46
o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro Ministro José Augusto Delgado* 1. Introdução 1. O trabalho que passamos a desenvolver visa atender à honrosa convo- cação para participar do 1II Colóquio Internacional de Direito Tributário, reali- zado no mês de agosto de 2001, no Centro de Extensão Universitária, São Paulo, que me foi formulada pelos Professores Ives Gandra da Silva Martins, Presiden- te do Centro de Extensão Universitária - São Paulo; Alejandro Altamirano, da Universidade Austral - Buenos Aires; Luís Eduardo Schoueri, do Centro de Extensão Universitária - São Paulo; e Marco Aurélio Greco, do Centro de Exten- são Universitária - São Paulo. O sigilo bancário é o questionamento central. Os organizadores do conclave formularam as indagações seguintes: O sigilo bancário diz respeito à intimidade e privacidade das pessoas? A segurança das relações jurídicas através do Sistema Financeiro pode ser afeta- da pelo acesso indiscriminado de agentes do Poder Público às informações bancárias? Em que casos poder-se-ia admitir a quebra do sigilo bancário? * Ministro do Superior Tribunal de Justiça. Professor de Direito Público (Administrativo, Tributário e Processual Civil). Professor UFRN (aposentado). Ex-professor da Universidade Católica de Pernambuco. Sócio Honorário da Academia Brasileira de Direito Tributário. Sócio Benemérito do Instituto Nacional de Direito Público. Conselheiro Consultivo do Conselho Nacional das Instituições de Mediação e Arbitragem. Integrante do Grupo Brasileiro da Sociedade Internacional do Direito Penal Militar e Direito Humanitário. Sócio Honorário do Instítuto de Estudos Jurídicos.

o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro

  • Upload
    others

  • View
    14

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro

o Sigilo Bancaacuterio no Ordenamento Juriacutedico Brasileiro

Ministro Joseacute Augusto Delgado

1 Introduccedilatildeo

1 O trabalho que passamos a desenvolver visa atender agrave honrosa convoshycaccedilatildeo para participar do 1II Coloacutequio Internacional de Direito Tributaacuterio realishyzado no mecircs de agosto de 2001 no Centro de Extensatildeo Universitaacuteria Satildeo Paulo que me foi formulada pelos Professores Ives Gandra da Silva Martins Presidenshyte do Centro de Extensatildeo Universitaacuteria - Satildeo Paulo Alejandro Altamirano da Universidade Austral - Buenos Aires Luiacutes Eduardo Schoueri do Centro de Extensatildeo Universitaacuteria - Satildeo Paulo e Marco Aureacutelio Greco do Centro de Extenshysatildeo Universitaacuteria - Satildeo Paulo

O sigilo bancaacuterio eacute o questionamento central Os organizadores do conclave formularam as indagaccedilotildees seguintes

O sigilo bancaacuterio diz respeito agrave intimidade e privacidade das pessoas A seguranccedila das relaccedilotildees juriacutedicas atraveacutes do Sistema Financeiro pode ser afetashyda pelo acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias Em que casos poder-se-ia admitir a quebra do sigilo bancaacuterio

Ministro do Superior Tribunal de Justiccedila Professor de Direito Puacuteblico (Administrativo Tributaacuterio e Processual Civil) Professor UFRN (aposentado) Ex-professor da Universidade Catoacutelica de Pernambuco Soacutecio Honoraacuterio da Academia Brasileira de Direito Tributaacuterio Soacutecio Benemeacuterito do Instituto Nacional de Direito Puacuteblico Conselheiro Consultivo do Conselho Nacional das Instituiccedilotildees de Mediaccedilatildeo e Arbitragem Integrante do Grupo Brasileiro da Sociedade Internacional do Direito Penal Militar e Direito Humanitaacuterio Soacutecio Honoraacuterio do Instiacutetuto de Estudos Juriacutedicos

224 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTlCA

Um sistema em que o Poder Judiciaacuterio torna-se aacuterbitro dos pedidos da Administraccedilatildeo para quebra do sigilo eacute o mais justo Ou deve ter a autoridade fiscal a faculdade incondicionada de quebrar o sigilo sempre que entender necessaacuterio Nesta segunda hipoacutetese caberia responsabilizaccedilatildeo da autoridade se tal quebra revelar-se inconsistente e indevida

Qual eacute o tratamento proposto por oacutergatildeos internacionais corno a OCDE e outros com relaccedilatildeo ao sigilo bancaacuterio De que forma compatibilizar o combashyte agrave criminalidade internacional sem violar a seguranccedila juriacutedica necessaacuteria a evitar a fuga de investimentos do Paiacutes

Passaremos a seguir ao cumprimento da tarefa

2 Consideraccedilotildees preliminares

O ordenamento juriacutedico brasileiro submete-se na eacutepoca contemporacircshynea a um intenso processo de transformaccedilotildees em decorrecircncia dos novos impactos sociais econocircmicos financeiros eacuteticos e globaJizantes que estatildeo afetando as relaccedilotildees entre Estado e cidadatildeo cidadatildeo e seu semelhante e deste com grupos institucionalizados oficiais ou natildeo-oficiais Esses fenocircmenos proshycuram valer-se de regras impostas pelo Direito e que sejam capazes de aprishymorar a funccedilatildeo estatal e de consagrar de modo mais hierarquizante possiacutevel os direitos fundamentais da cidadania

Os que colaboram com as suas ideacuteias e accedilotildees para que essas mudanccedilas nas estruturas juriacutedicas do Estado tenham ecircxito de modo especial as imposshytas nas funccedilotildees administrativas e comportamentais perseguem um uacutenico obshyjetivo o de que seja valorizado o cidadatildeo e respeitado os seus direitos fundashymentais

A Carta Magna de 1988 apregoa a partir do seu preacircmbulo e com contishynuidade no exposto nos demais tiacutetulos e capiacutetulos que a compotildeem mensashygens imperativas contendo propoacutesitos de homenagem agrave instituiccedilatildeo de um Esshytado democraacutetico com finalidade primordial voltada para a proteccedilatildeo dos dishyreitos sociais e individuais tendo como centro maior a valorizaccedilatildeo da liberdashyde da seguranccedila do bem-estar do desenvolvimento da igualdade da justiccedila tudo endereccedilado a que seja alcanccedilado um estaacutegio representativo de absoluta eficaacutecia e efetividade da dignidade humana I

o exame dos postulados informadores da Constituiccedilatildeo Federal de 1988 revela que o Estado democraacutetico por ela idealizado e pretendido materializar haacute de ter como fundamentos centrais o absoluto respeito aos ditames da soberania da cidadania da dignidade da pessoa humana dos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e do pluralismo poliacutetico Eacute o que estaacute posto de modo expresso no ar 2 da CF de 1988 A Repuacuteblica Federativa do Brasil formada pela uniatildeo indissoluacutevel dos Estados e Municiacutepios e do Distrito Federal constitui-se em Estado democraacutetico de direito e tem como fundamentos I - a soberania II - a cidadania 111 - a dignidade da pessoa humana IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa V - o pluralismo politico

ENSAIOS JURiacuteDICOS 225

A pretensatildeo eacute de ser construiacuteda uma democracia para o seacuteculo XXI com preceitos que ao serem apJicados abram espaccedilos para a execuccedilatildeo de medishydas concretas que resultem em oferecer ao cidadatildeo qualquer que seja a escashyla que ele pertenccedila na grade social seguranccedila puacuteblica e juriacutedica assistecircncia agrave sauacutede atendimento escolar guarda da moralidade liberdade amplo empreshygo respeito aos seus direitos fundamentais e outros valores que estatildeo inserishydos no contexto representativo da dignidade humana

O entendimento manifestado repousa na concepccedilatildeo de que eacute impossiacuteshyvel a convivecircncia com ecircxito do Estado com o cidadatildeo quando as suas relashyccedilotildees estatildeo em constante tensatildeo O alcance dessa situaccedilatildeo provoca inseguranshyccedila medo temor falta de confianccedila e incentiva a quebra dos princiacutepios da eacutetica e da moralidade2bull

2 No referente ao problema da tensatildeo existente entre cidadatildeo e Estado escrevi antes o seguinte O exame do panorama social da era contemporacircnea identifica a sociedade atravessando uma tensatildeo preacute-milecircnio Esse estado emocional ineacutedito estaacute afetando as relaccedilotildees entre as pessoas e foi identificado recentemente em trabalho elaborado por Seacutergio Villas Boas sob o tiacutetulo Tensatildeo PreacuteshyMilecircnio publicado no jornal Gazeta Mercantil de 12 e 13 de junho de 1999 p 2 Caderno - Leitura de Fim de Semana Extraio trecho de tal ensaio para meditaccedilatildeo O mundo estaacute atravessando um periacuteodo de tensatildeo preacute-milecircnio com todos os desconfortos irriacutetabiliacutedades fadigas tormentas mau humor e acima de tudo medo Terrores geralmente infundados Profecias e noticiaacuterios de TV formam um coro que reforccedila a nova TPM e produz uma repeticcedilatildeo estafante fome miseacuteria guerras assaltos assassinatos hediondos traacutefico de drogas e de influecircncias corrupccedilatildeo impunidade protecionismos sonegaccedilotildees (48 do que o governo arrecada vem do trabalho assalariado calcula-se que US$ 825 bilhotildees circulam no Paiacutes sem pagar impostos) precaacuteria sociabilizaccedilatildeo (taxa de desemprego em Satildeo Paulo superou 20 em maio) maior exigecircncia por escolaridade conhecimento e aparecircncias deflaccedilatildeo (ambiente talvez pior para fazer funcionar o capitalismo do que o regime de inflaccedilatildeo) instabilidade financeira solidatildeo O medo nunca escolheu seu objeto de terror tampouco pode ser delimitado em fronteiras geograacuteficas Nos Estados Unidos adolescentes armados exterminam colegas no paacutetio da escola e se suicidam em seguida na Europa grupos de extrema-direita atentam contra minorias eacutetnicas renutrindo o ideal da purificaccedilatildeo pelo extermiacutenio A desinformaccedilatildeo (ou seria desentendimento) estaacute levando as pessoas a viver um filme real permanente Eacute como se a qualquer momento um sujeito infectado por um viacuterus que corroacutei os ossos humanos arrancasse o cidadatildeo de seu BMW adquirido por leasing e dirigisse a maacutequina roubada ateacute um aeroporto onde uma adolescente graacutevida sob efeito de cocaiacutena acabara de sequumlestrar um aviatildeo levando para a Floacuterida velhinhos aposentados dispostos a realizar o sonho da casa de praia civilizada Mas o aviatildeo sequumlestrado pela viciada e pelo delinquumlente representantes das minorias se esborracha no asfalto reverberante do aeroporto Natildeo eacute positiva portanto a apresentaccedilatildeo de um balanccedilo positivo no balanccedilo que se faz da aplicaccedilatildeo da democracia neste final de seacuteculo porque a realidade demonstra que as suas linhas tradicionais foram aparentemente seguidas Urge portanto ser pensada uma forma de regime democraacutetico que seja capaz de inverter esse quadro catastroacutefico para a humanidade Para tanto lorna-se primordial que a Ciecircncia Juriacutedica e a Ciecircncia Poliacutetica renovem os seus postulados e os seus propoacutesitos voltem-se para a criaccedilatildeo de novos degraus e de novos princiacutepios atentas para a forccedila cogente e imperativa que eles devem ter colocando o cidadatildeo com todas as suas aspiraccedilotildees e

continua

226 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Envolvido por esse clima de indefiniccedilotildees institucionais acima apresentashydo embora de modo muito resumido passo a examinar as modificaccedilotildees introduzidas no ordenamento juriacutedico brasileiro afetando o sistema regulador das instituiccedilotildees financeiras com os seus clientes em face da fiscalizaccedilatildeo tribushytaacuteria com novas regras para o sigilo bancaacuterio

3 O sigilo bancaacuterio no Direito Comparado

Uma visatildeo raacutepida do tratamento dado por alguns ordenamentos juriacutedishycos estrangeiros para o sigilo bancaacuterio proporciona uma compreensatildeo mais alargada dessa entidade juriacutedica dos seus objetivos e dos efeitos produzidos por ele nas relaccedilotildees do titular da conta bancaacuteria com a instituiccedilatildeo financeira e com a garantia da sua seguranccedila no ambiente social

a) Portugal

A doutrina considera que a tutela do segredo bancaacuterio no Direito portushyguecircs na atualidade eacute um padratildeo protetor com caracteriacutesticas mais amplas do que o vigente na Suiacuteccedila ateacute entatildeo considerado o paiacutes que mais oferecia proteshyccedilatildeo nesse campo de relacionamento financeiro

continuaccedilatildeo

necessidades como sendo o centro das preocupaccedilotildees (Trabalho intitulado Democracia para o Seacuteculo XXI aguardando publicaccedilatildeo) Modelo de Democracia para o Seacuteculo XXI O fato do regime democraacutetico adotado no Brasil pela maioria dos anos durante o seacuteculo XX natildeo ter produzido resultados administrativos desejados e necessitados pela Naccedilatildeo natildeo deve servir de suporte para a defesa da volta ao autoritarismo ou de qualquer outra forma de regime Haacute que se reconhecer que as dificuldades vividas pela Naccedilatildeo natildeo podem ser tributadas apenas ao mau uso do regime democraacutetico Negativas em grande escala foram os modelos das eras de t 937 a t 946 e de 1964 a 1988 especialmente para o campo das liberdades dos direitos humanos e da valorizaccedilatildeo da dignidade dos homens Filio-me agrave corrente daqueles que pregam ser a democracia com todos os seus defeitos um regime muito melhor do que a mais perfeita das ditaduras A democracia mesmo ferida ela homenageia pelo menos a esperanccedila de um povo e simboliza o modelo de liberdade de seguranccedila e de desenvolvimento cultural e econocircmico pretendido pelo cidadatildeo diferente do que acontece com qualquer outro tipo de regime Aperfeiccediloar a atuaccedilatildeo do regime democraacutetico para o seacuteculo XXI natildeo eacute tarefa das mais faacuteceis Uma seacuterie de obstaacuteculos devem ser enfrentados e regulados sem se falar nas resistecircncias que seratildeo impostas por clones conservadores e privilegiados agraves mudanccedilas O certo eacute que algo precisa ser feito e com ousadia Necessaacuterio enfrentar os problemas e sugerir soluccedilotildees com posiccedilotildees que se integrem no atuar do homem encarregado de pensar e de fazer ciecircncia o que deve ser exercido sem temor Pelo contraacuterio Da exposiccedilatildeo e publicidade das ideacuteias surgem os modelos para a construccedilatildeo do futuro Se os objetivos forem alcanccedilados contribuiccedilotildees essenciais foram dadas para se evitar a mais temida revoluccedilatildeo que pode ser feita pelo ser humano que eacute a da revolta interna e silenciosa contra as instituiccedilotildees com forccedila ateacute de extinguir caso se realize a entidade tradicional do Estado

ENSAIOS JURiacuteDICOS 227

Esse entendimento decorre da interpretaccedilatildeo que os doutos manifestam sobre o Decreto-Lei n 21978 normativo disciplinador do sigilo bancaacuterio em Portugal

O objetivo da legislaccedilatildeo portuguesa sobre sigilo bancaacuterio conforme depreende-se da sua mensagem eacute imprimir confianccedila no funcionamento das instituiccedilotildees de creacutedito para que se afirmem como veiacuteculos necessaacuterios para a captaccedilatildeo da poupanccedila Essa ideacuteia foi exposta por Alexandra Falque de Gouvecirca Professora-Assistente da Faculdade de Direito de Lisboa e Assessora do Conseshylho para o Sistema Financeiro no corpo do artigo de sua autoria Perspectivas de Reformulaccedilatildeo da Tutela do Seguro Bancaacuterio no Direito Portuguecircs publicashydo na Revista do Gabinete de Documentaccedilatildeo e Direito Comparado da Proshycuradoria Geral da Repuacuteblica Lisboa 1990 pp 922

Destaco do corpo do mencionado artigo a observaccedilatildeo feita pela autoshyra pp 12 e 13 no sentido de que A tutela do segredo bancaacuterio surgiu em Portugal conjunturalmente associada aos esforccedilos de reanimaccedilatildeo das instituishyccedilotildees de creacutedito como fonte de captaccedilatildeo da poupanccedila Por esse facto foi-lhe dado um regime mais protector do que o proacuteprio regime vigente na Suiacuteccedila campeatilde em mateacuteria de protecccedilatildeo do segredo bancaacuterio

A seguir afirma a autora Eacute testemunha de que esse reforccedila a confianccedila nas instituiccedilotildees de creacutedito foi de facto o objectivo do legislador ao aprovar o normativo que disciplina o sigilo bancaacuterio a letra do preacircmbulo do Decreto-Lei n 21978 de 9 de janeiro que conteacutem o enquadramento legal da mateacuteria o qual reza o seguinte Ponderando que a reconstruccedilatildeo do Paiacutes implica o estashybelecimento de um clima de confianccedila na banca que permita a captaccedilatildeo e recuperaccedilatildeo do dinheiro entesourado vem o Governo revelando preocupashyccedilotildees pela tutela do segredo bancaacuterio No mesmo sentido a letra do preatildembushylo do Despacho Normativo n 3571979 de 20 de novembro A importatildencia do segredo bancaacuterio eacute bem conhecida para a estabilizaccedilatildeo normalidade de funshycionamento e transmissatildeo de uma imagem de confianccedila por parte de qualshyquer sistema bancaacuterio Nesta medida com a legislaccedilatildeo entatildeo aprovada o regishyme portuguecircs na mateacuteria afastou-se quer do sistema da Common Law de resshyponsabilidade (exclusivamente) civil do banqueiro por violaccedilatildeo ao dever de discriccedilatildeo bancaacuteria quer da generalidade dos sistemas europeus que integram a mateacuteria no regime geral do sigilo profissional (equiparando o banqueiro ao confidente necessaacuterio) aproximando-se mais dos sistemas praticados na Suiacuteshyccedila e no Liacutebano (todavia enquanto no Liacutebano haacute uma total imunidade das insshytituiccedilotildees de creacutedito agraves requisiccedilotildees da autoridade judiciaacuteria na Suiacuteccedila o princiacuteshypio eacute o da cooperaccedilatildeo com a funccedilatildeo judiciaacuteria no tocante agrave mateacuteria pena)

A autora conclui esse toacutepico do seu artigo afirmando Pela razatildeo aponshytada de ser essencialmente o interesse puacuteblico e colectivo o motivo

228 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

determinante da aprovaccedilatildeo do Decreto-Lei n 21978 o regime portuguecircs gizado nessa altura comeccedilou por ser ainda mais hermeacutetico do que o proacuteprio regime vigente na Suiacuteccedila na medida em que o dever de cooperaccedilatildeo com as autoridashydes judiciaacuterias cessa inclusivamente nas mateacuterias sujeitas a segredo bancaacuterio segundo o entendimento generalizado dos Tribunais e doutrina3bull Paradoxalshymente a disciplina juriacutedica natildeo encontrou de iniacutecio reflexo na materialidade dos factos tendo-se assistido a muacuteltiplos e impunes violaccedilotildees ao segredo banshycaacuterio

Arnoldo Wald analisando o sigilo bancaacuterio no ordenamento juriacutedico de Portugal registra O Coacutedigo Civil portuguecircs no seu art 80 dispotildee que Todos devem guardar reserva quanto agrave intimidade da vida privada de outrem A exshytensatildeo da reserva seraacute definida conforme a natureza do caso e as condiccedilotildees das pessoas O art 33 da Constituiccedilatildeo portuguesa de 1976 estabelece que 1 A todos eacute reconhecido o direito agrave identidade pessoal ao bom nome e reputashyccedilatildeo e agrave reserva da intimidade da vida privada e familiar 2 A lei estabeleceraacute garantias efectivas contra a utilizaccedilatildeo abusiva ou contraacuteria agrave dignidade humashyna de informaccedilotildees relativas agraves pessoas e famiacutelias

Tanto no acircmbito constitucional quanto na legislaccedilatildeo civil eacute garantido o direito agrave privacidade e agrave vida iacutentima que fundamentam o sigilo bancaacuterio Jaacute o Decreto-Lei n 2 de 911978 prevecirc expressamente o dever de segredo dos titulares dos oacutergatildeos dos bancos e aos seus trabalhadores4

b) Alemanha

Carlos Alberto Hagstron em artigo intitulado O Sigilo Bancaacuterio e o Poshyder Puacuteblico publicado na Revista de Direito Mercantil n 79 p 37 registra que Na Alemanha natildeo haacute regra especiacutefica nem definiccedilatildeo legal para o segredo bancaacuterio mas sua existecircncia eacute observada reconhecida pejo Direito Privado e pelo Direito Puacuteblico admitida em diversas leis aceita pela doutrina e pela jurisshyprudecircncia sofrendo contudo limitaccedilotildees decorrentes de interesses de orshydem puacuteblica e social quando pode haver a quebra do sigilo conforme aliaacutes lembra Seacutergio Carlos Covello na sua obra O Sigilo Bancaacuterio Leud 1991 p 34

3 A respeito desse aspecto o de cessar o dever de colaboraccedilatildeo com as autoridades judiciaacuterias quando envolver mateacuterias sujeitas a segredo bancaacuterio a autora ao fazer essa afirmaccedilatildeo assinala em nota de rodapeacute as seguintes obras que refletem igual entendimento Alberto Luiacutez O Segredo Bancaacuterio em Portugal in Revista da Ordem dos Advogados ano 41 Q (1981) pp 451 e segs Anselmo da Costa Freitas O Sigilo Bancaacuterio In Boletim da Ordem dos Advogados n 19 (outubro de 1983) pp 4 e segs Maria Eduarda Azevedo O Segredo Bancaacuterio In Ciecircncia e Teacutecnica Fiscal n 346348 (outubrodezembro de 1987) pp 73 e segs Joseacute Antoacutenio Pereira da Silva Regime Juriacutedico do Sigilo Bancaacuterio maio de 1988 (trabalho natildeo publicado) Jorge Patriacutecio Paul O Sigilo Bancaacuterio - sua Extensatildeo e Limites no Direito Portuguecircs In Revista da Banca n 12 (outubrodezembro) 1989 pp 71 e segs

4 Em artigo publicado sob o tiacutetulo Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais publicado na Revista dos Tribunais n 22 Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas p 24

ENSAIOS JURiacuteDICOS 229

A lei bancaacuteria alematilde de 1971961 em seu art 92 determina que haacute obrishygaccedilatildeo de ser preservado o direito agrave privacidade para aqueles que exercem uma funccedilatildeo federal de vigilatildencia por seus colaboradores e pelos controlashydores dos depoacutesitos (Arnoldo Wald em artigo Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais publicado na Revista dos Tribunais n 22 RT Cadernos de Direishyto Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas jan-marccedilo de 1998 p 24)

O citado autor esclarece ainda que na Alemanha a fonte do sigilo banshycaacuterio estaacute no direito agrave personalidade

c) Itaacutelia Franccedila Suiacuteccedila

Luiz Fernando de Bellinetli em artigo denominado Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio (Revista de Direito do Consumidor RT n 18 abril-junho de 1996 pp 141161) ao analisar o sigilo bancaacuterio no Direito Comparado comenshyta o tratamento que lhe eacute dado pela Alemanha Itaacutelia Franccedila Suiacuteccedila e Portugal

Em face de nos itens acima jaacute ter sido enfocado o tema na Alemanha e em Portugal destacaremos apenas do trabalho do autor as observaccedilotildees feishytas sobre o sigilo bancaacuterio nos ordenamentos juriacutedicos da Itaacutelia Franccedila e Suiacuteccedila

A respeito transcrevo o que escreveu o autor

412 ltaacutelia5

Assim como na Alemanha na Itaacutelia tambeacutem natildeo haacute norma especiacuteshyfica disciplinando o sigilo bancaacuterio embora seja ele reconhecido pela doutrina e pela jurisprudecircncia utilizando-se dispositivos variados do sisshytema para supeditaacute-lo

No entanto tambeacutem na Itaacutelia natildeo eacute ele absoluto cedendo ante interesse de ordem puacuteblica nos casos previstos em lei

Como afirma Giacomo Molle Lobbligo della banca ai segreto non e senza Umt ed essendo esse come si e delto dretto aIa tutela dei cliente e quindi di un interesse privato non vi sono limiti ad esso da parte dei legislatore Prescindendo daiacute casi nei quali la rivelzione sai imposta dala legge un dovere di comunicazione puoacute sorgere nei contrant della autoritaacute

5 Arnoldo Wald no artigo jaacute referido (Sigilo Bancaacuterio e Direitos Fundamentais Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas - 22 p 24) assinala que Na Itaacutelia o sigilo bancaacuterio decorre da garantia dos direitos agrave liberdade individual que permite a exclusatildeo do conhecimento por parte de terceiros de tudo que se refere agrave proacutepria pessoa a denominada riservalezza Este entendimento decorre da norma constitucional que institui a inviolabilidade dos direitos da personalidade e da Convenccedilatildeo Europeacuteia dos Direitos do Homem de 1950 que garante a toda pessoa o direito ao respeito de sua vida privada e familiar de seu domiciacutelio e de sua correspondecircncia O segredo nas movimentaccedilotildees financeiras no entendimento doutrinaacuterio italiano visa proteger aleacutem dos interesses do cliente o desenvolvimento da atividade bancaacuteria como algo inerente agrave estrutura e funccedilatildeo creditiacutecia

~o SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

giudiziaria dei fisco e di terzi (La Banca NellOrdinamento Giuridico itashyliano Milano - DoU A Giuffre Editore 1980 p 158)

413 Franccedila

Tambeacutem na Franccedila o sigilo bancaacuterio eacute protegido pelo ordenamenshyto juriacutedico embora inexistente uma norma especiacutefica fundando-se a proteccedilatildeo num conjunto de regras de ordem penal civil e comercial

Da mesma forma admite-se a quebra do sigilo em face de interesshyses de ordem puacuteblica6 bull

414 Suiacuteccedila

Paiacutes onde os bancos e a sua alardeada discriccedilatildeo satildeo instituiccedilotildees nacionais haacute previsatildeo legal especiacutefica para a proteccedilatildeo do sigilo

No entanto tambeacutem laacute o segredo natildeo eacute como alguns supotildeem absoluto

Conforme aduz Hagstrom Natildeo pode ser invocado em geral peshyrante a Justiccedila Penal Na Justiccedila Civil o Juiz tem poder discricionaacuterio para decidir sobre a mateacuteria havendo algumas variaccedilotildees de conformidade com as legislaccedilotildees cantonais Em procedimentos de taxaccedilatildeo e recursos o segredo eacute preservado perante o Fisco eacute afastado contudo no proceshydimento contencioso (penal fiscal) Algumas outras exceccedilotildees ao dever de segredo satildeo contempladas expressamente em textos legais

Quanto ao Direito suiacuteccedilo acrescente-se que Arnoldo Wald no artigo jaacute tado observa que a justificativa para o sigilo bancaacuterio estaacute no direito da rsonalidade A Lei de 1934 prevecirc pena de multa ou de prisatildeo para o funcioshyliacuterio da instituiccedilatildeo que violar o segredo bancaacuterio mesmo que inexista dano ara aquele que viu reveladas informaccedilotildees sobre sua vida financeira

A seguir Arnoldo Wald compara o Direito da Suiacuteccedila com o do Liacutebano lrmando A Suiacuteccedila assim como o Liacutebano para a maior seguranccedila e reforccedilo a preservaccedilatildeo do sigilo bancaacuterio utiliza a conta numerada ficando descoshyhecido o nome do cliente A legislaccedilatildeo libanesa prevecirc quatro hipoacuteteses de errogaccedilatildeo do sigilo a) o consentimento do cliente seus herdeiros ou legataacuteshyos b) no litiacutegio entre o cliente e o banco c) na falecircncia e d) no enriquecimenshy) iliacutecito

d) Inglaterra e EEUU

O sigilo bancaacuterio no Direito inglecircs e no sistema norte-americano mereshyeu de Arnoldo Wald no trabalho jaacute citado pp 24 e 25 a anaacutelise que transcrevo

o autor citado manda no particular conferir Carlos Alberto Hagstrom artigo O Sigilo Bancaacuterio e o Poder Puacuteblico RDM n 79 p 38 bem como Seacutergio Covello em O Sigilo Bancaacuterio Leud 1991 pp 2627

ENSAIOS JURiacuteDICOS 231

No Direito inglecircs natildeo haacute nenhuma norma escrita que estabelece sanccedilatildeo agrave violaccedilatildeo ao segredo bancaacuterio mas qualquer pessoa que queira trabalhar em uma instituiccedilatildeo financeira deve assinar um formulaacuterio esshypecial pelo qual se compromete a manter sigilo sobre as movimentaccedilotildees bancaacuterias O dever de segredo na atuaccedilatildeo do banco eacute interpretado rigoshyrosamente pelos tribunais ingleses

No sistema juriacutedico norte-americano depois de discrepacircncias nas legislaccedilotildees estaduais e apoacutes a lei federal que restringiu o acircmbito da obrishygatoriedade do sigilo bancaacuterio foi aprovada a Right to Financiai Privacy Act que dispotildee que a prestaccedilatildeo de informaccedilotildees por parte da instituiccedilatildeo financeira somente pode ser dada em processos administrativos ou judishyciais quando os dados forem relevantes para solucionar o litiacutegio Com essa lei a quebra do sigilo bancaacuterio ganhou um caraacuteter excepcional somente podendo ocorrer desde que respeitado o devido processo leshygal Assim o Direito americano buscou conciliar a defesa ao direito de privacidade o atendimento aos interesses puacuteblicos quanto agraves informashyccedilotildees financeiras e a existecircncia do contraditoacuterio

e) Reacutegis de Oliveira quando Deputado Federal em parecer apresentashydo agrave Comissatildeo de Constituiccedilatildeo e Justiccedila da Cacircmara dos Deputados com refeshyrecircncia a Projeto de Emenda Constitucional apresentado pelo Exmo Sr Presishydente da Repuacuteblica objetivando alterar o sect 1 ordm do art 145 da CF observou que o sigilo bancaacuterio no Direito Comparado eacute posto da forma seguinte

13 Direito Comparado Na Alemanha natildeo haacute regra especiacutefica nem definiccedilatildeo legal para o segredo bancaacuterio mas sua existecircncia eacute recoshynhecida bem como aceita pela doutrina e jurisprudecircncia Decorre de direito costumeiro somente podendo ser quebrado por expressa disposhysiccedilatildeo legal (J Barmann Le Secret Bancaire en Allemagne Feacutedeacuterale in Rapport pp 15 e segs) Na Beacutelgica haacute proibiccedilatildeo somente sendo viaacutevel a derrogaccedilatildeo do segredo pela Justiccedila Penal e pelo Fisco que somente tem acesso agraves informaccedilotildees bancaacuterias diante do processo pendente (Herion Le Secret Bancaire en Belfique in Rapport pp 5175) Na Itaacutelia os doshycumentos somente podem ser examinados pelos Juiacutezes Natildeo haacute acesso por parte das autoridades administrativas (idem p 129) Na Holanda da mesma forma o sigilo apenas cede ante ordem da autoridade judicial ou penal (Muller idem pp 99117) Na Franccedila a violaccedilatildeo ao segredo ocorre ante oacutergatildeos do Poder Puacuteblico que alegam interesses superiores aos dos particulares natildeo se admitindo a quebra diante de normas administratishyvas (Gavalda Stouflet idem pp 7797)

f) Voltando a analisar o sigilo bancaacuterio em Portugal pode-se afirmar que o sistema apresentava-se rigoroso e nacirco aceitava a quebra como se vecirc de

232 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

decisatildeo do Supremo Tribunal de Justiccedila em Scientia Juriacutedica tomo XXIv n 166168 de 1980 (Parecer publicado na Revista de Direito Mercantil n 99 pp 98 e segs)

Com o sentido de demonstrar como o sigilo bancaacuterio eacute tratado no ordeshynamento juriacutedico de Portugal cito na iacutentegra um acoacuterdatildeo da Secccedilatildeo Criminal do Tribunal de Relaccedilatildeo de Eacutevora cujo texto colhi da internet (httpwwwtrept jurisp321-96html)

Processo n 321]996

Acoacuterdatildeo

Acordam na Secccedilatildeo Criminal do Tribunal da Relaccedilatildeo de Eacutevora

1 No Tribunal Judicial da Comarca de Portimatildeo correm termos uns autos de inqueacuterito registados sob o n 35711994 que tiveram orishygem numa queixa apresentada por middotM Lda contra a sociedade E Lda nos quais se procede agrave investigaccedilatildeo de factos susceptiacuteveis de inteshygrar a praacutetica de um crime de emissatildeo de cheque sem provisatildeo

Estaacute em causa o cheque nO 3681861637 sacado sobre a Caixa Geral de Depoacutesitos emitido em 1 ordm de julho de 1994 no valor de 820661$00

No decurso do inqueacuterito o Ministeacuterio Puacuteblico solicitou agravequela insshytituiccedilatildeo bancaacuteria o fornecimento de determinada documentaccedilatildeo banshycaacuteria o que esta se negou fazer alegando que a revelaccedilatildeo da pretendida documentaccedilatildeo contende com o disposto na legislaccedilatildeo sobre segredo bancaacuterio

A requerimento do Digno Magistrado do Ministeacuterio Puacuteblico o MM Juiz de Instruccedilatildeo suscitou a intervenccedilatildeo deste Tribunal da Relaccedilatildeo a fim de dispensar os serviccedilos da Caixa Geral de Depoacutesitos do segredo bancaacuteshyrio quanto agrave documentaccedilatildeo bancaacuteria solicitada a saber coacutepia da ficha de assinaturas e extracto da conta da Agecircncia de S com o n sobre a qual foi sacado o cheque em causa respeitante aos meses de maio junho e julho de 1994

Nesta relaccedilatildeo o Exmo Procurador da Repuacuteblica emitiu douto pareshycer no sentido de a referida instituiccedilatildeo bancaacuteria ser dispensada do cumshyprimento do dever do segredo bancaacuterio em ordem agrave prestaccedilatildeo dos eleshymentos pretendidos para a efectivaccedilatildeo do inqueacuterito

Colhidos os vistos legais cumpre agora decidir

2 A Caixa Geral de Depoacutesitos atraveacutes do ofiacutecio fotocopiado agrave fi 5 dos autos recusou-se a fornecer os documentos pedidos pelo Ministeacuteshyrio Puacuteblico para instruccedilatildeo de um processo de inqueacuterito com fundamento no sigilo bancaacuterio

ENSAIOS JURiacuteDICOS 233

Compreendendo o inqueacuterito o conjunto de diligecircncias que visam investigar a existecircncia de um crime determinar os seus agentes e a resshyponsabilidade deles e descobrir e recolher as provas em ordem agrave decishysatildeo sobre a acusaccedilatildeo (cf art 262 n 1 do Coacutedigo de Processo Pena0 a consulta dos pretendidos documentos - extracto da conta e ficha de assinaturas - eacute sem margem para duacutevidas de grande importacircncia para a instruccedilatildeo do processo e recolha de indiacutecios probatoacuterios tendentes agrave eventual deduccedilatildeo de acusaccedilatildeo pois sem ela desde logo muito dificilshymente se poderaacute concluir pela identificaccedilatildeo da pessoa que assinou o cheque

O dever de sigilo bancaacuterio traduz uma obrigaccedilatildeo de facto negativo (de ROR facere) e encontra-se disciplinado no Decreto-Lei n 2981992 de 31 de dezembro que aprovou o Regime Geral das Instituiccedilotildees de Creacutedito e Sociedades Financeiras O art 78 de tal diploma consagrando o dever de segredo profissional dispotildee no seu n 1 que os membros dos orgatildeos de administraccedilatildeo ou de fiscalizaccedilatildeo das instituiccedilotildees de creacutedito os seus empregados mandataacuterios comitidos e outras pessoas que lhes prestem serviccedilos a tiacutetulo permanente ou ocasional natildeo podem revelar ou utilizar informaccedilotildees sobre factos ou elementos respeitantes agrave vida da instituiccedilatildeo ou agraves relaccedilotildees desta com os seus clientes cujo conhecimento lhes advenha exclusivamente do exerciacutecio das suas funccedilotildees ou da presshytaccedilatildeo dos seus serviccedilos explicitando-se no seu n 2 que estatildeo designadamente sujeitos a segredo os nomes dos clientes as contas de depoacutesito e seus movimentos e outras operaccedilotildees bancaacuterias

O dever de segredo profissional natildeo eacute poreacutem um dever absoluto isto eacute natildeo prevalece sempre sobre qualquer outro dever que com ele entre em conflito Sofre com efeito as excepccedilotildees previstas no art 79 do mesmo Decreto-Lei n 2981992 onde se estabelece aleacutem do mais que os factos e elementos cobertos pelo dever de segredo podem ser revelashydos nos termos previstos na lei penal e de processo penal - cf aliacutenea d don2

No art 84 do mesmo diploma legal prescreve-se que a violaccedilatildeo ao dever de segredo eacute puniacutevel nos termos do Coacutedigo Penal e efectivamente o Coacutedigo Penal vigente - revisto pelo Decreto-Lei n 481995 de 15 de marccedilo - prevecirc e pune como crimes quer a violaccedilatildeo a segredo profissioshynal quer o seu aproveitamento indevido - cf arts ] 95 e 196

Ao contraacuterio da versatildeo do Coacutedigo Penal anterior agrave referida revisatildeo - em que se estatuiacutea no art 185 que a violaccedilatildeo ao segredo profissional natildeo seria puniacutevel se ocorresse no cumprimento de um dever juriacutedico sensivelmente superior ou visasse a um interesse puacuteblico ou privado legiacutetimo quando considerados os interesses em conflito e os deveres

234 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

de informaccedilatildeo que segundo as circunstacircncias se impotildeem ao agente se pudesse considerar meio adequado para alcanccedilar aquele fim - natildeo conteacutem o Coacutedigo Penal actuaJ relativamente ao crime de violaccedilatildeo ao segredo profissional qualquer causa especiacutefica de exclusatildeo da ilicitude pelo que haacute que atentar nas causas gerais de exclusatildeo da ilicitude

Ao abordar o conflito de deveres dispotildee o art 36 n 1 do Coacutedigo Penal que natildeo eacute iliacutecito o facto de quem em caso de conflito no cumprishymento de deveres juriacutedicos ou de ordens legiacutetimas da autoridade satisfishyzer dever ou ordem de valor igualou superior ao do dever ou ordem que sacrificar Natildeo seraacute pois iliacutecita a violaccedilatildeo ao segredo profissional se perante um conflito de deveres o agente satisfizer o dever de valor igual ou superior ao do dever que sacrifica

No Coacutedigo de Processo Penal generalizou-se a possibilidade de quebra do segredo profissional

Assim as pessoas indicadas no n 1 do sobredito art 78 podem recusar-se a depor sobre factos objecto de segredo profissional mas se a autoridade judiciaacuteria concluindo embora pela legitimidade da recusa natildeo prescindir desse depoimento pode requerer ao tribunal que o ordeshyne E o tribunal deveraacute ordenar a prestaccedilatildeo do depoimento com quebra do segredo profissional sempre que entender que esta se mostra justificada face agraves normas e princiacutepios aplicaacuteveis da lei penal nomeadashymente ao princiacutepio da prevalecircncia do interesse preponderante - cf art 135 n 12 e 3 do Coacutedigo de Processo Penal

A possibilidade de apreensatildeo pela autoridade judiciaacuteria de tiacutetulos valores quantias ou outros objectos depositados em bancos ou outras instituiccedilotildees de creacutedito relacionados com um crime e que possam ser de grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova bem como a possibilidade de exame pelo juiz de correspondecircncia e documenshytaccedilatildeo bancaacuterias estatildeo previstas no art 181 n 1 e 2 do Coacutedigo de Processhyso Penal As pessoas obrigadas ao dever de segredo profissional podem recusar apresentar aqueles documentos ou objectos em seu poder se invocarem por escrito segredo profissional caso em que o conflito de interesses e deveres assim surgido seraacute dirimido pelo tribunal nos tershymos idecircnticos aos previstos para a recusa de depoimento - cf arts 182 n 2 e 135 ambos do citado coacutedigo

Enquanto o dever de segredo profissional eacute geralmente estabeleshycido a favor da integridade e liberdade das pessoas a quem aproveita tendo-se inserido a sua regulamentaccedilatildeo no Tiacutetulo VI do atraacutes mencionashydo Regime Geral das Instituiccedilotildees de Creacutedito e Sociedades Financeiras no qual se prevecirc um conjunto de regras de conduta que devem guiar a actuaccedilatildeo das instituiccedilotildees de creacutedito seus administradores e empregados

ENSAIOS JURiacuteDICOS 235

nas relaccedilotildees com os clientes visando proteger de forma eficaz a posishyccedilatildeo do consumidor de serviccedilos financeiros (cf preacircmbulo do Decreshyto-Lei n 2981992) ou estabelecer um clima de confianccedila na banca que permita a captaccedilatildeo e recuperaccedilatildeo do dinheiro entesourado (como se dizia no relatoacuterio do Decreto-Lei n 21978 de 9 de janeiro revogado pelo n 1 do art 5Q do citado Decreto-Lei n 2981992) no processo de inqueacuteshyrito a que procede o Ministeacuterio Puacuteblico estaacute em causa a realizaccedilatildeo de diligecircncias de prova que permitam investigar um crime de emissatildeo de cheque sem provisatildeo sob a eacutegide do princiacutepio da verdade material e incriminar o respectivo agente

O interesse que estaacute em jogo com a pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblishyco na obtenccedilatildeo da documentaccedilatildeo bancaacuteria eacute o da boa administraccedilatildeo da Justiccedila Penal e esse interesse eacute no caso em apreccedilo sensivelmente supeshyrior ao interesse da manutenccedilatildeo do segredo bancaacuterio o que equivale a di~er que este deve ceder perante aquele

Em suma no caso concreto ponderados os interesses em conflishyto entendemos que a quebra do dever de sigilo bancaacuterio se justifica nos termos do art 36 do Coacutedigo Penal pelo que deve ser dada procedecircncia agrave pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico e consequumlentemente ao abrigo do disposto nos arts 182 n 2 e 135 n 2 e 3 ambos do Coacutedigo de Processo Penal dispensar-se a Caixa Geral de Depoacutesitos do cumprimento do deshyver de sigilo bancaacuterio a fim de poder satisfazer tal pretensatildeo

3 Por todo o exposto determina-se que com quebra do dever de sigilo bancaacuterio a Caixa Geral de Depoacutesitos forneccedila ao Digno Magistrado do Ministeacuterio Puacuteblico com destino ao Processo de Inqueacuterito n 3571 1994 a documentaccedilatildeo bancaacuteria que este lhe havia solicitado

Natildeo eacute devida taxa de justiccedila

Texto processado e integralmente revisto pelo relator

Desembargador-Relator Rui Mauriacutecio

g) Substancioso estudo do sigilo bancaacuterio no Direito Comparado foi feishyto por Andreacute Serratildeo Borges de Sampaio Consultor da Uniatildeo nas informashyccedilotildees que prestou ao Advogado-Geral da Uniatildeo com referecircncia agrave ADIn n 2397 Transcrevo o inteiro teor do seu pronunciamento

51

6 O tratamento do sigilo bancaacuterio no Direito Comparado

Em verdade o Direito Comparado entende inoponiacutevel o sigilo banshycaacuterio agraves autoridades tributaacuterias Com efeito leciona Alfredo Echeverriacutea Herrera verbis

236 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

EI sigilo bancario constituye un reacutegimen limitado exclusivashymente ai aacutembito de las relaciones entre la institucioacuten bancaria y sus clientes e impone la obligacioacuten de confidencialidad de la institucioacuten sobre las informaciones que aqueacutellos le proporcionan

En todas las legislaciones bancarias el sigilo es relativo es decir el derecho dei ciudadano ai secreto y la correlativa obligacioacuten para el banco de no revelar a terceros las informaciones recibidas en el ejercicio de su actividad ceden cuando existe norma legal expresa o causa justificada

Elliacutemite legal ai sigilo estaacute constituiacutedo por la obligacioacuten dei banco de entregar informaciones y se fundamenta en motivos sushyperiores de orden puacuteblico o general siendo liacutecito entonces que el Estado establezca Iiacutemites legales ai secreto bancaria para auxiliar por ejemplo las actuaciones de la Justicia en el plano jurisdiccional y las dei Estado en el aacutembito dei ejercicio de su potestad impositiva

Es un principio irrebatible en la vida dei derecho que ni la autonomia de las personas ni los instrumentos dei aacuterea econoacutemica y financiera pueden servir en un momento dado como elementos juridicamente idoacuteneos para lesionar el intereacutes puacuteblico En consecuencia se puede afirmar que las limitaciones ai sigilo bancario son salvaguardias necesarias ai bien comuacuten en los caacutenones dei Estado moderno Estas limites deben ser materias reshyservadas a la ley por ser de caraacutecter excepcional en sentido estricto

En este orden de ideas necesariamente debe concluirse que existen legiacutetimos y superiores intereses en diversas aacutereas de la sociedad que se vinculan ai bien comuacuten y que deben ser tutelados por el Estado como lo es por ejemplo la necesidad de detectar y reprimir la evasioacuten de los impuestos los cuales transcienden ai evenshytual intereacutes geneacuterico que pueda tener el mismo Estado en la mantencioacuten dei sigilo bancaria En efecto desde el punto de vista de lajuridicidad y de la eacutetica no se puede sostener que el secreto bancaria pueda servir como instrumento para proteger la comisioacuten de actos

52

como el recieacuten mencionado que son constitutivos muchas veces de iliacutecitos penales bajo la forma de delitos tributarias o fraushydes fiscales con resultados ademaacutes de perjucio patrimonial ai Esshytado y dano ai intereacutes general de la sociedad

EI sistema bancaria frente a la existencia en la sociedad de un intereacutes general preponderante y superior estaacute naturalmente Ilamado a colaborar en la verificacioacuten y represioacuten de la evasioacuten tributaria

ENSAIOS JURiacuteDICOS 237

En este marco se inscribe la tendencia de la mayoda de las legislaciones modemas en cuanto a dotar aI Estado de facultades para intervenir en la actividad econoacutemica de los ciudadanos en procura de la correcta determinacioacuten de los tributos cuando se conshyfigura en el desarrollo de estas actividades un hecho gravado establecido en la ley

Ya la Constitucioacuten de Weimar en 919 proclamoacute que es liacutecito ai Estado intervenir para condicionar el ejercicio de los derechos a determinados fines sociales El bien comuacuten y la justicia social comenzaron desde entonces a servir de frontera a los derechos y Iibertades individuales

Cabe destacar que la OCDE (Organisation for Economic Cooperation and Development) en un documento elaborado en el ano 1999 sobre las praacutecticas de los paiacuteses en el acceso a la informacioacuten bancaria para fines tributarios advierte que se puede abusar de la confidencialidad para ocultar actividades iJegales y evadir impuestos y agrega en el resumen ejecutivo deI documento que ni la criminalizacioacuten dei fraude tributario ni el tratamiento de la evasioacuten de impuestos bajo las leyes tributarias de los paiacuteses miembros de la OCDE son homogeacuteneos pero que sin embargo los gobiernos de la mayoriacutea de los paiacuteses miembros de la OCDE han tomado la visi6n de que en este contexto las autoridades tributashyrias no deben ser tratadas como simples terceros sino que se les debe otorgar un acceso priviligiado a la informaci6n bancaria con fines tributarias

Se agrega en este estudio que una medida de esta naturaleza no pane en peligro la conlidencialidad de la inlormacioacuten bancaria puesto que las autoridades tributarias estaacuten sujetas a estrictos conshytroles sobre coacutemo utilizan la informacioacuten de los contribuyentes y todos los gobiemos han implementado regIas para proteger la conlidencialidad de la informaci6n tributaria (EI Sigilo Bancaacuterio Acesso a la Informadon Bancaria para Fines Tributarias)

Em verdade seu texto elenca 30 paiacuteses integrantes da OCDE (a saber Alemanha Austraacutelia Aacuteustria Beacutelgica Canadaacute Repuacuteblica Checa Dinamarca Finlacircndia Franccedila Greacutecia Hungria Islacircndia Irlanda Itaacutelia Japatildeo Coreacuteia Luxemburgo Meacutexico Paiacuteses Baixos Nova Zelacircndia Noshyruega Polocircnia Portugal Espanha Sueacutecia Turquia Suiacuteccedila Reino Unido Estados Unidos Repuacuteblica Eslovaca) dos quais em 1999 apenas trecircs (Portugal Repuacuteblica Eslovaca e Luxemburgo) natildeo facultavam o acesso por parte de autoridades tributaacuterias a informaccedilotildees relativas a pessoas suspeitas de fraude tributaacuteria

238 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

Desses trecircs paiacuteses hoje remanescem apenas dois Com efeito Portugal deixou de integrar esse grupo constrangedoramente minoritaacuterio ao aprovar em 29 de dezembro de 2000 a Lei n 30-G

Nesse diploma lecirc-se

Lei da Reforma de Tributaccedilatildeo do Rendimento

(Portugal)

Artigo 63 O - B

Acesso a informaccedilotildees e documentos bancaacuterios

1 A administraccedilatildeo tributaacuteria tem o poder de aceder directashymente aos documentos bancaacuterios nas situaccedilotildees de recusa da sua exibiccedilatildeo ou de autorizaccedilatildeo para a sua consulta

a) quando se trate de documentos de suporte de registos contabiliacutesticos dos sujeitos passivos de IRS e IRC que se enconshytrem sujeitos agrave contabilidade organizada

b) quando o contribuinte usufrua de benefiacutecios fiscais ou de regimes fiscais privilegiados havendo necessidade de controshylar os respectivos pressupostos e apenas para esse efeito

2 A administraccedilatildeo tributaacuteria tem o poder de aceder a todos os documentos bancaacuterios excepto as informaccedilotildees prestadas para justificar o recurso ao creacutedito nas situaccedilotildees de recusa de exibiccedilatildeo daqueles documentos ou de autorizaccedilatildeo para a sua consulta

a) quando se verificar a impossibilidade de comprovaccedilatildeo e quantificaccedilatildeo directa e exacta da mateacuteria tributaacutevel nos termos do artigo da Lei Geral Tributaacuteria e em geral quando estejam verifishycados os pressupostos para o recurso a uma avaliaccedilatildeo indirecta

b) quando os rendimentos declarados em sede de IRS se afastarem significativamente para menos sem razatildeo justificada dos padrotildees de rendimento que razoavelmente possam permitir as manifestaccedilotildees de riqueza evidenciadas pelo sujeito passivo nos termos do artigo 89-A da Lei Geral Tributaacuteria

c) quando existam indiacutecios da praacutetica de crime doloso em mateacuteria tributaacuteria designadamente nos casos de utilizaccedilatildeo de facturas falsas e em geral nas situaccedilotildees em que existam factos concretamente identificados gravemente indiciadores da falta de veracidade do declarado

d) quando seja necessaacuterio para fins fiscais comprovar a aplicaccedilatildeo de subsiacutedios puacuteblicos de qualquer natureza

ENSAIOS JUAlolCOS 239

3 As decisotildees da administraccedilatildeo tributaacuteria referidas nos nuacuteshymeros anteriores devem ser fundamentadas com expressa menshyccedilatildeo dos motivos concretos que as justificam pressupotildeem a audishyccedilatildeo preacutevia do contribuinte e satildeo da competecircncia do Director-Geshyral dos Impostos ou do Director-Geral das Alfacircndegas e dos Imshypostos Especiais sobre o consumo ou seus substitutos legais sem possibilidade de delegaccedilatildeo

4 Os actos praticados ao abrigo da competecircncia definida no nuacutemero anterior satildeo susceptiacuteveis de recurso judicial o qual teraacute efeito suspensivo nas situaccedilotildees previstas no n 2

5 Nos casos de deferimento do recurso previsto no nuacutemero anterior os elementos de prova entretanto obtidos natildeo podem ser utilizados para qualquer efeito em desfavor do contribuinte

6 As entidades que se encontrem numa relaccedilatildeo de domiacutenio com o contribuinte ficam sujeitas aos regimes de acesso agrave inforshymaccedilatildeo bancaacuteria referidos nos n 1 e 2

7 O acesso da administraccedilatildeo tributaacuteria a informaccedilatildeo banshycaacuteria relevante relativa a familiares ou terceiros que se encontrem numa relaccedilatildeo especial com o contribuinte depende de autorizashyccedilatildeo judicial expressa apoacutes audiccedilatildeo do visado obedecendo aos requisitos previstos no n 3

8 O regime previsto nos nuacutemeros anteriores natildeo prejudica a legislaccedilatildeo aplicaacutevel aos casos de investigaccedilatildeo por infracccedilatildeo peshynal e soacute pode ter por objecto operaccedilotildees e movimentos bancaacuterios realizados apoacutes a sua entrada em vigor sem prejuiacutezo do regime vigente para as situaccedilotildees anteriores

9 Os actos praticados ao abrigo da competecircncia prevista no n I devem ser objecto de comunicaccedilatildeo ao Defensor do Contrimiddot buinte

10 Para os efeitos desta lei considera-se documento bancaacuteshyrio qualquer documento ou registo independentemente do resshypectivo suporte em que se titulem comprovem ou registem opeshyraccedilotildees praticadas por instituiccedilotildees de creacutedito ou sociedades finanshyceiras no acircmbito da respectiva actividade incluindo os referentes a operaccedilotildees realizadas mediante utilizaccedilatildeo de cartotildees de creacutedito (coacutepia anexa)

Parece evidente destarte que todo o mundo civilizado abandonou a possibilidade de opor-se agrave Administraccedilatildeo Tributaacuteria o sigilo bancaacuterio

240 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

4 O sigilo bancaacuterio e o direito agrave intimidade e agrave privacidade das pessoas

A anaacutelise do sigilo bancaacuterio em face do direito agrave intimidade e agrave privacidashyde exige inicialmente que seja enfrentada a questatildeo referente ao seu conceito

Os doutrinadores natildeo tecircm assumido posiccedilatildeo uniforme quanto aos asshypectos conceituais dessa entidade juriacutedica

Seacutergio Carlos Covello autor da obra jaacute mencionada (O Sigilo Bancaacuterio Leud S Paulo 1991 p 69) entende que sigilo bancaacuterio eacute a obrigaccedilatildeo que tecircm os Bancos de natildeo revelar salvo justa causa as informaccedilotildees que venham a obter em virtude de sua atividade profissional

Luiz Fernando Bellinetti no artigo intitulado Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio (Revista do Direito do Consumidor Satildeo Paulo RT 1996 voI 18 p 144) defende posiccedilatildeo no sentido de que sigilo bancaacuterio eacute o dever juriacutedico que tecircm as instituiccedilotildees de creacutedito e as organizaccedilotildees auxiliares e seus empregados de natildeo revelar salvo justa causa as informaccedilotildees que venham a obter em virtushyde da atividade bancaacuteria a que se dedicam

Para Arnoldo Wald (in O Sigilo Bancaacuterio no Projeto de Lei Complemenshytar n 70 Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas n I pp 196209) o sigilo bancaacuterio se enquadra no conceito mais amplo do segredo profissional que tem merecido uma proteccedilatildeo mais ampla ensejando sua violaccedilatildeo caracterizaccedilatildeo como crime (art 154 do Coacutedigo PeshynaI)

Eivany A Silva tratando do tema em Consideraccedilotildees a Respeito do Sigilo de Dados (artigo publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio n 61 pp 41142 - Edit Dialeacutetica) afirma que o sigilo bancaacuterio eacute espeacutecie do gecircnero sigilo de dados constituindo um direito fundamental protegido constitucionalmente inserto que estaacute no rol dos direitos e garantias individuais ou seja em claacuteusushylas peacutetreas da Carta Magna natildeo podendo portanto ser modificado nem messhymo por emenda agrave Constituiccedilatildeo e portanto muito menos por legislaccedilatildeo de hierarquia inferior

Como examinado haacute divergecircncias na fixaccedilatildeo do conceito Essas divershygecircncias embora importantes para as posiccedilotildees doutrinaacuterias a serem assumishydas sobre o alcance do sigilo bancaacuterio natildeo geram contudo influecircncias de maior intensidade no relacionamento entre a instituiccedilatildeo financeira e os seus depositantes Isso porque o que merece ser considerado eacute a natureza juriacutedica do sigilo bancaacuterio isto eacute a que categoria de direito pertence e como por quem e quando a sua quebra pode ser determinada

Em face do exposto necessaacuterio eacute que se faccedila o alinhamento das teorias que procuram fundamentar o sigilo bancaacuterio

A doutrina em eacutepocas diversas examinou as seguintes teorias

ENSAIOS JURiacuteDICOS 241

Teoria contratualista O sigilo bancaacuterio de acordo com essa teoria deshycorre da relaccedilatildeo contratual que voluntariamente eacute formada entre o banco e o cliente por via da qual mesmo sem claacuteusula expressa a instituiccedilatildeo financeira assume a obrigaccedilatildeo de guardar segredo das movimentaccedilotildees de dinheiro que nela satildeo feitas Essa responsabilidade assumida pelo banco inspira-se segunshydo os adeptos da teoria em destaque nos usos nos costumes e na boa-feacute sempre aplicaacuteveis na intepretaccedilatildeo dos contratos comerciais7bull

Teoria do direito agrave privacidade Os adeptos dessa corrente afirmam que o sigilo bancaacuterio integra o campo do direito agrave privacidade que faz parte dos direitos da personalidade

Teoria consuetudinaacuteria Segundo os seguidores dessa linha de pensar o sigilo bancaacuterio decorre dos compromissos taacutecitos assumidos entre instituishyccedilotildees financeiras e seus clientes no sentido de natildeo serem levados ao conhecishymento de terceiros os valores transacionados O uso reiterado dessa praacutetica apoiada no elemento confianccedila passou a representar costume adotado nesse tipo de negoacutecio juriacutedico

Teoria da boa-feacute A adoccedilatildeo dessa teoria conduz o inteacuterprete a entender que o sigilo bancaacuterio por sua proacutepria natureza estaacute vinculado ao caraacuteter fiduciaacuterio da atividade bancaacuteria fundando-se portanto na boa-feacute ou dever de lisura que tanto marca o tipo de negoacutecio juriacutedico firmado

Teoria do sigilo profissional Essa teoria concebe o sigilo bancaacuterio como sendo uma espeacutecie do sigilo profissional Haacute portanto um dever eacutetico do banshyco em respeitar o sigilo bancaacuterio em decorrecircncia da profissatildeo exercida

Teoria do direito agrave intimidade dos bancos Os integrantes dessa forma de pensar sustentam que a instituiccedilatildeo financeira tem legiacutetimo interesse de afastar do conhecimento de terceiros a movimentaccedilatildeo financeira dos seus clientes e consequumlentemente dos fatos com elas relacionados

Teoria da complexidade do viacutenculo Essa teoria eacute explicada por Arnoldo Wald no trabalho jaacute citado da forma seguinte A doutrina moderna abandoshynou a noccedilatildeo da relaccedilatildeo juriacutedica contratual defendo a complexidade do viacutenshyculo Aleacutem dos direitos e das obrigaccedilotildees principais existem deveres secundaacuteshyrios para ambos os contratantes que decorrem da regra geral da boa-feacute denoshyminada na doutrina italiana de cOITeteza e na legislaccedilatildeo alematilde de Treu und Glauben Exige que a atuaccedilatildeo de uma parte natildeo cause danos agrave esfera juriacutedica da outra Dentro desta ideacuteia defende-se que o segredo bancaacuterio eacute um dever

7 Arnoldo Wald em Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais artigo publicado na Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas n 22 pp 1518 manifesta entendimento de que no campo normatIacutevo do Direito brasileiro esta teoria encontra respaldo nos arts 130 e 131 do Coacutedigo Comercial que prevecirc a interpretaccedilatildeo dos contratos segundo os usos os costumes e a boa-feacute

242 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

acessoacuterio na relaccedilatildeo juriacutedica Mesmo que natildeo nasccedila o contrato entre as partes a boa-feacute objetiva impede que a instituiccedilatildeo financeira prejudique os interesses do cidadatildeo

Estabelecidos os pressupostos doutrinaacuterios acima examinamos agora se o sigilo bancaacuterio diz respeito agrave intimidade e agrave privacidade das pessoas

A Constituiccedilatildeo Federal em seu artigo 5ordm incisos X e XII afirma

Art 5ordm Todos satildeo iguais perante a lei sem distinccedilatildeo de qualquer natureza garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Paiacutes a inviolabilidade do direito agrave vida agrave liberdade agrave igualdade agrave segushyranccedila e agrave propriedade nos termos seguintes

X - satildeo inviolaacuteveis a intimidade a vida privada a honra e a imagem das pessoas assegurado o direito agrave indenizaccedilatildeo pelo dano material ou moral decorrente de sua violaccedilatildeo

XJl - eacute inviolaacutevel o sigilo da correspondecircncia e das comunicaccedilotildees telegraacuteficas de dados e das comunicaccedilotildees telefocircnicas salvo no uacuteltimo caso por ordem judicial nas hipoacuteteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigaccedilatildeo criminal ou instruccedilatildeo processual penal

Essas garantias constitucionais protegem o cidadatildeo de qualquer investida de terceiros em sua intimidade em sua vida privada e no sigilo de seus dados

Na expressatildeo terceiros estaacute incluiacutedo o Estado e consequumlentemente seus agentes poliacuteticos e administrativos

A doutrina tem se manifestado de modo quase unacircnime no sentido de que o sigilo bancaacuterio eacute uma garantia constitucional que protege a privacidade das pessoas no campo econocircmico e financeiro A sua significaccedilatildeo eacute de natildeo tornar puacuteblica a movimentaccedilatildeo da conta bancaacuteria e das aplicaccedilotildees financeiras do cidadatildeo para que de nenhum modo os atos privados praticados possam ser tornados puacuteblicos

Esse posicionamento eacute o adotado pelos autores que passo a citar

Arnoldo Wald (O Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais artigo pushyblicado na Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas RT n 22 pp 1521)

O sigilo bancaacuterio eacute o meio para resguardar a privacidade no camshypo econocircmico pois veda a publicidade sobre a movimentaccedilatildeo da conta corrente bancaacuteria e das aplicaccedilotildees financeiras

ENSAIOS JURiacuteDICOS 243

Eivany A Silva (Consideraccedilotildees a Respeito do Sigilo de Dados artigo publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio n 61 Satildeo Paulo Editora Dialeacutetica p27)

A maioria dos ordenamentos juriacutedicos como o brasileiro tratam o sigilo bancaacuterio como direito fundamental do contribuinte agrave privacidashyde ou seja agrave resistecircncia agrave comunicaccedilatildeo de dados que representem desshydobramento da personalidade da pessoa direito agrave oposiccedilatildeo e agrave negaccedilatildeo de comunicaccedilatildeo

Ives Gandra da Silva Martins (Sigilo Bancaacuterio trabalho publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio S Paulo Editora Dialeacutetica n 1 pp 24 e 25)

Pelos incisos X e XII do artigo 5ordm tem o contribuinte o direito de preservaccedilatildeo de sua intimidade de sua privacidade e de que terceiros que detenham informaccedilotildees pessoais suas sejam obrigados a guardaacute-Ias

Natildeo pode pois a fiscalizaccedilatildeo exigir de terceiros informaccedilotildees que apenas pode obter do proacuteprio contribuinte

Em determinadas hipoacuteteses todavia o interesse puacuteblico haacute de preshyvalecer sobre o interesse individual mas caberaacute a um outro poder definir se tais hipoacuteteses efetivamente ocorrem com o que poderaacute o Poder Judishyciaacuterio autorizar se convencido estiver o magistrado de que a hipoacutetese eacute de gravidade e de lesatildeo ao interesse puacuteblico a quebra do direito ao sigilo bancaacuterio

Estou convencido ser esta a melhor conformaccedilatildeo juriacutedica da quesshytatildeo idealizada pelos constituintes defendida pela doutrina e consagrashyda na jurisprudecircncia corrente exegeacutetica esta a que me filio desde os meus primeiros escritos sobre a mateacuteria

Roberto Quiroga Mosquera (Tributaccedilatildeo no Mercado Financeiro e de Capitais obra publicada pela Editora Dialeacutetica Satildeo Paulo 1998 pp 70171)

Do exposto ateacute aqui eacute evidente que o direito ao sigilo bancaacuterio representa uma espeacutecie de direito agrave privacidade

Eacute incontroverso que os dados e informaccedilotildees de natureza bancaacuteria dizem respeito agrave intimidade e agrave vida privada dos cidadatildeos Dados que dizem respeito aos valores em dinheiro depositados em contas-correnshytes bancaacuterias tipos e caracteriacutesticas de aplicaccedilotildees financeiras ganhos e prejuiacutezos auferidos ou incorridos em operaccedilotildees bursaacuteteis etc satildeo sem sombra de duacutevida elementos particulares e pessoais de qualquer indiviacuteshyduo

244 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Utilizando outra voz informaccedilotildees que tocam no aspecto financeishyro do ser humano representam direito iacutentimo e personaliacutessimo devendo ser mantidas em sigilo por aqueles que eventualmente as detenham em razatildeo de sua atividade profissional Parece-nos que tal conclusatildeo eacute de uma clareza inconteste

Natildeo tem sido outra a posiccedilatildeo da doutrina mais abalizada do Paiacutes e da jurisprudecircncia dominante

o autor referido a seguir faz a observaccedilatildeo seguinte

Carlos Alberto Hagstrom (Sigilo Bancaacuterio Novas Questotildees Reshyvista de Direito Mercantil Satildeo Paulo Malheiros 1997 vaI 105 pp 4344) expotildee que apesar de existirem diversas teorias que procuram fundashymentar juridicamente o sigilo bancaacuterio modernamente a explicaccedilatildeo para o fundamento do referido instituto sofreu uma radical alteraccedilatildeo Divershysas constituiccedilotildees modernas esclarece o mencionado autor ampliaram e explicitaram o elenco de direitos e garantias individuais passando a garantir o direito agrave privacidade e agrave intimidade A Constituiccedilatildeo brasileira natildeo trilha caminho diferente Assegurou referidos direitos de forma exshypressa e sem restriccedilotildees O tema do sigilo bancaacuterio figura agora em niacutevel constitucional Tem status de norma superior no qual se reconhece o direito agrave intimidade como norma de caraacuteter geneacuterico em que estatildeo conshytemplados muacuteltiplos aspectos da vida privada em especial os de ordem econocircmico-financeira que compotildeem o que Hagstrom denominou a inshytimidade econocircmica ou intimidade patrimonial

Luiacutes Fernando 8ellinetti (Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio artigo publicado na Revista de Direito do Consumidor n 18 pp 141151)

Como jaacute dissemos anteriormente em certas hipoacuteteses o fundashymento para o segredo bancaacuterio seria a privacidade No entanto nesses casos o que se protege eacute a privacidade e natildeo propriamente o sigilo

Entendemos que uma coisa eacute garantir-se a privacidade da pessoa com fundamento em norma constitucional outra eacute garantir-se o segreshydo de informaccedilotildees bancaacuterias de uma pessoa com base na legislaccedilatildeo supramencionada

Sempre que a revelaccedilatildeo de informaccedilotildees bancaacuterias puder violar a privacidade da pessoa parece-nos que mais do que garantia ao sigilo bancaacuterio (com fundamento legal) tem a pessoa garantia agrave sua privacishydade (com fundamento constitucional)

ENSAIOS JURiacuteDICOS 245

No entanto se a revelaccedilatildeo da informaccedilatildeo natildeo invadir a esfera da intimidade da pessoa sua garantia eacute meramente legal do sigilo bancaacuterio

Carlos Maacuterio Velloso (citado por Misabel Derzi em Direito Tributaacuterio Aplicado obra publicada pela Editora Del Rey Belo Horizonte MO pp 278 e 279)

O sigilo bancaacuterio decorre do direito agrave privacidade inerente agrave pershysonalidade das pessoas consagrado na Constituiccedilatildeo Federal em seu art 5ordm X e protege tanto interesses privados como finalidades de ordem puacuteblica a saber o sistema de creacutedito O sigilo bancaacuterio natildeo eacute um princiacuteshypio absoluto

As exceccedilotildees ao sigilo bancaacuterio estatildeo previstas na Lei n 45951964 que continua em vigor

O Poder Judiciaacuterio pode requisitar relativamente a pessoas e instishytuiccedilotildees informaccedilotildees que implicam quebra de sigilo (Lei n 45951964 art 38 sect 1 ordm) entretanto mesmo havendo inqueacuterito policial instaurado deveraacute proceder com cautela prudecircncia e moderaccedilatildeo inerentes agrave mashygistratura

Luciana Fregodolli (O Direito agrave Intimidade - excerto da dissertaccedilatildeo que apresentou sob o tiacutetulo O Direito agrave Intimidade e a Prova Iliacutecita publicado pela Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Constitucional e Ciecircncia Poliacutetica -n 19 p 233)

O sigilo bancaacuterio protege interesses privados Eacute ele espeacutecie de direito agrave privacidade inerente agrave personalidade das pessoas e que a Consshytituiccedilatildeo Federal consagra no art 5ordm X aleacutem de atender a uma finalidade de ordem puacuteblica qual seja a de proteccedilatildeo ao sistema de creacutedito

O direito agrave privacidade abrange atualmente o de impedir que tershyceiros inclusive o Estado e o Fisco tenham acesso a informaccedilotildees sobre o que se denominou a aacuterea de manifestaccedilatildeo existencial do ser humano

Celso Ribeiro Bastos O pensamento de Celso Ribeiro Bastos foi exshyposto por Roberto Quiroga Mosquera na obra jaacute referida p 71 do modo seguinte

Celso Bastos eacute do mesmo pensar Apoacutes tecer consideraccedilotildees introdutoacuterias acerca do sigilo bancaacuterio e expor pensamentos de divershysos autores nacionais e alieniacutegenas conclui o constitucionalista brasileishyro no sentido de que todas as despesas ordinaacuterias feitas pelo cidadatildeo

246 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

comum em sua vida cotidiana devem ser consideradas parte de sua vida privada familiar ou domeacutestica e portanto protegidas contra interferecircnshycias a despeito de qualquer pretexto Desde as condutas mais corriqueishyras como as compras efetuadas em um supermercado para manutenshyccedilatildeo da famiacutelia quanto aquelas outras moralmente reprovaacuteveis como presentes ou joacuteias compradas e dadas a quem presta ao homem servishyccedilos de natureza extraconjugal tudo estaacute abarcado pelo manto da proteshyccedilatildeo agrave vida privada familiar ou domeacutestica ( ) E mais adiante arremata Hoje praticamente a vida do homem pode ser escrita a partir de seu talatildeo de cheques e nas sociedades mais avanccediladas pelos cartotildees de creacutedito e magneacuteticos Permitir-se que o sigilo bancaacuterio venha a ser romshypido por qualquer forma natildeo-extraordinaacuteria para salvaguarda de inteshyresse de porte no miacutenimo idecircntico eacute expor a seguranccedila individual a um constante e absurdo temor perante as possibilidades de controle direto ou pelo vazamento de alguma informaccedilatildeo

Haacute contudo corrente contraacuteria como passaremos a demonstrar

Andreacute Serratildeo Borges de Sampaio Consultor da Uniatildeo nas informashyccedilotildees prestadas ao Advogado-Geral da Uniatildeo sobre a ADIn n 2397 cita trechos de doutrina e jurisprudecircncia estrangeiras defendendo o entendimento de que o sigilo bancaacuterio natildeo tem conotaccedilatildeo de direito de privacidade Eis o que escreshyveu o parecerista citado

O jurista portuguecircs J L Saldanha Sanches coteja primorosashymente o sigilo bancaacuterio com a proteccedilatildeo da intimidade para concluir que natildeo haacute que se falar em direito ao sigilo bancaacuterio como concretizaccedilatildeo do direito agrave intimidade Nas suas palavras

Ora em que esfera podemos noacutes incluir o segredo bancaacuteshyrio enquanto instituto que concretiza certos valores do ordenashymento juriacutedico Como expressatildeo de interesses juridicamente tuteshylados

Seraacute o segredo bancaacuterio um prolongamento do direito agrave inshytimidade da esfera pessoal e familiar de uma qualquer pessoa sinshygular (uma vez que em relaccedilatildeo agraves pessoas coletivas a questatildeo natildeo pode mesmo ser colocada) Ou diraacute antes respeito aquela faixa mais larga que resguarda a privacidade de qualquer cidadatildeo e que soacute pode por isso sofrer qualquer intromissatildeo se surgirem razotildees vaacutelidas para que tal direito seja restringido

Ao afirmar-se que na perspectiva dos clientes dos bancos o segredo bancaacuterio eacute um direito com a reserva da sua vida privada temos uma primeira resposta para esta questatildeo

ENSAIOS JURiacuteDICOS 247

Mas falta distinguir entre intimidade e reserva da vida privashyda e entre clientes individuais e profissionais de um banco Natildeo estamos perante o mesmo tipo de tutela quando contamos que um particular espera que o banco natildeo divulgue a qualquer inteshyressado o volume da sua conta bancaacuteria (porque pura e simplesshymente quer manter sob reserva a sua vida particular) ou quando um comerciante confia no banco para que este natildeo revele quem satildeo os seus clientes fornecedores ou qual eacute o seu grau de endividamento

No caso da pessoa singular estaacute apenas em causa um conshyjunto de valores de natureza moral esta natildeo estaacute em princiacutepio preocupada com possiacuteveis prejuiacutezos econocircmicos ligados a qualshyquer divulgaccedilatildeo Apenas se opotildee por razotildees do seu foro pessoal e que natildeo carecem de fundamentaccedilatildeo que esta tenha lugar

Enquanto que o comerciante pode ser seriamente prejudishycado em termos concorrenciais com a revelaccedilatildeo da lista dos seus clientes ou com a sua situaccedilatildeo financeira

O dever de reserva que cabe ao banqueiro estaacute desta forma a serviccedilo do interesse comercial das empresas suas clientes - que pelo simples facto de o serem ou por necessitarem de obter creacutedishyto lhe datildeo informaccedilotildees com um forte valor comercial ou da pesshysoa singular que deseja manter a privacidade da sua situaccedilatildeo patrimonial

Ou em alternativa ao serviccedilo da manutenccedilatildeo da privacidashyde que qualquer um pode desejar ainda que a possiacutevel violaccedilatildeo desta apenas lhe possa acarretar danos natildeo-patrimoniais

E por isso o segredo bancaacuterio natildeo pode constituir a expresshysatildeo do imperativo constitucional da proteccedilatildeo da intimidade Ateacute porque o acesso a essa esfera estaacute vedado aos proacuteprios bancos

Natildeo nos parece aceitaacutevel que um banco como condiccedilatildeo para a concessatildeo de creacutedito a uma pessoa singular ou para estashybelecer com ela qualquer relaccedilatildeo contratual possa exigir desta informaccedilatildeo de tipo estritamente pessoal ou a sujeiccedilatildeo a exames meacutedicos que atingindo a sua esfera iacutentima afectam a sua dignidashyde Aqui estaacute em causa a ilicitude da pergunta por pressupor o acesso agrave esfera inviolaacutevel (e indisponiacutevel) da intimidade

A informaccedilatildeo que o banco pode obter para a defesa dos seus interesses legiacutetimos natildeo pode ir aleacutem da esfera patrimonial do seu cliente rendimentos bens possuiacutedos perspectivas profisshysionais

( )

248 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

Podemos pois concluir que o segredo bancaacuterio natildeo eacute natildeo pode ser uma concretizaccedilatildeo do princiacutepio constitucional do direishyto agrave intimidade

Este princiacutepio tem como funccedilatildeo consagrar uma zona de reshyselVa pessoal para factos opccedilotildees e circunstacircncias que soacute de forshyma indirecta e de todo secundaacuteria podem ter aspectos ou refleshyxos de natureza patrimonial (Saldanha Sanches J L Segredo Bancaacuterio e Tributaccedilatildeo do Lucro Real In Saldanha Sanches J L Estudos de Direito Contabiliacutestico e Fiscal Coimbra Coimbra Edishytora 2000 pp 105108)

Em diversos paiacuteses haacute a clara percepccedilatildeo que natildeo haacute que se conshyfundir direito agrave intimidade com sigilo bancaacuterio indicando que a quebra do sigilo pela Administraccedilatildeo Tributaacuteria natildeo constitui violaccedilatildeo ao direito Ao contraacuterio a existecircncia de um Estado Fiscal implica na necessidade de consagrar agrave administraccedilatildeo tributaacuteria tal faculdade o que se harmonishyza com diversos princiacutepios e outros direitos fundamentais constantes da Carta de 1988

O caso espanhol eacute exemplar neste sentido ao natildeo visualizar a vioshylaccedilatildeo ao direito agrave intimidade em relaccedilatildeo agrave quebra do sigilo bancaacuterio Portanto

el Tribunal Constitucional espaflOl se ha pronunciado por la negativa de que el conocimiento de las cuentas bancarias por la Administracioacuten pueda invadir el aacutembito constitucionalmente garantizado de la intimidad de los individuos porque tales extractos no constituyen per se uma biografiacutea personal en nuacutemeros y en siacute no tiene relevancia para la intimidad personal y familiar dei contribuyente ya que se trata de dados no secretos y confiados a una entidad (Campos Laura Rodriacuteguez Oerechos dei Contribuyente em la Repuacuteblica Argentina ai Amparo de la Convencioacuten Interamericana de Oerechos Humanos http wwwiefpaorgarcriteriosdigitalarticulosderechoshtm Visitado em 512001)

Ao analisar a jurisprudecircncia da Corte Constitucional espanhola quanto ao tema tambeacutem ressalta Saldanha Sanches

Na apreciaccedilatildeo da constitucionalidade da lei que permitia o controle administrativo das contas bancaacuterias o Tribunal Constitushycional espanhol realizou uma distinccedilatildeo entre intimidade pessoal e familiar e a intimidade econoacutemica onde a proteccedilatildeo constitucional eacute menos intensa

ENSAIOS JURiacuteDICOS 249

E procura fazer uma distinccedilatildeo entre a violaccedilatildeo agrave intimidade como consequumlecircncia de uma anaacutelise das contas bancaacuterias - coloshycando a hipoacutetese de uma recusa de cooperaccedilatildeo por parte do conshytribuinte se tal eventualidade se verificar - e a violaccedilatildeo directa da intimidade uma vez que esta natildeo pode resultar de uma mera anaacuteshylise de movimentos bancaacuterios (Saldanha Sanches J L A Situashyccedilatildeo Actual do Sigilo Bancaacuterio a Singularidade do Regime Portushyguecircs In Saldanha Sanches J L Estudos de Direito Contabiliacutestico e Fiscal Coimbra Coimbra Editora 2000 p 91)

Outro comentarista ao analisar a situaccedilatildeo do sistema espanhol quanto ao sigilo bancaacuterio e o direito agrave intimidade fez questatildeo de ressaltar

Seguacuten el r c frente a la Hacienda Puacuteblica no existe el derecho a la intimidad deI art 18 CE Ya la LO de 5 de mayo deI 82 vada praacutecticamente de contenido constitucional el derecho a la intimidado en cuanto el aacutembito de eacutesta queda deferido a la ley ordinaria (a 2ordm) y en cuanto que la esfera protegida frente a las Administraciones se reduce a poco O nada ai no reputarse intromisiones ilegiacutetimas las actuaciones autorizadas o acordadas por la Autoridad competente de acuerdo con la Ley (art 8ordm 1)

La LGTy el RI Iimiacutetan la esfera de la intimidad en las relacishyones con la Hacienda hasta el extremo de que solamenle existe un refugio limitado en el aacutembito deI secreto profesional en los casos de informacioacuten sobre terceros y siempre que no se trate de datos con transcendencia econoacutemica o tributaria EI rc no ha enconshytrado hasta el momento ni un solo supuesto de dato o informacioacuten econocircmica con transcendencia tributaria que limite la accioacuten inquisitiva de la Administracioacuten tributaria por razoacuten de intimidado Bien puede decirse por tanto que frente a la Administraciocircn tribushytaria en cuanto se trata deI ejercicio de su funciocircn de buacutesqueda de datos con transcendencia tributaria el derecho a la intimidad personal y familiar (art 18 I CE) no existe

La biacuteblia deI tribunal a estos efeclos estaacute constituida por la S 11084 reiterada en numerosas ocasiones ampliada en el Auto 64286 y reafirmada por ejemplo en la S 26 abril 90 tantas veces citada (FJ 10deg) Seguacuten esa doctrina la distribucioacutenjusta de la carshyga fiscal prevalece sobre el derecho a la intimidad parte dei art 812 I de la LO seguacuten el cual frente a la Ley (ordinaria) no hay intimidad protegida siempre que haya en dicha ley imperativos de intereacutes puacuteblico ( ) ni siquiera se habla dei predomiacutenio frente a la

250 SUPERIOR TRIBUNAl DE JUSTiCcedilA

intimidad de intereses u objetivos constitucionalmente protegidos Soacuteo admite que la actuadoacuten administrativa es arbitraria cuando no parezcajustificada por la Finalidad de la inspeccioacuten es decir cuando se trate de datos o informaciones que carezcan de transcendencia tributaria pero eacuteste obviamente no es sin Umite derivado dei derecho a la intimidad sino de la interdiccioacuten de arbitrariedad o desviacioacuten de poder de la Administracioacuten de la necesidad de ajuste de toda Administracioacuten ai acircmbito de su competencia que tanto vale para datos iacutentimos como para otros que no lo sean Seguacuten la S 11084 no hay esfera de intimidad proshytegida frente a una Administracioacuten tributaria amparada en una norma que elimina la intimidad como liacutemite (Garciacutea AIacuteloveros Jaime Una Nueva Ley General Tributaria Problemas Constitucioshynales In Kirchhof P et aI Garantiacuteas Constitucionales dei Contribuyente Valencia Tirant lo Blanch 1999 pp 109110)

Diante de tudo quanto foi exposto tendo-se o cuidado de registrar posicionamento de diferentes autores nacionais e estrangeiros haacute ambiente preparado para ser respondido o primeiro questionamento desdobrado em trecircs partes formulado para o 1II Coloacutequio Internacional de Direito Tributaacuterio promoccedilatildeo do Centro de Extensatildeo Universitaacuteria Eis a primeira parte do seu teor

O sigilo bancaacuterio diz respeito agrave intimidade e privacidade das pessoas

A resposta eacute optando por convencimento influenciado pelas ideacuteias da corrente predominante positiva

O nosso entendimento eacute no sentido de que o direito agrave intimidade integra os direitos da personalidade e visam proteger o direito agrave inviolabilidade do domiciacutelio da correspondecircncia das comunicaccedilotildees de quaisquer espeacutecies dos dados pessoais computadorizados do sigilo bancaacuterio O mesmo acontece com o direito agrave privacidade

A expansatildeo da proteccedilatildeo do direito agrave intimidade e agrave privacidade eacute uma consequumlecircncia da evoluccedilatildeo da era contemporacircnea nos setores tecnoloacutegicos e da instabilidade que passam as instituiccedilotildees estatais especialmente a encarreshygada de arrecadar tributos Haacute o reconhecimento de que desenvolve-se um processo de aguda corrosatildeo na proteccedilatildeo agrave intimidade que ao ser violada provoca a publicizaccedilatildeo das condutas mais iacutentimas do cidadatildeo

A concepccedilatildeo do sigilo bancaacuterio no acircmbito do direito agrave intimidade e agrave privacidade visa garantir ao homem o miacutenimo capaz para que lhe seja asseshygurada a sua condiccedilatildeo humana protegendo-o de ingerecircncias alheias como apregoa a Conferecircncia Noacuterdica sobre o Direito agrave Intimidade realizada em Estoshycolmo na data de maio de 1967 ao fazer inserir no documento que publicou a seguinte definiccedilatildeo O direito agrave intimidade eacute o direito do homem de viver de forma independente a sua vida com um miacutenimo de ingerecircncia alheia

ENSAIOS JURiacuteDICOS 251

5 Seguranccedila juriacutedica e acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias

A segunda pergunta apresentada pelos organizadores do coloacutequio estaacute assim posta

A seguranccedila das relaccedilotildees juriacutedicas atraveacutes do Sistema Financeiro pode ser afetada pelo acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves inforshymaccedilotildees bancaacuterias

O acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias se realizado caracteriza um atentado de suma gravidade aos direishytos do cidadatildeo Eacute um ataque aos princiacutepios sustentadores do sistema demoshycraacutetico adotado pelo constituinte de 1988 especialmente quando detonou que a Repuacuteblica Federativa do Brasil tem como objetivo fundamental o respeishyto agrave dignidade humana e agrave cidadania

Do ordenamento juriacutedico brasileiro a meu pensar natildeo haacute lugar para brotar qualquer interpretaccedilatildeo que conclua pela possibilidade de qualquer agenshyte do Poder Puacuteblico acessar de modo generalizado e sem motivaccedilatildeo informashyccedilotildees bancaacuterias do cidadatildeo mesmo com autorizaccedilatildeo judicial

Esclareccedilo desde logo que natildeo comungo com o pensamento de detershyminada corrente no sentido de ser absoluto o direito ao sigilo bancaacuterio Tenho-o como relativo poreacutem vinculado aos princiacutepios da razoabilidade da moralidade da legalidade e da motivaccedilatildeo expliacutecita e detalhada sob pena de ser impossiacutevel a sua quebra

O acesso indiscriminado do agente fiscal agraves informaccedilotildees bancaacuterias do cidadatildeo gera uma quebra da seguranccedila das relaccedilotildees juriacutedicas por um terceiro passar a ter sem causa justificadora conhecimento da vida iacutentima de algueacutem submetendo-o a partir daiacute a um regime de submissatildeo Por outro lado ninshygueacutem poderaacute garantir nem o proacuteprio Estado que o agente puacuteblico utilize os dados que chegaram ao seu conhecimento para outros intentos que natildeo o exclusivamente fiscal

Lembra Arnoldo Wald que O segredo na atividade bancaacuteria envolve concomitantemente interesses privaqos e coletivos que podem ser analisashydos sob trecircs acircngulos o interesse do cliente na sua relaccedilatildeo com a instituiccedilatildeo financeira o interesse do banco em atuar com discriccedilatildeo para ganhar a conshyfianccedila da populaccedilatildeo e captar recursos e o interesse social na existecircncia de um bom e eficiente sistema bancaacuterio Por estarem ligadas ao desenvolvimento da economia e aos interesses da comunidade as relaccedilotildees que envolvem as instishytuiccedilotildees financeiras natildeo recebem o mesmo tratamento juriacutedico dispendido a outras relaccedilotildees comerciais Inviaacutevel a aplicaccedilatildeo exclusiva das regras de Direito Privado as quais tecircm como princiacutepio norteador a autonomia da vontade pois

252 SUPERIOR TRIBUNAl DE JUSTiCcedilA

esta encontra limites nas normas cogentes proacuteprias do direito bancaacuterio e na intervenccedilatildeo do Estado8

A seguranccedila juriacutedica desse tipo de relaccedilatildeo envolve tambeacutem a manutenshyccedilatildeo do segredo das movimentaccedilotildees financeiras do contribuinte

Imprimir-se a mais ampla seguranccedila nas relaccedilotildees do Sistema Financeiro eacute fortalececirc-lo O Estado tem o dever de zelar por esse estado de seguranccedila natildeo permitindo consequumlentemente que o sigilo bancaacuterio seja quebrado pelo acesshyso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico por esse comportamento afeshytar a confiabilidade no sistema

Eacute de todo inconveniente permitir a possibilidade de um atuar do agente fiscal sem controle na quebra do sigilo bancaacuterio por afetar diretamente a seshyguranccedila da relaccedilatildeo juriacutedica firmada entre a instituiccedilatildeo financeira e o seu clienshyte em face deste sentir-se atingido pela accedilatildeo fiscal que passa a tomar conhecishymento de sua intimidade financeira e de fatos de sua vida privada sem o resshypaldo do Poder Judiciaacuterio

A seguranccedila juriacutedica nesse tipo de relaccedilatildeo deve assegurar impossibilidashyde de abuso de poder por parte do Fisco em face da necessidade de ser resshyguardada a garantia de que em um Estado de Direito natildeo pode ser concebido que conceda-se a uma parte mesmo que seja o Estado o domiacutenio absoluto de apanhar as provas que iraacute utilizar em caso de litiacutegio contra algueacutem

O acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias do contribuinte aleacutem de afetar a seguranccedila juriacutedica da relaccedilatildeo em questatildeo promove um desequiliacutebro entre o cidadatildeo-contribuinte e o Fisco por caracterizar coaccedilatildeo que coloca aquele em posiccedilatildeo de inferioridade

A valorizaccedilatildeo da seguranccedila juriacutedica da relaccedilatildeo existente entre instituiccedilatildeo financeira e contribuinte pelo Fisco natildeo quebrando o seu sigilo fiscal sem autorizaccedilatildeo judicial constitui causa de aplicaccedilatildeo de Justiccedila fiscal O seguimenshyto de seus princiacutepios valoriza o regime democraacutetico do qual ela faz parte

6 Casos de admissibilidade da quebra do sigilo bancaacuterio

Os casos de admissibilidade da quebra do sigilo bancaacuterio estatildeo na atuashylidade descritos no nosso ordenamento juriacutedico positivo

A Lei Complementar n 105 de 10 de janeiro de 2001 apoacutes determinar no art 112 de que as instituiccedilotildees financeiras conservaratildeo sigilo em suas operashyccedilotildees ativas e passivas e serviccedilos prestados dispotildee no sect 312 do mesmo artigo que

8 Arnoldo Wald no artigo Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais Revista dos Tribunais ano 6 n 22 janeiromiddotmarccedilo de 1998 n 22 Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas p 15

ENSAIOS JURiacuteDICOS 253

sect 3ordm Natildeo constitui violaccedilatildeo do dever de sigilo

I a troca de informaccedilotildees entre instituiccedilotildees financeiras para fins cadastrais inclusive por intermeacutedio de centrais de risco observadas as normas baixadas pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e pelo Banco Censhytral do Brasil

11 - o fornecimento de informaccedilotildees constantes de cadastro de emitentes de cheques sem provisatildeo de fundos e de devedores inadimplentes a entidades de proteccedilatildeo ao creacutedito observadas as norshymas baixadas pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e pelo Banco Central do Brasil

JJI - o fornecimento das informaccedilotildees de que trata o sect 2ordm do art II da Lei n 9311 de 24 de outubro de 1996

IV - a comunicaccedilatildeo agraves autoridades competentes da praacutetica de iliacutecitos penais ou administrativos abrangendo o fornecimento de inforshymaccedilotildees sobre operaccedilotildees que envolvam recursos provenientes de qualshyquer praacutetica criminosa

V - a revelaccedilatildeo de informaccedilotildees sigilosas com o consentimento expresso dos interessados

VI- a prestaccedilatildeo de informaccedilotildees nos termos e condiccedilotildees estabeleshycidos nos artigos 2ordm 3ordm 4ordm 5ordm 6ordm 7ordm e 9ordm desta lei complementar

sect 4ordm A quebra de sigilo poderaacute ser decretada quando necessaacuteria para apuraccedilatildeo de ocorrecircncia de qualquer iliacutecito em qualquer fase do inqueacuterito ou do processo judicial e especialmente nos seguintes crimes

I - de terrorismo

11 - de traacutefico iliacutecito de substacircncias entorpecentes ou drogas afins

III - de contrabando ou traacutefico de armas municcedilotildees ou material destinado a sua produccedilatildeo

IV - de extorsatildeo mediante sequumlestro

V - contra o sistema financeiro nacional

VI - contra a Administraccedilatildeo Puacuteblica

Vll- contra a ordem tributaacuteria e a previdecircncia social

VIII-lavagem de dinheiro ou ocultaccedilatildeo de bens direitos e valores

IX - praticado por organizaccedilatildeo criminosa

Como visto a lei complementar enumera inuacutemeras situaccedilotildees que indeshypendentemente de autorizaccedilatildeo judicial o sigilo bancaacuterio eacute quebrado

254 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

A dificuldade que se apresenta eacute a de conciliar os casos de quebra de sigilo bancaacuterio que a Lei Complementar n 105 autoriza com a garantia do direito agrave privacidade e agrave intimidade

Destaque-se entre os de maior relevacircncia os seguintes

- natildeo constituir violaccedilatildeo do dever de sigilo bancaacuterio a troca de informashyccedilotildees entre instituiccedilotildees financeiras para fins cadastrais inclusive por intermeacuteshydio de centrais de risco o que possibilita o conhecimento da vida financeira privada do cidadatildeo por vaacuterias pessoas sem desempenho de autoridade na instituiccedilatildeo independentemente de ser justificada com antecedecircncia a causa desse atuar

- o de serem fornecidos dados relativos a fornecimentos de informashyccedilotildees cadastrais de emitentes de cheques sem provisatildeo de fundos a entidades privadas de proteccedilatildeo ao creacutedito sem qualquer avaliaccedilatildeo por qualquer autorishydade da causa determinante do fato a quebra do sigilo bancaacuterio na fase do inqueacuterito por inexistir nessa ocasiaacuteo qualquer contraditoacuterio e respeito ao prinshyciacutepio do devido processo legal

Quanto agraves demais situaccedilotildees constantes na lei complementar que autorishyzam a quebra do sigilo bancaacuterio naacuteo obstante algumas serem absolutamente necessaacuterias haacute de serem vistas em compatibilidade com as garantias constitushycionais conforme jaacute assinalado

O colendo Supremo Tribunal pronunciaraacute como guarda e inteacuterprete maishyor da Carta Magna em ADln jaacute intentada sobre a constitucionalidade ou natildeo dos dispositivos supramencionados

Em campo doutrinaacuterio valoriza-se as posiccedilotildees apresentadas quando da resposta oferecida aos questionamentos anteriores todas acenando pela neshycessidade do controle do Poder Judiciaacuterio

7 Sistema mais justo para a quebra do sigilo bancaacuterio

Os organizadores do JII Coloacutequio Internacional de Direito Tributaacuterio subshymetem agora para anaacutelise a questatildeo do teor seguinte Um sistema em que o Poder Judiciaacuterio torna-se aacuterbitro dos pedidos da Administraccedilatildeo Puacuteblica para quebra do sigilo eacute o mais justo

Em um Estado que por imposiccedilatildeo de sua proacutepria Constituiccedilatildeo estaacute comprometido com a guarda e aplicaccedilatildeo efetiva de princiacutepios democraacuteticos especialmente o de respeitar os direitos e garantias fundamentais da cidadashynia natildeo haacute ambiente para que seja outorgado ao Poder Executivo por via da atuaccedilatildeo de agentes puacuteblicos fiscais o acesso sem o controle do Poder Judiciaacuteshyrio agraves informaccedilotildees bancaacuterias do contribuinte

ENSAIOS JURiacuteDICOS 255

o sigilo bancaacuterio por ser um direito fundamental que exige ser respeitashydo pela supremacia constitucional que o protege deve submeter a possibilishydade de sua quebra para fins tributaacuterios ao Poder Judiciaacuterio pela ausecircncia de interesse direto nos resultados da accedilatildeo fiscalizadora que eacute o recolhimento do tributo e pelas garantias de independecircncia prudecircncia e qualificaccedilatildeo juriacutedica que revestem esse poder

A atuaccedilatildeo da fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo pode ser exercida fora dos limishytes da legalidade imposta a partir da Carta Magna e demais imposiccedilotildees legais a ela subordinadas

Natildeo se desconhece que no atual Estado fiscal os tributos constituem os meios financeiros determinantes para o atendimento dos compromissos da Administraccedilatildeo Puacuteblica com as obrigaccedilotildees oriundas em decorrecircncia de sua atividade no campo educacional social de seguranccedila puacuteblica interna e extershyna da sauacutede da manutenccedilatildeo dos Poderes ou seja para manter funcionando a maacutequina estatal

Por natildeo entremostrar-se na eacutepoca contemporacircnea qualquer outra alshyternativa viaacutevel para transformar o Estado fiscal em um Estado produtivo os tributos passam a representar um indeclinaacutevel dever da cidadania cujo cumshyprimento deve ser por todos honrado conforme assinala Joseacute Casalta Nabais Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra em artigo intitulado Algumas Reflexotildees sobre o Actual Estado Fiscal

Por isso os impostos hatildeo de constituir um preccedilo aceitaacutevel ou seja um preccedilo limitado Um preccedilo que estou certo muitas das sociedashydes que nos antecederam gostariam de ter pago e algumas das actuais natildeo enjeitariam suportar Por isso bem podemos afirmar como jaacute o fizeshymos noutro lugar que no actual Estado fiscal para o qual natildeo se vislumshybra qualquer alternativa viaacutevel pelo menos nos tempos mais proacuteximos os impostos constituem um indeclinaacutevel dever de cidadania cujo cumshyprimento a todos nos deve honrar

A atuaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio para liberar o bloqueio fortalece a conshyfianccedila do cidadatildeo no procedimento da fiscalizaccedilatildeo e consagra a ideacuteia iacutensita em qualquer regime democraacutetico de que a atuaccedilatildeo do Estado tem limites

Na espeacutecie os limites impostos satildeo os decorrentes da quebra do sigilo ser necessaacuterio em face da possiacutevel ilicitude cometida pelo cidadatildeo poreacutem sem ser violados os direitos do cidadatildeo de gozar da sua privacidade e da sua intimidade

A denominada cidadania fiscal haacute de ser considerada de modo conjunshytural com os reflexos dos direitos fundamentais assegurados ao contribuinte sem prestigiar a responsabilidade que tem o Estado de promover a arrecadashyccedilatildeo dos tributos

256 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

Cedo espaccedilo para registrar que a cidadania fiscal deve configurar um estado de relaccedilatildeo juriacutedica em que todos suportem a concretizaccedilatildeo de um Estado em que todos tenham a qualidade de destinataacuterio do dever fundashymentaI de pagar impostos na medida da respectiva capacidade contributiva poreacutem que seja um Estado fiscal suportaacutevel isto eacute um estado cujo sistema fiscal se encontre balizado por estritos limites juriacutedico-constitucionais9

A Administraccedilatildeo Tributaacuteria por melhor que seja a sua estrutura e os seus propoacutesitos natildeo estaacute emocionalmente preparada para conceber e aplicar os princiacutepios que sustentam a cidadania fiscal Isso ocorre primeiramente porshyque o Fisco tem por missatildeo exclusiva exercer a funccedilatildeo de arrecadar tributos Eacute a sua meta essencial por ser atribuiccedilatildeo que na organizaccedilatildeo administrativa estatal estaacute obrigado a desempenhar Natildeo lhe cabe administrar o tributo arreshycadado limitando-se unicamente a envidar esforccedilos para o cumprimento das metas impostas para imprimir aumento na arrecadaccedilatildeo tributaacuteria O sucesso da Administraccedilatildeo Tributaacuteria eacute medido pelo maior volume de recursos fiscais atraiacutedos para os cofres do Governo nunca pelo respeito que exerccedila para com os direitos fundamentais do contribuinte Eacute uma questatildeo de cultura adminisshytrativa de distribuiccedilatildeo de funccedilotildees no sistema estatal impossiacutevel de ser mudashydo por sugestotildees doutrinaacuterias

Por outro lado a fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo consegue afastar as pressotildees exercidas sobre ela por determinados segmentos da organizaccedilatildeo estatal que defendem uma atuaccedilatildeo mais agressiva para a cobranccedila dos tributos tudo em decorrecircncia dos efeitos produzidos pela conduta iliacutecita marcante da sonegashyccedilatildeo fiscal

Esses fatores contribuem para que a fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo tenha condiccedilotildees de modo imparcial sem isenccedilatildeo avaliar a necessidade objetiva da quebra do sigilo bancaacuterio do cidadatildeo Por melhor que seja o seu desempenho nunca ganharaacute a confianccedila do contribuinte

A atribuiccedilatildeo da quebra do sigilo bancaacuterio em um regime democraacutetico onde predomina o respeito maior aos direitos fundamentais da cidadania deve ser exercido pelo Poder Judiciaacuterio natildeo soacute porque seus membros atualmente revestidos da garantia da vitaliciedade inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos bem como porque estatildeo revestidos de independecircncia absoluta em relaccedilatildeo ao Poder interessado na cobranccedila do tributo e consequumlentemenshyte no resultado a ser obtido pela accedilatildeo fiscal

Esse sistema misto onde o Fisco faz a solicitaccedilatildeo motivada para a queshybra do sigilo bancaacuterio ao Poder Judiciaacuterio e este apoacutes analisaacute-lo com objetivishydade e cautela defere ou indefere impotildee seguranccedila e confiabilidade na atuashyccedilatildeo fiscal e sublima o respeito agrave dignidade do contribuinte em outras palavras da cidadania fiscal isto eacute de uma cidadania de liberdade que o Estado fiscal

9 Joseacute Casalta Nabais (Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra) no artigo Algumas Reflexotildees sobre o Actual Estado Fiscal no site httpagugovbr

ENSAIOS JURiacuteDICOS 257

pressupotildee para natildeo ser postergada impotildee um sistema fiscal balizado por esshytritos limites juriacutedico-constitucionais Limites esses que integram a chamada constituiccedilatildeo fiscal e que podemos reconduzir para natildeo nos alongarmos nesse aspecto a duas ideacuteias uma ideacuteia de seguranccedila que tem o seu tradicional e principal suporte no princiacutepio da lega1idade fiscal e uma ideacuteia de justiccedila ou equumlidade que tem a ver com a medida dos impostos e assenta no princiacutepio da capacidade contributiva 10

Em conclusatildeo a adoccedilatildeo de um sistema para a quebra do sigilo bancaacuteshyrio em que o Poder Judiciaacuterio seja o aacuterbitro dos pedidos da Administraccedilatildeo Puacuteblica natildeo eacute somente mais justo mas consegue impor maior credibilidade agrave atuaccedilatildeo fiscal e presta homenagem com intensa potencialidade aos princiacuteshypios democraacuteticos consistentes na guarda da seguranccedila juriacutedica do respeito aos direitos fundamentais do cidadatildeo nesse rol incluidos os agrave privacidade e agrave intimidade Aleacutem disso torna mais respeitaacutevel a relaccedilatildeo entre Fisco e contrishybuinte justificando portanto a opccedilatildeo do Estado pelo regime democraacutetico

8 Autoridade fiscal e faculdade incondicionada de quebrar o sigilo bancaacuterio

Essa indagaccedilatildeo consubstancia a preocupaccedilatildeo de serem estabelecidos controles para a atuaccedilatildeo do agente puacuteblico fiscal Centra-se a preocupaccedilatildeo em imprimir nas relaccedilotildees juriacutedicas tributaacuterias de quaisquer espeacutecies o primashydo da legalidade aprimorando-se o atuar vinculado

Natildeo concilia-se com os postulados da democracia a adoccedilatildeo de um sisteshyma de fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria que outorgue faculdade incondicionada ao fiscal tributaacuterio de invadir a intimidade e a privacidade das pessoas sob o falso argushymento juriacutedico de que busca encontrar provas de sonegaccedilatildeo fiscal

Depreende-se do exposto que a autoridade fiscal natildeo deve ter faculdade incondicionada de quebrar o sigilo sempre que entender necessaacuterio Isso porshyque a praacutetica de atos administrativos por agentes puacuteblicos de modo incondicionado revela grave violaccedilatildeo ao princiacutepio da legalidade onde predoshymina a vontade da lei e natildeo o discricionarismo de quem o pratica

No trato do sigilo bancaacuterio o atuar incondicionado da fiscalizaccedilatildeo assushyme caracteriacutesticas de maior gravidade porque haacute violaccedilatildeo aos princiacutepios funshydamentais jaacute expostos e que satildeo prestigiados pela Carta Magna especialmenshyte por bater de frente de modo integral e absoluto com o direito agrave intimidade e agrave privacidade O atuar deve vincular-se rigidamente ao princiacutepio da legalidashyde especialmente aposta na Carta Magna sem a possibilidade de ser aberto qualquer canal para uso da conveniecircncia ou da oportunidade

Eacute de ser lembrada no trato do assunto a liccedilatildeo de Joseacute Casalta Nobais no trabalho jaacute citado no sentido de que Eacute certo que independentemente da

10 Idem p 15

=258=---___________________ SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTlCA

concepccedilatildeo a que se adira relativamente ao segredo bancaacuterio natildeo temos a menor duacutevida de que o acesso da Administraccedilatildeo Fiscal agrave informaccedilatildeo bancaacuteria seja directo sem necessidade de preacutevia decisatildeo judicial seja indirecto depois portanto de preacutevia decisatildeo judicial haacute de ter sempre uma natureza claramenshyte excepcional Na verdade constitua o segredo bancaacuterio uma manifestaccedilatildeo do direito fundamental agrave reserva da intimidade da vida privada constante do art 26 n 2 da Constituiccedilatildeo portuguesa ou suporte um outro direito fundashymentai um direito agrave reserva da vida privada anaacutelogo agravequele a sua afectaccedilatildeo teraacute sempre caraacuteter excepcional

A autoridade fiscal natildeo possui a necessaacuteria isenccedilatildeo e competecircncia institucional para averiguar o grau dessa excepcionalidade de modo que posshysa impor confianccedila ao cidadatildeo investido na condiccedilatildeo de contribuinte poreacutem com direitos a serem assegurados por forccedila do regime democraacutetico adotado

O certo eacute que na relaccedilatildeo juriacutedico-tributaacuteria deve ser buscado o justo equiliacutebrio pregado pelo Estado de Direito onde o cidadatildeo deve ter a sua dignishydade respeitada sem contudo afastar-se a necessidade do Estado arrecadar tributos de forma cogente e imperativa bem como de serem permitidas conshydiccedilotildees de atuaccedilatildeo que resultem no combate agrave sonegaccedilatildeo fiscal

9 Responsabilidade da autoridade administrativa que quebrar o sigilo banshycaacuterio de forma inconsistente e indevida

Eacute inerente ao regime democraacutetico que a autoridade administrativa puacuteblishyca estaacute obrigada a exercer as suas atribuiccedilotildees com rigorosa obediecircncia aos princiacutepios da legalidade moralidade publicidade impessoalidade e eficiecircncia entre outros

A Carta Magna consagra expressamente no art 37 a obediecircncia do agente puacuteblico a esse tipo de comportamento

A autoridade administrativia que quebrar de modo inconsistente e indevido o sigilo bancaacuterio do cidadatildeo pratica ato com capacidade de provocar os seguintes efeitos a) de invadir o direito agrave privacidade e agrave intimidade de algueacutem b) de provocar-lhe danos morais e materiais dependendo da repershycussatildeo provocada pelo seu atuar

Constatada a efetivaccedilatildeo real de danos morais e materiais a responsabishylidade do Estado pode ser acionada conforme permite o art 37 sect 6ordm da Consshytituiccedilatildeo Federal Solidificada a culpa ou dolo do agente puacuteblico e consagrada a materializaccedilatildeo do iliacutecito praticado com o consequumlente ressarcimento patrimonial o Estado deveraacute usando o direito de regresso investir contra o agente que agiu culposa ou dolosamente

Natildeo resume-se apenas ao campo da responsabilidade civil a atuaccedilatildeo da autoridade quando ilegalmente quebra o sigilo bancaacuterio de qualquer cidadatildeo

ENSAIOS JURiacuteDICOS 259

o art 10 da Lei Complementar n 105 de 10 de janeiro de 2001 determishyna que A quebra de sigilo fora das hipoacuteteses autorizadas nesta lei compleshymentar constitui crime e sujeita os responsaacuteveis agrave pena de reclusatildeo de um a quatro anos e multa aplicando-se no que couber o Coacutedigo Penal sem prejuiacuteshyzo de outras sanccedilotildees cabiacuteveis A seguir no seu paraacutegrafo uacutenico explicita que Incorre nas mesmas penas quem omitir retardar injustificadamente ou presshytar falsamente as informaccedilotildees requeridas nos termos desta lei complementar

O art 11 da mesma lei complementar expressa que O servidor puacuteblico que utilizar ou viabilizar a utilizaccedilatildeo de qualquer informaccedilatildeo obtida em decorshyrecircncia da quebra de sigilo de que trata esta lei complementar responde pessoshyal e diretamente pelos danos decorrentes sem prejuiacutezo da responsabilidade objetiva da entidade puacuteblica quando comprovado que o servidor agiu de acorshydo com a orientaccedilatildeo oficial

10 O sigilo bancaacuterio e o tratamento que lhe eacute dado por oacutergatildeos internacioshynais como a OCDE e outros

Rui Celso Reali Fragoso Presidente do Instituto dos Advogados de Satildeo Paulo em artigo intitulado O Sigilo Bancaacuterio veiculado pela Internet (http Ii wwwjuscombr) registra que atualmente temos trecircs sistemas legais no munshydo cuidando do sigilo bancaacuterio O primeiro eacute o anglo-saxatildeo em que o sigilo natildeo encontra amparo legal o segundo eacute o dos paiacuteses da Europa continental - eu o contemplo em vaacuterios diplomas legais o terceiro eacute o da Suiacuteccedila e do Liacutebano que o reforccedilam

Analisando esses trecircs sistemas o autor citado observa

Haacute aparente contradiccedilatildeo no sistema inglecircs e norte-americano pois se de um lado nestes paiacuteses se eleva a garantia das liberdades individuais de outro se despreza o sigilo bancaacuterio Eacute que se ocorre conshyflito entre a apuraccedilatildeo de fatos (fator social) e a privacidade das pessoas (fator individual) prevalece a primeira Mais ainda o relacionamento de clientes e bancos longe de estabelececirc-lo serve como fonte de informashyccedilatildeo em favor de terceiros a indiscriccedilatildeo injustificada poreacutem eacute objeto de sanccedilatildeo E na Inglaterra os poderes puacuteblicos natildeo intervecircm no funcionashymento dos estabelecimentos privados de creacutedito o que debilita a invesshytigaccedilatildeo

Nos paiacuteses da Europa continental a legislaccedilatildeo contempla o sigilo bancaacuterio como consequumlecircncia do profissional e comporta derrogaccedilotildees na esfera penal e em alguns casos na civil mas comina sanccedilotildees crimishynais no caso de violaccedilatildeo ao sigilo (Coacutedigo Penal francecircs artigo 378 Coacuteshydigo Penal italiano art 622)

260 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

A sistemaacutetica fortalecida eacute aquela utilizada na Suiacuteccedila decorrente da crise ocorrida em 1931 com o fechamento do Banco de Genebra que ensejou a ediccedilatildeo de lei estabelecendo severas puniccedilotildees de natureza civil e criminal Tanto a legislaccedilatildeo suiacuteccedila como a libanesa esta surgida em 1956 permitem derrogaccedilotildees em certas hipoacuteteses A existecircncia das conshytas numeradas comprova a importacircncia do sigilo nestes paiacuteses

Eacute certo natildeo ser absoluto o segredo nem sua quebra em determishynadas situaccedilotildees significa abuso de poder Aliaacutes nenhum direito eacute absoluto

A doutrina tem ultimamente tomado conhecimento sobre as transforshymaccedilotildees que tem passado em vaacuterios ordenamentos juriacutedicos a questatildeo do sigilo bancaacuterio

Zenobio Simotildees de Melo advogado no Paranaacute em artigo sob o tiacutetulo Quebra do Sigilo Bancaacuterio (Internet httpjuscombr) informa que o jornal O Estado de Satildeo Paulo de 21 de junho de 2000 publicou a notiacutecia seguinte

Numa das mais importantes decisotildees adotadas durante o Conseshylho Europeu que marca o fim da presidecircncia portuguesa da Uniatildeo Euroshypeacuteia (UE) seus 15 paiacuteses aprovaram ontem o pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal No ponto mais polecircmico o pacote deveraacute acabar com o sigilo bancaacuterio ateacute 2010 foi uma negociaccedilatildeo de 12 anos Aacuteustria e Luxemburgo natildeo aceitavam o princiacutepio de acabar com o sigilo bancaacuterio A justificativa austriacuteaca eacute que este eacute um princiacutepio que faz parte da Consshytituiccedilatildeo do paiacutes haacute 200 anos Para aceitar o acordo o paiacutes exigiu a manushytenccedilatildeo do sigilo nos bancos austriacuteacos para quem resida no paiacutes

Registro a iacutentegra da notiacutecia

Pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal eacute aprovado por membros da UE Decisatildeo prevecirc quebra do sigilo bancaacuterio nos paiacuteses do bloco econocircmico

Jair Rattner

Especial para o Estado

Santa Maria da Feira Portugal- Numa das mais importantes decishysotildees adotadas durante o Conselho Europeu que marca o fim da presishydecircncia portuguesa da Uniatildeo Europeacuteia (UE) seus 15 paiacuteses aprovaram ontem o pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal No ponto mais polecircmico o pashycote deveraacute acabar com o sigilo bancaacuterio ateacute 2010

Foi uma negociaccedilatildeo de 12 anos Agora temos um documento que vai estabelecer os princiacutepios e as orientaccedilotildees para as futuras diretivas nessa aacuterea afirmou o Primeiro-Ministro Portuguecircs Antonio Guterres que ocupa a presidecircncia rotativa da UE (no fim do mecircs ela seraacute transferida para a Franccedila)

ENSAIOS JURiacuteDICOS 261

o acordo abrange trecircs aacutereas um coacutedigo de conduta que prevecirc o desmantelamento dos 66 paraiacutesos fiscais existentes ou dependentes da UE a tributaccedilatildeo de royalties e o pagamento de impostos sobre rendishymentos das poupanccedilas de cidadatildeos europeus residentes em outros paiacuteshyses dentre os 15 que fazem parte do bloco econocircmico europeu

O grande problema eram as poupanccedilas Aacuteustria e Luxemburgo natildeo aceitavam o princiacutepio de acabar com o sigilo bancaacuterio A justificativa austriacuteaca eacute que este eacute um princiacutepio que faz parte da Constituiccedilatildeo do paiacutes haacute 200 anos Para aceitar o acordo o paiacutes exigiu a manutenccedilatildeo do sigilo nos bancos austriacuteacos para quem resida no paiacutes Essa questatildeo natildeo eacute importante soacute para a Europa porque abre caminho para a criaccedilatildeo de mecanismos de transparecircncia global no mundo financeiro que satildeo esshysenciais para a globalizaccedilatildeo da economia avaliou Guterres

O prazo para a introduccedilatildeo das mudanccedilas vai ateacute o fim de 2010 Ateacute o fim deste ano as negociaccedilotildees vatildeo ser sobre a definiccedilatildeo do conteuacutedo das diretivas (as normas da UE)

Em 2002 a UE discutiraacute com outros paiacuteses esses conteuacutedos para fazer acordos que deveratildeo ser aprovados ateacute o fim do ano por unanimishydade

A partir de 2003 seraacute iniciado um periacuteodo de sete anos de transishyccedilatildeo para a troca de informaccedilotildees sobre os investimentos de cidadatildeos de outros paiacuteses europeus Nesse periacuteodo alguns paiacuteses poderatildeo optar por cobrar impostos de 20 a 25 sobre os rendimentos dos investimentos de residentes no exterior

No capiacutetulo onde foi analisado o sigilo bancaacuterio no Direito Comparado haacute registros tambeacutem a respeito do tratamento que oacutergatildeos internacionais como o OCDEll e outros vecircm dando ao sigilo bancaacuterio conforme estudo que foi apresentado pelo autor ali citado

II OCDE (Organizaccedilatildeo de Cooperaccedilatildeo e Desenvolvimento Econocircmico) criado em 1961 para substituir a OECE (Comitecirc Fiscal da Organizaccedilatildeo Europeacuteia de Cooperaccedilatildeo Econocircmica) Um dos documentos mais importantes da OCDE eacute o resultante da sua Convenccedilatildeo-Modelo relashytiva a impostos sobre a renda e o capital Essa Convenccedilatildeo estaacute sistematizada em sete capiacutetulos assim explicitados por Alberto Xavier em sua obra Direito Tributaacuterio Internacioshynal do Brasil A Convenccedilatildeo-Modelo da OCDE (tal como a das Naccedilocirces Unidas) encontra-se sistematizada em sete capiacutetulos Os capiacutetulos I e I regulam os requisitos para a aplicaccedilatildeo do tratado O capiacutetulo [JI - de longe o mais importante - conteacutem as regras de distribuiccedilatildeo de competecircncia no que concerne aos impostos sobre o rendimento classificado este por tipos ou classes agrave semelhanccedila do que sucede nos sistemas de tributaccedilatildeo cedular O capiacutetulo IV ocupa-se das regras de distribuiccedilatildeo de competecircncia no que respeita aos impostos sobre o capital O capiacutetulo V determina as consequumlecircncias das regras dos capiacutetulos 111 e IV facultanshydo aos Estados a escolha entre os meacutetodos da isenccedilatildeo e da imputaccedilatildeo O capiacutetulo VI conteacutem disposiccedilotildees adicionais sobre natildeo-discriminaccedilatildeo procedimento amigaacutevel troca de informaccedilotildees e privileacutegios de funcionaacuterios diplomaacuteticos e consulares e regras sobre extenshysatildeo do tratado a partes do territoacuterio Enfim o capiacutetulo VII conteacutem disposiccedilotildees finais sobre entrada em vigor e cessaccedilatildeo do acordo

262 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

Heleno Torres em sua recente obra Direito Tributaacuterio Internacional -Planejamento Tributaacuterio e Operaccedilotildees Transnacionais RT p 147 analisando o posicionamento da OCDE referente agrave poliacutetica de determinados paiacuteses que adoshytam tributaccedilatildeo favorecida e os efeitos dos regimes fiscais prejudiciais registra que

A OCDE resolveu entrar na luta para minorar as praacuteticas fiscalshymente danosas insistindo sobre a necessidade de aumentar as trocas de informaccedilotildees entre os Estados aleacutem de redigir uma lista de paiacuteses com tributaccedilatildeo favorecida e fazer algumas recomendaccedilotildees em acircmbito nacional e convencional a partir do seu importante relatoacuterio Harmful tax competition na emerging global issue

Mesmo reconhecendo os aspectos positivos do ambiente global vigente no qual os sistemas tributaacuterios operam os paiacuteses-membros da OCDE concluiacuteram que eles precisavam agir para restringir a competiccedilatildeo tributaacuteria danosa coletivamente e individualmente opondo-se agrave expanshysatildeo de regimes de impostos preferenciais danosos particularmente nos setores financeiros e atividades de serviccedilo que podem causar distorccedilotildees no comeacutercio e desniacuteveis nos padrotildees de investimento sendo uma ameashyccedila para os sistemas tributaacuterios domeacutesticos e para a estrutura global de tributaccedilatildeo internacional

Mais adiante pp 152153 Heleno Torres afirma que

Entre as recomendaccedilotildees definidas nesse relatoacuterio com aplicashyccedilatildeo dirigida aos paiacuteses-membros da instituiccedilatildeo as mais importantes satildeo as seguintes

bull para contrastar a competiccedilatildeo fiscal prejudicial os paiacuteses devem revisar as suas leis regulamentos e praacuteticas sobre sigilo bancaacuterio para remover empecilhos de acesso a tais informaccedilotildees por autoridades fiscais

bull intensificar o uso de trocas de informaccedilotildees principalmente soshybre as transaccedilotildees com paiacuteses de tributaccedilatildeo favorecida

A conclusatildeo que pode ser firmada apoacutes anaacutelise dos pronunciamentos internacionais acima explicitados eacute a construccedilatildeo de uma corrente que defenshyde uma maior abertura para a quebra do sigilo bancaacuterio quando for necessaacuteshyrio para apurar iliacutecitos tributaacuterios

Essa portanto eacute a resposta que apresento para a indagaccedilatildeo Qual o tratamento proposto por oacutergatildeos internacionais como o OCDE e outros com relaccedilatildeo ao sigilo bancaacuterio

ENSAIOS JURiacuteDICOS 263

11 Compatibilizaccedilatildeo do combate agrave criminalidade internacional com o resshypeito agrave seguranccedila juriacutedica a fim de evitar a fuga de investimentos do Paiacutes

Haacute de se reconhecer natildeo ser faacutecil desenvolver-se um sistema juriacutedico que contenha regras que facilitem o combate agrave criminalidade internacional e ao mesmo tempo prestigie os direitos fundamentais do cidadatildeo especialmenshyte a sua seguranccedila juriacutedica

As convenccedilotildees internacionais conforme demonstrado estatildeo preocupashydas com esses aspectos sem deixar de lado os fenocircmenos causados pela globalizaccedilatildeo

Natildeo deve ser esquecido que o tema envolve aspectos diversos a comeshyccedilar pelos determinantes da soberania dos Estados das forccedilas em expansatildeo das organizaccedilotildees internacionais e da pregaccedilatildeo para que os direitos fundamenshytaIacutes do cidadatildeo sejam respeitados com maior Iacutentensidade

A soluccedilatildeo a meu pensar pode ser encontrada no fortalecimento do Direito Comunitaacuterio Os Estados por via de organismos internacionais firmashyriam tratados para a adoccedilatildeo de um Coacutedigo Processual Penal Internacional com efeitos vinculantes por parte das naccedilotildees onde seriam adotadas regras investigatoacuterias e apuratoacuterias dos iliacutecitos internacionais alargando os conceitos de indiacutecios e presunccedilotildees sem deixar contudo de prestigiar a afetividade dos direitos e garantias fundamentais do cidadatildeo

Todas as naccedilotildees no iniacutecio deste seacuteculo envidam esforccedilos para diminuir a crise da seguranccedila juriacutedica Satildeo vaacuterios os fatores determinantes todos tendo como causa comum o crescimento da delinquumlecircncia em decorrecircncia de poliacutetishycas econocircmicas e sociais adotadas por determinados governos que contrishybuem para aumentar o percentual de pessoas pobres

A preocupaccedilatildeo atual para o combate ao crime internacional eacute alcanccedilar niacutevel de uniformizaccedilatildeo dos sistemas adotados para a quebra do sigilo bancaacuteshyrio De iniacutecio deve ser defendida a postura de que nenhuma lesatildeo ou ameaccedila a direito deve ser excluiacuteda da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio Nessa perspectishyva ganha suma importacircncia a criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional em virshytude de pela sua atuaccedilatildeo natildeo perdurar a diversidade de sistemas legais a respeito do assunto a saber a) O anglo-saxatildeo onde o sigilo natildeo encontra amparo legal b) o dos paiacuteses da Europa continental que o contempla em vaacuterios diplomas escritos e c) o da Suiacuteccedila e do Liacutebano que o reforccedilam l2bull

A criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional envolve uma reconceiacutetuaccedilatildeo de soberania

Sobre o tema Celso D de Albuquerque Mello em Direito Internacional da Integraccedilatildeo Ed Renovar p 13 faz a seguinte observaccedilatildeo

12 Conforme anota Rui Celso Reali Fragoso no artigo O Sigilo Bancaacuterio publicado no site httpvvwwjuscombr

264 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Poder-se-ia fazer um pequeno reparo a Chaumont que a indeshypendecircncia nacional eacute um conceito juridicamente indeterminado e que ela pode ter diferentes graus Tanto que podemos escrever soberania versus cooperaccedilatildeo internacional apesar de reconhecermos que esta posiccedilatildeo pode ser considerada como radical vez que natildeo haacute uma total incompatibilidade entre as duas Entretanto natildeo se pode deixar de consshytatar que de certo modo a cooperaccedilatildeo internacional se encontra conshysagrada na Carta da ONU no arl 1 ordm que trata dos Propoacutesitos das Naccedilotildees Unidas e nos Princiacutepios estabelecidos na Carta da OEA (Capiacutetulo 11) O mesmo ocorre na resoluccedilatildeo da Assembleacuteia Geral da ONU de 1970 que aprova a Declaraccedilatildeo Relativa aos Princiacutepios do Direito Internacional Reshylativas agraves Relaccedilotildees Amigaacuteveis e agrave Cooperaccedilatildeo entre os Estados conforme a Carta das Naccedilotildees Unidas bem como na Carta de Direitos e Deveres Econocircmicos aprovada pela mesma Assembleacuteia Geral em 1974

O crescimento do crime internacional em decorrecircncia dos fenocircmenos globalizantes determina o surgimento de um dever juriacutedico dos Estados firmashyrem pactos de cooperaccedilatildeo entre si para que enfrentem as organizaccedilotildees voltashydas para a criminalidade Esse dever juriacutedico globalizado tem suas raiacutezes no moral intemacional que conforme assinala Celso Albuquerque Mello na obra citada p 13 sempre consagrou o princiacutepio da solidariedade ou ainda do auxiacutelio muacutetuo

Eacute o mais importante desafio neste iniacutecio de seacuteculo fazer com que surja uma legislaccedilatildeo internacional que compatibilize o combate agrave criminalidade inshyternacional sem violar a seguranccedila juriacutedica com finalidade exclusiva de evitar a fuga de investimenos do Paiacutes

Tenha-se contudo em consideraccedilatildeo que a globalizaccedilatildeo do crime emshybora seja uma grande ameaccedila aos valores tradicionais que sustentam a cidashydania especialmente a seguranccedila juriacutedica natildeo deve prejudicar o desenvolvishymento econocircmico de qualquer naccedilatildeo

Natildeo faccedilo coro ao assinalado por Eric Hobsbawm em sua obra Era dos Extremos O Breve Seacuteculo XX 1914-1991 1995 p 24 Companhia das Letras S Paulo traduccedilatildeo de Marcos Santarrita no sentido de que Talvez a caracteriacutesshytica mais impressionante do fim do seacuteculo XX seja a tensatildeo entre esse processo de globalizaccedilatildeo cada vez mais acelerado e a incapacidade conjunta das instishytuiccedilotildees puacuteblicas e do comportamento coletivo dos seres humanos de se acoshymodarem a ele

Penso que natildeo haacute essa acomodaccedilatildeo e que as instituiccedilotildees puacuteblicas espeshycialmente as submetidas ao controle da ciecircncia juriacutedica natildeo estatildeo incapacitashydas de encontrar caminhos que solucionem o problema existente

ENSAIOS JURiacuteDICOS 265

Eacute por demais positivo entre outros acontecimentos o fato da conscienshytizaccedilatildeo de que haacute de ser encontrada uma forma de combate agrave criminalidade internacional que natildeo afaste a garantia da seguranccedila juriacutedica Esta eacute uma neshycessidade para impor paz agrave naccedilatildeo e consequumlentemente criar ambiente para que novos investimentos necessaacuterios ao desenvolvimento do seu processo econocircmico aconteccedilam sem se falar na manutenccedilatildeo dos jaacute existentes

O Parlamento Europeu aprovou ultimamente uma resoluccedilatildeo sobre a criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional sob a consideraccedilatildeo de que eacute necessaacuteshyrio criaacute-lo de forma permanente para complementar os sistemas judiciais nashycionais e pocircr fim agrave impunidade de que gozam os responsaacuteveis por genociacutedio crimes contra a humanidade e crimes de guerra

A abertura para essa posiccedilatildeo denota a formaccedilatildeo de uma consciecircncia internacional para combater a criminalidade internacional em todos os niacuteveis contribuindo para fortalecer a seguranccedila juriacutedica interna de cada paiacutes

O documento representativo dessa resoluccedilatildeo eacute do teor seguinte

Parlamento Europeo

Resolucioacuten sobre el Tribunal Penal Internacional

EI Parlamento Europeo

Vistas sus anteriores resoluciones sobre un Tribunal Penal Interna-cional

A Considerando que es necesario crear un Tribunal Penallnternashycional permanente que complemente los sistemasjudiciales nacionales y ponga fin a la impunidad de que gozan los responsables de genocidio crimenes contra la humanidad y criacutemenes de guerra

B Considerando que la Comisioacuten de Derechos Humanos de las Naciones Unidas estaacute respaldando decididamente la creacioacuten de ese Trishybunal

C Considerando que la fase preparatoria de la creacioacuten dei Tribushynal Penal Internacional finalizoacute con la uacuteltima sesioacuten dei Comiteacute Preparatorio de las Naciones Unidas que tuvo lugar dei 16 de marzo al3 de abril de 1998

D Felicitaacutendose por la creciente participacioacuten de Estados en el proceso de negociaciones y esperando que un nuacutemero auacuten mayor de Esshytados procedentes de todas las regiones se encuentre plenamente represhysentado en la Conferencia Diplomaacutetica de Roma

E Considerando que dei 15 de junio al17 de julio de 1998 se celebra en Roma la Conferencia Diplomaacutetica de Plenipotenciarios para la constitucioacuten de un Tribunal Penal Internacional

266 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

F Considerando que los Estados miembros y la delegacioacuten de la Comisioacuten Europea que participan en la Conferencia Diplomaacutetica de Roma pueden desempenar un papel crucial a la hora de garantizar el eacutexito de la conclusioacuten de esta Conferencia Diplomaacutetica y acogiendo positivamente la mayor convergenciacutea de las posturas de los Estados miembros de la UE

G Congratulaacutendose por la oferta dei Gobierno de los Paiacuteses Bajos de servir de sede dei Tribunal Penal Internacional permanente

I Insta a la Conferencia Diplomaacutetica de Roma a aprovechar la oportunidad histoacuterica de concluir un texto de Estatuto para un Tribunal Penal Internacional independiente justo y eficaz

2 Insta a los representantes de los Estados miembros dei Consejo y de la Comisioacuten a garantizar activamente el ecircxito de los resultados a sashyber un auteacutentico Tribunal Penal Internacional en lugar de limitarse a un acuerdo de compromiso sobre principios esenciales en sus esfuerzos por conciliar las posturas de Estados reticentes

3 Destaca que para constituir un complemento eficaz de los sisteshymas judiciacuteales nacionales el Estatuto dei Tribunal Penal Internacional permanente objeto de la Conferencia de Roma deberaacute establecer

a un Fiscal independiente con competencias para investigare insshytruir sumarios por propia iniciativa en situaciones en las que se hayan cometido los delitos sometidos a lajurisdiccioacuten dei Tribunal

b Ia jurisdiccioacuten inherente y universal dei Tribunal en materia de genocidio criacutemenes contra la humanidad criacutemenes de guerra y agresioacuten sin que se requiera ninguacuten consentimiento dei Estado

c una buena relacioacuten de trabajo con los Tribunales lnternacionales ya establecidos en La Haya

d una relacioacuten constructiva con las Naciones Unidas yen partishycular con el Consejo de Seguridad basada en el pleno reconocimiento de sus respectivas funciones y competencias

e Ia obligacioacuten de los Estados firmantes de acatar y hacer cumplir sin demora las oacuterdenes y decisiones dei Tribunal

f los mayores niveles de respeto de los derechos de los acusados y de los sospechosos y de proteccioacuten de los intereses de las viacutectimas y de los testigos

g Ia garantiacutea de una financiacioacuten a largo plazo necesaria para asegurar la autonomiacutea e independencia dei Tribunal frente a cualquier presioacuten exterior

4 Destaca ademaacutes que la jurisdiccioacuten deI Tribunal sobre los delishytos de genociacutedio los criacutemenes contra la humanidad y los criacutemenes de

ENSAIOS JURiacuteDICOS 267

guerra deben considerarse con la misma calificacioacuten penal con indepenshydencia de que se hayan cometido en conflictos armados internacionales o en conflictos internos

5 Insta ai Consejo y a los Estados miembros a garantizar la universalidad y la transparencia de las negociaciones y la participacioacuten continuada de la comunidadjuriacutedica y la sociedad civil internacionales

6 Encarga a su Presidente que transmita la presente resolucioacuten ai Consejo a la Comisioacuten a los Gobiernos de los Estados miembros ai Secreshytario General de las Naciones Unidas ai Presidente de la Asamblea Geneshyral de las Naciones Unidas y ai Presidente de la Conferencia Diplomaacutetica de las Naciones Unidas para la constitucioacuten de un Tribunal Penal Internashycional

A resoluccedilatildeo supracitada demonstra que cresce a conscientizaccedilatildeo da necessidade de ser criado um Tribunal Penal Internacional com forccedila cogente obrigatoacuteria de suas decisotildees no acircmbito interno dos paiacuteses que participarem do pacto de sua constituiccedilatildeo

A doutrina internacional revela que a comunidade internacional somenshyte agora vem se preocupando em criar uma estructura internacional para determinar las responsabilidades individuales emergentes de violacioacuten de ciertos derechos baacutesicos dei ser humano Los mecanismos de responsabilidad estatal creados desde los 60 se dirigen a la mayor protecciotilden dei ser humano y la erradicacioacuten de las praacutecticas de volacioacuten sistemaacutetica de los derechos humanos ar via de la condena ai Estado que ordena o que tolera los abusos por lo cual se estructuraron entorno ai Estado conmo sujeto responsable Como haacute seflalado la Corte Internacional de Derechos Humanos el procedimiento ante ella no es un procedimiento penal lo que se busca determinar es el nivel de cumprimiento por parte de un Estado de sus obligaciones de derecho internacional Sin desconocer la importancia de determinar la responsabilidad dei Estado para que eacuteste tenga un incentivo para erradicar esas praacutectica de sus frotneras es pertinente detacar que las violaciones maacutes grave son en uacuteltima instancia coshymetidas por individuos (Francisco Cox Encarregado dei TPI HOH em artigo intitulado EI IlOH ante la Craciotilden de um Tribunal Penal Internacional no site httpwwwiidhedcrcpitpintrohtml)

A criaccedilatildeo de um Tribunal Penal Internacional atuaria permanentemente e teria competecircncia subsidiaacuteria em relaccedilatildeo agrave outorgada aos Tribunais Nacioshynais limitando-se a atuar apenas nos crimes internacionais previamente defishynidos como sendo do interesse da comunidade global

Merece registro no acircmbito do assunto tratado que na Conferecircncia Reshygional sobre o Tribunal Penal Internacional realizada em 18 e 19 de fevereiro de 1998 na cidade de Guatemala Guatemala um dos temas tratados foi o relativo

268 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

agrave harmonizaccedilatildeo das incriminaccedilotildees quando os seguintes aspectos foram disshycutidos Branqueamento corrupccedilatildeo fraude fiscal participaccedilatildeo em associashyccedilotildees criminosas um olhar agrave luz dos direitos nacionais e do direito internacioshynal Perspectivas Quais os comportamentos a incriminar Criar uma nova incriminaccedilatildeo da fraude fiscal Uma tentativa de harmonizaccedilatildeo o corpus jurls contendo disposiccedilotildees penais para proteccedilatildeo dos interesses financeiros da Uniatildeo Europeacuteia As negociaccedilotildees no seio do Conselho da Europa e da OCDE referenshytes agrave luta contra a corrupccedilatildeo etc O referido painel foi presidido por Benoit Dejemeppe procurador do Rei em Bruxelas e contou com a presenccedila de Tereshyza Beleza professora de Direito Penal na Faculdade de Direito de Lisboa como moderadora

Haacute como visto um largo campo de anaacutelise para desenvolver com possishybilidade do surgimento de sugestotildees que levem a ciecircncia juriacutedica a alcanccedilar com a atuaccedilatildeo estatal uma competecircncia internacional que possa combater o crime internacional e ao mesmo tempo proporcione seguranccedila juriacutedica na ordem interna ganhando assim o sistema juriacutedico confianccedila dos investidoshyres

Em conclusatildeo a forma de compatibilizar o combate agrave criminalidade internacional sem violar a seguranccedila juriacutedica necessaacuteria a evitar a fuga de inshyvestimentos do paiacutes estaacute na criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional com comshypetecircncia definida para processar e julgar delitos globalizantes e cujas decisotildees tenham forccedila imperativa no acircmbito interno das naccedilotildees participantes do pacto para o seu nascimento

Page 2: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro

224 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTlCA

Um sistema em que o Poder Judiciaacuterio torna-se aacuterbitro dos pedidos da Administraccedilatildeo para quebra do sigilo eacute o mais justo Ou deve ter a autoridade fiscal a faculdade incondicionada de quebrar o sigilo sempre que entender necessaacuterio Nesta segunda hipoacutetese caberia responsabilizaccedilatildeo da autoridade se tal quebra revelar-se inconsistente e indevida

Qual eacute o tratamento proposto por oacutergatildeos internacionais corno a OCDE e outros com relaccedilatildeo ao sigilo bancaacuterio De que forma compatibilizar o combashyte agrave criminalidade internacional sem violar a seguranccedila juriacutedica necessaacuteria a evitar a fuga de investimentos do Paiacutes

Passaremos a seguir ao cumprimento da tarefa

2 Consideraccedilotildees preliminares

O ordenamento juriacutedico brasileiro submete-se na eacutepoca contemporacircshynea a um intenso processo de transformaccedilotildees em decorrecircncia dos novos impactos sociais econocircmicos financeiros eacuteticos e globaJizantes que estatildeo afetando as relaccedilotildees entre Estado e cidadatildeo cidadatildeo e seu semelhante e deste com grupos institucionalizados oficiais ou natildeo-oficiais Esses fenocircmenos proshycuram valer-se de regras impostas pelo Direito e que sejam capazes de aprishymorar a funccedilatildeo estatal e de consagrar de modo mais hierarquizante possiacutevel os direitos fundamentais da cidadania

Os que colaboram com as suas ideacuteias e accedilotildees para que essas mudanccedilas nas estruturas juriacutedicas do Estado tenham ecircxito de modo especial as imposshytas nas funccedilotildees administrativas e comportamentais perseguem um uacutenico obshyjetivo o de que seja valorizado o cidadatildeo e respeitado os seus direitos fundashymentais

A Carta Magna de 1988 apregoa a partir do seu preacircmbulo e com contishynuidade no exposto nos demais tiacutetulos e capiacutetulos que a compotildeem mensashygens imperativas contendo propoacutesitos de homenagem agrave instituiccedilatildeo de um Esshytado democraacutetico com finalidade primordial voltada para a proteccedilatildeo dos dishyreitos sociais e individuais tendo como centro maior a valorizaccedilatildeo da liberdashyde da seguranccedila do bem-estar do desenvolvimento da igualdade da justiccedila tudo endereccedilado a que seja alcanccedilado um estaacutegio representativo de absoluta eficaacutecia e efetividade da dignidade humana I

o exame dos postulados informadores da Constituiccedilatildeo Federal de 1988 revela que o Estado democraacutetico por ela idealizado e pretendido materializar haacute de ter como fundamentos centrais o absoluto respeito aos ditames da soberania da cidadania da dignidade da pessoa humana dos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e do pluralismo poliacutetico Eacute o que estaacute posto de modo expresso no ar 2 da CF de 1988 A Repuacuteblica Federativa do Brasil formada pela uniatildeo indissoluacutevel dos Estados e Municiacutepios e do Distrito Federal constitui-se em Estado democraacutetico de direito e tem como fundamentos I - a soberania II - a cidadania 111 - a dignidade da pessoa humana IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa V - o pluralismo politico

ENSAIOS JURiacuteDICOS 225

A pretensatildeo eacute de ser construiacuteda uma democracia para o seacuteculo XXI com preceitos que ao serem apJicados abram espaccedilos para a execuccedilatildeo de medishydas concretas que resultem em oferecer ao cidadatildeo qualquer que seja a escashyla que ele pertenccedila na grade social seguranccedila puacuteblica e juriacutedica assistecircncia agrave sauacutede atendimento escolar guarda da moralidade liberdade amplo empreshygo respeito aos seus direitos fundamentais e outros valores que estatildeo inserishydos no contexto representativo da dignidade humana

O entendimento manifestado repousa na concepccedilatildeo de que eacute impossiacuteshyvel a convivecircncia com ecircxito do Estado com o cidadatildeo quando as suas relashyccedilotildees estatildeo em constante tensatildeo O alcance dessa situaccedilatildeo provoca inseguranshyccedila medo temor falta de confianccedila e incentiva a quebra dos princiacutepios da eacutetica e da moralidade2bull

2 No referente ao problema da tensatildeo existente entre cidadatildeo e Estado escrevi antes o seguinte O exame do panorama social da era contemporacircnea identifica a sociedade atravessando uma tensatildeo preacute-milecircnio Esse estado emocional ineacutedito estaacute afetando as relaccedilotildees entre as pessoas e foi identificado recentemente em trabalho elaborado por Seacutergio Villas Boas sob o tiacutetulo Tensatildeo PreacuteshyMilecircnio publicado no jornal Gazeta Mercantil de 12 e 13 de junho de 1999 p 2 Caderno - Leitura de Fim de Semana Extraio trecho de tal ensaio para meditaccedilatildeo O mundo estaacute atravessando um periacuteodo de tensatildeo preacute-milecircnio com todos os desconfortos irriacutetabiliacutedades fadigas tormentas mau humor e acima de tudo medo Terrores geralmente infundados Profecias e noticiaacuterios de TV formam um coro que reforccedila a nova TPM e produz uma repeticcedilatildeo estafante fome miseacuteria guerras assaltos assassinatos hediondos traacutefico de drogas e de influecircncias corrupccedilatildeo impunidade protecionismos sonegaccedilotildees (48 do que o governo arrecada vem do trabalho assalariado calcula-se que US$ 825 bilhotildees circulam no Paiacutes sem pagar impostos) precaacuteria sociabilizaccedilatildeo (taxa de desemprego em Satildeo Paulo superou 20 em maio) maior exigecircncia por escolaridade conhecimento e aparecircncias deflaccedilatildeo (ambiente talvez pior para fazer funcionar o capitalismo do que o regime de inflaccedilatildeo) instabilidade financeira solidatildeo O medo nunca escolheu seu objeto de terror tampouco pode ser delimitado em fronteiras geograacuteficas Nos Estados Unidos adolescentes armados exterminam colegas no paacutetio da escola e se suicidam em seguida na Europa grupos de extrema-direita atentam contra minorias eacutetnicas renutrindo o ideal da purificaccedilatildeo pelo extermiacutenio A desinformaccedilatildeo (ou seria desentendimento) estaacute levando as pessoas a viver um filme real permanente Eacute como se a qualquer momento um sujeito infectado por um viacuterus que corroacutei os ossos humanos arrancasse o cidadatildeo de seu BMW adquirido por leasing e dirigisse a maacutequina roubada ateacute um aeroporto onde uma adolescente graacutevida sob efeito de cocaiacutena acabara de sequumlestrar um aviatildeo levando para a Floacuterida velhinhos aposentados dispostos a realizar o sonho da casa de praia civilizada Mas o aviatildeo sequumlestrado pela viciada e pelo delinquumlente representantes das minorias se esborracha no asfalto reverberante do aeroporto Natildeo eacute positiva portanto a apresentaccedilatildeo de um balanccedilo positivo no balanccedilo que se faz da aplicaccedilatildeo da democracia neste final de seacuteculo porque a realidade demonstra que as suas linhas tradicionais foram aparentemente seguidas Urge portanto ser pensada uma forma de regime democraacutetico que seja capaz de inverter esse quadro catastroacutefico para a humanidade Para tanto lorna-se primordial que a Ciecircncia Juriacutedica e a Ciecircncia Poliacutetica renovem os seus postulados e os seus propoacutesitos voltem-se para a criaccedilatildeo de novos degraus e de novos princiacutepios atentas para a forccedila cogente e imperativa que eles devem ter colocando o cidadatildeo com todas as suas aspiraccedilotildees e

continua

226 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Envolvido por esse clima de indefiniccedilotildees institucionais acima apresentashydo embora de modo muito resumido passo a examinar as modificaccedilotildees introduzidas no ordenamento juriacutedico brasileiro afetando o sistema regulador das instituiccedilotildees financeiras com os seus clientes em face da fiscalizaccedilatildeo tribushytaacuteria com novas regras para o sigilo bancaacuterio

3 O sigilo bancaacuterio no Direito Comparado

Uma visatildeo raacutepida do tratamento dado por alguns ordenamentos juriacutedishycos estrangeiros para o sigilo bancaacuterio proporciona uma compreensatildeo mais alargada dessa entidade juriacutedica dos seus objetivos e dos efeitos produzidos por ele nas relaccedilotildees do titular da conta bancaacuteria com a instituiccedilatildeo financeira e com a garantia da sua seguranccedila no ambiente social

a) Portugal

A doutrina considera que a tutela do segredo bancaacuterio no Direito portushyguecircs na atualidade eacute um padratildeo protetor com caracteriacutesticas mais amplas do que o vigente na Suiacuteccedila ateacute entatildeo considerado o paiacutes que mais oferecia proteshyccedilatildeo nesse campo de relacionamento financeiro

continuaccedilatildeo

necessidades como sendo o centro das preocupaccedilotildees (Trabalho intitulado Democracia para o Seacuteculo XXI aguardando publicaccedilatildeo) Modelo de Democracia para o Seacuteculo XXI O fato do regime democraacutetico adotado no Brasil pela maioria dos anos durante o seacuteculo XX natildeo ter produzido resultados administrativos desejados e necessitados pela Naccedilatildeo natildeo deve servir de suporte para a defesa da volta ao autoritarismo ou de qualquer outra forma de regime Haacute que se reconhecer que as dificuldades vividas pela Naccedilatildeo natildeo podem ser tributadas apenas ao mau uso do regime democraacutetico Negativas em grande escala foram os modelos das eras de t 937 a t 946 e de 1964 a 1988 especialmente para o campo das liberdades dos direitos humanos e da valorizaccedilatildeo da dignidade dos homens Filio-me agrave corrente daqueles que pregam ser a democracia com todos os seus defeitos um regime muito melhor do que a mais perfeita das ditaduras A democracia mesmo ferida ela homenageia pelo menos a esperanccedila de um povo e simboliza o modelo de liberdade de seguranccedila e de desenvolvimento cultural e econocircmico pretendido pelo cidadatildeo diferente do que acontece com qualquer outro tipo de regime Aperfeiccediloar a atuaccedilatildeo do regime democraacutetico para o seacuteculo XXI natildeo eacute tarefa das mais faacuteceis Uma seacuterie de obstaacuteculos devem ser enfrentados e regulados sem se falar nas resistecircncias que seratildeo impostas por clones conservadores e privilegiados agraves mudanccedilas O certo eacute que algo precisa ser feito e com ousadia Necessaacuterio enfrentar os problemas e sugerir soluccedilotildees com posiccedilotildees que se integrem no atuar do homem encarregado de pensar e de fazer ciecircncia o que deve ser exercido sem temor Pelo contraacuterio Da exposiccedilatildeo e publicidade das ideacuteias surgem os modelos para a construccedilatildeo do futuro Se os objetivos forem alcanccedilados contribuiccedilotildees essenciais foram dadas para se evitar a mais temida revoluccedilatildeo que pode ser feita pelo ser humano que eacute a da revolta interna e silenciosa contra as instituiccedilotildees com forccedila ateacute de extinguir caso se realize a entidade tradicional do Estado

ENSAIOS JURiacuteDICOS 227

Esse entendimento decorre da interpretaccedilatildeo que os doutos manifestam sobre o Decreto-Lei n 21978 normativo disciplinador do sigilo bancaacuterio em Portugal

O objetivo da legislaccedilatildeo portuguesa sobre sigilo bancaacuterio conforme depreende-se da sua mensagem eacute imprimir confianccedila no funcionamento das instituiccedilotildees de creacutedito para que se afirmem como veiacuteculos necessaacuterios para a captaccedilatildeo da poupanccedila Essa ideacuteia foi exposta por Alexandra Falque de Gouvecirca Professora-Assistente da Faculdade de Direito de Lisboa e Assessora do Conseshylho para o Sistema Financeiro no corpo do artigo de sua autoria Perspectivas de Reformulaccedilatildeo da Tutela do Seguro Bancaacuterio no Direito Portuguecircs publicashydo na Revista do Gabinete de Documentaccedilatildeo e Direito Comparado da Proshycuradoria Geral da Repuacuteblica Lisboa 1990 pp 922

Destaco do corpo do mencionado artigo a observaccedilatildeo feita pela autoshyra pp 12 e 13 no sentido de que A tutela do segredo bancaacuterio surgiu em Portugal conjunturalmente associada aos esforccedilos de reanimaccedilatildeo das instituishyccedilotildees de creacutedito como fonte de captaccedilatildeo da poupanccedila Por esse facto foi-lhe dado um regime mais protector do que o proacuteprio regime vigente na Suiacuteccedila campeatilde em mateacuteria de protecccedilatildeo do segredo bancaacuterio

A seguir afirma a autora Eacute testemunha de que esse reforccedila a confianccedila nas instituiccedilotildees de creacutedito foi de facto o objectivo do legislador ao aprovar o normativo que disciplina o sigilo bancaacuterio a letra do preacircmbulo do Decreto-Lei n 21978 de 9 de janeiro que conteacutem o enquadramento legal da mateacuteria o qual reza o seguinte Ponderando que a reconstruccedilatildeo do Paiacutes implica o estashybelecimento de um clima de confianccedila na banca que permita a captaccedilatildeo e recuperaccedilatildeo do dinheiro entesourado vem o Governo revelando preocupashyccedilotildees pela tutela do segredo bancaacuterio No mesmo sentido a letra do preatildembushylo do Despacho Normativo n 3571979 de 20 de novembro A importatildencia do segredo bancaacuterio eacute bem conhecida para a estabilizaccedilatildeo normalidade de funshycionamento e transmissatildeo de uma imagem de confianccedila por parte de qualshyquer sistema bancaacuterio Nesta medida com a legislaccedilatildeo entatildeo aprovada o regishyme portuguecircs na mateacuteria afastou-se quer do sistema da Common Law de resshyponsabilidade (exclusivamente) civil do banqueiro por violaccedilatildeo ao dever de discriccedilatildeo bancaacuteria quer da generalidade dos sistemas europeus que integram a mateacuteria no regime geral do sigilo profissional (equiparando o banqueiro ao confidente necessaacuterio) aproximando-se mais dos sistemas praticados na Suiacuteshyccedila e no Liacutebano (todavia enquanto no Liacutebano haacute uma total imunidade das insshytituiccedilotildees de creacutedito agraves requisiccedilotildees da autoridade judiciaacuteria na Suiacuteccedila o princiacuteshypio eacute o da cooperaccedilatildeo com a funccedilatildeo judiciaacuteria no tocante agrave mateacuteria pena)

A autora conclui esse toacutepico do seu artigo afirmando Pela razatildeo aponshytada de ser essencialmente o interesse puacuteblico e colectivo o motivo

228 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

determinante da aprovaccedilatildeo do Decreto-Lei n 21978 o regime portuguecircs gizado nessa altura comeccedilou por ser ainda mais hermeacutetico do que o proacuteprio regime vigente na Suiacuteccedila na medida em que o dever de cooperaccedilatildeo com as autoridashydes judiciaacuterias cessa inclusivamente nas mateacuterias sujeitas a segredo bancaacuterio segundo o entendimento generalizado dos Tribunais e doutrina3bull Paradoxalshymente a disciplina juriacutedica natildeo encontrou de iniacutecio reflexo na materialidade dos factos tendo-se assistido a muacuteltiplos e impunes violaccedilotildees ao segredo banshycaacuterio

Arnoldo Wald analisando o sigilo bancaacuterio no ordenamento juriacutedico de Portugal registra O Coacutedigo Civil portuguecircs no seu art 80 dispotildee que Todos devem guardar reserva quanto agrave intimidade da vida privada de outrem A exshytensatildeo da reserva seraacute definida conforme a natureza do caso e as condiccedilotildees das pessoas O art 33 da Constituiccedilatildeo portuguesa de 1976 estabelece que 1 A todos eacute reconhecido o direito agrave identidade pessoal ao bom nome e reputashyccedilatildeo e agrave reserva da intimidade da vida privada e familiar 2 A lei estabeleceraacute garantias efectivas contra a utilizaccedilatildeo abusiva ou contraacuteria agrave dignidade humashyna de informaccedilotildees relativas agraves pessoas e famiacutelias

Tanto no acircmbito constitucional quanto na legislaccedilatildeo civil eacute garantido o direito agrave privacidade e agrave vida iacutentima que fundamentam o sigilo bancaacuterio Jaacute o Decreto-Lei n 2 de 911978 prevecirc expressamente o dever de segredo dos titulares dos oacutergatildeos dos bancos e aos seus trabalhadores4

b) Alemanha

Carlos Alberto Hagstron em artigo intitulado O Sigilo Bancaacuterio e o Poshyder Puacuteblico publicado na Revista de Direito Mercantil n 79 p 37 registra que Na Alemanha natildeo haacute regra especiacutefica nem definiccedilatildeo legal para o segredo bancaacuterio mas sua existecircncia eacute observada reconhecida pejo Direito Privado e pelo Direito Puacuteblico admitida em diversas leis aceita pela doutrina e pela jurisshyprudecircncia sofrendo contudo limitaccedilotildees decorrentes de interesses de orshydem puacuteblica e social quando pode haver a quebra do sigilo conforme aliaacutes lembra Seacutergio Carlos Covello na sua obra O Sigilo Bancaacuterio Leud 1991 p 34

3 A respeito desse aspecto o de cessar o dever de colaboraccedilatildeo com as autoridades judiciaacuterias quando envolver mateacuterias sujeitas a segredo bancaacuterio a autora ao fazer essa afirmaccedilatildeo assinala em nota de rodapeacute as seguintes obras que refletem igual entendimento Alberto Luiacutez O Segredo Bancaacuterio em Portugal in Revista da Ordem dos Advogados ano 41 Q (1981) pp 451 e segs Anselmo da Costa Freitas O Sigilo Bancaacuterio In Boletim da Ordem dos Advogados n 19 (outubro de 1983) pp 4 e segs Maria Eduarda Azevedo O Segredo Bancaacuterio In Ciecircncia e Teacutecnica Fiscal n 346348 (outubrodezembro de 1987) pp 73 e segs Joseacute Antoacutenio Pereira da Silva Regime Juriacutedico do Sigilo Bancaacuterio maio de 1988 (trabalho natildeo publicado) Jorge Patriacutecio Paul O Sigilo Bancaacuterio - sua Extensatildeo e Limites no Direito Portuguecircs In Revista da Banca n 12 (outubrodezembro) 1989 pp 71 e segs

4 Em artigo publicado sob o tiacutetulo Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais publicado na Revista dos Tribunais n 22 Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas p 24

ENSAIOS JURiacuteDICOS 229

A lei bancaacuteria alematilde de 1971961 em seu art 92 determina que haacute obrishygaccedilatildeo de ser preservado o direito agrave privacidade para aqueles que exercem uma funccedilatildeo federal de vigilatildencia por seus colaboradores e pelos controlashydores dos depoacutesitos (Arnoldo Wald em artigo Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais publicado na Revista dos Tribunais n 22 RT Cadernos de Direishyto Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas jan-marccedilo de 1998 p 24)

O citado autor esclarece ainda que na Alemanha a fonte do sigilo banshycaacuterio estaacute no direito agrave personalidade

c) Itaacutelia Franccedila Suiacuteccedila

Luiz Fernando de Bellinetli em artigo denominado Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio (Revista de Direito do Consumidor RT n 18 abril-junho de 1996 pp 141161) ao analisar o sigilo bancaacuterio no Direito Comparado comenshyta o tratamento que lhe eacute dado pela Alemanha Itaacutelia Franccedila Suiacuteccedila e Portugal

Em face de nos itens acima jaacute ter sido enfocado o tema na Alemanha e em Portugal destacaremos apenas do trabalho do autor as observaccedilotildees feishytas sobre o sigilo bancaacuterio nos ordenamentos juriacutedicos da Itaacutelia Franccedila e Suiacuteccedila

A respeito transcrevo o que escreveu o autor

412 ltaacutelia5

Assim como na Alemanha na Itaacutelia tambeacutem natildeo haacute norma especiacuteshyfica disciplinando o sigilo bancaacuterio embora seja ele reconhecido pela doutrina e pela jurisprudecircncia utilizando-se dispositivos variados do sisshytema para supeditaacute-lo

No entanto tambeacutem na Itaacutelia natildeo eacute ele absoluto cedendo ante interesse de ordem puacuteblica nos casos previstos em lei

Como afirma Giacomo Molle Lobbligo della banca ai segreto non e senza Umt ed essendo esse come si e delto dretto aIa tutela dei cliente e quindi di un interesse privato non vi sono limiti ad esso da parte dei legislatore Prescindendo daiacute casi nei quali la rivelzione sai imposta dala legge un dovere di comunicazione puoacute sorgere nei contrant della autoritaacute

5 Arnoldo Wald no artigo jaacute referido (Sigilo Bancaacuterio e Direitos Fundamentais Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas - 22 p 24) assinala que Na Itaacutelia o sigilo bancaacuterio decorre da garantia dos direitos agrave liberdade individual que permite a exclusatildeo do conhecimento por parte de terceiros de tudo que se refere agrave proacutepria pessoa a denominada riservalezza Este entendimento decorre da norma constitucional que institui a inviolabilidade dos direitos da personalidade e da Convenccedilatildeo Europeacuteia dos Direitos do Homem de 1950 que garante a toda pessoa o direito ao respeito de sua vida privada e familiar de seu domiciacutelio e de sua correspondecircncia O segredo nas movimentaccedilotildees financeiras no entendimento doutrinaacuterio italiano visa proteger aleacutem dos interesses do cliente o desenvolvimento da atividade bancaacuteria como algo inerente agrave estrutura e funccedilatildeo creditiacutecia

~o SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

giudiziaria dei fisco e di terzi (La Banca NellOrdinamento Giuridico itashyliano Milano - DoU A Giuffre Editore 1980 p 158)

413 Franccedila

Tambeacutem na Franccedila o sigilo bancaacuterio eacute protegido pelo ordenamenshyto juriacutedico embora inexistente uma norma especiacutefica fundando-se a proteccedilatildeo num conjunto de regras de ordem penal civil e comercial

Da mesma forma admite-se a quebra do sigilo em face de interesshyses de ordem puacuteblica6 bull

414 Suiacuteccedila

Paiacutes onde os bancos e a sua alardeada discriccedilatildeo satildeo instituiccedilotildees nacionais haacute previsatildeo legal especiacutefica para a proteccedilatildeo do sigilo

No entanto tambeacutem laacute o segredo natildeo eacute como alguns supotildeem absoluto

Conforme aduz Hagstrom Natildeo pode ser invocado em geral peshyrante a Justiccedila Penal Na Justiccedila Civil o Juiz tem poder discricionaacuterio para decidir sobre a mateacuteria havendo algumas variaccedilotildees de conformidade com as legislaccedilotildees cantonais Em procedimentos de taxaccedilatildeo e recursos o segredo eacute preservado perante o Fisco eacute afastado contudo no proceshydimento contencioso (penal fiscal) Algumas outras exceccedilotildees ao dever de segredo satildeo contempladas expressamente em textos legais

Quanto ao Direito suiacuteccedilo acrescente-se que Arnoldo Wald no artigo jaacute tado observa que a justificativa para o sigilo bancaacuterio estaacute no direito da rsonalidade A Lei de 1934 prevecirc pena de multa ou de prisatildeo para o funcioshyliacuterio da instituiccedilatildeo que violar o segredo bancaacuterio mesmo que inexista dano ara aquele que viu reveladas informaccedilotildees sobre sua vida financeira

A seguir Arnoldo Wald compara o Direito da Suiacuteccedila com o do Liacutebano lrmando A Suiacuteccedila assim como o Liacutebano para a maior seguranccedila e reforccedilo a preservaccedilatildeo do sigilo bancaacuterio utiliza a conta numerada ficando descoshyhecido o nome do cliente A legislaccedilatildeo libanesa prevecirc quatro hipoacuteteses de errogaccedilatildeo do sigilo a) o consentimento do cliente seus herdeiros ou legataacuteshyos b) no litiacutegio entre o cliente e o banco c) na falecircncia e d) no enriquecimenshy) iliacutecito

d) Inglaterra e EEUU

O sigilo bancaacuterio no Direito inglecircs e no sistema norte-americano mereshyeu de Arnoldo Wald no trabalho jaacute citado pp 24 e 25 a anaacutelise que transcrevo

o autor citado manda no particular conferir Carlos Alberto Hagstrom artigo O Sigilo Bancaacuterio e o Poder Puacuteblico RDM n 79 p 38 bem como Seacutergio Covello em O Sigilo Bancaacuterio Leud 1991 pp 2627

ENSAIOS JURiacuteDICOS 231

No Direito inglecircs natildeo haacute nenhuma norma escrita que estabelece sanccedilatildeo agrave violaccedilatildeo ao segredo bancaacuterio mas qualquer pessoa que queira trabalhar em uma instituiccedilatildeo financeira deve assinar um formulaacuterio esshypecial pelo qual se compromete a manter sigilo sobre as movimentaccedilotildees bancaacuterias O dever de segredo na atuaccedilatildeo do banco eacute interpretado rigoshyrosamente pelos tribunais ingleses

No sistema juriacutedico norte-americano depois de discrepacircncias nas legislaccedilotildees estaduais e apoacutes a lei federal que restringiu o acircmbito da obrishygatoriedade do sigilo bancaacuterio foi aprovada a Right to Financiai Privacy Act que dispotildee que a prestaccedilatildeo de informaccedilotildees por parte da instituiccedilatildeo financeira somente pode ser dada em processos administrativos ou judishyciais quando os dados forem relevantes para solucionar o litiacutegio Com essa lei a quebra do sigilo bancaacuterio ganhou um caraacuteter excepcional somente podendo ocorrer desde que respeitado o devido processo leshygal Assim o Direito americano buscou conciliar a defesa ao direito de privacidade o atendimento aos interesses puacuteblicos quanto agraves informashyccedilotildees financeiras e a existecircncia do contraditoacuterio

e) Reacutegis de Oliveira quando Deputado Federal em parecer apresentashydo agrave Comissatildeo de Constituiccedilatildeo e Justiccedila da Cacircmara dos Deputados com refeshyrecircncia a Projeto de Emenda Constitucional apresentado pelo Exmo Sr Presishydente da Repuacuteblica objetivando alterar o sect 1 ordm do art 145 da CF observou que o sigilo bancaacuterio no Direito Comparado eacute posto da forma seguinte

13 Direito Comparado Na Alemanha natildeo haacute regra especiacutefica nem definiccedilatildeo legal para o segredo bancaacuterio mas sua existecircncia eacute recoshynhecida bem como aceita pela doutrina e jurisprudecircncia Decorre de direito costumeiro somente podendo ser quebrado por expressa disposhysiccedilatildeo legal (J Barmann Le Secret Bancaire en Allemagne Feacutedeacuterale in Rapport pp 15 e segs) Na Beacutelgica haacute proibiccedilatildeo somente sendo viaacutevel a derrogaccedilatildeo do segredo pela Justiccedila Penal e pelo Fisco que somente tem acesso agraves informaccedilotildees bancaacuterias diante do processo pendente (Herion Le Secret Bancaire en Belfique in Rapport pp 5175) Na Itaacutelia os doshycumentos somente podem ser examinados pelos Juiacutezes Natildeo haacute acesso por parte das autoridades administrativas (idem p 129) Na Holanda da mesma forma o sigilo apenas cede ante ordem da autoridade judicial ou penal (Muller idem pp 99117) Na Franccedila a violaccedilatildeo ao segredo ocorre ante oacutergatildeos do Poder Puacuteblico que alegam interesses superiores aos dos particulares natildeo se admitindo a quebra diante de normas administratishyvas (Gavalda Stouflet idem pp 7797)

f) Voltando a analisar o sigilo bancaacuterio em Portugal pode-se afirmar que o sistema apresentava-se rigoroso e nacirco aceitava a quebra como se vecirc de

232 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

decisatildeo do Supremo Tribunal de Justiccedila em Scientia Juriacutedica tomo XXIv n 166168 de 1980 (Parecer publicado na Revista de Direito Mercantil n 99 pp 98 e segs)

Com o sentido de demonstrar como o sigilo bancaacuterio eacute tratado no ordeshynamento juriacutedico de Portugal cito na iacutentegra um acoacuterdatildeo da Secccedilatildeo Criminal do Tribunal de Relaccedilatildeo de Eacutevora cujo texto colhi da internet (httpwwwtrept jurisp321-96html)

Processo n 321]996

Acoacuterdatildeo

Acordam na Secccedilatildeo Criminal do Tribunal da Relaccedilatildeo de Eacutevora

1 No Tribunal Judicial da Comarca de Portimatildeo correm termos uns autos de inqueacuterito registados sob o n 35711994 que tiveram orishygem numa queixa apresentada por middotM Lda contra a sociedade E Lda nos quais se procede agrave investigaccedilatildeo de factos susceptiacuteveis de inteshygrar a praacutetica de um crime de emissatildeo de cheque sem provisatildeo

Estaacute em causa o cheque nO 3681861637 sacado sobre a Caixa Geral de Depoacutesitos emitido em 1 ordm de julho de 1994 no valor de 820661$00

No decurso do inqueacuterito o Ministeacuterio Puacuteblico solicitou agravequela insshytituiccedilatildeo bancaacuteria o fornecimento de determinada documentaccedilatildeo banshycaacuteria o que esta se negou fazer alegando que a revelaccedilatildeo da pretendida documentaccedilatildeo contende com o disposto na legislaccedilatildeo sobre segredo bancaacuterio

A requerimento do Digno Magistrado do Ministeacuterio Puacuteblico o MM Juiz de Instruccedilatildeo suscitou a intervenccedilatildeo deste Tribunal da Relaccedilatildeo a fim de dispensar os serviccedilos da Caixa Geral de Depoacutesitos do segredo bancaacuteshyrio quanto agrave documentaccedilatildeo bancaacuteria solicitada a saber coacutepia da ficha de assinaturas e extracto da conta da Agecircncia de S com o n sobre a qual foi sacado o cheque em causa respeitante aos meses de maio junho e julho de 1994

Nesta relaccedilatildeo o Exmo Procurador da Repuacuteblica emitiu douto pareshycer no sentido de a referida instituiccedilatildeo bancaacuteria ser dispensada do cumshyprimento do dever do segredo bancaacuterio em ordem agrave prestaccedilatildeo dos eleshymentos pretendidos para a efectivaccedilatildeo do inqueacuterito

Colhidos os vistos legais cumpre agora decidir

2 A Caixa Geral de Depoacutesitos atraveacutes do ofiacutecio fotocopiado agrave fi 5 dos autos recusou-se a fornecer os documentos pedidos pelo Ministeacuteshyrio Puacuteblico para instruccedilatildeo de um processo de inqueacuterito com fundamento no sigilo bancaacuterio

ENSAIOS JURiacuteDICOS 233

Compreendendo o inqueacuterito o conjunto de diligecircncias que visam investigar a existecircncia de um crime determinar os seus agentes e a resshyponsabilidade deles e descobrir e recolher as provas em ordem agrave decishysatildeo sobre a acusaccedilatildeo (cf art 262 n 1 do Coacutedigo de Processo Pena0 a consulta dos pretendidos documentos - extracto da conta e ficha de assinaturas - eacute sem margem para duacutevidas de grande importacircncia para a instruccedilatildeo do processo e recolha de indiacutecios probatoacuterios tendentes agrave eventual deduccedilatildeo de acusaccedilatildeo pois sem ela desde logo muito dificilshymente se poderaacute concluir pela identificaccedilatildeo da pessoa que assinou o cheque

O dever de sigilo bancaacuterio traduz uma obrigaccedilatildeo de facto negativo (de ROR facere) e encontra-se disciplinado no Decreto-Lei n 2981992 de 31 de dezembro que aprovou o Regime Geral das Instituiccedilotildees de Creacutedito e Sociedades Financeiras O art 78 de tal diploma consagrando o dever de segredo profissional dispotildee no seu n 1 que os membros dos orgatildeos de administraccedilatildeo ou de fiscalizaccedilatildeo das instituiccedilotildees de creacutedito os seus empregados mandataacuterios comitidos e outras pessoas que lhes prestem serviccedilos a tiacutetulo permanente ou ocasional natildeo podem revelar ou utilizar informaccedilotildees sobre factos ou elementos respeitantes agrave vida da instituiccedilatildeo ou agraves relaccedilotildees desta com os seus clientes cujo conhecimento lhes advenha exclusivamente do exerciacutecio das suas funccedilotildees ou da presshytaccedilatildeo dos seus serviccedilos explicitando-se no seu n 2 que estatildeo designadamente sujeitos a segredo os nomes dos clientes as contas de depoacutesito e seus movimentos e outras operaccedilotildees bancaacuterias

O dever de segredo profissional natildeo eacute poreacutem um dever absoluto isto eacute natildeo prevalece sempre sobre qualquer outro dever que com ele entre em conflito Sofre com efeito as excepccedilotildees previstas no art 79 do mesmo Decreto-Lei n 2981992 onde se estabelece aleacutem do mais que os factos e elementos cobertos pelo dever de segredo podem ser revelashydos nos termos previstos na lei penal e de processo penal - cf aliacutenea d don2

No art 84 do mesmo diploma legal prescreve-se que a violaccedilatildeo ao dever de segredo eacute puniacutevel nos termos do Coacutedigo Penal e efectivamente o Coacutedigo Penal vigente - revisto pelo Decreto-Lei n 481995 de 15 de marccedilo - prevecirc e pune como crimes quer a violaccedilatildeo a segredo profissioshynal quer o seu aproveitamento indevido - cf arts ] 95 e 196

Ao contraacuterio da versatildeo do Coacutedigo Penal anterior agrave referida revisatildeo - em que se estatuiacutea no art 185 que a violaccedilatildeo ao segredo profissional natildeo seria puniacutevel se ocorresse no cumprimento de um dever juriacutedico sensivelmente superior ou visasse a um interesse puacuteblico ou privado legiacutetimo quando considerados os interesses em conflito e os deveres

234 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

de informaccedilatildeo que segundo as circunstacircncias se impotildeem ao agente se pudesse considerar meio adequado para alcanccedilar aquele fim - natildeo conteacutem o Coacutedigo Penal actuaJ relativamente ao crime de violaccedilatildeo ao segredo profissional qualquer causa especiacutefica de exclusatildeo da ilicitude pelo que haacute que atentar nas causas gerais de exclusatildeo da ilicitude

Ao abordar o conflito de deveres dispotildee o art 36 n 1 do Coacutedigo Penal que natildeo eacute iliacutecito o facto de quem em caso de conflito no cumprishymento de deveres juriacutedicos ou de ordens legiacutetimas da autoridade satisfishyzer dever ou ordem de valor igualou superior ao do dever ou ordem que sacrificar Natildeo seraacute pois iliacutecita a violaccedilatildeo ao segredo profissional se perante um conflito de deveres o agente satisfizer o dever de valor igual ou superior ao do dever que sacrifica

No Coacutedigo de Processo Penal generalizou-se a possibilidade de quebra do segredo profissional

Assim as pessoas indicadas no n 1 do sobredito art 78 podem recusar-se a depor sobre factos objecto de segredo profissional mas se a autoridade judiciaacuteria concluindo embora pela legitimidade da recusa natildeo prescindir desse depoimento pode requerer ao tribunal que o ordeshyne E o tribunal deveraacute ordenar a prestaccedilatildeo do depoimento com quebra do segredo profissional sempre que entender que esta se mostra justificada face agraves normas e princiacutepios aplicaacuteveis da lei penal nomeadashymente ao princiacutepio da prevalecircncia do interesse preponderante - cf art 135 n 12 e 3 do Coacutedigo de Processo Penal

A possibilidade de apreensatildeo pela autoridade judiciaacuteria de tiacutetulos valores quantias ou outros objectos depositados em bancos ou outras instituiccedilotildees de creacutedito relacionados com um crime e que possam ser de grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova bem como a possibilidade de exame pelo juiz de correspondecircncia e documenshytaccedilatildeo bancaacuterias estatildeo previstas no art 181 n 1 e 2 do Coacutedigo de Processhyso Penal As pessoas obrigadas ao dever de segredo profissional podem recusar apresentar aqueles documentos ou objectos em seu poder se invocarem por escrito segredo profissional caso em que o conflito de interesses e deveres assim surgido seraacute dirimido pelo tribunal nos tershymos idecircnticos aos previstos para a recusa de depoimento - cf arts 182 n 2 e 135 ambos do citado coacutedigo

Enquanto o dever de segredo profissional eacute geralmente estabeleshycido a favor da integridade e liberdade das pessoas a quem aproveita tendo-se inserido a sua regulamentaccedilatildeo no Tiacutetulo VI do atraacutes mencionashydo Regime Geral das Instituiccedilotildees de Creacutedito e Sociedades Financeiras no qual se prevecirc um conjunto de regras de conduta que devem guiar a actuaccedilatildeo das instituiccedilotildees de creacutedito seus administradores e empregados

ENSAIOS JURiacuteDICOS 235

nas relaccedilotildees com os clientes visando proteger de forma eficaz a posishyccedilatildeo do consumidor de serviccedilos financeiros (cf preacircmbulo do Decreshyto-Lei n 2981992) ou estabelecer um clima de confianccedila na banca que permita a captaccedilatildeo e recuperaccedilatildeo do dinheiro entesourado (como se dizia no relatoacuterio do Decreto-Lei n 21978 de 9 de janeiro revogado pelo n 1 do art 5Q do citado Decreto-Lei n 2981992) no processo de inqueacuteshyrito a que procede o Ministeacuterio Puacuteblico estaacute em causa a realizaccedilatildeo de diligecircncias de prova que permitam investigar um crime de emissatildeo de cheque sem provisatildeo sob a eacutegide do princiacutepio da verdade material e incriminar o respectivo agente

O interesse que estaacute em jogo com a pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblishyco na obtenccedilatildeo da documentaccedilatildeo bancaacuteria eacute o da boa administraccedilatildeo da Justiccedila Penal e esse interesse eacute no caso em apreccedilo sensivelmente supeshyrior ao interesse da manutenccedilatildeo do segredo bancaacuterio o que equivale a di~er que este deve ceder perante aquele

Em suma no caso concreto ponderados os interesses em conflishyto entendemos que a quebra do dever de sigilo bancaacuterio se justifica nos termos do art 36 do Coacutedigo Penal pelo que deve ser dada procedecircncia agrave pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico e consequumlentemente ao abrigo do disposto nos arts 182 n 2 e 135 n 2 e 3 ambos do Coacutedigo de Processo Penal dispensar-se a Caixa Geral de Depoacutesitos do cumprimento do deshyver de sigilo bancaacuterio a fim de poder satisfazer tal pretensatildeo

3 Por todo o exposto determina-se que com quebra do dever de sigilo bancaacuterio a Caixa Geral de Depoacutesitos forneccedila ao Digno Magistrado do Ministeacuterio Puacuteblico com destino ao Processo de Inqueacuterito n 3571 1994 a documentaccedilatildeo bancaacuteria que este lhe havia solicitado

Natildeo eacute devida taxa de justiccedila

Texto processado e integralmente revisto pelo relator

Desembargador-Relator Rui Mauriacutecio

g) Substancioso estudo do sigilo bancaacuterio no Direito Comparado foi feishyto por Andreacute Serratildeo Borges de Sampaio Consultor da Uniatildeo nas informashyccedilotildees que prestou ao Advogado-Geral da Uniatildeo com referecircncia agrave ADIn n 2397 Transcrevo o inteiro teor do seu pronunciamento

51

6 O tratamento do sigilo bancaacuterio no Direito Comparado

Em verdade o Direito Comparado entende inoponiacutevel o sigilo banshycaacuterio agraves autoridades tributaacuterias Com efeito leciona Alfredo Echeverriacutea Herrera verbis

236 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

EI sigilo bancario constituye un reacutegimen limitado exclusivashymente ai aacutembito de las relaciones entre la institucioacuten bancaria y sus clientes e impone la obligacioacuten de confidencialidad de la institucioacuten sobre las informaciones que aqueacutellos le proporcionan

En todas las legislaciones bancarias el sigilo es relativo es decir el derecho dei ciudadano ai secreto y la correlativa obligacioacuten para el banco de no revelar a terceros las informaciones recibidas en el ejercicio de su actividad ceden cuando existe norma legal expresa o causa justificada

Elliacutemite legal ai sigilo estaacute constituiacutedo por la obligacioacuten dei banco de entregar informaciones y se fundamenta en motivos sushyperiores de orden puacuteblico o general siendo liacutecito entonces que el Estado establezca Iiacutemites legales ai secreto bancaria para auxiliar por ejemplo las actuaciones de la Justicia en el plano jurisdiccional y las dei Estado en el aacutembito dei ejercicio de su potestad impositiva

Es un principio irrebatible en la vida dei derecho que ni la autonomia de las personas ni los instrumentos dei aacuterea econoacutemica y financiera pueden servir en un momento dado como elementos juridicamente idoacuteneos para lesionar el intereacutes puacuteblico En consecuencia se puede afirmar que las limitaciones ai sigilo bancario son salvaguardias necesarias ai bien comuacuten en los caacutenones dei Estado moderno Estas limites deben ser materias reshyservadas a la ley por ser de caraacutecter excepcional en sentido estricto

En este orden de ideas necesariamente debe concluirse que existen legiacutetimos y superiores intereses en diversas aacutereas de la sociedad que se vinculan ai bien comuacuten y que deben ser tutelados por el Estado como lo es por ejemplo la necesidad de detectar y reprimir la evasioacuten de los impuestos los cuales transcienden ai evenshytual intereacutes geneacuterico que pueda tener el mismo Estado en la mantencioacuten dei sigilo bancaria En efecto desde el punto de vista de lajuridicidad y de la eacutetica no se puede sostener que el secreto bancaria pueda servir como instrumento para proteger la comisioacuten de actos

52

como el recieacuten mencionado que son constitutivos muchas veces de iliacutecitos penales bajo la forma de delitos tributarias o fraushydes fiscales con resultados ademaacutes de perjucio patrimonial ai Esshytado y dano ai intereacutes general de la sociedad

EI sistema bancaria frente a la existencia en la sociedad de un intereacutes general preponderante y superior estaacute naturalmente Ilamado a colaborar en la verificacioacuten y represioacuten de la evasioacuten tributaria

ENSAIOS JURiacuteDICOS 237

En este marco se inscribe la tendencia de la mayoda de las legislaciones modemas en cuanto a dotar aI Estado de facultades para intervenir en la actividad econoacutemica de los ciudadanos en procura de la correcta determinacioacuten de los tributos cuando se conshyfigura en el desarrollo de estas actividades un hecho gravado establecido en la ley

Ya la Constitucioacuten de Weimar en 919 proclamoacute que es liacutecito ai Estado intervenir para condicionar el ejercicio de los derechos a determinados fines sociales El bien comuacuten y la justicia social comenzaron desde entonces a servir de frontera a los derechos y Iibertades individuales

Cabe destacar que la OCDE (Organisation for Economic Cooperation and Development) en un documento elaborado en el ano 1999 sobre las praacutecticas de los paiacuteses en el acceso a la informacioacuten bancaria para fines tributarios advierte que se puede abusar de la confidencialidad para ocultar actividades iJegales y evadir impuestos y agrega en el resumen ejecutivo deI documento que ni la criminalizacioacuten dei fraude tributario ni el tratamiento de la evasioacuten de impuestos bajo las leyes tributarias de los paiacuteses miembros de la OCDE son homogeacuteneos pero que sin embargo los gobiernos de la mayoriacutea de los paiacuteses miembros de la OCDE han tomado la visi6n de que en este contexto las autoridades tributashyrias no deben ser tratadas como simples terceros sino que se les debe otorgar un acceso priviligiado a la informaci6n bancaria con fines tributarias

Se agrega en este estudio que una medida de esta naturaleza no pane en peligro la conlidencialidad de la inlormacioacuten bancaria puesto que las autoridades tributarias estaacuten sujetas a estrictos conshytroles sobre coacutemo utilizan la informacioacuten de los contribuyentes y todos los gobiemos han implementado regIas para proteger la conlidencialidad de la informaci6n tributaria (EI Sigilo Bancaacuterio Acesso a la Informadon Bancaria para Fines Tributarias)

Em verdade seu texto elenca 30 paiacuteses integrantes da OCDE (a saber Alemanha Austraacutelia Aacuteustria Beacutelgica Canadaacute Repuacuteblica Checa Dinamarca Finlacircndia Franccedila Greacutecia Hungria Islacircndia Irlanda Itaacutelia Japatildeo Coreacuteia Luxemburgo Meacutexico Paiacuteses Baixos Nova Zelacircndia Noshyruega Polocircnia Portugal Espanha Sueacutecia Turquia Suiacuteccedila Reino Unido Estados Unidos Repuacuteblica Eslovaca) dos quais em 1999 apenas trecircs (Portugal Repuacuteblica Eslovaca e Luxemburgo) natildeo facultavam o acesso por parte de autoridades tributaacuterias a informaccedilotildees relativas a pessoas suspeitas de fraude tributaacuteria

238 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

Desses trecircs paiacuteses hoje remanescem apenas dois Com efeito Portugal deixou de integrar esse grupo constrangedoramente minoritaacuterio ao aprovar em 29 de dezembro de 2000 a Lei n 30-G

Nesse diploma lecirc-se

Lei da Reforma de Tributaccedilatildeo do Rendimento

(Portugal)

Artigo 63 O - B

Acesso a informaccedilotildees e documentos bancaacuterios

1 A administraccedilatildeo tributaacuteria tem o poder de aceder directashymente aos documentos bancaacuterios nas situaccedilotildees de recusa da sua exibiccedilatildeo ou de autorizaccedilatildeo para a sua consulta

a) quando se trate de documentos de suporte de registos contabiliacutesticos dos sujeitos passivos de IRS e IRC que se enconshytrem sujeitos agrave contabilidade organizada

b) quando o contribuinte usufrua de benefiacutecios fiscais ou de regimes fiscais privilegiados havendo necessidade de controshylar os respectivos pressupostos e apenas para esse efeito

2 A administraccedilatildeo tributaacuteria tem o poder de aceder a todos os documentos bancaacuterios excepto as informaccedilotildees prestadas para justificar o recurso ao creacutedito nas situaccedilotildees de recusa de exibiccedilatildeo daqueles documentos ou de autorizaccedilatildeo para a sua consulta

a) quando se verificar a impossibilidade de comprovaccedilatildeo e quantificaccedilatildeo directa e exacta da mateacuteria tributaacutevel nos termos do artigo da Lei Geral Tributaacuteria e em geral quando estejam verifishycados os pressupostos para o recurso a uma avaliaccedilatildeo indirecta

b) quando os rendimentos declarados em sede de IRS se afastarem significativamente para menos sem razatildeo justificada dos padrotildees de rendimento que razoavelmente possam permitir as manifestaccedilotildees de riqueza evidenciadas pelo sujeito passivo nos termos do artigo 89-A da Lei Geral Tributaacuteria

c) quando existam indiacutecios da praacutetica de crime doloso em mateacuteria tributaacuteria designadamente nos casos de utilizaccedilatildeo de facturas falsas e em geral nas situaccedilotildees em que existam factos concretamente identificados gravemente indiciadores da falta de veracidade do declarado

d) quando seja necessaacuterio para fins fiscais comprovar a aplicaccedilatildeo de subsiacutedios puacuteblicos de qualquer natureza

ENSAIOS JUAlolCOS 239

3 As decisotildees da administraccedilatildeo tributaacuteria referidas nos nuacuteshymeros anteriores devem ser fundamentadas com expressa menshyccedilatildeo dos motivos concretos que as justificam pressupotildeem a audishyccedilatildeo preacutevia do contribuinte e satildeo da competecircncia do Director-Geshyral dos Impostos ou do Director-Geral das Alfacircndegas e dos Imshypostos Especiais sobre o consumo ou seus substitutos legais sem possibilidade de delegaccedilatildeo

4 Os actos praticados ao abrigo da competecircncia definida no nuacutemero anterior satildeo susceptiacuteveis de recurso judicial o qual teraacute efeito suspensivo nas situaccedilotildees previstas no n 2

5 Nos casos de deferimento do recurso previsto no nuacutemero anterior os elementos de prova entretanto obtidos natildeo podem ser utilizados para qualquer efeito em desfavor do contribuinte

6 As entidades que se encontrem numa relaccedilatildeo de domiacutenio com o contribuinte ficam sujeitas aos regimes de acesso agrave inforshymaccedilatildeo bancaacuteria referidos nos n 1 e 2

7 O acesso da administraccedilatildeo tributaacuteria a informaccedilatildeo banshycaacuteria relevante relativa a familiares ou terceiros que se encontrem numa relaccedilatildeo especial com o contribuinte depende de autorizashyccedilatildeo judicial expressa apoacutes audiccedilatildeo do visado obedecendo aos requisitos previstos no n 3

8 O regime previsto nos nuacutemeros anteriores natildeo prejudica a legislaccedilatildeo aplicaacutevel aos casos de investigaccedilatildeo por infracccedilatildeo peshynal e soacute pode ter por objecto operaccedilotildees e movimentos bancaacuterios realizados apoacutes a sua entrada em vigor sem prejuiacutezo do regime vigente para as situaccedilotildees anteriores

9 Os actos praticados ao abrigo da competecircncia prevista no n I devem ser objecto de comunicaccedilatildeo ao Defensor do Contrimiddot buinte

10 Para os efeitos desta lei considera-se documento bancaacuteshyrio qualquer documento ou registo independentemente do resshypectivo suporte em que se titulem comprovem ou registem opeshyraccedilotildees praticadas por instituiccedilotildees de creacutedito ou sociedades finanshyceiras no acircmbito da respectiva actividade incluindo os referentes a operaccedilotildees realizadas mediante utilizaccedilatildeo de cartotildees de creacutedito (coacutepia anexa)

Parece evidente destarte que todo o mundo civilizado abandonou a possibilidade de opor-se agrave Administraccedilatildeo Tributaacuteria o sigilo bancaacuterio

240 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

4 O sigilo bancaacuterio e o direito agrave intimidade e agrave privacidade das pessoas

A anaacutelise do sigilo bancaacuterio em face do direito agrave intimidade e agrave privacidashyde exige inicialmente que seja enfrentada a questatildeo referente ao seu conceito

Os doutrinadores natildeo tecircm assumido posiccedilatildeo uniforme quanto aos asshypectos conceituais dessa entidade juriacutedica

Seacutergio Carlos Covello autor da obra jaacute mencionada (O Sigilo Bancaacuterio Leud S Paulo 1991 p 69) entende que sigilo bancaacuterio eacute a obrigaccedilatildeo que tecircm os Bancos de natildeo revelar salvo justa causa as informaccedilotildees que venham a obter em virtude de sua atividade profissional

Luiz Fernando Bellinetti no artigo intitulado Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio (Revista do Direito do Consumidor Satildeo Paulo RT 1996 voI 18 p 144) defende posiccedilatildeo no sentido de que sigilo bancaacuterio eacute o dever juriacutedico que tecircm as instituiccedilotildees de creacutedito e as organizaccedilotildees auxiliares e seus empregados de natildeo revelar salvo justa causa as informaccedilotildees que venham a obter em virtushyde da atividade bancaacuteria a que se dedicam

Para Arnoldo Wald (in O Sigilo Bancaacuterio no Projeto de Lei Complemenshytar n 70 Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas n I pp 196209) o sigilo bancaacuterio se enquadra no conceito mais amplo do segredo profissional que tem merecido uma proteccedilatildeo mais ampla ensejando sua violaccedilatildeo caracterizaccedilatildeo como crime (art 154 do Coacutedigo PeshynaI)

Eivany A Silva tratando do tema em Consideraccedilotildees a Respeito do Sigilo de Dados (artigo publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio n 61 pp 41142 - Edit Dialeacutetica) afirma que o sigilo bancaacuterio eacute espeacutecie do gecircnero sigilo de dados constituindo um direito fundamental protegido constitucionalmente inserto que estaacute no rol dos direitos e garantias individuais ou seja em claacuteusushylas peacutetreas da Carta Magna natildeo podendo portanto ser modificado nem messhymo por emenda agrave Constituiccedilatildeo e portanto muito menos por legislaccedilatildeo de hierarquia inferior

Como examinado haacute divergecircncias na fixaccedilatildeo do conceito Essas divershygecircncias embora importantes para as posiccedilotildees doutrinaacuterias a serem assumishydas sobre o alcance do sigilo bancaacuterio natildeo geram contudo influecircncias de maior intensidade no relacionamento entre a instituiccedilatildeo financeira e os seus depositantes Isso porque o que merece ser considerado eacute a natureza juriacutedica do sigilo bancaacuterio isto eacute a que categoria de direito pertence e como por quem e quando a sua quebra pode ser determinada

Em face do exposto necessaacuterio eacute que se faccedila o alinhamento das teorias que procuram fundamentar o sigilo bancaacuterio

A doutrina em eacutepocas diversas examinou as seguintes teorias

ENSAIOS JURiacuteDICOS 241

Teoria contratualista O sigilo bancaacuterio de acordo com essa teoria deshycorre da relaccedilatildeo contratual que voluntariamente eacute formada entre o banco e o cliente por via da qual mesmo sem claacuteusula expressa a instituiccedilatildeo financeira assume a obrigaccedilatildeo de guardar segredo das movimentaccedilotildees de dinheiro que nela satildeo feitas Essa responsabilidade assumida pelo banco inspira-se segunshydo os adeptos da teoria em destaque nos usos nos costumes e na boa-feacute sempre aplicaacuteveis na intepretaccedilatildeo dos contratos comerciais7bull

Teoria do direito agrave privacidade Os adeptos dessa corrente afirmam que o sigilo bancaacuterio integra o campo do direito agrave privacidade que faz parte dos direitos da personalidade

Teoria consuetudinaacuteria Segundo os seguidores dessa linha de pensar o sigilo bancaacuterio decorre dos compromissos taacutecitos assumidos entre instituishyccedilotildees financeiras e seus clientes no sentido de natildeo serem levados ao conhecishymento de terceiros os valores transacionados O uso reiterado dessa praacutetica apoiada no elemento confianccedila passou a representar costume adotado nesse tipo de negoacutecio juriacutedico

Teoria da boa-feacute A adoccedilatildeo dessa teoria conduz o inteacuterprete a entender que o sigilo bancaacuterio por sua proacutepria natureza estaacute vinculado ao caraacuteter fiduciaacuterio da atividade bancaacuteria fundando-se portanto na boa-feacute ou dever de lisura que tanto marca o tipo de negoacutecio juriacutedico firmado

Teoria do sigilo profissional Essa teoria concebe o sigilo bancaacuterio como sendo uma espeacutecie do sigilo profissional Haacute portanto um dever eacutetico do banshyco em respeitar o sigilo bancaacuterio em decorrecircncia da profissatildeo exercida

Teoria do direito agrave intimidade dos bancos Os integrantes dessa forma de pensar sustentam que a instituiccedilatildeo financeira tem legiacutetimo interesse de afastar do conhecimento de terceiros a movimentaccedilatildeo financeira dos seus clientes e consequumlentemente dos fatos com elas relacionados

Teoria da complexidade do viacutenculo Essa teoria eacute explicada por Arnoldo Wald no trabalho jaacute citado da forma seguinte A doutrina moderna abandoshynou a noccedilatildeo da relaccedilatildeo juriacutedica contratual defendo a complexidade do viacutenshyculo Aleacutem dos direitos e das obrigaccedilotildees principais existem deveres secundaacuteshyrios para ambos os contratantes que decorrem da regra geral da boa-feacute denoshyminada na doutrina italiana de cOITeteza e na legislaccedilatildeo alematilde de Treu und Glauben Exige que a atuaccedilatildeo de uma parte natildeo cause danos agrave esfera juriacutedica da outra Dentro desta ideacuteia defende-se que o segredo bancaacuterio eacute um dever

7 Arnoldo Wald em Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais artigo publicado na Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas n 22 pp 1518 manifesta entendimento de que no campo normatIacutevo do Direito brasileiro esta teoria encontra respaldo nos arts 130 e 131 do Coacutedigo Comercial que prevecirc a interpretaccedilatildeo dos contratos segundo os usos os costumes e a boa-feacute

242 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

acessoacuterio na relaccedilatildeo juriacutedica Mesmo que natildeo nasccedila o contrato entre as partes a boa-feacute objetiva impede que a instituiccedilatildeo financeira prejudique os interesses do cidadatildeo

Estabelecidos os pressupostos doutrinaacuterios acima examinamos agora se o sigilo bancaacuterio diz respeito agrave intimidade e agrave privacidade das pessoas

A Constituiccedilatildeo Federal em seu artigo 5ordm incisos X e XII afirma

Art 5ordm Todos satildeo iguais perante a lei sem distinccedilatildeo de qualquer natureza garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Paiacutes a inviolabilidade do direito agrave vida agrave liberdade agrave igualdade agrave segushyranccedila e agrave propriedade nos termos seguintes

X - satildeo inviolaacuteveis a intimidade a vida privada a honra e a imagem das pessoas assegurado o direito agrave indenizaccedilatildeo pelo dano material ou moral decorrente de sua violaccedilatildeo

XJl - eacute inviolaacutevel o sigilo da correspondecircncia e das comunicaccedilotildees telegraacuteficas de dados e das comunicaccedilotildees telefocircnicas salvo no uacuteltimo caso por ordem judicial nas hipoacuteteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigaccedilatildeo criminal ou instruccedilatildeo processual penal

Essas garantias constitucionais protegem o cidadatildeo de qualquer investida de terceiros em sua intimidade em sua vida privada e no sigilo de seus dados

Na expressatildeo terceiros estaacute incluiacutedo o Estado e consequumlentemente seus agentes poliacuteticos e administrativos

A doutrina tem se manifestado de modo quase unacircnime no sentido de que o sigilo bancaacuterio eacute uma garantia constitucional que protege a privacidade das pessoas no campo econocircmico e financeiro A sua significaccedilatildeo eacute de natildeo tornar puacuteblica a movimentaccedilatildeo da conta bancaacuteria e das aplicaccedilotildees financeiras do cidadatildeo para que de nenhum modo os atos privados praticados possam ser tornados puacuteblicos

Esse posicionamento eacute o adotado pelos autores que passo a citar

Arnoldo Wald (O Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais artigo pushyblicado na Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas RT n 22 pp 1521)

O sigilo bancaacuterio eacute o meio para resguardar a privacidade no camshypo econocircmico pois veda a publicidade sobre a movimentaccedilatildeo da conta corrente bancaacuteria e das aplicaccedilotildees financeiras

ENSAIOS JURiacuteDICOS 243

Eivany A Silva (Consideraccedilotildees a Respeito do Sigilo de Dados artigo publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio n 61 Satildeo Paulo Editora Dialeacutetica p27)

A maioria dos ordenamentos juriacutedicos como o brasileiro tratam o sigilo bancaacuterio como direito fundamental do contribuinte agrave privacidashyde ou seja agrave resistecircncia agrave comunicaccedilatildeo de dados que representem desshydobramento da personalidade da pessoa direito agrave oposiccedilatildeo e agrave negaccedilatildeo de comunicaccedilatildeo

Ives Gandra da Silva Martins (Sigilo Bancaacuterio trabalho publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio S Paulo Editora Dialeacutetica n 1 pp 24 e 25)

Pelos incisos X e XII do artigo 5ordm tem o contribuinte o direito de preservaccedilatildeo de sua intimidade de sua privacidade e de que terceiros que detenham informaccedilotildees pessoais suas sejam obrigados a guardaacute-Ias

Natildeo pode pois a fiscalizaccedilatildeo exigir de terceiros informaccedilotildees que apenas pode obter do proacuteprio contribuinte

Em determinadas hipoacuteteses todavia o interesse puacuteblico haacute de preshyvalecer sobre o interesse individual mas caberaacute a um outro poder definir se tais hipoacuteteses efetivamente ocorrem com o que poderaacute o Poder Judishyciaacuterio autorizar se convencido estiver o magistrado de que a hipoacutetese eacute de gravidade e de lesatildeo ao interesse puacuteblico a quebra do direito ao sigilo bancaacuterio

Estou convencido ser esta a melhor conformaccedilatildeo juriacutedica da quesshytatildeo idealizada pelos constituintes defendida pela doutrina e consagrashyda na jurisprudecircncia corrente exegeacutetica esta a que me filio desde os meus primeiros escritos sobre a mateacuteria

Roberto Quiroga Mosquera (Tributaccedilatildeo no Mercado Financeiro e de Capitais obra publicada pela Editora Dialeacutetica Satildeo Paulo 1998 pp 70171)

Do exposto ateacute aqui eacute evidente que o direito ao sigilo bancaacuterio representa uma espeacutecie de direito agrave privacidade

Eacute incontroverso que os dados e informaccedilotildees de natureza bancaacuteria dizem respeito agrave intimidade e agrave vida privada dos cidadatildeos Dados que dizem respeito aos valores em dinheiro depositados em contas-correnshytes bancaacuterias tipos e caracteriacutesticas de aplicaccedilotildees financeiras ganhos e prejuiacutezos auferidos ou incorridos em operaccedilotildees bursaacuteteis etc satildeo sem sombra de duacutevida elementos particulares e pessoais de qualquer indiviacuteshyduo

244 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Utilizando outra voz informaccedilotildees que tocam no aspecto financeishyro do ser humano representam direito iacutentimo e personaliacutessimo devendo ser mantidas em sigilo por aqueles que eventualmente as detenham em razatildeo de sua atividade profissional Parece-nos que tal conclusatildeo eacute de uma clareza inconteste

Natildeo tem sido outra a posiccedilatildeo da doutrina mais abalizada do Paiacutes e da jurisprudecircncia dominante

o autor referido a seguir faz a observaccedilatildeo seguinte

Carlos Alberto Hagstrom (Sigilo Bancaacuterio Novas Questotildees Reshyvista de Direito Mercantil Satildeo Paulo Malheiros 1997 vaI 105 pp 4344) expotildee que apesar de existirem diversas teorias que procuram fundashymentar juridicamente o sigilo bancaacuterio modernamente a explicaccedilatildeo para o fundamento do referido instituto sofreu uma radical alteraccedilatildeo Divershysas constituiccedilotildees modernas esclarece o mencionado autor ampliaram e explicitaram o elenco de direitos e garantias individuais passando a garantir o direito agrave privacidade e agrave intimidade A Constituiccedilatildeo brasileira natildeo trilha caminho diferente Assegurou referidos direitos de forma exshypressa e sem restriccedilotildees O tema do sigilo bancaacuterio figura agora em niacutevel constitucional Tem status de norma superior no qual se reconhece o direito agrave intimidade como norma de caraacuteter geneacuterico em que estatildeo conshytemplados muacuteltiplos aspectos da vida privada em especial os de ordem econocircmico-financeira que compotildeem o que Hagstrom denominou a inshytimidade econocircmica ou intimidade patrimonial

Luiacutes Fernando 8ellinetti (Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio artigo publicado na Revista de Direito do Consumidor n 18 pp 141151)

Como jaacute dissemos anteriormente em certas hipoacuteteses o fundashymento para o segredo bancaacuterio seria a privacidade No entanto nesses casos o que se protege eacute a privacidade e natildeo propriamente o sigilo

Entendemos que uma coisa eacute garantir-se a privacidade da pessoa com fundamento em norma constitucional outra eacute garantir-se o segreshydo de informaccedilotildees bancaacuterias de uma pessoa com base na legislaccedilatildeo supramencionada

Sempre que a revelaccedilatildeo de informaccedilotildees bancaacuterias puder violar a privacidade da pessoa parece-nos que mais do que garantia ao sigilo bancaacuterio (com fundamento legal) tem a pessoa garantia agrave sua privacishydade (com fundamento constitucional)

ENSAIOS JURiacuteDICOS 245

No entanto se a revelaccedilatildeo da informaccedilatildeo natildeo invadir a esfera da intimidade da pessoa sua garantia eacute meramente legal do sigilo bancaacuterio

Carlos Maacuterio Velloso (citado por Misabel Derzi em Direito Tributaacuterio Aplicado obra publicada pela Editora Del Rey Belo Horizonte MO pp 278 e 279)

O sigilo bancaacuterio decorre do direito agrave privacidade inerente agrave pershysonalidade das pessoas consagrado na Constituiccedilatildeo Federal em seu art 5ordm X e protege tanto interesses privados como finalidades de ordem puacuteblica a saber o sistema de creacutedito O sigilo bancaacuterio natildeo eacute um princiacuteshypio absoluto

As exceccedilotildees ao sigilo bancaacuterio estatildeo previstas na Lei n 45951964 que continua em vigor

O Poder Judiciaacuterio pode requisitar relativamente a pessoas e instishytuiccedilotildees informaccedilotildees que implicam quebra de sigilo (Lei n 45951964 art 38 sect 1 ordm) entretanto mesmo havendo inqueacuterito policial instaurado deveraacute proceder com cautela prudecircncia e moderaccedilatildeo inerentes agrave mashygistratura

Luciana Fregodolli (O Direito agrave Intimidade - excerto da dissertaccedilatildeo que apresentou sob o tiacutetulo O Direito agrave Intimidade e a Prova Iliacutecita publicado pela Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Constitucional e Ciecircncia Poliacutetica -n 19 p 233)

O sigilo bancaacuterio protege interesses privados Eacute ele espeacutecie de direito agrave privacidade inerente agrave personalidade das pessoas e que a Consshytituiccedilatildeo Federal consagra no art 5ordm X aleacutem de atender a uma finalidade de ordem puacuteblica qual seja a de proteccedilatildeo ao sistema de creacutedito

O direito agrave privacidade abrange atualmente o de impedir que tershyceiros inclusive o Estado e o Fisco tenham acesso a informaccedilotildees sobre o que se denominou a aacuterea de manifestaccedilatildeo existencial do ser humano

Celso Ribeiro Bastos O pensamento de Celso Ribeiro Bastos foi exshyposto por Roberto Quiroga Mosquera na obra jaacute referida p 71 do modo seguinte

Celso Bastos eacute do mesmo pensar Apoacutes tecer consideraccedilotildees introdutoacuterias acerca do sigilo bancaacuterio e expor pensamentos de divershysos autores nacionais e alieniacutegenas conclui o constitucionalista brasileishyro no sentido de que todas as despesas ordinaacuterias feitas pelo cidadatildeo

246 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

comum em sua vida cotidiana devem ser consideradas parte de sua vida privada familiar ou domeacutestica e portanto protegidas contra interferecircnshycias a despeito de qualquer pretexto Desde as condutas mais corriqueishyras como as compras efetuadas em um supermercado para manutenshyccedilatildeo da famiacutelia quanto aquelas outras moralmente reprovaacuteveis como presentes ou joacuteias compradas e dadas a quem presta ao homem servishyccedilos de natureza extraconjugal tudo estaacute abarcado pelo manto da proteshyccedilatildeo agrave vida privada familiar ou domeacutestica ( ) E mais adiante arremata Hoje praticamente a vida do homem pode ser escrita a partir de seu talatildeo de cheques e nas sociedades mais avanccediladas pelos cartotildees de creacutedito e magneacuteticos Permitir-se que o sigilo bancaacuterio venha a ser romshypido por qualquer forma natildeo-extraordinaacuteria para salvaguarda de inteshyresse de porte no miacutenimo idecircntico eacute expor a seguranccedila individual a um constante e absurdo temor perante as possibilidades de controle direto ou pelo vazamento de alguma informaccedilatildeo

Haacute contudo corrente contraacuteria como passaremos a demonstrar

Andreacute Serratildeo Borges de Sampaio Consultor da Uniatildeo nas informashyccedilotildees prestadas ao Advogado-Geral da Uniatildeo sobre a ADIn n 2397 cita trechos de doutrina e jurisprudecircncia estrangeiras defendendo o entendimento de que o sigilo bancaacuterio natildeo tem conotaccedilatildeo de direito de privacidade Eis o que escreshyveu o parecerista citado

O jurista portuguecircs J L Saldanha Sanches coteja primorosashymente o sigilo bancaacuterio com a proteccedilatildeo da intimidade para concluir que natildeo haacute que se falar em direito ao sigilo bancaacuterio como concretizaccedilatildeo do direito agrave intimidade Nas suas palavras

Ora em que esfera podemos noacutes incluir o segredo bancaacuteshyrio enquanto instituto que concretiza certos valores do ordenashymento juriacutedico Como expressatildeo de interesses juridicamente tuteshylados

Seraacute o segredo bancaacuterio um prolongamento do direito agrave inshytimidade da esfera pessoal e familiar de uma qualquer pessoa sinshygular (uma vez que em relaccedilatildeo agraves pessoas coletivas a questatildeo natildeo pode mesmo ser colocada) Ou diraacute antes respeito aquela faixa mais larga que resguarda a privacidade de qualquer cidadatildeo e que soacute pode por isso sofrer qualquer intromissatildeo se surgirem razotildees vaacutelidas para que tal direito seja restringido

Ao afirmar-se que na perspectiva dos clientes dos bancos o segredo bancaacuterio eacute um direito com a reserva da sua vida privada temos uma primeira resposta para esta questatildeo

ENSAIOS JURiacuteDICOS 247

Mas falta distinguir entre intimidade e reserva da vida privashyda e entre clientes individuais e profissionais de um banco Natildeo estamos perante o mesmo tipo de tutela quando contamos que um particular espera que o banco natildeo divulgue a qualquer inteshyressado o volume da sua conta bancaacuteria (porque pura e simplesshymente quer manter sob reserva a sua vida particular) ou quando um comerciante confia no banco para que este natildeo revele quem satildeo os seus clientes fornecedores ou qual eacute o seu grau de endividamento

No caso da pessoa singular estaacute apenas em causa um conshyjunto de valores de natureza moral esta natildeo estaacute em princiacutepio preocupada com possiacuteveis prejuiacutezos econocircmicos ligados a qualshyquer divulgaccedilatildeo Apenas se opotildee por razotildees do seu foro pessoal e que natildeo carecem de fundamentaccedilatildeo que esta tenha lugar

Enquanto que o comerciante pode ser seriamente prejudishycado em termos concorrenciais com a revelaccedilatildeo da lista dos seus clientes ou com a sua situaccedilatildeo financeira

O dever de reserva que cabe ao banqueiro estaacute desta forma a serviccedilo do interesse comercial das empresas suas clientes - que pelo simples facto de o serem ou por necessitarem de obter creacutedishyto lhe datildeo informaccedilotildees com um forte valor comercial ou da pesshysoa singular que deseja manter a privacidade da sua situaccedilatildeo patrimonial

Ou em alternativa ao serviccedilo da manutenccedilatildeo da privacidashyde que qualquer um pode desejar ainda que a possiacutevel violaccedilatildeo desta apenas lhe possa acarretar danos natildeo-patrimoniais

E por isso o segredo bancaacuterio natildeo pode constituir a expresshysatildeo do imperativo constitucional da proteccedilatildeo da intimidade Ateacute porque o acesso a essa esfera estaacute vedado aos proacuteprios bancos

Natildeo nos parece aceitaacutevel que um banco como condiccedilatildeo para a concessatildeo de creacutedito a uma pessoa singular ou para estashybelecer com ela qualquer relaccedilatildeo contratual possa exigir desta informaccedilatildeo de tipo estritamente pessoal ou a sujeiccedilatildeo a exames meacutedicos que atingindo a sua esfera iacutentima afectam a sua dignidashyde Aqui estaacute em causa a ilicitude da pergunta por pressupor o acesso agrave esfera inviolaacutevel (e indisponiacutevel) da intimidade

A informaccedilatildeo que o banco pode obter para a defesa dos seus interesses legiacutetimos natildeo pode ir aleacutem da esfera patrimonial do seu cliente rendimentos bens possuiacutedos perspectivas profisshysionais

( )

248 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

Podemos pois concluir que o segredo bancaacuterio natildeo eacute natildeo pode ser uma concretizaccedilatildeo do princiacutepio constitucional do direishyto agrave intimidade

Este princiacutepio tem como funccedilatildeo consagrar uma zona de reshyselVa pessoal para factos opccedilotildees e circunstacircncias que soacute de forshyma indirecta e de todo secundaacuteria podem ter aspectos ou refleshyxos de natureza patrimonial (Saldanha Sanches J L Segredo Bancaacuterio e Tributaccedilatildeo do Lucro Real In Saldanha Sanches J L Estudos de Direito Contabiliacutestico e Fiscal Coimbra Coimbra Edishytora 2000 pp 105108)

Em diversos paiacuteses haacute a clara percepccedilatildeo que natildeo haacute que se conshyfundir direito agrave intimidade com sigilo bancaacuterio indicando que a quebra do sigilo pela Administraccedilatildeo Tributaacuteria natildeo constitui violaccedilatildeo ao direito Ao contraacuterio a existecircncia de um Estado Fiscal implica na necessidade de consagrar agrave administraccedilatildeo tributaacuteria tal faculdade o que se harmonishyza com diversos princiacutepios e outros direitos fundamentais constantes da Carta de 1988

O caso espanhol eacute exemplar neste sentido ao natildeo visualizar a vioshylaccedilatildeo ao direito agrave intimidade em relaccedilatildeo agrave quebra do sigilo bancaacuterio Portanto

el Tribunal Constitucional espaflOl se ha pronunciado por la negativa de que el conocimiento de las cuentas bancarias por la Administracioacuten pueda invadir el aacutembito constitucionalmente garantizado de la intimidad de los individuos porque tales extractos no constituyen per se uma biografiacutea personal en nuacutemeros y en siacute no tiene relevancia para la intimidad personal y familiar dei contribuyente ya que se trata de dados no secretos y confiados a una entidad (Campos Laura Rodriacuteguez Oerechos dei Contribuyente em la Repuacuteblica Argentina ai Amparo de la Convencioacuten Interamericana de Oerechos Humanos http wwwiefpaorgarcriteriosdigitalarticulosderechoshtm Visitado em 512001)

Ao analisar a jurisprudecircncia da Corte Constitucional espanhola quanto ao tema tambeacutem ressalta Saldanha Sanches

Na apreciaccedilatildeo da constitucionalidade da lei que permitia o controle administrativo das contas bancaacuterias o Tribunal Constitushycional espanhol realizou uma distinccedilatildeo entre intimidade pessoal e familiar e a intimidade econoacutemica onde a proteccedilatildeo constitucional eacute menos intensa

ENSAIOS JURiacuteDICOS 249

E procura fazer uma distinccedilatildeo entre a violaccedilatildeo agrave intimidade como consequumlecircncia de uma anaacutelise das contas bancaacuterias - coloshycando a hipoacutetese de uma recusa de cooperaccedilatildeo por parte do conshytribuinte se tal eventualidade se verificar - e a violaccedilatildeo directa da intimidade uma vez que esta natildeo pode resultar de uma mera anaacuteshylise de movimentos bancaacuterios (Saldanha Sanches J L A Situashyccedilatildeo Actual do Sigilo Bancaacuterio a Singularidade do Regime Portushyguecircs In Saldanha Sanches J L Estudos de Direito Contabiliacutestico e Fiscal Coimbra Coimbra Editora 2000 p 91)

Outro comentarista ao analisar a situaccedilatildeo do sistema espanhol quanto ao sigilo bancaacuterio e o direito agrave intimidade fez questatildeo de ressaltar

Seguacuten el r c frente a la Hacienda Puacuteblica no existe el derecho a la intimidad deI art 18 CE Ya la LO de 5 de mayo deI 82 vada praacutecticamente de contenido constitucional el derecho a la intimidado en cuanto el aacutembito de eacutesta queda deferido a la ley ordinaria (a 2ordm) y en cuanto que la esfera protegida frente a las Administraciones se reduce a poco O nada ai no reputarse intromisiones ilegiacutetimas las actuaciones autorizadas o acordadas por la Autoridad competente de acuerdo con la Ley (art 8ordm 1)

La LGTy el RI Iimiacutetan la esfera de la intimidad en las relacishyones con la Hacienda hasta el extremo de que solamenle existe un refugio limitado en el aacutembito deI secreto profesional en los casos de informacioacuten sobre terceros y siempre que no se trate de datos con transcendencia econoacutemica o tributaria EI rc no ha enconshytrado hasta el momento ni un solo supuesto de dato o informacioacuten econocircmica con transcendencia tributaria que limite la accioacuten inquisitiva de la Administracioacuten tributaria por razoacuten de intimidado Bien puede decirse por tanto que frente a la Administraciocircn tribushytaria en cuanto se trata deI ejercicio de su funciocircn de buacutesqueda de datos con transcendencia tributaria el derecho a la intimidad personal y familiar (art 18 I CE) no existe

La biacuteblia deI tribunal a estos efeclos estaacute constituida por la S 11084 reiterada en numerosas ocasiones ampliada en el Auto 64286 y reafirmada por ejemplo en la S 26 abril 90 tantas veces citada (FJ 10deg) Seguacuten esa doctrina la distribucioacutenjusta de la carshyga fiscal prevalece sobre el derecho a la intimidad parte dei art 812 I de la LO seguacuten el cual frente a la Ley (ordinaria) no hay intimidad protegida siempre que haya en dicha ley imperativos de intereacutes puacuteblico ( ) ni siquiera se habla dei predomiacutenio frente a la

250 SUPERIOR TRIBUNAl DE JUSTiCcedilA

intimidad de intereses u objetivos constitucionalmente protegidos Soacuteo admite que la actuadoacuten administrativa es arbitraria cuando no parezcajustificada por la Finalidad de la inspeccioacuten es decir cuando se trate de datos o informaciones que carezcan de transcendencia tributaria pero eacuteste obviamente no es sin Umite derivado dei derecho a la intimidad sino de la interdiccioacuten de arbitrariedad o desviacioacuten de poder de la Administracioacuten de la necesidad de ajuste de toda Administracioacuten ai acircmbito de su competencia que tanto vale para datos iacutentimos como para otros que no lo sean Seguacuten la S 11084 no hay esfera de intimidad proshytegida frente a una Administracioacuten tributaria amparada en una norma que elimina la intimidad como liacutemite (Garciacutea AIacuteloveros Jaime Una Nueva Ley General Tributaria Problemas Constitucioshynales In Kirchhof P et aI Garantiacuteas Constitucionales dei Contribuyente Valencia Tirant lo Blanch 1999 pp 109110)

Diante de tudo quanto foi exposto tendo-se o cuidado de registrar posicionamento de diferentes autores nacionais e estrangeiros haacute ambiente preparado para ser respondido o primeiro questionamento desdobrado em trecircs partes formulado para o 1II Coloacutequio Internacional de Direito Tributaacuterio promoccedilatildeo do Centro de Extensatildeo Universitaacuteria Eis a primeira parte do seu teor

O sigilo bancaacuterio diz respeito agrave intimidade e privacidade das pessoas

A resposta eacute optando por convencimento influenciado pelas ideacuteias da corrente predominante positiva

O nosso entendimento eacute no sentido de que o direito agrave intimidade integra os direitos da personalidade e visam proteger o direito agrave inviolabilidade do domiciacutelio da correspondecircncia das comunicaccedilotildees de quaisquer espeacutecies dos dados pessoais computadorizados do sigilo bancaacuterio O mesmo acontece com o direito agrave privacidade

A expansatildeo da proteccedilatildeo do direito agrave intimidade e agrave privacidade eacute uma consequumlecircncia da evoluccedilatildeo da era contemporacircnea nos setores tecnoloacutegicos e da instabilidade que passam as instituiccedilotildees estatais especialmente a encarreshygada de arrecadar tributos Haacute o reconhecimento de que desenvolve-se um processo de aguda corrosatildeo na proteccedilatildeo agrave intimidade que ao ser violada provoca a publicizaccedilatildeo das condutas mais iacutentimas do cidadatildeo

A concepccedilatildeo do sigilo bancaacuterio no acircmbito do direito agrave intimidade e agrave privacidade visa garantir ao homem o miacutenimo capaz para que lhe seja asseshygurada a sua condiccedilatildeo humana protegendo-o de ingerecircncias alheias como apregoa a Conferecircncia Noacuterdica sobre o Direito agrave Intimidade realizada em Estoshycolmo na data de maio de 1967 ao fazer inserir no documento que publicou a seguinte definiccedilatildeo O direito agrave intimidade eacute o direito do homem de viver de forma independente a sua vida com um miacutenimo de ingerecircncia alheia

ENSAIOS JURiacuteDICOS 251

5 Seguranccedila juriacutedica e acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias

A segunda pergunta apresentada pelos organizadores do coloacutequio estaacute assim posta

A seguranccedila das relaccedilotildees juriacutedicas atraveacutes do Sistema Financeiro pode ser afetada pelo acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves inforshymaccedilotildees bancaacuterias

O acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias se realizado caracteriza um atentado de suma gravidade aos direishytos do cidadatildeo Eacute um ataque aos princiacutepios sustentadores do sistema demoshycraacutetico adotado pelo constituinte de 1988 especialmente quando detonou que a Repuacuteblica Federativa do Brasil tem como objetivo fundamental o respeishyto agrave dignidade humana e agrave cidadania

Do ordenamento juriacutedico brasileiro a meu pensar natildeo haacute lugar para brotar qualquer interpretaccedilatildeo que conclua pela possibilidade de qualquer agenshyte do Poder Puacuteblico acessar de modo generalizado e sem motivaccedilatildeo informashyccedilotildees bancaacuterias do cidadatildeo mesmo com autorizaccedilatildeo judicial

Esclareccedilo desde logo que natildeo comungo com o pensamento de detershyminada corrente no sentido de ser absoluto o direito ao sigilo bancaacuterio Tenho-o como relativo poreacutem vinculado aos princiacutepios da razoabilidade da moralidade da legalidade e da motivaccedilatildeo expliacutecita e detalhada sob pena de ser impossiacutevel a sua quebra

O acesso indiscriminado do agente fiscal agraves informaccedilotildees bancaacuterias do cidadatildeo gera uma quebra da seguranccedila das relaccedilotildees juriacutedicas por um terceiro passar a ter sem causa justificadora conhecimento da vida iacutentima de algueacutem submetendo-o a partir daiacute a um regime de submissatildeo Por outro lado ninshygueacutem poderaacute garantir nem o proacuteprio Estado que o agente puacuteblico utilize os dados que chegaram ao seu conhecimento para outros intentos que natildeo o exclusivamente fiscal

Lembra Arnoldo Wald que O segredo na atividade bancaacuteria envolve concomitantemente interesses privaqos e coletivos que podem ser analisashydos sob trecircs acircngulos o interesse do cliente na sua relaccedilatildeo com a instituiccedilatildeo financeira o interesse do banco em atuar com discriccedilatildeo para ganhar a conshyfianccedila da populaccedilatildeo e captar recursos e o interesse social na existecircncia de um bom e eficiente sistema bancaacuterio Por estarem ligadas ao desenvolvimento da economia e aos interesses da comunidade as relaccedilotildees que envolvem as instishytuiccedilotildees financeiras natildeo recebem o mesmo tratamento juriacutedico dispendido a outras relaccedilotildees comerciais Inviaacutevel a aplicaccedilatildeo exclusiva das regras de Direito Privado as quais tecircm como princiacutepio norteador a autonomia da vontade pois

252 SUPERIOR TRIBUNAl DE JUSTiCcedilA

esta encontra limites nas normas cogentes proacuteprias do direito bancaacuterio e na intervenccedilatildeo do Estado8

A seguranccedila juriacutedica desse tipo de relaccedilatildeo envolve tambeacutem a manutenshyccedilatildeo do segredo das movimentaccedilotildees financeiras do contribuinte

Imprimir-se a mais ampla seguranccedila nas relaccedilotildees do Sistema Financeiro eacute fortalececirc-lo O Estado tem o dever de zelar por esse estado de seguranccedila natildeo permitindo consequumlentemente que o sigilo bancaacuterio seja quebrado pelo acesshyso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico por esse comportamento afeshytar a confiabilidade no sistema

Eacute de todo inconveniente permitir a possibilidade de um atuar do agente fiscal sem controle na quebra do sigilo bancaacuterio por afetar diretamente a seshyguranccedila da relaccedilatildeo juriacutedica firmada entre a instituiccedilatildeo financeira e o seu clienshyte em face deste sentir-se atingido pela accedilatildeo fiscal que passa a tomar conhecishymento de sua intimidade financeira e de fatos de sua vida privada sem o resshypaldo do Poder Judiciaacuterio

A seguranccedila juriacutedica nesse tipo de relaccedilatildeo deve assegurar impossibilidashyde de abuso de poder por parte do Fisco em face da necessidade de ser resshyguardada a garantia de que em um Estado de Direito natildeo pode ser concebido que conceda-se a uma parte mesmo que seja o Estado o domiacutenio absoluto de apanhar as provas que iraacute utilizar em caso de litiacutegio contra algueacutem

O acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias do contribuinte aleacutem de afetar a seguranccedila juriacutedica da relaccedilatildeo em questatildeo promove um desequiliacutebro entre o cidadatildeo-contribuinte e o Fisco por caracterizar coaccedilatildeo que coloca aquele em posiccedilatildeo de inferioridade

A valorizaccedilatildeo da seguranccedila juriacutedica da relaccedilatildeo existente entre instituiccedilatildeo financeira e contribuinte pelo Fisco natildeo quebrando o seu sigilo fiscal sem autorizaccedilatildeo judicial constitui causa de aplicaccedilatildeo de Justiccedila fiscal O seguimenshyto de seus princiacutepios valoriza o regime democraacutetico do qual ela faz parte

6 Casos de admissibilidade da quebra do sigilo bancaacuterio

Os casos de admissibilidade da quebra do sigilo bancaacuterio estatildeo na atuashylidade descritos no nosso ordenamento juriacutedico positivo

A Lei Complementar n 105 de 10 de janeiro de 2001 apoacutes determinar no art 112 de que as instituiccedilotildees financeiras conservaratildeo sigilo em suas operashyccedilotildees ativas e passivas e serviccedilos prestados dispotildee no sect 312 do mesmo artigo que

8 Arnoldo Wald no artigo Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais Revista dos Tribunais ano 6 n 22 janeiromiddotmarccedilo de 1998 n 22 Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas p 15

ENSAIOS JURiacuteDICOS 253

sect 3ordm Natildeo constitui violaccedilatildeo do dever de sigilo

I a troca de informaccedilotildees entre instituiccedilotildees financeiras para fins cadastrais inclusive por intermeacutedio de centrais de risco observadas as normas baixadas pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e pelo Banco Censhytral do Brasil

11 - o fornecimento de informaccedilotildees constantes de cadastro de emitentes de cheques sem provisatildeo de fundos e de devedores inadimplentes a entidades de proteccedilatildeo ao creacutedito observadas as norshymas baixadas pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e pelo Banco Central do Brasil

JJI - o fornecimento das informaccedilotildees de que trata o sect 2ordm do art II da Lei n 9311 de 24 de outubro de 1996

IV - a comunicaccedilatildeo agraves autoridades competentes da praacutetica de iliacutecitos penais ou administrativos abrangendo o fornecimento de inforshymaccedilotildees sobre operaccedilotildees que envolvam recursos provenientes de qualshyquer praacutetica criminosa

V - a revelaccedilatildeo de informaccedilotildees sigilosas com o consentimento expresso dos interessados

VI- a prestaccedilatildeo de informaccedilotildees nos termos e condiccedilotildees estabeleshycidos nos artigos 2ordm 3ordm 4ordm 5ordm 6ordm 7ordm e 9ordm desta lei complementar

sect 4ordm A quebra de sigilo poderaacute ser decretada quando necessaacuteria para apuraccedilatildeo de ocorrecircncia de qualquer iliacutecito em qualquer fase do inqueacuterito ou do processo judicial e especialmente nos seguintes crimes

I - de terrorismo

11 - de traacutefico iliacutecito de substacircncias entorpecentes ou drogas afins

III - de contrabando ou traacutefico de armas municcedilotildees ou material destinado a sua produccedilatildeo

IV - de extorsatildeo mediante sequumlestro

V - contra o sistema financeiro nacional

VI - contra a Administraccedilatildeo Puacuteblica

Vll- contra a ordem tributaacuteria e a previdecircncia social

VIII-lavagem de dinheiro ou ocultaccedilatildeo de bens direitos e valores

IX - praticado por organizaccedilatildeo criminosa

Como visto a lei complementar enumera inuacutemeras situaccedilotildees que indeshypendentemente de autorizaccedilatildeo judicial o sigilo bancaacuterio eacute quebrado

254 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

A dificuldade que se apresenta eacute a de conciliar os casos de quebra de sigilo bancaacuterio que a Lei Complementar n 105 autoriza com a garantia do direito agrave privacidade e agrave intimidade

Destaque-se entre os de maior relevacircncia os seguintes

- natildeo constituir violaccedilatildeo do dever de sigilo bancaacuterio a troca de informashyccedilotildees entre instituiccedilotildees financeiras para fins cadastrais inclusive por intermeacuteshydio de centrais de risco o que possibilita o conhecimento da vida financeira privada do cidadatildeo por vaacuterias pessoas sem desempenho de autoridade na instituiccedilatildeo independentemente de ser justificada com antecedecircncia a causa desse atuar

- o de serem fornecidos dados relativos a fornecimentos de informashyccedilotildees cadastrais de emitentes de cheques sem provisatildeo de fundos a entidades privadas de proteccedilatildeo ao creacutedito sem qualquer avaliaccedilatildeo por qualquer autorishydade da causa determinante do fato a quebra do sigilo bancaacuterio na fase do inqueacuterito por inexistir nessa ocasiaacuteo qualquer contraditoacuterio e respeito ao prinshyciacutepio do devido processo legal

Quanto agraves demais situaccedilotildees constantes na lei complementar que autorishyzam a quebra do sigilo bancaacuterio naacuteo obstante algumas serem absolutamente necessaacuterias haacute de serem vistas em compatibilidade com as garantias constitushycionais conforme jaacute assinalado

O colendo Supremo Tribunal pronunciaraacute como guarda e inteacuterprete maishyor da Carta Magna em ADln jaacute intentada sobre a constitucionalidade ou natildeo dos dispositivos supramencionados

Em campo doutrinaacuterio valoriza-se as posiccedilotildees apresentadas quando da resposta oferecida aos questionamentos anteriores todas acenando pela neshycessidade do controle do Poder Judiciaacuterio

7 Sistema mais justo para a quebra do sigilo bancaacuterio

Os organizadores do JII Coloacutequio Internacional de Direito Tributaacuterio subshymetem agora para anaacutelise a questatildeo do teor seguinte Um sistema em que o Poder Judiciaacuterio torna-se aacuterbitro dos pedidos da Administraccedilatildeo Puacuteblica para quebra do sigilo eacute o mais justo

Em um Estado que por imposiccedilatildeo de sua proacutepria Constituiccedilatildeo estaacute comprometido com a guarda e aplicaccedilatildeo efetiva de princiacutepios democraacuteticos especialmente o de respeitar os direitos e garantias fundamentais da cidadashynia natildeo haacute ambiente para que seja outorgado ao Poder Executivo por via da atuaccedilatildeo de agentes puacuteblicos fiscais o acesso sem o controle do Poder Judiciaacuteshyrio agraves informaccedilotildees bancaacuterias do contribuinte

ENSAIOS JURiacuteDICOS 255

o sigilo bancaacuterio por ser um direito fundamental que exige ser respeitashydo pela supremacia constitucional que o protege deve submeter a possibilishydade de sua quebra para fins tributaacuterios ao Poder Judiciaacuterio pela ausecircncia de interesse direto nos resultados da accedilatildeo fiscalizadora que eacute o recolhimento do tributo e pelas garantias de independecircncia prudecircncia e qualificaccedilatildeo juriacutedica que revestem esse poder

A atuaccedilatildeo da fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo pode ser exercida fora dos limishytes da legalidade imposta a partir da Carta Magna e demais imposiccedilotildees legais a ela subordinadas

Natildeo se desconhece que no atual Estado fiscal os tributos constituem os meios financeiros determinantes para o atendimento dos compromissos da Administraccedilatildeo Puacuteblica com as obrigaccedilotildees oriundas em decorrecircncia de sua atividade no campo educacional social de seguranccedila puacuteblica interna e extershyna da sauacutede da manutenccedilatildeo dos Poderes ou seja para manter funcionando a maacutequina estatal

Por natildeo entremostrar-se na eacutepoca contemporacircnea qualquer outra alshyternativa viaacutevel para transformar o Estado fiscal em um Estado produtivo os tributos passam a representar um indeclinaacutevel dever da cidadania cujo cumshyprimento deve ser por todos honrado conforme assinala Joseacute Casalta Nabais Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra em artigo intitulado Algumas Reflexotildees sobre o Actual Estado Fiscal

Por isso os impostos hatildeo de constituir um preccedilo aceitaacutevel ou seja um preccedilo limitado Um preccedilo que estou certo muitas das sociedashydes que nos antecederam gostariam de ter pago e algumas das actuais natildeo enjeitariam suportar Por isso bem podemos afirmar como jaacute o fizeshymos noutro lugar que no actual Estado fiscal para o qual natildeo se vislumshybra qualquer alternativa viaacutevel pelo menos nos tempos mais proacuteximos os impostos constituem um indeclinaacutevel dever de cidadania cujo cumshyprimento a todos nos deve honrar

A atuaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio para liberar o bloqueio fortalece a conshyfianccedila do cidadatildeo no procedimento da fiscalizaccedilatildeo e consagra a ideacuteia iacutensita em qualquer regime democraacutetico de que a atuaccedilatildeo do Estado tem limites

Na espeacutecie os limites impostos satildeo os decorrentes da quebra do sigilo ser necessaacuterio em face da possiacutevel ilicitude cometida pelo cidadatildeo poreacutem sem ser violados os direitos do cidadatildeo de gozar da sua privacidade e da sua intimidade

A denominada cidadania fiscal haacute de ser considerada de modo conjunshytural com os reflexos dos direitos fundamentais assegurados ao contribuinte sem prestigiar a responsabilidade que tem o Estado de promover a arrecadashyccedilatildeo dos tributos

256 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

Cedo espaccedilo para registrar que a cidadania fiscal deve configurar um estado de relaccedilatildeo juriacutedica em que todos suportem a concretizaccedilatildeo de um Estado em que todos tenham a qualidade de destinataacuterio do dever fundashymentaI de pagar impostos na medida da respectiva capacidade contributiva poreacutem que seja um Estado fiscal suportaacutevel isto eacute um estado cujo sistema fiscal se encontre balizado por estritos limites juriacutedico-constitucionais9

A Administraccedilatildeo Tributaacuteria por melhor que seja a sua estrutura e os seus propoacutesitos natildeo estaacute emocionalmente preparada para conceber e aplicar os princiacutepios que sustentam a cidadania fiscal Isso ocorre primeiramente porshyque o Fisco tem por missatildeo exclusiva exercer a funccedilatildeo de arrecadar tributos Eacute a sua meta essencial por ser atribuiccedilatildeo que na organizaccedilatildeo administrativa estatal estaacute obrigado a desempenhar Natildeo lhe cabe administrar o tributo arreshycadado limitando-se unicamente a envidar esforccedilos para o cumprimento das metas impostas para imprimir aumento na arrecadaccedilatildeo tributaacuteria O sucesso da Administraccedilatildeo Tributaacuteria eacute medido pelo maior volume de recursos fiscais atraiacutedos para os cofres do Governo nunca pelo respeito que exerccedila para com os direitos fundamentais do contribuinte Eacute uma questatildeo de cultura adminisshytrativa de distribuiccedilatildeo de funccedilotildees no sistema estatal impossiacutevel de ser mudashydo por sugestotildees doutrinaacuterias

Por outro lado a fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo consegue afastar as pressotildees exercidas sobre ela por determinados segmentos da organizaccedilatildeo estatal que defendem uma atuaccedilatildeo mais agressiva para a cobranccedila dos tributos tudo em decorrecircncia dos efeitos produzidos pela conduta iliacutecita marcante da sonegashyccedilatildeo fiscal

Esses fatores contribuem para que a fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo tenha condiccedilotildees de modo imparcial sem isenccedilatildeo avaliar a necessidade objetiva da quebra do sigilo bancaacuterio do cidadatildeo Por melhor que seja o seu desempenho nunca ganharaacute a confianccedila do contribuinte

A atribuiccedilatildeo da quebra do sigilo bancaacuterio em um regime democraacutetico onde predomina o respeito maior aos direitos fundamentais da cidadania deve ser exercido pelo Poder Judiciaacuterio natildeo soacute porque seus membros atualmente revestidos da garantia da vitaliciedade inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos bem como porque estatildeo revestidos de independecircncia absoluta em relaccedilatildeo ao Poder interessado na cobranccedila do tributo e consequumlentemenshyte no resultado a ser obtido pela accedilatildeo fiscal

Esse sistema misto onde o Fisco faz a solicitaccedilatildeo motivada para a queshybra do sigilo bancaacuterio ao Poder Judiciaacuterio e este apoacutes analisaacute-lo com objetivishydade e cautela defere ou indefere impotildee seguranccedila e confiabilidade na atuashyccedilatildeo fiscal e sublima o respeito agrave dignidade do contribuinte em outras palavras da cidadania fiscal isto eacute de uma cidadania de liberdade que o Estado fiscal

9 Joseacute Casalta Nabais (Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra) no artigo Algumas Reflexotildees sobre o Actual Estado Fiscal no site httpagugovbr

ENSAIOS JURiacuteDICOS 257

pressupotildee para natildeo ser postergada impotildee um sistema fiscal balizado por esshytritos limites juriacutedico-constitucionais Limites esses que integram a chamada constituiccedilatildeo fiscal e que podemos reconduzir para natildeo nos alongarmos nesse aspecto a duas ideacuteias uma ideacuteia de seguranccedila que tem o seu tradicional e principal suporte no princiacutepio da lega1idade fiscal e uma ideacuteia de justiccedila ou equumlidade que tem a ver com a medida dos impostos e assenta no princiacutepio da capacidade contributiva 10

Em conclusatildeo a adoccedilatildeo de um sistema para a quebra do sigilo bancaacuteshyrio em que o Poder Judiciaacuterio seja o aacuterbitro dos pedidos da Administraccedilatildeo Puacuteblica natildeo eacute somente mais justo mas consegue impor maior credibilidade agrave atuaccedilatildeo fiscal e presta homenagem com intensa potencialidade aos princiacuteshypios democraacuteticos consistentes na guarda da seguranccedila juriacutedica do respeito aos direitos fundamentais do cidadatildeo nesse rol incluidos os agrave privacidade e agrave intimidade Aleacutem disso torna mais respeitaacutevel a relaccedilatildeo entre Fisco e contrishybuinte justificando portanto a opccedilatildeo do Estado pelo regime democraacutetico

8 Autoridade fiscal e faculdade incondicionada de quebrar o sigilo bancaacuterio

Essa indagaccedilatildeo consubstancia a preocupaccedilatildeo de serem estabelecidos controles para a atuaccedilatildeo do agente puacuteblico fiscal Centra-se a preocupaccedilatildeo em imprimir nas relaccedilotildees juriacutedicas tributaacuterias de quaisquer espeacutecies o primashydo da legalidade aprimorando-se o atuar vinculado

Natildeo concilia-se com os postulados da democracia a adoccedilatildeo de um sisteshyma de fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria que outorgue faculdade incondicionada ao fiscal tributaacuterio de invadir a intimidade e a privacidade das pessoas sob o falso argushymento juriacutedico de que busca encontrar provas de sonegaccedilatildeo fiscal

Depreende-se do exposto que a autoridade fiscal natildeo deve ter faculdade incondicionada de quebrar o sigilo sempre que entender necessaacuterio Isso porshyque a praacutetica de atos administrativos por agentes puacuteblicos de modo incondicionado revela grave violaccedilatildeo ao princiacutepio da legalidade onde predoshymina a vontade da lei e natildeo o discricionarismo de quem o pratica

No trato do sigilo bancaacuterio o atuar incondicionado da fiscalizaccedilatildeo assushyme caracteriacutesticas de maior gravidade porque haacute violaccedilatildeo aos princiacutepios funshydamentais jaacute expostos e que satildeo prestigiados pela Carta Magna especialmenshyte por bater de frente de modo integral e absoluto com o direito agrave intimidade e agrave privacidade O atuar deve vincular-se rigidamente ao princiacutepio da legalidashyde especialmente aposta na Carta Magna sem a possibilidade de ser aberto qualquer canal para uso da conveniecircncia ou da oportunidade

Eacute de ser lembrada no trato do assunto a liccedilatildeo de Joseacute Casalta Nobais no trabalho jaacute citado no sentido de que Eacute certo que independentemente da

10 Idem p 15

=258=---___________________ SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTlCA

concepccedilatildeo a que se adira relativamente ao segredo bancaacuterio natildeo temos a menor duacutevida de que o acesso da Administraccedilatildeo Fiscal agrave informaccedilatildeo bancaacuteria seja directo sem necessidade de preacutevia decisatildeo judicial seja indirecto depois portanto de preacutevia decisatildeo judicial haacute de ter sempre uma natureza claramenshyte excepcional Na verdade constitua o segredo bancaacuterio uma manifestaccedilatildeo do direito fundamental agrave reserva da intimidade da vida privada constante do art 26 n 2 da Constituiccedilatildeo portuguesa ou suporte um outro direito fundashymentai um direito agrave reserva da vida privada anaacutelogo agravequele a sua afectaccedilatildeo teraacute sempre caraacuteter excepcional

A autoridade fiscal natildeo possui a necessaacuteria isenccedilatildeo e competecircncia institucional para averiguar o grau dessa excepcionalidade de modo que posshysa impor confianccedila ao cidadatildeo investido na condiccedilatildeo de contribuinte poreacutem com direitos a serem assegurados por forccedila do regime democraacutetico adotado

O certo eacute que na relaccedilatildeo juriacutedico-tributaacuteria deve ser buscado o justo equiliacutebrio pregado pelo Estado de Direito onde o cidadatildeo deve ter a sua dignishydade respeitada sem contudo afastar-se a necessidade do Estado arrecadar tributos de forma cogente e imperativa bem como de serem permitidas conshydiccedilotildees de atuaccedilatildeo que resultem no combate agrave sonegaccedilatildeo fiscal

9 Responsabilidade da autoridade administrativa que quebrar o sigilo banshycaacuterio de forma inconsistente e indevida

Eacute inerente ao regime democraacutetico que a autoridade administrativa puacuteblishyca estaacute obrigada a exercer as suas atribuiccedilotildees com rigorosa obediecircncia aos princiacutepios da legalidade moralidade publicidade impessoalidade e eficiecircncia entre outros

A Carta Magna consagra expressamente no art 37 a obediecircncia do agente puacuteblico a esse tipo de comportamento

A autoridade administrativia que quebrar de modo inconsistente e indevido o sigilo bancaacuterio do cidadatildeo pratica ato com capacidade de provocar os seguintes efeitos a) de invadir o direito agrave privacidade e agrave intimidade de algueacutem b) de provocar-lhe danos morais e materiais dependendo da repershycussatildeo provocada pelo seu atuar

Constatada a efetivaccedilatildeo real de danos morais e materiais a responsabishylidade do Estado pode ser acionada conforme permite o art 37 sect 6ordm da Consshytituiccedilatildeo Federal Solidificada a culpa ou dolo do agente puacuteblico e consagrada a materializaccedilatildeo do iliacutecito praticado com o consequumlente ressarcimento patrimonial o Estado deveraacute usando o direito de regresso investir contra o agente que agiu culposa ou dolosamente

Natildeo resume-se apenas ao campo da responsabilidade civil a atuaccedilatildeo da autoridade quando ilegalmente quebra o sigilo bancaacuterio de qualquer cidadatildeo

ENSAIOS JURiacuteDICOS 259

o art 10 da Lei Complementar n 105 de 10 de janeiro de 2001 determishyna que A quebra de sigilo fora das hipoacuteteses autorizadas nesta lei compleshymentar constitui crime e sujeita os responsaacuteveis agrave pena de reclusatildeo de um a quatro anos e multa aplicando-se no que couber o Coacutedigo Penal sem prejuiacuteshyzo de outras sanccedilotildees cabiacuteveis A seguir no seu paraacutegrafo uacutenico explicita que Incorre nas mesmas penas quem omitir retardar injustificadamente ou presshytar falsamente as informaccedilotildees requeridas nos termos desta lei complementar

O art 11 da mesma lei complementar expressa que O servidor puacuteblico que utilizar ou viabilizar a utilizaccedilatildeo de qualquer informaccedilatildeo obtida em decorshyrecircncia da quebra de sigilo de que trata esta lei complementar responde pessoshyal e diretamente pelos danos decorrentes sem prejuiacutezo da responsabilidade objetiva da entidade puacuteblica quando comprovado que o servidor agiu de acorshydo com a orientaccedilatildeo oficial

10 O sigilo bancaacuterio e o tratamento que lhe eacute dado por oacutergatildeos internacioshynais como a OCDE e outros

Rui Celso Reali Fragoso Presidente do Instituto dos Advogados de Satildeo Paulo em artigo intitulado O Sigilo Bancaacuterio veiculado pela Internet (http Ii wwwjuscombr) registra que atualmente temos trecircs sistemas legais no munshydo cuidando do sigilo bancaacuterio O primeiro eacute o anglo-saxatildeo em que o sigilo natildeo encontra amparo legal o segundo eacute o dos paiacuteses da Europa continental - eu o contemplo em vaacuterios diplomas legais o terceiro eacute o da Suiacuteccedila e do Liacutebano que o reforccedilam

