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o Planeiamento em Transportes* JOSEF BARAT** Parte I Aspectos Teóricos do Planejamento em Transportes 1 Introdução - a necessidade do planejamento econômico. 2 O se- tor de transportes e o sistema econômico - as relações básicas. 3 Objetivo de um plano de transportes. 4 Planejamento ao nível inter- setorial - as relações do setor de transportes com os demais setores da economia. 5 Planejamento ao nível setorial - relações entre as diferentes modalidades de transportes. 6 Planejamento ao nível mo- daI - a análise do emprêgo de recursos nas diferentes alternativas de investimento de cada modalidade. 7 A expansão do sistema de trans- portes no Brasil. 8 O sistema de transportes no Brasil e suas deficiências. * Trabalho preparado para palestra proferida em São Paulo, no I Simpósio de Administração de Transportes na EAESP, Escola de Administração de Emprêsas de São Paulo, da Fundação Getúlio Vargas. Meus agradecimentos à Economista Magali Martins de Paola é à contadora Edméa Aguiar do Valle, do Setor de Transportes do IPEA, pela colaboração valiosa que prestaram à realização dêste trabalho. ** Coordenador do Setor de Transportes do Instituto de Planejamento Econômico e Social - IPEA, do Ministério do Planejamento e Coordenação-Geral. R. Adm. públ., Rio de Janeiro, 5 (1): 49-98, jan./ jun. 1971

O Planejamento em Transporte

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Trabalho de Joseff Barat onde é realizada uma análise dos aspectos teóricos do planejamento em transportes e explicitada a relação entre o setor de transportes e o setor econômico.

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  • o Planeiamento em Transportes* JOSEF BARAT**

    Parte I

    Aspectos Tericos do Planejamento em Transportes

    1 Introduo - a necessidade do planejamento econmico. 2 O se-tor de transportes e o sistema econmico - as relaes bsicas. 3 Objetivo de um plano de transportes. 4 Planejamento ao nvel inter-setorial - as relaes do setor de transportes com os demais setores da economia. 5 Planejamento ao nvel setorial - relaes entre as diferentes modalidades de transportes. 6 Planejamento ao nvel mo-daI - a anlise do emprgo de recursos nas diferentes alternativas de investimento de cada modalidade. 7 A expanso do sistema de trans-portes no Brasil. 8 O sistema de transportes no Brasil e suas deficincias.

    * Trabalho preparado para palestra proferida em So Paulo, no I Simpsio de Administrao de Transportes na EAESP, Escola de Administrao de Emprsas de So Paulo, da Fundao Getlio Vargas. Meus agradecimentos Economista Magali Martins de Paola contadora Edma Aguiar do Valle, do Setor de Transportes do IPEA, pela colaborao valiosa que prestaram realizao dste trabalho.

    ** Coordenador do Setor de Transportes do Instituto de Planejamento Econmico e Social - IPEA, do Ministrio do Planejamento e Coordenao-Geral.

    R. Adm. pbl., Rio de Janeiro, 5 (1): 49-98, jan./ jun. 1971

  • 1 Introduo - a necessidade do planejamento econmico

    A histria do sculo XX tem demonstrado que as economias subdesenvolvi-das ampliam bastante suas perspectivas de viabilidade a longo prazo no processo de desenvolvimento quando conseguem: a) traar objetivos defini-dos e coerentes; b) estabelecer prioridades compatveis com aqules objeti-vos; e c) utilizar, da melhor forma, sua dotao de fatres de produo.

    A necessidade de planejamento econmico independe do marco ins-titucional ou do sistema poltico das sociedades, e corresponde aspira-o geral de progresso material e padres mais compatveis de bem-estar social.

    As experincias bem sucedidas de desenvolvimento econmico no nosso sculo evidenciam ainda a necessidade da formao de quadros tcnicos e administrativos de alto nvel, bem como da destinao macia de recursos para as atividades de pesquisa econmica e tecnolgica. Sem a formulao de objetivos definidos e sem uma conscincia clara das possibilidades de aproveitamento das suas aptides, as sociedades em desenvolvimento esta-ro condenadas rgida dependncia tecnolgica exterior.

    No existe, porm, em muitos pases em desenvolvimento, uma preocupa-o amadurecida com a formao de quadros tcnicos e administrativos es-tveis que possam conduzir a bom trmo o processo de planejamento econ-mico durante vrios perodos consecutivos. Sobrevindo qualquer alterao de ordem poltica, por exemplo, as equipes so destitudas ou marginalizadas em suas atividades e especializaes, cedendo lugar a outras que elaboraro no-vos planos. conveniente notar que tais planos, muitas vzes, tm carter acentuadamente promocional, no correspondendo muitos dos seus objetivos demanda real de maior racionalidade econmica.

    Como os planos carecem, geralmente, de um esquema de participao de representantes de empresrios e de empregados ligados aos diferentes setores de produo, torna-se difcil minimizar as decises de implementao de projetos de viabilidade econmica duvidosa, comuns na administrao pblica dos pases em desenvolvimento. A excessiva burocratizao do pla-nejamento dificulta, portanto, maior realismo e racionalidade nas decises relativas a investimentos - notadamente de infra-estrutura - pois, como se sabe, estas no esto ligadas, muitas vzes, a necessidades empresariais e coletivas concretas ou a exigncias do desenvolvimento econmico nacional.

    claro que, apesar da substituio de planos, muitos dos objetivos tra-ados e dos instrumentos de ao permanecem os mesmos, pois a realidade econmica objetiva sobrepe-se aos conflitos momentneos na superestrutu-ra poltica e institucional. Mas isso se faz a um custo elevado para as socie-dades que no podem prescindir da atuao daqueles quadros tcnicos des-tinados a impulsionar seu desenvolvimento.

    O planejamento em transportes, num pas em desenvolvimento, tem que ser visto no somente como parte dsse conjunto de descontinuidades e li-mitaes, mas tambm, como atividade que, por ser extremamente com-plexa, enfrenta outras dificuldades que lhe so peculiares.

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  • 2 O setor de transportes e o sistema econmico - as relaes bsicas

    Sabe-se que no funcionamento do sistema econmico, o setor de transportes desempenha papel fundamental prestando servios absorvidos, prticamente, por tdas as unidades produtivas disseminadas no espao econmico. Su-prindo os outros setores de matrias-primas e insumos em geral, deslocan-do mo-de-obra e distribuindo a produo final, os servios de transportes devem ser planejados numa economia em desenvolvimento para atender, em geral, a uma demanda intermediria. Nestas economias, ao contrrio do que se d com as industrializadas, o uso dos servios de transportes apresenta maior homogeneidade, uma vez que se assemelha mais a insumos industriais, devido densidade ainda fraca de automveis privados e da insignificante utilizao de transportes para fins sociais, militares, etc.! Como os custos do servio de transporte incorporam-se aos custos de produo de outros bens e servios; da tornou-se evidente que a sua operao deve-se fazer da forma mais racional, em conformidade com as caractersticas econmicas de cada modalidade, de maneira que a prestao de servios seja feita ao menor custo econmico e com maior eficincia.

    O investimento em transporte deve, por conseguinte, ser visto numa eco-nomia em desenvolvimento, como a soma de recursos disponveis que desviada da produo corrente para gerar uma produo tipicamente in-termediria. Isso pode significar que os investimentos em transportes sero, muitas vzes, condio necessria, mas no suficiente, para acelerar o de-senvolvimento econmico.

    Com efeito, o nvel e a localizao da demanda dos servios de transpor-tes so influenciados pelo crescimento da produo e do consumo de bens, vale dizer, pela existncia de fluxo de transportes e de trfego, pela especia-lizao da atividade econmica e pelas modificaes estruturais na economia. 2

    necessrio ressalvar, entretanto, que absorvendo elevada propor-o da formao bruta de capital, os investimentos em transportes no s-mente so condicionados pelo desenvolvimento econmico geral, como tambm condicionam novas especializaes, novos esquemas de diviso geogrfica de trabalho, decorrentes da incorporao de novos mercados. No h dvida, portanto, de que em virtude da absoro geral dos servios de transportes no processo produtivo, o setor-transportes atua, muitas vzes, como determinante das atividades dos demais setores, criando, de certa for-ma, a sua prpria demanda.

    Do ponto de vista das implicaes monetrias do investimento em trans-portes, deve-se lembrar que, nas economias em desenvolvimento pode gerar graves reflexos inflacionrios uma excessiva concentrao de recursos nesses investimentos (sem que haja uma demanda real dos mesmos). Assim, o setor

    ! ABOUCHAR, Alan. Public im'estimellt allocaiion alld pricillg policy for trallsporta-tion. Instituto de Pesquisa Econmico-Social Aplicada (IPEA). 2 DAROS, Eduardo Jos. Os transportes no Brasil. Revista Brasileira de Transportes, jan./mar. 1967.

    Planejamento em trans'portes 51

  • pblico pode ser forado a ampliar a disponibilidade interna de meios de pa~ gamento ou mesmo a utilizar parte da sua reserva de divisas para fazer face s presses geradas por sses investimentos.3 Por outro lado, quando se agra-vam as deficincias de operao, os efeitos inflacionrios passam a ser resul-tantes no somente da necessidade de cobertura dos deficits operacionais, como tambm da incorporao dos elevados custos de transporte aos custos dos demais bens e servios produzidos.

    Cabe acrescentar, ainda, que numa economia em desenvolvimento, o in-vestimento em transportes ter maior rentabilidade social na medida em que contribuir efetivamente para a racionalizao do uso do capital escasso e/ou para absoro e, mesmo, transformao qualitativa, do estoque de mo-de-obra.

    Convenientes, a propsito, so algumas consideraes relativas ao aprovei-tamento da dotao de fatres de produo. De modo geral, nos setores da econcmia onde prevalecem tecnologias ditadas pelas mais recentes conquis-tas dos grandes centros industriais, torna-se prticamente impossvel sua adaptao s peculiaridades das economias em desenvolvimento. o caso dos investimentos em alguns setores industriais bsicos, tais como a side-rurgia, a petroqumica, etc. Nesses casos, o nvo investimento, bem como a sua operao, esto mais rigidamente condicionados tecnologia vigente do que dotao de fatres produtivos locais.

    Sendo o setor de transportes, como foi visto, fundamental para a atividade econmica, seus investimentos - e a operao futura dsses investimen-tos - deveriam, em princpio, condicionarem-se a padres tecnolgi-cos e administrativos modernos. Acontece, entretanto, que nas economias em desenvolvimento o setor de transportes, ao contrrio dos setores cita-dos, no considerado, muitas vzes, como produtor de um insumo bsico e, portanto, indispensvel ao funcionamento do sistema econmico. Isso, provvelmente, se deve aos limites impostos pelas suas implicaes bvias de carter social, poltico, de segurana nacional e pela participao macia do setor pblico nos seus investimentos e operao.

    Assim, muitos projetos de transportes, reconhecidamente inviveis do ponto de vista econmico, so freqentemente implementados sob justifica-tivas de carter poltico, estratgico-militar ou social. Alm disso, convm acrescentar que devido grande participao do setor pblico, associam-se, em geral, investimentos em transportes a investimentos sociais a fundo perdido( escolas, hospitais, melhoramentos sanitrios, etc.), para os quais, tradicionalmente, a remunerao dos recursos aplicados , de certa forma, secundria.

