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Memórias de Rua - scientiaconsultoria.com.br · Organização e Ilustração da Capa ... travessas e becos foram ... conversas com os pioneiros em algumas poucas linhas, dando cor

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Memórias de Rua

As vivências e as visagenshistóricas de Juruti

Lílian PanachukJoão Carlos Melo

Jânua Munhoz

ORGANIZADO POR:

Organização e Capa

Organização e Capa

Organização e Ilustração da Capa

Colaboração e Capa

Colaboração

Consultoria

Revisão Ortográfica

Apoio

Realização

Fotos

Projeto Gráfico e Diagramação

Lilian Panachuk

Jânua Munhoz

João Carlos Melo

Greyce Guerra

Luíz Lúcio Ferreira Filho

Mario Jorge Gonçalves de Melo

Dean Batista dos Santos

Eduardo Alves Farias

Reinaldo Silva Nascimento Neto

Reinaldo Silva Nascimento Filho

Eneida Malerbi

Solange Caldarelli

Tatiane Lima

Alcoa World Alumina Brasil Ltda

Scientia Consultoria Científica

Acervo Scientia Consultoria

Wallace Felix

M533

Memórias de Rua: as vivências e as visagens históricas de Juruti / Lílian Panachuk; João Carlos Melo; Jânua Munhoz (organizadores); revisão, Tatiane Lima; projeto gráfico, Wallace Felix. – São Paulo: [s. n.], 2016. 156 p.: il.; 26 cm. ISBN 978-85-61345-03-7 1. Memória local. 2. Educação Patrimonial. 3. Patrimônio Arqueológi-co. 4. Patrimônio Cultural. I. Título.

CDD – 363.69

É permitida a reprodução total ou parcial desta publicação, desde que citada a fonte. Esta publicação não pode ser vendida. Tiragem: 1000 exemplares. Impresso no Brasil

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Dedicamos esta obra à Senhora Lucimar Fonseca (1925-2010) e à Professora Maria Pereira (em memória), da comunidade do Araçá Preto, nossa amiga e colaboradora, grande educadora e mulher.

A memória de vocês ecoa forte pelas ruas e pela lembrança de todos!

Dedicatória

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Ao finalizar este livro, escrito pelos jovens estagiários em parceria com a comunidade entre os anos de 2009 e 2015, ficamos emocionados em conhecer e reviver tantas histórias de Juruti. E devemos aqui reconhecer que obra como esta, somente é possível em colaboração e agradecemos aos parceiros.

Queremos agradecer o apoio financeiro da Alcoa, mas também o envolvimento com o Programa de Educação Patrimonial, que integra os Planos de Controle Ambiental da Companhia em Juruti (PA). Queremos agradecer, especialmente, duas mulheres “Alcoanas” que nos acompanharam cotidianamente com franqueza, entusiasmo e amor à educação, às mudanças propositivas. A Viviane Penna, Analista de Sustentabilidade, e Célia Oliveira, Consultora em Educação, muito obrigado por tudo. Queremos agradecer aos colegas que auxiliaram com a formação de nossos estagiários, em especial Cássia Boaventura, grande educadora que com amor e sabedoria desperta o melhor em cada um de nós, e ao Magnólio Oliveira e equipe, que com alegria e bom humor descortinaram o mundo da comunicação real e virtual. Agradecemos também ao material cedido pela Prefeitura de Juruti e pela Câmara de Vereadores do Município, que reproduzimos aqui.

É preciso agradecer, especialmente, a todas as famílias dos jovens autores deste livro, que totalizaram, até agora, 40 estagiários, e dizer-lhes muito obrigado pela confiança em dividir a formação destes jovens, que hoje brilham.

Agradecemos aos jovens autores deste livro pela dedicação, persistência, bela obra com a qual nos agraciaram. Por dividir conosco as angústias da vida e também suas alegrias, sucessos e felicidades. Sentimo-nos também parte desta obra, por escutar com vocês as gravações, pelos debates, por dividir conosco essa responsabilidade de colocar no papel parte da memória de Juruti.

Agradecimento

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Sem a participação dos moradores de Juruti, estas histórias não poderiam ser contadas. Gostaríamos de dizer a todos que nos cederam seu tempo em entrevistas, que dividiram conosco suas informações e seus acervos: muito obrigado! Esperamos que esta obra esteja à altura do carinho de vocês.

Obrigado Abdias da Silva, Adalgiza Palheta, Ademar, Aderbal Sampaio Cunha e Laurência Gomes Cunha, Agací de Lima Santos, Aiézer Duarte, Alberto Ivo, Alda Tavares Silva, Aldezi Pará, Aleílson Vidinha, Almiro, Ana, Ana Araújo Lima e Maria de Lima, Antônio das Graças, Antônio Sabino, Antônio Soldado, Carlos Alberto, Carmem Barroso, Casimiro Moraes da Silva, Clemente, Deuzarina, Diana de Souza Rego, Dirlei da Silva Araújo, Dona Joana da Silva Souza, Dona Laudinéia e marido, Dona Laurica e sua filha, Dona Lourdes Pimentel, Dona Maria, Dona Maria Imaculada, Dona Maria José Oliveira Silva, Dona Mirce, Dona Niddiege, Dona Oneide, Dona Raimunda da Silva Araújo, Dona Somenil, Dona Teresa, Dulceli, Edinilce de Souza Pereira, Eliel Batista, Evandina, Evilazio Maciel de Lima, Fernando Luiz, Firmino Santarém Gomes, Francisco Rodrigues de Sousa, Frank Jonas, Francisca Ramos, Ivete, Jana, Jesus Lima, Joana, Joana Cativo Batista, João Bonifácio do Nascimento (João Careca), Joaquim, José Torres, Juvenila Viana (Dona Sabá), Ladimil Salgado, Dona Lauli Soares de Souza, Lizete Alves, Lucídia Batista, Manuel Bruce Pimentel, Manuel Farias de Carvalho, Manuel Rocha, Maria Brito dos Santos, Maria Cristina, Maria de Fátima, Maria de Lima Silva (Maroca), Maria do Carmo e Ana Lúcia Batista Pereira, Maria Dulcina de Sousa, Maria Elba e José, Maria Heliomar, Maria Ivaneide Torres (Dona Mimi), Maria José, Maria Magali, Maria Odete, Maria Pinheiro, Maria Raimunda, Meblia Neengahiba, Mirtes Barroso da Costa, Mozi Rodrigues, Nilson, Nino Gonçalves Guimarães, Padre Alfonso Blúmenfeld, Paulo Cordeiro de Carvalho, Pedro Alves de Melo, Pedro Santarém Marturano, Professora Nazaré, Professora Orlandina da Silva Cardoso, Professora Régia Maria Gomes Pinheiro, Raimunda, Raimunda de Nazaré Almeida Sampaio (Dona Nani), Raimunda Dolzane da Silva, Raimunda dos Santos Sobrinho, Raimunda Rodrigues da Silva, Raimunda Rodrigues de Sousa, Raimundo do Santarém Marturano, Raimundo Marialva, Raimundo Printes, Rosangela, Roseia Maria Pinto Sousa, Rosemiro e Dona Marlene, Selis Bentes Gomes, Senhor Almiro Souza, Senhor Durval, Senhor Hermógino Gomes, Senhor Moises, Senhor Osmar Souza, Senhor Pedro, Senhor Ricardo e Aderci, Silvéria Cruz de Souza, Senhor Claros, Senhor José Augusto Batista, Umbelina da Silva Dolzani, Valdelina Pinto Sousa, Zeruia Bruce de Castro e Guilicia Castro, Reinaldo Neto (Professor Dinho), Robenildo Pimentel (Salgadinho), Adelaide Santos Silva, Amélia Tavares Cordeiro, Célia Maria da Silva, Janderson Silva, José Arino de Souza Melo, José Valcimar Gama Batista, Raimundo Nonato Farias de Souza, Rosemiro Silva e Valdéia da Gama Batista.

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Muitas outras pessoas foram importantes para este projeto dar certo: professores, vizinhos, taxistas, comerciantes, amigos e conhecidos, frequentadores de nossas atividades na cidade e no campo, agentes culturais e sociais, parceiros e apoiadores. Seria impossível nomear todos que fazem parte de nosso cotidiano em Juruti, e com vocês aprendemos a todo instante. A você, que participou deste Programa de Educação Patrimonial, sendo criança, jovem, adulto ou já maduro, nossos sinceros agradecimentos. Agradecemos, em especial, aos comunitários que nos cederam seus acervos pessoais para ilustrar esta história coletiva.

Juruti, dezembro de 2014.

Lílian Panachuk, João Carlos Melo e Jânua Munhoz

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Em 2009: Camila Oliveira de SouzaEduardo Alves FariasEvillen Batista BruceFranciane do Nascimento SilvaJuniele Batista AndradeLindel Júnior dos Santos SousaOrnelha Rodrigues da SilvaRômulo Augusto de Sousa Pimentel

Em 2010: Fagner Cordeiro FernandesLauriana Tyza Andriara Lima de SousaRafael Jone Vieira LopesRichard Breno Cavalcante dos SantosValdir Costa

Em 2011: Edmilson Paes de Souza Junior Raissa Farias de Andrade Safira Guerreiro Silveira

Em 2012: Dean Batista dos SantosHristo Miranda Marques

Autores

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Jonivaldo Souza GalúcioPaula Estéfane Santarém GuerreiroReinaldo Silva Nascimento NetoRenata Joyce Dolzane DuarteValderjon de Souza Galúcio

Em 2013: Ariele Pereira BarretoFernando Amauri Matos de SouzaKamila Nascimento da SilvaLeonardo da Costa GomesLucio Silva dos SantosRayane Teixeira Batista

Em 2014: Amanda Fabiane Monteiro dos SantosCamila Souza Silva Caroline Amaral NunesEmilly Dayane Ferreira BarbosaMariane de Oliveira MonteiroRobson Brito de SouzaWeslley da Silva Amaral

Em 2015: Andreza de Souza LopesJonecson Nascimento de MeloTamylles Lima de CarvalhoWenderson Bentes de Souza

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Progresso e Preservação

Em tempos de mudanças ocorridas em Juruti, a partir da chegada da Alcoa, minha preocupação como professor de História era a de como os saberes e conhecimentos do nosso povo seriam tratados pelas outras pessoas com conhecimento e formação distintos do nosso. Pessoas de todas as regiões do Brasil chegavam a Juruti em busca de emprego, pois nossa cidade passava por uma fase que proporcionava oportunidades de trabalho nas mais diversas áreas, e com isso a cultura, o crescimento demográfico e outros aspectos sociais seriam, com certeza, afetados. Então, como administrar os mais diversos interesses sem, contudo, não prejudicar nenhuma das partes?

Quando meu filho Reinaldo Neto começou a trabalhar na Scientia Consultoria Científica conheci a senhora Lílian Panachuk e então como diziam os mais antigos: juntou a fome com a vontade de comer. Explico: vi no projeto “Memórias de Rua”, em que os estagiários, entre eles meu filho, entrevistaram as pessoas com mais idade, rua a rua, e com isso a história de nossa cidade será conhecida pelas futuras gerações.

Então, pude participar de alguma forma deste livro, e por isso primeiro agradeço a Deus, assim como também à senhora Lílian Panachuk que me deu a honra de escrever estas poucas palavras, mas que para um professor de História chega a emocionar, pois este livro traduz um sonho que tive em escrever um livro tão bom quanto este.

Reinaldo Silva Nascimento FilhoPai do estagiário Reinaldo Silva Nascimento Neto

Professor de História e historiador de Juruti/PAColaborador na pesquisa Memórias de Rua

Frequentador do Escritório da Scientia em Juruti/PA

Palavra de professor e pai

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Palavra da Scientia Consultoria Científica

Este livro apresenta um dos resultados do Programa de Educação Patrimonial executado pela Scientia Consultoria Científica na cidade de Juruti (PA), que integra os Planos de Controle Ambiental (PCA) previstos no processo de licenciamento ambiental do empreendimento de mineração de bauxita da Alcoa no município.

Trata-se do diálogo com a comunidade local, especialmente com os mais veteranos, que trazem maior bagagem e experiência na cidade. Conversamos com muitos deles e suas observações e sábias indicações nos levaram a formatar essas ideias no projeto nomeado “Memórias de Rua”. O interesse era atrair para a realização da pesquisa sobre os logradouros da sede municipal, jovens do Ensino Médio, em geral pouco contemplados pelos programas e ações do licenciamento ambiental, embora sejam agentes muito importantes, pois serão futuramente os adultos atuantes na defesa do patrimônio cultural. Desenhamos o escopo do projeto juntamente com João Carlos Melo, colaborador deste Programa de Educação Patrimonial desde 2009, e apresentamos a proposta para diversos parceiros locais: agentes culturais e educadores, representantes de diferentes órgãos públicos, especialmente nas Secretarias Municipais de Educação, Cultura e Meio Ambiente.

A partir de 2009, com a colaboração de jovens de Ensino Médio de Juruti, começamos a formar uma equipe. Até o início de 2015, 40 estudantes foram estagiários de pesquisa da Scientia e executaram seus estudos junto à comunidade local para o projeto “Memórias de Rua”, além de outras atividades no Programa de Educação Patrimonial. A presença dos jovens pesquisadores fez com que as ideias modificassem aos poucos não somente na proposta de pesquisa, mas também na dinâmica dentro do Programa. Na pesquisa “Memórias

Apresentação

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de Rua” algumas ações foram propostas pelos jovens, além de toda a pesquisa realizada por eles:

• Foi sugerida a criação de um blog. Com isso, alguns estagiários foram capacitados pela equipe da Rede Juruti de Comunicação Comunitária, coordenada pela Magnética Vitae;

• O roteiro de perguntas foi alterado muitas vezes, de acordo com a equipe, sem sair do plano geral, qual seja, conhecer o histórico das ruas da cidade;

• Pesquisa sobre os Encomendadores de Almas, grupo;

• Muitas lendas foram coletadas e trabalhadas nas escolas e apresentações culturais, o que não era o foco inicial, mas acabou se colocando como um tema transversal relevante.

Para a realização da pesquisa, os jovens visitaram cada logradouro, debateram entre eles sobre as condições de infraestrutura das ruas, entrevistaram diversos moradores e gravaram as conversas. Depois, cada entrevista foi transcrita e catalogada, eventualmente junto com fotografias e recortes de jornais. Pesquisaram as informações obtidas em livros, compararam as entrevistas, somaram a memória com os documentos históricos. Somente depois de tudo isso, os históricos das ruas, travessas e becos foram escritos, tentando retratar as horas de conversas com os pioneiros em algumas poucas linhas, dando cor à memória. Este livro, esperamos, será o primeiro de muitos, pois Juruti tem muitas histórias para contar. Seus autores, já apresentados, são hoje jovens adultos e trarão fortes contribuições para sua terra natal. A organização do livro se deu aos poucos, com muitas colaborações, e para conduzi-las, João Carlos Melo, Jânua Munhoz e eu seguimos em parceria, ombro a ombro na trincheira da vida cultural de Juruti. Com o João e família, aprendi muito sobre esta comunidade, que considero também um pouco minha (me permitam); com Jânua e família, aprendi sobre ser mulher na comunidade; seus afazeres, direitos e deveres. Graças ao empenho de João Carlos e Jânua Munhoz, a equipe local brilhou e ainda brilha, com um colorido próprio, com um orgulho de ser, de construir, de propor, de atuar, de executar ações que beneficiam aos moradores, realizadas também por moradores locais, filhos da terra.

Lílian Panachuk – Coordenadora do Programa

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Palavra da Alcoa

O Programa de Estágio Científico “Memórias de Rua” vem sendo implementado no Município de Juruti desde 2009, por meio do Programa de Educação Patrimonial dos Planos de Controle Ambiental (PCAs) da Alcoa. O programa é executado pela Scientia Consultoria e já participaram desta atividade 40 jovens, entre 15 e 20 anos de idade, regularmente matriculados em escolas públicas no Município de Juruti.

Essa iniciativa é amplamente apoiada pela Alcoa por vislumbrar o envolvimento dos jovens como atores responsáveis pela preservação cultural e resgate da memória do município, cultivando a percepção sobre as dinâmicas de transformação social a partir do registro da história local.

Escrever as histórias de Juruti pelas mãos destes jovens pesquisadores é um grande exemplo de protagonismo juvenil, estimulando a corresponsabilidade frente à construção da história do município. O programa propiciou capacitação em diversas temáticas e a oportunidade de amadurecimento desses jovens como sua primeira experiência profissional. Como resultado, posteriormente alguns ex-estagiários deram continuidade em sua formação, participando, por exemplo, do programa Jovem Aprendiz.

Sobre a Alcoa Corp.

A Alcoa (NYSE: AA) é líder mundial no setor em produtos de bauxita, alumina e alumínio, com um forte portfólio de produtos de fundição e laminação de valor agregado e ativos de energia significativos. A Alcoa está construída sobre uma base de valores fortes e excelência operacional há quase 130 anos, desde a revolucionária descoberta que fez do alumínio uma parte vital e acessível da vida moderna. Desde a invenção da indústria de alumínio e no decorrer da nossa história, nossos talentosos Alcoanos têm apresentado incríveis inovações e melhores práticas que nos levaram à eficiência, segurança, sustentabilidade e comunidades mais fortes em todos os momentos em que operamos. Visite nosso site www.alcoa.com, siga @Alcoa no Twitter e, no Facebook, em

www.facebook.com/Alcoa. www.facebook/AlcoaBrasil

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Sobre a Alcoa no Brasil

A Alcoa opera no Brasil em cinco das seis unidades de negócios da Alcoa Corporation: Bauxita, Alumina, Alumínio, Fundição e Energia. A estratégia de transformação da companhia busca ampliar seus negócios na cadeia de valor do alumínio e criar operações na área de commodities globalmente competitivas. A Alcoa emprega localmente cerca de 2.300 pessoas e possui três unidades produtivas, em Minas Gerais, Maranhão e Pará, além de escritórios em São Paulo e no Distrito Federal. A companhia também é acionista da Mineração Rio do Norte (MRN) e de quatro usinas hidrelétricas: Machadinho, Barra Grande, Serra do Facão e Estreito. Foi escolhida pela oitava vez como uma das empresas-modelo pelo Guia Exame de Sustentabilidade. Também foi reconhecida pela 13ª vez como uma das Melhores Empresas para Trabalhar, de acordo com o Great Place to Work Institute; e uma das Melhores Empresas Para Começar a Carreira, segundo o Guia Você S/A. Para mais informações, visite www.alcoa.com.br e siga @Alcoa no Twitter em twitter.com/AlcoaBrasil e no Facebook em facebook.com/AlcoaBrasil.

Sobre a Alcoa Juruti

A Alcoa opera mina de bauxita no município de Juruti, oeste do Estado do Pará, desde 2009, como uma das principais unidades do negócio global de mineração da Alcoa. Composta por estruturas de lavra, beneficiamento, transporte através de ferrovia de cerca de 55 km e terminal portuário, a Alcoa Juruti emprega cerca de 1.400 funcionários direta e indiretamente, mantendo uma média de 80% do efetivo com origem paraense, e já gerou o montante de mais de R$ 260 milhões em pagamentos de impostos e royalties da mineração de bauxita.

Com uma proposta de operações integradas com a comunidade, a Companhia promove iniciativas voluntárias de responsabilidade social pelo fortalecimento das infraestruturas, mão de obra e negócios locais, além de impulsionar a criação do Tripé Juruti Sustentável como modelo de desenvolvimento local, abrangendo fórum de discussão entre poder público, organizações sociais e iniciativa privada; fundo de financiamento de projetos de sustentabilidade; e ferramenta de indicadores socioeconômicos para adequada orientação das prioridades do município. Segundo pesquisa de opinião pública conduzida pelo Ibope, 91% da população de Juruti é favorável e apoia as operações da Alcoa na cidade.

