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Monografia
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FACULDADES INTEGRADAS DE JAÚ – FIJ
IVO FRANCISCO MANOEL
AÇÕES AFIRMATIVAS
JAÚ
2012
IVO FRANCISCO MANOEL
AÇÕES AFIRMATIVAS
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao curso de Direito das Faculdades Integradas de Jaú, como um dos requisitos para conclusão do grau de Bacharel em Direito, elaborado sob a orientação da professora Juliana Zacarias Fabre Tebaldi.
JAÚ
2012
IVO FRANCISCO MANOEL
AÇÕES AFIRMATIVAS
Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) apresentado à Faculdade de Direito das Faculdades Integradas de Jaú, para obtenção do título de Bacharel em Direito.
Data de aprovação: ____ de ____________ de 2012.
Prof. – Orientadora
____________________
Prof. – banca
____________________
Prof. – banca
____________________
Dedico este trabalho aos meus pais Renato Manoel(In Memorian) e Francisca Vieira, meus irmãos Paulo Renato Manoel, Mauricio Manoel, Silvio Manoel, Franceli Aparecida Manoel, Rita de Cássia Manoel Delandrea, Isabela Manoel, Silvana Manoel (In Memorian), a minha esposa Sandra Regina Trochetti Monteiro Manoel, e meu querido filho Michel Jonatas Trochetti Monteiro Manoel, pelo acompanhamento nesta fase tão importante de minha vida. E pela
atenção e colaboração de minha orientadora Juliana Zacarias Fabre Tebaldi.
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus, que em nenhum momento deixou-me desanimar durante esta jornada.
Agradeço aos meus pais Renato Manoel (In Memorian) e Francisca Vieira, e a meus irmãos Paulo Renato Manoel, Mauricio Manoel, Silvio Manoel, Franceli Aparecida Manoel, Rita de Cássia Manoel Delandrea, Isabela Manoel, Silvana Manoel (In Memorian), a minha esposa Sandra Regina Trochetti Monteiro Manoel, e meu querido filho Michel Jonatas Trochetti Monteiro Manoel e a todos meus familiares.
Agradeço a minha orientadora Dra. Juliana Zacarias Fabre Tebaldi pela labuta diária e vários momentos de muito estudo.
Agradeço ainda a todos os meus amigos, que se fizeram presentes com suas palavras aconselhadoras em todos estes anos de estudo; agradeço a Adriana Arruda Murgel, Ana Marcela Pereira, Maria Silvia Modolo, Paulo José do Amaral, Celso Barbosa Romão, Maria Helena Liduena, Natália Lameza Ambrosio.
"Quatro coisas para o sucesso: Trabalhar e orar, pensar e acreditar."
( Dr. Norman Vincent Peale )
RESUMO
Tem por objetivo este trabalho demonstrar que as cotas reservadas aos negros acabam sendo de suma importância no meio em que convivem, pois por diversas vezes se não houvesse o benefício de tais cotas e ações afirmativas, pela discriminação que estes sofrem, acabariam sendo mais prejudicados ainda. Pois por meio das ações afirmativas busca-se que algumas minorias que são descriminadas pela sociedade possam ser protegidas e, ainda, que possam ter seus direitos protegidos, direitos já reservados em nossa Constituição Federal.
Palavras-Chave:
Ação afirmativa. Negros. Discriminação
ABSTRACT
This work aims to demonstrate that the quotas reserved for blacksends up being very important to live in the middle, because several times if there was no benefit of such quotas and affirmative action, discrimination they suffer, yet end up being most affected. For through affirmative action seeks to have some minorities that arediscriminated by society can be protected and that may have their rights protected, rights already reserved in our Constitution.
Keywords:
Affirmative action. Blacks. Discrimination
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO........................................................................................................10
2 AS PESSOAS SOCIALMENTE EXCLUÍDAS NO BRASIL.....................................12
2.1 A identificação das pessoas socialmnte excluídas..............................................12
2.2 Os motivos da exclusão..................................................................................16.
2.3 A desigualdade no Brasil.....................................Erro! Indicador não definido.
2.4 Políticas públicas de inclusão social.............................................................................29
3 O PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA IGUALDADE Erro! Indicador não definido.
3.1 Definição..............................................................Erro! Indicador não definido.
3.2. O aspecto material e formal do princípio da igualdade.....Erro! Indicador não definido.
3.3. A relação entre igualdade e cidadania...............Erro! Indicador não definido.
4 AÇÕES AFIRMATIVAS.............................................Erro! Indicador não definido.
4.1 Origem, definição e finalidade.............................Erro! Indicador não definido.
4.2 As ações afirmativas no Brasil.............................Erro! Indicador não definido.
4.3 As ações afirmativas como instrumento de inclusão socialErro! Indicador não definido.
5 CONCLUSÃO............................................................Erro! Indicador não definido.
REFERÊNCIAS...........................................................Erro! Indicador não definido.
10
1 INTRODUÇÃO
Será estudo deste trabalho, tema muito relevante, decorrente da nova forma
de análise Constitucional que envolve o direito das minorias, e na ordem prática é
bastante difundido nos Tribunais brasileiros.
As ações afirmativas tiveram origem nos Estados Unidos da América, logo
após se espalhando por outros países, assim o Brasil também passou a fazer parte
e aplicar tais ações.
Busca-se por meio das ações afirmativas fazer com que a discriminação que
atinge alguns grupos, que são chamados de minorias, seja afastada e que assim
não os prejudique, seja de forma econômica ou social, no âmbito do estudo ou ainda
do trabalho.
No decorrer do estudo vamos nos deparar por diversas vezes com o termo
minoria, e assim podemos pensar não no sentido quantitativo, mas sim, em
determinados grupos de pessoas que acabam sofrendo restrição de seus direitos,
isto em decorrência da discriminação e preconceito pelos demais membros de uma
sociedade.
E assim, acabam sendo privados de usufruírem de direitos, que são postos à
disposição de todo e qualquer indivíduo que compõe uma sociedade
independentemente de raça, cor ou sexo.
Por este e outros motivos, acaba sendo de suma importância fazermos
menção ao princípio da igualdade, onde iremos analisar de forma detalhada todos
os benefícios que o mesmo pode propiciar ao indivíduo, que compõe uma
sociedade.
Conjuntamente ao princípio da igualdade importante também é analisarmos
as ações afirmativas, que buscam dar maior proteção e igualar os direitos daqueles
que são ou foram de alguma forma discriminados, ou seja, das minorias com o
restante da sociedade.
11
Veremos que o Estado tem grande papel quando pensamos em qualquer tipo
de ação afirmativa, pois, mesmo no início se mantendo inerte e neutro perante as
discriminações que ocorriam, o mesmo percebeu que sem a sua oposição, tais
problemas apenas aumentariam e não poderiam ser resolvidos da devida forma que
a Constituição Federal, dispõe e protege a todos indistintamente.
Nesta senda, podemos observar que muitas são as minorias em nosso País,
tais como: idosos, mulheres, deficientes físicos, crianças, porém no decorrer deste
estudo nos aprofundaremos nas ações afirmativas que fazem sempre menção aos
negros e as cotas para os mesmos.
Quanto à inclusão social, uma pequena comparação será feita para com as
ações afirmativas, sendo de grande importância, pois com a inclusão social,
tentaremos demonstrar que o Estado busca incluir na sociedade grupos de pessoas
que sofrem ou que já sofreram qualquer tipo de discriminação.
O que realmente se pretende demonstrar com este trabalho é que, mesmo
acreditando serem as cotas mais um tipo de discriminação, estas acabam por
ajudar, e muito, aqueles que fazem parte das minorias que são discriminadas
perante a sociedade.
12
2 AS PESSOAS SOCIALMENTE EXCLUÍDAS NO BRASIL
Ultimamente inúmeros projetos são propostos perante o Congresso Nacional,
buscando desta forma, defender algumas modalidades de ações afirmativas.
Alguns doutrinadores ainda, acreditam que todo principal conteúdo de nosso
sistema educacional, é reservado aos brancos, com isto temos pequena parcela e
com inferior qualidade, dos recursos educacionais reservados aos negros e aos
pobres.
Com as ações afirmativas, busca-se a igualdade entre todos os cidadãos sem
qualquer tipo de distinção, assim como podemos observar tal direito protegido em
nossa Carta Magna, mais precisamente artigo 5º, caput.
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:”
Nesta senda, tais ações afirmativas determinadas pelo Estado têm por objeto
eliminar as desigualdades e todo o preconceito, decorrentes na sociedade entre os
cidadãos, fazendo com que os direitos que são reservados também as minorias que
fazem parte da sociedade, sejam por estes utilizados, sem que tais minorias, sejam
privadas de seus direitos ou que ainda seus direitos possam ser reduzidos, por
motivos de discriminação.
O que ocorre diariamente em nosso País é que mesmo não estando mais em
uma escravidão como no passado, ainda existem diversos meios de discriminação
em nossa sociedade.
Desta forma, como foco principal para este trabalho, podemos observar que,
os negros acabam por diversas vezes sendo privados de certos trabalhos e ainda de
estudos de alta qualidade por sua cor.
13
Logo com as ações afirmativas busca-se proteger os direitos de tais minorias
e demonstrar que assim como qualquer outro indivíduo que compõe uma sociedade
tem direitos iguais e que devem ser protegidos conforme o que dispõe nossa
Constituição Federal.
Podemos, neste contexto observar ainda que muitas são as minorias que
compõe nossa sociedade, tais como: as mulheres que por diversas vezes não
ocupam um cargo superior em determinada empresa ou trabalho, por literalmente
ser uma mulher.
Os idosos que por conta da idade acabam sendo dispensados do trabalho e
descaradamente trocados por jovens que, muitas vezes, não apresentam a mesma
experiência que os primeiros.
E ainda temos o caso, que mais nos interessa no momento, que são os dos
negros. Quantas vezes vemos a falta de oportunidade de estudos para um negro,
sendo que o motivo é apenas pela sua cor, desta forma este tipo de exclusão e
discriminação é que buscaremos demonstrar que jamais pode ocorrer, em nossa
sociedade.
Sendo assim, nosso País, entre outros, faz uso das cotas para negros em
especial nas Universidades, mesmo acreditando que seria mais um tipo de
discriminação, pois o que se busca em vestibulares é a capacidade de
conhecimento de alunos, e não a sua cor, raça ou sexo.
Mesmo assim vemos diversos casos em que a discriminação ocorre, mas
também podemos perceber que se não houvesse a cota para negros em
determinadas Universidades a discriminação seria maior ainda, pois possivelmente
nem vagas para os negros haveria.
E assim, sem vagas nas universidades, os negros continuariam sem
oportunidades de um melhor conhecimento, e neste diapasão, não havendo
melhoramento de sua cultura também, e, para que consiga melhores cargos no
mercado de trabalho, haveria mais dificuldades.
14
Nesta senda, as cotas, mesmo sendo um tema bastante polêmico, são
reservadas aos negros e em determinadas situações ajudam e muito, a extinguir e
afastar as discriminações que ocorrem contra estes.
Não apenas contra estes, pois as cotas acabam beneficiando além dos
negros, os indígenas e seus descendentes e ainda os pardos, a quem são
reservadas as cotas em algumas universidades.
Provendo-lhes mais oportunidades no meio social, na vida econômica, no
mercado de trabalho e nos estudos principalmente, na educação superior, sem
contar com o acesso a empregos públicos.
Sabemos ainda que existem diversas minorias que são socialmente
excluídas, como já citamos em alguns pontos deste estudo, são as mulheres,
crianças, os idosos, indígenas, portadores de necessidades especiais e o foco para
este trabalho, os negros.
Tais minorias conforme o que dispõe Carmem Rocha, a mesma citada por
Fernanda da Silva, as minorias são:
“Não se toma a expressão minoria no sentido quantificativo, senão que no de qualificação jurídica dos grupos contemplados ou aceitos com um cabedal menor de direitos, efetivamente assegurados, que outros, que detém o poder. Na verdade, minoria no Direito democraticamente concebido e praticado, teria que representar o número menor de pessoas, vez que a maioria é a base de cidadãos que compreenda o maior número tomado da totalidade dos membros da sociedade política. Todavia, a maioria é determinada por aquele que detém o poder político, econômico e inclusive social em determinada base de pesquisa. Ora, ao contrário do que se apura, por exemplo, no regime da representação democrática nas instituições governamentais, em que o número é que determina a maioria (cada cidadão faz-se representar por um voto, que é o seu, e da soma de votos é que se contam os representados e os representantes para se conhecer a maioria), em termos de direitos efetivamente havidos e respeitados numa sociedade, a minoria na prática dos direitos, nem sempre significa o número menor de pessoas. Antes, nesse caso, uma minoria pode bem compreender um contingente que supera em número (mas não na prática, no respeito etc.) o que é tido por maioria. Assim o caso de negros e mulheres no Brasil, que são tidos como minorias, mas que representam maior número de pessoas da globalidade dos que compõem a sociedade brasileira”.1
1 SILVA, Fernanda Duarte Lopes Lucas da. Princípio da igualdade. ed. Lumen Juris, 2003. p. 63.
15
Trocando em miúdos, não se busca demonstrar que as minorias são
qualificadas em quantidade, em número, sendo poucas pessoas, mas sim, que são
alguns grupos de determinadas pessoas que acabam sendo excluídas e
discriminadas pela sociedade.
Assim, mesmo sendo várias pessoas, por vezes, como são citados os
exemplos pela autora, das mulheres e dos negros, estas pessoas têm seus direitos
reduzidos, e por estes motivos é que as chamamos de minorias, por terem
prejudicados seus direitos, em razão da discriminação e do preconceito, pelos
demais membros da sociedade.
Neste diapasão, torna-se importantíssimo entendermos um pouco mais sobre
as discriminações que ocorrem contra o mesmo, sendo que, por vezes temos o que
chamamos de racismo.
Vemos ainda hoje negros que sofrem esse tipo de preconceito, sendo
julgados antecipadamente, sem ao menos poderem se manifestar ou se defender
das ofensas que ocorrem.
Falta de oportunidade que ocorre, simplesmente por sua cor de pele, mesmo
sendo, um absurdo este tipo de cena, não podemos negar que ocorre, não sendo
ainda, um caso raro.
Desta forma, todos aqueles que pertencem ao grupo de determinada minoria,
acabam sofrendo as mesmas conseqüências que um sofre. Sendo assim, ainda hoje
vemos as desigualdades entre brancos e negros.
Não adianta querermos negar, dizendo que o Brasil é um país miscigenado, e
que não faz diferença, pois sabemos que muitos sofrem com a discriminação e o
preconceito que lhes atingem, principalmente os negros com o racismo cordial.
Por termos uma sociedade insana ao ponto de crer que a cor da pele, assim
como na escravidão, vai alterar o conhecimento, a cultura, que um negro possa
obter e toda sua experiência, que, por vezes, é brilhante, não por ser um negro, mas
por ser uma pessoa, igual a qualquer outra da sociedade.
16
2.1 Os motivos de exclusão
Neste capítulo temos por base os ensinamentos jurídicos e históricos de
Renato Santos e Fátima Lobato, que muito podem desenvolver sobre o tema.
Desde a escravidão os negros já sofriam com a desigualdade, pois eram
considerados escravos e subseqüentemente, uma mercadoria perante a sociedade,
onde eram trocados e vendidos. Os escravos chegaram até mesmo a serem
considerados bens imóveis, que eram doados e hipotecados.
Em meados de 1830, alguns escravos começaram a ser libertados, e assim,
não pertenciam mais a seus senhores.
Nesta senda, dos dispositivos sobre a escravidão, passaram a ser leis raciais.
Porém ainda nesta época, não podia haver casamento entre brancos e negros, ou
seja, mais uma vez, podemos observar a discriminação e desigualdade perante os
olhos da sociedade.
Mesmo com a liberdade dos escravos, os negros ainda sofriam muitas
discriminações, para termos uma pequena noção do absurdo que ocorria,
observemos: os negros não podiam ter cachorros, não podiam portar armas de fogo,
e se quer podiam aprender a ler, isto em diversos Estados.
