidade empresarial brasileira,
constata-se que as organizações nacionais, tanto públicas como privadas, já
desenvolvem esforços no sentido de recuperar o tempo perdido (de pelo
menos duas décadas) que levou a um atraso em relação à situação mundial.
No entanto, se há poucas empresas brasileiras consideradas de "classe
mundial", já é possível avaliar a partir destas a aplicabilidade no sistema
empresarial brasileiro das novas práticas gerenciais que garantirão a sua
sobrevivência num mercado cada vez mais globalizado e competitivo.
Este estudo se justifica, portanto, pelas contribuições efetivas que
poderá propiciar às Escolas de Administração, formadoras da classe
empresarial e dos administradores profissionais que serão os condutores e
aplicadores destes novos instrumentos de gestão; ao setor empresarial,
público e privado, pela análise crítica que apontará as barreiras e
dificuldades existentes para implantação das novas idéias e práticas de
gestão, bem como pelas recomendações que fará no sentido de preparar as
empresas brasileiras a introduzirem estes novos métodos gerenciais.
Finalmente, este estudo será uma contribuição inovadora às pesquisas
acadêmicas na área de Administração, considerando que estará sendo
proposta uma estrutura consolidada de todo o conjunto de novas práticas
inovadoras de gestão: no entanto, elas são analisadas isoladamente, às
vezes até com maior profundidade do que serão neste estudo, porém não
estão inter-relacionadas a outras práticas e instrumentos gerenciais de
forma estruturada.
1.4 O MODELO DA PESQUISA
O modelo de pesquisa que orientou os esforços da coleta de dados ·.
nas fontes bibliográficas e nas empresas tem sua fundamentação teórica
baseada nas influências e impactos que exercem as grandes mudanças
ambientais sobre as organizações de uma forma geral e, principalmente,
sobre as empresas que necessitam continuamente se adaptar às novas
realidades ambientais para sobreviver.
Segundo Zaccarelli et ai (1980),
as macro e micro mudanças ambientais afetam diferencialmente as empresas. Os tipos de empresas que são muito sensíveis às transformações do ambiente são geralmente as empresas pequenas, as quais podem ser muito beneficiadas ou prejudicadas. As médias e grandes empresas levam, pelo peso de sua estrutura, um tempo maior para reagir e adaptar-se às novas conjunturas ambientais. Apesar de mais lentas, as médias e grandes empresas possuem mais recursos para identificar as mudanças e incorporá-las internamente, restabelecendo o seu equilíbrio com o novo contexto ambiental. (p. 48)
8
Em decorrência das pressões ambientais de natureza econom1ca,
política e tecnológica, as empresas procedem mudanças na sua filosofia
·gerencial, na estrutura organizacional, nos conceitos e instrumentos
gerenciais, sempre buscando recuperar suas condições de sobreviver e
competir nos ambientes instáveis nos quais atuam. Desta forma, os modelos
de gestão utilizados nas empresas são condicionados pelas novas
realidades ambientais. Por esta razão, em cada período de tempo,
predominam certas abordagens (ou modelos), os quais são
complementados ou questionados por modelos mais recentes que já
incorporam novas váriáveis extraídas da prática das empresas.
Existe, pois, uma inter-relação entre a evolução do macro ambiente
institucional e a evolução dos modelos de gestão praticados pelas empresas
nas diferentes etapas do processo de desenvolvimento da sociedade.
O Modelo de Pesquisa assume como pressuposto que é possível
estabelecer relações entre as mudanças e transformações ocorridas no
nível macro ambiental e a nivel micro da gestão de cada empresa. Assume,
inclusive, que é possível estabelecer, cronologicamente, os momentos
prováveis em que predominaram certas abordagens gerenc1a1s,
caracterizadas como ações de respostas das empresas na busca de um
novo equilíbrio, face a uma nova realidade externa. No entanto, este
pressuposto não significa que todas as empresas necessariamente
ajustarão a sua evolução gerencial de acordo com as mudanças no seu
contexto ambiental: há empresas que não evoluem ou não acompanham a
mesma velocidade das mudanças externas e tornam-se, assim,
organizações obsoletas.
9
Na seqüência, é apresentada a Figura 1, que retrata o quadro teórico
referencial que serve de suporte e fundamentação ao Modelo de pesquisa
utilizado.
Figura 1: O MODELO DE PESQUISA: QUADRO TEÓRICO
REFERENCIAL DE SUPORTE
O CENÁRIO
AMBIENTAL
IMPACTOS SOBRE A GESTÃO EMPRESARIAL
CENÁRIO
AMBIENTÀL
ONDAS DE TRANSFORMAÇÃO
Revolução Agrícola
Revolução Industrial
Revolução Informação
da :
MODELOS
DE
GESTÃO
- • ERAS EMPRE- Era da Era da Efi-
Produção ciência SARIAIS
em Massa
INÍCIO DA ERA 1920 1950
MODELOS TRA- • Administra- Administração
DICIONAIS DE ção Burocrática
GESTÃO Cientifica
• Administra-
I
Era da Era da I Era do(a) Qualidade Competiti- I
I ? vidade I
I
1970 1990 I 2000
Tradicionais _-ção das
Relações
Humanas
Outros "mode
los tradicio
nais" da Admi
nistração
l Presentes
Futuro
NOVOS MODELOS
-• GESTÃO DE
(em prática atual)
NOVOS MODELOS
--GESTÃO
(do futuro)
DE
Administração Japonesa
Administração Participativa
I
I I I I I I
Administração Empreendedora 1
I 1 AdministraI • ção Holfstica I I
I
I Administra-I • , ção Virtual I C .•
APLICAÇÃO DE ALGUMAS PRÁTICAS GERENCIAIS ESTUDOS DE CASO: INOVADORAS EM EMPRESAS BRASILEIRAS -LOCALIZA
- MÉTODO ENGENHARIA -INEPAR
10
Inicialmente, . dividiu-se o cenário histórico da evolução das .
abordagens da Administração em momentos:
• As Grandes Ondas de Transformação, compreendedo três grandes
períodos: a Revolução Agrícola (até 1750 D.C.}, a Revolução
Industrial (1750 a 1970) e a Revolução da Informação (após 1970},
de acordo com Toffler (1980).
• Por sua vez, a Revolução Industrial foi dividida também em três
períodos: 1 a Revolução Industrial (1820-1870); 2a Revolução
Industrial (1870-1950); 3a Revolução Industrial, a partir de 1950.
• Dentro destes períodos, foram analisadas as abordagens da
Administração, segundo o seguinte esquema:
a) Durante a 2a Revolução Industrial, inicia-se, em torno de 1920, a
Era da Gestão Empresarial, a qual se divide em 4 períodos
diferentes:
• Era da Produção em Massa (1920/49)
• Era da Eficiência ( 1950/69)
• Era da Qualdiade ( 1970/89)
• Era da Competitividade (a partir de 1990)
b) As duas primeiras Eras (Produção em Massa e Eficiência)
correspondem às abordagens tradicionais da Administração (da
Escola Clássica à Teoria da Contingência)
c) As duas últimas Eras (Qualidade e Competitividade) correspondem
às Novas Abordagens da Administração, que são os seguintes:
• Administração Japonesa
• Administração Participativa
• Administração Empreendedora
• Administração Holística
. . ..
11
• Administração Virtual
Cada uma destas novas abordagens de Administração será analisada
a partir dos seguintes aspectos:·
• Origem e evolução histórica (exceto as duas últimas abordagens,
tendo em vista que são abordagens futuristas da Administração)
• Filosofia central da abordagem.
• Principais práticas gerenciais: Processo decisório; postura
gerencial; estrutura organizacional; controles; sistemas de
incentivos; técnicas e instrumentos gerenciais.
• Aspectos críticos na aplicabilidade do modelo.
As abordagens teóricas componentes do quadro de referência acima
podem ser entendidas como escolas de estudiosos e práticos da
Administração que aspiraram ou ainda aspiram a condição de paradigma.
Segundo Kuhn (1991 ), algumas ciências cujo processo de formação são
recentes ainda não possuem paradigmas definidos. Assume-se como
pressuposto desta pesquisa que a Administração é uma ciência quase
normal que está na fase pré-paradigmática, onde as várias abordagens se
sucedem e sistematizam novas práticas gerenciais observadas na gestão
das organizações. Por conseguinte, suas estruturas conceituais e teóricas
não possuem a consistência de um paradigma típico das ciencias normais.
Este é o sentido do termo "modelo de gestão", utilizado freqüentemente
neste estudo e definido no item 1.5. (algumas vezes utiliza-se o termo
"abordagem" em substituição ao termo "modelo")/
1. 4. 1. Os Métodos de Pesquisa
Este estudo baseia-se na utilização de dois métodos de pesquisa: o
método da pequisa descritiva e o método do estudo de caso. Segundo lsaac
& Michael (1982),
a pesquisa descritiva visa descrever de forma sistematizada uma situação ou área de interesse com base em dados factuais da realidade observada. O estudo de caso focaliza a evolução de uma
empresa, de um indivíduo, de um grupo social, ou de toda uma comunidade, investigando os marcos da trajetória percorrida, dentro de um determinado período de tempo. (p. 12)
12
A evolução da administração, através da análise das diferentes
abordagens teóricas, foi feita através do levantamento e análise da literatura
de Administração referenciada no estudo. O uso destes procedimentos,
típicos da pesquisa descritiva, permitiu identificar as origens, a filosofia, os
conceitos, as técnicas e as práticas administrativas difundidos pelas
diferentes abordagens ou correntes teóricas da Administração. Estas
abordagens, que constituem o corpo de conhecimento teóricos, foram sendo
construídas a partir das práticas gerenciais observadas na gestão diária das
organizações. Além da análise da literatura técnica especializada de
Administração, foram pesquisadas matérias publicadas na imprensa e em
revistas de circulação nacional que revelavam experiências e resultados
obtidos por empresas que estavam praticando conceitos ou formas
inovadoras de Administração. A análise das informações contidas nestas
publicações permitiu estabelecer o quadro referencial teórico das práticas
de gestão observadas nas empresas, mencionado na Figura 1.
Com base neste quadro referencial, o estudo dos casos das
empresas que utilizam práticas inovadoras de gestão permitirá analisar a
utilização de conceitos e técnicas de gestão e estabelecer uma vinculação
destas práticas com conceitos vinculados a abordagens constantes do
quadro de referência.
A partir da identificação de práticas incorporadas nestas abordagens,
será possível estabelecer um elo com as macro mudanças
(megatendências) tipícas das várias eras (ondas) ou ciclos vividos nas
diferentes épocas de desenvolvimento da sociedade e as práticas de gestãc;>
das empresas
A partir do quadro téorico referencial construído com base nestas
abordagens, foi possível identificar inicialmente seis empresas consideradas
avançadas e inovadoras na utilização de novos conceitos e práticas
gerenciais relacionadas com as mais recentes abordagens teóricas da
Administração.
13
Para pesquisar e analisar com detalhes estas experiências
inovadoras o estudo utilizou-se do método de estudos de casos. Alguns
autores como Leenders & Erskine (1978) e, posteriormente, Maximiano &
Sbragia (1980) consideram o método de caso como uma forma de pesquisa
que gera a formação do conhecimento. Os casos podem ser elaborados
focalizando diferentes aspectos. Existem casos que narram um incidente
crítico, ou seja, relatam de forma sucinta alguma situação ou incidente que
mereça ser discutida sobre uma organização. Existem os casos diagnósticos
que registram, de forma ordenada, um grande volume de informações sobre
uma organização com o objetivo de caracterizar um tipo específico de
problemas ou de vários problemas, descritos a partir da visão e da
experiência das pessoas que os vivenciam na organização e, finalmente, o
caso que relata a história da empresa em um certo período, o qual pode
começar e terminar em qualquer ponto. No "lato- sensu", um caso completo
poderia começar desde a fundação da empresa até a data em que o mesmo
foi feito. É mais comum o caso cobrir apenas períodos considerados
relevantes pelo autor para demonstrar as evidências necessárias ao estudo
da problemática focalizada na pesquisa.
A escolha das empresas, cujos dados coletados serviram de base
para a elaboração dos estudos de casos, foi feita com base nos seguintes
critérios:
1) empresas que introduziram práticas gerenc1a1s inovadoras
vinculadas às novas abordagens teóricas da Administração, nos últimos
cinco anos e que já divulgaram estas experiências através de jornais e
revistas especializadas, em vídeos ou publicações institucionais ou em
livros de assuntos gerenciais;
2) empresas que se dispuseram, através de entrevistas
personalizadas, fornecer os dados que permitissem a elaboração dos casos
e, ao mesmo tempo, aprovaram e permitiram·a divulgação destes casos com
os nomes reais das empresas e dos protagonistas que viveram a
experiência;
3) empresas que operam em diferentes setores da economia, ou
seja: setor de serviços de locação de veículos, setor da industria da
construção civil e setor da industria eletroeletrônica. Desta forma, foi
14
possível conhecer as realidades das práticas de gestão no setor de
serviços, no setor de construção (mais tradicional) e em um terceiro setor
industrial mais dinâmico e de base tecnológica, como é o caso do setor de
eletroeletrônico.
Para elaboração dos casos integrantes do presente estudo, foram
entrevistados dirigentes de diferentes empresas que narraram a introdução
de conceitos e práticas inovadoras na gestão das empresas analisadas. Ao
mesmo tempo, foram coletados materiais institucionais e publicações que
complementaram as informações obtidas através das entrevistas.
1.5. DEFINIÇÃO DOS TERMOS
Os principais termos utilizados durante este estudo e que precisam
ser definidos são os seguintes:
MODELO DE GESTÃO
O modelo de gestão é um conjunto de conceitos e práticas que, .
orientadas por uma filosofia central, permitem a uma organização
operacionalizar todas as suas atividades, seja no seu âmbito interno como externo.
Considerando que a Administração ainda não é consolidada como
uma teoria, a palavra "modelo" não assume aqui o mesmo caráter que lhe é
propiciado nas ciências exatas. Tal definição foi operacionalizada apenas
para os propósitos limitados deste estudo. Assim, a expressão "modelo de
gestão" não tem um sentído rigoroso e pode ser substituída, de acordo com
o sentido, por "abordagem" ou "estilo" de gestão ou de administração.
15
ONDA DE TRANSFORMAÇÃO
O conceito de "onda de transformação" é de Alvin Toffler (1980},
segundo o qual a civilização humana evoluiu ao longo de três períodos de
tempo, cada qual caracterizado por um conjunto de paradigmas que afetam
a vida humana no que diz respeito à tecnologia predominante, ao sistema
econômico, ao sistema político, ao sistema social e aos recursos materiais
mais utilizados. Para efeito deste estudo, trabalhou-se com o conceito de
que estamos na transição da Segunda Onda (Sociedade Industrial) para
Terceira Onda (Sociedade da Informação ou do Conhecimento).
ERA EMPRESARIAL
É um período de tempo durante o qual predomina uma certa
característica na orientação da maioria das empresas, na tentativa de
buscar o crescimento e o ajuste de sua estrutura às mudanças ambientais.
Assim, num certo momento, aquela característica era produzir a maior
quantidade possível de um produto padronizado (Era da Produção em
Massa); depois passou a ser o controle interno das operações (Era da
Eficiência); depois passou para a busca da satisfação do cliente (Era da
Qualidade); e, finalmente, a busca do nível de excelência (eficiência mais
eficácia), atendendo os interesses de clientes, colaboradores, comunidade e
acionistas (Era da Competitividade).
CAPÍTULO 2
O CENÁRIO HISTÓRICO DA
ORIGEM E EVOLUÇÃO DOS
"MODELOS" DE GESTÃO
17
Os mais remotos registros da história da civilização humana indicam
que o homem sempre buscou algum formato organizacional visando atingir
seus objetivos, ora individuais ora coletivos, através da racionalização de
esforços que permitissem alcançar aqueles objetivos. Assim, os grandes
empreendimentos humanos, registrados a partir das primeiras civilizações,
evidenciam que já se buscava um "modelo" de organização que permitisse
ao homem o domínio sobre a natureza e os meios físicos de que dispunha,
incluindo o seu próprio trabalho e o seu conhecimento.
Este estudo não tem como objetivo estudar a "teoria da organização"
em si e nem reconstruir os modelos de gestão que foram evoluindo ao longo
da história humana. Considerando seus objetivos mais estreitos, já
abordados no Capítulo 1, quais sejam, entender "o quê" está mudando nas
organizações atualmente, a partir de "novas" práticas gerenciais
disseminadas amplamente nas organizações, o propósito do presente
capítulo é analisar o cenário histórico e seu respectivo ambiente que
provocaram a evolução dos modelos de gestão, desde as formas primitivas
pré-históricas até as organizações virtuais do futuro.
2.1. AS GRANDES "ONDAS DE TRANSFORMAÇÃO" E SEUS
IMPACTOS NAS ORGANIZAÇÕES
Segundo Toffler (1980), a civilização humana teria evoluído ao longo
de três grandes "ondas de transformação": a Revolução Agrícola (Primeira
Onda), a Revolução Industrial (Segunda Onda) e a Revolução dos Serviços
(Terceira Onda): são os grandes marcos da referência histórica da
humanidade. Portanto, para entender como as organizações evoluiram e o
conteúdo da mudança nestas organizações, é necessário compreender o
que significa cada um destes momentos, em termos dos seguintes aspectos
principais:
• o paradigma que orientava o estilo de vida das pessoas em cada
uma das "ondas"
• o sistema político então predominante
18
• idem o sistema social
• idem o sistema econômico
• e a tecnologia (conhecimento) básica que atendia as necessidades
humanas.
A Revolução Agrícola é antecedida pela sociedade primitiva, que se
caracterizava pelos seguintes aspectos:
• Paradigma: o mundo era visto puramente em termos naturais;
• Sistema Político: a unidade política básica era a tribo, governada
pelos anciãos;
• Sistema social: baseado em pequenos grupos ou tribos;
• Sistema Econômico: baseado em atividades de caça, coleta e
pesca, sem interesse econômico que não a sobrevivência;
• Tecnologia: a energia era humana; os materiais principais eram as
peles de animais e as pedras; as ferramentas, normalmente feitas
de pedras, eram utilizadas em funções de cortar e moer; não havia
nenhum método estruturado de organização do trabalho ou de
produção; o sistema de transporte era a caminhada (modo-a-pé); e
. o sistema de comunicação era a própria voz humana.
Portanto, a sociedade primitiva não gerou nenhum modelo de gestão,
pois as necessidades de sobrevivência eram atendidas pela própria
natureza, exigindo do homem quase nenhum esforço para atingir seus
objetivos individuais e coletivos. As "organizações" se limitavam aos
sistemas sociais e políticos embrionários.
No entanto, na medida em que a "explosão demográfica" determinava
um desequilíbrio no ambiente, fazendo escassear os recursos naturais que
até então garantiam a sobrevivência humana, rompe-se o paradigma
daquela sociedade e ocorre a primeira grande transformação (Primeira
Onda) na história humana: a Revolução Agrícola que, segundo os
historiadores, teria iniciado há cerca de dez mil anos atrás.
A partir deste momento, segundo Toffler (1980),
os chamados povos primitivos (. . .) foram ultrapassados pela Revolução Agrícola: O mundo "civilizado", em contraste, foi precisamente aquela parte do planeta em que a maior parte dos povos amanhavam o solo. Pois onde quer que surgisse a agricultura, a civilização criava raízes. (p. 35)
19
Assim, os principais aspectos que caracterizam a Revolução Agrícola
foram os seguintes:
• Paradigma: os valores principais da vida humana eram baseados
na harmonia com a natureza, o que influenciava a idéia de que o
ser humano era controlado por forças superiores (deuses): assim,
desenvolveu-se muito a religiosidade e a visão mística da vida,
dando origem aos movimentos espirituais que até hoje
predominam nas instituições religiosas (cristianismo, budismo,
islamismo, entre outros). O conhecimento básico era a matemática
(álgebra e geometria), a astronomia e a astrologia, todas
influenciadas pelo desenvolvimento da filosofia.
• Sistema Político: prevalecia o feudalismo, com sistemas de leis,
religião, classes sóciais e políticas atrelados ao controle das
terras, com autoridade transmitida hereditariamente (aristocracia);
a unidade política básica era a comunidade local.
• Sistema Social: prevalecia o esquema familiar estratificado com
definições claras das funções em virtude do sexo; a educação era
limitada à elite; assim, surgiram algumas castas e classes sociais
claramente definidas (nobres, sacerdotes, guerreiros, escravos e
servos).
• Sistema Econômico: a atividade principal era a produção e o
consumo de alimentos, sem atividades significativas de mercado,
pois a base da economia era local (descentralizada e auto
suficiente). A divisão do trabalho era simples, sendo feita em
função da comunidade, sendo a terra o recurso econômico mais
importante de produção.
20
• Tecnologia: a energia era natural (humana, animal e eólica); os
materiais básicos eram recursos renováveis (árvores, algodão, lã,
entre outros); as principais ferramentas eram a força muscular
humana ampliada através de alavancas e guinchos ou forças
naturais dirigidas (navegação, roda d'água e outros); os métodos
de produção eram artesanais; o sistema de transporte utilizava o
cavalo, a carroça e o barco à vela; o sistema de comunicação era
manuscrito.
Portanto, a Sociedade Agrícola chegou a desenvolver algumas
formas organizacionais não muito complexas, que deram fundamento aos
seus sistemas político, social e econômico. Segundo Toffler (1980),
houve fábricas embrionárias de produção em massa na Grécia e na Roma antigas. Houve perfurações para extração de petróleo em uma das ilhas gregas em 400 a. C. e na Birmânia em 100 d. C. Floresceram vastas burocracias na Babilônia e no Egito". Surgiram grandes metrópoles urbanas na Ásia e na América do Sul. Houve dinheiro e câmbio. Rotas comerciais entrecruzaram desertos, oceanos e montanhas de Catai a Calais. Existiram nações e companhias incipientes: Houve mesmo, na antiga Alexandria, uma surpreendente precursora da máquina a vapor. Contudo, não houve em parte alguma coisa que pudesse designar-se, mesmo remotamente, uma civilização industrial. (. . .) Até 1650 - 1750, por conseguinte, podemos falar de um mundo da Primeira Onda. (p. 36)
De fato, após o movimento renascentista dos séculos XV e XVI e a
Era das Grandes Descobertas, quando se buscavam "novos mundos" que
ampliassem o modo de vida que já se encontrava esgotado, a humanidade
começa a romper outro paradigma histórico da sua civilização: emerge a
Revolução Industrial (Segunda Onda}, com profundas alterações a serem
provocadas na vida humana nos próximas 300 anos a seguir (a partir de
meados do século XVII). Ainda segundo Toffler (1980},
foi este o mundo em que irrompeu a revolução industrial, lançando a Segunda Onda e criando uma contra civilização estranha, poderosa e febrilmente energética. O industrialismo foi mais do que chaminés e linha de montagem. Foi um sistema social rico, multiforme, que tocou todos os aspectos da vida humana e atacou todas as feições do passado da Primeira Onda. Produziu a grande fábrica de Willow Run, fora de Detroit, mas também colocou o trator na fazenda, a máquina de escrever no escritório, a geladeira na cozinha. Produziu o jornal e o cinema, o trem suburbano e o DC - 3. Deu-nos o
cubismo e a mus1ca de 12 tons. Deu-nos edifícios Banhaus e cadeiras de Barcelona, as greves brancas, as pílulas de vitaminas e o prolongamento da duração da vida. Universalízou o relógio de pulso e a urna eleitoral. Mais importante, interligou todas estas coisas - montou-as como máquina - e formou o sistema social mais poderoso, coeso e expansivo que o mundo já conheceu: a civilização da Segunda Onda. (p. 36) ·
21
As principais características da Revolução Industrial são as
seguintes:
• Paradigma: segundo Crawford (1994), a Sociedade Industrial tem
como uma de suas idéias centrais que "os homens se colocam
como controladores do destino num mundo competitivo com a
crença de que uma estrutura social racional pode produzir
harmonia num sistema de castigos e recompensas". (p. 18) A base
do conhecimento humano passa a ser a física e a química,
propiciando os grandes avanços científicos que possibilitaram
desenvolver o sistema produtivo industrial.
• Sistema Político: predominam duas correntes ideológicas, o
Marxismo e o Capitalismo; as leis, a religião, as classes sociais e a
base política são modelados de acordo com os interesses da
propriedade e do controle do capital investido. Outra vertente
política é o Nacionalismo, que leva a governos centralizados e
fortes, tanto na forma de governo representativo quanto na forma
ditatorial.
• Sistema Social: A base da sociedade é a família nuclear, com
divisão de papéis entre os sexos e instituições permanentes que
sustentam o sistema (casamento e relações parentais). Os valores
sociais enfatizam a conformidade, o elitismo e a divisão de
classes. A educação é massificada e se completa na idade adulta.
• Sistema Econômico: a base da economia é o mercado nacional,
cuja atividade é a produção de bens padronizados, tangíveis e com
divisão entre produção e consumo. Há uma divisão complexa do
trabalho, com mão-de-obra baseada em habilidades específicas,
modo de produção padronizado e organizações com vários níveis
22
hierárquicos, orientados para o controle das operações. O recurso
fundamental é o capital financeiro.
• Tecnologia: a energia é baseada em combustíveis fósseis (óleo e
carvão); os materiais são recursos não-renováveis, como metais,
por exemplo; as principais ferramentas são máquinas que
substituem a força humana (motores); os métodos de produção são
baseados na linha de montagem e partes intercambiáveis; o
sistema de transporte abrange o barco a vapor, a ferrovia, o
automóvel e o avião; e o sistema de comunicação inclui a imprensa
e a televisão.
Como se observa, o "conteúdo" das suas catacterísticas e o "tempo"
decorrido a partir da emergência da Segunda Onda provocaram a
aceleração das mudanças e seu impacto sobre o sistema produtivo. Assim,
vários autores costumam subdividir a Revolução Industrial em três períodos:
Primeira, Segunda e Terceira Revolução Industrial.
Segundo Cano ( 1994 },
a Primeira Revolução Industrial maturou plenamente entre 1820 e 1830 na Inglaterra, centro hegemônico do capitalismo de então. A partir daí, a Inglaterra liberou suas exportações de capitais, de equipamentos e também a saída de emigrantes com aptidões técnicas. (p. 15)
Segundo o mesmo autor, o que caracterizou a Primeira Revolução
Industrial foram bases técnicas relativamente simples, com tecnologia não
muito complexa, baixa densidade de capital por trabalhador e baixa relação
capital-produto.
Portanto, neste período o processo produtivo ainda tinha
características mais artesanais do que propriamente industriais, sendo um
período de transição para a Segunda Revolução Industrial. Assim, os
formatos organizacionais ainda eram pouco evoluídos, pois a produção
ocorria em unidades tecnicamente pouco complexas e com baixa
capacidade produtiva.
A Primeira Revolução Industrial ocorre em momentos diferentes em
outros países. Nos Estados Unidos, em meados do século XIX, na Região
i :I
23
Nordeste (Nova Inglaterra), já começava a se consolidar um setor industrial,
produzindo armas de fogo, relógios, implementas agrícolas, têxteis,
máquinas de costura e outros produtos, enquanto o resto do país
continuava predominantemente agrícola. Segundo Toffler (1980), a Guerra
Civil americana foi provocada basicamente pelo conflito entre os defensores
da sociedade industrial e os que defendiam a sociedade agrícola, afinal
vencida pelos primeiros.
No Japão, segundo o mesmo autor, a Restauração Meiji, iniciada em
1868, também representou o confronto entre o passado agrícola e o futuro
industrial para a sociedade nipônica. Na Rússia, tal embate ocorreria mais
tarde, com a Revolução de 1917, quando os bolchevistas eliminaram os
últimos vestígios que restavam da servidão e da monarquia feudal,
empurrando a agricultura para o segundo plano e conscientemente,
acelerando o industrialismo.
No Brasil, conforme Cano (1994), o engajamento à Primeira
Revolução Industrial se inicia entre as décadas de 1870 e 1880 e consolida
se entre as décadas de 1920 e 1930, com os famosos embates entre
"ruralistas" e "industrialistas". Segundo o autor,
no primeiro período (1880-1930), a implantação da indústria -notadamente de bens de consumo leves - esteve completamente subordinada à economia primário - exportadora, que lhe determinava não só a demanda de bens de consumo, mas também a constituição do mercado de trabalho, a origem da maior parte dos seus capitais e recursos financeiros e, por último, a capacidade para importar a maior parte dos bens de produção de que necessitava. (p.16e17)
A Segunda Revolução Industrial inicia-se ainda na primeira metade
do século XIX, maturando entre as décadas de 1870 e de 1890 e se
prolongando até 1950. Cano (1994) descreve assim este período:
. . . maior emprego da base científica com o desenvolvimento da física e da química; a inovação do motor a combustão; o uso da eletricidade; substituição do antigo padrão de livre concorrência com o surgimento da grande empresa, de trustes, cartéis e oligopólios; padrão tecnologicamente muito mais complexo; requisitos de grandes massas de capital e escalas produtivas maiores. Este novo padrão de industrialização constituiria também duas novas peças que se destacariam no cenário das principais economias líderes: o capital bancário e financeiro e o Estado estruturante, formulador e
.,
executor de políticas de industrialização na maioria desses países. (p. 17)
24
Portanto, a Segunda Revolução Industrial provocaria uma radical
transformação no processo de industrialização. Mais uma vez, o Brasil
demoraria cerca de meio século para atravessar este segundo período da
Revolução Industrial, a partir da Crise de 1929. Segundo Cano (1994),
iniciamos a sua implantação entre 1933-1955 de forma restringida e incipiente e de forma mais decisiva nos períodos de 1956-1962 e 1968-1980, quando concluímos a instalação dos setores produtores de bens de consumo durável, de bens intermediários e de capital. (p. 17)
E prossegue o mesmo autor:
... tivemos (o Brasil) maiores dificuldades para o engajamento na Segunda Revolução Industrial do que na Primeira, devido em grande parte às radicais alterações sofridas pelo processo de industrialização: grandes escalas de plantas; grandes massas de capital; complexidades tecnológicas; necessidade de maior uso de base científica; controles monopólicos e oligopólicos pelas grandes empresas, etc. (p. 21)
Portanto, enquanto o Brasil ingressava na Segunda Revolução
Industrial, o mundo desenvolvido já iniciava a Terceira Revolução Industrial:
esta se inicia logo após o final da Segunda Guerra, quando emerge o poder
financeiro das grandes companhias multinacionais, sobretudo de origem da
nação norte-americana, a nova potência econômica mundial. A principal
característica deste terceiro momento é um novo padrão tecnológico,
decorrente da aplicação de diversas pesquisas e invenções no campo da
eletrôniQa, para aplicação no campo industrial, provocando uma revolução
técnica extraordinária no desenvolvimento da microeletrônica, da
informática, da indústria química, de novos materiais e da biotecnologia. Na
década de 70, estas tecnologias são lideradas, além dos Estados Unidos,
pelo Japão e Alemanha, que já haviam recuperado suas economias após o
desastre da Segunda Guerra.
A Terceira Revolução Industrial é o apogeu da Sociedade Industrial e
está criando as condições que levarão (ou já estão levando) a humanidade
à Terceira Onda, ou à Revolução dos Serviços: será a Sociedade Pós
Industrial ou Sociedade do Conhecimento, que será analisada adiante.
25
Antes de prosseguir a análise da Terceira Onda, é necessário
explorar mais profundamente alguns aspectos da Sociedade Industrial,
sobretudo a evolução da gestão empresarial ao longo da revolução
Industrial.
2.2. A EVOLUÇÃO DAS ERAS EMPRESARIAIS
O surgimento do fenômeno empresàrial e, em conseqüência, dos
modelos de gestãp empresarial, ocorre é! partir sobretudo da Segunda
Revolução Industrial, nas últimas décadas do século XIX.
Segundo Reich (1983),
ao contrário da Revolução Industrial britânica (Primeira Revolução Industrial), que meramente dera aos trabalhadores novas ferramentas e fontes mais baratas de energia, que lhes permitia executar com mais eficiência basicamente as mesmas tarefas que faziam antes, as inovações nas últimas décadas do século XIX só
. podiam ser explorados por sistemas de fábricas, em grande escala, equipamentos especializados, recursos seguros de materiais e canais de distribuição e uma nova organização do trabalho. (p. 40) (grifo nosso)
Assim, como não havia até então modelos de gestão que orientassem
a produção em larga escala, os próprios inventores-empreendedores
assumiram naturalmente a tarefa de organizar o processo produtivo. Reich
(1983) retira do "Diário" de Thomas Edison estas palavras: "Meu trabalho
aqui está feito, minha lâmpada é perfeita. Agora vou iniciar a produção
prática do invento". (p. 40) E observe-se que um inglês, Joseph Swan,
reivindicava para si a invenção da lâmpada elétrica, mas só Thomas Edison
conseguiu organizar o empreendimento para produzi-la, o que se
transformou num império industrial.
A Segunda Revolução Industrial ocorre simultaneamente em vários
países, com o início de grandes empreendimentos industriais. Mas é nos
Estados Unidos que o processo industrial se desenvolve mais rapidamente.
Segundo Reich (1983),
I /
A América (. . .) estava singularmente bem equipada para a produção em massa de bens padronizados. eram excepcionalmente móveis o capital e o trabalho, grande o país, com recursos naturais de limites ainda desconhecidos, fontes baratas e abundantes de energia e um mercado potencial quase além do que se podia imaginar. (p. 42)
26
Assim, os Estados Unidos se tornaram a primeira nação a criar as
condições necessárias à produção em larga escala padronizada. Mas, de
outro lado, os ·inventores-empreendedores não tinham experiência na
"administração" das suas fábricas. Na realidade, eles não se preocupavam
com as tarefas administrativas da organização, nem com os sistemas de
coordenação e supervisão. Em vez disso, afirma Reich (1983),
supunha-se que a liderança empresarial requeria simples força de caráter, as virtudes protestantes de prudência, pontualidade e perseverança. (. . .) Os líderes emergentes do mundo dos negócios americanos proclamavam-se autodidatas e louvavam a missão cristã da empresa. O crescimento econômico e a força de caráter subjacente ao mesmo eram ao mesmo tempo apresentados como a salvação do mundo. (p. 46)
Outro aspecto é que a industrialização em larga escala, obtida em
pouco mais de algumas décadas, provocou três grandes problemas,
segundo Reich (1983):
o o excesso de produção em relação à capacidade de distribuir,
comercializar e consumir levou as empresas a remediarem o
problema através de fusões e consolidações, ou então de acordos
de preços entre os industriais, o que obrigou o Governo a
promulgar a Lei Antitruste Sherman, de 1890;
o · a deficiência .da organização das fábricas levou muitos industriais
a contratarem capatazes para supervisionarem os trabalhadores,· o
que provocou um agravamento das relações de trabalho, devido às
atitudes arbitrárias e autoritárias dos capatazes, criando
crescentes dificuldades na coordenação da produção dentro da
fábrica;
o a urbanização acelerada, provocada pela rápida industrialização,
fez aumentar a demanda de serviços sociais, · para o que o
Governo não estava preparado, pois, da mesma forma, a
"administração pública" também era incipiente.
27
Estes três problemas conjugados provocaram a queda da
produtividade nas duas primeiras décadas deste século, decorrente,
portanto, de falhas na estrutura organizacional. Assim, segundo Reich
(1983),
reduziu-se o crescimento contínuo da produção em grande escala. A inquietação trabalhista, as tensões sociais e a agitação política nas primeiras décadas do novo século limitaram a produtividade e colocaram questões fundamentais sobre o papel das grandes empresas na vida americana. Os Estados Unidos procuraram uma solução para o que parecia ser um impasse em sua política e economia. A resposta surgiu sob a forma de uma nova visão política e econômica: a da administração da empresa. (p. 58) (grifo nosso)
Surgia, assim, o que o próprio autor chama de "A Era da
Administração de Empresas", cujo início ocorre em torno de 1920.
A Figura 2 mostra a evolução das eras empresariais ao longo de
quatro momentos principais. Adaptando o modelo proposto por Maranaldo
(1989), são as seguintes eras:
• Era da Produção em Massa
• Era da Eficiência
• Era da Qualidade
• Era da Competitividade
Figura 2 - ERAS EMPRESARIAIS x RELAÇÃO EMPRESA-CLIENTE
I ÊNFASE NOS
VALORES
Adotar o
28
partilhar valo
res)
Valor para
uma nova aborda
gem gerencial
1920 1930 1940 19$0 1960 1970 1980 Ül90 2000
ERA DA PRODUÇÃO EM MASSA .....
j ERA DA EFICIÊNCIA
ERA DA QUALIDADE
• ERA DA
COMPETITIVIDADE
Tendo em vista o objetivo deste estudo, a evolução dos modelos de
gestão empresarial serão analisados de acordo com cada um destes
momentos. No entanto, com relação às duas primeiras eras, procurar-se-á
limitar a descrever suas principais características, pois a literatura sobre a
história da Administração tem fartamente explorado as várias Escolas e
teorias que foram surgindo ao longo daqueles dois períodos: a
Administração Científica, a Escola de· Relações Humanas, a Teoria
Burocrática, o Estruturalismo, a Escola Néo-Ciássica, a Teoria
Comportamental, a Escola Sistêmica e a Teoria da Contingência. Este
conjunto de . abordagens forma o que se pode chamar de "modelos
29
tradicionais" de administração, das quais serão analisadas apenas as
primeiras três, que constituem a base principal do pensamento
administrativo, pois as demais evoluíram a partir das concepções propostas
por aquelas abordagens pioneiras.
2.2.1. A Era da Produção em Massa
A partir desta primeira Era, a gestão empresarial começa
efetivamente a se consolidar como um conjunto de conhecimentos e
princípios que viriam resultar na formação da primeira abordagem científica
da administração, cujas idéias básicas foram propostas por dois
engenheiros: Frederick W. Taylor, que se preocupava com a racionalização
do trabalho e Henri Fayol, que focalizava o aspecto funcional das
organizações.
Segundo Bertero (1992), esta Escola
foi a manifestação de uma racionalidade de tipo baconiano e cartesiano ao nível da teoria da organização. O próprio Taylor lamentava (. . .) a ineficiência industrial que acarretava enormes prejuízos à nação, retardando o seu ritmo de desenvolvimento. Esta ineficiência, no entender de Taylor, era motivada pela falta de uma ciência da administração que permitisse a objetivação dos procedimentos e a constituição de um corpo de conhecimentos que dessem à administração as mesmas características da universalidade encontradiças em outros setores do conhecimento e da atividade humana. (p. 16)
A Administração Científica baseava-se em três princípios:
1 °) a especialização do trabalho através da simplificação de tarefas
isoladas. Segundo Reich (1983)
o novo era o esforço deliberado, laborioso, de decompor as tarefas em seus elementos básicos, de modo que cada uma das tarefas pudesse tornar-se exata e extremamente simples. Especialistas em "tempos e movimentos" procuravam reduzir todos os trabalhos a um número finito de passos elementares, todos os quais poderiam ser distribuídos como tarefas distintas. (. . .) todos os trabalhos manuais consistiam de 17 movimentos básicos. Em todas as tarefas, alguns desses movimentos podiam ser eliminados ou combinados para se obter maior eficiência. (p. 83)
30
2°) normas predeterminadas para coordenar as tarefas. Reich
(1983) continua:
. . . o aumento da especialização ex1g1a coordenação e controle detalhados por supeNisores de nível mais alto. A fim de assegurar a impossibilidade de decisões estreitas demais no nível de supeNisão, os supeNisores por seu turno, precisavam ser coordenados e controlados por um nível ainda mais alto de administração, capaz este de uma perspectiva mais ampla. A especialização pela simplificação obrigava ao desenvolvimento de hierarquias de administração, arranjadas em pirâmide. Todos os níveis da hierarquia eram responsáveis por uma parte progressivamente maior da operação. (p. 84)
3°) controle detalhado do desempenho
Mais uma vez é Reich (1983) quem explica:
O terceiro princípio derivava dos dois primeiros. A fim de saber que regra aplicar a uma situação específica, gerentes em todos os níveis precisavam de informações seguras sobre o estado corrente em cada fase do processo de produção. A administração científica oferecia um grande conjunto de instrumentos de coleta de informações: contabilidade de custos, controle de estoques, controles orçamentários, sistemas de apuração da situação financeira e relatórios sobre execução de tarefas. Requeria também um quadro de funcionários e cronometristas a fim de controlar os resultados. (p. 85)
Enfim, a administração científica tornou o trabalhador uma "extensão
da máquina", como mostra Charles Chaplin satiricamente em seu filme
"Tempos Modernos", de 1940. Este conjunto de princípios partia da
premissa do "homo economicus", baseada na racionalidade cartesiana que
pressupunha como a única motivação do trabalhador a obtenção de um
salário. De outro lado, isto levou à criação da "linha de montagem" de Ford
como o símbolo mais forte da Administração Científica.
A esta corrente de pensamento contrapõe-se uma segunda, ainda
dentro da abordagem clássica da administração, que veio a ser conhecida
como a "Escola de Relações Humanas", originada a partir das experiencias
conduzidas por Elton Mayo na ind~stria Western Eletric, de Hawthorne,
entre 1927 e 1932. Mayo percebe a importância da organização informal,
que leva os trabalhadores a buscarem a cooperação e o relacionamento
com outras pessoas no trabalho. Esta propensão à colaboração permite
31
evitar o conflito social e leva o bem-estar às pessoas: portanto, a
administração deve ser humanizada, partindo da premissa do "homo social".
No entanto, segundo Bertero (1992),
as experiências e teorias de G. Elton Mayo e de seus seguidores, do chamado grupo das Relações Humanas não negaram a necessidade da racionalidade na esfera da administração, mas antes se satisfizeram em apontar algumas limitações dos teóricos anteriores, sem todavia contestar-lhes os fundamentos. O próprio Mayo (. . .); ao avançar uma explicação sobre as causas de não se terem desenvolvido em nossa civilização industrial as "habilidades sociais" (social skills) com a mesma intensidade com que se desenvolveram as "habilidades técnicas" (technical skills), acaba por deplorar o estágio em que se encontravam as ciências sociais, devido, em última instância, ao fato de não terem logrado realizar ainda a "revolução científica" que as ciências da natureza haviam realizado no início da Idade Moderna. (p. 18)
De fato, várias críticas são dirigidas à Escola de Relações Humanas,
considerando suas abordagens ingênuas: por exemplo, a solução dos
conflitos entre os trabalhadores e a organização pela simples negação do
conflito: a solução ficaria no plano teórico. Outras críticas se referem ao
caráter meramente experimentalista desta Escola e ao enfoque
"manipulativo" das relações humanas, visando o interesse exclusivo da
organização.
Assim, o "industrialismo" predominante na Era da Produção em
Massa ainda não contava com uma "ciência social" que permitisse
"operacionalizar" seus conhecimentos em "modelos gerenciais" que
orientassem a administração das organizações.
A Era da Pr~dução em Massa evolui até o final dos anos 40, já no
Pós-Guerra e, segundo Toffler (1980), tem seis características prinCipais,
que marcam a Segunda Onda de transformação:
1 °) A padronização, visando a massificação dos produtos para
atender milhares de consumidores que, pressupostamente, teriam a mesma
necessidade, ou seja, atribuiriam o mesmo valor (satisfação) para o produto.
O Gráfico 1 mostra claramente que isto determinava a relação entre
empresa e cliente de tal modo que a especificação técnica do produto era
definida pela primeira, sem preocupação com a satisfação do segundo.
32
2°) A especialização, provocada pela divisão do trabalho: segundo
Toffler (1980), "A Segunda Onda substituiu o descuidado camponês pau
para-toda-a-obra pelo minucioso e limitado especialista e o trabalhador que
só fazia uma tarefa." (p. 62)
3°) A sincronização, provocada pela valorização do tempo como
dinheiro, à medida em que a produção era efetivada através de máquinas
caras e que, portanto, precisavam ter ritmo próprio. Assim, a sociedade
humana é obrigada a ajustar o seu tempo (horário de trabalhar, de
descansar, de estudar e de todas as atividades humanas) ao "relógio do
sistema produtivo".
4°) A concentração, tanto de energia (insumo para produção em
massa), quanto de pessoas (força de trabalho). Segundo Toffler (1980),
o industrialismo (. .. .) foi chamado a Época das Grandes Encarcerações"- quando· os cnmmosos eram cercados e concentrados em prisões, os mentalmente afetados eram cercados e concentrados em "asilos de loucos" e as crianças cercadas e concentradas em escolas, exatamente como os trabalhadores eram concentrados em fábricas. A concentração ocorreu também em fluxos de capital, de modo que a civilização da Segunda Onda gerou a companhia gigantesca e, além disso, o truste ou monopólio. (p. 66)
Esta caracteristica é o início do gigantismo empresarial. Conforme o
mesmo autor (1980),
por meados da década de 60, as três grandes companhias de automóveis dos Estados Unidos produziam 94 por cento de todos os carros americanos. Na Alemanha, quatro companhias em conjunto -a Volkswagen, a Daimler-Benz, a Opel (GM) e a Ford-Werke -fizeram 91 por cento da produção. Na França, a Renault, a Citroen, a Simca e a Peugeot produziram virtualmente 100 por cento. Na Itália, a Fiat sozinha construiu 90 por cento de todos os automóveis. (p. 66)
5°) A maximização, provocada pelo que T offler chamou de
"macrofilia obsessiva" -uma espécie de mania de grandeza e crescimento.
Segundo ele,
se fosse verdade que os períodos de produção na fábrica produziriam custos de unidade mais baixos, então, por analogia, os aumentos em escala produziriam economias igualmente em outras
atividades. "Grande" tornou-se smommo de "eficiente" e maximização tornou-se o quinto princípio chave da Segunda Onda. (p. 67)
33
Isto resultou que, quando os Estados Unidos completaram a fase do
industrialismo tradicional e começaram a sentir os primeiros efeitos da
Terceira Onda de mudanças, suas 50 maiores companhias industriais
tinham chegado a empregar uma média de 80.000 trabalhadores cada uma.
Algumas companhias já se tornavam gigantescas, como a General Motors,
com 595.000 empregados e a AT&T, atuante no setor de telecomunicações,
com 956.000 empregados por volta de 1970, quando esta se tornaria um
"dinossauro empresarial", conforme Toffler vai denominá-la mais tarde em
seu livro "A Empresa Flexível" (1985).
6°) A centralização, caracterizada pela passagem de uma economia
totalmente descentralizada da Primeira Onda para uma economia cujas
organizações passaram a utilizar métodos totalmente novos para centralizar
o poder; assim, os empregados foram divididos em funcionários "de linha" e
"de administração", visando centralizar o comando e as informações: estas,
por exemplo, fluíam por uma cadeia de comando centralizada até chegarem
ao nível superior, que tomava as decisões e enviava as ordens ao longo da·
linha. A administração centralizada, considerando o seu "sucesso" nas
grandes companhias de então, passou a se tornar modelo para outras
organizações e países cujas economias já faziam ou começavam a fazer
parte da Segunda Onda.
Para Toffler (1980),
estes seis princípios, cada um reforçando o outro, levam implacavelmente à expansão da burocracia. Produziram algumas das organizações burocráticas maiores, mais rígidas e mais poderosas que o mundo já vira, deixando o indivíduo a vaguear num mundo "kafkiano" de mega-organizações que se avolumavam. (p. 72)
Esta conseqüência do "inchaço" organizacional vai levar a uma nova
abordagem na evolução do pensamento administrativo, que foi o súrgimento
da Escola Burocrática e a passagem da Era da Produção em Massa para a
Era da Eficiência (dentro do modelo evolutivo das eras empresariais
ilustrado no Gráfico 1).
2.2.2. A era da Eficiência
A Era da Eficiência demarca o que Motta (1986) chama de
transição da teoria da administração para a teoria das organizações, isto é, a tentativa de estudar o sistema social em que a administração se exerce, com vistas à sua maior eficiência, face às determinações estruturais e comportamentais. A preocupação com a eficiência do sistema. (p. 13)
34
Esta nova postura, decorrente das críticas efetuadas à Administração
Científica pelo - seu mecanismo - e à Escola das relações Humanas - pelo
seu romantismo ingênuo - levará ao surgimento da Escola Burocrática, a
partir dos anos 40.
A inspiração desta escola foi baseada na Teoria da Burocracia do
sociólogo alemão Max Weber. Segundo Bertero (1992),
Weber chega à teoria da organização pelo que ousaríamos chamar de via política. Ao estudar as transformações econômicas, políticas e sociais da sociedade ocidental a partir da Idade Média, Weber não pode deixar de fascinar-se pela importância que gradativamente veio assumindo o Estado até atingir sua atual fisionomia. O Estado como centralizador de poder e responsável pela manutenção da soberania, o que implicava no controle de uma determinada área geográfica, viu-se forçado a criar uma superestrutura administrativa para administrar a coleta de recursos com que sustentar forças armadas de caráter permanente e manter os quadros administrativos não militares para implementação dos ordenamentos jurídicos. Isto levou à criação de uma "Máquina administrativa" ou "burocracia" que se caracteriza, antes de mais nada, pela sua "profissionalização." (p. 18)
Assim, a Escola Burocrática, ao buscar explicar como as
. organizações devem atingir a máxima eficiência, estabelece a premissa do
"Homem Administrativo", ou seja, o comportamento humano é orientado pela
racionalidade: o comportamento humano é previsível.
A partir desta premissa, pode-se estabelecer alguns princípios
enumerados pela Escola Burocrática que caracterizam as organizações,
como:
• O trabalho é dividido racionalmente e as rotinas são padronizadas.
35
• Há um conjunto de regulamentos e normas que estabelecem os
níveis hierárquicos de autoridade e as inter-relações funcionais.
• O sistema de comunicação é formalizado, tornando as relações
entre .as pessoas em caráter impessoal.
• O processo de carreira e as recompensas são baseados na
· meritocracia e na competência técnica.
Muitas destas características . da organização burocrática levarão
mais tarde à exaustão dos "modelos gerenciais" desenvolvidos ainda na
Sociedade Industrial. A Teoria Burocrática tem desdobramento na Escola
Estruturalista que, por sua vez, também recebe influências da Escola de
Relações Humanas. A Escola Néo-Ciássica procura retomar as idéias da
Escola Clássica, adptando-a às necessidades práticas das organizações
modernas.
As demais Escolas procuram desenvolver abordagens inovadoras,
como a Comportamental, que procura abandonar posturas normativas e
prescritivas das três teorias anteriores e a Escola Sistêmica, que focaliza a
organização como um sistema aberto: no entanto,. para efeito deste estudo,
não será necessário analisar estas abordagens de Administração, tendo em
vista que as três primeiras Escolas são as que demarcam as características
principais das organizações da Sociedade Industrial.
No próximo Capítulo, será analisada a exaustão dos modelos
tradicionais de administração, com a passagem da Sociedade Industrial
(Segunda Onda) para a Sociedade do Conhecimento (Terceira Onda). Ao
mesmo tempo, em termos de eras empresariais, as organizações estão
deixando para trás as Eras da Produção em Massa e da Eficiência e
ingressando nas Eras da Qualidade e da Competitividade.
CAPÍTUL03
O ESGOTAMENTO DOS
MODELOS DE GESTÃO DA
SOCIEDADE INDUSTRIAL
37
Os modelos de gestão analisados no Capítulo anterior, chamados de
"tradicionais", sobretudo a Administração Científica de Taylor e Fayol, a
Escola de Relações Humanas de Elton Mayo e a Teoria Burocrática de
Weber orientaram o surgimento e o crescimento das organizações, até que
estas se tornaram, em alguns casos, mega-corporações. À medida em que
foram crescendo, tais organizações foram adquirindo características cada
vez mais rígidas e passaram a ser o modelo do sucesso empresarial da
Segunda Onda.
O presente Capítulo tem o objetivo de analisar o esgotamento destes
"modelos de gestão" que, a partir dos anos 70, já não conseguem responder
aos desafios crescentes e cada vez mais complexos que afetam as
organizações. Ao mesmo tempo, é preciso compreender as causas daquele
esgotamento, as quais são explicadas basicamente pelo rompimento de um
novo paradigma: a passagem da Sociedade Industrial para a Sociedade do
Conhecimento. Mais uma vez, a humanidade esta revendo os aspectos
básicos que caracterizam as ondas de transformação: estamos passando da
Segunda para a Terceira Onda.
3.1. A TRANSIÇÃO DA SOCIEDADE INDUSTRIAL PARA A SOCIEDADE
DO CONHECIMENTO
Para. se analisar os novos modelos de gestão empresarial,
emergentes a partir dos anos 60 (com a administração _J.aponesa) e em
desenvolvimento ao longo dos anos 80 e 90, com novas abordagens, como
a gestão empreendedora e a gestão participativa, é necessário
compreender o cenário ambiental que provocou a exaustão dos modelos
38
tradicionais de gestão. Na medida em que as organizações fazem parte de
um sistema político, social e econômico, as mudanças ambientais afetam
todos os tipos de organização- públicas e privadas; pequenas ou grandes;
com objetivos lucrativos ou não. Assim, todas estas organizações têm sido·
afetadas. nas últimas décadas por um conjunto de transformações que
represe~tam um novo paradigma: a emergência de uma nova Sociedade
que vai "suceder" ao modo de vida determinado até então pela Revolução
Industrial.
É bem verdade que a palavra "suceder" tem sentido relativo, pois a
intensidade de mudança depende de que "sociedade" estamos falando:
regiões mais desenvolvidas industrialmente certamente serão as mais
influenciadas na mudança para o novo paradigma. No entanto, há países
como o Brasil, no qual convivem três sociedades diferentes- da Revolução
Agrícola, da Revolução Industrial e uma minoria já vivenciando a nova
Sociedade Pós-Industrial.
Vários autores têm estudado e escrito sobre a mudança da
Sociedade Industrial para uma Nova Sociedade e várias terminologias
diferentes têm sido adotadas:
Daniel Bell (1973) foi o pioneiro em citar a "Sociedade Pós
Industrial".
• Alvin Toffler dedicou uma trilogia a este assunto: O Choque do
Futuro (1970); a Terceira Onda (1980) e Powershift- As mudanças
do poder (1990), sem designar um nome específico para esta
"nova sociedade".
• Peter Drucker (1993) dedica um dos seus últimos livros à
"Sociedade Pós Capitalista".
• John Naisbitt (1982) utilizou o termo "Sociedade da Informação"
em seu livro "Megatendências", ao descrever o seguinte fato:
Os Estados Unidos pareciam ser, exteriormente, uma economia industrial próspera, mas um marco fundamental simbólico, pouco noticiado, anunciava o fim de uma era. Em 1956, pela primeira vez, trabalhadores em posições técnicas, administrativas e de escritório, ultrapassaram em número os operários da indústria. A América industrial abria passagem para uma nova sociedade, onde, pela primeira vez na história, a maioria de nós trabalhava mais com informação do que com produção de bens. (p. 12)
39
Este fato é apenas um dos sintomas das profundas mudanças que
começavam a provocar as mais importantes e velozes transformações na
civilização humana: a era do conhecimento. No capítulo anterior,
analisaram-se as características de cada um dos estágios da história da
humanidade que antecederam a Sociedade do Conhecimento. Crawford
(1994) cita tais características desta nova Sociedade, quais sejam:
• Paradigma: a base é o conhecimento, orientado por ciências
avançadas: eletrônica, física quântica, biologia molecular e
ecologia. As idéias centrais do paradigma são de que os homens
são capazes de uma transformação contínua e de crescimento
(pensamento com cérebro integrado); o sistema de valores enfatiza
um indivíduo autônomo numa sociedade descentralizada com
valores femininos dominantes;
• O Sistema Político: baseia-se na cooperação global: as instituições
são modeladas com base na propriedade e no controle do
conhecimento; as normas são definidas a nível de organizações
supra-nacionais (exemplo: ISO 9000 para a Qualidade; ISO 14000
para o meio-ambiente), envolvendo também os governos locais e
suas unidades;
• O Sistema social: Há diversos tipos de famílias, inclusive as
formadas por homossexuais, sendo sempre o indivíduo o centro
das mesmas; há ênfase em auto-ajuda; os valores sociais
enfatizam a diversidade, o igualitarismo e o individualismo; a
educação é individualizada e contínua;·
40
• O Sistema Econômico: A economia tem base global integrada, sua
atividade principal é a provisão de serviços de conhecimento com
maior fusão entre produtor e consumidor; a economia é
dinamizada através de organizações empreendedoras de pequeno
porte, cujos membros têm um ganho diretamente proporcional aos
seus resultados; o capital humano é o recurso fundamental;
Tecnologia: a energia é natural (sol e vento) e nuclear; os
materiais básicos de produção são recursos renováveis
(biotecnologia), a cerâmica e a reciclagem de materiais; as
ferramentas principais são máquinas para ajudar a mente
(computadores e eletrônica relacionada); os métodos de produção
são automatizados (robótica); o sistema de transporte é especial; o
sistema de comunicação utiliza canais individuais ilimitados,
através de meios eletrônicos.
Assim, este conjunto de novos paradigmas da Sociedade do
Conhecimento passa a tornar obsoletos os conceitos correspondentes que
vinham evoluindo ao longo da Revolução lndustrfal. Para as organizações,
por exemplo, os esU'!dos de tempos e movimentos de Frederick Taylor que
estabeleceram os fundamentos da Teoria Científica _da Administração têm
aplicação bastante restrita na economia do conhecimento, baseada
predominantemente em atividades ligados à informação, sobressaindo o
setor de serviços em detrimento das empresas manufatureiras.
As mudanças fundamentais da Sociedade Industrial para a
Sociedade do Conhecimento estão suportadas por um conjunto de
suposições que caracterizam cada uma destas Sociedades. Tais suposições
estão sintetizadas, para efeito comparativo, no Quadro 1.
Como decorrência das suposições básicas das Sociedades Industrial
e do Conhecimento, alguns valores básicos estão sofrendo transformações
radicais na passagem da primeira para a segunda. A seguir, alguns dos
valores objeto de tais mudanças são citados:
41
• da hierarquia (Sociedade Industrial) para a igualdade (Sociedade
do Conhecimento): o nível educacional passam a gerar maiores
oportunidades de mobilidade social.
• da conformidade (Sociedade Industrial) para a individualidade e
criatividade (Sociedade do Conhecimento): as pessoas deixam de
aceitar passivamente o que está estabelecido e passa a gerar
(novos) conhecimentos.
• da padronização (Sociedade Industrial) para a diversidade
(Sociedade do Conhecimento): as necessidades cada vez mais
individualizadas dos clientes obrigaram as empresas a diversificar
suas linhas de produtos e serviços.
• da centralização (Sociedade Industrial) para a descentralização
(Sociedade do Conhecimento): em decorrência do maior
igualitarismo na sociedade e nas organizações, os modelos
autocráticos estão se tornando obsoletos.
