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7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHOCENTRO DE CINCIAS SOCIAIS - CCSo
DEPARTAMENTO DE COMUNICAO SOCIAL
ANTONIO PAIVA DA SILVA
ANLISE DAS ESTRATGIAS DE COMUNICAO DA CAMPANHA NACIONALDE PREVENO E COMBATE AO TRABALHO ESCRAVO DA COMISSO
PASTORAL DA TERRA (CPT)
So Lus2014
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ANTONIO PAIVA DA SILVA
ANLISE DAS ESTRATGIAS DE COMUNICAO DA CAMPANHA NACIONALDE PREVENO E COMBATE AO TRABALHO ESCRAVO DA COMISSO
PASTORAL DA TERRA (CPT)
Monografia apresentada ao Curso de ComunicaoSocial da Universidade Federal do Maranho paraobteno de grau de Bacharel em Relaes Pblicas.
Orientadora: Profa. Mestre Flvia de Almeida Moura.
So Lus2014
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Silva, Antonio Paiva
Anlise das estratgias de comunicao da Campanha Nacional dePreveno e Combate ao Trabalho Escravo da Comisso Pastoral da Terra(CPT) /Antonio Paiva da Silva. - So Lus, 2014.
73f. : il.
Monografia (Graduao em Comunicao Social) - Curso deComunicao Social, Universidade Federal do Maranho, 2014.
1. Estratgias de comunicao. 2. Trabalho escravo. 3. Mobilizaosocial. I. Ttulo.
CDU 316.77
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ANTONIO PAIVA DA SILVA
ANLISE DAS ESTRATGIAS DE COMUNICAO DA CAMPANHA NACIONALDE PREVENO E COMBATE AO TRABALHO ESCRAVO DA COMISSO
PASTORAL DA TERRA (CPT)
Monografia apresentada ao Curso de Comunicao
Social da Universidade Federal do Maranho paraobteno de grau de Bacharel em Relaes Pblicas.
Aprovada em / /
BANCA EXAMINADORA
__________________________________________________Profa. Flvia de Almeida Moura (Orientadora)
Mestre emUniversidade Federal do Maranho - UFMA
___________________________________________________
Examinador 01
__________________________________________________
Examinador 02
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AGRADECIMENTOS
A Deus, Criador do universo, pelo dom da vida. Pela famlia que me deu,
pela capacidade de sonhar e de acreditar nos meus sonhos. Por permitir que aquele
menino mirrado, de cor amarelada, que comeou a sua luta numa escolinha de meia
parede e cho de barro numa viela sem energia eltrica, longe de tudo e de todos,
onde o dia era mais longo e a noite tinha o cu mais lindo j visto; aquele menino,
que mesmo sendo filho de roceiros, desde cedo preferiu os livros enxada, e que,
com a cara e a coragem deixou sua famlia e conseguiu entrar numa universidade
pblica federal e surpreender queles que muitas vezes o deixaram triste, aodizerem que seus sonhos eram altos demais para serem alcanados. A Ele, o Pai,
que me permitiu ser forte para encarar com dignidade todas as intempries
superadas at aqui, a Ele, todo honra e glria, sempre!
minha me, Antonia Paiva da Silva, que mesmo no tendo leitura (como
ela mesma me falava), me ensinou desde cedo, que s atravs da educao eu
conseguiria alcanar os meus objetivos. Ela, que sozinha criou e educou seus oito
filhos e fez questo de ensinar a cada um deles que, na vida, dinheiro no vale maisque dignidade. Que tu vivas muitos anos, Senhora Paiva, para que eu consiga
retribuir ao menos dez por cento de tudo o que me destes.
minha v, meus irmos, tios e tias, primos, cunhados e cunhadas obrigado
pela confiana e credibilidade que sempre depositaram em mim.
Aos colegas da Residncia Estudantil da UFMA (REUFMA), que ao longo de
quatro anos me ofereceram companhia e me ensinaram cada um sua maneira,
lies que levarei por toda a vida. A todos vocs, e de forma especial a RibamarQuadros, Marcos Viniciuns e Renan Lavareda, irmos que a vida me deu, muito
obrigado! Que a tradio desta casa, de formar grandes cidados se mantenha e
que todos tenham muito sucesso.
famlia Vigas: Andra, Marilu, Washington, Lisiane, Carlinhos e Dad,
que me adotaram como filho, irmo e neto, e me ajudaram a sorrir nos momentos
mais difceis, quando a saudade de casa doa no peito. A vocs, minha eterna
gratido.
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s bibliotecrias mais queridas da UFMA, Araceli e Teresa, que no perodo
de dois anos como bolsista da Biblioteca Central, me proporcionaram momentos de
alegria e aprendizagem. O carinho de vocs levarei sempre comigo.
tia Zlia, um anjo que Deus colocou em minha vida disfarado de vizinha,
e que tem sido uma das minhas alegrias dirias. Obrigado pelo carinho e dedicao!
equipe do Laboratrio Ilha da Cincia, que me proporcionou momentos de
grande aprendizado e companheirismo. Em especial, agradeo Gisele Cutrim, pela
amizade e disponibilidade; ao professor Antonio Oliveira, pela oportunidade e a
confiana que depositou em mim, pela ateno e prontido em colaborar com minha
formao. Sou grato a todos!
Ao professor Marcelo Carneiro, pelo apoio e pela generosidade dispensadaa mim em conceder uma bolsa de fomento do seu projeto para subsidiar minha
pesquisa. Fica a minha gratido!
Aos agentes da CPT entrevistados para este trabalho, em especial ao Frei
Xavier Plassat, da CPT Araguaia-Tocantins e coordenador da Campanha objeto
deste estudo, pela ateno e disponibilidade em colaborar com a realizao desta
pesquisa.
Aos meus amigos da UFMA, representados nominalmente pela minhaconterrnea, amiga, irm e fonte de inspirao, Ariadna Ferreira. Ari, viemos da
mesma terra, carregamos os mesmos sonhos, compartilhamos das mesmas
dificuldades, cursamos o mesmo curso, estamos ligados pelo mesmo amor, somos
vencedores juntos.
Aos meus queridos colegas de turma, Alexsandro Rodrigues, Daryanne
Caldas, Denise Arajo, Dianna Sanny (uma relao de gonguice eterna), Flvio
Mouran, Ivanna Castro, Ingrid, Natlia Coutinho, Patrcia Ribeiro, e, claro, minhasTats especiais: Thaysa Lopes, minha rainha do Nilo, Talyssa Soares, a ex-
estagiria da Caixa mais linda do mundo e Talita Reis, a minha RP mais chique e
elegante. Serei sempre o chinfrim buriticupuense mais paivificador que j
conheceram. A vocs, amor eterno.
E, por fim, aos meus mestres, professores e professoras que me ensinaram
e me motivaram nesses quatros anos de graduao, em especial, professora
Flvia Moura, que bem mais do que professora, orientadora tornou-se uma amiga,
um espelho, um exemplo de ser humano que me servir de inspirao.
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RESUMO
Este trabalho tem por objetivo analisar as estratgias de comunicao da Campanha
Nacional de preveno e combate ao Trabalho Escravo da Comisso Pastoral da
Terra (CPT). O estudo feito a partir de pesquisa documental, entrevistas e
questionrios com agentes e parceiros da CPT e com a coordenao da Campanha,
alm da coleta de dados atravs da observao participante. A pesquisa visa
compreender as principais aes e estratgias de comunicao desenvolvidas na/ e
pela Campanha De olho aberto para no virar escravo, coordenada pela entidadedesde 1997, bem como verificar dentre os seus organizadores e demais pessoas
envolvidas na execuo desta, a eficincia e os resultados alcanados por meio
dessa iniciativa no processo de preveno e combate ao Trabalho Escravo
Contemporneo no Brasil. Destaca-se nesse estudo a organizao de membros da
sociedade civil, e o uso da comunicao no enfrentamento aos problemas sociais
em paralelo s aes do Poder Pblico.
Palavras-chave: Estratgias de comunicao. Trabalho escravo contemporneo.
Mobilizao social.
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ABSTRACT
This work has its objectives to analyse the strategies of communication from the
National Campaign towards the prevention and combat of slave labour from The
Pastoral Land Commission (CPT). Our study was based on documental researches,
interviews and questioners to the CPT agents and partners, but also with the
campaigns coordination. Besides that, it is also based on the data collecting through
a participative observation. This research aims to comprehend the main actions and
strategies of communication developed in and by the campaign De olho aberto para
no virar escravo, coordinated by that entity since 1997, as well as to verify amongsttheir organizers and people involved on its execution the efficiency and results
accomplished through that initiative on the process of prevention and combat to
contemporary slave labour in Brazil. We highlight, therefore, the organization of civil
society and the usage of communication towards the confrontation of the social
problems to actions from public authorities.
Keywords: Communication strategies. Contemporary slavery labour. Socialmobilization.
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LISTA DE SIGLAS
CONATRAE - Comisso Nacional para a Erradicao do Trabalho Escravo
CPT - Comisso Pastoral da Terra
CDVDH/CB - Centro de Defesa da Vida e dos Direitos Humanos de Aailndia
Carmen Bascran
MTE - Ministrio do Trabalho e Emprego
OIT - Organizao Internacional do Trabalho
ONG - Organizao No Governamental
PEC - Proposta de Emenda Constitucional
RB - Reprter Brasil
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LISTA DE ILUSTRAES
p.
Figura 1 - Sanfoninha da CPT/verso 2011.................................................. 38
Grfico 1 - Formas de distribuio das estratgias de comunicao da
Campanha da CPT........................................................................ 40
Grfico 2 - Tipos de estratgias de comunicao utilizadas na Campanha
da CPT.......................................................................................... 42Grfico 3 - Estratgias de comunicao indicada como mais eficiente na
Campanha da CPT........................................................................ 42
Figura 3 - Cartaz da Campanha da CPT....................................................... 43
Figura 4 O Pulo do gato............................................................................... 47
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SUMRIO
p.
