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O ensino explícito, aspectos teóricos e práticos (2° texto) por Clermont Gauthier, Ph.D. Brasil XVII ENDIPE Encontro Nacional de Didática e Prática de Ensino Simpósio : A Didática e a Prática de Ensino nas Relações entre a Escola, a Formação de Professores e a Sociedade Como vimos no texto anterior, as pesquisas sobre a eficácia do ensino descreveram amplamente o efeito do professor sobre o desempenho dos alunos. Portanto, não se pode mais atribuir o sucesso do aluno apenas às características do seu quadro familiar ou socioeconômico. Mostrou-se que o professor é fator importante no desempenho acadêmico e nos resultados de um ensino de qualidade, e que os efeitos de tal ensino, repetido ao longo de vários anos, repercutem significativamente no sucesso do aluno. O inverso também é verdadeiro: um mau ensino tem um efeito cumulativo ao longo dos anos. Conforme destacou Hattie (2012), agora que muitos estudos têm mostrado o alto nível de variação de resultados entre os professores, a questão importante não é mais a de saber se os professores têm influência sobre o desempenho dos alunos, mas de levar o maior número posssível de professores a aumentar seus efeitos positivos na aprendizagem, a fim de reduzir essa lacuna de desempenho. As pesquisas sobre a eficácia do ensino têm demonstrado que várias abordagens têm condições de ser eficazes para o sucesso dos alunos. Estas abordagens, desenvolvidas ao longo dos anos por vários autores, cobrem elementos comuns, mas também apresentam estratégias diferentes. Incluem-se entre estas a Direct Instruction (Bereiter e Engelman), a Applied Behavior Analysis, o Mastery Learning (Bloom), o Teaching (Lindsley), o Success for All (Slavin), o ensino explícito (Rosenshine), o modelo das estratégias eficazes de ensino (Good and Grows), o modelo de concepção de aulas eficazes de Hunter, o modelo dos momentos de ensino de Gagné, o modelo de apresentação de conteúdo de Ausubel, o modelo de ensino como desempenho assistido de Tharp e Gallimore, etc. Por isso, empregamos o termo instrucionista 1 para agrupar numa só família todas essas abordagens em que, apesar de algumas variações, o professor torna a aprendizagem de conteúdo acadêmico de forma sistemática, estruturada e explícita para os alunos. "... Poucos pesquisadores interessaram-se no que chamamos hoje de abordagem "instrucionista " sem levar em consideração seu bom resultado junto a alunos fracos 1 Utilizamos o neologismo “ instrucionista” para substituir o termo inglês instructivist. Didática e Prática de Ensino: diálogos sobre a Escola, a Formação de Professores e a Sociedade EdUECE - Livro 4 00447

O ensino explícito, aspectos teóricos e práticos (2° texto). PROCESSOS... · de ensino está associada ao bom desempenho do aluno. Em termos práticos, vamos examinar os componentes

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O ensino explícito, aspectos teóricos e práticos

(2° texto)

por

Clermont Gauthier, Ph.D.

Brasil XVII ENDIPE Encontro Nacional de Didática e Prática de Ensino

Simpósio : A Didática e a Prática de Ensino nas Relações entre a Escola, a

Formação de Professores e a Sociedade

Como vimos no texto anterior, as pesquisas sobre a eficácia do ensino descreveram

amplamente o efeito do professor sobre o desempenho dos alunos. Portanto, não se pode

mais atribuir o sucesso do aluno apenas às características do seu quadro familiar ou

socioeconômico. Mostrou-se que o professor é fator importante no desempenho

acadêmico e nos resultados de um ensino de qualidade, e que os efeitos de tal ensino,

repetido ao longo de vários anos, repercutem significativamente no sucesso do aluno. O

inverso também é verdadeiro: um mau ensino tem um efeito cumulativo ao longo dos

anos. Conforme destacou Hattie (2012), agora que muitos estudos têm mostrado o alto

nível de variação de resultados entre os professores, a questão importante não é mais a de

saber se os professores têm influência sobre o desempenho dos alunos, mas de levar o

maior número posssível de professores a aumentar seus efeitos positivos na

aprendizagem, a fim de reduzir essa lacuna de desempenho.

As pesquisas sobre a eficácia do ensino têm demonstrado que várias abordagens têm

condições de ser eficazes para o sucesso dos alunos. Estas abordagens, desenvolvidas ao

longo dos anos por vários autores, cobrem elementos comuns, mas também apresentam

estratégias diferentes. Incluem-se entre estas a Direct Instruction (Bereiter e Engelman),

a Applied Behavior Analysis, o Mastery Learning (Bloom), o Teaching (Lindsley), o

Success for All (Slavin), o ensino explícito (Rosenshine), o modelo das estratégias

eficazes de ensino (Good and Grows), o modelo de concepção de aulas eficazes de

Hunter, o modelo dos momentos de ensino de Gagné, o modelo de apresentação de

conteúdo de Ausubel, o modelo de ensino como desempenho assistido de Tharp e

Gallimore, etc. Por isso, empregamos o termo instrucionista1 para agrupar numa só

família todas essas abordagens em que, apesar de algumas variações, o professor torna a

aprendizagem de conteúdo acadêmico de forma sistemática, estruturada e explícita para

os alunos.

"... Poucos pesquisadores interessaram-se no que chamamos hoje de abordagem

"instrucionista " sem levar em consideração seu bom resultado junto a alunos fracos

1 Utilizamos o neologismo “ instrucionista” para substituir o termo inglês instructivist.

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ou com dificuldades... Às vezes chamadas de “ensino direto”, “pedagogia do auto-

controle”, “ensino explícito”, ou “ensino de precisão”, estas estratégias de ensino

em sala de aula têm particularidades comuns. Os professores que as utilizam são

específicos sobre o que os alunos devem aprender e lhes comunicam claramente tais

expectativas; quase todo o tempo escolar é focado na aprendizagem desejada; a

avaliação fornece informações valiosas sobre os progressos realizados, o sucesso é

recompensado; o fracasso não é aceito; e o esforço continua até que os objetivos

sejam alcançados. "(Finn e Ravich, 1996, p. 8)

Os modelos instrucionistas consideram que as práticas de ensino são eficazes quando o

professor começa por rever os pré-requisitos, relaciona a matéria do dia com as

aprendizagens anteriores e depois, por etapas, aborda a matéria nova. Ele alterna breves

apresentações. Após a apresentação, o professor organiza exercícios dirigidos até que

todos os alunos tenham sido controlados e tenham recebido um feedback. Vêm, a seguir,

os exercícios individuais que se continuam até o controle autônomo do novo aprendizado

do aluno" (Rosenshine, 1986a, p. 96). É sobre esta faceta que se encaixam nossas

propostas. Seguindo Rosenshine, usamos o termo "ensino explícito" para designar a

abordagem pedagógica que descrevemos a seguir. O ensino explícito, cujas estratégias

foram validadas por evidências, é uma das principais condições de um ensino eficaz.

Mantendo o sentido primeiro dado por Rosenshine a esta abordagem pedagógica nós a

enriquecemos e ampliamos mediante adição de estratégias complementares para a gestão

da aprendizagem e da sala de aula, estratégias também oriundas de pesquisas sobre a

eficácia do ensino.

Esta comunicação abrange simultaneamente teoria e prática. Baseando-nos em obras

contemporâneas de psicologia cognitiva, examinaremos as razões pelas quais esta forma

de ensino está associada ao bom desempenho do aluno. Em termos práticos, vamos

examinar os componentes concretos desse ensino na sala de aula.

2.1. O ensino explícito, dimensões teóricas

Um dos autores mais reconhecidos por suas pesquisas empíricas sobre este tema é Barak

Rosenshine (1982, 1986 e 2002). Ele mostrou que o ensino explícito e sistemático é um

método particularmente apropriado para aprendizagem de numerosas disciplinas (leitura,

matemática, gramática, língua, ciência, história e até mesmo línguas estrangeiras). Além

disso, segundo ele, o ensino explícito e sistemático revelou-se particularmente adequado

aos jovens estudantes e a todos aqueles alunos de aprendizagem lenta,

independentemente de sua idade, mesmo com os adultos que tenham dificuldades de

aprendizagem (Hock, 2012). É de se notar que este tipo de ensino é benéfico a todos os

alunos quando se trata de uma matéria estruturada, ou complexa, e mostra-se proveitoso

com alunos de melhores desempenhos (Adams e Engelmann 1996; Marchand-Martella,

Martella e Slocum, 2004; Slavin et alii, 1989). Além disso, um estudo de

acompanhamento por Gersten e Keating, em 1987, revelou que os estudantes que se

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beneficiaram com as lições do modelo de Direct Instruction2, um método de ensino

explícito fortemente estruturado, alcançaram resultados superiores, melhores índices de

aprovação, uma porcentagem mais alta de pedidos de admissão e aceitação ao nível

colegial e, finalmente, uma menor porcentagem de repetição em relação aos grupos que

receberam instrução tradicional.

Além disso, como menciona Adams (1996), além de aumento do desempenho acadêmico

na maioria das disciplinas escolares, o Direct Instruction favorece o desenvolvimento de

habilidades cognitivas para o nível superior. Também deve-se notar que as pesquisas

sobre o ensino eficaz foram realizadas em salas de aula regulares e, muitas vezes, com

alunos de baixo desempenho, com dificuldades de aprendizagem ou provenientes de

meios desfavorecidos, onde o ensino explícito revelou-se particularmente adequado

(Brophy e Good, 1986; Gersten et alii, 1986; Swanson, 1999, 2000 e 2001; Swanson et

alii, 1998, 2001 e 2003, Rosenshine e Stevens, 1986). Esta abordagem pode também ser

oportuna para alunos de classe média e com alto QI, com alunos de classes especiais,

regulares, do ensino fundamental ao médio, para aprender habilidades simples ou

complexas e diferentes matérias. Mesmo os estudantes talentosos obtém melhores

ressultados com a Direct Instruction (Barbash, 2011). Além disso, as pesquisas

conduzidass por Reynolds e seus colaboradores indicam que as escolas reconhecidas

como eficazes recorrem maciçamente aos métodos do ensino dito explícito, constatação

verificada em diversos países com sistemas escolares muito diferenes (Austrália, Canadá,

Hong Kong, República da Irlanda, Holanda, Noruega, Taiwan, Reino Unido, EUA). A

este respeito, ao contrário do que muitos defendem, Reynolds e seus colaboradores

(2002) afirmam que algumas das dimensões associadas a escolas eficazes pode

"transcender" culturas. Na verdade, os ganhos de aprendizagem registrados em diferentes

ambientes parecem estar associados a um tipo de abordagem de ensino comum entre os

professores, ou seja, um ensino diretivo e explícito.

Todas essas pesquisas levam a concluir que há evidências suficientes em favor do ensino

explícito para torná-lo vantajoso para um sistema de ensino usá-lo. De fato, o risco de

falha é menor e os efeitos sobre a aprendizagem são positivos para uma ampla variedade

de alunos em diferentes disciplinas e em diferentes contextos culturais. Além disso, as

aprendizagens não são superficiais e nem efêmeras (Klahr e Nigam, 2004). Finalmente,

esta abordagem educativa não exige que os professores mudem radicalmente suas

práticas e não é oneroso para uma escola ou para uma mantenadora implantar.

O Ensino explícito e psicologia cognitiva

2 O Direct Instruction é um modelo de ensino baseado numa abordagem explícita, estruturada e intensiva.

Insiste-se no preparo minucioso das lições, cuja eficácia é verificada junto aos alunos e que são reajustadas

posteriormente antes de ser implantadas em mais ampla escala. Para mais informações, o leitor consultará

com proveito o siteWeb do National Institute for Direct Instruction no http://www.nifdi.org/15/.

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Como menciona Rosenshine (2008, p. 236), embora a maioria das pesquisas em

psicologia cognitiva foram realizadas após as realizadas sobre a eficácia do ensino, os

seus resultados combinam perfeitamente com esta última de forma que nos ajudam a

entender melhor os resultados da pesquisa sobre o ensino eficaz ou explícito. Em outras

palavras, as pesquisas sobre a arquitetura cognitiva constituem, de alguma forma, o

arcabouço teórico que faltava na pesquisa sobre a eficácia do ensino.

Antes de prosseguir, é necessário fornecer uma visão geral da arquitetura desenvolvida

pelo sistema cognitivo humano elaborado pela psicologia cognitiva, em que a memória

desempenha um papel fundamental. Na perspectiva cognitiva, a aprendizagem está

intrinsecamente ligada à função de memória em geral, responsável pela construção,

organização, codificação e recuperação do conhecimento.

Comparando com o funcionamento do computador, as pesquisas em psicologia cognitiva

estudam como os seres humanos coletam, codificam, interpretam, modificam e

armazenam informações vindo do entorno, e como leva isso em conta no momento de

tomar decisões.

Existem várias teorias cognitivas em relação à aprendizagem. Elas compartilham a

premissa básica de que a mente é um sistema de processamento de informações e

concedem um status central às informações que os seres humanos se representam, aos

meios que eles usam para processar estas informações e aos limites do sistema cognitivo

que restringem a quantidade de informações que podem ser representas e tratadas ao

executar determinada tarefa. Elas definem a aprendizagem como um conjunto de

processos para adquirir novos conhecimentos ou transformar o conhecimento existente.