• da eficiência (Sociedade lndustrial),para a eficácia (Sociedade do
Conhecimento): deve-se enfatizar mais os resultados do que os
meios e recursos para atingi-los.
• da especialização (Sociedade Industrial) para a generalização
(Sociedade do Conhecimento): as novas tecnologias de trabalho
requerem das pessoas visão holística (do todo) e postura
interdisciplinar na organização.
42
Quadro 1 -COMPARAÇÃO DE SUPOSIÇÕES BÁSICAS NAS SOCIEDADES
INDUSTRIAL E DO CONHECIMENTO
SOCIEDADE INDUSTRIAL SOCIEDADE DO CONHECIMENTO
A maioria das pessoas deseja sucesso A partir do memento em que as necessidades
econômico para atender a necessidades de subsistência foram satisfeitas, as
materiais; assim, o modo de motivá-las é recompensas unicamente econômicas não
através de recompensas econômicas. são suficientes para motivar a maioria das
pessoas.'
O trabalho, para maioria das pessoas, deve O trabalho, para a maioria das pessoas, deve
ser rotineiro e padronizado. ser variado, não repetitivo e responsável,
desafiando a capacidade individual de
discernimento, avaliação e julgamento.
Quanto maior a empresa, nielhor, mais forte Há limites superiores para as economias de
e mais lucrativa será. escala, tanto para corporações quanto para
organizações governamentais
Mão-de-obra, matérias-primas e capital são Informação e conhecimento são os elementos
os elementos básicos da produção. básicos da produção. •
A produção de bens e serviços A produção de bens e serviços orientados
padronizados é mais eficiente que uma para o cliente, através de um novo sistema
produção artesanal, na qual cada unidade artesanal, ou a produção artesanal, baseada
produzida difere da próxima. na informação e na tecnologia avançada, é
mais eficaz do que a produção em massa.
A organização mais eficiente é a burocracia, A melhor maneira de organização não é
na qual cada suborganização tem um papel burocracia, mas adhocracia. Numa
permanentemente claro e definido na organização ad hoc, cada componente
hierarquia. A burocracia é uma máquina organizacional é modular e disp_onível, cada
organizacional para a produção de decisões unidade interage com muitas outras
padronizadas. lateralmente e as decisões são adequadas a
cada cliente e não padronizadas.
Os avanços tecnológicos ajudam a Os avanços tecnológicos não trazem
padronizar a produção e levam ao necessariamente o progresso e podem, se
progresso. . não forem controlados cuidadosamente,
destruir o progresso já alcançado.
Fonte: CRAWFORD, Richard. Na Era do Capital Humano. São Paulo: Atlas, 1994.
43
o da maximização (Sociedade Industrial) para a qualidade de vida
(Sociedade do Conhecimento): ocorre um "ponto de mutação", na
visão de Capra ( 1989), que obrigará a sociedade a prestar mais
"atenção às condições políticas e considerar os custos sociais e
ambientais das atividades econômicas." (p. 203)
o da ênfase no conteúdo quantitativo (Sociedade Industrial) para a ênfase na qualidade do resultado (Sociedade do Conhecimento):
foi a grande mudança observada no comportamento dos
consumidores a partir dos anos 70, provocando a Era da
Qualidade.
o da segurança (Sociedade Industrial) para a auto-realização
(Sociedade do Conhecimento): as pessoas querem conquistar
seus objetivos pessoais e não mais serem agentes passivos,
aguardando que os mesmos sejam atendidos.
Este conjunto de suposições básicas e valores que estão sofrendo
um processo de mudança radical na passagem da Sociedade Industrial para
a Sociedade do Conhecimento estão provocando o mais importante
conjunto de transformações da história humana. Dentre os estudos que têm
avaliado os impactos destas mudanças, nos campos econômico, político,
social, cultural, organizacional e espiritual, destacam-se as análises das
megatendências dos anos 80 e do próximo milênio, conduzidas por John
Naisbitt e Patrícia Aburdene, que serão comentados a seguir:
3.2. AS MEGATENDÊNCIAS: AMEAÇAS E OPORTUNIDADES PARA AS
ORGANIZAÇÕES
No início dos anos 80, uma instituição privada dos Estados Unidos
(The Nasbitt Group ), passava a divulgar os resultados dos seus estudos
sobre as grandes mudanças que afetavam a sociedade americana. Neste
estudo, Naisbitt (1982) indicava as dez principais tendências que afetavarn
a sociedade, a partir de uma visão dos Estados Unidos para o mundo. Eram
as seguintes transfórmações que se vislumbravam:
44
1) De Sociedade Industrial para a Sociedade da Informação.
2) Da Tecnologia Forçada para o Alta Tecnologia/Alto Contato
Humano.
3) Da Economia Nacional para a Economia Mundial.
4) Do Curto Prazo para o Longo Prazo.
5) Da Centralização para a Descentralização.
6) Da Ajuda Institucional para a Auto-Ajuda.
7) Da Democracia Representativa para a Democracia Participativa.
8) Das Hierarquias para as Redes.
9) Do Norte para o Sul.
1 O) Do "Isto ou Aquilo" para a Opção Múltipla.
Percebe-se uma razoável congruência com as mudanças
anteriormente citadas por Crawford (1994), quando este foca a passagem
da Sociedade Industrial para a Sociedade do Conhecimento.
As megatendências constituem um conjunto de grandes
transformações nos âmbitos político, social, econômico, cultural, tecnológico
e espiritual, sem esquecer os aspectos organizacionais. Assim, as
organizações são afetadas profundamente por tais mudanças, seja no
âmbito restrito do seu negócio (clientes, fornecedores e empregados), seja
no ambiente ampliado do negócio (variáveis macro-ambientais).
Neste sentido, cada uma das megatendências citadas representa um
desafio para qualquer organização: tal desafio, dependendo da forma como
a mudança é percebida pela mesma, pode ser vista por esta de dois
ângulos diferentes: como ameaça ou como oportunidade. Aqui a abordagem
é a mesma da Gestão Estratégica, que parte da identificação da missão e
do negócio e, em seguida, do conhecimento do ambiente do negócio,
através do conjunto de ameaças e oportunidades que afetam cada
organização.
45
Embora Naisbitt & Aburdene (1990) tenham continuado e avançado
seus estudos das megatendências em direção à década de 90 e à virada do
próximo milênio, é preciso analisar melhor os efeitos das megatendências
dos anos 80 sobre as organizações, pois foi o momento de maior impacto e
cujas mudanças contribuíram para alterar radicalmente os paradigmas que
prevaleciam até então, ligados à Revolução Industrial: aquelas mudanças
representam o início da Sociedade do Conhecimento.
Assim, as empresas só sobreviverão à mudança dos novos
paradigmas, caso se antecipem ou se adaptem às novas características
ambientais, considerando a realidade sócio-econômica em que estão
inseridas. No caso do Brasil, por exemplo, aquelas megatendências dos
anos 80 só começam a ser sentidas de forma mais concreta nos anos 90 e,
mesmo assim, é preciso avaliar as diferentes realidades regionais no país,
considerando sua extensão territorial e sua complexa heterogeneidade
social e econômica.
As conseqüências (ameaças e oportunidades) que as organizações
têm sentido a partir destas megatendências podem ser sintetizadas em
algumas idéias:
• Megatendência 1: Da Sociedade Industrial para a Sociedade de
Informação
Segundo Naisbitt (1982), há cinco aspectos principais a serem
avaliados:
• A sociedade da informação é uma realidade econômica e não uma abstração intelectual.
• As inovações nas comunicações e na tecnologia de computadores acelerarão o ritmo da mudança, encolhendo o tempo de transmissão das informações.
• As novas tecnologias da informação serão aplicadas primeiro em antigas tarefas industriais, depois, gradualmente, gerarão novas atividades, processos e produtos.
• Numa sociedade muito letrada, onde os conhecimentos básicos de ler e escrever são mais necessários do que nunca, nosso sistema educacional se deteriora cada vez mais, formando pessoas cada vez menos preparadas. (p. 19)
46
Esta última afirmação do autor, embora se refira à realidade dos
Estados Unidos, aplicada à situação brasileira, torna-se um verdadeiro
desafio nacional. O Brasil está entrando na "Sociedade do Conhecimento"
com um índice de escolaridade de sua população em torno de 3, 7 anos, em
comparação a índices entre 1 O e 14 à nos para os países mais
desenvolvidos.
Portanto, para as empresas, se de um lado há imensas oportunidades
de novos produtos e serviços baseados na informação, de outro há grandes
ameaças com relação a um mercado estreito para tais produtos e serviços,
bem como escassez de pessoas educadas para trabalharem em atividades
relacionadas a novas tecnologias.
• Megatendência 2: Da Tecnologia Forçada
Tecnologia/Grande Contato Humano
Segundo Naisbitt (1982),
para a Alta
sempre que uma nova tecnologia é introduzida na sociedade, deve ser contrabalançada por uma resposta humana - ou seja, o grande contato humano - ou a tecnologia é rejeitada. Quanto mais alta tecnologia, mais "grande contato humano". (p. 39)
Assim, à medida em que as empresas vão introduzindo novas
tecnologias, maior importância deve ser conferida à forma como as pessoas
- clientes ou funcionários - se adaptarão às novas tecnologias. Na
Sociedade Industrial, a tecnologia era forçada - as pessoas ficavam
alienadas ao produto do seu trabalho e, em conseqüência, míopes em
relação ao cliente.
Assim, as oportunidades desta mudança estão na busca do equilíbrio
entre as necessidades das pessoas e as novas tecnologias, sendo estas
que deverão se adaptar às primeiras. As ameaças são representadas pela
rejeição das pessoas - desde clientes que se recusam a "consumir" os
novos produtos ou serviços (exemplo: o cliente do banco que não se adapta
aos serviços eletrônicos de saques, saldos e pagamentos de contas)- ou de
47
funcionários que não se adaptam às novas tecnologias, tornando-se
profissionais obsoletos e desmotivados.
• Megatendência 3: Da Economia Nacional para a Economia
Mundial:
Sem dúvida, esta é a mudança que talvez mais tenha ampliado sua
importância ao evoluir em direção aos nos 90, quando passa a ser uma das
principais megatendências. Sua manifestação mais concreta é pelo fim das
fronteiras geográficas dos países enquanto mercado, provocando a
formação de blocos econômicos regionais que vão se consolidar na década
de 90, como a Comunidade Econômica Européia (agora União Européia), o
NAFTA (North America Free Trade Agreement), a Associação Econômica
dos Países Asiáticos (evolução dos "Tigres Asiáticos") e Mercosul -
Mercado Comum dos Países do Cone Sul, envolvendo Brasil, Argentina,
Uruguai e Paraguai, bem como outros blocos em formação no mundo.
A globalização da economia está provocando os novos conceitos de
"produto global", "consumidor global", "empresa global" e "mercado global".
São produtos globais o automóvel, o computador, a alimentação "fast-food",
o vestuário "jeans", o calçado tênis e outros; são serviços globais as
telecomunicações (uma das provocadoras de tal globalização), a cultura
(vídeo, cinema e m~sica) e entretenimento (turismo, eventos esportivos e
artísticos, entre outros).
De outro lado, esta megatendência está provocando o surgimento de
um estilo global de vida, manifestado no consumo daqueles produtos e
serviços globais, o que fêz "explodir" nos últimos anos as redes de
franchising, cujo crescimento é viabilizado exatamente pelo conceito da
"globalização do estilo de vida". No entanto, contrapõe-se a tal
megatendência o nacionalismo cultural, que reage frente à globalização, em
defesa dos valores comunitários ou nacionais, como território, cultura e
idioma próprio: é o fenômeno dos conflitos bélicos localizados, geralmente
de povos e nacionalidades que pretendem resgatar sua identidade cultural.
48
Certamente não há empresa que não esteja afetada atualmente por
esta megatendência: mesmo que seja uma pequena empresa, sem qualquer
operação comercial com o mercado externo, provavelmente tem que ajustar
o seu produto/serviço, estratégia de marketing ou processo produtivo a esta
nova situação ambiental. Assim, as oportunidades e ameaças decorrentes
desta megatendência certamente estão entre as maiores, considerando
outras megatendências, inclusive com exigências dos modelos de gestão
das empresas, como será analisado adiante.
• Megatendência 4: Do Curto Prazo para o Longo Prazo
Na Sociedade Industrial, as empresas criaram estruturas voltadas
para a busca de resultados a curto prazo. A ênfase na atribuição de
objetivos e metas e seus sistemas de acompanhamento e controle; as
políticas de dividendos aos acionistas; os planos de carreira rígidos e
bonificações que premiavam resultados "do próximo balancete" levaram as
empresas a se voltarem "para dentro", esquecendo as necessidades dos
clientes e o seu próprio papel social. A mudança nos valores e
pressuposições básicas, na passagem da Sociedade Industrial para a
Sociedade do Conhecimento, provocou novas posturas dos clientes: maior
exigência com relação à qualidade dos produtos, postura ecológica no estilo
de vida, atitudes politicamente corretas e outras manifestações
comportamentais que evidenciam estarem as pessoas mais preocupadas
não apenas com o "seu" bem-estar, mas da coletividade.
Esta megatendência tem trazido ameaças às empresas no sentido
destas . não perceberem as mudanças que ocorrem no seu ambiente de
negócio. De outro lado, existem as oportunidades para aquelas que
repensarem o seu negócio e mudarem s.ua postura de planejamento
estratégico para visão estratégica. Tal mudança terá impacto fundamental
também nos novos modelos de gestão, como será analisado adiante.
49
• Megatendência 5: Da Centralização para a Descentralização
A Sociedade Industrial provocou o surgimento de grandes
organizações, tanto públicas como privadas, a partir do conceito de
produção em massa. Tais organizações se agigantaram e se tornaram
verdadeiros "organossauros", sem condições de se movimentarem sobre
suas próprias "patas". À medida em que a velocidade das mudanças
aumenta, elas perdem flexibilidade para acompanhar tais mudanças. Para
sobreviver na Sociedade da Informação, é preciso ter agilidade: as grandes
organizações estão buscando o caminho reverso, através de processos de
descentralização, seja utilizando parcerias com pequenas empresas
(terceirização, franchising e outros tipos de parcerias), seja "demolindo"
parte da burocracia que conduziu à centralização. Os novos modelos de
gestão são, em parte, decorrência desta nova postura de demolir e
reconstruir uma empresa mais flexível, através de programas de melhoria
contínua ou mudanças radicais de reengenharia.
As ameaças da megatendência existem para as empresas que
reagirem defensivamente a esta mudança. As oportunidades existem para
as empresas que mudarem, inclusive para pessoas que estão buscando sua
auto-realização através de projetos de empreendimento próprio, tornando
se parceiras de tais empresas.
• Megatendência 6: Da Ajuda Institucional para a Auto-Ajuda
A reconstrução da economia mundial, após a Segunda Grande
Guerra, seguiu a cartilha "keynesiana" que orientava o Governo a assumir
os investimentos básicos para atender as principais necessidades da
sociedade - educação, saúde, segurança, transportes, moradia, previdência
e outros. Era a política do "Welfare State" (Estado do Bem-Estar-Social).·
Segundo Naisbitt (1982)
confiamos cada vez mais no governo para nossas necessidades básicas. A função tradicional de um governo é a defesa e proteção de seus cidadãos. Pedimos também que ele fornecesse comida, moradia e empregos. Mas, na década de 60, o papel do governo
cresceu a ponto de ele testar brinquedos, regular o meio ambiente e grande parte da economia. (p. 129)
50
O Brasil não só seguiu a mesma receita, como também, na visão dos
economistas liberais, "exagerou na dose". Isto criou uma imensa máquina
burocrática que chega praticamente falida nos anos 80 e ainda permanece
como o principal problema estrutural do país, sendo o consenso que a
solução .a longo prazo do processo inflacionário é a "reforma fiscal". Em
outras palavras, o Estado devolverá, através da privatização, a prestação da
maioria dos serviços de interesse público às instituições civis.
No entanto, independente desta iniciativa, a própria sociedade civil já
vem criando mecanismos alternativos à prestação daqueles serviços pelo
Estado. Assim, ao lado da assistência médica pública ineficiente, nasceu um
setor privado de prestação de serviços na área de saúde; idem nas áreas de
educação, segurança, previdência e outras.
De outro lado, o custo social do "Welfare State" tornou-se de tal
modo insuportável que, em alguns países, já se estuda o sistema do
"Workfare", ou seja, a vinculação da ajuda governamental aos que
trabalham ou estão temporariamente sem trabalho. Esta nova postura é
decorrente do "poço sem fundo" criado pelas políticas de proteção social
que, em alguns países, tornaram o "desemprego" uma ocupação formal
mais protegida do que o emprego de baixa renda.
, O movimento de auto-ajuda provocou o surgimento e crescimento
rápido de um conjunto de instituições que se voltaram para áreas de
interesse social, porém sem estarem formalmente no Governo: trata-se das
chamadas "Organizações Não-Governamentais" (ONG's) ou, como também
são chamadas, organizações do Terceiro Setor.
O reflexo nos negócios é a busca do auto-emprego, que tem
provocado o fenômeno chamado "entrepreneurship" nos Estados Unidos, no
período de 1975-85 e, no Brasil, a partir da recessão econômica no período
1981-83: em outras palavras, no momento em que as políticas públicas de
geração de empregos fracassaram com a recessão econômica, a sociedade
reagiu na tentativa dos indivíduos gerarem seu próprio trabalho e garantirem
sua sobrevivência econômica. "Saímos de uma sociedade administrativa
para uma sociedade empreendedora", afirma Naisbitt (1982). Esta
51
megatendência é uma ameaça para as empresas cujas atividades ainda
dependem essencialmente da contratação pelo Estado, como empreiteiras
de obras públicas e fornecedores de produtos e serviços cujo principal
cliente é o Governo. No entanto, estão ocorrendo inúmeras oportunidades
de prestação de serviços alternativos à ineficiência governamental ou de
participação em processos de privatização de serviços públicos, seja
concorrendo isoladamente ou se associando em parcerias ou consórcios
com outras empresas. De outro lado, crescem produtos e serviços ligados à
tendência do "faça você mesmo" como uma indicação de que um maior
número de pessoas estão buscando sozinhas resolver seus problemas
operacionais e domésticos, em grande parte devido ao aumento dos custos
de prestação de serviços.
• Megatendência 7: Da Democracia Representativa para a
Democracia Participativa
Esta megatendência decorre diretamente das duas anteriores
(descentralização e busca da auto-aJl:Jda). Segundo Naisbitt (1982)
a ética da participação espalha-se de baixo para cima (. . .) e está alterando radicalmente a maneira como achamos que as pessoas devem ser dirigidas nas instituições. Cidadãos, trabalhadores e consumidores estão exigindo e obtendo maior voz ativa no governo, nos negócios e no mercado. (p. 157)
Portanto, esta megatendência tem efeitos no campo da política, dos
negócios e até das relações inter-pessoais, uma vez que a cultura
participativa cria maior voluntariedade e comprometimento das pessoas.
A Sociedade Industrial criou instituições públicas e modelou as
organizações privadas, visando a massificação dos produtos e serviços,
falhando num aspecto essencial: são "pessoas" que produzem e são
"pessoas" que consomem.
O consumidor não era ouvido, como indica a relação empresa-cliente
demonstrada no Gráfico 1, durante as Eras de Produção em Massa e da
Eficiência. Mas, a partir dos anos 70 nos estados Unidos e já nos anos 90
no Brasil, amadurece o movimento do consumidor ciente dos seus direitos.
52
Forma-se um verdadeiro "partido do consumidor", movimento que
certamente terá cada vez mais maior peso político.
De outro lado, as pessoas, enquanto empregados de uma empresa,
passam a buscar maior espaço para sua auto-realização pessoal e
profissional através do trabalho. Esta nova postura, decorrente da mudança
dos valores básicos na Sociedade do Conhecimento, tem pressionado as
empresas a desenvolverem novos estilos de gestão, o que será abordado
adiante. Empresas que têm resistido a tal pressão correm a ameaça de
perder (se já não perderam) seus funcionários mais competentes e criativos.
De outro lado, empresas inovadoras têm utilizado a disposição de seus
funcionários para uma maior participação e têm tido sucesso no
desenvolvimento de um novo relacionamento com os mesmos, através de
uma postura de parceria "empresa-empregado". Em tais empresas,
inclusive, a palavra "empregado" já é substituída por outras, como
"associado", "colaborador", "talento", "ser humano" e outras.
• Megatendência 8: Das Hier,a_rquias para as Redes
A Sociedade Industrial elegeu o modelo "piramidal" para estruturar e
gerenciar as empresas e, para tanto, inspirou-se no modelo hierarquizado
da Igreja Católica e do exército. Várias correntes do pensamento
administrativo tentaram propor mecanismos mais eficientes, mas na prática
não houve resultados efetivos: o sistema de produção em massa impunha a
estrutura hierarquizada de poder. Com o advento da Sociedade da
Informação, ocorrem as seguintes mudanças que afetam as hierarquias
organizacionais:
• o fluxo das informações é diferente do fluxo da manufatura;
• começam a surgir nas empresas nos anos 70 alternativas
organizacionais de unidades menores e descentralizadas:
unidades de negócio; centros de ·lucros ou de resultados, entre
outras formas;
53
• desenvolvem-se modelos participativos de gestão, envolvendo os
trabalhadores em equipes (círculos de controle de qualidade, por
exemplo);
• melhora o nível educacional dos trabalhadores, com postura de
rejeição natural à estrutura hierarquizada das empresas.
Este conjunto de mudanças não destruiu a hierarquia das
organizações: estas permanecem, tendo em algumas empresas sido
reduzidas quanto ao número de seus níveis e/ou, em outras, tendo passado
por flexibilização de suas normas. No entanto, a partir dos anos 80, começa
a proliferar, dentro e fora das empresas, a palavra "networking", ou seja,
"rede": trata-se de uma estrutura de comunicação lateral entre as pessoas,
fora da estrutura hierárquica formalizada.
E tais redes não se limitam ao campo do trabalho: hoje elas se
multiplicam na área de consumo ("network marketing"), na área social (o
movimento feminista em sua origem), na área de entretenimento
(competição de xadrez por computador, por exemplo), na troca de
informações tecnológicas (redes de conhecimento tipo Internet) e outras.
Em suma, as redes se tornaram uma forma de escapar às estruturas
hierarquizadas, pois estas não conseguem estabelecer relações laterais, já
que perderiam o controle de informações e, portanto, o poder. De outro
lado, nas redes prevalece o princípio "igualitário": há regras consensuais
que todos obedecem, mas não há controles hierarquizados.
Para as empresas que ainda adotam modelos centralizadores de
gestão, não há dúvida de que esta megatendência constitui uma das mais
sérias ameaças à sua sobrevivência. No entanto, para aquelas que
identificarem tais redes como oportunidades de mudanças em direção a
modelos mais flexíveis de gestão, certameote sobreviverão e se tornarão
uma espécie de empresa do futuro- a corporação virtual, baseada em redes
de parcerias, o que será comentado nos modelos emergentes de
administração.
54
• Megatendência 9: Do Norte para o Sul
Esta mudança, do ponto de vista geográfico, diz respeito a uma
reestruturação da economia norte-americana, que está se deslocando não
só no sentido Norte para o Sul, como também do Leste para o Oeste. Nas
megatendências dos anos 90, tal mudança evolui para incluir a região
formada pela Orda do Pacífico ("Pacific Rim") formada pela Costa Oeste dos
Estados Unidos, mais Japão, Coréia do Sul, Hong Kong, Cingapura,
Formosa e os países de industrialização emergentes, como Tailândia,
Indonésia, Filipinas e o Sul da China, ou seja, trata-se da tendência do
deslocamento do eixo do "Atlântico" para o eixo do "Pacífico" como a região
economicamente mais dinâmica e competitiva do mundo. Tal reestruturação
é decorrente da estagnação e do declínio dos setores industriais
tradicionais, os quais estão sendo substituídos por outros setores mais
dinâmicos da economia. Este fenômeno também começa a ocorrer no Brasil,
com o deslocamento do parque industrial das regiões tradicionalmente
manufatureiras (área metropolitana de São Paulo, por exemplo) para outras
regiões de desenvolvimento industrial mais recente.
• Megatendência 10: Do "Isto ou Aquilo" para a Opcão Múltipla
A sociedade massificada da Revolução Industrial tinha poucas
oportunidades de exercer opção na escolha de produtos ou serviços,
procurando atender suas necessidades individualizadas. Mesmo fora da
área de consumo, a situação não era muito diferente: para o projeto de vida
pessoal, era casar ou permanecer solteiro; para escolher uma profissão, era
"colarinho azul" ou "colarinho branco" (trabalho na fábrica ou no escritório),
e outras situações semelhantes.
A Sociedade da Informação abriu a possibilidade da diversidade; há
múltiplas opções para tudo: desde a diversificação de produtos e serviços,
aproximando-se cada vez mais da personalização do atendimento, o mesmo
ocorrendo em todos os aspectos da vida humana; a família tem vários
arranjos possíveis que não mais a tríade "pai-mãe-filhos"; as carreiras
profissionais multiplicaram as opções com as novas tecnologias de trabalho;
a busca da espiritualidade pode ser atendida com uma ampla gama de
55
religiões, seitas, movimentos esotéricos e filosofias alternativas de vida.
Enfim, o ser humano dificilmente poderá reclamar da falta de opções em
quase todos os campos de suas necessidades.
A ameaça para as empresas é não abrir o leque de opções de
produtos e serviços aos seus clientes. Assim, há grandes oportunidades
decorrentes da personalização crescente de produtos e serviços que
procuram atender de forma "customeirizada" os clientes potenciais.
A evolução das megatendências
As dez megatendências analisadas dizem respeito às mudanças
ocorridas ao longo dos anos 80, tendo em vista sobretudo a realidade do
que ocorreria naquela década nos Estados Unidos. À medida em que
aqueles fatos foram evoluindo (e confirmando a maioria das previsões) em
direção aos anos 90, observa-se que grande parte das mudanças
anunciadas passa a se generalizar por todos os países, abrangendo a
sociedade global, porém em ritmo e intensidade variados de acordo com o
grau de desenvolvimento sócio-eco~<?mico de cada país. Assim, no caso do
Brasil, apenas na década de 90 estão sendo percebidas as mudanças em
vários dos aspectos anunciados para os Estados Unidos nos anos 80: por
exemplo, a disseminação de sistemas de comunicação lateral (redes), a
descentralização de grandes estruturas, tanto na área pública como privada,
a maior integração à economia mundial, maior conscientização do
consumidor, entre outras posturas que vão se modificando e criando
ameaças e/ou oportunidades para as empresas.
No entanto, as megatendências dos anos 80 também evoluíram em
termos de conteúdo e o próprio Naisbitt, juntamente com Aburdene (1990),
desenvolveram novos estudos que levaram à descrição do cenário das
grandes transformações ao longo dos anos 90, em direção ao próximo
milênio. Segundo eles,
as tendências para o milênio influenciarão elementos importantes de sua vida - suas decisões quanto à carreira e emprego, suas escolhas em termos de viagens, negócios e investimentos, o lugar onde residir e a educação de seus filhos. Para obter o máximo desta
extraordinária década, você precisa estar consciente das mudanças que estão ocorrendo à sua volta. (p. 23)
56
Tendo em vista os objetivos deste estudo, podem ser destacadas as
seguintes megatendências que mais estão afetando as organizações nos
anos 90, todas elas representando a consolidação de mudanças que já
ocorriam nos anos 80.
• a globalização da economia
• a globalização do estilo de vida
• o declínio do Welfare State
• a era da biologia
• a emergência de novas lideranças
• o triunfo do indivíduo
As duas primeiras representam o prosseguimento da integração
econômica global e foram aceleradas com o fim da Guerra Fria,
representado pela queda do Muro de·Berlim em 1989. De outro lado, as três
últimas representam aspectos que estão afetando diretamente as pessoas e
as organizações.
Assim, a "era da biologia" significa o abandono da postura
mecanicista da "era da física" tradicional (deve-se lembrar que a própria
física evoluiu para a abordagem da física quântica). Neste sentido, as
organizações serão modeladas segundo as premissas da biologia, ou seja,
dos organismos vivos, cujos elementos interagem dinamicamente e se
iritercomunicam com o seu ambiente externo. Os novos modelos gerenciais,
baseados em estilo participativo e visão holística, bem como a postura
empreendedora ou a tendência à corporação virtual, estão inspirados mais
nos preceitos da biologia do que da física.
Com relação à emergência das novas lideranças, segundo Naisbitt e
Aburdene ( 1990}, há dois aspectos mais importantes a destacar:
a) O princípio dominante da organização deixou de ser a gerência com o objetivo de controlar a empresa, e passou a ser a liderança com o objetivo de extrair das pessoas o que elas têm de melhor e de
reagir rapidamente às mudanças"; b) "Fora do modelo militar de gerência, os homens e as mulheres são igualmente capazes de inspirar comprometimento e extrair das pessoas o que elas têm de melhor. (. . .) Se o homem foi o protótipo do trabalhador industrial, o trabalhador da era da informação é tipicamente uma mulher. (p.256)
57
Além da carreira empresarial, que tem obrigado diversas empresas a
reverem suas políticas de recursos humanos, no que diz respeito sobretudo
a planos de carreira e benefícios sociais, as mulheres têm aumentado sua
participação na carreira política e em cargos públicos. Também deve se
destacar a participação das mulheres na abertura de novas empresas,
sobretudo aquelas localizadas em setores originados das oportunidades de
mercado provocadas pela maior presença feminina no mercado de trabalho
(confecções, cosméticos, serviços de apoio doméstico, cuidados com o
corpo, educação e cuidados com crianças, entre outros).
Finalmente, com relação à megatendência "triunfo do indivíduo",
pode ser considerada como o "afunilamento" de todas as mudanças
políticas, econômicas, sociais, culturais, tecnológicas e espirituais, atuando
sobre as pessoas. A produção em massa será substituída pela produção de
pequenos lotes, direcionados a mercados globalizados cujos clientes
apresentam necessidades, cada vez mais individualizadas
("customeirização"). As megatendências da globalização da economia e do
triunfo do indivíduo estão criando uma situação aparentemente
contraditória, que Naisbitt ( 1994) chama de "Paradoxo Global", ou seja, --
quanto maior a economia (globalizada), menores, mais poderoso e mais
importantes são as suas partes (nações, empresas e indivíduos).
As pessoas passam a assumir uma crescente responsabilidade
individual diante dos problemas coletivos: desenvolve-se na sociedade o
conceito de "cidadania" e multiplicam-se os movimentos baseados no
voluntarismo e participação individual: por exemplo, a Campanha de
Combate à Fome, no Brasil e os movimentos ecológicos. Enfim, as pessoas
passam a resgatar a sua individualidade e não aceitam mais serem apenas
"elos de uma corrente" ou meros números de conta bancária, de CIC's e
RG's, de matrícula na Escola ou na empresa empregadora, entre_ outros
códigos que as vinculam burocraticamente a certas instituições.
58
3.3. AS NOVAS ERAS EMPRESARIAIS NA SOCIEDADE DO
CONHECIMENTO
Analisadas as megatendências que, a partir dos anos 80, romperam
os paradigmas da Sociedade Industrial, cabe analisar os efeitos destas
grandes transformações sobre as empresas. Neste sentido, é preciso
retomar a análise da evolução das eras empresariais, apresentada na
Figura 1.
No Capítulo 2, foram descritas as Eras da Produção em Massa e da
Eficiência, bem como foram analisados os modelos tradicionais de
administração que evoluíram ao longo daquelas duas primeiras eras.
Com a emergência da Sociedade do Conhecimento (ou Revolução da
Informação), duas novas eras empresariais dão seqüência àquela evolução:
• A Era da Qualidade, nas décadas de 70 e 80;
• A Era da Competitividade, a partir do início dos anos 90.
A Era da Qualidade
A partir do início dos anos 70, um novo tipo de relacionamento passa
a existir entre o consumidor/cliente e a empresa: de um lado, uma postura
mais consciente do consumidor com relação à sua situação de consumidor.
O mundo acabava de passar por movimentos sociais de protesto e
contestação ao "status quo" até então existente: a filosofia de vida "hippie"
contestava a sociedade materialista de consumo e pregava estilos
alternativos de viver, em busca da liberdade e felicidade humana; nascia o
movimento ecológico, que evoluiria ao longo dos anos 80 para se tornar o
movimento pró-qualidade de vida nos anos 90; os estudantes reclamavam
por maior liberdade e por um sistema de ensino menos comprometido com o
poder econômico estabelecido (representado pelas organizações da
decadente Revolução Industrial).
59
Diante deste novo quadro, as empresas se encontravam em
mercados cada vez mais saturados em termos de diversidade de produtos e
do andamento da concorrência. Assim, novas posturas passam a ser
buscadas, visando aumentar a satisfação (valor) para o cliente. Como
mostra o Figura 1, as curvas que simbolizam o valor para a empresa e o
valor para o cliente tendem a se encontrar, ou seja, ambas vão em direção à
Era da Qualidade; este novo momento da evolução da gestão empresarial
significará que não basta mais oferecer um produto ou serviço padronizado
(Era da Produção em Massa) a baixo custo operacional (Era da Eficiência):
mais do que isso, o cliente quer o atendimento das suas necessidades, o
que significa "qualidade".
É neste aspecto que as empresas japonesas começam a evidenciar
que estavam melhor preparadas que as empresas americanas e européias:
após 20 (vinte) anos de preparação, nos anos 50 e 60, as empresas
japonesas começam a difundir um novo conceito - Qualidade Total - que
viria a marcar de forma indiscutível um novo paradigma na relação
"empresa/cliente". Este foi o resultado do modelo gerencial desenvolvido no
Japão, como será analisado adiante, e que provocará a reação das
empresas ocidentais, sobretudo atr~xés do modelo de gestão participativa e
gestão empreendedora.
A Era da Qualidade significa ainda uma nova relação
interempresarial: à medida em que as empresas passam a buscar a
Qualidade Total, ou seja, a qualidade no processo de fabricação do produto
ou da prestação de serviço, todas as empresas envolvidas na cadeia de
produção serão necessariamente envolvidas na filosofia e nas práticas da
Qualidade Total.
Na medida em que as empresas vão adotando esta nova filosofia de
gestão ao longo dos anos 80, as grandes transformações, em velocidade
cada vez maior, vão determinar o início da era empresarial na qual nos
encontramos atualmente: a era da competitividade.
60
A Era da Competitividade
Conforme pode ser verificado na Figura 1, esta era se caracteriza por
uma relação já consolidada entre empresa e cliente, cuja orientação passa a
ser a "superação da expectativa do cliente". Assim, diversas· empresas
passam a adotar lemas, como: "Não basta satisfazer o cliente, é preciso
encantá-lo"; "O cliente em primeiro lugar"; "O cliente é o rei", entre outros.
Esta nova postura é que determinará a Competitividade da empresa no
mercado, ou seja, a sua capacidade de sobreviver.
Ser uma organização competitiva passou a ser uma questão
imperativa tanto para organizações privadas como públicas: se, para as
primeiras, a questão era de sobrevivência física, para as últimas seria
cumprir a sua missão, ou seja, prestar serviços de interesse público com
qualidade (satisfação do usuário).
No Brasil, esta questão provocou recentemente o desenvolvimento do
"Estudo da Competitividade da Indústria Brasileira", cujos coordenadores,
Coutinho & Ferraz (1994), afirmam que:
estão superadas as visões econômicas tradicionais que definiam a competítividade como uma · · questão de preços, custos (especialmente salários) e taxas de câmbio. Esta concepção levou, no passado, a políticas centradas na desvalorização cambial, no controle dos custos unitários de mão-de-obra e na produtividade do trabalho, como o objetivo de melhorar a competitividade em cada país. (p. 16)
Assim é que, por exemplo, países como Japão e Alemanha se
tornaram dois sucessos a nível mundial em competitividade, ao mesmo
tempo em que apresentavam fortes incrementos nos seus custos salariais e
enfrentavam longos períodos de sobrevalorização cambial.
Portanto, o novo conceito de competitividade, segundo Coutinho &
Ferraz, deve ser atribuído a um· conjunto de "fatores determinantes",
conforme ilustra a Figura 3. Há três tipos de fatores determinantes:
61
Figura 3- FATORES DETERMINANTES DA COMPETITIVIDADE DE UMA
EMPRESA
FATORES INTERNOS À EMPRESA
~ - Estratégia e Gestão
- Capacitação para
Inovação
- Capacitação Pro-dutiva
- Recursos Humanos
~
1\ F> s
E T o R
F> E s
FATORES ESTRUTURAIS
(SETORIAIS )
Mercado Configuração Concor-
do Setor rência
FATORES SISTÊMICOS
- Macro-econômicos
- Internacionais
-Sociais
-Tecnológicos
- Infra-Estruturais
- Fiscais e Financeiros
- Político-i nstitucionais
Fonte: Coutinho, Luciano & FERRAZ, João C. (Coord.}. Estudo da Competítívídade da
Indústria Brasileira. Campinas, SP: P.apirus-Editora da Universidade Estadual de
Campinas, 1994, p.19.
a) Fatores internos à empresa
Tais fatores são aqueles que estão sob o controle da empresa e com os
quais ela busca se diferenciar dos seus concorrentes:
• estratégia e gestão da empresa;
• capacitação da empresa para inovação;
• capacitação tecnológica e produtiva da empresa; ·
• a qualidade e a produtividade dos recursos humanos da empresa;
• o conhecimento do mercado e a capacidade de se adequar às suas
especificidades;
62
• a qualidade e a amplitude dos serviços de pós-vendas;
• as relações privilegiadas com usuários e fornecedores.
b) Fatores estruturais e setoriais
Tais fatores são aqueles que, mesmo não estando sob controle da
empresa, estão parcialmente sob a sua influência e caracterizam o ambiente
competitivo que ela enfrenta diretamente:
• fatores relacionados às características dos mercados
consumidores em termos da sua distribuição geográfica e em
faixas de renda; grau de satisfação e outros requisitos impostos
aos produtos; oportunidades de acesso a mercados internacionais;
as formas e os custos de comercialização predominantes;
• fatores relacionados às configurações da indústria ou setor em que
a empresa atua, tais como grau de concentração, escalas de
operação, atributos dos insumos, potencialidade de alianças com
fornecedores, usuários e concorrentes, grau de verticalização e
diversificação setorial; e ritmo, origem e direção do progresso
técnico;
• fatores relacionados à concorrência, no que tange às regras que
definem condutas e estruturas empresariais nas relações com
consumidores, meio ambiente e competidores; o sistema fiscal
tributário incidente sobre as operações industriais; práticas de
importação e exportação e a propriedade dos meios de produção
(inclusive propriedade intelectual).
c) Fatores sistêmicos
Tais fatores são aqueles sobre os quais a empresa não exerce
qualquer controle mas é afetada por eles, entre os quais:
63
• fatores macroeconômicos (taxa de câmbio, oferta de crédito e
taxas de juros, por exemplo);
• fatores político-institucionais, como as políticas tributária e tarifária,
as políticas de compras do Estado e os programas de apoio ao
investimento em tecnologia;
• fatores regulatórios, como as políticas de proteção ambiental, de
proteção à propriedade industrial, de defesa da concorrência e da
proteção ao consumidor;
• fatores relacionados à infra-estrutura, tais como disponibilidade,
qualidade e custo de energia, transportes, telecomunicações e
serviços tecnológicos;
• fatores sociais, como a situação da qualificação da mão-de-obra
(educação profissionalizante e treinamento}, políticas de educação
e formação de recursos humanos, trabalhista e de seguridade
social e grau de exigência dos consumidores;
• fatores relacionados à dimensão regional, como os aspectos
referentes à distribuição espacial da produção; e
• fatores internacionais, como as tendências do comércio mundial,
os fluxos internacionais de capitais, de investimento de risco e de
tecnologia, relações com organismos multilaterais, acordos
internacionais e políticas de comércio exterior.
Portanto, a competitividade de uma empresa está relacionada à
competitividade do seu setor e do próprio país, que deverá visar e oferecer
as condições adequadas para que alguns setores empresariais, de acordo
com a vocação e as vantagens competitivas do país, possam abrigar
organizações competitivas. No entanto, devem-se destacar, tendo em vista
o objeto deste estudo, os fatores internos de competitividade, pois estes são
relacionados ao modelo e à capacidade gerencial da empresa. Assim,
empresas que, em plena Era da Competitividade, ainda adotam posturas ·
gerenciais da Era da Produção em Massa ou da Era da Eficiência,
dificilmente terão condições de sobreviver a esta nova Era.
Concluindo, assim, Coutinho & Ferraz afirmam que
o sucesso competitivo passa (. . .) a depender da criação e da renovação das vantagens competitivas por parte das empresas, em um processo em que cada produtor se esforça para obter peculiaridades que o distingam favoravelmente dos demais, como, por exemplo, custo e/ou preço mais baixo, melhor qualidade, menor "lead-time", maior habilidade de servir à clientela, etc. O sucesso implica, também, que as empresas mostrem-se aptas não apenas a adotar estratégias competitivas adequadas, mas a impor correções de rumo quando necessário. (p.18)
64
Analisados os aspectos macroambientais que levaram à exaustão os
modelos tradicionais de administração (as megatendências e a emergência
das Eras de Qualidade e da Competitividade), serão avaliados no próximo.
item as características gerenciais da empresa brasileira e os desafios da
sua modernização, visando torná-la competitiva e garantir a sua
sobrevivência.
3.4. AS CARACTERÍSTICAS E OS DESAFIOS GERENCIAIS NA
EMPRESA BRASILEIRA
A partir das megatendências dos anos 80 e da emergência das Eras
da Qualidade e da Competitividade, a economia brasileira e o próprio setor
empresarial passam a sofrer grandes impactos provocados pelo cenário
mundial: num primeiro momento, as empresas encontram-se despreparadas
do ponto de vista de sua capacitação gerencial para reagir às ameaças ou
aproveitar as oportunidades; de outro lado, surgem os novos desafios para
· a modernização gerencial que irão evidenciar o rompimento das formas
tradicionais de gestão, ao mesmo tempo que indicarão os novos padrões de
práticas gerenciais a serem seguidos pelas empresas brasileiras.
Do ponto de vista econômico, o Brasil passa a receber profundos
impactos a partir de meados dos anos 70 e com maior força nos anos 80, à
medida em que as mudanças tecnológicas se aceleram e passam a
transformar as estruturas industriais nos países mais desenvolvidos
(passagem da Revolução Industrial para a Revolução da Informação ou
65
Sociedade do Conhecimento): o maior impacto ocorre com a difusão cada
vez mais veloz das tecnologias da informação, baseadas na microeletrônica.
Estas novas tecnologias propiciaram uma maior integração da economia
mundial (a formação dos blocos econômicos de países, a globalização
financeira, entre outros aspectos), mas os efeitos sobre os países não
ocorreram de forma igual, provocando um crescente distanciamento da
capacidade competitiva entre os países mais desenvolvidos e aqueles
pertencentes ao chamado "Terceiro Mundo", do qual o Brasil é um dos mais
ativos componentes.
Estes impactos, segundo Coutinho .& Ferraz (1994}, tiveram os
seguintes impactos estruturais na economia brasileira, com reflexo na
competitividade do setor empresarial:
• a emergência do complexo eletrônico como carro-chefe do
dinamismo das novas tecnologias de informação e de
telecomunicações, epicentro do processo de inovação nos países
avançados;
• a transformação dos métodos de produção, principalmente com a
difusão de automação industrial flexível e integrada de novas
técnicas organizacionais que implicam mudanças significativas nos
processos fabris, nas relações de trabalho e nos requisitos
educacionais da mão-de-obra;
• as inovações na forma de gestão e de organização empresarial,
com o avanço das formas de interligação e integração intra e
interempresas (sendo inclusive estabelecidos novos padrões de
relacionamento entre produtores, fornecedores e usuários,
incluindo consumidores finais);
• a forte aceleração dos investimentos diretos no exterior,
conduzindo a uma crescente interpenetração patrimonial entre os
grandes grupos econômicos dos países desenvolvidos;
• o rápido crescimento do comércio internacional, em particular do
comércio interindustrial (e, dentro dele, do comércio intra-firma); e
66
• a emergência de novas formas de concorrência entre grupos de
empresas, através de proliferação de redes de cooperação,
alianças competitivas, especialmente nos oligopólios mundiais.
Diante destes impactos que passaram a afetar diretamente o setor
empresarial brasileiro a partir dos anos 70, somados aos efeitos das
megatendências e à emergência das Eras da Qualidade e da
Competitividade, é preciso analisar quais eram as características gerenciais
predominantes das empresas brasileiras no período considerado (décadas
de 70 e 80). Assim, Boog (1991) define um conjunto de características, por
ele denominadas de "situação encontrada", presentes tipicamente na
empresa brasileira ao final dos anos 80; ao mesmo tempo, o autor propõe
um conjunto de características gerenciais que deveriam ser desenvolvidas
ou estar presentes na empresa brasileira, para que ela possa sobreviver na
Era da Competitividade: estas últimas são denominadas de "situação
desejável".
Ambas as situações (encontrada e desejável) estão ilustradas no · Quadro 2.
A "situação encontrada" na ·empresa brasileira evidencia que sua J
estrutura organizacional é rígida, baseada na ênfase à hierarquia, o que
leva a um processo decisório centralizado no topo da estrutura, ou seja, as
decisões são individuais. Isto leva os gerentes e dirigentes a se
concentrarem em suas atividades funcionais, com extrema lealdade à sua
área de especialização, o que exige dos mesmos basicamente habilidades
técnicas, pois serão cobrados pela sua eficiência, ou seja, pela gestão dos
recursos de que dispõem (atividades-meio). Este conjunto de práticas
reforça a cultura -da tradição na empresa, visando manter o "status quo" que
garantiu não somente o crescimento e sucesso empresarial, como também o
crescimento profissional daqueles que se moldaram às características
descritas.
De outro lado, a "situação desejável" indica que, para ser competitiva,
a empresa deverá buscar uma estrutura organizacional baseada na
flexibilidade, enfatizando o trabalho de grupo (modelos participativos de
gestão}, o que propiciará o clima adequado para a obtenção do consenso
da(s) equipe(s) no processo decisório: portanto, é preciso desenvolver
67
novas habilidades nos gerentes e dirigentes, para que estes, além de suas
habilidades técnicas, estejam preparados para trabalhar com equipes de
pessoas (habilidades humanas), sabendo o momento oportuno para
delegar-lhes autoridade e propiciando gradual autonomia ao grupo. Ao
mesmo tempo, os gerentes e dirigentes deverão buscar uma visão do todo
(visão holística) da organização, sabendo conceituar e orientar a busca de
solução de cada problema da sua área (habilidades conceituais). Este
conjunto de novas práticas e de atitudes gerenciais propiciará à empresa
uma cultura mais empreendedora, voltada para a inovação em busca de
resultados.
Quadro 2 - CARACTERÍSTICAS DA EMPRESA BRASILEIRA
SITUAÇÃO ENCONTRADA SITUAÇÃO DESEJÁVEL
• Rigidez organizacional • Flexibilidade
... . Tradição . Inovação
• Ênfase na hierarquia • Ênfase no trabalho de grupo
• Centralização no topo . Delegação e autonomia
• Decisões individuais . Decisões consensuais
. Lealdade a seu departamento • Lealdade à empresa como um todo
. Gerentes com ênfase em • Gerentes com habilidades técnicas,
habilidades técnicas humanas e conceituais
• Importância às atividades . Importância aos resultados (eficácia) · (eficiência)
Fonte: BOOG, Gustavo G. O desafio da competéncia. São Paulo: Best Seller, 1991.
68
As características assinaladas na "situação encontrada" são típicas
das empresas que se encontram ainda nas Eras da Produção em Massa e
da Eficiência e, portanto, orientadas em suas práticas gerenciais pelos·
modelos de administração tradicionais.
Por outro lado, as características da "situação desejável" são aquelas
observadas nas empresas que já estão buscando novas práticas gerenciais,
orientadas por novos modelos e abordagens da administração: portanto,
são empresas já preparadas ou que já vivenciam as características das Eras
da Qualidade e da Competitividade. Conforme se pode verificar na Figura 1,
as empresas que atingem a Era da Competitividade, após passar pela Era
da Qualidade, são obrigadas a assumir duas novas posturas, em relação às
suas posturas tradicionais:
1 °) adotar o chamado "marketing do valor", ou seja, desenvolver um
novo esforço orientado para superar a expectativa dos clientes.
2°) adotar novos modelos e teorias gerenciais, que transformem a
empresa numa organização inovadora e competitiva.
Nos dois próximos capítul9~. as duas questões acima serão
analisadas: no Capítulo 4 serão detalhadas as características dos novos
modelos gerenciais e, no Capítulo seguinte, serão avaliadas algumas·
experiências e resultados de empresas brasileiras que já colocam em
prática os novos modelos gerenciais.
CAPÍTUL04
OS NOVOS MODELOS DE
GESTÃO: PRINCIPAIS
ABORDAGENS E SUAS
CARACTERÍSTICAS
70
A partir da análise do rompimento dos modelos tradicionais de
administração, análise esta elaborada ao longo dos Capítulos 2 e 3, será
desenvolvido neste Capítulo o detalhamento dos novos modelos e práticas
gerenciais. Conforme já citado anteriormente, na definição do modelo desta
pesquisa, parte-se do ponto de vista de Kuhn ( 1991) de que as abordagens
da administração, em suas estruturas conceituais e teóricas, não possuem a
consistência de um paradigma típico das ciências normais. Neste sentido, o
que tem sido chamado, neste estudo, de "novos modelos gerenciais", tem
exatamente esta característica de abordagem em fase pré-paradigmática,
ou seja, não são conhecimentos solidificados em bases científicas que
permitam a ampla aplicabilidade no setor empresarial.
No entanto, tais abordagens foram desenvolvidas a partir da
evidência empírica de que estão contribuindo para a melhoria da
capacitação gerencial das empresas que têm aplicado várias práticas
inovadoras de gestão. Uma das contribuições mais importantes deste
estudo é tentar sistematizar este conjunto de práticas dentro de uma
estrutura denominada "novos modelos gerenciais" e que foi dividida em
cinco abordagens diferentes, assim designadas:
• Administração Japonesa
• Administração Participativa
• Administração Empreendedora
• Administração Holística
• Administração Virtual
As três primeiras abordagens serão consideradas como práticas
atualmente já conhecidas e difundidas largamente em várias empresas,
tanto a nível internacional como no Brasil. As duas últimas abordagens
estão ainda na fase embrionária de sua filosofia, enquanto uma nova linha
de pensamento administrativo, havendo poucas práticas que possam
assegurar a generalização de tais abordagens: portanto, podem ser
considerados os "modelos de administração do futuro".
71
Para categorizar as vanas práticas inovadoras dentro dos cinco
modelos de administração acima citados, utilizou-se como critério principal o
conjunto de características assemelhadas ou intercomplementares destas
práticas. Assim, a partir da análise da sua origem histórica, da sua filosofia e
dos principais instrumentos que operacionalizavam os conceitos
decorrentes, foi possível reunir e categorizar as referidas práticas
gerenciais. De outro lado, já existe uma literatura que vem divulgando
·estudos sobre estas novas práticas gerenciais e já é possível identificar uma
certa coerência entre diversos autores quando os mesmos se referem à
"administração japonesa", à "administração participativa" e à "administração
empreendedora".
A seguir, será analisada cada uma destas novas abordagens da
administração.
4.1. ADMINISTRAÇÃO JAPONESA
Certamente um dos países cjue mais tem suscitado curiosidade e
provocado estudos sobre a sua situação nos últimos anos é o Japão. A
força da sua economia, hoje a segunda do mundo; a sua cultura milenar que
convive ao lado da sofisticação tecnológica, esta em grande parte
desenvolvida pelo próprio esforço de pesquisa e inovação das empresas
japonesas; e, também, o sucesso das indústrias japonesas, que se tornaram
competitivas em vários setores de atividade, sobretudo nos segmentos de
automóveis, produtos eletrônicos, material fotográfico, entre outros.
No entanto, antes de estudar a administração japonesa, é importante
compreender a base cultural milenar do povo japonês, que foi o principal
fator que possibilitou o surgimento e sustentação das várias práticas da
administração japonesa, bem como a evolução histórica que antecede a
origem deste modelo.
72
4.1.1. Origem e evolução da administração japonesa
Com a Revolução Industrial implantada no Japão a partir de 1868,
correspondendo ao que historicamente se denomina "Restauração Meiji"
(restauração do poder imperial), inicia-se a modernização do país, depois
de alguns séculos de isolamento do resto do mundo. O desenvolvimento
econômico, propiciado pela sua modernização, torna o Japão o único país
não-ocidental a ser considerado uma economia industrial antes de 1945.
Uma das principais características da Era Meiji foi a prioridade à
educação: depois de abolir o feudalismo e o sistema social hierarquizado
que existia até então, procurou-se modernizar o Governo, através de uma
monarquia constitucional e de uma administração centralizada e provincial;
ao mesmo tempo, desenvolveram-se esforços para preparar o país para
ingressar no setor industrial, tanto leve como pesado. Para tanto, a
educação teria um papel estratégico: em 1871, foi criado o Ministério da
Educação e, a partir de então, foram treinados milhares de professores e
construiu-se uma ampla rede escolar. O ensino primário era obrigatório,
inicialmente com quatro anos, depois ampliado para seis anos. Investiu-se
também no ensino médio e ensino técnico, inclusive o médio superior, que
prepara os candidatos às universidades.
No entanto, como há registros de vanos autores, "as escolas se .
transformaram crescentemente num meio de ensinar ao povo sobretudo o
que pensar, em vez de como pensar". Assim, o ensino tornou-se doutrinário,
como mais tarde na União Soviética e na Alemanha nacional-socialista.
Segundo Peralva ( 1990},
nas aulas e nas casernas do Exército ensinava-se aos jovens japoneses glorificar as tradições militares do Japão. Eles chegaram a acreditar que a morte pelo imperador, no campo de batalha, era o destino mais glorioso do homem. Assim, criaram-se no japonês médio o nacionalismo fanático, já característico das classes mais altas e uma devoção ainda mais fanática ao imperador. (p. 21)
Na realidade, o que se buscava com esta "ideologia" educacional era
preparar a população japonesa para resistir a eventuais tentativas
colonizadoras de potências imperialistas ocidentais e, uma vez fortalecido o
país, inclusive de recursos materiais resultantes da sua incipiente
73
industrialização, passar a disputar com aquelas potências imperiais a
conquista de colônias nas regiões sob sua esfera de influência.
De fato, nas décadas seguintes, o Japão passa a travar guerras de
conquistas imperiais com a Rússia e a China, tendo expandido seu território.
Estes aspectos históricos são importantes para a compreensão do modelo
japonês de administração, pois, ao longo da evolução cultural da sociedade
japonesa, foram se consolidando três valores principais: os conceitos de
pátria, família e trabalho.
Historicamente, o conceito que os japoneses têm de serem um povo
único se deve ao fato de que as ilhas que fazem parte do território japonês
sempre foram dominadas pelo mesmo grupo étnico, por quase 1500 anos,
sendo que neste período prevaleceu sempre o poder da mesma família
imperial, cujos descendentes atravessaram todas as reviravoltas da história
do Japão até o século XX.
Quando as forças de ocupação aliada chegaram ao Japão, após sua
rendição ao final da 11 Guerra Mundial, encontraram as pessoas, nas
palavras de um escritor, "aturdidas, titubeantes, entorpecidas pelo choque".
O novo comandante-supremo, o general norte-americano Douglas Mac
Arthur, observou: "Não houve somente a derrocada do poderio militar
japonês; houve o desmoronamento de uma fé, a desintegração de tudo em
que acreditavam e que regia suas vidas e servia como razão pata sua luta".
Assim, o conceito de "pátria" está ligado ao nacionalismo fervoroso
do povo japonês: cada cidadão é parte de um povo, de uma nação. A sua
vida só tem razão de ser quando está ligado aos destinos da pátria.
Exemplos deste valor cultural são os guerreiros samurais, que defendiam os
senhores feudais {portanto, era a defesa do clã a que se pertencia); os
"kamikazes", jovens pilotos de aviões de combate, na 11 Guerra Mundial,
cuja missão era atirar o avião contra o alvo inimigo; a devoção fanática ao
Imperador, o símbolo da pátria (a Junta americana de intervenção após a
·Guerra não puniu o Imperador, ciente de que estaria criando imensas
dificuldades com a população japonesa).
O conceito de "família" é decorrente do primeiro valor: a pátria só
será permanente através da família. O conceito é milenar e atravessa toda a
74
história do povo japonês através dos "clãs", que eram a base da pátria. Na
família japonesa, cada pessoa tem um papel determinado e há expectativa,
por parte de outros familiares e da própria sociedade, que cada um cumpra
seu papel. Assim, as crianças representam o futuro da pátria e devem ser
educadas para continuar e aprimorar o progresso da nação; o pai é o
responsável pela provisão econômica da família; a mãe é a responsável
pela "gerência" da família, inclusive no aspecto financeiro; os idosos são o
símbolo da sabedoria e devem transmitir seus conhecimentos e experiência
de vida aos mais jovens. Há um grande respeito entre as gerações.
O terceiro valor cultural - o trabalho - é aquele que liga os dois
primeiros valores - pátria e família - dando base ao modelo gerencial
japonês. Se a família é que vai garantir a perenidade da pátria, o trabalho é
o que sustentará economicamente a família. E na economia industrial, da
qual o Japão sempre foi um dos países mais destacados (desde o início da
Era Meiji), o trabalho passou a ser exercido predominantemente nas
empresas. Daí, trabalho e empresa passam a fazer parte do mesmo valor
cultural. Ao ter sua economia destruída ao final da 11 Guerra Mundial, com
grande parte do seu parque industrial em ruínas e a sua produção industrial
reduzida a um sétimo do nível obtido em 1941, o país enfrentava o seu
maior desafio: reconstruir a nação. Segundo jornalistas da Time Life (1987),
as antigas virtudes dos japoneses, entretanto, não haviam desaparecido. A disciplina que os fez tão temidos na guerra ainda os servia na hora da catástrofe. Sua capacidade de trabalho superou a exaustão. Sua atitude propícia a esforços de cooperação sobrepujou a anarquia. Peritos na arte da sobriedade, os japoneses começaram a restaurar seu país devastado com cada pedaço de sucata que se pudesse achar nos destroços.