Analisando esses trecircs sistemas o autor citado observa

Haacute aparente contradiccedilatildeo no sistema inglecircs e norte-americano pois se de um lado nestes paiacuteses se eleva a garantia das liberdades individuais de outro se despreza o sigilo bancaacuterio Eacute que se ocorre conshyflito entre a apuraccedilatildeo de fatos (fator social) e a privacidade das pessoas (fator individual) prevalece a primeira Mais ainda o relacionamento de clientes e bancos longe de estabelececirc-lo serve como fonte de informashyccedilatildeo em favor de terceiros a indiscriccedilatildeo injustificada poreacutem eacute objeto de sanccedilatildeo E na Inglaterra os poderes puacuteblicos natildeo intervecircm no funcionashymento dos estabelecimentos privados de creacutedito o que debilita a invesshytigaccedilatildeo

Nos paiacuteses da Europa continental a legislaccedilatildeo contempla o sigilo bancaacuterio como consequumlecircncia do profissional e comporta derrogaccedilotildees na esfera penal e em alguns casos na civil mas comina sanccedilotildees crimishynais no caso de violaccedilatildeo ao sigilo (Coacutedigo Penal francecircs artigo 378 Coacuteshydigo Penal italiano art 622)

260 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

A sistemaacutetica fortalecida eacute aquela utilizada na Suiacuteccedila decorrente da crise ocorrida em 1931 com o fechamento do Banco de Genebra que ensejou a ediccedilatildeo de lei estabelecendo severas puniccedilotildees de natureza civil e criminal Tanto a legislaccedilatildeo suiacuteccedila como a libanesa esta surgida em 1956 permitem derrogaccedilotildees em certas hipoacuteteses A existecircncia das conshytas numeradas comprova a importacircncia do sigilo nestes paiacuteses

Eacute certo natildeo ser absoluto o segredo nem sua quebra em determishynadas situaccedilotildees significa abuso de poder Aliaacutes nenhum direito eacute absoluto

A doutrina tem ultimamente tomado conhecimento sobre as transforshymaccedilotildees que tem passado em vaacuterios ordenamentos juriacutedicos a questatildeo do sigilo bancaacuterio

Zenobio Simotildees de Melo advogado no Paranaacute em artigo sob o tiacutetulo Quebra do Sigilo Bancaacuterio (Internet httpjuscombr) informa que o jornal O Estado de Satildeo Paulo de 21 de junho de 2000 publicou a notiacutecia seguinte

Numa das mais importantes decisotildees adotadas durante o Conseshylho Europeu que marca o fim da presidecircncia portuguesa da Uniatildeo Euroshypeacuteia (UE) seus 15 paiacuteses aprovaram ontem o pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal No ponto mais polecircmico o pacote deveraacute acabar com o sigilo bancaacuterio ateacute 2010 foi uma negociaccedilatildeo de 12 anos Aacuteustria e Luxemburgo natildeo aceitavam o princiacutepio de acabar com o sigilo bancaacuterio A justificativa austriacuteaca eacute que este eacute um princiacutepio que faz parte da Consshytituiccedilatildeo do paiacutes haacute 200 anos Para aceitar o acordo o paiacutes exigiu a manushytenccedilatildeo do sigilo nos bancos austriacuteacos para quem resida no paiacutes

Registro a iacutentegra da notiacutecia

Pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal eacute aprovado por membros da UE Decisatildeo prevecirc quebra do sigilo bancaacuterio nos paiacuteses do bloco econocircmico

Jair Rattner

Especial para o Estado

Santa Maria da Feira Portugal- Numa das mais importantes decishysotildees adotadas durante o Conselho Europeu que marca o fim da presishydecircncia portuguesa da Uniatildeo Europeacuteia (UE) seus 15 paiacuteses aprovaram ontem o pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal No ponto mais polecircmico o pashycote deveraacute acabar com o sigilo bancaacuterio ateacute 2010

Foi uma negociaccedilatildeo de 12 anos Agora temos um documento que vai estabelecer os princiacutepios e as orientaccedilotildees para as futuras diretivas nessa aacuterea afirmou o Primeiro-Ministro Portuguecircs Antonio Guterres que ocupa a presidecircncia rotativa da UE (no fim do mecircs ela seraacute transferida para a Franccedila)

ENSAIOS JURiacuteDICOS 261

o acordo abrange trecircs aacutereas um coacutedigo de conduta que prevecirc o desmantelamento dos 66 paraiacutesos fiscais existentes ou dependentes da UE a tributaccedilatildeo de royalties e o pagamento de impostos sobre rendishymentos das poupanccedilas de cidadatildeos europeus residentes em outros paiacuteshyses dentre os 15 que fazem parte do bloco econocircmico europeu

O grande problema eram as poupanccedilas Aacuteustria e Luxemburgo natildeo aceitavam o princiacutepio de acabar com o sigilo bancaacuterio A justificativa austriacuteaca eacute que este eacute um princiacutepio que faz parte da Constituiccedilatildeo do paiacutes haacute 200 anos Para aceitar o acordo o paiacutes exigiu a manutenccedilatildeo do sigilo nos bancos austriacuteacos para quem resida no paiacutes Essa questatildeo natildeo eacute importante soacute para a Europa porque abre caminho para a criaccedilatildeo de mecanismos de transparecircncia global no mundo financeiro que satildeo esshysenciais para a globalizaccedilatildeo da economia avaliou Guterres

O prazo para a introduccedilatildeo das mudanccedilas vai ateacute o fim de 2010 Ateacute o fim deste ano as negociaccedilotildees vatildeo ser sobre a definiccedilatildeo do conteuacutedo das diretivas (as normas da UE)

Em 2002 a UE discutiraacute com outros paiacuteses esses conteuacutedos para fazer acordos que deveratildeo ser aprovados ateacute o fim do ano por unanimishydade

A partir de 2003 seraacute iniciado um periacuteodo de sete anos de transishyccedilatildeo para a troca de informaccedilotildees sobre os investimentos de cidadatildeos de outros paiacuteses europeus Nesse periacuteodo alguns paiacuteses poderatildeo optar por cobrar impostos de 20 a 25 sobre os rendimentos dos investimentos de residentes no exterior

No capiacutetulo onde foi analisado o sigilo bancaacuterio no Direito Comparado haacute registros tambeacutem a respeito do tratamento que oacutergatildeos internacionais como o OCDEll e outros vecircm dando ao sigilo bancaacuterio conforme estudo que foi apresentado pelo autor ali citado

II OCDE (Organizaccedilatildeo de Cooperaccedilatildeo e Desenvolvimento Econocircmico) criado em 1961 para substituir a OECE (Comitecirc Fiscal da Organizaccedilatildeo Europeacuteia de Cooperaccedilatildeo Econocircmica) Um dos documentos mais importantes da OCDE eacute o resultante da sua Convenccedilatildeo-Modelo relashytiva a impostos sobre a renda e o capital Essa Convenccedilatildeo estaacute sistematizada em sete capiacutetulos assim explicitados por Alberto Xavier em sua obra Direito Tributaacuterio Internacioshynal do Brasil A Convenccedilatildeo-Modelo da OCDE (tal como a das Naccedilocirces Unidas) encontra-se sistematizada em sete capiacutetulos Os capiacutetulos I e I regulam os requisitos para a aplicaccedilatildeo do tratado O capiacutetulo [JI - de longe o mais importante - conteacutem as regras de distribuiccedilatildeo de competecircncia no que concerne aos impostos sobre o rendimento classificado este por tipos ou classes agrave semelhanccedila do que sucede nos sistemas de tributaccedilatildeo cedular O capiacutetulo IV ocupa-se das regras de distribuiccedilatildeo de competecircncia no que respeita aos impostos sobre o capital O capiacutetulo V determina as consequumlecircncias das regras dos capiacutetulos 111 e IV facultanshydo aos Estados a escolha entre os meacutetodos da isenccedilatildeo e da imputaccedilatildeo O capiacutetulo VI conteacutem disposiccedilotildees adicionais sobre natildeo-discriminaccedilatildeo procedimento amigaacutevel troca de informaccedilotildees e privileacutegios de funcionaacuterios diplomaacuteticos e consulares e regras sobre extenshysatildeo do tratado a partes do territoacuterio Enfim o capiacutetulo VII conteacutem disposiccedilotildees finais sobre entrada em vigor e cessaccedilatildeo do acordo

262 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

Heleno Torres em sua recente obra Direito Tributaacuterio Internacional -Planejamento Tributaacuterio e Operaccedilotildees Transnacionais RT p 147 analisando o posicionamento da OCDE referente agrave poliacutetica de determinados paiacuteses que adoshytam tributaccedilatildeo favorecida e os efeitos dos regimes fiscais prejudiciais registra que

A OCDE resolveu entrar na luta para minorar as praacuteticas fiscalshymente danosas insistindo sobre a necessidade de aumentar as trocas de informaccedilotildees entre os Estados aleacutem de redigir uma lista de paiacuteses com tributaccedilatildeo favorecida e fazer algumas recomendaccedilotildees em acircmbito nacional e convencional a partir do seu importante relatoacuterio Harmful tax competition na emerging global issue

Mesmo reconhecendo os aspectos positivos do ambiente global vigente no qual os sistemas tributaacuterios operam os paiacuteses-membros da OCDE concluiacuteram que eles precisavam agir para restringir a competiccedilatildeo tributaacuteria danosa coletivamente e individualmente opondo-se agrave expanshysatildeo de regimes de impostos preferenciais danosos particularmente nos setores financeiros e atividades de serviccedilo que podem causar distorccedilotildees no comeacutercio e desniacuteveis nos padrotildees de investimento sendo uma ameashyccedila para os sistemas tributaacuterios domeacutesticos e para a estrutura global de tributaccedilatildeo internacional

Mais adiante pp 152153 Heleno Torres afirma que

Entre as recomendaccedilotildees definidas nesse relatoacuterio com aplicashyccedilatildeo dirigida aos paiacuteses-membros da instituiccedilatildeo as mais importantes satildeo as seguintes

bull para contrastar a competiccedilatildeo fiscal prejudicial os paiacuteses devem revisar as suas leis regulamentos e praacuteticas sobre sigilo bancaacuterio para remover empecilhos de acesso a tais informaccedilotildees por autoridades fiscais

bull intensificar o uso de trocas de informaccedilotildees principalmente soshybre as transaccedilotildees com paiacuteses de tributaccedilatildeo favorecida

A conclusatildeo que pode ser firmada apoacutes anaacutelise dos pronunciamentos internacionais acima explicitados eacute a construccedilatildeo de uma corrente que defenshyde uma maior abertura para a quebra do sigilo bancaacuterio quando for necessaacuteshyrio para apurar iliacutecitos tributaacuterios

Essa portanto eacute a resposta que apresento para a indagaccedilatildeo Qual o tratamento proposto por oacutergatildeos internacionais como o OCDE e outros com relaccedilatildeo ao sigilo bancaacuterio

ENSAIOS JURiacuteDICOS 263

11 Compatibilizaccedilatildeo do combate agrave criminalidade internacional com o resshypeito agrave seguranccedila juriacutedica a fim de evitar a fuga de investimentos do Paiacutes

Haacute de se reconhecer natildeo ser faacutecil desenvolver-se um sistema juriacutedico que contenha regras que facilitem o combate agrave criminalidade internacional e ao mesmo tempo prestigie os direitos fundamentais do cidadatildeo especialmenshyte a sua seguranccedila juriacutedica

As convenccedilotildees internacionais conforme demonstrado estatildeo preocupashydas com esses aspectos sem deixar de lado os fenocircmenos causados pela globalizaccedilatildeo

Natildeo deve ser esquecido que o tema envolve aspectos diversos a comeshyccedilar pelos determinantes da soberania dos Estados das forccedilas em expansatildeo das organizaccedilotildees internacionais e da pregaccedilatildeo para que os direitos fundamenshytaIacutes do cidadatildeo sejam respeitados com maior Iacutentensidade

A soluccedilatildeo a meu pensar pode ser encontrada no fortalecimento do Direito Comunitaacuterio Os Estados por via de organismos internacionais firmashyriam tratados para a adoccedilatildeo de um Coacutedigo Processual Penal Internacional com efeitos vinculantes por parte das naccedilotildees onde seriam adotadas regras investigatoacuterias e apuratoacuterias dos iliacutecitos internacionais alargando os conceitos de indiacutecios e presunccedilotildees sem deixar contudo de prestigiar a afetividade dos direitos e garantias fundamentais do cidadatildeo

Todas as naccedilotildees no iniacutecio deste seacuteculo envidam esforccedilos para diminuir a crise da seguranccedila juriacutedica Satildeo vaacuterios os fatores determinantes todos tendo como causa comum o crescimento da delinquumlecircncia em decorrecircncia de poliacutetishycas econocircmicas e sociais adotadas por determinados governos que contrishybuem para aumentar o percentual de pessoas pobres

A preocupaccedilatildeo atual para o combate ao crime internacional eacute alcanccedilar niacutevel de uniformizaccedilatildeo dos sistemas adotados para a quebra do sigilo bancaacuteshyrio De iniacutecio deve ser defendida a postura de que nenhuma lesatildeo ou ameaccedila a direito deve ser excluiacuteda da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio Nessa perspectishyva ganha suma importacircncia a criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional em virshytude de pela sua atuaccedilatildeo natildeo perdurar a diversidade de sistemas legais a respeito do assunto a saber a) O anglo-saxatildeo onde o sigilo natildeo encontra amparo legal b) o dos paiacuteses da Europa continental que o contempla em vaacuterios diplomas escritos e c) o da Suiacuteccedila e do Liacutebano que o reforccedilam l2bull

A criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional envolve uma reconceiacutetuaccedilatildeo de soberania

Sobre o tema Celso D de Albuquerque Mello em Direito Internacional da Integraccedilatildeo Ed Renovar p 13 faz a seguinte observaccedilatildeo

12 Conforme anota Rui Celso Reali Fragoso no artigo O Sigilo Bancaacuterio publicado no site httpvvwwjuscombr

264 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Poder-se-ia fazer um pequeno reparo a Chaumont que a indeshypendecircncia nacional eacute um conceito juridicamente indeterminado e que ela pode ter diferentes graus Tanto que podemos escrever soberania versus cooperaccedilatildeo internacional apesar de reconhecermos que esta posiccedilatildeo pode ser considerada como radical vez que natildeo haacute uma total incompatibilidade entre as duas Entretanto natildeo se pode deixar de consshytatar que de certo modo a cooperaccedilatildeo internacional se encontra conshysagrada na Carta da ONU no arl 1 ordm que trata dos Propoacutesitos das Naccedilotildees Unidas e nos Princiacutepios estabelecidos na Carta da OEA (Capiacutetulo 11) O mesmo ocorre na resoluccedilatildeo da Assembleacuteia Geral da ONU de 1970 que aprova a Declaraccedilatildeo Relativa aos Princiacutepios do Direito Internacional Reshylativas agraves Relaccedilotildees Amigaacuteveis e agrave Cooperaccedilatildeo entre os Estados conforme a Carta das Naccedilotildees Unidas bem como na Carta de Direitos e Deveres Econocircmicos aprovada pela mesma Assembleacuteia Geral em 1974

O crescimento do crime internacional em decorrecircncia dos fenocircmenos globalizantes determina o surgimento de um dever juriacutedico dos Estados firmashyrem pactos de cooperaccedilatildeo entre si para que enfrentem as organizaccedilotildees voltashydas para a criminalidade Esse dever juriacutedico globalizado tem suas raiacutezes no moral intemacional que conforme assinala Celso Albuquerque Mello na obra citada p 13 sempre consagrou o princiacutepio da solidariedade ou ainda do auxiacutelio muacutetuo

Eacute o mais importante desafio neste iniacutecio de seacuteculo fazer com que surja uma legislaccedilatildeo internacional que compatibilize o combate agrave criminalidade inshyternacional sem violar a seguranccedila juriacutedica com finalidade exclusiva de evitar a fuga de investimenos do Paiacutes

Tenha-se contudo em consideraccedilatildeo que a globalizaccedilatildeo do crime emshybora seja uma grande ameaccedila aos valores tradicionais que sustentam a cidashydania especialmente a seguranccedila juriacutedica natildeo deve prejudicar o desenvolvishymento econocircmico de qualquer naccedilatildeo

Natildeo faccedilo coro ao assinalado por Eric Hobsbawm em sua obra Era dos Extremos O Breve Seacuteculo XX 1914-1991 1995 p 24 Companhia das Letras S Paulo traduccedilatildeo de Marcos Santarrita no sentido de que Talvez a caracteriacutesshytica mais impressionante do fim do seacuteculo XX seja a tensatildeo entre esse processo de globalizaccedilatildeo cada vez mais acelerado e a incapacidade conjunta das instishytuiccedilotildees puacuteblicas e do comportamento coletivo dos seres humanos de se acoshymodarem a ele

Penso que natildeo haacute essa acomodaccedilatildeo e que as instituiccedilotildees puacuteblicas espeshycialmente as submetidas ao controle da ciecircncia juriacutedica natildeo estatildeo incapacitashydas de encontrar caminhos que solucionem o problema existente

ENSAIOS JURiacuteDICOS 265

Eacute por demais positivo entre outros acontecimentos o fato da conscienshytizaccedilatildeo de que haacute de ser encontrada uma forma de combate agrave criminalidade internacional que natildeo afaste a garantia da seguranccedila juriacutedica Esta eacute uma neshycessidade para impor paz agrave naccedilatildeo e consequumlentemente criar ambiente para que novos investimentos necessaacuterios ao desenvolvimento do seu processo econocircmico aconteccedilam sem se falar na manutenccedilatildeo dos jaacute existentes

O Parlamento Europeu aprovou ultimamente uma resoluccedilatildeo sobre a criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional sob a consideraccedilatildeo de que eacute necessaacuteshyrio criaacute-lo de forma permanente para complementar os sistemas judiciais nashycionais e pocircr fim agrave impunidade de que gozam os responsaacuteveis por genociacutedio crimes contra a humanidade e crimes de guerra

A abertura para essa posiccedilatildeo denota a formaccedilatildeo de uma consciecircncia internacional para combater a criminalidade internacional em todos os niacuteveis contribuindo para fortalecer a seguranccedila juriacutedica interna de cada paiacutes

O documento representativo dessa resoluccedilatildeo eacute do teor seguinte

Parlamento Europeo

Resolucioacuten sobre el Tribunal Penal Internacional

EI Parlamento Europeo

Vistas sus anteriores resoluciones sobre un Tribunal Penal Interna-cional

A Considerando que es necesario crear un Tribunal Penallnternashycional permanente que complemente los sistemasjudiciales nacionales y ponga fin a la impunidad de que gozan los responsables de genocidio crimenes contra la humanidad y criacutemenes de guerra

B Considerando que la Comisioacuten de Derechos Humanos de las Naciones Unidas estaacute respaldando decididamente la creacioacuten de ese Trishybunal

C Considerando que la fase preparatoria de la creacioacuten dei Tribushynal Penal Internacional finalizoacute con la uacuteltima sesioacuten dei Comiteacute Preparatorio de las Naciones Unidas que tuvo lugar dei 16 de marzo al3 de abril de 1998

D Felicitaacutendose por la creciente participacioacuten de Estados en el proceso de negociaciones y esperando que un nuacutemero auacuten mayor de Esshytados procedentes de todas las regiones se encuentre plenamente represhysentado en la Conferencia Diplomaacutetica de Roma

E Considerando que dei 15 de junio al17 de julio de 1998 se celebra en Roma la Conferencia Diplomaacutetica de Plenipotenciarios para la constitucioacuten de un Tribunal Penal Internacional

266 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

F Considerando que los Estados miembros y la delegacioacuten de la Comisioacuten Europea que participan en la Conferencia Diplomaacutetica de Roma pueden desempenar un papel crucial a la hora de garantizar el eacutexito de la conclusioacuten de esta Conferencia Diplomaacutetica y acogiendo positivamente la mayor convergenciacutea de las posturas de los Estados miembros de la UE

G Congratulaacutendose por la oferta dei Gobierno de los Paiacuteses Bajos de servir de sede dei Tribunal Penal Internacional permanente

I Insta a la Conferencia Diplomaacutetica de Roma a aprovechar la oportunidad histoacuterica de concluir un texto de Estatuto para un Tribunal Penal Internacional independiente justo y eficaz

2 Insta a los representantes de los Estados miembros dei Consejo y de la Comisioacuten a garantizar activamente el ecircxito de los resultados a sashyber un auteacutentico Tribunal Penal Internacional en lugar de limitarse a un acuerdo de compromiso sobre principios esenciales en sus esfuerzos por conciliar las posturas de Estados reticentes

3 Destaca que para constituir un complemento eficaz de los sisteshymas judiciacuteales nacionales el Estatuto dei Tribunal Penal Internacional permanente objeto de la Conferencia de Roma deberaacute establecer

a un Fiscal independiente con competencias para investigare insshytruir sumarios por propia iniciativa en situaciones en las que se hayan cometido los delitos sometidos a lajurisdiccioacuten dei Tribunal

b Ia jurisdiccioacuten inherente y universal dei Tribunal en materia de genocidio criacutemenes contra la humanidad criacutemenes de guerra y agresioacuten sin que se requiera ninguacuten consentimiento dei Estado

c una buena relacioacuten de trabajo con los Tribunales lnternacionales ya establecidos en La Haya

d una relacioacuten constructiva con las Naciones Unidas yen partishycular con el Consejo de Seguridad basada en el pleno reconocimiento de sus respectivas funciones y competencias

e Ia obligacioacuten de los Estados firmantes de acatar y hacer cumplir sin demora las oacuterdenes y decisiones dei Tribunal

f los mayores niveles de respeto de los derechos de los acusados y de los sospechosos y de proteccioacuten de los intereses de las viacutectimas y de los testigos

g Ia garantiacutea de una financiacioacuten a largo plazo necesaria para asegurar la autonomiacutea e independencia dei Tribunal frente a cualquier presioacuten exterior

4 Destaca ademaacutes que la jurisdiccioacuten deI Tribunal sobre los delishytos de genociacutedio los criacutemenes contra la humanidad y los criacutemenes de

ENSAIOS JURiacuteDICOS 267

guerra deben considerarse con la misma calificacioacuten penal con indepenshydencia de que se hayan cometido en conflictos armados internacionales o en conflictos internos

5 Insta ai Consejo y a los Estados miembros a garantizar la universalidad y la transparencia de las negociaciones y la participacioacuten continuada de la comunidadjuriacutedica y la sociedad civil internacionales

6 Encarga a su Presidente que transmita la presente resolucioacuten ai Consejo a la Comisioacuten a los Gobiernos de los Estados miembros ai Secreshytario General de las Naciones Unidas ai Presidente de la Asamblea Geneshyral de las Naciones Unidas y ai Presidente de la Conferencia Diplomaacutetica de las Naciones Unidas para la constitucioacuten de un Tribunal Penal Internashycional

A resoluccedilatildeo supracitada demonstra que cresce a conscientizaccedilatildeo da necessidade de ser criado um Tribunal Penal Internacional com forccedila cogente obrigatoacuteria de suas decisotildees no acircmbito interno dos paiacuteses que participarem do pacto de sua constituiccedilatildeo

A doutrina internacional revela que a comunidade internacional somenshyte agora vem se preocupando em criar uma estructura internacional para determinar las responsabilidades individuales emergentes de violacioacuten de ciertos derechos baacutesicos dei ser humano Los mecanismos de responsabilidad estatal creados desde los 60 se dirigen a la mayor protecciotilden dei ser humano y la erradicacioacuten de las praacutecticas de volacioacuten sistemaacutetica de los derechos humanos ar via de la condena ai Estado que ordena o que tolera los abusos por lo cual se estructuraron entorno ai Estado conmo sujeto responsable Como haacute seflalado la Corte Internacional de Derechos Humanos el procedimiento ante ella no es un procedimiento penal lo que se busca determinar es el nivel de cumprimiento por parte de un Estado de sus obligaciones de derecho internacional Sin desconocer la importancia de determinar la responsabilidad dei Estado para que eacuteste tenga un incentivo para erradicar esas praacutectica de sus frotneras es pertinente detacar que las violaciones maacutes grave son en uacuteltima instancia coshymetidas por individuos (Francisco Cox Encarregado dei TPI HOH em artigo intitulado EI IlOH ante la Craciotilden de um Tribunal Penal Internacional no site httpwwwiidhedcrcpitpintrohtml)

A criaccedilatildeo de um Tribunal Penal Internacional atuaria permanentemente e teria competecircncia subsidiaacuteria em relaccedilatildeo agrave outorgada aos Tribunais Nacioshynais limitando-se a atuar apenas nos crimes internacionais previamente defishynidos como sendo do interesse da comunidade global

Merece registro no acircmbito do assunto tratado que na Conferecircncia Reshygional sobre o Tribunal Penal Internacional realizada em 18 e 19 de fevereiro de 1998 na cidade de Guatemala Guatemala um dos temas tratados foi o relativo

268 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

agrave harmonizaccedilatildeo das incriminaccedilotildees quando os seguintes aspectos foram disshycutidos Branqueamento corrupccedilatildeo fraude fiscal participaccedilatildeo em associashyccedilotildees criminosas um olhar agrave luz dos direitos nacionais e do direito internacioshynal Perspectivas Quais os comportamentos a incriminar Criar uma nova incriminaccedilatildeo da fraude fiscal Uma tentativa de harmonizaccedilatildeo o corpus jurls contendo disposiccedilotildees penais para proteccedilatildeo dos interesses financeiros da Uniatildeo Europeacuteia As negociaccedilotildees no seio do Conselho da Europa e da OCDE referenshytes agrave luta contra a corrupccedilatildeo etc O referido painel foi presidido por Benoit Dejemeppe procurador do Rei em Bruxelas e contou com a presenccedila de Tereshyza Beleza professora de Direito Penal na Faculdade de Direito de Lisboa como moderadora

Haacute como visto um largo campo de anaacutelise para desenvolver com possishybilidade do surgimento de sugestotildees que levem a ciecircncia juriacutedica a alcanccedilar com a atuaccedilatildeo estatal uma competecircncia internacional que possa combater o crime internacional e ao mesmo tempo proporcione seguranccedila juriacutedica na ordem interna ganhando assim o sistema juriacutedico confianccedila dos investidoshyres

Em conclusatildeo a forma de compatibilizar o combate agrave criminalidade internacional sem violar a seguranccedila juriacutedica necessaacuteria a evitar a fuga de inshyvestimentos do paiacutes estaacute na criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional com comshypetecircncia definida para processar e julgar delitos globalizantes e cujas decisotildees tenham forccedila imperativa no acircmbito interno das naccedilotildees participantes do pacto para o seu nascimento

Page 3: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro

ENSAIOS JURiacuteDICOS 225

A pretensatildeo eacute de ser construiacuteda uma democracia para o seacuteculo XXI com preceitos que ao serem apJicados abram espaccedilos para a execuccedilatildeo de medishydas concretas que resultem em oferecer ao cidadatildeo qualquer que seja a escashyla que ele pertenccedila na grade social seguranccedila puacuteblica e juriacutedica assistecircncia agrave sauacutede atendimento escolar guarda da moralidade liberdade amplo empreshygo respeito aos seus direitos fundamentais e outros valores que estatildeo inserishydos no contexto representativo da dignidade humana

O entendimento manifestado repousa na concepccedilatildeo de que eacute impossiacuteshyvel a convivecircncia com ecircxito do Estado com o cidadatildeo quando as suas relashyccedilotildees estatildeo em constante tensatildeo O alcance dessa situaccedilatildeo provoca inseguranshyccedila medo temor falta de confianccedila e incentiva a quebra dos princiacutepios da eacutetica e da moralidade2bull

2 No referente ao problema da tensatildeo existente entre cidadatildeo e Estado escrevi antes o seguinte O exame do panorama social da era contemporacircnea identifica a sociedade atravessando uma tensatildeo preacute-milecircnio Esse estado emocional ineacutedito estaacute afetando as relaccedilotildees entre as pessoas e foi identificado recentemente em trabalho elaborado por Seacutergio Villas Boas sob o tiacutetulo Tensatildeo PreacuteshyMilecircnio publicado no jornal Gazeta Mercantil de 12 e 13 de junho de 1999 p 2 Caderno - Leitura de Fim de Semana Extraio trecho de tal ensaio para meditaccedilatildeo O mundo estaacute atravessando um periacuteodo de tensatildeo preacute-milecircnio com todos os desconfortos irriacutetabiliacutedades fadigas tormentas mau humor e acima de tudo medo Terrores geralmente infundados Profecias e noticiaacuterios de TV formam um coro que reforccedila a nova TPM e produz uma repeticcedilatildeo estafante fome miseacuteria guerras assaltos assassinatos hediondos traacutefico de drogas e de influecircncias corrupccedilatildeo impunidade protecionismos sonegaccedilotildees (48 do que o governo arrecada vem do trabalho assalariado calcula-se que US$ 825 bilhotildees circulam no Paiacutes sem pagar impostos) precaacuteria sociabilizaccedilatildeo (taxa de desemprego em Satildeo Paulo superou 20 em maio) maior exigecircncia por escolaridade conhecimento e aparecircncias deflaccedilatildeo (ambiente talvez pior para fazer funcionar o capitalismo do que o regime de inflaccedilatildeo) instabilidade financeira solidatildeo O medo nunca escolheu seu objeto de terror tampouco pode ser delimitado em fronteiras geograacuteficas Nos Estados Unidos adolescentes armados exterminam colegas no paacutetio da escola e se suicidam em seguida na Europa grupos de extrema-direita atentam contra minorias eacutetnicas renutrindo o ideal da purificaccedilatildeo pelo extermiacutenio A desinformaccedilatildeo (ou seria desentendimento) estaacute levando as pessoas a viver um filme real permanente Eacute como se a qualquer momento um sujeito infectado por um viacuterus que corroacutei os ossos humanos arrancasse o cidadatildeo de seu BMW adquirido por leasing e dirigisse a maacutequina roubada ateacute um aeroporto onde uma adolescente graacutevida sob efeito de cocaiacutena acabara de sequumlestrar um aviatildeo levando para a Floacuterida velhinhos aposentados dispostos a realizar o sonho da casa de praia civilizada Mas o aviatildeo sequumlestrado pela viciada e pelo delinquumlente representantes das minorias se esborracha no asfalto reverberante do aeroporto Natildeo eacute positiva portanto a apresentaccedilatildeo de um balanccedilo positivo no balanccedilo que se faz da aplicaccedilatildeo da democracia neste final de seacuteculo porque a realidade demonstra que as suas linhas tradicionais foram aparentemente seguidas Urge portanto ser pensada uma forma de regime democraacutetico que seja capaz de inverter esse quadro catastroacutefico para a humanidade Para tanto lorna-se primordial que a Ciecircncia Juriacutedica e a Ciecircncia Poliacutetica renovem os seus postulados e os seus propoacutesitos voltem-se para a criaccedilatildeo de novos degraus e de novos princiacutepios atentas para a forccedila cogente e imperativa que eles devem ter colocando o cidadatildeo com todas as suas aspiraccedilotildees e

continua

226 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Envolvido por esse clima de indefiniccedilotildees institucionais acima apresentashydo embora de modo muito resumido passo a examinar as modificaccedilotildees introduzidas no ordenamento juriacutedico brasileiro afetando o sistema regulador das instituiccedilotildees financeiras com os seus clientes em face da fiscalizaccedilatildeo tribushytaacuteria com novas regras para o sigilo bancaacuterio

3 O sigilo bancaacuterio no Direito Comparado

Uma visatildeo raacutepida do tratamento dado por alguns ordenamentos juriacutedishycos estrangeiros para o sigilo bancaacuterio proporciona uma compreensatildeo mais alargada dessa entidade juriacutedica dos seus objetivos e dos efeitos produzidos por ele nas relaccedilotildees do titular da conta bancaacuteria com a instituiccedilatildeo financeira e com a garantia da sua seguranccedila no ambiente social

a) Portugal

A doutrina considera que a tutela do segredo bancaacuterio no Direito portushyguecircs na atualidade eacute um padratildeo protetor com caracteriacutesticas mais amplas do que o vigente na Suiacuteccedila ateacute entatildeo considerado o paiacutes que mais oferecia proteshyccedilatildeo nesse campo de relacionamento financeiro

continuaccedilatildeo

necessidades como sendo o centro das preocupaccedilotildees (Trabalho intitulado Democracia para o Seacuteculo XXI aguardando publicaccedilatildeo) Modelo de Democracia para o Seacuteculo XXI O fato do regime democraacutetico adotado no Brasil pela maioria dos anos durante o seacuteculo XX natildeo ter produzido resultados administrativos desejados e necessitados pela Naccedilatildeo natildeo deve servir de suporte para a defesa da volta ao autoritarismo ou de qualquer outra forma de regime Haacute que se reconhecer que as dificuldades vividas pela Naccedilatildeo natildeo podem ser tributadas apenas ao mau uso do regime democraacutetico Negativas em grande escala foram os modelos das eras de t 937 a t 946 e de 1964 a 1988 especialmente para o campo das liberdades dos direitos humanos e da valorizaccedilatildeo da dignidade dos homens Filio-me agrave corrente daqueles que pregam ser a democracia com todos os seus defeitos um regime muito melhor do que a mais perfeita das ditaduras A democracia mesmo ferida ela homenageia pelo menos a esperanccedila de um povo e simboliza o modelo de liberdade de seguranccedila e de desenvolvimento cultural e econocircmico pretendido pelo cidadatildeo diferente do que acontece com qualquer outro tipo de regime Aperfeiccediloar a atuaccedilatildeo do regime democraacutetico para o seacuteculo XXI natildeo eacute tarefa das mais faacuteceis Uma seacuterie de obstaacuteculos devem ser enfrentados e regulados sem se falar nas resistecircncias que seratildeo impostas por clones conservadores e privilegiados agraves mudanccedilas O certo eacute que algo precisa ser feito e com ousadia Necessaacuterio enfrentar os problemas e sugerir soluccedilotildees com posiccedilotildees que se integrem no atuar do homem encarregado de pensar e de fazer ciecircncia o que deve ser exercido sem temor Pelo contraacuterio Da exposiccedilatildeo e publicidade das ideacuteias surgem os modelos para a construccedilatildeo do futuro Se os objetivos forem alcanccedilados contribuiccedilotildees essenciais foram dadas para se evitar a mais temida revoluccedilatildeo que pode ser feita pelo ser humano que eacute a da revolta interna e silenciosa contra as instituiccedilotildees com forccedila ateacute de extinguir caso se realize a entidade tradicional do Estado

ENSAIOS JURiacuteDICOS 227

Esse entendimento decorre da interpretaccedilatildeo que os doutos manifestam sobre o Decreto-Lei n 21978 normativo disciplinador do sigilo bancaacuterio em Portugal

O objetivo da legislaccedilatildeo portuguesa sobre sigilo bancaacuterio conforme depreende-se da sua mensagem eacute imprimir confianccedila no funcionamento das instituiccedilotildees de creacutedito para que se afirmem como veiacuteculos necessaacuterios para a captaccedilatildeo da poupanccedila Essa ideacuteia foi exposta por Alexandra Falque de Gouvecirca Professora-Assistente da Faculdade de Direito de Lisboa e Assessora do Conseshylho para o Sistema Financeiro no corpo do artigo de sua autoria Perspectivas de Reformulaccedilatildeo da Tutela do Seguro Bancaacuterio no Direito Portuguecircs publicashydo na Revista do Gabinete de Documentaccedilatildeo e Direito Comparado da Proshycuradoria Geral da Repuacuteblica Lisboa 1990 pp 922

Destaco do corpo do mencionado artigo a observaccedilatildeo feita pela autoshyra pp 12 e 13 no sentido de que A tutela do segredo bancaacuterio surgiu em Portugal conjunturalmente associada aos esforccedilos de reanimaccedilatildeo das instituishyccedilotildees de creacutedito como fonte de captaccedilatildeo da poupanccedila Por esse facto foi-lhe dado um regime mais protector do que o proacuteprio regime vigente na Suiacuteccedila campeatilde em mateacuteria de protecccedilatildeo do segredo bancaacuterio

A seguir afirma a autora Eacute testemunha de que esse reforccedila a confianccedila nas instituiccedilotildees de creacutedito foi de facto o objectivo do legislador ao aprovar o normativo que disciplina o sigilo bancaacuterio a letra do preacircmbulo do Decreto-Lei n 21978 de 9 de janeiro que conteacutem o enquadramento legal da mateacuteria o qual reza o seguinte Ponderando que a reconstruccedilatildeo do Paiacutes implica o estashybelecimento de um clima de confianccedila na banca que permita a captaccedilatildeo e recuperaccedilatildeo do dinheiro entesourado vem o Governo revelando preocupashyccedilotildees pela tutela do segredo bancaacuterio No mesmo sentido a letra do preatildembushylo do Despacho Normativo n 3571979 de 20 de novembro A importatildencia do segredo bancaacuterio eacute bem conhecida para a estabilizaccedilatildeo normalidade de funshycionamento e transmissatildeo de uma imagem de confianccedila por parte de qualshyquer sistema bancaacuterio Nesta medida com a legislaccedilatildeo entatildeo aprovada o regishyme portuguecircs na mateacuteria afastou-se quer do sistema da Common Law de resshyponsabilidade (exclusivamente) civil do banqueiro por violaccedilatildeo ao dever de discriccedilatildeo bancaacuteria quer da generalidade dos sistemas europeus que integram a mateacuteria no regime geral do sigilo profissional (equiparando o banqueiro ao confidente necessaacuterio) aproximando-se mais dos sistemas praticados na Suiacuteshyccedila e no Liacutebano (todavia enquanto no Liacutebano haacute uma total imunidade das insshytituiccedilotildees de creacutedito agraves requisiccedilotildees da autoridade judiciaacuteria na Suiacuteccedila o princiacuteshypio eacute o da cooperaccedilatildeo com a funccedilatildeo judiciaacuteria no tocante agrave mateacuteria pena)

A autora conclui esse toacutepico do seu artigo afirmando Pela razatildeo aponshytada de ser essencialmente o interesse puacuteblico e colectivo o motivo

228 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

determinante da aprovaccedilatildeo do Decreto-Lei n 21978 o regime portuguecircs gizado nessa altura comeccedilou por ser ainda mais hermeacutetico do que o proacuteprio regime vigente na Suiacuteccedila na medida em que o dever de cooperaccedilatildeo com as autoridashydes judiciaacuterias cessa inclusivamente nas mateacuterias sujeitas a segredo bancaacuterio segundo o entendimento generalizado dos Tribunais e doutrina3bull Paradoxalshymente a disciplina juriacutedica natildeo encontrou de iniacutecio reflexo na materialidade dos factos tendo-se assistido a muacuteltiplos e impunes violaccedilotildees ao segredo banshycaacuterio

Arnoldo Wald analisando o sigilo bancaacuterio no ordenamento juriacutedico de Portugal registra O Coacutedigo Civil portuguecircs no seu art 80 dispotildee que Todos devem guardar reserva quanto agrave intimidade da vida privada de outrem A exshytensatildeo da reserva seraacute definida conforme a natureza do caso e as condiccedilotildees das pessoas O art 33 da Constituiccedilatildeo portuguesa de 1976 estabelece que 1 A todos eacute reconhecido o direito agrave identidade pessoal ao bom nome e reputashyccedilatildeo e agrave reserva da intimidade da vida privada e familiar 2 A lei estabeleceraacute garantias efectivas contra a utilizaccedilatildeo abusiva ou contraacuteria agrave dignidade humashyna de informaccedilotildees relativas agraves pessoas e famiacutelias

Tanto no acircmbito constitucional quanto na legislaccedilatildeo civil eacute garantido o direito agrave privacidade e agrave vida iacutentima que fundamentam o sigilo bancaacuterio Jaacute o Decreto-Lei n 2 de 911978 prevecirc expressamente o dever de segredo dos titulares dos oacutergatildeos dos bancos e aos seus trabalhadores4

b) Alemanha

Carlos Alberto Hagstron em artigo intitulado O Sigilo Bancaacuterio e o Poshyder Puacuteblico publicado na Revista de Direito Mercantil n 79 p 37 registra que Na Alemanha natildeo haacute regra especiacutefica nem definiccedilatildeo legal para o segredo bancaacuterio mas sua existecircncia eacute observada reconhecida pejo Direito Privado e pelo Direito Puacuteblico admitida em diversas leis aceita pela doutrina e pela jurisshyprudecircncia sofrendo contudo limitaccedilotildees decorrentes de interesses de orshydem puacuteblica e social quando pode haver a quebra do sigilo conforme aliaacutes lembra Seacutergio Carlos Covello na sua obra O Sigilo Bancaacuterio Leud 1991 p 34

3 A respeito desse aspecto o de cessar o dever de colaboraccedilatildeo com as autoridades judiciaacuterias quando envolver mateacuterias sujeitas a segredo bancaacuterio a autora ao fazer essa afirmaccedilatildeo assinala em nota de rodapeacute as seguintes obras que refletem igual entendimento Alberto Luiacutez O Segredo Bancaacuterio em Portugal in Revista da Ordem dos Advogados ano 41 Q (1981) pp 451 e segs Anselmo da Costa Freitas O Sigilo Bancaacuterio In Boletim da Ordem dos Advogados n 19 (outubro de 1983) pp 4 e segs Maria Eduarda Azevedo O Segredo Bancaacuterio In Ciecircncia e Teacutecnica Fiscal n 346348 (outubrodezembro de 1987) pp 73 e segs Joseacute Antoacutenio Pereira da Silva Regime Juriacutedico do Sigilo Bancaacuterio maio de 1988 (trabalho natildeo publicado) Jorge Patriacutecio Paul O Sigilo Bancaacuterio - sua Extensatildeo e Limites no Direito Portuguecircs In Revista da Banca n 12 (outubrodezembro) 1989 pp 71 e segs

4 Em artigo publicado sob o tiacutetulo Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais publicado na Revista dos Tribunais n 22 Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas p 24

ENSAIOS JURiacuteDICOS 229

A lei bancaacuteria alematilde de 1971961 em seu art 92 determina que haacute obrishygaccedilatildeo de ser preservado o direito agrave privacidade para aqueles que exercem uma funccedilatildeo federal de vigilatildencia por seus colaboradores e pelos controlashydores dos depoacutesitos (Arnoldo Wald em artigo Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais publicado na Revista dos Tribunais n 22 RT Cadernos de Direishyto Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas jan-marccedilo de 1998 p 24)

O citado autor esclarece ainda que na Alemanha a fonte do sigilo banshycaacuterio estaacute no direito agrave personalidade

c) Itaacutelia Franccedila Suiacuteccedila

Luiz Fernando de Bellinetli em artigo denominado Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio (Revista de Direito do Consumidor RT n 18 abril-junho de 1996 pp 141161) ao analisar o sigilo bancaacuterio no Direito Comparado comenshyta o tratamento que lhe eacute dado pela Alemanha Itaacutelia Franccedila Suiacuteccedila e Portugal

Em face de nos itens acima jaacute ter sido enfocado o tema na Alemanha e em Portugal destacaremos apenas do trabalho do autor as observaccedilotildees feishytas sobre o sigilo bancaacuterio nos ordenamentos juriacutedicos da Itaacutelia Franccedila e Suiacuteccedila

A respeito transcrevo o que escreveu o autor

412 ltaacutelia5

Assim como na Alemanha na Itaacutelia tambeacutem natildeo haacute norma especiacuteshyfica disciplinando o sigilo bancaacuterio embora seja ele reconhecido pela doutrina e pela jurisprudecircncia utilizando-se dispositivos variados do sisshytema para supeditaacute-lo

No entanto tambeacutem na Itaacutelia natildeo eacute ele absoluto cedendo ante interesse de ordem puacuteblica nos casos previstos em lei

Como afirma Giacomo Molle Lobbligo della banca ai segreto non e senza Umt ed essendo esse come si e delto dretto aIa tutela dei cliente e quindi di un interesse privato non vi sono limiti ad esso da parte dei legislatore Prescindendo daiacute casi nei quali la rivelzione sai imposta dala legge un dovere di comunicazione puoacute sorgere nei contrant della autoritaacute

5 Arnoldo Wald no artigo jaacute referido (Sigilo Bancaacuterio e Direitos Fundamentais Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas - 22 p 24) assinala que Na Itaacutelia o sigilo bancaacuterio decorre da garantia dos direitos agrave liberdade individual que permite a exclusatildeo do conhecimento por parte de terceiros de tudo que se refere agrave proacutepria pessoa a denominada riservalezza Este entendimento decorre da norma constitucional que institui a inviolabilidade dos direitos da personalidade e da Convenccedilatildeo Europeacuteia dos Direitos do Homem de 1950 que garante a toda pessoa o direito ao respeito de sua vida privada e familiar de seu domiciacutelio e de sua correspondecircncia O segredo nas movimentaccedilotildees financeiras no entendimento doutrinaacuterio italiano visa proteger aleacutem dos interesses do cliente o desenvolvimento da atividade bancaacuteria como algo inerente agrave estrutura e funccedilatildeo creditiacutecia

~o SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

giudiziaria dei fisco e di terzi (La Banca NellOrdinamento Giuridico itashyliano Milano - DoU A Giuffre Editore 1980 p 158)

413 Franccedila

Tambeacutem na Franccedila o sigilo bancaacuterio eacute protegido pelo ordenamenshyto juriacutedico embora inexistente uma norma especiacutefica fundando-se a proteccedilatildeo num conjunto de regras de ordem penal civil e comercial

Da mesma forma admite-se a quebra do sigilo em face de interesshyses de ordem puacuteblica6 bull

414 Suiacuteccedila

Paiacutes onde os bancos e a sua alardeada discriccedilatildeo satildeo instituiccedilotildees nacionais haacute previsatildeo legal especiacutefica para a proteccedilatildeo do sigilo

No entanto tambeacutem laacute o segredo natildeo eacute como alguns supotildeem absoluto

Conforme aduz Hagstrom Natildeo pode ser invocado em geral peshyrante a Justiccedila Penal Na Justiccedila Civil o Juiz tem poder discricionaacuterio para decidir sobre a mateacuteria havendo algumas variaccedilotildees de conformidade com as legislaccedilotildees cantonais Em procedimentos de taxaccedilatildeo e recursos o segredo eacute preservado perante o Fisco eacute afastado contudo no proceshydimento contencioso (penal fiscal) Algumas outras exceccedilotildees ao dever de segredo satildeo contempladas expressamente em textos legais

Quanto ao Direito suiacuteccedilo acrescente-se que Arnoldo Wald no artigo jaacute tado observa que a justificativa para o sigilo bancaacuterio estaacute no direito da rsonalidade A Lei de 1934 prevecirc pena de multa ou de prisatildeo para o funcioshyliacuterio da instituiccedilatildeo que violar o segredo bancaacuterio mesmo que inexista dano ara aquele que viu reveladas informaccedilotildees sobre sua vida financeira

A seguir Arnoldo Wald compara o Direito da Suiacuteccedila com o do Liacutebano lrmando A Suiacuteccedila assim como o Liacutebano para a maior seguranccedila e reforccedilo a preservaccedilatildeo do sigilo bancaacuterio utiliza a conta numerada ficando descoshyhecido o nome do cliente A legislaccedilatildeo libanesa prevecirc quatro hipoacuteteses de errogaccedilatildeo do sigilo a) o consentimento do cliente seus herdeiros ou legataacuteshyos b) no litiacutegio entre o cliente e o banco c) na falecircncia e d) no enriquecimenshy) iliacutecito

d) Inglaterra e EEUU

O sigilo bancaacuterio no Direito inglecircs e no sistema norte-americano mereshyeu de Arnoldo Wald no trabalho jaacute citado pp 24 e 25 a anaacutelise que transcrevo

o autor citado manda no particular conferir Carlos Alberto Hagstrom artigo O Sigilo Bancaacuterio e o Poder Puacuteblico RDM n 79 p 38 bem como Seacutergio Covello em O Sigilo Bancaacuterio Leud 1991 pp 2627

ENSAIOS JURiacuteDICOS 231

No Direito inglecircs natildeo haacute nenhuma norma escrita que estabelece sanccedilatildeo agrave violaccedilatildeo ao segredo bancaacuterio mas qualquer pessoa que queira trabalhar em uma instituiccedilatildeo financeira deve assinar um formulaacuterio esshypecial pelo qual se compromete a manter sigilo sobre as movimentaccedilotildees bancaacuterias O dever de segredo na atuaccedilatildeo do banco eacute interpretado rigoshyrosamente pelos tribunais ingleses

No sistema juriacutedico norte-americano depois de discrepacircncias nas legislaccedilotildees estaduais e apoacutes a lei federal que restringiu o acircmbito da obrishygatoriedade do sigilo bancaacuterio foi aprovada a Right to Financiai Privacy Act que dispotildee que a prestaccedilatildeo de informaccedilotildees por parte da instituiccedilatildeo financeira somente pode ser dada em processos administrativos ou judishyciais quando os dados forem relevantes para solucionar o litiacutegio Com essa lei a quebra do sigilo bancaacuterio ganhou um caraacuteter excepcional somente podendo ocorrer desde que respeitado o devido processo leshygal Assim o Direito americano buscou conciliar a defesa ao direito de privacidade o atendimento aos interesses puacuteblicos quanto agraves informashyccedilotildees financeiras e a existecircncia do contraditoacuterio

e) Reacutegis de Oliveira quando Deputado Federal em parecer apresentashydo agrave Comissatildeo de Constituiccedilatildeo e Justiccedila da Cacircmara dos Deputados com refeshyrecircncia a Projeto de Emenda Constitucional apresentado pelo Exmo Sr Presishydente da Repuacuteblica objetivando alterar o sect 1 ordm do art 145 da CF observou que o sigilo bancaacuterio no Direito Comparado eacute posto da forma seguinte

13 Direito Comparado Na Alemanha natildeo haacute regra especiacutefica nem definiccedilatildeo legal para o segredo bancaacuterio mas sua existecircncia eacute recoshynhecida bem como aceita pela doutrina e jurisprudecircncia Decorre de direito costumeiro somente podendo ser quebrado por expressa disposhysiccedilatildeo legal (J Barmann Le Secret Bancaire en Allemagne Feacutedeacuterale in Rapport pp 15 e segs) Na Beacutelgica haacute proibiccedilatildeo somente sendo viaacutevel a derrogaccedilatildeo do segredo pela Justiccedila Penal e pelo Fisco que somente tem acesso agraves informaccedilotildees bancaacuterias diante do processo pendente (Herion Le Secret Bancaire en Belfique in Rapport pp 5175) Na Itaacutelia os doshycumentos somente podem ser examinados pelos Juiacutezes Natildeo haacute acesso por parte das autoridades administrativas (idem p 129) Na Holanda da mesma forma o sigilo apenas cede ante ordem da autoridade judicial ou penal (Muller idem pp 99117) Na Franccedila a violaccedilatildeo ao segredo ocorre ante oacutergatildeos do Poder Puacuteblico que alegam interesses superiores aos dos particulares natildeo se admitindo a quebra diante de normas administratishyvas (Gavalda Stouflet idem pp 7797)

f) Voltando a analisar o sigilo bancaacuterio em Portugal pode-se afirmar que o sistema apresentava-se rigoroso e nacirco aceitava a quebra como se vecirc de

232 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

decisatildeo do Supremo Tribunal de Justiccedila em Scientia Juriacutedica tomo XXIv n 166168 de 1980 (Parecer publicado na Revista de Direito Mercantil n 99 pp 98 e segs)

Com o sentido de demonstrar como o sigilo bancaacuterio eacute tratado no ordeshynamento juriacutedico de Portugal cito na iacutentegra um acoacuterdatildeo da Secccedilatildeo Criminal do Tribunal de Relaccedilatildeo de Eacutevora cujo texto colhi da internet (httpwwwtrept jurisp321-96html)

Processo n 321]996

Acoacuterdatildeo

Acordam na Secccedilatildeo Criminal do Tribunal da Relaccedilatildeo de Eacutevora

1 No Tribunal Judicial da Comarca de Portimatildeo correm termos uns autos de inqueacuterito registados sob o n 35711994 que tiveram orishygem numa queixa apresentada por middotM Lda contra a sociedade E Lda nos quais se procede agrave investigaccedilatildeo de factos susceptiacuteveis de inteshygrar a praacutetica de um crime de emissatildeo de cheque sem provisatildeo

Estaacute em causa o cheque nO 3681861637 sacado sobre a Caixa Geral de Depoacutesitos emitido em 1 ordm de julho de 1994 no valor de 820661$00

No decurso do inqueacuterito o Ministeacuterio Puacuteblico solicitou agravequela insshytituiccedilatildeo bancaacuteria o fornecimento de determinada documentaccedilatildeo banshycaacuteria o que esta se negou fazer alegando que a revelaccedilatildeo da pretendida documentaccedilatildeo contende com o disposto na legislaccedilatildeo sobre segredo bancaacuterio

A requerimento do Digno Magistrado do Ministeacuterio Puacuteblico o MM Juiz de Instruccedilatildeo suscitou a intervenccedilatildeo deste Tribunal da Relaccedilatildeo a fim de dispensar os serviccedilos da Caixa Geral de Depoacutesitos do segredo bancaacuteshyrio quanto agrave documentaccedilatildeo bancaacuteria solicitada a saber coacutepia da ficha de assinaturas e extracto da conta da Agecircncia de S com o n sobre a qual foi sacado o cheque em causa respeitante aos meses de maio junho e julho de 1994

Nesta relaccedilatildeo o Exmo Procurador da Repuacuteblica emitiu douto pareshycer no sentido de a referida instituiccedilatildeo bancaacuteria ser dispensada do cumshyprimento do dever do segredo bancaacuterio em ordem agrave prestaccedilatildeo dos eleshymentos pretendidos para a efectivaccedilatildeo do inqueacuterito

Colhidos os vistos legais cumpre agora decidir

2 A Caixa Geral de Depoacutesitos atraveacutes do ofiacutecio fotocopiado agrave fi 5 dos autos recusou-se a fornecer os documentos pedidos pelo Ministeacuteshyrio Puacuteblico para instruccedilatildeo de um processo de inqueacuterito com fundamento no sigilo bancaacuterio

ENSAIOS JURiacuteDICOS 233

Compreendendo o inqueacuterito o conjunto de diligecircncias que visam investigar a existecircncia de um crime determinar os seus agentes e a resshyponsabilidade deles e descobrir e recolher as provas em ordem agrave decishysatildeo sobre a acusaccedilatildeo (cf art 262 n 1 do Coacutedigo de Processo Pena0 a consulta dos pretendidos documentos - extracto da conta e ficha de assinaturas - eacute sem margem para duacutevidas de grande importacircncia para a instruccedilatildeo do processo e recolha de indiacutecios probatoacuterios tendentes agrave eventual deduccedilatildeo de acusaccedilatildeo pois sem ela desde logo muito dificilshymente se poderaacute concluir pela identificaccedilatildeo da pessoa que assinou o cheque

O dever de sigilo bancaacuterio traduz uma obrigaccedilatildeo de facto negativo (de ROR facere) e encontra-se disciplinado no Decreto-Lei n 2981992 de 31 de dezembro que aprovou o Regime Geral das Instituiccedilotildees de Creacutedito e Sociedades Financeiras O art 78 de tal diploma consagrando o dever de segredo profissional dispotildee no seu n 1 que os membros dos orgatildeos de administraccedilatildeo ou de fiscalizaccedilatildeo das instituiccedilotildees de creacutedito os seus empregados mandataacuterios comitidos e outras pessoas que lhes prestem serviccedilos a tiacutetulo permanente ou ocasional natildeo podem revelar ou utilizar informaccedilotildees sobre factos ou elementos respeitantes agrave vida da instituiccedilatildeo ou agraves relaccedilotildees desta com os seus clientes cujo conhecimento lhes advenha exclusivamente do exerciacutecio das suas funccedilotildees ou da presshytaccedilatildeo dos seus serviccedilos explicitando-se no seu n 2 que estatildeo designadamente sujeitos a segredo os nomes dos clientes as contas de depoacutesito e seus movimentos e outras operaccedilotildees bancaacuterias

O dever de segredo profissional natildeo eacute poreacutem um dever absoluto isto eacute natildeo prevalece sempre sobre qualquer outro dever que com ele entre em conflito Sofre com efeito as excepccedilotildees previstas no art 79 do mesmo Decreto-Lei n 2981992 onde se estabelece aleacutem do mais que os factos e elementos cobertos pelo dever de segredo podem ser revelashydos nos termos previstos na lei penal e de processo penal - cf aliacutenea d don2

No art 84 do mesmo diploma legal prescreve-se que a violaccedilatildeo ao dever de segredo eacute puniacutevel nos termos do Coacutedigo Penal e efectivamente o Coacutedigo Penal vigente - revisto pelo Decreto-Lei n 481995 de 15 de marccedilo - prevecirc e pune como crimes quer a violaccedilatildeo a segredo profissioshynal quer o seu aproveitamento indevido - cf arts ] 95 e 196

Ao contraacuterio da versatildeo do Coacutedigo Penal anterior agrave referida revisatildeo - em que se estatuiacutea no art 185 que a violaccedilatildeo ao segredo profissional natildeo seria puniacutevel se ocorresse no cumprimento de um dever juriacutedico sensivelmente superior ou visasse a um interesse puacuteblico ou privado legiacutetimo quando considerados os interesses em conflito e os deveres

234 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

de informaccedilatildeo que segundo as circunstacircncias se impotildeem ao agente se pudesse considerar meio adequado para alcanccedilar aquele fim - natildeo conteacutem o Coacutedigo Penal actuaJ relativamente ao crime de violaccedilatildeo ao segredo profissional qualquer causa especiacutefica de exclusatildeo da ilicitude pelo que haacute que atentar nas causas gerais de exclusatildeo da ilicitude

Ao abordar o conflito de deveres dispotildee o art 36 n 1 do Coacutedigo Penal que natildeo eacute iliacutecito o facto de quem em caso de conflito no cumprishymento de deveres juriacutedicos ou de ordens legiacutetimas da autoridade satisfishyzer dever ou ordem de valor igualou superior ao do dever ou ordem que sacrificar Natildeo seraacute pois iliacutecita a violaccedilatildeo ao segredo profissional se perante um conflito de deveres o agente satisfizer o dever de valor igual ou superior ao do dever que sacrifica

No Coacutedigo de Processo Penal generalizou-se a possibilidade de quebra do segredo profissional

Assim as pessoas indicadas no n 1 do sobredito art 78 podem recusar-se a depor sobre factos objecto de segredo profissional mas se a autoridade judiciaacuteria concluindo embora pela legitimidade da recusa natildeo prescindir desse depoimento pode requerer ao tribunal que o ordeshyne E o tribunal deveraacute ordenar a prestaccedilatildeo do depoimento com quebra do segredo profissional sempre que entender que esta se mostra justificada face agraves normas e princiacutepios aplicaacuteveis da lei penal nomeadashymente ao princiacutepio da prevalecircncia do interesse preponderante - cf art 135 n 12 e 3 do Coacutedigo de Processo Penal

A possibilidade de apreensatildeo pela autoridade judiciaacuteria de tiacutetulos valores quantias ou outros objectos depositados em bancos ou outras instituiccedilotildees de creacutedito relacionados com um crime e que possam ser de grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova bem como a possibilidade de exame pelo juiz de correspondecircncia e documenshytaccedilatildeo bancaacuterias estatildeo previstas no art 181 n 1 e 2 do Coacutedigo de Processhyso Penal As pessoas obrigadas ao dever de segredo profissional podem recusar apresentar aqueles documentos ou objectos em seu poder se invocarem por escrito segredo profissional caso em que o conflito de interesses e deveres assim surgido seraacute dirimido pelo tribunal nos tershymos idecircnticos aos previstos para a recusa de depoimento - cf arts 182 n 2 e 135 ambos do citado coacutedigo

Enquanto o dever de segredo profissional eacute geralmente estabeleshycido a favor da integridade e liberdade das pessoas a quem aproveita tendo-se inserido a sua regulamentaccedilatildeo no Tiacutetulo VI do atraacutes mencionashydo Regime Geral das Instituiccedilotildees de Creacutedito e Sociedades Financeiras no qual se prevecirc um conjunto de regras de conduta que devem guiar a actuaccedilatildeo das instituiccedilotildees de creacutedito seus administradores e empregados

ENSAIOS JURiacuteDICOS 235

nas relaccedilotildees com os clientes visando proteger de forma eficaz a posishyccedilatildeo do consumidor de serviccedilos financeiros (cf preacircmbulo do Decreshyto-Lei n 2981992) ou estabelecer um clima de confianccedila na banca que permita a captaccedilatildeo e recuperaccedilatildeo do dinheiro entesourado (como se dizia no relatoacuterio do Decreto-Lei n 21978 de 9 de janeiro revogado pelo n 1 do art 5Q do citado Decreto-Lei n 2981992) no processo de inqueacuteshyrito a que procede o Ministeacuterio Puacuteblico estaacute em causa a realizaccedilatildeo de diligecircncias de prova que permitam investigar um crime de emissatildeo de cheque sem provisatildeo sob a eacutegide do princiacutepio da verdade material e incriminar o respectivo agente

O interesse que estaacute em jogo com a pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblishyco na obtenccedilatildeo da documentaccedilatildeo bancaacuteria eacute o da boa administraccedilatildeo da Justiccedila Penal e esse interesse eacute no caso em apreccedilo sensivelmente supeshyrior ao interesse da manutenccedilatildeo do segredo bancaacuterio o que equivale a di~er que este deve ceder perante aquele

Em suma no caso concreto ponderados os interesses em conflishyto entendemos que a quebra do dever de sigilo bancaacuterio se justifica nos termos do art 36 do Coacutedigo Penal pelo que deve ser dada procedecircncia agrave pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico e consequumlentemente ao abrigo do disposto nos arts 182 n 2 e 135 n 2 e 3 ambos do Coacutedigo de Processo Penal dispensar-se a Caixa Geral de Depoacutesitos do cumprimento do deshyver de sigilo bancaacuterio a fim de poder satisfazer tal pretensatildeo

3 Por todo o exposto determina-se que com quebra do dever de sigilo bancaacuterio a Caixa Geral de Depoacutesitos forneccedila ao Digno Magistrado do Ministeacuterio Puacuteblico com destino ao Processo de Inqueacuterito n 3571 1994 a documentaccedilatildeo bancaacuteria que este lhe havia solicitado

Natildeo eacute devida taxa de justiccedila

Texto processado e integralmente revisto pelo relator

Desembargador-Relator Rui Mauriacutecio

g) Substancioso estudo do sigilo bancaacuterio no Direito Comparado foi feishyto por Andreacute Serratildeo Borges de Sampaio Consultor da Uniatildeo nas informashyccedilotildees que prestou ao Advogado-Geral da Uniatildeo com referecircncia agrave ADIn n 2397 Transcrevo o inteiro teor do seu pronunciamento

51

6 O tratamento do sigilo bancaacuterio no Direito Comparado

Em verdade o Direito Comparado entende inoponiacutevel o sigilo banshycaacuterio agraves autoridades tributaacuterias Com efeito leciona Alfredo Echeverriacutea Herrera verbis

236 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

EI sigilo bancario constituye un reacutegimen limitado exclusivashymente ai aacutembito de las relaciones entre la institucioacuten bancaria y sus clientes e impone la obligacioacuten de confidencialidad de la institucioacuten sobre las informaciones que aqueacutellos le proporcionan

En todas las legislaciones bancarias el sigilo es relativo es decir el derecho dei ciudadano ai secreto y la correlativa obligacioacuten para el banco de no revelar a terceros las informaciones recibidas en el ejercicio de su actividad ceden cuando existe norma legal expresa o causa justificada

Elliacutemite legal ai sigilo estaacute constituiacutedo por la obligacioacuten dei banco de entregar informaciones y se fundamenta en motivos sushyperiores de orden puacuteblico o general siendo liacutecito entonces que el Estado establezca Iiacutemites legales ai secreto bancaria para auxiliar por ejemplo las actuaciones de la Justicia en el plano jurisdiccional y las dei Estado en el aacutembito dei ejercicio de su potestad impositiva

Es un principio irrebatible en la vida dei derecho que ni la autonomia de las personas ni los instrumentos dei aacuterea econoacutemica y financiera pueden servir en un momento dado como elementos juridicamente idoacuteneos para lesionar el intereacutes puacuteblico En consecuencia se puede afirmar que las limitaciones ai sigilo bancario son salvaguardias necesarias ai bien comuacuten en los caacutenones dei Estado moderno Estas limites deben ser materias reshyservadas a la ley por ser de caraacutecter excepcional en sentido estricto

En este orden de ideas necesariamente debe concluirse que existen legiacutetimos y superiores intereses en diversas aacutereas de la sociedad que se vinculan ai bien comuacuten y que deben ser tutelados por el Estado como lo es por ejemplo la necesidad de detectar y reprimir la evasioacuten de los impuestos los cuales transcienden ai evenshytual intereacutes geneacuterico que pueda tener el mismo Estado en la mantencioacuten dei sigilo bancaria En efecto desde el punto de vista de lajuridicidad y de la eacutetica no se puede sostener que el secreto bancaria pueda servir como instrumento para proteger la comisioacuten de actos

52

como el recieacuten mencionado que son constitutivos muchas veces de iliacutecitos penales bajo la forma de delitos tributarias o fraushydes fiscales con resultados ademaacutes de perjucio patrimonial ai Esshytado y dano ai intereacutes general de la sociedad

EI sistema bancaria frente a la existencia en la sociedad de un intereacutes general preponderante y superior estaacute naturalmente Ilamado a colaborar en la verificacioacuten y represioacuten de la evasioacuten tributaria

ENSAIOS JURiacuteDICOS 237

En este marco se inscribe la tendencia de la mayoda de las legislaciones modemas en cuanto a dotar aI Estado de facultades para intervenir en la actividad econoacutemica de los ciudadanos en procura de la correcta determinacioacuten de los tributos cuando se conshyfigura en el desarrollo de estas actividades un hecho gravado establecido en la ley

Ya la Constitucioacuten de Weimar en 919 proclamoacute que es liacutecito ai Estado intervenir para condicionar el ejercicio de los derechos a determinados fines sociales El bien comuacuten y la justicia social comenzaron desde entonces a servir de frontera a los derechos y Iibertades individuales

Cabe destacar que la OCDE (Organisation for Economic Cooperation and Development) en un documento elaborado en el ano 1999 sobre las praacutecticas de los paiacuteses en el acceso a la informacioacuten bancaria para fines tributarios advierte que se puede abusar de la confidencialidad para ocultar actividades iJegales y evadir impuestos y agrega en el resumen ejecutivo deI documento que ni la criminalizacioacuten dei fraude tributario ni el tratamiento de la evasioacuten de impuestos bajo las leyes tributarias de los paiacuteses miembros de la OCDE son homogeacuteneos pero que sin embargo los gobiernos de la mayoriacutea de los paiacuteses miembros de la OCDE han tomado la visi6n de que en este contexto las autoridades tributashyrias no deben ser tratadas como simples terceros sino que se les debe otorgar un acceso priviligiado a la informaci6n bancaria con fines tributarias

Se agrega en este estudio que una medida de esta naturaleza no pane en peligro la conlidencialidad de la inlormacioacuten bancaria puesto que las autoridades tributarias estaacuten sujetas a estrictos conshytroles sobre coacutemo utilizan la informacioacuten de los contribuyentes y todos los gobiemos han implementado regIas para proteger la conlidencialidad de la informaci6n tributaria (EI Sigilo Bancaacuterio Acesso a la Informadon Bancaria para Fines Tributarias)

Em verdade seu texto elenca 30 paiacuteses integrantes da OCDE (a saber Alemanha Austraacutelia Aacuteustria Beacutelgica Canadaacute Repuacuteblica Checa Dinamarca Finlacircndia Franccedila Greacutecia Hungria Islacircndia Irlanda Itaacutelia Japatildeo Coreacuteia Luxemburgo Meacutexico Paiacuteses Baixos Nova Zelacircndia Noshyruega Polocircnia Portugal Espanha Sueacutecia Turquia Suiacuteccedila Reino Unido Estados Unidos Repuacuteblica Eslovaca) dos quais em 1999 apenas trecircs (Portugal Repuacuteblica Eslovaca e Luxemburgo) natildeo facultavam o acesso por parte de autoridades tributaacuterias a informaccedilotildees relativas a pessoas suspeitas de fraude tributaacuteria

238 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

Desses trecircs paiacuteses hoje remanescem apenas dois Com efeito Portugal deixou de integrar esse grupo constrangedoramente minoritaacuterio ao aprovar em 29 de dezembro de 2000 a Lei n 30-G

Nesse diploma lecirc-se

Lei da Reforma de Tributaccedilatildeo do Rendimento

(Portugal)

Artigo 63 O - B

Acesso a informaccedilotildees e documentos bancaacuterios

1 A administraccedilatildeo tributaacuteria tem o poder de aceder directashymente aos documentos bancaacuterios nas situaccedilotildees de recusa da sua exibiccedilatildeo ou de autorizaccedilatildeo para a sua consulta

a) quando se trate de documentos de suporte de registos contabiliacutesticos dos sujeitos passivos de IRS e IRC que se enconshytrem sujeitos agrave contabilidade organizada

b) quando o contribuinte usufrua de benefiacutecios fiscais ou de regimes fiscais privilegiados havendo necessidade de controshylar os respectivos pressupostos e apenas para esse efeito

2 A administraccedilatildeo tributaacuteria tem o poder de aceder a todos os documentos bancaacuterios excepto as informaccedilotildees prestadas para justificar o recurso ao creacutedito nas situaccedilotildees de recusa de exibiccedilatildeo daqueles documentos ou de autorizaccedilatildeo para a sua consulta

a) quando se verificar a impossibilidade de comprovaccedilatildeo e quantificaccedilatildeo directa e exacta da mateacuteria tributaacutevel nos termos do artigo da Lei Geral Tributaacuteria e em geral quando estejam verifishycados os pressupostos para o recurso a uma avaliaccedilatildeo indirecta

b) quando os rendimentos declarados em sede de IRS se afastarem significativamente para menos sem razatildeo justificada dos padrotildees de rendimento que razoavelmente possam permitir as manifestaccedilotildees de riqueza evidenciadas pelo sujeito passivo nos termos do artigo 89-A da Lei Geral Tributaacuteria

c) quando existam indiacutecios da praacutetica de crime doloso em mateacuteria tributaacuteria designadamente nos casos de utilizaccedilatildeo de facturas falsas e em geral nas situaccedilotildees em que existam factos concretamente identificados gravemente indiciadores da falta de veracidade do declarado

d) quando seja necessaacuterio para fins fiscais comprovar a aplicaccedilatildeo de subsiacutedios puacuteblicos de qualquer natureza

ENSAIOS JUAlolCOS 239

3 As decisotildees da administraccedilatildeo tributaacuteria referidas nos nuacuteshymeros anteriores devem ser fundamentadas com expressa menshyccedilatildeo dos motivos concretos que as justificam pressupotildeem a audishyccedilatildeo preacutevia do contribuinte e satildeo da competecircncia do Director-Geshyral dos Impostos ou do Director-Geral das Alfacircndegas e dos Imshypostos Especiais sobre o consumo ou seus substitutos legais sem possibilidade de delegaccedilatildeo

4 Os actos praticados ao abrigo da competecircncia definida no nuacutemero anterior satildeo susceptiacuteveis de recurso judicial o qual teraacute efeito suspensivo nas situaccedilotildees previstas no n 2

5 Nos casos de deferimento do recurso previsto no nuacutemero anterior os elementos de prova entretanto obtidos natildeo podem ser utilizados para qualquer efeito em desfavor do contribuinte

6 As entidades que se encontrem numa relaccedilatildeo de domiacutenio com o contribuinte ficam sujeitas aos regimes de acesso agrave inforshymaccedilatildeo bancaacuteria referidos nos n 1 e 2

7 O acesso da administraccedilatildeo tributaacuteria a informaccedilatildeo banshycaacuteria relevante relativa a familiares ou terceiros que se encontrem numa relaccedilatildeo especial com o contribuinte depende de autorizashyccedilatildeo judicial expressa apoacutes audiccedilatildeo do visado obedecendo aos requisitos previstos no n 3

8 O regime previsto nos nuacutemeros anteriores natildeo prejudica a legislaccedilatildeo aplicaacutevel aos casos de investigaccedilatildeo por infracccedilatildeo peshynal e soacute pode ter por objecto operaccedilotildees e movimentos bancaacuterios realizados apoacutes a sua entrada em vigor sem prejuiacutezo do regime vigente para as situaccedilotildees anteriores

9 Os actos praticados ao abrigo da competecircncia prevista no n I devem ser objecto de comunicaccedilatildeo ao Defensor do Contrimiddot buinte

10 Para os efeitos desta lei considera-se documento bancaacuteshyrio qualquer documento ou registo independentemente do resshypectivo suporte em que se titulem comprovem ou registem opeshyraccedilotildees praticadas por instituiccedilotildees de creacutedito ou sociedades finanshyceiras no acircmbito da respectiva actividade incluindo os referentes a operaccedilotildees realizadas mediante utilizaccedilatildeo de cartotildees de creacutedito (coacutepia anexa)

Parece evidente destarte que todo o mundo civilizado abandonou a possibilidade de opor-se agrave Administraccedilatildeo Tributaacuteria o sigilo bancaacuterio

240 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

4 O sigilo bancaacuterio e o direito agrave intimidade e agrave privacidade das pessoas

A anaacutelise do sigilo bancaacuterio em face do direito agrave intimidade e agrave privacidashyde exige inicialmente que seja enfrentada a questatildeo referente ao seu conceito

Os doutrinadores natildeo tecircm assumido posiccedilatildeo uniforme quanto aos asshypectos conceituais dessa entidade juriacutedica

Seacutergio Carlos Covello autor da obra jaacute mencionada (O Sigilo Bancaacuterio Leud S Paulo 1991 p 69) entende que sigilo bancaacuterio eacute a obrigaccedilatildeo que tecircm os Bancos de natildeo revelar salvo justa causa as informaccedilotildees que venham a obter em virtude de sua atividade profissional

Luiz Fernando Bellinetti no artigo intitulado Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio (Revista do Direito do Consumidor Satildeo Paulo RT 1996 voI 18 p 144) defende posiccedilatildeo no sentido de que sigilo bancaacuterio eacute o dever juriacutedico que tecircm as instituiccedilotildees de creacutedito e as organizaccedilotildees auxiliares e seus empregados de natildeo revelar salvo justa causa as informaccedilotildees que venham a obter em virtushyde da atividade bancaacuteria a que se dedicam

Para Arnoldo Wald (in O Sigilo Bancaacuterio no Projeto de Lei Complemenshytar n 70 Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas n I pp 196209) o sigilo bancaacuterio se enquadra no conceito mais amplo do segredo profissional que tem merecido uma proteccedilatildeo mais ampla ensejando sua violaccedilatildeo caracterizaccedilatildeo como crime (art 154 do Coacutedigo PeshynaI)

Eivany A Silva tratando do tema em Consideraccedilotildees a Respeito do Sigilo de Dados (artigo publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio n 61 pp 41142 - Edit Dialeacutetica) afirma que o sigilo bancaacuterio eacute espeacutecie do gecircnero sigilo de dados constituindo um direito fundamental protegido constitucionalmente inserto que estaacute no rol dos direitos e garantias individuais ou seja em claacuteusushylas peacutetreas da Carta Magna natildeo podendo portanto ser modificado nem messhymo por emenda agrave Constituiccedilatildeo e portanto muito menos por legislaccedilatildeo de hierarquia inferior

Como examinado haacute divergecircncias na fixaccedilatildeo do conceito Essas divershygecircncias embora importantes para as posiccedilotildees doutrinaacuterias a serem assumishydas sobre o alcance do sigilo bancaacuterio natildeo geram contudo influecircncias de maior intensidade no relacionamento entre a instituiccedilatildeo financeira e os seus depositantes Isso porque o que merece ser considerado eacute a natureza juriacutedica do sigilo bancaacuterio isto eacute a que categoria de direito pertence e como por quem e quando a sua quebra pode ser determinada

Em face do exposto necessaacuterio eacute que se faccedila o alinhamento das teorias que procuram fundamentar o sigilo bancaacuterio

A doutrina em eacutepocas diversas examinou as seguintes teorias

ENSAIOS JURiacuteDICOS 241

Teoria contratualista O sigilo bancaacuterio de acordo com essa teoria deshycorre da relaccedilatildeo contratual que voluntariamente eacute formada entre o banco e o cliente por via da qual mesmo sem claacuteusula expressa a instituiccedilatildeo financeira assume a obrigaccedilatildeo de guardar segredo das movimentaccedilotildees de dinheiro que nela satildeo feitas Essa responsabilidade assumida pelo banco inspira-se segunshydo os adeptos da teoria em destaque nos usos nos costumes e na boa-feacute sempre aplicaacuteveis na intepretaccedilatildeo dos contratos comerciais7bull

Teoria do direito agrave privacidade Os adeptos dessa corrente afirmam que o sigilo bancaacuterio integra o campo do direito agrave privacidade que faz parte dos direitos da personalidade

Teoria consuetudinaacuteria Segundo os seguidores dessa linha de pensar o sigilo bancaacuterio decorre dos compromissos taacutecitos assumidos entre instituishyccedilotildees financeiras e seus clientes no sentido de natildeo serem levados ao conhecishymento de terceiros os valores transacionados O uso reiterado dessa praacutetica apoiada no elemento confianccedila passou a representar costume adotado nesse tipo de negoacutecio juriacutedico

Teoria da boa-feacute A adoccedilatildeo dessa teoria conduz o inteacuterprete a entender que o sigilo bancaacuterio por sua proacutepria natureza estaacute vinculado ao caraacuteter fiduciaacuterio da atividade bancaacuteria fundando-se portanto na boa-feacute ou dever de lisura que tanto marca o tipo de negoacutecio juriacutedico firmado

Teoria do sigilo profissional Essa teoria concebe o sigilo bancaacuterio como sendo uma espeacutecie do sigilo profissional Haacute portanto um dever eacutetico do banshyco em respeitar o sigilo bancaacuterio em decorrecircncia da profissatildeo exercida

Teoria do direito agrave intimidade dos bancos Os integrantes dessa forma de pensar sustentam que a instituiccedilatildeo financeira tem legiacutetimo interesse de afastar do conhecimento de terceiros a movimentaccedilatildeo financeira dos seus clientes e consequumlentemente dos fatos com elas relacionados

Teoria da complexidade do viacutenculo Essa teoria eacute explicada por Arnoldo Wald no trabalho jaacute citado da forma seguinte A doutrina moderna abandoshynou a noccedilatildeo da relaccedilatildeo juriacutedica contratual defendo a complexidade do viacutenshyculo Aleacutem dos direitos e das obrigaccedilotildees principais existem deveres secundaacuteshyrios para ambos os contratantes que decorrem da regra geral da boa-feacute denoshyminada na doutrina italiana de cOITeteza e na legislaccedilatildeo alematilde de Treu und Glauben Exige que a atuaccedilatildeo de uma parte natildeo cause danos agrave esfera juriacutedica da outra Dentro desta ideacuteia defende-se que o segredo bancaacuterio eacute um dever

7 Arnoldo Wald em Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais artigo publicado na Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas n 22 pp 1518 manifesta entendimento de que no campo normatIacutevo do Direito brasileiro esta teoria encontra respaldo nos arts 130 e 131 do Coacutedigo Comercial que prevecirc a interpretaccedilatildeo dos contratos segundo os usos os costumes e a boa-feacute

242 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

acessoacuterio na relaccedilatildeo juriacutedica Mesmo que natildeo nasccedila o contrato entre as partes a boa-feacute objetiva impede que a instituiccedilatildeo financeira prejudique os interesses do cidadatildeo

Estabelecidos os pressupostos doutrinaacuterios acima examinamos agora se o sigilo bancaacuterio diz respeito agrave intimidade e agrave privacidade das pessoas

A Constituiccedilatildeo Federal em seu artigo 5ordm incisos X e XII afirma

Art 5ordm Todos satildeo iguais perante a lei sem distinccedilatildeo de qualquer natureza garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Paiacutes a inviolabilidade do direito agrave vida agrave liberdade agrave igualdade agrave segushyranccedila e agrave propriedade nos termos seguintes

X - satildeo inviolaacuteveis a intimidade a vida privada a honra e a imagem das pessoas assegurado o direito agrave indenizaccedilatildeo pelo dano material ou moral decorrente de sua violaccedilatildeo

XJl - eacute inviolaacutevel o sigilo da correspondecircncia e das comunicaccedilotildees telegraacuteficas de dados e das comunicaccedilotildees telefocircnicas salvo no uacuteltimo caso por ordem judicial nas hipoacuteteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigaccedilatildeo criminal ou instruccedilatildeo processual penal

Essas garantias constitucionais protegem o cidadatildeo de qualquer investida de terceiros em sua intimidade em sua vida privada e no sigilo de seus dados

Na expressatildeo terceiros estaacute incluiacutedo o Estado e consequumlentemente seus agentes poliacuteticos e administrativos

A doutrina tem se manifestado de modo quase unacircnime no sentido de que o sigilo bancaacuterio eacute uma garantia constitucional que protege a privacidade das pessoas no campo econocircmico e financeiro A sua significaccedilatildeo eacute de natildeo tornar puacuteblica a movimentaccedilatildeo da conta bancaacuteria e das aplicaccedilotildees financeiras do cidadatildeo para que de nenhum modo os atos privados praticados possam ser tornados puacuteblicos

Esse posicionamento eacute o adotado pelos autores que passo a citar

Arnoldo Wald (O Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais artigo pushyblicado na Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas RT n 22 pp 1521)

O sigilo bancaacuterio eacute o meio para resguardar a privacidade no camshypo econocircmico pois veda a publicidade sobre a movimentaccedilatildeo da conta corrente bancaacuteria e das aplicaccedilotildees financeiras

ENSAIOS JURiacuteDICOS 243

Eivany A Silva (Consideraccedilotildees a Respeito do Sigilo de Dados artigo publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio n 61 Satildeo Paulo Editora Dialeacutetica p27)

A maioria dos ordenamentos juriacutedicos como o brasileiro tratam o sigilo bancaacuterio como direito fundamental do contribuinte agrave privacidashyde ou seja agrave resistecircncia agrave comunicaccedilatildeo de dados que representem desshydobramento da personalidade da pessoa direito agrave oposiccedilatildeo e agrave negaccedilatildeo de comunicaccedilatildeo

Ives Gandra da Silva Martins (Sigilo Bancaacuterio trabalho publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio S Paulo Editora Dialeacutetica n 1 pp 24 e 25)

Pelos incisos X e XII do artigo 5ordm tem o contribuinte o direito de preservaccedilatildeo de sua intimidade de sua privacidade e de que terceiros que detenham informaccedilotildees pessoais suas sejam obrigados a guardaacute-Ias

Natildeo pode pois a fiscalizaccedilatildeo exigir de terceiros informaccedilotildees que apenas pode obter do proacuteprio contribuinte

Em determinadas hipoacuteteses todavia o interesse puacuteblico haacute de preshyvalecer sobre o interesse individual mas caberaacute a um outro poder definir se tais hipoacuteteses efetivamente ocorrem com o que poderaacute o Poder Judishyciaacuterio autorizar se convencido estiver o magistrado de que a hipoacutetese eacute de gravidade e de lesatildeo ao interesse puacuteblico a quebra do direito ao sigilo bancaacuterio

Estou convencido ser esta a melhor conformaccedilatildeo juriacutedica da quesshytatildeo idealizada pelos constituintes defendida pela doutrina e consagrashyda na jurisprudecircncia corrente exegeacutetica esta a que me filio desde os meus primeiros escritos sobre a mateacuteria

Roberto Quiroga Mosquera (Tributaccedilatildeo no Mercado Financeiro e de Capitais obra publicada pela Editora Dialeacutetica Satildeo Paulo 1998 pp 70171)

Do exposto ateacute aqui eacute evidente que o direito ao sigilo bancaacuterio representa uma espeacutecie de direito agrave privacidade

Eacute incontroverso que os dados e informaccedilotildees de natureza bancaacuteria dizem respeito agrave intimidade e agrave vida privada dos cidadatildeos Dados que dizem respeito aos valores em dinheiro depositados em contas-correnshytes bancaacuterias tipos e caracteriacutesticas de aplicaccedilotildees financeiras ganhos e prejuiacutezos auferidos ou incorridos em operaccedilotildees bursaacuteteis etc satildeo sem sombra de duacutevida elementos particulares e pessoais de qualquer indiviacuteshyduo

244 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Utilizando outra voz informaccedilotildees que tocam no aspecto financeishyro do ser humano representam direito iacutentimo e personaliacutessimo devendo ser mantidas em sigilo por aqueles que eventualmente as detenham em razatildeo de sua atividade profissional Parece-nos que tal conclusatildeo eacute de uma clareza inconteste

Natildeo tem sido outra a posiccedilatildeo da doutrina mais abalizada do Paiacutes e da jurisprudecircncia dominante

o autor referido a seguir faz a observaccedilatildeo seguinte

Carlos Alberto Hagstrom (Sigilo Bancaacuterio Novas Questotildees Reshyvista de Direito Mercantil Satildeo Paulo Malheiros 1997 vaI 105 pp 4344) expotildee que apesar de existirem diversas teorias que procuram fundashymentar juridicamente o sigilo bancaacuterio modernamente a explicaccedilatildeo para o fundamento do referido instituto sofreu uma radical alteraccedilatildeo Divershysas constituiccedilotildees modernas esclarece o mencionado autor ampliaram e explicitaram o elenco de direitos e garantias individuais passando a garantir o direito agrave privacidade e agrave intimidade A Constituiccedilatildeo brasileira natildeo trilha caminho diferente Assegurou referidos direitos de forma exshypressa e sem restriccedilotildees O tema do sigilo bancaacuterio figura agora em niacutevel constitucional Tem status de norma superior no qual se reconhece o direito agrave intimidade como norma de caraacuteter geneacuterico em que estatildeo conshytemplados muacuteltiplos aspectos da vida privada em especial os de ordem econocircmico-financeira que compotildeem o que Hagstrom denominou a inshytimidade econocircmica ou intimidade patrimonial

Luiacutes Fernando 8ellinetti (Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio artigo publicado na Revista de Direito do Consumidor n 18 pp 141151)

Como jaacute dissemos anteriormente em certas hipoacuteteses o fundashymento para o segredo bancaacuterio seria a privacidade No entanto nesses casos o que se protege eacute a privacidade e natildeo propriamente o sigilo

Entendemos que uma coisa eacute garantir-se a privacidade da pessoa com fundamento em norma constitucional outra eacute garantir-se o segreshydo de informaccedilotildees bancaacuterias de uma pessoa com base na legislaccedilatildeo supramencionada

Sempre que a revelaccedilatildeo de informaccedilotildees bancaacuterias puder violar a privacidade da pessoa parece-nos que mais do que garantia ao sigilo bancaacuterio (com fundamento legal) tem a pessoa garantia agrave sua privacishydade (com fundamento constitucional)

ENSAIOS JURiacuteDICOS 245

No entanto se a revelaccedilatildeo da informaccedilatildeo natildeo invadir a esfera da intimidade da pessoa sua garantia eacute meramente legal do sigilo bancaacuterio

Carlos Maacuterio Velloso (citado por Misabel Derzi em Direito Tributaacuterio Aplicado obra publicada pela Editora Del Rey Belo Horizonte MO pp 278 e 279)

O sigilo bancaacuterio decorre do direito agrave privacidade inerente agrave pershysonalidade das pessoas consagrado na Constituiccedilatildeo Federal em seu art 5ordm X e protege tanto interesses privados como finalidades de ordem puacuteblica a saber o sistema de creacutedito O sigilo bancaacuterio natildeo eacute um princiacuteshypio absoluto

As exceccedilotildees ao sigilo bancaacuterio estatildeo previstas na Lei n 45951964 que continua em vigor

O Poder Judiciaacuterio pode requisitar relativamente a pessoas e instishytuiccedilotildees informaccedilotildees que implicam quebra de sigilo (Lei n 45951964 art 38 sect 1 ordm) entretanto mesmo havendo inqueacuterito policial instaurado deveraacute proceder com cautela prudecircncia e moderaccedilatildeo inerentes agrave mashygistratura

Luciana Fregodolli (O Direito agrave Intimidade - excerto da dissertaccedilatildeo que apresentou sob o tiacutetulo O Direito agrave Intimidade e a Prova Iliacutecita publicado pela Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Constitucional e Ciecircncia Poliacutetica -n 19 p 233)

O sigilo bancaacuterio protege interesses privados Eacute ele espeacutecie de direito agrave privacidade inerente agrave personalidade das pessoas e que a Consshytituiccedilatildeo Federal consagra no art 5ordm X aleacutem de atender a uma finalidade de ordem puacuteblica qual seja a de proteccedilatildeo ao sistema de creacutedito

O direito agrave privacidade abrange atualmente o de impedir que tershyceiros inclusive o Estado e o Fisco tenham acesso a informaccedilotildees sobre o que se denominou a aacuterea de manifestaccedilatildeo existencial do ser humano

Celso Ribeiro Bastos O pensamento de Celso Ribeiro Bastos foi exshyposto por Roberto Quiroga Mosquera na obra jaacute referida p 71 do modo seguinte

Celso Bastos eacute do mesmo pensar Apoacutes tecer consideraccedilotildees introdutoacuterias acerca do sigilo bancaacuterio e expor pensamentos de divershysos autores nacionais e alieniacutegenas conclui o constitucionalista brasileishyro no sentido de que todas as despesas ordinaacuterias feitas pelo cidadatildeo

246 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

comum em sua vida cotidiana devem ser consideradas parte de sua vida privada familiar ou domeacutestica e portanto protegidas contra interferecircnshycias a despeito de qualquer pretexto Desde as condutas mais corriqueishyras como as compras efetuadas em um supermercado para manutenshyccedilatildeo da famiacutelia quanto aquelas outras moralmente reprovaacuteveis como presentes ou joacuteias compradas e dadas a quem presta ao homem servishyccedilos de natureza extraconjugal tudo estaacute abarcado pelo manto da proteshyccedilatildeo agrave vida privada familiar ou domeacutestica ( ) E mais adiante arremata Hoje praticamente a vida do homem pode ser escrita a partir de seu talatildeo de cheques e nas sociedades mais avanccediladas pelos cartotildees de creacutedito e magneacuteticos Permitir-se que o sigilo bancaacuterio venha a ser romshypido por qualquer forma natildeo-extraordinaacuteria para salvaguarda de inteshyresse de porte no miacutenimo idecircntico eacute expor a seguranccedila individual a um constante e absurdo temor perante as possibilidades de controle direto ou pelo vazamento de alguma informaccedilatildeo

Haacute contudo corrente contraacuteria como passaremos a demonstrar

Andreacute Serratildeo Borges de Sampaio Consultor da Uniatildeo nas informashyccedilotildees prestadas ao Advogado-Geral da Uniatildeo sobre a ADIn n 2397 cita trechos de doutrina e jurisprudecircncia estrangeiras defendendo o entendimento de que o sigilo bancaacuterio natildeo tem conotaccedilatildeo de direito de privacidade Eis o que escreshyveu o parecerista citado

O jurista portuguecircs J L Saldanha Sanches coteja primorosashymente o sigilo bancaacuterio com a proteccedilatildeo da intimidade para concluir que natildeo haacute que se falar em direito ao sigilo bancaacuterio como concretizaccedilatildeo do direito agrave intimidade Nas suas palavras

Ora em que esfera podemos noacutes incluir o segredo bancaacuteshyrio enquanto instituto que concretiza certos valores do ordenashymento juriacutedico Como expressatildeo de interesses juridicamente tuteshylados

Seraacute o segredo bancaacuterio um prolongamento do direito agrave inshytimidade da esfera pessoal e familiar de uma qualquer pessoa sinshygular (uma vez que em relaccedilatildeo agraves pessoas coletivas a questatildeo natildeo pode mesmo ser colocada) Ou diraacute antes respeito aquela faixa mais larga que resguarda a privacidade de qualquer cidadatildeo e que soacute pode por isso sofrer qualquer intromissatildeo se surgirem razotildees vaacutelidas para que tal direito seja restringido

Ao afirmar-se que na perspectiva dos clientes dos bancos o segredo bancaacuterio eacute um direito com a reserva da sua vida privada temos uma primeira resposta para esta questatildeo

ENSAIOS JURiacuteDICOS 247

Mas falta distinguir entre intimidade e reserva da vida privashyda e entre clientes individuais e profissionais de um banco Natildeo estamos perante o mesmo tipo de tutela quando contamos que um particular espera que o banco natildeo divulgue a qualquer inteshyressado o volume da sua conta bancaacuteria (porque pura e simplesshymente quer manter sob reserva a sua vida particular) ou quando um comerciante confia no banco para que este natildeo revele quem satildeo os seus clientes fornecedores ou qual eacute o seu grau de endividamento

No caso da pessoa singular estaacute apenas em causa um conshyjunto de valores de natureza moral esta natildeo estaacute em princiacutepio preocupada com possiacuteveis prejuiacutezos econocircmicos ligados a qualshyquer divulgaccedilatildeo Apenas se opotildee por razotildees do seu foro pessoal e que natildeo carecem de fundamentaccedilatildeo que esta tenha lugar

Enquanto que o comerciante pode ser seriamente prejudishycado em termos concorrenciais com a revelaccedilatildeo da lista dos seus clientes ou com a sua situaccedilatildeo financeira

O dever de reserva que cabe ao banqueiro estaacute desta forma a serviccedilo do interesse comercial das empresas suas clientes - que pelo simples facto de o serem ou por necessitarem de obter creacutedishyto lhe datildeo informaccedilotildees com um forte valor comercial ou da pesshysoa singular que deseja manter a privacidade da sua situaccedilatildeo patrimonial

Ou em alternativa ao serviccedilo da manutenccedilatildeo da privacidashyde que qualquer um pode desejar ainda que a possiacutevel violaccedilatildeo desta apenas lhe possa acarretar danos natildeo-patrimoniais

E por isso o segredo bancaacuterio natildeo pode constituir a expresshysatildeo do imperativo constitucional da proteccedilatildeo da intimidade Ateacute porque o acesso a essa esfera estaacute vedado aos proacuteprios bancos

Natildeo nos parece aceitaacutevel que um banco como condiccedilatildeo para a concessatildeo de creacutedito a uma pessoa singular ou para estashybelecer com ela qualquer relaccedilatildeo contratual possa exigir desta informaccedilatildeo de tipo estritamente pessoal ou a sujeiccedilatildeo a exames meacutedicos que atingindo a sua esfera iacutentima afectam a sua dignidashyde Aqui estaacute em causa a ilicitude da pergunta por pressupor o acesso agrave esfera inviolaacutevel (e indisponiacutevel) da intimidade

A informaccedilatildeo que o banco pode obter para a defesa dos seus interesses legiacutetimos natildeo pode ir aleacutem da esfera patrimonial do seu cliente rendimentos bens possuiacutedos perspectivas profisshysionais

( )

248 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

Podemos pois concluir que o segredo bancaacuterio natildeo eacute natildeo pode ser uma concretizaccedilatildeo do princiacutepio constitucional do direishyto agrave intimidade

Este princiacutepio tem como funccedilatildeo consagrar uma zona de reshyselVa pessoal para factos opccedilotildees e circunstacircncias que soacute de forshyma indirecta e de todo secundaacuteria podem ter aspectos ou refleshyxos de natureza patrimonial (Saldanha Sanches J L Segredo Bancaacuterio e Tributaccedilatildeo do Lucro Real In Saldanha Sanches J L Estudos de Direito Contabiliacutestico e Fiscal Coimbra Coimbra Edishytora 2000 pp 105108)

Em diversos paiacuteses haacute a clara percepccedilatildeo que natildeo haacute que se conshyfundir direito agrave intimidade com sigilo bancaacuterio indicando que a quebra do sigilo pela Administraccedilatildeo Tributaacuteria natildeo constitui violaccedilatildeo ao direito Ao contraacuterio a existecircncia de um Estado Fiscal implica na necessidade de consagrar agrave administraccedilatildeo tributaacuteria tal faculdade o que se harmonishyza com diversos princiacutepios e outros direitos fundamentais constantes da Carta de 1988

O caso espanhol eacute exemplar neste sentido ao natildeo visualizar a vioshylaccedilatildeo ao direito agrave intimidade em relaccedilatildeo agrave quebra do sigilo bancaacuterio Portanto

el Tribunal Constitucional espaflOl se ha pronunciado por la negativa de que el conocimiento de las cuentas bancarias por la Administracioacuten pueda invadir el aacutembito constitucionalmente garantizado de la intimidad de los individuos porque tales extractos no constituyen per se uma biografiacutea personal en nuacutemeros y en siacute no tiene relevancia para la intimidad personal y familiar dei contribuyente ya que se trata de dados no secretos y confiados a una entidad (Campos Laura Rodriacuteguez Oerechos dei Contribuyente em la Repuacuteblica Argentina ai Amparo de la Convencioacuten Interamericana de Oerechos Humanos http wwwiefpaorgarcriteriosdigitalarticulosderechoshtm Visitado em 512001)

Ao analisar a jurisprudecircncia da Corte Constitucional espanhola quanto ao tema tambeacutem ressalta Saldanha Sanches

Na apreciaccedilatildeo da constitucionalidade da lei que permitia o controle administrativo das contas bancaacuterias o Tribunal Constitushycional espanhol realizou uma distinccedilatildeo entre intimidade pessoal e familiar e a intimidade econoacutemica onde a proteccedilatildeo constitucional eacute menos intensa

ENSAIOS JURiacuteDICOS 249

E procura fazer uma distinccedilatildeo entre a violaccedilatildeo agrave intimidade como consequumlecircncia de uma anaacutelise das contas bancaacuterias - coloshycando a hipoacutetese de uma recusa de cooperaccedilatildeo por parte do conshytribuinte se tal eventualidade se verificar - e a violaccedilatildeo directa da intimidade uma vez que esta natildeo pode resultar de uma mera anaacuteshylise de movimentos bancaacuterios (Saldanha Sanches J L A Situashyccedilatildeo Actual do Sigilo Bancaacuterio a Singularidade do Regime Portushyguecircs In Saldanha Sanches J L Estudos de Direito Contabiliacutestico e Fiscal Coimbra Coimbra Editora 2000 p 91)

Outro comentarista ao analisar a situaccedilatildeo do sistema espanhol quanto ao sigilo bancaacuterio e o direito agrave intimidade fez questatildeo de ressaltar

Seguacuten el r c frente a la Hacienda Puacuteblica no existe el derecho a la intimidad deI art 18 CE Ya la LO de 5 de mayo deI 82 vada praacutecticamente de contenido constitucional el derecho a la intimidado en cuanto el aacutembito de eacutesta queda deferido a la ley ordinaria (a 2ordm) y en cuanto que la esfera protegida frente a las Administraciones se reduce a poco O nada ai no reputarse intromisiones ilegiacutetimas las actuaciones autorizadas o acordadas por la Autoridad competente de acuerdo con la Ley (art 8ordm 1)

La LGTy el RI Iimiacutetan la esfera de la intimidad en las relacishyones con la Hacienda hasta el extremo de que solamenle existe un refugio limitado en el aacutembito deI secreto profesional en los casos de informacioacuten sobre terceros y siempre que no se trate de datos con transcendencia econoacutemica o tributaria EI rc no ha enconshytrado hasta el momento ni un solo supuesto de dato o informacioacuten econocircmica con transcendencia tributaria que limite la accioacuten inquisitiva de la Administracioacuten tributaria por razoacuten de intimidado Bien puede decirse por tanto que frente a la Administraciocircn tribushytaria en cuanto se trata deI ejercicio de su funciocircn de buacutesqueda de datos con transcendencia tributaria el derecho a la intimidad personal y familiar (art 18 I CE) no existe

La biacuteblia deI tribunal a estos efeclos estaacute constituida por la S 11084 reiterada en numerosas ocasiones ampliada en el Auto 64286 y reafirmada por ejemplo en la S 26 abril 90 tantas veces citada (FJ 10deg) Seguacuten esa doctrina la distribucioacutenjusta de la carshyga fiscal prevalece sobre el derecho a la intimidad parte dei art 812 I de la LO seguacuten el cual frente a la Ley (ordinaria) no hay intimidad protegida siempre que haya en dicha ley imperativos de intereacutes puacuteblico ( ) ni siquiera se habla dei predomiacutenio frente a la

250 SUPERIOR TRIBUNAl DE JUSTiCcedilA

intimidad de intereses u objetivos constitucionalmente protegidos Soacuteo admite que la actuadoacuten administrativa es arbitraria cuando no parezcajustificada por la Finalidad de la inspeccioacuten es decir cuando se trate de datos o informaciones que carezcan de transcendencia tributaria pero eacuteste obviamente no es sin Umite derivado dei derecho a la intimidad sino de la interdiccioacuten de arbitrariedad o desviacioacuten de poder de la Administracioacuten de la necesidad de ajuste de toda Administracioacuten ai acircmbito de su competencia que tanto vale para datos iacutentimos como para otros que no lo sean Seguacuten la S 11084 no hay esfera de intimidad proshytegida frente a una Administracioacuten tributaria amparada en una norma que elimina la intimidad como liacutemite (Garciacutea AIacuteloveros Jaime Una Nueva Ley General Tributaria Problemas Constitucioshynales In Kirchhof P et aI Garantiacuteas Constitucionales dei Contribuyente Valencia Tirant lo Blanch 1999 pp 109110)

Diante de tudo quanto foi exposto tendo-se o cuidado de registrar posicionamento de diferentes autores nacionais e estrangeiros haacute ambiente preparado para ser respondido o primeiro questionamento desdobrado em trecircs partes formulado para o 1II Coloacutequio Internacional de Direito Tributaacuterio promoccedilatildeo do Centro de Extensatildeo Universitaacuteria Eis a primeira parte do seu teor

O sigilo bancaacuterio diz respeito agrave intimidade e privacidade das pessoas

A resposta eacute optando por convencimento influenciado pelas ideacuteias da corrente predominante positiva

O nosso entendimento eacute no sentido de que o direito agrave intimidade integra os direitos da personalidade e visam proteger o direito agrave inviolabilidade do domiciacutelio da correspondecircncia das comunicaccedilotildees de quaisquer espeacutecies dos dados pessoais computadorizados do sigilo bancaacuterio O mesmo acontece com o direito agrave privacidade

A expansatildeo da proteccedilatildeo do direito agrave intimidade e agrave privacidade eacute uma consequumlecircncia da evoluccedilatildeo da era contemporacircnea nos setores tecnoloacutegicos e da instabilidade que passam as instituiccedilotildees estatais especialmente a encarreshygada de arrecadar tributos Haacute o reconhecimento de que desenvolve-se um processo de aguda corrosatildeo na proteccedilatildeo agrave intimidade que ao ser violada provoca a publicizaccedilatildeo das condutas mais iacutentimas do cidadatildeo

A concepccedilatildeo do sigilo bancaacuterio no acircmbito do direito agrave intimidade e agrave privacidade visa garantir ao homem o miacutenimo capaz para que lhe seja asseshygurada a sua condiccedilatildeo humana protegendo-o de ingerecircncias alheias como apregoa a Conferecircncia Noacuterdica sobre o Direito agrave Intimidade realizada em Estoshycolmo na data de maio de 1967 ao fazer inserir no documento que publicou a seguinte definiccedilatildeo O direito agrave intimidade eacute o direito do homem de viver de forma independente a sua vida com um miacutenimo de ingerecircncia alheia

ENSAIOS JURiacuteDICOS 251

5 Seguranccedila juriacutedica e acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias

A segunda pergunta apresentada pelos organizadores do coloacutequio estaacute assim posta

A seguranccedila das relaccedilotildees juriacutedicas atraveacutes do Sistema Financeiro pode ser afetada pelo acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves inforshymaccedilotildees bancaacuterias

O acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias se realizado caracteriza um atentado de suma gravidade aos direishytos do cidadatildeo Eacute um ataque aos princiacutepios sustentadores do sistema demoshycraacutetico adotado pelo constituinte de 1988 especialmente quando detonou que a Repuacuteblica Federativa do Brasil tem como objetivo fundamental o respeishyto agrave dignidade humana e agrave cidadania

Do ordenamento juriacutedico brasileiro a meu pensar natildeo haacute lugar para brotar qualquer interpretaccedilatildeo que conclua pela possibilidade de qualquer agenshyte do Poder Puacuteblico acessar de modo generalizado e sem motivaccedilatildeo informashyccedilotildees bancaacuterias do cidadatildeo mesmo com autorizaccedilatildeo judicial

Esclareccedilo desde logo que natildeo comungo com o pensamento de detershyminada corrente no sentido de ser absoluto o direito ao sigilo bancaacuterio Tenho-o como relativo poreacutem vinculado aos princiacutepios da razoabilidade da moralidade da legalidade e da motivaccedilatildeo expliacutecita e detalhada sob pena de ser impossiacutevel a sua quebra

O acesso indiscriminado do agente fiscal agraves informaccedilotildees bancaacuterias do cidadatildeo gera uma quebra da seguranccedila das relaccedilotildees juriacutedicas por um terceiro passar a ter sem causa justificadora conhecimento da vida iacutentima de algueacutem submetendo-o a partir daiacute a um regime de submissatildeo Por outro lado ninshygueacutem poderaacute garantir nem o proacuteprio Estado que o agente puacuteblico utilize os dados que chegaram ao seu conhecimento para outros intentos que natildeo o exclusivamente fiscal

Lembra Arnoldo Wald que O segredo na atividade bancaacuteria envolve concomitantemente interesses privaqos e coletivos que podem ser analisashydos sob trecircs acircngulos o interesse do cliente na sua relaccedilatildeo com a instituiccedilatildeo financeira o interesse do banco em atuar com discriccedilatildeo para ganhar a conshyfianccedila da populaccedilatildeo e captar recursos e o interesse social na existecircncia de um bom e eficiente sistema bancaacuterio Por estarem ligadas ao desenvolvimento da economia e aos interesses da comunidade as relaccedilotildees que envolvem as instishytuiccedilotildees financeiras natildeo recebem o mesmo tratamento juriacutedico dispendido a outras relaccedilotildees comerciais Inviaacutevel a aplicaccedilatildeo exclusiva das regras de Direito Privado as quais tecircm como princiacutepio norteador a autonomia da vontade pois

252 SUPERIOR TRIBUNAl DE JUSTiCcedilA

esta encontra limites nas normas cogentes proacuteprias do direito bancaacuterio e na intervenccedilatildeo do Estado8

A seguranccedila juriacutedica desse tipo de relaccedilatildeo envolve tambeacutem a manutenshyccedilatildeo do segredo das movimentaccedilotildees financeiras do contribuinte

Imprimir-se a mais ampla seguranccedila nas relaccedilotildees do Sistema Financeiro eacute fortalececirc-lo O Estado tem o dever de zelar por esse estado de seguranccedila natildeo permitindo consequumlentemente que o sigilo bancaacuterio seja quebrado pelo acesshyso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico por esse comportamento afeshytar a confiabilidade no sistema

Eacute de todo inconveniente permitir a possibilidade de um atuar do agente fiscal sem controle na quebra do sigilo bancaacuterio por afetar diretamente a seshyguranccedila da relaccedilatildeo juriacutedica firmada entre a instituiccedilatildeo financeira e o seu clienshyte em face deste sentir-se atingido pela accedilatildeo fiscal que passa a tomar conhecishymento de sua intimidade financeira e de fatos de sua vida privada sem o resshypaldo do Poder Judiciaacuterio

A seguranccedila juriacutedica nesse tipo de relaccedilatildeo deve assegurar impossibilidashyde de abuso de poder por parte do Fisco em face da necessidade de ser resshyguardada a garantia de que em um Estado de Direito natildeo pode ser concebido que conceda-se a uma parte mesmo que seja o Estado o domiacutenio absoluto de apanhar as provas que iraacute utilizar em caso de litiacutegio contra algueacutem

O acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias do contribuinte aleacutem de afetar a seguranccedila juriacutedica da relaccedilatildeo em questatildeo promove um desequiliacutebro entre o cidadatildeo-contribuinte e o Fisco por caracterizar coaccedilatildeo que coloca aquele em posiccedilatildeo de inferioridade

A valorizaccedilatildeo da seguranccedila juriacutedica da relaccedilatildeo existente entre instituiccedilatildeo financeira e contribuinte pelo Fisco natildeo quebrando o seu sigilo fiscal sem autorizaccedilatildeo judicial constitui causa de aplicaccedilatildeo de Justiccedila fiscal O seguimenshyto de seus princiacutepios valoriza o regime democraacutetico do qual ela faz parte

6 Casos de admissibilidade da quebra do sigilo bancaacuterio

Os casos de admissibilidade da quebra do sigilo bancaacuterio estatildeo na atuashylidade descritos no nosso ordenamento juriacutedico positivo

A Lei Complementar n 105 de 10 de janeiro de 2001 apoacutes determinar no art 112 de que as instituiccedilotildees financeiras conservaratildeo sigilo em suas operashyccedilotildees ativas e passivas e serviccedilos prestados dispotildee no sect 312 do mesmo artigo que

8 Arnoldo Wald no artigo Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais Revista dos Tribunais ano 6 n 22 janeiromiddotmarccedilo de 1998 n 22 Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas p 15

ENSAIOS JURiacuteDICOS 253

sect 3ordm Natildeo constitui violaccedilatildeo do dever de sigilo

I a troca de informaccedilotildees entre instituiccedilotildees financeiras para fins cadastrais inclusive por intermeacutedio de centrais de risco observadas as normas baixadas pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e pelo Banco Censhytral do Brasil

11 - o fornecimento de informaccedilotildees constantes de cadastro de emitentes de cheques sem provisatildeo de fundos e de devedores inadimplentes a entidades de proteccedilatildeo ao creacutedito observadas as norshymas baixadas pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e pelo Banco Central do Brasil

JJI - o fornecimento das informaccedilotildees de que trata o sect 2ordm do art II da Lei n 9311 de 24 de outubro de 1996

IV - a comunicaccedilatildeo agraves autoridades competentes da praacutetica de iliacutecitos penais ou administrativos abrangendo o fornecimento de inforshymaccedilotildees sobre operaccedilotildees que envolvam recursos provenientes de qualshyquer praacutetica criminosa

V - a revelaccedilatildeo de informaccedilotildees sigilosas com o consentimento expresso dos interessados

VI- a prestaccedilatildeo de informaccedilotildees nos termos e condiccedilotildees estabeleshycidos nos artigos 2ordm 3ordm 4ordm 5ordm 6ordm 7ordm e 9ordm desta lei complementar

sect 4ordm A quebra de sigilo poderaacute ser decretada quando necessaacuteria para apuraccedilatildeo de ocorrecircncia de qualquer iliacutecito em qualquer fase do inqueacuterito ou do processo judicial e especialmente nos seguintes crimes

I - de terrorismo

11 - de traacutefico iliacutecito de substacircncias entorpecentes ou drogas afins

III - de contrabando ou traacutefico de armas municcedilotildees ou material destinado a sua produccedilatildeo

IV - de extorsatildeo mediante sequumlestro

V - contra o sistema financeiro nacional

VI - contra a Administraccedilatildeo Puacuteblica

Vll- contra a ordem tributaacuteria e a previdecircncia social

VIII-lavagem de dinheiro ou ocultaccedilatildeo de bens direitos e valores

IX - praticado por organizaccedilatildeo criminosa

Como visto a lei complementar enumera inuacutemeras situaccedilotildees que indeshypendentemente de autorizaccedilatildeo judicial o sigilo bancaacuterio eacute quebrado

254 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

A dificuldade que se apresenta eacute a de conciliar os casos de quebra de sigilo bancaacuterio que a Lei Complementar n 105 autoriza com a garantia do direito agrave privacidade e agrave intimidade

Destaque-se entre os de maior relevacircncia os seguintes

- natildeo constituir violaccedilatildeo do dever de sigilo bancaacuterio a troca de informashyccedilotildees entre instituiccedilotildees financeiras para fins cadastrais inclusive por intermeacuteshydio de centrais de risco o que possibilita o conhecimento da vida financeira privada do cidadatildeo por vaacuterias pessoas sem desempenho de autoridade na instituiccedilatildeo independentemente de ser justificada com antecedecircncia a causa desse atuar

- o de serem fornecidos dados relativos a fornecimentos de informashyccedilotildees cadastrais de emitentes de cheques sem provisatildeo de fundos a entidades privadas de proteccedilatildeo ao creacutedito sem qualquer avaliaccedilatildeo por qualquer autorishydade da causa determinante do fato a quebra do sigilo bancaacuterio na fase do inqueacuterito por inexistir nessa ocasiaacuteo qualquer contraditoacuterio e respeito ao prinshyciacutepio do devido processo legal

Quanto agraves demais situaccedilotildees constantes na lei complementar que autorishyzam a quebra do sigilo bancaacuterio naacuteo obstante algumas serem absolutamente necessaacuterias haacute de serem vistas em compatibilidade com as garantias constitushycionais conforme jaacute assinalado

O colendo Supremo Tribunal pronunciaraacute como guarda e inteacuterprete maishyor da Carta Magna em ADln jaacute intentada sobre a constitucionalidade ou natildeo dos dispositivos supramencionados

Em campo doutrinaacuterio valoriza-se as posiccedilotildees apresentadas quando da resposta oferecida aos questionamentos anteriores todas acenando pela neshycessidade do controle do Poder Judiciaacuterio

7 Sistema mais justo para a quebra do sigilo bancaacuterio

Os organizadores do JII Coloacutequio Internacional de Direito Tributaacuterio subshymetem agora para anaacutelise a questatildeo do teor seguinte Um sistema em que o Poder Judiciaacuterio torna-se aacuterbitro dos pedidos da Administraccedilatildeo Puacuteblica para quebra do sigilo eacute o mais justo

Em um Estado que por imposiccedilatildeo de sua proacutepria Constituiccedilatildeo estaacute comprometido com a guarda e aplicaccedilatildeo efetiva de princiacutepios democraacuteticos especialmente o de respeitar os direitos e garantias fundamentais da cidadashynia natildeo haacute ambiente para que seja outorgado ao Poder Executivo por via da atuaccedilatildeo de agentes puacuteblicos fiscais o acesso sem o controle do Poder Judiciaacuteshyrio agraves informaccedilotildees bancaacuterias do contribuinte

ENSAIOS JURiacuteDICOS 255

o sigilo bancaacuterio por ser um direito fundamental que exige ser respeitashydo pela supremacia constitucional que o protege deve submeter a possibilishydade de sua quebra para fins tributaacuterios ao Poder Judiciaacuterio pela ausecircncia de interesse direto nos resultados da accedilatildeo fiscalizadora que eacute o recolhimento do tributo e pelas garantias de independecircncia prudecircncia e qualificaccedilatildeo juriacutedica que revestem esse poder

A atuaccedilatildeo da fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo pode ser exercida fora dos limishytes da legalidade imposta a partir da Carta Magna e demais imposiccedilotildees legais a ela subordinadas

Natildeo se desconhece que no atual Estado fiscal os tributos constituem os meios financeiros determinantes para o atendimento dos compromissos da Administraccedilatildeo Puacuteblica com as obrigaccedilotildees oriundas em decorrecircncia de sua atividade no campo educacional social de seguranccedila puacuteblica interna e extershyna da sauacutede da manutenccedilatildeo dos Poderes ou seja para manter funcionando a maacutequina estatal

Por natildeo entremostrar-se na eacutepoca contemporacircnea qualquer outra alshyternativa viaacutevel para transformar o Estado fiscal em um Estado produtivo os tributos passam a representar um indeclinaacutevel dever da cidadania cujo cumshyprimento deve ser por todos honrado conforme assinala Joseacute Casalta Nabais Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra em artigo intitulado Algumas Reflexotildees sobre o Actual Estado Fiscal

Por isso os impostos hatildeo de constituir um preccedilo aceitaacutevel ou seja um preccedilo limitado Um preccedilo que estou certo muitas das sociedashydes que nos antecederam gostariam de ter pago e algumas das actuais natildeo enjeitariam suportar Por isso bem podemos afirmar como jaacute o fizeshymos noutro lugar que no actual Estado fiscal para o qual natildeo se vislumshybra qualquer alternativa viaacutevel pelo menos nos tempos mais proacuteximos os impostos constituem um indeclinaacutevel dever de cidadania cujo cumshyprimento a todos nos deve honrar

A atuaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio para liberar o bloqueio fortalece a conshyfianccedila do cidadatildeo no procedimento da fiscalizaccedilatildeo e consagra a ideacuteia iacutensita em qualquer regime democraacutetico de que a atuaccedilatildeo do Estado tem limites

Na espeacutecie os limites impostos satildeo os decorrentes da quebra do sigilo ser necessaacuterio em face da possiacutevel ilicitude cometida pelo cidadatildeo poreacutem sem ser violados os direitos do cidadatildeo de gozar da sua privacidade e da sua intimidade

A denominada cidadania fiscal haacute de ser considerada de modo conjunshytural com os reflexos dos direitos fundamentais assegurados ao contribuinte sem prestigiar a responsabilidade que tem o Estado de promover a arrecadashyccedilatildeo dos tributos

256 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

Cedo espaccedilo para registrar que a cidadania fiscal deve configurar um estado de relaccedilatildeo juriacutedica em que todos suportem a concretizaccedilatildeo de um Estado em que todos tenham a qualidade de destinataacuterio do dever fundashymentaI de pagar impostos na medida da respectiva capacidade contributiva poreacutem que seja um Estado fiscal suportaacutevel isto eacute um estado cujo sistema fiscal se encontre balizado por estritos limites juriacutedico-constitucionais9

A Administraccedilatildeo Tributaacuteria por melhor que seja a sua estrutura e os seus propoacutesitos natildeo estaacute emocionalmente preparada para conceber e aplicar os princiacutepios que sustentam a cidadania fiscal Isso ocorre primeiramente porshyque o Fisco tem por missatildeo exclusiva exercer a funccedilatildeo de arrecadar tributos Eacute a sua meta essencial por ser atribuiccedilatildeo que na organizaccedilatildeo administrativa estatal estaacute obrigado a desempenhar Natildeo lhe cabe administrar o tributo arreshycadado limitando-se unicamente a envidar esforccedilos para o cumprimento das metas impostas para imprimir aumento na arrecadaccedilatildeo tributaacuteria O sucesso da Administraccedilatildeo Tributaacuteria eacute medido pelo maior volume de recursos fiscais atraiacutedos para os cofres do Governo nunca pelo respeito que exerccedila para com os direitos fundamentais do contribuinte Eacute uma questatildeo de cultura adminisshytrativa de distribuiccedilatildeo de funccedilotildees no sistema estatal impossiacutevel de ser mudashydo por sugestotildees doutrinaacuterias

Por outro lado a fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo consegue afastar as pressotildees exercidas sobre ela por determinados segmentos da organizaccedilatildeo estatal que defendem uma atuaccedilatildeo mais agressiva para a cobranccedila dos tributos tudo em decorrecircncia dos efeitos produzidos pela conduta iliacutecita marcante da sonegashyccedilatildeo fiscal

Esses fatores contribuem para que a fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo tenha condiccedilotildees de modo imparcial sem isenccedilatildeo avaliar a necessidade objetiva da quebra do sigilo bancaacuterio do cidadatildeo Por melhor que seja o seu desempenho nunca ganharaacute a confianccedila do contribuinte

A atribuiccedilatildeo da quebra do sigilo bancaacuterio em um regime democraacutetico onde predomina o respeito maior aos direitos fundamentais da cidadania deve ser exercido pelo Poder Judiciaacuterio natildeo soacute porque seus membros atualmente revestidos da garantia da vitaliciedade inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos bem como porque estatildeo revestidos de independecircncia absoluta em relaccedilatildeo ao Poder interessado na cobranccedila do tributo e consequumlentemenshyte no resultado a ser obtido pela accedilatildeo fiscal

Esse sistema misto onde o Fisco faz a solicitaccedilatildeo motivada para a queshybra do sigilo bancaacuterio ao Poder Judiciaacuterio e este apoacutes analisaacute-lo com objetivishydade e cautela defere ou indefere impotildee seguranccedila e confiabilidade na atuashyccedilatildeo fiscal e sublima o respeito agrave dignidade do contribuinte em outras palavras da cidadania fiscal isto eacute de uma cidadania de liberdade que o Estado fiscal

9 Joseacute Casalta Nabais (Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra) no artigo Algumas Reflexotildees sobre o Actual Estado Fiscal no site httpagugovbr

ENSAIOS JURiacuteDICOS 257

pressupotildee para natildeo ser postergada impotildee um sistema fiscal balizado por esshytritos limites juriacutedico-constitucionais Limites esses que integram a chamada constituiccedilatildeo fiscal e que podemos reconduzir para natildeo nos alongarmos nesse aspecto a duas ideacuteias uma ideacuteia de seguranccedila que tem o seu tradicional e principal suporte no princiacutepio da lega1idade fiscal e uma ideacuteia de justiccedila ou equumlidade que tem a ver com a medida dos impostos e assenta no princiacutepio da capacidade contributiva 10

Em conclusatildeo a adoccedilatildeo de um sistema para a quebra do sigilo bancaacuteshyrio em que o Poder Judiciaacuterio seja o aacuterbitro dos pedidos da Administraccedilatildeo Puacuteblica natildeo eacute somente mais justo mas consegue impor maior credibilidade agrave atuaccedilatildeo fiscal e presta homenagem com intensa potencialidade aos princiacuteshypios democraacuteticos consistentes na guarda da seguranccedila juriacutedica do respeito aos direitos fundamentais do cidadatildeo nesse rol incluidos os agrave privacidade e agrave intimidade Aleacutem disso torna mais respeitaacutevel a relaccedilatildeo entre Fisco e contrishybuinte justificando portanto a opccedilatildeo do Estado pelo regime democraacutetico

8 Autoridade fiscal e faculdade incondicionada de quebrar o sigilo bancaacuterio

Essa indagaccedilatildeo consubstancia a preocupaccedilatildeo de serem estabelecidos controles para a atuaccedilatildeo do agente puacuteblico fiscal Centra-se a preocupaccedilatildeo em imprimir nas relaccedilotildees juriacutedicas tributaacuterias de quaisquer espeacutecies o primashydo da legalidade aprimorando-se o atuar vinculado

Natildeo concilia-se com os postulados da democracia a adoccedilatildeo de um sisteshyma de fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria que outorgue faculdade incondicionada ao fiscal tributaacuterio de invadir a intimidade e a privacidade das pessoas sob o falso argushymento juriacutedico de que busca encontrar provas de sonegaccedilatildeo fiscal

Depreende-se do exposto que a autoridade fiscal natildeo deve ter faculdade incondicionada de quebrar o sigilo sempre que entender necessaacuterio Isso porshyque a praacutetica de atos administrativos por agentes puacuteblicos de modo incondicionado revela grave violaccedilatildeo ao princiacutepio da legalidade onde predoshymina a vontade da lei e natildeo o discricionarismo de quem o pratica

No trato do sigilo bancaacuterio o atuar incondicionado da fiscalizaccedilatildeo assushyme caracteriacutesticas de maior gravidade porque haacute violaccedilatildeo aos princiacutepios funshydamentais jaacute expostos e que satildeo prestigiados pela Carta Magna especialmenshyte por bater de frente de modo integral e absoluto com o direito agrave intimidade e agrave privacidade O atuar deve vincular-se rigidamente ao princiacutepio da legalidashyde especialmente aposta na Carta Magna sem a possibilidade de ser aberto qualquer canal para uso da conveniecircncia ou da oportunidade

Eacute de ser lembrada no trato do assunto a liccedilatildeo de Joseacute Casalta Nobais no trabalho jaacute citado no sentido de que Eacute certo que independentemente da

10 Idem p 15

=258=---___________________ SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTlCA

concepccedilatildeo a que se adira relativamente ao segredo bancaacuterio natildeo temos a menor duacutevida de que o acesso da Administraccedilatildeo Fiscal agrave informaccedilatildeo bancaacuteria seja directo sem necessidade de preacutevia decisatildeo judicial seja indirecto depois portanto de preacutevia decisatildeo judicial haacute de ter sempre uma natureza claramenshyte excepcional Na verdade constitua o segredo bancaacuterio uma manifestaccedilatildeo do direito fundamental agrave reserva da intimidade da vida privada constante do art 26 n 2 da Constituiccedilatildeo portuguesa ou suporte um outro direito fundashymentai um direito agrave reserva da vida privada anaacutelogo agravequele a sua afectaccedilatildeo teraacute sempre caraacuteter excepcional

A autoridade fiscal natildeo possui a necessaacuteria isenccedilatildeo e competecircncia institucional para averiguar o grau dessa excepcionalidade de modo que posshysa impor confianccedila ao cidadatildeo investido na condiccedilatildeo de contribuinte poreacutem com direitos a serem assegurados por forccedila do regime democraacutetico adotado

O certo eacute que na relaccedilatildeo juriacutedico-tributaacuteria deve ser buscado o justo equiliacutebrio pregado pelo Estado de Direito onde o cidadatildeo deve ter a sua dignishydade respeitada sem contudo afastar-se a necessidade do Estado arrecadar tributos de forma cogente e imperativa bem como de serem permitidas conshydiccedilotildees de atuaccedilatildeo que resultem no combate agrave sonegaccedilatildeo fiscal

9 Responsabilidade da autoridade administrativa que quebrar o sigilo banshycaacuterio de forma inconsistente e indevida

Eacute inerente ao regime democraacutetico que a autoridade administrativa puacuteblishyca estaacute obrigada a exercer as suas atribuiccedilotildees com rigorosa obediecircncia aos princiacutepios da legalidade moralidade publicidade impessoalidade e eficiecircncia entre outros

A Carta Magna consagra expressamente no art 37 a obediecircncia do agente puacuteblico a esse tipo de comportamento

A autoridade administrativia que quebrar de modo inconsistente e indevido o sigilo bancaacuterio do cidadatildeo pratica ato com capacidade de provocar os seguintes efeitos a) de invadir o direito agrave privacidade e agrave intimidade de algueacutem b) de provocar-lhe danos morais e materiais dependendo da repershycussatildeo provocada pelo seu atuar

Constatada a efetivaccedilatildeo real de danos morais e materiais a responsabishylidade do Estado pode ser acionada conforme permite o art 37 sect 6ordm da Consshytituiccedilatildeo Federal Solidificada a culpa ou dolo do agente puacuteblico e consagrada a materializaccedilatildeo do iliacutecito praticado com o consequumlente ressarcimento patrimonial o Estado deveraacute usando o direito de regresso investir contra o agente que agiu culposa ou dolosamente

Natildeo resume-se apenas ao campo da responsabilidade civil a atuaccedilatildeo da autoridade quando ilegalmente quebra o sigilo bancaacuterio de qualquer cidadatildeo

ENSAIOS JURiacuteDICOS 259

o art 10 da Lei Complementar n 105 de 10 de janeiro de 2001 determishyna que A quebra de sigilo fora das hipoacuteteses autorizadas nesta lei compleshymentar constitui crime e sujeita os responsaacuteveis agrave pena de reclusatildeo de um a quatro anos e multa aplicando-se no que couber o Coacutedigo Penal sem prejuiacuteshyzo de outras sanccedilotildees cabiacuteveis A seguir no seu paraacutegrafo uacutenico explicita que Incorre nas mesmas penas quem omitir retardar injustificadamente ou presshytar falsamente as informaccedilotildees requeridas nos termos desta lei complementar

O art 11 da mesma lei complementar expressa que O servidor puacuteblico que utilizar ou viabilizar a utilizaccedilatildeo de qualquer informaccedilatildeo obtida em decorshyrecircncia da quebra de sigilo de que trata esta lei complementar responde pessoshyal e diretamente pelos danos decorrentes sem prejuiacutezo da responsabilidade objetiva da entidade puacuteblica quando comprovado que o servidor agiu de acorshydo com a orientaccedilatildeo oficial

10 O sigilo bancaacuterio e o tratamento que lhe eacute dado por oacutergatildeos internacioshynais como a OCDE e outros

Rui Celso Reali Fragoso Presidente do Instituto dos Advogados de Satildeo Paulo em artigo intitulado O Sigilo Bancaacuterio veiculado pela Internet (http Ii wwwjuscombr) registra que atualmente temos trecircs sistemas legais no munshydo cuidando do sigilo bancaacuterio O primeiro eacute o anglo-saxatildeo em que o sigilo natildeo encontra amparo legal o segundo eacute o dos paiacuteses da Europa continental - eu o contemplo em vaacuterios diplomas legais o terceiro eacute o da Suiacuteccedila e do Liacutebano que o reforccedilam

Analisando esses trecircs sistemas o autor citado observa

Haacute aparente contradiccedilatildeo no sistema inglecircs e norte-americano pois se de um lado nestes paiacuteses se eleva a garantia das liberdades individuais de outro se despreza o sigilo bancaacuterio Eacute que se ocorre conshyflito entre a apuraccedilatildeo de fatos (fator social) e a privacidade das pessoas (fator individual) prevalece a primeira Mais ainda o relacionamento de clientes e bancos longe de estabelececirc-lo serve como fonte de informashyccedilatildeo em favor de terceiros a indiscriccedilatildeo injustificada poreacutem eacute objeto de sanccedilatildeo E na Inglaterra os poderes puacuteblicos natildeo intervecircm no funcionashymento dos estabelecimentos privados de creacutedito o que debilita a invesshytigaccedilatildeo

Nos paiacuteses da Europa continental a legislaccedilatildeo contempla o sigilo bancaacuterio como consequumlecircncia do profissional e comporta derrogaccedilotildees na esfera penal e em alguns casos na civil mas comina sanccedilotildees crimishynais no caso de violaccedilatildeo ao sigilo (Coacutedigo Penal francecircs artigo 378 Coacuteshydigo Penal italiano art 622)

260 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

A sistemaacutetica fortalecida eacute aquela utilizada na Suiacuteccedila decorrente da crise ocorrida em 1931 com o fechamento do Banco de Genebra que ensejou a ediccedilatildeo de lei estabelecendo severas puniccedilotildees de natureza civil e criminal Tanto a legislaccedilatildeo suiacuteccedila como a libanesa esta surgida em 1956 permitem derrogaccedilotildees em certas hipoacuteteses A existecircncia das conshytas numeradas comprova a importacircncia do sigilo nestes paiacuteses

Eacute certo natildeo ser absoluto o segredo nem sua quebra em determishynadas situaccedilotildees significa abuso de poder Aliaacutes nenhum direito eacute absoluto

A doutrina tem ultimamente tomado conhecimento sobre as transforshymaccedilotildees que tem passado em vaacuterios ordenamentos juriacutedicos a questatildeo do sigilo bancaacuterio

Zenobio Simotildees de Melo advogado no Paranaacute em artigo sob o tiacutetulo Quebra do Sigilo Bancaacuterio (Internet httpjuscombr) informa que o jornal O Estado de Satildeo Paulo de 21 de junho de 2000 publicou a notiacutecia seguinte

Numa das mais importantes decisotildees adotadas durante o Conseshylho Europeu que marca o fim da presidecircncia portuguesa da Uniatildeo Euroshypeacuteia (UE) seus 15 paiacuteses aprovaram ontem o pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal No ponto mais polecircmico o pacote deveraacute acabar com o sigilo bancaacuterio ateacute 2010 foi uma negociaccedilatildeo de 12 anos Aacuteustria e Luxemburgo natildeo aceitavam o princiacutepio de acabar com o sigilo bancaacuterio A justificativa austriacuteaca eacute que este eacute um princiacutepio que faz parte da Consshytituiccedilatildeo do paiacutes haacute 200 anos Para aceitar o acordo o paiacutes exigiu a manushytenccedilatildeo do sigilo nos bancos austriacuteacos para quem resida no paiacutes

Registro a iacutentegra da notiacutecia

Pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal eacute aprovado por membros da UE Decisatildeo prevecirc quebra do sigilo bancaacuterio nos paiacuteses do bloco econocircmico

Jair Rattner

Especial para o Estado

Santa Maria da Feira Portugal- Numa das mais importantes decishysotildees adotadas durante o Conselho Europeu que marca o fim da presishydecircncia portuguesa da Uniatildeo Europeacuteia (UE) seus 15 paiacuteses aprovaram ontem o pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal No ponto mais polecircmico o pashycote deveraacute acabar com o sigilo bancaacuterio ateacute 2010

Foi uma negociaccedilatildeo de 12 anos Agora temos um documento que vai estabelecer os princiacutepios e as orientaccedilotildees para as futuras diretivas nessa aacuterea afirmou o Primeiro-Ministro Portuguecircs Antonio Guterres que ocupa a presidecircncia rotativa da UE (no fim do mecircs ela seraacute transferida para a Franccedila)

ENSAIOS JURiacuteDICOS 261

o acordo abrange trecircs aacutereas um coacutedigo de conduta que prevecirc o desmantelamento dos 66 paraiacutesos fiscais existentes ou dependentes da UE a tributaccedilatildeo de royalties e o pagamento de impostos sobre rendishymentos das poupanccedilas de cidadatildeos europeus residentes em outros paiacuteshyses dentre os 15 que fazem parte do bloco econocircmico europeu

O grande problema eram as poupanccedilas Aacuteustria e Luxemburgo natildeo aceitavam o princiacutepio de acabar com o sigilo bancaacuterio A justificativa austriacuteaca eacute que este eacute um princiacutepio que faz parte da Constituiccedilatildeo do paiacutes haacute 200 anos Para aceitar o acordo o paiacutes exigiu a manutenccedilatildeo do sigilo nos bancos austriacuteacos para quem resida no paiacutes Essa questatildeo natildeo eacute importante soacute para a Europa porque abre caminho para a criaccedilatildeo de mecanismos de transparecircncia global no mundo financeiro que satildeo esshysenciais para a globalizaccedilatildeo da economia avaliou Guterres

O prazo para a introduccedilatildeo das mudanccedilas vai ateacute o fim de 2010 Ateacute o fim deste ano as negociaccedilotildees vatildeo ser sobre a definiccedilatildeo do conteuacutedo das diretivas (as normas da UE)

Em 2002 a UE discutiraacute com outros paiacuteses esses conteuacutedos para fazer acordos que deveratildeo ser aprovados ateacute o fim do ano por unanimishydade

A partir de 2003 seraacute iniciado um periacuteodo de sete anos de transishyccedilatildeo para a troca de informaccedilotildees sobre os investimentos de cidadatildeos de outros paiacuteses europeus Nesse periacuteodo alguns paiacuteses poderatildeo optar por cobrar impostos de 20 a 25 sobre os rendimentos dos investimentos de residentes no exterior

No capiacutetulo onde foi analisado o sigilo bancaacuterio no Direito Comparado haacute registros tambeacutem a respeito do tratamento que oacutergatildeos internacionais como o OCDEll e outros vecircm dando ao sigilo bancaacuterio conforme estudo que foi apresentado pelo autor ali citado

II OCDE (Organizaccedilatildeo de Cooperaccedilatildeo e Desenvolvimento Econocircmico) criado em 1961 para substituir a OECE (Comitecirc Fiscal da Organizaccedilatildeo Europeacuteia de Cooperaccedilatildeo Econocircmica) Um dos documentos mais importantes da OCDE eacute o resultante da sua Convenccedilatildeo-Modelo relashytiva a impostos sobre a renda e o capital Essa Convenccedilatildeo estaacute sistematizada em sete capiacutetulos assim explicitados por Alberto Xavier em sua obra Direito Tributaacuterio Internacioshynal do Brasil A Convenccedilatildeo-Modelo da OCDE (tal como a das Naccedilocirces Unidas) encontra-se sistematizada em sete capiacutetulos Os capiacutetulos I e I regulam os requisitos para a aplicaccedilatildeo do tratado O capiacutetulo [JI - de longe o mais importante - conteacutem as regras de distribuiccedilatildeo de competecircncia no que concerne aos impostos sobre o rendimento classificado este por tipos ou classes agrave semelhanccedila do que sucede nos sistemas de tributaccedilatildeo cedular O capiacutetulo IV ocupa-se das regras de distribuiccedilatildeo de competecircncia no que respeita aos impostos sobre o capital O capiacutetulo V determina as consequumlecircncias das regras dos capiacutetulos 111 e IV facultanshydo aos Estados a escolha entre os meacutetodos da isenccedilatildeo e da imputaccedilatildeo O capiacutetulo VI conteacutem disposiccedilotildees adicionais sobre natildeo-discriminaccedilatildeo procedimento amigaacutevel troca de informaccedilotildees e privileacutegios de funcionaacuterios diplomaacuteticos e consulares e regras sobre extenshysatildeo do tratado a partes do territoacuterio Enfim o capiacutetulo VII conteacutem disposiccedilotildees finais sobre entrada em vigor e cessaccedilatildeo do acordo

262 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

Heleno Torres em sua recente obra Direito Tributaacuterio Internacional -Planejamento Tributaacuterio e Operaccedilotildees Transnacionais RT p 147 analisando o posicionamento da OCDE referente agrave poliacutetica de determinados paiacuteses que adoshytam tributaccedilatildeo favorecida e os efeitos dos regimes fiscais prejudiciais registra que

A OCDE resolveu entrar na luta para minorar as praacuteticas fiscalshymente danosas insistindo sobre a necessidade de aumentar as trocas de informaccedilotildees entre os Estados aleacutem de redigir uma lista de paiacuteses com tributaccedilatildeo favorecida e fazer algumas recomendaccedilotildees em acircmbito nacional e convencional a partir do seu importante relatoacuterio Harmful tax competition na emerging global issue

Mesmo reconhecendo os aspectos positivos do ambiente global vigente no qual os sistemas tributaacuterios operam os paiacuteses-membros da OCDE concluiacuteram que eles precisavam agir para restringir a competiccedilatildeo tributaacuteria danosa coletivamente e individualmente opondo-se agrave expanshysatildeo de regimes de impostos preferenciais danosos particularmente nos setores financeiros e atividades de serviccedilo que podem causar distorccedilotildees no comeacutercio e desniacuteveis nos padrotildees de investimento sendo uma ameashyccedila para os sistemas tributaacuterios domeacutesticos e para a estrutura global de tributaccedilatildeo internacional

Mais adiante pp 152153 Heleno Torres afirma que

Entre as recomendaccedilotildees definidas nesse relatoacuterio com aplicashyccedilatildeo dirigida aos paiacuteses-membros da instituiccedilatildeo as mais importantes satildeo as seguintes

bull para contrastar a competiccedilatildeo fiscal prejudicial os paiacuteses devem revisar as suas leis regulamentos e praacuteticas sobre sigilo bancaacuterio para remover empecilhos de acesso a tais informaccedilotildees por autoridades fiscais

bull intensificar o uso de trocas de informaccedilotildees principalmente soshybre as transaccedilotildees com paiacuteses de tributaccedilatildeo favorecida

A conclusatildeo que pode ser firmada apoacutes anaacutelise dos pronunciamentos internacionais acima explicitados eacute a construccedilatildeo de uma corrente que defenshyde uma maior abertura para a quebra do sigilo bancaacuterio quando for necessaacuteshyrio para apurar iliacutecitos tributaacuterios

Essa portanto eacute a resposta que apresento para a indagaccedilatildeo Qual o tratamento proposto por oacutergatildeos internacionais como o OCDE e outros com relaccedilatildeo ao sigilo bancaacuterio

ENSAIOS JURiacuteDICOS 263

11 Compatibilizaccedilatildeo do combate agrave criminalidade internacional com o resshypeito agrave seguranccedila juriacutedica a fim de evitar a fuga de investimentos do Paiacutes

Haacute de se reconhecer natildeo ser faacutecil desenvolver-se um sistema juriacutedico que contenha regras que facilitem o combate agrave criminalidade internacional e ao mesmo tempo prestigie os direitos fundamentais do cidadatildeo especialmenshyte a sua seguranccedila juriacutedica

As convenccedilotildees internacionais conforme demonstrado estatildeo preocupashydas com esses aspectos sem deixar de lado os fenocircmenos causados pela globalizaccedilatildeo

Natildeo deve ser esquecido que o tema envolve aspectos diversos a comeshyccedilar pelos determinantes da soberania dos Estados das forccedilas em expansatildeo das organizaccedilotildees internacionais e da pregaccedilatildeo para que os direitos fundamenshytaIacutes do cidadatildeo sejam respeitados com maior Iacutentensidade

A soluccedilatildeo a meu pensar pode ser encontrada no fortalecimento do Direito Comunitaacuterio Os Estados por via de organismos internacionais firmashyriam tratados para a adoccedilatildeo de um Coacutedigo Processual Penal Internacional com efeitos vinculantes por parte das naccedilotildees onde seriam adotadas regras investigatoacuterias e apuratoacuterias dos iliacutecitos internacionais alargando os conceitos de indiacutecios e presunccedilotildees sem deixar contudo de prestigiar a afetividade dos direitos e garantias fundamentais do cidadatildeo

Todas as naccedilotildees no iniacutecio deste seacuteculo envidam esforccedilos para diminuir a crise da seguranccedila juriacutedica Satildeo vaacuterios os fatores determinantes todos tendo como causa comum o crescimento da delinquumlecircncia em decorrecircncia de poliacutetishycas econocircmicas e sociais adotadas por determinados governos que contrishybuem para aumentar o percentual de pessoas pobres

A preocupaccedilatildeo atual para o combate ao crime internacional eacute alcanccedilar niacutevel de uniformizaccedilatildeo dos sistemas adotados para a quebra do sigilo bancaacuteshyrio De iniacutecio deve ser defendida a postura de que nenhuma lesatildeo ou ameaccedila a direito deve ser excluiacuteda da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio Nessa perspectishyva ganha suma importacircncia a criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional em virshytude de pela sua atuaccedilatildeo natildeo perdurar a diversidade de sistemas legais a respeito do assunto a saber a) O anglo-saxatildeo onde o sigilo natildeo encontra amparo legal b) o dos paiacuteses da Europa continental que o contempla em vaacuterios diplomas escritos e c) o da Suiacuteccedila e do Liacutebano que o reforccedilam l2bull

A criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional envolve uma reconceiacutetuaccedilatildeo de soberania

Sobre o tema Celso D de Albuquerque Mello em Direito Internacional da Integraccedilatildeo Ed Renovar p 13 faz a seguinte observaccedilatildeo

12 Conforme anota Rui Celso Reali Fragoso no artigo O Sigilo Bancaacuterio publicado no site httpvvwwjuscombr

264 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Poder-se-ia fazer um pequeno reparo a Chaumont que a indeshypendecircncia nacional eacute um conceito juridicamente indeterminado e que ela pode ter diferentes graus Tanto que podemos escrever soberania versus cooperaccedilatildeo internacional apesar de reconhecermos que esta posiccedilatildeo pode ser considerada como radical vez que natildeo haacute uma total incompatibilidade entre as duas Entretanto natildeo se pode deixar de consshytatar que de certo modo a cooperaccedilatildeo internacional se encontra conshysagrada na Carta da ONU no arl 1 ordm que trata dos Propoacutesitos das Naccedilotildees Unidas e nos Princiacutepios estabelecidos na Carta da OEA (Capiacutetulo 11) O mesmo ocorre na resoluccedilatildeo da Assembleacuteia Geral da ONU de 1970 que aprova a Declaraccedilatildeo Relativa aos Princiacutepios do Direito Internacional Reshylativas agraves Relaccedilotildees Amigaacuteveis e agrave Cooperaccedilatildeo entre os Estados conforme a Carta das Naccedilotildees Unidas bem como na Carta de Direitos e Deveres Econocircmicos aprovada pela mesma Assembleacuteia Geral em 1974

O crescimento do crime internacional em decorrecircncia dos fenocircmenos globalizantes determina o surgimento de um dever juriacutedico dos Estados firmashyrem pactos de cooperaccedilatildeo entre si para que enfrentem as organizaccedilotildees voltashydas para a criminalidade Esse dever juriacutedico globalizado tem suas raiacutezes no moral intemacional que conforme assinala Celso Albuquerque Mello na obra citada p 13 sempre consagrou o princiacutepio da solidariedade ou ainda do auxiacutelio muacutetuo

Eacute o mais importante desafio neste iniacutecio de seacuteculo fazer com que surja uma legislaccedilatildeo internacional que compatibilize o combate agrave criminalidade inshyternacional sem violar a seguranccedila juriacutedica com finalidade exclusiva de evitar a fuga de investimenos do Paiacutes

Tenha-se contudo em consideraccedilatildeo que a globalizaccedilatildeo do crime emshybora seja uma grande ameaccedila aos valores tradicionais que sustentam a cidashydania especialmente a seguranccedila juriacutedica natildeo deve prejudicar o desenvolvishymento econocircmico de qualquer naccedilatildeo

Natildeo faccedilo coro ao assinalado por Eric Hobsbawm em sua obra Era dos Extremos O Breve Seacuteculo XX 1914-1991 1995 p 24 Companhia das Letras S Paulo traduccedilatildeo de Marcos Santarrita no sentido de que Talvez a caracteriacutesshytica mais impressionante do fim do seacuteculo XX seja a tensatildeo entre esse processo de globalizaccedilatildeo cada vez mais acelerado e a incapacidade conjunta das instishytuiccedilotildees puacuteblicas e do comportamento coletivo dos seres humanos de se acoshymodarem a ele

Penso que natildeo haacute essa acomodaccedilatildeo e que as instituiccedilotildees puacuteblicas espeshycialmente as submetidas ao controle da ciecircncia juriacutedica natildeo estatildeo incapacitashydas de encontrar caminhos que solucionem o problema existente

ENSAIOS JURiacuteDICOS 265

Eacute por demais positivo entre outros acontecimentos o fato da conscienshytizaccedilatildeo de que haacute de ser encontrada uma forma de combate agrave criminalidade internacional que natildeo afaste a garantia da seguranccedila juriacutedica Esta eacute uma neshycessidade para impor paz agrave naccedilatildeo e consequumlentemente criar ambiente para que novos investimentos necessaacuterios ao desenvolvimento do seu processo econocircmico aconteccedilam sem se falar na manutenccedilatildeo dos jaacute existentes

O Parlamento Europeu aprovou ultimamente uma resoluccedilatildeo sobre a criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional sob a consideraccedilatildeo de que eacute necessaacuteshyrio criaacute-lo de forma permanente para complementar os sistemas judiciais nashycionais e pocircr fim agrave impunidade de que gozam os responsaacuteveis por genociacutedio crimes contra a humanidade e crimes de guerra

A abertura para essa posiccedilatildeo denota a formaccedilatildeo de uma consciecircncia internacional para combater a criminalidade internacional em todos os niacuteveis contribuindo para fortalecer a seguranccedila juriacutedica interna de cada paiacutes

O documento representativo dessa resoluccedilatildeo eacute do teor seguinte

Parlamento Europeo

Resolucioacuten sobre el Tribunal Penal Internacional

EI Parlamento Europeo

Vistas sus anteriores resoluciones sobre un Tribunal Penal Interna-cional

A Considerando que es necesario crear un Tribunal Penallnternashycional permanente que complemente los sistemasjudiciales nacionales y ponga fin a la impunidad de que gozan los responsables de genocidio crimenes contra la humanidad y criacutemenes de guerra

B Considerando que la Comisioacuten de Derechos Humanos de las Naciones Unidas estaacute respaldando decididamente la creacioacuten de ese Trishybunal

C Considerando que la fase preparatoria de la creacioacuten dei Tribushynal Penal Internacional finalizoacute con la uacuteltima sesioacuten dei Comiteacute Preparatorio de las Naciones Unidas que tuvo lugar dei 16 de marzo al3 de abril de 1998

D Felicitaacutendose por la creciente participacioacuten de Estados en el proceso de negociaciones y esperando que un nuacutemero auacuten mayor de Esshytados procedentes de todas las regiones se encuentre plenamente represhysentado en la Conferencia Diplomaacutetica de Roma

E Considerando que dei 15 de junio al17 de julio de 1998 se celebra en Roma la Conferencia Diplomaacutetica de Plenipotenciarios para la constitucioacuten de un Tribunal Penal Internacional

266 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

F Considerando que los Estados miembros y la delegacioacuten de la Comisioacuten Europea que participan en la Conferencia Diplomaacutetica de Roma pueden desempenar un papel crucial a la hora de garantizar el eacutexito de la conclusioacuten de esta Conferencia Diplomaacutetica y acogiendo positivamente la mayor convergenciacutea de las posturas de los Estados miembros de la UE

G Congratulaacutendose por la oferta dei Gobierno de los Paiacuteses Bajos de servir de sede dei Tribunal Penal Internacional permanente

I Insta a la Conferencia Diplomaacutetica de Roma a aprovechar la oportunidad histoacuterica de concluir un texto de Estatuto para un Tribunal Penal Internacional independiente justo y eficaz

2 Insta a los representantes de los Estados miembros dei Consejo y de la Comisioacuten a garantizar activamente el ecircxito de los resultados a sashyber un auteacutentico Tribunal Penal Internacional en lugar de limitarse a un acuerdo de compromiso sobre principios esenciales en sus esfuerzos por conciliar las posturas de Estados reticentes

3 Destaca que para constituir un complemento eficaz de los sisteshymas judiciacuteales nacionales el Estatuto dei Tribunal Penal Internacional permanente objeto de la Conferencia de Roma deberaacute establecer

a un Fiscal independiente con competencias para investigare insshytruir sumarios por propia iniciativa en situaciones en las que se hayan cometido los delitos sometidos a lajurisdiccioacuten dei Tribunal

b Ia jurisdiccioacuten inherente y universal dei Tribunal en materia de genocidio criacutemenes contra la humanidad criacutemenes de guerra y agresioacuten sin que se requiera ninguacuten consentimiento dei Estado

c una buena relacioacuten de trabajo con los Tribunales lnternacionales ya establecidos en La Haya

d una relacioacuten constructiva con las Naciones Unidas yen partishycular con el Consejo de Seguridad basada en el pleno reconocimiento de sus respectivas funciones y competencias

e Ia obligacioacuten de los Estados firmantes de acatar y hacer cumplir sin demora las oacuterdenes y decisiones dei Tribunal

f los mayores niveles de respeto de los derechos de los acusados y de los sospechosos y de proteccioacuten de los intereses de las viacutectimas y de los testigos

g Ia garantiacutea de una financiacioacuten a largo plazo necesaria para asegurar la autonomiacutea e independencia dei Tribunal frente a cualquier presioacuten exterior

4 Destaca ademaacutes que la jurisdiccioacuten deI Tribunal sobre los delishytos de genociacutedio los criacutemenes contra la humanidad y los criacutemenes de

ENSAIOS JURiacuteDICOS 267

guerra deben considerarse con la misma calificacioacuten penal con indepenshydencia de que se hayan cometido en conflictos armados internacionales o en conflictos internos

5 Insta ai Consejo y a los Estados miembros a garantizar la universalidad y la transparencia de las negociaciones y la participacioacuten continuada de la comunidadjuriacutedica y la sociedad civil internacionales

6 Encarga a su Presidente que transmita la presente resolucioacuten ai Consejo a la Comisioacuten a los Gobiernos de los Estados miembros ai Secreshytario General de las Naciones Unidas ai Presidente de la Asamblea Geneshyral de las Naciones Unidas y ai Presidente de la Conferencia Diplomaacutetica de las Naciones Unidas para la constitucioacuten de un Tribunal Penal Internashycional

A resoluccedilatildeo supracitada demonstra que cresce a conscientizaccedilatildeo da necessidade de ser criado um Tribunal Penal Internacional com forccedila cogente obrigatoacuteria de suas decisotildees no acircmbito interno dos paiacuteses que participarem do pacto de sua constituiccedilatildeo

A doutrina internacional revela que a comunidade internacional somenshyte agora vem se preocupando em criar uma estructura internacional para determinar las responsabilidades individuales emergentes de violacioacuten de ciertos derechos baacutesicos dei ser humano Los mecanismos de responsabilidad estatal creados desde los 60 se dirigen a la mayor protecciotilden dei ser humano y la erradicacioacuten de las praacutecticas de volacioacuten sistemaacutetica de los derechos humanos ar via de la condena ai Estado que ordena o que tolera los abusos por lo cual se estructuraron entorno ai Estado conmo sujeto responsable Como haacute seflalado la Corte Internacional de Derechos Humanos el procedimiento ante ella no es un procedimiento penal lo que se busca determinar es el nivel de cumprimiento por parte de un Estado de sus obligaciones de derecho internacional Sin desconocer la importancia de determinar la responsabilidad dei Estado para que eacuteste tenga un incentivo para erradicar esas praacutectica de sus frotneras es pertinente detacar que las violaciones maacutes grave son en uacuteltima instancia coshymetidas por individuos (Francisco Cox Encarregado dei TPI HOH em artigo intitulado EI IlOH ante la Craciotilden de um Tribunal Penal Internacional no site httpwwwiidhedcrcpitpintrohtml)

A criaccedilatildeo de um Tribunal Penal Internacional atuaria permanentemente e teria competecircncia subsidiaacuteria em relaccedilatildeo agrave outorgada aos Tribunais Nacioshynais limitando-se a atuar apenas nos crimes internacionais previamente defishynidos como sendo do interesse da comunidade global

Merece registro no acircmbito do assunto tratado que na Conferecircncia Reshygional sobre o Tribunal Penal Internacional realizada em 18 e 19 de fevereiro de 1998 na cidade de Guatemala Guatemala um dos temas tratados foi o relativo

268 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

agrave harmonizaccedilatildeo das incriminaccedilotildees quando os seguintes aspectos foram disshycutidos Branqueamento corrupccedilatildeo fraude fiscal participaccedilatildeo em associashyccedilotildees criminosas um olhar agrave luz dos direitos nacionais e do direito internacioshynal Perspectivas Quais os comportamentos a incriminar Criar uma nova incriminaccedilatildeo da fraude fiscal Uma tentativa de harmonizaccedilatildeo o corpus jurls contendo disposiccedilotildees penais para proteccedilatildeo dos interesses financeiros da Uniatildeo Europeacuteia As negociaccedilotildees no seio do Conselho da Europa e da OCDE referenshytes agrave luta contra a corrupccedilatildeo etc O referido painel foi presidido por Benoit Dejemeppe procurador do Rei em Bruxelas e contou com a presenccedila de Tereshyza Beleza professora de Direito Penal na Faculdade de Direito de Lisboa como moderadora

Haacute como visto um largo campo de anaacutelise para desenvolver com possishybilidade do surgimento de sugestotildees que levem a ciecircncia juriacutedica a alcanccedilar com a atuaccedilatildeo estatal uma competecircncia internacional que possa combater o crime internacional e ao mesmo tempo proporcione seguranccedila juriacutedica na ordem interna ganhando assim o sistema juriacutedico confianccedila dos investidoshyres

Em conclusatildeo a forma de compatibilizar o combate agrave criminalidade internacional sem violar a seguranccedila juriacutedica necessaacuteria a evitar a fuga de inshyvestimentos do paiacutes estaacute na criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional com comshypetecircncia definida para processar e julgar delitos globalizantes e cujas decisotildees tenham forccedila imperativa no acircmbito interno das naccedilotildees participantes do pacto para o seu nascimento

Page 4: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro

226 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Envolvido por esse clima de indefiniccedilotildees institucionais acima apresentashydo embora de modo muito resumido passo a examinar as modificaccedilotildees introduzidas no ordenamento juriacutedico brasileiro afetando o sistema regulador das instituiccedilotildees financeiras com os seus clientes em face da fiscalizaccedilatildeo tribushytaacuteria com novas regras para o sigilo bancaacuterio

3 O sigilo bancaacuterio no Direito Comparado

Uma visatildeo raacutepida do tratamento dado por alguns ordenamentos juriacutedishycos estrangeiros para o sigilo bancaacuterio proporciona uma compreensatildeo mais alargada dessa entidade juriacutedica dos seus objetivos e dos efeitos produzidos por ele nas relaccedilotildees do titular da conta bancaacuteria com a instituiccedilatildeo financeira e com a garantia da sua seguranccedila no ambiente social

a) Portugal

A doutrina considera que a tutela do segredo bancaacuterio no Direito portushyguecircs na atualidade eacute um padratildeo protetor com caracteriacutesticas mais amplas do que o vigente na Suiacuteccedila ateacute entatildeo considerado o paiacutes que mais oferecia proteshyccedilatildeo nesse campo de relacionamento financeiro

continuaccedilatildeo

necessidades como sendo o centro das preocupaccedilotildees (Trabalho intitulado Democracia para o Seacuteculo XXI aguardando publicaccedilatildeo) Modelo de Democracia para o Seacuteculo XXI O fato do regime democraacutetico adotado no Brasil pela maioria dos anos durante o seacuteculo XX natildeo ter produzido resultados administrativos desejados e necessitados pela Naccedilatildeo natildeo deve servir de suporte para a defesa da volta ao autoritarismo ou de qualquer outra forma de regime Haacute que se reconhecer que as dificuldades vividas pela Naccedilatildeo natildeo podem ser tributadas apenas ao mau uso do regime democraacutetico Negativas em grande escala foram os modelos das eras de t 937 a t 946 e de 1964 a 1988 especialmente para o campo das liberdades dos direitos humanos e da valorizaccedilatildeo da dignidade dos homens Filio-me agrave corrente daqueles que pregam ser a democracia com todos os seus defeitos um regime muito melhor do que a mais perfeita das ditaduras A democracia mesmo ferida ela homenageia pelo menos a esperanccedila de um povo e simboliza o modelo de liberdade de seguranccedila e de desenvolvimento cultural e econocircmico pretendido pelo cidadatildeo diferente do que acontece com qualquer outro tipo de regime Aperfeiccediloar a atuaccedilatildeo do regime democraacutetico para o seacuteculo XXI natildeo eacute tarefa das mais faacuteceis Uma seacuterie de obstaacuteculos devem ser enfrentados e regulados sem se falar nas resistecircncias que seratildeo impostas por clones conservadores e privilegiados agraves mudanccedilas O certo eacute que algo precisa ser feito e com ousadia Necessaacuterio enfrentar os problemas e sugerir soluccedilotildees com posiccedilotildees que se integrem no atuar do homem encarregado de pensar e de fazer ciecircncia o que deve ser exercido sem temor Pelo contraacuterio Da exposiccedilatildeo e publicidade das ideacuteias surgem os modelos para a construccedilatildeo do futuro Se os objetivos forem alcanccedilados contribuiccedilotildees essenciais foram dadas para se evitar a mais temida revoluccedilatildeo que pode ser feita pelo ser humano que eacute a da revolta interna e silenciosa contra as instituiccedilotildees com forccedila ateacute de extinguir caso se realize a entidade tradicional do Estado

ENSAIOS JURiacuteDICOS 227

Esse entendimento decorre da interpretaccedilatildeo que os doutos manifestam sobre o Decreto-Lei n 21978 normativo disciplinador do sigilo bancaacuterio em Portugal

O objetivo da legislaccedilatildeo portuguesa sobre sigilo bancaacuterio conforme depreende-se da sua mensagem eacute imprimir confianccedila no funcionamento das instituiccedilotildees de creacutedito para que se afirmem como veiacuteculos necessaacuterios para a captaccedilatildeo da poupanccedila Essa ideacuteia foi exposta por Alexandra Falque de Gouvecirca Professora-Assistente da Faculdade de Direito de Lisboa e Assessora do Conseshylho para o Sistema Financeiro no corpo do artigo de sua autoria Perspectivas de Reformulaccedilatildeo da Tutela do Seguro Bancaacuterio no Direito Portuguecircs publicashydo na Revista do Gabinete de Documentaccedilatildeo e Direito Comparado da Proshycuradoria Geral da Repuacuteblica Lisboa 1990 pp 922

Destaco do corpo do mencionado artigo a observaccedilatildeo feita pela autoshyra pp 12 e 13 no sentido de que A tutela do segredo bancaacuterio surgiu em Portugal conjunturalmente associada aos esforccedilos de reanimaccedilatildeo das instituishyccedilotildees de creacutedito como fonte de captaccedilatildeo da poupanccedila Por esse facto foi-lhe dado um regime mais protector do que o proacuteprio regime vigente na Suiacuteccedila campeatilde em mateacuteria de protecccedilatildeo do segredo bancaacuterio

A seguir afirma a autora Eacute testemunha de que esse reforccedila a confianccedila nas instituiccedilotildees de creacutedito foi de facto o objectivo do legislador ao aprovar o normativo que disciplina o sigilo bancaacuterio a letra do preacircmbulo do Decreto-Lei n 21978 de 9 de janeiro que conteacutem o enquadramento legal da mateacuteria o qual reza o seguinte Ponderando que a reconstruccedilatildeo do Paiacutes implica o estashybelecimento de um clima de confianccedila na banca que permita a captaccedilatildeo e recuperaccedilatildeo do dinheiro entesourado vem o Governo revelando preocupashyccedilotildees pela tutela do segredo bancaacuterio No mesmo sentido a letra do preatildembushylo do Despacho Normativo n 3571979 de 20 de novembro A importatildencia do segredo bancaacuterio eacute bem conhecida para a estabilizaccedilatildeo normalidade de funshycionamento e transmissatildeo de uma imagem de confianccedila por parte de qualshyquer sistema bancaacuterio Nesta medida com a legislaccedilatildeo entatildeo aprovada o regishyme portuguecircs na mateacuteria afastou-se quer do sistema da Common Law de resshyponsabilidade (exclusivamente) civil do banqueiro por violaccedilatildeo ao dever de discriccedilatildeo bancaacuteria quer da generalidade dos sistemas europeus que integram a mateacuteria no regime geral do sigilo profissional (equiparando o banqueiro ao confidente necessaacuterio) aproximando-se mais dos sistemas praticados na Suiacuteshyccedila e no Liacutebano (todavia enquanto no Liacutebano haacute uma total imunidade das insshytituiccedilotildees de creacutedito agraves requisiccedilotildees da autoridade judiciaacuteria na Suiacuteccedila o princiacuteshypio eacute o da cooperaccedilatildeo com a funccedilatildeo judiciaacuteria no tocante agrave mateacuteria pena)

A autora conclui esse toacutepico do seu artigo afirmando Pela razatildeo aponshytada de ser essencialmente o interesse puacuteblico e colectivo o motivo

228 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

determinante da aprovaccedilatildeo do Decreto-Lei n 21978 o regime portuguecircs gizado nessa altura comeccedilou por ser ainda mais hermeacutetico do que o proacuteprio regime vigente na Suiacuteccedila na medida em que o dever de cooperaccedilatildeo com as autoridashydes judiciaacuterias cessa inclusivamente nas mateacuterias sujeitas a segredo bancaacuterio segundo o entendimento generalizado dos Tribunais e doutrina3bull Paradoxalshymente a disciplina juriacutedica natildeo encontrou de iniacutecio reflexo na materialidade dos factos tendo-se assistido a muacuteltiplos e impunes violaccedilotildees ao segredo banshycaacuterio

Arnoldo Wald analisando o sigilo bancaacuterio no ordenamento juriacutedico de Portugal registra O Coacutedigo Civil portuguecircs no seu art 80 dispotildee que Todos devem guardar reserva quanto agrave intimidade da vida privada de outrem A exshytensatildeo da reserva seraacute definida conforme a natureza do caso e as condiccedilotildees das pessoas O art 33 da Constituiccedilatildeo portuguesa de 1976 estabelece que 1 A todos eacute reconhecido o direito agrave identidade pessoal ao bom nome e reputashyccedilatildeo e agrave reserva da intimidade da vida privada e familiar 2 A lei estabeleceraacute garantias efectivas contra a utilizaccedilatildeo abusiva ou contraacuteria agrave dignidade humashyna de informaccedilotildees relativas agraves pessoas e famiacutelias

Tanto no acircmbito constitucional quanto na legislaccedilatildeo civil eacute garantido o direito agrave privacidade e agrave vida iacutentima que fundamentam o sigilo bancaacuterio Jaacute o Decreto-Lei n 2 de 911978 prevecirc expressamente o dever de segredo dos titulares dos oacutergatildeos dos bancos e aos seus trabalhadores4

b) Alemanha

Carlos Alberto Hagstron em artigo intitulado O Sigilo Bancaacuterio e o Poshyder Puacuteblico publicado na Revista de Direito Mercantil n 79 p 37 registra que Na Alemanha natildeo haacute regra especiacutefica nem definiccedilatildeo legal para o segredo bancaacuterio mas sua existecircncia eacute observada reconhecida pejo Direito Privado e pelo Direito Puacuteblico admitida em diversas leis aceita pela doutrina e pela jurisshyprudecircncia sofrendo contudo limitaccedilotildees decorrentes de interesses de orshydem puacuteblica e social quando pode haver a quebra do sigilo conforme aliaacutes lembra Seacutergio Carlos Covello na sua obra O Sigilo Bancaacuterio Leud 1991 p 34

3 A respeito desse aspecto o de cessar o dever de colaboraccedilatildeo com as autoridades judiciaacuterias quando envolver mateacuterias sujeitas a segredo bancaacuterio a autora ao fazer essa afirmaccedilatildeo assinala em nota de rodapeacute as seguintes obras que refletem igual entendimento Alberto Luiacutez O Segredo Bancaacuterio em Portugal in Revista da Ordem dos Advogados ano 41 Q (1981) pp 451 e segs Anselmo da Costa Freitas O Sigilo Bancaacuterio In Boletim da Ordem dos Advogados n 19 (outubro de 1983) pp 4 e segs Maria Eduarda Azevedo O Segredo Bancaacuterio In Ciecircncia e Teacutecnica Fiscal n 346348 (outubrodezembro de 1987) pp 73 e segs Joseacute Antoacutenio Pereira da Silva Regime Juriacutedico do Sigilo Bancaacuterio maio de 1988 (trabalho natildeo publicado) Jorge Patriacutecio Paul O Sigilo Bancaacuterio - sua Extensatildeo e Limites no Direito Portuguecircs In Revista da Banca n 12 (outubrodezembro) 1989 pp 71 e segs

4 Em artigo publicado sob o tiacutetulo Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais publicado na Revista dos Tribunais n 22 Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas p 24

ENSAIOS JURiacuteDICOS 229

A lei bancaacuteria alematilde de 1971961 em seu art 92 determina que haacute obrishygaccedilatildeo de ser preservado o direito agrave privacidade para aqueles que exercem uma funccedilatildeo federal de vigilatildencia por seus colaboradores e pelos controlashydores dos depoacutesitos (Arnoldo Wald em artigo Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais publicado na Revista dos Tribunais n 22 RT Cadernos de Direishyto Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas jan-marccedilo de 1998 p 24)

O citado autor esclarece ainda que na Alemanha a fonte do sigilo banshycaacuterio estaacute no direito agrave personalidade

c) Itaacutelia Franccedila Suiacuteccedila

Luiz Fernando de Bellinetli em artigo denominado Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio (Revista de Direito do Consumidor RT n 18 abril-junho de 1996 pp 141161) ao analisar o sigilo bancaacuterio no Direito Comparado comenshyta o tratamento que lhe eacute dado pela Alemanha Itaacutelia Franccedila Suiacuteccedila e Portugal

Em face de nos itens acima jaacute ter sido enfocado o tema na Alemanha e em Portugal destacaremos apenas do trabalho do autor as observaccedilotildees feishytas sobre o sigilo bancaacuterio nos ordenamentos juriacutedicos da Itaacutelia Franccedila e Suiacuteccedila

A respeito transcrevo o que escreveu o autor

412 ltaacutelia5

Assim como na Alemanha na Itaacutelia tambeacutem natildeo haacute norma especiacuteshyfica disciplinando o sigilo bancaacuterio embora seja ele reconhecido pela doutrina e pela jurisprudecircncia utilizando-se dispositivos variados do sisshytema para supeditaacute-lo

No entanto tambeacutem na Itaacutelia natildeo eacute ele absoluto cedendo ante interesse de ordem puacuteblica nos casos previstos em lei

Como afirma Giacomo Molle Lobbligo della banca ai segreto non e senza Umt ed essendo esse come si e delto dretto aIa tutela dei cliente e quindi di un interesse privato non vi sono limiti ad esso da parte dei legislatore Prescindendo daiacute casi nei quali la rivelzione sai imposta dala legge un dovere di comunicazione puoacute sorgere nei contrant della autoritaacute

5 Arnoldo Wald no artigo jaacute referido (Sigilo Bancaacuterio e Direitos Fundamentais Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas - 22 p 24) assinala que Na Itaacutelia o sigilo bancaacuterio decorre da garantia dos direitos agrave liberdade individual que permite a exclusatildeo do conhecimento por parte de terceiros de tudo que se refere agrave proacutepria pessoa a denominada riservalezza Este entendimento decorre da norma constitucional que institui a inviolabilidade dos direitos da personalidade e da Convenccedilatildeo Europeacuteia dos Direitos do Homem de 1950 que garante a toda pessoa o direito ao respeito de sua vida privada e familiar de seu domiciacutelio e de sua correspondecircncia O segredo nas movimentaccedilotildees financeiras no entendimento doutrinaacuterio italiano visa proteger aleacutem dos interesses do cliente o desenvolvimento da atividade bancaacuteria como algo inerente agrave estrutura e funccedilatildeo creditiacutecia

~o SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

giudiziaria dei fisco e di terzi (La Banca NellOrdinamento Giuridico itashyliano Milano - DoU A Giuffre Editore 1980 p 158)

413 Franccedila

Tambeacutem na Franccedila o sigilo bancaacuterio eacute protegido pelo ordenamenshyto juriacutedico embora inexistente uma norma especiacutefica fundando-se a proteccedilatildeo num conjunto de regras de ordem penal civil e comercial

Da mesma forma admite-se a quebra do sigilo em face de interesshyses de ordem puacuteblica6 bull

414 Suiacuteccedila

Paiacutes onde os bancos e a sua alardeada discriccedilatildeo satildeo instituiccedilotildees nacionais haacute previsatildeo legal especiacutefica para a proteccedilatildeo do sigilo

No entanto tambeacutem laacute o segredo natildeo eacute como alguns supotildeem absoluto

Conforme aduz Hagstrom Natildeo pode ser invocado em geral peshyrante a Justiccedila Penal Na Justiccedila Civil o Juiz tem poder discricionaacuterio para decidir sobre a mateacuteria havendo algumas variaccedilotildees de conformidade com as legislaccedilotildees cantonais Em procedimentos de taxaccedilatildeo e recursos o segredo eacute preservado perante o Fisco eacute afastado contudo no proceshydimento contencioso (penal fiscal) Algumas outras exceccedilotildees ao dever de segredo satildeo contempladas expressamente em textos legais

Quanto ao Direito suiacuteccedilo acrescente-se que Arnoldo Wald no artigo jaacute tado observa que a justificativa para o sigilo bancaacuterio estaacute no direito da rsonalidade A Lei de 1934 prevecirc pena de multa ou de prisatildeo para o funcioshyliacuterio da instituiccedilatildeo que violar o segredo bancaacuterio mesmo que inexista dano ara aquele que viu reveladas informaccedilotildees sobre sua vida financeira

A seguir Arnoldo Wald compara o Direito da Suiacuteccedila com o do Liacutebano lrmando A Suiacuteccedila assim como o Liacutebano para a maior seguranccedila e reforccedilo a preservaccedilatildeo do sigilo bancaacuterio utiliza a conta numerada ficando descoshyhecido o nome do cliente A legislaccedilatildeo libanesa prevecirc quatro hipoacuteteses de errogaccedilatildeo do sigilo a) o consentimento do cliente seus herdeiros ou legataacuteshyos b) no litiacutegio entre o cliente e o banco c) na falecircncia e d) no enriquecimenshy) iliacutecito

d) Inglaterra e EEUU

O sigilo bancaacuterio no Direito inglecircs e no sistema norte-americano mereshyeu de Arnoldo Wald no trabalho jaacute citado pp 24 e 25 a anaacutelise que transcrevo

o autor citado manda no particular conferir Carlos Alberto Hagstrom artigo O Sigilo Bancaacuterio e o Poder Puacuteblico RDM n 79 p 38 bem como Seacutergio Covello em O Sigilo Bancaacuterio Leud 1991 pp 2627

ENSAIOS JURiacuteDICOS 231

No Direito inglecircs natildeo haacute nenhuma norma escrita que estabelece sanccedilatildeo agrave violaccedilatildeo ao segredo bancaacuterio mas qualquer pessoa que queira trabalhar em uma instituiccedilatildeo financeira deve assinar um formulaacuterio esshypecial pelo qual se compromete a manter sigilo sobre as movimentaccedilotildees bancaacuterias O dever de segredo na atuaccedilatildeo do banco eacute interpretado rigoshyrosamente pelos tribunais ingleses

No sistema juriacutedico norte-americano depois de discrepacircncias nas legislaccedilotildees estaduais e apoacutes a lei federal que restringiu o acircmbito da obrishygatoriedade do sigilo bancaacuterio foi aprovada a Right to Financiai Privacy Act que dispotildee que a prestaccedilatildeo de informaccedilotildees por parte da instituiccedilatildeo financeira somente pode ser dada em processos administrativos ou judishyciais quando os dados forem relevantes para solucionar o litiacutegio Com essa lei a quebra do sigilo bancaacuterio ganhou um caraacuteter excepcional somente podendo ocorrer desde que respeitado o devido processo leshygal Assim o Direito americano buscou conciliar a defesa ao direito de privacidade o atendimento aos interesses puacuteblicos quanto agraves informashyccedilotildees financeiras e a existecircncia do contraditoacuterio

e) Reacutegis de Oliveira quando Deputado Federal em parecer apresentashydo agrave Comissatildeo de Constituiccedilatildeo e Justiccedila da Cacircmara dos Deputados com refeshyrecircncia a Projeto de Emenda Constitucional apresentado pelo Exmo Sr Presishydente da Repuacuteblica objetivando alterar o sect 1 ordm do art 145 da CF observou que o sigilo bancaacuterio no Direito Comparado eacute posto da forma seguinte

13 Direito Comparado Na Alemanha natildeo haacute regra especiacutefica nem definiccedilatildeo legal para o segredo bancaacuterio mas sua existecircncia eacute recoshynhecida bem como aceita pela doutrina e jurisprudecircncia Decorre de direito costumeiro somente podendo ser quebrado por expressa disposhysiccedilatildeo legal (J Barmann Le Secret Bancaire en Allemagne Feacutedeacuterale in Rapport pp 15 e segs) Na Beacutelgica haacute proibiccedilatildeo somente sendo viaacutevel a derrogaccedilatildeo do segredo pela Justiccedila Penal e pelo Fisco que somente tem acesso agraves informaccedilotildees bancaacuterias diante do processo pendente (Herion Le Secret Bancaire en Belfique in Rapport pp 5175) Na Itaacutelia os doshycumentos somente podem ser examinados pelos Juiacutezes Natildeo haacute acesso por parte das autoridades administrativas (idem p 129) Na Holanda da mesma forma o sigilo apenas cede ante ordem da autoridade judicial ou penal (Muller idem pp 99117) Na Franccedila a violaccedilatildeo ao segredo ocorre ante oacutergatildeos do Poder Puacuteblico que alegam interesses superiores aos dos particulares natildeo se admitindo a quebra diante de normas administratishyvas (Gavalda Stouflet idem pp 7797)

f) Voltando a analisar o sigilo bancaacuterio em Portugal pode-se afirmar que o sistema apresentava-se rigoroso e nacirco aceitava a quebra como se vecirc de

232 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

decisatildeo do Supremo Tribunal de Justiccedila em Scientia Juriacutedica tomo XXIv n 166168 de 1980 (Parecer publicado na Revista de Direito Mercantil n 99 pp 98 e segs)

Com o sentido de demonstrar como o sigilo bancaacuterio eacute tratado no ordeshynamento juriacutedico de Portugal cito na iacutentegra um acoacuterdatildeo da Secccedilatildeo Criminal do Tribunal de Relaccedilatildeo de Eacutevora cujo texto colhi da internet (httpwwwtrept jurisp321-96html)

Processo n 321]996

Acoacuterdatildeo

Acordam na Secccedilatildeo Criminal do Tribunal da Relaccedilatildeo de Eacutevora

1 No Tribunal Judicial da Comarca de Portimatildeo correm termos uns autos de inqueacuterito registados sob o n 35711994 que tiveram orishygem numa queixa apresentada por middotM Lda contra a sociedade E Lda nos quais se procede agrave investigaccedilatildeo de factos susceptiacuteveis de inteshygrar a praacutetica de um crime de emissatildeo de cheque sem provisatildeo

Estaacute em causa o cheque nO 3681861637 sacado sobre a Caixa Geral de Depoacutesitos emitido em 1 ordm de julho de 1994 no valor de 820661$00

No decurso do inqueacuterito o Ministeacuterio Puacuteblico solicitou agravequela insshytituiccedilatildeo bancaacuteria o fornecimento de determinada documentaccedilatildeo banshycaacuteria o que esta se negou fazer alegando que a revelaccedilatildeo da pretendida documentaccedilatildeo contende com o disposto na legislaccedilatildeo sobre segredo bancaacuterio

A requerimento do Digno Magistrado do Ministeacuterio Puacuteblico o MM Juiz de Instruccedilatildeo suscitou a intervenccedilatildeo deste Tribunal da Relaccedilatildeo a fim de dispensar os serviccedilos da Caixa Geral de Depoacutesitos do segredo bancaacuteshyrio quanto agrave documentaccedilatildeo bancaacuteria solicitada a saber coacutepia da ficha de assinaturas e extracto da conta da Agecircncia de S com o n sobre a qual foi sacado o cheque em causa respeitante aos meses de maio junho e julho de 1994

Nesta relaccedilatildeo o Exmo Procurador da Repuacuteblica emitiu douto pareshycer no sentido de a referida instituiccedilatildeo bancaacuteria ser dispensada do cumshyprimento do dever do segredo bancaacuterio em ordem agrave prestaccedilatildeo dos eleshymentos pretendidos para a efectivaccedilatildeo do inqueacuterito

Colhidos os vistos legais cumpre agora decidir

2 A Caixa Geral de Depoacutesitos atraveacutes do ofiacutecio fotocopiado agrave fi 5 dos autos recusou-se a fornecer os documentos pedidos pelo Ministeacuteshyrio Puacuteblico para instruccedilatildeo de um processo de inqueacuterito com fundamento no sigilo bancaacuterio

ENSAIOS JURiacuteDICOS 233

Compreendendo o inqueacuterito o conjunto de diligecircncias que visam investigar a existecircncia de um crime determinar os seus agentes e a resshyponsabilidade deles e descobrir e recolher as provas em ordem agrave decishysatildeo sobre a acusaccedilatildeo (cf art 262 n 1 do Coacutedigo de Processo Pena0 a consulta dos pretendidos documentos - extracto da conta e ficha de assinaturas - eacute sem margem para duacutevidas de grande importacircncia para a instruccedilatildeo do processo e recolha de indiacutecios probatoacuterios tendentes agrave eventual deduccedilatildeo de acusaccedilatildeo pois sem ela desde logo muito dificilshymente se poderaacute concluir pela identificaccedilatildeo da pessoa que assinou o cheque

O dever de sigilo bancaacuterio traduz uma obrigaccedilatildeo de facto negativo (de ROR facere) e encontra-se disciplinado no Decreto-Lei n 2981992 de 31 de dezembro que aprovou o Regime Geral das Instituiccedilotildees de Creacutedito e Sociedades Financeiras O art 78 de tal diploma consagrando o dever de segredo profissional dispotildee no seu n 1 que os membros dos orgatildeos de administraccedilatildeo ou de fiscalizaccedilatildeo das instituiccedilotildees de creacutedito os seus empregados mandataacuterios comitidos e outras pessoas que lhes prestem serviccedilos a tiacutetulo permanente ou ocasional natildeo podem revelar ou utilizar informaccedilotildees sobre factos ou elementos respeitantes agrave vida da instituiccedilatildeo ou agraves relaccedilotildees desta com os seus clientes cujo conhecimento lhes advenha exclusivamente do exerciacutecio das suas funccedilotildees ou da presshytaccedilatildeo dos seus serviccedilos explicitando-se no seu n 2 que estatildeo designadamente sujeitos a segredo os nomes dos clientes as contas de depoacutesito e seus movimentos e outras operaccedilotildees bancaacuterias

O dever de segredo profissional natildeo eacute poreacutem um dever absoluto isto eacute natildeo prevalece sempre sobre qualquer outro dever que com ele entre em conflito Sofre com efeito as excepccedilotildees previstas no art 79 do mesmo Decreto-Lei n 2981992 onde se estabelece aleacutem do mais que os factos e elementos cobertos pelo dever de segredo podem ser revelashydos nos termos previstos na lei penal e de processo penal - cf aliacutenea d don2

No art 84 do mesmo diploma legal prescreve-se que a violaccedilatildeo ao dever de segredo eacute puniacutevel nos termos do Coacutedigo Penal e efectivamente o Coacutedigo Penal vigente - revisto pelo Decreto-Lei n 481995 de 15 de marccedilo - prevecirc e pune como crimes quer a violaccedilatildeo a segredo profissioshynal quer o seu aproveitamento indevido - cf arts ] 95 e 196

Ao contraacuterio da versatildeo do Coacutedigo Penal anterior agrave referida revisatildeo - em que se estatuiacutea no art 185 que a violaccedilatildeo ao segredo profissional natildeo seria puniacutevel se ocorresse no cumprimento de um dever juriacutedico sensivelmente superior ou visasse a um interesse puacuteblico ou privado legiacutetimo quando considerados os interesses em conflito e os deveres

234 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

de informaccedilatildeo que segundo as circunstacircncias se impotildeem ao agente se pudesse considerar meio adequado para alcanccedilar aquele fim - natildeo conteacutem o Coacutedigo Penal actuaJ relativamente ao crime de violaccedilatildeo ao segredo profissional qualquer causa especiacutefica de exclusatildeo da ilicitude pelo que haacute que atentar nas causas gerais de exclusatildeo da ilicitude

Ao abordar o conflito de deveres dispotildee o art 36 n 1 do Coacutedigo Penal que natildeo eacute iliacutecito o facto de quem em caso de conflito no cumprishymento de deveres juriacutedicos ou de ordens legiacutetimas da autoridade satisfishyzer dever ou ordem de valor igualou superior ao do dever ou ordem que sacrificar Natildeo seraacute pois iliacutecita a violaccedilatildeo ao segredo profissional se perante um conflito de deveres o agente satisfizer o dever de valor igual ou superior ao do dever que sacrifica

No Coacutedigo de Processo Penal generalizou-se a possibilidade de quebra do segredo profissional

Assim as pessoas indicadas no n 1 do sobredito art 78 podem recusar-se a depor sobre factos objecto de segredo profissional mas se a autoridade judiciaacuteria concluindo embora pela legitimidade da recusa natildeo prescindir desse depoimento pode requerer ao tribunal que o ordeshyne E o tribunal deveraacute ordenar a prestaccedilatildeo do depoimento com quebra do segredo profissional sempre que entender que esta se mostra justificada face agraves normas e princiacutepios aplicaacuteveis da lei penal nomeadashymente ao princiacutepio da prevalecircncia do interesse preponderante - cf art 135 n 12 e 3 do Coacutedigo de Processo Penal

A possibilidade de apreensatildeo pela autoridade judiciaacuteria de tiacutetulos valores quantias ou outros objectos depositados em bancos ou outras instituiccedilotildees de creacutedito relacionados com um crime e que possam ser de grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova bem como a possibilidade de exame pelo juiz de correspondecircncia e documenshytaccedilatildeo bancaacuterias estatildeo previstas no art 181 n 1 e 2 do Coacutedigo de Processhyso Penal As pessoas obrigadas ao dever de segredo profissional podem recusar apresentar aqueles documentos ou objectos em seu poder se invocarem por escrito segredo profissional caso em que o conflito de interesses e deveres assim surgido seraacute dirimido pelo tribunal nos tershymos idecircnticos aos previstos para a recusa de depoimento - cf arts 182 n 2 e 135 ambos do citado coacutedigo

Enquanto o dever de segredo profissional eacute geralmente estabeleshycido a favor da integridade e liberdade das pessoas a quem aproveita tendo-se inserido a sua regulamentaccedilatildeo no Tiacutetulo VI do atraacutes mencionashydo Regime Geral das Instituiccedilotildees de Creacutedito e Sociedades Financeiras no qual se prevecirc um conjunto de regras de conduta que devem guiar a actuaccedilatildeo das instituiccedilotildees de creacutedito seus administradores e empregados

ENSAIOS JURiacuteDICOS 235

nas relaccedilotildees com os clientes visando proteger de forma eficaz a posishyccedilatildeo do consumidor de serviccedilos financeiros (cf preacircmbulo do Decreshyto-Lei n 2981992) ou estabelecer um clima de confianccedila na banca que permita a captaccedilatildeo e recuperaccedilatildeo do dinheiro entesourado (como se dizia no relatoacuterio do Decreto-Lei n 21978 de 9 de janeiro revogado pelo n 1 do art 5Q do citado Decreto-Lei n 2981992) no processo de inqueacuteshyrito a que procede o Ministeacuterio Puacuteblico estaacute em causa a realizaccedilatildeo de diligecircncias de prova que permitam investigar um crime de emissatildeo de cheque sem provisatildeo sob a eacutegide do princiacutepio da verdade material e incriminar o respectivo agente

O interesse que estaacute em jogo com a pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblishyco na obtenccedilatildeo da documentaccedilatildeo bancaacuteria eacute o da boa administraccedilatildeo da Justiccedila Penal e esse interesse eacute no caso em apreccedilo sensivelmente supeshyrior ao interesse da manutenccedilatildeo do segredo bancaacuterio o que equivale a di~er que este deve ceder perante aquele

Em suma no caso concreto ponderados os interesses em conflishyto entendemos que a quebra do dever de sigilo bancaacuterio se justifica nos termos do art 36 do Coacutedigo Penal pelo que deve ser dada procedecircncia agrave pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico e consequumlentemente ao abrigo do disposto nos arts 182 n 2 e 135 n 2 e 3 ambos do Coacutedigo de Processo Penal dispensar-se a Caixa Geral de Depoacutesitos do cumprimento do deshyver de sigilo bancaacuterio a fim de poder satisfazer tal pretensatildeo

3 Por todo o exposto determina-se que com quebra do dever de sigilo bancaacuterio a Caixa Geral de Depoacutesitos forneccedila ao Digno Magistrado do Ministeacuterio Puacuteblico com destino ao Processo de Inqueacuterito n 3571 1994 a documentaccedilatildeo bancaacuteria que este lhe havia solicitado

Natildeo eacute devida taxa de justiccedila

Texto processado e integralmente revisto pelo relator

Desembargador-Relator Rui Mauriacutecio

g) Substancioso estudo do sigilo bancaacuterio no Direito Comparado foi feishyto por Andreacute Serratildeo Borges de Sampaio Consultor da Uniatildeo nas informashyccedilotildees que prestou ao Advogado-Geral da Uniatildeo com referecircncia agrave ADIn n 2397 Transcrevo o inteiro teor do seu pronunciamento

51

6 O tratamento do sigilo bancaacuterio no Direito Comparado

Em verdade o Direito Comparado entende inoponiacutevel o sigilo banshycaacuterio agraves autoridades tributaacuterias Com efeito leciona Alfredo Echeverriacutea Herrera verbis

236 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

EI sigilo bancario constituye un reacutegimen limitado exclusivashymente ai aacutembito de las relaciones entre la institucioacuten bancaria y sus clientes e impone la obligacioacuten de confidencialidad de la institucioacuten sobre las informaciones que aqueacutellos le proporcionan

En todas las legislaciones bancarias el sigilo es relativo es decir el derecho dei ciudadano ai secreto y la correlativa obligacioacuten para el banco de no revelar a terceros las informaciones recibidas en el ejercicio de su actividad ceden cuando existe norma legal expresa o causa justificada

Elliacutemite legal ai sigilo estaacute constituiacutedo por la obligacioacuten dei banco de entregar informaciones y se fundamenta en motivos sushyperiores de orden puacuteblico o general siendo liacutecito entonces que el Estado establezca Iiacutemites legales ai secreto bancaria para auxiliar por ejemplo las actuaciones de la Justicia en el plano jurisdiccional y las dei Estado en el aacutembito dei ejercicio de su potestad impositiva

Es un principio irrebatible en la vida dei derecho que ni la autonomia de las personas ni los instrumentos dei aacuterea econoacutemica y financiera pueden servir en un momento dado como elementos juridicamente idoacuteneos para lesionar el intereacutes puacuteblico En consecuencia se puede afirmar que las limitaciones ai sigilo bancario son salvaguardias necesarias ai bien comuacuten en los caacutenones dei Estado moderno Estas limites deben ser materias reshyservadas a la ley por ser de caraacutecter excepcional en sentido estricto

En este orden de ideas necesariamente debe concluirse que existen legiacutetimos y superiores intereses en diversas aacutereas de la sociedad que se vinculan ai bien comuacuten y que deben ser tutelados por el Estado como lo es por ejemplo la necesidad de detectar y reprimir la evasioacuten de los impuestos los cuales transcienden ai evenshytual intereacutes geneacuterico que pueda tener el mismo Estado en la mantencioacuten dei sigilo bancaria En efecto desde el punto de vista de lajuridicidad y de la eacutetica no se puede sostener que el secreto bancaria pueda servir como instrumento para proteger la comisioacuten de actos

52

como el recieacuten mencionado que son constitutivos muchas veces de iliacutecitos penales bajo la forma de delitos tributarias o fraushydes fiscales con resultados ademaacutes de perjucio patrimonial ai Esshytado y dano ai intereacutes general de la sociedad

EI sistema bancaria frente a la existencia en la sociedad de un intereacutes general preponderante y superior estaacute naturalmente Ilamado a colaborar en la verificacioacuten y represioacuten de la evasioacuten tributaria

ENSAIOS JURiacuteDICOS 237

En este marco se inscribe la tendencia de la mayoda de las legislaciones modemas en cuanto a dotar aI Estado de facultades para intervenir en la actividad econoacutemica de los ciudadanos en procura de la correcta determinacioacuten de los tributos cuando se conshyfigura en el desarrollo de estas actividades un hecho gravado establecido en la ley

Ya la Constitucioacuten de Weimar en 919 proclamoacute que es liacutecito ai Estado intervenir para condicionar el ejercicio de los derechos a determinados fines sociales El bien comuacuten y la justicia social comenzaron desde entonces a servir de frontera a los derechos y Iibertades individuales

Cabe destacar que la OCDE (Organisation for Economic Cooperation and Development) en un documento elaborado en el ano 1999 sobre las praacutecticas de los paiacuteses en el acceso a la informacioacuten bancaria para fines tributarios advierte que se puede abusar de la confidencialidad para ocultar actividades iJegales y evadir impuestos y agrega en el resumen ejecutivo deI documento que ni la criminalizacioacuten dei fraude tributario ni el tratamiento de la evasioacuten de impuestos bajo las leyes tributarias de los paiacuteses miembros de la OCDE son homogeacuteneos pero que sin embargo los gobiernos de la mayoriacutea de los paiacuteses miembros de la OCDE han tomado la visi6n de que en este contexto las autoridades tributashyrias no deben ser tratadas como simples terceros sino que se les debe otorgar un acceso priviligiado a la informaci6n bancaria con fines tributarias

Se agrega en este estudio que una medida de esta naturaleza no pane en peligro la conlidencialidad de la inlormacioacuten bancaria puesto que las autoridades tributarias estaacuten sujetas a estrictos conshytroles sobre coacutemo utilizan la informacioacuten de los contribuyentes y todos los gobiemos han implementado regIas para proteger la conlidencialidad de la informaci6n tributaria (EI Sigilo Bancaacuterio Acesso a la Informadon Bancaria para Fines Tributarias)

Em verdade seu texto elenca 30 paiacuteses integrantes da OCDE (a saber Alemanha Austraacutelia Aacuteustria Beacutelgica Canadaacute Repuacuteblica Checa Dinamarca Finlacircndia Franccedila Greacutecia Hungria Islacircndia Irlanda Itaacutelia Japatildeo Coreacuteia Luxemburgo Meacutexico Paiacuteses Baixos Nova Zelacircndia Noshyruega Polocircnia Portugal Espanha Sueacutecia Turquia Suiacuteccedila Reino Unido Estados Unidos Repuacuteblica Eslovaca) dos quais em 1999 apenas trecircs (Portugal Repuacuteblica Eslovaca e Luxemburgo) natildeo facultavam o acesso por parte de autoridades tributaacuterias a informaccedilotildees relativas a pessoas suspeitas de fraude tributaacuteria

238 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

Desses trecircs paiacuteses hoje remanescem apenas dois Com efeito Portugal deixou de integrar esse grupo constrangedoramente minoritaacuterio ao aprovar em 29 de dezembro de 2000 a Lei n 30-G

Nesse diploma lecirc-se

Lei da Reforma de Tributaccedilatildeo do Rendimento

(Portugal)

Artigo 63 O - B

Acesso a informaccedilotildees e documentos bancaacuterios

1 A administraccedilatildeo tributaacuteria tem o poder de aceder directashymente aos documentos bancaacuterios nas situaccedilotildees de recusa da sua exibiccedilatildeo ou de autorizaccedilatildeo para a sua consulta

a) quando se trate de documentos de suporte de registos contabiliacutesticos dos sujeitos passivos de IRS e IRC que se enconshytrem sujeitos agrave contabilidade organizada

b) quando o contribuinte usufrua de benefiacutecios fiscais ou de regimes fiscais privilegiados havendo necessidade de controshylar os respectivos pressupostos e apenas para esse efeito

2 A administraccedilatildeo tributaacuteria tem o poder de aceder a todos os documentos bancaacuterios excepto as informaccedilotildees prestadas para justificar o recurso ao creacutedito nas situaccedilotildees de recusa de exibiccedilatildeo daqueles documentos ou de autorizaccedilatildeo para a sua consulta

a) quando se verificar a impossibilidade de comprovaccedilatildeo e quantificaccedilatildeo directa e exacta da mateacuteria tributaacutevel nos termos do artigo da Lei Geral Tributaacuteria e em geral quando estejam verifishycados os pressupostos para o recurso a uma avaliaccedilatildeo indirecta

b) quando os rendimentos declarados em sede de IRS se afastarem significativamente para menos sem razatildeo justificada dos padrotildees de rendimento que razoavelmente possam permitir as manifestaccedilotildees de riqueza evidenciadas pelo sujeito passivo nos termos do artigo 89-A da Lei Geral Tributaacuteria

c) quando existam indiacutecios da praacutetica de crime doloso em mateacuteria tributaacuteria designadamente nos casos de utilizaccedilatildeo de facturas falsas e em geral nas situaccedilotildees em que existam factos concretamente identificados gravemente indiciadores da falta de veracidade do declarado

d) quando seja necessaacuterio para fins fiscais comprovar a aplicaccedilatildeo de subsiacutedios puacuteblicos de qualquer natureza

ENSAIOS JUAlolCOS 239

3 As decisotildees da administraccedilatildeo tributaacuteria referidas nos nuacuteshymeros anteriores devem ser fundamentadas com expressa menshyccedilatildeo dos motivos concretos que as justificam pressupotildeem a audishyccedilatildeo preacutevia do contribuinte e satildeo da competecircncia do Director-Geshyral dos Impostos ou do Director-Geral das Alfacircndegas e dos Imshypostos Especiais sobre o consumo ou seus substitutos legais sem possibilidade de delegaccedilatildeo

4 Os actos praticados ao abrigo da competecircncia definida no nuacutemero anterior satildeo susceptiacuteveis de recurso judicial o qual teraacute efeito suspensivo nas situaccedilotildees previstas no n 2

5 Nos casos de deferimento do recurso previsto no nuacutemero anterior os elementos de prova entretanto obtidos natildeo podem ser utilizados para qualquer efeito em desfavor do contribuinte

6 As entidades que se encontrem numa relaccedilatildeo de domiacutenio com o contribuinte ficam sujeitas aos regimes de acesso agrave inforshymaccedilatildeo bancaacuteria referidos nos n 1 e 2

7 O acesso da administraccedilatildeo tributaacuteria a informaccedilatildeo banshycaacuteria relevante relativa a familiares ou terceiros que se encontrem numa relaccedilatildeo especial com o contribuinte depende de autorizashyccedilatildeo judicial expressa apoacutes audiccedilatildeo do visado obedecendo aos requisitos previstos no n 3

8 O regime previsto nos nuacutemeros anteriores natildeo prejudica a legislaccedilatildeo aplicaacutevel aos casos de investigaccedilatildeo por infracccedilatildeo peshynal e soacute pode ter por objecto operaccedilotildees e movimentos bancaacuterios realizados apoacutes a sua entrada em vigor sem prejuiacutezo do regime vigente para as situaccedilotildees anteriores

9 Os actos praticados ao abrigo da competecircncia prevista no n I devem ser objecto de comunicaccedilatildeo ao Defensor do Contrimiddot buinte

10 Para os efeitos desta lei considera-se documento bancaacuteshyrio qualquer documento ou registo independentemente do resshypectivo suporte em que se titulem comprovem ou registem opeshyraccedilotildees praticadas por instituiccedilotildees de creacutedito ou sociedades finanshyceiras no acircmbito da respectiva actividade incluindo os referentes a operaccedilotildees realizadas mediante utilizaccedilatildeo de cartotildees de creacutedito (coacutepia anexa)

Parece evidente destarte que todo o mundo civilizado abandonou a possibilidade de opor-se agrave Administraccedilatildeo Tributaacuteria o sigilo bancaacuterio

240 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

4 O sigilo bancaacuterio e o direito agrave intimidade e agrave privacidade das pessoas

A anaacutelise do sigilo bancaacuterio em face do direito agrave intimidade e agrave privacidashyde exige inicialmente que seja enfrentada a questatildeo referente ao seu conceito

Os doutrinadores natildeo tecircm assumido posiccedilatildeo uniforme quanto aos asshypectos conceituais dessa entidade juriacutedica

Seacutergio Carlos Covello autor da obra jaacute mencionada (O Sigilo Bancaacuterio Leud S Paulo 1991 p 69) entende que sigilo bancaacuterio eacute a obrigaccedilatildeo que tecircm os Bancos de natildeo revelar salvo justa causa as informaccedilotildees que venham a obter em virtude de sua atividade profissional

Luiz Fernando Bellinetti no artigo intitulado Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio (Revista do Direito do Consumidor Satildeo Paulo RT 1996 voI 18 p 144) defende posiccedilatildeo no sentido de que sigilo bancaacuterio eacute o dever juriacutedico que tecircm as instituiccedilotildees de creacutedito e as organizaccedilotildees auxiliares e seus empregados de natildeo revelar salvo justa causa as informaccedilotildees que venham a obter em virtushyde da atividade bancaacuteria a que se dedicam

Para Arnoldo Wald (in O Sigilo Bancaacuterio no Projeto de Lei Complemenshytar n 70 Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas n I pp 196209) o sigilo bancaacuterio se enquadra no conceito mais amplo do segredo profissional que tem merecido uma proteccedilatildeo mais ampla ensejando sua violaccedilatildeo caracterizaccedilatildeo como crime (art 154 do Coacutedigo PeshynaI)

Eivany A Silva tratando do tema em Consideraccedilotildees a Respeito do Sigilo de Dados (artigo publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio n 61 pp 41142 - Edit Dialeacutetica) afirma que o sigilo bancaacuterio eacute espeacutecie do gecircnero sigilo de dados constituindo um direito fundamental protegido constitucionalmente inserto que estaacute no rol dos direitos e garantias individuais ou seja em claacuteusushylas peacutetreas da Carta Magna natildeo podendo portanto ser modificado nem messhymo por emenda agrave Constituiccedilatildeo e portanto muito menos por legislaccedilatildeo de hierarquia inferior

Como examinado haacute divergecircncias na fixaccedilatildeo do conceito Essas divershygecircncias embora importantes para as posiccedilotildees doutrinaacuterias a serem assumishydas sobre o alcance do sigilo bancaacuterio natildeo geram contudo influecircncias de maior intensidade no relacionamento entre a instituiccedilatildeo financeira e os seus depositantes Isso porque o que merece ser considerado eacute a natureza juriacutedica do sigilo bancaacuterio isto eacute a que categoria de direito pertence e como por quem e quando a sua quebra pode ser determinada

Em face do exposto necessaacuterio eacute que se faccedila o alinhamento das teorias que procuram fundamentar o sigilo bancaacuterio

A doutrina em eacutepocas diversas examinou as seguintes teorias

ENSAIOS JURiacuteDICOS 241

Teoria contratualista O sigilo bancaacuterio de acordo com essa teoria deshycorre da relaccedilatildeo contratual que voluntariamente eacute formada entre o banco e o cliente por via da qual mesmo sem claacuteusula expressa a instituiccedilatildeo financeira assume a obrigaccedilatildeo de guardar segredo das movimentaccedilotildees de dinheiro que nela satildeo feitas Essa responsabilidade assumida pelo banco inspira-se segunshydo os adeptos da teoria em destaque nos usos nos costumes e na boa-feacute sempre aplicaacuteveis na intepretaccedilatildeo dos contratos comerciais7bull

Teoria do direito agrave privacidade Os adeptos dessa corrente afirmam que o sigilo bancaacuterio integra o campo do direito agrave privacidade que faz parte dos direitos da personalidade

Teoria consuetudinaacuteria Segundo os seguidores dessa linha de pensar o sigilo bancaacuterio decorre dos compromissos taacutecitos assumidos entre instituishyccedilotildees financeiras e seus clientes no sentido de natildeo serem levados ao conhecishymento de terceiros os valores transacionados O uso reiterado dessa praacutetica apoiada no elemento confianccedila passou a representar costume adotado nesse tipo de negoacutecio juriacutedico

Teoria da boa-feacute A adoccedilatildeo dessa teoria conduz o inteacuterprete a entender que o sigilo bancaacuterio por sua proacutepria natureza estaacute vinculado ao caraacuteter fiduciaacuterio da atividade bancaacuteria fundando-se portanto na boa-feacute ou dever de lisura que tanto marca o tipo de negoacutecio juriacutedico firmado

Teoria do sigilo profissional Essa teoria concebe o sigilo bancaacuterio como sendo uma espeacutecie do sigilo profissional Haacute portanto um dever eacutetico do banshyco em respeitar o sigilo bancaacuterio em decorrecircncia da profissatildeo exercida

Teoria do direito agrave intimidade dos bancos Os integrantes dessa forma de pensar sustentam que a instituiccedilatildeo financeira tem legiacutetimo interesse de afastar do conhecimento de terceiros a movimentaccedilatildeo financeira dos seus clientes e consequumlentemente dos fatos com elas relacionados

Teoria da complexidade do viacutenculo Essa teoria eacute explicada por Arnoldo Wald no trabalho jaacute citado da forma seguinte A doutrina moderna abandoshynou a noccedilatildeo da relaccedilatildeo juriacutedica contratual defendo a complexidade do viacutenshyculo Aleacutem dos direitos e das obrigaccedilotildees principais existem deveres secundaacuteshyrios para ambos os contratantes que decorrem da regra geral da boa-feacute denoshyminada na doutrina italiana de cOITeteza e na legislaccedilatildeo alematilde de Treu und Glauben Exige que a atuaccedilatildeo de uma parte natildeo cause danos agrave esfera juriacutedica da outra Dentro desta ideacuteia defende-se que o segredo bancaacuterio eacute um dever

7 Arnoldo Wald em Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais artigo publicado na Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas n 22 pp 1518 manifesta entendimento de que no campo normatIacutevo do Direito brasileiro esta teoria encontra respaldo nos arts 130 e 131 do Coacutedigo Comercial que prevecirc a interpretaccedilatildeo dos contratos segundo os usos os costumes e a boa-feacute

242 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

acessoacuterio na relaccedilatildeo juriacutedica Mesmo que natildeo nasccedila o contrato entre as partes a boa-feacute objetiva impede que a instituiccedilatildeo financeira prejudique os interesses do cidadatildeo

Estabelecidos os pressupostos doutrinaacuterios acima examinamos agora se o sigilo bancaacuterio diz respeito agrave intimidade e agrave privacidade das pessoas

A Constituiccedilatildeo Federal em seu artigo 5ordm incisos X e XII afirma

Art 5ordm Todos satildeo iguais perante a lei sem distinccedilatildeo de qualquer natureza garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Paiacutes a inviolabilidade do direito agrave vida agrave liberdade agrave igualdade agrave segushyranccedila e agrave propriedade nos termos seguintes

X - satildeo inviolaacuteveis a intimidade a vida privada a honra e a imagem das pessoas assegurado o direito agrave indenizaccedilatildeo pelo dano material ou moral decorrente de sua violaccedilatildeo

XJl - eacute inviolaacutevel o sigilo da correspondecircncia e das comunicaccedilotildees telegraacuteficas de dados e das comunicaccedilotildees telefocircnicas salvo no uacuteltimo caso por ordem judicial nas hipoacuteteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigaccedilatildeo criminal ou instruccedilatildeo processual penal

Essas garantias constitucionais protegem o cidadatildeo de qualquer investida de terceiros em sua intimidade em sua vida privada e no sigilo de seus dados

Na expressatildeo terceiros estaacute incluiacutedo o Estado e consequumlentemente seus agentes poliacuteticos e administrativos

A doutrina tem se manifestado de modo quase unacircnime no sentido de que o sigilo bancaacuterio eacute uma garantia constitucional que protege a privacidade das pessoas no campo econocircmico e financeiro A sua significaccedilatildeo eacute de natildeo tornar puacuteblica a movimentaccedilatildeo da conta bancaacuteria e das aplicaccedilotildees financeiras do cidadatildeo para que de nenhum modo os atos privados praticados possam ser tornados puacuteblicos

Esse posicionamento eacute o adotado pelos autores que passo a citar

Arnoldo Wald (O Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais artigo pushyblicado na Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas RT n 22 pp 1521)

O sigilo bancaacuterio eacute o meio para resguardar a privacidade no camshypo econocircmico pois veda a publicidade sobre a movimentaccedilatildeo da conta corrente bancaacuteria e das aplicaccedilotildees financeiras

ENSAIOS JURiacuteDICOS 243

Eivany A Silva (Consideraccedilotildees a Respeito do Sigilo de Dados artigo publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio n 61 Satildeo Paulo Editora Dialeacutetica p27)

A maioria dos ordenamentos juriacutedicos como o brasileiro tratam o sigilo bancaacuterio como direito fundamental do contribuinte agrave privacidashyde ou seja agrave resistecircncia agrave comunicaccedilatildeo de dados que representem desshydobramento da personalidade da pessoa direito agrave oposiccedilatildeo e agrave negaccedilatildeo de comunicaccedilatildeo

Ives Gandra da Silva Martins (Sigilo Bancaacuterio trabalho publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio S Paulo Editora Dialeacutetica n 1 pp 24 e 25)

Pelos incisos X e XII do artigo 5ordm tem o contribuinte o direito de preservaccedilatildeo de sua intimidade de sua privacidade e de que terceiros que detenham informaccedilotildees pessoais suas sejam obrigados a guardaacute-Ias

Natildeo pode pois a fiscalizaccedilatildeo exigir de terceiros informaccedilotildees que apenas pode obter do proacuteprio contribuinte

Em determinadas hipoacuteteses todavia o interesse puacuteblico haacute de preshyvalecer sobre o interesse individual mas caberaacute a um outro poder definir se tais hipoacuteteses efetivamente ocorrem com o que poderaacute o Poder Judishyciaacuterio autorizar se convencido estiver o magistrado de que a hipoacutetese eacute de gravidade e de lesatildeo ao interesse puacuteblico a quebra do direito ao sigilo bancaacuterio

Estou convencido ser esta a melhor conformaccedilatildeo juriacutedica da quesshytatildeo idealizada pelos constituintes defendida pela doutrina e consagrashyda na jurisprudecircncia corrente exegeacutetica esta a que me filio desde os meus primeiros escritos sobre a mateacuteria

Roberto Quiroga Mosquera (Tributaccedilatildeo no Mercado Financeiro e de Capitais obra publicada pela Editora Dialeacutetica Satildeo Paulo 1998 pp 70171)

Do exposto ateacute aqui eacute evidente que o direito ao sigilo bancaacuterio representa uma espeacutecie de direito agrave privacidade

Eacute incontroverso que os dados e informaccedilotildees de natureza bancaacuteria dizem respeito agrave intimidade e agrave vida privada dos cidadatildeos Dados que dizem respeito aos valores em dinheiro depositados em contas-correnshytes bancaacuterias tipos e caracteriacutesticas de aplicaccedilotildees financeiras ganhos e prejuiacutezos auferidos ou incorridos em operaccedilotildees bursaacuteteis etc satildeo sem sombra de duacutevida elementos particulares e pessoais de qualquer indiviacuteshyduo

244 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Utilizando outra voz informaccedilotildees que tocam no aspecto financeishyro do ser humano representam direito iacutentimo e personaliacutessimo devendo ser mantidas em sigilo por aqueles que eventualmente as detenham em razatildeo de sua atividade profissional Parece-nos que tal conclusatildeo eacute de uma clareza inconteste

Natildeo tem sido outra a posiccedilatildeo da doutrina mais abalizada do Paiacutes e da jurisprudecircncia dominante

o autor referido a seguir faz a observaccedilatildeo seguinte

Carlos Alberto Hagstrom (Sigilo Bancaacuterio Novas Questotildees Reshyvista de Direito Mercantil Satildeo Paulo Malheiros 1997 vaI 105 pp 4344) expotildee que apesar de existirem diversas teorias que procuram fundashymentar juridicamente o sigilo bancaacuterio modernamente a explicaccedilatildeo para o fundamento do referido instituto sofreu uma radical alteraccedilatildeo Divershysas constituiccedilotildees modernas esclarece o mencionado autor ampliaram e explicitaram o elenco de direitos e garantias individuais passando a garantir o direito agrave privacidade e agrave intimidade A Constituiccedilatildeo brasileira natildeo trilha caminho diferente Assegurou referidos direitos de forma exshypressa e sem restriccedilotildees O tema do sigilo bancaacuterio figura agora em niacutevel constitucional Tem status de norma superior no qual se reconhece o direito agrave intimidade como norma de caraacuteter geneacuterico em que estatildeo conshytemplados muacuteltiplos aspectos da vida privada em especial os de ordem econocircmico-financeira que compotildeem o que Hagstrom denominou a inshytimidade econocircmica ou intimidade patrimonial

Luiacutes Fernando 8ellinetti (Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio artigo publicado na Revista de Direito do Consumidor n 18 pp 141151)

Como jaacute dissemos anteriormente em certas hipoacuteteses o fundashymento para o segredo bancaacuterio seria a privacidade No entanto nesses casos o que se protege eacute a privacidade e natildeo propriamente o sigilo

Entendemos que uma coisa eacute garantir-se a privacidade da pessoa com fundamento em norma constitucional outra eacute garantir-se o segreshydo de informaccedilotildees bancaacuterias de uma pessoa com base na legislaccedilatildeo supramencionada

Sempre que a revelaccedilatildeo de informaccedilotildees bancaacuterias puder violar a privacidade da pessoa parece-nos que mais do que garantia ao sigilo bancaacuterio (com fundamento legal) tem a pessoa garantia agrave sua privacishydade (com fundamento constitucional)

ENSAIOS JURiacuteDICOS 245

No entanto se a revelaccedilatildeo da informaccedilatildeo natildeo invadir a esfera da intimidade da pessoa sua garantia eacute meramente legal do sigilo bancaacuterio

Carlos Maacuterio Velloso (citado por Misabel Derzi em Direito Tributaacuterio Aplicado obra publicada pela Editora Del Rey Belo Horizonte MO pp 278 e 279)

O sigilo bancaacuterio decorre do direito agrave privacidade inerente agrave pershysonalidade das pessoas consagrado na Constituiccedilatildeo Federal em seu art 5ordm X e protege tanto interesses privados como finalidades de ordem puacuteblica a saber o sistema de creacutedito O sigilo bancaacuterio natildeo eacute um princiacuteshypio absoluto

As exceccedilotildees ao sigilo bancaacuterio estatildeo previstas na Lei n 45951964 que continua em vigor

O Poder Judiciaacuterio pode requisitar relativamente a pessoas e instishytuiccedilotildees informaccedilotildees que implicam quebra de sigilo (Lei n 45951964 art 38 sect 1 ordm) entretanto mesmo havendo inqueacuterito policial instaurado deveraacute proceder com cautela prudecircncia e moderaccedilatildeo inerentes agrave mashygistratura

Luciana Fregodolli (O Direito agrave Intimidade - excerto da dissertaccedilatildeo que apresentou sob o tiacutetulo O Direito agrave Intimidade e a Prova Iliacutecita publicado pela Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Constitucional e Ciecircncia Poliacutetica -n 19 p 233)

O sigilo bancaacuterio protege interesses privados Eacute ele espeacutecie de direito agrave privacidade inerente agrave personalidade das pessoas e que a Consshytituiccedilatildeo Federal consagra no art 5ordm X aleacutem de atender a uma finalidade de ordem puacuteblica qual seja a de proteccedilatildeo ao sistema de creacutedito

O direito agrave privacidade abrange atualmente o de impedir que tershyceiros inclusive o Estado e o Fisco tenham acesso a informaccedilotildees sobre o que se denominou a aacuterea de manifestaccedilatildeo existencial do ser humano

Celso Ribeiro Bastos O pensamento de Celso Ribeiro Bastos foi exshyposto por Roberto Quiroga Mosquera na obra jaacute referida p 71 do modo seguinte

Celso Bastos eacute do mesmo pensar Apoacutes tecer consideraccedilotildees introdutoacuterias acerca do sigilo bancaacuterio e expor pensamentos de divershysos autores nacionais e alieniacutegenas conclui o constitucionalista brasileishyro no sentido de que todas as despesas ordinaacuterias feitas pelo cidadatildeo

246 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

comum em sua vida cotidiana devem ser consideradas parte de sua vida privada familiar ou domeacutestica e portanto protegidas contra interferecircnshycias a despeito de qualquer pretexto Desde as condutas mais corriqueishyras como as compras efetuadas em um supermercado para manutenshyccedilatildeo da famiacutelia quanto aquelas outras moralmente reprovaacuteveis como presentes ou joacuteias compradas e dadas a quem presta ao homem servishyccedilos de natureza extraconjugal tudo estaacute abarcado pelo manto da proteshyccedilatildeo agrave vida privada familiar ou domeacutestica ( ) E mais adiante arremata Hoje praticamente a vida do homem pode ser escrita a partir de seu talatildeo de cheques e nas sociedades mais avanccediladas pelos cartotildees de creacutedito e magneacuteticos Permitir-se que o sigilo bancaacuterio venha a ser romshypido por qualquer forma natildeo-extraordinaacuteria para salvaguarda de inteshyresse de porte no miacutenimo idecircntico eacute expor a seguranccedila individual a um constante e absurdo temor perante as possibilidades de controle direto ou pelo vazamento de alguma informaccedilatildeo

Haacute contudo corrente contraacuteria como passaremos a demonstrar

Andreacute Serratildeo Borges de Sampaio Consultor da Uniatildeo nas informashyccedilotildees prestadas ao Advogado-Geral da Uniatildeo sobre a ADIn n 2397 cita trechos de doutrina e jurisprudecircncia estrangeiras defendendo o entendimento de que o sigilo bancaacuterio natildeo tem conotaccedilatildeo de direito de privacidade Eis o que escreshyveu o parecerista citado

O jurista portuguecircs J L Saldanha Sanches coteja primorosashymente o sigilo bancaacuterio com a proteccedilatildeo da intimidade para concluir que natildeo haacute que se falar em direito ao sigilo bancaacuterio como concretizaccedilatildeo do direito agrave intimidade Nas suas palavras

Ora em que esfera podemos noacutes incluir o segredo bancaacuteshyrio enquanto instituto que concretiza certos valores do ordenashymento juriacutedico Como expressatildeo de interesses juridicamente tuteshylados

Seraacute o segredo bancaacuterio um prolongamento do direito agrave inshytimidade da esfera pessoal e familiar de uma qualquer pessoa sinshygular (uma vez que em relaccedilatildeo agraves pessoas coletivas a questatildeo natildeo pode mesmo ser colocada) Ou diraacute antes respeito aquela faixa mais larga que resguarda a privacidade de qualquer cidadatildeo e que soacute pode por isso sofrer qualquer intromissatildeo se surgirem razotildees vaacutelidas para que tal direito seja restringido

Ao afirmar-se que na perspectiva dos clientes dos bancos o segredo bancaacuterio eacute um direito com a reserva da sua vida privada temos uma primeira resposta para esta questatildeo

ENSAIOS JURiacuteDICOS 247

Mas falta distinguir entre intimidade e reserva da vida privashyda e entre clientes individuais e profissionais de um banco Natildeo estamos perante o mesmo tipo de tutela quando contamos que um particular espera que o banco natildeo divulgue a qualquer inteshyressado o volume da sua conta bancaacuteria (porque pura e simplesshymente quer manter sob reserva a sua vida particular) ou quando um comerciante confia no banco para que este natildeo revele quem satildeo os seus clientes fornecedores ou qual eacute o seu grau de endividamento

No caso da pessoa singular estaacute apenas em causa um conshyjunto de valores de natureza moral esta natildeo estaacute em princiacutepio preocupada com possiacuteveis prejuiacutezos econocircmicos ligados a qualshyquer divulgaccedilatildeo Apenas se opotildee por razotildees do seu foro pessoal e que natildeo carecem de fundamentaccedilatildeo que esta tenha lugar

Enquanto que o comerciante pode ser seriamente prejudishycado em termos concorrenciais com a revelaccedilatildeo da lista dos seus clientes ou com a sua situaccedilatildeo financeira

O dever de reserva que cabe ao banqueiro estaacute desta forma a serviccedilo do interesse comercial das empresas suas clientes - que pelo simples facto de o serem ou por necessitarem de obter creacutedishyto lhe datildeo informaccedilotildees com um forte valor comercial ou da pesshysoa singular que deseja manter a privacidade da sua situaccedilatildeo patrimonial

Ou em alternativa ao serviccedilo da manutenccedilatildeo da privacidashyde que qualquer um pode desejar ainda que a possiacutevel violaccedilatildeo desta apenas lhe possa acarretar danos natildeo-patrimoniais

E por isso o segredo bancaacuterio natildeo pode constituir a expresshysatildeo do imperativo constitucional da proteccedilatildeo da intimidade Ateacute porque o acesso a essa esfera estaacute vedado aos proacuteprios bancos

Natildeo nos parece aceitaacutevel que um banco como condiccedilatildeo para a concessatildeo de creacutedito a uma pessoa singular ou para estashybelecer com ela qualquer relaccedilatildeo contratual possa exigir desta informaccedilatildeo de tipo estritamente pessoal ou a sujeiccedilatildeo a exames meacutedicos que atingindo a sua esfera iacutentima afectam a sua dignidashyde Aqui estaacute em causa a ilicitude da pergunta por pressupor o acesso agrave esfera inviolaacutevel (e indisponiacutevel) da intimidade

A informaccedilatildeo que o banco pode obter para a defesa dos seus interesses legiacutetimos natildeo pode ir aleacutem da esfera patrimonial do seu cliente rendimentos bens possuiacutedos perspectivas profisshysionais

( )

248 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

Podemos pois concluir que o segredo bancaacuterio natildeo eacute natildeo pode ser uma concretizaccedilatildeo do princiacutepio constitucional do direishyto agrave intimidade

Este princiacutepio tem como funccedilatildeo consagrar uma zona de reshyselVa pessoal para factos opccedilotildees e circunstacircncias que soacute de forshyma indirecta e de todo secundaacuteria podem ter aspectos ou refleshyxos de natureza patrimonial (Saldanha Sanches J L Segredo Bancaacuterio e Tributaccedilatildeo do Lucro Real In Saldanha Sanches J L Estudos de Direito Contabiliacutestico e Fiscal Coimbra Coimbra Edishytora 2000 pp 105108)

Em diversos paiacuteses haacute a clara percepccedilatildeo que natildeo haacute que se conshyfundir direito agrave intimidade com sigilo bancaacuterio indicando que a quebra do sigilo pela Administraccedilatildeo Tributaacuteria natildeo constitui violaccedilatildeo ao direito Ao contraacuterio a existecircncia de um Estado Fiscal implica na necessidade de consagrar agrave administraccedilatildeo tributaacuteria tal faculdade o que se harmonishyza com diversos princiacutepios e outros direitos fundamentais constantes da Carta de 1988

O caso espanhol eacute exemplar neste sentido ao natildeo visualizar a vioshylaccedilatildeo ao direito agrave intimidade em relaccedilatildeo agrave quebra do sigilo bancaacuterio Portanto

el Tribunal Constitucional espaflOl se ha pronunciado por la negativa de que el conocimiento de las cuentas bancarias por la Administracioacuten pueda invadir el aacutembito constitucionalmente garantizado de la intimidad de los individuos porque tales extractos no constituyen per se uma biografiacutea personal en nuacutemeros y en siacute no tiene relevancia para la intimidad personal y familiar dei contribuyente ya que se trata de dados no secretos y confiados a una entidad (Campos Laura Rodriacuteguez Oerechos dei Contribuyente em la Repuacuteblica Argentina ai Amparo de la Convencioacuten Interamericana de Oerechos Humanos http wwwiefpaorgarcriteriosdigitalarticulosderechoshtm Visitado em 512001)

Ao analisar a jurisprudecircncia da Corte Constitucional espanhola quanto ao tema tambeacutem ressalta Saldanha Sanches

Na apreciaccedilatildeo da constitucionalidade da lei que permitia o controle administrativo das contas bancaacuterias o Tribunal Constitushycional espanhol realizou uma distinccedilatildeo entre intimidade pessoal e familiar e a intimidade econoacutemica onde a proteccedilatildeo constitucional eacute menos intensa

ENSAIOS JURiacuteDICOS 249

E procura fazer uma distinccedilatildeo entre a violaccedilatildeo agrave intimidade como consequumlecircncia de uma anaacutelise das contas bancaacuterias - coloshycando a hipoacutetese de uma recusa de cooperaccedilatildeo por parte do conshytribuinte se tal eventualidade se verificar - e a violaccedilatildeo directa da intimidade uma vez que esta natildeo pode resultar de uma mera anaacuteshylise de movimentos bancaacuterios (Saldanha Sanches J L A Situashyccedilatildeo Actual do Sigilo Bancaacuterio a Singularidade do Regime Portushyguecircs In Saldanha Sanches J L Estudos de Direito Contabiliacutestico e Fiscal Coimbra Coimbra Editora 2000 p 91)

Outro comentarista ao analisar a situaccedilatildeo do sistema espanhol quanto ao sigilo bancaacuterio e o direito agrave intimidade fez questatildeo de ressaltar

Seguacuten el r c frente a la Hacienda Puacuteblica no existe el derecho a la intimidad deI art 18 CE Ya la LO de 5 de mayo deI 82 vada praacutecticamente de contenido constitucional el derecho a la intimidado en cuanto el aacutembito de eacutesta queda deferido a la ley ordinaria (a 2ordm) y en cuanto que la esfera protegida frente a las Administraciones se reduce a poco O nada ai no reputarse intromisiones ilegiacutetimas las actuaciones autorizadas o acordadas por la Autoridad competente de acuerdo con la Ley (art 8ordm 1)

La LGTy el RI Iimiacutetan la esfera de la intimidad en las relacishyones con la Hacienda hasta el extremo de que solamenle existe un refugio limitado en el aacutembito deI secreto profesional en los casos de informacioacuten sobre terceros y siempre que no se trate de datos con transcendencia econoacutemica o tributaria EI rc no ha enconshytrado hasta el momento ni un solo supuesto de dato o informacioacuten econocircmica con transcendencia tributaria que limite la accioacuten inquisitiva de la Administracioacuten tributaria por razoacuten de intimidado Bien puede decirse por tanto que frente a la Administraciocircn tribushytaria en cuanto se trata deI ejercicio de su funciocircn de buacutesqueda de datos con transcendencia tributaria el derecho a la intimidad personal y familiar (art 18 I CE) no existe

La biacuteblia deI tribunal a estos efeclos estaacute constituida por la S 11084 reiterada en numerosas ocasiones ampliada en el Auto 64286 y reafirmada por ejemplo en la S 26 abril 90 tantas veces citada (FJ 10deg) Seguacuten esa doctrina la distribucioacutenjusta de la carshyga fiscal prevalece sobre el derecho a la intimidad parte dei art 812 I de la LO seguacuten el cual frente a la Ley (ordinaria) no hay intimidad protegida siempre que haya en dicha ley imperativos de intereacutes puacuteblico ( ) ni siquiera se habla dei predomiacutenio frente a la

250 SUPERIOR TRIBUNAl DE JUSTiCcedilA

intimidad de intereses u objetivos constitucionalmente protegidos Soacuteo admite que la actuadoacuten administrativa es arbitraria cuando no parezcajustificada por la Finalidad de la inspeccioacuten es decir cuando se trate de datos o informaciones que carezcan de transcendencia tributaria pero eacuteste obviamente no es sin Umite derivado dei derecho a la intimidad sino de la interdiccioacuten de arbitrariedad o desviacioacuten de poder de la Administracioacuten de la necesidad de ajuste de toda Administracioacuten ai acircmbito de su competencia que tanto vale para datos iacutentimos como para otros que no lo sean Seguacuten la S 11084 no hay esfera de intimidad proshytegida frente a una Administracioacuten tributaria amparada en una norma que elimina la intimidad como liacutemite (Garciacutea AIacuteloveros Jaime Una Nueva Ley General Tributaria Problemas Constitucioshynales In Kirchhof P et aI Garantiacuteas Constitucionales dei Contribuyente Valencia Tirant lo Blanch 1999 pp 109110)

Diante de tudo quanto foi exposto tendo-se o cuidado de registrar posicionamento de diferentes autores nacionais e estrangeiros haacute ambiente preparado para ser respondido o primeiro questionamento desdobrado em trecircs partes formulado para o 1II Coloacutequio Internacional de Direito Tributaacuterio promoccedilatildeo do Centro de Extensatildeo Universitaacuteria Eis a primeira parte do seu teor

O sigilo bancaacuterio diz respeito agrave intimidade e privacidade das pessoas

A resposta eacute optando por convencimento influenciado pelas ideacuteias da corrente predominante positiva

O nosso entendimento eacute no sentido de que o direito agrave intimidade integra os direitos da personalidade e visam proteger o direito agrave inviolabilidade do domiciacutelio da correspondecircncia das comunicaccedilotildees de quaisquer espeacutecies dos dados pessoais computadorizados do sigilo bancaacuterio O mesmo acontece com o direito agrave privacidade

A expansatildeo da proteccedilatildeo do direito agrave intimidade e agrave privacidade eacute uma consequumlecircncia da evoluccedilatildeo da era contemporacircnea nos setores tecnoloacutegicos e da instabilidade que passam as instituiccedilotildees estatais especialmente a encarreshygada de arrecadar tributos Haacute o reconhecimento de que desenvolve-se um processo de aguda corrosatildeo na proteccedilatildeo agrave intimidade que ao ser violada provoca a publicizaccedilatildeo das condutas mais iacutentimas do cidadatildeo

A concepccedilatildeo do sigilo bancaacuterio no acircmbito do direito agrave intimidade e agrave privacidade visa garantir ao homem o miacutenimo capaz para que lhe seja asseshygurada a sua condiccedilatildeo humana protegendo-o de ingerecircncias alheias como apregoa a Conferecircncia Noacuterdica sobre o Direito agrave Intimidade realizada em Estoshycolmo na data de maio de 1967 ao fazer inserir no documento que publicou a seguinte definiccedilatildeo O direito agrave intimidade eacute o direito do homem de viver de forma independente a sua vida com um miacutenimo de ingerecircncia alheia

ENSAIOS JURiacuteDICOS 251

5 Seguranccedila juriacutedica e acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias

A segunda pergunta apresentada pelos organizadores do coloacutequio estaacute assim posta

A seguranccedila das relaccedilotildees juriacutedicas atraveacutes do Sistema Financeiro pode ser afetada pelo acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves inforshymaccedilotildees bancaacuterias

O acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias se realizado caracteriza um atentado de suma gravidade aos direishytos do cidadatildeo Eacute um ataque aos princiacutepios sustentadores do sistema demoshycraacutetico adotado pelo constituinte de 1988 especialmente quando detonou que a Repuacuteblica Federativa do Brasil tem como objetivo fundamental o respeishyto agrave dignidade humana e agrave cidadania

Do ordenamento juriacutedico brasileiro a meu pensar natildeo haacute lugar para brotar qualquer interpretaccedilatildeo que conclua pela possibilidade de qualquer agenshyte do Poder Puacuteblico acessar de modo generalizado e sem motivaccedilatildeo informashyccedilotildees bancaacuterias do cidadatildeo mesmo com autorizaccedilatildeo judicial

Esclareccedilo desde logo que natildeo comungo com o pensamento de detershyminada corrente no sentido de ser absoluto o direito ao sigilo bancaacuterio Tenho-o como relativo poreacutem vinculado aos princiacutepios da razoabilidade da moralidade da legalidade e da motivaccedilatildeo expliacutecita e detalhada sob pena de ser impossiacutevel a sua quebra

O acesso indiscriminado do agente fiscal agraves informaccedilotildees bancaacuterias do cidadatildeo gera uma quebra da seguranccedila das relaccedilotildees juriacutedicas por um terceiro passar a ter sem causa justificadora conhecimento da vida iacutentima de algueacutem submetendo-o a partir daiacute a um regime de submissatildeo Por outro lado ninshygueacutem poderaacute garantir nem o proacuteprio Estado que o agente puacuteblico utilize os dados que chegaram ao seu conhecimento para outros intentos que natildeo o exclusivamente fiscal

Lembra Arnoldo Wald que O segredo na atividade bancaacuteria envolve concomitantemente interesses privaqos e coletivos que podem ser analisashydos sob trecircs acircngulos o interesse do cliente na sua relaccedilatildeo com a instituiccedilatildeo financeira o interesse do banco em atuar com discriccedilatildeo para ganhar a conshyfianccedila da populaccedilatildeo e captar recursos e o interesse social na existecircncia de um bom e eficiente sistema bancaacuterio Por estarem ligadas ao desenvolvimento da economia e aos interesses da comunidade as relaccedilotildees que envolvem as instishytuiccedilotildees financeiras natildeo recebem o mesmo tratamento juriacutedico dispendido a outras relaccedilotildees comerciais Inviaacutevel a aplicaccedilatildeo exclusiva das regras de Direito Privado as quais tecircm como princiacutepio norteador a autonomia da vontade pois

252 SUPERIOR TRIBUNAl DE JUSTiCcedilA

esta encontra limites nas normas cogentes proacuteprias do direito bancaacuterio e na intervenccedilatildeo do Estado8

A seguranccedila juriacutedica desse tipo de relaccedilatildeo envolve tambeacutem a manutenshyccedilatildeo do segredo das movimentaccedilotildees financeiras do contribuinte

Imprimir-se a mais ampla seguranccedila nas relaccedilotildees do Sistema Financeiro eacute fortalececirc-lo O Estado tem o dever de zelar por esse estado de seguranccedila natildeo permitindo consequumlentemente que o sigilo bancaacuterio seja quebrado pelo acesshyso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico por esse comportamento afeshytar a confiabilidade no sistema

Eacute de todo inconveniente permitir a possibilidade de um atuar do agente fiscal sem controle na quebra do sigilo bancaacuterio por afetar diretamente a seshyguranccedila da relaccedilatildeo juriacutedica firmada entre a instituiccedilatildeo financeira e o seu clienshyte em face deste sentir-se atingido pela accedilatildeo fiscal que passa a tomar conhecishymento de sua intimidade financeira e de fatos de sua vida privada sem o resshypaldo do Poder Judiciaacuterio

A seguranccedila juriacutedica nesse tipo de relaccedilatildeo deve assegurar impossibilidashyde de abuso de poder por parte do Fisco em face da necessidade de ser resshyguardada a garantia de que em um Estado de Direito natildeo pode ser concebido que conceda-se a uma parte mesmo que seja o Estado o domiacutenio absoluto de apanhar as provas que iraacute utilizar em caso de litiacutegio contra algueacutem

O acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias do contribuinte aleacutem de afetar a seguranccedila juriacutedica da relaccedilatildeo em questatildeo promove um desequiliacutebro entre o cidadatildeo-contribuinte e o Fisco por caracterizar coaccedilatildeo que coloca aquele em posiccedilatildeo de inferioridade

A valorizaccedilatildeo da seguranccedila juriacutedica da relaccedilatildeo existente entre instituiccedilatildeo financeira e contribuinte pelo Fisco natildeo quebrando o seu sigilo fiscal sem autorizaccedilatildeo judicial constitui causa de aplicaccedilatildeo de Justiccedila fiscal O seguimenshyto de seus princiacutepios valoriza o regime democraacutetico do qual ela faz parte

6 Casos de admissibilidade da quebra do sigilo bancaacuterio

Os casos de admissibilidade da quebra do sigilo bancaacuterio estatildeo na atuashylidade descritos no nosso ordenamento juriacutedico positivo

A Lei Complementar n 105 de 10 de janeiro de 2001 apoacutes determinar no art 112 de que as instituiccedilotildees financeiras conservaratildeo sigilo em suas operashyccedilotildees ativas e passivas e serviccedilos prestados dispotildee no sect 312 do mesmo artigo que

8 Arnoldo Wald no artigo Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais Revista dos Tribunais ano 6 n 22 janeiromiddotmarccedilo de 1998 n 22 Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas p 15

ENSAIOS JURiacuteDICOS 253

sect 3ordm Natildeo constitui violaccedilatildeo do dever de sigilo

I a troca de informaccedilotildees entre instituiccedilotildees financeiras para fins cadastrais inclusive por intermeacutedio de centrais de risco observadas as normas baixadas pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e pelo Banco Censhytral do Brasil

11 - o fornecimento de informaccedilotildees constantes de cadastro de emitentes de cheques sem provisatildeo de fundos e de devedores inadimplentes a entidades de proteccedilatildeo ao creacutedito observadas as norshymas baixadas pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e pelo Banco Central do Brasil

JJI - o fornecimento das informaccedilotildees de que trata o sect 2ordm do art II da Lei n 9311 de 24 de outubro de 1996

IV - a comunicaccedilatildeo agraves autoridades competentes da praacutetica de iliacutecitos penais ou administrativos abrangendo o fornecimento de inforshymaccedilotildees sobre operaccedilotildees que envolvam recursos provenientes de qualshyquer praacutetica criminosa

V - a revelaccedilatildeo de informaccedilotildees sigilosas com o consentimento expresso dos interessados

VI- a prestaccedilatildeo de informaccedilotildees nos termos e condiccedilotildees estabeleshycidos nos artigos 2ordm 3ordm 4ordm 5ordm 6ordm 7ordm e 9ordm desta lei complementar

sect 4ordm A quebra de sigilo poderaacute ser decretada quando necessaacuteria para apuraccedilatildeo de ocorrecircncia de qualquer iliacutecito em qualquer fase do inqueacuterito ou do processo judicial e especialmente nos seguintes crimes

I - de terrorismo

11 - de traacutefico iliacutecito de substacircncias entorpecentes ou drogas afins

III - de contrabando ou traacutefico de armas municcedilotildees ou material destinado a sua produccedilatildeo

IV - de extorsatildeo mediante sequumlestro

V - contra o sistema financeiro nacional

VI - contra a Administraccedilatildeo Puacuteblica

Vll- contra a ordem tributaacuteria e a previdecircncia social

VIII-lavagem de dinheiro ou ocultaccedilatildeo de bens direitos e valores

IX - praticado por organizaccedilatildeo criminosa

Como visto a lei complementar enumera inuacutemeras situaccedilotildees que indeshypendentemente de autorizaccedilatildeo judicial o sigilo bancaacuterio eacute quebrado

254 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

A dificuldade que se apresenta eacute a de conciliar os casos de quebra de sigilo bancaacuterio que a Lei Complementar n 105 autoriza com a garantia do direito agrave privacidade e agrave intimidade

Destaque-se entre os de maior relevacircncia os seguintes

- natildeo constituir violaccedilatildeo do dever de sigilo bancaacuterio a troca de informashyccedilotildees entre instituiccedilotildees financeiras para fins cadastrais inclusive por intermeacuteshydio de centrais de risco o que possibilita o conhecimento da vida financeira privada do cidadatildeo por vaacuterias pessoas sem desempenho de autoridade na instituiccedilatildeo independentemente de ser justificada com antecedecircncia a causa desse atuar

- o de serem fornecidos dados relativos a fornecimentos de informashyccedilotildees cadastrais de emitentes de cheques sem provisatildeo de fundos a entidades privadas de proteccedilatildeo ao creacutedito sem qualquer avaliaccedilatildeo por qualquer autorishydade da causa determinante do fato a quebra do sigilo bancaacuterio na fase do inqueacuterito por inexistir nessa ocasiaacuteo qualquer contraditoacuterio e respeito ao prinshyciacutepio do devido processo legal

Quanto agraves demais situaccedilotildees constantes na lei complementar que autorishyzam a quebra do sigilo bancaacuterio naacuteo obstante algumas serem absolutamente necessaacuterias haacute de serem vistas em compatibilidade com as garantias constitushycionais conforme jaacute assinalado

O colendo Supremo Tribunal pronunciaraacute como guarda e inteacuterprete maishyor da Carta Magna em ADln jaacute intentada sobre a constitucionalidade ou natildeo dos dispositivos supramencionados

Em campo doutrinaacuterio valoriza-se as posiccedilotildees apresentadas quando da resposta oferecida aos questionamentos anteriores todas acenando pela neshycessidade do controle do Poder Judiciaacuterio

7 Sistema mais justo para a quebra do sigilo bancaacuterio

Os organizadores do JII Coloacutequio Internacional de Direito Tributaacuterio subshymetem agora para anaacutelise a questatildeo do teor seguinte Um sistema em que o Poder Judiciaacuterio torna-se aacuterbitro dos pedidos da Administraccedilatildeo Puacuteblica para quebra do sigilo eacute o mais justo

Em um Estado que por imposiccedilatildeo de sua proacutepria Constituiccedilatildeo estaacute comprometido com a guarda e aplicaccedilatildeo efetiva de princiacutepios democraacuteticos especialmente o de respeitar os direitos e garantias fundamentais da cidadashynia natildeo haacute ambiente para que seja outorgado ao Poder Executivo por via da atuaccedilatildeo de agentes puacuteblicos fiscais o acesso sem o controle do Poder Judiciaacuteshyrio agraves informaccedilotildees bancaacuterias do contribuinte

ENSAIOS JURiacuteDICOS 255

o sigilo bancaacuterio por ser um direito fundamental que exige ser respeitashydo pela supremacia constitucional que o protege deve submeter a possibilishydade de sua quebra para fins tributaacuterios ao Poder Judiciaacuterio pela ausecircncia de interesse direto nos resultados da accedilatildeo fiscalizadora que eacute o recolhimento do tributo e pelas garantias de independecircncia prudecircncia e qualificaccedilatildeo juriacutedica que revestem esse poder

A atuaccedilatildeo da fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo pode ser exercida fora dos limishytes da legalidade imposta a partir da Carta Magna e demais imposiccedilotildees legais a ela subordinadas

Natildeo se desconhece que no atual Estado fiscal os tributos constituem os meios financeiros determinantes para o atendimento dos compromissos da Administraccedilatildeo Puacuteblica com as obrigaccedilotildees oriundas em decorrecircncia de sua atividade no campo educacional social de seguranccedila puacuteblica interna e extershyna da sauacutede da manutenccedilatildeo dos Poderes ou seja para manter funcionando a maacutequina estatal

Por natildeo entremostrar-se na eacutepoca contemporacircnea qualquer outra alshyternativa viaacutevel para transformar o Estado fiscal em um Estado produtivo os tributos passam a representar um indeclinaacutevel dever da cidadania cujo cumshyprimento deve ser por todos honrado conforme assinala Joseacute Casalta Nabais Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra em artigo intitulado Algumas Reflexotildees sobre o Actual Estado Fiscal