    3 ABOUCHAR, Alan. A poltica de transportes e a inflao no Brasil. Instituto de Pes-quisa Econmico-Social Aplicada (IPEA).

    Para Alan Abouchar, existe uma srie de despesas no justificadas que poderiam e deveriam ser eliminadas, uma vez que servem apenas para a perpetuao de v-rios rgos burocrticos governamentais. Segundo o autor, mesmo depois de iden-tificadas tais despesas e feitos os seus cortes, ainda restaria um deficit que teria de ser combatido pelo lado da receita.

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  • Convm notar, finalmente, que as deficincias na operao e nos pro-gramas de expanso da capacidade do sistema de transportes no se devem atuao em si mesma do setor pblico, que tem mostrado excepcional dinamismo e produtividade em outras atividades, mas ao fato de esta atua-o ocorrer atravs de segmentos arcaicos da atividade pblica, ainda liga-dos a padres de comportamento pr-industriais.

    3 Objetivos de um plano de transportes

    A expanso planejada de um sistema de transportes envolve o equaciona-mento de objetivos e instrumentos de ao num contexto de exig~ncias e limitaes extremamente complexo. O planejamento em transportes, em primeiro lugar, no dever nunca ser fim em si mesmo, mas, sim, conjunto de meios para consecuo de objetivos socioeconmicos mais amplos. Isso entretanto, no deve significar que os planos de investimentos de transpor-tes se reduzam apenas a um conjunto de decises passivas, em relao s linhas de ao do planejamento global.

    Com efeito, se de um lado o plano de transportes sensvel s exigncias e objetivos externos que emergem da estratgia global definida para o desen-volvimento econmico, de outro lado, a funo econmica de deslocar bens intermedirios e finais no espao tem objetivos prprios que podem con-dicionar o prprio mbito do planejamento global.

    Neste caso, o desenvolvimento econmico poder exigir do sistema de transprotes objetivos econmicos de vrios tipos, destinados a alcanar v-rios resultados, a saber: a) facilitar a incorporao de recursos naturais su-butilizados ou no utilizados; b) estimular a produo industrial; c) ele-var os nveis de produtividade e facilitar o escoamento da produo agrcola; d) estimular o desenvolvimento e a incorporao de novas regies atravs de projetos integrados. Poder mesmo exigir objetivos poltico-sociais, como por exemplo: maior integrao nacional com eleminao de tenses sociais e polticas resultantes do isolamento de regies; planejamento ou induo de movimentos migratrios; melhoria dos padres de atendimento social em regies estagnadas e outras.4

    O sistema de transportes dever, entretanto, desempenhar sua funo de produtor de servios intermedirios de forma mais adequada sua operao econmica. Sendo assim, os objetivos internos do planejamento em trans-

    4 HUTCHINSON, B. G. Transport planning and regional development. Engineerillg loumal, jan. 1967.

    B. G. Hutchinson adverte que os objetivos de um sistema de transportes consis-tem num conjunto de definies operacionais, que identificariam as necessidades eco-nmicas e sociais de uma coletividade, que o sistema deve procurar satisfazer. Os objetivos associados com os sistemas regionais podem ser classificados em dois gru-pos: os internos, que se referem s caractersticas operacionais do sistema em si, e os externos, que dizem respeito s demandas funcionais impostas para o Sistema de Transportes pelo meio socioeconmico. BARAT, Josef. O investimento em transporte como fator de desenvolvimento regional - Uma anlise da expanso rodoviria no Brasil. Revista Brasileira de Economia, jul.lset. 1969.

    Planejamento em transportes 53

  • portes devero ser: a) minimizar os custos operacionais de prestao de servio; b) minimizar os custos de capital; c) minimizar o tempo de per-curso; d) ampliar a segurana no transporte, etc."

    Fica claro, por conseguinte, que os objetivos gerais da economia estabe-lecem muitas vzes limitaes s solues timas de operao e investi-mento do sistema de transportes. Isso significa que o sistema de transportes estar sujeito a uma srie de limitaes de ordem fsica, social, tcnica, legal, etc. Um plano de transportes dever ressaltar, todavia, seus objetivos internos, de tal forma que a funo desempenhada pelo sistema se sobrepo-nha a decises de carter arbitrrio, que levam em pequena conta os aspectos econmicos da operao e dos investimentos.

    Cabe assinalar, ainda, que a concretizao de objetivos externos ao plano de transportes implica na constituio em parte harmnica do todo a que deve obedecer, qual seja a estratgia global de desenvolvimento. Caso, entretanto, a estratgia no esteja bem definida e coerente nos seus objeti-vos, a justificativa de projetos de transporte com base em metas de desen-volvimento geral ser sempre superficial, com grande margem de riscos ou imprecises para o futuro, certamente servindo de pretexto para objetivos de carter apenas promocional.

    Sintetizando o j exposto, de dizer que, para a indispensvel harmonia do plano de transportes com a estratgia de desenvolvimento, preciso ter pre-sente que as diferentes etapas de desenvolvimento econmico exigem do sis-tema, alm do desempenho de suas funes especficas, uma expanso condicionada pelas prprias caractersticas do desenvolvimento. Assim, os critrios de deciso da poltica de transportes podem apresentar nfase va-rivel nos objetivos internos do seu planejamento, de acrdo com os est-gios de desenvolvimento do pas ou regio.

    Assim, por exemplo, o desenvolvimento de um sistema de comunidades com um raio de comrcio limitado em trno de vias navegveis, condiciona-ram, no Canad, a construo de canais nos rios So Loureno, Rideau e Ottawa entre 1800 e 1850. Com isto, o objetivo implcito na deciso era de prover o transporte de bens a um custo mnimo de capita1.6 Nos Esta-dos Unidos, a ocupao do Meio-Oeste e do Oeste, tambm entre 1850 c 1900, com o desenvolvimento de um comrcio extensivo, gerou investimentos no sistema ferrovirio com o objetivo de fornecer transportes e estimular o desenvolvimento e a unidade nacional tambm a um custo mnimo de capital,

    5 ODIER, Lionel. Les in:erfs economiques des fravaux roufiers. Paris. Ministere des Travaux Publics, 1962. 6 HUTCHINSON, B.G. Ibid.

    B. G. Hutchinson apresenta um quadro relacionando estgios de desenvolvimento do Canad com objetivo~ e critrios de deciso referentes ao sistema de transportes, lembrando que o desenvolvimento envolve mudanas de valres e de atitudes. Sendo

    . assim, o tcnico especialista em transportes pode ajudar estas mudanas, colocando diante da coletividade alternativas significativas no sentido de ampliar suas aspiraes. Seria grave rro para o especialista ou planejador aceitar os objetivos correntes e o sistema de valres e atitudes da coletividade como dados, no desenvolvimento de alternativas e solues de transportes. (O anexo 1 do presente trabalho baseado na idia desenvolvida por sse autor, no sentido de relacionar estgios de desenvolvi-mento com critrios de deciso e objetivos setoriais).

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  • diante das alternativas tecnolgicas existentes. No Brasil, a consolidao dos estgios superiores do processo de industrializao e a expanso acelerada da fronteira agrcola levaram expanso dos investimentos rodovirios para permitir a consolidao do mercado interno.7 f:sses investimentos permitiram, igualmente, ampliar a oferta dos servios de transporte ao menor custo de capital.

    A industrializao acelerada do ps-guerra em muitos pases europeus e nos Estados Unidos colocou como objetivos bsicos do planejamento de transporte a reduo dos custos de operao e manuteno, o aumento da segurana e a reduo dos tempos de percurso, com vistas maior ra-cionalidade do processo produtivo. Em algumas economias tipo welfare, as redues na freqncia dos acidentes para a comunidade e nos tempos de viagem para os usurios de veculos de passageiros so realadas, atual-mente, em detrimento das prprias redues nos custos de operao dos veculos por quilmetro percorrido. Deve-se ressaltar que dado o elevado nvel de renda atingida nessas sociedades, os objetivos do sistema de trans-portes passaram a ser tais que permitem nfase maior nos custos e bene-fcios sociais dos empreendimentos. Atualmente, em pases altamente industrializados, verifica-se, ainda, a substiutio de certas funes de trans-portes por sistemas especializados como oleodutos, condutores de granis slidos, facilidades urbanas expressas, integrao de sistemas receptores de carga, e outros.

    Os exemplos so constataes, a posteriori, de como evolui o sis-tema de transportes em economias hoje industrializadas. No houve, em muitas delas, evidentemente, um planejamento para se alcanarem os obje-tivos e os critrios de deciso citados. Entretanto, nos pases em desenvol-vimento, onde coexistem etapas de desenvolvimento, em diferentes re-gies, o planejamento dos transportes poder orientar-se por critrios de decises mais compatveis com as caractersticas regionais e com as neces-sidades do desenvolvimento nacional.

    Assim, enquanto numa regio o objetivo principal poder ser o de mi-nimizar os custos de operao e tempo de percurso para prover servios de transportes mais eficientemente e em conformidade com as caractersti-cas econmicas de cada modalidade, em outra, a necessidade de estimular o desenvolvimento econmico, promover a unidade nacional ou estabelecer suporte para projetos de colonizao e ocupao racionais do territrio, podero colocar como objetivo central da expanso do sistema de trans-portes o de cooperar com aquelas metas globais a um menor custo de capital, assim maximizando os benefcios indiretos dos investimentos.

    4 Planejamento ao nvel intersetorial - as relaes do setor de transportes com os demais setores da economia

    Numa aproximao simplificada do problema, pode-se dizer que o plane-jamento de transportes envolve, primeiramente, o dimensionamento e a

    7 BARAT, Josef. Ibid.

    Planejamento em tranStportes 55

  • combinao apropriada das capacidades futuras de prestao de servios pelas diferentes modalidades. Implica, em seguida, escalonamento das prioridades de investimentos que devero atender ao crescimento de urna demanda total e de demandas especficas por modalidade projetadas para o perodo de plano. O planejamento dever levar em considerao, ainda, a localizao espacial da demanda futura, segundo as diferentes necessida-des das regies que compem o espao econmico nacional.

    Para a determinao futura do nvel e da localizao da demanda total dos servios de transportes, torna-se necessrio o conhecimento dos incre-mentos na produo e no consumo aos nveis intermedirios e final, das modificaes na estrutura econmica e na especializao de atividades que acompanham o crescimento do sistema econmico. Os principais elementos que afetam os nveis e os ritmos de crescimento na produo e no consumo so: a) o crescimento populacional e as alteraes na participao e com-posio da populao ativa; b) a descoberta e a incorporao de novos re-cursos naturais ao processo produtivo; c) acumulao de capital; e d) in-troduo de novas tcnicas no processo de produo. Por outro lado, as modificaes e diversificaes na estrutura de demanda de bens e de servi-os dependero de: a) crescimento do nvel de renda e alteraes na sua distribuio; b) alteraes na dimenso e na composio etria da popula-o; e c) alteraes nos padres de consumo e evoluo da propenso para consumir.8

    Cabe salientar que as alteraes na estrutura econmica que acompanham o processo de desenvolvimento - e que tm grande importncia para o planejamento de transportes - se refletem, ainda, na intensificao do processo de urbanizao, atravs do deslocamento macio da mo-de-obra da agricultura para as indstrias e servios urbanos, alm da intensificao das taxas de crescimento da produo industrial. Tanto as modificaes nas disponibilidades de fatres de produo quanto na estrutura da demanda e da produo esto a~sociadas aos aumentos sucessivos da produtividade do trabalho e dos nveis de renda real da economia.

