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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CENTRO DE CIÊNCIAS FÍSICAS E MATEMÁTICAS DEPARTAMENTO DE MATEMÁTICA HARLLEY BORLIN RESOLUÇÃO DO PROBLEMA DA DUPLICAÇÃO DO VOLUME DO CUBO UTILIZANDO O ORIGAMI FLORIANÓPOLIS 2008

ORIGAMI NA MATEMÁTICA - UFSC

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CENTRO DE CIÊNCIAS FÍSICAS E MATEMÁTICAS

DEPARTAMENTO DE MATEMÁTICA

HARLLEY BORLIN

RESOLUÇÃO DO PROBLEMA DA DUPLICAÇÃO DO VOLUME DO CUBO UTILIZANDO O ORIGAMI

FLORIANÓPOLIS 2008

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Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao curso de Licenciatura em Matemática da Universidade Federal de Santa Catarina, para obtenção do grau de Licenciado em Matemática.

Orientador: Prof. Dr. Félix Pedro Quispe Gómez

FLORIANÓPOLIS 2008

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Dedico este trabalho ao meu avô Genuino Borlin (em memória) que de alguma forma me ajudou e está muito feliz com minha conquista onde quer que esteja.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, por não me deixar desistir e me dar forças pra seguir em frente.

À minha família: minha mãe Léa, meu pai Sérgio e meu irmão Dayvison, por

me apoiarem em todos os momentos e suportarem minha tristeza em diversas fases

desta caminhada.

À minha namorada Liamara, pelo carinho, apoio e compreensão pela

ausência em alguns momentos.

Ao professor Félix Pedro Quispe Gómez, pela paciência e apoio no decorrer

desta monografia. Além de orientador foi meu amigo e serviu de exemplo de como

devo seguir na carreira docente.

Aos professores Márcio Rodolfo Fernandes e Nereu Estanislau Burin, por

aceitarem o convite para participar da banca examinadora.

A todos os amigos que fiz neste curso, que de alguma forma me ajudaram,

fazendo com que a vinda até a faculdade fosse sinônimo de alegria e diversão, além

de estudos.

A todos que participam da comunidade universitária, que ajudam esta a

crescer cada dia mais.

Obrigado!

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“A inteligência é uma espécie de paladar que nos

dá a capacidade de saborear idéias”

Susan Sontag

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RESUMO

Este trabalho visa apresentar um pouco da história da matemática, bem como as tentativas de resolução de um problema da antiguidade, mais conhecido como problema da duplicação do volume de um cubo, ou problema deliano. Ao longo dos anos despertou o interesse de muitos matemáticos em tentar resolvê-lo geometricamente utilizando régua sem escala e compasso. Devido ao seu enunciado simples, pensaram que poderia ser fácil, no entanto constataram que não era tão simples quanto parecia. Conseguiram chegar apenas em aproximações, mas ninguém conseguiu resolvê-lo. Somente 2200 anos depois, com o surgimento da álgebra, o problema foi provado. Anos se passaram e finalmente foi demonstrado que o problema não pode ser resolvido com régua e compasso. Portanto, torna-se curioso que com a arte milenar japonesa de dobrar papel, o origami, conseguiu-se resolver este problema, sendo o objetivo maior deste trabalho, a apresentação, resolução e demonstração deste, utilizando o origami. Palavras-chave: História da Matemática; Problemas da Antiguidade; Matemática e o Origami.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Cubo com aresta m1

Figura 2: Cubo com aresta m2

Figura 3: Évariste Galois (1811-1832)

Figura 4: Construindo um quadrado com o dobro da área do menor de uma unidade

Figura 5: Uma parábola com qualquer lado reto

Figura 6: Duas parábolas com vértices na origem

Figura 7: Intersecção de uma parábola com uma hipérbole

Figura 8: Tsuru

Figura 9: Dobragem Miura

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO............................................................................................................... 10

CAPÍTULO 1 – A ORIGEM DO PROBLEMA DA DUPLICAÇÃO DO VOLUME DO CUBO.............................................................................................................................

11

1.1

UM POUCO DE HISTÓRIA................................................................................. 11

1.1.1 ANAXÁGORAS...................................................................................... 11 1.1.2 ARQUITAS............................................................................................. 13 1.1.3 PLATÃO................................................................................................. 14 1.1.4 PÉRICLES.............................................................................................. 17

1.2

A ORIGEM DO PROBLEMA............................................................................... 19

1.2.1 ÉVARISTE GALOIS............................................................................... 21 CAPÍTULO 2 – ALGUMAS TENTATIVAS DE RESOLVER O PROBLEMA DELIANO.......................................................................................................................

25

2.1 A CONTRIBUIÇÃO DE ARQUITAS (428 a.C. - 347 .C.).................................... 26

2.2 A CONTRIBUIÇÃO DE MENAECMUS (380 a.C. - 320 a.C.)............................. 27

2.3 A DEMONSTRAÇÃO DE QUE O PROBLEMA DELIANO NÃO PODE SER RESOLVIDO COM RÉGUA SEM ESCALA E COMPASSO...............................

29

CAPÍTULO 3 – UTILIZANDO O ORIGAMI PARA RESOLVER O PROBLEMA DA DUPLICAÇÃO DO VOLUME DO CUBO......................................................................

33

3.1 ORIGAMI.............................................................................................................. 33

3.2 RESOLVENDO O PROBLEMA COM UMA FOLHA QUADRADA DE PAPEL...........................................................................................................

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CONSIDERAÇÕES FINAIS...........................................................................................

42

BIBLIOGRAFIA ............................................................................................................ 43 ANEXO..........................................................................................................................

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INTRODUÇÃO

Prêmio Nobel por duas vezes, Albert Einstein (1879 – 1955) se faz

competente: “Como pode a Matemática, sendo produto do pensamento humano,

independente da experiência, se adaptar tão admiravelmente aos objetos da

realidade?”. Apropriadamente, já se definiu a Matemática como “rainha e serva de

todas as ciências”. E o destaque de sua majestade é o rigor, a lógica e a harmonia.

Rigorosa e lógica deve ter sido a percepção do rei Ptolomeu, que, ao folhear

os Elementos, de Euclides (c.325 – c.265 a.C.), perguntou esperançosamente ao

autor se não havia um caminho mais suave para aprender Geometria. Breve,

Euclides teria respondido: “Não há estrada real para a Geometria”.

Em contrapartida, o renomado escritor argentino Ernesto Sábato descreve a

Geometria como “um mundo de infinita harmonia” e afirma que, quando tinha doze

anos, assistiu à demonstração de um de seus teoremas e sentiu “uma espécie de

vertigem”.

Ao longo da história, a Geometria glorifica três problemas que se tornaram

clássicos: a quadratura do círculo, a duplicação do cubo e a trissecção do ângulo,

extremamente importantes no desenvolvimento da geometria.