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PARA COMEçAR ............................................................................................... 19

APRESENTAçãO .............................................................................................. 31

INTRODUçãO: Um olhar sobre a memória das ruas de Juruti ................... 49

AS RUAS PESQUISADAS ................................................................................. 53

RUAS DO BAIRRO CENTRO ............................................................................. 57

Rua Coronel Manuel Marques Diniz .............................................................. 58

Alameda Horizonte Bentes da Cunha ........................................................... 60

Beco Francisco Batista .................................................................................... 61

Rua Doutor Moraes Jardim/Rua da Saudade ............................................... 62

Rua Belém ........................................................................................................ 64

Rua Paes de Andrade ...................................................................................... 67

Rua Marechal Rondon .................................................................................... 69

Travessa Praça da República .......................................................................... 71

Rua Joaquim Gomes do Amaral ..................................................................... 74

Rua Judith Barroso Pinheiro ........................................................................... 77

Rua Firmino Guimarães de Sousa ................................................................. 78

Rua Presidente Juscelino Kubitschek ............................................................ 80

Avenida Presidente Tancredo de Almeida Neves ........................................ 81

Rua Américo Pereira Salgado ......................................................................... 84

Travessa Padre João Braz ................................................................................85

Travessa Major Pinto e Silva ........................................................................... 86

Travessa Barão do Rio Branco ....................................................................... 89

Travessa Manoel Marinho .............................................................................. 90

Sumário

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Travessa Lauro Sodré ..................................................................................... 91

Travessa Rui Barbosa ...................................................................................... 93

Travessa Floriano Peixoto .............................................................................. 95

Travessa Vereador Turíbio Vieira ................................................................... 96

RUAS DO BAIRRO BOM PASTOR ................................................................... 99

Rua da Saudade ............................................................................................. 100

Rua Belém ...................................................................................................... 104

Rua Marechal Rondon .................................................................................. 107

Rua Joaquim Gomes do Amaral ................................................................... 112

Rua Governador Fernando Guilhon ............................................................ 115

Travessa Vereador Turíbio Vieira ................................................................. 118

Travessa Dário Rodrigues ............................................................................ 119

Travessa Raimundo Emídio Santarém ........................................................ 122

Travessa Boa Ventura Bentes ...................................................................... 126

Travessa Marcos Belicha .............................................................................. 128

Travessa Antônio Rodrigues Oliveira .......................................................... 128

Travessa Tugo Maruoka ............................................................................... 130

RUAS DO BAIRRO PALMEIRAS ...................................................................... 133

Travessa Mário das Neves Batista ............................................................... 134

Travessa José Jacinto Vieira .......................................................................... 136

Travessa Américo Pereira Lima ................................................................... 137

VIVÊNCIAS E MEMÓRIAS DAS RUAS DE JURUTI ........................................... 139

Encomendadores de Alma ........................................................................... 139

As lendas de Juruti em teatro para todos! ................................................... 143

A Lenda do Cachorrão .................................................................................. 143

A Lenda da Loira do Jará ............................................................................... 146

A Lenda do Calça Molhada ........................................................................... 149

REFERÊNCIAS ................................................................................................. 151

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Quando conheci alguns moradores de Juruti (PA), da cidade e do campo, em setembro de 2007, pude notar claramente o orgulho em ser daquele local. Fui apresentada à comunidade durante uma reunião pública promovida pelo empreendedor, como a arqueóloga que iria trabalhar com educação patrimonial, contratada para o licenciamento ambiental da Alcoa. Desde então, muitas pessoas me procuraram e demonstraram o interesse em saber sobre o passado mais antigo e mais recente da cidade, e claro, traziam consigo as suas próprias reflexões e explicações, bem como suas memórias. O contato inicial da equipe do Programa de Educação Patrimonial foi com lideranças da cidade e do campo, com o objetivo de apresentar os resultados dos estudos arqueológicos e também compartilhar o plano de ação idealizado para a comunidade. Esse contato inicial com as lideranças teve como consequência uma série de alterações no escopo do projeto, pois o papel do técnico de pesquisa é esse, a meu ver, mediar os interesses conflitantes sempre em favor do patrimônio cultural.

Representantes de diferentes setores me fizeram notar como a cidade e suas histórias povoavam a vida de seus moradores. Todos tinham alguma história para contar sobre “caretinhas de índios” e outros objetos antigos diversos, além de lendas e visagens. A cidade, suas ruas, bairros e comunidades eram o cenário das narrativas. Aos poucos, me contaminei com a curiosidade de saber mais estas histórias, inicialmente por puro deleite e depois por vislumbrar o caráter científico dessa preocupação popular. Para isso, alguns acontecimentos marcantes precisam ser contados.

O Professor Robenildo Pimentel, conhecido como Salgadinho, compartilhou, ainda em 2008, que realizou uma pesquisa historiográfica sobre a memória do Bairro Terra Preta através de entrevista com os ex-moradores, removidos para a construção do porto da Alcoa. Essa excelente pesquisa foi publicada em seu trabalho de conclusão de

Para começar...

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curso1, e serviu de inspiração para o estudo realizado pelos estagiários da Scientia Consultoria, em Juruti. O Bairro Terra Preta está na divisa com o Bairro Bom Pastor, contemplado pela pesquisa dos jovens pesquisadores.

Também, em 2008, o Professor Reinaldo Filho conversou muito comigo e toda equipe durante a 1ª Semana de Arqueologia em Juruti, contou muitas histórias e fez muitas perguntas sobre a pesquisa de arqueologia em Juruti e diversos outros temas da cidade. Em 2012, ele acompanhou de perto o trabalho do filho, Reinaldo Neto, tanto como pai de estagiário quanto historiador e professor, estreitando os laços com a equipe do programa de educação patrimonial. Ele contribuiu contando as histórias locais, localizando pioneiros e compartilhando com a equipe o mapa que fez da malha urbana da cidade, entre 1991/1992, reproduzido na sequência. Ele é um dos historiadores da cidade, e seu estudo final de graduação em História focalizou a Teologia da Libertação em Juruti, trabalhando também com a estratégia da história oral2. Foi fundamental a leitura dessa obra como fonte para entender o cenário político e religioso do município.

1 - PIMENTEL, Robenildo de Sousa. 2009. “Memórias do bairro da Terra Preta: Um estudo histórico do antigo bairro-lembranças dos ex-moradores.” Universidade Federal do Pará. Instituto de Filosofia e Ciências Humanas. Núcleo Universitário de Oriximiná. Faculdade de História. Monografia de Graduação. 58p.2 - NASCIMENTO FILHO, Reinaldo Silva. 2012. A Teologia da Libertação em Juruti. Universidade Federal do Pará. Instituto de Filosofia e Ciências Humanas. Núcleo Universitário de Oriximiná. Faculdade de História. Monografia de Graduação. 38p

Mapa dos logradouros do centro da cidade de Juruti e imediações, produzido entre os anos de 1991 e 1992 pelo professor e pai de aluno, senhor Reinaldo Silva Nascimento

Filho, conhecido como Dinho.

Acervo: Reinaldo Silva Nascimento Filho, cedido para o projeto em 2012.

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Durante as reuniões públicas de que participei, sempre me chamou a atenção os comentários dos mais veteranos da comunidade sobre o descaso dos mais jovens pela cidade, e seu desconhecimento sobre os acontecimentos da cidade. Claro que as mudanças abruptas influenciavam bastante os jovens.

Outros agentes culturais e lideranças narraram à equipe sobre embates entre as gerações, especialmente no âmbito escolar, nas salas de Educação de Jovens e Adultos (EJA). Em geral, esses conflitos ocorriam com os mais jovens desprezando o conhecimento dos mais velhos, ou mesmo a cidade de Juruti, tratando com indiferença algumas tradições e traços culturais. Isso mostra, em partes, algumas das consequências das mudanças causadas em Juruti, e o impacto sobre o jovem local.

De 2007 em diante, era possível perceber as mudanças na malha urbana, pela vivência na cidade. Essa percepção foi quantificada pela Fundação Getúlio Vargas e é possível verificar um aumento de mais de 30%, 1/3 da população municipal vive hoje na sede urbana de Juruti3. A cidade mudou e ainda segue mudando rapidamente, e estas histórias conhecidas por todos corriam algum risco de se perder. Relembrando a fala de um personagem do filme Narradores de Javé4, em Juruti também não tinha sido necessário escrever as histórias antes, pois eram de domínio do público local, mas agora era preciso “tirar da cachola as histórias encravadas na mente do povo e colocar no papel”.

Perante tudo isso, juntamente com João Carlos Melo e demais membros da equipe da Scientia, foi escrito o Projeto Memórias de Rua e compartilhamos as ideias com alguns parceiros locais. Entre os anos de 2008 e 2009, apresentamos aos educadores durante a formação em educação patrimonial; aos parceiros de trabalho (especialmente aos representantes locais do Instituto Chico Mendes, na época Cássia Boaventura), ao financiador do Projeto (Alcoa); aos representantes diversos durante as reuniões do Conselho Juruti Sustentável (CONJUS); nas organizações civis locais (especialmente com o pessoal da Associação dos Artesãos do Município de Juruti – AMJU, Associação das Mulheres Trabalhadoras de Juruti – AMTJU, Colônia Z-42, dentre outras) e ainda em conversas informais com os moradores. Todo esse diálogo nos fez, em equipe, modificar ideias iniciais, mas todos com quem conversávamos, gostaram da perspectiva de ter jovens locais pesquisando, através de entrevistas com os moradores, o histórico das ruas da cidade. Afinal, essa pesquisa poderia contar com inúmeras contribuições, valorizaria os pioneiros de cada logradouro e permitiria registrar as lembranças.

3 - FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS. Indicadores de Juruti: para onde caminha o desenvolvimento do município. Juruti: FGV, 2009. Disponível na Internet em: http://www.indicadoresjuruti.com.br/index.php?secureUrl=f7T5oKocDFNyL9GM0GRM3_8wU7LkiAFIc30p1N_66p04 - CAFFÉ, Eliana. Narradores de Javé. [s.l.]: Bananeira Filmes, c2004. DVD. (100 min.).

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A presença jovem e a pesquisa Memórias de Rua

Entre 2009 e 2015, foram feitas seleções para o estágio remunerado ofertado pela Scientia aos estudantes do Ensino Médio. Neste processo seletivo, 230 estudantes se inscreveram, sendo que 40 participaram do projeto. Isso pode ser quantificado e indica que 10,5% dos estudantes de Ensino Médio prestaram a prova da Scientia para estágio remunerado, segundo os dados da Fundação Getúlio Vargas, nos Indicadores de Juruti, a média é de 2.423 estudantes para essas séries, contando os anos de 2009 e 2010, quando há dados disponíveis5. Sempre foi muito difícil escolher entre tantos bons estudantes, e muitas vezes, a equipe levou um tempo debatendo entre si. Gostaria de aproveitar para agradecer a todos que prestaram a prova.

A presença dos jovens alterou a rotina e foi um constante aprendizado ter cada um deles na equipe, e espero que tenham esta pesquisa e todo o convívio como uma experiência positiva, pois o foi para nós da equipe.

Perceber as transformações espaciais que ocorreram e ainda ocorrem em Juruti é um exercício de astúcia que envolve diferentes escalas e temas. Neste caminho é possível conectar os investimentos econômicos, processos migratórios, expansão urbana entre tantos processos que são acelerados pelas dinâmicas ligadas à exploração dos recursos naturais, como a mineração. Neste sentido, foi necessário dialogar com os jovens sobre diversos assuntos: Patrimônio Cultural e Natural, Geografia, História Regional, Arquitetura, Aproveitamento Turístico Local, Antropologia, Direito, Licenciamento Ambiental, dentre outros. Essa discussão interdisciplinar permitiria que os jovens percebessem múltiplos aspectos da cidade.

A pesquisa sobre os logradouros foi apresentada aos jovens a cada novo ano, e todos pareciam instigados com o tema.

Inicialmente, foram realizados cursos de formação, que depois continuavam com outros recursos. Assim, discutimos com os jovens sobre a cidade através de textos, vídeos e diálogos.

Com o tema do patrimônio edificado, por exemplo, a equipe da Scientia, liderada neste tema pelos arquitetos Greyce Guerra e Thiago Guerra, apresentaram o assunto e debateram sobre a preservação do patrimônio edificado, assim os estagiários refletiram sobre o conceito e a importância da preservação destes bens na prática local. Posteriormente, inseriram elementos para debater noções conceituais sobre preservação e tombamento. Apontando ainda a organização jurídica que sustenta e indica estas ações aplicadas a construções diversas, por motivos diferentes, mas em prol de um mesmo denominador: garantir a

5 - Disponível na Internet em:http://www.indicadoresjuruti.com.br/index.php?secureUrl=mfpbmpe 8591-B_7hK-CAz4-77ai6J18YmaHzULP14hw

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preservação dos bens para as futuras gerações, auxiliando na construção do passado local, regional, nacional e internacional. Discutiram ainda a dinamicidade do patrimônio nas edificações. Além de ser um exemplar de sua época, cada bem imóvel sofre alterações com o passar do tempo. Todos esses aspectos são importantes para contar a história de cada edificação, bem como os desejos e comportamentos sociais e ambientais, aspectos econômicos e morais de um período, e claro, demonstra os aspectos tecnológicos e estéticos de uma época.

Como exercício prático, o grupo de estagiários selecionou algumas casas de Juruti e pesquisou seus aspectos arquitetônicos e históricos, e ainda apontou aquelas que seriam interessantes à preservação. Embora muitas edificações mais antigas já tenham desaparecido com o fenômeno de terras caídas6, há ainda exemplares distribuídos pela malha urbana. Neste exercício, inicialmente mental e depois percorrendo as ruas da cidade, os jovens citaram várias casas na Travessa Lauro Sodré, na Rua Américo Pereira Lima e na Praça da República, e depois, com a permissão dos moradores, fizeram o inventário das casas.

Como exercício final, uma ficha de identificação foi criada em conjunto para diagnosticar as casas de interesse à preservação durante as pesquisas do projeto.

Diversos outros temas foram tratados durante a estadia dos jovens no Programa de Educação Patrimonial. João Carlos Melo e Jânua Munhoz acompanharam os jovens no dia a dia da pesquisa.

Além disso, os estagiários foram à Prefeitura para entender melhor o Plano Diretor Municipal, participaram de reuniões locais sobre o tema e discutiram em grupos o que observavam no cotidiano e nos documentos públicos.

6 - Terras caídas: fenômeno pelo qual as águas do rio Amazonas atingem as margens e as derrubam. Na década de 1980, na entrada da cidade foram destruídas dezenas plantações, casas residenciais e comerciais.

Discussões na equipe de Educação Patrimonial sobre os diversos temas, ano de 2009.

Dinâmicas para integração dos grupos, ano de 2010.

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A partir das discussões, reunindo os conhecimentos teóricos e relacionando-os à vivência dos estagiários, pôde-se definir a área a ser pesquisada, que ficou restrita inicialmente à área central mais antiga, uma vez que, este recorte espacial daria possibilidades de se conhecer pessoas de diversas idades que tinham causos para contar ou viveram o passado de Juruti. Posteriormente, optou-se em equipe por ampliar a pesquisa para o Bairro Bom Pastor e incluir três ruas do Bairro Palmeiras, àquelas que iniciam na beira do rio Amazonas, para ter todos os logradouros da frente da cidade com algum registro.

Os estagiários reuniram-se para estabelecer estratégias de direcionamento e organização da pesquisa, pré-definindo ruas e travessas a serem percorridas por cada equipe nos turnos da manhã e tarde, bem como a função de membros de cada equipe na execução dos trabalhos diários e para compartilhar novas informações.

Inicialmente, a área de atuação de cada grupo se deu no sentido centro-sul e centro-norte da região central da sede municipal e manteve a mesma ordem na expansão da pesquisa.

Apresentação sobre o projeto Memórias de Rua, na Praça da República, em Juruti, ano de 2011,

com estagiários dos anos anteriores.

Identificação dos bens patrimoniais edificados no Bairro Palmeiras, em 2013.

Formação prática, ano de 2012, visita ao sítio arqueológico do Maracaçu, em Juruti.

Entrevista com senhor Rosemiro Silva, em 2014.

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Para a realização dos trabalhos em campo, os estagiários fizeram uma sondagem em cada rua, contando com os próprios conhecimentos, formados no dia a dia de vivência no município. Depois, passaram a realizar saídas diárias às ruas para identificar pessoas, realizar as entrevistas, coletar informações sobre os topônimos e fotografar moradores, ruas, residências, móveis antigos e objetos que expressavam relação com a história de uma rua ou dos moradores.

Os entrevistados eram escolhidos pelo tempo de residência, pela indicação de outros moradores ou mesmo pela relação de parentesco ou amizade com a personalidade histórica que nomeia alguma rua.

Para as entrevistas, os jovens produziram, com auxílio da equipe, uma lista de perguntas de interesse, para que pudessem guiar a pesquisa, e assim levar uma estrutura de perguntas, que poderia ser alterada dependendo do caso. Assim todos ficariam seguros e teria uma unidade nas perguntas feitas aos moradores.

Por vezes, os entrevistados recebiam os jovens com uma pequena resistência. Os pesquisadores explicavam o interesse e o trabalho de pesquisa, passo fundamental para que todos os moradores se interessassem e se sentissem à vontade para colaborar, contando tudo o que sabiam.

Realização das entrevistas. Idosos recebem os jovens em suas residências.

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Neste projeto, o que se percebeu é que, após as entrevistas, as barreiras de idade e tempo foram ultrapassadas, criando vínculos de amizade e respeito entre os jovens e os idosos. Essa relação tem despertado nos jovens o sentimento de apropriação da história e dos patrimônios de seu município, garantindo assim a valorização e a preservação da cultura local.

Durante as entrevistas, os estagiários dialogaram, gravaram os depoimentos, fotografaram e coletaram registros antigos como: fotos, jornais, revistas ou documentos.

É fundamental ter essas informações anotadas, pois, por não existir registro escrito com detalhes da história de Juruti, muito ainda se encontra guardado na memória de seus habitantes mais antigos. Para que as perdas das histórias se tornem menores, com o passar das gerações, registrar mostra-se como um importante ato de valorização e preservação, não apenas por aqueles que viveram em um momento, mas pelas gerações que agora iniciam sua caminhada.

Realização das entrevistas. Idosos recebem os jovens em suas residências.

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Alguns desdobramentos da pesquisa

Em 2010, a equipe do Programa de Educação Patrimonial concorreu ao Prêmio Rodrigo Melo Franco de Andrade, organizado pelo Instituto Nacional do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – Iphan, e toda a pesquisa foi vista com bons olhos pela equipe do Instituto, conforme carta sequente.

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Em 2012, os estagiários da Scientia participaram do “I Congresso Pan-Amazônico” e do “VII Congresso da Região Norte de História Oral, História do Tempo Presente & Oralidades na Amazônia”, realizado de 27 a 30 de março na Universidade Federal do Pará – UFPA, em Belém. Os estagiários de Ensino Médio foram os mais jovens participantes do evento e apresentaram os resultados alcançados com a pesquisa.

Foi uma oportunidade de levar Juruti até a capital, mostrando a força jovem, e também foi bom momento para que pudessem conhecer a capital do Pará, e incluímos no passeio algumas visitas às ruas de Belém, com seus belos palacetes e casas antigas.

Jovens durante a apresentação no Seminário temático.

Jovens Valderjon, Hristo, Dean e Reinaldo, com os mediadores da mesa: Dr. Antônio Clarindo

Barbosa de Souza (UFCG-PB) e Ma. Venize Nazaré Ramos Rodrigues (UEPA).

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Para tentar concluir...