    Por conseguinte, a previso do nvel e da localizao futura da deman-da dos servios de transportes feita a partir das projees macroeconmi-cas - e, sempre que possvel, regionalizadas - de populao, emprgo, renda, consumo, prod'Jo fsica para os setores agrcola e industrial, ex-portao e importao, variveis essas que fazem parte da estrutura bsica de um plano de desenvolvimento.

    A importncia do planejamento intersetorial evidencia-se, ainda, nos pro-blemas relativos localizao industrial. O desenvolvimento dos transportes e a localizao industrial devem ser estudados conjuntamente, a fim de que os fluxos provenientes dos centros de matrias-primas, e destinados aos su-primentos dos plos de produo ou o movimento dos fluxos de produtos finais originados nos cmplexos industriais e destinados aos centros consumi-dores, faam-se de forma a mais racional possvel. Por outro lado, ne-

    8 MEIER, Gerald & BALDWIN, Robert. Ecol/omic development - theory, history alld policy. New York, John Wiley & Sons, 1963. Introduo e parte 1.

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  • cessrio o estudo da localizao dos plos industriais para que a determi-nao das capacidades futuras de transportes estejam de acrdo com a lo-calizao potencial dessas indstrias. Com efeito, o padro do desenvolvi-mento industrial e a localizao de novos empreendimentos exercem no tempo uma decisiva influncia sbre o montante e distribuio dos investi-mentos em transportes. Sabe-se, ainda, que em grande nmero de ativi-dades industriais h uma forte correlao entre a eficincia nos servios de transporte e a capacidade de atingir nveis timos de produo.

    Uma seleo deficiente de prioridades em projetos de transporte, ou mes-mo uma m distribuio de recursos entre modalidades, pode, por sua vez, afetar as decises de localiz::t~o de complexos industriais, arcando a eco-nomia nacional, no futuro, com 05 nus daquela seleo.9 Por outro lado, em relao ao setor agrcola, um planejamento racional de investimentos rodovirios pode estimular, por exemplo, a expanso ordenada de fronteira agrcola, incorporando ao processo econmico novas reas de ocupao.

    Cabe ressaltar que, no mbito de um planejamento econmico global, que busca o desenvolvimento cumulativo e autnomo de uma economia onde existem desequilbrios estruturais, o planejamento de transportes de-sempenha funo de grande importncia nas possibilidades de gerao de acrscimos de renda, de melhoria do bem-estar social e mesmo no es-tmulo de novas possibilidades de progresso tecnolgico.

    Como o investimento em transportes se constitui, em geral, na mais im-portante parcela setorial da formao bruta de capital numa economia em desenvolvimento, desempenha papel fundamental numa estratgia global de crescimento econmico. Assim, uma limitao no volume dstes investimen-tos ou uma falta de racionalidade na destinao de recursos podem constituir-se em estrangulamento das possibilidades da expanso da economia, devido, por exemplo, carncia de ligaes entre centros industriais e mercados potenciais, dificuldades de escoamento permanente da produo agrcola, limitaes das exportaes, etc.

    Isso porque a importncia do Setor de Transportes no reside somente no tipo de servio intermedirio que presta grande maioria dos seus usurios, mas, em certa medida, nas conseqncias mais difundidas que dle resultam, tais como a incorporao de novos mercados, estmulos atividade econmi-ca, elevao dos nveis de produtividade, integrao econmica permitida pelos maiores vnculos entre atividades rurais e urbanas, etc.

    Os investimentos, nesse setor, apresen~am ainda a caracterstica marcan-te de envolver perodos longos de maturao. Sendo assim, sses investi-mentos devem orientar-se para alm das necessidades quantitativas pre-sentes e previstas do sistema econmico, .levando em conta, tambm, as possibilidades de modificaes estruturais e as alteraes tecnolgicas futuras.

    Nesse nvel de planejamento situa-se, tamb.m, a preocupao bsica com a aplicao de recursos escassos. Essa aplicao deve ser feita ao mes-mo nvel de eficincia que em outros setores. Uma vez que o planejamento

    9 DAROS, Eduardo Jos. Ibid.

    Planejamento em tr.ansportes 57

  • em transportes est inserido num plano global de desenvolvimento, ne-cessrio saber se a aplicao de recursos em transportes corresponde forma realmente mais produtiva diante de outras alternativas econmicas e mesmo sociais.

    A preocupao com a aplicao de recursos deve ser particularmente im-portante nas economias em desenvolvimento. Com efeito, o setor de trans-portes, nessas economias, pressionado - talvez mais que os demais -por certas consideraes de ordem poltica, social e estratgica, tanto na ampliao da sua capacidade quanto na sua operao, pelo fato de ser largamente operado pelo setor pblico ou dependente de recursos do mes-mo. Todavia, sendo um setor da economia ligado operao de prtica-mente tdas as unidades produtivas, como foi visto, necessrio manter condies mnimas de racionalidade e integrao no seu funcionamento para evitar distores econmicas em cadeia. 10

    Nas economias em desenvolvimento, o recurso escasso geralmente o capital. Entretanto, o preo de capital raramente reflete a sua escassez, quando se trata da construo da infra-estrutura de transportes nessas eco-nomias. Com exceo dos investimentos nas frotas de veculos, os recursos para o financiamento de investimentos de infra-estrutura no so obtidos no mercado de capitais. Provm, de um modo geral, dos oramentos ou dos fundos governamentais criados especificamente para seu financiamento.

    Para a avaliao dos investimentos em transporte, relativamente a outros investimentos, necessrio levar em conta o conceito de custo de oportuni-dade do capital. Com efeito, diante da escassez de recursos para investimen-to, torna-se necessrio. na aplicao de recursos na infra-estrutura de trans-portes, saber se a remunerao resultante do seu emprgo ser pelo menos to alta quanto a remunerao de investimentos alternativos. Da resulta a necessidade de usar uma taxa de desconto que reflita a remunerao do capital que poder ser esperado, num nvel acima das taxas de juros cobra-das pelo govrno para financiar servios pblicos e abaixo das taxas que os empresrios pagariam por emprstimos a longo prazo.u

    10 DARos, Eduardo Jos. Ibid. Eduardo Daros chama ateno para as distores resultantes de uma poltica de

    preos que no traduza os custos reais totais dos vrios servios de transportes. Estas podem ocorrer de trs maneiras: a) entre servios de uma mesma modalidade; b) de modalidades distintas; e c) entre setores de produo. No primeiro caso, as distor-es resultam do fato de certos servios pagarem os deficits de outros, no ha-vendo deficit no conjunto de uma mesma modalidade. A distoro intermodal sur-ge quando o Govrno adota poltica discriminatria entre as vrias modalidades. Normalmente as distores intermodais so acompanhadas de distores entre ser-vios numa mesma modalidade. Finalmente a distoro intersetorial surge quando o setor de transportes, em conjunto, subvencionado pelo resto da economia. Este ltimo tipo de distoro no tem necessriamente de ser acompanhada das demais. 11 ADLER, Hans A. Avaliao econmica de projetos de transporte. Revista Brasi-leira de Transportes, jan. Im ar. 1967.

    Assinala Hans A. Adler que os juros realmente pagos constituem o custo finan-ceiro do capital, o que freqentemente no tem nenhuma relao com o seu custo econmico, isto , o custo de oportunidades do capital. Fundos de investimento para

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  • Por conseguinte, no planejamento de transportes necessrio buscar uma racionalidade na estrutura de preos, tanto para os recursos destinados a financiar investimentos, quanto para os prprios preos dos servios. Os projetos de investimento de transporte devem ser submetidos, portanto, avaliao econmica, como qualquer outro projeto de investimento setorial.

    5 Planejamento ao nvel setorial - relaes entre as diferentes modalidades de transportes

    O sistema de transportes que serve a um espao econmico nacional com-preende diversas modalidades. As capacidades de prestao de servios de-vem ser desenvolvidas tanto no sentido de atendimento das demandas espe-cficas de cada modalidade quanto no sentido de manuteno de um equil-brio entre as capacidades de atendimento individuais e a demanda total.

    Assim, os investimentos planejados para ampliar as capacidades de pres-tao de servios das diferentes modalidades devem ser distribudos de tal forma que a demanda total dos servios de transportes seja atendida mais racionalmente a um custo econmico menor para as atividades produtivas.

    fundamental, nesse estgio de planejamento, que haja coordenao dos investimentos, fazendo-se com que as capacidades das diferentes mo-dalidades sejam desenvolvidas como servios complementares que apresen-tem caractersticas prprias e vantagens comparativas especficas. A rigor, o sistema de transportes em seu conjunto deve ser visto, em cada etapa do processo de planejamento, como uma estrutura integrada, sendo que em trmos de inter-relao de cada modalidade com as demais devem ser leva-das em conta as possibilidades de especializao individual na prestao de servios.

    Cabe ressaltar que o planejamento dos investimentos se faz, em geral, sbre uma rde j existente. Tdas as decises tomadas no passado relati-vamente distribuio de recursos, bem como as distores existentes no atendimento da demanda, so dados para o planejamento que no podem ser corrigidos a curto prazoY

    Alm disso, o planejamento tem que levar em considerao a evoluo da rde de transportes existente, com sua histria especfica e o papel de-sempenhado pelas modalidades, uma por uma, nas diferentes etapas do desenvolvimento econmico do pas. de grande importncia, igualmente,

    transportes supridos pelo Govmo, freqentemente, so postos disposio em va-lres abaixo do custo para o Govmo. Ainda que cubram os custos, stes no re-fletem os custos econmicos se os fundos forem obtidos compulsoriamente pelo Go-vmo, direta ou indiretamente (p. ex. atravs de impostos ou por obrigaes que emprestam ao Govmo abaixo dos ndices de mercado). Os fundos obtidos do ex-terior, por sua vez, implicam freqentemente, taxas de juros substancialmente infe-riores ao custo de oportunidades do capital em pases menos desenvolvidos.

    12 DUNCAN, Peter Douglas. A estrutura de planejamento para o setor transportes. Revista Brasileira de Transportes, jul.lset. 1966.

    Planejamento em transportes 59

  • a anlise das alteraes estruturais verificadas no sistema economlCO e de seus efeitos sbre a demanda de transportes, em geral, e das caractersticas prprias de cada modalidade, em particular.

    conveniente esclarecer que, ao longo do tempo, verificam-se alteraes na composio da demanda dos diferentes servios de transportes. Isso se de-ve, em parte, s alteraes nas demandas especficas, que resultam das pr-prias condies tcnicas de melhor atendimento dos acrscimos de fluxos. Mas, em parte, tambm, essas alteraes so devidas a distores nos custos relativos com que as demandas so atendidas. Torna-se importante, portanto, alm do planejamento adequado dos investimentos, uma programao da poltica tarifria que permita uma operao integrada do sistema de trans-porte dentro da perspectiva de complementaridl.de intermodal mencionada anteriormente. Assim, o usurio, ao pagar a tarifa do servio, deve pagar efetivamente os custos reais de sua prestao. Com isso, tornam-se mais visveis as situaes de complementaridade ou de competio intermodal.