1 INTRODUO...................................................................................... 11
2 ESTRAT GIAS DE COMUNICAO EM REDES DE
MOBILIZAO SOCIAL....................................................................... 16
2.1 Estratgias de comunicao.............................................................. 16
2.2 Mobilizao social...............................................................................20
2.3 Redes.................................................................................................... 22
2.4 Comunicao popular......................................................................... 24
3 A CPT NO COMBATE AO TRABALHO ESCRAVO NO BRASIL........ 26
3.1 A Campanha Nacional de Preveno e Combate ao Trabalho
Escravo: De olho aberto para no virar escravo.......................... 28
3.2 Estratgias de Comunicao da Campanha: a Sanfoninha............ 30
3.3 Abordagem e organizao da CPT ................................................... 33
4 AN LISE DAS ESTRAT GIAS COMUNICACIONAIS DA
CAMPANHA DA CPT........................................................................... 36
4.1 Produtos e aes da Campanha da CPT........................................... 37
4.2 Encontro de avaliao e planejamento da Campanha..................... 49
5 CONSIDERAES FINAIS.................................................................. 51
REFERNCIAS..................................................................................... 56
APNDICES.......................................................................................... 59
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1 INTRODUO
A escravido no Brasil foi abolida legalmente em 13 de maio de 1888.
Todavia, em pleno sculo 21, o pas ainda convive com esta prtica, que representa
uma das mais perversas formas de explorao do ser humano, a chamada
escravido contempornea, caracterizada no mais pelo trabalhador negro preso a
correntes e submetido a fortes castigos, mas por situaes que tambm ferem a
dignidade humana, como a explorao da mo-de-obra com imobilizao do
trabalhador, nem sempre apenas por meio da coao fsica, mas tambm moral, na
qual este submetido a exaustivas jornadas de trabalho e precrias condies de
alojamento e alimentao, tendo ainda a sua liberdade de ir e vir restringida.Na escravido contempornea, no h distino de cor ou raa. No faz
diferena se a pessoa negra, amarela ou branca, basta estar em situao de
vulnerabilidade e cair nas falsas promessas de trabalho oferecidas por fazendeiros,
pecuaristas e, mais recentemente, empresrios da construo civil, dentre outros.
Vale ressaltar que as relaes entre classe e raa no Brasil esto imbricadas e,
dessa forma, mesmo no sendo pr-condio para ser escravo, a grande maioria
dos trabalhadores afrodescendente.As estatsticas do trabalho escravo contemporneo no Brasil so
impressionantes. De acordo com dados recentes da CPT (Comisso Pastoral da
Terra), em 2013, foram identificados 2.874 trabalhadores flagrados em regime de
escravido. Desse total, 2.208 foram libertados (CPT, 2014).
Na era da tecnologia, das grandes descobertas da Cincia, da capacidade
de criao cada vez maior do homem, um gigantesco contraste a existncia ainda
desse tipo de situao. Diante disso, a lentido e, s vezes, at omisso do PoderPblico na soluo de problemas sociais, acarreta no surgimento de iniciativas da
sociedade civil organizada, pelos movimentos sociais, no enfretamento de mazelas
da sociedade que se arrastam e se reconfiguram dcadas ps dcadas no pas.
A realizao desta monografia, voltada temtica das estratgias de
comunicao no combate ao trabalho escravo contemporneo, decorre da
participao do estudante no projeto de pesquisa Representaes do trabalhador
escravo (e acerca dele) em instncias miditicas e estratgias de comunicao em
redes de denncia no Maranho, desenvolvido pelo Departamento de Comunicao
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Social da Universidade Federal do Maranho, sob a coordenao da professora
Flvia de Almeida Moura, orientadora deste trabalho.
A oportunidade de integrar o projeto como bolsista 1 do Programa
Institucional de Bolsas de Iniciao Cientfica (PIBIC) foi de grande relevncia para o
estudante, ao passo que contribuiu para o seu amadurecimento enquanto
acadmico e pesquisador, atravs do grupo de estudos, com reunies semanais
com a participao de outros acadmicos, inclusive de outras reas do
conhecimento e mediao da coordenadora. A vivncia no grupo propiciou a
participao do estudante em eventos sobre o trabalho escravo, apresentao de
trabalhos em encontros, seminrios, semanas cientficas, bem como a produo e
publicao de artigos acerca desta temtica.Durante a realizao dos estudos, constatou-se a existncia de uma rede,
composta por diversas entidades, em nvel nacional e internacional, que trabalha em
prol da preveno e do combate ao trabalho escravo, como a ONG Reprter Brasil,
a Comisso Pastoral da Terra (CPT), o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-
Terra (MST), a Organizao Internacional do Trabalho (OIT), o Centro de Defesa da
Vida e dos Direitos Humanos de Aailndia Carmen Bascran (CDVDH/CB), entre
outras.Surgiu, ento, o interesse em pesquisar uma das entidades componentes
desta rede, a Comisso Pastoral da Terra (CPT), organizao da Igreja Catlica
voltada defesa dos direitos humanos e da reforma agrria. Dessa forma, a
pesquisa tem como o objetivo identificar as principais estratgias de comunicao da
CPT no combate ao Trabalho Escravo, mais especificamente da Campanha De
olho aberto para no virar escravo, coordenada pela entidade desde 1997. A
Campanha voltada aos trabalhadores rurais em situao de vulnerabilidade e,mais recentemente, tambm, aos trabalhadores de zonas urbanas, devido grande
incidncia da explorao da mo de obra na construo civil.
Para este estudo, a construo do arcabouo terico-metodolgico baseou-
se na escolha de categorias analticas que se apresentaram como fundamentais
para a compreenso do objeto em questo; como os conceitos de estratgias de
1 O estudante foi bolsista do Programa Institucional de Bolsas de Iniciao Cientfica (PIBIC), noperodo de agosto de 2012 a agosto de 2013, atravs de uma parceria com o projeto de pesquisaEstudo da organizao e funcionamento da rede de combate ao trabalho escravo no Maranho,coordenado pelo Prof. Dr. Marcelo Domingos Sampaio Carneiro, do Departamento de Sociologia eAntropologia da Universidade Federal do Maranho.
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comunicao, mobilizao social, rede e comunicao popular, trabalhados por
autores da Comunicao e das Cincias Sociais Aplicadas, como Mrcio Simeone
Henriques (2007), Margarida Maria Krohling Kunsch (2003), Cicilia Maria Krohling
Peruzzo (2004), Inesita Soares de Arajo (2002), Carlos Olavo Quandt e Queila
Souza (2008), entre outros.
Como metodologia, iniciou-se com a reviso bibliogrfica a partir de grupos
de estudos para a construo da fundamentao terica fundamental para
compreenso e discusso das categorias acima elencadas, estruturao de
procedimentos de anlise do objeto e do material coletado no campo, bem como a
observao das estratgias de comunicao utilizadas.
Para a obteno de informaes e entendimento das estratgias decomunicao desenvolvidas na Campanha da CPT, foram realizadas pesquisa
documental no portal da entidade, entrevistas com o Coordenador da Campanha,
observao participante durante encontro com membros da CPT e aplicao de
questionrio qualitativo.
A realizao de entrevistas com o coordenador da Campanha foi uma
ferramenta metodolgica importante, pois permitiu a apreenso de informaes
indispensveis sobre a CPT, sua forma de organizao e articulao; sobre aCampanha e as suas estratgias comunicacionais, bem como os desdobramentos
destas durante os anos. As entrevistas foram realizadas em 2011 pela coordenadora
do projeto supracitado, e em So Lus, em junho de 2013, pelo estudante.
A observao participante tambm foi uma estratgia importante para
substanciar a pesquisa durante a participao do estudante em um evento da CPT,
realizado em agosto de 2013, em Araguana - TO, onde este pode vivenciar por trs
dias a rotina e a metodologia de avaliao da Campanha da CPT por agentes eparceiros da entidade. Foi uma experincia enriquecedora, pois permitiu um olhar
mais prximo e detalhado do pesquisador sobre o seu objeto de estudo, no caso a
Campanha da CPT.
A observao participante se distingue da observao comum [...] namedida em que pressupe a integrao do investigador ao grupoinvestigado, ou seja, o pesquisador deixa de ser um observador externo dosacontecimentos e passa a fazer parte ativa deles. Esse tipo de coleta dedados muitas vezes leva o pesquisador a adotar temporariamente um estilode vida que prprio do grupo que est sendo pesquisado (BONI;
QUARESMA, 2005, p. 4).
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Com a aplicao de questionrio qualitativo com agentes e parceiros da CPT
pode-se verificar a percepo destes em relao s estratgias comunicacionais
desenvolvidas na Campanha, bem como os seus produtos de comunicao.
Procurou-se saber se essas pessoas, que participam diretamente da construo
dessas estratgias e produtos, e os utilizam no trabalho desenvolvido pela
Campanha em suas reas de atuao, acreditam e esto satisfeitas com os
resultados alcanados pelo trabalho. Para tanto, o questionrio foi estruturado com
os seguintes aspectos: identificao do entrevistado, formao, rea e atividade de
atuao na CPT, e percepo acerca das estratgias de comunicao da
Campanha, a partir de seis questes subjetivas abertas.
As etapas elencadas acima, desenvolvidas durante a pesquisa, resultaramna estruturao da presente monografia em trs captulos, alm da introduo e
consideraes finais. No primeiro captulo, busca-se discutir teoricamente, fazendo
as conexes possveis com o objeto em anlise, os conceitos fundamentais para a
construo deste trabalho. So eles: estratgias de comunicao, mobilizao
social, rede e comunicao popular. Desta forma, procura-se compreender o
conceito de estratgias de comunicao, as questes inerentes mobilizao social,
e a importncia de uma comunicao planejada estrategicamente em projetos queobjetivam a mobilizao de pessoas em prol de uma causa coletiva. Em seguida,
buscando entender as relaes traadas entre organismos formais, com estrutura e
localizao geogrfica diferente, mas que trabalham com propsitos iguais ou
semelhantes, como o caso da CPT e as demais entidades que compem a rede
de combate ao Trabalho Escravo em nvel nacional e internacional, adentra-se s
discusses acerca das redes. E, por fim, para se ter melhor compreenso da
concepo e desenvolvimento das estratgias de comunicao da Campanha daCPT, bem como do seu material de divulgao, da linguagem utilizada, da forma de
abordagem dos pblicos, parte-se para o conceito e discusso em torno da
comunicao popular.