Por isso os impostos hatildeo de constituir um preccedilo aceitaacutevel ou seja um preccedilo limitado Um preccedilo que estou certo muitas das sociedashydes que nos antecederam gostariam de ter pago e algumas das actuais natildeo enjeitariam suportar Por isso bem podemos afirmar como jaacute o fizeshymos noutro lugar que no actual Estado fiscal para o qual natildeo se vislumshybra qualquer alternativa viaacutevel pelo menos nos tempos mais proacuteximos os impostos constituem um indeclinaacutevel dever de cidadania cujo cumshyprimento a todos nos deve honrar

A atuaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio para liberar o bloqueio fortalece a conshyfianccedila do cidadatildeo no procedimento da fiscalizaccedilatildeo e consagra a ideacuteia iacutensita em qualquer regime democraacutetico de que a atuaccedilatildeo do Estado tem limites

Na espeacutecie os limites impostos satildeo os decorrentes da quebra do sigilo ser necessaacuterio em face da possiacutevel ilicitude cometida pelo cidadatildeo poreacutem sem ser violados os direitos do cidadatildeo de gozar da sua privacidade e da sua intimidade

A denominada cidadania fiscal haacute de ser considerada de modo conjunshytural com os reflexos dos direitos fundamentais assegurados ao contribuinte sem prestigiar a responsabilidade que tem o Estado de promover a arrecadashyccedilatildeo dos tributos

256 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

Cedo espaccedilo para registrar que a cidadania fiscal deve configurar um estado de relaccedilatildeo juriacutedica em que todos suportem a concretizaccedilatildeo de um Estado em que todos tenham a qualidade de destinataacuterio do dever fundashymentaI de pagar impostos na medida da respectiva capacidade contributiva poreacutem que seja um Estado fiscal suportaacutevel isto eacute um estado cujo sistema fiscal se encontre balizado por estritos limites juriacutedico-constitucionais9

A Administraccedilatildeo Tributaacuteria por melhor que seja a sua estrutura e os seus propoacutesitos natildeo estaacute emocionalmente preparada para conceber e aplicar os princiacutepios que sustentam a cidadania fiscal Isso ocorre primeiramente porshyque o Fisco tem por missatildeo exclusiva exercer a funccedilatildeo de arrecadar tributos Eacute a sua meta essencial por ser atribuiccedilatildeo que na organizaccedilatildeo administrativa estatal estaacute obrigado a desempenhar Natildeo lhe cabe administrar o tributo arreshycadado limitando-se unicamente a envidar esforccedilos para o cumprimento das metas impostas para imprimir aumento na arrecadaccedilatildeo tributaacuteria O sucesso da Administraccedilatildeo Tributaacuteria eacute medido pelo maior volume de recursos fiscais atraiacutedos para os cofres do Governo nunca pelo respeito que exerccedila para com os direitos fundamentais do contribuinte Eacute uma questatildeo de cultura adminisshytrativa de distribuiccedilatildeo de funccedilotildees no sistema estatal impossiacutevel de ser mudashydo por sugestotildees doutrinaacuterias

Por outro lado a fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo consegue afastar as pressotildees exercidas sobre ela por determinados segmentos da organizaccedilatildeo estatal que defendem uma atuaccedilatildeo mais agressiva para a cobranccedila dos tributos tudo em decorrecircncia dos efeitos produzidos pela conduta iliacutecita marcante da sonegashyccedilatildeo fiscal

Esses fatores contribuem para que a fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo tenha condiccedilotildees de modo imparcial sem isenccedilatildeo avaliar a necessidade objetiva da quebra do sigilo bancaacuterio do cidadatildeo Por melhor que seja o seu desempenho nunca ganharaacute a confianccedila do contribuinte

A atribuiccedilatildeo da quebra do sigilo bancaacuterio em um regime democraacutetico onde predomina o respeito maior aos direitos fundamentais da cidadania deve ser exercido pelo Poder Judiciaacuterio natildeo soacute porque seus membros atualmente revestidos da garantia da vitaliciedade inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos bem como porque estatildeo revestidos de independecircncia absoluta em relaccedilatildeo ao Poder interessado na cobranccedila do tributo e consequumlentemenshyte no resultado a ser obtido pela accedilatildeo fiscal

Esse sistema misto onde o Fisco faz a solicitaccedilatildeo motivada para a queshybra do sigilo bancaacuterio ao Poder Judiciaacuterio e este apoacutes analisaacute-lo com objetivishydade e cautela defere ou indefere impotildee seguranccedila e confiabilidade na atuashyccedilatildeo fiscal e sublima o respeito agrave dignidade do contribuinte em outras palavras da cidadania fiscal isto eacute de uma cidadania de liberdade que o Estado fiscal

9 Joseacute Casalta Nabais (Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra) no artigo Algumas Reflexotildees sobre o Actual Estado Fiscal no site httpagugovbr

ENSAIOS JURiacuteDICOS 257

pressupotildee para natildeo ser postergada impotildee um sistema fiscal balizado por esshytritos limites juriacutedico-constitucionais Limites esses que integram a chamada constituiccedilatildeo fiscal e que podemos reconduzir para natildeo nos alongarmos nesse aspecto a duas ideacuteias uma ideacuteia de seguranccedila que tem o seu tradicional e principal suporte no princiacutepio da lega1idade fiscal e uma ideacuteia de justiccedila ou equumlidade que tem a ver com a medida dos impostos e assenta no princiacutepio da capacidade contributiva 10

Em conclusatildeo a adoccedilatildeo de um sistema para a quebra do sigilo bancaacuteshyrio em que o Poder Judiciaacuterio seja o aacuterbitro dos pedidos da Administraccedilatildeo Puacuteblica natildeo eacute somente mais justo mas consegue impor maior credibilidade agrave atuaccedilatildeo fiscal e presta homenagem com intensa potencialidade aos princiacuteshypios democraacuteticos consistentes na guarda da seguranccedila juriacutedica do respeito aos direitos fundamentais do cidadatildeo nesse rol incluidos os agrave privacidade e agrave intimidade Aleacutem disso torna mais respeitaacutevel a relaccedilatildeo entre Fisco e contrishybuinte justificando portanto a opccedilatildeo do Estado pelo regime democraacutetico

8 Autoridade fiscal e faculdade incondicionada de quebrar o sigilo bancaacuterio

Essa indagaccedilatildeo consubstancia a preocupaccedilatildeo de serem estabelecidos controles para a atuaccedilatildeo do agente puacuteblico fiscal Centra-se a preocupaccedilatildeo em imprimir nas relaccedilotildees juriacutedicas tributaacuterias de quaisquer espeacutecies o primashydo da legalidade aprimorando-se o atuar vinculado

Natildeo concilia-se com os postulados da democracia a adoccedilatildeo de um sisteshyma de fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria que outorgue faculdade incondicionada ao fiscal tributaacuterio de invadir a intimidade e a privacidade das pessoas sob o falso argushymento juriacutedico de que busca encontrar provas de sonegaccedilatildeo fiscal

Depreende-se do exposto que a autoridade fiscal natildeo deve ter faculdade incondicionada de quebrar o sigilo sempre que entender necessaacuterio Isso porshyque a praacutetica de atos administrativos por agentes puacuteblicos de modo incondicionado revela grave violaccedilatildeo ao princiacutepio da legalidade onde predoshymina a vontade da lei e natildeo o discricionarismo de quem o pratica

No trato do sigilo bancaacuterio o atuar incondicionado da fiscalizaccedilatildeo assushyme caracteriacutesticas de maior gravidade porque haacute violaccedilatildeo aos princiacutepios funshydamentais jaacute expostos e que satildeo prestigiados pela Carta Magna especialmenshyte por bater de frente de modo integral e absoluto com o direito agrave intimidade e agrave privacidade O atuar deve vincular-se rigidamente ao princiacutepio da legalidashyde especialmente aposta na Carta Magna sem a possibilidade de ser aberto qualquer canal para uso da conveniecircncia ou da oportunidade

Eacute de ser lembrada no trato do assunto a liccedilatildeo de Joseacute Casalta Nobais no trabalho jaacute citado no sentido de que Eacute certo que independentemente da

10 Idem p 15

=258=---___________________ SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTlCA

concepccedilatildeo a que se adira relativamente ao segredo bancaacuterio natildeo temos a menor duacutevida de que o acesso da Administraccedilatildeo Fiscal agrave informaccedilatildeo bancaacuteria seja directo sem necessidade de preacutevia decisatildeo judicial seja indirecto depois portanto de preacutevia decisatildeo judicial haacute de ter sempre uma natureza claramenshyte excepcional Na verdade constitua o segredo bancaacuterio uma manifestaccedilatildeo do direito fundamental agrave reserva da intimidade da vida privada constante do art 26 n 2 da Constituiccedilatildeo portuguesa ou suporte um outro direito fundashymentai um direito agrave reserva da vida privada anaacutelogo agravequele a sua afectaccedilatildeo teraacute sempre caraacuteter excepcional

A autoridade fiscal natildeo possui a necessaacuteria isenccedilatildeo e competecircncia institucional para averiguar o grau dessa excepcionalidade de modo que posshysa impor confianccedila ao cidadatildeo investido na condiccedilatildeo de contribuinte poreacutem com direitos a serem assegurados por forccedila do regime democraacutetico adotado

O certo eacute que na relaccedilatildeo juriacutedico-tributaacuteria deve ser buscado o justo equiliacutebrio pregado pelo Estado de Direito onde o cidadatildeo deve ter a sua dignishydade respeitada sem contudo afastar-se a necessidade do Estado arrecadar tributos de forma cogente e imperativa bem como de serem permitidas conshydiccedilotildees de atuaccedilatildeo que resultem no combate agrave sonegaccedilatildeo fiscal

9 Responsabilidade da autoridade administrativa que quebrar o sigilo banshycaacuterio de forma inconsistente e indevida

Eacute inerente ao regime democraacutetico que a autoridade administrativa puacuteblishyca estaacute obrigada a exercer as suas atribuiccedilotildees com rigorosa obediecircncia aos princiacutepios da legalidade moralidade publicidade impessoalidade e eficiecircncia entre outros

A Carta Magna consagra expressamente no art 37 a obediecircncia do agente puacuteblico a esse tipo de comportamento

A autoridade administrativia que quebrar de modo inconsistente e indevido o sigilo bancaacuterio do cidadatildeo pratica ato com capacidade de provocar os seguintes efeitos a) de invadir o direito agrave privacidade e agrave intimidade de algueacutem b) de provocar-lhe danos morais e materiais dependendo da repershycussatildeo provocada pelo seu atuar

Constatada a efetivaccedilatildeo real de danos morais e materiais a responsabishylidade do Estado pode ser acionada conforme permite o art 37 sect 6ordm da Consshytituiccedilatildeo Federal Solidificada a culpa ou dolo do agente puacuteblico e consagrada a materializaccedilatildeo do iliacutecito praticado com o consequumlente ressarcimento patrimonial o Estado deveraacute usando o direito de regresso investir contra o agente que agiu culposa ou dolosamente

Natildeo resume-se apenas ao campo da responsabilidade civil a atuaccedilatildeo da autoridade quando ilegalmente quebra o sigilo bancaacuterio de qualquer cidadatildeo

ENSAIOS JURiacuteDICOS 259

o art 10 da Lei Complementar n 105 de 10 de janeiro de 2001 determishyna que A quebra de sigilo fora das hipoacuteteses autorizadas nesta lei compleshymentar constitui crime e sujeita os responsaacuteveis agrave pena de reclusatildeo de um a quatro anos e multa aplicando-se no que couber o Coacutedigo Penal sem prejuiacuteshyzo de outras sanccedilotildees cabiacuteveis A seguir no seu paraacutegrafo uacutenico explicita que Incorre nas mesmas penas quem omitir retardar injustificadamente ou presshytar falsamente as informaccedilotildees requeridas nos termos desta lei complementar

O art 11 da mesma lei complementar expressa que O servidor puacuteblico que utilizar ou viabilizar a utilizaccedilatildeo de qualquer informaccedilatildeo obtida em decorshyrecircncia da quebra de sigilo de que trata esta lei complementar responde pessoshyal e diretamente pelos danos decorrentes sem prejuiacutezo da responsabilidade objetiva da entidade puacuteblica quando comprovado que o servidor agiu de acorshydo com a orientaccedilatildeo oficial

10 O sigilo bancaacuterio e o tratamento que lhe eacute dado por oacutergatildeos internacioshynais como a OCDE e outros

Rui Celso Reali Fragoso Presidente do Instituto dos Advogados de Satildeo Paulo em artigo intitulado O Sigilo Bancaacuterio veiculado pela Internet (http Ii wwwjuscombr) registra que atualmente temos trecircs sistemas legais no munshydo cuidando do sigilo bancaacuterio O primeiro eacute o anglo-saxatildeo em que o sigilo natildeo encontra amparo legal o segundo eacute o dos paiacuteses da Europa continental - eu o contemplo em vaacuterios diplomas legais o terceiro eacute o da Suiacuteccedila e do Liacutebano que o reforccedilam

Analisando esses trecircs sistemas o autor citado observa

Haacute aparente contradiccedilatildeo no sistema inglecircs e norte-americano pois se de um lado nestes paiacuteses se eleva a garantia das liberdades individuais de outro se despreza o sigilo bancaacuterio Eacute que se ocorre conshyflito entre a apuraccedilatildeo de fatos (fator social) e a privacidade das pessoas (fator individual) prevalece a primeira Mais ainda o relacionamento de clientes e bancos longe de estabelececirc-lo serve como fonte de informashyccedilatildeo em favor de terceiros a indiscriccedilatildeo injustificada poreacutem eacute objeto de sanccedilatildeo E na Inglaterra os poderes puacuteblicos natildeo intervecircm no funcionashymento dos estabelecimentos privados de creacutedito o que debilita a invesshytigaccedilatildeo

Nos paiacuteses da Europa continental a legislaccedilatildeo contempla o sigilo bancaacuterio como consequumlecircncia do profissional e comporta derrogaccedilotildees na esfera penal e em alguns casos na civil mas comina sanccedilotildees crimishynais no caso de violaccedilatildeo ao sigilo (Coacutedigo Penal francecircs artigo 378 Coacuteshydigo Penal italiano art 622)

260 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

A sistemaacutetica fortalecida eacute aquela utilizada na Suiacuteccedila decorrente da crise ocorrida em 1931 com o fechamento do Banco de Genebra que ensejou a ediccedilatildeo de lei estabelecendo severas puniccedilotildees de natureza civil e criminal Tanto a legislaccedilatildeo suiacuteccedila como a libanesa esta surgida em 1956 permitem derrogaccedilotildees em certas hipoacuteteses A existecircncia das conshytas numeradas comprova a importacircncia do sigilo nestes paiacuteses

Eacute certo natildeo ser absoluto o segredo nem sua quebra em determishynadas situaccedilotildees significa abuso de poder Aliaacutes nenhum direito eacute absoluto

A doutrina tem ultimamente tomado conhecimento sobre as transforshymaccedilotildees que tem passado em vaacuterios ordenamentos juriacutedicos a questatildeo do sigilo bancaacuterio

Zenobio Simotildees de Melo advogado no Paranaacute em artigo sob o tiacutetulo Quebra do Sigilo Bancaacuterio (Internet httpjuscombr) informa que o jornal O Estado de Satildeo Paulo de 21 de junho de 2000 publicou a notiacutecia seguinte

Numa das mais importantes decisotildees adotadas durante o Conseshylho Europeu que marca o fim da presidecircncia portuguesa da Uniatildeo Euroshypeacuteia (UE) seus 15 paiacuteses aprovaram ontem o pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal No ponto mais polecircmico o pacote deveraacute acabar com o sigilo bancaacuterio ateacute 2010 foi uma negociaccedilatildeo de 12 anos Aacuteustria e Luxemburgo natildeo aceitavam o princiacutepio de acabar com o sigilo bancaacuterio A justificativa austriacuteaca eacute que este eacute um princiacutepio que faz parte da Consshytituiccedilatildeo do paiacutes haacute 200 anos Para aceitar o acordo o paiacutes exigiu a manushytenccedilatildeo do sigilo nos bancos austriacuteacos para quem resida no paiacutes

Registro a iacutentegra da notiacutecia

Pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal eacute aprovado por membros da UE Decisatildeo prevecirc quebra do sigilo bancaacuterio nos paiacuteses do bloco econocircmico

Jair Rattner

Especial para o Estado

Santa Maria da Feira Portugal- Numa das mais importantes decishysotildees adotadas durante o Conselho Europeu que marca o fim da presishydecircncia portuguesa da Uniatildeo Europeacuteia (UE) seus 15 paiacuteses aprovaram ontem o pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal No ponto mais polecircmico o pashycote deveraacute acabar com o sigilo bancaacuterio ateacute 2010

Foi uma negociaccedilatildeo de 12 anos Agora temos um documento que vai estabelecer os princiacutepios e as orientaccedilotildees para as futuras diretivas nessa aacuterea afirmou o Primeiro-Ministro Portuguecircs Antonio Guterres que ocupa a presidecircncia rotativa da UE (no fim do mecircs ela seraacute transferida para a Franccedila)

ENSAIOS JURiacuteDICOS 261

o acordo abrange trecircs aacutereas um coacutedigo de conduta que prevecirc o desmantelamento dos 66 paraiacutesos fiscais existentes ou dependentes da UE a tributaccedilatildeo de royalties e o pagamento de impostos sobre rendishymentos das poupanccedilas de cidadatildeos europeus residentes em outros paiacuteshyses dentre os 15 que fazem parte do bloco econocircmico europeu

O grande problema eram as poupanccedilas Aacuteustria e Luxemburgo natildeo aceitavam o princiacutepio de acabar com o sigilo bancaacuterio A justificativa austriacuteaca eacute que este eacute um princiacutepio que faz parte da Constituiccedilatildeo do paiacutes haacute 200 anos Para aceitar o acordo o paiacutes exigiu a manutenccedilatildeo do sigilo nos bancos austriacuteacos para quem resida no paiacutes Essa questatildeo natildeo eacute importante soacute para a Europa porque abre caminho para a criaccedilatildeo de mecanismos de transparecircncia global no mundo financeiro que satildeo esshysenciais para a globalizaccedilatildeo da economia avaliou Guterres

O prazo para a introduccedilatildeo das mudanccedilas vai ateacute o fim de 2010 Ateacute o fim deste ano as negociaccedilotildees vatildeo ser sobre a definiccedilatildeo do conteuacutedo das diretivas (as normas da UE)

Em 2002 a UE discutiraacute com outros paiacuteses esses conteuacutedos para fazer acordos que deveratildeo ser aprovados ateacute o fim do ano por unanimishydade

A partir de 2003 seraacute iniciado um periacuteodo de sete anos de transishyccedilatildeo para a troca de informaccedilotildees sobre os investimentos de cidadatildeos de outros paiacuteses europeus Nesse periacuteodo alguns paiacuteses poderatildeo optar por cobrar impostos de 20 a 25 sobre os rendimentos dos investimentos de residentes no exterior

No capiacutetulo onde foi analisado o sigilo bancaacuterio no Direito Comparado haacute registros tambeacutem a respeito do tratamento que oacutergatildeos internacionais como o OCDEll e outros vecircm dando ao sigilo bancaacuterio conforme estudo que foi apresentado pelo autor ali citado

II OCDE (Organizaccedilatildeo de Cooperaccedilatildeo e Desenvolvimento Econocircmico) criado em 1961 para substituir a OECE (Comitecirc Fiscal da Organizaccedilatildeo Europeacuteia de Cooperaccedilatildeo Econocircmica) Um dos documentos mais importantes da OCDE eacute o resultante da sua Convenccedilatildeo-Modelo relashytiva a impostos sobre a renda e o capital Essa Convenccedilatildeo estaacute sistematizada em sete capiacutetulos assim explicitados por Alberto Xavier em sua obra Direito Tributaacuterio Internacioshynal do Brasil A Convenccedilatildeo-Modelo da OCDE (tal como a das Naccedilocirces Unidas) encontra-se sistematizada em sete capiacutetulos Os capiacutetulos I e I regulam os requisitos para a aplicaccedilatildeo do tratado O capiacutetulo [JI - de longe o mais importante - conteacutem as regras de distribuiccedilatildeo de competecircncia no que concerne aos impostos sobre o rendimento classificado este por tipos ou classes agrave semelhanccedila do que sucede nos sistemas de tributaccedilatildeo cedular O capiacutetulo IV ocupa-se das regras de distribuiccedilatildeo de competecircncia no que respeita aos impostos sobre o capital O capiacutetulo V determina as consequumlecircncias das regras dos capiacutetulos 111 e IV facultanshydo aos Estados a escolha entre os meacutetodos da isenccedilatildeo e da imputaccedilatildeo O capiacutetulo VI conteacutem disposiccedilotildees adicionais sobre natildeo-discriminaccedilatildeo procedimento amigaacutevel troca de informaccedilotildees e privileacutegios de funcionaacuterios diplomaacuteticos e consulares e regras sobre extenshysatildeo do tratado a partes do territoacuterio Enfim o capiacutetulo VII conteacutem disposiccedilotildees finais sobre entrada em vigor e cessaccedilatildeo do acordo

262 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

Heleno Torres em sua recente obra Direito Tributaacuterio Internacional -Planejamento Tributaacuterio e Operaccedilotildees Transnacionais RT p 147 analisando o posicionamento da OCDE referente agrave poliacutetica de determinados paiacuteses que adoshytam tributaccedilatildeo favorecida e os efeitos dos regimes fiscais prejudiciais registra que

A OCDE resolveu entrar na luta para minorar as praacuteticas fiscalshymente danosas insistindo sobre a necessidade de aumentar as trocas de informaccedilotildees entre os Estados aleacutem de redigir uma lista de paiacuteses com tributaccedilatildeo favorecida e fazer algumas recomendaccedilotildees em acircmbito nacional e convencional a partir do seu importante relatoacuterio Harmful tax competition na emerging global issue

Mesmo reconhecendo os aspectos positivos do ambiente global vigente no qual os sistemas tributaacuterios operam os paiacuteses-membros da OCDE concluiacuteram que eles precisavam agir para restringir a competiccedilatildeo tributaacuteria danosa coletivamente e individualmente opondo-se agrave expanshysatildeo de regimes de impostos preferenciais danosos particularmente nos setores financeiros e atividades de serviccedilo que podem causar distorccedilotildees no comeacutercio e desniacuteveis nos padrotildees de investimento sendo uma ameashyccedila para os sistemas tributaacuterios domeacutesticos e para a estrutura global de tributaccedilatildeo internacional

Mais adiante pp 152153 Heleno Torres afirma que

Entre as recomendaccedilotildees definidas nesse relatoacuterio com aplicashyccedilatildeo dirigida aos paiacuteses-membros da instituiccedilatildeo as mais importantes satildeo as seguintes

bull para contrastar a competiccedilatildeo fiscal prejudicial os paiacuteses devem revisar as suas leis regulamentos e praacuteticas sobre sigilo bancaacuterio para remover empecilhos de acesso a tais informaccedilotildees por autoridades fiscais

bull intensificar o uso de trocas de informaccedilotildees principalmente soshybre as transaccedilotildees com paiacuteses de tributaccedilatildeo favorecida

A conclusatildeo que pode ser firmada apoacutes anaacutelise dos pronunciamentos internacionais acima explicitados eacute a construccedilatildeo de uma corrente que defenshyde uma maior abertura para a quebra do sigilo bancaacuterio quando for necessaacuteshyrio para apurar iliacutecitos tributaacuterios

Essa portanto eacute a resposta que apresento para a indagaccedilatildeo Qual o tratamento proposto por oacutergatildeos internacionais como o OCDE e outros com relaccedilatildeo ao sigilo bancaacuterio

ENSAIOS JURiacuteDICOS 263

11 Compatibilizaccedilatildeo do combate agrave criminalidade internacional com o resshypeito agrave seguranccedila juriacutedica a fim de evitar a fuga de investimentos do Paiacutes

Haacute de se reconhecer natildeo ser faacutecil desenvolver-se um sistema juriacutedico que contenha regras que facilitem o combate agrave criminalidade internacional e ao mesmo tempo prestigie os direitos fundamentais do cidadatildeo especialmenshyte a sua seguranccedila juriacutedica

As convenccedilotildees internacionais conforme demonstrado estatildeo preocupashydas com esses aspectos sem deixar de lado os fenocircmenos causados pela globalizaccedilatildeo

Natildeo deve ser esquecido que o tema envolve aspectos diversos a comeshyccedilar pelos determinantes da soberania dos Estados das forccedilas em expansatildeo das organizaccedilotildees internacionais e da pregaccedilatildeo para que os direitos fundamenshytaIacutes do cidadatildeo sejam respeitados com maior Iacutentensidade

A soluccedilatildeo a meu pensar pode ser encontrada no fortalecimento do Direito Comunitaacuterio Os Estados por via de organismos internacionais firmashyriam tratados para a adoccedilatildeo de um Coacutedigo Processual Penal Internacional com efeitos vinculantes por parte das naccedilotildees onde seriam adotadas regras investigatoacuterias e apuratoacuterias dos iliacutecitos internacionais alargando os conceitos de indiacutecios e presunccedilotildees sem deixar contudo de prestigiar a afetividade dos direitos e garantias fundamentais do cidadatildeo

Todas as naccedilotildees no iniacutecio deste seacuteculo envidam esforccedilos para diminuir a crise da seguranccedila juriacutedica Satildeo vaacuterios os fatores determinantes todos tendo como causa comum o crescimento da delinquumlecircncia em decorrecircncia de poliacutetishycas econocircmicas e sociais adotadas por determinados governos que contrishybuem para aumentar o percentual de pessoas pobres

A preocupaccedilatildeo atual para o combate ao crime internacional eacute alcanccedilar niacutevel de uniformizaccedilatildeo dos sistemas adotados para a quebra do sigilo bancaacuteshyrio De iniacutecio deve ser defendida a postura de que nenhuma lesatildeo ou ameaccedila a direito deve ser excluiacuteda da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio Nessa perspectishyva ganha suma importacircncia a criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional em virshytude de pela sua atuaccedilatildeo natildeo perdurar a diversidade de sistemas legais a respeito do assunto a saber a) O anglo-saxatildeo onde o sigilo natildeo encontra amparo legal b) o dos paiacuteses da Europa continental que o contempla em vaacuterios diplomas escritos e c) o da Suiacuteccedila e do Liacutebano que o reforccedilam l2bull

A criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional envolve uma reconceiacutetuaccedilatildeo de soberania

Sobre o tema Celso D de Albuquerque Mello em Direito Internacional da Integraccedilatildeo Ed Renovar p 13 faz a seguinte observaccedilatildeo

12 Conforme anota Rui Celso Reali Fragoso no artigo O Sigilo Bancaacuterio publicado no site httpvvwwjuscombr

264 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Poder-se-ia fazer um pequeno reparo a Chaumont que a indeshypendecircncia nacional eacute um conceito juridicamente indeterminado e que ela pode ter diferentes graus Tanto que podemos escrever soberania versus cooperaccedilatildeo internacional apesar de reconhecermos que esta posiccedilatildeo pode ser considerada como radical vez que natildeo haacute uma total incompatibilidade entre as duas Entretanto natildeo se pode deixar de consshytatar que de certo modo a cooperaccedilatildeo internacional se encontra conshysagrada na Carta da ONU no arl 1 ordm que trata dos Propoacutesitos das Naccedilotildees Unidas e nos Princiacutepios estabelecidos na Carta da OEA (Capiacutetulo 11) O mesmo ocorre na resoluccedilatildeo da Assembleacuteia Geral da ONU de 1970 que aprova a Declaraccedilatildeo Relativa aos Princiacutepios do Direito Internacional Reshylativas agraves Relaccedilotildees Amigaacuteveis e agrave Cooperaccedilatildeo entre os Estados conforme a Carta das Naccedilotildees Unidas bem como na Carta de Direitos e Deveres Econocircmicos aprovada pela mesma Assembleacuteia Geral em 1974

O crescimento do crime internacional em decorrecircncia dos fenocircmenos globalizantes determina o surgimento de um dever juriacutedico dos Estados firmashyrem pactos de cooperaccedilatildeo entre si para que enfrentem as organizaccedilotildees voltashydas para a criminalidade Esse dever juriacutedico globalizado tem suas raiacutezes no moral intemacional que conforme assinala Celso Albuquerque Mello na obra citada p 13 sempre consagrou o princiacutepio da solidariedade ou ainda do auxiacutelio muacutetuo

Eacute o mais importante desafio neste iniacutecio de seacuteculo fazer com que surja uma legislaccedilatildeo internacional que compatibilize o combate agrave criminalidade inshyternacional sem violar a seguranccedila juriacutedica com finalidade exclusiva de evitar a fuga de investimenos do Paiacutes

Tenha-se contudo em consideraccedilatildeo que a globalizaccedilatildeo do crime emshybora seja uma grande ameaccedila aos valores tradicionais que sustentam a cidashydania especialmente a seguranccedila juriacutedica natildeo deve prejudicar o desenvolvishymento econocircmico de qualquer naccedilatildeo

Natildeo faccedilo coro ao assinalado por Eric Hobsbawm em sua obra Era dos Extremos O Breve Seacuteculo XX 1914-1991 1995 p 24 Companhia das Letras S Paulo traduccedilatildeo de Marcos Santarrita no sentido de que Talvez a caracteriacutesshytica mais impressionante do fim do seacuteculo XX seja a tensatildeo entre esse processo de globalizaccedilatildeo cada vez mais acelerado e a incapacidade conjunta das instishytuiccedilotildees puacuteblicas e do comportamento coletivo dos seres humanos de se acoshymodarem a ele

Penso que natildeo haacute essa acomodaccedilatildeo e que as instituiccedilotildees puacuteblicas espeshycialmente as submetidas ao controle da ciecircncia juriacutedica natildeo estatildeo incapacitashydas de encontrar caminhos que solucionem o problema existente

ENSAIOS JURiacuteDICOS 265

Eacute por demais positivo entre outros acontecimentos o fato da conscienshytizaccedilatildeo de que haacute de ser encontrada uma forma de combate agrave criminalidade internacional que natildeo afaste a garantia da seguranccedila juriacutedica Esta eacute uma neshycessidade para impor paz agrave naccedilatildeo e consequumlentemente criar ambiente para que novos investimentos necessaacuterios ao desenvolvimento do seu processo econocircmico aconteccedilam sem se falar na manutenccedilatildeo dos jaacute existentes

O Parlamento Europeu aprovou ultimamente uma resoluccedilatildeo sobre a criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional sob a consideraccedilatildeo de que eacute necessaacuteshyrio criaacute-lo de forma permanente para complementar os sistemas judiciais nashycionais e pocircr fim agrave impunidade de que gozam os responsaacuteveis por genociacutedio crimes contra a humanidade e crimes de guerra

A abertura para essa posiccedilatildeo denota a formaccedilatildeo de uma consciecircncia internacional para combater a criminalidade internacional em todos os niacuteveis contribuindo para fortalecer a seguranccedila juriacutedica interna de cada paiacutes

O documento representativo dessa resoluccedilatildeo eacute do teor seguinte

Parlamento Europeo

Resolucioacuten sobre el Tribunal Penal Internacional

EI Parlamento Europeo

Vistas sus anteriores resoluciones sobre un Tribunal Penal Interna-cional

A Considerando que es necesario crear un Tribunal Penallnternashycional permanente que complemente los sistemasjudiciales nacionales y ponga fin a la impunidad de que gozan los responsables de genocidio crimenes contra la humanidad y criacutemenes de guerra

B Considerando que la Comisioacuten de Derechos Humanos de las Naciones Unidas estaacute respaldando decididamente la creacioacuten de ese Trishybunal

C Considerando que la fase preparatoria de la creacioacuten dei Tribushynal Penal Internacional finalizoacute con la uacuteltima sesioacuten dei Comiteacute Preparatorio de las Naciones Unidas que tuvo lugar dei 16 de marzo al3 de abril de 1998

D Felicitaacutendose por la creciente participacioacuten de Estados en el proceso de negociaciones y esperando que un nuacutemero auacuten mayor de Esshytados procedentes de todas las regiones se encuentre plenamente represhysentado en la Conferencia Diplomaacutetica de Roma

E Considerando que dei 15 de junio al17 de julio de 1998 se celebra en Roma la Conferencia Diplomaacutetica de Plenipotenciarios para la constitucioacuten de un Tribunal Penal Internacional

266 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

F Considerando que los Estados miembros y la delegacioacuten de la Comisioacuten Europea que participan en la Conferencia Diplomaacutetica de Roma pueden desempenar un papel crucial a la hora de garantizar el eacutexito de la conclusioacuten de esta Conferencia Diplomaacutetica y acogiendo positivamente la mayor convergenciacutea de las posturas de los Estados miembros de la UE

G Congratulaacutendose por la oferta dei Gobierno de los Paiacuteses Bajos de servir de sede dei Tribunal Penal Internacional permanente

I Insta a la Conferencia Diplomaacutetica de Roma a aprovechar la oportunidad histoacuterica de concluir un texto de Estatuto para un Tribunal Penal Internacional independiente justo y eficaz

2 Insta a los representantes de los Estados miembros dei Consejo y de la Comisioacuten a garantizar activamente el ecircxito de los resultados a sashyber un auteacutentico Tribunal Penal Internacional en lugar de limitarse a un acuerdo de compromiso sobre principios esenciales en sus esfuerzos por conciliar las posturas de Estados reticentes

3 Destaca que para constituir un complemento eficaz de los sisteshymas judiciacuteales nacionales el Estatuto dei Tribunal Penal Internacional permanente objeto de la Conferencia de Roma deberaacute establecer

a un Fiscal independiente con competencias para investigare insshytruir sumarios por propia iniciativa en situaciones en las que se hayan cometido los delitos sometidos a lajurisdiccioacuten dei Tribunal

b Ia jurisdiccioacuten inherente y universal dei Tribunal en materia de genocidio criacutemenes contra la humanidad criacutemenes de guerra y agresioacuten sin que se requiera ninguacuten consentimiento dei Estado

c una buena relacioacuten de trabajo con los Tribunales lnternacionales ya establecidos en La Haya

d una relacioacuten constructiva con las Naciones Unidas yen partishycular con el Consejo de Seguridad basada en el pleno reconocimiento de sus respectivas funciones y competencias

e Ia obligacioacuten de los Estados firmantes de acatar y hacer cumplir sin demora las oacuterdenes y decisiones dei Tribunal

f los mayores niveles de respeto de los derechos de los acusados y de los sospechosos y de proteccioacuten de los intereses de las viacutectimas y de los testigos

g Ia garantiacutea de una financiacioacuten a largo plazo necesaria para asegurar la autonomiacutea e independencia dei Tribunal frente a cualquier presioacuten exterior

4 Destaca ademaacutes que la jurisdiccioacuten deI Tribunal sobre los delishytos de genociacutedio los criacutemenes contra la humanidad y los criacutemenes de

ENSAIOS JURiacuteDICOS 267

guerra deben considerarse con la misma calificacioacuten penal con indepenshydencia de que se hayan cometido en conflictos armados internacionales o en conflictos internos

5 Insta ai Consejo y a los Estados miembros a garantizar la universalidad y la transparencia de las negociaciones y la participacioacuten continuada de la comunidadjuriacutedica y la sociedad civil internacionales

6 Encarga a su Presidente que transmita la presente resolucioacuten ai Consejo a la Comisioacuten a los Gobiernos de los Estados miembros ai Secreshytario General de las Naciones Unidas ai Presidente de la Asamblea Geneshyral de las Naciones Unidas y ai Presidente de la Conferencia Diplomaacutetica de las Naciones Unidas para la constitucioacuten de un Tribunal Penal Internashycional

A resoluccedilatildeo supracitada demonstra que cresce a conscientizaccedilatildeo da necessidade de ser criado um Tribunal Penal Internacional com forccedila cogente obrigatoacuteria de suas decisotildees no acircmbito interno dos paiacuteses que participarem do pacto de sua constituiccedilatildeo

A doutrina internacional revela que a comunidade internacional somenshyte agora vem se preocupando em criar uma estructura internacional para determinar las responsabilidades individuales emergentes de violacioacuten de ciertos derechos baacutesicos dei ser humano Los mecanismos de responsabilidad estatal creados desde los 60 se dirigen a la mayor protecciotilden dei ser humano y la erradicacioacuten de las praacutecticas de volacioacuten sistemaacutetica de los derechos humanos ar via de la condena ai Estado que ordena o que tolera los abusos por lo cual se estructuraron entorno ai Estado conmo sujeto responsable Como haacute seflalado la Corte Internacional de Derechos Humanos el procedimiento ante ella no es un procedimiento penal lo que se busca determinar es el nivel de cumprimiento por parte de un Estado de sus obligaciones de derecho internacional Sin desconocer la importancia de determinar la responsabilidad dei Estado para que eacuteste tenga un incentivo para erradicar esas praacutectica de sus frotneras es pertinente detacar que las violaciones maacutes grave son en uacuteltima instancia coshymetidas por individuos (Francisco Cox Encarregado dei TPI HOH em artigo intitulado EI IlOH ante la Craciotilden de um Tribunal Penal Internacional no site httpwwwiidhedcrcpitpintrohtml)

A criaccedilatildeo de um Tribunal Penal Internacional atuaria permanentemente e teria competecircncia subsidiaacuteria em relaccedilatildeo agrave outorgada aos Tribunais Nacioshynais limitando-se a atuar apenas nos crimes internacionais previamente defishynidos como sendo do interesse da comunidade global

Merece registro no acircmbito do assunto tratado que na Conferecircncia Reshygional sobre o Tribunal Penal Internacional realizada em 18 e 19 de fevereiro de 1998 na cidade de Guatemala Guatemala um dos temas tratados foi o relativo

268 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

agrave harmonizaccedilatildeo das incriminaccedilotildees quando os seguintes aspectos foram disshycutidos Branqueamento corrupccedilatildeo fraude fiscal participaccedilatildeo em associashyccedilotildees criminosas um olhar agrave luz dos direitos nacionais e do direito internacioshynal Perspectivas Quais os comportamentos a incriminar Criar uma nova incriminaccedilatildeo da fraude fiscal Uma tentativa de harmonizaccedilatildeo o corpus jurls contendo disposiccedilotildees penais para proteccedilatildeo dos interesses financeiros da Uniatildeo Europeacuteia As negociaccedilotildees no seio do Conselho da Europa e da OCDE referenshytes agrave luta contra a corrupccedilatildeo etc O referido painel foi presidido por Benoit Dejemeppe procurador do Rei em Bruxelas e contou com a presenccedila de Tereshyza Beleza professora de Direito Penal na Faculdade de Direito de Lisboa como moderadora

Haacute como visto um largo campo de anaacutelise para desenvolver com possishybilidade do surgimento de sugestotildees que levem a ciecircncia juriacutedica a alcanccedilar com a atuaccedilatildeo estatal uma competecircncia internacional que possa combater o crime internacional e ao mesmo tempo proporcione seguranccedila juriacutedica na ordem interna ganhando assim o sistema juriacutedico confianccedila dos investidoshyres

Em conclusatildeo a forma de compatibilizar o combate agrave criminalidade internacional sem violar a seguranccedila juriacutedica necessaacuteria a evitar a fuga de inshyvestimentos do paiacutes estaacute na criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional com comshypetecircncia definida para processar e julgar delitos globalizantes e cujas decisotildees tenham forccedila imperativa no acircmbito interno das naccedilotildees participantes do pacto para o seu nascimento

Page 5: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro

ENSAIOS JURiacuteDICOS 227

Esse entendimento decorre da interpretaccedilatildeo que os doutos manifestam sobre o Decreto-Lei n 21978 normativo disciplinador do sigilo bancaacuterio em Portugal

O objetivo da legislaccedilatildeo portuguesa sobre sigilo bancaacuterio conforme depreende-se da sua mensagem eacute imprimir confianccedila no funcionamento das instituiccedilotildees de creacutedito para que se afirmem como veiacuteculos necessaacuterios para a captaccedilatildeo da poupanccedila Essa ideacuteia foi exposta por Alexandra Falque de Gouvecirca Professora-Assistente da Faculdade de Direito de Lisboa e Assessora do Conseshylho para o Sistema Financeiro no corpo do artigo de sua autoria Perspectivas de Reformulaccedilatildeo da Tutela do Seguro Bancaacuterio no Direito Portuguecircs publicashydo na Revista do Gabinete de Documentaccedilatildeo e Direito Comparado da Proshycuradoria Geral da Repuacuteblica Lisboa 1990 pp 922

Destaco do corpo do mencionado artigo a observaccedilatildeo feita pela autoshyra pp 12 e 13 no sentido de que A tutela do segredo bancaacuterio surgiu em Portugal conjunturalmente associada aos esforccedilos de reanimaccedilatildeo das instituishyccedilotildees de creacutedito como fonte de captaccedilatildeo da poupanccedila Por esse facto foi-lhe dado um regime mais protector do que o proacuteprio regime vigente na Suiacuteccedila campeatilde em mateacuteria de protecccedilatildeo do segredo bancaacuterio

A seguir afirma a autora Eacute testemunha de que esse reforccedila a confianccedila nas instituiccedilotildees de creacutedito foi de facto o objectivo do legislador ao aprovar o normativo que disciplina o sigilo bancaacuterio a letra do preacircmbulo do Decreto-Lei n 21978 de 9 de janeiro que conteacutem o enquadramento legal da mateacuteria o qual reza o seguinte Ponderando que a reconstruccedilatildeo do Paiacutes implica o estashybelecimento de um clima de confianccedila na banca que permita a captaccedilatildeo e recuperaccedilatildeo do dinheiro entesourado vem o Governo revelando preocupashyccedilotildees pela tutela do segredo bancaacuterio No mesmo sentido a letra do preatildembushylo do Despacho Normativo n 3571979 de 20 de novembro A importatildencia do segredo bancaacuterio eacute bem conhecida para a estabilizaccedilatildeo normalidade de funshycionamento e transmissatildeo de uma imagem de confianccedila por parte de qualshyquer sistema bancaacuterio Nesta medida com a legislaccedilatildeo entatildeo aprovada o regishyme portuguecircs na mateacuteria afastou-se quer do sistema da Common Law de resshyponsabilidade (exclusivamente) civil do banqueiro por violaccedilatildeo ao dever de discriccedilatildeo bancaacuteria quer da generalidade dos sistemas europeus que integram a mateacuteria no regime geral do sigilo profissional (equiparando o banqueiro ao confidente necessaacuterio) aproximando-se mais dos sistemas praticados na Suiacuteshyccedila e no Liacutebano (todavia enquanto no Liacutebano haacute uma total imunidade das insshytituiccedilotildees de creacutedito agraves requisiccedilotildees da autoridade judiciaacuteria na Suiacuteccedila o princiacuteshypio eacute o da cooperaccedilatildeo com a funccedilatildeo judiciaacuteria no tocante agrave mateacuteria pena)

A autora conclui esse toacutepico do seu artigo afirmando Pela razatildeo aponshytada de ser essencialmente o interesse puacuteblico e colectivo o motivo

228 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

determinante da aprovaccedilatildeo do Decreto-Lei n 21978 o regime portuguecircs gizado nessa altura comeccedilou por ser ainda mais hermeacutetico do que o proacuteprio regime vigente na Suiacuteccedila na medida em que o dever de cooperaccedilatildeo com as autoridashydes judiciaacuterias cessa inclusivamente nas mateacuterias sujeitas a segredo bancaacuterio segundo o entendimento generalizado dos Tribunais e doutrina3bull Paradoxalshymente a disciplina juriacutedica natildeo encontrou de iniacutecio reflexo na materialidade dos factos tendo-se assistido a muacuteltiplos e impunes violaccedilotildees ao segredo banshycaacuterio

Arnoldo Wald analisando o sigilo bancaacuterio no ordenamento juriacutedico de Portugal registra O Coacutedigo Civil portuguecircs no seu art 80 dispotildee que Todos devem guardar reserva quanto agrave intimidade da vida privada de outrem A exshytensatildeo da reserva seraacute definida conforme a natureza do caso e as condiccedilotildees das pessoas O art 33 da Constituiccedilatildeo portuguesa de 1976 estabelece que 1 A todos eacute reconhecido o direito agrave identidade pessoal ao bom nome e reputashyccedilatildeo e agrave reserva da intimidade da vida privada e familiar 2 A lei estabeleceraacute garantias efectivas contra a utilizaccedilatildeo abusiva ou contraacuteria agrave dignidade humashyna de informaccedilotildees relativas agraves pessoas e famiacutelias

Tanto no acircmbito constitucional quanto na legislaccedilatildeo civil eacute garantido o direito agrave privacidade e agrave vida iacutentima que fundamentam o sigilo bancaacuterio Jaacute o Decreto-Lei n 2 de 911978 prevecirc expressamente o dever de segredo dos titulares dos oacutergatildeos dos bancos e aos seus trabalhadores4

b) Alemanha

Carlos Alberto Hagstron em artigo intitulado O Sigilo Bancaacuterio e o Poshyder Puacuteblico publicado na Revista de Direito Mercantil n 79 p 37 registra que Na Alemanha natildeo haacute regra especiacutefica nem definiccedilatildeo legal para o segredo bancaacuterio mas sua existecircncia eacute observada reconhecida pejo Direito Privado e pelo Direito Puacuteblico admitida em diversas leis aceita pela doutrina e pela jurisshyprudecircncia sofrendo contudo limitaccedilotildees decorrentes de interesses de orshydem puacuteblica e social quando pode haver a quebra do sigilo conforme aliaacutes lembra Seacutergio Carlos Covello na sua obra O Sigilo Bancaacuterio Leud 1991 p 34

3 A respeito desse aspecto o de cessar o dever de colaboraccedilatildeo com as autoridades judiciaacuterias quando envolver mateacuterias sujeitas a segredo bancaacuterio a autora ao fazer essa afirmaccedilatildeo assinala em nota de rodapeacute as seguintes obras que refletem igual entendimento Alberto Luiacutez O Segredo Bancaacuterio em Portugal in Revista da Ordem dos Advogados ano 41 Q (1981) pp 451 e segs Anselmo da Costa Freitas O Sigilo Bancaacuterio In Boletim da Ordem dos Advogados n 19 (outubro de 1983) pp 4 e segs Maria Eduarda Azevedo O Segredo Bancaacuterio In Ciecircncia e Teacutecnica Fiscal n 346348 (outubrodezembro de 1987) pp 73 e segs Joseacute Antoacutenio Pereira da Silva Regime Juriacutedico do Sigilo Bancaacuterio maio de 1988 (trabalho natildeo publicado) Jorge Patriacutecio Paul O Sigilo Bancaacuterio - sua Extensatildeo e Limites no Direito Portuguecircs In Revista da Banca n 12 (outubrodezembro) 1989 pp 71 e segs

4 Em artigo publicado sob o tiacutetulo Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais publicado na Revista dos Tribunais n 22 Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas p 24

ENSAIOS JURiacuteDICOS 229

A lei bancaacuteria alematilde de 1971961 em seu art 92 determina que haacute obrishygaccedilatildeo de ser preservado o direito agrave privacidade para aqueles que exercem uma funccedilatildeo federal de vigilatildencia por seus colaboradores e pelos controlashydores dos depoacutesitos (Arnoldo Wald em artigo Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais publicado na Revista dos Tribunais n 22 RT Cadernos de Direishyto Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas jan-marccedilo de 1998 p 24)

O citado autor esclarece ainda que na Alemanha a fonte do sigilo banshycaacuterio estaacute no direito agrave personalidade

c) Itaacutelia Franccedila Suiacuteccedila

Luiz Fernando de Bellinetli em artigo denominado Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio (Revista de Direito do Consumidor RT n 18 abril-junho de 1996 pp 141161) ao analisar o sigilo bancaacuterio no Direito Comparado comenshyta o tratamento que lhe eacute dado pela Alemanha Itaacutelia Franccedila Suiacuteccedila e Portugal

Em face de nos itens acima jaacute ter sido enfocado o tema na Alemanha e em Portugal destacaremos apenas do trabalho do autor as observaccedilotildees feishytas sobre o sigilo bancaacuterio nos ordenamentos juriacutedicos da Itaacutelia Franccedila e Suiacuteccedila

A respeito transcrevo o que escreveu o autor

412 ltaacutelia5

Assim como na Alemanha na Itaacutelia tambeacutem natildeo haacute norma especiacuteshyfica disciplinando o sigilo bancaacuterio embora seja ele reconhecido pela doutrina e pela jurisprudecircncia utilizando-se dispositivos variados do sisshytema para supeditaacute-lo

No entanto tambeacutem na Itaacutelia natildeo eacute ele absoluto cedendo ante interesse de ordem puacuteblica nos casos previstos em lei

Como afirma Giacomo Molle Lobbligo della banca ai segreto non e senza Umt ed essendo esse come si e delto dretto aIa tutela dei cliente e quindi di un interesse privato non vi sono limiti ad esso da parte dei legislatore Prescindendo daiacute casi nei quali la rivelzione sai imposta dala legge un dovere di comunicazione puoacute sorgere nei contrant della autoritaacute

5 Arnoldo Wald no artigo jaacute referido (Sigilo Bancaacuterio e Direitos Fundamentais Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas - 22 p 24) assinala que Na Itaacutelia o sigilo bancaacuterio decorre da garantia dos direitos agrave liberdade individual que permite a exclusatildeo do conhecimento por parte de terceiros de tudo que se refere agrave proacutepria pessoa a denominada riservalezza Este entendimento decorre da norma constitucional que institui a inviolabilidade dos direitos da personalidade e da Convenccedilatildeo Europeacuteia dos Direitos do Homem de 1950 que garante a toda pessoa o direito ao respeito de sua vida privada e familiar de seu domiciacutelio e de sua correspondecircncia O segredo nas movimentaccedilotildees financeiras no entendimento doutrinaacuterio italiano visa proteger aleacutem dos interesses do cliente o desenvolvimento da atividade bancaacuteria como algo inerente agrave estrutura e funccedilatildeo creditiacutecia

~o SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

giudiziaria dei fisco e di terzi (La Banca NellOrdinamento Giuridico itashyliano Milano - DoU A Giuffre Editore 1980 p 158)

413 Franccedila

Tambeacutem na Franccedila o sigilo bancaacuterio eacute protegido pelo ordenamenshyto juriacutedico embora inexistente uma norma especiacutefica fundando-se a proteccedilatildeo num conjunto de regras de ordem penal civil e comercial

Da mesma forma admite-se a quebra do sigilo em face de interesshyses de ordem puacuteblica6 bull

414 Suiacuteccedila

Paiacutes onde os bancos e a sua alardeada discriccedilatildeo satildeo instituiccedilotildees nacionais haacute previsatildeo legal especiacutefica para a proteccedilatildeo do sigilo

No entanto tambeacutem laacute o segredo natildeo eacute como alguns supotildeem absoluto

Conforme aduz Hagstrom Natildeo pode ser invocado em geral peshyrante a Justiccedila Penal Na Justiccedila Civil o Juiz tem poder discricionaacuterio para decidir sobre a mateacuteria havendo algumas variaccedilotildees de conformidade com as legislaccedilotildees cantonais Em procedimentos de taxaccedilatildeo e recursos o segredo eacute preservado perante o Fisco eacute afastado contudo no proceshydimento contencioso (penal fiscal) Algumas outras exceccedilotildees ao dever de segredo satildeo contempladas expressamente em textos legais

Quanto ao Direito suiacuteccedilo acrescente-se que Arnoldo Wald no artigo jaacute tado observa que a justificativa para o sigilo bancaacuterio estaacute no direito da rsonalidade A Lei de 1934 prevecirc pena de multa ou de prisatildeo para o funcioshyliacuterio da instituiccedilatildeo que violar o segredo bancaacuterio mesmo que inexista dano ara aquele que viu reveladas informaccedilotildees sobre sua vida financeira

A seguir Arnoldo Wald compara o Direito da Suiacuteccedila com o do Liacutebano lrmando A Suiacuteccedila assim como o Liacutebano para a maior seguranccedila e reforccedilo a preservaccedilatildeo do sigilo bancaacuterio utiliza a conta numerada ficando descoshyhecido o nome do cliente A legislaccedilatildeo libanesa prevecirc quatro hipoacuteteses de errogaccedilatildeo do sigilo a) o consentimento do cliente seus herdeiros ou legataacuteshyos b) no litiacutegio entre o cliente e o banco c) na falecircncia e d) no enriquecimenshy) iliacutecito

d) Inglaterra e EEUU

O sigilo bancaacuterio no Direito inglecircs e no sistema norte-americano mereshyeu de Arnoldo Wald no trabalho jaacute citado pp 24 e 25 a anaacutelise que transcrevo

o autor citado manda no particular conferir Carlos Alberto Hagstrom artigo O Sigilo Bancaacuterio e o Poder Puacuteblico RDM n 79 p 38 bem como Seacutergio Covello em O Sigilo Bancaacuterio Leud 1991 pp 2627

ENSAIOS JURiacuteDICOS 231

No Direito inglecircs natildeo haacute nenhuma norma escrita que estabelece sanccedilatildeo agrave violaccedilatildeo ao segredo bancaacuterio mas qualquer pessoa que queira trabalhar em uma instituiccedilatildeo financeira deve assinar um formulaacuterio esshypecial pelo qual se compromete a manter sigilo sobre as movimentaccedilotildees bancaacuterias O dever de segredo na atuaccedilatildeo do banco eacute interpretado rigoshyrosamente pelos tribunais ingleses

No sistema juriacutedico norte-americano depois de discrepacircncias nas legislaccedilotildees estaduais e apoacutes a lei federal que restringiu o acircmbito da obrishygatoriedade do sigilo bancaacuterio foi aprovada a Right to Financiai Privacy Act que dispotildee que a prestaccedilatildeo de informaccedilotildees por parte da instituiccedilatildeo financeira somente pode ser dada em processos administrativos ou judishyciais quando os dados forem relevantes para solucionar o litiacutegio Com essa lei a quebra do sigilo bancaacuterio ganhou um caraacuteter excepcional somente podendo ocorrer desde que respeitado o devido processo leshygal Assim o Direito americano buscou conciliar a defesa ao direito de privacidade o atendimento aos interesses puacuteblicos quanto agraves informashyccedilotildees financeiras e a existecircncia do contraditoacuterio

e) Reacutegis de Oliveira quando Deputado Federal em parecer apresentashydo agrave Comissatildeo de Constituiccedilatildeo e Justiccedila da Cacircmara dos Deputados com refeshyrecircncia a Projeto de Emenda Constitucional apresentado pelo Exmo Sr Presishydente da Repuacuteblica objetivando alterar o sect 1 ordm do art 145 da CF observou que o sigilo bancaacuterio no Direito Comparado eacute posto da forma seguinte

13 Direito Comparado Na Alemanha natildeo haacute regra especiacutefica nem definiccedilatildeo legal para o segredo bancaacuterio mas sua existecircncia eacute recoshynhecida bem como aceita pela doutrina e jurisprudecircncia Decorre de direito costumeiro somente podendo ser quebrado por expressa disposhysiccedilatildeo legal (J Barmann Le Secret Bancaire en Allemagne Feacutedeacuterale in Rapport pp 15 e segs) Na Beacutelgica haacute proibiccedilatildeo somente sendo viaacutevel a derrogaccedilatildeo do segredo pela Justiccedila Penal e pelo Fisco que somente tem acesso agraves informaccedilotildees bancaacuterias diante do processo pendente (Herion Le Secret Bancaire en Belfique in Rapport pp 5175) Na Itaacutelia os doshycumentos somente podem ser examinados pelos Juiacutezes Natildeo haacute acesso por parte das autoridades administrativas (idem p 129) Na Holanda da mesma forma o sigilo apenas cede ante ordem da autoridade judicial ou penal (Muller idem pp 99117) Na Franccedila a violaccedilatildeo ao segredo ocorre ante oacutergatildeos do Poder Puacuteblico que alegam interesses superiores aos dos particulares natildeo se admitindo a quebra diante de normas administratishyvas (Gavalda Stouflet idem pp 7797)

f) Voltando a analisar o sigilo bancaacuterio em Portugal pode-se afirmar que o sistema apresentava-se rigoroso e nacirco aceitava a quebra como se vecirc de

232 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

decisatildeo do Supremo Tribunal de Justiccedila em Scientia Juriacutedica tomo XXIv n 166168 de 1980 (Parecer publicado na Revista de Direito Mercantil n 99 pp 98 e segs)

Com o sentido de demonstrar como o sigilo bancaacuterio eacute tratado no ordeshynamento juriacutedico de Portugal cito na iacutentegra um acoacuterdatildeo da Secccedilatildeo Criminal do Tribunal de Relaccedilatildeo de Eacutevora cujo texto colhi da internet (httpwwwtrept jurisp321-96html)

Processo n 321]996

Acoacuterdatildeo

Acordam na Secccedilatildeo Criminal do Tribunal da Relaccedilatildeo de Eacutevora

1 No Tribunal Judicial da Comarca de Portimatildeo correm termos uns autos de inqueacuterito registados sob o n 35711994 que tiveram orishygem numa queixa apresentada por middotM Lda contra a sociedade E Lda nos quais se procede agrave investigaccedilatildeo de factos susceptiacuteveis de inteshygrar a praacutetica de um crime de emissatildeo de cheque sem provisatildeo

Estaacute em causa o cheque nO 3681861637 sacado sobre a Caixa Geral de Depoacutesitos emitido em 1 ordm de julho de 1994 no valor de 820661$00

No decurso do inqueacuterito o Ministeacuterio Puacuteblico solicitou agravequela insshytituiccedilatildeo bancaacuteria o fornecimento de determinada documentaccedilatildeo banshycaacuteria o que esta se negou fazer alegando que a revelaccedilatildeo da pretendida documentaccedilatildeo contende com o disposto na legislaccedilatildeo sobre segredo bancaacuterio

A requerimento do Digno Magistrado do Ministeacuterio Puacuteblico o MM Juiz de Instruccedilatildeo suscitou a intervenccedilatildeo deste Tribunal da Relaccedilatildeo a fim de dispensar os serviccedilos da Caixa Geral de Depoacutesitos do segredo bancaacuteshyrio quanto agrave documentaccedilatildeo bancaacuteria solicitada a saber coacutepia da ficha de assinaturas e extracto da conta da Agecircncia de S com o n sobre a qual foi sacado o cheque em causa respeitante aos meses de maio junho e julho de 1994

Nesta relaccedilatildeo o Exmo Procurador da Repuacuteblica emitiu douto pareshycer no sentido de a referida instituiccedilatildeo bancaacuteria ser dispensada do cumshyprimento do dever do segredo bancaacuterio em ordem agrave prestaccedilatildeo dos eleshymentos pretendidos para a efectivaccedilatildeo do inqueacuterito

Colhidos os vistos legais cumpre agora decidir

2 A Caixa Geral de Depoacutesitos atraveacutes do ofiacutecio fotocopiado agrave fi 5 dos autos recusou-se a fornecer os documentos pedidos pelo Ministeacuteshyrio Puacuteblico para instruccedilatildeo de um processo de inqueacuterito com fundamento no sigilo bancaacuterio

ENSAIOS JURiacuteDICOS 233

Compreendendo o inqueacuterito o conjunto de diligecircncias que visam investigar a existecircncia de um crime determinar os seus agentes e a resshyponsabilidade deles e descobrir e recolher as provas em ordem agrave decishysatildeo sobre a acusaccedilatildeo (cf art 262 n 1 do Coacutedigo de Processo Pena0 a consulta dos pretendidos documentos - extracto da conta e ficha de assinaturas - eacute sem margem para duacutevidas de grande importacircncia para a instruccedilatildeo do processo e recolha de indiacutecios probatoacuterios tendentes agrave eventual deduccedilatildeo de acusaccedilatildeo pois sem ela desde logo muito dificilshymente se poderaacute concluir pela identificaccedilatildeo da pessoa que assinou o cheque

O dever de sigilo bancaacuterio traduz uma obrigaccedilatildeo de facto negativo (de ROR facere) e encontra-se disciplinado no Decreto-Lei n 2981992 de 31 de dezembro que aprovou o Regime Geral das Instituiccedilotildees de Creacutedito e Sociedades Financeiras O art 78 de tal diploma consagrando o dever de segredo profissional dispotildee no seu n 1 que os membros dos orgatildeos de administraccedilatildeo ou de fiscalizaccedilatildeo das instituiccedilotildees de creacutedito os seus empregados mandataacuterios comitidos e outras pessoas que lhes prestem serviccedilos a tiacutetulo permanente ou ocasional natildeo podem revelar ou utilizar informaccedilotildees sobre factos ou elementos respeitantes agrave vida da instituiccedilatildeo ou agraves relaccedilotildees desta com os seus clientes cujo conhecimento lhes advenha exclusivamente do exerciacutecio das suas funccedilotildees ou da presshytaccedilatildeo dos seus serviccedilos explicitando-se no seu n 2 que estatildeo designadamente sujeitos a segredo os nomes dos clientes as contas de depoacutesito e seus movimentos e outras operaccedilotildees bancaacuterias

O dever de segredo profissional natildeo eacute poreacutem um dever absoluto isto eacute natildeo prevalece sempre sobre qualquer outro dever que com ele entre em conflito Sofre com efeito as excepccedilotildees previstas no art 79 do mesmo Decreto-Lei n 2981992 onde se estabelece aleacutem do mais que os factos e elementos cobertos pelo dever de segredo podem ser revelashydos nos termos previstos na lei penal e de processo penal - cf aliacutenea d don2

No art 84 do mesmo diploma legal prescreve-se que a violaccedilatildeo ao dever de segredo eacute puniacutevel nos termos do Coacutedigo Penal e efectivamente o Coacutedigo Penal vigente - revisto pelo Decreto-Lei n 481995 de 15 de marccedilo - prevecirc e pune como crimes quer a violaccedilatildeo a segredo profissioshynal quer o seu aproveitamento indevido - cf arts ] 95 e 196

Ao contraacuterio da versatildeo do Coacutedigo Penal anterior agrave referida revisatildeo - em que se estatuiacutea no art 185 que a violaccedilatildeo ao segredo profissional natildeo seria puniacutevel se ocorresse no cumprimento de um dever juriacutedico sensivelmente superior ou visasse a um interesse puacuteblico ou privado legiacutetimo quando considerados os interesses em conflito e os deveres

234 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

de informaccedilatildeo que segundo as circunstacircncias se impotildeem ao agente se pudesse considerar meio adequado para alcanccedilar aquele fim - natildeo conteacutem o Coacutedigo Penal actuaJ relativamente ao crime de violaccedilatildeo ao segredo profissional qualquer causa especiacutefica de exclusatildeo da ilicitude pelo que haacute que atentar nas causas gerais de exclusatildeo da ilicitude

Ao abordar o conflito de deveres dispotildee o art 36 n 1 do Coacutedigo Penal que natildeo eacute iliacutecito o facto de quem em caso de conflito no cumprishymento de deveres juriacutedicos ou de ordens legiacutetimas da autoridade satisfishyzer dever ou ordem de valor igualou superior ao do dever ou ordem que sacrificar Natildeo seraacute pois iliacutecita a violaccedilatildeo ao segredo profissional se perante um conflito de deveres o agente satisfizer o dever de valor igual ou superior ao do dever que sacrifica

No Coacutedigo de Processo Penal generalizou-se a possibilidade de quebra do segredo profissional

Assim as pessoas indicadas no n 1 do sobredito art 78 podem recusar-se a depor sobre factos objecto de segredo profissional mas se a autoridade judiciaacuteria concluindo embora pela legitimidade da recusa natildeo prescindir desse depoimento pode requerer ao tribunal que o ordeshyne E o tribunal deveraacute ordenar a prestaccedilatildeo do depoimento com quebra do segredo profissional sempre que entender que esta se mostra justificada face agraves normas e princiacutepios aplicaacuteveis da lei penal nomeadashymente ao princiacutepio da prevalecircncia do interesse preponderante - cf art 135 n 12 e 3 do Coacutedigo de Processo Penal

A possibilidade de apreensatildeo pela autoridade judiciaacuteria de tiacutetulos valores quantias ou outros objectos depositados em bancos ou outras instituiccedilotildees de creacutedito relacionados com um crime e que possam ser de grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova bem como a possibilidade de exame pelo juiz de correspondecircncia e documenshytaccedilatildeo bancaacuterias estatildeo previstas no art 181 n 1 e 2 do Coacutedigo de Processhyso Penal As pessoas obrigadas ao dever de segredo profissional podem recusar apresentar aqueles documentos ou objectos em seu poder se invocarem por escrito segredo profissional caso em que o conflito de interesses e deveres assim surgido seraacute dirimido pelo tribunal nos tershymos idecircnticos aos previstos para a recusa de depoimento - cf arts 182 n 2 e 135 ambos do citado coacutedigo

Enquanto o dever de segredo profissional eacute geralmente estabeleshycido a favor da integridade e liberdade das pessoas a quem aproveita tendo-se inserido a sua regulamentaccedilatildeo no Tiacutetulo VI do atraacutes mencionashydo Regime Geral das Instituiccedilotildees de Creacutedito e Sociedades Financeiras no qual se prevecirc um conjunto de regras de conduta que devem guiar a actuaccedilatildeo das instituiccedilotildees de creacutedito seus administradores e empregados

ENSAIOS JURiacuteDICOS 235

nas relaccedilotildees com os clientes visando proteger de forma eficaz a posishyccedilatildeo do consumidor de serviccedilos financeiros (cf preacircmbulo do Decreshyto-Lei n 2981992) ou estabelecer um clima de confianccedila na banca que permita a captaccedilatildeo e recuperaccedilatildeo do dinheiro entesourado (como se dizia no relatoacuterio do Decreto-Lei n 21978 de 9 de janeiro revogado pelo n 1 do art 5Q do citado Decreto-Lei n 2981992) no processo de inqueacuteshyrito a que procede o Ministeacuterio Puacuteblico estaacute em causa a realizaccedilatildeo de diligecircncias de prova que permitam investigar um crime de emissatildeo de cheque sem provisatildeo sob a eacutegide do princiacutepio da verdade material e incriminar o respectivo agente

O interesse que estaacute em jogo com a pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblishyco na obtenccedilatildeo da documentaccedilatildeo bancaacuteria eacute o da boa administraccedilatildeo da Justiccedila Penal e esse interesse eacute no caso em apreccedilo sensivelmente supeshyrior ao interesse da manutenccedilatildeo do segredo bancaacuterio o que equivale a di~er que este deve ceder perante aquele

Em suma no caso concreto ponderados os interesses em conflishyto entendemos que a quebra do dever de sigilo bancaacuterio se justifica nos termos do art 36 do Coacutedigo Penal pelo que deve ser dada procedecircncia agrave pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico e consequumlentemente ao abrigo do disposto nos arts 182 n 2 e 135 n 2 e 3 ambos do Coacutedigo de Processo Penal dispensar-se a Caixa Geral de Depoacutesitos do cumprimento do deshyver de sigilo bancaacuterio a fim de poder satisfazer tal pretensatildeo

3 Por todo o exposto determina-se que com quebra do dever de sigilo bancaacuterio a Caixa Geral de Depoacutesitos forneccedila ao Digno Magistrado do Ministeacuterio Puacuteblico com destino ao Processo de Inqueacuterito n 3571 1994 a documentaccedilatildeo bancaacuteria que este lhe havia solicitado

Natildeo eacute devida taxa de justiccedila

Texto processado e integralmente revisto pelo relator

Desembargador-Relator Rui Mauriacutecio

g) Substancioso estudo do sigilo bancaacuterio no Direito Comparado foi feishyto por Andreacute Serratildeo Borges de Sampaio Consultor da Uniatildeo nas informashyccedilotildees que prestou ao Advogado-Geral da Uniatildeo com referecircncia agrave ADIn n 2397 Transcrevo o inteiro teor do seu pronunciamento

51

6 O tratamento do sigilo bancaacuterio no Direito Comparado

Em verdade o Direito Comparado entende inoponiacutevel o sigilo banshycaacuterio agraves autoridades tributaacuterias Com efeito leciona Alfredo Echeverriacutea Herrera verbis

236 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

EI sigilo bancario constituye un reacutegimen limitado exclusivashymente ai aacutembito de las relaciones entre la institucioacuten bancaria y sus clientes e impone la obligacioacuten de confidencialidad de la institucioacuten sobre las informaciones que aqueacutellos le proporcionan

En todas las legislaciones bancarias el sigilo es relativo es decir el derecho dei ciudadano ai secreto y la correlativa obligacioacuten para el banco de no revelar a terceros las informaciones recibidas en el ejercicio de su actividad ceden cuando existe norma legal expresa o causa justificada

Elliacutemite legal ai sigilo estaacute constituiacutedo por la obligacioacuten dei banco de entregar informaciones y se fundamenta en motivos sushyperiores de orden puacuteblico o general siendo liacutecito entonces que el Estado establezca Iiacutemites legales ai secreto bancaria para auxiliar por ejemplo las actuaciones de la Justicia en el plano jurisdiccional y las dei Estado en el aacutembito dei ejercicio de su potestad impositiva

Es un principio irrebatible en la vida dei derecho que ni la autonomia de las personas ni los instrumentos dei aacuterea econoacutemica y financiera pueden servir en un momento dado como elementos juridicamente idoacuteneos para lesionar el intereacutes puacuteblico En consecuencia se puede afirmar que las limitaciones ai sigilo bancario son salvaguardias necesarias ai bien comuacuten en los caacutenones dei Estado moderno Estas limites deben ser materias reshyservadas a la ley por ser de caraacutecter excepcional en sentido estricto

En este orden de ideas necesariamente debe concluirse que existen legiacutetimos y superiores intereses en diversas aacutereas de la sociedad que se vinculan ai bien comuacuten y que deben ser tutelados por el Estado como lo es por ejemplo la necesidad de detectar y reprimir la evasioacuten de los impuestos los cuales transcienden ai evenshytual intereacutes geneacuterico que pueda tener el mismo Estado en la mantencioacuten dei sigilo bancaria En efecto desde el punto de vista de lajuridicidad y de la eacutetica no se puede sostener que el secreto bancaria pueda servir como instrumento para proteger la comisioacuten de actos

52

como el recieacuten mencionado que son constitutivos muchas veces de iliacutecitos penales bajo la forma de delitos tributarias o fraushydes fiscales con resultados ademaacutes de perjucio patrimonial ai Esshytado y dano ai intereacutes general de la sociedad

EI sistema bancaria frente a la existencia en la sociedad de un intereacutes general preponderante y superior estaacute naturalmente Ilamado a colaborar en la verificacioacuten y represioacuten de la evasioacuten tributaria

ENSAIOS JURiacuteDICOS 237

En este marco se inscribe la tendencia de la mayoda de las legislaciones modemas en cuanto a dotar aI Estado de facultades para intervenir en la actividad econoacutemica de los ciudadanos en procura de la correcta determinacioacuten de los tributos cuando se conshyfigura en el desarrollo de estas actividades un hecho gravado establecido en la ley

Ya la Constitucioacuten de Weimar en 919 proclamoacute que es liacutecito ai Estado intervenir para condicionar el ejercicio de los derechos a determinados fines sociales El bien comuacuten y la justicia social comenzaron desde entonces a servir de frontera a los derechos y Iibertades individuales

Cabe destacar que la OCDE (Organisation for Economic Cooperation and Development) en un documento elaborado en el ano 1999 sobre las praacutecticas de los paiacuteses en el acceso a la informacioacuten bancaria para fines tributarios advierte que se puede abusar de la confidencialidad para ocultar actividades iJegales y evadir impuestos y agrega en el resumen ejecutivo deI documento que ni la criminalizacioacuten dei fraude tributario ni el tratamiento de la evasioacuten de impuestos bajo las leyes tributarias de los paiacuteses miembros de la OCDE son homogeacuteneos pero que sin embargo los gobiernos de la mayoriacutea de los paiacuteses miembros de la OCDE han tomado la visi6n de que en este contexto las autoridades tributashyrias no deben ser tratadas como simples terceros sino que se les debe otorgar un acceso priviligiado a la informaci6n bancaria con fines tributarias

Se agrega en este estudio que una medida de esta naturaleza no pane en peligro la conlidencialidad de la inlormacioacuten bancaria puesto que las autoridades tributarias estaacuten sujetas a estrictos conshytroles sobre coacutemo utilizan la informacioacuten de los contribuyentes y todos los gobiemos han implementado regIas para proteger la conlidencialidad de la informaci6n tributaria (EI Sigilo Bancaacuterio Acesso a la Informadon Bancaria para Fines Tributarias)

Em verdade seu texto elenca 30 paiacuteses integrantes da OCDE (a saber Alemanha Austraacutelia Aacuteustria Beacutelgica Canadaacute Repuacuteblica Checa Dinamarca Finlacircndia Franccedila Greacutecia Hungria Islacircndia Irlanda Itaacutelia Japatildeo Coreacuteia Luxemburgo Meacutexico Paiacuteses Baixos Nova Zelacircndia Noshyruega Polocircnia Portugal Espanha Sueacutecia Turquia Suiacuteccedila Reino Unido Estados Unidos Repuacuteblica Eslovaca) dos quais em 1999 apenas trecircs (Portugal Repuacuteblica Eslovaca e Luxemburgo) natildeo facultavam o acesso por parte de autoridades tributaacuterias a informaccedilotildees relativas a pessoas suspeitas de fraude tributaacuteria

238 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

Desses trecircs paiacuteses hoje remanescem apenas dois Com efeito Portugal deixou de integrar esse grupo constrangedoramente minoritaacuterio ao aprovar em 29 de dezembro de 2000 a Lei n 30-G

Nesse diploma lecirc-se

Lei da Reforma de Tributaccedilatildeo do Rendimento

(Portugal)

Artigo 63 O - B

Acesso a informaccedilotildees e documentos bancaacuterios

1 A administraccedilatildeo tributaacuteria tem o poder de aceder directashymente aos documentos bancaacuterios nas situaccedilotildees de recusa da sua exibiccedilatildeo ou de autorizaccedilatildeo para a sua consulta

a) quando se trate de documentos de suporte de registos contabiliacutesticos dos sujeitos passivos de IRS e IRC que se enconshytrem sujeitos agrave contabilidade organizada

b) quando o contribuinte usufrua de benefiacutecios fiscais ou de regimes fiscais privilegiados havendo necessidade de controshylar os respectivos pressupostos e apenas para esse efeito

2 A administraccedilatildeo tributaacuteria tem o poder de aceder a todos os documentos bancaacuterios excepto as informaccedilotildees prestadas para justificar o recurso ao creacutedito nas situaccedilotildees de recusa de exibiccedilatildeo daqueles documentos ou de autorizaccedilatildeo para a sua consulta

a) quando se verificar a impossibilidade de comprovaccedilatildeo e quantificaccedilatildeo directa e exacta da mateacuteria tributaacutevel nos termos do artigo da Lei Geral Tributaacuteria e em geral quando estejam verifishycados os pressupostos para o recurso a uma avaliaccedilatildeo indirecta

b) quando os rendimentos declarados em sede de IRS se afastarem significativamente para menos sem razatildeo justificada dos padrotildees de rendimento que razoavelmente possam permitir as manifestaccedilotildees de riqueza evidenciadas pelo sujeito passivo nos termos do artigo 89-A da Lei Geral Tributaacuteria

c) quando existam indiacutecios da praacutetica de crime doloso em mateacuteria tributaacuteria designadamente nos casos de utilizaccedilatildeo de facturas falsas e em geral nas situaccedilotildees em que existam factos concretamente identificados gravemente indiciadores da falta de veracidade do declarado

d) quando seja necessaacuterio para fins fiscais comprovar a aplicaccedilatildeo de subsiacutedios puacuteblicos de qualquer natureza

ENSAIOS JUAlolCOS 239

3 As decisotildees da administraccedilatildeo tributaacuteria referidas nos nuacuteshymeros anteriores devem ser fundamentadas com expressa menshyccedilatildeo dos motivos concretos que as justificam pressupotildeem a audishyccedilatildeo preacutevia do contribuinte e satildeo da competecircncia do Director-Geshyral dos Impostos ou do Director-Geral das Alfacircndegas e dos Imshypostos Especiais sobre o consumo ou seus substitutos legais sem possibilidade de delegaccedilatildeo

4 Os actos praticados ao abrigo da competecircncia definida no nuacutemero anterior satildeo susceptiacuteveis de recurso judicial o qual teraacute efeito suspensivo nas situaccedilotildees previstas no n 2

5 Nos casos de deferimento do recurso previsto no nuacutemero anterior os elementos de prova entretanto obtidos natildeo podem ser utilizados para qualquer efeito em desfavor do contribuinte

6 As entidades que se encontrem numa relaccedilatildeo de domiacutenio com o contribuinte ficam sujeitas aos regimes de acesso agrave inforshymaccedilatildeo bancaacuteria referidos nos n 1 e 2

7 O acesso da administraccedilatildeo tributaacuteria a informaccedilatildeo banshycaacuteria relevante relativa a familiares ou terceiros que se encontrem numa relaccedilatildeo especial com o contribuinte depende de autorizashyccedilatildeo judicial expressa apoacutes audiccedilatildeo do visado obedecendo aos requisitos previstos no n 3

8 O regime previsto nos nuacutemeros anteriores natildeo prejudica a legislaccedilatildeo aplicaacutevel aos casos de investigaccedilatildeo por infracccedilatildeo peshynal e soacute pode ter por objecto operaccedilotildees e movimentos bancaacuterios realizados apoacutes a sua entrada em vigor sem prejuiacutezo do regime vigente para as situaccedilotildees anteriores

9 Os actos praticados ao abrigo da competecircncia prevista no n I devem ser objecto de comunicaccedilatildeo ao Defensor do Contrimiddot buinte

10 Para os efeitos desta lei considera-se documento bancaacuteshyrio qualquer documento ou registo independentemente do resshypectivo suporte em que se titulem comprovem ou registem opeshyraccedilotildees praticadas por instituiccedilotildees de creacutedito ou sociedades finanshyceiras no acircmbito da respectiva actividade incluindo os referentes a operaccedilotildees realizadas mediante utilizaccedilatildeo de cartotildees de creacutedito (coacutepia anexa)

Parece evidente destarte que todo o mundo civilizado abandonou a possibilidade de opor-se agrave Administraccedilatildeo Tributaacuteria o sigilo bancaacuterio

240 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

4 O sigilo bancaacuterio e o direito agrave intimidade e agrave privacidade das pessoas

A anaacutelise do sigilo bancaacuterio em face do direito agrave intimidade e agrave privacidashyde exige inicialmente que seja enfrentada a questatildeo referente ao seu conceito

Os doutrinadores natildeo tecircm assumido posiccedilatildeo uniforme quanto aos asshypectos conceituais dessa entidade juriacutedica

Seacutergio Carlos Covello autor da obra jaacute mencionada (O Sigilo Bancaacuterio Leud S Paulo 1991 p 69) entende que sigilo bancaacuterio eacute a obrigaccedilatildeo que tecircm os Bancos de natildeo revelar salvo justa causa as informaccedilotildees que venham a obter em virtude de sua atividade profissional

Luiz Fernando Bellinetti no artigo intitulado Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio (Revista do Direito do Consumidor Satildeo Paulo RT 1996 voI 18 p 144) defende posiccedilatildeo no sentido de que sigilo bancaacuterio eacute o dever juriacutedico que tecircm as instituiccedilotildees de creacutedito e as organizaccedilotildees auxiliares e seus empregados de natildeo revelar salvo justa causa as informaccedilotildees que venham a obter em virtushyde da atividade bancaacuteria a que se dedicam

Para Arnoldo Wald (in O Sigilo Bancaacuterio no Projeto de Lei Complemenshytar n 70 Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas n I pp 196209) o sigilo bancaacuterio se enquadra no conceito mais amplo do segredo profissional que tem merecido uma proteccedilatildeo mais ampla ensejando sua violaccedilatildeo caracterizaccedilatildeo como crime (art 154 do Coacutedigo PeshynaI)

Eivany A Silva tratando do tema em Consideraccedilotildees a Respeito do Sigilo de Dados (artigo publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio n 61 pp 41142 - Edit Dialeacutetica) afirma que o sigilo bancaacuterio eacute espeacutecie do gecircnero sigilo de dados constituindo um direito fundamental protegido constitucionalmente inserto que estaacute no rol dos direitos e garantias individuais ou seja em claacuteusushylas peacutetreas da Carta Magna natildeo podendo portanto ser modificado nem messhymo por emenda agrave Constituiccedilatildeo e portanto muito menos por legislaccedilatildeo de hierarquia inferior

Como examinado haacute divergecircncias na fixaccedilatildeo do conceito Essas divershygecircncias embora importantes para as posiccedilotildees doutrinaacuterias a serem assumishydas sobre o alcance do sigilo bancaacuterio natildeo geram contudo influecircncias de maior intensidade no relacionamento entre a instituiccedilatildeo financeira e os seus depositantes Isso porque o que merece ser considerado eacute a natureza juriacutedica do sigilo bancaacuterio isto eacute a que categoria de direito pertence e como por quem e quando a sua quebra pode ser determinada

Em face do exposto necessaacuterio eacute que se faccedila o alinhamento das teorias que procuram fundamentar o sigilo bancaacuterio

A doutrina em eacutepocas diversas examinou as seguintes teorias

ENSAIOS JURiacuteDICOS 241

Teoria contratualista O sigilo bancaacuterio de acordo com essa teoria deshycorre da relaccedilatildeo contratual que voluntariamente eacute formada entre o banco e o cliente por via da qual mesmo sem claacuteusula expressa a instituiccedilatildeo financeira assume a obrigaccedilatildeo de guardar segredo das movimentaccedilotildees de dinheiro que nela satildeo feitas Essa responsabilidade assumida pelo banco inspira-se segunshydo os adeptos da teoria em destaque nos usos nos costumes e na boa-feacute sempre aplicaacuteveis na intepretaccedilatildeo dos contratos comerciais7bull

Teoria do direito agrave privacidade Os adeptos dessa corrente afirmam que o sigilo bancaacuterio integra o campo do direito agrave privacidade que faz parte dos direitos da personalidade

Teoria consuetudinaacuteria Segundo os seguidores dessa linha de pensar o sigilo bancaacuterio decorre dos compromissos taacutecitos assumidos entre instituishyccedilotildees financeiras e seus clientes no sentido de natildeo serem levados ao conhecishymento de terceiros os valores transacionados O uso reiterado dessa praacutetica apoiada no elemento confianccedila passou a representar costume adotado nesse tipo de negoacutecio juriacutedico

Teoria da boa-feacute A adoccedilatildeo dessa teoria conduz o inteacuterprete a entender que o sigilo bancaacuterio por sua proacutepria natureza estaacute vinculado ao caraacuteter fiduciaacuterio da atividade bancaacuteria fundando-se portanto na boa-feacute ou dever de lisura que tanto marca o tipo de negoacutecio juriacutedico firmado

Teoria do sigilo profissional Essa teoria concebe o sigilo bancaacuterio como sendo uma espeacutecie do sigilo profissional Haacute portanto um dever eacutetico do banshyco em respeitar o sigilo bancaacuterio em decorrecircncia da profissatildeo exercida

Teoria do direito agrave intimidade dos bancos Os integrantes dessa forma de pensar sustentam que a instituiccedilatildeo financeira tem legiacutetimo interesse de afastar do conhecimento de terceiros a movimentaccedilatildeo financeira dos seus clientes e consequumlentemente dos fatos com elas relacionados

Teoria da complexidade do viacutenculo Essa teoria eacute explicada por Arnoldo Wald no trabalho jaacute citado da forma seguinte A doutrina moderna abandoshynou a noccedilatildeo da relaccedilatildeo juriacutedica contratual defendo a complexidade do viacutenshyculo Aleacutem dos direitos e das obrigaccedilotildees principais existem deveres secundaacuteshyrios para ambos os contratantes que decorrem da regra geral da boa-feacute denoshyminada na doutrina italiana de cOITeteza e na legislaccedilatildeo alematilde de Treu und Glauben Exige que a atuaccedilatildeo de uma parte natildeo cause danos agrave esfera juriacutedica da outra Dentro desta ideacuteia defende-se que o segredo bancaacuterio eacute um dever

7 Arnoldo Wald em Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais artigo publicado na Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas n 22 pp 1518 manifesta entendimento de que no campo normatIacutevo do Direito brasileiro esta teoria encontra respaldo nos arts 130 e 131 do Coacutedigo Comercial que prevecirc a interpretaccedilatildeo dos contratos segundo os usos os costumes e a boa-feacute

242 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

acessoacuterio na relaccedilatildeo juriacutedica Mesmo que natildeo nasccedila o contrato entre as partes a boa-feacute objetiva impede que a instituiccedilatildeo financeira prejudique os interesses do cidadatildeo

Estabelecidos os pressupostos doutrinaacuterios acima examinamos agora se o sigilo bancaacuterio diz respeito agrave intimidade e agrave privacidade das pessoas

A Constituiccedilatildeo Federal em seu artigo 5ordm incisos X e XII afirma

Art 5ordm Todos satildeo iguais perante a lei sem distinccedilatildeo de qualquer natureza garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Paiacutes a inviolabilidade do direito agrave vida agrave liberdade agrave igualdade agrave segushyranccedila e agrave propriedade nos termos seguintes

X - satildeo inviolaacuteveis a intimidade a vida privada a honra e a imagem das pessoas assegurado o direito agrave indenizaccedilatildeo pelo dano material ou moral decorrente de sua violaccedilatildeo

XJl - eacute inviolaacutevel o sigilo da correspondecircncia e das comunicaccedilotildees telegraacuteficas de dados e das comunicaccedilotildees telefocircnicas salvo no uacuteltimo caso por ordem judicial nas hipoacuteteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigaccedilatildeo criminal ou instruccedilatildeo processual penal

Essas garantias constitucionais protegem o cidadatildeo de qualquer investida de terceiros em sua intimidade em sua vida privada e no sigilo de seus dados

Na expressatildeo terceiros estaacute incluiacutedo o Estado e consequumlentemente seus agentes poliacuteticos e administrativos

A doutrina tem se manifestado de modo quase unacircnime no sentido de que o sigilo bancaacuterio eacute uma garantia constitucional que protege a privacidade das pessoas no campo econocircmico e financeiro A sua significaccedilatildeo eacute de natildeo tornar puacuteblica a movimentaccedilatildeo da conta bancaacuteria e das aplicaccedilotildees financeiras do cidadatildeo para que de nenhum modo os atos privados praticados possam ser tornados puacuteblicos

Esse posicionamento eacute o adotado pelos autores que passo a citar

Arnoldo Wald (O Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais artigo pushyblicado na Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas RT n 22 pp 1521)

O sigilo bancaacuterio eacute o meio para resguardar a privacidade no camshypo econocircmico pois veda a publicidade sobre a movimentaccedilatildeo da conta corrente bancaacuteria e das aplicaccedilotildees financeiras

ENSAIOS JURiacuteDICOS 243

Eivany A Silva (Consideraccedilotildees a Respeito do Sigilo de Dados artigo publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio n 61 Satildeo Paulo Editora Dialeacutetica p27)

A maioria dos ordenamentos juriacutedicos como o brasileiro tratam o sigilo bancaacuterio como direito fundamental do contribuinte agrave privacidashyde ou seja agrave resistecircncia agrave comunicaccedilatildeo de dados que representem desshydobramento da personalidade da pessoa direito agrave oposiccedilatildeo e agrave negaccedilatildeo de comunicaccedilatildeo

Ives Gandra da Silva Martins (Sigilo Bancaacuterio trabalho publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio S Paulo Editora Dialeacutetica n 1 pp 24 e 25)

Pelos incisos X e XII do artigo 5ordm tem o contribuinte o direito de preservaccedilatildeo de sua intimidade de sua privacidade e de que terceiros que detenham informaccedilotildees pessoais suas sejam obrigados a guardaacute-Ias

Natildeo pode pois a fiscalizaccedilatildeo exigir de terceiros informaccedilotildees que apenas pode obter do proacuteprio contribuinte

Em determinadas hipoacuteteses todavia o interesse puacuteblico haacute de preshyvalecer sobre o interesse individual mas caberaacute a um outro poder definir se tais hipoacuteteses efetivamente ocorrem com o que poderaacute o Poder Judishyciaacuterio autorizar se convencido estiver o magistrado de que a hipoacutetese eacute de gravidade e de lesatildeo ao interesse puacuteblico a quebra do direito ao sigilo bancaacuterio

Estou convencido ser esta a melhor conformaccedilatildeo juriacutedica da quesshytatildeo idealizada pelos constituintes defendida pela doutrina e consagrashyda na jurisprudecircncia corrente exegeacutetica esta a que me filio desde os meus primeiros escritos sobre a mateacuteria

Roberto Quiroga Mosquera (Tributaccedilatildeo no Mercado Financeiro e de Capitais obra publicada pela Editora Dialeacutetica Satildeo Paulo 1998 pp 70171)

Do exposto ateacute aqui eacute evidente que o direito ao sigilo bancaacuterio representa uma espeacutecie de direito agrave privacidade

Eacute incontroverso que os dados e informaccedilotildees de natureza bancaacuteria dizem respeito agrave intimidade e agrave vida privada dos cidadatildeos Dados que dizem respeito aos valores em dinheiro depositados em contas-correnshytes bancaacuterias tipos e caracteriacutesticas de aplicaccedilotildees financeiras ganhos e prejuiacutezos auferidos ou incorridos em operaccedilotildees bursaacuteteis etc satildeo sem sombra de duacutevida elementos particulares e pessoais de qualquer indiviacuteshyduo

244 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Utilizando outra voz informaccedilotildees que tocam no aspecto financeishyro do ser humano representam direito iacutentimo e personaliacutessimo devendo ser mantidas em sigilo por aqueles que eventualmente as detenham em razatildeo de sua atividade profissional Parece-nos que tal conclusatildeo eacute de uma clareza inconteste

Natildeo tem sido outra a posiccedilatildeo da doutrina mais abalizada do Paiacutes e da jurisprudecircncia dominante

o autor referido a seguir faz a observaccedilatildeo seguinte

Carlos Alberto Hagstrom (Sigilo Bancaacuterio Novas Questotildees Reshyvista de Direito Mercantil Satildeo Paulo Malheiros 1997 vaI 105 pp 4344) expotildee que apesar de existirem diversas teorias que procuram fundashymentar juridicamente o sigilo bancaacuterio modernamente a explicaccedilatildeo para o fundamento do referido instituto sofreu uma radical alteraccedilatildeo Divershysas constituiccedilotildees modernas esclarece o mencionado autor ampliaram e explicitaram o elenco de direitos e garantias individuais passando a garantir o direito agrave privacidade e agrave intimidade A Constituiccedilatildeo brasileira natildeo trilha caminho diferente Assegurou referidos direitos de forma exshypressa e sem restriccedilotildees O tema do sigilo bancaacuterio figura agora em niacutevel constitucional Tem status de norma superior no qual se reconhece o direito agrave intimidade como norma de caraacuteter geneacuterico em que estatildeo conshytemplados muacuteltiplos aspectos da vida privada em especial os de ordem econocircmico-financeira que compotildeem o que Hagstrom denominou a inshytimidade econocircmica ou intimidade patrimonial

Luiacutes Fernando 8ellinetti (Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio artigo publicado na Revista de Direito do Consumidor n 18 pp 141151)

Como jaacute dissemos anteriormente em certas hipoacuteteses o fundashymento para o segredo bancaacuterio seria a privacidade No entanto nesses casos o que se protege eacute a privacidade e natildeo propriamente o sigilo

Entendemos que uma coisa eacute garantir-se a privacidade da pessoa com fundamento em norma constitucional outra eacute garantir-se o segreshydo de informaccedilotildees bancaacuterias de uma pessoa com base na legislaccedilatildeo supramencionada

Sempre que a revelaccedilatildeo de informaccedilotildees bancaacuterias puder violar a privacidade da pessoa parece-nos que mais do que garantia ao sigilo bancaacuterio (com fundamento legal) tem a pessoa garantia agrave sua privacishydade (com fundamento constitucional)

ENSAIOS JURiacuteDICOS 245

No entanto se a revelaccedilatildeo da informaccedilatildeo natildeo invadir a esfera da intimidade da pessoa sua garantia eacute meramente legal do sigilo bancaacuterio

Carlos Maacuterio Velloso (citado por Misabel Derzi em Direito Tributaacuterio Aplicado obra publicada pela Editora Del Rey Belo Horizonte MO pp 278 e 279)

O sigilo bancaacuterio decorre do direito agrave privacidade inerente agrave pershysonalidade das pessoas consagrado na Constituiccedilatildeo Federal em seu art 5ordm X e protege tanto interesses privados como finalidades de ordem puacuteblica a saber o sistema de creacutedito O sigilo bancaacuterio natildeo eacute um princiacuteshypio absoluto

As exceccedilotildees ao sigilo bancaacuterio estatildeo previstas na Lei n 45951964 que continua em vigor

O Poder Judiciaacuterio pode requisitar relativamente a pessoas e instishytuiccedilotildees informaccedilotildees que implicam quebra de sigilo (Lei n 45951964 art 38 sect 1 ordm) entretanto mesmo havendo inqueacuterito policial instaurado deveraacute proceder com cautela prudecircncia e moderaccedilatildeo inerentes agrave mashygistratura

Luciana Fregodolli (O Direito agrave Intimidade - excerto da dissertaccedilatildeo que apresentou sob o tiacutetulo O Direito agrave Intimidade e a Prova Iliacutecita publicado pela Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Constitucional e Ciecircncia Poliacutetica -n 19 p 233)

O sigilo bancaacuterio protege interesses privados Eacute ele espeacutecie de direito agrave privacidade inerente agrave personalidade das pessoas e que a Consshytituiccedilatildeo Federal consagra no art 5ordm X aleacutem de atender a uma finalidade de ordem puacuteblica qual seja a de proteccedilatildeo ao sistema de creacutedito

O direito agrave privacidade abrange atualmente o de impedir que tershyceiros inclusive o Estado e o Fisco tenham acesso a informaccedilotildees sobre o que se denominou a aacuterea de manifestaccedilatildeo existencial do ser humano

Celso Ribeiro Bastos O pensamento de Celso Ribeiro Bastos foi exshyposto por Roberto Quiroga Mosquera na obra jaacute referida p 71 do modo seguinte

Celso Bastos eacute do mesmo pensar Apoacutes tecer consideraccedilotildees introdutoacuterias acerca do sigilo bancaacuterio e expor pensamentos de divershysos autores nacionais e alieniacutegenas conclui o constitucionalista brasileishyro no sentido de que todas as despesas ordinaacuterias feitas pelo cidadatildeo

246 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

comum em sua vida cotidiana devem ser consideradas parte de sua vida privada familiar ou domeacutestica e portanto protegidas contra interferecircnshycias a despeito de qualquer pretexto Desde as condutas mais corriqueishyras como as compras efetuadas em um supermercado para manutenshyccedilatildeo da famiacutelia quanto aquelas outras moralmente reprovaacuteveis como presentes ou joacuteias compradas e dadas a quem presta ao homem servishyccedilos de natureza extraconjugal tudo estaacute abarcado pelo manto da proteshyccedilatildeo agrave vida privada familiar ou domeacutestica ( ) E mais adiante arremata Hoje praticamente a vida do homem pode ser escrita a partir de seu talatildeo de cheques e nas sociedades mais avanccediladas pelos cartotildees de creacutedito e magneacuteticos Permitir-se que o sigilo bancaacuterio venha a ser romshypido por qualquer forma natildeo-extraordinaacuteria para salvaguarda de inteshyresse de porte no miacutenimo idecircntico eacute expor a seguranccedila individual a um constante e absurdo temor perante as possibilidades de controle direto ou pelo vazamento de alguma informaccedilatildeo

Haacute contudo corrente contraacuteria como passaremos a demonstrar

Andreacute Serratildeo Borges de Sampaio Consultor da Uniatildeo nas informashyccedilotildees prestadas ao Advogado-Geral da Uniatildeo sobre a ADIn n 2397 cita trechos de doutrina e jurisprudecircncia estrangeiras defendendo o entendimento de que o sigilo bancaacuterio natildeo tem conotaccedilatildeo de direito de privacidade Eis o que escreshyveu o parecerista citado

O jurista portuguecircs J L Saldanha Sanches coteja primorosashymente o sigilo bancaacuterio com a proteccedilatildeo da intimidade para concluir que natildeo haacute que se falar em direito ao sigilo bancaacuterio como concretizaccedilatildeo do direito agrave intimidade Nas suas palavras

Ora em que esfera podemos noacutes incluir o segredo bancaacuteshyrio enquanto instituto que concretiza certos valores do ordenashymento juriacutedico Como expressatildeo de interesses juridicamente tuteshylados

Seraacute o segredo bancaacuterio um prolongamento do direito agrave inshytimidade da esfera pessoal e familiar de uma qualquer pessoa sinshygular (uma vez que em relaccedilatildeo agraves pessoas coletivas a questatildeo natildeo pode mesmo ser colocada) Ou diraacute antes respeito aquela faixa mais larga que resguarda a privacidade de qualquer cidadatildeo e que soacute pode por isso sofrer qualquer intromissatildeo se surgirem razotildees vaacutelidas para que tal direito seja restringido

Ao afirmar-se que na perspectiva dos clientes dos bancos o segredo bancaacuterio eacute um direito com a reserva da sua vida privada temos uma primeira resposta para esta questatildeo

ENSAIOS JURiacuteDICOS 247

Mas falta distinguir entre intimidade e reserva da vida privashyda e entre clientes individuais e profissionais de um banco Natildeo estamos perante o mesmo tipo de tutela quando contamos que um particular espera que o banco natildeo divulgue a qualquer inteshyressado o volume da sua conta bancaacuteria (porque pura e simplesshymente quer manter sob reserva a sua vida particular) ou quando um comerciante confia no banco para que este natildeo revele quem satildeo os seus clientes fornecedores ou qual eacute o seu grau de endividamento

No caso da pessoa singular estaacute apenas em causa um conshyjunto de valores de natureza moral esta natildeo estaacute em princiacutepio preocupada com possiacuteveis prejuiacutezos econocircmicos ligados a qualshyquer divulgaccedilatildeo Apenas se opotildee por razotildees do seu foro pessoal e que natildeo carecem de fundamentaccedilatildeo que esta tenha lugar

Enquanto que o comerciante pode ser seriamente prejudishycado em termos concorrenciais com a revelaccedilatildeo da lista dos seus clientes ou com a sua situaccedilatildeo financeira

O dever de reserva que cabe ao banqueiro estaacute desta forma a serviccedilo do interesse comercial das empresas suas clientes - que pelo simples facto de o serem ou por necessitarem de obter creacutedishyto lhe datildeo informaccedilotildees com um forte valor comercial ou da pesshysoa singular que deseja manter a privacidade da sua situaccedilatildeo patrimonial

Ou em alternativa ao serviccedilo da manutenccedilatildeo da privacidashyde que qualquer um pode desejar ainda que a possiacutevel violaccedilatildeo desta apenas lhe possa acarretar danos natildeo-patrimoniais

E por isso o segredo bancaacuterio natildeo pode constituir a expresshysatildeo do imperativo constitucional da proteccedilatildeo da intimidade Ateacute porque o acesso a essa esfera estaacute vedado aos proacuteprios bancos

Natildeo nos parece aceitaacutevel que um banco como condiccedilatildeo para a concessatildeo de creacutedito a uma pessoa singular ou para estashybelecer com ela qualquer relaccedilatildeo contratual possa exigir desta informaccedilatildeo de tipo estritamente pessoal ou a sujeiccedilatildeo a exames meacutedicos que atingindo a sua esfera iacutentima afectam a sua dignidashyde Aqui estaacute em causa a ilicitude da pergunta por pressupor o acesso agrave esfera inviolaacutevel (e indisponiacutevel) da intimidade

A informaccedilatildeo que o banco pode obter para a defesa dos seus interesses legiacutetimos natildeo pode ir aleacutem da esfera patrimonial do seu cliente rendimentos bens possuiacutedos perspectivas profisshysionais

( )

248 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

Podemos pois concluir que o segredo bancaacuterio natildeo eacute natildeo pode ser uma concretizaccedilatildeo do princiacutepio constitucional do direishyto agrave intimidade

Este princiacutepio tem como funccedilatildeo consagrar uma zona de reshyselVa pessoal para factos opccedilotildees e circunstacircncias que soacute de forshyma indirecta e de todo secundaacuteria podem ter aspectos ou refleshyxos de natureza patrimonial (Saldanha Sanches J L Segredo Bancaacuterio e Tributaccedilatildeo do Lucro Real In Saldanha Sanches J L Estudos de Direito Contabiliacutestico e Fiscal Coimbra Coimbra Edishytora 2000 pp 105108)

Em diversos paiacuteses haacute a clara percepccedilatildeo que natildeo haacute que se conshyfundir direito agrave intimidade com sigilo bancaacuterio indicando que a quebra do sigilo pela Administraccedilatildeo Tributaacuteria natildeo constitui violaccedilatildeo ao direito Ao contraacuterio a existecircncia de um Estado Fiscal implica na necessidade de consagrar agrave administraccedilatildeo tributaacuteria tal faculdade o que se harmonishyza com diversos princiacutepios e outros direitos fundamentais constantes da Carta de 1988

O caso espanhol eacute exemplar neste sentido ao natildeo visualizar a vioshylaccedilatildeo ao direito agrave intimidade em relaccedilatildeo agrave quebra do sigilo bancaacuterio Portanto

el Tribunal Constitucional espaflOl se ha pronunciado por la negativa de que el conocimiento de las cuentas bancarias por la Administracioacuten pueda invadir el aacutembito constitucionalmente garantizado de la intimidad de los individuos porque tales extractos no constituyen per se uma biografiacutea personal en nuacutemeros y en siacute no tiene relevancia para la intimidad personal y familiar dei contribuyente ya que se trata de dados no secretos y confiados a una entidad (Campos Laura Rodriacuteguez Oerechos dei Contribuyente em la Repuacuteblica Argentina ai Amparo de la Convencioacuten Interamericana de Oerechos Humanos http wwwiefpaorgarcriteriosdigitalarticulosderechoshtm Visitado em 512001)

Ao analisar a jurisprudecircncia da Corte Constitucional espanhola quanto ao tema tambeacutem ressalta Saldanha Sanches

Na apreciaccedilatildeo da constitucionalidade da lei que permitia o controle administrativo das contas bancaacuterias o Tribunal Constitushycional espanhol realizou uma distinccedilatildeo entre intimidade pessoal e familiar e a intimidade econoacutemica onde a proteccedilatildeo constitucional eacute menos intensa

ENSAIOS JURiacuteDICOS 249

E procura fazer uma distinccedilatildeo entre a violaccedilatildeo agrave intimidade como consequumlecircncia de uma anaacutelise das contas bancaacuterias - coloshycando a hipoacutetese de uma recusa de cooperaccedilatildeo por parte do conshytribuinte se tal eventualidade se verificar - e a violaccedilatildeo directa da intimidade uma vez que esta natildeo pode resultar de uma mera anaacuteshylise de movimentos bancaacuterios (Saldanha Sanches J L A Situashyccedilatildeo Actual do Sigilo Bancaacuterio a Singularidade do Regime Portushyguecircs In Saldanha Sanches J L Estudos de Direito Contabiliacutestico e Fiscal Coimbra Coimbra Editora 2000 p 91)

Outro comentarista ao analisar a situaccedilatildeo do sistema espanhol quanto ao sigilo bancaacuterio e o direito agrave intimidade fez questatildeo de ressaltar

Seguacuten el r c frente a la Hacienda Puacuteblica no existe el derecho a la intimidad deI art 18 CE Ya la LO de 5 de mayo deI 82 vada praacutecticamente de contenido constitucional el derecho a la intimidado en cuanto el aacutembito de eacutesta queda deferido a la ley ordinaria (a 2ordm) y en cuanto que la esfera protegida frente a las Administraciones se reduce a poco O nada ai no reputarse intromisiones ilegiacutetimas las actuaciones autorizadas o acordadas por la Autoridad competente de acuerdo con la Ley (art 8ordm 1)

La LGTy el RI Iimiacutetan la esfera de la intimidad en las relacishyones con la Hacienda hasta el extremo de que solamenle existe un refugio limitado en el aacutembito deI secreto profesional en los casos de informacioacuten sobre terceros y siempre que no se trate de datos con transcendencia econoacutemica o tributaria EI rc no ha enconshytrado hasta el momento ni un solo supuesto de dato o informacioacuten econocircmica con transcendencia tributaria que limite la accioacuten inquisitiva de la Administracioacuten tributaria por razoacuten de intimidado Bien puede decirse por tanto que frente a la Administraciocircn tribushytaria en cuanto se trata deI ejercicio de su funciocircn de buacutesqueda de datos con transcendencia tributaria el derecho a la intimidad personal y familiar (art 18 I CE) no existe

La biacuteblia deI tribunal a estos efeclos estaacute constituida por la S 11084 reiterada en numerosas ocasiones ampliada en el Auto 64286 y reafirmada por ejemplo en la S 26 abril 90 tantas veces citada (FJ 10deg) Seguacuten esa doctrina la distribucioacutenjusta de la carshyga fiscal prevalece sobre el derecho a la intimidad parte dei art 812 I de la LO seguacuten el cual frente a la Ley (ordinaria) no hay intimidad protegida siempre que haya en dicha ley imperativos de intereacutes puacuteblico ( ) ni siquiera se habla dei predomiacutenio frente a la

250 SUPERIOR TRIBUNAl DE JUSTiCcedilA

intimidad de intereses u objetivos constitucionalmente protegidos Soacuteo admite que la actuadoacuten administrativa es arbitraria cuando no parezcajustificada por la Finalidad de la inspeccioacuten es decir cuando se trate de datos o informaciones que carezcan de transcendencia tributaria pero eacuteste obviamente no es sin Umite derivado dei derecho a la intimidad sino de la interdiccioacuten de arbitrariedad o desviacioacuten de poder de la Administracioacuten de la necesidad de ajuste de toda Administracioacuten ai acircmbito de su competencia que tanto vale para datos iacutentimos como para otros que no lo sean Seguacuten la S 11084 no hay esfera de intimidad proshytegida frente a una Administracioacuten tributaria amparada en una norma que elimina la intimidad como liacutemite (Garciacutea AIacuteloveros Jaime Una Nueva Ley General Tributaria Problemas Constitucioshynales In Kirchhof P et aI Garantiacuteas Constitucionales dei Contribuyente Valencia Tirant lo Blanch 1999 pp 109110)

Diante de tudo quanto foi exposto tendo-se o cuidado de registrar posicionamento de diferentes autores nacionais e estrangeiros haacute ambiente preparado para ser respondido o primeiro questionamento desdobrado em trecircs partes formulado para o 1II Coloacutequio Internacional de Direito Tributaacuterio promoccedilatildeo do Centro de Extensatildeo Universitaacuteria Eis a primeira parte do seu teor

O sigilo bancaacuterio diz respeito agrave intimidade e privacidade das pessoas

A resposta eacute optando por convencimento influenciado pelas ideacuteias da corrente predominante positiva

O nosso entendimento eacute no sentido de que o direito agrave intimidade integra os direitos da personalidade e visam proteger o direito agrave inviolabilidade do domiciacutelio da correspondecircncia das comunicaccedilotildees de quaisquer espeacutecies dos dados pessoais computadorizados do sigilo bancaacuterio O mesmo acontece com o direito agrave privacidade

A expansatildeo da proteccedilatildeo do direito agrave intimidade e agrave privacidade eacute uma consequumlecircncia da evoluccedilatildeo da era contemporacircnea nos setores tecnoloacutegicos e da instabilidade que passam as instituiccedilotildees estatais especialmente a encarreshygada de arrecadar tributos Haacute o reconhecimento de que desenvolve-se um processo de aguda corrosatildeo na proteccedilatildeo agrave intimidade que ao ser violada provoca a publicizaccedilatildeo das condutas mais iacutentimas do cidadatildeo

A concepccedilatildeo do sigilo bancaacuterio no acircmbito do direito agrave intimidade e agrave privacidade visa garantir ao homem o miacutenimo capaz para que lhe seja asseshygurada a sua condiccedilatildeo humana protegendo-o de ingerecircncias alheias como apregoa a Conferecircncia Noacuterdica sobre o Direito agrave Intimidade realizada em Estoshycolmo na data de maio de 1967 ao fazer inserir no documento que publicou a seguinte definiccedilatildeo O direito agrave intimidade eacute o direito do homem de viver de forma independente a sua vida com um miacutenimo de ingerecircncia alheia

ENSAIOS JURiacuteDICOS 251

5 Seguranccedila juriacutedica e acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias

A segunda pergunta apresentada pelos organizadores do coloacutequio estaacute assim posta

A seguranccedila das relaccedilotildees juriacutedicas atraveacutes do Sistema Financeiro pode ser afetada pelo acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves inforshymaccedilotildees bancaacuterias

O acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias se realizado caracteriza um atentado de suma gravidade aos direishytos do cidadatildeo Eacute um ataque aos princiacutepios sustentadores do sistema demoshycraacutetico adotado pelo constituinte de 1988 especialmente quando detonou que a Repuacuteblica Federativa do Brasil tem como objetivo fundamental o respeishyto agrave dignidade humana e agrave cidadania

Do ordenamento juriacutedico brasileiro a meu pensar natildeo haacute lugar para brotar qualquer interpretaccedilatildeo que conclua pela possibilidade de qualquer agenshyte do Poder Puacuteblico acessar de modo generalizado e sem motivaccedilatildeo informashyccedilotildees bancaacuterias do cidadatildeo mesmo com autorizaccedilatildeo judicial

Esclareccedilo desde logo que natildeo comungo com o pensamento de detershyminada corrente no sentido de ser absoluto o direito ao sigilo bancaacuterio Tenho-o como relativo poreacutem vinculado aos princiacutepios da razoabilidade da moralidade da legalidade e da motivaccedilatildeo expliacutecita e detalhada sob pena de ser impossiacutevel a sua quebra

O acesso indiscriminado do agente fiscal agraves informaccedilotildees bancaacuterias do cidadatildeo gera uma quebra da seguranccedila das relaccedilotildees juriacutedicas por um terceiro passar a ter sem causa justificadora conhecimento da vida iacutentima de algueacutem submetendo-o a partir daiacute a um regime de submissatildeo Por outro lado ninshygueacutem poderaacute garantir nem o proacuteprio Estado que o agente puacuteblico utilize os dados que chegaram ao seu conhecimento para outros intentos que natildeo o exclusivamente fiscal

Lembra Arnoldo Wald que O segredo na atividade bancaacuteria envolve concomitantemente interesses privaqos e coletivos que podem ser analisashydos sob trecircs acircngulos o interesse do cliente na sua relaccedilatildeo com a instituiccedilatildeo financeira o interesse do banco em atuar com discriccedilatildeo para ganhar a conshyfianccedila da populaccedilatildeo e captar recursos e o interesse social na existecircncia de um bom e eficiente sistema bancaacuterio Por estarem ligadas ao desenvolvimento da economia e aos interesses da comunidade as relaccedilotildees que envolvem as instishytuiccedilotildees financeiras natildeo recebem o mesmo tratamento juriacutedico dispendido a outras relaccedilotildees comerciais Inviaacutevel a aplicaccedilatildeo exclusiva das regras de Direito Privado as quais tecircm como princiacutepio norteador a autonomia da vontade pois

252 SUPERIOR TRIBUNAl DE JUSTiCcedilA

esta encontra limites nas normas cogentes proacuteprias do direito bancaacuterio e na intervenccedilatildeo do Estado8

A seguranccedila juriacutedica desse tipo de relaccedilatildeo envolve tambeacutem a manutenshyccedilatildeo do segredo das movimentaccedilotildees financeiras do contribuinte

Imprimir-se a mais ampla seguranccedila nas relaccedilotildees do Sistema Financeiro eacute fortalececirc-lo O Estado tem o dever de zelar por esse estado de seguranccedila natildeo permitindo consequumlentemente que o sigilo bancaacuterio seja quebrado pelo acesshyso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico por esse comportamento afeshytar a confiabilidade no sistema

Eacute de todo inconveniente permitir a possibilidade de um atuar do agente fiscal sem controle na quebra do sigilo bancaacuterio por afetar diretamente a seshyguranccedila da relaccedilatildeo juriacutedica firmada entre a instituiccedilatildeo financeira e o seu clienshyte em face deste sentir-se atingido pela accedilatildeo fiscal que passa a tomar conhecishymento de sua intimidade financeira e de fatos de sua vida privada sem o resshypaldo do Poder Judiciaacuterio

A seguranccedila juriacutedica nesse tipo de relaccedilatildeo deve assegurar impossibilidashyde de abuso de poder por parte do Fisco em face da necessidade de ser resshyguardada a garantia de que em um Estado de Direito natildeo pode ser concebido que conceda-se a uma parte mesmo que seja o Estado o domiacutenio absoluto de apanhar as provas que iraacute utilizar em caso de litiacutegio contra algueacutem

O acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias do contribuinte aleacutem de afetar a seguranccedila juriacutedica da relaccedilatildeo em questatildeo promove um desequiliacutebro entre o cidadatildeo-contribuinte e o Fisco por caracterizar coaccedilatildeo que coloca aquele em posiccedilatildeo de inferioridade

A valorizaccedilatildeo da seguranccedila juriacutedica da relaccedilatildeo existente entre instituiccedilatildeo financeira e contribuinte pelo Fisco natildeo quebrando o seu sigilo fiscal sem autorizaccedilatildeo judicial constitui causa de aplicaccedilatildeo de Justiccedila fiscal O seguimenshyto de seus princiacutepios valoriza o regime democraacutetico do qual ela faz parte

6 Casos de admissibilidade da quebra do sigilo bancaacuterio

Os casos de admissibilidade da quebra do sigilo bancaacuterio estatildeo na atuashylidade descritos no nosso ordenamento juriacutedico positivo

A Lei Complementar n 105 de 10 de janeiro de 2001 apoacutes determinar no art 112 de que as instituiccedilotildees financeiras conservaratildeo sigilo em suas operashyccedilotildees ativas e passivas e serviccedilos prestados dispotildee no sect 312 do mesmo artigo que

8 Arnoldo Wald no artigo Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais Revista dos Tribunais ano 6 n 22 janeiromiddotmarccedilo de 1998 n 22 Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas p 15

ENSAIOS JURiacuteDICOS 253

sect 3ordm Natildeo constitui violaccedilatildeo do dever de sigilo

I a troca de informaccedilotildees entre instituiccedilotildees financeiras para fins cadastrais inclusive por intermeacutedio de centrais de risco observadas as normas baixadas pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e pelo Banco Censhytral do Brasil

11 - o fornecimento de informaccedilotildees constantes de cadastro de emitentes de cheques sem provisatildeo de fundos e de devedores inadimplentes a entidades de proteccedilatildeo ao creacutedito observadas as norshymas baixadas pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e pelo Banco Central do Brasil

JJI - o fornecimento das informaccedilotildees de que trata o sect 2ordm do art II da Lei n 9311 de 24 de outubro de 1996

IV - a comunicaccedilatildeo agraves autoridades competentes da praacutetica de iliacutecitos penais ou administrativos abrangendo o fornecimento de inforshymaccedilotildees sobre operaccedilotildees que envolvam recursos provenientes de qualshyquer praacutetica criminosa

V - a revelaccedilatildeo de informaccedilotildees sigilosas com o consentimento expresso dos interessados

VI- a prestaccedilatildeo de informaccedilotildees nos termos e condiccedilotildees estabeleshycidos nos artigos 2ordm 3ordm 4ordm 5ordm 6ordm 7ordm e 9ordm desta lei complementar

sect 4ordm A quebra de sigilo poderaacute ser decretada quando necessaacuteria para apuraccedilatildeo de ocorrecircncia de qualquer iliacutecito em qualquer fase do inqueacuterito ou do processo judicial e especialmente nos seguintes crimes

I - de terrorismo

11 - de traacutefico iliacutecito de substacircncias entorpecentes ou drogas afins

III - de contrabando ou traacutefico de armas municcedilotildees ou material destinado a sua produccedilatildeo

IV - de extorsatildeo mediante sequumlestro

V - contra o sistema financeiro nacional

VI - contra a Administraccedilatildeo Puacuteblica

Vll- contra a ordem tributaacuteria e a previdecircncia social

VIII-lavagem de dinheiro ou ocultaccedilatildeo de bens direitos e valores

IX - praticado por organizaccedilatildeo criminosa

Como visto a lei complementar enumera inuacutemeras situaccedilotildees que indeshypendentemente de autorizaccedilatildeo judicial o sigilo bancaacuterio eacute quebrado

254 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

A dificuldade que se apresenta eacute a de conciliar os casos de quebra de sigilo bancaacuterio que a Lei Complementar n 105 autoriza com a garantia do direito agrave privacidade e agrave intimidade

Destaque-se entre os de maior relevacircncia os seguintes

- natildeo constituir violaccedilatildeo do dever de sigilo bancaacuterio a troca de informashyccedilotildees entre instituiccedilotildees financeiras para fins cadastrais inclusive por intermeacuteshydio de centrais de risco o que possibilita o conhecimento da vida financeira privada do cidadatildeo por vaacuterias pessoas sem desempenho de autoridade na instituiccedilatildeo independentemente de ser justificada com antecedecircncia a causa desse atuar

- o de serem fornecidos dados relativos a fornecimentos de informashyccedilotildees cadastrais de emitentes de cheques sem provisatildeo de fundos a entidades privadas de proteccedilatildeo ao creacutedito sem qualquer avaliaccedilatildeo por qualquer autorishydade da causa determinante do fato a quebra do sigilo bancaacuterio na fase do inqueacuterito por inexistir nessa ocasiaacuteo qualquer contraditoacuterio e respeito ao prinshyciacutepio do devido processo legal

Quanto agraves demais situaccedilotildees constantes na lei complementar que autorishyzam a quebra do sigilo bancaacuterio naacuteo obstante algumas serem absolutamente necessaacuterias haacute de serem vistas em compatibilidade com as garantias constitushycionais conforme jaacute assinalado

O colendo Supremo Tribunal pronunciaraacute como guarda e inteacuterprete maishyor da Carta Magna em ADln jaacute intentada sobre a constitucionalidade ou natildeo dos dispositivos supramencionados

Em campo doutrinaacuterio valoriza-se as posiccedilotildees apresentadas quando da resposta oferecida aos questionamentos anteriores todas acenando pela neshycessidade do controle do Poder Judiciaacuterio

7 Sistema mais justo para a quebra do sigilo bancaacuterio

Os organizadores do JII Coloacutequio Internacional de Direito Tributaacuterio subshymetem agora para anaacutelise a questatildeo do teor seguinte Um sistema em que o Poder Judiciaacuterio torna-se aacuterbitro dos pedidos da Administraccedilatildeo Puacuteblica para quebra do sigilo eacute o mais justo

Em um Estado que por imposiccedilatildeo de sua proacutepria Constituiccedilatildeo estaacute comprometido com a guarda e aplicaccedilatildeo efetiva de princiacutepios democraacuteticos especialmente o de respeitar os direitos e garantias fundamentais da cidadashynia natildeo haacute ambiente para que seja outorgado ao Poder Executivo por via da atuaccedilatildeo de agentes puacuteblicos fiscais o acesso sem o controle do Poder Judiciaacuteshyrio agraves informaccedilotildees bancaacuterias do contribuinte

ENSAIOS JURiacuteDICOS 255

o sigilo bancaacuterio por ser um direito fundamental que exige ser respeitashydo pela supremacia constitucional que o protege deve submeter a possibilishydade de sua quebra para fins tributaacuterios ao Poder Judiciaacuterio pela ausecircncia de interesse direto nos resultados da accedilatildeo fiscalizadora que eacute o recolhimento do tributo e pelas garantias de independecircncia prudecircncia e qualificaccedilatildeo juriacutedica que revestem esse poder

A atuaccedilatildeo da fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo pode ser exercida fora dos limishytes da legalidade imposta a partir da Carta Magna e demais imposiccedilotildees legais a ela subordinadas

Natildeo se desconhece que no atual Estado fiscal os tributos constituem os meios financeiros determinantes para o atendimento dos compromissos da Administraccedilatildeo Puacuteblica com as obrigaccedilotildees oriundas em decorrecircncia de sua atividade no campo educacional social de seguranccedila puacuteblica interna e extershyna da sauacutede da manutenccedilatildeo dos Poderes ou seja para manter funcionando a maacutequina estatal

Por natildeo entremostrar-se na eacutepoca contemporacircnea qualquer outra alshyternativa viaacutevel para transformar o Estado fiscal em um Estado produtivo os tributos passam a representar um indeclinaacutevel dever da cidadania cujo cumshyprimento deve ser por todos honrado conforme assinala Joseacute Casalta Nabais Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra em artigo intitulado Algumas Reflexotildees sobre o Actual Estado Fiscal

Por isso os impostos hatildeo de constituir um preccedilo aceitaacutevel ou seja um preccedilo limitado Um preccedilo que estou certo muitas das sociedashydes que nos antecederam gostariam de ter pago e algumas das actuais natildeo enjeitariam suportar Por isso bem podemos afirmar como jaacute o fizeshymos noutro lugar que no actual Estado fiscal para o qual natildeo se vislumshybra qualquer alternativa viaacutevel pelo menos nos tempos mais proacuteximos os impostos constituem um indeclinaacutevel dever de cidadania cujo cumshyprimento a todos nos deve honrar

A atuaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio para liberar o bloqueio fortalece a conshyfianccedila do cidadatildeo no procedimento da fiscalizaccedilatildeo e consagra a ideacuteia iacutensita em qualquer regime democraacutetico de que a atuaccedilatildeo do Estado tem limites

Na espeacutecie os limites impostos satildeo os decorrentes da quebra do sigilo ser necessaacuterio em face da possiacutevel ilicitude cometida pelo cidadatildeo poreacutem sem ser violados os direitos do cidadatildeo de gozar da sua privacidade e da sua intimidade

A denominada cidadania fiscal haacute de ser considerada de modo conjunshytural com os reflexos dos direitos fundamentais assegurados ao contribuinte sem prestigiar a responsabilidade que tem o Estado de promover a arrecadashyccedilatildeo dos tributos

256 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

Cedo espaccedilo para registrar que a cidadania fiscal deve configurar um estado de relaccedilatildeo juriacutedica em que todos suportem a concretizaccedilatildeo de um Estado em que todos tenham a qualidade de destinataacuterio do dever fundashymentaI de pagar impostos na medida da respectiva capacidade contributiva poreacutem que seja um Estado fiscal suportaacutevel isto eacute um estado cujo sistema fiscal se encontre balizado por estritos limites juriacutedico-constitucionais9

A Administraccedilatildeo Tributaacuteria por melhor que seja a sua estrutura e os seus propoacutesitos natildeo estaacute emocionalmente preparada para conceber e aplicar os princiacutepios que sustentam a cidadania fiscal Isso ocorre primeiramente porshyque o Fisco tem por missatildeo exclusiva exercer a funccedilatildeo de arrecadar tributos Eacute a sua meta essencial por ser atribuiccedilatildeo que na organizaccedilatildeo administrativa estatal estaacute obrigado a desempenhar Natildeo lhe cabe administrar o tributo arreshycadado limitando-se unicamente a envidar esforccedilos para o cumprimento das metas impostas para imprimir aumento na arrecadaccedilatildeo tributaacuteria O sucesso da Administraccedilatildeo Tributaacuteria eacute medido pelo maior volume de recursos fiscais atraiacutedos para os cofres do Governo nunca pelo respeito que exerccedila para com os direitos fundamentais do contribuinte Eacute uma questatildeo de cultura adminisshytrativa de distribuiccedilatildeo de funccedilotildees no sistema estatal impossiacutevel de ser mudashydo por sugestotildees doutrinaacuterias

Por outro lado a fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo consegue afastar as pressotildees exercidas sobre ela por determinados segmentos da organizaccedilatildeo estatal que defendem uma atuaccedilatildeo mais agressiva para a cobranccedila dos tributos tudo em decorrecircncia dos efeitos produzidos pela conduta iliacutecita marcante da sonegashyccedilatildeo fiscal

Esses fatores contribuem para que a fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo tenha condiccedilotildees de modo imparcial sem isenccedilatildeo avaliar a necessidade objetiva da quebra do sigilo bancaacuterio do cidadatildeo Por melhor que seja o seu desempenho nunca ganharaacute a confianccedila do contribuinte

A atribuiccedilatildeo da quebra do sigilo bancaacuterio em um regime democraacutetico onde predomina o respeito maior aos direitos fundamentais da cidadania deve ser exercido pelo Poder Judiciaacuterio natildeo soacute porque seus membros atualmente revestidos da garantia da vitaliciedade inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos bem como porque estatildeo revestidos de independecircncia absoluta em relaccedilatildeo ao Poder interessado na cobranccedila do tributo e consequumlentemenshyte no resultado a ser obtido pela accedilatildeo fiscal

Esse sistema misto onde o Fisco faz a solicitaccedilatildeo motivada para a queshybra do sigilo bancaacuterio ao Poder Judiciaacuterio e este apoacutes analisaacute-lo com objetivishydade e cautela defere ou indefere impotildee seguranccedila e confiabilidade na atuashyccedilatildeo fiscal e sublima o respeito agrave dignidade do contribuinte em outras palavras da cidadania fiscal isto eacute de uma cidadania de liberdade que o Estado fiscal

9 Joseacute Casalta Nabais (Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra) no artigo Algumas Reflexotildees sobre o Actual Estado Fiscal no site httpagugovbr

ENSAIOS JURiacuteDICOS 257

pressupotildee para natildeo ser postergada impotildee um sistema fiscal balizado por esshytritos limites juriacutedico-constitucionais Limites esses que integram a chamada constituiccedilatildeo fiscal e que podemos reconduzir para natildeo nos alongarmos nesse aspecto a duas ideacuteias uma ideacuteia de seguranccedila que tem o seu tradicional e principal suporte no princiacutepio da lega1idade fiscal e uma ideacuteia de justiccedila ou equumlidade que tem a ver com a medida dos impostos e assenta no princiacutepio da capacidade contributiva 10

Em conclusatildeo a adoccedilatildeo de um sistema para a quebra do sigilo bancaacuteshyrio em que o Poder Judiciaacuterio seja o aacuterbitro dos pedidos da Administraccedilatildeo Puacuteblica natildeo eacute somente mais justo mas consegue impor maior credibilidade agrave atuaccedilatildeo fiscal e presta homenagem com intensa potencialidade aos princiacuteshypios democraacuteticos consistentes na guarda da seguranccedila juriacutedica do respeito aos direitos fundamentais do cidadatildeo nesse rol incluidos os agrave privacidade e agrave intimidade Aleacutem disso torna mais respeitaacutevel a relaccedilatildeo entre Fisco e contrishybuinte justificando portanto a opccedilatildeo do Estado pelo regime democraacutetico

8 Autoridade fiscal e faculdade incondicionada de quebrar o sigilo bancaacuterio

Essa indagaccedilatildeo consubstancia a preocupaccedilatildeo de serem estabelecidos controles para a atuaccedilatildeo do agente puacuteblico fiscal Centra-se a preocupaccedilatildeo em imprimir nas relaccedilotildees juriacutedicas tributaacuterias de quaisquer espeacutecies o primashydo da legalidade aprimorando-se o atuar vinculado

Natildeo concilia-se com os postulados da democracia a adoccedilatildeo de um sisteshyma de fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria que outorgue faculdade incondicionada ao fiscal tributaacuterio de invadir a intimidade e a privacidade das pessoas sob o falso argushymento juriacutedico de que busca encontrar provas de sonegaccedilatildeo fiscal

Depreende-se do exposto que a autoridade fiscal natildeo deve ter faculdade incondicionada de quebrar o sigilo sempre que entender necessaacuterio Isso porshyque a praacutetica de atos administrativos por agentes puacuteblicos de modo incondicionado revela grave violaccedilatildeo ao princiacutepio da legalidade onde predoshymina a vontade da lei e natildeo o discricionarismo de quem o pratica

No trato do sigilo bancaacuterio o atuar incondicionado da fiscalizaccedilatildeo assushyme caracteriacutesticas de maior gravidade porque haacute violaccedilatildeo aos princiacutepios funshydamentais jaacute expostos e que satildeo prestigiados pela Carta Magna especialmenshyte por bater de frente de modo integral e absoluto com o direito agrave intimidade e agrave privacidade O atuar deve vincular-se rigidamente ao princiacutepio da legalidashyde especialmente aposta na Carta Magna sem a possibilidade de ser aberto qualquer canal para uso da conveniecircncia ou da oportunidade

Eacute de ser lembrada no trato do assunto a liccedilatildeo de Joseacute Casalta Nobais no trabalho jaacute citado no sentido de que Eacute certo que independentemente da

10 Idem p 15

=258=---___________________ SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTlCA

concepccedilatildeo a que se adira relativamente ao segredo bancaacuterio natildeo temos a menor duacutevida de que o acesso da Administraccedilatildeo Fiscal agrave informaccedilatildeo bancaacuteria seja directo sem necessidade de preacutevia decisatildeo judicial seja indirecto depois portanto de preacutevia decisatildeo judicial haacute de ter sempre uma natureza claramenshyte excepcional Na verdade constitua o segredo bancaacuterio uma manifestaccedilatildeo do direito fundamental agrave reserva da intimidade da vida privada constante do art 26 n 2 da Constituiccedilatildeo portuguesa ou suporte um outro direito fundashymentai um direito agrave reserva da vida privada anaacutelogo agravequele a sua afectaccedilatildeo teraacute sempre caraacuteter excepcional

A autoridade fiscal natildeo possui a necessaacuteria isenccedilatildeo e competecircncia institucional para averiguar o grau dessa excepcionalidade de modo que posshysa impor confianccedila ao cidadatildeo investido na condiccedilatildeo de contribuinte poreacutem com direitos a serem assegurados por forccedila do regime democraacutetico adotado

O certo eacute que na relaccedilatildeo juriacutedico-tributaacuteria deve ser buscado o justo equiliacutebrio pregado pelo Estado de Direito onde o cidadatildeo deve ter a sua dignishydade respeitada sem contudo afastar-se a necessidade do Estado arrecadar tributos de forma cogente e imperativa bem como de serem permitidas conshydiccedilotildees de atuaccedilatildeo que resultem no combate agrave sonegaccedilatildeo fiscal

9 Responsabilidade da autoridade administrativa que quebrar o sigilo banshycaacuterio de forma inconsistente e indevida

Eacute inerente ao regime democraacutetico que a autoridade administrativa puacuteblishyca estaacute obrigada a exercer as suas atribuiccedilotildees com rigorosa obediecircncia aos princiacutepios da legalidade moralidade publicidade impessoalidade e eficiecircncia entre outros

A Carta Magna consagra expressamente no art 37 a obediecircncia do agente puacuteblico a esse tipo de comportamento

A autoridade administrativia que quebrar de modo inconsistente e indevido o sigilo bancaacuterio do cidadatildeo pratica ato com capacidade de provocar os seguintes efeitos a) de invadir o direito agrave privacidade e agrave intimidade de algueacutem b) de provocar-lhe danos morais e materiais dependendo da repershycussatildeo provocada pelo seu atuar

Constatada a efetivaccedilatildeo real de danos morais e materiais a responsabishylidade do Estado pode ser acionada conforme permite o art 37 sect 6ordm da Consshytituiccedilatildeo Federal Solidificada a culpa ou dolo do agente puacuteblico e consagrada a materializaccedilatildeo do iliacutecito praticado com o consequumlente ressarcimento patrimonial o Estado deveraacute usando o direito de regresso investir contra o agente que agiu culposa ou dolosamente

Natildeo resume-se apenas ao campo da responsabilidade civil a atuaccedilatildeo da autoridade quando ilegalmente quebra o sigilo bancaacuterio de qualquer cidadatildeo

ENSAIOS JURiacuteDICOS 259

o art 10 da Lei Complementar n 105 de 10 de janeiro de 2001 determishyna que A quebra de sigilo fora das hipoacuteteses autorizadas nesta lei compleshymentar constitui crime e sujeita os responsaacuteveis agrave pena de reclusatildeo de um a quatro anos e multa aplicando-se no que couber o Coacutedigo Penal sem prejuiacuteshyzo de outras sanccedilotildees cabiacuteveis A seguir no seu paraacutegrafo uacutenico explicita que Incorre nas mesmas penas quem omitir retardar injustificadamente ou presshytar falsamente as informaccedilotildees requeridas nos termos desta lei complementar

O art 11 da mesma lei complementar expressa que O servidor puacuteblico que utilizar ou viabilizar a utilizaccedilatildeo de qualquer informaccedilatildeo obtida em decorshyrecircncia da quebra de sigilo de que trata esta lei complementar responde pessoshyal e diretamente pelos danos decorrentes sem prejuiacutezo da responsabilidade objetiva da entidade puacuteblica quando comprovado que o servidor agiu de acorshydo com a orientaccedilatildeo oficial

10 O sigilo bancaacuterio e o tratamento que lhe eacute dado por oacutergatildeos internacioshynais como a OCDE e outros

Rui Celso Reali Fragoso Presidente do Instituto dos Advogados de Satildeo Paulo em artigo intitulado O Sigilo Bancaacuterio veiculado pela Internet (http Ii wwwjuscombr) registra que atualmente temos trecircs sistemas legais no munshydo cuidando do sigilo bancaacuterio O primeiro eacute o anglo-saxatildeo em que o sigilo natildeo encontra amparo legal o segundo eacute o dos paiacuteses da Europa continental - eu o contemplo em vaacuterios diplomas legais o terceiro eacute o da Suiacuteccedila e do Liacutebano que o reforccedilam

Analisando esses trecircs sistemas o autor citado observa

Haacute aparente contradiccedilatildeo no sistema inglecircs e norte-americano pois se de um lado nestes paiacuteses se eleva a garantia das liberdades individuais de outro se despreza o sigilo bancaacuterio Eacute que se ocorre conshyflito entre a apuraccedilatildeo de fatos (fator social) e a privacidade das pessoas (fator individual) prevalece a primeira Mais ainda o relacionamento de clientes e bancos longe de estabelececirc-lo serve como fonte de informashyccedilatildeo em favor de terceiros a indiscriccedilatildeo injustificada poreacutem eacute objeto de sanccedilatildeo E na Inglaterra os poderes puacuteblicos natildeo intervecircm no funcionashymento dos estabelecimentos privados de creacutedito o que debilita a invesshytigaccedilatildeo

Nos paiacuteses da Europa continental a legislaccedilatildeo contempla o sigilo bancaacuterio como consequumlecircncia do profissional e comporta derrogaccedilotildees na esfera penal e em alguns casos na civil mas comina sanccedilotildees crimishynais no caso de violaccedilatildeo ao sigilo (Coacutedigo Penal francecircs artigo 378 Coacuteshydigo Penal italiano art 622)

260 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

A sistemaacutetica fortalecida eacute aquela utilizada na Suiacuteccedila decorrente da crise ocorrida em 1931 com o fechamento do Banco de Genebra que ensejou a ediccedilatildeo de lei estabelecendo severas puniccedilotildees de natureza civil e criminal Tanto a legislaccedilatildeo suiacuteccedila como a libanesa esta surgida em 1956 permitem derrogaccedilotildees em certas hipoacuteteses A existecircncia das conshytas numeradas comprova a importacircncia do sigilo nestes paiacuteses

Eacute certo natildeo ser absoluto o segredo nem sua quebra em determishynadas situaccedilotildees significa abuso de poder Aliaacutes nenhum direito eacute absoluto

A doutrina tem ultimamente tomado conhecimento sobre as transforshymaccedilotildees que tem passado em vaacuterios ordenamentos juriacutedicos a questatildeo do sigilo bancaacuterio

Zenobio Simotildees de Melo advogado no Paranaacute em artigo sob o tiacutetulo Quebra do Sigilo Bancaacuterio (Internet httpjuscombr) informa que o jornal O Estado de Satildeo Paulo de 21 de junho de 2000 publicou a notiacutecia seguinte

Numa das mais importantes decisotildees adotadas durante o Conseshylho Europeu que marca o fim da presidecircncia portuguesa da Uniatildeo Euroshypeacuteia (UE) seus 15 paiacuteses aprovaram ontem o pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal No ponto mais polecircmico o pacote deveraacute acabar com o sigilo bancaacuterio ateacute 2010 foi uma negociaccedilatildeo de 12 anos Aacuteustria e Luxemburgo natildeo aceitavam o princiacutepio de acabar com o sigilo bancaacuterio A justificativa austriacuteaca eacute que este eacute um princiacutepio que faz parte da Consshytituiccedilatildeo do paiacutes haacute 200 anos Para aceitar o acordo o paiacutes exigiu a manushytenccedilatildeo do sigilo nos bancos austriacuteacos para quem resida no paiacutes

Registro a iacutentegra da notiacutecia

Pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal eacute aprovado por membros da UE Decisatildeo prevecirc quebra do sigilo bancaacuterio nos paiacuteses do bloco econocircmico

Jair Rattner

Especial para o Estado

Santa Maria da Feira Portugal- Numa das mais importantes decishysotildees adotadas durante o Conselho Europeu que marca o fim da presishydecircncia portuguesa da Uniatildeo Europeacuteia (UE) seus 15 paiacuteses aprovaram ontem o pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal No ponto mais polecircmico o pashycote deveraacute acabar com o sigilo bancaacuterio ateacute 2010

Foi uma negociaccedilatildeo de 12 anos Agora temos um documento que vai estabelecer os princiacutepios e as orientaccedilotildees para as futuras diretivas nessa aacuterea afirmou o Primeiro-Ministro Portuguecircs Antonio Guterres que ocupa a presidecircncia rotativa da UE (no fim do mecircs ela seraacute transferida para a Franccedila)

ENSAIOS JURiacuteDICOS 261

o acordo abrange trecircs aacutereas um coacutedigo de conduta que prevecirc o desmantelamento dos 66 paraiacutesos fiscais existentes ou dependentes da UE a tributaccedilatildeo de royalties e o pagamento de impostos sobre rendishymentos das poupanccedilas de cidadatildeos europeus residentes em outros paiacuteshyses dentre os 15 que fazem parte do bloco econocircmico europeu

O grande problema eram as poupanccedilas Aacuteustria e Luxemburgo natildeo aceitavam o princiacutepio de acabar com o sigilo bancaacuterio A justificativa austriacuteaca eacute que este eacute um princiacutepio que faz parte da Constituiccedilatildeo do paiacutes haacute 200 anos Para aceitar o acordo o paiacutes exigiu a manutenccedilatildeo do sigilo nos bancos austriacuteacos para quem resida no paiacutes Essa questatildeo natildeo eacute importante soacute para a Europa porque abre caminho para a criaccedilatildeo de mecanismos de transparecircncia global no mundo financeiro que satildeo esshysenciais para a globalizaccedilatildeo da economia avaliou Guterres

O prazo para a introduccedilatildeo das mudanccedilas vai ateacute o fim de 2010 Ateacute o fim deste ano as negociaccedilotildees vatildeo ser sobre a definiccedilatildeo do conteuacutedo das diretivas (as normas da UE)

Em 2002 a UE discutiraacute com outros paiacuteses esses conteuacutedos para fazer acordos que deveratildeo ser aprovados ateacute o fim do ano por unanimishydade

A partir de 2003 seraacute iniciado um periacuteodo de sete anos de transishyccedilatildeo para a troca de informaccedilotildees sobre os investimentos de cidadatildeos de outros paiacuteses europeus Nesse periacuteodo alguns paiacuteses poderatildeo optar por cobrar impostos de 20 a 25 sobre os rendimentos dos investimentos de residentes no exterior

No capiacutetulo onde foi analisado o sigilo bancaacuterio no Direito Comparado haacute registros tambeacutem a respeito do tratamento que oacutergatildeos internacionais como o OCDEll e outros vecircm dando ao sigilo bancaacuterio conforme estudo que foi apresentado pelo autor ali citado

II OCDE (Organizaccedilatildeo de Cooperaccedilatildeo e Desenvolvimento Econocircmico) criado em 1961 para substituir a OECE (Comitecirc Fiscal da Organizaccedilatildeo Europeacuteia de Cooperaccedilatildeo Econocircmica) Um dos documentos mais importantes da OCDE eacute o resultante da sua Convenccedilatildeo-Modelo relashytiva a impostos sobre a renda e o capital Essa Convenccedilatildeo estaacute sistematizada em sete capiacutetulos assim explicitados por Alberto Xavier em sua obra Direito Tributaacuterio Internacioshynal do Brasil A Convenccedilatildeo-Modelo da OCDE (tal como a das Naccedilocirces Unidas) encontra-se sistematizada em sete capiacutetulos Os capiacutetulos I e I regulam os requisitos para a aplicaccedilatildeo do tratado O capiacutetulo [JI - de longe o mais importante - conteacutem as regras de distribuiccedilatildeo de competecircncia no que concerne aos impostos sobre o rendimento classificado este por tipos ou classes agrave semelhanccedila do que sucede nos sistemas de tributaccedilatildeo cedular O capiacutetulo IV ocupa-se das regras de distribuiccedilatildeo de competecircncia no que respeita aos impostos sobre o capital O capiacutetulo V determina as consequumlecircncias das regras dos capiacutetulos 111 e IV facultanshydo aos Estados a escolha entre os meacutetodos da isenccedilatildeo e da imputaccedilatildeo O capiacutetulo VI conteacutem disposiccedilotildees adicionais sobre natildeo-discriminaccedilatildeo procedimento amigaacutevel troca de informaccedilotildees e privileacutegios de funcionaacuterios diplomaacuteticos e consulares e regras sobre extenshysatildeo do tratado a partes do territoacuterio Enfim o capiacutetulo VII conteacutem disposiccedilotildees finais sobre entrada em vigor e cessaccedilatildeo do acordo

262 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

Heleno Torres em sua recente obra Direito Tributaacuterio Internacional -Planejamento Tributaacuterio e Operaccedilotildees Transnacionais RT p 147 analisando o posicionamento da OCDE referente agrave poliacutetica de determinados paiacuteses que adoshytam tributaccedilatildeo favorecida e os efeitos dos regimes fiscais prejudiciais registra que

A OCDE resolveu entrar na luta para minorar as praacuteticas fiscalshymente danosas insistindo sobre a necessidade de aumentar as trocas de informaccedilotildees entre os Estados aleacutem de redigir uma lista de paiacuteses com tributaccedilatildeo favorecida e fazer algumas recomendaccedilotildees em acircmbito nacional e convencional a partir do seu importante relatoacuterio Harmful tax competition na emerging global issue

Mesmo reconhecendo os aspectos positivos do ambiente global vigente no qual os sistemas tributaacuterios operam os paiacuteses-membros da OCDE concluiacuteram que eles precisavam agir para restringir a competiccedilatildeo tributaacuteria danosa coletivamente e individualmente opondo-se agrave expanshysatildeo de regimes de impostos preferenciais danosos particularmente nos setores financeiros e atividades de serviccedilo que podem causar distorccedilotildees no comeacutercio e desniacuteveis nos padrotildees de investimento sendo uma ameashyccedila para os sistemas tributaacuterios domeacutesticos e para a estrutura global de tributaccedilatildeo internacional

Mais adiante pp 152153 Heleno Torres afirma que

Entre as recomendaccedilotildees definidas nesse relatoacuterio com aplicashyccedilatildeo dirigida aos paiacuteses-membros da instituiccedilatildeo as mais importantes satildeo as seguintes

bull para contrastar a competiccedilatildeo fiscal prejudicial os paiacuteses devem revisar as suas leis regulamentos e praacuteticas sobre sigilo bancaacuterio para remover empecilhos de acesso a tais informaccedilotildees por autoridades fiscais

bull intensificar o uso de trocas de informaccedilotildees principalmente soshybre as transaccedilotildees com paiacuteses de tributaccedilatildeo favorecida

A conclusatildeo que pode ser firmada apoacutes anaacutelise dos pronunciamentos internacionais acima explicitados eacute a construccedilatildeo de uma corrente que defenshyde uma maior abertura para a quebra do sigilo bancaacuterio quando for necessaacuteshyrio para apurar iliacutecitos tributaacuterios

Essa portanto eacute a resposta que apresento para a indagaccedilatildeo Qual o tratamento proposto por oacutergatildeos internacionais como o OCDE e outros com relaccedilatildeo ao sigilo bancaacuterio

ENSAIOS JURiacuteDICOS 263

11 Compatibilizaccedilatildeo do combate agrave criminalidade internacional com o resshypeito agrave seguranccedila juriacutedica a fim de evitar a fuga de investimentos do Paiacutes

Haacute de se reconhecer natildeo ser faacutecil desenvolver-se um sistema juriacutedico que contenha regras que facilitem o combate agrave criminalidade internacional e ao mesmo tempo prestigie os direitos fundamentais do cidadatildeo especialmenshyte a sua seguranccedila juriacutedica

As convenccedilotildees internacionais conforme demonstrado estatildeo preocupashydas com esses aspectos sem deixar de lado os fenocircmenos causados pela globalizaccedilatildeo

Natildeo deve ser esquecido que o tema envolve aspectos diversos a comeshyccedilar pelos determinantes da soberania dos Estados das forccedilas em expansatildeo das organizaccedilotildees internacionais e da pregaccedilatildeo para que os direitos fundamenshytaIacutes do cidadatildeo sejam respeitados com maior Iacutentensidade

A soluccedilatildeo a meu pensar pode ser encontrada no fortalecimento do Direito Comunitaacuterio Os Estados por via de organismos internacionais firmashyriam tratados para a adoccedilatildeo de um Coacutedigo Processual Penal Internacional com efeitos vinculantes por parte das naccedilotildees onde seriam adotadas regras investigatoacuterias e apuratoacuterias dos iliacutecitos internacionais alargando os conceitos de indiacutecios e presunccedilotildees sem deixar contudo de prestigiar a afetividade dos direitos e garantias fundamentais do cidadatildeo

Todas as naccedilotildees no iniacutecio deste seacuteculo envidam esforccedilos para diminuir a crise da seguranccedila juriacutedica Satildeo vaacuterios os fatores determinantes todos tendo como causa comum o crescimento da delinquumlecircncia em decorrecircncia de poliacutetishycas econocircmicas e sociais adotadas por determinados governos que contrishybuem para aumentar o percentual de pessoas pobres

A preocupaccedilatildeo atual para o combate ao crime internacional eacute alcanccedilar niacutevel de uniformizaccedilatildeo dos sistemas adotados para a quebra do sigilo bancaacuteshyrio De iniacutecio deve ser defendida a postura de que nenhuma lesatildeo ou ameaccedila a direito deve ser excluiacuteda da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio Nessa perspectishyva ganha suma importacircncia a criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional em virshytude de pela sua atuaccedilatildeo natildeo perdurar a diversidade de sistemas legais a respeito do assunto a saber a) O anglo-saxatildeo onde o sigilo natildeo encontra amparo legal b) o dos paiacuteses da Europa continental que o contempla em vaacuterios diplomas escritos e c) o da Suiacuteccedila e do Liacutebano que o reforccedilam l2bull

A criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional envolve uma reconceiacutetuaccedilatildeo de soberania

Sobre o tema Celso D de Albuquerque Mello em Direito Internacional da Integraccedilatildeo Ed Renovar p 13 faz a seguinte observaccedilatildeo

12 Conforme anota Rui Celso Reali Fragoso no artigo O Sigilo Bancaacuterio publicado no site httpvvwwjuscombr

264 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Poder-se-ia fazer um pequeno reparo a Chaumont que a indeshypendecircncia nacional eacute um conceito juridicamente indeterminado e que ela pode ter diferentes graus Tanto que podemos escrever soberania versus cooperaccedilatildeo internacional apesar de reconhecermos que esta posiccedilatildeo pode ser considerada como radical vez que natildeo haacute uma total incompatibilidade entre as duas Entretanto natildeo se pode deixar de consshytatar que de certo modo a cooperaccedilatildeo internacional se encontra conshysagrada na Carta da ONU no arl 1 ordm que trata dos Propoacutesitos das Naccedilotildees Unidas e nos Princiacutepios estabelecidos na Carta da OEA (Capiacutetulo 11) O mesmo ocorre na resoluccedilatildeo da Assembleacuteia Geral da ONU de 1970 que aprova a Declaraccedilatildeo Relativa aos Princiacutepios do Direito Internacional Reshylativas agraves Relaccedilotildees Amigaacuteveis e agrave Cooperaccedilatildeo entre os Estados conforme a Carta das Naccedilotildees Unidas bem como na Carta de Direitos e Deveres Econocircmicos aprovada pela mesma Assembleacuteia Geral em 1974

O crescimento do crime internacional em decorrecircncia dos fenocircmenos globalizantes determina o surgimento de um dever juriacutedico dos Estados firmashyrem pactos de cooperaccedilatildeo entre si para que enfrentem as organizaccedilotildees voltashydas para a criminalidade Esse dever juriacutedico globalizado tem suas raiacutezes no moral intemacional que conforme assinala Celso Albuquerque Mello na obra citada p 13 sempre consagrou o princiacutepio da solidariedade ou ainda do auxiacutelio muacutetuo

Eacute o mais importante desafio neste iniacutecio de seacuteculo fazer com que surja uma legislaccedilatildeo internacional que compatibilize o combate agrave criminalidade inshyternacional sem violar a seguranccedila juriacutedica com finalidade exclusiva de evitar a fuga de investimenos do Paiacutes

Tenha-se contudo em consideraccedilatildeo que a globalizaccedilatildeo do crime emshybora seja uma grande ameaccedila aos valores tradicionais que sustentam a cidashydania especialmente a seguranccedila juriacutedica natildeo deve prejudicar o desenvolvishymento econocircmico de qualquer naccedilatildeo

Natildeo faccedilo coro ao assinalado por Eric Hobsbawm em sua obra Era dos Extremos O Breve Seacuteculo XX 1914-1991 1995 p 24 Companhia das Letras S Paulo traduccedilatildeo de Marcos Santarrita no sentido de que Talvez a caracteriacutesshytica mais impressionante do fim do seacuteculo XX seja a tensatildeo entre esse processo de globalizaccedilatildeo cada vez mais acelerado e a incapacidade conjunta das instishytuiccedilotildees puacuteblicas e do comportamento coletivo dos seres humanos de se acoshymodarem a ele

Penso que natildeo haacute essa acomodaccedilatildeo e que as instituiccedilotildees puacuteblicas espeshycialmente as submetidas ao controle da ciecircncia juriacutedica natildeo estatildeo incapacitashydas de encontrar caminhos que solucionem o problema existente

ENSAIOS JURiacuteDICOS 265

Eacute por demais positivo entre outros acontecimentos o fato da conscienshytizaccedilatildeo de que haacute de ser encontrada uma forma de combate agrave criminalidade internacional que natildeo afaste a garantia da seguranccedila juriacutedica Esta eacute uma neshycessidade para impor paz agrave naccedilatildeo e consequumlentemente criar ambiente para que novos investimentos necessaacuterios ao desenvolvimento do seu processo econocircmico aconteccedilam sem se falar na manutenccedilatildeo dos jaacute existentes

O Parlamento Europeu aprovou ultimamente uma resoluccedilatildeo sobre a criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional sob a consideraccedilatildeo de que eacute necessaacuteshyrio criaacute-lo de forma permanente para complementar os sistemas judiciais nashycionais e pocircr fim agrave impunidade de que gozam os responsaacuteveis por genociacutedio crimes contra a humanidade e crimes de guerra

A abertura para essa posiccedilatildeo denota a formaccedilatildeo de uma consciecircncia internacional para combater a criminalidade internacional em todos os niacuteveis contribuindo para fortalecer a seguranccedila juriacutedica interna de cada paiacutes

O documento representativo dessa resoluccedilatildeo eacute do teor seguinte

Parlamento Europeo

Resolucioacuten sobre el Tribunal Penal Internacional

EI Parlamento Europeo

Vistas sus anteriores resoluciones sobre un Tribunal Penal Interna-cional

A Considerando que es necesario crear un Tribunal Penallnternashycional permanente que complemente los sistemasjudiciales nacionales y ponga fin a la impunidad de que gozan los responsables de genocidio crimenes contra la humanidad y criacutemenes de guerra

B Considerando que la Comisioacuten de Derechos Humanos de las Naciones Unidas estaacute respaldando decididamente la creacioacuten de ese Trishybunal

C Considerando que la fase preparatoria de la creacioacuten dei Tribushynal Penal Internacional finalizoacute con la uacuteltima sesioacuten dei Comiteacute Preparatorio de las Naciones Unidas que tuvo lugar dei 16 de marzo al3 de abril de 1998

D Felicitaacutendose por la creciente participacioacuten de Estados en el proceso de negociaciones y esperando que un nuacutemero auacuten mayor de Esshytados procedentes de todas las regiones se encuentre plenamente represhysentado en la Conferencia Diplomaacutetica de Roma

E Considerando que dei 15 de junio al17 de julio de 1998 se celebra en Roma la Conferencia Diplomaacutetica de Plenipotenciarios para la constitucioacuten de un Tribunal Penal Internacional

266 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

F Considerando que los Estados miembros y la delegacioacuten de la Comisioacuten Europea que participan en la Conferencia Diplomaacutetica de Roma pueden desempenar un papel crucial a la hora de garantizar el eacutexito de la conclusioacuten de esta Conferencia Diplomaacutetica y acogiendo positivamente la mayor convergenciacutea de las posturas de los Estados miembros de la UE

G Congratulaacutendose por la oferta dei Gobierno de los Paiacuteses Bajos de servir de sede dei Tribunal Penal Internacional permanente

I Insta a la Conferencia Diplomaacutetica de Roma a aprovechar la oportunidad histoacuterica de concluir un texto de Estatuto para un Tribunal Penal Internacional independiente justo y eficaz

2 Insta a los representantes de los Estados miembros dei Consejo y de la Comisioacuten a garantizar activamente el ecircxito de los resultados a sashyber un auteacutentico Tribunal Penal Internacional en lugar de limitarse a un acuerdo de compromiso sobre principios esenciales en sus esfuerzos por conciliar las posturas de Estados reticentes

3 Destaca que para constituir un complemento eficaz de los sisteshymas judiciacuteales nacionales el Estatuto dei Tribunal Penal Internacional permanente objeto de la Conferencia de Roma deberaacute establecer

a un Fiscal independiente con competencias para investigare insshytruir sumarios por propia iniciativa en situaciones en las que se hayan cometido los delitos sometidos a lajurisdiccioacuten dei Tribunal

b Ia jurisdiccioacuten inherente y universal dei Tribunal en materia de genocidio criacutemenes contra la humanidad criacutemenes de guerra y agresioacuten sin que se requiera ninguacuten consentimiento dei Estado

c una buena relacioacuten de trabajo con los Tribunales lnternacionales ya establecidos en La Haya

d una relacioacuten constructiva con las Naciones Unidas yen partishycular con el Consejo de Seguridad basada en el pleno reconocimiento de sus respectivas funciones y competencias

e Ia obligacioacuten de los Estados firmantes de acatar y hacer cumplir sin demora las oacuterdenes y decisiones dei Tribunal

f los mayores niveles de respeto de los derechos de los acusados y de los sospechosos y de proteccioacuten de los intereses de las viacutectimas y de los testigos

g Ia garantiacutea de una financiacioacuten a largo plazo necesaria para asegurar la autonomiacutea e independencia dei Tribunal frente a cualquier presioacuten exterior

4 Destaca ademaacutes que la jurisdiccioacuten deI Tribunal sobre los delishytos de genociacutedio los criacutemenes contra la humanidad y los criacutemenes de

ENSAIOS JURiacuteDICOS 267

guerra deben considerarse con la misma calificacioacuten penal con indepenshydencia de que se hayan cometido en conflictos armados internacionales o en conflictos internos

5 Insta ai Consejo y a los Estados miembros a garantizar la universalidad y la transparencia de las negociaciones y la participacioacuten continuada de la comunidadjuriacutedica y la sociedad civil internacionales

6 Encarga a su Presidente que transmita la presente resolucioacuten ai Consejo a la Comisioacuten a los Gobiernos de los Estados miembros ai Secreshytario General de las Naciones Unidas ai Presidente de la Asamblea Geneshyral de las Naciones Unidas y ai Presidente de la Conferencia Diplomaacutetica de las Naciones Unidas para la constitucioacuten de un Tribunal Penal Internashycional

A resoluccedilatildeo supracitada demonstra que cresce a conscientizaccedilatildeo da necessidade de ser criado um Tribunal Penal Internacional com forccedila cogente obrigatoacuteria de suas decisotildees no acircmbito interno dos paiacuteses que participarem do pacto de sua constituiccedilatildeo

A doutrina internacional revela que a comunidade internacional somenshyte agora vem se preocupando em criar uma estructura internacional para determinar las responsabilidades individuales emergentes de violacioacuten de ciertos derechos baacutesicos dei ser humano Los mecanismos de responsabilidad estatal creados desde los 60 se dirigen a la mayor protecciotilden dei ser humano y la erradicacioacuten de las praacutecticas de volacioacuten sistemaacutetica de los derechos humanos ar via de la condena ai Estado que ordena o que tolera los abusos por lo cual se estructuraron entorno ai Estado conmo sujeto responsable Como haacute seflalado la Corte Internacional de Derechos Humanos el procedimiento ante ella no es un procedimiento penal lo que se busca determinar es el nivel de cumprimiento por parte de un Estado de sus obligaciones de derecho internacional Sin desconocer la importancia de determinar la responsabilidad dei Estado para que eacuteste tenga un incentivo para erradicar esas praacutectica de sus frotneras es pertinente detacar que las violaciones maacutes grave son en uacuteltima instancia coshymetidas por individuos (Francisco Cox Encarregado dei TPI HOH em artigo intitulado EI IlOH ante la Craciotilden de um Tribunal Penal Internacional no site httpwwwiidhedcrcpitpintrohtml)

A criaccedilatildeo de um Tribunal Penal Internacional atuaria permanentemente e teria competecircncia subsidiaacuteria em relaccedilatildeo agrave outorgada aos Tribunais Nacioshynais limitando-se a atuar apenas nos crimes internacionais previamente defishynidos como sendo do interesse da comunidade global

Merece registro no acircmbito do assunto tratado que na Conferecircncia Reshygional sobre o Tribunal Penal Internacional realizada em 18 e 19 de fevereiro de 1998 na cidade de Guatemala Guatemala um dos temas tratados foi o relativo

268 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

agrave harmonizaccedilatildeo das incriminaccedilotildees quando os seguintes aspectos foram disshycutidos Branqueamento corrupccedilatildeo fraude fiscal participaccedilatildeo em associashyccedilotildees criminosas um olhar agrave luz dos direitos nacionais e do direito internacioshynal Perspectivas Quais os comportamentos a incriminar Criar uma nova incriminaccedilatildeo da fraude fiscal Uma tentativa de harmonizaccedilatildeo o corpus jurls contendo disposiccedilotildees penais para proteccedilatildeo dos interesses financeiros da Uniatildeo Europeacuteia As negociaccedilotildees no seio do Conselho da Europa e da OCDE referenshytes agrave luta contra a corrupccedilatildeo etc O referido painel foi presidido por Benoit Dejemeppe procurador do Rei em Bruxelas e contou com a presenccedila de Tereshyza Beleza professora de Direito Penal na Faculdade de Direito de Lisboa como moderadora

Haacute como visto um largo campo de anaacutelise para desenvolver com possishybilidade do surgimento de sugestotildees que levem a ciecircncia juriacutedica a alcanccedilar com a atuaccedilatildeo estatal uma competecircncia internacional que possa combater o crime internacional e ao mesmo tempo proporcione seguranccedila juriacutedica na ordem interna ganhando assim o sistema juriacutedico confianccedila dos investidoshyres

Em conclusatildeo a forma de compatibilizar o combate agrave criminalidade internacional sem violar a seguranccedila juriacutedica necessaacuteria a evitar a fuga de inshyvestimentos do paiacutes estaacute na criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional com comshypetecircncia definida para processar e julgar delitos globalizantes e cujas decisotildees tenham forccedila imperativa no acircmbito interno das naccedilotildees participantes do pacto para o seu nascimento

Page 6: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro

228 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

determinante da aprovaccedilatildeo do Decreto-Lei n 21978 o regime portuguecircs gizado nessa altura comeccedilou por ser ainda mais hermeacutetico do que o proacuteprio regime vigente na Suiacuteccedila na medida em que o dever de cooperaccedilatildeo com as autoridashydes judiciaacuterias cessa inclusivamente nas mateacuterias sujeitas a segredo bancaacuterio segundo o entendimento generalizado dos Tribunais e doutrina3bull Paradoxalshymente a disciplina juriacutedica natildeo encontrou de iniacutecio reflexo na materialidade dos factos tendo-se assistido a muacuteltiplos e impunes violaccedilotildees ao segredo banshycaacuterio

Arnoldo Wald analisando o sigilo bancaacuterio no ordenamento juriacutedico de Portugal registra O Coacutedigo Civil portuguecircs no seu art 80 dispotildee que Todos devem guardar reserva quanto agrave intimidade da vida privada de outrem A exshytensatildeo da reserva seraacute definida conforme a natureza do caso e as condiccedilotildees das pessoas O art 33 da Constituiccedilatildeo portuguesa de 1976 estabelece que 1 A todos eacute reconhecido o direito agrave identidade pessoal ao bom nome e reputashyccedilatildeo e agrave reserva da intimidade da vida privada e familiar 2 A lei estabeleceraacute garantias efectivas contra a utilizaccedilatildeo abusiva ou contraacuteria agrave dignidade humashyna de informaccedilotildees relativas agraves pessoas e famiacutelias

Tanto no acircmbito constitucional quanto na legislaccedilatildeo civil eacute garantido o direito agrave privacidade e agrave vida iacutentima que fundamentam o sigilo bancaacuterio Jaacute o Decreto-Lei n 2 de 911978 prevecirc expressamente o dever de segredo dos titulares dos oacutergatildeos dos bancos e aos seus trabalhadores4

b) Alemanha

Carlos Alberto Hagstron em artigo intitulado O Sigilo Bancaacuterio e o Poshyder Puacuteblico publicado na Revista de Direito Mercantil n 79 p 37 registra que Na Alemanha natildeo haacute regra especiacutefica nem definiccedilatildeo legal para o segredo bancaacuterio mas sua existecircncia eacute observada reconhecida pejo Direito Privado e pelo Direito Puacuteblico admitida em diversas leis aceita pela doutrina e pela jurisshyprudecircncia sofrendo contudo limitaccedilotildees decorrentes de interesses de orshydem puacuteblica e social quando pode haver a quebra do sigilo conforme aliaacutes lembra Seacutergio Carlos Covello na sua obra O Sigilo Bancaacuterio Leud 1991 p 34

3 A respeito desse aspecto o de cessar o dever de colaboraccedilatildeo com as autoridades judiciaacuterias quando envolver mateacuterias sujeitas a segredo bancaacuterio a autora ao fazer essa afirmaccedilatildeo assinala em nota de rodapeacute as seguintes obras que refletem igual entendimento Alberto Luiacutez O Segredo Bancaacuterio em Portugal in Revista da Ordem dos Advogados ano 41 Q (1981) pp 451 e segs Anselmo da Costa Freitas O Sigilo Bancaacuterio In Boletim da Ordem dos Advogados n 19 (outubro de 1983) pp 4 e segs Maria Eduarda Azevedo O Segredo Bancaacuterio In Ciecircncia e Teacutecnica Fiscal n 346348 (outubrodezembro de 1987) pp 73 e segs Joseacute Antoacutenio Pereira da Silva Regime Juriacutedico do Sigilo Bancaacuterio maio de 1988 (trabalho natildeo publicado) Jorge Patriacutecio Paul O Sigilo Bancaacuterio - sua Extensatildeo e Limites no Direito Portuguecircs In Revista da Banca n 12 (outubrodezembro) 1989 pp 71 e segs

4 Em artigo publicado sob o tiacutetulo Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais publicado na Revista dos Tribunais n 22 Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas p 24

ENSAIOS JURiacuteDICOS 229

A lei bancaacuteria alematilde de 1971961 em seu art 92 determina que haacute obrishygaccedilatildeo de ser preservado o direito agrave privacidade para aqueles que exercem uma funccedilatildeo federal de vigilatildencia por seus colaboradores e pelos controlashydores dos depoacutesitos (Arnoldo Wald em artigo Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais publicado na Revista dos Tribunais n 22 RT Cadernos de Direishyto Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas jan-marccedilo de 1998 p 24)

O citado autor esclarece ainda que na Alemanha a fonte do sigilo banshycaacuterio estaacute no direito agrave personalidade

c) Itaacutelia Franccedila Suiacuteccedila

Luiz Fernando de Bellinetli em artigo denominado Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio (Revista de Direito do Consumidor RT n 18 abril-junho de 1996 pp 141161) ao analisar o sigilo bancaacuterio no Direito Comparado comenshyta o tratamento que lhe eacute dado pela Alemanha Itaacutelia Franccedila Suiacuteccedila e Portugal

Em face de nos itens acima jaacute ter sido enfocado o tema na Alemanha e em Portugal destacaremos apenas do trabalho do autor as observaccedilotildees feishytas sobre o sigilo bancaacuterio nos ordenamentos juriacutedicos da Itaacutelia Franccedila e Suiacuteccedila

A respeito transcrevo o que escreveu o autor

412 ltaacutelia5

Assim como na Alemanha na Itaacutelia tambeacutem natildeo haacute norma especiacuteshyfica disciplinando o sigilo bancaacuterio embora seja ele reconhecido pela doutrina e pela jurisprudecircncia utilizando-se dispositivos variados do sisshytema para supeditaacute-lo

No entanto tambeacutem na Itaacutelia natildeo eacute ele absoluto cedendo ante interesse de ordem puacuteblica nos casos previstos em lei

Como afirma Giacomo Molle Lobbligo della banca ai segreto non e senza Umt ed essendo esse come si e delto dretto aIa tutela dei cliente e quindi di un interesse privato non vi sono limiti ad esso da parte dei legislatore Prescindendo daiacute casi nei quali la rivelzione sai imposta dala legge un dovere di comunicazione puoacute sorgere nei contrant della autoritaacute

5 Arnoldo Wald no artigo jaacute referido (Sigilo Bancaacuterio e Direitos Fundamentais Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas - 22 p 24) assinala que Na Itaacutelia o sigilo bancaacuterio decorre da garantia dos direitos agrave liberdade individual que permite a exclusatildeo do conhecimento por parte de terceiros de tudo que se refere agrave proacutepria pessoa a denominada riservalezza Este entendimento decorre da norma constitucional que institui a inviolabilidade dos direitos da personalidade e da Convenccedilatildeo Europeacuteia dos Direitos do Homem de 1950 que garante a toda pessoa o direito ao respeito de sua vida privada e familiar de seu domiciacutelio e de sua correspondecircncia O segredo nas movimentaccedilotildees financeiras no entendimento doutrinaacuterio italiano visa proteger aleacutem dos interesses do cliente o desenvolvimento da atividade bancaacuteria como algo inerente agrave estrutura e funccedilatildeo creditiacutecia

~o SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

giudiziaria dei fisco e di terzi (La Banca NellOrdinamento Giuridico itashyliano Milano - DoU A Giuffre Editore 1980 p 158)

413 Franccedila

Tambeacutem na Franccedila o sigilo bancaacuterio eacute protegido pelo ordenamenshyto juriacutedico embora inexistente uma norma especiacutefica fundando-se a proteccedilatildeo num conjunto de regras de ordem penal civil e comercial

Da mesma forma admite-se a quebra do sigilo em face de interesshyses de ordem puacuteblica6 bull

414 Suiacuteccedila

Paiacutes onde os bancos e a sua alardeada discriccedilatildeo satildeo instituiccedilotildees nacionais haacute previsatildeo legal especiacutefica para a proteccedilatildeo do sigilo

No entanto tambeacutem laacute o segredo natildeo eacute como alguns supotildeem absoluto

Conforme aduz Hagstrom Natildeo pode ser invocado em geral peshyrante a Justiccedila Penal Na Justiccedila Civil o Juiz tem poder discricionaacuterio para decidir sobre a mateacuteria havendo algumas variaccedilotildees de conformidade com as legislaccedilotildees cantonais Em procedimentos de taxaccedilatildeo e recursos o segredo eacute preservado perante o Fisco eacute afastado contudo no proceshydimento contencioso (penal fiscal) Algumas outras exceccedilotildees ao dever de segredo satildeo contempladas expressamente em textos legais

Quanto ao Direito suiacuteccedilo acrescente-se que Arnoldo Wald no artigo jaacute tado observa que a justificativa para o sigilo bancaacuterio estaacute no direito da rsonalidade A Lei de 1934 prevecirc pena de multa ou de prisatildeo para o funcioshyliacuterio da instituiccedilatildeo que violar o segredo bancaacuterio mesmo que inexista dano ara aquele que viu reveladas informaccedilotildees sobre sua vida financeira

A seguir Arnoldo Wald compara o Direito da Suiacuteccedila com o do Liacutebano lrmando A Suiacuteccedila assim como o Liacutebano para a maior seguranccedila e reforccedilo a preservaccedilatildeo do sigilo bancaacuterio utiliza a conta numerada ficando descoshyhecido o nome do cliente A legislaccedilatildeo libanesa prevecirc quatro hipoacuteteses de errogaccedilatildeo do sigilo a) o consentimento do cliente seus herdeiros ou legataacuteshyos b) no litiacutegio entre o cliente e o banco c) na falecircncia e d) no enriquecimenshy) iliacutecito

d) Inglaterra e EEUU

O sigilo bancaacuterio no Direito inglecircs e no sistema norte-americano mereshyeu de Arnoldo Wald no trabalho jaacute citado pp 24 e 25 a anaacutelise que transcrevo

o autor citado manda no particular conferir Carlos Alberto Hagstrom artigo O Sigilo Bancaacuterio e o Poder Puacuteblico RDM n 79 p 38 bem como Seacutergio Covello em O Sigilo Bancaacuterio Leud 1991 pp 2627

ENSAIOS JURiacuteDICOS 231

No Direito inglecircs natildeo haacute nenhuma norma escrita que estabelece sanccedilatildeo agrave violaccedilatildeo ao segredo bancaacuterio mas qualquer pessoa que queira trabalhar em uma instituiccedilatildeo financeira deve assinar um formulaacuterio esshypecial pelo qual se compromete a manter sigilo sobre as movimentaccedilotildees bancaacuterias O dever de segredo na atuaccedilatildeo do banco eacute interpretado rigoshyrosamente pelos tribunais ingleses

No sistema juriacutedico norte-americano depois de discrepacircncias nas legislaccedilotildees estaduais e apoacutes a lei federal que restringiu o acircmbito da obrishygatoriedade do sigilo bancaacuterio foi aprovada a Right to Financiai Privacy Act que dispotildee que a prestaccedilatildeo de informaccedilotildees por parte da instituiccedilatildeo financeira somente pode ser dada em processos administrativos ou judishyciais quando os dados forem relevantes para solucionar o litiacutegio Com essa lei a quebra do sigilo bancaacuterio ganhou um caraacuteter excepcional somente podendo ocorrer desde que respeitado o devido processo leshygal Assim o Direito americano buscou conciliar a defesa ao direito de privacidade o atendimento aos interesses puacuteblicos quanto agraves informashyccedilotildees financeiras e a existecircncia do contraditoacuterio

e) Reacutegis de Oliveira quando Deputado Federal em parecer apresentashydo agrave Comissatildeo de Constituiccedilatildeo e Justiccedila da Cacircmara dos Deputados com refeshyrecircncia a Projeto de Emenda Constitucional apresentado pelo Exmo Sr Presishydente da Repuacuteblica objetivando alterar o sect 1 ordm do art 145 da CF observou que o sigilo bancaacuterio no Direito Comparado eacute posto da forma seguinte

13 Direito Comparado Na Alemanha natildeo haacute regra especiacutefica nem definiccedilatildeo legal para o segredo bancaacuterio mas sua existecircncia eacute recoshynhecida bem como aceita pela doutrina e jurisprudecircncia Decorre de direito costumeiro somente podendo ser quebrado por expressa disposhysiccedilatildeo legal (J Barmann Le Secret Bancaire en Allemagne Feacutedeacuterale in Rapport pp 15 e segs) Na Beacutelgica haacute proibiccedilatildeo somente sendo viaacutevel a derrogaccedilatildeo do segredo pela Justiccedila Penal e pelo Fisco que somente tem acesso agraves informaccedilotildees bancaacuterias diante do processo pendente (Herion Le Secret Bancaire en Belfique in Rapport pp 5175) Na Itaacutelia os doshycumentos somente podem ser examinados pelos Juiacutezes Natildeo haacute acesso por parte das autoridades administrativas (idem p 129) Na Holanda da mesma forma o sigilo apenas cede ante ordem da autoridade judicial ou penal (Muller idem pp 99117) Na Franccedila a violaccedilatildeo ao segredo ocorre ante oacutergatildeos do Poder Puacuteblico que alegam interesses superiores aos dos particulares natildeo se admitindo a quebra diante de normas administratishyvas (Gavalda Stouflet idem pp 7797)

f) Voltando a analisar o sigilo bancaacuterio em Portugal pode-se afirmar que o sistema apresentava-se rigoroso e nacirco aceitava a quebra como se vecirc de

232 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

decisatildeo do Supremo Tribunal de Justiccedila em Scientia Juriacutedica tomo XXIv n 166168 de 1980 (Parecer publicado na Revista de Direito Mercantil n 99 pp 98 e segs)

Com o sentido de demonstrar como o sigilo bancaacuterio eacute tratado no ordeshynamento juriacutedico de Portugal cito na iacutentegra um acoacuterdatildeo da Secccedilatildeo Criminal do Tribunal de Relaccedilatildeo de Eacutevora cujo texto colhi da internet (httpwwwtrept jurisp321-96html)

Processo n 321]996

Acoacuterdatildeo

Acordam na Secccedilatildeo Criminal do Tribunal da Relaccedilatildeo de Eacutevora

1 No Tribunal Judicial da Comarca de Portimatildeo correm termos uns autos de inqueacuterito registados sob o n 35711994 que tiveram orishygem numa queixa apresentada por middotM Lda contra a sociedade E Lda nos quais se procede agrave investigaccedilatildeo de factos susceptiacuteveis de inteshygrar a praacutetica de um crime de emissatildeo de cheque sem provisatildeo

Estaacute em causa o cheque nO 3681861637 sacado sobre a Caixa Geral de Depoacutesitos emitido em 1 ordm de julho de 1994 no valor de 820661$00

No decurso do inqueacuterito o Ministeacuterio Puacuteblico solicitou agravequela insshytituiccedilatildeo bancaacuteria o fornecimento de determinada documentaccedilatildeo banshycaacuteria o que esta se negou fazer alegando que a revelaccedilatildeo da pretendida documentaccedilatildeo contende com o disposto na legislaccedilatildeo sobre segredo bancaacuterio

A requerimento do Digno Magistrado do Ministeacuterio Puacuteblico o MM Juiz de Instruccedilatildeo suscitou a intervenccedilatildeo deste Tribunal da Relaccedilatildeo a fim de dispensar os serviccedilos da Caixa Geral de Depoacutesitos do segredo bancaacuteshyrio quanto agrave documentaccedilatildeo bancaacuteria solicitada a saber coacutepia da ficha de assinaturas e extracto da conta da Agecircncia de S com o n sobre a qual foi sacado o cheque em causa respeitante aos meses de maio junho e julho de 1994

Nesta relaccedilatildeo o Exmo Procurador da Repuacuteblica emitiu douto pareshycer no sentido de a referida instituiccedilatildeo bancaacuteria ser dispensada do cumshyprimento do dever do segredo bancaacuterio em ordem agrave prestaccedilatildeo dos eleshymentos pretendidos para a efectivaccedilatildeo do inqueacuterito

Colhidos os vistos legais cumpre agora decidir

2 A Caixa Geral de Depoacutesitos atraveacutes do ofiacutecio fotocopiado agrave fi 5 dos autos recusou-se a fornecer os documentos pedidos pelo Ministeacuteshyrio Puacuteblico para instruccedilatildeo de um processo de inqueacuterito com fundamento no sigilo bancaacuterio

ENSAIOS JURiacuteDICOS 233

Compreendendo o inqueacuterito o conjunto de diligecircncias que visam investigar a existecircncia de um crime determinar os seus agentes e a resshyponsabilidade deles e descobrir e recolher as provas em ordem agrave decishysatildeo sobre a acusaccedilatildeo (cf art 262 n 1 do Coacutedigo de Processo Pena0 a consulta dos pretendidos documentos - extracto da conta e ficha de assinaturas - eacute sem margem para duacutevidas de grande importacircncia para a instruccedilatildeo do processo e recolha de indiacutecios probatoacuterios tendentes agrave eventual deduccedilatildeo de acusaccedilatildeo pois sem ela desde logo muito dificilshymente se poderaacute concluir pela identificaccedilatildeo da pessoa que assinou o cheque

O dever de sigilo bancaacuterio traduz uma obrigaccedilatildeo de facto negativo (de ROR facere) e encontra-se disciplinado no Decreto-Lei n 2981992 de 31 de dezembro que aprovou o Regime Geral das Instituiccedilotildees de Creacutedito e Sociedades Financeiras O art 78 de tal diploma consagrando o dever de segredo profissional dispotildee no seu n 1 que os membros dos orgatildeos de administraccedilatildeo ou de fiscalizaccedilatildeo das instituiccedilotildees de creacutedito os seus empregados mandataacuterios comitidos e outras pessoas que lhes prestem serviccedilos a tiacutetulo permanente ou ocasional natildeo podem revelar ou utilizar informaccedilotildees sobre factos ou elementos respeitantes agrave vida da instituiccedilatildeo ou agraves relaccedilotildees desta com os seus clientes cujo conhecimento lhes advenha exclusivamente do exerciacutecio das suas funccedilotildees ou da presshytaccedilatildeo dos seus serviccedilos explicitando-se no seu n 2 que estatildeo designadamente sujeitos a segredo os nomes dos clientes as contas de depoacutesito e seus movimentos e outras operaccedilotildees bancaacuterias

O dever de segredo profissional natildeo eacute poreacutem um dever absoluto isto eacute natildeo prevalece sempre sobre qualquer outro dever que com ele entre em conflito Sofre com efeito as excepccedilotildees previstas no art 79 do mesmo Decreto-Lei n 2981992 onde se estabelece aleacutem do mais que os factos e elementos cobertos pelo dever de segredo podem ser revelashydos nos termos previstos na lei penal e de processo penal - cf aliacutenea d don2

No art 84 do mesmo diploma legal prescreve-se que a violaccedilatildeo ao dever de segredo eacute puniacutevel nos termos do Coacutedigo Penal e efectivamente o Coacutedigo Penal vigente - revisto pelo Decreto-Lei n 481995 de 15 de marccedilo - prevecirc e pune como crimes quer a violaccedilatildeo a segredo profissioshynal quer o seu aproveitamento indevido - cf arts ] 95 e 196

Ao contraacuterio da versatildeo do Coacutedigo Penal anterior agrave referida revisatildeo - em que se estatuiacutea no art 185 que a violaccedilatildeo ao segredo profissional natildeo seria puniacutevel se ocorresse no cumprimento de um dever juriacutedico sensivelmente superior ou visasse a um interesse puacuteblico ou privado legiacutetimo quando considerados os interesses em conflito e os deveres

234 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

de informaccedilatildeo que segundo as circunstacircncias se impotildeem ao agente se pudesse considerar meio adequado para alcanccedilar aquele fim - natildeo conteacutem o Coacutedigo Penal actuaJ relativamente ao crime de violaccedilatildeo ao segredo profissional qualquer causa especiacutefica de exclusatildeo da ilicitude pelo que haacute que atentar nas causas gerais de exclusatildeo da ilicitude

Ao abordar o conflito de deveres dispotildee o art 36 n 1 do Coacutedigo Penal que natildeo eacute iliacutecito o facto de quem em caso de conflito no cumprishymento de deveres juriacutedicos ou de ordens legiacutetimas da autoridade satisfishyzer dever ou ordem de valor igualou superior ao do dever ou ordem que sacrificar Natildeo seraacute pois iliacutecita a violaccedilatildeo ao segredo profissional se perante um conflito de deveres o agente satisfizer o dever de valor igual ou superior ao do dever que sacrifica

No Coacutedigo de Processo Penal generalizou-se a possibilidade de quebra do segredo profissional

Assim as pessoas indicadas no n 1 do sobredito art 78 podem recusar-se a depor sobre factos objecto de segredo profissional mas se a autoridade judiciaacuteria concluindo embora pela legitimidade da recusa natildeo prescindir desse depoimento pode requerer ao tribunal que o ordeshyne E o tribunal deveraacute ordenar a prestaccedilatildeo do depoimento com quebra do segredo profissional sempre que entender que esta se mostra justificada face agraves normas e princiacutepios aplicaacuteveis da lei penal nomeadashymente ao princiacutepio da prevalecircncia do interesse preponderante - cf art 135 n 12 e 3 do Coacutedigo de Processo Penal

A possibilidade de apreensatildeo pela autoridade judiciaacuteria de tiacutetulos valores quantias ou outros objectos depositados em bancos ou outras instituiccedilotildees de creacutedito relacionados com um crime e que possam ser de grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova bem como a possibilidade de exame pelo juiz de correspondecircncia e documenshytaccedilatildeo bancaacuterias estatildeo previstas no art 181 n 1 e 2 do Coacutedigo de Processhyso Penal As pessoas obrigadas ao dever de segredo profissional podem recusar apresentar aqueles documentos ou objectos em seu poder se invocarem por escrito segredo profissional caso em que o conflito de interesses e deveres assim surgido seraacute dirimido pelo tribunal nos tershymos idecircnticos aos previstos para a recusa de depoimento - cf arts 182 n 2 e 135 ambos do citado coacutedigo

Enquanto o dever de segredo profissional eacute geralmente estabeleshycido a favor da integridade e liberdade das pessoas a quem aproveita tendo-se inserido a sua regulamentaccedilatildeo no Tiacutetulo VI do atraacutes mencionashydo Regime Geral das Instituiccedilotildees de Creacutedito e Sociedades Financeiras no qual se prevecirc um conjunto de regras de conduta que devem guiar a actuaccedilatildeo das instituiccedilotildees de creacutedito seus administradores e empregados

ENSAIOS JURiacuteDICOS 235

nas relaccedilotildees com os clientes visando proteger de forma eficaz a posishyccedilatildeo do consumidor de serviccedilos financeiros (cf preacircmbulo do Decreshyto-Lei n 2981992) ou estabelecer um clima de confianccedila na banca que permita a captaccedilatildeo e recuperaccedilatildeo do dinheiro entesourado (como se dizia no relatoacuterio do Decreto-Lei n 21978 de 9 de janeiro revogado pelo n 1 do art 5Q do citado Decreto-Lei n 2981992) no processo de inqueacuteshyrito a que procede o Ministeacuterio Puacuteblico estaacute em causa a realizaccedilatildeo de diligecircncias de prova que permitam investigar um crime de emissatildeo de cheque sem provisatildeo sob a eacutegide do princiacutepio da verdade material e incriminar o respectivo agente

O interesse que estaacute em jogo com a pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblishyco na obtenccedilatildeo da documentaccedilatildeo bancaacuteria eacute o da boa administraccedilatildeo da Justiccedila Penal e esse interesse eacute no caso em apreccedilo sensivelmente supeshyrior ao interesse da manutenccedilatildeo do segredo bancaacuterio o que equivale a di~er que este deve ceder perante aquele

Em suma no caso concreto ponderados os interesses em conflishyto entendemos que a quebra do dever de sigilo bancaacuterio se justifica nos termos do art 36 do Coacutedigo Penal pelo que deve ser dada procedecircncia agrave pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico e consequumlentemente ao abrigo do disposto nos arts 182 n 2 e 135 n 2 e 3 ambos do Coacutedigo de Processo Penal dispensar-se a Caixa Geral de Depoacutesitos do cumprimento do deshyver de sigilo bancaacuterio a fim de poder satisfazer tal pretensatildeo

3 Por todo o exposto determina-se que com quebra do dever de sigilo bancaacuterio a Caixa Geral de Depoacutesitos forneccedila ao Digno Magistrado do Ministeacuterio Puacuteblico com destino ao Processo de Inqueacuterito n 3571 1994 a documentaccedilatildeo bancaacuteria que este lhe havia solicitado

Natildeo eacute devida taxa de justiccedila

Texto processado e integralmente revisto pelo relator

Desembargador-Relator Rui Mauriacutecio

g) Substancioso estudo do sigilo bancaacuterio no Direito Comparado foi feishyto por Andreacute Serratildeo Borges de Sampaio Consultor da Uniatildeo nas informashyccedilotildees que prestou ao Advogado-Geral da Uniatildeo com referecircncia agrave ADIn n 2397 Transcrevo o inteiro teor do seu pronunciamento

51

6 O tratamento do sigilo bancaacuterio no Direito Comparado

Em verdade o Direito Comparado entende inoponiacutevel o sigilo banshycaacuterio agraves autoridades tributaacuterias Com efeito leciona Alfredo Echeverriacutea Herrera verbis

236 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

EI sigilo bancario constituye un reacutegimen limitado exclusivashymente ai aacutembito de las relaciones entre la institucioacuten bancaria y sus clientes e impone la obligacioacuten de confidencialidad de la institucioacuten sobre las informaciones que aqueacutellos le proporcionan

En todas las legislaciones bancarias el sigilo es relativo es decir el derecho dei ciudadano ai secreto y la correlativa obligacioacuten para el banco de no revelar a terceros las informaciones recibidas en el ejercicio de su actividad ceden cuando existe norma legal expresa o causa justificada

Elliacutemite legal ai sigilo estaacute constituiacutedo por la obligacioacuten dei banco de entregar informaciones y se fundamenta en motivos sushyperiores de orden puacuteblico o general siendo liacutecito entonces que el Estado establezca Iiacutemites legales ai secreto bancaria para auxiliar por ejemplo las actuaciones de la Justicia en el plano jurisdiccional y las dei Estado en el aacutembito dei ejercicio de su potestad impositiva

Es un principio irrebatible en la vida dei derecho que ni la autonomia de las personas ni los instrumentos dei aacuterea econoacutemica y financiera pueden servir en un momento dado como elementos juridicamente idoacuteneos para lesionar el intereacutes puacuteblico En consecuencia se puede afirmar que las limitaciones ai sigilo bancario son salvaguardias necesarias ai bien comuacuten en los caacutenones dei Estado moderno Estas limites deben ser materias reshyservadas a la ley por ser de caraacutecter excepcional en sentido estricto

En este orden de ideas necesariamente debe concluirse que existen legiacutetimos y superiores intereses en diversas aacutereas de la sociedad que se vinculan ai bien comuacuten y que deben ser tutelados por el Estado como lo es por ejemplo la necesidad de detectar y reprimir la evasioacuten de los impuestos los cuales transcienden ai evenshytual intereacutes geneacuterico que pueda tener el mismo Estado en la mantencioacuten dei sigilo bancaria En efecto desde el punto de vista de lajuridicidad y de la eacutetica no se puede sostener que el secreto bancaria pueda servir como instrumento para proteger la comisioacuten de actos

52

como el recieacuten mencionado que son constitutivos muchas veces de iliacutecitos penales bajo la forma de delitos tributarias o fraushydes fiscales con resultados ademaacutes de perjucio patrimonial ai Esshytado y dano ai intereacutes general de la sociedad

EI sistema bancaria frente a la existencia en la sociedad de un intereacutes general preponderante y superior estaacute naturalmente Ilamado a colaborar en la verificacioacuten y represioacuten de la evasioacuten tributaria

ENSAIOS JURiacuteDICOS 237

En este marco se inscribe la tendencia de la mayoda de las legislaciones modemas en cuanto a dotar aI Estado de facultades para intervenir en la actividad econoacutemica de los ciudadanos en procura de la correcta determinacioacuten de los tributos cuando se conshyfigura en el desarrollo de estas actividades un hecho gravado establecido en la ley

Ya la Constitucioacuten de Weimar en 919 proclamoacute que es liacutecito ai Estado intervenir para condicionar el ejercicio de los derechos a determinados fines sociales El bien comuacuten y la justicia social comenzaron desde entonces a servir de frontera a los derechos y Iibertades individuales

Cabe destacar que la OCDE (Organisation for Economic Cooperation and Development) en un documento elaborado en el ano 1999 sobre las praacutecticas de los paiacuteses en el acceso a la informacioacuten bancaria para fines tributarios advierte que se puede abusar de la confidencialidad para ocultar actividades iJegales y evadir impuestos y agrega en el resumen ejecutivo deI documento que ni la criminalizacioacuten dei fraude tributario ni el tratamiento de la evasioacuten de impuestos bajo las leyes tributarias de los paiacuteses miembros de la OCDE son homogeacuteneos pero que sin embargo los gobiernos de la mayoriacutea de los paiacuteses miembros de la OCDE han tomado la visi6n de que en este contexto las autoridades tributashyrias no deben ser tratadas como simples terceros sino que se les debe otorgar un acceso priviligiado a la informaci6n bancaria con fines tributarias

Se agrega en este estudio que una medida de esta naturaleza no pane en peligro la conlidencialidad de la inlormacioacuten bancaria puesto que las autoridades tributarias estaacuten sujetas a estrictos conshytroles sobre coacutemo utilizan la informacioacuten de los contribuyentes y todos los gobiemos han implementado regIas para proteger la conlidencialidad de la informaci6n tributaria (EI Sigilo Bancaacuterio Acesso a la Informadon Bancaria para Fines Tributarias)

Em verdade seu texto elenca 30 paiacuteses integrantes da OCDE (a saber Alemanha Austraacutelia Aacuteustria Beacutelgica Canadaacute Repuacuteblica Checa Dinamarca Finlacircndia Franccedila Greacutecia Hungria Islacircndia Irlanda Itaacutelia Japatildeo Coreacuteia Luxemburgo Meacutexico Paiacuteses Baixos Nova Zelacircndia Noshyruega Polocircnia Portugal Espanha Sueacutecia Turquia Suiacuteccedila Reino Unido Estados Unidos Repuacuteblica Eslovaca) dos quais em 1999 apenas trecircs (Portugal Repuacuteblica Eslovaca e Luxemburgo) natildeo facultavam o acesso por parte de autoridades tributaacuterias a informaccedilotildees relativas a pessoas suspeitas de fraude tributaacuteria

238 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

Desses trecircs paiacuteses hoje remanescem apenas dois Com efeito Portugal deixou de integrar esse grupo constrangedoramente minoritaacuterio ao aprovar em 29 de dezembro de 2000 a Lei n 30-G

Nesse diploma lecirc-se

Lei da Reforma de Tributaccedilatildeo do Rendimento

(Portugal)

Artigo 63 O - B

Acesso a informaccedilotildees e documentos bancaacuterios

1 A administraccedilatildeo tributaacuteria tem o poder de aceder directashymente aos documentos bancaacuterios nas situaccedilotildees de recusa da sua exibiccedilatildeo ou de autorizaccedilatildeo para a sua consulta

a) quando se trate de documentos de suporte de registos contabiliacutesticos dos sujeitos passivos de IRS e IRC que se enconshytrem sujeitos agrave contabilidade organizada

b) quando o contribuinte usufrua de benefiacutecios fiscais ou de regimes fiscais privilegiados havendo necessidade de controshylar os respectivos pressupostos e apenas para esse efeito

2 A administraccedilatildeo tributaacuteria tem o poder de aceder a todos os documentos bancaacuterios excepto as informaccedilotildees prestadas para justificar o recurso ao creacutedito nas situaccedilotildees de recusa de exibiccedilatildeo daqueles documentos ou de autorizaccedilatildeo para a sua consulta

a) quando se verificar a impossibilidade de comprovaccedilatildeo e quantificaccedilatildeo directa e exacta da mateacuteria tributaacutevel nos termos do artigo da Lei Geral Tributaacuteria e em geral quando estejam verifishycados os pressupostos para o recurso a uma avaliaccedilatildeo indirecta

b) quando os rendimentos declarados em sede de IRS se afastarem significativamente para menos sem razatildeo justificada dos padrotildees de rendimento que razoavelmente possam permitir as manifestaccedilotildees de riqueza evidenciadas pelo sujeito passivo nos termos do artigo 89-A da Lei Geral Tributaacuteria

c) quando existam indiacutecios da praacutetica de crime doloso em mateacuteria tributaacuteria designadamente nos casos de utilizaccedilatildeo de facturas falsas e em geral nas situaccedilotildees em que existam factos concretamente identificados gravemente indiciadores da falta de veracidade do declarado

d) quando seja necessaacuterio para fins fiscais comprovar a aplicaccedilatildeo de subsiacutedios puacuteblicos de qualquer natureza

ENSAIOS JUAlolCOS 239

3 As decisotildees da administraccedilatildeo tributaacuteria referidas nos nuacuteshymeros anteriores devem ser fundamentadas com expressa menshyccedilatildeo dos motivos concretos que as justificam pressupotildeem a audishyccedilatildeo preacutevia do contribuinte e satildeo da competecircncia do Director-Geshyral dos Impostos ou do Director-Geral das Alfacircndegas e dos Imshypostos Especiais sobre o consumo ou seus substitutos legais sem possibilidade de delegaccedilatildeo

4 Os actos praticados ao abrigo da competecircncia definida no nuacutemero anterior satildeo susceptiacuteveis de recurso judicial o qual teraacute efeito suspensivo nas situaccedilotildees previstas no n 2

5 Nos casos de deferimento do recurso previsto no nuacutemero anterior os elementos de prova entretanto obtidos natildeo podem ser utilizados para qualquer efeito em desfavor do contribuinte

6 As entidades que se encontrem numa relaccedilatildeo de domiacutenio com o contribuinte ficam sujeitas aos regimes de acesso agrave inforshymaccedilatildeo bancaacuteria referidos nos n 1 e 2

7 O acesso da administraccedilatildeo tributaacuteria a informaccedilatildeo banshycaacuteria relevante relativa a familiares ou terceiros que se encontrem numa relaccedilatildeo especial com o contribuinte depende de autorizashyccedilatildeo judicial expressa apoacutes audiccedilatildeo do visado obedecendo aos requisitos previstos no n 3

8 O regime previsto nos nuacutemeros anteriores natildeo prejudica a legislaccedilatildeo aplicaacutevel aos casos de investigaccedilatildeo por infracccedilatildeo peshynal e soacute pode ter por objecto operaccedilotildees e movimentos bancaacuterios realizados apoacutes a sua entrada em vigor sem prejuiacutezo do regime vigente para as situaccedilotildees anteriores

9 Os actos praticados ao abrigo da competecircncia prevista no n I devem ser objecto de comunicaccedilatildeo ao Defensor do Contrimiddot buinte

10 Para os efeitos desta lei considera-se documento bancaacuteshyrio qualquer documento ou registo independentemente do resshypectivo suporte em que se titulem comprovem ou registem opeshyraccedilotildees praticadas por instituiccedilotildees de creacutedito ou sociedades finanshyceiras no acircmbito da respectiva actividade incluindo os referentes a operaccedilotildees realizadas mediante utilizaccedilatildeo de cartotildees de creacutedito (coacutepia anexa)

Parece evidente destarte que todo o mundo civilizado abandonou a possibilidade de opor-se agrave Administraccedilatildeo Tributaacuteria o sigilo bancaacuterio

240 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

4 O sigilo bancaacuterio e o direito agrave intimidade e agrave privacidade das pessoas

A anaacutelise do sigilo bancaacuterio em face do direito agrave intimidade e agrave privacidashyde exige inicialmente que seja enfrentada a questatildeo referente ao seu conceito

Os doutrinadores natildeo tecircm assumido posiccedilatildeo uniforme quanto aos asshypectos conceituais dessa entidade juriacutedica

Seacutergio Carlos Covello autor da obra jaacute mencionada (O Sigilo Bancaacuterio Leud S Paulo 1991 p 69) entende que sigilo bancaacuterio eacute a obrigaccedilatildeo que tecircm os Bancos de natildeo revelar salvo justa causa as informaccedilotildees que venham a obter em virtude de sua atividade profissional

Luiz Fernando Bellinetti no artigo intitulado Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio (Revista do Direito do Consumidor Satildeo Paulo RT 1996 voI 18 p 144) defende posiccedilatildeo no sentido de que sigilo bancaacuterio eacute o dever juriacutedico que tecircm as instituiccedilotildees de creacutedito e as organizaccedilotildees auxiliares e seus empregados de natildeo revelar salvo justa causa as informaccedilotildees que venham a obter em virtushyde da atividade bancaacuteria a que se dedicam

Para Arnoldo Wald (in O Sigilo Bancaacuterio no Projeto de Lei Complemenshytar n 70 Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas n I pp 196209) o sigilo bancaacuterio se enquadra no conceito mais amplo do segredo profissional que tem merecido uma proteccedilatildeo mais ampla ensejando sua violaccedilatildeo caracterizaccedilatildeo como crime (art 154 do Coacutedigo PeshynaI)

Eivany A Silva tratando do tema em Consideraccedilotildees a Respeito do Sigilo de Dados (artigo publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio n 61 pp 41142 - Edit Dialeacutetica) afirma que o sigilo bancaacuterio eacute espeacutecie do gecircnero sigilo de dados constituindo um direito fundamental protegido constitucionalmente inserto que estaacute no rol dos direitos e garantias individuais ou seja em claacuteusushylas peacutetreas da Carta Magna natildeo podendo portanto ser modificado nem messhymo por emenda agrave Constituiccedilatildeo e portanto muito menos por legislaccedilatildeo de hierarquia inferior

Como examinado haacute divergecircncias na fixaccedilatildeo do conceito Essas divershygecircncias embora importantes para as posiccedilotildees doutrinaacuterias a serem assumishydas sobre o alcance do sigilo bancaacuterio natildeo geram contudo influecircncias de maior intensidade no relacionamento entre a instituiccedilatildeo financeira e os seus depositantes Isso porque o que merece ser considerado eacute a natureza juriacutedica do sigilo bancaacuterio isto eacute a que categoria de direito pertence e como por quem e quando a sua quebra pode ser determinada

Em face do exposto necessaacuterio eacute que se faccedila o alinhamento das teorias que procuram fundamentar o sigilo bancaacuterio

A doutrina em eacutepocas diversas examinou as seguintes teorias

ENSAIOS JURiacuteDICOS 241

Teoria contratualista O sigilo bancaacuterio de acordo com essa teoria deshycorre da relaccedilatildeo contratual que voluntariamente eacute formada entre o banco e o cliente por via da qual mesmo sem claacuteusula expressa a instituiccedilatildeo financeira assume a obrigaccedilatildeo de guardar segredo das movimentaccedilotildees de dinheiro que nela satildeo feitas Essa responsabilidade assumida pelo banco inspira-se segunshydo os adeptos da teoria em destaque nos usos nos costumes e na boa-feacute sempre aplicaacuteveis na intepretaccedilatildeo dos contratos comerciais7bull

Teoria do direito agrave privacidade Os adeptos dessa corrente afirmam que o sigilo bancaacuterio integra o campo do direito agrave privacidade que faz parte dos direitos da personalidade

Teoria consuetudinaacuteria Segundo os seguidores dessa linha de pensar o sigilo bancaacuterio decorre dos compromissos taacutecitos assumidos entre instituishyccedilotildees financeiras e seus clientes no sentido de natildeo serem levados ao conhecishymento de terceiros os valores transacionados O uso reiterado dessa praacutetica apoiada no elemento confianccedila passou a representar costume adotado nesse tipo de negoacutecio juriacutedico

Teoria da boa-feacute A adoccedilatildeo dessa teoria conduz o inteacuterprete a entender que o sigilo bancaacuterio por sua proacutepria natureza estaacute vinculado ao caraacuteter fiduciaacuterio da atividade bancaacuteria fundando-se portanto na boa-feacute ou dever de lisura que tanto marca o tipo de negoacutecio juriacutedico firmado

Teoria do sigilo profissional Essa teoria concebe o sigilo bancaacuterio como sendo uma espeacutecie do sigilo profissional Haacute portanto um dever eacutetico do banshyco em respeitar o sigilo bancaacuterio em decorrecircncia da profissatildeo exercida

Teoria do direito agrave intimidade dos bancos Os integrantes dessa forma de pensar sustentam que a instituiccedilatildeo financeira tem legiacutetimo interesse de afastar do conhecimento de terceiros a movimentaccedilatildeo financeira dos seus clientes e consequumlentemente dos fatos com elas relacionados

Teoria da complexidade do viacutenculo Essa teoria eacute explicada por Arnoldo Wald no trabalho jaacute citado da forma seguinte A doutrina moderna abandoshynou a noccedilatildeo da relaccedilatildeo juriacutedica contratual defendo a complexidade do viacutenshyculo Aleacutem dos direitos e das obrigaccedilotildees principais existem deveres secundaacuteshyrios para ambos os contratantes que decorrem da regra geral da boa-feacute denoshyminada na doutrina italiana de cOITeteza e na legislaccedilatildeo alematilde de Treu und Glauben Exige que a atuaccedilatildeo de uma parte natildeo cause danos agrave esfera juriacutedica da outra Dentro desta ideacuteia defende-se que o segredo bancaacuterio eacute um dever

7 Arnoldo Wald em Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais artigo publicado na Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas n 22 pp 1518 manifesta entendimento de que no campo normatIacutevo do Direito brasileiro esta teoria encontra respaldo nos arts 130 e 131 do Coacutedigo Comercial que prevecirc a interpretaccedilatildeo dos contratos segundo os usos os costumes e a boa-feacute

242 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

acessoacuterio na relaccedilatildeo juriacutedica Mesmo que natildeo nasccedila o contrato entre as partes a boa-feacute objetiva impede que a instituiccedilatildeo financeira prejudique os interesses do cidadatildeo

Estabelecidos os pressupostos doutrinaacuterios acima examinamos agora se o sigilo bancaacuterio diz respeito agrave intimidade e agrave privacidade das pessoas

A Constituiccedilatildeo Federal em seu artigo 5ordm incisos X e XII afirma

Art 5ordm Todos satildeo iguais perante a lei sem distinccedilatildeo de qualquer natureza garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Paiacutes a inviolabilidade do direito agrave vida agrave liberdade agrave igualdade agrave segushyranccedila e agrave propriedade nos termos seguintes

X - satildeo inviolaacuteveis a intimidade a vida privada a honra e a imagem das pessoas assegurado o direito agrave indenizaccedilatildeo pelo dano material ou moral decorrente de sua violaccedilatildeo

XJl - eacute inviolaacutevel o sigilo da correspondecircncia e das comunicaccedilotildees telegraacuteficas de dados e das comunicaccedilotildees telefocircnicas salvo no uacuteltimo caso por ordem judicial nas hipoacuteteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigaccedilatildeo criminal ou instruccedilatildeo processual penal

Essas garantias constitucionais protegem o cidadatildeo de qualquer investida de terceiros em sua intimidade em sua vida privada e no sigilo de seus dados

Na expressatildeo terceiros estaacute incluiacutedo o Estado e consequumlentemente seus agentes poliacuteticos e administrativos

A doutrina tem se manifestado de modo quase unacircnime no sentido de que o sigilo bancaacuterio eacute uma garantia constitucional que protege a privacidade das pessoas no campo econocircmico e financeiro A sua significaccedilatildeo eacute de natildeo tornar puacuteblica a movimentaccedilatildeo da conta bancaacuteria e das aplicaccedilotildees financeiras do cidadatildeo para que de nenhum modo os atos privados praticados possam ser tornados puacuteblicos

Esse posicionamento eacute o adotado pelos autores que passo a citar

Arnoldo Wald (O Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais artigo pushyblicado na Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas RT n 22 pp 1521)

O sigilo bancaacuterio eacute o meio para resguardar a privacidade no camshypo econocircmico pois veda a publicidade sobre a movimentaccedilatildeo da conta corrente bancaacuteria e das aplicaccedilotildees financeiras

ENSAIOS JURiacuteDICOS 243

Eivany A Silva (Consideraccedilotildees a Respeito do Sigilo de Dados artigo publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio n 61 Satildeo Paulo Editora Dialeacutetica p27)

A maioria dos ordenamentos juriacutedicos como o brasileiro tratam o sigilo bancaacuterio como direito fundamental do contribuinte agrave privacidashyde ou seja agrave resistecircncia agrave comunicaccedilatildeo de dados que representem desshydobramento da personalidade da pessoa direito agrave oposiccedilatildeo e agrave negaccedilatildeo de comunicaccedilatildeo

Ives Gandra da Silva Martins (Sigilo Bancaacuterio trabalho publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio S Paulo Editora Dialeacutetica n 1 pp 24 e 25)

Pelos incisos X e XII do artigo 5ordm tem o contribuinte o direito de preservaccedilatildeo de sua intimidade de sua privacidade e de que terceiros que detenham informaccedilotildees pessoais suas sejam obrigados a guardaacute-Ias

Natildeo pode pois a fiscalizaccedilatildeo exigir de terceiros informaccedilotildees que apenas pode obter do proacuteprio contribuinte

Em determinadas hipoacuteteses todavia o interesse puacuteblico haacute de preshyvalecer sobre o interesse individual mas caberaacute a um outro poder definir se tais hipoacuteteses efetivamente ocorrem com o que poderaacute o Poder Judishyciaacuterio autorizar se convencido estiver o magistrado de que a hipoacutetese eacute de gravidade e de lesatildeo ao interesse puacuteblico a quebra do direito ao sigilo bancaacuterio

Estou convencido ser esta a melhor conformaccedilatildeo juriacutedica da quesshytatildeo idealizada pelos constituintes defendida pela doutrina e consagrashyda na jurisprudecircncia corrente exegeacutetica esta a que me filio desde os meus primeiros escritos sobre a mateacuteria

Roberto Quiroga Mosquera (Tributaccedilatildeo no Mercado Financeiro e de Capitais obra publicada pela Editora Dialeacutetica Satildeo Paulo 1998 pp 70171)

Do exposto ateacute aqui eacute evidente que o direito ao sigilo bancaacuterio representa uma espeacutecie de direito agrave privacidade

Eacute incontroverso que os dados e informaccedilotildees de natureza bancaacuteria dizem respeito agrave intimidade e agrave vida privada dos cidadatildeos Dados que dizem respeito aos valores em dinheiro depositados em contas-correnshytes bancaacuterias tipos e caracteriacutesticas de aplicaccedilotildees financeiras ganhos e prejuiacutezos auferidos ou incorridos em operaccedilotildees bursaacuteteis etc satildeo sem sombra de duacutevida elementos particulares e pessoais de qualquer indiviacuteshyduo

244 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Utilizando outra voz informaccedilotildees que tocam no aspecto financeishyro do ser humano representam direito iacutentimo e personaliacutessimo devendo ser mantidas em sigilo por aqueles que eventualmente as detenham em razatildeo de sua atividade profissional Parece-nos que tal conclusatildeo eacute de uma clareza inconteste

Natildeo tem sido outra a posiccedilatildeo da doutrina mais abalizada do Paiacutes e da jurisprudecircncia dominante

o autor referido a seguir faz a observaccedilatildeo seguinte

Carlos Alberto Hagstrom (Sigilo Bancaacuterio Novas Questotildees Reshyvista de Direito Mercantil Satildeo Paulo Malheiros 1997 vaI 105 pp 4344) expotildee que apesar de existirem diversas teorias que procuram fundashymentar juridicamente o sigilo bancaacuterio modernamente a explicaccedilatildeo para o fundamento do referido instituto sofreu uma radical alteraccedilatildeo Divershysas constituiccedilotildees modernas esclarece o mencionado autor ampliaram e explicitaram o elenco de direitos e garantias individuais passando a garantir o direito agrave privacidade e agrave intimidade A Constituiccedilatildeo brasileira natildeo trilha caminho diferente Assegurou referidos direitos de forma exshypressa e sem restriccedilotildees O tema do sigilo bancaacuterio figura agora em niacutevel constitucional Tem status de norma superior no qual se reconhece o direito agrave intimidade como norma de caraacuteter geneacuterico em que estatildeo conshytemplados muacuteltiplos aspectos da vida privada em especial os de ordem econocircmico-financeira que compotildeem o que Hagstrom denominou a inshytimidade econocircmica ou intimidade patrimonial

Luiacutes Fernando 8ellinetti (Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio artigo publicado na Revista de Direito do Consumidor n 18 pp 141151)

Como jaacute dissemos anteriormente em certas hipoacuteteses o fundashymento para o segredo bancaacuterio seria a privacidade No entanto nesses casos o que se protege eacute a privacidade e natildeo propriamente o sigilo

Entendemos que uma coisa eacute garantir-se a privacidade da pessoa com fundamento em norma constitucional outra eacute garantir-se o segreshydo de informaccedilotildees bancaacuterias de uma pessoa com base na legislaccedilatildeo supramencionada

Sempre que a revelaccedilatildeo de informaccedilotildees bancaacuterias puder violar a privacidade da pessoa parece-nos que mais do que garantia ao sigilo bancaacuterio (com fundamento legal) tem a pessoa garantia agrave sua privacishydade (com fundamento constitucional)

ENSAIOS JURiacuteDICOS 245

No entanto se a revelaccedilatildeo da informaccedilatildeo natildeo invadir a esfera da intimidade da pessoa sua garantia eacute meramente legal do sigilo bancaacuterio

Carlos Maacuterio Velloso (citado por Misabel Derzi em Direito Tributaacuterio Aplicado obra publicada pela Editora Del Rey Belo Horizonte MO pp 278 e 279)

O sigilo bancaacuterio decorre do direito agrave privacidade inerente agrave pershysonalidade das pessoas consagrado na Constituiccedilatildeo Federal em seu art 5ordm X e protege tanto interesses privados como finalidades de ordem puacuteblica a saber o sistema de creacutedito O sigilo bancaacuterio natildeo eacute um princiacuteshypio absoluto

As exceccedilotildees ao sigilo bancaacuterio estatildeo previstas na Lei n 45951964 que continua em vigor

O Poder Judiciaacuterio pode requisitar relativamente a pessoas e instishytuiccedilotildees informaccedilotildees que implicam quebra de sigilo (Lei n 45951964 art 38 sect 1 ordm) entretanto mesmo havendo inqueacuterito policial instaurado deveraacute proceder com cautela prudecircncia e moderaccedilatildeo inerentes agrave mashygistratura

Luciana Fregodolli (O Direito agrave Intimidade - excerto da dissertaccedilatildeo que apresentou sob o tiacutetulo O Direito agrave Intimidade e a Prova Iliacutecita publicado pela Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Constitucional e Ciecircncia Poliacutetica -n 19 p 233)

O sigilo bancaacuterio protege interesses privados Eacute ele espeacutecie de direito agrave privacidade inerente agrave personalidade das pessoas e que a Consshytituiccedilatildeo Federal consagra no art 5ordm X aleacutem de atender a uma finalidade de ordem puacuteblica qual seja a de proteccedilatildeo ao sistema de creacutedito

O direito agrave privacidade abrange atualmente o de impedir que tershyceiros inclusive o Estado e o Fisco tenham acesso a informaccedilotildees sobre o que se denominou a aacuterea de manifestaccedilatildeo existencial do ser humano

Celso Ribeiro Bastos O pensamento de Celso Ribeiro Bastos foi exshyposto por Roberto Quiroga Mosquera na obra jaacute referida p 71 do modo seguinte

Celso Bastos eacute do mesmo pensar Apoacutes tecer consideraccedilotildees introdutoacuterias acerca do sigilo bancaacuterio e expor pensamentos de divershysos autores nacionais e alieniacutegenas conclui o constitucionalista brasileishyro no sentido de que todas as despesas ordinaacuterias feitas pelo cidadatildeo

246 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

comum em sua vida cotidiana devem ser consideradas parte de sua vida privada familiar ou domeacutestica e portanto protegidas contra interferecircnshycias a despeito de qualquer pretexto Desde as condutas mais corriqueishyras como as compras efetuadas em um supermercado para manutenshyccedilatildeo da famiacutelia quanto aquelas outras moralmente reprovaacuteveis como presentes ou joacuteias compradas e dadas a quem presta ao homem servishyccedilos de natureza extraconjugal tudo estaacute abarcado pelo manto da proteshyccedilatildeo agrave vida privada familiar ou domeacutestica ( ) E mais adiante arremata Hoje praticamente a vida do homem pode ser escrita a partir de seu talatildeo de cheques e nas sociedades mais avanccediladas pelos cartotildees de creacutedito e magneacuteticos Permitir-se que o sigilo bancaacuterio venha a ser romshypido por qualquer forma natildeo-extraordinaacuteria para salvaguarda de inteshyresse de porte no miacutenimo idecircntico eacute expor a seguranccedila individual a um constante e absurdo temor perante as possibilidades de controle direto ou pelo vazamento de alguma informaccedilatildeo

Haacute contudo corrente contraacuteria como passaremos a demonstrar

Andreacute Serratildeo Borges de Sampaio Consultor da Uniatildeo nas informashyccedilotildees prestadas ao Advogado-Geral da Uniatildeo sobre a ADIn n 2397 cita trechos de doutrina e jurisprudecircncia estrangeiras defendendo o entendimento de que o sigilo bancaacuterio natildeo tem conotaccedilatildeo de direito de privacidade Eis o que escreshyveu o parecerista citado

O jurista portuguecircs J L Saldanha Sanches coteja primorosashymente o sigilo bancaacuterio com a proteccedilatildeo da intimidade para concluir que natildeo haacute que se falar em direito ao sigilo bancaacuterio como concretizaccedilatildeo do direito agrave intimidade Nas suas palavras

Ora em que esfera podemos noacutes incluir o segredo bancaacuteshyrio enquanto instituto que concretiza certos valores do ordenashymento juriacutedico Como expressatildeo de interesses juridicamente tuteshylados

Seraacute o segredo bancaacuterio um prolongamento do direito agrave inshytimidade da esfera pessoal e familiar de uma qualquer pessoa sinshygular (uma vez que em relaccedilatildeo agraves pessoas coletivas a questatildeo natildeo pode mesmo ser colocada) Ou diraacute antes respeito aquela faixa mais larga que resguarda a privacidade de qualquer cidadatildeo e que soacute pode por isso sofrer qualquer intromissatildeo se surgirem razotildees vaacutelidas para que tal direito seja restringido

Ao afirmar-se que na perspectiva dos clientes dos bancos o segredo bancaacuterio eacute um direito com a reserva da sua vida privada temos uma primeira resposta para esta questatildeo

ENSAIOS JURiacuteDICOS 247

Mas falta distinguir entre intimidade e reserva da vida privashyda e entre clientes individuais e profissionais de um banco Natildeo estamos perante o mesmo tipo de tutela quando contamos que um particular espera que o banco natildeo divulgue a qualquer inteshyressado o volume da sua conta bancaacuteria (porque pura e simplesshymente quer manter sob reserva a sua vida particular) ou quando um comerciante confia no banco para que este natildeo revele quem satildeo os seus clientes fornecedores ou qual eacute o seu grau de endividamento

No caso da pessoa singular estaacute apenas em causa um conshyjunto de valores de natureza moral esta natildeo estaacute em princiacutepio preocupada com possiacuteveis prejuiacutezos econocircmicos ligados a qualshyquer divulgaccedilatildeo Apenas se opotildee por razotildees do seu foro pessoal e que natildeo carecem de fundamentaccedilatildeo que esta tenha lugar

Enquanto que o comerciante pode ser seriamente prejudishycado em termos concorrenciais com a revelaccedilatildeo da lista dos seus clientes ou com a sua situaccedilatildeo financeira

O dever de reserva que cabe ao banqueiro estaacute desta forma a serviccedilo do interesse comercial das empresas suas clientes - que pelo simples facto de o serem ou por necessitarem de obter creacutedishyto lhe datildeo informaccedilotildees com um forte valor comercial ou da pesshysoa singular que deseja manter a privacidade da sua situaccedilatildeo patrimonial

Ou em alternativa ao serviccedilo da manutenccedilatildeo da privacidashyde que qualquer um pode desejar ainda que a possiacutevel violaccedilatildeo desta apenas lhe possa acarretar danos natildeo-patrimoniais

E por isso o segredo bancaacuterio natildeo pode constituir a expresshysatildeo do imperativo constitucional da proteccedilatildeo da intimidade Ateacute porque o acesso a essa esfera estaacute vedado aos proacuteprios bancos

Natildeo nos parece aceitaacutevel que um banco como condiccedilatildeo para a concessatildeo de creacutedito a uma pessoa singular ou para estashybelecer com ela qualquer relaccedilatildeo contratual possa exigir desta informaccedilatildeo de tipo estritamente pessoal ou a sujeiccedilatildeo a exames meacutedicos que atingindo a sua esfera iacutentima afectam a sua dignidashyde Aqui estaacute em causa a ilicitude da pergunta por pressupor o acesso agrave esfera inviolaacutevel (e indisponiacutevel) da intimidade

A informaccedilatildeo que o banco pode obter para a defesa dos seus interesses legiacutetimos natildeo pode ir aleacutem da esfera patrimonial do seu cliente rendimentos bens possuiacutedos perspectivas profisshysionais

( )

248 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

Podemos pois concluir que o segredo bancaacuterio natildeo eacute natildeo pode ser uma concretizaccedilatildeo do princiacutepio constitucional do direishyto agrave intimidade

Este princiacutepio tem como funccedilatildeo consagrar uma zona de reshyselVa pessoal para factos opccedilotildees e circunstacircncias que soacute de forshyma indirecta e de todo secundaacuteria podem ter aspectos ou refleshyxos de natureza patrimonial (Saldanha Sanches J L Segredo Bancaacuterio e Tributaccedilatildeo do Lucro Real In Saldanha Sanches J L Estudos de Direito Contabiliacutestico e Fiscal Coimbra Coimbra Edishytora 2000 pp 105108)

Em diversos paiacuteses haacute a clara percepccedilatildeo que natildeo haacute que se conshyfundir direito agrave intimidade com sigilo bancaacuterio indicando que a quebra do sigilo pela Administraccedilatildeo Tributaacuteria natildeo constitui violaccedilatildeo ao direito Ao contraacuterio a existecircncia de um Estado Fiscal implica na necessidade de consagrar agrave administraccedilatildeo tributaacuteria tal faculdade o que se harmonishyza com diversos princiacutepios e outros direitos fundamentais constantes da Carta de 1988

O caso espanhol eacute exemplar neste sentido ao natildeo visualizar a vioshylaccedilatildeo ao direito agrave intimidade em relaccedilatildeo agrave quebra do sigilo bancaacuterio Portanto

el Tribunal Constitucional espaflOl se ha pronunciado por la negativa de que el conocimiento de las cuentas bancarias por la Administracioacuten pueda invadir el aacutembito constitucionalmente garantizado de la intimidad de los individuos porque tales extractos no constituyen per se uma biografiacutea personal en nuacutemeros y en siacute no tiene relevancia para la intimidad personal y familiar dei contribuyente ya que se trata de dados no secretos y confiados a una entidad (Campos Laura Rodriacuteguez Oerechos dei Contribuyente em la Repuacuteblica Argentina ai Amparo de la Convencioacuten Interamericana de Oerechos Humanos http wwwiefpaorgarcriteriosdigitalarticulosderechoshtm Visitado em 512001)

Ao analisar a jurisprudecircncia da Corte Constitucional espanhola quanto ao tema tambeacutem ressalta Saldanha Sanches

Na apreciaccedilatildeo da constitucionalidade da lei que permitia o controle administrativo das contas bancaacuterias o Tribunal Constitushycional espanhol realizou uma distinccedilatildeo entre intimidade pessoal e familiar e a intimidade econoacutemica onde a proteccedilatildeo constitucional eacute menos intensa

ENSAIOS JURiacuteDICOS 249

E procura fazer uma distinccedilatildeo entre a violaccedilatildeo agrave intimidade como consequumlecircncia de uma anaacutelise das contas bancaacuterias - coloshycando a hipoacutetese de uma recusa de cooperaccedilatildeo por parte do conshytribuinte se tal eventualidade se verificar - e a violaccedilatildeo directa da intimidade uma vez que esta natildeo pode resultar de uma mera anaacuteshylise de movimentos bancaacuterios (Saldanha Sanches J L A Situashyccedilatildeo Actual do Sigilo Bancaacuterio a Singularidade do Regime Portushyguecircs In Saldanha Sanches J L Estudos de Direito Contabiliacutestico e Fiscal Coimbra Coimbra Editora 2000 p 91)

Outro comentarista ao analisar a situaccedilatildeo do sistema espanhol quanto ao sigilo bancaacuterio e o direito agrave intimidade fez questatildeo de ressaltar

Seguacuten el r c frente a la Hacienda Puacuteblica no existe el derecho a la intimidad deI art 18 CE Ya la LO de 5 de mayo deI 82 vada praacutecticamente de contenido constitucional el derecho a la intimidado en cuanto el aacutembito de eacutesta queda deferido a la ley ordinaria (a 2ordm) y en cuanto que la esfera protegida frente a las Administraciones se reduce a poco O nada ai no reputarse intromisiones ilegiacutetimas las actuaciones autorizadas o acordadas por la Autoridad competente de acuerdo con la Ley (art 8ordm 1)

La LGTy el RI Iimiacutetan la esfera de la intimidad en las relacishyones con la Hacienda hasta el extremo de que solamenle existe un refugio limitado en el aacutembito deI secreto profesional en los casos de informacioacuten sobre terceros y siempre que no se trate de datos con transcendencia econoacutemica o tributaria EI rc no ha enconshytrado hasta el momento ni un solo supuesto de dato o informacioacuten econocircmica con transcendencia tributaria que limite la accioacuten inquisitiva de la Administracioacuten tributaria por razoacuten de intimidado Bien puede decirse por tanto que frente a la Administraciocircn tribushytaria en cuanto se trata deI ejercicio de su funciocircn de buacutesqueda de datos con transcendencia tributaria el derecho a la intimidad personal y familiar (art 18 I CE) no existe

La biacuteblia deI tribunal a estos efeclos estaacute constituida por la S 11084 reiterada en numerosas ocasiones ampliada en el Auto 64286 y reafirmada por ejemplo en la S 26 abril 90 tantas veces citada (FJ 10deg) Seguacuten esa doctrina la distribucioacutenjusta de la carshyga fiscal prevalece sobre el derecho a la intimidad parte dei art 812 I de la LO seguacuten el cual frente a la Ley (ordinaria) no hay intimidad protegida siempre que haya en dicha ley imperativos de intereacutes puacuteblico ( ) ni siquiera se habla dei predomiacutenio frente a la

250 SUPERIOR TRIBUNAl DE JUSTiCcedilA

intimidad de intereses u objetivos constitucionalmente protegidos Soacuteo admite que la actuadoacuten administrativa es arbitraria cuando no parezcajustificada por la Finalidad de la inspeccioacuten es decir cuando se trate de datos o informaciones que carezcan de transcendencia tributaria pero eacuteste obviamente no es sin Umite derivado dei derecho a la intimidad sino de la interdiccioacuten de arbitrariedad o desviacioacuten de poder de la Administracioacuten de la necesidad de ajuste de toda Administracioacuten ai acircmbito de su competencia que tanto vale para datos iacutentimos como para otros que no lo sean Seguacuten la S 11084 no hay esfera de intimidad proshytegida frente a una Administracioacuten tributaria amparada en una norma que elimina la intimidad como liacutemite (Garciacutea AIacuteloveros Jaime Una Nueva Ley General Tributaria Problemas Constitucioshynales In Kirchhof P et aI Garantiacuteas Constitucionales dei Contribuyente Valencia Tirant lo Blanch 1999 pp 109110)

Diante de tudo quanto foi exposto tendo-se o cuidado de registrar posicionamento de diferentes autores nacionais e estrangeiros haacute ambiente preparado para ser respondido o primeiro questionamento desdobrado em trecircs partes formulado para o 1II Coloacutequio Internacional de Direito Tributaacuterio promoccedilatildeo do Centro de Extensatildeo Universitaacuteria Eis a primeira parte do seu teor

O sigilo bancaacuterio diz respeito agrave intimidade e privacidade das pessoas

A resposta eacute optando por convencimento influenciado pelas ideacuteias da corrente predominante positiva

O nosso entendimento eacute no sentido de que o direito agrave intimidade integra os direitos da personalidade e visam proteger o direito agrave inviolabilidade do domiciacutelio da correspondecircncia das comunicaccedilotildees de quaisquer espeacutecies dos dados pessoais computadorizados do sigilo bancaacuterio O mesmo acontece com o direito agrave privacidade

A expansatildeo da proteccedilatildeo do direito agrave intimidade e agrave privacidade eacute uma consequumlecircncia da evoluccedilatildeo da era contemporacircnea nos setores tecnoloacutegicos e da instabilidade que passam as instituiccedilotildees estatais especialmente a encarreshygada de arrecadar tributos Haacute o reconhecimento de que desenvolve-se um processo de aguda corrosatildeo na proteccedilatildeo agrave intimidade que ao ser violada provoca a publicizaccedilatildeo das condutas mais iacutentimas do cidadatildeo

A concepccedilatildeo do sigilo bancaacuterio no acircmbito do direito agrave intimidade e agrave privacidade visa garantir ao homem o miacutenimo capaz para que lhe seja asseshygurada a sua condiccedilatildeo humana protegendo-o de ingerecircncias alheias como apregoa a Conferecircncia Noacuterdica sobre o Direito agrave Intimidade realizada em Estoshycolmo na data de maio de 1967 ao fazer inserir no documento que publicou a seguinte definiccedilatildeo O direito agrave intimidade eacute o direito do homem de viver de forma independente a sua vida com um miacutenimo de ingerecircncia alheia

ENSAIOS JURiacuteDICOS 251

5 Seguranccedila juriacutedica e acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias

A segunda pergunta apresentada pelos organizadores do coloacutequio estaacute assim posta

A seguranccedila das relaccedilotildees juriacutedicas atraveacutes do Sistema Financeiro pode ser afetada pelo acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves inforshymaccedilotildees bancaacuterias

O acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias se realizado caracteriza um atentado de suma gravidade aos direishytos do cidadatildeo Eacute um ataque aos princiacutepios sustentadores do sistema demoshycraacutetico adotado pelo constituinte de 1988 especialmente quando detonou que a Repuacuteblica Federativa do Brasil tem como objetivo fundamental o respeishyto agrave dignidade humana e agrave cidadania

Do ordenamento juriacutedico brasileiro a meu pensar natildeo haacute lugar para brotar qualquer interpretaccedilatildeo que conclua pela possibilidade de qualquer agenshyte do Poder Puacuteblico acessar de modo generalizado e sem motivaccedilatildeo informashyccedilotildees bancaacuterias do cidadatildeo mesmo com autorizaccedilatildeo judicial

Esclareccedilo desde logo que natildeo comungo com o pensamento de detershyminada corrente no sentido de ser absoluto o direito ao sigilo bancaacuterio Tenho-o como relativo poreacutem vinculado aos princiacutepios da razoabilidade da moralidade da legalidade e da motivaccedilatildeo expliacutecita e detalhada sob pena de ser impossiacutevel a sua quebra

O acesso indiscriminado do agente fiscal agraves informaccedilotildees bancaacuterias do cidadatildeo gera uma quebra da seguranccedila das relaccedilotildees juriacutedicas por um terceiro passar a ter sem causa justificadora conhecimento da vida iacutentima de algueacutem submetendo-o a partir daiacute a um regime de submissatildeo Por outro lado ninshygueacutem poderaacute garantir nem o proacuteprio Estado que o agente puacuteblico utilize os dados que chegaram ao seu conhecimento para outros intentos que natildeo o exclusivamente fiscal

Lembra Arnoldo Wald que O segredo na atividade bancaacuteria envolve concomitantemente interesses privaqos e coletivos que podem ser analisashydos sob trecircs acircngulos o interesse do cliente na sua relaccedilatildeo com a instituiccedilatildeo financeira o interesse do banco em atuar com discriccedilatildeo para ganhar a conshyfianccedila da populaccedilatildeo e captar recursos e o interesse social na existecircncia de um bom e eficiente sistema bancaacuterio Por estarem ligadas ao desenvolvimento da economia e aos interesses da comunidade as relaccedilotildees que envolvem as instishytuiccedilotildees financeiras natildeo recebem o mesmo tratamento juriacutedico dispendido a outras relaccedilotildees comerciais Inviaacutevel a aplicaccedilatildeo exclusiva das regras de Direito Privado as quais tecircm como princiacutepio norteador a autonomia da vontade pois

252 SUPERIOR TRIBUNAl DE JUSTiCcedilA

esta encontra limites nas normas cogentes proacuteprias do direito bancaacuterio e na intervenccedilatildeo do Estado8

A seguranccedila juriacutedica desse tipo de relaccedilatildeo envolve tambeacutem a manutenshyccedilatildeo do segredo das movimentaccedilotildees financeiras do contribuinte

Imprimir-se a mais ampla seguranccedila nas relaccedilotildees do Sistema Financeiro eacute fortalececirc-lo O Estado tem o dever de zelar por esse estado de seguranccedila natildeo permitindo consequumlentemente que o sigilo bancaacuterio seja quebrado pelo acesshyso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico por esse comportamento afeshytar a confiabilidade no sistema

Eacute de todo inconveniente permitir a possibilidade de um atuar do agente fiscal sem controle na quebra do sigilo bancaacuterio por afetar diretamente a seshyguranccedila da relaccedilatildeo juriacutedica firmada entre a instituiccedilatildeo financeira e o seu clienshyte em face deste sentir-se atingido pela accedilatildeo fiscal que passa a tomar conhecishymento de sua intimidade financeira e de fatos de sua vida privada sem o resshypaldo do Poder Judiciaacuterio

A seguranccedila juriacutedica nesse tipo de relaccedilatildeo deve assegurar impossibilidashyde de abuso de poder por parte do Fisco em face da necessidade de ser resshyguardada a garantia de que em um Estado de Direito natildeo pode ser concebido que conceda-se a uma parte mesmo que seja o Estado o domiacutenio absoluto de apanhar as provas que iraacute utilizar em caso de litiacutegio contra algueacutem

O acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias do contribuinte aleacutem de afetar a seguranccedila juriacutedica da relaccedilatildeo em questatildeo promove um desequiliacutebro entre o cidadatildeo-contribuinte e o Fisco por caracterizar coaccedilatildeo que coloca aquele em posiccedilatildeo de inferioridade

A valorizaccedilatildeo da seguranccedila juriacutedica da relaccedilatildeo existente entre instituiccedilatildeo financeira e contribuinte pelo Fisco natildeo quebrando o seu sigilo fiscal sem autorizaccedilatildeo judicial constitui causa de aplicaccedilatildeo de Justiccedila fiscal O seguimenshyto de seus princiacutepios valoriza o regime democraacutetico do qual ela faz parte

6 Casos de admissibilidade da quebra do sigilo bancaacuterio

Os casos de admissibilidade da quebra do sigilo bancaacuterio estatildeo na atuashylidade descritos no nosso ordenamento juriacutedico positivo

A Lei Complementar n 105 de 10 de janeiro de 2001 apoacutes determinar no art 112 de que as instituiccedilotildees financeiras conservaratildeo sigilo em suas operashyccedilotildees ativas e passivas e serviccedilos prestados dispotildee no sect 312 do mesmo artigo que

8 Arnoldo Wald no artigo Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais Revista dos Tribunais ano 6 n 22 janeiromiddotmarccedilo de 1998 n 22 Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas p 15

ENSAIOS JURiacuteDICOS 253

sect 3ordm Natildeo constitui violaccedilatildeo do dever de sigilo

I a troca de informaccedilotildees entre instituiccedilotildees financeiras para fins cadastrais inclusive por intermeacutedio de centrais de risco observadas as normas baixadas pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e pelo Banco Censhytral do Brasil

11 - o fornecimento de informaccedilotildees constantes de cadastro de emitentes de cheques sem provisatildeo de fundos e de devedores inadimplentes a entidades de proteccedilatildeo ao creacutedito observadas as norshymas baixadas pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e pelo Banco Central do Brasil

JJI - o fornecimento das informaccedilotildees de que trata o sect 2ordm do art II da Lei n 9311 de 24 de outubro de 1996

IV - a comunicaccedilatildeo agraves autoridades competentes da praacutetica de iliacutecitos penais ou administrativos abrangendo o fornecimento de inforshymaccedilotildees sobre operaccedilotildees que envolvam recursos provenientes de qualshyquer praacutetica criminosa

V - a revelaccedilatildeo de informaccedilotildees sigilosas com o consentimento expresso dos interessados

VI- a prestaccedilatildeo de informaccedilotildees nos termos e condiccedilotildees estabeleshycidos nos artigos 2ordm 3ordm 4ordm 5ordm 6ordm 7ordm e 9ordm desta lei complementar

sect 4ordm A quebra de sigilo poderaacute ser decretada quando necessaacuteria para apuraccedilatildeo de ocorrecircncia de qualquer iliacutecito em qualquer fase do inqueacuterito ou do processo judicial e especialmente nos seguintes crimes

I - de terrorismo

11 - de traacutefico iliacutecito de substacircncias entorpecentes ou drogas afins

III - de contrabando ou traacutefico de armas municcedilotildees ou material destinado a sua produccedilatildeo

IV - de extorsatildeo mediante sequumlestro

V - contra o sistema financeiro nacional

VI - contra a Administraccedilatildeo Puacuteblica

Vll- contra a ordem tributaacuteria e a previdecircncia social

VIII-lavagem de dinheiro ou ocultaccedilatildeo de bens direitos e valores

IX - praticado por organizaccedilatildeo criminosa

Como visto a lei complementar enumera inuacutemeras situaccedilotildees que indeshypendentemente de autorizaccedilatildeo judicial o sigilo bancaacuterio eacute quebrado

254 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

A dificuldade que se apresenta eacute a de conciliar os casos de quebra de sigilo bancaacuterio que a Lei Complementar n 105 autoriza com a garantia do direito agrave privacidade e agrave intimidade

Destaque-se entre os de maior relevacircncia os seguintes

- natildeo constituir violaccedilatildeo do dever de sigilo bancaacuterio a troca de informashyccedilotildees entre instituiccedilotildees financeiras para fins cadastrais inclusive por intermeacuteshydio de centrais de risco o que possibilita o conhecimento da vida financeira privada do cidadatildeo por vaacuterias pessoas sem desempenho de autoridade na instituiccedilatildeo independentemente de ser justificada com antecedecircncia a causa desse atuar

- o de serem fornecidos dados relativos a fornecimentos de informashyccedilotildees cadastrais de emitentes de cheques sem provisatildeo de fundos a entidades privadas de proteccedilatildeo ao creacutedito sem qualquer avaliaccedilatildeo por qualquer autorishydade da causa determinante do fato a quebra do sigilo bancaacuterio na fase do inqueacuterito por inexistir nessa ocasiaacuteo qualquer contraditoacuterio e respeito ao prinshyciacutepio do devido processo legal

Quanto agraves demais situaccedilotildees constantes na lei complementar que autorishyzam a quebra do sigilo bancaacuterio naacuteo obstante algumas serem absolutamente necessaacuterias haacute de serem vistas em compatibilidade com as garantias constitushycionais conforme jaacute assinalado

O colendo Supremo Tribunal pronunciaraacute como guarda e inteacuterprete maishyor da Carta Magna em ADln jaacute intentada sobre a constitucionalidade ou natildeo dos dispositivos supramencionados

Em campo doutrinaacuterio valoriza-se as posiccedilotildees apresentadas quando da resposta oferecida aos questionamentos anteriores todas acenando pela neshycessidade do controle do Poder Judiciaacuterio

7 Sistema mais justo para a quebra do sigilo bancaacuterio

Os organizadores do JII Coloacutequio Internacional de Direito Tributaacuterio subshymetem agora para anaacutelise a questatildeo do teor seguinte Um sistema em que o Poder Judiciaacuterio torna-se aacuterbitro dos pedidos da Administraccedilatildeo Puacuteblica para quebra do sigilo eacute o mais justo

Em um Estado que por imposiccedilatildeo de sua proacutepria Constituiccedilatildeo estaacute comprometido com a guarda e aplicaccedilatildeo efetiva de princiacutepios democraacuteticos especialmente o de respeitar os direitos e garantias fundamentais da cidadashynia natildeo haacute ambiente para que seja outorgado ao Poder Executivo por via da atuaccedilatildeo de agentes puacuteblicos fiscais o acesso sem o controle do Poder Judiciaacuteshyrio agraves informaccedilotildees bancaacuterias do contribuinte

ENSAIOS JURiacuteDICOS 255

o sigilo bancaacuterio por ser um direito fundamental que exige ser respeitashydo pela supremacia constitucional que o protege deve submeter a possibilishydade de sua quebra para fins tributaacuterios ao Poder Judiciaacuterio pela ausecircncia de interesse direto nos resultados da accedilatildeo fiscalizadora que eacute o recolhimento do tributo e pelas garantias de independecircncia prudecircncia e qualificaccedilatildeo juriacutedica que revestem esse poder

A atuaccedilatildeo da fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo pode ser exercida fora dos limishytes da legalidade imposta a partir da Carta Magna e demais imposiccedilotildees legais a ela subordinadas

Natildeo se desconhece que no atual Estado fiscal os tributos constituem os meios financeiros determinantes para o atendimento dos compromissos da Administraccedilatildeo Puacuteblica com as obrigaccedilotildees oriundas em decorrecircncia de sua atividade no campo educacional social de seguranccedila puacuteblica interna e extershyna da sauacutede da manutenccedilatildeo dos Poderes ou seja para manter funcionando a maacutequina estatal

Por natildeo entremostrar-se na eacutepoca contemporacircnea qualquer outra alshyternativa viaacutevel para transformar o Estado fiscal em um Estado produtivo os tributos passam a representar um indeclinaacutevel dever da cidadania cujo cumshyprimento deve ser por todos honrado conforme assinala Joseacute Casalta Nabais Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra em artigo intitulado Algumas Reflexotildees sobre o Actual Estado Fiscal

Por isso os impostos hatildeo de constituir um preccedilo aceitaacutevel ou seja um preccedilo limitado Um preccedilo que estou certo muitas das sociedashydes que nos antecederam gostariam de ter pago e algumas das actuais natildeo enjeitariam suportar Por isso bem podemos afirmar como jaacute o fizeshymos noutro lugar que no actual Estado fiscal para o qual natildeo se vislumshybra qualquer alternativa viaacutevel pelo menos nos tempos mais proacuteximos os impostos constituem um indeclinaacutevel dever de cidadania cujo cumshyprimento a todos nos deve honrar

A atuaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio para liberar o bloqueio fortalece a conshyfianccedila do cidadatildeo no procedimento da fiscalizaccedilatildeo e consagra a ideacuteia iacutensita em qualquer regime democraacutetico de que a atuaccedilatildeo do Estado tem limites

Na espeacutecie os limites impostos satildeo os decorrentes da quebra do sigilo ser necessaacuterio em face da possiacutevel ilicitude cometida pelo cidadatildeo poreacutem sem ser violados os direitos do cidadatildeo de gozar da sua privacidade e da sua intimidade

A denominada cidadania fiscal haacute de ser considerada de modo conjunshytural com os reflexos dos direitos fundamentais assegurados ao contribuinte sem prestigiar a responsabilidade que tem o Estado de promover a arrecadashyccedilatildeo dos tributos

256 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

Cedo espaccedilo para registrar que a cidadania fiscal deve configurar um estado de relaccedilatildeo juriacutedica em que todos suportem a concretizaccedilatildeo de um Estado em que todos tenham a qualidade de destinataacuterio do dever fundashymentaI de pagar impostos na medida da respectiva capacidade contributiva poreacutem que seja um Estado fiscal suportaacutevel isto eacute um estado cujo sistema fiscal se encontre balizado por estritos limites juriacutedico-constitucionais9

A Administraccedilatildeo Tributaacuteria por melhor que seja a sua estrutura e os seus propoacutesitos natildeo estaacute emocionalmente preparada para conceber e aplicar os princiacutepios que sustentam a cidadania fiscal Isso ocorre primeiramente porshyque o Fisco tem por missatildeo exclusiva exercer a funccedilatildeo de arrecadar tributos Eacute a sua meta essencial por ser atribuiccedilatildeo que na organizaccedilatildeo administrativa estatal estaacute obrigado a desempenhar Natildeo lhe cabe administrar o tributo arreshycadado limitando-se unicamente a envidar esforccedilos para o cumprimento das metas impostas para imprimir aumento na arrecadaccedilatildeo tributaacuteria O sucesso da Administraccedilatildeo Tributaacuteria eacute medido pelo maior volume de recursos fiscais atraiacutedos para os cofres do Governo nunca pelo respeito que exerccedila para com os direitos fundamentais do contribuinte Eacute uma questatildeo de cultura adminisshytrativa de distribuiccedilatildeo de funccedilotildees no sistema estatal impossiacutevel de ser mudashydo por sugestotildees doutrinaacuterias