Essas teorias compartilham também de uma visão comum das características estruturais

do sistema de processamento de informações, ou seja, do que é chamado de "arquitetura

cognitiva".

A arquitetura cognitiva

Destacamos brevemente dois componentes importantes da arquitetura cognitiva: a

memória de trabalho e a memória de longo prazo.

A memória de trabalho tem duas limitações importantes: primeiro, o prazo de

disponibilização da informação (geralmente de 5 a 20 segundos) e o número de unidades

que pode conter (sete para o adulto médio, com um intervalo que varia de mais ou menos

duas). Uma unidade de informação pode ser uma sílaba, uma palavra, um parágrafo, uma

regra, um conceito ou uma rede de conceitos. Isso depende da estruturação do

conhecimento, ou seja, como eles são organizados na memória. Podemos então constatar

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a vantagem de ter uma boa organização do conhecimento e, daí, a importância de se ter

padrões.

Outrossim, a memória de longo prazo é um reservatório ilimitado de conhecimentos.

Nela, todo novo saber vem enxertar-se, por cacho, aos conhecimentos anteriores.

Armazenados na memória de longo prazo, eles irão, eventualmente, servir de lembrete a

ser utilizado na resolução de vários problemas. A memória de trabalho constitue a

interface com a qual as pessoas podem dar sentido aos estímulos que vêm de seu entorno,

a partir da bagagem de conhecimentos acumulados em sua memória de longo prazo. No

entanto, no processo de aquisição de novos conhecimentos, não pode haver sobrecarga.

A teoria da carga cognitiva

A teoria da carga cognitiva é um dos desenvolvimentos teóricos recentes mais

significativos no campo das teorias da aprendizagem (Chanquoy, Tricot e Sweller de

2007, Kirschner, e Kester Corbalan, 2010). A complexidade do processamento cognitivo

necessário para entender e executar uma tarefa em nova área, pode resultar em não haver

mais espaço disponível na memória de trabalho para reter o conhecimento que tem sido

utilizado nesta área. Dada a capacidade limitada da memória de trabalho, Sweller et alii

(2006, 2007) propõem interpretar esse excesso de recursos disponíveis, como seno

sobrecarga cognitiva.

As pesquisas de Sweller conduzem a duas implicações imediatas pedagogicamente. Em

primeiro lugar, propôr a uma pessoa aprender novos conhecimentos, resolvendo um

problema para o qual não tem conhecimento prévio relevante, é um método de ensino

ineficaz. Em segundo lugar, se isto não é uma abordagem para a aquisição de

conhecimentos na forma de esquemas, então o que o seria? A questão é importante

porque desafia a visão dominante, mas errada, dos adeptos de novas pedagogias e da

descoberta segundo a qual "os padrões são aprendidos fazendo: mais o estudante vai

encontrar e tentar resolver muitos problemas, mais ele pode desenvolver esquemas na

memória "(Chanquoy et alii, 2007, p. 132).

A teoria da carga cognitiva foi desenvolvida para fornecer respostas a esta questão, de

fundamenal importância para o ensino. A teoria da carga cognitiva enfoca principalmente

o papel da memória de trabalho na aquisição e utilização dos esquemas. Procura

responder, por exemplo, à pergunta "Para que servem os padrões? ". A principal premissa

da teoria da carga cognitiva é que os padrões servem, em primeiro lugar, para organizar

na memória de longo prazo a grande quantidade de conhecimentos e, por outro, permitir a

execução de tarefas complexas que exigem a mobilização simultânea de vários

conhecimentos e know-how, apesar das limitações da memória de trabalho.

Note-se que a finalidade do tratamento da informação na memória de trabalho é orientar a

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ação em um ambiente complexo. De acordo com a teoria da carga cognitiva, quanto

maior for a quantidade e a complexidade das informações organizadas que podem ser

transferidas da memória de longo prazo para a memória de trabalho, mais importante é a

complexidade das informaçoes que se podem tratar. Pois se ela não tem a capacidade de

permitir que os padrões relevantes na memória de trabalho atendam às exigências da

tarefa, um especialista não é um especialista e deve recorrer a estratégias gerais para a

solução de problemas nas mesmas condições que um novato (Clark, Nguyen e Sweller,

2006). A principal função dos sistemas é permitir que um indivíduo supere as limitações

da memória de trabalho. A eficácia dos sistemas nesta função depende do seu grau de

automação, pois cada sistema automatizado libera recursos cognitivos para a aquisição de

novos padrões.

A teoria da carga cognitiva considera que existem dois processos, cuja função principal é

permitir que a memória de trabalho, cujas capacidades são limitadas, processe grandes

conjuntos de informações e melhore a aprendizagem (Chanquoy et alii, 2007). O primeiro

processo é a aquisição de padrões; o segundo, a automação deles. A teoria da carga

cognitiva enfatiza a importância da automação que gradualmente permite que o indivíduo

execute tarefas mais complexas, sem exceder a capacidade da memória de trabalho, uma

vez que os padrões adquiridos podem processar uma grande quantidade de informações,

como se fosse uma única unidade significativa ou um bloco ou um pedaço (Paas, Renkl e

Sweller, 2004; Clark, Nguyen e Sweller, 2006).

Uma vez que os novatos ainda não desenvolveram os padrões que permitem aos

especialistas resolver problemas complexos, eles precisam do professor e do ensino

explícito que estruturam a aprendizagem desde a simplicidade até a complexidade. para

um substituto aos padrão do qual carecem (Clark, Nguyen e Sweller, 2006). Isso, lhes

permite liberar espaço em sua memória de trabalho para tornar a aprendizagem possível.

Sem tal substituto, o novato construirá representação inadequada das aprendizagens a

alcançar, o que irá levá-lo a integrar em sua memória de longo prazo conhecimentos

errôneos que, uma vez cristalizados, tornam-se muito difíceis de corrigir.

2.2 . O Ensino explícito, características práticas

Como lecionam os professores que "fazem uma diferença positiva" para favorecer a

aprendizagem do aluno? Recorrem eles a várias estratégias avulsas de ensino ou podemos

identificar um padrão de comportamentos eficazes (Rosenshine, 2008, p. 235)?

O artigo de Rosenshine e Stevens publicado no Handbook of research on teaching de

1986 constitui, em nossa opinião, a primeira prova, com base em fontes empíricas, de um

modelo de ensino eficaz. Em suma, parece que os professores eficientes adotam

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estratégias parecidas ao ponto de formar um padrão ou modelo genérico de ensino de tipo

"instrucionista".

2.2.1. Natureza do ensino explícito

Em geral, as pesquisas sobre o ensino confirmam que as abordagens "instrucionistas", tal

como o ensino explícito, são caracterizadas por etapas estruturadas fortemente integradas.

Além disso, como indicado pelo termo “explícito”, o professor procura evitar o implícito

e a imprecisão que pode interferir na aprendizagem. Então, quais são as estratégias que o

professor deve usar diariamente para ensinar explicitamente?

Para isso, cria-se um conjunto de suportes (escoras) para ajudar os alunos no processo de

aprendizagem. Estes apoios ou escoramento passam pelo dizer, mostrar, orientar os

alunos na sua aprendizagem. Dizer, no sentido de explicitar para os alunos as intenções e

os objetivos da lição. Dizer, também, no sentido de tornar o conhecimento prévio

explícito e disponível para os alunos que precisam. Mostrar, no sentido de explicitar a

realização de uma tarefa executando-a na frente dos alunos e explicitando o raciocínio em

voz alta. Guiar, no sentido de levar o aluno a explicitar o seu raciocínio implícito em

situações de prática. Guiar, também no sentido de lhes fornecer uma retroação apropriada

para que eles construam conhecimentos adequados antes de os erros se cristalizarem em

suas mentes (Gauthier, Bissonnette, Richard e Castonguay, 2013).

A principal função dessas escoras é evitar a sobrecarga da memória de trabalho de alunos

(Sweller, 1988; Sweller, Kirschner & Clark, 2006). Sabemos agora, graças ao trabalho

realizado sobre a arquitetura cognitiva, que a capacidade da memória de trabalho é

limitada, de modo que, para facilitar o aprendizado, é melhor para o professor decompor

o conhecimento ou a habilidade em componentes mais simples a fim de que o aluno

aprenda progressivamente.

Alguns associam erradamente o ensino explícito à pedagogia tradicional. É

provavelmente mais apropriado falar de ensino magistral que de pedagogia tradicional

porque, como demonstrado por Kessler (1964), o ensino tradicional é mais uma

caricatura que foi desenvolvido com um propósito polêmico de que um conceito rigoroso

descrevendo a realidade da tradição de ensino. A pedagogia tradicional é simplesmente

uma forma de ensino em que o professor incentiva a transmissão do saber mediante um

monólogo, enquanto no ensino explícito, o professor dialoga constantemente com os

alunos.

2.2.2. Funcionamento do ensino explícito

Tem sido demonstrado anteriormente (Gauthier et alii, 1997) que o professor tem duas

grandes funções inter-relacionadas: a gestão das aprendizagens e o manejo da classe (ou

gestão dos comportamentos). A gestão das aprendizagens refere-se ao conjunto das

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estratégias que os professores utilizam para que os alunos aprendam o conteúdo do

programa. O manejo da sala de aula refere-se a estratégias que o professor faz para criar

um ambiente propício para a aprendizagem e para a vida em classe. Tanto a gestão da

aprendizagem quanto a gestão da sala de aula é realizada em três fases: preparação,

interação com os alunos e consolidação, e pode ser objeto do ensino explícito (Gauthier

et alii, 2013). No texto a seguir3, será tratado apenas da gestão das aprendisagens.

2.2.2.1 A gestão das aprendizagens: a fase de preparação

Durante esta fase, o professor trabalha a partir do currículo e procura adaptá-lo "a seu

jeito". Ele o analisa a fim de destacar os principais componentes e possíveis dificuldades

e para determinar a melhor sequência para ensinar os elementos de conteúdo. A fase de

preparação inclui um conjunto de estratégias: 1. identificar os objetivos claros de

aprendizagem; 2. destacar as principais ideias; 3. determinar o conhecimento anterior; 4.

integrar estrategicamente diferentes tipos de conhecimento; 5. planejar os esteios de

apoio à aprendizagem; 6. planeja a revisão; 7. verificar o alinhamento curricular.

Exprimir com precisão os objetivos de aprendizagem

Desde o trabalho de Tyler em 1949 e a publicação de seu famoso livro, Basic Principles

of Curriculum and Instruction, reconhece-se que a precisão dos objetivos é essencial para

facilitar o ensino e a aprendizagem. A indicação dos objetivos deve indicar as

expectativas do aluno no final do aprendizado. Ela permite que o professor se concentre

nos objetivos e que o aluno saiba o que se espera dele. Ela permite também que os

professores selecionem melhor as atividades de aprendizagem adequadas e facilita a

avaliação da aprendizagem.

Identificar as principais ideias

Nem tudo tem a mesma importância num programa. É por isso que é preciso distinguir o

conteúdo essencial daqueles que são apenas secundários. As ideias-chaves são os

principais conceitos centrais, conhecimentos básicos de que os professores devem ensinar

definitivamente. Trazer as principais ideias simultaneamente permite identificar noções

acessórias.

Determinar os conhecimentos prévios

Alguns conhecimentos ou experiências são anteriores, e o controle deles é um pré-

requisito para a aquisição de novos conhecimentos. Por exemplo, antes de ensinar a

resolução de problemas que requerem o cálculo da hipotenusa, o professor deve

assegurar-se de que os alunos sabem o que é raiz quadrada. Ele deve verificar o nível de

3 Estamos preparando uma obra sobre a gestão da classe ou o que chamamos de ensino explícito dos comportamentos. Deve sair no

início de 2015

Didática e Prática de Ensino: diálogos sobre a Escola, a Formação de Professores e a Sociedade

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dificuldade da tarefa a cumprir, para que o conhecimento caminhe do simples ao

complexo.

Integrar de maneira estratégica vários tipos de conhecimento

Os conhecimentos podem ser divididos em três categorias: declarativos, procedimentais e

condicionais. Esta distinção é importante porque temos de perceber que não podemos

levar os alunos a desenvolver habilidades de procedimento se estamos ensinando apenas

o conhecimento declarativo e que o conhecimento condicional é desconhecida. Não só os

alunos não saberão como realizar a tarefa, mas eles não vão reconhecer o contexto em

que desempenhá-la.

Planejar dispositivos de sustentação da aprendizagem (escoras)

O ensino explícito caracteriza-se pelo uso de múltiplos dispositivos de apoio (visual,

verbal, físico) que o professor escolhe de acordo com o nível de habilidade dos alunos e,

em seguida, os retira gradativamente na medida em que observa o progresso deles.

Planejar a revisão

O professor deve reservar um tempo para revisar o conteúdo. Para ser mais eficaz, a

revisão deve ser distribuída, cumulativa e variada. Rosenshine e Stevens (1986) propõem

uma revisão diária, semanal e mensal.

Verificar o alinhamento curricular

O conceito de alinhamento curricular é essencial, pois permite adaptar o trabalho previsto

àquele que será feito. Durante a fase de preparação, o professor verifica a coerência entre

o curriculum prescrito, o ensino que pretende realizar e a avaliação prevista. Não seria

lógico avaliar o conteúdo não ensinado ou que não faz parte do programa.