Essa pesquisa perdurou por quase sete anos, e foi uma experiência única para mim, tanto pelas emoções que despertou quanto pelas diversas instruções que recebi da comunidade. Pode parecer um pouco demagógico escrever estas linhas, mas posso garantir a todos que Juruti fez meu mundo se expandir: foi aqui que conheci a Amazônia e essa experiência me fez ter outros pontos de vista, que sequer teria imaginado sem a ajuda de Juruti. Aprendi palavras novas, que hoje uso em meu dia a dia, agora em Belo Horizonte, e tenho que explicar a todos o que significam; aprendi a me interessar pelas histórias dos narradores locais, são histórias incríveis que mostram toda a inventividade do povo local. Aprendi sobre um povo forte, sobre sua labuta, suas angústias e alegrias.

Neste momento, seguirei por outros caminhos em busca de mais estudo e é também minha despedida deste Programa, mas meu coração e minha mente terão sempre Juruti e os grandes amigos que fiz por lá, que me ensinaram sobre a Amazônia.

Espero que todos os participantes desta pesquisa gostem do texto, pois ele nos enche de alegria, por ser fruto do esforço de jovens locais, “minhocas da terra”, que trabalharam com afinco para narrar da melhor maneira as histórias compartilhadas. Durante os anos, os vi chegarem animados, sorrindo, e também angustiados e algumas vezes com os olhos cheios de lágrimas. A pesquisa os emocionou de várias formas, fez com que ficassem encantados com tudo que sabiam por informações de alguém, saber sobre o passado era interessante para eles, e alguns aspectos da vida local, como a tragédia das terras caídas na década de 1980, os consternou. O interesse sobre os Encomendadores de Alma também foi genuíno e ainda hoje alguns jovens frequentam essas manifestações católicas, e todos tratam com distinção seus penitentes. Certamente estes adolescentes pensam, lutam e desejam uma Juruti realmente sustentável, e muitos deles estão sempre em reuniões públicas, debatendo suas ideias, e isso mostra que auxiliamos, como equipe, na formação dessas novas lideranças, e isso nos alegra profundamente.

Na minha interação com os jovens, sendo eu alguém de fora da comunidade, percebi claramente o aumento da autoestima, a valorização da identidade local, o interesse renovado pela cidade. As descobertas sobre a cidade alteraram o ponto de vista de cada um destes jovens. Hoje, todos se destacam na comunidade de alguma forma, tomando para sua responsabilidade a construção da cidade que se deseja. Muitos deles se tornaram lideranças na vida política em diferentes esferas, e é possível encontrá-los defendendo suas próprias ideias em alguma assembleia de debates e também nas redes sociais.

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Outros são atuantes na vida cultural da cidade, nas fanfarras e no Festribal, por exemplo, tocam e dançam em diferentes desfiles cívicos e ensinam aos mais novos uma dança ou instrumento musical. Outros são educadores (de Educação Infantil e Fundamental, de Música) e outros são estudantes de algum curso superior (Direito, Arquitetura, Psicologia, Medicina, Relações Internacionais, dentre outros). Muitos deles trabalham para ajudar os pais, outros já formaram suas próprias famílias e labutam para criar a prole de forma adequada, com atenção e responsabilidade. Todos que encontram comigo sempre afirmam que a participação na pesquisa foi importante para suas vidas de forma geral, os familiares e entrevistados compartilham desta opinião.

Gostaria de aproveitar para agradecer a Juruti por ter me abrigado por todo esse tempo e espero revê-la em breve. Agradeço a todos pelas inúmeras histórias que escutei desses narradores locais. A entrega do certificado de participação é uma pequena mostra do profundo respeito que toda equipe tem pelo conhecimento de vocês! Que novas histórias e saberes possam ser divulgados, pois encantarão a todos, como fez comigo!

Senhor Nino Guimarães e senhora Maria Brito, receberam o certificado de participação no projeto, em 2014.

Lílian Panachuk

Coordenadora do Programa de Educação Patrimonial entre 2007 e 2015

Belo Horizonte, outubro de 2015.

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Este livro é um dos resultados de uma pesquisa de maior envergadura iniciada em 2002 e executada, em grande parte, pela Scientia Consultoria Científica para o licenciamento ambiental de responsabilidade da Alcoa World Alumina Ltda., em Juruti (PA). A Scientia participou de várias etapas do licenciamento ambiental: estudo de impacto ambiental (CNEC, 2002), execução de prospecções intensivas (CALDARELLI, 2003), resgate arqueológico e estudo tecnológico do material identificado (CALDARELLI e PANACHUK, 2007, 2008, 2008a), e ainda hoje desenvolve processos de educação patrimonial no município (CALDARELLI E PANACHUK 2008b, 2009a, 2009b, 2010a, 2010b, 2011a, 2011b, 2012a, 2012b, 2013a, 2013b, 2014, 2015). Além da Scientia, pesquisadores do Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG) realizaram pesquisas para o empreendimento durante o processo de licenciamento ambiental da área prevista para o porto (BUENO e MACHADO, 2005), com identificação de sítios arqueológicos que foram escavados posteriormente pela Scientia (2007, 2008, 2008a), o que incluiu a análise tecnológica dos bens encontrados.

A região tem uma história bastante antiga, com expressiva ocupação indígena, bem antes de qualquer europeu chegar por essas terras. Os estudos arqueológicos realizados pela Scientia Consultoria e pelo Museu Paraense Emílio Goeldi, para o licenciamento ambiental da área da Mina de Juruti, resultaram em mais de 70 locais de antigas moradias ou áreas de atividades diferentes, que chamamos de sítios arqueológicos, cujos relatórios foram entregues ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) de Belém, conforme indicado acima. A maioria dos sítios conta a história mais antiga, uma história longa, do passado que não está na nossa memória individual, mas na memória dos objetos e na paisagem. Esses dados estão apresentados com maior profundidade em outros dois volumes que, juntamente com este, Memórias de Rua, formarão um conjunto.

Apresentação

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No livro aqui apresentado, focalizaremos na história dos limites territoriais do que se tornou o município de Juruti, localizado no extremo oeste do estado do Pará, delimitado pelos municípios de Aveiro, Santarém, Óbidos e Oriximiná, pertencentes ao estado do Pará, além de Nhamundá e Parintins, pertencentes ao Amazonas. As fontes utilizadas são os documentos escritos, os mapas, os registros da formação do município e de suas ruas, os registros antigos que podem inclusive ser observados na Internet. Algumas dessas histórias o povo de Juruti conhece bem, foram repassadas pelas antigas gerações, e ainda hoje todos as mantêm “na ponta da língua”. Talvez, exista ainda mais um pouco de história nesses documentos, que esperam por serem revistos.

Os primeiros registros conhecidos sobre Juruti

O primeiro registro escrito conhecido sobre o hoje município de Juruti foi feito pela Comissão Demarcadora de Limites durante o período pombalino, no ano de 1768. José Monteiro de Noronha (2006:40) descreveu o itinerário da região que percorreu

Da boca inferior do rio Nhamundá deve-se procurar outra vez a margem austral do rio Amazonas para fugir do caldeirão que fica junto à boca superior. E continuar-se-á a viagem até o sítio chamado Maracauaçu-tapera, que dista mais seis léguas e serve de limite às duas capitanias ao sul do rio Amazonas. De Maracauaçu-tapera seguir-se-á viagem pela mesma costa do Sul até o primeiro furo do rio Tupinambaranas, superior quatro léguas.

Antônio Porro argumentou (2006:81) que o local seria a ilha defronte à cidade de Juruti, chamada hoje de Maracaçu. Algumas representações cartográficas do final do século XVIII e do século XIX apoiam esta visão. Mas é importante perceber que Maracauaçu-tapera era então o limite entre duas capitanias, Santa Maria do Grão Pará e São José do Rio Negro; Juruti é um dos municípios limites entre os atuais estados do Pará e Amazonas.

No mapa de autoria de José Joaquim Vitório da Costa (18--?), efetivada durante viagens entre 1780 e 1789, há uma parada designada como Caraucú assú. Em local próximo, foi possível verificar Maraca aquaco na carta de Jean Baptiste Anville (1779), e ainda a grafia Cararaúcú na “Carta geografica da capitania de Mato Grosso” (1800). No “Mapa geographico do Rio das Amazonas e do Rio Negro” (18--?) foi registrado como Maracaçu Tapera, na carta de Adrien Brué (1826) foi grafado como Marura assu, já no mapa de Villas Boas (1841) o local foi chamado apenas de Tapera. Na carta do Visconde Villiers de L’Ile (1852) o local foi nomeado como Maracuaçutapera, e na carta de Serra

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(1852) o sítio foi chamado de Ponta de Curaraucu. Provavelmente seja o local até hoje conhecido como Maracaçu, na porção nordeste da malha urbana da sede do município, que inclui uma ilha e o outeiro defronte.

Detalhe de carta de autoria de José Joaquim Vitório da Costa (18--?), efetivada com viagens feitas entre 1780 e 1789.

http://objdigital.bn.br/objdigital2/acervo_digital/div_cartografia/cart525845/cart525845.html

Detalhe do mapa de Anville (1779). http://objdigital.bn.br/acervo_digital/div_cartografia/cart389309.htm

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Em 1795, na região do atual município de Juruti houve uma rebelião dos Mundurucu que se deslocavam para leste desde o rio Madeira (CERQUEIRA E SILVA, 1833). Esses indígenas foram aldeados em 1818 na região conhecida como Juruti Velho, na missão de Juruty, paróquia de Nossa Senhora da Saúde; lá, os indígenas introduziram o cultivo do guaraná, produto a partir de então explorado pelos jesuítas (FERREIRA PENNA, 1869:46). Essa passagem histórica é bem conhecida pelos munícipes, especialmente por conta da festa local, o Festribal, na qual duas tribos folclóricas competem entre si, os Mundurucu e os Muirapinima.

No início do século XIX, o sistema colonial português estimulava a produção de gêneros diversos na região amazônica, entre eles a borracha, o pau-cravo, o guaraná, a baunilha, o anil. A partir da Abertura dos Portos (1808) e das migrações de judeus do Marrocos para o interior da Amazônia, a partir de 1810 modificou-se o cenário regional e local, especialmente nas atividades ligadas ao comércio: a figura do regatão rompeu o predomínio comercial português e nordestino, aviador e seringalista (BENCHIMOL, 2008:85). Até hoje na comunidade jurutiense, alguns sobrenomes indicam a história dessas migrações: Hamoy/Amoy, Cohen, Belicha, Benithar/Benitah.

Através dos relatos de Ferreira Penna (1869:109-110), registramos, já no período do Império Brasileiro, a presença do Pesqueiro Real, construído na Villa Franca, na enseada do Jacaré, atualmente pertencente ao município de Juruti. Aponta o autor que em 1830, o conjunto construído nessas áreas de pesca estava cotado entre os bens públicos, mas o desgaste intenso fez as construções se desintegrarem até dez anos depois.

Em 1832, o então Lugar de Juruty, recebeu um ilustre fugitivo da milícia, o cônego Batista Campos, importante membro articulador do que foi chamado de “Movimento da Cabanagem” (RAIOL, 1868:102). A movimentação política era flagrante em toda a região, como se observa nas entrelinhas do documento presidencial sequente:

Officio do prezidente do Pará ao ministro do império, de 25 de fevereiro de 1832:

Illmº e Exmº Sr. – na presente occasião nada de notável occorre na província que possa communicar à V. Exc, senão que o Arcipreste Campos, refugiando-se no lugar de Juruty, destricto da Villa de Faro, que tem conseguido fazer-se reconhecer Vice-Prezidente da Provincia pelas Câmaras de Faro, Óbidos e Alter do Chão, villas situadas nas margens do Amazonas. Este iníquo homem, não obstante estar pronunciado em uma devasa, a que procedeu pelos acontecimentos e 2 de Junho do anno

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passado, não desiste da empreza de levar avante os seus planos ambiciosos e anarchicos.

Participo à V. Exc. que aqui chegaram no dia 23 o Prezidente e o Commandante Militar para esta Provincia e tomaram posse na conformidade das Imperiais Ordens no dia 27. O povo está satisfeito e tranqüilo com a nomeação e chegada de tão conspícuos Empregados.

Deus Guarde a V. Exc. – Pará 25 de Fevereiro de 1832. _ Illmº Exmº Sr. José Lino Coutinho, Ministro e Secretario de Estado dos Negócios do Império. – Marcellino José Cardozo.

Em 1883, a então Villa de Juruty foi elevada à categoria de município (IBGE, 2010; SEPOF, 2008) e esta é a data oficial do aniversário da cidade, que conta hoje com 133 anos, marcando, pois, sua configuração como município, ainda com a sede urbana na região conhecida hoje como Juruti Velho, vizinha à Serra dos Parintins. Em 1884, apareceu nos documentos públicos a paragem de Maracauassú-tapera, margem direita do rio Amazonas, em frente à ilha de Santa Rita; esse registro indica a mudança da localização da sede urbana de Juruti Velho para Juruti Novo, distrito cuja população total seria de 1.687 pessoas, e cujo centro contaria com cerca de 150 moradores, 12 casas, duas escolas, seis casas de comércio além de Paço Municipal e igreja coberta de palha (Diário de Noticias, 1884:67).

É possível que tenhamos identificado o local, pela comparação entre as informações obtidas com os educadores e moradores entrevistados, e os documentos de época: a antiga igreja, descrita sumariamente no documento citado, corresponderia às ruínas de edificação e de mausoléus ainda existentes. Este local é conhecido como Maracaçu, nome não somente da ilha, mas também de uma região mais a nordeste, às margens do rio Amazonas. Trata-se de um outeiro, elevado, que durante o inverno mantém o topo a salvo das águas que tomam sua base. Existem fotos de alguns anos atrás com a frente da construção totalmente intacta, mas não foi possível identificar o seu possuidor.

O século XX viu surgir no cenário econômico o uso do pau-rosa na indústria da perfumaria. Em 1925, a exportação de óleo essencial produzido em Juruti Velho chegou a 16 toneladas (FERRAZ ET AL, 2009). No ano anterior, já quase 80% da receita de Juruti vinha da exportação deste produto (Ministério da Agricultura, Indústria e Commercio, 1926:122). A Usina de Pau-Rosa foi identificada como sítio arqueológico pela equipe da Scientia e nomeado Pacoval Usina. No local foram identificadas, dentre outros implementos, carcaças

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de veículos automotivos e caminhões, máquina a vapor da Arnold Jung Lokomotivfabrik GmbH, Jungenthal, empresa alemã – que fornecia pressão de 200 libras para o funcionamento do triturador, da serra e do tanque de destilação produzidas pela empresa The James Leffel & Co., indústria norte-americana de Ohio. Ainda existem na comunidade antigos trabalhadores e empreendedores de óleos essenciais, como o Senhor Raimundo Marinalva, que concedeu entrevista para os jovens pesquisadores da Scientia contando como era a vida naquele período.

Durante o século XX, a renda do município era obtida da extração da juta e de algum gado; neste cenário foi criada, em 1947, a agremiação Boi Campineiro, pelo senhor Nino Guimarães – associação folclórica que está na origem do grande Festival das Tribos, um duelo de dança e música entre duas “tribos”, Mundurucu e Muirapinima, conforme ele mesmo narrou em entrevista à nossa equipe. Este período é bem conhecido pelos pioneiros da atual sede urbana de Juruti.

Os dados apontados acima não são exaustivos, mas servem para demonstrar que a região entre o rio Juruti e a angustura [passagem] de Óbidos era relativamente descrita, e já ocupada pelas indústrias coloniais desde meados do século XVIII, e foi cenário de importantes transformações socioeconômicas nos séculos XIX e XX.

O licenciamento ambiental e os indicadores socioeconômicos

O século XXI trouxe uma grande mudança na organização da cidade com a exploração minerária da bauxita capitaneada pela Alcoa. Uma das diferenças entre os ciclos econômicos anteriores e este da mineração é a existência das pesquisas relativas ao meio ambiente definidas pela legislação brasileira: o licenciamento ambiental, um instrumento de caráter preventivo, composto por etapas encadeadas, o que lhe atribui a condição de procedimento administrativo (FIORILLO, 2012:223). Desde sua implementação no Brasil, na década de 1980, até hoje, o cenário modificou-se bastante (SÁNCHEZ, 2008). Embora este tema não seja nosso objetivo específico, é impossível nos desvincularmos dele, pois constitui o contexto de nossa ação, a arqueologia preventiva.

O processo de execução do licenciamento ambiental tem sido amplamente questionado por agentes econômicos, representantes políticos, pela sociedade civil, pelos próprios órgãos governamentais (Fiorillo, Morita, Ferreira, 2011:193), além de grupos de pesquisas ligados à universidade (ZHOURI, 2011, Painel de Especialistas em Belo Monte, dentre outros). Muitos são os desafios ligados ao licenciamento ambiental, que aciona diferentes coletivos, com distintos interesses.

Em Juruti, com o processo de exploração da bauxita, uma série de transformações, positivas e negativas, ocorreu no município entre

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2000 e 2010: aumento da população em mais de 34%, aumento da malha urbana, o número de carros cresceu, bem como a quantidade de lixo produzido, mas também a escolaridade dos educadores sofreu incremento, o acesso à saúde aumentou e houve redução da mortalidade infantil (FGV, 2011). Modificações positivas e negativas podem ser vistas em Juruti, algumas causadas pela obra, outras intensificadas por ela.

Alguns caminhos escolhidos pela Alcoa para a condução do processo de licenciamento ambiental se constituíram como importantes instrumentos para a própria comunidade. A criação e estruturação de um espaço de diálogo, nomeado Conselho Juruti Sustentável (CONJUS), estruturado nos moldes da Agenda 21 Local, foi inovador e teve como consequência a maior participação e organização política da comunidade. Este coletivo formado pelo Conselho Consultivo, a Secretaria Executiva e as Câmaras Técnicas, deliberam as ações consideradas prioritárias para o incremento da qualidade de vida no município a serem beneficiadas pelo Fundo Juruti Sustentável (MONZONI ET AL, 2008). Para a gestão desta estrutura, houve a criação de um fundo financeiro, chamado Fundo Juruti Sustentável (FUNJUS), para sustentar o espeço de diálogo e implementar as medidas propostas pela assembleia. Ao mesmo tempo, uma equipe da Fundação Getúlio Vargas conduz pesquisa dos indicadores socioeconômicos de Juruti, utilizando a participação popular como metodologia de ação, objetivando traçar o perfil do município e ser um instrumento para a política pública local.

No final do ano de 2013, foi deliberado no colegiado do FUNJUS a internalização da ferramenta no território de Juruti. Uma das estratégias defendida foi a integração ao CONJUS, que já possui personalidade jurídica. Uma série de reuniões foi realizada, visando estabelecer acordos sobre o funcionamento dessa integração não se tratando apenas de uma incorporação, mas também da alteração do estatuto do CONJUS, com a pactuação de novas estruturas de governança e atribuições. Assim, a proposta do Instituto Juruti Sustentável – IJUS passou em 2015 a integrar as duas instâncias em uma única instituição, com a missão de contribuir com a construção de uma Juruti mais sustentável e estruturada para servir melhor a população.

Neste sentido, a proposta é a própria execução da Agenda 21 Local, ao “criar um espaço institucional formal para o processo de planejamento e diálogo intersetorial de longo prazo, em contínua revisão e aplicação” (MONZONI ET AL, 2008:85).

O intenso diálogo entre as partes tiveram como consequência, por exemplo, a concessão pelo INCRA do CCDRU - Contrato de Concessão do Direito Real de Uso à Associação das Comunidades da Região

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de Juruti Velho (ACORJUVE) – na participação de 1,5% dos lucros da mineradora de Juruti, resultado inédito no Brasil.

Essa arena de debates, criada pelo empreendedor, é um espaço que realmente possibilita o empoderamento da comunidade, e ajuda a criar brechas favoráveis à comunidade neste emaranhado de interesses que o campo ambiental sustenta. Isto porque a maior representatividade do conselho é da sociedade civil organizada.