No segundo captulo, apresenta-se a Comisso Pastoral da Terra (CPT), seu
histrico, desde a sua origem, misso e objetivos, sua atuao concreta na busca
por justia social ao homem do campo e nas aes de preveno e no combate ao
Trabalho Escravo. Em seguida, trata-se da concepo da Campanha De olho
aberto para no virar escravo, coordenada pela entidade a partir de 1997, bem
como das suas estratgias comunicacionais, material de divulgao e formas de
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articulao de parceiros no enfrentamento do problema e das suas aes voltadas
para chamar a ateno da opinio pblica, em nvel nacional e internacional, sobre o
trabalho escravo no pas.
No terceiro e ltimo captulo, analisa-se a atuao da CPT na rede de
combate ao trabalho escravo, especialmente as aes e estratgias de comunicao
da Campanha da entidade, observando a sua forma de atuao e o seu
comportamento em relao aos diferentes pblicos. Tambm no captulo trs
apresenta-se e discute-se o resultado da pesquisa qualitativa realizada com agentes
e parceiros da CPT atravs de questionrio, que buscou verificar a opinio dessas
pessoas sobre a Campanha Nacional de preveno e combate ao Trabalho Escravo,
da CPT.Esta monografia traz um tema que no muito debatido na sociedade e
pouco mencionado nos estudos de Comunicao. Portanto, acredita-se na
importncia e relevncia desse tipo de trabalho, visto que contribui para a divulgao
de iniciativas interessantes, como as da CPT no enfrentamento dessa antiga, porm
ainda resistente mazela social, muitas vezes negligenciada pelo poder pblico.
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2 ESTRATGIAS DE COMUNICAO EM REDES DE MOBILIZAO SOCIAL
Para o desenvolvimento deste trabalho faz-se necessrio promover a
discusso entre conceitos fundamentais para a compreenso das estratgias de
comunicao desenvolvidas na Campanha Nacional de Preveno e Combate ao
Trabalho Escravo, De olho para no virar escravo, pela Comisso Pastoral da
Terra (CPT), a comear pelo entendimento do que sejam as estratgias de
comunicao e o seu uso nos projetos de mobilizao social, bem como as
discusses acerca dos conceitos de rede e comunicao popular.
2.1 Estratgias de comunicao
Para Baldissera (2001) por comunicao, entende-se o processo de
construo e disputa de sentidos. Para ele, a questo da disputa de sentidos pode
ser pensada sob a perspectiva de que os interlocutores, nas prticas
comunicacionais, sempre estabelecem relaes de fora. Nas campanhas, nos
projetos de mobilizao social, a comunicao precisa ser instituda como fluxo e,
no, reduzida a um sistema de informaes. Isto , o processo comunicacional dialgico, no deve se restringir a um circuito, em que as informaes so
despejadas de cima para baixo, sem se levar em considerao os pblicos
envolvidos.
Baseados em Frana (2002), pode-se olhar a comunicao sob duas
perspectivas: a informacional e a relacional. A primeira vista como um processo de
troca de informaes entre um emissor para um receptor e a relacional, que para,
alm disto, v a comunicao como um processo de produo de sentidos entre ossujeitos interlocutores, considerando o contexto sociocultural em que estes esto
inseridos. De acordo a perspectiva relacional, Frana (2002) acrescenta que a
comunicao compreende um processo de produo e compartilhamento de sentido
entre sujeitos e interlocutores, realizado por meio de uma materialidade simblica
(da produo de discursos) e inserido em determinado contexto sobre o qual atua e
do qual recebe os reflexos.
Henriques (2007) afirma que a comunicao, mais que uma transferncia de
informaes, se configura como um espao de trocas mtuas entre os sujeitos
interlocutores, onde no h um detentor nico do conhecimento, mas cada um tem
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contribuies importantes a oferecer. Partindo-se desse entendimento, o referido
autor discorre:
[...] o carter dialgico da comunicao no apenas a transferncia do
saber, mas um encontro de sujeitos interlocutores na medida em quedefende uma causa de interesse mtuo. A comunicao dialgica, nestesentido, libertadora, uma vez que no invade ou manipula o outro, masbusca problematizar o conhecimento de uma realidade, explic-la etransform-la. (HENRIQUES, 2007, p.23).
Nesta mesma linha de pensamento, Peruzzo (2004) defende que a
comunicao se configura como uma ferramenta importante de uma democracia,
uma vez que esta possibilita a organizao e convocao de vontades bem como o
protagonismo do cidado no processo de mobilizao por mudana em uma dada
realidade.[...] a comunicao mais que meios e mensagens, pois se realiza comoparte de uma dinmica de organizao e mobilizao social; est imbudode uma proposta de transformao social e, ao mesmo tempo, deconstruo de uma sociedade mais justa; abre a possibilidade para aparticipao ativa do cidado comum como protagonista do processo.(PERUZZO, 2004, P.20-21).
Mas, afinal, o que seriam as estratgias de comunicao?
Antes de se definir estratgias de comunicao torna-se oportuno conceituar
estratgias. Na literatura, o termo estratgia tem diversas definies e no h umauniformidade entre elas. Como afirma Hambrick (1983 apud NICOLAU, 2001)
estratgia um conceito multidimensional e situacional e isso dificulta uma definio
de consenso. Bueno (2009) entende estratgia como a arte de definir e aplicar
recursos com o intuito de atingir objetivos previamente estabelecidos. Por sua vez,
Thietart (1984 apud NICOLAU, 2001) considera estratgia como o conjunto de
decises e aes relativas escolha dos meios e articulao de recursos com
vista a atingir um objetivo.
Partindo desse entendimento, pode-se adentrar ao conceito de estratgia de
comunicao. Para Corrado (1994), a estratgia de comunicao deve compor um
plano da organizao, que vai nortear suas aes, definindo quem, quando, como e
para quem se vai comunicar. E esclarece:
[...] consiste no plano da empresa para transmitir as notcias para seuspblicos. A estratgia define quem so esses pblicos, por que importantecomunicar-se com eles, quando e onde a comunicao deve acontecer,quem o responsvel pelas comunicaes, o que deve ser dito e qual ovnculo com as metas comerciais.
Como se pode ver, a definio de Corrado (1994) voltada para o setor
empresarial. Nas discusses do objeto em estudo, devem-se pensar as estratgias
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de comunicao como algo mais abrangente, voltada ao social, como defende
Bueno (2009) ao considerar que:
[...] a comunicao estratgica (pelo menos no conceito em que a temos
formulado) se afirma melhor (ou est mais potencializada) com a teoriasistmica de estratgia, j que ela maximiza a importncia das condiessociais, d nfase dimenso cultural e aceita o planejamento multifatorialou seja, no limita ou prioriza a vertente econmica ou financeira.
A partir das consideraes acima, pode-se pensar as estratgias de
comunicao como um comportamento racional e planejado, baseado em uma
pesquisa dos pblicos, bem como do ambiente em que este est inserido,
considerando as suas relaes socioculturais, adotado por aquele que deseja
comunicar, fazer ser ouvido, para resolver possveis problemas comunicativos em
busca de atingir o seu objetivo. Assim, utilizar a comunicao de forma estratgica
saber, antes de tudo, para quem se est comunicando; fazer uma anlise
minuciosa dos pblicos a que se quer atingir. S assim ser possvel, dentre outros,
verificar as possveis barreiras, o grau de dificuldades a serem enfrentadas durante
o processo de mobilizao/convencimento.
claro que esse no pode ser um processo simples, feito de forma intuitiva,
mas deve ser resultado de um planejamento que Kunsch (2003) define como um
processo tcnico, racional, lgico e poltico - como um ato de inteligncia, em suma.
O exerccio da aplicao do processo de planejamento estratgico muito
proveitoso, pois permite equacionar uma srie de coisas, sobretudo produzir uma
anlise estratgica capaz de construir um diagnstico situacional com indicativos
das ameaas, demandas e oportunidades do ambiente externo, e, ao mesmo tempo,
avaliar o nvel de resposta que uma organizao possui em relao s suas
possibilidades e fraquezas (KUNSCH, 2003).
Sobre o planejamento da comunicao, afirma-se que deve existir no sentidode permitir a tomada de posies a respeito de questes crticas e estratgicas e de
motivar, associar e integrar os diversos pblicos atravs da criao, da manuteno
e do fortalecimento dos vnculos de cada pblico com o projeto institudo
(HENRIQUES, 2007, p. 40). a partir deste planejamento que ser possvel
estabelecer metas e objetivos a serem atingidos em dado espao de tempo. Neste
processo imprescindvel a definio dos pblicos a serem alcanados.
Para a classificao dos pblicos da Campanha Nacional de Preveno eCombate ao Trabalho, da CPT, utilizaram-se os conceitos de Henriques (2007), que
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prope uma diviso de pblicos diferente dos modelos clssicos. Para o autor, o
modelo clssico de diviso de pblicos, baseado nas categorias tradicionais de
pblico interno, externo e misto, no se aplica aos movimentos sociais, devido
serem estes uma instituio aberta e descentralizada, o que torna invivel definir o
que se encontra em suas fronteiras internas e o que se projeta para fora dela, no
sendo possvel distinguir o interno do externo. Para tanto, Henriques (2007) prope
uma diviso a partir de trs nveis de aproximao, a saber:
A) Beneficiados (B) - o pblico entendido como sendo todas aspessoas e instituies que podem ser localizadas dentro do mbitoespacial que o projeto delimita para a sua atuao. B) Legitimadores(L) - grupo de pessoas ou instituies que, localizados dentro dombito espacial do projeto, no apenas se beneficiam com os seus
resultados ou dispem-se a legitimar a sua existncia, mas,possuindo informaes acerca de sua existncia e operao, socapazes de reconhec-lo e julg-lo como til e importante, podendose converter em colaboradores diretos em qualquer tempo. c)Geradores (G) - grupo de pessoas ou instituies que, localizadasdentro do que se define como mbito espacial do projeto, no apenasse beneficiam com os seus resultados ou dispem-se a legitimar asua existncia, mas efetivamente organizam e realizam aes emnome do projeto.