Desta forma, mesmo com toda liberdade que os escravos passaram a obter,
ainda assim, os negros não viviam em pé de igualdade com os brancos.
Nos anos compreendidos entre 1896 e 1954, a Suprema Corte passou a fazer
uso do equal protection clause, ou seja, separados mas iguais, onde negros e
brancos, perante uma oportunidade de serviço, ambos deveriam ser tratados com
igualdade, não havendo distinção quanto à raça.
Logo, as mesas de refeição, em cadeias e penitenciárias, deveriam ser
separadas para brancos e negros, e assim também ocorria nas empresas
ferroviárias, as acomodações dos passageiros deveriam ser separadas, para
17
brancos e negros, e a empresa que assim não cumprisse, seria processada
penalmente.
Com a segunda Guerra Mundial, negros passam a ganhar um novo espaço,
no mercado de trabalho, neste caminho também seguiram as mulheres.
Sendo que, com os brancos e homens, partindo para os campos de batalha,
seus cargos e funções acabaram ficando vagos, e subseqüentemente foram
ocupados pelos negros e pelas mulheres.
Porém foi apenas em 1941, nos Estados Unidos da América, que o
Presidente Franklin D. Roosevelt, por meio da lei 8.806, de 25 de junho de 1941,
passou a impedir a discriminação racial na contratação de funcionários, nas relações
mantidas entre o governo e empresas bélicas.
Após o fim da Segunda Guerra Mundial, não ocorreram muitas modificações
quanto às discriminações raciais, sendo que, por quase uma década não pudemos
contar com nenhum tipo de avanço quanto ao tema.
Nesta seara, em 1954 uma nova manifestação da Suprema Corte criou novas
esperanças quanto à problemática, havendo uma revisão, a partir da manifestação
de estudantes negros que buscavam por meio do princípio da igualdade, afastar
qualquer tipo de discriminação que até o momento ocorrera, sendo que o principal
objetivo era o ingresso em instituições públicas.
Assim para Renato dos Santos e Fátima Lobato, os motivos da exclusão
ainda podem ser:
“A universidade é o divisor de águas numa sociedade racialmente dividida onde o critério para a incorporação às classes profissionais também é o critério da exclusão social. Até existir uma classe média negra profissional, com domínio dos mesmos códigos e competências da elite, não haverá combate efetivo à discriminação racial. E o ensino superior detém as maiores taxas de retorno para o indivíduo. Portanto, na procura de mobilidade ou de ascensão social, este é o nível que mais influencia na ruptura do ciclo da pobreza”.2
2 SANTOS, Renato Emerson dos, LOBATO Fátima. Ações afirmativas. ed. DP&A, 2003. p. 59.
18
Desta forma, levando em consideração o pensamento dos ilustríssimos
doutrinadores, podemos realmente perceber que a “UNIVERSIDADE”, acaba
influenciando e muito, em todo conhecimento que um se humano pode obter.
Nesta senda, acreditamos que com todo esse conhecimento, as minorias
possam ser igualadas, aos demais membros de uma sociedade.
Com isto, quanto mais conhecimento o ser humano passa a adquirir, mais
facilidade terá, para reagir e lutar por seus direitos que são violados a cada dia.
Porém lembremos que, para um negro poder freqüentar uma universidade,
existe muitos obstáculos a serem efetivamente enfrentados, e para isto, contamos
sempre com as ações afirmativas, por meio das cotas para negros.
Assim podemos observar, como cita Fátima Lobato e Renato dos Santos:
“Como a discriminação racial está presente na área educacional, o desenvolvimento educacional e a especialização dos afro-descendentes fica prejudicada, importando na dificuldade de sucesso na escola e ao acesso às posições melhor remuneradas do mercado de trabalho, gerando um círculo vicioso de pobreza, insucesso escolar e marginalização social”.3
Observemos desde já, um dos exemplos que pode acabar dificultando o
crescimento dos negros e assim fazendo com que seus direitos sejam violados, por
meio das discriminações que ocorrem.
Podemos perceber ainda que, havendo a dificuldade de um negro freqüentar
uma faculdade ou universidade, sua vida acaba sendo totalmente prejudicada, pois,
dificilmente terá uma boa oportunidade de trabalho, de merecimento e de cargos
bem sucedidos.
Por outro lado, se um negro consegue passar por todos os obstáculos que
lhes são propostos, já é um grande vitorioso, sendo que, com isto, os negros
passam a conquistar todo o espaço e direitos que merecem, e lhes são
resguardados em nossa Constituição Federal brasileira.
3 SANTOS, Renato Emerson dos, LOBATO Fátima. Ações afirmativas. ed. DP&A, 2003. p. 61.
19
Sendo assim, podemos observar que desde sempre, os negros já sofriam
com as discriminações que lhe eram impostas, exclusão que teve início nos tempos
da escravidão.
Acreditamos que por este motivo, até hoje os negros ainda sofrem, por sua
cor e por serem julgados por vezes incompetentes, por carregarem todo o fardo de
tempos antigos.
E por mais que se esforcem acabam sendo privados de seus direitos, de
oportunidades no mercado de trabalho e principalmente nos estudos, em busca de
uma vida mais digna.
Pois a sociedade ainda acredita que os mesmos não possuem o
conhecimento necessário para fazer parte de cargos importantes, de vagas em uma
universidade de alto nível, como um branco.
O que falta, muitas vezes, é uma simples oportunidade, para que comecem a
brilhar e trilhar no caminho da vitória. E que nós não sejamos um obstáculo para que
isso possa acontecer por meio da discriminação e do preconceito.
2.3 A desigualdade no Brasil
Com a colonização do Brasil, foi introduzido em nosso país a escravidão dos
negros, passando desta forma a já ter início a desigualdade entre os membros de
uma sociedade, pois neste ato, víamos negros serem maltratados, trabalharem sem
receber qualquer tipo de benefício, serem trocados e vendidos como um produto,
uma mercadoria, assim podemos ter como base para o contexto histórico os
pensamentos do doutrinador, Ingo Wolfgang Sarlet.
Com a Lei Áurea, os escravos puderam ser abolidos dos cativeiros, porém
suas condições de vida continuaram sendo as mais precárias possíveis, sem
educação de qualidade, lazer, e todos os direitos que lhe seriam de direito, não
podiam ainda ser desfrutados, tornando suas vidas sem sentido.
20
Pois mesmo sendo libertados dos cativeiros, continuaram dependendo e
muito ainda, dos brancos, pois não tinham condições dignas para que pudessem se
alimentar e sustentar suas famílias.
Assim, perdurou, por muito tempo, a idéia que se tinha de que os negros
pertenciam a um mundo diferenciado e que deveriam ser tratados como sempre
foram no tempo da escravidão.
E, ainda hoje, vemos esse tipo de situação, quantos negros são tratados com
desigualdade, e o motivo qual será? Isso é que gostaríamos de entender, apenas
por sua cor de pele, ou por no passado terem vivido situações horríveis onde eram
considerados um objeto?
Grande repugnância nos causa, ao pensarmos que uma pessoa é
discriminada, é privada do trabalho digno, de uma posição social igualitária, apenas
por sua cor de pele, ou ainda por seus antepassados.
Quantos brancos são acusados de crimes violentos e horripilantes, quantos
praticam atos considerados pela sociedade como indesejáveis, até a um animal, e,
mesmo assim, os negros são considerados por vezes como pessoas insensíveis, e
que não merecem ter todos os seus direitos alcançados.
Com isto, não podemos deixar de citar que até mesmo o princípio da
dignidade humana, acaba sendo ferido, pois é óbvio que por vezes a discriminação
acaba sendo tão violenta que atinge todo o sentimento de dignidade que um negro
possa sentir.
Traçando algumas linhas sobre a matéria, a dignidade da pessoa humana é
atribuída a toda e qualquer pessoa humana, tem conexão ainda com os direitos
fundamentais, mesmo não estando elencada entre os mesmos, mas sim sendo um
princípio fundamental, devendo desta forma, ser respeitado por todos os indivíduos,
inclusive pelo próprio Estado.
Como sabemos o conceito do princípio da dignidade humana, causa grandes
discussões, assim podemos seguir a opinião de José de Melo Alexandrino,
dissertando o seguinte:
21
“O princípio da dignidade da pessoa humana parece pertencer àquele lote de realidades particularmente avessas à claridade, chegando a dar a impressão de se obscurecer na razão direta do esforço despendido para o clarificar”.4
Lembremos porém, que foi por meio do pensamento de Cícero, na Roma
antiga, que pudemos ter uma pequena noção de dignidade humana, sendo que na
época a dignidade estava relacionada a posição social.
Porém, somente após a Segunda Guerra Mundial, foi expressamente
reconhecida à dignidade humana por meio de uma Constituição, sendo por meio de
seu artigo 1º, III:
A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: III - a dignidade da pessoa humana.
Importante ainda fazermos menção quanto à Declaração Universal da ONU
(Organização das Nações Unidas) de 1948, em seu artigo I, que reza o seguinte:
Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade.
Sendo assim, podemos entender que além da dignidade humana, todos os
membros de uma sociedade são livres, tendo direitos e ainda deveres, e além da
dignidade que nos é proposta, devemos respeitar o próximo, havendo entre todos o
que chamamos de reciprocidade de respeito.
Logo, ninguém deve ser tratado de forma desumana, sendo maltratado,
passando por humilhações, constrangimentos, seja físico ou ainda psicológico,
qualquer tipo de sofrimento físico, ou seja, nenhuma forma de discriminação,
devendo desta forma, manter uma vida saudável e propícia, conforme os direitos
que são protegidos a todos os seres humanos.
Neste mesmo sentido temos o posicionamento de Renata Malta que acredita:
4 SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado , 2010, p. 47.
22
“As repercussões atingem tanto a saúde física (fadiga, insônia, perda de apetite) como a mental (depressão, frustração, revolta, medo, etc.) dos atingidos, como no campo econômico (diminuição dos rendimentos, o aumento de acidentes, violência etc.) e no campo social onde a de atingir a sua plenitude. Combinando todos esses efeitos, teremos as alterações das relações intergrupais, as quais, conseqüentemente, acarretarão distúrbios de ordem econômica dentre outros”.5
Neste contexto, as formas de discriminação que são impostas às minorias,
em nosso caso, tendo como foco os negros, acabam prejudicando sua saúde física,
mental, causando medo, revolta, e por vezes os prejudicam economicamente,
causando frustração a todo seu lado psicológico.
Importante neste ato, conforme a jurisprudência norte-americana,
demonstrarmos as três identificações de discriminação citadas:
“- A forma mais perceptível de discriminação ocorre quando uma pessoa tem a intenção e o propósito de negar à outra um tratamento igual, em razão da cor, do sexo, da religião, etc, podendo ser expressa, como no caso de algumas leis que versavam sobre a segregação racial, ou ainda podendo ser tácita, como naquelas leis que, ao serem implementadas, acabam desfavorecendo determinados grupos em razão de sua raça etc.
- A segunda forma de discriminação se define em razão do seu impacto, ou seja, o impacto causado por aquela lei que atinge mais um grupo do que outro, ou ainda um determinado grupo é favorecido em detrimento de outro.
- A terceira forma de discriminação é a discriminação social”.6
Conforme podemos observar, a jurisprudência norte-americana, aposta em
três tipos de discriminação diferentes, a primeira quando a pessoa pratica o ato de
discriminação tendo por propósito atingi-la, por meio da raça, cor, sexo, religião,
entre outros.
5 BÔAS, Renata Malta Vilas. Ações afirmativas e o princípio da igualdade. ed. América Jurídica, 2003. p. 48.
6 BÔAS, Renata Malta Vilas. Ações afirmativas e o princípio da igualdade. ed. América Jurídica, 2003. p. 36.
23
Já a segunda forma de discriminação advém do ato de uma lei proteger mais
um determinado grupo do que outro, ou ainda, atingir mais a um grupo do que a
outro.
Por fim, a última hipótese de discriminação, conforme dispõe a jurisprudência
norte-americana, é a discriminação social.
Nosso país pode ser considerado um grande discriminador de pessoas, ainda
existe muito preconceito e descriminalização entre as pessoas que vivem em
sociedade.
Discriminações quanto à raça, quanto a pessoas portadoras de deficiência,
que por vezes necessitam de ajuda para atravessar um sinal no meio do trânsito,
para empurrar sua cadeira de rodas, e os demais que se dizem cidadãos, ignoram
esta situação a seu redor.
Atualmente muitas mães são discriminadas por tomarem a decisão de
abortarem filhos anencéfalos, pessoas que se quer sabem muitas vezes a realidade
dessas mães.
Diversas são as formas de discriminação, não importa a sua forma, mas não
devemos deixar que a mesma venha a ocorrer, seja para com os negros, seja para
com qualquer minoria. Pois todos somos seres humanos, com direitos e deveres que
devem ser respeitados e cumpridos.
2.4 Políticas públicas de inclusão social
A inclusão social acaba sendo um tipo de política pública, salientando que
trataremos do assunto em momento mais oportuno.
Lembrando que as políticas públicas são um tipo de ação aprovada pelo
Estado, buscando atender alguns grupos da sociedade, sendo que, alguns destes
grupos acabam sendo privilegiados algumas vezes, por alguma distinção que os
mesmo obtém.
24
Tendo como foco principal a diminuição das desigualdades que ocorrem
entre os grupos que compõe a sociedade, sendo que, havendo qualquer tipo de
discriminação que possa vir a prejudicar um cidadão, podemos fazer uso, das ações
afirmativas, tendo o apoio do Estado.
Em especial buscando ainda as políticas públicas, refletiremos no conflito de
interesses que possam ocorrer entre determinadas pessoas, e assim, diversas são
as formas de construção dos processos, sabemos que, sempre teremos uma
problemática a ser resolvida, quando estivermos diante de pessoas ou de um grupo
de pessoas com o mesmo interesse em determinado objeto ou determinada
oportunidade a ser usufruída, assim teremos o Estado que irá intervir e neste ato,
buscará resolver esta situação.
O Estado, busca proteger a sociedade, em situações de risco, dando
caminhos a serem seguidos, e ainda, nos demonstrando uma visão ampla das
ações governamentais que são diferentes ou contrárias as que ocorrem no Brasil.
Neste contexto, podemos fazer referência ao julgamento da ADPF nº 186,
sendo que, a mesma foi proposta pelo partido DEMOCRATAS, e dispõe sobre as
cotas raciais para ingresso às universidades; e foi aprovada por unanimidade no
Supremo Tribunal Federal; há de se estranhar que o estado-membro mais rico da
federação é São Paulo, que a Universidade de São Paulo(USP), Universidade do
Estado de São Paulo(UNESP) e Universidade de Campinas(UNICAMP) não têm
cotas.
Com intuito de defender atos que atingem preceitos fundamentais, reservando
20% das vagas para os negros.
Importante ressaltar que, buscou-se a melhor inclusão de minorias ou ainda a
adoção de um modelo para o Estado Social na existência do racismo brasileiro.
Questionando se a raça pode ser considerada como um critério válido no
Brasil, trazendo diferenciações entre os cidadãos.
Desta forma, o partido político do DEMOCRATAS, defende o acesso aos
direitos fundamentais, pois a aparência de uma pessoa não diz nada sobre quem
este realmente é, logo os seres humanos são todos iguais.
25
Concluindo que, as cotas raciais violam o princípio da proporcionalidade, no
que diz respeito a fazer uso da raça como critério diferenciado entre os indivíduos.
Nesta senda, a Procuradoria-Geral da República, manifestou-se de maneira
positiva quanto a ADPF de nº 186.
Torna importante frisar que, em muitos países sempre houve problemas
quanto à etnia, e no Brasil o problema vem sendo associado sempre a outros
problemas, na maioria das vezes, à situação econômica do individuo.
Em meados do Governo de Luiz Inácio Lula da Silva, passou-se a aprofundar-
se mais no assunto em tela, criando a Secretaria Especial para a Promoção da
Igualdade racial.
Modificando o Sistema de Financiamento ao Estudante e criando ainda o
Programa Universidade para todos, com bolsas e vagas para os negros.