Educação Patrimonial em Juruti

O Programa de Educação Patrimonial de Juruti configura-se em uma proposta educativa continuada – dentro das limitações da arqueologia preventiva, completou em 2015 seu oitavo ano de ação –, pois o objetivo maior é que a comunidade continue este processo, inserido na dinâmica social do município e de suas vicissitudes históricas. Ao iniciar o programa, em setembro de 2007, foi (e ainda é) preciso conhecer continuamente o território em uma perspectiva integral e incluir os saberes da família e da comunidade, agregando-os aos diversos campos do conhecimento que se pretende tratar (CENPEC, 2011:44), portanto, focamos o pertencimento territorial e a herança cultural local (HORTA, GRUNBERG, MONTEIRO, 1999). Esse processo continuado deve

primar pela construção coletiva e democrática do conhecimento, por meio do diálogo permanente entre os agentes culturais e sociais e pela participação efetiva das comunidades detentoras e produtoras das referências culturais (IPHAN, 2014:19).

Tudo isto permite, finalmente, desenvolver valores e atitudes que se desejam democráticas, éticas e cidadãs (DEWEY, 1979; CENPEC, 2011).

Para executar a proposta de diálogo realmente multivocal, que desde o início nos propusemos, é necessário estar presente na comunidade por períodos frequentes. As ciências aplicadas pressupõem o tempo para observar, compartilhar intenções, construir em conjunto, aplicar, avaliar os resultados e propor mudanças a fim de experimentar novas hipóteses de trabalho (BASTIDE, 1979:158; CENPEC, 2011). É necessário contar com tempo para percorrer esse caminho, é preciso ter tempo, é preciso também estar lá (GEERTZ, 2001).

O tempo, seu ritmo e duração são construídos socialmente (Bergson, 1988), variam de acordo com a ação e o significado (BOSI, 2004:418). Para entender as vicissitudes do tempo, é necessário negociar o ponto de vista (Bosi, 2004), admirar o outro no sentido de adentrar no que é olhado (FREIRE, 1979:23).

O tempo e o ritmo das organizações civis são completamente

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diferentes do tempo e do ritmo das organizações industriais produtivas, como a mineração. Está aí outro desafio. É preciso então, articular o tempo e seu ritmo com a construção democrática e multivocal que se pretende, mediando o processo para aproximá-lo da simetria.

A participação da comunidade local nas reuniões diversas decorrentes do contexto em que ocorre a exploração de bauxita pode ser entendida, de acordo com Viveiros de Castro & Andrade (1988), como uma falsa participação. Isso porque existe um problema de simetria na medida em que a participação ocorre depois de deliberada a ação (Baines, 2000), no caso, a própria exploração dos recursos. A licença ambiental é um ato com discricionariedade sui generis, pois o estudo ambiental é amplo e sujeito a interpretações, sendo possível a concessão da licença mesmo quando o estudo de impacto é desfavorável (FIORILLO, 2012:223-224).

Conhecer o pessoal e “fincar o pé”

O primeiro momento da equipe de educação patrimonial em Juruti, em setembro de 2007, se deu em uma reunião pública promovida pelo empreendedor, com o objetivo principal de expor cada um dos 35 programas que estavam em curso (com graus diferentes de implementação no município) e debater tais questões dentro de grupos temáticos. Cada um dos oito grupos temáticos comportou representantes de diversas organizações civis, das três esferas de governança e de empresas privadas. Esta estrutura de reunião fez aproximar as partes por afinidade temática, e nos permitiu a todos conhecer potenciais parceiros de debates e ações.

Essa foi, portanto, a primeira apresentação formal do Programa de Educação Patrimonial à comunidade, aos demais técnicos do licenciamento ambiental e aos órgãos públicos ali representados. Durante o evento, muitos moradores de Juruti vieram nos contar sobre algum sítio arqueológico conhecido, sobre “terra preta”, “caretinhas”. Foi também um momento delicado, tenso e com aproximações e conflitos neste campo local. A comunidade local me pareceu, desde o primeiro momento, muito atenta em todas as entrelinhas. Nascia aí uma arena para o exercício coletivo do diálogo, do debate, do conflito, das trocas e da negociação.

Já em 2008, tratamos de “fincar o pé na comunidade” já que a proposta de discussões e de construção coletiva de um conselho local, inspirado nas estratégias esboçadas na Agenda 21 Local, seria uma experiência fundamental e absorveria tempo. Para cumprir o compromisso de participar das reuniões comunitárias, seria necessária uma dedicação de tempo considerável em Juruti.

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O tempo - tanto o cronológico quanto o social - tornou-se, então, alvo de nossas preocupações. Foi preciso formar a equipe, comparecer às reuniões, entender o município, através de dados estatísticos e outros mais; entender como a comunidade sentia as mudanças, entender os mecanismos de ação e organização da sociedade jurutiense, conhecer as escolas e seus protocolos. As durações destes processos são subjetivas e difíceis de prever.

No final de 2008, escolhemos uma casa local para comportar o escritório da Scientia na sede urbana do município de Juruti, tarefa árdua, pois a edificação comunica informações (DESVALLÉES & MAIRESSE, 2010). Nossa sede localizava-se então no bairro Maracanã, no limite entre os bairros Centro e Bom Pastor, formada por construção principal de dois pisos e uma peça de um piso nos fundos do terreno, além de uma área livre no entorno da peça principal. Foi preciso adaptar a construção às necessidades do projeto, sem qualquer reforma. Vale dizer que no início de nossa instalação na casa, no final de 2008, a edificação destoava das demais, majoritariamente de um piso, de adobe ou pau a pique, com raras casas de alvenaria, a nossa entre elas. Hoje, a diferença não existe, no começo essa edificação intimidava alguns, mas aos poucos, conseguimos atrair a comunidade. Afinal, ter um espaço nos permitiu existir para a comunidade, de forma contínua durante os anos, e compor uma equipe majoritariamente com membros da comunidade. Isto nos avalizou com as famílias e permitiu abarcar o público mais jovem, que não conta com muitos espaços que valorizem a cultura e o lazer dedicados a eles.

Ações de ensino e pesquisa

Ao longo dos anos, trabalhamos em parceria com diferentes agentes sociais e culturais do município, falaremos um pouco sobre o processo envolvendo os educadores, os artistas e a equipe local para apresentar os resultados alcançados.

Com os educadores, o plano foi trabalhar continuamente entre 2008 e 2012, pois havia uma curiosidade genuína sobre o patrimônio arqueológico, todos queriam falar sobre sua terra, “seu chão”, mostrar que eram “filhos da terra”, e todo o nosso discurso sobre o patrimônio arqueológico, a ocupação antiga de território, tudo isto era (e ainda é) de interesse da comunidade. Trabalhar com os educadores da zona urbana e da zona rural nos permitiu conhecer a realidade escolar e entender sobre os patrimônios de interesse das comunidades, fortalecer as trocas de saber, conhecer a comunidade através dos formadores de opinião. Durante as nossas interações, produzimos e analisamos diferentes indicadores sobre o patrimônio cultural, a fim de entender e utilizar o conhecimento do educador, assim tendo nossas práticas corroboradas pela comunidade.

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Certamente, os resultados positivos desta interação nos abriram muitas portas e, como consequência, começaram a contar com a nossa equipe para muitos eventos culturais na cidade e no campo, e ainda hoje existe tal parceria com as escolas. O trabalho com os educadores foi construído em quatro anos, e culminou com o desenvolvimento de um projeto com a temática do patrimônio cultural, proposta desenvolvida pelos professores em suas respectivas instituições de ensino, para a implementação por eles no contexto escolar. Muitas boas ideias foram desenvolvidas pelos professores, alguns destes projetos tomaram conta das comunidades da zona rural, como a “Arqueologia da Comunidade” desenvolvida em Araçá Preto na Escola Delfino Pereira pela Professora Maria Pereira (em memória) e equipe. Na zona urbana, boas práticas escolares também conseguiram envolver a comunidade de pais e alunos do 9º ano com o projeto “Juri Simulado” desenvolvido pelo professor Robenildo Pimentel, docente de História na Escola Nossa Senhora da Saúde.

Ao longo dos anos, trabalhando com os educadores preconizamos o diálogo franco, discutindo sobre licenciamento ambiental e seus impactos, o patrimônio cultural e sua legislação específica, dentre outros assuntos organizados durante a formação. Essa forma de conduzir permitiu uma parceria intensa, deflagrada no uso do escritório da Scientia em Juruti pelos professores: solicitando empréstimos de materiais de apoio (como réplicas arqueológicas de cerâmica, cartazes explicativos, livros, filmes, músicas, dentre outros), recursos materiais (lupa binocular, globo terrestre, equipamento eletroeletrônico) e recursos humanos (nossos técnicos, pessoas locais interessadas em debater sobre seu próprio patrimônio).

A ação com os artistas começou em 2008, quando, em conjunto, traçamos cada item do que seria feito pela equipe da Scientia e as associações comunitárias envolvidas. As negociações foram intensas, os debates foram importantes para que, aos poucos, cada uma das equipes se conhecesse melhor.

Trabalhar com os ceramistas locais nos permitiu debates intensos sobre a técnica produtiva da olaria, limites e implicações da arqueologia, sobre o licenciamento ambiental, os resultados da análise do material Pocó e Konduri, dentre outros. O objetivo era a produção de réplicas arqueológicas e objetos com inspiração em objetos arqueológicos, já que havia também para eles um interesse e grande conhecimento geral sobre os artefatos. Investimos um ano no diálogo com os artistas, costurando um curso que fosse satisfatório para as partes, o que ocorreu nos anos de 2009 e 2010. Essa ação permitiu não somente o incremento da renda da Associação de Artesãos do Município de Juruti (AMJU), como nos conectou também com a Associação de Mulheres Trabalhadoras do Município de Juruti (AMTJU), e expandiu nossa ação com os artistas para a zona rural. Em ambas as associações existem ceramistas experientes, então foi possível somar conhecimentos e realizar a formação com eles. Ainda hoje, há produção de

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peças com inspiração arqueológica, e muitas novas oleiras surgiram, bem como uma nova geração de artistas começa a despontar.

As peças criadas pelos artistas têm alta qualidade técnica, potencial de venda e são comercializadas em Juruti ainda hoje. Para compartilhar alguns resultados (figura sequente), apresentaremos uma peça feita pela experiente oleira Dona Hortência, e outra pela talentosa artista Dona Valdéia, que fazia então sua primeira peça de cerâmica, mas é versada em outras artes plásticas.

A formação de uma equipe local nos permitiu amadurecer como grupo e dividir a responsabilidade da concepção e execução de cada atividade do projeto, especialmente pela participação desde o início do projeto do educador João Carlos Melo – figura desde sempre ligada ao cenário cultural da cidade (como ele diz “está no DNA”, já que é neto de senhor Nino Guimarães, idealizador do Boi Campineiro, citado anteriormente).

A composição de um corpo técnico local nos deixou incluir em nossa equipe jovens de Ensino Médio da rede pública, a fim de apoiar a formação local e atrair os jovens para as questões do patrimônio cultural. Para escolher o tema gerador da pesquisa que os jovens iriam desenvolver, conversamos com muitos interlocutores, em especial os educadores. Muitos apontavam para a belicosidade entre gerações expressa em conflitos em sala de Educação de Jovens e Adultos como um problema a ser enfrentado, a preocupação de que as mudanças abruptas causassem um estranhamento sobre a identidade cultural para estes jovens, desconhecimento sobre a história recente de Juruti. Tendo estas pertinentes questões como pano de fundo, nossa equipe desenhou o projeto de estágio que foi nomeado “Memórias de Rua”, cujo tema gerador é ainda hoje os logradouros da parte mais antiga da cidade, abrangendo três bairros – Centro, Bom Pastor e Palmeiras.

Algumas das primeiras peças feitas em 2009 por Dona Hortência (esquerda) e por Dona Valdéia (direita). Em ambos os casos, alta qualidade técnica.

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A malha urbana da cidade mudou completamente nos últimos dez anos (entre 2000 e 2010), com aumento em mais de 30%; a população do município aumentou em 50%, e muitas outras grandes alterações socioeconômicas foram vivenciadas por todos nós. Muitas variáveis foram medidas como indicadores sociais pela equipe da Fundação Getúlio Vargas (FGV, 2011). Todos estes resultados de pesquisa nos fizeram ponderar no sentido da implementação de um estudo sobre as ruas, arena cotidiana da mudança, que permite múltiplos olhares, que integra o velho e o moço, que é resiliente e abarca as mudanças e as continuidades concomitantemente. Concordamos, em equipe, que seria um grande aprendizado a todos utilizar a metodologia da história oral, e fazer relacionar as gerações através de um tema que encanta a todo jurutiense, sua própria terra, seu território. Os jovens estagiários de Ensino Médio foram então nossos grandes parceiros, com o entusiasmo que lhes é peculiar. Desde o final de 2009 até hoje, compuseram nossa equipe local, como estagiários, 40 jovens de Ensino Médio remunerados para desenvolver a pesquisa intitulada “Memórias de Rua”. Cada candidato foi selecionado através de uma série de atividades ordenadas, com duração de três dias, para podermos conhecer os candidatos em curto espaço de tempo (alguns de fato conhecíamos de outros encontros, e João Carlos sempre conhece a todos), nestes dias realizamos trabalho em grupo, debatemos filmes, realizamos prova escrita através de interpretação de texto e entrevista. A presença dos jovens oxigenou ideias e propostas, trouxe novos caminhos para o programa.

Durante a pesquisa, os jovens selecionavam, através de critérios múltiplos, membros da comunidade que seriam entrevistados por conhecer sobre a história de constituição de certo logradouro, sua história real e também aquela fantástica. Ao longo dos anos, os jovens foram convidados ou indicados a marcar entrevistas com uma personalidade da cidade, e assim eles (e nós) foram conhecendo histórias que não conhecíamos, relacionando o acervo disponibilizado e produzindo históricos compostos das narrativas populares. Os jovens fizeram treinamentos e criaram um blog com alguns dos resultados da pesquisa, ele serviu para que jurutienses já não residentes no município fizessem contato, mandassem notícias, solicitassem explicações, e algumas mediações puderam ser feitas. Na medida em que pesquisavam, também apresentavam os resultados para a comunidade, especialmente nas escolas e em eventos da cidade.

Ao longo dos anos, do Programa de Educação Patrimonial de Juruti mais de 1.600 agentes sociais, culturais, educacionais desenvolveram conosco alguma atividade de pesquisa: oferecemos cursos de formação a professores e a ceramistas, nas zonas urbana e rural; estágios de formação e atividades de pesquisa para colaboradores e estagiários

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residentes na zona urbana; e contatamos os entrevistados no projeto Memórias de Rua na área central da sede municipal.

Ações sociais e culturais

As reuniões constantes nos fizeram conhecer rapidamente um grande número de pessoas, representantes de organizações civis, órgãos públicos, dentre outros e, além disso, nos permitiu criar vínculos e parcerias com outros programas afins que estavam sendo executados, de forma a somar esforços. Nesta medida, várias ações de diversos programas deixaram de ser disciplinares para se embasarem de fato na interdisciplinaridade.

Ao longo dos anos, travamos forte parceria com os colegas do Projeto Clubinho da Tartaruga do Programa Quelônios da Amazônia/IBAMA. A parceria entre a educação ambiental (Ibama) e nosso programa decorre da reciprocidade temática, de um lado patrimônio natural, de outro patrimônio cultural; e das semelhanças metodológicas e teóricas. Conforme salientam Moraes (2006) e Bezerra (2010), essa é uma parceria que pode gerar bons resultados, desde que ambas as equipes percebam a integralidade entre ambiente e ser humano, tanto no presente quanto no passado. Neste caso, o entendimento das partes que o ambiente e a cultura se relacionam (é o que dizemos em nossos programas) deve reverberar na integração destas equipes, de um lado a educação patrimonial e de outro, a educação ambiental, para tratar desta integralidade do patrimônio junto com a comunidade.

Durante todos os anos, nossa equipe esteve presente em ações de grande alcance realizadas em parceria com órgãos públicos locais e com o empreendedor, e também promoveu diferentes eventos, tanto na zona urbana quanto na zona rural. Todos estes eventos foram importantes para a divulgação dos resultados da nossa pesquisa, mas foi a constituição de um espaço local que nos permitiu verdadeira integração, como residente.

A partir de 2009, efetivamos, em nosso escritório em Juruti, atividades lúdicas constantes ofertadas ao público infantojuvenil, com o nome “Navegar pelo Saber”. Trata-se de um conjunto de atividades pedagógicas sobre o patrimônio cultural, que foca o território local sem perder de vista a valorização, a diversidade cultural. Interessa nesta ação debater com as crianças e adolescentes sobre a vida em Juruti, utilizando diferentes recursos – livros, filmes, lupas binoculares, teatros, danças, mapas, globos terrestres. Ao longo dos anos, João Carlos, que é artista plástico e educador, criou diferentes brinquedos tendo como tema o patrimônio cultural de Juruti e entorno: dominós, quebra-cabeças, jogos de memória, personagens míticos e do folclore local, jogos de lendas, Boi Campineiro,

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dentre outros. Diversas gincanas culturais foram organizadas com a utilização de brinquedos idealizados e executados por João Carlos. As crianças (de todas as idades) se encantam com cada brinquedo, e como são mais valorizados, mais usados que os demais itens, e muito bem cuidados. Os pequenos apreciam a produção local, sabem que foi o professor quem fez, e se admiram em conhecer sobre a história local e do mundo. Gostam, como todos nós, de ver o seu próprio ponto de vista valorizado. Muitas crianças chamam nosso escritório de “Espaço da Criança” e é o que desenhamos em conjunto, um lugar para recebê-las de braços abertos.

O plano de atividades do “Navegar pelo Saber” de cada ano é feito com observância ao calendário de datas comemorativas do município, também utilizada no âmbito escolar, e escolhemos um tema por mês. Cada ação acontece pela manhã e pela tarde, com apoio dos estagiários e monitores, tem duas horas máximas de duração, é dividida entre as boas-vindas, debate sobre o tema, expressão individual ou em grupo, apresentação dos resultados e encerramento, por fim é servido um lanche para os participantes. Entre os anos de 2009 e 2013, realizamos 521 atendimentos como este, e participaram 8.342 “pequenos” jurutieneses nas ações do “Navegar pelo Saber”. O público infantojuvenil de hoje é o tomador de decisão de amanhã (VARINE, 2012:91) e é urgente propiciar espaços de lazer e cultura, de reflexão, escassos em todas as cidades do interior do Pará. Em Juruti, os indicadores socioeconômicos elencaram para 2010, no atributo chamado “equipamento cultural e esportivo” um total de 91 campos de futebol nas comunidades da zona rural, e para a zona urbana uma biblioteca pública, sete campos de futebol e quatro quadras poliesportivas (FGV, 2011:91). Imperativo é diminuir a desigualdade,

III Semana de Arqueologia, no Barracão Comunitário do Cristo Rei, 30/10/2013, João Carlos apresenta a Roda das Lendas.

Atividade elaborada e liderada por João Carlos, sobre as lendas locais e regionais.

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visível em outros parâmetros socioeconômicos coletados em Juruti (FGV, 2011).

Pudemos acompanhar adolescentes virando jovens adultos, e muitas são as histórias de vida nas quais estes mesmos jovens estão assumindo: postos de liderança na representação de associações civis locais, na vida acadêmica, na vida profissional e produtiva, como adultos democráticos, éticos, plenos de cidadania, e pensamos ter participação na construção destes valores e atitudes (DEWEY, 1979; CENPEC, 2011).

O nosso escritório local recebe constantemente visitas de professores – tanto para combinar eventos quanto para consultar nossa biblioteca; comunitários – com coleções arqueológicas para serem vistas, fotos de locais que são sítios arqueológicos, fotos de materiais cerâmicos; grupos de alunos – realizando pesquisa escolar e precisando de livros específicos, ou algum outro material de apoio. É um local onde os antigos colaboradores se sentem bem para retornar, e passam para “tomar um café”, “trocar um dedo de prosa”, contar de como vai a vida. Assim, é um local de atualizações sobre a história de vida de crianças, jovens e adultos, que entraram nesta ciranda em favor do patrimônio local.