A duplicação do cubo é um problema de enunciado muito simples e talvez por

esse motivo tenha despertado o interesse de muitos matemáticos. Mas a primeira

questão que se coloca ao escrever sobre este problema é: como terá surgido o

problema da duplicação do cubo, ou também conhecido como problema deliano?

Vejamos a seguir um pouco da história deste problema.

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CAPÍTULO 1

A ORIGEM DO PROBLEMA DA DUPLICAÇÃO

DO VOLUME DO CUBO

1.1 UM POUCO DE HISTÓRIA

Vamos primeiramente conhecer um pouco da história da matemática e de

estudiosos importantes que viveram na época em que surgiu o Problema Deliano.

1.1.1 ANAXÁGORAS

Anaxágoras foi um filósofo, biólogo, astrônomo, físico e matemático grego.

Nasceu em 499 a.C., em Clazômenas, na Jônia, colônia grega na Ásia Menor,

Fenícia, 30 km a oeste de Izmir, chamada hoje de Turquia. Ele levou para Atenas a

filosofia jônica de tendência mecânica e onde fundou, sob os auspícios de Péricles,

que era o seu discípulo e protetor, a Primeira Escola de Filosofia da cidade de

Atenas, contribuindo para a expansão do pensamento filosófico e científico que era

desenvolvido nas cidades gregas da ásia.

Anaxágoras tinha um espírito prático e foi um dos responsáveis por mudanças

fundamentais na matemática do século V a.C., por ter elaborado teorias de

incontestável profundidade, por ter exercido grande influência sobre a filosofia grega

posterior a ele e de ter desenvolvido em Atenas as concepções desenvolvidas pelos

pensadores das colônias helênicas. Como Anaxágoras era fiel descendente da

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escola jônica de Tales, em função de suas opiniões científicas se chocarem com as

concepções religiosas da época.

Por acreditar e dizer que o sol não era uma divindade, mas uma grande pedra

incandescente e que a lua era uma terra habitada sem luz própria, Anaxágoras foi

preso e julgado por ateísmo em 431 a.C. em Atenas e neste período se dedicou

mais à pesquisa matemática. Foi libertado com a ajuda de seu aluno Péricles e foi

morar em Lâmpsaco, na Mísia, até o seu falecimento em 428 a.C. (no ano do

nascimento de Arquitas, um ano antes do de Platão e um ano depois da morte de

Péricles). Nesta cidade fundou uma escola de filosofia que fez com que ele

ganhasse muita estima e fama junto com a população local.

Com as suas idéias, foi publicada uma obra, Sobre a Natureza, que era um

tratado aparentemente pequeno em que tentava conciliar a existência do múltiplo

frente a crítica de Parmênides e sua escola, que havia concebido o ser como

princípio de tudo o que é, identificando o ser como Uno Imutável. Essa obra foi o

primeiro best-seller científico da época. Anaxágoras era mais filósofo do que

matemático e era motivado pelo desejo de saber, descobriu os processos de

respiração dos peixes e das plantas, explicou a inteligência dos homens e parece ter

dado a explicação correta para os eclipses, além de acreditar que a matemática era

composta de átomos.

Sua obra pode ser situada entre a tradição milésia e o pensamento de

Parmênides. Com os filósofos de Mileto, sustentava que a experiência sensorial põe

o ser humano em contato com uma realidade cambiante, cuja constituição última ele

pretendia encontrar. Como Parmênides afirmava que só o ser é e o não-ser não é,

porque ao ser não se pode acrescentar e nem tirar nada, considerando assim que

“nada vem à existência nem é destruído, tudo é resultado da mistura e da divisão”.

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Defendeu também a idéia de que, junto à matéria, existe um princípio ordenador,

uma inteligência como causa do movimento, por isso, foi chamado de o primeiro

dualista.

Anaxágoras aparece ao lado de Pitágoras no quadro Escola de Atenas de

Rafael, segurando a tableta com o número triangular 1+2+3+4, a sagrada tetractys

dos Pitagóricos.

1.1.2 ARQUITAS

Arquitas foi matemático, astrônomo, filósofo, músico e político grego, nascido

no ano de 428 a.C. em Tarento, cidade colonial grega no sul da Itália, nas costas do

mediterrâneo. Era representante da escola pitagórica e de caráter platônico, foi um

dos principais responsáveis por mudanças fundamentais na matemática do quinto

século antes de Cristo e de transição na era platônica.

Foi discípulo de Filolaus e amigo de Platão, mas foi mais aritmético do que

geômetra e sem a componente religiosa e mística dos pitagóricos como Filolaus.

Arquitas acreditava que o número era o que havia de mais importantena vida e na

matemática, porém previa que no futuro a supremacia seria da geometria. Foi o

primeiro a usar o cubo em geometria e a restringir as matemáticas às disciplinas

técnicas como geometria, aritmética, astronomia e acústica.

Na política, Arquitas nunca foi derrotado e foi eleito governador da cidade

durante sete vezes consecutivas, onde governou como autocrático moderado,

bondoso, justo e adorava crianças, para as quais costumava inventar brinquedos,

como por exemplo, o primeiro brinquedo voador, a pomba, criado em 400 a.C.. Sua

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ação mais notável na política foi quando fez uma intervenção junto ao tirano Dionísio

para salvar a vida de seu amigo Platão.

Muitas obras hoje perdidas sobre mecânica e geometria, são atribuídas a ele.

Escreveu sobre as utilizações das médias aritméticas e geométricas, sobre métodos

interativos para determinação de raízes quadradas e sobre geometria analítica. Para

resolver o famoso Problema Deliano, que é o problema da duplicação do volume do

cubo, Arquitas utilizou um modelo tridimensional.

Introduziu o estudo da média harmônica na música e escreveu Harmonia, da

qual conhecemos alguns fragmentos. Arquitas sempre achou que a música era mais

importante que a literatura no ensino das crianças, dentro de um núcleo educacional

chamado de quadrivium, formado por quatro disciplinas: aritmética, música,

geometria e astronomia. Influenciou Euclides e seus estudos e idéias são a origem

da matemática ter se tornado matéria básica na educação nos dias de hoje.

Arquitas morreu em 365 a.C., em um naufrágio na costa da Apúlia.

1.1.3 PLATÃO

Platão foi um filósofo e matemático grego nascido no ano de 427 a.C..

Acrdita-se que seu nome verdadeiro tenha sido Arístocles e que Platão era um

apelido que fazia referência à sua característica física, tal como o porte atlético ou os

ombros largos, ou ainda a sua ampla capacidade intelectual de tratar de diferentes

temas.