Por outro lado a fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo consegue afastar as pressotildees exercidas sobre ela por determinados segmentos da organizaccedilatildeo estatal que defendem uma atuaccedilatildeo mais agressiva para a cobranccedila dos tributos tudo em decorrecircncia dos efeitos produzidos pela conduta iliacutecita marcante da sonegashyccedilatildeo fiscal

Esses fatores contribuem para que a fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo tenha condiccedilotildees de modo imparcial sem isenccedilatildeo avaliar a necessidade objetiva da quebra do sigilo bancaacuterio do cidadatildeo Por melhor que seja o seu desempenho nunca ganharaacute a confianccedila do contribuinte

A atribuiccedilatildeo da quebra do sigilo bancaacuterio em um regime democraacutetico onde predomina o respeito maior aos direitos fundamentais da cidadania deve ser exercido pelo Poder Judiciaacuterio natildeo soacute porque seus membros atualmente revestidos da garantia da vitaliciedade inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos bem como porque estatildeo revestidos de independecircncia absoluta em relaccedilatildeo ao Poder interessado na cobranccedila do tributo e consequumlentemenshyte no resultado a ser obtido pela accedilatildeo fiscal

Esse sistema misto onde o Fisco faz a solicitaccedilatildeo motivada para a queshybra do sigilo bancaacuterio ao Poder Judiciaacuterio e este apoacutes analisaacute-lo com objetivishydade e cautela defere ou indefere impotildee seguranccedila e confiabilidade na atuashyccedilatildeo fiscal e sublima o respeito agrave dignidade do contribuinte em outras palavras da cidadania fiscal isto eacute de uma cidadania de liberdade que o Estado fiscal

9 Joseacute Casalta Nabais (Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra) no artigo Algumas Reflexotildees sobre o Actual Estado Fiscal no site httpagugovbr

ENSAIOS JURiacuteDICOS 257

pressupotildee para natildeo ser postergada impotildee um sistema fiscal balizado por esshytritos limites juriacutedico-constitucionais Limites esses que integram a chamada constituiccedilatildeo fiscal e que podemos reconduzir para natildeo nos alongarmos nesse aspecto a duas ideacuteias uma ideacuteia de seguranccedila que tem o seu tradicional e principal suporte no princiacutepio da lega1idade fiscal e uma ideacuteia de justiccedila ou equumlidade que tem a ver com a medida dos impostos e assenta no princiacutepio da capacidade contributiva 10

Em conclusatildeo a adoccedilatildeo de um sistema para a quebra do sigilo bancaacuteshyrio em que o Poder Judiciaacuterio seja o aacuterbitro dos pedidos da Administraccedilatildeo Puacuteblica natildeo eacute somente mais justo mas consegue impor maior credibilidade agrave atuaccedilatildeo fiscal e presta homenagem com intensa potencialidade aos princiacuteshypios democraacuteticos consistentes na guarda da seguranccedila juriacutedica do respeito aos direitos fundamentais do cidadatildeo nesse rol incluidos os agrave privacidade e agrave intimidade Aleacutem disso torna mais respeitaacutevel a relaccedilatildeo entre Fisco e contrishybuinte justificando portanto a opccedilatildeo do Estado pelo regime democraacutetico

8 Autoridade fiscal e faculdade incondicionada de quebrar o sigilo bancaacuterio

Essa indagaccedilatildeo consubstancia a preocupaccedilatildeo de serem estabelecidos controles para a atuaccedilatildeo do agente puacuteblico fiscal Centra-se a preocupaccedilatildeo em imprimir nas relaccedilotildees juriacutedicas tributaacuterias de quaisquer espeacutecies o primashydo da legalidade aprimorando-se o atuar vinculado

Natildeo concilia-se com os postulados da democracia a adoccedilatildeo de um sisteshyma de fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria que outorgue faculdade incondicionada ao fiscal tributaacuterio de invadir a intimidade e a privacidade das pessoas sob o falso argushymento juriacutedico de que busca encontrar provas de sonegaccedilatildeo fiscal

Depreende-se do exposto que a autoridade fiscal natildeo deve ter faculdade incondicionada de quebrar o sigilo sempre que entender necessaacuterio Isso porshyque a praacutetica de atos administrativos por agentes puacuteblicos de modo incondicionado revela grave violaccedilatildeo ao princiacutepio da legalidade onde predoshymina a vontade da lei e natildeo o discricionarismo de quem o pratica

No trato do sigilo bancaacuterio o atuar incondicionado da fiscalizaccedilatildeo assushyme caracteriacutesticas de maior gravidade porque haacute violaccedilatildeo aos princiacutepios funshydamentais jaacute expostos e que satildeo prestigiados pela Carta Magna especialmenshyte por bater de frente de modo integral e absoluto com o direito agrave intimidade e agrave privacidade O atuar deve vincular-se rigidamente ao princiacutepio da legalidashyde especialmente aposta na Carta Magna sem a possibilidade de ser aberto qualquer canal para uso da conveniecircncia ou da oportunidade

Eacute de ser lembrada no trato do assunto a liccedilatildeo de Joseacute Casalta Nobais no trabalho jaacute citado no sentido de que Eacute certo que independentemente da

10 Idem p 15

=258=---___________________ SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTlCA

concepccedilatildeo a que se adira relativamente ao segredo bancaacuterio natildeo temos a menor duacutevida de que o acesso da Administraccedilatildeo Fiscal agrave informaccedilatildeo bancaacuteria seja directo sem necessidade de preacutevia decisatildeo judicial seja indirecto depois portanto de preacutevia decisatildeo judicial haacute de ter sempre uma natureza claramenshyte excepcional Na verdade constitua o segredo bancaacuterio uma manifestaccedilatildeo do direito fundamental agrave reserva da intimidade da vida privada constante do art 26 n 2 da Constituiccedilatildeo portuguesa ou suporte um outro direito fundashymentai um direito agrave reserva da vida privada anaacutelogo agravequele a sua afectaccedilatildeo teraacute sempre caraacuteter excepcional

A autoridade fiscal natildeo possui a necessaacuteria isenccedilatildeo e competecircncia institucional para averiguar o grau dessa excepcionalidade de modo que posshysa impor confianccedila ao cidadatildeo investido na condiccedilatildeo de contribuinte poreacutem com direitos a serem assegurados por forccedila do regime democraacutetico adotado

O certo eacute que na relaccedilatildeo juriacutedico-tributaacuteria deve ser buscado o justo equiliacutebrio pregado pelo Estado de Direito onde o cidadatildeo deve ter a sua dignishydade respeitada sem contudo afastar-se a necessidade do Estado arrecadar tributos de forma cogente e imperativa bem como de serem permitidas conshydiccedilotildees de atuaccedilatildeo que resultem no combate agrave sonegaccedilatildeo fiscal

9 Responsabilidade da autoridade administrativa que quebrar o sigilo banshycaacuterio de forma inconsistente e indevida

Eacute inerente ao regime democraacutetico que a autoridade administrativa puacuteblishyca estaacute obrigada a exercer as suas atribuiccedilotildees com rigorosa obediecircncia aos princiacutepios da legalidade moralidade publicidade impessoalidade e eficiecircncia entre outros

A Carta Magna consagra expressamente no art 37 a obediecircncia do agente puacuteblico a esse tipo de comportamento

A autoridade administrativia que quebrar de modo inconsistente e indevido o sigilo bancaacuterio do cidadatildeo pratica ato com capacidade de provocar os seguintes efeitos a) de invadir o direito agrave privacidade e agrave intimidade de algueacutem b) de provocar-lhe danos morais e materiais dependendo da repershycussatildeo provocada pelo seu atuar

Constatada a efetivaccedilatildeo real de danos morais e materiais a responsabishylidade do Estado pode ser acionada conforme permite o art 37 sect 6ordm da Consshytituiccedilatildeo Federal Solidificada a culpa ou dolo do agente puacuteblico e consagrada a materializaccedilatildeo do iliacutecito praticado com o consequumlente ressarcimento patrimonial o Estado deveraacute usando o direito de regresso investir contra o agente que agiu culposa ou dolosamente

Natildeo resume-se apenas ao campo da responsabilidade civil a atuaccedilatildeo da autoridade quando ilegalmente quebra o sigilo bancaacuterio de qualquer cidadatildeo

ENSAIOS JURiacuteDICOS 259

o art 10 da Lei Complementar n 105 de 10 de janeiro de 2001 determishyna que A quebra de sigilo fora das hipoacuteteses autorizadas nesta lei compleshymentar constitui crime e sujeita os responsaacuteveis agrave pena de reclusatildeo de um a quatro anos e multa aplicando-se no que couber o Coacutedigo Penal sem prejuiacuteshyzo de outras sanccedilotildees cabiacuteveis A seguir no seu paraacutegrafo uacutenico explicita que Incorre nas mesmas penas quem omitir retardar injustificadamente ou presshytar falsamente as informaccedilotildees requeridas nos termos desta lei complementar

O art 11 da mesma lei complementar expressa que O servidor puacuteblico que utilizar ou viabilizar a utilizaccedilatildeo de qualquer informaccedilatildeo obtida em decorshyrecircncia da quebra de sigilo de que trata esta lei complementar responde pessoshyal e diretamente pelos danos decorrentes sem prejuiacutezo da responsabilidade objetiva da entidade puacuteblica quando comprovado que o servidor agiu de acorshydo com a orientaccedilatildeo oficial

10 O sigilo bancaacuterio e o tratamento que lhe eacute dado por oacutergatildeos internacioshynais como a OCDE e outros

Rui Celso Reali Fragoso Presidente do Instituto dos Advogados de Satildeo Paulo em artigo intitulado O Sigilo Bancaacuterio veiculado pela Internet (http Ii wwwjuscombr) registra que atualmente temos trecircs sistemas legais no munshydo cuidando do sigilo bancaacuterio O primeiro eacute o anglo-saxatildeo em que o sigilo natildeo encontra amparo legal o segundo eacute o dos paiacuteses da Europa continental - eu o contemplo em vaacuterios diplomas legais o terceiro eacute o da Suiacuteccedila e do Liacutebano que o reforccedilam

Analisando esses trecircs sistemas o autor citado observa

Haacute aparente contradiccedilatildeo no sistema inglecircs e norte-americano pois se de um lado nestes paiacuteses se eleva a garantia das liberdades individuais de outro se despreza o sigilo bancaacuterio Eacute que se ocorre conshyflito entre a apuraccedilatildeo de fatos (fator social) e a privacidade das pessoas (fator individual) prevalece a primeira Mais ainda o relacionamento de clientes e bancos longe de estabelececirc-lo serve como fonte de informashyccedilatildeo em favor de terceiros a indiscriccedilatildeo injustificada poreacutem eacute objeto de sanccedilatildeo E na Inglaterra os poderes puacuteblicos natildeo intervecircm no funcionashymento dos estabelecimentos privados de creacutedito o que debilita a invesshytigaccedilatildeo

Nos paiacuteses da Europa continental a legislaccedilatildeo contempla o sigilo bancaacuterio como consequumlecircncia do profissional e comporta derrogaccedilotildees na esfera penal e em alguns casos na civil mas comina sanccedilotildees crimishynais no caso de violaccedilatildeo ao sigilo (Coacutedigo Penal francecircs artigo 378 Coacuteshydigo Penal italiano art 622)

260 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

A sistemaacutetica fortalecida eacute aquela utilizada na Suiacuteccedila decorrente da crise ocorrida em 1931 com o fechamento do Banco de Genebra que ensejou a ediccedilatildeo de lei estabelecendo severas puniccedilotildees de natureza civil e criminal Tanto a legislaccedilatildeo suiacuteccedila como a libanesa esta surgida em 1956 permitem derrogaccedilotildees em certas hipoacuteteses A existecircncia das conshytas numeradas comprova a importacircncia do sigilo nestes paiacuteses

Eacute certo natildeo ser absoluto o segredo nem sua quebra em determishynadas situaccedilotildees significa abuso de poder Aliaacutes nenhum direito eacute absoluto

A doutrina tem ultimamente tomado conhecimento sobre as transforshymaccedilotildees que tem passado em vaacuterios ordenamentos juriacutedicos a questatildeo do sigilo bancaacuterio

Zenobio Simotildees de Melo advogado no Paranaacute em artigo sob o tiacutetulo Quebra do Sigilo Bancaacuterio (Internet httpjuscombr) informa que o jornal O Estado de Satildeo Paulo de 21 de junho de 2000 publicou a notiacutecia seguinte

Numa das mais importantes decisotildees adotadas durante o Conseshylho Europeu que marca o fim da presidecircncia portuguesa da Uniatildeo Euroshypeacuteia (UE) seus 15 paiacuteses aprovaram ontem o pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal No ponto mais polecircmico o pacote deveraacute acabar com o sigilo bancaacuterio ateacute 2010 foi uma negociaccedilatildeo de 12 anos Aacuteustria e Luxemburgo natildeo aceitavam o princiacutepio de acabar com o sigilo bancaacuterio A justificativa austriacuteaca eacute que este eacute um princiacutepio que faz parte da Consshytituiccedilatildeo do paiacutes haacute 200 anos Para aceitar o acordo o paiacutes exigiu a manushytenccedilatildeo do sigilo nos bancos austriacuteacos para quem resida no paiacutes

Registro a iacutentegra da notiacutecia

Pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal eacute aprovado por membros da UE Decisatildeo prevecirc quebra do sigilo bancaacuterio nos paiacuteses do bloco econocircmico

Jair Rattner

Especial para o Estado

Santa Maria da Feira Portugal- Numa das mais importantes decishysotildees adotadas durante o Conselho Europeu que marca o fim da presishydecircncia portuguesa da Uniatildeo Europeacuteia (UE) seus 15 paiacuteses aprovaram ontem o pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal No ponto mais polecircmico o pashycote deveraacute acabar com o sigilo bancaacuterio ateacute 2010

Foi uma negociaccedilatildeo de 12 anos Agora temos um documento que vai estabelecer os princiacutepios e as orientaccedilotildees para as futuras diretivas nessa aacuterea afirmou o Primeiro-Ministro Portuguecircs Antonio Guterres que ocupa a presidecircncia rotativa da UE (no fim do mecircs ela seraacute transferida para a Franccedila)

ENSAIOS JURiacuteDICOS 261

o acordo abrange trecircs aacutereas um coacutedigo de conduta que prevecirc o desmantelamento dos 66 paraiacutesos fiscais existentes ou dependentes da UE a tributaccedilatildeo de royalties e o pagamento de impostos sobre rendishymentos das poupanccedilas de cidadatildeos europeus residentes em outros paiacuteshyses dentre os 15 que fazem parte do bloco econocircmico europeu

O grande problema eram as poupanccedilas Aacuteustria e Luxemburgo natildeo aceitavam o princiacutepio de acabar com o sigilo bancaacuterio A justificativa austriacuteaca eacute que este eacute um princiacutepio que faz parte da Constituiccedilatildeo do paiacutes haacute 200 anos Para aceitar o acordo o paiacutes exigiu a manutenccedilatildeo do sigilo nos bancos austriacuteacos para quem resida no paiacutes Essa questatildeo natildeo eacute importante soacute para a Europa porque abre caminho para a criaccedilatildeo de mecanismos de transparecircncia global no mundo financeiro que satildeo esshysenciais para a globalizaccedilatildeo da economia avaliou Guterres

O prazo para a introduccedilatildeo das mudanccedilas vai ateacute o fim de 2010 Ateacute o fim deste ano as negociaccedilotildees vatildeo ser sobre a definiccedilatildeo do conteuacutedo das diretivas (as normas da UE)

Em 2002 a UE discutiraacute com outros paiacuteses esses conteuacutedos para fazer acordos que deveratildeo ser aprovados ateacute o fim do ano por unanimishydade

A partir de 2003 seraacute iniciado um periacuteodo de sete anos de transishyccedilatildeo para a troca de informaccedilotildees sobre os investimentos de cidadatildeos de outros paiacuteses europeus Nesse periacuteodo alguns paiacuteses poderatildeo optar por cobrar impostos de 20 a 25 sobre os rendimentos dos investimentos de residentes no exterior

No capiacutetulo onde foi analisado o sigilo bancaacuterio no Direito Comparado haacute registros tambeacutem a respeito do tratamento que oacutergatildeos internacionais como o OCDEll e outros vecircm dando ao sigilo bancaacuterio conforme estudo que foi apresentado pelo autor ali citado

II OCDE (Organizaccedilatildeo de Cooperaccedilatildeo e Desenvolvimento Econocircmico) criado em 1961 para substituir a OECE (Comitecirc Fiscal da Organizaccedilatildeo Europeacuteia de Cooperaccedilatildeo Econocircmica) Um dos documentos mais importantes da OCDE eacute o resultante da sua Convenccedilatildeo-Modelo relashytiva a impostos sobre a renda e o capital Essa Convenccedilatildeo estaacute sistematizada em sete capiacutetulos assim explicitados por Alberto Xavier em sua obra Direito Tributaacuterio Internacioshynal do Brasil A Convenccedilatildeo-Modelo da OCDE (tal como a das Naccedilocirces Unidas) encontra-se sistematizada em sete capiacutetulos Os capiacutetulos I e I regulam os requisitos para a aplicaccedilatildeo do tratado O capiacutetulo [JI - de longe o mais importante - conteacutem as regras de distribuiccedilatildeo de competecircncia no que concerne aos impostos sobre o rendimento classificado este por tipos ou classes agrave semelhanccedila do que sucede nos sistemas de tributaccedilatildeo cedular O capiacutetulo IV ocupa-se das regras de distribuiccedilatildeo de competecircncia no que respeita aos impostos sobre o capital O capiacutetulo V determina as consequumlecircncias das regras dos capiacutetulos 111 e IV facultanshydo aos Estados a escolha entre os meacutetodos da isenccedilatildeo e da imputaccedilatildeo O capiacutetulo VI conteacutem disposiccedilotildees adicionais sobre natildeo-discriminaccedilatildeo procedimento amigaacutevel troca de informaccedilotildees e privileacutegios de funcionaacuterios diplomaacuteticos e consulares e regras sobre extenshysatildeo do tratado a partes do territoacuterio Enfim o capiacutetulo VII conteacutem disposiccedilotildees finais sobre entrada em vigor e cessaccedilatildeo do acordo

262 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

Heleno Torres em sua recente obra Direito Tributaacuterio Internacional -Planejamento Tributaacuterio e Operaccedilotildees Transnacionais RT p 147 analisando o posicionamento da OCDE referente agrave poliacutetica de determinados paiacuteses que adoshytam tributaccedilatildeo favorecida e os efeitos dos regimes fiscais prejudiciais registra que

A OCDE resolveu entrar na luta para minorar as praacuteticas fiscalshymente danosas insistindo sobre a necessidade de aumentar as trocas de informaccedilotildees entre os Estados aleacutem de redigir uma lista de paiacuteses com tributaccedilatildeo favorecida e fazer algumas recomendaccedilotildees em acircmbito nacional e convencional a partir do seu importante relatoacuterio Harmful tax competition na emerging global issue

Mesmo reconhecendo os aspectos positivos do ambiente global vigente no qual os sistemas tributaacuterios operam os paiacuteses-membros da OCDE concluiacuteram que eles precisavam agir para restringir a competiccedilatildeo tributaacuteria danosa coletivamente e individualmente opondo-se agrave expanshysatildeo de regimes de impostos preferenciais danosos particularmente nos setores financeiros e atividades de serviccedilo que podem causar distorccedilotildees no comeacutercio e desniacuteveis nos padrotildees de investimento sendo uma ameashyccedila para os sistemas tributaacuterios domeacutesticos e para a estrutura global de tributaccedilatildeo internacional

Mais adiante pp 152153 Heleno Torres afirma que

Entre as recomendaccedilotildees definidas nesse relatoacuterio com aplicashyccedilatildeo dirigida aos paiacuteses-membros da instituiccedilatildeo as mais importantes satildeo as seguintes

bull para contrastar a competiccedilatildeo fiscal prejudicial os paiacuteses devem revisar as suas leis regulamentos e praacuteticas sobre sigilo bancaacuterio para remover empecilhos de acesso a tais informaccedilotildees por autoridades fiscais

bull intensificar o uso de trocas de informaccedilotildees principalmente soshybre as transaccedilotildees com paiacuteses de tributaccedilatildeo favorecida

A conclusatildeo que pode ser firmada apoacutes anaacutelise dos pronunciamentos internacionais acima explicitados eacute a construccedilatildeo de uma corrente que defenshyde uma maior abertura para a quebra do sigilo bancaacuterio quando for necessaacuteshyrio para apurar iliacutecitos tributaacuterios

Essa portanto eacute a resposta que apresento para a indagaccedilatildeo Qual o tratamento proposto por oacutergatildeos internacionais como o OCDE e outros com relaccedilatildeo ao sigilo bancaacuterio

ENSAIOS JURiacuteDICOS 263

11 Compatibilizaccedilatildeo do combate agrave criminalidade internacional com o resshypeito agrave seguranccedila juriacutedica a fim de evitar a fuga de investimentos do Paiacutes

Haacute de se reconhecer natildeo ser faacutecil desenvolver-se um sistema juriacutedico que contenha regras que facilitem o combate agrave criminalidade internacional e ao mesmo tempo prestigie os direitos fundamentais do cidadatildeo especialmenshyte a sua seguranccedila juriacutedica

As convenccedilotildees internacionais conforme demonstrado estatildeo preocupashydas com esses aspectos sem deixar de lado os fenocircmenos causados pela globalizaccedilatildeo

Natildeo deve ser esquecido que o tema envolve aspectos diversos a comeshyccedilar pelos determinantes da soberania dos Estados das forccedilas em expansatildeo das organizaccedilotildees internacionais e da pregaccedilatildeo para que os direitos fundamenshytaIacutes do cidadatildeo sejam respeitados com maior Iacutentensidade

A soluccedilatildeo a meu pensar pode ser encontrada no fortalecimento do Direito Comunitaacuterio Os Estados por via de organismos internacionais firmashyriam tratados para a adoccedilatildeo de um Coacutedigo Processual Penal Internacional com efeitos vinculantes por parte das naccedilotildees onde seriam adotadas regras investigatoacuterias e apuratoacuterias dos iliacutecitos internacionais alargando os conceitos de indiacutecios e presunccedilotildees sem deixar contudo de prestigiar a afetividade dos direitos e garantias fundamentais do cidadatildeo

Todas as naccedilotildees no iniacutecio deste seacuteculo envidam esforccedilos para diminuir a crise da seguranccedila juriacutedica Satildeo vaacuterios os fatores determinantes todos tendo como causa comum o crescimento da delinquumlecircncia em decorrecircncia de poliacutetishycas econocircmicas e sociais adotadas por determinados governos que contrishybuem para aumentar o percentual de pessoas pobres

A preocupaccedilatildeo atual para o combate ao crime internacional eacute alcanccedilar niacutevel de uniformizaccedilatildeo dos sistemas adotados para a quebra do sigilo bancaacuteshyrio De iniacutecio deve ser defendida a postura de que nenhuma lesatildeo ou ameaccedila a direito deve ser excluiacuteda da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio Nessa perspectishyva ganha suma importacircncia a criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional em virshytude de pela sua atuaccedilatildeo natildeo perdurar a diversidade de sistemas legais a respeito do assunto a saber a) O anglo-saxatildeo onde o sigilo natildeo encontra amparo legal b) o dos paiacuteses da Europa continental que o contempla em vaacuterios diplomas escritos e c) o da Suiacuteccedila e do Liacutebano que o reforccedilam l2bull

A criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional envolve uma reconceiacutetuaccedilatildeo de soberania

Sobre o tema Celso D de Albuquerque Mello em Direito Internacional da Integraccedilatildeo Ed Renovar p 13 faz a seguinte observaccedilatildeo

12 Conforme anota Rui Celso Reali Fragoso no artigo O Sigilo Bancaacuterio publicado no site httpvvwwjuscombr

264 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Poder-se-ia fazer um pequeno reparo a Chaumont que a indeshypendecircncia nacional eacute um conceito juridicamente indeterminado e que ela pode ter diferentes graus Tanto que podemos escrever soberania versus cooperaccedilatildeo internacional apesar de reconhecermos que esta posiccedilatildeo pode ser considerada como radical vez que natildeo haacute uma total incompatibilidade entre as duas Entretanto natildeo se pode deixar de consshytatar que de certo modo a cooperaccedilatildeo internacional se encontra conshysagrada na Carta da ONU no arl 1 ordm que trata dos Propoacutesitos das Naccedilotildees Unidas e nos Princiacutepios estabelecidos na Carta da OEA (Capiacutetulo 11) O mesmo ocorre na resoluccedilatildeo da Assembleacuteia Geral da ONU de 1970 que aprova a Declaraccedilatildeo Relativa aos Princiacutepios do Direito Internacional Reshylativas agraves Relaccedilotildees Amigaacuteveis e agrave Cooperaccedilatildeo entre os Estados conforme a Carta das Naccedilotildees Unidas bem como na Carta de Direitos e Deveres Econocircmicos aprovada pela mesma Assembleacuteia Geral em 1974

O crescimento do crime internacional em decorrecircncia dos fenocircmenos globalizantes determina o surgimento de um dever juriacutedico dos Estados firmashyrem pactos de cooperaccedilatildeo entre si para que enfrentem as organizaccedilotildees voltashydas para a criminalidade Esse dever juriacutedico globalizado tem suas raiacutezes no moral intemacional que conforme assinala Celso Albuquerque Mello na obra citada p 13 sempre consagrou o princiacutepio da solidariedade ou ainda do auxiacutelio muacutetuo

Eacute o mais importante desafio neste iniacutecio de seacuteculo fazer com que surja uma legislaccedilatildeo internacional que compatibilize o combate agrave criminalidade inshyternacional sem violar a seguranccedila juriacutedica com finalidade exclusiva de evitar a fuga de investimenos do Paiacutes

Tenha-se contudo em consideraccedilatildeo que a globalizaccedilatildeo do crime emshybora seja uma grande ameaccedila aos valores tradicionais que sustentam a cidashydania especialmente a seguranccedila juriacutedica natildeo deve prejudicar o desenvolvishymento econocircmico de qualquer naccedilatildeo

Natildeo faccedilo coro ao assinalado por Eric Hobsbawm em sua obra Era dos Extremos O Breve Seacuteculo XX 1914-1991 1995 p 24 Companhia das Letras S Paulo traduccedilatildeo de Marcos Santarrita no sentido de que Talvez a caracteriacutesshytica mais impressionante do fim do seacuteculo XX seja a tensatildeo entre esse processo de globalizaccedilatildeo cada vez mais acelerado e a incapacidade conjunta das instishytuiccedilotildees puacuteblicas e do comportamento coletivo dos seres humanos de se acoshymodarem a ele

Penso que natildeo haacute essa acomodaccedilatildeo e que as instituiccedilotildees puacuteblicas espeshycialmente as submetidas ao controle da ciecircncia juriacutedica natildeo estatildeo incapacitashydas de encontrar caminhos que solucionem o problema existente

ENSAIOS JURiacuteDICOS 265

Eacute por demais positivo entre outros acontecimentos o fato da conscienshytizaccedilatildeo de que haacute de ser encontrada uma forma de combate agrave criminalidade internacional que natildeo afaste a garantia da seguranccedila juriacutedica Esta eacute uma neshycessidade para impor paz agrave naccedilatildeo e consequumlentemente criar ambiente para que novos investimentos necessaacuterios ao desenvolvimento do seu processo econocircmico aconteccedilam sem se falar na manutenccedilatildeo dos jaacute existentes

O Parlamento Europeu aprovou ultimamente uma resoluccedilatildeo sobre a criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional sob a consideraccedilatildeo de que eacute necessaacuteshyrio criaacute-lo de forma permanente para complementar os sistemas judiciais nashycionais e pocircr fim agrave impunidade de que gozam os responsaacuteveis por genociacutedio crimes contra a humanidade e crimes de guerra

A abertura para essa posiccedilatildeo denota a formaccedilatildeo de uma consciecircncia internacional para combater a criminalidade internacional em todos os niacuteveis contribuindo para fortalecer a seguranccedila juriacutedica interna de cada paiacutes

O documento representativo dessa resoluccedilatildeo eacute do teor seguinte

Parlamento Europeo

Resolucioacuten sobre el Tribunal Penal Internacional

EI Parlamento Europeo

Vistas sus anteriores resoluciones sobre un Tribunal Penal Interna-cional

A Considerando que es necesario crear un Tribunal Penallnternashycional permanente que complemente los sistemasjudiciales nacionales y ponga fin a la impunidad de que gozan los responsables de genocidio crimenes contra la humanidad y criacutemenes de guerra

B Considerando que la Comisioacuten de Derechos Humanos de las Naciones Unidas estaacute respaldando decididamente la creacioacuten de ese Trishybunal

C Considerando que la fase preparatoria de la creacioacuten dei Tribushynal Penal Internacional finalizoacute con la uacuteltima sesioacuten dei Comiteacute Preparatorio de las Naciones Unidas que tuvo lugar dei 16 de marzo al3 de abril de 1998

D Felicitaacutendose por la creciente participacioacuten de Estados en el proceso de negociaciones y esperando que un nuacutemero auacuten mayor de Esshytados procedentes de todas las regiones se encuentre plenamente represhysentado en la Conferencia Diplomaacutetica de Roma

E Considerando que dei 15 de junio al17 de julio de 1998 se celebra en Roma la Conferencia Diplomaacutetica de Plenipotenciarios para la constitucioacuten de un Tribunal Penal Internacional

266 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

F Considerando que los Estados miembros y la delegacioacuten de la Comisioacuten Europea que participan en la Conferencia Diplomaacutetica de Roma pueden desempenar un papel crucial a la hora de garantizar el eacutexito de la conclusioacuten de esta Conferencia Diplomaacutetica y acogiendo positivamente la mayor convergenciacutea de las posturas de los Estados miembros de la UE

G Congratulaacutendose por la oferta dei Gobierno de los Paiacuteses Bajos de servir de sede dei Tribunal Penal Internacional permanente

I Insta a la Conferencia Diplomaacutetica de Roma a aprovechar la oportunidad histoacuterica de concluir un texto de Estatuto para un Tribunal Penal Internacional independiente justo y eficaz

2 Insta a los representantes de los Estados miembros dei Consejo y de la Comisioacuten a garantizar activamente el ecircxito de los resultados a sashyber un auteacutentico Tribunal Penal Internacional en lugar de limitarse a un acuerdo de compromiso sobre principios esenciales en sus esfuerzos por conciliar las posturas de Estados reticentes

3 Destaca que para constituir un complemento eficaz de los sisteshymas judiciacuteales nacionales el Estatuto dei Tribunal Penal Internacional permanente objeto de la Conferencia de Roma deberaacute establecer

a un Fiscal independiente con competencias para investigare insshytruir sumarios por propia iniciativa en situaciones en las que se hayan cometido los delitos sometidos a lajurisdiccioacuten dei Tribunal

b Ia jurisdiccioacuten inherente y universal dei Tribunal en materia de genocidio criacutemenes contra la humanidad criacutemenes de guerra y agresioacuten sin que se requiera ninguacuten consentimiento dei Estado

c una buena relacioacuten de trabajo con los Tribunales lnternacionales ya establecidos en La Haya

d una relacioacuten constructiva con las Naciones Unidas yen partishycular con el Consejo de Seguridad basada en el pleno reconocimiento de sus respectivas funciones y competencias

e Ia obligacioacuten de los Estados firmantes de acatar y hacer cumplir sin demora las oacuterdenes y decisiones dei Tribunal

f los mayores niveles de respeto de los derechos de los acusados y de los sospechosos y de proteccioacuten de los intereses de las viacutectimas y de los testigos

g Ia garantiacutea de una financiacioacuten a largo plazo necesaria para asegurar la autonomiacutea e independencia dei Tribunal frente a cualquier presioacuten exterior

4 Destaca ademaacutes que la jurisdiccioacuten deI Tribunal sobre los delishytos de genociacutedio los criacutemenes contra la humanidad y los criacutemenes de

ENSAIOS JURiacuteDICOS 267

guerra deben considerarse con la misma calificacioacuten penal con indepenshydencia de que se hayan cometido en conflictos armados internacionales o en conflictos internos

5 Insta ai Consejo y a los Estados miembros a garantizar la universalidad y la transparencia de las negociaciones y la participacioacuten continuada de la comunidadjuriacutedica y la sociedad civil internacionales

6 Encarga a su Presidente que transmita la presente resolucioacuten ai Consejo a la Comisioacuten a los Gobiernos de los Estados miembros ai Secreshytario General de las Naciones Unidas ai Presidente de la Asamblea Geneshyral de las Naciones Unidas y ai Presidente de la Conferencia Diplomaacutetica de las Naciones Unidas para la constitucioacuten de un Tribunal Penal Internashycional

A resoluccedilatildeo supracitada demonstra que cresce a conscientizaccedilatildeo da necessidade de ser criado um Tribunal Penal Internacional com forccedila cogente obrigatoacuteria de suas decisotildees no acircmbito interno dos paiacuteses que participarem do pacto de sua constituiccedilatildeo

A doutrina internacional revela que a comunidade internacional somenshyte agora vem se preocupando em criar uma estructura internacional para determinar las responsabilidades individuales emergentes de violacioacuten de ciertos derechos baacutesicos dei ser humano Los mecanismos de responsabilidad estatal creados desde los 60 se dirigen a la mayor protecciotilden dei ser humano y la erradicacioacuten de las praacutecticas de volacioacuten sistemaacutetica de los derechos humanos ar via de la condena ai Estado que ordena o que tolera los abusos por lo cual se estructuraron entorno ai Estado conmo sujeto responsable Como haacute seflalado la Corte Internacional de Derechos Humanos el procedimiento ante ella no es un procedimiento penal lo que se busca determinar es el nivel de cumprimiento por parte de un Estado de sus obligaciones de derecho internacional Sin desconocer la importancia de determinar la responsabilidad dei Estado para que eacuteste tenga un incentivo para erradicar esas praacutectica de sus frotneras es pertinente detacar que las violaciones maacutes grave son en uacuteltima instancia coshymetidas por individuos (Francisco Cox Encarregado dei TPI HOH em artigo intitulado EI IlOH ante la Craciotilden de um Tribunal Penal Internacional no site httpwwwiidhedcrcpitpintrohtml)

A criaccedilatildeo de um Tribunal Penal Internacional atuaria permanentemente e teria competecircncia subsidiaacuteria em relaccedilatildeo agrave outorgada aos Tribunais Nacioshynais limitando-se a atuar apenas nos crimes internacionais previamente defishynidos como sendo do interesse da comunidade global

Merece registro no acircmbito do assunto tratado que na Conferecircncia Reshygional sobre o Tribunal Penal Internacional realizada em 18 e 19 de fevereiro de 1998 na cidade de Guatemala Guatemala um dos temas tratados foi o relativo

268 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

agrave harmonizaccedilatildeo das incriminaccedilotildees quando os seguintes aspectos foram disshycutidos Branqueamento corrupccedilatildeo fraude fiscal participaccedilatildeo em associashyccedilotildees criminosas um olhar agrave luz dos direitos nacionais e do direito internacioshynal Perspectivas Quais os comportamentos a incriminar Criar uma nova incriminaccedilatildeo da fraude fiscal Uma tentativa de harmonizaccedilatildeo o corpus jurls contendo disposiccedilotildees penais para proteccedilatildeo dos interesses financeiros da Uniatildeo Europeacuteia As negociaccedilotildees no seio do Conselho da Europa e da OCDE referenshytes agrave luta contra a corrupccedilatildeo etc O referido painel foi presidido por Benoit Dejemeppe procurador do Rei em Bruxelas e contou com a presenccedila de Tereshyza Beleza professora de Direito Penal na Faculdade de Direito de Lisboa como moderadora

Haacute como visto um largo campo de anaacutelise para desenvolver com possishybilidade do surgimento de sugestotildees que levem a ciecircncia juriacutedica a alcanccedilar com a atuaccedilatildeo estatal uma competecircncia internacional que possa combater o crime internacional e ao mesmo tempo proporcione seguranccedila juriacutedica na ordem interna ganhando assim o sistema juriacutedico confianccedila dos investidoshyres

Em conclusatildeo a forma de compatibilizar o combate agrave criminalidade internacional sem violar a seguranccedila juriacutedica necessaacuteria a evitar a fuga de inshyvestimentos do paiacutes estaacute na criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional com comshypetecircncia definida para processar e julgar delitos globalizantes e cujas decisotildees tenham forccedila imperativa no acircmbito interno das naccedilotildees participantes do pacto para o seu nascimento

Page 7: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro

ENSAIOS JURiacuteDICOS 229

A lei bancaacuteria alematilde de 1971961 em seu art 92 determina que haacute obrishygaccedilatildeo de ser preservado o direito agrave privacidade para aqueles que exercem uma funccedilatildeo federal de vigilatildencia por seus colaboradores e pelos controlashydores dos depoacutesitos (Arnoldo Wald em artigo Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais publicado na Revista dos Tribunais n 22 RT Cadernos de Direishyto Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas jan-marccedilo de 1998 p 24)

O citado autor esclarece ainda que na Alemanha a fonte do sigilo banshycaacuterio estaacute no direito agrave personalidade

c) Itaacutelia Franccedila Suiacuteccedila

Luiz Fernando de Bellinetli em artigo denominado Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio (Revista de Direito do Consumidor RT n 18 abril-junho de 1996 pp 141161) ao analisar o sigilo bancaacuterio no Direito Comparado comenshyta o tratamento que lhe eacute dado pela Alemanha Itaacutelia Franccedila Suiacuteccedila e Portugal

Em face de nos itens acima jaacute ter sido enfocado o tema na Alemanha e em Portugal destacaremos apenas do trabalho do autor as observaccedilotildees feishytas sobre o sigilo bancaacuterio nos ordenamentos juriacutedicos da Itaacutelia Franccedila e Suiacuteccedila

A respeito transcrevo o que escreveu o autor

412 ltaacutelia5

Assim como na Alemanha na Itaacutelia tambeacutem natildeo haacute norma especiacuteshyfica disciplinando o sigilo bancaacuterio embora seja ele reconhecido pela doutrina e pela jurisprudecircncia utilizando-se dispositivos variados do sisshytema para supeditaacute-lo

No entanto tambeacutem na Itaacutelia natildeo eacute ele absoluto cedendo ante interesse de ordem puacuteblica nos casos previstos em lei

Como afirma Giacomo Molle Lobbligo della banca ai segreto non e senza Umt ed essendo esse come si e delto dretto aIa tutela dei cliente e quindi di un interesse privato non vi sono limiti ad esso da parte dei legislatore Prescindendo daiacute casi nei quali la rivelzione sai imposta dala legge un dovere di comunicazione puoacute sorgere nei contrant della autoritaacute

5 Arnoldo Wald no artigo jaacute referido (Sigilo Bancaacuterio e Direitos Fundamentais Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas - 22 p 24) assinala que Na Itaacutelia o sigilo bancaacuterio decorre da garantia dos direitos agrave liberdade individual que permite a exclusatildeo do conhecimento por parte de terceiros de tudo que se refere agrave proacutepria pessoa a denominada riservalezza Este entendimento decorre da norma constitucional que institui a inviolabilidade dos direitos da personalidade e da Convenccedilatildeo Europeacuteia dos Direitos do Homem de 1950 que garante a toda pessoa o direito ao respeito de sua vida privada e familiar de seu domiciacutelio e de sua correspondecircncia O segredo nas movimentaccedilotildees financeiras no entendimento doutrinaacuterio italiano visa proteger aleacutem dos interesses do cliente o desenvolvimento da atividade bancaacuteria como algo inerente agrave estrutura e funccedilatildeo creditiacutecia

~o SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

giudiziaria dei fisco e di terzi (La Banca NellOrdinamento Giuridico itashyliano Milano - DoU A Giuffre Editore 1980 p 158)

413 Franccedila

Tambeacutem na Franccedila o sigilo bancaacuterio eacute protegido pelo ordenamenshyto juriacutedico embora inexistente uma norma especiacutefica fundando-se a proteccedilatildeo num conjunto de regras de ordem penal civil e comercial

Da mesma forma admite-se a quebra do sigilo em face de interesshyses de ordem puacuteblica6 bull

414 Suiacuteccedila

Paiacutes onde os bancos e a sua alardeada discriccedilatildeo satildeo instituiccedilotildees nacionais haacute previsatildeo legal especiacutefica para a proteccedilatildeo do sigilo

No entanto tambeacutem laacute o segredo natildeo eacute como alguns supotildeem absoluto

Conforme aduz Hagstrom Natildeo pode ser invocado em geral peshyrante a Justiccedila Penal Na Justiccedila Civil o Juiz tem poder discricionaacuterio para decidir sobre a mateacuteria havendo algumas variaccedilotildees de conformidade com as legislaccedilotildees cantonais Em procedimentos de taxaccedilatildeo e recursos o segredo eacute preservado perante o Fisco eacute afastado contudo no proceshydimento contencioso (penal fiscal) Algumas outras exceccedilotildees ao dever de segredo satildeo contempladas expressamente em textos legais

Quanto ao Direito suiacuteccedilo acrescente-se que Arnoldo Wald no artigo jaacute tado observa que a justificativa para o sigilo bancaacuterio estaacute no direito da rsonalidade A Lei de 1934 prevecirc pena de multa ou de prisatildeo para o funcioshyliacuterio da instituiccedilatildeo que violar o segredo bancaacuterio mesmo que inexista dano ara aquele que viu reveladas informaccedilotildees sobre sua vida financeira

A seguir Arnoldo Wald compara o Direito da Suiacuteccedila com o do Liacutebano lrmando A Suiacuteccedila assim como o Liacutebano para a maior seguranccedila e reforccedilo a preservaccedilatildeo do sigilo bancaacuterio utiliza a conta numerada ficando descoshyhecido o nome do cliente A legislaccedilatildeo libanesa prevecirc quatro hipoacuteteses de errogaccedilatildeo do sigilo a) o consentimento do cliente seus herdeiros ou legataacuteshyos b) no litiacutegio entre o cliente e o banco c) na falecircncia e d) no enriquecimenshy) iliacutecito

d) Inglaterra e EEUU

O sigilo bancaacuterio no Direito inglecircs e no sistema norte-americano mereshyeu de Arnoldo Wald no trabalho jaacute citado pp 24 e 25 a anaacutelise que transcrevo

o autor citado manda no particular conferir Carlos Alberto Hagstrom artigo O Sigilo Bancaacuterio e o Poder Puacuteblico RDM n 79 p 38 bem como Seacutergio Covello em O Sigilo Bancaacuterio Leud 1991 pp 2627

ENSAIOS JURiacuteDICOS 231

No Direito inglecircs natildeo haacute nenhuma norma escrita que estabelece sanccedilatildeo agrave violaccedilatildeo ao segredo bancaacuterio mas qualquer pessoa que queira trabalhar em uma instituiccedilatildeo financeira deve assinar um formulaacuterio esshypecial pelo qual se compromete a manter sigilo sobre as movimentaccedilotildees bancaacuterias O dever de segredo na atuaccedilatildeo do banco eacute interpretado rigoshyrosamente pelos tribunais ingleses

No sistema juriacutedico norte-americano depois de discrepacircncias nas legislaccedilotildees estaduais e apoacutes a lei federal que restringiu o acircmbito da obrishygatoriedade do sigilo bancaacuterio foi aprovada a Right to Financiai Privacy Act que dispotildee que a prestaccedilatildeo de informaccedilotildees por parte da instituiccedilatildeo financeira somente pode ser dada em processos administrativos ou judishyciais quando os dados forem relevantes para solucionar o litiacutegio Com essa lei a quebra do sigilo bancaacuterio ganhou um caraacuteter excepcional somente podendo ocorrer desde que respeitado o devido processo leshygal Assim o Direito americano buscou conciliar a defesa ao direito de privacidade o atendimento aos interesses puacuteblicos quanto agraves informashyccedilotildees financeiras e a existecircncia do contraditoacuterio

e) Reacutegis de Oliveira quando Deputado Federal em parecer apresentashydo agrave Comissatildeo de Constituiccedilatildeo e Justiccedila da Cacircmara dos Deputados com refeshyrecircncia a Projeto de Emenda Constitucional apresentado pelo Exmo Sr Presishydente da Repuacuteblica objetivando alterar o sect 1 ordm do art 145 da CF observou que o sigilo bancaacuterio no Direito Comparado eacute posto da forma seguinte

13 Direito Comparado Na Alemanha natildeo haacute regra especiacutefica nem definiccedilatildeo legal para o segredo bancaacuterio mas sua existecircncia eacute recoshynhecida bem como aceita pela doutrina e jurisprudecircncia Decorre de direito costumeiro somente podendo ser quebrado por expressa disposhysiccedilatildeo legal (J Barmann Le Secret Bancaire en Allemagne Feacutedeacuterale in Rapport pp 15 e segs) Na Beacutelgica haacute proibiccedilatildeo somente sendo viaacutevel a derrogaccedilatildeo do segredo pela Justiccedila Penal e pelo Fisco que somente tem acesso agraves informaccedilotildees bancaacuterias diante do processo pendente (Herion Le Secret Bancaire en Belfique in Rapport pp 5175) Na Itaacutelia os doshycumentos somente podem ser examinados pelos Juiacutezes Natildeo haacute acesso por parte das autoridades administrativas (idem p 129) Na Holanda da mesma forma o sigilo apenas cede ante ordem da autoridade judicial ou penal (Muller idem pp 99117) Na Franccedila a violaccedilatildeo ao segredo ocorre ante oacutergatildeos do Poder Puacuteblico que alegam interesses superiores aos dos particulares natildeo se admitindo a quebra diante de normas administratishyvas (Gavalda Stouflet idem pp 7797)

f) Voltando a analisar o sigilo bancaacuterio em Portugal pode-se afirmar que o sistema apresentava-se rigoroso e nacirco aceitava a quebra como se vecirc de

232 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

decisatildeo do Supremo Tribunal de Justiccedila em Scientia Juriacutedica tomo XXIv n 166168 de 1980 (Parecer publicado na Revista de Direito Mercantil n 99 pp 98 e segs)

Com o sentido de demonstrar como o sigilo bancaacuterio eacute tratado no ordeshynamento juriacutedico de Portugal cito na iacutentegra um acoacuterdatildeo da Secccedilatildeo Criminal do Tribunal de Relaccedilatildeo de Eacutevora cujo texto colhi da internet (httpwwwtrept jurisp321-96html)

Processo n 321]996

Acoacuterdatildeo

Acordam na Secccedilatildeo Criminal do Tribunal da Relaccedilatildeo de Eacutevora

1 No Tribunal Judicial da Comarca de Portimatildeo correm termos uns autos de inqueacuterito registados sob o n 35711994 que tiveram orishygem numa queixa apresentada por middotM Lda contra a sociedade E Lda nos quais se procede agrave investigaccedilatildeo de factos susceptiacuteveis de inteshygrar a praacutetica de um crime de emissatildeo de cheque sem provisatildeo

Estaacute em causa o cheque nO 3681861637 sacado sobre a Caixa Geral de Depoacutesitos emitido em 1 ordm de julho de 1994 no valor de 820661$00

No decurso do inqueacuterito o Ministeacuterio Puacuteblico solicitou agravequela insshytituiccedilatildeo bancaacuteria o fornecimento de determinada documentaccedilatildeo banshycaacuteria o que esta se negou fazer alegando que a revelaccedilatildeo da pretendida documentaccedilatildeo contende com o disposto na legislaccedilatildeo sobre segredo bancaacuterio

A requerimento do Digno Magistrado do Ministeacuterio Puacuteblico o MM Juiz de Instruccedilatildeo suscitou a intervenccedilatildeo deste Tribunal da Relaccedilatildeo a fim de dispensar os serviccedilos da Caixa Geral de Depoacutesitos do segredo bancaacuteshyrio quanto agrave documentaccedilatildeo bancaacuteria solicitada a saber coacutepia da ficha de assinaturas e extracto da conta da Agecircncia de S com o n sobre a qual foi sacado o cheque em causa respeitante aos meses de maio junho e julho de 1994

Nesta relaccedilatildeo o Exmo Procurador da Repuacuteblica emitiu douto pareshycer no sentido de a referida instituiccedilatildeo bancaacuteria ser dispensada do cumshyprimento do dever do segredo bancaacuterio em ordem agrave prestaccedilatildeo dos eleshymentos pretendidos para a efectivaccedilatildeo do inqueacuterito

Colhidos os vistos legais cumpre agora decidir

2 A Caixa Geral de Depoacutesitos atraveacutes do ofiacutecio fotocopiado agrave fi 5 dos autos recusou-se a fornecer os documentos pedidos pelo Ministeacuteshyrio Puacuteblico para instruccedilatildeo de um processo de inqueacuterito com fundamento no sigilo bancaacuterio

ENSAIOS JURiacuteDICOS 233

Compreendendo o inqueacuterito o conjunto de diligecircncias que visam investigar a existecircncia de um crime determinar os seus agentes e a resshyponsabilidade deles e descobrir e recolher as provas em ordem agrave decishysatildeo sobre a acusaccedilatildeo (cf art 262 n 1 do Coacutedigo de Processo Pena0 a consulta dos pretendidos documentos - extracto da conta e ficha de assinaturas - eacute sem margem para duacutevidas de grande importacircncia para a instruccedilatildeo do processo e recolha de indiacutecios probatoacuterios tendentes agrave eventual deduccedilatildeo de acusaccedilatildeo pois sem ela desde logo muito dificilshymente se poderaacute concluir pela identificaccedilatildeo da pessoa que assinou o cheque

O dever de sigilo bancaacuterio traduz uma obrigaccedilatildeo de facto negativo (de ROR facere) e encontra-se disciplinado no Decreto-Lei n 2981992 de 31 de dezembro que aprovou o Regime Geral das Instituiccedilotildees de Creacutedito e Sociedades Financeiras O art 78 de tal diploma consagrando o dever de segredo profissional dispotildee no seu n 1 que os membros dos orgatildeos de administraccedilatildeo ou de fiscalizaccedilatildeo das instituiccedilotildees de creacutedito os seus empregados mandataacuterios comitidos e outras pessoas que lhes prestem serviccedilos a tiacutetulo permanente ou ocasional natildeo podem revelar ou utilizar informaccedilotildees sobre factos ou elementos respeitantes agrave vida da instituiccedilatildeo ou agraves relaccedilotildees desta com os seus clientes cujo conhecimento lhes advenha exclusivamente do exerciacutecio das suas funccedilotildees ou da presshytaccedilatildeo dos seus serviccedilos explicitando-se no seu n 2 que estatildeo designadamente sujeitos a segredo os nomes dos clientes as contas de depoacutesito e seus movimentos e outras operaccedilotildees bancaacuterias

O dever de segredo profissional natildeo eacute poreacutem um dever absoluto isto eacute natildeo prevalece sempre sobre qualquer outro dever que com ele entre em conflito Sofre com efeito as excepccedilotildees previstas no art 79 do mesmo Decreto-Lei n 2981992 onde se estabelece aleacutem do mais que os factos e elementos cobertos pelo dever de segredo podem ser revelashydos nos termos previstos na lei penal e de processo penal - cf aliacutenea d don2

No art 84 do mesmo diploma legal prescreve-se que a violaccedilatildeo ao dever de segredo eacute puniacutevel nos termos do Coacutedigo Penal e efectivamente o Coacutedigo Penal vigente - revisto pelo Decreto-Lei n 481995 de 15 de marccedilo - prevecirc e pune como crimes quer a violaccedilatildeo a segredo profissioshynal quer o seu aproveitamento indevido - cf arts ] 95 e 196

Ao contraacuterio da versatildeo do Coacutedigo Penal anterior agrave referida revisatildeo - em que se estatuiacutea no art 185 que a violaccedilatildeo ao segredo profissional natildeo seria puniacutevel se ocorresse no cumprimento de um dever juriacutedico sensivelmente superior ou visasse a um interesse puacuteblico ou privado legiacutetimo quando considerados os interesses em conflito e os deveres

234 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

de informaccedilatildeo que segundo as circunstacircncias se impotildeem ao agente se pudesse considerar meio adequado para alcanccedilar aquele fim - natildeo conteacutem o Coacutedigo Penal actuaJ relativamente ao crime de violaccedilatildeo ao segredo profissional qualquer causa especiacutefica de exclusatildeo da ilicitude pelo que haacute que atentar nas causas gerais de exclusatildeo da ilicitude

Ao abordar o conflito de deveres dispotildee o art 36 n 1 do Coacutedigo Penal que natildeo eacute iliacutecito o facto de quem em caso de conflito no cumprishymento de deveres juriacutedicos ou de ordens legiacutetimas da autoridade satisfishyzer dever ou ordem de valor igualou superior ao do dever ou ordem que sacrificar Natildeo seraacute pois iliacutecita a violaccedilatildeo ao segredo profissional se perante um conflito de deveres o agente satisfizer o dever de valor igual ou superior ao do dever que sacrifica

No Coacutedigo de Processo Penal generalizou-se a possibilidade de quebra do segredo profissional

Assim as pessoas indicadas no n 1 do sobredito art 78 podem recusar-se a depor sobre factos objecto de segredo profissional mas se a autoridade judiciaacuteria concluindo embora pela legitimidade da recusa natildeo prescindir desse depoimento pode requerer ao tribunal que o ordeshyne E o tribunal deveraacute ordenar a prestaccedilatildeo do depoimento com quebra do segredo profissional sempre que entender que esta se mostra justificada face agraves normas e princiacutepios aplicaacuteveis da lei penal nomeadashymente ao princiacutepio da prevalecircncia do interesse preponderante - cf art 135 n 12 e 3 do Coacutedigo de Processo Penal

A possibilidade de apreensatildeo pela autoridade judiciaacuteria de tiacutetulos valores quantias ou outros objectos depositados em bancos ou outras instituiccedilotildees de creacutedito relacionados com um crime e que possam ser de grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova bem como a possibilidade de exame pelo juiz de correspondecircncia e documenshytaccedilatildeo bancaacuterias estatildeo previstas no art 181 n 1 e 2 do Coacutedigo de Processhyso Penal As pessoas obrigadas ao dever de segredo profissional podem recusar apresentar aqueles documentos ou objectos em seu poder se invocarem por escrito segredo profissional caso em que o conflito de interesses e deveres assim surgido seraacute dirimido pelo tribunal nos tershymos idecircnticos aos previstos para a recusa de depoimento - cf arts 182 n 2 e 135 ambos do citado coacutedigo

Enquanto o dever de segredo profissional eacute geralmente estabeleshycido a favor da integridade e liberdade das pessoas a quem aproveita tendo-se inserido a sua regulamentaccedilatildeo no Tiacutetulo VI do atraacutes mencionashydo Regime Geral das Instituiccedilotildees de Creacutedito e Sociedades Financeiras no qual se prevecirc um conjunto de regras de conduta que devem guiar a actuaccedilatildeo das instituiccedilotildees de creacutedito seus administradores e empregados

ENSAIOS JURiacuteDICOS 235

nas relaccedilotildees com os clientes visando proteger de forma eficaz a posishyccedilatildeo do consumidor de serviccedilos financeiros (cf preacircmbulo do Decreshyto-Lei n 2981992) ou estabelecer um clima de confianccedila na banca que permita a captaccedilatildeo e recuperaccedilatildeo do dinheiro entesourado (como se dizia no relatoacuterio do Decreto-Lei n 21978 de 9 de janeiro revogado pelo n 1 do art 5Q do citado Decreto-Lei n 2981992) no processo de inqueacuteshyrito a que procede o Ministeacuterio Puacuteblico estaacute em causa a realizaccedilatildeo de diligecircncias de prova que permitam investigar um crime de emissatildeo de cheque sem provisatildeo sob a eacutegide do princiacutepio da verdade material e incriminar o respectivo agente

O interesse que estaacute em jogo com a pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblishyco na obtenccedilatildeo da documentaccedilatildeo bancaacuteria eacute o da boa administraccedilatildeo da Justiccedila Penal e esse interesse eacute no caso em apreccedilo sensivelmente supeshyrior ao interesse da manutenccedilatildeo do segredo bancaacuterio o que equivale a di~er que este deve ceder perante aquele

Em suma no caso concreto ponderados os interesses em conflishyto entendemos que a quebra do dever de sigilo bancaacuterio se justifica nos termos do art 36 do Coacutedigo Penal pelo que deve ser dada procedecircncia agrave pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico e consequumlentemente ao abrigo do disposto nos arts 182 n 2 e 135 n 2 e 3 ambos do Coacutedigo de Processo Penal dispensar-se a Caixa Geral de Depoacutesitos do cumprimento do deshyver de sigilo bancaacuterio a fim de poder satisfazer tal pretensatildeo

3 Por todo o exposto determina-se que com quebra do dever de sigilo bancaacuterio a Caixa Geral de Depoacutesitos forneccedila ao Digno Magistrado do Ministeacuterio Puacuteblico com destino ao Processo de Inqueacuterito n 3571 1994 a documentaccedilatildeo bancaacuteria que este lhe havia solicitado

Natildeo eacute devida taxa de justiccedila

Texto processado e integralmente revisto pelo relator

Desembargador-Relator Rui Mauriacutecio

g) Substancioso estudo do sigilo bancaacuterio no Direito Comparado foi feishyto por Andreacute Serratildeo Borges de Sampaio Consultor da Uniatildeo nas informashyccedilotildees que prestou ao Advogado-Geral da Uniatildeo com referecircncia agrave ADIn n 2397 Transcrevo o inteiro teor do seu pronunciamento

51

6 O tratamento do sigilo bancaacuterio no Direito Comparado

Em verdade o Direito Comparado entende inoponiacutevel o sigilo banshycaacuterio agraves autoridades tributaacuterias Com efeito leciona Alfredo Echeverriacutea Herrera verbis

236 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

EI sigilo bancario constituye un reacutegimen limitado exclusivashymente ai aacutembito de las relaciones entre la institucioacuten bancaria y sus clientes e impone la obligacioacuten de confidencialidad de la institucioacuten sobre las informaciones que aqueacutellos le proporcionan

En todas las legislaciones bancarias el sigilo es relativo es decir el derecho dei ciudadano ai secreto y la correlativa obligacioacuten para el banco de no revelar a terceros las informaciones recibidas en el ejercicio de su actividad ceden cuando existe norma legal expresa o causa justificada

Elliacutemite legal ai sigilo estaacute constituiacutedo por la obligacioacuten dei banco de entregar informaciones y se fundamenta en motivos sushyperiores de orden puacuteblico o general siendo liacutecito entonces que el Estado establezca Iiacutemites legales ai secreto bancaria para auxiliar por ejemplo las actuaciones de la Justicia en el plano jurisdiccional y las dei Estado en el aacutembito dei ejercicio de su potestad impositiva

Es un principio irrebatible en la vida dei derecho que ni la autonomia de las personas ni los instrumentos dei aacuterea econoacutemica y financiera pueden servir en un momento dado como elementos juridicamente idoacuteneos para lesionar el intereacutes puacuteblico En consecuencia se puede afirmar que las limitaciones ai sigilo bancario son salvaguardias necesarias ai bien comuacuten en los caacutenones dei Estado moderno Estas limites deben ser materias reshyservadas a la ley por ser de caraacutecter excepcional en sentido estricto

En este orden de ideas necesariamente debe concluirse que existen legiacutetimos y superiores intereses en diversas aacutereas de la sociedad que se vinculan ai bien comuacuten y que deben ser tutelados por el Estado como lo es por ejemplo la necesidad de detectar y reprimir la evasioacuten de los impuestos los cuales transcienden ai evenshytual intereacutes geneacuterico que pueda tener el mismo Estado en la mantencioacuten dei sigilo bancaria En efecto desde el punto de vista de lajuridicidad y de la eacutetica no se puede sostener que el secreto bancaria pueda servir como instrumento para proteger la comisioacuten de actos

52

como el recieacuten mencionado que son constitutivos muchas veces de iliacutecitos penales bajo la forma de delitos tributarias o fraushydes fiscales con resultados ademaacutes de perjucio patrimonial ai Esshytado y dano ai intereacutes general de la sociedad

EI sistema bancaria frente a la existencia en la sociedad de un intereacutes general preponderante y superior estaacute naturalmente Ilamado a colaborar en la verificacioacuten y represioacuten de la evasioacuten tributaria

ENSAIOS JURiacuteDICOS 237

En este marco se inscribe la tendencia de la mayoda de las legislaciones modemas en cuanto a dotar aI Estado de facultades para intervenir en la actividad econoacutemica de los ciudadanos en procura de la correcta determinacioacuten de los tributos cuando se conshyfigura en el desarrollo de estas actividades un hecho gravado establecido en la ley

Ya la Constitucioacuten de Weimar en 919 proclamoacute que es liacutecito ai Estado intervenir para condicionar el ejercicio de los derechos a determinados fines sociales El bien comuacuten y la justicia social comenzaron desde entonces a servir de frontera a los derechos y Iibertades individuales

Cabe destacar que la OCDE (Organisation for Economic Cooperation and Development) en un documento elaborado en el ano 1999 sobre las praacutecticas de los paiacuteses en el acceso a la informacioacuten bancaria para fines tributarios advierte que se puede abusar de la confidencialidad para ocultar actividades iJegales y evadir impuestos y agrega en el resumen ejecutivo deI documento que ni la criminalizacioacuten dei fraude tributario ni el tratamiento de la evasioacuten de impuestos bajo las leyes tributarias de los paiacuteses miembros de la OCDE son homogeacuteneos pero que sin embargo los gobiernos de la mayoriacutea de los paiacuteses miembros de la OCDE han tomado la visi6n de que en este contexto las autoridades tributashyrias no deben ser tratadas como simples terceros sino que se les debe otorgar un acceso priviligiado a la informaci6n bancaria con fines tributarias

Se agrega en este estudio que una medida de esta naturaleza no pane en peligro la conlidencialidad de la inlormacioacuten bancaria puesto que las autoridades tributarias estaacuten sujetas a estrictos conshytroles sobre coacutemo utilizan la informacioacuten de los contribuyentes y todos los gobiemos han implementado regIas para proteger la conlidencialidad de la informaci6n tributaria (EI Sigilo Bancaacuterio Acesso a la Informadon Bancaria para Fines Tributarias)

Em verdade seu texto elenca 30 paiacuteses integrantes da OCDE (a saber Alemanha Austraacutelia Aacuteustria Beacutelgica Canadaacute Repuacuteblica Checa Dinamarca Finlacircndia Franccedila Greacutecia Hungria Islacircndia Irlanda Itaacutelia Japatildeo Coreacuteia Luxemburgo Meacutexico Paiacuteses Baixos Nova Zelacircndia Noshyruega Polocircnia Portugal Espanha Sueacutecia Turquia Suiacuteccedila Reino Unido Estados Unidos Repuacuteblica Eslovaca) dos quais em 1999 apenas trecircs (Portugal Repuacuteblica Eslovaca e Luxemburgo) natildeo facultavam o acesso por parte de autoridades tributaacuterias a informaccedilotildees relativas a pessoas suspeitas de fraude tributaacuteria

238 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

Desses trecircs paiacuteses hoje remanescem apenas dois Com efeito Portugal deixou de integrar esse grupo constrangedoramente minoritaacuterio ao aprovar em 29 de dezembro de 2000 a Lei n 30-G

Nesse diploma lecirc-se

Lei da Reforma de Tributaccedilatildeo do Rendimento

(Portugal)

Artigo 63 O - B

Acesso a informaccedilotildees e documentos bancaacuterios

1 A administraccedilatildeo tributaacuteria tem o poder de aceder directashymente aos documentos bancaacuterios nas situaccedilotildees de recusa da sua exibiccedilatildeo ou de autorizaccedilatildeo para a sua consulta

a) quando se trate de documentos de suporte de registos contabiliacutesticos dos sujeitos passivos de IRS e IRC que se enconshytrem sujeitos agrave contabilidade organizada

b) quando o contribuinte usufrua de benefiacutecios fiscais ou de regimes fiscais privilegiados havendo necessidade de controshylar os respectivos pressupostos e apenas para esse efeito

2 A administraccedilatildeo tributaacuteria tem o poder de aceder a todos os documentos bancaacuterios excepto as informaccedilotildees prestadas para justificar o recurso ao creacutedito nas situaccedilotildees de recusa de exibiccedilatildeo daqueles documentos ou de autorizaccedilatildeo para a sua consulta

a) quando se verificar a impossibilidade de comprovaccedilatildeo e quantificaccedilatildeo directa e exacta da mateacuteria tributaacutevel nos termos do artigo da Lei Geral Tributaacuteria e em geral quando estejam verifishycados os pressupostos para o recurso a uma avaliaccedilatildeo indirecta

b) quando os rendimentos declarados em sede de IRS se afastarem significativamente para menos sem razatildeo justificada dos padrotildees de rendimento que razoavelmente possam permitir as manifestaccedilotildees de riqueza evidenciadas pelo sujeito passivo nos termos do artigo 89-A da Lei Geral Tributaacuteria

c) quando existam indiacutecios da praacutetica de crime doloso em mateacuteria tributaacuteria designadamente nos casos de utilizaccedilatildeo de facturas falsas e em geral nas situaccedilotildees em que existam factos concretamente identificados gravemente indiciadores da falta de veracidade do declarado

d) quando seja necessaacuterio para fins fiscais comprovar a aplicaccedilatildeo de subsiacutedios puacuteblicos de qualquer natureza

ENSAIOS JUAlolCOS 239

3 As decisotildees da administraccedilatildeo tributaacuteria referidas nos nuacuteshymeros anteriores devem ser fundamentadas com expressa menshyccedilatildeo dos motivos concretos que as justificam pressupotildeem a audishyccedilatildeo preacutevia do contribuinte e satildeo da competecircncia do Director-Geshyral dos Impostos ou do Director-Geral das Alfacircndegas e dos Imshypostos Especiais sobre o consumo ou seus substitutos legais sem possibilidade de delegaccedilatildeo

4 Os actos praticados ao abrigo da competecircncia definida no nuacutemero anterior satildeo susceptiacuteveis de recurso judicial o qual teraacute efeito suspensivo nas situaccedilotildees previstas no n 2

5 Nos casos de deferimento do recurso previsto no nuacutemero anterior os elementos de prova entretanto obtidos natildeo podem ser utilizados para qualquer efeito em desfavor do contribuinte

6 As entidades que se encontrem numa relaccedilatildeo de domiacutenio com o contribuinte ficam sujeitas aos regimes de acesso agrave inforshymaccedilatildeo bancaacuteria referidos nos n 1 e 2

7 O acesso da administraccedilatildeo tributaacuteria a informaccedilatildeo banshycaacuteria relevante relativa a familiares ou terceiros que se encontrem numa relaccedilatildeo especial com o contribuinte depende de autorizashyccedilatildeo judicial expressa apoacutes audiccedilatildeo do visado obedecendo aos requisitos previstos no n 3

8 O regime previsto nos nuacutemeros anteriores natildeo prejudica a legislaccedilatildeo aplicaacutevel aos casos de investigaccedilatildeo por infracccedilatildeo peshynal e soacute pode ter por objecto operaccedilotildees e movimentos bancaacuterios realizados apoacutes a sua entrada em vigor sem prejuiacutezo do regime vigente para as situaccedilotildees anteriores

9 Os actos praticados ao abrigo da competecircncia prevista no n I devem ser objecto de comunicaccedilatildeo ao Defensor do Contrimiddot buinte

10 Para os efeitos desta lei considera-se documento bancaacuteshyrio qualquer documento ou registo independentemente do resshypectivo suporte em que se titulem comprovem ou registem opeshyraccedilotildees praticadas por instituiccedilotildees de creacutedito ou sociedades finanshyceiras no acircmbito da respectiva actividade incluindo os referentes a operaccedilotildees realizadas mediante utilizaccedilatildeo de cartotildees de creacutedito (coacutepia anexa)

Parece evidente destarte que todo o mundo civilizado abandonou a possibilidade de opor-se agrave Administraccedilatildeo Tributaacuteria o sigilo bancaacuterio

240 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

4 O sigilo bancaacuterio e o direito agrave intimidade e agrave privacidade das pessoas

A anaacutelise do sigilo bancaacuterio em face do direito agrave intimidade e agrave privacidashyde exige inicialmente que seja enfrentada a questatildeo referente ao seu conceito

Os doutrinadores natildeo tecircm assumido posiccedilatildeo uniforme quanto aos asshypectos conceituais dessa entidade juriacutedica

Seacutergio Carlos Covello autor da obra jaacute mencionada (O Sigilo Bancaacuterio Leud S Paulo 1991 p 69) entende que sigilo bancaacuterio eacute a obrigaccedilatildeo que tecircm os Bancos de natildeo revelar salvo justa causa as informaccedilotildees que venham a obter em virtude de sua atividade profissional

Luiz Fernando Bellinetti no artigo intitulado Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio (Revista do Direito do Consumidor Satildeo Paulo RT 1996 voI 18 p 144) defende posiccedilatildeo no sentido de que sigilo bancaacuterio eacute o dever juriacutedico que tecircm as instituiccedilotildees de creacutedito e as organizaccedilotildees auxiliares e seus empregados de natildeo revelar salvo justa causa as informaccedilotildees que venham a obter em virtushyde da atividade bancaacuteria a que se dedicam

Para Arnoldo Wald (in O Sigilo Bancaacuterio no Projeto de Lei Complemenshytar n 70 Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas n I pp 196209) o sigilo bancaacuterio se enquadra no conceito mais amplo do segredo profissional que tem merecido uma proteccedilatildeo mais ampla ensejando sua violaccedilatildeo caracterizaccedilatildeo como crime (art 154 do Coacutedigo PeshynaI)

Eivany A Silva tratando do tema em Consideraccedilotildees a Respeito do Sigilo de Dados (artigo publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio n 61 pp 41142 - Edit Dialeacutetica) afirma que o sigilo bancaacuterio eacute espeacutecie do gecircnero sigilo de dados constituindo um direito fundamental protegido constitucionalmente inserto que estaacute no rol dos direitos e garantias individuais ou seja em claacuteusushylas peacutetreas da Carta Magna natildeo podendo portanto ser modificado nem messhymo por emenda agrave Constituiccedilatildeo e portanto muito menos por legislaccedilatildeo de hierarquia inferior

Como examinado haacute divergecircncias na fixaccedilatildeo do conceito Essas divershygecircncias embora importantes para as posiccedilotildees doutrinaacuterias a serem assumishydas sobre o alcance do sigilo bancaacuterio natildeo geram contudo influecircncias de maior intensidade no relacionamento entre a instituiccedilatildeo financeira e os seus depositantes Isso porque o que merece ser considerado eacute a natureza juriacutedica do sigilo bancaacuterio isto eacute a que categoria de direito pertence e como por quem e quando a sua quebra pode ser determinada

Em face do exposto necessaacuterio eacute que se faccedila o alinhamento das teorias que procuram fundamentar o sigilo bancaacuterio

A doutrina em eacutepocas diversas examinou as seguintes teorias

ENSAIOS JURiacuteDICOS 241

Teoria contratualista O sigilo bancaacuterio de acordo com essa teoria deshycorre da relaccedilatildeo contratual que voluntariamente eacute formada entre o banco e o cliente por via da qual mesmo sem claacuteusula expressa a instituiccedilatildeo financeira assume a obrigaccedilatildeo de guardar segredo das movimentaccedilotildees de dinheiro que nela satildeo feitas Essa responsabilidade assumida pelo banco inspira-se segunshydo os adeptos da teoria em destaque nos usos nos costumes e na boa-feacute sempre aplicaacuteveis na intepretaccedilatildeo dos contratos comerciais7bull

Teoria do direito agrave privacidade Os adeptos dessa corrente afirmam que o sigilo bancaacuterio integra o campo do direito agrave privacidade que faz parte dos direitos da personalidade

Teoria consuetudinaacuteria Segundo os seguidores dessa linha de pensar o sigilo bancaacuterio decorre dos compromissos taacutecitos assumidos entre instituishyccedilotildees financeiras e seus clientes no sentido de natildeo serem levados ao conhecishymento de terceiros os valores transacionados O uso reiterado dessa praacutetica apoiada no elemento confianccedila passou a representar costume adotado nesse tipo de negoacutecio juriacutedico

Teoria da boa-feacute A adoccedilatildeo dessa teoria conduz o inteacuterprete a entender que o sigilo bancaacuterio por sua proacutepria natureza estaacute vinculado ao caraacuteter fiduciaacuterio da atividade bancaacuteria fundando-se portanto na boa-feacute ou dever de lisura que tanto marca o tipo de negoacutecio juriacutedico firmado

Teoria do sigilo profissional Essa teoria concebe o sigilo bancaacuterio como sendo uma espeacutecie do sigilo profissional Haacute portanto um dever eacutetico do banshyco em respeitar o sigilo bancaacuterio em decorrecircncia da profissatildeo exercida

Teoria do direito agrave intimidade dos bancos Os integrantes dessa forma de pensar sustentam que a instituiccedilatildeo financeira tem legiacutetimo interesse de afastar do conhecimento de terceiros a movimentaccedilatildeo financeira dos seus clientes e consequumlentemente dos fatos com elas relacionados

Teoria da complexidade do viacutenculo Essa teoria eacute explicada por Arnoldo Wald no trabalho jaacute citado da forma seguinte A doutrina moderna abandoshynou a noccedilatildeo da relaccedilatildeo juriacutedica contratual defendo a complexidade do viacutenshyculo Aleacutem dos direitos e das obrigaccedilotildees principais existem deveres secundaacuteshyrios para ambos os contratantes que decorrem da regra geral da boa-feacute denoshyminada na doutrina italiana de cOITeteza e na legislaccedilatildeo alematilde de Treu und Glauben Exige que a atuaccedilatildeo de uma parte natildeo cause danos agrave esfera juriacutedica da outra Dentro desta ideacuteia defende-se que o segredo bancaacuterio eacute um dever

7 Arnoldo Wald em Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais artigo publicado na Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas n 22 pp 1518 manifesta entendimento de que no campo normatIacutevo do Direito brasileiro esta teoria encontra respaldo nos arts 130 e 131 do Coacutedigo Comercial que prevecirc a interpretaccedilatildeo dos contratos segundo os usos os costumes e a boa-feacute

242 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

acessoacuterio na relaccedilatildeo juriacutedica Mesmo que natildeo nasccedila o contrato entre as partes a boa-feacute objetiva impede que a instituiccedilatildeo financeira prejudique os interesses do cidadatildeo

Estabelecidos os pressupostos doutrinaacuterios acima examinamos agora se o sigilo bancaacuterio diz respeito agrave intimidade e agrave privacidade das pessoas

A Constituiccedilatildeo Federal em seu artigo 5ordm incisos X e XII afirma

Art 5ordm Todos satildeo iguais perante a lei sem distinccedilatildeo de qualquer natureza garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Paiacutes a inviolabilidade do direito agrave vida agrave liberdade agrave igualdade agrave segushyranccedila e agrave propriedade nos termos seguintes

X - satildeo inviolaacuteveis a intimidade a vida privada a honra e a imagem das pessoas assegurado o direito agrave indenizaccedilatildeo pelo dano material ou moral decorrente de sua violaccedilatildeo

XJl - eacute inviolaacutevel o sigilo da correspondecircncia e das comunicaccedilotildees telegraacuteficas de dados e das comunicaccedilotildees telefocircnicas salvo no uacuteltimo caso por ordem judicial nas hipoacuteteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigaccedilatildeo criminal ou instruccedilatildeo processual penal

Essas garantias constitucionais protegem o cidadatildeo de qualquer investida de terceiros em sua intimidade em sua vida privada e no sigilo de seus dados

Na expressatildeo terceiros estaacute incluiacutedo o Estado e consequumlentemente seus agentes poliacuteticos e administrativos

A doutrina tem se manifestado de modo quase unacircnime no sentido de que o sigilo bancaacuterio eacute uma garantia constitucional que protege a privacidade das pessoas no campo econocircmico e financeiro A sua significaccedilatildeo eacute de natildeo tornar puacuteblica a movimentaccedilatildeo da conta bancaacuteria e das aplicaccedilotildees financeiras do cidadatildeo para que de nenhum modo os atos privados praticados possam ser tornados puacuteblicos

Esse posicionamento eacute o adotado pelos autores que passo a citar

Arnoldo Wald (O Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais artigo pushyblicado na Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas RT n 22 pp 1521)

O sigilo bancaacuterio eacute o meio para resguardar a privacidade no camshypo econocircmico pois veda a publicidade sobre a movimentaccedilatildeo da conta corrente bancaacuteria e das aplicaccedilotildees financeiras

ENSAIOS JURiacuteDICOS 243

Eivany A Silva (Consideraccedilotildees a Respeito do Sigilo de Dados artigo publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio n 61 Satildeo Paulo Editora Dialeacutetica p27)

A maioria dos ordenamentos juriacutedicos como o brasileiro tratam o sigilo bancaacuterio como direito fundamental do contribuinte agrave privacidashyde ou seja agrave resistecircncia agrave comunicaccedilatildeo de dados que representem desshydobramento da personalidade da pessoa direito agrave oposiccedilatildeo e agrave negaccedilatildeo de comunicaccedilatildeo

Ives Gandra da Silva Martins (Sigilo Bancaacuterio trabalho publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio S Paulo Editora Dialeacutetica n 1 pp 24 e 25)

Pelos incisos X e XII do artigo 5ordm tem o contribuinte o direito de preservaccedilatildeo de sua intimidade de sua privacidade e de que terceiros que detenham informaccedilotildees pessoais suas sejam obrigados a guardaacute-Ias

Natildeo pode pois a fiscalizaccedilatildeo exigir de terceiros informaccedilotildees que apenas pode obter do proacuteprio contribuinte

Em determinadas hipoacuteteses todavia o interesse puacuteblico haacute de preshyvalecer sobre o interesse individual mas caberaacute a um outro poder definir se tais hipoacuteteses efetivamente ocorrem com o que poderaacute o Poder Judishyciaacuterio autorizar se convencido estiver o magistrado de que a hipoacutetese eacute de gravidade e de lesatildeo ao interesse puacuteblico a quebra do direito ao sigilo bancaacuterio

Estou convencido ser esta a melhor conformaccedilatildeo juriacutedica da quesshytatildeo idealizada pelos constituintes defendida pela doutrina e consagrashyda na jurisprudecircncia corrente exegeacutetica esta a que me filio desde os meus primeiros escritos sobre a mateacuteria

Roberto Quiroga Mosquera (Tributaccedilatildeo no Mercado Financeiro e de Capitais obra publicada pela Editora Dialeacutetica Satildeo Paulo 1998 pp 70171)

Do exposto ateacute aqui eacute evidente que o direito ao sigilo bancaacuterio representa uma espeacutecie de direito agrave privacidade

Eacute incontroverso que os dados e informaccedilotildees de natureza bancaacuteria dizem respeito agrave intimidade e agrave vida privada dos cidadatildeos Dados que dizem respeito aos valores em dinheiro depositados em contas-correnshytes bancaacuterias tipos e caracteriacutesticas de aplicaccedilotildees financeiras ganhos e prejuiacutezos auferidos ou incorridos em operaccedilotildees bursaacuteteis etc satildeo sem sombra de duacutevida elementos particulares e pessoais de qualquer indiviacuteshyduo

244 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Utilizando outra voz informaccedilotildees que tocam no aspecto financeishyro do ser humano representam direito iacutentimo e personaliacutessimo devendo ser mantidas em sigilo por aqueles que eventualmente as detenham em razatildeo de sua atividade profissional Parece-nos que tal conclusatildeo eacute de uma clareza inconteste

Natildeo tem sido outra a posiccedilatildeo da doutrina mais abalizada do Paiacutes e da jurisprudecircncia dominante

o autor referido a seguir faz a observaccedilatildeo seguinte

Carlos Alberto Hagstrom (Sigilo Bancaacuterio Novas Questotildees Reshyvista de Direito Mercantil Satildeo Paulo Malheiros 1997 vaI 105 pp 4344) expotildee que apesar de existirem diversas teorias que procuram fundashymentar juridicamente o sigilo bancaacuterio modernamente a explicaccedilatildeo para o fundamento do referido instituto sofreu uma radical alteraccedilatildeo Divershysas constituiccedilotildees modernas esclarece o mencionado autor ampliaram e explicitaram o elenco de direitos e garantias individuais passando a garantir o direito agrave privacidade e agrave intimidade A Constituiccedilatildeo brasileira natildeo trilha caminho diferente Assegurou referidos direitos de forma exshypressa e sem restriccedilotildees O tema do sigilo bancaacuterio figura agora em niacutevel constitucional Tem status de norma superior no qual se reconhece o direito agrave intimidade como norma de caraacuteter geneacuterico em que estatildeo conshytemplados muacuteltiplos aspectos da vida privada em especial os de ordem econocircmico-financeira que compotildeem o que Hagstrom denominou a inshytimidade econocircmica ou intimidade patrimonial

Luiacutes Fernando 8ellinetti (Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio artigo publicado na Revista de Direito do Consumidor n 18 pp 141151)

Como jaacute dissemos anteriormente em certas hipoacuteteses o fundashymento para o segredo bancaacuterio seria a privacidade No entanto nesses casos o que se protege eacute a privacidade e natildeo propriamente o sigilo

Entendemos que uma coisa eacute garantir-se a privacidade da pessoa com fundamento em norma constitucional outra eacute garantir-se o segreshydo de informaccedilotildees bancaacuterias de uma pessoa com base na legislaccedilatildeo supramencionada

Sempre que a revelaccedilatildeo de informaccedilotildees bancaacuterias puder violar a privacidade da pessoa parece-nos que mais do que garantia ao sigilo bancaacuterio (com fundamento legal) tem a pessoa garantia agrave sua privacishydade (com fundamento constitucional)

ENSAIOS JURiacuteDICOS 245

No entanto se a revelaccedilatildeo da informaccedilatildeo natildeo invadir a esfera da intimidade da pessoa sua garantia eacute meramente legal do sigilo bancaacuterio

Carlos Maacuterio Velloso (citado por Misabel Derzi em Direito Tributaacuterio Aplicado obra publicada pela Editora Del Rey Belo Horizonte MO pp 278 e 279)

O sigilo bancaacuterio decorre do direito agrave privacidade inerente agrave pershysonalidade das pessoas consagrado na Constituiccedilatildeo Federal em seu art 5ordm X e protege tanto interesses privados como finalidades de ordem puacuteblica a saber o sistema de creacutedito O sigilo bancaacuterio natildeo eacute um princiacuteshypio absoluto

As exceccedilotildees ao sigilo bancaacuterio estatildeo previstas na Lei n 45951964 que continua em vigor

O Poder Judiciaacuterio pode requisitar relativamente a pessoas e instishytuiccedilotildees informaccedilotildees que implicam quebra de sigilo (Lei n 45951964 art 38 sect 1 ordm) entretanto mesmo havendo inqueacuterito policial instaurado deveraacute proceder com cautela prudecircncia e moderaccedilatildeo inerentes agrave mashygistratura

Luciana Fregodolli (O Direito agrave Intimidade - excerto da dissertaccedilatildeo que apresentou sob o tiacutetulo O Direito agrave Intimidade e a Prova Iliacutecita publicado pela Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Constitucional e Ciecircncia Poliacutetica -n 19 p 233)

O sigilo bancaacuterio protege interesses privados Eacute ele espeacutecie de direito agrave privacidade inerente agrave personalidade das pessoas e que a Consshytituiccedilatildeo Federal consagra no art 5ordm X aleacutem de atender a uma finalidade de ordem puacuteblica qual seja a de proteccedilatildeo ao sistema de creacutedito

O direito agrave privacidade abrange atualmente o de impedir que tershyceiros inclusive o Estado e o Fisco tenham acesso a informaccedilotildees sobre o que se denominou a aacuterea de manifestaccedilatildeo existencial do ser humano

Celso Ribeiro Bastos O pensamento de Celso Ribeiro Bastos foi exshyposto por Roberto Quiroga Mosquera na obra jaacute referida p 71 do modo seguinte

Celso Bastos eacute do mesmo pensar Apoacutes tecer consideraccedilotildees introdutoacuterias acerca do sigilo bancaacuterio e expor pensamentos de divershysos autores nacionais e alieniacutegenas conclui o constitucionalista brasileishyro no sentido de que todas as despesas ordinaacuterias feitas pelo cidadatildeo

246 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

comum em sua vida cotidiana devem ser consideradas parte de sua vida privada familiar ou domeacutestica e portanto protegidas contra interferecircnshycias a despeito de qualquer pretexto Desde as condutas mais corriqueishyras como as compras efetuadas em um supermercado para manutenshyccedilatildeo da famiacutelia quanto aquelas outras moralmente reprovaacuteveis como presentes ou joacuteias compradas e dadas a quem presta ao homem servishyccedilos de natureza extraconjugal tudo estaacute abarcado pelo manto da proteshyccedilatildeo agrave vida privada familiar ou domeacutestica ( ) E mais adiante arremata Hoje praticamente a vida do homem pode ser escrita a partir de seu talatildeo de cheques e nas sociedades mais avanccediladas pelos cartotildees de creacutedito e magneacuteticos Permitir-se que o sigilo bancaacuterio venha a ser romshypido por qualquer forma natildeo-extraordinaacuteria para salvaguarda de inteshyresse de porte no miacutenimo idecircntico eacute expor a seguranccedila individual a um constante e absurdo temor perante as possibilidades de controle direto ou pelo vazamento de alguma informaccedilatildeo

Haacute contudo corrente contraacuteria como passaremos a demonstrar

Andreacute Serratildeo Borges de Sampaio Consultor da Uniatildeo nas informashyccedilotildees prestadas ao Advogado-Geral da Uniatildeo sobre a ADIn n 2397 cita trechos de doutrina e jurisprudecircncia estrangeiras defendendo o entendimento de que o sigilo bancaacuterio natildeo tem conotaccedilatildeo de direito de privacidade Eis o que escreshyveu o parecerista citado

O jurista portuguecircs J L Saldanha Sanches coteja primorosashymente o sigilo bancaacuterio com a proteccedilatildeo da intimidade para concluir que natildeo haacute que se falar em direito ao sigilo bancaacuterio como concretizaccedilatildeo do direito agrave intimidade Nas suas palavras

Ora em que esfera podemos noacutes incluir o segredo bancaacuteshyrio enquanto instituto que concretiza certos valores do ordenashymento juriacutedico Como expressatildeo de interesses juridicamente tuteshylados

Seraacute o segredo bancaacuterio um prolongamento do direito agrave inshytimidade da esfera pessoal e familiar de uma qualquer pessoa sinshygular (uma vez que em relaccedilatildeo agraves pessoas coletivas a questatildeo natildeo pode mesmo ser colocada) Ou diraacute antes respeito aquela faixa mais larga que resguarda a privacidade de qualquer cidadatildeo e que soacute pode por isso sofrer qualquer intromissatildeo se surgirem razotildees vaacutelidas para que tal direito seja restringido

Ao afirmar-se que na perspectiva dos clientes dos bancos o segredo bancaacuterio eacute um direito com a reserva da sua vida privada temos uma primeira resposta para esta questatildeo

ENSAIOS JURiacuteDICOS 247

Mas falta distinguir entre intimidade e reserva da vida privashyda e entre clientes individuais e profissionais de um banco Natildeo estamos perante o mesmo tipo de tutela quando contamos que um particular espera que o banco natildeo divulgue a qualquer inteshyressado o volume da sua conta bancaacuteria (porque pura e simplesshymente quer manter sob reserva a sua vida particular) ou quando um comerciante confia no banco para que este natildeo revele quem satildeo os seus clientes fornecedores ou qual eacute o seu grau de endividamento

No caso da pessoa singular estaacute apenas em causa um conshyjunto de valores de natureza moral esta natildeo estaacute em princiacutepio preocupada com possiacuteveis prejuiacutezos econocircmicos ligados a qualshyquer divulgaccedilatildeo Apenas se opotildee por razotildees do seu foro pessoal e que natildeo carecem de fundamentaccedilatildeo que esta tenha lugar

Enquanto que o comerciante pode ser seriamente prejudishycado em termos concorrenciais com a revelaccedilatildeo da lista dos seus clientes ou com a sua situaccedilatildeo financeira

O dever de reserva que cabe ao banqueiro estaacute desta forma a serviccedilo do interesse comercial das empresas suas clientes - que pelo simples facto de o serem ou por necessitarem de obter creacutedishyto lhe datildeo informaccedilotildees com um forte valor comercial ou da pesshysoa singular que deseja manter a privacidade da sua situaccedilatildeo patrimonial

Ou em alternativa ao serviccedilo da manutenccedilatildeo da privacidashyde que qualquer um pode desejar ainda que a possiacutevel violaccedilatildeo desta apenas lhe possa acarretar danos natildeo-patrimoniais

E por isso o segredo bancaacuterio natildeo pode constituir a expresshysatildeo do imperativo constitucional da proteccedilatildeo da intimidade Ateacute porque o acesso a essa esfera estaacute vedado aos proacuteprios bancos

Natildeo nos parece aceitaacutevel que um banco como condiccedilatildeo para a concessatildeo de creacutedito a uma pessoa singular ou para estashybelecer com ela qualquer relaccedilatildeo contratual possa exigir desta informaccedilatildeo de tipo estritamente pessoal ou a sujeiccedilatildeo a exames meacutedicos que atingindo a sua esfera iacutentima afectam a sua dignidashyde Aqui estaacute em causa a ilicitude da pergunta por pressupor o acesso agrave esfera inviolaacutevel (e indisponiacutevel) da intimidade

A informaccedilatildeo que o banco pode obter para a defesa dos seus interesses legiacutetimos natildeo pode ir aleacutem da esfera patrimonial do seu cliente rendimentos bens possuiacutedos perspectivas profisshysionais

( )

248 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

Podemos pois concluir que o segredo bancaacuterio natildeo eacute natildeo pode ser uma concretizaccedilatildeo do princiacutepio constitucional do direishyto agrave intimidade

Este princiacutepio tem como funccedilatildeo consagrar uma zona de reshyselVa pessoal para factos opccedilotildees e circunstacircncias que soacute de forshyma indirecta e de todo secundaacuteria podem ter aspectos ou refleshyxos de natureza patrimonial (Saldanha Sanches J L Segredo Bancaacuterio e Tributaccedilatildeo do Lucro Real In Saldanha Sanches J L Estudos de Direito Contabiliacutestico e Fiscal Coimbra Coimbra Edishytora 2000 pp 105108)

Em diversos paiacuteses haacute a clara percepccedilatildeo que natildeo haacute que se conshyfundir direito agrave intimidade com sigilo bancaacuterio indicando que a quebra do sigilo pela Administraccedilatildeo Tributaacuteria natildeo constitui violaccedilatildeo ao direito Ao contraacuterio a existecircncia de um Estado Fiscal implica na necessidade de consagrar agrave administraccedilatildeo tributaacuteria tal faculdade o que se harmonishyza com diversos princiacutepios e outros direitos fundamentais constantes da Carta de 1988

O caso espanhol eacute exemplar neste sentido ao natildeo visualizar a vioshylaccedilatildeo ao direito agrave intimidade em relaccedilatildeo agrave quebra do sigilo bancaacuterio Portanto

el Tribunal Constitucional espaflOl se ha pronunciado por la negativa de que el conocimiento de las cuentas bancarias por la Administracioacuten pueda invadir el aacutembito constitucionalmente garantizado de la intimidad de los individuos porque tales extractos no constituyen per se uma biografiacutea personal en nuacutemeros y en siacute no tiene relevancia para la intimidad personal y familiar dei contribuyente ya que se trata de dados no secretos y confiados a una entidad (Campos Laura Rodriacuteguez Oerechos dei Contribuyente em la Repuacuteblica Argentina ai Amparo de la Convencioacuten Interamericana de Oerechos Humanos http wwwiefpaorgarcriteriosdigitalarticulosderechoshtm Visitado em 512001)

Ao analisar a jurisprudecircncia da Corte Constitucional espanhola quanto ao tema tambeacutem ressalta Saldanha Sanches

Na apreciaccedilatildeo da constitucionalidade da lei que permitia o controle administrativo das contas bancaacuterias o Tribunal Constitushycional espanhol realizou uma distinccedilatildeo entre intimidade pessoal e familiar e a intimidade econoacutemica onde a proteccedilatildeo constitucional eacute menos intensa

ENSAIOS JURiacuteDICOS 249

E procura fazer uma distinccedilatildeo entre a violaccedilatildeo agrave intimidade como consequumlecircncia de uma anaacutelise das contas bancaacuterias - coloshycando a hipoacutetese de uma recusa de cooperaccedilatildeo por parte do conshytribuinte se tal eventualidade se verificar - e a violaccedilatildeo directa da intimidade uma vez que esta natildeo pode resultar de uma mera anaacuteshylise de movimentos bancaacuterios (Saldanha Sanches J L A Situashyccedilatildeo Actual do Sigilo Bancaacuterio a Singularidade do Regime Portushyguecircs In Saldanha Sanches J L Estudos de Direito Contabiliacutestico e Fiscal Coimbra Coimbra Editora 2000 p 91)

Outro comentarista ao analisar a situaccedilatildeo do sistema espanhol quanto ao sigilo bancaacuterio e o direito agrave intimidade fez questatildeo de ressaltar

Seguacuten el r c frente a la Hacienda Puacuteblica no existe el derecho a la intimidad deI art 18 CE Ya la LO de 5 de mayo deI 82 vada praacutecticamente de contenido constitucional el derecho a la intimidado en cuanto el aacutembito de eacutesta queda deferido a la ley ordinaria (a 2ordm) y en cuanto que la esfera protegida frente a las Administraciones se reduce a poco O nada ai no reputarse intromisiones ilegiacutetimas las actuaciones autorizadas o acordadas por la Autoridad competente de acuerdo con la Ley (art 8ordm 1)

La LGTy el RI Iimiacutetan la esfera de la intimidad en las relacishyones con la Hacienda hasta el extremo de que solamenle existe un refugio limitado en el aacutembito deI secreto profesional en los casos de informacioacuten sobre terceros y siempre que no se trate de datos con transcendencia econoacutemica o tributaria EI rc no ha enconshytrado hasta el momento ni un solo supuesto de dato o informacioacuten econocircmica con transcendencia tributaria que limite la accioacuten inquisitiva de la Administracioacuten tributaria por razoacuten de intimidado Bien puede decirse por tanto que frente a la Administraciocircn tribushytaria en cuanto se trata deI ejercicio de su funciocircn de buacutesqueda de datos con transcendencia tributaria el derecho a la intimidad personal y familiar (art 18 I CE) no existe

La biacuteblia deI tribunal a estos efeclos estaacute constituida por la S 11084 reiterada en numerosas ocasiones ampliada en el Auto 64286 y reafirmada por ejemplo en la S 26 abril 90 tantas veces citada (FJ 10deg) Seguacuten esa doctrina la distribucioacutenjusta de la carshyga fiscal prevalece sobre el derecho a la intimidad parte dei art 812 I de la LO seguacuten el cual frente a la Ley (ordinaria) no hay intimidad protegida siempre que haya en dicha ley imperativos de intereacutes puacuteblico ( ) ni siquiera se habla dei predomiacutenio frente a la

250 SUPERIOR TRIBUNAl DE JUSTiCcedilA

intimidad de intereses u objetivos constitucionalmente protegidos Soacuteo admite que la actuadoacuten administrativa es arbitraria cuando no parezcajustificada por la Finalidad de la inspeccioacuten es decir cuando se trate de datos o informaciones que carezcan de transcendencia tributaria pero eacuteste obviamente no es sin Umite derivado dei derecho a la intimidad sino de la interdiccioacuten de arbitrariedad o desviacioacuten de poder de la Administracioacuten de la necesidad de ajuste de toda Administracioacuten ai acircmbito de su competencia que tanto vale para datos iacutentimos como para otros que no lo sean Seguacuten la S 11084 no hay esfera de intimidad proshytegida frente a una Administracioacuten tributaria amparada en una norma que elimina la intimidad como liacutemite (Garciacutea AIacuteloveros Jaime Una Nueva Ley General Tributaria Problemas Constitucioshynales In Kirchhof P et aI Garantiacuteas Constitucionales dei Contribuyente Valencia Tirant lo Blanch 1999 pp 109110)

Diante de tudo quanto foi exposto tendo-se o cuidado de registrar posicionamento de diferentes autores nacionais e estrangeiros haacute ambiente preparado para ser respondido o primeiro questionamento desdobrado em trecircs partes formulado para o 1II Coloacutequio Internacional de Direito Tributaacuterio promoccedilatildeo do Centro de Extensatildeo Universitaacuteria Eis a primeira parte do seu teor

O sigilo bancaacuterio diz respeito agrave intimidade e privacidade das pessoas

A resposta eacute optando por convencimento influenciado pelas ideacuteias da corrente predominante positiva

O nosso entendimento eacute no sentido de que o direito agrave intimidade integra os direitos da personalidade e visam proteger o direito agrave inviolabilidade do domiciacutelio da correspondecircncia das comunicaccedilotildees de quaisquer espeacutecies dos dados pessoais computadorizados do sigilo bancaacuterio O mesmo acontece com o direito agrave privacidade

A expansatildeo da proteccedilatildeo do direito agrave intimidade e agrave privacidade eacute uma consequumlecircncia da evoluccedilatildeo da era contemporacircnea nos setores tecnoloacutegicos e da instabilidade que passam as instituiccedilotildees estatais especialmente a encarreshygada de arrecadar tributos Haacute o reconhecimento de que desenvolve-se um processo de aguda corrosatildeo na proteccedilatildeo agrave intimidade que ao ser violada provoca a publicizaccedilatildeo das condutas mais iacutentimas do cidadatildeo

A concepccedilatildeo do sigilo bancaacuterio no acircmbito do direito agrave intimidade e agrave privacidade visa garantir ao homem o miacutenimo capaz para que lhe seja asseshygurada a sua condiccedilatildeo humana protegendo-o de ingerecircncias alheias como apregoa a Conferecircncia Noacuterdica sobre o Direito agrave Intimidade realizada em Estoshycolmo na data de maio de 1967 ao fazer inserir no documento que publicou a seguinte definiccedilatildeo O direito agrave intimidade eacute o direito do homem de viver de forma independente a sua vida com um miacutenimo de ingerecircncia alheia

ENSAIOS JURiacuteDICOS 251

5 Seguranccedila juriacutedica e acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias

A segunda pergunta apresentada pelos organizadores do coloacutequio estaacute assim posta

A seguranccedila das relaccedilotildees juriacutedicas atraveacutes do Sistema Financeiro pode ser afetada pelo acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves inforshymaccedilotildees bancaacuterias

O acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias se realizado caracteriza um atentado de suma gravidade aos direishytos do cidadatildeo Eacute um ataque aos princiacutepios sustentadores do sistema demoshycraacutetico adotado pelo constituinte de 1988 especialmente quando detonou que a Repuacuteblica Federativa do Brasil tem como objetivo fundamental o respeishyto agrave dignidade humana e agrave cidadania

Do ordenamento juriacutedico brasileiro a meu pensar natildeo haacute lugar para brotar qualquer interpretaccedilatildeo que conclua pela possibilidade de qualquer agenshyte do Poder Puacuteblico acessar de modo generalizado e sem motivaccedilatildeo informashyccedilotildees bancaacuterias do cidadatildeo mesmo com autorizaccedilatildeo judicial

Esclareccedilo desde logo que natildeo comungo com o pensamento de detershyminada corrente no sentido de ser absoluto o direito ao sigilo bancaacuterio Tenho-o como relativo poreacutem vinculado aos princiacutepios da razoabilidade da moralidade da legalidade e da motivaccedilatildeo expliacutecita e detalhada sob pena de ser impossiacutevel a sua quebra

O acesso indiscriminado do agente fiscal agraves informaccedilotildees bancaacuterias do cidadatildeo gera uma quebra da seguranccedila das relaccedilotildees juriacutedicas por um terceiro passar a ter sem causa justificadora conhecimento da vida iacutentima de algueacutem submetendo-o a partir daiacute a um regime de submissatildeo Por outro lado ninshygueacutem poderaacute garantir nem o proacuteprio Estado que o agente puacuteblico utilize os dados que chegaram ao seu conhecimento para outros intentos que natildeo o exclusivamente fiscal

Lembra Arnoldo Wald que O segredo na atividade bancaacuteria envolve concomitantemente interesses privaqos e coletivos que podem ser analisashydos sob trecircs acircngulos o interesse do cliente na sua relaccedilatildeo com a instituiccedilatildeo financeira o interesse do banco em atuar com discriccedilatildeo para ganhar a conshyfianccedila da populaccedilatildeo e captar recursos e o interesse social na existecircncia de um bom e eficiente sistema bancaacuterio Por estarem ligadas ao desenvolvimento da economia e aos interesses da comunidade as relaccedilotildees que envolvem as instishytuiccedilotildees financeiras natildeo recebem o mesmo tratamento juriacutedico dispendido a outras relaccedilotildees comerciais Inviaacutevel a aplicaccedilatildeo exclusiva das regras de Direito Privado as quais tecircm como princiacutepio norteador a autonomia da vontade pois

252 SUPERIOR TRIBUNAl DE JUSTiCcedilA

esta encontra limites nas normas cogentes proacuteprias do direito bancaacuterio e na intervenccedilatildeo do Estado8

A seguranccedila juriacutedica desse tipo de relaccedilatildeo envolve tambeacutem a manutenshyccedilatildeo do segredo das movimentaccedilotildees financeiras do contribuinte

Imprimir-se a mais ampla seguranccedila nas relaccedilotildees do Sistema Financeiro eacute fortalececirc-lo O Estado tem o dever de zelar por esse estado de seguranccedila natildeo permitindo consequumlentemente que o sigilo bancaacuterio seja quebrado pelo acesshyso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico por esse comportamento afeshytar a confiabilidade no sistema

Eacute de todo inconveniente permitir a possibilidade de um atuar do agente fiscal sem controle na quebra do sigilo bancaacuterio por afetar diretamente a seshyguranccedila da relaccedilatildeo juriacutedica firmada entre a instituiccedilatildeo financeira e o seu clienshyte em face deste sentir-se atingido pela accedilatildeo fiscal que passa a tomar conhecishymento de sua intimidade financeira e de fatos de sua vida privada sem o resshypaldo do Poder Judiciaacuterio

A seguranccedila juriacutedica nesse tipo de relaccedilatildeo deve assegurar impossibilidashyde de abuso de poder por parte do Fisco em face da necessidade de ser resshyguardada a garantia de que em um Estado de Direito natildeo pode ser concebido que conceda-se a uma parte mesmo que seja o Estado o domiacutenio absoluto de apanhar as provas que iraacute utilizar em caso de litiacutegio contra algueacutem

O acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias do contribuinte aleacutem de afetar a seguranccedila juriacutedica da relaccedilatildeo em questatildeo promove um desequiliacutebro entre o cidadatildeo-contribuinte e o Fisco por caracterizar coaccedilatildeo que coloca aquele em posiccedilatildeo de inferioridade

A valorizaccedilatildeo da seguranccedila juriacutedica da relaccedilatildeo existente entre instituiccedilatildeo financeira e contribuinte pelo Fisco natildeo quebrando o seu sigilo fiscal sem autorizaccedilatildeo judicial constitui causa de aplicaccedilatildeo de Justiccedila fiscal O seguimenshyto de seus princiacutepios valoriza o regime democraacutetico do qual ela faz parte

6 Casos de admissibilidade da quebra do sigilo bancaacuterio

Os casos de admissibilidade da quebra do sigilo bancaacuterio estatildeo na atuashylidade descritos no nosso ordenamento juriacutedico positivo

A Lei Complementar n 105 de 10 de janeiro de 2001 apoacutes determinar no art 112 de que as instituiccedilotildees financeiras conservaratildeo sigilo em suas operashyccedilotildees ativas e passivas e serviccedilos prestados dispotildee no sect 312 do mesmo artigo que

8 Arnoldo Wald no artigo Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais Revista dos Tribunais ano 6 n 22 janeiromiddotmarccedilo de 1998 n 22 Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas p 15

ENSAIOS JURiacuteDICOS 253

sect 3ordm Natildeo constitui violaccedilatildeo do dever de sigilo

I a troca de informaccedilotildees entre instituiccedilotildees financeiras para fins cadastrais inclusive por intermeacutedio de centrais de risco observadas as normas baixadas pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e pelo Banco Censhytral do Brasil

11 - o fornecimento de informaccedilotildees constantes de cadastro de emitentes de cheques sem provisatildeo de fundos e de devedores inadimplentes a entidades de proteccedilatildeo ao creacutedito observadas as norshymas baixadas pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e pelo Banco Central do Brasil

JJI - o fornecimento das informaccedilotildees de que trata o sect 2ordm do art II da Lei n 9311 de 24 de outubro de 1996

IV - a comunicaccedilatildeo agraves autoridades competentes da praacutetica de iliacutecitos penais ou administrativos abrangendo o fornecimento de inforshymaccedilotildees sobre operaccedilotildees que envolvam recursos provenientes de qualshyquer praacutetica criminosa

V - a revelaccedilatildeo de informaccedilotildees sigilosas com o consentimento expresso dos interessados

VI- a prestaccedilatildeo de informaccedilotildees nos termos e condiccedilotildees estabeleshycidos nos artigos 2ordm 3ordm 4ordm 5ordm 6ordm 7ordm e 9ordm desta lei complementar

sect 4ordm A quebra de sigilo poderaacute ser decretada quando necessaacuteria para apuraccedilatildeo de ocorrecircncia de qualquer iliacutecito em qualquer fase do inqueacuterito ou do processo judicial e especialmente nos seguintes crimes

I - de terrorismo

11 - de traacutefico iliacutecito de substacircncias entorpecentes ou drogas afins

III - de contrabando ou traacutefico de armas municcedilotildees ou material destinado a sua produccedilatildeo

IV - de extorsatildeo mediante sequumlestro

V - contra o sistema financeiro nacional

VI - contra a Administraccedilatildeo Puacuteblica

Vll- contra a ordem tributaacuteria e a previdecircncia social

VIII-lavagem de dinheiro ou ocultaccedilatildeo de bens direitos e valores

IX - praticado por organizaccedilatildeo criminosa

Como visto a lei complementar enumera inuacutemeras situaccedilotildees que indeshypendentemente de autorizaccedilatildeo judicial o sigilo bancaacuterio eacute quebrado

254 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

A dificuldade que se apresenta eacute a de conciliar os casos de quebra de sigilo bancaacuterio que a Lei Complementar n 105 autoriza com a garantia do direito agrave privacidade e agrave intimidade

Destaque-se entre os de maior relevacircncia os seguintes

- natildeo constituir violaccedilatildeo do dever de sigilo bancaacuterio a troca de informashyccedilotildees entre instituiccedilotildees financeiras para fins cadastrais inclusive por intermeacuteshydio de centrais de risco o que possibilita o conhecimento da vida financeira privada do cidadatildeo por vaacuterias pessoas sem desempenho de autoridade na instituiccedilatildeo independentemente de ser justificada com antecedecircncia a causa desse atuar

- o de serem fornecidos dados relativos a fornecimentos de informashyccedilotildees cadastrais de emitentes de cheques sem provisatildeo de fundos a entidades privadas de proteccedilatildeo ao creacutedito sem qualquer avaliaccedilatildeo por qualquer autorishydade da causa determinante do fato a quebra do sigilo bancaacuterio na fase do inqueacuterito por inexistir nessa ocasiaacuteo qualquer contraditoacuterio e respeito ao prinshyciacutepio do devido processo legal

Quanto agraves demais situaccedilotildees constantes na lei complementar que autorishyzam a quebra do sigilo bancaacuterio naacuteo obstante algumas serem absolutamente necessaacuterias haacute de serem vistas em compatibilidade com as garantias constitushycionais conforme jaacute assinalado

O colendo Supremo Tribunal pronunciaraacute como guarda e inteacuterprete maishyor da Carta Magna em ADln jaacute intentada sobre a constitucionalidade ou natildeo dos dispositivos supramencionados

Em campo doutrinaacuterio valoriza-se as posiccedilotildees apresentadas quando da resposta oferecida aos questionamentos anteriores todas acenando pela neshycessidade do controle do Poder Judiciaacuterio

7 Sistema mais justo para a quebra do sigilo bancaacuterio

Os organizadores do JII Coloacutequio Internacional de Direito Tributaacuterio subshymetem agora para anaacutelise a questatildeo do teor seguinte Um sistema em que o Poder Judiciaacuterio torna-se aacuterbitro dos pedidos da Administraccedilatildeo Puacuteblica para quebra do sigilo eacute o mais justo

Em um Estado que por imposiccedilatildeo de sua proacutepria Constituiccedilatildeo estaacute comprometido com a guarda e aplicaccedilatildeo efetiva de princiacutepios democraacuteticos especialmente o de respeitar os direitos e garantias fundamentais da cidadashynia natildeo haacute ambiente para que seja outorgado ao Poder Executivo por via da atuaccedilatildeo de agentes puacuteblicos fiscais o acesso sem o controle do Poder Judiciaacuteshyrio agraves informaccedilotildees bancaacuterias do contribuinte

ENSAIOS JURiacuteDICOS 255

o sigilo bancaacuterio por ser um direito fundamental que exige ser respeitashydo pela supremacia constitucional que o protege deve submeter a possibilishydade de sua quebra para fins tributaacuterios ao Poder Judiciaacuterio pela ausecircncia de interesse direto nos resultados da accedilatildeo fiscalizadora que eacute o recolhimento do tributo e pelas garantias de independecircncia prudecircncia e qualificaccedilatildeo juriacutedica que revestem esse poder

A atuaccedilatildeo da fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo pode ser exercida fora dos limishytes da legalidade imposta a partir da Carta Magna e demais imposiccedilotildees legais a ela subordinadas

Natildeo se desconhece que no atual Estado fiscal os tributos constituem os meios financeiros determinantes para o atendimento dos compromissos da Administraccedilatildeo Puacuteblica com as obrigaccedilotildees oriundas em decorrecircncia de sua atividade no campo educacional social de seguranccedila puacuteblica interna e extershyna da sauacutede da manutenccedilatildeo dos Poderes ou seja para manter funcionando a maacutequina estatal

Por natildeo entremostrar-se na eacutepoca contemporacircnea qualquer outra alshyternativa viaacutevel para transformar o Estado fiscal em um Estado produtivo os tributos passam a representar um indeclinaacutevel dever da cidadania cujo cumshyprimento deve ser por todos honrado conforme assinala Joseacute Casalta Nabais Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra em artigo intitulado Algumas Reflexotildees sobre o Actual Estado Fiscal

Por isso os impostos hatildeo de constituir um preccedilo aceitaacutevel ou seja um preccedilo limitado Um preccedilo que estou certo muitas das sociedashydes que nos antecederam gostariam de ter pago e algumas das actuais natildeo enjeitariam suportar Por isso bem podemos afirmar como jaacute o fizeshymos noutro lugar que no actual Estado fiscal para o qual natildeo se vislumshybra qualquer alternativa viaacutevel pelo menos nos tempos mais proacuteximos os impostos constituem um indeclinaacutevel dever de cidadania cujo cumshyprimento a todos nos deve honrar

A atuaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio para liberar o bloqueio fortalece a conshyfianccedila do cidadatildeo no procedimento da fiscalizaccedilatildeo e consagra a ideacuteia iacutensita em qualquer regime democraacutetico de que a atuaccedilatildeo do Estado tem limites

Na espeacutecie os limites impostos satildeo os decorrentes da quebra do sigilo ser necessaacuterio em face da possiacutevel ilicitude cometida pelo cidadatildeo poreacutem sem ser violados os direitos do cidadatildeo de gozar da sua privacidade e da sua intimidade

A denominada cidadania fiscal haacute de ser considerada de modo conjunshytural com os reflexos dos direitos fundamentais assegurados ao contribuinte sem prestigiar a responsabilidade que tem o Estado de promover a arrecadashyccedilatildeo dos tributos

256 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

Cedo espaccedilo para registrar que a cidadania fiscal deve configurar um estado de relaccedilatildeo juriacutedica em que todos suportem a concretizaccedilatildeo de um Estado em que todos tenham a qualidade de destinataacuterio do dever fundashymentaI de pagar impostos na medida da respectiva capacidade contributiva poreacutem que seja um Estado fiscal suportaacutevel isto eacute um estado cujo sistema fiscal se encontre balizado por estritos limites juriacutedico-constitucionais9

A Administraccedilatildeo Tributaacuteria por melhor que seja a sua estrutura e os seus propoacutesitos natildeo estaacute emocionalmente preparada para conceber e aplicar os princiacutepios que sustentam a cidadania fiscal Isso ocorre primeiramente porshyque o Fisco tem por missatildeo exclusiva exercer a funccedilatildeo de arrecadar tributos Eacute a sua meta essencial por ser atribuiccedilatildeo que na organizaccedilatildeo administrativa estatal estaacute obrigado a desempenhar Natildeo lhe cabe administrar o tributo arreshycadado limitando-se unicamente a envidar esforccedilos para o cumprimento das metas impostas para imprimir aumento na arrecadaccedilatildeo tributaacuteria O sucesso da Administraccedilatildeo Tributaacuteria eacute medido pelo maior volume de recursos fiscais atraiacutedos para os cofres do Governo nunca pelo respeito que exerccedila para com os direitos fundamentais do contribuinte Eacute uma questatildeo de cultura adminisshytrativa de distribuiccedilatildeo de funccedilotildees no sistema estatal impossiacutevel de ser mudashydo por sugestotildees doutrinaacuterias

Por outro lado a fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo consegue afastar as pressotildees exercidas sobre ela por determinados segmentos da organizaccedilatildeo estatal que defendem uma atuaccedilatildeo mais agressiva para a cobranccedila dos tributos tudo em decorrecircncia dos efeitos produzidos pela conduta iliacutecita marcante da sonegashyccedilatildeo fiscal

Esses fatores contribuem para que a fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo tenha condiccedilotildees de modo imparcial sem isenccedilatildeo avaliar a necessidade objetiva da quebra do sigilo bancaacuterio do cidadatildeo Por melhor que seja o seu desempenho nunca ganharaacute a confianccedila do contribuinte

A atribuiccedilatildeo da quebra do sigilo bancaacuterio em um regime democraacutetico onde predomina o respeito maior aos direitos fundamentais da cidadania deve ser exercido pelo Poder Judiciaacuterio natildeo soacute porque seus membros atualmente revestidos da garantia da vitaliciedade inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos bem como porque estatildeo revestidos de independecircncia absoluta em relaccedilatildeo ao Poder interessado na cobranccedila do tributo e consequumlentemenshyte no resultado a ser obtido pela accedilatildeo fiscal

Esse sistema misto onde o Fisco faz a solicitaccedilatildeo motivada para a queshybra do sigilo bancaacuterio ao Poder Judiciaacuterio e este apoacutes analisaacute-lo com objetivishydade e cautela defere ou indefere impotildee seguranccedila e confiabilidade na atuashyccedilatildeo fiscal e sublima o respeito agrave dignidade do contribuinte em outras palavras da cidadania fiscal isto eacute de uma cidadania de liberdade que o Estado fiscal

9 Joseacute Casalta Nabais (Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra) no artigo Algumas Reflexotildees sobre o Actual Estado Fiscal no site httpagugovbr

ENSAIOS JURiacuteDICOS 257

pressupotildee para natildeo ser postergada impotildee um sistema fiscal balizado por esshytritos limites juriacutedico-constitucionais Limites esses que integram a chamada constituiccedilatildeo fiscal e que podemos reconduzir para natildeo nos alongarmos nesse aspecto a duas ideacuteias uma ideacuteia de seguranccedila que tem o seu tradicional e principal suporte no princiacutepio da lega1idade fiscal e uma ideacuteia de justiccedila ou equumlidade que tem a ver com a medida dos impostos e assenta no princiacutepio da capacidade contributiva 10

Em conclusatildeo a adoccedilatildeo de um sistema para a quebra do sigilo bancaacuteshyrio em que o Poder Judiciaacuterio seja o aacuterbitro dos pedidos da Administraccedilatildeo Puacuteblica natildeo eacute somente mais justo mas consegue impor maior credibilidade agrave atuaccedilatildeo fiscal e presta homenagem com intensa potencialidade aos princiacuteshypios democraacuteticos consistentes na guarda da seguranccedila juriacutedica do respeito aos direitos fundamentais do cidadatildeo nesse rol incluidos os agrave privacidade e agrave intimidade Aleacutem disso torna mais respeitaacutevel a relaccedilatildeo entre Fisco e contrishybuinte justificando portanto a opccedilatildeo do Estado pelo regime democraacutetico

8 Autoridade fiscal e faculdade incondicionada de quebrar o sigilo bancaacuterio

Essa indagaccedilatildeo consubstancia a preocupaccedilatildeo de serem estabelecidos controles para a atuaccedilatildeo do agente puacuteblico fiscal Centra-se a preocupaccedilatildeo em imprimir nas relaccedilotildees juriacutedicas tributaacuterias de quaisquer espeacutecies o primashydo da legalidade aprimorando-se o atuar vinculado

Natildeo concilia-se com os postulados da democracia a adoccedilatildeo de um sisteshyma de fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria que outorgue faculdade incondicionada ao fiscal tributaacuterio de invadir a intimidade e a privacidade das pessoas sob o falso argushymento juriacutedico de que busca encontrar provas de sonegaccedilatildeo fiscal

Depreende-se do exposto que a autoridade fiscal natildeo deve ter faculdade incondicionada de quebrar o sigilo sempre que entender necessaacuterio Isso porshyque a praacutetica de atos administrativos por agentes puacuteblicos de modo incondicionado revela grave violaccedilatildeo ao princiacutepio da legalidade onde predoshymina a vontade da lei e natildeo o discricionarismo de quem o pratica

No trato do sigilo bancaacuterio o atuar incondicionado da fiscalizaccedilatildeo assushyme caracteriacutesticas de maior gravidade porque haacute violaccedilatildeo aos princiacutepios funshydamentais jaacute expostos e que satildeo prestigiados pela Carta Magna especialmenshyte por bater de frente de modo integral e absoluto com o direito agrave intimidade e agrave privacidade O atuar deve vincular-se rigidamente ao princiacutepio da legalidashyde especialmente aposta na Carta Magna sem a possibilidade de ser aberto qualquer canal para uso da conveniecircncia ou da oportunidade

Eacute de ser lembrada no trato do assunto a liccedilatildeo de Joseacute Casalta Nobais no trabalho jaacute citado no sentido de que Eacute certo que independentemente da

10 Idem p 15

=258=---___________________ SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTlCA

concepccedilatildeo a que se adira relativamente ao segredo bancaacuterio natildeo temos a menor duacutevida de que o acesso da Administraccedilatildeo Fiscal agrave informaccedilatildeo bancaacuteria seja directo sem necessidade de preacutevia decisatildeo judicial seja indirecto depois portanto de preacutevia decisatildeo judicial haacute de ter sempre uma natureza claramenshyte excepcional Na verdade constitua o segredo bancaacuterio uma manifestaccedilatildeo do direito fundamental agrave reserva da intimidade da vida privada constante do art 26 n 2 da Constituiccedilatildeo portuguesa ou suporte um outro direito fundashymentai um direito agrave reserva da vida privada anaacutelogo agravequele a sua afectaccedilatildeo teraacute sempre caraacuteter excepcional

A autoridade fiscal natildeo possui a necessaacuteria isenccedilatildeo e competecircncia institucional para averiguar o grau dessa excepcionalidade de modo que posshysa impor confianccedila ao cidadatildeo investido na condiccedilatildeo de contribuinte poreacutem com direitos a serem assegurados por forccedila do regime democraacutetico adotado

O certo eacute que na relaccedilatildeo juriacutedico-tributaacuteria deve ser buscado o justo equiliacutebrio pregado pelo Estado de Direito onde o cidadatildeo deve ter a sua dignishydade respeitada sem contudo afastar-se a necessidade do Estado arrecadar tributos de forma cogente e imperativa bem como de serem permitidas conshydiccedilotildees de atuaccedilatildeo que resultem no combate agrave sonegaccedilatildeo fiscal

9 Responsabilidade da autoridade administrativa que quebrar o sigilo banshycaacuterio de forma inconsistente e indevida

Eacute inerente ao regime democraacutetico que a autoridade administrativa puacuteblishyca estaacute obrigada a exercer as suas atribuiccedilotildees com rigorosa obediecircncia aos princiacutepios da legalidade moralidade publicidade impessoalidade e eficiecircncia entre outros

A Carta Magna consagra expressamente no art 37 a obediecircncia do agente puacuteblico a esse tipo de comportamento

A autoridade administrativia que quebrar de modo inconsistente e indevido o sigilo bancaacuterio do cidadatildeo pratica ato com capacidade de provocar os seguintes efeitos a) de invadir o direito agrave privacidade e agrave intimidade de algueacutem b) de provocar-lhe danos morais e materiais dependendo da repershycussatildeo provocada pelo seu atuar

Constatada a efetivaccedilatildeo real de danos morais e materiais a responsabishylidade do Estado pode ser acionada conforme permite o art 37 sect 6ordm da Consshytituiccedilatildeo Federal Solidificada a culpa ou dolo do agente puacuteblico e consagrada a materializaccedilatildeo do iliacutecito praticado com o consequumlente ressarcimento patrimonial o Estado deveraacute usando o direito de regresso investir contra o agente que agiu culposa ou dolosamente

Natildeo resume-se apenas ao campo da responsabilidade civil a atuaccedilatildeo da autoridade quando ilegalmente quebra o sigilo bancaacuterio de qualquer cidadatildeo

ENSAIOS JURiacuteDICOS 259

o art 10 da Lei Complementar n 105 de 10 de janeiro de 2001 determishyna que A quebra de sigilo fora das hipoacuteteses autorizadas nesta lei compleshymentar constitui crime e sujeita os responsaacuteveis agrave pena de reclusatildeo de um a quatro anos e multa aplicando-se no que couber o Coacutedigo Penal sem prejuiacuteshyzo de outras sanccedilotildees cabiacuteveis A seguir no seu paraacutegrafo uacutenico explicita que Incorre nas mesmas penas quem omitir retardar injustificadamente ou presshytar falsamente as informaccedilotildees requeridas nos termos desta lei complementar

O art 11 da mesma lei complementar expressa que O servidor puacuteblico que utilizar ou viabilizar a utilizaccedilatildeo de qualquer informaccedilatildeo obtida em decorshyrecircncia da quebra de sigilo de que trata esta lei complementar responde pessoshyal e diretamente pelos danos decorrentes sem prejuiacutezo da responsabilidade objetiva da entidade puacuteblica quando comprovado que o servidor agiu de acorshydo com a orientaccedilatildeo oficial

10 O sigilo bancaacuterio e o tratamento que lhe eacute dado por oacutergatildeos internacioshynais como a OCDE e outros

Rui Celso Reali Fragoso Presidente do Instituto dos Advogados de Satildeo Paulo em artigo intitulado O Sigilo Bancaacuterio veiculado pela Internet (http Ii wwwjuscombr) registra que atualmente temos trecircs sistemas legais no munshydo cuidando do sigilo bancaacuterio O primeiro eacute o anglo-saxatildeo em que o sigilo natildeo encontra amparo legal o segundo eacute o dos paiacuteses da Europa continental - eu o contemplo em vaacuterios diplomas legais o terceiro eacute o da Suiacuteccedila e do Liacutebano que o reforccedilam

Analisando esses trecircs sistemas o autor citado observa

Haacute aparente contradiccedilatildeo no sistema inglecircs e norte-americano pois se de um lado nestes paiacuteses se eleva a garantia das liberdades individuais de outro se despreza o sigilo bancaacuterio Eacute que se ocorre conshyflito entre a apuraccedilatildeo de fatos (fator social) e a privacidade das pessoas (fator individual) prevalece a primeira Mais ainda o relacionamento de clientes e bancos longe de estabelececirc-lo serve como fonte de informashyccedilatildeo em favor de terceiros a indiscriccedilatildeo injustificada poreacutem eacute objeto de sanccedilatildeo E na Inglaterra os poderes puacuteblicos natildeo intervecircm no funcionashymento dos estabelecimentos privados de creacutedito o que debilita a invesshytigaccedilatildeo

Nos paiacuteses da Europa continental a legislaccedilatildeo contempla o sigilo bancaacuterio como consequumlecircncia do profissional e comporta derrogaccedilotildees na esfera penal e em alguns casos na civil mas comina sanccedilotildees crimishynais no caso de violaccedilatildeo ao sigilo (Coacutedigo Penal francecircs artigo 378 Coacuteshydigo Penal italiano art 622)

260 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

A sistemaacutetica fortalecida eacute aquela utilizada na Suiacuteccedila decorrente da crise ocorrida em 1931 com o fechamento do Banco de Genebra que ensejou a ediccedilatildeo de lei estabelecendo severas puniccedilotildees de natureza civil e criminal Tanto a legislaccedilatildeo suiacuteccedila como a libanesa esta surgida em 1956 permitem derrogaccedilotildees em certas hipoacuteteses A existecircncia das conshytas numeradas comprova a importacircncia do sigilo nestes paiacuteses

Eacute certo natildeo ser absoluto o segredo nem sua quebra em determishynadas situaccedilotildees significa abuso de poder Aliaacutes nenhum direito eacute absoluto

A doutrina tem ultimamente tomado conhecimento sobre as transforshymaccedilotildees que tem passado em vaacuterios ordenamentos juriacutedicos a questatildeo do sigilo bancaacuterio

Zenobio Simotildees de Melo advogado no Paranaacute em artigo sob o tiacutetulo Quebra do Sigilo Bancaacuterio (Internet httpjuscombr) informa que o jornal O Estado de Satildeo Paulo de 21 de junho de 2000 publicou a notiacutecia seguinte

Numa das mais importantes decisotildees adotadas durante o Conseshylho Europeu que marca o fim da presidecircncia portuguesa da Uniatildeo Euroshypeacuteia (UE) seus 15 paiacuteses aprovaram ontem o pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal No ponto mais polecircmico o pacote deveraacute acabar com o sigilo bancaacuterio ateacute 2010 foi uma negociaccedilatildeo de 12 anos Aacuteustria e Luxemburgo natildeo aceitavam o princiacutepio de acabar com o sigilo bancaacuterio A justificativa austriacuteaca eacute que este eacute um princiacutepio que faz parte da Consshytituiccedilatildeo do paiacutes haacute 200 anos Para aceitar o acordo o paiacutes exigiu a manushytenccedilatildeo do sigilo nos bancos austriacuteacos para quem resida no paiacutes

Registro a iacutentegra da notiacutecia

Pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal eacute aprovado por membros da UE Decisatildeo prevecirc quebra do sigilo bancaacuterio nos paiacuteses do bloco econocircmico

Jair Rattner

Especial para o Estado

Santa Maria da Feira Portugal- Numa das mais importantes decishysotildees adotadas durante o Conselho Europeu que marca o fim da presishydecircncia portuguesa da Uniatildeo Europeacuteia (UE) seus 15 paiacuteses aprovaram ontem o pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal No ponto mais polecircmico o pashycote deveraacute acabar com o sigilo bancaacuterio ateacute 2010

Foi uma negociaccedilatildeo de 12 anos Agora temos um documento que vai estabelecer os princiacutepios e as orientaccedilotildees para as futuras diretivas nessa aacuterea afirmou o Primeiro-Ministro Portuguecircs Antonio Guterres que ocupa a presidecircncia rotativa da UE (no fim do mecircs ela seraacute transferida para a Franccedila)

ENSAIOS JURiacuteDICOS 261

o acordo abrange trecircs aacutereas um coacutedigo de conduta que prevecirc o desmantelamento dos 66 paraiacutesos fiscais existentes ou dependentes da UE a tributaccedilatildeo de royalties e o pagamento de impostos sobre rendishymentos das poupanccedilas de cidadatildeos europeus residentes em outros paiacuteshyses dentre os 15 que fazem parte do bloco econocircmico europeu

O grande problema eram as poupanccedilas Aacuteustria e Luxemburgo natildeo aceitavam o princiacutepio de acabar com o sigilo bancaacuterio A justificativa austriacuteaca eacute que este eacute um princiacutepio que faz parte da Constituiccedilatildeo do paiacutes haacute 200 anos Para aceitar o acordo o paiacutes exigiu a manutenccedilatildeo do sigilo nos bancos austriacuteacos para quem resida no paiacutes Essa questatildeo natildeo eacute importante soacute para a Europa porque abre caminho para a criaccedilatildeo de mecanismos de transparecircncia global no mundo financeiro que satildeo esshysenciais para a globalizaccedilatildeo da economia avaliou Guterres

O prazo para a introduccedilatildeo das mudanccedilas vai ateacute o fim de 2010 Ateacute o fim deste ano as negociaccedilotildees vatildeo ser sobre a definiccedilatildeo do conteuacutedo das diretivas (as normas da UE)

Em 2002 a UE discutiraacute com outros paiacuteses esses conteuacutedos para fazer acordos que deveratildeo ser aprovados ateacute o fim do ano por unanimishydade

A partir de 2003 seraacute iniciado um periacuteodo de sete anos de transishyccedilatildeo para a troca de informaccedilotildees sobre os investimentos de cidadatildeos de outros paiacuteses europeus Nesse periacuteodo alguns paiacuteses poderatildeo optar por cobrar impostos de 20 a 25 sobre os rendimentos dos investimentos de residentes no exterior

No capiacutetulo onde foi analisado o sigilo bancaacuterio no Direito Comparado haacute registros tambeacutem a respeito do tratamento que oacutergatildeos internacionais como o OCDEll e outros vecircm dando ao sigilo bancaacuterio conforme estudo que foi apresentado pelo autor ali citado

II OCDE (Organizaccedilatildeo de Cooperaccedilatildeo e Desenvolvimento Econocircmico) criado em 1961 para substituir a OECE (Comitecirc Fiscal da Organizaccedilatildeo Europeacuteia de Cooperaccedilatildeo Econocircmica) Um dos documentos mais importantes da OCDE eacute o resultante da sua Convenccedilatildeo-Modelo relashytiva a impostos sobre a renda e o capital Essa Convenccedilatildeo estaacute sistematizada em sete capiacutetulos assim explicitados por Alberto Xavier em sua obra Direito Tributaacuterio Internacioshynal do Brasil A Convenccedilatildeo-Modelo da OCDE (tal como a das Naccedilocirces Unidas) encontra-se sistematizada em sete capiacutetulos Os capiacutetulos I e I regulam os requisitos para a aplicaccedilatildeo do tratado O capiacutetulo [JI - de longe o mais importante - conteacutem as regras de distribuiccedilatildeo de competecircncia no que concerne aos impostos sobre o rendimento classificado este por tipos ou classes agrave semelhanccedila do que sucede nos sistemas de tributaccedilatildeo cedular O capiacutetulo IV ocupa-se das regras de distribuiccedilatildeo de competecircncia no que respeita aos impostos sobre o capital O capiacutetulo V determina as consequumlecircncias das regras dos capiacutetulos 111 e IV facultanshydo aos Estados a escolha entre os meacutetodos da isenccedilatildeo e da imputaccedilatildeo O capiacutetulo VI conteacutem disposiccedilotildees adicionais sobre natildeo-discriminaccedilatildeo procedimento amigaacutevel troca de informaccedilotildees e privileacutegios de funcionaacuterios diplomaacuteticos e consulares e regras sobre extenshysatildeo do tratado a partes do territoacuterio Enfim o capiacutetulo VII conteacutem disposiccedilotildees finais sobre entrada em vigor e cessaccedilatildeo do acordo

262 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

Heleno Torres em sua recente obra Direito Tributaacuterio Internacional -Planejamento Tributaacuterio e Operaccedilotildees Transnacionais RT p 147 analisando o posicionamento da OCDE referente agrave poliacutetica de determinados paiacuteses que adoshytam tributaccedilatildeo favorecida e os efeitos dos regimes fiscais prejudiciais registra que

A OCDE resolveu entrar na luta para minorar as praacuteticas fiscalshymente danosas insistindo sobre a necessidade de aumentar as trocas de informaccedilotildees entre os Estados aleacutem de redigir uma lista de paiacuteses com tributaccedilatildeo favorecida e fazer algumas recomendaccedilotildees em acircmbito nacional e convencional a partir do seu importante relatoacuterio Harmful tax competition na emerging global issue

Mesmo reconhecendo os aspectos positivos do ambiente global vigente no qual os sistemas tributaacuterios operam os paiacuteses-membros da OCDE concluiacuteram que eles precisavam agir para restringir a competiccedilatildeo tributaacuteria danosa coletivamente e individualmente opondo-se agrave expanshysatildeo de regimes de impostos preferenciais danosos particularmente nos setores financeiros e atividades de serviccedilo que podem causar distorccedilotildees no comeacutercio e desniacuteveis nos padrotildees de investimento sendo uma ameashyccedila para os sistemas tributaacuterios domeacutesticos e para a estrutura global de tributaccedilatildeo internacional

Mais adiante pp 152153 Heleno Torres afirma que

Entre as recomendaccedilotildees definidas nesse relatoacuterio com aplicashyccedilatildeo dirigida aos paiacuteses-membros da instituiccedilatildeo as mais importantes satildeo as seguintes

bull para contrastar a competiccedilatildeo fiscal prejudicial os paiacuteses devem revisar as suas leis regulamentos e praacuteticas sobre sigilo bancaacuterio para remover empecilhos de acesso a tais informaccedilotildees por autoridades fiscais

bull intensificar o uso de trocas de informaccedilotildees principalmente soshybre as transaccedilotildees com paiacuteses de tributaccedilatildeo favorecida

A conclusatildeo que pode ser firmada apoacutes anaacutelise dos pronunciamentos internacionais acima explicitados eacute a construccedilatildeo de uma corrente que defenshyde uma maior abertura para a quebra do sigilo bancaacuterio quando for necessaacuteshyrio para apurar iliacutecitos tributaacuterios

Essa portanto eacute a resposta que apresento para a indagaccedilatildeo Qual o tratamento proposto por oacutergatildeos internacionais como o OCDE e outros com relaccedilatildeo ao sigilo bancaacuterio

ENSAIOS JURiacuteDICOS 263

11 Compatibilizaccedilatildeo do combate agrave criminalidade internacional com o resshypeito agrave seguranccedila juriacutedica a fim de evitar a fuga de investimentos do Paiacutes

Haacute de se reconhecer natildeo ser faacutecil desenvolver-se um sistema juriacutedico que contenha regras que facilitem o combate agrave criminalidade internacional e ao mesmo tempo prestigie os direitos fundamentais do cidadatildeo especialmenshyte a sua seguranccedila juriacutedica

As convenccedilotildees internacionais conforme demonstrado estatildeo preocupashydas com esses aspectos sem deixar de lado os fenocircmenos causados pela globalizaccedilatildeo

Natildeo deve ser esquecido que o tema envolve aspectos diversos a comeshyccedilar pelos determinantes da soberania dos Estados das forccedilas em expansatildeo das organizaccedilotildees internacionais e da pregaccedilatildeo para que os direitos fundamenshytaIacutes do cidadatildeo sejam respeitados com maior Iacutentensidade

A soluccedilatildeo a meu pensar pode ser encontrada no fortalecimento do Direito Comunitaacuterio Os Estados por via de organismos internacionais firmashyriam tratados para a adoccedilatildeo de um Coacutedigo Processual Penal Internacional com efeitos vinculantes por parte das naccedilotildees onde seriam adotadas regras investigatoacuterias e apuratoacuterias dos iliacutecitos internacionais alargando os conceitos de indiacutecios e presunccedilotildees sem deixar contudo de prestigiar a afetividade dos direitos e garantias fundamentais do cidadatildeo

Todas as naccedilotildees no iniacutecio deste seacuteculo envidam esforccedilos para diminuir a crise da seguranccedila juriacutedica Satildeo vaacuterios os fatores determinantes todos tendo como causa comum o crescimento da delinquumlecircncia em decorrecircncia de poliacutetishycas econocircmicas e sociais adotadas por determinados governos que contrishybuem para aumentar o percentual de pessoas pobres

A preocupaccedilatildeo atual para o combate ao crime internacional eacute alcanccedilar niacutevel de uniformizaccedilatildeo dos sistemas adotados para a quebra do sigilo bancaacuteshyrio De iniacutecio deve ser defendida a postura de que nenhuma lesatildeo ou ameaccedila a direito deve ser excluiacuteda da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio Nessa perspectishyva ganha suma importacircncia a criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional em virshytude de pela sua atuaccedilatildeo natildeo perdurar a diversidade de sistemas legais a respeito do assunto a saber a) O anglo-saxatildeo onde o sigilo natildeo encontra amparo legal b) o dos paiacuteses da Europa continental que o contempla em vaacuterios diplomas escritos e c) o da Suiacuteccedila e do Liacutebano que o reforccedilam l2bull

A criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional envolve uma reconceiacutetuaccedilatildeo de soberania

Sobre o tema Celso D de Albuquerque Mello em Direito Internacional da Integraccedilatildeo Ed Renovar p 13 faz a seguinte observaccedilatildeo

12 Conforme anota Rui Celso Reali Fragoso no artigo O Sigilo Bancaacuterio publicado no site httpvvwwjuscombr

264 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Poder-se-ia fazer um pequeno reparo a Chaumont que a indeshypendecircncia nacional eacute um conceito juridicamente indeterminado e que ela pode ter diferentes graus Tanto que podemos escrever soberania versus cooperaccedilatildeo internacional apesar de reconhecermos que esta posiccedilatildeo pode ser considerada como radical vez que natildeo haacute uma total incompatibilidade entre as duas Entretanto natildeo se pode deixar de consshytatar que de certo modo a cooperaccedilatildeo internacional se encontra conshysagrada na Carta da ONU no arl 1 ordm que trata dos Propoacutesitos das Naccedilotildees Unidas e nos Princiacutepios estabelecidos na Carta da OEA (Capiacutetulo 11) O mesmo ocorre na resoluccedilatildeo da Assembleacuteia Geral da ONU de 1970 que aprova a Declaraccedilatildeo Relativa aos Princiacutepios do Direito Internacional Reshylativas agraves Relaccedilotildees Amigaacuteveis e agrave Cooperaccedilatildeo entre os Estados conforme a Carta das Naccedilotildees Unidas bem como na Carta de Direitos e Deveres Econocircmicos aprovada pela mesma Assembleacuteia Geral em 1974

O crescimento do crime internacional em decorrecircncia dos fenocircmenos globalizantes determina o surgimento de um dever juriacutedico dos Estados firmashyrem pactos de cooperaccedilatildeo entre si para que enfrentem as organizaccedilotildees voltashydas para a criminalidade Esse dever juriacutedico globalizado tem suas raiacutezes no moral intemacional que conforme assinala Celso Albuquerque Mello na obra citada p 13 sempre consagrou o princiacutepio da solidariedade ou ainda do auxiacutelio muacutetuo

Eacute o mais importante desafio neste iniacutecio de seacuteculo fazer com que surja uma legislaccedilatildeo internacional que compatibilize o combate agrave criminalidade inshyternacional sem violar a seguranccedila juriacutedica com finalidade exclusiva de evitar a fuga de investimenos do Paiacutes

Tenha-se contudo em consideraccedilatildeo que a globalizaccedilatildeo do crime emshybora seja uma grande ameaccedila aos valores tradicionais que sustentam a cidashydania especialmente a seguranccedila juriacutedica natildeo deve prejudicar o desenvolvishymento econocircmico de qualquer naccedilatildeo

Natildeo faccedilo coro ao assinalado por Eric Hobsbawm em sua obra Era dos Extremos O Breve Seacuteculo XX 1914-1991 1995 p 24 Companhia das Letras S Paulo traduccedilatildeo de Marcos Santarrita no sentido de que Talvez a caracteriacutesshytica mais impressionante do fim do seacuteculo XX seja a tensatildeo entre esse processo de globalizaccedilatildeo cada vez mais acelerado e a incapacidade conjunta das instishytuiccedilotildees puacuteblicas e do comportamento coletivo dos seres humanos de se acoshymodarem a ele

Penso que natildeo haacute essa acomodaccedilatildeo e que as instituiccedilotildees puacuteblicas espeshycialmente as submetidas ao controle da ciecircncia juriacutedica natildeo estatildeo incapacitashydas de encontrar caminhos que solucionem o problema existente

ENSAIOS JURiacuteDICOS 265

Eacute por demais positivo entre outros acontecimentos o fato da conscienshytizaccedilatildeo de que haacute de ser encontrada uma forma de combate agrave criminalidade internacional que natildeo afaste a garantia da seguranccedila juriacutedica Esta eacute uma neshycessidade para impor paz agrave naccedilatildeo e consequumlentemente criar ambiente para que novos investimentos necessaacuterios ao desenvolvimento do seu processo econocircmico aconteccedilam sem se falar na manutenccedilatildeo dos jaacute existentes

O Parlamento Europeu aprovou ultimamente uma resoluccedilatildeo sobre a criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional sob a consideraccedilatildeo de que eacute necessaacuteshyrio criaacute-lo de forma permanente para complementar os sistemas judiciais nashycionais e pocircr fim agrave impunidade de que gozam os responsaacuteveis por genociacutedio crimes contra a humanidade e crimes de guerra

A abertura para essa posiccedilatildeo denota a formaccedilatildeo de uma consciecircncia internacional para combater a criminalidade internacional em todos os niacuteveis contribuindo para fortalecer a seguranccedila juriacutedica interna de cada paiacutes

O documento representativo dessa resoluccedilatildeo eacute do teor seguinte

Parlamento Europeo

Resolucioacuten sobre el Tribunal Penal Internacional

EI Parlamento Europeo

Vistas sus anteriores resoluciones sobre un Tribunal Penal Interna-cional

A Considerando que es necesario crear un Tribunal Penallnternashycional permanente que complemente los sistemasjudiciales nacionales y ponga fin a la impunidad de que gozan los responsables de genocidio crimenes contra la humanidad y criacutemenes de guerra

B Considerando que la Comisioacuten de Derechos Humanos de las Naciones Unidas estaacute respaldando decididamente la creacioacuten de ese Trishybunal

C Considerando que la fase preparatoria de la creacioacuten dei Tribushynal Penal Internacional finalizoacute con la uacuteltima sesioacuten dei Comiteacute Preparatorio de las Naciones Unidas que tuvo lugar dei 16 de marzo al3 de abril de 1998

D Felicitaacutendose por la creciente participacioacuten de Estados en el proceso de negociaciones y esperando que un nuacutemero auacuten mayor de Esshytados procedentes de todas las regiones se encuentre plenamente represhysentado en la Conferencia Diplomaacutetica de Roma

E Considerando que dei 15 de junio al17 de julio de 1998 se celebra en Roma la Conferencia Diplomaacutetica de Plenipotenciarios para la constitucioacuten de un Tribunal Penal Internacional

266 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

F Considerando que los Estados miembros y la delegacioacuten de la Comisioacuten Europea que participan en la Conferencia Diplomaacutetica de Roma pueden desempenar un papel crucial a la hora de garantizar el eacutexito de la conclusioacuten de esta Conferencia Diplomaacutetica y acogiendo positivamente la mayor convergenciacutea de las posturas de los Estados miembros de la UE

G Congratulaacutendose por la oferta dei Gobierno de los Paiacuteses Bajos de servir de sede dei Tribunal Penal Internacional permanente

I Insta a la Conferencia Diplomaacutetica de Roma a aprovechar la oportunidad histoacuterica de concluir un texto de Estatuto para un Tribunal Penal Internacional independiente justo y eficaz

2 Insta a los representantes de los Estados miembros dei Consejo y de la Comisioacuten a garantizar activamente el ecircxito de los resultados a sashyber un auteacutentico Tribunal Penal Internacional en lugar de limitarse a un acuerdo de compromiso sobre principios esenciales en sus esfuerzos por conciliar las posturas de Estados reticentes

3 Destaca que para constituir un complemento eficaz de los sisteshymas judiciacuteales nacionales el Estatuto dei Tribunal Penal Internacional permanente objeto de la Conferencia de Roma deberaacute establecer

a un Fiscal independiente con competencias para investigare insshytruir sumarios por propia iniciativa en situaciones en las que se hayan cometido los delitos sometidos a lajurisdiccioacuten dei Tribunal

b Ia jurisdiccioacuten inherente y universal dei Tribunal en materia de genocidio criacutemenes contra la humanidad criacutemenes de guerra y agresioacuten sin que se requiera ninguacuten consentimiento dei Estado

c una buena relacioacuten de trabajo con los Tribunales lnternacionales ya establecidos en La Haya

d una relacioacuten constructiva con las Naciones Unidas yen partishycular con el Consejo de Seguridad basada en el pleno reconocimiento de sus respectivas funciones y competencias

e Ia obligacioacuten de los Estados firmantes de acatar y hacer cumplir sin demora las oacuterdenes y decisiones dei Tribunal

f los mayores niveles de respeto de los derechos de los acusados y de los sospechosos y de proteccioacuten de los intereses de las viacutectimas y de los testigos

g Ia garantiacutea de una financiacioacuten a largo plazo necesaria para asegurar la autonomiacutea e independencia dei Tribunal frente a cualquier presioacuten exterior

4 Destaca ademaacutes que la jurisdiccioacuten deI Tribunal sobre los delishytos de genociacutedio los criacutemenes contra la humanidad y los criacutemenes de

ENSAIOS JURiacuteDICOS 267

guerra deben considerarse con la misma calificacioacuten penal con indepenshydencia de que se hayan cometido en conflictos armados internacionales o en conflictos internos

5 Insta ai Consejo y a los Estados miembros a garantizar la universalidad y la transparencia de las negociaciones y la participacioacuten continuada de la comunidadjuriacutedica y la sociedad civil internacionales

6 Encarga a su Presidente que transmita la presente resolucioacuten ai Consejo a la Comisioacuten a los Gobiernos de los Estados miembros ai Secreshytario General de las Naciones Unidas ai Presidente de la Asamblea Geneshyral de las Naciones Unidas y ai Presidente de la Conferencia Diplomaacutetica de las Naciones Unidas para la constitucioacuten de un Tribunal Penal Internashycional

A resoluccedilatildeo supracitada demonstra que cresce a conscientizaccedilatildeo da necessidade de ser criado um Tribunal Penal Internacional com forccedila cogente obrigatoacuteria de suas decisotildees no acircmbito interno dos paiacuteses que participarem do pacto de sua constituiccedilatildeo

A doutrina internacional revela que a comunidade internacional somenshyte agora vem se preocupando em criar uma estructura internacional para determinar las responsabilidades individuales emergentes de violacioacuten de ciertos derechos baacutesicos dei ser humano Los mecanismos de responsabilidad estatal creados desde los 60 se dirigen a la mayor protecciotilden dei ser humano y la erradicacioacuten de las praacutecticas de volacioacuten sistemaacutetica de los derechos humanos ar via de la condena ai Estado que ordena o que tolera los abusos por lo cual se estructuraron entorno ai Estado conmo sujeto responsable Como haacute seflalado la Corte Internacional de Derechos Humanos el procedimiento ante ella no es un procedimiento penal lo que se busca determinar es el nivel de cumprimiento por parte de un Estado de sus obligaciones de derecho internacional Sin desconocer la importancia de determinar la responsabilidad dei Estado para que eacuteste tenga un incentivo para erradicar esas praacutectica de sus frotneras es pertinente detacar que las violaciones maacutes grave son en uacuteltima instancia coshymetidas por individuos (Francisco Cox Encarregado dei TPI HOH em artigo intitulado EI IlOH ante la Craciotilden de um Tribunal Penal Internacional no site httpwwwiidhedcrcpitpintrohtml)

A criaccedilatildeo de um Tribunal Penal Internacional atuaria permanentemente e teria competecircncia subsidiaacuteria em relaccedilatildeo agrave outorgada aos Tribunais Nacioshynais limitando-se a atuar apenas nos crimes internacionais previamente defishynidos como sendo do interesse da comunidade global

Merece registro no acircmbito do assunto tratado que na Conferecircncia Reshygional sobre o Tribunal Penal Internacional realizada em 18 e 19 de fevereiro de 1998 na cidade de Guatemala Guatemala um dos temas tratados foi o relativo

268 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

agrave harmonizaccedilatildeo das incriminaccedilotildees quando os seguintes aspectos foram disshycutidos Branqueamento corrupccedilatildeo fraude fiscal participaccedilatildeo em associashyccedilotildees criminosas um olhar agrave luz dos direitos nacionais e do direito internacioshynal Perspectivas Quais os comportamentos a incriminar Criar uma nova incriminaccedilatildeo da fraude fiscal Uma tentativa de harmonizaccedilatildeo o corpus jurls contendo disposiccedilotildees penais para proteccedilatildeo dos interesses financeiros da Uniatildeo Europeacuteia As negociaccedilotildees no seio do Conselho da Europa e da OCDE referenshytes agrave luta contra a corrupccedilatildeo etc O referido painel foi presidido por Benoit Dejemeppe procurador do Rei em Bruxelas e contou com a presenccedila de Tereshyza Beleza professora de Direito Penal na Faculdade de Direito de Lisboa como moderadora

Haacute como visto um largo campo de anaacutelise para desenvolver com possishybilidade do surgimento de sugestotildees que levem a ciecircncia juriacutedica a alcanccedilar com a atuaccedilatildeo estatal uma competecircncia internacional que possa combater o crime internacional e ao mesmo tempo proporcione seguranccedila juriacutedica na ordem interna ganhando assim o sistema juriacutedico confianccedila dos investidoshyres

Em conclusatildeo a forma de compatibilizar o combate agrave criminalidade internacional sem violar a seguranccedila juriacutedica necessaacuteria a evitar a fuga de inshyvestimentos do paiacutes estaacute na criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional com comshypetecircncia definida para processar e julgar delitos globalizantes e cujas decisotildees tenham forccedila imperativa no acircmbito interno das naccedilotildees participantes do pacto para o seu nascimento

Page 8: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro

~o SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

giudiziaria dei fisco e di terzi (La Banca NellOrdinamento Giuridico itashyliano Milano - DoU A Giuffre Editore 1980 p 158)

413 Franccedila

Tambeacutem na Franccedila o sigilo bancaacuterio eacute protegido pelo ordenamenshyto juriacutedico embora inexistente uma norma especiacutefica fundando-se a proteccedilatildeo num conjunto de regras de ordem penal civil e comercial

Da mesma forma admite-se a quebra do sigilo em face de interesshyses de ordem puacuteblica6 bull

414 Suiacuteccedila

Paiacutes onde os bancos e a sua alardeada discriccedilatildeo satildeo instituiccedilotildees nacionais haacute previsatildeo legal especiacutefica para a proteccedilatildeo do sigilo

No entanto tambeacutem laacute o segredo natildeo eacute como alguns supotildeem absoluto

Conforme aduz Hagstrom Natildeo pode ser invocado em geral peshyrante a Justiccedila Penal Na Justiccedila Civil o Juiz tem poder discricionaacuterio para decidir sobre a mateacuteria havendo algumas variaccedilotildees de conformidade com as legislaccedilotildees cantonais Em procedimentos de taxaccedilatildeo e recursos o segredo eacute preservado perante o Fisco eacute afastado contudo no proceshydimento contencioso (penal fiscal) Algumas outras exceccedilotildees ao dever de segredo satildeo contempladas expressamente em textos legais

Quanto ao Direito suiacuteccedilo acrescente-se que Arnoldo Wald no artigo jaacute tado observa que a justificativa para o sigilo bancaacuterio estaacute no direito da rsonalidade A Lei de 1934 prevecirc pena de multa ou de prisatildeo para o funcioshyliacuterio da instituiccedilatildeo que violar o segredo bancaacuterio mesmo que inexista dano ara aquele que viu reveladas informaccedilotildees sobre sua vida financeira

A seguir Arnoldo Wald compara o Direito da Suiacuteccedila com o do Liacutebano lrmando A Suiacuteccedila assim como o Liacutebano para a maior seguranccedila e reforccedilo a preservaccedilatildeo do sigilo bancaacuterio utiliza a conta numerada ficando descoshyhecido o nome do cliente A legislaccedilatildeo libanesa prevecirc quatro hipoacuteteses de errogaccedilatildeo do sigilo a) o consentimento do cliente seus herdeiros ou legataacuteshyos b) no litiacutegio entre o cliente e o banco c) na falecircncia e d) no enriquecimenshy) iliacutecito

d) Inglaterra e EEUU

O sigilo bancaacuterio no Direito inglecircs e no sistema norte-americano mereshyeu de Arnoldo Wald no trabalho jaacute citado pp 24 e 25 a anaacutelise que transcrevo

o autor citado manda no particular conferir Carlos Alberto Hagstrom artigo O Sigilo Bancaacuterio e o Poder Puacuteblico RDM n 79 p 38 bem como Seacutergio Covello em O Sigilo Bancaacuterio Leud 1991 pp 2627

ENSAIOS JURiacuteDICOS 231

No Direito inglecircs natildeo haacute nenhuma norma escrita que estabelece sanccedilatildeo agrave violaccedilatildeo ao segredo bancaacuterio mas qualquer pessoa que queira trabalhar em uma instituiccedilatildeo financeira deve assinar um formulaacuterio esshypecial pelo qual se compromete a manter sigilo sobre as movimentaccedilotildees bancaacuterias O dever de segredo na atuaccedilatildeo do banco eacute interpretado rigoshyrosamente pelos tribunais ingleses

No sistema juriacutedico norte-americano depois de discrepacircncias nas legislaccedilotildees estaduais e apoacutes a lei federal que restringiu o acircmbito da obrishygatoriedade do sigilo bancaacuterio foi aprovada a Right to Financiai Privacy Act que dispotildee que a prestaccedilatildeo de informaccedilotildees por parte da instituiccedilatildeo financeira somente pode ser dada em processos administrativos ou judishyciais quando os dados forem relevantes para solucionar o litiacutegio Com essa lei a quebra do sigilo bancaacuterio ganhou um caraacuteter excepcional somente podendo ocorrer desde que respeitado o devido processo leshygal Assim o Direito americano buscou conciliar a defesa ao direito de privacidade o atendimento aos interesses puacuteblicos quanto agraves informashyccedilotildees financeiras e a existecircncia do contraditoacuterio

e) Reacutegis de Oliveira quando Deputado Federal em parecer apresentashydo agrave Comissatildeo de Constituiccedilatildeo e Justiccedila da Cacircmara dos Deputados com refeshyrecircncia a Projeto de Emenda Constitucional apresentado pelo Exmo Sr Presishydente da Repuacuteblica objetivando alterar o sect 1 ordm do art 145 da CF observou que o sigilo bancaacuterio no Direito Comparado eacute posto da forma seguinte

13 Direito Comparado Na Alemanha natildeo haacute regra especiacutefica nem definiccedilatildeo legal para o segredo bancaacuterio mas sua existecircncia eacute recoshynhecida bem como aceita pela doutrina e jurisprudecircncia Decorre de direito costumeiro somente podendo ser quebrado por expressa disposhysiccedilatildeo legal (J Barmann Le Secret Bancaire en Allemagne Feacutedeacuterale in Rapport pp 15 e segs) Na Beacutelgica haacute proibiccedilatildeo somente sendo viaacutevel a derrogaccedilatildeo do segredo pela Justiccedila Penal e pelo Fisco que somente tem acesso agraves informaccedilotildees bancaacuterias diante do processo pendente (Herion Le Secret Bancaire en Belfique in Rapport pp 5175) Na Itaacutelia os doshycumentos somente podem ser examinados pelos Juiacutezes Natildeo haacute acesso por parte das autoridades administrativas (idem p 129) Na Holanda da mesma forma o sigilo apenas cede ante ordem da autoridade judicial ou penal (Muller idem pp 99117) Na Franccedila a violaccedilatildeo ao segredo ocorre ante oacutergatildeos do Poder Puacuteblico que alegam interesses superiores aos dos particulares natildeo se admitindo a quebra diante de normas administratishyvas (Gavalda Stouflet idem pp 7797)

f) Voltando a analisar o sigilo bancaacuterio em Portugal pode-se afirmar que o sistema apresentava-se rigoroso e nacirco aceitava a quebra como se vecirc de

232 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

decisatildeo do Supremo Tribunal de Justiccedila em Scientia Juriacutedica tomo XXIv n 166168 de 1980 (Parecer publicado na Revista de Direito Mercantil n 99 pp 98 e segs)

Com o sentido de demonstrar como o sigilo bancaacuterio eacute tratado no ordeshynamento juriacutedico de Portugal cito na iacutentegra um acoacuterdatildeo da Secccedilatildeo Criminal do Tribunal de Relaccedilatildeo de Eacutevora cujo texto colhi da internet (httpwwwtrept jurisp321-96html)

Processo n 321]996

Acoacuterdatildeo

Acordam na Secccedilatildeo Criminal do Tribunal da Relaccedilatildeo de Eacutevora

1 No Tribunal Judicial da Comarca de Portimatildeo correm termos uns autos de inqueacuterito registados sob o n 35711994 que tiveram orishygem numa queixa apresentada por middotM Lda contra a sociedade E Lda nos quais se procede agrave investigaccedilatildeo de factos susceptiacuteveis de inteshygrar a praacutetica de um crime de emissatildeo de cheque sem provisatildeo

Estaacute em causa o cheque nO 3681861637 sacado sobre a Caixa Geral de Depoacutesitos emitido em 1 ordm de julho de 1994 no valor de 820661$00

No decurso do inqueacuterito o Ministeacuterio Puacuteblico solicitou agravequela insshytituiccedilatildeo bancaacuteria o fornecimento de determinada documentaccedilatildeo banshycaacuteria o que esta se negou fazer alegando que a revelaccedilatildeo da pretendida documentaccedilatildeo contende com o disposto na legislaccedilatildeo sobre segredo bancaacuterio

A requerimento do Digno Magistrado do Ministeacuterio Puacuteblico o MM Juiz de Instruccedilatildeo suscitou a intervenccedilatildeo deste Tribunal da Relaccedilatildeo a fim de dispensar os serviccedilos da Caixa Geral de Depoacutesitos do segredo bancaacuteshyrio quanto agrave documentaccedilatildeo bancaacuteria solicitada a saber coacutepia da ficha de assinaturas e extracto da conta da Agecircncia de S com o n sobre a qual foi sacado o cheque em causa respeitante aos meses de maio junho e julho de 1994

Nesta relaccedilatildeo o Exmo Procurador da Repuacuteblica emitiu douto pareshycer no sentido de a referida instituiccedilatildeo bancaacuteria ser dispensada do cumshyprimento do dever do segredo bancaacuterio em ordem agrave prestaccedilatildeo dos eleshymentos pretendidos para a efectivaccedilatildeo do inqueacuterito

Colhidos os vistos legais cumpre agora decidir

2 A Caixa Geral de Depoacutesitos atraveacutes do ofiacutecio fotocopiado agrave fi 5 dos autos recusou-se a fornecer os documentos pedidos pelo Ministeacuteshyrio Puacuteblico para instruccedilatildeo de um processo de inqueacuterito com fundamento no sigilo bancaacuterio

ENSAIOS JURiacuteDICOS 233

Compreendendo o inqueacuterito o conjunto de diligecircncias que visam investigar a existecircncia de um crime determinar os seus agentes e a resshyponsabilidade deles e descobrir e recolher as provas em ordem agrave decishysatildeo sobre a acusaccedilatildeo (cf art 262 n 1 do Coacutedigo de Processo Pena0 a consulta dos pretendidos documentos - extracto da conta e ficha de assinaturas - eacute sem margem para duacutevidas de grande importacircncia para a instruccedilatildeo do processo e recolha de indiacutecios probatoacuterios tendentes agrave eventual deduccedilatildeo de acusaccedilatildeo pois sem ela desde logo muito dificilshymente se poderaacute concluir pela identificaccedilatildeo da pessoa que assinou o cheque

O dever de sigilo bancaacuterio traduz uma obrigaccedilatildeo de facto negativo (de ROR facere) e encontra-se disciplinado no Decreto-Lei n 2981992 de 31 de dezembro que aprovou o Regime Geral das Instituiccedilotildees de Creacutedito e Sociedades Financeiras O art 78 de tal diploma consagrando o dever de segredo profissional dispotildee no seu n 1 que os membros dos orgatildeos de administraccedilatildeo ou de fiscalizaccedilatildeo das instituiccedilotildees de creacutedito os seus empregados mandataacuterios comitidos e outras pessoas que lhes prestem serviccedilos a tiacutetulo permanente ou ocasional natildeo podem revelar ou utilizar informaccedilotildees sobre factos ou elementos respeitantes agrave vida da instituiccedilatildeo ou agraves relaccedilotildees desta com os seus clientes cujo conhecimento lhes advenha exclusivamente do exerciacutecio das suas funccedilotildees ou da presshytaccedilatildeo dos seus serviccedilos explicitando-se no seu n 2 que estatildeo designadamente sujeitos a segredo os nomes dos clientes as contas de depoacutesito e seus movimentos e outras operaccedilotildees bancaacuterias

O dever de segredo profissional natildeo eacute poreacutem um dever absoluto isto eacute natildeo prevalece sempre sobre qualquer outro dever que com ele entre em conflito Sofre com efeito as excepccedilotildees previstas no art 79 do mesmo Decreto-Lei n 2981992 onde se estabelece aleacutem do mais que os factos e elementos cobertos pelo dever de segredo podem ser revelashydos nos termos previstos na lei penal e de processo penal - cf aliacutenea d don2

No art 84 do mesmo diploma legal prescreve-se que a violaccedilatildeo ao dever de segredo eacute puniacutevel nos termos do Coacutedigo Penal e efectivamente o Coacutedigo Penal vigente - revisto pelo Decreto-Lei n 481995 de 15 de marccedilo - prevecirc e pune como crimes quer a violaccedilatildeo a segredo profissioshynal quer o seu aproveitamento indevido - cf arts ] 95 e 196

Ao contraacuterio da versatildeo do Coacutedigo Penal anterior agrave referida revisatildeo - em que se estatuiacutea no art 185 que a violaccedilatildeo ao segredo profissional natildeo seria puniacutevel se ocorresse no cumprimento de um dever juriacutedico sensivelmente superior ou visasse a um interesse puacuteblico ou privado legiacutetimo quando considerados os interesses em conflito e os deveres

234 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

de informaccedilatildeo que segundo as circunstacircncias se impotildeem ao agente se pudesse considerar meio adequado para alcanccedilar aquele fim - natildeo conteacutem o Coacutedigo Penal actuaJ relativamente ao crime de violaccedilatildeo ao segredo profissional qualquer causa especiacutefica de exclusatildeo da ilicitude pelo que haacute que atentar nas causas gerais de exclusatildeo da ilicitude

Ao abordar o conflito de deveres dispotildee o art 36 n 1 do Coacutedigo Penal que natildeo eacute iliacutecito o facto de quem em caso de conflito no cumprishymento de deveres juriacutedicos ou de ordens legiacutetimas da autoridade satisfishyzer dever ou ordem de valor igualou superior ao do dever ou ordem que sacrificar Natildeo seraacute pois iliacutecita a violaccedilatildeo ao segredo profissional se perante um conflito de deveres o agente satisfizer o dever de valor igual ou superior ao do dever que sacrifica

No Coacutedigo de Processo Penal generalizou-se a possibilidade de quebra do segredo profissional

Assim as pessoas indicadas no n 1 do sobredito art 78 podem recusar-se a depor sobre factos objecto de segredo profissional mas se a autoridade judiciaacuteria concluindo embora pela legitimidade da recusa natildeo prescindir desse depoimento pode requerer ao tribunal que o ordeshyne E o tribunal deveraacute ordenar a prestaccedilatildeo do depoimento com quebra do segredo profissional sempre que entender que esta se mostra justificada face agraves normas e princiacutepios aplicaacuteveis da lei penal nomeadashymente ao princiacutepio da prevalecircncia do interesse preponderante - cf art 135 n 12 e 3 do Coacutedigo de Processo Penal

A possibilidade de apreensatildeo pela autoridade judiciaacuteria de tiacutetulos valores quantias ou outros objectos depositados em bancos ou outras instituiccedilotildees de creacutedito relacionados com um crime e que possam ser de grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova bem como a possibilidade de exame pelo juiz de correspondecircncia e documenshytaccedilatildeo bancaacuterias estatildeo previstas no art 181 n 1 e 2 do Coacutedigo de Processhyso Penal As pessoas obrigadas ao dever de segredo profissional podem recusar apresentar aqueles documentos ou objectos em seu poder se invocarem por escrito segredo profissional caso em que o conflito de interesses e deveres assim surgido seraacute dirimido pelo tribunal nos tershymos idecircnticos aos previstos para a recusa de depoimento - cf arts 182 n 2 e 135 ambos do citado coacutedigo

Enquanto o dever de segredo profissional eacute geralmente estabeleshycido a favor da integridade e liberdade das pessoas a quem aproveita tendo-se inserido a sua regulamentaccedilatildeo no Tiacutetulo VI do atraacutes mencionashydo Regime Geral das Instituiccedilotildees de Creacutedito e Sociedades Financeiras no qual se prevecirc um conjunto de regras de conduta que devem guiar a actuaccedilatildeo das instituiccedilotildees de creacutedito seus administradores e empregados

ENSAIOS JURiacuteDICOS 235

nas relaccedilotildees com os clientes visando proteger de forma eficaz a posishyccedilatildeo do consumidor de serviccedilos financeiros (cf preacircmbulo do Decreshyto-Lei n 2981992) ou estabelecer um clima de confianccedila na banca que permita a captaccedilatildeo e recuperaccedilatildeo do dinheiro entesourado (como se dizia no relatoacuterio do Decreto-Lei n 21978 de 9 de janeiro revogado pelo n 1 do art 5Q do citado Decreto-Lei n 2981992) no processo de inqueacuteshyrito a que procede o Ministeacuterio Puacuteblico estaacute em causa a realizaccedilatildeo de diligecircncias de prova que permitam investigar um crime de emissatildeo de cheque sem provisatildeo sob a eacutegide do princiacutepio da verdade material e incriminar o respectivo agente

O interesse que estaacute em jogo com a pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblishyco na obtenccedilatildeo da documentaccedilatildeo bancaacuteria eacute o da boa administraccedilatildeo da Justiccedila Penal e esse interesse eacute no caso em apreccedilo sensivelmente supeshyrior ao interesse da manutenccedilatildeo do segredo bancaacuterio o que equivale a di~er que este deve ceder perante aquele

Em suma no caso concreto ponderados os interesses em conflishyto entendemos que a quebra do dever de sigilo bancaacuterio se justifica nos termos do art 36 do Coacutedigo Penal pelo que deve ser dada procedecircncia agrave pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico e consequumlentemente ao abrigo do disposto nos arts 182 n 2 e 135 n 2 e 3 ambos do Coacutedigo de Processo Penal dispensar-se a Caixa Geral de Depoacutesitos do cumprimento do deshyver de sigilo bancaacuterio a fim de poder satisfazer tal pretensatildeo

3 Por todo o exposto determina-se que com quebra do dever de sigilo bancaacuterio a Caixa Geral de Depoacutesitos forneccedila ao Digno Magistrado do Ministeacuterio Puacuteblico com destino ao Processo de Inqueacuterito n 3571 1994 a documentaccedilatildeo bancaacuteria que este lhe havia solicitado

Natildeo eacute devida taxa de justiccedila

Texto processado e integralmente revisto pelo relator

Desembargador-Relator Rui Mauriacutecio

g) Substancioso estudo do sigilo bancaacuterio no Direito Comparado foi feishyto por Andreacute Serratildeo Borges de Sampaio Consultor da Uniatildeo nas informashyccedilotildees que prestou ao Advogado-Geral da Uniatildeo com referecircncia agrave ADIn n 2397 Transcrevo o inteiro teor do seu pronunciamento

51

6 O tratamento do sigilo bancaacuterio no Direito Comparado

Em verdade o Direito Comparado entende inoponiacutevel o sigilo banshycaacuterio agraves autoridades tributaacuterias Com efeito leciona Alfredo Echeverriacutea Herrera verbis

236 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

EI sigilo bancario constituye un reacutegimen limitado exclusivashymente ai aacutembito de las relaciones entre la institucioacuten bancaria y sus clientes e impone la obligacioacuten de confidencialidad de la institucioacuten sobre las informaciones que aqueacutellos le proporcionan

En todas las legislaciones bancarias el sigilo es relativo es decir el derecho dei ciudadano ai secreto y la correlativa obligacioacuten para el banco de no revelar a terceros las informaciones recibidas en el ejercicio de su actividad ceden cuando existe norma legal expresa o causa justificada

Elliacutemite legal ai sigilo estaacute constituiacutedo por la obligacioacuten dei banco de entregar informaciones y se fundamenta en motivos sushyperiores de orden puacuteblico o general siendo liacutecito entonces que el Estado establezca Iiacutemites legales ai secreto bancaria para auxiliar por ejemplo las actuaciones de la Justicia en el plano jurisdiccional y las dei Estado en el aacutembito dei ejercicio de su potestad impositiva

Es un principio irrebatible en la vida dei derecho que ni la autonomia de las personas ni los instrumentos dei aacuterea econoacutemica y financiera pueden servir en un momento dado como elementos juridicamente idoacuteneos para lesionar el intereacutes puacuteblico En consecuencia se puede afirmar que las limitaciones ai sigilo bancario son salvaguardias necesarias ai bien comuacuten en los caacutenones dei Estado moderno Estas limites deben ser materias reshyservadas a la ley por ser de caraacutecter excepcional en sentido estricto

En este orden de ideas necesariamente debe concluirse que existen legiacutetimos y superiores intereses en diversas aacutereas de la sociedad que se vinculan ai bien comuacuten y que deben ser tutelados por el Estado como lo es por ejemplo la necesidad de detectar y reprimir la evasioacuten de los impuestos los cuales transcienden ai evenshytual intereacutes geneacuterico que pueda tener el mismo Estado en la mantencioacuten dei sigilo bancaria En efecto desde el punto de vista de lajuridicidad y de la eacutetica no se puede sostener que el secreto bancaria pueda servir como instrumento para proteger la comisioacuten de actos

52

como el recieacuten mencionado que son constitutivos muchas veces de iliacutecitos penales bajo la forma de delitos tributarias o fraushydes fiscales con resultados ademaacutes de perjucio patrimonial ai Esshytado y dano ai intereacutes general de la sociedad

EI sistema bancaria frente a la existencia en la sociedad de un intereacutes general preponderante y superior estaacute naturalmente Ilamado a colaborar en la verificacioacuten y represioacuten de la evasioacuten tributaria

ENSAIOS JURiacuteDICOS 237

En este marco se inscribe la tendencia de la mayoda de las legislaciones modemas en cuanto a dotar aI Estado de facultades para intervenir en la actividad econoacutemica de los ciudadanos en procura de la correcta determinacioacuten de los tributos cuando se conshyfigura en el desarrollo de estas actividades un hecho gravado establecido en la ley

Ya la Constitucioacuten de Weimar en 919 proclamoacute que es liacutecito ai Estado intervenir para condicionar el ejercicio de los derechos a determinados fines sociales El bien comuacuten y la justicia social comenzaron desde entonces a servir de frontera a los derechos y Iibertades individuales

Cabe destacar que la OCDE (Organisation for Economic Cooperation and Development) en un documento elaborado en el ano 1999 sobre las praacutecticas de los paiacuteses en el acceso a la informacioacuten bancaria para fines tributarios advierte que se puede abusar de la confidencialidad para ocultar actividades iJegales y evadir impuestos y agrega en el resumen ejecutivo deI documento que ni la criminalizacioacuten dei fraude tributario ni el tratamiento de la evasioacuten de impuestos bajo las leyes tributarias de los paiacuteses miembros de la OCDE son homogeacuteneos pero que sin embargo los gobiernos de la mayoriacutea de los paiacuteses miembros de la OCDE han tomado la visi6n de que en este contexto las autoridades tributashyrias no deben ser tratadas como simples terceros sino que se les debe otorgar un acceso priviligiado a la informaci6n bancaria con fines tributarias

Se agrega en este estudio que una medida de esta naturaleza no pane en peligro la conlidencialidad de la inlormacioacuten bancaria puesto que las autoridades tributarias estaacuten sujetas a estrictos conshytroles sobre coacutemo utilizan la informacioacuten de los contribuyentes y todos los gobiemos han implementado regIas para proteger la conlidencialidad de la informaci6n tributaria (EI Sigilo Bancaacuterio Acesso a la Informadon Bancaria para Fines Tributarias)

Em verdade seu texto elenca 30 paiacuteses integrantes da OCDE (a saber Alemanha Austraacutelia Aacuteustria Beacutelgica Canadaacute Repuacuteblica Checa Dinamarca Finlacircndia Franccedila Greacutecia Hungria Islacircndia Irlanda Itaacutelia Japatildeo Coreacuteia Luxemburgo Meacutexico Paiacuteses Baixos Nova Zelacircndia Noshyruega Polocircnia Portugal Espanha Sueacutecia Turquia Suiacuteccedila Reino Unido Estados Unidos Repuacuteblica Eslovaca) dos quais em 1999 apenas trecircs (Portugal Repuacuteblica Eslovaca e Luxemburgo) natildeo facultavam o acesso por parte de autoridades tributaacuterias a informaccedilotildees relativas a pessoas suspeitas de fraude tributaacuteria

238 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

Desses trecircs paiacuteses hoje remanescem apenas dois Com efeito Portugal deixou de integrar esse grupo constrangedoramente minoritaacuterio ao aprovar em 29 de dezembro de 2000 a Lei n 30-G

Nesse diploma lecirc-se

Lei da Reforma de Tributaccedilatildeo do Rendimento

(Portugal)

Artigo 63 O - B

Acesso a informaccedilotildees e documentos bancaacuterios

1 A administraccedilatildeo tributaacuteria tem o poder de aceder directashymente aos documentos bancaacuterios nas situaccedilotildees de recusa da sua exibiccedilatildeo ou de autorizaccedilatildeo para a sua consulta

a) quando se trate de documentos de suporte de registos contabiliacutesticos dos sujeitos passivos de IRS e IRC que se enconshytrem sujeitos agrave contabilidade organizada

b) quando o contribuinte usufrua de benefiacutecios fiscais ou de regimes fiscais privilegiados havendo necessidade de controshylar os respectivos pressupostos e apenas para esse efeito

2 A administraccedilatildeo tributaacuteria tem o poder de aceder a todos os documentos bancaacuterios excepto as informaccedilotildees prestadas para justificar o recurso ao creacutedito nas situaccedilotildees de recusa de exibiccedilatildeo daqueles documentos ou de autorizaccedilatildeo para a sua consulta

a) quando se verificar a impossibilidade de comprovaccedilatildeo e quantificaccedilatildeo directa e exacta da mateacuteria tributaacutevel nos termos do artigo da Lei Geral Tributaacuteria e em geral quando estejam verifishycados os pressupostos para o recurso a uma avaliaccedilatildeo indirecta

b) quando os rendimentos declarados em sede de IRS se afastarem significativamente para menos sem razatildeo justificada dos padrotildees de rendimento que razoavelmente possam permitir as manifestaccedilotildees de riqueza evidenciadas pelo sujeito passivo nos termos do artigo 89-A da Lei Geral Tributaacuteria

c) quando existam indiacutecios da praacutetica de crime doloso em mateacuteria tributaacuteria designadamente nos casos de utilizaccedilatildeo de facturas falsas e em geral nas situaccedilotildees em que existam factos concretamente identificados gravemente indiciadores da falta de veracidade do declarado

d) quando seja necessaacuterio para fins fiscais comprovar a aplicaccedilatildeo de subsiacutedios puacuteblicos de qualquer natureza

ENSAIOS JUAlolCOS 239

3 As decisotildees da administraccedilatildeo tributaacuteria referidas nos nuacuteshymeros anteriores devem ser fundamentadas com expressa menshyccedilatildeo dos motivos concretos que as justificam pressupotildeem a audishyccedilatildeo preacutevia do contribuinte e satildeo da competecircncia do Director-Geshyral dos Impostos ou do Director-Geral das Alfacircndegas e dos Imshypostos Especiais sobre o consumo ou seus substitutos legais sem possibilidade de delegaccedilatildeo

4 Os actos praticados ao abrigo da competecircncia definida no nuacutemero anterior satildeo susceptiacuteveis de recurso judicial o qual teraacute efeito suspensivo nas situaccedilotildees previstas no n 2

5 Nos casos de deferimento do recurso previsto no nuacutemero anterior os elementos de prova entretanto obtidos natildeo podem ser utilizados para qualquer efeito em desfavor do contribuinte

6 As entidades que se encontrem numa relaccedilatildeo de domiacutenio com o contribuinte ficam sujeitas aos regimes de acesso agrave inforshymaccedilatildeo bancaacuteria referidos nos n 1 e 2

7 O acesso da administraccedilatildeo tributaacuteria a informaccedilatildeo banshycaacuteria relevante relativa a familiares ou terceiros que se encontrem numa relaccedilatildeo especial com o contribuinte depende de autorizashyccedilatildeo judicial expressa apoacutes audiccedilatildeo do visado obedecendo aos requisitos previstos no n 3

8 O regime previsto nos nuacutemeros anteriores natildeo prejudica a legislaccedilatildeo aplicaacutevel aos casos de investigaccedilatildeo por infracccedilatildeo peshynal e soacute pode ter por objecto operaccedilotildees e movimentos bancaacuterios realizados apoacutes a sua entrada em vigor sem prejuiacutezo do regime vigente para as situaccedilotildees anteriores

9 Os actos praticados ao abrigo da competecircncia prevista no n I devem ser objecto de comunicaccedilatildeo ao Defensor do Contrimiddot buinte

10 Para os efeitos desta lei considera-se documento bancaacuteshyrio qualquer documento ou registo independentemente do resshypectivo suporte em que se titulem comprovem ou registem opeshyraccedilotildees praticadas por instituiccedilotildees de creacutedito ou sociedades finanshyceiras no acircmbito da respectiva actividade incluindo os referentes a operaccedilotildees realizadas mediante utilizaccedilatildeo de cartotildees de creacutedito (coacutepia anexa)

Parece evidente destarte que todo o mundo civilizado abandonou a possibilidade de opor-se agrave Administraccedilatildeo Tributaacuteria o sigilo bancaacuterio

240 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

4 O sigilo bancaacuterio e o direito agrave intimidade e agrave privacidade das pessoas

A anaacutelise do sigilo bancaacuterio em face do direito agrave intimidade e agrave privacidashyde exige inicialmente que seja enfrentada a questatildeo referente ao seu conceito

Os doutrinadores natildeo tecircm assumido posiccedilatildeo uniforme quanto aos asshypectos conceituais dessa entidade juriacutedica

Seacutergio Carlos Covello autor da obra jaacute mencionada (O Sigilo Bancaacuterio Leud S Paulo 1991 p 69) entende que sigilo bancaacuterio eacute a obrigaccedilatildeo que tecircm os Bancos de natildeo revelar salvo justa causa as informaccedilotildees que venham a obter em virtude de sua atividade profissional

Luiz Fernando Bellinetti no artigo intitulado Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio (Revista do Direito do Consumidor Satildeo Paulo RT 1996 voI 18 p 144) defende posiccedilatildeo no sentido de que sigilo bancaacuterio eacute o dever juriacutedico que tecircm as instituiccedilotildees de creacutedito e as organizaccedilotildees auxiliares e seus empregados de natildeo revelar salvo justa causa as informaccedilotildees que venham a obter em virtushyde da atividade bancaacuteria a que se dedicam

Para Arnoldo Wald (in O Sigilo Bancaacuterio no Projeto de Lei Complemenshytar n 70 Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas n I pp 196209) o sigilo bancaacuterio se enquadra no conceito mais amplo do segredo profissional que tem merecido uma proteccedilatildeo mais ampla ensejando sua violaccedilatildeo caracterizaccedilatildeo como crime (art 154 do Coacutedigo PeshynaI)

Eivany A Silva tratando do tema em Consideraccedilotildees a Respeito do Sigilo de Dados (artigo publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio n 61 pp 41142 - Edit Dialeacutetica) afirma que o sigilo bancaacuterio eacute espeacutecie do gecircnero sigilo de dados constituindo um direito fundamental protegido constitucionalmente inserto que estaacute no rol dos direitos e garantias individuais ou seja em claacuteusushylas peacutetreas da Carta Magna natildeo podendo portanto ser modificado nem messhymo por emenda agrave Constituiccedilatildeo e portanto muito menos por legislaccedilatildeo de hierarquia inferior

Como examinado haacute divergecircncias na fixaccedilatildeo do conceito Essas divershygecircncias embora importantes para as posiccedilotildees doutrinaacuterias a serem assumishydas sobre o alcance do sigilo bancaacuterio natildeo geram contudo influecircncias de maior intensidade no relacionamento entre a instituiccedilatildeo financeira e os seus depositantes Isso porque o que merece ser considerado eacute a natureza juriacutedica do sigilo bancaacuterio isto eacute a que categoria de direito pertence e como por quem e quando a sua quebra pode ser determinada

Em face do exposto necessaacuterio eacute que se faccedila o alinhamento das teorias que procuram fundamentar o sigilo bancaacuterio

A doutrina em eacutepocas diversas examinou as seguintes teorias

ENSAIOS JURiacuteDICOS 241

Teoria contratualista O sigilo bancaacuterio de acordo com essa teoria deshycorre da relaccedilatildeo contratual que voluntariamente eacute formada entre o banco e o cliente por via da qual mesmo sem claacuteusula expressa a instituiccedilatildeo financeira assume a obrigaccedilatildeo de guardar segredo das movimentaccedilotildees de dinheiro que nela satildeo feitas Essa responsabilidade assumida pelo banco inspira-se segunshydo os adeptos da teoria em destaque nos usos nos costumes e na boa-feacute sempre aplicaacuteveis na intepretaccedilatildeo dos contratos comerciais7bull

Teoria do direito agrave privacidade Os adeptos dessa corrente afirmam que o sigilo bancaacuterio integra o campo do direito agrave privacidade que faz parte dos direitos da personalidade

Teoria consuetudinaacuteria Segundo os seguidores dessa linha de pensar o sigilo bancaacuterio decorre dos compromissos taacutecitos assumidos entre instituishyccedilotildees financeiras e seus clientes no sentido de natildeo serem levados ao conhecishymento de terceiros os valores transacionados O uso reiterado dessa praacutetica apoiada no elemento confianccedila passou a representar costume adotado nesse tipo de negoacutecio juriacutedico

Teoria da boa-feacute A adoccedilatildeo dessa teoria conduz o inteacuterprete a entender que o sigilo bancaacuterio por sua proacutepria natureza estaacute vinculado ao caraacuteter fiduciaacuterio da atividade bancaacuteria fundando-se portanto na boa-feacute ou dever de lisura que tanto marca o tipo de negoacutecio juriacutedico firmado

Teoria do sigilo profissional Essa teoria concebe o sigilo bancaacuterio como sendo uma espeacutecie do sigilo profissional Haacute portanto um dever eacutetico do banshyco em respeitar o sigilo bancaacuterio em decorrecircncia da profissatildeo exercida

Teoria do direito agrave intimidade dos bancos Os integrantes dessa forma de pensar sustentam que a instituiccedilatildeo financeira tem legiacutetimo interesse de afastar do conhecimento de terceiros a movimentaccedilatildeo financeira dos seus clientes e consequumlentemente dos fatos com elas relacionados

Teoria da complexidade do viacutenculo Essa teoria eacute explicada por Arnoldo Wald no trabalho jaacute citado da forma seguinte A doutrina moderna abandoshynou a noccedilatildeo da relaccedilatildeo juriacutedica contratual defendo a complexidade do viacutenshyculo Aleacutem dos direitos e das obrigaccedilotildees principais existem deveres secundaacuteshyrios para ambos os contratantes que decorrem da regra geral da boa-feacute denoshyminada na doutrina italiana de cOITeteza e na legislaccedilatildeo alematilde de Treu und Glauben Exige que a atuaccedilatildeo de uma parte natildeo cause danos agrave esfera juriacutedica da outra Dentro desta ideacuteia defende-se que o segredo bancaacuterio eacute um dever

7 Arnoldo Wald em Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais artigo publicado na Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas n 22 pp 1518 manifesta entendimento de que no campo normatIacutevo do Direito brasileiro esta teoria encontra respaldo nos arts 130 e 131 do Coacutedigo Comercial que prevecirc a interpretaccedilatildeo dos contratos segundo os usos os costumes e a boa-feacute

242 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

acessoacuterio na relaccedilatildeo juriacutedica Mesmo que natildeo nasccedila o contrato entre as partes a boa-feacute objetiva impede que a instituiccedilatildeo financeira prejudique os interesses do cidadatildeo

Estabelecidos os pressupostos doutrinaacuterios acima examinamos agora se o sigilo bancaacuterio diz respeito agrave intimidade e agrave privacidade das pessoas

A Constituiccedilatildeo Federal em seu artigo 5ordm incisos X e XII afirma

Art 5ordm Todos satildeo iguais perante a lei sem distinccedilatildeo de qualquer natureza garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Paiacutes a inviolabilidade do direito agrave vida agrave liberdade agrave igualdade agrave segushyranccedila e agrave propriedade nos termos seguintes

X - satildeo inviolaacuteveis a intimidade a vida privada a honra e a imagem das pessoas assegurado o direito agrave indenizaccedilatildeo pelo dano material ou moral decorrente de sua violaccedilatildeo

XJl - eacute inviolaacutevel o sigilo da correspondecircncia e das comunicaccedilotildees telegraacuteficas de dados e das comunicaccedilotildees telefocircnicas salvo no uacuteltimo caso por ordem judicial nas hipoacuteteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigaccedilatildeo criminal ou instruccedilatildeo processual penal

Essas garantias constitucionais protegem o cidadatildeo de qualquer investida de terceiros em sua intimidade em sua vida privada e no sigilo de seus dados

Na expressatildeo terceiros estaacute incluiacutedo o Estado e consequumlentemente seus agentes poliacuteticos e administrativos

A doutrina tem se manifestado de modo quase unacircnime no sentido de que o sigilo bancaacuterio eacute uma garantia constitucional que protege a privacidade das pessoas no campo econocircmico e financeiro A sua significaccedilatildeo eacute de natildeo tornar puacuteblica a movimentaccedilatildeo da conta bancaacuteria e das aplicaccedilotildees financeiras do cidadatildeo para que de nenhum modo os atos privados praticados possam ser tornados puacuteblicos

Esse posicionamento eacute o adotado pelos autores que passo a citar

Arnoldo Wald (O Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais artigo pushyblicado na Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas RT n 22 pp 1521)

O sigilo bancaacuterio eacute o meio para resguardar a privacidade no camshypo econocircmico pois veda a publicidade sobre a movimentaccedilatildeo da conta corrente bancaacuteria e das aplicaccedilotildees financeiras

ENSAIOS JURiacuteDICOS 243

Eivany A Silva (Consideraccedilotildees a Respeito do Sigilo de Dados artigo publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio n 61 Satildeo Paulo Editora Dialeacutetica p27)

A maioria dos ordenamentos juriacutedicos como o brasileiro tratam o sigilo bancaacuterio como direito fundamental do contribuinte agrave privacidashyde ou seja agrave resistecircncia agrave comunicaccedilatildeo de dados que representem desshydobramento da personalidade da pessoa direito agrave oposiccedilatildeo e agrave negaccedilatildeo de comunicaccedilatildeo

Ives Gandra da Silva Martins (Sigilo Bancaacuterio trabalho publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio S Paulo Editora Dialeacutetica n 1 pp 24 e 25)

Pelos incisos X e XII do artigo 5ordm tem o contribuinte o direito de preservaccedilatildeo de sua intimidade de sua privacidade e de que terceiros que detenham informaccedilotildees pessoais suas sejam obrigados a guardaacute-Ias

Natildeo pode pois a fiscalizaccedilatildeo exigir de terceiros informaccedilotildees que apenas pode obter do proacuteprio contribuinte

Em determinadas hipoacuteteses todavia o interesse puacuteblico haacute de preshyvalecer sobre o interesse individual mas caberaacute a um outro poder definir se tais hipoacuteteses efetivamente ocorrem com o que poderaacute o Poder Judishyciaacuterio autorizar se convencido estiver o magistrado de que a hipoacutetese eacute de gravidade e de lesatildeo ao interesse puacuteblico a quebra do direito ao sigilo bancaacuterio

Estou convencido ser esta a melhor conformaccedilatildeo juriacutedica da quesshytatildeo idealizada pelos constituintes defendida pela doutrina e consagrashyda na jurisprudecircncia corrente exegeacutetica esta a que me filio desde os meus primeiros escritos sobre a mateacuteria

Roberto Quiroga Mosquera (Tributaccedilatildeo no Mercado Financeiro e de Capitais obra publicada pela Editora Dialeacutetica Satildeo Paulo 1998 pp 70171)

Do exposto ateacute aqui eacute evidente que o direito ao sigilo bancaacuterio representa uma espeacutecie de direito agrave privacidade

Eacute incontroverso que os dados e informaccedilotildees de natureza bancaacuteria dizem respeito agrave intimidade e agrave vida privada dos cidadatildeos Dados que dizem respeito aos valores em dinheiro depositados em contas-correnshytes bancaacuterias tipos e caracteriacutesticas de aplicaccedilotildees financeiras ganhos e prejuiacutezos auferidos ou incorridos em operaccedilotildees bursaacuteteis etc satildeo sem sombra de duacutevida elementos particulares e pessoais de qualquer indiviacuteshyduo

244 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Utilizando outra voz informaccedilotildees que tocam no aspecto financeishyro do ser humano representam direito iacutentimo e personaliacutessimo devendo ser mantidas em sigilo por aqueles que eventualmente as detenham em razatildeo de sua atividade profissional Parece-nos que tal conclusatildeo eacute de uma clareza inconteste

Natildeo tem sido outra a posiccedilatildeo da doutrina mais abalizada do Paiacutes e da jurisprudecircncia dominante

o autor referido a seguir faz a observaccedilatildeo seguinte

Carlos Alberto Hagstrom (Sigilo Bancaacuterio Novas Questotildees Reshyvista de Direito Mercantil Satildeo Paulo Malheiros 1997 vaI 105 pp 4344) expotildee que apesar de existirem diversas teorias que procuram fundashymentar juridicamente o sigilo bancaacuterio modernamente a explicaccedilatildeo para o fundamento do referido instituto sofreu uma radical alteraccedilatildeo Divershysas constituiccedilotildees modernas esclarece o mencionado autor ampliaram e explicitaram o elenco de direitos e garantias individuais passando a garantir o direito agrave privacidade e agrave intimidade A Constituiccedilatildeo brasileira natildeo trilha caminho diferente Assegurou referidos direitos de forma exshypressa e sem restriccedilotildees O tema do sigilo bancaacuterio figura agora em niacutevel constitucional Tem status de norma superior no qual se reconhece o direito agrave intimidade como norma de caraacuteter geneacuterico em que estatildeo conshytemplados muacuteltiplos aspectos da vida privada em especial os de ordem econocircmico-financeira que compotildeem o que Hagstrom denominou a inshytimidade econocircmica ou intimidade patrimonial

Luiacutes Fernando 8ellinetti (Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio artigo publicado na Revista de Direito do Consumidor n 18 pp 141151)

Como jaacute dissemos anteriormente em certas hipoacuteteses o fundashymento para o segredo bancaacuterio seria a privacidade No entanto nesses casos o que se protege eacute a privacidade e natildeo propriamente o sigilo

Entendemos que uma coisa eacute garantir-se a privacidade da pessoa com fundamento em norma constitucional outra eacute garantir-se o segreshydo de informaccedilotildees bancaacuterias de uma pessoa com base na legislaccedilatildeo supramencionada

Sempre que a revelaccedilatildeo de informaccedilotildees bancaacuterias puder violar a privacidade da pessoa parece-nos que mais do que garantia ao sigilo bancaacuterio (com fundamento legal) tem a pessoa garantia agrave sua privacishydade (com fundamento constitucional)

ENSAIOS JURiacuteDICOS 245

No entanto se a revelaccedilatildeo da informaccedilatildeo natildeo invadir a esfera da intimidade da pessoa sua garantia eacute meramente legal do sigilo bancaacuterio

Carlos Maacuterio Velloso (citado por Misabel Derzi em Direito Tributaacuterio Aplicado obra publicada pela Editora Del Rey Belo Horizonte MO pp 278 e 279)

O sigilo bancaacuterio decorre do direito agrave privacidade inerente agrave pershysonalidade das pessoas consagrado na Constituiccedilatildeo Federal em seu art 5ordm X e protege tanto interesses privados como finalidades de ordem puacuteblica a saber o sistema de creacutedito O sigilo bancaacuterio natildeo eacute um princiacuteshypio absoluto

As exceccedilotildees ao sigilo bancaacuterio estatildeo previstas na Lei n 45951964 que continua em vigor

O Poder Judiciaacuterio pode requisitar relativamente a pessoas e instishytuiccedilotildees informaccedilotildees que implicam quebra de sigilo (Lei n 45951964 art 38 sect 1 ordm) entretanto mesmo havendo inqueacuterito policial instaurado deveraacute proceder com cautela prudecircncia e moderaccedilatildeo inerentes agrave mashygistratura

Luciana Fregodolli (O Direito agrave Intimidade - excerto da dissertaccedilatildeo que apresentou sob o tiacutetulo O Direito agrave Intimidade e a Prova Iliacutecita publicado pela Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Constitucional e Ciecircncia Poliacutetica -n 19 p 233)

O sigilo bancaacuterio protege interesses privados Eacute ele espeacutecie de direito agrave privacidade inerente agrave personalidade das pessoas e que a Consshytituiccedilatildeo Federal consagra no art 5ordm X aleacutem de atender a uma finalidade de ordem puacuteblica qual seja a de proteccedilatildeo ao sistema de creacutedito

O direito agrave privacidade abrange atualmente o de impedir que tershyceiros inclusive o Estado e o Fisco tenham acesso a informaccedilotildees sobre o que se denominou a aacuterea de manifestaccedilatildeo existencial do ser humano

Celso Ribeiro Bastos O pensamento de Celso Ribeiro Bastos foi exshyposto por Roberto Quiroga Mosquera na obra jaacute referida p 71 do modo seguinte

Celso Bastos eacute do mesmo pensar Apoacutes tecer consideraccedilotildees introdutoacuterias acerca do sigilo bancaacuterio e expor pensamentos de divershysos autores nacionais e alieniacutegenas conclui o constitucionalista brasileishyro no sentido de que todas as despesas ordinaacuterias feitas pelo cidadatildeo

246 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

comum em sua vida cotidiana devem ser consideradas parte de sua vida privada familiar ou domeacutestica e portanto protegidas contra interferecircnshycias a despeito de qualquer pretexto Desde as condutas mais corriqueishyras como as compras efetuadas em um supermercado para manutenshyccedilatildeo da famiacutelia quanto aquelas outras moralmente reprovaacuteveis como presentes ou joacuteias compradas e dadas a quem presta ao homem servishyccedilos de natureza extraconjugal tudo estaacute abarcado pelo manto da proteshyccedilatildeo agrave vida privada familiar ou domeacutestica ( ) E mais adiante arremata Hoje praticamente a vida do homem pode ser escrita a partir de seu talatildeo de cheques e nas sociedades mais avanccediladas pelos cartotildees de creacutedito e magneacuteticos Permitir-se que o sigilo bancaacuterio venha a ser romshypido por qualquer forma natildeo-extraordinaacuteria para salvaguarda de inteshyresse de porte no miacutenimo idecircntico eacute expor a seguranccedila individual a um constante e absurdo temor perante as possibilidades de controle direto ou pelo vazamento de alguma informaccedilatildeo

Haacute contudo corrente contraacuteria como passaremos a demonstrar

Andreacute Serratildeo Borges de Sampaio Consultor da Uniatildeo nas informashyccedilotildees prestadas ao Advogado-Geral da Uniatildeo sobre a ADIn n 2397 cita trechos de doutrina e jurisprudecircncia estrangeiras defendendo o entendimento de que o sigilo bancaacuterio natildeo tem conotaccedilatildeo de direito de privacidade Eis o que escreshyveu o parecerista citado

O jurista portuguecircs J L Saldanha Sanches coteja primorosashymente o sigilo bancaacuterio com a proteccedilatildeo da intimidade para concluir que natildeo haacute que se falar em direito ao sigilo bancaacuterio como concretizaccedilatildeo do direito agrave intimidade Nas suas palavras

Ora em que esfera podemos noacutes incluir o segredo bancaacuteshyrio enquanto instituto que concretiza certos valores do ordenashymento juriacutedico Como expressatildeo de interesses juridicamente tuteshylados

Seraacute o segredo bancaacuterio um prolongamento do direito agrave inshytimidade da esfera pessoal e familiar de uma qualquer pessoa sinshygular (uma vez que em relaccedilatildeo agraves pessoas coletivas a questatildeo natildeo pode mesmo ser colocada) Ou diraacute antes respeito aquela faixa mais larga que resguarda a privacidade de qualquer cidadatildeo e que soacute pode por isso sofrer qualquer intromissatildeo se surgirem razotildees vaacutelidas para que tal direito seja restringido

Ao afirmar-se que na perspectiva dos clientes dos bancos o segredo bancaacuterio eacute um direito com a reserva da sua vida privada temos uma primeira resposta para esta questatildeo

ENSAIOS JURiacuteDICOS 247

Mas falta distinguir entre intimidade e reserva da vida privashyda e entre clientes individuais e profissionais de um banco Natildeo estamos perante o mesmo tipo de tutela quando contamos que um particular espera que o banco natildeo divulgue a qualquer inteshyressado o volume da sua conta bancaacuteria (porque pura e simplesshymente quer manter sob reserva a sua vida particular) ou quando um comerciante confia no banco para que este natildeo revele quem satildeo os seus clientes fornecedores ou qual eacute o seu grau de endividamento

No caso da pessoa singular estaacute apenas em causa um conshyjunto de valores de natureza moral esta natildeo estaacute em princiacutepio preocupada com possiacuteveis prejuiacutezos econocircmicos ligados a qualshyquer divulgaccedilatildeo Apenas se opotildee por razotildees do seu foro pessoal e que natildeo carecem de fundamentaccedilatildeo que esta tenha lugar

Enquanto que o comerciante pode ser seriamente prejudishycado em termos concorrenciais com a revelaccedilatildeo da lista dos seus clientes ou com a sua situaccedilatildeo financeira

O dever de reserva que cabe ao banqueiro estaacute desta forma a serviccedilo do interesse comercial das empresas suas clientes - que pelo simples facto de o serem ou por necessitarem de obter creacutedishyto lhe datildeo informaccedilotildees com um forte valor comercial ou da pesshysoa singular que deseja manter a privacidade da sua situaccedilatildeo patrimonial

Ou em alternativa ao serviccedilo da manutenccedilatildeo da privacidashyde que qualquer um pode desejar ainda que a possiacutevel violaccedilatildeo desta apenas lhe possa acarretar danos natildeo-patrimoniais

E por isso o segredo bancaacuterio natildeo pode constituir a expresshysatildeo do imperativo constitucional da proteccedilatildeo da intimidade Ateacute porque o acesso a essa esfera estaacute vedado aos proacuteprios bancos

Natildeo nos parece aceitaacutevel que um banco como condiccedilatildeo para a concessatildeo de creacutedito a uma pessoa singular ou para estashybelecer com ela qualquer relaccedilatildeo contratual possa exigir desta informaccedilatildeo de tipo estritamente pessoal ou a sujeiccedilatildeo a exames meacutedicos que atingindo a sua esfera iacutentima afectam a sua dignidashyde Aqui estaacute em causa a ilicitude da pergunta por pressupor o acesso agrave esfera inviolaacutevel (e indisponiacutevel) da intimidade

A informaccedilatildeo que o banco pode obter para a defesa dos seus interesses legiacutetimos natildeo pode ir aleacutem da esfera patrimonial do seu cliente rendimentos bens possuiacutedos perspectivas profisshysionais

( )

248 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

Podemos pois concluir que o segredo bancaacuterio natildeo eacute natildeo pode ser uma concretizaccedilatildeo do princiacutepio constitucional do direishyto agrave intimidade

Este princiacutepio tem como funccedilatildeo consagrar uma zona de reshyselVa pessoal para factos opccedilotildees e circunstacircncias que soacute de forshyma indirecta e de todo secundaacuteria podem ter aspectos ou refleshyxos de natureza patrimonial (Saldanha Sanches J L Segredo Bancaacuterio e Tributaccedilatildeo do Lucro Real In Saldanha Sanches J L Estudos de Direito Contabiliacutestico e Fiscal Coimbra Coimbra Edishytora 2000 pp 105108)

Em diversos paiacuteses haacute a clara percepccedilatildeo que natildeo haacute que se conshyfundir direito agrave intimidade com sigilo bancaacuterio indicando que a quebra do sigilo pela Administraccedilatildeo Tributaacuteria natildeo constitui violaccedilatildeo ao direito Ao contraacuterio a existecircncia de um Estado Fiscal implica na necessidade de consagrar agrave administraccedilatildeo tributaacuteria tal faculdade o que se harmonishyza com diversos princiacutepios e outros direitos fundamentais constantes da Carta de 1988

O caso espanhol eacute exemplar neste sentido ao natildeo visualizar a vioshylaccedilatildeo ao direito agrave intimidade em relaccedilatildeo agrave quebra do sigilo bancaacuterio Portanto

el Tribunal Constitucional espaflOl se ha pronunciado por la negativa de que el conocimiento de las cuentas bancarias por la Administracioacuten pueda invadir el aacutembito constitucionalmente garantizado de la intimidad de los individuos porque tales extractos no constituyen per se uma biografiacutea personal en nuacutemeros y en siacute no tiene relevancia para la intimidad personal y familiar dei contribuyente ya que se trata de dados no secretos y confiados a una entidad (Campos Laura Rodriacuteguez Oerechos dei Contribuyente em la Repuacuteblica Argentina ai Amparo de la Convencioacuten Interamericana de Oerechos Humanos http wwwiefpaorgarcriteriosdigitalarticulosderechoshtm Visitado em 512001)

Ao analisar a jurisprudecircncia da Corte Constitucional espanhola quanto ao tema tambeacutem ressalta Saldanha Sanches

Na apreciaccedilatildeo da constitucionalidade da lei que permitia o controle administrativo das contas bancaacuterias o Tribunal Constitushycional espanhol realizou uma distinccedilatildeo entre intimidade pessoal e familiar e a intimidade econoacutemica onde a proteccedilatildeo constitucional eacute menos intensa

ENSAIOS JURiacuteDICOS 249

E procura fazer uma distinccedilatildeo entre a violaccedilatildeo agrave intimidade como consequumlecircncia de uma anaacutelise das contas bancaacuterias - coloshycando a hipoacutetese de uma recusa de cooperaccedilatildeo por parte do conshytribuinte se tal eventualidade se verificar - e a violaccedilatildeo directa da intimidade uma vez que esta natildeo pode resultar de uma mera anaacuteshylise de movimentos bancaacuterios (Saldanha Sanches J L A Situashyccedilatildeo Actual do Sigilo Bancaacuterio a Singularidade do Regime Portushyguecircs In Saldanha Sanches J L Estudos de Direito Contabiliacutestico e Fiscal Coimbra Coimbra Editora 2000 p 91)

Outro comentarista ao analisar a situaccedilatildeo do sistema espanhol quanto ao sigilo bancaacuterio e o direito agrave intimidade fez questatildeo de ressaltar

Seguacuten el r c frente a la Hacienda Puacuteblica no existe el derecho a la intimidad deI art 18 CE Ya la LO de 5 de mayo deI 82 vada praacutecticamente de contenido constitucional el derecho a la intimidado en cuanto el aacutembito de eacutesta queda deferido a la ley ordinaria (a 2ordm) y en cuanto que la esfera protegida frente a las Administraciones se reduce a poco O nada ai no reputarse intromisiones ilegiacutetimas las actuaciones autorizadas o acordadas por la Autoridad competente de acuerdo con la Ley (art 8ordm 1)

La LGTy el RI Iimiacutetan la esfera de la intimidad en las relacishyones con la Hacienda hasta el extremo de que solamenle existe un refugio limitado en el aacutembito deI secreto profesional en los casos de informacioacuten sobre terceros y siempre que no se trate de datos con transcendencia econoacutemica o tributaria EI rc no ha enconshytrado hasta el momento ni un solo supuesto de dato o informacioacuten econocircmica con transcendencia tributaria que limite la accioacuten inquisitiva de la Administracioacuten tributaria por razoacuten de intimidado Bien puede decirse por tanto que frente a la Administraciocircn tribushytaria en cuanto se trata deI ejercicio de su funciocircn de buacutesqueda de datos con transcendencia tributaria el derecho a la intimidad personal y familiar (art 18 I CE) no existe

La biacuteblia deI tribunal a estos efeclos estaacute constituida por la S 11084 reiterada en numerosas ocasiones ampliada en el Auto 64286 y reafirmada por ejemplo en la S 26 abril 90 tantas veces citada (FJ 10deg) Seguacuten esa doctrina la distribucioacutenjusta de la carshyga fiscal prevalece sobre el derecho a la intimidad parte dei art 812 I de la LO seguacuten el cual frente a la Ley (ordinaria) no hay intimidad protegida siempre que haya en dicha ley imperativos de intereacutes puacuteblico ( ) ni siquiera se habla dei predomiacutenio frente a la

250 SUPERIOR TRIBUNAl DE JUSTiCcedilA

intimidad de intereses u objetivos constitucionalmente protegidos Soacuteo admite que la actuadoacuten administrativa es arbitraria cuando no parezcajustificada por la Finalidad de la inspeccioacuten es decir cuando se trate de datos o informaciones que carezcan de transcendencia tributaria pero eacuteste obviamente no es sin Umite derivado dei derecho a la intimidad sino de la interdiccioacuten de arbitrariedad o desviacioacuten de poder de la Administracioacuten de la necesidad de ajuste de toda Administracioacuten ai acircmbito de su competencia que tanto vale para datos iacutentimos como para otros que no lo sean Seguacuten la S 11084 no hay esfera de intimidad proshytegida frente a una Administracioacuten tributaria amparada en una norma que elimina la intimidad como liacutemite (Garciacutea AIacuteloveros Jaime Una Nueva Ley General Tributaria Problemas Constitucioshynales In Kirchhof P et aI Garantiacuteas Constitucionales dei Contribuyente Valencia Tirant lo Blanch 1999 pp 109110)

Diante de tudo quanto foi exposto tendo-se o cuidado de registrar posicionamento de diferentes autores nacionais e estrangeiros haacute ambiente preparado para ser respondido o primeiro questionamento desdobrado em trecircs partes formulado para o 1II Coloacutequio Internacional de Direito Tributaacuterio promoccedilatildeo do Centro de Extensatildeo Universitaacuteria Eis a primeira parte do seu teor

O sigilo bancaacuterio diz respeito agrave intimidade e privacidade das pessoas

A resposta eacute optando por convencimento influenciado pelas ideacuteias da corrente predominante positiva

O nosso entendimento eacute no sentido de que o direito agrave intimidade integra os direitos da personalidade e visam proteger o direito agrave inviolabilidade do domiciacutelio da correspondecircncia das comunicaccedilotildees de quaisquer espeacutecies dos dados pessoais computadorizados do sigilo bancaacuterio O mesmo acontece com o direito agrave privacidade

A expansatildeo da proteccedilatildeo do direito agrave intimidade e agrave privacidade eacute uma consequumlecircncia da evoluccedilatildeo da era contemporacircnea nos setores tecnoloacutegicos e da instabilidade que passam as instituiccedilotildees estatais especialmente a encarreshygada de arrecadar tributos Haacute o reconhecimento de que desenvolve-se um processo de aguda corrosatildeo na proteccedilatildeo agrave intimidade que ao ser violada provoca a publicizaccedilatildeo das condutas mais iacutentimas do cidadatildeo

A concepccedilatildeo do sigilo bancaacuterio no acircmbito do direito agrave intimidade e agrave privacidade visa garantir ao homem o miacutenimo capaz para que lhe seja asseshygurada a sua condiccedilatildeo humana protegendo-o de ingerecircncias alheias como apregoa a Conferecircncia Noacuterdica sobre o Direito agrave Intimidade realizada em Estoshycolmo na data de maio de 1967 ao fazer inserir no documento que publicou a seguinte definiccedilatildeo O direito agrave intimidade eacute o direito do homem de viver de forma independente a sua vida com um miacutenimo de ingerecircncia alheia

ENSAIOS JURiacuteDICOS 251

5 Seguranccedila juriacutedica e acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias

A segunda pergunta apresentada pelos organizadores do coloacutequio estaacute assim posta

A seguranccedila das relaccedilotildees juriacutedicas atraveacutes do Sistema Financeiro pode ser afetada pelo acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves inforshymaccedilotildees bancaacuterias

O acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias se realizado caracteriza um atentado de suma gravidade aos direishytos do cidadatildeo Eacute um ataque aos princiacutepios sustentadores do sistema demoshycraacutetico adotado pelo constituinte de 1988 especialmente quando detonou que a Repuacuteblica Federativa do Brasil tem como objetivo fundamental o respeishyto agrave dignidade humana e agrave cidadania

Do ordenamento juriacutedico brasileiro a meu pensar natildeo haacute lugar para brotar qualquer interpretaccedilatildeo que conclua pela possibilidade de qualquer agenshyte do Poder Puacuteblico acessar de modo generalizado e sem motivaccedilatildeo informashyccedilotildees bancaacuterias do cidadatildeo mesmo com autorizaccedilatildeo judicial

Esclareccedilo desde logo que natildeo comungo com o pensamento de detershyminada corrente no sentido de ser absoluto o direito ao sigilo bancaacuterio Tenho-o como relativo poreacutem vinculado aos princiacutepios da razoabilidade da moralidade da legalidade e da motivaccedilatildeo expliacutecita e detalhada sob pena de ser impossiacutevel a sua quebra

O acesso indiscriminado do agente fiscal agraves informaccedilotildees bancaacuterias do cidadatildeo gera uma quebra da seguranccedila das relaccedilotildees juriacutedicas por um terceiro passar a ter sem causa justificadora conhecimento da vida iacutentima de algueacutem submetendo-o a partir daiacute a um regime de submissatildeo Por outro lado ninshygueacutem poderaacute garantir nem o proacuteprio Estado que o agente puacuteblico utilize os dados que chegaram ao seu conhecimento para outros intentos que natildeo o exclusivamente fiscal

Lembra Arnoldo Wald que O segredo na atividade bancaacuteria envolve concomitantemente interesses privaqos e coletivos que podem ser analisashydos sob trecircs acircngulos o interesse do cliente na sua relaccedilatildeo com a instituiccedilatildeo financeira o interesse do banco em atuar com discriccedilatildeo para ganhar a conshyfianccedila da populaccedilatildeo e captar recursos e o interesse social na existecircncia de um bom e eficiente sistema bancaacuterio Por estarem ligadas ao desenvolvimento da economia e aos interesses da comunidade as relaccedilotildees que envolvem as instishytuiccedilotildees financeiras natildeo recebem o mesmo tratamento juriacutedico dispendido a outras relaccedilotildees comerciais Inviaacutevel a aplicaccedilatildeo exclusiva das regras de Direito Privado as quais tecircm como princiacutepio norteador a autonomia da vontade pois

252 SUPERIOR TRIBUNAl DE JUSTiCcedilA

esta encontra limites nas normas cogentes proacuteprias do direito bancaacuterio e na intervenccedilatildeo do Estado8

A seguranccedila juriacutedica desse tipo de relaccedilatildeo envolve tambeacutem a manutenshyccedilatildeo do segredo das movimentaccedilotildees financeiras do contribuinte

Imprimir-se a mais ampla seguranccedila nas relaccedilotildees do Sistema Financeiro eacute fortalececirc-lo O Estado tem o dever de zelar por esse estado de seguranccedila natildeo permitindo consequumlentemente que o sigilo bancaacuterio seja quebrado pelo acesshyso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico por esse comportamento afeshytar a confiabilidade no sistema

Eacute de todo inconveniente permitir a possibilidade de um atuar do agente fiscal sem controle na quebra do sigilo bancaacuterio por afetar diretamente a seshyguranccedila da relaccedilatildeo juriacutedica firmada entre a instituiccedilatildeo financeira e o seu clienshyte em face deste sentir-se atingido pela accedilatildeo fiscal que passa a tomar conhecishymento de sua intimidade financeira e de fatos de sua vida privada sem o resshypaldo do Poder Judiciaacuterio

A seguranccedila juriacutedica nesse tipo de relaccedilatildeo deve assegurar impossibilidashyde de abuso de poder por parte do Fisco em face da necessidade de ser resshyguardada a garantia de que em um Estado de Direito natildeo pode ser concebido que conceda-se a uma parte mesmo que seja o Estado o domiacutenio absoluto de apanhar as provas que iraacute utilizar em caso de litiacutegio contra algueacutem

O acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias do contribuinte aleacutem de afetar a seguranccedila juriacutedica da relaccedilatildeo em questatildeo promove um desequiliacutebro entre o cidadatildeo-contribuinte e o Fisco por caracterizar coaccedilatildeo que coloca aquele em posiccedilatildeo de inferioridade

A valorizaccedilatildeo da seguranccedila juriacutedica da relaccedilatildeo existente entre instituiccedilatildeo financeira e contribuinte pelo Fisco natildeo quebrando o seu sigilo fiscal sem autorizaccedilatildeo judicial constitui causa de aplicaccedilatildeo de Justiccedila fiscal O seguimenshyto de seus princiacutepios valoriza o regime democraacutetico do qual ela faz parte

6 Casos de admissibilidade da quebra do sigilo bancaacuterio

Os casos de admissibilidade da quebra do sigilo bancaacuterio estatildeo na atuashylidade descritos no nosso ordenamento juriacutedico positivo

A Lei Complementar n 105 de 10 de janeiro de 2001 apoacutes determinar no art 112 de que as instituiccedilotildees financeiras conservaratildeo sigilo em suas operashyccedilotildees ativas e passivas e serviccedilos prestados dispotildee no sect 312 do mesmo artigo que

8 Arnoldo Wald no artigo Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais Revista dos Tribunais ano 6 n 22 janeiromiddotmarccedilo de 1998 n 22 Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas p 15

ENSAIOS JURiacuteDICOS 253

sect 3ordm Natildeo constitui violaccedilatildeo do dever de sigilo

I a troca de informaccedilotildees entre instituiccedilotildees financeiras para fins cadastrais inclusive por intermeacutedio de centrais de risco observadas as normas baixadas pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e pelo Banco Censhytral do Brasil

11 - o fornecimento de informaccedilotildees constantes de cadastro de emitentes de cheques sem provisatildeo de fundos e de devedores inadimplentes a entidades de proteccedilatildeo ao creacutedito observadas as norshymas baixadas pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e pelo Banco Central do Brasil

JJI - o fornecimento das informaccedilotildees de que trata o sect 2ordm do art II da Lei n 9311 de 24 de outubro de 1996

IV - a comunicaccedilatildeo agraves autoridades competentes da praacutetica de iliacutecitos penais ou administrativos abrangendo o fornecimento de inforshymaccedilotildees sobre operaccedilotildees que envolvam recursos provenientes de qualshyquer praacutetica criminosa

V - a revelaccedilatildeo de informaccedilotildees sigilosas com o consentimento expresso dos interessados

VI- a prestaccedilatildeo de informaccedilotildees nos termos e condiccedilotildees estabeleshycidos nos artigos 2ordm 3ordm 4ordm 5ordm 6ordm 7ordm e 9ordm desta lei complementar

sect 4ordm A quebra de sigilo poderaacute ser decretada quando necessaacuteria para apuraccedilatildeo de ocorrecircncia de qualquer iliacutecito em qualquer fase do inqueacuterito ou do processo judicial e especialmente nos seguintes crimes

I - de terrorismo

11 - de traacutefico iliacutecito de substacircncias entorpecentes ou drogas afins

III - de contrabando ou traacutefico de armas municcedilotildees ou material destinado a sua produccedilatildeo

IV - de extorsatildeo mediante sequumlestro

V - contra o sistema financeiro nacional

VI - contra a Administraccedilatildeo Puacuteblica

Vll- contra a ordem tributaacuteria e a previdecircncia social

VIII-lavagem de dinheiro ou ocultaccedilatildeo de bens direitos e valores

IX - praticado por organizaccedilatildeo criminosa

Como visto a lei complementar enumera inuacutemeras situaccedilotildees que indeshypendentemente de autorizaccedilatildeo judicial o sigilo bancaacuterio eacute quebrado

254 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

A dificuldade que se apresenta eacute a de conciliar os casos de quebra de sigilo bancaacuterio que a Lei Complementar n 105 autoriza com a garantia do direito agrave privacidade e agrave intimidade

Destaque-se entre os de maior relevacircncia os seguintes

- natildeo constituir violaccedilatildeo do dever de sigilo bancaacuterio a troca de informashyccedilotildees entre instituiccedilotildees financeiras para fins cadastrais inclusive por intermeacuteshydio de centrais de risco o que possibilita o conhecimento da vida financeira privada do cidadatildeo por vaacuterias pessoas sem desempenho de autoridade na instituiccedilatildeo independentemente de ser justificada com antecedecircncia a causa desse atuar

- o de serem fornecidos dados relativos a fornecimentos de informashyccedilotildees cadastrais de emitentes de cheques sem provisatildeo de fundos a entidades privadas de proteccedilatildeo ao creacutedito sem qualquer avaliaccedilatildeo por qualquer autorishydade da causa determinante do fato a quebra do sigilo bancaacuterio na fase do inqueacuterito por inexistir nessa ocasiaacuteo qualquer contraditoacuterio e respeito ao prinshyciacutepio do devido processo legal

Quanto agraves demais situaccedilotildees constantes na lei complementar que autorishyzam a quebra do sigilo bancaacuterio naacuteo obstante algumas serem absolutamente necessaacuterias haacute de serem vistas em compatibilidade com as garantias constitushycionais conforme jaacute assinalado

O colendo Supremo Tribunal pronunciaraacute como guarda e inteacuterprete maishyor da Carta Magna em ADln jaacute intentada sobre a constitucionalidade ou natildeo dos dispositivos supramencionados

Em campo doutrinaacuterio valoriza-se as posiccedilotildees apresentadas quando da resposta oferecida aos questionamentos anteriores todas acenando pela neshycessidade do controle do Poder Judiciaacuterio

7 Sistema mais justo para a quebra do sigilo bancaacuterio

Os organizadores do JII Coloacutequio Internacional de Direito Tributaacuterio subshymetem agora para anaacutelise a questatildeo do teor seguinte Um sistema em que o Poder Judiciaacuterio torna-se aacuterbitro dos pedidos da Administraccedilatildeo Puacuteblica para quebra do sigilo eacute o mais justo

Em um Estado que por imposiccedilatildeo de sua proacutepria Constituiccedilatildeo estaacute comprometido com a guarda e aplicaccedilatildeo efetiva de princiacutepios democraacuteticos especialmente o de respeitar os direitos e garantias fundamentais da cidadashynia natildeo haacute ambiente para que seja outorgado ao Poder Executivo por via da atuaccedilatildeo de agentes puacuteblicos fiscais o acesso sem o controle do Poder Judiciaacuteshyrio agraves informaccedilotildees bancaacuterias do contribuinte

ENSAIOS JURiacuteDICOS 255

o sigilo bancaacuterio por ser um direito fundamental que exige ser respeitashydo pela supremacia constitucional que o protege deve submeter a possibilishydade de sua quebra para fins tributaacuterios ao Poder Judiciaacuterio pela ausecircncia de interesse direto nos resultados da accedilatildeo fiscalizadora que eacute o recolhimento do tributo e pelas garantias de independecircncia prudecircncia e qualificaccedilatildeo juriacutedica que revestem esse poder

A atuaccedilatildeo da fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo pode ser exercida fora dos limishytes da legalidade imposta a partir da Carta Magna e demais imposiccedilotildees legais a ela subordinadas

Natildeo se desconhece que no atual Estado fiscal os tributos constituem os meios financeiros determinantes para o atendimento dos compromissos da Administraccedilatildeo Puacuteblica com as obrigaccedilotildees oriundas em decorrecircncia de sua atividade no campo educacional social de seguranccedila puacuteblica interna e extershyna da sauacutede da manutenccedilatildeo dos Poderes ou seja para manter funcionando a maacutequina estatal

Por natildeo entremostrar-se na eacutepoca contemporacircnea qualquer outra alshyternativa viaacutevel para transformar o Estado fiscal em um Estado produtivo os tributos passam a representar um indeclinaacutevel dever da cidadania cujo cumshyprimento deve ser por todos honrado conforme assinala Joseacute Casalta Nabais Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra em artigo intitulado Algumas Reflexotildees sobre o Actual Estado Fiscal

Por isso os impostos hatildeo de constituir um preccedilo aceitaacutevel ou seja um preccedilo limitado Um preccedilo que estou certo muitas das sociedashydes que nos antecederam gostariam de ter pago e algumas das actuais natildeo enjeitariam suportar Por isso bem podemos afirmar como jaacute o fizeshymos noutro lugar que no actual Estado fiscal para o qual natildeo se vislumshybra qualquer alternativa viaacutevel pelo menos nos tempos mais proacuteximos os impostos constituem um indeclinaacutevel dever de cidadania cujo cumshyprimento a todos nos deve honrar

A atuaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio para liberar o bloqueio fortalece a conshyfianccedila do cidadatildeo no procedimento da fiscalizaccedilatildeo e consagra a ideacuteia iacutensita em qualquer regime democraacutetico de que a atuaccedilatildeo do Estado tem limites

Na espeacutecie os limites impostos satildeo os decorrentes da quebra do sigilo ser necessaacuterio em face da possiacutevel ilicitude cometida pelo cidadatildeo poreacutem sem ser violados os direitos do cidadatildeo de gozar da sua privacidade e da sua intimidade

A denominada cidadania fiscal haacute de ser considerada de modo conjunshytural com os reflexos dos direitos fundamentais assegurados ao contribuinte sem prestigiar a responsabilidade que tem o Estado de promover a arrecadashyccedilatildeo dos tributos

256 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

Cedo espaccedilo para registrar que a cidadania fiscal deve configurar um estado de relaccedilatildeo juriacutedica em que todos suportem a concretizaccedilatildeo de um Estado em que todos tenham a qualidade de destinataacuterio do dever fundashymentaI de pagar impostos na medida da respectiva capacidade contributiva poreacutem que seja um Estado fiscal suportaacutevel isto eacute um estado cujo sistema fiscal se encontre balizado por estritos limites juriacutedico-constitucionais9

A Administraccedilatildeo Tributaacuteria por melhor que seja a sua estrutura e os seus propoacutesitos natildeo estaacute emocionalmente preparada para conceber e aplicar os princiacutepios que sustentam a cidadania fiscal Isso ocorre primeiramente porshyque o Fisco tem por missatildeo exclusiva exercer a funccedilatildeo de arrecadar tributos Eacute a sua meta essencial por ser atribuiccedilatildeo que na organizaccedilatildeo administrativa estatal estaacute obrigado a desempenhar Natildeo lhe cabe administrar o tributo arreshycadado limitando-se unicamente a envidar esforccedilos para o cumprimento das metas impostas para imprimir aumento na arrecadaccedilatildeo tributaacuteria O sucesso da Administraccedilatildeo Tributaacuteria eacute medido pelo maior volume de recursos fiscais atraiacutedos para os cofres do Governo nunca pelo respeito que exerccedila para com os direitos fundamentais do contribuinte Eacute uma questatildeo de cultura adminisshytrativa de distribuiccedilatildeo de funccedilotildees no sistema estatal impossiacutevel de ser mudashydo por sugestotildees doutrinaacuterias

Por outro lado a fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo consegue afastar as pressotildees exercidas sobre ela por determinados segmentos da organizaccedilatildeo estatal que defendem uma atuaccedilatildeo mais agressiva para a cobranccedila dos tributos tudo em decorrecircncia dos efeitos produzidos pela conduta iliacutecita marcante da sonegashyccedilatildeo fiscal

Esses fatores contribuem para que a fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo tenha condiccedilotildees de modo imparcial sem isenccedilatildeo avaliar a necessidade objetiva da quebra do sigilo bancaacuterio do cidadatildeo Por melhor que seja o seu desempenho nunca ganharaacute a confianccedila do contribuinte

A atribuiccedilatildeo da quebra do sigilo bancaacuterio em um regime democraacutetico onde predomina o respeito maior aos direitos fundamentais da cidadania deve ser exercido pelo Poder Judiciaacuterio natildeo soacute porque seus membros atualmente revestidos da garantia da vitaliciedade inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos bem como porque estatildeo revestidos de independecircncia absoluta em relaccedilatildeo ao Poder interessado na cobranccedila do tributo e consequumlentemenshyte no resultado a ser obtido pela accedilatildeo fiscal

Esse sistema misto onde o Fisco faz a solicitaccedilatildeo motivada para a queshybra do sigilo bancaacuterio ao Poder Judiciaacuterio e este apoacutes analisaacute-lo com objetivishydade e cautela defere ou indefere impotildee seguranccedila e confiabilidade na atuashyccedilatildeo fiscal e sublima o respeito agrave dignidade do contribuinte em outras palavras da cidadania fiscal isto eacute de uma cidadania de liberdade que o Estado fiscal

9 Joseacute Casalta Nabais (Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra) no artigo Algumas Reflexotildees sobre o Actual Estado Fiscal no site httpagugovbr

ENSAIOS JURiacuteDICOS 257

pressupotildee para natildeo ser postergada impotildee um sistema fiscal balizado por esshytritos limites juriacutedico-constitucionais Limites esses que integram a chamada constituiccedilatildeo fiscal e que podemos reconduzir para natildeo nos alongarmos nesse aspecto a duas ideacuteias uma ideacuteia de seguranccedila que tem o seu tradicional e principal suporte no princiacutepio da lega1idade fiscal e uma ideacuteia de justiccedila ou equumlidade que tem a ver com a medida dos impostos e assenta no princiacutepio da capacidade contributiva 10

Em conclusatildeo a adoccedilatildeo de um sistema para a quebra do sigilo bancaacuteshyrio em que o Poder Judiciaacuterio seja o aacuterbitro dos pedidos da Administraccedilatildeo Puacuteblica natildeo eacute somente mais justo mas consegue impor maior credibilidade agrave atuaccedilatildeo fiscal e presta homenagem com intensa potencialidade aos princiacuteshypios democraacuteticos consistentes na guarda da seguranccedila juriacutedica do respeito aos direitos fundamentais do cidadatildeo nesse rol incluidos os agrave privacidade e agrave intimidade Aleacutem disso torna mais respeitaacutevel a relaccedilatildeo entre Fisco e contrishybuinte justificando portanto a opccedilatildeo do Estado pelo regime democraacutetico

8 Autoridade fiscal e faculdade incondicionada de quebrar o sigilo bancaacuterio

Essa indagaccedilatildeo consubstancia a preocupaccedilatildeo de serem estabelecidos controles para a atuaccedilatildeo do agente puacuteblico fiscal Centra-se a preocupaccedilatildeo em imprimir nas relaccedilotildees juriacutedicas tributaacuterias de quaisquer espeacutecies o primashydo da legalidade aprimorando-se o atuar vinculado

Natildeo concilia-se com os postulados da democracia a adoccedilatildeo de um sisteshyma de fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria que outorgue faculdade incondicionada ao fiscal tributaacuterio de invadir a intimidade e a privacidade das pessoas sob o falso argushymento juriacutedico de que busca encontrar provas de sonegaccedilatildeo fiscal

Depreende-se do exposto que a autoridade fiscal natildeo deve ter faculdade incondicionada de quebrar o sigilo sempre que entender necessaacuterio Isso porshyque a praacutetica de atos administrativos por agentes puacuteblicos de modo incondicionado revela grave violaccedilatildeo ao princiacutepio da legalidade onde predoshymina a vontade da lei e natildeo o discricionarismo de quem o pratica

No trato do sigilo bancaacuterio o atuar incondicionado da fiscalizaccedilatildeo assushyme caracteriacutesticas de maior gravidade porque haacute violaccedilatildeo aos princiacutepios funshydamentais jaacute expostos e que satildeo prestigiados pela Carta Magna especialmenshyte por bater de frente de modo integral e absoluto com o direito agrave intimidade e agrave privacidade O atuar deve vincular-se rigidamente ao princiacutepio da legalidashyde especialmente aposta na Carta Magna sem a possibilidade de ser aberto qualquer canal para uso da conveniecircncia ou da oportunidade

Eacute de ser lembrada no trato do assunto a liccedilatildeo de Joseacute Casalta Nobais no trabalho jaacute citado no sentido de que Eacute certo que independentemente da

10 Idem p 15

=258=---___________________ SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTlCA

concepccedilatildeo a que se adira relativamente ao segredo bancaacuterio natildeo temos a menor duacutevida de que o acesso da Administraccedilatildeo Fiscal agrave informaccedilatildeo bancaacuteria seja directo sem necessidade de preacutevia decisatildeo judicial seja indirecto depois portanto de preacutevia decisatildeo judicial haacute de ter sempre uma natureza claramenshyte excepcional Na verdade constitua o segredo bancaacuterio uma manifestaccedilatildeo do direito fundamental agrave reserva da intimidade da vida privada constante do art 26 n 2 da Constituiccedilatildeo portuguesa ou suporte um outro direito fundashymentai um direito agrave reserva da vida privada anaacutelogo agravequele a sua afectaccedilatildeo teraacute sempre caraacuteter excepcional

A autoridade fiscal natildeo possui a necessaacuteria isenccedilatildeo e competecircncia institucional para averiguar o grau dessa excepcionalidade de modo que posshysa impor confianccedila ao cidadatildeo investido na condiccedilatildeo de contribuinte poreacutem com direitos a serem assegurados por forccedila do regime democraacutetico adotado

O certo eacute que na relaccedilatildeo juriacutedico-tributaacuteria deve ser buscado o justo equiliacutebrio pregado pelo Estado de Direito onde o cidadatildeo deve ter a sua dignishydade respeitada sem contudo afastar-se a necessidade do Estado arrecadar tributos de forma cogente e imperativa bem como de serem permitidas conshydiccedilotildees de atuaccedilatildeo que resultem no combate agrave sonegaccedilatildeo fiscal

9 Responsabilidade da autoridade administrativa que quebrar o sigilo banshycaacuterio de forma inconsistente e indevida

Eacute inerente ao regime democraacutetico que a autoridade administrativa puacuteblishyca estaacute obrigada a exercer as suas atribuiccedilotildees com rigorosa obediecircncia aos princiacutepios da legalidade moralidade publicidade impessoalidade e eficiecircncia entre outros

A Carta Magna consagra expressamente no art 37 a obediecircncia do agente puacuteblico a esse tipo de comportamento

A autoridade administrativia que quebrar de modo inconsistente e indevido o sigilo bancaacuterio do cidadatildeo pratica ato com capacidade de provocar os seguintes efeitos a) de invadir o direito agrave privacidade e agrave intimidade de algueacutem b) de provocar-lhe danos morais e materiais dependendo da repershycussatildeo provocada pelo seu atuar

Constatada a efetivaccedilatildeo real de danos morais e materiais a responsabishylidade do Estado pode ser acionada conforme permite o art 37 sect 6ordm da Consshytituiccedilatildeo Federal Solidificada a culpa ou dolo do agente puacuteblico e consagrada a materializaccedilatildeo do iliacutecito praticado com o consequumlente ressarcimento patrimonial o Estado deveraacute usando o direito de regresso investir contra o agente que agiu culposa ou dolosamente

Natildeo resume-se apenas ao campo da responsabilidade civil a atuaccedilatildeo da autoridade quando ilegalmente quebra o sigilo bancaacuterio de qualquer cidadatildeo

ENSAIOS JURiacuteDICOS 259

o art 10 da Lei Complementar n 105 de 10 de janeiro de 2001 determishyna que A quebra de sigilo fora das hipoacuteteses autorizadas nesta lei compleshymentar constitui crime e sujeita os responsaacuteveis agrave pena de reclusatildeo de um a quatro anos e multa aplicando-se no que couber o Coacutedigo Penal sem prejuiacuteshyzo de outras sanccedilotildees cabiacuteveis A seguir no seu paraacutegrafo uacutenico explicita que Incorre nas mesmas penas quem omitir retardar injustificadamente ou presshytar falsamente as informaccedilotildees requeridas nos termos desta lei complementar

O art 11 da mesma lei complementar expressa que O servidor puacuteblico que utilizar ou viabilizar a utilizaccedilatildeo de qualquer informaccedilatildeo obtida em decorshyrecircncia da quebra de sigilo de que trata esta lei complementar responde pessoshyal e diretamente pelos danos decorrentes sem prejuiacutezo da responsabilidade objetiva da entidade puacuteblica quando comprovado que o servidor agiu de acorshydo com a orientaccedilatildeo oficial

10 O sigilo bancaacuterio e o tratamento que lhe eacute dado por oacutergatildeos internacioshynais como a OCDE e outros

Rui Celso Reali Fragoso Presidente do Instituto dos Advogados de Satildeo Paulo em artigo intitulado O Sigilo Bancaacuterio veiculado pela Internet (http Ii wwwjuscombr) registra que atualmente temos trecircs sistemas legais no munshydo cuidando do sigilo bancaacuterio O primeiro eacute o anglo-saxatildeo em que o sigilo natildeo encontra amparo legal o segundo eacute o dos paiacuteses da Europa continental - eu o contemplo em vaacuterios diplomas legais o terceiro eacute o da Suiacuteccedila e do Liacutebano que o reforccedilam

Analisando esses trecircs sistemas o autor citado observa

Haacute aparente contradiccedilatildeo no sistema inglecircs e norte-americano pois se de um lado nestes paiacuteses se eleva a garantia das liberdades individuais de outro se despreza o sigilo bancaacuterio Eacute que se ocorre conshyflito entre a apuraccedilatildeo de fatos (fator social) e a privacidade das pessoas (fator individual) prevalece a primeira Mais ainda o relacionamento de clientes e bancos longe de estabelececirc-lo serve como fonte de informashyccedilatildeo em favor de terceiros a indiscriccedilatildeo injustificada poreacutem eacute objeto de sanccedilatildeo E na Inglaterra os poderes puacuteblicos natildeo intervecircm no funcionashymento dos estabelecimentos privados de creacutedito o que debilita a invesshytigaccedilatildeo

Nos paiacuteses da Europa continental a legislaccedilatildeo contempla o sigilo bancaacuterio como consequumlecircncia do profissional e comporta derrogaccedilotildees na esfera penal e em alguns casos na civil mas comina sanccedilotildees crimishynais no caso de violaccedilatildeo ao sigilo (Coacutedigo Penal francecircs artigo 378 Coacuteshydigo Penal italiano art 622)

260 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

A sistemaacutetica fortalecida eacute aquela utilizada na Suiacuteccedila decorrente da crise ocorrida em 1931 com o fechamento do Banco de Genebra que ensejou a ediccedilatildeo de lei estabelecendo severas puniccedilotildees de natureza civil e criminal Tanto a legislaccedilatildeo suiacuteccedila como a libanesa esta surgida em 1956 permitem derrogaccedilotildees em certas hipoacuteteses A existecircncia das conshytas numeradas comprova a importacircncia do sigilo nestes paiacuteses

Eacute certo natildeo ser absoluto o segredo nem sua quebra em determishynadas situaccedilotildees significa abuso de poder Aliaacutes nenhum direito eacute absoluto

A doutrina tem ultimamente tomado conhecimento sobre as transforshymaccedilotildees que tem passado em vaacuterios ordenamentos juriacutedicos a questatildeo do sigilo bancaacuterio

Zenobio Simotildees de Melo advogado no Paranaacute em artigo sob o tiacutetulo Quebra do Sigilo Bancaacuterio (Internet httpjuscombr) informa que o jornal O Estado de Satildeo Paulo de 21 de junho de 2000 publicou a notiacutecia seguinte

Numa das mais importantes decisotildees adotadas durante o Conseshylho Europeu que marca o fim da presidecircncia portuguesa da Uniatildeo Euroshypeacuteia (UE) seus 15 paiacuteses aprovaram ontem o pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal No ponto mais polecircmico o pacote deveraacute acabar com o sigilo bancaacuterio ateacute 2010 foi uma negociaccedilatildeo de 12 anos Aacuteustria e Luxemburgo natildeo aceitavam o princiacutepio de acabar com o sigilo bancaacuterio A justificativa austriacuteaca eacute que este eacute um princiacutepio que faz parte da Consshytituiccedilatildeo do paiacutes haacute 200 anos Para aceitar o acordo o paiacutes exigiu a manushytenccedilatildeo do sigilo nos bancos austriacuteacos para quem resida no paiacutes

Registro a iacutentegra da notiacutecia

Pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal eacute aprovado por membros da UE Decisatildeo prevecirc quebra do sigilo bancaacuterio nos paiacuteses do bloco econocircmico

Jair Rattner

Especial para o Estado

Santa Maria da Feira Portugal- Numa das mais importantes decishysotildees adotadas durante o Conselho Europeu que marca o fim da presishydecircncia portuguesa da Uniatildeo Europeacuteia (UE) seus 15 paiacuteses aprovaram ontem o pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal No ponto mais polecircmico o pashycote deveraacute acabar com o sigilo bancaacuterio ateacute 2010

Foi uma negociaccedilatildeo de 12 anos Agora temos um documento que vai estabelecer os princiacutepios e as orientaccedilotildees para as futuras diretivas nessa aacuterea afirmou o Primeiro-Ministro Portuguecircs Antonio Guterres que ocupa a presidecircncia rotativa da UE (no fim do mecircs ela seraacute transferida para a Franccedila)

ENSAIOS JURiacuteDICOS 261

o acordo abrange trecircs aacutereas um coacutedigo de conduta que prevecirc o desmantelamento dos 66 paraiacutesos fiscais existentes ou dependentes da UE a tributaccedilatildeo de royalties e o pagamento de impostos sobre rendishymentos das poupanccedilas de cidadatildeos europeus residentes em outros paiacuteshyses dentre os 15 que fazem parte do bloco econocircmico europeu

O grande problema eram as poupanccedilas Aacuteustria e Luxemburgo natildeo aceitavam o princiacutepio de acabar com o sigilo bancaacuterio A justificativa austriacuteaca eacute que este eacute um princiacutepio que faz parte da Constituiccedilatildeo do paiacutes haacute 200 anos Para aceitar o acordo o paiacutes exigiu a manutenccedilatildeo do sigilo nos bancos austriacuteacos para quem resida no paiacutes Essa questatildeo natildeo eacute importante soacute para a Europa porque abre caminho para a criaccedilatildeo de mecanismos de transparecircncia global no mundo financeiro que satildeo esshysenciais para a globalizaccedilatildeo da economia avaliou Guterres

O prazo para a introduccedilatildeo das mudanccedilas vai ateacute o fim de 2010 Ateacute o fim deste ano as negociaccedilotildees vatildeo ser sobre a definiccedilatildeo do conteuacutedo das diretivas (as normas da UE)

Em 2002 a UE discutiraacute com outros paiacuteses esses conteuacutedos para fazer acordos que deveratildeo ser aprovados ateacute o fim do ano por unanimishydade

A partir de 2003 seraacute iniciado um periacuteodo de sete anos de transishyccedilatildeo para a troca de informaccedilotildees sobre os investimentos de cidadatildeos de outros paiacuteses europeus Nesse periacuteodo alguns paiacuteses poderatildeo optar por cobrar impostos de 20 a 25 sobre os rendimentos dos investimentos de residentes no exterior

No capiacutetulo onde foi analisado o sigilo bancaacuterio no Direito Comparado haacute registros tambeacutem a respeito do tratamento que oacutergatildeos internacionais como o OCDEll e outros vecircm dando ao sigilo bancaacuterio conforme estudo que foi apresentado pelo autor ali citado