No Programa de Educação Patrimonial em Juruti, entre 2008 e 2013, a equipe da Scientia atuou junto a 21.651 participantes em diferentes ações organizadas para diferentes públicos. Essa atuação consistiu, nas zonas urbana e rural, na participação em reuniões públicas, na promoção e na participação em eventos culturais e em ações com profissionais da Alcoa. Na zona urbana, consistiu no oferecimento das ações do Projeto Navegar pelo Saber e na recepção dos frequentadores da Casa da Scientia.

Um processo em movimento

Como mencionado, nestes anos de trabalho em Juruti, o Programa de Educação Patrimonial envolveu mais de 26.000 pessoas da cidade e do campo. Toda essa participação ocorreu pelo interesse da população pelo tema, e pela forma de trabalho assumido pela equipe: colaboradores residentes em Juruti, compartilhar de intenções, construções coletivas das propostas desenvolvidas com instituições e parceiros diversos.

Outra mostra do interesse da comunidade pelo programa foi expressa nas participações voluntárias e nas solicitações de entrevistas que nossos jovens estagiários receberam ao longo do estudo “Memórias de Rua”. Quase 200 entrevistas com 122 atores locais foram efetivadas na zona urbana de Juruti. O debate sobre a formação

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e históricos dos logradouros, ao evocar a história de formação da sede urbana, incluiu expressão e registro do ponto de vista dos munícipes. Como consequência, os jovens deram voz à comunidade detentora do conhecimento sobre a formação dos bairros mais antigos, aprenderam sobre a cidade, escreveram as histórias e as divulgaram no blog intitulado “Memórias de Rua”.

Ao longo deste tempo, em diálogo, muitos conflitos foram mediados a fim de traçar acordos e tomadas de decisões. Os processos dialógicos demandam tempo, pois precisam de maturação, são cheios de idas e vindas, próprios dos combates entre pontos de vista, das atualizações e das rivalizações que incluem indivíduos e coletivos. O campo ambiental amplifica este cenário ao envolver diferentes atores e coletivos, e interesses. O campo do patrimônio cultural também é arena de conflito, envolve diferentes indivíduos e coletivos, é complexo, dialético e polifônico (IPHAN, 2014:20). Portanto, nestes anos todos fomos confrontados muitas vezes pela comunidade, com questionamentos acerca do patrimônio cultural, sobre nosso programa, nossas intenções. Em todos os momentos, nos dispusemos a dialogar e apresentar nossas respostas, nossas ações, nossos resultados, nossa equipe, para juntos chegarmos à uma combinação válida para as partes – que neste contexto do licenciamento ambiental envolve a comunidade, o empreendedor e os órgãos públicos gestores do patrimônio cultural, todos em prol do patrimônio cultural.

Toda essa experiência em Juruti de gestão compartilhada com nossos monitores e estagiários, e também com a comunidade que nos avaliza e confronta, tem sido bem-sucedida, e a grande participação popular é uma das medidas que podemos utilizar, pois corresponde a 49% da população do município. O contexto da arqueologia preventiva pode ser, em um país com grandes desigualdades socioeconômicas, relevante e auxiliar na mediação para uma maior simetria através do protagonismo comunitário. Em muitos aspectos este é o quadro atual de Juruti, com conflitos próprios de uma sociedade cada vez mais detentora de sua própria escolha.

Lílian Panachuk

Coordenadora do projeto (2007-2014)

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IntroduçãoUm olhar sobre a memória das ruas de Juruti

Elaboramos esta obra para falar das ruas de Juruti, suas localizações e moradores mais antigos, do histórico dos logradouros, nele incluídas as histórias sobrenaturais, as visagens e assombrações tão populares no município.

Ela surgiu a partir do projeto “Memórias de Rua”, desenvolvido pelos estagiários da Scientia Consultoria Científica. Os dados foram levantados por meio de pesquisas de campo, que englobaram entrevistas com moradores antigos da cidade, levantamento bibliográfico e documental, além de uma análise crítica de cada logradouro. Procuramos, com esta publicação, resgatar e preservar, a partir de informações, mapas, fotografias, histórias, lendas e objetos antigos, partes do histórico das ruas de Juruti. Deixando registrado um pouquinho da herança esquecida ou premeditadamente ignorada, apresentando-a a todos dispostos a conhecer o rico passado do município.

Procuramos resgatar as memórias e as crendices populares, mesclando-as às informações resultantes de estudos científicos, sem medir forças entre ciência e sobrenatural e, assim, apresentar um pouco da riqueza de nossa cultura e do imaginário popular, uma vez que os jurutienses não escapam à fascinação dessas histórias.

“Cada vez que um velho morre, é como se uma biblioteca toda queimasse.” (Provérbio africano)

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Juruti ocupa hoje um lugar de destaque no oeste paraense, com significados diversos para pessoas de grupos sociais distintos. Uma rua, avenida ou travessa, para uns pode ser o local de simples passagem; para outros, como as crianças que nelas brincam, o local de diversão; para o vendedor ambulante que trabalha, um lugar de negociação, e assim por diante.

As ruas estão relacionadas à questão da cidadania: por direito, podemos usar os espaços públicos e temos o dever de lutar para a ampliação, a conservação e o uso democrático desses espaços.

Em meados do século XX, havia na frente da cidade um pedaço de terra utilizado pelos moradores como terreno para plantio da juta, naquela época atividade predominante na economia do município. Lá, se localizaram as primeiras ruas de Juruti, como a Rua Beira-Mar. No segundo domingo de agosto de 1985, as terras caídas, fenômeno natural do rio Amazonas, destruíram tudo o que havia naquele local, chamado de Jurutizinho. Esse acontecimento está na lembrança de todo jurutiense:

“Houve esta erosão e nós fomos perdedores de 52 casas (...), antigamente tinha o Mercado Municipal, era bonito, e destruiu. Porque lá nessa frente, tudo quanto era comércio era lá” (dona Lourdes Pimentel, 16 de abril de 2010).

“Muitas casas foram levadas pela fúria da maior avenida do mundo que é o rio Amazonas” (senhor Alberto Ivo, 24 de março de 2010).

“Foi no segundo domingo de agosto do ano de 1985, que aconteceu a primeira grande queda, era Dia dos Pais, mais ou menos pelas oito horas da noite, aí teve a primeira queda, aí caiu a energia e todo mundo correu para lá. E aí pronto, entrou em processo de erosão. Foi caindo o comércio de todo mundo, todo mundo tentando tirar alguma coisa, mas não teve mais jeito porque era um processo natural.” (professora Régia Maria Gomes Pinheiro, 28 de novembro de 2009).

Esse acontecimento causou enorme impacto socioambiental no município, devido à destruição de prédios residenciais e das maiores casas comerciais – farmácias, grandes armazéns de juta e de outras mercadorias. Dessa maneira, as famílias começaram a construir suas moradias mais afastadas do rio, no local onde hoje está localizada a primeira rua do município, chamada Rua Coronel Marques Diniz, que nesta ocasião era habitada por poucas pessoas.

Este é o motivo maior de nossa pesquisa, registrar a memória da comunidade já que as edificações mais antigas, ainda do tempo

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do Brasil Império, foram destruídas pela força das águas e somente existem na lembrança dos moradores locais. Podemos começar por entender a história a partir das ruas de nosso município, lugares onde viveram ilustres pessoas, que pelos mais diversificados motivos tornaram-se imortais no momento em que seus nomes foram dados aos logradouros. Assim, percebemos o passado marcado no nosso cotidiano.

Em um sentido amplo, o pleno exercício da cidadania diz respeito ao conjunto de direitos e deveres de cada pessoa na sociedade. Deste modo, apresentamos de forma motivadora e agradável, um constante desafio que vai ficar para sempre gravado na sua memória com informações que comovem, instruem e inspiram crianças, jovens e adultos. Todos vão adorar, quer lendo pela primeira vez, quer relembrando o que já ouviu em sua infância ou juventude. Você jamais encontrará livro mais gostoso de se ler como este sobre as memórias das ruas de Juruti.

Boa leitura com muita emoção, ao mundo histórico das ruas de Juruti.

Coletivo de Jovens Pesquisadores “Memórias de Rua” (2009-2015)

Programa de Educação Patrimonial em Juruti/PA

As ruas pesquisadas:Bairros Centro, Bom Pastor e Palmeiras

Para proceder à pesquisa, foi elaborada uma planta do centro urbano, que os estudantes seguiram para se localizarem espacialmente, conforme abaixo.

Essa planta foi adaptada a partir do documento da Associação Comercial e Empresarial de Juruti – ACEJ (2008) e também do Mapa de Reinaldo Silva Nascimento Filho (1991/1992), reproduzido anteriormente.

Atualmente, com as ferramentas, como o Google Earth, é possível verificar a mudança da malha urbana ao longo dos anos, através de imagem de satélite de 1969 e 2014. A imagem de satélite mais antiga nos permite ver a malha urbana mais concentrada.

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Memórias de Rua

Entre os anos de 1969 e 2003, a sede urbana de Juruti modificou-se aos poucos, conforme pode ser visto na reprodução a partir do Google Earth.

Entre os anos de 2003 e 2008, a mudança foi mais acelerada, com grande expansão da rede urbana, e grande aumento.

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As ruas pesquisadas: Cantro, Bom Pastor e Palmeiras

E ainda entre os anos de 2008 e 2014, é possível vermos ainda maior expansão.

Todas essas mudanças espaciais ocorreram de forma acelerada, e é preciso registrar essas alterações para que não se percam.

Todos os mapas produzidos devem ser consultados para melhor localização das ruas da cidade, em especial a planta baixa que abre essa seção.

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Memórias de Rua

Em cada capítulo, um detalhe deste mapa abrirá o item, a fim de indicar a localização de cada logradouro, para que o leitor possa verificar sua posição na cidade. Em cada um deles, começamos a descrição pelas ruas da beira do rio Amazonas, em direção ao Lago do Jará, para os logradouros paralelos ao grande rio (portanto, de oeste para leste); e depois descrevemos desde a porção norte para o sul, ou da esquerda para a direita, para as ruas perpendiculares ao rio Amazonas.

É possível ver ainda nos mapas, além da localização do logradouro, alguns locais destacados por serem de grande importância para o município, como: escolas, estádio, sedes de grupos folclóricos, de associações comunitárias, dentre outras instituições que são lugares de memória, cenário para muitas das histórias aqui narradas.

Sugerimos então, que a leitura do livro seja acompanhada de identificação de cada logradouro nos mapas correspondentes. Essa estratégia vai tornar mais fácil o entendimento tanto para aqueles que estão conhecendo a cidade através dessas histórias, quanto daqueles que bem conhecem Juruti.

Ruas do Bairro Centro1

1 - Texto produzido pelos estagiários de 2009 e 2010.

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Memórias de Rua

As vias mais antigas do centro de Juruti são Rua Belém, Rua Marechal Rondon e Rua Joaquim Gomes do Amaral. A Rua Barão do Rio Branco foi aberta mais tarde. Nota-se a Praça da República e a Igreja Matriz. Conforme foto abaixo, essas ruas percorrem toda a cidade no sentido leste para oeste, acompanhando o rio.

Rua Coronel Manuel Marques Diniz

Segundo os entrevistados, foi nomeada por Américo Pereira Lima na década de 1930. A rua ficou assim conhecida em homenagem ao primeiro intendente municipal de Juruti, indicado pelo governo estadual, que exerceu mandato entre 1914 e 1922. Ele se casou com Dona Cassandra Diniz, com quem teve oito filhos: Aluísio, Lourdes, Idegar, Manoel Filho, Gracinda, Sara, Luiz Marinho e Hosana. O patriarca da família mudou-se para Belém a fim de dar novas oportunidades de estudo aos filhos, não deixando descendentes diretos na comunidade, mas seus parentes ainda atuam na política local.

O senhor Raimundo Marialva contou quais foram os primeiros moradores da rua, e sua narrativa mostra como as casas eram espaçadas.

“Bem nesta casa aqui morava o finado Lodurval, lá adiante Osvaldo Meireles Cunha (prefeito na década de 1950), lá mais adiante o Ricardo, pra lá era o grupo velho, morava também Horizonte Bentes da Cunha (comerciante local), lá mais adiante o Benedito e lá mais no canto o Joaquim Coimbra.” (Raimundo Marialva)

Desde os anos 1980, com o fenômeno das terras caídas, muitas casas e estabelecimentos comerciais foram desconstruídos, outros permanecem até hoje e intensificou-se o processo de ocupação. A rua Beira-Mar e a atual rua Coronel Manuel Marques Diniz guardam ligações em relação à localização, presença de estabelecimentos

Acervo: Paróquia.

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Ruas do Bairro Centro

comerciais e o fenômeno das terras caídas. Alguns dizem que resta um trecho da antiga rua no novo logradouro. Vale ressaltar que foi uma das primeiras ruas a ser asfaltada; ganhou um cais, entre 1989 e 1992, separando a rua da margem do rio.

Muitos fatores contribuíram para que essa rua sofresse modificações em sua estrutura e movimento. A rua está na área de embarque e desembarque de produtos que entram e saem pelo porto da cidade,

A Rua Beira-Mar antes do fenômeno das terras caídas, outubro de1985.

Acervo: Régia Pinheiro. A Rua Beira-Mar em 2010.

Aspecto da beira do Amazonas, logo depois do fenômeno das terras caídas, outubro de1985. Acervo: Régia Pinheiro.

Antigo mercado na época das águas. Sem data, possivelmente década de 1950. Acervo: Régia Pinheiro.

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Memórias de Rua

além de ser importante área comercial deste município desde 1985.

O primeiro Mercado Municipal de Juruti estava assentado no lado esquerdo desta rua. Foi demolido, pois a Defesa Civil do estado chegou à conclusão que estava em uma área de risco. Ele foi construído no mandato do prefeito Abbas dos Santos Arruda, exercido entre 1963 e 1966, e destruído depois do fenômeno das terras caídas.

E ainda, nesta rua, apareceu certa vez o cachorrão que “se gerava” a partir de certo homem. Foi dona Lourdes Pimentel quem contou o fato:

“Uma vez eu estava com uma menina quando nós vimos aquele cachorro “auauauauau”. Estava baixando lá pra banda da beira, aí tinha alguém com um revólver, e disse: “Pois eu vou já atirar, se for gente ele vai morrer cachorro”. Atirou no meio do cachorro. Quando foi no outro dia apareceu um senhor baleado na perna e era o cara que eu tinha dado comida.”

Segundo relatos, atualmente, “as visagens têm ficado espantadas”, as histórias têm sido cada vez menos frequentes, com as luzes da cidade, juntamente com a movimentação de veículos e pessoas. Causos como esse, do homem que se transformava em cachorro, estão desaparecendo, mas são importantes por contar o sobrenatural que ainda existe na mente do povo local.

Alameda Horizonte Bentes da Cunha

Esta é uma pequena alameda, mas homenageia um importante

comerciante do início do século XX, da cidade de Juruti. O levantamento da história desta alameda foi dificultoso, pois todas as casas foram vendidas e os moradores atuais não tomaram conhecimento do passado da via.

A Alameda Horizonte Bentes da Cunha, em 2010.

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Ruas do Bairro Centro

Segundo dados da Prefeitura de Juruti, essa via foi nomeada oficialmente pelo Prefeito Madson Auzier Pinheiro, pelo Projeto de Lei nº 2, de 12 de dezembro de 1986, e assinado o anteprojeto pelo então vereador Raimundo Coelho, segundo documentos e dados coletados na Câmara Municipal e reproduzidos aqui.

A rua transversal à alameda Horizonte Bentes da Cunha, conforme indica o documento, seria a atual rua Barão do Rio Branco? Não obtivemos resposta a essa questão.

Beco Francisco Batista

O Beco Francisco Batista faz a ligação entre as ruas Dr. Moraes Jardim e Alameda Horizonte Bentes da Cunha. Foi uma homenagem a Francisco Batista, importante comerciante do município e primeiro morador deste beco. Ele nunca mediu esforços em busca de melhores condições de infraestrutura e acesso ao local, junto às autoridades.

Por muito tempo, esta via foi chamada de Beco 1º de Maio pelos moradores. Em seguida, ficou conhecido como Dr. Moraes Jardim e depois de vários anos, recebeu o nome de Beco Francisco Batista, conforme explica o Senhor Iliel Batista, filho de Francisco.

Acervo: Câmara dos Vereadores de Juruti.

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Memórias de Rua

“Eró homenageou meu pai, porque inclusive ele também era morador muito antigo daqui da rua, por isso que ele colocou o nome do meu pai. (...) Ele tinha na mente também homenagear (...) todas as pessoas mais antigas que moravam na cidade (...), tá na memória dele ele resolveu homenagear nosso pai por ser morador muito antigo (...) foi comerciante, um dos comerciantes mais fortes da cidade, (...) foi comerciante lá na [rua] Américo Pereira Salgado (...) olha, muita gente conhece meu pai. Naquele tempo ele tinha o comércio dele, do Jânio, do Benito, do Seu Elias (...).”

Durante a década de 1950, este beco passou por determinadas transformações em sua estrutura por ser uma vasta área de vegetação natural. Nesta rua, o fenômeno das terras caídas gerou um enorme buraco e graças ao apelo de Francisco Batista, o então prefeito

Firmino de Sousa Guimarães (1955-1958) tapou o buraco e depois inaugurou o beco para dar acesso à Avenida Barão do Rio Branco por uma escadaria feita de madeira. Em seguida, Osvaldo Meireles Cunha, prefeito em seu segundo mandato (1959-1962), construiu uma nova escadaria e fez duas rampas.

Esse beco teve grande importância para a população de Juruti após o fenômeno das terras caídas, pois se tornou o único meio de acesso ao porto da cidade por muitos anos.

Rua Doutor Moraes Jardim / Rua da Saudade

Trata-se de uma das ruas antigas da cidade e lá foi instalado o cemitério de Juruti, no final do século XIX. No entanto, na delimitação urbana, o cemitério situa-se no Bairro Bom Pastor. O nome Joaquim Rodrigues de Moraes Jardim pode ser identificado como o nome do

Aspecto do Beco Francisco Batista, em 2009. Um dos primeiros entrevistados, senhor Iliel Batista.

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Ruas do Bairro Centro

engenheiro que esteve à frente do município em 1958, tendo sido intendente nesta época. A Rua Doutor Moraes Jardim muda de nome a partir da Travessa Lauro Sodré para a direita da cidade (em direção ao cemitério da Saudade), passando a se chamar Rua da Saudade.

O professor Aleílson Vidinha, que reside neste logradouro, reflete sobre os motivos deste outro nome:

“A história que eu sei é a que as minhas avós contaram. Elas disseram o seguinte, foi justamente por causa do nome dado ao cemitério, e aí, quando eu já me entendi, já foi Rua da Saudade. Mas para a maioria das pessoas, quando a gente fala Rua da Saudade, elas acham que o nome é bonito, mas elas não têm noção de que a Rua da Saudade é onde fica o cemitério, entendeu? Geralmente a saudade é um sentimento que nós temos de alguém que já partiu, e o cemitério dá essa ilustração pra gente, ele demonstra essa situação. O cemitério é o um local onde ficam pessoas que já foram embora e que dão saudade”.

Na parte da rua conhecida como Doutor Moraes Jardim estava instalado também o antigo grupo escolar, edificado aproximadamente em 1960. Este edifício foi destruído em decorrência do fenômeno das terras caídas.

Dona Aldezi Pará, que nasceu, cresceu e mora nesta via, contou que “essa rua, antigamente, tinha um espaço mais amplo [na] largura”.

Como não faltam histórias nas ruas que têm cemitérios, aqui não poderia ser diferente. Na Rua da Saudade muitas lendas são contadas. Dona Aldezi Pará foi convencida sobre a ocorrência de uma visagem específica. Vejam como foi.

“Isso aconteceu, depois que eu fiquei viúva. Vim morar aqui

A Rua Dr. Moraes Jardim/da Saudade, em 2010.Aspecto da Rua da Saudade em julho de 1985. Acervo: Régia Pinheiro.