Mesmo despedaçados como estavam pela derrota, os japoneses, com honestidade notável, culpavam não o inimigo mas seus próprios líderes e o militarismo estabelecido desde á década de 30. Trabalhando em harmonia, foram gradualmente trilhando um caminho novo e melhor. {p. 89)
De fato, o trabalho árduo e disciplinado passou a ser uma das
características típicas da sociedade japonesa, o que vai se refletir em
algumas práticas do modelo japonês de gestão. Segundo o relato dos
mesmos jornalistas da Time Life (1987),
A reputação dos japoneses de trabalharem duro, de forma dedicada e sem reclamações, tornou-se uma lenda moderna. Como qualquer outro país, · o Japão também tem seus rebeldes, contestadores e sonhadores. Mas em geral, no âmbito da empresa, é um país de viciados em trabalho. As jornadas são longas e principalmente em pequenas fábricas e empresas familiares espalhadas por todo o país. Funcionários de pequenas oficinas trabalham em suas bancadas por cinco dias e meio ou seis dias por semana. Só nas grandes indústrias a semana de trabalho foi reduzida para um máximo de 40 horas, mas a atividade é intensa.
75
"No Japão, o trabalho é uma cerimônia", diz o escritor lchiro
Kawasaki.
Muitas explicações foram dadas para a mania de trabalho dos japoneses. Uma motivação importante é o desejo de aprovação pelo grupo. Preguiça, no Japão, é considerada um terrível deslize moral. Se outros membros de seu grupo trabalham duro e você não, no fim você será rejeitado, diz o executivo de uma empresa. E ele continua: Ser excluído de um grupo é a coisa mais atérradora que um japonês pode imaginar. (p. 128)
Assim, a partir dos três valores culturais analisados - pátria, família e
trabalho/empresa - o Japão passa a reconstruir a sua economia,
centralizando tais esforços junto· ·às empresas. Após sete anos de
intervenção norte-americana, o Japão volta a conduzir o seu próprio
destino, com a assinatura do Tratado de Paz e o Tratado de Segurança
Mútua, ambos com os Estados Unidos, em 1952.
Com a reorganização do país, mantém-se a monarquia (por um
respeito às tradições) e implanta-se um sistema parlamentarista de
Governo: o primeiro-ministro é nomeado pelo Imperador (que tem apenas
uma função simbólica) e chefia o gabinete de ministros. Entre os Ministérios
governamentais, cabe destacar aquele que, além de ser o mais conhecido
internacionalmente, foi um dos responsáveis pelo reerguimento econômico
do país: o Ministério do Comércio Internacional e da Indústria - o famoso
MITI. Este Ministério elaborou um plano estratégico de desenvolvimento
industrial, que priorizou inicialmente alguns setores (siderúrgicas, estaleiros
e petroquímicas) e permitiu, através de financiamentos a longo prazo, a
reconstrução do parque industrial do ·país, porém agora com outro enfoque:
o esforço econômico, envolvendo Governo - empresários - trabalhadores,
não teria mais o objetivo de preparar o país para conquistar "sonhos
76
imperiais" e sim para que o país se tornasse competitivo internacionalmente:
para tanto, seria necessário modernizar as empresas e incentivar a
pesquisa tecnológica. Inicialmente, deu-se prioridade à educação: desde a
nova Constituição de 1947, a educação obrigatória passou a ser de nove
anos e, diferentemente do ensino anterior, o objetivo era ensinar "a pensar"
e não "como pensar".
Nos primeiros anos da recuperação, o Japão contou com a "boa
vontade" dos países mais industrializados, sobretudo dos Estados Unidos,
que assumira compromissos de ajuda ao Japão após a assinatura do
Tratado de Paz (1952) e o fim da intervenção pós-guerra. Assim é que, com
a eclosão da Guerra da Coréia (1950-1953}, grande parte do suprimento às
tropas americanas - desde vestimentas até munições e outros objetos de
natureza bélica - passam a ser encomendados junto às indústrias
japonesas. Como os produtos japoneses não tinham boa qualidade, os
americanos decidem trazer um especialista em estatística do Departamento
de Recenseamento dos Estados Unidos - E. Edwards Deming - até então um
desconhecido, pelos próprios americanos, no campo da gestão empresarial.
A partir daquele momento, a gestão japonesa começava a dar seus
primeiros passos -e a mudar a própria Teoria da Administração.
O próprio Oeming (1990) relata sua participação pessoal neste
momento importante da história da gestão japonesa:
O mundo inteiro conhece muito bem o milagre do Japão e sabe que este milagre começou com um choque em 1950. Antes disso, a qualidade dos bens de consumo japoneses tinha granjeado, no mundo todo, uma fama negativa, de produtos mal feitos e baratos. (. . .) Subitamente, a qualidade e a confiabilidade dos produtos japoneses deram um salto e, em 1954, tinham ganho mercados no mundo inteiro. Tinha começado a nova era econômica. O que ocorrera?
A resposta é que a direção convenceu-se de que a qualidade era vital
para a exportação e que eles poderiam empreender a mudança.
Aprenderam, em seguidas conferências, alguma coisa sobre suas
responsabilidades pela consecução deste objetivo e que teriam que assumir
a liderança para este fim. A administração e os operários das fábricas
somaram seus esforços para conseguir qualidade e criar empregos.
(. .. )As autoridades militares japonesas formaram, para o esforço de guerra, diversos grupos de cientistas (. . .) com um novo objetivo: a reconstrução do Japão. Um dos grupos passou a ser a União dos Cientistas e Engenheiros Japoneses - JUSE, (. . .) que começou a levar a sério a instrução a respeito dos métodos de aperfeiçoamento da qualidade. (. . .) o pessoal da JUSE resolveu que o passo seguinte seria trazer um especialista estrangeiro. O convite me foi feito em 1949 e eu pude aceitá-lo em junho de 1950. (p. 353)
77
A partir de então, Deming começa a divulgar suas idéias para
dirigentes empresariais e utiliza um fluxograma simplificado para apresentar
sua concepção sobre Qualidade, conforme ilustração da Figura 4.
Figura 4 - O FLUXOGRAMA DE MELHORIA DA QUALIDADE
DE EDWARDS DEMING
Recepçãoe I teste dos insumos
Projeto e reprojeto
E-(--- Pesquisa de
mercado
Consumidores
Fornecedores ;) de insumos e equipamentos ~
: ~ Produção, montagem, inspeção, distribuiçao ~ /
~;:?---~) Teste~s:L~os.) ) ~ ~ das máquinas, dos métodos, dos custos
Segundo o próprio Deming (1990) explica,
o consumidor é a parte mais importante da linha de produção - um princípio novo para a administração japonesa. Seria preciso garantir o desempenho dos produtos. Ela teria que olhar para a frente e projetar novos produtos e serviços. Teria que trabalhar com o fornecedor escolhido de qualquer material, em uma relação
duradoura de confiança e lealdade no sentido de melhorar a uniformidade e a confiabilidade dos materiais fornecidos. A administração teria que prestar muita atenção na manutenção dos equipamentos nas instruções e gabaritos. (p. 354)
78
Em outras palavras, Deming estava mostrando aos dirigentes
japoneses que eles não deviam cometer os mesmos erros das empresas
americanas que, aliás, não davam até então importância às suas idéias.
Quais eram estes erros? Focar a qualidade nos produtos (inspeção da
qualidade) e não nos processos (qualidade total). Assim, a melhoria da
qualidade abrange todo o processo de produção, desde os insumos até o
consumidor, bem como a revisão do projeto do produto/serviço para o
futuro.
Outra contribuição importante na fase de aprendizagem sobre a
qualidade é a criação, pela JUSE, do Prêmio Deming de Qualidade, que
estimulou as empresas e as pessoas conquistarem este importante prêmio,
de prestígio crescente no país, tendo em vista o sentimento patriótico que
envolvia, naquele momento da história do Japão, a busca da qualidade.
A partir das idéias de Deming, a JUSE e os dirigentes empresariais
japoneses percebem que a filosofia tia qualidade, por ele divulgada, casa-se
perfeitamente com os valores culturais tradicionais do Japão: portanto, a
idéia seria facilmente disseminada entre os gerentes e trabalhadores, bem
como os fornecedores envolvidos no processo. O objetivo de todos naquele
momento era reerguer a pátria.
Assim, a JUSE passa a desenvolver um amplo esforço de educação
junto a diversas empresas líderes no Japão, treinando engenheiros,
supervisores e operários, em técnicas estatísticas voltadas para a melhoria
da qualidade.
Segundo Ogliastri (1992},
em 1954, convidaram o Professor Joseph Juran, um austríaco naturalizado norte-americano, para que lhes desse cursos sobre a administração do controle de qualidade, através do qual o seu conceito de "controle de qualidade total" disseminou nas grandes empresas japonesas os conhecimentos de gerência e de comportamento humano na organização que existiam nos Estados Unidos. (p. 32)
79
Até 1970, já haviam sido treinados pela JUSE cêrca de 14.700
engenheiros e milhares de supervisores. Também foram ensinadas técnicas
de amostragem para pesquisa de mercado: já desde 1951, os treinandos se
dividiram em grupos para pesquisar, de porta em porta, as necessidades de
máquinas de costura, bicicletas e remédios das famílias japonesas. Assim, a
filosofia da qualidade total começava a impregnar a cultura empresarial
japonesa, que passava a se orientar para as necessidades do consumidor.
Por volta de 1960, outra evolução importante começava a ocorrer nas
empresas japonesas: por orientação do Dr. Kaoru lshikawa, começavam a
se formar grupos espontâneos de pessoas que trabalhavam juntas nos
mesmos processos ou tarefas, visando discutir os problemas da área e
buscar as soluções mais adequadas. Tais grupos procuravam, assim,
eliminar as causas especiais de variabilidade e aperfeiçoar os sistemas,
através de mudanças das ferramentas, dos projetos e das programações de
tempo e até mesmo de alterações de processo de produção. À medida em
que foram se multiplicando dentro das empresas, estes grupos passaram a
ser chamados de Círculos de Qualidade<*>, pois o objetivo fundamental era
a melhoria da qualidade.
O modelo dos Círculos de· Qualidade se disseminou entre as
empresas japonesas de tal forma que, segundo Ogliastri (1992),
em 1961, a revista japonesa Controle da Qualidade decidiu incorporar aos supervisores da fábrica as atividades de controle da qualidade, publicar uma revista dirigida a eles (a preços populares) e convidá-los aos painéis dos seus congressos. (. . .) O governo iniciou uma extensa campanha com prêmios e programas educativos pelo rádio e pela televisão, designou novembro como o "mês da qualidade" e impôs padrões muito altos para produtos destinados à exportação. (. . .) Em 1980, existiam dez milhões de japoneses que participavam de programas de círculos de qualidade. (p. 33)
Segundo Deming,
um dos cem relatórios feitos na convenção nacional dos CQ em Tóquio em novembro de 1980 foi uma explicação de como, com uma reesquematização do trabalho, cinco pessoas fazem agora, o mesmo trabalho que antes era feito por sete. Ou seja, cem pessoas conseguem fazer agora o trabalho de 140. As outras quarenta
(*) Círculo de Qualidade e Círculos do Controle de Qualidade são denominações da mesma prática de gestão participativa, com origem na gestão japonesa.
pessoas não ficaram sem emprego. Foram, simplesmente, transferidas para outro trabalho. Contribuições como esta ajudam a melhorar a posição concorrencial da empresa, e o resultado final é que a empresa precisará de mais, e não de menos empregados. (p. 357)
80
À medida em que a economia japonesa se recuperava, era maior o
número de empresas que aderia às novas práticas de gestão, orientadas
para a qualidade. Deming (1990). previu este fato, como ele mesmo
descreve:
O primeiro obstáculo a ser vencido a nível de direção no Japão em 1950 foi a suposição geral de que seria impossível eles fazerem concorrência à indústria americana e européia, em vista da reputação de má qualidade do bens de consumo produzidos no Japão. O ano de 1950 foi o começo de um novo Japão em termos de qualidade. Previ, em 1950, que os produtos japoneses invadiriam, dentro de cinco anos, os mercados do mundo inteiro, e que o padrão de vida do Japão igualar-se-ia, com o tempo, ao dos países prósperos do mundo. (p. )
De fato, por volta de 1954, a economia japonesa passava do período
de recuperação para o de expansão, que ficou conhecido como a
"prosperidade Jimmu", em alusão aq nome do primeiro imperador da história
do Japão; em 1959, começava um novo período de prosperidade, que foi
denominado de "lwato", significando que era a maior desde as épocas
mitológicas. E, como previra Deming, na década de 60, o Japão ultrapassou
os suíços na produção de relógios, os alemães nos aparelhos fotográficos,
os americanos e os europeus em vários outros produtos eletrônicos e no
progresso ferroviário, com o trem-bala (Shinkansen).
"Disse a eles, muitos anos depois, que a qualidade japonesa poderia
ser a melhor e não a pior do mundo e que podiam transformar a frase "made
in Japan" de. um sinônimo de refugo em uma marca registrada de
qualidade", recordou-se Deming. De fato, a economia japonesa passa a ser
conhecida pela razão social "Japão SIA", tendo em vista que o país passava
a basear sua atividade no comércio internacional, importando matérias
primas, processando-as e exportando produtos acabados para o resto do
mundo.
E Deming (1990) completa suas previsões acima:
A base de minha confiança nesta previsões era: (1) observações sobre a mão-de-obra japonesa; (2) o conhecimento e a dedicação do trabalhador japonês e a sua ânsia de aprender; (3) a fé em que a direção da empresa japonesa aceitaria suas responsabilidades e delas se desincumbiria; (4) a ampliação da educação pela JUSE. (p.356)
81
Deve-se observar a presença dos valores culturais tradicionais do
povo japonês nas características do sucesso da empresa japonesa, na
previsão de Deming. Nos anos 70, as empresas japonesas se consolidam
no mercado mundial, destacando-se na liderança em vários segmentos,
como automóveis e produtos eletrônicos. A seguir, serão analisados
algumas das principais práticas e instrumentos gerenciais que foram se
desenvolvendo ao longo da evolução do modelo de administração japonesa.
4.1.2. Práticas e instrumentos da administração japonesa
Ao analisar a evolução da administração japonesa no tópico anterior,
verificou-se que foram sendo desenvolvidas duas importantes práticas
gerenciais que até então · os tradicionais de administração não haviam ... focalizado: o controle da Qualidade Total (TQC) e os Círculos de Controle
de Qualidade (CCQ). Além destas, outras práticas foram elaboradas ou
surgiram em decorrência dos valores culturais que permeavam a gestão das
empresas.
Para sistematizar estas novas práticas gerenciais da administração
japonesa, as mesmas serão divididas, segundo três categorias:
• práticas voltadas para a relação de emprego;
• práticas voltadas para a relação interempresarial;
• práticas de organização do trabalho e da empresa.
a) Práticas voltadas para a relação de emprego
Segundo Ogliastri (1992),
a administração japonesa pode ser resumida em duas características: a prática de que a autoridade vem de baixo para cima e uma coesa organização de grupos de trabalho. As principais conseqüências desses dois fatos são um excepcional desenvolvimento de seus recursos humanos, a satisfação, lealdade e motivação das pessoas e um trabalho eficientemente orientado para o longo prazo. (p. 12)
Segundo Yoshino (1968), citada em Fleury (1993),
nos primeiros estágios de industrialização japonesa, a competição e a necessidade de acumulação de capital levou as empresas a adotar padrões de relações de trabalho tão predatórios quanto as ocidentais (europeias e americanas). A mão-de-obra era abundante, as condições de trabalho precárias, os contratos de trabalho temporários, com alta taxa de rotatividade. Em 1911, o Governo promulgou o "Factory Act" regulamentando as condições de trabalho.
(. . .) com o crescimento econômico, a necessidade de uma mão-deobra mais estável, qualificada, com baixa taxa de rotatividade e absenteismo tornou-se prioritária. Foram modificando-se os padrões de relações de trabalho, passando os empregados a ser contratados diretamente pela empresa; reforçava-se a idéia da empresa como uma grande família.
E, assim, gradualmente, foram se definindo os traços mais distintos do sistema de gestão japonês: o emprego vitalício, os salários e promoções baseados na senioridade, idade e educação, o processo decisório (sistema ringi), a importância do grupo e não do indivíduo, gerando o comprometimento a uma · cultura corporativa extremamente forte. (p. 126)
82
Deve-se considerar que os "traços distintivos" de que fala Yoshino
(1968) foram formados sobretudo a partir do final dos anos 40, quando as
empresas japonesas se lançam no processo de reconstrução da economia
do país.
Peralva (1990), a partir das características da gestão de recursos
humanos na empresa japonesa, levanta as seguintes questões na relação
empresa-empregados:
Por que o japonês é solidário com a empresa de que é empregado? Por que, às vezes, nem termina as férias e volta ao seNiço? Por que, na maioria dos casos, em lugar de paralisar o trabalho, limita-se a exprimir seu desagrado ou apoiar sua reivindicação enrolando no braço ou na cabeça uma faixa vermelha, com os dizeres em branco
"estamos em greve"? Será que o cidadão nipônico é mesmo, no dizer dos americanos, um "work-aholic", isto é, viciado no trabalho? Ou um patriota extremado? (p. 72)
83
Deve-se entender, inicialmente, que grande parte das características
da relação de emprego foram estabelecidas no período da reconstrução
econômica do país, quando os valores culturais, sobretudo o patriotismo,
influenciaram no desenvolvimento destas práticas.
Com relação à carga de trabalho, estatísticas internacionais, citadas
por Peralva ( 1990), evidenciam que o . trabalhador japonês está muito
próximo da carga semanal de trabalho (41,5 horas) em relação ao seu
colega norte-americano (40,0 horas) e alemão (40,2 horas). O que
diferencia bastante nesta comparação é o número de dias de férias pagas,
sendo no Japão em média de 13,9 dias ao ano, quando nos Estados Unidos
é de 22,2 e na Alemanha (ex-Ocidental) é de 24 dias.
O que explica a dedicação do trabalhador japonês ao trabalho é,
além dos fatores culturais e psicológicos de integração ao grupo e à
sociedade, o sistema de salários e bonificação, prevalecente nas grandes
empresas principalmente.
Segundo Peralva (1990),
o sistema japonês de bonificação faz com que, na prática e de maneira informal, o salário se divida em duas ou três partes. A primeira parte é recebida mensalmente, a segunda no fim do semestre, constituída de mais três salários, e a terceira no fim de ano, com três ou quatro salários extras (em média), dependendo do aumento da produtividade, em resumo, do lucro da empresa. (p. 73)
Assim, grande parte da remuneração do trabalhador é variável e tal
variação depende do resultado, para o qual cada trabalhador está
consciente da sua responsabilidade individual em ajudar a obtê-lo. Deve-se
ressaltar que há diferenças salariais entre as empresas japonesas,
dependendo do porte da empresa: aliás, o status de uma pessoa no Japão
depende do tamanho da empresa em que trabalha.
Assim, os jovens, quando concluem a universidade ou o nível. médio
( cêrca de 90% da população jovem completa pelo menos nove anos de
escolaridade), procuram ingressar em grandes empresas, que promovem
84
seleção de candidatos no período logo após o término do ano letivo. Há
cerimônias para recepção e integração dos pandidatos aprovados que, a
partir daí, iniciarão uma longa carreira na empresa. Três novas
características devem ser analisadas na relação de emprego: a vitaliciedade
do emprego, a promoção por senioridade e a relação empresa-sindicato.
Emprego vitalício
Segundo Ouchi (1985),
a característica mais importante da organização japonesa é o emprego para a vida toda: o emprego vitalício, mais do que uma simples política, é a rubrica sob a qual muitas facetas da vida e do trabalho japoneses se integram.
(. . .) Emprego para a vida toda significa que uma grande firma ou um órgão do governo (. . .) admite uma grande quantidade de novos empregados, todos. de uma vez, embora geralmente não tenha trabalho para todos eles imediatamente. As promoções são sempre internas e uma pessoa com um, cinco ou vinte anos em uma empresa não será admitida e nem ao menos considerado por outra empresa. Uma vez contratado, o novo empregado é mantido até a aposentadoria compulsória, aos cinqüenta e cinco anos. Um empregado não será demitido por nada além de umfj grande ofensa criminal e a demissão é uma punição severa, pois quem foi demitido não tem esperança de encontrar emprego em uma firma comparável e, por isso, tem de procurar uma menor, que paga salários comparativamente menores e oferece pouca proteção, ou então tem de voltar para sua cidade natal. (p. 17)
Deve-se observar, no entanto, que este modelo de emprego vitalício
está restrito a 35% ou 40% no máximo das empresas japonesas e que, por
outra característica cultural do mercado de trabalho, praticamente tem
beneficiado os trabalhadores do sexo masculino.
Segundo Hirata (1993), a partir de uma pesquisa realizada nas
empresas japonesas em 1982,
Constatamos que os pilares do dito "modelo" japonês de relações industriais industriais não diziam respeito nem às mulheres assalariadas japonesas, nem aos trabalhadores das fábricas subempreiteiras, em geral pequenas e médias empresas.
A mesma pesquisadora retornou ao Japão em 1989, após um período.
de "boom" econômico sustentado durante 38 meses, quando o país
85
apresentava a taxa de crescimento mais elevada do mundo industrial e
constatou que
esta conjuntura econômica modificou a gestão do emprego vitalício, ao introduzir a contratação em meio de carreira, e transformou de forma espetacular o perfil do mercado de trabalho. A atividade feminina aumentou de modo notável, sobretudo a das assalariadas em regime de "part-time" e, pela primeira vez na história do Japão, lançou-se mão do trabalho imigrante. (p. 17)
Deve-se considerar que a "importação" de mão-de-obra está
relacionada ao aumento do custo do trabalhador japonês que, nos anos 80,
alcança e, em alguns casos, ultrapassa o nível salarial dos países mais
industrializados; em função disto e do nível de bem-estar alcançado pela
população, já não havia trabalhadores disponíveis para realizar as tarefas
que no Japão são denominadas "ka ka ka" ( correspondendo às iniciais da
letra "k" e que designam: trabalho sujo, pesado e insalubre). Tais tarefas
são executadas pela mão-de-obra imigrante, incluídos aí grande parte dos
cento e cinqüenta mil "dekasséguis" brasileiros.
Senioridade
Trata-se do sistema de prom6Çao por antigüidade. Segundo Ogliastri
(1993),
o sistema de cargos hierárquicos na empresa japonesa tem muitas semelhanças com a organização militar. O cargo se adquire por antigüidade e as promoções são praticamente automáticas: nas empresas maiores, o executivo ingressa recém-formado pela universidade e, (. . .), depois de dez anos, recebe a sua primeira promoção, a assistente do chefe de um_grupo e, aproximadamente cinco anos depois, é nomeado chefe de um grupo. Somente a partir da promoção seguinte, a gerente de departamento, é que começa um sistema de promoções por mérito e não por antigüidade, e isto ocorre quando o executivo atinge os quarenta e cinco anos de idade: este é o nível de gerência média, encarregada do desenvolvimento de todo o pessoal do seu departamento. Depois seguem os cargos de alta gerência, de vice-presidência para cima. (p. 16)
Segundo análises realizadas recentemente por lnagami (1989),
citados por Fleury (1993), com base em dados do Japan lnstitute for Labor,
verifica-se que
o sistema de promoção e salários com base na senioridade, com seu enfoque igualitário, vem sendo se transformando em um sistema orientado para a habilidade e desempenho; os empregados regulares não objetam ao novo sistema desde que as mudanças não sejam drásticas. (p. 135)
86
Ou seja, o sistema de promoção na empresa japonesa passa a
valorizar mais o mérito e o desempenho do que a antigüidade, uma vez que
esta impedia a ascensão de pessoas com maior talento e que poderiam sair
espontaneamente de empresa à busca de novas oportunidades de carreira,
inclusive através do negócio próprio. Ao se analisar adiante a gestão das
empresas americanas nos ·anos 70, vai se verificar que estas enfrentaram o
mesmo problema de incentivar a carreira interna de empregados criativos e
empreendedores.
Relação Empresa-Sindicato
Finalmente, outro aspecto a ser analisado na questão da relação
empregatícia no Japão diz respeito ao pap~l do sindicato. Durante a 11
Guerra Mundial, já havia os sindicatos de trabalhadores que, em sua
maioria, estavam ligados individualmente a gtar\des empresas e não a uma
entidade sindical. No entanto, com a revitalizaç~o econômica do país, a
federação sindical (SOHYO), que existia desd~ a ocupação norte
americana, passa a fortalecer a sua participação na relação empresas
empregados. Assim, segundo Peralva (1190},
duas vezes por ano empreendem-se negociações entre representantes das empresas e representantes dos empregados. É o que se denomina a lei de Ofensiva de Primavera (Shunto), que tem seu ponto alto no 1° de Maio, e a Ofensiva de Outono (Shiuto), que culmina em dezembro, quando se aproxima a grande festa de ano-novo e a febre do consumismo atinge as mais elevadas temperaturas. (p. 73)
Nos anos mais recentes, conforme Ogliastri (1993),
a SOHYO, maior federação sindical do país, quer chegar a uma negociação anual comum a todas as empresas. Mas durante os anos 80 adquiriu-se o hábito de esperar a negociação "de prova" em alguma empresa: as demais seguem a pauta da primeira, e aquelas que obtiveram melhores resultados que a empresa de base proporcionam um aumento ligeiramente maior. (p. 23)
87
Com o crescente índice de participação dos trabalhadores na gestão
da empresa, sobretudo através dos Círculos de Controle de Qualidade, em
muitas empresas o sindicato perdeu o papel de intermediador entre
empresas e trabalhadores. No entanto, isto não significou o fracasso destes
sindicatos, pois eles passaram a atuar dentro de um novo papel, talvez mais
nobre do que o primeiro: como complementadores das políticas sociais das
empresas, e do Governo, através de sistemas de assistência médica, lazer,
cultura e esporte para os trabalhadores.
A seguir, serão analisadas as práticas da administração japonesa
referentes às relações interempresariais.
b) Práticas voltadas para a relação interempresarial
Certamente grande parte do sucesso das empresas japonesas pode
ser atribuído ao seu sistema de relações interempresariais. Historicamente,
as empresas japonesas, inicialmente devido à concentração do capital em
famílias (clãs) descendentes dos senhores feudais, formavam poderosos
conglomerados empresariais, coohecidas como "Zaibatsu". Com a
Revolução Industrial empreendida na Era Meiji, pretendia-se acabar com
tais grupos, desconcentrando o poder econômico. No entanto, eles
conseguiram sobreviver enquanto empresas, embora antigos executivos,
descendentes das famílias feudais, fossem expurgadas da vida pública.
Com o esforço de produção para a Guerra da Coréia e, em seguida, a
reconstrução do país, ·estes grupos ressurgiram e se multiplicaram,
formando uma espécie de um "tecido inter-empresarial": grande parte da
economia japonesa (mais de 50 por cento do PIS) está relacionada a estes
grupos. Mas, como os "zaibatsu" não tinham uma boa imagem junto ao ·povo
japonês, pelos problemas políticos que haviam provocado no passado
(corrupção de funcionários públicos, exploração predatória da mão-de-obra,
concentração do poder econômico, entre outros), o Governo decidiu
reestruturá-los, passando inclusive a se . chamarem "keiretsu" que, em
japonês, tem o sentido de "conglomerado empresarial".
Segundo Miyashita & Russell (1994), existem dois tipos de "keiretsu":
horizontal e vertical.
88
O "keiretsul" horizontal é formado por um grupo de empresas,
atuantes em diversos setores diferentes da economia e que têm um banco
como o poder econômico central do grupo. São apenas seis "keiretsu's"
horizontais, conhecidos como "Big Six" e são os seguintes: Mitsui,
Mitsubishi, Sumitomo, Fuyo, Sanwa e Dai-lchi-Kangyo. Os três primeiros
eram antigos "zaibatsu" (e fazem questão de não incluírem esta informação
na sua memória empresarial). Cada um deles possui poderosas empresas,
diversas delas líderes em seus setores, inclusive a nível mundial.
Por exemplo, a Mitsui inclui a Toyota, a Toshiba e a lshikawajima
(estaleiros), além de dezenas de outras menos conhecidas; o Fuji Bank (do
"Keiretsu" Fuyo) inclui a Nissan, a Canon, a Hitachi, a NKK (televisão) e
outras.
Já o "kereitsu" vertical é um grupo de empresas que mantém relações
de compra e venda entre elas.
Ouchi (1985) descreve o funcionamento destes grupos:
c Cada grupo consiste em vinte a trinta grandes firmas, todas aglomeradas em torno de um banco poderoso. Essas grandes firmas representam cada um dós importantes setores industriais da economia, de modo que geralmente um grupo inclui uma companhia de navegação, uma companhia siderúrgica, uma companhia de seguros, uma companhia de comércio, e assim por diante.
Por sua vez, ao redor de cada uma das grandes firmas, há uma série de empresas satélites, talvez cem ou mais, em alguns casos. Essas empresas satélites, pequenas firmas que empregam uma família ou talvez cem pessoas, geralmente fabricam submontagens ou prestam um serviço, vendido somente a um único cliente maior. As empresas satélites não eram consideradas como membros do grupo e não desfrutavam da proteção financeira ou outros tipos de proteção oferecidos às firmas maiores.
A relação entre as satélites e as maiores firmas no Japão constitui um monopólio bilateral, em que a empresa satélite tem somente um cliente para seu produto e a firma maior tem somente um fornecedor para cada um dos seus insumos. (p. 18)
Outro aspecto importante da relação interempresarial na
administração japonesa é a integração das empresas para colocar em
89
prática os sistemas "just-in-time" e kanban, o que será analisado .no tópico a
seguir.
c) Práticas de organização do trabalho e da empresa
As práticas voltadas para a relação empresa-empregados e para as
relações interempresariais se refletem ou interagem com as práticas
int~rnas da gestão japonesa, tais como: o processo decisório, a filosofia da
melhoria contínua (kaizen) e a gestão industrial Uust-in-time, kaban e
manufatura flexível). Cada uma destas práticas será analisada a seguir.
O processo decisório
Uma das características mais conhecidas da administração japonesa
é o sistema de decisão, cujo processo é consensual: há uma palavra
específica para designar tal processo: "ringi". Esta palavra se compõe de
duas partes: "rin" significa "submeter proposta a um superior e receber sua
aprovação" e "gi" significa "deliberações e decisões".
Este sistema possibilita que· as decisões sejam tomadas de baixo
para cima, invertendo a pirâmide tradicional dos sistemas hierarquizados de
decisão. Inicialmente, o sistema "ringi" procura estimular a diversidade de
idéias e alternativas de decisão, evitando a homogeneidade, que é
característica das organizações burocráticas (as mesmas pessoas tomam as
mesmas decisões sobre os mesmos problemas em suas áreas de
responsabi I idade).
Assim, o passo inicial é estimular os subordinados ou pessoas mais
jovens da equipe a propor as alternativas a uma decisão.
Ouchi (1985) relata o processo "ringi" em um banco japonês.
Quando está para ser tomada uma grande decisão uma proposta escrita coloca em discussão uma alternativa melhor. A tarefa de redigir a resposta vai para o membro mais jovem e mais novo do departamento. Naturalmente, o presidente, ou o vice-presidente, conhece as alternativas aceitáveis e o jovem tenta ao máximo calcular quais são elas. Conversa com todos, solicitando opiniões, dando atenção especial aos que conhecem melhor o homem da cúpula. (. . .) Este jovem freqüentemente cometerá alguns erros
durante o processo. Sugerirá coisas que são tecnicamente impossíveis ou politicamente inaceitáveis, .e deixará de incluir outras. Os administradores experientes jamais se impõem ao jovem, nunca se sentam com ele para dizer-lhe o que a proposta deveria conter. (. . .) Por fim, é redigida uma proposta forma que depois circula desde a base da organização até o topo. Em cada estágio, o administrador em apreço manifesta sua concordância, fixando seu carimbo no documento. No final deste processo "ringi", a proposta está literalmente coberta de carimbos de aprovação de todas as pessoas envolvidas. (p. 46)
90
Depois de obtido o consenso, o documento aprovado passa a circular
entre os vários gerentes para a aprovação formal. É normal este processo
decisório levar algumas semanas ou meses, de acordo com a complexidade
do problema a ser decidido. E a responsabilidade da decisão fica tão difusa
que ela não pode ser atribuída a uma pessoa, individualmente. Em teoria, a
responsabilidade final caberia ao presidente, mas ele pode alegar que agiu
com base na aprovação prévia dada pelos membros da equipe. A
responsabilidade fica compartilhada entre todos os membros da equipe.
Existe pouca margem para que o presidente possa fazer um
julgamento independente sobre a questão a decidir. O documento aprovado
por consenso não apresenta alternativas e os dados que o acompanham
são escassos -e, naturalmente, sempre em apoio à decisão proposta.
Assim, é raro ocorrer a não aprovação de uma proposta pela alta
administração.
O sistema "ringi" de decisão não é compreendido pelas empresas I
ocidentais, o que se justifica pela questão cultural. Mas, à medida em que o
Japão vem participando crescentemente da economia mundial e aumenta o
volume de suas operações com empresas ocidentais, as empresas
japonesas têm tido dificuldades em manter este processo consensual de
decisão, devido à lentidão inata do processo. Assim, embora um grande
número de empresas ainda mantenha o sistema "ringi", evidencia-se que é
utilizado cada vez menos, sobretudo pelas empresas que estão em setores
mais competitivos ou globalizados, nos quais as decisões devem ser mais
rápidas para acompanhar a velocidade das mudanças.
91
A filosofia da melhoria contínua
Esta filosofia, mais conhecida como "kaizen", significa a melhoria
contínua, ou seja, a busca permanente da perfeição. A palavra tem duas
partes: "kai" tem o sentido de repetição e "zen" é o estado da perfeição, de
acordo com a religião budista. Os japoneses levaram este conceito espiritual
para dentro das empresas e fizeram do mesmo uma prática vinculada à
gestão da Qualidade Total. Assim, cada vez que se atinge um resultado de
melhoria; não. pode se acomodar: é necessário continuar a desenvolver
novos esforços, visando obter uma nova melhoria. E assim por diante, sem
nunca chegar ao estágio da perfeição. Foi provavelmente com base nesta
filosofia que os japoneses vêm perseguindo, e continuam a perseguir, o
aprimoramento dos seus produtos, como a miniaturização dos componentes
eletrônicos, que possibilitou passar do "mainframe" para o computador
pessoal de mesa ("desk-top"), depois o computador portátil de colo ("lap
top"), depois o computador de bolso ou que cabe na palma da mão ("palm
top") e já existe até o "finger-top", para aplicação na medicina em cirurgias
intra-vasculares ou operações de robótica de micro-precisão.
Outro aspecto fundamental d~. filosofia "kaizen" é que, segundo lmai
(1990),
o kaizen gera o pensamento orientado para o processo, já que os processos devem ser melhorados antes que consigamos resultados melhores. Além disso, o kaizen é orientado para as pessoas e dirigido aos esforços das pessoas. Isto contrasta nitidamente com o pensamento orientado para o resultado, da maioria dos gerentes ocidentais. (p. 14)
Neste sentido, a idéia de "melhoria contínua" se contrapõe à idéia
ocidental de inovação. Enquanto a inovação busca a solução de problemas
através de saltos, a filosofia "kaizen" busca as mesmas soluções através de
pequenas melhorias. O resultado é que, enquanto a inovação exige maior
esforço inclusive de mudanças. culturais e até de maiores investimentos, o
"kaizen" pode ser aplicado com a adaptação mais gradual das pessoas ao
novo "status quo" resultante da melhoria contínua.
A filosofia do "kaizen", aplicada em programas de Qualidade Total,
tem gerado a criação dos chamados "Grupos de Melhoria Contínua", a
serem analisados no modelo de administração participativa.
92
Práticas de gestão industrial
Depois de implantar vários mecanismos de gestão na empresa como ·
um todo, à medida em que as empresas japonesas foram aumentando seu
volume de operações, novas práticas e técnicas gerenciais foram
desenvolvidas, agora voltadas para o processo industrial. As três práticas
mais conhecidas nesta área são: os sistemas just-in-time, kanban e
manufatura flexível que, para serem compreendidos, devem ser analisados
em conjünto.
Focalizando a gestão da produção nas empresas japonesas, Coriat
( 1993) afirma que
uma das causas essenctats da formidável competitividade das empresas japonesas tem a ver com o fato de que, por razões que lhe são próprias e que a história econômica e a sociologia histórica do Japão explicam, este país se viu na situação de ter que inovar nas áreas associadas da organização do trabalho e da gestão de produção. E que, pelo jogo de uma série de inovações organizacionais coerentes entre si, ele formou por fim uma verdadeira "escola japonesa de gestão de produção", distinta da escola clássica americana (Administração Científica), justamente associada aos nomes de Taylor e Ford). Ponto-chave, esta nova escola se revela especialmente adaptada às condições contemporâneas da competição entre empresas, nas quais a obrigação de diferenciação e de qualidade têm um lugar essencial. (. 79)
Assim, os japoneses seguiram caminhos diferentes dos americanos
no que diz respeito à racionalização do trabalho ao invés da especialização
em tarefas, no Japão partiu-se para a polivalência dos trabalhadores
qualificados. Para tanto, foi adequado o arranjo físico de máquinas e
treinado o operador para que ele possa desempenhar múltiplas funções,
otimizando a utilização de seus tempos ociosos.
Analisando o sistema de produção da empresa japonesa, Ribeiro
(1989) conclui que
o milagre japonês não tem nada de sobrenatural. O que existe é uma atitude dirigida para o HOMEM, procurando aprimorar suas habilidades e através dela partir para programas mais amplos de otimização da produtividade. Foi através desta reversão conceitual, definindo o HOMEM como ponto chave, ao invés da MÁQUINA, que os japoneses conseguiram se impor dentro da comunidade
industrial, tornando-se respeitados como fabricantes de produtos de alta tecnologia, elevada escala de produção e baixo custo. (p. 1 O)
93
O sistema de produção japonês tornou-se um paradigma para todo o
mundo industrial; neste sentido, vários autores têm denominado este
sistema de:
• japonização ou toyotismo- Wood (1993)
• ohnismo- Coriat (1993)
• sistema de produção Toyota ou sistema kanban- Ribeiro (1989).
Historicamente, atribui-se a Taiichi Ohno (daí, o ohnismo de Coriat),
ex-vice-presidente da . Toyota Motor Company, o desenvolvimento das
técnicas industriais que vieram a constituir o sistema japonês de gestão
industrial: isto ocorreu no início dos anos 50, portanto, no período de
recuperação do parque industrial. No· entanto, as técnicas só se
consolidaram como um novo sistema de produção no período de expansão
da economia japonesa pós-1954.
A seguir, serão analisadas .as três principais técnicas de gestão
industrial desenvolvidas pela administração japonesa: o "kanban", o Just-in
Time e a manufatura flexível.
KANBAN
A palavra "Kanban" em japonês significa cartão ou painel. É através
de cartões ou painéis que o sistema de controle de produção comanda as
operações: quem determina a fabricação de um novo lote é o consumo das
peças ou componentes realizado pelo setor seguinte.
Assim, o controle "kanban" praticamente elimina da fábrica os papéis,
as chefias e a burocracia: ficam apenas ·as atividades-fins, que serão
programadas e controladas pelo "kanban", uma vez que estas geram valor
(satisfação) para o cliente e este se dispõe a pagar este custo.
Neste sentido, Ribeiro (1989) afirma que,
tradicionalmente, a programação de produção explode, em diversas ordens de serviço, a fabricação dos diferentes tipos de peças que compõem um determinado produto. Cada seção executa operações
independentes, de acordo com as ordens de fabricação em seu poder e as fornece às seções subseqüentes. Este método é hoje conhecido como "PUSH METHOD", ou seja, um método que poderia ser entendido como o sentido de "Empurrar a Produção". (p. 40)
De outro lado, observa o mesmo autor,
no sistema "kanban" a produção é comandada pelas linhas de montagem. Somente após o consumo das peças na linha de montagem é gerada autorização de fabricação do novo lote. (. . .) O sistema "kanban" utiliza o "PULL METHOD", ou seja, o método que poderia ser entendido com o sentido de "Puxar a Produção".
94
Assim, o sistema "kanban" deve ser complementado com a outra
técnica de gestão industrial, o sistema Just-in-Time.
JUST-IN-TIME
Segundo Edward Hay (1992}, o sistema de fabricação Just-in-Time
visa "produzir o mínimo de unidades, nas menores quantidades possíveis,
no tempo mais longo possível e eliminando todas as razões para se fazer
estoques." (p. 7)
Inclusive o Just-in-Time tamb.ém é conhecido como "estoque- zero".
Segundo Ruas et ai (1993),
o Just-in-Time (ou JIT) pode ser compreendido como um processo que visa a eliminação total dos desperdícios (programa perda -zero). Estas perdas podem ter várias origens: dos defeitos de fabricação (problema esse que é geralmente atacado por programas de garantia de qualidade) às atividades ou práticas que geram custo e não adicionam valor ao produto (tais como movimentação de matérias-primas ou produtos em elaboração, tempo de preparação de equipamentos, controles indiretos de qualidade e manutenção, preservação de grandes volumes de estoques de produtos acabados ou de matérias-primas em processo). (p. 1 05)
Assim, o Just-in-Time torna-se uma arma estratégica para a empresa,
pois envolve uma nova postura de relacionamento com seus fornecedores -
tal relação passa a ser de parceria e não mais de simples relação comercial
de suprimento. O fornecedor deve se reorganizar - inclusive reaplicando
várias das técnicas de gestão industrial do seu cliente-parceiro, a fim de
atendê-lo com relação às quantidades requeridas somente dos produtos
necessários e no momento certo.
95
Os conceitos que dão suporte à implantação do JIT são:
balanceamento, sincronização e fluxo. Curiosamente, os mesmos que Henry
Ford utilizou para criar a linha de montagem. Onde errou? Onde os
japoneses acertaram? Certamente foi na concepção de um "sistema de
gestão industrial" que envolve, além das técnicas, o envolvimento dos
recursos humanos, estimulando sua participação ativa na produção, na
melhoria da produtividade e das condições gerais de trabalho: de outro
lado, os mesmos são premiados por participação nos resultados.
O sistema Just-in-Time tem sido uma das técnicas mais divulgadas e
aplicadas por empresas ocidentais. Uma vez implantada, tem exigido
mudanças profundas na gestão das empresas no sentido de flexibilizar sua
estrutura produtiva, reduzir custos associados e desencadear um programa
de qualidade.
MANUFATURA FLEXÍVEL
-o processo de manufatura flexível não é uma técnica em si, como
podem ser chamados o "kanban" e o Just-in-Time: na realidade, é o
resultado de várias outras técnicas que buscam tornar o processo industrial
mais flexível, em termos de duas catacterísticas:
• a flexibilidade da organização da produção: trata-se da aptidão de
ajustar os equipamentos a uma demanda variável em volume e
composição. Está relacionada a equipamentos multiuso e
automoção microeletrônica;
• a flexibilidade em termos da aptidão dos trabalhadores trocarem de
posto ou de tarefa durante o processo produtivo: tal característica
implica na polivalência ou multifuncionalidade dos trabalhadores.
Há outros formas de flexibilidade, como a nível da estrutura
organizacional, mas cabe aqui se restringir à área de manufatura, que é um
dos marcos distintivos da gestão industrial na administração japonesa.
Assim, a flexibilidade na linha de produção pode assumir diversas formas,
segundo Salerno (1993):
96
• flexibilidade de volume: é a capacidade de variar o volume de um
ou mais itens sem afetar significativamente os custos ou margem
operacional;
• flexibilidade de gama ou família: é a capacidade de introduzir,
retirar e/ou modificar produtos, peças e componentes de linha;
• flexibilidade de mix: capacidade de suportar alterações no mix de
produção, dentro de uma dada gama/família de produtos, peças ou
componentes. Muito ligado ao tempo de preparação de máquinas
(set up);
• flexibilidade para suportar sazonalidades na produção, o que está
ligado à flexibilidade de contratação da mão,..de-obra, uma vez que
pode ser necessário contar com horas-extras, ou de possibilidade
de deslocar mão-de-obra entre setores produtivos de uma mesma
empresa ou fábrica;
• flexibilidade para suportar o mau funcionamento do sistema
produtivo: capacidade de resposta a imprevistos (falta de
suprimentos, variabilidade. da matéria-prima, variabilidade do
equipamento, quebras, problemas de coordenação, entre outros).
Para implantar e obter um processo de manufatura flexível, é preciso
integrar diversas técnicas de gestão industrial, além daquelas já citadas
(círculos de qualidade, Qualidade Total, "kanban" e Just-in-Time):
• Mínimo Inventário em Processo, também conhecido como MIPS -
Minimized lnventory Production System - objetiva reduzir ao
mínimo o estoque de peças em produção ou acabadas.
• Limpeza e arrumação: visa eliminar excessos, materiais fora de
uso, peças rejeitadas e máquinas obsoletas das áreas fabris,
permitindo identificar visualmente qualquer irregularidade. Faz
parte do Programa SS, que normalmente é a primeira fase de
implantação da Qualidade Total, também conhecida por House
keeping = limpeza da casa. (58 são iniciais das palavras
japonesas: Seiri = organização; Seiton = ordenação; Seiso = limpeza; Seiketsu = asseio; e Shitsuke = disciplina).
97
• Máquinas em disponibilidade: visa buscar a eficiência do conjunto
homem-máquina-ferramenta quando da real necessidade.
• Troca rápida de ferramenta: objetiva reduzir a menos de 1 O
minutos os tempos de paradas de máquina, de linha de montagem
ou de qualquer processo para troca do tipo de peça ou de produto.
• Operador polivalente: visa treinar_ o operador e ajustar as
máquinas e ferramentas, visando otimizar os tempos ociosos do
operador, preparando-o para execução de tarefas diferentes.
• Automatização de baixo custo: procura adaptar acessórios aos
equipamentos existentes, visando eliminar tempos ociosos do
operador da máquina ou de ambos, aumentando suas eficiências.
• Produção em lotes pequenos: consiste na sincronização das
operações ao longo do processo de produção, regularizando o
ritmo de trabalho e balanceando as quantidades produzidas na
unidade de tempo.
A partir deste conjunto de técnicas acima comentadas, foi possível
desenvolver nas empresas japonesas o sistema FMS - Flexible
Manufacturing System, ou seja, o Sistema de Manufatura Flexível. Não
significa que todas as técnicas anteriores são aplicadas para implantar o
FMS.
Segundo Ribeiro (1989),
o Sistema FMS, atualmente em desenvolvimento no Japão, visa a transformar uma operação que atue sob encomenda numa fabricação ágil, extremamente flexível, com prazos de entrega reduzidos. Existe ainda forte tendência de transformar produção em série, em fabricação pedido a pedido, acelerando os setores produtivos no sentido do rápido atendimento ao cliente. Este procedimento é diametralmente oposto ao sistema tradicional de programação semanal, mensal e até trimestral, onde os produtos são fabricados segundo tendência histórica do consumo, com pouco possibilidade de mudança durante a execução do programa. (p. 49)
Deve-se lembrar que as indústrias foram obrigadas a buscar sistemas
flexíveis de manufatura a partir do início dos anos 80 devido à tendência
(analisada anteriormente) da individualização do consumo, o que provocou
98
o surgimento de "nichos de mercado". A história empresarial recente mostra
que as indústrias japonesas podem não ter sido as primeiras a perceberem
esta tendência, mas foram as primeiras a aproveitar as oportunidades dela
decorrentes, através do FMS, sem esquecer as tecnologias de automação,
sobretudo a robótica, que permitiram à indústria japonesa saltar à frente das
suas concorrentes ocidentais.
4. 1. 3. Aspectos críticos na aplicabilidade da administração japonesa
Se a administração japonesa tem sido constantemente estudada e
analisada sob forma de estudos e pesquisas de profissionais, ligados tanto
à área acadêmica como empresarial, grande parte dos quais já está
publicada em livros e periódicos, tal fato, por si só, evidencia a importância
do conhecimento das suas práticas gerenciais.
No entanto, este interesse pela gestão japonesa tem uma motivação:
quase todos os autores e pesquisadores tentam avaliar até que nível é
possível transferir para as empr~~as ocidentais as experiências bem
sucedidas nas empresas japonesas.
Ao desenvolver a pesquisa literária para este estudo, observaram-se
dois tipos de atitudes dos pesquisadores e autores: inicialmente, uma
atitude de deslumbramento com o "modelo" japonês; num segundo
momento, a postura crítica de tentar avaliar a aplicabilidade do "modelo"
estudado.
As duas atitudes podem ser constatadas nas páginas dos estudos
publicados (ou no próprio título da obra). Assim, seguem alguns exemplos:
• Ouchi (1985) escreve o livro "Teoria Z" e propõe o seguinte
subtítulo: "Como as Empresas podem enfrentar o desafio japonês".
O título da Parte 1 do livro indica o deslumbramento: "Aprendendo
com o Japão" e a Introdução : "Por que precisamos aprender" e,
logo no Capítulo 1, o título é: O que podemos aprender".
99
• Pascale & Athos (1982) vivenciaram a mesma experiência de
Ouchi e escrevem o livro "As artes gerenciais japonesas" e abrem
o subtítulo: "Métodos e Sistemas dos Executivos Japoneses,
Adaptados à realidade Ocidental". O capítulo 1 - "O Espelho
Japonês" e o Capítulo 2 - "O Exemplo da Matsushita" pretendem
colocar o leitor mirando uma situação que poderá ser ou não
transportada para a sua realidade.
• Ogliastri (1992) estudou e escreveu "Gerência Japonesa e
Círculos de Participação", com o subtítulo "Experiências na
América Latina". Logo no Capítulo 1, aborda o título: "A empresa
japonesa: exemplo de autoridade e respeito humano", numa
tentativa de comparar na segunda parte do livro diversas
experiências de empresas latino-americanas na implantação dos
Círculos de Participação.
• Falconi (1992) tem desenvolvido um trabalho quase pioneiro no
Brasil, através da Fundação Christiano Ottoni, ligada à Escola de
Engenharia da Universidade Federal de Minas Gerais, em Belo
Horizonte. Escreve o livro ·"TQC - Controle da Qualidade Total" e
dá o seguinte subtítulo, entre parenteses: "(No Estilo Japonês)".
Desde 1984 ele vem pesquisando sobre qualidade, até que
resolveu trazer a "linha japonesa" da Qualidade, como é ensinada
pela JUSE no Japão: segundo ele, a razão é a "simplicidade" que
facilitará a aplicação do TQC no Brasil, ao qual as maiores
empresas brasileiras, tanto privadas como estatais, vêm aderindo
nos últimos anos.
• Schonberger (1988), depois de escrever o livro "Técnicas
Industriais Japonesas", desenvolve um segundo título, chamado
"Fabricação Classe Universal", onde analisa as empresas que
aplicaram as técnicas japonesas de gestão industrial e se tornaram
"empresas de classe universal". No entanto, logo no prefácio,
dedica uma página com o título "Agradecendo aos Japoneses",
onde conclui com as seguintes palavras: "( .. .) o sucesso japonês é
facilmente compreensível, fácil de ser aceito (uma vez que seja
100
conhecido), extremamente fácil de ser ensinado e aprendido e não
tão difícil de ser aplicado." (p. V)
• Murata & Harrison (1992) escrevem o livro "Como fazer com que
métodos japoneses funcionem no Ocidente", abrindo o texto com o
Capítulo 1: "Preparando-se para competir com o Japão". No último
. capítulo, propõem várias idéias de como "transformar as maneiras
japonesas bem-sucedidas em maneiras bem-sucedidas
apropriadas à cultura ocidental", envolvendo os seguintes
aspectos: trabalho de equipe; lealdade; interesse; valor na vida de
trabalho; integração; curiosidade; valor da experiência; e rotação
de postos e promoção.
• loshimoto (1992) escreve o livro: "Qualidade, Produtividade e
Cultura", com o seguinte subtítulo: "O que podemos aprender com
os japoneses", No texto, ele tenta responder a algumas questões, .
como:
Qual é a razão para o sucesso dos japoneses? Como é possível implantar os procedimentos e q.~ técnicas gerenciais nipônicas em nosso país? Por que quase sempre eles não dão certo? Há algum segredo não revelado? (orelha da capa).
Depois de analisar os vários conceitos e técnicas da gestão
japonesa, compara suas aplicações no Japão e no Brasil, baseando-se em
sua experiência profissional como engenheiro mecânico de produção.
• Hay (1993) escreve o livro "Just-in-Time", com o subtítulo: "Um
Exame dos Novos Conceitos de Produção". Seu capítulo 1 assume
a seguinte forma interrogativa: "Mas vai funcionar em minha
empresa?", como que a interpretar as dúvidas de dirigentes e
gerentes de empresas ocidentais que acreditam que "isto só dá
certo no Japão". Ele desenvolve um esforço para mostrar que "a
fabricação Just-in-time pode funcionar em qualquer ambiente
produtivo, seja qual for o ramo de atividade." (p. 21)
101
• Woronoff (1993), em contraposição aos autores citados, assume
uma postura crítica em relação à administração japonesa,
criticando a "mistificação" que se faz àquele modelo de gestão. O
autor procura inicialmente demonstrar como os próprios japoneses
têm dificuldades de se adaptar ou conviver com as· práticas do
modelo, sobretudo com relação ao emprego vitalício, à carreira
baseada na senioridade e à decisão consensual em grupo.
Finalmente, Hirata (1993) coordena a edição do livro "Sobre o Modelo
Japonês", em que vários autores,
especialistas em questões do trabalho, mas não necessariamente em relação ao Japão, abordam esse "modelo" sob dois pontos de vista: sua natureza e sua transferibilidade a outros países, sobretudo no Brasil, onde a presença da empresa japonesa é bastante significativa, tanto em termos de investimentos diretos quanto de adoção de seus métodos e técnicas. (orelha da capa)
Os autores não são unânimes nem quanto à transferibilidade do
modelo e nem quanto à "emergência de um novo paradigma de organização
industrial alternativo ao fordismo" e, .~ssim, recomendam ao leitor ''julgar por
si mesmo as contribuições e os limites do "modelo", a sua atração e
relatividade''.
Neste tópico do estudo, o objetivo é apenas levantar a polêmica
existente sobre o "modelo" japonês de administração: o tema será
novamente focalizado nas conclusões gerais do estudo.
No entanto, antes de encerrar a análise da administração japonesa,
após conhecer a sua origem, evolução e principais práticas gerenciais, é
importante entender o que levou estas empresas a serem tão bem
sucedidas frente às empresas ocidentais, nos setores em que foram
colocados em situação competitiva.
Ouchi (1985), depois de estudar durante vários anos as empresas
japonesas e as empresas americanas, estabelece uma comparação entre os
dois tipos de empresa e percebe que as características gerenciais são
quase sempre oponentes. É claro, alerta o autor, que tais características
BIBLIOTECt~ l{ARt A. BOEDECKER
102
são genéricas, não estando necessariamente todas presentes
simultaneamente na mesma empresa ou que todas as empresas se
enquadram naquela tipologia, que está apresentada sinteticamente no
Quadro 3.
Quadro 3 - CARACTERÍSTICAS GERENCIAIS DAS EMPRESAS
JAPONESAS E AMERICANAS
ORGANIZAÇÕES JAPONESAS
• Emprego vitalício
• Avaliação e promoção lentas
ORGANIZAÇÕES AMERICANAS
• Emprego a curto prazo
Avaliação e promoção rápidas
• Trajetórias de carreira não- • Trajetórias de carreira
especializadas
• Mecanismos de controle implícitos
• Tomada de decisão coletiva
• Responsabilidade coletiva
• Interesse holístico
•
•
especializadas
Mecanismos de controle explícitos
Tomada de decisão individual
Responsabilidade individual
Interesse segmentado
Fonte: OUCHI, William. Teoria Z- Como as empresas podem ebfrebtar o desafio japonês.
São Paulo: Ed. Nobel, 1985.
Assim, a empresa americana ( qué representa tipicamente a empresa
ocidental) atrai empregados para desenvolverem carreiras especializadas,
pois receberão como principal atribuição a execução de uma tarefa
específica: a carreira poderá ser rápida, dependendo da avaliação do seu
desempenho, mas não há lealdade para com a empresa: assim, o emprego
poderá ter curta duração.
De outro ·lado, a empresa japonesa atrai candidatos, independente de
haver vagas em certos postos de trabalho, pois será 'iniciada uma relação
empregatícia baseada na lealdade e no emprego vitalício: assim, a carreira
será longa e o empregado não se voltará para uma especialização
funcional.
103
Com relação ao processo decisório, na empresa americana as
decisões são centralizadas e, portanto, de responsabilidade individual.
Dada a hierarquia rígida existente, passa a prevalecer a cultura do controle
sobre as pessoas, o que é operacionalizado através de mecanismos
explícitos (regulamentos, autorizações formais, relatórios de
acompanhamento e outros procedimentos explícitos). Com isto, o interesse
das pessoas passa a ser na obediência às normas e à obtenção das metas
designadas, levando a uma visão microscópica do seu trabalho, limitada
pela extensão da tarefa.
De outro lado, na empresa japonesa, a decisão é coletiva, buscando
se exaustivamente o consenso entre a equipe e a decisão é provocada no
sentido de "baixo para cima": portanto, é um estilo participativo e, do ponto
de vista da nossa cultura ocidental, até coercitivo. No entanto, a
responsabilidade é coletiva, o que dispensa mecanismos explícitos de
controle: este é implícito. A própria equipe pune com posturas morais que
deixam o punido humilhado perante todos. Assim, uma vez que cada um se
compromete com a busca de resultados, ou a decisão da equipe, a
responsabilidade coletiva exigirá de todos uma visão holística dos
problemas analisados e do próprio trabalho desenvolvido. Neste sentido, o
trabalho será um prazer e um desafio.
Certamente outras características poderão ser comparadas entre as
empresas japonesas e americanas, além destas analisadas por Ouchi. No
entanto, estas já são suficientes para demonstrar as razões que levaram ao
sucesso da empresa japonesa, sobretudo a partir dos anos 70, e às
crescentes dificuldades da empresa americana para competir naquele
mesmo período.
Esta situação levou a empresa americana (e também as demais
empresas ocidentais) a reagirem a partir do "final da década de 70 e início
da década de 80: tal reação se manifestava pela busca de novos
mecanismos de gestão, constatado que aqueles até então praticados
estavam exaurindo sua possibilidade de manter aquelas empresas
competitivas. Começam a emergir a gestão participativa e a gestão
empreendedora, que serão analisadas a seguir.
104
4.2 ADMINISTRAÇÃO PARTICIPATIVA
Diferente da administração japonesa, a administração participativa
não tem uma origem histórica definida, seu arcabouço conceitual é disperso
(no tempo e no espaço) e são raras as empresas que colocam em prática a
filosofia participativa de gestão, daí a dificuldade de identificar e analisar
tais práticas.