II OCDE (Organizaccedilatildeo de Cooperaccedilatildeo e Desenvolvimento Econocircmico) criado em 1961 para substituir a OECE (Comitecirc Fiscal da Organizaccedilatildeo Europeacuteia de Cooperaccedilatildeo Econocircmica) Um dos documentos mais importantes da OCDE eacute o resultante da sua Convenccedilatildeo-Modelo relashytiva a impostos sobre a renda e o capital Essa Convenccedilatildeo estaacute sistematizada em sete capiacutetulos assim explicitados por Alberto Xavier em sua obra Direito Tributaacuterio Internacioshynal do Brasil A Convenccedilatildeo-Modelo da OCDE (tal como a das Naccedilocirces Unidas) encontra-se sistematizada em sete capiacutetulos Os capiacutetulos I e I regulam os requisitos para a aplicaccedilatildeo do tratado O capiacutetulo [JI - de longe o mais importante - conteacutem as regras de distribuiccedilatildeo de competecircncia no que concerne aos impostos sobre o rendimento classificado este por tipos ou classes agrave semelhanccedila do que sucede nos sistemas de tributaccedilatildeo cedular O capiacutetulo IV ocupa-se das regras de distribuiccedilatildeo de competecircncia no que respeita aos impostos sobre o capital O capiacutetulo V determina as consequumlecircncias das regras dos capiacutetulos 111 e IV facultanshydo aos Estados a escolha entre os meacutetodos da isenccedilatildeo e da imputaccedilatildeo O capiacutetulo VI conteacutem disposiccedilotildees adicionais sobre natildeo-discriminaccedilatildeo procedimento amigaacutevel troca de informaccedilotildees e privileacutegios de funcionaacuterios diplomaacuteticos e consulares e regras sobre extenshysatildeo do tratado a partes do territoacuterio Enfim o capiacutetulo VII conteacutem disposiccedilotildees finais sobre entrada em vigor e cessaccedilatildeo do acordo

262 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

Heleno Torres em sua recente obra Direito Tributaacuterio Internacional -Planejamento Tributaacuterio e Operaccedilotildees Transnacionais RT p 147 analisando o posicionamento da OCDE referente agrave poliacutetica de determinados paiacuteses que adoshytam tributaccedilatildeo favorecida e os efeitos dos regimes fiscais prejudiciais registra que

A OCDE resolveu entrar na luta para minorar as praacuteticas fiscalshymente danosas insistindo sobre a necessidade de aumentar as trocas de informaccedilotildees entre os Estados aleacutem de redigir uma lista de paiacuteses com tributaccedilatildeo favorecida e fazer algumas recomendaccedilotildees em acircmbito nacional e convencional a partir do seu importante relatoacuterio Harmful tax competition na emerging global issue

Mesmo reconhecendo os aspectos positivos do ambiente global vigente no qual os sistemas tributaacuterios operam os paiacuteses-membros da OCDE concluiacuteram que eles precisavam agir para restringir a competiccedilatildeo tributaacuteria danosa coletivamente e individualmente opondo-se agrave expanshysatildeo de regimes de impostos preferenciais danosos particularmente nos setores financeiros e atividades de serviccedilo que podem causar distorccedilotildees no comeacutercio e desniacuteveis nos padrotildees de investimento sendo uma ameashyccedila para os sistemas tributaacuterios domeacutesticos e para a estrutura global de tributaccedilatildeo internacional

Mais adiante pp 152153 Heleno Torres afirma que

Entre as recomendaccedilotildees definidas nesse relatoacuterio com aplicashyccedilatildeo dirigida aos paiacuteses-membros da instituiccedilatildeo as mais importantes satildeo as seguintes

bull para contrastar a competiccedilatildeo fiscal prejudicial os paiacuteses devem revisar as suas leis regulamentos e praacuteticas sobre sigilo bancaacuterio para remover empecilhos de acesso a tais informaccedilotildees por autoridades fiscais

bull intensificar o uso de trocas de informaccedilotildees principalmente soshybre as transaccedilotildees com paiacuteses de tributaccedilatildeo favorecida

A conclusatildeo que pode ser firmada apoacutes anaacutelise dos pronunciamentos internacionais acima explicitados eacute a construccedilatildeo de uma corrente que defenshyde uma maior abertura para a quebra do sigilo bancaacuterio quando for necessaacuteshyrio para apurar iliacutecitos tributaacuterios

Essa portanto eacute a resposta que apresento para a indagaccedilatildeo Qual o tratamento proposto por oacutergatildeos internacionais como o OCDE e outros com relaccedilatildeo ao sigilo bancaacuterio

ENSAIOS JURiacuteDICOS 263

11 Compatibilizaccedilatildeo do combate agrave criminalidade internacional com o resshypeito agrave seguranccedila juriacutedica a fim de evitar a fuga de investimentos do Paiacutes

Haacute de se reconhecer natildeo ser faacutecil desenvolver-se um sistema juriacutedico que contenha regras que facilitem o combate agrave criminalidade internacional e ao mesmo tempo prestigie os direitos fundamentais do cidadatildeo especialmenshyte a sua seguranccedila juriacutedica

As convenccedilotildees internacionais conforme demonstrado estatildeo preocupashydas com esses aspectos sem deixar de lado os fenocircmenos causados pela globalizaccedilatildeo

Natildeo deve ser esquecido que o tema envolve aspectos diversos a comeshyccedilar pelos determinantes da soberania dos Estados das forccedilas em expansatildeo das organizaccedilotildees internacionais e da pregaccedilatildeo para que os direitos fundamenshytaIacutes do cidadatildeo sejam respeitados com maior Iacutentensidade

A soluccedilatildeo a meu pensar pode ser encontrada no fortalecimento do Direito Comunitaacuterio Os Estados por via de organismos internacionais firmashyriam tratados para a adoccedilatildeo de um Coacutedigo Processual Penal Internacional com efeitos vinculantes por parte das naccedilotildees onde seriam adotadas regras investigatoacuterias e apuratoacuterias dos iliacutecitos internacionais alargando os conceitos de indiacutecios e presunccedilotildees sem deixar contudo de prestigiar a afetividade dos direitos e garantias fundamentais do cidadatildeo

Todas as naccedilotildees no iniacutecio deste seacuteculo envidam esforccedilos para diminuir a crise da seguranccedila juriacutedica Satildeo vaacuterios os fatores determinantes todos tendo como causa comum o crescimento da delinquumlecircncia em decorrecircncia de poliacutetishycas econocircmicas e sociais adotadas por determinados governos que contrishybuem para aumentar o percentual de pessoas pobres

A preocupaccedilatildeo atual para o combate ao crime internacional eacute alcanccedilar niacutevel de uniformizaccedilatildeo dos sistemas adotados para a quebra do sigilo bancaacuteshyrio De iniacutecio deve ser defendida a postura de que nenhuma lesatildeo ou ameaccedila a direito deve ser excluiacuteda da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio Nessa perspectishyva ganha suma importacircncia a criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional em virshytude de pela sua atuaccedilatildeo natildeo perdurar a diversidade de sistemas legais a respeito do assunto a saber a) O anglo-saxatildeo onde o sigilo natildeo encontra amparo legal b) o dos paiacuteses da Europa continental que o contempla em vaacuterios diplomas escritos e c) o da Suiacuteccedila e do Liacutebano que o reforccedilam l2bull

A criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional envolve uma reconceiacutetuaccedilatildeo de soberania

Sobre o tema Celso D de Albuquerque Mello em Direito Internacional da Integraccedilatildeo Ed Renovar p 13 faz a seguinte observaccedilatildeo

12 Conforme anota Rui Celso Reali Fragoso no artigo O Sigilo Bancaacuterio publicado no site httpvvwwjuscombr

264 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Poder-se-ia fazer um pequeno reparo a Chaumont que a indeshypendecircncia nacional eacute um conceito juridicamente indeterminado e que ela pode ter diferentes graus Tanto que podemos escrever soberania versus cooperaccedilatildeo internacional apesar de reconhecermos que esta posiccedilatildeo pode ser considerada como radical vez que natildeo haacute uma total incompatibilidade entre as duas Entretanto natildeo se pode deixar de consshytatar que de certo modo a cooperaccedilatildeo internacional se encontra conshysagrada na Carta da ONU no arl 1 ordm que trata dos Propoacutesitos das Naccedilotildees Unidas e nos Princiacutepios estabelecidos na Carta da OEA (Capiacutetulo 11) O mesmo ocorre na resoluccedilatildeo da Assembleacuteia Geral da ONU de 1970 que aprova a Declaraccedilatildeo Relativa aos Princiacutepios do Direito Internacional Reshylativas agraves Relaccedilotildees Amigaacuteveis e agrave Cooperaccedilatildeo entre os Estados conforme a Carta das Naccedilotildees Unidas bem como na Carta de Direitos e Deveres Econocircmicos aprovada pela mesma Assembleacuteia Geral em 1974

O crescimento do crime internacional em decorrecircncia dos fenocircmenos globalizantes determina o surgimento de um dever juriacutedico dos Estados firmashyrem pactos de cooperaccedilatildeo entre si para que enfrentem as organizaccedilotildees voltashydas para a criminalidade Esse dever juriacutedico globalizado tem suas raiacutezes no moral intemacional que conforme assinala Celso Albuquerque Mello na obra citada p 13 sempre consagrou o princiacutepio da solidariedade ou ainda do auxiacutelio muacutetuo

Eacute o mais importante desafio neste iniacutecio de seacuteculo fazer com que surja uma legislaccedilatildeo internacional que compatibilize o combate agrave criminalidade inshyternacional sem violar a seguranccedila juriacutedica com finalidade exclusiva de evitar a fuga de investimenos do Paiacutes

Tenha-se contudo em consideraccedilatildeo que a globalizaccedilatildeo do crime emshybora seja uma grande ameaccedila aos valores tradicionais que sustentam a cidashydania especialmente a seguranccedila juriacutedica natildeo deve prejudicar o desenvolvishymento econocircmico de qualquer naccedilatildeo

Natildeo faccedilo coro ao assinalado por Eric Hobsbawm em sua obra Era dos Extremos O Breve Seacuteculo XX 1914-1991 1995 p 24 Companhia das Letras S Paulo traduccedilatildeo de Marcos Santarrita no sentido de que Talvez a caracteriacutesshytica mais impressionante do fim do seacuteculo XX seja a tensatildeo entre esse processo de globalizaccedilatildeo cada vez mais acelerado e a incapacidade conjunta das instishytuiccedilotildees puacuteblicas e do comportamento coletivo dos seres humanos de se acoshymodarem a ele

Penso que natildeo haacute essa acomodaccedilatildeo e que as instituiccedilotildees puacuteblicas espeshycialmente as submetidas ao controle da ciecircncia juriacutedica natildeo estatildeo incapacitashydas de encontrar caminhos que solucionem o problema existente

ENSAIOS JURiacuteDICOS 265

Eacute por demais positivo entre outros acontecimentos o fato da conscienshytizaccedilatildeo de que haacute de ser encontrada uma forma de combate agrave criminalidade internacional que natildeo afaste a garantia da seguranccedila juriacutedica Esta eacute uma neshycessidade para impor paz agrave naccedilatildeo e consequumlentemente criar ambiente para que novos investimentos necessaacuterios ao desenvolvimento do seu processo econocircmico aconteccedilam sem se falar na manutenccedilatildeo dos jaacute existentes

O Parlamento Europeu aprovou ultimamente uma resoluccedilatildeo sobre a criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional sob a consideraccedilatildeo de que eacute necessaacuteshyrio criaacute-lo de forma permanente para complementar os sistemas judiciais nashycionais e pocircr fim agrave impunidade de que gozam os responsaacuteveis por genociacutedio crimes contra a humanidade e crimes de guerra

A abertura para essa posiccedilatildeo denota a formaccedilatildeo de uma consciecircncia internacional para combater a criminalidade internacional em todos os niacuteveis contribuindo para fortalecer a seguranccedila juriacutedica interna de cada paiacutes

O documento representativo dessa resoluccedilatildeo eacute do teor seguinte

Parlamento Europeo

Resolucioacuten sobre el Tribunal Penal Internacional

EI Parlamento Europeo

Vistas sus anteriores resoluciones sobre un Tribunal Penal Interna-cional

A Considerando que es necesario crear un Tribunal Penallnternashycional permanente que complemente los sistemasjudiciales nacionales y ponga fin a la impunidad de que gozan los responsables de genocidio crimenes contra la humanidad y criacutemenes de guerra

B Considerando que la Comisioacuten de Derechos Humanos de las Naciones Unidas estaacute respaldando decididamente la creacioacuten de ese Trishybunal

C Considerando que la fase preparatoria de la creacioacuten dei Tribushynal Penal Internacional finalizoacute con la uacuteltima sesioacuten dei Comiteacute Preparatorio de las Naciones Unidas que tuvo lugar dei 16 de marzo al3 de abril de 1998

D Felicitaacutendose por la creciente participacioacuten de Estados en el proceso de negociaciones y esperando que un nuacutemero auacuten mayor de Esshytados procedentes de todas las regiones se encuentre plenamente represhysentado en la Conferencia Diplomaacutetica de Roma

E Considerando que dei 15 de junio al17 de julio de 1998 se celebra en Roma la Conferencia Diplomaacutetica de Plenipotenciarios para la constitucioacuten de un Tribunal Penal Internacional

266 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

F Considerando que los Estados miembros y la delegacioacuten de la Comisioacuten Europea que participan en la Conferencia Diplomaacutetica de Roma pueden desempenar un papel crucial a la hora de garantizar el eacutexito de la conclusioacuten de esta Conferencia Diplomaacutetica y acogiendo positivamente la mayor convergenciacutea de las posturas de los Estados miembros de la UE

G Congratulaacutendose por la oferta dei Gobierno de los Paiacuteses Bajos de servir de sede dei Tribunal Penal Internacional permanente

I Insta a la Conferencia Diplomaacutetica de Roma a aprovechar la oportunidad histoacuterica de concluir un texto de Estatuto para un Tribunal Penal Internacional independiente justo y eficaz

2 Insta a los representantes de los Estados miembros dei Consejo y de la Comisioacuten a garantizar activamente el ecircxito de los resultados a sashyber un auteacutentico Tribunal Penal Internacional en lugar de limitarse a un acuerdo de compromiso sobre principios esenciales en sus esfuerzos por conciliar las posturas de Estados reticentes

3 Destaca que para constituir un complemento eficaz de los sisteshymas judiciacuteales nacionales el Estatuto dei Tribunal Penal Internacional permanente objeto de la Conferencia de Roma deberaacute establecer

a un Fiscal independiente con competencias para investigare insshytruir sumarios por propia iniciativa en situaciones en las que se hayan cometido los delitos sometidos a lajurisdiccioacuten dei Tribunal

b Ia jurisdiccioacuten inherente y universal dei Tribunal en materia de genocidio criacutemenes contra la humanidad criacutemenes de guerra y agresioacuten sin que se requiera ninguacuten consentimiento dei Estado

c una buena relacioacuten de trabajo con los Tribunales lnternacionales ya establecidos en La Haya

d una relacioacuten constructiva con las Naciones Unidas yen partishycular con el Consejo de Seguridad basada en el pleno reconocimiento de sus respectivas funciones y competencias

e Ia obligacioacuten de los Estados firmantes de acatar y hacer cumplir sin demora las oacuterdenes y decisiones dei Tribunal

f los mayores niveles de respeto de los derechos de los acusados y de los sospechosos y de proteccioacuten de los intereses de las viacutectimas y de los testigos

g Ia garantiacutea de una financiacioacuten a largo plazo necesaria para asegurar la autonomiacutea e independencia dei Tribunal frente a cualquier presioacuten exterior

4 Destaca ademaacutes que la jurisdiccioacuten deI Tribunal sobre los delishytos de genociacutedio los criacutemenes contra la humanidad y los criacutemenes de

ENSAIOS JURiacuteDICOS 267

guerra deben considerarse con la misma calificacioacuten penal con indepenshydencia de que se hayan cometido en conflictos armados internacionales o en conflictos internos

5 Insta ai Consejo y a los Estados miembros a garantizar la universalidad y la transparencia de las negociaciones y la participacioacuten continuada de la comunidadjuriacutedica y la sociedad civil internacionales

6 Encarga a su Presidente que transmita la presente resolucioacuten ai Consejo a la Comisioacuten a los Gobiernos de los Estados miembros ai Secreshytario General de las Naciones Unidas ai Presidente de la Asamblea Geneshyral de las Naciones Unidas y ai Presidente de la Conferencia Diplomaacutetica de las Naciones Unidas para la constitucioacuten de un Tribunal Penal Internashycional

A resoluccedilatildeo supracitada demonstra que cresce a conscientizaccedilatildeo da necessidade de ser criado um Tribunal Penal Internacional com forccedila cogente obrigatoacuteria de suas decisotildees no acircmbito interno dos paiacuteses que participarem do pacto de sua constituiccedilatildeo

A doutrina internacional revela que a comunidade internacional somenshyte agora vem se preocupando em criar uma estructura internacional para determinar las responsabilidades individuales emergentes de violacioacuten de ciertos derechos baacutesicos dei ser humano Los mecanismos de responsabilidad estatal creados desde los 60 se dirigen a la mayor protecciotilden dei ser humano y la erradicacioacuten de las praacutecticas de volacioacuten sistemaacutetica de los derechos humanos ar via de la condena ai Estado que ordena o que tolera los abusos por lo cual se estructuraron entorno ai Estado conmo sujeto responsable Como haacute seflalado la Corte Internacional de Derechos Humanos el procedimiento ante ella no es un procedimiento penal lo que se busca determinar es el nivel de cumprimiento por parte de un Estado de sus obligaciones de derecho internacional Sin desconocer la importancia de determinar la responsabilidad dei Estado para que eacuteste tenga un incentivo para erradicar esas praacutectica de sus frotneras es pertinente detacar que las violaciones maacutes grave son en uacuteltima instancia coshymetidas por individuos (Francisco Cox Encarregado dei TPI HOH em artigo intitulado EI IlOH ante la Craciotilden de um Tribunal Penal Internacional no site httpwwwiidhedcrcpitpintrohtml)

A criaccedilatildeo de um Tribunal Penal Internacional atuaria permanentemente e teria competecircncia subsidiaacuteria em relaccedilatildeo agrave outorgada aos Tribunais Nacioshynais limitando-se a atuar apenas nos crimes internacionais previamente defishynidos como sendo do interesse da comunidade global

Merece registro no acircmbito do assunto tratado que na Conferecircncia Reshygional sobre o Tribunal Penal Internacional realizada em 18 e 19 de fevereiro de 1998 na cidade de Guatemala Guatemala um dos temas tratados foi o relativo

268 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

agrave harmonizaccedilatildeo das incriminaccedilotildees quando os seguintes aspectos foram disshycutidos Branqueamento corrupccedilatildeo fraude fiscal participaccedilatildeo em associashyccedilotildees criminosas um olhar agrave luz dos direitos nacionais e do direito internacioshynal Perspectivas Quais os comportamentos a incriminar Criar uma nova incriminaccedilatildeo da fraude fiscal Uma tentativa de harmonizaccedilatildeo o corpus jurls contendo disposiccedilotildees penais para proteccedilatildeo dos interesses financeiros da Uniatildeo Europeacuteia As negociaccedilotildees no seio do Conselho da Europa e da OCDE referenshytes agrave luta contra a corrupccedilatildeo etc O referido painel foi presidido por Benoit Dejemeppe procurador do Rei em Bruxelas e contou com a presenccedila de Tereshyza Beleza professora de Direito Penal na Faculdade de Direito de Lisboa como moderadora

Haacute como visto um largo campo de anaacutelise para desenvolver com possishybilidade do surgimento de sugestotildees que levem a ciecircncia juriacutedica a alcanccedilar com a atuaccedilatildeo estatal uma competecircncia internacional que possa combater o crime internacional e ao mesmo tempo proporcione seguranccedila juriacutedica na ordem interna ganhando assim o sistema juriacutedico confianccedila dos investidoshyres

Em conclusatildeo a forma de compatibilizar o combate agrave criminalidade internacional sem violar a seguranccedila juriacutedica necessaacuteria a evitar a fuga de inshyvestimentos do paiacutes estaacute na criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional com comshypetecircncia definida para processar e julgar delitos globalizantes e cujas decisotildees tenham forccedila imperativa no acircmbito interno das naccedilotildees participantes do pacto para o seu nascimento

Page 9: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro

ENSAIOS JURiacuteDICOS 231

No Direito inglecircs natildeo haacute nenhuma norma escrita que estabelece sanccedilatildeo agrave violaccedilatildeo ao segredo bancaacuterio mas qualquer pessoa que queira trabalhar em uma instituiccedilatildeo financeira deve assinar um formulaacuterio esshypecial pelo qual se compromete a manter sigilo sobre as movimentaccedilotildees bancaacuterias O dever de segredo na atuaccedilatildeo do banco eacute interpretado rigoshyrosamente pelos tribunais ingleses

No sistema juriacutedico norte-americano depois de discrepacircncias nas legislaccedilotildees estaduais e apoacutes a lei federal que restringiu o acircmbito da obrishygatoriedade do sigilo bancaacuterio foi aprovada a Right to Financiai Privacy Act que dispotildee que a prestaccedilatildeo de informaccedilotildees por parte da instituiccedilatildeo financeira somente pode ser dada em processos administrativos ou judishyciais quando os dados forem relevantes para solucionar o litiacutegio Com essa lei a quebra do sigilo bancaacuterio ganhou um caraacuteter excepcional somente podendo ocorrer desde que respeitado o devido processo leshygal Assim o Direito americano buscou conciliar a defesa ao direito de privacidade o atendimento aos interesses puacuteblicos quanto agraves informashyccedilotildees financeiras e a existecircncia do contraditoacuterio

e) Reacutegis de Oliveira quando Deputado Federal em parecer apresentashydo agrave Comissatildeo de Constituiccedilatildeo e Justiccedila da Cacircmara dos Deputados com refeshyrecircncia a Projeto de Emenda Constitucional apresentado pelo Exmo Sr Presishydente da Repuacuteblica objetivando alterar o sect 1 ordm do art 145 da CF observou que o sigilo bancaacuterio no Direito Comparado eacute posto da forma seguinte

13 Direito Comparado Na Alemanha natildeo haacute regra especiacutefica nem definiccedilatildeo legal para o segredo bancaacuterio mas sua existecircncia eacute recoshynhecida bem como aceita pela doutrina e jurisprudecircncia Decorre de direito costumeiro somente podendo ser quebrado por expressa disposhysiccedilatildeo legal (J Barmann Le Secret Bancaire en Allemagne Feacutedeacuterale in Rapport pp 15 e segs) Na Beacutelgica haacute proibiccedilatildeo somente sendo viaacutevel a derrogaccedilatildeo do segredo pela Justiccedila Penal e pelo Fisco que somente tem acesso agraves informaccedilotildees bancaacuterias diante do processo pendente (Herion Le Secret Bancaire en Belfique in Rapport pp 5175) Na Itaacutelia os doshycumentos somente podem ser examinados pelos Juiacutezes Natildeo haacute acesso por parte das autoridades administrativas (idem p 129) Na Holanda da mesma forma o sigilo apenas cede ante ordem da autoridade judicial ou penal (Muller idem pp 99117) Na Franccedila a violaccedilatildeo ao segredo ocorre ante oacutergatildeos do Poder Puacuteblico que alegam interesses superiores aos dos particulares natildeo se admitindo a quebra diante de normas administratishyvas (Gavalda Stouflet idem pp 7797)

f) Voltando a analisar o sigilo bancaacuterio em Portugal pode-se afirmar que o sistema apresentava-se rigoroso e nacirco aceitava a quebra como se vecirc de

232 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

decisatildeo do Supremo Tribunal de Justiccedila em Scientia Juriacutedica tomo XXIv n 166168 de 1980 (Parecer publicado na Revista de Direito Mercantil n 99 pp 98 e segs)

Com o sentido de demonstrar como o sigilo bancaacuterio eacute tratado no ordeshynamento juriacutedico de Portugal cito na iacutentegra um acoacuterdatildeo da Secccedilatildeo Criminal do Tribunal de Relaccedilatildeo de Eacutevora cujo texto colhi da internet (httpwwwtrept jurisp321-96html)

Processo n 321]996

Acoacuterdatildeo

Acordam na Secccedilatildeo Criminal do Tribunal da Relaccedilatildeo de Eacutevora

1 No Tribunal Judicial da Comarca de Portimatildeo correm termos uns autos de inqueacuterito registados sob o n 35711994 que tiveram orishygem numa queixa apresentada por middotM Lda contra a sociedade E Lda nos quais se procede agrave investigaccedilatildeo de factos susceptiacuteveis de inteshygrar a praacutetica de um crime de emissatildeo de cheque sem provisatildeo

Estaacute em causa o cheque nO 3681861637 sacado sobre a Caixa Geral de Depoacutesitos emitido em 1 ordm de julho de 1994 no valor de 820661$00

No decurso do inqueacuterito o Ministeacuterio Puacuteblico solicitou agravequela insshytituiccedilatildeo bancaacuteria o fornecimento de determinada documentaccedilatildeo banshycaacuteria o que esta se negou fazer alegando que a revelaccedilatildeo da pretendida documentaccedilatildeo contende com o disposto na legislaccedilatildeo sobre segredo bancaacuterio

A requerimento do Digno Magistrado do Ministeacuterio Puacuteblico o MM Juiz de Instruccedilatildeo suscitou a intervenccedilatildeo deste Tribunal da Relaccedilatildeo a fim de dispensar os serviccedilos da Caixa Geral de Depoacutesitos do segredo bancaacuteshyrio quanto agrave documentaccedilatildeo bancaacuteria solicitada a saber coacutepia da ficha de assinaturas e extracto da conta da Agecircncia de S com o n sobre a qual foi sacado o cheque em causa respeitante aos meses de maio junho e julho de 1994

Nesta relaccedilatildeo o Exmo Procurador da Repuacuteblica emitiu douto pareshycer no sentido de a referida instituiccedilatildeo bancaacuteria ser dispensada do cumshyprimento do dever do segredo bancaacuterio em ordem agrave prestaccedilatildeo dos eleshymentos pretendidos para a efectivaccedilatildeo do inqueacuterito

Colhidos os vistos legais cumpre agora decidir

2 A Caixa Geral de Depoacutesitos atraveacutes do ofiacutecio fotocopiado agrave fi 5 dos autos recusou-se a fornecer os documentos pedidos pelo Ministeacuteshyrio Puacuteblico para instruccedilatildeo de um processo de inqueacuterito com fundamento no sigilo bancaacuterio

ENSAIOS JURiacuteDICOS 233

Compreendendo o inqueacuterito o conjunto de diligecircncias que visam investigar a existecircncia de um crime determinar os seus agentes e a resshyponsabilidade deles e descobrir e recolher as provas em ordem agrave decishysatildeo sobre a acusaccedilatildeo (cf art 262 n 1 do Coacutedigo de Processo Pena0 a consulta dos pretendidos documentos - extracto da conta e ficha de assinaturas - eacute sem margem para duacutevidas de grande importacircncia para a instruccedilatildeo do processo e recolha de indiacutecios probatoacuterios tendentes agrave eventual deduccedilatildeo de acusaccedilatildeo pois sem ela desde logo muito dificilshymente se poderaacute concluir pela identificaccedilatildeo da pessoa que assinou o cheque

O dever de sigilo bancaacuterio traduz uma obrigaccedilatildeo de facto negativo (de ROR facere) e encontra-se disciplinado no Decreto-Lei n 2981992 de 31 de dezembro que aprovou o Regime Geral das Instituiccedilotildees de Creacutedito e Sociedades Financeiras O art 78 de tal diploma consagrando o dever de segredo profissional dispotildee no seu n 1 que os membros dos orgatildeos de administraccedilatildeo ou de fiscalizaccedilatildeo das instituiccedilotildees de creacutedito os seus empregados mandataacuterios comitidos e outras pessoas que lhes prestem serviccedilos a tiacutetulo permanente ou ocasional natildeo podem revelar ou utilizar informaccedilotildees sobre factos ou elementos respeitantes agrave vida da instituiccedilatildeo ou agraves relaccedilotildees desta com os seus clientes cujo conhecimento lhes advenha exclusivamente do exerciacutecio das suas funccedilotildees ou da presshytaccedilatildeo dos seus serviccedilos explicitando-se no seu n 2 que estatildeo designadamente sujeitos a segredo os nomes dos clientes as contas de depoacutesito e seus movimentos e outras operaccedilotildees bancaacuterias

O dever de segredo profissional natildeo eacute poreacutem um dever absoluto isto eacute natildeo prevalece sempre sobre qualquer outro dever que com ele entre em conflito Sofre com efeito as excepccedilotildees previstas no art 79 do mesmo Decreto-Lei n 2981992 onde se estabelece aleacutem do mais que os factos e elementos cobertos pelo dever de segredo podem ser revelashydos nos termos previstos na lei penal e de processo penal - cf aliacutenea d don2

No art 84 do mesmo diploma legal prescreve-se que a violaccedilatildeo ao dever de segredo eacute puniacutevel nos termos do Coacutedigo Penal e efectivamente o Coacutedigo Penal vigente - revisto pelo Decreto-Lei n 481995 de 15 de marccedilo - prevecirc e pune como crimes quer a violaccedilatildeo a segredo profissioshynal quer o seu aproveitamento indevido - cf arts ] 95 e 196

Ao contraacuterio da versatildeo do Coacutedigo Penal anterior agrave referida revisatildeo - em que se estatuiacutea no art 185 que a violaccedilatildeo ao segredo profissional natildeo seria puniacutevel se ocorresse no cumprimento de um dever juriacutedico sensivelmente superior ou visasse a um interesse puacuteblico ou privado legiacutetimo quando considerados os interesses em conflito e os deveres

234 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

de informaccedilatildeo que segundo as circunstacircncias se impotildeem ao agente se pudesse considerar meio adequado para alcanccedilar aquele fim - natildeo conteacutem o Coacutedigo Penal actuaJ relativamente ao crime de violaccedilatildeo ao segredo profissional qualquer causa especiacutefica de exclusatildeo da ilicitude pelo que haacute que atentar nas causas gerais de exclusatildeo da ilicitude

Ao abordar o conflito de deveres dispotildee o art 36 n 1 do Coacutedigo Penal que natildeo eacute iliacutecito o facto de quem em caso de conflito no cumprishymento de deveres juriacutedicos ou de ordens legiacutetimas da autoridade satisfishyzer dever ou ordem de valor igualou superior ao do dever ou ordem que sacrificar Natildeo seraacute pois iliacutecita a violaccedilatildeo ao segredo profissional se perante um conflito de deveres o agente satisfizer o dever de valor igual ou superior ao do dever que sacrifica

No Coacutedigo de Processo Penal generalizou-se a possibilidade de quebra do segredo profissional

Assim as pessoas indicadas no n 1 do sobredito art 78 podem recusar-se a depor sobre factos objecto de segredo profissional mas se a autoridade judiciaacuteria concluindo embora pela legitimidade da recusa natildeo prescindir desse depoimento pode requerer ao tribunal que o ordeshyne E o tribunal deveraacute ordenar a prestaccedilatildeo do depoimento com quebra do segredo profissional sempre que entender que esta se mostra justificada face agraves normas e princiacutepios aplicaacuteveis da lei penal nomeadashymente ao princiacutepio da prevalecircncia do interesse preponderante - cf art 135 n 12 e 3 do Coacutedigo de Processo Penal

A possibilidade de apreensatildeo pela autoridade judiciaacuteria de tiacutetulos valores quantias ou outros objectos depositados em bancos ou outras instituiccedilotildees de creacutedito relacionados com um crime e que possam ser de grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova bem como a possibilidade de exame pelo juiz de correspondecircncia e documenshytaccedilatildeo bancaacuterias estatildeo previstas no art 181 n 1 e 2 do Coacutedigo de Processhyso Penal As pessoas obrigadas ao dever de segredo profissional podem recusar apresentar aqueles documentos ou objectos em seu poder se invocarem por escrito segredo profissional caso em que o conflito de interesses e deveres assim surgido seraacute dirimido pelo tribunal nos tershymos idecircnticos aos previstos para a recusa de depoimento - cf arts 182 n 2 e 135 ambos do citado coacutedigo

Enquanto o dever de segredo profissional eacute geralmente estabeleshycido a favor da integridade e liberdade das pessoas a quem aproveita tendo-se inserido a sua regulamentaccedilatildeo no Tiacutetulo VI do atraacutes mencionashydo Regime Geral das Instituiccedilotildees de Creacutedito e Sociedades Financeiras no qual se prevecirc um conjunto de regras de conduta que devem guiar a actuaccedilatildeo das instituiccedilotildees de creacutedito seus administradores e empregados

ENSAIOS JURiacuteDICOS 235

nas relaccedilotildees com os clientes visando proteger de forma eficaz a posishyccedilatildeo do consumidor de serviccedilos financeiros (cf preacircmbulo do Decreshyto-Lei n 2981992) ou estabelecer um clima de confianccedila na banca que permita a captaccedilatildeo e recuperaccedilatildeo do dinheiro entesourado (como se dizia no relatoacuterio do Decreto-Lei n 21978 de 9 de janeiro revogado pelo n 1 do art 5Q do citado Decreto-Lei n 2981992) no processo de inqueacuteshyrito a que procede o Ministeacuterio Puacuteblico estaacute em causa a realizaccedilatildeo de diligecircncias de prova que permitam investigar um crime de emissatildeo de cheque sem provisatildeo sob a eacutegide do princiacutepio da verdade material e incriminar o respectivo agente

O interesse que estaacute em jogo com a pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblishyco na obtenccedilatildeo da documentaccedilatildeo bancaacuteria eacute o da boa administraccedilatildeo da Justiccedila Penal e esse interesse eacute no caso em apreccedilo sensivelmente supeshyrior ao interesse da manutenccedilatildeo do segredo bancaacuterio o que equivale a di~er que este deve ceder perante aquele

Em suma no caso concreto ponderados os interesses em conflishyto entendemos que a quebra do dever de sigilo bancaacuterio se justifica nos termos do art 36 do Coacutedigo Penal pelo que deve ser dada procedecircncia agrave pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico e consequumlentemente ao abrigo do disposto nos arts 182 n 2 e 135 n 2 e 3 ambos do Coacutedigo de Processo Penal dispensar-se a Caixa Geral de Depoacutesitos do cumprimento do deshyver de sigilo bancaacuterio a fim de poder satisfazer tal pretensatildeo

3 Por todo o exposto determina-se que com quebra do dever de sigilo bancaacuterio a Caixa Geral de Depoacutesitos forneccedila ao Digno Magistrado do Ministeacuterio Puacuteblico com destino ao Processo de Inqueacuterito n 3571 1994 a documentaccedilatildeo bancaacuteria que este lhe havia solicitado

Natildeo eacute devida taxa de justiccedila

Texto processado e integralmente revisto pelo relator

Desembargador-Relator Rui Mauriacutecio

g) Substancioso estudo do sigilo bancaacuterio no Direito Comparado foi feishyto por Andreacute Serratildeo Borges de Sampaio Consultor da Uniatildeo nas informashyccedilotildees que prestou ao Advogado-Geral da Uniatildeo com referecircncia agrave ADIn n 2397 Transcrevo o inteiro teor do seu pronunciamento

51

6 O tratamento do sigilo bancaacuterio no Direito Comparado

Em verdade o Direito Comparado entende inoponiacutevel o sigilo banshycaacuterio agraves autoridades tributaacuterias Com efeito leciona Alfredo Echeverriacutea Herrera verbis

236 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

EI sigilo bancario constituye un reacutegimen limitado exclusivashymente ai aacutembito de las relaciones entre la institucioacuten bancaria y sus clientes e impone la obligacioacuten de confidencialidad de la institucioacuten sobre las informaciones que aqueacutellos le proporcionan

En todas las legislaciones bancarias el sigilo es relativo es decir el derecho dei ciudadano ai secreto y la correlativa obligacioacuten para el banco de no revelar a terceros las informaciones recibidas en el ejercicio de su actividad ceden cuando existe norma legal expresa o causa justificada

Elliacutemite legal ai sigilo estaacute constituiacutedo por la obligacioacuten dei banco de entregar informaciones y se fundamenta en motivos sushyperiores de orden puacuteblico o general siendo liacutecito entonces que el Estado establezca Iiacutemites legales ai secreto bancaria para auxiliar por ejemplo las actuaciones de la Justicia en el plano jurisdiccional y las dei Estado en el aacutembito dei ejercicio de su potestad impositiva

Es un principio irrebatible en la vida dei derecho que ni la autonomia de las personas ni los instrumentos dei aacuterea econoacutemica y financiera pueden servir en un momento dado como elementos juridicamente idoacuteneos para lesionar el intereacutes puacuteblico En consecuencia se puede afirmar que las limitaciones ai sigilo bancario son salvaguardias necesarias ai bien comuacuten en los caacutenones dei Estado moderno Estas limites deben ser materias reshyservadas a la ley por ser de caraacutecter excepcional en sentido estricto

En este orden de ideas necesariamente debe concluirse que existen legiacutetimos y superiores intereses en diversas aacutereas de la sociedad que se vinculan ai bien comuacuten y que deben ser tutelados por el Estado como lo es por ejemplo la necesidad de detectar y reprimir la evasioacuten de los impuestos los cuales transcienden ai evenshytual intereacutes geneacuterico que pueda tener el mismo Estado en la mantencioacuten dei sigilo bancaria En efecto desde el punto de vista de lajuridicidad y de la eacutetica no se puede sostener que el secreto bancaria pueda servir como instrumento para proteger la comisioacuten de actos

52

como el recieacuten mencionado que son constitutivos muchas veces de iliacutecitos penales bajo la forma de delitos tributarias o fraushydes fiscales con resultados ademaacutes de perjucio patrimonial ai Esshytado y dano ai intereacutes general de la sociedad

EI sistema bancaria frente a la existencia en la sociedad de un intereacutes general preponderante y superior estaacute naturalmente Ilamado a colaborar en la verificacioacuten y represioacuten de la evasioacuten tributaria

ENSAIOS JURiacuteDICOS 237

En este marco se inscribe la tendencia de la mayoda de las legislaciones modemas en cuanto a dotar aI Estado de facultades para intervenir en la actividad econoacutemica de los ciudadanos en procura de la correcta determinacioacuten de los tributos cuando se conshyfigura en el desarrollo de estas actividades un hecho gravado establecido en la ley

Ya la Constitucioacuten de Weimar en 919 proclamoacute que es liacutecito ai Estado intervenir para condicionar el ejercicio de los derechos a determinados fines sociales El bien comuacuten y la justicia social comenzaron desde entonces a servir de frontera a los derechos y Iibertades individuales

Cabe destacar que la OCDE (Organisation for Economic Cooperation and Development) en un documento elaborado en el ano 1999 sobre las praacutecticas de los paiacuteses en el acceso a la informacioacuten bancaria para fines tributarios advierte que se puede abusar de la confidencialidad para ocultar actividades iJegales y evadir impuestos y agrega en el resumen ejecutivo deI documento que ni la criminalizacioacuten dei fraude tributario ni el tratamiento de la evasioacuten de impuestos bajo las leyes tributarias de los paiacuteses miembros de la OCDE son homogeacuteneos pero que sin embargo los gobiernos de la mayoriacutea de los paiacuteses miembros de la OCDE han tomado la visi6n de que en este contexto las autoridades tributashyrias no deben ser tratadas como simples terceros sino que se les debe otorgar un acceso priviligiado a la informaci6n bancaria con fines tributarias

Se agrega en este estudio que una medida de esta naturaleza no pane en peligro la conlidencialidad de la inlormacioacuten bancaria puesto que las autoridades tributarias estaacuten sujetas a estrictos conshytroles sobre coacutemo utilizan la informacioacuten de los contribuyentes y todos los gobiemos han implementado regIas para proteger la conlidencialidad de la informaci6n tributaria (EI Sigilo Bancaacuterio Acesso a la Informadon Bancaria para Fines Tributarias)

Em verdade seu texto elenca 30 paiacuteses integrantes da OCDE (a saber Alemanha Austraacutelia Aacuteustria Beacutelgica Canadaacute Repuacuteblica Checa Dinamarca Finlacircndia Franccedila Greacutecia Hungria Islacircndia Irlanda Itaacutelia Japatildeo Coreacuteia Luxemburgo Meacutexico Paiacuteses Baixos Nova Zelacircndia Noshyruega Polocircnia Portugal Espanha Sueacutecia Turquia Suiacuteccedila Reino Unido Estados Unidos Repuacuteblica Eslovaca) dos quais em 1999 apenas trecircs (Portugal Repuacuteblica Eslovaca e Luxemburgo) natildeo facultavam o acesso por parte de autoridades tributaacuterias a informaccedilotildees relativas a pessoas suspeitas de fraude tributaacuteria

238 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

Desses trecircs paiacuteses hoje remanescem apenas dois Com efeito Portugal deixou de integrar esse grupo constrangedoramente minoritaacuterio ao aprovar em 29 de dezembro de 2000 a Lei n 30-G

Nesse diploma lecirc-se

Lei da Reforma de Tributaccedilatildeo do Rendimento

(Portugal)

Artigo 63 O - B

Acesso a informaccedilotildees e documentos bancaacuterios

1 A administraccedilatildeo tributaacuteria tem o poder de aceder directashymente aos documentos bancaacuterios nas situaccedilotildees de recusa da sua exibiccedilatildeo ou de autorizaccedilatildeo para a sua consulta

a) quando se trate de documentos de suporte de registos contabiliacutesticos dos sujeitos passivos de IRS e IRC que se enconshytrem sujeitos agrave contabilidade organizada

b) quando o contribuinte usufrua de benefiacutecios fiscais ou de regimes fiscais privilegiados havendo necessidade de controshylar os respectivos pressupostos e apenas para esse efeito

2 A administraccedilatildeo tributaacuteria tem o poder de aceder a todos os documentos bancaacuterios excepto as informaccedilotildees prestadas para justificar o recurso ao creacutedito nas situaccedilotildees de recusa de exibiccedilatildeo daqueles documentos ou de autorizaccedilatildeo para a sua consulta

a) quando se verificar a impossibilidade de comprovaccedilatildeo e quantificaccedilatildeo directa e exacta da mateacuteria tributaacutevel nos termos do artigo da Lei Geral Tributaacuteria e em geral quando estejam verifishycados os pressupostos para o recurso a uma avaliaccedilatildeo indirecta

b) quando os rendimentos declarados em sede de IRS se afastarem significativamente para menos sem razatildeo justificada dos padrotildees de rendimento que razoavelmente possam permitir as manifestaccedilotildees de riqueza evidenciadas pelo sujeito passivo nos termos do artigo 89-A da Lei Geral Tributaacuteria

c) quando existam indiacutecios da praacutetica de crime doloso em mateacuteria tributaacuteria designadamente nos casos de utilizaccedilatildeo de facturas falsas e em geral nas situaccedilotildees em que existam factos concretamente identificados gravemente indiciadores da falta de veracidade do declarado

d) quando seja necessaacuterio para fins fiscais comprovar a aplicaccedilatildeo de subsiacutedios puacuteblicos de qualquer natureza

ENSAIOS JUAlolCOS 239

3 As decisotildees da administraccedilatildeo tributaacuteria referidas nos nuacuteshymeros anteriores devem ser fundamentadas com expressa menshyccedilatildeo dos motivos concretos que as justificam pressupotildeem a audishyccedilatildeo preacutevia do contribuinte e satildeo da competecircncia do Director-Geshyral dos Impostos ou do Director-Geral das Alfacircndegas e dos Imshypostos Especiais sobre o consumo ou seus substitutos legais sem possibilidade de delegaccedilatildeo

4 Os actos praticados ao abrigo da competecircncia definida no nuacutemero anterior satildeo susceptiacuteveis de recurso judicial o qual teraacute efeito suspensivo nas situaccedilotildees previstas no n 2

5 Nos casos de deferimento do recurso previsto no nuacutemero anterior os elementos de prova entretanto obtidos natildeo podem ser utilizados para qualquer efeito em desfavor do contribuinte

6 As entidades que se encontrem numa relaccedilatildeo de domiacutenio com o contribuinte ficam sujeitas aos regimes de acesso agrave inforshymaccedilatildeo bancaacuteria referidos nos n 1 e 2

7 O acesso da administraccedilatildeo tributaacuteria a informaccedilatildeo banshycaacuteria relevante relativa a familiares ou terceiros que se encontrem numa relaccedilatildeo especial com o contribuinte depende de autorizashyccedilatildeo judicial expressa apoacutes audiccedilatildeo do visado obedecendo aos requisitos previstos no n 3

8 O regime previsto nos nuacutemeros anteriores natildeo prejudica a legislaccedilatildeo aplicaacutevel aos casos de investigaccedilatildeo por infracccedilatildeo peshynal e soacute pode ter por objecto operaccedilotildees e movimentos bancaacuterios realizados apoacutes a sua entrada em vigor sem prejuiacutezo do regime vigente para as situaccedilotildees anteriores

9 Os actos praticados ao abrigo da competecircncia prevista no n I devem ser objecto de comunicaccedilatildeo ao Defensor do Contrimiddot buinte

10 Para os efeitos desta lei considera-se documento bancaacuteshyrio qualquer documento ou registo independentemente do resshypectivo suporte em que se titulem comprovem ou registem opeshyraccedilotildees praticadas por instituiccedilotildees de creacutedito ou sociedades finanshyceiras no acircmbito da respectiva actividade incluindo os referentes a operaccedilotildees realizadas mediante utilizaccedilatildeo de cartotildees de creacutedito (coacutepia anexa)

Parece evidente destarte que todo o mundo civilizado abandonou a possibilidade de opor-se agrave Administraccedilatildeo Tributaacuteria o sigilo bancaacuterio

240 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

4 O sigilo bancaacuterio e o direito agrave intimidade e agrave privacidade das pessoas

A anaacutelise do sigilo bancaacuterio em face do direito agrave intimidade e agrave privacidashyde exige inicialmente que seja enfrentada a questatildeo referente ao seu conceito

Os doutrinadores natildeo tecircm assumido posiccedilatildeo uniforme quanto aos asshypectos conceituais dessa entidade juriacutedica

Seacutergio Carlos Covello autor da obra jaacute mencionada (O Sigilo Bancaacuterio Leud S Paulo 1991 p 69) entende que sigilo bancaacuterio eacute a obrigaccedilatildeo que tecircm os Bancos de natildeo revelar salvo justa causa as informaccedilotildees que venham a obter em virtude de sua atividade profissional

Luiz Fernando Bellinetti no artigo intitulado Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio (Revista do Direito do Consumidor Satildeo Paulo RT 1996 voI 18 p 144) defende posiccedilatildeo no sentido de que sigilo bancaacuterio eacute o dever juriacutedico que tecircm as instituiccedilotildees de creacutedito e as organizaccedilotildees auxiliares e seus empregados de natildeo revelar salvo justa causa as informaccedilotildees que venham a obter em virtushyde da atividade bancaacuteria a que se dedicam

Para Arnoldo Wald (in O Sigilo Bancaacuterio no Projeto de Lei Complemenshytar n 70 Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas n I pp 196209) o sigilo bancaacuterio se enquadra no conceito mais amplo do segredo profissional que tem merecido uma proteccedilatildeo mais ampla ensejando sua violaccedilatildeo caracterizaccedilatildeo como crime (art 154 do Coacutedigo PeshynaI)

Eivany A Silva tratando do tema em Consideraccedilotildees a Respeito do Sigilo de Dados (artigo publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio n 61 pp 41142 - Edit Dialeacutetica) afirma que o sigilo bancaacuterio eacute espeacutecie do gecircnero sigilo de dados constituindo um direito fundamental protegido constitucionalmente inserto que estaacute no rol dos direitos e garantias individuais ou seja em claacuteusushylas peacutetreas da Carta Magna natildeo podendo portanto ser modificado nem messhymo por emenda agrave Constituiccedilatildeo e portanto muito menos por legislaccedilatildeo de hierarquia inferior

Como examinado haacute divergecircncias na fixaccedilatildeo do conceito Essas divershygecircncias embora importantes para as posiccedilotildees doutrinaacuterias a serem assumishydas sobre o alcance do sigilo bancaacuterio natildeo geram contudo influecircncias de maior intensidade no relacionamento entre a instituiccedilatildeo financeira e os seus depositantes Isso porque o que merece ser considerado eacute a natureza juriacutedica do sigilo bancaacuterio isto eacute a que categoria de direito pertence e como por quem e quando a sua quebra pode ser determinada

Em face do exposto necessaacuterio eacute que se faccedila o alinhamento das teorias que procuram fundamentar o sigilo bancaacuterio

A doutrina em eacutepocas diversas examinou as seguintes teorias

ENSAIOS JURiacuteDICOS 241

Teoria contratualista O sigilo bancaacuterio de acordo com essa teoria deshycorre da relaccedilatildeo contratual que voluntariamente eacute formada entre o banco e o cliente por via da qual mesmo sem claacuteusula expressa a instituiccedilatildeo financeira assume a obrigaccedilatildeo de guardar segredo das movimentaccedilotildees de dinheiro que nela satildeo feitas Essa responsabilidade assumida pelo banco inspira-se segunshydo os adeptos da teoria em destaque nos usos nos costumes e na boa-feacute sempre aplicaacuteveis na intepretaccedilatildeo dos contratos comerciais7bull

Teoria do direito agrave privacidade Os adeptos dessa corrente afirmam que o sigilo bancaacuterio integra o campo do direito agrave privacidade que faz parte dos direitos da personalidade

Teoria consuetudinaacuteria Segundo os seguidores dessa linha de pensar o sigilo bancaacuterio decorre dos compromissos taacutecitos assumidos entre instituishyccedilotildees financeiras e seus clientes no sentido de natildeo serem levados ao conhecishymento de terceiros os valores transacionados O uso reiterado dessa praacutetica apoiada no elemento confianccedila passou a representar costume adotado nesse tipo de negoacutecio juriacutedico

Teoria da boa-feacute A adoccedilatildeo dessa teoria conduz o inteacuterprete a entender que o sigilo bancaacuterio por sua proacutepria natureza estaacute vinculado ao caraacuteter fiduciaacuterio da atividade bancaacuteria fundando-se portanto na boa-feacute ou dever de lisura que tanto marca o tipo de negoacutecio juriacutedico firmado

Teoria do sigilo profissional Essa teoria concebe o sigilo bancaacuterio como sendo uma espeacutecie do sigilo profissional Haacute portanto um dever eacutetico do banshyco em respeitar o sigilo bancaacuterio em decorrecircncia da profissatildeo exercida

Teoria do direito agrave intimidade dos bancos Os integrantes dessa forma de pensar sustentam que a instituiccedilatildeo financeira tem legiacutetimo interesse de afastar do conhecimento de terceiros a movimentaccedilatildeo financeira dos seus clientes e consequumlentemente dos fatos com elas relacionados

Teoria da complexidade do viacutenculo Essa teoria eacute explicada por Arnoldo Wald no trabalho jaacute citado da forma seguinte A doutrina moderna abandoshynou a noccedilatildeo da relaccedilatildeo juriacutedica contratual defendo a complexidade do viacutenshyculo Aleacutem dos direitos e das obrigaccedilotildees principais existem deveres secundaacuteshyrios para ambos os contratantes que decorrem da regra geral da boa-feacute denoshyminada na doutrina italiana de cOITeteza e na legislaccedilatildeo alematilde de Treu und Glauben Exige que a atuaccedilatildeo de uma parte natildeo cause danos agrave esfera juriacutedica da outra Dentro desta ideacuteia defende-se que o segredo bancaacuterio eacute um dever

7 Arnoldo Wald em Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais artigo publicado na Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas n 22 pp 1518 manifesta entendimento de que no campo normatIacutevo do Direito brasileiro esta teoria encontra respaldo nos arts 130 e 131 do Coacutedigo Comercial que prevecirc a interpretaccedilatildeo dos contratos segundo os usos os costumes e a boa-feacute

242 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

acessoacuterio na relaccedilatildeo juriacutedica Mesmo que natildeo nasccedila o contrato entre as partes a boa-feacute objetiva impede que a instituiccedilatildeo financeira prejudique os interesses do cidadatildeo

Estabelecidos os pressupostos doutrinaacuterios acima examinamos agora se o sigilo bancaacuterio diz respeito agrave intimidade e agrave privacidade das pessoas

A Constituiccedilatildeo Federal em seu artigo 5ordm incisos X e XII afirma

Art 5ordm Todos satildeo iguais perante a lei sem distinccedilatildeo de qualquer natureza garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Paiacutes a inviolabilidade do direito agrave vida agrave liberdade agrave igualdade agrave segushyranccedila e agrave propriedade nos termos seguintes

X - satildeo inviolaacuteveis a intimidade a vida privada a honra e a imagem das pessoas assegurado o direito agrave indenizaccedilatildeo pelo dano material ou moral decorrente de sua violaccedilatildeo

XJl - eacute inviolaacutevel o sigilo da correspondecircncia e das comunicaccedilotildees telegraacuteficas de dados e das comunicaccedilotildees telefocircnicas salvo no uacuteltimo caso por ordem judicial nas hipoacuteteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigaccedilatildeo criminal ou instruccedilatildeo processual penal

Essas garantias constitucionais protegem o cidadatildeo de qualquer investida de terceiros em sua intimidade em sua vida privada e no sigilo de seus dados

Na expressatildeo terceiros estaacute incluiacutedo o Estado e consequumlentemente seus agentes poliacuteticos e administrativos

A doutrina tem se manifestado de modo quase unacircnime no sentido de que o sigilo bancaacuterio eacute uma garantia constitucional que protege a privacidade das pessoas no campo econocircmico e financeiro A sua significaccedilatildeo eacute de natildeo tornar puacuteblica a movimentaccedilatildeo da conta bancaacuteria e das aplicaccedilotildees financeiras do cidadatildeo para que de nenhum modo os atos privados praticados possam ser tornados puacuteblicos

Esse posicionamento eacute o adotado pelos autores que passo a citar

Arnoldo Wald (O Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais artigo pushyblicado na Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas RT n 22 pp 1521)

O sigilo bancaacuterio eacute o meio para resguardar a privacidade no camshypo econocircmico pois veda a publicidade sobre a movimentaccedilatildeo da conta corrente bancaacuteria e das aplicaccedilotildees financeiras

ENSAIOS JURiacuteDICOS 243

Eivany A Silva (Consideraccedilotildees a Respeito do Sigilo de Dados artigo publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio n 61 Satildeo Paulo Editora Dialeacutetica p27)

A maioria dos ordenamentos juriacutedicos como o brasileiro tratam o sigilo bancaacuterio como direito fundamental do contribuinte agrave privacidashyde ou seja agrave resistecircncia agrave comunicaccedilatildeo de dados que representem desshydobramento da personalidade da pessoa direito agrave oposiccedilatildeo e agrave negaccedilatildeo de comunicaccedilatildeo

Ives Gandra da Silva Martins (Sigilo Bancaacuterio trabalho publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio S Paulo Editora Dialeacutetica n 1 pp 24 e 25)

Pelos incisos X e XII do artigo 5ordm tem o contribuinte o direito de preservaccedilatildeo de sua intimidade de sua privacidade e de que terceiros que detenham informaccedilotildees pessoais suas sejam obrigados a guardaacute-Ias

Natildeo pode pois a fiscalizaccedilatildeo exigir de terceiros informaccedilotildees que apenas pode obter do proacuteprio contribuinte

Em determinadas hipoacuteteses todavia o interesse puacuteblico haacute de preshyvalecer sobre o interesse individual mas caberaacute a um outro poder definir se tais hipoacuteteses efetivamente ocorrem com o que poderaacute o Poder Judishyciaacuterio autorizar se convencido estiver o magistrado de que a hipoacutetese eacute de gravidade e de lesatildeo ao interesse puacuteblico a quebra do direito ao sigilo bancaacuterio

Estou convencido ser esta a melhor conformaccedilatildeo juriacutedica da quesshytatildeo idealizada pelos constituintes defendida pela doutrina e consagrashyda na jurisprudecircncia corrente exegeacutetica esta a que me filio desde os meus primeiros escritos sobre a mateacuteria

Roberto Quiroga Mosquera (Tributaccedilatildeo no Mercado Financeiro e de Capitais obra publicada pela Editora Dialeacutetica Satildeo Paulo 1998 pp 70171)

Do exposto ateacute aqui eacute evidente que o direito ao sigilo bancaacuterio representa uma espeacutecie de direito agrave privacidade

Eacute incontroverso que os dados e informaccedilotildees de natureza bancaacuteria dizem respeito agrave intimidade e agrave vida privada dos cidadatildeos Dados que dizem respeito aos valores em dinheiro depositados em contas-correnshytes bancaacuterias tipos e caracteriacutesticas de aplicaccedilotildees financeiras ganhos e prejuiacutezos auferidos ou incorridos em operaccedilotildees bursaacuteteis etc satildeo sem sombra de duacutevida elementos particulares e pessoais de qualquer indiviacuteshyduo

244 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Utilizando outra voz informaccedilotildees que tocam no aspecto financeishyro do ser humano representam direito iacutentimo e personaliacutessimo devendo ser mantidas em sigilo por aqueles que eventualmente as detenham em razatildeo de sua atividade profissional Parece-nos que tal conclusatildeo eacute de uma clareza inconteste

Natildeo tem sido outra a posiccedilatildeo da doutrina mais abalizada do Paiacutes e da jurisprudecircncia dominante

o autor referido a seguir faz a observaccedilatildeo seguinte

Carlos Alberto Hagstrom (Sigilo Bancaacuterio Novas Questotildees Reshyvista de Direito Mercantil Satildeo Paulo Malheiros 1997 vaI 105 pp 4344) expotildee que apesar de existirem diversas teorias que procuram fundashymentar juridicamente o sigilo bancaacuterio modernamente a explicaccedilatildeo para o fundamento do referido instituto sofreu uma radical alteraccedilatildeo Divershysas constituiccedilotildees modernas esclarece o mencionado autor ampliaram e explicitaram o elenco de direitos e garantias individuais passando a garantir o direito agrave privacidade e agrave intimidade A Constituiccedilatildeo brasileira natildeo trilha caminho diferente Assegurou referidos direitos de forma exshypressa e sem restriccedilotildees O tema do sigilo bancaacuterio figura agora em niacutevel constitucional Tem status de norma superior no qual se reconhece o direito agrave intimidade como norma de caraacuteter geneacuterico em que estatildeo conshytemplados muacuteltiplos aspectos da vida privada em especial os de ordem econocircmico-financeira que compotildeem o que Hagstrom denominou a inshytimidade econocircmica ou intimidade patrimonial

Luiacutes Fernando 8ellinetti (Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio artigo publicado na Revista de Direito do Consumidor n 18 pp 141151)

Como jaacute dissemos anteriormente em certas hipoacuteteses o fundashymento para o segredo bancaacuterio seria a privacidade No entanto nesses casos o que se protege eacute a privacidade e natildeo propriamente o sigilo

Entendemos que uma coisa eacute garantir-se a privacidade da pessoa com fundamento em norma constitucional outra eacute garantir-se o segreshydo de informaccedilotildees bancaacuterias de uma pessoa com base na legislaccedilatildeo supramencionada

Sempre que a revelaccedilatildeo de informaccedilotildees bancaacuterias puder violar a privacidade da pessoa parece-nos que mais do que garantia ao sigilo bancaacuterio (com fundamento legal) tem a pessoa garantia agrave sua privacishydade (com fundamento constitucional)

ENSAIOS JURiacuteDICOS 245

No entanto se a revelaccedilatildeo da informaccedilatildeo natildeo invadir a esfera da intimidade da pessoa sua garantia eacute meramente legal do sigilo bancaacuterio

Carlos Maacuterio Velloso (citado por Misabel Derzi em Direito Tributaacuterio Aplicado obra publicada pela Editora Del Rey Belo Horizonte MO pp 278 e 279)

O sigilo bancaacuterio decorre do direito agrave privacidade inerente agrave pershysonalidade das pessoas consagrado na Constituiccedilatildeo Federal em seu art 5ordm X e protege tanto interesses privados como finalidades de ordem puacuteblica a saber o sistema de creacutedito O sigilo bancaacuterio natildeo eacute um princiacuteshypio absoluto

As exceccedilotildees ao sigilo bancaacuterio estatildeo previstas na Lei n 45951964 que continua em vigor

O Poder Judiciaacuterio pode requisitar relativamente a pessoas e instishytuiccedilotildees informaccedilotildees que implicam quebra de sigilo (Lei n 45951964 art 38 sect 1 ordm) entretanto mesmo havendo inqueacuterito policial instaurado deveraacute proceder com cautela prudecircncia e moderaccedilatildeo inerentes agrave mashygistratura

Luciana Fregodolli (O Direito agrave Intimidade - excerto da dissertaccedilatildeo que apresentou sob o tiacutetulo O Direito agrave Intimidade e a Prova Iliacutecita publicado pela Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Constitucional e Ciecircncia Poliacutetica -n 19 p 233)

O sigilo bancaacuterio protege interesses privados Eacute ele espeacutecie de direito agrave privacidade inerente agrave personalidade das pessoas e que a Consshytituiccedilatildeo Federal consagra no art 5ordm X aleacutem de atender a uma finalidade de ordem puacuteblica qual seja a de proteccedilatildeo ao sistema de creacutedito

O direito agrave privacidade abrange atualmente o de impedir que tershyceiros inclusive o Estado e o Fisco tenham acesso a informaccedilotildees sobre o que se denominou a aacuterea de manifestaccedilatildeo existencial do ser humano

Celso Ribeiro Bastos O pensamento de Celso Ribeiro Bastos foi exshyposto por Roberto Quiroga Mosquera na obra jaacute referida p 71 do modo seguinte

Celso Bastos eacute do mesmo pensar Apoacutes tecer consideraccedilotildees introdutoacuterias acerca do sigilo bancaacuterio e expor pensamentos de divershysos autores nacionais e alieniacutegenas conclui o constitucionalista brasileishyro no sentido de que todas as despesas ordinaacuterias feitas pelo cidadatildeo

246 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

comum em sua vida cotidiana devem ser consideradas parte de sua vida privada familiar ou domeacutestica e portanto protegidas contra interferecircnshycias a despeito de qualquer pretexto Desde as condutas mais corriqueishyras como as compras efetuadas em um supermercado para manutenshyccedilatildeo da famiacutelia quanto aquelas outras moralmente reprovaacuteveis como presentes ou joacuteias compradas e dadas a quem presta ao homem servishyccedilos de natureza extraconjugal tudo estaacute abarcado pelo manto da proteshyccedilatildeo agrave vida privada familiar ou domeacutestica ( ) E mais adiante arremata Hoje praticamente a vida do homem pode ser escrita a partir de seu talatildeo de cheques e nas sociedades mais avanccediladas pelos cartotildees de creacutedito e magneacuteticos Permitir-se que o sigilo bancaacuterio venha a ser romshypido por qualquer forma natildeo-extraordinaacuteria para salvaguarda de inteshyresse de porte no miacutenimo idecircntico eacute expor a seguranccedila individual a um constante e absurdo temor perante as possibilidades de controle direto ou pelo vazamento de alguma informaccedilatildeo

Haacute contudo corrente contraacuteria como passaremos a demonstrar

Andreacute Serratildeo Borges de Sampaio Consultor da Uniatildeo nas informashyccedilotildees prestadas ao Advogado-Geral da Uniatildeo sobre a ADIn n 2397 cita trechos de doutrina e jurisprudecircncia estrangeiras defendendo o entendimento de que o sigilo bancaacuterio natildeo tem conotaccedilatildeo de direito de privacidade Eis o que escreshyveu o parecerista citado

O jurista portuguecircs J L Saldanha Sanches coteja primorosashymente o sigilo bancaacuterio com a proteccedilatildeo da intimidade para concluir que natildeo haacute que se falar em direito ao sigilo bancaacuterio como concretizaccedilatildeo do direito agrave intimidade Nas suas palavras

Ora em que esfera podemos noacutes incluir o segredo bancaacuteshyrio enquanto instituto que concretiza certos valores do ordenashymento juriacutedico Como expressatildeo de interesses juridicamente tuteshylados

Seraacute o segredo bancaacuterio um prolongamento do direito agrave inshytimidade da esfera pessoal e familiar de uma qualquer pessoa sinshygular (uma vez que em relaccedilatildeo agraves pessoas coletivas a questatildeo natildeo pode mesmo ser colocada) Ou diraacute antes respeito aquela faixa mais larga que resguarda a privacidade de qualquer cidadatildeo e que soacute pode por isso sofrer qualquer intromissatildeo se surgirem razotildees vaacutelidas para que tal direito seja restringido

Ao afirmar-se que na perspectiva dos clientes dos bancos o segredo bancaacuterio eacute um direito com a reserva da sua vida privada temos uma primeira resposta para esta questatildeo

ENSAIOS JURiacuteDICOS 247

Mas falta distinguir entre intimidade e reserva da vida privashyda e entre clientes individuais e profissionais de um banco Natildeo estamos perante o mesmo tipo de tutela quando contamos que um particular espera que o banco natildeo divulgue a qualquer inteshyressado o volume da sua conta bancaacuteria (porque pura e simplesshymente quer manter sob reserva a sua vida particular) ou quando um comerciante confia no banco para que este natildeo revele quem satildeo os seus clientes fornecedores ou qual eacute o seu grau de endividamento

No caso da pessoa singular estaacute apenas em causa um conshyjunto de valores de natureza moral esta natildeo estaacute em princiacutepio preocupada com possiacuteveis prejuiacutezos econocircmicos ligados a qualshyquer divulgaccedilatildeo Apenas se opotildee por razotildees do seu foro pessoal e que natildeo carecem de fundamentaccedilatildeo que esta tenha lugar

Enquanto que o comerciante pode ser seriamente prejudishycado em termos concorrenciais com a revelaccedilatildeo da lista dos seus clientes ou com a sua situaccedilatildeo financeira

O dever de reserva que cabe ao banqueiro estaacute desta forma a serviccedilo do interesse comercial das empresas suas clientes - que pelo simples facto de o serem ou por necessitarem de obter creacutedishyto lhe datildeo informaccedilotildees com um forte valor comercial ou da pesshysoa singular que deseja manter a privacidade da sua situaccedilatildeo patrimonial

Ou em alternativa ao serviccedilo da manutenccedilatildeo da privacidashyde que qualquer um pode desejar ainda que a possiacutevel violaccedilatildeo desta apenas lhe possa acarretar danos natildeo-patrimoniais

E por isso o segredo bancaacuterio natildeo pode constituir a expresshysatildeo do imperativo constitucional da proteccedilatildeo da intimidade Ateacute porque o acesso a essa esfera estaacute vedado aos proacuteprios bancos

Natildeo nos parece aceitaacutevel que um banco como condiccedilatildeo para a concessatildeo de creacutedito a uma pessoa singular ou para estashybelecer com ela qualquer relaccedilatildeo contratual possa exigir desta informaccedilatildeo de tipo estritamente pessoal ou a sujeiccedilatildeo a exames meacutedicos que atingindo a sua esfera iacutentima afectam a sua dignidashyde Aqui estaacute em causa a ilicitude da pergunta por pressupor o acesso agrave esfera inviolaacutevel (e indisponiacutevel) da intimidade

A informaccedilatildeo que o banco pode obter para a defesa dos seus interesses legiacutetimos natildeo pode ir aleacutem da esfera patrimonial do seu cliente rendimentos bens possuiacutedos perspectivas profisshysionais

( )

248 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

Podemos pois concluir que o segredo bancaacuterio natildeo eacute natildeo pode ser uma concretizaccedilatildeo do princiacutepio constitucional do direishyto agrave intimidade

Este princiacutepio tem como funccedilatildeo consagrar uma zona de reshyselVa pessoal para factos opccedilotildees e circunstacircncias que soacute de forshyma indirecta e de todo secundaacuteria podem ter aspectos ou refleshyxos de natureza patrimonial (Saldanha Sanches J L Segredo Bancaacuterio e Tributaccedilatildeo do Lucro Real In Saldanha Sanches J L Estudos de Direito Contabiliacutestico e Fiscal Coimbra Coimbra Edishytora 2000 pp 105108)

Em diversos paiacuteses haacute a clara percepccedilatildeo que natildeo haacute que se conshyfundir direito agrave intimidade com sigilo bancaacuterio indicando que a quebra do sigilo pela Administraccedilatildeo Tributaacuteria natildeo constitui violaccedilatildeo ao direito Ao contraacuterio a existecircncia de um Estado Fiscal implica na necessidade de consagrar agrave administraccedilatildeo tributaacuteria tal faculdade o que se harmonishyza com diversos princiacutepios e outros direitos fundamentais constantes da Carta de 1988

O caso espanhol eacute exemplar neste sentido ao natildeo visualizar a vioshylaccedilatildeo ao direito agrave intimidade em relaccedilatildeo agrave quebra do sigilo bancaacuterio Portanto

el Tribunal Constitucional espaflOl se ha pronunciado por la negativa de que el conocimiento de las cuentas bancarias por la Administracioacuten pueda invadir el aacutembito constitucionalmente garantizado de la intimidad de los individuos porque tales extractos no constituyen per se uma biografiacutea personal en nuacutemeros y en siacute no tiene relevancia para la intimidad personal y familiar dei contribuyente ya que se trata de dados no secretos y confiados a una entidad (Campos Laura Rodriacuteguez Oerechos dei Contribuyente em la Repuacuteblica Argentina ai Amparo de la Convencioacuten Interamericana de Oerechos Humanos http wwwiefpaorgarcriteriosdigitalarticulosderechoshtm Visitado em 512001)

Ao analisar a jurisprudecircncia da Corte Constitucional espanhola quanto ao tema tambeacutem ressalta Saldanha Sanches

Na apreciaccedilatildeo da constitucionalidade da lei que permitia o controle administrativo das contas bancaacuterias o Tribunal Constitushycional espanhol realizou uma distinccedilatildeo entre intimidade pessoal e familiar e a intimidade econoacutemica onde a proteccedilatildeo constitucional eacute menos intensa

ENSAIOS JURiacuteDICOS 249

E procura fazer uma distinccedilatildeo entre a violaccedilatildeo agrave intimidade como consequumlecircncia de uma anaacutelise das contas bancaacuterias - coloshycando a hipoacutetese de uma recusa de cooperaccedilatildeo por parte do conshytribuinte se tal eventualidade se verificar - e a violaccedilatildeo directa da intimidade uma vez que esta natildeo pode resultar de uma mera anaacuteshylise de movimentos bancaacuterios (Saldanha Sanches J L A Situashyccedilatildeo Actual do Sigilo Bancaacuterio a Singularidade do Regime Portushyguecircs In Saldanha Sanches J L Estudos de Direito Contabiliacutestico e Fiscal Coimbra Coimbra Editora 2000 p 91)

Outro comentarista ao analisar a situaccedilatildeo do sistema espanhol quanto ao sigilo bancaacuterio e o direito agrave intimidade fez questatildeo de ressaltar

Seguacuten el r c frente a la Hacienda Puacuteblica no existe el derecho a la intimidad deI art 18 CE Ya la LO de 5 de mayo deI 82 vada praacutecticamente de contenido constitucional el derecho a la intimidado en cuanto el aacutembito de eacutesta queda deferido a la ley ordinaria (a 2ordm) y en cuanto que la esfera protegida frente a las Administraciones se reduce a poco O nada ai no reputarse intromisiones ilegiacutetimas las actuaciones autorizadas o acordadas por la Autoridad competente de acuerdo con la Ley (art 8ordm 1)

La LGTy el RI Iimiacutetan la esfera de la intimidad en las relacishyones con la Hacienda hasta el extremo de que solamenle existe un refugio limitado en el aacutembito deI secreto profesional en los casos de informacioacuten sobre terceros y siempre que no se trate de datos con transcendencia econoacutemica o tributaria EI rc no ha enconshytrado hasta el momento ni un solo supuesto de dato o informacioacuten econocircmica con transcendencia tributaria que limite la accioacuten inquisitiva de la Administracioacuten tributaria por razoacuten de intimidado Bien puede decirse por tanto que frente a la Administraciocircn tribushytaria en cuanto se trata deI ejercicio de su funciocircn de buacutesqueda de datos con transcendencia tributaria el derecho a la intimidad personal y familiar (art 18 I CE) no existe

La biacuteblia deI tribunal a estos efeclos estaacute constituida por la S 11084 reiterada en numerosas ocasiones ampliada en el Auto 64286 y reafirmada por ejemplo en la S 26 abril 90 tantas veces citada (FJ 10deg) Seguacuten esa doctrina la distribucioacutenjusta de la carshyga fiscal prevalece sobre el derecho a la intimidad parte dei art 812 I de la LO seguacuten el cual frente a la Ley (ordinaria) no hay intimidad protegida siempre que haya en dicha ley imperativos de intereacutes puacuteblico ( ) ni siquiera se habla dei predomiacutenio frente a la

250 SUPERIOR TRIBUNAl DE JUSTiCcedilA

intimidad de intereses u objetivos constitucionalmente protegidos Soacuteo admite que la actuadoacuten administrativa es arbitraria cuando no parezcajustificada por la Finalidad de la inspeccioacuten es decir cuando se trate de datos o informaciones que carezcan de transcendencia tributaria pero eacuteste obviamente no es sin Umite derivado dei derecho a la intimidad sino de la interdiccioacuten de arbitrariedad o desviacioacuten de poder de la Administracioacuten de la necesidad de ajuste de toda Administracioacuten ai acircmbito de su competencia que tanto vale para datos iacutentimos como para otros que no lo sean Seguacuten la S 11084 no hay esfera de intimidad proshytegida frente a una Administracioacuten tributaria amparada en una norma que elimina la intimidad como liacutemite (Garciacutea AIacuteloveros Jaime Una Nueva Ley General Tributaria Problemas Constitucioshynales In Kirchhof P et aI Garantiacuteas Constitucionales dei Contribuyente Valencia Tirant lo Blanch 1999 pp 109110)

Diante de tudo quanto foi exposto tendo-se o cuidado de registrar posicionamento de diferentes autores nacionais e estrangeiros haacute ambiente preparado para ser respondido o primeiro questionamento desdobrado em trecircs partes formulado para o 1II Coloacutequio Internacional de Direito Tributaacuterio promoccedilatildeo do Centro de Extensatildeo Universitaacuteria Eis a primeira parte do seu teor

O sigilo bancaacuterio diz respeito agrave intimidade e privacidade das pessoas

A resposta eacute optando por convencimento influenciado pelas ideacuteias da corrente predominante positiva

O nosso entendimento eacute no sentido de que o direito agrave intimidade integra os direitos da personalidade e visam proteger o direito agrave inviolabilidade do domiciacutelio da correspondecircncia das comunicaccedilotildees de quaisquer espeacutecies dos dados pessoais computadorizados do sigilo bancaacuterio O mesmo acontece com o direito agrave privacidade

A expansatildeo da proteccedilatildeo do direito agrave intimidade e agrave privacidade eacute uma consequumlecircncia da evoluccedilatildeo da era contemporacircnea nos setores tecnoloacutegicos e da instabilidade que passam as instituiccedilotildees estatais especialmente a encarreshygada de arrecadar tributos Haacute o reconhecimento de que desenvolve-se um processo de aguda corrosatildeo na proteccedilatildeo agrave intimidade que ao ser violada provoca a publicizaccedilatildeo das condutas mais iacutentimas do cidadatildeo

A concepccedilatildeo do sigilo bancaacuterio no acircmbito do direito agrave intimidade e agrave privacidade visa garantir ao homem o miacutenimo capaz para que lhe seja asseshygurada a sua condiccedilatildeo humana protegendo-o de ingerecircncias alheias como apregoa a Conferecircncia Noacuterdica sobre o Direito agrave Intimidade realizada em Estoshycolmo na data de maio de 1967 ao fazer inserir no documento que publicou a seguinte definiccedilatildeo O direito agrave intimidade eacute o direito do homem de viver de forma independente a sua vida com um miacutenimo de ingerecircncia alheia

ENSAIOS JURiacuteDICOS 251

5 Seguranccedila juriacutedica e acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias

A segunda pergunta apresentada pelos organizadores do coloacutequio estaacute assim posta

A seguranccedila das relaccedilotildees juriacutedicas atraveacutes do Sistema Financeiro pode ser afetada pelo acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves inforshymaccedilotildees bancaacuterias

O acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias se realizado caracteriza um atentado de suma gravidade aos direishytos do cidadatildeo Eacute um ataque aos princiacutepios sustentadores do sistema demoshycraacutetico adotado pelo constituinte de 1988 especialmente quando detonou que a Repuacuteblica Federativa do Brasil tem como objetivo fundamental o respeishyto agrave dignidade humana e agrave cidadania

Do ordenamento juriacutedico brasileiro a meu pensar natildeo haacute lugar para brotar qualquer interpretaccedilatildeo que conclua pela possibilidade de qualquer agenshyte do Poder Puacuteblico acessar de modo generalizado e sem motivaccedilatildeo informashyccedilotildees bancaacuterias do cidadatildeo mesmo com autorizaccedilatildeo judicial

Esclareccedilo desde logo que natildeo comungo com o pensamento de detershyminada corrente no sentido de ser absoluto o direito ao sigilo bancaacuterio Tenho-o como relativo poreacutem vinculado aos princiacutepios da razoabilidade da moralidade da legalidade e da motivaccedilatildeo expliacutecita e detalhada sob pena de ser impossiacutevel a sua quebra

O acesso indiscriminado do agente fiscal agraves informaccedilotildees bancaacuterias do cidadatildeo gera uma quebra da seguranccedila das relaccedilotildees juriacutedicas por um terceiro passar a ter sem causa justificadora conhecimento da vida iacutentima de algueacutem submetendo-o a partir daiacute a um regime de submissatildeo Por outro lado ninshygueacutem poderaacute garantir nem o proacuteprio Estado que o agente puacuteblico utilize os dados que chegaram ao seu conhecimento para outros intentos que natildeo o exclusivamente fiscal

Lembra Arnoldo Wald que O segredo na atividade bancaacuteria envolve concomitantemente interesses privaqos e coletivos que podem ser analisashydos sob trecircs acircngulos o interesse do cliente na sua relaccedilatildeo com a instituiccedilatildeo financeira o interesse do banco em atuar com discriccedilatildeo para ganhar a conshyfianccedila da populaccedilatildeo e captar recursos e o interesse social na existecircncia de um bom e eficiente sistema bancaacuterio Por estarem ligadas ao desenvolvimento da economia e aos interesses da comunidade as relaccedilotildees que envolvem as instishytuiccedilotildees financeiras natildeo recebem o mesmo tratamento juriacutedico dispendido a outras relaccedilotildees comerciais Inviaacutevel a aplicaccedilatildeo exclusiva das regras de Direito Privado as quais tecircm como princiacutepio norteador a autonomia da vontade pois

252 SUPERIOR TRIBUNAl DE JUSTiCcedilA

esta encontra limites nas normas cogentes proacuteprias do direito bancaacuterio e na intervenccedilatildeo do Estado8

A seguranccedila juriacutedica desse tipo de relaccedilatildeo envolve tambeacutem a manutenshyccedilatildeo do segredo das movimentaccedilotildees financeiras do contribuinte

Imprimir-se a mais ampla seguranccedila nas relaccedilotildees do Sistema Financeiro eacute fortalececirc-lo O Estado tem o dever de zelar por esse estado de seguranccedila natildeo permitindo consequumlentemente que o sigilo bancaacuterio seja quebrado pelo acesshyso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico por esse comportamento afeshytar a confiabilidade no sistema

Eacute de todo inconveniente permitir a possibilidade de um atuar do agente fiscal sem controle na quebra do sigilo bancaacuterio por afetar diretamente a seshyguranccedila da relaccedilatildeo juriacutedica firmada entre a instituiccedilatildeo financeira e o seu clienshyte em face deste sentir-se atingido pela accedilatildeo fiscal que passa a tomar conhecishymento de sua intimidade financeira e de fatos de sua vida privada sem o resshypaldo do Poder Judiciaacuterio

A seguranccedila juriacutedica nesse tipo de relaccedilatildeo deve assegurar impossibilidashyde de abuso de poder por parte do Fisco em face da necessidade de ser resshyguardada a garantia de que em um Estado de Direito natildeo pode ser concebido que conceda-se a uma parte mesmo que seja o Estado o domiacutenio absoluto de apanhar as provas que iraacute utilizar em caso de litiacutegio contra algueacutem

O acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias do contribuinte aleacutem de afetar a seguranccedila juriacutedica da relaccedilatildeo em questatildeo promove um desequiliacutebro entre o cidadatildeo-contribuinte e o Fisco por caracterizar coaccedilatildeo que coloca aquele em posiccedilatildeo de inferioridade

A valorizaccedilatildeo da seguranccedila juriacutedica da relaccedilatildeo existente entre instituiccedilatildeo financeira e contribuinte pelo Fisco natildeo quebrando o seu sigilo fiscal sem autorizaccedilatildeo judicial constitui causa de aplicaccedilatildeo de Justiccedila fiscal O seguimenshyto de seus princiacutepios valoriza o regime democraacutetico do qual ela faz parte

6 Casos de admissibilidade da quebra do sigilo bancaacuterio

Os casos de admissibilidade da quebra do sigilo bancaacuterio estatildeo na atuashylidade descritos no nosso ordenamento juriacutedico positivo

A Lei Complementar n 105 de 10 de janeiro de 2001 apoacutes determinar no art 112 de que as instituiccedilotildees financeiras conservaratildeo sigilo em suas operashyccedilotildees ativas e passivas e serviccedilos prestados dispotildee no sect 312 do mesmo artigo que

8 Arnoldo Wald no artigo Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais Revista dos Tribunais ano 6 n 22 janeiromiddotmarccedilo de 1998 n 22 Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas p 15

ENSAIOS JURiacuteDICOS 253

sect 3ordm Natildeo constitui violaccedilatildeo do dever de sigilo

I a troca de informaccedilotildees entre instituiccedilotildees financeiras para fins cadastrais inclusive por intermeacutedio de centrais de risco observadas as normas baixadas pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e pelo Banco Censhytral do Brasil

11 - o fornecimento de informaccedilotildees constantes de cadastro de emitentes de cheques sem provisatildeo de fundos e de devedores inadimplentes a entidades de proteccedilatildeo ao creacutedito observadas as norshymas baixadas pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e pelo Banco Central do Brasil

JJI - o fornecimento das informaccedilotildees de que trata o sect 2ordm do art II da Lei n 9311 de 24 de outubro de 1996

IV - a comunicaccedilatildeo agraves autoridades competentes da praacutetica de iliacutecitos penais ou administrativos abrangendo o fornecimento de inforshymaccedilotildees sobre operaccedilotildees que envolvam recursos provenientes de qualshyquer praacutetica criminosa

V - a revelaccedilatildeo de informaccedilotildees sigilosas com o consentimento expresso dos interessados

VI- a prestaccedilatildeo de informaccedilotildees nos termos e condiccedilotildees estabeleshycidos nos artigos 2ordm 3ordm 4ordm 5ordm 6ordm 7ordm e 9ordm desta lei complementar

sect 4ordm A quebra de sigilo poderaacute ser decretada quando necessaacuteria para apuraccedilatildeo de ocorrecircncia de qualquer iliacutecito em qualquer fase do inqueacuterito ou do processo judicial e especialmente nos seguintes crimes

I - de terrorismo

11 - de traacutefico iliacutecito de substacircncias entorpecentes ou drogas afins

III - de contrabando ou traacutefico de armas municcedilotildees ou material destinado a sua produccedilatildeo

IV - de extorsatildeo mediante sequumlestro

V - contra o sistema financeiro nacional

VI - contra a Administraccedilatildeo Puacuteblica

Vll- contra a ordem tributaacuteria e a previdecircncia social

VIII-lavagem de dinheiro ou ocultaccedilatildeo de bens direitos e valores

IX - praticado por organizaccedilatildeo criminosa

Como visto a lei complementar enumera inuacutemeras situaccedilotildees que indeshypendentemente de autorizaccedilatildeo judicial o sigilo bancaacuterio eacute quebrado

254 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

A dificuldade que se apresenta eacute a de conciliar os casos de quebra de sigilo bancaacuterio que a Lei Complementar n 105 autoriza com a garantia do direito agrave privacidade e agrave intimidade

Destaque-se entre os de maior relevacircncia os seguintes

- natildeo constituir violaccedilatildeo do dever de sigilo bancaacuterio a troca de informashyccedilotildees entre instituiccedilotildees financeiras para fins cadastrais inclusive por intermeacuteshydio de centrais de risco o que possibilita o conhecimento da vida financeira privada do cidadatildeo por vaacuterias pessoas sem desempenho de autoridade na instituiccedilatildeo independentemente de ser justificada com antecedecircncia a causa desse atuar

- o de serem fornecidos dados relativos a fornecimentos de informashyccedilotildees cadastrais de emitentes de cheques sem provisatildeo de fundos a entidades privadas de proteccedilatildeo ao creacutedito sem qualquer avaliaccedilatildeo por qualquer autorishydade da causa determinante do fato a quebra do sigilo bancaacuterio na fase do inqueacuterito por inexistir nessa ocasiaacuteo qualquer contraditoacuterio e respeito ao prinshyciacutepio do devido processo legal

Quanto agraves demais situaccedilotildees constantes na lei complementar que autorishyzam a quebra do sigilo bancaacuterio naacuteo obstante algumas serem absolutamente necessaacuterias haacute de serem vistas em compatibilidade com as garantias constitushycionais conforme jaacute assinalado

O colendo Supremo Tribunal pronunciaraacute como guarda e inteacuterprete maishyor da Carta Magna em ADln jaacute intentada sobre a constitucionalidade ou natildeo dos dispositivos supramencionados

Em campo doutrinaacuterio valoriza-se as posiccedilotildees apresentadas quando da resposta oferecida aos questionamentos anteriores todas acenando pela neshycessidade do controle do Poder Judiciaacuterio

7 Sistema mais justo para a quebra do sigilo bancaacuterio

Os organizadores do JII Coloacutequio Internacional de Direito Tributaacuterio subshymetem agora para anaacutelise a questatildeo do teor seguinte Um sistema em que o Poder Judiciaacuterio torna-se aacuterbitro dos pedidos da Administraccedilatildeo Puacuteblica para quebra do sigilo eacute o mais justo

Em um Estado que por imposiccedilatildeo de sua proacutepria Constituiccedilatildeo estaacute comprometido com a guarda e aplicaccedilatildeo efetiva de princiacutepios democraacuteticos especialmente o de respeitar os direitos e garantias fundamentais da cidadashynia natildeo haacute ambiente para que seja outorgado ao Poder Executivo por via da atuaccedilatildeo de agentes puacuteblicos fiscais o acesso sem o controle do Poder Judiciaacuteshyrio agraves informaccedilotildees bancaacuterias do contribuinte

ENSAIOS JURiacuteDICOS 255

o sigilo bancaacuterio por ser um direito fundamental que exige ser respeitashydo pela supremacia constitucional que o protege deve submeter a possibilishydade de sua quebra para fins tributaacuterios ao Poder Judiciaacuterio pela ausecircncia de interesse direto nos resultados da accedilatildeo fiscalizadora que eacute o recolhimento do tributo e pelas garantias de independecircncia prudecircncia e qualificaccedilatildeo juriacutedica que revestem esse poder

A atuaccedilatildeo da fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo pode ser exercida fora dos limishytes da legalidade imposta a partir da Carta Magna e demais imposiccedilotildees legais a ela subordinadas

Natildeo se desconhece que no atual Estado fiscal os tributos constituem os meios financeiros determinantes para o atendimento dos compromissos da Administraccedilatildeo Puacuteblica com as obrigaccedilotildees oriundas em decorrecircncia de sua atividade no campo educacional social de seguranccedila puacuteblica interna e extershyna da sauacutede da manutenccedilatildeo dos Poderes ou seja para manter funcionando a maacutequina estatal

Por natildeo entremostrar-se na eacutepoca contemporacircnea qualquer outra alshyternativa viaacutevel para transformar o Estado fiscal em um Estado produtivo os tributos passam a representar um indeclinaacutevel dever da cidadania cujo cumshyprimento deve ser por todos honrado conforme assinala Joseacute Casalta Nabais Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra em artigo intitulado Algumas Reflexotildees sobre o Actual Estado Fiscal

Por isso os impostos hatildeo de constituir um preccedilo aceitaacutevel ou seja um preccedilo limitado Um preccedilo que estou certo muitas das sociedashydes que nos antecederam gostariam de ter pago e algumas das actuais natildeo enjeitariam suportar Por isso bem podemos afirmar como jaacute o fizeshymos noutro lugar que no actual Estado fiscal para o qual natildeo se vislumshybra qualquer alternativa viaacutevel pelo menos nos tempos mais proacuteximos os impostos constituem um indeclinaacutevel dever de cidadania cujo cumshyprimento a todos nos deve honrar

A atuaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio para liberar o bloqueio fortalece a conshyfianccedila do cidadatildeo no procedimento da fiscalizaccedilatildeo e consagra a ideacuteia iacutensita em qualquer regime democraacutetico de que a atuaccedilatildeo do Estado tem limites

Na espeacutecie os limites impostos satildeo os decorrentes da quebra do sigilo ser necessaacuterio em face da possiacutevel ilicitude cometida pelo cidadatildeo poreacutem sem ser violados os direitos do cidadatildeo de gozar da sua privacidade e da sua intimidade

A denominada cidadania fiscal haacute de ser considerada de modo conjunshytural com os reflexos dos direitos fundamentais assegurados ao contribuinte sem prestigiar a responsabilidade que tem o Estado de promover a arrecadashyccedilatildeo dos tributos

256 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

Cedo espaccedilo para registrar que a cidadania fiscal deve configurar um estado de relaccedilatildeo juriacutedica em que todos suportem a concretizaccedilatildeo de um Estado em que todos tenham a qualidade de destinataacuterio do dever fundashymentaI de pagar impostos na medida da respectiva capacidade contributiva poreacutem que seja um Estado fiscal suportaacutevel isto eacute um estado cujo sistema fiscal se encontre balizado por estritos limites juriacutedico-constitucionais9

A Administraccedilatildeo Tributaacuteria por melhor que seja a sua estrutura e os seus propoacutesitos natildeo estaacute emocionalmente preparada para conceber e aplicar os princiacutepios que sustentam a cidadania fiscal Isso ocorre primeiramente porshyque o Fisco tem por missatildeo exclusiva exercer a funccedilatildeo de arrecadar tributos Eacute a sua meta essencial por ser atribuiccedilatildeo que na organizaccedilatildeo administrativa estatal estaacute obrigado a desempenhar Natildeo lhe cabe administrar o tributo arreshycadado limitando-se unicamente a envidar esforccedilos para o cumprimento das metas impostas para imprimir aumento na arrecadaccedilatildeo tributaacuteria O sucesso da Administraccedilatildeo Tributaacuteria eacute medido pelo maior volume de recursos fiscais atraiacutedos para os cofres do Governo nunca pelo respeito que exerccedila para com os direitos fundamentais do contribuinte Eacute uma questatildeo de cultura adminisshytrativa de distribuiccedilatildeo de funccedilotildees no sistema estatal impossiacutevel de ser mudashydo por sugestotildees doutrinaacuterias

Por outro lado a fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo consegue afastar as pressotildees exercidas sobre ela por determinados segmentos da organizaccedilatildeo estatal que defendem uma atuaccedilatildeo mais agressiva para a cobranccedila dos tributos tudo em decorrecircncia dos efeitos produzidos pela conduta iliacutecita marcante da sonegashyccedilatildeo fiscal

Esses fatores contribuem para que a fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo tenha condiccedilotildees de modo imparcial sem isenccedilatildeo avaliar a necessidade objetiva da quebra do sigilo bancaacuterio do cidadatildeo Por melhor que seja o seu desempenho nunca ganharaacute a confianccedila do contribuinte

A atribuiccedilatildeo da quebra do sigilo bancaacuterio em um regime democraacutetico onde predomina o respeito maior aos direitos fundamentais da cidadania deve ser exercido pelo Poder Judiciaacuterio natildeo soacute porque seus membros atualmente revestidos da garantia da vitaliciedade inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos bem como porque estatildeo revestidos de independecircncia absoluta em relaccedilatildeo ao Poder interessado na cobranccedila do tributo e consequumlentemenshyte no resultado a ser obtido pela accedilatildeo fiscal

Esse sistema misto onde o Fisco faz a solicitaccedilatildeo motivada para a queshybra do sigilo bancaacuterio ao Poder Judiciaacuterio e este apoacutes analisaacute-lo com objetivishydade e cautela defere ou indefere impotildee seguranccedila e confiabilidade na atuashyccedilatildeo fiscal e sublima o respeito agrave dignidade do contribuinte em outras palavras da cidadania fiscal isto eacute de uma cidadania de liberdade que o Estado fiscal

9 Joseacute Casalta Nabais (Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra) no artigo Algumas Reflexotildees sobre o Actual Estado Fiscal no site httpagugovbr

ENSAIOS JURiacuteDICOS 257

pressupotildee para natildeo ser postergada impotildee um sistema fiscal balizado por esshytritos limites juriacutedico-constitucionais Limites esses que integram a chamada constituiccedilatildeo fiscal e que podemos reconduzir para natildeo nos alongarmos nesse aspecto a duas ideacuteias uma ideacuteia de seguranccedila que tem o seu tradicional e principal suporte no princiacutepio da lega1idade fiscal e uma ideacuteia de justiccedila ou equumlidade que tem a ver com a medida dos impostos e assenta no princiacutepio da capacidade contributiva 10

Em conclusatildeo a adoccedilatildeo de um sistema para a quebra do sigilo bancaacuteshyrio em que o Poder Judiciaacuterio seja o aacuterbitro dos pedidos da Administraccedilatildeo Puacuteblica natildeo eacute somente mais justo mas consegue impor maior credibilidade agrave atuaccedilatildeo fiscal e presta homenagem com intensa potencialidade aos princiacuteshypios democraacuteticos consistentes na guarda da seguranccedila juriacutedica do respeito aos direitos fundamentais do cidadatildeo nesse rol incluidos os agrave privacidade e agrave intimidade Aleacutem disso torna mais respeitaacutevel a relaccedilatildeo entre Fisco e contrishybuinte justificando portanto a opccedilatildeo do Estado pelo regime democraacutetico

8 Autoridade fiscal e faculdade incondicionada de quebrar o sigilo bancaacuterio

Essa indagaccedilatildeo consubstancia a preocupaccedilatildeo de serem estabelecidos controles para a atuaccedilatildeo do agente puacuteblico fiscal Centra-se a preocupaccedilatildeo em imprimir nas relaccedilotildees juriacutedicas tributaacuterias de quaisquer espeacutecies o primashydo da legalidade aprimorando-se o atuar vinculado

Natildeo concilia-se com os postulados da democracia a adoccedilatildeo de um sisteshyma de fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria que outorgue faculdade incondicionada ao fiscal tributaacuterio de invadir a intimidade e a privacidade das pessoas sob o falso argushymento juriacutedico de que busca encontrar provas de sonegaccedilatildeo fiscal

Depreende-se do exposto que a autoridade fiscal natildeo deve ter faculdade incondicionada de quebrar o sigilo sempre que entender necessaacuterio Isso porshyque a praacutetica de atos administrativos por agentes puacuteblicos de modo incondicionado revela grave violaccedilatildeo ao princiacutepio da legalidade onde predoshymina a vontade da lei e natildeo o discricionarismo de quem o pratica

No trato do sigilo bancaacuterio o atuar incondicionado da fiscalizaccedilatildeo assushyme caracteriacutesticas de maior gravidade porque haacute violaccedilatildeo aos princiacutepios funshydamentais jaacute expostos e que satildeo prestigiados pela Carta Magna especialmenshyte por bater de frente de modo integral e absoluto com o direito agrave intimidade e agrave privacidade O atuar deve vincular-se rigidamente ao princiacutepio da legalidashyde especialmente aposta na Carta Magna sem a possibilidade de ser aberto qualquer canal para uso da conveniecircncia ou da oportunidade

Eacute de ser lembrada no trato do assunto a liccedilatildeo de Joseacute Casalta Nobais no trabalho jaacute citado no sentido de que Eacute certo que independentemente da

10 Idem p 15

=258=---___________________ SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTlCA

concepccedilatildeo a que se adira relativamente ao segredo bancaacuterio natildeo temos a menor duacutevida de que o acesso da Administraccedilatildeo Fiscal agrave informaccedilatildeo bancaacuteria seja directo sem necessidade de preacutevia decisatildeo judicial seja indirecto depois portanto de preacutevia decisatildeo judicial haacute de ter sempre uma natureza claramenshyte excepcional Na verdade constitua o segredo bancaacuterio uma manifestaccedilatildeo do direito fundamental agrave reserva da intimidade da vida privada constante do art 26 n 2 da Constituiccedilatildeo portuguesa ou suporte um outro direito fundashymentai um direito agrave reserva da vida privada anaacutelogo agravequele a sua afectaccedilatildeo teraacute sempre caraacuteter excepcional

A autoridade fiscal natildeo possui a necessaacuteria isenccedilatildeo e competecircncia institucional para averiguar o grau dessa excepcionalidade de modo que posshysa impor confianccedila ao cidadatildeo investido na condiccedilatildeo de contribuinte poreacutem com direitos a serem assegurados por forccedila do regime democraacutetico adotado

O certo eacute que na relaccedilatildeo juriacutedico-tributaacuteria deve ser buscado o justo equiliacutebrio pregado pelo Estado de Direito onde o cidadatildeo deve ter a sua dignishydade respeitada sem contudo afastar-se a necessidade do Estado arrecadar tributos de forma cogente e imperativa bem como de serem permitidas conshydiccedilotildees de atuaccedilatildeo que resultem no combate agrave sonegaccedilatildeo fiscal

9 Responsabilidade da autoridade administrativa que quebrar o sigilo banshycaacuterio de forma inconsistente e indevida

Eacute inerente ao regime democraacutetico que a autoridade administrativa puacuteblishyca estaacute obrigada a exercer as suas atribuiccedilotildees com rigorosa obediecircncia aos princiacutepios da legalidade moralidade publicidade impessoalidade e eficiecircncia entre outros

A Carta Magna consagra expressamente no art 37 a obediecircncia do agente puacuteblico a esse tipo de comportamento

A autoridade administrativia que quebrar de modo inconsistente e indevido o sigilo bancaacuterio do cidadatildeo pratica ato com capacidade de provocar os seguintes efeitos a) de invadir o direito agrave privacidade e agrave intimidade de algueacutem b) de provocar-lhe danos morais e materiais dependendo da repershycussatildeo provocada pelo seu atuar

Constatada a efetivaccedilatildeo real de danos morais e materiais a responsabishylidade do Estado pode ser acionada conforme permite o art 37 sect 6ordm da Consshytituiccedilatildeo Federal Solidificada a culpa ou dolo do agente puacuteblico e consagrada a materializaccedilatildeo do iliacutecito praticado com o consequumlente ressarcimento patrimonial o Estado deveraacute usando o direito de regresso investir contra o agente que agiu culposa ou dolosamente

Natildeo resume-se apenas ao campo da responsabilidade civil a atuaccedilatildeo da autoridade quando ilegalmente quebra o sigilo bancaacuterio de qualquer cidadatildeo

ENSAIOS JURiacuteDICOS 259

o art 10 da Lei Complementar n 105 de 10 de janeiro de 2001 determishyna que A quebra de sigilo fora das hipoacuteteses autorizadas nesta lei compleshymentar constitui crime e sujeita os responsaacuteveis agrave pena de reclusatildeo de um a quatro anos e multa aplicando-se no que couber o Coacutedigo Penal sem prejuiacuteshyzo de outras sanccedilotildees cabiacuteveis A seguir no seu paraacutegrafo uacutenico explicita que Incorre nas mesmas penas quem omitir retardar injustificadamente ou presshytar falsamente as informaccedilotildees requeridas nos termos desta lei complementar

O art 11 da mesma lei complementar expressa que O servidor puacuteblico que utilizar ou viabilizar a utilizaccedilatildeo de qualquer informaccedilatildeo obtida em decorshyrecircncia da quebra de sigilo de que trata esta lei complementar responde pessoshyal e diretamente pelos danos decorrentes sem prejuiacutezo da responsabilidade objetiva da entidade puacuteblica quando comprovado que o servidor agiu de acorshydo com a orientaccedilatildeo oficial

10 O sigilo bancaacuterio e o tratamento que lhe eacute dado por oacutergatildeos internacioshynais como a OCDE e outros

Rui Celso Reali Fragoso Presidente do Instituto dos Advogados de Satildeo Paulo em artigo intitulado O Sigilo Bancaacuterio veiculado pela Internet (http Ii wwwjuscombr) registra que atualmente temos trecircs sistemas legais no munshydo cuidando do sigilo bancaacuterio O primeiro eacute o anglo-saxatildeo em que o sigilo natildeo encontra amparo legal o segundo eacute o dos paiacuteses da Europa continental - eu o contemplo em vaacuterios diplomas legais o terceiro eacute o da Suiacuteccedila e do Liacutebano que o reforccedilam

Analisando esses trecircs sistemas o autor citado observa

Haacute aparente contradiccedilatildeo no sistema inglecircs e norte-americano pois se de um lado nestes paiacuteses se eleva a garantia das liberdades individuais de outro se despreza o sigilo bancaacuterio Eacute que se ocorre conshyflito entre a apuraccedilatildeo de fatos (fator social) e a privacidade das pessoas (fator individual) prevalece a primeira Mais ainda o relacionamento de clientes e bancos longe de estabelececirc-lo serve como fonte de informashyccedilatildeo em favor de terceiros a indiscriccedilatildeo injustificada poreacutem eacute objeto de sanccedilatildeo E na Inglaterra os poderes puacuteblicos natildeo intervecircm no funcionashymento dos estabelecimentos privados de creacutedito o que debilita a invesshytigaccedilatildeo

Nos paiacuteses da Europa continental a legislaccedilatildeo contempla o sigilo bancaacuterio como consequumlecircncia do profissional e comporta derrogaccedilotildees na esfera penal e em alguns casos na civil mas comina sanccedilotildees crimishynais no caso de violaccedilatildeo ao sigilo (Coacutedigo Penal francecircs artigo 378 Coacuteshydigo Penal italiano art 622)

260 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

A sistemaacutetica fortalecida eacute aquela utilizada na Suiacuteccedila decorrente da crise ocorrida em 1931 com o fechamento do Banco de Genebra que ensejou a ediccedilatildeo de lei estabelecendo severas puniccedilotildees de natureza civil e criminal Tanto a legislaccedilatildeo suiacuteccedila como a libanesa esta surgida em 1956 permitem derrogaccedilotildees em certas hipoacuteteses A existecircncia das conshytas numeradas comprova a importacircncia do sigilo nestes paiacuteses

Eacute certo natildeo ser absoluto o segredo nem sua quebra em determishynadas situaccedilotildees significa abuso de poder Aliaacutes nenhum direito eacute absoluto

A doutrina tem ultimamente tomado conhecimento sobre as transforshymaccedilotildees que tem passado em vaacuterios ordenamentos juriacutedicos a questatildeo do sigilo bancaacuterio

Zenobio Simotildees de Melo advogado no Paranaacute em artigo sob o tiacutetulo Quebra do Sigilo Bancaacuterio (Internet httpjuscombr) informa que o jornal O Estado de Satildeo Paulo de 21 de junho de 2000 publicou a notiacutecia seguinte

Numa das mais importantes decisotildees adotadas durante o Conseshylho Europeu que marca o fim da presidecircncia portuguesa da Uniatildeo Euroshypeacuteia (UE) seus 15 paiacuteses aprovaram ontem o pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal No ponto mais polecircmico o pacote deveraacute acabar com o sigilo bancaacuterio ateacute 2010 foi uma negociaccedilatildeo de 12 anos Aacuteustria e Luxemburgo natildeo aceitavam o princiacutepio de acabar com o sigilo bancaacuterio A justificativa austriacuteaca eacute que este eacute um princiacutepio que faz parte da Consshytituiccedilatildeo do paiacutes haacute 200 anos Para aceitar o acordo o paiacutes exigiu a manushytenccedilatildeo do sigilo nos bancos austriacuteacos para quem resida no paiacutes

Registro a iacutentegra da notiacutecia

Pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal eacute aprovado por membros da UE Decisatildeo prevecirc quebra do sigilo bancaacuterio nos paiacuteses do bloco econocircmico

Jair Rattner

Especial para o Estado

Santa Maria da Feira Portugal- Numa das mais importantes decishysotildees adotadas durante o Conselho Europeu que marca o fim da presishydecircncia portuguesa da Uniatildeo Europeacuteia (UE) seus 15 paiacuteses aprovaram ontem o pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal No ponto mais polecircmico o pashycote deveraacute acabar com o sigilo bancaacuterio ateacute 2010

Foi uma negociaccedilatildeo de 12 anos Agora temos um documento que vai estabelecer os princiacutepios e as orientaccedilotildees para as futuras diretivas nessa aacuterea afirmou o Primeiro-Ministro Portuguecircs Antonio Guterres que ocupa a presidecircncia rotativa da UE (no fim do mecircs ela seraacute transferida para a Franccedila)

ENSAIOS JURiacuteDICOS 261

o acordo abrange trecircs aacutereas um coacutedigo de conduta que prevecirc o desmantelamento dos 66 paraiacutesos fiscais existentes ou dependentes da UE a tributaccedilatildeo de royalties e o pagamento de impostos sobre rendishymentos das poupanccedilas de cidadatildeos europeus residentes em outros paiacuteshyses dentre os 15 que fazem parte do bloco econocircmico europeu

O grande problema eram as poupanccedilas Aacuteustria e Luxemburgo natildeo aceitavam o princiacutepio de acabar com o sigilo bancaacuterio A justificativa austriacuteaca eacute que este eacute um princiacutepio que faz parte da Constituiccedilatildeo do paiacutes haacute 200 anos Para aceitar o acordo o paiacutes exigiu a manutenccedilatildeo do sigilo nos bancos austriacuteacos para quem resida no paiacutes Essa questatildeo natildeo eacute importante soacute para a Europa porque abre caminho para a criaccedilatildeo de mecanismos de transparecircncia global no mundo financeiro que satildeo esshysenciais para a globalizaccedilatildeo da economia avaliou Guterres

O prazo para a introduccedilatildeo das mudanccedilas vai ateacute o fim de 2010 Ateacute o fim deste ano as negociaccedilotildees vatildeo ser sobre a definiccedilatildeo do conteuacutedo das diretivas (as normas da UE)

Em 2002 a UE discutiraacute com outros paiacuteses esses conteuacutedos para fazer acordos que deveratildeo ser aprovados ateacute o fim do ano por unanimishydade

A partir de 2003 seraacute iniciado um periacuteodo de sete anos de transishyccedilatildeo para a troca de informaccedilotildees sobre os investimentos de cidadatildeos de outros paiacuteses europeus Nesse periacuteodo alguns paiacuteses poderatildeo optar por cobrar impostos de 20 a 25 sobre os rendimentos dos investimentos de residentes no exterior

No capiacutetulo onde foi analisado o sigilo bancaacuterio no Direito Comparado haacute registros tambeacutem a respeito do tratamento que oacutergatildeos internacionais como o OCDEll e outros vecircm dando ao sigilo bancaacuterio conforme estudo que foi apresentado pelo autor ali citado

II OCDE (Organizaccedilatildeo de Cooperaccedilatildeo e Desenvolvimento Econocircmico) criado em 1961 para substituir a OECE (Comitecirc Fiscal da Organizaccedilatildeo Europeacuteia de Cooperaccedilatildeo Econocircmica) Um dos documentos mais importantes da OCDE eacute o resultante da sua Convenccedilatildeo-Modelo relashytiva a impostos sobre a renda e o capital Essa Convenccedilatildeo estaacute sistematizada em sete capiacutetulos assim explicitados por Alberto Xavier em sua obra Direito Tributaacuterio Internacioshynal do Brasil A Convenccedilatildeo-Modelo da OCDE (tal como a das Naccedilocirces Unidas) encontra-se sistematizada em sete capiacutetulos Os capiacutetulos I e I regulam os requisitos para a aplicaccedilatildeo do tratado O capiacutetulo [JI - de longe o mais importante - conteacutem as regras de distribuiccedilatildeo de competecircncia no que concerne aos impostos sobre o rendimento classificado este por tipos ou classes agrave semelhanccedila do que sucede nos sistemas de tributaccedilatildeo cedular O capiacutetulo IV ocupa-se das regras de distribuiccedilatildeo de competecircncia no que respeita aos impostos sobre o capital O capiacutetulo V determina as consequumlecircncias das regras dos capiacutetulos 111 e IV facultanshydo aos Estados a escolha entre os meacutetodos da isenccedilatildeo e da imputaccedilatildeo O capiacutetulo VI conteacutem disposiccedilotildees adicionais sobre natildeo-discriminaccedilatildeo procedimento amigaacutevel troca de informaccedilotildees e privileacutegios de funcionaacuterios diplomaacuteticos e consulares e regras sobre extenshysatildeo do tratado a partes do territoacuterio Enfim o capiacutetulo VII conteacutem disposiccedilotildees finais sobre entrada em vigor e cessaccedilatildeo do acordo

262 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

Heleno Torres em sua recente obra Direito Tributaacuterio Internacional -Planejamento Tributaacuterio e Operaccedilotildees Transnacionais RT p 147 analisando o posicionamento da OCDE referente agrave poliacutetica de determinados paiacuteses que adoshytam tributaccedilatildeo favorecida e os efeitos dos regimes fiscais prejudiciais registra que

A OCDE resolveu entrar na luta para minorar as praacuteticas fiscalshymente danosas insistindo sobre a necessidade de aumentar as trocas de informaccedilotildees entre os Estados aleacutem de redigir uma lista de paiacuteses com tributaccedilatildeo favorecida e fazer algumas recomendaccedilotildees em acircmbito nacional e convencional a partir do seu importante relatoacuterio Harmful tax competition na emerging global issue

Mesmo reconhecendo os aspectos positivos do ambiente global vigente no qual os sistemas tributaacuterios operam os paiacuteses-membros da OCDE concluiacuteram que eles precisavam agir para restringir a competiccedilatildeo tributaacuteria danosa coletivamente e individualmente opondo-se agrave expanshysatildeo de regimes de impostos preferenciais danosos particularmente nos setores financeiros e atividades de serviccedilo que podem causar distorccedilotildees no comeacutercio e desniacuteveis nos padrotildees de investimento sendo uma ameashyccedila para os sistemas tributaacuterios domeacutesticos e para a estrutura global de tributaccedilatildeo internacional

Mais adiante pp 152153 Heleno Torres afirma que

Entre as recomendaccedilotildees definidas nesse relatoacuterio com aplicashyccedilatildeo dirigida aos paiacuteses-membros da instituiccedilatildeo as mais importantes satildeo as seguintes

bull para contrastar a competiccedilatildeo fiscal prejudicial os paiacuteses devem revisar as suas leis regulamentos e praacuteticas sobre sigilo bancaacuterio para remover empecilhos de acesso a tais informaccedilotildees por autoridades fiscais

bull intensificar o uso de trocas de informaccedilotildees principalmente soshybre as transaccedilotildees com paiacuteses de tributaccedilatildeo favorecida

A conclusatildeo que pode ser firmada apoacutes anaacutelise dos pronunciamentos internacionais acima explicitados eacute a construccedilatildeo de uma corrente que defenshyde uma maior abertura para a quebra do sigilo bancaacuterio quando for necessaacuteshyrio para apurar iliacutecitos tributaacuterios

Essa portanto eacute a resposta que apresento para a indagaccedilatildeo Qual o tratamento proposto por oacutergatildeos internacionais como o OCDE e outros com relaccedilatildeo ao sigilo bancaacuterio

ENSAIOS JURiacuteDICOS 263

11 Compatibilizaccedilatildeo do combate agrave criminalidade internacional com o resshypeito agrave seguranccedila juriacutedica a fim de evitar a fuga de investimentos do Paiacutes

Haacute de se reconhecer natildeo ser faacutecil desenvolver-se um sistema juriacutedico que contenha regras que facilitem o combate agrave criminalidade internacional e ao mesmo tempo prestigie os direitos fundamentais do cidadatildeo especialmenshyte a sua seguranccedila juriacutedica

As convenccedilotildees internacionais conforme demonstrado estatildeo preocupashydas com esses aspectos sem deixar de lado os fenocircmenos causados pela globalizaccedilatildeo

Natildeo deve ser esquecido que o tema envolve aspectos diversos a comeshyccedilar pelos determinantes da soberania dos Estados das forccedilas em expansatildeo das organizaccedilotildees internacionais e da pregaccedilatildeo para que os direitos fundamenshytaIacutes do cidadatildeo sejam respeitados com maior Iacutentensidade

A soluccedilatildeo a meu pensar pode ser encontrada no fortalecimento do Direito Comunitaacuterio Os Estados por via de organismos internacionais firmashyriam tratados para a adoccedilatildeo de um Coacutedigo Processual Penal Internacional com efeitos vinculantes por parte das naccedilotildees onde seriam adotadas regras investigatoacuterias e apuratoacuterias dos iliacutecitos internacionais alargando os conceitos de indiacutecios e presunccedilotildees sem deixar contudo de prestigiar a afetividade dos direitos e garantias fundamentais do cidadatildeo

Todas as naccedilotildees no iniacutecio deste seacuteculo envidam esforccedilos para diminuir a crise da seguranccedila juriacutedica Satildeo vaacuterios os fatores determinantes todos tendo como causa comum o crescimento da delinquumlecircncia em decorrecircncia de poliacutetishycas econocircmicas e sociais adotadas por determinados governos que contrishybuem para aumentar o percentual de pessoas pobres

A preocupaccedilatildeo atual para o combate ao crime internacional eacute alcanccedilar niacutevel de uniformizaccedilatildeo dos sistemas adotados para a quebra do sigilo bancaacuteshyrio De iniacutecio deve ser defendida a postura de que nenhuma lesatildeo ou ameaccedila a direito deve ser excluiacuteda da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio Nessa perspectishyva ganha suma importacircncia a criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional em virshytude de pela sua atuaccedilatildeo natildeo perdurar a diversidade de sistemas legais a respeito do assunto a saber a) O anglo-saxatildeo onde o sigilo natildeo encontra amparo legal b) o dos paiacuteses da Europa continental que o contempla em vaacuterios diplomas escritos e c) o da Suiacuteccedila e do Liacutebano que o reforccedilam l2bull

A criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional envolve uma reconceiacutetuaccedilatildeo de soberania

Sobre o tema Celso D de Albuquerque Mello em Direito Internacional da Integraccedilatildeo Ed Renovar p 13 faz a seguinte observaccedilatildeo

12 Conforme anota Rui Celso Reali Fragoso no artigo O Sigilo Bancaacuterio publicado no site httpvvwwjuscombr

264 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Poder-se-ia fazer um pequeno reparo a Chaumont que a indeshypendecircncia nacional eacute um conceito juridicamente indeterminado e que ela pode ter diferentes graus Tanto que podemos escrever soberania versus cooperaccedilatildeo internacional apesar de reconhecermos que esta posiccedilatildeo pode ser considerada como radical vez que natildeo haacute uma total incompatibilidade entre as duas Entretanto natildeo se pode deixar de consshytatar que de certo modo a cooperaccedilatildeo internacional se encontra conshysagrada na Carta da ONU no arl 1 ordm que trata dos Propoacutesitos das Naccedilotildees Unidas e nos Princiacutepios estabelecidos na Carta da OEA (Capiacutetulo 11) O mesmo ocorre na resoluccedilatildeo da Assembleacuteia Geral da ONU de 1970 que aprova a Declaraccedilatildeo Relativa aos Princiacutepios do Direito Internacional Reshylativas agraves Relaccedilotildees Amigaacuteveis e agrave Cooperaccedilatildeo entre os Estados conforme a Carta das Naccedilotildees Unidas bem como na Carta de Direitos e Deveres Econocircmicos aprovada pela mesma Assembleacuteia Geral em 1974

O crescimento do crime internacional em decorrecircncia dos fenocircmenos globalizantes determina o surgimento de um dever juriacutedico dos Estados firmashyrem pactos de cooperaccedilatildeo entre si para que enfrentem as organizaccedilotildees voltashydas para a criminalidade Esse dever juriacutedico globalizado tem suas raiacutezes no moral intemacional que conforme assinala Celso Albuquerque Mello na obra citada p 13 sempre consagrou o princiacutepio da solidariedade ou ainda do auxiacutelio muacutetuo

Eacute o mais importante desafio neste iniacutecio de seacuteculo fazer com que surja uma legislaccedilatildeo internacional que compatibilize o combate agrave criminalidade inshyternacional sem violar a seguranccedila juriacutedica com finalidade exclusiva de evitar a fuga de investimenos do Paiacutes

Tenha-se contudo em consideraccedilatildeo que a globalizaccedilatildeo do crime emshybora seja uma grande ameaccedila aos valores tradicionais que sustentam a cidashydania especialmente a seguranccedila juriacutedica natildeo deve prejudicar o desenvolvishymento econocircmico de qualquer naccedilatildeo

Natildeo faccedilo coro ao assinalado por Eric Hobsbawm em sua obra Era dos Extremos O Breve Seacuteculo XX 1914-1991 1995 p 24 Companhia das Letras S Paulo traduccedilatildeo de Marcos Santarrita no sentido de que Talvez a caracteriacutesshytica mais impressionante do fim do seacuteculo XX seja a tensatildeo entre esse processo de globalizaccedilatildeo cada vez mais acelerado e a incapacidade conjunta das instishytuiccedilotildees puacuteblicas e do comportamento coletivo dos seres humanos de se acoshymodarem a ele

Penso que natildeo haacute essa acomodaccedilatildeo e que as instituiccedilotildees puacuteblicas espeshycialmente as submetidas ao controle da ciecircncia juriacutedica natildeo estatildeo incapacitashydas de encontrar caminhos que solucionem o problema existente

ENSAIOS JURiacuteDICOS 265

Eacute por demais positivo entre outros acontecimentos o fato da conscienshytizaccedilatildeo de que haacute de ser encontrada uma forma de combate agrave criminalidade internacional que natildeo afaste a garantia da seguranccedila juriacutedica Esta eacute uma neshycessidade para impor paz agrave naccedilatildeo e consequumlentemente criar ambiente para que novos investimentos necessaacuterios ao desenvolvimento do seu processo econocircmico aconteccedilam sem se falar na manutenccedilatildeo dos jaacute existentes

O Parlamento Europeu aprovou ultimamente uma resoluccedilatildeo sobre a criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional sob a consideraccedilatildeo de que eacute necessaacuteshyrio criaacute-lo de forma permanente para complementar os sistemas judiciais nashycionais e pocircr fim agrave impunidade de que gozam os responsaacuteveis por genociacutedio crimes contra a humanidade e crimes de guerra

A abertura para essa posiccedilatildeo denota a formaccedilatildeo de uma consciecircncia internacional para combater a criminalidade internacional em todos os niacuteveis contribuindo para fortalecer a seguranccedila juriacutedica interna de cada paiacutes

O documento representativo dessa resoluccedilatildeo eacute do teor seguinte

Parlamento Europeo

Resolucioacuten sobre el Tribunal Penal Internacional

EI Parlamento Europeo

Vistas sus anteriores resoluciones sobre un Tribunal Penal Interna-cional

A Considerando que es necesario crear un Tribunal Penallnternashycional permanente que complemente los sistemasjudiciales nacionales y ponga fin a la impunidad de que gozan los responsables de genocidio crimenes contra la humanidad y criacutemenes de guerra

B Considerando que la Comisioacuten de Derechos Humanos de las Naciones Unidas estaacute respaldando decididamente la creacioacuten de ese Trishybunal

C Considerando que la fase preparatoria de la creacioacuten dei Tribushynal Penal Internacional finalizoacute con la uacuteltima sesioacuten dei Comiteacute Preparatorio de las Naciones Unidas que tuvo lugar dei 16 de marzo al3 de abril de 1998

D Felicitaacutendose por la creciente participacioacuten de Estados en el proceso de negociaciones y esperando que un nuacutemero auacuten mayor de Esshytados procedentes de todas las regiones se encuentre plenamente represhysentado en la Conferencia Diplomaacutetica de Roma

E Considerando que dei 15 de junio al17 de julio de 1998 se celebra en Roma la Conferencia Diplomaacutetica de Plenipotenciarios para la constitucioacuten de un Tribunal Penal Internacional

266 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

F Considerando que los Estados miembros y la delegacioacuten de la Comisioacuten Europea que participan en la Conferencia Diplomaacutetica de Roma pueden desempenar un papel crucial a la hora de garantizar el eacutexito de la conclusioacuten de esta Conferencia Diplomaacutetica y acogiendo positivamente la mayor convergenciacutea de las posturas de los Estados miembros de la UE

G Congratulaacutendose por la oferta dei Gobierno de los Paiacuteses Bajos de servir de sede dei Tribunal Penal Internacional permanente

I Insta a la Conferencia Diplomaacutetica de Roma a aprovechar la oportunidad histoacuterica de concluir un texto de Estatuto para un Tribunal Penal Internacional independiente justo y eficaz

2 Insta a los representantes de los Estados miembros dei Consejo y de la Comisioacuten a garantizar activamente el ecircxito de los resultados a sashyber un auteacutentico Tribunal Penal Internacional en lugar de limitarse a un acuerdo de compromiso sobre principios esenciales en sus esfuerzos por conciliar las posturas de Estados reticentes

3 Destaca que para constituir un complemento eficaz de los sisteshymas judiciacuteales nacionales el Estatuto dei Tribunal Penal Internacional permanente objeto de la Conferencia de Roma deberaacute establecer

a un Fiscal independiente con competencias para investigare insshytruir sumarios por propia iniciativa en situaciones en las que se hayan cometido los delitos sometidos a lajurisdiccioacuten dei Tribunal

b Ia jurisdiccioacuten inherente y universal dei Tribunal en materia de genocidio criacutemenes contra la humanidad criacutemenes de guerra y agresioacuten sin que se requiera ninguacuten consentimiento dei Estado

c una buena relacioacuten de trabajo con los Tribunales lnternacionales ya establecidos en La Haya

d una relacioacuten constructiva con las Naciones Unidas yen partishycular con el Consejo de Seguridad basada en el pleno reconocimiento de sus respectivas funciones y competencias

e Ia obligacioacuten de los Estados firmantes de acatar y hacer cumplir sin demora las oacuterdenes y decisiones dei Tribunal

f los mayores niveles de respeto de los derechos de los acusados y de los sospechosos y de proteccioacuten de los intereses de las viacutectimas y de los testigos

g Ia garantiacutea de una financiacioacuten a largo plazo necesaria para asegurar la autonomiacutea e independencia dei Tribunal frente a cualquier presioacuten exterior

4 Destaca ademaacutes que la jurisdiccioacuten deI Tribunal sobre los delishytos de genociacutedio los criacutemenes contra la humanidad y los criacutemenes de

ENSAIOS JURiacuteDICOS 267

guerra deben considerarse con la misma calificacioacuten penal con indepenshydencia de que se hayan cometido en conflictos armados internacionales o en conflictos internos

5 Insta ai Consejo y a los Estados miembros a garantizar la universalidad y la transparencia de las negociaciones y la participacioacuten continuada de la comunidadjuriacutedica y la sociedad civil internacionales

6 Encarga a su Presidente que transmita la presente resolucioacuten ai Consejo a la Comisioacuten a los Gobiernos de los Estados miembros ai Secreshytario General de las Naciones Unidas ai Presidente de la Asamblea Geneshyral de las Naciones Unidas y ai Presidente de la Conferencia Diplomaacutetica de las Naciones Unidas para la constitucioacuten de un Tribunal Penal Internashycional

A resoluccedilatildeo supracitada demonstra que cresce a conscientizaccedilatildeo da necessidade de ser criado um Tribunal Penal Internacional com forccedila cogente obrigatoacuteria de suas decisotildees no acircmbito interno dos paiacuteses que participarem do pacto de sua constituiccedilatildeo

A doutrina internacional revela que a comunidade internacional somenshyte agora vem se preocupando em criar uma estructura internacional para determinar las responsabilidades individuales emergentes de violacioacuten de ciertos derechos baacutesicos dei ser humano Los mecanismos de responsabilidad estatal creados desde los 60 se dirigen a la mayor protecciotilden dei ser humano y la erradicacioacuten de las praacutecticas de volacioacuten sistemaacutetica de los derechos humanos ar via de la condena ai Estado que ordena o que tolera los abusos por lo cual se estructuraron entorno ai Estado conmo sujeto responsable Como haacute seflalado la Corte Internacional de Derechos Humanos el procedimiento ante ella no es un procedimiento penal lo que se busca determinar es el nivel de cumprimiento por parte de un Estado de sus obligaciones de derecho internacional Sin desconocer la importancia de determinar la responsabilidad dei Estado para que eacuteste tenga un incentivo para erradicar esas praacutectica de sus frotneras es pertinente detacar que las violaciones maacutes grave son en uacuteltima instancia coshymetidas por individuos (Francisco Cox Encarregado dei TPI HOH em artigo intitulado EI IlOH ante la Craciotilden de um Tribunal Penal Internacional no site httpwwwiidhedcrcpitpintrohtml)

A criaccedilatildeo de um Tribunal Penal Internacional atuaria permanentemente e teria competecircncia subsidiaacuteria em relaccedilatildeo agrave outorgada aos Tribunais Nacioshynais limitando-se a atuar apenas nos crimes internacionais previamente defishynidos como sendo do interesse da comunidade global

Merece registro no acircmbito do assunto tratado que na Conferecircncia Reshygional sobre o Tribunal Penal Internacional realizada em 18 e 19 de fevereiro de 1998 na cidade de Guatemala Guatemala um dos temas tratados foi o relativo

268 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

agrave harmonizaccedilatildeo das incriminaccedilotildees quando os seguintes aspectos foram disshycutidos Branqueamento corrupccedilatildeo fraude fiscal participaccedilatildeo em associashyccedilotildees criminosas um olhar agrave luz dos direitos nacionais e do direito internacioshynal Perspectivas Quais os comportamentos a incriminar Criar uma nova incriminaccedilatildeo da fraude fiscal Uma tentativa de harmonizaccedilatildeo o corpus jurls contendo disposiccedilotildees penais para proteccedilatildeo dos interesses financeiros da Uniatildeo Europeacuteia As negociaccedilotildees no seio do Conselho da Europa e da OCDE referenshytes agrave luta contra a corrupccedilatildeo etc O referido painel foi presidido por Benoit Dejemeppe procurador do Rei em Bruxelas e contou com a presenccedila de Tereshyza Beleza professora de Direito Penal na Faculdade de Direito de Lisboa como moderadora

Haacute como visto um largo campo de anaacutelise para desenvolver com possishybilidade do surgimento de sugestotildees que levem a ciecircncia juriacutedica a alcanccedilar com a atuaccedilatildeo estatal uma competecircncia internacional que possa combater o crime internacional e ao mesmo tempo proporcione seguranccedila juriacutedica na ordem interna ganhando assim o sistema juriacutedico confianccedila dos investidoshyres

Em conclusatildeo a forma de compatibilizar o combate agrave criminalidade internacional sem violar a seguranccedila juriacutedica necessaacuteria a evitar a fuga de inshyvestimentos do paiacutes estaacute na criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional com comshypetecircncia definida para processar e julgar delitos globalizantes e cujas decisotildees tenham forccedila imperativa no acircmbito interno das naccedilotildees participantes do pacto para o seu nascimento

Page 10: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro

232 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

decisatildeo do Supremo Tribunal de Justiccedila em Scientia Juriacutedica tomo XXIv n 166168 de 1980 (Parecer publicado na Revista de Direito Mercantil n 99 pp 98 e segs)

Com o sentido de demonstrar como o sigilo bancaacuterio eacute tratado no ordeshynamento juriacutedico de Portugal cito na iacutentegra um acoacuterdatildeo da Secccedilatildeo Criminal do Tribunal de Relaccedilatildeo de Eacutevora cujo texto colhi da internet (httpwwwtrept jurisp321-96html)

Processo n 321]996

Acoacuterdatildeo

Acordam na Secccedilatildeo Criminal do Tribunal da Relaccedilatildeo de Eacutevora

1 No Tribunal Judicial da Comarca de Portimatildeo correm termos uns autos de inqueacuterito registados sob o n 35711994 que tiveram orishygem numa queixa apresentada por middotM Lda contra a sociedade E Lda nos quais se procede agrave investigaccedilatildeo de factos susceptiacuteveis de inteshygrar a praacutetica de um crime de emissatildeo de cheque sem provisatildeo

Estaacute em causa o cheque nO 3681861637 sacado sobre a Caixa Geral de Depoacutesitos emitido em 1 ordm de julho de 1994 no valor de 820661$00

No decurso do inqueacuterito o Ministeacuterio Puacuteblico solicitou agravequela insshytituiccedilatildeo bancaacuteria o fornecimento de determinada documentaccedilatildeo banshycaacuteria o que esta se negou fazer alegando que a revelaccedilatildeo da pretendida documentaccedilatildeo contende com o disposto na legislaccedilatildeo sobre segredo bancaacuterio

A requerimento do Digno Magistrado do Ministeacuterio Puacuteblico o MM Juiz de Instruccedilatildeo suscitou a intervenccedilatildeo deste Tribunal da Relaccedilatildeo a fim de dispensar os serviccedilos da Caixa Geral de Depoacutesitos do segredo bancaacuteshyrio quanto agrave documentaccedilatildeo bancaacuteria solicitada a saber coacutepia da ficha de assinaturas e extracto da conta da Agecircncia de S com o n sobre a qual foi sacado o cheque em causa respeitante aos meses de maio junho e julho de 1994

Nesta relaccedilatildeo o Exmo Procurador da Repuacuteblica emitiu douto pareshycer no sentido de a referida instituiccedilatildeo bancaacuteria ser dispensada do cumshyprimento do dever do segredo bancaacuterio em ordem agrave prestaccedilatildeo dos eleshymentos pretendidos para a efectivaccedilatildeo do inqueacuterito

Colhidos os vistos legais cumpre agora decidir

2 A Caixa Geral de Depoacutesitos atraveacutes do ofiacutecio fotocopiado agrave fi 5 dos autos recusou-se a fornecer os documentos pedidos pelo Ministeacuteshyrio Puacuteblico para instruccedilatildeo de um processo de inqueacuterito com fundamento no sigilo bancaacuterio

ENSAIOS JURiacuteDICOS 233

Compreendendo o inqueacuterito o conjunto de diligecircncias que visam investigar a existecircncia de um crime determinar os seus agentes e a resshyponsabilidade deles e descobrir e recolher as provas em ordem agrave decishysatildeo sobre a acusaccedilatildeo (cf art 262 n 1 do Coacutedigo de Processo Pena0 a consulta dos pretendidos documentos - extracto da conta e ficha de assinaturas - eacute sem margem para duacutevidas de grande importacircncia para a instruccedilatildeo do processo e recolha de indiacutecios probatoacuterios tendentes agrave eventual deduccedilatildeo de acusaccedilatildeo pois sem ela desde logo muito dificilshymente se poderaacute concluir pela identificaccedilatildeo da pessoa que assinou o cheque

O dever de sigilo bancaacuterio traduz uma obrigaccedilatildeo de facto negativo (de ROR facere) e encontra-se disciplinado no Decreto-Lei n 2981992 de 31 de dezembro que aprovou o Regime Geral das Instituiccedilotildees de Creacutedito e Sociedades Financeiras O art 78 de tal diploma consagrando o dever de segredo profissional dispotildee no seu n 1 que os membros dos orgatildeos de administraccedilatildeo ou de fiscalizaccedilatildeo das instituiccedilotildees de creacutedito os seus empregados mandataacuterios comitidos e outras pessoas que lhes prestem serviccedilos a tiacutetulo permanente ou ocasional natildeo podem revelar ou utilizar informaccedilotildees sobre factos ou elementos respeitantes agrave vida da instituiccedilatildeo ou agraves relaccedilotildees desta com os seus clientes cujo conhecimento lhes advenha exclusivamente do exerciacutecio das suas funccedilotildees ou da presshytaccedilatildeo dos seus serviccedilos explicitando-se no seu n 2 que estatildeo designadamente sujeitos a segredo os nomes dos clientes as contas de depoacutesito e seus movimentos e outras operaccedilotildees bancaacuterias

O dever de segredo profissional natildeo eacute poreacutem um dever absoluto isto eacute natildeo prevalece sempre sobre qualquer outro dever que com ele entre em conflito Sofre com efeito as excepccedilotildees previstas no art 79 do mesmo Decreto-Lei n 2981992 onde se estabelece aleacutem do mais que os factos e elementos cobertos pelo dever de segredo podem ser revelashydos nos termos previstos na lei penal e de processo penal - cf aliacutenea d don2

No art 84 do mesmo diploma legal prescreve-se que a violaccedilatildeo ao dever de segredo eacute puniacutevel nos termos do Coacutedigo Penal e efectivamente o Coacutedigo Penal vigente - revisto pelo Decreto-Lei n 481995 de 15 de marccedilo - prevecirc e pune como crimes quer a violaccedilatildeo a segredo profissioshynal quer o seu aproveitamento indevido - cf arts ] 95 e 196

Ao contraacuterio da versatildeo do Coacutedigo Penal anterior agrave referida revisatildeo - em que se estatuiacutea no art 185 que a violaccedilatildeo ao segredo profissional natildeo seria puniacutevel se ocorresse no cumprimento de um dever juriacutedico sensivelmente superior ou visasse a um interesse puacuteblico ou privado legiacutetimo quando considerados os interesses em conflito e os deveres

234 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

de informaccedilatildeo que segundo as circunstacircncias se impotildeem ao agente se pudesse considerar meio adequado para alcanccedilar aquele fim - natildeo conteacutem o Coacutedigo Penal actuaJ relativamente ao crime de violaccedilatildeo ao segredo profissional qualquer causa especiacutefica de exclusatildeo da ilicitude pelo que haacute que atentar nas causas gerais de exclusatildeo da ilicitude

Ao abordar o conflito de deveres dispotildee o art 36 n 1 do Coacutedigo Penal que natildeo eacute iliacutecito o facto de quem em caso de conflito no cumprishymento de deveres juriacutedicos ou de ordens legiacutetimas da autoridade satisfishyzer dever ou ordem de valor igualou superior ao do dever ou ordem que sacrificar Natildeo seraacute pois iliacutecita a violaccedilatildeo ao segredo profissional se perante um conflito de deveres o agente satisfizer o dever de valor igual ou superior ao do dever que sacrifica

No Coacutedigo de Processo Penal generalizou-se a possibilidade de quebra do segredo profissional

Assim as pessoas indicadas no n 1 do sobredito art 78 podem recusar-se a depor sobre factos objecto de segredo profissional mas se a autoridade judiciaacuteria concluindo embora pela legitimidade da recusa natildeo prescindir desse depoimento pode requerer ao tribunal que o ordeshyne E o tribunal deveraacute ordenar a prestaccedilatildeo do depoimento com quebra do segredo profissional sempre que entender que esta se mostra justificada face agraves normas e princiacutepios aplicaacuteveis da lei penal nomeadashymente ao princiacutepio da prevalecircncia do interesse preponderante - cf art 135 n 12 e 3 do Coacutedigo de Processo Penal

A possibilidade de apreensatildeo pela autoridade judiciaacuteria de tiacutetulos valores quantias ou outros objectos depositados em bancos ou outras instituiccedilotildees de creacutedito relacionados com um crime e que possam ser de grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova bem como a possibilidade de exame pelo juiz de correspondecircncia e documenshytaccedilatildeo bancaacuterias estatildeo previstas no art 181 n 1 e 2 do Coacutedigo de Processhyso Penal As pessoas obrigadas ao dever de segredo profissional podem recusar apresentar aqueles documentos ou objectos em seu poder se invocarem por escrito segredo profissional caso em que o conflito de interesses e deveres assim surgido seraacute dirimido pelo tribunal nos tershymos idecircnticos aos previstos para a recusa de depoimento - cf arts 182 n 2 e 135 ambos do citado coacutedigo

Enquanto o dever de segredo profissional eacute geralmente estabeleshycido a favor da integridade e liberdade das pessoas a quem aproveita tendo-se inserido a sua regulamentaccedilatildeo no Tiacutetulo VI do atraacutes mencionashydo Regime Geral das Instituiccedilotildees de Creacutedito e Sociedades Financeiras no qual se prevecirc um conjunto de regras de conduta que devem guiar a actuaccedilatildeo das instituiccedilotildees de creacutedito seus administradores e empregados

ENSAIOS JURiacuteDICOS 235

nas relaccedilotildees com os clientes visando proteger de forma eficaz a posishyccedilatildeo do consumidor de serviccedilos financeiros (cf preacircmbulo do Decreshyto-Lei n 2981992) ou estabelecer um clima de confianccedila na banca que permita a captaccedilatildeo e recuperaccedilatildeo do dinheiro entesourado (como se dizia no relatoacuterio do Decreto-Lei n 21978 de 9 de janeiro revogado pelo n 1 do art 5Q do citado Decreto-Lei n 2981992) no processo de inqueacuteshyrito a que procede o Ministeacuterio Puacuteblico estaacute em causa a realizaccedilatildeo de diligecircncias de prova que permitam investigar um crime de emissatildeo de cheque sem provisatildeo sob a eacutegide do princiacutepio da verdade material e incriminar o respectivo agente

O interesse que estaacute em jogo com a pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblishyco na obtenccedilatildeo da documentaccedilatildeo bancaacuteria eacute o da boa administraccedilatildeo da Justiccedila Penal e esse interesse eacute no caso em apreccedilo sensivelmente supeshyrior ao interesse da manutenccedilatildeo do segredo bancaacuterio o que equivale a di~er que este deve ceder perante aquele

Em suma no caso concreto ponderados os interesses em conflishyto entendemos que a quebra do dever de sigilo bancaacuterio se justifica nos termos do art 36 do Coacutedigo Penal pelo que deve ser dada procedecircncia agrave pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico e consequumlentemente ao abrigo do disposto nos arts 182 n 2 e 135 n 2 e 3 ambos do Coacutedigo de Processo Penal dispensar-se a Caixa Geral de Depoacutesitos do cumprimento do deshyver de sigilo bancaacuterio a fim de poder satisfazer tal pretensatildeo

3 Por todo o exposto determina-se que com quebra do dever de sigilo bancaacuterio a Caixa Geral de Depoacutesitos forneccedila ao Digno Magistrado do Ministeacuterio Puacuteblico com destino ao Processo de Inqueacuterito n 3571 1994 a documentaccedilatildeo bancaacuteria que este lhe havia solicitado

Natildeo eacute devida taxa de justiccedila

Texto processado e integralmente revisto pelo relator

Desembargador-Relator Rui Mauriacutecio

g) Substancioso estudo do sigilo bancaacuterio no Direito Comparado foi feishyto por Andreacute Serratildeo Borges de Sampaio Consultor da Uniatildeo nas informashyccedilotildees que prestou ao Advogado-Geral da Uniatildeo com referecircncia agrave ADIn n 2397 Transcrevo o inteiro teor do seu pronunciamento

51

6 O tratamento do sigilo bancaacuterio no Direito Comparado

Em verdade o Direito Comparado entende inoponiacutevel o sigilo banshycaacuterio agraves autoridades tributaacuterias Com efeito leciona Alfredo Echeverriacutea Herrera verbis

236 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

EI sigilo bancario constituye un reacutegimen limitado exclusivashymente ai aacutembito de las relaciones entre la institucioacuten bancaria y sus clientes e impone la obligacioacuten de confidencialidad de la institucioacuten sobre las informaciones que aqueacutellos le proporcionan

En todas las legislaciones bancarias el sigilo es relativo es decir el derecho dei ciudadano ai secreto y la correlativa obligacioacuten para el banco de no revelar a terceros las informaciones recibidas en el ejercicio de su actividad ceden cuando existe norma legal expresa o causa justificada

Elliacutemite legal ai sigilo estaacute constituiacutedo por la obligacioacuten dei banco de entregar informaciones y se fundamenta en motivos sushyperiores de orden puacuteblico o general siendo liacutecito entonces que el Estado establezca Iiacutemites legales ai secreto bancaria para auxiliar por ejemplo las actuaciones de la Justicia en el plano jurisdiccional y las dei Estado en el aacutembito dei ejercicio de su potestad impositiva

Es un principio irrebatible en la vida dei derecho que ni la autonomia de las personas ni los instrumentos dei aacuterea econoacutemica y financiera pueden servir en un momento dado como elementos juridicamente idoacuteneos para lesionar el intereacutes puacuteblico En consecuencia se puede afirmar que las limitaciones ai sigilo bancario son salvaguardias necesarias ai bien comuacuten en los caacutenones dei Estado moderno Estas limites deben ser materias reshyservadas a la ley por ser de caraacutecter excepcional en sentido estricto

En este orden de ideas necesariamente debe concluirse que existen legiacutetimos y superiores intereses en diversas aacutereas de la sociedad que se vinculan ai bien comuacuten y que deben ser tutelados por el Estado como lo es por ejemplo la necesidad de detectar y reprimir la evasioacuten de los impuestos los cuales transcienden ai evenshytual intereacutes geneacuterico que pueda tener el mismo Estado en la mantencioacuten dei sigilo bancaria En efecto desde el punto de vista de lajuridicidad y de la eacutetica no se puede sostener que el secreto bancaria pueda servir como instrumento para proteger la comisioacuten de actos

52

como el recieacuten mencionado que son constitutivos muchas veces de iliacutecitos penales bajo la forma de delitos tributarias o fraushydes fiscales con resultados ademaacutes de perjucio patrimonial ai Esshytado y dano ai intereacutes general de la sociedad

EI sistema bancaria frente a la existencia en la sociedad de un intereacutes general preponderante y superior estaacute naturalmente Ilamado a colaborar en la verificacioacuten y represioacuten de la evasioacuten tributaria

ENSAIOS JURiacuteDICOS 237

En este marco se inscribe la tendencia de la mayoda de las legislaciones modemas en cuanto a dotar aI Estado de facultades para intervenir en la actividad econoacutemica de los ciudadanos en procura de la correcta determinacioacuten de los tributos cuando se conshyfigura en el desarrollo de estas actividades un hecho gravado establecido en la ley

Ya la Constitucioacuten de Weimar en 919 proclamoacute que es liacutecito ai Estado intervenir para condicionar el ejercicio de los derechos a determinados fines sociales El bien comuacuten y la justicia social comenzaron desde entonces a servir de frontera a los derechos y Iibertades individuales

Cabe destacar que la OCDE (Organisation for Economic Cooperation and Development) en un documento elaborado en el ano 1999 sobre las praacutecticas de los paiacuteses en el acceso a la informacioacuten bancaria para fines tributarios advierte que se puede abusar de la confidencialidad para ocultar actividades iJegales y evadir impuestos y agrega en el resumen ejecutivo deI documento que ni la criminalizacioacuten dei fraude tributario ni el tratamiento de la evasioacuten de impuestos bajo las leyes tributarias de los paiacuteses miembros de la OCDE son homogeacuteneos pero que sin embargo los gobiernos de la mayoriacutea de los paiacuteses miembros de la OCDE han tomado la visi6n de que en este contexto las autoridades tributashyrias no deben ser tratadas como simples terceros sino que se les debe otorgar un acceso priviligiado a la informaci6n bancaria con fines tributarias

Se agrega en este estudio que una medida de esta naturaleza no pane en peligro la conlidencialidad de la inlormacioacuten bancaria puesto que las autoridades tributarias estaacuten sujetas a estrictos conshytroles sobre coacutemo utilizan la informacioacuten de los contribuyentes y todos los gobiemos han implementado regIas para proteger la conlidencialidad de la informaci6n tributaria (EI Sigilo Bancaacuterio Acesso a la Informadon Bancaria para Fines Tributarias)

Em verdade seu texto elenca 30 paiacuteses integrantes da OCDE (a saber Alemanha Austraacutelia Aacuteustria Beacutelgica Canadaacute Repuacuteblica Checa Dinamarca Finlacircndia Franccedila Greacutecia Hungria Islacircndia Irlanda Itaacutelia Japatildeo Coreacuteia Luxemburgo Meacutexico Paiacuteses Baixos Nova Zelacircndia Noshyruega Polocircnia Portugal Espanha Sueacutecia Turquia Suiacuteccedila Reino Unido Estados Unidos Repuacuteblica Eslovaca) dos quais em 1999 apenas trecircs (Portugal Repuacuteblica Eslovaca e Luxemburgo) natildeo facultavam o acesso por parte de autoridades tributaacuterias a informaccedilotildees relativas a pessoas suspeitas de fraude tributaacuteria

238 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

Desses trecircs paiacuteses hoje remanescem apenas dois Com efeito Portugal deixou de integrar esse grupo constrangedoramente minoritaacuterio ao aprovar em 29 de dezembro de 2000 a Lei n 30-G

Nesse diploma lecirc-se

Lei da Reforma de Tributaccedilatildeo do Rendimento

(Portugal)

Artigo 63 O - B

Acesso a informaccedilotildees e documentos bancaacuterios

1 A administraccedilatildeo tributaacuteria tem o poder de aceder directashymente aos documentos bancaacuterios nas situaccedilotildees de recusa da sua exibiccedilatildeo ou de autorizaccedilatildeo para a sua consulta

a) quando se trate de documentos de suporte de registos contabiliacutesticos dos sujeitos passivos de IRS e IRC que se enconshytrem sujeitos agrave contabilidade organizada

b) quando o contribuinte usufrua de benefiacutecios fiscais ou de regimes fiscais privilegiados havendo necessidade de controshylar os respectivos pressupostos e apenas para esse efeito

2 A administraccedilatildeo tributaacuteria tem o poder de aceder a todos os documentos bancaacuterios excepto as informaccedilotildees prestadas para justificar o recurso ao creacutedito nas situaccedilotildees de recusa de exibiccedilatildeo daqueles documentos ou de autorizaccedilatildeo para a sua consulta

a) quando se verificar a impossibilidade de comprovaccedilatildeo e quantificaccedilatildeo directa e exacta da mateacuteria tributaacutevel nos termos do artigo da Lei Geral Tributaacuteria e em geral quando estejam verifishycados os pressupostos para o recurso a uma avaliaccedilatildeo indirecta

b) quando os rendimentos declarados em sede de IRS se afastarem significativamente para menos sem razatildeo justificada dos padrotildees de rendimento que razoavelmente possam permitir as manifestaccedilotildees de riqueza evidenciadas pelo sujeito passivo nos termos do artigo 89-A da Lei Geral Tributaacuteria

c) quando existam indiacutecios da praacutetica de crime doloso em mateacuteria tributaacuteria designadamente nos casos de utilizaccedilatildeo de facturas falsas e em geral nas situaccedilotildees em que existam factos concretamente identificados gravemente indiciadores da falta de veracidade do declarado

d) quando seja necessaacuterio para fins fiscais comprovar a aplicaccedilatildeo de subsiacutedios puacuteblicos de qualquer natureza

ENSAIOS JUAlolCOS 239

3 As decisotildees da administraccedilatildeo tributaacuteria referidas nos nuacuteshymeros anteriores devem ser fundamentadas com expressa menshyccedilatildeo dos motivos concretos que as justificam pressupotildeem a audishyccedilatildeo preacutevia do contribuinte e satildeo da competecircncia do Director-Geshyral dos Impostos ou do Director-Geral das Alfacircndegas e dos Imshypostos Especiais sobre o consumo ou seus substitutos legais sem possibilidade de delegaccedilatildeo

4 Os actos praticados ao abrigo da competecircncia definida no nuacutemero anterior satildeo susceptiacuteveis de recurso judicial o qual teraacute efeito suspensivo nas situaccedilotildees previstas no n 2

5 Nos casos de deferimento do recurso previsto no nuacutemero anterior os elementos de prova entretanto obtidos natildeo podem ser utilizados para qualquer efeito em desfavor do contribuinte

6 As entidades que se encontrem numa relaccedilatildeo de domiacutenio com o contribuinte ficam sujeitas aos regimes de acesso agrave inforshymaccedilatildeo bancaacuteria referidos nos n 1 e 2

7 O acesso da administraccedilatildeo tributaacuteria a informaccedilatildeo banshycaacuteria relevante relativa a familiares ou terceiros que se encontrem numa relaccedilatildeo especial com o contribuinte depende de autorizashyccedilatildeo judicial expressa apoacutes audiccedilatildeo do visado obedecendo aos requisitos previstos no n 3

8 O regime previsto nos nuacutemeros anteriores natildeo prejudica a legislaccedilatildeo aplicaacutevel aos casos de investigaccedilatildeo por infracccedilatildeo peshynal e soacute pode ter por objecto operaccedilotildees e movimentos bancaacuterios realizados apoacutes a sua entrada em vigor sem prejuiacutezo do regime vigente para as situaccedilotildees anteriores

9 Os actos praticados ao abrigo da competecircncia prevista no n I devem ser objecto de comunicaccedilatildeo ao Defensor do Contrimiddot buinte

10 Para os efeitos desta lei considera-se documento bancaacuteshyrio qualquer documento ou registo independentemente do resshypectivo suporte em que se titulem comprovem ou registem opeshyraccedilotildees praticadas por instituiccedilotildees de creacutedito ou sociedades finanshyceiras no acircmbito da respectiva actividade incluindo os referentes a operaccedilotildees realizadas mediante utilizaccedilatildeo de cartotildees de creacutedito (coacutepia anexa)

Parece evidente destarte que todo o mundo civilizado abandonou a possibilidade de opor-se agrave Administraccedilatildeo Tributaacuteria o sigilo bancaacuterio

240 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

4 O sigilo bancaacuterio e o direito agrave intimidade e agrave privacidade das pessoas

A anaacutelise do sigilo bancaacuterio em face do direito agrave intimidade e agrave privacidashyde exige inicialmente que seja enfrentada a questatildeo referente ao seu conceito

Os doutrinadores natildeo tecircm assumido posiccedilatildeo uniforme quanto aos asshypectos conceituais dessa entidade juriacutedica

Seacutergio Carlos Covello autor da obra jaacute mencionada (O Sigilo Bancaacuterio Leud S Paulo 1991 p 69) entende que sigilo bancaacuterio eacute a obrigaccedilatildeo que tecircm os Bancos de natildeo revelar salvo justa causa as informaccedilotildees que venham a obter em virtude de sua atividade profissional

Luiz Fernando Bellinetti no artigo intitulado Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio (Revista do Direito do Consumidor Satildeo Paulo RT 1996 voI 18 p 144) defende posiccedilatildeo no sentido de que sigilo bancaacuterio eacute o dever juriacutedico que tecircm as instituiccedilotildees de creacutedito e as organizaccedilotildees auxiliares e seus empregados de natildeo revelar salvo justa causa as informaccedilotildees que venham a obter em virtushyde da atividade bancaacuteria a que se dedicam

Para Arnoldo Wald (in O Sigilo Bancaacuterio no Projeto de Lei Complemenshytar n 70 Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas n I pp 196209) o sigilo bancaacuterio se enquadra no conceito mais amplo do segredo profissional que tem merecido uma proteccedilatildeo mais ampla ensejando sua violaccedilatildeo caracterizaccedilatildeo como crime (art 154 do Coacutedigo PeshynaI)

Eivany A Silva tratando do tema em Consideraccedilotildees a Respeito do Sigilo de Dados (artigo publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio n 61 pp 41142 - Edit Dialeacutetica) afirma que o sigilo bancaacuterio eacute espeacutecie do gecircnero sigilo de dados constituindo um direito fundamental protegido constitucionalmente inserto que estaacute no rol dos direitos e garantias individuais ou seja em claacuteusushylas peacutetreas da Carta Magna natildeo podendo portanto ser modificado nem messhymo por emenda agrave Constituiccedilatildeo e portanto muito menos por legislaccedilatildeo de hierarquia inferior

Como examinado haacute divergecircncias na fixaccedilatildeo do conceito Essas divershygecircncias embora importantes para as posiccedilotildees doutrinaacuterias a serem assumishydas sobre o alcance do sigilo bancaacuterio natildeo geram contudo influecircncias de maior intensidade no relacionamento entre a instituiccedilatildeo financeira e os seus depositantes Isso porque o que merece ser considerado eacute a natureza juriacutedica do sigilo bancaacuterio isto eacute a que categoria de direito pertence e como por quem e quando a sua quebra pode ser determinada

Em face do exposto necessaacuterio eacute que se faccedila o alinhamento das teorias que procuram fundamentar o sigilo bancaacuterio

A doutrina em eacutepocas diversas examinou as seguintes teorias

ENSAIOS JURiacuteDICOS 241

Teoria contratualista O sigilo bancaacuterio de acordo com essa teoria deshycorre da relaccedilatildeo contratual que voluntariamente eacute formada entre o banco e o cliente por via da qual mesmo sem claacuteusula expressa a instituiccedilatildeo financeira assume a obrigaccedilatildeo de guardar segredo das movimentaccedilotildees de dinheiro que nela satildeo feitas Essa responsabilidade assumida pelo banco inspira-se segunshydo os adeptos da teoria em destaque nos usos nos costumes e na boa-feacute sempre aplicaacuteveis na intepretaccedilatildeo dos contratos comerciais7bull

Teoria do direito agrave privacidade Os adeptos dessa corrente afirmam que o sigilo bancaacuterio integra o campo do direito agrave privacidade que faz parte dos direitos da personalidade

Teoria consuetudinaacuteria Segundo os seguidores dessa linha de pensar o sigilo bancaacuterio decorre dos compromissos taacutecitos assumidos entre instituishyccedilotildees financeiras e seus clientes no sentido de natildeo serem levados ao conhecishymento de terceiros os valores transacionados O uso reiterado dessa praacutetica apoiada no elemento confianccedila passou a representar costume adotado nesse tipo de negoacutecio juriacutedico

Teoria da boa-feacute A adoccedilatildeo dessa teoria conduz o inteacuterprete a entender que o sigilo bancaacuterio por sua proacutepria natureza estaacute vinculado ao caraacuteter fiduciaacuterio da atividade bancaacuteria fundando-se portanto na boa-feacute ou dever de lisura que tanto marca o tipo de negoacutecio juriacutedico firmado

Teoria do sigilo profissional Essa teoria concebe o sigilo bancaacuterio como sendo uma espeacutecie do sigilo profissional Haacute portanto um dever eacutetico do banshyco em respeitar o sigilo bancaacuterio em decorrecircncia da profissatildeo exercida

Teoria do direito agrave intimidade dos bancos Os integrantes dessa forma de pensar sustentam que a instituiccedilatildeo financeira tem legiacutetimo interesse de afastar do conhecimento de terceiros a movimentaccedilatildeo financeira dos seus clientes e consequumlentemente dos fatos com elas relacionados

Teoria da complexidade do viacutenculo Essa teoria eacute explicada por Arnoldo Wald no trabalho jaacute citado da forma seguinte A doutrina moderna abandoshynou a noccedilatildeo da relaccedilatildeo juriacutedica contratual defendo a complexidade do viacutenshyculo Aleacutem dos direitos e das obrigaccedilotildees principais existem deveres secundaacuteshyrios para ambos os contratantes que decorrem da regra geral da boa-feacute denoshyminada na doutrina italiana de cOITeteza e na legislaccedilatildeo alematilde de Treu und Glauben Exige que a atuaccedilatildeo de uma parte natildeo cause danos agrave esfera juriacutedica da outra Dentro desta ideacuteia defende-se que o segredo bancaacuterio eacute um dever

7 Arnoldo Wald em Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais artigo publicado na Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas n 22 pp 1518 manifesta entendimento de que no campo normatIacutevo do Direito brasileiro esta teoria encontra respaldo nos arts 130 e 131 do Coacutedigo Comercial que prevecirc a interpretaccedilatildeo dos contratos segundo os usos os costumes e a boa-feacute

242 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

acessoacuterio na relaccedilatildeo juriacutedica Mesmo que natildeo nasccedila o contrato entre as partes a boa-feacute objetiva impede que a instituiccedilatildeo financeira prejudique os interesses do cidadatildeo

Estabelecidos os pressupostos doutrinaacuterios acima examinamos agora se o sigilo bancaacuterio diz respeito agrave intimidade e agrave privacidade das pessoas

A Constituiccedilatildeo Federal em seu artigo 5ordm incisos X e XII afirma

Art 5ordm Todos satildeo iguais perante a lei sem distinccedilatildeo de qualquer natureza garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Paiacutes a inviolabilidade do direito agrave vida agrave liberdade agrave igualdade agrave segushyranccedila e agrave propriedade nos termos seguintes

X - satildeo inviolaacuteveis a intimidade a vida privada a honra e a imagem das pessoas assegurado o direito agrave indenizaccedilatildeo pelo dano material ou moral decorrente de sua violaccedilatildeo

XJl - eacute inviolaacutevel o sigilo da correspondecircncia e das comunicaccedilotildees telegraacuteficas de dados e das comunicaccedilotildees telefocircnicas salvo no uacuteltimo caso por ordem judicial nas hipoacuteteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigaccedilatildeo criminal ou instruccedilatildeo processual penal

Essas garantias constitucionais protegem o cidadatildeo de qualquer investida de terceiros em sua intimidade em sua vida privada e no sigilo de seus dados

Na expressatildeo terceiros estaacute incluiacutedo o Estado e consequumlentemente seus agentes poliacuteticos e administrativos

A doutrina tem se manifestado de modo quase unacircnime no sentido de que o sigilo bancaacuterio eacute uma garantia constitucional que protege a privacidade das pessoas no campo econocircmico e financeiro A sua significaccedilatildeo eacute de natildeo tornar puacuteblica a movimentaccedilatildeo da conta bancaacuteria e das aplicaccedilotildees financeiras do cidadatildeo para que de nenhum modo os atos privados praticados possam ser tornados puacuteblicos

Esse posicionamento eacute o adotado pelos autores que passo a citar

Arnoldo Wald (O Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais artigo pushyblicado na Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas RT n 22 pp 1521)

O sigilo bancaacuterio eacute o meio para resguardar a privacidade no camshypo econocircmico pois veda a publicidade sobre a movimentaccedilatildeo da conta corrente bancaacuteria e das aplicaccedilotildees financeiras

ENSAIOS JURiacuteDICOS 243

Eivany A Silva (Consideraccedilotildees a Respeito do Sigilo de Dados artigo publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio n 61 Satildeo Paulo Editora Dialeacutetica p27)

A maioria dos ordenamentos juriacutedicos como o brasileiro tratam o sigilo bancaacuterio como direito fundamental do contribuinte agrave privacidashyde ou seja agrave resistecircncia agrave comunicaccedilatildeo de dados que representem desshydobramento da personalidade da pessoa direito agrave oposiccedilatildeo e agrave negaccedilatildeo de comunicaccedilatildeo

Ives Gandra da Silva Martins (Sigilo Bancaacuterio trabalho publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio S Paulo Editora Dialeacutetica n 1 pp 24 e 25)

Pelos incisos X e XII do artigo 5ordm tem o contribuinte o direito de preservaccedilatildeo de sua intimidade de sua privacidade e de que terceiros que detenham informaccedilotildees pessoais suas sejam obrigados a guardaacute-Ias

Natildeo pode pois a fiscalizaccedilatildeo exigir de terceiros informaccedilotildees que apenas pode obter do proacuteprio contribuinte

Em determinadas hipoacuteteses todavia o interesse puacuteblico haacute de preshyvalecer sobre o interesse individual mas caberaacute a um outro poder definir se tais hipoacuteteses efetivamente ocorrem com o que poderaacute o Poder Judishyciaacuterio autorizar se convencido estiver o magistrado de que a hipoacutetese eacute de gravidade e de lesatildeo ao interesse puacuteblico a quebra do direito ao sigilo bancaacuterio

Estou convencido ser esta a melhor conformaccedilatildeo juriacutedica da quesshytatildeo idealizada pelos constituintes defendida pela doutrina e consagrashyda na jurisprudecircncia corrente exegeacutetica esta a que me filio desde os meus primeiros escritos sobre a mateacuteria

Roberto Quiroga Mosquera (Tributaccedilatildeo no Mercado Financeiro e de Capitais obra publicada pela Editora Dialeacutetica Satildeo Paulo 1998 pp 70171)

Do exposto ateacute aqui eacute evidente que o direito ao sigilo bancaacuterio representa uma espeacutecie de direito agrave privacidade

Eacute incontroverso que os dados e informaccedilotildees de natureza bancaacuteria dizem respeito agrave intimidade e agrave vida privada dos cidadatildeos Dados que dizem respeito aos valores em dinheiro depositados em contas-correnshytes bancaacuterias tipos e caracteriacutesticas de aplicaccedilotildees financeiras ganhos e prejuiacutezos auferidos ou incorridos em operaccedilotildees bursaacuteteis etc satildeo sem sombra de duacutevida elementos particulares e pessoais de qualquer indiviacuteshyduo

244 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Utilizando outra voz informaccedilotildees que tocam no aspecto financeishyro do ser humano representam direito iacutentimo e personaliacutessimo devendo ser mantidas em sigilo por aqueles que eventualmente as detenham em razatildeo de sua atividade profissional Parece-nos que tal conclusatildeo eacute de uma clareza inconteste

Natildeo tem sido outra a posiccedilatildeo da doutrina mais abalizada do Paiacutes e da jurisprudecircncia dominante

o autor referido a seguir faz a observaccedilatildeo seguinte

Carlos Alberto Hagstrom (Sigilo Bancaacuterio Novas Questotildees Reshyvista de Direito Mercantil Satildeo Paulo Malheiros 1997 vaI 105 pp 4344) expotildee que apesar de existirem diversas teorias que procuram fundashymentar juridicamente o sigilo bancaacuterio modernamente a explicaccedilatildeo para o fundamento do referido instituto sofreu uma radical alteraccedilatildeo Divershysas constituiccedilotildees modernas esclarece o mencionado autor ampliaram e explicitaram o elenco de direitos e garantias individuais passando a garantir o direito agrave privacidade e agrave intimidade A Constituiccedilatildeo brasileira natildeo trilha caminho diferente Assegurou referidos direitos de forma exshypressa e sem restriccedilotildees O tema do sigilo bancaacuterio figura agora em niacutevel constitucional Tem status de norma superior no qual se reconhece o direito agrave intimidade como norma de caraacuteter geneacuterico em que estatildeo conshytemplados muacuteltiplos aspectos da vida privada em especial os de ordem econocircmico-financeira que compotildeem o que Hagstrom denominou a inshytimidade econocircmica ou intimidade patrimonial

Luiacutes Fernando 8ellinetti (Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio artigo publicado na Revista de Direito do Consumidor n 18 pp 141151)

Como jaacute dissemos anteriormente em certas hipoacuteteses o fundashymento para o segredo bancaacuterio seria a privacidade No entanto nesses casos o que se protege eacute a privacidade e natildeo propriamente o sigilo

Entendemos que uma coisa eacute garantir-se a privacidade da pessoa com fundamento em norma constitucional outra eacute garantir-se o segreshydo de informaccedilotildees bancaacuterias de uma pessoa com base na legislaccedilatildeo supramencionada

Sempre que a revelaccedilatildeo de informaccedilotildees bancaacuterias puder violar a privacidade da pessoa parece-nos que mais do que garantia ao sigilo bancaacuterio (com fundamento legal) tem a pessoa garantia agrave sua privacishydade (com fundamento constitucional)

ENSAIOS JURiacuteDICOS 245

No entanto se a revelaccedilatildeo da informaccedilatildeo natildeo invadir a esfera da intimidade da pessoa sua garantia eacute meramente legal do sigilo bancaacuterio

Carlos Maacuterio Velloso (citado por Misabel Derzi em Direito Tributaacuterio Aplicado obra publicada pela Editora Del Rey Belo Horizonte MO pp 278 e 279)

O sigilo bancaacuterio decorre do direito agrave privacidade inerente agrave pershysonalidade das pessoas consagrado na Constituiccedilatildeo Federal em seu art 5ordm X e protege tanto interesses privados como finalidades de ordem puacuteblica a saber o sistema de creacutedito O sigilo bancaacuterio natildeo eacute um princiacuteshypio absoluto

As exceccedilotildees ao sigilo bancaacuterio estatildeo previstas na Lei n 45951964 que continua em vigor

O Poder Judiciaacuterio pode requisitar relativamente a pessoas e instishytuiccedilotildees informaccedilotildees que implicam quebra de sigilo (Lei n 45951964 art 38 sect 1 ordm) entretanto mesmo havendo inqueacuterito policial instaurado deveraacute proceder com cautela prudecircncia e moderaccedilatildeo inerentes agrave mashygistratura

Luciana Fregodolli (O Direito agrave Intimidade - excerto da dissertaccedilatildeo que apresentou sob o tiacutetulo O Direito agrave Intimidade e a Prova Iliacutecita publicado pela Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Constitucional e Ciecircncia Poliacutetica -n 19 p 233)

O sigilo bancaacuterio protege interesses privados Eacute ele espeacutecie de direito agrave privacidade inerente agrave personalidade das pessoas e que a Consshytituiccedilatildeo Federal consagra no art 5ordm X aleacutem de atender a uma finalidade de ordem puacuteblica qual seja a de proteccedilatildeo ao sistema de creacutedito

O direito agrave privacidade abrange atualmente o de impedir que tershyceiros inclusive o Estado e o Fisco tenham acesso a informaccedilotildees sobre o que se denominou a aacuterea de manifestaccedilatildeo existencial do ser humano

Celso Ribeiro Bastos O pensamento de Celso Ribeiro Bastos foi exshyposto por Roberto Quiroga Mosquera na obra jaacute referida p 71 do modo seguinte

Celso Bastos eacute do mesmo pensar Apoacutes tecer consideraccedilotildees introdutoacuterias acerca do sigilo bancaacuterio e expor pensamentos de divershysos autores nacionais e alieniacutegenas conclui o constitucionalista brasileishyro no sentido de que todas as despesas ordinaacuterias feitas pelo cidadatildeo

246 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

comum em sua vida cotidiana devem ser consideradas parte de sua vida privada familiar ou domeacutestica e portanto protegidas contra interferecircnshycias a despeito de qualquer pretexto Desde as condutas mais corriqueishyras como as compras efetuadas em um supermercado para manutenshyccedilatildeo da famiacutelia quanto aquelas outras moralmente reprovaacuteveis como presentes ou joacuteias compradas e dadas a quem presta ao homem servishyccedilos de natureza extraconjugal tudo estaacute abarcado pelo manto da proteshyccedilatildeo agrave vida privada familiar ou domeacutestica ( ) E mais adiante arremata Hoje praticamente a vida do homem pode ser escrita a partir de seu talatildeo de cheques e nas sociedades mais avanccediladas pelos cartotildees de creacutedito e magneacuteticos Permitir-se que o sigilo bancaacuterio venha a ser romshypido por qualquer forma natildeo-extraordinaacuteria para salvaguarda de inteshyresse de porte no miacutenimo idecircntico eacute expor a seguranccedila individual a um constante e absurdo temor perante as possibilidades de controle direto ou pelo vazamento de alguma informaccedilatildeo

Haacute contudo corrente contraacuteria como passaremos a demonstrar

Andreacute Serratildeo Borges de Sampaio Consultor da Uniatildeo nas informashyccedilotildees prestadas ao Advogado-Geral da Uniatildeo sobre a ADIn n 2397 cita trechos de doutrina e jurisprudecircncia estrangeiras defendendo o entendimento de que o sigilo bancaacuterio natildeo tem conotaccedilatildeo de direito de privacidade Eis o que escreshyveu o parecerista citado

O jurista portuguecircs J L Saldanha Sanches coteja primorosashymente o sigilo bancaacuterio com a proteccedilatildeo da intimidade para concluir que natildeo haacute que se falar em direito ao sigilo bancaacuterio como concretizaccedilatildeo do direito agrave intimidade Nas suas palavras

Ora em que esfera podemos noacutes incluir o segredo bancaacuteshyrio enquanto instituto que concretiza certos valores do ordenashymento juriacutedico Como expressatildeo de interesses juridicamente tuteshylados

Seraacute o segredo bancaacuterio um prolongamento do direito agrave inshytimidade da esfera pessoal e familiar de uma qualquer pessoa sinshygular (uma vez que em relaccedilatildeo agraves pessoas coletivas a questatildeo natildeo pode mesmo ser colocada) Ou diraacute antes respeito aquela faixa mais larga que resguarda a privacidade de qualquer cidadatildeo e que soacute pode por isso sofrer qualquer intromissatildeo se surgirem razotildees vaacutelidas para que tal direito seja restringido

Ao afirmar-se que na perspectiva dos clientes dos bancos o segredo bancaacuterio eacute um direito com a reserva da sua vida privada temos uma primeira resposta para esta questatildeo

ENSAIOS JURiacuteDICOS 247

Mas falta distinguir entre intimidade e reserva da vida privashyda e entre clientes individuais e profissionais de um banco Natildeo estamos perante o mesmo tipo de tutela quando contamos que um particular espera que o banco natildeo divulgue a qualquer inteshyressado o volume da sua conta bancaacuteria (porque pura e simplesshymente quer manter sob reserva a sua vida particular) ou quando um comerciante confia no banco para que este natildeo revele quem satildeo os seus clientes fornecedores ou qual eacute o seu grau de endividamento

No caso da pessoa singular estaacute apenas em causa um conshyjunto de valores de natureza moral esta natildeo estaacute em princiacutepio preocupada com possiacuteveis prejuiacutezos econocircmicos ligados a qualshyquer divulgaccedilatildeo Apenas se opotildee por razotildees do seu foro pessoal e que natildeo carecem de fundamentaccedilatildeo que esta tenha lugar

Enquanto que o comerciante pode ser seriamente prejudishycado em termos concorrenciais com a revelaccedilatildeo da lista dos seus clientes ou com a sua situaccedilatildeo financeira

O dever de reserva que cabe ao banqueiro estaacute desta forma a serviccedilo do interesse comercial das empresas suas clientes - que pelo simples facto de o serem ou por necessitarem de obter creacutedishyto lhe datildeo informaccedilotildees com um forte valor comercial ou da pesshysoa singular que deseja manter a privacidade da sua situaccedilatildeo patrimonial

Ou em alternativa ao serviccedilo da manutenccedilatildeo da privacidashyde que qualquer um pode desejar ainda que a possiacutevel violaccedilatildeo desta apenas lhe possa acarretar danos natildeo-patrimoniais

E por isso o segredo bancaacuterio natildeo pode constituir a expresshysatildeo do imperativo constitucional da proteccedilatildeo da intimidade Ateacute porque o acesso a essa esfera estaacute vedado aos proacuteprios bancos

Natildeo nos parece aceitaacutevel que um banco como condiccedilatildeo para a concessatildeo de creacutedito a uma pessoa singular ou para estashybelecer com ela qualquer relaccedilatildeo contratual possa exigir desta informaccedilatildeo de tipo estritamente pessoal ou a sujeiccedilatildeo a exames meacutedicos que atingindo a sua esfera iacutentima afectam a sua dignidashyde Aqui estaacute em causa a ilicitude da pergunta por pressupor o acesso agrave esfera inviolaacutevel (e indisponiacutevel) da intimidade

A informaccedilatildeo que o banco pode obter para a defesa dos seus interesses legiacutetimos natildeo pode ir aleacutem da esfera patrimonial do seu cliente rendimentos bens possuiacutedos perspectivas profisshysionais

( )

248 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

Podemos pois concluir que o segredo bancaacuterio natildeo eacute natildeo pode ser uma concretizaccedilatildeo do princiacutepio constitucional do direishyto agrave intimidade

Este princiacutepio tem como funccedilatildeo consagrar uma zona de reshyselVa pessoal para factos opccedilotildees e circunstacircncias que soacute de forshyma indirecta e de todo secundaacuteria podem ter aspectos ou refleshyxos de natureza patrimonial (Saldanha Sanches J L Segredo Bancaacuterio e Tributaccedilatildeo do Lucro Real In Saldanha Sanches J L Estudos de Direito Contabiliacutestico e Fiscal Coimbra Coimbra Edishytora 2000 pp 105108)

Em diversos paiacuteses haacute a clara percepccedilatildeo que natildeo haacute que se conshyfundir direito agrave intimidade com sigilo bancaacuterio indicando que a quebra do sigilo pela Administraccedilatildeo Tributaacuteria natildeo constitui violaccedilatildeo ao direito Ao contraacuterio a existecircncia de um Estado Fiscal implica na necessidade de consagrar agrave administraccedilatildeo tributaacuteria tal faculdade o que se harmonishyza com diversos princiacutepios e outros direitos fundamentais constantes da Carta de 1988

O caso espanhol eacute exemplar neste sentido ao natildeo visualizar a vioshylaccedilatildeo ao direito agrave intimidade em relaccedilatildeo agrave quebra do sigilo bancaacuterio Portanto

el Tribunal Constitucional espaflOl se ha pronunciado por la negativa de que el conocimiento de las cuentas bancarias por la Administracioacuten pueda invadir el aacutembito constitucionalmente garantizado de la intimidad de los individuos porque tales extractos no constituyen per se uma biografiacutea personal en nuacutemeros y en siacute no tiene relevancia para la intimidad personal y familiar dei contribuyente ya que se trata de dados no secretos y confiados a una entidad (Campos Laura Rodriacuteguez Oerechos dei Contribuyente em la Repuacuteblica Argentina ai Amparo de la Convencioacuten Interamericana de Oerechos Humanos http wwwiefpaorgarcriteriosdigitalarticulosderechoshtm Visitado em 512001)

Ao analisar a jurisprudecircncia da Corte Constitucional espanhola quanto ao tema tambeacutem ressalta Saldanha Sanches

Na apreciaccedilatildeo da constitucionalidade da lei que permitia o controle administrativo das contas bancaacuterias o Tribunal Constitushycional espanhol realizou uma distinccedilatildeo entre intimidade pessoal e familiar e a intimidade econoacutemica onde a proteccedilatildeo constitucional eacute menos intensa

ENSAIOS JURiacuteDICOS 249

E procura fazer uma distinccedilatildeo entre a violaccedilatildeo agrave intimidade como consequumlecircncia de uma anaacutelise das contas bancaacuterias - coloshycando a hipoacutetese de uma recusa de cooperaccedilatildeo por parte do conshytribuinte se tal eventualidade se verificar - e a violaccedilatildeo directa da intimidade uma vez que esta natildeo pode resultar de uma mera anaacuteshylise de movimentos bancaacuterios (Saldanha Sanches J L A Situashyccedilatildeo Actual do Sigilo Bancaacuterio a Singularidade do Regime Portushyguecircs In Saldanha Sanches J L Estudos de Direito Contabiliacutestico e Fiscal Coimbra Coimbra Editora 2000 p 91)

Outro comentarista ao analisar a situaccedilatildeo do sistema espanhol quanto ao sigilo bancaacuterio e o direito agrave intimidade fez questatildeo de ressaltar

Seguacuten el r c frente a la Hacienda Puacuteblica no existe el derecho a la intimidad deI art 18 CE Ya la LO de 5 de mayo deI 82 vada praacutecticamente de contenido constitucional el derecho a la intimidado en cuanto el aacutembito de eacutesta queda deferido a la ley ordinaria (a 2ordm) y en cuanto que la esfera protegida frente a las Administraciones se reduce a poco O nada ai no reputarse intromisiones ilegiacutetimas las actuaciones autorizadas o acordadas por la Autoridad competente de acuerdo con la Ley (art 8ordm 1)

La LGTy el RI Iimiacutetan la esfera de la intimidad en las relacishyones con la Hacienda hasta el extremo de que solamenle existe un refugio limitado en el aacutembito deI secreto profesional en los casos de informacioacuten sobre terceros y siempre que no se trate de datos con transcendencia econoacutemica o tributaria EI rc no ha enconshytrado hasta el momento ni un solo supuesto de dato o informacioacuten econocircmica con transcendencia tributaria que limite la accioacuten inquisitiva de la Administracioacuten tributaria por razoacuten de intimidado Bien puede decirse por tanto que frente a la Administraciocircn tribushytaria en cuanto se trata deI ejercicio de su funciocircn de buacutesqueda de datos con transcendencia tributaria el derecho a la intimidad personal y familiar (art 18 I CE) no existe

La biacuteblia deI tribunal a estos efeclos estaacute constituida por la S 11084 reiterada en numerosas ocasiones ampliada en el Auto 64286 y reafirmada por ejemplo en la S 26 abril 90 tantas veces citada (FJ 10deg) Seguacuten esa doctrina la distribucioacutenjusta de la carshyga fiscal prevalece sobre el derecho a la intimidad parte dei art 812 I de la LO seguacuten el cual frente a la Ley (ordinaria) no hay intimidad protegida siempre que haya en dicha ley imperativos de intereacutes puacuteblico ( ) ni siquiera se habla dei predomiacutenio frente a la

250 SUPERIOR TRIBUNAl DE JUSTiCcedilA

intimidad de intereses u objetivos constitucionalmente protegidos Soacuteo admite que la actuadoacuten administrativa es arbitraria cuando no parezcajustificada por la Finalidad de la inspeccioacuten es decir cuando se trate de datos o informaciones que carezcan de transcendencia tributaria pero eacuteste obviamente no es sin Umite derivado dei derecho a la intimidad sino de la interdiccioacuten de arbitrariedad o desviacioacuten de poder de la Administracioacuten de la necesidad de ajuste de toda Administracioacuten ai acircmbito de su competencia que tanto vale para datos iacutentimos como para otros que no lo sean Seguacuten la S 11084 no hay esfera de intimidad proshytegida frente a una Administracioacuten tributaria amparada en una norma que elimina la intimidad como liacutemite (Garciacutea AIacuteloveros Jaime Una Nueva Ley General Tributaria Problemas Constitucioshynales In Kirchhof P et aI Garantiacuteas Constitucionales dei Contribuyente Valencia Tirant lo Blanch 1999 pp 109110)

Diante de tudo quanto foi exposto tendo-se o cuidado de registrar posicionamento de diferentes autores nacionais e estrangeiros haacute ambiente preparado para ser respondido o primeiro questionamento desdobrado em trecircs partes formulado para o 1II Coloacutequio Internacional de Direito Tributaacuterio promoccedilatildeo do Centro de Extensatildeo Universitaacuteria Eis a primeira parte do seu teor

O sigilo bancaacuterio diz respeito agrave intimidade e privacidade das pessoas

A resposta eacute optando por convencimento influenciado pelas ideacuteias da corrente predominante positiva

O nosso entendimento eacute no sentido de que o direito agrave intimidade integra os direitos da personalidade e visam proteger o direito agrave inviolabilidade do domiciacutelio da correspondecircncia das comunicaccedilotildees de quaisquer espeacutecies dos dados pessoais computadorizados do sigilo bancaacuterio O mesmo acontece com o direito agrave privacidade

A expansatildeo da proteccedilatildeo do direito agrave intimidade e agrave privacidade eacute uma consequumlecircncia da evoluccedilatildeo da era contemporacircnea nos setores tecnoloacutegicos e da instabilidade que passam as instituiccedilotildees estatais especialmente a encarreshygada de arrecadar tributos Haacute o reconhecimento de que desenvolve-se um processo de aguda corrosatildeo na proteccedilatildeo agrave intimidade que ao ser violada provoca a publicizaccedilatildeo das condutas mais iacutentimas do cidadatildeo

A concepccedilatildeo do sigilo bancaacuterio no acircmbito do direito agrave intimidade e agrave privacidade visa garantir ao homem o miacutenimo capaz para que lhe seja asseshygurada a sua condiccedilatildeo humana protegendo-o de ingerecircncias alheias como apregoa a Conferecircncia Noacuterdica sobre o Direito agrave Intimidade realizada em Estoshycolmo na data de maio de 1967 ao fazer inserir no documento que publicou a seguinte definiccedilatildeo O direito agrave intimidade eacute o direito do homem de viver de forma independente a sua vida com um miacutenimo de ingerecircncia alheia

ENSAIOS JURiacuteDICOS 251

5 Seguranccedila juriacutedica e acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias

A segunda pergunta apresentada pelos organizadores do coloacutequio estaacute assim posta

A seguranccedila das relaccedilotildees juriacutedicas atraveacutes do Sistema Financeiro pode ser afetada pelo acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves inforshymaccedilotildees bancaacuterias

O acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias se realizado caracteriza um atentado de suma gravidade aos direishytos do cidadatildeo Eacute um ataque aos princiacutepios sustentadores do sistema demoshycraacutetico adotado pelo constituinte de 1988 especialmente quando detonou que a Repuacuteblica Federativa do Brasil tem como objetivo fundamental o respeishyto agrave dignidade humana e agrave cidadania

Do ordenamento juriacutedico brasileiro a meu pensar natildeo haacute lugar para brotar qualquer interpretaccedilatildeo que conclua pela possibilidade de qualquer agenshyte do Poder Puacuteblico acessar de modo generalizado e sem motivaccedilatildeo informashyccedilotildees bancaacuterias do cidadatildeo mesmo com autorizaccedilatildeo judicial

Esclareccedilo desde logo que natildeo comungo com o pensamento de detershyminada corrente no sentido de ser absoluto o direito ao sigilo bancaacuterio Tenho-o como relativo poreacutem vinculado aos princiacutepios da razoabilidade da moralidade da legalidade e da motivaccedilatildeo expliacutecita e detalhada sob pena de ser impossiacutevel a sua quebra

O acesso indiscriminado do agente fiscal agraves informaccedilotildees bancaacuterias do cidadatildeo gera uma quebra da seguranccedila das relaccedilotildees juriacutedicas por um terceiro passar a ter sem causa justificadora conhecimento da vida iacutentima de algueacutem submetendo-o a partir daiacute a um regime de submissatildeo Por outro lado ninshygueacutem poderaacute garantir nem o proacuteprio Estado que o agente puacuteblico utilize os dados que chegaram ao seu conhecimento para outros intentos que natildeo o exclusivamente fiscal

Lembra Arnoldo Wald que O segredo na atividade bancaacuteria envolve concomitantemente interesses privaqos e coletivos que podem ser analisashydos sob trecircs acircngulos o interesse do cliente na sua relaccedilatildeo com a instituiccedilatildeo financeira o interesse do banco em atuar com discriccedilatildeo para ganhar a conshyfianccedila da populaccedilatildeo e captar recursos e o interesse social na existecircncia de um bom e eficiente sistema bancaacuterio Por estarem ligadas ao desenvolvimento da economia e aos interesses da comunidade as relaccedilotildees que envolvem as instishytuiccedilotildees financeiras natildeo recebem o mesmo tratamento juriacutedico dispendido a outras relaccedilotildees comerciais Inviaacutevel a aplicaccedilatildeo exclusiva das regras de Direito Privado as quais tecircm como princiacutepio norteador a autonomia da vontade pois

252 SUPERIOR TRIBUNAl DE JUSTiCcedilA

esta encontra limites nas normas cogentes proacuteprias do direito bancaacuterio e na intervenccedilatildeo do Estado8

A seguranccedila juriacutedica desse tipo de relaccedilatildeo envolve tambeacutem a manutenshyccedilatildeo do segredo das movimentaccedilotildees financeiras do contribuinte

Imprimir-se a mais ampla seguranccedila nas relaccedilotildees do Sistema Financeiro eacute fortalececirc-lo O Estado tem o dever de zelar por esse estado de seguranccedila natildeo permitindo consequumlentemente que o sigilo bancaacuterio seja quebrado pelo acesshyso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico por esse comportamento afeshytar a confiabilidade no sistema

Eacute de todo inconveniente permitir a possibilidade de um atuar do agente fiscal sem controle na quebra do sigilo bancaacuterio por afetar diretamente a seshyguranccedila da relaccedilatildeo juriacutedica firmada entre a instituiccedilatildeo financeira e o seu clienshyte em face deste sentir-se atingido pela accedilatildeo fiscal que passa a tomar conhecishymento de sua intimidade financeira e de fatos de sua vida privada sem o resshypaldo do Poder Judiciaacuterio

A seguranccedila juriacutedica nesse tipo de relaccedilatildeo deve assegurar impossibilidashyde de abuso de poder por parte do Fisco em face da necessidade de ser resshyguardada a garantia de que em um Estado de Direito natildeo pode ser concebido que conceda-se a uma parte mesmo que seja o Estado o domiacutenio absoluto de apanhar as provas que iraacute utilizar em caso de litiacutegio contra algueacutem

O acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias do contribuinte aleacutem de afetar a seguranccedila juriacutedica da relaccedilatildeo em questatildeo promove um desequiliacutebro entre o cidadatildeo-contribuinte e o Fisco por caracterizar coaccedilatildeo que coloca aquele em posiccedilatildeo de inferioridade

A valorizaccedilatildeo da seguranccedila juriacutedica da relaccedilatildeo existente entre instituiccedilatildeo financeira e contribuinte pelo Fisco natildeo quebrando o seu sigilo fiscal sem autorizaccedilatildeo judicial constitui causa de aplicaccedilatildeo de Justiccedila fiscal O seguimenshyto de seus princiacutepios valoriza o regime democraacutetico do qual ela faz parte

6 Casos de admissibilidade da quebra do sigilo bancaacuterio

Os casos de admissibilidade da quebra do sigilo bancaacuterio estatildeo na atuashylidade descritos no nosso ordenamento juriacutedico positivo

A Lei Complementar n 105 de 10 de janeiro de 2001 apoacutes determinar no art 112 de que as instituiccedilotildees financeiras conservaratildeo sigilo em suas operashyccedilotildees ativas e passivas e serviccedilos prestados dispotildee no sect 312 do mesmo artigo que

8 Arnoldo Wald no artigo Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais Revista dos Tribunais ano 6 n 22 janeiromiddotmarccedilo de 1998 n 22 Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas p 15

ENSAIOS JURiacuteDICOS 253

sect 3ordm Natildeo constitui violaccedilatildeo do dever de sigilo

I a troca de informaccedilotildees entre instituiccedilotildees financeiras para fins cadastrais inclusive por intermeacutedio de centrais de risco observadas as normas baixadas pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e pelo Banco Censhytral do Brasil

11 - o fornecimento de informaccedilotildees constantes de cadastro de emitentes de cheques sem provisatildeo de fundos e de devedores inadimplentes a entidades de proteccedilatildeo ao creacutedito observadas as norshymas baixadas pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e pelo Banco Central do Brasil

JJI - o fornecimento das informaccedilotildees de que trata o sect 2ordm do art II da Lei n 9311 de 24 de outubro de 1996

IV - a comunicaccedilatildeo agraves autoridades competentes da praacutetica de iliacutecitos penais ou administrativos abrangendo o fornecimento de inforshymaccedilotildees sobre operaccedilotildees que envolvam recursos provenientes de qualshyquer praacutetica criminosa

V - a revelaccedilatildeo de informaccedilotildees sigilosas com o consentimento expresso dos interessados

VI- a prestaccedilatildeo de informaccedilotildees nos termos e condiccedilotildees estabeleshycidos nos artigos 2ordm 3ordm 4ordm 5ordm 6ordm 7ordm e 9ordm desta lei complementar

sect 4ordm A quebra de sigilo poderaacute ser decretada quando necessaacuteria para apuraccedilatildeo de ocorrecircncia de qualquer iliacutecito em qualquer fase do inqueacuterito ou do processo judicial e especialmente nos seguintes crimes

I - de terrorismo

11 - de traacutefico iliacutecito de substacircncias entorpecentes ou drogas afins

III - de contrabando ou traacutefico de armas municcedilotildees ou material destinado a sua produccedilatildeo

IV - de extorsatildeo mediante sequumlestro

V - contra o sistema financeiro nacional

VI - contra a Administraccedilatildeo Puacuteblica

Vll- contra a ordem tributaacuteria e a previdecircncia social

VIII-lavagem de dinheiro ou ocultaccedilatildeo de bens direitos e valores

IX - praticado por organizaccedilatildeo criminosa

Como visto a lei complementar enumera inuacutemeras situaccedilotildees que indeshypendentemente de autorizaccedilatildeo judicial o sigilo bancaacuterio eacute quebrado

254 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

A dificuldade que se apresenta eacute a de conciliar os casos de quebra de sigilo bancaacuterio que a Lei Complementar n 105 autoriza com a garantia do direito agrave privacidade e agrave intimidade

Destaque-se entre os de maior relevacircncia os seguintes

- natildeo constituir violaccedilatildeo do dever de sigilo bancaacuterio a troca de informashyccedilotildees entre instituiccedilotildees financeiras para fins cadastrais inclusive por intermeacuteshydio de centrais de risco o que possibilita o conhecimento da vida financeira privada do cidadatildeo por vaacuterias pessoas sem desempenho de autoridade na instituiccedilatildeo independentemente de ser justificada com antecedecircncia a causa desse atuar

- o de serem fornecidos dados relativos a fornecimentos de informashyccedilotildees cadastrais de emitentes de cheques sem provisatildeo de fundos a entidades privadas de proteccedilatildeo ao creacutedito sem qualquer avaliaccedilatildeo por qualquer autorishydade da causa determinante do fato a quebra do sigilo bancaacuterio na fase do inqueacuterito por inexistir nessa ocasiaacuteo qualquer contraditoacuterio e respeito ao prinshyciacutepio do devido processo legal

Quanto agraves demais situaccedilotildees constantes na lei complementar que autorishyzam a quebra do sigilo bancaacuterio naacuteo obstante algumas serem absolutamente necessaacuterias haacute de serem vistas em compatibilidade com as garantias constitushycionais conforme jaacute assinalado

O colendo Supremo Tribunal pronunciaraacute como guarda e inteacuterprete maishyor da Carta Magna em ADln jaacute intentada sobre a constitucionalidade ou natildeo dos dispositivos supramencionados

Em campo doutrinaacuterio valoriza-se as posiccedilotildees apresentadas quando da resposta oferecida aos questionamentos anteriores todas acenando pela neshycessidade do controle do Poder Judiciaacuterio

7 Sistema mais justo para a quebra do sigilo bancaacuterio

Os organizadores do JII Coloacutequio Internacional de Direito Tributaacuterio subshymetem agora para anaacutelise a questatildeo do teor seguinte Um sistema em que o Poder Judiciaacuterio torna-se aacuterbitro dos pedidos da Administraccedilatildeo Puacuteblica para quebra do sigilo eacute o mais justo

Em um Estado que por imposiccedilatildeo de sua proacutepria Constituiccedilatildeo estaacute comprometido com a guarda e aplicaccedilatildeo efetiva de princiacutepios democraacuteticos especialmente o de respeitar os direitos e garantias fundamentais da cidadashynia natildeo haacute ambiente para que seja outorgado ao Poder Executivo por via da atuaccedilatildeo de agentes puacuteblicos fiscais o acesso sem o controle do Poder Judiciaacuteshyrio agraves informaccedilotildees bancaacuterias do contribuinte

ENSAIOS JURiacuteDICOS 255

o sigilo bancaacuterio por ser um direito fundamental que exige ser respeitashydo pela supremacia constitucional que o protege deve submeter a possibilishydade de sua quebra para fins tributaacuterios ao Poder Judiciaacuterio pela ausecircncia de interesse direto nos resultados da accedilatildeo fiscalizadora que eacute o recolhimento do tributo e pelas garantias de independecircncia prudecircncia e qualificaccedilatildeo juriacutedica que revestem esse poder

A atuaccedilatildeo da fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo pode ser exercida fora dos limishytes da legalidade imposta a partir da Carta Magna e demais imposiccedilotildees legais a ela subordinadas

Natildeo se desconhece que no atual Estado fiscal os tributos constituem os meios financeiros determinantes para o atendimento dos compromissos da Administraccedilatildeo Puacuteblica com as obrigaccedilotildees oriundas em decorrecircncia de sua atividade no campo educacional social de seguranccedila puacuteblica interna e extershyna da sauacutede da manutenccedilatildeo dos Poderes ou seja para manter funcionando a maacutequina estatal

Por natildeo entremostrar-se na eacutepoca contemporacircnea qualquer outra alshyternativa viaacutevel para transformar o Estado fiscal em um Estado produtivo os tributos passam a representar um indeclinaacutevel dever da cidadania cujo cumshyprimento deve ser por todos honrado conforme assinala Joseacute Casalta Nabais Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra em artigo intitulado Algumas Reflexotildees sobre o Actual Estado Fiscal

Por isso os impostos hatildeo de constituir um preccedilo aceitaacutevel ou seja um preccedilo limitado Um preccedilo que estou certo muitas das sociedashydes que nos antecederam gostariam de ter pago e algumas das actuais natildeo enjeitariam suportar Por isso bem podemos afirmar como jaacute o fizeshymos noutro lugar que no actual Estado fiscal para o qual natildeo se vislumshybra qualquer alternativa viaacutevel pelo menos nos tempos mais proacuteximos os impostos constituem um indeclinaacutevel dever de cidadania cujo cumshyprimento a todos nos deve honrar

A atuaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio para liberar o bloqueio fortalece a conshyfianccedila do cidadatildeo no procedimento da fiscalizaccedilatildeo e consagra a ideacuteia iacutensita em qualquer regime democraacutetico de que a atuaccedilatildeo do Estado tem limites

Na espeacutecie os limites impostos satildeo os decorrentes da quebra do sigilo ser necessaacuterio em face da possiacutevel ilicitude cometida pelo cidadatildeo poreacutem sem ser violados os direitos do cidadatildeo de gozar da sua privacidade e da sua intimidade

A denominada cidadania fiscal haacute de ser considerada de modo conjunshytural com os reflexos dos direitos fundamentais assegurados ao contribuinte sem prestigiar a responsabilidade que tem o Estado de promover a arrecadashyccedilatildeo dos tributos

256 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

Cedo espaccedilo para registrar que a cidadania fiscal deve configurar um estado de relaccedilatildeo juriacutedica em que todos suportem a concretizaccedilatildeo de um Estado em que todos tenham a qualidade de destinataacuterio do dever fundashymentaI de pagar impostos na medida da respectiva capacidade contributiva poreacutem que seja um Estado fiscal suportaacutevel isto eacute um estado cujo sistema fiscal se encontre balizado por estritos limites juriacutedico-constitucionais9

A Administraccedilatildeo Tributaacuteria por melhor que seja a sua estrutura e os seus propoacutesitos natildeo estaacute emocionalmente preparada para conceber e aplicar os princiacutepios que sustentam a cidadania fiscal Isso ocorre primeiramente porshyque o Fisco tem por missatildeo exclusiva exercer a funccedilatildeo de arrecadar tributos Eacute a sua meta essencial por ser atribuiccedilatildeo que na organizaccedilatildeo administrativa estatal estaacute obrigado a desempenhar Natildeo lhe cabe administrar o tributo arreshycadado limitando-se unicamente a envidar esforccedilos para o cumprimento das metas impostas para imprimir aumento na arrecadaccedilatildeo tributaacuteria O sucesso da Administraccedilatildeo Tributaacuteria eacute medido pelo maior volume de recursos fiscais atraiacutedos para os cofres do Governo nunca pelo respeito que exerccedila para com os direitos fundamentais do contribuinte Eacute uma questatildeo de cultura adminisshytrativa de distribuiccedilatildeo de funccedilotildees no sistema estatal impossiacutevel de ser mudashydo por sugestotildees doutrinaacuterias

Por outro lado a fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo consegue afastar as pressotildees exercidas sobre ela por determinados segmentos da organizaccedilatildeo estatal que defendem uma atuaccedilatildeo mais agressiva para a cobranccedila dos tributos tudo em decorrecircncia dos efeitos produzidos pela conduta iliacutecita marcante da sonegashyccedilatildeo fiscal

Esses fatores contribuem para que a fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo tenha condiccedilotildees de modo imparcial sem isenccedilatildeo avaliar a necessidade objetiva da quebra do sigilo bancaacuterio do cidadatildeo Por melhor que seja o seu desempenho nunca ganharaacute a confianccedila do contribuinte

A atribuiccedilatildeo da quebra do sigilo bancaacuterio em um regime democraacutetico onde predomina o respeito maior aos direitos fundamentais da cidadania deve ser exercido pelo Poder Judiciaacuterio natildeo soacute porque seus membros atualmente revestidos da garantia da vitaliciedade inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos bem como porque estatildeo revestidos de independecircncia absoluta em relaccedilatildeo ao Poder interessado na cobranccedila do tributo e consequumlentemenshyte no resultado a ser obtido pela accedilatildeo fiscal

Esse sistema misto onde o Fisco faz a solicitaccedilatildeo motivada para a queshybra do sigilo bancaacuterio ao Poder Judiciaacuterio e este apoacutes analisaacute-lo com objetivishydade e cautela defere ou indefere impotildee seguranccedila e confiabilidade na atuashyccedilatildeo fiscal e sublima o respeito agrave dignidade do contribuinte em outras palavras da cidadania fiscal isto eacute de uma cidadania de liberdade que o Estado fiscal

9 Joseacute Casalta Nabais (Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra) no artigo Algumas Reflexotildees sobre o Actual Estado Fiscal no site httpagugovbr

ENSAIOS JURiacuteDICOS 257

pressupotildee para natildeo ser postergada impotildee um sistema fiscal balizado por esshytritos limites juriacutedico-constitucionais Limites esses que integram a chamada constituiccedilatildeo fiscal e que podemos reconduzir para natildeo nos alongarmos nesse aspecto a duas ideacuteias uma ideacuteia de seguranccedila que tem o seu tradicional e principal suporte no princiacutepio da lega1idade fiscal e uma ideacuteia de justiccedila ou equumlidade que tem a ver com a medida dos impostos e assenta no princiacutepio da capacidade contributiva 10

Em conclusatildeo a adoccedilatildeo de um sistema para a quebra do sigilo bancaacuteshyrio em que o Poder Judiciaacuterio seja o aacuterbitro dos pedidos da Administraccedilatildeo Puacuteblica natildeo eacute somente mais justo mas consegue impor maior credibilidade agrave atuaccedilatildeo fiscal e presta homenagem com intensa potencialidade aos princiacuteshypios democraacuteticos consistentes na guarda da seguranccedila juriacutedica do respeito aos direitos fundamentais do cidadatildeo nesse rol incluidos os agrave privacidade e agrave intimidade Aleacutem disso torna mais respeitaacutevel a relaccedilatildeo entre Fisco e contrishybuinte justificando portanto a opccedilatildeo do Estado pelo regime democraacutetico

8 Autoridade fiscal e faculdade incondicionada de quebrar o sigilo bancaacuterio

Essa indagaccedilatildeo consubstancia a preocupaccedilatildeo de serem estabelecidos controles para a atuaccedilatildeo do agente puacuteblico fiscal Centra-se a preocupaccedilatildeo em imprimir nas relaccedilotildees juriacutedicas tributaacuterias de quaisquer espeacutecies o primashydo da legalidade aprimorando-se o atuar vinculado

Natildeo concilia-se com os postulados da democracia a adoccedilatildeo de um sisteshyma de fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria que outorgue faculdade incondicionada ao fiscal tributaacuterio de invadir a intimidade e a privacidade das pessoas sob o falso argushymento juriacutedico de que busca encontrar provas de sonegaccedilatildeo fiscal

Depreende-se do exposto que a autoridade fiscal natildeo deve ter faculdade incondicionada de quebrar o sigilo sempre que entender necessaacuterio Isso porshyque a praacutetica de atos administrativos por agentes puacuteblicos de modo incondicionado revela grave violaccedilatildeo ao princiacutepio da legalidade onde predoshymina a vontade da lei e natildeo o discricionarismo de quem o pratica

No trato do sigilo bancaacuterio o atuar incondicionado da fiscalizaccedilatildeo assushyme caracteriacutesticas de maior gravidade porque haacute violaccedilatildeo aos princiacutepios funshydamentais jaacute expostos e que satildeo prestigiados pela Carta Magna especialmenshyte por bater de frente de modo integral e absoluto com o direito agrave intimidade e agrave privacidade O atuar deve vincular-se rigidamente ao princiacutepio da legalidashyde especialmente aposta na Carta Magna sem a possibilidade de ser aberto qualquer canal para uso da conveniecircncia ou da oportunidade

Eacute de ser lembrada no trato do assunto a liccedilatildeo de Joseacute Casalta Nobais no trabalho jaacute citado no sentido de que Eacute certo que independentemente da

10 Idem p 15

=258=---___________________ SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTlCA

concepccedilatildeo a que se adira relativamente ao segredo bancaacuterio natildeo temos a menor duacutevida de que o acesso da Administraccedilatildeo Fiscal agrave informaccedilatildeo bancaacuteria seja directo sem necessidade de preacutevia decisatildeo judicial seja indirecto depois portanto de preacutevia decisatildeo judicial haacute de ter sempre uma natureza claramenshyte excepcional Na verdade constitua o segredo bancaacuterio uma manifestaccedilatildeo do direito fundamental agrave reserva da intimidade da vida privada constante do art 26 n 2 da Constituiccedilatildeo portuguesa ou suporte um outro direito fundashymentai um direito agrave reserva da vida privada anaacutelogo agravequele a sua afectaccedilatildeo teraacute sempre caraacuteter excepcional

A autoridade fiscal natildeo possui a necessaacuteria isenccedilatildeo e competecircncia institucional para averiguar o grau dessa excepcionalidade de modo que posshysa impor confianccedila ao cidadatildeo investido na condiccedilatildeo de contribuinte poreacutem com direitos a serem assegurados por forccedila do regime democraacutetico adotado

O certo eacute que na relaccedilatildeo juriacutedico-tributaacuteria deve ser buscado o justo equiliacutebrio pregado pelo Estado de Direito onde o cidadatildeo deve ter a sua dignishydade respeitada sem contudo afastar-se a necessidade do Estado arrecadar tributos de forma cogente e imperativa bem como de serem permitidas conshydiccedilotildees de atuaccedilatildeo que resultem no combate agrave sonegaccedilatildeo fiscal

9 Responsabilidade da autoridade administrativa que quebrar o sigilo banshycaacuterio de forma inconsistente e indevida

Eacute inerente ao regime democraacutetico que a autoridade administrativa puacuteblishyca estaacute obrigada a exercer as suas atribuiccedilotildees com rigorosa obediecircncia aos princiacutepios da legalidade moralidade publicidade impessoalidade e eficiecircncia entre outros

A Carta Magna consagra expressamente no art 37 a obediecircncia do agente puacuteblico a esse tipo de comportamento

A autoridade administrativia que quebrar de modo inconsistente e indevido o sigilo bancaacuterio do cidadatildeo pratica ato com capacidade de provocar os seguintes efeitos a) de invadir o direito agrave privacidade e agrave intimidade de algueacutem b) de provocar-lhe danos morais e materiais dependendo da repershycussatildeo provocada pelo seu atuar

Constatada a efetivaccedilatildeo real de danos morais e materiais a responsabishylidade do Estado pode ser acionada conforme permite o art 37 sect 6ordm da Consshytituiccedilatildeo Federal Solidificada a culpa ou dolo do agente puacuteblico e consagrada a materializaccedilatildeo do iliacutecito praticado com o consequumlente ressarcimento patrimonial o Estado deveraacute usando o direito de regresso investir contra o agente que agiu culposa ou dolosamente

Natildeo resume-se apenas ao campo da responsabilidade civil a atuaccedilatildeo da autoridade quando ilegalmente quebra o sigilo bancaacuterio de qualquer cidadatildeo

ENSAIOS JURiacuteDICOS 259

o art 10 da Lei Complementar n 105 de 10 de janeiro de 2001 determishyna que A quebra de sigilo fora das hipoacuteteses autorizadas nesta lei compleshymentar constitui crime e sujeita os responsaacuteveis agrave pena de reclusatildeo de um a quatro anos e multa aplicando-se no que couber o Coacutedigo Penal sem prejuiacuteshyzo de outras sanccedilotildees cabiacuteveis A seguir no seu paraacutegrafo uacutenico explicita que Incorre nas mesmas penas quem omitir retardar injustificadamente ou presshytar falsamente as informaccedilotildees requeridas nos termos desta lei complementar

O art 11 da mesma lei complementar expressa que O servidor puacuteblico que utilizar ou viabilizar a utilizaccedilatildeo de qualquer informaccedilatildeo obtida em decorshyrecircncia da quebra de sigilo de que trata esta lei complementar responde pessoshyal e diretamente pelos danos decorrentes sem prejuiacutezo da responsabilidade objetiva da entidade puacuteblica quando comprovado que o servidor agiu de acorshydo com a orientaccedilatildeo oficial

10 O sigilo bancaacuterio e o tratamento que lhe eacute dado por oacutergatildeos internacioshynais como a OCDE e outros

Rui Celso Reali Fragoso Presidente do Instituto dos Advogados de Satildeo Paulo em artigo intitulado O Sigilo Bancaacuterio veiculado pela Internet (http Ii wwwjuscombr) registra que atualmente temos trecircs sistemas legais no munshydo cuidando do sigilo bancaacuterio O primeiro eacute o anglo-saxatildeo em que o sigilo natildeo encontra amparo legal o segundo eacute o dos paiacuteses da Europa continental - eu o contemplo em vaacuterios diplomas legais o terceiro eacute o da Suiacuteccedila e do Liacutebano que o reforccedilam

Analisando esses trecircs sistemas o autor citado observa

Haacute aparente contradiccedilatildeo no sistema inglecircs e norte-americano pois se de um lado nestes paiacuteses se eleva a garantia das liberdades individuais de outro se despreza o sigilo bancaacuterio Eacute que se ocorre conshyflito entre a apuraccedilatildeo de fatos (fator social) e a privacidade das pessoas (fator individual) prevalece a primeira Mais ainda o relacionamento de clientes e bancos longe de estabelececirc-lo serve como fonte de informashyccedilatildeo em favor de terceiros a indiscriccedilatildeo injustificada poreacutem eacute objeto de sanccedilatildeo E na Inglaterra os poderes puacuteblicos natildeo intervecircm no funcionashymento dos estabelecimentos privados de creacutedito o que debilita a invesshytigaccedilatildeo

Nos paiacuteses da Europa continental a legislaccedilatildeo contempla o sigilo bancaacuterio como consequumlecircncia do profissional e comporta derrogaccedilotildees na esfera penal e em alguns casos na civil mas comina sanccedilotildees crimishynais no caso de violaccedilatildeo ao sigilo (Coacutedigo Penal francecircs artigo 378 Coacuteshydigo Penal italiano art 622)

260 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

A sistemaacutetica fortalecida eacute aquela utilizada na Suiacuteccedila decorrente da crise ocorrida em 1931 com o fechamento do Banco de Genebra que ensejou a ediccedilatildeo de lei estabelecendo severas puniccedilotildees de natureza civil e criminal Tanto a legislaccedilatildeo suiacuteccedila como a libanesa esta surgida em 1956 permitem derrogaccedilotildees em certas hipoacuteteses A existecircncia das conshytas numeradas comprova a importacircncia do sigilo nestes paiacuteses

Eacute certo natildeo ser absoluto o segredo nem sua quebra em determishynadas situaccedilotildees significa abuso de poder Aliaacutes nenhum direito eacute absoluto

A doutrina tem ultimamente tomado conhecimento sobre as transforshymaccedilotildees que tem passado em vaacuterios ordenamentos juriacutedicos a questatildeo do sigilo bancaacuterio

Zenobio Simotildees de Melo advogado no Paranaacute em artigo sob o tiacutetulo Quebra do Sigilo Bancaacuterio (Internet httpjuscombr) informa que o jornal O Estado de Satildeo Paulo de 21 de junho de 2000 publicou a notiacutecia seguinte

Numa das mais importantes decisotildees adotadas durante o Conseshylho Europeu que marca o fim da presidecircncia portuguesa da Uniatildeo Euroshypeacuteia (UE) seus 15 paiacuteses aprovaram ontem o pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal No ponto mais polecircmico o pacote deveraacute acabar com o sigilo bancaacuterio ateacute 2010 foi uma negociaccedilatildeo de 12 anos Aacuteustria e Luxemburgo natildeo aceitavam o princiacutepio de acabar com o sigilo bancaacuterio A justificativa austriacuteaca eacute que este eacute um princiacutepio que faz parte da Consshytituiccedilatildeo do paiacutes haacute 200 anos Para aceitar o acordo o paiacutes exigiu a manushytenccedilatildeo do sigilo nos bancos austriacuteacos para quem resida no paiacutes

Registro a iacutentegra da notiacutecia

Pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal eacute aprovado por membros da UE Decisatildeo prevecirc quebra do sigilo bancaacuterio nos paiacuteses do bloco econocircmico

Jair Rattner

Especial para o Estado

Santa Maria da Feira Portugal- Numa das mais importantes decishysotildees adotadas durante o Conselho Europeu que marca o fim da presishydecircncia portuguesa da Uniatildeo Europeacuteia (UE) seus 15 paiacuteses aprovaram ontem o pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal No ponto mais polecircmico o pashycote deveraacute acabar com o sigilo bancaacuterio ateacute 2010

Foi uma negociaccedilatildeo de 12 anos Agora temos um documento que vai estabelecer os princiacutepios e as orientaccedilotildees para as futuras diretivas nessa aacuterea afirmou o Primeiro-Ministro Portuguecircs Antonio Guterres que ocupa a presidecircncia rotativa da UE (no fim do mecircs ela seraacute transferida para a Franccedila)

ENSAIOS JURiacuteDICOS 261

o acordo abrange trecircs aacutereas um coacutedigo de conduta que prevecirc o desmantelamento dos 66 paraiacutesos fiscais existentes ou dependentes da UE a tributaccedilatildeo de royalties e o pagamento de impostos sobre rendishymentos das poupanccedilas de cidadatildeos europeus residentes em outros paiacuteshyses dentre os 15 que fazem parte do bloco econocircmico europeu

O grande problema eram as poupanccedilas Aacuteustria e Luxemburgo natildeo aceitavam o princiacutepio de acabar com o sigilo bancaacuterio A justificativa austriacuteaca eacute que este eacute um princiacutepio que faz parte da Constituiccedilatildeo do paiacutes haacute 200 anos Para aceitar o acordo o paiacutes exigiu a manutenccedilatildeo do sigilo nos bancos austriacuteacos para quem resida no paiacutes Essa questatildeo natildeo eacute importante soacute para a Europa porque abre caminho para a criaccedilatildeo de mecanismos de transparecircncia global no mundo financeiro que satildeo esshysenciais para a globalizaccedilatildeo da economia avaliou Guterres

O prazo para a introduccedilatildeo das mudanccedilas vai ateacute o fim de 2010 Ateacute o fim deste ano as negociaccedilotildees vatildeo ser sobre a definiccedilatildeo do conteuacutedo das diretivas (as normas da UE)

Em 2002 a UE discutiraacute com outros paiacuteses esses conteuacutedos para fazer acordos que deveratildeo ser aprovados ateacute o fim do ano por unanimishydade

A partir de 2003 seraacute iniciado um periacuteodo de sete anos de transishyccedilatildeo para a troca de informaccedilotildees sobre os investimentos de cidadatildeos de outros paiacuteses europeus Nesse periacuteodo alguns paiacuteses poderatildeo optar por cobrar impostos de 20 a 25 sobre os rendimentos dos investimentos de residentes no exterior

No capiacutetulo onde foi analisado o sigilo bancaacuterio no Direito Comparado haacute registros tambeacutem a respeito do tratamento que oacutergatildeos internacionais como o OCDEll e outros vecircm dando ao sigilo bancaacuterio conforme estudo que foi apresentado pelo autor ali citado

II OCDE (Organizaccedilatildeo de Cooperaccedilatildeo e Desenvolvimento Econocircmico) criado em 1961 para substituir a OECE (Comitecirc Fiscal da Organizaccedilatildeo Europeacuteia de Cooperaccedilatildeo Econocircmica) Um dos documentos mais importantes da OCDE eacute o resultante da sua Convenccedilatildeo-Modelo relashytiva a impostos sobre a renda e o capital Essa Convenccedilatildeo estaacute sistematizada em sete capiacutetulos assim explicitados por Alberto Xavier em sua obra Direito Tributaacuterio Internacioshynal do Brasil A Convenccedilatildeo-Modelo da OCDE (tal como a das Naccedilocirces Unidas) encontra-se sistematizada em sete capiacutetulos Os capiacutetulos I e I regulam os requisitos para a aplicaccedilatildeo do tratado O capiacutetulo [JI - de longe o mais importante - conteacutem as regras de distribuiccedilatildeo de competecircncia no que concerne aos impostos sobre o rendimento classificado este por tipos ou classes agrave semelhanccedila do que sucede nos sistemas de tributaccedilatildeo cedular O capiacutetulo IV ocupa-se das regras de distribuiccedilatildeo de competecircncia no que respeita aos impostos sobre o capital O capiacutetulo V determina as consequumlecircncias das regras dos capiacutetulos 111 e IV facultanshydo aos Estados a escolha entre os meacutetodos da isenccedilatildeo e da imputaccedilatildeo O capiacutetulo VI conteacutem disposiccedilotildees adicionais sobre natildeo-discriminaccedilatildeo procedimento amigaacutevel troca de informaccedilotildees e privileacutegios de funcionaacuterios diplomaacuteticos e consulares e regras sobre extenshysatildeo do tratado a partes do territoacuterio Enfim o capiacutetulo VII conteacutem disposiccedilotildees finais sobre entrada em vigor e cessaccedilatildeo do acordo

262 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

Heleno Torres em sua recente obra Direito Tributaacuterio Internacional -Planejamento Tributaacuterio e Operaccedilotildees Transnacionais RT p 147 analisando o posicionamento da OCDE referente agrave poliacutetica de determinados paiacuteses que adoshytam tributaccedilatildeo favorecida e os efeitos dos regimes fiscais prejudiciais registra que

A OCDE resolveu entrar na luta para minorar as praacuteticas fiscalshymente danosas insistindo sobre a necessidade de aumentar as trocas de informaccedilotildees entre os Estados aleacutem de redigir uma lista de paiacuteses com tributaccedilatildeo favorecida e fazer algumas recomendaccedilotildees em acircmbito nacional e convencional a partir do seu importante relatoacuterio Harmful tax competition na emerging global issue

Mesmo reconhecendo os aspectos positivos do ambiente global vigente no qual os sistemas tributaacuterios operam os paiacuteses-membros da OCDE concluiacuteram que eles precisavam agir para restringir a competiccedilatildeo tributaacuteria danosa coletivamente e individualmente opondo-se agrave expanshysatildeo de regimes de impostos preferenciais danosos particularmente nos setores financeiros e atividades de serviccedilo que podem causar distorccedilotildees no comeacutercio e desniacuteveis nos padrotildees de investimento sendo uma ameashyccedila para os sistemas tributaacuterios domeacutesticos e para a estrutura global de tributaccedilatildeo internacional

Mais adiante pp 152153 Heleno Torres afirma que

Entre as recomendaccedilotildees definidas nesse relatoacuterio com aplicashyccedilatildeo dirigida aos paiacuteses-membros da instituiccedilatildeo as mais importantes satildeo as seguintes

bull para contrastar a competiccedilatildeo fiscal prejudicial os paiacuteses devem revisar as suas leis regulamentos e praacuteticas sobre sigilo bancaacuterio para remover empecilhos de acesso a tais informaccedilotildees por autoridades fiscais

bull intensificar o uso de trocas de informaccedilotildees principalmente soshybre as transaccedilotildees com paiacuteses de tributaccedilatildeo favorecida

A conclusatildeo que pode ser firmada apoacutes anaacutelise dos pronunciamentos internacionais acima explicitados eacute a construccedilatildeo de uma corrente que defenshyde uma maior abertura para a quebra do sigilo bancaacuterio quando for necessaacuteshyrio para apurar iliacutecitos tributaacuterios

Essa portanto eacute a resposta que apresento para a indagaccedilatildeo Qual o tratamento proposto por oacutergatildeos internacionais como o OCDE e outros com relaccedilatildeo ao sigilo bancaacuterio

ENSAIOS JURiacuteDICOS 263

11 Compatibilizaccedilatildeo do combate agrave criminalidade internacional com o resshypeito agrave seguranccedila juriacutedica a fim de evitar a fuga de investimentos do Paiacutes

Haacute de se reconhecer natildeo ser faacutecil desenvolver-se um sistema juriacutedico que contenha regras que facilitem o combate agrave criminalidade internacional e ao mesmo tempo prestigie os direitos fundamentais do cidadatildeo especialmenshyte a sua seguranccedila juriacutedica

As convenccedilotildees internacionais conforme demonstrado estatildeo preocupashydas com esses aspectos sem deixar de lado os fenocircmenos causados pela globalizaccedilatildeo

Natildeo deve ser esquecido que o tema envolve aspectos diversos a comeshyccedilar pelos determinantes da soberania dos Estados das forccedilas em expansatildeo das organizaccedilotildees internacionais e da pregaccedilatildeo para que os direitos fundamenshytaIacutes do cidadatildeo sejam respeitados com maior Iacutentensidade

A soluccedilatildeo a meu pensar pode ser encontrada no fortalecimento do Direito Comunitaacuterio Os Estados por via de organismos internacionais firmashyriam tratados para a adoccedilatildeo de um Coacutedigo Processual Penal Internacional com efeitos vinculantes por parte das naccedilotildees onde seriam adotadas regras investigatoacuterias e apuratoacuterias dos iliacutecitos internacionais alargando os conceitos de indiacutecios e presunccedilotildees sem deixar contudo de prestigiar a afetividade dos direitos e garantias fundamentais do cidadatildeo

Todas as naccedilotildees no iniacutecio deste seacuteculo envidam esforccedilos para diminuir a crise da seguranccedila juriacutedica Satildeo vaacuterios os fatores determinantes todos tendo como causa comum o crescimento da delinquumlecircncia em decorrecircncia de poliacutetishycas econocircmicas e sociais adotadas por determinados governos que contrishybuem para aumentar o percentual de pessoas pobres

A preocupaccedilatildeo atual para o combate ao crime internacional eacute alcanccedilar niacutevel de uniformizaccedilatildeo dos sistemas adotados para a quebra do sigilo bancaacuteshyrio De iniacutecio deve ser defendida a postura de que nenhuma lesatildeo ou ameaccedila a direito deve ser excluiacuteda da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio Nessa perspectishyva ganha suma importacircncia a criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional em virshytude de pela sua atuaccedilatildeo natildeo perdurar a diversidade de sistemas legais a respeito do assunto a saber a) O anglo-saxatildeo onde o sigilo natildeo encontra amparo legal b) o dos paiacuteses da Europa continental que o contempla em vaacuterios diplomas escritos e c) o da Suiacuteccedila e do Liacutebano que o reforccedilam l2bull

A criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional envolve uma reconceiacutetuaccedilatildeo de soberania

Sobre o tema Celso D de Albuquerque Mello em Direito Internacional da Integraccedilatildeo Ed Renovar p 13 faz a seguinte observaccedilatildeo

12 Conforme anota Rui Celso Reali Fragoso no artigo O Sigilo Bancaacuterio publicado no site httpvvwwjuscombr

264 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Poder-se-ia fazer um pequeno reparo a Chaumont que a indeshypendecircncia nacional eacute um conceito juridicamente indeterminado e que ela pode ter diferentes graus Tanto que podemos escrever soberania versus cooperaccedilatildeo internacional apesar de reconhecermos que esta posiccedilatildeo pode ser considerada como radical vez que natildeo haacute uma total incompatibilidade entre as duas Entretanto natildeo se pode deixar de consshytatar que de certo modo a cooperaccedilatildeo internacional se encontra conshysagrada na Carta da ONU no arl 1 ordm que trata dos Propoacutesitos das Naccedilotildees Unidas e nos Princiacutepios estabelecidos na Carta da OEA (Capiacutetulo 11) O mesmo ocorre na resoluccedilatildeo da Assembleacuteia Geral da ONU de 1970 que aprova a Declaraccedilatildeo Relativa aos Princiacutepios do Direito Internacional Reshylativas agraves Relaccedilotildees Amigaacuteveis e agrave Cooperaccedilatildeo entre os Estados conforme a Carta das Naccedilotildees Unidas bem como na Carta de Direitos e Deveres Econocircmicos aprovada pela mesma Assembleacuteia Geral em 1974

O crescimento do crime internacional em decorrecircncia dos fenocircmenos globalizantes determina o surgimento de um dever juriacutedico dos Estados firmashyrem pactos de cooperaccedilatildeo entre si para que enfrentem as organizaccedilotildees voltashydas para a criminalidade Esse dever juriacutedico globalizado tem suas raiacutezes no moral intemacional que conforme assinala Celso Albuquerque Mello na obra citada p 13 sempre consagrou o princiacutepio da solidariedade ou ainda do auxiacutelio muacutetuo

Eacute o mais importante desafio neste iniacutecio de seacuteculo fazer com que surja uma legislaccedilatildeo internacional que compatibilize o combate agrave criminalidade inshyternacional sem violar a seguranccedila juriacutedica com finalidade exclusiva de evitar a fuga de investimenos do Paiacutes

Tenha-se contudo em consideraccedilatildeo que a globalizaccedilatildeo do crime emshybora seja uma grande ameaccedila aos valores tradicionais que sustentam a cidashydania especialmente a seguranccedila juriacutedica natildeo deve prejudicar o desenvolvishymento econocircmico de qualquer naccedilatildeo

Natildeo faccedilo coro ao assinalado por Eric Hobsbawm em sua obra Era dos Extremos O Breve Seacuteculo XX 1914-1991 1995 p 24 Companhia das Letras S Paulo traduccedilatildeo de Marcos Santarrita no sentido de que Talvez a caracteriacutesshytica mais impressionante do fim do seacuteculo XX seja a tensatildeo entre esse processo de globalizaccedilatildeo cada vez mais acelerado e a incapacidade conjunta das instishytuiccedilotildees puacuteblicas e do comportamento coletivo dos seres humanos de se acoshymodarem a ele

Penso que natildeo haacute essa acomodaccedilatildeo e que as instituiccedilotildees puacuteblicas espeshycialmente as submetidas ao controle da ciecircncia juriacutedica natildeo estatildeo incapacitashydas de encontrar caminhos que solucionem o problema existente

ENSAIOS JURiacuteDICOS 265

Eacute por demais positivo entre outros acontecimentos o fato da conscienshytizaccedilatildeo de que haacute de ser encontrada uma forma de combate agrave criminalidade internacional que natildeo afaste a garantia da seguranccedila juriacutedica Esta eacute uma neshycessidade para impor paz agrave naccedilatildeo e consequumlentemente criar ambiente para que novos investimentos necessaacuterios ao desenvolvimento do seu processo econocircmico aconteccedilam sem se falar na manutenccedilatildeo dos jaacute existentes

O Parlamento Europeu aprovou ultimamente uma resoluccedilatildeo sobre a criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional sob a consideraccedilatildeo de que eacute necessaacuteshyrio criaacute-lo de forma permanente para complementar os sistemas judiciais nashycionais e pocircr fim agrave impunidade de que gozam os responsaacuteveis por genociacutedio crimes contra a humanidade e crimes de guerra

A abertura para essa posiccedilatildeo denota a formaccedilatildeo de uma consciecircncia internacional para combater a criminalidade internacional em todos os niacuteveis contribuindo para fortalecer a seguranccedila juriacutedica interna de cada paiacutes

O documento representativo dessa resoluccedilatildeo eacute do teor seguinte

Parlamento Europeo

Resolucioacuten sobre el Tribunal Penal Internacional

EI Parlamento Europeo

Vistas sus anteriores resoluciones sobre un Tribunal Penal Interna-cional

A Considerando que es necesario crear un Tribunal Penallnternashycional permanente que complemente los sistemasjudiciales nacionales y ponga fin a la impunidad de que gozan los responsables de genocidio crimenes contra la humanidad y criacutemenes de guerra

B Considerando que la Comisioacuten de Derechos Humanos de las Naciones Unidas estaacute respaldando decididamente la creacioacuten de ese Trishybunal

C Considerando que la fase preparatoria de la creacioacuten dei Tribushynal Penal Internacional finalizoacute con la uacuteltima sesioacuten dei Comiteacute Preparatorio de las Naciones Unidas que tuvo lugar dei 16 de marzo al3 de abril de 1998

D Felicitaacutendose por la creciente participacioacuten de Estados en el proceso de negociaciones y esperando que un nuacutemero auacuten mayor de Esshytados procedentes de todas las regiones se encuentre plenamente represhysentado en la Conferencia Diplomaacutetica de Roma

E Considerando que dei 15 de junio al17 de julio de 1998 se celebra en Roma la Conferencia Diplomaacutetica de Plenipotenciarios para la constitucioacuten de un Tribunal Penal Internacional

266 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

F Considerando que los Estados miembros y la delegacioacuten de la Comisioacuten Europea que participan en la Conferencia Diplomaacutetica de Roma pueden desempenar un papel crucial a la hora de garantizar el eacutexito de la conclusioacuten de esta Conferencia Diplomaacutetica y acogiendo positivamente la mayor convergenciacutea de las posturas de los Estados miembros de la UE

G Congratulaacutendose por la oferta dei Gobierno de los Paiacuteses Bajos de servir de sede dei Tribunal Penal Internacional permanente

I Insta a la Conferencia Diplomaacutetica de Roma a aprovechar la oportunidad histoacuterica de concluir un texto de Estatuto para un Tribunal Penal Internacional independiente justo y eficaz

2 Insta a los representantes de los Estados miembros dei Consejo y de la Comisioacuten a garantizar activamente el ecircxito de los resultados a sashyber un auteacutentico Tribunal Penal Internacional en lugar de limitarse a un acuerdo de compromiso sobre principios esenciales en sus esfuerzos por conciliar las posturas de Estados reticentes

3 Destaca que para constituir un complemento eficaz de los sisteshymas judiciacuteales nacionales el Estatuto dei Tribunal Penal Internacional permanente objeto de la Conferencia de Roma deberaacute establecer

a un Fiscal independiente con competencias para investigare insshytruir sumarios por propia iniciativa en situaciones en las que se hayan cometido los delitos sometidos a lajurisdiccioacuten dei Tribunal

b Ia jurisdiccioacuten inherente y universal dei Tribunal en materia de genocidio criacutemenes contra la humanidad criacutemenes de guerra y agresioacuten sin que se requiera ninguacuten consentimiento dei Estado

c una buena relacioacuten de trabajo con los Tribunales lnternacionales ya establecidos en La Haya

d una relacioacuten constructiva con las Naciones Unidas yen partishycular con el Consejo de Seguridad basada en el pleno reconocimiento de sus respectivas funciones y competencias

e Ia obligacioacuten de los Estados firmantes de acatar y hacer cumplir sin demora las oacuterdenes y decisiones dei Tribunal

f los mayores niveles de respeto de los derechos de los acusados y de los sospechosos y de proteccioacuten de los intereses de las viacutectimas y de los testigos

g Ia garantiacutea de una financiacioacuten a largo plazo necesaria para asegurar la autonomiacutea e independencia dei Tribunal frente a cualquier presioacuten exterior

4 Destaca ademaacutes que la jurisdiccioacuten deI Tribunal sobre los delishytos de genociacutedio los criacutemenes contra la humanidad y los criacutemenes de

ENSAIOS JURiacuteDICOS 267

guerra deben considerarse con la misma calificacioacuten penal con indepenshydencia de que se hayan cometido en conflictos armados internacionales o en conflictos internos

5 Insta ai Consejo y a los Estados miembros a garantizar la universalidad y la transparencia de las negociaciones y la participacioacuten continuada de la comunidadjuriacutedica y la sociedad civil internacionales

6 Encarga a su Presidente que transmita la presente resolucioacuten ai Consejo a la Comisioacuten a los Gobiernos de los Estados miembros ai Secreshytario General de las Naciones Unidas ai Presidente de la Asamblea Geneshyral de las Naciones Unidas y ai Presidente de la Conferencia Diplomaacutetica de las Naciones Unidas para la constitucioacuten de un Tribunal Penal Internashycional

A resoluccedilatildeo supracitada demonstra que cresce a conscientizaccedilatildeo da necessidade de ser criado um Tribunal Penal Internacional com forccedila cogente obrigatoacuteria de suas decisotildees no acircmbito interno dos paiacuteses que participarem do pacto de sua constituiccedilatildeo

A doutrina internacional revela que a comunidade internacional somenshyte agora vem se preocupando em criar uma estructura internacional para determinar las responsabilidades individuales emergentes de violacioacuten de ciertos derechos baacutesicos dei ser humano Los mecanismos de responsabilidad estatal creados desde los 60 se dirigen a la mayor protecciotilden dei ser humano y la erradicacioacuten de las praacutecticas de volacioacuten sistemaacutetica de los derechos humanos ar via de la condena ai Estado que ordena o que tolera los abusos por lo cual se estructuraron entorno ai Estado conmo sujeto responsable Como haacute seflalado la Corte Internacional de Derechos Humanos el procedimiento ante ella no es un procedimiento penal lo que se busca determinar es el nivel de cumprimiento por parte de un Estado de sus obligaciones de derecho internacional Sin desconocer la importancia de determinar la responsabilidad dei Estado para que eacuteste tenga un incentivo para erradicar esas praacutectica de sus frotneras es pertinente detacar que las violaciones maacutes grave son en uacuteltima instancia coshymetidas por individuos (Francisco Cox Encarregado dei TPI HOH em artigo intitulado EI IlOH ante la Craciotilden de um Tribunal Penal Internacional no site httpwwwiidhedcrcpitpintrohtml)

A criaccedilatildeo de um Tribunal Penal Internacional atuaria permanentemente e teria competecircncia subsidiaacuteria em relaccedilatildeo agrave outorgada aos Tribunais Nacioshynais limitando-se a atuar apenas nos crimes internacionais previamente defishynidos como sendo do interesse da comunidade global

Merece registro no acircmbito do assunto tratado que na Conferecircncia Reshygional sobre o Tribunal Penal Internacional realizada em 18 e 19 de fevereiro de 1998 na cidade de Guatemala Guatemala um dos temas tratados foi o relativo

268 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

agrave harmonizaccedilatildeo das incriminaccedilotildees quando os seguintes aspectos foram disshycutidos Branqueamento corrupccedilatildeo fraude fiscal participaccedilatildeo em associashyccedilotildees criminosas um olhar agrave luz dos direitos nacionais e do direito internacioshynal Perspectivas Quais os comportamentos a incriminar Criar uma nova incriminaccedilatildeo da fraude fiscal Uma tentativa de harmonizaccedilatildeo o corpus jurls contendo disposiccedilotildees penais para proteccedilatildeo dos interesses financeiros da Uniatildeo Europeacuteia As negociaccedilotildees no seio do Conselho da Europa e da OCDE referenshytes agrave luta contra a corrupccedilatildeo etc O referido painel foi presidido por Benoit Dejemeppe procurador do Rei em Bruxelas e contou com a presenccedila de Tereshyza Beleza professora de Direito Penal na Faculdade de Direito de Lisboa como moderadora

Haacute como visto um largo campo de anaacutelise para desenvolver com possishybilidade do surgimento de sugestotildees que levem a ciecircncia juriacutedica a alcanccedilar com a atuaccedilatildeo estatal uma competecircncia internacional que possa combater o crime internacional e ao mesmo tempo proporcione seguranccedila juriacutedica na ordem interna ganhando assim o sistema juriacutedico confianccedila dos investidoshyres

Em conclusatildeo a forma de compatibilizar o combate agrave criminalidade internacional sem violar a seguranccedila juriacutedica necessaacuteria a evitar a fuga de inshyvestimentos do paiacutes estaacute na criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional com comshypetecircncia definida para processar e julgar delitos globalizantes e cujas decisotildees tenham forccedila imperativa no acircmbito interno das naccedilotildees participantes do pacto para o seu nascimento

Page 11: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro

ENSAIOS JURiacuteDICOS 233

Compreendendo o inqueacuterito o conjunto de diligecircncias que visam investigar a existecircncia de um crime determinar os seus agentes e a resshyponsabilidade deles e descobrir e recolher as provas em ordem agrave decishysatildeo sobre a acusaccedilatildeo (cf art 262 n 1 do Coacutedigo de Processo Pena0 a consulta dos pretendidos documentos - extracto da conta e ficha de assinaturas - eacute sem margem para duacutevidas de grande importacircncia para a instruccedilatildeo do processo e recolha de indiacutecios probatoacuterios tendentes agrave eventual deduccedilatildeo de acusaccedilatildeo pois sem ela desde logo muito dificilshymente se poderaacute concluir pela identificaccedilatildeo da pessoa que assinou o cheque

O dever de sigilo bancaacuterio traduz uma obrigaccedilatildeo de facto negativo (de ROR facere) e encontra-se disciplinado no Decreto-Lei n 2981992 de 31 de dezembro que aprovou o Regime Geral das Instituiccedilotildees de Creacutedito e Sociedades Financeiras O art 78 de tal diploma consagrando o dever de segredo profissional dispotildee no seu n 1 que os membros dos orgatildeos de administraccedilatildeo ou de fiscalizaccedilatildeo das instituiccedilotildees de creacutedito os seus empregados mandataacuterios comitidos e outras pessoas que lhes prestem serviccedilos a tiacutetulo permanente ou ocasional natildeo podem revelar ou utilizar informaccedilotildees sobre factos ou elementos respeitantes agrave vida da instituiccedilatildeo ou agraves relaccedilotildees desta com os seus clientes cujo conhecimento lhes advenha exclusivamente do exerciacutecio das suas funccedilotildees ou da presshytaccedilatildeo dos seus serviccedilos explicitando-se no seu n 2 que estatildeo designadamente sujeitos a segredo os nomes dos clientes as contas de depoacutesito e seus movimentos e outras operaccedilotildees bancaacuterias

O dever de segredo profissional natildeo eacute poreacutem um dever absoluto isto eacute natildeo prevalece sempre sobre qualquer outro dever que com ele entre em conflito Sofre com efeito as excepccedilotildees previstas no art 79 do mesmo Decreto-Lei n 2981992 onde se estabelece aleacutem do mais que os factos e elementos cobertos pelo dever de segredo podem ser revelashydos nos termos previstos na lei penal e de processo penal - cf aliacutenea d don2

No art 84 do mesmo diploma legal prescreve-se que a violaccedilatildeo ao dever de segredo eacute puniacutevel nos termos do Coacutedigo Penal e efectivamente o Coacutedigo Penal vigente - revisto pelo Decreto-Lei n 481995 de 15 de marccedilo - prevecirc e pune como crimes quer a violaccedilatildeo a segredo profissioshynal quer o seu aproveitamento indevido - cf arts ] 95 e 196

Ao contraacuterio da versatildeo do Coacutedigo Penal anterior agrave referida revisatildeo - em que se estatuiacutea no art 185 que a violaccedilatildeo ao segredo profissional natildeo seria puniacutevel se ocorresse no cumprimento de um dever juriacutedico sensivelmente superior ou visasse a um interesse puacuteblico ou privado legiacutetimo quando considerados os interesses em conflito e os deveres

234 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

de informaccedilatildeo que segundo as circunstacircncias se impotildeem ao agente se pudesse considerar meio adequado para alcanccedilar aquele fim - natildeo conteacutem o Coacutedigo Penal actuaJ relativamente ao crime de violaccedilatildeo ao segredo profissional qualquer causa especiacutefica de exclusatildeo da ilicitude pelo que haacute que atentar nas causas gerais de exclusatildeo da ilicitude

Ao abordar o conflito de deveres dispotildee o art 36 n 1 do Coacutedigo Penal que natildeo eacute iliacutecito o facto de quem em caso de conflito no cumprishymento de deveres juriacutedicos ou de ordens legiacutetimas da autoridade satisfishyzer dever ou ordem de valor igualou superior ao do dever ou ordem que sacrificar Natildeo seraacute pois iliacutecita a violaccedilatildeo ao segredo profissional se perante um conflito de deveres o agente satisfizer o dever de valor igual ou superior ao do dever que sacrifica

No Coacutedigo de Processo Penal generalizou-se a possibilidade de quebra do segredo profissional

Assim as pessoas indicadas no n 1 do sobredito art 78 podem recusar-se a depor sobre factos objecto de segredo profissional mas se a autoridade judiciaacuteria concluindo embora pela legitimidade da recusa natildeo prescindir desse depoimento pode requerer ao tribunal que o ordeshyne E o tribunal deveraacute ordenar a prestaccedilatildeo do depoimento com quebra do segredo profissional sempre que entender que esta se mostra justificada face agraves normas e princiacutepios aplicaacuteveis da lei penal nomeadashymente ao princiacutepio da prevalecircncia do interesse preponderante - cf art 135 n 12 e 3 do Coacutedigo de Processo Penal

A possibilidade de apreensatildeo pela autoridade judiciaacuteria de tiacutetulos valores quantias ou outros objectos depositados em bancos ou outras instituiccedilotildees de creacutedito relacionados com um crime e que possam ser de grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova bem como a possibilidade de exame pelo juiz de correspondecircncia e documenshytaccedilatildeo bancaacuterias estatildeo previstas no art 181 n 1 e 2 do Coacutedigo de Processhyso Penal As pessoas obrigadas ao dever de segredo profissional podem recusar apresentar aqueles documentos ou objectos em seu poder se invocarem por escrito segredo profissional caso em que o conflito de interesses e deveres assim surgido seraacute dirimido pelo tribunal nos tershymos idecircnticos aos previstos para a recusa de depoimento - cf arts 182 n 2 e 135 ambos do citado coacutedigo

Enquanto o dever de segredo profissional eacute geralmente estabeleshycido a favor da integridade e liberdade das pessoas a quem aproveita tendo-se inserido a sua regulamentaccedilatildeo no Tiacutetulo VI do atraacutes mencionashydo Regime Geral das Instituiccedilotildees de Creacutedito e Sociedades Financeiras no qual se prevecirc um conjunto de regras de conduta que devem guiar a actuaccedilatildeo das instituiccedilotildees de creacutedito seus administradores e empregados

ENSAIOS JURiacuteDICOS 235

nas relaccedilotildees com os clientes visando proteger de forma eficaz a posishyccedilatildeo do consumidor de serviccedilos financeiros (cf preacircmbulo do Decreshyto-Lei n 2981992) ou estabelecer um clima de confianccedila na banca que permita a captaccedilatildeo e recuperaccedilatildeo do dinheiro entesourado (como se dizia no relatoacuterio do Decreto-Lei n 21978 de 9 de janeiro revogado pelo n 1 do art 5Q do citado Decreto-Lei n 2981992) no processo de inqueacuteshyrito a que procede o Ministeacuterio Puacuteblico estaacute em causa a realizaccedilatildeo de diligecircncias de prova que permitam investigar um crime de emissatildeo de cheque sem provisatildeo sob a eacutegide do princiacutepio da verdade material e incriminar o respectivo agente

O interesse que estaacute em jogo com a pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblishyco na obtenccedilatildeo da documentaccedilatildeo bancaacuteria eacute o da boa administraccedilatildeo da Justiccedila Penal e esse interesse eacute no caso em apreccedilo sensivelmente supeshyrior ao interesse da manutenccedilatildeo do segredo bancaacuterio o que equivale a di~er que este deve ceder perante aquele

Em suma no caso concreto ponderados os interesses em conflishyto entendemos que a quebra do dever de sigilo bancaacuterio se justifica nos termos do art 36 do Coacutedigo Penal pelo que deve ser dada procedecircncia agrave pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico e consequumlentemente ao abrigo do disposto nos arts 182 n 2 e 135 n 2 e 3 ambos do Coacutedigo de Processo Penal dispensar-se a Caixa Geral de Depoacutesitos do cumprimento do deshyver de sigilo bancaacuterio a fim de poder satisfazer tal pretensatildeo

3 Por todo o exposto determina-se que com quebra do dever de sigilo bancaacuterio a Caixa Geral de Depoacutesitos forneccedila ao Digno Magistrado do Ministeacuterio Puacuteblico com destino ao Processo de Inqueacuterito n 3571 1994 a documentaccedilatildeo bancaacuteria que este lhe havia solicitado

Natildeo eacute devida taxa de justiccedila

Texto processado e integralmente revisto pelo relator

Desembargador-Relator Rui Mauriacutecio

g) Substancioso estudo do sigilo bancaacuterio no Direito Comparado foi feishyto por Andreacute Serratildeo Borges de Sampaio Consultor da Uniatildeo nas informashyccedilotildees que prestou ao Advogado-Geral da Uniatildeo com referecircncia agrave ADIn n 2397 Transcrevo o inteiro teor do seu pronunciamento

51

6 O tratamento do sigilo bancaacuterio no Direito Comparado

Em verdade o Direito Comparado entende inoponiacutevel o sigilo banshycaacuterio agraves autoridades tributaacuterias Com efeito leciona Alfredo Echeverriacutea Herrera verbis