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Memórias de Rua

com meus pais e já ouvia falar que tinha uma visão. À noite, um fantasma que era uma pessoa de roupa comprida, que não arrastava o pé no chão e puxava uma corrente que fazia aquele barulho. Mas eu não acreditava. O senhor que me contava morava ali, ele me contou a história, mas eu nunca acreditei. Aí eu fiquei com meus filhos pequenos, eram bem pequenos. Tudo silêncio. Essa casa aqui ainda era a escola, que já tinha sido desativada. Aí estava um silêncio, acho que umas onze horas ou meia-noite, aí eu ouvi um barulho. Aí veio aquele barulho (...) pela escola. Aí veio aquele barulho, longe eu ouvi esse barulho. Não era impressão minha porque eu não acreditava. Vinha aquele barulho, parece que vinha arrastando um negócio. Lá, certas horas, batia assim, fazia ‘tum’. Parece que descansava uma coisa pesada. Aí veio embora, eu disse: ‘é hoje que eu vou ver o negócio’. Aí veio, quando chegou ali naquele canto, parece que arriou um negócio muito pesado, aí parece que descansou. Aí demora, vinha arrastando de novo. Bem na frente de casa parou uma vez, aquilo arrepiou logo. Eu não podia nem me mexer na rede de medo. Arriou bem na frente, depois parou. Começou de novo a arrastar aquele negócio. O pessoal diz que é uma corrente, mas não sei se era corrente porque eu não vi, mas era um barulho assim, arrastando. Não sei se continuou ou se parou, mas isso eu ouvi, ninguém me contou. O senhor diz que ele levantou, abriu a porta e viu uma sombra, porque era escuro. E sabe que nunca mais eu vi, só essa vez. Mas que existiu, existiu, pode ser que não aconteça agora que já tem luz a noite toda e as pessoas estão sempre andando por aí. Aí afastou, mas isso aí eu só acreditei porque eu ouvi o movimento todo”.

Rua Belém

Este logradouro é uma homenagem à capital do estado do Pará. Trata-se de uma antiga rua da cidade, aberta desde a implantação do distrito

Aspectos da Rua Belém, em 2017.

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Ruas do Bairro Centro

municipal nesta região, que data de 1859. Nesta época, a Freguesia de Juruty (assim grafado) comportava cerca de 150 pessoas situadas na região que conhecemos como Maracaçu, próximo à sede municipal, mas na época era chamado de Maracaassu-Tapera. A maior população ainda se localizava na Missão de Nossa Senhora da Saúde na região de Juruti Velho, que nesta época somava quase 500 indígenas da etnia Mundurucu.

Segundo relatos de João Careca, a Rua Belém teria sido nomeada no mandato de Osvaldo Meireles Cunha, na década de 1950.

Hoje, ela é dividida em duas partes, uma conhecida como Paes de Andrade, a partir da Travessa Barão do Rio Branco para a esquerda da cidade, em direção à Travessa Major Pinto e Silva. A Rua Belém estende-se da Travessa Barão do Rio Branco para a direita, em direção à Travessa Lauro Sodré.

Dona Laudinéia aponta o antigo nome desta rua como Rua Ticano, ela conta ainda sobre o passado da rua:

“Era tipo mata, tinha umas estradinhas, quando eu cheguei pra cá, eram só essas estradas, não é como agora que quando chega não sabe nem para onde vai. Era tudo de estradinha, eu me lembro quando cheguei aqui. Ali onde tem o colégio [atual Elza Guimarães], ali tinha uma estrada, que ia embora, lá para onde é o sindicato. Ainda me lembro que era assim. Picadinha pra varar de uma rua e ir para a casa do vizinho”.

Não apenas a estrutura da rua está na memória de seus moradores, as manifestações culturais também. As festas e bailes eram animados na rua e em toda a cidade, conforme relata o senhor Ricardo, morador da rua desde 1962.

“Antigamente aqui em Juruti, todas as brincadeiras eram boas, tinha boi, tinha carnaval, tudo era de fantasia. Ainda me lembro que tinha uma modinha que cantava assim: ‘chegou o japiin lá da campina pra dançar, é preto e amarelo no meio do pessoal, ôepiá, ôepiá viva o nosso japiin; ôepiá, ôepiá viva o nosso japiin’. Eu me lembro bem disso”.

O senhor Fernando Luiz, morador da Rua Belém há mais de 70 anos, contou sobre os bailes na rua e a existência de lendas, como nas demais ruas, principalmente as antigas. São histórias interessantes de serem conhecidas.

“Olha, eu nunca vi. Mas certas pessoas viram e falavam que existia uma Matinta Pereira. Não sei se existe mais.”

Nos primeiros anos da história de Juruti, à medida que aumentava

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Memórias de Rua

o número de habitantes, surgiu a necessidade de expandir o território da cidade, pois a vinda de pessoas atraídas pelas oportunidades de empregos proporcionados pelo cultivo da juta, acabou criando um ambiente propício para o surgimento de novos logradouros públicos. Neste contexto está inserida a Rua Belém. Devido à fundação ser bem antiga, perdeu-se no tempo a data exata de seu surgimento. No entanto, sabe-se que os fundadores foram os próprios moradores, que se organizaram em chamados “puxiruns” para juntos a construírem. O intuito era o de ligar as residências ao porto e principalmente aos roçados, de onde normalmente extraíam lenha e faziam plantações de mandioca e de outros produtos agrícolas, transformando, assim, as pequenas estradas abertas em meio à grande mata na rua, que após vários anos, ganhou o status atual, conforme afirma a moradora Ana Araújo, de 74 anos:

“(...) Só uns camininho tinha... Sabe onde é o Chapéu de Palha? Pra lá era só mesmo um camininho, a gente ia lá pra comprar as coisas. Tudo era assim, tudo era pequeno, só mato (...).”

Por localizar-se em terras altas, a Rua Belém foi aplainada por diversas vezes, segundo diz a moradora Maria de Lima, popularmente conhecida como Dona Maroca. Ela conta que antes esse local não era cavado, era muito alto e só depois de um tempo que o então

prefeito da cidade mandou aplainá-la, a fim de dar-lhe aspectos de rua. Contudo, mesmo após essas transformações, ainda é possível observar a diferença que há entre a altura das casas com relação à via.

Mediante o processo de desenvolvimento verificado em Juruti, nos últimos anos muitas das primeiras moradias tiveram seus estilos alterados, porém ainda existem algumas casas que permanecem até hoje com suas características originais, relativamente bem preservadas.

Em meio a essas transformações e acompanhando a organização da estrutura física da cidade, a então Rua Belém passou a dividir o espaço em que foi construída com a Rua Paes de Andrade. A denominação desta rua registrada na história homenageia uma das mais importantes famílias do Paraná de Dona Rosa, respeitada entre os demais por

Casa de taipa. Casa de madeira.

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Ruas do Bairro Centro

terem sido grandes produtores de cacau durante o início de século XX. Entre eles sobressai-se a ilustre figura de Romualdo Paes de Andrade, que era proprietário de grandes extensões de terras no Curumucuri e no Paraná onde permaneceu pelo resto de sua vida.

“Antes, tinha uns boizinho de brinquedo que os meninos faziam aí. Era o que eles faziam aí na rua... Que era o Boi Chicote e o Boi Mascote, mas era tudo de brinquedo, né? Eles que faziam a evolução com a mão. É eles faziam, mas depois num teve mais, faz muitos anos já”.

Segundo os dados relatados pela moradora Maria de Lima, antigamente os moradores realizavam nesta rua algumas manifestações culturais que originaram a atual festa folclórica, o “Festribal”. As pessoas participavam tanto na organização quanto nas apresentações de danças e rituais de cunho popular atribuído ao boi-bumbá. Essas manifestações ofereciam aos moradores um pouco mais de diversão, ao mesmo tempo em que contribuíam para elevar o Festribal de Juruti à categoria de maior manifestação cultural do estado do Pará.

O logradouro não tem uma variedade de lendas pra contar, provavelmente porque os moradores mais antigos faleceram ou se mudaram. Com o passar do tempo, perderam-se muitas histórias daquele local, permanecendo somente algumas lendas, como a do “caixão branco”. Fala-se sobre um caixão branco que aparecia no tronco de uma árvore grande. Algumas pessoas dizem que quem passasse pela árvore, a partir da meia-noite e olhasse pra lá, enxergava o caixão encostado nela.

“No toco dessa mangueira aqui enxergavam um caixão. O seu Zé Caiana uma vez... Uma vez ele contou que ele passou aí e tinha um “caixãozão branco”, disse que bem aí no toco dessa mangueira. Mas eu, eu nunca vi”. (Maria de Lima Silva)

Ela conta que nunca viu esse caixão, mas um dia ficou até mais tarde na rua e nada aconteceu. Mesmo assim, afirma o que a ela foi dito. A trilha que antes era rodeada de mato e pequenas casas transformou-se numa rua bem maior em extensão, e o mato que a rodeava deu lugar a novas moradias e construções. Além de todas essas modificações, ainda podemos encontrar casas e personalidades antigas que fazem essa artéria tornar-se muito mais interessante aos olhos de quem a observa e a admira.

Os habitantes locais sempre ouvirão alguém falar sobre a história desse logradouro repassada por seus pais, avós ou moradores antigos que nesse local ainda residem e guardam essas histórias muito bem guardadas, em um lugar onde não possam ser perdidas enquanto

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Memórias de Rua

permanecerem vivos, dentro de suas memórias.

Rua Paes de Andrade

A Rua Paes de Andrade foi criada após a Rua Belém, por volta de 1870. Eis aqui um pouco da história de uma família que se instalou na cidade de Juruti no período de “transformação”, quando a rua recebeu o nome Paes de Andrade, mas ficou pouco conhecida, pois não chega a ser tão extensa como as demais. Apesar de ser pequena, é muito bem cuidada.

Edificação na Rua Paes de Andrade, em 2011.

Inauguração da Escola Joaquim Freire de Andrade. Acervo: Família Andrade.

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Ruas do Bairro Centro

Os corpos de alguns dos membros da família Paes de Andrade descansam no cemitério da Saudade, como o senhor Romualdo Paes de Andrade (1909-1982) e o senhor Otávio Paes de Andrade (1921-2009), pioneiros desta rua. Um membro da família Andrade nomeou uma escola, Joaquim Freire de Andrade, provavelmente na década de 1960.

Para melhores esclarecimentos, a Rua Paes de Andrade é composta por dois quarteirões. Apesar das transformações – desde 1970, foi alargada, retificada e asfaltada, ainda exibe casas antigas, parte do patrimônio edificado jurutiense.

Na imagem acima, podemos ver um pouco do verdadeiro passado de Juruti, que se esconde atrás de cimento e tinta que, com o passar do tempo, vai se degradando e mostrando seu verdadeiro interior.

Hoje em dia, a Rua Paes de Andrade é completamente diferente, antes era esburacada, agora é asfaltada, aquela poeira incessante hoje não existe mais, o desenvolvimento fez com que tudo o que antes era problema hoje não seja mais.

Nem tudo mudou, pois hoje podemos ver casas ainda de taipa, que revelam ser construções de muitos anos atrás, talvez até construídas no mesmo período da abertura da rua, e podem contar parte da história de Juruti. Assim como os idosos, essas construções antigas também são de grande importância para a preservação da memória sobre o passado de Juruti.

Patrimônio edificado na Rua Paes de Andrade. Notar a taipa.

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Memórias de Rua

Rua Marechal Rondon

Como comentou a professora Régia “quase toda cidade do Brasil tem uma rua com o nome de Marechal Rondon”. O nome completo era Cândido Mariano da Silva Rondon, nasceu em 1865 e seu feito foi ter aberto caminhos para implantação de linhas telegráficas, que

passaram a permitir a comunicação entre os cidadãos deste imenso país. Além disso, demarcou fronteiras de limites territoriais, entrou em

contato com diferentes grupos indígenas e chegou a ser indicado ao Prêmio Nobel da Paz em 1957. Faleceu no ano seguinte, aos 93 anos.

Praça da República e a Igreja Matriz, em 2011. Praça da República em 2007. Acervo: Arquivo Alcoa.

Autoridades em frente à Igreja Matriz de Juruti, possivelmente na década de 1970. Acervo: Régia Pinheiro.

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Ruas do Bairro Centro

Em Juruti, essa é uma rua de destaque porque passa em frente à Igreja Matriz Nossa Senhora da Saúde. Tem um grande número de lojas e restaurantes, sendo, em função disso, muito movimentada.

Tanto no passado como no presente, esse é um logradouro muito importante e muito frequentado pela população.

Dona Juvenila Viana, mais conhecida como dona Sabá, conta sobre o passado da rua, que já habita há 86 anos:

“Ah mana, eu nasci aqui. Aqui essas ruas eram só caminho cheio de laranjeira. Era só casa de palha. Era bom porque a gente ia trabalhar, ninguém era rico, mas tinha força para trabalhar. Trabalhava em roça, trabalhava em juta, tudo a gente tinha. Graças a Deus! E assim o pessoal era aqui”.

Dona Maria Raimunda também conta um pouquinho sobre o passado da rua:

“Antigamente, aqui, a rua era diferente. Estou com 63 anos, eu nasci e me criei aqui, eu conheço. Isso aqui não era como agora, era um capim só. Depois, os moradores arqueavam na frente das suas casas”.

As lendas apareciam nesta rua, como a história do aparecimento de um cavalo, do qual era ouvido apenas o cavalgar, mas ninguém achava suas marcas no chão, como conta Dona Mirce:

“Agora tropel [de] cavalo a gente ouvia de noite. Ficava quieto dentro de casa e quando ouvia aquele negócio arrepiava a gente. Mas também ninguém vinha pra fora, e de manhã ninguém via pegada de cavalo nenhuma. Agora, saber o que era né, ninguém sabia. Essas coisas existiam muito porque era mato. Aí as visagens, até os próprios bichos faziam a visagem, com medo junto com a gente. (...) Tem essas coisas”.

Travessa Praça da República

Esta travessa foi aberta há muitos anos, quando famílias vindas de várias regiões do município agruparam-se nos arredores de um antigo arraial que havia em frente à paróquia de Nossa Senhora da Saúde; era um barracão utilizado durante as festividades religiosas como lugar para venda de comidas e de leilão de oferendas.

Ainda cercado por grandes áreas desabitadas, no local formou-se um pequeno núcleo de famílias. As casas eram geralmente construídas de palha e taipa, os quintais eram longos, não havia asfalto, água encanada nem luz elétrica instalada.

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Memórias de Rua

A travessa é relativamente pequena, sendo uma das menores desta cidade e situa-se entre a Rua Paes de Andrade e a Rua Marechal Rondon.

Até hoje, não há um nome oficial para esta rua, no entanto, os moradores a chamam de Travessa Praça da República. Essa denominação popular surgiu na década 1970, durante a administração

do então prefeito Nilson Barroso Pinheiro, que teve o projeto audacioso de construir uma praça onde a população pudesse desfrutar de melhores condições de lazer. O desenho foi cuidadosamente esboçado pelo senhor Ameriquinho, filho de Américo Pereira Lima, que deu à estrutura o formato da bandeira nacional, com traços que lembram o estilo da cerâmica Marajoara. Com a praça construída, as pessoas

Construção da Praça da República. Acervo: Paróquia.

Vista aérea da cidade, provavelmente na década de 1960. Acervo:Régia Pinheiro.

Igreja Matriz ao fundo. Cenário completamente diferente do atual, sem esse declive.

Acervo: Paróquia de Juruti. Foto cedida pelo padre Alfonso Blúmenfeld em 12 de janeiro de 2011.

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Ruas do Bairro Centro

passaram a chamar essa pequena via de Travessa Praça da República.

À medida que os anos iam se passando, novos moradores chegavam e, consequentemente, essa travessa ganhou gradativamente o status de hoje.

Antigamente, havia grandes valas nesta artéria, além de mato para todo lado. Algumas famílias viveram nesta via até o momento em que a Matriz de Nossa Senhora da Saúde precisou do espaço, localizado nos arredores para construir o clipe e o salão Dom Bosco. Assim, os padres negociaram com as famílias que aceitaram pacificamente a proposta.

Os moradores mais antigos da Travessa Praça da República, como dona Nazaré, relembram as histórias contadas pelos moradores antigos sobre o aparecimento de muitas visagens e o famoso Matim, que passaria nas noites de sexta-feira para pegar tabaco. Como diz

senhor Rosemiro:

“Vinha aquele tal de Matim que assoviava e a gente ficava com medo, vinha passava e a gente respeitava naquela época, os mais velhos e até as mais crianças”.

Isso causava medo nas crianças, que herdaram os costumes e as crenças de seus antepassados e mantiveram o rico imaginário popular dos jurutienses.

Antes de serem construídas a Arena Cultural e o Parque Infantil,

Vista superior da Praça da República, com sua forma de bandeira, e a Igreja Matriz. Acervo: Paróquia de Juruti. Foto cedida pelo Padre

Alfonso Blúmenfeld em 12 de janeiro de 2011.

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Memórias de Rua

na margem deste logradouro havia um grande terreno utilizado por diversas pessoas como área comercial para lojas, bares e restaurantes. Ali, eram realizados diversos movimentos, como o desfile de 7 de Setembro. Na década de 1980, Juruti era palco de grandes manifestações culturais, realizadas em uma quadra que havia nas proximidades deste logradouro.

A Travessa Praça da República passou por todas essas transformações e, hoje, apresenta-se entre as mais lindas de Juruti, totalmente habitada e estruturada fisicamente, com o sistema de esgoto e asfalto, além de água encanada e energia elétrica. Vale ressaltar que muitas das características iniciais desta rua perderam-se no tempo, a partir do desenvolvimento em que Juruti se encontra. E um deles foi a tranquilidade, que permanece somente na lembrança de seus moradores.

O povoado que compõe o atual município de Juruti surgiu nas primeiras décadas do século XVIII, próximo às praias brancas do lago Juruti Velho, no mesmo local de uma antiga aldeia de índios Mundurucu, segundo as pesquisas do naturalista Domingos Soares Ferreira Pena (1818-1888).

Posteriormente, deu-se o povoamento da atual sede. As construções foram realizadas pelos moradores organizados em puxiruns, antes que fosse formado o Conselho de Intendência Municipal, ou seja, foi realizado pela própria população. Nessa época, as casas eram de taipa, madeira ou, simplesmente, de palha, e aglomeravam-se em pequenos quarteirões concentrados no centro da cidade. Assim como nas outras ruas, não existia água encanada, luz elétrica, asfalto e outros benefícios da infraestrutura.

Aspecto da Praça da República, possivelmente na década de 1960. Foto cedida pela Comunidade.

A Praça ganha grafismos Marajoara na década de 1980. Foto cedida pela Comunidade.

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Ruas do Bairro Centro

Rua Joaquim Gomes do Amaral

Inicialmente, a família Amaral alojou-se nas terras que hoje compreendem a comunidade Curumucuri, onde permaneceu por diversos anos. As condições de vida naquela localidade não eram as melhores e isto os obrigou a mudar para o Paraná de Dona Rosa. Lá, se tornaram poderosos latifundiários, dominando cerca de 50% daquelas terras, e ficaram entre os maiores produtores de cacau do Baixo Amazonas.

O senhor Joaquim casou-se com a senhora Auta Arruda do Amaral, irmã de Abdias de Arruda, prefeito de Juruti em 1963. Mais tarde, Joaquim tornou-se um bem-sucedido criador de gado.

Pertencente a uma rica família local, ele era proprietário de uma lancha a vapor denominada Brasileirinha e de um pequeno avião Catalina, além de terras e de um confortável casarão. Após a criação do Conselho de Intendência Municipal, Joaquim Gomes tornou-se intendente entre 1923 e 1930, ocupando o cargo por oito anos.