Foi fundador da Academia Ateniense, onde se reuniam os principais mestres

e pesquisadores da época, entre os quais se destacou o seu discípulo mais

importante, Eudoxo, que apesar de não ter sido um grande criador da matemática,

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foi um guia e inspirador do desenvolvimento desta ciência e ficou conhecido como o

criador de matemáticos.

Platão foi o criador do platonismo, doutrina caracterizada principalmente pela

teoria das idéias e dos números e pela preocupação com temas éticos com base no

conhecimento das verdades básicas que fazem a realidade visando toda meditação

filosófica ao conhecimento do Bem, o que ele achava ser o essencial para existir a

justiça entre os estados e entre os homens.

Seu pensamento foi assimilado pelo cristianismo primitivo, dominando a

filosofia cristã antiga e medieval, e, junto com seu mestre e amigo Sócrates e o

discípulo Aristóteles, lançou a base sobre a qual se assentaria o início de toda a

filosofia ocidental. Acredita-se que Platão iniciou os seus estudos filosóficos com

Crátilo, seguidor de Heráclito, antes de conhecer Sócrates, do qual se tornou um

quase adorador. Sócrates era um crítico dos maus hábitos e dos governos de

Atenas, o que causou a sua condenação à morte.

Depois que Sócrates morreu, em 399 a.C., acreditando que Atenas havia

perdido a liberdade de pensamento, Platão foi viajar pelo mundo helênico,

dedicando-se ao comércio e ao estudo por vários anos.

Em Cirene estudou Geometria com Teodoro e em Tarento conheceu e tornou-

se amigo do rei-geômetra Arquitas, com quem aprendeu a matemática dos

pitagóricos. Em Mégara foi ao encontro de Euclides, outro discípulo de seu mestre.

Foi a Siracusa, no sul da Itália, a convite de Dionísio I, onde se relacionou com

outros pitagóricos, mas as suas doutrinas acabaram irritando a Dionísio I e este

mandou vendê-lo como escravo no mercado de Egina, onde foi resgatado por um

cirenaico.

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De volta a Atenas, em 387 a.C., estudou com Teodoro e Taeatetus e iniciou

os seus ensinamentos filosóficos. Inicialmente não escreveu sobre matemática, só

tendo uma visão do assunto após uma visita a seu amigo Arquitas, na Sicília, que

voltaria a visitar mais vezes, tornando-se o seu mais importante discípulo. Após a

morte de Dionísio I, o seu sucessor, Dionísio II, convidou Platão a outra viagem à

Sicília, para pôr em prática suas idéias de reforma política.

Novamente em Atenas em 360 a.C., fundou sua famosa Academia que era

destinada à investigação filosófica, onde dirigiu e ensinou até a sua morte, aos 80

anos. Nessa academia reuniu um grupo de excelentes geômetras, como Têudio de

Magnésia, Âmiclas de Heracléia, Menecmo e Dinostrato de Atenas, Ateneu de

Cízico, Hermótimo de Cólofon e Taeatetus de Atenas. O livro-texto usado na

Academia foi escrito por Têudio, certamente aproveitando parte dos trabalhos feitos

por Hipócrates.

Nessa época, meio século antes de Euclides, já se usava a expressão

Elementos de Geometria. Apesar de muitos avanços, continuavam de pé os Três

Problemas Clássicos (a trissecção do ângulo, a duplicação do cubo e a quadratura

do círculo), além de parte da Teoria das Proporções, envolvendo grandezas

incomensuráveis. A convite de Dionísio II, foi mais uma vez ao sul da Itália, mas teve

que fugir de volta a Atenas acusado de participar de lutas políticas contra o governo,

que terminaria exilado por seus atos arbitrários.

Em sua época a matemática grega passou por drásticas modificações,

surgindo também à álgebra geométrica no lugar da álgebra aritmética surgindo a

homogeneidade das equações, ou seja, a soma de segmentos só com segmentos,

volume só com volume, etc. A ele deve-se também o fato da matemática ter se

tornado uma disciplina essencial para a educação dos homens. Ao quadrivium de

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Arquitas acrescentou a estereometria, pois achava que até o momento a geometria

dos sólidos não tivera a ênfase necessária

Da sua escola devem-se algumas definições interessantes como o ponto é o

início de uma reta e esta é um comprimento sem largura, a distinção entre números

pares e ímpares e suas operações entre si, etc. Não concordava com o uso de

instrumentos, como régua e compasso, no desenho de figuras, pois tudo deveria ser

definido através de equações. Seus trinta e seis trabalhos divididos em tetralogias

nos chegaram até hoje via o famoso gramático Trisilo.

Morreu no ano de 347 a.C. em Atenas e entre suas principais obras citam-se

Timaeus (sobre sólidos regulares), Repúplica (sobre aritmética), Phaedo (sobre as

últimas horas de Sócrates), Leis (sobre cidadania) e Taeatetus (sobre a obra deste).

Foi um dos filósofos mais influentes de todos os tempos e seus ideais estéticos e

humanistas do Renascimento constituíram uma recuperação do platonismo. Há

elementos platônicos também em pensadores modernos, como Leibniz e Hegel.

1.1.4 PÉRICLES

Péricles nasceu em Atenas em 495 a.C.. Foi um estadista ateniense e

governador de Atenas durante 32 anos (463-431 a.C.). Seu governo marcou o

surgimento da civilização helênica como potência científica da Antiguidade, época

de maior esplendor desta civilização e da consolidação do sistema democrático

ateniense.

Por ser de uma família de elite, influente nas finanças e na política e educado

por filósofos, Péricles tornou-se general, entrou na política e foi eleito o general

superior na Grécia Antiga, derrotando o líder aristocrata Címon, com uma plataforma

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de reformas democráticas. Isto lhe atribuiu o comando das forças de terra e de mar,

influenciar no controle da fazenda pública e na política interna e externa do estado.

Reelegeu-se anualmente durante mais de 30 anos.

Célebre orador e estrategista, tornou-se o principal artesão da expansão

imperial de Atenas como potência comercial da Grécia. Instalou novas colônias e

ampliou a hegemonia ateniense sobre 400 cidades-estado, através da liga de Delos,

contra os persas. No seu governo, Atenas expandiu, monopolizou o comércio

marítimo e tiranizou seus aliados da confederação de Delos, o que levou ao longo

conflito com Esparta, que culminou com a Guerra do Peloponeso (431-404 a.C.).

Durante o período inicial de seu governo, Péricles enfrentou grandes

dificuldades, principalmente quando a peste começou a dizimar a população

ateniense, reprimiu brutalmente as rebeliões e governou sob forte oposição. Foi a

maior figura política de Atenas e a organização definitiva da democracia ateniense

teve nele seu mais eficaz agente.