    Dentro do objetivo de coordenao, expresso na situao-limite em que a demanda total deva ser atendida a um custo econmico menor para as ati-vidades produtoras, necessrio que a demanda total seja distribuda pelas diferentes modalidades de transporte da maneira mais racional. Assim, exa-minam-se, nesse nvel de planejamento, os fluxos globais de mercadorias e passageiros, traduzidos em trfego existente e prev-se a distribuio futura, isto , que parcela da demanda ser atendida pelas diferentes modalidades, uma a uma.

    O aperfeioamento do planejamento intermodal e as suas possibilidades de sucesso dependem, bsicamente, da elaborao de um conjunto de estu-dos de natureza tcnico-econmica. fsses estudos permitiro complementar as projees e estimativas provenientes do planejamento global com dados mais concretos relativamente aos fluxos de transportes. possvel afirmar, com efeito, que somerte atravs dsses estudos que os planos de trans-portes podem ser integrados efetivamente aos planos globais. Os estudos tcnico-econmicos de'-ero permitir, primeiramente, uma identificao ge-ral das necessidades de transportes. atravs de estudos detalhados das ten-dncias futuras de deslocamentos dos fluxos de um conjunto de mercado-rias agrcolas, extrativas e industriais escolhidas. De modo geral, um nme-ro pequeno de mercadorias (de 15 a 20) corresponde ao grosso de utili-zao da capacidade das diferentes modalidades de transportes.

    Para cada mercadoria o estudo feito nos seguintes estgios:

    a) condies correntes e localizao mais importantes da produo; b) condies atuais do consumo com anlise da destinao dos fluxos

    atuais por modalidades de transportes para os centros de consumo mais importantes;

    c) sistemas de distribuio, estocagem e armazenamento da mercadoria; d) hiptese das tendncias futuras da produo, do consumo e do deslo-

    camento dos flUXO-i, tendo em vista a distribuio mais racional dos fluxos pelas diferentes modalidades.

    60 R.A.P. 1/71

  • Aps a realizao dos estudos de mercadorias e uma vez determinados os principais fluxos futuros, sses so consolidados para que o conjunto de fluxos seja distribudo preliminarmente pelas diferentes modalidades nas rotas mais importantes.

    Essa distribuio preliminar feita com base no estudo da demanda atual dos servios de transporte, refletida na distribuio do trfego de mercado-rias e passageiros, pelas modalidades. Alm disso, estudado exaustiva-mente o sistema de transporte atual, refletido nas diferentes caractersticas administrativas, fsicas, operacionais e financeiras das diferentes modalidades. So feitos, a seguir, estudos de custo do servio, examinando-se os custos de modalidades alternativas, de forma que fiquem relacionadas as vanta-gens comparativas de cada modalidade. Os estudos de custos complementam, portanto, aqules de mercadorias, permitindo aperfeioar as projees de distribuio do trfego pelas modalidades.

    Cabe ressaltar, finalmente, um outro grupo importante de estudos que se constituem naqueles que: a) relacionam grandes projetos de localizao industrial com as necessidades de transporte futuras e b) calculam as ca-pacidades de transporte futuras necessrias para implementar planos de desenvolvimento regional em regies selecionadas que possuem elevado po-tencial de expanso das atividades agropecurias e extrativas. Note-se que sse grupo de estudos de grande importncia nos pases em desenvolvi-mento com disponibilidades de recursos naturais e mo-de-obra para se-rem incorporadas ao processo de desenvolvimento mediante a seleo de projetos integrados de transportes, colonizao, expanso agropecuria, mi-nerao, etc.

    6 Planejamento ao nvel moda I - a anlise do emprgo de recursos nas diferentes alternativas de investimento de cada modalidade

    tsse o nvel mais concreto do processo de planejamento em transportes. Nle so analisados os emprgos de recursos nos diferentes investimentos de cada modalidade. Para cada uma feita uma anlise exaustiva do equi-lbrio entre a capacidade instalada e o atendimento da demanda, anlise de compatibilidade da mo-de-obra disponvel com a eficincia na prestao dos servios, anlise de poltica de preos e problemas de organizao e administrao.13

    13 DUNCAN, Peter Douglas. Ibid. Peter D. Duncan lembra que a anlise detalhada da operao e do estabeleci-

    mento de preos de serv:;os de transportes, correntemente ofertados por uma moda-lidade particular, fornece o ponto inicial de estudo do aperfeioamento da modali-dade para alcanar o crescimento previsto da demanda de seus servios. Para fer-rovias, portos e navegao, freqentemente se chegar concluso de que os me-lhoramentos substanciais, tanto em servio quanto em capacidade podem ser feitos por mudanas organizacionais e aperfeioamento tcnico envolvendo relativamente poucos novos investimentos. Isto j no acontece com o transporte rodovirio que, em virtude da sua grande flexibilidade, de seu crescimento relativamente recente e da natureza privada de propriedade dos veculos, tende a operar mais competitiva-mente e mais eficientemente do que as modalidades citadas.

    Planejamento em tran3portes 61

  • o planejamento nesse nvel leva em conta, de forma detalhada, as carac-tersticas tecnolgicas e os custos de prestao dos servios na modalidade estudada. feito a partir da comparao dos servios estimados com suas caractersticas tcnicas e seus custos e tambm aps a diviso de trfego para as diferentes modalidades previstas numa situao futura em que pre-valecer maior racionalidade na prestao dos servios.

    Alm da minuciosa anlise dos problemas relativos operao e poltica tarifria, so feitas anlises benefcio-custo dos investimentos ne-cessrios ao aumento da capacidade de atendimento da demanda ou extenso da rde.

    Com base nas anlises benefcio-custo dos projetos, formulam-se progra-mas de investimentos - consolidados em planos-diretores para cada mo-dalidade, de acrdo com as prioridades estabelecidas pelas relaes mais altas fixadas naquelas anlises. Tal programa dever sofrer correes ao longo do perodo de plano, em funo das prprias alteraes que se verifi-cam na demanda dos servios especficos de cada modalidade.

    Assim, como o objetivo principal do planejamento ao nvel intersetorial o de proceder quantificao e localizao da demanda total, bem como destinao de recursos ao setor de transportes frente a outras alternativas setoriais para o planejamento ao nvel setorial, o objetivo do planejamento ao nvel modal consiste em fornecer: a) as indicaes da natureza e carac-tersticas tecnolgicas e b) os custos dos servios dentro de uma estrutura de preos racional, tambm, para aqule nvel de planejamento.

    Dessa forma, a etapa mais complexa do processo de planejamento em transportes, para onde convergem as informaes dos nveis mais abstratos e mais concretos, a da coordenao dos programas de investimento e das polticas de operao das diferentes modalidades no mbito de um plano setorial.

    fundamental, por'.anto, no processo de planejamento em transportes uma viso coordenada das vrias modalidades, notadamente da ferroviria e rodoviria, alm de uma integrao de poltica aos nveis federal, estadual e municipal para o alcance de maior integrao regional do sistema de transportes.

    Por outro lado, o acompanhamento dos custos relativos das diferentes modalidades e a concepo de uma poltica tarifria integrada dependem, alm de uma contabilidade de custos adequada ao nvel de emprsa, de uniformidade no tratamento do problema pelas vrias autoridades envolvi-das quer quanto a definies e critrios, quer quanto a mtodos de anlise.

    7 A expanso do sistema de transportes no Brasil 14

    Na fase em que predominou, como elemento determinante da gemo e crescimento da renda, a exportao de produtos primrios, as atividades

    14 Para uma viso mai, compreensiva da expanso da expanso do sistema de transportes no Brasil no contexto do recente desenvolvimento econmico, ver anexo I.

    62 R.A.P. 1/71

  • econmicas no Brasil caracterizaram-se por uma acentuada concentrao numa estreita faixa litornea com acesso ao sistema de navegao de longo-curso. Os investimentos em transportes foram feitos nas diferentes regies no sentido de permitir o escoamento da sua produo primria para o principal prto regional, da maneira mais eficiente. Por outro lado, a in-tegrao longitudinal dos diferentes plos de exportao se fazia atravs da navegao de cabotagem.

    Nesse sentido, o sistema de transportes adquiriu uma feio na qual havia uma complementaridade dos sistemas ferrovirio e de navegao de cabo-tagem. Com vistas aos objetivos de exportao, as redes ferrovirias expan-diram-se isoladamente, segundo sistemas regionais que ligavam os impor-tantes centros de produo e comercializao agrcola aos portos regionais. A grande quantidade de portos no litoral brasileiro, com diferentes capaci-dades, e muitas vzes, prximos uns dos outros, indica, por sua vez, que a navegao de cabotagem desempenhou um importante papel na integrao longitudinal dos plos exportadores regionaisY

    Com a acelerada industrializao, atravs de um processo de substitui-o de importaes, o sistema de transportes teve que fazer frente aos fluxos adicionais de bens intermedirios e finais, para atendimento do mercado interno. A expanso da capacidade de transportes se fz atravs de maior participao do transporte rodovirio no deslocamento dos fluxos resultan-tes da rpida expanso da oferta final. Comearam a surgir as primeiras rodovias-tronco interestaduais, em geral paralelas s ferrovias e suplemen-tando a capacidade de transporte dessas ltimas.

    A capacidade de transporte das ferrovias era determinada pelos fluxos de exportao de produtos primrios. O movimento de retrno de produtos manufaturados - em geral importados - apresentava maior valor por unidade de pso e requeria a utilizao de menor capacidade. Com a indus-trializao aumentaram os fluxos de produtos primrios agora necessrios para o mercado urbano em expanso e os fluxos de manufaturados. O alto valor dsses ltimos justificava a suplementao da capacidade de trans-porte atravs das rodovias.

    Com a consolidao dos estgios superiores do processo de industriali-zao (produo de insumos bsicos, bens de consumo durvel e bens de capital), verificou-se tambm a consolidao do mercado nacional. A ex-panso da fronteira agrcola com a ocupao de novas terras permitiu a continuidade no suprimento de matrias-primas e alimentos para a expan-so industrial. Por outro lado, as manufaturas produzidas passaram a atin-gir pontos cada vez mais remotos no territrio nacional. O transporte rodo-virio desempenhou papel fundamental nesse estgio do desenvclvimento econmico. Verificou-se, nesse perodo, a consolidao de um sistema ro-dovirio de mbito nacional. Cumpre ressaltar que a implantao da inds-tria automobilstica, nessa poca, determinando um incremento substancial

    15 BARAT, Josef. O setor de transportes na economia brasileira. Revista de Adminis-trao Pblica, Fundao Getlio Vargas, 2. semestre de 1968.