2.2.2.2 A gestão das aprendizagens: a fase de interação com os alunos

Uma vez concluido o planejamento, o professor passa para a interação real com os

alunos. Ele executa várias ações tais como verificação diária das tarefas, iniciar a aula,

dirigi-la e terminá-la.

Verificar as tarefas diariamente

A questão das tarefas de casa é controversa. No entanto, o professor que utiliza a lição de

casa corretamente leve seus alunos a aproveitar. Hattie (2012) examinou várias meta-

análises de tarefas de casa e encontrou resultado d = 0,29. Assim, quando se comparam

os alunos com tarefas de casa com os que não as têm, vemos que as tarefas de casa

permitem que os alunos progridem ou aumentem sua grau de aprendizagem de 15%.

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Iniciar a aula

Na abertura da aula, o professor assegura-se de obter a atenção dos alunos: "Atenção!

Agora vamos ... "Diz o objetivo da lição, o justifica, caso seja necessário, liga-o ao

conteúdo visto anteriormente. Pode resumir o conteúdo que será abordado na aula e dar o

plano dela. Em seguida, ele irá ativar o conhecimento prévio de aprendizagem ou

habilidades.

Conduzir a Aula

A condução da aula inclui o uso de um conjunto de estratégias que podem ser

implementadas em três etapas: modelagem, prática orientada e prática independente.

Lição de condução (modelagem)

O professor começa a aula pela etapa de modelagem. Ele mostra o que deve ser

aprendido. Ao fazer isso, ele explica como ele procede e transmite seu pensamento.

Anuncia cada passo para executar a tarefa: as perguntas, as estratégias que ele usará.

Conduzir a lição (prática guiada)

O professor continua com a etapa da prática guiada. Nela, ele faz com que os alunos

trabalhem, geralmente em equipes, enquanto os supervisiona de perto. Ele faz perguntas e

trabalha a partir de problemas já resolvidos. Coloca suportes apropriados e verifica a

compreensão dos alunos. Retroage e corrige as respostas deles.

Perguntar. Foi provado que os professores mais eficientes pedem que os alunos

expliquem como eles fizeram para chegar à resposta. Os menos eficientes não só

perguntam menos, mas quase nunca perguntam aos alunos sobre as suas maneiras de

obter resultados.

Verificar a compreensão. Hollingsworth e Ybarra (2009) propuseram para testar o

conhecimento a estratégia que expressamos pelo acrônimo EQACER sigla: (E) ensinar

algo, (Q) questionar (A) aguardar um momento, (C) convidar um estudante ao acaso (E)

escutar sua resposta, (R) reagir, fornecer feedback.

Trabalhar a partir de problemas previamente resolvidos. Trabalhar a partir de

problemas resolvidos anteriormente evita sobrecarregar a memória de trabalho dos

estudantes, leva a concentrar-se nas etapas necessárias para resolvê-los e sobre os

elementos importantes do problema. Os exemplos permitem demonstrar, passo a passo, a

maneira de resolver um problema.

Empregar o apoio necessário. Durante a prática guiada, o professor fornece apoio ao

estudante, apoio que lhes retira gradativamente, à medida que progridem na sua

aprendizagem.

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EdUECE - Livro 400456

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Retroagir e corrigir. Há uma forte correlação entre retroação e desempenho do aluno. Ao

invés de parabenizar o aluno, o professor enfatiza uma retroação específica sobre a tarefa

realizada pelo aluno, para que ele associe o seu resultado a seu próprio comportamento. O

professor mantém breves contatos individuais (até 30 segundos) para evitar o transtorno

que possa ocorrer.

Conduzir a aula (prática independente)

Durante esta etapa, o aluno realiza a tarefa sozinho e sem ajuda. Se não sabe como

realizar a tarefa sozinho e o professor insistir para que se exercite, ele integrará na

memória interpretações equivocadas. Será trabalho muito difícil para o professor fazer

desaprender o que foi armazenado erroneamente na memória de aluno. É inútil dar

dezenas de problemas para resolver, quando os alunos não sabem executar a tarefa

indicada. É melhor então ensinar novamente.

Durante a prática independente, o professor não dá aos alunos exercícios de natureza

diferente do que eles fizeram durante a prática guiada.

Terminar a aula

No final da aula, o professor aproveita a oportunidade para assegurar a objetivação do

aprendido. Ele destaca o essencial. Em seguida, ele anuncia a próxima lição e oferece

atividades para uma maior consolidação e automação.

2.2.2.3 A gestão das aprendizagens: a fase de consolidação

Durante esta fase, o professor concentra-se em duas estratégias principais para assegurar

a consolidação e a automação de aprendizagem: dar tarefas de casa e fazer a revisão

diária, semanal e mensal.

Passar tarefas para casa

As tarefas permitem aos alunos praticar o conteúdo aprendido em sala de aula, a fim de

chegar a automatizar o aprendizado. O professor não dá tarefas de casa com novos itens.

As tarefas são parte da rotina da sala de aula e não são negociadas a cada dia. O professor

também sabe que a tarefa de casa não revisada em sala de aula resultará em futuras

tarefas mal feitas ou não feitas.

Além disso, Marzano, Pickering e Pollock (2001) descobriram que quando o professor

comenta as tarefas, o tamanho do efeito é d = 0,83, o que significa um ganho porcentual

de 30 pontos. No entanto, quando não há comentários ou notas, a magnitude cai para d =

0,28, ou 11 pontos percentuais, o que é muito menos eficaz.

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Em geral, os autores recomendam tarefas curtas e frequentes que envolvem a prática de

habilidades simples. O professor prepara cuidadosamente as lições de casa, e os alunos

exercitam-se a praticá-las em sala de aula e, em seguida, as reveem coletivamente.

Revisões semanais e mensais

As revisões permitem organizar novos conhecimentos em rede e possibilitam a sua

mobilização quando se quer recorrer a eles. Os professores eficientes dedicam 15 a 20%

de seu ensino na revisão semanal e mensal.

Conclusão

O ensino eficaz é um ensino explícito que se caracteriza pelo estabelecimento de

dispositivos para simplificar a tarefa de aprendizagem dos alunos. Baseia-se

principalmente no fato de que a memória de trabalho tem capacidade limitada e

rapidamente torna-se sobrecarregada. Para evitar essa sobrecarga é importante ensinar o

conteúdo por etapas. Uma preparação cuidadosa e o uso de boas estratégias, para

interagir com os alunos, incluindo modelagem, prática orientada e prática independente e

atividades de consolidação facilitarão a aprendizagem.

Longe de ser um novo dogma, o ensino explícito é a abordagem de ensino pela qual

temos a maior soma de evidências que demonstram sua eficácia. No entanto, nos casos

em que os alunos já têm alguma experiência, onde o conteúdo e contexto de ensino

permitem, as abordagens por decobertas podem ser indicadas. É preciso reconhecer que

as classes da grande maioria dos professores, pouco ou não pertencem a esta categoria.

Finalmente, é também importante notar que, apesar da eficácia demonstrada de ensino

explícito, este modelo não ocupa o lugar que merece nas faculdades de educação, onde

reina as abordagens construtivistas cujas provas de eficácia são limitadas.

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ESTÁGIO COM PESQUISA: A ONTOGÊNESE DE UM PROCESSO1

Evandro Ghedin2

Introdução

A pesquisa que deu origem a este trabalho situa-se na interseção estágio-

pesquisa como condição do desenvolvimento profissional e articulador da identidade

docente no processo de formação inicial de professores.

A ideia motora do trabalho defende que a articulação entre estágio e pesquisa na

formação inicial de professores constitui instrumento epistemológico, teórico e

metodológico que se propõe como modelo alternativo-inovador nas licenciaturas,

constitutivo à autonomia intelectual, profissional e da identidade docente. Decorrente da

produção científica na área da Educação, a pesquisa fundamenta-se nos conceitos de

professor reflexivo e pesquisador, que lhe dão suporte epistemológico e metodológico.

A pesquisa teve por objetivos: (1) sintetizar as perspectivas teórico-

epistemológicas apresentadas na literatura da área que discute a formação do professor

reflexivo-pesquisador como fundamentação articuladora do estágio-pesquisa na

formação inicial de professores; (2) estudar os procedimentos adotados e propostas de

cursos de formação inicial de professores tendo em vista sua avaliação, compreensão da

prática instituída e aprofundamento da formação; (3) refletir e propor o

desenvolvimento de práticas pedagógicas para a formação inicial de professores

articulando estágio com pesquisa, tendo como referência a literatura da área e propostas

em desenvolvimento para a formação do professor-pesquisador.

A abordagem metodológica adotada para a análise documental foi a da

hermenêutica crítica e no que se refere à coleta de dados, pautou-se em procedimentos

da pesquisa-ação e outros instrumentos da investigação qualitativa.

O trabalho conclui que o desenvolvimento do estágio com pesquisa fundamenta-

se em uma “pedagogia do conhecimento” que institui a estrutura de uma educação

1 O presente texto é uma síntese do relatório de pesquisa intitulado: Estágio com pesquisa na formação inicial de professores, originalmente apresentado como relatório de pós-doutoramento à Faculdade de Educação da USP, sob a supervisão da Profa. Dra. Selma Garrido Pimenta. 2 Professor na Universidade Estadual de Roraima (UERR). Doutor em Filosofia da Educação pela FEUSP, onde fez estágio de Pós-Doutorado em Didática. Atua na linha de formação de professores no Doutorado em Educação em Ciência da Rede Amazônica de Educação em Ciências e Matemática (REAMEC), no Doutorado em Educação da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), no Mestrado em Ensino de Ciência e de Educação da UERR.

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científica constitutiva da identidade que possibilita um trabalho docente centrado nos

processos de conhecimento como condição de autonomia intelectual, política e

científica do professor.

A filogênese do processo de Estágio com Pesquisa

Este texto origina-se da pesquisa que nasceu de uma experiência positiva

desenhada e executada em um curso de licenciatura. O objetivo geral da pesquisa

desenhava o estudo de uma proposta de formação inicial de professores centrada na

articulação do estágio com pesquisa como condição de desenvolvimento da autonomia

intelectual, profissional e da identidade docente, tendo em vista a formação de um

professor-pesquisador da própria prática como condição da construção de sua

autonomia de intelectual crítico.

Os objetivos foram desdobrados em questões centrais do processo investigativo:

(I) quais as perspectivas teórico-epistemológicas que se apresentam na literatura da área

que discutem a formação do professor reflexivo-pesquisador que se constitua como

fundamentação articuladora do estágio com pesquisa na formação inicial de professores

capazes de sustentar uma proposta pedagógica na direção aqui proposta? Quais são os

procedimentos adotados pelos cursos de formação inicial de professores em instituições

que já desenvolveram/desenvolvem o processo de formação inicial articulando estágio

com pesquisa? Quais os resultados obtidos até o momento? Como é possível, a partir

das propostas existentes, desenhar uma perspectiva comum tendo em vista a avaliação,

compreensão da prática instituída e aprofundamento deste modelo formativo? Como

desenvolver um “projeto” de formação inicial de professores articulador do estágio com

pesquisa, tendo como referência a literatura da área e as propostas em desenvolvimento

para a formação do professor-pesquisador em instituições brasileiras, como resposta às

necessidades formativas inovadoras desta prática?

A pesquisa propôs-se e defende a seguinte tese: “A articulação do estágio com

pesquisa constitui instrumento epistemológico-teórico-metodológico fundante de um

modelo alternativo/inovador da formação inicial como condição de desenvolvimento da

autonomia intelectual, profissional e da identidade docente, tendo em vista a formação

de um professor-pesquisador crítico-reflexivo”.

O texto aqui apresentado, como resultado de um processo de investigação, é

decorrente da leitura, análise, sistematização e síntese da produção sobre a formação de

professores a partir de determinados conceitos previamente definidos como centrais

Didática e Prática de Ensino: diálogos sobre a Escola, a Formação de Professores e a Sociedade

EdUECE - Livro 400464

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para a teorização da prática e desta a teoria: a construção do conhecimento na

escola/universidade/curso, a organização do trabalho com o conhecimento, os

professores diante do conhecimento. Essas categorias desdobradas em duas: saberes da

docência e identidade do professor. Decorrente desse mapeamento, assumindo-se como

metodologia da formação, tem-se os conceitos de professor pesquisador, professor

reflexivo, ensino de estágio e estágio com pesquisa como elementos centrais e

fundamentais a essa investigação.

Iniciou-se o trabalho com o levantamento de uma extensa bibliografia. Esta

decorrente das pesquisas na área que discutem o tema e os conceitos aqui apontados

como chaves de leitura para interpretar e propor alternativas a formação. Para isso,

lançou-se mão de uma vasta base de dados disponíveis para conhecimento,

compreensão e aprofundamento do conhecimento que decorre da investigação deste

objeto. Procurou-se avaliar e sintetizar a origem do conceito de professor pesquisador e

seus desdobramentos na literatura brasileira.