Por esses e por outros motivos, Joaquim Gomes do Amaral entrou para a história desta cidade e, ainda hoje é lembrado com muita frequência como político e principalmente como indivíduo que dedicou anos de sua vida e parte do seu tempo aos interesses da população.

Conforme o escritor Ademar Ayres do Amaral, a Rua Joaquim Gomes existe desde o início do século XX, porém ganhou essa denominação na

Vista da Rua Joaquim Gomes do Amaral, em 2012.

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Memórias de Rua

década de 1960, quando o então prefeito, Abdias Arruda, oficializou-a com essa denominação em homenagem ao cunhado, casado com sua irmã Auta Arruda.

A ocupação da Rua Joaquim Gomes do Amaral deu-se, principalmente, por pessoas vindas das comunidades rurais do município à procura do emprego oferecido pelo cultivo e exploração do pau-rosa e da juta, a partir da década de 1920.

Essas atividades econômicas ligadas à juta eram praticadas na frente da cidade, às margens do igarapé da Boca de Baixo, conforme a denominação popular, que separava a várzea da terra firme. O fenômeno das terras caídas levou consigo casas, armazéns, comércios, plantação e tudo que havia na frente da cidade. Essa história somente habita a memória da comunidade, existindo poucos registros a este respeito.

Sobre a atividade de exploração do pau-rosa, destaca-se o sítio arqueológico Pacoval da Usina, encontrado pela equipe da Scientia nas redondezas da cidade. Trata-se, provavelmente, segundo informações, da antiga Usina de Pau-Rosa existente a partir de 1924.

O local, onde hoje se localiza a Escola Estadual de Ensino Fundamental Deputado Américo Pereira Lima, era ocupado por um campo de futebol chamado Ivan Viana Pará (esposo de dona Aldezi, filha de senhor Osvaldo Meireles Cunha, nossa entrevistada). Lá, eram realizadas, durante o mês de junho, festas juninas e outras manifestações culturais. Foi neste local que começou o grupo folclórico Tribo Muirapinima, a partir de um movimento com o objetivo da angariar fundos para a compra de lajotas, que mais tarde revestiriam o chão das salas de aula.

Antigamente, havia no início desta rua uma importante área comercial, formada por diversos estabelecimentos, um ao lado do

Sítio arqueológico Pacoval da Usina. À esquerda, fornos para extração do óleo. Acima, detalhe de marca e modelo do

equipamento alemão.

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Ruas do Bairro Centro

outro, denominada Vila “Nó Cego”. Eram pequenas baiucas, açougues e frutarias que, com o processo de desenvolvimento em Juruti, foram transformados em grandes casas de comércio.

De acordo com relatos dos moradores atuais, as primeiras famílias que habitaram a rua foram: Pedro Cruz, Francisco Batista (conhecido como Chico Pau), já falecidos, e a de dona Nazaré, que permanece morando no mesmo local.

Com o passar do tempo, a Rua Joaquim Gomes do Amaral sofreu várias modificações em sua estrutura, como o chão de terra natural que deu lugar a uma rua revestida com piçarra, asfaltada alguns anos depois e atualmente sinalizada. A construção de novos prédios – escola, posto de saúde, danceterias, comércios e residências – caracteriza-a como uma das mais movimentadas de Juruti.

O modo de vida foi afetado com a chegada de novos moradores durante a instalação do empreendimento de mineração em Juruti. Exemplos dessas modificações são claros: a confiança entre a vizinhança desapareceu, o diálogo dos finais de tarde foram esquecidos, hoje, raramente são vistos; a tranquilidade das noites também foi se perdendo.

Segundo o relato de senhor Manuel de Jesus, morador da rua desde 1983:

“... eram poucas casas, não tinha esse movimento que tem hoje. Hoje, Juruti não dorme, todo mundo fica acordado...”.

Rua Judith Barroso Pinheiro

Judith Barroso Pinheiro nasceu no município de Juruti e era casada com o senhor Arnaldo Pinheiro. Nilson Barroso Pinheiro, filho do casal, foi prefeito de Juruti em dois mandatos, o primeiro de 1967 a 1970 e o segundo de 1975 a 1978. Foi ele quem nomeou a rua em homenagem à sua mãe, mas os dados da Prefeitura de Juruti indicam que essa rua só foi nomeada oficialmente pelo Prefeito Antônio Assunção Coelho, pelo Projeto de Lei nº 6, de 18 de setembro de 1981.

Inicialmente, a cidade de Juruti era relativamente pequena e as travessas terminavam nos limites da Rua Joaquim Gomes do Amaral. Com o passar dos anos, à medida que a população aumentava, surgiu a necessidade de expandir estes limites. A formação desta e de outras ruas inseriu-se no contexto da intensa migração da zona rural para a sede, a partir da década de 1960.

Entre os primeiros moradores, podemos citar os senhores Silas e Nilson Tibinga, as senhoras Desterro e Toninha.

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Memórias de Rua

Quando a atual Rua Judith Barroso Pinheiro ainda era um caminho, as casas eram feitas de madeira, de palha e posteriormente de tijolo. O primeiro nome deste logradouro foi Rua do Abrigo; essa denominação popular surgiu na década de 1970, a partir de um trabalho social da Igreja Católica sob os cuidados de Irmã Brunildes. Tratava-se de uma casa de apoio para as famílias menos favorecidas, onde ofereciam tratamento aos doentes que não tinham como ir a hospitais em outros municípios. Anos depois, com a chegada de juntas médicas, esse projeto terminou e no mesmo lugar foi construída uma escola de Educação Infantil.

Atualmente, a Rua Judith Barroso é pouco movimentada e parte dela foi asfaltada em 2014; mas na época da pesquisa, em 2009, ainda não tinha asfalto. Nela pudemos encontrar muitas casas de moradores bem antigos como a de senhor Nilson Pinheiro.

Nela, também, se localiza a Associação dos Artesãos do Município de Juruti (AMJU) construída com apoio de Irmã Brunildes e que hoje possui espaço próprio para venda de materiais regionais diversos.

Na Rua Judith Barroso houve grandes modificações estruturais, uma delas foi a construção de um muro que a separa da Rua Fernando Guilhon. Esse acontecimento causou um enorme impacto para os moradores, especialmente aos comerciantes que tiveram de fechar seus estabelecimentos, pois o tráfego de pessoas diminuiu com a construção do muro.

As ruas de Juruti, na década de 1960 eram de chão batido, muitas árvores, casas de palha. Acervo: Comunidade.

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Ruas do Bairro Centro

Rua Firmino Guimarães de Sousa

Firmino Guimarães de Sousa era natural da ilha de Santa Rita, no município de Juruti, onde viveu com sua família nos tempos de criança. Ingressou na vida política e assumiu a prefeitura de Juruti entre os anos de 1955 e 1958. Além de prefeito, exerceu cargo na Câmara Legislativa. Antes de ganhar esse nome, essa rua chamava-se Antônio Queirós,

Documento gentilmente cedido pela Câmara Municipal de Juruti.

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Memórias de Rua

segundo informações dos entrevistados. Conforme dados da Prefeitura, essa via foi nomeada oficialmente pelo Prefeito Antônio Assunção Coelho, pelo Projeto de Lei nº 6, de 18 de setembro de 1981, a seguir apresentada.

Inicialmente, a Rua Firmino Guimarães de Sousa foi marcada pelos pequenos caminhos que cortavam a floresta até as casas dos poucos moradores, que viviam em meio à grande tranquilidade. Com o passar do tempo, a Rua Firmino Guimarães de Sousa sofreu os impactos do desenvolvimento, cresceu na direção leste, recebeu asfalto e mais moradores.

Rua Presidente Juscelino Kubitschek

Com o desenvolvimento ocorrido no município de Juruti desde 1950, sobretudo devido à produção de juta, houve um aumento da população na cidade, pessoas de regiões próximas atraídas pela oportunidade de melhoria de vida. Ao chegarem à cidade, muitas dessas pessoas se depararam com moradores que já haviam se estruturado na área onde hoje se localiza o centro. Devido a esse fator, foi necessária a abertura de novos caminhos que originaram novas ruas, e a multiplicação de moradias; novos bairros se formaram.

Essa via se inicia no Centro, passa pelo Bairro Palmeiras e termina no Bairro São Francisco.

Segundo dados da Prefeitura de Juruti, foi nomeada oficialmente pelo Prefeito Antônio Assunção Coelho, pelo Projeto de Lei nº 6, de 18 de setembro de 1981. Inicialmente com aspecto pacato, sofreu algumas transformações com o passar do tempo.

Essa rua ainda mantém características antigas; não houve muitas mudanças paisagísticas e as casas estão bem conservadas, ainda habitadas pelas famílias originais. Ainda se pode encontrar residências feitas à moda antiga, construídas de madeira, palha, e as famosas casas de taipa que eram construídas de barro, palha de naja, o talo da palha e o barro. A palha servia como cobertura da casa, o talo como estrutura das paredes para fixar o barro. Atualmente, as casas não são mais construídas dessa forma, devido ao surgimento de novos materiais e novas formas de construção.

Os moradores mais antigos contam que quando chegaram, tudo era mato e foram abrindo caminhos, aos poucos, com ajuda de uns e outros. Em 2009, ainda pudemos pisar em uma rua de chão batido, sem muitas modificações. Alguns moradores relataram que,

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Ruas do Bairro Centro

de início, construíram suas casas próximas à rua, e depois o prefeito mandou fazer as casas em locais mais adequados, com recuos, para organizar os quarteirões do Bairro Centro.

Segundo relatos de alguns moradores, sabe-se que chegaram por volta de 1977 na cidade, nessa época o prefeito era Nilson Pinheiro passando o cargo para Antônio Assunção Coelho. Começou a construção das casas e a formação do bairro.

Nesta rua, podem-se encontrar moradores antigos. Entre eles é possível recuperar trajetórias de vida com algumas características comuns: a chegada a Juruti nas décadas de 1960 e 1970; a ausência de trabalho e de renda fixa, a busca por trabalho – os homens fazendo serviços diversos por diárias, as mulheres buscando costuras, ou trouxas de roupas para lavar e passar . Além de filhos biológicos, não raramente os casais assumiam também crianças por adoção. De início a moradia se dava em casa de aluguel; mas, com o tempo o casal comprava um terreno e ia aos poucos construindo uma casa. Em relação à alimentação, a pesca, realizada por elementos da própria família, era um recurso valioso. Aos poucos, as atividades iniciais, temporárias e variadas, iam sendo substituídas por outras, permanentes.

Entre as principais ruas do centro de Juruti esta é apenas mais uma entre tantas que se destacam com grande valor para a cidade. O seu passado nos leva a uma realidade de vida diferente da dos dias atuais, com moradores diversificados e histórias que preenchem a mente de jovens e adultos que interagem com a história deste município.

A Rua Juscelino Kubitschek retrata a vida de moradores que lutaram com muito trabalho e que venceram com tempo para que pudessem chegar ao patamar de vida em que se encontram atualmente. Em meio a toda essa história, descobrimos que temos uma riqueza de conhecimento incalculável que acabamos não dando muita atenção ou valor, mas podemos extrair grandes conhecimentos que nos beneficiarão futuramente.

Avenida Presidente Tancredo de Almeida Neves

Segundo dados da Prefeitura de Juruti, essa rua foi nomeada oficialmente pelo Prefeito Madson Auzier Pinheiro, pelo Projeto de Lei nº 1, de 18 de junho de 1985, e antes se chamava Raimunda da Silva Coêlho, conforme documento gentilmente cedido pela Câmara de Vereadores.

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Memórias de Rua

Na década de 1980, Juruti era uma cidade pequena e pouco habitada se comparada à atualidade. A sede distrital estava compreendida entre as Travessas Padre João Brás e Lauro Sodré, onde morava a maior parcela da população.

Com o crescimento demográfico, tornava-se necessário ocupar os lugares mais afastados do centro, por isso começou a ocupação do que era até então a extremidade da cidade, na época cercada por grandes áreas de floresta.

Acervo: Câmara dos Vereadores de Juruti.

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Ruas do Bairro Centro

Segundo informações que chegaram ao conhecimento da equipe, esta rua surgiu provavelmente há 70 anos, a partir de um caminho feito pelas primeiras famílias que se estabeleceram neste local. Um dos principais fatores que contribuiu para a intensificação do povoamento desta rua foi, sem dúvida alguma, o fenômeno natural das terras caídas. A princípio, não havia ruas e as pessoas chegavam até suas residências andando por pequenos caminhos, feitos pelas próprias famílias.

Dizem os idôneos moradores da Avenida Tancredo Neves, que quando a rua começou a ser formada, a maioria das casas era feita de madeira e palha, além disso, não havia muito barulho e a vida era tranquila, com relação à violência.

Há, na Avenida Tancredo de Almeida Neves, um trecho formado por quatro quarteirões, conhecido historicamente como Caierão. Essa denominação popular surgiu há alguns anos, quando o atual campo do Clube do Remo era ainda utilizado por diversas famílias que trabalhavam na produção do carvão. Além disso, ela ajuda a conhecer um pouco da história econômica de Juruti.

A falta de emprego era uma das dificuldades enfrentadas pelos jurutienses em meados da década de 1980, por isso algumas atividades econômicas, hoje pouco praticadas, eram de certa forma grandes fontes de renda, principalmente para as famílias mais carentes. Assim, muitas pessoas ganhavam a vida a partir da produção do carvão em caieiras, originando o sugestivo nome, como diz dona Ana:

“Esse bairro ficou conhecido como Caierão porque onde hoje é o campo do Remo era o lugar aonde as pessoas vinham e faziam Caiera (buraco onde se produz o carvão), quando a gente andava, a gente pisava nos buracos das Caieras e os pés ficavam pretos com o pó do carvão. Isso eu ainda vi de perto”.

Na Rua Tancredo Neves ocorriam comemorações coletivas que envolviam as famílias dos moradores, como o Natal. Alguns desses moradores ainda buscam manter esse espírito de comunidade.

No que se refere à existência de estruturas, nos dias de hoje, é destacada na avenida a existência do Estádio Pimpão, do clube do Remo.

Rua Américo Pereira Salgado

O nome da rua foi uma homenagem feita ao primeiro farmacêutico da cidade, senhor Américo Pereira Salgado, morador que muito fez pela comunidade local.

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Memórias de Rua

Esta rua, diferentemente das demais do município que estão em constante mudança, permanece quase sem transformações. Ela é parte do que restou da rua original, bem maior, com aproximadamente 180 metros de comprimento, parte perdida nas águas do rio Amazonas com o fenômeno das terras caídas, segundo seus moradores mais antigos.

Há poucas edificações, mas todas guardam reflexos de uma sociedade de aspecto simples. Um exemplo é uma casa que se encontra em estado de ruína e abandono, construída por volta de 1930 pelo senhor Raimundo Marialva para uso comercial. Os últimos moradores foram dona “Pequi” e seu marido, que moravam nela com a permissão do dono.

Outro prédio que chama a atenção é o Hotel Mimi, dizem ser um dos primeiros hotéis da cidade e que ainda mantém quase todas as características antigas.

Pela sua antiguidade, essa rua não foge às histórias sobrenaturais e lendas. Senhor Almiro Souza, mecânico e morador antigo, conta que na rua há uma história de visagem, a do “Cachorrão”, que acontecia sempre à noite quando o fornecimento de luz era interrompido:

“Ele costumava aparecer às onze da noite porque a luz ia das seis às onze e a hora que apagava a luz, aí o cachorro aparecia, também as visagens começavam a fazer festa na rua”.

Uma rua calma e aparentemente esquecida, mas que guarda na memória parte da história de Juruti especialmente na época de desenvolvimento da cidade.

Parte da Rua Américo Pereira Salgado, ainda não asfaltada em 2009.

Hotel Mimi, apontado como um dos mais antigos da cidade, mantém sua arquitetura tradicional.Dona Maria Ivaneide - D. Mimi -i foi entrevistada

em 17/11/2009.

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Ruas do Bairro Centro

Travessa Padre João Braz

Esta travessa ganhou a denominação em homenagem a uma ilustre personalidade ligada à história de Juruti, o primeiro vigário na atual sede municipal.

O Padre João Braz Roberto Pimentel chegou a Juruti em 26 de junho de 1889. Trabalhou durante muitos anos em Monte Alegre, no entanto, mudou-se para Juruti onde se destacou na vida religiosa. A história de sua viagem para Juruti foi publicada em um jornal santareno.

“De a “Tribuna do Monte”, de cinco de junho de 1889, órgão da imprensa editado na vizinha cidade de Monte Alegre, cujo exemplar nos foi gentilmente ofertado pelo venerando senhor Pedro Arruda, tabelião do cartório 1.º ofício, de onde extraímos o seguinte: O vigário encarregado desta paróquia, não podendo despedir-se de todas as pessoas que se dignaram dispensar-lhe parte de sua amizade, vem por meio da imprensa fazer o agradecimento a todos os que não foram comunicados, dizendo que ao partir para Juruti leva consigo lembranças e saudades deste povo pelo qual tem muito carinho. Oferece a todos os seus amigos, assim considerados, a sua utilidade na vila de Juruti, onde administrará a obra da igreja de Nossa Senhora da Saúde.” (Fonte: Correio do Interior, 1966, pág.10).

Ao chegar a Juruti, construiu uma pequena igreja na Rua Major Pinto e Silva e, posteriormente, o santuário de Nossa Senhora da Saúde, hoje igreja matriz do município.

Posteriormente, envolveu-se com uma fiel com quem teve duas filhas. O Padre faleceu em Juruti, no ano de 1899, e seus restos mortais encontram-se repousados no Cemitério da Saudade. Anos depois de sua morte, o seu nome passou a designar uma das primeiras ruas de Juruti, a Rua Padre João Braz.

Túmulo do padre João Braz, no Cemitério da Saudade, Juruti.

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Memórias de Rua

A rua tem início no centro da cidade e termina às margens do Lago Jará, um dos principais mananciais de água doce de Juruti. O número de pessoas que habitava essa travessa era muito pequeno e seus primeiros moradores construíram suas casas nas proximidades do rio Amazonas onde a rua começava. A maioria das habitações era coberta com palha e possuía paredes de taipa.

Com o passar do tempo, foram chegando cada vez mais moradores, e hoje é uma travessa com muitos habitantes.

Travessa Major Pinto e Silva

A travessa se originou a partir de uma pequena estrada de terra batida construída por aqueles que se preocupavam com a organização do espaço em que estavam inseridos. Inicialmente, era habitada por poucas famílias e as casas eram feitas de palha, de madeira ou de barro, conforme o gosto ou a possibilidade dos donos.

O nome desta travessa homenageia o Major Pinto e Silva. Pouco se sabe sobre a biografia do homenageado, apenas que era natural do Rio de Janeiro e veio servir em Juruti a convite do então prefeito, Abdias Arruda, responsável pela nomeação desta via pública na década de 1960.

No início da ocupação de Juruti o comércio existia, mas a forte expressão econômica estava nas plantações que a comunidade fazia nas proximidades de suas residências. Isto acabou ajudando no desenvolvimento desta artéria, pois os caminhos que faziam até as roças, depois de muitos anos, foram transformados em ruas.

Com o passar do tempo, na medida em que a população aumentava, novos moradores foram chegando, o que levou à expansão da cidade. Assim, o lugar ia mudando gradativamente, o que se ainda percebe através dos estilos de construções que vemos hoje, depois de mais de um século.

No período em que o padre João Braz residiu no município, enquanto era

Travessa Major Pinto e Silva, em 2010.

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Ruas do Bairro Centro

construída a Igreja Matriz Nossa Senhora da Saúde, as celebrações se realizavam em uma pequena capela na Travessa Major Pinto e Silva que por meses funcionou como templo católico. Este se localizava vizinho à casa onde o padre morava com sua família.

A antiga sede da Escola Estadual de Ensino Fundamental Deputado Américo Pereira Lima situava-se nesta rua. Na década de 1980, devido às ameaças das terras caídas, o prédio sofreu rachaduras, as aulas foram suspensas e os alunos foram transferidos para o novo prédio na Rua Joaquim Gomes do Amaral. A última escola a ser construída nesta rua foi o Educandário de Nossa Senhora da Saúde, pelos padres que administravam a paróquia nessa ocasião, com ajuda da população jurutiense.