Sendo a campanha da CPT voltada aos trabalhadores em situao
vulnervel ao trabalho anlogo escravido, nessa primeira categoria encontram-se
os trabalhadores (inicialmente trabalhadores rurais, mas estendendo-se a outros
trabalhadores, como por exemplo, da construo civil), e a famlia deles, que so
beneficiados pelas aes de fiscalizao da campanha, tanto pela questo de
resgate e indenizao financeira, quanto pelo trabalho de informao/preveno.
Os legitimadores seriam a comunidade, associaes, sindicatos, conselhos,
etc., que se beneficiam do combate ao TE por meio de aes e projetos sociais
promovidos em prol disto, a exemplo do Escravo, nem Pensar da Reprter Brasi l,
desenvolvido com lideranas comunitrias e grupos escolares, em Aailndia - MA,dentre outros.
Na categoria dos geradores, pode-se pensar nos ncleos regionais da CPT,
bem com as organizaes parceiras no desenvolvimento da campanha, como o
CDVDH/CB (Centro de Defesa da Vida e dos Direitos Humanos de Aailndia/
Carmen Bscaran), a ONG Reprter Brasil, grupos que no apenas so
beneficiados, mas tambm se propem a contribuir efetivamente com o combate ao
trabalho escravo.
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Essa definio e o conhecimento mnimo dos pblicos a serem trabalhados
so fatores imprescindveis em qualquer projeto de mobilizao. Segundo Varo
(2013), o mapeamento dos pblicos de suma importncia, pois isto dar um
subsdio de informaes necessrias para se definir e direcionar as aes
comunicacionais do movimento mobilizador. Partindo deste cenrio, onde j se
encontram mapeados os pblicos, Henriques (2007) defende que, o planejamento
da comunicao deve, antes de tudo, seguir preceitos ticos, podendo ser
considerado, a partir da, um dos principais instrumentos para auxiliar o movimento
em seu projeto de transformao da realidade.
2.2 Mobilizao social
Segundo Henriques (2007), Mobilizao social se constitui num processo
pelo qual se convoca pessoas ou grupos de pessoas a lutarem juntas, em consenso,
em busca de se alcanar um objetivo comum a todas elas, seja para conquistar
melhorias comunidade em que vivem, seja para mudar a realidade desta
comunidade.
Os movimentos sociais necessitam, por natureza, de intensa mobilizaopara atrair e manter pessoas engajadas nas causas que defendem. Nesse processo,
a comunicao assume funes especficas, a fim de dinamizar a mobilizao e
potencializar os movimentos, para que estes no se tornem simples sequncias de
aes e reaes desarticuladas de pouca representatividade (HENRIQUES, 2007, p.
20).
Essas estratgias de mobilizao esto presentes na Campanha da CPT,
que objetiva o engajamento de pessoas e entidades na preveno e no combate aotrabalho escravo atravs da sensibilizao de multiplicadores e parceiros. A esse
respeito, Xavier Plassat, coordenador da Campanha da CPT, afirma em entrevista
concedida durante o desenvolvimento desta pesquisa, em 2011, que so
aproveitadas todas as oportunidades possveis de apario pblica da campanha
(entrevistas, debates, prmios) para pautar a mdia, tanto nacional como
internacional com bastante comunicao voltada para Europa e EUA, onde a CPT
tem, segundo ele, parceiros eficazes, como: Free the Slaves, AntiSlavery
International, CRS, Trocaire, Fastenopfer (ONGs e agncias de fomentos).
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No processo de mobilizao de pessoas necessria uma comunicao
estrategicamente planejada na estruturao de um projeto mobilizador, uma vez que
as pessoas precisam se sentir parte do movimento e abraar verdadeiramente a sua
causa, ou seja:
Sendo a participao uma condio intrnseca e essencial para amobilizao, a principal funo da comunicao em um projeto demobilizao gerar e manter vnculos entre os movimentos e seus pblicos,por meio do reconhecimento da existncia e importncia de cada um e docompartilhamento de sentidos e valores (HENRIQUES, 2007, p. 20).
Isto , no existe a participao popular quando as pessoas no se sentem
parte do movimento, quando no se reconhecem nele e no se percebem capazes e
responsveis de fazer a mudana acontecer ao seu redor. Isso o que Henriques(2007) define como corresponsabilidade, quando o pblico age por se sentir
responsvel pelo sucesso do projeto, entendendo sua participao como essencial
ao todo. Para tanto, o autor prope que, a comunicao deve ser planejada para
estimular a participao destes pblicos, devendo estar orientada pelo sentimento
de corresponsabilidade. Mas, alm disso, Braga; Henriques; Mafra (2004) ressaltam
que, para que se efetive a participao, valores e vises semelhantes entre os
participantes de um projeto so fundamentais. Ou seja, para que pessoas se
mobilizem e tomem a deciso de se engajarem em algum movimento, preciso no
s que essas elas tenham carncias e problemas em comum, mas que
compartilhem valores e vises de mundo semelhantes.
No caso da Campanha Nacional de Preveno e Combate ao Trabalho
Escravo, mais do que alcanar os trabalhadores suscetveis a essa forma de
trabalho (trabalho escravo), preveni-los de se submeter a essa condio, bem como
resgatar aqueles que j caram nas armadilhas dessa prtica que, infelizmente
recorrente, se faz necessrio tambm um trabalho de convencimento da sociedade,
de forma geral, de que esta uma questo que a atinge diretamente, uma vez que,
mesmo inconscientemente ou no, as pessoas acabam colaborando com tal
prtica quando, por exemplo, consomem/utilizam um produto de uma
empresa/organizao que se utiliza de mo-de-obra escrava. Do mesmo modo, o
trabalhador muitas vezes no se reconhece como escravizado e, em muitos casos,
naturaliza a condio de explorao.
Sabe-se que obrigao dos poderes executivo, judicirio e legislativo,
institurem em conjunto ou a partir de suas competncias, mecanismos de combate
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e erradicao ao trabalho em condio anloga a de escravo, todavia tarefa
tambm da sociedade discutir e refletir acerca de tal tema.
2.3 Redes
A Comisso Pastoral da Terra (CPT) faz parte de uma rede de denncia da
explorao da mo de obra escrava, composta por vrias entidades que atuam em
todo o pas no combate e preveno do trabalho escravo, a Comisso Nacional para
a Erradicao do Trabalho Escravo (CONATRAE), rgo colegiado vinculado
Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidncia da Repblica.
Para se pensar as relaes entre as entidades que compe essa rede,recorreu-se a autores que conceituam e discutem a temtica, numa abordagem
diferente da que comumente empregada nos estudos sobre a tecnologia da
informao, mas sob a tica de autores ligados aos campos da Antropologia,
Sociologia e Comunicao.
Para Aguiar (2007), redes sociais so, antes de tudo, relaes entre
pessoas, estejam elas interagindo em causa prpria, em defesa de outrem ou em
nome de uma organizao, mediadas ou no por sistemas informatizados; somtodos de interao que sempre visam algum tipo de mudana concreta na vida
das pessoas, no coletivo e/ou nas organizaes participantes. As redes sociais
podem ser formais ou informais, ressaltando-se que:
As interaes de indivduos em suas relaes cotidianas - familiares,comunitrias, em crculos de amizades, trabalho, estudo, militncia, etc. -caracterizam as redes sociais informais, que surgem espontaneamente, sobas demandas das subjetividades, das necessidades e das identidades. Masredes sociais tambm podem ser constitudas de forma intencional, comoindica o verbo to network (de difcil traduo para o portugus). Ou seja,
podem ser fomentadas por indivduos ou grupos com poder de liderana, quearticulam pessoas em torno de interesses, projetos e/ou objetivos comuns(AGUIAR, 2007, p. 2-3).
Pode-se afirmar que a rede de combate ao trabalho escravo, da qual a CPT
faz parte, uma rede social formal, composta por entidades, grupos de pessoas,
geralmente com a presena de lideranas, que trabalham visando articular e
mobilizar mais pessoas para lutar pela causa. Quandt; Souza (2008) afirmam que
recentemente os movimentos da sociedade civil na busca por solues para
problemas sociais crnicos como fome, misria e violncia tm contribudo para uminteresse ainda maior nas redes sociais e suas propriedades. O que um fator
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positivo para o enfrentamento de problemas muitas vezes negligenciados pelos
gestores pblicos, fato que pode ser explicado por interesses pessoais ou de
terceiros que poderiam ser afetados no caso de polticas combativas mais duras em
relao, por exemplo, a prtica de escravido por grandes latifundirios. Um
exemplo pontual disto foi a luta incessante da bancada ruralista do Congresso
Nacional, que por uma dcada tentou barrar a PEC do Trabalho Escravo, enfim
aprovada em 2014, mas ainda sob a tentativa de esvaziamento da emenda, por
parte dessa bancada, que busca diminuir as situaes em que ela poderia ser
aplicada.
Para Arajo (2002), a compreenso de redes permite melhor compreenso
da produo dos sentidos sociais e, em decorrncia, a prpria prtica social.Segundo ela, nas redes que so lanadas as questes sociais para debates e
onde so travadas as disputas em busca de foras aliadas a fim de se reforar a luta
por determinados objetivos, justificando-se que:
Redes so espaos sociais e, como tais, so arena dos embates sociais ede lutas polticas. So espaos de articulao de campos e eixos de poder.Redes possibilitam tanto a reproduo quanto a transformao das relaesde poder. Os ajustes, as mediaes, as negociaes, as apropriaes, oprocesso poltico, enfim, feito ao nvel do territrio concreto, no nvel local.[...].