Na opção desta estratégia metodológica realizou-se uma investigação que se deu

a partir da produção científica sobre estágio com pesquisa que se apresentou nos

últimos dez anos, em eventos da área: o ENDIPE (Encontro Nacional de Didática e

Prática de Ensino); a ANPED (Associação Nacional de Pós-Graduação em Educação),

sendo que nesta deu-se nos Grupos de Trabalho de Didática e Formação de

Professores; o ENPEC (Encontro Nacional de Pesquisa em Educação em Ciências),

promovido pela ABRAPEC (Associação Brasileira de Pesquisa em Educação em

Ciências), neste concentrou-se, também no levantamento da produção que discute o

Estágio nas Licenciaturas, pois para além dos problemas que estas enfrentam, há uma

riqueza de pesquisas que podem colaborar na sustentação teórica da proposta aqui

desenhada.

Fez-se um extenso levantamento da produção de pesquisas publicadas em livros

da área sem uma delimitação temporal. Além disso, fez-se um mapeamento da produção

de teses e dissertações de programas de pós-graduação na área da educação. Estas

disponíveis nas bibliotecas virtuais dos programas de pós-graduação. Do mesmo modo,

fez-se uma intensa busca da produção em periódicos científicos da área, além de uma

busca detalhada no Google Acadêmico. Esse procedimento permitiu um mapeamento da

rica produção do conhecimento sobre os conceitos chaves aqui apresentados.

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No transcurso do processo mapeou-se a experiência do estagio com pesquisa em

quatro instituições e se analisou os dados de uma instituição para garantir profundidade

epistêmica e clareza metodológica.

Nesse caso, abriu-se mão da comparação dos projetos de cursos, desenvolvidos

no âmbito de determinadas escolas e/ou cursos para concentrar-se em diferentes olhares

sobre um mesmo problema. Essa opção possibilitou testar metodologias diferentes na

abordagem de um mesmo objeto. O resultado desta decisão tornou possível verificar

que metodologias diferentes, no processo da pesquisa educacional, levam a resultados

muito próximos quando são desenvolvidas adequadamente. Para além da validação da

dimensão metodológica do processo investigativo, o resultado do trabalho possibilita

sustentar e defender que os processos de autonomia intelectual e a identidade

profissional do professor estão intimamente relacionados quando a formação conduz

práticas de investigação que possibilitam processos reflexivos estruturantes de outros

processos perceptivos e cognitivos. Decorrente disso, pode-se pensar que a identidade

docente e sua autonomia estão intimamente ligadas aos processos de percepção e

cognição, compreendendo-se que isso só se realiza num determinado contexto social,

ideológico e cultural.

A inter-relação entre percepção e cognição é um constructo humano que

funciona como mecanismo de leitura e interpretação do mundo. Quanto mais se

desenvolvem mais aprofundam a leitura e mais completa é a interpretação. A interseção

entre mecanismos perceptivos e cognitivos, desenvolvidos pelos processos de reflexão,

desencadeados pelos procedimentos de investigação, constituem os elementos centrais

da identidade e da autonomia docente no espaço da atuação profissional. Essa conclusão

“parece” ser o ganho mais significativo deste trabalho, pois tudo leva a crer que os

processos de investigação constituem instrumentos capazes de proporcionar, ao

professor em formação, relações neurológicas duradouras, isto é, uma estrutura de

pensamento e ação que lhe permite agir no cotidiano da escola orientado por uma forma

de percepção de si que lhe garante mais segurança no trato dos problemas pedagógicos

que precisa dar conta no cotidiano escolar.

Ao defender a ideia de que a educação científica do professor passa pela

necessidade que este possui de dominar os procedimentos da produção do conhecimento

científico, sustenta-se que o estágio com pesquisa constitui-se no instrumento de

formação que possibilitará, ao final do processo e ao longo do desenvolvimento

profissional, uma nova identidade para a docência. Nesse caso, a identidade docente não

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EdUECE - Livro 400466

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está exclusivamente no exercício profissional, mas no modo como o docente pensa a si

mesmo e o sentido que constrói sobre o seu trabalho pedagógico.

Isso implica colocar o ser do professor em outra condição. Aquela de que é

fundamental, diante de todas as mudanças e alterações no mundo contemporâneo,

ensiná-lo a trabalhar com os processos e não com os produtos educacionais, isto é,

apreender a produzir conhecimento a partir de seu contexto, de suas condições, de seus

problemas, de suas dificuldades, de seus dilemas. Trata-se de possibilitar ao professor,

na formação inicial, uma formação científica de tal modo que esta possa fazer com que

compreenda seu trabalho como parte da construção de uma cultura científica, pois age

como investigador de sua prática, como construtor das ciências da educação. Isso por si

só tornaria possível à superação do fosso existente entre escola e universidade.

Este trabalho demonstra as razões e os procedimentos que tornam possível uma

educação científica do professor, capaz de fazer dele um sujeito de identidade e

autonomia no modo de pensar e fazer ciência. Os instrumentos para tal, dentre tantos

outros, encontram-se na articulação de um conjunto de mecanismos pensados e

organizados inter-transdiciplinarmente na formação inicial de professores.

O trabalho não esgota as possibilidades de se pensar a formação. O que faz é

oferecer uma alternativa centrada numa epistemologia diferente daquela que forma o

professor para cumprir uma tarefa meramente operacional no conjunto da educação

escolar. Do mesmo modo que não se quer formar um especialista em pesquisas

educacionais, pois esse não é um trabalho da formação inicial. O que se espera é que

este professor, egresso das licenciaturas, seja capaz de operar, em seu trabalho

pedagógico, com os mecanismos das ciências da educação como condição do trabalho

docente.

Para efeito desse trabalho de pesquisa, além do que já foi mencionado, lançou-se

mão de processos metodológicos específicos. Esse horizonte nos conduz a organização

do conhecimento a partir das práticas dos sujeitos pesquisados. O ponto central da

articulação do processo não está no método que sustenta a organização e acesso as

informações, mas no próprio objeto-sujeito da ação investigativa. Embora que, no atual

contexto da pesquisa em educação, não seja mais possível separar o sujeito do objeto e

nem o método do conceito. No caso específico deste trabalho, situado na perspectiva de

uma hermenêutica crítica, a dimensão do conceito constituiu o eixo articulador do

trabalho de mapeamento do conteúdo produzido sobre o objeto, antecedendo o processo

próprio de inserção na realidade pesquisada.

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No desenvolvimento da pesquisa ação operou-se tecnicamente com três grupos

de sujeitos no processo investigativo: (1) acompanhamento e orientação do estágio com

pesquisa com um grupo de 28 estudantes em formação durante quatro semestres letivos;

(2) desenvolvimento de um curso de formação continuada feito com 15 egressos do

curso e que trabalham como professores concursados do sistema público de educação;

(3) solicitou-se aos professores que trabalharam no estágio com pesquisa por mais de

três anos que elaborassem um relato escrito sobre a experiência realizada. Dez

professores aceitaram o desafio e elaboraram textos que constituem os relatos da sua

experiência do estágio com pesquisa. Esses textos foram lidos, estudados e analisados a

luz das práticas instituídas e das teorias que os engendraram. Ao todo foram 98 sujeitos

pesquisados ao longo do processo.

A ontogênese do processo de Estágio com Pesquisa

Por aquilo que fica evidenciado ao longo da pesquisa pode-se afirmar que a

realização do estágio com pesquisa constitui um processo de educação científica do

professor que caracteriza sua identidade docente enquanto profissional que, pelo

domínio dos processos de construção e produção do conhecimento, se constitui sujeito

de sua autonomia.

Concluímos, então, que serão necessárias determinadas atitudes que viabilizem a

formação do professor pesquisador, dentre elas: o desenvolvimento de um período de

estágio vinculado à pesquisa, a discussão dos conceitos que constituem o processo

formativo docente, a apresentação dos elementos técnico-científicos que

instrumentalizam a Pedagogia como ciência articuladora das ciências da educação, pois

se considera que essa trajetória também se caracteriza como um processo de Educação

Científica.

Consideramos o período de estágio, na formação inicial de professores, como o

primeiro momento em que ele tem contato com a realidade da sala de aula,

desenvolvendo suas práticas pedagógicas por meio das atividades realizadas nesse

período. Neste contexto, faz-se necessário um processo de estágio que apresente os

elementos instrumentalizadores das ciências da educação e discuta os conceitos

constitutivos da formação docente, porém, entende-se que esta trajetória apenas se

consolidará quando articulada à pesquisa.

Nessa perspectiva de estágio, o estudante de licenciatura conhece os

instrumentos com os quais operam as ciências da educação, tendo contato com projetos

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EdUECE - Livro 400468

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de natureza variada (pedagógicos, político-pedagógicos, pesquisa, etc.), planejamentos

diversos (de aula, de curso, de unidades) e desenhos curriculares. Esta modalidade

também evidencia os conceitos que caracterizam a formação docente, tais como:

identidade, saberes, autonomia e profissionalização, além de trabalhar as técnicas que

viabilizam uma trajetória metodológica. Entende-se que é o conjunto da

operacionalização destes elementos que propiciam ao professor intervir na realidade

educacional permitindo-lhe encontrar respostas para as situações-problemas ocorridas

na sala de aula e ao mesmo tempo construir, desconstruir e reconstruir o conhecimento.

Para que esse modelo de formação obtenha êxito no âmbito escolar é preciso que

ele seja sustentado pela compreensão da Pedagogia como ciência articuladora das

ciências da educação, pois dessa forma acredita-se que o próprio processo de estágio

vinculado à pesquisa também se constituirá num processo de Educação Científica do

docente em formação inicial.

Na nossa compreensão o estágio vinculado à pesquisa possibilita que o professor

inicie a legitimação de sua identidade docente a partir de um olhar reflexivo sobre o seu

contexto, pois dessa forma ele dá início à busca por sua autonomia

profissional/intelectual.

Nossa intenção nessa investigação foi contribuir com a perspectiva

epistemológica que sustenta a formação do professor-pesquisador, tendo em vista um

processo de estágio vinculado à pesquisa onde o estudante dará início a construção de

sua identidade docente e despertará para a necessidade de desenvolver sua autonomia

intelectual/profissional. Entende-se que o próprio processo de formação docente quando

articulado com a pesquisa, que prioriza a discussão dos conceitos que constituem a

formação do professor e discute os elementos técnico-científicos que operam nas

ciências da educação, pode ser considerado também um processo de Educação

Científica.

Assume-se aqui a necessidade de tratar a Pedagogia como a ciência articuladora

das ciências da educação. Nesse contexto, a incorporação da pesquisa no espaço do

ensino constitui-se elemento articulador da construção de uma prática desta ciência no

contexto da escola. Assume-se que a articulação do estágio com a pesquisa no momento

da formação do professor constitui instrumento formativo para a própria compreensão

da Pedagogia como ciência, pois seus processos são incorporados às práticas dos

docentes.

Didática e Prática de Ensino: diálogos sobre a Escola, a Formação de Professores e a Sociedade

EdUECE - Livro 400469

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Ao defender essa ideia, também assume-se uma perspectiva de Educação

Científica na formação de professores, que vai além da discussão de conceitos

científicos, abarcando uma reflexão sobre os próprios conceitos constituidores do

processo formativo docente. Ao refletir sobre este processo enfatiza-se a necessidade de

o professor tornar-se sujeito do conhecimento agindo com autonomia no espaço escolar

para ressignificar as suas práticas a partir da problematização de seu contexto. Para isso,

se faz necessário a articulação das teorias trabalhadas na escola às práticas que ele

desenvolverá em sala de aula, daí considerarmos o período de estágio como o primeiro

momento desta articulação.

Compreender o estágio como um dos principais espaços para o estudante realizar

pesquisas, pode constituir-se no primeiro passo para a construção de sua identidade de

professor-pesquisador, pois neste momento ele pode adquirir postura e habilidades que

propiciem uma leitura crítica do contexto educativo a partir da problematização das

situações que observam.

Dessa forma, considera-se que, apesar de todos os limites desse trabalho, os

resultados obtidos durante o seu desenvolvimento nos levam a concluir que o estágio

com pesquisa, pelos processos que engendra, possibilita a articulação dos elementos

constituidores da formação docente. Entretanto, para o êxito deste processo faz-se

necessário algumas recomendações às instituições responsáveis pelos cursos de

formação de professores:

Proporcionar aos estudantes do magistério um processo de estágio voltado para a

pesquisa;

Tratar o período de estágio como um momento de articulação dos conteúdos

curriculares às atividades desenvolvidas;

Disponibilizar, ao professor de estágio, ferramentas teórico-metodológicas que

possibilitem a ressignificação de suas práticas no transcorrer do processo;

Promover a interação entre os professores de estágio a partir dos registros de

suas experiências;

Incentivar os professores e estudantes a desenvolverem pesquisas no espaço de

estágio;

Possibilitar aos professores e estudantes meios para a comunicação e publicação

dos resultados de suas pesquisas;

Viabilizar a pratica do acompanhamento da docência e da pesquisa por meio de

condições objetivas de trabalho.

Didática e Prática de Ensino: diálogos sobre a Escola, a Formação de Professores e a Sociedade

EdUECE - Livro 400470

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A consolidação destas diretrizes por meio dos cursos de formação de professores

contribui para o desenvolvimento de um modelo de estágio que propicia a formação do

professor-pesquisador. No entanto, se faz necessário uma junção de forças entre quem

dirige a instituição, a coordenação de curso, os professores e estudantes em torno de um

projeto que é, por natureza, inter e transdiciplinar.