Péricles realizou grandes construções em Atenas, como o Partenon, templo

pagão de insuperável perfeição arquitetônica e riqueza escultória, e estimulou as

artes e a cultura. A identidade de sua primeira esposa é desconhecida, porém sabe-

se que dela divorciou-se dez anos após o casamento para viver com a bela e

inteligente Aspásia, de Mileto, 25 anos mais jovem e que teria grande influência

política em seu governo.

Depois de muitos anos no poder, Péricles perdeu a eleição (431 a.C.), quando

a liga de Delos foi derrotada por Esparta, uma forte peste matou um terço da

população ateniense e ele foi responsabilizado por essas desgraças. Reelegeu-se

estratego novamente em 429 a.C., mas morreu pouco depois, vítima da peste que

ainda atingia Atenas. Sua época foi marcada como o século de Péricles.

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1.2 A ORIGEM DO PROBLEMA

A origem deste problema é um pouco duvidosa, mas segundo BOYER

(1996), acredita-se que Anaxágoras faleceu em 428 a.C., ano em que nasceu

Arquitas, um ano antes do nascimento de Platão e um ano antes da morte de

Péricles. Péricles faleceu em 427 a.C. devido a uma peste que acredita-se que

matou um quarto da população de Atenas.

Existe uma lenda que diz que um grupo, preocupado com a peste que se

espalhava, procurou o oráculo de Apolo (o deus do sol), na cidade de Delos, para

encontrar alguma forma de acabar com a peste. O oráculo informou que para

resolver essa questão e acabar com o mal era necessário que alguém conseguisse

dobrar o volume do cubo que sustentava a estátua do deus Apolo. Os atenienses

resolveram então obedecer e dobraram as dimensões do altar, mas isso não foi o

suficiente para acabar com a peste, uma vez que dobrando as dimensões do cubo

não se obtem um cubo com o dobro do volume, como pode-se verificar abaixo com

os cubos construidos no software Geogebra:

i) Se um cubo possui uma aresta a medindo m1 , seu volume será:

Figura 1: Cubo com aresta m1

333 1,1, mVVaV cubocubocubo

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ii) Quando este cubo tem a aresta duplicada, ou seja, passa a medir m2 , o seu

volume será:

Figura 2: Cubo com aresta m2

333 8,2, mVVaV cubocubocubo

Assim, os atenienses não obteram o dobro, mas sim octuplicaram o volume

do altar. Segundo Platão, a verdadeira intenção do deus Apolo era a de envergonhar

os gregos por seu total desprezo com a matemática e com a geometria em

particular.

Este problema deu origem ao Problema Deliano, ou Problema da Cidade de

Delos, que diz que dada a aresta de um cubo, deve-se construir apenas com régua

e compasso, onde a régua deve ser utilizada apenas para traçar linhas retas e não

para medir, a aresta de um segundo cubo, tendo o dobro do volume do primeiro.

Mais de 2200 anos depois seria provado (item 2.3 do capítulo 2) que o

problema é impossível de resolver utilizando apenas a régua sem escala e o

compasso. Mesmo assim, a maior parte da matemática grega e muito da

investigação da matemática que veio a seguir tentou conseguir provar o impossível.

A solução (apresentada no capítulo 2) deste problema é trivial com os

recursos da álgebra e o desfecho final deste problema veio com o matemático

francês Évariste Galois (1811-1832).

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1.2.1 ÉVARISTE GALOIS

Figura 3: Évariste Galois (1811-1832)

Évariste Galois foi à escola no Liceu de Louis-le-Grand quando tinha doze

anos. Nesta escola não encontrou nenhum curso de matemática,que era o seu

maior interesse. Aos dezesseis anos que Galouis fez o seu primeiro curso de

matemática, passando a deixar de lado as outras matérias. O seu conhecimento

pela matemática logo superou o conhecimento do seu professor e passou a estudar

diretamente dos livros escritos pelos gênios de sua época. Com dezessete anos

Galois já havia absorvido os conceitos mais modernos e então publicou seu primeiro

trabalho nos Annales de Gergonne.

Apesar de saber mais matemática do que seria preciso para passar nas

provas do Liceu, as soluções de Galois eram tão sofisticadas e inovadoras que seus

professores não conseguiam julgá-las corretamente e ainda Galois fazia muitos

cálculos de cabeça, sem transcrevê-los, deixando os professores frustrados e

perplexos. Era precipitado, explosivo e quando prestou exame para o colégio com

mais prestígio em seu país, a École Polytechnique, os seus modos rudes e a falta de

explicações na prova oral fizeram com que sua admissão fosse negada. No ano

seguinte tentou novamente ingressar no colégio e mais uma vez seus saltos lógicos

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na prova oral só confundiram o examinador e, quando Galois sentiu que ia ser

reprovado mais uma vez e frustrado por sua inteligência não estar sendo

reconhecida, perdeu a calma e jogou um apagador no examinador. Depois disso,

Galois nunca mais voltaria a entrar nas famosas salas da Polytechnique.

Apesar disso, Galois continuou confiante no seu talento matemático e

prosseguiu com as suas pesquisas. Seu principal interesse era a busca de soluções

para certas equações, como a equação quadrática e queria muito encontrar uma

regra para resolver as equações de quinto grau, um dos grandes desafios de sua

época. Com dezessete anos, ele fez progressos suficientes para submeter dois

trabalhos de pesquisa à Academia de Ciências.

Depois do suicídio de seu pai, em julho de 1829, Galois juntou seus dois

trabalhos num só e os enviou para o secretário da Academia bem antes do limite do

prazo. O secretário, Joseph Fourier, devia entregá-lo para a avaliação, mas este

morreu algumas semanas antes da data da decisão dos juizes, e apesar de vários

trabalhos terem sido entregues ao comitê, o de Galois não estava entre eles. Este

trabalho não apresentava uma solução para os problemas de quinto grau, mas

oferecia uma visão tão brilhante que muitos matemáticos o consideravam como o

provável vencedor. O trabalho nunca foi encontrado.

Galois achou que o seu trabalho foi perdido propositalmente. No ano seguinte

a Academia rejeitou outro manuscrito seu, dizendo que os argumentos não eram

claros e nem desenvolvidos. Assim, Galois decidiu que havia uma conspiração para

excluí-lo da comunidade matemática e passou a negligenciar suas pesquisas em

favor da luta pela causa republicana e publicou um ataque sarcástico contra o diretor

do seu colégio, École Normale Supérieure, que reslutou na sua expulsão e extinção

na carreira de matemático.

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Em 04 de dezembro de 1830 o gênio alistou-se na Artilharia da Guarda

Nacional, um ramo de milícia conhecido como “inimigos do povo”, tornando-se um

rebelde profissional, mas antes do fim do mês, essa Artilharia foi extinta e Galois

ficou desamparado e sem lar. Alguns de seus colegas matemáticos começaram a se

preocupar com o seu destino.