Entretanto, em 2010 foi aprovado a Lei N.º 12.288 de 20 de julho de 2010”
Estatuto da Igualdade Racial”.
26
3. O PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA IGUALDADE
3.1 Definição
A primeira Constituição de nosso país que promulgou sobre o princípio da
igualdade foi a de 1891, em seu artigo 72, parágrafo 2º:
“Todos são iguais perante a lei. A República não admite privilégio de nascimento, desconhece foros de nobreza, e extingue as ordens honoríficas existentes e todas as suas prerrogativas e regalias, bem como os títulos nobiliários e de conselho”.7
Importante fazermos ressalva também ao Estatuto da Igualdade Racial,
segundo os artigos 1º e 2º:
“Art. 1º. Esta lei institui o Estatuto da Igualdade Racial, para combater a discriminação racial e as desigualdades raciais que atingem os afro-brasileiros, incluindo a dimensão racial nas políticas públicas desenvolvidas pelo Estado”.
“Art. 2º. É dever do Estado e da sociedade garantir a igualdade de oportunidades, reconhecendo a todo cidadão brasileiro, independente da raça ou cor da pele, o direito à participação na comunidade, defendendo sua dignidade e seus valores religiosos e culturais”.
O princípio da igualdade ou ainda princípio da isonomia, de início já nos faz
imaginar que, o que o legislador busca nos transmitir, é que, todos devem ter um
tratamento igualitário, sem que desta maneira, exista qualquer tipo de distinção, seja
de raça, cor ou sexo.
7 SILVA, Fernanda Duarte Lopes Lucas da. Princípio da igualdade. ed. Lumen Juris, 2003. p. 49.
27
Por vezes existe o que chamamos de máxima aristotélica, fazendo com que
haja um tratamento “igual aos iguais e desigual aos desiguais, na medida dessa
desigualdade”. Assim buscando definir em cada caso concreto quem são os iguais e
os desiguais.
Logo segundo Robert Alexy:
“Se não houver uma razão suficiente para a permissibilidade de um tratamento desigual, então, o tratamento igual é obrigatório”.8
E assim continua seu pensamento:
“Se não houver razão suficiente para permissibilidade de um tratamento igual, então é obrigatório um tratamento desigual”.9
Como já citado, dependeremos de cada caso concreto, para fazermos uso de
uma das fórmulas que nos é apresentada segundo o pensamento de Robert Alexy,
sendo que, se não houver desigualdade, deveremos desde logo, tratar todos com
igualdade.
Por outro lado, havendo uma situação de desigualdade, aí sim, devemos
tratar com desigualdade, os membros, minorias, ou pessoas que compõem uma
situação, quando precisaremos fazer uso deste princípio.
Para Guilherme Dray, o mesmo citado por Renato Santos e Fátima Lobato, o
princípio da igualdade,
“a concepção de uma igualdade puramente formal, assente no princípio geral da igualdade perante a lei, começou a ser questionada, quando se constatou que a igualdade de direitos não era, por si só, suficiente para tornar acessíveis a quem era socialmente desfavorecido as oportunidades de que gozavam os indivíduos socialmente privilegiados. Importaria, pois, colocar os primeiros ao mesmo nível de partida. Em vez de igualdade de oportunidades, importava falar em igualdade de condições”.10
8 ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. ed. Malheiros, 2008. p. 408.
9 ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. ed. Malheiros, 2008. p. 409.
10 SANTOS, Renato Emerson dos, LOBATO Fátima. Ações afirmativas. ed. DP&A, 2003. p. 19.
28
Neste contexto, pudemos perceber com o tempo, que a lei não bastava, para
que fosse cumprido o que a mesma trazia em seu teor, com isto, o princípio da
igualdade passou a ser necessário, pois de qualquer forma continuavam as minorias
sofrendo com a desigualdade e discriminação que a sociedade lhes impunha.
Para Flávia Piovesan,
“do ente abstrato, genérico, destituído de cor, sexo, idade, classe social, dentre outros critérios, emerge o sujeito de direito concreto, historicamente situado, com especificidades e particularidades. Daí apontar-se não mais ao indivíduo genérica e abstratamente considerado, mas ao indivíduo “especificado”, considerando-se categorizações relativas ao gênero, idade, etnia, raça etc”.11
Buscando desta forma, a partir de suas especificações tentativas de
concretização para afastar a discriminação e neste ato, buscar a igualdade entre tais
sujeitos, devendo ser ainda observado que a todo este procedimento, damos o
nome de ações afirmativas.
Podemos citar ainda o pensamento de Carlos Ari Sundfeld, o mesmo citado
por Fernanda da Silva:
“Do conjunto das normas constitucionais, bem assim de seu sentido,
extrai-se que os particulares são iguais perante o Estado como um
todo. São iguais perante o legislador, assim devendo ser por ele
tratados. São iguais perante a lei, donde a necessidade de, em sua
aplicação, o juiz, como a Administração, tratarem-nos de modo
parificado”.12
Ainda no século XX, podemos observar que muitos homens e mulheres, ainda
sofrem por preconceitos e comportamentos desiguais perante a sociedade, isto de
forma injusta e contrária à lei e princípios constitucionais de nosso País.
11 SANTOS, Renato Emerson dos, LOBATO Fátima. Ações afirmativas. ed. DP&A, 2003. p. 20.
12 SILVA, Fernanda Duarte Lopes Lucas da. Princípio da igualdade. ed. Lumen Juris, 2003. p. 52.
29
Por estes e outros motivos, muitos sujeitos acabam se vendo desorientados
em meio a nossas leis, sendo estas falhas, tendo que se socorrer a quotas
resguardadas aos negros, como exemplo.
Sendo um direito, que beneficia e muito os negros, pois se não fossem as
quotas a estes reservadas, como seria a vida dos mesmos? Será que teriam
oportunidades de estudo, como hoje ocorre, mesmo que, sendo ainda muito
limitada? E mercado de trabalho?
Por outro lado, muito assusta e deve ser repensado em nossa sociedade,
deve haver necessariamente as cotas, para que todos tenham o mesmo direito de
usufruir de seus direitos, direitos estes que são reservados a todos, sem qualquer
distinção, inclusive de raça e cor.
Grande indignidade neste momento nos causa, e o princípio da igualdade, da
dignidade? Com todo desenvolvimento de nosso País, com tanta atualidade a nossa
volta, estamos parados ainda hoje, nos tempos da escravidão?
Os negros acabam sendo excluídos e discriminados, simplesmente por sua
cor, por vezes perdendo oportunidades que o mundo oferece, porque a sociedade
acredita que sua cor, poderá modificar todo seu desempenho e conhecimento.
Logo durante este estudo vamos fazer uso da palavra igualdade por diversas
vezes, sendo assim, seguiremos mais uma vez o pensamento da ilustre
doutrinadora, Renata Malta:
“Igualdade é uma das palavras mais pronunciadas, analisadas e discutidas no mundo inteiro, embora o seu significado possa variar conforme a época em função dos contextos filosófico, socioeconômico e político. Mesmo sem um conceito universalmente aceito, não parece arbitrário afirmar que todos os seres humanos possuem, intuitivamente, a essência da idéia de igualdade.13
Realmente como já pudemos observar o tema é totalmente polêmico, pois
sabemos o que se busca com o princípio da igualdade, porém poucas são as
palavras para que possamos defini-lo com exatidão.
13 BÔAS, Renata Malta Vilas. Ações afirmativas e o princípio da igualdade. ed. América Jurídica, 2003. p. 1.
30
Neste sentido faremos uso ainda do que dispõe o Novo Dicionário Aurélio:
“Igualdade. (do lat. Aequalite.) S.f. 1. Qualidade ou estado de igual; paridade. 2. Uniformidade, identidade. 3. Eqüidade, justiça. 4. Mat. Propriedade de ser igual. Igualdade moral. Et. Relação entre os indivíduos em virtude do qual todos eles são portadores dos mesmos direitos fundamentais que provêm da humanidade e definem a dignidade da pessoa humana”.14
Poderemos ainda citar o pensamento de Celso de Mello, sobre o princípio da
igualdade:
“Assim, imagina-se que as pessoas não podem ser legalmente desequiparadas me razão da raça, ou do sexo, ou da convicção religiosa (art. 5º. Caput da Carta Constitucional) ou em razão da cor dos olhos, da compleição corporal, etc”.15
Já para Hans kelsen, citado por Fernanda da Silva:
“A igualdade dos sujeitos na ordenação jurídica, garantida pela Constituição, não significa que estes devam ser tratados de maneira idêntica nas normas e em particular nas leis expedidas com base na Constituição. A igualdade assim entendida não é concebível: seria absurdo impor a todos os indivíduos exatamente as mesmas obrigações ou lhes conferir exatamente os mesmos direitos sem fazer distinção alguma entre eles, como, por exemplo, entre crianças e adultos, indivíduos mentalmente sadios e alienados, homens e mulheres. (Citado por Bandeira de Mello, 1993: 11)”.16
E assim continua:
“O princípio da igualdade contém uma directiva essencial dirigida ao próprio legislador: tratar por igual aquilo que é essencialmente igual e desigualmente aquilo que é essencialmente desigual. A qualificação das várias situações como iguais ou desiguais depende do caráter idêntico ou distinto dos seus elementos essenciais. (Citado por Ana Prata, 1982: 93)”.17
14 BÔAS, Renata Malta Vilas. Ações afirmativas e o princípio da igualdade. ed. América Jurídica, 2003. p. 3.
15 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Conteúdo jurídico do princípio da igualdade. ed. Malheiros, 2004. p. 15.
16 SILVA, Fernanda Duarte Lopes Lucas da. Princípio da igualdade. ed. Lumen Juris, 2003. p. 79.
17 SILVA, Fernanda Duarte Lopes Lucas da. Princípio da igualdade. ed. Lumen Juris, 2003. p. 80.
31
Desta forma, podemos observar que várias são as definições para o contexto
de igualdade, sendo que, sabemos que o principal objetivo que nos é proposto, é o
de tratar todos de forma igual, e assim, afastando qualquer tipo de discriminação e
preconceito, que possam vir a prejudicar os direitos das minorias de nossa
sociedade.
3.2 O aspecto material e formal do princípio da igualdade
Primeiramente lembremos que faremos breves relatos sobre o princípio da
igualdade material, ou ainda igualdade de resultados, e a igualdade formal, ou
procedimental.
A igualdade formal, ou seja, aquela que podemos chamar de igualdade
perante a lei, trata-se de uma igualdade processual.
Podemos observar que, ao pensarmos no termo igualdade material,
saberemos que existe grande índice de injustiça social, buscando desta forma,
afastar toda desigualdade social.
Conforme o ensinamento de Renata Malta:
“Princípio da igualdade formal, que diz respeito ao princípio da igualdade perante a lei; e Princípio da igualdade material, que se refere ao princípio da redução das desigualdades”.18
Trocando em miúdos, a igualdade formal, nos revela a igualdade conforme o
que dispõe a lei, por outro lado, a igualdade material, nos demonstra que estaremos
diante de um princípio que busca reduzir as desigualdades que afrontam as minorias
de uma sociedade.
Sendo que ainda devemos analisar o que dispõe Renata Malta:
18 BÔAS, Renata Malta Vilas. Ações afirmativas e o princípio da igualdade. ed. América Jurídica, 2003. p. 20.
32
“Não sendo o princípio da igualdade formal suficiente para se atingir a igualdade, uma vez que não vem acompanhado de institutos hábeis para torná-lo um princípio eficaz, evoluímos para o princípio da igualdade material, o qual decorre da necessidade de tratamento prioritário e diferenciado àqueles grupos ou pessoas que são carecedores da igualdade, em razão de circunstâncias específicas”.19
Sem que o princípio da igualdade formal conseguisse atingir os objetivos do
princípio da igualdade, passamos a fazer uso ainda da igualdade material, onde se
busca dar um tratamento diferenciado às minorias, para que estas possam usufruir
de seus direitos descritos na Constituição Federal, sem que haja restrições sobre
estes.
Por outro lado, a igualdade material, pode ser demonstrada por meio de seus
resultados, tendo diversos exemplos que são citados em nossa Constituição
Federal, vejamos:
“Art. 3º. Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I – construir uma sociedade livre, justa e solidária; (...) III. Erradicar a pobreza e marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais.”
Segundo Fernanda Silva:
“A igualdade material (para alguns autores chamada de igualdade substantiva ou substancial) é aquela eu assegura o tratamento uniforme de todos os homens, resultando em igualdade real e efetiva de todos, perante todo os bens da vida”.20
Neste diapasão, observemos que a Constituição Federal, não se ouvida em
proteger e buscar sempre a igualdade entre os cidadãos que compõe a sociedade,
tendo por meta final fazer com que toda discriminação seja exterminada.
Sendo uma sociedade justa, livre e solidária, conforme os ditames da
Constituição, e por meio da igualdade material.
19 BÔAS, Renata Malta Vilas. Ações afirmativas e o princípio da igualdade. ed. América Jurídica, 2003. p. 21.
20 SILVA, Fernanda Duarte Lopes Lucas da. Princípio da igualdade. ed. Lumen Juris, 2003. p. 36.
33
3.3 A relação entre igualdade e cidadania
A cidadania sempre caminhou ao lado dos direitos, e pela luta dos mesmos,
ou seja, dos direitos fundamentais, sendo por vezes um grande referencial pelas
conquistas por toda humanidade.
Consideramos o termo cidadania, um agrupamento ou um conjunto de direitos
e deveres, onde um indivíduo está ligado, aos seus direitos, se cumprir seus
deveres, suas obrigações; desta forma, todos temos direitos que nos são
reservados, porém temos além destes, deveres que devemos cumprir.
Dever de respeitar a sinalização de transito, respeitar ao próximo, cumprir
com os pagamentos de impostos e taxas que são devidos, entre outros. Direito à
vida, à liberdade, à propriedade, à igualdade, e todos os direitos elencados em
nossa Constituição Federal.
Assim, a cidadania sempre manteve uma ligação com direitos, em especial
com os direitos políticos, sendo assim, sabemos que há uma ligação entre o
princípio da igualdade e a cidadania.
Isto mesmo, a cidadania muito tem haver com a igualdade, pois ambas
buscam igualar as pessoas, para que todos tenham deveres, e que ainda todos
tenham seus direitos adquiridos, sem que para isso ocorra qualquer tipo de
desigualdade.
Busca que todos sejam tratados igualmente, sem que haja distinção por sua
cor, raça, religião, posição econômica.
Por fim, o principal objetivo que se tem, é o de termos um país, mais
igualitário, sem discriminação e preconceito, um país mais humano e digno, sem
pessoas passando fome, ou sem ter um teto para morar.
Pessoas capacitadas ao trabalho e ao estudo, sem que sua cor, raça
modifique, suas oportunidades de aprender e um dia quem sabe ensinar.
34
Buscamos um país mais digno, isto por meio, do princípio da igualdade, da
cidadania, das cotas para os negros, para as minorias, por meio das ações
afirmativas.
4. AÇÕES AFIRMATIVAS
4.1 Origem, definição e finalidade
35
Fazendo uso do pensamento de Fátima Lobato e Renato Santos, as ações
afirmativas tiveram sua origem nos Estados Unidos, onde o Presidente John F.
Kennedy, passou a utilizar a expressão ação afirmativa, porém foi seu sucessor
Lyndon B. Johnson, que passou a utilizá-la no meio jurídico.
Buscando resolver o problema quanto à marginalização que ocorria com os
negros, esta de forma tanto social como econômica, tendo ainda por objetivo,
proteger os grupos que eram considerados como minorias na época.
Visava-se obter a igualdade de oportunidades e exterminar a discriminação;
após dois meses na presidência, Kennedy expediu Executive Order 10.925, que
buscava fiscalizar, as discriminações que ocorriam.
Passou ainda a observar os contratos de trabalho para que também não
ocorresse nenhum tipo de discriminação, fazendo com que não houvesse qualquer
tipo de limitação aos negros, quanto à promoção, empregos, dispensa ou término de
contrato, remuneração, ou seja, em todo procedimento da relação de trabalho.