    Planejamento em transportes 63

  • na frota de veculos, contribuiu decisivamente para o maior pso relativo do trfego rodovirio no atendimento da demanda total dos servios de transporte.16

    Pode ser dito, por conseguinte, que simultneamente com a intensifica-o dos fluxos de carga resultante da expanso da oferta final - entre 1947 e 1968 o PIB cresceu a uma taxa mdia anual de 5,9% e o Produto Indus-trial a 8 % - houve tambm uma intensa substituio intermodal em favor do transporte rodovirio.17

    A expanso excessiva do sistema rodovirio situa-se cumulativamente como efeito e causa da deteriorao dos sistemas ferrovirio e de navega-o costeira. Com efeito, a proliferao de novos investimentos rodovirios ao mesmo tempo que atenderam presso da demanda pelos servios de transporte, oferecendo um ajustamento expost, a partir de certo ponto a prpria ampliao exagerada do transporte rodovirio na composio da demanda passou a dificultar tambm as condies de recuperao das de-mais modalidades.18 Chegou-se, em meados da dcada dos 60, a uma si-tuao de hipertrofia do sistema rodovirio que implicou, concretamente, o transporte ineficiente de muitos bens, distorcendo a funo econmica especfica dos transportes, principalmente nas regies de maior desenvolvi-mento. Assim, o sistema de transportes chegou a constituir-se num obstculo s prprias possibilidades de desenvolvimento econmico.

    Atualmente, numa fase de desenvolvimento em que se busca a expanso do mercado interno, atravs da incorporao de grupos populacionais di-nmica do consumo de massa e o aumento do poder de competio de pro-dutos nacionais - especialmente dos manufaturados - no mercado exter-no, cabe ao sistema de transporte, principalmente na parte mais desenvolvi-da do pas (Centro-Sul) operar dentro de maior integrao e coordenao setorial, com vistas ao atingimento de melhores padres de eficincia para no converter-se em fator de inibio da nova dinmica do desenvol-vimento.

    Dada, entretanto, grande complexidade do espao econmico brasi-leiro, o sistema de transportes dever favorecer integrao progressiva dos espaos circundantes dos ncleos industriais mais dinmicos, atravs de melhor distribuio espacial da atividade econmica. Para isso, os inves-timentos em transporte devero complementar as aes governamentais no sentido de fortalecimento de blocos de investimentos que resultem na cria-o de plos de desenvolvimento de mbito nacional ou regional.

    Nas regies mais desenvolvidas do pas, portanto, as preocupaes bsicas do planejamento em transportes devem ser:

    16 BARAT, Josef. O investimento em transporte como fator de desenvolvimento re-gional. cit. 17 Entre 1950 e 1966 o crescimento do trfego rodovirio de carga, em toneladas-quilmetro transportadas. se fz a uma taxa mdia anual de 10,2 % enquanto que o crescimento do trfego nas demais modalidades se fz a apenas 4,6%. 18 BARAT, Josef. O setor de transportes na economia brasileira. cit.

    64 R.A.P. 1/71

  • a) aumento de eficincia do funcionamento das rdes principais; atravs da incorporao de tecnologia moderna ao transporte, embarque e de-sembarque de grandes massas.

    b) estmulo racionalizao na distribuio espacial da atividade econmi-ca e ao melhor aproveitamento da rde principal atravs de investimen-tos em sistemas de alimentao.

    Nas regies perifricas, por sua vez, o planejamento deve evoluir no sentido de:

    a) permitir a integrao progressiva das reglOes estagnadas ou decadentes ao processo de desenvolvimento nacional;

    b) apoiar projetos ou programas de desenvolvimento regional, colonizao ou ocupao racional do territrio nos quais os investimentos no trans-porte participam como complementao de blocos de investimento.

    8 O planejamento de transportes no Brasil e suas deficincias

    Sendo bastante recente, no Brasil, a experincia em planejamento global, o planejamento em transportes ao nvel intersetorial restringiu-se apenas a alguns planos de desenvolvimento econmico.19 Assim, o Plano Trienal de Desenvolvimento Econmico-Social (1963-1965) incluiu o Setor de Trans-portes no Programa Global de Investimentos com a destinao de recursos para as diferentes modalidades, sem descer ao nvel de projetos prioritrios. O Plano fz recomendaes sumrias de medidas institucionais necessrias reestruturao operacional do setor. J se chamava a ateno na poca para a necessidade de reviso tarifria dos servios e a criao do Minist-rio dos Transportes para a coordenao mais efetiva da poltica setorial. J o Programa de Ao Econmica - PAEG (1964-1966) estabeleceu um escopo mais detalhado de investimentos para seu perodo de vigncia e pro-ps linhas de ao mais concretas para a recuperao econmica e opera-cional do sistema nacional de transportes. Sabe-se que ste, em 1964, j havia quase atingido a situao de colapso, principalmente no que diz res-peito s operaes ferroviria, martima e porturia.

    Embora o Setor de Transportes no aparea explicitamente como setor prioritrio de atuao governamental nesses dois planos, o fato que, em ambos, a poltica de reduo do deficit de caixa do Govrno Federal im-plicou necessriamente propsitos de reorganizao ou de reestruturao do sistema de transporte. bste contribuiu de forma decisiva, atravs das subvenes concedidas diretamente pelo setor pblico para cobertura dos deficits operacionais dos servios ferrovirio, porturio, martimo e areo, alm da elevada soma de recursos destinados ao setor rodovirio - que

    19 Uma anlise mais detalhada dos objetivos gerais e especficos para transportes dos planos governamentais, acompanhada de uma avaliao sumria dos seus resulta-dos, feita na parte 11 dste trabalho.

    P[c.nejamento em tran!J{Jortes 65

  • se constituram, na realidade, em um subsdio indireto - por uma insu-ficiente contribuio do usurio na cobertura dos custos de capital e ma-nuteno. Isso tanto na sua parte operacional, quanto na prpria poltica de investimentos.

    o Programa Estratgico de Desenvolvimento (1958-1970) por sua vez, definiu a infra-estrutura econmica, em geral e a de transportes, em parti-cular, como rea estratgica de prioridade de investimentos. ~sse plano foi alm da simples destinao de recursos para o setor e da listagem de me-didas de carter operacional e administrativa. Com efeito, houve uma preo-cupao em situar o setor de transporte como integrante do bloco de setores dinmicos que proporcionariam, do lado da demanda e do lado da oferta dos seus servios, condies favorveis para expanso do Produto Interno Bruto a taxas elevadas.20

    No que diz respeito ao planejamento setorial constata-se que o sistema de transportes no Brasil evoluiu historicamente margem de qualquer tipo de integrao ou coordenao intermodal. Analisando-se a situao do sis-tema de transportes no Brasil antes de 1965, verifica-se que, durante pelo menos 15 anos, houve deteriorao dos transportes ferrovirio e martimo de cabotagem em favor de uma expanso desproporcional do sistema ro-dovirio. Essa expanso deveu-se - alm da acumulao contnua de dis-tores na estrutura da demanda, permitida pela ausncia de critrios eco-nmicos nas decises de investimentos modais - conjugao de fatres peculiares ao desenvolvimento econmico brasileiro, vista anteriormente.

    Poderia verificar-se, j na poca, que a hipertrofia do sistema rodovirio, motivando uma excessiva concentrao da demanda nos seus servios, culmi-naria, inevitvelmente, no transporte ineficiente e nos custos econmicos elevados no deslocamento dos fluxos resultantes da industrializao.

    Somente a partir de 1965 foi iniciada a fase de planejamento setorial. Essa atitude constituiu resultado de recomendaes contidas em diagnstico preparado por uma equipe especializada no Banco Mundial. Efetuou-se um levantamento completo da situao econmica nacional, tendo sido as de-ficincias operacionais dos servios de transportes e a orientao deficiente da poltica de investimentos apontadas como srias restries s possibili-dades de expanso da economia.

    Com a criao do Grupo Executivo de Integrao da Poltica de Trans-porte - GEIPOT - foi realizada uma srie de estudos setoriais, desen-volvidos em duas fases. A fase I, iniciada em outubro de 1965, compreen-deu a realizao de planos-diretores rodovirios para quatro estados (Rio

    20 MINISTRIO DO PLANEJAMENTO E COORDENAO-GERAL. Programa estratgico de desenvolvimento - transportes. set. 1969.

    66 R.A.P. 1/71

  • Grande do Sul, Santa Catarina, Paran e Minas Gerais), um plano de ao para ferrovias brasileiras, inclusive as ferrovias do estado de So Paulo, estudos gerais sbre os portos do Rio de Janeiro, Santos e Recife e o estu-do sbre a situao da navegao de cabotagem. A fase lI, iniciada em 1967 e concluda em 1969, compreendeu a realizao de planos-diretores rodovirios para os demais estados no abrangidos pela fase I, com ex-ceo dos estados de Amazonas, Par, Acre e Territrios. Durante as duas fases foram tambm realizados estudos especficos da viabilidade tecnico-econmica para determinadas rodovias, inclusive o anel rodovirio da ci-dade de So Paulo.

    No planejamento ao nvel de modalidade, a atuao dos rgos de trans-portes restringiu-se sempre elaborao de projetos de engenharia especfi-cos sem preocupao com a avaliao econmica dos mesmos, alm de ausncia de integrao dsses projetos nos de outras modalidades.

    Mesmo aps iniciados os primeiros estudos do GEIPOT com vistas ao planejamento do setor de transportes, persistiu a falta de coordenao entre os diversos rgos que atuaram na mesma modalidade ou em modalidades complementares, todos les empenhados em programas prprios de inves-timentos. Cabe lembrar que neste nvel de planejamento houve a experin-cia precria do Plano Nacional de Viao, e seus desdobramentos por modalidade, que, a rigor, jamais teve caractersticas de plano. Na verdade, o PNV jamais elaborou cronogramas de execuo da parte fsica dos in-vestimentos nem destinou recursos para financiamento de obras escolhidas como prioritrias.

    Finalmente, importante fazer referncia conhecida duplicao de ta-refas a atribuies dos diversos rgos que operam na mesma esfera, ao nvel de cada modalidade. Isso sempre constituiu, evidentemente, um entra-ve ao aperfeioamento do prprio planejamento e busca de maior racio-nalidade econmica nesse nvel.

    Sintetizando, possvel dizer que, no processo de planejamento dos trans-portes, no Brasil, deve-se evoluir para uma situao em que caiba ao Mi-nistrio do Planejamento e Coordenao-Geral: a) a determinao das ne-cessidades globais de servios de transportes, dentro do contexto do desen-volvimento geral; b) a coordenao dos investimentos no setor de trans-portes com os demais setores da economia; e c) o estabelecimento de dire-trizes gerais para a anlise dos projetos de investimentos.

    Ao Ministrio dos Transportes por sua vez caberia: a) coordenao e compatibilizao dos investimentos entre as diferentes modalidades, isto , o planejamento no nvel setorial e b) a avaliao dos mritos relativos e o estabelecimento de prioridades para os projetos especficos, isto , o plane-jamento no nvel de modalidade.