Depois disso Évariste Galois foi preso e ficou na cadeia por um mês, acusado

de ameaçar a vida do rei. Foi levado a julgamento e foi absolvido, mas no mês

seguinte foi preso de novo, sentenciado a seis meses de prisão. Na prisão começou

a beber, por influência dos outros. Uma semana depois, um colega que estava ao

seu lado foi atingido por uma bala e Galois ficou convencido que havia um complô

do governo para assassiná-lo.

O medo da persseguição política o aterrorizava. O isolamento dos amigos e

da família e a rejeição de suas idéias matemáticas o mergulharam num estado de

depressão. Bêbado e delirante ele tentou se matar com uma faca, mas seus colegas

republicanos conseguiram dominá-lo e desarmá-lo.

Um mês antes do fim da sentença, irrompeu uma epidemia de cólera em

Paris e os presos foram libertados. Depois disso Galois teve um romance com uma

mulher que já estava comprometida a outro. Quando este descobriu a traição ficou

furioso e como era um dos melhores atiradores da França, desafiou Galois para um

duelo. Galois aceitou, mas como sabia que suas chances eram mínimas escreveu

cartas para os amigos. Trecho da carta:

“...Eu morri vítima de uma infame namoradeira e dos dois idiotas que ela envolveu. Minha vida termina em consequência de uma miserável calúnia. Ah! Por que tenho que morrer por uma coisa tão insignificante e desprezível? Eu peço aos céus que testemunhem que foi apenas pela força e pela coação que eu cedi à provocação que tentei evitar por todos os meios...”

Page 24: ORIGAMI NA MATEMÁTICA - UFSC

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E numa tentativa desesperada de conseguir reconhecimento, ele escreveu

durante a noite toda o teorema que, acreditava, que explicaria o enigma da equação

de quinto grau e enviou esta carta pedindo que, caso morresse, aquelas páginas

fossem enviadas aos grandes matemáticos da Europa.

Na manhã seguinte, Galois foi atingido no estômago e ficou agonizando no

chão, vindo a falecer no dia seguinte. Os trabalhos de Galois foram reconhecidos

uma década depois.

Galois tinha formulado um explicação completa de como obter soluções para

equações de quinto grau. Primeiro ele separou-as em dois tipos: as que podiam ser

solucionadas e as que não podiam. Para as que podiam ele deduziu uma fórmula

para encontrar as soluções. Era uma das obras-primas da matemática do século

XIX, criada por um de seus mais trágicos heróis.

A teoria de Galois dá uma clara explicação a problemas de construção com

régua e compasso, como o Problema Deliano, pois explica em detalhes porque é

possível resolver equações de quarto grau, ou menores, utilizando as noções de

números algébricos e transcendentes.

Para Galois, o conjunto dos construtíveis será:

compassoeréguacomesconstrutívoscomprimentelconstrutívéRCR ;

Este conjunto RC possui as seguintes propriedades:

RR

RR

CC

CC

,

1

No capítulo seguinte veremos algumas tentativas ao longo dos anos para

tentar resolver este problema utilizando régua sem escala e compasso.

Page 25: ORIGAMI NA MATEMÁTICA - UFSC

25

CAPÍTULO 2

ALGUMAS TENTATIVAS DE RESOLVER O PROBLEMA DELIANO

Os geômetras da época já sabiam que para duplicar a área de um quadrado

bastava considerar, para o lado do quadrado com a área desejada, a diagonal do

quadrado original.

Isto quer dizer que se temos um quadrado de lado medindo uma unidade e

queremos um quadrado com o dobro da área deste, basta construir um quadrado de

lado 21 , como na figura abaixo:

Figura 4: Construindo um quadrado com o dobro da área do menor de uma unidade

Assim sendo, para duplicar um quadrado de aresta a basta construir um

quadrado de aresta 2a . É então natural surgir a questão de transpor este problema

para figuras sólidas como o cubo. Com os recursos da álgebra, vejamos porque isto

não acontece:

Page 26: ORIGAMI NA MATEMÁTICA - UFSC

26

Seja um segmento de reta de comprimento a . O volume de um cubo cuja

aresta seja a é:

3aV aarestadecubo (1)

Queremos obter um segmento de reta de comprimento b , cujo volume de um

cubo de aresta b é:

3bV barestadecubo (2)

Como o objetivo do problema deliano é duplicar o volume do cubo de aresta

a , então segue que:

aarestadecubobarestadecubo VV 2 (3)

Substituindo (1) e (2) em (3) teremos:

333 22a

bab

Assim, o problema se reduz a obter dois segmentos de reta cujos

comprimentos estejam na proporção 1 : 3 2 .

2.1 A CONTRIBUIÇÃO DE ARQUITAS (428 a.C.- 347 a.C.)

Acredita-se que Arquitas tivesse acesso a um tratado mais antigo sobre os

elementos da matemática e que o processo iterativo para obter a raiz quadrada, que

é frequentemente conhecido pelo seu nome, tenha sido utilizado muito antes na

Mesopotâmia. Mas Arquitas também contribuiu com resultados originais.

A sua contribuição mais notável foi uma solução tridimensional do Problema

Deliano, que é descrito mais facilmente na linguagem da geometria analítica.

Seja um cubo a ser duplicado com aresta medindo a . Seja ( a , 0, 0) o centro

de três círculos mutuamente ortogonais de raio a e cada um localizado em um plano

Page 27: ORIGAMI NA MATEMÁTICA - UFSC

27

perpendicular a um eixo coordenado. Sobre o círculo perpendicular ao eixo Ox é

construído um cone com vértice (0, 0, 0). Sobre o círculo no plano xy é construído

um cilindro circular reto. Seja o círculo no plano xz girado em torno do eixo Oz para

gerar um toro. As equações dessas três superfícies são:

)(4)(,2, 222222222222 yxazyxyxaxzyx

Essas três superfícies se encontram num ponto cuja coordenada x é 3 2a ,

que é a aresta do cubo que foi desejado.

Este resultado impressiona quando levamos em consideração que Arquitas

obteve sua solução sem a ajuda de coordenadas.

Porém esta solução não é obtida com régua sem escala e compasso.

2.2 A CONTRIBUIÇÃO DE MENAECMUS (380 a.C. - 320 a.C.)

Menaecmus foi um matemático da Grécia antiga, atribui-se a ele a descoberta

das curvas elipse, parábola e hipérbole. Sabe-se também que ele ensinou Alexandre

o grande.

Sabe-se que tinha esbarrado nas cônicas numa busca bem-sucedida por

curvas com as propriedades adequadas à duplicação do cubo e em termos de

notação moderna é fácil chegar a solução. Deslocando o plano de secção (Figura 5)

podemos achar uma parábola com qualquer lado reto.