236 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

EI sigilo bancario constituye un reacutegimen limitado exclusivashymente ai aacutembito de las relaciones entre la institucioacuten bancaria y sus clientes e impone la obligacioacuten de confidencialidad de la institucioacuten sobre las informaciones que aqueacutellos le proporcionan

En todas las legislaciones bancarias el sigilo es relativo es decir el derecho dei ciudadano ai secreto y la correlativa obligacioacuten para el banco de no revelar a terceros las informaciones recibidas en el ejercicio de su actividad ceden cuando existe norma legal expresa o causa justificada

Elliacutemite legal ai sigilo estaacute constituiacutedo por la obligacioacuten dei banco de entregar informaciones y se fundamenta en motivos sushyperiores de orden puacuteblico o general siendo liacutecito entonces que el Estado establezca Iiacutemites legales ai secreto bancaria para auxiliar por ejemplo las actuaciones de la Justicia en el plano jurisdiccional y las dei Estado en el aacutembito dei ejercicio de su potestad impositiva

Es un principio irrebatible en la vida dei derecho que ni la autonomia de las personas ni los instrumentos dei aacuterea econoacutemica y financiera pueden servir en un momento dado como elementos juridicamente idoacuteneos para lesionar el intereacutes puacuteblico En consecuencia se puede afirmar que las limitaciones ai sigilo bancario son salvaguardias necesarias ai bien comuacuten en los caacutenones dei Estado moderno Estas limites deben ser materias reshyservadas a la ley por ser de caraacutecter excepcional en sentido estricto

En este orden de ideas necesariamente debe concluirse que existen legiacutetimos y superiores intereses en diversas aacutereas de la sociedad que se vinculan ai bien comuacuten y que deben ser tutelados por el Estado como lo es por ejemplo la necesidad de detectar y reprimir la evasioacuten de los impuestos los cuales transcienden ai evenshytual intereacutes geneacuterico que pueda tener el mismo Estado en la mantencioacuten dei sigilo bancaria En efecto desde el punto de vista de lajuridicidad y de la eacutetica no se puede sostener que el secreto bancaria pueda servir como instrumento para proteger la comisioacuten de actos

52

como el recieacuten mencionado que son constitutivos muchas veces de iliacutecitos penales bajo la forma de delitos tributarias o fraushydes fiscales con resultados ademaacutes de perjucio patrimonial ai Esshytado y dano ai intereacutes general de la sociedad

EI sistema bancaria frente a la existencia en la sociedad de un intereacutes general preponderante y superior estaacute naturalmente Ilamado a colaborar en la verificacioacuten y represioacuten de la evasioacuten tributaria

ENSAIOS JURiacuteDICOS 237

En este marco se inscribe la tendencia de la mayoda de las legislaciones modemas en cuanto a dotar aI Estado de facultades para intervenir en la actividad econoacutemica de los ciudadanos en procura de la correcta determinacioacuten de los tributos cuando se conshyfigura en el desarrollo de estas actividades un hecho gravado establecido en la ley

Ya la Constitucioacuten de Weimar en 919 proclamoacute que es liacutecito ai Estado intervenir para condicionar el ejercicio de los derechos a determinados fines sociales El bien comuacuten y la justicia social comenzaron desde entonces a servir de frontera a los derechos y Iibertades individuales

Cabe destacar que la OCDE (Organisation for Economic Cooperation and Development) en un documento elaborado en el ano 1999 sobre las praacutecticas de los paiacuteses en el acceso a la informacioacuten bancaria para fines tributarios advierte que se puede abusar de la confidencialidad para ocultar actividades iJegales y evadir impuestos y agrega en el resumen ejecutivo deI documento que ni la criminalizacioacuten dei fraude tributario ni el tratamiento de la evasioacuten de impuestos bajo las leyes tributarias de los paiacuteses miembros de la OCDE son homogeacuteneos pero que sin embargo los gobiernos de la mayoriacutea de los paiacuteses miembros de la OCDE han tomado la visi6n de que en este contexto las autoridades tributashyrias no deben ser tratadas como simples terceros sino que se les debe otorgar un acceso priviligiado a la informaci6n bancaria con fines tributarias

Se agrega en este estudio que una medida de esta naturaleza no pane en peligro la conlidencialidad de la inlormacioacuten bancaria puesto que las autoridades tributarias estaacuten sujetas a estrictos conshytroles sobre coacutemo utilizan la informacioacuten de los contribuyentes y todos los gobiemos han implementado regIas para proteger la conlidencialidad de la informaci6n tributaria (EI Sigilo Bancaacuterio Acesso a la Informadon Bancaria para Fines Tributarias)

Em verdade seu texto elenca 30 paiacuteses integrantes da OCDE (a saber Alemanha Austraacutelia Aacuteustria Beacutelgica Canadaacute Repuacuteblica Checa Dinamarca Finlacircndia Franccedila Greacutecia Hungria Islacircndia Irlanda Itaacutelia Japatildeo Coreacuteia Luxemburgo Meacutexico Paiacuteses Baixos Nova Zelacircndia Noshyruega Polocircnia Portugal Espanha Sueacutecia Turquia Suiacuteccedila Reino Unido Estados Unidos Repuacuteblica Eslovaca) dos quais em 1999 apenas trecircs (Portugal Repuacuteblica Eslovaca e Luxemburgo) natildeo facultavam o acesso por parte de autoridades tributaacuterias a informaccedilotildees relativas a pessoas suspeitas de fraude tributaacuteria

238 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

Desses trecircs paiacuteses hoje remanescem apenas dois Com efeito Portugal deixou de integrar esse grupo constrangedoramente minoritaacuterio ao aprovar em 29 de dezembro de 2000 a Lei n 30-G

Nesse diploma lecirc-se

Lei da Reforma de Tributaccedilatildeo do Rendimento

(Portugal)

Artigo 63 O - B

Acesso a informaccedilotildees e documentos bancaacuterios

1 A administraccedilatildeo tributaacuteria tem o poder de aceder directashymente aos documentos bancaacuterios nas situaccedilotildees de recusa da sua exibiccedilatildeo ou de autorizaccedilatildeo para a sua consulta

a) quando se trate de documentos de suporte de registos contabiliacutesticos dos sujeitos passivos de IRS e IRC que se enconshytrem sujeitos agrave contabilidade organizada

b) quando o contribuinte usufrua de benefiacutecios fiscais ou de regimes fiscais privilegiados havendo necessidade de controshylar os respectivos pressupostos e apenas para esse efeito

2 A administraccedilatildeo tributaacuteria tem o poder de aceder a todos os documentos bancaacuterios excepto as informaccedilotildees prestadas para justificar o recurso ao creacutedito nas situaccedilotildees de recusa de exibiccedilatildeo daqueles documentos ou de autorizaccedilatildeo para a sua consulta

a) quando se verificar a impossibilidade de comprovaccedilatildeo e quantificaccedilatildeo directa e exacta da mateacuteria tributaacutevel nos termos do artigo da Lei Geral Tributaacuteria e em geral quando estejam verifishycados os pressupostos para o recurso a uma avaliaccedilatildeo indirecta

b) quando os rendimentos declarados em sede de IRS se afastarem significativamente para menos sem razatildeo justificada dos padrotildees de rendimento que razoavelmente possam permitir as manifestaccedilotildees de riqueza evidenciadas pelo sujeito passivo nos termos do artigo 89-A da Lei Geral Tributaacuteria

c) quando existam indiacutecios da praacutetica de crime doloso em mateacuteria tributaacuteria designadamente nos casos de utilizaccedilatildeo de facturas falsas e em geral nas situaccedilotildees em que existam factos concretamente identificados gravemente indiciadores da falta de veracidade do declarado

d) quando seja necessaacuterio para fins fiscais comprovar a aplicaccedilatildeo de subsiacutedios puacuteblicos de qualquer natureza

ENSAIOS JUAlolCOS 239

3 As decisotildees da administraccedilatildeo tributaacuteria referidas nos nuacuteshymeros anteriores devem ser fundamentadas com expressa menshyccedilatildeo dos motivos concretos que as justificam pressupotildeem a audishyccedilatildeo preacutevia do contribuinte e satildeo da competecircncia do Director-Geshyral dos Impostos ou do Director-Geral das Alfacircndegas e dos Imshypostos Especiais sobre o consumo ou seus substitutos legais sem possibilidade de delegaccedilatildeo

4 Os actos praticados ao abrigo da competecircncia definida no nuacutemero anterior satildeo susceptiacuteveis de recurso judicial o qual teraacute efeito suspensivo nas situaccedilotildees previstas no n 2

5 Nos casos de deferimento do recurso previsto no nuacutemero anterior os elementos de prova entretanto obtidos natildeo podem ser utilizados para qualquer efeito em desfavor do contribuinte

6 As entidades que se encontrem numa relaccedilatildeo de domiacutenio com o contribuinte ficam sujeitas aos regimes de acesso agrave inforshymaccedilatildeo bancaacuteria referidos nos n 1 e 2

7 O acesso da administraccedilatildeo tributaacuteria a informaccedilatildeo banshycaacuteria relevante relativa a familiares ou terceiros que se encontrem numa relaccedilatildeo especial com o contribuinte depende de autorizashyccedilatildeo judicial expressa apoacutes audiccedilatildeo do visado obedecendo aos requisitos previstos no n 3

8 O regime previsto nos nuacutemeros anteriores natildeo prejudica a legislaccedilatildeo aplicaacutevel aos casos de investigaccedilatildeo por infracccedilatildeo peshynal e soacute pode ter por objecto operaccedilotildees e movimentos bancaacuterios realizados apoacutes a sua entrada em vigor sem prejuiacutezo do regime vigente para as situaccedilotildees anteriores

9 Os actos praticados ao abrigo da competecircncia prevista no n I devem ser objecto de comunicaccedilatildeo ao Defensor do Contrimiddot buinte

10 Para os efeitos desta lei considera-se documento bancaacuteshyrio qualquer documento ou registo independentemente do resshypectivo suporte em que se titulem comprovem ou registem opeshyraccedilotildees praticadas por instituiccedilotildees de creacutedito ou sociedades finanshyceiras no acircmbito da respectiva actividade incluindo os referentes a operaccedilotildees realizadas mediante utilizaccedilatildeo de cartotildees de creacutedito (coacutepia anexa)

Parece evidente destarte que todo o mundo civilizado abandonou a possibilidade de opor-se agrave Administraccedilatildeo Tributaacuteria o sigilo bancaacuterio

240 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

4 O sigilo bancaacuterio e o direito agrave intimidade e agrave privacidade das pessoas

A anaacutelise do sigilo bancaacuterio em face do direito agrave intimidade e agrave privacidashyde exige inicialmente que seja enfrentada a questatildeo referente ao seu conceito

Os doutrinadores natildeo tecircm assumido posiccedilatildeo uniforme quanto aos asshypectos conceituais dessa entidade juriacutedica

Seacutergio Carlos Covello autor da obra jaacute mencionada (O Sigilo Bancaacuterio Leud S Paulo 1991 p 69) entende que sigilo bancaacuterio eacute a obrigaccedilatildeo que tecircm os Bancos de natildeo revelar salvo justa causa as informaccedilotildees que venham a obter em virtude de sua atividade profissional

Luiz Fernando Bellinetti no artigo intitulado Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio (Revista do Direito do Consumidor Satildeo Paulo RT 1996 voI 18 p 144) defende posiccedilatildeo no sentido de que sigilo bancaacuterio eacute o dever juriacutedico que tecircm as instituiccedilotildees de creacutedito e as organizaccedilotildees auxiliares e seus empregados de natildeo revelar salvo justa causa as informaccedilotildees que venham a obter em virtushyde da atividade bancaacuteria a que se dedicam

Para Arnoldo Wald (in O Sigilo Bancaacuterio no Projeto de Lei Complemenshytar n 70 Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas n I pp 196209) o sigilo bancaacuterio se enquadra no conceito mais amplo do segredo profissional que tem merecido uma proteccedilatildeo mais ampla ensejando sua violaccedilatildeo caracterizaccedilatildeo como crime (art 154 do Coacutedigo PeshynaI)

Eivany A Silva tratando do tema em Consideraccedilotildees a Respeito do Sigilo de Dados (artigo publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio n 61 pp 41142 - Edit Dialeacutetica) afirma que o sigilo bancaacuterio eacute espeacutecie do gecircnero sigilo de dados constituindo um direito fundamental protegido constitucionalmente inserto que estaacute no rol dos direitos e garantias individuais ou seja em claacuteusushylas peacutetreas da Carta Magna natildeo podendo portanto ser modificado nem messhymo por emenda agrave Constituiccedilatildeo e portanto muito menos por legislaccedilatildeo de hierarquia inferior

Como examinado haacute divergecircncias na fixaccedilatildeo do conceito Essas divershygecircncias embora importantes para as posiccedilotildees doutrinaacuterias a serem assumishydas sobre o alcance do sigilo bancaacuterio natildeo geram contudo influecircncias de maior intensidade no relacionamento entre a instituiccedilatildeo financeira e os seus depositantes Isso porque o que merece ser considerado eacute a natureza juriacutedica do sigilo bancaacuterio isto eacute a que categoria de direito pertence e como por quem e quando a sua quebra pode ser determinada

Em face do exposto necessaacuterio eacute que se faccedila o alinhamento das teorias que procuram fundamentar o sigilo bancaacuterio

A doutrina em eacutepocas diversas examinou as seguintes teorias

ENSAIOS JURiacuteDICOS 241

Teoria contratualista O sigilo bancaacuterio de acordo com essa teoria deshycorre da relaccedilatildeo contratual que voluntariamente eacute formada entre o banco e o cliente por via da qual mesmo sem claacuteusula expressa a instituiccedilatildeo financeira assume a obrigaccedilatildeo de guardar segredo das movimentaccedilotildees de dinheiro que nela satildeo feitas Essa responsabilidade assumida pelo banco inspira-se segunshydo os adeptos da teoria em destaque nos usos nos costumes e na boa-feacute sempre aplicaacuteveis na intepretaccedilatildeo dos contratos comerciais7bull

Teoria do direito agrave privacidade Os adeptos dessa corrente afirmam que o sigilo bancaacuterio integra o campo do direito agrave privacidade que faz parte dos direitos da personalidade

Teoria consuetudinaacuteria Segundo os seguidores dessa linha de pensar o sigilo bancaacuterio decorre dos compromissos taacutecitos assumidos entre instituishyccedilotildees financeiras e seus clientes no sentido de natildeo serem levados ao conhecishymento de terceiros os valores transacionados O uso reiterado dessa praacutetica apoiada no elemento confianccedila passou a representar costume adotado nesse tipo de negoacutecio juriacutedico

Teoria da boa-feacute A adoccedilatildeo dessa teoria conduz o inteacuterprete a entender que o sigilo bancaacuterio por sua proacutepria natureza estaacute vinculado ao caraacuteter fiduciaacuterio da atividade bancaacuteria fundando-se portanto na boa-feacute ou dever de lisura que tanto marca o tipo de negoacutecio juriacutedico firmado

Teoria do sigilo profissional Essa teoria concebe o sigilo bancaacuterio como sendo uma espeacutecie do sigilo profissional Haacute portanto um dever eacutetico do banshyco em respeitar o sigilo bancaacuterio em decorrecircncia da profissatildeo exercida

Teoria do direito agrave intimidade dos bancos Os integrantes dessa forma de pensar sustentam que a instituiccedilatildeo financeira tem legiacutetimo interesse de afastar do conhecimento de terceiros a movimentaccedilatildeo financeira dos seus clientes e consequumlentemente dos fatos com elas relacionados

Teoria da complexidade do viacutenculo Essa teoria eacute explicada por Arnoldo Wald no trabalho jaacute citado da forma seguinte A doutrina moderna abandoshynou a noccedilatildeo da relaccedilatildeo juriacutedica contratual defendo a complexidade do viacutenshyculo Aleacutem dos direitos e das obrigaccedilotildees principais existem deveres secundaacuteshyrios para ambos os contratantes que decorrem da regra geral da boa-feacute denoshyminada na doutrina italiana de cOITeteza e na legislaccedilatildeo alematilde de Treu und Glauben Exige que a atuaccedilatildeo de uma parte natildeo cause danos agrave esfera juriacutedica da outra Dentro desta ideacuteia defende-se que o segredo bancaacuterio eacute um dever

7 Arnoldo Wald em Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais artigo publicado na Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas n 22 pp 1518 manifesta entendimento de que no campo normatIacutevo do Direito brasileiro esta teoria encontra respaldo nos arts 130 e 131 do Coacutedigo Comercial que prevecirc a interpretaccedilatildeo dos contratos segundo os usos os costumes e a boa-feacute

242 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

acessoacuterio na relaccedilatildeo juriacutedica Mesmo que natildeo nasccedila o contrato entre as partes a boa-feacute objetiva impede que a instituiccedilatildeo financeira prejudique os interesses do cidadatildeo

Estabelecidos os pressupostos doutrinaacuterios acima examinamos agora se o sigilo bancaacuterio diz respeito agrave intimidade e agrave privacidade das pessoas

A Constituiccedilatildeo Federal em seu artigo 5ordm incisos X e XII afirma

Art 5ordm Todos satildeo iguais perante a lei sem distinccedilatildeo de qualquer natureza garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Paiacutes a inviolabilidade do direito agrave vida agrave liberdade agrave igualdade agrave segushyranccedila e agrave propriedade nos termos seguintes

X - satildeo inviolaacuteveis a intimidade a vida privada a honra e a imagem das pessoas assegurado o direito agrave indenizaccedilatildeo pelo dano material ou moral decorrente de sua violaccedilatildeo

XJl - eacute inviolaacutevel o sigilo da correspondecircncia e das comunicaccedilotildees telegraacuteficas de dados e das comunicaccedilotildees telefocircnicas salvo no uacuteltimo caso por ordem judicial nas hipoacuteteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigaccedilatildeo criminal ou instruccedilatildeo processual penal

Essas garantias constitucionais protegem o cidadatildeo de qualquer investida de terceiros em sua intimidade em sua vida privada e no sigilo de seus dados

Na expressatildeo terceiros estaacute incluiacutedo o Estado e consequumlentemente seus agentes poliacuteticos e administrativos

A doutrina tem se manifestado de modo quase unacircnime no sentido de que o sigilo bancaacuterio eacute uma garantia constitucional que protege a privacidade das pessoas no campo econocircmico e financeiro A sua significaccedilatildeo eacute de natildeo tornar puacuteblica a movimentaccedilatildeo da conta bancaacuteria e das aplicaccedilotildees financeiras do cidadatildeo para que de nenhum modo os atos privados praticados possam ser tornados puacuteblicos

Esse posicionamento eacute o adotado pelos autores que passo a citar

Arnoldo Wald (O Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais artigo pushyblicado na Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas RT n 22 pp 1521)

O sigilo bancaacuterio eacute o meio para resguardar a privacidade no camshypo econocircmico pois veda a publicidade sobre a movimentaccedilatildeo da conta corrente bancaacuteria e das aplicaccedilotildees financeiras

ENSAIOS JURiacuteDICOS 243

Eivany A Silva (Consideraccedilotildees a Respeito do Sigilo de Dados artigo publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio n 61 Satildeo Paulo Editora Dialeacutetica p27)

A maioria dos ordenamentos juriacutedicos como o brasileiro tratam o sigilo bancaacuterio como direito fundamental do contribuinte agrave privacidashyde ou seja agrave resistecircncia agrave comunicaccedilatildeo de dados que representem desshydobramento da personalidade da pessoa direito agrave oposiccedilatildeo e agrave negaccedilatildeo de comunicaccedilatildeo

Ives Gandra da Silva Martins (Sigilo Bancaacuterio trabalho publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio S Paulo Editora Dialeacutetica n 1 pp 24 e 25)

Pelos incisos X e XII do artigo 5ordm tem o contribuinte o direito de preservaccedilatildeo de sua intimidade de sua privacidade e de que terceiros que detenham informaccedilotildees pessoais suas sejam obrigados a guardaacute-Ias

Natildeo pode pois a fiscalizaccedilatildeo exigir de terceiros informaccedilotildees que apenas pode obter do proacuteprio contribuinte

Em determinadas hipoacuteteses todavia o interesse puacuteblico haacute de preshyvalecer sobre o interesse individual mas caberaacute a um outro poder definir se tais hipoacuteteses efetivamente ocorrem com o que poderaacute o Poder Judishyciaacuterio autorizar se convencido estiver o magistrado de que a hipoacutetese eacute de gravidade e de lesatildeo ao interesse puacuteblico a quebra do direito ao sigilo bancaacuterio

Estou convencido ser esta a melhor conformaccedilatildeo juriacutedica da quesshytatildeo idealizada pelos constituintes defendida pela doutrina e consagrashyda na jurisprudecircncia corrente exegeacutetica esta a que me filio desde os meus primeiros escritos sobre a mateacuteria

Roberto Quiroga Mosquera (Tributaccedilatildeo no Mercado Financeiro e de Capitais obra publicada pela Editora Dialeacutetica Satildeo Paulo 1998 pp 70171)

Do exposto ateacute aqui eacute evidente que o direito ao sigilo bancaacuterio representa uma espeacutecie de direito agrave privacidade

Eacute incontroverso que os dados e informaccedilotildees de natureza bancaacuteria dizem respeito agrave intimidade e agrave vida privada dos cidadatildeos Dados que dizem respeito aos valores em dinheiro depositados em contas-correnshytes bancaacuterias tipos e caracteriacutesticas de aplicaccedilotildees financeiras ganhos e prejuiacutezos auferidos ou incorridos em operaccedilotildees bursaacuteteis etc satildeo sem sombra de duacutevida elementos particulares e pessoais de qualquer indiviacuteshyduo

244 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Utilizando outra voz informaccedilotildees que tocam no aspecto financeishyro do ser humano representam direito iacutentimo e personaliacutessimo devendo ser mantidas em sigilo por aqueles que eventualmente as detenham em razatildeo de sua atividade profissional Parece-nos que tal conclusatildeo eacute de uma clareza inconteste

Natildeo tem sido outra a posiccedilatildeo da doutrina mais abalizada do Paiacutes e da jurisprudecircncia dominante

o autor referido a seguir faz a observaccedilatildeo seguinte

Carlos Alberto Hagstrom (Sigilo Bancaacuterio Novas Questotildees Reshyvista de Direito Mercantil Satildeo Paulo Malheiros 1997 vaI 105 pp 4344) expotildee que apesar de existirem diversas teorias que procuram fundashymentar juridicamente o sigilo bancaacuterio modernamente a explicaccedilatildeo para o fundamento do referido instituto sofreu uma radical alteraccedilatildeo Divershysas constituiccedilotildees modernas esclarece o mencionado autor ampliaram e explicitaram o elenco de direitos e garantias individuais passando a garantir o direito agrave privacidade e agrave intimidade A Constituiccedilatildeo brasileira natildeo trilha caminho diferente Assegurou referidos direitos de forma exshypressa e sem restriccedilotildees O tema do sigilo bancaacuterio figura agora em niacutevel constitucional Tem status de norma superior no qual se reconhece o direito agrave intimidade como norma de caraacuteter geneacuterico em que estatildeo conshytemplados muacuteltiplos aspectos da vida privada em especial os de ordem econocircmico-financeira que compotildeem o que Hagstrom denominou a inshytimidade econocircmica ou intimidade patrimonial

Luiacutes Fernando 8ellinetti (Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio artigo publicado na Revista de Direito do Consumidor n 18 pp 141151)

Como jaacute dissemos anteriormente em certas hipoacuteteses o fundashymento para o segredo bancaacuterio seria a privacidade No entanto nesses casos o que se protege eacute a privacidade e natildeo propriamente o sigilo

Entendemos que uma coisa eacute garantir-se a privacidade da pessoa com fundamento em norma constitucional outra eacute garantir-se o segreshydo de informaccedilotildees bancaacuterias de uma pessoa com base na legislaccedilatildeo supramencionada

Sempre que a revelaccedilatildeo de informaccedilotildees bancaacuterias puder violar a privacidade da pessoa parece-nos que mais do que garantia ao sigilo bancaacuterio (com fundamento legal) tem a pessoa garantia agrave sua privacishydade (com fundamento constitucional)

ENSAIOS JURiacuteDICOS 245

No entanto se a revelaccedilatildeo da informaccedilatildeo natildeo invadir a esfera da intimidade da pessoa sua garantia eacute meramente legal do sigilo bancaacuterio

Carlos Maacuterio Velloso (citado por Misabel Derzi em Direito Tributaacuterio Aplicado obra publicada pela Editora Del Rey Belo Horizonte MO pp 278 e 279)

O sigilo bancaacuterio decorre do direito agrave privacidade inerente agrave pershysonalidade das pessoas consagrado na Constituiccedilatildeo Federal em seu art 5ordm X e protege tanto interesses privados como finalidades de ordem puacuteblica a saber o sistema de creacutedito O sigilo bancaacuterio natildeo eacute um princiacuteshypio absoluto

As exceccedilotildees ao sigilo bancaacuterio estatildeo previstas na Lei n 45951964 que continua em vigor

O Poder Judiciaacuterio pode requisitar relativamente a pessoas e instishytuiccedilotildees informaccedilotildees que implicam quebra de sigilo (Lei n 45951964 art 38 sect 1 ordm) entretanto mesmo havendo inqueacuterito policial instaurado deveraacute proceder com cautela prudecircncia e moderaccedilatildeo inerentes agrave mashygistratura

Luciana Fregodolli (O Direito agrave Intimidade - excerto da dissertaccedilatildeo que apresentou sob o tiacutetulo O Direito agrave Intimidade e a Prova Iliacutecita publicado pela Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Constitucional e Ciecircncia Poliacutetica -n 19 p 233)

O sigilo bancaacuterio protege interesses privados Eacute ele espeacutecie de direito agrave privacidade inerente agrave personalidade das pessoas e que a Consshytituiccedilatildeo Federal consagra no art 5ordm X aleacutem de atender a uma finalidade de ordem puacuteblica qual seja a de proteccedilatildeo ao sistema de creacutedito

O direito agrave privacidade abrange atualmente o de impedir que tershyceiros inclusive o Estado e o Fisco tenham acesso a informaccedilotildees sobre o que se denominou a aacuterea de manifestaccedilatildeo existencial do ser humano

Celso Ribeiro Bastos O pensamento de Celso Ribeiro Bastos foi exshyposto por Roberto Quiroga Mosquera na obra jaacute referida p 71 do modo seguinte

Celso Bastos eacute do mesmo pensar Apoacutes tecer consideraccedilotildees introdutoacuterias acerca do sigilo bancaacuterio e expor pensamentos de divershysos autores nacionais e alieniacutegenas conclui o constitucionalista brasileishyro no sentido de que todas as despesas ordinaacuterias feitas pelo cidadatildeo

246 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

comum em sua vida cotidiana devem ser consideradas parte de sua vida privada familiar ou domeacutestica e portanto protegidas contra interferecircnshycias a despeito de qualquer pretexto Desde as condutas mais corriqueishyras como as compras efetuadas em um supermercado para manutenshyccedilatildeo da famiacutelia quanto aquelas outras moralmente reprovaacuteveis como presentes ou joacuteias compradas e dadas a quem presta ao homem servishyccedilos de natureza extraconjugal tudo estaacute abarcado pelo manto da proteshyccedilatildeo agrave vida privada familiar ou domeacutestica ( ) E mais adiante arremata Hoje praticamente a vida do homem pode ser escrita a partir de seu talatildeo de cheques e nas sociedades mais avanccediladas pelos cartotildees de creacutedito e magneacuteticos Permitir-se que o sigilo bancaacuterio venha a ser romshypido por qualquer forma natildeo-extraordinaacuteria para salvaguarda de inteshyresse de porte no miacutenimo idecircntico eacute expor a seguranccedila individual a um constante e absurdo temor perante as possibilidades de controle direto ou pelo vazamento de alguma informaccedilatildeo

Haacute contudo corrente contraacuteria como passaremos a demonstrar

Andreacute Serratildeo Borges de Sampaio Consultor da Uniatildeo nas informashyccedilotildees prestadas ao Advogado-Geral da Uniatildeo sobre a ADIn n 2397 cita trechos de doutrina e jurisprudecircncia estrangeiras defendendo o entendimento de que o sigilo bancaacuterio natildeo tem conotaccedilatildeo de direito de privacidade Eis o que escreshyveu o parecerista citado

O jurista portuguecircs J L Saldanha Sanches coteja primorosashymente o sigilo bancaacuterio com a proteccedilatildeo da intimidade para concluir que natildeo haacute que se falar em direito ao sigilo bancaacuterio como concretizaccedilatildeo do direito agrave intimidade Nas suas palavras

Ora em que esfera podemos noacutes incluir o segredo bancaacuteshyrio enquanto instituto que concretiza certos valores do ordenashymento juriacutedico Como expressatildeo de interesses juridicamente tuteshylados

Seraacute o segredo bancaacuterio um prolongamento do direito agrave inshytimidade da esfera pessoal e familiar de uma qualquer pessoa sinshygular (uma vez que em relaccedilatildeo agraves pessoas coletivas a questatildeo natildeo pode mesmo ser colocada) Ou diraacute antes respeito aquela faixa mais larga que resguarda a privacidade de qualquer cidadatildeo e que soacute pode por isso sofrer qualquer intromissatildeo se surgirem razotildees vaacutelidas para que tal direito seja restringido

Ao afirmar-se que na perspectiva dos clientes dos bancos o segredo bancaacuterio eacute um direito com a reserva da sua vida privada temos uma primeira resposta para esta questatildeo

ENSAIOS JURiacuteDICOS 247

Mas falta distinguir entre intimidade e reserva da vida privashyda e entre clientes individuais e profissionais de um banco Natildeo estamos perante o mesmo tipo de tutela quando contamos que um particular espera que o banco natildeo divulgue a qualquer inteshyressado o volume da sua conta bancaacuteria (porque pura e simplesshymente quer manter sob reserva a sua vida particular) ou quando um comerciante confia no banco para que este natildeo revele quem satildeo os seus clientes fornecedores ou qual eacute o seu grau de endividamento

No caso da pessoa singular estaacute apenas em causa um conshyjunto de valores de natureza moral esta natildeo estaacute em princiacutepio preocupada com possiacuteveis prejuiacutezos econocircmicos ligados a qualshyquer divulgaccedilatildeo Apenas se opotildee por razotildees do seu foro pessoal e que natildeo carecem de fundamentaccedilatildeo que esta tenha lugar

Enquanto que o comerciante pode ser seriamente prejudishycado em termos concorrenciais com a revelaccedilatildeo da lista dos seus clientes ou com a sua situaccedilatildeo financeira

O dever de reserva que cabe ao banqueiro estaacute desta forma a serviccedilo do interesse comercial das empresas suas clientes - que pelo simples facto de o serem ou por necessitarem de obter creacutedishyto lhe datildeo informaccedilotildees com um forte valor comercial ou da pesshysoa singular que deseja manter a privacidade da sua situaccedilatildeo patrimonial

Ou em alternativa ao serviccedilo da manutenccedilatildeo da privacidashyde que qualquer um pode desejar ainda que a possiacutevel violaccedilatildeo desta apenas lhe possa acarretar danos natildeo-patrimoniais

E por isso o segredo bancaacuterio natildeo pode constituir a expresshysatildeo do imperativo constitucional da proteccedilatildeo da intimidade Ateacute porque o acesso a essa esfera estaacute vedado aos proacuteprios bancos

Natildeo nos parece aceitaacutevel que um banco como condiccedilatildeo para a concessatildeo de creacutedito a uma pessoa singular ou para estashybelecer com ela qualquer relaccedilatildeo contratual possa exigir desta informaccedilatildeo de tipo estritamente pessoal ou a sujeiccedilatildeo a exames meacutedicos que atingindo a sua esfera iacutentima afectam a sua dignidashyde Aqui estaacute em causa a ilicitude da pergunta por pressupor o acesso agrave esfera inviolaacutevel (e indisponiacutevel) da intimidade

A informaccedilatildeo que o banco pode obter para a defesa dos seus interesses legiacutetimos natildeo pode ir aleacutem da esfera patrimonial do seu cliente rendimentos bens possuiacutedos perspectivas profisshysionais

( )

248 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

Podemos pois concluir que o segredo bancaacuterio natildeo eacute natildeo pode ser uma concretizaccedilatildeo do princiacutepio constitucional do direishyto agrave intimidade

Este princiacutepio tem como funccedilatildeo consagrar uma zona de reshyselVa pessoal para factos opccedilotildees e circunstacircncias que soacute de forshyma indirecta e de todo secundaacuteria podem ter aspectos ou refleshyxos de natureza patrimonial (Saldanha Sanches J L Segredo Bancaacuterio e Tributaccedilatildeo do Lucro Real In Saldanha Sanches J L Estudos de Direito Contabiliacutestico e Fiscal Coimbra Coimbra Edishytora 2000 pp 105108)

Em diversos paiacuteses haacute a clara percepccedilatildeo que natildeo haacute que se conshyfundir direito agrave intimidade com sigilo bancaacuterio indicando que a quebra do sigilo pela Administraccedilatildeo Tributaacuteria natildeo constitui violaccedilatildeo ao direito Ao contraacuterio a existecircncia de um Estado Fiscal implica na necessidade de consagrar agrave administraccedilatildeo tributaacuteria tal faculdade o que se harmonishyza com diversos princiacutepios e outros direitos fundamentais constantes da Carta de 1988

O caso espanhol eacute exemplar neste sentido ao natildeo visualizar a vioshylaccedilatildeo ao direito agrave intimidade em relaccedilatildeo agrave quebra do sigilo bancaacuterio Portanto

el Tribunal Constitucional espaflOl se ha pronunciado por la negativa de que el conocimiento de las cuentas bancarias por la Administracioacuten pueda invadir el aacutembito constitucionalmente garantizado de la intimidad de los individuos porque tales extractos no constituyen per se uma biografiacutea personal en nuacutemeros y en siacute no tiene relevancia para la intimidad personal y familiar dei contribuyente ya que se trata de dados no secretos y confiados a una entidad (Campos Laura Rodriacuteguez Oerechos dei Contribuyente em la Repuacuteblica Argentina ai Amparo de la Convencioacuten Interamericana de Oerechos Humanos http wwwiefpaorgarcriteriosdigitalarticulosderechoshtm Visitado em 512001)

Ao analisar a jurisprudecircncia da Corte Constitucional espanhola quanto ao tema tambeacutem ressalta Saldanha Sanches

Na apreciaccedilatildeo da constitucionalidade da lei que permitia o controle administrativo das contas bancaacuterias o Tribunal Constitushycional espanhol realizou uma distinccedilatildeo entre intimidade pessoal e familiar e a intimidade econoacutemica onde a proteccedilatildeo constitucional eacute menos intensa

ENSAIOS JURiacuteDICOS 249

E procura fazer uma distinccedilatildeo entre a violaccedilatildeo agrave intimidade como consequumlecircncia de uma anaacutelise das contas bancaacuterias - coloshycando a hipoacutetese de uma recusa de cooperaccedilatildeo por parte do conshytribuinte se tal eventualidade se verificar - e a violaccedilatildeo directa da intimidade uma vez que esta natildeo pode resultar de uma mera anaacuteshylise de movimentos bancaacuterios (Saldanha Sanches J L A Situashyccedilatildeo Actual do Sigilo Bancaacuterio a Singularidade do Regime Portushyguecircs In Saldanha Sanches J L Estudos de Direito Contabiliacutestico e Fiscal Coimbra Coimbra Editora 2000 p 91)

Outro comentarista ao analisar a situaccedilatildeo do sistema espanhol quanto ao sigilo bancaacuterio e o direito agrave intimidade fez questatildeo de ressaltar

Seguacuten el r c frente a la Hacienda Puacuteblica no existe el derecho a la intimidad deI art 18 CE Ya la LO de 5 de mayo deI 82 vada praacutecticamente de contenido constitucional el derecho a la intimidado en cuanto el aacutembito de eacutesta queda deferido a la ley ordinaria (a 2ordm) y en cuanto que la esfera protegida frente a las Administraciones se reduce a poco O nada ai no reputarse intromisiones ilegiacutetimas las actuaciones autorizadas o acordadas por la Autoridad competente de acuerdo con la Ley (art 8ordm 1)

La LGTy el RI Iimiacutetan la esfera de la intimidad en las relacishyones con la Hacienda hasta el extremo de que solamenle existe un refugio limitado en el aacutembito deI secreto profesional en los casos de informacioacuten sobre terceros y siempre que no se trate de datos con transcendencia econoacutemica o tributaria EI rc no ha enconshytrado hasta el momento ni un solo supuesto de dato o informacioacuten econocircmica con transcendencia tributaria que limite la accioacuten inquisitiva de la Administracioacuten tributaria por razoacuten de intimidado Bien puede decirse por tanto que frente a la Administraciocircn tribushytaria en cuanto se trata deI ejercicio de su funciocircn de buacutesqueda de datos con transcendencia tributaria el derecho a la intimidad personal y familiar (art 18 I CE) no existe

La biacuteblia deI tribunal a estos efeclos estaacute constituida por la S 11084 reiterada en numerosas ocasiones ampliada en el Auto 64286 y reafirmada por ejemplo en la S 26 abril 90 tantas veces citada (FJ 10deg) Seguacuten esa doctrina la distribucioacutenjusta de la carshyga fiscal prevalece sobre el derecho a la intimidad parte dei art 812 I de la LO seguacuten el cual frente a la Ley (ordinaria) no hay intimidad protegida siempre que haya en dicha ley imperativos de intereacutes puacuteblico ( ) ni siquiera se habla dei predomiacutenio frente a la

250 SUPERIOR TRIBUNAl DE JUSTiCcedilA

intimidad de intereses u objetivos constitucionalmente protegidos Soacuteo admite que la actuadoacuten administrativa es arbitraria cuando no parezcajustificada por la Finalidad de la inspeccioacuten es decir cuando se trate de datos o informaciones que carezcan de transcendencia tributaria pero eacuteste obviamente no es sin Umite derivado dei derecho a la intimidad sino de la interdiccioacuten de arbitrariedad o desviacioacuten de poder de la Administracioacuten de la necesidad de ajuste de toda Administracioacuten ai acircmbito de su competencia que tanto vale para datos iacutentimos como para otros que no lo sean Seguacuten la S 11084 no hay esfera de intimidad proshytegida frente a una Administracioacuten tributaria amparada en una norma que elimina la intimidad como liacutemite (Garciacutea AIacuteloveros Jaime Una Nueva Ley General Tributaria Problemas Constitucioshynales In Kirchhof P et aI Garantiacuteas Constitucionales dei Contribuyente Valencia Tirant lo Blanch 1999 pp 109110)

Diante de tudo quanto foi exposto tendo-se o cuidado de registrar posicionamento de diferentes autores nacionais e estrangeiros haacute ambiente preparado para ser respondido o primeiro questionamento desdobrado em trecircs partes formulado para o 1II Coloacutequio Internacional de Direito Tributaacuterio promoccedilatildeo do Centro de Extensatildeo Universitaacuteria Eis a primeira parte do seu teor

O sigilo bancaacuterio diz respeito agrave intimidade e privacidade das pessoas

A resposta eacute optando por convencimento influenciado pelas ideacuteias da corrente predominante positiva

O nosso entendimento eacute no sentido de que o direito agrave intimidade integra os direitos da personalidade e visam proteger o direito agrave inviolabilidade do domiciacutelio da correspondecircncia das comunicaccedilotildees de quaisquer espeacutecies dos dados pessoais computadorizados do sigilo bancaacuterio O mesmo acontece com o direito agrave privacidade

A expansatildeo da proteccedilatildeo do direito agrave intimidade e agrave privacidade eacute uma consequumlecircncia da evoluccedilatildeo da era contemporacircnea nos setores tecnoloacutegicos e da instabilidade que passam as instituiccedilotildees estatais especialmente a encarreshygada de arrecadar tributos Haacute o reconhecimento de que desenvolve-se um processo de aguda corrosatildeo na proteccedilatildeo agrave intimidade que ao ser violada provoca a publicizaccedilatildeo das condutas mais iacutentimas do cidadatildeo

A concepccedilatildeo do sigilo bancaacuterio no acircmbito do direito agrave intimidade e agrave privacidade visa garantir ao homem o miacutenimo capaz para que lhe seja asseshygurada a sua condiccedilatildeo humana protegendo-o de ingerecircncias alheias como apregoa a Conferecircncia Noacuterdica sobre o Direito agrave Intimidade realizada em Estoshycolmo na data de maio de 1967 ao fazer inserir no documento que publicou a seguinte definiccedilatildeo O direito agrave intimidade eacute o direito do homem de viver de forma independente a sua vida com um miacutenimo de ingerecircncia alheia

ENSAIOS JURiacuteDICOS 251

5 Seguranccedila juriacutedica e acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias

A segunda pergunta apresentada pelos organizadores do coloacutequio estaacute assim posta

A seguranccedila das relaccedilotildees juriacutedicas atraveacutes do Sistema Financeiro pode ser afetada pelo acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves inforshymaccedilotildees bancaacuterias

O acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias se realizado caracteriza um atentado de suma gravidade aos direishytos do cidadatildeo Eacute um ataque aos princiacutepios sustentadores do sistema demoshycraacutetico adotado pelo constituinte de 1988 especialmente quando detonou que a Repuacuteblica Federativa do Brasil tem como objetivo fundamental o respeishyto agrave dignidade humana e agrave cidadania

Do ordenamento juriacutedico brasileiro a meu pensar natildeo haacute lugar para brotar qualquer interpretaccedilatildeo que conclua pela possibilidade de qualquer agenshyte do Poder Puacuteblico acessar de modo generalizado e sem motivaccedilatildeo informashyccedilotildees bancaacuterias do cidadatildeo mesmo com autorizaccedilatildeo judicial

Esclareccedilo desde logo que natildeo comungo com o pensamento de detershyminada corrente no sentido de ser absoluto o direito ao sigilo bancaacuterio Tenho-o como relativo poreacutem vinculado aos princiacutepios da razoabilidade da moralidade da legalidade e da motivaccedilatildeo expliacutecita e detalhada sob pena de ser impossiacutevel a sua quebra

O acesso indiscriminado do agente fiscal agraves informaccedilotildees bancaacuterias do cidadatildeo gera uma quebra da seguranccedila das relaccedilotildees juriacutedicas por um terceiro passar a ter sem causa justificadora conhecimento da vida iacutentima de algueacutem submetendo-o a partir daiacute a um regime de submissatildeo Por outro lado ninshygueacutem poderaacute garantir nem o proacuteprio Estado que o agente puacuteblico utilize os dados que chegaram ao seu conhecimento para outros intentos que natildeo o exclusivamente fiscal

Lembra Arnoldo Wald que O segredo na atividade bancaacuteria envolve concomitantemente interesses privaqos e coletivos que podem ser analisashydos sob trecircs acircngulos o interesse do cliente na sua relaccedilatildeo com a instituiccedilatildeo financeira o interesse do banco em atuar com discriccedilatildeo para ganhar a conshyfianccedila da populaccedilatildeo e captar recursos e o interesse social na existecircncia de um bom e eficiente sistema bancaacuterio Por estarem ligadas ao desenvolvimento da economia e aos interesses da comunidade as relaccedilotildees que envolvem as instishytuiccedilotildees financeiras natildeo recebem o mesmo tratamento juriacutedico dispendido a outras relaccedilotildees comerciais Inviaacutevel a aplicaccedilatildeo exclusiva das regras de Direito Privado as quais tecircm como princiacutepio norteador a autonomia da vontade pois

252 SUPERIOR TRIBUNAl DE JUSTiCcedilA

esta encontra limites nas normas cogentes proacuteprias do direito bancaacuterio e na intervenccedilatildeo do Estado8

A seguranccedila juriacutedica desse tipo de relaccedilatildeo envolve tambeacutem a manutenshyccedilatildeo do segredo das movimentaccedilotildees financeiras do contribuinte

Imprimir-se a mais ampla seguranccedila nas relaccedilotildees do Sistema Financeiro eacute fortalececirc-lo O Estado tem o dever de zelar por esse estado de seguranccedila natildeo permitindo consequumlentemente que o sigilo bancaacuterio seja quebrado pelo acesshyso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico por esse comportamento afeshytar a confiabilidade no sistema

Eacute de todo inconveniente permitir a possibilidade de um atuar do agente fiscal sem controle na quebra do sigilo bancaacuterio por afetar diretamente a seshyguranccedila da relaccedilatildeo juriacutedica firmada entre a instituiccedilatildeo financeira e o seu clienshyte em face deste sentir-se atingido pela accedilatildeo fiscal que passa a tomar conhecishymento de sua intimidade financeira e de fatos de sua vida privada sem o resshypaldo do Poder Judiciaacuterio

A seguranccedila juriacutedica nesse tipo de relaccedilatildeo deve assegurar impossibilidashyde de abuso de poder por parte do Fisco em face da necessidade de ser resshyguardada a garantia de que em um Estado de Direito natildeo pode ser concebido que conceda-se a uma parte mesmo que seja o Estado o domiacutenio absoluto de apanhar as provas que iraacute utilizar em caso de litiacutegio contra algueacutem

O acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias do contribuinte aleacutem de afetar a seguranccedila juriacutedica da relaccedilatildeo em questatildeo promove um desequiliacutebro entre o cidadatildeo-contribuinte e o Fisco por caracterizar coaccedilatildeo que coloca aquele em posiccedilatildeo de inferioridade

A valorizaccedilatildeo da seguranccedila juriacutedica da relaccedilatildeo existente entre instituiccedilatildeo financeira e contribuinte pelo Fisco natildeo quebrando o seu sigilo fiscal sem autorizaccedilatildeo judicial constitui causa de aplicaccedilatildeo de Justiccedila fiscal O seguimenshyto de seus princiacutepios valoriza o regime democraacutetico do qual ela faz parte

6 Casos de admissibilidade da quebra do sigilo bancaacuterio

Os casos de admissibilidade da quebra do sigilo bancaacuterio estatildeo na atuashylidade descritos no nosso ordenamento juriacutedico positivo

A Lei Complementar n 105 de 10 de janeiro de 2001 apoacutes determinar no art 112 de que as instituiccedilotildees financeiras conservaratildeo sigilo em suas operashyccedilotildees ativas e passivas e serviccedilos prestados dispotildee no sect 312 do mesmo artigo que

8 Arnoldo Wald no artigo Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais Revista dos Tribunais ano 6 n 22 janeiromiddotmarccedilo de 1998 n 22 Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas p 15

ENSAIOS JURiacuteDICOS 253

sect 3ordm Natildeo constitui violaccedilatildeo do dever de sigilo

I a troca de informaccedilotildees entre instituiccedilotildees financeiras para fins cadastrais inclusive por intermeacutedio de centrais de risco observadas as normas baixadas pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e pelo Banco Censhytral do Brasil

11 - o fornecimento de informaccedilotildees constantes de cadastro de emitentes de cheques sem provisatildeo de fundos e de devedores inadimplentes a entidades de proteccedilatildeo ao creacutedito observadas as norshymas baixadas pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e pelo Banco Central do Brasil

JJI - o fornecimento das informaccedilotildees de que trata o sect 2ordm do art II da Lei n 9311 de 24 de outubro de 1996

IV - a comunicaccedilatildeo agraves autoridades competentes da praacutetica de iliacutecitos penais ou administrativos abrangendo o fornecimento de inforshymaccedilotildees sobre operaccedilotildees que envolvam recursos provenientes de qualshyquer praacutetica criminosa

V - a revelaccedilatildeo de informaccedilotildees sigilosas com o consentimento expresso dos interessados

VI- a prestaccedilatildeo de informaccedilotildees nos termos e condiccedilotildees estabeleshycidos nos artigos 2ordm 3ordm 4ordm 5ordm 6ordm 7ordm e 9ordm desta lei complementar

sect 4ordm A quebra de sigilo poderaacute ser decretada quando necessaacuteria para apuraccedilatildeo de ocorrecircncia de qualquer iliacutecito em qualquer fase do inqueacuterito ou do processo judicial e especialmente nos seguintes crimes

I - de terrorismo

11 - de traacutefico iliacutecito de substacircncias entorpecentes ou drogas afins

III - de contrabando ou traacutefico de armas municcedilotildees ou material destinado a sua produccedilatildeo

IV - de extorsatildeo mediante sequumlestro

V - contra o sistema financeiro nacional

VI - contra a Administraccedilatildeo Puacuteblica

Vll- contra a ordem tributaacuteria e a previdecircncia social

VIII-lavagem de dinheiro ou ocultaccedilatildeo de bens direitos e valores

IX - praticado por organizaccedilatildeo criminosa

Como visto a lei complementar enumera inuacutemeras situaccedilotildees que indeshypendentemente de autorizaccedilatildeo judicial o sigilo bancaacuterio eacute quebrado

254 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

A dificuldade que se apresenta eacute a de conciliar os casos de quebra de sigilo bancaacuterio que a Lei Complementar n 105 autoriza com a garantia do direito agrave privacidade e agrave intimidade

Destaque-se entre os de maior relevacircncia os seguintes

- natildeo constituir violaccedilatildeo do dever de sigilo bancaacuterio a troca de informashyccedilotildees entre instituiccedilotildees financeiras para fins cadastrais inclusive por intermeacuteshydio de centrais de risco o que possibilita o conhecimento da vida financeira privada do cidadatildeo por vaacuterias pessoas sem desempenho de autoridade na instituiccedilatildeo independentemente de ser justificada com antecedecircncia a causa desse atuar

- o de serem fornecidos dados relativos a fornecimentos de informashyccedilotildees cadastrais de emitentes de cheques sem provisatildeo de fundos a entidades privadas de proteccedilatildeo ao creacutedito sem qualquer avaliaccedilatildeo por qualquer autorishydade da causa determinante do fato a quebra do sigilo bancaacuterio na fase do inqueacuterito por inexistir nessa ocasiaacuteo qualquer contraditoacuterio e respeito ao prinshyciacutepio do devido processo legal

Quanto agraves demais situaccedilotildees constantes na lei complementar que autorishyzam a quebra do sigilo bancaacuterio naacuteo obstante algumas serem absolutamente necessaacuterias haacute de serem vistas em compatibilidade com as garantias constitushycionais conforme jaacute assinalado

O colendo Supremo Tribunal pronunciaraacute como guarda e inteacuterprete maishyor da Carta Magna em ADln jaacute intentada sobre a constitucionalidade ou natildeo dos dispositivos supramencionados

Em campo doutrinaacuterio valoriza-se as posiccedilotildees apresentadas quando da resposta oferecida aos questionamentos anteriores todas acenando pela neshycessidade do controle do Poder Judiciaacuterio

7 Sistema mais justo para a quebra do sigilo bancaacuterio

Os organizadores do JII Coloacutequio Internacional de Direito Tributaacuterio subshymetem agora para anaacutelise a questatildeo do teor seguinte Um sistema em que o Poder Judiciaacuterio torna-se aacuterbitro dos pedidos da Administraccedilatildeo Puacuteblica para quebra do sigilo eacute o mais justo

Em um Estado que por imposiccedilatildeo de sua proacutepria Constituiccedilatildeo estaacute comprometido com a guarda e aplicaccedilatildeo efetiva de princiacutepios democraacuteticos especialmente o de respeitar os direitos e garantias fundamentais da cidadashynia natildeo haacute ambiente para que seja outorgado ao Poder Executivo por via da atuaccedilatildeo de agentes puacuteblicos fiscais o acesso sem o controle do Poder Judiciaacuteshyrio agraves informaccedilotildees bancaacuterias do contribuinte

ENSAIOS JURiacuteDICOS 255

o sigilo bancaacuterio por ser um direito fundamental que exige ser respeitashydo pela supremacia constitucional que o protege deve submeter a possibilishydade de sua quebra para fins tributaacuterios ao Poder Judiciaacuterio pela ausecircncia de interesse direto nos resultados da accedilatildeo fiscalizadora que eacute o recolhimento do tributo e pelas garantias de independecircncia prudecircncia e qualificaccedilatildeo juriacutedica que revestem esse poder

A atuaccedilatildeo da fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo pode ser exercida fora dos limishytes da legalidade imposta a partir da Carta Magna e demais imposiccedilotildees legais a ela subordinadas

Natildeo se desconhece que no atual Estado fiscal os tributos constituem os meios financeiros determinantes para o atendimento dos compromissos da Administraccedilatildeo Puacuteblica com as obrigaccedilotildees oriundas em decorrecircncia de sua atividade no campo educacional social de seguranccedila puacuteblica interna e extershyna da sauacutede da manutenccedilatildeo dos Poderes ou seja para manter funcionando a maacutequina estatal

Por natildeo entremostrar-se na eacutepoca contemporacircnea qualquer outra alshyternativa viaacutevel para transformar o Estado fiscal em um Estado produtivo os tributos passam a representar um indeclinaacutevel dever da cidadania cujo cumshyprimento deve ser por todos honrado conforme assinala Joseacute Casalta Nabais Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra em artigo intitulado Algumas Reflexotildees sobre o Actual Estado Fiscal

Por isso os impostos hatildeo de constituir um preccedilo aceitaacutevel ou seja um preccedilo limitado Um preccedilo que estou certo muitas das sociedashydes que nos antecederam gostariam de ter pago e algumas das actuais natildeo enjeitariam suportar Por isso bem podemos afirmar como jaacute o fizeshymos noutro lugar que no actual Estado fiscal para o qual natildeo se vislumshybra qualquer alternativa viaacutevel pelo menos nos tempos mais proacuteximos os impostos constituem um indeclinaacutevel dever de cidadania cujo cumshyprimento a todos nos deve honrar

A atuaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio para liberar o bloqueio fortalece a conshyfianccedila do cidadatildeo no procedimento da fiscalizaccedilatildeo e consagra a ideacuteia iacutensita em qualquer regime democraacutetico de que a atuaccedilatildeo do Estado tem limites

Na espeacutecie os limites impostos satildeo os decorrentes da quebra do sigilo ser necessaacuterio em face da possiacutevel ilicitude cometida pelo cidadatildeo poreacutem sem ser violados os direitos do cidadatildeo de gozar da sua privacidade e da sua intimidade

A denominada cidadania fiscal haacute de ser considerada de modo conjunshytural com os reflexos dos direitos fundamentais assegurados ao contribuinte sem prestigiar a responsabilidade que tem o Estado de promover a arrecadashyccedilatildeo dos tributos

256 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

Cedo espaccedilo para registrar que a cidadania fiscal deve configurar um estado de relaccedilatildeo juriacutedica em que todos suportem a concretizaccedilatildeo de um Estado em que todos tenham a qualidade de destinataacuterio do dever fundashymentaI de pagar impostos na medida da respectiva capacidade contributiva poreacutem que seja um Estado fiscal suportaacutevel isto eacute um estado cujo sistema fiscal se encontre balizado por estritos limites juriacutedico-constitucionais9

A Administraccedilatildeo Tributaacuteria por melhor que seja a sua estrutura e os seus propoacutesitos natildeo estaacute emocionalmente preparada para conceber e aplicar os princiacutepios que sustentam a cidadania fiscal Isso ocorre primeiramente porshyque o Fisco tem por missatildeo exclusiva exercer a funccedilatildeo de arrecadar tributos Eacute a sua meta essencial por ser atribuiccedilatildeo que na organizaccedilatildeo administrativa estatal estaacute obrigado a desempenhar Natildeo lhe cabe administrar o tributo arreshycadado limitando-se unicamente a envidar esforccedilos para o cumprimento das metas impostas para imprimir aumento na arrecadaccedilatildeo tributaacuteria O sucesso da Administraccedilatildeo Tributaacuteria eacute medido pelo maior volume de recursos fiscais atraiacutedos para os cofres do Governo nunca pelo respeito que exerccedila para com os direitos fundamentais do contribuinte Eacute uma questatildeo de cultura adminisshytrativa de distribuiccedilatildeo de funccedilotildees no sistema estatal impossiacutevel de ser mudashydo por sugestotildees doutrinaacuterias

Por outro lado a fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo consegue afastar as pressotildees exercidas sobre ela por determinados segmentos da organizaccedilatildeo estatal que defendem uma atuaccedilatildeo mais agressiva para a cobranccedila dos tributos tudo em decorrecircncia dos efeitos produzidos pela conduta iliacutecita marcante da sonegashyccedilatildeo fiscal

Esses fatores contribuem para que a fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo tenha condiccedilotildees de modo imparcial sem isenccedilatildeo avaliar a necessidade objetiva da quebra do sigilo bancaacuterio do cidadatildeo Por melhor que seja o seu desempenho nunca ganharaacute a confianccedila do contribuinte

A atribuiccedilatildeo da quebra do sigilo bancaacuterio em um regime democraacutetico onde predomina o respeito maior aos direitos fundamentais da cidadania deve ser exercido pelo Poder Judiciaacuterio natildeo soacute porque seus membros atualmente revestidos da garantia da vitaliciedade inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos bem como porque estatildeo revestidos de independecircncia absoluta em relaccedilatildeo ao Poder interessado na cobranccedila do tributo e consequumlentemenshyte no resultado a ser obtido pela accedilatildeo fiscal

Esse sistema misto onde o Fisco faz a solicitaccedilatildeo motivada para a queshybra do sigilo bancaacuterio ao Poder Judiciaacuterio e este apoacutes analisaacute-lo com objetivishydade e cautela defere ou indefere impotildee seguranccedila e confiabilidade na atuashyccedilatildeo fiscal e sublima o respeito agrave dignidade do contribuinte em outras palavras da cidadania fiscal isto eacute de uma cidadania de liberdade que o Estado fiscal

9 Joseacute Casalta Nabais (Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra) no artigo Algumas Reflexotildees sobre o Actual Estado Fiscal no site httpagugovbr

ENSAIOS JURiacuteDICOS 257

pressupotildee para natildeo ser postergada impotildee um sistema fiscal balizado por esshytritos limites juriacutedico-constitucionais Limites esses que integram a chamada constituiccedilatildeo fiscal e que podemos reconduzir para natildeo nos alongarmos nesse aspecto a duas ideacuteias uma ideacuteia de seguranccedila que tem o seu tradicional e principal suporte no princiacutepio da lega1idade fiscal e uma ideacuteia de justiccedila ou equumlidade que tem a ver com a medida dos impostos e assenta no princiacutepio da capacidade contributiva 10

Em conclusatildeo a adoccedilatildeo de um sistema para a quebra do sigilo bancaacuteshyrio em que o Poder Judiciaacuterio seja o aacuterbitro dos pedidos da Administraccedilatildeo Puacuteblica natildeo eacute somente mais justo mas consegue impor maior credibilidade agrave atuaccedilatildeo fiscal e presta homenagem com intensa potencialidade aos princiacuteshypios democraacuteticos consistentes na guarda da seguranccedila juriacutedica do respeito aos direitos fundamentais do cidadatildeo nesse rol incluidos os agrave privacidade e agrave intimidade Aleacutem disso torna mais respeitaacutevel a relaccedilatildeo entre Fisco e contrishybuinte justificando portanto a opccedilatildeo do Estado pelo regime democraacutetico

8 Autoridade fiscal e faculdade incondicionada de quebrar o sigilo bancaacuterio

Essa indagaccedilatildeo consubstancia a preocupaccedilatildeo de serem estabelecidos controles para a atuaccedilatildeo do agente puacuteblico fiscal Centra-se a preocupaccedilatildeo em imprimir nas relaccedilotildees juriacutedicas tributaacuterias de quaisquer espeacutecies o primashydo da legalidade aprimorando-se o atuar vinculado

Natildeo concilia-se com os postulados da democracia a adoccedilatildeo de um sisteshyma de fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria que outorgue faculdade incondicionada ao fiscal tributaacuterio de invadir a intimidade e a privacidade das pessoas sob o falso argushymento juriacutedico de que busca encontrar provas de sonegaccedilatildeo fiscal

Depreende-se do exposto que a autoridade fiscal natildeo deve ter faculdade incondicionada de quebrar o sigilo sempre que entender necessaacuterio Isso porshyque a praacutetica de atos administrativos por agentes puacuteblicos de modo incondicionado revela grave violaccedilatildeo ao princiacutepio da legalidade onde predoshymina a vontade da lei e natildeo o discricionarismo de quem o pratica

No trato do sigilo bancaacuterio o atuar incondicionado da fiscalizaccedilatildeo assushyme caracteriacutesticas de maior gravidade porque haacute violaccedilatildeo aos princiacutepios funshydamentais jaacute expostos e que satildeo prestigiados pela Carta Magna especialmenshyte por bater de frente de modo integral e absoluto com o direito agrave intimidade e agrave privacidade O atuar deve vincular-se rigidamente ao princiacutepio da legalidashyde especialmente aposta na Carta Magna sem a possibilidade de ser aberto qualquer canal para uso da conveniecircncia ou da oportunidade

Eacute de ser lembrada no trato do assunto a liccedilatildeo de Joseacute Casalta Nobais no trabalho jaacute citado no sentido de que Eacute certo que independentemente da

10 Idem p 15

=258=---___________________ SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTlCA

concepccedilatildeo a que se adira relativamente ao segredo bancaacuterio natildeo temos a menor duacutevida de que o acesso da Administraccedilatildeo Fiscal agrave informaccedilatildeo bancaacuteria seja directo sem necessidade de preacutevia decisatildeo judicial seja indirecto depois portanto de preacutevia decisatildeo judicial haacute de ter sempre uma natureza claramenshyte excepcional Na verdade constitua o segredo bancaacuterio uma manifestaccedilatildeo do direito fundamental agrave reserva da intimidade da vida privada constante do art 26 n 2 da Constituiccedilatildeo portuguesa ou suporte um outro direito fundashymentai um direito agrave reserva da vida privada anaacutelogo agravequele a sua afectaccedilatildeo teraacute sempre caraacuteter excepcional

A autoridade fiscal natildeo possui a necessaacuteria isenccedilatildeo e competecircncia institucional para averiguar o grau dessa excepcionalidade de modo que posshysa impor confianccedila ao cidadatildeo investido na condiccedilatildeo de contribuinte poreacutem com direitos a serem assegurados por forccedila do regime democraacutetico adotado

O certo eacute que na relaccedilatildeo juriacutedico-tributaacuteria deve ser buscado o justo equiliacutebrio pregado pelo Estado de Direito onde o cidadatildeo deve ter a sua dignishydade respeitada sem contudo afastar-se a necessidade do Estado arrecadar tributos de forma cogente e imperativa bem como de serem permitidas conshydiccedilotildees de atuaccedilatildeo que resultem no combate agrave sonegaccedilatildeo fiscal

9 Responsabilidade da autoridade administrativa que quebrar o sigilo banshycaacuterio de forma inconsistente e indevida

Eacute inerente ao regime democraacutetico que a autoridade administrativa puacuteblishyca estaacute obrigada a exercer as suas atribuiccedilotildees com rigorosa obediecircncia aos princiacutepios da legalidade moralidade publicidade impessoalidade e eficiecircncia entre outros

A Carta Magna consagra expressamente no art 37 a obediecircncia do agente puacuteblico a esse tipo de comportamento

A autoridade administrativia que quebrar de modo inconsistente e indevido o sigilo bancaacuterio do cidadatildeo pratica ato com capacidade de provocar os seguintes efeitos a) de invadir o direito agrave privacidade e agrave intimidade de algueacutem b) de provocar-lhe danos morais e materiais dependendo da repershycussatildeo provocada pelo seu atuar

Constatada a efetivaccedilatildeo real de danos morais e materiais a responsabishylidade do Estado pode ser acionada conforme permite o art 37 sect 6ordm da Consshytituiccedilatildeo Federal Solidificada a culpa ou dolo do agente puacuteblico e consagrada a materializaccedilatildeo do iliacutecito praticado com o consequumlente ressarcimento patrimonial o Estado deveraacute usando o direito de regresso investir contra o agente que agiu culposa ou dolosamente

Natildeo resume-se apenas ao campo da responsabilidade civil a atuaccedilatildeo da autoridade quando ilegalmente quebra o sigilo bancaacuterio de qualquer cidadatildeo

ENSAIOS JURiacuteDICOS 259

o art 10 da Lei Complementar n 105 de 10 de janeiro de 2001 determishyna que A quebra de sigilo fora das hipoacuteteses autorizadas nesta lei compleshymentar constitui crime e sujeita os responsaacuteveis agrave pena de reclusatildeo de um a quatro anos e multa aplicando-se no que couber o Coacutedigo Penal sem prejuiacuteshyzo de outras sanccedilotildees cabiacuteveis A seguir no seu paraacutegrafo uacutenico explicita que Incorre nas mesmas penas quem omitir retardar injustificadamente ou presshytar falsamente as informaccedilotildees requeridas nos termos desta lei complementar

O art 11 da mesma lei complementar expressa que O servidor puacuteblico que utilizar ou viabilizar a utilizaccedilatildeo de qualquer informaccedilatildeo obtida em decorshyrecircncia da quebra de sigilo de que trata esta lei complementar responde pessoshyal e diretamente pelos danos decorrentes sem prejuiacutezo da responsabilidade objetiva da entidade puacuteblica quando comprovado que o servidor agiu de acorshydo com a orientaccedilatildeo oficial

10 O sigilo bancaacuterio e o tratamento que lhe eacute dado por oacutergatildeos internacioshynais como a OCDE e outros

Rui Celso Reali Fragoso Presidente do Instituto dos Advogados de Satildeo Paulo em artigo intitulado O Sigilo Bancaacuterio veiculado pela Internet (http Ii wwwjuscombr) registra que atualmente temos trecircs sistemas legais no munshydo cuidando do sigilo bancaacuterio O primeiro eacute o anglo-saxatildeo em que o sigilo natildeo encontra amparo legal o segundo eacute o dos paiacuteses da Europa continental - eu o contemplo em vaacuterios diplomas legais o terceiro eacute o da Suiacuteccedila e do Liacutebano que o reforccedilam

Analisando esses trecircs sistemas o autor citado observa

Haacute aparente contradiccedilatildeo no sistema inglecircs e norte-americano pois se de um lado nestes paiacuteses se eleva a garantia das liberdades individuais de outro se despreza o sigilo bancaacuterio Eacute que se ocorre conshyflito entre a apuraccedilatildeo de fatos (fator social) e a privacidade das pessoas (fator individual) prevalece a primeira Mais ainda o relacionamento de clientes e bancos longe de estabelececirc-lo serve como fonte de informashyccedilatildeo em favor de terceiros a indiscriccedilatildeo injustificada poreacutem eacute objeto de sanccedilatildeo E na Inglaterra os poderes puacuteblicos natildeo intervecircm no funcionashymento dos estabelecimentos privados de creacutedito o que debilita a invesshytigaccedilatildeo

Nos paiacuteses da Europa continental a legislaccedilatildeo contempla o sigilo bancaacuterio como consequumlecircncia do profissional e comporta derrogaccedilotildees na esfera penal e em alguns casos na civil mas comina sanccedilotildees crimishynais no caso de violaccedilatildeo ao sigilo (Coacutedigo Penal francecircs artigo 378 Coacuteshydigo Penal italiano art 622)

260 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

A sistemaacutetica fortalecida eacute aquela utilizada na Suiacuteccedila decorrente da crise ocorrida em 1931 com o fechamento do Banco de Genebra que ensejou a ediccedilatildeo de lei estabelecendo severas puniccedilotildees de natureza civil e criminal Tanto a legislaccedilatildeo suiacuteccedila como a libanesa esta surgida em 1956 permitem derrogaccedilotildees em certas hipoacuteteses A existecircncia das conshytas numeradas comprova a importacircncia do sigilo nestes paiacuteses

Eacute certo natildeo ser absoluto o segredo nem sua quebra em determishynadas situaccedilotildees significa abuso de poder Aliaacutes nenhum direito eacute absoluto

A doutrina tem ultimamente tomado conhecimento sobre as transforshymaccedilotildees que tem passado em vaacuterios ordenamentos juriacutedicos a questatildeo do sigilo bancaacuterio

Zenobio Simotildees de Melo advogado no Paranaacute em artigo sob o tiacutetulo Quebra do Sigilo Bancaacuterio (Internet httpjuscombr) informa que o jornal O Estado de Satildeo Paulo de 21 de junho de 2000 publicou a notiacutecia seguinte

Numa das mais importantes decisotildees adotadas durante o Conseshylho Europeu que marca o fim da presidecircncia portuguesa da Uniatildeo Euroshypeacuteia (UE) seus 15 paiacuteses aprovaram ontem o pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal No ponto mais polecircmico o pacote deveraacute acabar com o sigilo bancaacuterio ateacute 2010 foi uma negociaccedilatildeo de 12 anos Aacuteustria e Luxemburgo natildeo aceitavam o princiacutepio de acabar com o sigilo bancaacuterio A justificativa austriacuteaca eacute que este eacute um princiacutepio que faz parte da Consshytituiccedilatildeo do paiacutes haacute 200 anos Para aceitar o acordo o paiacutes exigiu a manushytenccedilatildeo do sigilo nos bancos austriacuteacos para quem resida no paiacutes

Registro a iacutentegra da notiacutecia

Pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal eacute aprovado por membros da UE Decisatildeo prevecirc quebra do sigilo bancaacuterio nos paiacuteses do bloco econocircmico

Jair Rattner

Especial para o Estado

Santa Maria da Feira Portugal- Numa das mais importantes decishysotildees adotadas durante o Conselho Europeu que marca o fim da presishydecircncia portuguesa da Uniatildeo Europeacuteia (UE) seus 15 paiacuteses aprovaram ontem o pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal No ponto mais polecircmico o pashycote deveraacute acabar com o sigilo bancaacuterio ateacute 2010

Foi uma negociaccedilatildeo de 12 anos Agora temos um documento que vai estabelecer os princiacutepios e as orientaccedilotildees para as futuras diretivas nessa aacuterea afirmou o Primeiro-Ministro Portuguecircs Antonio Guterres que ocupa a presidecircncia rotativa da UE (no fim do mecircs ela seraacute transferida para a Franccedila)

ENSAIOS JURiacuteDICOS 261

o acordo abrange trecircs aacutereas um coacutedigo de conduta que prevecirc o desmantelamento dos 66 paraiacutesos fiscais existentes ou dependentes da UE a tributaccedilatildeo de royalties e o pagamento de impostos sobre rendishymentos das poupanccedilas de cidadatildeos europeus residentes em outros paiacuteshyses dentre os 15 que fazem parte do bloco econocircmico europeu

O grande problema eram as poupanccedilas Aacuteustria e Luxemburgo natildeo aceitavam o princiacutepio de acabar com o sigilo bancaacuterio A justificativa austriacuteaca eacute que este eacute um princiacutepio que faz parte da Constituiccedilatildeo do paiacutes haacute 200 anos Para aceitar o acordo o paiacutes exigiu a manutenccedilatildeo do sigilo nos bancos austriacuteacos para quem resida no paiacutes Essa questatildeo natildeo eacute importante soacute para a Europa porque abre caminho para a criaccedilatildeo de mecanismos de transparecircncia global no mundo financeiro que satildeo esshysenciais para a globalizaccedilatildeo da economia avaliou Guterres

O prazo para a introduccedilatildeo das mudanccedilas vai ateacute o fim de 2010 Ateacute o fim deste ano as negociaccedilotildees vatildeo ser sobre a definiccedilatildeo do conteuacutedo das diretivas (as normas da UE)

Em 2002 a UE discutiraacute com outros paiacuteses esses conteuacutedos para fazer acordos que deveratildeo ser aprovados ateacute o fim do ano por unanimishydade

A partir de 2003 seraacute iniciado um periacuteodo de sete anos de transishyccedilatildeo para a troca de informaccedilotildees sobre os investimentos de cidadatildeos de outros paiacuteses europeus Nesse periacuteodo alguns paiacuteses poderatildeo optar por cobrar impostos de 20 a 25 sobre os rendimentos dos investimentos de residentes no exterior

No capiacutetulo onde foi analisado o sigilo bancaacuterio no Direito Comparado haacute registros tambeacutem a respeito do tratamento que oacutergatildeos internacionais como o OCDEll e outros vecircm dando ao sigilo bancaacuterio conforme estudo que foi apresentado pelo autor ali citado

II OCDE (Organizaccedilatildeo de Cooperaccedilatildeo e Desenvolvimento Econocircmico) criado em 1961 para substituir a OECE (Comitecirc Fiscal da Organizaccedilatildeo Europeacuteia de Cooperaccedilatildeo Econocircmica) Um dos documentos mais importantes da OCDE eacute o resultante da sua Convenccedilatildeo-Modelo relashytiva a impostos sobre a renda e o capital Essa Convenccedilatildeo estaacute sistematizada em sete capiacutetulos assim explicitados por Alberto Xavier em sua obra Direito Tributaacuterio Internacioshynal do Brasil A Convenccedilatildeo-Modelo da OCDE (tal como a das Naccedilocirces Unidas) encontra-se sistematizada em sete capiacutetulos Os capiacutetulos I e I regulam os requisitos para a aplicaccedilatildeo do tratado O capiacutetulo [JI - de longe o mais importante - conteacutem as regras de distribuiccedilatildeo de competecircncia no que concerne aos impostos sobre o rendimento classificado este por tipos ou classes agrave semelhanccedila do que sucede nos sistemas de tributaccedilatildeo cedular O capiacutetulo IV ocupa-se das regras de distribuiccedilatildeo de competecircncia no que respeita aos impostos sobre o capital O capiacutetulo V determina as consequumlecircncias das regras dos capiacutetulos 111 e IV facultanshydo aos Estados a escolha entre os meacutetodos da isenccedilatildeo e da imputaccedilatildeo O capiacutetulo VI conteacutem disposiccedilotildees adicionais sobre natildeo-discriminaccedilatildeo procedimento amigaacutevel troca de informaccedilotildees e privileacutegios de funcionaacuterios diplomaacuteticos e consulares e regras sobre extenshysatildeo do tratado a partes do territoacuterio Enfim o capiacutetulo VII conteacutem disposiccedilotildees finais sobre entrada em vigor e cessaccedilatildeo do acordo

262 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

Heleno Torres em sua recente obra Direito Tributaacuterio Internacional -Planejamento Tributaacuterio e Operaccedilotildees Transnacionais RT p 147 analisando o posicionamento da OCDE referente agrave poliacutetica de determinados paiacuteses que adoshytam tributaccedilatildeo favorecida e os efeitos dos regimes fiscais prejudiciais registra que

A OCDE resolveu entrar na luta para minorar as praacuteticas fiscalshymente danosas insistindo sobre a necessidade de aumentar as trocas de informaccedilotildees entre os Estados aleacutem de redigir uma lista de paiacuteses com tributaccedilatildeo favorecida e fazer algumas recomendaccedilotildees em acircmbito nacional e convencional a partir do seu importante relatoacuterio Harmful tax competition na emerging global issue

Mesmo reconhecendo os aspectos positivos do ambiente global vigente no qual os sistemas tributaacuterios operam os paiacuteses-membros da OCDE concluiacuteram que eles precisavam agir para restringir a competiccedilatildeo tributaacuteria danosa coletivamente e individualmente opondo-se agrave expanshysatildeo de regimes de impostos preferenciais danosos particularmente nos setores financeiros e atividades de serviccedilo que podem causar distorccedilotildees no comeacutercio e desniacuteveis nos padrotildees de investimento sendo uma ameashyccedila para os sistemas tributaacuterios domeacutesticos e para a estrutura global de tributaccedilatildeo internacional

Mais adiante pp 152153 Heleno Torres afirma que

Entre as recomendaccedilotildees definidas nesse relatoacuterio com aplicashyccedilatildeo dirigida aos paiacuteses-membros da instituiccedilatildeo as mais importantes satildeo as seguintes

bull para contrastar a competiccedilatildeo fiscal prejudicial os paiacuteses devem revisar as suas leis regulamentos e praacuteticas sobre sigilo bancaacuterio para remover empecilhos de acesso a tais informaccedilotildees por autoridades fiscais

bull intensificar o uso de trocas de informaccedilotildees principalmente soshybre as transaccedilotildees com paiacuteses de tributaccedilatildeo favorecida

A conclusatildeo que pode ser firmada apoacutes anaacutelise dos pronunciamentos internacionais acima explicitados eacute a construccedilatildeo de uma corrente que defenshyde uma maior abertura para a quebra do sigilo bancaacuterio quando for necessaacuteshyrio para apurar iliacutecitos tributaacuterios

Essa portanto eacute a resposta que apresento para a indagaccedilatildeo Qual o tratamento proposto por oacutergatildeos internacionais como o OCDE e outros com relaccedilatildeo ao sigilo bancaacuterio

ENSAIOS JURiacuteDICOS 263

11 Compatibilizaccedilatildeo do combate agrave criminalidade internacional com o resshypeito agrave seguranccedila juriacutedica a fim de evitar a fuga de investimentos do Paiacutes

Haacute de se reconhecer natildeo ser faacutecil desenvolver-se um sistema juriacutedico que contenha regras que facilitem o combate agrave criminalidade internacional e ao mesmo tempo prestigie os direitos fundamentais do cidadatildeo especialmenshyte a sua seguranccedila juriacutedica

As convenccedilotildees internacionais conforme demonstrado estatildeo preocupashydas com esses aspectos sem deixar de lado os fenocircmenos causados pela globalizaccedilatildeo

Natildeo deve ser esquecido que o tema envolve aspectos diversos a comeshyccedilar pelos determinantes da soberania dos Estados das forccedilas em expansatildeo das organizaccedilotildees internacionais e da pregaccedilatildeo para que os direitos fundamenshytaIacutes do cidadatildeo sejam respeitados com maior Iacutentensidade

A soluccedilatildeo a meu pensar pode ser encontrada no fortalecimento do Direito Comunitaacuterio Os Estados por via de organismos internacionais firmashyriam tratados para a adoccedilatildeo de um Coacutedigo Processual Penal Internacional com efeitos vinculantes por parte das naccedilotildees onde seriam adotadas regras investigatoacuterias e apuratoacuterias dos iliacutecitos internacionais alargando os conceitos de indiacutecios e presunccedilotildees sem deixar contudo de prestigiar a afetividade dos direitos e garantias fundamentais do cidadatildeo

Todas as naccedilotildees no iniacutecio deste seacuteculo envidam esforccedilos para diminuir a crise da seguranccedila juriacutedica Satildeo vaacuterios os fatores determinantes todos tendo como causa comum o crescimento da delinquumlecircncia em decorrecircncia de poliacutetishycas econocircmicas e sociais adotadas por determinados governos que contrishybuem para aumentar o percentual de pessoas pobres

A preocupaccedilatildeo atual para o combate ao crime internacional eacute alcanccedilar niacutevel de uniformizaccedilatildeo dos sistemas adotados para a quebra do sigilo bancaacuteshyrio De iniacutecio deve ser defendida a postura de que nenhuma lesatildeo ou ameaccedila a direito deve ser excluiacuteda da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio Nessa perspectishyva ganha suma importacircncia a criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional em virshytude de pela sua atuaccedilatildeo natildeo perdurar a diversidade de sistemas legais a respeito do assunto a saber a) O anglo-saxatildeo onde o sigilo natildeo encontra amparo legal b) o dos paiacuteses da Europa continental que o contempla em vaacuterios diplomas escritos e c) o da Suiacuteccedila e do Liacutebano que o reforccedilam l2bull

A criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional envolve uma reconceiacutetuaccedilatildeo de soberania

Sobre o tema Celso D de Albuquerque Mello em Direito Internacional da Integraccedilatildeo Ed Renovar p 13 faz a seguinte observaccedilatildeo

12 Conforme anota Rui Celso Reali Fragoso no artigo O Sigilo Bancaacuterio publicado no site httpvvwwjuscombr

264 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Poder-se-ia fazer um pequeno reparo a Chaumont que a indeshypendecircncia nacional eacute um conceito juridicamente indeterminado e que ela pode ter diferentes graus Tanto que podemos escrever soberania versus cooperaccedilatildeo internacional apesar de reconhecermos que esta posiccedilatildeo pode ser considerada como radical vez que natildeo haacute uma total incompatibilidade entre as duas Entretanto natildeo se pode deixar de consshytatar que de certo modo a cooperaccedilatildeo internacional se encontra conshysagrada na Carta da ONU no arl 1 ordm que trata dos Propoacutesitos das Naccedilotildees Unidas e nos Princiacutepios estabelecidos na Carta da OEA (Capiacutetulo 11) O mesmo ocorre na resoluccedilatildeo da Assembleacuteia Geral da ONU de 1970 que aprova a Declaraccedilatildeo Relativa aos Princiacutepios do Direito Internacional Reshylativas agraves Relaccedilotildees Amigaacuteveis e agrave Cooperaccedilatildeo entre os Estados conforme a Carta das Naccedilotildees Unidas bem como na Carta de Direitos e Deveres Econocircmicos aprovada pela mesma Assembleacuteia Geral em 1974

O crescimento do crime internacional em decorrecircncia dos fenocircmenos globalizantes determina o surgimento de um dever juriacutedico dos Estados firmashyrem pactos de cooperaccedilatildeo entre si para que enfrentem as organizaccedilotildees voltashydas para a criminalidade Esse dever juriacutedico globalizado tem suas raiacutezes no moral intemacional que conforme assinala Celso Albuquerque Mello na obra citada p 13 sempre consagrou o princiacutepio da solidariedade ou ainda do auxiacutelio muacutetuo

Eacute o mais importante desafio neste iniacutecio de seacuteculo fazer com que surja uma legislaccedilatildeo internacional que compatibilize o combate agrave criminalidade inshyternacional sem violar a seguranccedila juriacutedica com finalidade exclusiva de evitar a fuga de investimenos do Paiacutes

Tenha-se contudo em consideraccedilatildeo que a globalizaccedilatildeo do crime emshybora seja uma grande ameaccedila aos valores tradicionais que sustentam a cidashydania especialmente a seguranccedila juriacutedica natildeo deve prejudicar o desenvolvishymento econocircmico de qualquer naccedilatildeo

Natildeo faccedilo coro ao assinalado por Eric Hobsbawm em sua obra Era dos Extremos O Breve Seacuteculo XX 1914-1991 1995 p 24 Companhia das Letras S Paulo traduccedilatildeo de Marcos Santarrita no sentido de que Talvez a caracteriacutesshytica mais impressionante do fim do seacuteculo XX seja a tensatildeo entre esse processo de globalizaccedilatildeo cada vez mais acelerado e a incapacidade conjunta das instishytuiccedilotildees puacuteblicas e do comportamento coletivo dos seres humanos de se acoshymodarem a ele

Penso que natildeo haacute essa acomodaccedilatildeo e que as instituiccedilotildees puacuteblicas espeshycialmente as submetidas ao controle da ciecircncia juriacutedica natildeo estatildeo incapacitashydas de encontrar caminhos que solucionem o problema existente

ENSAIOS JURiacuteDICOS 265

Eacute por demais positivo entre outros acontecimentos o fato da conscienshytizaccedilatildeo de que haacute de ser encontrada uma forma de combate agrave criminalidade internacional que natildeo afaste a garantia da seguranccedila juriacutedica Esta eacute uma neshycessidade para impor paz agrave naccedilatildeo e consequumlentemente criar ambiente para que novos investimentos necessaacuterios ao desenvolvimento do seu processo econocircmico aconteccedilam sem se falar na manutenccedilatildeo dos jaacute existentes

O Parlamento Europeu aprovou ultimamente uma resoluccedilatildeo sobre a criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional sob a consideraccedilatildeo de que eacute necessaacuteshyrio criaacute-lo de forma permanente para complementar os sistemas judiciais nashycionais e pocircr fim agrave impunidade de que gozam os responsaacuteveis por genociacutedio crimes contra a humanidade e crimes de guerra

A abertura para essa posiccedilatildeo denota a formaccedilatildeo de uma consciecircncia internacional para combater a criminalidade internacional em todos os niacuteveis contribuindo para fortalecer a seguranccedila juriacutedica interna de cada paiacutes

O documento representativo dessa resoluccedilatildeo eacute do teor seguinte

Parlamento Europeo

Resolucioacuten sobre el Tribunal Penal Internacional

EI Parlamento Europeo

Vistas sus anteriores resoluciones sobre un Tribunal Penal Interna-cional

A Considerando que es necesario crear un Tribunal Penallnternashycional permanente que complemente los sistemasjudiciales nacionales y ponga fin a la impunidad de que gozan los responsables de genocidio crimenes contra la humanidad y criacutemenes de guerra

B Considerando que la Comisioacuten de Derechos Humanos de las Naciones Unidas estaacute respaldando decididamente la creacioacuten de ese Trishybunal

C Considerando que la fase preparatoria de la creacioacuten dei Tribushynal Penal Internacional finalizoacute con la uacuteltima sesioacuten dei Comiteacute Preparatorio de las Naciones Unidas que tuvo lugar dei 16 de marzo al3 de abril de 1998

D Felicitaacutendose por la creciente participacioacuten de Estados en el proceso de negociaciones y esperando que un nuacutemero auacuten mayor de Esshytados procedentes de todas las regiones se encuentre plenamente represhysentado en la Conferencia Diplomaacutetica de Roma

E Considerando que dei 15 de junio al17 de julio de 1998 se celebra en Roma la Conferencia Diplomaacutetica de Plenipotenciarios para la constitucioacuten de un Tribunal Penal Internacional

266 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

F Considerando que los Estados miembros y la delegacioacuten de la Comisioacuten Europea que participan en la Conferencia Diplomaacutetica de Roma pueden desempenar un papel crucial a la hora de garantizar el eacutexito de la conclusioacuten de esta Conferencia Diplomaacutetica y acogiendo positivamente la mayor convergenciacutea de las posturas de los Estados miembros de la UE

G Congratulaacutendose por la oferta dei Gobierno de los Paiacuteses Bajos de servir de sede dei Tribunal Penal Internacional permanente

I Insta a la Conferencia Diplomaacutetica de Roma a aprovechar la oportunidad histoacuterica de concluir un texto de Estatuto para un Tribunal Penal Internacional independiente justo y eficaz

2 Insta a los representantes de los Estados miembros dei Consejo y de la Comisioacuten a garantizar activamente el ecircxito de los resultados a sashyber un auteacutentico Tribunal Penal Internacional en lugar de limitarse a un acuerdo de compromiso sobre principios esenciales en sus esfuerzos por conciliar las posturas de Estados reticentes

3 Destaca que para constituir un complemento eficaz de los sisteshymas judiciacuteales nacionales el Estatuto dei Tribunal Penal Internacional permanente objeto de la Conferencia de Roma deberaacute establecer

a un Fiscal independiente con competencias para investigare insshytruir sumarios por propia iniciativa en situaciones en las que se hayan cometido los delitos sometidos a lajurisdiccioacuten dei Tribunal

b Ia jurisdiccioacuten inherente y universal dei Tribunal en materia de genocidio criacutemenes contra la humanidad criacutemenes de guerra y agresioacuten sin que se requiera ninguacuten consentimiento dei Estado

c una buena relacioacuten de trabajo con los Tribunales lnternacionales ya establecidos en La Haya

d una relacioacuten constructiva con las Naciones Unidas yen partishycular con el Consejo de Seguridad basada en el pleno reconocimiento de sus respectivas funciones y competencias

e Ia obligacioacuten de los Estados firmantes de acatar y hacer cumplir sin demora las oacuterdenes y decisiones dei Tribunal

f los mayores niveles de respeto de los derechos de los acusados y de los sospechosos y de proteccioacuten de los intereses de las viacutectimas y de los testigos

g Ia garantiacutea de una financiacioacuten a largo plazo necesaria para asegurar la autonomiacutea e independencia dei Tribunal frente a cualquier presioacuten exterior

4 Destaca ademaacutes que la jurisdiccioacuten deI Tribunal sobre los delishytos de genociacutedio los criacutemenes contra la humanidad y los criacutemenes de

ENSAIOS JURiacuteDICOS 267

guerra deben considerarse con la misma calificacioacuten penal con indepenshydencia de que se hayan cometido en conflictos armados internacionales o en conflictos internos

5 Insta ai Consejo y a los Estados miembros a garantizar la universalidad y la transparencia de las negociaciones y la participacioacuten continuada de la comunidadjuriacutedica y la sociedad civil internacionales

6 Encarga a su Presidente que transmita la presente resolucioacuten ai Consejo a la Comisioacuten a los Gobiernos de los Estados miembros ai Secreshytario General de las Naciones Unidas ai Presidente de la Asamblea Geneshyral de las Naciones Unidas y ai Presidente de la Conferencia Diplomaacutetica de las Naciones Unidas para la constitucioacuten de un Tribunal Penal Internashycional

A resoluccedilatildeo supracitada demonstra que cresce a conscientizaccedilatildeo da necessidade de ser criado um Tribunal Penal Internacional com forccedila cogente obrigatoacuteria de suas decisotildees no acircmbito interno dos paiacuteses que participarem do pacto de sua constituiccedilatildeo

A doutrina internacional revela que a comunidade internacional somenshyte agora vem se preocupando em criar uma estructura internacional para determinar las responsabilidades individuales emergentes de violacioacuten de ciertos derechos baacutesicos dei ser humano Los mecanismos de responsabilidad estatal creados desde los 60 se dirigen a la mayor protecciotilden dei ser humano y la erradicacioacuten de las praacutecticas de volacioacuten sistemaacutetica de los derechos humanos ar via de la condena ai Estado que ordena o que tolera los abusos por lo cual se estructuraron entorno ai Estado conmo sujeto responsable Como haacute seflalado la Corte Internacional de Derechos Humanos el procedimiento ante ella no es un procedimiento penal lo que se busca determinar es el nivel de cumprimiento por parte de un Estado de sus obligaciones de derecho internacional Sin desconocer la importancia de determinar la responsabilidad dei Estado para que eacuteste tenga un incentivo para erradicar esas praacutectica de sus frotneras es pertinente detacar que las violaciones maacutes grave son en uacuteltima instancia coshymetidas por individuos (Francisco Cox Encarregado dei TPI HOH em artigo intitulado EI IlOH ante la Craciotilden de um Tribunal Penal Internacional no site httpwwwiidhedcrcpitpintrohtml)

A criaccedilatildeo de um Tribunal Penal Internacional atuaria permanentemente e teria competecircncia subsidiaacuteria em relaccedilatildeo agrave outorgada aos Tribunais Nacioshynais limitando-se a atuar apenas nos crimes internacionais previamente defishynidos como sendo do interesse da comunidade global

Merece registro no acircmbito do assunto tratado que na Conferecircncia Reshygional sobre o Tribunal Penal Internacional realizada em 18 e 19 de fevereiro de 1998 na cidade de Guatemala Guatemala um dos temas tratados foi o relativo

268 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

agrave harmonizaccedilatildeo das incriminaccedilotildees quando os seguintes aspectos foram disshycutidos Branqueamento corrupccedilatildeo fraude fiscal participaccedilatildeo em associashyccedilotildees criminosas um olhar agrave luz dos direitos nacionais e do direito internacioshynal Perspectivas Quais os comportamentos a incriminar Criar uma nova incriminaccedilatildeo da fraude fiscal Uma tentativa de harmonizaccedilatildeo o corpus jurls contendo disposiccedilotildees penais para proteccedilatildeo dos interesses financeiros da Uniatildeo Europeacuteia As negociaccedilotildees no seio do Conselho da Europa e da OCDE referenshytes agrave luta contra a corrupccedilatildeo etc O referido painel foi presidido por Benoit Dejemeppe procurador do Rei em Bruxelas e contou com a presenccedila de Tereshyza Beleza professora de Direito Penal na Faculdade de Direito de Lisboa como moderadora

Haacute como visto um largo campo de anaacutelise para desenvolver com possishybilidade do surgimento de sugestotildees que levem a ciecircncia juriacutedica a alcanccedilar com a atuaccedilatildeo estatal uma competecircncia internacional que possa combater o crime internacional e ao mesmo tempo proporcione seguranccedila juriacutedica na ordem interna ganhando assim o sistema juriacutedico confianccedila dos investidoshyres

Em conclusatildeo a forma de compatibilizar o combate agrave criminalidade internacional sem violar a seguranccedila juriacutedica necessaacuteria a evitar a fuga de inshyvestimentos do paiacutes estaacute na criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional com comshypetecircncia definida para processar e julgar delitos globalizantes e cujas decisotildees tenham forccedila imperativa no acircmbito interno das naccedilotildees participantes do pacto para o seu nascimento

Page 12: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro

234 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

de informaccedilatildeo que segundo as circunstacircncias se impotildeem ao agente se pudesse considerar meio adequado para alcanccedilar aquele fim - natildeo conteacutem o Coacutedigo Penal actuaJ relativamente ao crime de violaccedilatildeo ao segredo profissional qualquer causa especiacutefica de exclusatildeo da ilicitude pelo que haacute que atentar nas causas gerais de exclusatildeo da ilicitude

Ao abordar o conflito de deveres dispotildee o art 36 n 1 do Coacutedigo Penal que natildeo eacute iliacutecito o facto de quem em caso de conflito no cumprishymento de deveres juriacutedicos ou de ordens legiacutetimas da autoridade satisfishyzer dever ou ordem de valor igualou superior ao do dever ou ordem que sacrificar Natildeo seraacute pois iliacutecita a violaccedilatildeo ao segredo profissional se perante um conflito de deveres o agente satisfizer o dever de valor igual ou superior ao do dever que sacrifica

No Coacutedigo de Processo Penal generalizou-se a possibilidade de quebra do segredo profissional

Assim as pessoas indicadas no n 1 do sobredito art 78 podem recusar-se a depor sobre factos objecto de segredo profissional mas se a autoridade judiciaacuteria concluindo embora pela legitimidade da recusa natildeo prescindir desse depoimento pode requerer ao tribunal que o ordeshyne E o tribunal deveraacute ordenar a prestaccedilatildeo do depoimento com quebra do segredo profissional sempre que entender que esta se mostra justificada face agraves normas e princiacutepios aplicaacuteveis da lei penal nomeadashymente ao princiacutepio da prevalecircncia do interesse preponderante - cf art 135 n 12 e 3 do Coacutedigo de Processo Penal

A possibilidade de apreensatildeo pela autoridade judiciaacuteria de tiacutetulos valores quantias ou outros objectos depositados em bancos ou outras instituiccedilotildees de creacutedito relacionados com um crime e que possam ser de grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova bem como a possibilidade de exame pelo juiz de correspondecircncia e documenshytaccedilatildeo bancaacuterias estatildeo previstas no art 181 n 1 e 2 do Coacutedigo de Processhyso Penal As pessoas obrigadas ao dever de segredo profissional podem recusar apresentar aqueles documentos ou objectos em seu poder se invocarem por escrito segredo profissional caso em que o conflito de interesses e deveres assim surgido seraacute dirimido pelo tribunal nos tershymos idecircnticos aos previstos para a recusa de depoimento - cf arts 182 n 2 e 135 ambos do citado coacutedigo

Enquanto o dever de segredo profissional eacute geralmente estabeleshycido a favor da integridade e liberdade das pessoas a quem aproveita tendo-se inserido a sua regulamentaccedilatildeo no Tiacutetulo VI do atraacutes mencionashydo Regime Geral das Instituiccedilotildees de Creacutedito e Sociedades Financeiras no qual se prevecirc um conjunto de regras de conduta que devem guiar a actuaccedilatildeo das instituiccedilotildees de creacutedito seus administradores e empregados

ENSAIOS JURiacuteDICOS 235

nas relaccedilotildees com os clientes visando proteger de forma eficaz a posishyccedilatildeo do consumidor de serviccedilos financeiros (cf preacircmbulo do Decreshyto-Lei n 2981992) ou estabelecer um clima de confianccedila na banca que permita a captaccedilatildeo e recuperaccedilatildeo do dinheiro entesourado (como se dizia no relatoacuterio do Decreto-Lei n 21978 de 9 de janeiro revogado pelo n 1 do art 5Q do citado Decreto-Lei n 2981992) no processo de inqueacuteshyrito a que procede o Ministeacuterio Puacuteblico estaacute em causa a realizaccedilatildeo de diligecircncias de prova que permitam investigar um crime de emissatildeo de cheque sem provisatildeo sob a eacutegide do princiacutepio da verdade material e incriminar o respectivo agente

O interesse que estaacute em jogo com a pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblishyco na obtenccedilatildeo da documentaccedilatildeo bancaacuteria eacute o da boa administraccedilatildeo da Justiccedila Penal e esse interesse eacute no caso em apreccedilo sensivelmente supeshyrior ao interesse da manutenccedilatildeo do segredo bancaacuterio o que equivale a di~er que este deve ceder perante aquele

Em suma no caso concreto ponderados os interesses em conflishyto entendemos que a quebra do dever de sigilo bancaacuterio se justifica nos termos do art 36 do Coacutedigo Penal pelo que deve ser dada procedecircncia agrave pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico e consequumlentemente ao abrigo do disposto nos arts 182 n 2 e 135 n 2 e 3 ambos do Coacutedigo de Processo Penal dispensar-se a Caixa Geral de Depoacutesitos do cumprimento do deshyver de sigilo bancaacuterio a fim de poder satisfazer tal pretensatildeo

3 Por todo o exposto determina-se que com quebra do dever de sigilo bancaacuterio a Caixa Geral de Depoacutesitos forneccedila ao Digno Magistrado do Ministeacuterio Puacuteblico com destino ao Processo de Inqueacuterito n 3571 1994 a documentaccedilatildeo bancaacuteria que este lhe havia solicitado

Natildeo eacute devida taxa de justiccedila

Texto processado e integralmente revisto pelo relator

Desembargador-Relator Rui Mauriacutecio

g) Substancioso estudo do sigilo bancaacuterio no Direito Comparado foi feishyto por Andreacute Serratildeo Borges de Sampaio Consultor da Uniatildeo nas informashyccedilotildees que prestou ao Advogado-Geral da Uniatildeo com referecircncia agrave ADIn n 2397 Transcrevo o inteiro teor do seu pronunciamento

51

6 O tratamento do sigilo bancaacuterio no Direito Comparado

Em verdade o Direito Comparado entende inoponiacutevel o sigilo banshycaacuterio agraves autoridades tributaacuterias Com efeito leciona Alfredo Echeverriacutea Herrera verbis

236 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

EI sigilo bancario constituye un reacutegimen limitado exclusivashymente ai aacutembito de las relaciones entre la institucioacuten bancaria y sus clientes e impone la obligacioacuten de confidencialidad de la institucioacuten sobre las informaciones que aqueacutellos le proporcionan

En todas las legislaciones bancarias el sigilo es relativo es decir el derecho dei ciudadano ai secreto y la correlativa obligacioacuten para el banco de no revelar a terceros las informaciones recibidas en el ejercicio de su actividad ceden cuando existe norma legal expresa o causa justificada

Elliacutemite legal ai sigilo estaacute constituiacutedo por la obligacioacuten dei banco de entregar informaciones y se fundamenta en motivos sushyperiores de orden puacuteblico o general siendo liacutecito entonces que el Estado establezca Iiacutemites legales ai secreto bancaria para auxiliar por ejemplo las actuaciones de la Justicia en el plano jurisdiccional y las dei Estado en el aacutembito dei ejercicio de su potestad impositiva

Es un principio irrebatible en la vida dei derecho que ni la autonomia de las personas ni los instrumentos dei aacuterea econoacutemica y financiera pueden servir en un momento dado como elementos juridicamente idoacuteneos para lesionar el intereacutes puacuteblico En consecuencia se puede afirmar que las limitaciones ai sigilo bancario son salvaguardias necesarias ai bien comuacuten en los caacutenones dei Estado moderno Estas limites deben ser materias reshyservadas a la ley por ser de caraacutecter excepcional en sentido estricto

En este orden de ideas necesariamente debe concluirse que existen legiacutetimos y superiores intereses en diversas aacutereas de la sociedad que se vinculan ai bien comuacuten y que deben ser tutelados por el Estado como lo es por ejemplo la necesidad de detectar y reprimir la evasioacuten de los impuestos los cuales transcienden ai evenshytual intereacutes geneacuterico que pueda tener el mismo Estado en la mantencioacuten dei sigilo bancaria En efecto desde el punto de vista de lajuridicidad y de la eacutetica no se puede sostener que el secreto bancaria pueda servir como instrumento para proteger la comisioacuten de actos

52

como el recieacuten mencionado que son constitutivos muchas veces de iliacutecitos penales bajo la forma de delitos tributarias o fraushydes fiscales con resultados ademaacutes de perjucio patrimonial ai Esshytado y dano ai intereacutes general de la sociedad

EI sistema bancaria frente a la existencia en la sociedad de un intereacutes general preponderante y superior estaacute naturalmente Ilamado a colaborar en la verificacioacuten y represioacuten de la evasioacuten tributaria

ENSAIOS JURiacuteDICOS 237

En este marco se inscribe la tendencia de la mayoda de las legislaciones modemas en cuanto a dotar aI Estado de facultades para intervenir en la actividad econoacutemica de los ciudadanos en procura de la correcta determinacioacuten de los tributos cuando se conshyfigura en el desarrollo de estas actividades un hecho gravado establecido en la ley

Ya la Constitucioacuten de Weimar en 919 proclamoacute que es liacutecito ai Estado intervenir para condicionar el ejercicio de los derechos a determinados fines sociales El bien comuacuten y la justicia social comenzaron desde entonces a servir de frontera a los derechos y Iibertades individuales

Cabe destacar que la OCDE (Organisation for Economic Cooperation and Development) en un documento elaborado en el ano 1999 sobre las praacutecticas de los paiacuteses en el acceso a la informacioacuten bancaria para fines tributarios advierte que se puede abusar de la confidencialidad para ocultar actividades iJegales y evadir impuestos y agrega en el resumen ejecutivo deI documento que ni la criminalizacioacuten dei fraude tributario ni el tratamiento de la evasioacuten de impuestos bajo las leyes tributarias de los paiacuteses miembros de la OCDE son homogeacuteneos pero que sin embargo los gobiernos de la mayoriacutea de los paiacuteses miembros de la OCDE han tomado la visi6n de que en este contexto las autoridades tributashyrias no deben ser tratadas como simples terceros sino que se les debe otorgar un acceso priviligiado a la informaci6n bancaria con fines tributarias

Se agrega en este estudio que una medida de esta naturaleza no pane en peligro la conlidencialidad de la inlormacioacuten bancaria puesto que las autoridades tributarias estaacuten sujetas a estrictos conshytroles sobre coacutemo utilizan la informacioacuten de los contribuyentes y todos los gobiemos han implementado regIas para proteger la conlidencialidad de la informaci6n tributaria (EI Sigilo Bancaacuterio Acesso a la Informadon Bancaria para Fines Tributarias)

Em verdade seu texto elenca 30 paiacuteses integrantes da OCDE (a saber Alemanha Austraacutelia Aacuteustria Beacutelgica Canadaacute Repuacuteblica Checa Dinamarca Finlacircndia Franccedila Greacutecia Hungria Islacircndia Irlanda Itaacutelia Japatildeo Coreacuteia Luxemburgo Meacutexico Paiacuteses Baixos Nova Zelacircndia Noshyruega Polocircnia Portugal Espanha Sueacutecia Turquia Suiacuteccedila Reino Unido Estados Unidos Repuacuteblica Eslovaca) dos quais em 1999 apenas trecircs (Portugal Repuacuteblica Eslovaca e Luxemburgo) natildeo facultavam o acesso por parte de autoridades tributaacuterias a informaccedilotildees relativas a pessoas suspeitas de fraude tributaacuteria

238 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

Desses trecircs paiacuteses hoje remanescem apenas dois Com efeito Portugal deixou de integrar esse grupo constrangedoramente minoritaacuterio ao aprovar em 29 de dezembro de 2000 a Lei n 30-G

Nesse diploma lecirc-se

Lei da Reforma de Tributaccedilatildeo do Rendimento

(Portugal)

Artigo 63 O - B

Acesso a informaccedilotildees e documentos bancaacuterios

1 A administraccedilatildeo tributaacuteria tem o poder de aceder directashymente aos documentos bancaacuterios nas situaccedilotildees de recusa da sua exibiccedilatildeo ou de autorizaccedilatildeo para a sua consulta

a) quando se trate de documentos de suporte de registos contabiliacutesticos dos sujeitos passivos de IRS e IRC que se enconshytrem sujeitos agrave contabilidade organizada

b) quando o contribuinte usufrua de benefiacutecios fiscais ou de regimes fiscais privilegiados havendo necessidade de controshylar os respectivos pressupostos e apenas para esse efeito

2 A administraccedilatildeo tributaacuteria tem o poder de aceder a todos os documentos bancaacuterios excepto as informaccedilotildees prestadas para justificar o recurso ao creacutedito nas situaccedilotildees de recusa de exibiccedilatildeo daqueles documentos ou de autorizaccedilatildeo para a sua consulta

a) quando se verificar a impossibilidade de comprovaccedilatildeo e quantificaccedilatildeo directa e exacta da mateacuteria tributaacutevel nos termos do artigo da Lei Geral Tributaacuteria e em geral quando estejam verifishycados os pressupostos para o recurso a uma avaliaccedilatildeo indirecta

b) quando os rendimentos declarados em sede de IRS se afastarem significativamente para menos sem razatildeo justificada dos padrotildees de rendimento que razoavelmente possam permitir as manifestaccedilotildees de riqueza evidenciadas pelo sujeito passivo nos termos do artigo 89-A da Lei Geral Tributaacuteria

c) quando existam indiacutecios da praacutetica de crime doloso em mateacuteria tributaacuteria designadamente nos casos de utilizaccedilatildeo de facturas falsas e em geral nas situaccedilotildees em que existam factos concretamente identificados gravemente indiciadores da falta de veracidade do declarado

d) quando seja necessaacuterio para fins fiscais comprovar a aplicaccedilatildeo de subsiacutedios puacuteblicos de qualquer natureza

ENSAIOS JUAlolCOS 239

3 As decisotildees da administraccedilatildeo tributaacuteria referidas nos nuacuteshymeros anteriores devem ser fundamentadas com expressa menshyccedilatildeo dos motivos concretos que as justificam pressupotildeem a audishyccedilatildeo preacutevia do contribuinte e satildeo da competecircncia do Director-Geshyral dos Impostos ou do Director-Geral das Alfacircndegas e dos Imshypostos Especiais sobre o consumo ou seus substitutos legais sem possibilidade de delegaccedilatildeo

4 Os actos praticados ao abrigo da competecircncia definida no nuacutemero anterior satildeo susceptiacuteveis de recurso judicial o qual teraacute efeito suspensivo nas situaccedilotildees previstas no n 2

5 Nos casos de deferimento do recurso previsto no nuacutemero anterior os elementos de prova entretanto obtidos natildeo podem ser utilizados para qualquer efeito em desfavor do contribuinte

6 As entidades que se encontrem numa relaccedilatildeo de domiacutenio com o contribuinte ficam sujeitas aos regimes de acesso agrave inforshymaccedilatildeo bancaacuteria referidos nos n 1 e 2

7 O acesso da administraccedilatildeo tributaacuteria a informaccedilatildeo banshycaacuteria relevante relativa a familiares ou terceiros que se encontrem numa relaccedilatildeo especial com o contribuinte depende de autorizashyccedilatildeo judicial expressa apoacutes audiccedilatildeo do visado obedecendo aos requisitos previstos no n 3

8 O regime previsto nos nuacutemeros anteriores natildeo prejudica a legislaccedilatildeo aplicaacutevel aos casos de investigaccedilatildeo por infracccedilatildeo peshynal e soacute pode ter por objecto operaccedilotildees e movimentos bancaacuterios realizados apoacutes a sua entrada em vigor sem prejuiacutezo do regime vigente para as situaccedilotildees anteriores

9 Os actos praticados ao abrigo da competecircncia prevista no n I devem ser objecto de comunicaccedilatildeo ao Defensor do Contrimiddot buinte

10 Para os efeitos desta lei considera-se documento bancaacuteshyrio qualquer documento ou registo independentemente do resshypectivo suporte em que se titulem comprovem ou registem opeshyraccedilotildees praticadas por instituiccedilotildees de creacutedito ou sociedades finanshyceiras no acircmbito da respectiva actividade incluindo os referentes a operaccedilotildees realizadas mediante utilizaccedilatildeo de cartotildees de creacutedito (coacutepia anexa)

Parece evidente destarte que todo o mundo civilizado abandonou a possibilidade de opor-se agrave Administraccedilatildeo Tributaacuteria o sigilo bancaacuterio

240 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

4 O sigilo bancaacuterio e o direito agrave intimidade e agrave privacidade das pessoas

A anaacutelise do sigilo bancaacuterio em face do direito agrave intimidade e agrave privacidashyde exige inicialmente que seja enfrentada a questatildeo referente ao seu conceito

Os doutrinadores natildeo tecircm assumido posiccedilatildeo uniforme quanto aos asshypectos conceituais dessa entidade juriacutedica

Seacutergio Carlos Covello autor da obra jaacute mencionada (O Sigilo Bancaacuterio Leud S Paulo 1991 p 69) entende que sigilo bancaacuterio eacute a obrigaccedilatildeo que tecircm os Bancos de natildeo revelar salvo justa causa as informaccedilotildees que venham a obter em virtude de sua atividade profissional

Luiz Fernando Bellinetti no artigo intitulado Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio (Revista do Direito do Consumidor Satildeo Paulo RT 1996 voI 18 p 144) defende posiccedilatildeo no sentido de que sigilo bancaacuterio eacute o dever juriacutedico que tecircm as instituiccedilotildees de creacutedito e as organizaccedilotildees auxiliares e seus empregados de natildeo revelar salvo justa causa as informaccedilotildees que venham a obter em virtushyde da atividade bancaacuteria a que se dedicam

Para Arnoldo Wald (in O Sigilo Bancaacuterio no Projeto de Lei Complemenshytar n 70 Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas n I pp 196209) o sigilo bancaacuterio se enquadra no conceito mais amplo do segredo profissional que tem merecido uma proteccedilatildeo mais ampla ensejando sua violaccedilatildeo caracterizaccedilatildeo como crime (art 154 do Coacutedigo PeshynaI)

Eivany A Silva tratando do tema em Consideraccedilotildees a Respeito do Sigilo de Dados (artigo publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio n 61 pp 41142 - Edit Dialeacutetica) afirma que o sigilo bancaacuterio eacute espeacutecie do gecircnero sigilo de dados constituindo um direito fundamental protegido constitucionalmente inserto que estaacute no rol dos direitos e garantias individuais ou seja em claacuteusushylas peacutetreas da Carta Magna natildeo podendo portanto ser modificado nem messhymo por emenda agrave Constituiccedilatildeo e portanto muito menos por legislaccedilatildeo de hierarquia inferior

Como examinado haacute divergecircncias na fixaccedilatildeo do conceito Essas divershygecircncias embora importantes para as posiccedilotildees doutrinaacuterias a serem assumishydas sobre o alcance do sigilo bancaacuterio natildeo geram contudo influecircncias de maior intensidade no relacionamento entre a instituiccedilatildeo financeira e os seus depositantes Isso porque o que merece ser considerado eacute a natureza juriacutedica do sigilo bancaacuterio isto eacute a que categoria de direito pertence e como por quem e quando a sua quebra pode ser determinada

Em face do exposto necessaacuterio eacute que se faccedila o alinhamento das teorias que procuram fundamentar o sigilo bancaacuterio

A doutrina em eacutepocas diversas examinou as seguintes teorias

ENSAIOS JURiacuteDICOS 241

Teoria contratualista O sigilo bancaacuterio de acordo com essa teoria deshycorre da relaccedilatildeo contratual que voluntariamente eacute formada entre o banco e o cliente por via da qual mesmo sem claacuteusula expressa a instituiccedilatildeo financeira assume a obrigaccedilatildeo de guardar segredo das movimentaccedilotildees de dinheiro que nela satildeo feitas Essa responsabilidade assumida pelo banco inspira-se segunshydo os adeptos da teoria em destaque nos usos nos costumes e na boa-feacute sempre aplicaacuteveis na intepretaccedilatildeo dos contratos comerciais7bull

Teoria do direito agrave privacidade Os adeptos dessa corrente afirmam que o sigilo bancaacuterio integra o campo do direito agrave privacidade que faz parte dos direitos da personalidade

Teoria consuetudinaacuteria Segundo os seguidores dessa linha de pensar o sigilo bancaacuterio decorre dos compromissos taacutecitos assumidos entre instituishyccedilotildees financeiras e seus clientes no sentido de natildeo serem levados ao conhecishymento de terceiros os valores transacionados O uso reiterado dessa praacutetica apoiada no elemento confianccedila passou a representar costume adotado nesse tipo de negoacutecio juriacutedico

Teoria da boa-feacute A adoccedilatildeo dessa teoria conduz o inteacuterprete a entender que o sigilo bancaacuterio por sua proacutepria natureza estaacute vinculado ao caraacuteter fiduciaacuterio da atividade bancaacuteria fundando-se portanto na boa-feacute ou dever de lisura que tanto marca o tipo de negoacutecio juriacutedico firmado

Teoria do sigilo profissional Essa teoria concebe o sigilo bancaacuterio como sendo uma espeacutecie do sigilo profissional Haacute portanto um dever eacutetico do banshyco em respeitar o sigilo bancaacuterio em decorrecircncia da profissatildeo exercida

Teoria do direito agrave intimidade dos bancos Os integrantes dessa forma de pensar sustentam que a instituiccedilatildeo financeira tem legiacutetimo interesse de afastar do conhecimento de terceiros a movimentaccedilatildeo financeira dos seus clientes e consequumlentemente dos fatos com elas relacionados

Teoria da complexidade do viacutenculo Essa teoria eacute explicada por Arnoldo Wald no trabalho jaacute citado da forma seguinte A doutrina moderna abandoshynou a noccedilatildeo da relaccedilatildeo juriacutedica contratual defendo a complexidade do viacutenshyculo Aleacutem dos direitos e das obrigaccedilotildees principais existem deveres secundaacuteshyrios para ambos os contratantes que decorrem da regra geral da boa-feacute denoshyminada na doutrina italiana de cOITeteza e na legislaccedilatildeo alematilde de Treu und Glauben Exige que a atuaccedilatildeo de uma parte natildeo cause danos agrave esfera juriacutedica da outra Dentro desta ideacuteia defende-se que o segredo bancaacuterio eacute um dever

7 Arnoldo Wald em Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais artigo publicado na Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas n 22 pp 1518 manifesta entendimento de que no campo normatIacutevo do Direito brasileiro esta teoria encontra respaldo nos arts 130 e 131 do Coacutedigo Comercial que prevecirc a interpretaccedilatildeo dos contratos segundo os usos os costumes e a boa-feacute

242 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

acessoacuterio na relaccedilatildeo juriacutedica Mesmo que natildeo nasccedila o contrato entre as partes a boa-feacute objetiva impede que a instituiccedilatildeo financeira prejudique os interesses do cidadatildeo

Estabelecidos os pressupostos doutrinaacuterios acima examinamos agora se o sigilo bancaacuterio diz respeito agrave intimidade e agrave privacidade das pessoas

A Constituiccedilatildeo Federal em seu artigo 5ordm incisos X e XII afirma

Art 5ordm Todos satildeo iguais perante a lei sem distinccedilatildeo de qualquer natureza garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Paiacutes a inviolabilidade do direito agrave vida agrave liberdade agrave igualdade agrave segushyranccedila e agrave propriedade nos termos seguintes

X - satildeo inviolaacuteveis a intimidade a vida privada a honra e a imagem das pessoas assegurado o direito agrave indenizaccedilatildeo pelo dano material ou moral decorrente de sua violaccedilatildeo

XJl - eacute inviolaacutevel o sigilo da correspondecircncia e das comunicaccedilotildees telegraacuteficas de dados e das comunicaccedilotildees telefocircnicas salvo no uacuteltimo caso por ordem judicial nas hipoacuteteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigaccedilatildeo criminal ou instruccedilatildeo processual penal

Essas garantias constitucionais protegem o cidadatildeo de qualquer investida de terceiros em sua intimidade em sua vida privada e no sigilo de seus dados

Na expressatildeo terceiros estaacute incluiacutedo o Estado e consequumlentemente seus agentes poliacuteticos e administrativos

A doutrina tem se manifestado de modo quase unacircnime no sentido de que o sigilo bancaacuterio eacute uma garantia constitucional que protege a privacidade das pessoas no campo econocircmico e financeiro A sua significaccedilatildeo eacute de natildeo tornar puacuteblica a movimentaccedilatildeo da conta bancaacuteria e das aplicaccedilotildees financeiras do cidadatildeo para que de nenhum modo os atos privados praticados possam ser tornados puacuteblicos

Esse posicionamento eacute o adotado pelos autores que passo a citar

Arnoldo Wald (O Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais artigo pushyblicado na Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas RT n 22 pp 1521)

O sigilo bancaacuterio eacute o meio para resguardar a privacidade no camshypo econocircmico pois veda a publicidade sobre a movimentaccedilatildeo da conta corrente bancaacuteria e das aplicaccedilotildees financeiras

ENSAIOS JURiacuteDICOS 243

Eivany A Silva (Consideraccedilotildees a Respeito do Sigilo de Dados artigo publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio n 61 Satildeo Paulo Editora Dialeacutetica p27)

A maioria dos ordenamentos juriacutedicos como o brasileiro tratam o sigilo bancaacuterio como direito fundamental do contribuinte agrave privacidashyde ou seja agrave resistecircncia agrave comunicaccedilatildeo de dados que representem desshydobramento da personalidade da pessoa direito agrave oposiccedilatildeo e agrave negaccedilatildeo de comunicaccedilatildeo

Ives Gandra da Silva Martins (Sigilo Bancaacuterio trabalho publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio S Paulo Editora Dialeacutetica n 1 pp 24 e 25)

Pelos incisos X e XII do artigo 5ordm tem o contribuinte o direito de preservaccedilatildeo de sua intimidade de sua privacidade e de que terceiros que detenham informaccedilotildees pessoais suas sejam obrigados a guardaacute-Ias

Natildeo pode pois a fiscalizaccedilatildeo exigir de terceiros informaccedilotildees que apenas pode obter do proacuteprio contribuinte

Em determinadas hipoacuteteses todavia o interesse puacuteblico haacute de preshyvalecer sobre o interesse individual mas caberaacute a um outro poder definir se tais hipoacuteteses efetivamente ocorrem com o que poderaacute o Poder Judishyciaacuterio autorizar se convencido estiver o magistrado de que a hipoacutetese eacute de gravidade e de lesatildeo ao interesse puacuteblico a quebra do direito ao sigilo bancaacuterio

Estou convencido ser esta a melhor conformaccedilatildeo juriacutedica da quesshytatildeo idealizada pelos constituintes defendida pela doutrina e consagrashyda na jurisprudecircncia corrente exegeacutetica esta a que me filio desde os meus primeiros escritos sobre a mateacuteria

Roberto Quiroga Mosquera (Tributaccedilatildeo no Mercado Financeiro e de Capitais obra publicada pela Editora Dialeacutetica Satildeo Paulo 1998 pp 70171)

Do exposto ateacute aqui eacute evidente que o direito ao sigilo bancaacuterio representa uma espeacutecie de direito agrave privacidade

Eacute incontroverso que os dados e informaccedilotildees de natureza bancaacuteria dizem respeito agrave intimidade e agrave vida privada dos cidadatildeos Dados que dizem respeito aos valores em dinheiro depositados em contas-correnshytes bancaacuterias tipos e caracteriacutesticas de aplicaccedilotildees financeiras ganhos e prejuiacutezos auferidos ou incorridos em operaccedilotildees bursaacuteteis etc satildeo sem sombra de duacutevida elementos particulares e pessoais de qualquer indiviacuteshyduo

244 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Utilizando outra voz informaccedilotildees que tocam no aspecto financeishyro do ser humano representam direito iacutentimo e personaliacutessimo devendo ser mantidas em sigilo por aqueles que eventualmente as detenham em razatildeo de sua atividade profissional Parece-nos que tal conclusatildeo eacute de uma clareza inconteste

Natildeo tem sido outra a posiccedilatildeo da doutrina mais abalizada do Paiacutes e da jurisprudecircncia dominante

o autor referido a seguir faz a observaccedilatildeo seguinte

Carlos Alberto Hagstrom (Sigilo Bancaacuterio Novas Questotildees Reshyvista de Direito Mercantil Satildeo Paulo Malheiros 1997 vaI 105 pp 4344) expotildee que apesar de existirem diversas teorias que procuram fundashymentar juridicamente o sigilo bancaacuterio modernamente a explicaccedilatildeo para o fundamento do referido instituto sofreu uma radical alteraccedilatildeo Divershysas constituiccedilotildees modernas esclarece o mencionado autor ampliaram e explicitaram o elenco de direitos e garantias individuais passando a garantir o direito agrave privacidade e agrave intimidade A Constituiccedilatildeo brasileira natildeo trilha caminho diferente Assegurou referidos direitos de forma exshypressa e sem restriccedilotildees O tema do sigilo bancaacuterio figura agora em niacutevel constitucional Tem status de norma superior no qual se reconhece o direito agrave intimidade como norma de caraacuteter geneacuterico em que estatildeo conshytemplados muacuteltiplos aspectos da vida privada em especial os de ordem econocircmico-financeira que compotildeem o que Hagstrom denominou a inshytimidade econocircmica ou intimidade patrimonial

Luiacutes Fernando 8ellinetti (Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio artigo publicado na Revista de Direito do Consumidor n 18 pp 141151)

Como jaacute dissemos anteriormente em certas hipoacuteteses o fundashymento para o segredo bancaacuterio seria a privacidade No entanto nesses casos o que se protege eacute a privacidade e natildeo propriamente o sigilo

Entendemos que uma coisa eacute garantir-se a privacidade da pessoa com fundamento em norma constitucional outra eacute garantir-se o segreshydo de informaccedilotildees bancaacuterias de uma pessoa com base na legislaccedilatildeo supramencionada

Sempre que a revelaccedilatildeo de informaccedilotildees bancaacuterias puder violar a privacidade da pessoa parece-nos que mais do que garantia ao sigilo bancaacuterio (com fundamento legal) tem a pessoa garantia agrave sua privacishydade (com fundamento constitucional)

ENSAIOS JURiacuteDICOS 245

No entanto se a revelaccedilatildeo da informaccedilatildeo natildeo invadir a esfera da intimidade da pessoa sua garantia eacute meramente legal do sigilo bancaacuterio

Carlos Maacuterio Velloso (citado por Misabel Derzi em Direito Tributaacuterio Aplicado obra publicada pela Editora Del Rey Belo Horizonte MO pp 278 e 279)

O sigilo bancaacuterio decorre do direito agrave privacidade inerente agrave pershysonalidade das pessoas consagrado na Constituiccedilatildeo Federal em seu art 5ordm X e protege tanto interesses privados como finalidades de ordem puacuteblica a saber o sistema de creacutedito O sigilo bancaacuterio natildeo eacute um princiacuteshypio absoluto

As exceccedilotildees ao sigilo bancaacuterio estatildeo previstas na Lei n 45951964 que continua em vigor

O Poder Judiciaacuterio pode requisitar relativamente a pessoas e instishytuiccedilotildees informaccedilotildees que implicam quebra de sigilo (Lei n 45951964 art 38 sect 1 ordm) entretanto mesmo havendo inqueacuterito policial instaurado deveraacute proceder com cautela prudecircncia e moderaccedilatildeo inerentes agrave mashygistratura

Luciana Fregodolli (O Direito agrave Intimidade - excerto da dissertaccedilatildeo que apresentou sob o tiacutetulo O Direito agrave Intimidade e a Prova Iliacutecita publicado pela Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Constitucional e Ciecircncia Poliacutetica -n 19 p 233)

O sigilo bancaacuterio protege interesses privados Eacute ele espeacutecie de direito agrave privacidade inerente agrave personalidade das pessoas e que a Consshytituiccedilatildeo Federal consagra no art 5ordm X aleacutem de atender a uma finalidade de ordem puacuteblica qual seja a de proteccedilatildeo ao sistema de creacutedito

O direito agrave privacidade abrange atualmente o de impedir que tershyceiros inclusive o Estado e o Fisco tenham acesso a informaccedilotildees sobre o que se denominou a aacuterea de manifestaccedilatildeo existencial do ser humano

Celso Ribeiro Bastos O pensamento de Celso Ribeiro Bastos foi exshyposto por Roberto Quiroga Mosquera na obra jaacute referida p 71 do modo seguinte

Celso Bastos eacute do mesmo pensar Apoacutes tecer consideraccedilotildees introdutoacuterias acerca do sigilo bancaacuterio e expor pensamentos de divershysos autores nacionais e alieniacutegenas conclui o constitucionalista brasileishyro no sentido de que todas as despesas ordinaacuterias feitas pelo cidadatildeo

246 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

comum em sua vida cotidiana devem ser consideradas parte de sua vida privada familiar ou domeacutestica e portanto protegidas contra interferecircnshycias a despeito de qualquer pretexto Desde as condutas mais corriqueishyras como as compras efetuadas em um supermercado para manutenshyccedilatildeo da famiacutelia quanto aquelas outras moralmente reprovaacuteveis como presentes ou joacuteias compradas e dadas a quem presta ao homem servishyccedilos de natureza extraconjugal tudo estaacute abarcado pelo manto da proteshyccedilatildeo agrave vida privada familiar ou domeacutestica ( ) E mais adiante arremata Hoje praticamente a vida do homem pode ser escrita a partir de seu talatildeo de cheques e nas sociedades mais avanccediladas pelos cartotildees de creacutedito e magneacuteticos Permitir-se que o sigilo bancaacuterio venha a ser romshypido por qualquer forma natildeo-extraordinaacuteria para salvaguarda de inteshyresse de porte no miacutenimo idecircntico eacute expor a seguranccedila individual a um constante e absurdo temor perante as possibilidades de controle direto ou pelo vazamento de alguma informaccedilatildeo

Haacute contudo corrente contraacuteria como passaremos a demonstrar

Andreacute Serratildeo Borges de Sampaio Consultor da Uniatildeo nas informashyccedilotildees prestadas ao Advogado-Geral da Uniatildeo sobre a ADIn n 2397 cita trechos de doutrina e jurisprudecircncia estrangeiras defendendo o entendimento de que o sigilo bancaacuterio natildeo tem conotaccedilatildeo de direito de privacidade Eis o que escreshyveu o parecerista citado

O jurista portuguecircs J L Saldanha Sanches coteja primorosashymente o sigilo bancaacuterio com a proteccedilatildeo da intimidade para concluir que natildeo haacute que se falar em direito ao sigilo bancaacuterio como concretizaccedilatildeo do direito agrave intimidade Nas suas palavras

Ora em que esfera podemos noacutes incluir o segredo bancaacuteshyrio enquanto instituto que concretiza certos valores do ordenashymento juriacutedico Como expressatildeo de interesses juridicamente tuteshylados

Seraacute o segredo bancaacuterio um prolongamento do direito agrave inshytimidade da esfera pessoal e familiar de uma qualquer pessoa sinshygular (uma vez que em relaccedilatildeo agraves pessoas coletivas a questatildeo natildeo pode mesmo ser colocada) Ou diraacute antes respeito aquela faixa mais larga que resguarda a privacidade de qualquer cidadatildeo e que soacute pode por isso sofrer qualquer intromissatildeo se surgirem razotildees vaacutelidas para que tal direito seja restringido

Ao afirmar-se que na perspectiva dos clientes dos bancos o segredo bancaacuterio eacute um direito com a reserva da sua vida privada temos uma primeira resposta para esta questatildeo

ENSAIOS JURiacuteDICOS 247

Mas falta distinguir entre intimidade e reserva da vida privashyda e entre clientes individuais e profissionais de um banco Natildeo estamos perante o mesmo tipo de tutela quando contamos que um particular espera que o banco natildeo divulgue a qualquer inteshyressado o volume da sua conta bancaacuteria (porque pura e simplesshymente quer manter sob reserva a sua vida particular) ou quando um comerciante confia no banco para que este natildeo revele quem satildeo os seus clientes fornecedores ou qual eacute o seu grau de endividamento

No caso da pessoa singular estaacute apenas em causa um conshyjunto de valores de natureza moral esta natildeo estaacute em princiacutepio preocupada com possiacuteveis prejuiacutezos econocircmicos ligados a qualshyquer divulgaccedilatildeo Apenas se opotildee por razotildees do seu foro pessoal e que natildeo carecem de fundamentaccedilatildeo que esta tenha lugar

Enquanto que o comerciante pode ser seriamente prejudishycado em termos concorrenciais com a revelaccedilatildeo da lista dos seus clientes ou com a sua situaccedilatildeo financeira

O dever de reserva que cabe ao banqueiro estaacute desta forma a serviccedilo do interesse comercial das empresas suas clientes - que pelo simples facto de o serem ou por necessitarem de obter creacutedishyto lhe datildeo informaccedilotildees com um forte valor comercial ou da pesshysoa singular que deseja manter a privacidade da sua situaccedilatildeo patrimonial

Ou em alternativa ao serviccedilo da manutenccedilatildeo da privacidashyde que qualquer um pode desejar ainda que a possiacutevel violaccedilatildeo desta apenas lhe possa acarretar danos natildeo-patrimoniais

E por isso o segredo bancaacuterio natildeo pode constituir a expresshysatildeo do imperativo constitucional da proteccedilatildeo da intimidade Ateacute porque o acesso a essa esfera estaacute vedado aos proacuteprios bancos

Natildeo nos parece aceitaacutevel que um banco como condiccedilatildeo para a concessatildeo de creacutedito a uma pessoa singular ou para estashybelecer com ela qualquer relaccedilatildeo contratual possa exigir desta informaccedilatildeo de tipo estritamente pessoal ou a sujeiccedilatildeo a exames meacutedicos que atingindo a sua esfera iacutentima afectam a sua dignidashyde Aqui estaacute em causa a ilicitude da pergunta por pressupor o acesso agrave esfera inviolaacutevel (e indisponiacutevel) da intimidade

A informaccedilatildeo que o banco pode obter para a defesa dos seus interesses legiacutetimos natildeo pode ir aleacutem da esfera patrimonial do seu cliente rendimentos bens possuiacutedos perspectivas profisshysionais

( )

248 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

Podemos pois concluir que o segredo bancaacuterio natildeo eacute natildeo pode ser uma concretizaccedilatildeo do princiacutepio constitucional do direishyto agrave intimidade

Este princiacutepio tem como funccedilatildeo consagrar uma zona de reshyselVa pessoal para factos opccedilotildees e circunstacircncias que soacute de forshyma indirecta e de todo secundaacuteria podem ter aspectos ou refleshyxos de natureza patrimonial (Saldanha Sanches J L Segredo Bancaacuterio e Tributaccedilatildeo do Lucro Real In Saldanha Sanches J L Estudos de Direito Contabiliacutestico e Fiscal Coimbra Coimbra Edishytora 2000 pp 105108)

Em diversos paiacuteses haacute a clara percepccedilatildeo que natildeo haacute que se conshyfundir direito agrave intimidade com sigilo bancaacuterio indicando que a quebra do sigilo pela Administraccedilatildeo Tributaacuteria natildeo constitui violaccedilatildeo ao direito Ao contraacuterio a existecircncia de um Estado Fiscal implica na necessidade de consagrar agrave administraccedilatildeo tributaacuteria tal faculdade o que se harmonishyza com diversos princiacutepios e outros direitos fundamentais constantes da Carta de 1988

O caso espanhol eacute exemplar neste sentido ao natildeo visualizar a vioshylaccedilatildeo ao direito agrave intimidade em relaccedilatildeo agrave quebra do sigilo bancaacuterio Portanto

el Tribunal Constitucional espaflOl se ha pronunciado por la negativa de que el conocimiento de las cuentas bancarias por la Administracioacuten pueda invadir el aacutembito constitucionalmente garantizado de la intimidad de los individuos porque tales extractos no constituyen per se uma biografiacutea personal en nuacutemeros y en siacute no tiene relevancia para la intimidad personal y familiar dei contribuyente ya que se trata de dados no secretos y confiados a una entidad (Campos Laura Rodriacuteguez Oerechos dei Contribuyente em la Repuacuteblica Argentina ai Amparo de la Convencioacuten Interamericana de Oerechos Humanos http wwwiefpaorgarcriteriosdigitalarticulosderechoshtm Visitado em 512001)

Ao analisar a jurisprudecircncia da Corte Constitucional espanhola quanto ao tema tambeacutem ressalta Saldanha Sanches

Na apreciaccedilatildeo da constitucionalidade da lei que permitia o controle administrativo das contas bancaacuterias o Tribunal Constitushycional espanhol realizou uma distinccedilatildeo entre intimidade pessoal e familiar e a intimidade econoacutemica onde a proteccedilatildeo constitucional eacute menos intensa

ENSAIOS JURiacuteDICOS 249

E procura fazer uma distinccedilatildeo entre a violaccedilatildeo agrave intimidade como consequumlecircncia de uma anaacutelise das contas bancaacuterias - coloshycando a hipoacutetese de uma recusa de cooperaccedilatildeo por parte do conshytribuinte se tal eventualidade se verificar - e a violaccedilatildeo directa da intimidade uma vez que esta natildeo pode resultar de uma mera anaacuteshylise de movimentos bancaacuterios (Saldanha Sanches J L A Situashyccedilatildeo Actual do Sigilo Bancaacuterio a Singularidade do Regime Portushyguecircs In Saldanha Sanches J L Estudos de Direito Contabiliacutestico e Fiscal Coimbra Coimbra Editora 2000 p 91)

Outro comentarista ao analisar a situaccedilatildeo do sistema espanhol quanto ao sigilo bancaacuterio e o direito agrave intimidade fez questatildeo de ressaltar

Seguacuten el r c frente a la Hacienda Puacuteblica no existe el derecho a la intimidad deI art 18 CE Ya la LO de 5 de mayo deI 82 vada praacutecticamente de contenido constitucional el derecho a la intimidado en cuanto el aacutembito de eacutesta queda deferido a la ley ordinaria (a 2ordm) y en cuanto que la esfera protegida frente a las Administraciones se reduce a poco O nada ai no reputarse intromisiones ilegiacutetimas las actuaciones autorizadas o acordadas por la Autoridad competente de acuerdo con la Ley (art 8ordm 1)

La LGTy el RI Iimiacutetan la esfera de la intimidad en las relacishyones con la Hacienda hasta el extremo de que solamenle existe un refugio limitado en el aacutembito deI secreto profesional en los casos de informacioacuten sobre terceros y siempre que no se trate de datos con transcendencia econoacutemica o tributaria EI rc no ha enconshytrado hasta el momento ni un solo supuesto de dato o informacioacuten econocircmica con transcendencia tributaria que limite la accioacuten inquisitiva de la Administracioacuten tributaria por razoacuten de intimidado Bien puede decirse por tanto que frente a la Administraciocircn tribushytaria en cuanto se trata deI ejercicio de su funciocircn de buacutesqueda de datos con transcendencia tributaria el derecho a la intimidad personal y familiar (art 18 I CE) no existe

La biacuteblia deI tribunal a estos efeclos estaacute constituida por la S 11084 reiterada en numerosas ocasiones ampliada en el Auto 64286 y reafirmada por ejemplo en la S 26 abril 90 tantas veces citada (FJ 10deg) Seguacuten esa doctrina la distribucioacutenjusta de la carshyga fiscal prevalece sobre el derecho a la intimidad parte dei art 812 I de la LO seguacuten el cual frente a la Ley (ordinaria) no hay intimidad protegida siempre que haya en dicha ley imperativos de intereacutes puacuteblico ( ) ni siquiera se habla dei predomiacutenio frente a la

250 SUPERIOR TRIBUNAl DE JUSTiCcedilA

intimidad de intereses u objetivos constitucionalmente protegidos Soacuteo admite que la actuadoacuten administrativa es arbitraria cuando no parezcajustificada por la Finalidad de la inspeccioacuten es decir cuando se trate de datos o informaciones que carezcan de transcendencia tributaria pero eacuteste obviamente no es sin Umite derivado dei derecho a la intimidad sino de la interdiccioacuten de arbitrariedad o desviacioacuten de poder de la Administracioacuten de la necesidad de ajuste de toda Administracioacuten ai acircmbito de su competencia que tanto vale para datos iacutentimos como para otros que no lo sean Seguacuten la S 11084 no hay esfera de intimidad proshytegida frente a una Administracioacuten tributaria amparada en una norma que elimina la intimidad como liacutemite (Garciacutea AIacuteloveros Jaime Una Nueva Ley General Tributaria Problemas Constitucioshynales In Kirchhof P et aI Garantiacuteas Constitucionales dei Contribuyente Valencia Tirant lo Blanch 1999 pp 109110)

Diante de tudo quanto foi exposto tendo-se o cuidado de registrar posicionamento de diferentes autores nacionais e estrangeiros haacute ambiente preparado para ser respondido o primeiro questionamento desdobrado em trecircs partes formulado para o 1II Coloacutequio Internacional de Direito Tributaacuterio promoccedilatildeo do Centro de Extensatildeo Universitaacuteria Eis a primeira parte do seu teor

O sigilo bancaacuterio diz respeito agrave intimidade e privacidade das pessoas

A resposta eacute optando por convencimento influenciado pelas ideacuteias da corrente predominante positiva

O nosso entendimento eacute no sentido de que o direito agrave intimidade integra os direitos da personalidade e visam proteger o direito agrave inviolabilidade do domiciacutelio da correspondecircncia das comunicaccedilotildees de quaisquer espeacutecies dos dados pessoais computadorizados do sigilo bancaacuterio O mesmo acontece com o direito agrave privacidade

A expansatildeo da proteccedilatildeo do direito agrave intimidade e agrave privacidade eacute uma consequumlecircncia da evoluccedilatildeo da era contemporacircnea nos setores tecnoloacutegicos e da instabilidade que passam as instituiccedilotildees estatais especialmente a encarreshygada de arrecadar tributos Haacute o reconhecimento de que desenvolve-se um processo de aguda corrosatildeo na proteccedilatildeo agrave intimidade que ao ser violada provoca a publicizaccedilatildeo das condutas mais iacutentimas do cidadatildeo

A concepccedilatildeo do sigilo bancaacuterio no acircmbito do direito agrave intimidade e agrave privacidade visa garantir ao homem o miacutenimo capaz para que lhe seja asseshygurada a sua condiccedilatildeo humana protegendo-o de ingerecircncias alheias como apregoa a Conferecircncia Noacuterdica sobre o Direito agrave Intimidade realizada em Estoshycolmo na data de maio de 1967 ao fazer inserir no documento que publicou a seguinte definiccedilatildeo O direito agrave intimidade eacute o direito do homem de viver de forma independente a sua vida com um miacutenimo de ingerecircncia alheia

ENSAIOS JURiacuteDICOS 251

5 Seguranccedila juriacutedica e acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias

A segunda pergunta apresentada pelos organizadores do coloacutequio estaacute assim posta

A seguranccedila das relaccedilotildees juriacutedicas atraveacutes do Sistema Financeiro pode ser afetada pelo acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves inforshymaccedilotildees bancaacuterias

O acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias se realizado caracteriza um atentado de suma gravidade aos direishytos do cidadatildeo Eacute um ataque aos princiacutepios sustentadores do sistema demoshycraacutetico adotado pelo constituinte de 1988 especialmente quando detonou que a Repuacuteblica Federativa do Brasil tem como objetivo fundamental o respeishyto agrave dignidade humana e agrave cidadania

Do ordenamento juriacutedico brasileiro a meu pensar natildeo haacute lugar para brotar qualquer interpretaccedilatildeo que conclua pela possibilidade de qualquer agenshyte do Poder Puacuteblico acessar de modo generalizado e sem motivaccedilatildeo informashyccedilotildees bancaacuterias do cidadatildeo mesmo com autorizaccedilatildeo judicial

Esclareccedilo desde logo que natildeo comungo com o pensamento de detershyminada corrente no sentido de ser absoluto o direito ao sigilo bancaacuterio Tenho-o como relativo poreacutem vinculado aos princiacutepios da razoabilidade da moralidade da legalidade e da motivaccedilatildeo expliacutecita e detalhada sob pena de ser impossiacutevel a sua quebra

O acesso indiscriminado do agente fiscal agraves informaccedilotildees bancaacuterias do cidadatildeo gera uma quebra da seguranccedila das relaccedilotildees juriacutedicas por um terceiro passar a ter sem causa justificadora conhecimento da vida iacutentima de algueacutem submetendo-o a partir daiacute a um regime de submissatildeo Por outro lado ninshygueacutem poderaacute garantir nem o proacuteprio Estado que o agente puacuteblico utilize os dados que chegaram ao seu conhecimento para outros intentos que natildeo o exclusivamente fiscal

Lembra Arnoldo Wald que O segredo na atividade bancaacuteria envolve concomitantemente interesses privaqos e coletivos que podem ser analisashydos sob trecircs acircngulos o interesse do cliente na sua relaccedilatildeo com a instituiccedilatildeo financeira o interesse do banco em atuar com discriccedilatildeo para ganhar a conshyfianccedila da populaccedilatildeo e captar recursos e o interesse social na existecircncia de um bom e eficiente sistema bancaacuterio Por estarem ligadas ao desenvolvimento da economia e aos interesses da comunidade as relaccedilotildees que envolvem as instishytuiccedilotildees financeiras natildeo recebem o mesmo tratamento juriacutedico dispendido a outras relaccedilotildees comerciais Inviaacutevel a aplicaccedilatildeo exclusiva das regras de Direito Privado as quais tecircm como princiacutepio norteador a autonomia da vontade pois

252 SUPERIOR TRIBUNAl DE JUSTiCcedilA

esta encontra limites nas normas cogentes proacuteprias do direito bancaacuterio e na intervenccedilatildeo do Estado8

A seguranccedila juriacutedica desse tipo de relaccedilatildeo envolve tambeacutem a manutenshyccedilatildeo do segredo das movimentaccedilotildees financeiras do contribuinte

Imprimir-se a mais ampla seguranccedila nas relaccedilotildees do Sistema Financeiro eacute fortalececirc-lo O Estado tem o dever de zelar por esse estado de seguranccedila natildeo permitindo consequumlentemente que o sigilo bancaacuterio seja quebrado pelo acesshyso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico por esse comportamento afeshytar a confiabilidade no sistema

Eacute de todo inconveniente permitir a possibilidade de um atuar do agente fiscal sem controle na quebra do sigilo bancaacuterio por afetar diretamente a seshyguranccedila da relaccedilatildeo juriacutedica firmada entre a instituiccedilatildeo financeira e o seu clienshyte em face deste sentir-se atingido pela accedilatildeo fiscal que passa a tomar conhecishymento de sua intimidade financeira e de fatos de sua vida privada sem o resshypaldo do Poder Judiciaacuterio

A seguranccedila juriacutedica nesse tipo de relaccedilatildeo deve assegurar impossibilidashyde de abuso de poder por parte do Fisco em face da necessidade de ser resshyguardada a garantia de que em um Estado de Direito natildeo pode ser concebido que conceda-se a uma parte mesmo que seja o Estado o domiacutenio absoluto de apanhar as provas que iraacute utilizar em caso de litiacutegio contra algueacutem

O acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias do contribuinte aleacutem de afetar a seguranccedila juriacutedica da relaccedilatildeo em questatildeo promove um desequiliacutebro entre o cidadatildeo-contribuinte e o Fisco por caracterizar coaccedilatildeo que coloca aquele em posiccedilatildeo de inferioridade

A valorizaccedilatildeo da seguranccedila juriacutedica da relaccedilatildeo existente entre instituiccedilatildeo financeira e contribuinte pelo Fisco natildeo quebrando o seu sigilo fiscal sem autorizaccedilatildeo judicial constitui causa de aplicaccedilatildeo de Justiccedila fiscal O seguimenshyto de seus princiacutepios valoriza o regime democraacutetico do qual ela faz parte

6 Casos de admissibilidade da quebra do sigilo bancaacuterio

Os casos de admissibilidade da quebra do sigilo bancaacuterio estatildeo na atuashylidade descritos no nosso ordenamento juriacutedico positivo

A Lei Complementar n 105 de 10 de janeiro de 2001 apoacutes determinar no art 112 de que as instituiccedilotildees financeiras conservaratildeo sigilo em suas operashyccedilotildees ativas e passivas e serviccedilos prestados dispotildee no sect 312 do mesmo artigo que

8 Arnoldo Wald no artigo Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais Revista dos Tribunais ano 6 n 22 janeiromiddotmarccedilo de 1998 n 22 Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas p 15

ENSAIOS JURiacuteDICOS 253

sect 3ordm Natildeo constitui violaccedilatildeo do dever de sigilo

I a troca de informaccedilotildees entre instituiccedilotildees financeiras para fins cadastrais inclusive por intermeacutedio de centrais de risco observadas as normas baixadas pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e pelo Banco Censhytral do Brasil

11 - o fornecimento de informaccedilotildees constantes de cadastro de emitentes de cheques sem provisatildeo de fundos e de devedores inadimplentes a entidades de proteccedilatildeo ao creacutedito observadas as norshymas baixadas pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e pelo Banco Central do Brasil

JJI - o fornecimento das informaccedilotildees de que trata o sect 2ordm do art II da Lei n 9311 de 24 de outubro de 1996

IV - a comunicaccedilatildeo agraves autoridades competentes da praacutetica de iliacutecitos penais ou administrativos abrangendo o fornecimento de inforshymaccedilotildees sobre operaccedilotildees que envolvam recursos provenientes de qualshyquer praacutetica criminosa

V - a revelaccedilatildeo de informaccedilotildees sigilosas com o consentimento expresso dos interessados

VI- a prestaccedilatildeo de informaccedilotildees nos termos e condiccedilotildees estabeleshycidos nos artigos 2ordm 3ordm 4ordm 5ordm 6ordm 7ordm e 9ordm desta lei complementar

sect 4ordm A quebra de sigilo poderaacute ser decretada quando necessaacuteria para apuraccedilatildeo de ocorrecircncia de qualquer iliacutecito em qualquer fase do inqueacuterito ou do processo judicial e especialmente nos seguintes crimes

I - de terrorismo

11 - de traacutefico iliacutecito de substacircncias entorpecentes ou drogas afins

III - de contrabando ou traacutefico de armas municcedilotildees ou material destinado a sua produccedilatildeo

IV - de extorsatildeo mediante sequumlestro

V - contra o sistema financeiro nacional

VI - contra a Administraccedilatildeo Puacuteblica

Vll- contra a ordem tributaacuteria e a previdecircncia social

VIII-lavagem de dinheiro ou ocultaccedilatildeo de bens direitos e valores

IX - praticado por organizaccedilatildeo criminosa

Como visto a lei complementar enumera inuacutemeras situaccedilotildees que indeshypendentemente de autorizaccedilatildeo judicial o sigilo bancaacuterio eacute quebrado

254 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

A dificuldade que se apresenta eacute a de conciliar os casos de quebra de sigilo bancaacuterio que a Lei Complementar n 105 autoriza com a garantia do direito agrave privacidade e agrave intimidade

Destaque-se entre os de maior relevacircncia os seguintes

- natildeo constituir violaccedilatildeo do dever de sigilo bancaacuterio a troca de informashyccedilotildees entre instituiccedilotildees financeiras para fins cadastrais inclusive por intermeacuteshydio de centrais de risco o que possibilita o conhecimento da vida financeira privada do cidadatildeo por vaacuterias pessoas sem desempenho de autoridade na instituiccedilatildeo independentemente de ser justificada com antecedecircncia a causa desse atuar

- o de serem fornecidos dados relativos a fornecimentos de informashyccedilotildees cadastrais de emitentes de cheques sem provisatildeo de fundos a entidades privadas de proteccedilatildeo ao creacutedito sem qualquer avaliaccedilatildeo por qualquer autorishydade da causa determinante do fato a quebra do sigilo bancaacuterio na fase do inqueacuterito por inexistir nessa ocasiaacuteo qualquer contraditoacuterio e respeito ao prinshyciacutepio do devido processo legal

Quanto agraves demais situaccedilotildees constantes na lei complementar que autorishyzam a quebra do sigilo bancaacuterio naacuteo obstante algumas serem absolutamente necessaacuterias haacute de serem vistas em compatibilidade com as garantias constitushycionais conforme jaacute assinalado

O colendo Supremo Tribunal pronunciaraacute como guarda e inteacuterprete maishyor da Carta Magna em ADln jaacute intentada sobre a constitucionalidade ou natildeo dos dispositivos supramencionados

Em campo doutrinaacuterio valoriza-se as posiccedilotildees apresentadas quando da resposta oferecida aos questionamentos anteriores todas acenando pela neshycessidade do controle do Poder Judiciaacuterio

7 Sistema mais justo para a quebra do sigilo bancaacuterio

Os organizadores do JII Coloacutequio Internacional de Direito Tributaacuterio subshymetem agora para anaacutelise a questatildeo do teor seguinte Um sistema em que o Poder Judiciaacuterio torna-se aacuterbitro dos pedidos da Administraccedilatildeo Puacuteblica para quebra do sigilo eacute o mais justo

Em um Estado que por imposiccedilatildeo de sua proacutepria Constituiccedilatildeo estaacute comprometido com a guarda e aplicaccedilatildeo efetiva de princiacutepios democraacuteticos especialmente o de respeitar os direitos e garantias fundamentais da cidadashynia natildeo haacute ambiente para que seja outorgado ao Poder Executivo por via da atuaccedilatildeo de agentes puacuteblicos fiscais o acesso sem o controle do Poder Judiciaacuteshyrio agraves informaccedilotildees bancaacuterias do contribuinte

ENSAIOS JURiacuteDICOS 255

o sigilo bancaacuterio por ser um direito fundamental que exige ser respeitashydo pela supremacia constitucional que o protege deve submeter a possibilishydade de sua quebra para fins tributaacuterios ao Poder Judiciaacuterio pela ausecircncia de interesse direto nos resultados da accedilatildeo fiscalizadora que eacute o recolhimento do tributo e pelas garantias de independecircncia prudecircncia e qualificaccedilatildeo juriacutedica que revestem esse poder

A atuaccedilatildeo da fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo pode ser exercida fora dos limishytes da legalidade imposta a partir da Carta Magna e demais imposiccedilotildees legais a ela subordinadas

Natildeo se desconhece que no atual Estado fiscal os tributos constituem os meios financeiros determinantes para o atendimento dos compromissos da Administraccedilatildeo Puacuteblica com as obrigaccedilotildees oriundas em decorrecircncia de sua atividade no campo educacional social de seguranccedila puacuteblica interna e extershyna da sauacutede da manutenccedilatildeo dos Poderes ou seja para manter funcionando a maacutequina estatal

Por natildeo entremostrar-se na eacutepoca contemporacircnea qualquer outra alshyternativa viaacutevel para transformar o Estado fiscal em um Estado produtivo os tributos passam a representar um indeclinaacutevel dever da cidadania cujo cumshyprimento deve ser por todos honrado conforme assinala Joseacute Casalta Nabais Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra em artigo intitulado Algumas Reflexotildees sobre o Actual Estado Fiscal

Por isso os impostos hatildeo de constituir um preccedilo aceitaacutevel ou seja um preccedilo limitado Um preccedilo que estou certo muitas das sociedashydes que nos antecederam gostariam de ter pago e algumas das actuais natildeo enjeitariam suportar Por isso bem podemos afirmar como jaacute o fizeshymos noutro lugar que no actual Estado fiscal para o qual natildeo se vislumshybra qualquer alternativa viaacutevel pelo menos nos tempos mais proacuteximos os impostos constituem um indeclinaacutevel dever de cidadania cujo cumshyprimento a todos nos deve honrar

A atuaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio para liberar o bloqueio fortalece a conshyfianccedila do cidadatildeo no procedimento da fiscalizaccedilatildeo e consagra a ideacuteia iacutensita em qualquer regime democraacutetico de que a atuaccedilatildeo do Estado tem limites

Na espeacutecie os limites impostos satildeo os decorrentes da quebra do sigilo ser necessaacuterio em face da possiacutevel ilicitude cometida pelo cidadatildeo poreacutem sem ser violados os direitos do cidadatildeo de gozar da sua privacidade e da sua intimidade

A denominada cidadania fiscal haacute de ser considerada de modo conjunshytural com os reflexos dos direitos fundamentais assegurados ao contribuinte sem prestigiar a responsabilidade que tem o Estado de promover a arrecadashyccedilatildeo dos tributos

256 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

Cedo espaccedilo para registrar que a cidadania fiscal deve configurar um estado de relaccedilatildeo juriacutedica em que todos suportem a concretizaccedilatildeo de um Estado em que todos tenham a qualidade de destinataacuterio do dever fundashymentaI de pagar impostos na medida da respectiva capacidade contributiva poreacutem que seja um Estado fiscal suportaacutevel isto eacute um estado cujo sistema fiscal se encontre balizado por estritos limites juriacutedico-constitucionais9

A Administraccedilatildeo Tributaacuteria por melhor que seja a sua estrutura e os seus propoacutesitos natildeo estaacute emocionalmente preparada para conceber e aplicar os princiacutepios que sustentam a cidadania fiscal Isso ocorre primeiramente porshyque o Fisco tem por missatildeo exclusiva exercer a funccedilatildeo de arrecadar tributos Eacute a sua meta essencial por ser atribuiccedilatildeo que na organizaccedilatildeo administrativa estatal estaacute obrigado a desempenhar Natildeo lhe cabe administrar o tributo arreshycadado limitando-se unicamente a envidar esforccedilos para o cumprimento das metas impostas para imprimir aumento na arrecadaccedilatildeo tributaacuteria O sucesso da Administraccedilatildeo Tributaacuteria eacute medido pelo maior volume de recursos fiscais atraiacutedos para os cofres do Governo nunca pelo respeito que exerccedila para com os direitos fundamentais do contribuinte Eacute uma questatildeo de cultura adminisshytrativa de distribuiccedilatildeo de funccedilotildees no sistema estatal impossiacutevel de ser mudashydo por sugestotildees doutrinaacuterias

Por outro lado a fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo consegue afastar as pressotildees exercidas sobre ela por determinados segmentos da organizaccedilatildeo estatal que defendem uma atuaccedilatildeo mais agressiva para a cobranccedila dos tributos tudo em decorrecircncia dos efeitos produzidos pela conduta iliacutecita marcante da sonegashyccedilatildeo fiscal

Esses fatores contribuem para que a fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo tenha condiccedilotildees de modo imparcial sem isenccedilatildeo avaliar a necessidade objetiva da quebra do sigilo bancaacuterio do cidadatildeo Por melhor que seja o seu desempenho nunca ganharaacute a confianccedila do contribuinte

A atribuiccedilatildeo da quebra do sigilo bancaacuterio em um regime democraacutetico onde predomina o respeito maior aos direitos fundamentais da cidadania deve ser exercido pelo Poder Judiciaacuterio natildeo soacute porque seus membros atualmente revestidos da garantia da vitaliciedade inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos bem como porque estatildeo revestidos de independecircncia absoluta em relaccedilatildeo ao Poder interessado na cobranccedila do tributo e consequumlentemenshyte no resultado a ser obtido pela accedilatildeo fiscal

Esse sistema misto onde o Fisco faz a solicitaccedilatildeo motivada para a queshybra do sigilo bancaacuterio ao Poder Judiciaacuterio e este apoacutes analisaacute-lo com objetivishydade e cautela defere ou indefere impotildee seguranccedila e confiabilidade na atuashyccedilatildeo fiscal e sublima o respeito agrave dignidade do contribuinte em outras palavras da cidadania fiscal isto eacute de uma cidadania de liberdade que o Estado fiscal

9 Joseacute Casalta Nabais (Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra) no artigo Algumas Reflexotildees sobre o Actual Estado Fiscal no site httpagugovbr

ENSAIOS JURiacuteDICOS 257

pressupotildee para natildeo ser postergada impotildee um sistema fiscal balizado por esshytritos limites juriacutedico-constitucionais Limites esses que integram a chamada constituiccedilatildeo fiscal e que podemos reconduzir para natildeo nos alongarmos nesse aspecto a duas ideacuteias uma ideacuteia de seguranccedila que tem o seu tradicional e principal suporte no princiacutepio da lega1idade fiscal e uma ideacuteia de justiccedila ou equumlidade que tem a ver com a medida dos impostos e assenta no princiacutepio da capacidade contributiva 10

Em conclusatildeo a adoccedilatildeo de um sistema para a quebra do sigilo bancaacuteshyrio em que o Poder Judiciaacuterio seja o aacuterbitro dos pedidos da Administraccedilatildeo Puacuteblica natildeo eacute somente mais justo mas consegue impor maior credibilidade agrave atuaccedilatildeo fiscal e presta homenagem com intensa potencialidade aos princiacuteshypios democraacuteticos consistentes na guarda da seguranccedila juriacutedica do respeito aos direitos fundamentais do cidadatildeo nesse rol incluidos os agrave privacidade e agrave intimidade Aleacutem disso torna mais respeitaacutevel a relaccedilatildeo entre Fisco e contrishybuinte justificando portanto a opccedilatildeo do Estado pelo regime democraacutetico

8 Autoridade fiscal e faculdade incondicionada de quebrar o sigilo bancaacuterio

Essa indagaccedilatildeo consubstancia a preocupaccedilatildeo de serem estabelecidos controles para a atuaccedilatildeo do agente puacuteblico fiscal Centra-se a preocupaccedilatildeo em imprimir nas relaccedilotildees juriacutedicas tributaacuterias de quaisquer espeacutecies o primashydo da legalidade aprimorando-se o atuar vinculado

Natildeo concilia-se com os postulados da democracia a adoccedilatildeo de um sisteshyma de fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria que outorgue faculdade incondicionada ao fiscal tributaacuterio de invadir a intimidade e a privacidade das pessoas sob o falso argushymento juriacutedico de que busca encontrar provas de sonegaccedilatildeo fiscal

Depreende-se do exposto que a autoridade fiscal natildeo deve ter faculdade incondicionada de quebrar o sigilo sempre que entender necessaacuterio Isso porshyque a praacutetica de atos administrativos por agentes puacuteblicos de modo incondicionado revela grave violaccedilatildeo ao princiacutepio da legalidade onde predoshymina a vontade da lei e natildeo o discricionarismo de quem o pratica

No trato do sigilo bancaacuterio o atuar incondicionado da fiscalizaccedilatildeo assushyme caracteriacutesticas de maior gravidade porque haacute violaccedilatildeo aos princiacutepios funshydamentais jaacute expostos e que satildeo prestigiados pela Carta Magna especialmenshyte por bater de frente de modo integral e absoluto com o direito agrave intimidade e agrave privacidade O atuar deve vincular-se rigidamente ao princiacutepio da legalidashyde especialmente aposta na Carta Magna sem a possibilidade de ser aberto qualquer canal para uso da conveniecircncia ou da oportunidade

Eacute de ser lembrada no trato do assunto a liccedilatildeo de Joseacute Casalta Nobais no trabalho jaacute citado no sentido de que Eacute certo que independentemente da

10 Idem p 15

=258=---___________________ SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTlCA

concepccedilatildeo a que se adira relativamente ao segredo bancaacuterio natildeo temos a menor duacutevida de que o acesso da Administraccedilatildeo Fiscal agrave informaccedilatildeo bancaacuteria seja directo sem necessidade de preacutevia decisatildeo judicial seja indirecto depois portanto de preacutevia decisatildeo judicial haacute de ter sempre uma natureza claramenshyte excepcional Na verdade constitua o segredo bancaacuterio uma manifestaccedilatildeo do direito fundamental agrave reserva da intimidade da vida privada constante do art 26 n 2 da Constituiccedilatildeo portuguesa ou suporte um outro direito fundashymentai um direito agrave reserva da vida privada anaacutelogo agravequele a sua afectaccedilatildeo teraacute sempre caraacuteter excepcional

A autoridade fiscal natildeo possui a necessaacuteria isenccedilatildeo e competecircncia institucional para averiguar o grau dessa excepcionalidade de modo que posshysa impor confianccedila ao cidadatildeo investido na condiccedilatildeo de contribuinte poreacutem com direitos a serem assegurados por forccedila do regime democraacutetico adotado

O certo eacute que na relaccedilatildeo juriacutedico-tributaacuteria deve ser buscado o justo equiliacutebrio pregado pelo Estado de Direito onde o cidadatildeo deve ter a sua dignishydade respeitada sem contudo afastar-se a necessidade do Estado arrecadar tributos de forma cogente e imperativa bem como de serem permitidas conshydiccedilotildees de atuaccedilatildeo que resultem no combate agrave sonegaccedilatildeo fiscal

9 Responsabilidade da autoridade administrativa que quebrar o sigilo banshycaacuterio de forma inconsistente e indevida

Eacute inerente ao regime democraacutetico que a autoridade administrativa puacuteblishyca estaacute obrigada a exercer as suas atribuiccedilotildees com rigorosa obediecircncia aos princiacutepios da legalidade moralidade publicidade impessoalidade e eficiecircncia entre outros

A Carta Magna consagra expressamente no art 37 a obediecircncia do agente puacuteblico a esse tipo de comportamento

A autoridade administrativia que quebrar de modo inconsistente e indevido o sigilo bancaacuterio do cidadatildeo pratica ato com capacidade de provocar os seguintes efeitos a) de invadir o direito agrave privacidade e agrave intimidade de algueacutem b) de provocar-lhe danos morais e materiais dependendo da repershycussatildeo provocada pelo seu atuar

Constatada a efetivaccedilatildeo real de danos morais e materiais a responsabishylidade do Estado pode ser acionada conforme permite o art 37 sect 6ordm da Consshytituiccedilatildeo Federal Solidificada a culpa ou dolo do agente puacuteblico e consagrada a materializaccedilatildeo do iliacutecito praticado com o consequumlente ressarcimento patrimonial o Estado deveraacute usando o direito de regresso investir contra o agente que agiu culposa ou dolosamente

Natildeo resume-se apenas ao campo da responsabilidade civil a atuaccedilatildeo da autoridade quando ilegalmente quebra o sigilo bancaacuterio de qualquer cidadatildeo

ENSAIOS JURiacuteDICOS 259

o art 10 da Lei Complementar n 105 de 10 de janeiro de 2001 determishyna que A quebra de sigilo fora das hipoacuteteses autorizadas nesta lei compleshymentar constitui crime e sujeita os responsaacuteveis agrave pena de reclusatildeo de um a quatro anos e multa aplicando-se no que couber o Coacutedigo Penal sem prejuiacuteshyzo de outras sanccedilotildees cabiacuteveis A seguir no seu paraacutegrafo uacutenico explicita que Incorre nas mesmas penas quem omitir retardar injustificadamente ou presshytar falsamente as informaccedilotildees requeridas nos termos desta lei complementar

O art 11 da mesma lei complementar expressa que O servidor puacuteblico que utilizar ou viabilizar a utilizaccedilatildeo de qualquer informaccedilatildeo obtida em decorshyrecircncia da quebra de sigilo de que trata esta lei complementar responde pessoshyal e diretamente pelos danos decorrentes sem prejuiacutezo da responsabilidade objetiva da entidade puacuteblica quando comprovado que o servidor agiu de acorshydo com a orientaccedilatildeo oficial

10 O sigilo bancaacuterio e o tratamento que lhe eacute dado por oacutergatildeos internacioshynais como a OCDE e outros

Rui Celso Reali Fragoso Presidente do Instituto dos Advogados de Satildeo Paulo em artigo intitulado O Sigilo Bancaacuterio veiculado pela Internet (http Ii wwwjuscombr) registra que atualmente temos trecircs sistemas legais no munshydo cuidando do sigilo bancaacuterio O primeiro eacute o anglo-saxatildeo em que o sigilo natildeo encontra amparo legal o segundo eacute o dos paiacuteses da Europa continental - eu o contemplo em vaacuterios diplomas legais o terceiro eacute o da Suiacuteccedila e do Liacutebano que o reforccedilam

Analisando esses trecircs sistemas o autor citado observa

Haacute aparente contradiccedilatildeo no sistema inglecircs e norte-americano pois se de um lado nestes paiacuteses se eleva a garantia das liberdades individuais de outro se despreza o sigilo bancaacuterio Eacute que se ocorre conshyflito entre a apuraccedilatildeo de fatos (fator social) e a privacidade das pessoas (fator individual) prevalece a primeira Mais ainda o relacionamento de clientes e bancos longe de estabelececirc-lo serve como fonte de informashyccedilatildeo em favor de terceiros a indiscriccedilatildeo injustificada poreacutem eacute objeto de sanccedilatildeo E na Inglaterra os poderes puacuteblicos natildeo intervecircm no funcionashymento dos estabelecimentos privados de creacutedito o que debilita a invesshytigaccedilatildeo

Nos paiacuteses da Europa continental a legislaccedilatildeo contempla o sigilo bancaacuterio como consequumlecircncia do profissional e comporta derrogaccedilotildees na esfera penal e em alguns casos na civil mas comina sanccedilotildees crimishynais no caso de violaccedilatildeo ao sigilo (Coacutedigo Penal francecircs artigo 378 Coacuteshydigo Penal italiano art 622)

260 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

A sistemaacutetica fortalecida eacute aquela utilizada na Suiacuteccedila decorrente da crise ocorrida em 1931 com o fechamento do Banco de Genebra que ensejou a ediccedilatildeo de lei estabelecendo severas puniccedilotildees de natureza civil e criminal Tanto a legislaccedilatildeo suiacuteccedila como a libanesa esta surgida em 1956 permitem derrogaccedilotildees em certas hipoacuteteses A existecircncia das conshytas numeradas comprova a importacircncia do sigilo nestes paiacuteses

Eacute certo natildeo ser absoluto o segredo nem sua quebra em determishynadas situaccedilotildees significa abuso de poder Aliaacutes nenhum direito eacute absoluto

A doutrina tem ultimamente tomado conhecimento sobre as transforshymaccedilotildees que tem passado em vaacuterios ordenamentos juriacutedicos a questatildeo do sigilo bancaacuterio

Zenobio Simotildees de Melo advogado no Paranaacute em artigo sob o tiacutetulo Quebra do Sigilo Bancaacuterio (Internet httpjuscombr) informa que o jornal O Estado de Satildeo Paulo de 21 de junho de 2000 publicou a notiacutecia seguinte

Numa das mais importantes decisotildees adotadas durante o Conseshylho Europeu que marca o fim da presidecircncia portuguesa da Uniatildeo Euroshypeacuteia (UE) seus 15 paiacuteses aprovaram ontem o pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal No ponto mais polecircmico o pacote deveraacute acabar com o sigilo bancaacuterio ateacute 2010 foi uma negociaccedilatildeo de 12 anos Aacuteustria e Luxemburgo natildeo aceitavam o princiacutepio de acabar com o sigilo bancaacuterio A justificativa austriacuteaca eacute que este eacute um princiacutepio que faz parte da Consshytituiccedilatildeo do paiacutes haacute 200 anos Para aceitar o acordo o paiacutes exigiu a manushytenccedilatildeo do sigilo nos bancos austriacuteacos para quem resida no paiacutes

Registro a iacutentegra da notiacutecia

Pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal eacute aprovado por membros da UE Decisatildeo prevecirc quebra do sigilo bancaacuterio nos paiacuteses do bloco econocircmico

Jair Rattner

Especial para o Estado

Santa Maria da Feira Portugal- Numa das mais importantes decishysotildees adotadas durante o Conselho Europeu que marca o fim da presishydecircncia portuguesa da Uniatildeo Europeacuteia (UE) seus 15 paiacuteses aprovaram ontem o pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal No ponto mais polecircmico o pashycote deveraacute acabar com o sigilo bancaacuterio ateacute 2010

Foi uma negociaccedilatildeo de 12 anos Agora temos um documento que vai estabelecer os princiacutepios e as orientaccedilotildees para as futuras diretivas nessa aacuterea afirmou o Primeiro-Ministro Portuguecircs Antonio Guterres que ocupa a presidecircncia rotativa da UE (no fim do mecircs ela seraacute transferida para a Franccedila)

ENSAIOS JURiacuteDICOS 261

o acordo abrange trecircs aacutereas um coacutedigo de conduta que prevecirc o desmantelamento dos 66 paraiacutesos fiscais existentes ou dependentes da UE a tributaccedilatildeo de royalties e o pagamento de impostos sobre rendishymentos das poupanccedilas de cidadatildeos europeus residentes em outros paiacuteshyses dentre os 15 que fazem parte do bloco econocircmico europeu

O grande problema eram as poupanccedilas Aacuteustria e Luxemburgo natildeo aceitavam o princiacutepio de acabar com o sigilo bancaacuterio A justificativa austriacuteaca eacute que este eacute um princiacutepio que faz parte da Constituiccedilatildeo do paiacutes haacute 200 anos Para aceitar o acordo o paiacutes exigiu a manutenccedilatildeo do sigilo nos bancos austriacuteacos para quem resida no paiacutes Essa questatildeo natildeo eacute importante soacute para a Europa porque abre caminho para a criaccedilatildeo de mecanismos de transparecircncia global no mundo financeiro que satildeo esshysenciais para a globalizaccedilatildeo da economia avaliou Guterres

O prazo para a introduccedilatildeo das mudanccedilas vai ateacute o fim de 2010 Ateacute o fim deste ano as negociaccedilotildees vatildeo ser sobre a definiccedilatildeo do conteuacutedo das diretivas (as normas da UE)

Em 2002 a UE discutiraacute com outros paiacuteses esses conteuacutedos para fazer acordos que deveratildeo ser aprovados ateacute o fim do ano por unanimishydade

A partir de 2003 seraacute iniciado um periacuteodo de sete anos de transishyccedilatildeo para a troca de informaccedilotildees sobre os investimentos de cidadatildeos de outros paiacuteses europeus Nesse periacuteodo alguns paiacuteses poderatildeo optar por cobrar impostos de 20 a 25 sobre os rendimentos dos investimentos de residentes no exterior

No capiacutetulo onde foi analisado o sigilo bancaacuterio no Direito Comparado haacute registros tambeacutem a respeito do tratamento que oacutergatildeos internacionais como o OCDEll e outros vecircm dando ao sigilo bancaacuterio conforme estudo que foi apresentado pelo autor ali citado

II OCDE (Organizaccedilatildeo de Cooperaccedilatildeo e Desenvolvimento Econocircmico) criado em 1961 para substituir a OECE (Comitecirc Fiscal da Organizaccedilatildeo Europeacuteia de Cooperaccedilatildeo Econocircmica) Um dos documentos mais importantes da OCDE eacute o resultante da sua Convenccedilatildeo-Modelo relashytiva a impostos sobre a renda e o capital Essa Convenccedilatildeo estaacute sistematizada em sete capiacutetulos assim explicitados por Alberto Xavier em sua obra Direito Tributaacuterio Internacioshynal do Brasil A Convenccedilatildeo-Modelo da OCDE (tal como a das Naccedilocirces Unidas) encontra-se sistematizada em sete capiacutetulos Os capiacutetulos I e I regulam os requisitos para a aplicaccedilatildeo do tratado O capiacutetulo [JI - de longe o mais importante - conteacutem as regras de distribuiccedilatildeo de competecircncia no que concerne aos impostos sobre o rendimento classificado este por tipos ou classes agrave semelhanccedila do que sucede nos sistemas de tributaccedilatildeo cedular O capiacutetulo IV ocupa-se das regras de distribuiccedilatildeo de competecircncia no que respeita aos impostos sobre o capital O capiacutetulo V determina as consequumlecircncias das regras dos capiacutetulos 111 e IV facultanshydo aos Estados a escolha entre os meacutetodos da isenccedilatildeo e da imputaccedilatildeo O capiacutetulo VI conteacutem disposiccedilotildees adicionais sobre natildeo-discriminaccedilatildeo procedimento amigaacutevel troca de informaccedilotildees e privileacutegios de funcionaacuterios diplomaacuteticos e consulares e regras sobre extenshysatildeo do tratado a partes do territoacuterio Enfim o capiacutetulo VII conteacutem disposiccedilotildees finais sobre entrada em vigor e cessaccedilatildeo do acordo

262 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

Heleno Torres em sua recente obra Direito Tributaacuterio Internacional -Planejamento Tributaacuterio e Operaccedilotildees Transnacionais RT p 147 analisando o posicionamento da OCDE referente agrave poliacutetica de determinados paiacuteses que adoshytam tributaccedilatildeo favorecida e os efeitos dos regimes fiscais prejudiciais registra que

A OCDE resolveu entrar na luta para minorar as praacuteticas fiscalshymente danosas insistindo sobre a necessidade de aumentar as trocas de informaccedilotildees entre os Estados aleacutem de redigir uma lista de paiacuteses com tributaccedilatildeo favorecida e fazer algumas recomendaccedilotildees em acircmbito nacional e convencional a partir do seu importante relatoacuterio Harmful tax competition na emerging global issue

Mesmo reconhecendo os aspectos positivos do ambiente global vigente no qual os sistemas tributaacuterios operam os paiacuteses-membros da OCDE concluiacuteram que eles precisavam agir para restringir a competiccedilatildeo tributaacuteria danosa coletivamente e individualmente opondo-se agrave expanshysatildeo de regimes de impostos preferenciais danosos particularmente nos setores financeiros e atividades de serviccedilo que podem causar distorccedilotildees no comeacutercio e desniacuteveis nos padrotildees de investimento sendo uma ameashyccedila para os sistemas tributaacuterios domeacutesticos e para a estrutura global de tributaccedilatildeo internacional

Mais adiante pp 152153 Heleno Torres afirma que

Entre as recomendaccedilotildees definidas nesse relatoacuterio com aplicashyccedilatildeo dirigida aos paiacuteses-membros da instituiccedilatildeo as mais importantes satildeo as seguintes

bull para contrastar a competiccedilatildeo fiscal prejudicial os paiacuteses devem revisar as suas leis regulamentos e praacuteticas sobre sigilo bancaacuterio para remover empecilhos de acesso a tais informaccedilotildees por autoridades fiscais

bull intensificar o uso de trocas de informaccedilotildees principalmente soshybre as transaccedilotildees com paiacuteses de tributaccedilatildeo favorecida

A conclusatildeo que pode ser firmada apoacutes anaacutelise dos pronunciamentos internacionais acima explicitados eacute a construccedilatildeo de uma corrente que defenshyde uma maior abertura para a quebra do sigilo bancaacuterio quando for necessaacuteshyrio para apurar iliacutecitos tributaacuterios

Essa portanto eacute a resposta que apresento para a indagaccedilatildeo Qual o tratamento proposto por oacutergatildeos internacionais como o OCDE e outros com relaccedilatildeo ao sigilo bancaacuterio

ENSAIOS JURiacuteDICOS 263

11 Compatibilizaccedilatildeo do combate agrave criminalidade internacional com o resshypeito agrave seguranccedila juriacutedica a fim de evitar a fuga de investimentos do Paiacutes

Haacute de se reconhecer natildeo ser faacutecil desenvolver-se um sistema juriacutedico que contenha regras que facilitem o combate agrave criminalidade internacional e ao mesmo tempo prestigie os direitos fundamentais do cidadatildeo especialmenshyte a sua seguranccedila juriacutedica

As convenccedilotildees internacionais conforme demonstrado estatildeo preocupashydas com esses aspectos sem deixar de lado os fenocircmenos causados pela globalizaccedilatildeo

Natildeo deve ser esquecido que o tema envolve aspectos diversos a comeshyccedilar pelos determinantes da soberania dos Estados das forccedilas em expansatildeo das organizaccedilotildees internacionais e da pregaccedilatildeo para que os direitos fundamenshytaIacutes do cidadatildeo sejam respeitados com maior Iacutentensidade

A soluccedilatildeo a meu pensar pode ser encontrada no fortalecimento do Direito Comunitaacuterio Os Estados por via de organismos internacionais firmashyriam tratados para a adoccedilatildeo de um Coacutedigo Processual Penal Internacional com efeitos vinculantes por parte das naccedilotildees onde seriam adotadas regras investigatoacuterias e apuratoacuterias dos iliacutecitos internacionais alargando os conceitos de indiacutecios e presunccedilotildees sem deixar contudo de prestigiar a afetividade dos direitos e garantias fundamentais do cidadatildeo

Todas as naccedilotildees no iniacutecio deste seacuteculo envidam esforccedilos para diminuir a crise da seguranccedila juriacutedica Satildeo vaacuterios os fatores determinantes todos tendo como causa comum o crescimento da delinquumlecircncia em decorrecircncia de poliacutetishycas econocircmicas e sociais adotadas por determinados governos que contrishybuem para aumentar o percentual de pessoas pobres

A preocupaccedilatildeo atual para o combate ao crime internacional eacute alcanccedilar niacutevel de uniformizaccedilatildeo dos sistemas adotados para a quebra do sigilo bancaacuteshyrio De iniacutecio deve ser defendida a postura de que nenhuma lesatildeo ou ameaccedila a direito deve ser excluiacuteda da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio Nessa perspectishyva ganha suma importacircncia a criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional em virshytude de pela sua atuaccedilatildeo natildeo perdurar a diversidade de sistemas legais a respeito do assunto a saber a) O anglo-saxatildeo onde o sigilo natildeo encontra amparo legal b) o dos paiacuteses da Europa continental que o contempla em vaacuterios diplomas escritos e c) o da Suiacuteccedila e do Liacutebano que o reforccedilam l2bull

A criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional envolve uma reconceiacutetuaccedilatildeo de soberania

Sobre o tema Celso D de Albuquerque Mello em Direito Internacional da Integraccedilatildeo Ed Renovar p 13 faz a seguinte observaccedilatildeo

12 Conforme anota Rui Celso Reali Fragoso no artigo O Sigilo Bancaacuterio publicado no site httpvvwwjuscombr

264 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Poder-se-ia fazer um pequeno reparo a Chaumont que a indeshypendecircncia nacional eacute um conceito juridicamente indeterminado e que ela pode ter diferentes graus Tanto que podemos escrever soberania versus cooperaccedilatildeo internacional apesar de reconhecermos que esta posiccedilatildeo pode ser considerada como radical vez que natildeo haacute uma total incompatibilidade entre as duas Entretanto natildeo se pode deixar de consshytatar que de certo modo a cooperaccedilatildeo internacional se encontra conshysagrada na Carta da ONU no arl 1 ordm que trata dos Propoacutesitos das Naccedilotildees Unidas e nos Princiacutepios estabelecidos na Carta da OEA (Capiacutetulo 11) O mesmo ocorre na resoluccedilatildeo da Assembleacuteia Geral da ONU de 1970 que aprova a Declaraccedilatildeo Relativa aos Princiacutepios do Direito Internacional Reshylativas agraves Relaccedilotildees Amigaacuteveis e agrave Cooperaccedilatildeo entre os Estados conforme a Carta das Naccedilotildees Unidas bem como na Carta de Direitos e Deveres Econocircmicos aprovada pela mesma Assembleacuteia Geral em 1974

O crescimento do crime internacional em decorrecircncia dos fenocircmenos globalizantes determina o surgimento de um dever juriacutedico dos Estados firmashyrem pactos de cooperaccedilatildeo entre si para que enfrentem as organizaccedilotildees voltashydas para a criminalidade Esse dever juriacutedico globalizado tem suas raiacutezes no moral intemacional que conforme assinala Celso Albuquerque Mello na obra citada p 13 sempre consagrou o princiacutepio da solidariedade ou ainda do auxiacutelio muacutetuo

Eacute o mais importante desafio neste iniacutecio de seacuteculo fazer com que surja uma legislaccedilatildeo internacional que compatibilize o combate agrave criminalidade inshyternacional sem violar a seguranccedila juriacutedica com finalidade exclusiva de evitar a fuga de investimenos do Paiacutes

Tenha-se contudo em consideraccedilatildeo que a globalizaccedilatildeo do crime emshybora seja uma grande ameaccedila aos valores tradicionais que sustentam a cidashydania especialmente a seguranccedila juriacutedica natildeo deve prejudicar o desenvolvishymento econocircmico de qualquer naccedilatildeo

Natildeo faccedilo coro ao assinalado por Eric Hobsbawm em sua obra Era dos Extremos O Breve Seacuteculo XX 1914-1991 1995 p 24 Companhia das Letras S Paulo traduccedilatildeo de Marcos Santarrita no sentido de que Talvez a caracteriacutesshytica mais impressionante do fim do seacuteculo XX seja a tensatildeo entre esse processo de globalizaccedilatildeo cada vez mais acelerado e a incapacidade conjunta das instishytuiccedilotildees puacuteblicas e do comportamento coletivo dos seres humanos de se acoshymodarem a ele

Penso que natildeo haacute essa acomodaccedilatildeo e que as instituiccedilotildees puacuteblicas espeshycialmente as submetidas ao controle da ciecircncia juriacutedica natildeo estatildeo incapacitashydas de encontrar caminhos que solucionem o problema existente

ENSAIOS JURiacuteDICOS 265

Eacute por demais positivo entre outros acontecimentos o fato da conscienshytizaccedilatildeo de que haacute de ser encontrada uma forma de combate agrave criminalidade internacional que natildeo afaste a garantia da seguranccedila juriacutedica Esta eacute uma neshycessidade para impor paz agrave naccedilatildeo e consequumlentemente criar ambiente para que novos investimentos necessaacuterios ao desenvolvimento do seu processo econocircmico aconteccedilam sem se falar na manutenccedilatildeo dos jaacute existentes

O Parlamento Europeu aprovou ultimamente uma resoluccedilatildeo sobre a criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional sob a consideraccedilatildeo de que eacute necessaacuteshyrio criaacute-lo de forma permanente para complementar os sistemas judiciais nashycionais e pocircr fim agrave impunidade de que gozam os responsaacuteveis por genociacutedio crimes contra a humanidade e crimes de guerra

A abertura para essa posiccedilatildeo denota a formaccedilatildeo de uma consciecircncia internacional para combater a criminalidade internacional em todos os niacuteveis contribuindo para fortalecer a seguranccedila juriacutedica interna de cada paiacutes

O documento representativo dessa resoluccedilatildeo eacute do teor seguinte

Parlamento Europeo

Resolucioacuten sobre el Tribunal Penal Internacional

EI Parlamento Europeo

Vistas sus anteriores resoluciones sobre un Tribunal Penal Interna-cional

A Considerando que es necesario crear un Tribunal Penallnternashycional permanente que complemente los sistemasjudiciales nacionales y ponga fin a la impunidad de que gozan los responsables de genocidio crimenes contra la humanidad y criacutemenes de guerra

B Considerando que la Comisioacuten de Derechos Humanos de las Naciones Unidas estaacute respaldando decididamente la creacioacuten de ese Trishybunal

C Considerando que la fase preparatoria de la creacioacuten dei Tribushynal Penal Internacional finalizoacute con la uacuteltima sesioacuten dei Comiteacute Preparatorio de las Naciones Unidas que tuvo lugar dei 16 de marzo al3 de abril de 1998

D Felicitaacutendose por la creciente participacioacuten de Estados en el proceso de negociaciones y esperando que un nuacutemero auacuten mayor de Esshytados procedentes de todas las regiones se encuentre plenamente represhysentado en la Conferencia Diplomaacutetica de Roma

E Considerando que dei 15 de junio al17 de julio de 1998 se celebra en Roma la Conferencia Diplomaacutetica de Plenipotenciarios para la constitucioacuten de un Tribunal Penal Internacional

266 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

F Considerando que los Estados miembros y la delegacioacuten de la Comisioacuten Europea que participan en la Conferencia Diplomaacutetica de Roma pueden desempenar un papel crucial a la hora de garantizar el eacutexito de la conclusioacuten de esta Conferencia Diplomaacutetica y acogiendo positivamente la mayor convergenciacutea de las posturas de los Estados miembros de la UE

G Congratulaacutendose por la oferta dei Gobierno de los Paiacuteses Bajos de servir de sede dei Tribunal Penal Internacional permanente

I Insta a la Conferencia Diplomaacutetica de Roma a aprovechar la oportunidad histoacuterica de concluir un texto de Estatuto para un Tribunal Penal Internacional independiente justo y eficaz

2 Insta a los representantes de los Estados miembros dei Consejo y de la Comisioacuten a garantizar activamente el ecircxito de los resultados a sashyber un auteacutentico Tribunal Penal Internacional en lugar de limitarse a un acuerdo de compromiso sobre principios esenciales en sus esfuerzos por conciliar las posturas de Estados reticentes

3 Destaca que para constituir un complemento eficaz de los sisteshymas judiciacuteales nacionales el Estatuto dei Tribunal Penal Internacional permanente objeto de la Conferencia de Roma deberaacute establecer

a un Fiscal independiente con competencias para investigare insshytruir sumarios por propia iniciativa en situaciones en las que se hayan cometido los delitos sometidos a lajurisdiccioacuten dei Tribunal

b Ia jurisdiccioacuten inherente y universal dei Tribunal en materia de genocidio criacutemenes contra la humanidad criacutemenes de guerra y agresioacuten sin que se requiera ninguacuten consentimiento dei Estado

c una buena relacioacuten de trabajo con los Tribunales lnternacionales ya establecidos en La Haya

d una relacioacuten constructiva con las Naciones Unidas yen partishycular con el Consejo de Seguridad basada en el pleno reconocimiento de sus respectivas funciones y competencias

e Ia obligacioacuten de los Estados firmantes de acatar y hacer cumplir sin demora las oacuterdenes y decisiones dei Tribunal

f los mayores niveles de respeto de los derechos de los acusados y de los sospechosos y de proteccioacuten de los intereses de las viacutectimas y de los testigos

g Ia garantiacutea de una financiacioacuten a largo plazo necesaria para asegurar la autonomiacutea e independencia dei Tribunal frente a cualquier presioacuten exterior

4 Destaca ademaacutes que la jurisdiccioacuten deI Tribunal sobre los delishytos de genociacutedio los criacutemenes contra la humanidad y los criacutemenes de

ENSAIOS JURiacuteDICOS 267

guerra deben considerarse con la misma calificacioacuten penal con indepenshydencia de que se hayan cometido en conflictos armados internacionales o en conflictos internos

5 Insta ai Consejo y a los Estados miembros a garantizar la universalidad y la transparencia de las negociaciones y la participacioacuten continuada de la comunidadjuriacutedica y la sociedad civil internacionales

6 Encarga a su Presidente que transmita la presente resolucioacuten ai Consejo a la Comisioacuten a los Gobiernos de los Estados miembros ai Secreshytario General de las Naciones Unidas ai Presidente de la Asamblea Geneshyral de las Naciones Unidas y ai Presidente de la Conferencia Diplomaacutetica de las Naciones Unidas para la constitucioacuten de un Tribunal Penal Internashycional

A resoluccedilatildeo supracitada demonstra que cresce a conscientizaccedilatildeo da necessidade de ser criado um Tribunal Penal Internacional com forccedila cogente obrigatoacuteria de suas decisotildees no acircmbito interno dos paiacuteses que participarem do pacto de sua constituiccedilatildeo

A doutrina internacional revela que a comunidade internacional somenshyte agora vem se preocupando em criar uma estructura internacional para determinar las responsabilidades individuales emergentes de violacioacuten de ciertos derechos baacutesicos dei ser humano Los mecanismos de responsabilidad estatal creados desde los 60 se dirigen a la mayor protecciotilden dei ser humano y la erradicacioacuten de las praacutecticas de volacioacuten sistemaacutetica de los derechos humanos ar via de la condena ai Estado que ordena o que tolera los abusos por lo cual se estructuraron entorno ai Estado conmo sujeto responsable Como haacute seflalado la Corte Internacional de Derechos Humanos el procedimiento ante ella no es un procedimiento penal lo que se busca determinar es el nivel de cumprimiento por parte de un Estado de sus obligaciones de derecho internacional Sin desconocer la importancia de determinar la responsabilidad dei Estado para que eacuteste tenga un incentivo para erradicar esas praacutectica de sus frotneras es pertinente detacar que las violaciones maacutes grave son en uacuteltima instancia coshymetidas por individuos (Francisco Cox Encarregado dei TPI HOH em artigo intitulado EI IlOH ante la Craciotilden de um Tribunal Penal Internacional no site httpwwwiidhedcrcpitpintrohtml)

A criaccedilatildeo de um Tribunal Penal Internacional atuaria permanentemente e teria competecircncia subsidiaacuteria em relaccedilatildeo agrave outorgada aos Tribunais Nacioshynais limitando-se a atuar apenas nos crimes internacionais previamente defishynidos como sendo do interesse da comunidade global

Merece registro no acircmbito do assunto tratado que na Conferecircncia Reshygional sobre o Tribunal Penal Internacional realizada em 18 e 19 de fevereiro de 1998 na cidade de Guatemala Guatemala um dos temas tratados foi o relativo

268 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

agrave harmonizaccedilatildeo das incriminaccedilotildees quando os seguintes aspectos foram disshycutidos Branqueamento corrupccedilatildeo fraude fiscal participaccedilatildeo em associashyccedilotildees criminosas um olhar agrave luz dos direitos nacionais e do direito internacioshynal Perspectivas Quais os comportamentos a incriminar Criar uma nova incriminaccedilatildeo da fraude fiscal Uma tentativa de harmonizaccedilatildeo o corpus jurls contendo disposiccedilotildees penais para proteccedilatildeo dos interesses financeiros da Uniatildeo Europeacuteia As negociaccedilotildees no seio do Conselho da Europa e da OCDE referenshytes agrave luta contra a corrupccedilatildeo etc O referido painel foi presidido por Benoit Dejemeppe procurador do Rei em Bruxelas e contou com a presenccedila de Tereshyza Beleza professora de Direito Penal na Faculdade de Direito de Lisboa como moderadora

Haacute como visto um largo campo de anaacutelise para desenvolver com possishybilidade do surgimento de sugestotildees que levem a ciecircncia juriacutedica a alcanccedilar com a atuaccedilatildeo estatal uma competecircncia internacional que possa combater o crime internacional e ao mesmo tempo proporcione seguranccedila juriacutedica na ordem interna ganhando assim o sistema juriacutedico confianccedila dos investidoshyres

Em conclusatildeo a forma de compatibilizar o combate agrave criminalidade internacional sem violar a seguranccedila juriacutedica necessaacuteria a evitar a fuga de inshyvestimentos do paiacutes estaacute na criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional com comshypetecircncia definida para processar e julgar delitos globalizantes e cujas decisotildees tenham forccedila imperativa no acircmbito interno das naccedilotildees participantes do pacto para o seu nascimento

Page 13: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro

ENSAIOS JURiacuteDICOS 235

nas relaccedilotildees com os clientes visando proteger de forma eficaz a posishyccedilatildeo do consumidor de serviccedilos financeiros (cf preacircmbulo do Decreshyto-Lei n 2981992) ou estabelecer um clima de confianccedila na banca que permita a captaccedilatildeo e recuperaccedilatildeo do dinheiro entesourado (como se dizia no relatoacuterio do Decreto-Lei n 21978 de 9 de janeiro revogado pelo n 1 do art 5Q do citado Decreto-Lei n 2981992) no processo de inqueacuteshyrito a que procede o Ministeacuterio Puacuteblico estaacute em causa a realizaccedilatildeo de diligecircncias de prova que permitam investigar um crime de emissatildeo de cheque sem provisatildeo sob a eacutegide do princiacutepio da verdade material e incriminar o respectivo agente

O interesse que estaacute em jogo com a pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblishyco na obtenccedilatildeo da documentaccedilatildeo bancaacuteria eacute o da boa administraccedilatildeo da Justiccedila Penal e esse interesse eacute no caso em apreccedilo sensivelmente supeshyrior ao interesse da manutenccedilatildeo do segredo bancaacuterio o que equivale a di~er que este deve ceder perante aquele

Em suma no caso concreto ponderados os interesses em conflishyto entendemos que a quebra do dever de sigilo bancaacuterio se justifica nos termos do art 36 do Coacutedigo Penal pelo que deve ser dada procedecircncia agrave pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico e consequumlentemente ao abrigo do disposto nos arts 182 n 2 e 135 n 2 e 3 ambos do Coacutedigo de Processo Penal dispensar-se a Caixa Geral de Depoacutesitos do cumprimento do deshyver de sigilo bancaacuterio a fim de poder satisfazer tal pretensatildeo

3 Por todo o exposto determina-se que com quebra do dever de sigilo bancaacuterio a Caixa Geral de Depoacutesitos forneccedila ao Digno Magistrado do Ministeacuterio Puacuteblico com destino ao Processo de Inqueacuterito n 3571 1994 a documentaccedilatildeo bancaacuteria que este lhe havia solicitado

Natildeo eacute devida taxa de justiccedila

Texto processado e integralmente revisto pelo relator

Desembargador-Relator Rui Mauriacutecio

g) Substancioso estudo do sigilo bancaacuterio no Direito Comparado foi feishyto por Andreacute Serratildeo Borges de Sampaio Consultor da Uniatildeo nas informashyccedilotildees que prestou ao Advogado-Geral da Uniatildeo com referecircncia agrave ADIn n 2397 Transcrevo o inteiro teor do seu pronunciamento

51

6 O tratamento do sigilo bancaacuterio no Direito Comparado

Em verdade o Direito Comparado entende inoponiacutevel o sigilo banshycaacuterio agraves autoridades tributaacuterias Com efeito leciona Alfredo Echeverriacutea Herrera verbis

236 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

EI sigilo bancario constituye un reacutegimen limitado exclusivashymente ai aacutembito de las relaciones entre la institucioacuten bancaria y sus clientes e impone la obligacioacuten de confidencialidad de la institucioacuten sobre las informaciones que aqueacutellos le proporcionan

En todas las legislaciones bancarias el sigilo es relativo es decir el derecho dei ciudadano ai secreto y la correlativa obligacioacuten para el banco de no revelar a terceros las informaciones recibidas en el ejercicio de su actividad ceden cuando existe norma legal expresa o causa justificada

Elliacutemite legal ai sigilo estaacute constituiacutedo por la obligacioacuten dei banco de entregar informaciones y se fundamenta en motivos sushyperiores de orden puacuteblico o general siendo liacutecito entonces que el Estado establezca Iiacutemites legales ai secreto bancaria para auxiliar por ejemplo las actuaciones de la Justicia en el plano jurisdiccional y las dei Estado en el aacutembito dei ejercicio de su potestad impositiva

Es un principio irrebatible en la vida dei derecho que ni la autonomia de las personas ni los instrumentos dei aacuterea econoacutemica y financiera pueden servir en un momento dado como elementos juridicamente idoacuteneos para lesionar el intereacutes puacuteblico En consecuencia se puede afirmar que las limitaciones ai sigilo bancario son salvaguardias necesarias ai bien comuacuten en los caacutenones dei Estado moderno Estas limites deben ser materias reshyservadas a la ley por ser de caraacutecter excepcional en sentido estricto

En este orden de ideas necesariamente debe concluirse que existen legiacutetimos y superiores intereses en diversas aacutereas de la sociedad que se vinculan ai bien comuacuten y que deben ser tutelados por el Estado como lo es por ejemplo la necesidad de detectar y reprimir la evasioacuten de los impuestos los cuales transcienden ai evenshytual intereacutes geneacuterico que pueda tener el mismo Estado en la mantencioacuten dei sigilo bancaria En efecto desde el punto de vista de lajuridicidad y de la eacutetica no se puede sostener que el secreto bancaria pueda servir como instrumento para proteger la comisioacuten de actos

52

como el recieacuten mencionado que son constitutivos muchas veces de iliacutecitos penales bajo la forma de delitos tributarias o fraushydes fiscales con resultados ademaacutes de perjucio patrimonial ai Esshytado y dano ai intereacutes general de la sociedad

EI sistema bancaria frente a la existencia en la sociedad de un intereacutes general preponderante y superior estaacute naturalmente Ilamado a colaborar en la verificacioacuten y represioacuten de la evasioacuten tributaria

ENSAIOS JURiacuteDICOS 237

En este marco se inscribe la tendencia de la mayoda de las legislaciones modemas en cuanto a dotar aI Estado de facultades para intervenir en la actividad econoacutemica de los ciudadanos en procura de la correcta determinacioacuten de los tributos cuando se conshyfigura en el desarrollo de estas actividades un hecho gravado establecido en la ley

Ya la Constitucioacuten de Weimar en 919 proclamoacute que es liacutecito ai Estado intervenir para condicionar el ejercicio de los derechos a determinados fines sociales El bien comuacuten y la justicia social comenzaron desde entonces a servir de frontera a los derechos y Iibertades individuales

Cabe destacar que la OCDE (Organisation for Economic Cooperation and Development) en un documento elaborado en el ano 1999 sobre las praacutecticas de los paiacuteses en el acceso a la informacioacuten bancaria para fines tributarios advierte que se puede abusar de la confidencialidad para ocultar actividades iJegales y evadir impuestos y agrega en el resumen ejecutivo deI documento que ni la criminalizacioacuten dei fraude tributario ni el tratamiento de la evasioacuten de impuestos bajo las leyes tributarias de los paiacuteses miembros de la OCDE son homogeacuteneos pero que sin embargo los gobiernos de la mayoriacutea de los paiacuteses miembros de la OCDE han tomado la visi6n de que en este contexto las autoridades tributashyrias no deben ser tratadas como simples terceros sino que se les debe otorgar un acceso priviligiado a la informaci6n bancaria con fines tributarias

Se agrega en este estudio que una medida de esta naturaleza no pane en peligro la conlidencialidad de la inlormacioacuten bancaria puesto que las autoridades tributarias estaacuten sujetas a estrictos conshytroles sobre coacutemo utilizan la informacioacuten de los contribuyentes y todos los gobiemos han implementado regIas para proteger la conlidencialidad de la informaci6n tributaria (EI Sigilo Bancaacuterio Acesso a la Informadon Bancaria para Fines Tributarias)

Em verdade seu texto elenca 30 paiacuteses integrantes da OCDE (a saber Alemanha Austraacutelia Aacuteustria Beacutelgica Canadaacute Repuacuteblica Checa Dinamarca Finlacircndia Franccedila Greacutecia Hungria Islacircndia Irlanda Itaacutelia Japatildeo Coreacuteia Luxemburgo Meacutexico Paiacuteses Baixos Nova Zelacircndia Noshyruega Polocircnia Portugal Espanha Sueacutecia Turquia Suiacuteccedila Reino Unido Estados Unidos Repuacuteblica Eslovaca) dos quais em 1999 apenas trecircs (Portugal Repuacuteblica Eslovaca e Luxemburgo) natildeo facultavam o acesso por parte de autoridades tributaacuterias a informaccedilotildees relativas a pessoas suspeitas de fraude tributaacuteria

238 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

Desses trecircs paiacuteses hoje remanescem apenas dois Com efeito Portugal deixou de integrar esse grupo constrangedoramente minoritaacuterio ao aprovar em 29 de dezembro de 2000 a Lei n 30-G

Nesse diploma lecirc-se

Lei da Reforma de Tributaccedilatildeo do Rendimento

(Portugal)

Artigo 63 O - B

Acesso a informaccedilotildees e documentos bancaacuterios

1 A administraccedilatildeo tributaacuteria tem o poder de aceder directashymente aos documentos bancaacuterios nas situaccedilotildees de recusa da sua exibiccedilatildeo ou de autorizaccedilatildeo para a sua consulta

a) quando se trate de documentos de suporte de registos contabiliacutesticos dos sujeitos passivos de IRS e IRC que se enconshytrem sujeitos agrave contabilidade organizada

b) quando o contribuinte usufrua de benefiacutecios fiscais ou de regimes fiscais privilegiados havendo necessidade de controshylar os respectivos pressupostos e apenas para esse efeito

2 A administraccedilatildeo tributaacuteria tem o poder de aceder a todos os documentos bancaacuterios excepto as informaccedilotildees prestadas para justificar o recurso ao creacutedito nas situaccedilotildees de recusa de exibiccedilatildeo daqueles documentos ou de autorizaccedilatildeo para a sua consulta

a) quando se verificar a impossibilidade de comprovaccedilatildeo e quantificaccedilatildeo directa e exacta da mateacuteria tributaacutevel nos termos do artigo da Lei Geral Tributaacuteria e em geral quando estejam verifishycados os pressupostos para o recurso a uma avaliaccedilatildeo indirecta

b) quando os rendimentos declarados em sede de IRS se afastarem significativamente para menos sem razatildeo justificada dos padrotildees de rendimento que razoavelmente possam permitir as manifestaccedilotildees de riqueza evidenciadas pelo sujeito passivo nos termos do artigo 89-A da Lei Geral Tributaacuteria

c) quando existam indiacutecios da praacutetica de crime doloso em mateacuteria tributaacuteria designadamente nos casos de utilizaccedilatildeo de facturas falsas e em geral nas situaccedilotildees em que existam factos concretamente identificados gravemente indiciadores da falta de veracidade do declarado

d) quando seja necessaacuterio para fins fiscais comprovar a aplicaccedilatildeo de subsiacutedios puacuteblicos de qualquer natureza

ENSAIOS JUAlolCOS 239

3 As decisotildees da administraccedilatildeo tributaacuteria referidas nos nuacuteshymeros anteriores devem ser fundamentadas com expressa menshyccedilatildeo dos motivos concretos que as justificam pressupotildeem a audishyccedilatildeo preacutevia do contribuinte e satildeo da competecircncia do Director-Geshyral dos Impostos ou do Director-Geral das Alfacircndegas e dos Imshypostos Especiais sobre o consumo ou seus substitutos legais sem possibilidade de delegaccedilatildeo

4 Os actos praticados ao abrigo da competecircncia definida no nuacutemero anterior satildeo susceptiacuteveis de recurso judicial o qual teraacute efeito suspensivo nas situaccedilotildees previstas no n 2

5 Nos casos de deferimento do recurso previsto no nuacutemero anterior os elementos de prova entretanto obtidos natildeo podem ser utilizados para qualquer efeito em desfavor do contribuinte

6 As entidades que se encontrem numa relaccedilatildeo de domiacutenio com o contribuinte ficam sujeitas aos regimes de acesso agrave inforshymaccedilatildeo bancaacuteria referidos nos n 1 e 2

7 O acesso da administraccedilatildeo tributaacuteria a informaccedilatildeo banshycaacuteria relevante relativa a familiares ou terceiros que se encontrem numa relaccedilatildeo especial com o contribuinte depende de autorizashyccedilatildeo judicial expressa apoacutes audiccedilatildeo do visado obedecendo aos requisitos previstos no n 3

8 O regime previsto nos nuacutemeros anteriores natildeo prejudica a legislaccedilatildeo aplicaacutevel aos casos de investigaccedilatildeo por infracccedilatildeo peshynal e soacute pode ter por objecto operaccedilotildees e movimentos bancaacuterios realizados apoacutes a sua entrada em vigor sem prejuiacutezo do regime vigente para as situaccedilotildees anteriores

9 Os actos praticados ao abrigo da competecircncia prevista no n I devem ser objecto de comunicaccedilatildeo ao Defensor do Contrimiddot buinte

10 Para os efeitos desta lei considera-se documento bancaacuteshyrio qualquer documento ou registo independentemente do resshypectivo suporte em que se titulem comprovem ou registem opeshyraccedilotildees praticadas por instituiccedilotildees de creacutedito ou sociedades finanshyceiras no acircmbito da respectiva actividade incluindo os referentes a operaccedilotildees realizadas mediante utilizaccedilatildeo de cartotildees de creacutedito (coacutepia anexa)

Parece evidente destarte que todo o mundo civilizado abandonou a possibilidade de opor-se agrave Administraccedilatildeo Tributaacuteria o sigilo bancaacuterio

240 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

4 O sigilo bancaacuterio e o direito agrave intimidade e agrave privacidade das pessoas

A anaacutelise do sigilo bancaacuterio em face do direito agrave intimidade e agrave privacidashyde exige inicialmente que seja enfrentada a questatildeo referente ao seu conceito

Os doutrinadores natildeo tecircm assumido posiccedilatildeo uniforme quanto aos asshypectos conceituais dessa entidade juriacutedica

Seacutergio Carlos Covello autor da obra jaacute mencionada (O Sigilo Bancaacuterio Leud S Paulo 1991 p 69) entende que sigilo bancaacuterio eacute a obrigaccedilatildeo que tecircm os Bancos de natildeo revelar salvo justa causa as informaccedilotildees que venham a obter em virtude de sua atividade profissional

Luiz Fernando Bellinetti no artigo intitulado Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio (Revista do Direito do Consumidor Satildeo Paulo RT 1996 voI 18 p 144) defende posiccedilatildeo no sentido de que sigilo bancaacuterio eacute o dever juriacutedico que tecircm as instituiccedilotildees de creacutedito e as organizaccedilotildees auxiliares e seus empregados de natildeo revelar salvo justa causa as informaccedilotildees que venham a obter em virtushyde da atividade bancaacuteria a que se dedicam

Para Arnoldo Wald (in O Sigilo Bancaacuterio no Projeto de Lei Complemenshytar n 70 Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas n I pp 196209) o sigilo bancaacuterio se enquadra no conceito mais amplo do segredo profissional que tem merecido uma proteccedilatildeo mais ampla ensejando sua violaccedilatildeo caracterizaccedilatildeo como crime (art 154 do Coacutedigo PeshynaI)

Eivany A Silva tratando do tema em Consideraccedilotildees a Respeito do Sigilo de Dados (artigo publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio n 61 pp 41142 - Edit Dialeacutetica) afirma que o sigilo bancaacuterio eacute espeacutecie do gecircnero sigilo de dados constituindo um direito fundamental protegido constitucionalmente inserto que estaacute no rol dos direitos e garantias individuais ou seja em claacuteusushylas peacutetreas da Carta Magna natildeo podendo portanto ser modificado nem messhymo por emenda agrave Constituiccedilatildeo e portanto muito menos por legislaccedilatildeo de hierarquia inferior

Como examinado haacute divergecircncias na fixaccedilatildeo do conceito Essas divershygecircncias embora importantes para as posiccedilotildees doutrinaacuterias a serem assumishydas sobre o alcance do sigilo bancaacuterio natildeo geram contudo influecircncias de maior intensidade no relacionamento entre a instituiccedilatildeo financeira e os seus depositantes Isso porque o que merece ser considerado eacute a natureza juriacutedica do sigilo bancaacuterio isto eacute a que categoria de direito pertence e como por quem e quando a sua quebra pode ser determinada

Em face do exposto necessaacuterio eacute que se faccedila o alinhamento das teorias que procuram fundamentar o sigilo bancaacuterio

A doutrina em eacutepocas diversas examinou as seguintes teorias

ENSAIOS JURiacuteDICOS 241

Teoria contratualista O sigilo bancaacuterio de acordo com essa teoria deshycorre da relaccedilatildeo contratual que voluntariamente eacute formada entre o banco e o cliente por via da qual mesmo sem claacuteusula expressa a instituiccedilatildeo financeira assume a obrigaccedilatildeo de guardar segredo das movimentaccedilotildees de dinheiro que nela satildeo feitas Essa responsabilidade assumida pelo banco inspira-se segunshydo os adeptos da teoria em destaque nos usos nos costumes e na boa-feacute sempre aplicaacuteveis na intepretaccedilatildeo dos contratos comerciais7bull

Teoria do direito agrave privacidade Os adeptos dessa corrente afirmam que o sigilo bancaacuterio integra o campo do direito agrave privacidade que faz parte dos direitos da personalidade

Teoria consuetudinaacuteria Segundo os seguidores dessa linha de pensar o sigilo bancaacuterio decorre dos compromissos taacutecitos assumidos entre instituishyccedilotildees financeiras e seus clientes no sentido de natildeo serem levados ao conhecishymento de terceiros os valores transacionados O uso reiterado dessa praacutetica apoiada no elemento confianccedila passou a representar costume adotado nesse tipo de negoacutecio juriacutedico

Teoria da boa-feacute A adoccedilatildeo dessa teoria conduz o inteacuterprete a entender que o sigilo bancaacuterio por sua proacutepria natureza estaacute vinculado ao caraacuteter fiduciaacuterio da atividade bancaacuteria fundando-se portanto na boa-feacute ou dever de lisura que tanto marca o tipo de negoacutecio juriacutedico firmado

Teoria do sigilo profissional Essa teoria concebe o sigilo bancaacuterio como sendo uma espeacutecie do sigilo profissional Haacute portanto um dever eacutetico do banshyco em respeitar o sigilo bancaacuterio em decorrecircncia da profissatildeo exercida

Teoria do direito agrave intimidade dos bancos Os integrantes dessa forma de pensar sustentam que a instituiccedilatildeo financeira tem legiacutetimo interesse de afastar do conhecimento de terceiros a movimentaccedilatildeo financeira dos seus clientes e consequumlentemente dos fatos com elas relacionados

Teoria da complexidade do viacutenculo Essa teoria eacute explicada por Arnoldo Wald no trabalho jaacute citado da forma seguinte A doutrina moderna abandoshynou a noccedilatildeo da relaccedilatildeo juriacutedica contratual defendo a complexidade do viacutenshyculo Aleacutem dos direitos e das obrigaccedilotildees principais existem deveres secundaacuteshyrios para ambos os contratantes que decorrem da regra geral da boa-feacute denoshyminada na doutrina italiana de cOITeteza e na legislaccedilatildeo alematilde de Treu und Glauben Exige que a atuaccedilatildeo de uma parte natildeo cause danos agrave esfera juriacutedica da outra Dentro desta ideacuteia defende-se que o segredo bancaacuterio eacute um dever

7 Arnoldo Wald em Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais artigo publicado na Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas n 22 pp 1518 manifesta entendimento de que no campo normatIacutevo do Direito brasileiro esta teoria encontra respaldo nos arts 130 e 131 do Coacutedigo Comercial que prevecirc a interpretaccedilatildeo dos contratos segundo os usos os costumes e a boa-feacute

242 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

acessoacuterio na relaccedilatildeo juriacutedica Mesmo que natildeo nasccedila o contrato entre as partes a boa-feacute objetiva impede que a instituiccedilatildeo financeira prejudique os interesses do cidadatildeo

Estabelecidos os pressupostos doutrinaacuterios acima examinamos agora se o sigilo bancaacuterio diz respeito agrave intimidade e agrave privacidade das pessoas

A Constituiccedilatildeo Federal em seu artigo 5ordm incisos X e XII afirma

Art 5ordm Todos satildeo iguais perante a lei sem distinccedilatildeo de qualquer natureza garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Paiacutes a inviolabilidade do direito agrave vida agrave liberdade agrave igualdade agrave segushyranccedila e agrave propriedade nos termos seguintes

X - satildeo inviolaacuteveis a intimidade a vida privada a honra e a imagem das pessoas assegurado o direito agrave indenizaccedilatildeo pelo dano material ou moral decorrente de sua violaccedilatildeo

XJl - eacute inviolaacutevel o sigilo da correspondecircncia e das comunicaccedilotildees telegraacuteficas de dados e das comunicaccedilotildees telefocircnicas salvo no uacuteltimo caso por ordem judicial nas hipoacuteteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigaccedilatildeo criminal ou instruccedilatildeo processual penal

Essas garantias constitucionais protegem o cidadatildeo de qualquer investida de terceiros em sua intimidade em sua vida privada e no sigilo de seus dados

Na expressatildeo terceiros estaacute incluiacutedo o Estado e consequumlentemente seus agentes poliacuteticos e administrativos

A doutrina tem se manifestado de modo quase unacircnime no sentido de que o sigilo bancaacuterio eacute uma garantia constitucional que protege a privacidade das pessoas no campo econocircmico e financeiro A sua significaccedilatildeo eacute de natildeo tornar puacuteblica a movimentaccedilatildeo da conta bancaacuteria e das aplicaccedilotildees financeiras do cidadatildeo para que de nenhum modo os atos privados praticados possam ser tornados puacuteblicos

Esse posicionamento eacute o adotado pelos autores que passo a citar

Arnoldo Wald (O Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais artigo pushyblicado na Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas RT n 22 pp 1521)

O sigilo bancaacuterio eacute o meio para resguardar a privacidade no camshypo econocircmico pois veda a publicidade sobre a movimentaccedilatildeo da conta corrente bancaacuteria e das aplicaccedilotildees financeiras

ENSAIOS JURiacuteDICOS 243

Eivany A Silva (Consideraccedilotildees a Respeito do Sigilo de Dados artigo publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio n 61 Satildeo Paulo Editora Dialeacutetica p27)

A maioria dos ordenamentos juriacutedicos como o brasileiro tratam o sigilo bancaacuterio como direito fundamental do contribuinte agrave privacidashyde ou seja agrave resistecircncia agrave comunicaccedilatildeo de dados que representem desshydobramento da personalidade da pessoa direito agrave oposiccedilatildeo e agrave negaccedilatildeo de comunicaccedilatildeo

Ives Gandra da Silva Martins (Sigilo Bancaacuterio trabalho publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio S Paulo Editora Dialeacutetica n 1 pp 24 e 25)

Pelos incisos X e XII do artigo 5ordm tem o contribuinte o direito de preservaccedilatildeo de sua intimidade de sua privacidade e de que terceiros que detenham informaccedilotildees pessoais suas sejam obrigados a guardaacute-Ias

Natildeo pode pois a fiscalizaccedilatildeo exigir de terceiros informaccedilotildees que apenas pode obter do proacuteprio contribuinte

Em determinadas hipoacuteteses todavia o interesse puacuteblico haacute de preshyvalecer sobre o interesse individual mas caberaacute a um outro poder definir se tais hipoacuteteses efetivamente ocorrem com o que poderaacute o Poder Judishyciaacuterio autorizar se convencido estiver o magistrado de que a hipoacutetese eacute de gravidade e de lesatildeo ao interesse puacuteblico a quebra do direito ao sigilo bancaacuterio

Estou convencido ser esta a melhor conformaccedilatildeo juriacutedica da quesshytatildeo idealizada pelos constituintes defendida pela doutrina e consagrashyda na jurisprudecircncia corrente exegeacutetica esta a que me filio desde os meus primeiros escritos sobre a mateacuteria

Roberto Quiroga Mosquera (Tributaccedilatildeo no Mercado Financeiro e de Capitais obra publicada pela Editora Dialeacutetica Satildeo Paulo 1998 pp 70171)

Do exposto ateacute aqui eacute evidente que o direito ao sigilo bancaacuterio representa uma espeacutecie de direito agrave privacidade

Eacute incontroverso que os dados e informaccedilotildees de natureza bancaacuteria dizem respeito agrave intimidade e agrave vida privada dos cidadatildeos Dados que dizem respeito aos valores em dinheiro depositados em contas-correnshytes bancaacuterias tipos e caracteriacutesticas de aplicaccedilotildees financeiras ganhos e prejuiacutezos auferidos ou incorridos em operaccedilotildees bursaacuteteis etc satildeo sem sombra de duacutevida elementos particulares e pessoais de qualquer indiviacuteshyduo

244 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Utilizando outra voz informaccedilotildees que tocam no aspecto financeishyro do ser humano representam direito iacutentimo e personaliacutessimo devendo ser mantidas em sigilo por aqueles que eventualmente as detenham em razatildeo de sua atividade profissional Parece-nos que tal conclusatildeo eacute de uma clareza inconteste

Natildeo tem sido outra a posiccedilatildeo da doutrina mais abalizada do Paiacutes e da jurisprudecircncia dominante

o autor referido a seguir faz a observaccedilatildeo seguinte

Carlos Alberto Hagstrom (Sigilo Bancaacuterio Novas Questotildees Reshyvista de Direito Mercantil Satildeo Paulo Malheiros 1997 vaI 105 pp 4344) expotildee que apesar de existirem diversas teorias que procuram fundashymentar juridicamente o sigilo bancaacuterio modernamente a explicaccedilatildeo para o fundamento do referido instituto sofreu uma radical alteraccedilatildeo Divershysas constituiccedilotildees modernas esclarece o mencionado autor ampliaram e explicitaram o elenco de direitos e garantias individuais passando a garantir o direito agrave privacidade e agrave intimidade A Constituiccedilatildeo brasileira natildeo trilha caminho diferente Assegurou referidos direitos de forma exshypressa e sem restriccedilotildees O tema do sigilo bancaacuterio figura agora em niacutevel constitucional Tem status de norma superior no qual se reconhece o direito agrave intimidade como norma de caraacuteter geneacuterico em que estatildeo conshytemplados muacuteltiplos aspectos da vida privada em especial os de ordem econocircmico-financeira que compotildeem o que Hagstrom denominou a inshytimidade econocircmica ou intimidade patrimonial

Luiacutes Fernando 8ellinetti (Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio artigo publicado na Revista de Direito do Consumidor n 18 pp 141151)

Como jaacute dissemos anteriormente em certas hipoacuteteses o fundashymento para o segredo bancaacuterio seria a privacidade No entanto nesses casos o que se protege eacute a privacidade e natildeo propriamente o sigilo

Entendemos que uma coisa eacute garantir-se a privacidade da pessoa com fundamento em norma constitucional outra eacute garantir-se o segreshydo de informaccedilotildees bancaacuterias de uma pessoa com base na legislaccedilatildeo supramencionada

Sempre que a revelaccedilatildeo de informaccedilotildees bancaacuterias puder violar a privacidade da pessoa parece-nos que mais do que garantia ao sigilo bancaacuterio (com fundamento legal) tem a pessoa garantia agrave sua privacishydade (com fundamento constitucional)

ENSAIOS JURiacuteDICOS 245

No entanto se a revelaccedilatildeo da informaccedilatildeo natildeo invadir a esfera da intimidade da pessoa sua garantia eacute meramente legal do sigilo bancaacuterio

Carlos Maacuterio Velloso (citado por Misabel Derzi em Direito Tributaacuterio Aplicado obra publicada pela Editora Del Rey Belo Horizonte MO pp 278 e 279)

O sigilo bancaacuterio decorre do direito agrave privacidade inerente agrave pershysonalidade das pessoas consagrado na Constituiccedilatildeo Federal em seu art 5ordm X e protege tanto interesses privados como finalidades de ordem puacuteblica a saber o sistema de creacutedito O sigilo bancaacuterio natildeo eacute um princiacuteshypio absoluto

As exceccedilotildees ao sigilo bancaacuterio estatildeo previstas na Lei n 45951964 que continua em vigor

O Poder Judiciaacuterio pode requisitar relativamente a pessoas e instishytuiccedilotildees informaccedilotildees que implicam quebra de sigilo (Lei n 45951964 art 38 sect 1 ordm) entretanto mesmo havendo inqueacuterito policial instaurado deveraacute proceder com cautela prudecircncia e moderaccedilatildeo inerentes agrave mashygistratura

Luciana Fregodolli (O Direito agrave Intimidade - excerto da dissertaccedilatildeo que apresentou sob o tiacutetulo O Direito agrave Intimidade e a Prova Iliacutecita publicado pela Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Constitucional e Ciecircncia Poliacutetica -n 19 p 233)

O sigilo bancaacuterio protege interesses privados Eacute ele espeacutecie de direito agrave privacidade inerente agrave personalidade das pessoas e que a Consshytituiccedilatildeo Federal consagra no art 5ordm X aleacutem de atender a uma finalidade de ordem puacuteblica qual seja a de proteccedilatildeo ao sistema de creacutedito

O direito agrave privacidade abrange atualmente o de impedir que tershyceiros inclusive o Estado e o Fisco tenham acesso a informaccedilotildees sobre o que se denominou a aacuterea de manifestaccedilatildeo existencial do ser humano

Celso Ribeiro Bastos O pensamento de Celso Ribeiro Bastos foi exshyposto por Roberto Quiroga Mosquera na obra jaacute referida p 71 do modo seguinte

Celso Bastos eacute do mesmo pensar Apoacutes tecer consideraccedilotildees introdutoacuterias acerca do sigilo bancaacuterio e expor pensamentos de divershysos autores nacionais e alieniacutegenas conclui o constitucionalista brasileishyro no sentido de que todas as despesas ordinaacuterias feitas pelo cidadatildeo

246 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

comum em sua vida cotidiana devem ser consideradas parte de sua vida privada familiar ou domeacutestica e portanto protegidas contra interferecircnshycias a despeito de qualquer pretexto Desde as condutas mais corriqueishyras como as compras efetuadas em um supermercado para manutenshyccedilatildeo da famiacutelia quanto aquelas outras moralmente reprovaacuteveis como presentes ou joacuteias compradas e dadas a quem presta ao homem servishyccedilos de natureza extraconjugal tudo estaacute abarcado pelo manto da proteshyccedilatildeo agrave vida privada familiar ou domeacutestica ( ) E mais adiante arremata Hoje praticamente a vida do homem pode ser escrita a partir de seu talatildeo de cheques e nas sociedades mais avanccediladas pelos cartotildees de creacutedito e magneacuteticos Permitir-se que o sigilo bancaacuterio venha a ser romshypido por qualquer forma natildeo-extraordinaacuteria para salvaguarda de inteshyresse de porte no miacutenimo idecircntico eacute expor a seguranccedila individual a um constante e absurdo temor perante as possibilidades de controle direto ou pelo vazamento de alguma informaccedilatildeo

Haacute contudo corrente contraacuteria como passaremos a demonstrar

Andreacute Serratildeo Borges de Sampaio Consultor da Uniatildeo nas informashyccedilotildees prestadas ao Advogado-Geral da Uniatildeo sobre a ADIn n 2397 cita trechos de doutrina e jurisprudecircncia estrangeiras defendendo o entendimento de que o sigilo bancaacuterio natildeo tem conotaccedilatildeo de direito de privacidade Eis o que escreshyveu o parecerista citado

O jurista portuguecircs J L Saldanha Sanches coteja primorosashymente o sigilo bancaacuterio com a proteccedilatildeo da intimidade para concluir que natildeo haacute que se falar em direito ao sigilo bancaacuterio como concretizaccedilatildeo do direito agrave intimidade Nas suas palavras

Ora em que esfera podemos noacutes incluir o segredo bancaacuteshyrio enquanto instituto que concretiza certos valores do ordenashymento juriacutedico Como expressatildeo de interesses juridicamente tuteshylados

Seraacute o segredo bancaacuterio um prolongamento do direito agrave inshytimidade da esfera pessoal e familiar de uma qualquer pessoa sinshygular (uma vez que em relaccedilatildeo agraves pessoas coletivas a questatildeo natildeo pode mesmo ser colocada) Ou diraacute antes respeito aquela faixa mais larga que resguarda a privacidade de qualquer cidadatildeo e que soacute pode por isso sofrer qualquer intromissatildeo se surgirem razotildees vaacutelidas para que tal direito seja restringido

Ao afirmar-se que na perspectiva dos clientes dos bancos o segredo bancaacuterio eacute um direito com a reserva da sua vida privada temos uma primeira resposta para esta questatildeo

ENSAIOS JURiacuteDICOS 247

Mas falta distinguir entre intimidade e reserva da vida privashyda e entre clientes individuais e profissionais de um banco Natildeo estamos perante o mesmo tipo de tutela quando contamos que um particular espera que o banco natildeo divulgue a qualquer inteshyressado o volume da sua conta bancaacuteria (porque pura e simplesshymente quer manter sob reserva a sua vida particular) ou quando um comerciante confia no banco para que este natildeo revele quem satildeo os seus clientes fornecedores ou qual eacute o seu grau de endividamento

No caso da pessoa singular estaacute apenas em causa um conshyjunto de valores de natureza moral esta natildeo estaacute em princiacutepio preocupada com possiacuteveis prejuiacutezos econocircmicos ligados a qualshyquer divulgaccedilatildeo Apenas se opotildee por razotildees do seu foro pessoal e que natildeo carecem de fundamentaccedilatildeo que esta tenha lugar

Enquanto que o comerciante pode ser seriamente prejudishycado em termos concorrenciais com a revelaccedilatildeo da lista dos seus clientes ou com a sua situaccedilatildeo financeira

O dever de reserva que cabe ao banqueiro estaacute desta forma a serviccedilo do interesse comercial das empresas suas clientes - que pelo simples facto de o serem ou por necessitarem de obter creacutedishyto lhe datildeo informaccedilotildees com um forte valor comercial ou da pesshysoa singular que deseja manter a privacidade da sua situaccedilatildeo patrimonial

Ou em alternativa ao serviccedilo da manutenccedilatildeo da privacidashyde que qualquer um pode desejar ainda que a possiacutevel violaccedilatildeo desta apenas lhe possa acarretar danos natildeo-patrimoniais

E por isso o segredo bancaacuterio natildeo pode constituir a expresshysatildeo do imperativo constitucional da proteccedilatildeo da intimidade Ateacute porque o acesso a essa esfera estaacute vedado aos proacuteprios bancos

Natildeo nos parece aceitaacutevel que um banco como condiccedilatildeo para a concessatildeo de creacutedito a uma pessoa singular ou para estashybelecer com ela qualquer relaccedilatildeo contratual possa exigir desta informaccedilatildeo de tipo estritamente pessoal ou a sujeiccedilatildeo a exames meacutedicos que atingindo a sua esfera iacutentima afectam a sua dignidashyde Aqui estaacute em causa a ilicitude da pergunta por pressupor o acesso agrave esfera inviolaacutevel (e indisponiacutevel) da intimidade

A informaccedilatildeo que o banco pode obter para a defesa dos seus interesses legiacutetimos natildeo pode ir aleacutem da esfera patrimonial do seu cliente rendimentos bens possuiacutedos perspectivas profisshysionais

( )

248 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

Podemos pois concluir que o segredo bancaacuterio natildeo eacute natildeo pode ser uma concretizaccedilatildeo do princiacutepio constitucional do direishyto agrave intimidade

Este princiacutepio tem como funccedilatildeo consagrar uma zona de reshyselVa pessoal para factos opccedilotildees e circunstacircncias que soacute de forshyma indirecta e de todo secundaacuteria podem ter aspectos ou refleshyxos de natureza patrimonial (Saldanha Sanches J L Segredo Bancaacuterio e Tributaccedilatildeo do Lucro Real In Saldanha Sanches J L Estudos de Direito Contabiliacutestico e Fiscal Coimbra Coimbra Edishytora 2000 pp 105108)

Em diversos paiacuteses haacute a clara percepccedilatildeo que natildeo haacute que se conshyfundir direito agrave intimidade com sigilo bancaacuterio indicando que a quebra do sigilo pela Administraccedilatildeo Tributaacuteria natildeo constitui violaccedilatildeo ao direito Ao contraacuterio a existecircncia de um Estado Fiscal implica na necessidade de consagrar agrave administraccedilatildeo tributaacuteria tal faculdade o que se harmonishyza com diversos princiacutepios e outros direitos fundamentais constantes da Carta de 1988

O caso espanhol eacute exemplar neste sentido ao natildeo visualizar a vioshylaccedilatildeo ao direito agrave intimidade em relaccedilatildeo agrave quebra do sigilo bancaacuterio Portanto

el Tribunal Constitucional espaflOl se ha pronunciado por la negativa de que el conocimiento de las cuentas bancarias por la Administracioacuten pueda invadir el aacutembito constitucionalmente garantizado de la intimidad de los individuos porque tales extractos no constituyen per se uma biografiacutea personal en nuacutemeros y en siacute no tiene relevancia para la intimidad personal y familiar dei contribuyente ya que se trata de dados no secretos y confiados a una entidad (Campos Laura Rodriacuteguez Oerechos dei Contribuyente em la Repuacuteblica Argentina ai Amparo de la Convencioacuten Interamericana de Oerechos Humanos http wwwiefpaorgarcriteriosdigitalarticulosderechoshtm Visitado em 512001)

Ao analisar a jurisprudecircncia da Corte Constitucional espanhola quanto ao tema tambeacutem ressalta Saldanha Sanches

Na apreciaccedilatildeo da constitucionalidade da lei que permitia o controle administrativo das contas bancaacuterias o Tribunal Constitushycional espanhol realizou uma distinccedilatildeo entre intimidade pessoal e familiar e a intimidade econoacutemica onde a proteccedilatildeo constitucional eacute menos intensa

ENSAIOS JURiacuteDICOS 249

E procura fazer uma distinccedilatildeo entre a violaccedilatildeo agrave intimidade como consequumlecircncia de uma anaacutelise das contas bancaacuterias - coloshycando a hipoacutetese de uma recusa de cooperaccedilatildeo por parte do conshytribuinte se tal eventualidade se verificar - e a violaccedilatildeo directa da intimidade uma vez que esta natildeo pode resultar de uma mera anaacuteshylise de movimentos bancaacuterios (Saldanha Sanches J L A Situashyccedilatildeo Actual do Sigilo Bancaacuterio a Singularidade do Regime Portushyguecircs In Saldanha Sanches J L Estudos de Direito Contabiliacutestico e Fiscal Coimbra Coimbra Editora 2000 p 91)

Outro comentarista ao analisar a situaccedilatildeo do sistema espanhol quanto ao sigilo bancaacuterio e o direito agrave intimidade fez questatildeo de ressaltar

Seguacuten el r c frente a la Hacienda Puacuteblica no existe el derecho a la intimidad deI art 18 CE Ya la LO de 5 de mayo deI 82 vada praacutecticamente de contenido constitucional el derecho a la intimidado en cuanto el aacutembito de eacutesta queda deferido a la ley ordinaria (a 2ordm) y en cuanto que la esfera protegida frente a las Administraciones se reduce a poco O nada ai no reputarse intromisiones ilegiacutetimas las actuaciones autorizadas o acordadas por la Autoridad competente de acuerdo con la Ley (art 8ordm 1)

La LGTy el RI Iimiacutetan la esfera de la intimidad en las relacishyones con la Hacienda hasta el extremo de que solamenle existe un refugio limitado en el aacutembito deI secreto profesional en los casos de informacioacuten sobre terceros y siempre que no se trate de datos con transcendencia econoacutemica o tributaria EI rc no ha enconshytrado hasta el momento ni un solo supuesto de dato o informacioacuten econocircmica con transcendencia tributaria que limite la accioacuten inquisitiva de la Administracioacuten tributaria por razoacuten de intimidado Bien puede decirse por tanto que frente a la Administraciocircn tribushytaria en cuanto se trata deI ejercicio de su funciocircn de buacutesqueda de datos con transcendencia tributaria el derecho a la intimidad personal y familiar (art 18 I CE) no existe

La biacuteblia deI tribunal a estos efeclos estaacute constituida por la S 11084 reiterada en numerosas ocasiones ampliada en el Auto 64286 y reafirmada por ejemplo en la S 26 abril 90 tantas veces citada (FJ 10deg) Seguacuten esa doctrina la distribucioacutenjusta de la carshyga fiscal prevalece sobre el derecho a la intimidad parte dei art 812 I de la LO seguacuten el cual frente a la Ley (ordinaria) no hay intimidad protegida siempre que haya en dicha ley imperativos de intereacutes puacuteblico ( ) ni siquiera se habla dei predomiacutenio frente a la

250 SUPERIOR TRIBUNAl DE JUSTiCcedilA

intimidad de intereses u objetivos constitucionalmente protegidos Soacuteo admite que la actuadoacuten administrativa es arbitraria cuando no parezcajustificada por la Finalidad de la inspeccioacuten es decir cuando se trate de datos o informaciones que carezcan de transcendencia tributaria pero eacuteste obviamente no es sin Umite derivado dei derecho a la intimidad sino de la interdiccioacuten de arbitrariedad o desviacioacuten de poder de la Administracioacuten de la necesidad de ajuste de toda Administracioacuten ai acircmbito de su competencia que tanto vale para datos iacutentimos como para otros que no lo sean Seguacuten la S 11084 no hay esfera de intimidad proshytegida frente a una Administracioacuten tributaria amparada en una norma que elimina la intimidad como liacutemite (Garciacutea AIacuteloveros Jaime Una Nueva Ley General Tributaria Problemas Constitucioshynales In Kirchhof P et aI Garantiacuteas Constitucionales dei Contribuyente Valencia Tirant lo Blanch 1999 pp 109110)

Diante de tudo quanto foi exposto tendo-se o cuidado de registrar posicionamento de diferentes autores nacionais e estrangeiros haacute ambiente preparado para ser respondido o primeiro questionamento desdobrado em trecircs partes formulado para o 1II Coloacutequio Internacional de Direito Tributaacuterio promoccedilatildeo do Centro de Extensatildeo Universitaacuteria Eis a primeira parte do seu teor

O sigilo bancaacuterio diz respeito agrave intimidade e privacidade das pessoas

A resposta eacute optando por convencimento influenciado pelas ideacuteias da corrente predominante positiva

O nosso entendimento eacute no sentido de que o direito agrave intimidade integra os direitos da personalidade e visam proteger o direito agrave inviolabilidade do domiciacutelio da correspondecircncia das comunicaccedilotildees de quaisquer espeacutecies dos dados pessoais computadorizados do sigilo bancaacuterio O mesmo acontece com o direito agrave privacidade

A expansatildeo da proteccedilatildeo do direito agrave intimidade e agrave privacidade eacute uma consequumlecircncia da evoluccedilatildeo da era contemporacircnea nos setores tecnoloacutegicos e da instabilidade que passam as instituiccedilotildees estatais especialmente a encarreshygada de arrecadar tributos Haacute o reconhecimento de que desenvolve-se um processo de aguda corrosatildeo na proteccedilatildeo agrave intimidade que ao ser violada provoca a publicizaccedilatildeo das condutas mais iacutentimas do cidadatildeo

A concepccedilatildeo do sigilo bancaacuterio no acircmbito do direito agrave intimidade e agrave privacidade visa garantir ao homem o miacutenimo capaz para que lhe seja asseshygurada a sua condiccedilatildeo humana protegendo-o de ingerecircncias alheias como apregoa a Conferecircncia Noacuterdica sobre o Direito agrave Intimidade realizada em Estoshycolmo na data de maio de 1967 ao fazer inserir no documento que publicou a seguinte definiccedilatildeo O direito agrave intimidade eacute o direito do homem de viver de forma independente a sua vida com um miacutenimo de ingerecircncia alheia

ENSAIOS JURiacuteDICOS 251

5 Seguranccedila juriacutedica e acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias

A segunda pergunta apresentada pelos organizadores do coloacutequio estaacute assim posta

A seguranccedila das relaccedilotildees juriacutedicas atraveacutes do Sistema Financeiro pode ser afetada pelo acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves inforshymaccedilotildees bancaacuterias

O acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias se realizado caracteriza um atentado de suma gravidade aos direishytos do cidadatildeo Eacute um ataque aos princiacutepios sustentadores do sistema demoshycraacutetico adotado pelo constituinte de 1988 especialmente quando detonou que a Repuacuteblica Federativa do Brasil tem como objetivo fundamental o respeishyto agrave dignidade humana e agrave cidadania

Do ordenamento juriacutedico brasileiro a meu pensar natildeo haacute lugar para brotar qualquer interpretaccedilatildeo que conclua pela possibilidade de qualquer agenshyte do Poder Puacuteblico acessar de modo generalizado e sem motivaccedilatildeo informashyccedilotildees bancaacuterias do cidadatildeo mesmo com autorizaccedilatildeo judicial

Esclareccedilo desde logo que natildeo comungo com o pensamento de detershyminada corrente no sentido de ser absoluto o direito ao sigilo bancaacuterio Tenho-o como relativo poreacutem vinculado aos princiacutepios da razoabilidade da moralidade da legalidade e da motivaccedilatildeo expliacutecita e detalhada sob pena de ser impossiacutevel a sua quebra

O acesso indiscriminado do agente fiscal agraves informaccedilotildees bancaacuterias do cidadatildeo gera uma quebra da seguranccedila das relaccedilotildees juriacutedicas por um terceiro passar a ter sem causa justificadora conhecimento da vida iacutentima de algueacutem submetendo-o a partir daiacute a um regime de submissatildeo Por outro lado ninshygueacutem poderaacute garantir nem o proacuteprio Estado que o agente puacuteblico utilize os dados que chegaram ao seu conhecimento para outros intentos que natildeo o exclusivamente fiscal

Lembra Arnoldo Wald que O segredo na atividade bancaacuteria envolve concomitantemente interesses privaqos e coletivos que podem ser analisashydos sob trecircs acircngulos o interesse do cliente na sua relaccedilatildeo com a instituiccedilatildeo financeira o interesse do banco em atuar com discriccedilatildeo para ganhar a conshyfianccedila da populaccedilatildeo e captar recursos e o interesse social na existecircncia de um bom e eficiente sistema bancaacuterio Por estarem ligadas ao desenvolvimento da economia e aos interesses da comunidade as relaccedilotildees que envolvem as instishytuiccedilotildees financeiras natildeo recebem o mesmo tratamento juriacutedico dispendido a outras relaccedilotildees comerciais Inviaacutevel a aplicaccedilatildeo exclusiva das regras de Direito Privado as quais tecircm como princiacutepio norteador a autonomia da vontade pois

252 SUPERIOR TRIBUNAl DE JUSTiCcedilA

esta encontra limites nas normas cogentes proacuteprias do direito bancaacuterio e na intervenccedilatildeo do Estado8

A seguranccedila juriacutedica desse tipo de relaccedilatildeo envolve tambeacutem a manutenshyccedilatildeo do segredo das movimentaccedilotildees financeiras do contribuinte

Imprimir-se a mais ampla seguranccedila nas relaccedilotildees do Sistema Financeiro eacute fortalececirc-lo O Estado tem o dever de zelar por esse estado de seguranccedila natildeo permitindo consequumlentemente que o sigilo bancaacuterio seja quebrado pelo acesshyso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico por esse comportamento afeshytar a confiabilidade no sistema

Eacute de todo inconveniente permitir a possibilidade de um atuar do agente fiscal sem controle na quebra do sigilo bancaacuterio por afetar diretamente a seshyguranccedila da relaccedilatildeo juriacutedica firmada entre a instituiccedilatildeo financeira e o seu clienshyte em face deste sentir-se atingido pela accedilatildeo fiscal que passa a tomar conhecishymento de sua intimidade financeira e de fatos de sua vida privada sem o resshypaldo do Poder Judiciaacuterio

A seguranccedila juriacutedica nesse tipo de relaccedilatildeo deve assegurar impossibilidashyde de abuso de poder por parte do Fisco em face da necessidade de ser resshyguardada a garantia de que em um Estado de Direito natildeo pode ser concebido que conceda-se a uma parte mesmo que seja o Estado o domiacutenio absoluto de apanhar as provas que iraacute utilizar em caso de litiacutegio contra algueacutem

O acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias do contribuinte aleacutem de afetar a seguranccedila juriacutedica da relaccedilatildeo em questatildeo promove um desequiliacutebro entre o cidadatildeo-contribuinte e o Fisco por caracterizar coaccedilatildeo que coloca aquele em posiccedilatildeo de inferioridade

A valorizaccedilatildeo da seguranccedila juriacutedica da relaccedilatildeo existente entre instituiccedilatildeo financeira e contribuinte pelo Fisco natildeo quebrando o seu sigilo fiscal sem autorizaccedilatildeo judicial constitui causa de aplicaccedilatildeo de Justiccedila fiscal O seguimenshyto de seus princiacutepios valoriza o regime democraacutetico do qual ela faz parte

6 Casos de admissibilidade da quebra do sigilo bancaacuterio

Os casos de admissibilidade da quebra do sigilo bancaacuterio estatildeo na atuashylidade descritos no nosso ordenamento juriacutedico positivo

A Lei Complementar n 105 de 10 de janeiro de 2001 apoacutes determinar no art 112 de que as instituiccedilotildees financeiras conservaratildeo sigilo em suas operashyccedilotildees ativas e passivas e serviccedilos prestados dispotildee no sect 312 do mesmo artigo que

8 Arnoldo Wald no artigo Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais Revista dos Tribunais ano 6 n 22 janeiromiddotmarccedilo de 1998 n 22 Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas p 15

ENSAIOS JURiacuteDICOS 253

sect 3ordm Natildeo constitui violaccedilatildeo do dever de sigilo

I a troca de informaccedilotildees entre instituiccedilotildees financeiras para fins cadastrais inclusive por intermeacutedio de centrais de risco observadas as normas baixadas pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e pelo Banco Censhytral do Brasil

11 - o fornecimento de informaccedilotildees constantes de cadastro de emitentes de cheques sem provisatildeo de fundos e de devedores inadimplentes a entidades de proteccedilatildeo ao creacutedito observadas as norshymas baixadas pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e pelo Banco Central do Brasil

JJI - o fornecimento das informaccedilotildees de que trata o sect 2ordm do art II da Lei n 9311 de 24 de outubro de 1996

IV - a comunicaccedilatildeo agraves autoridades competentes da praacutetica de iliacutecitos penais ou administrativos abrangendo o fornecimento de inforshymaccedilotildees sobre operaccedilotildees que envolvam recursos provenientes de qualshyquer praacutetica criminosa

V - a revelaccedilatildeo de informaccedilotildees sigilosas com o consentimento expresso dos interessados