Olhando para o objeto em anlise, percebe-se que a CPT age politicamente
em diversos momentos na rede, inclusive na luta pela aprovao da PEC 438, e em
diversas outras ocasies como mediadora da questo do trabalho escravo junto a
organismos internacionais, como a Organizao Internacional do Trabalho (OIT),
Organizao das Naes Unidas (ONU), por exemplo. O que , claramente, a
convocao de poderes maiores em prol da causa.
Quandt; Souza (2008) propem que, na anlise das redes sociais, mais
importante que os atores so as relaes sociais estabelecidas entre eles. Ainda
para os autores, o conceito de redes sociais passa pelo entendimento de estruturas
dinmicas e complexas formadas por pessoas com valores e/ou objetivos em
comum, interligadas de forma horizontal e predominantemente descentralizada,
embora seja possvel identificar hierarquias e centralidades na formao das redes.
Baseados nesta anlise e trazendo para o objeto em questo, pode-se
identificar na rede de combate ao trabalho escravo, a CPT, com os seus agentes
centrais distribudos pelo pas, repassando e propondo aes aos parceiros (demais
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atores), como a Reprter Brasil e o CDVHD/CB, por exemplo, alm dos
trabalhadores, pblico de interesse da entidade.
2.4 Comunicao popular
A comunicao popular nasce como uma forma alternativa de comunicao
para os grupos minoritrios, que tm nela, o seu canal prprio de mobilizao. [...]
representa uma forma alternativa de comunicao e tem sua origem nos
movimentos populares dos anos de 1970 e 1980, no Brasil e na Amrica Latina
como um todo. [...] no se caracteriza como um tipo qualquer de mdia, mas como
um processo de comunicao que emerge da ao dos grupos populares. Essaao tem carter mobilizador coletivo na figura dos movimentos e organizaes
populares, que perpassa e perpassada por canais prprios de comunicao
(PERUZZO, 2006, p.1).
Silva; Moura (2013) relatam que a comunicao popular tem um longo
histrico de luta e busca pela democratizao da comunicao. As autoras resgatam
que, no Brasil, a comunicao e os movimentos sociais ganham maior impulso
durante o perodo ditatorial, em que a sociedade teve os principais direitos cessadospela forma de governo vigente. Segundo elas, neste momento, a comunicao
popular surge como forma de resistncia fazendo contraponto censura e
manipulao dos meios de comunicao, possuindo grande atuao; o que significa
mudana do posicionamento da sociedade, passando a ser mais crtica no modo de
se posicionar.
A comunicao popular recebe outras denominaes, em diferentes
momentos, mas o sentido poltico dos termos sempre o mesmo. [...] foi tambmdenominada de alternativa, participativa, horizontal, comunitria e dialgica,
dependendo do lugar social e do tipo de prtica em questo. Porm, o sentido
poltico o mesmo, ou seja, o fato de tratar-se de uma forma de expresso de
segmentos excludos da populao, mas em processo de mobilizao visando
atingir seus interesses e suprir necessidades de sobrevivncia e de participao
poltica (PERUZZO, 2006, p. 2). A autora torna claro que desde o final do sculo 20,
a comunicao popular ganhou termos sinnimos aqui no Brasil, passando a ser
chamada sistematicamente de comunicao comunitria, dentre outras
denominaes existentes. Ressalta ainda que, o uso indistinto dos termos, em
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diferentes contextos e sua apropriao pela grande mdia, para designar produes
prprias, por exemplo, requer a imerso na origem do termo de origem da
comunicao popular. E se posiciona a respeito:
prudente recorrer ao status original dessa modalidade comunicativa naAmrica Latina, bem como aos conceitos de comunidade, para acaracterizao mais adequada do processo. Historicamente o adjetivopopular denotou tratar-se de comunicao do povo, feita por ele e paraele, por meio de suas organizaes e movimentos emancipatrios visando transformao das estruturas opressivas e condies desumanas desobrevivncia. (PERUZZO, 2006, p. 2).
Os meios de comunicao populares, por se constiturem como ferramentas
comunicacionais do povo, feitas pelo povo, tornam-se uma alternativa acessvel e
importante queles que no possuem voz nas grandes mdias e propiciam, comodefendem Silva; Moura (2012), a participao direta do cidado, que agora tem um
aliado na luta pela transformao social da comunidade em seu entorno.
Embora a comunicao popular seja antagnica comunicao massiva,
com princpios e processos distintos, Peruzzo (1998) afirma que os dois processos
comunicativos no se repelem, mas coexistem e se complementam e,
oportunamente afirma:
Na prtica, os meios de comunicao popular, apesar de sua importncia ede seu significado poltico, no chegam a colocar-se como forassuperadoras dos meios massivos. Os dois so complementares e noexcludentes. Os grandes veculos, por um lado, fazem-se necessrios, porexemplo, mas no conseguem suprir todas as necessidades em nvel decomunidade e de movimentos sociais organizados. (PERUZZO, 1998, p.130).
Nas estratgias comunicacionais da CPT, percebe-se claramente o uso dos
dois meios de comunicao; do primeiro (comunicao popular), nos produtos
destinados aos trabalhadores, como so o caso da sanfoninha e dos demais
produtos da Campanha em anlise, e do segundo (comunicao massiva), nadivulgao de aes e dados estatsticos referentes s denncias e combate ao
trabalho escravo, como forma de chamar a ateno da opinio pblica ao problema.
Em suma, como defende Peruzzo (2006) a comunicao popular se traduz
na voz das periferias, classes subalternas, realizada num processo de luta de
classes. E o que faz a comunicao ser popular sua insero num contexto
alternativo, caracterizado por sua tendncia a romper a ordem do capital, integrar
aquilo que o fragmenta. Isto a comunicao popular difere (pelo menos na teoria)dos grandes meios massivos patrocinados pelo capital. Ela, por sua vez, feita pelo
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povo, e sua sobrevivncia (falando de recurso, tanto humano, quanto material)
depende, no geral, do povo.
3 A CPT NO COMBATE AO TRABALHO ESCRAVO NO BRASIL
A Comisso Pastoral da Terra (CPT) um rgo da Conferncia Nacional
dos Bispos do Brasil (CNBB), vinculado Comisso Episcopal para o Servio da
Caridade, da Justia e da Paz e compe o quadro de entidades da Comisso
Nacional para a Erradicao do Trabalho Escravo (CONATRAE), sendo responsvel
por receber e encaminhar denncias de trabalhadores, produzindo regularmente
estatsticas sobre a dimenso do problema no pas.A CPT est inserida, de forma atuante, na rede de denncia da explorao
da mo-de-obra escrava, composta por vrias entidades que atuam em todo o pas
no combate e preveno ao trabalho escravo contemporneo, entendido aqui como
todas as formas de explorao em que h imobilizao da mo-de-obra por meio da
coao fsica e/ou moral, da restrio da capacidade de ir e vir dos subordinados e
da limitao de sua liberdade de oferecer a outros seus servios (ESTERCI, 1994).
A presena das ONGs - entendidas como assessoria e apoio aosmovimentos populares - nos movimentos sociais desde a dcada 70, tem crescido
de forma notria nos ltimos anos, o que refletiu numa maior visibilidade deles. A
esse respeito, descreve-se:
[...] na virada dos anos 70/80, essas entidades voltam os seusinvestimentos para a atuao no campo dos movimentos sociais que entocrescem pelo pas (como o sindical urbano e rural, os de luta pela terra e osde moradores de reas perifricas das cidades), padro que passa apredominar largamente sobre a ao do tipo comunitrio localizado (que, noentanto, nunca ser de todo abandonada): tanto , que passam a se auto
classificar como entidades a servio do Movimento Popular (LANDIM,1998, p. 41).
Neste cenrio, esto inseridas as Organizaes No-Governamentais
(ONGs) que buscam agir paralelamente ao Estado na busca de solues para esses
problemas. Tais organizaes esto inseridas no chamado Terceiro Setor, que surge
em decorrncia da impotncia do sistema e pela crescente conscientizao da
sociedade civil, e se apresenta como forma alternativa de organizao para atender
propsitos coletivos. Assim sendo, torna-se pertinente esclarecer:
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O Terceiro Setor uma parcela da sociedade formada por um conjunto deorganizaes da sociedade civil, no-governamentais, de direitos privados esem fins lucrativos que atende propsitos pblicos margem do aparelhoformal do Estado. Justifica-se como terceiro porque no est na condiode primeiro - O Estado; to pouco representa o segundo integrado pela
iniciativa privada (LIMA, 2004, p.98).
Juridicamente, as ONGs so sociedades civis sem fins lucrativos e
enquadram-se na legislao referente a esse tipo de organizao. Essas sociedades
so formalmente reconhecidas pelo Cdigo Civil Brasileiro de 1916, enquanto
pessoas jurdicas de direito privado sem fins econmicos. Compreendem, segundo o
art.16, I - As sociedades civis, religiosas, pias, morais, cientficas ou literrias, as
associaes de utilidade pblica e as fundaes. As ONGs, dessa forma, podero
escolher o registro legal seja de sociedades civis (ou associaes, a lei usa as duasexpresses transitivamente), seja de fundaes - o que menos frequente
(LANDIM,1998).
A forte e crescente presena de entidades do Terceiro Setor em aes
sociais pode ser explicada, pelo fato de a sociedade civil organizada enfrentar
dificuldades por falta de novas definies metodolgicas em relao ao diagnstico
e ao planejamento da comunicao. Uma viso a partir dos pblicos (e no dos
instrumentos) parece ser extremamente til para posicionar estas questes sob umatica humanista e verdadeiramente interessada na participao ampla e democrtica
(HENRIQUES, 2007, p.13).
Tal preocupao pode ser observada em alguns produtos de comunicao
da CPT, como por exemplo, na sanfoninha, que se utiliza do cotidiano e da
linguagem do trabalhador rural a fim de conseguir passar a sua mensagem.