Na realidade, ao se denominar "administração participativa" uma das
linhas de pensamento que constituem os novos modelos de gestão, a intenção não era colocá-lo ao mesmo nível dos demais. Na realidade, a
participação é muito mais um estilo de gestão do que um conjunto de
práticas e mecanismos de gestão. Neste sentido, a sua análise estará mais
voltada para as formas como se operacionaliza o estilo participativo de
gestão, sem preocupação de ideologia as possíveis tentativas de práticas
descentralizadas de gestão.
4.2.1. Origem da gestão participativa
Não existe, no campo da Teoria da Administração, uma "Escola" ou a
própria "Teoria" da Participação. No entanto, nos últimos anos, o assunto
vem merecendo estudos e interesse crescentes, porém sem a divulgação de
novas abordagens ou de novos conceitos que tornem a gestão participativa
um modelo pré-paradigmático.
Mesmo que não tenha desenvolvido um corpo estruturado de teorias,
a gestão participativa tem recebido algumas contribuições ao longo das
teorias tradicionais de administração. Assim, a experiência de Elton Mayo,
no período de 1927 a 1932, na fábrica da Western Electric, mostrou a
importância do grupo informal, ao se constatar que as moças que
participavam dos testes procuravam aumentar o nível de colaboração entre
elas, à medida em que aumentava o grau de dificuldade, provocado pela
própria experiência, em executar o seu trabalho.
105
McGregor (1960), ao propor as Teorias X e Y, identificou na segunda
o estilo de administração que valorizava o aspecto comportamental do ser
humano no trabalho. Portanto, um estilo mais participativo propiciaria
melhores resultados e maior satisfação das pessoas com o seu trabalho.
Chris Argyris (1975) também contribui para o conceitual da gestão
participativa, ao propor o enriquecimento das tarefas ("job enrichment")
como uma alternativa para reduzir a. dicotomia entre as necessidades das
pessoas e as necessidades das organizações. O enriquecimento das
tarefas permite maior proximidade entre as pessoas e aumenta sua
intensidade emocional, estimulando a participação nos trabalhos de grupo.
Likert (1961) propõe o modelo de estilos de liderança, enfatizando o
estilo de liderança participativa; para ele, "para uma liderança eficaz, é
fundamental que a mesma propicie envolvimento e enseje a participação de
todos".
Outra contribuição a ser registrada é de Chester Barnard, com a sua
Teoria da Cooperação: ele propõe, segundo Freitas ( 1991 ),
a cooperação formal, idealizando um sistema consciente de atividades coordenadas entre d'i..las ou mais pessoas. Inicia-se aí o rompimento com um passado clássico e o projeto de um futuro novo, em que a comunicação entre pessoas com vontade de contribuir para metas comuns seria a base da organização. (p. 38)
O mesmo autor comenta que
Barnard foi grandioso em seu trabalho, aconselhando corajosamente os executivos de sua época, e mostrando-lhes a possibilidade de serem práticos no propósito de organizar e unir as pessoas em uma ação coesa para um objeto único. (p. 38)
O último teórico das escolas tradicionais de administração que
contribuiu conceitualmente para a gestão participativa foi Abraham Maslow,
que estudou as . necessidades humanas numa escala hierárquica de
atendimento. Depois de garantir sua sobrevivência física, atendendo suas
necessidades fisiológicas e de segurança, o próximo nível de necessidades
é o reconhecimento social e é neste· momento que o estilo participativo de
gestão pode propiciar às pessoas a sua realização pessoal e profissional,
levando~as ao nível de auto-estima.
Segundo Mendonça (1987),
- o pressuposto fundamental dessas diversas visões é a identificação do conflito indivíduo versus organização e a preconização da possibilidade de sua superação por meio de uma ação sobre o homem, através de formas de motivação intrínsecas. Daí por que (. . .) a gerência participativa enfatiza arranjos organizacionais -rotação de cargo, enriquecimento da tarefa, ampliação da tarefa, grupos semi-autonômos e gerência por objetivos - para permitir o desenvolvimento psicológico do indivíduo e do grupo. (p. 56)
106
A emergência da gestão japonesa e seus resultados espetaculares a
partir dos anos 70, bem como o ingresso na Era da Qualidade (anos 70) e
da Competitividade (anos 90), têm provocado um novo interesse recente de
diversos autores sobre a gestão participativa: isto decorre do fato de que a
tendência das novas práticas gerenciais, tanto da gestão japonesa como
empreendedora, apontam para a ênfase em trabalhos em equipe.
Segundo Crawford (1994),
numa economia do conhecimento, os recursos humanos e não o capital físico e financeiro - constituem as vantagens competitivas das organizações e a gerência deve maximizar a preparação de trabalhadores altamente especializados. À medida que o homem da organização se torna uma espécie em decadência e que os trabalhadores devem sua yida profissional ao treinamento profissional e à sua capacidade mental e não a simplesmente fazer parte de uma organização, os estilos de administração participativa tornam-se cada vez mais importantes. O crescimento do trabalhador de "colarinho dourado" está gerando uma mudança de um estilo de administração autoritário para um estilo de administração participativa, com estrutura de trabalho orientada aos recursos humanos. (p. 124)
O estilo de gestão participativa pressupõe que as pessoas desejam:
• Trabalhar com pessoas que os tratem com respeito.
• Fazer um trabalho interessante.
• Serem reconhecidas por um bom trabalho.
• Ter uma chance de desenvolver suas habilidades.
107
• Trabalhar para pessoas que ouçam idéias de como fazer as coisas
de uma forma melhor.
• Ter uma chance de pensar por elas mesmas.
• Ter uma oportunidade de ver os resultados do seu trabalho.
• Trabalhar para um gerente eficiente.
• Trabalhar num emprego que apresente desafios.
• Sentirem-se bem informados sobre o que está ocorrendo.
Portanto, as pessoas esperam do seu trabalho muito mais do que o
salário: o trabalho deve conviver, de forma harmoniosa, com outras
prioridades, como família, saúde e espiritual idade.
Neste sentido, as práticas da gestão participativa devem levar em
conta as expectativas das pessoas na organização.
Assim, é preciso analisar o modelo de gestão participativa de um
ponto de vista mais pragmático e ~peracional, o que será desenvolvido a
seguir.
4.2.2. O funcionamento da gestão participativa: conceitos e práticas
Tendo em vista a vinculação crescente do estilo participativo de
gestão com as novas práticas gerenciais (Qualidade Total, por exemplo), o
presente tópico abordará o aspecto do funcionamento da administração
participativa, iniciando por um conceito mais operacional deste "modelo" de
administração.
Segundo Maranaldo (1989),
Administração Participatíva é o conjunto harmônico de sistemas, condições organizacionais e comportamentos gerenciais que provocam e incentivam a participação de todos no processo de administrar os três recursos gerenciais (Capital, Informação e Recursos Humanos), obtendo, através dessa participação, o total comprometimento com os resultados, medidos como eficiência, eficácia e qualidade.
108
Seguindo este conceito, antes de implantar um processo participativo
numa empresa, é necessário harmonizar três aspectos:
• seus sistemas (produção, comercialização, recursos humanos,
administração e finanças, entre outros): se há conflitos de estilos
diferentes de gestão entre estes sistemas, é difícil implantar a
gestão participativa numa empresa;
• condições organizacionais: é preciso flexibilizar a estrutura
organizacional, com menor número de níveis hierárquicos e
normas mais adaptáveis;
• comportamentos gerenciais: certamente é o mais importante dos
três, pois os gerentes serão os principais mobilizadores das
pessoas para o processo participativo.
A segunda parte do conceito aborda outro aspecto importante: indica
os dois pilares que sustentam a gestão participativa, ou seja, a "participação
de todos" e o "comprometimento total com os resultados":
• participação de todos: a princípio nenhuma pessoa, em qualquer
nível hierárquico, deve ser excluída do processo participativo. No
entanto, isto implica num grande risco para a empresa; a gestão
participativa pode transformar a empresa numa "assembléia geral
permanente", ou seja, resvalar a participação para o
"assembleismo" ou "democratismo". Daí, a importância do segundo
pilar que vai sustentar a gestão participativa, analisado a seguir;
• comprometimento total com os resultados: este aspecto garante
que cada pessoa está consciente da sua responsabilidade
individual com os resultados a serem perseguidos pela equipe ou
pela empresa. Este comprometimento é uma das características
mais importantes da administração participativa, pois disciplina a
atuação individual de cada pessoa, evitando o risco de pender
para o "assembleismo".
Neste sentido, é imprescindível que a empresa, antes de implantar a
gestão participativa, defina claramente os objetivos ou resultados a serem
alcançados, entre os quais, por exemplo: ·
109
• melhoria da qualidade
• maior produtividade
• melhoria do clima de trabalho
• enriquecimento das funções
• flexibilidade na utilização de recursos
Os objetivos definidos para serem alcançados, através da
administração participativa, vão definir o melhor formato organizacional para
implantar o processo. Por exemplo, se o objetivo é melhorar a qualidade dos
produtos e/ou serviços, a forma organizacional será Círculos de Controle de
Qualidade ou, mais modernamente, Times de Qualidade ou Grupos de
Melhoria Contínua; se o objetivo é melhorar o clima de trabalho, certamente
o melhor formato será de célula de produção ou grupo semi-autônomo.
Outras formas são:
• Comissão de Fábrica: geralmente representa o sindicato da
categoria na discussão dos problemas internos da empresa;
• Conselho de Representantes de Empregados: quando se pretende
acompanhar o desempenho financeiro da empresa para discutir e
negociar a participação dos empregados nos lucros.
Estes formatos vão determinar dois tipos de gestão participativa:
• direta: quando todos os empregados participam. Exemplo, times de
qualidade;
• indireta: quando há representantes dos empregados que "falam"
por todos. Exemplo, Comissão de Fábrica.
Para implantar a gestão participativa, algumas condições devem ser
obedecidas:
110
a) Quanto ao uso do poder
• Deve-se ter consciência prévia de que haverá perda parcial do
poder nos níveis superiores. Assim, os dirigentes delegam para os
gerentes algumas atividades e decisões que antes se
concentravam neles; idem dos gerentes para a equipe, de forma
que há uma diluição do poder na empresa, envolvendo mais
. intensamente os colaboradores, o que viabiliza a redução de níveis
hierárquicos e possibilita a maior horizontalização da empresa.
• Deve-se delegar efetivamente a autoridade à equipe para tomar
decisões: a responsabilidade formal permanece com quem
delegou.
• Deve-se negociar as decisões a serem delegadas por área de
competência, ou seja, a equipe ou as pessoas que receberam
delegação de autoridade devem agir dentro de uma área limitada
de competência, para evitar "invasão" sobre outras áreas.
• Deve haver uma predisposição para autonomizar gradualmente os
grupos: gestão participativa . não se implanta com a delegação
imediata de 1 00% de uma decisão: sempre é possível graduar. Por
exemplo, se a delegação para a equipe é de gerenciamento dos
recursos de treinamento, inicialmente deve-se estabelecer um
percentual dos recursos a serem gerenciados; com a avaliação do
processo, caso os resultados sejam atingidos, aquele percentual
poderá gradualmente ir aumentando, até o limite máximo possível
ou até o nível adequado ao tipo de decisão.
Finalmente, antes de implantar a gestão participativa, os dirigentes,
gerentes e colaboradores devem estar conscientes de que o processo é
irreversível, ou seja, não tem retorno; caso contrário, poderá provocar
grandes frustrações aos empregados, que desacreditarão por muito tempo
em qualquer esforço participativo.
A implantação da gestão participativa ho processo decisório pode
ocorrer segundo uma escala gradativa, conforme Figura 5.
lll
Figura 5- AVALIAÇÃO DO GRAU DE PARTICIPAÇÃO DA EQUIPE NO
PROCESSO DECISÓRIO
GRAU CARACTERÍSTICA DA PARTICIPAÇÃO
O Os funcionários cumprem ordens e ficam alheios aos
acontecimentos
1 A direção toma decisões e informa a equipe
2 A direção toma decisões, informa e ouve reações
3 A direção pede sugestões, decide e informa
4 A direção permite que os funcionários participem da decisão
5 A direção delega a decisão e reserva-se a prerrogativa da
palavra final
6 A direção delega completamente a decisão
Nos dois primeiros graus, o estilo de gestão é autoritário: a direção
decide sem ouvir a equipe.
A partir do grau 2, já há um estilo misto de gestão, que pode ser
chamado de "gestão diretiva ou unilateral" e vai até o grau 4.
A gestão participativa só ocorre efetivamente a partir do grau 5, pois
neste nível as pessoas se comprometem com o resultado, já que receberam
delegação de autoridade: até então elas são apenas atuantes passivos no
processo decisório, com as devidas graduações.
Quando se atinge o grau 6, pode-se afirmar que a equipe atingiu o
nível do "empowerment" ou do auto-gerenciamento, ou seja, a equipe
assume responsabilidades e toma decisões sobre tarefas e trabalhos,
incluindo muitas das responsabilidades que pertenciam ao líder. A partir
deste momento, o gerente já perdeu suas funções tradicionais de
"controlador das pessoas" e passou a exercer uma atividade mais nobre,
que é o de gerente estilo "coach", ou seja, orientador da equipe, para que
esta tenha condições de auto-gerenciar suas atividades.
112
Várias empresas, que há muitos anos vêm implantando práticas de
gestão participativa, estão atingindo este nível de auto-gerenciamento.
Quando a empresa atinge tal nível, há outra questão a ser estudada e
definida, agora junto com as equipes: a questão da participação nos
resultados ou lucros da empresa. Como tal questão é comum ao modelo da
gestão empreendedora, será discutida dentro daquele modelo.
4.2.3. ·Etapas para implantação da gestão participativa
Segundo Freitas (1991 ), são as seguintes as etapas para implantar a
gestão participativa numa empresa:
1. Conscientização pelos dirigentes da necessidade da mudança do
comportamento: esta é de cima para baixo ("top-down").
2. Treinamento para sensibilização dos dirigentes, gerentes e
equipes.
3. Quebra da rigidez hierárquica, visando abrir espaços para os
grupos a serem criados.
, 4. Análise sociológica dos grupos de trabalho e desenho do
sociograma dos diversos canais informais, visando facilitar a comunicação
entre as pessoas.
5. Treinamento para o trabalho em grupo, visando reeducar todas as
pessoas para o trabalho coletivo, o que implica numa nova cultura.
6. Incentivo à critividade individual e grupal, visando estimular a
busca de soluções inovadoras para os problemas da empresa.
7. Treinamento intensivo para o trabalho cooperativo, visando buscar
a realização de metas grupais.
113
8. Criação de grupos de estudos e de trabalho, de acordo com os
objetivos a serem buscados.
9. Planejamento das metas e objetivos da empresa, visando engajar
as pessoas no cumprimento dos resultados a serem buscados
coletivamente.
1 O. Implantação e acompanhamento dos resultados, com atenção
especial sobre as resistências ao estilo participativo.
Uma vez implantada a gestão participativa, um dos resultados que
provavelmente a empresa conseguirá será a mudança na sua relação com
os empregados: de uma relação empregatícia, passará a ser uma relação
de parceria.
4.2.4. Aspectos críticos na aplicabilidade da gestão participativa
Com base nas experiências dé implantação de programas de gestão
participativa em algumas empresas, tem-se observado algumas dificuldades
comuns a estas empresas. Almeida (1994) aponta três mais freqüentes"
Na implantação do programa, a dificuldade maior é a falta de preparo e de conscientização das chefias para o trabalho participativo. A cultura predominante é de valorizar mais o estilo impositivo e a quantidade (volume de produção).
Uma outra dificuldade é o baixo grau do pessoal de nível operacional. Isto exige um trabalho constante de acompanhamento e de formação, além da adequação da metodologia.
Um problema geral é a falta de habilidade da maioria das pessoas para trabalhar em grupo e com grupos.
Finalmente, no reconhecimento dos grupos, um obstáculo importante é a própria estrutura formal da empresa que dificulta a agilização das decisões para implantação dos projetos dos grupos. (p. 77)
114
Além destas dificuldades internas, pode-se encontrar obstáculos junto
ao sindicato de trabalhadores. Infelizmente, no Brasil (como é comum ainda
na maioria dos países ocidentais), o sindicato ainda tem como papel
principal a intermediação na relação empresa-empregados. Certamente
haverá novos e desafiadores papéis para tais entidades nos próximos anos,
à medida em que as empresas acelerem a implantação de novas práticas
gerenciais. Como estas geralmente resultam em estilos mais participativos
de gestão, significa que haverá canais diretos de relação empresa
empregados. Alguns sindicatos, receosos quanto à perda do poder, tentam
boicotar os processo participativos de gestão, mas, felizmente, não são
todos que manifestam tal postura. De qualquer maneira, é outra possível
dificuldade a ser encontrada na implantação de modelos participativos de
gestão.
4.3 ADMINISTRAÇÃO EMPREENDEDORA
A competitividade crescente das empresas japonesas, sobretudo a
partir dos anos 70, obrigou as empresas americanas (e mais tarde as
européias) a uma atitude de reação. A princípio, as empresas americanas
não acreditavam que o sucesso das empresas japonesas se manteriam por
muito tempo: viam ainda as empresas japonesas apenas como copiadoras
de idéias e de tecnologias, que seriam, no máximo, aprimoradas. Esta
miopia das empresas americanas custou-lhes caro, mas trouxe também
lições.
Assim, a partir do início dos anos 80, as empresas americanas já
haviam compreendido que o que as empresas japonesas tinham realizado,
de fato, era uma "revolução gerencial". Os livros de Pascale & Athos (1982)
e de Ouchi (1985) ajudaram a criar a nova visão de que as empresas
americanas estavam fora da competitividade (e não sobreviveriam) devido
ao seu modelo de administração tradicional. O esforço para mudar tal
situação levou ao desenvolvimento do "modelo" de administração
115
empreendedora, cujas origens e principais características serão analisadas
a seguir.
4.3.1. Origens da administração empreendedora
Do declínio industrial à "economia empreendedora"
Após o final da 11 Guerra Mundial, como principal potência econômica
industrial, os Estados Unidos passa a transferir grandes volumes de
investimentos para a Europa e o Japão, visando ajudar a reconstrução dos
países que participaram do esforço de guerra.
Com isso, segundo Cano (1994), promoveu-se a expansão daquelas
economias sobretudo a japonesa e a alemã, "transformando esses países
em duas grandes potências" (p. 59), enquanto a própria economia
americana esgotava suas fontes internas de crescimento acelerado,
passando a conviver, no final da década de 70, com a chamada "crise da
hegemonia (econômica) americana".
Segundo Peters (1989), as causas do alarme do declínio americano
já eram visíveis:
Nossa produtividade média de negoctos cresceu 3% ao ano, de 1950 a 1965. De 1965 a 1973, a taxa foi de 2% e, de 1973 para cá (1987), mal chegou a 1%. A produtividade de manufatura está ainda pior. Ela cresceu 2, 5% ao ano de 1950 a 1985, enquanto a do Japão cresceu 8,4%, a da Alemanha e Itália, 5,5%, a da França 5,3%, a do Canadá 3,5% e a da Inglaterra 3, 1%. (p. 4)
Reich (1983) interpreta assim o que ocorreu no período:
Quando os termos da concorrência global começaram a sofrer alteração em fins da década de 1960, as vantagens competitivas dos países industrializados mudaram para produtos e processos de sistemas flexíveis, aos quais as superestruturas não conseguiram reagir. Essas estruturas, tipicamente, procuraram manter intactas as velhas bases industriais, protegendo-as contra incursões estrangeiras. (p. 208)
Assim, por volta de meados da década de 1960, as indústrias básicas
haviam perdido o hábito de concorrer. Os sindicatos faziam acordos de três
116
anos, muitos deles incluindo aumentos automáticos com a elevação do
custo de vida. Alguns órgãos do Governo, como o Departamento de Defesa,
rotineiramente negociavam contratos não-competitivos com os líderes
empresariais; a Comissão Federativa de Comércio providenciava a proteção
de preços, evitando descontos a distribuidores e varejistas.
Assim, conclui Reich (1983),
uma vez que a rentabilidade ·estava mais ou menos garantida, nenhum motivo havia para inovar em novos produtos ou processos. Na verdade, inovação demais poderia desestabilizar a estrutura. (p. 209)
Isto levou as indústrias americanas a perderem a condição de
concorrer com tecnologia e preços: preferiram manter-se sob a proteção das
"superestruturas"; procurando defender-se das importações. Isto garantiria
os lucros a curto prazo (que Reich denominou de "capitalismo de papel") e
as empresas preferiam pagar dividendos aos investidores, visando manter
atrativo o "papel" (ações) da empresa no mercado de capitais, do que
investir em novas fábricas, modernizar equipamentos, pesquisar e
desenvolver novos produtos ou melhorar a qualificação dos seus recursos
humanos.
No final da década de 60, o Governo americano percebeu que sua
ajuda estava tirando a competitividade internacional das empresas
americanas: assim, algumas proteções começaram a ser afrouxadas e
definiram-se prazos para que as indústrias de vários setores estratégicos
reiniciassem investimentos em modernização, sobretudo para se adequarem
ao sistema de produção flexível.
No entanto, o círculo vicioso estava estabelecido: a maioria das
empresas estava em situação financeira difícil, devido à postura defensiva
até então adotada; assim, os grandes bancos não tinham interesse em
emprestar capitais para investimento de médio e longo prazo, preferindo
concentrar suas operações no curto prazo e no mercado financeiro
("capitalismo de papel").
Outro aspecto a considerar, segundo Reich (1983), é que,
ironicamente, esses esforços para preservar a velha base industrial tenderam, na verdade, para tornar ainda mais flexíveis e dinâmicas
as economias do Japão e de várias nações em desenvolvimento do que teriam sido em outras condições, e isto exatamente porque elas foram forçadas a se adaptar às políticas protecionistas americanas, (. . .) assim, as restrições introduziram os fabricantes estrangeiros no mais caro e mais especializado segmento do mercado americano, onde os produtores do país, em outras circunstâncias, teriam suas maiores possibilidades de manter a competitividade. (p. 221)
Womack et ai (1992) exemplificam tal situação:
Constitui a General Motors o mais impressionante exemplo. Continua· essa gigantesca companhia, sendo o maior complexo industrial do planeta, tendo indubitavelmente a liderança da produção em massa, sistema que ajudou a criar. Agora, na era da produção enxuta, encontra-se com excesso de gerentes, trabalhadores e instalações fabris. No entanto, a GM ainda não deparou com uma crise de vida ou morte, (. . .) não tendo sido, por causa disto, capaz de modificar-se. (p. 2)
Peters (1989) avalia secamente:
A verdade é que todas as grandes empresas de manufatura ou de serviços estão sofrendo traumas: do Bank of America e Citicorp à Ou Ponte General Motors, da IBM e Intel ao Hospital Corporation of America. (.,.)Estamos sendo derrotados basicamente devído à baixa qualidade daquilo que produzimos e pelo nosso fracasso, como resultado de atendimento questionável e de resposta lenta, na utilização de nossa vantagem, de estarmos próximos ao maior mercado do mundo. (p. 5)
117
No entanto, Drucker (1986), avaliando a economia americana no
período 1965-1985, começou a observar um novo aspecto pouco percebido
até então por outros autores: o fenômeno do que ele denominou
"entrepreneurship", que poderia ser traduzido literalmente como
"empreendedorismo", mas a expressão que tem prevalecido é "espírito
empreendedor", a qual foi inclusive utilizado como tradução do título do
livro.
Segundo Drucker ( 1986),
desde meados dos anos 70, slogans como "a economia do crescimento zero", a "desindustrialização dos Estados Unidos" e uma "estagnação "Kondratieff" a longo prazo da economia" tornaram-se populares e são considerados como axiomas. No entanto, os fatos e os números desmentem todos esses slogans. O que está acontecendo nos Estados Unidos é algo bem diferente: um
redirecionamento profundo da economia, de "gerencial" para "empreendedora". (grifo nosso) (p. 1)
118
Ele mostra, com dados estatísticos, que a economia americana gerou
4 milhões de empregos no período 1974-1984, exatamente num período
turbulento, com duas crises de petróleo (1974 e 1978) e do declínio das
grandes indústrias. E compara esta situação com a Europa que, em 1970,
possuía 20 milhões de empregados a mais que os Estados Unidos e, em
1984, passou a ter 1 O milhões de empregados a menos; idem com relação
ao Japão que, no período de 1970 a 1982, teve apenas 1 O por cento de
aumento no número de empregos. Dentro da própria economia americana,
verificou-se que, "por volta de 1984, a lista das "500 da Fortuna" havia
perdido de vez, pelo menos, de 4 a 5 milhões de vagas." (p. 4)
Então Drucker (1986), conclui que
todos esses novos empregos só podem ter sido criados pelas instituições pequenas e médias, a maioria delas pequenas e médias empresas privadas, e das quais um grande número, talvez a maioria, é de novas empresas, que sequer existiam há vinte anos trás. De acordo com o "The Economist", hoje em dia, 600.000 novas empresas estão começando a cada ano nos Estados Unidos - cêrca de sete vezes mais do que as .. que começaram em cada um dos anos de grande crescimento das décadas de 50 e 60. (p. 4)
Cabe então a pergunta: "De onde vieram todos · esses
empreendedores?" Drucker responde a questão:
foi o surgimento da economia empreendedora, que é um evento tanto cultural e psicológico, quanto econômico ou tecnológico. (. . .) O que viabilizou o aparecimento da economia empreendedora são as novas aplicações da administração:
• a novos empreendimentos, comerciais ou não, enquanto que. a maior parte das pessoas até agora tem considerado a Administração aplicável apenas a empresa existente;
• a pequenos empreendimentos, enquanto que a maior parte das pessoas estava absolutamente certa até há poucos anos de que a Administração era só para os "grandões";
• a empreendimentos não comerciais (serviços de saúde, educação e outros), enquanto que a maior parte das pessoas ainda ouve "empresa" quando depara com a palavra "Administração";
• a atividades que simplesmente não eram consideradas "empresas" de maneira alguma, como pequenos restaurantes, por exemplo;
• e, acima de tudo à inovação sistemática: à busca e ao aproveitamento de novas oportunidades para satisfazer as carências humanas e necessidades humanas. (p. 20)
119
De outro lado, cabe a questão: de onde estavam saindo os novos
empreendedores? Certamente das grandes empresas que estavam em
declínio dos seus negócios, não estavam investindo em inovações (de
produtos ou processos) e, em conseqüência, desestimulavam as pessoas
com talento e espírito empreendedor a desenvolverem carreira nestas
organizações. Drucker (1986) pergunta:
Como explicar (. .. ) que, de um momento para outro, surja tanta gente disposta a trabalhar como doida por longos anos e a enfrentar sérios riscos, em vez de ter a segurança das grandes organizações? Onde estão os hedonistas, os que buscam status, os "eu também", os conformistas? (p. 19)
Assim, empresas do porte da IBM, Xerox, Ou Ponte outras começam
a perder "talentos" que saiam para criar seu próprio negócio. Ao tentarem
entender o que desmotivava tais pessoas a permanecerem na empresa,
estas empresas começaram a perceber que os problemas estavam no seu
modelo de gestão.
b) Do "planejamento estratégico" à "gestão empreendedora"
A partir dos anos 50, as empresas americanas começam a enfrentar
novas questões, que não tinham precedentes anteriores, sobretudo na área
de marketing (estabilidade das vendas, surgimento de produtos substitutos
baseados em novas tecnologias, entre outros). Os métodos tradicionais de
gestão, baseados sobretudo em controles, .não tinha soluções para este e
outros novos problemas. Depois de muito esforço na busca de tais soluções,
surgiu no início dos anos 60 o "planejamento estratégico". Para que este
funcionasse, era imprescindível a atenção e o comprometimento do nível
diretivo da organização, o que nem sempre ocorria ou, quando muito, havia
um entusiasmo temporário do dirigente, que logo priorizava novas
situações.
Segundo Ansoff (1990),
a experiência inicial com o planejamento estratégico enfrentou três problemas sérios:
1. a "paralisia pela análise", que ocorre quando uma série de planos estratégicos não leva a resultados significativos no mercado.
2. A resistência organizacional à introdução do planejamento estratégico na empresa.
3. A expulsão do planejamento estratégico da empresa assim que o temporariamente vigoroso apoio da alta administração ao planejamento é retirado ou diminuído. (p. 178)
Outras críticas que são feitas ao planejamento estratégico são:
120
• concentração das decisões no topo da administração, com a
alienação do nível operacional (apenas toma conhecimento das
_metas a serem cumpridas a curto prazo) e a contribuição passiva
do nível gerencial (apenas controla a execução dos planos);
• as empresas criaram duas estruturas separadas: uma para
planejar e outra para exe~~tar. A separação entre quem pensa e
quem realiza tem levado a conflitos desgastantes e geralmente
insuperáveis nas grandes empresas;
• reforço das características burocráticas da organização, uma vez
que as atividades passam a ser planejadas e controladas com
mecanismos rígidos de gestão. Assim, a empresa perde
flexibilidade para acompanhar as mudanças.
Ansoff ( 1990) não só percebeu que grande parte das críticas eram
procedentes, como também constatou, através de estudos estatisticamente
confiáveis, que o planejamento estratégico, "quando devidamente usado,
realmente produz melhorias significativas no desempenho da empresa." (p.
178)
A partir destas constatações, ele propõe uma nova abordagem para o
planejamento estratégico: trata-se da "administração estratégica". Nesta
nova abordagem, ele afirma que
o planejamento estratégico é apenas um de três processos que devem ser combinados para assegurar uma adaptação estratégica efetiva. Os outros dois processos são: o planejamento do potencial de gestão e a administração do processo geral de mudança estratégica. (p. 178)
l2l
Assim, Ansoff passa a trabalhar com dois novos conceitos que,
agregados à abordagem tradicional do planejamento estratégico,
revitalizarão nas empresas a função de planejamento, agora sob a rubrica
de "administração estratégica" e com uma nova postura que levará ao
modelo de "gestão empreendedora".
O segundo processo componente da administração estratégica é o
"planejamento do potencial de gestão" da empresa, ou seja, é avaliar, a
partir do comportamento estratégico da empresa, qual a possibilidade que
ela tem de aproveitar as oportunidades oferecidas pelo ambiente externo.
Antes disso, Ansoff (1990) define dois tipos de comportamento da
empresa:
1. Comportamento Operacional: a empresa procura rentabilidade
no. aproveitamento de uma oportu~i~ade ambiental, assegurando o preço
mais alto possível e a maior participação no mercado.
2. Comportamento Estratégico: a empresa substitui produtos e/ou
mercados obsoletos por novos produtos e/ou mercados que oferecem maior
rentabilidade futura. Para tanto, a empresa identifica novas demandas,
desenvolve produtos mais adequados ao mercado, melhora o seu processo
de produção e comercialização, faz testes de mercado e lança novos
produtos.
Para avaliar o tipo de comportamento (operacional ou estratégico), é
necessário considerar que há dois tipos de mudanças:
1. Mudança incrementalista: os produtos e mercados evoluem
através de aperfeiçoamentos gradativos, seguindo a lógica histórica do
desenvolvimento da empresa.
2. Mudança descontínua: os produtos e mercados evoluem,
rompendo a lógica histórica da empresa, através da substituição de
tecnologias, do desinvestimento, da diversificação e da internacionalização.
122
A Figura 6 mostra que há quatro variantes significativas de
comportamento da empresa, quando se inter-relacionam os dois tipos de
comportamento com os dois níveis de mudança. No entanto, face ao objeto
deste estudo, só interessa avaliar os comportamentos extremos, ou seja:
• comportamento concorrencial
• comportamento empreendedor
Figura 6- VARIEDADE DE COMPORTAMENTO ESTRATÉGICO E
OPERACIONAL
TIPO DE
COMPORTAMENTO
Operacional
Estratégico
TIPO DE MUDANÇA
INCREMENTAL J DESCONTÍNUA
Concorrencial
Empreendedora
Segundo Ansoff (1990), no período inicial da Revolução Industrial,
até cêrca de 1900, prevaleceu o · comportamento empreendedor:
empreendedores visionários criavam empresas, a partir das novas
tecnologias emergentes e da demanda que surgia no mercado; de 1900 a
1950, prevaleceu o comportamento concorrencial, sem eliminar de vez o
comportamento empreendedor: foi o período da consolidação das grandes
empresas, a partir da exploração das oportunidades do ambiente no mesmo
mercado em que já atuavam, pois este tinha espaço para crescer.
A partir de meados da década de 1950, começa a alterar a
importância relativa dos dois comportamentos. As mudanças no· mercado
global tornam os desafios concorrenciais mais importantes, com a entrada
de novos concorrentes e a postura mais agressiva dos consumidores. Mas o
comportamento concorrencial esgotou a garantia de crescimento e
rentabilidade das empresas a partir dos anos 70; a partir daí, o surgimento
de novas tecnologias e o crescimento rápido do setor de serviços exigiu
novos desafios das empresas que, para sobreviverem e manterem sua
rentabilidade, passaram a ter que adotar posturas empreendedoras mais
123
agressivas, mas sustentando também seu comportamento concorrencial. A
seguir, serão analisadas as características e principais práticas da gestão
empreendedora, desenvolvidas após a adoção desta nova postura
(empreendedora) frente às mudanças turbulentas do meio-ambiente a partir
dos anos 80.
4.3.2. Características e principais práticas da gestão empreendedora
A partir da nova abordagem do planejamento empresarial, proposto
por Ansoff sob a filosofia da Administração Estratégica, ficou claro que, para
adotar posturas estratégicas na gestão dos negócios, as empresas
deveriam desenvolver o comportamento empreendedor. Esta nova postura
deveria ser operacionalizada através de mecanismos e práticas próprias, já
que havia o risco de que idéias inovadoras e empregados com
comportamento empreendedor fossem controlados burocraticamente pelos
instrumentos de gestão já existentes na empresa.
Assim, a partir dos anos 80, não só diversas empresas já vinham
colocando em prática o (novo) comportamento empreendedor, como isso
também provocou inúmeros estudos .e publicações sobre tais experiências
bem sucedidas. Alguns destes autores e suas linhas de estudo são os
seguintes:
• Gifford Pinchot 111 (1989) Estudou o comportamento
empreendedor de diversas empresas americanas e criou a palavra
"intrapreneurship" para designar esta nova postura empresarial,
em analogia ao "entrepreneurship" (criação do negócio próprio).
• Larry Farrell (1993) - Estudou o mesmo aspecto desenvolvido por
Pinchot 111, porém dedicou mais tempo à pesquisa (cêrca de d~z
anos), o que lhe possibilitou escrever uma obra mais madura e
atualizada.
• John Kao ( 1991) - A partir de sua atividade acadêmica na Harvard
Business School, preocupou-se em pesquisar a relação entre a
organização, a criatividade e o empregado empreendedor, com o
objetivo de elaborar um livro-texto para uso didático.
124
• Rosabeth Moss Kanter (1989) - Desenvolve a abordagem das
organizações pós-empreendedoras, avaliando como serão as
empresas após adotarem o estilo empreendedor de gestão.
• Gary Linn & Norman Linn (1992) - Desenvolveram procedimentos
metodológicos para operacionalizar a implantação de idéias
inovadoras na empresa.
• David Osborne & Ted Gaebler (1994) - Desenvolveram o conceito
de "espírito empreendedor" para aplicá-lo às organizações do
set~r público.
Além destes autores que têm se dedicado ao campo do
"entre/intrapreneurship" nos últimos anos, pode-se destacar os trabalhos de
outros que, embora não tratando exclusivamente deste novo campo do
conhecimento administrativo, têm oferecido novas abordagens e conceitos
básicos relacionados ao assunto.
• lgor Ansoff (1990) - Conforme já citado, pela sua abordagem da
Administração Estratégica, que conduziu as empresas ao
"comportamento empreend~_dor".
• Edgar Schein (1983) - Desenvolveu estudos sobre o papel dos
empreendedores na formação da cultura organizacional.
• Gareth Morgan ( 1989) - Desenvolveu estudos sobre as
organizações criativas e as novas formas de gestão empresarial,
incluindo a abordagem empreendedora.
• Henry Mintzburg (1983)- Desenvolveu estudos sobre os desenhos
organizacionais, nos quais inclui uma abordagem empreendedora
para a Adhocracia.
• John Naisbitt (1985) - A partir dos estudos das megatendências
(nos anos 80 e virado do milênio}, estudou como as empresas
estão se "reinventando" para se adaptarem às turbulências ·
ambientais. Entre as diversas práticas de "reinvenção", identificou
a empresa como uma "federação de empreendedores".
125
4.3.2.1. Características de uma organização empreendedora
A partir dos anos 80, a palavra empreendedor(a) tem sido utilizada,
em ambos os gêneros, como substantivo e como adjetivo; na primeira forma,
designa uma pessoa cujas características comportamentais definem um
empregado, gerente ou dirigente empreendedor ou, geralmente, aquele(a)
que cria seu negócio próprio; quando funciona adjetivando um substantivo,
tanto pode se referir a uma pessoa- gerente empreendedor(a), por exemplo
- como também uma organização ou empresa que adota o comportamento
empreendedor, citado por Ansoff. ·
·Nos anos 90, tem se multiplicado o uso da palavra empreendedor(a)
como adjetivo. No presente tópico, por exemplo, será analisada a
organização empreendedora.
Antes, porém, é importante analisar o contexto, tanto no ambiente
externo como interno das organizações, o que está levando as mesmas a
adotarem a Gestão Empreendedora. A Figura 7 ilustra a situação: a partir
das megatendências do ambiente (externo), as empresas sofrem impactos
(ameaças e/ou oportunidades) que afetarão o seu ambiente interno. Assim,
questões como inovação, competitividade, qualidade, visão da clientela,
criatividade, parceria, reinvenção da empresa, administração participativa,
espírito empreendedor, flexibilidade, unidade independente de negócio,
parceria e ética nos negócios, entre outras possíveis novas palavras, se
constituirão em desafios para a empresa; se esta focalizar tais desafios do
ponto de vista de "oportunidade", estará adotando posturas favoráveis à mudança.·
Por exemplo, uma nova relação com a clientela; incentivo à criatividade dos empregados; adotar normas e estrutura mais flexíveis, entre
outras: o resultado será uma empresa mais competitiva.
Por outro lado, se a postura for defensiva (encara as megatendências
do ambiente como ameaças}, correrá o risco de perder clientes;
desestimular a carreira dos empregados; enfatizar o controle sobre as
pess_oas e recursos (eficiência): o resultado será uma empresa estabilizada
com grande possibilidade de fracassar.
r---1
-
Figura 7 - CONTEXTO DO AMBIENTE EXTERNO E INTERNO
DE UMA ORGANIZAÇÃO EMPREENDEDORA
AMBIENTE EXTERNO I
o o MEGATENDÊNCIAS AMEAÇAS E/OU
DO AMBIENTE OPORTUNIDADES
o o AMBIENTE INTERNO
Inovação Reinvenção da Empresa
Competitividade Administração participativa . Qualidade Espírito Empreendedor
Visão da Clientela Flexibilidade
Criatividade Unidade Independente de Negócios
Parceria Ética nos Negócios
o .. NOVA ABORDAGEM DO PLANEJAMENTO:
DO NÍVEL ESTRATÉGICO AO OPERACIONAL
o I
GESTÃO ESTRATÉGICA
I o
COMPORTAMENTO EMPREENDEDOR
PLANEJAMENTO + AÇÃO = RESULTADOS
o GESTÃO EMPREENDEDORA
126
127
Caso a empresa adote a primeira postura (voltada para aproveitar
oportunidades}, deverá rever ou reforçar seu sistema de planejamento,
adotando a abordagem da gestão estratégica: esta levará a empresa a
adotar um comportamento empreendedor, ou seja, em que o planejamento e
a ação estão integrados, inclusive funcionalmente nas mesmas pessoas ou
equipes, num esforço orientado para resultados. Esta postura indica que a
organização está na direção de um estilo empreendedor de gestão.
Dos autores anteriormente citados, Ansoff é quem melhor caraterizou
a organização de comportamento empreendedor, comparando-a com a
organização de comportamento concorrencial, conforme está apresentado
no Quadro 4, segundo diversos atributos, como objetivos, metas, estrutura
organizacional, sistema de planejamento, entre outros.
A análise comparativa dos dois perfis organizacionais permite
concluir que:
a) Se uma empresa predominantemente adota o perfil
concorrencial e deseja· passar para o perfil empreendedor, deverá
desenvolver um grande esforço para mudar o modelo de gestão, incluindo
os sistemas e estruturas organizacionais. Por ·exemplo, reduzir os níveis
hierárquicos ou estabelecer unidades de negócios independentes, com
gerentes de estilo empreendedor, conduzindo tais unidades.
b) É preciso criar uma cultura de risco na organização, o que
implica eliminar qualquer atitude primitiva perante o fracasso. Só assim as
pessoas estarão estimuladas a assumir a busca de soluções para os
problemas.
c) Os perfis, tanto concorrencial como empreendedor, não devem
ser mutuamente exclusivos. A empresa precisa dos dois estilos de gestão,
um para inovar e outro para manter os processos em andamento. É preciso
desenvolver mecanismos de . integração entre ambos, inclusive porque a
Administração Estratégica buscará integrar o planejamento com a ação, na
busca de resultados (conforme ilustra a Figura 7).
128
Quadro 4- COMPARAÇÃO DE PERFIS ORGANIZACIONAIS:
ORGANIZAÇÃO CONCORRENCIAL x EMPREENDEDORA
Atributo
Objetivo
Metas
Modo
Concorrencial
Otimizar rentabilidade
Extrapolação modulada de metas passadas
Empreendedora
Otimizar potencial de rentabilidade
Determinação por interação de oportunidades e potencialidades
Sistema de recom- (1) Recompensa por es- (1) Recompensa por criatividade e iniciativa
pensa e punição tabilidade, eficiência
Informação
Problemas
Estilo de liderança
(2) Recompensa por desempenho passado
(3) Punição por distanciamento das metas
(1) Interna: desempenho
(2) Punição por falta de iniciativa
(1) Interna: potencialidades Externa: oportuni- . dades futuras no-
(2) Externa: oportunida- (2) des tradicionais conhecidas v as
Não-repetitivos, novos
(1) Carisma
Repetitivos, familiares , ..
(1) Popularidade (2) Habilidade de inspirar
maior esforço (2) Habilidade de ins
pirar aceitação de mudança
Estrutura cional
organiza- (1) Estável ou em expan- (1) Fluída, em prosão cesso de mudan
Sistema de planejamento
Resolução de problemas pela administração (a) Estímulo à ação
(2) Atividades agrupadas pelo processo de conversão de recursos
(3) Atividades ligadas de maneira frouxa
Planejamento a longo prazo
ça estrutural (2) Atividades agru
padas por problemas
(3) Atividades ligadas de maneira frouxa
Planejamento estratégico
(1) Impulso no sentido de (1) realizar metas
(b) Busca de alter- (1) Confiar no precedente (1) nativas
Busca de novas oportunidades Gerar alternativas criativas
Fonte: ANSOFF, lgor. A Nova Estratégia Empresarial. São Paulo: Atlas, 1990.
129
Este aspecto da integração é importante para evitar a rejeição, por
exemplo, dos projetos desenvolvidos no planejamento, por parte de áreas
ou pessoas que adotem o estilo empreendedor, entendendo que sua ação
empreendedora esteja sendo boicotada ou dificultada.
Drucker (1986) destaca as seguintes características típicas da
organização empreendedora:
a) a organização deve ser receptiva à inovação e predisposta a ver
a mudança como uma oportunidade e não como uma ameaça. Para tanto,
diretrizes e práticas são necessárias para criar o clima empreendedor;
b) o desempenho da empresa deve ser obrigatoriamente
acompanhado, pois a avaliação dos resultados é o maior aprendizado do
estímulo à ação dos empreendedores;
c) a gestão empreendedora requer práticas específicas pertinentes
à estrutura organizacional, à gestão das pessoas e às políticas de
remuneração e de carreira;
d) existem alguns "nãos" a serem observados, entre os quais:
• "não" misturar unidades administrativas e empreendedoras;
• "não" confundir inovação com diversificação: a empresa deverá
inovar dentro do seu negócio, onde tem forcas competitivas.
para desenvolver a nova idéia;
• "não" empreender idéias novas através da aqu1s1çao de
empresas ou negócios já existentes: a gestão empreendedora
só pode ser implantada dentro da própria empresa.
4.3.2.2. Características dos "intrapreneurs"
A palavra "empreendedor", de origem francesa "entrepreneur" e
assim adotada pelos americanos, foi preocupação inicial do economista
austríaco Joseph Schumpeter (1941) que, ao estudar o processo de
130
desenvolvimento econômico dos países, percebeu que havia um "agente
motor" que propiciava o progresso econômico. Este conceito é clássico:
"O empreendedor é o agente do processo de destruição construtiva,
que é o impulso fundamental da economia capitalista, criando novos
produtos, novos métodos de produção e novos mercados".
Segundo Degen ( 1989),
foi o processo de destruição criativa que tornou obsoleta a canetatinteiro em favor da esferográfica, a válvula eletrônica em favor do transistor, a régua de cálculo em favor da calculadora eletrônica, a locomotiva a vapor em favor da elétrica ou a diesel, etc. (p. 9)
Do ponto de vista comportamental, quem melhor define a atitude do
empreendedor é Mclelland (1961 ), para quem tais pessoas estão
estimuladas a trabalhar duramente para atingir um objetivo pessoal
(segundo ele, é uma minoria) e seu comportamento se manifesta através de
três níveis de motivação:
• necessidade de realização: é a necessidade do sucesso
competitivo, medido em relação a um padrão pessoal de
excelência. Cada pessoa ·tem seu critério próprio de sucesso
(motivo financeiro, realização profissional, reconhecimento, entre
outros);
• necessidade de afiliação: é a busca de relacionamentos afetivos
com outras pessoas, seja de caráter cordial, compadecido,
caloroso ou outros;
• necessidade de poder, visando controlar ou influenciar outras
pessoas.
Trazendo o conceito de Mclelland para o campo da gestão
empresarial, pode-se afirmar que, diante da necessidade da solução de
problemas, haverá dois perfis comportamentais diferentes:
1°) perfil conservador diante dos problemas: é aquele em que o
indivíduo procura adotar comportamentos padrões diante dos problemas; o
sucesso levará o indivíduo a confiar naquele padrão de comportamento;
131
2°) perfil empreendedor diante dos problemas: o indivíduo busca
desenvolver diferentes padrões de comportamento, como uma forma de
aprendizagem, já que está altamente motivado a competir e a lutar para
atingir uma necessidade de realização ou de afiliação.
Com relação às características pessoais dos empreendedores,
Pinchot 111 (1989) foi quem descreveu e conceituou melhor o seu
comportamento típico. Inicialmente, ele cunhou a palavra "intrapreneur"
como uma abreviatura para "entrepreneur intracorporativo", pois seu
interesse estava voltado para o empreendedor que atua numa organização
já existente. Segundo ele,
lntrapreneur" é o sonhador que realiza: é aquele que assume a responsabilidade pela criação de inovações de qualquer espécie dentro da organização. O "intrapreneur" pode ser o criador ou o inventor, mas é sempre o sonhador que concebe como transformar uma idéia em uma realidade lucrativa. (p. xi)
Em outras palavras, o "intrapreneur" nem sempre tem a solução
pronta: ele é estimulado, por suas próprias características, a desenvolver a
solução, que pode inclusive vir de terceiros (um membro da equipe, um
cliente ou um fornecedor).
Pinchot 111 (1989) descreve o "intrapreneur" com relação à suas
principais atitudes:
• motivação: quer liberdade para agir e buscar recursos. É auto
motivado, orientado para resultados, mas também reage às
recompensas e ao reconhecimento da organização. Dedica-se à
"causa";
• orientação quanto ao tempo: prazo de 3 a 15 anos, de acordo com
o tipo de empreendimento. Tem urgência para atender
cronogramas auto-impostos ou definidos pela empresa;
• ação: "põe a mão na massa". Pode saber como delegar, mas
quando necessário faz o que deve ser feito.· Orientado para a
ação, combinado à visão;
• habilidades: semelhantes praticamente ao "entrepreneur" (dono do
negócio próprio}, mas a situação exige maior capacidade para
132
prosperar dentro da organização. Neste aspecto, precisa ser
ajudado;
• coragem e destino: auto-confiante e corajoso. Muitos
"intrapreneurs" são cínicos a respeito do sistema, mas otimistas
quanto à sua capacidade de superá-lo;
• atenção: tanto para eventos dentro como fora da empresa. Hábil
para "vender'' internamente as necessidades de risco e do
mercado, mas também focaliza os clientes;
• metas: são auto-definidos; fazem coisas que não lhe foram
solicitadas;
• risco: gosta de riscos moderados. Em geral, não teme ser demitido;
vê pouco risco pess~al;
• padrão de qualidade: auto-determinado; procura superar os
padrões definidos;
• pesquisa de mercado: faz sua própria pesqu1sa e avaliação
intuitiva do mercado;
• status: considera os símbolos de status tradicionais uma piada -
prefere símbolos de liberdade;
• fracasso e erro: sensível à necessidade de parecer disciplinado na
empresa. Tenta ocultar os projetos de risco, assim pode aprender
com os erros sem o custo político do fracasso público; supera erros
e fracassos;
• objetivos da empresa: procura ser fiel;
• decisões: gosta de fazer os outros concordarem com sua visão. É
pouco mais paciente e disposto a compromissos que o
"entrepreneur", mas ainda é executor;
• a quem serve: agrada a si mesmo, aos clientes e patrocinadores;
• atitude em relação ao sistema: não gosta do sistema, mas aprende
a manipulá-lo;
133
• estilo de solução de problemas: resolve problemas dentro do
sistema ou passa por cima deles, sem deixá-lo;
• histórico sócio-econômico: classe média;
• nível de instrução: com freqüência é alto, em particular nas áreas
técnicas;
• relacionamento inter-pessoal: transações dentro da hierarquia.
As características acima descritas são genéricas e não significa que
devam estar presentes em sua totalidade no "intrapreneur", mas devem ser
predominantes no seu comportamento.
Quando a empresa como um todo adota o estilo empreendedor de
gestão, isto implica em que, além dos "intrapreneurs", enquanto
empregados atuando nas diversas áreas da empresa, os gerentes deverão
também desenvolver posturas empreendedoras.
Algumas das características observadas nos gerentes
empreendedores, inclusive até requeridas por empresas que praticam a
gestão empreendedora, são as seguintes:
• desenvolver atitude interativa perante as questões estratégicas da
organização, ou seja, os gerentes não podem se limitar à visão do
seu departamento ou área: a lealdade deve ser para com toda a
empresa e, assim, é preciso interagir com as outras áreas afetas
ao problema para entender o seu ponto de vista sobre a questão;
• saber administrar as turbulências ambientais: estas não estão
previstas no Manual da Organização; ocorrem aleatoriamente e se
originam no ambiente externo, fora do controle da empresa: daí o
espírito empreendedor na busca de soluções criativas;
• estar orientado para o processo de inovação: é a postura nata dos
gerentes empreendedores, pois empreender significa inovar para
buscar resultados;
• ter capacidade administrativa para consolidar planos inovativos:
não basta apenas inovar~ é preciso manter as ações em curso; daí
134
os gerentes empreendedores continuam sendo executivos e
controladores, com a diferença de que o objetivo são os resultados
(e não o controle em si);
• desenvolver liderança sobre a equipe, no sentido de estimular a
inovação e premiar a equipe: na gestão empreendedora, os
gerentes passam a ser orientadores da equipe ("coach");
• estimular a participação dos membros da equipe, visando propiciar
a necessária criatividade ao grupo. Mais do que a participação, o
gerente deve buscar a integração das pessoas ao trabalho de
equipe;
desenvolver processos de negociação no estilo "ganha-ganha", no
sentido de facilitar a busca de relações de parceria (internas e
externas);
adotar postura competitiva nas ações e decisões, ou seja, priorizar
aquilo que agrega valor ao cliente (noção de custo x valor).
4.3.2.3. Aspectos organizacionais da gestão empreendedora
Para implantar a gestão empreendedora em uma organização já
existente, é preciso considerar vários aspectos fundamentais para o êxito da
prática empreendedora. Drucker (1986) afirma que,
para a empresa em operação ter condições de inovar, ela precisa criar uma estrutura que permita às pessoas serem empreendedoras. Tem que delinear relacionamentos baseados em empreendimento. Precisa se assegurar de que as suas recompensas e incentivos, seus salários, suas decisões sobre pessoal e diretrizes, todos recompensam o comportamento empreendedor correto, e não o punem. (p. 224)
Neste sentido, a empresa deverá desenvolver os seguintes cuidados
no que diz aos aspectos organizacionais para implantar um estilo
empreendedor de gestão: ·
135
1 °) separar atividades novas, de caráter empreendedor, das
atividades tradicionais, que têm geralmente caráter operacional ou de
manutenção: uma não pode prejudicar a outra;
2°) é necessário localizar o novo empreendimento nos níveis
superiores da organização, a fim de facilitar a obtenção de apoio das
diversas áreas que fornecerão recursos (humanos, financeiros, técnicos ou
informações). Necessariamente o gerente ou coordenador do
"intraempreendimento" não deverá se dedicar integralmente ao projeto:
cada situação deve ter a solução mais adequada. Caso a mesma pessoa
coordene mais de um ou até todos os projetos inovadores da empresa,
neste caso se justificará sua atuação exclusiva para a ação empreendedora;
3°) a política de remuneração da equipe empreendedora deve
incluir um salário fixo, enquadrando os membros da equipe no plano, de
cargos e salários da empresa mais um critério definido na participação nos
resultados, quando estes começarem a aparecer. Algumas empresas
antecipam parcelas pequenas destes resultados quando as perspectivas do
projeto empreendedor são otimistas; porém, mais uma vez, cada projeto
orientará a solução mais adeq~;~~da para a empresa e a equipe
empreendedora, o que deverá ser objeto de negociação;
4°) deverá haver alguém ou um grupo de pessoas que seja
claramente responsabilizado pelo projeto. Nos primeiros anos de
experiência com projetos empreendedores, no início dos anos 80, as
empresas preferiam apoiar idéias pessoais de funcionários, que passavam
então a ser tratados como "intrapreneurs". No entanto, esta alternativa
começou a provocar problemas internos, sobretudo de inter-relacionamento
pessoal, que resultaram em conflitos, ciúmes e, geralmente, no fracasso dos
projetos. Assim, à medida em que a experiência das práticas
empreendedoras permitia, as empresas passaram a enfatizar o apoio às
equipes empreendedoras. Estas têm maior facilidade de identificação do
projeto empreendedor como um esforço inovador da empresa e não de um
indivíduo "cheio de idéias". Assim, os conflitos têm sido menores ou, pelos
menos, gerenciáveis e o grau de sucesso dos projetos inovadores de
equipes empreendedoras tem sido mais favorável, de acordo com estudos
feitos nas empresas que utilizaram ambas as alternativas;
136
5°) o "intrapreneur" ou a equipe empreendedora precisam ter uma
certa autonomia de atuação, fugindo das normas e da estrutura formal da
empresa. A própria cultura empreendedora, a ser disseminada na empresa,
facilitará a compreensão, por parte de todos os funcionários e de todas as
áreas, dos "privilégios" do "intrapreneur" ou da equipe empreendedora.
Assim, tanto no sentido vertical como horizontal do organograma da
empresa, é preciso conceder uma certa liberdade de interação do
"intrapreneur" ou da equipe com as diversas áreas da empresa que deverão
apoiar o projeto. A nível horizontal, por exemplo, os contatos seriam com as
áreas de marketing, finanças, recursos humanos, engenharia ou
desenvolvimento (se houver) e outras. No nível vertical, o "intrapreneur" ou
equipe empreendedora não ficariam em linha de subordinação direta ou
supervisão funcional;
6°) a empresa tem várias alternativas de desenho organizacional
para o projeto empreendedor; entre estas, o formato que tem sido adotado
com maior freqüência é a adhocracia, baseada em "forças-tarefas" ou
estrutura temporária. Mintzberg (1983) propõe uma "estrutura adhocrática"
para projetos inovadores, que teriam as seguintes características:
· estrutura altamente orgânica; · com pouca formalização; alta especialização em tarefas horizontalizadas, com base em treinamento formal da equipe; tendência a agrupar os especialistas em equipes de projeto orientadas para o mercado; mecanismos de interligação entre as equipes, visando troca de informações e experiências; e descentralização seletiva dentro destas equipes, visando combinar gerentes de linha com especialistas e o staff. (p. 254)
Mintzberg (1983) lembra ainda que "inovar é quebrar os padrões
estabelecidos. Assim, a organização inovativa não pode confiar em qualquer
forma de padronização da coordenação." (p. 254) Isto ocorre, por exemplo,
quando a empresa atua num mercado cujas mudanças são muito rápidas,
exigindo adaptação e lançamento de novos produtos, estes com o ciclo de
vida cada vez mais curto.· A este tipo de equipe, Mintzberg chama de
"adhocracia empreendedora".
Para Waterman Jr. (1992), ao utilizar estrutura adhocrática,
problemas do tipo "nós contra eles" são os piores obstáculos a se superar em empresas ansiosas por criar um contexto no qual a adhocracia e a burocracia possam coexistir pacificamente. (. . .) o
objetivo é partilhar não apenas o trabalho, mas também as idéias. (p. 59)
137
Waterman cita o exemplo de uma empresa que adotou o formato de
"colméias" de trabalhadores, em que os membros das várias equipes
(colméias) aprendem tudo sobre o trabalho dos outros, fazendo rodízios
para manter o serviço interessante e não rotineiro: isto também amplia suas
habilidades. E ajudam-se mutuamente para encontrar soluções para
problemas especiais, além de realizarem as manutenções de rotina sem
esperar um especialista.
7°) Outro aspecto que afeta a estrutura organizacional no estilo
empreendedor de gestão é a busca de parcerias com outras empresas,
visando complementar atividades necessárias à fabricação de um produto
ou prestação de serviço. O fator que está cada vez mais obrigando as
empresas a desenvolverem relações de parceria é a questão da
competitividade, ou seja, para competir no seu mercado, a empresa deve
concentrar seus esforços no seu negócio essencial ("core competition") e
transferir atividades complementares ou nas quais não consegue ser
competitivas para terceiros.
Há várias modalidades de paréefias:
Aliança estratégica
Segundo Lewis (1992),
numa aliança estratégica, as empresas cooperam em nome de suas necessidades mútuas e compartilham dos riscos para alcançar um objetivo comum, Sem uma necessidade mútua as empresas podem ter o mesmo objetivo, mas cada uma pode atingi-lo sozinho. Se elas não compartilharem de riscos significantes, não poderão esperar compromissos mútuos. As empresas somente dividem riscos se necessitam uma da outra para atingir o mesmo objetivo. (p. 1)
Exemplos de alianças estratégicas têm sido freqüentes na indústria
automobilística, cuja globalização impôs a necessidade de relações de
parceria para que as indústrias possam competir no mercado. Mas há casos
de insucessos neste tipo de aliança, como é o exemplo recente do fim da
Autolatina (parceria entre a Volkswagem e a Ford para atuação conjunta no
mercado latino-americano).