O desenvolvimento da pesquisa permitiu refletir sobre a Universidade enquanto

instituição formadora dos professores na condição de sujeitos desta formação e em que

medida a formação docente, mediada pelos processos da pesquisa, é capaz, nesta

triangulação, da ação educativa de formar professores como intelectuais autônomos,

instrumentalizados por uma educação científica e crítica.

O percurso dos estudos sobre a epistemologia do professor pesquisador revelam

que este é um sujeito à medida que tem o domínio da escolha dos processos de

construção e produção do conhecimento e que, por isso mesmo, faz de seu trabalho

educativo uma experiência de articulação entre teoria e prática.

Ao estudar o estágio com pesquisa na triangulação entre a epistemologia do

conceito de professor pesquisador, na intercessão com o conceito de professor

reflexivo, articulado, fundamentado e organizado aos processos de investigação da

realidade pode-se afirmar que um professor formado nesta perspectiva tem mais

condições de dominar as ferramentas da construção do conhecimento pelo caminho da

pesquisa que outro formado só a partir dos conceitos, isto é, dos produtos da Ciência.

Este estudo constata que os professores recém-formados possuem sérias

dificuldades no enfrentamento da cultura escolar, por isso acabam rendendo-se a ela,

conservando os hábitos que já encontram ao chegar à escola. No entanto, os docentes

pesquisados, também manifestam sentimentos de que a formação lhes deu uma visão

mais alargada da realidade e lhes permite perceber com mais clareza as injustiças

sociais e os mecanismos de coerção. Têm uma visão diferenciada da realidade,

especialmente no sentido de perceber algumas “brechas” para fazer diferença no

contexto escolar em que se encontram.

De acordo com a pesquisa, a proposta do estágio com pesquisa garantiu aos

professores uma visão mais crítica da realidade, além de despertar-lhes o interesse pelos

processos de pesquisa desenvolvidos na escola, mesmo que dentro de espaços e

condições limitadas por um currículo que incorpora a velocidade e o interesse do

mercado e não a construção do conhecimento, que demanda tempo e um novo currículo

a ser elaborado, estudado e testado pelo coletivo escolar.

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EdUECE - Livro 400471

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Constatou-se que o Ensino de Ciências, embora as iniciativas em levar alguns

dos processos da pesquisa para sala de aula, ainda se faz, em sua maioria, pelo estudo

dos conceitos consolidados pela ciência com apoio do livro didático e não com os

processos de construção da ciência.

Levando em conta que o processo de formação do professor é inconcluso,

acredita-se que os egressos formados na perspectiva do Estágio com Pesquisa, dão

pistas, em sua prática, de um ensino com processos que fazem parte da investigação em

aula, mas se pode dizer que a marca mais evidente dessa atitude investigativa é o

inconformismo com a realidade escolar. A resposta que dão os professores está na

necessidade que sentem de buscar constantemente o desenvolvimento de práticas

educativas mais críticas pela busca constante do saber construído em colaboração com

os estudantes.

Constatou-se que não basta ter conhecimento para mudar uma realidade como a

escola. O conhecimento é uma ferramenta e o professor, por mais que saiba utilizar bem

essa ferramenta, não tem condições de fazer uma transformação enquanto individuo, por

isso, a educação sozinha não muda uma sociedade, mas é capaz de construir a mudança

por meio dos processos de reorganização do conhecimento, do trabalho coletivo e da

renovação do currículo centrado nos processos e não exclusivamente nos produtos de

ensino.

Construir processos de conhecimento é acercar-se da realidade. Portanto, ao

estudar o Estágio com Pesquisa compreendeu-se que a construção do conhecimento é

feito a partir de todo um processo de pesquisa. Percebeu-se que a grande dificuldade dos

professores da Educação Básica é que não se apropriaram dos processos de produção do

conhecimento da Ciência na graduação. Uma formação estreita implica limitações na

construção do conhecimento com seus estudantes, reduzindo-se a aula ao repasse de

informações e não a apropriação do conteúdo por parte dos discentes.

Isto acontece porque a compreensão dos conceitos de Ciências tem sido

enfatizada nos programas de formação contínua como questões que carecem de

soluções meramente técnicas e práticas, reflexo da tradição acadêmica que toma como

premissa que o domínio da “matéria”, pelo professor, é o mais importante para a

formação docente.

A pesquisa revela que o Ensino de Ciências é visto, de um lado, como disciplina

decorativa presente no currículo escolar, com uma carga horária mínima e seu ensino se

dá predominante a partir do livro texto. De outro, como visão de mundo que, com seus

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EdUECE - Livro 400472

Page 27: O ensino explícito, aspectos teóricos e práticos (2° texto). PROCESSOS... · de ensino está associada ao bom desempenho do aluno. Em termos práticos, vamos examinar os componentes

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instrumentos de construção do conhecimento, possibilita o desenvolvimento dos

estudantes mediante processos de investigação em aula de diferentes modos, inclusive

através de jogos.

Os professores compreendem que o Ensino de Ciências é um componente

curricular que, por ser trabalhado de forma disciplinar e com menor carga horária em

relação às outras disciplinas do Ensino Fundamental, é desenvolvido por meio do livro

texto na maioria das vezes, como atividades extraescolares.

Os professores demonstraram interesse em realizar aulas mais significativas.

Nisso a pesquisa demonstrou que eles até fazem, com certo limite, experiências que

envolvem alguns passos da pesquisa, como a observação de um objeto, o registro dessa

observação e socializam com os colegas os resultados. Quando tem apoio do gestor e do

pedagogo utilizam alguns espaços não formais, muito raramente em datas

comemorativas.

Entre os pontos limitantes da pesquisa destacam-se a inviabilidade de

participação efetiva dos sujeitos egressos no curso de formação proporcionado. No

entanto, é preciso relembrar que a formação continua deve acontecer mesmo é na escola

onde os professores desenvolvem a docência, o que não foi possível neste caso.

Acredita-se que como a pesquisa é constituída por sujeitos, de gente como a

gente. Muitas vezes, foi desafiador estudar a realidade na qual se trabalha e interagir

com os pares, talvez porque desnude o fazer pedagógico cotidiano em que, ao estudar

sobre a formação desenvolvida por terceiros, reflete-se também sobre o “papel” de

formador, para além da responsabilidade de pesquisador.

A busca da resposta à pergunta: em que medida o estágio vinculado à pesquisa

contribuiu para a educação científica na formação inicial de professores? Fez-se um

caminho que trouxe como resposta as seguintes conclusões:

O curso estudado, até certo momento de sua historia, conseguiu desenvolver

naqueles sujeitos das primeiras turmas, cujo recorte se dá no período de 2003 a

2005, a ideia mais sólida da proposta do professor pesquisador reflexivo. O que

fica visível na compreensão que os professores egressos (tanto os que

participaram do curso como os entrevistados) nos apresentam.

A maior referência de uma postura investigativa sentida nos egressos se dá pela

resistência às condições de um ensino memorístico e a postura de constante

busca pelo conhecimento, uma vez que nenhuma transformação coletiva

acontece, enquanto sentimento, de forma individual, pois ela é coletiva e

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EdUECE - Livro 400473

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processual, embora se saiba que possa partir das ações de cada sujeito na direção

do coletivo.

O conceito de professor pesquisador, enquanto não foi bem compreendido em

sua proposta pelos professores do curso (na Universidade), não foi

compreendido pelos estudantes, que só se apropriaram depois de perceber os

professores mais afinados com o conceito e sua prática.

O trabalho de gestão da instituição pesquisada, enquanto esteve articulado com a

coordenação do curso pesquisado, com o devido apoio a professores e

estudantes, deu resposta positiva ao modelo de docente que se pretendia, ficando

claro, pela fala dos sujeitos, que na medida em que a coordenação pedagógica

não articulou com a clareza adequada a organização do trabalho pedagógico com

professores e estudantes, estes últimos sentiram a ruptura de um processo de

formação que se iniciou valorizando a pesquisa e depois a deixou em segundo

plano, perdendo sua epistemologia vinculada ao conceito de formação reflexiva-

pesquisadora.

Concluiu-se também que os professores que vem de uma jornada de trabalho de

quarenta horas precisam de maior energia física e intelectual para dar conta de

não cair no adormecimento de suas capacidades intelectuais diante do sistema

opressor e alienante que devora aqueles que não estão preparados para resistir à

cultura escolar hegemônica, desesperançados com as condições que exigem

ruptura com as ideias de uma educação discriminadora.

Esta pesquisa teve seus limites. Ao estudar a literatura que trata do conceito de

professor-pesquisador foi possível compreender que quando o professor desconhece

como se constrói o conhecimento este não domina os processos de construção dos

conceitos da Ciência a qual se origina sua disciplina. O professor, por sua vez,

concentra todos os seus esforços em fazer com que os estudantes decorem os conceitos,

ou os aprendam mecanicamente, sem a construção do processo, que vai requerer utilizar

elementos da pesquisa que na sua formação também não foi desenvolvida. Isso reflete

uma prática conteudista em que professor e estudante saem frustrados e

incompreendidos, engolidos pela cultura centrada em um currículo carregado de

conceitos que deve dominar em um curto espaço de tempo, que não coincide com o

tempo necessário para a construção significativa do conhecimento escolar.

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EdUECE - Livro 400474

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Diante destas reflexões conclui-se que a formação desenvolvida no Estágio com

Pesquisa deixa marcas de uma educação científica na inquietação sentida em todos os

egressos cursistas e entrevistados.

É possível concluir, também, que estes não encontram condições para agir em

todas as ocasiões como professores pesquisadores, mas deixam claro que a luta que

travam consigo mesmos na condição de intelectuais da cultura, embora em número

menor, é vivenciada com seus estudantes para a formação destes a partir de processos

que articulam ensino com processos de investigação.

Na experiência com os concluintes constatou-se um movimento que foi da falta

dos pressupostos (conhecimentos, planejamento e projeto consistente) que influenciou

negativamente tanto na proposta de integração entre estágio e pesquisa, quanto de uma

Educação Científica sustentada na concepção de professor-pesquisador. Mas, depois do

percurso, com o desenvolvimento das atividades observou-se avanços referentes ao

processo de Educação Científica, principalmente porque os estudantes se empenharam

em superar a falta dos pressupostos, que não tiveram acesso em disciplinas

anteriormente, possibilitando-os perceber a educação desenvolvida por meio do ato de

pesquisa, que permite uma mudança de perspectiva de um ensino formativo para uma

prática criativa e transformadora.

No contexto daquela experiência com os concluintes é importante frisar que a

sociedade proclama os princípios democráticos, mas pouco investe no cultivo da

autonomia, da habilidade argumentativa e do valor da diversidade. De certo modo, o

modelo de estágio com pesquisa contrasta com esta contradição, pois busca formar

justamente esse sujeito crítico e participativo. Decorrente disso e por meio da pesquisa o

professor terá maiores condições de cultivar as características necessárias para operar

mudanças significativas no desenvolvimento coletivo da sociedade. Desta forma, a

ressignificação da concepção do professor-pesquisador por parte dos estudantes dessa

pesquisa, no processo vivenciado por aqueles sujeitos, demonstra o desenvolvimento da

Educação Científica.

O desenvolvimento do Estágio com Pesquisa enfatiza que o processo da

formação científica é construído a partir da valorização, planejamento e

acompanhamento dos diversos professores das disciplinas no transcorrer do curso, do

mesmo modo que, ao longo do estudo, os estudantes devem ser estimulados a uma

perspectiva crítico-reflexiva na e sobre a prática. No caso desta pesquisa, a proposta do

estágio com pesquisa, constata-se que houve a ressignificação da concepção do

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EdUECE - Livro 400475

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professor pesquisador, levando os estudantes a perceberem a necessidade de reflexão

sobre o espaço de articulação do estágio com a pesquisa. Além disso, também

perceberam a proposta do estágio com pesquisa presente naquele momento formativo,

gerando um avanço no momento de Educação Cientifica. Desse modo, entenderam que

o espaço destinado à proposta de se pesquisar no estágio contribui no desenvolvimento

do pensamento articulador entre prática e teoria, isto é, educação e ciência.

Conclusão

Embora não seja muito adequado no momento da conclusão, considera-se

importante retomar algumas falas dos sujeitos, pois sintetizam elementos significativos

do processo. Um dos professores orientadores entrevistados apresentou bem as

fortalezas e debilidades no processo de articulação entre estágio e pesquisa: “as

fortalezas são: engajamento dos professores, compreensão de universalidade de

conhecimentos e práticas, oferta de possibilidade de ida às escolas desde os primeiros

períodos do curso, exercícios interdisciplinares e confecção de projetos de pesquisa e

propostas de ações. As debilidades são: desarticulação entre os docentes e as

disciplinas que ministram, falta de uma escola de aplicação dos saberes e fazeres do

curso”.

Por meio da atividade do painel integrado com os concluintes obteve-se

sugestões dos estudantes sobre a melhoria do processo formativo no curso em questão:

(1) o estabelecimento de parcerias entre a universidade e as escolas públicas para

contribuir significantemente com a prática educativa; (2) discutir com estudantes, desde

o início da formação inicial, a proposta do curso em atrelar estágio à pesquisa,

contribuindo para o avanço das pesquisas desenvolvidas; (3) iniciar o processo de

orientação e estágio logo no início do processo formativo mantendo o mesmo corpo

docente no acompanhamento da pesquisa.