A criao oficial da CPT aconteceu em 1975, durante a XIV Assembleia
Geral da CNBB, que procurava estabelecer uma Comisso Pastoral que se
posicionasse contra a explorao latifundiria e em favor dos posseiros nos conflitos
do campo principalmente no eixo Centro Oeste - Norte. De acordo com o histrico
da entidade, a CPT tem como objetivos centrais: a promoo da vida dos seres
humanos e do planeta terra; a construo de prticas e valores no meio rural que
criem novas relaes entre pessoas, famlias, comunidades e povos numa
perspectiva de solidariedade; o protagonismo dos camponeses e dos trabalhadores;
o enfrentamento ao modelo predador do ambiente e escravizador da vida de
pessoas e comunidades; o fortalecimento do trabalho de base junto s comunidades
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camponesas e as atingidas pelos grandes projetos, promovendo o protagonismo dos
trabalhadores, sua organizao e articulao (CPT, 2010).
A entidade tambm acompanha, apoia e estimula a defesa dos territrios
das comunidades tradicionais como espaos de reproduo da vida e de relaes
econmicas, religiosas, culturais, sociais e polticas solidrias; a articulao dos
movimentos sociais do campo com os da cidade, atravs da participao em redes e
fruns; mobilizao, apoios e respaldos aos camponeses e a suas organizaes, em
todos os nveis da sociedade e da mdia, tambm no estrangeiro; alm da promoo
da participao da sociedade nos projetos de lei de iniciativa popular, como no da
reforma poltica e nas consultas democrticas atravs de campanhas, referendos e
plebiscitos, dentre outros (CPT, 2010).
3.1 A Campanha Nacional de Preveno e Combate ao Trabalho Escravo: De
olho aberto para no virar escravo
Desde a sua fundao, a Comisso Pastoral da Terra luta contra a
permanncia do trabalho escravo no Brasil. A primeira denncia conhecida sobre
conceito moderno de trabalho escravo de 1972, realizada por Dom PedroCasaldaliga, de acordo com o critrio dvida impagvel.
Para intensificar ainda mais o trabalho de combate e preveno
explorao da mo-de-obra escrava, a CPT lanou e coordena desde 1997 a
Campanha Nacional de Preveno e Combate ao Trabalho Escravo: De olho aberto
para no virar escravo. Segundo a entidade, a campanha foi uma experincia
inovadora, realizada na Grande Regio Norte, visando articular estratgias de
trabalho que prevenissem e combatessem o trabalho escravo nos Estados deMaranho, Tocantins, Par e Mato Grosso. O foco nessa regio se justifica, segundo
a CPT, pela preferncia desses estados pelos aliciadores.
Essa Campanha partia da observao - de novo confirmada pelos casos
flagrados de 1997 para c no sul do Par - de que Maranho e Tocantins so
regies preferenciais de aliciamento, fornecedores de mo de obra, para as
empreitas realizadas no Par e Mato Grosso, em regies cada vez mais distantes
(ex.: regio do alto Xingu) (CPT, 2010).
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A campanha apoiada em material didtico, como de sensibilizao, voltado
para os trabalhadores em situao vulnervel; de orientao para monitores da
Campanha, alm de divulgao, para opinio pblica da sociedade em geral.
De acordo com a CPT, a Campanha teve desdobramentos diferenciados
conforme a regio envolvida, desde encontros de sensibilizao e primeiras
orientaes, encontros de capacitao nas regies de incidncia de trabalho
escravo, at acompanhamento de operaes de resgate e das pendncias que
delas decorrem, como aes criminais e trabalhistas, orientao s vtimas, proteo
a testemunhas e/ou vtimas.
A referida campanha, segundo o seu coordenador, Xavier Plassat, teve
incio formalmente em 1997, como resultado de um processo de discusso dasCPTs da Grande Regio Norte (PA, MA, TO), inicialmente provocado pela CPT do
sul-Par, em relao necessidade de se articularem na preveno e combate ao
trabalho escravo, de acordo com a posio de cada estado ao longo da rota do
aliciamento e da escravizao (estados emissores e estados receptores de mo-de-
obra). Porm, a atuao estratgica da CPT em relao ao trabalho escravo vem
desde muitos anos antes, a saber:
A primeira grande denncia foi em 1984, o caso da fazenda da Vale do RioCristalino, da Volkswagen, no Sul do Par. Os pees conseguiram escapara p da fazenda e foram parar em So Flix do Araguaia. Houvemobilizao e a ideia de flagrar os responsveis foi frustrada. Na poca, ogovernador do Para era Jader Barbalho. No se conseguiu fazer o flagrante,ento convocou-se a imprensa nacional e internacional e se fez a denncia.Havia indcios de que eram 600 trabalhadores. Mais tarde, uma matriapublicada na Alemanha afirmou que havia 800 trabalhadores escravizados(CPT, 2010).
Segundo a CPT, a Campanha tem, desde o seu incio, como aes
prioritrias, a denncia e divulgao de casos concretos a partir de relatos defugitivos colhidos principalmente no MT (Prelazia de So Flix do Araguaia) e no sul-
Par (Conceio do Araguaia, Rio Maria, Marab), e, esporadicamente, no MA e
TO, hoje no mais de forma espordica, visto a forte incidncia de casos nos dois
estados; o caso emblemtico da Volkswagen em 1984; cobrana das autoridades do
Executivo, do Legislativo e do Judicirio, por meio de dossis, manifestaes
pblicas, audincias; carta de Dom Pedro (1971); denncias aos Ministros da
Justia, do Trabalho e da Reforma Agrria (caso STR Porto Nacional, 1987);
formao do Frum nacional contra a Violncia no Campo (1991); Seminrio
nacional TE na Cmara dos deputados (1994): utilizao das mediaes e espaos
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internacionais disponveis para pressionar, contornar e vencer a omisso das
autoridades brasileiras (OIT, OEA, ONU): denncia na ONU, OIT e Parlamento
europeu (1993 via Marcelo Lavnre, presidente da OAB); caso Jos Pereira na
CIDH da OEA (1994); caso Brasil Verde (1998) e o planejamento e realizao de
aes de divulgao e sensibilizao da opinio pblica. Sobre esta ltima ao da
Campanha, Plassat (2011) relata:
Em 2002 iniciamos com Binka Le Breton a preparao do livro VidasRoubadas (Loyola, 2003), com lanamentos realizados em 10 capitais, epublicao de verses inglesa, italiana, francesa; em 2005/06 realizamosem mutiro o vdeo Aprisionados por Promessas (co-produo CPT,Witness e Cejil); multiplicamos seminrios e eventos, inseres na mdia,com passagens no Fantstico, Globo Reprter, Programa do J, entre
outros.
Outra grande ao e, talvez a mais substancial da Campanha, a
construo e articulao de uma rede de entidades engajadas na preveno e no
combate ao TE e capacitao de multiplicadores, como a formao do Frum
Nacional contra a Violncia no Campo (1991); a construo de parcerias com o
CDVDH/CB (1997), na realizao das duas Conferncias Inter-participativas de
Aailndia em 2002 e 2007; com a ONG Reprter Brasil, na produo de
informaes e dados, e na realizao de programas preventivos, como o E scravo,nem Pensar e capacitao de agentes associativos, professores, agentes de
pastoral, lideranas sindicais nos municpios mais atingidos pelo problema
(PLASSAT, 2011).
3.2 Estratgias de Comunicao da Campanha: a Sanfoninha
A Campanha De olho aberto para no virar escravo no possui um planode comunicao formalmente estruturado, conforme comenta Plassat (2011).
No h uma real estratgia de comunicao formalizada, mas existem simvrias aes, bem como produtos de comunicao, planejadas nessesentido, como por exemplo, instrumentos de divulgao (sanfoninha, cartaz,calendrio, banners) e logomarca (garoto-propaganda, lema De Olhoaberto para no virar escravo); uma poltica de ampla disponibilizao dosdados disponveis (desde que no considerados confidenciais ou de risco);elaborao de notas pblicas de acordo com as necessidades conjunturais;aproveitamento das oportunidades de apario pblica da campanha(entrevistas, debates, prmios) para pautar a mdia, tanto nacional comointernacional com bastante comunicao voltada para Europa e EUA, ondeh parceiros eficazes, como a Free the Slaves, AntiSlavery International,CRS, Trocaire, Fastenopfer, entre outras.
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Um dos produtos da campanha a chamada sanfoninha, um material
impresso dobrado em vrias partes, que cabe no bolso e que conta, por intermdio
de uma histria em quadrinhos (HQ), uma histria bem conhecida dentre os
trabalhadores escravizados: um agenciador que convida um grupo de trabalhadores
para uma empreitada prometendo verbalmente algumas condies de trabalho, mas,
que chegando ao local, no era nada daquilo que prometia. Situaes de maus
tratos, desrespeito dignidade humana, condies insalubres de trabalho
(alojamento, alimentao) e demais so tratadas no HQ que, ao final, indica a
denncia como a melhor soluo: Diga no escravido. Obrigar algum a
trabalhar por dvida ou mediante fraude ou violncia ou em condies degradantes
crime. Impedir sua sada crime. Denuncie! (CPT, 2011).O material ainda possui, nas pginas posteriores, outras informaes
referentes a contrato de trabalho, acordo coletivo, carteira assinada, alm de
telefones e endereos teis de entidades que compem a rede de denncia,
distribudas pelo pas. (Figura 1)
A escolha da sanfoninha como principal forma de divulgao da campanha
se deve, em primeiro plano facilidade, tanto na leitura, devido ser uma linguagem
mais dinmica e ldica, como no caso dos quadrinhos que possibilitam maisdescontrao no acesso a informao, e na praticidade, pelo seu formato o que
facilita no processo de distribuio e manuseio do material.
A sanfoninha destinada ao trabalhador em situao de risco, sendo que
para chegar a este trabalhador, depende de equipes, sindicatos, associaes
parceiras e dos prprios trabalhadores que, muitas vezes, pedem para seus colegas.
Todas as equipes da Campanha recebem uma quantidade suficiente para seu
trabalho e de seus parceiros regionais e a distribuio feita de mo em mo,mediante uma conversa de quem entrega. Alguns fiscais distribuem aos
trabalhadores resgatados no ato da fiscalizao.
A comunicao representa um mecanismo de suma importncia para o
desenvolvimento de aes coletivas e de carter social, portanto, as estratgias
estabelecidas nesse mbito consistem numa forma de fortalecer esses processos.