Tercerização
Segundo Fontanella et ai. (1994),
a Terceirização é uma tecnologia de administração que consiste na compra de bens é/ou serviços especializados, de forma sistêmica e intensiva, para serem integrados na condição de atividade-meio à atividade-fim da empresa compradora, permitindo a concentração de energia em sua real vocação, com intuito de potencializar ganhos em qualidade e competitividade. (p. 19)
138
Assim, ao adotar a terceirização como uma decisão estratégica do
negócio, a empresa pode estar buscando, entre outros objetivos:
• ter acesso a novas tecnologias que ainda não domina;
• buscar novas culturas empresariais nas empresas-parceiras;
• intensificar o investimento na atividade fim, transferindo atividades
não essenciais para outras empresas;
• diminuir o custo fixo e obter economia de escala.
No entanto, a terceirização no Brasil ainda não está ao nível do
conceito e dos objetivos acima enumerados, com poucas exceções. Grande
parte das empresas que adotaram a terceirização o fizeram apenas com
objetivos de curto prazo (redução de custos, sobretudo de salários e
encargos sociais). As conseqüências são a deterioração das condições de
trabalho e a insegurança dos trabalhadores cuja atividade ainda não foi
terce i rizada.
Franchising
Segundo Bernard (1992),
podemos definir o franchising (ou franquia comercial e de distribuição, segundo o termo jurídico empregado no Brasil, embora pouco popular) como uma oportunidade de negócios na qual o proprietário, seja ele produtor ou distribuidor, de um serviço ou de um produto que possua uma marca registrada, concede direitos exclusivos a um indivíduo ou, em alguns casos, uma pessoa jurídica, para distribuir/vender, em determinada área, determinado serviço ou produto, que em troca recebe uma taxa inicial e/ou royalties, além de uma conformidade à padronização da qualidade por ele proposta. Denominamos o indivíduo ou as empresas concedentes dos direitos o "franqueador", enquanto o indivíduo (ou, em alguns casos, a
\ ·~ v
pessoa jurídica) a quem é concedido o direito de operar de acordo com determinado método de produzir ou vender um produto ou serviço passa a ser denominado "franqueado". (p. 24)
139
O franchising é um sistema de negócio em crescimento rápido nos
últimos anos, a nível mundial e também no Brasil, impulsionado pela
globalização da economia e do estilo de vida, conforme análise anterior no
Capítulo 3. Para os empreendedores, pode ser uma "escola empresarial"
para quem ainda não tem experiência como empresário.
Joint-venture ·
Trata-se de uma parceria entre duas ou mais empresas que se juntam
para entrar num novo negócio de risco, seja compartilhando recursos
financeiros para os investimentos, seja combinando capital· e tecnologia, de
acordo com a competência técnica de cada parte. Trata-se de uma forma de
parceria muito utilizada em operações internacionais de negócios.
Há outras formas de parcerias, porém ainda pouco aplicadas no
Brasil: as redes horizontais de pequenas empresas que atuam no mesmo
setor de atividade (concorrentes entre si) e que desenvolvem projetos
compartilhados de investimentos em .tecnologia, central de matérias-primas,
centros de comercialização de seus produtos e outras formas de
compartilhamento de recursos.
Outro modelo, comum sobretudo na Europa Ocidental, é o das redes
verticais de empresas que atuam em diferentes elos da mesma cadeia
produtiva e que intercomplementam suas atividades (relação de
fornecedores-clientes na cadeia produtiva).
Um aspecto fundamental para o sucesso das parcerias entre
empresas é a postura de cada parte frente ao seu parceiro; cada um deve
estar predisposto a ceder para poder ganhar (negociação "ganha-ganha"):
ambos os lados precisam ter vantagens com a parceria, pois este é um
"casamento" entre organizações.
.-
140
4.3.2.4 Políticas de recursos humanos para estimular o espírito
empreendedor
Para que uma empresa adote e pratique com sucesso o estilo
empreendedor de gestão, não basta estimular as pessoas a desenvolverem
novas idéias ou a desenharem formatos organizacionais adequados à
inovação: além destes aspectos, é fundamental elaborar e colocar em
prática um conjunto de políticas de recursos humanos.
A seguir, serão analisadas algumas políticas que têm sido
observadas em algumas empresas que já adotam a gestão empreendedora:
a) Desenvolvimento de um clima organizacional favorável à inovação
A inovação, enquanto rompimento de posturas tradicionais, necessita
de um ambiente organizacional adequado a estimular as pessoas e as
equipes a se auto-motivarem na busca de resultados. O desafio para a
gestão de Recursos Humanos, neste caso, é desenvolver instrumentos que
operacionalizem, dentro da empres~,. uma (nova) cultura organizacional que
atinja pelo menos três objetivos:
• o envolvimento emocional e mental das pessoas com a empresa;
• a auto-motivação para colaboração (inter e intra-grupal);
• a aceitação de responsabilidades.
Quando uma empresa vai ao mercado de trabalho atrair novos
profissionais, a postura tradicional é "obter o máximo das pessoas": tal
postura não atinge nenhum daqueles objetivos.
No entanto, a empresa que adota o estilo empreendedor de gestão
provavelmente inverterá aquele foco: "o que a empresa pode retribuir às
pessoas pela sua colaboração". Assim, há empresas que estão adotando as
seguintes práticas:
141
• uma nova postura ética para com os empregados, procurando
enfatizar uma relação de parceria (ao invés da relação
empregatícia);
• identificar os projetos de vida pessoais dos empregados, a fim de
compatibilizá-los com o trabalho: assim, as políticas de recursos
humanos serão melhor direcionadas, no sentido de ·propiCiar às
pessoas a sua realização pessoal e profissional, através do
trabalho;
• flexibilidade na gestão do horário de trabalho, visando
compatibilizar o trabalho com a vida pessoal;
• possibilidade de participação nos resultados gerados pelas
pessoas ou equipes;
• desenvolvimento de programas que possibilitem a integração
família-empresa: isto proporciona segurança e conforto às
pessoas.
Na realidade, a "cultura orgq.nizacional favorável à inovação" não é
uma política isolada: mais que isto, é o resultado da combinação de outras
políticas de recursos humanos, a serem analisadas adiante. O depoimento
de Rodgers (1990), sobre sua experiência de "intrapreneur" na IBM,
conforma tal afirmação:
Desde o início, Tom Watson, Sr. (um dos fundadores da IBM), sabia que não se pode estimular o desenvolvimento de empreendedores corporativos sobrecarregando seus funcionários com uma enervante estrutura burocrática. Watson não era um teórico, mas sabia intuitivamente que uma burocracia excessiva estrangula a criatividade e o espírito necessário para se assumir riscos. Sua solução foi a de construir sua empresa de tal forma que nenhum funcionário precisasse tratar com uma estrutura gigantesca, não importando quanto ela crescesse. Quando entrei na empresa, ela faturava $250 milhões por ano e não se "sentia" grande. Se eu tivesse sido contratado por uma empresa muito menor que a IBM, teria, provavelmente, que tratar com uma burocracia muito maior. Mesmo hoje, um novo funcionário que entra na IBM- agora uma corporação de $50 bilhões - acha-se em uma atmosfera de empresa pequena. Isso se deve, em parte, ao fato de a empresa nunca permitir que suas filiais cresçam demais; e, em qualquer função, um gerente supervisiona de dez a doze pessoas, raramente mais. Desta forma, ninguém fica perdido. Um empreendedor em formação é rapidamente reconhecido e incentivado. Não só se espera que o
gerente estimule esse tipo de pessoa, mas ele também é avaliado quanto ao sucesso do estímulo dado. O resultado é um ambiente de trabalho carregado de entusiasmo, energia criativa e comprometimento. (p. 239-240)
142
Assim, segundo Naisbitt (1985), emerge um novo papel para os
dirigentes: "o de criar um ambiente que, mais do que dar a oportunidade de
-contribuir para o crescimento da instituição, seja favorável ao
desenvolvimento individuar. (p. 64)
b) Implantação do horário flexível de trabalho
A Sociedade Industrial, voltada para a massificação da produção,
implementou mecanismo de controle do tempo - para trabalhar, estudar,
comprar, viajar, lazer e outras atividades humanas. Certamente, o controle
de tempo mais marcante - e que é o condicionador dos demais - é o
referente ao trabalho.
Não existe relação direta entre inovação e horário de trabalho: a
inovação é um processo atemporal e, também, sem relação espacial com o
trabalho. Ou seja, a inovação pode G>Gorrer em qualquer tempo e lugar.
Além deste aspecto, alguns fatores têm provocado a exaustão da
necessidade de controlar o horário de trabalho das pessoas, entre as quais:
• novas tecnologias de comunicação, que estão viabilizando o
trabalho à distância ("telecommuting"). Segundo Naisbitt &
Aburdene ( 1990),
um novo tipo de trabalhador da informação está mudando o panorama. Livres para viverem praticamente em qualquer lugar que desejem, cada vez mais indivíduos têm optado por morar m cidades pequenas e áreas rurais. (. . .) Pela primeira vez na história, estão sendo rompidas as "amarras" que forçavam as pessoas a morar nas cercanias de seu local de trabalho. (p. 375)
Esta tendênCia, na visão daqueles autores, estão criando os
chamados "eletronic cottages" ("chalés eletrônicos"), em que as
pessoas- ficam em casa, trabalhando em seus computadores, em
vez de irem para escritórios localizados nas redondezas;
143
• as mudanças no mercado de trabalho, sobretudo com a
participação crescente da mulher em atividades remuneradas
(rompendo com o longo ciclo dos serviços gratuitos prestados à
família como "dona-de-casa"), têm possibilitado a redução da
jornada de trabalho, tanto do marido e da mulher, que agora
compartilham as despesas da casa e, inclusive, tarefas antes
exclusivas das "donas-de-casa": fazer compras, pagar contas,
levar e buscar as crianças para a escola e centros de recreação,
entre outras atividades. Está acabando o modelo de família da
sociedade industrial, cujo trabalhador típico era do sexo masculino, .
com horário integral de 8 horas de trabalho e uma família a
sustentar;
• novas formas contratuais de trabalho: as empresas estão adotando
novos formatos jurídicos e administrativos para a contratação de
serviços. É crescente o número de empresas que está "demitindo"
seu staff mais qualificado e recontratando-os através de
terceirização ou de prestação de serviços como consultores, em
tempo parcial e sem necessidade de manter exclusividade para
com a empresa (desde que o "consultor" não complemente suas
hor~s de trabalho prestando serviços ao principal concorrente);
• novas estruturas organizacionais: com estruturas mais
horizontalizadas, é possível à maioria dos trabalhadores auto
gerenciarem o seu tempo de trabalho, compatibilizando interesses
pessoais com as necessidades do trabalho. Assim, as empresas
definem regras gerais, de acordo com a natureza das atividades
(por exemplo, se há atendimento 24 horas ao cliente, se existem
processos que não podem parar, entre outros) e as equipes e
respectivos gerentes definem as regras específicas. Estabelecem
se os horários extremos de entrada e saída; os intervalos para
almoço/descanso previstos na legislação trabalhista; horários
comuns em que a presença de todos é obrigatória para
desenvolver os trabalhos coletivos (discussão de projetos,
relatórios, novos produtos e serviços, entre outros);
• compartilhamento de tarefas: com as novas tecnologias de
trabalho, exigindo o perfil multifuncional ou polivalente das
144
pessoas, já é possível adotar formas mais avançadas de horário
flexível com o compartilhamento de tarefas entre duas ou mais
pessoas que executam as mesmas atividades. Assim, é possível
programar o trabalho, de tal forma que uma pessoa trabalhe de
segunda a quarta-feira e outra de quarta a sexta-feira. A quarta
feira seria comum para ambas, a fim de ajustarem e
reprogramarem as atividades. Já existem exemplos deste tipo de
flexibilidade de trabalho em· empresas americanas e européias.
c) Revisão das políticas de remuneração de compensação
A postura empreendedora exige das empresas uma nova reflexão e
novas práticas de recompensar seus empregados. A "velha" política salarial,
baseada em planos de cargos e salários e em sistemas de avaliação de
desempenho já obsoletos, não garantem mais a permanência na empresa
de pessoas com potencial empreendedor. Muitas empresas têm perdido
funcionários talentosos porque adotam sistemas rígidos e burocráticos de
remuneração e de desenvolvimento de carreira.
Várias empresas inovadoras, buscando romper esta postura
tradicional, estão desenvolvendo novas alternativas de remuneração, entre
as quais:
c. 1 . participação em lucros ou resultados
É preciso, inicialmente, diferenciar as duas alternativas: a
participação em lucros ("profit sharing") baseia-se exclusivamente nos
resultados financeiros apurados ao final de um exercício fiscal ou de um
período determinado. É a alternativa atualmente mais utilizada, porém
geralmente desvinculada de uma política de recursos humanos que
incentive a inovação e o espírito empreendedor das pessoas na
organização.
Por outro lado, a participação em resultados ("gain sharing") tem um
sentido mais abrangente e permite à empresa adotar esta alternativa como
145
parte de uma política de recursos humanos orientada para a inovação.
Neste sentido, o objetivo é premiar o desempenho das equipes e das
pessoas, através de indicadores previamente determinados (aumento de
produtividade, redução de custos, melhoria da qualidade, redução do "lead
time", entre outros).
Os principais problemas enfrentados em ambas as situações são as
seguintes:
• dificuldade de implantar sistemas de informação que permitam
aferir com relativa precisão os resultados e indicar o nível de
contribuição das áreas, equipes ou pessoas aos resultados
obtidos;
• a falta de uma legislação trabalhista que não seja apenas
esclarecedora, mas também incentivadora da premiação dos
resultados pelas empresas. Apenas recentemente o Governo
brasileiro tomou iniciativa neste sentido, mesmo assim através de
Medida Provisória, "regulamentado a participação dos
trabalhadores nos lucros ou resultados das empresas". Embora os
projetos de tal regulamentação já sejam tentativas desde 1946 e a
Constituição de 1988 chegou a criar a obrigatoriedade desta
participação, observa-se que a questão principal ainda não foi
discutida: a relação empresa-empregados, não numa visão
empregatícia e sim numa postura de parceria; assim, a questão
tem sido desviada para o âmbito jurídico da questão, envolvendo
aspectos como: geração de direitos adquiridos, incidência de
encargos sociais e impostos sobre a parcela distribuída. Tal
aspecto é agravado pela cultura de grande parte dos empregados
que passa a considerar a participação nos lucros como parte de
sua renda (salário) e não como o resultado de sua contribuição
individual para com o cumprimento dos objetivos empresariais;
• a cultura empresarial tradicional, que teme perder não só a parcela
dos lucros transferida aos trabalhadores, como também parte do
poder, uma vez que a discussão de indicadores ou o
desenvolvimento de sistemas de informações transparentes sobre
146
os negócios da empresa colocariam em "cheque" o controle
centralizado da gestão empresarial.
No entanto, várias empresas, independentemente da obrigação legal,
já praticam ambas as modalidades: observa-se que aquelas que praticam
modelos mais tradicionais de gestão tendem a dotar a "participação em
lucros", quando os dirigentes determinam um certo percentual a ser
distribuído, sendo em algumas empresas de acordo com o salário do
empregado e em outras não se segue esta proporcionalidade; já as
empresas que adotam a "participação nos resultados" geralmente colocam
em prática várias posturas inovadoras de gestão, como programas de
qualidade, melhoria contínua da produtividade, administração participativa,
parcerias com outras empresas, entre outras.
Inclusive, nestas últimas empresas, observa-se que a participação em
resultados evolui gradativamente: passa da participação em lucros para a
participação em resultados num primeiro momento, com base no
desempenho de uma área ou unidade de negócios; em seguida, uma vez
obtida maior coesão na relação empresa-empregados, evolui-se para a
participação em resultados "a nível ,il)dividual", ou seja, a empresa implanta
mecanismos de informações e de acompanhamento sistemático do
desempenho dos seus negócios, que permitam atribuir os devidos méritos a
cada empregado, de acordo com as metas que lhe foram designadas e o
seu respectivo cumprimento. Algumas empresas, neste sentido, começam a
implantar contratos de gestão a nível individual, fixando os objetivos e metas
de cada empregado e os respectivos critérios de avaliação do seu
desempenho.
Quando uma empresa atinge este nível, algumas conseqüências são
observadas:
• melhoria do ambiente de trabalho, favorecendo a integração entre
as equipes e as diversas áreas da empresa (os resultados
individuais dependem do desempenho global);
• índice de rotatividade de empregados ("turn-over") próximo a zero:
as pessoas aumentam sua lealdade à empresa e fazem planos de
carreira longe para realização dos seus objetivos profissionais;
147
• maior "alinhamento" das pessoas com a visão da missão da
empresa: cada um sente a responsabilidade individual pelo
atingimento dos resultados;
• melhor identificação com a clientela da empresa, propiciando as
condições favoráveis a uma gestão baseada na filosofia da
qualidade (satisfação dos clientes).
Outra alternativa utilizada por empresas inovadoras é o sistema de
"spot bônus" ou de bonificação, cujo objetivo é premiar o esforço individual
ou de equipes pelos resultados alcançados em transações, negócios e de
conquista de novos clientes ou novos mercados. Geralmente tal alternativa
é aplicada mais para os funcionários envolvidos com os negócios externos
da empresa.
c.2. participação societária
Esta alternativa implica em redistribuir partes do capital da empresa
entre um grupo selecionado de empregados ou a distribuição generalizada
de cotas de capital da empresa entre todos os empregados. Na primeira
situação, quando apenas um grupo limitado de funcionários tem
possibilidade de ter participação societária, normalmente o processo está
vinculado a um sistema de premiação não sistematizado em políticas e
normas da empresa: os dirigentes simplesmente decidem propiciar a um ou
mais empregados tal participação, geralmente num percentual pouco
significativo do capital social, visando recompensar uma idéia inovadora ou
a abertura de um cliente importante. No entanto, tem-se observado, nas
poucas experiências conhecidas, que este tipo de recompensa não é a mais
adequada (em relação à participação em resultados, por exemplo), pois se
corre o risco de que o funcionário venha a assumir posturas patronais e
deixe em segundo plano suas características empreendedoras que
possibilitaram tal recompensa.
De outro lado, há casos raros de empresas que, desde a sua
constituição, adotaram um modelo societário ou acionário no qual os
empregados passam a subscrever cotas ou ações da empresa e todo o
capital social é detido por pessoas internas à organização. Embora não haja
148
vinculação direta com a carreira, este sistema cria um envolvimento maior
do empregado com a organização, pois ele passa a ser um investidor na
empresa que lhe garante o emprego. Dificilmente este modelo poderá ser
adotado em uma empresa já existente.
c.3. Carreira em "Y"
A carreira em "Y" é uma alternativa recente que várias empresas têm
utilizado como uma política de remuneração alternativa ao Plano de Cargos
e Salários tradicional, visando viabilizar a carreira de pessoas que têm
predominantemente o perfil técnico-empreendedor. Tanto que algumas
empresas adotam a denominação "carreira técnica" ou "carreira paralela".
Segundo Resende ( 1991 ),
isto certamente ocorreu não porque, de repente, se tenha descoberto que os fatores tradicionais de avaliação de cargos e suas ponderações de pesos apresentassem falhas ou incoerências. Mas, provavelmente, pelo fato de estar havendo gradativo crescimento quantitativo e qualitativo de cargos técnicos, de assessoria e consultoria, por força do impacto do desenvolvimento da tecnologia nas organtz:ações, e das reformulações organizacionais, as quais indicam nítida tendência de redução de níveis hierárquicos e surgimento de mais funções de staff. (p. 81)
Assim, a carreira em "Y" pode evitar uma situação cada vez mais
freqüente em grandes empresas, tanto privadas como públicas, nos últimos
anos: transformar excelentes técnicos em gerentes. O resultado prático é
que, geralmente, as empresas perdem potencial empreendedor e nem
sempre ganham um bom gerente, mesmo porque tais pessoas não têm perfil
administrativo.
Resende (1991) aconselha que
não se transforme, todavia, a carreira em "Y" em panacéia das dificuldades de administração salarial, nem no último modismo da área de R.H. Não deve ela servir de pretexto, também, para que os técnicos se transformem nos novos heróis das empresas, desbancando os gerentes. (p. 82)
Assim, deve se ter uma certa cautela e critérios definidos para aplicar
a carreira em "Y"; talvez não seja aplicável em todos os tipos de carreira
149
técnica, nem para todos os setores de· atividade. Certamente organizações
cujas atividades tipicamente dependem de desenvolvimento tecnológico se
adequarão mais facilmente à carreira em "Y". É preciso lembrar ainda que
este modelo de desenvolvimento de carreira afeta predominantemente
pessoas que estão em cargos e funções estratégicas na empresa: isto exige
maior cuidado, pois há situações no plano de carreira que se tornam
irreversíveis.
A configuração da carreira em "Y" se justifica pela sua semelhança
com o formato da letra que lhe dá a denominação. Assim, por exemplo, a
Figura 8 ilustra um caso hipotético de uma empresa em que existem áreas
de produção e áreas técnicas (planejamento, pesquisa e desenvolvimento,
engenharia, entre outras). Neste exemplo, os salários da carreira técnica
podem ser até superiores aos da carreira administrativa, dependendo da
política salarial da empresa.
Figura 8 - CARREIRA EM "Y"
Superintendente Técnico
Assistente Técnico 111
Assistente Técnico 11
Assistente Técnico I
Superintendente de Produção
... Gerente Depto.de Produção
... Chefe Setor de Produção
....... Assistente de Chefia
Trainee
Estagiário
Resende (1991) sugere alguns critérios para definir que cargos
técnicos devem ser enquadrados na carreira em " Y":
150
• Há permanente dificuldade para formar ou obter mão-de-obra.
• Há exigências de qualificações extras ou muito especiais dos seus
ocupantes (estágios prolongados no exterior, pós-graduação, etc.).
• É necessário que seus ocupantes tenham domínio de tecnologias
complexas aplicáveis aos processos operacionais ou produtivos da
empresa.
• Suas tarefas são basicamente de pesquisa e desenvolvimento,
voltado para atuação e inovação tecnológica.
• Seus profissionais assessoram os dirigentes em importantes e
fundamentais sistemas administrativos e gerenciais (planejamento
estratégico, por exemplo).
• Seus ocupantes têm missões especiais de representação ou
negócios, através dos quais oferecem significativas contribuições à
empresa.
Assim, segundo estes critérios, cargos espec1a1s de assessoria
administrativa, com atribuições de· grande responsabilidade e exigindo
conhecimentos e habilidades específicos, devem ser também considerados
como possíveis enquadramentos na carreira em "Y".
Para as empresas que praticam gestão empreendedora, este modelo
de carreira certamente deverá ser adotado crescentemente, com as devidas
adequações a cada empresa.
c.4. Remuneração variável
Uma das mais recentes práticas das empresas inovadoras é a
introdução de um novo conceito na política de remuneração dos
empregados: trata-se da remuneração variável.
Segundo as experiências observadas recentemente nestas
empresas, a remuneração variável pode ser conceituada como a
bonificação complementar ao salário fixo, em decorrência do cumprimento
151
de metas previamente determinadas. Assim, a empresa passa a contar com
um sistema de remuneração misto: um, baseado no salário fixo, de acordo
com o Plano de Cargos e Salários e atendendo todos os requisitos da
legislação trabalhista; um segundo, de caráter deliberativo da empresa que,
através da decisão dos dirigentes ou por processo de negociação direta
com os empregados, estabelece metas a serem cumpridas (globais, por
setor e até por empregado), cuja medição estabelecerá a premiação
previamente acordada.
A diferença em relação ao Plano de Incentivos é que esta alternativa
está vinculada diretamente à política salarial e a premiação sempre será
monetária. Ao mesmo tempo, uma vez implantada, deverá ter caráter
permanente e, em alguns aspectos, poderá se agregar ao próprio salário, de
acordo com a legislação trabalhista.
Esta alternativa deverá se conciliada com a política de participação
nos lucros ou resultados das empresas, cuja regulamentação está em curso
no Congresso Nacional, já estando em vigor desde 30.12.94, através de
Medida Provisória. A diferença é que, enquanto a remuneração variável é
de periodicidade mensal, acompanhando a política salarial, a participação
em lucros ou resultados, de acordo' com a regulamentação em curso, deve
ter periodicidade mínima semestral (exatamente para não se confundir com
o salário e premiar o desempenho obtido durante certo período).
d) Planos de incentivos
Como complemento às novas políticas na área de remuneração, as
empresas têm buscado outros tipos de recompensas, geralmente não
monetárias, visando incentivar os funcionários a cumprirem metas e a maior
integração aos objetivos da empresa. Assim, tem se multiplicado nos últimos
anos o conjunto de alternativas destes incentivos. Neste sentido, eles têm
se diferenciado dos benefícios que as empresas concedem, seja por
cumprimento de legislação trabalhista (vale-refeição, vale-transporte,
auxílio-creche e outras), seja por deliberação da própria empresa
(assistência médico-hospitalar, seguro de vida, auxílio-doença,
financiamento/empréstimo, viagens de lazer e outros).
152
O que diferencia os benefícios acima dos planos de incentivos é que
os primeiros se constituem em vantagens garantidas aos funcionários,
independentemente de resultados dos negócios ou do cumprimento de
metas: ou seja, uma vez adotados, eles tornam-se como que parte do custo
fixo da empresa e, pela legislação trabalhista no Brasil, alguns se
incorporam ao salário e não podem ser revertidos.
Ao contrário, os planos de incentivos, que ficaram muito conhecidos
como programas de "Marketing de Incentivos", . estão atrelados ao
cumprimento de metas, como o aumento de vendas ou de produção,
melhoria da produtividade, entre outros. Algumas empresas têm utilizado
tais incentivos também para premiar novas idéias, seja de um funcionário
isoladamente, seja de uma equipe. Por estarem vinculados a resultados,
para a empresa representam custos variáveis e, para os funcionários, um
desafio.
As premiações, geralmente, são não monetárias, para não interferir
na política salarial da empresa e devem ser previamente acordadas com os
funcionários através de uma regulamentação própria. Inclusive, surgiram
várias empresa nos últimos anos que gerenciam este tipo de programa,
evitando assim desgastes internos para a organização que decida recorrer a
este tipo de incentivo. As premiações podem ser viagens nacionais e
internacionais, vale-compras, planos de saúde, aparelhos elétrico
eletrônicos (tele/cine/foto/som), automóveis e, até em alguns casos,
dinheiro. Os motivos que levam as empresas a desenvolverem tais
programas são, além do maior motivação para os funcionários, a obtenção
de uma relação de cumplicidade dos mesmos com relação aos objetivos a
serem cumpridos, a valorização do trabalho inovador, a maior qualificação
dos funcionários, o aumento dos salários indiretos e até a disputa com a
concorrência, quando esta ameaça atrair funcionários da empresa.
Para a Administração Empreendedora, estes programas de incentivo
são fundamentais, porque complementam a política de remuneração da
empresa, estimulando a capacidade empreendedora dos seus funcionários.
153
e) Endomarketing
Trata-se de uma postura pró-ativa da empresa, que visa aumentar a
integraÇão interna das pessoas através do estímulo à melhoria na relação
entre clientes internos e fornecedores internos, o que vem sendo
denominado de Endomarketing ou Marketing Interno. Assim, esta postura
representa a conjugação de duas políticas: de Recursos Humanos e de
Marketing.
Geralmente, este tipo de programa está vinculado à melhoria da
qualidade e da produtividade, para o que o processo de integração entre
equipes internas é essencial. O Endomarketing exige mudança de
comportamento das pessoas, pois estarão sempre se colocando como
fornecedores ou como clientes, em qualquer processo do qual façam parte.
Para a Administração Empreendedora, o Endomarketing é um
instrumento gerencial importante na formação das equipes
empreendedoras.
f) Outras políticas de Recursos Humanos
Além das políticas já mencionadas, as empresas que desejam
estimular a inovação e o espírito empreendedor de seus funcionários e
equipes podem desenvolver outros tipos de políticas, que complementam as
anteriores (não são mutuamente exclusivas). Entre estas, pode-se destacar
as seguintes:
• estímulo ao ambiente mais intelectual na empresa, visando criar
um clima mais propício à inovação: assim, algumas empresas têm
criado programas culturais, envolvendo os próprios funcionários,
como coral de música, teatro na empresa, produção de vídeos
internos, criação de espaços culturais na empresa para exposição
de artes, salas de leituras e outras formas de incentivo cultural;
• estímulo à integração intergrupal, visando desenvolver a visão
holística da empresa, tão importante para a criação de inovações
"globais": assim, algumas empresas têm incentivado o rodízio
154
funcional dentro das áreas e entre as áreas; ao mesmo tempo,
criam programas do tipo "MBWA - Management by Walking
Around", cujo sentido é fazer as pessoas caminharem em outras
áreas da empresa, visando interagir com outras áreas e trocar
idéias e experiências;
• intercâmbio entre pessoas mais jovens e mais maduras, visando a
troca de experiências e de criação de idéias novas. Algumas
empresas, inclusive, têm recontratado funcionários recém
aposentados, em tempo parcial, como uma espécie de consultores
internos, visando repassar seu conhecimento e experiência às
equipes mais jovens.
O conjunto das políticas de Recursos Humanos, acima citados, uma
vez implantadas e mantidas pelas empresas, certamente terão um efeito
muito positivo na atração e manutenção de pessoas que poderão se tornar
"intrapreneurs" na organização. Dificilmente uma empresa será bem
sucedida com o modelo empreendedor de gestão se não desenvolver e
praticar políticas de Recursos Humanos estimuladoras da inovação.
4.4. ASPECTOS CRÍTICOS NA APLICABILIDADE DA ADMINISTRAÇÃO
EMPREENDEDORA
Após analisar os principais conceitos e práticas da Administração
Empreendedora, cabe a questão: o modelo é aplicável a toda organização já
existente? Quais os requisitos para implantação de suas práticas? Como
avaliar os resultados do modelo? Quais as exigências com relação às
pessoas?
Inicialmente, pode-se definir que qualquer ambiente, em processo de
turbulência e de grandes mudanças, como a sociedade vive atualmente,
comporta e exige organizações inovadoras. O modelo empreendedor de
gestão não é o único a desenvolver instrumentos e práticas que estimulam a
criatividade e a inovação na empresa; ao mesmo tempo, ele não exige
exclusividade quanto à abordagem ou estilo de gestão. Dada a sua
155
flexibilidade, facilmente se acopla ou complementa a outras novas
abordagens da administração (modelo participativo ou holístico, por
exemplo).
No entanto, o modelo empreendedor exige alguns cuidados na sua
implantação. Por exemplo, a experiência em algumas grandes empresas
americanas evidenciou que a abordagem do "intrapreneur", atuando
isoladamente, não é a mais adequada; deve-se incentivar a inovação,
assim, através de equipes empreendedoras. Para tanto, desenvolver
lideranças e implantar políticas transparentes de Recursos Humanos,
visando estimular a inovação e recompensá-la, são condições fundamentais
para o êxito do modelo. De um outro lado, a empresa que desenvolve
esforços na direção deste modelo deve aprender a conviver com pessoas
empreendedoras; estas procuram permanentemente sua auto-realização
pessoal e profissional, o que nem sempre está ligado à motivação
financeira, sendo pessoas que desenvolvem acentuadamente o espírito de
independência. Neste sentido, as equipes e pessoas empreendedoras
devem ser acomodadas em áreas ou unidades com um certo nível de
autonomia funcional, sendo acompanhadas mais pelos resultados (eficácia)
do que pelo controle dos recurso~. utilizados (eficiência). Outro aspecto
decorrente é que a empresa precisa aprender a conviver com o risco das
inovações: a cultura empreendedora exige que tolere eventuais fracassos
de novas idéias, pois, segundo uma pesquisa desenvolvida nos Estados
Unidos, citada por Degen ( 1989), apenas duas de cada dez idéias
inovadoras implantadas são bem sucedidas. Em outras palavras, a empresa
precisaria aprender a lição durante oito vezes (fracasso) para colher os
resultados positivos que compensam todos os erros, apenas duas vezes.
Outro aspecto é de que o modelo empreendedor, seja através de
idéias pessoais ("intrapreneurs") ou de equipes empreendedoras, quebra a
estrutura organizacional e "confunde" os conceitos de autoridade e de
responsabilidade: é preciso desenvolver uma nova cultura organizacional
que absorva estas novas posturas de gestão. A independência das equipes
ou a ênfase sobre os resultados individuais podem destruir os valores
organizacionais, se a empresa não estiver devidamente preparada para
implantar e conviver com este modelo.
156
4.5. ADMINISTRAÇÃO HOLÍSTICA
Nas últimas décadas, (res)surgiu dentro das ciências o chamado
"movimento holístico". De origem grega, a palavra hólos = todo, vem
crescentemente penetrando nas abordagen~ cada vez mas complexas de
todos os ramos do conhecimento humano. A questão parece ser facilmente
explicável; as ciências, de forma geral, foram construídas com base em
paradigmas mecanicistas, suportados numa visão cartesiana-newtoniana do
mundo: todos os fenômenos eram possíveis de serem divididos em partes e
cada uma destas seria estudada profundamente, constituindo um ramo
específico do saber humano; assim foi com a química e seus elementos
individualizados; com a física e sua estrutura orientada para as partes do
material; com a medicina, que "retalhou" o organismo humano, perdendo a
visão do sistema biológico que comanda a vida humana; . e, na
administração, o mesmo processo ocorreu, a partir da visão da
"administração científica" de Taylor e Fayol, reduzindo o trabalho humano
ao nível da visão da tarefa.
Segundo I ma i ( 1991 ),
a crise é de percepção. Dada a sua complexidade, os assuntos foram sendo fragmentados para serem estudados por especialistas. Cada fragmento foi sendo aprofundado ao longo dos anos, tornando-se ainda mais complexo, incontrolável e distante da realidade em rápida mudança. Perdemos a visão simplificada do todo e, simultaneamente, os conceitos econômicos e administrativos tornaram-se obsoletos, deixando de funcionar.
(. . .) Na enorme confusão reinante, precisamos resgatar novamente a visão global e simplificada dos fatos, para nos lançarmos rapidamente na nova Era Convergente e até para podermos perceber os erros estruturais acobertados até hoje pela visão complexa e fragmentada, entender a que ponto chegamos na complexidade de obsoleta e incontrolável dos temas. (p. 53)
E o autor volta ao ponto inicial: "É a crise de percepção, que chamo
também de crise de perda da visão global e simplificada, ou a crise da visão
complexa e fragmentada dos fatos." (p. 54)
Esta visão fragmentada tem provocado uma reação em cadeia de
todas as ciências. Ferguson (1980) "denuncia" uma conspiração mundial:
Uma rede poderosa, embora sem liderança, está trabalhando no sentido de provocar uma mudança -radical (. . .). Seus membros romperam com alguns elementos-chave do pensamento ocidental e até mesmo podem ter rompido com a continuidade da História. Esta rede é a Conspiração Aquariana: uma conspiração sem doutrina política, sem manifesto, com conspiradores que buscam o poder apenas para difundi-la, e cujas estratégias são pragmáticas, até científicas, mas cujas perspectivas parecem tão misteriosas que eles hesitam em discuti-las. (. . .) esta conspiração benigna a favor de uma nova ordem deflagrou o mais rápido realinhamento cultural da História. (p. 23)
157
Kuhn ( 1991) interpreta tal "conspiração" como a "mudança de
paradigma", ou seja, uma forma de pensamento inteiramente diferente do
que sempre existiu, mas que não era percebido assim.
Capra (1989) tem sido um dos maiores influenciadores da visão
holística: ele mostra as grandes mutações pelas quais passa a sociedade -
na tecnologia, na educação, na economia, na medicina, na psicologia, na
ecologia, entre outras grandes áreas - e a mudança de valores que afetam
aspectos como a individuação, a criatividade, a flexibilidade, a informação, a
autonomia, entre outros valores, cuja mudança afeta tanto organizações
como as pessoas. O autor procura explicar como o paradigma cartesiano
newtoniana afetou a prática econômica contemporânea: a fragmentação das
especializações, o desvinculamento dos valores superiores da humanidade,
a abordagem competitiva na exploração da natureza, o esgotamento
progressivo dos recursos naturais, o consenso de que a natureza existe
para o homem, a visão do homem com um ente consumidor, o que levou a
um consumo desenfreado, a confusão entre riqueza material e felicidade, a
tecnologia a serviço da destruição em massa e a venda de 70% de
armamentos aos países do Terceiro Mundo, a divisão econômica norte-sul
do mundo, a exploração indiscriminada das sociedades pela multinacionais,
entre outras questões. ,
A visão holística é uma das abordagens destes novos paradigmas
das ciências, inclusive da Administração. Há um movimento emergente de
pesquisadores e autores que já tenta desenvolver uma "ab_ordagem holística
da administração" e já existem algumas experiências que procuram colocar
em prática tal abordagem.
158
4.5.1. A visão holística na Administração
Historicamente, uma das primeiras experiências registradas na
evolução dos modelos de administração que teria buscado, de forma
deliberada ou não, uma abordagem holística para solução de problemas
organizacionais, foi em uma das unidades de produção da Volvo, na Suécia,
na década de 60. De um lado, o alto nível sócio-econômico-cultural do país
possibilitou aos trabalhadores um nível alto de bem-estar social; de outro
lado, o trabalho rotineiro da linha de montagem dos automóveis e
caminhões alienava estes trabalhadores, desmotivando-os para a realização
do trabalho. Eram "especialistas" em tarefas determinadas do processo de
fabricação e não tinham qualquer visão do cliente que compraria o produto
final de cuja produção participava.
A solução "holística" da Volvo foi a criação de uma tecnologia de
produção, que exigiu inclusive a construção de uma nova fábrica: surgia a
"célula de produção". Neste conceito, cada célula tem uma equipe de
funcionários auto-gerenciável. Na medida em que a empresa vai se
organizar com base num conjunto de células, a sua estrutura passa a ser
policelular.
Landier (1987) estabelece algumas características da empresa
policelular:
• o grupo é representado por um animador, que é o líder natural;
• há intensidade nas relações interpessoais;
• as qualidades e defeitos determinam o reconhecimento de cada
membro; a intensidade pessoal é construída através do
pertencimento ao grupo;
• o grupo se auto-:-gerencia e cada um dos membros pode ter
iniciativa própria;
• um mesmo indivíduo pode pertencer a mais de um grupo;
• algumas células podem ter durabilidade no tempo, enquanto outras
podem ter vida efêmera;
159
• a eficácia organizacional está ligada aos mecanismos das
comunicações internas das células e entre as células;
• o "tecido" celular é organizado na forma de uma "rede" com muitos
caminhos possíveis entre uma célula e outra;
• há uma semelhança de cada célula com uma pequena
organização, havendo no entanto uma ligação muito forte com a
visão global da empresa;
• não existem tarefas definidas no interior da célula; as papéis são
assumidos de acordo com as competências individuais;
• a célula que não for eficaz não consegue sobreviver na
organização;
• há uma célula central cujo papel é assegurar a unidade
empresarial e controlar a eficácia das demais células;
• as condições externas é que determinam o crescimento da
empresa;
• ao crescer demasiadamente, uma célula pode ser subdividida em
células menores, visando garantir estas características;
• o fato de uma célula não ser eficaz não significa risco para todo o
conjunto das outras células;
• as condições para estimular e gerar inovações são aumentadas.
As caraterísticas e práticas da administração holística serão
ànalisadas a seguir.
4.5.2. Práticas da Administração Holística
Sendo um "modelo" de administração do futuro, existem poucas
empresas que têm adotado algumas· das práticas holísticas de gestão. Entre
estas práticas, as principais são as seguintes:
160
• Quanto aos objetivos
A administração Holística procura realizar plenamente os objetivos
dos dirigentes e funcionários da empresa, procurando integrar os objetivos
individuais com os interesses da organização; ao mesmo tempo, a
organização deve buscar a satisfação plena dos clientes.
Segundo Wiersema & Thompson (1995},
a abordagem fragmentada das empresas erra o alvo porque não é desta maneira que o consumidor vê seus fornecedores. Os consumidores vêem as empresas fornecedoras como um todo e não fazem distinção quanto à área da companhia que o deixou na mão. Assim, se uma linha aérea extravia a bagagem de João da Silva, ele presume que os pilotos são fracos na pilotagem de jatos, também. Se o vendedor não pode dar os preços atualizados dos produtos químicos industriais que Joana da Silva estiver tentando encomendar-lhe, ela duvida que a companhia faça a entrega a tempo ou mantenha a mesma qualidade do seu fornecedor. Os clientes não fragmentam a visão que têm de um fornecedor. Portanto, este deve começar a ver seus clientes holisticamente. Caso contrário, arrisca-se a perdê-los para um concorrente que o faça. (p. 5)
A Tecnologia de Informação possibilitará às empresas obterem uma
visão holística dos seus clientes, lidando com o tamanho e a complexidade
de seu mercado sem quebrar a unidade do serviço ao consumidor.
Finalmente, ainda com relação aos objetivos, a Administração
Holística. procura construir relacionamentos fortes para com seus
fornecedores e revendedores/distribuidores, que também fazem parte do
negócio, na visão holística dos clientes.
• Quanto à estrutura da empresa
Prevalece, na empresa que adota Administração Holística, uma certa
informalidade, pois a empresa não depende, para seu funcionamento, da
estrutura formal.
Assim, são estabelecidos valores comuns a todos os membros da
equipe e prevalece uma comunicação lateral intensa, ou seja,
relacionamento em rede integrada, o que permite uma fluidez contínua das
informações e uma grande flexibilidade.
161
De outro lado, a empresa holística passa a dispensar autoridade e
mecanismos formais de controle. Segundo Ribeiro (1989),
assim como são essenciais as chefias intermediárias em organizações convencionais, da mesma forma elas se tornam totalmente dispensáveis nas organizações holísticas. Na verdade, essa nova concepção de chefia já é praticada pela administração japonesa, exatamente por desfrutar da convergência de valores, fruto de um processo cultural e não planejado, como precisa ser feito nas organizações ocidentais. (p. 59)
O formato das equipes auto-gerenciáveis são células de produção ou
de serviços, também denominados Grupos Semi-Autônomos ("semi" porque
a autonomia é operacional e mercadológica e a equipe depende do apoio
de um "staff' centralizado, na área de finanças, suprimentos, recursos
humanos, informática e outros)~
• Quanto às caraterísticas comporlamentais da equipe
A empresa holística se caracteriza pelo comprometimento individual
de cada membro da equipe para com o resultado, objetivo ou missão da
equipe e/ou da empresa.
Por não existir mais tarefa fiidívidualizada, os membros da equipe
trabalham em regime de rodízio de funções, o que lhes propicia uma visão
holística do trabalho e exige dos mesmos a polivalência ou a
multifuncionalidade, ou seja, devem estar preparados para executar
diversos tipos de tarefas dentro da equipe. Esta característica da empresa
holística exige uma integração da equipe, o que garantirá a satisfação no
trabalho de cada um dos membros e sua realização pessoal e profissional.
Com isto, ocorre uma estabilidade funcional tácita dos membros da equipe,
embora as equipes multifuncionais passam ser transitórias.
4.5.3. Condições para uma empresa adotar o modelo holístico de
gestão
A empresa que decidir praticar o modelo de Administração Holística
deverá atender as seguintes condições no processo de mudança:
• eliminar a hierarquia piramidal;
162
• eliminar, da sua estrutura formal, os departamentos, divisões e
setores, para adotar o sistema de células;
• fim das associações de funcionários: não é necessário existir
intermediação entre empresa e funcionários;
• fim dos cargos e da disputa pelos mesmos: as pessoas serão
polivalentes ou multifuncionais, sem vinculação a cargos formais;
• fim do controle e da autoridade: implanta-se o sistema de equipes
auto-gerenciadas;
• redução do emprego em tempo integral: implantam-se relações de
parceria que complementam as atividades de tempo integral;
• redução ao máximo dos ativos fixos da empresa: as células de
produção e parcerias não requerem concentração de ativos na
empresa.
Quanto à aplicabilidade da Administração Holística, sem dúvida a
principal dificuldade é de natureza cultural, pois a mudança comportamental
é radical em relação a outras forma·s ·organizacionais mais tradicionais. O
alto comprometimento individual com a equipe exige mudança de
características pessoais, enquanto a multifuncionalidade exige o
desenvolvimento de novas habilidades técnicas e humanas (relacionamento
e integração com a equipe).
Por se tratar de um modelo de vanguarda na administração, os
cuidados na adoção de suas práticas e instrumentos gerenciais deverão ser
muito mais rigorosos.
4.6. ADMINISTRAÇÃO VIRTUAL
.A adoção pelas organizações de novos· modelos gerenciais, bem
como de novas tecnologias de trabalho, está levando a um modelo
163
organizacional visto atualmente como a "empresa do futuro". Tal visão é
decorrente de dois aspectos:
• de um lado, todos os novos modelos gerenciais são baseados na
filosofia de redução da estrutura formal das organizações, gerada
sobretudo a partir da orientação dos modelos tradicionais de estão;
• de outro lado, as novas tecnologias de trabalho, sobretudo a
informática, estão possibilitando a automação de diversos
processos administrativos, fabris, operacionais e comerciais,
reduzindo não só internamente a necessidade de níveis
hierárquicos e de postos de trabalho, como também viabilizando a
interligação com outras empresas que, numa relação de parceria,
passam a fazer parte de um "networking" organizacional.
Surge então o conceito de "empresa ou corporação virtual", cuja
origem será analisada a seguir:
4.6.1. Origem da "Corporação Virtual"
Segundo Davidow & Mallone (1993),
a corporação virtual começou com uma visão de futurólogos, chegou a possibilidade para os teóricos de administração e hoje tornou-se uma necessidade econômica para os executivos das empresas ... tudo em pouco mais de dez anos. Este fato não só salienta a inevitabilidade deste novo modelo empresarial, mas também sugere o senso acelerado de tempo que irá caracterizá-lo. (p. 4)
A palavra "virtual" se incorporou para adjetivar este novo modelo
organizacional da mesma forma que já havia se incorporado a outros termos
substantivos.
Segundo o Novo Dicionário Aurélio, a palavra "virtual" tem os
seguintes significados, enquanto adjetivo:
1. Que existe como faculdade, porém sem exercício ou efeito atual.
2. Suscetível de se realizar; potencial.
164
Assim, este sentido de "vir a ser" ou de "potencial" é o que tem
caracterizado todos os conceitos "virtuais" nas últimas décadas: na
informática, no final dos anos 50, foram desenvolvidos os chamados
"computadores virtuais"- máquinas que operavam em rede, possibilitando o
trabalho simultâneo de várias pessoas, embora cada um se sentisse como
um trabalhador isolado, como se toda a .estrutura fosse construída só para
ele; na. ótica, surge a "imagem virtual", através de técnicas de holografia,
que permitem reproduzir várias imagens sobre o mesmo plano.
A aplicação do conceito "virtual" à administração vem do aspecto de
que, segundo Davidow & Mallone (1993),
estruturas antes bem definidas começam a perder seus contornos, o que parecia permanente começa a mudar continuamente e produtos e serviços se adaptam para atender nossos desejos. Os produtos virtuais não só terão grande valor para os clientes, mas também a capacidade para fazê-los irá determinar quais serão as corporações de sucesso no século 21. (p. )
Segundo Hawken (1983),
informação e recursos são sinônimos. (. . .) A faculdade reforçadora do concreto armado e a atmosfera do restaurante são ambas informações. O preço, a qualidade, o design, a utilidade e o acabamento são todos partes de informação sobre produtos e serviços. A única tendência que é mais importante compreender é a razão variável entre massa e informações em mercadorias e serviços. (p. 11)
A partir desta relação entre informação e massa, Davis (1990) propõe
a seguinte equação:
INFORMAÇÃO VALOR DO PRODUTO =
MASSA
Na sua visão, tal equação é a essência da mudança da economia de massa baseada na indústria para a economia de serviços baseada na informação. (. . .) O aço tem muita massa com relativamente pouca informação, ao contrário qe um chip de computador, que tem muita informação em relação à sua massa. Se uma folha de papel estiver escrita, terá mais informação e por isso será mais valiosa. (p. 108)
165
Na área organizacional, esta "equação" começa a mostrar os efeitos
combinados das mudanças gerenciais e das inovações tecnológicas: assim,
no mês de setembro de 1994, surge na França o Banque Directe (Gazeta
Mercantil - 17.03.94): um banco com 50.000 clientes e nenhuma agência.
Todos os serviços são prestados através de uma rede interconectada de
computadores, aparelhos de fax, telefone e televisão interativa. -O único
contato físico do cliente com o banco é receber o talonário de cheques pelo
correio. Portanto, com um pequeno "staff'' e a tecnologia de informação, o
"banco virtual" certamente é mais competitivo do que o seu concorrente que
utiliza os serviços convencionais, baseados numa estrutura física (agência)
e organizacional (atendimento).
Clegg (1990) analisa o modelo organizacional da corporação
multinacional italiana Benetton: esta, na realidade, é uma empresa familiar
sediada no Norte da Itália, opera no ramo de confecções de moda, voltada
para os públicos masculino e feminino, tanto jovem como infantil,
procurando os mercados cujo estilo de vida do consumidor seja
notoriamente afluente: nível cultural alto, gosto de estilos diferentes de vida,
tem comportamentos de vanguarda e facilmente aceita inovações nos
produtos de consumo. Para atingir tal mercado, a nível mundial, a empresa
não tem fábrica e nem lojas próprias; no lado da produção, está articulada a
uma rede de pequenas e médias indústrias que fabricam toda a sua linha de
produtos; do lado da distribuição, opera com uma rede mundial de 2.500
lojas, todas sob o sistema de franchising, operando exclusivamente sob a
marca Benetton. "E o que é então a organização Benetton?", pergunta Clegg
(1990). Trata-se de um pequeno staff de pessoas, que cuidam do design,
estilo das roupas, da criação das coleções, do marketing e dos contratos de
terceirização (produção) e de franchising (comercialização). A empresa está
interligada com os produtores e distribuidores através de uma rede de
computadores, de forma que a estrutura é altamente flexível e pode
responder rapidamente a uma mudança do mercado, tão influenciado pelas
transformações correntes no mundo.
166
4.6.2. Principais práticas gerenciais na Corporação Virtual
Tratando-se de um modelo futurístico de gestão empresarial, as
práticas de instrumentos aplicados por uma. corporação virtual ainda não
estão instrumentalizados. No entanto, é possível prescrever algumas das
principais características que esta práticas assumirão, tanto a partir das
poucas experiências já existentes, como da evolução prevista para tais
organizações.
Davidow & Mallone (1989) perguntam"
"Como será uma corporação virtual?" (p. 5)
E eles mesmos tentam responder:
Não existe uma resposta única. Para o observador externo, uma corporação virtual parecerá quase sem contornos, com a interface entre empresa, fornecedores e clientes permeável e mudando continuamente. Do lado de dentro da empresa, a visão não será menos amorfa, com os tradicionais escritórios, departamentos e divisões operacionais sendo constantemente reformados de acordo com as necessidades. As responsabilidades dos cargos mudarão regulamente, bem como as linhas de autoridade - até mesmo a própria definição de funcionário irá mudar, à medida em que alguns clientes e fornecedores comeÇarem a passar mais tempo na empresa do que alguns dos seus próprios empregados. (p. 5)
Outras características que a corporação virtual deverá desenvolver
são:
• capacidade para se entregar, rápida e globalmente, uma grande
variedade de produtos sob medida;
• serviços "incluídos" nos produtos;
• envolvimento dos clientes no desenvolvimento dos produtos
(engenharia simultânea);
• bancos de dados atualizados sobre os clientes, produtos,
fornecedores, metodologia de projeto e produção, visando atender
o cliente em tempo real;
• sistemas de informações integradas à rede de clientes e
fornecedores, levando as empresas a operarem em "networkings";
167
• cargos desvinculados do poder: funções gerenciais e operacionais
serão intercambiáveis;
• empresa em contínua transmutação;
• acumulação de práticas gerenciais desenvolvidas em outras
abordagens inovadoras de gestão, como fornecimento Just-in
Time, equipes de trabalho, fabricação flexível, simplificação
organizacional, CAD, qualidade total, entre outros;
• acordos de cooperação possíveis com concorrentes, visando
compartilhar investimentos em tecnologia ou de custos
operacionais (compras conjuntas, infra-estrutura de transporte,
armazenagem e comunicação, entre outros).
Segundo Paulin et ai (1994), estes acordos de cooperação podem ser
de vários tipos, incluindo redes de clientes, fornecedores e até
concorrentes. Os principais tipos são:
• Acordo de franquia (franchising): .é uma aliança formal na qual um
ou mais empresas - geralmente do setor de serviços - se tornam
parceiras de outra empresa que vai lhes transferir sua tecnologia,
fórmula comercial ou assessoria de gestão.
• Acordo de licença: é uma. aliança formal na qual duas ou mais
empresas se engajam com outra empresa que vai lhe ceder sua
tecnologia, suas licenças próprias, sua marca de comércio ou
outras vantagens de sua propriedade de que podem ser úteis para
o detentor em troca do pagamento de royalties.
• Aliança: é uma ligação formal ou informal entre as empresas
formadoras de uma rede externa de uma empresa, caracterizada
por uma relação de cooperação. No caso da ligação informal, as
obrigações dos parceiros são modestos, sem base contratual e
cada um permanece na rede quando e se quiser. Na ligação
formal, a relação é contratual, sendo o mais importante ó nível de
controle.
168
• Aliança estratégica: é uma relação de longo prazo entre duas
empresas, no interior da qual os riscos e os benefícios são
compartilhados em função do seu impacto sobre. o resultado de
cada uma das partes.
• Consórcio: é uma aliança estratégica entre diversas empresas que
juntam seus recursos para criar uma nova empresa, com o objetivo
de realizar uma operação ou um projeto. A nova empresa nascida
desta aliança também leva o nome de consórcio.
• Empresa conjunta ("Coentreprise''): é uma aliança formal entre
duas ou diversas empresas que exige um investimento de cada
uma das partes, com o objetivo de criar uma nova empresa, a partir
de suas áreas internas de interface, a qual também será chamada
"Empresa Conjunta".
• "Maillage": trata-se de uma ligação informal entre empresas,
caracterizada por uma relação de associação destinada a
favorecer a atividade de cada uma delas sem que sejam forçadas
as ligações financeiras entre elas. Trata-se de uma relação de
associação por afinidade, t:l'entro da qual cada empresa assume a
responsabilidade pelo seu desenvolvimento.
• "Parrainage": trata-se de uma aliança informal, estabelecida por
uma duração limitada, entre duas empresas cuja ligação é
caracterizada por uma relação de ajuda da empresa "A" para a
empresa "8".
Estas várias formas de aliança vão se estabelecendo de acordo com
a necessidade que cada empresa tem para buscar a sua sobrevivência e
tornar competitiva e inovadora no mercado em que atua.
Assim, a corporação virtual reunirá todo o conjunto de instrumentos e
práticas gerenciais desenvolvidos ao longo das inovações administrativas
propostas pelas novas abordagens gerenciais; significa que, à medida em
que a empresa aplica práticas participativas de gestão, parcerias com
fornecedores e clientes, inovação em produtos e serviços, visando
satisfazer o cliente, bem como outros instrumentos inovadores de gestão, a
empresa estará caminhando naturalmente para o modelo virtual.
169
4.6.3. Aspectos críticos na aplicabilidade das práticas gerenciais da
administração virtual
Segundo Davidow & Mallone (1993),
as corporações virtuais somente poderão prosperar em um ambiente de trabalho em equipe, no qual os funcionários, a gerência, os clientes, fornecedores e o governo trabalham em conjunto para atingir metas comuns. (p. 17,)
.I'
Assim, não basta fazer investimentos em tecnologia da informação,
integrar a empresa em rede com outras empresas, se os outros aspectos, de
natureza comportamental, não forem atendidos. Assim, a transição para o
modelo virtual é um processo evolutivo, baseado na interface "pessoas x
tecnologia". A corporação virtual será a típica organização da Sociedade do
Conhecimento: portanto, a maioria das organizações não pratica ainda o
modelo virtual de administração à sua. aplicabilidade exigirá uma profunda
mudança cultural das organizações, para viabilizar os relacionamentos de
parcerias.
''
4.7. A TRANSIÇÃO DOS "MODELOS TRADICIONAIS" PARA OS
"NOVOS MODELOS" DE ADMINISTRAÇÃO"
A partir dos anos 80, vários autores têm se dedicado a pesquisar
empresas que estão passando por transformações profundas em seus
modelo de gestão. Ao tentar explicar tais mudanças, praticamente todos
buscam expandir as práticas observadas e tentar propor tais experiências
como "os novos caminhos da administração".
Assim, sem seguir rigorosamente uma ordem cronológica, pode-se
citar os seguintes autores e suas linhas de trabalho, algumas das quais
bastante disseminadas:
170
Ouchi (1985) propõe a Teoria "Z", como um caminho que as
empresas americanas (e ocidentais) deveriam seguir as práticas
da gestão japonesa.
Peter & Waterman ( 1986) estudam as empresas americanas bem
sucedidas e procuram mostrá-las como modelos em "Busca da
Excelência" (no Brasil, o título da tradução desta obra foi infeliz:
"Vencendo a crise"); mais tarde, Peter (1989), partindo do ponto de
vista de que "não existem empresas excelentes", propõe uma
"revolução gerencial" em direção à flexibilidade organizaCional;
por sua vez, Waterman (1989) também procura mostrar que o "novo" caminho é o da "Renovação" (a essência da vida), para que
a empresa possa "assegurar sua sobrevivência e seu
crescimento".
• Naisbitt & Aburdene (1985), depois de analisar as práticas
desenvolvidas por empresas inovadoras nos primeiros anos da
década de 80, propõem a "Reinvenção da Empresa", visando
adaptá-la à nova Sociedade da Informação, na qual ocorrem
radicais mudanças no ambiérite do trabalho.
• Drucker (1986) chama a atenção para a emergência do "espírito
empreendedor", dentro e fora das empresas, como a maior
mudança provocada pelas oportunidades emergentes da década
de 80.
• Pinchot 111 (1989) continua a abordagem de Drucker e estuda o
comportamento das organizações e das pessoas inovadoras e
cunha um novo termo na teoria gerencial: "intrapreneurship",
procurando mostrar que é dentro das organizações que as
pessoas empreendedoras podem realizar seus objetivos pessoais
e, com isto, aquelas empresas é que sairão ganhando, por se
tornarem organizações inovadoras.