    Planejamento em transportes 67

  • Parte 11

    Metas dos planos governamentais para transportes

    1 Plano da Comisso Mista Brasil-Estados Unidos (1951/52). 2 Pro-grama de Metas (1956/60). 3 Plano Trienal de Desenvolvimento Eco-nmico-Social (1963/65). 4 Programa de Ao Econmica do Go-vrno - PAEG (1964/66). 5 Programa Estratgico de Desenvolvi-mento - PED (1968/70).

    1 Plano da Comisso Mista Brasil-Estados Unidos (1951/52)

    A) Objetivos gerais do plano

    O Plano da Comisso Mista Brasil-Estados Unidos, elaborado em 1951/52, constituiu-se na primeira grande tentativa de planejamento econmico feita no Brasil. Essa tentativa no passou, na verdade, de um diagnstico geral da economia brasileira com seleo de projetos setoriais mais importantes e recomendaes para sua implementao.

    O plano da comisso ressaltou o empenho do Govrno brasileiro em combater as presses inflacionrias, revelando ao mesmo tempo conscincia da necessidade de ser instituda uma poltica efetiva de desenvolvimento econmico. O diagnstico constatou o fracasso do Govrno Federal na manuteno e renovao da infra-estrutura e props investimentos em se-tores especiais, principalmente na oferta de servios de transportes e de energia eltrica. Ficou constatado que a carncia dessas facilidades bsicas vinha retardando o desenvolvimento do pas.21

    O Plano da Comisso Mista foi, bsicamente, um programa de investi-mentos pblicos, cohrindo apenas parte dos investimentos necessrios em setores como o de transportes e o de energia. Foi orientado para os pro-jetos prioritrios que no apresentavam perspectivas de financiamento priva-do adequado e props medidas para obteno de novos recursos tributrios que remediassem a debilidade financeira do Govrno Federal. 22

    B) Objetivos do plano no setor de transportes

    O melhoramento e a recuperao do sistema de transportes constitua cam-po prioritrio de ao para o Plano da Comisso. A nfase nesse programa

    21 COMISSO MISTA BRASIL-ESTADOS UNIDOS PARA DESENVOLVIMEl\'TO ECONMI-CO. Relatrio geral. Rio de Janeiro, 1954. tomo I. 22 Recursos adicionais ~aptados sbre a renda e lucros no distribudos na forma de emprstimos compulsrios.

    68 R.A.P. 1/71

  • de transportes variou bastante conforme as diferentes modalidades. Consta-tou-se que, nos anos anteriores, houve um acrscimo considervel do trfego rodovirio e areo, enquanto que as ferrovias e navegao de cabotagem no evoluram no ritmo necessrio para atender crescente demanda de transporte pesado numa economia em expanso industrial.

    O desequilbrio anterior na distribuio de recursos para investimentos resultou na estagnao ou retrocesso daquelas modalidades de transporte mais adaptveis s massas de mercadorias com baixo valor unitrio requeri-das para o desenvolvimento in~ustrial. Houve, por conseguinte, maior aten-o por parte da Comisso Mista Brasil-Estados Unidos para os projetos relativos navegao de cabotagem e fluvial e para o transporte ferrovirio como mtodos de transporte alternativos em muitos casos econmicamente mais justificados, de uma parte dos fluxos gerados pela industrializao. O programa da Comisso visou, portanto, essencialmente, reabilitao mais do que expanso do sistema de transportes.~3

    Nos projetos elaborados pela Comisso Mista, foram feitas anlises de custos e benefcios (diretos e indiretos) dos projetos, com base em investi-gaes de campo, avaliao de mercados locais e regionais e potencialidade econmica das regies. O programa total de transportes compreendeu um investimento da ordem de 220 milhes de dlares. A maior parcela dsse investimento coube ao Programa de Reequipamento Ferrovirio. Foram contemplados ainda com recursos, projetos de melhoramento e dragagem de portos, navegao costeira e fluvial, estaleiros e equipamento para conser-vao de estradas de rodagem. ~4

    C) Objetivos e medidas por modalidades

    Ferrovias

    As prioridades dos investimentos ferrovirios foram dadas reabilitao e ao reequipamento das ferrovias que serviam s regies mais produtivas do pas, estando, por conseguinte, relacionadas ao volume de trfego existente. Estava implcita a poltica de concentrao de recursos em pontos crticos e no a pulverizao sbre todo o sistema ferrovirio.

    Os principais projetos ferrovirios recomendados foram:

    aquisio de locomotivas Diesel para substituio das locomotivas a vapor e aumento da capacidade de trao; aumento da capacidade total de transportes atravs da aquisio de material rodante (vages de carga e passageiros) e;

    23 Ibid. 24 A criao do Banco Nacional do Desenvolvimento Econmico, em 1952, pos-sibilitou a destinao de recursos para o financiamento de grande parte do reequi-pamento e melhoria das ferrovias, dos portos e da navegao costeira.

    Planejamento em transportes 69

  • estabelecimento de prioridades de investimentos para reaparelhamento da via permanente entre as ferrovias e entre os trechos de uma mesma ferrovia.

    Portos

    A nfase no programa de portos consIstIU nos projetos que visavam ao acrscimo da capacidade de manipulao de carga e de armazenamento, bem como ao aperfeioamento de processos de operao para melhor utili-zao das instalaes existentes.

    O programa de recuperao dos portos apresentou trs aspectos prin-cipais:

    dragagem; reequipamento ou expanso (em alguns casos) das instalaes por-turias e; reformas dos mtodos operacionais.

    Navegao

    O programa de navegao da Comisso Mista foi particularmente concentra-do no reequipamento e consolidao da frota de cabotagem do Govrno. Foi dada entretanto ao setor privado de navegao oportunidade de se beneficiar do programa de reequipamento. As emprsas beneficiadas seriam aquelas com maior experincia operacional e estabilidade financeira.

    Foram elaborados tambm projetos de modernizao e expanso da frota fluvial com prioridade quelas que serviam s bacias do rio Paran-Paraguai.

    Rodovias

    O programa rodovirio da Comisso Mista recomendou maior ateno pavimentao das rodovias, sempre que a densidade de trfego a justificasse.

    D) Avaliao sumria do plano

    Como foi ressaltado inicialmente, o chamado Plano da Comisso Mista Brasil-Estados Unidos no passou de um diagnstico da economia brasi-leira, com seleo de projetos setoriais e recomendaes de medidas para sua implementao. A grande maioria dos projetos recomendados no foi implantada, por diversas razes de carter poltico e institucional. O diag-nstico teve, entretanto, o mrito de contribuir para o aprimoramento das medidas de poltica econmica subseqentes e permitiu uma melhor com-preenso do funcionamento da economia brasileira. Parte da equipe que

    70 R.A.P. 1/71

  • partICIpou da elaborao do Plano vma a trabalhar, posteriormente, na elaborao do Programa de Metas e, muitos dos projetos e medidas re-comendados pela Comisso seriam mais tarde incorporados quele programa.

    No diagnstico da Comisso foi desenvolvido o conceito de pontos de estrangulamento, isto , a percepo de que existiam certas reas de de-manda insatisfeitas, que estrangulavam a economia e que justificavam a elaborao de projetos nas reas de energia e transportes. O diagnstico acentuou que os desequilbrios do desenvolvimento econmico brasileiro tinham provocado, principalmente, uma demanda insatisfeita de infra-estru-tura econmica.25

    O diagnstico da Comisso elaborou tambm um conceito de pontos de germinao que seriam bsicamente o oposto do conceito dos pontos de estrangulamento. Tal conceito partia do pressuposto de que a oferta de in-fra-estrutura poderia desencadear novas atividades produtivas. f-sses dois conceitos serviriam de base para concepes posteriores do Programa de Metas que consideraria como pontos de estrangulamento ao desenvolvi-mento as deficincias nos sistemas de energia, transportes e abastecimento. Por outro lado, o Programa de Metas, baseado no conceito de pontos de germinao, justificaria a grande massa de investimentos rodovirios e a meta autnoma de construo da nova capital.

    possvel dizer, portanto, que, embora o Plano da Comisso Mista no chegasse sequer a ser implementado, pode ser considerado como um marco de referncia na histria do planejamento brasileiro que daria origem mais tarde ao Programa de Metas.

    2 Programa de metas (1956/60)26

    A) Objetivos gerais do programa

    o Programa de Metas preparado pelo Conselho de Desenvolvimento para o perodo 1956/60 no representou propriamente um esfro coordenado de planejar a economia do pas em seu conjunto. Os projetos nos setores prioritrios englobavam crca de um quarto, apenas, da produo nacional.27

    O Programa apresentou, entretanto, pela primeira vez no Brasil, a mo-bilizao e coordenao de diferentes instrumentos da poltica econmica, visando a alcanar objetivos definidos. O Programa visou, fundamentalmen-te, integrao vertical da estrutura industrial e ao desenvolvimento coorde-

    25 LAFER, Celso. O planejamento no Brasil - observaes sbre o programa de me-tas. So Paulo, Ed. Perspectiva, 1970. 26 Uma apresentao detalhada dos recursos programados para investimentos em transporte segundo suas origens para os planos governamentais a partir do Programa de Metas, feita no anexo 2. 27 PROGRAMA DE METAS. Relatrio de atividades de 1958. Rio de Janeiro, Presidn-cia da Repblica, Conselho de Desenvolvimento, 1958.

    Planejamento em transportes 71

  • nado da infra-estrutura de energia e transportes para apoio ao processo de industrializao. ~8

    O Programa de Metas foi composto de um conjunto de projetos distribu-dos pelos setores prioritrios representados pelas metas de energia, trans-portes, alimentao e indstrias de base. Identificados os setores prioritrios e, dentro dsses setores, estabelecidas as metas - atravs da integrao dos conceitos de pontos de crescimento e pontos de estrangulamento (interno e externo), bem como da interdependncia entre as metas dos setores e a de-manda derivada - o programa procurou fixar para cada meta um objetivo definido.~\J Os objetivos foram quantificados projetando-se por extrapolao a composio provvel da demanda dos prximos anos.

    Os objetivos quantificados foram testados e revistos durante o perodo de aplicao do plano atravs de um mtodo de aproximaes sucessivas, conferindo ao Programa de Metas caractersticas de um planejamento con-tnuo. Sendo assim, a tcnica de planejamento utilizada era capaz de pro-gramar as metas de cada setor, mas incapaz de coordenar ou testar a com-patibilidade dos setores.