Page 28: ORIGAMI NA MATEMÁTICA - UFSC

28

Figura 5: Uma parábola com qualquer lado reto

Se quisermos duplicar um cubo de aresta a , basta determinar sobre um cone

retângulo duas parábolas, uma com lado reto a e outra com lado reto 2 a .

Se agora colocarmos as duas parábolas com vértices na origem e eixos

(Figura 6) segundo o dos x e o dos y respectivamente, o ponto de intersecção das

duas curvas, terá coordenadas ),( yx , satisfazendo a proporção continuada:

a

y

y

x

x

a

Figura 6: Duas parábolas com vértices na origem

Isto é, temos: 33 4,2 ayax

Page 29: ORIGAMI NA MATEMÁTICA - UFSC

29

E portanto a abscissa x é a aresta do cubo procurado.

É provável que Menaecmus soubesse que a duplicação também pode ser

efetuada por meio de uma hipérbole retangular mais uma parábola.

Se a parábola da equação xa

y2

2 e a hipérbole da equação 2ayx são

colocadas sobre o mesmo sistema de coordenadas (Figura 7), o ponto de

intersecção terá coordenadas: 3

3

2,2

ayax .

Figura 7: Intersecção de uma parábola com uma hipérbole

E portanto a abscissa x é o lado do cubo procurado.

Mas, esta solução não é obtida com régua sem escala e compasso.

2.3 A DEMONSTRAÇÃO DE QUE O PROBLEMA DELIANO NÃO PODE SER

RESOLVIDO COM RÉGUA SEM ESCALA E COMPASSO

Segundo COURANT (2000), se um cubo possui uma aresta medindo uma

unidade, o volume deste será a unidade cúbica, ou seja, o volume será 31 .

O Problema Deliano pede que se obtenha a medida da aresta de um cubo

com o dobro deste volume.

Page 30: ORIGAMI NA MATEMÁTICA - UFSC

30

Seja x a aresta deste cubo desejado. Esta aresta irá satisfazer a equação

cúbica:

333 2202 xxx

O número x não pode ser obtido através de uma construção com régua e

compasso e para verificar isso será realizada uma prova indireta, ou seja, uma prova

por absurdo.

Primeiramente vamos supor que esta construção seja possível. Sabemos que

todos os números construtíveis são algébricos, ou seja, são números reais ou

complexos que satisfazem alguma equação algébrica da forma:

0... 0

1

1

1

1 axaxaxa n

n

n

n 0,1( nan e )Rak

Sabemos também que os números de um corpo racional kF são raízes de

uma equação de grau k2 , com coeficientes racionais.

Assim, o número x estará contido em algum corpo kF e este será encontrado

a partir do corpo racional.

Como 3 2 é um número irracional, este não pode fazer parte de um corpo

racional 0F (corpo racional gerado por um único segmento, que faz com que todos

os números construtíveis sejam algébricos) e portanto x somente poderá estar

incluído em algum corpo kF , onde k será um inteiro positivo.

Supondo que k é o último positivo em que x esteja contido em algum corpo

kF e que qp, e w pertencem a algum corpo 1kF , mas w não pertence, temos que

x pode ser escrito na forma:

wqpx

Se x está no corpo racional kF , temos também que 3x pertence ao mesmo

corpo, pois a operação da multiplicação é fechada em relação aos números

Page 31: ORIGAMI NA MATEMÁTICA - UFSC

31

racionais. Se 3x pertence ao corpo racional kF temos que 23x também pertence a

este corpo, uma vez que a operação da adição é fechada em relação aos números

racionais.

Se a e b são números racionais que estão no corpo 1kF , temos:

wbax 23

Como temos wqpx , segue que:

wbawwqqpwpqp

wbawwqwpqwqpp

wbawqp

)3(23

233

2)(

3223

3223

3

Portanto:

wqqpbwpqpa 3223 3,23

Se fizermos wqpx' , temos que:

wwqqpwpqp

wwqwpqwqpp

wqpx

)3(23

233

2)(2)'(

3223

3223

33

Como já vimos que 23 23 wpqpa e wqqpb 323 , temos:

wbax

wbawqp

2)'(

2)(

3

3

Se x deveria ser uma raiz de 023x e temos wbax 23 , segue que:

0wba

Isso nos diz que a e b devem ser iguais a zero, pois se não fosse assim,

teríamos que b

aw e portanto w pertenceria ao corpo 1kF , o que contraria a

nossa hipótese, que diz que w não pertence ao corpo 1kF .

Portanto, como temos 0b , segue:

Page 32: ORIGAMI NA MATEMÁTICA - UFSC

32

00 awba

Como 02)'( 3x e wqpx' , temos que 'x também é uma solução da

equação cúbica 023x . Além disso:

0'' xxxx

Substituindo, temos: 020)()( wqwqpwqp .

Este resultado é verificado, pois para wq2 ser zero, q deveria ser zero. Se

q fosse zero e wqpx , teríamos px , e estes estariam no corpo 1kF , o que

também contraria a hipótese, que diz que x pertence ao corpo kF .

Como demonstramos que wqpx e wqpx' são raízes da equação

cúbica 023x e ainda 'xx , temos uma contradição, visto que existe apenas um

número real x que seja igual à raiz cúbica de 2, as outras raízes cúbicas de 2 sendo

imaginárias (ver em anexo). Como vimos que qp, e w são números reais, temos

x e 'x também números reais, o que é um absurdo.

Deste modo, a hipótese de que a construção do número x com régua sem

escala e compasso é possível leva a um absurdo, o que significa que está errada e

que a solução não está contida em um corpo.

Portanto, duplicar o volume de um cubo, com aresta medindo uma unidade,

utilizando régua não graduada e compasso é impossível. ■

No capítulo seguinte veremos a solução deste problema utilizando o origami.

Page 33: ORIGAMI NA MATEMÁTICA - UFSC

33

CAPÍTULO 3

UTILIZANDO O ORIGAMI PARA RESOLVER O PROBLEMA DA

DUPLICAÇÃO DO VOLUME DO CUBO

3.1 ORIGAMI

Origami, é a arte japonesa de dobrar o papel. A origem da palavra advém do

japonês ori (dobrar) kami (papel), que ao juntar as duas palavras a pronúncia fica

"origami". Apesar de ser um patrimônio da cultura japonesa, é provável que tenha

começado na China, a qual é considerada "o berço do papel". Geralmente utiliza-se

um pedaço de papel quadrado, cujas dobras são feitas sem poder cortar o papel.

Conforme se foram desenvolvendo métodos mais simples de criar papel, o

papel foi tornando-se menos caro, e o origami, cada vez mais uma arte popular.

Contudo, os japoneses sempre foram muito cuidadosos em não desperdiçar;

guardavam sempre todos os pequenos restos de papel, e usavam nos seus modelos

de origami.