Com o passar do tempo as mulheres, idosos, índios, deficientes físicos, entre
outros, passaram a englobar e usufruir de tal benefício.
Mas precisamente foi formalizada pela autoridade norte-americana, nos
primeiros momentos do estado moderno, sendo um direito fundamental, reconhecido
na Howard University em 04/06/1965 (quatro de junho de mil novecentos e sessenta
e cinco). Ocorrendo logo após um movimento que passou a ser conhecido como
affirmative action, ou seja, ações afirmativas.
Neste diapasão, as ações afirmativas foram usadas inicialmente em
empresas empreiteiras que eram contratadas por entidades públicas, sendo que,
estas eram obrigadas a fazer uso das ações afirmativas, logo tinham por objetivo
assegurar as “minorias” que não haveria desigualdades.
36
Com isto, passamos a obter diversos programas e planos governamentais e
ainda particulares, buscando trazer melhores condições e oportunidades de
emprego, estudo e cargos, as minorias da sociedade.
Ao citarmos a expressão minoria, fiquemos atentos, pois não estamos diante
do sentido quantitativo, mas sim de um sentido que busca demonstrar determinados
grupos que possuem menores direitos, comparados aos demais sujeitos que
compõe a sociedade. Exemplo claro é o das mulheres e dos negros, mesmo
compondo o maior número de pessoas, são uma minoria, pois seus direitos por
diversas vezes são reduzidos, sendo desta forma, discriminados.
Nas palavras de Renato Santos e Fátima Lobato, quanto às minorias:
“E mais: é preciso uma ampla conscientização sobre o fato de que a marginalização socioeconômico a que são relegadas as minorias, especialmente as raciais, resulta de um único fenômeno: a discriminação”.21
Trocando em miúdos, a tentativa de excluir e reduzir, marginalizar qualquer
minoria e de forma especial os grupos raciais, acaba acarretando o que chamamos
de discriminação.
Buscando desta forma proteger essas minorias por meio das ações
afirmativas, que buscam reparar a discriminação e fazer com que as minorias
tenham mais oportunidades.
Lembrando que não podemos confundir as ações afirmativas com a equal but
separeted, que tinha por objetivo a igualdade entre brancos e negros, porém os
mesmos deveriam estudar e morar separadamente, o que não ocorre nas ações
afirmativas.
Cabe ao Estado desta forma, diante de uma situação de discriminação
manter-se neutro, como se nada estivesse ocorrendo, ou atuar intervindo
diretamente e fazendo valer os direitos que são postos à disposição de todos os
cidadãos, inclusive das minorias que sofrem com a redução de seus direitos.
21 SANTOS, Renato Emerson dos, LOBATO Fátima. Ações afirmativas. ed. DP&A, 2003. p. 24.
37
No início, o Estado se mantinha inerte e neutro, pois acreditava que os
direitos descritos em nossa Constituição Federal bastariam e seriam cumpridos sem
qualquer relato de problemas e conseqüências árduas ao mesmo.
Logo com o passar dos tempos o Estado pode perceber que na realidade
certos grupos considerados minorias perante o restante da sociedade, sofriam com
discriminação e privação de seus direitos, não podendo de forma alguma se manter
neutro o mesmo.
Desta forma, devendo tomar atitudes quanto à problemática em tela, isto
ocorrendo por meio das ações afirmativas.
Podemos definir as ações afirmativas segundo Renato Santos e Fátima
Lobato:
“As ações afirmativas se definem como políticas públicas (e privadas) voltadas à concretização do princípio constitucional da igualdade material e à neutralização dos efeitos da discriminação racial, de gênero, de idade, de origem nacional e de compleição física”.22
E assim continuam o pensamento:
“Inicialmente, as ações afirmativas se definiam como um mero “encorajamento” por parte do Estado a que as pessoas com poder decisório nas áreas pública e privada levassem em consideração, nas suas decisões relativas a temas sensíveis como o acesso à educação e ao mercado de trabalho, fatores até então tidos como formalmente irrelevantes pela grande maioria dos responsáveis políticos e empresarias, quais sejam, a raça, a cor, o sexo e a origem nacional das pessoas. Tal encorajamento tinha por meta, tanto quanto possível, ver concretizado o ideal de que tanto as escolas quanto as empresas refletissem em sua composição a representação de cada grupo na sociedade ou no respectivo mercado de trabalho. Num segundo momento, talvez em decorrência da constatação da ineficácia dos procedimentos clássicos de combate à discriminação, deu-se início a um processo de alteração conceitual do instituto, que passou a ser associado à idéia, mais ousada, de realização da igualdade de oportunidades através da imposição de cotas rígidas de acesso de representantes de minorias a determinados setores do mercado de trabalho e a instituições educacionais. Data também, desse período, a vinculação entre a ação afirmativa e o atingimento de certas metas estatísticas concernentes à presença de negros e mulheres num determinado setor do mercado de trabalho ou numa determinada instituição de ensino (GLAZER, 1991).”23
22 SANTOS, Renato Emerson dos, LOBATO Fátima. Ações afirmativas. ed. DP&A, 2003. p. 21.
38
Trocando em miúdos, as ações afirmativas, são políticas públicas, sendo que
estas buscam firmar o princípio da igualdade, para que ocorra a exterminação da
discriminação racial, e todas as demais discriminações.
Já para Celi Santos, citada por Renata Malta, as ações afirmativas são:
“Todas as práticas positivas, com vistas a promover a proteção dos excluídos e dos desamparados, as mudanças comportamentais arraigadas por culturas ultrapassadas, o pleno exercício dos direitos e garantias fundamentais, bem como os demais direitos inscritos na Constituição de 1988, cuja efetividade destas ações será realizada pelo Estado em parceria com a sociedade civil”.24
As ações afirmativas ocorrem por vontade do Estado, assim todas as
desigualdades ocorridas devem ser extintas, tendo por objetivo final, um tratamento
igual entre todos os entes que compõe uma sociedade. Desta forma, toda
discriminação e marginalização devem ser combatidas.
Por meio das ações afirmativas, toda e qualquer pessoa que acaba sofrendo
discriminação e em virtude disso, acaba tendo privação de seus direitos protegidos e
designados em nossa Constituição Federal, serão protegidos pelas ações
afirmativas.
Ou seja, toda e qualquer pessoa que por motivo de racismo, machismo,
homofobia e qualquer tipo de discriminação, e por este ato forem impedidas de
receber qualquer tipo de privilégio, respeito ou ainda valoração social, seja no
trabalho ou estudos, terá o benefício das ações afirmativas, para que assim, seus
direitos sejam revistos.
Sendo que, quando estivermos diante de práticas de desigualdades, de
discriminação faremos uso das ações afirmativas, discriminação esta, de forma
negativa.
23 SANTOS, Renato Emerson dos, LOBATO Fátima. Ações afirmativas. ed. DP&A, 2003. p. 26.
24 BÔAS, Renata Malta Vilas. Ações afirmativas e o princípio da igualdade. ed. América Jurídica, 2003. p. 31.
39
Logo não iremos considerar as ações afirmativas, como um direito das
minorias que são discriminadas, mas sim, o que se espera é que, o grupo que será
protegido, não esteja em vantagem, quanto à situação que se espera um resultado
positivo ao mesmo.
Podemos ainda observar que, conforme cita Serge Atchabahian, as ações
afirmativas tem por finalidade:
“Com o objetivo de colocar todos os membros da sociedade em condições de igualdade, isto é, de competição no processo da obtenção dos bens da vida para a satisfação de suas necessidades, considerou-se necessário favorecer uns em detrimento de outros”. 25
Neste contexto, busca-se a igualdade entre todos os indivíduos que compõe a
sociedade, e havendo um conflito de interesses entre tais indivíduos, que não haja
parcialidade, para que assim, as minorias não sejam prejudicadas por motivos de
discriminação e seus direitos sejam satisfeitos.
Como já fizemos esta observação o autor também segue no pensamento
descrevendo que, as ações afirmativas são uma forma de discriminação, logo uma
discriminação como já citamos outrora, saudável, pois busca por meio desta
discriminação a igualdade entre os membros da sociedade, ou seja, busca-se
reduzir e extinguir as diferenças que existem entre os mesmos.
Renato dos Santos e Fátima Lobato citam o pensamento de Ellis Cashmore:
“Nesse mesmo sentido, Ellis Cashmore (2000, p. 31) diz que a ação afirmativa “visa ir além da tentativa de garantir igualdade de oportunidades individuais ao tornar crime a discriminação, e tem como beneficiários os membros de grupos que enfrentam preconceitos”.26
Ou seja, no pensamento de Ellis, as ações afirmativas buscam, além da
tentativa de igualdade, afastar as discriminações e preconceitos que possam vir a
prejudicar as minorias de nosso país.
25 ATCHABAHIAN, Serge. Princípio da Igualdade e Ações Afirmativas. ed. RCS, 2004. p. 149.
26 SANTOS, Renato Emerson dos, LOBATO Fátima. Ações afirmativas. ed. DP&A, 2003. p. 63.
40
Logo, as ações afirmativas, visam apenas beneficiar as minorias, que são
privadas de seus direitos, por algum tipo de discriminação que as mesmas ocorrem,
no caso do negro, muitas vezes por sua cor de pele, ou ainda, por nos tempos
passados, ter ocorrido o que chamávamos de escravidão.
4.2 As ações afirmativas como instrumento de inclusão social
Busca as ações afirmativas, proteger todas as pessoas que são excluídas
pela sociedade, seja por motivos de raça, cor, sexo, formação física, ou qualquer
outro tipo de exclusão, até mesmo financeira.
Por vezes, tais indivíduos acabam sofrendo restrições de seus direitos,
direitos estes que são reservados em nossa Constituição Federal, e por tais pessoas
serem excluídas, e seus direitos serem restritos, passamos a fazer uso das ações
afirmativas.
Podemos dizer que conjuntamente a esta, temos o que chamamos de
inclusão social, onde busca-se fazer com que indivíduos que possuem também
direitos e deveres, que um dia como é o exemplo dos escravos, foram excluídos, ou
que ainda continuam sofrendo qualquer tipo de preconceito, como podemos citar os
negros, que um dia foram escravos, e que por este mesmo motivo, mesmo após
serem libertados e possuírem direitos assim como os brancos, ainda assim
continuam sofrendo com discriminações e preconceitos.
Assim, por meio da inclusão social, o que buscamos é fazer com que tais
pessoas, sejam amparadas pelo Estado, para que não sofram qualquer tipo de
preconceito, pois nossa Constituição protege a todos os seres humanos sem
qualquer tipo de distinção.
A inclusão social, é uma forma de transportar para dentro da sociedade
aquele grupo que são ou foram excluídos de alguma forma, por preconceito,
ideologia, ou qualquer outra forma de discriminação.
41
Sendo as ações afirmativas, ações que buscam ter por objetivo a exclusão de
preconceitos, sejam raciais ou ainda por algum tipo de deficiência, desta forma, por
meio das ações afirmativas tem-se a intenção de beneficiar todos os que são
excluídos e desfavorecidos.
Podemos observar com mais facilidade a inclusão social, quando qualquer
indivíduo sofre discriminação e acaba sendo privado de seus direitos, sendo neste
ato possuidor de oportunidades, porém inalcançáveis, por ser considerado pela
sociedade diferente e excluído.
Visam as ações afirmativas, implantar a sociedade o preceito constitucional
da igualdade, sob enfoque substancial por material.
Destarte, por sofrerem algum tipo de preconceito, as ações afirmativas são a
ferramenta estatal adequada, a manutenção de uma sociedade igualitária.
A título de exemplo, é saliente que os deficientes físicos foram a qualquer
tempo vítima de algum tipo de preconceito e o Estado reagindo afirmativamente a
esta (exclusão social), determina inclusive, em concursos públicos, empresas
públicas e privadas a reserva de vagas a estes deficientes que outrora, sofreram
discriminações.
Desta forma, acaba sendo inadequado pensarmos, que pessoas podem ser
excluídas e que outras excluem , seja por motivos de deficiência, de raça, classe
social. Em que país estamos vivendo? Em que século? Fazemos parte ainda do
tempo da escravidão?
Grande impugnância podemos sentir ao pensarmos que pessoas são
excluídas, são privadas de um trabalho ou situação social mais digna, ou ainda e
mais importante de uma vaga em uma Universidade.
Ainda podemos citar as pessoas de classe baixa, que também são excluídos,
por não terem condições financeiras que a sociedade acredita ser interessante, para
os ditames culturais ou financeiros.
E neste momento, podemos imaginar o que seria de tais pessoas, se não
houvessem as famosas quotas para negros, se não pudemos fazer uso das ações
afirmativas da inclusão social.
42
Data vênia, com toda atualidade que existe ao nosso redor, a única coisa que
nos falta, é a conscientização de que, a cor de uma pessoa não modifica sua
sabedoria ou todo seu conhecimento, toda sua cultura e experiência.
4.3 As ações afirmativas no Brasil
As ações afirmativas passaram a fazer parte de nosso país, a partir do
momento em que, nosso governo federal assumiu posição internacional, desta
forma, reconhecendo a existência de muitos atos discriminatórios contra negros no
Brasil.
Podemos observar que há diversos grupos que são discriminados e são
considerados minorias em nosso país, logo no decorrer deste trabalho faremos
menção ao negro por diversas vezes, sendo nosso foco para elaboração deste
estudo.
Sendo que poderíamos ainda fazer menção, aos idosos, portadores de
necessidades especiais, as mulheres, índios, assim como as crianças.
Neste diapasão, passamos a obter no Brasil as ações afirmativas, em
princípio, fazendo menção as cotas para negros, fazendo com que os negros, desta
forma, pudessem obter maior acesso às faculdades e universidades.
Lembrando que, nossa Constituição Federal de 1988 (mil novecentos e
noventa e oito), não autoriza expressamente as ações afirmativas, porém faz
grandes observações quanto ao princípio da igualdade, em seu artigo 5º, e em seu
preâmbulo. Assim, como observa que a prática de racismo é um tipo de crime
inafiançável e ainda imprescritível.
Porém podemos fazer menção quanto ao pensamento exposto por Renato
dos Santos e Fátima Lobato:
“Já no plano estritamente jurídico, que se subordina à tomada de consciência assinalada nas linhas anteriores, o princípio da ação
43
afirmativa e seus mecanismos como as cotas é perfeitamente compatível com o Direito Constitucional Brasileiro cujas normas claramente permitem discriminações justas, ou seja, discriminações que devem ser feitas em razão da igualdade material, como forma de compensar a desigualdade de oportunidades, ou, em alguns casos, de fomentar o desenvolvimento de setores considerados prioritários. A intenção de dar-se um tratamento mais favorável a quem esta em situação de desvantagem, em razão de serem grupos débeis econômica e socialmente, não caracteriza arbítrio ou violação do princípio da igualdade, pelo contrário, pretende viabilizar a isonomia material, como justifica o professor Carlos Roberto de Siqueira Castro (s./d.,p. 444-446 e 451)”.27
Logo as ações afirmativas, são possíveis, mesmo não estando
expressamente escritas no texto constitucional, isto por meio do princípio da
igualdade.
Temos ainda a proteção quanto ao ingresso nas escolas, sem distinção,
conforme o que dispõe o princípio da igualdade.
Nesta senda, as ações afirmativas são espalhadas pelo país, porém não há
uma forma prescrita em lei, sendo medidas isoladas, como citam alguns
doutrinadores.
Acredita-se ainda, segundo Renato dos Santos e Fátima Lobato, que:
“Somente a ação afirmativa, vale dizer, a atuação transformadora, igualadora pelo e segundo o Direito possibilita a verdade do princípio da igualdade, para se chegar à igualdade que a Constituição Brasileira garante como direito fundamental de todos”.28
Trocando em miúdos, para que tenhamos o princípio da igualdade garantindo
conforme a Constituição Federal de nosso país, a igualdade entre todos, será
necessário termos como base as ações afirmativas.