O fazer comunicativo, mais do que informar, toma por tarefa criar uma interao
prpria entre estes projetos e seus pblicos, atravs do compartilhamento de
sentidos e valores (HENRIQUES, 2007, p. 34). Isto , no basta apenas repassar o
material informativo aos trabalhadores, mas necessrio que este material, bem
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como a maneira como ele chega e apresentado ao trabalhador, seja capaz de
produzir sentido para ele, que proporcione uma identificao do trabalhador com o
contedo do material.
A CPT utiliza ainda outras formas de veiculao das suas atividades, como
cartazes, folders, banners, logomarcas, garoto-propaganda, e o lema De Olho
aberto para no virar escravo com a finalidade de diversificar e maximizar o poder
de alcance da campanha, que busca levar informao aos trabalhadores que sofrem
com o trabalho forado e que no conhecem a prpria realidade e os direitos
trabalhistas que lhes assistem. A entidade tem tambm como estratgia a
disponibilizao do seu banco de dados, exceto no caso de documentos
confidenciais ou que representam algum tipo de risco, voltada para a formao deopinio mais especializada, como no caso de cientistas e pesquisadores das
universidades,
Em cada regio, as aes da Campanha se do de formas diversas. [...] a
Campanha tem desdobramentos diferenciados conforme a regio envolvida desde
encontros de sensibilizao e primeiras orientaes, encontros de capacitao nas
regies de incidncia de trabalho escravo at acompanhamento de operaes de
resgate e das pendncias que delas decorrem (aes criminais e trabalhistas,orientao s vtimas, proteo a testemunhas e/ou vtimas) (CPT, 2010).
3.3 Abordagem e organizao da CPT
Sobre a forma de organizao do banco de dados de denncia e casos de
trabalho escravo, afirma-se que os dados referentes a denncias so
sistematicamente levantados desde a primeira denncia recebida, mas que s em1995, com a criao do Grupo Mvel, que passou a existir um acompanhamento
sistemtico dos dados nacionais. Afirma-se tambm que a partir de 2007, as
denncias recebidas pela equipe da Campanha passaram a ser padronizadas,
considerando-se que:
[...] toda equipe da Campanha, ao receber denncia, obedece a uma rotinadefinida em comum: contedo e estrutura-padronizada (a partir de 2007,conforme modelo definido junto com a SIT/MTE), envio imediato para a SITem Braslia e para a Coordenao da Campanha, que monitora asdenncias em tempo real (PLASSAT, 2011).
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Segundo Plassat (2011), embora as primeiras referncias de denncias
datarem desde a dcada de 70, somente com as fiscalizaes realizadas pelo Grupo
Mvel, a partir de 1995, que as especulaes sobre possveis casos de trabalho
escravo do lugar a registros legais de imposio de trabalho forado por meio de
autos de fiscalizao e da coleta de provas que qualificam a situao anloga de
escravo previstas no Cdigo Penal. Sobre o banco de dados, afirma que possui uma
configurao muito simples objetivando facilitar e agilizar seu funcionamento,
identificando-se [...] uma planilha Excel com umas 25 colunas identificando para
cada caso, as caractersticas essenciais que interessam para o monitoramento:
data, que fazenda, que proprietrio, que gato, onde, quantos trabalhadores, grau de
gravidade (1, 2, 3), data de fiscalizao e por quem, quantos resgatados, valor pago,atividade ou servio desenvolvido.
O processamento dos casos registrados possvel graas a algumas
frmulas instaladas na planilha, que permitem uma anlise consolidada do ano (e
dos vrios anos, acumulados desde 2000) e constantemente atualizada por fonte,
status da fiscalizao, Estado, municpio, atividade e grande regio. A Campanha
vem agregando aos poucos mais e mais equipes da CPT, tanto pela crescente
capacidade de interveno que adquire em funo da captao de maiores recursose da notoriedade, quanto pelo descobrimento do trabalho escravo em novas reas
do pas (PLASSAT, 2011).
Em 2003, em funo das campanhas contra o trabalho escravo empreendido
pela prpria CPT e da presso imposta pelo Comit dos Expertos da OIT
(Organizao Internacional do Trabalho), pela Comisso interamericana da OEA
(Organizao dos Estados Americanos) e sob cobranas da Comisso Especial do
Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH), se estabelece umPlano Nacional de Erradicao e a denncia ao trabalho escravo ganha consistncia
e se converte numa luta pelo Brasil afora, que faz com que o carter naturalizado ou
mesmo cultural imposto aos indivduos escravizados, enquanto condio de
tratamento desumano e degradante, tanto para sociedade como para eles prprios,
pudesse ser profundamente revisto. Em 2003, aumentou consideravelmente o
nmero de reportagens e discursos oficiais sobre o problema no pas e, por parte do
governo, expresses tais como trabalho forado ou semiescravo, foram substitudas
simplesmente por trabalho escravo (REZENDE, 2003).
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O resultado dessa nova abordagem o incio de um processo que se reflete
na libertao de um grande nmero de trabalhadores em situao de escravido.
Graas s evidncias adquiridas por intermdio da fiscalizao, a condio anloga
de trabalho escravo tomou forma mediante lei aprovada em dezembro de 2003, ao
estabelecer formalmente as figuras que definem essa condio: negao da
liberdade do trabalhador (o trabalho forado) e violao da sua dignidade (o trabalho
degradante). Com essa conquista no campo judicial esses critrios passam a
configurar no arcabouo legal, isto , est tipificado como crime e descrito no artigo
149 do Cdigo Penal Brasileiro - CPB.
Dentro da estratgia organizacional da rede de combate ao trabalho
escravo, existe uma relao de nomes designada como lista suja. Trata -se doCadastro de Empregadores da Portaria Interministerial, regulado pela Portaria
02/2011, do Ministrio do Trabalho e Emprego (MTE) e Secretaria de Direitos
Humanos da Presidncia da Repblica (SDH/PR), criado pelo Governo Federal, em
novembro de 2003, com o objetivo de dar transparncia s aes do poder pblico
no combate ao trabalho escravo. A relao traz os empregadores flagrados com
esse tipo de mo de obra e que tiveram oportunidade de se defender em primeira e
segunda instncia administrativa, antes de ser confirmado o conjunto de autuaesque configuraram condies anlogas s de escravo (ONG REPRTER BRASIL,
2005).
A lista suja contribui para que as empresas signatrias do Pacto Nacional
para a Erradicao do Trabalho Escravo verifiquem, por meio de consulta, se
determinada propriedade est na relao e, assim, exclurem esta da lista de
fornecedores. Segundo a ONG Reprter Brasil (2005) at o Pacto Nacional ser
criado, o sistema de combate ao trabalho escravo no havia envolvido o setorempresarial. A ONG afirma que os estudos de cadeia produtiva e o Pacto Nacional
tornaram possvel o combate escravido atravs do seu vis comercial. E que,
com eles, a sociedade pode atingir quem lucra restringindo a liberdade de outros. A
incluso na lista s possvel aps o esgotamento de todos os recursos contra a
prpria fiscalizao e o prazo de permanncia na lista de no mnimo dois anos e a
sada aps esse prazo s efetivada no caso do cumprimento de todas as
obrigaes ligadas s infraes anteriores e seno for atestada reincidncia. A lista
atualizada semestralmente pelo Ministrio do Trabalho e do Emprego (MTE),
podendo haver a excluso e/ou incluso de novos nomes. Na ltima atualizao,
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divulgada em julho do corrente ano, a listagem sofreu alteraes, com 91 novos
nomes includos e 48, excludos, entre pessoas jurdicas e fsicas, ficando na lista
suja, exatos 609 nomes (VICENTE, 2014).
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4 ANLISE DAS ESTRATGIAS COMUNICACIONAIS DA CAMPANHA DA CPT
Como j visto anteriormente, a Campanha Nacional de Preveno e
Combate ao Trabalho Escravo De olho aberto para no virar escravo foi criada e
coordenada pela CPT desde 1997 e, tem como propsito, segundo Plassat (2011), a
construo e a articulao, a partir de uma grande mobilizao e sensibilizao de
multiplicadores e parceiros, de uma rede de entidades engajadas na preveno e no
combate ao trabalho escravo.
A campanha da CPT, assim como a maioria das campanhas sociais, busca
fazer um trabalho de educao. Como determina a Constituio Brasileira de 1988,
em seu artigo 205, a educao direito de todos e dever do Estado e da famlia,mas esta dever ser promovida e incentivada com a colaborao da sociedade,
visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exerccio da
cidadania e sua qualificao para o trabalho. Neste cenrio, visvel a grande
participao das Organizaes No governamentais (ONGs), e um exemplo a CPT
que desde a sua origem, em 1975, tem sido uma defensora das causas sociais.
A Campanha se prope educar os trabalhadores vulnerveis a condies
anlogas de escravido, por meio das suas aes, fornecendo esclarecimentos arespeito do trabalho decente, e das formas de superexplorao do trabalho,
incentivando a realizao de denncias, prevenindo-os contra os riscos que possam
vir a ameaar esses trabalhadores e suas famlias. Tambm procura fornecer dados
referentes a essa prtica no pas, bem como participando de articulaes em prol de
polticas sociais que solucionem problemas base do trabalho escravo e que resultem
na elaborao de polticas pblicas para a reinsero social de trabalhadores
resgatados dessa situao, visto que apenas resgatar o trabalhador da condio deescravo e no lhe oferecer oportunidades de trabalho (de formao, capacitao)
no soluciona o problema. O trabalhador resgatado muitas vezes acaba se
submetendo novamente situao de onde foi retirado.
Vale ressaltar que a Campanha no se restringe a um pblico especfico (os
trabalhadores vulnerveis), mas busca atingir tambm a sociedade, de modo geral,
que, direta ou indiretamente afetada com esse problema e, de certa forma
tambm corresponsvel por ele. Assim, percebe-se que os princpios da Campanha
esto voltados para um trabalho educativo, que para alm de prevenir, consiga, ou
pelo menos busque modificar disposies culturais, atitudes, educar sujeitos sociais
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envolvidos direta ou indiretamente com a questo do trabalho escravo, de forma a
criar uma viso coerente a respeito desta problemtica, sem reduzir esses
trabalhadores a vtimas, mas compreender que o trabalho escravo ainda existe,
recorrente e que a mobilizao e participao de toda a sociedade fundamental
para o extermnio desta prtica.