Para ratificar, apresentam-se trechos das falas de dois estudantes que

experienciaram a condição de sujeitos dessa pesquisa. O primeiro recomenda que “[...] a

coordenação deve ser mais politicamente independente, para que tenha maior

liberdade para tomar decisões, sobretudo quanto às questões de extensão. Isso

aproximará o objeto das pesquisas à realidade contextual em que as mesmas são

produzidas. Quanto aos professores, muitos estão bitolados a linhas epistêmicas

ortodoxas, algumas muito distantes do foco local, sem falar de que não estão em

sintonia com as próprias propostas de pesquisa da universidade, já que não passaram

Didática e Prática de Ensino: diálogos sobre a Escola, a Formação de Professores e a Sociedade

EdUECE - Livro 400476

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pelos mesmos processos a que empurra os discentes, algo que cria abismos conceituais

e metodológicos” (Egresso 4).

O segundo sustenta que: “[...] todas as disciplinas ligadas diretamente à

pesquisa, devem ser priorizadas no processo formativo, levando o aluno ao

conhecimento real em relação ao universo geral da pesquisa educacional. A instituição

deve procurar e proporcionar ao maior número de acadêmicos possíveis a participação

em projetos de iniciação cientifica remunerado ou não, ressaltando sempre a

importância desses projetos na formação profissional e acadêmica. A coordenação

deve procurar conscientizar os acadêmicos desde seu ingresso sobre a proposta da

Universidade de formar o professor pesquisador [...], mostrando alternativas e

promovendo encontros e eventos que esclareçam definitivamente este processo para

todos. Os professores devem apoiar a coordenação e sempre que possível esclarecer

temas relacionados a pesquisa, independente da disciplina a qual estejam ministrando,

pois todos são no mínimo mestres em seus respectivos campos de conhecimento e estão

capacitados a orientar e ajudar os alunos em relação a estes temas” (Egresso 5).

A partir da compreensão da expressão dos sujeitos, o processo vivenciado na

realização do plano de ação com os concluintes levou-os a repensar a sua própria

formação evidenciando aspectos do Projeto Pedagógico do Curso, que propõe que a

pesquisa seja o eixo articulador entre as disciplinas. Por outro lado, mesmo que alguns

estudantes não tenham tido conhecimento sobre o Projeto Pedagógico do Curso,

percebe-se que reconheceram a proposta de estágio como processo de pesquisa centrado

na ideia de que a aprendizagem da profissão leva o professor a produzir conhecimento a

partir da prática.

Constata-se, depois da análise, que a elaboração do trabalho de conclusão do

curso, quando conduzida a partir da valorização da pesquisa, é um processo formativo

que contribui para que a educação científica efetivamente ganhe sentido na formação do

professor.

Ficou evidente também que quando o processo em questão é evidenciado no

período de estágio, mais significativa fica aquela experiência. Os estudantes concluintes

passaram a vivenciar um momento ímpar em que lhes foi possível articular o que foi

dito pelos professores em sala de aula, durante o processo de formação, com o que os

professores que atuam na docência faziam e fazem no cotidiano das escolas, não apenas

como um compromisso a ser cumprido por exigência do curso, mas como um momento

de aprendizado de como é possível ser professor pesquisador, na articulação entre teoria

Didática e Prática de Ensino: diálogos sobre a Escola, a Formação de Professores e a Sociedade

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e prática. Ao mesmo tempo em que essa experiência também ajuda o professor a

compreender a sala de aula como um espaço de construção da cidadania, princípio

básico da Educação Científica.

Decorrente de todo o trabalho aqui apresentado podemos afirmar que o

desenvolvimento do estágio com pesquisa fundamenta-se em uma “pedagogia do

conhecimento” que constitui a estrutura de uma educação científica constitutiva de uma

identidade que possibilita um trabalho docente centrado nos processos de conhecimento

como condição de autonomia intelectual, política e científica do professor. Por isso,

abre novos horizontes na direção da crítica ao instituído...

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EdUECE - Livro 400479

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Eixo: A Didática e a Prática de Ensino na relação com a Formação de Professores

Subeixo: Escola como espaço de formação docente.

Simpósio: 2.1. Processos Didáticos na formação de professores: relação teoria e prática

Título da Apresentação

Didática multidimensional: da prática coletiva à construção de princípios

articuladores

Autores

PIMENTA, Selma Garrido

Universidade de São Paulo – USP

[email protected]

FRANCO, Maria Amélia Santoro

Universidade Católica de Santos - UCS

[email protected]

FUSARI, José Cerchi

Universidade de São Paulo – USP

[email protected]

Resumo

Consideramos que os saberes ensinados são reconstruídos pelos educadores e

educandos e, a partir dessa reconstrução, os sujeitos têm possibilidade de se tornarem

autônomos, emancipados, questionadores. Como a Didática tem oferecido fundamentos

a essa prática? A disciplina Didática, em suas origens, foi identificada, no Brasil, a uma

perspectiva normativa e prescritiva de métodos e técnicas de ensinar, perspectiva essa

que ainda permanece bastante arraigada no imaginário dos professores. Quando

indagados sobre o que dela esperam, respondem: técnicas de ensinar. O que evoluiu no

campo de seu ensino para alterar essa expectativa? Na convicção de que a Didática, nos

seus princípios gerais, pode contribuir para fundamentar a prática do ensino em

diferentes níveis e modalidades, foi que criamos, em 1989, (Pimenta et all, 2013) um

grupo de estudos e pesquisas com foco nas práticas escolares e nas práticas de ensinar e

aprender. A grande questão que passou a nortear o grupo após o ano de 2001 foi: O que

a Didática pode oferecer, em seus fundamentos teóricos e metodológicos, aos

professores em formação? Como articular uma Didática que tenha no sujeito aprendente

seu olhar e seu foco? Percebemos em nossas investigações que as didáticas específicas

muitas vezes, ao se preocuparem apenas com a transposição didática, minimizam a

configuração complexa da prática do ensino. Assim, propomos discutir as articulações

possíveis entre os princípios pedagógicos da epistemologia de uma Didática

Fundamental com as didáticas específicas, propondo o estatuto de uma Didática

Multidimensional, que fundamente a prática do ensino como um fenômeno complexo e

multirreferencial, uma vez que temos observado que o foco excessivo na dimensão

disciplinar retira da tarefa do ensino sua necessária multidimensionalidade.

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Palavras–chave: Epistemologia Didática; Didática Multidimensional;

multirreferencialidade

Introdução:

Consideramos que os saberes ensinados são reconstruídos pelos educadores e

educandos e, a partir dessa reconstrução, os sujeitos têm possibilidade de se tornarem

autônomos, emancipados, questionadores. Situados em contextos que lhes garantam

condições institucionais e de trabalho para o exercício digno de suas atividades de

ensinar e aprender, professores e alunos, conseguem esse nível de qualidade. Como a

Didática tem oferecido fundamentos a essa prática vislumbrada por Freire, (1996)? A

disciplina Didática, em suas origens, foi identificada, no Brasil, a uma perspectiva

normativa e prescritiva de métodos e técnicas de ensinar, perspectiva essa que ainda

permanece bastante arraigada no imaginário dos professores brasileiros e dos alunos que

se direcionam aos cursos de formação. Essas tensões conceituais serão analisadas neste

texto.

Pode-se afirmar que a lógica da Didática é a lógica do ensino, no entanto e

contraditoriamente, essa vocação básica da Didática realiza-se apenas e tão somente

através da aprendizagem dos sujeitos envolvidos no processo. Portanto a questão da

Didática amplia-se e complexifica-se ao tomar como objeto de estudo e pesquisa não

apenas os atos de ensinar, mas o processo e as circunstâncias que produzem as

aprendizagens e que, em sua totalidade, podem ser denominados de processos de

ensino. Portanto o foco da Didática, dentro nos processos de ensino, passa a ser a

mobilização dos sujeitos para elaborarem a construção/reconstrução de conhecimentos e

saberes.

Assim, mais complexo que elaborar o ensino, numa perspectiva antiga de

organização de transmissão de conteúdos, será agora a perspectiva de desencadear nos

alunos atividade intelectual que lhes permita criar sentido às aprendizagens e só assim,

reelaborá-las e transformá-las em saberes.

Paulo Freire (2011) insiste nessa perspectiva desde os primórdios da Pedagogia

do Oprimido nos finais da década de setenta do século passado. E retoma suas idéias,

quando retorna ao Brasil no início do século XXI, reafirmando que ensinar não é

transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua produção ou a sua

construção (p.24), realçando que essa perspectiva transforma o papel do professor e da

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Didática, uma vez que quem forma se forma e reforma ao formar, e quem é formado

forma-se e forma ao ser formado (p.25). Reiterava assim que o educador deve ajudar os

alunos a questionar sua realidade, problematizá-la e tornar visível o que antes estava

oculto, desenvolvendo novos conhecimentos sobre ela. Paulo Freire (2011) considera

que quanto mais se exerce criticamente a capacidade de aprender, mais se constrói e se

desenvolve o que denomina curiosidade epistemológica, conceito aproximado do que

estamos aqui denominando de atividade intelectual do aluno, articulado aos conceitos

de sentido e prazer em Charlot (2000). Aí está o papel contemporâneo da Didática que

estamos denominando de Didática Multidimensional: uma Didática que tenha como

foco, a produção de atividade intelectual, no aluno e pelo aluno, articulada a contextos

nos quais os processos de ensinar e aprender ocorre. Uma Didática que se paute numa

pedagogia do sujeito, do diálogo, onde a aprendizagem seja mediação entre educadores

e educandos.

Os princípios epistemológicos dessa Didática Multidimensional buscamos nos

20 anos de pesquisas junto ao GEPEFE-USP (Grupo de Estudos e Pesquisas sobre

Formação do Educador), bem como na teoria de Paulo Freire e na perspectiva de que, as

didáticas específicas, excessivamente voltadas à estruturação de conteúdos e métodos,

acaba apequenando e impedindo a consideração do ensino em sua perspectiva

multirreferencial e multidimensional. Os conceitos de curiosidade epistemológica

(Freire, 2011), de multirreferencialidade (Ardoino) e da relação com o saber (Charlot,

2000) estarão implicados na construção do conceito aqui proposto de Didática

Multidimensional.

Multidimensional ou Multirreferencial?

O conceito de multirreferencialidade, cunhado por Ardoíno 1992, veio ao

encontro de nossas pesquisas e estudos sobre a Pedagogia como ciência da educação,

afirmando-a como a matriz articuladora dos diferentes aportes disciplinares que se

debruçam sobre a educação. Assim, conforme Franco (2001, p. 11):

(...) as demais ciências, ao estudarem a realidade educacional utilizam-se

de seus aportes epistemológicos que fundamentam seus métodos e recortam

seu objeto. Essa postura tem sistematicamente produzido uma visão

distorcida da potencialidade desse objeto de estudo (a educação) e talvez

seja um dos fatores que poderão explicar o contínuo fosso entre teoria e

prática educacional.

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E ainda Pimenta (1996, p. 45):

A fecundidade destas ciências, no entanto, é de pouco valor para a

investigação pedagógica, pois o psicólogo, quando trabalha no campo

educacional, não faz pedagogia. Ele tão-somente aplica conceitos e

métodos de sua ciência a um dos campos da atividade humana, no caso, a

educação [...]

Por isso, a multirreferencialidade foi se constituindo em um apoio à nossa

perspectiva de considerar a educação como campo de estudo de diferentes ciências, mas

com aportes metodológicos diferentes. Entendemos que só a Pedagogia pode

compreender o fenômeno educativo a partir da ótica do pedagógico. E Ardoíno nos

reforça quando afirma que:

[...] a análise multirreferencial das situações das práticas, dos fenômenos e

dos fatos educativos se propõe explicitamente uma leitura plural de tais

objetos, sob diferentes ângulos e em função de sistemas de referências

distintos, os quais não podem reduzir-se uns aos outros. (Ardoino, 1998, p.

7)

Ao estudarmos a Pedagogia, também considerávamos importante a não redução,

subordinação ou sobreposição de um aporte teórico sobre os outros. Era a diversidade

de aportes que nos interessava e que permitia uma leitura plural e complexa dos

fenômenos da educação.

Ao explicitar a Pedagogia como ciência da e para a práxis, que toma a práxis

como ponto de partida (iluminada pelas escolhas teóricas) e ponto de chegada (revendo,

confirmando, negando, propondo teorias e apontando as transformações necessárias à

emancipação humana), realizamos estudos para reconfigurar o método dessa ciência,

que não poderia se contentar com os aportes positivistas. A propósito e conforme

Franco, 2001:

Mesmo a abordagem inter e multidisciplinar, integrando os conhecimentos

produzidos pelas diversas ciências que estudam a educação, dificilmente

poderá dar conta de compreender a essência do fenômeno educativo”[...]

pois os fenômenos ao serem apreendidos, pelas diferentes ciências, com

diferentes intencionalidades, nem sempre terão pontos articuladores de

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convergência epistemológica, redundando no que Coelho e Silva (1991: 31)

chama de “tapeçaria de conhecimentos dispersos pelas ciências.”