Já para George Reis Andrews, citado por Renato Santos e Fátima Lobato, as
ações afirmativas:
“Significa mais do que o combate contra a discriminação. A ação afirmativa indica uma intervenção estatal para promover o aumento
27 SANTOS, Renato Emerson dos, LOBATO Fátima. Ações afirmativas. ed. DP&A, 2003. p. 67.
28 SANTOS, Renato Emerson dos, LOBATO Fátima. Ações afirmativas. ed. DP&A, 2003. p. 41.
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da presença negra – ou feminina, ou de outras minorias étnicas – na educação, no emprego, e nas outras esferas da vida pública. Promover esse aumento implica levar em conta a cor como critério relevante na seleção de candidatos para tais oportunidades (...). Tradicionalmente foram as pessoas brancas as favorecidas para qualquer oportunidade social ou econômica; com a ação afirmativa, o Estado estabelece certas preferências para as pessoas negras, ou mulheres, ou membros de outras minorias étnicas. Essas preferências não são absolutas; a raça é só um dos critérios utilizados para a distribuição de vagas nas faculdades ou empregos. Um candidato negro de baixa capacidade não pode substituir a um candidato branco de alta capacidade. Mas, no caso de competição entre dois candidatos de capacidade mais ou menos igual, um branco e outro negro, segundo os critérios da ação afirmativa, o candidato negro teria preferência sobre o branco (ANDREWS, 1997, p. 137-138)”.29
Em uma pequena comparação, podemos observar que a Suprema Corte
Norte-Americana, de início acreditou que a ação afirmativa e suas leis, apenas
proibiam as discriminações que ocorriam, entendendo ainda que tal ação fosse
contraria aos dispositivos da Constituição, na verdade o que ocorreu é de sempre
obterem termos vagos quanto à problemática.
Importantíssimo mencionarmos a Emenda XIV, utilizada nos Estados Unidos
da América, sendo uma das fontes mais utilizadas por outros países além do
próprio, como referência para as ações afirmativas.
EMENDA XIV Seção 1 Todas as pessoas nascidas ou naturalizadas nos Estados Unidos e sujeitas a sua jurisdição são cidadãos dos Estados Unidos e do Estado onde tiver residência, Nenhum Estado poderá fazer ou executar leis restringindo os privilégios ou as imunidades dos cidadãos dos Estados Unidos; nem poderá privar qualquer pessoa de sua vida, liberdade, ou bens sem processo legal, ou negar a qualquer pessoa sob sua jurisdição a igual proteção das leis. 30
Trocando em miúdos, já de início temos a proteção ao direito à igualdade,
diante uma lei, todos devem ser tratados igualmente, sem distinção, sendo que,
havendo proteção para um branco a mesma proteção deverá alcançar a um negro,
29 SANTOS, Renato Emerson dos, LOBATO Fátima. Ações afirmativas. ed. DP&A, 2003. p. 90.
30 MENEZES, Paulo Lucena de. A ação afirmativa (Affimetive action) no direito Norte-Americano. ed. Revista dos Tribunais, 2001. p. 158.
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ao pobre, ao rico, e assim por diante, ou seja, não deve haver distinção alguma,
entre os membros de uma sociedade.
Já no Canadá, em sua Constituição de 1867, não foram mencionados os
direitos e garantias individuais, e assim persistindo até o ano de 1960.
O modelo já utilizado pela Suprema Corte Norte-Americana, passou a ser
utilizado por diversos países, assim como podemos mencionar o Canadá.
Passando logo após a por meio da Constituion Act esta de 1982 a prever em
seu artigo 15:
“15. (1). Todos os indivíduos são iguais perante e sob a lei, e têm direito à igual proteção e ao igual benefício da lei sem discriminações e, em particular sem discriminação baseada em raça, origem nacional ou étnica, cor, religião, sexo, idade, ou deficiência física ou mental”.31
Mais uma vez, vemos a proteção quanto ao direito de igualdade, mais
especificamente, sem discriminação quanto à raça, origem nacional, cor, religião,
sexo, idade ou ainda quanto à deficiência física ou mental, e desta forma, podemos
observar uma maior proximidade quanto ao mencionado artigo 5º de nossa
Constituição Federal.
Importante fazermos menção quanto a este dispositivo, que somente será
aplicado a relações públicas e jamais a relações privadas.
Por outro lado na África do Sul, o regime que se utilizava era o apartheid,
passando desta forma, a ser inserido um regime de tremenda discriminação racial,
sendo assim, os negros foram submetidos à inferioridade e constrangimentos.
Neste diapasão, é óbvio, que a situação dos negros, não poderia continuar
desta maneira, sendo assim, buscou-se a elaboração de um novo texto
constitucional, tendo a intenção de afastar toda forma de discriminação que ocorria
contra os negros, passando neste ato as ações afirmativas a terem maior relevância
no âmbito nacional.
31 MENEZES, Paulo Lucena de. A ação afirmativa (Affimetive action) no direito Norte-Americano. ed. Revista dos Tribunais, 2001. p. 129.
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Passando em fevereiro de 1997 (um mil novecentos e noventa e sete) a
fazerem uso de uma nova redação, contida na Constituição.
“9. (2) A igualdade (perante a lei) inclui a plena e igual fruição de todos os direitos e liberdades. Para promover a obtenção dessa igualdade, medidas legislativas e outras que visem proteger ou favorecer pessoas, ou categorias de pessoas prejudicadas por discriminação injusta poderão ser tomadas”.32
Trocando em miúdos, o foco que sempre se busca é o da igualdade entre os
membros de uma sociedade, para que desta forma, todos possam usufruir de seus
direitos, sem que haja violação do mesmo, por pertencer a uma determinada
minoria.
Desta forma, até aproximadamente o ano de 1999 (um mil novecentos e
noventa e nove), houve um aumento dos negros em cargos de gerência média de
até 33% (trinta e três por cento).
Vemos desta forma, que de certa forma, as discriminações estão sendo
reduzidas, porém ainda falta muito, para que seja totalmente extinta.
Segundo o antropólogo Kabengele Munanga:
“O Racismo brasileiro é um crime perfeito, porque a própria vitima é que é
responsável pelo seu racismo, quem cometeu não tem nenhum problema”.
32 MENEZES, Paulo Lucena de. A ação afirmativa (Affimetive action) no direito Norte-Americano. ed. Revista dos Tribunais, 2001. p. 134.
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5. CONCLUSÃO
Neste contexto pudemos perceber que o tema deste trabalho causa grande
repercussão e discussão no meio jurídico, pois tem como objetivo defender e
proteger os direitos que são reservados a todos, em especial as minorias que
compõe nossa sociedade.
A inclusão social acaba ajudando a resolver a problemática que por vezes
toma rumos que são incontroláveis aos artigos descritos em nossa Constituição
Federal, pois acabam sendo insuficientes.
Além da inclusão social, podemos ainda contar com as ações afirmativas,
sendo um ponto muito positivo no direito brasileiro, pois a partir destas, podemos
observar grande melhora, no meio jurídico.
Pois buscam fazer com que todos sejam tratados de maneira igualitária,
sabemos que a discriminação ocorre diariamente em nosso país, e com isso
algumas minorias, acabam sofrendo restrição de seus direitos.
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Temos como foco deste estudo, os negros, que sofrem brutalmente nos dias
atuais por discriminação e preconceito, desta forma pelas ações afirmativas busca-
se maior proteção aos negros, para que os mesmos, não sofram qualquer tipo de
restrição aos direitos que lhes são reservados.
Ou seja, para que os negros não percam uma oportunidade no mercado de
trabalho, ou ainda uma vaga em uma universidade ou faculdade bem conceituada,
apenas por sua cor.
Pois sua raça, sua cor, não alterará sua sabedoria, seu conhecimento e toda
sua cultura; desta forma, não podemos aceitar que tal discriminação e preconceito
ocorram.
Acabam sendo de suma importância as cotas para os negros desta forma,
pois sem as cotas, as poucas oportunidades que estes possuem, seriam mais
limitadas ainda.
Neste diapasão, mesmo acreditando que as cotas para os negros são mais
um tipo de discriminação, pois se todos são iguais, não deveriam ser necessárias as
cotas, para que o direito aí sim se torne igual a todos.
Porém, mesmo não sendo da forma que deveria, ainda sim, ajuda na
problemática que os negros enfrentam, pela discriminação e preconceito que a
sociedade os transmite.
Desta forma, o que buscamos demonstrar é que, a situação que ainda ocorre
nos dias de hoje, acaba sendo impugnante, e devidamente contraria aos ditames de
nossa Constituição Federal.
Para que possamos combater o racismo e toda forma de discriminação em
nosso País, primeiramente necessitamos de um Estado mais presente e
responsável, quando estamos diante de um desrespeito ao que dispõe nossa
Constituição Federal.
Sabemos que, mesmo o Estado deixando de ser neutro e passando a pensar
um pouco mais nas minorias de nosso País, por meio das ações afirmativas, ainda
não basta.
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Logo, buscamos por meio das ações afirmativas e das cotas, que os negros
obtenham todos seus direitos, sem que ocorra qualquer tipo de restrição, seja por
sua cor de pele, sua raça, sexo ou religião, pois todos somos iguais e pertencemos
aos mesmo mundo, e temos como pretexto a mesma Constituição, onde TODOS
SÃO IGUAIS EM DIREITOS E DEVERES.
CRONOLOGIA DE EVENTOS HISTÓRICOS
1776 - Adoção da Declaração de Direitos da Virgínia.
Proclamação da Independência.
1781 - Os Artigos da Confederação são ratificados.
1789 – A constituição é ratificada.
1791 – O Bill of Rights (devidos direitos) é integrado à
Constituição.
50
1800 – Thomas Jefferson é eleito Presidente.
1822 - Proclamação da Independência do Brasil.
1824 – A Constituição Brasileira.
1860 – Lincoln é eleito Presidente.
1861 – Começa a Guerra Civil Americana.
1865 – A Décima Terceira Emenda Constitucional, abolindo a
escravidão, é ratificada.
1866 – A Ku Klux Klan é fundada em Pulaski, Estado do
Tennessee.
1871 – Lei do Ventre-Livre no Brasil.
1885 – Lei Saraiva – Cotegipe ou dos Sexagenários no Brasil.
1888 – Abolida a escravidão no Brasil.
51
1889 – Proclamação da Republica do Brasil.
1920 – As mulheres norte-americanas obtêm o direito de votar
com a ratificação da Décima Nona Emenda Constitucional.
1929 – Inicia-se a Grande Depressão Mundial.
1934 - As mulheres brasileiras obtêm o direito de votar com a
Nova Constituição da Era Getulio Vargas.
1939 – A Alemanha invade a Polônia, dando início à Segunda
Guerra Mundial.
1941 – Os japoneses atacam Pearl Harbor ( Os Estados Unidos
entram na Segunda Grande Guerra).
1945 – Acaba a Segunda Guerra Mundial.
1961 – O Presidente Kennedy edita a Executive Order nº
10.925.
1963 – O Presidente Kennedy é assassinado.
52
1964 – Martin L. King Junior ganha o Prêmio Nobel da Paz,
pela luta dos direitos civis do negro, e os negros obtêm direito
de votar nos Estados Unidos.
1967 – Thurgood Marshal torna-se o primeiro negro a integrar
a Suprema Corte Norte-americana.
1968 – Martin Luther King Junior é assassinado.
1981 – Sandra Day O’Connor torna-se a primeira mulher a
integrar a Suprema Corte Norte-
americana.
1988 - Promulgada a Nova Constituição Brasileira, faz parte
dela algumas ações afirmativa, como para mulheres e
portadores de necessidades especiais (deficientes físicos).
2002 - Eleito no Brasil Luis Inácio Lula da Silva, o primeiro
Presidente operário do país.
2003 – Promulga a Lei 10.639/2003 História e Cultura da
África.
53
2003 – Criado a Secretaria Especial das Políticas de Promoção
da
Igualdade Racial no Brasil.
2004 – Joaquim Benedito Barbosa é o primeiro negro brasileiro
a integrar
o Supremo Tribunal Federal.
2008 – Benedito Gonçalves é o primeiro negro brasileiro a
integrar o
Superior Tribunal de Justiça.
2008 – Barak Obama é o primeiro negro presidente dos
Estados Unidos.
54
REFERÊNCIAS
ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. São Paulo: Malheiros. 2008.
ARAUJO, Luiz Alberto David, NUNES JUNIOR, Vidal Serrano. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2008.
ATCHABAHIAN, Serge. Princípio da igualdade e Ações afirmativas. São Paulo: RCS, 2004.
BOAS – Renata Malta Vilas. Ações afirmativas e o princípio da igualdade. Rio de Janeiro: América Jurídica, 2003.
55
FELIPPE, Marcio Sotelo. Razão jurídica e dignidade humana. São Paulo: Max Limonad., 1996.
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Conteúdo jurídico do princípio da igualdade. São Paulo: Malheiros, 2004.
MENEZES, Paulo Lucena de. A ação afirmativa (affirmative action) no direito Norte-Americano. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001.
SANTOS, Renato Emerson dos, LOBATO, Fátima. Ações afirmativas. Rio de Janeiro: DP&A, 2003.
SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado , 2010.
SCHAFER, Jairo. Classificação aos Direitos Fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005.
SILVA, Fernanda Duarte Lopes Lucas da. Princípio Constitucional da igualdade. Rio de Janeiro: Editora Lumen Júris, 2003.
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ANEXO A
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ANEXO B
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ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL (Med.
Liminar) 186-2
Origem: DISTRITO FEDERAL Entrada no STF: 20/07/2009
Relator: MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI Distribuído:
Partes: Requerente: DEMOCRATAS - DEM (CF 103, VIII) Requerido :CONSELHO DE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO DA UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA - CEPE REITOR DA UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA CENTRO DE SELEÇÃO E DE PROMOÇÃO DE EVENTOS DA UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA - CESPE/UNB
Interessado:
Dispositivo Legal Questionado
Ata da Reunião Extraordinária do Conselho de Ensino, Pesquisa eExtensão da Universidade de Brasília (CEPE, realizada no dia 06 dejunho de 2003); Resolução nº 038, de 18 de junho de 200,, do Conselhode Ensino, Pesquisa e Extensão da Universidade de Brasília (CEPE);Plnao de Metas para a Integração Social, Étnica e Racial daUniversidade de Brasília - UnB, especificamente os pontos I("Objetivo"), II ("Ações para alcançar o objetivo"), II("Permanência"), "1", "2" e "3, a, b, c"; e III ("Caminhos para aimplementação"), itens 1, 2 e 3. As impugnações aqui referidas tomampor base o texto literal do Plano de Metas, apesar da evidenteconfusão na distribuição entre itens, alíneas e subitens; Item 2,subitens 2.2, 2.2.1, 2.3, item 3, subitem 3.9.8 e item 7 e subitens,do Edital nº 2, de 20 de abril de 2009, do 2º Vestibular de 2009, doCESPE - Centro de Seleção e de Promoção de Eventos - órgao que integraa Fundação Universidade de Brasília e organiza a realização doconcurso vestibular para acesso à Unb./#
Fundamentação Constitucional
- Art. 001º, caput e III- Art. 003º, 0IV- Art. 004º, VIII- Art. 005º, 00I, 0II, XXXIII, XLII e LIV- Art. 037, caput- Art. 205- Art. 206, 00I- Art. 207, caput- Art. 208, 00V/#
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Resultado da Liminar
Decisão Monocrática - Indeferida - "ad referendum"Decisão Plenária da Liminar
Resultado Final
Aguardando JulgamentoDecisão Final
Retirado de pauta por indicação do Relator. Ausente,justificadamente, o senhor Ministro Joaquim Barbosa. Presidência doSenhor Ministro Peluso. - Plenário, 01.09.2011.