VI- a prestaccedilatildeo de informaccedilotildees nos termos e condiccedilotildees estabeleshycidos nos artigos 2ordm 3ordm 4ordm 5ordm 6ordm 7ordm e 9ordm desta lei complementar

sect 4ordm A quebra de sigilo poderaacute ser decretada quando necessaacuteria para apuraccedilatildeo de ocorrecircncia de qualquer iliacutecito em qualquer fase do inqueacuterito ou do processo judicial e especialmente nos seguintes crimes

I - de terrorismo

11 - de traacutefico iliacutecito de substacircncias entorpecentes ou drogas afins

III - de contrabando ou traacutefico de armas municcedilotildees ou material destinado a sua produccedilatildeo

IV - de extorsatildeo mediante sequumlestro

V - contra o sistema financeiro nacional

VI - contra a Administraccedilatildeo Puacuteblica

Vll- contra a ordem tributaacuteria e a previdecircncia social

VIII-lavagem de dinheiro ou ocultaccedilatildeo de bens direitos e valores

IX - praticado por organizaccedilatildeo criminosa

Como visto a lei complementar enumera inuacutemeras situaccedilotildees que indeshypendentemente de autorizaccedilatildeo judicial o sigilo bancaacuterio eacute quebrado

254 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

A dificuldade que se apresenta eacute a de conciliar os casos de quebra de sigilo bancaacuterio que a Lei Complementar n 105 autoriza com a garantia do direito agrave privacidade e agrave intimidade

Destaque-se entre os de maior relevacircncia os seguintes

- natildeo constituir violaccedilatildeo do dever de sigilo bancaacuterio a troca de informashyccedilotildees entre instituiccedilotildees financeiras para fins cadastrais inclusive por intermeacuteshydio de centrais de risco o que possibilita o conhecimento da vida financeira privada do cidadatildeo por vaacuterias pessoas sem desempenho de autoridade na instituiccedilatildeo independentemente de ser justificada com antecedecircncia a causa desse atuar

- o de serem fornecidos dados relativos a fornecimentos de informashyccedilotildees cadastrais de emitentes de cheques sem provisatildeo de fundos a entidades privadas de proteccedilatildeo ao creacutedito sem qualquer avaliaccedilatildeo por qualquer autorishydade da causa determinante do fato a quebra do sigilo bancaacuterio na fase do inqueacuterito por inexistir nessa ocasiaacuteo qualquer contraditoacuterio e respeito ao prinshyciacutepio do devido processo legal

Quanto agraves demais situaccedilotildees constantes na lei complementar que autorishyzam a quebra do sigilo bancaacuterio naacuteo obstante algumas serem absolutamente necessaacuterias haacute de serem vistas em compatibilidade com as garantias constitushycionais conforme jaacute assinalado

O colendo Supremo Tribunal pronunciaraacute como guarda e inteacuterprete maishyor da Carta Magna em ADln jaacute intentada sobre a constitucionalidade ou natildeo dos dispositivos supramencionados

Em campo doutrinaacuterio valoriza-se as posiccedilotildees apresentadas quando da resposta oferecida aos questionamentos anteriores todas acenando pela neshycessidade do controle do Poder Judiciaacuterio

7 Sistema mais justo para a quebra do sigilo bancaacuterio

Os organizadores do JII Coloacutequio Internacional de Direito Tributaacuterio subshymetem agora para anaacutelise a questatildeo do teor seguinte Um sistema em que o Poder Judiciaacuterio torna-se aacuterbitro dos pedidos da Administraccedilatildeo Puacuteblica para quebra do sigilo eacute o mais justo

Em um Estado que por imposiccedilatildeo de sua proacutepria Constituiccedilatildeo estaacute comprometido com a guarda e aplicaccedilatildeo efetiva de princiacutepios democraacuteticos especialmente o de respeitar os direitos e garantias fundamentais da cidadashynia natildeo haacute ambiente para que seja outorgado ao Poder Executivo por via da atuaccedilatildeo de agentes puacuteblicos fiscais o acesso sem o controle do Poder Judiciaacuteshyrio agraves informaccedilotildees bancaacuterias do contribuinte

ENSAIOS JURiacuteDICOS 255

o sigilo bancaacuterio por ser um direito fundamental que exige ser respeitashydo pela supremacia constitucional que o protege deve submeter a possibilishydade de sua quebra para fins tributaacuterios ao Poder Judiciaacuterio pela ausecircncia de interesse direto nos resultados da accedilatildeo fiscalizadora que eacute o recolhimento do tributo e pelas garantias de independecircncia prudecircncia e qualificaccedilatildeo juriacutedica que revestem esse poder

A atuaccedilatildeo da fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo pode ser exercida fora dos limishytes da legalidade imposta a partir da Carta Magna e demais imposiccedilotildees legais a ela subordinadas

Natildeo se desconhece que no atual Estado fiscal os tributos constituem os meios financeiros determinantes para o atendimento dos compromissos da Administraccedilatildeo Puacuteblica com as obrigaccedilotildees oriundas em decorrecircncia de sua atividade no campo educacional social de seguranccedila puacuteblica interna e extershyna da sauacutede da manutenccedilatildeo dos Poderes ou seja para manter funcionando a maacutequina estatal

Por natildeo entremostrar-se na eacutepoca contemporacircnea qualquer outra alshyternativa viaacutevel para transformar o Estado fiscal em um Estado produtivo os tributos passam a representar um indeclinaacutevel dever da cidadania cujo cumshyprimento deve ser por todos honrado conforme assinala Joseacute Casalta Nabais Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra em artigo intitulado Algumas Reflexotildees sobre o Actual Estado Fiscal

Por isso os impostos hatildeo de constituir um preccedilo aceitaacutevel ou seja um preccedilo limitado Um preccedilo que estou certo muitas das sociedashydes que nos antecederam gostariam de ter pago e algumas das actuais natildeo enjeitariam suportar Por isso bem podemos afirmar como jaacute o fizeshymos noutro lugar que no actual Estado fiscal para o qual natildeo se vislumshybra qualquer alternativa viaacutevel pelo menos nos tempos mais proacuteximos os impostos constituem um indeclinaacutevel dever de cidadania cujo cumshyprimento a todos nos deve honrar

A atuaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio para liberar o bloqueio fortalece a conshyfianccedila do cidadatildeo no procedimento da fiscalizaccedilatildeo e consagra a ideacuteia iacutensita em qualquer regime democraacutetico de que a atuaccedilatildeo do Estado tem limites

Na espeacutecie os limites impostos satildeo os decorrentes da quebra do sigilo ser necessaacuterio em face da possiacutevel ilicitude cometida pelo cidadatildeo poreacutem sem ser violados os direitos do cidadatildeo de gozar da sua privacidade e da sua intimidade

A denominada cidadania fiscal haacute de ser considerada de modo conjunshytural com os reflexos dos direitos fundamentais assegurados ao contribuinte sem prestigiar a responsabilidade que tem o Estado de promover a arrecadashyccedilatildeo dos tributos

256 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

Cedo espaccedilo para registrar que a cidadania fiscal deve configurar um estado de relaccedilatildeo juriacutedica em que todos suportem a concretizaccedilatildeo de um Estado em que todos tenham a qualidade de destinataacuterio do dever fundashymentaI de pagar impostos na medida da respectiva capacidade contributiva poreacutem que seja um Estado fiscal suportaacutevel isto eacute um estado cujo sistema fiscal se encontre balizado por estritos limites juriacutedico-constitucionais9

A Administraccedilatildeo Tributaacuteria por melhor que seja a sua estrutura e os seus propoacutesitos natildeo estaacute emocionalmente preparada para conceber e aplicar os princiacutepios que sustentam a cidadania fiscal Isso ocorre primeiramente porshyque o Fisco tem por missatildeo exclusiva exercer a funccedilatildeo de arrecadar tributos Eacute a sua meta essencial por ser atribuiccedilatildeo que na organizaccedilatildeo administrativa estatal estaacute obrigado a desempenhar Natildeo lhe cabe administrar o tributo arreshycadado limitando-se unicamente a envidar esforccedilos para o cumprimento das metas impostas para imprimir aumento na arrecadaccedilatildeo tributaacuteria O sucesso da Administraccedilatildeo Tributaacuteria eacute medido pelo maior volume de recursos fiscais atraiacutedos para os cofres do Governo nunca pelo respeito que exerccedila para com os direitos fundamentais do contribuinte Eacute uma questatildeo de cultura adminisshytrativa de distribuiccedilatildeo de funccedilotildees no sistema estatal impossiacutevel de ser mudashydo por sugestotildees doutrinaacuterias

Por outro lado a fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo consegue afastar as pressotildees exercidas sobre ela por determinados segmentos da organizaccedilatildeo estatal que defendem uma atuaccedilatildeo mais agressiva para a cobranccedila dos tributos tudo em decorrecircncia dos efeitos produzidos pela conduta iliacutecita marcante da sonegashyccedilatildeo fiscal

Esses fatores contribuem para que a fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo tenha condiccedilotildees de modo imparcial sem isenccedilatildeo avaliar a necessidade objetiva da quebra do sigilo bancaacuterio do cidadatildeo Por melhor que seja o seu desempenho nunca ganharaacute a confianccedila do contribuinte

A atribuiccedilatildeo da quebra do sigilo bancaacuterio em um regime democraacutetico onde predomina o respeito maior aos direitos fundamentais da cidadania deve ser exercido pelo Poder Judiciaacuterio natildeo soacute porque seus membros atualmente revestidos da garantia da vitaliciedade inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos bem como porque estatildeo revestidos de independecircncia absoluta em relaccedilatildeo ao Poder interessado na cobranccedila do tributo e consequumlentemenshyte no resultado a ser obtido pela accedilatildeo fiscal

Esse sistema misto onde o Fisco faz a solicitaccedilatildeo motivada para a queshybra do sigilo bancaacuterio ao Poder Judiciaacuterio e este apoacutes analisaacute-lo com objetivishydade e cautela defere ou indefere impotildee seguranccedila e confiabilidade na atuashyccedilatildeo fiscal e sublima o respeito agrave dignidade do contribuinte em outras palavras da cidadania fiscal isto eacute de uma cidadania de liberdade que o Estado fiscal

9 Joseacute Casalta Nabais (Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra) no artigo Algumas Reflexotildees sobre o Actual Estado Fiscal no site httpagugovbr

ENSAIOS JURiacuteDICOS 257

pressupotildee para natildeo ser postergada impotildee um sistema fiscal balizado por esshytritos limites juriacutedico-constitucionais Limites esses que integram a chamada constituiccedilatildeo fiscal e que podemos reconduzir para natildeo nos alongarmos nesse aspecto a duas ideacuteias uma ideacuteia de seguranccedila que tem o seu tradicional e principal suporte no princiacutepio da lega1idade fiscal e uma ideacuteia de justiccedila ou equumlidade que tem a ver com a medida dos impostos e assenta no princiacutepio da capacidade contributiva 10

Em conclusatildeo a adoccedilatildeo de um sistema para a quebra do sigilo bancaacuteshyrio em que o Poder Judiciaacuterio seja o aacuterbitro dos pedidos da Administraccedilatildeo Puacuteblica natildeo eacute somente mais justo mas consegue impor maior credibilidade agrave atuaccedilatildeo fiscal e presta homenagem com intensa potencialidade aos princiacuteshypios democraacuteticos consistentes na guarda da seguranccedila juriacutedica do respeito aos direitos fundamentais do cidadatildeo nesse rol incluidos os agrave privacidade e agrave intimidade Aleacutem disso torna mais respeitaacutevel a relaccedilatildeo entre Fisco e contrishybuinte justificando portanto a opccedilatildeo do Estado pelo regime democraacutetico

8 Autoridade fiscal e faculdade incondicionada de quebrar o sigilo bancaacuterio

Essa indagaccedilatildeo consubstancia a preocupaccedilatildeo de serem estabelecidos controles para a atuaccedilatildeo do agente puacuteblico fiscal Centra-se a preocupaccedilatildeo em imprimir nas relaccedilotildees juriacutedicas tributaacuterias de quaisquer espeacutecies o primashydo da legalidade aprimorando-se o atuar vinculado

Natildeo concilia-se com os postulados da democracia a adoccedilatildeo de um sisteshyma de fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria que outorgue faculdade incondicionada ao fiscal tributaacuterio de invadir a intimidade e a privacidade das pessoas sob o falso argushymento juriacutedico de que busca encontrar provas de sonegaccedilatildeo fiscal

Depreende-se do exposto que a autoridade fiscal natildeo deve ter faculdade incondicionada de quebrar o sigilo sempre que entender necessaacuterio Isso porshyque a praacutetica de atos administrativos por agentes puacuteblicos de modo incondicionado revela grave violaccedilatildeo ao princiacutepio da legalidade onde predoshymina a vontade da lei e natildeo o discricionarismo de quem o pratica

No trato do sigilo bancaacuterio o atuar incondicionado da fiscalizaccedilatildeo assushyme caracteriacutesticas de maior gravidade porque haacute violaccedilatildeo aos princiacutepios funshydamentais jaacute expostos e que satildeo prestigiados pela Carta Magna especialmenshyte por bater de frente de modo integral e absoluto com o direito agrave intimidade e agrave privacidade O atuar deve vincular-se rigidamente ao princiacutepio da legalidashyde especialmente aposta na Carta Magna sem a possibilidade de ser aberto qualquer canal para uso da conveniecircncia ou da oportunidade

Eacute de ser lembrada no trato do assunto a liccedilatildeo de Joseacute Casalta Nobais no trabalho jaacute citado no sentido de que Eacute certo que independentemente da

10 Idem p 15

=258=---___________________ SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTlCA

concepccedilatildeo a que se adira relativamente ao segredo bancaacuterio natildeo temos a menor duacutevida de que o acesso da Administraccedilatildeo Fiscal agrave informaccedilatildeo bancaacuteria seja directo sem necessidade de preacutevia decisatildeo judicial seja indirecto depois portanto de preacutevia decisatildeo judicial haacute de ter sempre uma natureza claramenshyte excepcional Na verdade constitua o segredo bancaacuterio uma manifestaccedilatildeo do direito fundamental agrave reserva da intimidade da vida privada constante do art 26 n 2 da Constituiccedilatildeo portuguesa ou suporte um outro direito fundashymentai um direito agrave reserva da vida privada anaacutelogo agravequele a sua afectaccedilatildeo teraacute sempre caraacuteter excepcional

A autoridade fiscal natildeo possui a necessaacuteria isenccedilatildeo e competecircncia institucional para averiguar o grau dessa excepcionalidade de modo que posshysa impor confianccedila ao cidadatildeo investido na condiccedilatildeo de contribuinte poreacutem com direitos a serem assegurados por forccedila do regime democraacutetico adotado

O certo eacute que na relaccedilatildeo juriacutedico-tributaacuteria deve ser buscado o justo equiliacutebrio pregado pelo Estado de Direito onde o cidadatildeo deve ter a sua dignishydade respeitada sem contudo afastar-se a necessidade do Estado arrecadar tributos de forma cogente e imperativa bem como de serem permitidas conshydiccedilotildees de atuaccedilatildeo que resultem no combate agrave sonegaccedilatildeo fiscal

9 Responsabilidade da autoridade administrativa que quebrar o sigilo banshycaacuterio de forma inconsistente e indevida

Eacute inerente ao regime democraacutetico que a autoridade administrativa puacuteblishyca estaacute obrigada a exercer as suas atribuiccedilotildees com rigorosa obediecircncia aos princiacutepios da legalidade moralidade publicidade impessoalidade e eficiecircncia entre outros

A Carta Magna consagra expressamente no art 37 a obediecircncia do agente puacuteblico a esse tipo de comportamento

A autoridade administrativia que quebrar de modo inconsistente e indevido o sigilo bancaacuterio do cidadatildeo pratica ato com capacidade de provocar os seguintes efeitos a) de invadir o direito agrave privacidade e agrave intimidade de algueacutem b) de provocar-lhe danos morais e materiais dependendo da repershycussatildeo provocada pelo seu atuar

Constatada a efetivaccedilatildeo real de danos morais e materiais a responsabishylidade do Estado pode ser acionada conforme permite o art 37 sect 6ordm da Consshytituiccedilatildeo Federal Solidificada a culpa ou dolo do agente puacuteblico e consagrada a materializaccedilatildeo do iliacutecito praticado com o consequumlente ressarcimento patrimonial o Estado deveraacute usando o direito de regresso investir contra o agente que agiu culposa ou dolosamente

Natildeo resume-se apenas ao campo da responsabilidade civil a atuaccedilatildeo da autoridade quando ilegalmente quebra o sigilo bancaacuterio de qualquer cidadatildeo

ENSAIOS JURiacuteDICOS 259

o art 10 da Lei Complementar n 105 de 10 de janeiro de 2001 determishyna que A quebra de sigilo fora das hipoacuteteses autorizadas nesta lei compleshymentar constitui crime e sujeita os responsaacuteveis agrave pena de reclusatildeo de um a quatro anos e multa aplicando-se no que couber o Coacutedigo Penal sem prejuiacuteshyzo de outras sanccedilotildees cabiacuteveis A seguir no seu paraacutegrafo uacutenico explicita que Incorre nas mesmas penas quem omitir retardar injustificadamente ou presshytar falsamente as informaccedilotildees requeridas nos termos desta lei complementar

O art 11 da mesma lei complementar expressa que O servidor puacuteblico que utilizar ou viabilizar a utilizaccedilatildeo de qualquer informaccedilatildeo obtida em decorshyrecircncia da quebra de sigilo de que trata esta lei complementar responde pessoshyal e diretamente pelos danos decorrentes sem prejuiacutezo da responsabilidade objetiva da entidade puacuteblica quando comprovado que o servidor agiu de acorshydo com a orientaccedilatildeo oficial

10 O sigilo bancaacuterio e o tratamento que lhe eacute dado por oacutergatildeos internacioshynais como a OCDE e outros

Rui Celso Reali Fragoso Presidente do Instituto dos Advogados de Satildeo Paulo em artigo intitulado O Sigilo Bancaacuterio veiculado pela Internet (http Ii wwwjuscombr) registra que atualmente temos trecircs sistemas legais no munshydo cuidando do sigilo bancaacuterio O primeiro eacute o anglo-saxatildeo em que o sigilo natildeo encontra amparo legal o segundo eacute o dos paiacuteses da Europa continental - eu o contemplo em vaacuterios diplomas legais o terceiro eacute o da Suiacuteccedila e do Liacutebano que o reforccedilam

Analisando esses trecircs sistemas o autor citado observa

Haacute aparente contradiccedilatildeo no sistema inglecircs e norte-americano pois se de um lado nestes paiacuteses se eleva a garantia das liberdades individuais de outro se despreza o sigilo bancaacuterio Eacute que se ocorre conshyflito entre a apuraccedilatildeo de fatos (fator social) e a privacidade das pessoas (fator individual) prevalece a primeira Mais ainda o relacionamento de clientes e bancos longe de estabelececirc-lo serve como fonte de informashyccedilatildeo em favor de terceiros a indiscriccedilatildeo injustificada poreacutem eacute objeto de sanccedilatildeo E na Inglaterra os poderes puacuteblicos natildeo intervecircm no funcionashymento dos estabelecimentos privados de creacutedito o que debilita a invesshytigaccedilatildeo

Nos paiacuteses da Europa continental a legislaccedilatildeo contempla o sigilo bancaacuterio como consequumlecircncia do profissional e comporta derrogaccedilotildees na esfera penal e em alguns casos na civil mas comina sanccedilotildees crimishynais no caso de violaccedilatildeo ao sigilo (Coacutedigo Penal francecircs artigo 378 Coacuteshydigo Penal italiano art 622)

260 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

A sistemaacutetica fortalecida eacute aquela utilizada na Suiacuteccedila decorrente da crise ocorrida em 1931 com o fechamento do Banco de Genebra que ensejou a ediccedilatildeo de lei estabelecendo severas puniccedilotildees de natureza civil e criminal Tanto a legislaccedilatildeo suiacuteccedila como a libanesa esta surgida em 1956 permitem derrogaccedilotildees em certas hipoacuteteses A existecircncia das conshytas numeradas comprova a importacircncia do sigilo nestes paiacuteses

Eacute certo natildeo ser absoluto o segredo nem sua quebra em determishynadas situaccedilotildees significa abuso de poder Aliaacutes nenhum direito eacute absoluto

A doutrina tem ultimamente tomado conhecimento sobre as transforshymaccedilotildees que tem passado em vaacuterios ordenamentos juriacutedicos a questatildeo do sigilo bancaacuterio

Zenobio Simotildees de Melo advogado no Paranaacute em artigo sob o tiacutetulo Quebra do Sigilo Bancaacuterio (Internet httpjuscombr) informa que o jornal O Estado de Satildeo Paulo de 21 de junho de 2000 publicou a notiacutecia seguinte

Numa das mais importantes decisotildees adotadas durante o Conseshylho Europeu que marca o fim da presidecircncia portuguesa da Uniatildeo Euroshypeacuteia (UE) seus 15 paiacuteses aprovaram ontem o pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal No ponto mais polecircmico o pacote deveraacute acabar com o sigilo bancaacuterio ateacute 2010 foi uma negociaccedilatildeo de 12 anos Aacuteustria e Luxemburgo natildeo aceitavam o princiacutepio de acabar com o sigilo bancaacuterio A justificativa austriacuteaca eacute que este eacute um princiacutepio que faz parte da Consshytituiccedilatildeo do paiacutes haacute 200 anos Para aceitar o acordo o paiacutes exigiu a manushytenccedilatildeo do sigilo nos bancos austriacuteacos para quem resida no paiacutes

Registro a iacutentegra da notiacutecia

Pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal eacute aprovado por membros da UE Decisatildeo prevecirc quebra do sigilo bancaacuterio nos paiacuteses do bloco econocircmico

Jair Rattner

Especial para o Estado

Santa Maria da Feira Portugal- Numa das mais importantes decishysotildees adotadas durante o Conselho Europeu que marca o fim da presishydecircncia portuguesa da Uniatildeo Europeacuteia (UE) seus 15 paiacuteses aprovaram ontem o pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal No ponto mais polecircmico o pashycote deveraacute acabar com o sigilo bancaacuterio ateacute 2010

Foi uma negociaccedilatildeo de 12 anos Agora temos um documento que vai estabelecer os princiacutepios e as orientaccedilotildees para as futuras diretivas nessa aacuterea afirmou o Primeiro-Ministro Portuguecircs Antonio Guterres que ocupa a presidecircncia rotativa da UE (no fim do mecircs ela seraacute transferida para a Franccedila)

ENSAIOS JURiacuteDICOS 261

o acordo abrange trecircs aacutereas um coacutedigo de conduta que prevecirc o desmantelamento dos 66 paraiacutesos fiscais existentes ou dependentes da UE a tributaccedilatildeo de royalties e o pagamento de impostos sobre rendishymentos das poupanccedilas de cidadatildeos europeus residentes em outros paiacuteshyses dentre os 15 que fazem parte do bloco econocircmico europeu

O grande problema eram as poupanccedilas Aacuteustria e Luxemburgo natildeo aceitavam o princiacutepio de acabar com o sigilo bancaacuterio A justificativa austriacuteaca eacute que este eacute um princiacutepio que faz parte da Constituiccedilatildeo do paiacutes haacute 200 anos Para aceitar o acordo o paiacutes exigiu a manutenccedilatildeo do sigilo nos bancos austriacuteacos para quem resida no paiacutes Essa questatildeo natildeo eacute importante soacute para a Europa porque abre caminho para a criaccedilatildeo de mecanismos de transparecircncia global no mundo financeiro que satildeo esshysenciais para a globalizaccedilatildeo da economia avaliou Guterres

O prazo para a introduccedilatildeo das mudanccedilas vai ateacute o fim de 2010 Ateacute o fim deste ano as negociaccedilotildees vatildeo ser sobre a definiccedilatildeo do conteuacutedo das diretivas (as normas da UE)

Em 2002 a UE discutiraacute com outros paiacuteses esses conteuacutedos para fazer acordos que deveratildeo ser aprovados ateacute o fim do ano por unanimishydade

A partir de 2003 seraacute iniciado um periacuteodo de sete anos de transishyccedilatildeo para a troca de informaccedilotildees sobre os investimentos de cidadatildeos de outros paiacuteses europeus Nesse periacuteodo alguns paiacuteses poderatildeo optar por cobrar impostos de 20 a 25 sobre os rendimentos dos investimentos de residentes no exterior

No capiacutetulo onde foi analisado o sigilo bancaacuterio no Direito Comparado haacute registros tambeacutem a respeito do tratamento que oacutergatildeos internacionais como o OCDEll e outros vecircm dando ao sigilo bancaacuterio conforme estudo que foi apresentado pelo autor ali citado

II OCDE (Organizaccedilatildeo de Cooperaccedilatildeo e Desenvolvimento Econocircmico) criado em 1961 para substituir a OECE (Comitecirc Fiscal da Organizaccedilatildeo Europeacuteia de Cooperaccedilatildeo Econocircmica) Um dos documentos mais importantes da OCDE eacute o resultante da sua Convenccedilatildeo-Modelo relashytiva a impostos sobre a renda e o capital Essa Convenccedilatildeo estaacute sistematizada em sete capiacutetulos assim explicitados por Alberto Xavier em sua obra Direito Tributaacuterio Internacioshynal do Brasil A Convenccedilatildeo-Modelo da OCDE (tal como a das Naccedilocirces Unidas) encontra-se sistematizada em sete capiacutetulos Os capiacutetulos I e I regulam os requisitos para a aplicaccedilatildeo do tratado O capiacutetulo [JI - de longe o mais importante - conteacutem as regras de distribuiccedilatildeo de competecircncia no que concerne aos impostos sobre o rendimento classificado este por tipos ou classes agrave semelhanccedila do que sucede nos sistemas de tributaccedilatildeo cedular O capiacutetulo IV ocupa-se das regras de distribuiccedilatildeo de competecircncia no que respeita aos impostos sobre o capital O capiacutetulo V determina as consequumlecircncias das regras dos capiacutetulos 111 e IV facultanshydo aos Estados a escolha entre os meacutetodos da isenccedilatildeo e da imputaccedilatildeo O capiacutetulo VI conteacutem disposiccedilotildees adicionais sobre natildeo-discriminaccedilatildeo procedimento amigaacutevel troca de informaccedilotildees e privileacutegios de funcionaacuterios diplomaacuteticos e consulares e regras sobre extenshysatildeo do tratado a partes do territoacuterio Enfim o capiacutetulo VII conteacutem disposiccedilotildees finais sobre entrada em vigor e cessaccedilatildeo do acordo

262 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

Heleno Torres em sua recente obra Direito Tributaacuterio Internacional -Planejamento Tributaacuterio e Operaccedilotildees Transnacionais RT p 147 analisando o posicionamento da OCDE referente agrave poliacutetica de determinados paiacuteses que adoshytam tributaccedilatildeo favorecida e os efeitos dos regimes fiscais prejudiciais registra que

A OCDE resolveu entrar na luta para minorar as praacuteticas fiscalshymente danosas insistindo sobre a necessidade de aumentar as trocas de informaccedilotildees entre os Estados aleacutem de redigir uma lista de paiacuteses com tributaccedilatildeo favorecida e fazer algumas recomendaccedilotildees em acircmbito nacional e convencional a partir do seu importante relatoacuterio Harmful tax competition na emerging global issue

Mesmo reconhecendo os aspectos positivos do ambiente global vigente no qual os sistemas tributaacuterios operam os paiacuteses-membros da OCDE concluiacuteram que eles precisavam agir para restringir a competiccedilatildeo tributaacuteria danosa coletivamente e individualmente opondo-se agrave expanshysatildeo de regimes de impostos preferenciais danosos particularmente nos setores financeiros e atividades de serviccedilo que podem causar distorccedilotildees no comeacutercio e desniacuteveis nos padrotildees de investimento sendo uma ameashyccedila para os sistemas tributaacuterios domeacutesticos e para a estrutura global de tributaccedilatildeo internacional

Mais adiante pp 152153 Heleno Torres afirma que

Entre as recomendaccedilotildees definidas nesse relatoacuterio com aplicashyccedilatildeo dirigida aos paiacuteses-membros da instituiccedilatildeo as mais importantes satildeo as seguintes

bull para contrastar a competiccedilatildeo fiscal prejudicial os paiacuteses devem revisar as suas leis regulamentos e praacuteticas sobre sigilo bancaacuterio para remover empecilhos de acesso a tais informaccedilotildees por autoridades fiscais

bull intensificar o uso de trocas de informaccedilotildees principalmente soshybre as transaccedilotildees com paiacuteses de tributaccedilatildeo favorecida

A conclusatildeo que pode ser firmada apoacutes anaacutelise dos pronunciamentos internacionais acima explicitados eacute a construccedilatildeo de uma corrente que defenshyde uma maior abertura para a quebra do sigilo bancaacuterio quando for necessaacuteshyrio para apurar iliacutecitos tributaacuterios

Essa portanto eacute a resposta que apresento para a indagaccedilatildeo Qual o tratamento proposto por oacutergatildeos internacionais como o OCDE e outros com relaccedilatildeo ao sigilo bancaacuterio

ENSAIOS JURiacuteDICOS 263

11 Compatibilizaccedilatildeo do combate agrave criminalidade internacional com o resshypeito agrave seguranccedila juriacutedica a fim de evitar a fuga de investimentos do Paiacutes

Haacute de se reconhecer natildeo ser faacutecil desenvolver-se um sistema juriacutedico que contenha regras que facilitem o combate agrave criminalidade internacional e ao mesmo tempo prestigie os direitos fundamentais do cidadatildeo especialmenshyte a sua seguranccedila juriacutedica

As convenccedilotildees internacionais conforme demonstrado estatildeo preocupashydas com esses aspectos sem deixar de lado os fenocircmenos causados pela globalizaccedilatildeo

Natildeo deve ser esquecido que o tema envolve aspectos diversos a comeshyccedilar pelos determinantes da soberania dos Estados das forccedilas em expansatildeo das organizaccedilotildees internacionais e da pregaccedilatildeo para que os direitos fundamenshytaIacutes do cidadatildeo sejam respeitados com maior Iacutentensidade

A soluccedilatildeo a meu pensar pode ser encontrada no fortalecimento do Direito Comunitaacuterio Os Estados por via de organismos internacionais firmashyriam tratados para a adoccedilatildeo de um Coacutedigo Processual Penal Internacional com efeitos vinculantes por parte das naccedilotildees onde seriam adotadas regras investigatoacuterias e apuratoacuterias dos iliacutecitos internacionais alargando os conceitos de indiacutecios e presunccedilotildees sem deixar contudo de prestigiar a afetividade dos direitos e garantias fundamentais do cidadatildeo

Todas as naccedilotildees no iniacutecio deste seacuteculo envidam esforccedilos para diminuir a crise da seguranccedila juriacutedica Satildeo vaacuterios os fatores determinantes todos tendo como causa comum o crescimento da delinquumlecircncia em decorrecircncia de poliacutetishycas econocircmicas e sociais adotadas por determinados governos que contrishybuem para aumentar o percentual de pessoas pobres

A preocupaccedilatildeo atual para o combate ao crime internacional eacute alcanccedilar niacutevel de uniformizaccedilatildeo dos sistemas adotados para a quebra do sigilo bancaacuteshyrio De iniacutecio deve ser defendida a postura de que nenhuma lesatildeo ou ameaccedila a direito deve ser excluiacuteda da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio Nessa perspectishyva ganha suma importacircncia a criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional em virshytude de pela sua atuaccedilatildeo natildeo perdurar a diversidade de sistemas legais a respeito do assunto a saber a) O anglo-saxatildeo onde o sigilo natildeo encontra amparo legal b) o dos paiacuteses da Europa continental que o contempla em vaacuterios diplomas escritos e c) o da Suiacuteccedila e do Liacutebano que o reforccedilam l2bull

A criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional envolve uma reconceiacutetuaccedilatildeo de soberania

Sobre o tema Celso D de Albuquerque Mello em Direito Internacional da Integraccedilatildeo Ed Renovar p 13 faz a seguinte observaccedilatildeo

12 Conforme anota Rui Celso Reali Fragoso no artigo O Sigilo Bancaacuterio publicado no site httpvvwwjuscombr

264 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Poder-se-ia fazer um pequeno reparo a Chaumont que a indeshypendecircncia nacional eacute um conceito juridicamente indeterminado e que ela pode ter diferentes graus Tanto que podemos escrever soberania versus cooperaccedilatildeo internacional apesar de reconhecermos que esta posiccedilatildeo pode ser considerada como radical vez que natildeo haacute uma total incompatibilidade entre as duas Entretanto natildeo se pode deixar de consshytatar que de certo modo a cooperaccedilatildeo internacional se encontra conshysagrada na Carta da ONU no arl 1 ordm que trata dos Propoacutesitos das Naccedilotildees Unidas e nos Princiacutepios estabelecidos na Carta da OEA (Capiacutetulo 11) O mesmo ocorre na resoluccedilatildeo da Assembleacuteia Geral da ONU de 1970 que aprova a Declaraccedilatildeo Relativa aos Princiacutepios do Direito Internacional Reshylativas agraves Relaccedilotildees Amigaacuteveis e agrave Cooperaccedilatildeo entre os Estados conforme a Carta das Naccedilotildees Unidas bem como na Carta de Direitos e Deveres Econocircmicos aprovada pela mesma Assembleacuteia Geral em 1974

O crescimento do crime internacional em decorrecircncia dos fenocircmenos globalizantes determina o surgimento de um dever juriacutedico dos Estados firmashyrem pactos de cooperaccedilatildeo entre si para que enfrentem as organizaccedilotildees voltashydas para a criminalidade Esse dever juriacutedico globalizado tem suas raiacutezes no moral intemacional que conforme assinala Celso Albuquerque Mello na obra citada p 13 sempre consagrou o princiacutepio da solidariedade ou ainda do auxiacutelio muacutetuo

Eacute o mais importante desafio neste iniacutecio de seacuteculo fazer com que surja uma legislaccedilatildeo internacional que compatibilize o combate agrave criminalidade inshyternacional sem violar a seguranccedila juriacutedica com finalidade exclusiva de evitar a fuga de investimenos do Paiacutes

Tenha-se contudo em consideraccedilatildeo que a globalizaccedilatildeo do crime emshybora seja uma grande ameaccedila aos valores tradicionais que sustentam a cidashydania especialmente a seguranccedila juriacutedica natildeo deve prejudicar o desenvolvishymento econocircmico de qualquer naccedilatildeo

Natildeo faccedilo coro ao assinalado por Eric Hobsbawm em sua obra Era dos Extremos O Breve Seacuteculo XX 1914-1991 1995 p 24 Companhia das Letras S Paulo traduccedilatildeo de Marcos Santarrita no sentido de que Talvez a caracteriacutesshytica mais impressionante do fim do seacuteculo XX seja a tensatildeo entre esse processo de globalizaccedilatildeo cada vez mais acelerado e a incapacidade conjunta das instishytuiccedilotildees puacuteblicas e do comportamento coletivo dos seres humanos de se acoshymodarem a ele

Penso que natildeo haacute essa acomodaccedilatildeo e que as instituiccedilotildees puacuteblicas espeshycialmente as submetidas ao controle da ciecircncia juriacutedica natildeo estatildeo incapacitashydas de encontrar caminhos que solucionem o problema existente

ENSAIOS JURiacuteDICOS 265

Eacute por demais positivo entre outros acontecimentos o fato da conscienshytizaccedilatildeo de que haacute de ser encontrada uma forma de combate agrave criminalidade internacional que natildeo afaste a garantia da seguranccedila juriacutedica Esta eacute uma neshycessidade para impor paz agrave naccedilatildeo e consequumlentemente criar ambiente para que novos investimentos necessaacuterios ao desenvolvimento do seu processo econocircmico aconteccedilam sem se falar na manutenccedilatildeo dos jaacute existentes

O Parlamento Europeu aprovou ultimamente uma resoluccedilatildeo sobre a criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional sob a consideraccedilatildeo de que eacute necessaacuteshyrio criaacute-lo de forma permanente para complementar os sistemas judiciais nashycionais e pocircr fim agrave impunidade de que gozam os responsaacuteveis por genociacutedio crimes contra a humanidade e crimes de guerra

A abertura para essa posiccedilatildeo denota a formaccedilatildeo de uma consciecircncia internacional para combater a criminalidade internacional em todos os niacuteveis contribuindo para fortalecer a seguranccedila juriacutedica interna de cada paiacutes

O documento representativo dessa resoluccedilatildeo eacute do teor seguinte

Parlamento Europeo

Resolucioacuten sobre el Tribunal Penal Internacional

EI Parlamento Europeo

Vistas sus anteriores resoluciones sobre un Tribunal Penal Interna-cional

A Considerando que es necesario crear un Tribunal Penallnternashycional permanente que complemente los sistemasjudiciales nacionales y ponga fin a la impunidad de que gozan los responsables de genocidio crimenes contra la humanidad y criacutemenes de guerra

B Considerando que la Comisioacuten de Derechos Humanos de las Naciones Unidas estaacute respaldando decididamente la creacioacuten de ese Trishybunal

C Considerando que la fase preparatoria de la creacioacuten dei Tribushynal Penal Internacional finalizoacute con la uacuteltima sesioacuten dei Comiteacute Preparatorio de las Naciones Unidas que tuvo lugar dei 16 de marzo al3 de abril de 1998

D Felicitaacutendose por la creciente participacioacuten de Estados en el proceso de negociaciones y esperando que un nuacutemero auacuten mayor de Esshytados procedentes de todas las regiones se encuentre plenamente represhysentado en la Conferencia Diplomaacutetica de Roma

E Considerando que dei 15 de junio al17 de julio de 1998 se celebra en Roma la Conferencia Diplomaacutetica de Plenipotenciarios para la constitucioacuten de un Tribunal Penal Internacional

266 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

F Considerando que los Estados miembros y la delegacioacuten de la Comisioacuten Europea que participan en la Conferencia Diplomaacutetica de Roma pueden desempenar un papel crucial a la hora de garantizar el eacutexito de la conclusioacuten de esta Conferencia Diplomaacutetica y acogiendo positivamente la mayor convergenciacutea de las posturas de los Estados miembros de la UE

G Congratulaacutendose por la oferta dei Gobierno de los Paiacuteses Bajos de servir de sede dei Tribunal Penal Internacional permanente

I Insta a la Conferencia Diplomaacutetica de Roma a aprovechar la oportunidad histoacuterica de concluir un texto de Estatuto para un Tribunal Penal Internacional independiente justo y eficaz

2 Insta a los representantes de los Estados miembros dei Consejo y de la Comisioacuten a garantizar activamente el ecircxito de los resultados a sashyber un auteacutentico Tribunal Penal Internacional en lugar de limitarse a un acuerdo de compromiso sobre principios esenciales en sus esfuerzos por conciliar las posturas de Estados reticentes

3 Destaca que para constituir un complemento eficaz de los sisteshymas judiciacuteales nacionales el Estatuto dei Tribunal Penal Internacional permanente objeto de la Conferencia de Roma deberaacute establecer

a un Fiscal independiente con competencias para investigare insshytruir sumarios por propia iniciativa en situaciones en las que se hayan cometido los delitos sometidos a lajurisdiccioacuten dei Tribunal

b Ia jurisdiccioacuten inherente y universal dei Tribunal en materia de genocidio criacutemenes contra la humanidad criacutemenes de guerra y agresioacuten sin que se requiera ninguacuten consentimiento dei Estado

c una buena relacioacuten de trabajo con los Tribunales lnternacionales ya establecidos en La Haya

d una relacioacuten constructiva con las Naciones Unidas yen partishycular con el Consejo de Seguridad basada en el pleno reconocimiento de sus respectivas funciones y competencias

e Ia obligacioacuten de los Estados firmantes de acatar y hacer cumplir sin demora las oacuterdenes y decisiones dei Tribunal

f los mayores niveles de respeto de los derechos de los acusados y de los sospechosos y de proteccioacuten de los intereses de las viacutectimas y de los testigos

g Ia garantiacutea de una financiacioacuten a largo plazo necesaria para asegurar la autonomiacutea e independencia dei Tribunal frente a cualquier presioacuten exterior

4 Destaca ademaacutes que la jurisdiccioacuten deI Tribunal sobre los delishytos de genociacutedio los criacutemenes contra la humanidad y los criacutemenes de

ENSAIOS JURiacuteDICOS 267

guerra deben considerarse con la misma calificacioacuten penal con indepenshydencia de que se hayan cometido en conflictos armados internacionales o en conflictos internos

5 Insta ai Consejo y a los Estados miembros a garantizar la universalidad y la transparencia de las negociaciones y la participacioacuten continuada de la comunidadjuriacutedica y la sociedad civil internacionales

6 Encarga a su Presidente que transmita la presente resolucioacuten ai Consejo a la Comisioacuten a los Gobiernos de los Estados miembros ai Secreshytario General de las Naciones Unidas ai Presidente de la Asamblea Geneshyral de las Naciones Unidas y ai Presidente de la Conferencia Diplomaacutetica de las Naciones Unidas para la constitucioacuten de un Tribunal Penal Internashycional

A resoluccedilatildeo supracitada demonstra que cresce a conscientizaccedilatildeo da necessidade de ser criado um Tribunal Penal Internacional com forccedila cogente obrigatoacuteria de suas decisotildees no acircmbito interno dos paiacuteses que participarem do pacto de sua constituiccedilatildeo

A doutrina internacional revela que a comunidade internacional somenshyte agora vem se preocupando em criar uma estructura internacional para determinar las responsabilidades individuales emergentes de violacioacuten de ciertos derechos baacutesicos dei ser humano Los mecanismos de responsabilidad estatal creados desde los 60 se dirigen a la mayor protecciotilden dei ser humano y la erradicacioacuten de las praacutecticas de volacioacuten sistemaacutetica de los derechos humanos ar via de la condena ai Estado que ordena o que tolera los abusos por lo cual se estructuraron entorno ai Estado conmo sujeto responsable Como haacute seflalado la Corte Internacional de Derechos Humanos el procedimiento ante ella no es un procedimiento penal lo que se busca determinar es el nivel de cumprimiento por parte de un Estado de sus obligaciones de derecho internacional Sin desconocer la importancia de determinar la responsabilidad dei Estado para que eacuteste tenga un incentivo para erradicar esas praacutectica de sus frotneras es pertinente detacar que las violaciones maacutes grave son en uacuteltima instancia coshymetidas por individuos (Francisco Cox Encarregado dei TPI HOH em artigo intitulado EI IlOH ante la Craciotilden de um Tribunal Penal Internacional no site httpwwwiidhedcrcpitpintrohtml)

A criaccedilatildeo de um Tribunal Penal Internacional atuaria permanentemente e teria competecircncia subsidiaacuteria em relaccedilatildeo agrave outorgada aos Tribunais Nacioshynais limitando-se a atuar apenas nos crimes internacionais previamente defishynidos como sendo do interesse da comunidade global

Merece registro no acircmbito do assunto tratado que na Conferecircncia Reshygional sobre o Tribunal Penal Internacional realizada em 18 e 19 de fevereiro de 1998 na cidade de Guatemala Guatemala um dos temas tratados foi o relativo

268 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

agrave harmonizaccedilatildeo das incriminaccedilotildees quando os seguintes aspectos foram disshycutidos Branqueamento corrupccedilatildeo fraude fiscal participaccedilatildeo em associashyccedilotildees criminosas um olhar agrave luz dos direitos nacionais e do direito internacioshynal Perspectivas Quais os comportamentos a incriminar Criar uma nova incriminaccedilatildeo da fraude fiscal Uma tentativa de harmonizaccedilatildeo o corpus jurls contendo disposiccedilotildees penais para proteccedilatildeo dos interesses financeiros da Uniatildeo Europeacuteia As negociaccedilotildees no seio do Conselho da Europa e da OCDE referenshytes agrave luta contra a corrupccedilatildeo etc O referido painel foi presidido por Benoit Dejemeppe procurador do Rei em Bruxelas e contou com a presenccedila de Tereshyza Beleza professora de Direito Penal na Faculdade de Direito de Lisboa como moderadora

Haacute como visto um largo campo de anaacutelise para desenvolver com possishybilidade do surgimento de sugestotildees que levem a ciecircncia juriacutedica a alcanccedilar com a atuaccedilatildeo estatal uma competecircncia internacional que possa combater o crime internacional e ao mesmo tempo proporcione seguranccedila juriacutedica na ordem interna ganhando assim o sistema juriacutedico confianccedila dos investidoshyres

Em conclusatildeo a forma de compatibilizar o combate agrave criminalidade internacional sem violar a seguranccedila juriacutedica necessaacuteria a evitar a fuga de inshyvestimentos do paiacutes estaacute na criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional com comshypetecircncia definida para processar e julgar delitos globalizantes e cujas decisotildees tenham forccedila imperativa no acircmbito interno das naccedilotildees participantes do pacto para o seu nascimento

Page 14: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro

236 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

EI sigilo bancario constituye un reacutegimen limitado exclusivashymente ai aacutembito de las relaciones entre la institucioacuten bancaria y sus clientes e impone la obligacioacuten de confidencialidad de la institucioacuten sobre las informaciones que aqueacutellos le proporcionan

En todas las legislaciones bancarias el sigilo es relativo es decir el derecho dei ciudadano ai secreto y la correlativa obligacioacuten para el banco de no revelar a terceros las informaciones recibidas en el ejercicio de su actividad ceden cuando existe norma legal expresa o causa justificada

Elliacutemite legal ai sigilo estaacute constituiacutedo por la obligacioacuten dei banco de entregar informaciones y se fundamenta en motivos sushyperiores de orden puacuteblico o general siendo liacutecito entonces que el Estado establezca Iiacutemites legales ai secreto bancaria para auxiliar por ejemplo las actuaciones de la Justicia en el plano jurisdiccional y las dei Estado en el aacutembito dei ejercicio de su potestad impositiva

Es un principio irrebatible en la vida dei derecho que ni la autonomia de las personas ni los instrumentos dei aacuterea econoacutemica y financiera pueden servir en un momento dado como elementos juridicamente idoacuteneos para lesionar el intereacutes puacuteblico En consecuencia se puede afirmar que las limitaciones ai sigilo bancario son salvaguardias necesarias ai bien comuacuten en los caacutenones dei Estado moderno Estas limites deben ser materias reshyservadas a la ley por ser de caraacutecter excepcional en sentido estricto

En este orden de ideas necesariamente debe concluirse que existen legiacutetimos y superiores intereses en diversas aacutereas de la sociedad que se vinculan ai bien comuacuten y que deben ser tutelados por el Estado como lo es por ejemplo la necesidad de detectar y reprimir la evasioacuten de los impuestos los cuales transcienden ai evenshytual intereacutes geneacuterico que pueda tener el mismo Estado en la mantencioacuten dei sigilo bancaria En efecto desde el punto de vista de lajuridicidad y de la eacutetica no se puede sostener que el secreto bancaria pueda servir como instrumento para proteger la comisioacuten de actos

52

como el recieacuten mencionado que son constitutivos muchas veces de iliacutecitos penales bajo la forma de delitos tributarias o fraushydes fiscales con resultados ademaacutes de perjucio patrimonial ai Esshytado y dano ai intereacutes general de la sociedad

EI sistema bancaria frente a la existencia en la sociedad de un intereacutes general preponderante y superior estaacute naturalmente Ilamado a colaborar en la verificacioacuten y represioacuten de la evasioacuten tributaria

ENSAIOS JURiacuteDICOS 237

En este marco se inscribe la tendencia de la mayoda de las legislaciones modemas en cuanto a dotar aI Estado de facultades para intervenir en la actividad econoacutemica de los ciudadanos en procura de la correcta determinacioacuten de los tributos cuando se conshyfigura en el desarrollo de estas actividades un hecho gravado establecido en la ley

Ya la Constitucioacuten de Weimar en 919 proclamoacute que es liacutecito ai Estado intervenir para condicionar el ejercicio de los derechos a determinados fines sociales El bien comuacuten y la justicia social comenzaron desde entonces a servir de frontera a los derechos y Iibertades individuales

Cabe destacar que la OCDE (Organisation for Economic Cooperation and Development) en un documento elaborado en el ano 1999 sobre las praacutecticas de los paiacuteses en el acceso a la informacioacuten bancaria para fines tributarios advierte que se puede abusar de la confidencialidad para ocultar actividades iJegales y evadir impuestos y agrega en el resumen ejecutivo deI documento que ni la criminalizacioacuten dei fraude tributario ni el tratamiento de la evasioacuten de impuestos bajo las leyes tributarias de los paiacuteses miembros de la OCDE son homogeacuteneos pero que sin embargo los gobiernos de la mayoriacutea de los paiacuteses miembros de la OCDE han tomado la visi6n de que en este contexto las autoridades tributashyrias no deben ser tratadas como simples terceros sino que se les debe otorgar un acceso priviligiado a la informaci6n bancaria con fines tributarias

Se agrega en este estudio que una medida de esta naturaleza no pane en peligro la conlidencialidad de la inlormacioacuten bancaria puesto que las autoridades tributarias estaacuten sujetas a estrictos conshytroles sobre coacutemo utilizan la informacioacuten de los contribuyentes y todos los gobiemos han implementado regIas para proteger la conlidencialidad de la informaci6n tributaria (EI Sigilo Bancaacuterio Acesso a la Informadon Bancaria para Fines Tributarias)

Em verdade seu texto elenca 30 paiacuteses integrantes da OCDE (a saber Alemanha Austraacutelia Aacuteustria Beacutelgica Canadaacute Repuacuteblica Checa Dinamarca Finlacircndia Franccedila Greacutecia Hungria Islacircndia Irlanda Itaacutelia Japatildeo Coreacuteia Luxemburgo Meacutexico Paiacuteses Baixos Nova Zelacircndia Noshyruega Polocircnia Portugal Espanha Sueacutecia Turquia Suiacuteccedila Reino Unido Estados Unidos Repuacuteblica Eslovaca) dos quais em 1999 apenas trecircs (Portugal Repuacuteblica Eslovaca e Luxemburgo) natildeo facultavam o acesso por parte de autoridades tributaacuterias a informaccedilotildees relativas a pessoas suspeitas de fraude tributaacuteria

238 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

Desses trecircs paiacuteses hoje remanescem apenas dois Com efeito Portugal deixou de integrar esse grupo constrangedoramente minoritaacuterio ao aprovar em 29 de dezembro de 2000 a Lei n 30-G

Nesse diploma lecirc-se

Lei da Reforma de Tributaccedilatildeo do Rendimento

(Portugal)

Artigo 63 O - B

Acesso a informaccedilotildees e documentos bancaacuterios

1 A administraccedilatildeo tributaacuteria tem o poder de aceder directashymente aos documentos bancaacuterios nas situaccedilotildees de recusa da sua exibiccedilatildeo ou de autorizaccedilatildeo para a sua consulta

a) quando se trate de documentos de suporte de registos contabiliacutesticos dos sujeitos passivos de IRS e IRC que se enconshytrem sujeitos agrave contabilidade organizada

b) quando o contribuinte usufrua de benefiacutecios fiscais ou de regimes fiscais privilegiados havendo necessidade de controshylar os respectivos pressupostos e apenas para esse efeito

2 A administraccedilatildeo tributaacuteria tem o poder de aceder a todos os documentos bancaacuterios excepto as informaccedilotildees prestadas para justificar o recurso ao creacutedito nas situaccedilotildees de recusa de exibiccedilatildeo daqueles documentos ou de autorizaccedilatildeo para a sua consulta

a) quando se verificar a impossibilidade de comprovaccedilatildeo e quantificaccedilatildeo directa e exacta da mateacuteria tributaacutevel nos termos do artigo da Lei Geral Tributaacuteria e em geral quando estejam verifishycados os pressupostos para o recurso a uma avaliaccedilatildeo indirecta

b) quando os rendimentos declarados em sede de IRS se afastarem significativamente para menos sem razatildeo justificada dos padrotildees de rendimento que razoavelmente possam permitir as manifestaccedilotildees de riqueza evidenciadas pelo sujeito passivo nos termos do artigo 89-A da Lei Geral Tributaacuteria

c) quando existam indiacutecios da praacutetica de crime doloso em mateacuteria tributaacuteria designadamente nos casos de utilizaccedilatildeo de facturas falsas e em geral nas situaccedilotildees em que existam factos concretamente identificados gravemente indiciadores da falta de veracidade do declarado

d) quando seja necessaacuterio para fins fiscais comprovar a aplicaccedilatildeo de subsiacutedios puacuteblicos de qualquer natureza

ENSAIOS JUAlolCOS 239

3 As decisotildees da administraccedilatildeo tributaacuteria referidas nos nuacuteshymeros anteriores devem ser fundamentadas com expressa menshyccedilatildeo dos motivos concretos que as justificam pressupotildeem a audishyccedilatildeo preacutevia do contribuinte e satildeo da competecircncia do Director-Geshyral dos Impostos ou do Director-Geral das Alfacircndegas e dos Imshypostos Especiais sobre o consumo ou seus substitutos legais sem possibilidade de delegaccedilatildeo

4 Os actos praticados ao abrigo da competecircncia definida no nuacutemero anterior satildeo susceptiacuteveis de recurso judicial o qual teraacute efeito suspensivo nas situaccedilotildees previstas no n 2

5 Nos casos de deferimento do recurso previsto no nuacutemero anterior os elementos de prova entretanto obtidos natildeo podem ser utilizados para qualquer efeito em desfavor do contribuinte

6 As entidades que se encontrem numa relaccedilatildeo de domiacutenio com o contribuinte ficam sujeitas aos regimes de acesso agrave inforshymaccedilatildeo bancaacuteria referidos nos n 1 e 2

7 O acesso da administraccedilatildeo tributaacuteria a informaccedilatildeo banshycaacuteria relevante relativa a familiares ou terceiros que se encontrem numa relaccedilatildeo especial com o contribuinte depende de autorizashyccedilatildeo judicial expressa apoacutes audiccedilatildeo do visado obedecendo aos requisitos previstos no n 3

8 O regime previsto nos nuacutemeros anteriores natildeo prejudica a legislaccedilatildeo aplicaacutevel aos casos de investigaccedilatildeo por infracccedilatildeo peshynal e soacute pode ter por objecto operaccedilotildees e movimentos bancaacuterios realizados apoacutes a sua entrada em vigor sem prejuiacutezo do regime vigente para as situaccedilotildees anteriores

9 Os actos praticados ao abrigo da competecircncia prevista no n I devem ser objecto de comunicaccedilatildeo ao Defensor do Contrimiddot buinte

10 Para os efeitos desta lei considera-se documento bancaacuteshyrio qualquer documento ou registo independentemente do resshypectivo suporte em que se titulem comprovem ou registem opeshyraccedilotildees praticadas por instituiccedilotildees de creacutedito ou sociedades finanshyceiras no acircmbito da respectiva actividade incluindo os referentes a operaccedilotildees realizadas mediante utilizaccedilatildeo de cartotildees de creacutedito (coacutepia anexa)

Parece evidente destarte que todo o mundo civilizado abandonou a possibilidade de opor-se agrave Administraccedilatildeo Tributaacuteria o sigilo bancaacuterio

240 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

4 O sigilo bancaacuterio e o direito agrave intimidade e agrave privacidade das pessoas

A anaacutelise do sigilo bancaacuterio em face do direito agrave intimidade e agrave privacidashyde exige inicialmente que seja enfrentada a questatildeo referente ao seu conceito

Os doutrinadores natildeo tecircm assumido posiccedilatildeo uniforme quanto aos asshypectos conceituais dessa entidade juriacutedica

Seacutergio Carlos Covello autor da obra jaacute mencionada (O Sigilo Bancaacuterio Leud S Paulo 1991 p 69) entende que sigilo bancaacuterio eacute a obrigaccedilatildeo que tecircm os Bancos de natildeo revelar salvo justa causa as informaccedilotildees que venham a obter em virtude de sua atividade profissional

Luiz Fernando Bellinetti no artigo intitulado Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio (Revista do Direito do Consumidor Satildeo Paulo RT 1996 voI 18 p 144) defende posiccedilatildeo no sentido de que sigilo bancaacuterio eacute o dever juriacutedico que tecircm as instituiccedilotildees de creacutedito e as organizaccedilotildees auxiliares e seus empregados de natildeo revelar salvo justa causa as informaccedilotildees que venham a obter em virtushyde da atividade bancaacuteria a que se dedicam

Para Arnoldo Wald (in O Sigilo Bancaacuterio no Projeto de Lei Complemenshytar n 70 Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas n I pp 196209) o sigilo bancaacuterio se enquadra no conceito mais amplo do segredo profissional que tem merecido uma proteccedilatildeo mais ampla ensejando sua violaccedilatildeo caracterizaccedilatildeo como crime (art 154 do Coacutedigo PeshynaI)

Eivany A Silva tratando do tema em Consideraccedilotildees a Respeito do Sigilo de Dados (artigo publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio n 61 pp 41142 - Edit Dialeacutetica) afirma que o sigilo bancaacuterio eacute espeacutecie do gecircnero sigilo de dados constituindo um direito fundamental protegido constitucionalmente inserto que estaacute no rol dos direitos e garantias individuais ou seja em claacuteusushylas peacutetreas da Carta Magna natildeo podendo portanto ser modificado nem messhymo por emenda agrave Constituiccedilatildeo e portanto muito menos por legislaccedilatildeo de hierarquia inferior

Como examinado haacute divergecircncias na fixaccedilatildeo do conceito Essas divershygecircncias embora importantes para as posiccedilotildees doutrinaacuterias a serem assumishydas sobre o alcance do sigilo bancaacuterio natildeo geram contudo influecircncias de maior intensidade no relacionamento entre a instituiccedilatildeo financeira e os seus depositantes Isso porque o que merece ser considerado eacute a natureza juriacutedica do sigilo bancaacuterio isto eacute a que categoria de direito pertence e como por quem e quando a sua quebra pode ser determinada

Em face do exposto necessaacuterio eacute que se faccedila o alinhamento das teorias que procuram fundamentar o sigilo bancaacuterio

A doutrina em eacutepocas diversas examinou as seguintes teorias

ENSAIOS JURiacuteDICOS 241

Teoria contratualista O sigilo bancaacuterio de acordo com essa teoria deshycorre da relaccedilatildeo contratual que voluntariamente eacute formada entre o banco e o cliente por via da qual mesmo sem claacuteusula expressa a instituiccedilatildeo financeira assume a obrigaccedilatildeo de guardar segredo das movimentaccedilotildees de dinheiro que nela satildeo feitas Essa responsabilidade assumida pelo banco inspira-se segunshydo os adeptos da teoria em destaque nos usos nos costumes e na boa-feacute sempre aplicaacuteveis na intepretaccedilatildeo dos contratos comerciais7bull

Teoria do direito agrave privacidade Os adeptos dessa corrente afirmam que o sigilo bancaacuterio integra o campo do direito agrave privacidade que faz parte dos direitos da personalidade

Teoria consuetudinaacuteria Segundo os seguidores dessa linha de pensar o sigilo bancaacuterio decorre dos compromissos taacutecitos assumidos entre instituishyccedilotildees financeiras e seus clientes no sentido de natildeo serem levados ao conhecishymento de terceiros os valores transacionados O uso reiterado dessa praacutetica apoiada no elemento confianccedila passou a representar costume adotado nesse tipo de negoacutecio juriacutedico

Teoria da boa-feacute A adoccedilatildeo dessa teoria conduz o inteacuterprete a entender que o sigilo bancaacuterio por sua proacutepria natureza estaacute vinculado ao caraacuteter fiduciaacuterio da atividade bancaacuteria fundando-se portanto na boa-feacute ou dever de lisura que tanto marca o tipo de negoacutecio juriacutedico firmado

Teoria do sigilo profissional Essa teoria concebe o sigilo bancaacuterio como sendo uma espeacutecie do sigilo profissional Haacute portanto um dever eacutetico do banshyco em respeitar o sigilo bancaacuterio em decorrecircncia da profissatildeo exercida

Teoria do direito agrave intimidade dos bancos Os integrantes dessa forma de pensar sustentam que a instituiccedilatildeo financeira tem legiacutetimo interesse de afastar do conhecimento de terceiros a movimentaccedilatildeo financeira dos seus clientes e consequumlentemente dos fatos com elas relacionados

Teoria da complexidade do viacutenculo Essa teoria eacute explicada por Arnoldo Wald no trabalho jaacute citado da forma seguinte A doutrina moderna abandoshynou a noccedilatildeo da relaccedilatildeo juriacutedica contratual defendo a complexidade do viacutenshyculo Aleacutem dos direitos e das obrigaccedilotildees principais existem deveres secundaacuteshyrios para ambos os contratantes que decorrem da regra geral da boa-feacute denoshyminada na doutrina italiana de cOITeteza e na legislaccedilatildeo alematilde de Treu und Glauben Exige que a atuaccedilatildeo de uma parte natildeo cause danos agrave esfera juriacutedica da outra Dentro desta ideacuteia defende-se que o segredo bancaacuterio eacute um dever

7 Arnoldo Wald em Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais artigo publicado na Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas n 22 pp 1518 manifesta entendimento de que no campo normatIacutevo do Direito brasileiro esta teoria encontra respaldo nos arts 130 e 131 do Coacutedigo Comercial que prevecirc a interpretaccedilatildeo dos contratos segundo os usos os costumes e a boa-feacute

242 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

acessoacuterio na relaccedilatildeo juriacutedica Mesmo que natildeo nasccedila o contrato entre as partes a boa-feacute objetiva impede que a instituiccedilatildeo financeira prejudique os interesses do cidadatildeo

Estabelecidos os pressupostos doutrinaacuterios acima examinamos agora se o sigilo bancaacuterio diz respeito agrave intimidade e agrave privacidade das pessoas

A Constituiccedilatildeo Federal em seu artigo 5ordm incisos X e XII afirma

Art 5ordm Todos satildeo iguais perante a lei sem distinccedilatildeo de qualquer natureza garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Paiacutes a inviolabilidade do direito agrave vida agrave liberdade agrave igualdade agrave segushyranccedila e agrave propriedade nos termos seguintes

X - satildeo inviolaacuteveis a intimidade a vida privada a honra e a imagem das pessoas assegurado o direito agrave indenizaccedilatildeo pelo dano material ou moral decorrente de sua violaccedilatildeo

XJl - eacute inviolaacutevel o sigilo da correspondecircncia e das comunicaccedilotildees telegraacuteficas de dados e das comunicaccedilotildees telefocircnicas salvo no uacuteltimo caso por ordem judicial nas hipoacuteteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigaccedilatildeo criminal ou instruccedilatildeo processual penal

Essas garantias constitucionais protegem o cidadatildeo de qualquer investida de terceiros em sua intimidade em sua vida privada e no sigilo de seus dados

Na expressatildeo terceiros estaacute incluiacutedo o Estado e consequumlentemente seus agentes poliacuteticos e administrativos

A doutrina tem se manifestado de modo quase unacircnime no sentido de que o sigilo bancaacuterio eacute uma garantia constitucional que protege a privacidade das pessoas no campo econocircmico e financeiro A sua significaccedilatildeo eacute de natildeo tornar puacuteblica a movimentaccedilatildeo da conta bancaacuteria e das aplicaccedilotildees financeiras do cidadatildeo para que de nenhum modo os atos privados praticados possam ser tornados puacuteblicos

Esse posicionamento eacute o adotado pelos autores que passo a citar

Arnoldo Wald (O Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais artigo pushyblicado na Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas RT n 22 pp 1521)

O sigilo bancaacuterio eacute o meio para resguardar a privacidade no camshypo econocircmico pois veda a publicidade sobre a movimentaccedilatildeo da conta corrente bancaacuteria e das aplicaccedilotildees financeiras

ENSAIOS JURiacuteDICOS 243

Eivany A Silva (Consideraccedilotildees a Respeito do Sigilo de Dados artigo publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio n 61 Satildeo Paulo Editora Dialeacutetica p27)

A maioria dos ordenamentos juriacutedicos como o brasileiro tratam o sigilo bancaacuterio como direito fundamental do contribuinte agrave privacidashyde ou seja agrave resistecircncia agrave comunicaccedilatildeo de dados que representem desshydobramento da personalidade da pessoa direito agrave oposiccedilatildeo e agrave negaccedilatildeo de comunicaccedilatildeo

Ives Gandra da Silva Martins (Sigilo Bancaacuterio trabalho publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio S Paulo Editora Dialeacutetica n 1 pp 24 e 25)

Pelos incisos X e XII do artigo 5ordm tem o contribuinte o direito de preservaccedilatildeo de sua intimidade de sua privacidade e de que terceiros que detenham informaccedilotildees pessoais suas sejam obrigados a guardaacute-Ias

Natildeo pode pois a fiscalizaccedilatildeo exigir de terceiros informaccedilotildees que apenas pode obter do proacuteprio contribuinte

Em determinadas hipoacuteteses todavia o interesse puacuteblico haacute de preshyvalecer sobre o interesse individual mas caberaacute a um outro poder definir se tais hipoacuteteses efetivamente ocorrem com o que poderaacute o Poder Judishyciaacuterio autorizar se convencido estiver o magistrado de que a hipoacutetese eacute de gravidade e de lesatildeo ao interesse puacuteblico a quebra do direito ao sigilo bancaacuterio

Estou convencido ser esta a melhor conformaccedilatildeo juriacutedica da quesshytatildeo idealizada pelos constituintes defendida pela doutrina e consagrashyda na jurisprudecircncia corrente exegeacutetica esta a que me filio desde os meus primeiros escritos sobre a mateacuteria

Roberto Quiroga Mosquera (Tributaccedilatildeo no Mercado Financeiro e de Capitais obra publicada pela Editora Dialeacutetica Satildeo Paulo 1998 pp 70171)

Do exposto ateacute aqui eacute evidente que o direito ao sigilo bancaacuterio representa uma espeacutecie de direito agrave privacidade

Eacute incontroverso que os dados e informaccedilotildees de natureza bancaacuteria dizem respeito agrave intimidade e agrave vida privada dos cidadatildeos Dados que dizem respeito aos valores em dinheiro depositados em contas-correnshytes bancaacuterias tipos e caracteriacutesticas de aplicaccedilotildees financeiras ganhos e prejuiacutezos auferidos ou incorridos em operaccedilotildees bursaacuteteis etc satildeo sem sombra de duacutevida elementos particulares e pessoais de qualquer indiviacuteshyduo

244 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Utilizando outra voz informaccedilotildees que tocam no aspecto financeishyro do ser humano representam direito iacutentimo e personaliacutessimo devendo ser mantidas em sigilo por aqueles que eventualmente as detenham em razatildeo de sua atividade profissional Parece-nos que tal conclusatildeo eacute de uma clareza inconteste

Natildeo tem sido outra a posiccedilatildeo da doutrina mais abalizada do Paiacutes e da jurisprudecircncia dominante

o autor referido a seguir faz a observaccedilatildeo seguinte

Carlos Alberto Hagstrom (Sigilo Bancaacuterio Novas Questotildees Reshyvista de Direito Mercantil Satildeo Paulo Malheiros 1997 vaI 105 pp 4344) expotildee que apesar de existirem diversas teorias que procuram fundashymentar juridicamente o sigilo bancaacuterio modernamente a explicaccedilatildeo para o fundamento do referido instituto sofreu uma radical alteraccedilatildeo Divershysas constituiccedilotildees modernas esclarece o mencionado autor ampliaram e explicitaram o elenco de direitos e garantias individuais passando a garantir o direito agrave privacidade e agrave intimidade A Constituiccedilatildeo brasileira natildeo trilha caminho diferente Assegurou referidos direitos de forma exshypressa e sem restriccedilotildees O tema do sigilo bancaacuterio figura agora em niacutevel constitucional Tem status de norma superior no qual se reconhece o direito agrave intimidade como norma de caraacuteter geneacuterico em que estatildeo conshytemplados muacuteltiplos aspectos da vida privada em especial os de ordem econocircmico-financeira que compotildeem o que Hagstrom denominou a inshytimidade econocircmica ou intimidade patrimonial

Luiacutes Fernando 8ellinetti (Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio artigo publicado na Revista de Direito do Consumidor n 18 pp 141151)

Como jaacute dissemos anteriormente em certas hipoacuteteses o fundashymento para o segredo bancaacuterio seria a privacidade No entanto nesses casos o que se protege eacute a privacidade e natildeo propriamente o sigilo

Entendemos que uma coisa eacute garantir-se a privacidade da pessoa com fundamento em norma constitucional outra eacute garantir-se o segreshydo de informaccedilotildees bancaacuterias de uma pessoa com base na legislaccedilatildeo supramencionada

Sempre que a revelaccedilatildeo de informaccedilotildees bancaacuterias puder violar a privacidade da pessoa parece-nos que mais do que garantia ao sigilo bancaacuterio (com fundamento legal) tem a pessoa garantia agrave sua privacishydade (com fundamento constitucional)

ENSAIOS JURiacuteDICOS 245

No entanto se a revelaccedilatildeo da informaccedilatildeo natildeo invadir a esfera da intimidade da pessoa sua garantia eacute meramente legal do sigilo bancaacuterio

Carlos Maacuterio Velloso (citado por Misabel Derzi em Direito Tributaacuterio Aplicado obra publicada pela Editora Del Rey Belo Horizonte MO pp 278 e 279)

O sigilo bancaacuterio decorre do direito agrave privacidade inerente agrave pershysonalidade das pessoas consagrado na Constituiccedilatildeo Federal em seu art 5ordm X e protege tanto interesses privados como finalidades de ordem puacuteblica a saber o sistema de creacutedito O sigilo bancaacuterio natildeo eacute um princiacuteshypio absoluto

As exceccedilotildees ao sigilo bancaacuterio estatildeo previstas na Lei n 45951964 que continua em vigor

O Poder Judiciaacuterio pode requisitar relativamente a pessoas e instishytuiccedilotildees informaccedilotildees que implicam quebra de sigilo (Lei n 45951964 art 38 sect 1 ordm) entretanto mesmo havendo inqueacuterito policial instaurado deveraacute proceder com cautela prudecircncia e moderaccedilatildeo inerentes agrave mashygistratura

Luciana Fregodolli (O Direito agrave Intimidade - excerto da dissertaccedilatildeo que apresentou sob o tiacutetulo O Direito agrave Intimidade e a Prova Iliacutecita publicado pela Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Constitucional e Ciecircncia Poliacutetica -n 19 p 233)

O sigilo bancaacuterio protege interesses privados Eacute ele espeacutecie de direito agrave privacidade inerente agrave personalidade das pessoas e que a Consshytituiccedilatildeo Federal consagra no art 5ordm X aleacutem de atender a uma finalidade de ordem puacuteblica qual seja a de proteccedilatildeo ao sistema de creacutedito

O direito agrave privacidade abrange atualmente o de impedir que tershyceiros inclusive o Estado e o Fisco tenham acesso a informaccedilotildees sobre o que se denominou a aacuterea de manifestaccedilatildeo existencial do ser humano

Celso Ribeiro Bastos O pensamento de Celso Ribeiro Bastos foi exshyposto por Roberto Quiroga Mosquera na obra jaacute referida p 71 do modo seguinte

Celso Bastos eacute do mesmo pensar Apoacutes tecer consideraccedilotildees introdutoacuterias acerca do sigilo bancaacuterio e expor pensamentos de divershysos autores nacionais e alieniacutegenas conclui o constitucionalista brasileishyro no sentido de que todas as despesas ordinaacuterias feitas pelo cidadatildeo

246 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

comum em sua vida cotidiana devem ser consideradas parte de sua vida privada familiar ou domeacutestica e portanto protegidas contra interferecircnshycias a despeito de qualquer pretexto Desde as condutas mais corriqueishyras como as compras efetuadas em um supermercado para manutenshyccedilatildeo da famiacutelia quanto aquelas outras moralmente reprovaacuteveis como presentes ou joacuteias compradas e dadas a quem presta ao homem servishyccedilos de natureza extraconjugal tudo estaacute abarcado pelo manto da proteshyccedilatildeo agrave vida privada familiar ou domeacutestica ( ) E mais adiante arremata Hoje praticamente a vida do homem pode ser escrita a partir de seu talatildeo de cheques e nas sociedades mais avanccediladas pelos cartotildees de creacutedito e magneacuteticos Permitir-se que o sigilo bancaacuterio venha a ser romshypido por qualquer forma natildeo-extraordinaacuteria para salvaguarda de inteshyresse de porte no miacutenimo idecircntico eacute expor a seguranccedila individual a um constante e absurdo temor perante as possibilidades de controle direto ou pelo vazamento de alguma informaccedilatildeo

Haacute contudo corrente contraacuteria como passaremos a demonstrar

Andreacute Serratildeo Borges de Sampaio Consultor da Uniatildeo nas informashyccedilotildees prestadas ao Advogado-Geral da Uniatildeo sobre a ADIn n 2397 cita trechos de doutrina e jurisprudecircncia estrangeiras defendendo o entendimento de que o sigilo bancaacuterio natildeo tem conotaccedilatildeo de direito de privacidade Eis o que escreshyveu o parecerista citado

O jurista portuguecircs J L Saldanha Sanches coteja primorosashymente o sigilo bancaacuterio com a proteccedilatildeo da intimidade para concluir que natildeo haacute que se falar em direito ao sigilo bancaacuterio como concretizaccedilatildeo do direito agrave intimidade Nas suas palavras

Ora em que esfera podemos noacutes incluir o segredo bancaacuteshyrio enquanto instituto que concretiza certos valores do ordenashymento juriacutedico Como expressatildeo de interesses juridicamente tuteshylados

Seraacute o segredo bancaacuterio um prolongamento do direito agrave inshytimidade da esfera pessoal e familiar de uma qualquer pessoa sinshygular (uma vez que em relaccedilatildeo agraves pessoas coletivas a questatildeo natildeo pode mesmo ser colocada) Ou diraacute antes respeito aquela faixa mais larga que resguarda a privacidade de qualquer cidadatildeo e que soacute pode por isso sofrer qualquer intromissatildeo se surgirem razotildees vaacutelidas para que tal direito seja restringido

Ao afirmar-se que na perspectiva dos clientes dos bancos o segredo bancaacuterio eacute um direito com a reserva da sua vida privada temos uma primeira resposta para esta questatildeo

ENSAIOS JURiacuteDICOS 247

Mas falta distinguir entre intimidade e reserva da vida privashyda e entre clientes individuais e profissionais de um banco Natildeo estamos perante o mesmo tipo de tutela quando contamos que um particular espera que o banco natildeo divulgue a qualquer inteshyressado o volume da sua conta bancaacuteria (porque pura e simplesshymente quer manter sob reserva a sua vida particular) ou quando um comerciante confia no banco para que este natildeo revele quem satildeo os seus clientes fornecedores ou qual eacute o seu grau de endividamento

No caso da pessoa singular estaacute apenas em causa um conshyjunto de valores de natureza moral esta natildeo estaacute em princiacutepio preocupada com possiacuteveis prejuiacutezos econocircmicos ligados a qualshyquer divulgaccedilatildeo Apenas se opotildee por razotildees do seu foro pessoal e que natildeo carecem de fundamentaccedilatildeo que esta tenha lugar

Enquanto que o comerciante pode ser seriamente prejudishycado em termos concorrenciais com a revelaccedilatildeo da lista dos seus clientes ou com a sua situaccedilatildeo financeira

O dever de reserva que cabe ao banqueiro estaacute desta forma a serviccedilo do interesse comercial das empresas suas clientes - que pelo simples facto de o serem ou por necessitarem de obter creacutedishyto lhe datildeo informaccedilotildees com um forte valor comercial ou da pesshysoa singular que deseja manter a privacidade da sua situaccedilatildeo patrimonial

Ou em alternativa ao serviccedilo da manutenccedilatildeo da privacidashyde que qualquer um pode desejar ainda que a possiacutevel violaccedilatildeo desta apenas lhe possa acarretar danos natildeo-patrimoniais

E por isso o segredo bancaacuterio natildeo pode constituir a expresshysatildeo do imperativo constitucional da proteccedilatildeo da intimidade Ateacute porque o acesso a essa esfera estaacute vedado aos proacuteprios bancos

Natildeo nos parece aceitaacutevel que um banco como condiccedilatildeo para a concessatildeo de creacutedito a uma pessoa singular ou para estashybelecer com ela qualquer relaccedilatildeo contratual possa exigir desta informaccedilatildeo de tipo estritamente pessoal ou a sujeiccedilatildeo a exames meacutedicos que atingindo a sua esfera iacutentima afectam a sua dignidashyde Aqui estaacute em causa a ilicitude da pergunta por pressupor o acesso agrave esfera inviolaacutevel (e indisponiacutevel) da intimidade

A informaccedilatildeo que o banco pode obter para a defesa dos seus interesses legiacutetimos natildeo pode ir aleacutem da esfera patrimonial do seu cliente rendimentos bens possuiacutedos perspectivas profisshysionais

( )

248 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

Podemos pois concluir que o segredo bancaacuterio natildeo eacute natildeo pode ser uma concretizaccedilatildeo do princiacutepio constitucional do direishyto agrave intimidade

Este princiacutepio tem como funccedilatildeo consagrar uma zona de reshyselVa pessoal para factos opccedilotildees e circunstacircncias que soacute de forshyma indirecta e de todo secundaacuteria podem ter aspectos ou refleshyxos de natureza patrimonial (Saldanha Sanches J L Segredo Bancaacuterio e Tributaccedilatildeo do Lucro Real In Saldanha Sanches J L Estudos de Direito Contabiliacutestico e Fiscal Coimbra Coimbra Edishytora 2000 pp 105108)

Em diversos paiacuteses haacute a clara percepccedilatildeo que natildeo haacute que se conshyfundir direito agrave intimidade com sigilo bancaacuterio indicando que a quebra do sigilo pela Administraccedilatildeo Tributaacuteria natildeo constitui violaccedilatildeo ao direito Ao contraacuterio a existecircncia de um Estado Fiscal implica na necessidade de consagrar agrave administraccedilatildeo tributaacuteria tal faculdade o que se harmonishyza com diversos princiacutepios e outros direitos fundamentais constantes da Carta de 1988

O caso espanhol eacute exemplar neste sentido ao natildeo visualizar a vioshylaccedilatildeo ao direito agrave intimidade em relaccedilatildeo agrave quebra do sigilo bancaacuterio Portanto

el Tribunal Constitucional espaflOl se ha pronunciado por la negativa de que el conocimiento de las cuentas bancarias por la Administracioacuten pueda invadir el aacutembito constitucionalmente garantizado de la intimidad de los individuos porque tales extractos no constituyen per se uma biografiacutea personal en nuacutemeros y en siacute no tiene relevancia para la intimidad personal y familiar dei contribuyente ya que se trata de dados no secretos y confiados a una entidad (Campos Laura Rodriacuteguez Oerechos dei Contribuyente em la Repuacuteblica Argentina ai Amparo de la Convencioacuten Interamericana de Oerechos Humanos http wwwiefpaorgarcriteriosdigitalarticulosderechoshtm Visitado em 512001)

Ao analisar a jurisprudecircncia da Corte Constitucional espanhola quanto ao tema tambeacutem ressalta Saldanha Sanches

Na apreciaccedilatildeo da constitucionalidade da lei que permitia o controle administrativo das contas bancaacuterias o Tribunal Constitushycional espanhol realizou uma distinccedilatildeo entre intimidade pessoal e familiar e a intimidade econoacutemica onde a proteccedilatildeo constitucional eacute menos intensa

ENSAIOS JURiacuteDICOS 249

E procura fazer uma distinccedilatildeo entre a violaccedilatildeo agrave intimidade como consequumlecircncia de uma anaacutelise das contas bancaacuterias - coloshycando a hipoacutetese de uma recusa de cooperaccedilatildeo por parte do conshytribuinte se tal eventualidade se verificar - e a violaccedilatildeo directa da intimidade uma vez que esta natildeo pode resultar de uma mera anaacuteshylise de movimentos bancaacuterios (Saldanha Sanches J L A Situashyccedilatildeo Actual do Sigilo Bancaacuterio a Singularidade do Regime Portushyguecircs In Saldanha Sanches J L Estudos de Direito Contabiliacutestico e Fiscal Coimbra Coimbra Editora 2000 p 91)

Outro comentarista ao analisar a situaccedilatildeo do sistema espanhol quanto ao sigilo bancaacuterio e o direito agrave intimidade fez questatildeo de ressaltar

Seguacuten el r c frente a la Hacienda Puacuteblica no existe el derecho a la intimidad deI art 18 CE Ya la LO de 5 de mayo deI 82 vada praacutecticamente de contenido constitucional el derecho a la intimidado en cuanto el aacutembito de eacutesta queda deferido a la ley ordinaria (a 2ordm) y en cuanto que la esfera protegida frente a las Administraciones se reduce a poco O nada ai no reputarse intromisiones ilegiacutetimas las actuaciones autorizadas o acordadas por la Autoridad competente de acuerdo con la Ley (art 8ordm 1)

La LGTy el RI Iimiacutetan la esfera de la intimidad en las relacishyones con la Hacienda hasta el extremo de que solamenle existe un refugio limitado en el aacutembito deI secreto profesional en los casos de informacioacuten sobre terceros y siempre que no se trate de datos con transcendencia econoacutemica o tributaria EI rc no ha enconshytrado hasta el momento ni un solo supuesto de dato o informacioacuten econocircmica con transcendencia tributaria que limite la accioacuten inquisitiva de la Administracioacuten tributaria por razoacuten de intimidado Bien puede decirse por tanto que frente a la Administraciocircn tribushytaria en cuanto se trata deI ejercicio de su funciocircn de buacutesqueda de datos con transcendencia tributaria el derecho a la intimidad personal y familiar (art 18 I CE) no existe

La biacuteblia deI tribunal a estos efeclos estaacute constituida por la S 11084 reiterada en numerosas ocasiones ampliada en el Auto 64286 y reafirmada por ejemplo en la S 26 abril 90 tantas veces citada (FJ 10deg) Seguacuten esa doctrina la distribucioacutenjusta de la carshyga fiscal prevalece sobre el derecho a la intimidad parte dei art 812 I de la LO seguacuten el cual frente a la Ley (ordinaria) no hay intimidad protegida siempre que haya en dicha ley imperativos de intereacutes puacuteblico ( ) ni siquiera se habla dei predomiacutenio frente a la

250 SUPERIOR TRIBUNAl DE JUSTiCcedilA

intimidad de intereses u objetivos constitucionalmente protegidos Soacuteo admite que la actuadoacuten administrativa es arbitraria cuando no parezcajustificada por la Finalidad de la inspeccioacuten es decir cuando se trate de datos o informaciones que carezcan de transcendencia tributaria pero eacuteste obviamente no es sin Umite derivado dei derecho a la intimidad sino de la interdiccioacuten de arbitrariedad o desviacioacuten de poder de la Administracioacuten de la necesidad de ajuste de toda Administracioacuten ai acircmbito de su competencia que tanto vale para datos iacutentimos como para otros que no lo sean Seguacuten la S 11084 no hay esfera de intimidad proshytegida frente a una Administracioacuten tributaria amparada en una norma que elimina la intimidad como liacutemite (Garciacutea AIacuteloveros Jaime Una Nueva Ley General Tributaria Problemas Constitucioshynales In Kirchhof P et aI Garantiacuteas Constitucionales dei Contribuyente Valencia Tirant lo Blanch 1999 pp 109110)

Diante de tudo quanto foi exposto tendo-se o cuidado de registrar posicionamento de diferentes autores nacionais e estrangeiros haacute ambiente preparado para ser respondido o primeiro questionamento desdobrado em trecircs partes formulado para o 1II Coloacutequio Internacional de Direito Tributaacuterio promoccedilatildeo do Centro de Extensatildeo Universitaacuteria Eis a primeira parte do seu teor

O sigilo bancaacuterio diz respeito agrave intimidade e privacidade das pessoas

A resposta eacute optando por convencimento influenciado pelas ideacuteias da corrente predominante positiva

O nosso entendimento eacute no sentido de que o direito agrave intimidade integra os direitos da personalidade e visam proteger o direito agrave inviolabilidade do domiciacutelio da correspondecircncia das comunicaccedilotildees de quaisquer espeacutecies dos dados pessoais computadorizados do sigilo bancaacuterio O mesmo acontece com o direito agrave privacidade

A expansatildeo da proteccedilatildeo do direito agrave intimidade e agrave privacidade eacute uma consequumlecircncia da evoluccedilatildeo da era contemporacircnea nos setores tecnoloacutegicos e da instabilidade que passam as instituiccedilotildees estatais especialmente a encarreshygada de arrecadar tributos Haacute o reconhecimento de que desenvolve-se um processo de aguda corrosatildeo na proteccedilatildeo agrave intimidade que ao ser violada provoca a publicizaccedilatildeo das condutas mais iacutentimas do cidadatildeo

A concepccedilatildeo do sigilo bancaacuterio no acircmbito do direito agrave intimidade e agrave privacidade visa garantir ao homem o miacutenimo capaz para que lhe seja asseshygurada a sua condiccedilatildeo humana protegendo-o de ingerecircncias alheias como apregoa a Conferecircncia Noacuterdica sobre o Direito agrave Intimidade realizada em Estoshycolmo na data de maio de 1967 ao fazer inserir no documento que publicou a seguinte definiccedilatildeo O direito agrave intimidade eacute o direito do homem de viver de forma independente a sua vida com um miacutenimo de ingerecircncia alheia

ENSAIOS JURiacuteDICOS 251

5 Seguranccedila juriacutedica e acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias

A segunda pergunta apresentada pelos organizadores do coloacutequio estaacute assim posta

A seguranccedila das relaccedilotildees juriacutedicas atraveacutes do Sistema Financeiro pode ser afetada pelo acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves inforshymaccedilotildees bancaacuterias

O acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias se realizado caracteriza um atentado de suma gravidade aos direishytos do cidadatildeo Eacute um ataque aos princiacutepios sustentadores do sistema demoshycraacutetico adotado pelo constituinte de 1988 especialmente quando detonou que a Repuacuteblica Federativa do Brasil tem como objetivo fundamental o respeishyto agrave dignidade humana e agrave cidadania

Do ordenamento juriacutedico brasileiro a meu pensar natildeo haacute lugar para brotar qualquer interpretaccedilatildeo que conclua pela possibilidade de qualquer agenshyte do Poder Puacuteblico acessar de modo generalizado e sem motivaccedilatildeo informashyccedilotildees bancaacuterias do cidadatildeo mesmo com autorizaccedilatildeo judicial

Esclareccedilo desde logo que natildeo comungo com o pensamento de detershyminada corrente no sentido de ser absoluto o direito ao sigilo bancaacuterio Tenho-o como relativo poreacutem vinculado aos princiacutepios da razoabilidade da moralidade da legalidade e da motivaccedilatildeo expliacutecita e detalhada sob pena de ser impossiacutevel a sua quebra

O acesso indiscriminado do agente fiscal agraves informaccedilotildees bancaacuterias do cidadatildeo gera uma quebra da seguranccedila das relaccedilotildees juriacutedicas por um terceiro passar a ter sem causa justificadora conhecimento da vida iacutentima de algueacutem submetendo-o a partir daiacute a um regime de submissatildeo Por outro lado ninshygueacutem poderaacute garantir nem o proacuteprio Estado que o agente puacuteblico utilize os dados que chegaram ao seu conhecimento para outros intentos que natildeo o exclusivamente fiscal

Lembra Arnoldo Wald que O segredo na atividade bancaacuteria envolve concomitantemente interesses privaqos e coletivos que podem ser analisashydos sob trecircs acircngulos o interesse do cliente na sua relaccedilatildeo com a instituiccedilatildeo financeira o interesse do banco em atuar com discriccedilatildeo para ganhar a conshyfianccedila da populaccedilatildeo e captar recursos e o interesse social na existecircncia de um bom e eficiente sistema bancaacuterio Por estarem ligadas ao desenvolvimento da economia e aos interesses da comunidade as relaccedilotildees que envolvem as instishytuiccedilotildees financeiras natildeo recebem o mesmo tratamento juriacutedico dispendido a outras relaccedilotildees comerciais Inviaacutevel a aplicaccedilatildeo exclusiva das regras de Direito Privado as quais tecircm como princiacutepio norteador a autonomia da vontade pois

252 SUPERIOR TRIBUNAl DE JUSTiCcedilA

esta encontra limites nas normas cogentes proacuteprias do direito bancaacuterio e na intervenccedilatildeo do Estado8

A seguranccedila juriacutedica desse tipo de relaccedilatildeo envolve tambeacutem a manutenshyccedilatildeo do segredo das movimentaccedilotildees financeiras do contribuinte

Imprimir-se a mais ampla seguranccedila nas relaccedilotildees do Sistema Financeiro eacute fortalececirc-lo O Estado tem o dever de zelar por esse estado de seguranccedila natildeo permitindo consequumlentemente que o sigilo bancaacuterio seja quebrado pelo acesshyso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico por esse comportamento afeshytar a confiabilidade no sistema

Eacute de todo inconveniente permitir a possibilidade de um atuar do agente fiscal sem controle na quebra do sigilo bancaacuterio por afetar diretamente a seshyguranccedila da relaccedilatildeo juriacutedica firmada entre a instituiccedilatildeo financeira e o seu clienshyte em face deste sentir-se atingido pela accedilatildeo fiscal que passa a tomar conhecishymento de sua intimidade financeira e de fatos de sua vida privada sem o resshypaldo do Poder Judiciaacuterio

A seguranccedila juriacutedica nesse tipo de relaccedilatildeo deve assegurar impossibilidashyde de abuso de poder por parte do Fisco em face da necessidade de ser resshyguardada a garantia de que em um Estado de Direito natildeo pode ser concebido que conceda-se a uma parte mesmo que seja o Estado o domiacutenio absoluto de apanhar as provas que iraacute utilizar em caso de litiacutegio contra algueacutem

O acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias do contribuinte aleacutem de afetar a seguranccedila juriacutedica da relaccedilatildeo em questatildeo promove um desequiliacutebro entre o cidadatildeo-contribuinte e o Fisco por caracterizar coaccedilatildeo que coloca aquele em posiccedilatildeo de inferioridade

A valorizaccedilatildeo da seguranccedila juriacutedica da relaccedilatildeo existente entre instituiccedilatildeo financeira e contribuinte pelo Fisco natildeo quebrando o seu sigilo fiscal sem autorizaccedilatildeo judicial constitui causa de aplicaccedilatildeo de Justiccedila fiscal O seguimenshyto de seus princiacutepios valoriza o regime democraacutetico do qual ela faz parte

6 Casos de admissibilidade da quebra do sigilo bancaacuterio

Os casos de admissibilidade da quebra do sigilo bancaacuterio estatildeo na atuashylidade descritos no nosso ordenamento juriacutedico positivo

A Lei Complementar n 105 de 10 de janeiro de 2001 apoacutes determinar no art 112 de que as instituiccedilotildees financeiras conservaratildeo sigilo em suas operashyccedilotildees ativas e passivas e serviccedilos prestados dispotildee no sect 312 do mesmo artigo que

8 Arnoldo Wald no artigo Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais Revista dos Tribunais ano 6 n 22 janeiromiddotmarccedilo de 1998 n 22 Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas p 15

ENSAIOS JURiacuteDICOS 253

sect 3ordm Natildeo constitui violaccedilatildeo do dever de sigilo

I a troca de informaccedilotildees entre instituiccedilotildees financeiras para fins cadastrais inclusive por intermeacutedio de centrais de risco observadas as normas baixadas pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e pelo Banco Censhytral do Brasil

11 - o fornecimento de informaccedilotildees constantes de cadastro de emitentes de cheques sem provisatildeo de fundos e de devedores inadimplentes a entidades de proteccedilatildeo ao creacutedito observadas as norshymas baixadas pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e pelo Banco Central do Brasil

JJI - o fornecimento das informaccedilotildees de que trata o sect 2ordm do art II da Lei n 9311 de 24 de outubro de 1996

IV - a comunicaccedilatildeo agraves autoridades competentes da praacutetica de iliacutecitos penais ou administrativos abrangendo o fornecimento de inforshymaccedilotildees sobre operaccedilotildees que envolvam recursos provenientes de qualshyquer praacutetica criminosa

V - a revelaccedilatildeo de informaccedilotildees sigilosas com o consentimento expresso dos interessados

VI- a prestaccedilatildeo de informaccedilotildees nos termos e condiccedilotildees estabeleshycidos nos artigos 2ordm 3ordm 4ordm 5ordm 6ordm 7ordm e 9ordm desta lei complementar

sect 4ordm A quebra de sigilo poderaacute ser decretada quando necessaacuteria para apuraccedilatildeo de ocorrecircncia de qualquer iliacutecito em qualquer fase do inqueacuterito ou do processo judicial e especialmente nos seguintes crimes

I - de terrorismo

11 - de traacutefico iliacutecito de substacircncias entorpecentes ou drogas afins

III - de contrabando ou traacutefico de armas municcedilotildees ou material destinado a sua produccedilatildeo

IV - de extorsatildeo mediante sequumlestro

V - contra o sistema financeiro nacional

VI - contra a Administraccedilatildeo Puacuteblica

Vll- contra a ordem tributaacuteria e a previdecircncia social

VIII-lavagem de dinheiro ou ocultaccedilatildeo de bens direitos e valores

IX - praticado por organizaccedilatildeo criminosa

Como visto a lei complementar enumera inuacutemeras situaccedilotildees que indeshypendentemente de autorizaccedilatildeo judicial o sigilo bancaacuterio eacute quebrado

254 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

A dificuldade que se apresenta eacute a de conciliar os casos de quebra de sigilo bancaacuterio que a Lei Complementar n 105 autoriza com a garantia do direito agrave privacidade e agrave intimidade

Destaque-se entre os de maior relevacircncia os seguintes

- natildeo constituir violaccedilatildeo do dever de sigilo bancaacuterio a troca de informashyccedilotildees entre instituiccedilotildees financeiras para fins cadastrais inclusive por intermeacuteshydio de centrais de risco o que possibilita o conhecimento da vida financeira privada do cidadatildeo por vaacuterias pessoas sem desempenho de autoridade na instituiccedilatildeo independentemente de ser justificada com antecedecircncia a causa desse atuar

- o de serem fornecidos dados relativos a fornecimentos de informashyccedilotildees cadastrais de emitentes de cheques sem provisatildeo de fundos a entidades privadas de proteccedilatildeo ao creacutedito sem qualquer avaliaccedilatildeo por qualquer autorishydade da causa determinante do fato a quebra do sigilo bancaacuterio na fase do inqueacuterito por inexistir nessa ocasiaacuteo qualquer contraditoacuterio e respeito ao prinshyciacutepio do devido processo legal

Quanto agraves demais situaccedilotildees constantes na lei complementar que autorishyzam a quebra do sigilo bancaacuterio naacuteo obstante algumas serem absolutamente necessaacuterias haacute de serem vistas em compatibilidade com as garantias constitushycionais conforme jaacute assinalado

O colendo Supremo Tribunal pronunciaraacute como guarda e inteacuterprete maishyor da Carta Magna em ADln jaacute intentada sobre a constitucionalidade ou natildeo dos dispositivos supramencionados

Em campo doutrinaacuterio valoriza-se as posiccedilotildees apresentadas quando da resposta oferecida aos questionamentos anteriores todas acenando pela neshycessidade do controle do Poder Judiciaacuterio

7 Sistema mais justo para a quebra do sigilo bancaacuterio

Os organizadores do JII Coloacutequio Internacional de Direito Tributaacuterio subshymetem agora para anaacutelise a questatildeo do teor seguinte Um sistema em que o Poder Judiciaacuterio torna-se aacuterbitro dos pedidos da Administraccedilatildeo Puacuteblica para quebra do sigilo eacute o mais justo

Em um Estado que por imposiccedilatildeo de sua proacutepria Constituiccedilatildeo estaacute comprometido com a guarda e aplicaccedilatildeo efetiva de princiacutepios democraacuteticos especialmente o de respeitar os direitos e garantias fundamentais da cidadashynia natildeo haacute ambiente para que seja outorgado ao Poder Executivo por via da atuaccedilatildeo de agentes puacuteblicos fiscais o acesso sem o controle do Poder Judiciaacuteshyrio agraves informaccedilotildees bancaacuterias do contribuinte

ENSAIOS JURiacuteDICOS 255

o sigilo bancaacuterio por ser um direito fundamental que exige ser respeitashydo pela supremacia constitucional que o protege deve submeter a possibilishydade de sua quebra para fins tributaacuterios ao Poder Judiciaacuterio pela ausecircncia de interesse direto nos resultados da accedilatildeo fiscalizadora que eacute o recolhimento do tributo e pelas garantias de independecircncia prudecircncia e qualificaccedilatildeo juriacutedica que revestem esse poder

A atuaccedilatildeo da fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo pode ser exercida fora dos limishytes da legalidade imposta a partir da Carta Magna e demais imposiccedilotildees legais a ela subordinadas

Natildeo se desconhece que no atual Estado fiscal os tributos constituem os meios financeiros determinantes para o atendimento dos compromissos da Administraccedilatildeo Puacuteblica com as obrigaccedilotildees oriundas em decorrecircncia de sua atividade no campo educacional social de seguranccedila puacuteblica interna e extershyna da sauacutede da manutenccedilatildeo dos Poderes ou seja para manter funcionando a maacutequina estatal

Por natildeo entremostrar-se na eacutepoca contemporacircnea qualquer outra alshyternativa viaacutevel para transformar o Estado fiscal em um Estado produtivo os tributos passam a representar um indeclinaacutevel dever da cidadania cujo cumshyprimento deve ser por todos honrado conforme assinala Joseacute Casalta Nabais Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra em artigo intitulado Algumas Reflexotildees sobre o Actual Estado Fiscal

Por isso os impostos hatildeo de constituir um preccedilo aceitaacutevel ou seja um preccedilo limitado Um preccedilo que estou certo muitas das sociedashydes que nos antecederam gostariam de ter pago e algumas das actuais natildeo enjeitariam suportar Por isso bem podemos afirmar como jaacute o fizeshymos noutro lugar que no actual Estado fiscal para o qual natildeo se vislumshybra qualquer alternativa viaacutevel pelo menos nos tempos mais proacuteximos os impostos constituem um indeclinaacutevel dever de cidadania cujo cumshyprimento a todos nos deve honrar

A atuaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio para liberar o bloqueio fortalece a conshyfianccedila do cidadatildeo no procedimento da fiscalizaccedilatildeo e consagra a ideacuteia iacutensita em qualquer regime democraacutetico de que a atuaccedilatildeo do Estado tem limites

Na espeacutecie os limites impostos satildeo os decorrentes da quebra do sigilo ser necessaacuterio em face da possiacutevel ilicitude cometida pelo cidadatildeo poreacutem sem ser violados os direitos do cidadatildeo de gozar da sua privacidade e da sua intimidade

A denominada cidadania fiscal haacute de ser considerada de modo conjunshytural com os reflexos dos direitos fundamentais assegurados ao contribuinte sem prestigiar a responsabilidade que tem o Estado de promover a arrecadashyccedilatildeo dos tributos

256 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

Cedo espaccedilo para registrar que a cidadania fiscal deve configurar um estado de relaccedilatildeo juriacutedica em que todos suportem a concretizaccedilatildeo de um Estado em que todos tenham a qualidade de destinataacuterio do dever fundashymentaI de pagar impostos na medida da respectiva capacidade contributiva poreacutem que seja um Estado fiscal suportaacutevel isto eacute um estado cujo sistema fiscal se encontre balizado por estritos limites juriacutedico-constitucionais9

A Administraccedilatildeo Tributaacuteria por melhor que seja a sua estrutura e os seus propoacutesitos natildeo estaacute emocionalmente preparada para conceber e aplicar os princiacutepios que sustentam a cidadania fiscal Isso ocorre primeiramente porshyque o Fisco tem por missatildeo exclusiva exercer a funccedilatildeo de arrecadar tributos Eacute a sua meta essencial por ser atribuiccedilatildeo que na organizaccedilatildeo administrativa estatal estaacute obrigado a desempenhar Natildeo lhe cabe administrar o tributo arreshycadado limitando-se unicamente a envidar esforccedilos para o cumprimento das metas impostas para imprimir aumento na arrecadaccedilatildeo tributaacuteria O sucesso da Administraccedilatildeo Tributaacuteria eacute medido pelo maior volume de recursos fiscais atraiacutedos para os cofres do Governo nunca pelo respeito que exerccedila para com os direitos fundamentais do contribuinte Eacute uma questatildeo de cultura adminisshytrativa de distribuiccedilatildeo de funccedilotildees no sistema estatal impossiacutevel de ser mudashydo por sugestotildees doutrinaacuterias

Por outro lado a fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo consegue afastar as pressotildees exercidas sobre ela por determinados segmentos da organizaccedilatildeo estatal que defendem uma atuaccedilatildeo mais agressiva para a cobranccedila dos tributos tudo em decorrecircncia dos efeitos produzidos pela conduta iliacutecita marcante da sonegashyccedilatildeo fiscal

Esses fatores contribuem para que a fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo tenha condiccedilotildees de modo imparcial sem isenccedilatildeo avaliar a necessidade objetiva da quebra do sigilo bancaacuterio do cidadatildeo Por melhor que seja o seu desempenho nunca ganharaacute a confianccedila do contribuinte

A atribuiccedilatildeo da quebra do sigilo bancaacuterio em um regime democraacutetico onde predomina o respeito maior aos direitos fundamentais da cidadania deve ser exercido pelo Poder Judiciaacuterio natildeo soacute porque seus membros atualmente revestidos da garantia da vitaliciedade inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos bem como porque estatildeo revestidos de independecircncia absoluta em relaccedilatildeo ao Poder interessado na cobranccedila do tributo e consequumlentemenshyte no resultado a ser obtido pela accedilatildeo fiscal

Esse sistema misto onde o Fisco faz a solicitaccedilatildeo motivada para a queshybra do sigilo bancaacuterio ao Poder Judiciaacuterio e este apoacutes analisaacute-lo com objetivishydade e cautela defere ou indefere impotildee seguranccedila e confiabilidade na atuashyccedilatildeo fiscal e sublima o respeito agrave dignidade do contribuinte em outras palavras da cidadania fiscal isto eacute de uma cidadania de liberdade que o Estado fiscal

9 Joseacute Casalta Nabais (Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra) no artigo Algumas Reflexotildees sobre o Actual Estado Fiscal no site httpagugovbr

ENSAIOS JURiacuteDICOS 257

pressupotildee para natildeo ser postergada impotildee um sistema fiscal balizado por esshytritos limites juriacutedico-constitucionais Limites esses que integram a chamada constituiccedilatildeo fiscal e que podemos reconduzir para natildeo nos alongarmos nesse aspecto a duas ideacuteias uma ideacuteia de seguranccedila que tem o seu tradicional e principal suporte no princiacutepio da lega1idade fiscal e uma ideacuteia de justiccedila ou equumlidade que tem a ver com a medida dos impostos e assenta no princiacutepio da capacidade contributiva 10

Em conclusatildeo a adoccedilatildeo de um sistema para a quebra do sigilo bancaacuteshyrio em que o Poder Judiciaacuterio seja o aacuterbitro dos pedidos da Administraccedilatildeo Puacuteblica natildeo eacute somente mais justo mas consegue impor maior credibilidade agrave atuaccedilatildeo fiscal e presta homenagem com intensa potencialidade aos princiacuteshypios democraacuteticos consistentes na guarda da seguranccedila juriacutedica do respeito aos direitos fundamentais do cidadatildeo nesse rol incluidos os agrave privacidade e agrave intimidade Aleacutem disso torna mais respeitaacutevel a relaccedilatildeo entre Fisco e contrishybuinte justificando portanto a opccedilatildeo do Estado pelo regime democraacutetico

8 Autoridade fiscal e faculdade incondicionada de quebrar o sigilo bancaacuterio

Essa indagaccedilatildeo consubstancia a preocupaccedilatildeo de serem estabelecidos controles para a atuaccedilatildeo do agente puacuteblico fiscal Centra-se a preocupaccedilatildeo em imprimir nas relaccedilotildees juriacutedicas tributaacuterias de quaisquer espeacutecies o primashydo da legalidade aprimorando-se o atuar vinculado

Natildeo concilia-se com os postulados da democracia a adoccedilatildeo de um sisteshyma de fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria que outorgue faculdade incondicionada ao fiscal tributaacuterio de invadir a intimidade e a privacidade das pessoas sob o falso argushymento juriacutedico de que busca encontrar provas de sonegaccedilatildeo fiscal

Depreende-se do exposto que a autoridade fiscal natildeo deve ter faculdade incondicionada de quebrar o sigilo sempre que entender necessaacuterio Isso porshyque a praacutetica de atos administrativos por agentes puacuteblicos de modo incondicionado revela grave violaccedilatildeo ao princiacutepio da legalidade onde predoshymina a vontade da lei e natildeo o discricionarismo de quem o pratica

No trato do sigilo bancaacuterio o atuar incondicionado da fiscalizaccedilatildeo assushyme caracteriacutesticas de maior gravidade porque haacute violaccedilatildeo aos princiacutepios funshydamentais jaacute expostos e que satildeo prestigiados pela Carta Magna especialmenshyte por bater de frente de modo integral e absoluto com o direito agrave intimidade e agrave privacidade O atuar deve vincular-se rigidamente ao princiacutepio da legalidashyde especialmente aposta na Carta Magna sem a possibilidade de ser aberto qualquer canal para uso da conveniecircncia ou da oportunidade

Eacute de ser lembrada no trato do assunto a liccedilatildeo de Joseacute Casalta Nobais no trabalho jaacute citado no sentido de que Eacute certo que independentemente da

10 Idem p 15

=258=---___________________ SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTlCA

concepccedilatildeo a que se adira relativamente ao segredo bancaacuterio natildeo temos a menor duacutevida de que o acesso da Administraccedilatildeo Fiscal agrave informaccedilatildeo bancaacuteria seja directo sem necessidade de preacutevia decisatildeo judicial seja indirecto depois portanto de preacutevia decisatildeo judicial haacute de ter sempre uma natureza claramenshyte excepcional Na verdade constitua o segredo bancaacuterio uma manifestaccedilatildeo do direito fundamental agrave reserva da intimidade da vida privada constante do art 26 n 2 da Constituiccedilatildeo portuguesa ou suporte um outro direito fundashymentai um direito agrave reserva da vida privada anaacutelogo agravequele a sua afectaccedilatildeo teraacute sempre caraacuteter excepcional

A autoridade fiscal natildeo possui a necessaacuteria isenccedilatildeo e competecircncia institucional para averiguar o grau dessa excepcionalidade de modo que posshysa impor confianccedila ao cidadatildeo investido na condiccedilatildeo de contribuinte poreacutem com direitos a serem assegurados por forccedila do regime democraacutetico adotado

O certo eacute que na relaccedilatildeo juriacutedico-tributaacuteria deve ser buscado o justo equiliacutebrio pregado pelo Estado de Direito onde o cidadatildeo deve ter a sua dignishydade respeitada sem contudo afastar-se a necessidade do Estado arrecadar tributos de forma cogente e imperativa bem como de serem permitidas conshydiccedilotildees de atuaccedilatildeo que resultem no combate agrave sonegaccedilatildeo fiscal

9 Responsabilidade da autoridade administrativa que quebrar o sigilo banshycaacuterio de forma inconsistente e indevida

Eacute inerente ao regime democraacutetico que a autoridade administrativa puacuteblishyca estaacute obrigada a exercer as suas atribuiccedilotildees com rigorosa obediecircncia aos princiacutepios da legalidade moralidade publicidade impessoalidade e eficiecircncia entre outros

A Carta Magna consagra expressamente no art 37 a obediecircncia do agente puacuteblico a esse tipo de comportamento

A autoridade administrativia que quebrar de modo inconsistente e indevido o sigilo bancaacuterio do cidadatildeo pratica ato com capacidade de provocar os seguintes efeitos a) de invadir o direito agrave privacidade e agrave intimidade de algueacutem b) de provocar-lhe danos morais e materiais dependendo da repershycussatildeo provocada pelo seu atuar

Constatada a efetivaccedilatildeo real de danos morais e materiais a responsabishylidade do Estado pode ser acionada conforme permite o art 37 sect 6ordm da Consshytituiccedilatildeo Federal Solidificada a culpa ou dolo do agente puacuteblico e consagrada a materializaccedilatildeo do iliacutecito praticado com o consequumlente ressarcimento patrimonial o Estado deveraacute usando o direito de regresso investir contra o agente que agiu culposa ou dolosamente

Natildeo resume-se apenas ao campo da responsabilidade civil a atuaccedilatildeo da autoridade quando ilegalmente quebra o sigilo bancaacuterio de qualquer cidadatildeo

ENSAIOS JURiacuteDICOS 259

o art 10 da Lei Complementar n 105 de 10 de janeiro de 2001 determishyna que A quebra de sigilo fora das hipoacuteteses autorizadas nesta lei compleshymentar constitui crime e sujeita os responsaacuteveis agrave pena de reclusatildeo de um a quatro anos e multa aplicando-se no que couber o Coacutedigo Penal sem prejuiacuteshyzo de outras sanccedilotildees cabiacuteveis A seguir no seu paraacutegrafo uacutenico explicita que Incorre nas mesmas penas quem omitir retardar injustificadamente ou presshytar falsamente as informaccedilotildees requeridas nos termos desta lei complementar

O art 11 da mesma lei complementar expressa que O servidor puacuteblico que utilizar ou viabilizar a utilizaccedilatildeo de qualquer informaccedilatildeo obtida em decorshyrecircncia da quebra de sigilo de que trata esta lei complementar responde pessoshyal e diretamente pelos danos decorrentes sem prejuiacutezo da responsabilidade objetiva da entidade puacuteblica quando comprovado que o servidor agiu de acorshydo com a orientaccedilatildeo oficial

10 O sigilo bancaacuterio e o tratamento que lhe eacute dado por oacutergatildeos internacioshynais como a OCDE e outros

Rui Celso Reali Fragoso Presidente do Instituto dos Advogados de Satildeo Paulo em artigo intitulado O Sigilo Bancaacuterio veiculado pela Internet (http Ii wwwjuscombr) registra que atualmente temos trecircs sistemas legais no munshydo cuidando do sigilo bancaacuterio O primeiro eacute o anglo-saxatildeo em que o sigilo natildeo encontra amparo legal o segundo eacute o dos paiacuteses da Europa continental - eu o contemplo em vaacuterios diplomas legais o terceiro eacute o da Suiacuteccedila e do Liacutebano que o reforccedilam

Analisando esses trecircs sistemas o autor citado observa

Haacute aparente contradiccedilatildeo no sistema inglecircs e norte-americano pois se de um lado nestes paiacuteses se eleva a garantia das liberdades individuais de outro se despreza o sigilo bancaacuterio Eacute que se ocorre conshyflito entre a apuraccedilatildeo de fatos (fator social) e a privacidade das pessoas (fator individual) prevalece a primeira Mais ainda o relacionamento de clientes e bancos longe de estabelececirc-lo serve como fonte de informashyccedilatildeo em favor de terceiros a indiscriccedilatildeo injustificada poreacutem eacute objeto de sanccedilatildeo E na Inglaterra os poderes puacuteblicos natildeo intervecircm no funcionashymento dos estabelecimentos privados de creacutedito o que debilita a invesshytigaccedilatildeo

Nos paiacuteses da Europa continental a legislaccedilatildeo contempla o sigilo bancaacuterio como consequumlecircncia do profissional e comporta derrogaccedilotildees na esfera penal e em alguns casos na civil mas comina sanccedilotildees crimishynais no caso de violaccedilatildeo ao sigilo (Coacutedigo Penal francecircs artigo 378 Coacuteshydigo Penal italiano art 622)

260 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

A sistemaacutetica fortalecida eacute aquela utilizada na Suiacuteccedila decorrente da crise ocorrida em 1931 com o fechamento do Banco de Genebra que ensejou a ediccedilatildeo de lei estabelecendo severas puniccedilotildees de natureza civil e criminal Tanto a legislaccedilatildeo suiacuteccedila como a libanesa esta surgida em 1956 permitem derrogaccedilotildees em certas hipoacuteteses A existecircncia das conshytas numeradas comprova a importacircncia do sigilo nestes paiacuteses

Eacute certo natildeo ser absoluto o segredo nem sua quebra em determishynadas situaccedilotildees significa abuso de poder Aliaacutes nenhum direito eacute absoluto

A doutrina tem ultimamente tomado conhecimento sobre as transforshymaccedilotildees que tem passado em vaacuterios ordenamentos juriacutedicos a questatildeo do sigilo bancaacuterio

Zenobio Simotildees de Melo advogado no Paranaacute em artigo sob o tiacutetulo Quebra do Sigilo Bancaacuterio (Internet httpjuscombr) informa que o jornal O Estado de Satildeo Paulo de 21 de junho de 2000 publicou a notiacutecia seguinte

Numa das mais importantes decisotildees adotadas durante o Conseshylho Europeu que marca o fim da presidecircncia portuguesa da Uniatildeo Euroshypeacuteia (UE) seus 15 paiacuteses aprovaram ontem o pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal No ponto mais polecircmico o pacote deveraacute acabar com o sigilo bancaacuterio ateacute 2010 foi uma negociaccedilatildeo de 12 anos Aacuteustria e Luxemburgo natildeo aceitavam o princiacutepio de acabar com o sigilo bancaacuterio A justificativa austriacuteaca eacute que este eacute um princiacutepio que faz parte da Consshytituiccedilatildeo do paiacutes haacute 200 anos Para aceitar o acordo o paiacutes exigiu a manushytenccedilatildeo do sigilo nos bancos austriacuteacos para quem resida no paiacutes

Registro a iacutentegra da notiacutecia

Pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal eacute aprovado por membros da UE Decisatildeo prevecirc quebra do sigilo bancaacuterio nos paiacuteses do bloco econocircmico

Jair Rattner

Especial para o Estado

Santa Maria da Feira Portugal- Numa das mais importantes decishysotildees adotadas durante o Conselho Europeu que marca o fim da presishydecircncia portuguesa da Uniatildeo Europeacuteia (UE) seus 15 paiacuteses aprovaram ontem o pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal No ponto mais polecircmico o pashycote deveraacute acabar com o sigilo bancaacuterio ateacute 2010

Foi uma negociaccedilatildeo de 12 anos Agora temos um documento que vai estabelecer os princiacutepios e as orientaccedilotildees para as futuras diretivas nessa aacuterea afirmou o Primeiro-Ministro Portuguecircs Antonio Guterres que ocupa a presidecircncia rotativa da UE (no fim do mecircs ela seraacute transferida para a Franccedila)

ENSAIOS JURiacuteDICOS 261

o acordo abrange trecircs aacutereas um coacutedigo de conduta que prevecirc o desmantelamento dos 66 paraiacutesos fiscais existentes ou dependentes da UE a tributaccedilatildeo de royalties e o pagamento de impostos sobre rendishymentos das poupanccedilas de cidadatildeos europeus residentes em outros paiacuteshyses dentre os 15 que fazem parte do bloco econocircmico europeu

O grande problema eram as poupanccedilas Aacuteustria e Luxemburgo natildeo aceitavam o princiacutepio de acabar com o sigilo bancaacuterio A justificativa austriacuteaca eacute que este eacute um princiacutepio que faz parte da Constituiccedilatildeo do paiacutes haacute 200 anos Para aceitar o acordo o paiacutes exigiu a manutenccedilatildeo do sigilo nos bancos austriacuteacos para quem resida no paiacutes Essa questatildeo natildeo eacute importante soacute para a Europa porque abre caminho para a criaccedilatildeo de mecanismos de transparecircncia global no mundo financeiro que satildeo esshysenciais para a globalizaccedilatildeo da economia avaliou Guterres

O prazo para a introduccedilatildeo das mudanccedilas vai ateacute o fim de 2010 Ateacute o fim deste ano as negociaccedilotildees vatildeo ser sobre a definiccedilatildeo do conteuacutedo das diretivas (as normas da UE)

Em 2002 a UE discutiraacute com outros paiacuteses esses conteuacutedos para fazer acordos que deveratildeo ser aprovados ateacute o fim do ano por unanimishydade

A partir de 2003 seraacute iniciado um periacuteodo de sete anos de transishyccedilatildeo para a troca de informaccedilotildees sobre os investimentos de cidadatildeos de outros paiacuteses europeus Nesse periacuteodo alguns paiacuteses poderatildeo optar por cobrar impostos de 20 a 25 sobre os rendimentos dos investimentos de residentes no exterior

No capiacutetulo onde foi analisado o sigilo bancaacuterio no Direito Comparado haacute registros tambeacutem a respeito do tratamento que oacutergatildeos internacionais como o OCDEll e outros vecircm dando ao sigilo bancaacuterio conforme estudo que foi apresentado pelo autor ali citado

II OCDE (Organizaccedilatildeo de Cooperaccedilatildeo e Desenvolvimento Econocircmico) criado em 1961 para substituir a OECE (Comitecirc Fiscal da Organizaccedilatildeo Europeacuteia de Cooperaccedilatildeo Econocircmica) Um dos documentos mais importantes da OCDE eacute o resultante da sua Convenccedilatildeo-Modelo relashytiva a impostos sobre a renda e o capital Essa Convenccedilatildeo estaacute sistematizada em sete capiacutetulos assim explicitados por Alberto Xavier em sua obra Direito Tributaacuterio Internacioshynal do Brasil A Convenccedilatildeo-Modelo da OCDE (tal como a das Naccedilocirces Unidas) encontra-se sistematizada em sete capiacutetulos Os capiacutetulos I e I regulam os requisitos para a aplicaccedilatildeo do tratado O capiacutetulo [JI - de longe o mais importante - conteacutem as regras de distribuiccedilatildeo de competecircncia no que concerne aos impostos sobre o rendimento classificado este por tipos ou classes agrave semelhanccedila do que sucede nos sistemas de tributaccedilatildeo cedular O capiacutetulo IV ocupa-se das regras de distribuiccedilatildeo de competecircncia no que respeita aos impostos sobre o capital O capiacutetulo V determina as consequumlecircncias das regras dos capiacutetulos 111 e IV facultanshydo aos Estados a escolha entre os meacutetodos da isenccedilatildeo e da imputaccedilatildeo O capiacutetulo VI conteacutem disposiccedilotildees adicionais sobre natildeo-discriminaccedilatildeo procedimento amigaacutevel troca de informaccedilotildees e privileacutegios de funcionaacuterios diplomaacuteticos e consulares e regras sobre extenshysatildeo do tratado a partes do territoacuterio Enfim o capiacutetulo VII conteacutem disposiccedilotildees finais sobre entrada em vigor e cessaccedilatildeo do acordo

262 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

Heleno Torres em sua recente obra Direito Tributaacuterio Internacional -Planejamento Tributaacuterio e Operaccedilotildees Transnacionais RT p 147 analisando o posicionamento da OCDE referente agrave poliacutetica de determinados paiacuteses que adoshytam tributaccedilatildeo favorecida e os efeitos dos regimes fiscais prejudiciais registra que

A OCDE resolveu entrar na luta para minorar as praacuteticas fiscalshymente danosas insistindo sobre a necessidade de aumentar as trocas de informaccedilotildees entre os Estados aleacutem de redigir uma lista de paiacuteses com tributaccedilatildeo favorecida e fazer algumas recomendaccedilotildees em acircmbito nacional e convencional a partir do seu importante relatoacuterio Harmful tax competition na emerging global issue

Mesmo reconhecendo os aspectos positivos do ambiente global vigente no qual os sistemas tributaacuterios operam os paiacuteses-membros da OCDE concluiacuteram que eles precisavam agir para restringir a competiccedilatildeo tributaacuteria danosa coletivamente e individualmente opondo-se agrave expanshysatildeo de regimes de impostos preferenciais danosos particularmente nos setores financeiros e atividades de serviccedilo que podem causar distorccedilotildees no comeacutercio e desniacuteveis nos padrotildees de investimento sendo uma ameashyccedila para os sistemas tributaacuterios domeacutesticos e para a estrutura global de tributaccedilatildeo internacional

Mais adiante pp 152153 Heleno Torres afirma que

Entre as recomendaccedilotildees definidas nesse relatoacuterio com aplicashyccedilatildeo dirigida aos paiacuteses-membros da instituiccedilatildeo as mais importantes satildeo as seguintes

bull para contrastar a competiccedilatildeo fiscal prejudicial os paiacuteses devem revisar as suas leis regulamentos e praacuteticas sobre sigilo bancaacuterio para remover empecilhos de acesso a tais informaccedilotildees por autoridades fiscais

bull intensificar o uso de trocas de informaccedilotildees principalmente soshybre as transaccedilotildees com paiacuteses de tributaccedilatildeo favorecida

A conclusatildeo que pode ser firmada apoacutes anaacutelise dos pronunciamentos internacionais acima explicitados eacute a construccedilatildeo de uma corrente que defenshyde uma maior abertura para a quebra do sigilo bancaacuterio quando for necessaacuteshyrio para apurar iliacutecitos tributaacuterios

Essa portanto eacute a resposta que apresento para a indagaccedilatildeo Qual o tratamento proposto por oacutergatildeos internacionais como o OCDE e outros com relaccedilatildeo ao sigilo bancaacuterio

ENSAIOS JURiacuteDICOS 263

11 Compatibilizaccedilatildeo do combate agrave criminalidade internacional com o resshypeito agrave seguranccedila juriacutedica a fim de evitar a fuga de investimentos do Paiacutes

Haacute de se reconhecer natildeo ser faacutecil desenvolver-se um sistema juriacutedico que contenha regras que facilitem o combate agrave criminalidade internacional e ao mesmo tempo prestigie os direitos fundamentais do cidadatildeo especialmenshyte a sua seguranccedila juriacutedica

As convenccedilotildees internacionais conforme demonstrado estatildeo preocupashydas com esses aspectos sem deixar de lado os fenocircmenos causados pela globalizaccedilatildeo

Natildeo deve ser esquecido que o tema envolve aspectos diversos a comeshyccedilar pelos determinantes da soberania dos Estados das forccedilas em expansatildeo das organizaccedilotildees internacionais e da pregaccedilatildeo para que os direitos fundamenshytaIacutes do cidadatildeo sejam respeitados com maior Iacutentensidade

A soluccedilatildeo a meu pensar pode ser encontrada no fortalecimento do Direito Comunitaacuterio Os Estados por via de organismos internacionais firmashyriam tratados para a adoccedilatildeo de um Coacutedigo Processual Penal Internacional com efeitos vinculantes por parte das naccedilotildees onde seriam adotadas regras investigatoacuterias e apuratoacuterias dos iliacutecitos internacionais alargando os conceitos de indiacutecios e presunccedilotildees sem deixar contudo de prestigiar a afetividade dos direitos e garantias fundamentais do cidadatildeo

Todas as naccedilotildees no iniacutecio deste seacuteculo envidam esforccedilos para diminuir a crise da seguranccedila juriacutedica Satildeo vaacuterios os fatores determinantes todos tendo como causa comum o crescimento da delinquumlecircncia em decorrecircncia de poliacutetishycas econocircmicas e sociais adotadas por determinados governos que contrishybuem para aumentar o percentual de pessoas pobres

A preocupaccedilatildeo atual para o combate ao crime internacional eacute alcanccedilar niacutevel de uniformizaccedilatildeo dos sistemas adotados para a quebra do sigilo bancaacuteshyrio De iniacutecio deve ser defendida a postura de que nenhuma lesatildeo ou ameaccedila a direito deve ser excluiacuteda da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio Nessa perspectishyva ganha suma importacircncia a criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional em virshytude de pela sua atuaccedilatildeo natildeo perdurar a diversidade de sistemas legais a respeito do assunto a saber a) O anglo-saxatildeo onde o sigilo natildeo encontra amparo legal b) o dos paiacuteses da Europa continental que o contempla em vaacuterios diplomas escritos e c) o da Suiacuteccedila e do Liacutebano que o reforccedilam l2bull

A criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional envolve uma reconceiacutetuaccedilatildeo de soberania

Sobre o tema Celso D de Albuquerque Mello em Direito Internacional da Integraccedilatildeo Ed Renovar p 13 faz a seguinte observaccedilatildeo

12 Conforme anota Rui Celso Reali Fragoso no artigo O Sigilo Bancaacuterio publicado no site httpvvwwjuscombr

264 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Poder-se-ia fazer um pequeno reparo a Chaumont que a indeshypendecircncia nacional eacute um conceito juridicamente indeterminado e que ela pode ter diferentes graus Tanto que podemos escrever soberania versus cooperaccedilatildeo internacional apesar de reconhecermos que esta posiccedilatildeo pode ser considerada como radical vez que natildeo haacute uma total incompatibilidade entre as duas Entretanto natildeo se pode deixar de consshytatar que de certo modo a cooperaccedilatildeo internacional se encontra conshysagrada na Carta da ONU no arl 1 ordm que trata dos Propoacutesitos das Naccedilotildees Unidas e nos Princiacutepios estabelecidos na Carta da OEA (Capiacutetulo 11) O mesmo ocorre na resoluccedilatildeo da Assembleacuteia Geral da ONU de 1970 que aprova a Declaraccedilatildeo Relativa aos Princiacutepios do Direito Internacional Reshylativas agraves Relaccedilotildees Amigaacuteveis e agrave Cooperaccedilatildeo entre os Estados conforme a Carta das Naccedilotildees Unidas bem como na Carta de Direitos e Deveres Econocircmicos aprovada pela mesma Assembleacuteia Geral em 1974

O crescimento do crime internacional em decorrecircncia dos fenocircmenos globalizantes determina o surgimento de um dever juriacutedico dos Estados firmashyrem pactos de cooperaccedilatildeo entre si para que enfrentem as organizaccedilotildees voltashydas para a criminalidade Esse dever juriacutedico globalizado tem suas raiacutezes no moral intemacional que conforme assinala Celso Albuquerque Mello na obra citada p 13 sempre consagrou o princiacutepio da solidariedade ou ainda do auxiacutelio muacutetuo

Eacute o mais importante desafio neste iniacutecio de seacuteculo fazer com que surja uma legislaccedilatildeo internacional que compatibilize o combate agrave criminalidade inshyternacional sem violar a seguranccedila juriacutedica com finalidade exclusiva de evitar a fuga de investimenos do Paiacutes

Tenha-se contudo em consideraccedilatildeo que a globalizaccedilatildeo do crime emshybora seja uma grande ameaccedila aos valores tradicionais que sustentam a cidashydania especialmente a seguranccedila juriacutedica natildeo deve prejudicar o desenvolvishymento econocircmico de qualquer naccedilatildeo

Natildeo faccedilo coro ao assinalado por Eric Hobsbawm em sua obra Era dos Extremos O Breve Seacuteculo XX 1914-1991 1995 p 24 Companhia das Letras S Paulo traduccedilatildeo de Marcos Santarrita no sentido de que Talvez a caracteriacutesshytica mais impressionante do fim do seacuteculo XX seja a tensatildeo entre esse processo de globalizaccedilatildeo cada vez mais acelerado e a incapacidade conjunta das instishytuiccedilotildees puacuteblicas e do comportamento coletivo dos seres humanos de se acoshymodarem a ele

Penso que natildeo haacute essa acomodaccedilatildeo e que as instituiccedilotildees puacuteblicas espeshycialmente as submetidas ao controle da ciecircncia juriacutedica natildeo estatildeo incapacitashydas de encontrar caminhos que solucionem o problema existente

ENSAIOS JURiacuteDICOS 265

Eacute por demais positivo entre outros acontecimentos o fato da conscienshytizaccedilatildeo de que haacute de ser encontrada uma forma de combate agrave criminalidade internacional que natildeo afaste a garantia da seguranccedila juriacutedica Esta eacute uma neshycessidade para impor paz agrave naccedilatildeo e consequumlentemente criar ambiente para que novos investimentos necessaacuterios ao desenvolvimento do seu processo econocircmico aconteccedilam sem se falar na manutenccedilatildeo dos jaacute existentes

O Parlamento Europeu aprovou ultimamente uma resoluccedilatildeo sobre a criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional sob a consideraccedilatildeo de que eacute necessaacuteshyrio criaacute-lo de forma permanente para complementar os sistemas judiciais nashycionais e pocircr fim agrave impunidade de que gozam os responsaacuteveis por genociacutedio crimes contra a humanidade e crimes de guerra

A abertura para essa posiccedilatildeo denota a formaccedilatildeo de uma consciecircncia internacional para combater a criminalidade internacional em todos os niacuteveis contribuindo para fortalecer a seguranccedila juriacutedica interna de cada paiacutes

O documento representativo dessa resoluccedilatildeo eacute do teor seguinte

Parlamento Europeo

Resolucioacuten sobre el Tribunal Penal Internacional

EI Parlamento Europeo

Vistas sus anteriores resoluciones sobre un Tribunal Penal Interna-cional

A Considerando que es necesario crear un Tribunal Penallnternashycional permanente que complemente los sistemasjudiciales nacionales y ponga fin a la impunidad de que gozan los responsables de genocidio crimenes contra la humanidad y criacutemenes de guerra

B Considerando que la Comisioacuten de Derechos Humanos de las Naciones Unidas estaacute respaldando decididamente la creacioacuten de ese Trishybunal

C Considerando que la fase preparatoria de la creacioacuten dei Tribushynal Penal Internacional finalizoacute con la uacuteltima sesioacuten dei Comiteacute Preparatorio de las Naciones Unidas que tuvo lugar dei 16 de marzo al3 de abril de 1998

D Felicitaacutendose por la creciente participacioacuten de Estados en el proceso de negociaciones y esperando que un nuacutemero auacuten mayor de Esshytados procedentes de todas las regiones se encuentre plenamente represhysentado en la Conferencia Diplomaacutetica de Roma

E Considerando que dei 15 de junio al17 de julio de 1998 se celebra en Roma la Conferencia Diplomaacutetica de Plenipotenciarios para la constitucioacuten de un Tribunal Penal Internacional

266 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

F Considerando que los Estados miembros y la delegacioacuten de la Comisioacuten Europea que participan en la Conferencia Diplomaacutetica de Roma pueden desempenar un papel crucial a la hora de garantizar el eacutexito de la conclusioacuten de esta Conferencia Diplomaacutetica y acogiendo positivamente la mayor convergenciacutea de las posturas de los Estados miembros de la UE

G Congratulaacutendose por la oferta dei Gobierno de los Paiacuteses Bajos de servir de sede dei Tribunal Penal Internacional permanente

I Insta a la Conferencia Diplomaacutetica de Roma a aprovechar la oportunidad histoacuterica de concluir un texto de Estatuto para un Tribunal Penal Internacional independiente justo y eficaz

2 Insta a los representantes de los Estados miembros dei Consejo y de la Comisioacuten a garantizar activamente el ecircxito de los resultados a sashyber un auteacutentico Tribunal Penal Internacional en lugar de limitarse a un acuerdo de compromiso sobre principios esenciales en sus esfuerzos por conciliar las posturas de Estados reticentes

3 Destaca que para constituir un complemento eficaz de los sisteshymas judiciacuteales nacionales el Estatuto dei Tribunal Penal Internacional permanente objeto de la Conferencia de Roma deberaacute establecer

a un Fiscal independiente con competencias para investigare insshytruir sumarios por propia iniciativa en situaciones en las que se hayan cometido los delitos sometidos a lajurisdiccioacuten dei Tribunal

b Ia jurisdiccioacuten inherente y universal dei Tribunal en materia de genocidio criacutemenes contra la humanidad criacutemenes de guerra y agresioacuten sin que se requiera ninguacuten consentimiento dei Estado

c una buena relacioacuten de trabajo con los Tribunales lnternacionales ya establecidos en La Haya

d una relacioacuten constructiva con las Naciones Unidas yen partishycular con el Consejo de Seguridad basada en el pleno reconocimiento de sus respectivas funciones y competencias

e Ia obligacioacuten de los Estados firmantes de acatar y hacer cumplir sin demora las oacuterdenes y decisiones dei Tribunal

f los mayores niveles de respeto de los derechos de los acusados y de los sospechosos y de proteccioacuten de los intereses de las viacutectimas y de los testigos

g Ia garantiacutea de una financiacioacuten a largo plazo necesaria para asegurar la autonomiacutea e independencia dei Tribunal frente a cualquier presioacuten exterior

4 Destaca ademaacutes que la jurisdiccioacuten deI Tribunal sobre los delishytos de genociacutedio los criacutemenes contra la humanidad y los criacutemenes de

ENSAIOS JURiacuteDICOS 267

guerra deben considerarse con la misma calificacioacuten penal con indepenshydencia de que se hayan cometido en conflictos armados internacionales o en conflictos internos

5 Insta ai Consejo y a los Estados miembros a garantizar la universalidad y la transparencia de las negociaciones y la participacioacuten continuada de la comunidadjuriacutedica y la sociedad civil internacionales

6 Encarga a su Presidente que transmita la presente resolucioacuten ai Consejo a la Comisioacuten a los Gobiernos de los Estados miembros ai Secreshytario General de las Naciones Unidas ai Presidente de la Asamblea Geneshyral de las Naciones Unidas y ai Presidente de la Conferencia Diplomaacutetica de las Naciones Unidas para la constitucioacuten de un Tribunal Penal Internashycional

A resoluccedilatildeo supracitada demonstra que cresce a conscientizaccedilatildeo da necessidade de ser criado um Tribunal Penal Internacional com forccedila cogente obrigatoacuteria de suas decisotildees no acircmbito interno dos paiacuteses que participarem do pacto de sua constituiccedilatildeo

A doutrina internacional revela que a comunidade internacional somenshyte agora vem se preocupando em criar uma estructura internacional para determinar las responsabilidades individuales emergentes de violacioacuten de ciertos derechos baacutesicos dei ser humano Los mecanismos de responsabilidad estatal creados desde los 60 se dirigen a la mayor protecciotilden dei ser humano y la erradicacioacuten de las praacutecticas de volacioacuten sistemaacutetica de los derechos humanos ar via de la condena ai Estado que ordena o que tolera los abusos por lo cual se estructuraron entorno ai Estado conmo sujeto responsable Como haacute seflalado la Corte Internacional de Derechos Humanos el procedimiento ante ella no es un procedimiento penal lo que se busca determinar es el nivel de cumprimiento por parte de un Estado de sus obligaciones de derecho internacional Sin desconocer la importancia de determinar la responsabilidad dei Estado para que eacuteste tenga un incentivo para erradicar esas praacutectica de sus frotneras es pertinente detacar que las violaciones maacutes grave son en uacuteltima instancia coshymetidas por individuos (Francisco Cox Encarregado dei TPI HOH em artigo intitulado EI IlOH ante la Craciotilden de um Tribunal Penal Internacional no site httpwwwiidhedcrcpitpintrohtml)

A criaccedilatildeo de um Tribunal Penal Internacional atuaria permanentemente e teria competecircncia subsidiaacuteria em relaccedilatildeo agrave outorgada aos Tribunais Nacioshynais limitando-se a atuar apenas nos crimes internacionais previamente defishynidos como sendo do interesse da comunidade global

Merece registro no acircmbito do assunto tratado que na Conferecircncia Reshygional sobre o Tribunal Penal Internacional realizada em 18 e 19 de fevereiro de 1998 na cidade de Guatemala Guatemala um dos temas tratados foi o relativo

268 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

agrave harmonizaccedilatildeo das incriminaccedilotildees quando os seguintes aspectos foram disshycutidos Branqueamento corrupccedilatildeo fraude fiscal participaccedilatildeo em associashyccedilotildees criminosas um olhar agrave luz dos direitos nacionais e do direito internacioshynal Perspectivas Quais os comportamentos a incriminar Criar uma nova incriminaccedilatildeo da fraude fiscal Uma tentativa de harmonizaccedilatildeo o corpus jurls contendo disposiccedilotildees penais para proteccedilatildeo dos interesses financeiros da Uniatildeo Europeacuteia As negociaccedilotildees no seio do Conselho da Europa e da OCDE referenshytes agrave luta contra a corrupccedilatildeo etc O referido painel foi presidido por Benoit Dejemeppe procurador do Rei em Bruxelas e contou com a presenccedila de Tereshyza Beleza professora de Direito Penal na Faculdade de Direito de Lisboa como moderadora

Haacute como visto um largo campo de anaacutelise para desenvolver com possishybilidade do surgimento de sugestotildees que levem a ciecircncia juriacutedica a alcanccedilar com a atuaccedilatildeo estatal uma competecircncia internacional que possa combater o crime internacional e ao mesmo tempo proporcione seguranccedila juriacutedica na ordem interna ganhando assim o sistema juriacutedico confianccedila dos investidoshyres

Em conclusatildeo a forma de compatibilizar o combate agrave criminalidade internacional sem violar a seguranccedila juriacutedica necessaacuteria a evitar a fuga de inshyvestimentos do paiacutes estaacute na criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional com comshypetecircncia definida para processar e julgar delitos globalizantes e cujas decisotildees tenham forccedila imperativa no acircmbito interno das naccedilotildees participantes do pacto para o seu nascimento

Page 15: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro

ENSAIOS JURiacuteDICOS 237

En este marco se inscribe la tendencia de la mayoda de las legislaciones modemas en cuanto a dotar aI Estado de facultades para intervenir en la actividad econoacutemica de los ciudadanos en procura de la correcta determinacioacuten de los tributos cuando se conshyfigura en el desarrollo de estas actividades un hecho gravado establecido en la ley

Ya la Constitucioacuten de Weimar en 919 proclamoacute que es liacutecito ai Estado intervenir para condicionar el ejercicio de los derechos a determinados fines sociales El bien comuacuten y la justicia social comenzaron desde entonces a servir de frontera a los derechos y Iibertades individuales

Cabe destacar que la OCDE (Organisation for Economic Cooperation and Development) en un documento elaborado en el ano 1999 sobre las praacutecticas de los paiacuteses en el acceso a la informacioacuten bancaria para fines tributarios advierte que se puede abusar de la confidencialidad para ocultar actividades iJegales y evadir impuestos y agrega en el resumen ejecutivo deI documento que ni la criminalizacioacuten dei fraude tributario ni el tratamiento de la evasioacuten de impuestos bajo las leyes tributarias de los paiacuteses miembros de la OCDE son homogeacuteneos pero que sin embargo los gobiernos de la mayoriacutea de los paiacuteses miembros de la OCDE han tomado la visi6n de que en este contexto las autoridades tributashyrias no deben ser tratadas como simples terceros sino que se les debe otorgar un acceso priviligiado a la informaci6n bancaria con fines tributarias

Se agrega en este estudio que una medida de esta naturaleza no pane en peligro la conlidencialidad de la inlormacioacuten bancaria puesto que las autoridades tributarias estaacuten sujetas a estrictos conshytroles sobre coacutemo utilizan la informacioacuten de los contribuyentes y todos los gobiemos han implementado regIas para proteger la conlidencialidad de la informaci6n tributaria (EI Sigilo Bancaacuterio Acesso a la Informadon Bancaria para Fines Tributarias)

Em verdade seu texto elenca 30 paiacuteses integrantes da OCDE (a saber Alemanha Austraacutelia Aacuteustria Beacutelgica Canadaacute Repuacuteblica Checa Dinamarca Finlacircndia Franccedila Greacutecia Hungria Islacircndia Irlanda Itaacutelia Japatildeo Coreacuteia Luxemburgo Meacutexico Paiacuteses Baixos Nova Zelacircndia Noshyruega Polocircnia Portugal Espanha Sueacutecia Turquia Suiacuteccedila Reino Unido Estados Unidos Repuacuteblica Eslovaca) dos quais em 1999 apenas trecircs (Portugal Repuacuteblica Eslovaca e Luxemburgo) natildeo facultavam o acesso por parte de autoridades tributaacuterias a informaccedilotildees relativas a pessoas suspeitas de fraude tributaacuteria

238 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

Desses trecircs paiacuteses hoje remanescem apenas dois Com efeito Portugal deixou de integrar esse grupo constrangedoramente minoritaacuterio ao aprovar em 29 de dezembro de 2000 a Lei n 30-G

Nesse diploma lecirc-se

Lei da Reforma de Tributaccedilatildeo do Rendimento

(Portugal)

Artigo 63 O - B

Acesso a informaccedilotildees e documentos bancaacuterios

1 A administraccedilatildeo tributaacuteria tem o poder de aceder directashymente aos documentos bancaacuterios nas situaccedilotildees de recusa da sua exibiccedilatildeo ou de autorizaccedilatildeo para a sua consulta

a) quando se trate de documentos de suporte de registos contabiliacutesticos dos sujeitos passivos de IRS e IRC que se enconshytrem sujeitos agrave contabilidade organizada

b) quando o contribuinte usufrua de benefiacutecios fiscais ou de regimes fiscais privilegiados havendo necessidade de controshylar os respectivos pressupostos e apenas para esse efeito

2 A administraccedilatildeo tributaacuteria tem o poder de aceder a todos os documentos bancaacuterios excepto as informaccedilotildees prestadas para justificar o recurso ao creacutedito nas situaccedilotildees de recusa de exibiccedilatildeo daqueles documentos ou de autorizaccedilatildeo para a sua consulta

a) quando se verificar a impossibilidade de comprovaccedilatildeo e quantificaccedilatildeo directa e exacta da mateacuteria tributaacutevel nos termos do artigo da Lei Geral Tributaacuteria e em geral quando estejam verifishycados os pressupostos para o recurso a uma avaliaccedilatildeo indirecta

b) quando os rendimentos declarados em sede de IRS se afastarem significativamente para menos sem razatildeo justificada dos padrotildees de rendimento que razoavelmente possam permitir as manifestaccedilotildees de riqueza evidenciadas pelo sujeito passivo nos termos do artigo 89-A da Lei Geral Tributaacuteria

c) quando existam indiacutecios da praacutetica de crime doloso em mateacuteria tributaacuteria designadamente nos casos de utilizaccedilatildeo de facturas falsas e em geral nas situaccedilotildees em que existam factos concretamente identificados gravemente indiciadores da falta de veracidade do declarado

d) quando seja necessaacuterio para fins fiscais comprovar a aplicaccedilatildeo de subsiacutedios puacuteblicos de qualquer natureza

ENSAIOS JUAlolCOS 239

3 As decisotildees da administraccedilatildeo tributaacuteria referidas nos nuacuteshymeros anteriores devem ser fundamentadas com expressa menshyccedilatildeo dos motivos concretos que as justificam pressupotildeem a audishyccedilatildeo preacutevia do contribuinte e satildeo da competecircncia do Director-Geshyral dos Impostos ou do Director-Geral das Alfacircndegas e dos Imshypostos Especiais sobre o consumo ou seus substitutos legais sem possibilidade de delegaccedilatildeo

4 Os actos praticados ao abrigo da competecircncia definida no nuacutemero anterior satildeo susceptiacuteveis de recurso judicial o qual teraacute efeito suspensivo nas situaccedilotildees previstas no n 2

5 Nos casos de deferimento do recurso previsto no nuacutemero anterior os elementos de prova entretanto obtidos natildeo podem ser utilizados para qualquer efeito em desfavor do contribuinte

6 As entidades que se encontrem numa relaccedilatildeo de domiacutenio com o contribuinte ficam sujeitas aos regimes de acesso agrave inforshymaccedilatildeo bancaacuteria referidos nos n 1 e 2

7 O acesso da administraccedilatildeo tributaacuteria a informaccedilatildeo banshycaacuteria relevante relativa a familiares ou terceiros que se encontrem numa relaccedilatildeo especial com o contribuinte depende de autorizashyccedilatildeo judicial expressa apoacutes audiccedilatildeo do visado obedecendo aos requisitos previstos no n 3

8 O regime previsto nos nuacutemeros anteriores natildeo prejudica a legislaccedilatildeo aplicaacutevel aos casos de investigaccedilatildeo por infracccedilatildeo peshynal e soacute pode ter por objecto operaccedilotildees e movimentos bancaacuterios realizados apoacutes a sua entrada em vigor sem prejuiacutezo do regime vigente para as situaccedilotildees anteriores

9 Os actos praticados ao abrigo da competecircncia prevista no n I devem ser objecto de comunicaccedilatildeo ao Defensor do Contrimiddot buinte

10 Para os efeitos desta lei considera-se documento bancaacuteshyrio qualquer documento ou registo independentemente do resshypectivo suporte em que se titulem comprovem ou registem opeshyraccedilotildees praticadas por instituiccedilotildees de creacutedito ou sociedades finanshyceiras no acircmbito da respectiva actividade incluindo os referentes a operaccedilotildees realizadas mediante utilizaccedilatildeo de cartotildees de creacutedito (coacutepia anexa)

Parece evidente destarte que todo o mundo civilizado abandonou a possibilidade de opor-se agrave Administraccedilatildeo Tributaacuteria o sigilo bancaacuterio

240 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

4 O sigilo bancaacuterio e o direito agrave intimidade e agrave privacidade das pessoas

A anaacutelise do sigilo bancaacuterio em face do direito agrave intimidade e agrave privacidashyde exige inicialmente que seja enfrentada a questatildeo referente ao seu conceito

Os doutrinadores natildeo tecircm assumido posiccedilatildeo uniforme quanto aos asshypectos conceituais dessa entidade juriacutedica

Seacutergio Carlos Covello autor da obra jaacute mencionada (O Sigilo Bancaacuterio Leud S Paulo 1991 p 69) entende que sigilo bancaacuterio eacute a obrigaccedilatildeo que tecircm os Bancos de natildeo revelar salvo justa causa as informaccedilotildees que venham a obter em virtude de sua atividade profissional

Luiz Fernando Bellinetti no artigo intitulado Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio (Revista do Direito do Consumidor Satildeo Paulo RT 1996 voI 18 p 144) defende posiccedilatildeo no sentido de que sigilo bancaacuterio eacute o dever juriacutedico que tecircm as instituiccedilotildees de creacutedito e as organizaccedilotildees auxiliares e seus empregados de natildeo revelar salvo justa causa as informaccedilotildees que venham a obter em virtushyde da atividade bancaacuteria a que se dedicam

Para Arnoldo Wald (in O Sigilo Bancaacuterio no Projeto de Lei Complemenshytar n 70 Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas n I pp 196209) o sigilo bancaacuterio se enquadra no conceito mais amplo do segredo profissional que tem merecido uma proteccedilatildeo mais ampla ensejando sua violaccedilatildeo caracterizaccedilatildeo como crime (art 154 do Coacutedigo PeshynaI)

Eivany A Silva tratando do tema em Consideraccedilotildees a Respeito do Sigilo de Dados (artigo publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio n 61 pp 41142 - Edit Dialeacutetica) afirma que o sigilo bancaacuterio eacute espeacutecie do gecircnero sigilo de dados constituindo um direito fundamental protegido constitucionalmente inserto que estaacute no rol dos direitos e garantias individuais ou seja em claacuteusushylas peacutetreas da Carta Magna natildeo podendo portanto ser modificado nem messhymo por emenda agrave Constituiccedilatildeo e portanto muito menos por legislaccedilatildeo de hierarquia inferior

Como examinado haacute divergecircncias na fixaccedilatildeo do conceito Essas divershygecircncias embora importantes para as posiccedilotildees doutrinaacuterias a serem assumishydas sobre o alcance do sigilo bancaacuterio natildeo geram contudo influecircncias de maior intensidade no relacionamento entre a instituiccedilatildeo financeira e os seus depositantes Isso porque o que merece ser considerado eacute a natureza juriacutedica do sigilo bancaacuterio isto eacute a que categoria de direito pertence e como por quem e quando a sua quebra pode ser determinada

Em face do exposto necessaacuterio eacute que se faccedila o alinhamento das teorias que procuram fundamentar o sigilo bancaacuterio

A doutrina em eacutepocas diversas examinou as seguintes teorias

ENSAIOS JURiacuteDICOS 241

Teoria contratualista O sigilo bancaacuterio de acordo com essa teoria deshycorre da relaccedilatildeo contratual que voluntariamente eacute formada entre o banco e o cliente por via da qual mesmo sem claacuteusula expressa a instituiccedilatildeo financeira assume a obrigaccedilatildeo de guardar segredo das movimentaccedilotildees de dinheiro que nela satildeo feitas Essa responsabilidade assumida pelo banco inspira-se segunshydo os adeptos da teoria em destaque nos usos nos costumes e na boa-feacute sempre aplicaacuteveis na intepretaccedilatildeo dos contratos comerciais7bull

Teoria do direito agrave privacidade Os adeptos dessa corrente afirmam que o sigilo bancaacuterio integra o campo do direito agrave privacidade que faz parte dos direitos da personalidade

Teoria consuetudinaacuteria Segundo os seguidores dessa linha de pensar o sigilo bancaacuterio decorre dos compromissos taacutecitos assumidos entre instituishyccedilotildees financeiras e seus clientes no sentido de natildeo serem levados ao conhecishymento de terceiros os valores transacionados O uso reiterado dessa praacutetica apoiada no elemento confianccedila passou a representar costume adotado nesse tipo de negoacutecio juriacutedico

Teoria da boa-feacute A adoccedilatildeo dessa teoria conduz o inteacuterprete a entender que o sigilo bancaacuterio por sua proacutepria natureza estaacute vinculado ao caraacuteter fiduciaacuterio da atividade bancaacuteria fundando-se portanto na boa-feacute ou dever de lisura que tanto marca o tipo de negoacutecio juriacutedico firmado

Teoria do sigilo profissional Essa teoria concebe o sigilo bancaacuterio como sendo uma espeacutecie do sigilo profissional Haacute portanto um dever eacutetico do banshyco em respeitar o sigilo bancaacuterio em decorrecircncia da profissatildeo exercida

Teoria do direito agrave intimidade dos bancos Os integrantes dessa forma de pensar sustentam que a instituiccedilatildeo financeira tem legiacutetimo interesse de afastar do conhecimento de terceiros a movimentaccedilatildeo financeira dos seus clientes e consequumlentemente dos fatos com elas relacionados

Teoria da complexidade do viacutenculo Essa teoria eacute explicada por Arnoldo Wald no trabalho jaacute citado da forma seguinte A doutrina moderna abandoshynou a noccedilatildeo da relaccedilatildeo juriacutedica contratual defendo a complexidade do viacutenshyculo Aleacutem dos direitos e das obrigaccedilotildees principais existem deveres secundaacuteshyrios para ambos os contratantes que decorrem da regra geral da boa-feacute denoshyminada na doutrina italiana de cOITeteza e na legislaccedilatildeo alematilde de Treu und Glauben Exige que a atuaccedilatildeo de uma parte natildeo cause danos agrave esfera juriacutedica da outra Dentro desta ideacuteia defende-se que o segredo bancaacuterio eacute um dever

7 Arnoldo Wald em Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais artigo publicado na Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas n 22 pp 1518 manifesta entendimento de que no campo normatIacutevo do Direito brasileiro esta teoria encontra respaldo nos arts 130 e 131 do Coacutedigo Comercial que prevecirc a interpretaccedilatildeo dos contratos segundo os usos os costumes e a boa-feacute

242 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

acessoacuterio na relaccedilatildeo juriacutedica Mesmo que natildeo nasccedila o contrato entre as partes a boa-feacute objetiva impede que a instituiccedilatildeo financeira prejudique os interesses do cidadatildeo

Estabelecidos os pressupostos doutrinaacuterios acima examinamos agora se o sigilo bancaacuterio diz respeito agrave intimidade e agrave privacidade das pessoas

A Constituiccedilatildeo Federal em seu artigo 5ordm incisos X e XII afirma

Art 5ordm Todos satildeo iguais perante a lei sem distinccedilatildeo de qualquer natureza garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Paiacutes a inviolabilidade do direito agrave vida agrave liberdade agrave igualdade agrave segushyranccedila e agrave propriedade nos termos seguintes

X - satildeo inviolaacuteveis a intimidade a vida privada a honra e a imagem das pessoas assegurado o direito agrave indenizaccedilatildeo pelo dano material ou moral decorrente de sua violaccedilatildeo

XJl - eacute inviolaacutevel o sigilo da correspondecircncia e das comunicaccedilotildees telegraacuteficas de dados e das comunicaccedilotildees telefocircnicas salvo no uacuteltimo caso por ordem judicial nas hipoacuteteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigaccedilatildeo criminal ou instruccedilatildeo processual penal

Essas garantias constitucionais protegem o cidadatildeo de qualquer investida de terceiros em sua intimidade em sua vida privada e no sigilo de seus dados

Na expressatildeo terceiros estaacute incluiacutedo o Estado e consequumlentemente seus agentes poliacuteticos e administrativos

A doutrina tem se manifestado de modo quase unacircnime no sentido de que o sigilo bancaacuterio eacute uma garantia constitucional que protege a privacidade das pessoas no campo econocircmico e financeiro A sua significaccedilatildeo eacute de natildeo tornar puacuteblica a movimentaccedilatildeo da conta bancaacuteria e das aplicaccedilotildees financeiras do cidadatildeo para que de nenhum modo os atos privados praticados possam ser tornados puacuteblicos

Esse posicionamento eacute o adotado pelos autores que passo a citar

Arnoldo Wald (O Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais artigo pushyblicado na Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas RT n 22 pp 1521)

O sigilo bancaacuterio eacute o meio para resguardar a privacidade no camshypo econocircmico pois veda a publicidade sobre a movimentaccedilatildeo da conta corrente bancaacuteria e das aplicaccedilotildees financeiras

ENSAIOS JURiacuteDICOS 243

Eivany A Silva (Consideraccedilotildees a Respeito do Sigilo de Dados artigo publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio n 61 Satildeo Paulo Editora Dialeacutetica p27)

A maioria dos ordenamentos juriacutedicos como o brasileiro tratam o sigilo bancaacuterio como direito fundamental do contribuinte agrave privacidashyde ou seja agrave resistecircncia agrave comunicaccedilatildeo de dados que representem desshydobramento da personalidade da pessoa direito agrave oposiccedilatildeo e agrave negaccedilatildeo de comunicaccedilatildeo

Ives Gandra da Silva Martins (Sigilo Bancaacuterio trabalho publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio S Paulo Editora Dialeacutetica n 1 pp 24 e 25)

Pelos incisos X e XII do artigo 5ordm tem o contribuinte o direito de preservaccedilatildeo de sua intimidade de sua privacidade e de que terceiros que detenham informaccedilotildees pessoais suas sejam obrigados a guardaacute-Ias

Natildeo pode pois a fiscalizaccedilatildeo exigir de terceiros informaccedilotildees que apenas pode obter do proacuteprio contribuinte

Em determinadas hipoacuteteses todavia o interesse puacuteblico haacute de preshyvalecer sobre o interesse individual mas caberaacute a um outro poder definir se tais hipoacuteteses efetivamente ocorrem com o que poderaacute o Poder Judishyciaacuterio autorizar se convencido estiver o magistrado de que a hipoacutetese eacute de gravidade e de lesatildeo ao interesse puacuteblico a quebra do direito ao sigilo bancaacuterio

Estou convencido ser esta a melhor conformaccedilatildeo juriacutedica da quesshytatildeo idealizada pelos constituintes defendida pela doutrina e consagrashyda na jurisprudecircncia corrente exegeacutetica esta a que me filio desde os meus primeiros escritos sobre a mateacuteria

Roberto Quiroga Mosquera (Tributaccedilatildeo no Mercado Financeiro e de Capitais obra publicada pela Editora Dialeacutetica Satildeo Paulo 1998 pp 70171)

Do exposto ateacute aqui eacute evidente que o direito ao sigilo bancaacuterio representa uma espeacutecie de direito agrave privacidade

Eacute incontroverso que os dados e informaccedilotildees de natureza bancaacuteria dizem respeito agrave intimidade e agrave vida privada dos cidadatildeos Dados que dizem respeito aos valores em dinheiro depositados em contas-correnshytes bancaacuterias tipos e caracteriacutesticas de aplicaccedilotildees financeiras ganhos e prejuiacutezos auferidos ou incorridos em operaccedilotildees bursaacuteteis etc satildeo sem sombra de duacutevida elementos particulares e pessoais de qualquer indiviacuteshyduo

244 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Utilizando outra voz informaccedilotildees que tocam no aspecto financeishyro do ser humano representam direito iacutentimo e personaliacutessimo devendo ser mantidas em sigilo por aqueles que eventualmente as detenham em razatildeo de sua atividade profissional Parece-nos que tal conclusatildeo eacute de uma clareza inconteste

Natildeo tem sido outra a posiccedilatildeo da doutrina mais abalizada do Paiacutes e da jurisprudecircncia dominante

o autor referido a seguir faz a observaccedilatildeo seguinte

Carlos Alberto Hagstrom (Sigilo Bancaacuterio Novas Questotildees Reshyvista de Direito Mercantil Satildeo Paulo Malheiros 1997 vaI 105 pp 4344) expotildee que apesar de existirem diversas teorias que procuram fundashymentar juridicamente o sigilo bancaacuterio modernamente a explicaccedilatildeo para o fundamento do referido instituto sofreu uma radical alteraccedilatildeo Divershysas constituiccedilotildees modernas esclarece o mencionado autor ampliaram e explicitaram o elenco de direitos e garantias individuais passando a garantir o direito agrave privacidade e agrave intimidade A Constituiccedilatildeo brasileira natildeo trilha caminho diferente Assegurou referidos direitos de forma exshypressa e sem restriccedilotildees O tema do sigilo bancaacuterio figura agora em niacutevel constitucional Tem status de norma superior no qual se reconhece o direito agrave intimidade como norma de caraacuteter geneacuterico em que estatildeo conshytemplados muacuteltiplos aspectos da vida privada em especial os de ordem econocircmico-financeira que compotildeem o que Hagstrom denominou a inshytimidade econocircmica ou intimidade patrimonial

Luiacutes Fernando 8ellinetti (Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio artigo publicado na Revista de Direito do Consumidor n 18 pp 141151)

Como jaacute dissemos anteriormente em certas hipoacuteteses o fundashymento para o segredo bancaacuterio seria a privacidade No entanto nesses casos o que se protege eacute a privacidade e natildeo propriamente o sigilo

Entendemos que uma coisa eacute garantir-se a privacidade da pessoa com fundamento em norma constitucional outra eacute garantir-se o segreshydo de informaccedilotildees bancaacuterias de uma pessoa com base na legislaccedilatildeo supramencionada

Sempre que a revelaccedilatildeo de informaccedilotildees bancaacuterias puder violar a privacidade da pessoa parece-nos que mais do que garantia ao sigilo bancaacuterio (com fundamento legal) tem a pessoa garantia agrave sua privacishydade (com fundamento constitucional)

ENSAIOS JURiacuteDICOS 245

No entanto se a revelaccedilatildeo da informaccedilatildeo natildeo invadir a esfera da intimidade da pessoa sua garantia eacute meramente legal do sigilo bancaacuterio

Carlos Maacuterio Velloso (citado por Misabel Derzi em Direito Tributaacuterio Aplicado obra publicada pela Editora Del Rey Belo Horizonte MO pp 278 e 279)

O sigilo bancaacuterio decorre do direito agrave privacidade inerente agrave pershysonalidade das pessoas consagrado na Constituiccedilatildeo Federal em seu art 5ordm X e protege tanto interesses privados como finalidades de ordem puacuteblica a saber o sistema de creacutedito O sigilo bancaacuterio natildeo eacute um princiacuteshypio absoluto

As exceccedilotildees ao sigilo bancaacuterio estatildeo previstas na Lei n 45951964 que continua em vigor

O Poder Judiciaacuterio pode requisitar relativamente a pessoas e instishytuiccedilotildees informaccedilotildees que implicam quebra de sigilo (Lei n 45951964 art 38 sect 1 ordm) entretanto mesmo havendo inqueacuterito policial instaurado deveraacute proceder com cautela prudecircncia e moderaccedilatildeo inerentes agrave mashygistratura

Luciana Fregodolli (O Direito agrave Intimidade - excerto da dissertaccedilatildeo que apresentou sob o tiacutetulo O Direito agrave Intimidade e a Prova Iliacutecita publicado pela Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Constitucional e Ciecircncia Poliacutetica -n 19 p 233)

O sigilo bancaacuterio protege interesses privados Eacute ele espeacutecie de direito agrave privacidade inerente agrave personalidade das pessoas e que a Consshytituiccedilatildeo Federal consagra no art 5ordm X aleacutem de atender a uma finalidade de ordem puacuteblica qual seja a de proteccedilatildeo ao sistema de creacutedito

O direito agrave privacidade abrange atualmente o de impedir que tershyceiros inclusive o Estado e o Fisco tenham acesso a informaccedilotildees sobre o que se denominou a aacuterea de manifestaccedilatildeo existencial do ser humano

Celso Ribeiro Bastos O pensamento de Celso Ribeiro Bastos foi exshyposto por Roberto Quiroga Mosquera na obra jaacute referida p 71 do modo seguinte

Celso Bastos eacute do mesmo pensar Apoacutes tecer consideraccedilotildees introdutoacuterias acerca do sigilo bancaacuterio e expor pensamentos de divershysos autores nacionais e alieniacutegenas conclui o constitucionalista brasileishyro no sentido de que todas as despesas ordinaacuterias feitas pelo cidadatildeo

246 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

comum em sua vida cotidiana devem ser consideradas parte de sua vida privada familiar ou domeacutestica e portanto protegidas contra interferecircnshycias a despeito de qualquer pretexto Desde as condutas mais corriqueishyras como as compras efetuadas em um supermercado para manutenshyccedilatildeo da famiacutelia quanto aquelas outras moralmente reprovaacuteveis como presentes ou joacuteias compradas e dadas a quem presta ao homem servishyccedilos de natureza extraconjugal tudo estaacute abarcado pelo manto da proteshyccedilatildeo agrave vida privada familiar ou domeacutestica ( ) E mais adiante arremata Hoje praticamente a vida do homem pode ser escrita a partir de seu talatildeo de cheques e nas sociedades mais avanccediladas pelos cartotildees de creacutedito e magneacuteticos Permitir-se que o sigilo bancaacuterio venha a ser romshypido por qualquer forma natildeo-extraordinaacuteria para salvaguarda de inteshyresse de porte no miacutenimo idecircntico eacute expor a seguranccedila individual a um constante e absurdo temor perante as possibilidades de controle direto ou pelo vazamento de alguma informaccedilatildeo

Haacute contudo corrente contraacuteria como passaremos a demonstrar

Andreacute Serratildeo Borges de Sampaio Consultor da Uniatildeo nas informashyccedilotildees prestadas ao Advogado-Geral da Uniatildeo sobre a ADIn n 2397 cita trechos de doutrina e jurisprudecircncia estrangeiras defendendo o entendimento de que o sigilo bancaacuterio natildeo tem conotaccedilatildeo de direito de privacidade Eis o que escreshyveu o parecerista citado

O jurista portuguecircs J L Saldanha Sanches coteja primorosashymente o sigilo bancaacuterio com a proteccedilatildeo da intimidade para concluir que natildeo haacute que se falar em direito ao sigilo bancaacuterio como concretizaccedilatildeo do direito agrave intimidade Nas suas palavras

Ora em que esfera podemos noacutes incluir o segredo bancaacuteshyrio enquanto instituto que concretiza certos valores do ordenashymento juriacutedico Como expressatildeo de interesses juridicamente tuteshylados

Seraacute o segredo bancaacuterio um prolongamento do direito agrave inshytimidade da esfera pessoal e familiar de uma qualquer pessoa sinshygular (uma vez que em relaccedilatildeo agraves pessoas coletivas a questatildeo natildeo pode mesmo ser colocada) Ou diraacute antes respeito aquela faixa mais larga que resguarda a privacidade de qualquer cidadatildeo e que soacute pode por isso sofrer qualquer intromissatildeo se surgirem razotildees vaacutelidas para que tal direito seja restringido

Ao afirmar-se que na perspectiva dos clientes dos bancos o segredo bancaacuterio eacute um direito com a reserva da sua vida privada temos uma primeira resposta para esta questatildeo

ENSAIOS JURiacuteDICOS 247

Mas falta distinguir entre intimidade e reserva da vida privashyda e entre clientes individuais e profissionais de um banco Natildeo estamos perante o mesmo tipo de tutela quando contamos que um particular espera que o banco natildeo divulgue a qualquer inteshyressado o volume da sua conta bancaacuteria (porque pura e simplesshymente quer manter sob reserva a sua vida particular) ou quando um comerciante confia no banco para que este natildeo revele quem satildeo os seus clientes fornecedores ou qual eacute o seu grau de endividamento

No caso da pessoa singular estaacute apenas em causa um conshyjunto de valores de natureza moral esta natildeo estaacute em princiacutepio preocupada com possiacuteveis prejuiacutezos econocircmicos ligados a qualshyquer divulgaccedilatildeo Apenas se opotildee por razotildees do seu foro pessoal e que natildeo carecem de fundamentaccedilatildeo que esta tenha lugar

Enquanto que o comerciante pode ser seriamente prejudishycado em termos concorrenciais com a revelaccedilatildeo da lista dos seus clientes ou com a sua situaccedilatildeo financeira

O dever de reserva que cabe ao banqueiro estaacute desta forma a serviccedilo do interesse comercial das empresas suas clientes - que pelo simples facto de o serem ou por necessitarem de obter creacutedishyto lhe datildeo informaccedilotildees com um forte valor comercial ou da pesshysoa singular que deseja manter a privacidade da sua situaccedilatildeo patrimonial

Ou em alternativa ao serviccedilo da manutenccedilatildeo da privacidashyde que qualquer um pode desejar ainda que a possiacutevel violaccedilatildeo desta apenas lhe possa acarretar danos natildeo-patrimoniais

E por isso o segredo bancaacuterio natildeo pode constituir a expresshysatildeo do imperativo constitucional da proteccedilatildeo da intimidade Ateacute porque o acesso a essa esfera estaacute vedado aos proacuteprios bancos

Natildeo nos parece aceitaacutevel que um banco como condiccedilatildeo para a concessatildeo de creacutedito a uma pessoa singular ou para estashybelecer com ela qualquer relaccedilatildeo contratual possa exigir desta informaccedilatildeo de tipo estritamente pessoal ou a sujeiccedilatildeo a exames meacutedicos que atingindo a sua esfera iacutentima afectam a sua dignidashyde Aqui estaacute em causa a ilicitude da pergunta por pressupor o acesso agrave esfera inviolaacutevel (e indisponiacutevel) da intimidade

A informaccedilatildeo que o banco pode obter para a defesa dos seus interesses legiacutetimos natildeo pode ir aleacutem da esfera patrimonial do seu cliente rendimentos bens possuiacutedos perspectivas profisshysionais

( )

248 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

Podemos pois concluir que o segredo bancaacuterio natildeo eacute natildeo pode ser uma concretizaccedilatildeo do princiacutepio constitucional do direishyto agrave intimidade

Este princiacutepio tem como funccedilatildeo consagrar uma zona de reshyselVa pessoal para factos opccedilotildees e circunstacircncias que soacute de forshyma indirecta e de todo secundaacuteria podem ter aspectos ou refleshyxos de natureza patrimonial (Saldanha Sanches J L Segredo Bancaacuterio e Tributaccedilatildeo do Lucro Real In Saldanha Sanches J L Estudos de Direito Contabiliacutestico e Fiscal Coimbra Coimbra Edishytora 2000 pp 105108)

Em diversos paiacuteses haacute a clara percepccedilatildeo que natildeo haacute que se conshyfundir direito agrave intimidade com sigilo bancaacuterio indicando que a quebra do sigilo pela Administraccedilatildeo Tributaacuteria natildeo constitui violaccedilatildeo ao direito Ao contraacuterio a existecircncia de um Estado Fiscal implica na necessidade de consagrar agrave administraccedilatildeo tributaacuteria tal faculdade o que se harmonishyza com diversos princiacutepios e outros direitos fundamentais constantes da Carta de 1988

O caso espanhol eacute exemplar neste sentido ao natildeo visualizar a vioshylaccedilatildeo ao direito agrave intimidade em relaccedilatildeo agrave quebra do sigilo bancaacuterio Portanto

el Tribunal Constitucional espaflOl se ha pronunciado por la negativa de que el conocimiento de las cuentas bancarias por la Administracioacuten pueda invadir el aacutembito constitucionalmente garantizado de la intimidad de los individuos porque tales extractos no constituyen per se uma biografiacutea personal en nuacutemeros y en siacute no tiene relevancia para la intimidad personal y familiar dei contribuyente ya que se trata de dados no secretos y confiados a una entidad (Campos Laura Rodriacuteguez Oerechos dei Contribuyente em la Repuacuteblica Argentina ai Amparo de la Convencioacuten Interamericana de Oerechos Humanos http wwwiefpaorgarcriteriosdigitalarticulosderechoshtm Visitado em 512001)

Ao analisar a jurisprudecircncia da Corte Constitucional espanhola quanto ao tema tambeacutem ressalta Saldanha Sanches

Na apreciaccedilatildeo da constitucionalidade da lei que permitia o controle administrativo das contas bancaacuterias o Tribunal Constitushycional espanhol realizou uma distinccedilatildeo entre intimidade pessoal e familiar e a intimidade econoacutemica onde a proteccedilatildeo constitucional eacute menos intensa

ENSAIOS JURiacuteDICOS 249

E procura fazer uma distinccedilatildeo entre a violaccedilatildeo agrave intimidade como consequumlecircncia de uma anaacutelise das contas bancaacuterias - coloshycando a hipoacutetese de uma recusa de cooperaccedilatildeo por parte do conshytribuinte se tal eventualidade se verificar - e a violaccedilatildeo directa da intimidade uma vez que esta natildeo pode resultar de uma mera anaacuteshylise de movimentos bancaacuterios (Saldanha Sanches J L A Situashyccedilatildeo Actual do Sigilo Bancaacuterio a Singularidade do Regime Portushyguecircs In Saldanha Sanches J L Estudos de Direito Contabiliacutestico e Fiscal Coimbra Coimbra Editora 2000 p 91)

Outro comentarista ao analisar a situaccedilatildeo do sistema espanhol quanto ao sigilo bancaacuterio e o direito agrave intimidade fez questatildeo de ressaltar

Seguacuten el r c frente a la Hacienda Puacuteblica no existe el derecho a la intimidad deI art 18 CE Ya la LO de 5 de mayo deI 82 vada praacutecticamente de contenido constitucional el derecho a la intimidado en cuanto el aacutembito de eacutesta queda deferido a la ley ordinaria (a 2ordm) y en cuanto que la esfera protegida frente a las Administraciones se reduce a poco O nada ai no reputarse intromisiones ilegiacutetimas las actuaciones autorizadas o acordadas por la Autoridad competente de acuerdo con la Ley (art 8ordm 1)

La LGTy el RI Iimiacutetan la esfera de la intimidad en las relacishyones con la Hacienda hasta el extremo de que solamenle existe un refugio limitado en el aacutembito deI secreto profesional en los casos de informacioacuten sobre terceros y siempre que no se trate de datos con transcendencia econoacutemica o tributaria EI rc no ha enconshytrado hasta el momento ni un solo supuesto de dato o informacioacuten econocircmica con transcendencia tributaria que limite la accioacuten inquisitiva de la Administracioacuten tributaria por razoacuten de intimidado Bien puede decirse por tanto que frente a la Administraciocircn tribushytaria en cuanto se trata deI ejercicio de su funciocircn de buacutesqueda de datos con transcendencia tributaria el derecho a la intimidad personal y familiar (art 18 I CE) no existe

La biacuteblia deI tribunal a estos efeclos estaacute constituida por la S 11084 reiterada en numerosas ocasiones ampliada en el Auto 64286 y reafirmada por ejemplo en la S 26 abril 90 tantas veces citada (FJ 10deg) Seguacuten esa doctrina la distribucioacutenjusta de la carshyga fiscal prevalece sobre el derecho a la intimidad parte dei art 812 I de la LO seguacuten el cual frente a la Ley (ordinaria) no hay intimidad protegida siempre que haya en dicha ley imperativos de intereacutes puacuteblico ( ) ni siquiera se habla dei predomiacutenio frente a la

250 SUPERIOR TRIBUNAl DE JUSTiCcedilA

intimidad de intereses u objetivos constitucionalmente protegidos Soacuteo admite que la actuadoacuten administrativa es arbitraria cuando no parezcajustificada por la Finalidad de la inspeccioacuten es decir cuando se trate de datos o informaciones que carezcan de transcendencia tributaria pero eacuteste obviamente no es sin Umite derivado dei derecho a la intimidad sino de la interdiccioacuten de arbitrariedad o desviacioacuten de poder de la Administracioacuten de la necesidad de ajuste de toda Administracioacuten ai acircmbito de su competencia que tanto vale para datos iacutentimos como para otros que no lo sean Seguacuten la S 11084 no hay esfera de intimidad proshytegida frente a una Administracioacuten tributaria amparada en una norma que elimina la intimidad como liacutemite (Garciacutea AIacuteloveros Jaime Una Nueva Ley General Tributaria Problemas Constitucioshynales In Kirchhof P et aI Garantiacuteas Constitucionales dei Contribuyente Valencia Tirant lo Blanch 1999 pp 109110)

Diante de tudo quanto foi exposto tendo-se o cuidado de registrar posicionamento de diferentes autores nacionais e estrangeiros haacute ambiente preparado para ser respondido o primeiro questionamento desdobrado em trecircs partes formulado para o 1II Coloacutequio Internacional de Direito Tributaacuterio promoccedilatildeo do Centro de Extensatildeo Universitaacuteria Eis a primeira parte do seu teor

O sigilo bancaacuterio diz respeito agrave intimidade e privacidade das pessoas

A resposta eacute optando por convencimento influenciado pelas ideacuteias da corrente predominante positiva

O nosso entendimento eacute no sentido de que o direito agrave intimidade integra os direitos da personalidade e visam proteger o direito agrave inviolabilidade do domiciacutelio da correspondecircncia das comunicaccedilotildees de quaisquer espeacutecies dos dados pessoais computadorizados do sigilo bancaacuterio O mesmo acontece com o direito agrave privacidade

A expansatildeo da proteccedilatildeo do direito agrave intimidade e agrave privacidade eacute uma consequumlecircncia da evoluccedilatildeo da era contemporacircnea nos setores tecnoloacutegicos e da instabilidade que passam as instituiccedilotildees estatais especialmente a encarreshygada de arrecadar tributos Haacute o reconhecimento de que desenvolve-se um processo de aguda corrosatildeo na proteccedilatildeo agrave intimidade que ao ser violada provoca a publicizaccedilatildeo das condutas mais iacutentimas do cidadatildeo

A concepccedilatildeo do sigilo bancaacuterio no acircmbito do direito agrave intimidade e agrave privacidade visa garantir ao homem o miacutenimo capaz para que lhe seja asseshygurada a sua condiccedilatildeo humana protegendo-o de ingerecircncias alheias como apregoa a Conferecircncia Noacuterdica sobre o Direito agrave Intimidade realizada em Estoshycolmo na data de maio de 1967 ao fazer inserir no documento que publicou a seguinte definiccedilatildeo O direito agrave intimidade eacute o direito do homem de viver de forma independente a sua vida com um miacutenimo de ingerecircncia alheia

ENSAIOS JURiacuteDICOS 251

5 Seguranccedila juriacutedica e acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias

A segunda pergunta apresentada pelos organizadores do coloacutequio estaacute assim posta

A seguranccedila das relaccedilotildees juriacutedicas atraveacutes do Sistema Financeiro pode ser afetada pelo acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves inforshymaccedilotildees bancaacuterias

O acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias se realizado caracteriza um atentado de suma gravidade aos direishytos do cidadatildeo Eacute um ataque aos princiacutepios sustentadores do sistema demoshycraacutetico adotado pelo constituinte de 1988 especialmente quando detonou que a Repuacuteblica Federativa do Brasil tem como objetivo fundamental o respeishyto agrave dignidade humana e agrave cidadania

Do ordenamento juriacutedico brasileiro a meu pensar natildeo haacute lugar para brotar qualquer interpretaccedilatildeo que conclua pela possibilidade de qualquer agenshyte do Poder Puacuteblico acessar de modo generalizado e sem motivaccedilatildeo informashyccedilotildees bancaacuterias do cidadatildeo mesmo com autorizaccedilatildeo judicial

Esclareccedilo desde logo que natildeo comungo com o pensamento de detershyminada corrente no sentido de ser absoluto o direito ao sigilo bancaacuterio Tenho-o como relativo poreacutem vinculado aos princiacutepios da razoabilidade da moralidade da legalidade e da motivaccedilatildeo expliacutecita e detalhada sob pena de ser impossiacutevel a sua quebra

O acesso indiscriminado do agente fiscal agraves informaccedilotildees bancaacuterias do cidadatildeo gera uma quebra da seguranccedila das relaccedilotildees juriacutedicas por um terceiro passar a ter sem causa justificadora conhecimento da vida iacutentima de algueacutem submetendo-o a partir daiacute a um regime de submissatildeo Por outro lado ninshygueacutem poderaacute garantir nem o proacuteprio Estado que o agente puacuteblico utilize os dados que chegaram ao seu conhecimento para outros intentos que natildeo o exclusivamente fiscal

Lembra Arnoldo Wald que O segredo na atividade bancaacuteria envolve concomitantemente interesses privaqos e coletivos que podem ser analisashydos sob trecircs acircngulos o interesse do cliente na sua relaccedilatildeo com a instituiccedilatildeo financeira o interesse do banco em atuar com discriccedilatildeo para ganhar a conshyfianccedila da populaccedilatildeo e captar recursos e o interesse social na existecircncia de um bom e eficiente sistema bancaacuterio Por estarem ligadas ao desenvolvimento da economia e aos interesses da comunidade as relaccedilotildees que envolvem as instishytuiccedilotildees financeiras natildeo recebem o mesmo tratamento juriacutedico dispendido a outras relaccedilotildees comerciais Inviaacutevel a aplicaccedilatildeo exclusiva das regras de Direito Privado as quais tecircm como princiacutepio norteador a autonomia da vontade pois

252 SUPERIOR TRIBUNAl DE JUSTiCcedilA

esta encontra limites nas normas cogentes proacuteprias do direito bancaacuterio e na intervenccedilatildeo do Estado8

A seguranccedila juriacutedica desse tipo de relaccedilatildeo envolve tambeacutem a manutenshyccedilatildeo do segredo das movimentaccedilotildees financeiras do contribuinte

Imprimir-se a mais ampla seguranccedila nas relaccedilotildees do Sistema Financeiro eacute fortalececirc-lo O Estado tem o dever de zelar por esse estado de seguranccedila natildeo permitindo consequumlentemente que o sigilo bancaacuterio seja quebrado pelo acesshyso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico por esse comportamento afeshytar a confiabilidade no sistema

Eacute de todo inconveniente permitir a possibilidade de um atuar do agente fiscal sem controle na quebra do sigilo bancaacuterio por afetar diretamente a seshyguranccedila da relaccedilatildeo juriacutedica firmada entre a instituiccedilatildeo financeira e o seu clienshyte em face deste sentir-se atingido pela accedilatildeo fiscal que passa a tomar conhecishymento de sua intimidade financeira e de fatos de sua vida privada sem o resshypaldo do Poder Judiciaacuterio

A seguranccedila juriacutedica nesse tipo de relaccedilatildeo deve assegurar impossibilidashyde de abuso de poder por parte do Fisco em face da necessidade de ser resshyguardada a garantia de que em um Estado de Direito natildeo pode ser concebido que conceda-se a uma parte mesmo que seja o Estado o domiacutenio absoluto de apanhar as provas que iraacute utilizar em caso de litiacutegio contra algueacutem

O acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias do contribuinte aleacutem de afetar a seguranccedila juriacutedica da relaccedilatildeo em questatildeo promove um desequiliacutebro entre o cidadatildeo-contribuinte e o Fisco por caracterizar coaccedilatildeo que coloca aquele em posiccedilatildeo de inferioridade

A valorizaccedilatildeo da seguranccedila juriacutedica da relaccedilatildeo existente entre instituiccedilatildeo financeira e contribuinte pelo Fisco natildeo quebrando o seu sigilo fiscal sem autorizaccedilatildeo judicial constitui causa de aplicaccedilatildeo de Justiccedila fiscal O seguimenshyto de seus princiacutepios valoriza o regime democraacutetico do qual ela faz parte

6 Casos de admissibilidade da quebra do sigilo bancaacuterio

Os casos de admissibilidade da quebra do sigilo bancaacuterio estatildeo na atuashylidade descritos no nosso ordenamento juriacutedico positivo

A Lei Complementar n 105 de 10 de janeiro de 2001 apoacutes determinar no art 112 de que as instituiccedilotildees financeiras conservaratildeo sigilo em suas operashyccedilotildees ativas e passivas e serviccedilos prestados dispotildee no sect 312 do mesmo artigo que

8 Arnoldo Wald no artigo Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais Revista dos Tribunais ano 6 n 22 janeiromiddotmarccedilo de 1998 n 22 Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas p 15

ENSAIOS JURiacuteDICOS 253

sect 3ordm Natildeo constitui violaccedilatildeo do dever de sigilo

I a troca de informaccedilotildees entre instituiccedilotildees financeiras para fins cadastrais inclusive por intermeacutedio de centrais de risco observadas as normas baixadas pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e pelo Banco Censhytral do Brasil

11 - o fornecimento de informaccedilotildees constantes de cadastro de emitentes de cheques sem provisatildeo de fundos e de devedores inadimplentes a entidades de proteccedilatildeo ao creacutedito observadas as norshymas baixadas pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e pelo Banco Central do Brasil

JJI - o fornecimento das informaccedilotildees de que trata o sect 2ordm do art II da Lei n 9311 de 24 de outubro de 1996

IV - a comunicaccedilatildeo agraves autoridades competentes da praacutetica de iliacutecitos penais ou administrativos abrangendo o fornecimento de inforshymaccedilotildees sobre operaccedilotildees que envolvam recursos provenientes de qualshyquer praacutetica criminosa

V - a revelaccedilatildeo de informaccedilotildees sigilosas com o consentimento expresso dos interessados

VI- a prestaccedilatildeo de informaccedilotildees nos termos e condiccedilotildees estabeleshycidos nos artigos 2ordm 3ordm 4ordm 5ordm 6ordm 7ordm e 9ordm desta lei complementar

sect 4ordm A quebra de sigilo poderaacute ser decretada quando necessaacuteria para apuraccedilatildeo de ocorrecircncia de qualquer iliacutecito em qualquer fase do inqueacuterito ou do processo judicial e especialmente nos seguintes crimes

I - de terrorismo

11 - de traacutefico iliacutecito de substacircncias entorpecentes ou drogas afins

III - de contrabando ou traacutefico de armas municcedilotildees ou material destinado a sua produccedilatildeo

IV - de extorsatildeo mediante sequumlestro

V - contra o sistema financeiro nacional

VI - contra a Administraccedilatildeo Puacuteblica

Vll- contra a ordem tributaacuteria e a previdecircncia social

VIII-lavagem de dinheiro ou ocultaccedilatildeo de bens direitos e valores

IX - praticado por organizaccedilatildeo criminosa

Como visto a lei complementar enumera inuacutemeras situaccedilotildees que indeshypendentemente de autorizaccedilatildeo judicial o sigilo bancaacuterio eacute quebrado

254 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

A dificuldade que se apresenta eacute a de conciliar os casos de quebra de sigilo bancaacuterio que a Lei Complementar n 105 autoriza com a garantia do direito agrave privacidade e agrave intimidade

Destaque-se entre os de maior relevacircncia os seguintes

- natildeo constituir violaccedilatildeo do dever de sigilo bancaacuterio a troca de informashyccedilotildees entre instituiccedilotildees financeiras para fins cadastrais inclusive por intermeacuteshydio de centrais de risco o que possibilita o conhecimento da vida financeira privada do cidadatildeo por vaacuterias pessoas sem desempenho de autoridade na instituiccedilatildeo independentemente de ser justificada com antecedecircncia a causa desse atuar

- o de serem fornecidos dados relativos a fornecimentos de informashyccedilotildees cadastrais de emitentes de cheques sem provisatildeo de fundos a entidades privadas de proteccedilatildeo ao creacutedito sem qualquer avaliaccedilatildeo por qualquer autorishydade da causa determinante do fato a quebra do sigilo bancaacuterio na fase do inqueacuterito por inexistir nessa ocasiaacuteo qualquer contraditoacuterio e respeito ao prinshyciacutepio do devido processo legal

Quanto agraves demais situaccedilotildees constantes na lei complementar que autorishyzam a quebra do sigilo bancaacuterio naacuteo obstante algumas serem absolutamente necessaacuterias haacute de serem vistas em compatibilidade com as garantias constitushycionais conforme jaacute assinalado

O colendo Supremo Tribunal pronunciaraacute como guarda e inteacuterprete maishyor da Carta Magna em ADln jaacute intentada sobre a constitucionalidade ou natildeo dos dispositivos supramencionados

Em campo doutrinaacuterio valoriza-se as posiccedilotildees apresentadas quando da resposta oferecida aos questionamentos anteriores todas acenando pela neshycessidade do controle do Poder Judiciaacuterio

7 Sistema mais justo para a quebra do sigilo bancaacuterio

Os organizadores do JII Coloacutequio Internacional de Direito Tributaacuterio subshymetem agora para anaacutelise a questatildeo do teor seguinte Um sistema em que o Poder Judiciaacuterio torna-se aacuterbitro dos pedidos da Administraccedilatildeo Puacuteblica para quebra do sigilo eacute o mais justo

Em um Estado que por imposiccedilatildeo de sua proacutepria Constituiccedilatildeo estaacute comprometido com a guarda e aplicaccedilatildeo efetiva de princiacutepios democraacuteticos especialmente o de respeitar os direitos e garantias fundamentais da cidadashynia natildeo haacute ambiente para que seja outorgado ao Poder Executivo por via da atuaccedilatildeo de agentes puacuteblicos fiscais o acesso sem o controle do Poder Judiciaacuteshyrio agraves informaccedilotildees bancaacuterias do contribuinte

ENSAIOS JURiacuteDICOS 255

o sigilo bancaacuterio por ser um direito fundamental que exige ser respeitashydo pela supremacia constitucional que o protege deve submeter a possibilishydade de sua quebra para fins tributaacuterios ao Poder Judiciaacuterio pela ausecircncia de interesse direto nos resultados da accedilatildeo fiscalizadora que eacute o recolhimento do tributo e pelas garantias de independecircncia prudecircncia e qualificaccedilatildeo juriacutedica que revestem esse poder

A atuaccedilatildeo da fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo pode ser exercida fora dos limishytes da legalidade imposta a partir da Carta Magna e demais imposiccedilotildees legais a ela subordinadas

Natildeo se desconhece que no atual Estado fiscal os tributos constituem os meios financeiros determinantes para o atendimento dos compromissos da Administraccedilatildeo Puacuteblica com as obrigaccedilotildees oriundas em decorrecircncia de sua atividade no campo educacional social de seguranccedila puacuteblica interna e extershyna da sauacutede da manutenccedilatildeo dos Poderes ou seja para manter funcionando a maacutequina estatal

Por natildeo entremostrar-se na eacutepoca contemporacircnea qualquer outra alshyternativa viaacutevel para transformar o Estado fiscal em um Estado produtivo os tributos passam a representar um indeclinaacutevel dever da cidadania cujo cumshyprimento deve ser por todos honrado conforme assinala Joseacute Casalta Nabais Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra em artigo intitulado Algumas Reflexotildees sobre o Actual Estado Fiscal

Por isso os impostos hatildeo de constituir um preccedilo aceitaacutevel ou seja um preccedilo limitado Um preccedilo que estou certo muitas das sociedashydes que nos antecederam gostariam de ter pago e algumas das actuais natildeo enjeitariam suportar Por isso bem podemos afirmar como jaacute o fizeshymos noutro lugar que no actual Estado fiscal para o qual natildeo se vislumshybra qualquer alternativa viaacutevel pelo menos nos tempos mais proacuteximos os impostos constituem um indeclinaacutevel dever de cidadania cujo cumshyprimento a todos nos deve honrar

A atuaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio para liberar o bloqueio fortalece a conshyfianccedila do cidadatildeo no procedimento da fiscalizaccedilatildeo e consagra a ideacuteia iacutensita em qualquer regime democraacutetico de que a atuaccedilatildeo do Estado tem limites

Na espeacutecie os limites impostos satildeo os decorrentes da quebra do sigilo ser necessaacuterio em face da possiacutevel ilicitude cometida pelo cidadatildeo poreacutem sem ser violados os direitos do cidadatildeo de gozar da sua privacidade e da sua intimidade

A denominada cidadania fiscal haacute de ser considerada de modo conjunshytural com os reflexos dos direitos fundamentais assegurados ao contribuinte sem prestigiar a responsabilidade que tem o Estado de promover a arrecadashyccedilatildeo dos tributos

256 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

Cedo espaccedilo para registrar que a cidadania fiscal deve configurar um estado de relaccedilatildeo juriacutedica em que todos suportem a concretizaccedilatildeo de um Estado em que todos tenham a qualidade de destinataacuterio do dever fundashymentaI de pagar impostos na medida da respectiva capacidade contributiva poreacutem que seja um Estado fiscal suportaacutevel isto eacute um estado cujo sistema fiscal se encontre balizado por estritos limites juriacutedico-constitucionais9

A Administraccedilatildeo Tributaacuteria por melhor que seja a sua estrutura e os seus propoacutesitos natildeo estaacute emocionalmente preparada para conceber e aplicar os princiacutepios que sustentam a cidadania fiscal Isso ocorre primeiramente porshyque o Fisco tem por missatildeo exclusiva exercer a funccedilatildeo de arrecadar tributos Eacute a sua meta essencial por ser atribuiccedilatildeo que na organizaccedilatildeo administrativa estatal estaacute obrigado a desempenhar Natildeo lhe cabe administrar o tributo arreshycadado limitando-se unicamente a envidar esforccedilos para o cumprimento das metas impostas para imprimir aumento na arrecadaccedilatildeo tributaacuteria O sucesso da Administraccedilatildeo Tributaacuteria eacute medido pelo maior volume de recursos fiscais atraiacutedos para os cofres do Governo nunca pelo respeito que exerccedila para com os direitos fundamentais do contribuinte Eacute uma questatildeo de cultura adminisshytrativa de distribuiccedilatildeo de funccedilotildees no sistema estatal impossiacutevel de ser mudashydo por sugestotildees doutrinaacuterias

Por outro lado a fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo consegue afastar as pressotildees exercidas sobre ela por determinados segmentos da organizaccedilatildeo estatal que defendem uma atuaccedilatildeo mais agressiva para a cobranccedila dos tributos tudo em decorrecircncia dos efeitos produzidos pela conduta iliacutecita marcante da sonegashyccedilatildeo fiscal

Esses fatores contribuem para que a fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo tenha condiccedilotildees de modo imparcial sem isenccedilatildeo avaliar a necessidade objetiva da quebra do sigilo bancaacuterio do cidadatildeo Por melhor que seja o seu desempenho nunca ganharaacute a confianccedila do contribuinte

A atribuiccedilatildeo da quebra do sigilo bancaacuterio em um regime democraacutetico onde predomina o respeito maior aos direitos fundamentais da cidadania deve ser exercido pelo Poder Judiciaacuterio natildeo soacute porque seus membros atualmente revestidos da garantia da vitaliciedade inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos bem como porque estatildeo revestidos de independecircncia absoluta em relaccedilatildeo ao Poder interessado na cobranccedila do tributo e consequumlentemenshyte no resultado a ser obtido pela accedilatildeo fiscal

Esse sistema misto onde o Fisco faz a solicitaccedilatildeo motivada para a queshybra do sigilo bancaacuterio ao Poder Judiciaacuterio e este apoacutes analisaacute-lo com objetivishydade e cautela defere ou indefere impotildee seguranccedila e confiabilidade na atuashyccedilatildeo fiscal e sublima o respeito agrave dignidade do contribuinte em outras palavras da cidadania fiscal isto eacute de uma cidadania de liberdade que o Estado fiscal

9 Joseacute Casalta Nabais (Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra) no artigo Algumas Reflexotildees sobre o Actual Estado Fiscal no site httpagugovbr

ENSAIOS JURiacuteDICOS 257

pressupotildee para natildeo ser postergada impotildee um sistema fiscal balizado por esshytritos limites juriacutedico-constitucionais Limites esses que integram a chamada constituiccedilatildeo fiscal e que podemos reconduzir para natildeo nos alongarmos nesse aspecto a duas ideacuteias uma ideacuteia de seguranccedila que tem o seu tradicional e principal suporte no princiacutepio da lega1idade fiscal e uma ideacuteia de justiccedila ou equumlidade que tem a ver com a medida dos impostos e assenta no princiacutepio da capacidade contributiva 10

Em conclusatildeo a adoccedilatildeo de um sistema para a quebra do sigilo bancaacuteshyrio em que o Poder Judiciaacuterio seja o aacuterbitro dos pedidos da Administraccedilatildeo Puacuteblica natildeo eacute somente mais justo mas consegue impor maior credibilidade agrave atuaccedilatildeo fiscal e presta homenagem com intensa potencialidade aos princiacuteshypios democraacuteticos consistentes na guarda da seguranccedila juriacutedica do respeito aos direitos fundamentais do cidadatildeo nesse rol incluidos os agrave privacidade e agrave intimidade Aleacutem disso torna mais respeitaacutevel a relaccedilatildeo entre Fisco e contrishybuinte justificando portanto a opccedilatildeo do Estado pelo regime democraacutetico

8 Autoridade fiscal e faculdade incondicionada de quebrar o sigilo bancaacuterio

Essa indagaccedilatildeo consubstancia a preocupaccedilatildeo de serem estabelecidos controles para a atuaccedilatildeo do agente puacuteblico fiscal Centra-se a preocupaccedilatildeo em imprimir nas relaccedilotildees juriacutedicas tributaacuterias de quaisquer espeacutecies o primashydo da legalidade aprimorando-se o atuar vinculado

Natildeo concilia-se com os postulados da democracia a adoccedilatildeo de um sisteshyma de fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria que outorgue faculdade incondicionada ao fiscal tributaacuterio de invadir a intimidade e a privacidade das pessoas sob o falso argushymento juriacutedico de que busca encontrar provas de sonegaccedilatildeo fiscal

Depreende-se do exposto que a autoridade fiscal natildeo deve ter faculdade incondicionada de quebrar o sigilo sempre que entender necessaacuterio Isso porshyque a praacutetica de atos administrativos por agentes puacuteblicos de modo incondicionado revela grave violaccedilatildeo ao princiacutepio da legalidade onde predoshymina a vontade da lei e natildeo o discricionarismo de quem o pratica

No trato do sigilo bancaacuterio o atuar incondicionado da fiscalizaccedilatildeo assushyme caracteriacutesticas de maior gravidade porque haacute violaccedilatildeo aos princiacutepios funshydamentais jaacute expostos e que satildeo prestigiados pela Carta Magna especialmenshyte por bater de frente de modo integral e absoluto com o direito agrave intimidade e agrave privacidade O atuar deve vincular-se rigidamente ao princiacutepio da legalidashyde especialmente aposta na Carta Magna sem a possibilidade de ser aberto qualquer canal para uso da conveniecircncia ou da oportunidade

Eacute de ser lembrada no trato do assunto a liccedilatildeo de Joseacute Casalta Nobais no trabalho jaacute citado no sentido de que Eacute certo que independentemente da

10 Idem p 15

=258=---___________________ SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTlCA

concepccedilatildeo a que se adira relativamente ao segredo bancaacuterio natildeo temos a menor duacutevida de que o acesso da Administraccedilatildeo Fiscal agrave informaccedilatildeo bancaacuteria seja directo sem necessidade de preacutevia decisatildeo judicial seja indirecto depois portanto de preacutevia decisatildeo judicial haacute de ter sempre uma natureza claramenshyte excepcional Na verdade constitua o segredo bancaacuterio uma manifestaccedilatildeo do direito fundamental agrave reserva da intimidade da vida privada constante do art 26 n 2 da Constituiccedilatildeo portuguesa ou suporte um outro direito fundashymentai um direito agrave reserva da vida privada anaacutelogo agravequele a sua afectaccedilatildeo teraacute sempre caraacuteter excepcional

A autoridade fiscal natildeo possui a necessaacuteria isenccedilatildeo e competecircncia institucional para averiguar o grau dessa excepcionalidade de modo que posshysa impor confianccedila ao cidadatildeo investido na condiccedilatildeo de contribuinte poreacutem com direitos a serem assegurados por forccedila do regime democraacutetico adotado

O certo eacute que na relaccedilatildeo juriacutedico-tributaacuteria deve ser buscado o justo equiliacutebrio pregado pelo Estado de Direito onde o cidadatildeo deve ter a sua dignishydade respeitada sem contudo afastar-se a necessidade do Estado arrecadar tributos de forma cogente e imperativa bem como de serem permitidas conshydiccedilotildees de atuaccedilatildeo que resultem no combate agrave sonegaccedilatildeo fiscal

9 Responsabilidade da autoridade administrativa que quebrar o sigilo banshycaacuterio de forma inconsistente e indevida

Eacute inerente ao regime democraacutetico que a autoridade administrativa puacuteblishyca estaacute obrigada a exercer as suas atribuiccedilotildees com rigorosa obediecircncia aos princiacutepios da legalidade moralidade publicidade impessoalidade e eficiecircncia entre outros

A Carta Magna consagra expressamente no art 37 a obediecircncia do agente puacuteblico a esse tipo de comportamento

A autoridade administrativia que quebrar de modo inconsistente e indevido o sigilo bancaacuterio do cidadatildeo pratica ato com capacidade de provocar os seguintes efeitos a) de invadir o direito agrave privacidade e agrave intimidade de algueacutem b) de provocar-lhe danos morais e materiais dependendo da repershycussatildeo provocada pelo seu atuar

Constatada a efetivaccedilatildeo real de danos morais e materiais a responsabishylidade do Estado pode ser acionada conforme permite o art 37 sect 6ordm da Consshytituiccedilatildeo Federal Solidificada a culpa ou dolo do agente puacuteblico e consagrada a materializaccedilatildeo do iliacutecito praticado com o consequumlente ressarcimento patrimonial o Estado deveraacute usando o direito de regresso investir contra o agente que agiu culposa ou dolosamente

Natildeo resume-se apenas ao campo da responsabilidade civil a atuaccedilatildeo da autoridade quando ilegalmente quebra o sigilo bancaacuterio de qualquer cidadatildeo

ENSAIOS JURiacuteDICOS 259

o art 10 da Lei Complementar n 105 de 10 de janeiro de 2001 determishyna que A quebra de sigilo fora das hipoacuteteses autorizadas nesta lei compleshymentar constitui crime e sujeita os responsaacuteveis agrave pena de reclusatildeo de um a quatro anos e multa aplicando-se no que couber o Coacutedigo Penal sem prejuiacuteshyzo de outras sanccedilotildees cabiacuteveis A seguir no seu paraacutegrafo uacutenico explicita que Incorre nas mesmas penas quem omitir retardar injustificadamente ou presshytar falsamente as informaccedilotildees requeridas nos termos desta lei complementar

O art 11 da mesma lei complementar expressa que O servidor puacuteblico que utilizar ou viabilizar a utilizaccedilatildeo de qualquer informaccedilatildeo obtida em decorshyrecircncia da quebra de sigilo de que trata esta lei complementar responde pessoshyal e diretamente pelos danos decorrentes sem prejuiacutezo da responsabilidade objetiva da entidade puacuteblica quando comprovado que o servidor agiu de acorshydo com a orientaccedilatildeo oficial

10 O sigilo bancaacuterio e o tratamento que lhe eacute dado por oacutergatildeos internacioshynais como a OCDE e outros

Rui Celso Reali Fragoso Presidente do Instituto dos Advogados de Satildeo Paulo em artigo intitulado O Sigilo Bancaacuterio veiculado pela Internet (http Ii wwwjuscombr) registra que atualmente temos trecircs sistemas legais no munshydo cuidando do sigilo bancaacuterio O primeiro eacute o anglo-saxatildeo em que o sigilo natildeo encontra amparo legal o segundo eacute o dos paiacuteses da Europa continental - eu o contemplo em vaacuterios diplomas legais o terceiro eacute o da Suiacuteccedila e do Liacutebano que o reforccedilam

Analisando esses trecircs sistemas o autor citado observa

Haacute aparente contradiccedilatildeo no sistema inglecircs e norte-americano pois se de um lado nestes paiacuteses se eleva a garantia das liberdades individuais de outro se despreza o sigilo bancaacuterio Eacute que se ocorre conshyflito entre a apuraccedilatildeo de fatos (fator social) e a privacidade das pessoas (fator individual) prevalece a primeira Mais ainda o relacionamento de clientes e bancos longe de estabelececirc-lo serve como fonte de informashyccedilatildeo em favor de terceiros a indiscriccedilatildeo injustificada poreacutem eacute objeto de sanccedilatildeo E na Inglaterra os poderes puacuteblicos natildeo intervecircm no funcionashymento dos estabelecimentos privados de creacutedito o que debilita a invesshytigaccedilatildeo

Nos paiacuteses da Europa continental a legislaccedilatildeo contempla o sigilo bancaacuterio como consequumlecircncia do profissional e comporta derrogaccedilotildees na esfera penal e em alguns casos na civil mas comina sanccedilotildees crimishynais no caso de violaccedilatildeo ao sigilo (Coacutedigo Penal francecircs artigo 378 Coacuteshydigo Penal italiano art 622)

260 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

A sistemaacutetica fortalecida eacute aquela utilizada na Suiacuteccedila decorrente da crise ocorrida em 1931 com o fechamento do Banco de Genebra que ensejou a ediccedilatildeo de lei estabelecendo severas puniccedilotildees de natureza civil e criminal Tanto a legislaccedilatildeo suiacuteccedila como a libanesa esta surgida em 1956 permitem derrogaccedilotildees em certas hipoacuteteses A existecircncia das conshytas numeradas comprova a importacircncia do sigilo nestes paiacuteses

Eacute certo natildeo ser absoluto o segredo nem sua quebra em determishynadas situaccedilotildees significa abuso de poder Aliaacutes nenhum direito eacute absoluto

A doutrina tem ultimamente tomado conhecimento sobre as transforshymaccedilotildees que tem passado em vaacuterios ordenamentos juriacutedicos a questatildeo do sigilo bancaacuterio

Zenobio Simotildees de Melo advogado no Paranaacute em artigo sob o tiacutetulo Quebra do Sigilo Bancaacuterio (Internet httpjuscombr) informa que o jornal O Estado de Satildeo Paulo de 21 de junho de 2000 publicou a notiacutecia seguinte

Numa das mais importantes decisotildees adotadas durante o Conseshylho Europeu que marca o fim da presidecircncia portuguesa da Uniatildeo Euroshypeacuteia (UE) seus 15 paiacuteses aprovaram ontem o pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal No ponto mais polecircmico o pacote deveraacute acabar com o sigilo bancaacuterio ateacute 2010 foi uma negociaccedilatildeo de 12 anos Aacuteustria e Luxemburgo natildeo aceitavam o princiacutepio de acabar com o sigilo bancaacuterio A justificativa austriacuteaca eacute que este eacute um princiacutepio que faz parte da Consshytituiccedilatildeo do paiacutes haacute 200 anos Para aceitar o acordo o paiacutes exigiu a manushytenccedilatildeo do sigilo nos bancos austriacuteacos para quem resida no paiacutes

Registro a iacutentegra da notiacutecia

Pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal eacute aprovado por membros da UE Decisatildeo prevecirc quebra do sigilo bancaacuterio nos paiacuteses do bloco econocircmico

Jair Rattner

Especial para o Estado

Santa Maria da Feira Portugal- Numa das mais importantes decishysotildees adotadas durante o Conselho Europeu que marca o fim da presishydecircncia portuguesa da Uniatildeo Europeacuteia (UE) seus 15 paiacuteses aprovaram ontem o pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal No ponto mais polecircmico o pashycote deveraacute acabar com o sigilo bancaacuterio ateacute 2010

Foi uma negociaccedilatildeo de 12 anos Agora temos um documento que vai estabelecer os princiacutepios e as orientaccedilotildees para as futuras diretivas nessa aacuterea afirmou o Primeiro-Ministro Portuguecircs Antonio Guterres que ocupa a presidecircncia rotativa da UE (no fim do mecircs ela seraacute transferida para a Franccedila)

ENSAIOS JURiacuteDICOS 261

o acordo abrange trecircs aacutereas um coacutedigo de conduta que prevecirc o desmantelamento dos 66 paraiacutesos fiscais existentes ou dependentes da UE a tributaccedilatildeo de royalties e o pagamento de impostos sobre rendishymentos das poupanccedilas de cidadatildeos europeus residentes em outros paiacuteshyses dentre os 15 que fazem parte do bloco econocircmico europeu

O grande problema eram as poupanccedilas Aacuteustria e Luxemburgo natildeo aceitavam o princiacutepio de acabar com o sigilo bancaacuterio A justificativa austriacuteaca eacute que este eacute um princiacutepio que faz parte da Constituiccedilatildeo do paiacutes haacute 200 anos Para aceitar o acordo o paiacutes exigiu a manutenccedilatildeo do sigilo nos bancos austriacuteacos para quem resida no paiacutes Essa questatildeo natildeo eacute importante soacute para a Europa porque abre caminho para a criaccedilatildeo de mecanismos de transparecircncia global no mundo financeiro que satildeo esshysenciais para a globalizaccedilatildeo da economia avaliou Guterres

O prazo para a introduccedilatildeo das mudanccedilas vai ateacute o fim de 2010 Ateacute o fim deste ano as negociaccedilotildees vatildeo ser sobre a definiccedilatildeo do conteuacutedo das diretivas (as normas da UE)

Em 2002 a UE discutiraacute com outros paiacuteses esses conteuacutedos para fazer acordos que deveratildeo ser aprovados ateacute o fim do ano por unanimishydade

A partir de 2003 seraacute iniciado um periacuteodo de sete anos de transishyccedilatildeo para a troca de informaccedilotildees sobre os investimentos de cidadatildeos de outros paiacuteses europeus Nesse periacuteodo alguns paiacuteses poderatildeo optar por cobrar impostos de 20 a 25 sobre os rendimentos dos investimentos de residentes no exterior

No capiacutetulo onde foi analisado o sigilo bancaacuterio no Direito Comparado haacute registros tambeacutem a respeito do tratamento que oacutergatildeos internacionais como o OCDEll e outros vecircm dando ao sigilo bancaacuterio conforme estudo que foi apresentado pelo autor ali citado

II OCDE (Organizaccedilatildeo de Cooperaccedilatildeo e Desenvolvimento Econocircmico) criado em 1961 para substituir a OECE (Comitecirc Fiscal da Organizaccedilatildeo Europeacuteia de Cooperaccedilatildeo Econocircmica) Um dos documentos mais importantes da OCDE eacute o resultante da sua Convenccedilatildeo-Modelo relashytiva a impostos sobre a renda e o capital Essa Convenccedilatildeo estaacute sistematizada em sete capiacutetulos assim explicitados por Alberto Xavier em sua obra Direito Tributaacuterio Internacioshynal do Brasil A Convenccedilatildeo-Modelo da OCDE (tal como a das Naccedilocirces Unidas) encontra-se sistematizada em sete capiacutetulos Os capiacutetulos I e I regulam os requisitos para a aplicaccedilatildeo do tratado O capiacutetulo [JI - de longe o mais importante - conteacutem as regras de distribuiccedilatildeo de competecircncia no que concerne aos impostos sobre o rendimento classificado este por tipos ou classes agrave semelhanccedila do que sucede nos sistemas de tributaccedilatildeo cedular O capiacutetulo IV ocupa-se das regras de distribuiccedilatildeo de competecircncia no que respeita aos impostos sobre o capital O capiacutetulo V determina as consequumlecircncias das regras dos capiacutetulos 111 e IV facultanshydo aos Estados a escolha entre os meacutetodos da isenccedilatildeo e da imputaccedilatildeo O capiacutetulo VI conteacutem disposiccedilotildees adicionais sobre natildeo-discriminaccedilatildeo procedimento amigaacutevel troca de informaccedilotildees e privileacutegios de funcionaacuterios diplomaacuteticos e consulares e regras sobre extenshysatildeo do tratado a partes do territoacuterio Enfim o capiacutetulo VII conteacutem disposiccedilotildees finais sobre entrada em vigor e cessaccedilatildeo do acordo

262 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

Heleno Torres em sua recente obra Direito Tributaacuterio Internacional -Planejamento Tributaacuterio e Operaccedilotildees Transnacionais RT p 147 analisando o posicionamento da OCDE referente agrave poliacutetica de determinados paiacuteses que adoshytam tributaccedilatildeo favorecida e os efeitos dos regimes fiscais prejudiciais registra que

A OCDE resolveu entrar na luta para minorar as praacuteticas fiscalshymente danosas insistindo sobre a necessidade de aumentar as trocas de informaccedilotildees entre os Estados aleacutem de redigir uma lista de paiacuteses com tributaccedilatildeo favorecida e fazer algumas recomendaccedilotildees em acircmbito nacional e convencional a partir do seu importante relatoacuterio Harmful tax competition na emerging global issue

Mesmo reconhecendo os aspectos positivos do ambiente global vigente no qual os sistemas tributaacuterios operam os paiacuteses-membros da OCDE concluiacuteram que eles precisavam agir para restringir a competiccedilatildeo tributaacuteria danosa coletivamente e individualmente opondo-se agrave expanshysatildeo de regimes de impostos preferenciais danosos particularmente nos setores financeiros e atividades de serviccedilo que podem causar distorccedilotildees no comeacutercio e desniacuteveis nos padrotildees de investimento sendo uma ameashyccedila para os sistemas tributaacuterios domeacutesticos e para a estrutura global de tributaccedilatildeo internacional

Mais adiante pp 152153 Heleno Torres afirma que

Entre as recomendaccedilotildees definidas nesse relatoacuterio com aplicashyccedilatildeo dirigida aos paiacuteses-membros da instituiccedilatildeo as mais importantes satildeo as seguintes

bull para contrastar a competiccedilatildeo fiscal prejudicial os paiacuteses devem revisar as suas leis regulamentos e praacuteticas sobre sigilo bancaacuterio para remover empecilhos de acesso a tais informaccedilotildees por autoridades fiscais

bull intensificar o uso de trocas de informaccedilotildees principalmente soshybre as transaccedilotildees com paiacuteses de tributaccedilatildeo favorecida

A conclusatildeo que pode ser firmada apoacutes anaacutelise dos pronunciamentos internacionais acima explicitados eacute a construccedilatildeo de uma corrente que defenshyde uma maior abertura para a quebra do sigilo bancaacuterio quando for necessaacuteshyrio para apurar iliacutecitos tributaacuterios

Essa portanto eacute a resposta que apresento para a indagaccedilatildeo Qual o tratamento proposto por oacutergatildeos internacionais como o OCDE e outros com relaccedilatildeo ao sigilo bancaacuterio

ENSAIOS JURiacuteDICOS 263

11 Compatibilizaccedilatildeo do combate agrave criminalidade internacional com o resshypeito agrave seguranccedila juriacutedica a fim de evitar a fuga de investimentos do Paiacutes

Haacute de se reconhecer natildeo ser faacutecil desenvolver-se um sistema juriacutedico que contenha regras que facilitem o combate agrave criminalidade internacional e ao mesmo tempo prestigie os direitos fundamentais do cidadatildeo especialmenshyte a sua seguranccedila juriacutedica

As convenccedilotildees internacionais conforme demonstrado estatildeo preocupashydas com esses aspectos sem deixar de lado os fenocircmenos causados pela globalizaccedilatildeo

Natildeo deve ser esquecido que o tema envolve aspectos diversos a comeshyccedilar pelos determinantes da soberania dos Estados das forccedilas em expansatildeo das organizaccedilotildees internacionais e da pregaccedilatildeo para que os direitos fundamenshytaIacutes do cidadatildeo sejam respeitados com maior Iacutentensidade

A soluccedilatildeo a meu pensar pode ser encontrada no fortalecimento do Direito Comunitaacuterio Os Estados por via de organismos internacionais firmashyriam tratados para a adoccedilatildeo de um Coacutedigo Processual Penal Internacional com efeitos vinculantes por parte das naccedilotildees onde seriam adotadas regras investigatoacuterias e apuratoacuterias dos iliacutecitos internacionais alargando os conceitos de indiacutecios e presunccedilotildees sem deixar contudo de prestigiar a afetividade dos direitos e garantias fundamentais do cidadatildeo

Todas as naccedilotildees no iniacutecio deste seacuteculo envidam esforccedilos para diminuir a crise da seguranccedila juriacutedica Satildeo vaacuterios os fatores determinantes todos tendo como causa comum o crescimento da delinquumlecircncia em decorrecircncia de poliacutetishycas econocircmicas e sociais adotadas por determinados governos que contrishybuem para aumentar o percentual de pessoas pobres

A preocupaccedilatildeo atual para o combate ao crime internacional eacute alcanccedilar niacutevel de uniformizaccedilatildeo dos sistemas adotados para a quebra do sigilo bancaacuteshyrio De iniacutecio deve ser defendida a postura de que nenhuma lesatildeo ou ameaccedila a direito deve ser excluiacuteda da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio Nessa perspectishyva ganha suma importacircncia a criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional em virshytude de pela sua atuaccedilatildeo natildeo perdurar a diversidade de sistemas legais a respeito do assunto a saber a) O anglo-saxatildeo onde o sigilo natildeo encontra amparo legal b) o dos paiacuteses da Europa continental que o contempla em vaacuterios diplomas escritos e c) o da Suiacuteccedila e do Liacutebano que o reforccedilam l2bull

A criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional envolve uma reconceiacutetuaccedilatildeo de soberania

Sobre o tema Celso D de Albuquerque Mello em Direito Internacional da Integraccedilatildeo Ed Renovar p 13 faz a seguinte observaccedilatildeo

12 Conforme anota Rui Celso Reali Fragoso no artigo O Sigilo Bancaacuterio publicado no site httpvvwwjuscombr

264 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Poder-se-ia fazer um pequeno reparo a Chaumont que a indeshypendecircncia nacional eacute um conceito juridicamente indeterminado e que ela pode ter diferentes graus Tanto que podemos escrever soberania versus cooperaccedilatildeo internacional apesar de reconhecermos que esta posiccedilatildeo pode ser considerada como radical vez que natildeo haacute uma total incompatibilidade entre as duas Entretanto natildeo se pode deixar de consshytatar que de certo modo a cooperaccedilatildeo internacional se encontra conshysagrada na Carta da ONU no arl 1 ordm que trata dos Propoacutesitos das Naccedilotildees Unidas e nos Princiacutepios estabelecidos na Carta da OEA (Capiacutetulo 11) O mesmo ocorre na resoluccedilatildeo da Assembleacuteia Geral da ONU de 1970 que aprova a Declaraccedilatildeo Relativa aos Princiacutepios do Direito Internacional Reshylativas agraves Relaccedilotildees Amigaacuteveis e agrave Cooperaccedilatildeo entre os Estados conforme a Carta das Naccedilotildees Unidas bem como na Carta de Direitos e Deveres Econocircmicos aprovada pela mesma Assembleacuteia Geral em 1974

O crescimento do crime internacional em decorrecircncia dos fenocircmenos globalizantes determina o surgimento de um dever juriacutedico dos Estados firmashyrem pactos de cooperaccedilatildeo entre si para que enfrentem as organizaccedilotildees voltashydas para a criminalidade Esse dever juriacutedico globalizado tem suas raiacutezes no moral intemacional que conforme assinala Celso Albuquerque Mello na obra citada p 13 sempre consagrou o princiacutepio da solidariedade ou ainda do auxiacutelio muacutetuo

Eacute o mais importante desafio neste iniacutecio de seacuteculo fazer com que surja uma legislaccedilatildeo internacional que compatibilize o combate agrave criminalidade inshyternacional sem violar a seguranccedila juriacutedica com finalidade exclusiva de evitar a fuga de investimenos do Paiacutes

Tenha-se contudo em consideraccedilatildeo que a globalizaccedilatildeo do crime emshybora seja uma grande ameaccedila aos valores tradicionais que sustentam a cidashydania especialmente a seguranccedila juriacutedica natildeo deve prejudicar o desenvolvishymento econocircmico de qualquer naccedilatildeo

Natildeo faccedilo coro ao assinalado por Eric Hobsbawm em sua obra Era dos Extremos O Breve Seacuteculo XX 1914-1991 1995 p 24 Companhia das Letras S Paulo traduccedilatildeo de Marcos Santarrita no sentido de que Talvez a caracteriacutesshytica mais impressionante do fim do seacuteculo XX seja a tensatildeo entre esse processo de globalizaccedilatildeo cada vez mais acelerado e a incapacidade conjunta das instishytuiccedilotildees puacuteblicas e do comportamento coletivo dos seres humanos de se acoshymodarem a ele

Penso que natildeo haacute essa acomodaccedilatildeo e que as instituiccedilotildees puacuteblicas espeshycialmente as submetidas ao controle da ciecircncia juriacutedica natildeo estatildeo incapacitashydas de encontrar caminhos que solucionem o problema existente

ENSAIOS JURiacuteDICOS 265

Eacute por demais positivo entre outros acontecimentos o fato da conscienshytizaccedilatildeo de que haacute de ser encontrada uma forma de combate agrave criminalidade internacional que natildeo afaste a garantia da seguranccedila juriacutedica Esta eacute uma neshycessidade para impor paz agrave naccedilatildeo e consequumlentemente criar ambiente para que novos investimentos necessaacuterios ao desenvolvimento do seu processo econocircmico aconteccedilam sem se falar na manutenccedilatildeo dos jaacute existentes

O Parlamento Europeu aprovou ultimamente uma resoluccedilatildeo sobre a criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional sob a consideraccedilatildeo de que eacute necessaacuteshyrio criaacute-lo de forma permanente para complementar os sistemas judiciais nashycionais e pocircr fim agrave impunidade de que gozam os responsaacuteveis por genociacutedio crimes contra a humanidade e crimes de guerra

A abertura para essa posiccedilatildeo denota a formaccedilatildeo de uma consciecircncia internacional para combater a criminalidade internacional em todos os niacuteveis contribuindo para fortalecer a seguranccedila juriacutedica interna de cada paiacutes

O documento representativo dessa resoluccedilatildeo eacute do teor seguinte

Parlamento Europeo

Resolucioacuten sobre el Tribunal Penal Internacional

EI Parlamento Europeo

Vistas sus anteriores resoluciones sobre un Tribunal Penal Interna-cional

A Considerando que es necesario crear un Tribunal Penallnternashycional permanente que complemente los sistemasjudiciales nacionales y ponga fin a la impunidad de que gozan los responsables de genocidio crimenes contra la humanidad y criacutemenes de guerra

B Considerando que la Comisioacuten de Derechos Humanos de las Naciones Unidas estaacute respaldando decididamente la creacioacuten de ese Trishybunal

C Considerando que la fase preparatoria de la creacioacuten dei Tribushynal Penal Internacional finalizoacute con la uacuteltima sesioacuten dei Comiteacute Preparatorio de las Naciones Unidas que tuvo lugar dei 16 de marzo al3 de abril de 1998

D Felicitaacutendose por la creciente participacioacuten de Estados en el proceso de negociaciones y esperando que un nuacutemero auacuten mayor de Esshytados procedentes de todas las regiones se encuentre plenamente represhysentado en la Conferencia Diplomaacutetica de Roma

E Considerando que dei 15 de junio al17 de julio de 1998 se celebra en Roma la Conferencia Diplomaacutetica de Plenipotenciarios para la constitucioacuten de un Tribunal Penal Internacional

266 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

F Considerando que los Estados miembros y la delegacioacuten de la Comisioacuten Europea que participan en la Conferencia Diplomaacutetica de Roma pueden desempenar un papel crucial a la hora de garantizar el eacutexito de la conclusioacuten de esta Conferencia Diplomaacutetica y acogiendo positivamente la mayor convergenciacutea de las posturas de los Estados miembros de la UE

G Congratulaacutendose por la oferta dei Gobierno de los Paiacuteses Bajos de servir de sede dei Tribunal Penal Internacional permanente

I Insta a la Conferencia Diplomaacutetica de Roma a aprovechar la oportunidad histoacuterica de concluir un texto de Estatuto para un Tribunal Penal Internacional independiente justo y eficaz

2 Insta a los representantes de los Estados miembros dei Consejo y de la Comisioacuten a garantizar activamente el ecircxito de los resultados a sashyber un auteacutentico Tribunal Penal Internacional en lugar de limitarse a un acuerdo de compromiso sobre principios esenciales en sus esfuerzos por conciliar las posturas de Estados reticentes

3 Destaca que para constituir un complemento eficaz de los sisteshymas judiciacuteales nacionales el Estatuto dei Tribunal Penal Internacional permanente objeto de la Conferencia de Roma deberaacute establecer

a un Fiscal independiente con competencias para investigare insshytruir sumarios por propia iniciativa en situaciones en las que se hayan cometido los delitos sometidos a lajurisdiccioacuten dei Tribunal

b Ia jurisdiccioacuten inherente y universal dei Tribunal en materia de genocidio criacutemenes contra la humanidad criacutemenes de guerra y agresioacuten sin que se requiera ninguacuten consentimiento dei Estado

c una buena relacioacuten de trabajo con los Tribunales lnternacionales ya establecidos en La Haya

d una relacioacuten constructiva con las Naciones Unidas yen partishycular con el Consejo de Seguridad basada en el pleno reconocimiento de sus respectivas funciones y competencias

e Ia obligacioacuten de los Estados firmantes de acatar y hacer cumplir sin demora las oacuterdenes y decisiones dei Tribunal

f los mayores niveles de respeto de los derechos de los acusados y de los sospechosos y de proteccioacuten de los intereses de las viacutectimas y de los testigos

g Ia garantiacutea de una financiacioacuten a largo plazo necesaria para asegurar la autonomiacutea e independencia dei Tribunal frente a cualquier presioacuten exterior

4 Destaca ademaacutes que la jurisdiccioacuten deI Tribunal sobre los delishytos de genociacutedio los criacutemenes contra la humanidad y los criacutemenes de

ENSAIOS JURiacuteDICOS 267

guerra deben considerarse con la misma calificacioacuten penal con indepenshydencia de que se hayan cometido en conflictos armados internacionales o en conflictos internos

5 Insta ai Consejo y a los Estados miembros a garantizar la universalidad y la transparencia de las negociaciones y la participacioacuten continuada de la comunidadjuriacutedica y la sociedad civil internacionales

6 Encarga a su Presidente que transmita la presente resolucioacuten ai Consejo a la Comisioacuten a los Gobiernos de los Estados miembros ai Secreshytario General de las Naciones Unidas ai Presidente de la Asamblea Geneshyral de las Naciones Unidas y ai Presidente de la Conferencia Diplomaacutetica de las Naciones Unidas para la constitucioacuten de un Tribunal Penal Internashycional

A resoluccedilatildeo supracitada demonstra que cresce a conscientizaccedilatildeo da necessidade de ser criado um Tribunal Penal Internacional com forccedila cogente obrigatoacuteria de suas decisotildees no acircmbito interno dos paiacuteses que participarem do pacto de sua constituiccedilatildeo

A doutrina internacional revela que a comunidade internacional somenshyte agora vem se preocupando em criar uma estructura internacional para determinar las responsabilidades individuales emergentes de violacioacuten de ciertos derechos baacutesicos dei ser humano Los mecanismos de responsabilidad estatal creados desde los 60 se dirigen a la mayor protecciotilden dei ser humano y la erradicacioacuten de las praacutecticas de volacioacuten sistemaacutetica de los derechos humanos ar via de la condena ai Estado que ordena o que tolera los abusos por lo cual se estructuraron entorno ai Estado conmo sujeto responsable Como haacute seflalado la Corte Internacional de Derechos Humanos el procedimiento ante ella no es un procedimiento penal lo que se busca determinar es el nivel de cumprimiento por parte de un Estado de sus obligaciones de derecho internacional Sin desconocer la importancia de determinar la responsabilidad dei Estado para que eacuteste tenga un incentivo para erradicar esas praacutectica de sus frotneras es pertinente detacar que las violaciones maacutes grave son en uacuteltima instancia coshymetidas por individuos (Francisco Cox Encarregado dei TPI HOH em artigo intitulado EI IlOH ante la Craciotilden de um Tribunal Penal Internacional no site httpwwwiidhedcrcpitpintrohtml)

A criaccedilatildeo de um Tribunal Penal Internacional atuaria permanentemente e teria competecircncia subsidiaacuteria em relaccedilatildeo agrave outorgada aos Tribunais Nacioshynais limitando-se a atuar apenas nos crimes internacionais previamente defishynidos como sendo do interesse da comunidade global

Merece registro no acircmbito do assunto tratado que na Conferecircncia Reshygional sobre o Tribunal Penal Internacional realizada em 18 e 19 de fevereiro de 1998 na cidade de Guatemala Guatemala um dos temas tratados foi o relativo

268 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

agrave harmonizaccedilatildeo das incriminaccedilotildees quando os seguintes aspectos foram disshycutidos Branqueamento corrupccedilatildeo fraude fiscal participaccedilatildeo em associashyccedilotildees criminosas um olhar agrave luz dos direitos nacionais e do direito internacioshynal Perspectivas Quais os comportamentos a incriminar Criar uma nova incriminaccedilatildeo da fraude fiscal Uma tentativa de harmonizaccedilatildeo o corpus jurls contendo disposiccedilotildees penais para proteccedilatildeo dos interesses financeiros da Uniatildeo Europeacuteia As negociaccedilotildees no seio do Conselho da Europa e da OCDE referenshytes agrave luta contra a corrupccedilatildeo etc O referido painel foi presidido por Benoit Dejemeppe procurador do Rei em Bruxelas e contou com a presenccedila de Tereshyza Beleza professora de Direito Penal na Faculdade de Direito de Lisboa como moderadora

Haacute como visto um largo campo de anaacutelise para desenvolver com possishybilidade do surgimento de sugestotildees que levem a ciecircncia juriacutedica a alcanccedilar com a atuaccedilatildeo estatal uma competecircncia internacional que possa combater o crime internacional e ao mesmo tempo proporcione seguranccedila juriacutedica na ordem interna ganhando assim o sistema juriacutedico confianccedila dos investidoshyres

Em conclusatildeo a forma de compatibilizar o combate agrave criminalidade internacional sem violar a seguranccedila juriacutedica necessaacuteria a evitar a fuga de inshyvestimentos do paiacutes estaacute na criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional com comshypetecircncia definida para processar e julgar delitos globalizantes e cujas decisotildees tenham forccedila imperativa no acircmbito interno das naccedilotildees participantes do pacto para o seu nascimento

Page 16: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro

238 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

Desses trecircs paiacuteses hoje remanescem apenas dois Com efeito Portugal deixou de integrar esse grupo constrangedoramente minoritaacuterio ao aprovar em 29 de dezembro de 2000 a Lei n 30-G

Nesse diploma lecirc-se

Lei da Reforma de Tributaccedilatildeo do Rendimento

(Portugal)

Artigo 63 O - B

Acesso a informaccedilotildees e documentos bancaacuterios

1 A administraccedilatildeo tributaacuteria tem o poder de aceder directashymente aos documentos bancaacuterios nas situaccedilotildees de recusa da sua exibiccedilatildeo ou de autorizaccedilatildeo para a sua consulta

a) quando se trate de documentos de suporte de registos contabiliacutesticos dos sujeitos passivos de IRS e IRC que se enconshytrem sujeitos agrave contabilidade organizada

b) quando o contribuinte usufrua de benefiacutecios fiscais ou de regimes fiscais privilegiados havendo necessidade de controshylar os respectivos pressupostos e apenas para esse efeito

2 A administraccedilatildeo tributaacuteria tem o poder de aceder a todos os documentos bancaacuterios excepto as informaccedilotildees prestadas para justificar o recurso ao creacutedito nas situaccedilotildees de recusa de exibiccedilatildeo daqueles documentos ou de autorizaccedilatildeo para a sua consulta

a) quando se verificar a impossibilidade de comprovaccedilatildeo e quantificaccedilatildeo directa e exacta da mateacuteria tributaacutevel nos termos do artigo da Lei Geral Tributaacuteria e em geral quando estejam verifishycados os pressupostos para o recurso a uma avaliaccedilatildeo indirecta

b) quando os rendimentos declarados em sede de IRS se afastarem significativamente para menos sem razatildeo justificada dos padrotildees de rendimento que razoavelmente possam permitir as manifestaccedilotildees de riqueza evidenciadas pelo sujeito passivo nos termos do artigo 89-A da Lei Geral Tributaacuteria

c) quando existam indiacutecios da praacutetica de crime doloso em mateacuteria tributaacuteria designadamente nos casos de utilizaccedilatildeo de facturas falsas e em geral nas situaccedilotildees em que existam factos concretamente identificados gravemente indiciadores da falta de veracidade do declarado

d) quando seja necessaacuterio para fins fiscais comprovar a aplicaccedilatildeo de subsiacutedios puacuteblicos de qualquer natureza

ENSAIOS JUAlolCOS 239

3 As decisotildees da administraccedilatildeo tributaacuteria referidas nos nuacuteshymeros anteriores devem ser fundamentadas com expressa menshyccedilatildeo dos motivos concretos que as justificam pressupotildeem a audishyccedilatildeo preacutevia do contribuinte e satildeo da competecircncia do Director-Geshyral dos Impostos ou do Director-Geral das Alfacircndegas e dos Imshypostos Especiais sobre o consumo ou seus substitutos legais sem possibilidade de delegaccedilatildeo

4 Os actos praticados ao abrigo da competecircncia definida no nuacutemero anterior satildeo susceptiacuteveis de recurso judicial o qual teraacute efeito suspensivo nas situaccedilotildees previstas no n 2

5 Nos casos de deferimento do recurso previsto no nuacutemero anterior os elementos de prova entretanto obtidos natildeo podem ser utilizados para qualquer efeito em desfavor do contribuinte

6 As entidades que se encontrem numa relaccedilatildeo de domiacutenio com o contribuinte ficam sujeitas aos regimes de acesso agrave inforshymaccedilatildeo bancaacuteria referidos nos n 1 e 2

7 O acesso da administraccedilatildeo tributaacuteria a informaccedilatildeo banshycaacuteria relevante relativa a familiares ou terceiros que se encontrem numa relaccedilatildeo especial com o contribuinte depende de autorizashyccedilatildeo judicial expressa apoacutes audiccedilatildeo do visado obedecendo aos requisitos previstos no n 3

8 O regime previsto nos nuacutemeros anteriores natildeo prejudica a legislaccedilatildeo aplicaacutevel aos casos de investigaccedilatildeo por infracccedilatildeo peshynal e soacute pode ter por objecto operaccedilotildees e movimentos bancaacuterios realizados apoacutes a sua entrada em vigor sem prejuiacutezo do regime vigente para as situaccedilotildees anteriores

9 Os actos praticados ao abrigo da competecircncia prevista no n I devem ser objecto de comunicaccedilatildeo ao Defensor do Contrimiddot buinte

10 Para os efeitos desta lei considera-se documento bancaacuteshyrio qualquer documento ou registo independentemente do resshypectivo suporte em que se titulem comprovem ou registem opeshyraccedilotildees praticadas por instituiccedilotildees de creacutedito ou sociedades finanshyceiras no acircmbito da respectiva actividade incluindo os referentes a operaccedilotildees realizadas mediante utilizaccedilatildeo de cartotildees de creacutedito (coacutepia anexa)

Parece evidente destarte que todo o mundo civilizado abandonou a possibilidade de opor-se agrave Administraccedilatildeo Tributaacuteria o sigilo bancaacuterio

240 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

4 O sigilo bancaacuterio e o direito agrave intimidade e agrave privacidade das pessoas

A anaacutelise do sigilo bancaacuterio em face do direito agrave intimidade e agrave privacidashyde exige inicialmente que seja enfrentada a questatildeo referente ao seu conceito

Os doutrinadores natildeo tecircm assumido posiccedilatildeo uniforme quanto aos asshypectos conceituais dessa entidade juriacutedica

Seacutergio Carlos Covello autor da obra jaacute mencionada (O Sigilo Bancaacuterio Leud S Paulo 1991 p 69) entende que sigilo bancaacuterio eacute a obrigaccedilatildeo que tecircm os Bancos de natildeo revelar salvo justa causa as informaccedilotildees que venham a obter em virtude de sua atividade profissional

Luiz Fernando Bellinetti no artigo intitulado Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio (Revista do Direito do Consumidor Satildeo Paulo RT 1996 voI 18 p 144) defende posiccedilatildeo no sentido de que sigilo bancaacuterio eacute o dever juriacutedico que tecircm as instituiccedilotildees de creacutedito e as organizaccedilotildees auxiliares e seus empregados de natildeo revelar salvo justa causa as informaccedilotildees que venham a obter em virtushyde da atividade bancaacuteria a que se dedicam

Para Arnoldo Wald (in O Sigilo Bancaacuterio no Projeto de Lei Complemenshytar n 70 Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas n I pp 196209) o sigilo bancaacuterio se enquadra no conceito mais amplo do segredo profissional que tem merecido uma proteccedilatildeo mais ampla ensejando sua violaccedilatildeo caracterizaccedilatildeo como crime (art 154 do Coacutedigo PeshynaI)

Eivany A Silva tratando do tema em Consideraccedilotildees a Respeito do Sigilo de Dados (artigo publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio n 61 pp 41142 - Edit Dialeacutetica) afirma que o sigilo bancaacuterio eacute espeacutecie do gecircnero sigilo de dados constituindo um direito fundamental protegido constitucionalmente inserto que estaacute no rol dos direitos e garantias individuais ou seja em claacuteusushylas peacutetreas da Carta Magna natildeo podendo portanto ser modificado nem messhymo por emenda agrave Constituiccedilatildeo e portanto muito menos por legislaccedilatildeo de hierarquia inferior

Como examinado haacute divergecircncias na fixaccedilatildeo do conceito Essas divershygecircncias embora importantes para as posiccedilotildees doutrinaacuterias a serem assumishydas sobre o alcance do sigilo bancaacuterio natildeo geram contudo influecircncias de maior intensidade no relacionamento entre a instituiccedilatildeo financeira e os seus depositantes Isso porque o que merece ser considerado eacute a natureza juriacutedica do sigilo bancaacuterio isto eacute a que categoria de direito pertence e como por quem e quando a sua quebra pode ser determinada

Em face do exposto necessaacuterio eacute que se faccedila o alinhamento das teorias que procuram fundamentar o sigilo bancaacuterio

A doutrina em eacutepocas diversas examinou as seguintes teorias

ENSAIOS JURiacuteDICOS 241

Teoria contratualista O sigilo bancaacuterio de acordo com essa teoria deshycorre da relaccedilatildeo contratual que voluntariamente eacute formada entre o banco e o cliente por via da qual mesmo sem claacuteusula expressa a instituiccedilatildeo financeira assume a obrigaccedilatildeo de guardar segredo das movimentaccedilotildees de dinheiro que nela satildeo feitas Essa responsabilidade assumida pelo banco inspira-se segunshydo os adeptos da teoria em destaque nos usos nos costumes e na boa-feacute sempre aplicaacuteveis na intepretaccedilatildeo dos contratos comerciais7bull

Teoria do direito agrave privacidade Os adeptos dessa corrente afirmam que o sigilo bancaacuterio integra o campo do direito agrave privacidade que faz parte dos direitos da personalidade

Teoria consuetudinaacuteria Segundo os seguidores dessa linha de pensar o sigilo bancaacuterio decorre dos compromissos taacutecitos assumidos entre instituishyccedilotildees financeiras e seus clientes no sentido de natildeo serem levados ao conhecishymento de terceiros os valores transacionados O uso reiterado dessa praacutetica apoiada no elemento confianccedila passou a representar costume adotado nesse tipo de negoacutecio juriacutedico

Teoria da boa-feacute A adoccedilatildeo dessa teoria conduz o inteacuterprete a entender que o sigilo bancaacuterio por sua proacutepria natureza estaacute vinculado ao caraacuteter fiduciaacuterio da atividade bancaacuteria fundando-se portanto na boa-feacute ou dever de lisura que tanto marca o tipo de negoacutecio juriacutedico firmado

Teoria do sigilo profissional Essa teoria concebe o sigilo bancaacuterio como sendo uma espeacutecie do sigilo profissional Haacute portanto um dever eacutetico do banshyco em respeitar o sigilo bancaacuterio em decorrecircncia da profissatildeo exercida

Teoria do direito agrave intimidade dos bancos Os integrantes dessa forma de pensar sustentam que a instituiccedilatildeo financeira tem legiacutetimo interesse de afastar do conhecimento de terceiros a movimentaccedilatildeo financeira dos seus clientes e consequumlentemente dos fatos com elas relacionados

Teoria da complexidade do viacutenculo Essa teoria eacute explicada por Arnoldo Wald no trabalho jaacute citado da forma seguinte A doutrina moderna abandoshynou a noccedilatildeo da relaccedilatildeo juriacutedica contratual defendo a complexidade do viacutenshyculo Aleacutem dos direitos e das obrigaccedilotildees principais existem deveres secundaacuteshyrios para ambos os contratantes que decorrem da regra geral da boa-feacute denoshyminada na doutrina italiana de cOITeteza e na legislaccedilatildeo alematilde de Treu und Glauben Exige que a atuaccedilatildeo de uma parte natildeo cause danos agrave esfera juriacutedica da outra Dentro desta ideacuteia defende-se que o segredo bancaacuterio eacute um dever

7 Arnoldo Wald em Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais artigo publicado na Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas n 22 pp 1518 manifesta entendimento de que no campo normatIacutevo do Direito brasileiro esta teoria encontra respaldo nos arts 130 e 131 do Coacutedigo Comercial que prevecirc a interpretaccedilatildeo dos contratos segundo os usos os costumes e a boa-feacute

242 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

acessoacuterio na relaccedilatildeo juriacutedica Mesmo que natildeo nasccedila o contrato entre as partes a boa-feacute objetiva impede que a instituiccedilatildeo financeira prejudique os interesses do cidadatildeo

Estabelecidos os pressupostos doutrinaacuterios acima examinamos agora se o sigilo bancaacuterio diz respeito agrave intimidade e agrave privacidade das pessoas

A Constituiccedilatildeo Federal em seu artigo 5ordm incisos X e XII afirma

Art 5ordm Todos satildeo iguais perante a lei sem distinccedilatildeo de qualquer natureza garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Paiacutes a inviolabilidade do direito agrave vida agrave liberdade agrave igualdade agrave segushyranccedila e agrave propriedade nos termos seguintes

X - satildeo inviolaacuteveis a intimidade a vida privada a honra e a imagem das pessoas assegurado o direito agrave indenizaccedilatildeo pelo dano material ou moral decorrente de sua violaccedilatildeo

XJl - eacute inviolaacutevel o sigilo da correspondecircncia e das comunicaccedilotildees telegraacuteficas de dados e das comunicaccedilotildees telefocircnicas salvo no uacuteltimo caso por ordem judicial nas hipoacuteteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigaccedilatildeo criminal ou instruccedilatildeo processual penal

Essas garantias constitucionais protegem o cidadatildeo de qualquer investida de terceiros em sua intimidade em sua vida privada e no sigilo de seus dados

Na expressatildeo terceiros estaacute incluiacutedo o Estado e consequumlentemente seus agentes poliacuteticos e administrativos

A doutrina tem se manifestado de modo quase unacircnime no sentido de que o sigilo bancaacuterio eacute uma garantia constitucional que protege a privacidade das pessoas no campo econocircmico e financeiro A sua significaccedilatildeo eacute de natildeo tornar puacuteblica a movimentaccedilatildeo da conta bancaacuteria e das aplicaccedilotildees financeiras do cidadatildeo para que de nenhum modo os atos privados praticados possam ser tornados puacuteblicos

Esse posicionamento eacute o adotado pelos autores que passo a citar

Arnoldo Wald (O Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais artigo pushyblicado na Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas RT n 22 pp 1521)

O sigilo bancaacuterio eacute o meio para resguardar a privacidade no camshypo econocircmico pois veda a publicidade sobre a movimentaccedilatildeo da conta corrente bancaacuteria e das aplicaccedilotildees financeiras

ENSAIOS JURiacuteDICOS 243

Eivany A Silva (Consideraccedilotildees a Respeito do Sigilo de Dados artigo publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio n 61 Satildeo Paulo Editora Dialeacutetica p27)

A maioria dos ordenamentos juriacutedicos como o brasileiro tratam o sigilo bancaacuterio como direito fundamental do contribuinte agrave privacidashyde ou seja agrave resistecircncia agrave comunicaccedilatildeo de dados que representem desshydobramento da personalidade da pessoa direito agrave oposiccedilatildeo e agrave negaccedilatildeo de comunicaccedilatildeo