    O sucesso na realizao das metas principais deveu-se, bsicamente, con-jugao de uma srie de elementos autnomos do processo de desenvolvi-mento e tambm criao de novas possibilidades de financiamento. Os elementos autnomos foram: a) substituio de importaes; b) investi-mentos do setor pblico em reas prioritrias; e c) investimentos e finan-ciamentos externos.30

    No havendo na poca um sistema financeiro que atendesse s necessida-des industriais e identificada a incapacidade do setor pblico em atrair efi-cientemente recursos do setor privado, foram estruturadas novas fontes de financiamento para o programa. Em primeiro lugar, houve um aumento na participao do setor pblico, desempenhando um papel ativo na promoo do desenvolvimento. O papel do setor pblico traduziu-se no acrscimo de participao do Govrno na formao de capital e na operao de servios pblicos, bem como na concesso de incentivos ao setor privado. Em segui-da, houve uma coordenao de medidas visando a atrair investimentos pri-vados do exterior e a assegurar crditos e emprstimos externos. E, final-mente, a concesso de uma srie de incentivos aos investimentos privados nacionais nas atividades industriais englobadas pelos grupos executivos. sses eram os rgos governamentais responsveis diretamente pela concesso dsses incentivos.31 As principais modalidades de ao governamental no

    28 LESSA, Carlos. Fifteen years of economic policy in Brasil. Economic Bulletin for Latin America, 9 (2): 1964. Cf. - A industrializao brasileira, diagnstico e perspectivas. IPEA, Programa Es-tratgico de Desenvolvimento, estudo especial, jan. 1969. 29 Os critrios para o estabelecimento de metas foram diretos (percepo da priori-dade pela importncia na parte de importaes) ou indiretos (percepo da prioridade da produo interna pelo impacto sbre a atividade econmica). Dstes ltimos re-sultou o conceito de demanda derivada. 30 Ibid. 31 Deve-se ressaltar, igualmente, o papel do BNDE como agncia de promoo do desenvolvimento, financiando quer projetos de infra-estrutura bsica, quer projetos de unidades privadas industriais.

    72 R.A.P. 1/71

  • Programa de Metas foram: a) ao empresarial direta: neste campo, coube s agncias governamentais programar e executar os investimentos em infra-estrutura e complexos industriais; b) ao sbre os preos: o Govrno criou incentivos iniciativa privada, pblica e mista para a execuo dos objetivos previstos nas metas; c) ao sbre a formao de capital e a escala de pro-duo: atravs de financiamentos, concesso de avais, isenes ou redues de direitos e outorga de subvenes cambiais para importao de equipa-mentos, coube ao Govrno facilitar a capitalizao das emprsas; d) ao sbre as expectativas: enunciando suas metas de produo e divulgando o propsito de propiciar meios para a execuo das mesmas, pretendeu o Go-vrno agir favorvelmente sbre a propenso a investir do empresariado em geral; e) assistncia tcnica: atravs de Conselho de Desenvolvimento e do BNDE, era objetivo do Govrno assegurar a coordenao das inverses p-blicas com as iniciativas privadas.

    B) Metas no setor de transportes

    o setor de transportes recebeu no Programa de Metas o tratamento de setor prioritrio para investimentos, uma vez que suas deficincias de investimen-tos e de operao foram ressaltadas como obstculos ao alvo dos objetivos mais gerais do programa, quais sejam os de expanso e integrao da estru-tura industrial. O setor de transportes abrangeu crca de 30% do total de investimentos inicialmente previstos no programa.

    Ferrovias

    O Programa, no que se refere ao planejamento do transporte ferrovirio, enfocou dois aspectos distintos: construo e reaparelhamento.

    Na meta de construo foi dada prioridade a linhas com indiscutvel signi-ficao econmica e a variantes, destinadas a eliminar trechos onerosos das linhas existentes, em que a densidade de trfego justificasse o investimento.

    Na meta de reaparelhamento foram elaborados aproximadamente 20 pro-jetos, visando dar ao parque ferrovirio a eficincia de operao necessria. Os projetos referiram-se bsicamente s seguintes metas:

    aquisio de material rodante de trao; aquisio de material rodante de transporte e; reaparelhamento da via permanente com aquisio de trilhos e acess-rios e substituio de dormentes.

    A criao da Rde Ferroviria Federal S.A. permitiu centralizar os pro-gramas de reaparelhamento e construo ferroviria que vinham sendo feitos lenta e desordenadamente em virtude da falta de uma organizao adminis-trativa especfica para o setor.

    Planejamento em tranS'portes 73

  • Rodovias

    A modalidade rodoviria foi explicitada no programa, como um dos setores bsicos do plano de desenvolvimento econmico do Govrno Federal. Em decorrncia das deficincias do sistema ferrovirio, as rodovias foram consi-deradas como elemento preponderante do intercmbio entre as vrias re-gies do pas.

    A necessidade inadivel de construo, pavimentao e melhoramento da rde levou o Govrno a programar o refro de fundos financeiros para a execuo dsses investimentos.

    Foi reformulada a programao rodoviria com o objetivo de trazer para a administrao federal um maior nmero de estradas federais, tendo em vista o fato de que at dezembro de 1955, apenas 70% da rde federal cons-tante do Programa Qinqenal de Obras Rodovirias estavam a cargo do DNER.

    As recomendaes e/ou metas do programa para o setor rodovirio fo-ram: a) Suplementao das verbas da Unio para a realizao das estra-das do Plano Rodovirio Nacional integrantes do Programa Qinqenal de Obras Rodovirias, ainda que com drstica reduo de tdas as demais dotaes destinadas a fins rodovirios; b) redistribuio de verbas, favo-recendo mais os servios de pavimentao do que os de implantao b-sica, nas futuras revises de servios e obras do Programa Qinqenal; c) adoo do tipo superior de pavimentao em todos os trechos rodovirios cujo movimento dirio excedia a 100 caminhes ou 150 veculos em geral, evitando que as verbas destinadas pavimentao fssem consumidas em obras preliminares de melhoramentos, construes ou reconstrues prvias, as quais se devem cingir ao mnimo exigido pelas condies de segurana; d) recomendao no sentido de que fssem elevados os gios aplicados a petrleo e derivados, com a finalidade de reforar os recursos destinados ao Plano Rodovirio, tendo em vista que a diminuio do custo de opera-o dos veculos em estradas pavimentadas seria senSIvelmente superior aos eventuais aumentos de custo ocasional, com a eliminao do favorecimento cambial importao do combustvel lquido; e) regulamentao de outras fontes de receita rodoviria, especialmente o pedgio e a contribuio de melhoria, a fim de reembolsar o Poder Pblico dos vultosos dispndios, captando uma parcela de valorizao que beneficiaria as propriedades mar-ginais, ou proximamente marginais, das vias implantadas ou pavimentdas, e recompondo em parte seu poder de investimento no setor; f) entrosa-mento mais efetivo do Banco Nacional do Desenvolvimento Econmico com os rgos rodovirios federais e estaduais para execuo de programas plu-rianuais de investimentos, garantidos pelas respectivas quotas do Fundo Ro-doviri032 e de Pavimentao e sob a orientao tcnica e superviso do Departamento Nacional de Estradas de Rodagem.

    32 Lei n.O 2.975 de 27/11/1956.

    74 R.A.P. 1/71

  • Portos

    Projetos especficos para construo de novas instalaes, reequipamento e dragagem foram elaborados com base nas resolues da Comisso Mista Brasil-Estados Unidos que foram revistas e postas em trmos de plano de ao imediata e efetiva. Para tanto, o Govrno garantiu a obteno de em-prstimos externos e assegurou a suplementao dos recursos em moeda na-cional com a criao do Fundo Porturio Nacional.33

    Navegao

    A criao do Fundo de Marinha Mercante,34 a par de outras providncias adotadas pelo Govrno, visou a dar condies de realizao de um programa de construo naval ao pas, que teria uma possibilidade calculada de de-manda superior a 100.000 TDW anuais. Com isso, se comeou a perseguir o objetivo de reaparelhar e ampliar a frota de cabotagem e de aumentar a participao da bandeira brasileira no transporte de longo curso, permitindo a liberao de divisas para o alvio da presso sbre o balano de paga-mentos.

    O aumento de produtividade mdia do setor porturio, permitiria a modi-ficao da operao da frota de cabotagem, proporcionando maior remunera-o aos armadores quando descessem os perodos de imobilizao nos ter-minais martimos.

    As metas no setor martimo foram as seguintes: a) fixao da extenso em que seria conveniente atender as estimativas das necessidades do merca-do brasileiro para navios at 1960, tendo em vista a disponibilidade de re-cursos em moeda nacional e em divisas para as importaes de navios; b) se-leo das importaes de navios, tendo em vista a reduo dos dispndios cambiais ao mnimo necessrio e refro do mercado com que contaria a in-dstria de construo naval; c) aumento da participao de navios brasilei-ros no transporte de mercadorias no comrcio exterior por etapas: inicial-mente a aquisio de embarcaes, depois a construo em massa no pas, e, posteriormente, a execuo de reparos gerais em navios do tipo Lloyd-Naes; d) no setor da navegao fluvial, a renovao e expanso da frota SNAPP do SNBP e da CNSF.

    A viao Civil

    o plano de desenvolvimento do Transporte Areo compreendeu trs partes: o reequipamento do material de vo, a infra-estrutura de vo e a indstria aeronutica.

    33 Lei D.O 3.421 de 10/07/1958. 34 Lei D.O 3.381 de 24/04/1958.

    Planejamento em transportes 75

  • No que se refere a reequipamento, todo o material deveria ser importado, em razo da inexistncia de indstria aeronutica no pas. Ao Ministrio da Aeronutica, aplicando recursos do Fundo Aeronutico,:)~ coube o planeja-mento e funcionamento da infra-estrutura de vo.

    Medidas de disciplinamento dos planos de reequipamento das emprsas de aviao foram impostas, uma vez que os programas por elas formulados foram mais amplos que a provvel expanso de demanda. Impsto um limi-te para a quota cambial disponvel para investimentos aerovirios, cada em-prsa recebeu parcela correspondente sua participao relativa no mercado.

    C) Avaliao sumria do programa

    Um dos fatres de sucesso do Programa de Metas talvez tenha sido o de no englobar a totalidade da produo, permitindo que uma grande parte dos recursos para investimentos continuasse a ser distribuda atravs do:> mecanismos tradicionais do sistema poltico e institucional brasileiros.:J6 Isso facilitou a implementao do programa, o qual, embora no apresentasse uma compatibilidade ou coerncia no emprgo dos seus instrumentos, con~ tribuiu para o desenvolvimento dos setores e metas prioritrias, evitando de-sequilbrios mais graves, resultantes da expanso industrial,37

    Diga-se, portanto, que dentro do mbito de objetivos a que se props, o Programa de Metas foi um exemplo de sucesso na formulao e implemen-tao do planejamento no Brasil. Do ponto de vista dos transportes, um rpido balano das metas propostas indica que houve um grande sucesso nos resultados em rela'o s metas previstas.

    Com relao s ferrovias, as metas fsicas de aquisio de locomotivas e vages e de reaparelhamento da via permanente alcanaram no conjunto, prticamente 75 % do previsto. Relativamente construo ferroviria, fo-ram entregues 827 km de linhas atingindo-se crca de 50% da meta previs-ta. O volume de carga transportada, entretanto, no perodo 1956/60, cres-ceu de crca de 22 % e pode-se atribuir em grande parte sse acrscimo ao conjunto das metas de construo e reaparelhamento ferrovirio.