Nessa perspectiva, foi importante naquele momento analisar a proposta de

Ardoino que discute a questão das ciências da educação, realçando:

Apesar das tentativas para “calcá-las” mais ou menos sobre o padrão das

ciências exatas, já não podemos nos contentar atualmente com uma

aproximação somente “positivista” no marco das ciências antropossociais

[...] no seio das quais se situam, incontestavelmente, diferentes olhares que

pretendem dar conta cientificamente dos fenômenos que interessam à

educação e às práticas que põem esta em ação. (Ardoíno, 1998, p. 8).

Esses estudos reforçaram nossa concepção de que a Didática e a Didática

Específicas necessitam articular-se à ciência pedagógica, numa relação de íntima

aderência, uma vez que ausente dos fundamentos pedagógicos que lhe dão suporte,

torna-se mera tecnologia.

Como espaço privilegiado da Pedagogia, estudamos e pesquisamos a Didática

Geral, diferenciando-a das Didáticas Específicas, que são para nós, metodologias

voltadas à estruturação da parte do ensino que organiza os conteúdos das diferentes

disciplinas. Temos concluído que, muitas vezes, o foco excessivo na dimensão

disciplinar retira da tarefa do ensino sua necessária multidimensionalidade. Acreditamos

que o ensino é uma atividade multidimensional, em todas as esferas disciplinares.

Empregamos esse termo, em complemento à abordagem multirreferencial, para

reafirmar nossa convicção de que o ensino, de qualquer disciplina do saber, requer uma

dinâmica de convergência nos atos e formas de ensinar. Requer fundamentos

pedagógicos essenciais, uma vez que a prática da educação organiza-se como fenômeno

complexo imbricado nas condições históricas e mediado por múltiplas determinações.

Considerando que o ensino na sociedade se desenvolve intencionalmente nas

instituições escolares, faz-se necessário explicitar os princípios de uma Didática mais

geral que articule e fundamente os processos de mediação entre a teoria pedagógica e a

ação de ensinar.

A concretização do ensino em sala de aula extrapola e transcende a perspectiva

das Didáticas Específicas cujo foco é a estrutura metodológica e conceitual dos

conteúdos. A tessitura dos conteúdos e sua necessária transposição didática, requer a

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contínua articulação entre os princípios educativos, a intencionalidade pedagógica e a

especificidade das condições dadas. Essa triangulação solicita uma base sólida de

princípios e valores, de forma a não se tornar uma mera aplicação de modos de fazer. A

didática específica, por sua vez, requer uma base de fundamentos para bem se articular

com o todo, base essa já assinalada na perspectiva de Chevallard (1991) em: La

transposición didáctica: del saber sabio al saber enseñado. Mas o que é o saber sábio

senão um saber antecedente que fundamenta e dirige o saber ensinado? Cremos que há,

ou pode haver, um processo contínuo de simplificação dos conteúdos para se adaptarem

às limitações do saber ensinado. Aliás, à própria percepção de que algo pode ser

ensinado de fora para dentro. Essa perspectiva de ensinar pode apequenar a dimensão do

saber sábio. Além de minimizar e mesmo subtrair os sujeitos aprendentes e ensinantes,

ao afirmar que toda disciplina (da matemática, no caso de Chevallard e todo o IREM, na

França) possui uma lógica imanente da qual decorre a lógica de ensiná-la, pois são

somente os especialistas das disciplinas aqueles que têm competência para saber e dizer

como ensiná-la. Nessa ótica, os professores, em que pese sua colaboração nesse

processo, seriam os técnicos que executariam o que foi definido pelos especialistas. E

de que lugar os especialistas ‘dizem’? Para quem dizem? Em que contextos dizem? Há

um ‘dizer’ válido/aplicável em qualquer escola, para toda e qualquer situação em que se

encontram os sujeitos professor/aluno? Que sujeitos os ‘matemáticos especialistas

pretendem formar quando dizem o que e como ensinar matemática?

Dentre os autores que apontam os perigos dessa simplificação, Luccas (2004, p.

123) afirma que:

A ausência da segunda transposição didática e a presença da simplificação

sofrida pelo saber, a nosso ver, apresenta-se como um dos fatores

responsáveis pelo fracasso no atual ensino, como muitas pesquisas vêm

apontando. Acreditamos que a existência da simplificação deve-se,

principalmente, à falta de formação apropriada dos responsáveis para

trabalharem com a transposição didática.

E Davini, quando se refere ao problema das didáticas das disciplinas (em

especial à Transposição Didática) de estarem

[...] elaborando uma “teoria diafragmática” [que] ao colocar seu foco em

uma ou duas dimensões, reduzem o processo de ensino a uma tarefa

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formativa nas disciplinas separadas entre si, constituindo teorias

autonomizadas e fragmentárias. (Davini, 2013, p. 54).

Há que se pensar na imponderabilidade dessa transposição: quem a faz? Como a

faz? O professor é o responsável por essa transposição? Como não desprezar o saber

sábio que antecede o saber científico? Para Chevallard (1991) a Transposição Didática é

feita por uma Instituição ‘invisível’, uma ‘esfera pensante’ que ele nomeou de Noosfera:

professores, instituições, livros didáticos, universidades, redes de ensino, etc.. Cabe

indagar: como articular interesses/valores/perspectivas de tantas ordens? Como permitir

que essas didáticas de cada disciplina caminhem de maneira tão avulsa e não

coordenadas? Será que Lucca, (citado) tem razão quando afirma que a transposição é

um dos fatores que explicariam o fracasso das salas de aula? E que um dos fatores que

contribuem para isso é o tratamento fragmentado do saber escolar, fragmentado (e

mesmo enclausurado) em cada disciplina, conforme Davini?

Chevallard (1991) aponta a necessidade de um trabalho interno de transposição,

onde o professor é o responsável por esse novo momento na transformação do

conteúdo. Mas nós nos perguntamos: quem é esse professor? Onde está o coletivo de

professores? De que forma foi realizada a formação desse professor? Pode ele produzir

adequadamente o que dele se espera? Há fragilidades que precisam ser superadas,

especialmente na articulação dessas duas esferas da transposição. Há a necessidade de

um rigor e uma vigilância epistemológica, do contrário os saberes se perderão num

labirinto de pequenas interpretações. E os alunos serão vitimados se não aprenderem o

que e do jeito que os ‘sábios’ dizem que ele devem aprender.

Concordamos que há um trabalho político pedagógico necessário para que os

conteúdos escolares sejam negociados, filtrados, escolhidos, propostos no projeto

político pedagógico dos cursos, das áreas, das disciplinas, negociados, articulados,

discutidos entre os professores. Essa ideia existe desde Comenius. Concordamos com

Sacristán (1996, p. 42) quando realça que uma das razões de ser do saber-fazer

pedagógico tem sido a de propiciar a elaboração da cultura transmissível para que seja

assimilável por determinados receptores.

Essa possível simplificação que a transposição pode gerar, foi também

comentada por Lopes (1999) quando propôs o conceito de mediação didática em

substituição ao de transposição didática, sugerindo uma perspectiva dialética que

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substituísse a idéia de reprodução, ou mesmo de um “movimento de transportar de um

lugar a outro, sem alterações”(p.208).

Também Forquin (1993), relembra a importância do resgate da dimensão

epistemológica na discussão do conhecimento escolar. O autor preconiza o retorno à

lógica pedagógica em oposição à razão sociológica (ou à razão matemática,

completamos nós), que por muito tempo impregnou os estudos de construção dos

saberes curriculares.

Lopes vai mais adiante e reafirma o que talvez estejamos buscando com a

Didática Multidimensional:

Além da crítica de Forquin, defendo que o papel da epistemologia não se

resume à discussão da validade epistemológica dos saberes, mas na

possibilidade de introduzir uma nova forma de compreender e questionar

o conhecimento, internamente, na sua própria forma de se

constituir.”(grifos nossos) (1999, p.167).

Na seleção de conteúdos didáticos, para além das questões específicas postas

pelas didáticas das disciplinas, há toda uma teoria pedagógica presente na formulação

de projetos de organização da escola.

Os conteúdos a serem ensinados passam necessariamente pela análise das

diferentes culturas presentes nas instituições, bem como pela análise das tensões e dos

valores necessários à explicitação das finalidades do ensino; pela análise das diversas e

divergentes concepções de educação e ideologias presentes nos sistemas de ensino; pela

incorporação de diferentes contribuições das áreas de conhecimentos específicos no

desenvolvimento humano que produzem processos de subjetividade e socialização dos

sujeitos aprendentes e ensinantes. Que ‘perfil’ de humano, de humanidade queremos

construir no nosso educando? Qual a contribuição das disciplinas específicas? É

desejável que se mantenham enclausuradas nos seus respectivos aportes? Essas questões

apontam para o qual deve ser o fio condutor de todo o projeto político pedagógico. E a

pedagogia e a didática como aqui explicitamos, podem respaldar educadores e

educandos na reconstrução dos saberes ensinados; para que se tornem autônomos,

emancipados, questionadores dos saberes historicamente produzidos, analisando-os em

seus nexos com os problemas sociais, humanos, gerados por esses mesmos saberes. E

reconstruindo-os na direção de superar esses problemas.

Ao delinear conteúdos de ensino há que se ocupar com as (novas) formas de

comunicação entre as gerações; com o estudo e o desenvolvimento de modelos

metodológicos e didáticos; com a formulação e crítica de critérios para a seleção de

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conteúdos e organização de atividades de aprendizagem, coerentes ao projeto educativo

institucional; com a ressignificação dos sistemas de avaliação para que sejam estratégias

de inclusão, participação e indiquem caminhos de superação dos problemas e das

dificuldades dos estudantes e das escolas.

Ainda temos a considerar que todo processo didático está imbricado com as

políticas de formação dos docentes em diferentes cenários nacionais e internacionais, na

busca de práticas que possibilitem o desenvolvimento de capacidades de reflexão crítica

nos futuros docentes, tendo em vista o fortalecimento da autonomia didático pedagógica

dos coletivos de docentes imersos na educação escolar.

No entanto, mesmo nessas pesquisas pouco se tem considerado os impasses da

escola atual, com as precárias condições trabalho que fragilizam as relações professores,

alunos conhecimento; com as fragilidades da formação docente, distanciada das

contradições presentes nas escolas, nos sistemas de ensino e na sociedade. E que exigem

uma Didática ampliada em suas perspectivas, uma Didática com forte vinculação à

ciência pedagógica. À medida em que as Didáticas Específicas se esquecem que o

tratamento dos conteúdos de ensino e das práticas docentes precisa se deslocar da sala

de aula para a escola, ou seja, ampliando-os como prática docente pedagógica, os

temas clássicos como projeto político pedagógico, projeto curricular, objetivos e

finalidades do ensino, métodos e metodologias, recursos, avaliação, etc., se neutralizam,

fragilizam a prática formativa inerente ao ensino; ou seja, compromete o que lhe pode

trazer significados (Freire, 2011; Charlot, 2013).

Há, pois, que se considerar, com FRANCO, 2012, que nas práticas docentes e

nas práticas didáticas, atividades formativas dos sujeitos que ensinam e que aprendem

há múltiplas dimensões pedagógicas, que incluem e extrapolam a sala de aula. Daí,

entendemos que a essa Didática, que tem seu suporte na teoria pedagógica que parte da

práxis educativa e a ela retorna, seria próprio denominar de Multidimensional.

A Didática Multidimensional explicita assim seu campo próprio e dialoga com

as Didáticas Específicas porque há princípios formativos e pedagógicos que devem estar

presentes em todo processo de ensino-aprendizagem, sem os quais essa não se realiza.

Afirmamos assim que, a ausência desses fundamentos pedagógicos, torna o

ensino de qualquer disciplina em simples treinamento do fazer ou do pensar. Ou,

conforme FRANCO (2010), ao considerar [...] a Pedagogia [como] o espaço dialético

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para a compreensão e a operacionalização das articulações entre a teoria e a prática

educativa, e nessa direção ela se organiza como espaço comunicativo à Didática. A

autora conclui que:

Não basta à Pedagogia refletir ou teorizar sobre o ato pedagógico; não

basta à Pedagogia também, orientar ou, muito menos, prescrever ações

práticas para a concretização das práticas educativas. É preciso que a

Pedagogia produza conhecimentos na direção da superação da

fragmentação dos saberes pedagógicos, docentes e científicos que foram

historicamente dissociados. (2010, p.12).

Quando falamos em multidimensionalidade, falamos de convergência, de

fundamentos pedagógicos que subsidiam a proposta multirreferencial. Entendemos que

há uma relação dialética entre multirreferencialidade e multidimensionalidade. A

multirreferencialidade permite a compreensão das totalidades no todo e a

multidimensionalidade do todo às totalidades. O multirreferencial nos ajuda a

compreender a educação em sua complexidade e totalidade; já a multidimensionalidade

foca o ensino na perspectiva da totalidade. Pois, conforme aponta Ardoino, 1995, p. 7-8:

[...] o problema que a análise multirreferencial se coloca é utilizar várias

linguagens para a compreensão dos fenômenos sem misturá-las, sem

reduzi-las umas às outras; o conhecimento produzido por essa postura

seria, portanto, um conhecimento “bricolado”, “tecido” .