Ives Gandra da Silva Martins (Sigilo Bancaacuterio trabalho publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio S Paulo Editora Dialeacutetica n 1 pp 24 e 25)

Pelos incisos X e XII do artigo 5ordm tem o contribuinte o direito de preservaccedilatildeo de sua intimidade de sua privacidade e de que terceiros que detenham informaccedilotildees pessoais suas sejam obrigados a guardaacute-Ias

Natildeo pode pois a fiscalizaccedilatildeo exigir de terceiros informaccedilotildees que apenas pode obter do proacuteprio contribuinte

Em determinadas hipoacuteteses todavia o interesse puacuteblico haacute de preshyvalecer sobre o interesse individual mas caberaacute a um outro poder definir se tais hipoacuteteses efetivamente ocorrem com o que poderaacute o Poder Judishyciaacuterio autorizar se convencido estiver o magistrado de que a hipoacutetese eacute de gravidade e de lesatildeo ao interesse puacuteblico a quebra do direito ao sigilo bancaacuterio

Estou convencido ser esta a melhor conformaccedilatildeo juriacutedica da quesshytatildeo idealizada pelos constituintes defendida pela doutrina e consagrashyda na jurisprudecircncia corrente exegeacutetica esta a que me filio desde os meus primeiros escritos sobre a mateacuteria

Roberto Quiroga Mosquera (Tributaccedilatildeo no Mercado Financeiro e de Capitais obra publicada pela Editora Dialeacutetica Satildeo Paulo 1998 pp 70171)

Do exposto ateacute aqui eacute evidente que o direito ao sigilo bancaacuterio representa uma espeacutecie de direito agrave privacidade

Eacute incontroverso que os dados e informaccedilotildees de natureza bancaacuteria dizem respeito agrave intimidade e agrave vida privada dos cidadatildeos Dados que dizem respeito aos valores em dinheiro depositados em contas-correnshytes bancaacuterias tipos e caracteriacutesticas de aplicaccedilotildees financeiras ganhos e prejuiacutezos auferidos ou incorridos em operaccedilotildees bursaacuteteis etc satildeo sem sombra de duacutevida elementos particulares e pessoais de qualquer indiviacuteshyduo

244 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Utilizando outra voz informaccedilotildees que tocam no aspecto financeishyro do ser humano representam direito iacutentimo e personaliacutessimo devendo ser mantidas em sigilo por aqueles que eventualmente as detenham em razatildeo de sua atividade profissional Parece-nos que tal conclusatildeo eacute de uma clareza inconteste

Natildeo tem sido outra a posiccedilatildeo da doutrina mais abalizada do Paiacutes e da jurisprudecircncia dominante

o autor referido a seguir faz a observaccedilatildeo seguinte

Carlos Alberto Hagstrom (Sigilo Bancaacuterio Novas Questotildees Reshyvista de Direito Mercantil Satildeo Paulo Malheiros 1997 vaI 105 pp 4344) expotildee que apesar de existirem diversas teorias que procuram fundashymentar juridicamente o sigilo bancaacuterio modernamente a explicaccedilatildeo para o fundamento do referido instituto sofreu uma radical alteraccedilatildeo Divershysas constituiccedilotildees modernas esclarece o mencionado autor ampliaram e explicitaram o elenco de direitos e garantias individuais passando a garantir o direito agrave privacidade e agrave intimidade A Constituiccedilatildeo brasileira natildeo trilha caminho diferente Assegurou referidos direitos de forma exshypressa e sem restriccedilotildees O tema do sigilo bancaacuterio figura agora em niacutevel constitucional Tem status de norma superior no qual se reconhece o direito agrave intimidade como norma de caraacuteter geneacuterico em que estatildeo conshytemplados muacuteltiplos aspectos da vida privada em especial os de ordem econocircmico-financeira que compotildeem o que Hagstrom denominou a inshytimidade econocircmica ou intimidade patrimonial

Luiacutes Fernando 8ellinetti (Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio artigo publicado na Revista de Direito do Consumidor n 18 pp 141151)

Como jaacute dissemos anteriormente em certas hipoacuteteses o fundashymento para o segredo bancaacuterio seria a privacidade No entanto nesses casos o que se protege eacute a privacidade e natildeo propriamente o sigilo

Entendemos que uma coisa eacute garantir-se a privacidade da pessoa com fundamento em norma constitucional outra eacute garantir-se o segreshydo de informaccedilotildees bancaacuterias de uma pessoa com base na legislaccedilatildeo supramencionada

Sempre que a revelaccedilatildeo de informaccedilotildees bancaacuterias puder violar a privacidade da pessoa parece-nos que mais do que garantia ao sigilo bancaacuterio (com fundamento legal) tem a pessoa garantia agrave sua privacishydade (com fundamento constitucional)

ENSAIOS JURiacuteDICOS 245

No entanto se a revelaccedilatildeo da informaccedilatildeo natildeo invadir a esfera da intimidade da pessoa sua garantia eacute meramente legal do sigilo bancaacuterio

Carlos Maacuterio Velloso (citado por Misabel Derzi em Direito Tributaacuterio Aplicado obra publicada pela Editora Del Rey Belo Horizonte MO pp 278 e 279)

O sigilo bancaacuterio decorre do direito agrave privacidade inerente agrave pershysonalidade das pessoas consagrado na Constituiccedilatildeo Federal em seu art 5ordm X e protege tanto interesses privados como finalidades de ordem puacuteblica a saber o sistema de creacutedito O sigilo bancaacuterio natildeo eacute um princiacuteshypio absoluto

As exceccedilotildees ao sigilo bancaacuterio estatildeo previstas na Lei n 45951964 que continua em vigor

O Poder Judiciaacuterio pode requisitar relativamente a pessoas e instishytuiccedilotildees informaccedilotildees que implicam quebra de sigilo (Lei n 45951964 art 38 sect 1 ordm) entretanto mesmo havendo inqueacuterito policial instaurado deveraacute proceder com cautela prudecircncia e moderaccedilatildeo inerentes agrave mashygistratura

Luciana Fregodolli (O Direito agrave Intimidade - excerto da dissertaccedilatildeo que apresentou sob o tiacutetulo O Direito agrave Intimidade e a Prova Iliacutecita publicado pela Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Constitucional e Ciecircncia Poliacutetica -n 19 p 233)

O sigilo bancaacuterio protege interesses privados Eacute ele espeacutecie de direito agrave privacidade inerente agrave personalidade das pessoas e que a Consshytituiccedilatildeo Federal consagra no art 5ordm X aleacutem de atender a uma finalidade de ordem puacuteblica qual seja a de proteccedilatildeo ao sistema de creacutedito

O direito agrave privacidade abrange atualmente o de impedir que tershyceiros inclusive o Estado e o Fisco tenham acesso a informaccedilotildees sobre o que se denominou a aacuterea de manifestaccedilatildeo existencial do ser humano

Celso Ribeiro Bastos O pensamento de Celso Ribeiro Bastos foi exshyposto por Roberto Quiroga Mosquera na obra jaacute referida p 71 do modo seguinte

Celso Bastos eacute do mesmo pensar Apoacutes tecer consideraccedilotildees introdutoacuterias acerca do sigilo bancaacuterio e expor pensamentos de divershysos autores nacionais e alieniacutegenas conclui o constitucionalista brasileishyro no sentido de que todas as despesas ordinaacuterias feitas pelo cidadatildeo

246 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

comum em sua vida cotidiana devem ser consideradas parte de sua vida privada familiar ou domeacutestica e portanto protegidas contra interferecircnshycias a despeito de qualquer pretexto Desde as condutas mais corriqueishyras como as compras efetuadas em um supermercado para manutenshyccedilatildeo da famiacutelia quanto aquelas outras moralmente reprovaacuteveis como presentes ou joacuteias compradas e dadas a quem presta ao homem servishyccedilos de natureza extraconjugal tudo estaacute abarcado pelo manto da proteshyccedilatildeo agrave vida privada familiar ou domeacutestica ( ) E mais adiante arremata Hoje praticamente a vida do homem pode ser escrita a partir de seu talatildeo de cheques e nas sociedades mais avanccediladas pelos cartotildees de creacutedito e magneacuteticos Permitir-se que o sigilo bancaacuterio venha a ser romshypido por qualquer forma natildeo-extraordinaacuteria para salvaguarda de inteshyresse de porte no miacutenimo idecircntico eacute expor a seguranccedila individual a um constante e absurdo temor perante as possibilidades de controle direto ou pelo vazamento de alguma informaccedilatildeo

Haacute contudo corrente contraacuteria como passaremos a demonstrar

Andreacute Serratildeo Borges de Sampaio Consultor da Uniatildeo nas informashyccedilotildees prestadas ao Advogado-Geral da Uniatildeo sobre a ADIn n 2397 cita trechos de doutrina e jurisprudecircncia estrangeiras defendendo o entendimento de que o sigilo bancaacuterio natildeo tem conotaccedilatildeo de direito de privacidade Eis o que escreshyveu o parecerista citado

O jurista portuguecircs J L Saldanha Sanches coteja primorosashymente o sigilo bancaacuterio com a proteccedilatildeo da intimidade para concluir que natildeo haacute que se falar em direito ao sigilo bancaacuterio como concretizaccedilatildeo do direito agrave intimidade Nas suas palavras

Ora em que esfera podemos noacutes incluir o segredo bancaacuteshyrio enquanto instituto que concretiza certos valores do ordenashymento juriacutedico Como expressatildeo de interesses juridicamente tuteshylados

Seraacute o segredo bancaacuterio um prolongamento do direito agrave inshytimidade da esfera pessoal e familiar de uma qualquer pessoa sinshygular (uma vez que em relaccedilatildeo agraves pessoas coletivas a questatildeo natildeo pode mesmo ser colocada) Ou diraacute antes respeito aquela faixa mais larga que resguarda a privacidade de qualquer cidadatildeo e que soacute pode por isso sofrer qualquer intromissatildeo se surgirem razotildees vaacutelidas para que tal direito seja restringido

Ao afirmar-se que na perspectiva dos clientes dos bancos o segredo bancaacuterio eacute um direito com a reserva da sua vida privada temos uma primeira resposta para esta questatildeo

ENSAIOS JURiacuteDICOS 247

Mas falta distinguir entre intimidade e reserva da vida privashyda e entre clientes individuais e profissionais de um banco Natildeo estamos perante o mesmo tipo de tutela quando contamos que um particular espera que o banco natildeo divulgue a qualquer inteshyressado o volume da sua conta bancaacuteria (porque pura e simplesshymente quer manter sob reserva a sua vida particular) ou quando um comerciante confia no banco para que este natildeo revele quem satildeo os seus clientes fornecedores ou qual eacute o seu grau de endividamento

No caso da pessoa singular estaacute apenas em causa um conshyjunto de valores de natureza moral esta natildeo estaacute em princiacutepio preocupada com possiacuteveis prejuiacutezos econocircmicos ligados a qualshyquer divulgaccedilatildeo Apenas se opotildee por razotildees do seu foro pessoal e que natildeo carecem de fundamentaccedilatildeo que esta tenha lugar

Enquanto que o comerciante pode ser seriamente prejudishycado em termos concorrenciais com a revelaccedilatildeo da lista dos seus clientes ou com a sua situaccedilatildeo financeira

O dever de reserva que cabe ao banqueiro estaacute desta forma a serviccedilo do interesse comercial das empresas suas clientes - que pelo simples facto de o serem ou por necessitarem de obter creacutedishyto lhe datildeo informaccedilotildees com um forte valor comercial ou da pesshysoa singular que deseja manter a privacidade da sua situaccedilatildeo patrimonial

Ou em alternativa ao serviccedilo da manutenccedilatildeo da privacidashyde que qualquer um pode desejar ainda que a possiacutevel violaccedilatildeo desta apenas lhe possa acarretar danos natildeo-patrimoniais

E por isso o segredo bancaacuterio natildeo pode constituir a expresshysatildeo do imperativo constitucional da proteccedilatildeo da intimidade Ateacute porque o acesso a essa esfera estaacute vedado aos proacuteprios bancos

Natildeo nos parece aceitaacutevel que um banco como condiccedilatildeo para a concessatildeo de creacutedito a uma pessoa singular ou para estashybelecer com ela qualquer relaccedilatildeo contratual possa exigir desta informaccedilatildeo de tipo estritamente pessoal ou a sujeiccedilatildeo a exames meacutedicos que atingindo a sua esfera iacutentima afectam a sua dignidashyde Aqui estaacute em causa a ilicitude da pergunta por pressupor o acesso agrave esfera inviolaacutevel (e indisponiacutevel) da intimidade

A informaccedilatildeo que o banco pode obter para a defesa dos seus interesses legiacutetimos natildeo pode ir aleacutem da esfera patrimonial do seu cliente rendimentos bens possuiacutedos perspectivas profisshysionais

( )

248 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

Podemos pois concluir que o segredo bancaacuterio natildeo eacute natildeo pode ser uma concretizaccedilatildeo do princiacutepio constitucional do direishyto agrave intimidade

Este princiacutepio tem como funccedilatildeo consagrar uma zona de reshyselVa pessoal para factos opccedilotildees e circunstacircncias que soacute de forshyma indirecta e de todo secundaacuteria podem ter aspectos ou refleshyxos de natureza patrimonial (Saldanha Sanches J L Segredo Bancaacuterio e Tributaccedilatildeo do Lucro Real In Saldanha Sanches J L Estudos de Direito Contabiliacutestico e Fiscal Coimbra Coimbra Edishytora 2000 pp 105108)

Em diversos paiacuteses haacute a clara percepccedilatildeo que natildeo haacute que se conshyfundir direito agrave intimidade com sigilo bancaacuterio indicando que a quebra do sigilo pela Administraccedilatildeo Tributaacuteria natildeo constitui violaccedilatildeo ao direito Ao contraacuterio a existecircncia de um Estado Fiscal implica na necessidade de consagrar agrave administraccedilatildeo tributaacuteria tal faculdade o que se harmonishyza com diversos princiacutepios e outros direitos fundamentais constantes da Carta de 1988

O caso espanhol eacute exemplar neste sentido ao natildeo visualizar a vioshylaccedilatildeo ao direito agrave intimidade em relaccedilatildeo agrave quebra do sigilo bancaacuterio Portanto

el Tribunal Constitucional espaflOl se ha pronunciado por la negativa de que el conocimiento de las cuentas bancarias por la Administracioacuten pueda invadir el aacutembito constitucionalmente garantizado de la intimidad de los individuos porque tales extractos no constituyen per se uma biografiacutea personal en nuacutemeros y en siacute no tiene relevancia para la intimidad personal y familiar dei contribuyente ya que se trata de dados no secretos y confiados a una entidad (Campos Laura Rodriacuteguez Oerechos dei Contribuyente em la Repuacuteblica Argentina ai Amparo de la Convencioacuten Interamericana de Oerechos Humanos http wwwiefpaorgarcriteriosdigitalarticulosderechoshtm Visitado em 512001)

Ao analisar a jurisprudecircncia da Corte Constitucional espanhola quanto ao tema tambeacutem ressalta Saldanha Sanches

Na apreciaccedilatildeo da constitucionalidade da lei que permitia o controle administrativo das contas bancaacuterias o Tribunal Constitushycional espanhol realizou uma distinccedilatildeo entre intimidade pessoal e familiar e a intimidade econoacutemica onde a proteccedilatildeo constitucional eacute menos intensa

ENSAIOS JURiacuteDICOS 249

E procura fazer uma distinccedilatildeo entre a violaccedilatildeo agrave intimidade como consequumlecircncia de uma anaacutelise das contas bancaacuterias - coloshycando a hipoacutetese de uma recusa de cooperaccedilatildeo por parte do conshytribuinte se tal eventualidade se verificar - e a violaccedilatildeo directa da intimidade uma vez que esta natildeo pode resultar de uma mera anaacuteshylise de movimentos bancaacuterios (Saldanha Sanches J L A Situashyccedilatildeo Actual do Sigilo Bancaacuterio a Singularidade do Regime Portushyguecircs In Saldanha Sanches J L Estudos de Direito Contabiliacutestico e Fiscal Coimbra Coimbra Editora 2000 p 91)

Outro comentarista ao analisar a situaccedilatildeo do sistema espanhol quanto ao sigilo bancaacuterio e o direito agrave intimidade fez questatildeo de ressaltar

Seguacuten el r c frente a la Hacienda Puacuteblica no existe el derecho a la intimidad deI art 18 CE Ya la LO de 5 de mayo deI 82 vada praacutecticamente de contenido constitucional el derecho a la intimidado en cuanto el aacutembito de eacutesta queda deferido a la ley ordinaria (a 2ordm) y en cuanto que la esfera protegida frente a las Administraciones se reduce a poco O nada ai no reputarse intromisiones ilegiacutetimas las actuaciones autorizadas o acordadas por la Autoridad competente de acuerdo con la Ley (art 8ordm 1)

La LGTy el RI Iimiacutetan la esfera de la intimidad en las relacishyones con la Hacienda hasta el extremo de que solamenle existe un refugio limitado en el aacutembito deI secreto profesional en los casos de informacioacuten sobre terceros y siempre que no se trate de datos con transcendencia econoacutemica o tributaria EI rc no ha enconshytrado hasta el momento ni un solo supuesto de dato o informacioacuten econocircmica con transcendencia tributaria que limite la accioacuten inquisitiva de la Administracioacuten tributaria por razoacuten de intimidado Bien puede decirse por tanto que frente a la Administraciocircn tribushytaria en cuanto se trata deI ejercicio de su funciocircn de buacutesqueda de datos con transcendencia tributaria el derecho a la intimidad personal y familiar (art 18 I CE) no existe

La biacuteblia deI tribunal a estos efeclos estaacute constituida por la S 11084 reiterada en numerosas ocasiones ampliada en el Auto 64286 y reafirmada por ejemplo en la S 26 abril 90 tantas veces citada (FJ 10deg) Seguacuten esa doctrina la distribucioacutenjusta de la carshyga fiscal prevalece sobre el derecho a la intimidad parte dei art 812 I de la LO seguacuten el cual frente a la Ley (ordinaria) no hay intimidad protegida siempre que haya en dicha ley imperativos de intereacutes puacuteblico ( ) ni siquiera se habla dei predomiacutenio frente a la

250 SUPERIOR TRIBUNAl DE JUSTiCcedilA

intimidad de intereses u objetivos constitucionalmente protegidos Soacuteo admite que la actuadoacuten administrativa es arbitraria cuando no parezcajustificada por la Finalidad de la inspeccioacuten es decir cuando se trate de datos o informaciones que carezcan de transcendencia tributaria pero eacuteste obviamente no es sin Umite derivado dei derecho a la intimidad sino de la interdiccioacuten de arbitrariedad o desviacioacuten de poder de la Administracioacuten de la necesidad de ajuste de toda Administracioacuten ai acircmbito de su competencia que tanto vale para datos iacutentimos como para otros que no lo sean Seguacuten la S 11084 no hay esfera de intimidad proshytegida frente a una Administracioacuten tributaria amparada en una norma que elimina la intimidad como liacutemite (Garciacutea AIacuteloveros Jaime Una Nueva Ley General Tributaria Problemas Constitucioshynales In Kirchhof P et aI Garantiacuteas Constitucionales dei Contribuyente Valencia Tirant lo Blanch 1999 pp 109110)

Diante de tudo quanto foi exposto tendo-se o cuidado de registrar posicionamento de diferentes autores nacionais e estrangeiros haacute ambiente preparado para ser respondido o primeiro questionamento desdobrado em trecircs partes formulado para o 1II Coloacutequio Internacional de Direito Tributaacuterio promoccedilatildeo do Centro de Extensatildeo Universitaacuteria Eis a primeira parte do seu teor

O sigilo bancaacuterio diz respeito agrave intimidade e privacidade das pessoas

A resposta eacute optando por convencimento influenciado pelas ideacuteias da corrente predominante positiva

O nosso entendimento eacute no sentido de que o direito agrave intimidade integra os direitos da personalidade e visam proteger o direito agrave inviolabilidade do domiciacutelio da correspondecircncia das comunicaccedilotildees de quaisquer espeacutecies dos dados pessoais computadorizados do sigilo bancaacuterio O mesmo acontece com o direito agrave privacidade

A expansatildeo da proteccedilatildeo do direito agrave intimidade e agrave privacidade eacute uma consequumlecircncia da evoluccedilatildeo da era contemporacircnea nos setores tecnoloacutegicos e da instabilidade que passam as instituiccedilotildees estatais especialmente a encarreshygada de arrecadar tributos Haacute o reconhecimento de que desenvolve-se um processo de aguda corrosatildeo na proteccedilatildeo agrave intimidade que ao ser violada provoca a publicizaccedilatildeo das condutas mais iacutentimas do cidadatildeo

A concepccedilatildeo do sigilo bancaacuterio no acircmbito do direito agrave intimidade e agrave privacidade visa garantir ao homem o miacutenimo capaz para que lhe seja asseshygurada a sua condiccedilatildeo humana protegendo-o de ingerecircncias alheias como apregoa a Conferecircncia Noacuterdica sobre o Direito agrave Intimidade realizada em Estoshycolmo na data de maio de 1967 ao fazer inserir no documento que publicou a seguinte definiccedilatildeo O direito agrave intimidade eacute o direito do homem de viver de forma independente a sua vida com um miacutenimo de ingerecircncia alheia

ENSAIOS JURiacuteDICOS 251

5 Seguranccedila juriacutedica e acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias

A segunda pergunta apresentada pelos organizadores do coloacutequio estaacute assim posta

A seguranccedila das relaccedilotildees juriacutedicas atraveacutes do Sistema Financeiro pode ser afetada pelo acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves inforshymaccedilotildees bancaacuterias

O acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias se realizado caracteriza um atentado de suma gravidade aos direishytos do cidadatildeo Eacute um ataque aos princiacutepios sustentadores do sistema demoshycraacutetico adotado pelo constituinte de 1988 especialmente quando detonou que a Repuacuteblica Federativa do Brasil tem como objetivo fundamental o respeishyto agrave dignidade humana e agrave cidadania

Do ordenamento juriacutedico brasileiro a meu pensar natildeo haacute lugar para brotar qualquer interpretaccedilatildeo que conclua pela possibilidade de qualquer agenshyte do Poder Puacuteblico acessar de modo generalizado e sem motivaccedilatildeo informashyccedilotildees bancaacuterias do cidadatildeo mesmo com autorizaccedilatildeo judicial

Esclareccedilo desde logo que natildeo comungo com o pensamento de detershyminada corrente no sentido de ser absoluto o direito ao sigilo bancaacuterio Tenho-o como relativo poreacutem vinculado aos princiacutepios da razoabilidade da moralidade da legalidade e da motivaccedilatildeo expliacutecita e detalhada sob pena de ser impossiacutevel a sua quebra

O acesso indiscriminado do agente fiscal agraves informaccedilotildees bancaacuterias do cidadatildeo gera uma quebra da seguranccedila das relaccedilotildees juriacutedicas por um terceiro passar a ter sem causa justificadora conhecimento da vida iacutentima de algueacutem submetendo-o a partir daiacute a um regime de submissatildeo Por outro lado ninshygueacutem poderaacute garantir nem o proacuteprio Estado que o agente puacuteblico utilize os dados que chegaram ao seu conhecimento para outros intentos que natildeo o exclusivamente fiscal

Lembra Arnoldo Wald que O segredo na atividade bancaacuteria envolve concomitantemente interesses privaqos e coletivos que podem ser analisashydos sob trecircs acircngulos o interesse do cliente na sua relaccedilatildeo com a instituiccedilatildeo financeira o interesse do banco em atuar com discriccedilatildeo para ganhar a conshyfianccedila da populaccedilatildeo e captar recursos e o interesse social na existecircncia de um bom e eficiente sistema bancaacuterio Por estarem ligadas ao desenvolvimento da economia e aos interesses da comunidade as relaccedilotildees que envolvem as instishytuiccedilotildees financeiras natildeo recebem o mesmo tratamento juriacutedico dispendido a outras relaccedilotildees comerciais Inviaacutevel a aplicaccedilatildeo exclusiva das regras de Direito Privado as quais tecircm como princiacutepio norteador a autonomia da vontade pois

252 SUPERIOR TRIBUNAl DE JUSTiCcedilA

esta encontra limites nas normas cogentes proacuteprias do direito bancaacuterio e na intervenccedilatildeo do Estado8

A seguranccedila juriacutedica desse tipo de relaccedilatildeo envolve tambeacutem a manutenshyccedilatildeo do segredo das movimentaccedilotildees financeiras do contribuinte

Imprimir-se a mais ampla seguranccedila nas relaccedilotildees do Sistema Financeiro eacute fortalececirc-lo O Estado tem o dever de zelar por esse estado de seguranccedila natildeo permitindo consequumlentemente que o sigilo bancaacuterio seja quebrado pelo acesshyso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico por esse comportamento afeshytar a confiabilidade no sistema

Eacute de todo inconveniente permitir a possibilidade de um atuar do agente fiscal sem controle na quebra do sigilo bancaacuterio por afetar diretamente a seshyguranccedila da relaccedilatildeo juriacutedica firmada entre a instituiccedilatildeo financeira e o seu clienshyte em face deste sentir-se atingido pela accedilatildeo fiscal que passa a tomar conhecishymento de sua intimidade financeira e de fatos de sua vida privada sem o resshypaldo do Poder Judiciaacuterio

A seguranccedila juriacutedica nesse tipo de relaccedilatildeo deve assegurar impossibilidashyde de abuso de poder por parte do Fisco em face da necessidade de ser resshyguardada a garantia de que em um Estado de Direito natildeo pode ser concebido que conceda-se a uma parte mesmo que seja o Estado o domiacutenio absoluto de apanhar as provas que iraacute utilizar em caso de litiacutegio contra algueacutem

O acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias do contribuinte aleacutem de afetar a seguranccedila juriacutedica da relaccedilatildeo em questatildeo promove um desequiliacutebro entre o cidadatildeo-contribuinte e o Fisco por caracterizar coaccedilatildeo que coloca aquele em posiccedilatildeo de inferioridade

A valorizaccedilatildeo da seguranccedila juriacutedica da relaccedilatildeo existente entre instituiccedilatildeo financeira e contribuinte pelo Fisco natildeo quebrando o seu sigilo fiscal sem autorizaccedilatildeo judicial constitui causa de aplicaccedilatildeo de Justiccedila fiscal O seguimenshyto de seus princiacutepios valoriza o regime democraacutetico do qual ela faz parte

6 Casos de admissibilidade da quebra do sigilo bancaacuterio

Os casos de admissibilidade da quebra do sigilo bancaacuterio estatildeo na atuashylidade descritos no nosso ordenamento juriacutedico positivo

A Lei Complementar n 105 de 10 de janeiro de 2001 apoacutes determinar no art 112 de que as instituiccedilotildees financeiras conservaratildeo sigilo em suas operashyccedilotildees ativas e passivas e serviccedilos prestados dispotildee no sect 312 do mesmo artigo que

8 Arnoldo Wald no artigo Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais Revista dos Tribunais ano 6 n 22 janeiromiddotmarccedilo de 1998 n 22 Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas p 15

ENSAIOS JURiacuteDICOS 253

sect 3ordm Natildeo constitui violaccedilatildeo do dever de sigilo

I a troca de informaccedilotildees entre instituiccedilotildees financeiras para fins cadastrais inclusive por intermeacutedio de centrais de risco observadas as normas baixadas pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e pelo Banco Censhytral do Brasil

11 - o fornecimento de informaccedilotildees constantes de cadastro de emitentes de cheques sem provisatildeo de fundos e de devedores inadimplentes a entidades de proteccedilatildeo ao creacutedito observadas as norshymas baixadas pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e pelo Banco Central do Brasil

JJI - o fornecimento das informaccedilotildees de que trata o sect 2ordm do art II da Lei n 9311 de 24 de outubro de 1996

IV - a comunicaccedilatildeo agraves autoridades competentes da praacutetica de iliacutecitos penais ou administrativos abrangendo o fornecimento de inforshymaccedilotildees sobre operaccedilotildees que envolvam recursos provenientes de qualshyquer praacutetica criminosa

V - a revelaccedilatildeo de informaccedilotildees sigilosas com o consentimento expresso dos interessados

VI- a prestaccedilatildeo de informaccedilotildees nos termos e condiccedilotildees estabeleshycidos nos artigos 2ordm 3ordm 4ordm 5ordm 6ordm 7ordm e 9ordm desta lei complementar

sect 4ordm A quebra de sigilo poderaacute ser decretada quando necessaacuteria para apuraccedilatildeo de ocorrecircncia de qualquer iliacutecito em qualquer fase do inqueacuterito ou do processo judicial e especialmente nos seguintes crimes

I - de terrorismo

11 - de traacutefico iliacutecito de substacircncias entorpecentes ou drogas afins

III - de contrabando ou traacutefico de armas municcedilotildees ou material destinado a sua produccedilatildeo

IV - de extorsatildeo mediante sequumlestro

V - contra o sistema financeiro nacional

VI - contra a Administraccedilatildeo Puacuteblica

Vll- contra a ordem tributaacuteria e a previdecircncia social

VIII-lavagem de dinheiro ou ocultaccedilatildeo de bens direitos e valores

IX - praticado por organizaccedilatildeo criminosa

Como visto a lei complementar enumera inuacutemeras situaccedilotildees que indeshypendentemente de autorizaccedilatildeo judicial o sigilo bancaacuterio eacute quebrado

254 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

A dificuldade que se apresenta eacute a de conciliar os casos de quebra de sigilo bancaacuterio que a Lei Complementar n 105 autoriza com a garantia do direito agrave privacidade e agrave intimidade

Destaque-se entre os de maior relevacircncia os seguintes

- natildeo constituir violaccedilatildeo do dever de sigilo bancaacuterio a troca de informashyccedilotildees entre instituiccedilotildees financeiras para fins cadastrais inclusive por intermeacuteshydio de centrais de risco o que possibilita o conhecimento da vida financeira privada do cidadatildeo por vaacuterias pessoas sem desempenho de autoridade na instituiccedilatildeo independentemente de ser justificada com antecedecircncia a causa desse atuar

- o de serem fornecidos dados relativos a fornecimentos de informashyccedilotildees cadastrais de emitentes de cheques sem provisatildeo de fundos a entidades privadas de proteccedilatildeo ao creacutedito sem qualquer avaliaccedilatildeo por qualquer autorishydade da causa determinante do fato a quebra do sigilo bancaacuterio na fase do inqueacuterito por inexistir nessa ocasiaacuteo qualquer contraditoacuterio e respeito ao prinshyciacutepio do devido processo legal

Quanto agraves demais situaccedilotildees constantes na lei complementar que autorishyzam a quebra do sigilo bancaacuterio naacuteo obstante algumas serem absolutamente necessaacuterias haacute de serem vistas em compatibilidade com as garantias constitushycionais conforme jaacute assinalado

O colendo Supremo Tribunal pronunciaraacute como guarda e inteacuterprete maishyor da Carta Magna em ADln jaacute intentada sobre a constitucionalidade ou natildeo dos dispositivos supramencionados

Em campo doutrinaacuterio valoriza-se as posiccedilotildees apresentadas quando da resposta oferecida aos questionamentos anteriores todas acenando pela neshycessidade do controle do Poder Judiciaacuterio

7 Sistema mais justo para a quebra do sigilo bancaacuterio

Os organizadores do JII Coloacutequio Internacional de Direito Tributaacuterio subshymetem agora para anaacutelise a questatildeo do teor seguinte Um sistema em que o Poder Judiciaacuterio torna-se aacuterbitro dos pedidos da Administraccedilatildeo Puacuteblica para quebra do sigilo eacute o mais justo

Em um Estado que por imposiccedilatildeo de sua proacutepria Constituiccedilatildeo estaacute comprometido com a guarda e aplicaccedilatildeo efetiva de princiacutepios democraacuteticos especialmente o de respeitar os direitos e garantias fundamentais da cidadashynia natildeo haacute ambiente para que seja outorgado ao Poder Executivo por via da atuaccedilatildeo de agentes puacuteblicos fiscais o acesso sem o controle do Poder Judiciaacuteshyrio agraves informaccedilotildees bancaacuterias do contribuinte

ENSAIOS JURiacuteDICOS 255

o sigilo bancaacuterio por ser um direito fundamental que exige ser respeitashydo pela supremacia constitucional que o protege deve submeter a possibilishydade de sua quebra para fins tributaacuterios ao Poder Judiciaacuterio pela ausecircncia de interesse direto nos resultados da accedilatildeo fiscalizadora que eacute o recolhimento do tributo e pelas garantias de independecircncia prudecircncia e qualificaccedilatildeo juriacutedica que revestem esse poder

A atuaccedilatildeo da fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo pode ser exercida fora dos limishytes da legalidade imposta a partir da Carta Magna e demais imposiccedilotildees legais a ela subordinadas

Natildeo se desconhece que no atual Estado fiscal os tributos constituem os meios financeiros determinantes para o atendimento dos compromissos da Administraccedilatildeo Puacuteblica com as obrigaccedilotildees oriundas em decorrecircncia de sua atividade no campo educacional social de seguranccedila puacuteblica interna e extershyna da sauacutede da manutenccedilatildeo dos Poderes ou seja para manter funcionando a maacutequina estatal

Por natildeo entremostrar-se na eacutepoca contemporacircnea qualquer outra alshyternativa viaacutevel para transformar o Estado fiscal em um Estado produtivo os tributos passam a representar um indeclinaacutevel dever da cidadania cujo cumshyprimento deve ser por todos honrado conforme assinala Joseacute Casalta Nabais Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra em artigo intitulado Algumas Reflexotildees sobre o Actual Estado Fiscal

Por isso os impostos hatildeo de constituir um preccedilo aceitaacutevel ou seja um preccedilo limitado Um preccedilo que estou certo muitas das sociedashydes que nos antecederam gostariam de ter pago e algumas das actuais natildeo enjeitariam suportar Por isso bem podemos afirmar como jaacute o fizeshymos noutro lugar que no actual Estado fiscal para o qual natildeo se vislumshybra qualquer alternativa viaacutevel pelo menos nos tempos mais proacuteximos os impostos constituem um indeclinaacutevel dever de cidadania cujo cumshyprimento a todos nos deve honrar

A atuaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio para liberar o bloqueio fortalece a conshyfianccedila do cidadatildeo no procedimento da fiscalizaccedilatildeo e consagra a ideacuteia iacutensita em qualquer regime democraacutetico de que a atuaccedilatildeo do Estado tem limites

Na espeacutecie os limites impostos satildeo os decorrentes da quebra do sigilo ser necessaacuterio em face da possiacutevel ilicitude cometida pelo cidadatildeo poreacutem sem ser violados os direitos do cidadatildeo de gozar da sua privacidade e da sua intimidade

A denominada cidadania fiscal haacute de ser considerada de modo conjunshytural com os reflexos dos direitos fundamentais assegurados ao contribuinte sem prestigiar a responsabilidade que tem o Estado de promover a arrecadashyccedilatildeo dos tributos

256 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

Cedo espaccedilo para registrar que a cidadania fiscal deve configurar um estado de relaccedilatildeo juriacutedica em que todos suportem a concretizaccedilatildeo de um Estado em que todos tenham a qualidade de destinataacuterio do dever fundashymentaI de pagar impostos na medida da respectiva capacidade contributiva poreacutem que seja um Estado fiscal suportaacutevel isto eacute um estado cujo sistema fiscal se encontre balizado por estritos limites juriacutedico-constitucionais9

A Administraccedilatildeo Tributaacuteria por melhor que seja a sua estrutura e os seus propoacutesitos natildeo estaacute emocionalmente preparada para conceber e aplicar os princiacutepios que sustentam a cidadania fiscal Isso ocorre primeiramente porshyque o Fisco tem por missatildeo exclusiva exercer a funccedilatildeo de arrecadar tributos Eacute a sua meta essencial por ser atribuiccedilatildeo que na organizaccedilatildeo administrativa estatal estaacute obrigado a desempenhar Natildeo lhe cabe administrar o tributo arreshycadado limitando-se unicamente a envidar esforccedilos para o cumprimento das metas impostas para imprimir aumento na arrecadaccedilatildeo tributaacuteria O sucesso da Administraccedilatildeo Tributaacuteria eacute medido pelo maior volume de recursos fiscais atraiacutedos para os cofres do Governo nunca pelo respeito que exerccedila para com os direitos fundamentais do contribuinte Eacute uma questatildeo de cultura adminisshytrativa de distribuiccedilatildeo de funccedilotildees no sistema estatal impossiacutevel de ser mudashydo por sugestotildees doutrinaacuterias

Por outro lado a fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo consegue afastar as pressotildees exercidas sobre ela por determinados segmentos da organizaccedilatildeo estatal que defendem uma atuaccedilatildeo mais agressiva para a cobranccedila dos tributos tudo em decorrecircncia dos efeitos produzidos pela conduta iliacutecita marcante da sonegashyccedilatildeo fiscal

Esses fatores contribuem para que a fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo tenha condiccedilotildees de modo imparcial sem isenccedilatildeo avaliar a necessidade objetiva da quebra do sigilo bancaacuterio do cidadatildeo Por melhor que seja o seu desempenho nunca ganharaacute a confianccedila do contribuinte

A atribuiccedilatildeo da quebra do sigilo bancaacuterio em um regime democraacutetico onde predomina o respeito maior aos direitos fundamentais da cidadania deve ser exercido pelo Poder Judiciaacuterio natildeo soacute porque seus membros atualmente revestidos da garantia da vitaliciedade inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos bem como porque estatildeo revestidos de independecircncia absoluta em relaccedilatildeo ao Poder interessado na cobranccedila do tributo e consequumlentemenshyte no resultado a ser obtido pela accedilatildeo fiscal

Esse sistema misto onde o Fisco faz a solicitaccedilatildeo motivada para a queshybra do sigilo bancaacuterio ao Poder Judiciaacuterio e este apoacutes analisaacute-lo com objetivishydade e cautela defere ou indefere impotildee seguranccedila e confiabilidade na atuashyccedilatildeo fiscal e sublima o respeito agrave dignidade do contribuinte em outras palavras da cidadania fiscal isto eacute de uma cidadania de liberdade que o Estado fiscal

9 Joseacute Casalta Nabais (Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra) no artigo Algumas Reflexotildees sobre o Actual Estado Fiscal no site httpagugovbr

ENSAIOS JURiacuteDICOS 257

pressupotildee para natildeo ser postergada impotildee um sistema fiscal balizado por esshytritos limites juriacutedico-constitucionais Limites esses que integram a chamada constituiccedilatildeo fiscal e que podemos reconduzir para natildeo nos alongarmos nesse aspecto a duas ideacuteias uma ideacuteia de seguranccedila que tem o seu tradicional e principal suporte no princiacutepio da lega1idade fiscal e uma ideacuteia de justiccedila ou equumlidade que tem a ver com a medida dos impostos e assenta no princiacutepio da capacidade contributiva 10

Em conclusatildeo a adoccedilatildeo de um sistema para a quebra do sigilo bancaacuteshyrio em que o Poder Judiciaacuterio seja o aacuterbitro dos pedidos da Administraccedilatildeo Puacuteblica natildeo eacute somente mais justo mas consegue impor maior credibilidade agrave atuaccedilatildeo fiscal e presta homenagem com intensa potencialidade aos princiacuteshypios democraacuteticos consistentes na guarda da seguranccedila juriacutedica do respeito aos direitos fundamentais do cidadatildeo nesse rol incluidos os agrave privacidade e agrave intimidade Aleacutem disso torna mais respeitaacutevel a relaccedilatildeo entre Fisco e contrishybuinte justificando portanto a opccedilatildeo do Estado pelo regime democraacutetico

8 Autoridade fiscal e faculdade incondicionada de quebrar o sigilo bancaacuterio

Essa indagaccedilatildeo consubstancia a preocupaccedilatildeo de serem estabelecidos controles para a atuaccedilatildeo do agente puacuteblico fiscal Centra-se a preocupaccedilatildeo em imprimir nas relaccedilotildees juriacutedicas tributaacuterias de quaisquer espeacutecies o primashydo da legalidade aprimorando-se o atuar vinculado

Natildeo concilia-se com os postulados da democracia a adoccedilatildeo de um sisteshyma de fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria que outorgue faculdade incondicionada ao fiscal tributaacuterio de invadir a intimidade e a privacidade das pessoas sob o falso argushymento juriacutedico de que busca encontrar provas de sonegaccedilatildeo fiscal

Depreende-se do exposto que a autoridade fiscal natildeo deve ter faculdade incondicionada de quebrar o sigilo sempre que entender necessaacuterio Isso porshyque a praacutetica de atos administrativos por agentes puacuteblicos de modo incondicionado revela grave violaccedilatildeo ao princiacutepio da legalidade onde predoshymina a vontade da lei e natildeo o discricionarismo de quem o pratica

No trato do sigilo bancaacuterio o atuar incondicionado da fiscalizaccedilatildeo assushyme caracteriacutesticas de maior gravidade porque haacute violaccedilatildeo aos princiacutepios funshydamentais jaacute expostos e que satildeo prestigiados pela Carta Magna especialmenshyte por bater de frente de modo integral e absoluto com o direito agrave intimidade e agrave privacidade O atuar deve vincular-se rigidamente ao princiacutepio da legalidashyde especialmente aposta na Carta Magna sem a possibilidade de ser aberto qualquer canal para uso da conveniecircncia ou da oportunidade

Eacute de ser lembrada no trato do assunto a liccedilatildeo de Joseacute Casalta Nobais no trabalho jaacute citado no sentido de que Eacute certo que independentemente da

10 Idem p 15

=258=---___________________ SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTlCA

concepccedilatildeo a que se adira relativamente ao segredo bancaacuterio natildeo temos a menor duacutevida de que o acesso da Administraccedilatildeo Fiscal agrave informaccedilatildeo bancaacuteria seja directo sem necessidade de preacutevia decisatildeo judicial seja indirecto depois portanto de preacutevia decisatildeo judicial haacute de ter sempre uma natureza claramenshyte excepcional Na verdade constitua o segredo bancaacuterio uma manifestaccedilatildeo do direito fundamental agrave reserva da intimidade da vida privada constante do art 26 n 2 da Constituiccedilatildeo portuguesa ou suporte um outro direito fundashymentai um direito agrave reserva da vida privada anaacutelogo agravequele a sua afectaccedilatildeo teraacute sempre caraacuteter excepcional

A autoridade fiscal natildeo possui a necessaacuteria isenccedilatildeo e competecircncia institucional para averiguar o grau dessa excepcionalidade de modo que posshysa impor confianccedila ao cidadatildeo investido na condiccedilatildeo de contribuinte poreacutem com direitos a serem assegurados por forccedila do regime democraacutetico adotado

O certo eacute que na relaccedilatildeo juriacutedico-tributaacuteria deve ser buscado o justo equiliacutebrio pregado pelo Estado de Direito onde o cidadatildeo deve ter a sua dignishydade respeitada sem contudo afastar-se a necessidade do Estado arrecadar tributos de forma cogente e imperativa bem como de serem permitidas conshydiccedilotildees de atuaccedilatildeo que resultem no combate agrave sonegaccedilatildeo fiscal

9 Responsabilidade da autoridade administrativa que quebrar o sigilo banshycaacuterio de forma inconsistente e indevida

Eacute inerente ao regime democraacutetico que a autoridade administrativa puacuteblishyca estaacute obrigada a exercer as suas atribuiccedilotildees com rigorosa obediecircncia aos princiacutepios da legalidade moralidade publicidade impessoalidade e eficiecircncia entre outros

A Carta Magna consagra expressamente no art 37 a obediecircncia do agente puacuteblico a esse tipo de comportamento

A autoridade administrativia que quebrar de modo inconsistente e indevido o sigilo bancaacuterio do cidadatildeo pratica ato com capacidade de provocar os seguintes efeitos a) de invadir o direito agrave privacidade e agrave intimidade de algueacutem b) de provocar-lhe danos morais e materiais dependendo da repershycussatildeo provocada pelo seu atuar

Constatada a efetivaccedilatildeo real de danos morais e materiais a responsabishylidade do Estado pode ser acionada conforme permite o art 37 sect 6ordm da Consshytituiccedilatildeo Federal Solidificada a culpa ou dolo do agente puacuteblico e consagrada a materializaccedilatildeo do iliacutecito praticado com o consequumlente ressarcimento patrimonial o Estado deveraacute usando o direito de regresso investir contra o agente que agiu culposa ou dolosamente

Natildeo resume-se apenas ao campo da responsabilidade civil a atuaccedilatildeo da autoridade quando ilegalmente quebra o sigilo bancaacuterio de qualquer cidadatildeo

ENSAIOS JURiacuteDICOS 259

o art 10 da Lei Complementar n 105 de 10 de janeiro de 2001 determishyna que A quebra de sigilo fora das hipoacuteteses autorizadas nesta lei compleshymentar constitui crime e sujeita os responsaacuteveis agrave pena de reclusatildeo de um a quatro anos e multa aplicando-se no que couber o Coacutedigo Penal sem prejuiacuteshyzo de outras sanccedilotildees cabiacuteveis A seguir no seu paraacutegrafo uacutenico explicita que Incorre nas mesmas penas quem omitir retardar injustificadamente ou presshytar falsamente as informaccedilotildees requeridas nos termos desta lei complementar

O art 11 da mesma lei complementar expressa que O servidor puacuteblico que utilizar ou viabilizar a utilizaccedilatildeo de qualquer informaccedilatildeo obtida em decorshyrecircncia da quebra de sigilo de que trata esta lei complementar responde pessoshyal e diretamente pelos danos decorrentes sem prejuiacutezo da responsabilidade objetiva da entidade puacuteblica quando comprovado que o servidor agiu de acorshydo com a orientaccedilatildeo oficial

10 O sigilo bancaacuterio e o tratamento que lhe eacute dado por oacutergatildeos internacioshynais como a OCDE e outros

Rui Celso Reali Fragoso Presidente do Instituto dos Advogados de Satildeo Paulo em artigo intitulado O Sigilo Bancaacuterio veiculado pela Internet (http Ii wwwjuscombr) registra que atualmente temos trecircs sistemas legais no munshydo cuidando do sigilo bancaacuterio O primeiro eacute o anglo-saxatildeo em que o sigilo natildeo encontra amparo legal o segundo eacute o dos paiacuteses da Europa continental - eu o contemplo em vaacuterios diplomas legais o terceiro eacute o da Suiacuteccedila e do Liacutebano que o reforccedilam

Analisando esses trecircs sistemas o autor citado observa

Haacute aparente contradiccedilatildeo no sistema inglecircs e norte-americano pois se de um lado nestes paiacuteses se eleva a garantia das liberdades individuais de outro se despreza o sigilo bancaacuterio Eacute que se ocorre conshyflito entre a apuraccedilatildeo de fatos (fator social) e a privacidade das pessoas (fator individual) prevalece a primeira Mais ainda o relacionamento de clientes e bancos longe de estabelececirc-lo serve como fonte de informashyccedilatildeo em favor de terceiros a indiscriccedilatildeo injustificada poreacutem eacute objeto de sanccedilatildeo E na Inglaterra os poderes puacuteblicos natildeo intervecircm no funcionashymento dos estabelecimentos privados de creacutedito o que debilita a invesshytigaccedilatildeo

Nos paiacuteses da Europa continental a legislaccedilatildeo contempla o sigilo bancaacuterio como consequumlecircncia do profissional e comporta derrogaccedilotildees na esfera penal e em alguns casos na civil mas comina sanccedilotildees crimishynais no caso de violaccedilatildeo ao sigilo (Coacutedigo Penal francecircs artigo 378 Coacuteshydigo Penal italiano art 622)

260 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

A sistemaacutetica fortalecida eacute aquela utilizada na Suiacuteccedila decorrente da crise ocorrida em 1931 com o fechamento do Banco de Genebra que ensejou a ediccedilatildeo de lei estabelecendo severas puniccedilotildees de natureza civil e criminal Tanto a legislaccedilatildeo suiacuteccedila como a libanesa esta surgida em 1956 permitem derrogaccedilotildees em certas hipoacuteteses A existecircncia das conshytas numeradas comprova a importacircncia do sigilo nestes paiacuteses

Eacute certo natildeo ser absoluto o segredo nem sua quebra em determishynadas situaccedilotildees significa abuso de poder Aliaacutes nenhum direito eacute absoluto

A doutrina tem ultimamente tomado conhecimento sobre as transforshymaccedilotildees que tem passado em vaacuterios ordenamentos juriacutedicos a questatildeo do sigilo bancaacuterio

Zenobio Simotildees de Melo advogado no Paranaacute em artigo sob o tiacutetulo Quebra do Sigilo Bancaacuterio (Internet httpjuscombr) informa que o jornal O Estado de Satildeo Paulo de 21 de junho de 2000 publicou a notiacutecia seguinte

Numa das mais importantes decisotildees adotadas durante o Conseshylho Europeu que marca o fim da presidecircncia portuguesa da Uniatildeo Euroshypeacuteia (UE) seus 15 paiacuteses aprovaram ontem o pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal No ponto mais polecircmico o pacote deveraacute acabar com o sigilo bancaacuterio ateacute 2010 foi uma negociaccedilatildeo de 12 anos Aacuteustria e Luxemburgo natildeo aceitavam o princiacutepio de acabar com o sigilo bancaacuterio A justificativa austriacuteaca eacute que este eacute um princiacutepio que faz parte da Consshytituiccedilatildeo do paiacutes haacute 200 anos Para aceitar o acordo o paiacutes exigiu a manushytenccedilatildeo do sigilo nos bancos austriacuteacos para quem resida no paiacutes

Registro a iacutentegra da notiacutecia

Pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal eacute aprovado por membros da UE Decisatildeo prevecirc quebra do sigilo bancaacuterio nos paiacuteses do bloco econocircmico

Jair Rattner

Especial para o Estado

Santa Maria da Feira Portugal- Numa das mais importantes decishysotildees adotadas durante o Conselho Europeu que marca o fim da presishydecircncia portuguesa da Uniatildeo Europeacuteia (UE) seus 15 paiacuteses aprovaram ontem o pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal No ponto mais polecircmico o pashycote deveraacute acabar com o sigilo bancaacuterio ateacute 2010

Foi uma negociaccedilatildeo de 12 anos Agora temos um documento que vai estabelecer os princiacutepios e as orientaccedilotildees para as futuras diretivas nessa aacuterea afirmou o Primeiro-Ministro Portuguecircs Antonio Guterres que ocupa a presidecircncia rotativa da UE (no fim do mecircs ela seraacute transferida para a Franccedila)

ENSAIOS JURiacuteDICOS 261

o acordo abrange trecircs aacutereas um coacutedigo de conduta que prevecirc o desmantelamento dos 66 paraiacutesos fiscais existentes ou dependentes da UE a tributaccedilatildeo de royalties e o pagamento de impostos sobre rendishymentos das poupanccedilas de cidadatildeos europeus residentes em outros paiacuteshyses dentre os 15 que fazem parte do bloco econocircmico europeu

O grande problema eram as poupanccedilas Aacuteustria e Luxemburgo natildeo aceitavam o princiacutepio de acabar com o sigilo bancaacuterio A justificativa austriacuteaca eacute que este eacute um princiacutepio que faz parte da Constituiccedilatildeo do paiacutes haacute 200 anos Para aceitar o acordo o paiacutes exigiu a manutenccedilatildeo do sigilo nos bancos austriacuteacos para quem resida no paiacutes Essa questatildeo natildeo eacute importante soacute para a Europa porque abre caminho para a criaccedilatildeo de mecanismos de transparecircncia global no mundo financeiro que satildeo esshysenciais para a globalizaccedilatildeo da economia avaliou Guterres

O prazo para a introduccedilatildeo das mudanccedilas vai ateacute o fim de 2010 Ateacute o fim deste ano as negociaccedilotildees vatildeo ser sobre a definiccedilatildeo do conteuacutedo das diretivas (as normas da UE)

Em 2002 a UE discutiraacute com outros paiacuteses esses conteuacutedos para fazer acordos que deveratildeo ser aprovados ateacute o fim do ano por unanimishydade

A partir de 2003 seraacute iniciado um periacuteodo de sete anos de transishyccedilatildeo para a troca de informaccedilotildees sobre os investimentos de cidadatildeos de outros paiacuteses europeus Nesse periacuteodo alguns paiacuteses poderatildeo optar por cobrar impostos de 20 a 25 sobre os rendimentos dos investimentos de residentes no exterior

No capiacutetulo onde foi analisado o sigilo bancaacuterio no Direito Comparado haacute registros tambeacutem a respeito do tratamento que oacutergatildeos internacionais como o OCDEll e outros vecircm dando ao sigilo bancaacuterio conforme estudo que foi apresentado pelo autor ali citado

II OCDE (Organizaccedilatildeo de Cooperaccedilatildeo e Desenvolvimento Econocircmico) criado em 1961 para substituir a OECE (Comitecirc Fiscal da Organizaccedilatildeo Europeacuteia de Cooperaccedilatildeo Econocircmica) Um dos documentos mais importantes da OCDE eacute o resultante da sua Convenccedilatildeo-Modelo relashytiva a impostos sobre a renda e o capital Essa Convenccedilatildeo estaacute sistematizada em sete capiacutetulos assim explicitados por Alberto Xavier em sua obra Direito Tributaacuterio Internacioshynal do Brasil A Convenccedilatildeo-Modelo da OCDE (tal como a das Naccedilocirces Unidas) encontra-se sistematizada em sete capiacutetulos Os capiacutetulos I e I regulam os requisitos para a aplicaccedilatildeo do tratado O capiacutetulo [JI - de longe o mais importante - conteacutem as regras de distribuiccedilatildeo de competecircncia no que concerne aos impostos sobre o rendimento classificado este por tipos ou classes agrave semelhanccedila do que sucede nos sistemas de tributaccedilatildeo cedular O capiacutetulo IV ocupa-se das regras de distribuiccedilatildeo de competecircncia no que respeita aos impostos sobre o capital O capiacutetulo V determina as consequumlecircncias das regras dos capiacutetulos 111 e IV facultanshydo aos Estados a escolha entre os meacutetodos da isenccedilatildeo e da imputaccedilatildeo O capiacutetulo VI conteacutem disposiccedilotildees adicionais sobre natildeo-discriminaccedilatildeo procedimento amigaacutevel troca de informaccedilotildees e privileacutegios de funcionaacuterios diplomaacuteticos e consulares e regras sobre extenshysatildeo do tratado a partes do territoacuterio Enfim o capiacutetulo VII conteacutem disposiccedilotildees finais sobre entrada em vigor e cessaccedilatildeo do acordo

262 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

Heleno Torres em sua recente obra Direito Tributaacuterio Internacional -Planejamento Tributaacuterio e Operaccedilotildees Transnacionais RT p 147 analisando o posicionamento da OCDE referente agrave poliacutetica de determinados paiacuteses que adoshytam tributaccedilatildeo favorecida e os efeitos dos regimes fiscais prejudiciais registra que

A OCDE resolveu entrar na luta para minorar as praacuteticas fiscalshymente danosas insistindo sobre a necessidade de aumentar as trocas de informaccedilotildees entre os Estados aleacutem de redigir uma lista de paiacuteses com tributaccedilatildeo favorecida e fazer algumas recomendaccedilotildees em acircmbito nacional e convencional a partir do seu importante relatoacuterio Harmful tax competition na emerging global issue

Mesmo reconhecendo os aspectos positivos do ambiente global vigente no qual os sistemas tributaacuterios operam os paiacuteses-membros da OCDE concluiacuteram que eles precisavam agir para restringir a competiccedilatildeo tributaacuteria danosa coletivamente e individualmente opondo-se agrave expanshysatildeo de regimes de impostos preferenciais danosos particularmente nos setores financeiros e atividades de serviccedilo que podem causar distorccedilotildees no comeacutercio e desniacuteveis nos padrotildees de investimento sendo uma ameashyccedila para os sistemas tributaacuterios domeacutesticos e para a estrutura global de tributaccedilatildeo internacional

Mais adiante pp 152153 Heleno Torres afirma que

Entre as recomendaccedilotildees definidas nesse relatoacuterio com aplicashyccedilatildeo dirigida aos paiacuteses-membros da instituiccedilatildeo as mais importantes satildeo as seguintes

bull para contrastar a competiccedilatildeo fiscal prejudicial os paiacuteses devem revisar as suas leis regulamentos e praacuteticas sobre sigilo bancaacuterio para remover empecilhos de acesso a tais informaccedilotildees por autoridades fiscais

bull intensificar o uso de trocas de informaccedilotildees principalmente soshybre as transaccedilotildees com paiacuteses de tributaccedilatildeo favorecida

A conclusatildeo que pode ser firmada apoacutes anaacutelise dos pronunciamentos internacionais acima explicitados eacute a construccedilatildeo de uma corrente que defenshyde uma maior abertura para a quebra do sigilo bancaacuterio quando for necessaacuteshyrio para apurar iliacutecitos tributaacuterios

Essa portanto eacute a resposta que apresento para a indagaccedilatildeo Qual o tratamento proposto por oacutergatildeos internacionais como o OCDE e outros com relaccedilatildeo ao sigilo bancaacuterio

ENSAIOS JURiacuteDICOS 263

11 Compatibilizaccedilatildeo do combate agrave criminalidade internacional com o resshypeito agrave seguranccedila juriacutedica a fim de evitar a fuga de investimentos do Paiacutes

Haacute de se reconhecer natildeo ser faacutecil desenvolver-se um sistema juriacutedico que contenha regras que facilitem o combate agrave criminalidade internacional e ao mesmo tempo prestigie os direitos fundamentais do cidadatildeo especialmenshyte a sua seguranccedila juriacutedica

As convenccedilotildees internacionais conforme demonstrado estatildeo preocupashydas com esses aspectos sem deixar de lado os fenocircmenos causados pela globalizaccedilatildeo

Natildeo deve ser esquecido que o tema envolve aspectos diversos a comeshyccedilar pelos determinantes da soberania dos Estados das forccedilas em expansatildeo das organizaccedilotildees internacionais e da pregaccedilatildeo para que os direitos fundamenshytaIacutes do cidadatildeo sejam respeitados com maior Iacutentensidade

A soluccedilatildeo a meu pensar pode ser encontrada no fortalecimento do Direito Comunitaacuterio Os Estados por via de organismos internacionais firmashyriam tratados para a adoccedilatildeo de um Coacutedigo Processual Penal Internacional com efeitos vinculantes por parte das naccedilotildees onde seriam adotadas regras investigatoacuterias e apuratoacuterias dos iliacutecitos internacionais alargando os conceitos de indiacutecios e presunccedilotildees sem deixar contudo de prestigiar a afetividade dos direitos e garantias fundamentais do cidadatildeo

Todas as naccedilotildees no iniacutecio deste seacuteculo envidam esforccedilos para diminuir a crise da seguranccedila juriacutedica Satildeo vaacuterios os fatores determinantes todos tendo como causa comum o crescimento da delinquumlecircncia em decorrecircncia de poliacutetishycas econocircmicas e sociais adotadas por determinados governos que contrishybuem para aumentar o percentual de pessoas pobres

A preocupaccedilatildeo atual para o combate ao crime internacional eacute alcanccedilar niacutevel de uniformizaccedilatildeo dos sistemas adotados para a quebra do sigilo bancaacuteshyrio De iniacutecio deve ser defendida a postura de que nenhuma lesatildeo ou ameaccedila a direito deve ser excluiacuteda da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio Nessa perspectishyva ganha suma importacircncia a criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional em virshytude de pela sua atuaccedilatildeo natildeo perdurar a diversidade de sistemas legais a respeito do assunto a saber a) O anglo-saxatildeo onde o sigilo natildeo encontra amparo legal b) o dos paiacuteses da Europa continental que o contempla em vaacuterios diplomas escritos e c) o da Suiacuteccedila e do Liacutebano que o reforccedilam l2bull

A criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional envolve uma reconceiacutetuaccedilatildeo de soberania

Sobre o tema Celso D de Albuquerque Mello em Direito Internacional da Integraccedilatildeo Ed Renovar p 13 faz a seguinte observaccedilatildeo

12 Conforme anota Rui Celso Reali Fragoso no artigo O Sigilo Bancaacuterio publicado no site httpvvwwjuscombr

264 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Poder-se-ia fazer um pequeno reparo a Chaumont que a indeshypendecircncia nacional eacute um conceito juridicamente indeterminado e que ela pode ter diferentes graus Tanto que podemos escrever soberania versus cooperaccedilatildeo internacional apesar de reconhecermos que esta posiccedilatildeo pode ser considerada como radical vez que natildeo haacute uma total incompatibilidade entre as duas Entretanto natildeo se pode deixar de consshytatar que de certo modo a cooperaccedilatildeo internacional se encontra conshysagrada na Carta da ONU no arl 1 ordm que trata dos Propoacutesitos das Naccedilotildees Unidas e nos Princiacutepios estabelecidos na Carta da OEA (Capiacutetulo 11) O mesmo ocorre na resoluccedilatildeo da Assembleacuteia Geral da ONU de 1970 que aprova a Declaraccedilatildeo Relativa aos Princiacutepios do Direito Internacional Reshylativas agraves Relaccedilotildees Amigaacuteveis e agrave Cooperaccedilatildeo entre os Estados conforme a Carta das Naccedilotildees Unidas bem como na Carta de Direitos e Deveres Econocircmicos aprovada pela mesma Assembleacuteia Geral em 1974

O crescimento do crime internacional em decorrecircncia dos fenocircmenos globalizantes determina o surgimento de um dever juriacutedico dos Estados firmashyrem pactos de cooperaccedilatildeo entre si para que enfrentem as organizaccedilotildees voltashydas para a criminalidade Esse dever juriacutedico globalizado tem suas raiacutezes no moral intemacional que conforme assinala Celso Albuquerque Mello na obra citada p 13 sempre consagrou o princiacutepio da solidariedade ou ainda do auxiacutelio muacutetuo

Eacute o mais importante desafio neste iniacutecio de seacuteculo fazer com que surja uma legislaccedilatildeo internacional que compatibilize o combate agrave criminalidade inshyternacional sem violar a seguranccedila juriacutedica com finalidade exclusiva de evitar a fuga de investimenos do Paiacutes

Tenha-se contudo em consideraccedilatildeo que a globalizaccedilatildeo do crime emshybora seja uma grande ameaccedila aos valores tradicionais que sustentam a cidashydania especialmente a seguranccedila juriacutedica natildeo deve prejudicar o desenvolvishymento econocircmico de qualquer naccedilatildeo

Natildeo faccedilo coro ao assinalado por Eric Hobsbawm em sua obra Era dos Extremos O Breve Seacuteculo XX 1914-1991 1995 p 24 Companhia das Letras S Paulo traduccedilatildeo de Marcos Santarrita no sentido de que Talvez a caracteriacutesshytica mais impressionante do fim do seacuteculo XX seja a tensatildeo entre esse processo de globalizaccedilatildeo cada vez mais acelerado e a incapacidade conjunta das instishytuiccedilotildees puacuteblicas e do comportamento coletivo dos seres humanos de se acoshymodarem a ele

Penso que natildeo haacute essa acomodaccedilatildeo e que as instituiccedilotildees puacuteblicas espeshycialmente as submetidas ao controle da ciecircncia juriacutedica natildeo estatildeo incapacitashydas de encontrar caminhos que solucionem o problema existente

ENSAIOS JURiacuteDICOS 265

Eacute por demais positivo entre outros acontecimentos o fato da conscienshytizaccedilatildeo de que haacute de ser encontrada uma forma de combate agrave criminalidade internacional que natildeo afaste a garantia da seguranccedila juriacutedica Esta eacute uma neshycessidade para impor paz agrave naccedilatildeo e consequumlentemente criar ambiente para que novos investimentos necessaacuterios ao desenvolvimento do seu processo econocircmico aconteccedilam sem se falar na manutenccedilatildeo dos jaacute existentes

O Parlamento Europeu aprovou ultimamente uma resoluccedilatildeo sobre a criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional sob a consideraccedilatildeo de que eacute necessaacuteshyrio criaacute-lo de forma permanente para complementar os sistemas judiciais nashycionais e pocircr fim agrave impunidade de que gozam os responsaacuteveis por genociacutedio crimes contra a humanidade e crimes de guerra

A abertura para essa posiccedilatildeo denota a formaccedilatildeo de uma consciecircncia internacional para combater a criminalidade internacional em todos os niacuteveis contribuindo para fortalecer a seguranccedila juriacutedica interna de cada paiacutes

O documento representativo dessa resoluccedilatildeo eacute do teor seguinte

Parlamento Europeo

Resolucioacuten sobre el Tribunal Penal Internacional

EI Parlamento Europeo

Vistas sus anteriores resoluciones sobre un Tribunal Penal Interna-cional

A Considerando que es necesario crear un Tribunal Penallnternashycional permanente que complemente los sistemasjudiciales nacionales y ponga fin a la impunidad de que gozan los responsables de genocidio crimenes contra la humanidad y criacutemenes de guerra

B Considerando que la Comisioacuten de Derechos Humanos de las Naciones Unidas estaacute respaldando decididamente la creacioacuten de ese Trishybunal

C Considerando que la fase preparatoria de la creacioacuten dei Tribushynal Penal Internacional finalizoacute con la uacuteltima sesioacuten dei Comiteacute Preparatorio de las Naciones Unidas que tuvo lugar dei 16 de marzo al3 de abril de 1998

D Felicitaacutendose por la creciente participacioacuten de Estados en el proceso de negociaciones y esperando que un nuacutemero auacuten mayor de Esshytados procedentes de todas las regiones se encuentre plenamente represhysentado en la Conferencia Diplomaacutetica de Roma

E Considerando que dei 15 de junio al17 de julio de 1998 se celebra en Roma la Conferencia Diplomaacutetica de Plenipotenciarios para la constitucioacuten de un Tribunal Penal Internacional

266 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

F Considerando que los Estados miembros y la delegacioacuten de la Comisioacuten Europea que participan en la Conferencia Diplomaacutetica de Roma pueden desempenar un papel crucial a la hora de garantizar el eacutexito de la conclusioacuten de esta Conferencia Diplomaacutetica y acogiendo positivamente la mayor convergenciacutea de las posturas de los Estados miembros de la UE

G Congratulaacutendose por la oferta dei Gobierno de los Paiacuteses Bajos de servir de sede dei Tribunal Penal Internacional permanente

I Insta a la Conferencia Diplomaacutetica de Roma a aprovechar la oportunidad histoacuterica de concluir un texto de Estatuto para un Tribunal Penal Internacional independiente justo y eficaz

2 Insta a los representantes de los Estados miembros dei Consejo y de la Comisioacuten a garantizar activamente el ecircxito de los resultados a sashyber un auteacutentico Tribunal Penal Internacional en lugar de limitarse a un acuerdo de compromiso sobre principios esenciales en sus esfuerzos por conciliar las posturas de Estados reticentes

3 Destaca que para constituir un complemento eficaz de los sisteshymas judiciacuteales nacionales el Estatuto dei Tribunal Penal Internacional permanente objeto de la Conferencia de Roma deberaacute establecer

a un Fiscal independiente con competencias para investigare insshytruir sumarios por propia iniciativa en situaciones en las que se hayan cometido los delitos sometidos a lajurisdiccioacuten dei Tribunal

b Ia jurisdiccioacuten inherente y universal dei Tribunal en materia de genocidio criacutemenes contra la humanidad criacutemenes de guerra y agresioacuten sin que se requiera ninguacuten consentimiento dei Estado

c una buena relacioacuten de trabajo con los Tribunales lnternacionales ya establecidos en La Haya

d una relacioacuten constructiva con las Naciones Unidas yen partishycular con el Consejo de Seguridad basada en el pleno reconocimiento de sus respectivas funciones y competencias

e Ia obligacioacuten de los Estados firmantes de acatar y hacer cumplir sin demora las oacuterdenes y decisiones dei Tribunal

f los mayores niveles de respeto de los derechos de los acusados y de los sospechosos y de proteccioacuten de los intereses de las viacutectimas y de los testigos

g Ia garantiacutea de una financiacioacuten a largo plazo necesaria para asegurar la autonomiacutea e independencia dei Tribunal frente a cualquier presioacuten exterior

4 Destaca ademaacutes que la jurisdiccioacuten deI Tribunal sobre los delishytos de genociacutedio los criacutemenes contra la humanidad y los criacutemenes de

ENSAIOS JURiacuteDICOS 267

guerra deben considerarse con la misma calificacioacuten penal con indepenshydencia de que se hayan cometido en conflictos armados internacionales o en conflictos internos

5 Insta ai Consejo y a los Estados miembros a garantizar la universalidad y la transparencia de las negociaciones y la participacioacuten continuada de la comunidadjuriacutedica y la sociedad civil internacionales

6 Encarga a su Presidente que transmita la presente resolucioacuten ai Consejo a la Comisioacuten a los Gobiernos de los Estados miembros ai Secreshytario General de las Naciones Unidas ai Presidente de la Asamblea Geneshyral de las Naciones Unidas y ai Presidente de la Conferencia Diplomaacutetica de las Naciones Unidas para la constitucioacuten de un Tribunal Penal Internashycional

A resoluccedilatildeo supracitada demonstra que cresce a conscientizaccedilatildeo da necessidade de ser criado um Tribunal Penal Internacional com forccedila cogente obrigatoacuteria de suas decisotildees no acircmbito interno dos paiacuteses que participarem do pacto de sua constituiccedilatildeo

A doutrina internacional revela que a comunidade internacional somenshyte agora vem se preocupando em criar uma estructura internacional para determinar las responsabilidades individuales emergentes de violacioacuten de ciertos derechos baacutesicos dei ser humano Los mecanismos de responsabilidad estatal creados desde los 60 se dirigen a la mayor protecciotilden dei ser humano y la erradicacioacuten de las praacutecticas de volacioacuten sistemaacutetica de los derechos humanos ar via de la condena ai Estado que ordena o que tolera los abusos por lo cual se estructuraron entorno ai Estado conmo sujeto responsable Como haacute seflalado la Corte Internacional de Derechos Humanos el procedimiento ante ella no es un procedimiento penal lo que se busca determinar es el nivel de cumprimiento por parte de un Estado de sus obligaciones de derecho internacional Sin desconocer la importancia de determinar la responsabilidad dei Estado para que eacuteste tenga un incentivo para erradicar esas praacutectica de sus frotneras es pertinente detacar que las violaciones maacutes grave son en uacuteltima instancia coshymetidas por individuos (Francisco Cox Encarregado dei TPI HOH em artigo intitulado EI IlOH ante la Craciotilden de um Tribunal Penal Internacional no site httpwwwiidhedcrcpitpintrohtml)

A criaccedilatildeo de um Tribunal Penal Internacional atuaria permanentemente e teria competecircncia subsidiaacuteria em relaccedilatildeo agrave outorgada aos Tribunais Nacioshynais limitando-se a atuar apenas nos crimes internacionais previamente defishynidos como sendo do interesse da comunidade global

Merece registro no acircmbito do assunto tratado que na Conferecircncia Reshygional sobre o Tribunal Penal Internacional realizada em 18 e 19 de fevereiro de 1998 na cidade de Guatemala Guatemala um dos temas tratados foi o relativo

268 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

agrave harmonizaccedilatildeo das incriminaccedilotildees quando os seguintes aspectos foram disshycutidos Branqueamento corrupccedilatildeo fraude fiscal participaccedilatildeo em associashyccedilotildees criminosas um olhar agrave luz dos direitos nacionais e do direito internacioshynal Perspectivas Quais os comportamentos a incriminar Criar uma nova incriminaccedilatildeo da fraude fiscal Uma tentativa de harmonizaccedilatildeo o corpus jurls contendo disposiccedilotildees penais para proteccedilatildeo dos interesses financeiros da Uniatildeo Europeacuteia As negociaccedilotildees no seio do Conselho da Europa e da OCDE referenshytes agrave luta contra a corrupccedilatildeo etc O referido painel foi presidido por Benoit Dejemeppe procurador do Rei em Bruxelas e contou com a presenccedila de Tereshyza Beleza professora de Direito Penal na Faculdade de Direito de Lisboa como moderadora

Haacute como visto um largo campo de anaacutelise para desenvolver com possishybilidade do surgimento de sugestotildees que levem a ciecircncia juriacutedica a alcanccedilar com a atuaccedilatildeo estatal uma competecircncia internacional que possa combater o crime internacional e ao mesmo tempo proporcione seguranccedila juriacutedica na ordem interna ganhando assim o sistema juriacutedico confianccedila dos investidoshyres

Em conclusatildeo a forma de compatibilizar o combate agrave criminalidade internacional sem violar a seguranccedila juriacutedica necessaacuteria a evitar a fuga de inshyvestimentos do paiacutes estaacute na criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional com comshypetecircncia definida para processar e julgar delitos globalizantes e cujas decisotildees tenham forccedila imperativa no acircmbito interno das naccedilotildees participantes do pacto para o seu nascimento

Page 17: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro

ENSAIOS JUAlolCOS 239

3 As decisotildees da administraccedilatildeo tributaacuteria referidas nos nuacuteshymeros anteriores devem ser fundamentadas com expressa menshyccedilatildeo dos motivos concretos que as justificam pressupotildeem a audishyccedilatildeo preacutevia do contribuinte e satildeo da competecircncia do Director-Geshyral dos Impostos ou do Director-Geral das Alfacircndegas e dos Imshypostos Especiais sobre o consumo ou seus substitutos legais sem possibilidade de delegaccedilatildeo

4 Os actos praticados ao abrigo da competecircncia definida no nuacutemero anterior satildeo susceptiacuteveis de recurso judicial o qual teraacute efeito suspensivo nas situaccedilotildees previstas no n 2

5 Nos casos de deferimento do recurso previsto no nuacutemero anterior os elementos de prova entretanto obtidos natildeo podem ser utilizados para qualquer efeito em desfavor do contribuinte

6 As entidades que se encontrem numa relaccedilatildeo de domiacutenio com o contribuinte ficam sujeitas aos regimes de acesso agrave inforshymaccedilatildeo bancaacuteria referidos nos n 1 e 2

7 O acesso da administraccedilatildeo tributaacuteria a informaccedilatildeo banshycaacuteria relevante relativa a familiares ou terceiros que se encontrem numa relaccedilatildeo especial com o contribuinte depende de autorizashyccedilatildeo judicial expressa apoacutes audiccedilatildeo do visado obedecendo aos requisitos previstos no n 3

8 O regime previsto nos nuacutemeros anteriores natildeo prejudica a legislaccedilatildeo aplicaacutevel aos casos de investigaccedilatildeo por infracccedilatildeo peshynal e soacute pode ter por objecto operaccedilotildees e movimentos bancaacuterios realizados apoacutes a sua entrada em vigor sem prejuiacutezo do regime vigente para as situaccedilotildees anteriores

9 Os actos praticados ao abrigo da competecircncia prevista no n I devem ser objecto de comunicaccedilatildeo ao Defensor do Contrimiddot buinte

10 Para os efeitos desta lei considera-se documento bancaacuteshyrio qualquer documento ou registo independentemente do resshypectivo suporte em que se titulem comprovem ou registem opeshyraccedilotildees praticadas por instituiccedilotildees de creacutedito ou sociedades finanshyceiras no acircmbito da respectiva actividade incluindo os referentes a operaccedilotildees realizadas mediante utilizaccedilatildeo de cartotildees de creacutedito (coacutepia anexa)

Parece evidente destarte que todo o mundo civilizado abandonou a possibilidade de opor-se agrave Administraccedilatildeo Tributaacuteria o sigilo bancaacuterio

240 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

4 O sigilo bancaacuterio e o direito agrave intimidade e agrave privacidade das pessoas

A anaacutelise do sigilo bancaacuterio em face do direito agrave intimidade e agrave privacidashyde exige inicialmente que seja enfrentada a questatildeo referente ao seu conceito

Os doutrinadores natildeo tecircm assumido posiccedilatildeo uniforme quanto aos asshypectos conceituais dessa entidade juriacutedica

Seacutergio Carlos Covello autor da obra jaacute mencionada (O Sigilo Bancaacuterio Leud S Paulo 1991 p 69) entende que sigilo bancaacuterio eacute a obrigaccedilatildeo que tecircm os Bancos de natildeo revelar salvo justa causa as informaccedilotildees que venham a obter em virtude de sua atividade profissional

Luiz Fernando Bellinetti no artigo intitulado Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio (Revista do Direito do Consumidor Satildeo Paulo RT 1996 voI 18 p 144) defende posiccedilatildeo no sentido de que sigilo bancaacuterio eacute o dever juriacutedico que tecircm as instituiccedilotildees de creacutedito e as organizaccedilotildees auxiliares e seus empregados de natildeo revelar salvo justa causa as informaccedilotildees que venham a obter em virtushyde da atividade bancaacuteria a que se dedicam

Para Arnoldo Wald (in O Sigilo Bancaacuterio no Projeto de Lei Complemenshytar n 70 Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas n I pp 196209) o sigilo bancaacuterio se enquadra no conceito mais amplo do segredo profissional que tem merecido uma proteccedilatildeo mais ampla ensejando sua violaccedilatildeo caracterizaccedilatildeo como crime (art 154 do Coacutedigo PeshynaI)

Eivany A Silva tratando do tema em Consideraccedilotildees a Respeito do Sigilo de Dados (artigo publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio n 61 pp 41142 - Edit Dialeacutetica) afirma que o sigilo bancaacuterio eacute espeacutecie do gecircnero sigilo de dados constituindo um direito fundamental protegido constitucionalmente inserto que estaacute no rol dos direitos e garantias individuais ou seja em claacuteusushylas peacutetreas da Carta Magna natildeo podendo portanto ser modificado nem messhymo por emenda agrave Constituiccedilatildeo e portanto muito menos por legislaccedilatildeo de hierarquia inferior

Como examinado haacute divergecircncias na fixaccedilatildeo do conceito Essas divershygecircncias embora importantes para as posiccedilotildees doutrinaacuterias a serem assumishydas sobre o alcance do sigilo bancaacuterio natildeo geram contudo influecircncias de maior intensidade no relacionamento entre a instituiccedilatildeo financeira e os seus depositantes Isso porque o que merece ser considerado eacute a natureza juriacutedica do sigilo bancaacuterio isto eacute a que categoria de direito pertence e como por quem e quando a sua quebra pode ser determinada

Em face do exposto necessaacuterio eacute que se faccedila o alinhamento das teorias que procuram fundamentar o sigilo bancaacuterio

A doutrina em eacutepocas diversas examinou as seguintes teorias

ENSAIOS JURiacuteDICOS 241

Teoria contratualista O sigilo bancaacuterio de acordo com essa teoria deshycorre da relaccedilatildeo contratual que voluntariamente eacute formada entre o banco e o cliente por via da qual mesmo sem claacuteusula expressa a instituiccedilatildeo financeira assume a obrigaccedilatildeo de guardar segredo das movimentaccedilotildees de dinheiro que nela satildeo feitas Essa responsabilidade assumida pelo banco inspira-se segunshydo os adeptos da teoria em destaque nos usos nos costumes e na boa-feacute sempre aplicaacuteveis na intepretaccedilatildeo dos contratos comerciais7bull

Teoria do direito agrave privacidade Os adeptos dessa corrente afirmam que o sigilo bancaacuterio integra o campo do direito agrave privacidade que faz parte dos direitos da personalidade

Teoria consuetudinaacuteria Segundo os seguidores dessa linha de pensar o sigilo bancaacuterio decorre dos compromissos taacutecitos assumidos entre instituishyccedilotildees financeiras e seus clientes no sentido de natildeo serem levados ao conhecishymento de terceiros os valores transacionados O uso reiterado dessa praacutetica apoiada no elemento confianccedila passou a representar costume adotado nesse tipo de negoacutecio juriacutedico

Teoria da boa-feacute A adoccedilatildeo dessa teoria conduz o inteacuterprete a entender que o sigilo bancaacuterio por sua proacutepria natureza estaacute vinculado ao caraacuteter fiduciaacuterio da atividade bancaacuteria fundando-se portanto na boa-feacute ou dever de lisura que tanto marca o tipo de negoacutecio juriacutedico firmado

Teoria do sigilo profissional Essa teoria concebe o sigilo bancaacuterio como sendo uma espeacutecie do sigilo profissional Haacute portanto um dever eacutetico do banshyco em respeitar o sigilo bancaacuterio em decorrecircncia da profissatildeo exercida

Teoria do direito agrave intimidade dos bancos Os integrantes dessa forma de pensar sustentam que a instituiccedilatildeo financeira tem legiacutetimo interesse de afastar do conhecimento de terceiros a movimentaccedilatildeo financeira dos seus clientes e consequumlentemente dos fatos com elas relacionados

Teoria da complexidade do viacutenculo Essa teoria eacute explicada por Arnoldo Wald no trabalho jaacute citado da forma seguinte A doutrina moderna abandoshynou a noccedilatildeo da relaccedilatildeo juriacutedica contratual defendo a complexidade do viacutenshyculo Aleacutem dos direitos e das obrigaccedilotildees principais existem deveres secundaacuteshyrios para ambos os contratantes que decorrem da regra geral da boa-feacute denoshyminada na doutrina italiana de cOITeteza e na legislaccedilatildeo alematilde de Treu und Glauben Exige que a atuaccedilatildeo de uma parte natildeo cause danos agrave esfera juriacutedica da outra Dentro desta ideacuteia defende-se que o segredo bancaacuterio eacute um dever

7 Arnoldo Wald em Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais artigo publicado na Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas n 22 pp 1518 manifesta entendimento de que no campo normatIacutevo do Direito brasileiro esta teoria encontra respaldo nos arts 130 e 131 do Coacutedigo Comercial que prevecirc a interpretaccedilatildeo dos contratos segundo os usos os costumes e a boa-feacute

242 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

acessoacuterio na relaccedilatildeo juriacutedica Mesmo que natildeo nasccedila o contrato entre as partes a boa-feacute objetiva impede que a instituiccedilatildeo financeira prejudique os interesses do cidadatildeo

Estabelecidos os pressupostos doutrinaacuterios acima examinamos agora se o sigilo bancaacuterio diz respeito agrave intimidade e agrave privacidade das pessoas

A Constituiccedilatildeo Federal em seu artigo 5ordm incisos X e XII afirma

Art 5ordm Todos satildeo iguais perante a lei sem distinccedilatildeo de qualquer natureza garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Paiacutes a inviolabilidade do direito agrave vida agrave liberdade agrave igualdade agrave segushyranccedila e agrave propriedade nos termos seguintes

X - satildeo inviolaacuteveis a intimidade a vida privada a honra e a imagem das pessoas assegurado o direito agrave indenizaccedilatildeo pelo dano material ou moral decorrente de sua violaccedilatildeo

XJl - eacute inviolaacutevel o sigilo da correspondecircncia e das comunicaccedilotildees telegraacuteficas de dados e das comunicaccedilotildees telefocircnicas salvo no uacuteltimo caso por ordem judicial nas hipoacuteteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigaccedilatildeo criminal ou instruccedilatildeo processual penal

Essas garantias constitucionais protegem o cidadatildeo de qualquer investida de terceiros em sua intimidade em sua vida privada e no sigilo de seus dados

Na expressatildeo terceiros estaacute incluiacutedo o Estado e consequumlentemente seus agentes poliacuteticos e administrativos

A doutrina tem se manifestado de modo quase unacircnime no sentido de que o sigilo bancaacuterio eacute uma garantia constitucional que protege a privacidade das pessoas no campo econocircmico e financeiro A sua significaccedilatildeo eacute de natildeo tornar puacuteblica a movimentaccedilatildeo da conta bancaacuteria e das aplicaccedilotildees financeiras do cidadatildeo para que de nenhum modo os atos privados praticados possam ser tornados puacuteblicos

Esse posicionamento eacute o adotado pelos autores que passo a citar

Arnoldo Wald (O Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais artigo pushyblicado na Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas RT n 22 pp 1521)

O sigilo bancaacuterio eacute o meio para resguardar a privacidade no camshypo econocircmico pois veda a publicidade sobre a movimentaccedilatildeo da conta corrente bancaacuteria e das aplicaccedilotildees financeiras

ENSAIOS JURiacuteDICOS 243

Eivany A Silva (Consideraccedilotildees a Respeito do Sigilo de Dados artigo publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio n 61 Satildeo Paulo Editora Dialeacutetica p27)

A maioria dos ordenamentos juriacutedicos como o brasileiro tratam o sigilo bancaacuterio como direito fundamental do contribuinte agrave privacidashyde ou seja agrave resistecircncia agrave comunicaccedilatildeo de dados que representem desshydobramento da personalidade da pessoa direito agrave oposiccedilatildeo e agrave negaccedilatildeo de comunicaccedilatildeo

Ives Gandra da Silva Martins (Sigilo Bancaacuterio trabalho publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio S Paulo Editora Dialeacutetica n 1 pp 24 e 25)

Pelos incisos X e XII do artigo 5ordm tem o contribuinte o direito de preservaccedilatildeo de sua intimidade de sua privacidade e de que terceiros que detenham informaccedilotildees pessoais suas sejam obrigados a guardaacute-Ias

Natildeo pode pois a fiscalizaccedilatildeo exigir de terceiros informaccedilotildees que apenas pode obter do proacuteprio contribuinte

Em determinadas hipoacuteteses todavia o interesse puacuteblico haacute de preshyvalecer sobre o interesse individual mas caberaacute a um outro poder definir se tais hipoacuteteses efetivamente ocorrem com o que poderaacute o Poder Judishyciaacuterio autorizar se convencido estiver o magistrado de que a hipoacutetese eacute de gravidade e de lesatildeo ao interesse puacuteblico a quebra do direito ao sigilo bancaacuterio

Estou convencido ser esta a melhor conformaccedilatildeo juriacutedica da quesshytatildeo idealizada pelos constituintes defendida pela doutrina e consagrashyda na jurisprudecircncia corrente exegeacutetica esta a que me filio desde os meus primeiros escritos sobre a mateacuteria

Roberto Quiroga Mosquera (Tributaccedilatildeo no Mercado Financeiro e de Capitais obra publicada pela Editora Dialeacutetica Satildeo Paulo 1998 pp 70171)

Do exposto ateacute aqui eacute evidente que o direito ao sigilo bancaacuterio representa uma espeacutecie de direito agrave privacidade

Eacute incontroverso que os dados e informaccedilotildees de natureza bancaacuteria dizem respeito agrave intimidade e agrave vida privada dos cidadatildeos Dados que dizem respeito aos valores em dinheiro depositados em contas-correnshytes bancaacuterias tipos e caracteriacutesticas de aplicaccedilotildees financeiras ganhos e prejuiacutezos auferidos ou incorridos em operaccedilotildees bursaacuteteis etc satildeo sem sombra de duacutevida elementos particulares e pessoais de qualquer indiviacuteshyduo

244 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Utilizando outra voz informaccedilotildees que tocam no aspecto financeishyro do ser humano representam direito iacutentimo e personaliacutessimo devendo ser mantidas em sigilo por aqueles que eventualmente as detenham em razatildeo de sua atividade profissional Parece-nos que tal conclusatildeo eacute de uma clareza inconteste

Natildeo tem sido outra a posiccedilatildeo da doutrina mais abalizada do Paiacutes e da jurisprudecircncia dominante

o autor referido a seguir faz a observaccedilatildeo seguinte

Carlos Alberto Hagstrom (Sigilo Bancaacuterio Novas Questotildees Reshyvista de Direito Mercantil Satildeo Paulo Malheiros 1997 vaI 105 pp 4344) expotildee que apesar de existirem diversas teorias que procuram fundashymentar juridicamente o sigilo bancaacuterio modernamente a explicaccedilatildeo para o fundamento do referido instituto sofreu uma radical alteraccedilatildeo Divershysas constituiccedilotildees modernas esclarece o mencionado autor ampliaram e explicitaram o elenco de direitos e garantias individuais passando a garantir o direito agrave privacidade e agrave intimidade A Constituiccedilatildeo brasileira natildeo trilha caminho diferente Assegurou referidos direitos de forma exshypressa e sem restriccedilotildees O tema do sigilo bancaacuterio figura agora em niacutevel constitucional Tem status de norma superior no qual se reconhece o direito agrave intimidade como norma de caraacuteter geneacuterico em que estatildeo conshytemplados muacuteltiplos aspectos da vida privada em especial os de ordem econocircmico-financeira que compotildeem o que Hagstrom denominou a inshytimidade econocircmica ou intimidade patrimonial

Luiacutes Fernando 8ellinetti (Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio artigo publicado na Revista de Direito do Consumidor n 18 pp 141151)

Como jaacute dissemos anteriormente em certas hipoacuteteses o fundashymento para o segredo bancaacuterio seria a privacidade No entanto nesses casos o que se protege eacute a privacidade e natildeo propriamente o sigilo

Entendemos que uma coisa eacute garantir-se a privacidade da pessoa com fundamento em norma constitucional outra eacute garantir-se o segreshydo de informaccedilotildees bancaacuterias de uma pessoa com base na legislaccedilatildeo supramencionada

Sempre que a revelaccedilatildeo de informaccedilotildees bancaacuterias puder violar a privacidade da pessoa parece-nos que mais do que garantia ao sigilo bancaacuterio (com fundamento legal) tem a pessoa garantia agrave sua privacishydade (com fundamento constitucional)

ENSAIOS JURiacuteDICOS 245

No entanto se a revelaccedilatildeo da informaccedilatildeo natildeo invadir a esfera da intimidade da pessoa sua garantia eacute meramente legal do sigilo bancaacuterio

Carlos Maacuterio Velloso (citado por Misabel Derzi em Direito Tributaacuterio Aplicado obra publicada pela Editora Del Rey Belo Horizonte MO pp 278 e 279)

O sigilo bancaacuterio decorre do direito agrave privacidade inerente agrave pershysonalidade das pessoas consagrado na Constituiccedilatildeo Federal em seu art 5ordm X e protege tanto interesses privados como finalidades de ordem puacuteblica a saber o sistema de creacutedito O sigilo bancaacuterio natildeo eacute um princiacuteshypio absoluto

As exceccedilotildees ao sigilo bancaacuterio estatildeo previstas na Lei n 45951964 que continua em vigor

O Poder Judiciaacuterio pode requisitar relativamente a pessoas e instishytuiccedilotildees informaccedilotildees que implicam quebra de sigilo (Lei n 45951964 art 38 sect 1 ordm) entretanto mesmo havendo inqueacuterito policial instaurado deveraacute proceder com cautela prudecircncia e moderaccedilatildeo inerentes agrave mashygistratura

Luciana Fregodolli (O Direito agrave Intimidade - excerto da dissertaccedilatildeo que apresentou sob o tiacutetulo O Direito agrave Intimidade e a Prova Iliacutecita publicado pela Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Constitucional e Ciecircncia Poliacutetica -n 19 p 233)

O sigilo bancaacuterio protege interesses privados Eacute ele espeacutecie de direito agrave privacidade inerente agrave personalidade das pessoas e que a Consshytituiccedilatildeo Federal consagra no art 5ordm X aleacutem de atender a uma finalidade de ordem puacuteblica qual seja a de proteccedilatildeo ao sistema de creacutedito

O direito agrave privacidade abrange atualmente o de impedir que tershyceiros inclusive o Estado e o Fisco tenham acesso a informaccedilotildees sobre o que se denominou a aacuterea de manifestaccedilatildeo existencial do ser humano

Celso Ribeiro Bastos O pensamento de Celso Ribeiro Bastos foi exshyposto por Roberto Quiroga Mosquera na obra jaacute referida p 71 do modo seguinte

Celso Bastos eacute do mesmo pensar Apoacutes tecer consideraccedilotildees introdutoacuterias acerca do sigilo bancaacuterio e expor pensamentos de divershysos autores nacionais e alieniacutegenas conclui o constitucionalista brasileishyro no sentido de que todas as despesas ordinaacuterias feitas pelo cidadatildeo

246 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

comum em sua vida cotidiana devem ser consideradas parte de sua vida privada familiar ou domeacutestica e portanto protegidas contra interferecircnshycias a despeito de qualquer pretexto Desde as condutas mais corriqueishyras como as compras efetuadas em um supermercado para manutenshyccedilatildeo da famiacutelia quanto aquelas outras moralmente reprovaacuteveis como presentes ou joacuteias compradas e dadas a quem presta ao homem servishyccedilos de natureza extraconjugal tudo estaacute abarcado pelo manto da proteshyccedilatildeo agrave vida privada familiar ou domeacutestica ( ) E mais adiante arremata Hoje praticamente a vida do homem pode ser escrita a partir de seu talatildeo de cheques e nas sociedades mais avanccediladas pelos cartotildees de creacutedito e magneacuteticos Permitir-se que o sigilo bancaacuterio venha a ser romshypido por qualquer forma natildeo-extraordinaacuteria para salvaguarda de inteshyresse de porte no miacutenimo idecircntico eacute expor a seguranccedila individual a um constante e absurdo temor perante as possibilidades de controle direto ou pelo vazamento de alguma informaccedilatildeo

Haacute contudo corrente contraacuteria como passaremos a demonstrar

Andreacute Serratildeo Borges de Sampaio Consultor da Uniatildeo nas informashyccedilotildees prestadas ao Advogado-Geral da Uniatildeo sobre a ADIn n 2397 cita trechos de doutrina e jurisprudecircncia estrangeiras defendendo o entendimento de que o sigilo bancaacuterio natildeo tem conotaccedilatildeo de direito de privacidade Eis o que escreshyveu o parecerista citado

O jurista portuguecircs J L Saldanha Sanches coteja primorosashymente o sigilo bancaacuterio com a proteccedilatildeo da intimidade para concluir que natildeo haacute que se falar em direito ao sigilo bancaacuterio como concretizaccedilatildeo do direito agrave intimidade Nas suas palavras

Ora em que esfera podemos noacutes incluir o segredo bancaacuteshyrio enquanto instituto que concretiza certos valores do ordenashymento juriacutedico Como expressatildeo de interesses juridicamente tuteshylados

Seraacute o segredo bancaacuterio um prolongamento do direito agrave inshytimidade da esfera pessoal e familiar de uma qualquer pessoa sinshygular (uma vez que em relaccedilatildeo agraves pessoas coletivas a questatildeo natildeo pode mesmo ser colocada) Ou diraacute antes respeito aquela faixa mais larga que resguarda a privacidade de qualquer cidadatildeo e que soacute pode por isso sofrer qualquer intromissatildeo se surgirem razotildees vaacutelidas para que tal direito seja restringido

Ao afirmar-se que na perspectiva dos clientes dos bancos o segredo bancaacuterio eacute um direito com a reserva da sua vida privada temos uma primeira resposta para esta questatildeo

ENSAIOS JURiacuteDICOS 247

Mas falta distinguir entre intimidade e reserva da vida privashyda e entre clientes individuais e profissionais de um banco Natildeo estamos perante o mesmo tipo de tutela quando contamos que um particular espera que o banco natildeo divulgue a qualquer inteshyressado o volume da sua conta bancaacuteria (porque pura e simplesshymente quer manter sob reserva a sua vida particular) ou quando um comerciante confia no banco para que este natildeo revele quem satildeo os seus clientes fornecedores ou qual eacute o seu grau de endividamento

No caso da pessoa singular estaacute apenas em causa um conshyjunto de valores de natureza moral esta natildeo estaacute em princiacutepio preocupada com possiacuteveis prejuiacutezos econocircmicos ligados a qualshyquer divulgaccedilatildeo Apenas se opotildee por razotildees do seu foro pessoal e que natildeo carecem de fundamentaccedilatildeo que esta tenha lugar

Enquanto que o comerciante pode ser seriamente prejudishycado em termos concorrenciais com a revelaccedilatildeo da lista dos seus clientes ou com a sua situaccedilatildeo financeira

O dever de reserva que cabe ao banqueiro estaacute desta forma a serviccedilo do interesse comercial das empresas suas clientes - que pelo simples facto de o serem ou por necessitarem de obter creacutedishyto lhe datildeo informaccedilotildees com um forte valor comercial ou da pesshysoa singular que deseja manter a privacidade da sua situaccedilatildeo patrimonial

Ou em alternativa ao serviccedilo da manutenccedilatildeo da privacidashyde que qualquer um pode desejar ainda que a possiacutevel violaccedilatildeo desta apenas lhe possa acarretar danos natildeo-patrimoniais

E por isso o segredo bancaacuterio natildeo pode constituir a expresshysatildeo do imperativo constitucional da proteccedilatildeo da intimidade Ateacute porque o acesso a essa esfera estaacute vedado aos proacuteprios bancos

Natildeo nos parece aceitaacutevel que um banco como condiccedilatildeo para a concessatildeo de creacutedito a uma pessoa singular ou para estashybelecer com ela qualquer relaccedilatildeo contratual possa exigir desta informaccedilatildeo de tipo estritamente pessoal ou a sujeiccedilatildeo a exames meacutedicos que atingindo a sua esfera iacutentima afectam a sua dignidashyde Aqui estaacute em causa a ilicitude da pergunta por pressupor o acesso agrave esfera inviolaacutevel (e indisponiacutevel) da intimidade

A informaccedilatildeo que o banco pode obter para a defesa dos seus interesses legiacutetimos natildeo pode ir aleacutem da esfera patrimonial do seu cliente rendimentos bens possuiacutedos perspectivas profisshysionais

( )

248 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

Podemos pois concluir que o segredo bancaacuterio natildeo eacute natildeo pode ser uma concretizaccedilatildeo do princiacutepio constitucional do direishyto agrave intimidade

Este princiacutepio tem como funccedilatildeo consagrar uma zona de reshyselVa pessoal para factos opccedilotildees e circunstacircncias que soacute de forshyma indirecta e de todo secundaacuteria podem ter aspectos ou refleshyxos de natureza patrimonial (Saldanha Sanches J L Segredo Bancaacuterio e Tributaccedilatildeo do Lucro Real In Saldanha Sanches J L Estudos de Direito Contabiliacutestico e Fiscal Coimbra Coimbra Edishytora 2000 pp 105108)

Em diversos paiacuteses haacute a clara percepccedilatildeo que natildeo haacute que se conshyfundir direito agrave intimidade com sigilo bancaacuterio indicando que a quebra do sigilo pela Administraccedilatildeo Tributaacuteria natildeo constitui violaccedilatildeo ao direito Ao contraacuterio a existecircncia de um Estado Fiscal implica na necessidade de consagrar agrave administraccedilatildeo tributaacuteria tal faculdade o que se harmonishyza com diversos princiacutepios e outros direitos fundamentais constantes da Carta de 1988

O caso espanhol eacute exemplar neste sentido ao natildeo visualizar a vioshylaccedilatildeo ao direito agrave intimidade em relaccedilatildeo agrave quebra do sigilo bancaacuterio Portanto

el Tribunal Constitucional espaflOl se ha pronunciado por la negativa de que el conocimiento de las cuentas bancarias por la Administracioacuten pueda invadir el aacutembito constitucionalmente garantizado de la intimidad de los individuos porque tales extractos no constituyen per se uma biografiacutea personal en nuacutemeros y en siacute no tiene relevancia para la intimidad personal y familiar dei contribuyente ya que se trata de dados no secretos y confiados a una entidad (Campos Laura Rodriacuteguez Oerechos dei Contribuyente em la Repuacuteblica Argentina ai Amparo de la Convencioacuten Interamericana de Oerechos Humanos http wwwiefpaorgarcriteriosdigitalarticulosderechoshtm Visitado em 512001)

Ao analisar a jurisprudecircncia da Corte Constitucional espanhola quanto ao tema tambeacutem ressalta Saldanha Sanches

Na apreciaccedilatildeo da constitucionalidade da lei que permitia o controle administrativo das contas bancaacuterias o Tribunal Constitushycional espanhol realizou uma distinccedilatildeo entre intimidade pessoal e familiar e a intimidade econoacutemica onde a proteccedilatildeo constitucional eacute menos intensa

ENSAIOS JURiacuteDICOS 249

E procura fazer uma distinccedilatildeo entre a violaccedilatildeo agrave intimidade como consequumlecircncia de uma anaacutelise das contas bancaacuterias - coloshycando a hipoacutetese de uma recusa de cooperaccedilatildeo por parte do conshytribuinte se tal eventualidade se verificar - e a violaccedilatildeo directa da intimidade uma vez que esta natildeo pode resultar de uma mera anaacuteshylise de movimentos bancaacuterios (Saldanha Sanches J L A Situashyccedilatildeo Actual do Sigilo Bancaacuterio a Singularidade do Regime Portushyguecircs In Saldanha Sanches J L Estudos de Direito Contabiliacutestico e Fiscal Coimbra Coimbra Editora 2000 p 91)

Outro comentarista ao analisar a situaccedilatildeo do sistema espanhol quanto ao sigilo bancaacuterio e o direito agrave intimidade fez questatildeo de ressaltar

Seguacuten el r c frente a la Hacienda Puacuteblica no existe el derecho a la intimidad deI art 18 CE Ya la LO de 5 de mayo deI 82 vada praacutecticamente de contenido constitucional el derecho a la intimidado en cuanto el aacutembito de eacutesta queda deferido a la ley ordinaria (a 2ordm) y en cuanto que la esfera protegida frente a las Administraciones se reduce a poco O nada ai no reputarse intromisiones ilegiacutetimas las actuaciones autorizadas o acordadas por la Autoridad competente de acuerdo con la Ley (art 8ordm 1)

La LGTy el RI Iimiacutetan la esfera de la intimidad en las relacishyones con la Hacienda hasta el extremo de que solamenle existe un refugio limitado en el aacutembito deI secreto profesional en los casos de informacioacuten sobre terceros y siempre que no se trate de datos con transcendencia econoacutemica o tributaria EI rc no ha enconshytrado hasta el momento ni un solo supuesto de dato o informacioacuten econocircmica con transcendencia tributaria que limite la accioacuten inquisitiva de la Administracioacuten tributaria por razoacuten de intimidado Bien puede decirse por tanto que frente a la Administraciocircn tribushytaria en cuanto se trata deI ejercicio de su funciocircn de buacutesqueda de datos con transcendencia tributaria el derecho a la intimidad personal y familiar (art 18 I CE) no existe

La biacuteblia deI tribunal a estos efeclos estaacute constituida por la S 11084 reiterada en numerosas ocasiones ampliada en el Auto 64286 y reafirmada por ejemplo en la S 26 abril 90 tantas veces citada (FJ 10deg) Seguacuten esa doctrina la distribucioacutenjusta de la carshyga fiscal prevalece sobre el derecho a la intimidad parte dei art 812 I de la LO seguacuten el cual frente a la Ley (ordinaria) no hay intimidad protegida siempre que haya en dicha ley imperativos de intereacutes puacuteblico ( ) ni siquiera se habla dei predomiacutenio frente a la

250 SUPERIOR TRIBUNAl DE JUSTiCcedilA

intimidad de intereses u objetivos constitucionalmente protegidos Soacuteo admite que la actuadoacuten administrativa es arbitraria cuando no parezcajustificada por la Finalidad de la inspeccioacuten es decir cuando se trate de datos o informaciones que carezcan de transcendencia tributaria pero eacuteste obviamente no es sin Umite derivado dei derecho a la intimidad sino de la interdiccioacuten de arbitrariedad o desviacioacuten de poder de la Administracioacuten de la necesidad de ajuste de toda Administracioacuten ai acircmbito de su competencia que tanto vale para datos iacutentimos como para otros que no lo sean Seguacuten la S 11084 no hay esfera de intimidad proshytegida frente a una Administracioacuten tributaria amparada en una norma que elimina la intimidad como liacutemite (Garciacutea AIacuteloveros Jaime Una Nueva Ley General Tributaria Problemas Constitucioshynales In Kirchhof P et aI Garantiacuteas Constitucionales dei Contribuyente Valencia Tirant lo Blanch 1999 pp 109110)

Diante de tudo quanto foi exposto tendo-se o cuidado de registrar posicionamento de diferentes autores nacionais e estrangeiros haacute ambiente preparado para ser respondido o primeiro questionamento desdobrado em trecircs partes formulado para o 1II Coloacutequio Internacional de Direito Tributaacuterio promoccedilatildeo do Centro de Extensatildeo Universitaacuteria Eis a primeira parte do seu teor

O sigilo bancaacuterio diz respeito agrave intimidade e privacidade das pessoas

A resposta eacute optando por convencimento influenciado pelas ideacuteias da corrente predominante positiva

O nosso entendimento eacute no sentido de que o direito agrave intimidade integra os direitos da personalidade e visam proteger o direito agrave inviolabilidade do domiciacutelio da correspondecircncia das comunicaccedilotildees de quaisquer espeacutecies dos dados pessoais computadorizados do sigilo bancaacuterio O mesmo acontece com o direito agrave privacidade

A expansatildeo da proteccedilatildeo do direito agrave intimidade e agrave privacidade eacute uma consequumlecircncia da evoluccedilatildeo da era contemporacircnea nos setores tecnoloacutegicos e da instabilidade que passam as instituiccedilotildees estatais especialmente a encarreshygada de arrecadar tributos Haacute o reconhecimento de que desenvolve-se um processo de aguda corrosatildeo na proteccedilatildeo agrave intimidade que ao ser violada provoca a publicizaccedilatildeo das condutas mais iacutentimas do cidadatildeo

A concepccedilatildeo do sigilo bancaacuterio no acircmbito do direito agrave intimidade e agrave privacidade visa garantir ao homem o miacutenimo capaz para que lhe seja asseshygurada a sua condiccedilatildeo humana protegendo-o de ingerecircncias alheias como apregoa a Conferecircncia Noacuterdica sobre o Direito agrave Intimidade realizada em Estoshycolmo na data de maio de 1967 ao fazer inserir no documento que publicou a seguinte definiccedilatildeo O direito agrave intimidade eacute o direito do homem de viver de forma independente a sua vida com um miacutenimo de ingerecircncia alheia

ENSAIOS JURiacuteDICOS 251

5 Seguranccedila juriacutedica e acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias

A segunda pergunta apresentada pelos organizadores do coloacutequio estaacute assim posta

A seguranccedila das relaccedilotildees juriacutedicas atraveacutes do Sistema Financeiro pode ser afetada pelo acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves inforshymaccedilotildees bancaacuterias

O acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias se realizado caracteriza um atentado de suma gravidade aos direishytos do cidadatildeo Eacute um ataque aos princiacutepios sustentadores do sistema demoshycraacutetico adotado pelo constituinte de 1988 especialmente quando detonou que a Repuacuteblica Federativa do Brasil tem como objetivo fundamental o respeishyto agrave dignidade humana e agrave cidadania

Do ordenamento juriacutedico brasileiro a meu pensar natildeo haacute lugar para brotar qualquer interpretaccedilatildeo que conclua pela possibilidade de qualquer agenshyte do Poder Puacuteblico acessar de modo generalizado e sem motivaccedilatildeo informashyccedilotildees bancaacuterias do cidadatildeo mesmo com autorizaccedilatildeo judicial

Esclareccedilo desde logo que natildeo comungo com o pensamento de detershyminada corrente no sentido de ser absoluto o direito ao sigilo bancaacuterio Tenho-o como relativo poreacutem vinculado aos princiacutepios da razoabilidade da moralidade da legalidade e da motivaccedilatildeo expliacutecita e detalhada sob pena de ser impossiacutevel a sua quebra

O acesso indiscriminado do agente fiscal agraves informaccedilotildees bancaacuterias do cidadatildeo gera uma quebra da seguranccedila das relaccedilotildees juriacutedicas por um terceiro passar a ter sem causa justificadora conhecimento da vida iacutentima de algueacutem submetendo-o a partir daiacute a um regime de submissatildeo Por outro lado ninshygueacutem poderaacute garantir nem o proacuteprio Estado que o agente puacuteblico utilize os dados que chegaram ao seu conhecimento para outros intentos que natildeo o exclusivamente fiscal

Lembra Arnoldo Wald que O segredo na atividade bancaacuteria envolve concomitantemente interesses privaqos e coletivos que podem ser analisashydos sob trecircs acircngulos o interesse do cliente na sua relaccedilatildeo com a instituiccedilatildeo financeira o interesse do banco em atuar com discriccedilatildeo para ganhar a conshyfianccedila da populaccedilatildeo e captar recursos e o interesse social na existecircncia de um bom e eficiente sistema bancaacuterio Por estarem ligadas ao desenvolvimento da economia e aos interesses da comunidade as relaccedilotildees que envolvem as instishytuiccedilotildees financeiras natildeo recebem o mesmo tratamento juriacutedico dispendido a outras relaccedilotildees comerciais Inviaacutevel a aplicaccedilatildeo exclusiva das regras de Direito Privado as quais tecircm como princiacutepio norteador a autonomia da vontade pois

252 SUPERIOR TRIBUNAl DE JUSTiCcedilA

esta encontra limites nas normas cogentes proacuteprias do direito bancaacuterio e na intervenccedilatildeo do Estado8

A seguranccedila juriacutedica desse tipo de relaccedilatildeo envolve tambeacutem a manutenshyccedilatildeo do segredo das movimentaccedilotildees financeiras do contribuinte

Imprimir-se a mais ampla seguranccedila nas relaccedilotildees do Sistema Financeiro eacute fortalececirc-lo O Estado tem o dever de zelar por esse estado de seguranccedila natildeo permitindo consequumlentemente que o sigilo bancaacuterio seja quebrado pelo acesshyso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico por esse comportamento afeshytar a confiabilidade no sistema

Eacute de todo inconveniente permitir a possibilidade de um atuar do agente fiscal sem controle na quebra do sigilo bancaacuterio por afetar diretamente a seshyguranccedila da relaccedilatildeo juriacutedica firmada entre a instituiccedilatildeo financeira e o seu clienshyte em face deste sentir-se atingido pela accedilatildeo fiscal que passa a tomar conhecishymento de sua intimidade financeira e de fatos de sua vida privada sem o resshypaldo do Poder Judiciaacuterio

A seguranccedila juriacutedica nesse tipo de relaccedilatildeo deve assegurar impossibilidashyde de abuso de poder por parte do Fisco em face da necessidade de ser resshyguardada a garantia de que em um Estado de Direito natildeo pode ser concebido que conceda-se a uma parte mesmo que seja o Estado o domiacutenio absoluto de apanhar as provas que iraacute utilizar em caso de litiacutegio contra algueacutem

O acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias do contribuinte aleacutem de afetar a seguranccedila juriacutedica da relaccedilatildeo em questatildeo promove um desequiliacutebro entre o cidadatildeo-contribuinte e o Fisco por caracterizar coaccedilatildeo que coloca aquele em posiccedilatildeo de inferioridade

A valorizaccedilatildeo da seguranccedila juriacutedica da relaccedilatildeo existente entre instituiccedilatildeo financeira e contribuinte pelo Fisco natildeo quebrando o seu sigilo fiscal sem autorizaccedilatildeo judicial constitui causa de aplicaccedilatildeo de Justiccedila fiscal O seguimenshyto de seus princiacutepios valoriza o regime democraacutetico do qual ela faz parte

6 Casos de admissibilidade da quebra do sigilo bancaacuterio

Os casos de admissibilidade da quebra do sigilo bancaacuterio estatildeo na atuashylidade descritos no nosso ordenamento juriacutedico positivo

A Lei Complementar n 105 de 10 de janeiro de 2001 apoacutes determinar no art 112 de que as instituiccedilotildees financeiras conservaratildeo sigilo em suas operashyccedilotildees ativas e passivas e serviccedilos prestados dispotildee no sect 312 do mesmo artigo que

8 Arnoldo Wald no artigo Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais Revista dos Tribunais ano 6 n 22 janeiromiddotmarccedilo de 1998 n 22 Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas p 15

ENSAIOS JURiacuteDICOS 253

sect 3ordm Natildeo constitui violaccedilatildeo do dever de sigilo

I a troca de informaccedilotildees entre instituiccedilotildees financeiras para fins cadastrais inclusive por intermeacutedio de centrais de risco observadas as normas baixadas pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e pelo Banco Censhytral do Brasil

11 - o fornecimento de informaccedilotildees constantes de cadastro de emitentes de cheques sem provisatildeo de fundos e de devedores inadimplentes a entidades de proteccedilatildeo ao creacutedito observadas as norshymas baixadas pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e pelo Banco Central do Brasil

JJI - o fornecimento das informaccedilotildees de que trata o sect 2ordm do art II da Lei n 9311 de 24 de outubro de 1996

IV - a comunicaccedilatildeo agraves autoridades competentes da praacutetica de iliacutecitos penais ou administrativos abrangendo o fornecimento de inforshymaccedilotildees sobre operaccedilotildees que envolvam recursos provenientes de qualshyquer praacutetica criminosa

V - a revelaccedilatildeo de informaccedilotildees sigilosas com o consentimento expresso dos interessados

VI- a prestaccedilatildeo de informaccedilotildees nos termos e condiccedilotildees estabeleshycidos nos artigos 2ordm 3ordm 4ordm 5ordm 6ordm 7ordm e 9ordm desta lei complementar

sect 4ordm A quebra de sigilo poderaacute ser decretada quando necessaacuteria para apuraccedilatildeo de ocorrecircncia de qualquer iliacutecito em qualquer fase do inqueacuterito ou do processo judicial e especialmente nos seguintes crimes

I - de terrorismo

11 - de traacutefico iliacutecito de substacircncias entorpecentes ou drogas afins

III - de contrabando ou traacutefico de armas municcedilotildees ou material destinado a sua produccedilatildeo

IV - de extorsatildeo mediante sequumlestro

V - contra o sistema financeiro nacional

VI - contra a Administraccedilatildeo Puacuteblica

Vll- contra a ordem tributaacuteria e a previdecircncia social

VIII-lavagem de dinheiro ou ocultaccedilatildeo de bens direitos e valores

IX - praticado por organizaccedilatildeo criminosa

Como visto a lei complementar enumera inuacutemeras situaccedilotildees que indeshypendentemente de autorizaccedilatildeo judicial o sigilo bancaacuterio eacute quebrado

254 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

A dificuldade que se apresenta eacute a de conciliar os casos de quebra de sigilo bancaacuterio que a Lei Complementar n 105 autoriza com a garantia do direito agrave privacidade e agrave intimidade

Destaque-se entre os de maior relevacircncia os seguintes

- natildeo constituir violaccedilatildeo do dever de sigilo bancaacuterio a troca de informashyccedilotildees entre instituiccedilotildees financeiras para fins cadastrais inclusive por intermeacuteshydio de centrais de risco o que possibilita o conhecimento da vida financeira privada do cidadatildeo por vaacuterias pessoas sem desempenho de autoridade na instituiccedilatildeo independentemente de ser justificada com antecedecircncia a causa desse atuar

- o de serem fornecidos dados relativos a fornecimentos de informashyccedilotildees cadastrais de emitentes de cheques sem provisatildeo de fundos a entidades privadas de proteccedilatildeo ao creacutedito sem qualquer avaliaccedilatildeo por qualquer autorishydade da causa determinante do fato a quebra do sigilo bancaacuterio na fase do inqueacuterito por inexistir nessa ocasiaacuteo qualquer contraditoacuterio e respeito ao prinshyciacutepio do devido processo legal

Quanto agraves demais situaccedilotildees constantes na lei complementar que autorishyzam a quebra do sigilo bancaacuterio naacuteo obstante algumas serem absolutamente necessaacuterias haacute de serem vistas em compatibilidade com as garantias constitushycionais conforme jaacute assinalado

O colendo Supremo Tribunal pronunciaraacute como guarda e inteacuterprete maishyor da Carta Magna em ADln jaacute intentada sobre a constitucionalidade ou natildeo dos dispositivos supramencionados

Em campo doutrinaacuterio valoriza-se as posiccedilotildees apresentadas quando da resposta oferecida aos questionamentos anteriores todas acenando pela neshycessidade do controle do Poder Judiciaacuterio

7 Sistema mais justo para a quebra do sigilo bancaacuterio

Os organizadores do JII Coloacutequio Internacional de Direito Tributaacuterio subshymetem agora para anaacutelise a questatildeo do teor seguinte Um sistema em que o Poder Judiciaacuterio torna-se aacuterbitro dos pedidos da Administraccedilatildeo Puacuteblica para quebra do sigilo eacute o mais justo

Em um Estado que por imposiccedilatildeo de sua proacutepria Constituiccedilatildeo estaacute comprometido com a guarda e aplicaccedilatildeo efetiva de princiacutepios democraacuteticos especialmente o de respeitar os direitos e garantias fundamentais da cidadashynia natildeo haacute ambiente para que seja outorgado ao Poder Executivo por via da atuaccedilatildeo de agentes puacuteblicos fiscais o acesso sem o controle do Poder Judiciaacuteshyrio agraves informaccedilotildees bancaacuterias do contribuinte

ENSAIOS JURiacuteDICOS 255

o sigilo bancaacuterio por ser um direito fundamental que exige ser respeitashydo pela supremacia constitucional que o protege deve submeter a possibilishydade de sua quebra para fins tributaacuterios ao Poder Judiciaacuterio pela ausecircncia de interesse direto nos resultados da accedilatildeo fiscalizadora que eacute o recolhimento do tributo e pelas garantias de independecircncia prudecircncia e qualificaccedilatildeo juriacutedica que revestem esse poder

A atuaccedilatildeo da fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo pode ser exercida fora dos limishytes da legalidade imposta a partir da Carta Magna e demais imposiccedilotildees legais a ela subordinadas

Natildeo se desconhece que no atual Estado fiscal os tributos constituem os meios financeiros determinantes para o atendimento dos compromissos da Administraccedilatildeo Puacuteblica com as obrigaccedilotildees oriundas em decorrecircncia de sua atividade no campo educacional social de seguranccedila puacuteblica interna e extershyna da sauacutede da manutenccedilatildeo dos Poderes ou seja para manter funcionando a maacutequina estatal

Por natildeo entremostrar-se na eacutepoca contemporacircnea qualquer outra alshyternativa viaacutevel para transformar o Estado fiscal em um Estado produtivo os tributos passam a representar um indeclinaacutevel dever da cidadania cujo cumshyprimento deve ser por todos honrado conforme assinala Joseacute Casalta Nabais Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra em artigo intitulado Algumas Reflexotildees sobre o Actual Estado Fiscal

Por isso os impostos hatildeo de constituir um preccedilo aceitaacutevel ou seja um preccedilo limitado Um preccedilo que estou certo muitas das sociedashydes que nos antecederam gostariam de ter pago e algumas das actuais natildeo enjeitariam suportar Por isso bem podemos afirmar como jaacute o fizeshymos noutro lugar que no actual Estado fiscal para o qual natildeo se vislumshybra qualquer alternativa viaacutevel pelo menos nos tempos mais proacuteximos os impostos constituem um indeclinaacutevel dever de cidadania cujo cumshyprimento a todos nos deve honrar

A atuaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio para liberar o bloqueio fortalece a conshyfianccedila do cidadatildeo no procedimento da fiscalizaccedilatildeo e consagra a ideacuteia iacutensita em qualquer regime democraacutetico de que a atuaccedilatildeo do Estado tem limites

Na espeacutecie os limites impostos satildeo os decorrentes da quebra do sigilo ser necessaacuterio em face da possiacutevel ilicitude cometida pelo cidadatildeo poreacutem sem ser violados os direitos do cidadatildeo de gozar da sua privacidade e da sua intimidade

A denominada cidadania fiscal haacute de ser considerada de modo conjunshytural com os reflexos dos direitos fundamentais assegurados ao contribuinte sem prestigiar a responsabilidade que tem o Estado de promover a arrecadashyccedilatildeo dos tributos

256 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

Cedo espaccedilo para registrar que a cidadania fiscal deve configurar um estado de relaccedilatildeo juriacutedica em que todos suportem a concretizaccedilatildeo de um Estado em que todos tenham a qualidade de destinataacuterio do dever fundashymentaI de pagar impostos na medida da respectiva capacidade contributiva poreacutem que seja um Estado fiscal suportaacutevel isto eacute um estado cujo sistema fiscal se encontre balizado por estritos limites juriacutedico-constitucionais9

A Administraccedilatildeo Tributaacuteria por melhor que seja a sua estrutura e os seus propoacutesitos natildeo estaacute emocionalmente preparada para conceber e aplicar os princiacutepios que sustentam a cidadania fiscal Isso ocorre primeiramente porshyque o Fisco tem por missatildeo exclusiva exercer a funccedilatildeo de arrecadar tributos Eacute a sua meta essencial por ser atribuiccedilatildeo que na organizaccedilatildeo administrativa estatal estaacute obrigado a desempenhar Natildeo lhe cabe administrar o tributo arreshycadado limitando-se unicamente a envidar esforccedilos para o cumprimento das metas impostas para imprimir aumento na arrecadaccedilatildeo tributaacuteria O sucesso da Administraccedilatildeo Tributaacuteria eacute medido pelo maior volume de recursos fiscais atraiacutedos para os cofres do Governo nunca pelo respeito que exerccedila para com os direitos fundamentais do contribuinte Eacute uma questatildeo de cultura adminisshytrativa de distribuiccedilatildeo de funccedilotildees no sistema estatal impossiacutevel de ser mudashydo por sugestotildees doutrinaacuterias

Por outro lado a fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo consegue afastar as pressotildees exercidas sobre ela por determinados segmentos da organizaccedilatildeo estatal que defendem uma atuaccedilatildeo mais agressiva para a cobranccedila dos tributos tudo em decorrecircncia dos efeitos produzidos pela conduta iliacutecita marcante da sonegashyccedilatildeo fiscal

Esses fatores contribuem para que a fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo tenha condiccedilotildees de modo imparcial sem isenccedilatildeo avaliar a necessidade objetiva da quebra do sigilo bancaacuterio do cidadatildeo Por melhor que seja o seu desempenho nunca ganharaacute a confianccedila do contribuinte

A atribuiccedilatildeo da quebra do sigilo bancaacuterio em um regime democraacutetico onde predomina o respeito maior aos direitos fundamentais da cidadania deve ser exercido pelo Poder Judiciaacuterio natildeo soacute porque seus membros atualmente revestidos da garantia da vitaliciedade inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos bem como porque estatildeo revestidos de independecircncia absoluta em relaccedilatildeo ao Poder interessado na cobranccedila do tributo e consequumlentemenshyte no resultado a ser obtido pela accedilatildeo fiscal

Esse sistema misto onde o Fisco faz a solicitaccedilatildeo motivada para a queshybra do sigilo bancaacuterio ao Poder Judiciaacuterio e este apoacutes analisaacute-lo com objetivishydade e cautela defere ou indefere impotildee seguranccedila e confiabilidade na atuashyccedilatildeo fiscal e sublima o respeito agrave dignidade do contribuinte em outras palavras da cidadania fiscal isto eacute de uma cidadania de liberdade que o Estado fiscal

9 Joseacute Casalta Nabais (Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra) no artigo Algumas Reflexotildees sobre o Actual Estado Fiscal no site httpagugovbr

ENSAIOS JURiacuteDICOS 257

pressupotildee para natildeo ser postergada impotildee um sistema fiscal balizado por esshytritos limites juriacutedico-constitucionais Limites esses que integram a chamada constituiccedilatildeo fiscal e que podemos reconduzir para natildeo nos alongarmos nesse aspecto a duas ideacuteias uma ideacuteia de seguranccedila que tem o seu tradicional e principal suporte no princiacutepio da lega1idade fiscal e uma ideacuteia de justiccedila ou equumlidade que tem a ver com a medida dos impostos e assenta no princiacutepio da capacidade contributiva 10

Em conclusatildeo a adoccedilatildeo de um sistema para a quebra do sigilo bancaacuteshyrio em que o Poder Judiciaacuterio seja o aacuterbitro dos pedidos da Administraccedilatildeo Puacuteblica natildeo eacute somente mais justo mas consegue impor maior credibilidade agrave atuaccedilatildeo fiscal e presta homenagem com intensa potencialidade aos princiacuteshypios democraacuteticos consistentes na guarda da seguranccedila juriacutedica do respeito aos direitos fundamentais do cidadatildeo nesse rol incluidos os agrave privacidade e agrave intimidade Aleacutem disso torna mais respeitaacutevel a relaccedilatildeo entre Fisco e contrishybuinte justificando portanto a opccedilatildeo do Estado pelo regime democraacutetico

8 Autoridade fiscal e faculdade incondicionada de quebrar o sigilo bancaacuterio

Essa indagaccedilatildeo consubstancia a preocupaccedilatildeo de serem estabelecidos controles para a atuaccedilatildeo do agente puacuteblico fiscal Centra-se a preocupaccedilatildeo em imprimir nas relaccedilotildees juriacutedicas tributaacuterias de quaisquer espeacutecies o primashydo da legalidade aprimorando-se o atuar vinculado

Natildeo concilia-se com os postulados da democracia a adoccedilatildeo de um sisteshyma de fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria que outorgue faculdade incondicionada ao fiscal tributaacuterio de invadir a intimidade e a privacidade das pessoas sob o falso argushymento juriacutedico de que busca encontrar provas de sonegaccedilatildeo fiscal

Depreende-se do exposto que a autoridade fiscal natildeo deve ter faculdade incondicionada de quebrar o sigilo sempre que entender necessaacuterio Isso porshyque a praacutetica de atos administrativos por agentes puacuteblicos de modo incondicionado revela grave violaccedilatildeo ao princiacutepio da legalidade onde predoshymina a vontade da lei e natildeo o discricionarismo de quem o pratica

No trato do sigilo bancaacuterio o atuar incondicionado da fiscalizaccedilatildeo assushyme caracteriacutesticas de maior gravidade porque haacute violaccedilatildeo aos princiacutepios funshydamentais jaacute expostos e que satildeo prestigiados pela Carta Magna especialmenshyte por bater de frente de modo integral e absoluto com o direito agrave intimidade e agrave privacidade O atuar deve vincular-se rigidamente ao princiacutepio da legalidashyde especialmente aposta na Carta Magna sem a possibilidade de ser aberto qualquer canal para uso da conveniecircncia ou da oportunidade

Eacute de ser lembrada no trato do assunto a liccedilatildeo de Joseacute Casalta Nobais no trabalho jaacute citado no sentido de que Eacute certo que independentemente da

10 Idem p 15

=258=---___________________ SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTlCA

concepccedilatildeo a que se adira relativamente ao segredo bancaacuterio natildeo temos a menor duacutevida de que o acesso da Administraccedilatildeo Fiscal agrave informaccedilatildeo bancaacuteria seja directo sem necessidade de preacutevia decisatildeo judicial seja indirecto depois portanto de preacutevia decisatildeo judicial haacute de ter sempre uma natureza claramenshyte excepcional Na verdade constitua o segredo bancaacuterio uma manifestaccedilatildeo do direito fundamental agrave reserva da intimidade da vida privada constante do art 26 n 2 da Constituiccedilatildeo portuguesa ou suporte um outro direito fundashymentai um direito agrave reserva da vida privada anaacutelogo agravequele a sua afectaccedilatildeo teraacute sempre caraacuteter excepcional

A autoridade fiscal natildeo possui a necessaacuteria isenccedilatildeo e competecircncia institucional para averiguar o grau dessa excepcionalidade de modo que posshysa impor confianccedila ao cidadatildeo investido na condiccedilatildeo de contribuinte poreacutem com direitos a serem assegurados por forccedila do regime democraacutetico adotado

O certo eacute que na relaccedilatildeo juriacutedico-tributaacuteria deve ser buscado o justo equiliacutebrio pregado pelo Estado de Direito onde o cidadatildeo deve ter a sua dignishydade respeitada sem contudo afastar-se a necessidade do Estado arrecadar tributos de forma cogente e imperativa bem como de serem permitidas conshydiccedilotildees de atuaccedilatildeo que resultem no combate agrave sonegaccedilatildeo fiscal

9 Responsabilidade da autoridade administrativa que quebrar o sigilo banshycaacuterio de forma inconsistente e indevida

Eacute inerente ao regime democraacutetico que a autoridade administrativa puacuteblishyca estaacute obrigada a exercer as suas atribuiccedilotildees com rigorosa obediecircncia aos princiacutepios da legalidade moralidade publicidade impessoalidade e eficiecircncia entre outros

A Carta Magna consagra expressamente no art 37 a obediecircncia do agente puacuteblico a esse tipo de comportamento

A autoridade administrativia que quebrar de modo inconsistente e indevido o sigilo bancaacuterio do cidadatildeo pratica ato com capacidade de provocar os seguintes efeitos a) de invadir o direito agrave privacidade e agrave intimidade de algueacutem b) de provocar-lhe danos morais e materiais dependendo da repershycussatildeo provocada pelo seu atuar

Constatada a efetivaccedilatildeo real de danos morais e materiais a responsabishylidade do Estado pode ser acionada conforme permite o art 37 sect 6ordm da Consshytituiccedilatildeo Federal Solidificada a culpa ou dolo do agente puacuteblico e consagrada a materializaccedilatildeo do iliacutecito praticado com o consequumlente ressarcimento patrimonial o Estado deveraacute usando o direito de regresso investir contra o agente que agiu culposa ou dolosamente

Natildeo resume-se apenas ao campo da responsabilidade civil a atuaccedilatildeo da autoridade quando ilegalmente quebra o sigilo bancaacuterio de qualquer cidadatildeo

ENSAIOS JURiacuteDICOS 259

o art 10 da Lei Complementar n 105 de 10 de janeiro de 2001 determishyna que A quebra de sigilo fora das hipoacuteteses autorizadas nesta lei compleshymentar constitui crime e sujeita os responsaacuteveis agrave pena de reclusatildeo de um a quatro anos e multa aplicando-se no que couber o Coacutedigo Penal sem prejuiacuteshyzo de outras sanccedilotildees cabiacuteveis A seguir no seu paraacutegrafo uacutenico explicita que Incorre nas mesmas penas quem omitir retardar injustificadamente ou presshytar falsamente as informaccedilotildees requeridas nos termos desta lei complementar

O art 11 da mesma lei complementar expressa que O servidor puacuteblico que utilizar ou viabilizar a utilizaccedilatildeo de qualquer informaccedilatildeo obtida em decorshyrecircncia da quebra de sigilo de que trata esta lei complementar responde pessoshyal e diretamente pelos danos decorrentes sem prejuiacutezo da responsabilidade objetiva da entidade puacuteblica quando comprovado que o servidor agiu de acorshydo com a orientaccedilatildeo oficial

10 O sigilo bancaacuterio e o tratamento que lhe eacute dado por oacutergatildeos internacioshynais como a OCDE e outros

Rui Celso Reali Fragoso Presidente do Instituto dos Advogados de Satildeo Paulo em artigo intitulado O Sigilo Bancaacuterio veiculado pela Internet (http Ii wwwjuscombr) registra que atualmente temos trecircs sistemas legais no munshydo cuidando do sigilo bancaacuterio O primeiro eacute o anglo-saxatildeo em que o sigilo natildeo encontra amparo legal o segundo eacute o dos paiacuteses da Europa continental - eu o contemplo em vaacuterios diplomas legais o terceiro eacute o da Suiacuteccedila e do Liacutebano que o reforccedilam

Analisando esses trecircs sistemas o autor citado observa

Haacute aparente contradiccedilatildeo no sistema inglecircs e norte-americano pois se de um lado nestes paiacuteses se eleva a garantia das liberdades individuais de outro se despreza o sigilo bancaacuterio Eacute que se ocorre conshyflito entre a apuraccedilatildeo de fatos (fator social) e a privacidade das pessoas (fator individual) prevalece a primeira Mais ainda o relacionamento de clientes e bancos longe de estabelececirc-lo serve como fonte de informashyccedilatildeo em favor de terceiros a indiscriccedilatildeo injustificada poreacutem eacute objeto de sanccedilatildeo E na Inglaterra os poderes puacuteblicos natildeo intervecircm no funcionashymento dos estabelecimentos privados de creacutedito o que debilita a invesshytigaccedilatildeo

Nos paiacuteses da Europa continental a legislaccedilatildeo contempla o sigilo bancaacuterio como consequumlecircncia do profissional e comporta derrogaccedilotildees na esfera penal e em alguns casos na civil mas comina sanccedilotildees crimishynais no caso de violaccedilatildeo ao sigilo (Coacutedigo Penal francecircs artigo 378 Coacuteshydigo Penal italiano art 622)

260 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

A sistemaacutetica fortalecida eacute aquela utilizada na Suiacuteccedila decorrente da crise ocorrida em 1931 com o fechamento do Banco de Genebra que ensejou a ediccedilatildeo de lei estabelecendo severas puniccedilotildees de natureza civil e criminal Tanto a legislaccedilatildeo suiacuteccedila como a libanesa esta surgida em 1956 permitem derrogaccedilotildees em certas hipoacuteteses A existecircncia das conshytas numeradas comprova a importacircncia do sigilo nestes paiacuteses

Eacute certo natildeo ser absoluto o segredo nem sua quebra em determishynadas situaccedilotildees significa abuso de poder Aliaacutes nenhum direito eacute absoluto

A doutrina tem ultimamente tomado conhecimento sobre as transforshymaccedilotildees que tem passado em vaacuterios ordenamentos juriacutedicos a questatildeo do sigilo bancaacuterio

Zenobio Simotildees de Melo advogado no Paranaacute em artigo sob o tiacutetulo Quebra do Sigilo Bancaacuterio (Internet httpjuscombr) informa que o jornal O Estado de Satildeo Paulo de 21 de junho de 2000 publicou a notiacutecia seguinte

Numa das mais importantes decisotildees adotadas durante o Conseshylho Europeu que marca o fim da presidecircncia portuguesa da Uniatildeo Euroshypeacuteia (UE) seus 15 paiacuteses aprovaram ontem o pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal No ponto mais polecircmico o pacote deveraacute acabar com o sigilo bancaacuterio ateacute 2010 foi uma negociaccedilatildeo de 12 anos Aacuteustria e Luxemburgo natildeo aceitavam o princiacutepio de acabar com o sigilo bancaacuterio A justificativa austriacuteaca eacute que este eacute um princiacutepio que faz parte da Consshytituiccedilatildeo do paiacutes haacute 200 anos Para aceitar o acordo o paiacutes exigiu a manushytenccedilatildeo do sigilo nos bancos austriacuteacos para quem resida no paiacutes

Registro a iacutentegra da notiacutecia

Pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal eacute aprovado por membros da UE Decisatildeo prevecirc quebra do sigilo bancaacuterio nos paiacuteses do bloco econocircmico

Jair Rattner

Especial para o Estado

Santa Maria da Feira Portugal- Numa das mais importantes decishysotildees adotadas durante o Conselho Europeu que marca o fim da presishydecircncia portuguesa da Uniatildeo Europeacuteia (UE) seus 15 paiacuteses aprovaram ontem o pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal No ponto mais polecircmico o pashycote deveraacute acabar com o sigilo bancaacuterio ateacute 2010

Foi uma negociaccedilatildeo de 12 anos Agora temos um documento que vai estabelecer os princiacutepios e as orientaccedilotildees para as futuras diretivas nessa aacuterea afirmou o Primeiro-Ministro Portuguecircs Antonio Guterres que ocupa a presidecircncia rotativa da UE (no fim do mecircs ela seraacute transferida para a Franccedila)

ENSAIOS JURiacuteDICOS 261

o acordo abrange trecircs aacutereas um coacutedigo de conduta que prevecirc o desmantelamento dos 66 paraiacutesos fiscais existentes ou dependentes da UE a tributaccedilatildeo de royalties e o pagamento de impostos sobre rendishymentos das poupanccedilas de cidadatildeos europeus residentes em outros paiacuteshyses dentre os 15 que fazem parte do bloco econocircmico europeu

O grande problema eram as poupanccedilas Aacuteustria e Luxemburgo natildeo aceitavam o princiacutepio de acabar com o sigilo bancaacuterio A justificativa austriacuteaca eacute que este eacute um princiacutepio que faz parte da Constituiccedilatildeo do paiacutes haacute 200 anos Para aceitar o acordo o paiacutes exigiu a manutenccedilatildeo do sigilo nos bancos austriacuteacos para quem resida no paiacutes Essa questatildeo natildeo eacute importante soacute para a Europa porque abre caminho para a criaccedilatildeo de mecanismos de transparecircncia global no mundo financeiro que satildeo esshysenciais para a globalizaccedilatildeo da economia avaliou Guterres

O prazo para a introduccedilatildeo das mudanccedilas vai ateacute o fim de 2010 Ateacute o fim deste ano as negociaccedilotildees vatildeo ser sobre a definiccedilatildeo do conteuacutedo das diretivas (as normas da UE)

Em 2002 a UE discutiraacute com outros paiacuteses esses conteuacutedos para fazer acordos que deveratildeo ser aprovados ateacute o fim do ano por unanimishydade

A partir de 2003 seraacute iniciado um periacuteodo de sete anos de transishyccedilatildeo para a troca de informaccedilotildees sobre os investimentos de cidadatildeos de outros paiacuteses europeus Nesse periacuteodo alguns paiacuteses poderatildeo optar por cobrar impostos de 20 a 25 sobre os rendimentos dos investimentos de residentes no exterior

No capiacutetulo onde foi analisado o sigilo bancaacuterio no Direito Comparado haacute registros tambeacutem a respeito do tratamento que oacutergatildeos internacionais como o OCDEll e outros vecircm dando ao sigilo bancaacuterio conforme estudo que foi apresentado pelo autor ali citado

II OCDE (Organizaccedilatildeo de Cooperaccedilatildeo e Desenvolvimento Econocircmico) criado em 1961 para substituir a OECE (Comitecirc Fiscal da Organizaccedilatildeo Europeacuteia de Cooperaccedilatildeo Econocircmica) Um dos documentos mais importantes da OCDE eacute o resultante da sua Convenccedilatildeo-Modelo relashytiva a impostos sobre a renda e o capital Essa Convenccedilatildeo estaacute sistematizada em sete capiacutetulos assim explicitados por Alberto Xavier em sua obra Direito Tributaacuterio Internacioshynal do Brasil A Convenccedilatildeo-Modelo da OCDE (tal como a das Naccedilocirces Unidas) encontra-se sistematizada em sete capiacutetulos Os capiacutetulos I e I regulam os requisitos para a aplicaccedilatildeo do tratado O capiacutetulo [JI - de longe o mais importante - conteacutem as regras de distribuiccedilatildeo de competecircncia no que concerne aos impostos sobre o rendimento classificado este por tipos ou classes agrave semelhanccedila do que sucede nos sistemas de tributaccedilatildeo cedular O capiacutetulo IV ocupa-se das regras de distribuiccedilatildeo de competecircncia no que respeita aos impostos sobre o capital O capiacutetulo V determina as consequumlecircncias das regras dos capiacutetulos 111 e IV facultanshydo aos Estados a escolha entre os meacutetodos da isenccedilatildeo e da imputaccedilatildeo O capiacutetulo VI conteacutem disposiccedilotildees adicionais sobre natildeo-discriminaccedilatildeo procedimento amigaacutevel troca de informaccedilotildees e privileacutegios de funcionaacuterios diplomaacuteticos e consulares e regras sobre extenshysatildeo do tratado a partes do territoacuterio Enfim o capiacutetulo VII conteacutem disposiccedilotildees finais sobre entrada em vigor e cessaccedilatildeo do acordo

262 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

Heleno Torres em sua recente obra Direito Tributaacuterio Internacional -Planejamento Tributaacuterio e Operaccedilotildees Transnacionais RT p 147 analisando o posicionamento da OCDE referente agrave poliacutetica de determinados paiacuteses que adoshytam tributaccedilatildeo favorecida e os efeitos dos regimes fiscais prejudiciais registra que

A OCDE resolveu entrar na luta para minorar as praacuteticas fiscalshymente danosas insistindo sobre a necessidade de aumentar as trocas de informaccedilotildees entre os Estados aleacutem de redigir uma lista de paiacuteses com tributaccedilatildeo favorecida e fazer algumas recomendaccedilotildees em acircmbito nacional e convencional a partir do seu importante relatoacuterio Harmful tax competition na emerging global issue

Mesmo reconhecendo os aspectos positivos do ambiente global vigente no qual os sistemas tributaacuterios operam os paiacuteses-membros da OCDE concluiacuteram que eles precisavam agir para restringir a competiccedilatildeo tributaacuteria danosa coletivamente e individualmente opondo-se agrave expanshysatildeo de regimes de impostos preferenciais danosos particularmente nos setores financeiros e atividades de serviccedilo que podem causar distorccedilotildees no comeacutercio e desniacuteveis nos padrotildees de investimento sendo uma ameashyccedila para os sistemas tributaacuterios domeacutesticos e para a estrutura global de tributaccedilatildeo internacional

Mais adiante pp 152153 Heleno Torres afirma que

Entre as recomendaccedilotildees definidas nesse relatoacuterio com aplicashyccedilatildeo dirigida aos paiacuteses-membros da instituiccedilatildeo as mais importantes satildeo as seguintes

bull para contrastar a competiccedilatildeo fiscal prejudicial os paiacuteses devem revisar as suas leis regulamentos e praacuteticas sobre sigilo bancaacuterio para remover empecilhos de acesso a tais informaccedilotildees por autoridades fiscais

bull intensificar o uso de trocas de informaccedilotildees principalmente soshybre as transaccedilotildees com paiacuteses de tributaccedilatildeo favorecida

A conclusatildeo que pode ser firmada apoacutes anaacutelise dos pronunciamentos internacionais acima explicitados eacute a construccedilatildeo de uma corrente que defenshyde uma maior abertura para a quebra do sigilo bancaacuterio quando for necessaacuteshyrio para apurar iliacutecitos tributaacuterios

Essa portanto eacute a resposta que apresento para a indagaccedilatildeo Qual o tratamento proposto por oacutergatildeos internacionais como o OCDE e outros com relaccedilatildeo ao sigilo bancaacuterio

ENSAIOS JURiacuteDICOS 263

11 Compatibilizaccedilatildeo do combate agrave criminalidade internacional com o resshypeito agrave seguranccedila juriacutedica a fim de evitar a fuga de investimentos do Paiacutes

Haacute de se reconhecer natildeo ser faacutecil desenvolver-se um sistema juriacutedico que contenha regras que facilitem o combate agrave criminalidade internacional e ao mesmo tempo prestigie os direitos fundamentais do cidadatildeo especialmenshyte a sua seguranccedila juriacutedica

As convenccedilotildees internacionais conforme demonstrado estatildeo preocupashydas com esses aspectos sem deixar de lado os fenocircmenos causados pela globalizaccedilatildeo

Natildeo deve ser esquecido que o tema envolve aspectos diversos a comeshyccedilar pelos determinantes da soberania dos Estados das forccedilas em expansatildeo das organizaccedilotildees internacionais e da pregaccedilatildeo para que os direitos fundamenshytaIacutes do cidadatildeo sejam respeitados com maior Iacutentensidade

A soluccedilatildeo a meu pensar pode ser encontrada no fortalecimento do Direito Comunitaacuterio Os Estados por via de organismos internacionais firmashyriam tratados para a adoccedilatildeo de um Coacutedigo Processual Penal Internacional com efeitos vinculantes por parte das naccedilotildees onde seriam adotadas regras investigatoacuterias e apuratoacuterias dos iliacutecitos internacionais alargando os conceitos de indiacutecios e presunccedilotildees sem deixar contudo de prestigiar a afetividade dos direitos e garantias fundamentais do cidadatildeo

Todas as naccedilotildees no iniacutecio deste seacuteculo envidam esforccedilos para diminuir a crise da seguranccedila juriacutedica Satildeo vaacuterios os fatores determinantes todos tendo como causa comum o crescimento da delinquumlecircncia em decorrecircncia de poliacutetishycas econocircmicas e sociais adotadas por determinados governos que contrishybuem para aumentar o percentual de pessoas pobres

A preocupaccedilatildeo atual para o combate ao crime internacional eacute alcanccedilar niacutevel de uniformizaccedilatildeo dos sistemas adotados para a quebra do sigilo bancaacuteshyrio De iniacutecio deve ser defendida a postura de que nenhuma lesatildeo ou ameaccedila a direito deve ser excluiacuteda da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio Nessa perspectishyva ganha suma importacircncia a criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional em virshytude de pela sua atuaccedilatildeo natildeo perdurar a diversidade de sistemas legais a respeito do assunto a saber a) O anglo-saxatildeo onde o sigilo natildeo encontra amparo legal b) o dos paiacuteses da Europa continental que o contempla em vaacuterios diplomas escritos e c) o da Suiacuteccedila e do Liacutebano que o reforccedilam l2bull

A criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional envolve uma reconceiacutetuaccedilatildeo de soberania

Sobre o tema Celso D de Albuquerque Mello em Direito Internacional da Integraccedilatildeo Ed Renovar p 13 faz a seguinte observaccedilatildeo

12 Conforme anota Rui Celso Reali Fragoso no artigo O Sigilo Bancaacuterio publicado no site httpvvwwjuscombr

264 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Poder-se-ia fazer um pequeno reparo a Chaumont que a indeshypendecircncia nacional eacute um conceito juridicamente indeterminado e que ela pode ter diferentes graus Tanto que podemos escrever soberania versus cooperaccedilatildeo internacional apesar de reconhecermos que esta posiccedilatildeo pode ser considerada como radical vez que natildeo haacute uma total incompatibilidade entre as duas Entretanto natildeo se pode deixar de consshytatar que de certo modo a cooperaccedilatildeo internacional se encontra conshysagrada na Carta da ONU no arl 1 ordm que trata dos Propoacutesitos das Naccedilotildees Unidas e nos Princiacutepios estabelecidos na Carta da OEA (Capiacutetulo 11) O mesmo ocorre na resoluccedilatildeo da Assembleacuteia Geral da ONU de 1970 que aprova a Declaraccedilatildeo Relativa aos Princiacutepios do Direito Internacional Reshylativas agraves Relaccedilotildees Amigaacuteveis e agrave Cooperaccedilatildeo entre os Estados conforme a Carta das Naccedilotildees Unidas bem como na Carta de Direitos e Deveres Econocircmicos aprovada pela mesma Assembleacuteia Geral em 1974

O crescimento do crime internacional em decorrecircncia dos fenocircmenos globalizantes determina o surgimento de um dever juriacutedico dos Estados firmashyrem pactos de cooperaccedilatildeo entre si para que enfrentem as organizaccedilotildees voltashydas para a criminalidade Esse dever juriacutedico globalizado tem suas raiacutezes no moral intemacional que conforme assinala Celso Albuquerque Mello na obra citada p 13 sempre consagrou o princiacutepio da solidariedade ou ainda do auxiacutelio muacutetuo

Eacute o mais importante desafio neste iniacutecio de seacuteculo fazer com que surja uma legislaccedilatildeo internacional que compatibilize o combate agrave criminalidade inshyternacional sem violar a seguranccedila juriacutedica com finalidade exclusiva de evitar a fuga de investimenos do Paiacutes

Tenha-se contudo em consideraccedilatildeo que a globalizaccedilatildeo do crime emshybora seja uma grande ameaccedila aos valores tradicionais que sustentam a cidashydania especialmente a seguranccedila juriacutedica natildeo deve prejudicar o desenvolvishymento econocircmico de qualquer naccedilatildeo

Natildeo faccedilo coro ao assinalado por Eric Hobsbawm em sua obra Era dos Extremos O Breve Seacuteculo XX 1914-1991 1995 p 24 Companhia das Letras S Paulo traduccedilatildeo de Marcos Santarrita no sentido de que Talvez a caracteriacutesshytica mais impressionante do fim do seacuteculo XX seja a tensatildeo entre esse processo de globalizaccedilatildeo cada vez mais acelerado e a incapacidade conjunta das instishytuiccedilotildees puacuteblicas e do comportamento coletivo dos seres humanos de se acoshymodarem a ele

Penso que natildeo haacute essa acomodaccedilatildeo e que as instituiccedilotildees puacuteblicas espeshycialmente as submetidas ao controle da ciecircncia juriacutedica natildeo estatildeo incapacitashydas de encontrar caminhos que solucionem o problema existente

ENSAIOS JURiacuteDICOS 265

Eacute por demais positivo entre outros acontecimentos o fato da conscienshytizaccedilatildeo de que haacute de ser encontrada uma forma de combate agrave criminalidade internacional que natildeo afaste a garantia da seguranccedila juriacutedica Esta eacute uma neshycessidade para impor paz agrave naccedilatildeo e consequumlentemente criar ambiente para que novos investimentos necessaacuterios ao desenvolvimento do seu processo econocircmico aconteccedilam sem se falar na manutenccedilatildeo dos jaacute existentes

O Parlamento Europeu aprovou ultimamente uma resoluccedilatildeo sobre a criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional sob a consideraccedilatildeo de que eacute necessaacuteshyrio criaacute-lo de forma permanente para complementar os sistemas judiciais nashycionais e pocircr fim agrave impunidade de que gozam os responsaacuteveis por genociacutedio crimes contra a humanidade e crimes de guerra

A abertura para essa posiccedilatildeo denota a formaccedilatildeo de uma consciecircncia internacional para combater a criminalidade internacional em todos os niacuteveis contribuindo para fortalecer a seguranccedila juriacutedica interna de cada paiacutes

O documento representativo dessa resoluccedilatildeo eacute do teor seguinte

Parlamento Europeo

Resolucioacuten sobre el Tribunal Penal Internacional

EI Parlamento Europeo

Vistas sus anteriores resoluciones sobre un Tribunal Penal Interna-cional

A Considerando que es necesario crear un Tribunal Penallnternashycional permanente que complemente los sistemasjudiciales nacionales y ponga fin a la impunidad de que gozan los responsables de genocidio crimenes contra la humanidad y criacutemenes de guerra

B Considerando que la Comisioacuten de Derechos Humanos de las Naciones Unidas estaacute respaldando decididamente la creacioacuten de ese Trishybunal

C Considerando que la fase preparatoria de la creacioacuten dei Tribushynal Penal Internacional finalizoacute con la uacuteltima sesioacuten dei Comiteacute Preparatorio de las Naciones Unidas que tuvo lugar dei 16 de marzo al3 de abril de 1998

D Felicitaacutendose por la creciente participacioacuten de Estados en el proceso de negociaciones y esperando que un nuacutemero auacuten mayor de Esshytados procedentes de todas las regiones se encuentre plenamente represhysentado en la Conferencia Diplomaacutetica de Roma

E Considerando que dei 15 de junio al17 de julio de 1998 se celebra en Roma la Conferencia Diplomaacutetica de Plenipotenciarios para la constitucioacuten de un Tribunal Penal Internacional

266 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

F Considerando que los Estados miembros y la delegacioacuten de la Comisioacuten Europea que participan en la Conferencia Diplomaacutetica de Roma pueden desempenar un papel crucial a la hora de garantizar el eacutexito de la conclusioacuten de esta Conferencia Diplomaacutetica y acogiendo positivamente la mayor convergenciacutea de las posturas de los Estados miembros de la UE

G Congratulaacutendose por la oferta dei Gobierno de los Paiacuteses Bajos de servir de sede dei Tribunal Penal Internacional permanente

I Insta a la Conferencia Diplomaacutetica de Roma a aprovechar la oportunidad histoacuterica de concluir un texto de Estatuto para un Tribunal Penal Internacional independiente justo y eficaz

2 Insta a los representantes de los Estados miembros dei Consejo y de la Comisioacuten a garantizar activamente el ecircxito de los resultados a sashyber un auteacutentico Tribunal Penal Internacional en lugar de limitarse a un acuerdo de compromiso sobre principios esenciales en sus esfuerzos por conciliar las posturas de Estados reticentes

3 Destaca que para constituir un complemento eficaz de los sisteshymas judiciacuteales nacionales el Estatuto dei Tribunal Penal Internacional permanente objeto de la Conferencia de Roma deberaacute establecer

a un Fiscal independiente con competencias para investigare insshytruir sumarios por propia iniciativa en situaciones en las que se hayan cometido los delitos sometidos a lajurisdiccioacuten dei Tribunal

b Ia jurisdiccioacuten inherente y universal dei Tribunal en materia de genocidio criacutemenes contra la humanidad criacutemenes de guerra y agresioacuten sin que se requiera ninguacuten consentimiento dei Estado

c una buena relacioacuten de trabajo con los Tribunales lnternacionales ya establecidos en La Haya

d una relacioacuten constructiva con las Naciones Unidas yen partishycular con el Consejo de Seguridad basada en el pleno reconocimiento de sus respectivas funciones y competencias

e Ia obligacioacuten de los Estados firmantes de acatar y hacer cumplir sin demora las oacuterdenes y decisiones dei Tribunal

f los mayores niveles de respeto de los derechos de los acusados y de los sospechosos y de proteccioacuten de los intereses de las viacutectimas y de los testigos

g Ia garantiacutea de una financiacioacuten a largo plazo necesaria para asegurar la autonomiacutea e independencia dei Tribunal frente a cualquier presioacuten exterior

4 Destaca ademaacutes que la jurisdiccioacuten deI Tribunal sobre los delishytos de genociacutedio los criacutemenes contra la humanidad y los criacutemenes de

ENSAIOS JURiacuteDICOS 267

guerra deben considerarse con la misma calificacioacuten penal con indepenshydencia de que se hayan cometido en conflictos armados internacionales o en conflictos internos

5 Insta ai Consejo y a los Estados miembros a garantizar la universalidad y la transparencia de las negociaciones y la participacioacuten continuada de la comunidadjuriacutedica y la sociedad civil internacionales

6 Encarga a su Presidente que transmita la presente resolucioacuten ai Consejo a la Comisioacuten a los Gobiernos de los Estados miembros ai Secreshytario General de las Naciones Unidas ai Presidente de la Asamblea Geneshyral de las Naciones Unidas y ai Presidente de la Conferencia Diplomaacutetica de las Naciones Unidas para la constitucioacuten de un Tribunal Penal Internashycional

A resoluccedilatildeo supracitada demonstra que cresce a conscientizaccedilatildeo da necessidade de ser criado um Tribunal Penal Internacional com forccedila cogente obrigatoacuteria de suas decisotildees no acircmbito interno dos paiacuteses que participarem do pacto de sua constituiccedilatildeo

A doutrina internacional revela que a comunidade internacional somenshyte agora vem se preocupando em criar uma estructura internacional para determinar las responsabilidades individuales emergentes de violacioacuten de ciertos derechos baacutesicos dei ser humano Los mecanismos de responsabilidad estatal creados desde los 60 se dirigen a la mayor protecciotilden dei ser humano y la erradicacioacuten de las praacutecticas de volacioacuten sistemaacutetica de los derechos humanos ar via de la condena ai Estado que ordena o que tolera los abusos por lo cual se estructuraron entorno ai Estado conmo sujeto responsable Como haacute seflalado la Corte Internacional de Derechos Humanos el procedimiento ante ella no es un procedimiento penal lo que se busca determinar es el nivel de cumprimiento por parte de un Estado de sus obligaciones de derecho internacional Sin desconocer la importancia de determinar la responsabilidad dei Estado para que eacuteste tenga un incentivo para erradicar esas praacutectica de sus frotneras es pertinente detacar que las violaciones maacutes grave son en uacuteltima instancia coshymetidas por individuos (Francisco Cox Encarregado dei TPI HOH em artigo intitulado EI IlOH ante la Craciotilden de um Tribunal Penal Internacional no site httpwwwiidhedcrcpitpintrohtml)

A criaccedilatildeo de um Tribunal Penal Internacional atuaria permanentemente e teria competecircncia subsidiaacuteria em relaccedilatildeo agrave outorgada aos Tribunais Nacioshynais limitando-se a atuar apenas nos crimes internacionais previamente defishynidos como sendo do interesse da comunidade global

Merece registro no acircmbito do assunto tratado que na Conferecircncia Reshygional sobre o Tribunal Penal Internacional realizada em 18 e 19 de fevereiro de 1998 na cidade de Guatemala Guatemala um dos temas tratados foi o relativo

268 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

agrave harmonizaccedilatildeo das incriminaccedilotildees quando os seguintes aspectos foram disshycutidos Branqueamento corrupccedilatildeo fraude fiscal participaccedilatildeo em associashyccedilotildees criminosas um olhar agrave luz dos direitos nacionais e do direito internacioshynal Perspectivas Quais os comportamentos a incriminar Criar uma nova incriminaccedilatildeo da fraude fiscal Uma tentativa de harmonizaccedilatildeo o corpus jurls contendo disposiccedilotildees penais para proteccedilatildeo dos interesses financeiros da Uniatildeo Europeacuteia As negociaccedilotildees no seio do Conselho da Europa e da OCDE referenshytes agrave luta contra a corrupccedilatildeo etc O referido painel foi presidido por Benoit Dejemeppe procurador do Rei em Bruxelas e contou com a presenccedila de Tereshyza Beleza professora de Direito Penal na Faculdade de Direito de Lisboa como moderadora

Haacute como visto um largo campo de anaacutelise para desenvolver com possishybilidade do surgimento de sugestotildees que levem a ciecircncia juriacutedica a alcanccedilar com a atuaccedilatildeo estatal uma competecircncia internacional que possa combater o crime internacional e ao mesmo tempo proporcione seguranccedila juriacutedica na ordem interna ganhando assim o sistema juriacutedico confianccedila dos investidoshyres

Em conclusatildeo a forma de compatibilizar o combate agrave criminalidade internacional sem violar a seguranccedila juriacutedica necessaacuteria a evitar a fuga de inshyvestimentos do paiacutes estaacute na criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional com comshypetecircncia definida para processar e julgar delitos globalizantes e cujas decisotildees tenham forccedila imperativa no acircmbito interno das naccedilotildees participantes do pacto para o seu nascimento

Page 18: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro

240 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

4 O sigilo bancaacuterio e o direito agrave intimidade e agrave privacidade das pessoas

A anaacutelise do sigilo bancaacuterio em face do direito agrave intimidade e agrave privacidashyde exige inicialmente que seja enfrentada a questatildeo referente ao seu conceito

Os doutrinadores natildeo tecircm assumido posiccedilatildeo uniforme quanto aos asshypectos conceituais dessa entidade juriacutedica

Seacutergio Carlos Covello autor da obra jaacute mencionada (O Sigilo Bancaacuterio Leud S Paulo 1991 p 69) entende que sigilo bancaacuterio eacute a obrigaccedilatildeo que tecircm os Bancos de natildeo revelar salvo justa causa as informaccedilotildees que venham a obter em virtude de sua atividade profissional

Luiz Fernando Bellinetti no artigo intitulado Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio (Revista do Direito do Consumidor Satildeo Paulo RT 1996 voI 18 p 144) defende posiccedilatildeo no sentido de que sigilo bancaacuterio eacute o dever juriacutedico que tecircm as instituiccedilotildees de creacutedito e as organizaccedilotildees auxiliares e seus empregados de natildeo revelar salvo justa causa as informaccedilotildees que venham a obter em virtushyde da atividade bancaacuteria a que se dedicam

Para Arnoldo Wald (in O Sigilo Bancaacuterio no Projeto de Lei Complemenshytar n 70 Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas n I pp 196209) o sigilo bancaacuterio se enquadra no conceito mais amplo do segredo profissional que tem merecido uma proteccedilatildeo mais ampla ensejando sua violaccedilatildeo caracterizaccedilatildeo como crime (art 154 do Coacutedigo PeshynaI)

Eivany A Silva tratando do tema em Consideraccedilotildees a Respeito do Sigilo de Dados (artigo publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio n 61 pp 41142 - Edit Dialeacutetica) afirma que o sigilo bancaacuterio eacute espeacutecie do gecircnero sigilo de dados constituindo um direito fundamental protegido constitucionalmente inserto que estaacute no rol dos direitos e garantias individuais ou seja em claacuteusushylas peacutetreas da Carta Magna natildeo podendo portanto ser modificado nem messhymo por emenda agrave Constituiccedilatildeo e portanto muito menos por legislaccedilatildeo de hierarquia inferior

Como examinado haacute divergecircncias na fixaccedilatildeo do conceito Essas divershygecircncias embora importantes para as posiccedilotildees doutrinaacuterias a serem assumishydas sobre o alcance do sigilo bancaacuterio natildeo geram contudo influecircncias de maior intensidade no relacionamento entre a instituiccedilatildeo financeira e os seus depositantes Isso porque o que merece ser considerado eacute a natureza juriacutedica do sigilo bancaacuterio isto eacute a que categoria de direito pertence e como por quem e quando a sua quebra pode ser determinada

Em face do exposto necessaacuterio eacute que se faccedila o alinhamento das teorias que procuram fundamentar o sigilo bancaacuterio

A doutrina em eacutepocas diversas examinou as seguintes teorias

ENSAIOS JURiacuteDICOS 241

Teoria contratualista O sigilo bancaacuterio de acordo com essa teoria deshycorre da relaccedilatildeo contratual que voluntariamente eacute formada entre o banco e o cliente por via da qual mesmo sem claacuteusula expressa a instituiccedilatildeo financeira assume a obrigaccedilatildeo de guardar segredo das movimentaccedilotildees de dinheiro que nela satildeo feitas Essa responsabilidade assumida pelo banco inspira-se segunshydo os adeptos da teoria em destaque nos usos nos costumes e na boa-feacute sempre aplicaacuteveis na intepretaccedilatildeo dos contratos comerciais7bull

Teoria do direito agrave privacidade Os adeptos dessa corrente afirmam que o sigilo bancaacuterio integra o campo do direito agrave privacidade que faz parte dos direitos da personalidade

Teoria consuetudinaacuteria Segundo os seguidores dessa linha de pensar o sigilo bancaacuterio decorre dos compromissos taacutecitos assumidos entre instituishyccedilotildees financeiras e seus clientes no sentido de natildeo serem levados ao conhecishymento de terceiros os valores transacionados O uso reiterado dessa praacutetica apoiada no elemento confianccedila passou a representar costume adotado nesse tipo de negoacutecio juriacutedico

Teoria da boa-feacute A adoccedilatildeo dessa teoria conduz o inteacuterprete a entender que o sigilo bancaacuterio por sua proacutepria natureza estaacute vinculado ao caraacuteter fiduciaacuterio da atividade bancaacuteria fundando-se portanto na boa-feacute ou dever de lisura que tanto marca o tipo de negoacutecio juriacutedico firmado

Teoria do sigilo profissional Essa teoria concebe o sigilo bancaacuterio como sendo uma espeacutecie do sigilo profissional Haacute portanto um dever eacutetico do banshyco em respeitar o sigilo bancaacuterio em decorrecircncia da profissatildeo exercida

Teoria do direito agrave intimidade dos bancos Os integrantes dessa forma de pensar sustentam que a instituiccedilatildeo financeira tem legiacutetimo interesse de afastar do conhecimento de terceiros a movimentaccedilatildeo financeira dos seus clientes e consequumlentemente dos fatos com elas relacionados

Teoria da complexidade do viacutenculo Essa teoria eacute explicada por Arnoldo Wald no trabalho jaacute citado da forma seguinte A doutrina moderna abandoshynou a noccedilatildeo da relaccedilatildeo juriacutedica contratual defendo a complexidade do viacutenshyculo Aleacutem dos direitos e das obrigaccedilotildees principais existem deveres secundaacuteshyrios para ambos os contratantes que decorrem da regra geral da boa-feacute denoshyminada na doutrina italiana de cOITeteza e na legislaccedilatildeo alematilde de Treu und Glauben Exige que a atuaccedilatildeo de uma parte natildeo cause danos agrave esfera juriacutedica da outra Dentro desta ideacuteia defende-se que o segredo bancaacuterio eacute um dever

7 Arnoldo Wald em Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais artigo publicado na Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas n 22 pp 1518 manifesta entendimento de que no campo normatIacutevo do Direito brasileiro esta teoria encontra respaldo nos arts 130 e 131 do Coacutedigo Comercial que prevecirc a interpretaccedilatildeo dos contratos segundo os usos os costumes e a boa-feacute

242 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

acessoacuterio na relaccedilatildeo juriacutedica Mesmo que natildeo nasccedila o contrato entre as partes a boa-feacute objetiva impede que a instituiccedilatildeo financeira prejudique os interesses do cidadatildeo

Estabelecidos os pressupostos doutrinaacuterios acima examinamos agora se o sigilo bancaacuterio diz respeito agrave intimidade e agrave privacidade das pessoas

A Constituiccedilatildeo Federal em seu artigo 5ordm incisos X e XII afirma

Art 5ordm Todos satildeo iguais perante a lei sem distinccedilatildeo de qualquer natureza garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Paiacutes a inviolabilidade do direito agrave vida agrave liberdade agrave igualdade agrave segushyranccedila e agrave propriedade nos termos seguintes

X - satildeo inviolaacuteveis a intimidade a vida privada a honra e a imagem das pessoas assegurado o direito agrave indenizaccedilatildeo pelo dano material ou moral decorrente de sua violaccedilatildeo

XJl - eacute inviolaacutevel o sigilo da correspondecircncia e das comunicaccedilotildees telegraacuteficas de dados e das comunicaccedilotildees telefocircnicas salvo no uacuteltimo caso por ordem judicial nas hipoacuteteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigaccedilatildeo criminal ou instruccedilatildeo processual penal

Essas garantias constitucionais protegem o cidadatildeo de qualquer investida de terceiros em sua intimidade em sua vida privada e no sigilo de seus dados

Na expressatildeo terceiros estaacute incluiacutedo o Estado e consequumlentemente seus agentes poliacuteticos e administrativos

A doutrina tem se manifestado de modo quase unacircnime no sentido de que o sigilo bancaacuterio eacute uma garantia constitucional que protege a privacidade das pessoas no campo econocircmico e financeiro A sua significaccedilatildeo eacute de natildeo tornar puacuteblica a movimentaccedilatildeo da conta bancaacuteria e das aplicaccedilotildees financeiras do cidadatildeo para que de nenhum modo os atos privados praticados possam ser tornados puacuteblicos

Esse posicionamento eacute o adotado pelos autores que passo a citar

Arnoldo Wald (O Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais artigo pushyblicado na Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas RT n 22 pp 1521)

O sigilo bancaacuterio eacute o meio para resguardar a privacidade no camshypo econocircmico pois veda a publicidade sobre a movimentaccedilatildeo da conta corrente bancaacuteria e das aplicaccedilotildees financeiras

ENSAIOS JURiacuteDICOS 243

Eivany A Silva (Consideraccedilotildees a Respeito do Sigilo de Dados artigo publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio n 61 Satildeo Paulo Editora Dialeacutetica p27)

A maioria dos ordenamentos juriacutedicos como o brasileiro tratam o sigilo bancaacuterio como direito fundamental do contribuinte agrave privacidashyde ou seja agrave resistecircncia agrave comunicaccedilatildeo de dados que representem desshydobramento da personalidade da pessoa direito agrave oposiccedilatildeo e agrave negaccedilatildeo de comunicaccedilatildeo

Ives Gandra da Silva Martins (Sigilo Bancaacuterio trabalho publicado na Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio S Paulo Editora Dialeacutetica n 1 pp 24 e 25)

Pelos incisos X e XII do artigo 5ordm tem o contribuinte o direito de preservaccedilatildeo de sua intimidade de sua privacidade e de que terceiros que detenham informaccedilotildees pessoais suas sejam obrigados a guardaacute-Ias

Natildeo pode pois a fiscalizaccedilatildeo exigir de terceiros informaccedilotildees que apenas pode obter do proacuteprio contribuinte

Em determinadas hipoacuteteses todavia o interesse puacuteblico haacute de preshyvalecer sobre o interesse individual mas caberaacute a um outro poder definir se tais hipoacuteteses efetivamente ocorrem com o que poderaacute o Poder Judishyciaacuterio autorizar se convencido estiver o magistrado de que a hipoacutetese eacute de gravidade e de lesatildeo ao interesse puacuteblico a quebra do direito ao sigilo bancaacuterio

Estou convencido ser esta a melhor conformaccedilatildeo juriacutedica da quesshytatildeo idealizada pelos constituintes defendida pela doutrina e consagrashyda na jurisprudecircncia corrente exegeacutetica esta a que me filio desde os meus primeiros escritos sobre a mateacuteria

Roberto Quiroga Mosquera (Tributaccedilatildeo no Mercado Financeiro e de Capitais obra publicada pela Editora Dialeacutetica Satildeo Paulo 1998 pp 70171)

Do exposto ateacute aqui eacute evidente que o direito ao sigilo bancaacuterio representa uma espeacutecie de direito agrave privacidade

Eacute incontroverso que os dados e informaccedilotildees de natureza bancaacuteria dizem respeito agrave intimidade e agrave vida privada dos cidadatildeos Dados que dizem respeito aos valores em dinheiro depositados em contas-correnshytes bancaacuterias tipos e caracteriacutesticas de aplicaccedilotildees financeiras ganhos e prejuiacutezos auferidos ou incorridos em operaccedilotildees bursaacuteteis etc satildeo sem sombra de duacutevida elementos particulares e pessoais de qualquer indiviacuteshyduo

244 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Utilizando outra voz informaccedilotildees que tocam no aspecto financeishyro do ser humano representam direito iacutentimo e personaliacutessimo devendo ser mantidas em sigilo por aqueles que eventualmente as detenham em razatildeo de sua atividade profissional Parece-nos que tal conclusatildeo eacute de uma clareza inconteste

Natildeo tem sido outra a posiccedilatildeo da doutrina mais abalizada do Paiacutes e da jurisprudecircncia dominante

o autor referido a seguir faz a observaccedilatildeo seguinte

Carlos Alberto Hagstrom (Sigilo Bancaacuterio Novas Questotildees Reshyvista de Direito Mercantil Satildeo Paulo Malheiros 1997 vaI 105 pp 4344) expotildee que apesar de existirem diversas teorias que procuram fundashymentar juridicamente o sigilo bancaacuterio modernamente a explicaccedilatildeo para o fundamento do referido instituto sofreu uma radical alteraccedilatildeo Divershysas constituiccedilotildees modernas esclarece o mencionado autor ampliaram e explicitaram o elenco de direitos e garantias individuais passando a garantir o direito agrave privacidade e agrave intimidade A Constituiccedilatildeo brasileira natildeo trilha caminho diferente Assegurou referidos direitos de forma exshypressa e sem restriccedilotildees O tema do sigilo bancaacuterio figura agora em niacutevel constitucional Tem status de norma superior no qual se reconhece o direito agrave intimidade como norma de caraacuteter geneacuterico em que estatildeo conshytemplados muacuteltiplos aspectos da vida privada em especial os de ordem econocircmico-financeira que compotildeem o que Hagstrom denominou a inshytimidade econocircmica ou intimidade patrimonial

Luiacutes Fernando 8ellinetti (Limitaccedilotildees Legais ao Sigilo Bancaacuterio artigo publicado na Revista de Direito do Consumidor n 18 pp 141151)

Como jaacute dissemos anteriormente em certas hipoacuteteses o fundashymento para o segredo bancaacuterio seria a privacidade No entanto nesses casos o que se protege eacute a privacidade e natildeo propriamente o sigilo

Entendemos que uma coisa eacute garantir-se a privacidade da pessoa com fundamento em norma constitucional outra eacute garantir-se o segreshydo de informaccedilotildees bancaacuterias de uma pessoa com base na legislaccedilatildeo supramencionada

Sempre que a revelaccedilatildeo de informaccedilotildees bancaacuterias puder violar a privacidade da pessoa parece-nos que mais do que garantia ao sigilo bancaacuterio (com fundamento legal) tem a pessoa garantia agrave sua privacishydade (com fundamento constitucional)

ENSAIOS JURiacuteDICOS 245

No entanto se a revelaccedilatildeo da informaccedilatildeo natildeo invadir a esfera da intimidade da pessoa sua garantia eacute meramente legal do sigilo bancaacuterio

Carlos Maacuterio Velloso (citado por Misabel Derzi em Direito Tributaacuterio Aplicado obra publicada pela Editora Del Rey Belo Horizonte MO pp 278 e 279)

O sigilo bancaacuterio decorre do direito agrave privacidade inerente agrave pershysonalidade das pessoas consagrado na Constituiccedilatildeo Federal em seu art 5ordm X e protege tanto interesses privados como finalidades de ordem puacuteblica a saber o sistema de creacutedito O sigilo bancaacuterio natildeo eacute um princiacuteshypio absoluto

As exceccedilotildees ao sigilo bancaacuterio estatildeo previstas na Lei n 45951964 que continua em vigor

O Poder Judiciaacuterio pode requisitar relativamente a pessoas e instishytuiccedilotildees informaccedilotildees que implicam quebra de sigilo (Lei n 45951964 art 38 sect 1 ordm) entretanto mesmo havendo inqueacuterito policial instaurado deveraacute proceder com cautela prudecircncia e moderaccedilatildeo inerentes agrave mashygistratura

Luciana Fregodolli (O Direito agrave Intimidade - excerto da dissertaccedilatildeo que apresentou sob o tiacutetulo O Direito agrave Intimidade e a Prova Iliacutecita publicado pela Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Constitucional e Ciecircncia Poliacutetica -n 19 p 233)

O sigilo bancaacuterio protege interesses privados Eacute ele espeacutecie de direito agrave privacidade inerente agrave personalidade das pessoas e que a Consshytituiccedilatildeo Federal consagra no art 5ordm X aleacutem de atender a uma finalidade de ordem puacuteblica qual seja a de proteccedilatildeo ao sistema de creacutedito

O direito agrave privacidade abrange atualmente o de impedir que tershyceiros inclusive o Estado e o Fisco tenham acesso a informaccedilotildees sobre o que se denominou a aacuterea de manifestaccedilatildeo existencial do ser humano

Celso Ribeiro Bastos O pensamento de Celso Ribeiro Bastos foi exshyposto por Roberto Quiroga Mosquera na obra jaacute referida p 71 do modo seguinte

Celso Bastos eacute do mesmo pensar Apoacutes tecer consideraccedilotildees introdutoacuterias acerca do sigilo bancaacuterio e expor pensamentos de divershysos autores nacionais e alieniacutegenas conclui o constitucionalista brasileishyro no sentido de que todas as despesas ordinaacuterias feitas pelo cidadatildeo

246 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

comum em sua vida cotidiana devem ser consideradas parte de sua vida privada familiar ou domeacutestica e portanto protegidas contra interferecircnshycias a despeito de qualquer pretexto Desde as condutas mais corriqueishyras como as compras efetuadas em um supermercado para manutenshyccedilatildeo da famiacutelia quanto aquelas outras moralmente reprovaacuteveis como presentes ou joacuteias compradas e dadas a quem presta ao homem servishyccedilos de natureza extraconjugal tudo estaacute abarcado pelo manto da proteshyccedilatildeo agrave vida privada familiar ou domeacutestica ( ) E mais adiante arremata Hoje praticamente a vida do homem pode ser escrita a partir de seu talatildeo de cheques e nas sociedades mais avanccediladas pelos cartotildees de creacutedito e magneacuteticos Permitir-se que o sigilo bancaacuterio venha a ser romshypido por qualquer forma natildeo-extraordinaacuteria para salvaguarda de inteshyresse de porte no miacutenimo idecircntico eacute expor a seguranccedila individual a um constante e absurdo temor perante as possibilidades de controle direto ou pelo vazamento de alguma informaccedilatildeo

Haacute contudo corrente contraacuteria como passaremos a demonstrar

Andreacute Serratildeo Borges de Sampaio Consultor da Uniatildeo nas informashyccedilotildees prestadas ao Advogado-Geral da Uniatildeo sobre a ADIn n 2397 cita trechos de doutrina e jurisprudecircncia estrangeiras defendendo o entendimento de que o sigilo bancaacuterio natildeo tem conotaccedilatildeo de direito de privacidade Eis o que escreshyveu o parecerista citado

O jurista portuguecircs J L Saldanha Sanches coteja primorosashymente o sigilo bancaacuterio com a proteccedilatildeo da intimidade para concluir que natildeo haacute que se falar em direito ao sigilo bancaacuterio como concretizaccedilatildeo do direito agrave intimidade Nas suas palavras

Ora em que esfera podemos noacutes incluir o segredo bancaacuteshyrio enquanto instituto que concretiza certos valores do ordenashymento juriacutedico Como expressatildeo de interesses juridicamente tuteshylados

Seraacute o segredo bancaacuterio um prolongamento do direito agrave inshytimidade da esfera pessoal e familiar de uma qualquer pessoa sinshygular (uma vez que em relaccedilatildeo agraves pessoas coletivas a questatildeo natildeo pode mesmo ser colocada) Ou diraacute antes respeito aquela faixa mais larga que resguarda a privacidade de qualquer cidadatildeo e que soacute pode por isso sofrer qualquer intromissatildeo se surgirem razotildees vaacutelidas para que tal direito seja restringido

Ao afirmar-se que na perspectiva dos clientes dos bancos o segredo bancaacuterio eacute um direito com a reserva da sua vida privada temos uma primeira resposta para esta questatildeo

ENSAIOS JURiacuteDICOS 247

Mas falta distinguir entre intimidade e reserva da vida privashyda e entre clientes individuais e profissionais de um banco Natildeo estamos perante o mesmo tipo de tutela quando contamos que um particular espera que o banco natildeo divulgue a qualquer inteshyressado o volume da sua conta bancaacuteria (porque pura e simplesshymente quer manter sob reserva a sua vida particular) ou quando um comerciante confia no banco para que este natildeo revele quem satildeo os seus clientes fornecedores ou qual eacute o seu grau de endividamento

No caso da pessoa singular estaacute apenas em causa um conshyjunto de valores de natureza moral esta natildeo estaacute em princiacutepio preocupada com possiacuteveis prejuiacutezos econocircmicos ligados a qualshyquer divulgaccedilatildeo Apenas se opotildee por razotildees do seu foro pessoal e que natildeo carecem de fundamentaccedilatildeo que esta tenha lugar

Enquanto que o comerciante pode ser seriamente prejudishycado em termos concorrenciais com a revelaccedilatildeo da lista dos seus clientes ou com a sua situaccedilatildeo financeira

O dever de reserva que cabe ao banqueiro estaacute desta forma a serviccedilo do interesse comercial das empresas suas clientes - que pelo simples facto de o serem ou por necessitarem de obter creacutedishyto lhe datildeo informaccedilotildees com um forte valor comercial ou da pesshysoa singular que deseja manter a privacidade da sua situaccedilatildeo patrimonial

Ou em alternativa ao serviccedilo da manutenccedilatildeo da privacidashyde que qualquer um pode desejar ainda que a possiacutevel violaccedilatildeo desta apenas lhe possa acarretar danos natildeo-patrimoniais

E por isso o segredo bancaacuterio natildeo pode constituir a expresshysatildeo do imperativo constitucional da proteccedilatildeo da intimidade Ateacute porque o acesso a essa esfera estaacute vedado aos proacuteprios bancos

Natildeo nos parece aceitaacutevel que um banco como condiccedilatildeo para a concessatildeo de creacutedito a uma pessoa singular ou para estashybelecer com ela qualquer relaccedilatildeo contratual possa exigir desta informaccedilatildeo de tipo estritamente pessoal ou a sujeiccedilatildeo a exames meacutedicos que atingindo a sua esfera iacutentima afectam a sua dignidashyde Aqui estaacute em causa a ilicitude da pergunta por pressupor o acesso agrave esfera inviolaacutevel (e indisponiacutevel) da intimidade

A informaccedilatildeo que o banco pode obter para a defesa dos seus interesses legiacutetimos natildeo pode ir aleacutem da esfera patrimonial do seu cliente rendimentos bens possuiacutedos perspectivas profisshysionais

( )

248 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

Podemos pois concluir que o segredo bancaacuterio natildeo eacute natildeo pode ser uma concretizaccedilatildeo do princiacutepio constitucional do direishyto agrave intimidade

Este princiacutepio tem como funccedilatildeo consagrar uma zona de reshyselVa pessoal para factos opccedilotildees e circunstacircncias que soacute de forshyma indirecta e de todo secundaacuteria podem ter aspectos ou refleshyxos de natureza patrimonial (Saldanha Sanches J L Segredo Bancaacuterio e Tributaccedilatildeo do Lucro Real In Saldanha Sanches J L Estudos de Direito Contabiliacutestico e Fiscal Coimbra Coimbra Edishytora 2000 pp 105108)

Em diversos paiacuteses haacute a clara percepccedilatildeo que natildeo haacute que se conshyfundir direito agrave intimidade com sigilo bancaacuterio indicando que a quebra do sigilo pela Administraccedilatildeo Tributaacuteria natildeo constitui violaccedilatildeo ao direito Ao contraacuterio a existecircncia de um Estado Fiscal implica na necessidade de consagrar agrave administraccedilatildeo tributaacuteria tal faculdade o que se harmonishyza com diversos princiacutepios e outros direitos fundamentais constantes da Carta de 1988

O caso espanhol eacute exemplar neste sentido ao natildeo visualizar a vioshylaccedilatildeo ao direito agrave intimidade em relaccedilatildeo agrave quebra do sigilo bancaacuterio Portanto

el Tribunal Constitucional espaflOl se ha pronunciado por la negativa de que el conocimiento de las cuentas bancarias por la Administracioacuten pueda invadir el aacutembito constitucionalmente garantizado de la intimidad de los individuos porque tales extractos no constituyen per se uma biografiacutea personal en nuacutemeros y en siacute no tiene relevancia para la intimidad personal y familiar dei contribuyente ya que se trata de dados no secretos y confiados a una entidad (Campos Laura Rodriacuteguez Oerechos dei Contribuyente em la Repuacuteblica Argentina ai Amparo de la Convencioacuten Interamericana de Oerechos Humanos http wwwiefpaorgarcriteriosdigitalarticulosderechoshtm Visitado em 512001)

Ao analisar a jurisprudecircncia da Corte Constitucional espanhola quanto ao tema tambeacutem ressalta Saldanha Sanches

Na apreciaccedilatildeo da constitucionalidade da lei que permitia o controle administrativo das contas bancaacuterias o Tribunal Constitushycional espanhol realizou uma distinccedilatildeo entre intimidade pessoal e familiar e a intimidade econoacutemica onde a proteccedilatildeo constitucional eacute menos intensa

ENSAIOS JURiacuteDICOS 249

E procura fazer uma distinccedilatildeo entre a violaccedilatildeo agrave intimidade como consequumlecircncia de uma anaacutelise das contas bancaacuterias - coloshycando a hipoacutetese de uma recusa de cooperaccedilatildeo por parte do conshytribuinte se tal eventualidade se verificar - e a violaccedilatildeo directa da intimidade uma vez que esta natildeo pode resultar de uma mera anaacuteshylise de movimentos bancaacuterios (Saldanha Sanches J L A Situashyccedilatildeo Actual do Sigilo Bancaacuterio a Singularidade do Regime Portushyguecircs In Saldanha Sanches J L Estudos de Direito Contabiliacutestico e Fiscal Coimbra Coimbra Editora 2000 p 91)

Outro comentarista ao analisar a situaccedilatildeo do sistema espanhol quanto ao sigilo bancaacuterio e o direito agrave intimidade fez questatildeo de ressaltar

Seguacuten el r c frente a la Hacienda Puacuteblica no existe el derecho a la intimidad deI art 18 CE Ya la LO de 5 de mayo deI 82 vada praacutecticamente de contenido constitucional el derecho a la intimidado en cuanto el aacutembito de eacutesta queda deferido a la ley ordinaria (a 2ordm) y en cuanto que la esfera protegida frente a las Administraciones se reduce a poco O nada ai no reputarse intromisiones ilegiacutetimas las actuaciones autorizadas o acordadas por la Autoridad competente de acuerdo con la Ley (art 8ordm 1)

La LGTy el RI Iimiacutetan la esfera de la intimidad en las relacishyones con la Hacienda hasta el extremo de que solamenle existe un refugio limitado en el aacutembito deI secreto profesional en los casos de informacioacuten sobre terceros y siempre que no se trate de datos con transcendencia econoacutemica o tributaria EI rc no ha enconshytrado hasta el momento ni un solo supuesto de dato o informacioacuten econocircmica con transcendencia tributaria que limite la accioacuten inquisitiva de la Administracioacuten tributaria por razoacuten de intimidado Bien puede decirse por tanto que frente a la Administraciocircn tribushytaria en cuanto se trata deI ejercicio de su funciocircn de buacutesqueda de datos con transcendencia tributaria el derecho a la intimidad personal y familiar (art 18 I CE) no existe

La biacuteblia deI tribunal a estos efeclos estaacute constituida por la S 11084 reiterada en numerosas ocasiones ampliada en el Auto 64286 y reafirmada por ejemplo en la S 26 abril 90 tantas veces citada (FJ 10deg) Seguacuten esa doctrina la distribucioacutenjusta de la carshyga fiscal prevalece sobre el derecho a la intimidad parte dei art 812 I de la LO seguacuten el cual frente a la Ley (ordinaria) no hay intimidad protegida siempre que haya en dicha ley imperativos de intereacutes puacuteblico ( ) ni siquiera se habla dei predomiacutenio frente a la

250 SUPERIOR TRIBUNAl DE JUSTiCcedilA

intimidad de intereses u objetivos constitucionalmente protegidos Soacuteo admite que la actuadoacuten administrativa es arbitraria cuando no parezcajustificada por la Finalidad de la inspeccioacuten es decir cuando se trate de datos o informaciones que carezcan de transcendencia tributaria pero eacuteste obviamente no es sin Umite derivado dei derecho a la intimidad sino de la interdiccioacuten de arbitrariedad o desviacioacuten de poder de la Administracioacuten de la necesidad de ajuste de toda Administracioacuten ai acircmbito de su competencia que tanto vale para datos iacutentimos como para otros que no lo sean Seguacuten la S 11084 no hay esfera de intimidad proshytegida frente a una Administracioacuten tributaria amparada en una norma que elimina la intimidad como liacutemite (Garciacutea AIacuteloveros Jaime Una Nueva Ley General Tributaria Problemas Constitucioshynales In Kirchhof P et aI Garantiacuteas Constitucionales dei Contribuyente Valencia Tirant lo Blanch 1999 pp 109110)

Diante de tudo quanto foi exposto tendo-se o cuidado de registrar posicionamento de diferentes autores nacionais e estrangeiros haacute ambiente preparado para ser respondido o primeiro questionamento desdobrado em trecircs partes formulado para o 1II Coloacutequio Internacional de Direito Tributaacuterio promoccedilatildeo do Centro de Extensatildeo Universitaacuteria Eis a primeira parte do seu teor

O sigilo bancaacuterio diz respeito agrave intimidade e privacidade das pessoas

A resposta eacute optando por convencimento influenciado pelas ideacuteias da corrente predominante positiva

O nosso entendimento eacute no sentido de que o direito agrave intimidade integra os direitos da personalidade e visam proteger o direito agrave inviolabilidade do domiciacutelio da correspondecircncia das comunicaccedilotildees de quaisquer espeacutecies dos dados pessoais computadorizados do sigilo bancaacuterio O mesmo acontece com o direito agrave privacidade

A expansatildeo da proteccedilatildeo do direito agrave intimidade e agrave privacidade eacute uma consequumlecircncia da evoluccedilatildeo da era contemporacircnea nos setores tecnoloacutegicos e da instabilidade que passam as instituiccedilotildees estatais especialmente a encarreshygada de arrecadar tributos Haacute o reconhecimento de que desenvolve-se um processo de aguda corrosatildeo na proteccedilatildeo agrave intimidade que ao ser violada provoca a publicizaccedilatildeo das condutas mais iacutentimas do cidadatildeo

A concepccedilatildeo do sigilo bancaacuterio no acircmbito do direito agrave intimidade e agrave privacidade visa garantir ao homem o miacutenimo capaz para que lhe seja asseshygurada a sua condiccedilatildeo humana protegendo-o de ingerecircncias alheias como apregoa a Conferecircncia Noacuterdica sobre o Direito agrave Intimidade realizada em Estoshycolmo na data de maio de 1967 ao fazer inserir no documento que publicou a seguinte definiccedilatildeo O direito agrave intimidade eacute o direito do homem de viver de forma independente a sua vida com um miacutenimo de ingerecircncia alheia

ENSAIOS JURiacuteDICOS 251

5 Seguranccedila juriacutedica e acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias

A segunda pergunta apresentada pelos organizadores do coloacutequio estaacute assim posta

A seguranccedila das relaccedilotildees juriacutedicas atraveacutes do Sistema Financeiro pode ser afetada pelo acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves inforshymaccedilotildees bancaacuterias

O acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias se realizado caracteriza um atentado de suma gravidade aos direishytos do cidadatildeo Eacute um ataque aos princiacutepios sustentadores do sistema demoshycraacutetico adotado pelo constituinte de 1988 especialmente quando detonou que a Repuacuteblica Federativa do Brasil tem como objetivo fundamental o respeishyto agrave dignidade humana e agrave cidadania

Do ordenamento juriacutedico brasileiro a meu pensar natildeo haacute lugar para brotar qualquer interpretaccedilatildeo que conclua pela possibilidade de qualquer agenshyte do Poder Puacuteblico acessar de modo generalizado e sem motivaccedilatildeo informashyccedilotildees bancaacuterias do cidadatildeo mesmo com autorizaccedilatildeo judicial

Esclareccedilo desde logo que natildeo comungo com o pensamento de detershyminada corrente no sentido de ser absoluto o direito ao sigilo bancaacuterio Tenho-o como relativo poreacutem vinculado aos princiacutepios da razoabilidade da moralidade da legalidade e da motivaccedilatildeo expliacutecita e detalhada sob pena de ser impossiacutevel a sua quebra

O acesso indiscriminado do agente fiscal agraves informaccedilotildees bancaacuterias do cidadatildeo gera uma quebra da seguranccedila das relaccedilotildees juriacutedicas por um terceiro passar a ter sem causa justificadora conhecimento da vida iacutentima de algueacutem submetendo-o a partir daiacute a um regime de submissatildeo Por outro lado ninshygueacutem poderaacute garantir nem o proacuteprio Estado que o agente puacuteblico utilize os dados que chegaram ao seu conhecimento para outros intentos que natildeo o exclusivamente fiscal

Lembra Arnoldo Wald que O segredo na atividade bancaacuteria envolve concomitantemente interesses privaqos e coletivos que podem ser analisashydos sob trecircs acircngulos o interesse do cliente na sua relaccedilatildeo com a instituiccedilatildeo financeira o interesse do banco em atuar com discriccedilatildeo para ganhar a conshyfianccedila da populaccedilatildeo e captar recursos e o interesse social na existecircncia de um bom e eficiente sistema bancaacuterio Por estarem ligadas ao desenvolvimento da economia e aos interesses da comunidade as relaccedilotildees que envolvem as instishytuiccedilotildees financeiras natildeo recebem o mesmo tratamento juriacutedico dispendido a outras relaccedilotildees comerciais Inviaacutevel a aplicaccedilatildeo exclusiva das regras de Direito Privado as quais tecircm como princiacutepio norteador a autonomia da vontade pois

252 SUPERIOR TRIBUNAl DE JUSTiCcedilA

esta encontra limites nas normas cogentes proacuteprias do direito bancaacuterio e na intervenccedilatildeo do Estado8

A seguranccedila juriacutedica desse tipo de relaccedilatildeo envolve tambeacutem a manutenshyccedilatildeo do segredo das movimentaccedilotildees financeiras do contribuinte

Imprimir-se a mais ampla seguranccedila nas relaccedilotildees do Sistema Financeiro eacute fortalececirc-lo O Estado tem o dever de zelar por esse estado de seguranccedila natildeo permitindo consequumlentemente que o sigilo bancaacuterio seja quebrado pelo acesshyso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico por esse comportamento afeshytar a confiabilidade no sistema

Eacute de todo inconveniente permitir a possibilidade de um atuar do agente fiscal sem controle na quebra do sigilo bancaacuterio por afetar diretamente a seshyguranccedila da relaccedilatildeo juriacutedica firmada entre a instituiccedilatildeo financeira e o seu clienshyte em face deste sentir-se atingido pela accedilatildeo fiscal que passa a tomar conhecishymento de sua intimidade financeira e de fatos de sua vida privada sem o resshypaldo do Poder Judiciaacuterio

A seguranccedila juriacutedica nesse tipo de relaccedilatildeo deve assegurar impossibilidashyde de abuso de poder por parte do Fisco em face da necessidade de ser resshyguardada a garantia de que em um Estado de Direito natildeo pode ser concebido que conceda-se a uma parte mesmo que seja o Estado o domiacutenio absoluto de apanhar as provas que iraacute utilizar em caso de litiacutegio contra algueacutem

O acesso indiscriminado de agentes do Poder Puacuteblico agraves informaccedilotildees bancaacuterias do contribuinte aleacutem de afetar a seguranccedila juriacutedica da relaccedilatildeo em questatildeo promove um desequiliacutebro entre o cidadatildeo-contribuinte e o Fisco por caracterizar coaccedilatildeo que coloca aquele em posiccedilatildeo de inferioridade

A valorizaccedilatildeo da seguranccedila juriacutedica da relaccedilatildeo existente entre instituiccedilatildeo financeira e contribuinte pelo Fisco natildeo quebrando o seu sigilo fiscal sem autorizaccedilatildeo judicial constitui causa de aplicaccedilatildeo de Justiccedila fiscal O seguimenshyto de seus princiacutepios valoriza o regime democraacutetico do qual ela faz parte

6 Casos de admissibilidade da quebra do sigilo bancaacuterio

Os casos de admissibilidade da quebra do sigilo bancaacuterio estatildeo na atuashylidade descritos no nosso ordenamento juriacutedico positivo

A Lei Complementar n 105 de 10 de janeiro de 2001 apoacutes determinar no art 112 de que as instituiccedilotildees financeiras conservaratildeo sigilo em suas operashyccedilotildees ativas e passivas e serviccedilos prestados dispotildee no sect 312 do mesmo artigo que

8 Arnoldo Wald no artigo Sigilo Bancaacuterio e os Direitos Fundamentais Revista dos Tribunais ano 6 n 22 janeiromiddotmarccedilo de 1998 n 22 Cadernos de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas p 15

ENSAIOS JURiacuteDICOS 253

sect 3ordm Natildeo constitui violaccedilatildeo do dever de sigilo

I a troca de informaccedilotildees entre instituiccedilotildees financeiras para fins cadastrais inclusive por intermeacutedio de centrais de risco observadas as normas baixadas pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e pelo Banco Censhytral do Brasil

11 - o fornecimento de informaccedilotildees constantes de cadastro de emitentes de cheques sem provisatildeo de fundos e de devedores inadimplentes a entidades de proteccedilatildeo ao creacutedito observadas as norshymas baixadas pelo Conselho Monetaacuterio Nacional e pelo Banco Central do Brasil

JJI - o fornecimento das informaccedilotildees de que trata o sect 2ordm do art II da Lei n 9311 de 24 de outubro de 1996

IV - a comunicaccedilatildeo agraves autoridades competentes da praacutetica de iliacutecitos penais ou administrativos abrangendo o fornecimento de inforshymaccedilotildees sobre operaccedilotildees que envolvam recursos provenientes de qualshyquer praacutetica criminosa

V - a revelaccedilatildeo de informaccedilotildees sigilosas com o consentimento expresso dos interessados

VI- a prestaccedilatildeo de informaccedilotildees nos termos e condiccedilotildees estabeleshycidos nos artigos 2ordm 3ordm 4ordm 5ordm 6ordm 7ordm e 9ordm desta lei complementar

sect 4ordm A quebra de sigilo poderaacute ser decretada quando necessaacuteria para apuraccedilatildeo de ocorrecircncia de qualquer iliacutecito em qualquer fase do inqueacuterito ou do processo judicial e especialmente nos seguintes crimes

I - de terrorismo

11 - de traacutefico iliacutecito de substacircncias entorpecentes ou drogas afins

III - de contrabando ou traacutefico de armas municcedilotildees ou material destinado a sua produccedilatildeo

IV - de extorsatildeo mediante sequumlestro

V - contra o sistema financeiro nacional

VI - contra a Administraccedilatildeo Puacuteblica

Vll- contra a ordem tributaacuteria e a previdecircncia social

VIII-lavagem de dinheiro ou ocultaccedilatildeo de bens direitos e valores

IX - praticado por organizaccedilatildeo criminosa

Como visto a lei complementar enumera inuacutemeras situaccedilotildees que indeshypendentemente de autorizaccedilatildeo judicial o sigilo bancaacuterio eacute quebrado

254 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

A dificuldade que se apresenta eacute a de conciliar os casos de quebra de sigilo bancaacuterio que a Lei Complementar n 105 autoriza com a garantia do direito agrave privacidade e agrave intimidade

Destaque-se entre os de maior relevacircncia os seguintes

- natildeo constituir violaccedilatildeo do dever de sigilo bancaacuterio a troca de informashyccedilotildees entre instituiccedilotildees financeiras para fins cadastrais inclusive por intermeacuteshydio de centrais de risco o que possibilita o conhecimento da vida financeira privada do cidadatildeo por vaacuterias pessoas sem desempenho de autoridade na instituiccedilatildeo independentemente de ser justificada com antecedecircncia a causa desse atuar

- o de serem fornecidos dados relativos a fornecimentos de informashyccedilotildees cadastrais de emitentes de cheques sem provisatildeo de fundos a entidades privadas de proteccedilatildeo ao creacutedito sem qualquer avaliaccedilatildeo por qualquer autorishydade da causa determinante do fato a quebra do sigilo bancaacuterio na fase do inqueacuterito por inexistir nessa ocasiaacuteo qualquer contraditoacuterio e respeito ao prinshyciacutepio do devido processo legal

Quanto agraves demais situaccedilotildees constantes na lei complementar que autorishyzam a quebra do sigilo bancaacuterio naacuteo obstante algumas serem absolutamente necessaacuterias haacute de serem vistas em compatibilidade com as garantias constitushycionais conforme jaacute assinalado

O colendo Supremo Tribunal pronunciaraacute como guarda e inteacuterprete maishyor da Carta Magna em ADln jaacute intentada sobre a constitucionalidade ou natildeo dos dispositivos supramencionados

Em campo doutrinaacuterio valoriza-se as posiccedilotildees apresentadas quando da resposta oferecida aos questionamentos anteriores todas acenando pela neshycessidade do controle do Poder Judiciaacuterio

7 Sistema mais justo para a quebra do sigilo bancaacuterio

Os organizadores do JII Coloacutequio Internacional de Direito Tributaacuterio subshymetem agora para anaacutelise a questatildeo do teor seguinte Um sistema em que o Poder Judiciaacuterio torna-se aacuterbitro dos pedidos da Administraccedilatildeo Puacuteblica para quebra do sigilo eacute o mais justo

Em um Estado que por imposiccedilatildeo de sua proacutepria Constituiccedilatildeo estaacute comprometido com a guarda e aplicaccedilatildeo efetiva de princiacutepios democraacuteticos especialmente o de respeitar os direitos e garantias fundamentais da cidadashynia natildeo haacute ambiente para que seja outorgado ao Poder Executivo por via da atuaccedilatildeo de agentes puacuteblicos fiscais o acesso sem o controle do Poder Judiciaacuteshyrio agraves informaccedilotildees bancaacuterias do contribuinte

ENSAIOS JURiacuteDICOS 255

o sigilo bancaacuterio por ser um direito fundamental que exige ser respeitashydo pela supremacia constitucional que o protege deve submeter a possibilishydade de sua quebra para fins tributaacuterios ao Poder Judiciaacuterio pela ausecircncia de interesse direto nos resultados da accedilatildeo fiscalizadora que eacute o recolhimento do tributo e pelas garantias de independecircncia prudecircncia e qualificaccedilatildeo juriacutedica que revestem esse poder

A atuaccedilatildeo da fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo pode ser exercida fora dos limishytes da legalidade imposta a partir da Carta Magna e demais imposiccedilotildees legais a ela subordinadas

Natildeo se desconhece que no atual Estado fiscal os tributos constituem os meios financeiros determinantes para o atendimento dos compromissos da Administraccedilatildeo Puacuteblica com as obrigaccedilotildees oriundas em decorrecircncia de sua atividade no campo educacional social de seguranccedila puacuteblica interna e extershyna da sauacutede da manutenccedilatildeo dos Poderes ou seja para manter funcionando a maacutequina estatal

Por natildeo entremostrar-se na eacutepoca contemporacircnea qualquer outra alshyternativa viaacutevel para transformar o Estado fiscal em um Estado produtivo os tributos passam a representar um indeclinaacutevel dever da cidadania cujo cumshyprimento deve ser por todos honrado conforme assinala Joseacute Casalta Nabais Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra em artigo intitulado Algumas Reflexotildees sobre o Actual Estado Fiscal

Por isso os impostos hatildeo de constituir um preccedilo aceitaacutevel ou seja um preccedilo limitado Um preccedilo que estou certo muitas das sociedashydes que nos antecederam gostariam de ter pago e algumas das actuais natildeo enjeitariam suportar Por isso bem podemos afirmar como jaacute o fizeshymos noutro lugar que no actual Estado fiscal para o qual natildeo se vislumshybra qualquer alternativa viaacutevel pelo menos nos tempos mais proacuteximos os impostos constituem um indeclinaacutevel dever de cidadania cujo cumshyprimento a todos nos deve honrar

A atuaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio para liberar o bloqueio fortalece a conshyfianccedila do cidadatildeo no procedimento da fiscalizaccedilatildeo e consagra a ideacuteia iacutensita em qualquer regime democraacutetico de que a atuaccedilatildeo do Estado tem limites

Na espeacutecie os limites impostos satildeo os decorrentes da quebra do sigilo ser necessaacuterio em face da possiacutevel ilicitude cometida pelo cidadatildeo poreacutem sem ser violados os direitos do cidadatildeo de gozar da sua privacidade e da sua intimidade

A denominada cidadania fiscal haacute de ser considerada de modo conjunshytural com os reflexos dos direitos fundamentais assegurados ao contribuinte sem prestigiar a responsabilidade que tem o Estado de promover a arrecadashyccedilatildeo dos tributos

256 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

Cedo espaccedilo para registrar que a cidadania fiscal deve configurar um estado de relaccedilatildeo juriacutedica em que todos suportem a concretizaccedilatildeo de um Estado em que todos tenham a qualidade de destinataacuterio do dever fundashymentaI de pagar impostos na medida da respectiva capacidade contributiva poreacutem que seja um Estado fiscal suportaacutevel isto eacute um estado cujo sistema fiscal se encontre balizado por estritos limites juriacutedico-constitucionais9

A Administraccedilatildeo Tributaacuteria por melhor que seja a sua estrutura e os seus propoacutesitos natildeo estaacute emocionalmente preparada para conceber e aplicar os princiacutepios que sustentam a cidadania fiscal Isso ocorre primeiramente porshyque o Fisco tem por missatildeo exclusiva exercer a funccedilatildeo de arrecadar tributos Eacute a sua meta essencial por ser atribuiccedilatildeo que na organizaccedilatildeo administrativa estatal estaacute obrigado a desempenhar Natildeo lhe cabe administrar o tributo arreshycadado limitando-se unicamente a envidar esforccedilos para o cumprimento das metas impostas para imprimir aumento na arrecadaccedilatildeo tributaacuteria O sucesso da Administraccedilatildeo Tributaacuteria eacute medido pelo maior volume de recursos fiscais atraiacutedos para os cofres do Governo nunca pelo respeito que exerccedila para com os direitos fundamentais do contribuinte Eacute uma questatildeo de cultura adminisshytrativa de distribuiccedilatildeo de funccedilotildees no sistema estatal impossiacutevel de ser mudashydo por sugestotildees doutrinaacuterias

Por outro lado a fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo consegue afastar as pressotildees exercidas sobre ela por determinados segmentos da organizaccedilatildeo estatal que defendem uma atuaccedilatildeo mais agressiva para a cobranccedila dos tributos tudo em decorrecircncia dos efeitos produzidos pela conduta iliacutecita marcante da sonegashyccedilatildeo fiscal

Esses fatores contribuem para que a fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria natildeo tenha condiccedilotildees de modo imparcial sem isenccedilatildeo avaliar a necessidade objetiva da quebra do sigilo bancaacuterio do cidadatildeo Por melhor que seja o seu desempenho nunca ganharaacute a confianccedila do contribuinte

A atribuiccedilatildeo da quebra do sigilo bancaacuterio em um regime democraacutetico onde predomina o respeito maior aos direitos fundamentais da cidadania deve ser exercido pelo Poder Judiciaacuterio natildeo soacute porque seus membros atualmente revestidos da garantia da vitaliciedade inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos bem como porque estatildeo revestidos de independecircncia absoluta em relaccedilatildeo ao Poder interessado na cobranccedila do tributo e consequumlentemenshyte no resultado a ser obtido pela accedilatildeo fiscal

Esse sistema misto onde o Fisco faz a solicitaccedilatildeo motivada para a queshybra do sigilo bancaacuterio ao Poder Judiciaacuterio e este apoacutes analisaacute-lo com objetivishydade e cautela defere ou indefere impotildee seguranccedila e confiabilidade na atuashyccedilatildeo fiscal e sublima o respeito agrave dignidade do contribuinte em outras palavras da cidadania fiscal isto eacute de uma cidadania de liberdade que o Estado fiscal

9 Joseacute Casalta Nabais (Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra) no artigo Algumas Reflexotildees sobre o Actual Estado Fiscal no site httpagugovbr

ENSAIOS JURiacuteDICOS 257

pressupotildee para natildeo ser postergada impotildee um sistema fiscal balizado por esshytritos limites juriacutedico-constitucionais Limites esses que integram a chamada constituiccedilatildeo fiscal e que podemos reconduzir para natildeo nos alongarmos nesse aspecto a duas ideacuteias uma ideacuteia de seguranccedila que tem o seu tradicional e principal suporte no princiacutepio da lega1idade fiscal e uma ideacuteia de justiccedila ou equumlidade que tem a ver com a medida dos impostos e assenta no princiacutepio da capacidade contributiva 10

Em conclusatildeo a adoccedilatildeo de um sistema para a quebra do sigilo bancaacuteshyrio em que o Poder Judiciaacuterio seja o aacuterbitro dos pedidos da Administraccedilatildeo Puacuteblica natildeo eacute somente mais justo mas consegue impor maior credibilidade agrave atuaccedilatildeo fiscal e presta homenagem com intensa potencialidade aos princiacuteshypios democraacuteticos consistentes na guarda da seguranccedila juriacutedica do respeito aos direitos fundamentais do cidadatildeo nesse rol incluidos os agrave privacidade e agrave intimidade Aleacutem disso torna mais respeitaacutevel a relaccedilatildeo entre Fisco e contrishybuinte justificando portanto a opccedilatildeo do Estado pelo regime democraacutetico

8 Autoridade fiscal e faculdade incondicionada de quebrar o sigilo bancaacuterio

Essa indagaccedilatildeo consubstancia a preocupaccedilatildeo de serem estabelecidos controles para a atuaccedilatildeo do agente puacuteblico fiscal Centra-se a preocupaccedilatildeo em imprimir nas relaccedilotildees juriacutedicas tributaacuterias de quaisquer espeacutecies o primashydo da legalidade aprimorando-se o atuar vinculado

Natildeo concilia-se com os postulados da democracia a adoccedilatildeo de um sisteshyma de fiscalizaccedilatildeo tributaacuteria que outorgue faculdade incondicionada ao fiscal tributaacuterio de invadir a intimidade e a privacidade das pessoas sob o falso argushymento juriacutedico de que busca encontrar provas de sonegaccedilatildeo fiscal

Depreende-se do exposto que a autoridade fiscal natildeo deve ter faculdade incondicionada de quebrar o sigilo sempre que entender necessaacuterio Isso porshyque a praacutetica de atos administrativos por agentes puacuteblicos de modo incondicionado revela grave violaccedilatildeo ao princiacutepio da legalidade onde predoshymina a vontade da lei e natildeo o discricionarismo de quem o pratica

No trato do sigilo bancaacuterio o atuar incondicionado da fiscalizaccedilatildeo assushyme caracteriacutesticas de maior gravidade porque haacute violaccedilatildeo aos princiacutepios funshydamentais jaacute expostos e que satildeo prestigiados pela Carta Magna especialmenshyte por bater de frente de modo integral e absoluto com o direito agrave intimidade e agrave privacidade O atuar deve vincular-se rigidamente ao princiacutepio da legalidashyde especialmente aposta na Carta Magna sem a possibilidade de ser aberto qualquer canal para uso da conveniecircncia ou da oportunidade

Eacute de ser lembrada no trato do assunto a liccedilatildeo de Joseacute Casalta Nobais no trabalho jaacute citado no sentido de que Eacute certo que independentemente da

10 Idem p 15

=258=---___________________ SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTlCA

concepccedilatildeo a que se adira relativamente ao segredo bancaacuterio natildeo temos a menor duacutevida de que o acesso da Administraccedilatildeo Fiscal agrave informaccedilatildeo bancaacuteria seja directo sem necessidade de preacutevia decisatildeo judicial seja indirecto depois portanto de preacutevia decisatildeo judicial haacute de ter sempre uma natureza claramenshyte excepcional Na verdade constitua o segredo bancaacuterio uma manifestaccedilatildeo do direito fundamental agrave reserva da intimidade da vida privada constante do art 26 n 2 da Constituiccedilatildeo portuguesa ou suporte um outro direito fundashymentai um direito agrave reserva da vida privada anaacutelogo agravequele a sua afectaccedilatildeo teraacute sempre caraacuteter excepcional

A autoridade fiscal natildeo possui a necessaacuteria isenccedilatildeo e competecircncia institucional para averiguar o grau dessa excepcionalidade de modo que posshysa impor confianccedila ao cidadatildeo investido na condiccedilatildeo de contribuinte poreacutem com direitos a serem assegurados por forccedila do regime democraacutetico adotado

O certo eacute que na relaccedilatildeo juriacutedico-tributaacuteria deve ser buscado o justo equiliacutebrio pregado pelo Estado de Direito onde o cidadatildeo deve ter a sua dignishydade respeitada sem contudo afastar-se a necessidade do Estado arrecadar tributos de forma cogente e imperativa bem como de serem permitidas conshydiccedilotildees de atuaccedilatildeo que resultem no combate agrave sonegaccedilatildeo fiscal

9 Responsabilidade da autoridade administrativa que quebrar o sigilo banshycaacuterio de forma inconsistente e indevida

Eacute inerente ao regime democraacutetico que a autoridade administrativa puacuteblishyca estaacute obrigada a exercer as suas atribuiccedilotildees com rigorosa obediecircncia aos princiacutepios da legalidade moralidade publicidade impessoalidade e eficiecircncia entre outros

A Carta Magna consagra expressamente no art 37 a obediecircncia do agente puacuteblico a esse tipo de comportamento

A autoridade administrativia que quebrar de modo inconsistente e indevido o sigilo bancaacuterio do cidadatildeo pratica ato com capacidade de provocar os seguintes efeitos a) de invadir o direito agrave privacidade e agrave intimidade de algueacutem b) de provocar-lhe danos morais e materiais dependendo da repershycussatildeo provocada pelo seu atuar

Constatada a efetivaccedilatildeo real de danos morais e materiais a responsabishylidade do Estado pode ser acionada conforme permite o art 37 sect 6ordm da Consshytituiccedilatildeo Federal Solidificada a culpa ou dolo do agente puacuteblico e consagrada a materializaccedilatildeo do iliacutecito praticado com o consequumlente ressarcimento patrimonial o Estado deveraacute usando o direito de regresso investir contra o agente que agiu culposa ou dolosamente

Natildeo resume-se apenas ao campo da responsabilidade civil a atuaccedilatildeo da autoridade quando ilegalmente quebra o sigilo bancaacuterio de qualquer cidadatildeo

ENSAIOS JURiacuteDICOS 259

o art 10 da Lei Complementar n 105 de 10 de janeiro de 2001 determishyna que A quebra de sigilo fora das hipoacuteteses autorizadas nesta lei compleshymentar constitui crime e sujeita os responsaacuteveis agrave pena de reclusatildeo de um a quatro anos e multa aplicando-se no que couber o Coacutedigo Penal sem prejuiacuteshyzo de outras sanccedilotildees cabiacuteveis A seguir no seu paraacutegrafo uacutenico explicita que Incorre nas mesmas penas quem omitir retardar injustificadamente ou presshytar falsamente as informaccedilotildees requeridas nos termos desta lei complementar

O art 11 da mesma lei complementar expressa que O servidor puacuteblico que utilizar ou viabilizar a utilizaccedilatildeo de qualquer informaccedilatildeo obtida em decorshyrecircncia da quebra de sigilo de que trata esta lei complementar responde pessoshyal e diretamente pelos danos decorrentes sem prejuiacutezo da responsabilidade objetiva da entidade puacuteblica quando comprovado que o servidor agiu de acorshydo com a orientaccedilatildeo oficial

10 O sigilo bancaacuterio e o tratamento que lhe eacute dado por oacutergatildeos internacioshynais como a OCDE e outros

Rui Celso Reali Fragoso Presidente do Instituto dos Advogados de Satildeo Paulo em artigo intitulado O Sigilo Bancaacuterio veiculado pela Internet (http Ii wwwjuscombr) registra que atualmente temos trecircs sistemas legais no munshydo cuidando do sigilo bancaacuterio O primeiro eacute o anglo-saxatildeo em que o sigilo natildeo encontra amparo legal o segundo eacute o dos paiacuteses da Europa continental - eu o contemplo em vaacuterios diplomas legais o terceiro eacute o da Suiacuteccedila e do Liacutebano que o reforccedilam

Analisando esses trecircs sistemas o autor citado observa

Haacute aparente contradiccedilatildeo no sistema inglecircs e norte-americano pois se de um lado nestes paiacuteses se eleva a garantia das liberdades individuais de outro se despreza o sigilo bancaacuterio Eacute que se ocorre conshyflito entre a apuraccedilatildeo de fatos (fator social) e a privacidade das pessoas (fator individual) prevalece a primeira Mais ainda o relacionamento de clientes e bancos longe de estabelececirc-lo serve como fonte de informashyccedilatildeo em favor de terceiros a indiscriccedilatildeo injustificada poreacutem eacute objeto de sanccedilatildeo E na Inglaterra os poderes puacuteblicos natildeo intervecircm no funcionashymento dos estabelecimentos privados de creacutedito o que debilita a invesshytigaccedilatildeo

Nos paiacuteses da Europa continental a legislaccedilatildeo contempla o sigilo bancaacuterio como consequumlecircncia do profissional e comporta derrogaccedilotildees na esfera penal e em alguns casos na civil mas comina sanccedilotildees crimishynais no caso de violaccedilatildeo ao sigilo (Coacutedigo Penal francecircs artigo 378 Coacuteshydigo Penal italiano art 622)

260 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

A sistemaacutetica fortalecida eacute aquela utilizada na Suiacuteccedila decorrente da crise ocorrida em 1931 com o fechamento do Banco de Genebra que ensejou a ediccedilatildeo de lei estabelecendo severas puniccedilotildees de natureza civil e criminal Tanto a legislaccedilatildeo suiacuteccedila como a libanesa esta surgida em 1956 permitem derrogaccedilotildees em certas hipoacuteteses A existecircncia das conshytas numeradas comprova a importacircncia do sigilo nestes paiacuteses

Eacute certo natildeo ser absoluto o segredo nem sua quebra em determishynadas situaccedilotildees significa abuso de poder Aliaacutes nenhum direito eacute absoluto

A doutrina tem ultimamente tomado conhecimento sobre as transforshymaccedilotildees que tem passado em vaacuterios ordenamentos juriacutedicos a questatildeo do sigilo bancaacuterio

Zenobio Simotildees de Melo advogado no Paranaacute em artigo sob o tiacutetulo Quebra do Sigilo Bancaacuterio (Internet httpjuscombr) informa que o jornal O Estado de Satildeo Paulo de 21 de junho de 2000 publicou a notiacutecia seguinte

Numa das mais importantes decisotildees adotadas durante o Conseshylho Europeu que marca o fim da presidecircncia portuguesa da Uniatildeo Euroshypeacuteia (UE) seus 15 paiacuteses aprovaram ontem o pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal No ponto mais polecircmico o pacote deveraacute acabar com o sigilo bancaacuterio ateacute 2010 foi uma negociaccedilatildeo de 12 anos Aacuteustria e Luxemburgo natildeo aceitavam o princiacutepio de acabar com o sigilo bancaacuterio A justificativa austriacuteaca eacute que este eacute um princiacutepio que faz parte da Consshytituiccedilatildeo do paiacutes haacute 200 anos Para aceitar o acordo o paiacutes exigiu a manushytenccedilatildeo do sigilo nos bancos austriacuteacos para quem resida no paiacutes

Registro a iacutentegra da notiacutecia

Pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal eacute aprovado por membros da UE Decisatildeo prevecirc quebra do sigilo bancaacuterio nos paiacuteses do bloco econocircmico

Jair Rattner

Especial para o Estado

Santa Maria da Feira Portugal- Numa das mais importantes decishysotildees adotadas durante o Conselho Europeu que marca o fim da presishydecircncia portuguesa da Uniatildeo Europeacuteia (UE) seus 15 paiacuteses aprovaram ontem o pacote de harmonizaccedilatildeo fiscal No ponto mais polecircmico o pashycote deveraacute acabar com o sigilo bancaacuterio ateacute 2010

Foi uma negociaccedilatildeo de 12 anos Agora temos um documento que vai estabelecer os princiacutepios e as orientaccedilotildees para as futuras diretivas nessa aacuterea afirmou o Primeiro-Ministro Portuguecircs Antonio Guterres que ocupa a presidecircncia rotativa da UE (no fim do mecircs ela seraacute transferida para a Franccedila)

ENSAIOS JURiacuteDICOS 261

o acordo abrange trecircs aacutereas um coacutedigo de conduta que prevecirc o desmantelamento dos 66 paraiacutesos fiscais existentes ou dependentes da UE a tributaccedilatildeo de royalties e o pagamento de impostos sobre rendishymentos das poupanccedilas de cidadatildeos europeus residentes em outros paiacuteshyses dentre os 15 que fazem parte do bloco econocircmico europeu

O grande problema eram as poupanccedilas Aacuteustria e Luxemburgo natildeo aceitavam o princiacutepio de acabar com o sigilo bancaacuterio A justificativa austriacuteaca eacute que este eacute um princiacutepio que faz parte da Constituiccedilatildeo do paiacutes haacute 200 anos Para aceitar o acordo o paiacutes exigiu a manutenccedilatildeo do sigilo nos bancos austriacuteacos para quem resida no paiacutes Essa questatildeo natildeo eacute importante soacute para a Europa porque abre caminho para a criaccedilatildeo de mecanismos de transparecircncia global no mundo financeiro que satildeo esshysenciais para a globalizaccedilatildeo da economia avaliou Guterres

O prazo para a introduccedilatildeo das mudanccedilas vai ateacute o fim de 2010 Ateacute o fim deste ano as negociaccedilotildees vatildeo ser sobre a definiccedilatildeo do conteuacutedo das diretivas (as normas da UE)

Em 2002 a UE discutiraacute com outros paiacuteses esses conteuacutedos para fazer acordos que deveratildeo ser aprovados ateacute o fim do ano por unanimishydade

A partir de 2003 seraacute iniciado um periacuteodo de sete anos de transishyccedilatildeo para a troca de informaccedilotildees sobre os investimentos de cidadatildeos de outros paiacuteses europeus Nesse periacuteodo alguns paiacuteses poderatildeo optar por cobrar impostos de 20 a 25 sobre os rendimentos dos investimentos de residentes no exterior

No capiacutetulo onde foi analisado o sigilo bancaacuterio no Direito Comparado haacute registros tambeacutem a respeito do tratamento que oacutergatildeos internacionais como o OCDEll e outros vecircm dando ao sigilo bancaacuterio conforme estudo que foi apresentado pelo autor ali citado

II OCDE (Organizaccedilatildeo de Cooperaccedilatildeo e Desenvolvimento Econocircmico) criado em 1961 para substituir a OECE (Comitecirc Fiscal da Organizaccedilatildeo Europeacuteia de Cooperaccedilatildeo Econocircmica) Um dos documentos mais importantes da OCDE eacute o resultante da sua Convenccedilatildeo-Modelo relashytiva a impostos sobre a renda e o capital Essa Convenccedilatildeo estaacute sistematizada em sete capiacutetulos assim explicitados por Alberto Xavier em sua obra Direito Tributaacuterio Internacioshynal do Brasil A Convenccedilatildeo-Modelo da OCDE (tal como a das Naccedilocirces Unidas) encontra-se sistematizada em sete capiacutetulos Os capiacutetulos I e I regulam os requisitos para a aplicaccedilatildeo do tratado O capiacutetulo [JI - de longe o mais importante - conteacutem as regras de distribuiccedilatildeo de competecircncia no que concerne aos impostos sobre o rendimento classificado este por tipos ou classes agrave semelhanccedila do que sucede nos sistemas de tributaccedilatildeo cedular O capiacutetulo IV ocupa-se das regras de distribuiccedilatildeo de competecircncia no que respeita aos impostos sobre o capital O capiacutetulo V determina as consequumlecircncias das regras dos capiacutetulos 111 e IV facultanshydo aos Estados a escolha entre os meacutetodos da isenccedilatildeo e da imputaccedilatildeo O capiacutetulo VI conteacutem disposiccedilotildees adicionais sobre natildeo-discriminaccedilatildeo procedimento amigaacutevel troca de informaccedilotildees e privileacutegios de funcionaacuterios diplomaacuteticos e consulares e regras sobre extenshysatildeo do tratado a partes do territoacuterio Enfim o capiacutetulo VII conteacutem disposiccedilotildees finais sobre entrada em vigor e cessaccedilatildeo do acordo

262 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

Heleno Torres em sua recente obra Direito Tributaacuterio Internacional -Planejamento Tributaacuterio e Operaccedilotildees Transnacionais RT p 147 analisando o posicionamento da OCDE referente agrave poliacutetica de determinados paiacuteses que adoshytam tributaccedilatildeo favorecida e os efeitos dos regimes fiscais prejudiciais registra que

A OCDE resolveu entrar na luta para minorar as praacuteticas fiscalshymente danosas insistindo sobre a necessidade de aumentar as trocas de informaccedilotildees entre os Estados aleacutem de redigir uma lista de paiacuteses com tributaccedilatildeo favorecida e fazer algumas recomendaccedilotildees em acircmbito nacional e convencional a partir do seu importante relatoacuterio Harmful tax competition na emerging global issue

Mesmo reconhecendo os aspectos positivos do ambiente global vigente no qual os sistemas tributaacuterios operam os paiacuteses-membros da OCDE concluiacuteram que eles precisavam agir para restringir a competiccedilatildeo tributaacuteria danosa coletivamente e individualmente opondo-se agrave expanshysatildeo de regimes de impostos preferenciais danosos particularmente nos setores financeiros e atividades de serviccedilo que podem causar distorccedilotildees no comeacutercio e desniacuteveis nos padrotildees de investimento sendo uma ameashyccedila para os sistemas tributaacuterios domeacutesticos e para a estrutura global de tributaccedilatildeo internacional

Mais adiante pp 152153 Heleno Torres afirma que

Entre as recomendaccedilotildees definidas nesse relatoacuterio com aplicashyccedilatildeo dirigida aos paiacuteses-membros da instituiccedilatildeo as mais importantes satildeo as seguintes

bull para contrastar a competiccedilatildeo fiscal prejudicial os paiacuteses devem revisar as suas leis regulamentos e praacuteticas sobre sigilo bancaacuterio para remover empecilhos de acesso a tais informaccedilotildees por autoridades fiscais

bull intensificar o uso de trocas de informaccedilotildees principalmente soshybre as transaccedilotildees com paiacuteses de tributaccedilatildeo favorecida

A conclusatildeo que pode ser firmada apoacutes anaacutelise dos pronunciamentos internacionais acima explicitados eacute a construccedilatildeo de uma corrente que defenshyde uma maior abertura para a quebra do sigilo bancaacuterio quando for necessaacuteshyrio para apurar iliacutecitos tributaacuterios

Essa portanto eacute a resposta que apresento para a indagaccedilatildeo Qual o tratamento proposto por oacutergatildeos internacionais como o OCDE e outros com relaccedilatildeo ao sigilo bancaacuterio

ENSAIOS JURiacuteDICOS 263

11 Compatibilizaccedilatildeo do combate agrave criminalidade internacional com o resshypeito agrave seguranccedila juriacutedica a fim de evitar a fuga de investimentos do Paiacutes

Haacute de se reconhecer natildeo ser faacutecil desenvolver-se um sistema juriacutedico que contenha regras que facilitem o combate agrave criminalidade internacional e ao mesmo tempo prestigie os direitos fundamentais do cidadatildeo especialmenshyte a sua seguranccedila juriacutedica

As convenccedilotildees internacionais conforme demonstrado estatildeo preocupashydas com esses aspectos sem deixar de lado os fenocircmenos causados pela globalizaccedilatildeo

Natildeo deve ser esquecido que o tema envolve aspectos diversos a comeshyccedilar pelos determinantes da soberania dos Estados das forccedilas em expansatildeo das organizaccedilotildees internacionais e da pregaccedilatildeo para que os direitos fundamenshytaIacutes do cidadatildeo sejam respeitados com maior Iacutentensidade

A soluccedilatildeo a meu pensar pode ser encontrada no fortalecimento do Direito Comunitaacuterio Os Estados por via de organismos internacionais firmashyriam tratados para a adoccedilatildeo de um Coacutedigo Processual Penal Internacional com efeitos vinculantes por parte das naccedilotildees onde seriam adotadas regras investigatoacuterias e apuratoacuterias dos iliacutecitos internacionais alargando os conceitos de indiacutecios e presunccedilotildees sem deixar contudo de prestigiar a afetividade dos direitos e garantias fundamentais do cidadatildeo

Todas as naccedilotildees no iniacutecio deste seacuteculo envidam esforccedilos para diminuir a crise da seguranccedila juriacutedica Satildeo vaacuterios os fatores determinantes todos tendo como causa comum o crescimento da delinquumlecircncia em decorrecircncia de poliacutetishycas econocircmicas e sociais adotadas por determinados governos que contrishybuem para aumentar o percentual de pessoas pobres

A preocupaccedilatildeo atual para o combate ao crime internacional eacute alcanccedilar niacutevel de uniformizaccedilatildeo dos sistemas adotados para a quebra do sigilo bancaacuteshyrio De iniacutecio deve ser defendida a postura de que nenhuma lesatildeo ou ameaccedila a direito deve ser excluiacuteda da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio Nessa perspectishyva ganha suma importacircncia a criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional em virshytude de pela sua atuaccedilatildeo natildeo perdurar a diversidade de sistemas legais a respeito do assunto a saber a) O anglo-saxatildeo onde o sigilo natildeo encontra amparo legal b) o dos paiacuteses da Europa continental que o contempla em vaacuterios diplomas escritos e c) o da Suiacuteccedila e do Liacutebano que o reforccedilam l2bull

A criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional envolve uma reconceiacutetuaccedilatildeo de soberania

Sobre o tema Celso D de Albuquerque Mello em Direito Internacional da Integraccedilatildeo Ed Renovar p 13 faz a seguinte observaccedilatildeo

12 Conforme anota Rui Celso Reali Fragoso no artigo O Sigilo Bancaacuterio publicado no site httpvvwwjuscombr

264 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTiCcedilA

Poder-se-ia fazer um pequeno reparo a Chaumont que a indeshypendecircncia nacional eacute um conceito juridicamente indeterminado e que ela pode ter diferentes graus Tanto que podemos escrever soberania versus cooperaccedilatildeo internacional apesar de reconhecermos que esta posiccedilatildeo pode ser considerada como radical vez que natildeo haacute uma total incompatibilidade entre as duas Entretanto natildeo se pode deixar de consshytatar que de certo modo a cooperaccedilatildeo internacional se encontra conshysagrada na Carta da ONU no arl 1 ordm que trata dos Propoacutesitos das Naccedilotildees Unidas e nos Princiacutepios estabelecidos na Carta da OEA (Capiacutetulo 11) O mesmo ocorre na resoluccedilatildeo da Assembleacuteia Geral da ONU de 1970 que aprova a Declaraccedilatildeo Relativa aos Princiacutepios do Direito Internacional Reshylativas agraves Relaccedilotildees Amigaacuteveis e agrave Cooperaccedilatildeo entre os Estados conforme a Carta das Naccedilotildees Unidas bem como na Carta de Direitos e Deveres Econocircmicos aprovada pela mesma Assembleacuteia Geral em 1974

O crescimento do crime internacional em decorrecircncia dos fenocircmenos globalizantes determina o surgimento de um dever juriacutedico dos Estados firmashyrem pactos de cooperaccedilatildeo entre si para que enfrentem as organizaccedilotildees voltashydas para a criminalidade Esse dever juriacutedico globalizado tem suas raiacutezes no moral intemacional que conforme assinala Celso Albuquerque Mello na obra citada p 13 sempre consagrou o princiacutepio da solidariedade ou ainda do auxiacutelio muacutetuo

Eacute o mais importante desafio neste iniacutecio de seacuteculo fazer com que surja uma legislaccedilatildeo internacional que compatibilize o combate agrave criminalidade inshyternacional sem violar a seguranccedila juriacutedica com finalidade exclusiva de evitar a fuga de investimenos do Paiacutes

Tenha-se contudo em consideraccedilatildeo que a globalizaccedilatildeo do crime emshybora seja uma grande ameaccedila aos valores tradicionais que sustentam a cidashydania especialmente a seguranccedila juriacutedica natildeo deve prejudicar o desenvolvishymento econocircmico de qualquer naccedilatildeo

Natildeo faccedilo coro ao assinalado por Eric Hobsbawm em sua obra Era dos Extremos O Breve Seacuteculo XX 1914-1991 1995 p 24 Companhia das Letras S Paulo traduccedilatildeo de Marcos Santarrita no sentido de que Talvez a caracteriacutesshytica mais impressionante do fim do seacuteculo XX seja a tensatildeo entre esse processo de globalizaccedilatildeo cada vez mais acelerado e a incapacidade conjunta das instishytuiccedilotildees puacuteblicas e do comportamento coletivo dos seres humanos de se acoshymodarem a ele

Penso que natildeo haacute essa acomodaccedilatildeo e que as instituiccedilotildees puacuteblicas espeshycialmente as submetidas ao controle da ciecircncia juriacutedica natildeo estatildeo incapacitashydas de encontrar caminhos que solucionem o problema existente

ENSAIOS JURiacuteDICOS 265

Eacute por demais positivo entre outros acontecimentos o fato da conscienshytizaccedilatildeo de que haacute de ser encontrada uma forma de combate agrave criminalidade internacional que natildeo afaste a garantia da seguranccedila juriacutedica Esta eacute uma neshycessidade para impor paz agrave naccedilatildeo e consequumlentemente criar ambiente para que novos investimentos necessaacuterios ao desenvolvimento do seu processo econocircmico aconteccedilam sem se falar na manutenccedilatildeo dos jaacute existentes

O Parlamento Europeu aprovou ultimamente uma resoluccedilatildeo sobre a criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional sob a consideraccedilatildeo de que eacute necessaacuteshyrio criaacute-lo de forma permanente para complementar os sistemas judiciais nashycionais e pocircr fim agrave impunidade de que gozam os responsaacuteveis por genociacutedio crimes contra a humanidade e crimes de guerra

A abertura para essa posiccedilatildeo denota a formaccedilatildeo de uma consciecircncia internacional para combater a criminalidade internacional em todos os niacuteveis contribuindo para fortalecer a seguranccedila juriacutedica interna de cada paiacutes

O documento representativo dessa resoluccedilatildeo eacute do teor seguinte

Parlamento Europeo

Resolucioacuten sobre el Tribunal Penal Internacional

EI Parlamento Europeo

Vistas sus anteriores resoluciones sobre un Tribunal Penal Interna-cional

A Considerando que es necesario crear un Tribunal Penallnternashycional permanente que complemente los sistemasjudiciales nacionales y ponga fin a la impunidad de que gozan los responsables de genocidio crimenes contra la humanidad y criacutemenes de guerra

B Considerando que la Comisioacuten de Derechos Humanos de las Naciones Unidas estaacute respaldando decididamente la creacioacuten de ese Trishybunal

C Considerando que la fase preparatoria de la creacioacuten dei Tribushynal Penal Internacional finalizoacute con la uacuteltima sesioacuten dei Comiteacute Preparatorio de las Naciones Unidas que tuvo lugar dei 16 de marzo al3 de abril de 1998

D Felicitaacutendose por la creciente participacioacuten de Estados en el proceso de negociaciones y esperando que un nuacutemero auacuten mayor de Esshytados procedentes de todas las regiones se encuentre plenamente represhysentado en la Conferencia Diplomaacutetica de Roma

E Considerando que dei 15 de junio al17 de julio de 1998 se celebra en Roma la Conferencia Diplomaacutetica de Plenipotenciarios para la constitucioacuten de un Tribunal Penal Internacional

266 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

F Considerando que los Estados miembros y la delegacioacuten de la Comisioacuten Europea que participan en la Conferencia Diplomaacutetica de Roma pueden desempenar un papel crucial a la hora de garantizar el eacutexito de la conclusioacuten de esta Conferencia Diplomaacutetica y acogiendo positivamente la mayor convergenciacutea de las posturas de los Estados miembros de la UE

G Congratulaacutendose por la oferta dei Gobierno de los Paiacuteses Bajos de servir de sede dei Tribunal Penal Internacional permanente

I Insta a la Conferencia Diplomaacutetica de Roma a aprovechar la oportunidad histoacuterica de concluir un texto de Estatuto para un Tribunal Penal Internacional independiente justo y eficaz

2 Insta a los representantes de los Estados miembros dei Consejo y de la Comisioacuten a garantizar activamente el ecircxito de los resultados a sashyber un auteacutentico Tribunal Penal Internacional en lugar de limitarse a un acuerdo de compromiso sobre principios esenciales en sus esfuerzos por conciliar las posturas de Estados reticentes

3 Destaca que para constituir un complemento eficaz de los sisteshymas judiciacuteales nacionales el Estatuto dei Tribunal Penal Internacional permanente objeto de la Conferencia de Roma deberaacute establecer

a un Fiscal independiente con competencias para investigare insshytruir sumarios por propia iniciativa en situaciones en las que se hayan cometido los delitos sometidos a lajurisdiccioacuten dei Tribunal

b Ia jurisdiccioacuten inherente y universal dei Tribunal en materia de genocidio criacutemenes contra la humanidad criacutemenes de guerra y agresioacuten sin que se requiera ninguacuten consentimiento dei Estado

c una buena relacioacuten de trabajo con los Tribunales lnternacionales ya establecidos en La Haya

d una relacioacuten constructiva con las Naciones Unidas yen partishycular con el Consejo de Seguridad basada en el pleno reconocimiento de sus respectivas funciones y competencias

e Ia obligacioacuten de los Estados firmantes de acatar y hacer cumplir sin demora las oacuterdenes y decisiones dei Tribunal

f los mayores niveles de respeto de los derechos de los acusados y de los sospechosos y de proteccioacuten de los intereses de las viacutectimas y de los testigos

g Ia garantiacutea de una financiacioacuten a largo plazo necesaria para asegurar la autonomiacutea e independencia dei Tribunal frente a cualquier presioacuten exterior

4 Destaca ademaacutes que la jurisdiccioacuten deI Tribunal sobre los delishytos de genociacutedio los criacutemenes contra la humanidad y los criacutemenes de

ENSAIOS JURiacuteDICOS 267

guerra deben considerarse con la misma calificacioacuten penal con indepenshydencia de que se hayan cometido en conflictos armados internacionales o en conflictos internos

5 Insta ai Consejo y a los Estados miembros a garantizar la universalidad y la transparencia de las negociaciones y la participacioacuten continuada de la comunidadjuriacutedica y la sociedad civil internacionales

6 Encarga a su Presidente que transmita la presente resolucioacuten ai Consejo a la Comisioacuten a los Gobiernos de los Estados miembros ai Secreshytario General de las Naciones Unidas ai Presidente de la Asamblea Geneshyral de las Naciones Unidas y ai Presidente de la Conferencia Diplomaacutetica de las Naciones Unidas para la constitucioacuten de un Tribunal Penal Internashycional

A resoluccedilatildeo supracitada demonstra que cresce a conscientizaccedilatildeo da necessidade de ser criado um Tribunal Penal Internacional com forccedila cogente obrigatoacuteria de suas decisotildees no acircmbito interno dos paiacuteses que participarem do pacto de sua constituiccedilatildeo

A doutrina internacional revela que a comunidade internacional somenshyte agora vem se preocupando em criar uma estructura internacional para determinar las responsabilidades individuales emergentes de violacioacuten de ciertos derechos baacutesicos dei ser humano Los mecanismos de responsabilidad estatal creados desde los 60 se dirigen a la mayor protecciotilden dei ser humano y la erradicacioacuten de las praacutecticas de volacioacuten sistemaacutetica de los derechos humanos ar via de la condena ai Estado que ordena o que tolera los abusos por lo cual se estructuraron entorno ai Estado conmo sujeto responsable Como haacute seflalado la Corte Internacional de Derechos Humanos el procedimiento ante ella no es un procedimiento penal lo que se busca determinar es el nivel de cumprimiento por parte de un Estado de sus obligaciones de derecho internacional Sin desconocer la importancia de determinar la responsabilidad dei Estado para que eacuteste tenga un incentivo para erradicar esas praacutectica de sus frotneras es pertinente detacar que las violaciones maacutes grave son en uacuteltima instancia coshymetidas por individuos (Francisco Cox Encarregado dei TPI HOH em artigo intitulado EI IlOH ante la Craciotilden de um Tribunal Penal Internacional no site httpwwwiidhedcrcpitpintrohtml)

A criaccedilatildeo de um Tribunal Penal Internacional atuaria permanentemente e teria competecircncia subsidiaacuteria em relaccedilatildeo agrave outorgada aos Tribunais Nacioshynais limitando-se a atuar apenas nos crimes internacionais previamente defishynidos como sendo do interesse da comunidade global

Merece registro no acircmbito do assunto tratado que na Conferecircncia Reshygional sobre o Tribunal Penal Internacional realizada em 18 e 19 de fevereiro de 1998 na cidade de Guatemala Guatemala um dos temas tratados foi o relativo

268 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICcedilA

agrave harmonizaccedilatildeo das incriminaccedilotildees quando os seguintes aspectos foram disshycutidos Branqueamento corrupccedilatildeo fraude fiscal participaccedilatildeo em associashyccedilotildees criminosas um olhar agrave luz dos direitos nacionais e do direito internacioshynal Perspectivas Quais os comportamentos a incriminar Criar uma nova incriminaccedilatildeo da fraude fiscal Uma tentativa de harmonizaccedilatildeo o corpus jurls contendo disposiccedilotildees penais para proteccedilatildeo dos interesses financeiros da Uniatildeo Europeacuteia As negociaccedilotildees no seio do Conselho da Europa e da OCDE referenshytes agrave luta contra a corrupccedilatildeo etc O referido painel foi presidido por Benoit Dejemeppe procurador do Rei em Bruxelas e contou com a presenccedila de Tereshyza Beleza professora de Direito Penal na Faculdade de Direito de Lisboa como moderadora

Haacute como visto um largo campo de anaacutelise para desenvolver com possishybilidade do surgimento de sugestotildees que levem a ciecircncia juriacutedica a alcanccedilar com a atuaccedilatildeo estatal uma competecircncia internacional que possa combater o crime internacional e ao mesmo tempo proporcione seguranccedila juriacutedica na ordem interna ganhando assim o sistema juriacutedico confianccedila dos investidoshyres

Em conclusatildeo a forma de compatibilizar o combate agrave criminalidade internacional sem violar a seguranccedila juriacutedica necessaacuteria a evitar a fuga de inshyvestimentos do paiacutes estaacute na criaccedilatildeo do Tribunal Penal Internacional com comshypetecircncia definida para processar e julgar delitos globalizantes e cujas decisotildees tenham forccedila imperativa no acircmbito interno das naccedilotildees participantes do pacto para o seu nascimento

Page 19: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro
Page 20: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro
Page 21: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro
Page 22: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro
Page 23: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro
Page 24: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro
Page 25: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro
Page 26: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro
Page 27: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro
Page 28: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro
Page 29: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro
Page 30: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro
Page 31: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro
Page 32: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro
Page 33: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro
Page 34: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro
Page 35: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro
Page 36: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro
Page 37: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro
Page 38: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro
Page 39: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro
Page 40: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro
Page 41: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro
Page 42: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro
Page 43: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro
Page 44: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro
Page 45: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro
Page 46: o Sigilo Bancário no Ordenamento Jurídico Brasileiro