Data de Julgamento Final
PlenárioData de Publicação da Decisão Final
PendenteDecisão Monocrática da Liminar
Trata-se de argüição de descumprimento de preceito fundamental,proposta pelo partido político DEMOCRATAS (DEM), contra atosadministrativos da Universidade de Brasília que instituíram o programade cotas raciais para ingresso naquela universidade.Alega-se ofensa aos artigos 1º, caput e inciso III; 3º, inciso IV; 4º,inciso VIII; 5º, incisos I, II, XXXIII, XLII, LIV; 37, caput; 205;207, caput; e 208, inciso V, da Constituição de 1988.A peça inicial defende, em síntese, que “(...) na presente hipótese,sucessivos atos estatais oriundos da Universidade de Brasília atingirampreceitos fundamentais diversos, na medida em que estipularam a criaçãoda reserva de vagas de 20% para negros no acesso às vagas universais einstituíram verdadeiro 'Tribunal Racial', composto por pessoasnão-identificadas e por meio do qual os direitos dos indivíduosficariam, sorrateiramente, à mercê da discricionariedade doscomponentes, (...)”(fl. 9).O autor esclarece, inicialmente, que a presente arguição não visa aquestionar a constitucionalidade de ações afirmativas como políticasnecessárias para a inclusão de minorias, ou mesmo a adoção do modelo deEstado Social pelo Brasil e a existência de racismo, preconceito ediscriminação na sociedade brasileira. Acentua, dessa forma, que a ação
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impugna, especificamente, a adoção de políticas afirmativas“racialistas”, nos moldes da adotada pela UnB, que entende inadequadapara as especificidades brasileiras.Assim, a petição traz trechos em que se questiona se “a raça,isoladamente, pode ser considerada no Brasil um critério válido,legítimo, razoável, constitucional, de diferenciação entre o exercíciode direitos dos cidadãos” (fl. 28). Defende o partido político, comisso, que o acesso aos direitos fundamentais no Brasil não é negado aosnegros, mas aos pobres e que o problema econômico está atrelado àquestão racial.Alega que o sistema de cotas da UnB pode agravar o preconceito racial,uma vez que institui a consciência estatal da raça, promove ofensaarbitrária ao princípio da igualdade, gera discriminação reversa emrelação aos brancos pobres, além de favorecer a classe média negra (fl.29).Afirma que o item 7 e os subitens do Edital nº 02/2009 do CESPE/UNBviolam o princípio da igualdade e da dignidade humana, na medida em queressuscitam a crença de que é possível identificar a que raça pertenceuma pessoa (fl. 29). Assim, indaga a respeito da constitucionalidadedos critérios utilizados pela comissão designada pelo CESPE paradefinir a “raça” do candidato, afirmando que saber quem é ou não negrovai muito além do fenótipo.A petição ressalta, ainda, que a aparência de uma pessoa diz muitopouco sobre a sua ancestralidade (fl. 30). Refere, com isso, que a“teoria compensatória”, que visa à reparação do dano causado pelaescravidão, não pode ser aplicada num país miscigenado como o Brasil.Na inicial, é frisado que, nos últimos 30 anos, estabeleceu-se umconsenso entre os geneticistas segundo o qual os seres humanos sãotodos iguais (fl. 37) e que as características fenotípicas representamapenas 0,035% do genoma humano. Aponta-se, dessa forma, o perigo daimportação de modelos como o de Ruanda e o dos Estados Unidos daAmérica (fls. 41-43).Sustenta-se, ademais, que os dados estatísticos referentes aosindicadores sociais são manipulados e que a pobreza no Brasil tem“todas as cores” (fls. 54-58).Especificamente quanto ao sistema de classificação racial da UnB, oarguente enfatiza que todos os censos brasileiros sempre utilizaram ocritério da autoclassificação (fl. 61).Expõe que, no Brasil, “a existência de valores nacionais, comuns atodas as raças, parece quebrar o estigma da classificação racialmaniqueísta” (fl. 67).Conclui, assim, que as cotas raciais instituídas pela UnB violam oprincípio constitucional da proporcionalidade, por ofensa aosubprincípio da adequação, no que concerne à utilização da raça comocritério diferenciador de direitos entre indivíduos, uma vez que é apobreza que impede o acesso ao ensino superior (fl. 74). Sugere que ummodelo que levasse em conta a renda em vez da cor da pele seria menoslesivo aos direitos fundamentais e também atingiria a finalidadepretendida de integrar os negros (fl. 75).Quanto ao periculum in mora, afirma o partido político que o resultadodo 2º Vestibular 2009 da Universidade de Brasília, o qual foi realizadode acordo com o sistema de acesso por meio de cotas raciais, foipublicado no dia 17 de julho de 2009, e o registro dos estudantesaprovados, cotistas e não cotistas, está previsto para os dias 23 e 24de julho de 2009 (fl. 76).O pedido final da arguição de descumprimento de preceito fundamentalestá assim formulado:“(...)seja a ação julgada procedente para o fim de que esta EgrégiaCorte Constitucional declare a inconstitucionalidade, com eficácia ergaomnes, efeitos ex tunc e vinculantes dos seguintes atos administrativose normativos: (i) Ata da Reunião Extraordinária do Conselho de Ensino,Pesquisa e Extensão da Universidade de Brasília (CEPE), realizada nodia 6 de junho de 2003; (ii) Resolução nº 38, de 18 de junho de 2003,do Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão da Universidade de Brasília(CEPE); (iii) Plano de Metas para a Integração Social, Étnica e Racialda Universidade de Brasília - UnB, especificamente os pontos I(“Objetivo”), II (“Ações para alcançar o objetivo”), l (“Acesso”),alínea 'a'; II (“Ações para alcançar o objetivo”), II (“Permanência”),'l', '2' e '3, a, b, c'; e III (“Caminhos para a implementação”), itens1, 2 e 3. As impugnações aqui referidas tomam por base o texto literaldo Plano de Metas, apesar da evidente confusão na distribuição entreitens, alíneas e subitens; e (iv) Item 2, subitens 2.2., 2.2.1, 2.3,
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item 3, subitem 3.9.8 e item 7 e subitens, do Edital nº 2, de 20 deabril de 2009, do 2º Vestibular de 2009 - CESPE/UnB, por ofensadescarada e manifesta ao artigo 1º, caput (princípio republicano) einciso III (dignidade da pessoa humana); ao artigo 3º, inciso IV (vedao preconceito de cor e a discriminação); o artigo 4º, inciso III(repúdio ao racismo); o artigo 5º, incisos I (igualdade), II(legalidade), XXXIII (direito à informação dos órgãos públicos), XLII(vedação ao racismo) e LIV (devido processo legal e princípio daproporcionalidade), o artigo 37, caput (princípios da legalidade, daimpessoalidade, da razoabilidade, da publicidade, da moralidade,corolários do princípio republicano), além dos artigos 205 (direitouniversal de educação), 206, caput e inciso I (igualdade nas condiçõesde acesso ao ensino), 207 (autonomia universitária) e 208, inciso V(princípio do acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa eda criação artística segundo a capacidade de cada um), todos daConstituição Federal.” (fl. 79)Em despacho de 21 de julho de 2009 (fl. 613), requisitei as informaçõesdos arguidos e as manifestações do Advogado-Geral da União e doProcurador-Geral da República (art. 5º, § 2º, da Lei n° 9.882/99).O Reitor da Universidade de Brasília, o Diretor do Centro de Promoçãode Eventos da Universidade de Brasília e o Presidente do Conselho deEnsino, Pesquisa e Extensão da Universidade de Brasília prestaraminformações (fls. 628-668), alegando a impossibilidade da propositurade arguição de descumprimento de preceito fundamental, por ser cabívelo ajuizamento de ação direta de inconstitucionalidade (fl. 636).Asseveraram, com base no princípio da dignidade da pessoa humana, aconstitucionalidade dos atos impugnados (fls. 636-640). Sustentaram que“não é possível ignorar, face à análise de abundantes dadosestatísticos, que cidadãos brasileiros de cor negra partem, em suaimensa maioria, de condições sócio-econômicas muito desfavoráveiscomparativamente aos de cor branca” (fl. 643). Alegaram, ainda, que aConvenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de DiscriminaçãoRacial, ratificada pelo Brasil, prevê ações afirmativas como forma derechaçar a discriminação racial (fl. 645). Esclarecem, assim, que ocritério utilizado pela Universidade não é o genético, mas o da análisedo fenótipo do candidato (fl. 664). Ressaltam, por fim, que já foramrealizados 10 vestibulares utilizando-se o sistema de cotas, nãohavendo periculum in mora a justificar a concessão da medida liminarrequerida (fl. 667).A Procuradoria-Geral da República manifestou-se pela admissibilidade daADPF e pelo indeferimento da medida cautelar postulada, “seja pelaausência de plausibilidade do direito invocado, em vista daconstitucionalidade das políticas de ação afirmativa impugnadas, sejapela presença do periculum in mora inverso” (fl. 709-733).Na petição de fls. 735-765, o Advogado-Geral da União manifestou-sepela denegação da medida cautelar pleiteada, por ausência dosrequisitos necessários à sua concessão.Passo a decidir tão-somente o pedido de medida cautelar.O art. 5º, § 1º, da Lei n° 9.882/99 permite que, no período de recesso,o pedido de medida cautelar seja apreciado em decisão monocrática doPresidente do STF - a quem compete decidir sobre questões urgentes noperíodo de recesso ou de férias, conforme o art. 13, VIII, do RegimentoInterno do Tribunal -, a qual posteriormente deverá ser levada aoreferendo do Plenário da Corte.A presente arguição de descumprimento de preceito fundamental traz aesta Corte uma das questões constitucionais mais fascinantes de nossotempo - acertadamente cunhado por Bobbio como o “tempo dos direitos”(BOBBIO, Norberto, L' età dei diritti. Einaudi editore, Torino, 1990) -e que, desde meados do século passado, tem sido o centro de infindáveisdebates em muitos países e, no Brasil, atinge atualmente seu auge.Trata-se do difícil problema quanto à legitimidade constitucional dosprogramas de ação afirmativa que implementam mecanismos dediscriminação positiva para inclusão de minorias e determinadossegmentos sociais.O tema causa polêmica, tornando-se objeto de discussão, e a razão paratanto está no fato de que ele toca nas mais profundas concepçõesindividuais e coletivas a respeito dos valores fundamentais daliberdade e da igualdade.Liberdade e igualdade constituem os valores sobre os quais está fundadoo Estado constitucional. A história do constitucionalismo se confundecom a história da afirmação desses dois fundamentos da ordem jurídica.Não há como negar, portanto, a simbiose existente entre liberdade e
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igualdade e o Estado Democrático de Direito. Isso é algo que a ninguémsoa estranho - pelo menos em sociedades construídas sobre valoresdemocráticos - e, neste momento, deixo claro que não pretendo rememorarou reexaminar o tema sob esse prisma.Não posso deixar de levar em conta, no contexto dessa temática, asassertivas do Mestre e amigo Professor Peter Häberle, o qual muito bemconstatou que, na dogmática constitucional, muito já se tratou e muitojá se falou sobre liberdade e igualdade, mas pouca coisa se encontrasobre o terceiro valor fundamental da Revolução Francesa de 1789: afraternidade (HÄBERLE, Peter. Libertad, igualdad, fraternidad. 1789como historia, actualidad y futuro del Estado constitucional. Madrid:Trotta; 1998). E é dessa perspectiva que parto para as análises quefaço a seguir.No limiar deste século XXI, liberdade e igualdade devem ser(re)pensadas segundo o valor fundamental da fraternidade. Com issoquero dizer que a fraternidade pode constituir a chave por meio da qualpodemos abrir várias portas para a solução dos principais problemashoje vividos pela humanidade em tema de liberdade e igualdade.Vivemos, atualmente, as consequências dos acontecimentos do dia 11 desetembro de 2001 e sabemos muito bem o que significam osfundamentalismos de todo tipo para os pilares da liberdade e igualdade.Fazemos parte de sociedades multiculturais e complexas e tentamos aindacompreender a real dimensão das manifestações racistas,segregacionistas e nacionalistas, que representam graves ameaças àliberdade e à igualdade.Nesse contexto, a tolerância nas sociedades multiculturais é o cernedas questões a que este século nos convidou a enfrentar em tema deliberdade e igualdade.Pensar a igualdade segundo o valor da fraternidade significa ter emmente as diferenças e as particularidades humanas em todos os seusaspectos. A tolerância em tema de igualdade, nesse sentido, impõe aigual consideração do outro em suas peculiaridades e idiossincrasias.Numa sociedade marcada pelo pluralismo, a igualdade só pode serigualdade com igual respeito às diferenças. Enfim, no Estadodemocrático, a conjugação dos valores da igualdade e da fraternidadeexpressa uma normatividade constitucional no sentido de reconhecimentoe proteção das minorias.A questão da constitucionalidade de ações afirmativas voltadas aoobjetivo de remediar desigualdades históricas entre grupos étnicos esociais, com o intuito de promover a justiça social, representa umponto de inflexão do próprio valor da igualdade. Diante desse tema,somos chamados a refletir sobre até que ponto, em sociedadespluralistas, a manutenção do status quo não significa a perpetuação detais desigualdades.Se, por um lado, a clássica concepção liberal de igualdade como umvalor meramente formal há muito foi superada, em vista do seu potencialde ser um meio de legitimação da manutenção de iniquidades, por outro oobjetivo de se garantir uma efetiva igualdade material deve semprelevar em consideração a necessidade de se respeitar os demais valoresconstitucionais.Não se deve esquecer, nesse ponto, o que Alexy trata como o paradoxo daigualdade, no sentido de que toda igualdade de direito tem porconsequência uma desigualdade de fato, e toda desigualdade de fato temcomo pressuposto uma desigualdade de direito (ALEXY, Robert. Teoría delos derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios Políticos yConstitucionales; 2001). Assim, o mandamento constitucional dereconhecimento e proteção igual das diferenças impõe um tratamentodesigual por parte da lei. O paradoxo da igualdade, portanto, suscitaproblemas dos mais complexos para o exame da constitucionalidade dasações afirmativas em sociedades plurais.Cortes constitucionais de diversos Estados têm sido chamadas a sepronunciar sobre a constitucionalidade de programas de açõesafirmativas nas últimas décadas. No entanto, é importante salientar queessa temática - que até certo ponto pode ser tida como universal - temcontornos específicos conforme as particularidades históricas eculturais de cada sociedade.O tema não pode deixar de ser abordado desde uma reflexão maisaprofundada sobre o conceito do que chamamos de “raça”. Nunca é demaisesclarecer que a ciência contemporânea, por meio de pesquisasgenéticas, comprovou a inexistência de “raças” humanas. Os estudos dogenoma humano comprovam a existência de uma única espécie dividida embilhões de indivíduos únicos: “somos todos muito parecidos e, ao mesmo