• Kanter (1989) procura mostrar os caminhos da empresa pós
empreendedora, tal como se faz para "ensinar os elefantes a
l7l
dançarem", em analogia à pesada estrutura organizacional que a
maioria das grandes empresas carrega.
• Beer et ai. ( 1990) procuram mostrar o "caminho crítico" para a
renovação organizacional das empresas, já que alguns esforços
atingem melhor os objetivos do que outros. A partir de entrevistas
com diversos executivos e gerentes, eles tentam mostrar "o que
funciona" e "o que não funciona" na busca da mudança
organizacional.
• Tomasko (1992) propõe o caminho do"Downsizing" para que as
empresas reduzam o tamanho de sua estrutura e procurem novas
alternativas de sobrevivência no mercado competitivo.
• Mills (1993) propõe o "Renascimento da Empresa", através de
alternativas como a estrutura organizacional colegiada, eliminando
as divisões hierarquizadas e burocráticas que sufocam a inovação
e a produtividade nas empresas.
• Hammer & Champy (1994) criam a palavra "Reengeneering"
("Reengenharia") e provocam um dos maiores movimentos
recentes na busca das novas "fórmulas" para garantir a
sobrevivência das empresas nos turbulentos anos 90: a postura é
radical ("esqueça o que você sabe sobre como as empresas
devem funcionar: quase tudo está errado!") e, assim, as reações
idem. Para Drucker, "a reengenharia será a bússola e o mapa
mundi empresarial no século XXI".
• Byham ( 1992) introduziu a abordagem da energização
("empowerment") das pessoas e das equipes, visando introduzir
mudanças em todos os níveis da organização. Esta abordagem
tem sido amplamente divulgada entre grandes empresas nos
últimos anos.
Algumas destas obras foram analisadas por Wood (1990), além de
outras por ele escolhidas, formando um conjunto de novas idéias que ele
chamou de "A Nova Onda Administrativa". Segundo o mesmo,
o desafio que a nova onda apresenta às ciências sociais é como nós investigaremos o simbolismo nas ações administrativas, e mais importante, os seus efeitos sobre o desempenho econômico. Na medida em que os administradores realmente comecem a agir com base nas idéias da nova onda, eles estarão provendo locais ideais de pesquisa para tais explorações. O desafio, particularmente para os que são céticos sobre seus prováveis efeitos de longo prazo, será primeiro de divisar critérios e métodos pelos quais possam avaliálos. (p. 21)
172
De fato, estas e outras abordagens de novas práticas e instrumentos
gerenciais têm sido propostas (por exemplo, na área de Qualidade Total).
Na realidade, há um consenso: o futuro da gestão empresarial terá pouco a
ver com o seu passado.
' : . ·-I::. , . ' ·"" .. "
Assim, na medida em que o cenário ambiental vai evoluindo (e cada
vez mais rápido), maiores serão os desafios para as empresas se
adequarem ao novo p~radigma - se sobreviverem. Da mesma forma, os . ' desafios para os (novos) administradores são crescentes: é preciso
repensar não só as práticas gerenciais, a própria Administração, enquanto
um conjunto de conhecimentos, não está totalmente preparada para
prescrever os modelos organizaciona-is do futuro. Há · muito caminho a
percorrer na transição entre os "modelbs tradicionais" e "os novos modelos"
de administração.
CAPÍTULOS
ESTUDOS DE CASO
ESTUDO DE CASO 1:
LOCALIZA RENT A CAR
175
ESTUDO DE CASO 1: LOCALIZA RENT A CAR
A LOCALIZA RENT A CAR (que será denominada LOCALIZA ao
longo deste estudo de caso) é uma empresa de capital nacional, criada em
1973 na cidade de Belo Horizonte - MG e que desde o início dos anos 80
assumiu a liderança do mercado de locação de automóveis, sem perdê-la
até o ano de 1994.
Ao longo da trajetória de seus 21 anos já completados, a empresa
registra uma história bem sucedida de um empreendimento nascido sob o
ideal do seu fundador, Salim Mattar e de mais três sócios. Ao mesmo tempo,
é uma empresa que demonstra a possibilidade de aplicar novas práticas de
gestão, sem apego a "modismos administrativos", mas no firme propósito de
perseguir sua missão e seus objetivos.
Para a elaboração deste estudo de caso, foram realizadas várias
visitas à empresa, com entrevistas dos seus principais Diretores e
executivos. Ao mesmo tempo, a empresa forneceu um amplo material de
registros históricos da sua evoluçã9. gerencial, o que permitiu desenvolver
um "case" consistente com a abordagem teórica desenvolvida no Capítulo 4;
assim, será possível analisar, ao final deste estudo de caso, as novas
práticas gerenciais e identificar os novos modelos de gestão aplicados pela
empresa.
1. O nascimento da empresa
Após formar-se em Administração de Empresas, determinado a
construir uma rede de locação de carros no País, o jovem Salim Mattar, aos
22 anos, procurou três sócios que, empreendedores como ele, aceitaram
abrir o negócio em 1973, num momento que o mundo atravessava a
primeira grande crise do petróleo e a ameaça de racionamento ou falta de
combustível. Naquele ano, Belo Horizonte possuía doze locadoras de
carros, cuja frota era formada basicamente por fuscas e opalas para atender
a dois tipos de públicos bem definidos. O negócio de locação de veículos
viveria naquele ano seu grande boom - 50% das locadoras de veículos
176
surgiram no início dos anos 70. Incipiente, a atividade era dominada por
e!Ylpresas pouco profissionais, algumas das quais entraram no negócio
quase por acaso.
O mercado brasileiro estava comandado por três empresas de rent a
car; a mais importante delas, a Hertz, possuía cinco filiais.
Organizado, planejador e estrategista nato, Salim inaugurou sua
empresa com objetivos e metas bem definidas. Há quem aponte aí a origem
do sucesso da LOCALIZA.
Amante do Marketing, Salim não descuidou, intuitivamente no início e
estrategicamente depois, de qualquer detalhe, em seu projeto: a LOCALIZA
já nasceu com público definido- Classe A e B, que paga bem por um serviço
diferenciado; política de preços inovadora - era a mais cara da época se
comparada ao aluguel da concorrência, mas oferecia mais opções de
produtos e outras novidades que atraíam o usuário; atendimento
personalizado - os próprios donos trataram de imprimir o padrão de
atendimento à clientela, pois, por vários anos, cuidaram de tudo dentro da
empresa, do balcão à manutenção dos veículos; ponto de venda
diferenciado - a LOCALIZA possuía· a mais sofisticada loja de locação de
Belo Horizonte e seus clientes eram recebidos impecavelmente, com direito
a atenções e conforto não encontrados na concorrência; comunicação
criativa - os empresários contrataram a melhor agência de publicidade de
Belo Horizonte na época e lançaram sua empresa com brindes
promocionais (kit com flanela, cigarros e fósforos com logotipo LOCALIZA).
Folhetos comunicando a abertura, enviado por mala direta, spot de rádio,
anúncio em jornal e o slogan: "Vive la Difference", posicionando, desde
então, a LOCALIZA como uma empresa de locação de carros diferenciada.
Para a época tudo isso representava inovação absoluta. E para
completar, introduziu serviços e produtos não existentes na concorrência:
atendimento 24 horas; locação nos finais de semana; diárias fracionadas;
frota diversificada com os novos lançamentos da indústria automobilística.
Em quatro anos, a empresa conquistou o mercado mineiro -
empresas, agências, hotéis e consumidores diretos já conheciam e
utilizavam o serviço rent a car LOCALIZA.
177
2. O crescimento da empresa nos primeiros anos
De acordo com Fernando Campos, Diretor de Marketing, o estreito
relacionamento com públicos de outras praças ocorreu a partir de 74 com a
abertura de sua primeira loja no aeroporto da Pampulha, o que intensificou a
locação de veículos para executivos, em viagens de negócios, e turistas.
De 73 a 75, a LOCALIZA passa de 907 locações, no primeiro ano, a
2.870 no terceiro. Sua frota inicial, formada por seus fuscas usados chegou
a 1 00 carros em três anos.
Com a demanda reprimida e o rápido crescimento do negócio, a
LOCALIZA não se livraria de uma crise interna que durou quase três anos.
Segundo aquele Diretor, cinco fatores básicos, além da própria
inexperiência, motivaram a crise que quase levou a empresa à falência: alto
grau de endividamento, com perda de crédito; altos custos operacionais;
juros crescentes; explosão inflacionária e crescimento desordenado.
O momento crítico ocorreu ·fia fase da renovação da frota. Sem
crédito, descapitalizada, a empresa teve que implementar um plano de
saneamento das finanças, maximização dos serviços aos clientes e rígida
administração de despesas com pessoal.
A fé no negócio, talento, dedicação, ousadia e "feeling", foram as
armas da LOCALIZA para superar a crise, agravada pelo abandono de dois
sócios, assustados com a situação da empresa. Cada um dos sócios que
ficou convidou um irmão para assumir o lugar dos ex-sócios com 20% de
participação na empresa.
Em 76, a empresa começava a se recuperar pagando todas as
dívidas.
A LOCALIZA conseguiu um excelente crescimento de 76 a 78,
passando de 3.216 locações anuais a 7.749, e começa a pensar em
expansão.
178
3. O início das mudanças estruturais
Em 1979, a LOCALIZA já era uma grande empresa de locação de
veículos em Belo Horizonte. Finanças em dia, tem início uma nova fase de
desenvolvimento. Nesta ocasião, ocorre a primeira grande mudança
estrutural na LOCALIZA. Os sócios decidem se revesar nas diretorias.
Há recursos em caixa e a decisão, desde o início, de sempre
reinvestir na empresa cria um impasse: diversificar ou crescer? Os sócios
resolvem apostar na expansão. A esta altura a LOCALIZA já realiza
pesquisas junto a seus clientes e monitoramento da concorrência, com
amplo conhecimento de seu mercado. Assim, estrategicamente a empresa
decide comprar ao invés de instalar suas próprias locadoras de carros em
outras cidades, pois além de evitar dificuldades operacionais de instalação
e equipes, ainda adquiria o negócio pronto com frota e cadastro de clientes-
o maior patrimônio da locação de veículos na época, pois ainda era restrito
o número de usuários destes serviço.
Outra decisão importante foi enviar um dos diretores para administrar
a primeira filial por seis meses, para que a empresa adquirisse know how
para operar à distância. E com isso, 'dominar ainda mais o ciclo do negócio.
A primeira aquisição foi em Vitória, onde comprou a empresa de
locação líder da cidade, com frota e cadastro de clientes como planejado. A
LOCALIZA inicia imediatamente suas operações na capital capixaba e, em
seis meses, obtém resultado operacional.
A empresa estava pronta para sua primeira etapa de expansão e,
novamente, com incrível senso de oportunidad~, desvia o projeto de
crescimento da direção Sul/Sudeste.
Tradicionalmente, a concorrência vinha concentrando suas atividades
nestas regiões onde o mercado era mais competitivo. A LOCALIZA, no
entanto, direcionou seus esforços a um mercado pouco explorado:
Norte/Nordeste. A chegada aos grandes centros urbanos localizados no
Sul/Sudeste do País exigiria um super esforço financeiro e operacional. O
crescimento para o Norte/Nordeste, menos arrojado, determinava, por outro
lado, uma expansão horizontal dentro de suas possibilidades, e que
permitiria torná-la pioneira entre as grandes redes.
179
Na época tinha início o boom turístico na região. E, dezoito meses
foram compradas sete empresas de locação de veículos em Salvador,
Aracaju, Maceió, Recife, Fortaleza, Natal e Belém. Ao mesmo tempo, a
empresa instalava sua locadora própria no Rio de Janeiro. Em pouco tempo,
a LOCALIZA marcou presença no Norte/Nordeste assumindo a liderança do
mercado nacional em número de pontos de venda, volume de locação, frota
e presença nos aeroportos. Em São Paulo também foram compradas duas
empresas, iniciando seu posicionamento no importante mercado paulista.
Alem disso, a empresa passou a se especializar em atender grandes
clientes, através de postos avançados, com agências instaladas em regiões
distantes ou em grandes projetos como Angra dos Reis, a Hidrelétrica de
Embarcação, em Minas Gerais, e a Represa de Pedra do Cavalo, em
Brasília.
Esta etapa de crescimento da empresa prossegue até 1982, com a
abertura de novas agências, como a de São Luis (MA), que viria a se tornar
a agência mais rentável de toda a rede. De 1979 a 1981, a LOCALIZA
passava de 7.121 para 32.160 locações anuais, comprovando sua vitalidade
e vocação para o crescimento.
4. A primeira crise estrutural da empresa
Segundo Salim Mattar, então Diretor-Superintendente da empresa,
em 1982, a LOCALIZA já possuía a maior malha de locação de veículos do
País e mantém sua disposição de continuar crescendo.
No entanto, a expansão desordenada provocou o estrangulamento da
estrutura interna, que exigia agilidade da direção em solucionar prob.lemas
específicos, como: falta de qualificação profissional; faixa etária jovem;
baixos salários; excesso de trabalho; e problemas de organização funcional
e de comunicações.
A solução de cada uma destas barreiras representava um desafio e
impunha reflexão sobre os caminhos da modernização inadiável da empresa
a serem implementados nos anos seguintes. Tem início um programa de
treinamento e a empresa começa a mudar a filosofia de contratação,
180
apostando em profissionais mais experientes. Ao mesmo tempo, elabora
uma nova estrutura organizacional, criando novas gerências, como a de
Marketing, com a contratação de Fernando Campos, seu atual Diretor.
Até então, o modelo de gestão da empresa era tipicamente
burocrático-funcional, com estrutura departamentalizada e controles
centralizados.
5. Os novos caminhos do crescimento: interiorização e
internacionalização
O Diretor .de Marketing, Fernando Campos, como uma de suas
primeiras iniciativas, desenvolveu uma pesquisa de mercado, visando
identificar novos mercados que garantissem a expansão da empresa.
Segundo ele, as pesquisas realizadas junto à clientela já sinalizavam para
dois novos caminhos, adotados em 84 também por uma situação
conjuntural: a interiorização e a internacionalização. A LOCALIZA inicia os
estudos de associação a uma rede mundial de carros e começa a analisar
alternativas para atender à demanda .do interior.
Outro dado que terá influência no mercado é a ascensão dos fluxos
turísticos internacionais, que provocam a elevação da demanda. Vale
ressaltar que o consumidor comum não tem o hábito da locação de veículos,
ao contrário do turista estrangeiro, especialmente os da Europa e Estados
Unidos.
Em 1983, a indústria de locação de veículos de carros se expandia a
taxas elevadas. O mercado começa a se estruturar- e a se profissionalizar
atendendo à crescente demanda, provocada pela divulgação do serviço rent
a car.
A LOCALIZA já desfrutava de posição confortável como líder do setor
com 35 agências, 42.871 locações anuais e presença nos principais
aeroportos e capitais do País.
Naquele ano, vários fatos tornam a disputa de mercado mais acirrada
e antecipam os planos de profissionalização do setor. Por um lado, Avis e
181
Hertz marcam presença forte como grandes multinacionais. Por outro,
nascia a lnterlocadora, uma rede de aluguéis de carros com o suporte de
pesos pesados como a Varig e VW. Em Belém, a Belauto e, em Porto
Alegre, a Locarauto experimentam expansão para o Sudeste, aumentando
suas redes.
A partir de então o nível competitivo do mercado não perdoará mais
amadorismo. Somente os grandes sobreviverão.
Sempre atenta às necessidades dos clientes e à situação da
economia como um todo, a LOCALIZA percebeu em 1982/1983 que
precisavam ampliar ainda mais sua área de atuação. O Brasil, na época,
uma das dez maiores economias do mundo, tinha uma série de contrastes,
com uma parte rica e industrializada, ao lado de regiões pobres e altamente
subdesenvolvidas. Com alto grau de endividamento, sem liquidez no
mercado, o País vivia a grande crise da dívida externa, com reflexos dentro
das empresas nacionais.
Em 1984, todos estes fatores ao lado da tendência de globalização
da economia mundial, levam a LOCALIZA a implementar, após um ano
inteiro de estudos, o projeto de associação a uma rede mundial de locação.
O projeto se concretiza com o contrato assinado com a norte-americana
National Car Rental, a maior rede de aluguel de carros do mundo, em
número de pontos de venda e a terceira maior em faturamento.
O acordo com a empresa nada custou, com a LOCALIZA associando
a marca National ao seu nome mantendo a cor verde - a mesma da empresa
americana, e adotando dois traços paralelos e inclinados na logotipia. A
National entrou no mercado brasileiro, como desejava, através de uma
grande rede, e a LOCALIZA via atendida mais uma necessidade de seus
clientes: o acesso à rede internacional de locação de veículos, com
presença em mais 130 países.
Para ser fechado o acordo entre as duas empresas, a LOCALIZA teve
de comprar mais uma locadora de veículos que usava e detinha o nome da
National do Brasil.
A National, além da LOCALIZA é associada a três empresas de
locação de veículos no mundo: Tilden, no Canadá - Europcar, em todo o
182
Continente Europeu, e à Nippon, no Japão. Desta maneira, a necessidade
internacional dos clientes estava atendida, com amplo retorno institucional
para a LOCALIZA pelo prestígio da marca National.
Nos anos de 1982 a 1983, a LOCALIZA já havia detectado também
por pesquisas junto à clientela, uma demanda em cidades do interior do
País como Araçatuba, llheús, Santarém e Blumenau, entre diversas outras.
Apos dois anos de amplo estudo, a empresa deflagra o primeiro
Franchising em locação de veículos e um dos primeiros sistemas do gênero
no Brasil.
Assim, uma operação de conquista de mercado e expansão de
negócios em termos de retorno de investimento com rentabilidade- abrindo
agências em cidades que muitas vezes comportavam pequena frota - foi
viável por esta moderna ferramenta de Marketing: o sistema de franquia.
6. A expansão através do Franchising
Segundo o Diretor de Franchising, Aristides Newton, em 1984, é
criada a LOCALIZA SYSTEM, empresa especializada em licenciar agências
com a marca LOCALIZA, que passaria a se integrar ao sistema. A
implantação do Franchising exigiu da LOCALIZA uma grande
profissionalização, alterando comportamentos, mudando a estrutura da
corporação, criando um novo tipo de parceiro: o FRANQUEADO.
Tudo foi feito para garantir o melhor para os clientes e para a própria
LOCALIZA, que estava presente no maior número de cidades.
Sempre atenta às novidades e buscando estar preparada para
responder às transformações constantes e inevitáveis do mercado, a
LOCALIZA, em 1985 incrementa seu programa de cursos, seminários e
intercâmbios internacionais. A associação com a National Car Rental
também lhe garantia o acesso às informações e meandros do mercado
norte-americano, o mais avançado .do mundo. Esta atualização permitia à
LOCALIZA ter uma visão sobre o futuro do seu mercado e oferecer o melhor
suporte a toda a sua rede, inovando sempre.
183
A LOCALIZA continuava sua trajetória ascendente e fortalecia sua
liderança, instalando-se em todas as cidades do País com mais de 300 mil
habitantes. No final de 1987, a empresa já possuía uma extensa malha de
agências próprias e franqueadas - e a maior frota do País com 4. 720
veículos.
Ao contrário do que se possa imaginar, este posicionamento estava
bem distante do que a LOCALIZA poderia avançar em termos empresariais
e mercadológicos. A consciência de sua necessidade de sair na frente e
alavancar uma indústria que tinha então apenas 10% de seu potencial
trabalhado, conduziu a alta direção da LOCALIZA a uma nova revisão de
sua filosofia e seus objetivos. Três anos depois é fácil entender porque os
funcionários da LOCALIZA dividem a história da empresa em duas etapas:
antes e depois de 1988.
7. 1988: um marco na história da empresa
Consolidada a interiorização da empresa, a LOCALIZA passa a
vislumbrar novos horizontes para continuar sua rota de crescimento, até
então bem sucedida. Percebia-se o esgotamento de suas estratégias
utilizadas até então e, inclusive, do seu próprio modelo de gestão. A
empresa já ultrapassava um quadro de mais de mil e quatrocentos
funcionários e o mercado potencial permitia o crescimento de toda a
"indústria" de locação de automóveis: a empresa visava não só crescer,
como manter a liderança já conquistada desde 1981.
O cenário do Setor
Pesquisa divulgadas em 1988 revelavam o seguinte cenário para o
setor: segundo Salim Mattar, existiam 20 milhões de pessoas no Brasil, de
alto poder aquisitivo, das classes A/8, prontas para consumir os chamados
serviços de primeira linha, oferecidos por segmentos como cartões de
crédito, companhias aéreas, bancos, agências de viagens e locação de
veículos O indústria que começava a se posicionar como a irmã mais nova
do pool de serviços de primeira linha e responder ao avanço do hábito de
consumo dos brasileiros.
184
No entanto, mesmo diante deste potencial altamente positivo, a
indústria de locações continuava limitada até então a 3 milhões de pessoas,
a maior parte executivos em viagens de negócio.
Iniciada nos anos 60, a atividade não estava incorporada à vida do
consumidor, como nos Estados Unidos onde são realizados 63 milhões de
locações/ano e a frota é de 1,5 milhão de veículos. Só para se ter uma idéia
da distância do nosso jovem mercado - que começou 50 anos depois do
norte-americano - a frota nacional de carros de aluguel era formada então
por 35 mil veículos.
Até aquele momento as locações realizadas pelo segmento
empresarial - executivos em viagens de negócios - representavam o grosso
volume das locadoras e uma pequena parte - flutuante na alta estação -
pelo turismo interno e externo. A massa dos consumidores potenciais não
conhecia o aluguel de carros. Falta de hábito e desconhecimento do serviço
e das vantagens, redundava (e ainda redunda) - em baixos volumes,
implicando em preços altos. Um círculo vicioso que começava na demanda
restrita e acabava em· juros altos para renovação da frota. (Nos Estados
Unidos se aluga um carro por 100 dólares por uma semana - graças à
economia em escala e estabilidade econômica - enquanto no Brasil é
suficiente para apenas 2 diárias).
A pressão do mercado como um todo terá grande influência no
processo de mudanças do segmento de locações, a partir daquele ano.
A indústria automobilística desenvolvia na época, novos produtos e
veículos mais compactos - a Fiat torna-se importante parceira da
LOCALIZA. Crescia a demanda provocada por segmentos como hotéis e
agências de viagens, estimuladas principalmente pelo turismo.
Ameaças e oportunidades do mercado
O mercado de locação de veículos começava o ano de 88 em grande
efervescência. A lnterlocadora que se formara três anos antes - com suporte
da VW e Varig já ocupava o segundo lugar no ranking. Assumia papel de
destaque também a Unidas, surgida da dissidência de ex-franqueadas da
Nobre.
185
Quatrocentas locadoras dominavam o mercado então - 1 O redes, que
detinham o bolo do mercado nacional e 390 pequenas locadoras de atuação
local. Das dez, 8 operavam em sistema de franchising, 1 diretamente e 1 por
representantes. A LOCALIZA, líder, detinha 178 pontos de vendas, a
segunda colocada 95 e a terceira 54. Na época, 160 locadoras integravam a
ABLA -Associação Brasileira de Locadoras de Automóveis, criada em 1973.
A franquia dava um interessante panorama das mudanças do
mercado. Do bolo total de empresas, 128 operavam por franquia - a
LOCALIZA, pioneira no sistema, já possuía 44 empresas franqueadas, a
lnterlocadora 30; a Hertz 6 e as locadoras independentes 13.
Em todo o Brasil, 120 cidades operavam com locação. A LOCALIZA
estava presente em 93 cidades - 78% do total; a lnterlocadora já chegara
em 50 cidades; a Unidas, em 29- e a Nobre, em 25.
Disputado ponto de distribuição, os aeroportos já tinham 137 pontos
de vendas de locação - A LOCALIZA com 56, a lnterlocadora com 17, a
Locarauto com 16 e a Hertz com 12 lojas.
Apesar de líderes mundiais e de ter iniciado a a atividade no País, a
Hertz e a Avis perdiam mercado para as grandes redes nacionais.
A Budget, também uma líder mundial, no 4° lugar no ranking,
começava a operar agressivamente no Brasil, no eixo Rio/São Paulo e já
detinha 9 pontos centrais - fora dos aeroportos.
Em relação aos preços, o aluguel diário era o mesmo acompanhando
a tarifa da líder- a variação ocorria nos descontos.
Em relação ao perfil dos clientes, 70% era formado por executivos
(empresas), e 30% por turistas (as flutuações aconteciam nos meses de alta
estação, especialmente no Sul do País, Rio e Nordeste onde havia inversão
total dos números).
O conjunto das locadoras atendia uma demanda inercial e atuava de
forma tímida em termos de comunicação - até então nenhuma delas havia
realizado uma campanha nacional na mídia eletrônica, A base da
186
comunicação era a mala direta - que atingia exatamente aquele público já
sensibilizado pelo serviço de locação de veículos.
A relação dos clientes com as marcas era quase desoladora: para o
consumidor, as locadoras eram todas iguais, havia pouca percepção de
diferenciação entre elas.
Enfrentando ameaças
A situação do mercado com a pressão de novos competidores e
demanda represada, pronta para desaguar, exigia um reposicionamento da
LOCALIZA. Fatores internos também empurravam os dirigentes da empresa
para o novo desafio: mudar a LOCALIZA de patamar. A empresa não
poderia acomodar-se na situação de líder com sua extensa rede de lojas,
sua máquina bem azeitada e uma clientela cativa. Era preciso ir mais longe.
A LOCALIZA enfrenta nesta época, segundo seu Diretor de Marketing, uma
grande crise: "possuíamos uma estrutura de alto nível, porém
necessitávamos, naquele momento, de novas fórmulas, estratégias e
inovações capazes de ejetar a empresa para um novo patamar'. Era preciso
dar o "start", assumindo as mudanças exigidas pelo momento e que não se
restrigiam a garantir sua fatia de mercado. A cúpula da LOCALIZA sabia de
sua responsabilidade como líder para mobilizar o grande mercado potencial,
indicado pelas pesquisas, para o qual ela já vinha se preparando, há algum
tempo. E chegara o momento, diz Fernando Campos.
8. A "virada" da empresa: o Planejamento Estratégico Competitivo
A partir da análise do cenário, das ameaças e das oportunidades que
a empresa enfrentava naquele momento, a LOCALIZA tinha percepção do
que estava acontecendo em seu mercado e "olhou para o próprio umbigo",
como reforça Campos, desnudando os seus mais sérios problemas: o baixo
volume de negócios para uma enorme rede de distribuição, em contraponto
a um potencial de 20 milhões de novos consumidores; o crescimento de
competitividade dos anos 90; a necessidade de modernização de suas
estruturas internas, o investimento em suas equipes e revisão de sua cultura
de gestão - a LOCALIZA tinha uma administração centralizada. Para
alavancar o mercado e se posicionar no segmento de primeira linha a
187
empresa precisava romper barreiras. O atalho para os novos caminhos
surgiria num encontro de 1 O dias do "board" da empresa, onde foi passado
o filme da LOCALIZA.
PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO COMPETITIVO
Historicamente orientada pe.lo marketing, a LOCALIZA, durante o
seminário com a alta cúpula, oferecido pela IBM, em 1988, lançou mão da
avançada metodologia de Michael Porter para realizar um profundo raio X
em suas estruturas internas e um completo diagnóstico do mercado de
locação de veículos do País. Elabora, então, seu primeiro Planejamento
Estratégico Competitivo e parte para a grande virada de sua história,
buscando tornar-se uma empresa dirigida pelo mercado. Conceituação
sofisticada que não passava na prática da aplicação integrada de táticas
corriqueiras · de marketing, visando atender as expectativas dos seus
diversos públicos: clientes, fornecedores, franqueados, parceiros (agentes
de viagens, companhias aéreas, cartões de crédito e hotéis, entre outros) e
funcionários. No encontro realizado no Centro de Convenções da IBM, na
Gávea, foi debatida a missão da empresa, seus fatores de sucesso, seus
problemas e soluções, estabelecendo planos e projetos específicos
desenvolvidos e implantados nos anos seguintes. E mais, dentro de uma
visão moderna de marketing, a direção decide centrar suas ações na
interação de seus públicos e introduz um novo conceito na empresa: o
marketing de relacionamento.
O encontro relatado teve como resultado as seguintes definições:
MISSÃO DA EMPRESA
"Manter a liderança no mercado de locação de veículos, diretamente
e através de um sistema de Franchising, oferecendo serviços diferenciados
e de alta qualidade, satisfazendo os interesses dos clientes, funcionários e
comunidade como um todo, com rentabilidade".
188
Fatores críticos de sucesso
• Imagem;
• localização e número de pontos de venda, ênfase em aeroportos;
• eficiência e eficácia em vendas;
• atrair e manter pessoal de alta qualidade;
• carros novos.
Objetivos
• Posicionar a marca como líder;
• posicionar a localiza no pool dos serviços de primeira linha;
• expansão dos negócios através de Franchising;
• manter a liderança de mercado;
• institucionalizar o aluguel de carros.
Problemas
• Deficiência na informatização;
• estrutura matricial de vendas inadequada;
• ausência de posicionamento;
• atuação/imagem nos mercados de Rio e São Paulo;
• instalações deficientes localizadas;
• sistemas de informações gerenciais;
• estrutura de alto custo;
• administração centralizada;
• falta de qualificação de pessoal para serviços avançados de
primeira linha;
• novos competidores.
Estratégias
a) Utilizar a informática como ferramenta de marketing
• investimentos em equipamentos (Mainframe, terminais, etc.);
• contratação de rede de comunicação;
• desenvolvimento de sistemas estratégicos para o marketing;
• formação de Banco de Dados.
b) Comunicação integrada
• propaganda;
• promoção de vendas;
• merchandising;
• assessoria de imprensa;
• plano de marketing interno;
• plano de identificação visual.
c) Otimizar negócios com canais de distribuição
• consolidar a atuação junto aos agentes de viagem;
• incrementar parceiros com rede de hotelaria;
• desenvolver relacionamento com companhias aéreas;
• ampliar presença em congressos e eventos.
d) Expansão da rede
• . ampliar a rede de franqueados;
• crescimento vertical nas filiais corporativas.
189
190
e) Aperfeiçoamento dos Serviços/Marketing de Relacionamento
• lançar novos produtos;
• beneficiar produtos regulares;
• intensificar promoções;
• RH integrado a Marketing.
f) Expandir vendas
• estruturação por unidades estratégicas de negócios;
• treinamento de operações de vendas;
• desenvolver material de apoio a vendas.
A análise dos resultados do encontro da Gávea permite analisar
alguns aspectos do modelo de gestão da empresa:
• Entre os fatores críticos de sucesso, dois se referem à estrutura
gerencial: "eficiência e efiç;$cia em vendas" e "atrair e manter
pessoal de alta qualidade";
• Entre os objetivos, a "expansão dos negócios através de
Franchising" significava uma alternativa de fortalecimento das
parcerias (franqueados), favorecendo uma estrutura mais
horizontal izada.
• Entre os problemas identificados, apontaram-se vários aspectos de
falhas na estrutura organizacional:
"estrutura matricial de vendas inadequada";
"estrutura de alto custo";
"administração centralizada".
• Entre as estratégias definidas, várias delas exigiriam revisão da
estrutura organizacional para serem implantadas:
191
Na expansão da rede, seja para "ampliar a rede de
franqueados", seja no "crescimento vertical nas filiais
corporativas" (lojas próprias da LOCALIZA).
No aperfeiçoamento dos Serviços/Marketing de
Relacionamento, sobretudo com a "integração de Recursos
Humanos ao Marketing".
Na expansão de vendas, através da "estruturação por
unidades estratégicas de negócios".
Portanto, a empresa estava adotando a Administração Estratégica,
que a conduziria depois ao modelo de Gestão Empreendedora.
9. A implantação do Planejamento Estratégico
A partir da reunião histórica da Gávea e da revisão da missão,
estratégias e objetivos da empresa, elaborou-:-se o Planejamento Estratégico
Competitivo para o período 1988-1990. Ao retornar do encontro, a direção
da empresa reuniu seus gerentes ·de todas as filiais para apresentar as
principais conclusões e definiu que cada área deveria trabalhar de forma
independente na formatação e implementação dos projetos, definindo
objetivos, estratégias e táticas que perseguissem as metas globais daquele
Planejamento. Assim, estava em curso a implementação de um estilo
empreendedor de gestão, baseado na flexibilidade organizacional e na
autonomia operacional das unidades de negócio.
Um fator estratégico para a mudança do modelo de gestão foi a
aplicação de novas práticas gerenciais, centradas no Marketing de
Relacionamento, cujo objetivo é integrar as pessoas (Recursos Humanos)
com a visão da clientela (Marketing); portanto, trata-se de integrar as
práticas de gestão de RH com as estratégias e ações de Marketing da
empresa.
Segundo Eugênio Mattar, então Diretor de Recursos Humanos,
Administração e Finanças, a ação integrada entre o Marketing e Recursos
Humanos levou a empresa a uma valorização de seu público interno,
192
fazendo-o engajar-se de maneira consciente nos novos propósitos. Com
isso, a colocação do homem certo no lugar certo tornou-se possível, bem
como o desencadeamento de um grande trabalho de treinamento em todos
os níveis, visando um aprimoramento da comunicação interna e, finalmente,
a delegação de poderes para as pontas.
A LOCALIZA passou, então, da decisão centralizada para a decisão
em todos os níveis, com reflexos diretos nos seus consumidores.
Tal decisão possibilita à LOCALIZA virar "de cabeça para baixo" sua
estrutura organizacional e seu processo decisório. Duas histórias que
ocorrem logo a seguir registram o resultado desta decisão:
Cena 1: 1990- Toca o telefone no Setor de Atendimento ao Cliente na
agência da LOCALIZA em Maceió:
- Por favor, alguém pode me ajudar? Acabo de alugar uma Kombi aí
e por duas vezes, no meio do caminho, tive que parar para fechar o porta
malas; agora abro o carro e vejo que a mala sumiu.
- O senhor pode nos dar seu nome e informar o valor da mala e do
seu conteúdo para podermos providenciar o ressarcimento?
Cena 11: 1991 - Após três dias de viagem, o jovem entra na agência
da LOCALIZA na Avenida Paulista, em São Paulo, e entrega a chave à
operadora. A pedido desta, informa-lhe surpreso a quantidade de
quilômetros rodados e o nível do combustível. Senta-se à espera que seja
feita a conferência. A moça não sai do lugar. Faz os cálculos e devolve o
cartão de crédito ao cliente, agradecendo sua preferência. O jovem
permanece em frente à operadora por alguns segundos sem entender nada.
E se estivesse mentindo?
Saiu da agência com uma certeza: por algum motivo desconhecido, o
terminal de computador indicava que ele era um cliente preferencial.
Chegou a imaginar a anotação: cliente confiável.
Dias depois, ao relatar o fato ·a um amigo descobre que ele recebera
o mesmo tratamento. Permanece inconformado. Tempos depois, ao retornar
à agência não resiste a perguntar à mesma operadora:
193
- Você não confere a quilometragem e o gasto de combustível
quando os clientes devolvem o carro?
- Não é necessário.
- Vocês não temem ser enganados? Insiste.
- Por princípio nós confiamos nas informações de nossos clientes.
Estes dois momentos ilustram de forma contundente as
transformações ocorridas na empresa. "Representam, segundo Fernando
Campos, a exemplificação da revolução do óbvio, que a LOCALIZA teve
coragem de fazer em 88 ao encarar suas próprias contradições e as reais
expectativas do mercado. A nova postura restabeleceu algo precioso no
segmento de prestação de serviços: a confiança no cliente e o
comportamento mútuo. Tudo isso graças a um projeto que integrou as ações
de Marketing e Recursos Humanos e que alteraram definitivamente as
relações entre a empresa/equipe e a empresa/cliente.
Para conseguir que histórias como as duas acima relatadas se
tornassem rotineiras na empresa, o público interno passou a ser treinado
para ter um relacionamento com o 'êliémte no mais alto nível de respeito e
confiança. A palavra de ordem era ser positivo, transparente, acreditar,
confiar e transformar o cliente em aliado da empresa. A palavra "não" foi
completamente eliminada do dicionário da LOCALIZA, dentro desta nova
postura, criando reflexos extremamente positivos e resultando em mudança
de comportamento do próprio cliente.
"Quando você encanta o cliente ele se torna seu aliado", afirma
convicto o Diretor de Marketing, Fernando Campos. O Marketing do
Relacionamento, além de ser o meio seguro de estabelecer este
encantamento, é também, a forma de estabelecer um relacionamento de
longo prazo, que a LOCALIZA está aplicando com sucesso. (Vale ressaltar
que este projeto mexe com a cultura da empresa, por isso é de longo prazo).
O Marketing de Relacionamento, iniciativa pioneira da LOCALIZA no
mercado de locação de veículos, estabeleceu para o público interno o mesmo clima de confiança e respeito para com o cliente, "A moça que está
no balcão é quem sabe o que é melhor para o cliente", assevera Campos.
194
Mas ela só pode decidir se tiver confiança em si e certeza de que sua
decisão será acatada pela empresa. Para que suas equipes adquiram esta
independência, um trabalho de treinamento está sendo realizado até hoje.
Trata-se de mudar completamente a postura até então adotada, tornando as
pessoas mais positivas diante do cliente.
1 O. "Em busca da Excelência"
Em 1990, elaborou-se a primeira revisão do Planejamento Estr-atégico
Competitivo: segundo Engênio Mattar, concluiu-se que a conquista dos
objetivos traçados só seria possível através do total comprometimento de
seus funcionários com os resultados da empresa.
Decide-se então lançar o programa "Em busca da Excelência", cujo
objetivo é conscientizar os funcionários da LOCALIZA para que cada um,
desde o lavador de carros até o gerente, saibam da importância do seu
trabalho no conjunto da organização e compreendam que o cliente satisfeito
é o maior patrimônio de uma empresa de serviços.
Este programa estabeleceu as bases do "Plano Estratégico 1990-
1994" e, ao mesmo tempo, redefiniu o negócio, a missão, os objetivos e os
princípios que norteariam os rumos da empresa nos próximos anos. A
seguir, são transcritas estas definições, que inclusive orientarão a
consolidação de um novo modelo de gestão.
NEGÓCIO da Empresa: Soluções em Transportes.
MISSÃO da Empresa: Oferecer soluções em transportes através de
aluguel de carros, buscando a excelência.
OBJETIVOS
• Aumentar a receita no mínimo em 20% ao ano.
• Ampliar a liderança no mercado de aluguel de carros .
• Ter o melhor e_ mais motivado quadro de pessoal e a mais
dinâmica equipe de vendas e operações.
195
• Obter rentabilidade anual mínima de 15% sobre o patrimônio
líquido e lucro líquido mínimo de 1 O% da receita.
PRINCÍPIOS
• Expectativas dos clientes orientam nossas ações.
Todo trabalho visa a satisfação dos clientes, internos e externos.
Esses clientes são o foco central na definição das ações.
• Busca constante da eficácia.
A produtividade é garantida através da eficácia e racionalidade na
execução dos trabalhos, procurando fazer certo da primeira vez, com
ausência de erros.
Toda ação é importante e deve ser executada com competência,
atenção e pontualidade.
• Estilo gerencial empreendedor, inovador e participativo.
Agilidade, inovação, criatividade., flexibilidade, iniciativa, comunicação
clara, comprometimento e participação são qualidades estimuladas na
Empresa.
A exploração competente e eficaz de oportunidades geradas no
mercado deve ser uma constante.
• Valorização do indivíduo.
O indivíduo e a principal força de desenvolvimento nas organizações.
A segurança, o estímulo ao crescimento pessoal, com promoção de
oportunidades de treinamento, reconhecim~nto e incentivo de talentos, são
formas de respeito às pessoas como indivíduos e como profissionais.
• Zelo pela imagem da Empresa.
O respeito aos padrões de comportamento, apresentação e
organização, bem como a conservação das instalações e do patrimônio com
196
a efetiva atuação de todos, garantem a promoção constante da imagem da
Empresa.
• Ética nos relacionamentos.
A postura ética no relacionamento com clientes, funcionários,
parceiros e sociedade determinam o comportamento da Empresa.
Observe-se o terceiro princípio anunciado apresenta o estilo de
gestão desejado pela empresa: "empreendedor, inovador e participativo".
Esta postura, junto com as demais, levaria a uma política estratégica de
Recursos Humanos vinculada à visão mercadológica da empresa: nascia o
Endomarketing.
11. O Plano Estratégico de Recursos Humanos
Segundo Eugênio Mattar, a atenção às definições do novo
Planejamento Estratégico levou a empresa a repensar suas políticas de
Recursos Humanos. Assim, caberia ao RH ser a ponte de comunicação e
orientação entre os propósitos da empresa da direção e do corpo funcional.
A intenção foi a de transformar cada funcionário num "homem de
marketing".
Foi elaborado então o Plano Estratégico de Recursos Humanos,
sintetizado a seguir:
MISSÃO
Prover a empresa de pessoas adequadas, mantendo-as motivadas e
com desempenho superior.
PRINCÍPIOS
• Manter estreito relacionamento com os funcionários.
197
• Agir com transparência, justiça e democracia.
• Manter confidencialidade das informações pessoais.
• Ter a confiança mútua como uma constante no relacionamento.
• Estar comprometido com a educação e o bem estar dos
funcionários.
• Zelar pelo desempenho superior.
OBJETIVOS E ESTRATÉGIAS
Objetivo 1: Ter funcionários satisfeitos e comprometidos
Estratégias:
• Estimular a participação no desenvolvimento da empresa;
• Buscar maior interação com todas as unidades.
• Apoiar a melhoria do desem.penho dos funcionários.
• Apoiar a formação de cultura de vendas e atendimento.
• Evoluir políticas de remuneração e educação.
• Promover mudanças de comportamento organizacional via
educação e comunicação interna.
Objetivo 2: Posicionar-se internamente e externamente como uma
empresa com Recursos Humanos e pessoas diferenciadas.
Estratégia:
• Aprimorar o relacionamento dom o público interno e externo.
• Diferenciar-se positivament.e no mercado de RH.
• Dar visibilidade aos funcionários de sua crescente valorização
profissional na LOCALIZA.
198
Ao iniciar a implementação do novo Planejamento Estratégico, no
início de 1990, a empresa, assim como todo o país, sofre um "choque": as
medidas econômicas tomadas pelo Governo Collor. O confisco monetário,
associado a outras decisões, provocou a paralisia da economia. Os reflexos
sobre a LOCALIZA são brutais. Passa a enfrentar crise de capital de giro
pela falta de cruzeiros e tem dificuldade para obtenção de empréstimos. O
consumidor de locação de carros desaparece, determinando a queda do
preço do aluguel diário de carros e retração no movimento de aluguel
mensal. Muitos clientes ficam inadimplentes. Impossibilitada de adquirir
carros novos, a empresa vê ainda a venda dos- carros usados estancar.
Integrantes da diretoria e gerência são desviados de suas funções
para acompanhar as novas medidas. A implementação do planejamento
estratégico fica comprometida.
Pela primeira vez em sua história, a LOCALIZA estava enfrentando
uma retração vertiginosa dos negócios e com a perspectiva de ver seu
resultado anual ser negativo.
Diante de números como a queda de 60 para 2 locações/dia em uma
das agências de melhor desempenho., surge a necessidade de um Plano
Emergencial que provoque a união de todos os profissionais da LOCALIZA
na luta pela recuperação do volume de negócios.
Em apenas 48 horas, a LOCALIZA elaborou o Plano Emergencial (em
anexo) para enfrentar aquele momento, introduziram um programa de
premiação, baseado em salário variável de acordo com as vendas, e a
participação nos lucros. Levaram ao ar uma campanha nacional de TV. Os
funcionários foram avisados que os preços dé locação estavam reduzidos e
o mercado estava informado. Foram orientados também sobre a flexibilidade
nas negociações, recebendo maior poder e autonomia para decisões face a
face com o cliente. Portanto, se recuperassem o volume de vendas, todos
seriam recompensados.
A LOCALIZA aproveitou novamente a ameaça de crise para progredir
e, neste momento, o crescimento envolveu também a melhoria das relações
internas. Ao enfrentar a crise com uma mudança planejada e orientada, a
empresa conseguiu superar o momento crítico, recuperando o volume de
199
vendas em apenas 3 meses, contando fundamentalmente com a
colaboração dos seus funcionários.
A participação ativa dos profissionais, especialmente pela maneira
como entenderam o significado daquele período, convenceu a direção da
LOCALIZA de que a primeira estratégia a ser previamente traçada era
implantar o Planejamento de Recursos Humanos e o fez 15 dias após a
deflagração da crise de março de 1990.
Plano Emergencial - 1990
OBJETIVOS
Recuperar o nível de vendas de imediato
ESTRATÉGIAS E TÁTICAS
• Envolver os funcionários
Convocação de todos os funcionários.
Garantia de estabilização do nível de empregos.
Remuneração variável (premiação).
Delegação de poder para as pontas
Participação nos lucros
• Estabelecer preços competitivos
Redução de despesas.
Suspensão dos investimentos.
Redução dos preços de venda.
• Divulgação para o grande público
Campanha de propaganda na mídia impressa e eletrônica,
Display no balcão das agências.
200
Emissão de 245.000 malas diretas.
Porém antes de implantar aquele Plano, era necessário avaliar os
principais problemas enfrentados na área de Recursos Humanos. Foram
identificadas as seguintes situações:
• O crescimento desordenado da empresa no período de 1984 e
1988 provocou o inchaço da estrutura. Com 1400 funcionários, era
preciso reconhecer e administrar a necessidade de enxugamento,
bem como a falta de adaptação de alguns funcionários ao novo
modelo empresarial.
• A . área de RH da LOCALIZA atuava, até então, de forma
centralizada, decidindo de cima para baixo as estratégias de
recursos humanos. Era necessário encontrar uma nova linha de
atuação, que se adaptasse ao contexto proposto para a empresa,
a partir daquele momento.
• Os salários não estavam competitivos em relação ao mercado. A
LOCALIZA precisava encontrar meios para corrigir as injustiças
salariais e restabelecer a c.ampetitividade da remuneração.
• Os funcionários precisariam estar envolvidos com a mudança. E
isto exigia a definição dos caminhos para conquistar a confiança
de todos no sucesso da proposta.
. • A comunicação estava centralizada, precisando ser revista em
todos os seus conceitos operacionais, fornecendo a todos os
funcionários as informações gerenciais, necessárias para a
realização dos programas de mudança de postura gerencial.
• A LOCALIZA tinha também a noção exata dos riscos da
transferência de autoridade para as pontas. Dar condições para
que os funcionários tivessem segurança e confiança suficientes
para evitar o erro, era um grande desafio a ser enfrentado.
• Enfim, a estrutura da empresa precisava ser modernizada, assim
como os relacionamentos. Era preciso achatar a pirâmide de uma
vez por todas.
201
Portanto, o quadro de problemas mais uma vez indicava a
necessidade de rever o modelo de gestão.
12. A "Hora da Verdade"
Para entender este momento da história da LOCALIZA, é preciso
conhecer o livro "A Hora da Verdade", de Jan Carlzon (1990). Este livro
passou a ser uma espécie de "bíblia" para a LOCALIZA, de leitura
obrigatória de seus funcionários, pois tem orientado a empresa a ser uma
organização modelo em serviços no que diz respeito às suas práticas de
gestão de Recursos Humanos.
Como a companhia sueca de aviação SAS, dirigida por Carlzon, a
LOCALIZA também definiu como seu foco de negócio a satisfação plena do
cliente.
E a solução de Carlzon para qualquer problema ou reclamação feita
por um cliente é eliminar as barreiras horizontais de comunicação, definindo
um novo papel para os gerentes d.~ nível médio, então "contratados para
fazer com que as instruções sejam seguidas", e transformá-los de
administradores em líderes e auxiliares do pessoal; da linha de frente que
tem contato direto com o cliente.
Afinal, o primeiro encontro de quinze segundos entre um cliente e o
pessoal da linha de frente, determina a impressão sobre toda a companhia
na mente deste cliente. É a situação que Carlzon chama de "A Hora da
Verdade".
Durante uma crise ele percebeu que os serviços e o pessoal de ponta
eram as duas alavancas do sucesso.
Transferiu autonomia e encorajou as pessoas a não aceitarem um
"não" como resposta. Além de fortalecer seu pessoal, apostou no
desenvolvimento do espírito de liderança de cada funcionário. E valorizou
muito mais a intuição, emoção e criatividade.
202
As novas ferramentas dos líderes são uma visão clara e concisa do
negócio e a perfeita habilidade para se comunicar, estimulando a equipe a
se envolver, com alma, no novo projeto.
Ele acredita também que as pessoas somente brilham quando as
exigências são muito altas. Um componente básico são as avaliações
rigorosas e honestas. Os objetivos firmes e visíveis, dirigidos para o
atendimento ao cliente e calculados para criar a competição entre as
unidades, aceleram a marcha do processo.
A segurança para agir com autonomia e exercer a autoridade é
garantida por uma administração que impede demissões sumárias; a
motivação vem do aumento da responsabilidade e do sistema de
recompensa transparente; a auto-confiança nas decisões está alicerçada no
treinamento constante, o _estímulo para assumir responsabilidades vem da
certeza de que o projeto pessoal será atingido em conjunto com as metas da
empresa.
-13. Retomando "Em Busca da Excelência"
Com a recuperação dos negócios ainda em 1990, graças ao Plano
Emergencial, ficou evidente que a transferência da responsabilidade para as
pontas envolveu todos os funcionários na busca da solução da crise.
Superada esta fase, pretendia-se retomar o programa "Em Busca da
Excelência", como uma nova proposta de gestão empresarial.
O programa foi adotado como estratégia empresarial para colocar
toda a empresa no caminho da melhoria permanente da sua qualidade. Os
conceitos mensuráveis e subjetivos da Excelência são considerados
compatíveis com o passado da empresa e imprescindíveis para encaminhar
a formação de uma nova cultura.
A Excelência é_ viável quando a cultura da empresa já possui
arraigados no cotidiano dos funcionários, valores como respeito, ética,
criatividade, disposição de ser melhor.
203
Durante 1991, Em Busca da Excelência foi o tema presente em todas
as campanhas e encontros da empresa. O comportamento que a LOCALIZA
queria transferir às pessoas foi disseminado mais claramente no ano
seguinte que teve como tema A Eficácia Operacional. Demonstrou-se
através de inúmeros recursos de comunicação e treinamento, a capacidade
de uma equipe chegar ao pódium e estar preparàda para superar seu
próprio desempenho.
Em 1993, ano da Visão Compartilhada, a abordagem mostrou a
importância de todos estarem conscientes do significado do caminho da
Excelência e dispostos a se envolver permanentemente com o programa.
O processo da Busca da Excelência está ligado à consolidação de
valores da empresa, difundidos pelo Livro Verde de Valores Localiza e na
série de livretos Edições em Busca de Excelência.
Para a LOCALIZA obter esta postura dos seus funcionários, é
necessário que a diretoria demonstre confiança em seus profissionais. A
responsabilidade por idéias, decisões e ações deve vir, principalmente, de
quem está, dia-a-dia, na Hora da Verdade com os clientes.
14. A Reengenharia na "Busca da Excelência"
Em 1991, com 1400 funcionários, a diretoria da LOCALIZA entendeu
ter chegado um dos momentos mais difíceis na execução do plano de
mudanças: achatar a pirâmide. Após os primeiros meses de
desencadeamento do processo da Busca da Excelência e transferência de
responsabilidade para as pontas, constatou-se a necessidade da empresa
se adaptar ainda mais à nova realidade com a implantação das mudanças
de cultural gerencial.
Ao estabelecer a orientação do foco para o cliente, foi necessário
eliminar os níveis hierárquicos de responsabilidade para ter agilidade de
responder rapidamente ao mercado.
A gerência média deveria desempenhar funções de apoio ao pessoal
de frente, ao invés de ficar presa, exclusivamente, a questões
204
administrativas. Deste novo gerente e equipe seria cobrados resultados
sobre as metas estabelecidas. Coube à gerência oferecer as condições e
meios para que sua equipe atingisse os objetivos pré-estabelecidos.
A primeira readaptação envolveu a redução do quadro de
funcionários em 400 pessoas. Através de um programa de demissão, eles
tiveram indenizações extras, receberam apoio profissional para recolocação,
assistência médica prolongada e outros benefícios. Em grande parte, esta
medida deveu-se à terceirização de várias atividades, como manutenção da
frota, informática, xerox e outras.
Esta medida foi um choque para a direção da empresa - nunca
haviam passado por este problema. Os funcionários que permaneceram,
compreenderam a decisão da empresa. Em menos de 30 dias, todos os
demitidos estavam em novos empregos. O mercado valorizava os
funcionários da LOCALIZA. Os novos parceiros absorveram parte destes
funcionários demitidos.
No ano seguinte, a Reengenharia atuou para a reestruturação da
empresa e a área de Relações Humanas buscou a adequação das pessoas
a cargos e funções. Esta reestruturação colocou a empresa num processo
de melhoria contínua ao adotar sistemas que permitiram as pessoas certas
trabalharem nos lugares certos.
A nova estrutura organizacional adotou o modelo matricial, conforme
ilustração em anexo do novo organograma. A empresa está estruturada em
três áreas de negócios: aluguel diário, aluguel de frota e venda de carros
semi-novos, todas como parte da Diretoria de Marketing.
As áreas matriciais fornecem apoio aos "centros de responsabilidade
de negócios".
Diretoria de
205
ESTRUTURA ORGANIZACIONAL
I Diretoria de RH,
Adm.e Finanças
CONSELHO
I PRESIDÊNCIA
(C.E.O.)
~1-----~ VICE PRESIDÊNCIA
SUPERINTENDÊNCIA (C.O.O.)
1 I I I
Diretoria de Diretoria de Diretoria de Sistemas
Operações Franchising e Informações
1-- Marketing e Vendas
1--
Aluguel Diário
Diretoria de
Marketing e Vendas
Aluguel de Frota
Diretoria de
Marketing e Vendas
Carros Seminovos
15. Preparando Novas Lideranças
O papel da direção da empresa no desencadeamento do processo de
mudança de gestão foi fundamental. Cada diretor da LOCALIZA precisou
transformar-se num líder genuíno e dar ao ambiente, condições propícias
para a implantação da nova cultura, onde os funcionários pudessem exercer
suas responsabilidades com confiança e habilidade. Assim, os diretores
foram os primeiros a serem treinados para estabelecer boa comunicação
206
com a equipe, compartilhar e envolvê-la nos projetos. E não puderam mais
tomar decisões de maneira isolada e autoritária.
Para atuar adequadamente em todas as áreas e satisfazer os
funcionários, o RH da LOCALIZA passou por uma forte reestruturação. De
um centro de custos passou a fonte de lucros. Descentralizou suas ações e,
com a política de transferência de responsabilidades para as pontas,
capacitou os gerentes regionais como responsáveis pela contratação das
pessoas. Desenvolveu o manual de orientação sobre como contratar o
profissional mais capacitado para a função, o manual de política salarial,
entre outros. Hoje o RH oferece todo o suporte para as filiais, atuando como
uma consultoria.
O RH está voltado para resultados. É de sua responsabilidade
direcionar as pessoas para alcançar os objetivos estabelecidos pela
empresa. Deve orientar os esforços, a liderança, o treinamento, o
comportamento e a cultura da empresa para que os funcionários realizem os
seus sonhos profissionais e pessoais.
Cabe ao RH propor a adoção de sistemas de remuneração por
resultados e programas de treinamento, cuja aprovação é feita por todos os
envolvidos. Este processo de compartilhar as decisões é aplicado também
aos critérios do sistema de avaliação de desempenho.
Quando um funcionário deixa a LOCALIZA, preenche um questionário
em que se procura colher todas as informações sobre os problemas que,
eventualmente, tenha vivenciado na empresa.
A ascensão interna é outro projeto da área. Nele, as vagas abertas
são oferecidas inicialmente ao público interno. As chefias não podem
antepor obstáculos. Se o candidato for qualificado à função, ele vai assumir.
Somente em caso de falta de solução interna é que a vaga é aberta ao
mercado.
A missão da área de RH deste momento em diante é de sustentar o
empenho da equipe para atingir as metas estabelecidas e atuar como um
orientador de todas as áreas, já que a autonomia conquistada pelos
gerentes transformou-os em profissionais capazes de administrar e motivar
207
sua própria equipe. Os gerentes são hoje profissionais de Relações
Humanas.
16. Implantando o Endomarketing
A partir da nova visão de Recursos Humanos na LOCALIZA, foi
possível implantar a filosofia do Endomarketing, ou seja, integrar as políticas
de Recursos Humanos com as políticas de Marketing; a prática do
Endomarketing foi operacionalizada através de três programas nas áreas de
Recompensa, Educação e Comunicação, os quais atuando de forma
integrada, procuram alcançar a eficácia empresarial através de um estilo
empreendedor, descentralizado e participativo de gestão.
Cada um destes programas será analisado a seguir:
16.1. Programa de Recompensa
A recompensa na LOCALIZA é a somatória ·de remuneração mais
reconhecimento, e através de salários competitivos, baseada em política
. salarial transparente e em ações de ·homenagem. A melhor performance
sempre será valorizada, inclusive com a criação de meios para avaliação
individual e de equipe, com a participação nos lucros da empresa,
campanhas de inventiva permanentes, programa de benefícios abrangente,
administração de salários com regras bem claras desde o processo de
admissão, critérios para progressão profissional até normas específicas
quanto a demissões de qualquer natureza.
Para conseguir isso, definiu-se claramente uma política de
remuneração salarial. Com a contratação da Hay do Brasil, desenvolveu-se
um programa para obter justiça interna de salários e competitividade com o
mercado. Em trabalho conjunto com uma comissão de funcionários,
encontrou-se uma fórmula profissional de administração de cargos e
salários. Transparente, a fórmula vem sendo aperfeiçoada a cada ano,
consistindo hoje na soma do salário base mais o ATS (Adicional por Tempo
de Serviço), o prêmio mensal, conforme o volume de vendas e resultados, e
a participação anual nos lucros e benefícios. Desde o office boy até o
208
presidente, o salário é variável em função do desempenho individual ou de
equipe, mensalmente.
A participação nos lucros não é social, ou seja, dividida igualmente
entre todos. Quem contribui mais para o resultado da empresa, tem um
melhor desempenho, recebe um percentual maior.