Durante séculos não existiram instruções para criar os modelos de origami,

pois eram transmitidas verbalmente de geração em geração. Esta forma de arte viria

a tornar-se parte da herança cultural dos japoneses. Em 1787 foi publicado um livro

(Hiden Senbazuru Orikata) contendo o primeiro conjunto de instruções de origami

para dobrar um pássaro sagrado do Japão. O origami tornou-se uma forma de arte

muito popular, conforme indica uma impressão em madeira de 1819 intitulada "Um

Page 34: ORIGAMI NA MATEMÁTICA - UFSC

34

mágico transforma folhas em pássaros", que mostra pássaros a serem criados a

partir de folhas de papel, mais conhecido como Tsuru (Figura 8). Segundo a cultura

japonesa aquele que fizer mil Tsurus teria um pedido realizado.

Figura 8 – Tsuru

Em 1845 foi publicado outro livro (Kan no mado) que incluía uma coleção de

aproximadamente 150 modelos de origami. Este livro introduzia o modelo do sapo,

muito conhecido hoje em dia. Com esta publicação, o origami espalhou-se como

atividade recreativa no Japão.

Não seriam apenas os japoneses que dobravam o papel, mas também os

mouros, no Norte da África, que trouxeram a dobragem do papel para Espanha na

sequência da invasão árabe no século VIII. Os mouros usavam a dobragem de

papel para criar figuras geométricas, pois a religião proibia-os de criar formas de

animais. Da Espanha se espalhou para a América do Sul. Com as rotas comerciais

marítimas, o origami entra na Europa e, mais tarde, nos Estados Unidos.

O conceito moderno do origami não só dobra papéis, mas também ajuda a

dobrar utilidades, soluções e tecnologias ao redor do mundo. Os benefícios nos

campos da Matemática, Ciência e Arte, por exemplo, se estenderam por diversas

universidades sendo objeto de estudo em diferentes locais do planeta. No Japão,

por exemplo, o origami é aplicado na educação desde 1972 e as crianças são

Page 35: ORIGAMI NA MATEMÁTICA - UFSC

35

iniciadas pelos pais quando ainda pequenas. Um outro bom exemplo está na

Universidade de Nova Jersey nos Estados Unidos onde o origami é utilizado nas

aulas de geometria computacional em 3 dimensões a algum tempo. Origami é

realmente uma arte barata. Atualmente as diversas fontes para pesquisa na internet

e a acessibilidade cada vez maior aos computadores podem trazer esse recurso

para dentro das escolas na mesma velocidade que a rede avança. O Brasil é o

sétimo maior produtor de celulose do planeta e a quantidade de papel presente em

nossa sociedade prova que os meios podem ser encontrados em diversos locais e

de forma bem acessível.

A presença do origami em nossa vida cotidiana é maior do que pensamos.

Hoje o origami tem aplicabilidades que ultrapassam a nossa percepção na correria

do dia-a-dia. O origami está presente nos automóveis onde - por meio de dobras - foi

conseguida uma total eficiência no equipamento de segurança conhecido como “air-

bag”, evitando explosões quando inflados. Nos aviões também, por meio das

maiores envergaduras de asas já obtidas e dispositivos que se “dobram e

desdobram” aumentando a eficiência das aeronaves e economizando espaço.

Um fato curioso foi que a forma mais eficiente para levar objetos grandes e

planos ao espaço, tais como antenas e painéis solares de satélites, de maneira tal

que ocupem pouco espaço durante o transporte, e uma vez no destino final, possam

ser abertos rapidamente e com o mínimo gasto de energia, foi solucionada com o

origami. A solução a este problema foi dada pelo Prof. Koryo Miura, da Universidade

de Tokyo, com a forma mostrada na figura 9. As dobras são interdependentes, e

assim, o movimento ao longo de uma delas produz movimentos ao longo das outras.

Dessa forma, a folha pode ser aberta com pouco esforço apenas puxando-a por

duas esquinas opostas. O mesmo principio pode ser aplicado para dobrar mapas.

Page 36: ORIGAMI NA MATEMÁTICA - UFSC

36

Figura 9 – Dobragem Miura

Com o origami, foi possível também desenvolver embalagens mais práticas

como as caixas de comida chinesa, caixas de hambúrgueres, sacolas de compra

etc. Até na moda o origami ajudou e ajuda a definir novos conceitos com roupas que

podem ser dobradas e encaixadas para formar novas peças e novos estilos. São

inúmeras as aplicabilidades do origami e isso significa que os países mais

desenvolvidos já visualizaram o quanto é produtivo, utilizar origami em locais onde

se produz conhecimento e desenvolvimento como escolas, universidades e centros

de pesquisa.

3.2 RESOLVENDO O PROBLEMA COM UMA FOLHA QUADRADA DE PAPEL

Segundo LUCERO (2006), a solução a seguir foi feita por Peter Messer.

Partimos de uma folha quadrada de papel de dimensão arbitrária. A solução

consta de duas etapas, na primeira devemos dividir a folha em três partes iguais.

Isso pode ser feito pelos seguintes passos:

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37

(1) Marcar o ponto médio na (2) Dobrar e abrir. borda direita.

(3) Dobrar e abrir. (4) Dobrar horizontalmente, de for- ma que a borda superior toque a intersecção das linhas de dobrado

anteriores, e abrir.

(5) Dobrar horizontalmente, de for- (6) As linhas de dobrado horizontais ma que a borda inferior toque a dividem a folha em três partes iguais. linha de dobrado anterior, e abrir.

Page 38: ORIGAMI NA MATEMÁTICA - UFSC

38

Os passos a seguir determinam 3 2 . As linhas que não são relevantes foram

eliminadas para maior clareza.

(7) Dobrar de forma que o ponto A fi- (8) Resultado final. que sobre a borda direita, e o ponto B sobre a linha horizontal indicada.

DEMONSTRAÇÃO

Primeiro demonstraremos que a seqüência de passos (1)-(6) divide a folha de

papel em 3 partes iguais. O seguinte diagrama reproduz o resultado no passo (6).

Temos colocado um par de eixos cartesianos yex , com origem no canto inferior

esquerdo da folha de papel. O comprimento dos lados da folha é l , indicado abaixo:

O ponto C está à mesma

Page 39: ORIGAMI NA MATEMÁTICA - UFSC

39

distância das bordas inferior e direita da folha, que chamaremos de s , portanto suas

coordenadas são ),(),( sslyx CC . As coordenadas do ponto D são

)2/,(),( llyx DD . Podemos então dizer que:

)(tgsl

s

x

y

C

C

Igualando as equações, obtemos:

32

2

1 lssls

sl

s

Pelos passos (4) e (5), a distância entre as linhas de dobrado horizontais, e

entre a linha superior e a borda superior da folha, também deve ser 3l .