Para tanto, a CPT conta com aes pontuais como oficinas de formao de
agentes para o trabalho de preveno e combate a essa prtica aproveitamento dos
espaos pblicos, como eventos e da mdia para plublicizao do problema e,
consequentemente chamar a opinio pblica para debater o tema. Percebe-se aqui,
a importncia de um planejamento, que permita a tomada de posies a respeito
dessas aes e estratgias que motivem e integrem os diversos organismos sociaisem prol dessa causa (combate ao trabalho escravo), como defende Henriques
(2007).
Para o referido autor, essa integrao se d atravs da criao, da
manuteno e do fortalecimento dos vnculos de cada pblico com o projeto
institudo. Talvez a ausncia de uma ou mais estratgias da CPT nesse sentido, de
integrar, de forma mais consistente os diversos setores sociais luta, seja um dos
pontos fracos da Campanha.
4.1 Produtos e aes da Campanha da CPT
A Campanha da CPT no possui, segundo o coordenador Xavier Plassat,
um planejamento estratgico formalizado das suas aes. Entretanto, foram
identificados durante a pesquisa alguns produtos de comunicao confeccionados
estrategicamente para a preveno da explorao da mo de obra escrava junto aostrabalhadores. Mostra-se abaixo, os principais produtos da campanha:
Figura 2 - Sanfoninha da CPT/verso 2011.
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Fonte: CPT Nacional, 2011.
A sanfoninha, como j descrita anteriormente, um material impresso
dobrado em vrias partes, que atravs de uma histria em quadrinhos (HQ),
descreve situaes comuns entre os trabalhadores escravizados, e os incentiva a
denunciar o trabalho escravo, como tambm prevenir outros trabalhadores de se
submeterem ao trabalho em situao anloga escravido.
Constata-se aqui, a compreenso da CPT de que as estratgiascomunicacionais da Campanha precisam atuar no campo da dialogicidade, se
apropriando do contexto sociocultural do seu interlocutor (o trabalhador), sem
invaso cultural, sem imposio de valores desconhecidos por eles, por
compreender que a comunicao adequada mobilizao social , antes de tudo,
dialgica, libertadora e educativa (HENRIQUES, 2007, p. 25).
De acordo com Plassat (2011), a primeira verso da sanfoninha foi
produzida no ano de 1998. Desde ento ela reproduzida e atualizada a cada ano.
O material, segundo ele, foi uma criao coletiva, que nasceu das discusses da
Coordenao da Campanha acerca da necessidade de um instrumento simples,
com informaes bsicas, destinado a um trabalhador em situao vulnervel,
geralmente analfabeto ou com baixo grau de instruo, sendo esta a principal
justificativa para o uso da histria em quadrinhos, permitindo que o trabalhador
tenha condies de se identificar, mesmo ser conseguir ler, como este trabalhador
iludido e escravizado.
Plassat (2011) explica tambm que, o formato da safoninha foi inspirado em
um material publicitrio, com formato de carto telefnico, que trazia um espelho na
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capa e informaes na parte interna. [...] trazia at 2009, um calendrio do ano no
lugar do espelho, mas que para evitar o vencimento antecipado da edio, o espelho
foi substitudo por uma mensagem e um desenho.
Ressalta-se aqui, que a comunicao no se faz necessariamente com texto
escrito; o uso de um desenho em um material destinado a um pblico com grande
incidncia de analfabetismo (trabalhadores rurais) agrega muito a ele, visto que
capaz de produzir sentidos para os interlocutores, principalmente quando se
considera o contexto sociocultural em que estes esto inseridos (FRANA, 2002).
Sobre a forma como a sanfoninha distribuda aos trabalhadores, explica-se
que esse trabalho feito por membros da CPT, sindicatos, associaes parceiras,
por alguns fiscais do trabalho e dos prprios trabalhadores que, muitas vezes pedempara seus colegas. Segundo ele, todas as equipes da Campanha recebem uma
quantidade suficiente para seu trabalho e de seus parceiros regionais; essa
distribuio feita de mo em mo, mediante uma conversa de quem entrega. Para
a obteno desse e outros tipos de informao referentes Campanha, utilizou-se
como metodologia a pesquisa qualitativa, por meio da qual, buscou-se verificar,
dentre os membros da CPT e organizadores da Campanha, a percepo destes
sobre as estratgias e os produtos de comunicao utilizados pela Campanha notrabalho de preveno e combate ao trabalho escravo (PLASSAT, 2011).
A pesquisa utilizou como tcnica para coleta de dados um questionrio
qualitativo, cuja estruturao foi constituda por: nome, ocupao, funo
desempenhada na Campanha da CPT e seis questes subjetivas, aplicado a treze
(13) dos 18 participantes do Encontro de Avaliao e Planejamento da Campanha,
realizado em agosto de 2013, em Araguana (TO), entre agentes e parceiros da
CPT. (APNDICE A)A pesquisa tambm compunha o plano de trabalho do estudante, que na
ocasio era bolsista do Programa Institucional de Bolsas de Iniciao Cientfica
(PIBIC), numa parceria entre o Projeto de Pesquisa Representaes do trabalhador
escravo (e acerca dele) em instncias miditicas e estratgias de comunicao em
redes de denncia no Maranho e o Projeto de Pesquisa Estudo da organizao e
funcionamento da rede de combate ao trabalho escravo no maranho.
A partir da tabulao dos dados foi possvel verificar que a Campanha tem
conseguido um alto grau de satisfao entre os membros da CPT, e que as suas
estratgias de comunicao tambm so bem vistas, embora, segundo a maioria
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dos entrevistados, precisam ser aperfeioadas. Percebe-se que a Campanha possui
como estratgia de distribuio do material, a comunicao dirigida. Para 46% dos
entrevistados, o material da Campanha (as estratgias de comunicao)
distribudo diretamente ao trabalhador, corpo a corpo, o que permite a explicao e
discusso acerca do contedo. Os outros 54% afirmaram que distribuem o material
em palestras e eventos sobre o tema, o que permite afirmar que o material
repassado diretamente aos agentes colaboradores da Campanha, sejam eles
parceiros ou mesmo, os demais membros da sociedade civil, dispostos a contribuir
com a causa. (Grfico 1)
Grfico 1 - Formas de distribuio das estratgias de comunicao da Campanha da CPT.
Henriques (2007) afirma que a comunicao dirigida, a interao face-a-face
retoma os contextos interativos de co-presena, promovendo uma maior
proximidade entre os indivduos e possibilitando aes mais coesas, isto , a
presena fsica do agente, a sua proximidade e credibilidade com o interlocutor traz
mais consistncia ao material que dele recebido.
Percebe-se tambm que, diferentes atores da rede (equipes da CPT,
sindicatos, associaes parceiras, fiscais do trabalho, os prprios trabalhadores) so
envolvidos nesse trabalho. Como defendem Quandt; Sousa (2008) [...] estar
localizado em um ponto estratgico da rede muitas vezes mais importante que
estar localizado em algum determinado nvel hierrquico, mesmo que superior. Isto
, a proximidade e o grau de credibilidade de quem distribui o material com o
trabalhador so fatores importantes para a sua aceitao. O que vai ao encontro
com o pensamento de Quandt; Sousa (2008) quando afirmam que esses atores que
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atuam como ns conectores entre diferentes subgrupos da rede ou entre redes so
pontos de influncia sobre a estrutura como um todo, seja no papel de agentes de
transferncia de informao, seja como pontos crticos de falha.
Sobre a tiragem da sanfoninha, Plassat (2011) relata que entre os anos de
1999 e 2005, a sanfoninha tinha uma tiragem anual de 25 a 40.000 exemplares e,
que em 2011, a mdia de tiragem j era de 100.000. Uma constatao de que a
sanfoninha tem tido uma boa recepo do pblico de interesse, se demonstrando
como uma boa estratgia da Campanha. O material impresso numa grfica em
Curitiba-PR e ultimamente tem sido custeado com recursos oriundos de Termo de
Ajuste de Conduta (TAC), mas j houve cooperao por parte da Secretaria Especial
dos Direitos Humanos (SEDH) e de instituies religiosas.A sanfoninha um dos produtos da campanha com excelente aceitao do
pblico. o tipo de artigo que no vai para o lixo ou no abandonado no cho;
pela forma de distribuio personalizada e pelo contedo e utilidade evidente, e
tambm o aspecto agradvel e o material resistente, tem longa vida no bolso do
trabalhador. Muitos denunciantes se referem explicitamente sanfoninha para
explicar como chegaram at nosso escritrio ou nosso telefone (PLASSAT, 2011).
Na pesquisa qualitativa, a sanfoninha se destaca como o material educativomais utilizado e tambm considerado o mais eficiente na opinio dos 13
entrevistados (o encontro teve a participao de 18 membros), por utilizar uma
linguagem coloquial, vrias informaes teis sobre o que pode ser considerado
trabalho escravo, telefones e endereos para denncia, alm de ser fcil de
manusear e guardar.
Quando questionados de forma aberta (sem listar estratgias e/ou produtos),
sobre as estratgias de comunicao da Campanha utilizadas em suas reas deatuao, a sanfoninha foi citada por 100% dos entrevistados, conforme indica o
grfico 2.
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Grfico 2 - Tipos de estratgias de comunicao utilizadas na Campanha da
CPT.
A sanfoninha foi citada tambm pela maioria (43% dos entrevistados) comosendo a estratgia de comunicao mais eficiente da Campanha junto aos
trabalhadores. (Grfico 3)
Grfico 3 - Estratgias de comunicao indicada como mais eficiente na
Campanha da CPT.
Vale ressaltar que, 22% dos entrevistados acreditam que todas asestratgias da Campanha so eficientes, o que representa que mais membros, alm
dos 43% concor