À remuneração participativa, a LOCALIZA acoplou um sistema de
recompensa através de diversos tipos de homenagens, como aos que
completam qüinqüênios na empresa. Patrocina festas para os
aniversariantes do mês. Uma das homenagens é o Este Elogio é pra Você,
aplicado toda vez que um cliente elogia um funcionário. Este recebe um
certificado, carta do diretor superintendente e o cliente externo também
recebe uma correspondência do Presidente agradecendo a atenção.
Em 1992, a LOCALIZA adotou, dos cargos de assistente para 'cima,
um Contrato de Gestão Individual para cada funcionário. Ao formalizar os
objetivos, conseguiu-se um nível de comprometimento tangível.
O Programa de Recompensa se compõe dos seguintes
subprogramas:
a) Política de salários e benefícios
Tem por objetivo compatibilizar salários e benefícios em função das
necessidades da empresa, de satisfação e motivação dos funcionários e
também da competitividade no mercado de trabalho.
O salário na LOCALIZA é composto pelo salário-base, ATS (Adicional
por Tempo de Serviço), prêmio mensal por atingimento de metas e
participação nos lucros. A atualização do valor-base é feita de acordo com
pesquisas realizadas entre as grandes empresas do mercado para garantir
que seja um valor competitivo. O ATS é uma gratificação que corresponde a
1% do salário-base a cada ano de serviço até o limite de 1 0% O prêmio é
uma parcela mensal variável recebida por funcionário, de acordo com seu
desempenho individual ou da equipe atingindo até 70% do salário-base.
Além disso, há os aumentos por mérito, anuais, incorporados aos salários
nos percentuais de 3,5%, 7,12% com o máximo de 14,75%.
. 209
Entre os benefícios destacam-se Vale Restaurante, Vale
Supermercado, Seguro de Vida, Plano de Saúde, Reembolso do Material
Escolar, Auxílio Creche, Auxílio Educação, etc.
São fornecidos uniformes aos funcionários de ponta que têm contato
direto com os clientes. Os funcionários com filhos recém-nascidos têm
direito também ao Kit Natalidade composto por mais de 14 produtos
básicos.
b) Campanhas de superação de metas
Objetivam a motivação dos funcionários no aumento da
produtividade, demonstrando que podem superar as metas previstas no
contrato de gestão.
c) Recrutamento e seleção
Desde 1991, o recrutamento e seleção de pessoal utiliza diversos
recursos para a identificação de profissionais que se adequam ao perfil
pretendido para o cargo e à cultura da empresa. Um dos recursos aplicados
é a grafologia, que permite avaliar o estado emocional e a capacidade de
desenvolvimento do candidato. OuUO recurso é a utilização da dinâmica de
grupo.
Outro ponto importante é a comparação das expectativas
profissionais do candidato em relação ao que a empresa pode lhe oferecer.
As normas da LOCALIZA nesta área dão prioridade aos profissionais
internos para o preenchimento das vagas abertas. Somente após
constatada a impossibilidade de uma solução interna, é que se vai ao
mercado para suprir a vaga em aberto.
d) Contrato de gestão
Adotado desde 1992, é o contrato pelo qual todos os níveis da
empresa formalizam seu compromisso quanto a metas operacionais de
vendas, ou comportamentais, e resultados da empresa. o contrato é
assinado por ocupantes de cargos de assistente para cima e é definido por
dois pontos básicos: objetivos da sua área e ações a serem tomadas.
210
Sua aplicação permitiu a cada funcionário discutir o que pretende
realizar para a empresa. Na elaboração do contrato são discutidos metas e
objetivos para o próximo ano de trabalho. As metas são divididas ao longo
de doze meses e são permanentemente acompanhadas pelos profissionais.
A sua aplicação contribui para a difusão de uma cultura de resultados e
vendas, de redução de custos, e da satisfação dos funcionários.
e) Avaliação de desempenho
Os funcionários são avaliados individualmente. quanto à sua
performance. No nível gerencial é analisado também o alcançado pela
equipe. Os componentes da avaliação têm 70% do peso ligado ao contrato
de gestão, observando-se o que era esperado e o que se conquistou. Para
os demais 30% da avaliação, observam os valores comportamentais
relativos ao estilo gerencial pretendido pela empresa.
A avaliação é discutida abertamente entre funcionário e chefia. Ao
discutir pontos qualitativos e quantitativos, o responsável pela avaliação
apresenta um resultado objetivo, conforme classificação pré-determinada.
j) Horário flexível
Nas funções que o permitem, os funcionários têm flexibilidade de 45
minutos no horário de trabalho. Não há cartão de ponto e são os próprios
colegas que controlam eventuais desvios.
g) Plano de homenagens
Mensalmente, a LOCALIZA homenageia os aniversariantes da
empresa, na matriz e em cada filial. Os funcionários realizam a
comemoração da maneira que acharem mais conveniente. Todos os anos
no aniversário da empresa, são homenageados os funcionários que
completam 5, 1 O ou mais anos de companhia.
h) Programa de demissões especial
Dependendo do tempo de casa, o funcionário não é demitido pelo
gerente, mas colocado à disposição da RH. Se o funcionário tem mais de 5
anos de empresa sua demissão só pÓde ser assinada pelo diretor
Superintendente. Se tem mais de 1 O anos de companhia, somente pelo
211
Presidente. O RH avalia todas as possibilidades para ele encontrar nova
ocupação na empresa. Se a saída é irreversível, a LOCALIZA auxilia no
encontro do novo emprego com apoio de especialistas. Ao deixar a
empresa, o ex-funcionário preenche um questionário de avaliação.
i) Este elogio é pra você
Se um funcionário de atendimento recebe um elogio de um cliente,
este receberá uma carta do Diretor Superintendente. E o Diretor Presidente
da companhia envia uma carta também para o cliente agradecendo o
estímulo.
16.2. Programa de Educação
Consciente de que se trata de uma responsabilidade da empresa, a
LOCALIZA investe na educação de seus funcionários, recorrendo a meios
que valorizam o indivíduo, comprometendo-os com os seus princípios. O
aproveitamento das pessoas nos lugares certos é prioridade no RH da
LOCALIZA.
O público interno passou a ser treinado para ter um relacionamento
de alto nível com o cliente, assumir responsabilidades e tomar decisões no
momento deste encontro. Cada colaborador deve trabalhar para a
LOCALIZA ser, sempre, a melhor e a maior locadora de veículos do país.
As campanhas "Seja Positivo", "Diga Sim ao Cliente", "Faça Mais
pelo Cliente" e "Vender deve ser um Espetáculo", influenciaram
positivamente as relações internas da empresa e o atendimento do cliente
externo.
O treinamento básico para todos os funcionários foi o Emoções, que
teve como intuito criar o espírito de equipe na empresa. Focado para a
Busca da Excelência, este treinamento visava mexer com a emoção das
pessoas, estimulando-as a serem naturalmente positivas no trabalho.
A Hora da Verdade veio na seqüência. Do office-boy ao presidente,
todos participaram deste treinamento levado para todos os escritórios da
rede no País. É a partir deste ponto que a empresa começa a levantar e
212
resolver necessidades dos funcionários. O atendimento das reivindicações
foi encaminhado para se conseguir um ambiente de trabalho cada vez
melhor.
O estímulo à leitura é permanente com a montagem da biblioteca
LOCALIZA com mais de 500 títulos à disposição de todos os funcionários.
Na área de Educação, os principais eventos envolvem a consolidação
da cultura, orientação geral, integração e motivação do público interno.
O Programa de Educação se compõe dos seguintes subprogramas:
a) Livro verde de valores Localiza
É o código de ética da LOCALIZA que orienta o dia-a-dia de todas as
ações da equipe. O livro contém a sua história, missão, negócio e princípios
que a norteiam. Sua leitura é um dos meios para que se compreenda,
assimile e se atue de acordo com os valores da empresa.
b) Face a face com o cliente
No mês de aniversário da LOCALIZA, os executivos (incluindo o
Presidente) entram em contato direto com o público, atendendo nos balcões
das agências por um ou dois dias. Isso permite uma atualização sobre o
setor de atuação da empresa, verificação sobre a prática dos valores e
princípios da LOCALIZA, uma maior compreensão das necessidades do
mercado através de informações dos clientes e também saber o que o
público pensa dos serviços da empresa.
c) Interação com consultorias
A LOCALIZA busca constantemente o apoio de consultorias externas
especializadas e de altíssimo nível para assessorá-la. A Booz, Aliem &
Hamilton colaborou com o programa de reengenharia, a Arthur Andersen na
melhoria dos processos, e a Hay do Brasil nos trabalhos para identificação
da percepção de lideranças, contrato de gestão, etc.
213
d) Campanhas motivacionais
Apoiadas por material promocional (impressos e vídeos), as
campanhas motivacionais objetivam alinhar as atitudes dos funcionários às
da empresa. Assim, em 1994 houve a campanha "Seja Positivo", visando
incentivar os funcionários a assumirem posturas positivas, mesmo diante de
adversidades; no mesmo ano· também foi implantada a "Faça Mais Pelo
Cliente", estimulando atender e superar as expectativas dos clientes. Em
1993, "Diga Sim" visava criar o hábito do "sim", evitando a utilização do
"não" na empresa.
e) Banco de idéias
O Banco de Idéias funciona como um canal permanentemente aberto
para o público interno, ouvindo suas sugestões e freqüentemente adotando
as, tornando-o assim mais participativo no desenvolvimento da empresa.
f) Livro "A Hora da Verdade"
Escrito por Jan Carlzon, é leitura obrigatória de todos os funcionários
que respondem a uma avaliação sobre o livro. A função desta ação é
reforçar o programa Em Busca tfa · Excelência através dos exemplos
utilizados pelo autor que podem e devem. ser utilizados no dia-a-dia da
LOCALIZA
g) Ciclo de Debates
Estar em sintonia com o que acontece no mercado em geral e,
principalmente, em sua área específica de atuação, é fundamental para o
crescimento e desenvolvimento profissional dos dirigentes de qualquer
empresa. As palestras, em que os executivos debatem estes assuntos, são
filmadas e exibidas a todos os funcionários das filiais.
h) Capacitação, Treinamento e Desenvolvimento
Na LOCALIZA os treinamentos não são sistematizados. As áreas
identificam as necessidades, decidem sobre elas e solicitam o apoio da área
de RH que funciona como uma consultora, propondo a solução e o
treinamento adequado àquele momento.
214
i) Kits de Orientação
O RH necessita de agilidade para oferecer seus serviços de
consultoria. Um dos recursos para conquistar a maior eficiência e eficácia
neste projeto foi criar kits de orientação e treinamento aos funcionários para
que todos tenham informações seguras sobre como lidar com temas como:
Excelência ao Conduzir o Carro, Excelência nas Entrevistas, Programa de
Integração dos Novos Funcionários, Capacidade de Negociar.
j) Convenções e Encontros
Objetivam a consolidação da cultura LOCALIZA e a integração e
motivação constantes. Bienal, a Convenção Nacional completou sua sétima
edição em 1992. Em março de 1994 aconteceu a primeira Convenção
Internacional com a participação de 366 pessoas, dos quais 216
franqueados do Brasil e Exterior.
Nesses eventos foram apresentados os planos da LOCALIZA para os
dois anos seguintes. Os presidentes das montadoras Fiat e Autolatina
destacaram-se entre os palestrantes convidados.
Os temas anuais da empresa são alcançados e reforçados ao longo
destes encontros. Toda a decoração das instalações é baseada no tema,
como por exemplo, em 1992, quando tema foi Eficácia Operacional,
apoiando-se no desempenho das equipes de Fórmula 1 .
. 16. 3. Programa de Comunicação
A Comunicação Interna foi a arma para transmitir novos ideais e
convencer a todos, que podiam e deviam assumir a responsabilidade de
alcançar a Excelência.
Para a LOCALIZA, llquem não recebe informação não pode assumir
responsabilidades, mas quem a recebe não pode deixar de assumi-las". O
desenvolvimento do sistema de comunicação interna com os funcionários é
215
efetivo, passando a levar informações relativas à empresa e ao mercado
para todos os funcionários.
Por meio de boletins, informativos emitidos por área, jornais de
agregação comunitária, manuais (reestruturados anualmente) e boletins de
RH, a área de comunicação da LOCALIZA trabalha para que nenhum
funcionário saiba qualquer assunto referente à empresa por intermédio de
terceiros.
Os fatos mais importantes do mercado de locação de carros também
são passados regularmente para todos os funcionários através dos veículos
de comunicação interna.
Assim, todos sabem o que está acontecendo na empresa e no
mercado. O funcionário se sente preparado e valorizado para se situar no
contexto e tomar decisões.
O Sistema de Informações de Marketing, Operações e Finanças, foi
todo readequado para descentralizar o nível de conhecimento necessário à eficaz tomada de decisão e estimular a ação descentralizada.
O estímulo à participação também foi realizado pela Comunicação
Interna com a criação do Banco de Idéias, aberto a funcionários e clientes.
Tendo como princípio responder a toda e qualquer sugestão, o sistema
começou a funcionar em 1992.
O Programa de Comunicação se compõe dos seguintes
subprogramas:
a) Privilege News
Publicação distribuída aos clientes internos e externos, que tem como
objetivo informar sobre fatos e notícias da. LOCALIZA, em relação à sua
atuação no mercado nacional e internacional. A tiragem é de 110.000
exemplares.
b) BIS- Boletim de Integração do Sistema
O BIS foi a primeira publicação interna da LOCALIZA. Foi lançado em
1984 e tem como objetivo informar o público interno sobre as atividades da
216
empresa. O BIS é praticamente uma leitura obrigatória e natural de todos os
funcionários LOCALIZA.
c) Ver de Fato
Edição destinada a manter o relacionamento com o funcionário e sua
família, mantendo-os integrados aos objetivos da empresa. Traz
informações sobre variedades. É publicado em português e castelhano, com
tiragem de 2.000 exemplares que são enviados para a residência dos
funcionários.
d) Clipping
Periodicamente, as notícias publicadas na imprensa sobre o setor de
locação de carros e a própria LOCALIZA, são agrupadas e circulam pela
. empresa. É um meio de manter os funcionários atualizados sobre o mercado
e a concorrência.
e) Informativos das Áreas
Específicos, os informativos não têm uma periodicidade definida, mas
são editados em função da necessidade imediata de uma divisão divulgar
acontecimentos para a equipe.
A LOCALIZA, desde 1991, edita os informativos: RH, Atendimento,
Franchising, Aluguel Diário, Aluguel de Frota, Carros Seminovos,
Manutenção e Financeiro. São leitura obrigatória.
f) Manuais de Orientação
Os Manuais são criados para documentar os critérios e políticas de
RH e orientar as chefias sobre Recrutamento e Seleção de Pessoal,
Benefícios e Política Salarial. São distribuídos para o público interno.
g) Temas Anuais
A LOCALIZA anualmente adota temas para disseminar por toda a
companhia o conceito predominante na corporação. Os temas anuais
adotados em 1991, 1992 e 1993 foram "Em Busca da Excelência", "Eficácia
Operacional" e "Visão Compartilhada", respectivamente. Um instrumento
217
para consolidação dos conceitos adotados são os vídeos motivacionais
exibidos em convenções, encontros e visitas da diretoria às filiais. A
visualização dos conceitos buscados, geralmente através de analogias,
torna sua compreensão e absorção mais eficazes.
h) Atenda com "SIM"
Este subprograma é uma campanha interna, lançada no final de
1993, visando a melhorar a comunicação externa e interna da empresa.
Baseia-se · em dois aspectos da comunicação: Simpatia e Interesses
Máximos- "SIM". Para divulgá-la internamente, foram utilizados estandarts,
cartazes, bottons e selos adesivos. Ao mesmo tempo, foi editado o livro
"Máximos do Atendimento Localiza", segundo volume das "Edições em
Busca da Excelência", o qual procura sintetizar a cultura de atendimento da
empresa.
17. Programa de Qualidade
Em janeiro de 1995, foi implanto o Programa "Qualidade Total
Localiza - QTL", que pretende envolver todos os funcionários na nova
filosofia que, segundo Eugênio Mattar, pretende consolidar as práticas de
gestão orientadas para o cliente que a empresa sempre desenvolveu, porém
não de uma forma estruturada. Inicialmente, todos os funcionários estão
recebendo o livro "Iniciando Conceitos em Qualidade Total" como base
conceitual do Programa.
18. Os Resultados Alcançados
Dada a filosofia de Integração entre Recursos Humanos e Marketing
(Endomarketing) que orientam todos os esforços da empresa nos últimos
quatro anos e levou à prática de inovações gerenciais ao longo daquele
período, pode-se avaliar os resultados de todo o esforço de gestão, tendo
como base alguns indicadores nas ·duas áreas mais envolvidas (Recursos
Humanos e Marketing) e resultados globais.
218
De acordo com relatórios recentes da empresa, cedidos para a
elaboração deste estudo de caso, poderão ser avaliados os seguintes
indicadores:
18.1. Na área de Recursos Humanos
• Salários e Benefícios
A partir de 1991, a quantidade global de salários pagos pela
LOCALIZA tem aumentado. Neste ano, o pagamento de salários base mais
ATS (Adicional por Tempo de Serviço) totalizou US$6,7 milhões. No ano
seguinte, a quantidade paga somou US$7,7 milhões. e no ano passado
atingiu quase US$8 milhões. No período de 90 a 94 a massa salarial
dobrou, mesmo com o decréscimo do número de funcionários.
Aos salários agregam-se os benefícios oferecidos pela empresa, cujo
montante de investimentos esteve acima de US$ 1 milhão, fechando 1993
com US$1, 170 milhões.
• Remuneração Variável
Premiação mensal e participaçâo nos lucros
A premiação por resultados, instituída desde 1990, garantiu aos
funcionários recursos sempre superiores a US$500 mil. Entretanto, as
mudanças implementadas começaram a apresentar resultados mais
expressivos a partir de 1993, quando o volume de prêmios pagos foi de
aproximadamente US$ 635 mil. O alto desempenho dos profissionais
LOCALIZA nos primeiros quatro meses do ano fazem a empresa projetar um
pagamento de prêmios em 1994 no valor de US$ 1 ,2 milhão.
Quanto à participação nos lucros, a empresa cumpriu o acertado com
sua equipe, destinando US$224,8 mil do lucro de 1990, que foram pagos em
1991. No ano seguinte, 1992, a quantidade caiu para US$ 1200,2 mil face à
queda de faturamento ocorrida em 1991. O prejuízo de 1992 não impediu
que a direção da LOCALIZA adotasse, em 1993, uma medida ousada:
anteciparam o pagamento de parte dos lucros projetos, num total de US$
175,6 mil. Agora, em 1994, a empresa paga mais US$ 400 mil, referentes ao
219
lucro de 1993. Para 1994 projeta-se uma distribuição em 95 superior a US$
1,0 milhão.
• Rentabilidade por funcionário
A rentabilidade média por· funcionário é o índice que demonstra
claramente o acerto da LOCALIZA em alterar sua gestão empresarial. O
lucro líquido por funcionário atingiu em 1990 um grande resultado, US$8,9
mil/funcionário. A partir do ano seguinte, num quadro recessivo onde os
preços de locação caíram 40% reais e o patrimônio sofreu um baque de
20% pela redução do valor dos carros, a rentabilidade baixou para US$3,5
mil/funcionário e em 1992 foi negativo.
• Funcionários Satisfeitos
Os atuais 700 funcionários estão totalmente adaptados ao novo
modelo de gestão empresarial. A LOCALIZA pesquisa periodicamente o
clima organizacional comparando com o mercado e empreendendo ações
de melhoria e correção. Nesta área a LOCALIZA já é um "benchmark".
Diversas empresas a visitam todos os anos para conhecer seus métodos de
operação.
A LOCALIZA é a empresa que mais investe na formação de mão-de
obra para o setor de aluguel de carros, cumprindo seu papel de empresa
líder.
18.2. Na área de Marketing
• Número médio de locações por funcionário
O índice de produtividade locação/funcionário tem aumentado
constantemente.
Com base nos 5 primeiros meses do ano, para 1994 a LOCALIZA
projeta uma produtividade de 245,9 locações/funcionários em 1993 este
índice foi de 216,0 e em 1992 foi 194,7.
.,
220
• Número de carros (da frota) por funcionário
O aumento de frota elevou o índice de 7,9 em 1993 para 9,4 em
1994.
• Encantamento dos clientes
A carteira de clientes atingiu o número de 400 mil pessoas físicas e
jurídicas em 1994, sendo a LOCALIZA líder de mercado, percebida como
líder pelo público, como empresa de maior qualidade no setor, e com a
marca mais conhecida (Pesquisa independente realizada pelo DataFolha
em 1993)
18.3. Resultados Globais
• Crescimento da empresa ·
O sistema Localiza permanece líder no setor de aluguel de carros no
Brasil, detendo 25% do mercado. O Sistema conta com 301 agências, sendo
250 franqueadas no Brasil e América Latina. Diretamente, o Sistema
emprega 1,9 mil funcionários dos quais 700 pertencem a Localiza Rent a
Car, que estão comprometidos em obter, ao final de 1994, um resultado
20% superior ao faturamento do ano anterior, da ordem de 136 milhões,
com lucro líquido de 3,1 milhão. Todas as ações de Educação e
Comunicação são repassadas para todo o Sistema.
O atendimento de locações diárias e terceirização de frotas é
realizado com 10,5 mil carros e está desenvolvendo um programa de
renovação de seus automóveis para chegar no final de 1994 operando 13
mil veículos, correspondendo a crescimento de 20%. A LOCALIZA de
janeiro a junho de 1994, cresceu 30% em relação ao mesmo período no ano
de 1993. No período de 90 a 94, cresceu 160% em seu volume de negócios.
A empresa dobrou de tamanho nos últimos dois anos em volume de
negócios. O número de clientes foi para a casa de 400 mil. O número de
funcionários estacionou em 700. .,
221
• Processo de Gestão
A transferência de autoridade para as pontas já está concluída. A
prova de que deu certo está nos números do primeiro semestre de 1994,
projetando crescimento de 30% ao ano no volume de vendas e com
rentabilidade assegurada. Prova disso é a média da premiação mensal que
já ultrapassou 30% nos primeiros 5 meses do ano de 1994, atingindo um
índice de 36%.
• Consolidação de Valores
Os valores LOCALIZA estão disseminados pela empresa. As
expectativas dos clientes orientam as ações da organização. A valorização
dos indivíduos é um compromisso realizado todos os dias. A ética nos
relacionamentos está no cotidiano de cada funcionário.
O zelo pela imagem da empresa frutifica da consciência de que o
negócio da LOCALIZA é serviço, e não apenas aluguel de carros. O espírito
empreendedor e participativo vem da busca constante da eficácia de uma
equipe talentosa e motivada.
19. Análise do modelo de gestão
Ao longo do estudo de caso, observou-se nitidamente que a vocação
empreendedora da empresa, baseada na visão do seu líder e fundador,
Salim Mattar, propiciou crescimento contínuo para a LOCALIZA. As
dificuldades encontradas foram transformadas de ameaça em oportunidades
e os eventuais fracassos foram lições aprendidas.
Como principais práticas inovadas de gestão, a LOCALIZA vem
utilizando uma postura inovadora na aplicação de novas práticas de gestão;
assim, pode-se destacar suas principais ferramentas gerenciais
identificadas com os novos modelos de gestão:
222
a) Gestão Empreendedora
• Estrutura descentralizada e flexível, através de Unidades de
Negócio Autônomas (Centros de Responsabilidade de Negócios);
• estilo inovador dos dirigentes e gerentes;
• sistema de premiação dos funcionários por resultado individual;
• integração entre Recursos Humanos e Marketing (Endomarketing);
• postura de toda a organização orientada para o cliente (áreas
matriciais x áreas de negócios);
• parceria com outras empresas (manutenção de frota,
compartilhamento de desenvolvimento de software's e outros);
• a flexibilidade para mudança frente às crises ambientais.
b) Administração Participativa· ·
• Comprometimento dos funcionários com a missão da empresa;
• descentralização das decisões ao nível da unidade de negócio
("hora da verdade");
• integração intra e intergrupal.
c) Administração Holística
Segundo Eugênio Mattar, a empresa busca a visão holística, na
medida em que dirigentes e gerentes procuram ter uma visão de toda a
empresa e transmiti-la aos funcionários: o Endomarketing tem sido
importante para disseminar este tipo de visão.
O Programa de Qualidade, recém-implantado, de acordo com a
orientação que vier a receber nos próximos meses, poderá receber
223
influências da administração japonesa, sobretudo no que diz respeito à
participação dos funcionários em equipes de qualidade total, à busca de
consenso grupal e à parceria com outras empresas, principalmente
fornecedores, que também deverão aderir à filosofia da qualidade para
garantir a qualidade do processo.
No entanto, fica evidente que a LOCALIZA é uma empresa que
predominantemente aplica práticas gerenc1a1s da Administração
Empreendedora. Tal conclusão é referendada por seu líder, que não só
adota pessoalmente este estilo, como também incentiva outros dirigentes e
gerentes a serem empreendedores.
.. ESTUDO DE CASO 2: ,
METODO ENGENHARIA
225
ESTUDO DE CASO 2: MÉTODO ENGENHARIA
Uma das empresas mais destacadas no setor empresarial brasileiro,
tendo recebido o Prêmio de "Melhor Empresa do Ano" da Revista Exame,
em 1992, a Método Engenharia conseguiu obter sucesso empresarial numa
trajetória de pouco mais de 20 anos, atuando num segmento de mercado - a
construção civil- nitidamente conservador e reativo à mudança.
Assim, a empresa tem tomado medidas aparentemente ousadas, mas
que refletem o amadurecimento de um modelo de gestão baseado no
___ processo participativo, no qual dirigentes, gerentes e funcionários têm se 'c '' '~·:' .. ' ' •
comprometido com os resultados globais da empresa.
A elaboração deste estudo de caso foi baseado em entrevistas
pessoais com dirigentes da organização, Hugo Marques da Rosa e Victor
Henrique Foroni (sócios-fundadores) e Oscar Simões- Diretor de Recursos
Humanos, bem· como em pesquisas de publicações e de material
institucional cedido pela empresa.
1. Os antecedentes à criação da empresa
Segundo Hugo Marques da Rosa, um dos dois sócios-fundadores da
Método, analisar a história da Método exige entender a história dos seus
empreendedores. As posturas, valores e princípios que nortearam o
nascimento e o crescimento da empresa estão muito relacionados à sua
filosofia de vida.
Segundo Hugo, ele recebeu duas influências importantes na sua vida: ,,J •
a primeiro foi de seu pai que, tuberculose;>, se dedicou à Medicina para
encontrar meios de resolver não só o seu problema, como de tantas outras
pessoas que tinham tal doença. Era a visão da procura por um ideal de vida.
A segunda influência ser refere à sua vida de estudante secundário.
Seus professores eram jovens e o sistema de ensino enfatizava muito a
liberdade e o sistema ,participativo dentro da classe. Não havia provas, .? sistema de aprovação era pela avaliação dos professores. Não havia
226
sabatinas, como ocorria em outras escolas. A avaliação era feita
basicamente em função do desempenho e da participação dos alunos
durante as aulas, durante os debates e pelos trabalhos em grupo.
Normalmente as atividades eram feitas em grupo. Assim, teve seu primeiro
contato com um sistema participativo.
Mais tarde, veio para São Paulo, onde prestou vestibular para a
Escola Politécnica da USP, onde optou pelo -Curso de Engenharia
Mecânica. Foi então morar nos alojamentos da Universidade, já que não
tinha recursos financeiros para alugar ou dividir um apartamento. Este fato
acabou contribuindo muito na sua formação de caráter, tendo influência em
sua postura profissional.
Ocorre que, naquele período (fins da década de 60), com o
recrudescimento do movimento estudantil, tanto a nível mundial como no
Brasil, houve uma radicalização política. O Governo decide fechar o CRUSP
e, de repente, ele se vê sem local para morar. Quais seriam suas
alternativas que outros colegas seguiram? Fazer estágio ou dar aula em
Cursinhos pré-vestibular. A primeira alternativa não garantiria sua
sobrevivência; a segunda ele não aceitava politicamente, por ser contra este
tipo de educação.
A solução parecia ser uma só: tornar-se empresário.
"Sendo empresário", diz Hugo,
não teria compromissos de horário, poderia trabalhar entre uma aula e outra, na hora do almoço. Além do mais, como empresário teria autonomia, teria independência, não ficaria restrito a determinado compromisso com uma empresa. Contudo, como ser empresário se eu não tinha condição de sobreviver?
Com uma pequena poupança familiar, juntou-se com alguns colegas
e montou, em Diadema, uma fábrica de blocos: alugaram umas máquinas
encostadas e um terreno, com determinado prazo de carência para pagar o
primeiro aluguel em troca de benfeitorias necessárias. Com as máquinas,
conseguiram também uma carência para pagar os primeiros aluguéis. O
investimento, assim, foi pequeno e nem utilizou toda a poupança disponível,
sobrando um pouco para sobreviver. Como a fábrica funcionava desde as
sete horas da manhã ele precisa estar presente, era obrigado a uma
227
verdadeira maratona diária para comparecer duas vezes por dia à
universidade, mas conseguia compatibilizar ambas as atividades.
Segundo Hugo,
dos fatos marcantes dessa época, ocupou o primeiro lugar a absoluta inexperiência. Para se ter idéia, quando conseguimos montar a fábrica e começar a produzir os primeiros blocos, a primeira venda foi feita à vista. Não se imaginava como vender a prazo sem capital de giro.
Ele confessa que não sabia como fazer uma venda a prazo e que só
depois das primeira vendas foi perguntar ao contador o que era fatura e
duplicata que os clientes lhe pediam.
Iniciamos nossas atividades com pouquíssimos trabalhadores, meia dúzia deles, e conhecíamos visualmente as pessoas. Chegando à fábrica às 7 horas, em uma manhã notei a ausência de um dos operários e perguntei: "onde é que está o fulano?" "ele não veio, não vem mais, pediu demissão 11
• Fiquei profundamente chocado por ser um empresário idealista, um sujeito que queria o melhor possível para os seus trabalhadores e, de repente um deles pedia demissão, não queria trabalhar na empresa, não me queria como patrão. Era meu primeiro grande problema a ser. administrado na área de recursos humanos. O que fazer? Peguei o endereço do cidadão e fui à casa dele para conversar, saber o por quê de não querer mais trabalhar na empresa. Sem sabét, eu estava fazendo minha primeira entrevista de desligamento.
Começou também a aprender sobre marketing, disse ele. Observava
a ação do principal concorrente, que tinha um custo menor dos seus
produtos, pois ele mesmo comprava e transportava as matérias-primas e
nem pagava impostos, trabalhando na informalidade. Havia outro
concorrente, de porte maior, com capacidade financeira para vender a longo
prazo, entre outras vantagens para os clientes. Concorrendo com o primeiro
nas vendas menores .e com o segundo nas maiores, era preciso encontrar
uma solução.
Encontramos duas saídas. Havia, como ainda existe, legislação obrigando os proprietários a murar os terrenos desocupados e fazer calçadas. Como tínhamos um colega da faculdade que trabalha na prefeitura, conseguíamos receber informações sobre as pessoas que estavam notificadas para murarem seus terrenos. O sujeito recebia a notificação da prefeitura e no dia seguinte recebia a visita nossa. Oferecíamo-nos para construir o muro para ele. E nesse tipo de prestação de serviços também tínhamos concorrentes, porque como hoje, havia enorme número de empresas especializadas na
· construção de muros e calçadas. No entanto, como fábrica de
blocos tínhamos vantagem competitiva, porque normalmente essas empresas compravam blocos de terceiros. Como chegávamos junto coma notificação da prefeitura, o cliente não precisava procurar pelo serviço e por vantagem competitiva, pois nosso custo era menor por utilizarmos os blocos que fabricávamos.
Essa foi a saída típica de marketing: descobrimos um segmento de mercado no qual usar nosso produto e com vantagem competitiva.
Além dessa, descobrimos outra saída: o bloco é um produto muito pesado; de baixa densidade de custo, ou seja, tanto a matéria-prima quanto o transporte têm custo elevado relativamente ao peso do produto. Além de considerar-se o ICM incidente sobre as Vendas. Se os blocos fossem fabricados no próprio canteiro da obra haveria economia de frete e de impostos, porque não existia incidência de ICM. Assim, começamos a oferecer às construtoras - no caso de grandes conjuntos habitacionais a serem construídos com blocos - a montagem de uma fábrica de blocos no próprio canteiro da obra. Com a isenção de frete e imposto, com a matéria-prima comprada em nome da construtora, tínhamos condições de cobrar apenas pelo nosso serviço e ter preço mais competitivo.
228
Assim surgiu a primeira obra: uma construtora havia iniciado um
conjunto de casas populares em São Bernardo e contratou os serviços da
empresa para murar o terreno e administrar a fábrica de blocos da obra.
Como a construtora estava em crise administrativa e financeira, acabou
repassando toda a obra: eram 28 c~~as a serem construídas num prazo de
90 dias.
Aceitamos o desafio; era nossa primeira chance de fazer uma coisa maior. Havia, porém, uma dificuldade:· nunca tínhamos entrado numa obra. (. . .) Nós não entendíamos absolutamente nada de construção civil, não tínhamos a menor experiência.
Para agravar a situação, o engenheiro não aparecia na obra, o
projeto não estava detalhado e não havia planejamento de suprimentos.
Como nessa época eu ainda cursava a faculdade, fazendo mecânica de produção, comecei a perceber que a construção civil era uma área extremamente fértil para um engenheiro de produção, o que não ocorria em uma indústria mecânica.
"Entretanto", prossegue Hugo,
em um setor como o da construção civil, totalmente desorganizado, com pequenos investimentos conseguiam-se grandes avanços. Quanto mais desorganizado um setor, quanto mais primitivo o estágio de organização de determinado setor, maiores avanços são conseguidos com os mesmos recursos. Assim, a construção civil pareceu-me uma área extremamente fértil. Inclusive, foi-me propiciada a oportunidade de, nessa experiência, elaborar mel!
' j •J
(' . .
trabalho de formatura, sobre planejamento e controle de produção em construção civil dentro de uma obra.
Ao término dessa primeira obra recebemos convite para auxiliar na administração de uma construtora concordatária, mas com certo volume de bons contratos. Aceito o convite, fomos tentar gerir essa empresa. Foi uma rica experiência administrar na crise, dentro de maior grau de dificuldade. Adquirimos grande experiência em relacionamento com bancos, fornecedores, planejamento financeiro; foi uma espécie de madureza em administração financeira.
Essa empresa também fazia obras públicas. Foi nosso primeiro contato com o setor que, aliás, não diferia muito do das obras privadas. Os projetos eram bastantes rudimentares, as obras dirigidas pelos mestres, não ·havendo na empresa outro engenheiro, além do dono. A parte de suprimentos era absolutamente desorganizada.
De qualquer forma, a empresa não tinha estrutura de empresa. O engenheiro começava a trabalhar como profissional liberal, fazendo obras. De repente, surgem mais algumas obras e ele começa a montar uma peque estrutura: um pequeno escritório, uma secretária. Depois de algum tempo, um mensageiro e a empresa ia crescendo, apesar de o engenheiro não deixar de ser um profissional liberal. Muitas vezes, no nascedouro das empresas construtoras, no Brasil, é que as empresas são geridas, são organizadas como um prolongamento de uma atividade profissional liberal.
Após a experiência com a construtora concordatária, da qual saímos com um patrimônio em cessões -de crédito, fomos convidados a trabalhar com outra empresa construtora - mais organizada, mas com um sócio extremamente centralizador, incapaz de delegar decisões - e a única coisa positiva dessa experiência foi exatamente a lição aprendida pelo lado negativo, ou seja, não ser possível realizar algo com autonomia, sem liberdade."
2. O nascimento da Método Engenharia
229
A falta de autonomia, descrita na situação antecedente, foi a grande
motivação para criar a Método Engenharia. A oportunidade surgiu com a
possibilidade de ter que construir um galpão para uma fábrica de herbicidas
e inseticidas líquidos, que estava se relocalizando em função de problemas
ambientais; mas, era um desafio para os empreendedores, pois em 45 dias
seria iniciada as montagens dos equipamentos para iniciar a produção nos
90 dias seguintes.
Resolvemos fazer uma proposta para a execução dessa obra. Ainda não tínhamos uma empresa. Precisávamos de um nome e de papel timbrado para elaborar a proposta. Sentamo-nos, fizemos uma lista
e escolhemos o nome Método porque tinha a ver com o que pensávamos em termos de organização de uma empresa e, ao mesmo tempo, era uma palavra comum. Já havíamos percebido que uma das coisas importantes para a imagem de uma empresa construtura era a tradição. Como montar uma empresa nova que tivesse tradição? Resolvemos adotar como nome uma palavra que fosse absolutamente comum, lida pelas pessoas nos jornais, nas revistas, no dia-a-dia, e escrita com um tipo de letra parecido com a de jornal. Ao verem Método escrito com aquele tipo de letra as pessoas deveriam achar que já haviam visto aquilo 50, 100 vezes na vida, ficando a impressão de uma empresa muito antiga, conhecida. E isso funcionou. Com menos de um ano de atividade, encontrávamos pessoas que diziam: "Já conheço a empresa de vocês há alguns anos", disse Hugo.
230
A esposa do sócio, Victor Henrique Forani, escreveu Método com
letraset em uma folha de papel, que foi reproduzida. Assim foi feita a
primeira proposta e até hoje a empresa mantém a comunicação visual
"criada" para regularizar sua situação.
Segundo Hugo,
a Método tinha por objetivo básico inicial crescer. Por que? Porque quando se parte do zero, tem-se de crescer, criar uma massa crítica, sem pensar em racionalização: .aumento de produtividade de zero é zero! Assim, o objetivo básico dos primeiros tempos foi crescer, a qualquer custo, de qualquer maneira, para depois, tendo volume de negócio, poder organizar e racionalizar.
Tínhamos visão um pouco mais estruturada de marketing, além da assessoria externa de uma grande empresa prestadora de serviços na área de assessoria de imprensa, a qual produzia um jornal interno, o que na época era absoluta novidade. Eram poucas as empresas no Brasil que contavam com assessoria de imprensa e no setor de construção civil provavelmente nenhuma.
Esse jornal interno - o Hora Prêmio - foi um dos precursores do jornalismo de empresa no Brasil. ·
Por outro lado, diz agora Victor Foroni,
o mercado de construção civil era muito favorável. Havia grandes projetos em execução. As grandes empresas brasileiras dedicavamse a grandes obras - hidrelétricas, rodovias -, que tal porte que as como o metrô de São Paulo e a ponte Rio-Niterói foram inicialmente executadas por médias empresas.
Em um mercado que crescia 15% ao ano, com empresa nãoaparelhadas do ponto de vista tecnológico para enfrentar esse crescimento, sobravam obras. A Método, no início, direcionou-se mais para o segmento de obras públicas, pela facilidade oferecida
no mercado. As empresas podiam optar pelo volume de obras que lhes interessava assumir num determinado momento.
3. A filosofia de gestão
A Método Engenharia, segundo Hugo,
é o produto de uma sociedade de duas pessoas com personalidades muito diferentes, cujo resultado é exatamente a conseqüência da interação e da soma dessas duas personalidades. Dentro da
. empresa sempre tivemos maior vocação para determinadas áreas. A minha sempre foi pelas áreas de marketing, financeira e, algumas vezes, recursos humanos. A vocação de meu sócio - Victor Henrique Foroni - é para a produção, além de às vezes, dedicar-se também a finanças e recursos humanos.
Como deve-se proceder para dirigir uma sociedade com partes rigorosamente iguais? Dizem que a empresa deve ter sempre um número ímpar de sócios; alguém para desempatar. Como se desempata em uma sociedade formada por pessoas com personalidades muito diferentes, na qual as funções são divididas?
Temos, dentro da empresa, um processo de decisão no qual cada sócio tem a última palavra em sua área. Isso não significa serem as decisões tomadas unilateralmente. O que costumo fazer quando tenho novas idéias é discutí-las com meu sócio. Quando sua opinião é frontalmente contrária à minha, e isso acontece com freqüência, não significa que simplesmente vou decidir pela minha idéia ou abandoná-la. Procuro o desempate ouvindo outras pessoas da organização, e até pessoas de fora dela, numa tentativa de obter subsídios sobre a questão. Procuro levar em conta não o achômetro, no qual as pessoas acham que a posição A ou 8 está correta, mas os argumentos que usam para defender uma ou outra posição. A decisão é sempre tomada em cima de argumentos.
É dessa forma que dirigimos a organização: se eu tiver determinada opinião, contrária à de meu sócio, e perceber, conversando com cinco pessoas, que todas elas têm opinião contrária à minha, provavelmente estarei errado e então deverei reformular meu pensamento . . Provavelmente irei decidir diferentemente daquilo que de início havia pensado, porém a decisão é minha. Esta é a fórmula que encontramos para conseguir conviver.
231
No entanto, segundo Oscar Simões, Diretor de Recursos Humanos,
para atingir este nível de gestão, a empresa passou por uma fase de
"esquizofrenia". Havia reuniões e debates em excesso, entre representantes
dos diversos níveis hierárquicos e setores. De outro lado, a empresa nascia
232
com base em uma estrutura departamentalizada, o que dificultava o
processo participativo.
O Diretor de Recursos Humanos, Oscar Simões, disse que,
quando empresas de nosso porte ainda falavam em departamento pessoal, já pensávamos em área de recursos humanos. Nossa ambição era ir além de um departamento pessoal, era realmente constituir uma área de recursos humanos. A Método, desde o início de suas atividades, tinha um sistema de participação nos lucros para os funcionários, inicialmente, restrito ao pessoal do escritório, inclusive a faxineira e os office-boys, uma vez que os funcionários de obras recebiam prêmio de produtividade ao terminá-las.
Tínhamos ainda grande preocupação com clima organizacional e motivação, coisas de que também não se falava. A primeira pesquisa sobre clima organizacional da Método foi feita nessa fase, objetivando conhecer que os funcionários viam como pontos negativos e como pontos positivos na empresa e o que nós, sócios da empresa, precisávamos fazer para melhorar o clima da organização.
Já se percebia que o clima da organização dependia em grande parte
das atitudes dos sócios-diretores. Segundo Oscar Simões, a empresa tinha
dois estilos completamente diferentes de gestão e pela pesquisa feita
queríamos conhecer como isso era. visto pelo quadro de funcionários. A
motivação dos funcionários era buscada, principalmente, através do
envolvimento dos sócios com os funcionários. Com pequeno quadro
funcional, a proximidade era maior. Semanalmente fazíamos reuniões com
os funcionários: toda sexta-feira fazíamos churrascos com a participação de
todos; qualquer acontecimento era festejado na empresa, desde o
aniversário do office-boy, gerando sentimento de equipe muito grande e
sendo forte fator motivador.
4. A primeira fase da empresa: 1973- 1982
Nessa primeira fase, iniciada em 1973 com a fundação da empresa,
até 1982, foràm feitas algumas tentativas de racionalização e instrualização
em algumas obras. Uma das tentativas mais marcantes foi realizada na área
de habitação popular. Elaborou-se um projeto e, numa tentativa de
industrialização, consegui-se viabilizá-lo. O projeto e seu custo eram
competitivos com relação ao mercado, porém, naquela oportunidade, após a
233
construção de mil casas - parte de um grande contrato realizado com a
Cohab de São Paulo -, a contratante decidiu substituir o projeto pela
construção de apartamentos. O sistema da empresa não se adaptava ao
novo projeto e, assim, suas máquinas estão até hoje enferrujando.
Tentativas desse tipo não foram bem-sucedidas porque, era sempre mais
fácil aumentar um cruzeiro no preço de venda do que reduzir um cruzeiro no
custo, o que desestimulava qualquer tentativa de racionalização.
Na área financeira, o objetivo prioritário era crescer com recursos
próprios. A empresa deveria se apoiar nas próprias pernas, reinvestindo os
lucros integralmente. Durante toda a história da Método, mas principalmente
nessa época, os lucros eram integralmente reinvestidos - não uma grande
parte, mas 1 00% dos lucros eram reinvestidos na empresa. Os sócios
retiravam apenas pro-labore calculado em função do que achavam que
conseguiam receber foram da empresa, se fossem trabalhar como
funcionários de outra organização, portanto, equivalente ao valor de
mercado de trabalho.
Nesse fase, as características principais da administração eram a
centralização das decisões, em es~il.o marcadamente paternalista, ênfase
nos resultados e, basicamente, determinação e disposição de aceitar riscos.
Entre as dificuldades dos primeiros tempos, havia a sazonalidade das
obras, que eram pequenas, com prazo médio de seis meses e, geralmente,
públicas, contratadas na mesma fase do ano- entre outubro e dezembro-,
. em função de orçamento, verba, etc. Dessa forma, o faturamento era
altamente oscilante, não havendo condição de manter quadro de pessoal
estável, o que dificultava extremamente a possibilidade de racionalização e
até de treinamento.
Havia um ciclo de crises com a redução das obras, quando a
empresa foi obrigada a reduzir a equipe. Com a contratação de novas
obras, a iniciarem-se ao mesmo tempo, o quadro desfalcado gerava crise de
produção. Comprando matéria-prima . e com as obras não conseguíamos
decolar, não havia como pagar os materiais adquiridos, o que gerava crise
financeira. Quando as obras finalmente entravam na fase em que conseguia
começar a receber e saía da crise financeira surgia a crise comercial
novamente. Era um ciclo de crises: comercial, produção, financeira ... Ciclo
234
esse que não afetava somente a Método, mas todas as empresas que
executavam o mesmo tipo de obra. Não se conseguia ter um período com
produção andando normalmente e situação financeira equilibrada, além do
crônico atraso de pagamento das obras públicas.
A situação agravou-se com a crise do início dos anos 80 chegando
ao Brasil. A dívida externa tornou-se impagável e pelo acordo feito com o
FMI houve restrições nos investimentos fixos.
O governo brasileiro foi forçado a cortar o déficit público e, não
conseguindo cortar custeio, cortou o investimento. Cortar investimento no
setor de construção civil significava cortar obras. Essa crise econômica foi
particularmente grave nesse setor nos anos de 1983 e 1984.
Simultaneamente, começava a transição política no Brasil. Embora
persistisse o regime militar, começava a haver liberdade de imprensa, já se
começava a respirar um clima diferente no país. E a situação da empresa
dentro disso? Em 1982 ocorreram eleições municipais, quando as obras
estavam muito centradas em prefeituras de São Paulo e do interior. Com
vários prefeitos candidatando-se a outros cargos, essas obras eram
realizadas com base no ritmo político, para serem inauguradas antes da
eleições. Muitas obras foram executadas com atropelos, sem verbas
disponíveis para acompanhar o ritmo acelerado, andando à frente dos seus
empenhos.
A Método executava uma grande obra contratada com a prefeitura de
São Paulo, tocada em ritmo de 14 horas por dia, em três turnos, incluindo
sábados, domingos e feriados, na qual trabalhavam 1 . 700 funcionários
quando, de um dia para o outro, recebeu ordem da prefeitura para parar a
obra. "Fomos forçados a demitir os 1. 700 funcionários, o mesmo ocorrendo
com outras obras contratadas com outras prefeituras", disse Hugo.
No primeiro semestre de 1982 o faturamento estava em torno de US$
4 milhões por mês, mantendo cerca de 3.500 funcionários distribuídos entre
a Método e as demais empresas da Corporação atuando em construção
civil. Em seis meses esse contingente foi reduzido a 700, 800 funcionários,
ou seja, um corte de 80% do quadro funcional. Aliado a isso, atrasos e não
recebimento de correção monetária por atraso de pagamento da parte de
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órgão públicos causaram a queda do patrimônio líquido à metade. Em 31 de
dezembro de 1982, o patrimônio líquido era a metade do possuído em 31 de
dezembro de 1981, ou seja, a metade do que fora construído em quase dez
anos perdida em seis meses.
5. A fase de crescimento e transição: 1983 - 1986
A segunda etapa da história da Método tinha como principal
estratégia de recuperação era capitalizar a empresa, o que só poderia
ocorrer se a mesma gerasse lucro. Nessa fase - 1983 a 1986 - o objetivo da
empresa deixou de ser o crescimento e passou a ser o lucro. Continou o
reinvestimento de 100% dos lucros, dimuindo a disposição de assumir
riscos, principalmente riscos financeiros.
Foi enfatizado o controle, basicamente através da informatização da
empresa. Iniciou-se um grande esforço, inclusive com a criação da empresa
- Método Informática, cujo grande objetivo era informatizar a Método em sua
totalidade. Buscou-se a redução de riscos pela seleção de clientes e pela
administração dos contratos, evit~~do-se executar obras sem recursos
empenhados. "Passamos a fazer a gestão financeira dos nossos clientes,
quer dizer, conhecer a situação financeira de nossos clientes melhor do que
eles mesmos", disse Hugo.
Por razões distintas, meu sócio e eu afastámo-nos um pouco da empresa, delegando sua estão a profissionais contratados. Iniciouse fase de transição, passando-se, inclusive, a buscar executivos para os postos mais altos da organização.
Dentro da estratégia de assumir menores riscos, desenvolveu-se um
esforço de diversificação, começando a atuar na área de telefonia, no
mercado imobiliário e dando maior ênfase ao mercado de obras privadas. O
objetivo não era deixar de contratar obras públicas, mas ter atuação
equilibrada entre os dois setores - público e privado -, além de
empreendimentos próprios na área de incorporação, a qual oferece a
vantagem de "sermos os agentes, decisores, podermos dimensionar nosso
volume de negócios, contrabalançando, na área de incorporação, as
oscilações dos outros dois segmentos."
236
Com a gestão profissionalizada da empresa, os dois sócios decidiram
sair da empresa e se dedicarem a atividades associativas (Associação
Paulista de Empreiteiras de Obras Públicas) e cursos no exterior.
6. A ·fase da diferenciação pela qualidade: 1986- 1990
Em 1986, após 13 anos de atividade, passava a se destacar no
segmento de construção civil. Foi considerada em 1986 e 1987 como a
empresa em melhor situação financeira no setor e tal resultado foi obtido
durante seis anos consecutivos.
Na visão de Hugo,
isso significava que nossos objetivos haviam sido atingidos. Porém, ao analisarmos nosso produto, constatávamos serem nossas obras rigorosamente semelhantes às da concorrência. Talvez a qualidade não fosse rigorosamente igual à média, mas comparável à das melhores empresas do setor, o que pouco significava. As empresas do setor de construção civil eram muito parecidas; nosso trabalhador era igual ao trabalhador das outras construtoras; o nosso engenheiro assemelhava-se ao engenheiro das demais construtoras; e o nível de problemas que enfrentávamos era o mesmo que os outros tinham.
Essa análise demonstrou-nos que, embora bem-sucedidos economicamente, nosso produto, intrinsecamente, tinha um valor igual ao dos outros. Talvez nosso sucesso resultasse de boa administração financeira, controles mais eficazes, reinvestimentos do lucro; mas nosso produto era semelhante ao de outras empresas e queríamos um produto diferenciado.
Surgiu então, algo, que poderia ser chamado de crise de produção -uma crise existencial dos sócios. Achávamos que só nos interessaria continuar com a empresa à medida que conseguíssemos fazer uma coisa melhor. Precisávamos de um desafio: realizar uma coisa melhor que o concorrente. Lucro, já havíamos provado que conseguíamos; já tínhamos provado a capacidade de conseguir. Só não havíamos conseguido provar sermos capazes de fazer uma coisa melhor.
Assim, no período de 1987 a 1990, com o retorno dos dois sócios à
operação da empresa, foram definidos novos objetivos: produtividade,
qualidade, agilidade e flexibilidade.
Segundo Hugo,
buscamos produtividade, para que a empresa seja mais competitiva. Qualidade, para termos diferenciação e não sermos obrigados a vencer a concorrência, simplesmente por ter preço menor. Concorrer pu(a e simplesmente com preço é praticar concorrência predatória, A medida que se tenha produto de qualidade notoriamente superior, é sempre possível melhor enfrentar a concorrência. Agilidade e flexibilidade estão ligadas ao processo do ambiente em que vivemos, tanto quanto ao país, como a nível mundial. Em qualquer setor, seja ele econômico, social ou político, as mudanças são cada vez mais rápidas. As empresas somente conseguem sobreviver se em ritmo de mudanças aceleradas, respondendo com agilidade e flexibilidade. Agilidade relativamente à velocidade com que as empresas se adaptam às novas situações; flexibilidade quanto à própria capacidade de adaptação.
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A partir destes quatro objetivos, a empresa precisava definir seu
modelo de gestão; porém, a estratégia para atingimento daqueles objetivos
era mudar a cultura do setor, cultura essa que, na construção civil, é
considerada como um grande entrave para a sua melhoria de qualidade.
Esta cultura é influenciada por um mercado excessivamente fácil e
favorável, desfrutado durante longos anos; é uma cultura marcada por vícios
- problema da economia brasileira como um todo: a mentalidade dos
cartórios e dos mercados protegidos.
Hugo descreve como esta cu_l~ura tem afetado o setor e como chega
às obras:.
A construção civil foi um dos segmentos protegidos, por lei de defesa de engenharia nacional. Esta lei, ao invés de defendê-la, acabou por prejudicá-la, em nada contribuindo para tornar as empresas do setor mais competitivas. O segmento da construção civil é marcadamente nacional, não por as empresas serem competitivas, mas por ter havido, de fato, reserva de mercado.
Do poto de vista de gestão, era uma cultura bastante autoritária: a do mestre-feitor, figura predominante na indústria como um todo, hoje já abolida, mas que persiste na construção civil. Como resultado, o operário só trabalha se tiver alguém em cima dele, exigindo trabalho.
Outra característica cultural é a execução da obra ser de responsabilidade do mestre, Em nossa área de atuação, que é a de edificações, a obra é feita pelo mestre. O engenheiro simplesmente passeia pela obra. Quem determina como proceder, impõe o ritmq e a organização é o mestre da obra. E quem é o mestre da obra? E o indivíduo que se iniciou na construção civil como ajudante. Por ser habilidoso, começou a imitar o pedreiro, o· carpinteiro, vindo a exercer essas funções e, posteriormente, com espírito de liderança, virou feitor, virou encarregado, virou mestre, sem ter recebido
qualquer treinamento. O processo de formação na construção civil é basicamente de aprendizado por imitação.
7. A disseminação da filosofia da empresa
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Dados os entraves à realização dos objetivos da empresa,
anteriormente definidos, devido àquela cultura do setor já descrita, a
empresa chegou à conclusão de que precisava mudar "a sua cultura". Como
se muda uma cultura? Hugo explica:
Começamos com a explicação da filosofia da empresa, a qual contradizia a cultura do setor. Iniciamos um treinamento objetivo, procurando passar aos funcionários a filosofia da Método, que tem quatro princípios básicos.
O primeiro princípio é fazer bem-feito, baseado na convicção de que o sucesso da empresa está ligado à sua credibilidade, a qual só pode ser obtida com qualidade. Qualidade não se consegue pelo simples desejo. Não adiante uma empresa querer ter um produto de boa qualidade, ela precisa se organizar para obtê-/o. A qualidade começa pela organização da empresa como empresa, por sua estrutura organizacional, passando por todas as etapas envolvidas no processo. Um produto bem-feito é resultado de projeto bem-feito, marketing bem-eito, venda bem-feita, treinamento de pessoal bemfeito, além de área de · ·recursos humanos capacitada, acompanhamento de produção, matéria-prima adequada. Não basta implantar controle de qualidade numa empresa se ele apenas demonstrar que o produto não é de boa qualidade.
O segundo princípio é que a empresa é um veículo soclal, propiciando o desenvolvimento das pessoas que nela atuam. E o desenvolvimento da empresa que alimenta o das pessoas e viceversa, o desenvolvimento das pessoas alimenta o da empresa. Não existe empresa competente com funcionários incompetentes. Assim, é através do desenvolvimento dos funcionários que se consegue o desenvolvimento da empresa. E é essa a missão social da empresa: desenvolver as, pessoas, não só tecnicamente, mas socialmente, culturalmente. E o desenvolvimento do ser humano pleno - em nível cultural, social e político - que vai criar o desenvolvimento da empresa.
O terceiro princípio refere-se às relações do trabalho serem regidas por negociação e troca, num processo marcadamente democrático. A relação da empresa com seus funcionários é de negociação e troca, significando a abolição do paternalismo dentro da Método.
Finalmente, há o princípio da competência, condição essencial para a sobrevivência das empresas no final deste século, vivendo em processo de busca de liberdade, de democracia, extremamente
acentuado. Hoje é constatado esse anseio mundial pela liberdade. Quando a filosofia da Método foi escrita, esses movimentos que estão mudando o mundo ainda não estavam em curso. Essa mudança percebida não ocorre apenas em nível de país, mas também nas estruturas familiar, escolar, empresarial, e na sociedade como um todo. Ao mesmo tempo, a democracia implica em regras de jogo muito claras. Dentro de um regime democrático não existe condição para favorecimento, cartório ou reserva de mercado. As empresas têm de se preparar para competir; só as empresas competentes conseguirão sobreviver dentro de um regime democrático.
Paralelamente, está ocorrendo um processo de internacionalização da economia: A concorrência não se limita às empresas nacionais. Mais cedo ou mais tarde a construção -civil irá enfrentar a concorrência internacional e, acredito, será mais cedo do que se imagina.
Além disso, há outro tipo de competição em torno do mercado de trabalho. O setor foi abastecido durante longo tempo por migrantes vindos do interior para as capitais, pessoas totalmente despreparadas profissionalmente e para o convívio urbano. A construção civil teve a missão de urbanizar essas pessoas.
Esses migrantes, durante a crise ocorrida em 198311984, acabaram desempregados, descobrindo ser mais fácil sobrevier em outro tipo de atividade. A economia informal cresceu com atividades na área de serviços: vendedores ambulantes, vigilantes de prédio, catadores de papel.
Quando o setor de construção civil começou a se recuperar, os trabalhadores não retornaram, uma vez que, na novas atividades, tinham condições de trabalho e melhores ganhos.
Uma pesquisa feita junto a nossos funcionários revela que a maioria deles não quer seus filhos trabalhando na construção civil; preferem que sejam motoristas, metalúrgicos, entre as mais diferentes profissões.
Resta saber como o setor vai sobreviver sem trabalhadores. A migração de outras regiões do Brasil - do interior para as capitais -está terminando. Hoje, temos quase 70% da população brasileira nos grandes centros urbanos e apenas 30% no campo, inverso do que ocorría ha 30 anos. Daqui para frente, o setor da construção civil vai ter que disputar esse trabalhador com o comércio, com a indústria, com outros tipos de atividade.