Agora demonstraremos que a dobra do passo (7) determina 3 2 sobre a borda

direita da folha. Para isso, colocamos novamente um par de eixos cartesianos yex ,

com origem no canto inferior esquerdo da folha de papel (figura na página seguinte).

Os pontos A e B são os indicados no passo (7) anterior, e têm coordenadas

)0,0(),( AA yx e )3/,0(),( lyx BB , respectivamente. Nesse mesmo passo,

realizamos a dobra sobre a linha m , e os pontos A e B passam a ocupar as

posições A e B , respectivamente, de coordenadas )1,(),( '' lyx AA e

)3/2,(),( '' layx BB , onde a designa a abscissa do ponto B . Os pontos A e B ,

sobre a linha de dobrado, são os pontos médios dos segmentos AA e BB ,

respectivamente, e têm coordenadas )2/1,2/(),( "" lyx AA e )2/,2/(),( "" layx BB .

2

1

D

D

x

y

Page 40: ORIGAMI NA MATEMÁTICA - UFSC

40

Pela geometria da figura, os três ângulos designados por , com vértice

em A , B e B , são iguais. Calculemos o valor de )(tg em cada caso:

llxx

yytg

AA

AA 1

0

01)(

'

' (1)

a

l

a

ll

a

ll

xx

yy

BB

BB 33

2

0

33

2

'

' (2)

11

2

2

2

12

2

1

2

22

""

""

l

al

l

al

l

al

l

al

yy

xx

AB

BA (3)

Igualando as equações (1) e (2) obtemos:

3

31 2la

a

l

l

Similarmente, igualando (1) e (3):

1

1

l

al

l

Substituindo o valor de a nesta última equação e operando, resulta em:

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41

3

31

1

31 32

2

lll

l

ll

l

0333333 2332 llllll

Esta equação cúbica pode ser escrita na forma:

02)1( 3l

Portanto, substituindo 1lt , obtemos:

33 202 tt

O que prova a solução do problema deliano. ■

Page 42: ORIGAMI NA MATEMÁTICA - UFSC

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho contribuiu muito para eu conhecer um pouco da história da

matemática e principalmente me ajudou a perceber que a beleza de um problema

matemático não está na resposta, e sim, nos métodos usados para resolvê-lo. No

entanto, a arte do origami nos proporcionou visualizar a resolução de um problema

que há anos ficou sem uma solução geométrica, o que realmente é admirável.

Como podemos observar ao longo deste trabalho, a impossibilidade da

resolução deste problema não é só devido ao uso de uma régua não graduada.

Apesar de não ter sido resolvido com régua sem escala e compasso, a descoberta

de novos objetos matemáticos e a riqueza interna adquirida pelos matemáticos

envolvidos foi de grande importância para o desenvolvimento da geometria futura.

Assim, a busca pelo impossível acarretou num crescimento brilhante da

matemática na população mundial. A popularidade deste problema levou muitos

matemáticos amadores a tentar solucioná-lo. Mesmo quando já se sabia que era

impossível de se resolver com régua e compasso, o Royal Society de Londres,

recebia centena de provas falsas. Isso nos mostra o quanto um desafio perturba

uma pessoa que se sinta atraída por essas questões.

A raiz cúbica de 2 é a solução da equação 023x . Com dobraduras de uma

folha de papel, é possível resolver qualquer equação cúbica 023 dcxbxax , o

que é impossível de ser feito com régua e compasso. Isso permite resolver outros

problemas geométricos de construção que possam ser reduzidos a uma equação

cúbica, como a trissecção de um ângulo, e a construção de um heptágono regular.

Page 43: ORIGAMI NA MATEMÁTICA - UFSC

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BIBLIOGRAFIA

BOYER, C. B. História da Matemática. Editora Edgar Blücher Ltda., São Paulo, 1996. Traduzido por Elza F. Gomide do original em inglês: A History of Mathematics, John Wiley & Sons, Nova Iorque, 1991.

COURANT, R. e ROBBINS, H. O que é Matemática? Editora Ciência Moderna Ltda., Rio de Janeiro, 2000. Traduzido por Adalberto da Silva Brito do original em inglês: What is Mathematics?, 1941.

DESTEFFANI, R. P. Origami na educação e na vida. Disponível na internet em: http://www.ferrazorigami.com.br/?q=node/12. Acesso em ago. 2008.

JAHN, A. P e BONGIOVANNI, V. Revisitando os 3 problemas insolúveis da matemática. Revista do Professor de Matemática. N°. 66, Editora Sociedade Brasileira de Matemática, 2008.

LUCERO, J. C. O Problema Deliano. Disponível na internet em: http://www.mat.unb.br/~lucero/origami/Notas_2.pdf. Acesso em jun. 2008.

ORIGAMI NA CIÊNCIA, TECNOLOGIA E DESIGN. Miura-Ori (a dobra de Miura). Disponível na internet em: http://orig4mi.wordpress.com/2008/06/06/ori-miura-a-dobra-de-miura. Acesso em set. 2008.

SHENG, L. Y. Utilização da Arte do Origami no Ensino de Geometria. Disponível na internet em: www.ime.unicamp.br/erpm2005/anais/c3.pdf. Acesso em ago. 2008.

WIKIPEDIA, A ENCICLOPEDIA LIVRE. Évariste Galois. Disponível na internet em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Galois. Acesso em set. 2008.

WIKIPEDIA, A ENCICLOPEDIA LIVRE. Origami. Disponível na internet em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Origami. Acesso em ago. 2008.

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ANEXO

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FÓRMULA DE MOIVRE, UTILIZADA PARA ACHAR RAÍZES CÚBICAS DE 2

IMAGINÁRIAS:

A fórmula descoberta pelo matemático Abraham De Moivre (1667 – 1754):

nisennisen n cos)(cos , é uma das relações mais notáveis e úteis da

matemática elementar, podendo achar raízes cúbicas de 2 imaginárias. Esta fórmula

pode ser ilustrada com um exemplo:

Podemos aplicar a fórmula para 3n e desenvolver o lado esquerdo de

acordo com a fórmula binomial, 32233 33)( vuvvuuvu , obtendo a relação:

)cos3(cos3cos33cos 3223 sensenisenisen .

Uma única igualdade como esta entre dois números complexos equivale a um

par de igualdades entre números reais. Isto porque, quando dois números

complexos são iguais, ambas as partes (real e imaginária) devem ser iguais.

Portanto, podemos escrever:

3223 cos33,cos3cos3cos sensensensen .

Utilizando a relação 1cos 22 sen , temos:

.34)3(

,cos3cos4))(cos1()cos(3)(cos)3cos(

3

323

sensensen

Fórmulas semelhantes, expressando nsen e ncos em termos de potências de sen

e cos respectivamente, podem ser facilmente obtidas para qualquer valor de n .