    35 Lei n.o 3.000 de 11/12/1956. Decreto n.o 41.148 de 13/03/1957 36 Cf. O planejamento no Brasil - observaes sbre o Programa de Metas. Celso Lafer, cit. Para Celso Lafer, o sucesso do Programa de Metas, esgotando as virtua-lidades de suas solues administrativas, ocasionou problemas para os governos sub-seqentes pela criao de novas zonas de incerteza. Assim, a economia brasileira pas-sou de uma zona de incerteza externa para interna, em virtude da industrializao com nfase no mercado interno, acarretando a necessidade de utilizao de tda uma Administrao Pblica e no apenas de alguns rgos de ponta como no Programa de Metas, para prosseguir com sucesso no esfro de planejamento. O sistema econmico estaria diante no mais da implantao de unidades produtivas em setores chave ou da superao de pontos de estrangulamento, mas sim diante do contrle do funcionamento de um sistema muito mais complexo. Dado o carter difuso da competncia na administrao pblica brasileira, tornava-se difcil, logo aps o Programa de Metas, a institucionalizao do planejamento econmico no Brasil. 37 LESSA, Carlos. Filteen yars 01 economic policy in Brazil. cito

    76 R.A.P. 1/7/

  • Com relao s rodovias, o programa de pavimentao alcanou 6.210 km equivalente a 207% da meta de 3.000 km inicialmente prevista e depois alterada para 5.000 km. A quilometragem de estradas federais pavimenta-das dobrou no perodo do programa. A meta de construo, inicialmente prevista para 10.000 km, e posteriormente revista para 13.000 km alcanou 14.900 km, ou seja 150% da meta inicial.

    Em portos, as metas de obras porturias, reaparelhamento e dragagem em conjunto atingiu crca de 56% das qualificaes fsicas previstas para o perodo do Plano.

    Na navegao, tdas as metas previstas de incorporao frota de navios de longo curso, petroleiros e cabotagem, foram alcanadas. Finalmente, nos transportes aerovirios foram acrescidas 13 unidades frota area, alcana-das as metas previstas de infra-estrutura e abertura de novos campos de pouso.3S

    Da avaliao das metas quantificadas em trmos fsicos pelo Programa de Metas, verifica-se que para o conjunto do setor de transportes o programa apresentou um excelente desempenho, atendendo grande parte das metas, no s inicialmente previstas, como tambm revistas ao longo do perodo de execuo.

    3 Plano trienal de desenvolvimento econmico-social (1963/65)

    A) Objetivos gerais do plano

    O plano props-se corrigir as distores economlcas e sociais resultantes do acelerado esfro de industrializao verificado nos anos precedentes. Foi elaborado num momento em que taxas de crescimento relativamente menores do Produto Interno Bruto anunciavam um perodo de relativa es-tagnao para a economia nacional. Associava-se essa estagnao uma rpida acelerao do processo inflacionrio. O plano definiu quatro objetivos fundamentais de poltica econmica: a) re-cuperao do ritmo de desenvolvimento econmico observado no perodo 1957/61 (crca de 7% ao ano); b) conteno progressiva do processo inflacionrio; c) correes nas desigualdades de distribuio de renda, tanto sob o aspecto pessoal, quanto regional; d) atenuao das presses sbre o balano de pagamentos e reescalonamento do endividamento externo.

    Definiu, ainda, uma srie de reformar econmicas e institucionais neces-srias para a consecuo daqueles objetivos.39

    Embora com o nome de plano, no objetivou o Plano Trienal a implan-tao propriamente do planejamento no Brasil. Tratou-se mais de um es-fro de transio em busca de um conhecimento mais sistemtico da reali-dade econmica, permitindo maior eficincia na capacitao de deciso,

    38 PROGRAMA DE METAS. Relatrio de atividades. cit. 39 PLANO TRIENAL DE DESE:\"VOLVIMENTO ECONMICO E SOCIAL. Sntese. Presidncia da Repblica, dez. 1962.

    Planejamento em transportes 77

  • atravs da hierarquizao mais objetiva dos problemas nacionais. Somente aps essa transio e alcanados sses objetivos mais imediatos que seria possvel dar maior profundidade ao de planejamento.4o

    B) Objetivos do plano no setor de transportes

    Inseriu-se a aplicao de recursos no setor de transportes, dentro dos obje-tivos gerais de assegurar uma elevada taxa de crescimento do produto e de melhorar as condies de vida da populao. Para isso, seria necessria a orientao dos investimentos tendentes a harmonizar a estrutura da produ-o demanda.

    O plano previu a aplicao de recursos no setor, segundo diretrizes que permitissem evitar sua pulverizao, obtendo dessa forma a maior produti-vidade econmica e social. Alm disso visou a assegurar, atravs da expan-so do sistema de transportes, a interligao das regies de grande potencial econmico. Com vista correo das distores do sistema de transportes, foram consideradas - embora superficialmente apenas - as compatibilida-des do setor com o planejamento global e as disponibilidades financeiras do pas para a execuo do plano.

    C) Objetivos e medidas por modalidades

    Ferrovias

    O programa objetivou, principalmente, corrigir deficincias estruturais do setor, atravs das seguintes metas:

    liberao de recursos materiais e humanos pela erradicao de ramais fer-rovirios antieconmicos; direo dos investimentos para trechos ou linhas de grande significado econmico. Os investimentos foram programados para construes no-vas, remodelao de vias permanentes, bem como a modernizao de materiais rodante e de trao.

    Navegao e Portos

    A principal diretriz do plano, nesse setor, foi considerar o navio e o prto como unidades de operao conjugadas. Os objetivos foram os seguintes:

    melhoria da produtividade dos portos atravs da alocao de recursos, segundo as caractersticas da frota mercante brasileira. plena utilizao dos estaleiros nacionais para a renovao da frota mer-cante de longo curso e cabotagem;

    .w Cf. PLANO TRIENAL. cil.

    78 R.A.P. 1/71

  • especializao das emprsas estatais de transporte martimo - Costeira (cabotagem) e Lloyd (Longo Curso).

    Rodovias

    o principal objetivo proposto, nesse setor, foi concentrar esforos na con-cluso dos empreendimentos que propiciassem maiores e mais rpidos be-nefcios sociais. Para tanto, foi revisto o Plano Qinqenal de Obras Rodo-virias com vistas a torn-lo compatvel com a capacidade de investimentos do pas.

    A viao Civil

    Os programas, nesse setor, foram estabelecidos em funo de trfego exis-tente e potencial, e incluiu servios de proteo ao vo e construo e me-lhoramento de aeroportos, pistas e estaes de passageiros. O plano pro-ps-se tambm a dar condies para que a frota area pudesse operar no s internamente, mas, tambm, em linhas internacionais.

    D) Avaliao sumria do plano

    Embora o prprio Plano Trienal tenha realado que tratava mais de permi-tir eficcia na capacidade de deciso e um conhecimento mais sistemtico da realidade econmica, no se constituindo em profunda ao de planeja-mento, o fato que sse plano, embora tenha diagnosticado conveniente-mente a economia, no alcanou realmente seus objetivos de promover o desenvolvimento e vencer a inflao.

    A mudana poltica ocorrida em 1964 substituiu o Plano Trienal pelo PAEG, que conservou, entretanto, no seu captulo de transportes, muitas das recomendaes feitas no escopo do Plano Trienal. Essas, com efeito, tinham sido resultado da verificao objetiva de uma srie de limitaes que as deficientes polticas de investimento e de operao tinham impsto ao prprio desenvolvimento do pas.

    4 Programa de ao econmica do govrno - PAEG (1964/66)

    A) Objetivos gerais do programa

    Os principais objetivos gerais do PAEG foram essencialmente os mesmos do Plano Trienal. O PAEG, embora resultado de uma profunda modifica-o poltica e institucional, no divergia muito do Plano precedente, no diagnstico da economia brasileira, mas sim no corpo de solues e medidas apresentadas.

    Planejamento em tranJ'{Jortes 79

  • Surgindo numa fase de relativa estagnao do desenvolvimento e de um processo inflacionrio beira da hiperinflao, que tumultuava as expecta-tivas do mercado, o PAEG props-se atingir os seguintes objetivos bsicos: a) reativao do ritmo de desenvolvimento econmico; b) reduo pro-gressiva da inflao; c) reduo dos desequilbrios regionais e setoriais; d) gerao do emprgo produtivo em ritmo compatvel com o crescimento da fra de trabalho; e) reduo dos deficits do balano de pagamentos.

    O PAEG definiu-se como um programa de carter indicativo para uma economia de mercado, representando um esfro no sentido de interpretao do processo de desenvolvimento econmico brasileiro e de formulao de medidas de poltica econmica capazes de eliminar os pontos de estrangula-mento que impediam um desempenho satisfatrio dos agentes econmicosY

    Caracterizada a inflao como uma das causas importantes na explicao da estagnao econmica no perodo 1962-1964 e colocando os fatres de ordem monetria como os mais importantes na alimentao de um processo inflacionrio que ultrapassava a taxa de 80% ao ano, o PAEG centralizou sua ateno mais imediata nos deficits crnicos do oramento federal, nos acrscimos de salrios acima dos nveis de produtividade e nas distores de custoS.42

    dentro dessa estratgia global que se situaram os objetivos concernentes ao setor de transportes.

    B) Objetivos do programa no setor de transportes

    Sendo o setor de transportes, na poca de implantao do programa, tanto do ponto de vista das polticas de investimento quanto dos sistemas de opera-o, um dos maiores responsveis (seno o maior) pelos fatres de alimen-tao de curto prazo do processo inflacionrio, logicamente o PAEG teria que consolidar um conjunto coerente e eficaz de metas operacionais e dire-trizes de poltica de investimento que permitissem o saneamento do setor.

    O programa visou, conseqentemente, ao eficiente e econmico atendi-mento da demanda por transportes e a eliminao de dois focos inflacion-rios - inflao de custos resultantes de uma crescente queda de eficincia na aplicao dos fatres de produo e o efeito monetrio ocasionado pelas emisses necessrias cobertura de deficits operacionais. Para tanto, vi-sou-se reduo dos custos de transportes e a sua gradativa e total transfe-rncia para os usurios atravs da cobrana de fretes e tarifas realistas.

    As metas operacionais visaram a dar maior aproveitamento aos recursos existentes, atravs de medidas de carter estrutural e comercial. Do ponto de vista estrutural, visou-se a um melhor aproveitamento do potencial ge-rencial atravs da reorganizao administrativa das autarquias.

    41 PROGRAMA de ao econmica do govmo. Ministrio do Planejamento e Co-ordenao Econmica, Rio de Janeiro, 1964. 4!! Cf. MARTONE. Celso L. Anlise do programa de ao econmica do govmo. Planejamento no Brasil. So Paulo, Ed. Perspectiva, 1970.

    80 R.A.P. 1/71

  • Comercialmente, era meta do Govrno permitir s autarquias concorrerem pelas cargas sem dependerem de subsdios e operaram sem discriminao de preo para certas cargas e passageiros. Visou-se tambm melhoria da po-ltica trabalhista das autarquias, liberando-as dos excessivos nus com pes-soal atravs da utilizao de organismos de treinamento de pessoal.

    Quanto poltica .de investimentos, a aplicao dsses visou expanso dos sistemas de transportes a longo prazo, eliminando os pontos de estran-gulamento e destinando-os em maior parte infra-estrutura dos sistemas. O programa advertia, ainda, quanto necessidade de seleo cada vez mais objetiva das obras (em trmos de prioridades resultantes das relaes bene-fcio/custo) para a eliminao de desperdcio, representados pela falta de continuidade na execuo de obras e pela pulverizao de recursos.

    C) Linhas de ao do govrno por modalidades

    A re