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tempo, muito diferentes” (Cfr.: PENA, Sérgio D. J. Humanidade SemRaças? Série 21, Publifolha, p. 11.).Este Supremo Tribunal Federal, inclusive, no histórico julgamento doHabeas Corpus nº 82.424-2/RS, frisou a inexistência de subdivisõesraciais entre indivíduos.A noção de “raça”, que insiste em dividir e classificar os sereshumanos em “categorias”, resulta de um processo político-social que, aolongo da história, originou o racismo, a discriminação e o preconceitosegregacionista. Como explica Joaze Bernardino, “a categoria raça é umaconstrução sociológica, que por esse motivo sofrerá variações de acordocom a realidade histórica em que ela for utilizada”. Em razão disso,uma pessoa pode ser considerada branca num contexto social e negra emoutro, como ocorre com “alguns brasileiros brancos que são tratadoscomo negros nos Estados Unidos” (BERNARDINO, Joaze. Levando a raça asério: ação afirmativa e correto reconhecimento, In: Levando a raça asério: ação afirmativa e universidade. Rio de Janeiro: DP&A, 2004, p.19-20).De toda forma, é preciso enfatizar que, enquanto em muitos países opreconceito sempre foi uma questão étnica, no Brasil o problema vemassociado a outros vários fatores, dentre os quais sobressai a posiçãoou o status cultural, social e econômico do indivíduo. Como já escrevianos idos da década de 40 do século passado Caio Prado Júnior, célebrehistoriador brasileiro, “a classificação étnica do indivíduo se faz noBrasil muito mais pela sua posição social; e a raça, pelo menos nasclasses superiores, é mais função daquela posição que dos caracteressomáticos” (PRADO JÚNIOR, Caio. Formação do Brasil Contemporâneo. SãoPaulo: Brasiliense; 2006, p. 109).Isso não quer dizer que não haja problemas “raciais” no Brasil. Opreconceito está em toda parte. Como dizia Bobbio, “não existepreconceito pior do que o acreditar não ter preconceitos” (BOBBIO,Norberto. Elogio da serenidade e outros escritos morais. São Paulo:Unesp; 2002, p. 122).No debate sobre o tema, somos também levados a analisar a diferençaexistente entre a discriminação promovida pelo Estado e a discriminaçãopraticada pelos particulares.Desde a abolição da escravatura - um dos fatos mais importantes dahistória de afirmação e efetivação dos direitos fundamentais no Brasil-, não há notícia de que o Estado brasileiro tenha se utilizado docritério racial para realizar diferenciação legal entre seus cidadãos.Esse é um fator de relevo que distingue o debate sobre o tema noBrasil. Nos Estados Unidos, por exemplo, existiu um sistemainstitucionalizado de discriminação racial estimulado pela sociedade epelo próprio Estado, por seus Poderes Executivo, Legislativo eJudiciário, em seus diferentes níveis. A segregação entre negros ebrancos foi amplamente implementada pelo denominado sistema Jim Crow elegitimada durante várias décadas pela doutrina do “separados masiguais” (separate but equal), criada pela famosa decisão da SupremaCorte nos caso Plessy vs. Ferguson (163 U.S 537 1896). Com base nessesistema legal segregacionista, os negros foram proibidos de frequentaras mesmas escolas que os brancos, comer nos mesmos restaurantes elanchonetes, morar em determinados bairros, serem proprietários oulocatários de imóveis pertencentes a brancos, utilizar os mesmostransportes públicos, teatros, banheiros etc., casar com brancos, votare serem votados e, enfim, de serem cidadãos dos Estados Unidos daAmérica. Foi nesse específico contexto de cruel discriminação contra osnegros que surgiram as ações afirmativas como uma espécie de mecanismoemergencial de inclusão e integração social dos grupos minoritários ede solução para os conflitos sociais que se alastravam por todo o paísna década de 60.Assim, não se pode deixar de considerar que o preconceito racialexistente no Brasil nunca chegou a se transformar numa espécie de ódioracial coletivo, tampouco ensejou o surgimento de organizaçõescontrárias aos negros, como a Ku Klux Klan e os Conselhos de CidadãosBrancos, tal como ocorrido nos Estados Unidos. Na República Brasileira,nunca houve formas de segregação racial legitimadas pelo próprioEstado.No Brasil, a análise do tema das ações afirmativas deve basear-se,sobretudo, em estudos históricos, sociológicos e antropológicos sobreas relações raciais em nosso país.Durante muito tempo, os sociólogos, antropólogos e historiadoresidentificaram no processo de miscigenação que formou a sociedadebrasileira uma forma de democracia racial. O apogeu da tese da
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“democracia racial brasileira” se deu na década de 30, com o trabalhode Gilberto Freyre (Casa grande & Senzala).Na década de 50, a crença na democracia racial levou os representantesbrasileiros na UNESCO (Artur Ramos e Luiz Aguiar Costa Pinto), após a2ª Guerra Mundial, a propor o Brasil como exemplo de uma experiênciabem-sucedida de relações raciais.A partir da década de 60, pesquisas financiadas pela UNESCO, edesenvolvidas por sociólogos brasileiros (Florestan Fernandes, FernandoHenrique Cardoso e Oracy Nogueira, por exemplo), começaram a questionara existência dessa dita democracia. Concluíram que, no fundo, o Brasildesenvolvera uma forma de discriminação “racial” escondida atrás domito da “democracia racial”. Apontaram que, enquanto nos Estados Unidosdesenvolveu-se o preconceito com base na origem do indivíduo(ancestralidade), no Brasil existia o preconceito com base na cor dapele da pessoa (fenótipo).Na década de 70, pesquisadores como Carlos Hasenbalg e Nelson do Vallee Silva afirmaram que o preconceito e a discriminação não estavamapenas fundados nas sequelas da escravatura, mas assumiram novas formase significados a partir da abolição, estando relacionadas aos“benefícios simbólicos adquiridos pelos brancos no processo decompetição e desqualificação dos negros”. Simultaneamente, osmovimentos negros passaram a questionar a visão integracionista daslideranças negras brasileiras das décadas de 30, 40, 50 e 60.Foi na década de 90, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso,que o tema das ações afirmativas entrou na agenda do governobrasileiro, com a criação do Grupo de Trabalho Interministerial para aValorização da População Negra em 1995, as propostas do ProgramaNacional de Direitos Humanos (PNDH) em 1996, e a participação do Brasilna Conferência Mundial contra o Racismo, Discriminação Racial,Xenofobia e Formas Correlatas de Intolerância, em 2001, na África doSul.O governo de Luiz Inácio Lula da Silva aprofundou esse processo. Crioua Secretaria Especial para a Promoção da Igualdade Racial, modificou oSistema de Financiamento ao Estudante e criou o Programa Universidadepara Todos, prevendo bolsas e vagas específicas para “negros”. Em 2003,o Conselho Nacional de Educação exarou as Diretrizes NacionaisCurriculares para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para oEnsino da História e Cultura Afro-Brasileira.Em 2005, o Senado aprovou o “Estatuto da Igualdade Racial”, projeto doSenador Paulo Paim, ainda não aprovado pela Câmara dos Deputados. Oprojeto visa a estabelecer direitos para a população brasileira quechama de “afro-brasileiros”, definida no artigo 1º, parágrafo 3º, comoaqueles que “se classificam como tais e/ou como negros, pretos, pardosou definição análoga”.A análise dessas considerações históricas e do que se produziu noâmbito da sociologia e da antropologia no Brasil nos leva até mesmo aquestionar se o Estado Brasileiro não estaria passando por um processode abandono da idéia, muito difundida, de um país miscigenado e, aospoucos, adotando uma nova concepção de nação bicolor.Em 2005, o jogador de futebol Ronaldo - “O Fenômeno” -, presenciando asagressões racistas que jogadores negros estavam sofrendo nos gramadosespanhóis, deu a seguinte declaração: “Eu, que sou branco, sofro comtamanha ignorância. A solução é educar as pessoas”. Tal declaraçãogerou grande repercussão no Brasil e obrigou Ronaldo a explicar o queele quis dizer: “Eu quis dizer que tenho pele mais clara, só isso, emesmo assim sou vítima de racismo. Meu pai é negro. Não sou branco, nãosou negro, sou humano. Sou contra qualquer tipo de discriminação”. AliKamel utiliza esse acontecimento como exemplo das mudanças que estariamocorrendo na mentalidade brasileira. Alerta, dessa forma, que a crisegerada pela declaração do jogador é a prova de que estamos aceitando atese da “nação bicolor”; que antes o discurso predominante erafavorável à autodeclaração e que agora achamos que temos o direito declassificar as pessoas (KAMEL, Ali. Não Somos Racistas: uma reação aosque querem nos transformar numa nação bicolor. Rio de Janeiro: NovaFronteira, 2006, p. 139-140).Por mais que se questione a existência de uma “Democracia Racial” noBrasil, é fato que a sociedade brasileira vivenciou um processo demiscigenação singular. Nesse sentido, elucida Carlos Lessa que “OBrasil não tem cor. Tem todo um mosaico de combinações possíveis”(LESSA, Carlos. "O Brasil não é bicolor", In: FRY, Peter e outros(org.) Divisões Perigosas: Políticas raciais no Brasil Contemporâneo.Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007, p. 123).
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Na Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílio (PNAD), em 1976, osbrasileiros se autoatribuíram 135 cores distintas. Tal fato demonstracabalmente a dificuldade dos brasileiros de identificarem a sua cor depele.Para Fátima Oliveira, “ser negro é, essencialmente, um posicionamentopolítico, onde se assume a identidade racial negra. Identidaderacial-étnica é o sentimento de pertencimento a um grupo racial ouétnico, decorrente de construção social, cultural e política”(OLIVEIRA, Fátima. Ser negro no Brasil: alcances e limites, In: Revistade Estudos Avançados, vol. 18, nº 50. Instituto de Estudos Avançados daUniversidade de São Paulo. São Paulo: IEA. Janeiro/abril de 2004, p.57-58.)As preocupações com as consequências da adoção de cotas raciais para oacesso à Universidade levaram cento e treze intelectuais brasileiros(antropólogos, sociólogos, historiadores, juristas, jornalistas,escritores, dramaturgos, artistas, ativistas e políticos) a redigir umacarta contra as leis raciais no Brasil. No documento, os subscritoresalertam que “o racismo contamina profundamente as sociedades quando alei sinaliza às pessoas que elas pertencem a determinado grupo racial -e que seus direitos são afetados por esse critério de pertinência deraça”. Sustentam que “as cotas raciais proporcionam privilégios a umaínfima minoria de estudantes de classe média e conservam intacta, atrásde seu manto falsamente inclusivo, uma estrutura de ensino públicoarruinada”. Defendem que existem outras formas de superar asdesigualdades brasileiras, proporcionando um verdadeiro acessouniversal ao ensino superior, menos gravosas para a identidadenacional, como a oferta de cursos preparatórios gratuitos e aeliminação das taxas de inscrição nos exames vestibulares (“Cento eTreze cidadãos anti-racistas contra as leis raciais”, assinado porcento e treze intelectuais brasileiros, entre eles, Ana Maria Machado,Caetano Veloso, Demétrio Magnoli, Ferreira Gullar, José Ubaldo Ribeiro,Lya Luft e Ruth Cardoso).A Universidade de Brasília foi a primeira instituição de ensinosuperior federal a adotar um sistema de cotas raciais para ingresso pormeio do vestibular. A iniciativa, baseada na autonomia universitária,adotou, segundo as informações prestadas pela UnB, o critério daanálise do fenótipo do candidato: “os critérios utilizados são os dofenótipo, ou seja, se a pessoa é negra (preto ou pardo), uma vez que,como já suscitado na presente peça, é essa característica que leva àdiscriminação ou ao preconceito” (fl. 664).O critério utilizado para deferir ou não ao candidato o direito aconcorrer dentro da reserva de cotas raciais gera algunsquestionamentos importantes. Afinal, qual é o fenótipo dos “negros”(“pretos” e “pardos”) brasileiros? Quem está técnica e legitimamentecapacitado a definir o fenótipo de um cidadão brasileiro? Essasindagações não são despropositadas se considerarmos alguns incidentesocorridos na história da política de cotas raciais da UnB.Marcos Chor Maio e Ricardo Ventura Santos relatam que o procedimentoadotado pela UnB gerou constrangimentos e dilemas de identidade entreos candidatos:“Os responsáveis pelo vestibular da UnB por diversas ocasiões reiteramque a meta da comissão era o de analisar as características físicas,visando identificar traços da raça negra. Esse objetivo gerouconstrangimentos diversos e dilemas identitários de não pouca montaentre os candidatos ao vestibular, devido às dúvidas de se os critériosseriam mesmo o de aparência física (negra) ou de (afro-)descendência. Acandidata Ana Paula Leão Paim, a princípio na dúvida sobre se sedeclararia “negra”, foi convencida pelo argumento da mãe, que lhe disseque sua 'tataravó era escrava'. Contudo, ainda assim, Ana Paula estavapreocupada pois, segundo ela, 'pela fotografia não dá para analisar adescendência'. Outra candidata, Elizabete Braga, que 'não se intimidoucom a fotografia', comentou: 'Minha irmã não seria considerada negra,por exemplo. Ela é filha de outro pai, tem a pele mais clara e o cabelomais liso' (Borges, 2004). Ricardo Zanchet, um candidato que sedeclarou 'negro', ainda que 'com a pele clara, cabelo liso ecastanho... nem de longe lembra[ndo] um negro', e cuja classificaçãonão foi aceita pela comissão, afirmou: 'Vou levar a certidão denascimento de meu avô e mostrar a eles... Se meu avô e minha bisavóeram negros, eu sou fruto de miscigenação e tenho direito' (Paraguassú,2004).(...)Se a primeira etapa do trabalho de identificação racial da UnB foi
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conduzido pela equipe da 'anatomia racial', a segunda foi conduzida porum comitê de 'psicologia racial'. Trinta e quatro dos 212 candidatoscom inscrições negadas na primeira etapa entraram com recurso junto àUnB. Uma nova comissão foi formada 'por professores da UnB e membros deONGs', que exigiu dos candidatos um documento oficial para comprovar acor. Foram ainda submetidos à entrevista (gravada, transcrita eregistrada em ata) na qual, entre outros tópicos, foram questionadosacerca de seus valores e percepções: 'Você tem ou já teve algumaligação com o movimento negro? Já se sentiu discriminado por causa dasua cor? Antes de se inscrever no vestibular, já tinha pensado em vocêcomo um negro?' (Cruz, 2004). O candidato Alex Fabiany José Muniz, de23 anos, um dos beneficiários da nova rodada da seleção das cotas,conseguiu um certificado comprovando que era pardo ao levar a certidãode nascimento e uma foto dos pais. Conforme seu depoimento, 'aentrevista tem um cunho altamente político... perguntaram se eu haviaparticipado de algum movimento negro ou se tinha namorado alguma vezcom alguma mulata' (Darse Júnior, 2004).” (MAIO, Marcos Chor; e SANTOS,Ricardo Ventura. Política de Cotas Raciais, os 'Olhos da Sociedade' eos usos da antropologia: o caso do vestibular da Universidade deBrasília [UNB]. Documento juntado à fls. 219-221 dos autos)Em 2004, o irmão da candidata Fernanda Souza de Oliveira, filho domesmo pai e da mesma mãe, foi considerado “negro”, mas ela não. Em2007, os gêmeos idênticos Alex e Alan Teixeira da Cunha foramconsiderados de “cores diferentes” pela comissão da UnB. Em 2008, JoelCarvalho de Aguiar foi considerado “branco” pela Comissão, enquanto suafilha Luá Resende Aguiar foi considerada “negra”, mesmo, segundo Joel,a mãe de Luá sendo “branca”.A adoção do critério de análise do fenótipo para a confirmação daveracidade da informação prestada pelo vestibulando pode suscitaralguns problemas. De fato, a maioria das universidades brasileiras queadotaram o sistema de cotas 'raciais' seguiram o critério daautodeclaração associado ao critério de renda.A Comissão de Relações Étnicas e Raciais da Associação Brasileira deAntropologia (Crer-ABA), em junho de 2004, manifestou-se contrária aocritério adotado pela UnB, nos seguintes termos:“A pretensa objetividade dos mecanismos adotados pela UnB constitui, defato, um constrangimento ao direito individual, notadamente ao da livreautoidentificação. Além disso, desconsidera o arcabouço conceitual dasciências sociais, e, em particular, da antropologia social eantropologia biológica. A Crer-ABA entende que a adoção do sistema decotas raciais nas Universidades públicas é uma medida de caráterpolítico que não deve se submeter, tampouco submeter aqueles aos quaisvisa beneficiar, a critérios autoritários, sob pena de se abrir caminhopara novas modalidades de exceção atentatória à livre manifestação daspessoas.” (MAIO, Marcos Chor; e SANTOS, Ricardo Ventura. Política deCotas Raciais, os 'Olhos da Sociedade' e os usos da antropologia: ocaso do vestibular da Universidade de Brasília [UNB]. Documento juntadoà fls. 228 dos autos)Defendendo a adoção do critério da autodeclaração no lugar da análisedo fenótipo, Marcos Chor Maio e Ricardo Ventura Santos concluem que:“A comissão de identificação racial da UnB operou uma ruptura com umaespécie de 'acordo tácito' que vinha vigorando no processo deimplantação do sistema de cotas no país, qual seja, o respeito àauto-atribuição de raça no plano das relações sociais. A valorizaçãodesse critério, próprio das sociedades modernas e imprescindível emface da fluidez racial existente no Brasil, cai por terra a partir dasnormas estabelecidas pela UnB.” (MAIO, Marcos Chor; e SANTOS, RicardoVentura. Política de Cotas Raciais, os 'Olhos da Sociedade' e os usosda antropologia: o caso do vestibular da Universidade de Brasília[UNB]. Documento juntado à fls. 231 dos autos.)Ademais, parece haver certo consenso quanto à necessidade de que osprogramas de ações afirmativas sejam limitados no tempo, devendo passarpor avaliações empíricas rigorosas e constantes. Nesse sentido,inclusive, o “Plano de Metas para a integração social, étnica e racialda Universidade de Brasília” é exemplar, ao prever a disponibilidade dareserva de vagas pelo período de 10 anos apenas (fl. 98).Na qualidade de medidas de emergência ante a premência e urgência desolução dos problemas de discriminação racial, as ações afirmativas nãoconstituem subterfúgio e, portanto, não excluem a adoção de medidas delongo prazo, como a necessária melhora das condições do ensinofundamental no Brasil.Outro importante aspecto a ser considerado diz respeito às dificuldades