O diálogo entre a Didática e as Didáticas Específicas que emerge dessa

compreensão das múltiplas dimensões do ensino e aprendizagem, aponta para a

possibilidade de se superar o tratamento fragmentado dos conteúdos de ensino. Tomar a

especialização, própria das áreas do saber, como referência exclusiva na escolha do

saber a ser ensinado, sem imbricá-los aos pedagógicos e aos próprios das demais áreas

que compõem o currículo escolar, explica, em parte, o fracasso da educação escolar. Ao

contrário, a perspectiva do trabalho coletivo interdisciplinar, referidos aos contextos que

envolvem a educação que se pratica na escola, vem mostrando sucesso nos resultados de

qualidade do conjunto dos estudantes de escolas que, a partir dessa perspectiva, têm

criado novos arranjos curriculares, com atividades que mobilizam a relação dos sujeitos

ensinantes e aprendentes críticos e reflexivos.

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A Didática multidimensional propõe a superação dos ‘pequenos poderes’ das

disciplinas específicas que gera um currículo bricolado, somatório de disciplinas, que

impede a compreensão das partes no todo e deste nas partes. E fragmenta, individualiza,

empobrece, enfraquece a relação dos sujeitos com o conhecimento, dificultando a

possibilidade de que compreendam suas relações enquanto sujeitos situados no mundo.

E afirma a perspectiva da totalidade, articulando as partes no todo como forma

de síntese, superando a bricolagem, através do filtro pedagógico. O que nos permite

ajustar e propor seus princípios.

Por uma Didática Multidimensional:

O professor em sala de aula, oprimido por múltiplas e precárias condições de

trabalho difíceis de serem superadas, sempre nos pergunta: o que ou como pode a

Didática ajudar? Como a Didática, cujo objeto de estudo se concentra fortemente nos

processos que ocorrem na sala de aula, com vistas à formação, às aprendizagens do

aluno, pode ajudar o professor? Frente às dificuldades pedagógicas postas ao professor,

o que pode a Didática “recomendar”?

A partir dos estudos e das pesquisas que realizamos no âmbito do GEPEFE, nos

últimos 20 anos, e com base na obra de Paulo FREIRE e nos estudos de CHARLOT

(2000; 2013), passamos a reafirmar alguns princípios que consideramos essenciais à

prática pedagógica docente.

1- As atividades que compõem o ensino resultam melhor quando envolvidas

em processos investigativos. Alunos e professores ao se articularem como

pesquisadores em ação passam a problematizar a realidade e a buscar alternativas de

pensamento e reflexão. Ao invés de transmitir conceitos e conteúdos a perspectiva será

a de pesquisar a realidade envolvida com aquele conceito, tendo nos saberes das áreas

de ensino como ‘ferramentas’ que ampliam o olhar dos sujeitos sobre a realidade. É

sabido que uma das melhores formas de envolver o aluno nas atividades é mobilizá-lo

com perguntas, pesquisas, buscas e sínteses. (Freire, 1979; Charlot, 2013; Pimenta,

2012; Franco, 2013). A sala de aula transformada em oficina de busca e indagação

produz aprendizagens mais consistentes do que aquelas produzidas em ambientes de

transmissão de conteúdos. (Galleão, 2014). A ação de ensinar como prática social é

permeada por múltiplas articulações entre professores, alunos, instituição e comunidade,

impregnadas pelos contextos socioculturais a que pertencem, formando um jogo de

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múltiplas confluências que se multideterminam num determinado tempo e espaço

social, impregnando e configurando a realidade existencial do docente. Assim, o fazer

docente estará sempre impregnado com as concepções de mundo, de vida e de

existência dos sujeitos da prática. Desta forma, só a pesquisa contínua e criteriosa pode

colocar o professor em processo de contextualização do ensinar/aprender. (Franco,

2013), e de ressignificar seus saberes disciplinares. Lembrando, no entanto o que nos

ensina FREIRE, 2007, p. 86: Antes de qualquer tentativa de discussão de técnicas, de

materiais, de métodos para uma aula dinâmica assim, é preciso, indispensável mesmo,

que o professor se ache“repousado” no saber de que a pedra fundamental é a

curiosidade do ser humano. E ela que me faz perguntar, conhecer, atuar, mais

perguntar, re-conhecer. É bom realçar que a Didática não recomenda técnicas, pois

sabe que elas só são funcionais se denotarem uma forma de expressão significativa do

professor para o processo de ensinar. E cada professor trabalha, opera técnicas conforme

sua postura, seus valores, suas expectativas em relação a que alunos pretende formar e

projeta com seu trabalho.

2- Paulo Freire em toda sua obra sempre se referiu à necessidade de se

estabelecer entre alunos e professores um universo comum de conhecimento, a partir do

qual poder-se-ia estabelecer as bases de um diálogo na perspectiva do logos que vai

então se estruturando e se construindo. Nesse processo, os sentidos vão sendo criados e

transformados, conforme Charlot. Assim, consideramos que esse segundo princípio

seria a necessidade de processos dialogais na sala de aula. Historicamente, esse sentido

de diálogo proposto por Freire, foi sendo muitas vezes apropriado como senso comum.

Há que se recordar que o diálogo precisa estar voltado à construção do conhecimento.

Lembra-nos Freire que para aprender é preciso existir, e existir ultrapassa viver porque é

mais do que estar no mundo. É estar nele e com ele. E é essa capacidade ou

possibilidade de ligação comunicativa do existente com o mundo objetivo, contida na

própria etimologia da palavra, que incorpora ao existir o sentido de criticidade que não

há no simples viver. Transcender, discernir, dialogar (comunicar e participar) são

exclusividades do existir. O existir é individual, contudo só se realiza em relação com

outros existires. Em comunicação com eles.( FREIRE, 1979, p. 57). Essa exigente

proposta de diálogo como criticidade é fundamental para superar o sentido banal de

diálogo como conversa. Em sala de aula o diálogo adquire a perspectiva de

problematização da realidade e de crítica; e com respaldo no projeto político pedagógico

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coletivo esse trabalho em aula amplia o sentido do ensino para os estudantes. Essa é a

dimensão que precisa ser buscada, a superação do empírico pelo concreto, o que se faz

pelo diálogo e pela teoria. Esse processo cria sentido e mobiliza para a ação. Afirma

Freire em 1979, que uma educação dialogal e crítica pode conduzir a uma transitividade

crítica voltada para a responsabilidade social e política e esta transitividade se

caracteriza pela profundidade na interpretação dos problemas. Pela substituição de

explicações mágicas por princípios causais. (…) Pela prática do diálogo, e não da

polêmica.(p.85).

3- Outro princípio que a Didática Multidimensional recomenda é a

construção de processos de práxis, na perspectiva freireana: a praxis, como reflexão e

ação dos homens sobre o mundo para transformá-lo. Sem ela, é impossível a superacão

da contradição opressor-oprimido.” (1997:38). Temos falado da importância da

reflexão, no entanto, mais uma vez, há que se considerar que a apreensão apressada do

conceito, por parte de muitos professores e pesquisadores, tem banalizado sua

interpretação (Pimenta, 2011) e impedido de ser uma proposta contra-hegemônica

frente ao pragmatismo e ao tecnicismo que tem impregnado as práticas educativas e

sociais. É preciso refletir a partir de um saber comum, de um saber contextualizado

sobre o papel social e político da educação e do trabalho docente. Esse movimento da

epistemologia reflexiva da prática, dentro da racionalidade crítica, tal qual proposta por

Carr e Kemmis (1995) e desenvolvida por Pimenta (2002), inova e organiza

possibilidades de ruptura com algumas circunstâncias da cultura profissional

institucionalizada que limitam o exercício e o desenvolvimento da autonomia intelectual

dos docentes. Por isso é estratégico para a superação de condições inadequadas do

trabalho do professor. Vale a pena refletir com Imbert (2003) a distinção que faz entre

prática e práxis, e atentando para a questão da autonomia e da perspectiva

emancipatória, inerente ao sentido de práxis: Distinguir práxis e prática permite uma

demarcação das características do empreendimento pedagógico. Há, ou não, lugar na

escola para uma práxis? Ou será que, na maioria das vezes, são, sobretudo, simples

práticas que nela se desenvolvem, ou seja, um fazer que ocupa o tempo e o espaço, visa

a um efeito, produz um objeto (ou não, acrescentamos) (aprendizagem, saberes) e um

sujeito-objeto (um escolar que recebe esse saber e sofre essas aprendizagens), mas que

em nenhum momento é portador de autonomia. (2003:15). O exercício da práxis requer

processos de conscientização do professor sobre o papel que desempenha na sala de

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aula, no mundo, na vida dos alunos. Somente um professor consciente dessas

circunstâncias pode produzir mudanças e novas perspectivas na vida dos alunos.

4 . Construção de processos de mediação. Como a Didática pode tornar

possível o ensino? Um ensino que proceda à mediação reflexiva entre os valores e a

cultura que a sociedade dissemina e os estudantes em formação? Pode a Didática

sozinha dar conta desta tarefa? É claro que não, no entanto ela, como campo específico

de conhecimento, tem uma responsabilidade social em acompanhar e refletir as

mudanças que ocorrem no mundo e dar respostas para a ressignificação dos processos

de ensino na perspectiva da aprendizagem do aluno. E contribuir com os sujeitos desse

processo, e com a construção de situações de aprendizagem significativas, dentre elas as

aulas, para que sejam interessantes, conforme Charlot, 2000:73) “...uma aula

“interessante” é uma aula na qual se estabeleça, em uma forma específica, uma

relação com o mundo, uma relação consigo mesmo e uma relação com o outro”. A

mediação didática aí penetra ao dispor aos docentes perspectivas de análise que os

ajudem a compreender os contextos históricos, sociais, organizacionais, culturais, nos

quais os sujeitos estão, em relação com o saber a ser re/aprendido.

Assim, a Didática se estrutura nas possibilidades de mediação entre o ensino,

prioritariamente na responsabilidade de professores e a aprendizagem dos alunos.

Enfatizamos que Didática é, acima de tudo, a construção de conhecimentos que

possibilitam a mediação entre o que é preciso ensinar e o que é necessário aprender;

entre o saber estruturado nas disciplinas e o saber ensinável nas circunstâncias e

momentos; entre as atuais formas de relação com o saber e as novas formas possíveis de

reconstruí-las.

5- Considerando a complexidade do ato pedagógico de ensinar e aprender

em contextos, parece-nos relevante considerar que os saberes de várias áreas sejam

mobilizados nesses contextos, pois como nos diz o poeta João Cabral de Mello Neto um

galo sozinho não tece a manhã... À Didática Multidimensional compete considerar os

processos de redes de saberes, dispondo os saberes da ciência pedagógica na criação

das atividades dos ensinantes e dos aprendentes. “Não porque contenha diretrizes

concretas válidas para ‘hoje e amanhã’, mas porque permite(m) realizar uma autêntica

análise crítica da cultura pedagógica, o que facilita ao professor (e à escola,

acrescentamos) debruçar-se sobre as dificuldades concretas que encontra em seu

trabalho, bem como superá-las de maneira criadora”. conforme (Suchodolski, 1979, p.

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477). Na análise de pesquisas apresentadas em eventos nacionais e internacionais

percebe-se a existência de vasto leque temático – epistemologia didática; docência e

pesquisa; relação professor – aluno – conhecimentos; autoridade e autoritarismo;

avaliação; projeto pedagógico; metodologias específicas; relação comunicacional

mediadas por tecnologias, formação de professores crítico-reflexivos, e tantas outras

que poderiam sugerir uma dispersão temática e perda de foco da didática.

No entanto, se considerarmos a complexidade do objeto da didática – o ensino

enquanto fenômeno complexo e prática social – percebemos que as pesquisas estão

apontando para uma abordagem que poderíamos denominar de multidimensional, para

além da multirreferencialidade de um fenômeno, que não se esgota com a análise de

uma única perspectiva, conforme Ardoíno,

Assumindo plenamente a complexidade da realidade sobre a qual se

interroga, a multi-referencialidade se propõe uma leitura plural dos objetos

(práticos ou teóricos), sob diferentes ângulos, implicando diversos olhares e

linguagens específicos. (Ardoíno, 1998, p.103).

A Didática Multidimensional assume como pressuposto a noção de multi-

referencialidade, para subsidiar seu compromisso com o ensino, fenômeno complexo, e

no momento em que as pesquisas na área se voltam para as práticas, interrogando-as

quanto aos seus resultados. Comporta assim uma intenção claramente prática, mas

também teórica, na medida em que possibilita melhor compreender as práticas, numa

perspectiva que se aproxima da curiosidade científica, mas também ética. Em outras

palavras, a noção de multi-referencialidade na base da Didática Multidimensional

aponta para o trabalho conjunto entre professores e pesquisadores no qual o papel da

teoria é o de alargar a compreensão que se tem da prática, nos contextos nos quais se

realiza (escola, sistemas de ensino, movimentos sociais), para criar as condições

objetivas de transformá-las no sentido que se faz necessário (da utopia que se deseja)

(Pimenta, 1996, p. 70).

Em consequência, através da Didática Multidimensional temos a intenção de

valorizar o trabalho docente na perspectiva de, em diálogo com seus saberes de

especialistas, de experiências, de cidadãos, disponibilizar os aportes da ciência

pedagógica que contribuam para ampliar suas análises e crítica, que os ajude a

compreender os contextos histórico, sociais, culturais, organizacionais nos quais se dá

sua complexa atividade docente.

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