Para enfrentar a situação o setor precisa se preparar, pagando maiores salários e oferecendo melhores condições de trabalho. Como pagar maiores salários com baixa produção? O setor deverá se tornar competente. Terá de aumentar sua produtividade que, hoje, é aproximadamente um décimo da dos países desenvolvidos; ou seja, temos em uma obra semelhante, dez vezes mais trabalhadores do que a França, a Alemanha, os Estados Unidos, o
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Canadá. Nossa produtividade precisa ser multiplicada por dez! Não é uma questão de aumentar 20% ou 30%.
Condição essencial para ser competente é enxergar antes, é enxergar longe. Esse é outro dado da nossa filosofia. é Fundamental para que a empresa seja competente ter visão de futuro. Isso não significa antever a próxima medida que o governo vai ditar, o que seria impossível, mas os grandes movimentos da sociedade. Como estará o nosso país daqui a 20 anos? Daqui a 15 anos, como estará o mundo? Nossa preocupação no presente não deve ser com o plano econômico ou como sobreviver no futuro próximo., mas como vamos fazer para virar o século, como vamos estar no ano 2010.
O empresário brasileiro precisa aprender a ter visão de futuro e começar a se preparar para enfrentar crises. Na Método esse processo foi iniciado com a explicitação da sua filosofia e conseqüentes políticas de produção, recursos humanos e marketing, além de planejamento estratégico.
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Também não adianta, segundo Hugo, um planejamento detalhado
para os próximos cinco anos, se as condições estão continuamente
mudando. Na Método, não temos planejamento estratégico, temos objetivos
estratégicos.
8. A implantação de um novo·modelo de gestão
Após discutida e disseminada por toda a empresa a filosofia de
gestão, o próximo passo era implantar um novo modelo de gestão, orientado
pela filosofia e voltado ao atingimento dos quatro objetivos. Segundo Hugo,
Para isto acontecer, era preciso buscar novas tecnologias, não só em nível de produção, mas também de gestão. Para tanto, não bastaria escolher algum modelo que deu certo e tentar implantá-lo. Era necessário saber o que estava acontecendo no Brasil e no resto do mundo, observar casos bem-sucedidos, sem adotar qualquer desses casos como modelo, mas aproveitando idéias, estudando um conjunto de idéias que poderia ser adaptado e criar um modelo próprio. Não existe maneira ideal de dirigir uma empresa, existem maneiras de dirigir cada uma delas. Nessa fase, a busca de motivação dos funcionários foi colocada como questão essencial. Procurou-se motivá-los através de ambiente adequado de trabalho, ambiente democrático, sistema participativo. Conseguimos bom índice de motivação com uma gestão mais democrática da empresa.
O que é gestão participativa? Em primeiro lugar, encaro a gestão participativa como um processo. Não algo que a empresa tenha imposto por modelo: "a partir de hoje decidimos ter uma gestão participativa." Só é possível praticar estão participativa se a empresa tiver cultura apropriada para isso. Não posso afirmar que a Método,
hoje, seja uma empresa participativa. Acredito que ele é mais participativa do que era há um ano e que, provavelmente, no próximo ano será ainda mais, pois não se trata de um estado, mas de um processo.
Dentro· desse processo de participação, a condição básica é que a ideologia da empresa e sua filosofia estejam impregnadas nas pessoas e que essas pessoas passem a agir de acordo com tal ideologia. Há, inclusive, críticas a esse respeito na literatura, mas acredito ser condição essencial para que a gestão participativa ocorra a empresa ter forte ideologia, impregnada nas pessoas que a compõem. E o que eu chamo vestir a cabeça. Normalmente, os dirigentes querem que o funcionário vista a camisa da empresa. Eu prefiro que o funcionário vista a cabeça da empresa, ou seja, pense como a empresa pensa. Como se consegue isso? Esse procedimento faz parte de um processo de mudanças. Uma das formas de se conseguir a adesão do funcionário é fazer com que ele participe da formulação das políticas da empresa.
A filosofia da empresa é opção de seus acionistas, uma coisa não negociável; a pessoa concorda ou discorda. No entanto, as políticas que são a tradução da filosofia para as ações, para o cotidiano da empresa, essas devem ser feitas em conjunto com os funcionários. Como exemplo, nossa política de recursos humanos foi escrita em conjunto com os funcionários. Foram escolhidos representantes de todos os segmentos de funcionários - office-boys, secretárias, engenheiros, gerentes - e a política de recursos humanos foi definida por esse grupo de funcionários, depois de uma série de discussões. A redação dessa política inclui uma negociação e, a partir do momento em que é cohsensual, fica muito mais fácil de ser aceita e praticada por todos.
Para implantar a estão participativa é condição essencial a criação de uma cultura dentro da empresa e ideologia que permita isso. Dentro desse esquema participativo, um dado importante - mas não essencial - é a participação nos lucros, a qual precisa ser feita com certo cuidado, pois muitas vezes a busca do lucro compromete outros objetivos. Mesmo existindo participação nos lucros dentro da empresa, não é através dela que se chega à gestão participativa.
Com relação aos limites da gestão participativa, não adianta discutir com um pedreiro o planejamento estratégico da empresa, isso seria uma simulação. Acho que as pessoas têm de contribuir dentro dos limites de sua competência, à medida de sua capacidade, nas coisas que lhe dizem respeito. As condições de trabalho, por exemplo, têm de ser profundamente discutidas com os· funcionários, assim como a forma de remuneração, ou nosso política salarial.
241
Assim, implantou-se o "Modelo de Gestão" da empresa, o qual parte
do conjunto de valores definidos (filosofia), orientando as políticas de
recursos humanos, o processo de gestão (participativa) e a tecnologia a ser
adotada: com isso, a empresa busca atingir seus objetivos (qualidade,
produtividade, flexibilidade e agilidade), visando tanto satisfazer seus
242
clientes como melhorar e preservar a imagem da empresa (missão). O
cumprimento dos objetivos e da missão implicará nos resultados
econômicos, que visam não só satisfazer os acionistas, como também
promover o crescimento e a perpetuação da empresa e satisfazer
plenamente os colaboradores, cuja resposta será alinhamento com os
objetivos da empresa.
MODELO DE GESTÃO DA EMPRESA
SATISFAÇÃO DOS
CLIENTES
SATISFAÇÃO DOS
CLIENTES
TECNOLOGIA
CRESCIMENTO/ PERPETUAÇÃO
RESULTADOS ECONÔMICOS .
················)
QUALIDADE PRODUTIVIDADE
FLEXIBILIDADE
GESTÃO
VALORES
•
SATISFAÇÃO DOS
ACIONISTAS
IMAGEM
RECURSOS
HUMANOS
243
9. A nova estrutura organizacional
A estrutura organizacional da Método é o resultado de sua própria
história: não foi planejada e sim foi evoluindo até chegar ao estágio atual. A
empresa caminha para um modelo mais empreendedor, porém centrada no
processo criativo em equipe e não incentivando individualmente os
colaboradores talentosos.
As áreas foram sendo criadas ·de acordo com as necessidades; muitas vezes, a necessidade despareceu, mas a área confinou. O mais importante na empresa não é exatamente aquilo que está no organograma. Um dos problemas que enfrentamos é relativo à estrutura organizacional inadequada, herança dessa história e sobre a qual a empresa precisa agir.
Um dos nossos objetivos para o futuro é exatamente buscar uma nova estrutura organizacional, ou melhor, uma nova forma de organização. Esse trabalho já começou com a desmontagem do organograma. Há dois ou três anos, deliberadamente, não fazemos organograma da empresa. Não se sabe muito bem que é subordinado a quem, e criar certa confusão favorece demonstrar estrutura difícil de modificar, pois ela se protege. Para poder modificá-la é preciso apagar um pouquinho a memória de como ela era.
Estamos igualmente procurando reduzir os níveis hierárquicos. Na cúpula da empresa conseguimos eliminar dois deles. Tínhamos um diretor-superintendente de divisão dentro de cada departamento; hoje, praticamente, temos só dois níveis. Somos um processo em busca de nova organização. Não sei qual será - vai ter de ser buscada em conjunto com as pessoas que compõem a empresa.
Outra questão fundamental dentro da empresa é a comunicação. Para praticar gestão participativa, além de as pessoas estarem imbuídas da ideologia da empresa, devem receber informações sobre tudo o que acontece dentro dela: a empresa precisa ser transparente, possibilitando às pessoas o acesso a dados que habitualmente são sigilosos, como fluxo de caixa - quanto a empresa tem disponível, quanto vai . receber, qual o seu lucro, enfim, informaçõesgeralmente restritas à área financeira da empresa.
Na Método isso é absolutamente transparente. É elaborado um relatório gerencial, distribuído aos gerentes da empresa. Todos têm condições de saber qual é o saldo de caixa da empresa naquele momento, quanto vai ter no fim do mês, se há dificuldade financeira, qual o quadro de pessoal, qual é o índice de rotatividade, de segurança do trabalho, etc.
Para mim, gestão participativa é a pessoa ser parte da empresa; participar é ser parte e não colocar sugestão numa caixinha para ser examinada por um comitê. Participar é como ser parte de um corpo humano: cada célula do corpo humano tem o mesmo código
genético. Se examinarmos cada célula do corpo de uma pessoa, o DNA de todas elas ter o mesmo código genético. Eu imagino que a empresa com gestão participativa seja uma coisa muito parecida. E para isso a comunicação é indispensável. Todo funcionário precisa ter acesso a todas as informações necessárias para poder pautar suas ações no dia-a-dia. Quando a Método recruta um executivo, fica muito atenta ao seu perfil, ao seu estilo de gerência e à sua forma de agir; se ele é uma pessoa autoritária, se pratica uma gestão mais democrática. O perfil do executivo da Método tem de estar intimamente relacionado com o tipo de gestão que a empresa pratica.
Os objetivos da Método para o futuro continuam sendo os mesmos de hoje:· produtividade, qualidade, flexibilidade e agilidade. A estratégia é a mesma, com uma pequena modificação: na área de recursos humanos enfatiza-se a busca de motivação pela autorealização.
As pessoas, principalmente na franja superior da empresa, têm grande motivação pela auto-realização. Contudo, para se autorealizar é necessário, antes, realizar e para realizar é preciso estar capacitado e qualificado. Assim, nosso esforço na área de recursos humanos volta-se para a Engenharia - objeto de nosso trabalho - e para o treinamento. Nesse sentido, foram feitos convênios com ·a Escola Politécnica, que montou um curso de pós-graduação específico para a Método, com um curriculum específico para complementar a formação de seus engenheiros no que foi identificado, ao longo do tempo, como necessário.
Ao mesmo tempo, estamos constituindo uma joint venture com uma empresa do Canadá, com o objetivo de enviar nossos engenheiros para treinamento no exterior, receber os engenheiros canadenses, para treinar nosso pessoal aqui, e desenvolvermos trabalhos em conjunto. No futuro deveremos operar em conjunto com essa empresa. Quer dizer, nada melhor para nos defendermos da concorrência externa do que conhecer perfeitamente como as empresas atuam no exterior. Identificamos uma empresa que tem um perfil de produto muito parecido com o nosso e vamos conhecer a sua tecnologia.
Finalizando, estamos hoje no meio de uma fase, adotando algumas mudanças de rumo. Talvez a principal delas seja a questão da motivação. Acreditávamos que pelo fato de terem ambiente propício, as pessoas iriam desenvolver alto potencial, através do qual obteríamos altas produtividade e qualidade. Verificamos que isso é importante, mas não suficiente, pois está faltando a ferramenta, que vamos procurar fornecer a partir de agora.
Nossa ênfase atual é a área de produção, ou seja, o produto de qualidade. A Método tem hoje uma boa imagem, porém, um bom produto é o melhor marketing que podemos fazer.
244
Mais recentemente, a empresa vem buscando parcerias, não só no
mercado internacional, visando buscar novas tecnologias, como vem
245
detectando oportunidades de novos negócios no mercado nacional: assim,
desenvolveu uma parceria com a Promon, para ambas atuarem em conjunto
na implantação de novos sistemas de telefonia.
ESTRUTURA ORGANIZACIONAL
-Marketing Institucional
-RH Estratégico
-Desenv. Organizacional
-Diversificação
ADMINISTRATIVO
FINANCEIRO
-Controladoria
-Financeiro
-Juridico
-Administração Sede
246
11. Análise do modelo de gestão
Ao longo do estudo de caso, foi possível observar que,
historicamente, a empresa nasceu com uma característica empreendedora
(oportunidades aproveitadas pelos sócios-fundadores), mas durante o seu
processo de crescimento, foi se consolidando um modelo participativo de
gestão, ao ponto tal que levou o empreendimento a uma gestão
profissionalizada, que permitiu inclusive o afastamento dos sócios durante
quase quatro anos da direção dos negócios, período durante o qual a
empresa apresentou resultados financeiros excepcionais, que até lhe
propiciaram prêmios por este desempenho.
Com o retorno dos sócios, em 1990, o modelo de gestão se definiu
melhor, com a divulgação mais ampla da filosofia e dos objetivos
organizacionais. Isto permitiu a consolidação da empresa e seu perfil atual
se orienta para o estilo empreendedor, na medida em que a empresa busca
parcerias internacionais (aquisição de novas tecnologias) e exploração de
novos negócios sinérgicos à sua atividade principal (setor de telefonia, por
exemplo, em associação com a Prorhon).
ESTUDO DE CASO 3:
INEPAR S.A. A
ELETROELETRONICA
248
ESTUDO DE CASO 3: INEPAR S.A. ELETROELETRÔNICA
A INEPAR S.A. ELETROELETRÔNICA (que será denominada
simplesmente de INEPAR ao longo deste estudo de caso) é uma empresa
de capital nacional, criada em 1990, tendo origem na INEPAR S. A. Indústria
e Construções, parte de um grupo empresarial do setor de material
eletroeletrônico, com sede em Curitiba. A empresa tem duas fábricas, sendo
que a Unidade 1 atende o mercado de sistemas para indústria e construção.
A Unidade 2 é voltada para o mercado eletroeletrônico, sendo sua linha de
produtos constituída de produtos de alta tecnologia.
Para elaborar este estudo de caso, foram entrevistadas diversas
pessoas, entre dirigentes e gerentes, onde várias informações foram
levantadas por observação. Trata-se de uma empresa aberta e transparente
para informações, sem medo de mostrar seus erros e acertos, o que é típico
de uma empresa inovadora.
•• o
1. A evolução histórica da empresa
A INEPAR é atualmente o maior fabricante brasileiro de
equipamentos eletrônicos, elétricos e eletroeletrônicos destinados a
geração, transmissão, utilização de energia elétrica, hoje atuando com
liderança também nas áreas de automação e serviÇos, telecomunicações e
outras.
O Grupo lnepar nasceu em Curitiba em 1968 e, após se firmar como
o maior produtorde. painéis e quadros elétricos, iniciou, em 1976 sua
expansão, com a implantação da lnebrasa S.A., em ltajaí- SC.
Adquiriu a IBR - Indústria Brasileira de Ralés, em 1982 e a Postes
Seccionais em 1984. Em associação com a Westinghouse, criou em 1987 a
lnepar Semicondutores, cujo controle total assumiu em 1988. Da mesma
Westinghouse já havia adquirido a Elcon (capacitadores). A Hober do Brasil
foi incorporada no ano seguinte.
249
Em 1990, adquiriu as instalações da Sony do Brasil na Cidade
Industrial de Curitiba e ali instalou a Inepar S.A. Eletroeletrônica.
A Palitei Equipamentos Elétricos, fábrica de capacitares de baixa
tensão do Grupo Itel, foi comprada em 1991, época em que o Grupo
assumiu também metade do capital da JL Capacitares, de São Paulo.
O Grupo Inepar diversificou seus investimentos também em outras
áreas e hoje participa de empreendimentos como as revendas BMW -
Eurolmport (Paraná, Sta. Catarina e Rio de Janeiro), a HTV - Televisão a
Cabo (Giobosat), concessionárias GM, Factoring e fomento comercial,
agropecuária e outros. No início de julho de 1992, o Grupo lnepar reafirmou
sua pujança: firmou joint-venture com a General Electric do Brasil, para
fabricação de medidores de energia e equipamentos destinados à geração,
transmissão e utilização de energia elétrica, em quatro unidades fabris, sob
o comando da lnepar S.A. Eletroeletrônica.
A composição da joint venture: GE = 19,9% e INEPAR = 80,1 %.
Assim, observa-se que a empresa, desde o início de suas atividades,
sempre buscou o crescimento por r"!l~io de desenvolvimento e absorção de
tecnologia, bem como a verticalização da produção, comprando outras
empresas ou desenvolvendo parcerias com empresas que complementam
sua atividade, como foi no caso da General Electric. Segundo Atiliano de
Oms "o objetivo desta associação é reduzir custos de produção, ganhar
competitividade e ampliar a participação no mercado."
Esta política de crescimento permitiu à empresa estar presente em
praticamente todas as atividades da sociedade. Da usina geradora de
energia, passando pelas linhas de transmissão, subtestações, redes
urbanas e rurais de distribuição, instalações industriais, comerciais e
residenciais, a empresa está presente com equipamentos, produtos e
serviços.
Da mesma maneira, a empresa se faz presente, através de seus
produtos e serviços, em estações de saneamento, tratamento de água,
sistemas de telecomunicações e telefonia, sistemas de transporte
eletrificado de passageiros (metrô, trens e tróleibus) e sistemas de
iluminação pública contam com equipamentos e serviços de engenharia
250
especializada. A empresa tem atuado ainda no segmento de conservação
de energia e automação de sistemas.
Todo este conjunto de produtos e serviços permitiu à empresa faturar
cerca de 250 milhões de dólares em 1993 e seu quadro de "colaboradores
. se aproxima a 3.000 pessoas.
2. A filosofia empresarial
Em 1976, a INEPAR ainda não era uma empresa de expressão
nacional, com seu faturamento não tendo ainda atingido dois milhões de
dólares. No entanto, os seus Diretores já tinham uma visão clara do seu
"ideal" empresarial e fizeram registrar seus pensamentos em uma folha de
papel, que até hoje é distribuído entre os colaboradores e que expressa a
"maneira pela qual pensamos".
A Filosofia INEPAR" está sintetizada em 18 pontos, a seguir
transcritos literalmente:
Princípios determinantes da ftlosofia do Grupo
1. A boa ética profissional e empresarial será constante em todos os
procedimentos da empresa.
2. Toda e qualquer decisão deverá fundamentar-se no objetivo
visado.
3. Dar-se-á ênfase à descoberta e desenvolvimento dos potenciais
humanos existentes dentro do Grupo, delegando liberdade e
responsabi I idade.
4. O desenvolvimento da empresa e o desenvolvimento profissional
de seus gerentes caminharão paralelamente e constituirão, juntamente com
a perpetuidade, os objetivos principais da organização.
5. Dentro do princípio da procura constante do desenvolvimento e
longevidade da organização, procurar-se-á sempre promover a participação
na sociedade dos elementos de níveis gerenciais.
251
6. A responsabilidade pública e social do Grupo será demonstrada,
não só pelos seus dirigentes, mas também pela conduta interna e externa
de seus colaboradores.
7. A responsabilidade pela retribuição será considerada igualmente
relevante à responsabilidade pela contribuição .
. 8. Procurar-se-á sempre alcançar resultados incomuns através de
pessoas comuns.
9. Dar-se-á ênfase aos resultados e às contribuições, muito mais que
aos movimentos e ao trabalho em si mesmo, e o pessoal será julgado pela
sua atuação com a máxima abstração possível das características que não
interferem diretamente nessa atuação.
1 O. As pessoas aqui serão julgadas pelos resultados obtidos, e
não pela capacidade pessoal.
11. Buscar-se-á desenvolver ao máximo a prática da autonomia e
da otimização tática no nível gerencial e de chefias, dando-se total
importância às inovações através da análise dos seus benefícios.
12. Diante de qualquer decisão altamente significativa, o critério
prioritário é o de custo e benefício.
13. Entende-se sempre como competência nas empresas o
conglomerado profissional, contribuições apresentadas, relacionamento
humano, atributos morais e motivação ao desenvolvimento.
14. A qualidade do produto e a satisfação de utilização por parte
do cliente serão sempre fatores impulsionadores de nossa cada vez maior
participação no mercado.
15. O planejamento é considerado de alta relevância e, entende-se
por flexibilidade não o descumprimento do planejado, e sim o constante
replanejamento e correspondente cumprimento dos resultados assim
previstos.
16. O emprego constante da engenharia econômica aliada à
simplicidade com qualidade serão as tônicas da preocupação no
252
desenvolvimento, ou criação do produto, com vista sempre à adequação do
idealizado à realidade almejada pelo mercado consumidor.
17. A estrutura interna da empresa deverá evoluir a partir dos
objetivos claramente definidos, e a ênfase estará na exploração dos pontos
fortes , a par do cuidado normal no tratamento ou extinção dos pontos
fracos.
18. Procurar-se-á sempre manter a organização como
genuinamente nacional e como retrato fidedigno de engrandecimento de
nosso país.
Tal filosofia permitiu à empresa crescer e desenvolver os seus
negócios, principalmente porque a sua cultura tem acompanhado todo este
processo dinâmico sem perder a unidade e a essência: desenvolver,
expandir, criar e consolidar nas pessoas que forma a principal riqueza da
empresa, buscando sempre atingir e realizar resultados incomuns com
pessoas comuns.
Atiano de Oms Sobrinho e sua equipe de Diretores passara esta
cultura de crescimento, arrojo e busca. incessante de resultados incomuns a
todos os níveis de seus colaboradores.
A consolidação e constante reafirmação desta cultura é a ênfase em
todos os programas de tratamento, motivacionais, assistenciais, estratégicos
e táticos de todas as atividades do Grupo lnepar. Por isso é que quando se
visita a lnepar tem-se a clara idéia de que todos realizam seu trabalho com
a alegria e felicidade estampada no rosto. Quem trabalha feliz mesmo no
meio de tempos tão difíceis, produz mais e melhor.
Graças à sua cultura expansionista e de valorização constante de
seus recursos humanos é que o Grupo lnepar é extremamente bem
sucedido.
O sucesso é repartido com todos os que trabalham em prol do
desenvolvimento da empresa. O bem estar no trabalho é busca constante
de todos. A participação de todos tem sido decisiva para que os pbjetivos,
que são sempre altamente desafiadores, sejam alcançados.
253
Os fatos comprovam este sucesso que, por sua vez, evidencia que a
cultura é forte, sólida e plenamente assimilada por todos.
A síntese da filosofia da INEPAR pode ser resumida nestas palavras:
"Obter resultados extraordinários através de pessoas comuns". Ao mesmo
tempo, tal filosofia passava a orientar dois programas que abrangem grande
parte das práticas gerenciais inovadoras da empresa: o programa de
Garantia da Qualidade e o Projeto Q.uero-Quero.
3. O Programa de Garantia da Qualidade
Ao final dos anos 70, a INEPAR já iniciava um programa voltado à sua clientela: adotou a gestão através da Garantia da Qualidade. Desde
então, a empresa tem mantido a filosofia da Qualidade como uma das suas
práticas gerenciais mais importantes.
Assim. o sistema adotado permite que todas as etapas do ciclo
produtivo estejam interrelacionados desde a elaboração da proposta,
administração total e integrada no contrato até atividades de supervisão,
assistência técnica, passando por 'atividades intermediárias, entre outras,
como de Engenharia, Suprimentos, Produção, Controle de Qualidade e
Expedição.
A garantia da uniformidade do tratamento de cada
assegurada através de procedimentos, instruções e
conhecimento de todo corpo funcional.
São objetivos do Sistema de Qualidade:
cliente está
normas de
• assegurar que a fabricação dos produtos satisfaça os requisitos do
sistema bem como especificações do cliente e sua plena
adequação ao uso para o qual foi especificado;
• assegurar que, quando em funcionamento, os produtos não
apresentem defeitos de . fabricação ou não conformidades,
propiciando o seu máximo desempenho;
254
• assegurar uma constante otimização das operações industriais,
possibilitando um nível de confiabilidade maior, bem como
facilidade na sua supervisão e manutenção do produto com alta
economicidade;
• atualização constante do sistema operacional, da tecnologia e
diminuição das incertezas.
4. O Programa Quero-Quero
A partir da filosofia empresarial anteriormente definida, a empresa
focou todo o seu esforço de busca de resultados nos seus colaboradores.
Para tanto, era necessário romper o tradicional modelo de "vinculação
trabalhista" e partir para uma "relação de parceria" com os empregados.
Quem explica é Renato Requião, Diretor Industrial:
a empresa queria provar que é possível estabelecer
uma relação capital-trabalho decente. De outro lado,
precisava quebrar uma ·cerla cultura tradicional em
relação aos empregados: estes não gostam de
trabalho em ambiente sujo e querem discutir os
problemas do seu trabalho.
Assim, Renato Requião dizia que a empresa procura a "gerência pela
simplicidade" e isto levou ao desenvolvimento do Programa Quero-Quero,
que já recebeu inclusive um prêmio do Instituto Paranaense de
Administração de Pessoal - IPAP em 1991. Este programa surgiu para
harmonizar o "quero"do empregado com o "quero" da empresa. todas as
ações do programa são inspiradas no "humanware", a filosofia que tem o
ser humano como centro de todas as atenções e como principal fator
competitivo para grupos e organizações.
O nome "quero-quero", inspirador do nome do programa, vem de um
passarinho muito comum nos campos do Sul do Brasil, cujas características
são: viver em liberdade absoluta, manter seu espaço muito limpo e defender
seu ninho como um bravo guerreiro.
255
O Programa Quero-Quero está estruturado em um conjunto de 1 O
Mandamentos e de 11 linhas de projetos a serem desenvolvidos, cada qual
com o "Quero" do Empregado e com o "Quero;' da Empresa.
Os Quadros a seguir apresentam os mandamentos e os projetos
referidos, os quais são depois relacionados, um a um , com relação a seus
objetivos:
OS 1 O MANDAMENTOS DO PROGRAMA "QUERO-QUERO"
01. Amarás tua empresa como a ti mesmo.
02. Produzirás qualidade acima de tudo.
03. Produzirás cada vez mais e melhor.
04. Participarás das decisões da tua área.
05. Melhorarás profissionalmente e financeiramente.
06. Auxiliarás teus colegas para que sejas auxiliado.
07. Preservarás a tua empresa, da mesma maneira que ela te
preservará.
08. Preservarás os interesses dos teus clientes como os teus
próprios.
09. Lembrarás sempre que o teu progesso e o da lnepar só· virão
através do teu trabalho.
1 O. Pensarás em ti, na tua família, na tua lnepar, no Paraná e no
Brasil para que faças algo pelo MUNDO.
256
PROGRAMA "QUERO-QUERO" 1991
Objetivo: Integração empregado/Empresa na busca de melhores
resultados para ambos os lados.
Perfi l/Projetos:
QUERO (EMPREGADO) QUERO (EMPRESA)
a) Cultura/Leitura (Praça da Leitura) a) Qualidade
b) Conhecimento/comunicação/integra- b) Aumento da produtividade ção (café com Presidente)
c) Integração 1° Lar/2° Lar (visita dos c) Diminuição turn over familiares)
d) Conhecimento/acompanhamento (a d) Aumento da competitividade no mar-palavra do Presidente) cado brasileiro e internacional
e) Melhora financeira - alcançar 50% e) Desburocratização acima da média do mercado nos próximos 04 anos
f) Limpeza - a fábrica mais limpa do f) Melhor alternativa para associações mundo e joint-venture no Brasil para com
empresas estrangeiras
g) Organização - arrumação que facilite g) o trabalho e produtividade
Maximização dos resultados do Grupo lnepar, mesmo que a custa de sacrifícios internos
h) ambiente - familiar, amizade, cole- h) guismo, união de forças
Soluções inovadoras nos benefícios concedidos aos seus colaboradores
i) Ajuda - se dispor a prestar treina- i) Aumento de faturamento menta aos colegas, formal ou in-formalmente
j) Eliminação de desperdícios
k) Participaão nas decisões da área-
j) Empresa modelo/destaque sob todos os aspectos
k) Integração entre empresas do Grupo lnepar
257
DESCRIÇÃO DOS OBJETIVOS DO PROGRAMA "QUERO-QUERO" 1991
(EMPREGADO)
QUERO (EMPREGADO)
a) Cultura/Leitura (Praça da Leitura)
b) Conhecimento/comunicação/integração (café com Presidente)
OBJETIVO
Propiciar a todos os empregados da INEPAR acesso a revistas e jornais informativos e técnicos, visando aprimorar os seus conhecimentos e desenvolver as suas criatividades de acordo com a evolução das técnicas existentes.
A praça deverá ser utilizada para todo e qualquer evento cultural. As apresentações de conjuntos musicais, bandas, filmes educativos devem ser estimulados e já provaram ser um sucesso.
Integração empregado/empregador, eliminando as dificuldades de entendimento entre estas partes.
Operacionalização: Reuniões todas as 2as feiras no início do expediente, tomando o desjejum com o presidente da empresa, o diretor da área sorteada e mais nove funcionários escolhidos.
Este projeto nunca cessará e fará com que todos participem e retornem outras vezes, integrando cada vez mais as partes em questão, externando os anseios e dificuldades dos empregados e da empresa.
c)
d)
e)
QUERO (EMPREGADO)
Integração 1 o Lar/2° Lar (visita dos familiares)
Conhecimento/acompanhamento (a palavra do Presidente)
Melhora financeira - alcançar 50% acima da média do mercado nos próximos 04 anos
258
OBJETIVO
Trazer os familiares dos que aqui trabalham, para mostrar a empresa e o local onde passamos a maior parte de nossas vidas.
Aqui é o 2° lar e nossa casa o 1 o lar, portanto necessitamos do máximo bem estar para podermos viver dignamente.
O projeto já é sucesso e tem propiciado sub-produtos valiosos, tais como: diminuição do turn over; valorização dos empregados perante suas famílias; colaboração dos familiares na limpeza e organização; colaboração da empresa na limpeza e organização de algumas famílias; idéias de benefícios viáveis, sugeridos pelos familiares, etc.
Conhecer e acompanhar o crescimento e situação da empresa, participando de maneira construtiva e realista da sua evolução, tendo em vista que a evolução de cada colaborador é necessária para o sucesso do todo empresarial.
Cada colaborador deverá se sentir um empreendedor, onde suas idéias serão utilizadas para enriquecer a força e a competitividade da lnepar no mercado.
"O conhecimento da empresa é de vital importância para que se tenham empregados informados e que compreendam as mais diversas situações sempre relacionadas com as épocas e o perfil do mercado".
Conseguir perceber salários 50% acima da média de mercado para cada mesma categoria até o final de 1994, utilizando métodos inovadores de produção, ganho e satisfação. "Os métodos tradicionais já provaram não admitir melhora para o trabalhador".
O modelo utilizado com a "Mala Caseira" já está mostrando bons resultados.
259
QUERO (EMPREGADO) OBJETIVO
f) Limpeza - a fábrica mais limpa do Conseguir e manter estes intuitos mundo através do Comitê de Fábrica,
composta de elementos líderes e que realmente mostrem aptidão para estes objetivos. Treinamentos internos e mesmo externos deverão ser definidos e levados à aprovação por este comitê.
"Começamos mos_trando a fábrica pelo seu banheiro". E como enxergar o íntimo do ser humano.
g) Organização- arrumação que facilite Idem o trabalho e produtividade
h) ambiente - familiar, amizade, cole- Idem guismo, união de forças
i) Ajuda - se dispor a prestar treina- Idem mento aos colegas, formal ou informalmente
j) Eliminação de desperdícios
k) Participação nas decisões da área
Diminuir até a eliminação, os desperdícios e retrabalhos. Cada área deverá manter reuniões rápidas e objetivas com todos seus colaboradores, a fim de obter idéias simples que ataquem definitivamente estes problemas.
Testes já executados mostraram resultados surpreendentes, tais como: economia de energia nos intervalos; economia de água através de recirculação; melhoramentos em máquinas operatrizes; readequação de lay-out; inspeção de qualidade em fornecedores; etc.
"O Comitê de Fábrica" poderá orientar o procedimento de cada área, a fim de se obter maximização de resultados.
Idem
260
DESCRIÇÃO DOS OBJETIVOS DO PROGRAMA "QUERO-QUERO" 1991
, (EMPRESA)
a)
b)
c)
d)
e)
f)
QUERO (EMPRESA)
Qualidade
Aumento da produtividade
Diminuição turn over
Aumento da competitividade no mercado brasileiro e internacional
Desburocratização
Melhor alternativa para associações e joint-venture no Brasil para com empresas estrangeiras
OBJETIVO
Integrar todos os colaboradores de maneira participativa nos programas de garantia assegurada já existentes na INEPAR. "Produzir qualidade ao invés de controlar qualidade".
Melhorar os resultados da produção, através de sistemas modernos e inovadores que primem pela simplicidade. Já temos o exemplo do Kanban, os resultados são significativos e paupáveis.
Manter a equipe em constante desenvolvimento, não perdendo "cabeças" valiosas que foram aqui treinadas e desenvolvidas. Muitas vezes as razões das demissões são rídiculas e oriundas por falta de uma melhor comunicação. Os projetos de motivação e satisfação no trabalho fazem parte importante deste contexto.
Racionalizar através da engenharia econômica os produtos existentes e buscar novas opções no mercado internacional e nacional que pr'ôpiciem maior agressividade nas vendas/
Racionalizar os sistemas existentes, simplificando os processos, facilitando os controles e propiciando produtividade maior com qualidade assegurada.
"A lnepar participa de Instituto especializado em desburocratização".
A lnepar tem que ser a melhor alternativa no Brasil para associação, acordos tecnológicos e joint-ventures com empresas que busquem entrar no mercado brasileiro.
INEPAR:
Qualidade-Produtividade-AgressividadeConhecimento do Mercado
Relacionamento-Respeitabi I idade-Competência
g)
h)
i)
j)
k)
QUERO (EMPRESA)
Maximização dos resultados do Grupo lnepar, mesmo que à custa de sacrifícios internos
Soluções inovadoras nos benefícios concedidos aos seus colaboradores
Aumento de faturamento
Empresa modelo/destaque sob todos os aspectos
Integração entre empresas do Grupo lnepar
261
OBJETIVO
Relacionamento exemplar e salutar entre as empresas do grupo. Não poderemos admitir isolamentos e busca parcial de resultados.
"O todo é o mais importante"
"A busca do resultado maximizado será diretamente proporcional à nossa inteligência, humildade, despreendimento e competência".
Obter soluções inteligentes que beneficiem todos os empregados de maneira a não comprometer a saúde financeira da empresa.
"Para se obter bons ovos, o cuidado com a galinha é o mais importante". Sabemos que é até possível obter ovos com duas gemas!!?
Acatar as idéias dos funcionários através das reuniões da Área e Comitê de Fábrica.
Alcançar os resultados da Eletroeletrônica tendo como meta a quintuplicação do faturamento no final de 1994.
Assim todos os pré-requisitos para a obtenção destes resultados serão fruto dos projetos que executaremos ao longo dos próximos 04 anos.
Ser o melhor e trabalhar na melhor empresa, só pode ser motivo de orgulho.
"Vestir a Camisa" é prerrogativa de poucas erhpresas. Seremos uma delas e procuraremos ser a melhor.
Faremos distintivos do projeto Quero-Quero, escolhendo em votação o melhor modelo do pássaro para que através de "pregadores de lapela" mostremos o nosso orgulho de aqui trabalhar.
Integrar todas as empresas do Grupo, trocando experiências e maximizando os resultados.
"Devemos ter humildade suficiente para absorvermos as boas experiências dos outros, passando-as para a prática."
O repasse de esperiências com sucesso, economiza tempo e dinheiro para as co-irmãs, evitando · gastos desnecessários com consultorias ou tentativas frustradas.
Como exemplo, gostaríamos que todos os nossos colaboradores utilizassem veículos G.M. adquiridos nas concessionárias do grupo, pois além do resultado financeiro há o resultado psicológico de se estar colaborando para o resultado como um todo. A recíproca deve também ser verdadeira.
262
Os resultados dos vários projetos implantados dentro do Programa
"Quero-Quero" são estimulantes. A avaliação será feita com relação a cada
um dos projetos avaliados.
Projeto Cultura/Leitura
• A empresa implantou um espaço no interior da fábrica - a Praça da
Leitura - onde são colocadas as revistas: não há controle sobre
elas e é até normal os empregados trazerem revistas de casa para
deixarem na "Praça". A empresa assina vários jornais e revistas.
Normalmente a "Praça" é utilizada durante os horários de almoço e
nos intervalos da manhã e da tarde. (em anexo: cartazete "A Praça
é Sua").
• A empresa tem investido em muito treinamento, parte deste feito
com ampliação da jornada de trabalho. Há cuidados para evitar
problemas com o Sindicato (não caracterizar como hora-extra).
Tem havido treinamento inter-áreas opcionais (pensa-se em
formalizar mais tal exigência). Os próprios funcionários são
estimulados a ensinar seus colegas: uma secretária treinou outras
secretárias e, com isso, gahhou um Curso de Espanhol, pago pela
empresa.
• Na última sexta-feira de cada mês, realiza-se um evento cultural -
comerata, teatro, concerto de violão, entre outros, com duração de
01 (uma) hora; a empresa encerra o expediente meia-hora antes e
o empregado cede mais meia-hora do seu tempo, sem
remuneração: isto visa valorizar o evento cultural.
• Não há premiação pela geração de novas idéias: o funcionário já
se sente premiado ao ver sua ,idéia implantada.
Projeto Conhecimento/Comunicação// ntegração
• "Café com o Presidente"- é realizado toda segunda-feira, reunindo
o Diretor da área e mais dez funcionários. São discutidos vários
projetos e idéias (o próprio Programa "Quero-quero" foi resultado
263
destas sugestões). Outras idéias geradas foram: pagamento de
bolsas de estudo através da fundação lnepar, mantida pela
empresa; o Presidente também propõe projetos: por exemplo,
sobre o aumento da jornada de trabalho, para aumentar a
produção. Às sextas-feiras, o Presidente toma café com Gerentes
e Diretores (numa das últimas semanas, ocorreu a idéia de criar
uma nova empresa no Grupo).
• Os Diretores se revezam num café da manhã com gerentes e dez
funcionários de cada vez, além de um almoço semanal de
confraternização.
Projeto Integração 1° Lar/2° Lar
• A idéia é que o 1° lar é a família; o 2° lar é a empresa: ambos
precisam se integrar. toda sexta-feira são convidadas três famílias
de empregados para visitar a empresa. O objetivo é valorizar o
funcionário perante seus familiares, que conhecerão seu ambiente
de trabalho, assistirão ~alestras e vídeos sobre a empresa,
almoçarão juntos e poderão gerar opiniões e sugestões para a
empresa. Por exemplo, uma família sugeriu rever o critério de
distribuição de cestas básicas, pois casados e solteiros recebiam
uma igual. Hoje, a empresa já diferencia a cesta, em função do
"cadastro familiar".
• "A lnepar agradece": é um projecto de agradecimento formal às
famílias de funcionários que viajam freqüentemente a serviço da
empresa.
Projeto "Conhecimento! Acompanhamento"
• "Palavra do Presidente": regularmente o Presidente faz duas
palestras por ano: uma sobre os resultados do ano findo e as
perspectivas da empresa no futuro; outra de saudação aos novos
funcionários, visando integrá-los à cultura da empresa.
264
Projeto Limpeza - Fábrica mais limpa do mundo
• Foram elaborados diversos cartazetes e informes para serem
colocados nos locais de acesso dos colaboradores, entre os quais,
o "Perfil do Colaborador", enfatizando mais "habilidades" de
limpeza.
COLEGA
• Vamos zelar pelo nosso banheiro.
• Não vamos escrever nas paredes, pois é só pedir papel de
rascunho que a Empresa fornece.
• Vamos lembrar que todos nós utilizamos a mesma instalação.
• Queremos ser respeitados, não vamos admitir que irresponsáveis
prejudiquem a nossa imagem perante os outros colegas.
• Aqui é nosso segundo lar e não prisão.
• Ninguém é obrigado a ficar e nós não somos obrigados a aturar
pessoas desleixadas e sujas.
• Obrigado, ajude a fiscalizar.
COLEGAS
• To dos lembram que tivemos de escrever um texto até mesmo
pesado para podermos sensibilizar alguns companheiros, a
respeito dos cuidados com a higiene e limpeza dos banheiros.
• Felizmente todos estão colaborando e hoje nos orgulhamos da
fábrica, do escritório, do jardim, do restaurante e do banheiro que
temos.
PARABÉNS A TODOS
VAMOS CONTINUAR CABRICHANDO!
SIMPLESMENTE QUEREMOS SER OS MELHORES!
265
• Há caixas coletoras de papel por toda a empresa, visando reciclar
este material.
• Os ambientes na empresa são realmente muito limpos, inclusive na
área industrial, onde máquinas e ferramentas convivem com
arranjos de flores e gaiolas de pássaros.
Projeto Ambiente - Familiar, Amizade, Coleguismo, União das Forças
• Desde o final de 1992, não há mais relógio de ponto na entrada, o
que inclusive melhorou a pontualidade.
• Há buttons coloridos à disposição dos funcionários na entrada da
empresa. São três cores com funções bem claras:
quem usar o button verde, indica que está de bem com a vida;
quem usar o amarelo, indica que tem problemas, porém sem
gravidade;
quem usar o vermelho, significa que precisa de ajuda. Isto
pode reduzir também o índice de acidentes de trabalho, na
medida em que tais pessoas não receberão neste dia tarefas
que impliquem riscos para si ou para quem usaria o produto ou
serviço que estariam fazendo.
• O crachá do funcionário indica o nome ou apelido, escolhido pelo
próprio, pelo qual deseja ser identificado ou chamado. Evüa-se
assim chamá-lo pelo número, nome ou apelido degradante.
Projeto Ajuda
• Vários funcionários têm sido instrutores formais ou informais de
seus colegas. Isto tem aumento o nível de integração e de
266
responsabilidade destas pessoas e maior respeito perante seus
colegas.
Projeto Eliminação de desperdícios
• As próprias equipes são conscientizadas e motivadas a reduzir
desperdícios. Por exemplo, houve redução significativa no custo de
manutenção dos banheiros. Os próprios funcionários da unidade
produtiva gerenciam a verba para a manutenção, o que os levou a
manter e usar os banheiros de forma mais responsável.
Projeto Participação nas decisões da área
• O estilo gerencial da lnepar é predominantemente participativo em
todas as áreas: há ênfase no trabalho por equipes.
• Há um funcionário, escolhido pelo voto direto dos demais, que
participa do Conselho de Administração de todas as empresas do
grupo.
Outros projetos da empresa
Além dos projetos citados no Programa "Quero-Quero", a empresa
tem colocado em ação vários outros subprogramas voltados para a melhoria
na relação capital-trabalho. entre estes, pode-se citar os seguintes:
Parceria - Com funcionários aposentados que abriram suas próprias
empresas; com funcionários que mo11taram empresas e têm a lnepar
como cliente; com ex-funcionários que formaram empresas nas quais
a lnepar é sócia-minoritária.
Treinar para ser treinado - Aqueles funcionários que se dispuserem a
treinar seus colegas acumulam créditos para receber novos
treinamentos.
267
Plano de Assistência Médica (Pami) - Autogerenciamento da saúde,
com credenciamento direto de profissionais, laboratórios e hospitais.
Só são envolvidos os funcionários, os credenciados e a Fundação
lnepar, criada em junho de 1992, com o objetivo de cuidar da imagem
institucional da empresa e agrupar funções sociais, ambientais,
educacionais e econômicas.
Programa de Bolsas de Estudo (Probein) - Bolsas para dependentes
de funcionários, da pré-escola ao terceiro grau.
Programa de Assistência ao Empregado (PAE) - Atendimento e
encaminhamento de funcionários com problemas relacionados ao
álcool, drogas, stress e desequilíbrio emocional.
Piá no oficio - Adesão ao projeto da prefeitura de Curitiba para
contratação de menores carentes, que trabalham meio período e
continuam estudando.
Projeto de Ensino e Saúde Especial (Pense) - Bolsa mensal para
atender funcionários com filhos portadores de deficiências.
Vale creche- Outro programa ·da prefeitura. A empresa contribui com
o valor necessário à manutenção de uma creche municipal e tem
direito a 120 vagas, sendo o benefício gratuito para os funcionários.
Fundação Alírio Pfiffer - Entidade especializada no transplante de
medula óssea, mantida pela lnepar.
Projeto de Valorização de Idéias Talentosas (Provita) - A idéia
implementada por quem fez a sugestão, é reconhecida formalmente
com um diploma e divulgação interna.
Treinamento e cursos para familiares dos funcionários, em diversas
áreas, para a formação profissional de dependentes.
Hino Nacional - Projeto de incentivo ao patriotismo. Os funcionários
cantam o Hino Nacional em dia e horário escolhido por votação.
O resultado do Progama "Quero-Quero" e de seus subprogramas é o
que o "turn over" na empresa é próximo de zero, ou seja, as pessoas
268
admitidas passam a fazer uma carreira estável, cumprindo o seu papel
("quero" da empresa) e são compensados pela empresa ("quero" do
empregado).
De outro lado, a empresa distribui lucros aos seus empregados,
tornando-os parceiros nos resultados globais.
5. Práticas inovadoras na gestão industrial
Como resultado das inovações no relação capital-trabalho, a empresa
tem conseguido colocar em prática várias idéias inovadoras na gestão
industrial. Os principais aspectos analisados são os seguintes:
• a empresa tem um Sistema Kanban que orienta e acompanha o
processo de produção;
• há uma boa relação com os fornecedores, visando melhorar
continuamente o sistema "just-in-time", devido às características
peculiares da linha de produtos (não é. seriado}, há dificuldades
para a efetiva aplicação· deste sistema. No entanto, como
fornecedora de algumas grandes indústrias do setor de
eletrodomésticos, a INEPAR pratica o "just-in-time";
• sistema de parceria com os empregados, inclusive aposentados
(projeto já citado) reduz os custos de produção;
• o lay-out da fábrica é discutido pelos gerentes com os
empregados: as modificações são imediatas e não há resistência.
6. Análise do modelo de gestão
Como se verificou através das informações coletadas e analisadas
neste estudo de caso, a INEPAR é uma empresa que sempre buscou
inovações gerenciais. Ao avaliar as suas práticas adotadas ao longo de sua
trajetória de sucesso empresarial e de seus resultados, pode-se considerar
269
que a empresa tem predominantemente aplicado conceitos e práticas da
administração japonesa e da administração participativa.
Assim, tais práticas podem ser divididas segundo as duas
abordagens:
Administração japonesa:
• conceitos de um Programa SS (Housekeeping), envolvendo:
organização; ordenação; limpeza; asseio e disciplina;
• práticas de gestão industrial baseadas no Kanban e "just-in-time";
• comprometimento com a cultura da empresa;
• integração empresa-família;
• subcontratação industrial (envolvendo ex-empregados).
Administração participativa
• encontros freqüentes dos funcionários com o Presidente, Diretores
e Gerentes;
• comprometimento com os resultados da empresa;
• participação nos lucros;
• trabalhos com ênfase em equipe;
• representação dos funcionários no Conselho de Administração do
Grupo;
• implementação de idéias sugeridas pelos funcionários.
Neste sentido, a INEPAR é uma empresa que pode ser considerada
inovadora em métodos e práticas gerenciais, tendo abandonado as posturas
tradicionais de gestão.
CAPÍTUL06
CONCLUSÕES DO ESTUDO E
RECOMENDAÇÕES
271
Com base no presente estudo, baseado na análise do cenário
histórico da evolução dos modelos de gestão; da descrição da filosofia; dos
conceitos e principais práticas dos novos modelos de gestão; e da análise
de três estudos de caso de empresas brasileiras que têm desenvolvido
esforços para aplicar alguns dos conceitos e práticas dos novos modelos
estudados, é possível estabelecer um conjunto de afirmações conclusivas
sobre o estudo, bem como propor algumas recomendações.
As conclusões serão vinculados aos respectivos objetos do estudo e
se referem aos seguintes aspectos:
a) Com relação ao objetivo "analisar o contexto histórico da
evolução da gestão empresarial a nível mundial e brasileiro", conclui-se
que:
a.1- A origem e evolução dos modelos de gestão são influenciados
pelas mudanças ambientais que afetam as organizações. Neste sentido, a
evolução das "ondas de transformação" e, dentro destas, a· evolução das
"eras empresariais" determinaram as condições para o surgimento e
evolução de conceitos e práticas de administração que, com o tempo, foram
reconhecidos como modelos ou Teorias da Administração.
a.2- Neste sentido, o cenário ambiental que provocou a entrada do
Brasil na "era empresarial" influenciou para que o processo de
industrialização no país decolasse quando os países mais desenvolvidos já
se encontravam no esgotamento do seu paradigma de sociedade Industrial.
Portanto, os modelos de gestão aplicados pelas empresas brasileiras, de
forma geral, ainda são predominantemente de características tradicionais,
baseados na Era da Produção em Massa e da Era da Eficiência (período
1920/1970).
a.3- Não há uma linearidade entre as "ondas de transformação", as
"eras empresariais" e o modelo de gestão aplicado ao nível de determinada
organização. As empresas podem estar em níveis diferentes de evolução \
organizacional e, em conseqüência, do modelo de gestão predominante.
Assim, as empresas brasileiras estão distribuídas nas quatro eras
empresariais, não significando que todas elas estariam acompanhando a
"era da competitividade" nos anos 90.
272
b) com relação ao objetivo "analisar as origens, características e
principais instrumentos dos novos modelos de gestão empresarial", conclui
se que:
b.1- Dentre os novos modelos de Administração, ou seja, aqueles
surgidos no rompimento da Sociedade Industrial para a Sociedade da
Informação, a Administração Japonesa emerge como a abordagem que mais
se aproxima do conceito de modelo de gestão, ou seja: tem uma origem
histórica e cultural profunda, decorrente do ambiente onde surgiu;
desenvolveu conceitos novos e independentes dos modelos tradicionais de
gestão; absorveu também conceitos e práticas dos modelos tradicionais,
sem descaracterizar a estrutura dos seus conceitos; e criou instrumentos
gerenciais específicos, de ampla aplicabilidade nas empresas orientais· e
ocidentais.
b.2- Os novos modelos de administração têm algumas
características comuns, destacando-se dois aspectos: uma forte orientação
para o cliente e um estilo mais participativo de gestão. Assim, as
características e os instrumentos . gerenciais desenvolvidos por estes
modelos procuram, de um lado, substituir a visão da estrutura funcional,
orientada para controles, para estrutura orientada para resultados; de outro,
de uma estrutura verticalizada para uma estrutura horizontalizada.
b.3- Em termos do desenho organizacional, os modelos estão
evoluindo em três estágios: num primeiro momento, a estrutura é
hierarquizada no sentido vertical (modelos tradicionais); num segundo
momento, a estrutura continua hierarquizada, porém em menor número de
níveis hierárquicos e passa a ter um desenho mais horizontalizado, através
de estilos mais participativos e empreendedores de gestão (Administração
Japonesa, Participativa e Empreendedora). Finalmente, percebe-se que as
organizações caminham no futuro para serem parte de uma rede de
pequenas organizações, interligadas por interesses comuns (Administração
Holística e Corporação Virtual).
273
b.4- Analisando a evolução cronológica dos modelos de gestão,
observa-se que, nos extremos (entre os modelos tradicionais e a corporação
virtual}, surgiram os modelos de Administração Japonesa, Administração
Participativa e Administração Empreendedora, cujo principal papel parece
ser de transição dos modelos tradicionais para a corporação virtual no
futuro. Assim, as empresas que adotam, por exemplo, práticas
empreendedoras de gestão, não estão utilizando seus instrumentos como
um modelo definitivo e sim como ferramentas de transição na busca de um
modelo que permita sua sobrevivência e competitividade. Isto não significa
que a corporação virtual será o modelo definitivo de administração: assim
como os novos modelos surgiram em função das mudanças ambientais, não
é possível ainda vislumbrar o cenário futuro e sua implicações sobre os
modelos gerenciais "pós-virtuais".
c) Com relação ao objetivo "analisar, através do estudo de caso,
três empresas que notoriamente incorporam na sua prática administrativa
vários instrumentos gerenciais inovadores", conclui-se que:
c.1- As empresas brasileiras analisadas não utilizam os novos
modelos de gestão de forma exclusiva, ou seja, tais empresas combinam
várias práticas inovadoras de gestão, as quais podem ser identificadas com
mais de um modelo de gestão inovador. Esta conclusão reforça um dos
aspectos anteriores de que tais modelos possuem características comuns
(visão da clientela e estilo mais participativo de gestão) e possuem
instrumentos gerenciais que podem ser combinados ou complementados em
suas práticas.
c.2- As empresas brasileiras analisadas são líderes de mercado ou
inovadores de tecnologias e processos operacionais em seu setor de
atividades. Tal característica evidencia uma inter-relação entre a
competitividade e o modelo de gestão, ou seja, para que as empresas
sobrevivam na Era da Competitividade, deverão desenvolver esforços para
adotar algumas das práticas gerenciais propugnadas pelos novos modelos
de gestão.·
274
d) Com relação ao objetivo "propor em conjunto de
recomendações", este estudo propõe algumas idéias a seguir:
A partir das conclusões enunciadas são elaboradas algumas
recomendações, dirigidas às Escolas de Administração, aos dirigentes
empresariais e aos profissionais _que atuam no nível gerencial das
organizações.
a) Recomendações às Escolas de Administração
O mundo está evoluindo rapidamente e já há sinais evidentes que a
sociedade passa a viver, nesta prox1ma virada de milênio,
predominantemente a Sociedade da Informação ou do Conhecimento.
Assim, as organizações precisarão acelerar a mudança dos seus modelos
de gestão, adotando abordagens inovadoras de administração e certamente
aquelas que foram analisadas neste estudo estarão presentes nas práticas
. gerenciais corriqueiras destas organizações.
De outro lado, observa-se que a maioria das Escolas de
Administração, responsáveis pela formação dos profissionais que dirigirão
as empresas ou gerenciarão seus processos administrativos, em sua grande
maioria, ainda adotam conteúdos curriculares cujo conhecimento passa a se
tornar obsoleto diante das novas abordagens do administração.
Neste sentido, a estrutura curricular é mais informativa ("como se
administrava uma empresa nas Eras da Produção em Massa e da
Eficiência) do que formadora ("como se administrará a empresa das Eras da
Qualidade e da Competitividade).
No entanto, a questão não é apenas "mudar o conteúdo curricular". É
preciso trabalhar e desenvolver este conteúdo. O ensino de Administração
no Brasil está praticamente (desvinculado) da pesquisa e pouco se conhece
da realidade gerencial das nossas empresas nacionais. Assim, observa-se
que aquelas empresas mais inovadoras, como as três organizações
analisadas neste estudo, estão buscando novos conhecimentos e práticas
em empresas de consultoria de origem internacional.
275
Assim, as Escolas de Administração não têm cumprido o papel de
serem "geradoras" de conhecimento e sim, em regra, meramente
"multiplicadoras" de conhecimentos já gerados ... e geralmente já obsoletos.
Concluindo esta análise, recomenda-se, de forma generalizada, às
Escolas de Administração (públicas ou privadas, independentes ou
vinculadas à Universidades) que repensem sua missão e a forma como
estão preparando os profissionais que conduzirão as organizações nas
próximas turbulentas décadas.
b) Recomendações aos dirigentes empresariais
A sobrevivência das organizações, públicas ou privadas, nos
próximos anos e décadas, dependerá cada vez mais da capacidade dos
seus dirigentes orientarem e conduzirem as grandes mudanças necessárias
à adaptação (ou até antecipação) aos novos cenários ambientais.
Assim, os dirigentes empresariais assumirão novos desafios e papéis
diante deste quadro. Antes de mud13r as organizações, é preciso mudar as
pessoas, não no sentido de substitui-las, mas de fazer com que elas
mudem.
Tais mudanças, certamente, devem começar pelos propnos
dirigentes: a condução das organizações inovadoras e competitivas exigirá
deles, em primeiro lugar, a postura de "líderes de visão". As organizações
caminharão no sentido para o qual esta visão apontará: este será o principal
papel dos dirigentes. Quanto aos papéis tradicionais, grande parte será
delegado aos níveis gerenciais, sobretudo aqueles relacionados c.om a
gestão de processos internos e suas respectivas decisões.
Concluindo, recomenda-se aos dirigentes empresariais, repensarem
o seu papel e sua postura pessoal frente ao cenário prospectivo das novas
abordagens da administração. Como se verificou anteriormente, todas as
alternativas de novos modelos de gestão caminham para estilos mais
participativos de administração.
276
c) Recomendações aos profissionais de nível gerencial das
organizações
Após a análise dos novos modelos de estão e o papel decorrente dos
dirigentes empresariais, cabe recomendar aos profissionais, atuais e
futuros, do nível gerencial das organizações, um repensar sobre o seu
papel, posturas e habilidades pessoais frente ao cenário emergente de
novas práticas de gestão.
Os gerentes assumirão um (novo) papel, muito mais nobre e
importante do que aquele exercico nos modelos tradicionais da
administração: de controladores em busca da eficiência, passarão a ser os
orientadores das pessoas na busca da excelência (eficiência+ eficácia). Em
outras palavras, considerando que os modelos emergentes de
administração levarão as organizações a operarem em estruturadas
horizontalizadas, no máximo com três níveis hierárquicos e o trabalho
organizado com ênfase em equipes, geralmente auto-gerenciáveis, um novo
papel caberá aos profissionais da gerência: assim, serão os orientadores
("coach") e líderes de equipe, com a missão de estimular as pessoas à auto
motivação ("empowerment") em busca dos resultados e da missão da
empresa.
Concluindo, recomenda-se a estes profissionais a postura da auto
aprendizagem permanente. O melhor gerente não será mais aquele que tem
maior conhecimento: será aquele que está mais auto-motivado para
aprender.
Com estas recomendações - às Escolas de Administração, aos
dirigentes empresariais e aos profissionais de nível gerencial -o autor deste
estudo espera estar cumprindo modestamente com um dos propósitos
anunciados: contribui para o aprimoramento da gestão empresarial nas
organizações brasileiras.
277
ABSTRACT
The main purpose of this thesis is to contribute to understanding the
new approaches of management. The study is composed of three parts: the
first describes the evolution of the "corporate eras", since the Second
Industrial Revolution ("mass production") until the lnformation Society
("competitivity era"); the second part is a description of a conceptual
framework of the new approaches of management, including the following:
japanese management; participative management; entre/intrapreneurial
management; holistic management; and virtual corporation. Finally, the third
partis a report of three case studies about the evolution of the management
in brazilian innovative companies. Thus, the study is a descriptive research.
The main conclusion is that the brazilian companies need rapidly to
cope their managerial models to the new approaches to survive in the
turbulent nineties.
The study resulted in a set of recommendations about the introduction
of the new approaches of management in brazilian companies.
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