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de acesso ao ensino superior no Brasil. Sabemos que a universidadepública é altamente excludente. De um lado, é preciso alargar areflexão, para que não esqueçamos que a análise do acesso àuniversidade é fundamental, mas é apenas uma parcela do debate de umademocracia inclusiva. O que se quer destacar é que devemos pensar aquestão em face do modelo de educação brasileiro como um todo, para nãobuscar soluções apenas na etapa universitária. A valorização e fomentode políticas públicas prioritárias e inclusivas voltadas às etapasanteriores (educação básica) e alternativas (cursos técnicos) sãofundamentais, para que não assumamos a universidade como único caminhopossível para o sucesso profissional e intelectual.Ademais, ressalte-se que nosso ensino superior também é excludente, emrazão do modelo restrito de vagas ofertadas por quase todos os cursos.Nós, que militamos na universidade pública, podemos verificar apresença de pouquíssimos alunos nas salas de aula, existindo um gastoexcessivo com professores em relação ao número de alunos. É o caso daFaculdade de Direito da Universidade de Brasília. Recebia 50 alunos porsemestre, apenas 100 por ano. Aumentou-se para 60 alunos a cadasemestre, não mais do que 120 alunos por ano, com a ampliação do númerode professores pelo Programa de Apoio a Planos de Reestruturação eExpansão das Universidades Federais (REUNI), mantendo-se, assim, aproporção entre o número de vagas e o número de professores. Seconsiderarmos as vagas do Programa de Avaliação Seriada (PAS) e doSistema de Cotas para Negros, restam apenas 72 vagas no concursouniversal por ano. Por que não aumentarmos o número de vagas porprofessor? Um número tão reduzido de vagas em universidades públicas é,por si só, um fator de exclusão.A título de registro, no Brasil se gasta 58,6% da renda per capita/anopor aluno. Na Alemanha, 41,2%; na Austrália, 25,4%; na Coréia, 7,3%; naIrlanda, 27,2%; na Espanha, 22,4%; na Argentina, 17,8%; no Chile,17,7%; no México, 35% (Cfr.: KAMEL, Ali. Não Somos Racistas: uma reaçãoaos que querem nos transformar numa nação bicolor. Rio de Janeiro: NovaFronteira, 2006, p. 136.).De outro lado, o modelo do concurso universal demanda uma rediscussão.Há uma grande ironia no nosso modelo: somente aqueles que eventualmentepassaram por todas as escolas privadas é que lograrão, depois, acessovia vestibular e poderão, então, chegar à escola pública superior,dotadas de conceito de excelência.Assim, somos levados a acreditar que a exclusão no acesso àsuniversidades públicas é determinada pela condição financeira. Nesseponto, parece não haver distinção entre “brancos” e “negros”, mas entrericos e pobres. Como apontam alguns estudos, os pobres no Brasil têmtodas as “cores” de pele. Dessa forma, não podemos deixar de nosperguntar quais serão as consequências das políticas de cotas raciaispara a diminuição do preconceito. Será justo, aqui, tratar de formadesigual pessoas que se encontram em situações iguais, apenas em razãode suas características fenotípicas? E que medidas ajudarão na inclusãodaqueles que não se autoclassificam como “negros”? Com a ampla adoçãode programas de cotas raciais, como ficará, do ponto de vista dodireito à igualdade, a situação do “branco” pobre? A adoção do critérioda renda não seria mais adequada para a democratização do acesso aoensino superior no Brasil? Por outro lado, até que ponto podemosrealmente afirmar que a discriminação pode ser reduzida a um fenômenomeramente econômico? Podemos questionar, ainda, até que ponto aexistência de uma dívida histórica em relação a determinado segmentosocial justificaria o tratamento desigual.A despeito de não convivermos com legislações racistas como a dosEstados Unidos, estudos estatísticos apontam para um padrão de vida dosnegros muito inferior aos dos brancos. Até que ponto essas informaçõescorroboram a ação afirmativa com base na cor da pele? Quais oscritérios utilizados no levantamento de tais dados? Esses estudospoderiam ser questionados?A petição da Universidade de Brasília (fl. 650) noticia que, segundo a“Síntese de Indicadores Sociais - 2006”, realizada pelo IBGE, asinformações coletadas convergem para indicar que o critério depertencimento étnico-racial é altamente determinante no processo dediferenciação e exclusão social. Indicam que “a taxa de analfabetismode pretos (14,6%) e de pardos (15,6%) continua sendo em 2005 mais de odobro que a de brancos (7,0%)”.A manifestação do Advogado-Geral da União faz referência à “Síntese deIndicadores Sociais - 2008”, também realizada pelo IBGE, segundo a qual“em números absolutos, em 2007, dos pouco mais de 14 milhões de
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analfabetos brasileiros, quase 9 milhões são pretos e pardos,demonstrando que para este setor da população a situação continua muitograve. Em termos relativos, a taxa de analfabetismo da população brancaé de 6,1% para as pessoas de 15 anos ou mais de idade, sendo que estasmesmas taxas para pretos e pardos superam 14%, ou seja, mais que odobro que a de brancos” (fl. 748).Enquanto muitos se apegam aos dados estatísticos para comprovar aexistência de racismo no Brasil, outros, como Ali Kamel, SimonSchwartzman e José Murilo de Carvalho, questionam essas conclusões. AliKamel, em obra realizada em 2006, afirma que alguns estudos, muitasvezes, manipulam os dados referentes aos “pardos”, ora incluídos entreos “negros”, ora considerados à parte. Refere que, segundo o IBGE, os“negros” são 5,9%; os “brancos”, 51,4% e os “pardos” 42% dosbrasileiros. Afirma que, segundo os dados do PNUD, entre 1982 a 2001, opercentual de “negros” e “pardos” pobres caiu de 58% para 47%, enquantoo de “brancos” pobres se manteve praticamente estável, de 21% para 22%.Comparados esses percentuais com o aumento da população brasileira noperíodo, conclui que “a pobreza caiu muito mais acentuadamente entre osnegros e pardos do que entre os brancos”. (KAMEL, Ali. Não SomosRacistas: uma reação aos que querem nos transformar numa nação bicolor.Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006, p. 49 e 67).É certo que o Brasil caminha para a adoção de um modelo próprio deações afirmativas de inclusão social, em virtude das peculiaridadesculturais e sociais da sociedade brasileira, que impedem o acesso doindivíduo a bens fundamentais, como a educação e o emprego.No entanto, é importante ter em mente que a solução para tais problemasnão está na importação acrítica de modelos construídos em momentoshistóricos específicos tendo em vista realidades culturais, sociais epolíticas totalmente diversas das quais vivenciamos atualmente noBrasil, mas na interpretação do texto constitucional considerando-se asespecificidades históricas e culturais da sociedade brasileira.Thomas Sowell, PhD em economia pela Chigago University e Professor dasuniversidades de Cornell, Amherst e University of California LosAngeles - UCLA, examinou a aplicação de ações afirmativas em diversospaíses do mundo e concluiu o seguinte: "Inúmeros princípios, teorias, hipóteses e assertivas têm-seutilizados para justificar os programas de ação afirmativa - algunscomuns a vários países do mundo, outros peculiares a determinadospaíses ou comunidades. Notável é o fato de que raramente essas noçõessão empiricamente testadas, ou mesmo claramente definidas oulogicamente examinadas, muito menos pesadas em relação aos dolorososcustos que muitas vezes impõem. Apesar das afirmativas abrangentesfeitas em prol dos programas de ação afirmativa, um exame de suasconseqüências reais torna difícil o apoio a tais programas ou mesmodizer-se que esses programas foram benéficos ao cômputo geral - a menosque se esteja disposto a dizer que qualquer quantidade de reparaçãosocial, por menor que seja, vale o vulto dos custos e dos perigos, pormaiores que sejam." (SOWELL, Thomas. Ação Afirmativa ao redor do mundo:estudo empírico. Trad. Joubert de Oliveira Brízida. 2ª ed. Rio deJaneiro: UniverCidade Editora, p. 198, 2004)Infelizmente, no Brasil, o debate sobre ações afirmativas iniciou-se deforma equivocada e deturpada. Confundem-se ações afirmativas compolítica de cotas, sem se atentar para o fato de que as cotasrepresentam apenas uma das formas de políticas positivas de inclusãosocial. Na verdade, as ações afirmativas são o gênero do qual as cotassão a espécie. E, ao contrário do que muitos pensam, mesmo nos EstadosUnidos o sistema de cotas sofre sérias restrições doutrinárias ejurisprudenciais, como se pode depreender da análise da série de casosjulgados pela Suprema Corte, dentre os quais sobressaem o famoso CasoBakke (Regents of the University of California vs. Bakke; 438 U.S 265,1978).Em recentes julgados, a Suprema Corte norte-americana voltou arestringir a adoção de políticas raciais. No caso Parents Involved inCommunity Schools vs. Seattle School District No. 1. (28 de junho de2007), no qual se discutiu a possibilidade de o distrito escolar adotarcritérios raciais (classificando os estudantes em brancos e não brancosou negros e não negros) como forma de alocá-los nas escolas públicas,os juízes, por maioria, entenderam desarrazoado o critério esalientaram que “a maneira de acabar com a discriminação com base naraça é parar de discriminar com base na raça”. O Justice Kennedyafirmou que, “quando o governo classifica um indivíduo por raça, eleprecisa primeiro definir o que ele entende por raça. Quem, exatamente,
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é branco ou não branco? Ser forçado a viver com um rótulo racialdefinido pelo governo é inconsistente com a dignidade dos indivíduos emnossa sociedade. É um rótulo que os indivíduos não têm o poder demudar. Classificações governamentais que obrigam pessoas a marchar emdiferentes direções de acordo com tipologias raciais podem causar novasdivisões”. No caso Ricci et al. vs. DeStefano et. al. (29 de junho de2009), a Corte, por maioria, entendeu que decisões que tomam como basea questão da raça violam o comando do Título VII do Civil Rights Act de1964, o qual prevê que o empregador não pode agir de forma diversa porcausa da raça do indivíduo.A matéria atrai, ainda, a análise sobre a noção de reserva daadministração e a de reserva de lei. Sabe-se que a reserva de lei, emsua acepção de “reserva de Parlamento”, exige que certos temas, dada asua relevância, sejam objeto de deliberação democrática, num ambientede publicidade e discussão próprio das casas legislativas. Busca-seassegurar, com isso, a legitimidade democrática para a regulaçãonormativa de assuntos que sensibilizem a comunidade.A reserva de lei tem especial significado na conformação e na restriçãodos direitos fundamentais. A Constituição autoriza a intervençãolegislativa no âmbito de proteção dos direitos e garantiasfundamentais. O conteúdo da autorização para intervenção legislativa ea sua formulação podem assumir significado transcendental para a maiorou menor efetividade das garantias fundamentais.Se não bastasse a complexidade que o tema “ação afirmativa comomecanismo de inclusão social” atrai, a definição dos critérios a seremimplementados em universidades públicas para definir quem faz jus aobenefício constitui matéria que amplia direitos de uns com imediatarepercussão na vida de outros. Ao reservar 20% (vinte por cento) dasvagas para determinado segmento da sociedade, outra parcela estaráprivada desse percentual de vagas.Todas as ações que visem a estabelecer e a aprimorar a igualdade entrenós são dignas de apreço. É importante, no entanto, refletir sobre aspossíveis consequências da adoção de políticas públicas que levem emconsideração apenas o critério racial. Não podemos deixar que o combateao preconceito e à discriminação em razão da cor da pele, fundamentalpara a construção de uma verdadeira democracia, reforce as crençasperversas do racismo e divida nossa sociedade em dois pólosantagônicos: “brancos” e “não brancos” ou “negros” e “não negros”.Todas essas questões deverão ser objeto de apreciação pelo Plenáriodesta Corte, que se pronunciará, em momento oportuno, sobre o inteiroteor do pedido de medida cautelar. Deverá o Tribunal, ainda, analisar ocabimento desta ação e a eventual possibilidade de seu conhecimentocomo ADI, em razão da peculiar natureza jurídica de seu objeto.O questionamento feito pelo Partido Democratas (DEM) é de sumaimportância para o fortalecimento da democracia no Brasil. As questõese dúvidas levantadas são muito sérias, estão ligadas à identidadenacional, envolvem o próprio conceito que o brasileiro tem de si mesmoe demonstram a necessidade de promovermos a justiça social. Somos ounão um país racista? Qual a forma mais adequada de combatermos opreconceito e a discriminação no Brasil? Desistimos da “DemocraciaRacial” ou podemos lutar para, por meio da eliminação do preconceito,torná-la uma realidade? Precisamos nos tornar uma “nação bicolor” paravencermos as “chagas” da escravidão? Até que ponto a exclusão socialgera preconceito? O preconceito em razão da cor da pele está ligado ounão ao preconceito em razão da renda? Como tornar a UniversidadePública um espaço aberto a todos os brasileiros? Será a educação básicao verdadeiro instrumento apto a realizar a inclusão social quequeremos: um país livre e igual, no qual as pessoas não sejamdiscriminadas pela cor de sua pele, pelo dinheiro em sua contabancária, pelo seu gênero, pela sua opção sexual, pela sua idade, pelasua opção política, pela sua orientação religiosa, pela região do paísonde moram etc.?Mas, enquanto essa mudança não vem, como alcançar essa amplitudedemocrática? Devemos nos perguntar, desde agora, como fazer paraaproximar a atuação social, judicial, administrativa e legislativa àsdeterminações constitucionais que concretizam os direitos fundamentaisda liberdade, da igualdade e da fraternidade, nas suas mais diversasconcretizações.Em relação ao ensino superior, o sistema de cotas raciais se apresentacomo o mais adequado ao fim pretendido? As ações afirmativas raciais,que conjuguem o critério econômico, serão mais eficazes? Cotas baseadasunicamente na renda familiar ou apenas para os egressos do ensino
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público atingiriam o mesmo fim de forma mais igualitária? Quais oscritérios mais adequados para as peculiaridades da realidadebrasileira?Embora a importância dos temas em debate mereça a apreciação céleredesta Suprema Corte, neste momento não há urgência a justificar aconcessão da medida liminar.O sistema de cotas raciais da UnB tem sido adotado desde o vestibularde 2004, renovando-se a cada semestre. A interposição da presentearguição ocorreu após a divulgação do resultado final do vestibular2/2009, quando já encerrados os trabalhos dacomissão avaliadora do sistema de cotas.Assim, por ora, não vislumbro qualquer razão para a medida cautelar desuspensão do registro (matrícula) dos alunos que foram aprovados noúltimo vestibular da UnB ou para qualquer interferência no andamentodos trabalhos na universidade.Com essas breves considerações sobre o tema, indefiro o pedido demedida cautelar, ad referendum do Plenário.Publique-se.Comunique-se.Ante o término do período de férias do Tribunal, proceda-se à livredistribuição do processo.Brasília, 31 de julho de 2009.Ministro GILMAR MENDESPresidente(art. 13, VIII, RI-STF)/#
Decisão Monocrática Final