Assim como as demais ruas de Juruti, esta apresenta uma exuberante riqueza cultural, pois seus moradores herdaram de seus antepassados a doce forma de transmitir os mitos e lendas de geração em geração. Nos finais da tarde, era comum que as pessoas contassem essas histórias, não deixando, assim, morrer os costumes.

Dentre as principais lendas desta rua destaca-se a da “Mulher de Branco”. Conta-se que, há muito tempo, quando ainda eram poucas as casas da rua, a maior parte em taipa, e não havia iluminação pública, pessoas voltando de uma festa viram uma mulher de vestido branco comprido e com a cabeça coberta por um pano também branco, com sandálias de verniz que brilhavam á luz do luar. Essa visagem passava bem devagar pelas pessoas e se detinha sob um cajueiro, onde desaparecia.

Antigamente, a Travessa Major Pinto e Silva terminava na Rua Joaquim Gomes do Amaral, mas a necessidade de terrenos para novas casas levou os moradores a expandi-la e hoje é totalmente habitada, desde o porto da cidade até as proximidades do Lago Jará.

Irmã Brunildes, apesar de não ter residido nesta artéria, é nela muito lembrada, pois estimulou e ajudou a construção de casas, escolas, postos de saúde e associações comunitárias em todo o município. Essa religiosa alemã, desde 1970, se envolveu na vida da população jurutiense a fim de colaborar nas mudanças sociais. Desenvolveu os mais audaciosos projetos sociais para ajudar as famílias menos favorecidas.

Senhor Nino Gonçalves Guimarães reside nesta rua há muitos anos. Hoje com 84 anos, conta o que percebeu durante esse longo processo de desenvolvimento, que viu de perto. As informações que transmite são bem antigas, chegando a relatar até mesmo os fatos e acontecimentos que o antecederam, mas que lhe foram transmitidos por seus pais.

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Memórias de Rua

Senhor Nino destacou-se entre os demais como um dos grandes colaboradores para a cultura do município, e por isso ganhou o certificado de Honra ao Mérito Cultural no ano de 2007, por incentivos sociais e culturais em Juruti. Foi fundador do famoso Boi-Bumbá Campineiro, que por vários anos comandou a diversão nesta cidade. Os ensaios, assim como a confecção de adereços necessários para as apresentações, eram realizados em sua casa, à margem da Travessa Major Pinto e Silva. Dessa maneira, senhor Nino tornou-se conhecido e conceituado em Juruti como um homem de coragem que não mediu esforços para elevar o festival de Juruti à categoria de maior manifestação cultural do oeste do Pará.

Hoje, a Travessa Major Pinto e Silva está totalmente povoada e asfaltada até a esquina com a Rua Tancredo de Almeida Neves.

Dentre os moradores mais antigos estão: dona Lauriana, dona Cristina, dona Nane, senhor Nino Gonçalves Guimarães, senhor Olívio, senhor Dorcílio.

Travessa Barão do Rio Branco

Esta travessa foi assim denominada em homenagem ao ilustre brasileiro José Maria da Silva Paranhos, agraciado com o título de Barão do Rio Branco pelo imperador Pedro II.

A Travessa Barão do Rio Branco foi criada com o intuito de facilitar o acesso para a Rua Marechal Rondon, que fora criada na mesma época. A travessa era e ainda é uma das principais da cidade. De início, ela apresentava capim em suas laterais, era mais extensa e íngreme em relação ao que é hoje.

Com as mudanças climáticas que o mundo estava sofrendo, vieram

Apresentação do Boi Campineiro, 1992.Acervo: Nino Guimarães.

Trabalho de construção das casas pela Cáritas, em Juruti liderada por Irmã Brunildes. Sem data.

Acervo: Régia Pinheiro.

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Ruas do Bairro Centro

consequências que ocorrem na Amazônia há muito tempo, e uma delas foi o fenômeno das terras caídas. Como a Travessa Barão do Rio Branco dava acesso para frente da cidade, onde caíram quase todos os prédios, muitas pessoas ficaram desabrigadas e muitos comerciantes perderam toda a mercadoria em poucos minutos. A queda das terras

prejudicou a economia do município, deixando uma enorme cratera na frente da cidade e na travessa.

A Travessa Barão do Rio Branco, hoje, tem grande quantidade de casas comerciais e nela se localiza o Mercado Municipal Isaias Batista, inaugurado em setembro de 1992. Isaias Batista, prefeito da época, havia chegado ao poder no município com o apoio do deputado Jader Barbalho.

Travessa Barão do Rio Branco com adorno em comemoração ao Festribal.

Travessa Barão do Rio Branco: Mercado Público, em 2010.

Travessa Barão do Rio Branco, no início dos anos 2000. Ao fundo, rio Amazonas. Acervo: Maria do Carmo Batista Pereira.

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Memórias de Rua

Travessa Manoel Marinho

O sr. Manoel Marinho chegou a Juruti por volta de 1945, provavelmente proveniente da região de Lago Grande, Santarém.

Casou-se com a sra. Benitah da Silva Soares, com que teve 12 filhos: Mozart Tibiriçá, Mério Paraguaçu, Mitre Caramuru, Mário Junior, Sulamericano, Mússilo Araguaia, Max Baré, Meblia Neengahiba, Mikal, Iara, Mozete Guajará e Musa Brasileira.

Poeta, atuou como agente de estatística, delegado, funcionário municipal; jornalista colaborador da Folha do Norte e professor do antigo ensino primário. Faleceu em 1951.

Além da via, o nome Manoel Marinho foi dado à biblioteca da cidade.

Construção da Rua Belém e da Travessa Barão do Rio Branco.

Acervo: Paróquia.

Casa antiga entre a Travessa Barão do Rio Branco e a Rua Belém.

Sr. Manoel Marinho.

Acervo Meeblia Neehgahiba.

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Ruas do Bairro Centro

Travessa Lauro Sodré

Esta travessa recebeu o nome de um importante republicano e abolicionista do Pará, Lauro Nina Sodré e Silva, o primeiro governador constitucional do estado. Seu mandato perdurou de 1891 a 1897. Deste último ano a 1922, foi eleito senador quatro vezes, três pelo Pará e uma pelo Distrito Federal. Neste ínterim, foi novamente eleito governador do estado entre 1917 e 1921.

Foi o único governante do Norte do Brasil que não aderiu ao golpe desencadeado, em 1891, pelo Marechal Deodoro da Fonseca. Por suas virtudes cívicas e administrativas, tornou-se um político estimado pela população. Seu nome é homenageado em institutos, palacetes e ruas na capital e em outras cidades do estado do Pará, como nesta travessa do município de Juruti.

Trata-se de um dos mais antigos logradouros de Juruti, de forma que não foi possível verificar a data exata de fundação, bem como seu fundador, pois não existem registros sobre a história das ruas de maneira geral. Esta travessa era a principal via que ligava o porto ao Lago do Jará. O início da rua, à margem do Amazonas, servia para o embarque e desembarque dos produtos agrícolas que vinham da zona rural para serem comercializados na cidade.

Segundo contam os jurutienses mais antigos, essa área era utilizada pelos primeiros moradores como roça para o plantio da mandioca, matéria-prima para a produção da farinha. Além disso, eram cultivados outros alimentos como batata, milho, feijão etc.

Todos esses fatores fizeram com que, aos poucos, se originasse um longo caminho, que mais tarde ficaria conhecido como Travessa Lauro Sodré, antes constituída apenas por terra batida.

A Travessa Lauro Sodré possui uma característica que a diferencia de todas as outras ruas de Juruti, pois é a única na qual foram plantadas mangueiras alinhadas, dando um toque especial de beleza natural a este cenário.

No lado direito desta travessa foi construída pelo poder público do município, a primeira Prefeitura de Juruti, edifício onde hoje funciona a Câmara dos Vereadores.

Uma das moradoras marcantes foi a senhora Zelinda de Sousa Guimarães, que dedicou parte de sua vida à educação, fazendo de sua própria residência uma escola na qual seus aprendizes eram educados. Dona Zelinda morou por toda sua vida em Juruti, nesta travessa, aonde veio a falecer. Esses dados foram narrados por seu sobrinho, senhor Omar Guimarães, que herdou a casa. Vale dizer que

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Memórias de Rua

a educadora Zelinda era também poeta e narrou a beleza local em verso e prosa. Além disso, também está imortalizada na memória local, pois nomeia uma escola municipal de Juruti.

Ainda podemos encontrar, nos dias atuais, várias casas antigas, que mantêm no espaço a materialização e marcas de um período histórico específico. Essas casas devem ser bem conservadas, pois integram o patrimônio edificado de Juruti. Se forem destruídas, se perderá parte da identidade que está marcada e pode ser contada por meio do estilo construtivo, como a casa de senhor Hildeberto.

A Farmácia e Drogaria do Povo foi o primeiro estabelecimento comercial nesta rua. Resistiu ao tempo e, hoje, encontra-se com suas características arquitetônicas relativamente preservadas, representa um estilo de construção característico das décadas entre 1940 e 1960.

Em 1963, Abbas Arruda, um dos moradores desta rua, assumiu a prefeitura de Juruti. Ele é bastante lembrado por ter trazido para Juruti o sistema de água encanada, tendo construído, durante a sua gestão, a caixa d’água às margens da Travessa Lauro Sodré, onde permanece até hoje.

A Travessa Lauro Sodré e suas mangueiras.A Travessa Lauro Sodré em outubro de 1984, ainda sem asfalto, onde se destaca a então

Prefeitura, hoje Câmara dos Vereadores. Acervo: Régia Pinheiro.

A Farmácia e Drogaria do Povo mantém a estrutura eclética na arquitetura.

Nesta rua, outras residências também mantêm a arquitetura antiga e austera.

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Ruas do Bairro Centro

Há, ainda, o famoso pequizeiro (árvore frutífera) que é considerado patrimônio natural de Juruti. A utilidade do pequi foi aprendida com os indígenas, que não somente consomem o fruto, mas também o utilizam como matéria-prima para a fabricação de um corante escuro comum para tingir redes.

Muitas pessoas dizem que debaixo desta árvore, nas noites de lua cheia, aparecem assombrações que amedrontam aqueles que passeiam sozinhos pela rua.

Travessa Rui Barbosa

A travessa ficou assim conhecida para homenagear uma figura de renome nacional. Rui Barbosa nasceu em 1849, na Rua dos Capitães, hoje Rua Rui Barbosa, Freguesia da Sé, na cidade de Salvador, na então Província da Bahia. Aos 5 anos, fez seu professor Antônio Gentil Ibirapitanga exclamar: “Este menino de 5 anos de idade é o maior talento que eu já vi. (...) Em 15 dias aprendeu análise gramatical, a distinguir orações e a conjugar todos os verbos regulares.” Sem dúvida, um dos homens mais inteligentes de seu tempo, atuou na política e nas ciências, era um patriota e hoje tem homenagem em quase toda as cidades do Brasil.

Em Juruti, o local onde hoje se estende a Travessa Rui Barbosa era uma vasta mata fechada, cercada por árvores e habitada apenas pelos animais, como diz dona Lizete Alves: “As ruas eram cheias de árvores e pássaros voando”.

Segundo informações transmitidas durante as entrevistas, essa travessa originou-se a partir de uma pequena estrada feita pelos próprios moradores, que se organizaram em chamados puxiruns para abrir os caminhos, utilizando para isso ferramentas muito comuns como: terçados, enxadas e outros. Dessa maneira, o espaço geográfico ganhava uma nova cara, a partir da intensa interferência humana no meio ambiente.

Seus primeiros moradores, muitos dos quais já se foram, chegaram a vê-la numa época em que as famílias ainda praticavam a agricultura de subsistência.

Esta travessa sempre abrigou grande quantidade de residências e algumas pequenas mercearias. Muitas vezes, eram colocadas nesta área grandes quantidades de terra para conter a erosão, o que não adiantava, pois com as chuvas o problema voltava trazendo mais destruição. Como conta dona Lizete Alves:

“Não tinha porto, aí na direção do porto era apenas uma ribanceira bem alta. Com a erosão essas coisas foram caindo a terra e ficou uma parte bem acidentada e foi tirando as casas de lá (...)”.

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Memórias de Rua

Atualmente, existe no início da rua o porto de Juruti para o embarque e desembarque de pessoas e mercadorias. Para que isso fosse possível, foi necessária a construção de novas estruturas, que ganharam mais segurança com o asfaltamento.

Na Travessa Rui Barbosa permanece uma mangueira gigante que já se tornou símbolo do lugar, considerada patrimônio natural de Juruti. Além das frutas, oferece sombra durante o dia.

É conhecida uma considerável quantidade de mitos e lendas, cada pessoa conta diferentes histórias, como disse dona Lizete Alves:

“Aquela história da Matinta Pereira. Teve gente que sentiu a presença dela e logo depois ouvia o seu canto. Aqui na rua mesmo, alguns contam que prometiam para ela tabaco, eu nunca vi. Também falam do cavalo, inclusive o delegado contou que viu esse cavalo que se transformava. Seguiu atrás do cavalo até aqui no meu quintal, onde havia uma casinha velha, ele entrou e o cavalo querendo entrar. Quando ele olhou, o cavalo ia descendo lá mais ou menos no ‘seu’ Otávio. Ele contou que o cavalo ainda arranhou a porta.

Isso foi verídico! Várias pessoas o viram entrar na casa do compadre José Lúcio”.

Juruti sempre foi uma cidade privilegiada quanto às manifestações culturais, no entanto, havia uma grande necessidade de um local onde os grupos pudessem fazer suas apresentações. Por isso, foi construída na Travessa Rui Barbosa, uma quadra para solucionar esse problema. Lá, eram feitos os arraiais juninos e outras festividades. Foi lá que os grupos folclóricos das Tribos Mundurucu e Muirapinima começaram a trajetória de sucesso hoje existente. Hoje, nesta rua existe o Universo Mundurucu, onde acontecem festas constantemente. É na parte mais afastada desta rua, que margeia a Arena Tribódromo, na altura da Rua Arnaldo Pinheiro, onde acontece o Festribal no mês de julho.

Travessa Floriano Peixoto

A denominação é uma homenagem a Floriano Peixoto (1839–1895) que tem seu nome registrado em diversas cidades do Brasil. Integrante do Exército Brasileiro, posteriormente ingressou na vida política, chegando a exercer a presidência da então República dos Estados Unidos do Brasil, entre 1891 e 1894.

Como quase todas as ruas do município, a Travessa Floriano Peixoto foi aberta a partir de uma pequena estrada feita pelas famílias com

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Ruas do Bairro Centro

intuito de ligar as casas a lugares mais distantes para obtenção de lenha para fazer fogo e preparar alimentos.

No local predominavam roças para a prática da agricultura familiar. Parte dessa rua foi destruída pelo fenômeno natural das terras caídas, na década de 1980. O fenômeno causou pânico nas famílias que deixaram suas casas e saíram à procura de um novo lugar propício para mais uma vez construírem seus lares. Ainda hoje podemos encontrar os rastros desse acontecimento, através das marcas causadas pela erosão.

A primeira pavimentação desta rua foi feita de concreto, posteriormente recebeu a pavimentação asfáltica que permanece até hoje.

Entre os moradores mais antigos destaca-se dona Lauli Soares de Souza, de 83 anos, mãe do vereador Raimundo de Souza Coelho (1949-1997), cujos restos mortais repousam no Cemitério da Saudade. Ela viu de perto as mudanças que ocorreram durante este longo percurso de moradia na travessa estudada, como relata:

“Eu nasci e me criei neste lugar, quando cheguei aqui quase tudo era mato e hoje só se vê casas, comércio e lojas e com isso passou de uma pequena estrada para a rua grande que temos hoje.”

Travessa Floriano Peixoto às margens do rio Amazonas.

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Memórias de Rua

Travessa Vereador Turíbio Vieira

Este logradouro foi assim denominado em homenagem a um ilustre personagem político de Juruti. Turíbio Vieira foi um dos primeiros jurutienses a ocupar uma cadeira na Câmara Municipal, no período em que a democracia retornava ao Brasil.

Ele nasceu na ilha de Santa Rita onde viveu por vários anos, casou-se e constituiu família. Naquela época, só havia as primeiras séries do Ensino Fundamental na comunidade, por isso mudou-se definitivamente para Juruti, pois seus filhos precisavam dar continuidade aos estudos na sede distrital.

Segundo os entrevistados, este homenageado era um cidadão de caráter generoso e se comovia diante da péssima situação econômica de várias famílias da região. Sempre gostou de ajudar os mais necessitados, e ficou conhecido pela vontade que tinha de lutar pelos direitos da população.

Posteriormente, ingressou na vida política e candidatou-se a uma vaga na Câmara Municipal, sendo eleito o vereador mais bem votado em seu pleito. Após sua gestão, mudou-se para Belém por motivos relacionados à saúde, onde faleceu, lá deixando seus parentes.

Esta travessa teve sua origem de uma pequena estrada feita com objetivo de ligar as residências ao porto da cidade, onde se concentrava a mais importante área comercial de Juruti. A partir de meados do século XX, era comum a migração de pessoas das comunidades rurais para a sede do município, em busca de melhores condições de vida; eram poucas e concorridas ofertas de trabalho, e a produção de juta era a atividade que mais rendia lucros.

Outro ponto da Travessa Floriano Peixoto: rua asfaltada e mangueiras.

Vista da travessa Vereador Turíbio Vieira, em 2012.

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Ruas do Bairro Centro

A preferência dessas pessoas era habitar nas proximidades do porto da cidade, porém certas famílias resolveram alojarem-se um pouco mais distante dali, no local onde hoje está assentada a Travessa Turíbio Vieira.

Inicialmente, era formada por poucas moradias, cujos donos praticavam a agricultura de subsistência em terrenos, seus produtos principais eram a mandioca para produção de farinha, o milho, a melancia e o jerimum. Assim permaneceu a rua por vários anos, ocupada por poucas famílias e cercada por grandes áreas de floresta.

Com o aumento da população de Juruti, também aumentava a necessidade de expandir a zona urbana, isso fez com que a travessa recebesse expressivo número de habitantes, alargamento da via trafegável e maior extensão; atualmente, localiza-se nos limites de três bairros: Centro, Bom Pastor e Maracanã.

Na década de 1960, o general Abbas dos Santos Arruda determinou a construção da Escola Municipal de Ensino Fundamental Dr. Abdias de Arruda no lado direito desta rua, assim nomeada em homenagem ao seu pai. Em 2009, a antiga escola Abdias de Arruda passou a se chamar Elza Albuquerque de Lima (foto sequente) na gestão municipal do prefeito Manoel Henrique Gomes Costa – passando assim a homenagear uma professora do município, muito aclamada, que veio a falecer muito jovem, com apenas 37 anos, e foi enterrada no Cemitério da Saudade.

No dia 2 de outubro de 1993, o governo estadual inaugurou nesta rua a mais importante obra relacionada à área de saúde de Juruti, o Hospital Municipal Pedro Vallinoto que ainda está em funcionamento.

Vista da travessa Vereador Turíbio Vieira, em 2012. Na Travessa Vereador Turíbio Vieira o escritório da Scientia permaneceu por sete anos. Foto de 2014.

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Memórias de Rua

Apesar dos anos que se passaram, ao longo dos quais muitas mudanças ocorreram, ainda é possível encontrar na Travessa Vereador Turíbio Vieira várias casas com suas características originais de construção relativamente bem preservadas, é o caso da residência de dona Paixão, do lado direito deste logradouro, atualmente pintada de azul.

Um dos primeiros moradores da rua foi o senhor Luiz Anastácio Cardoso, vereador de 1963 a 1966. Ele tinha uma casa feita de madeira embutida por barro, estilo tradicional chamado de taipa. Após seu falecimento, os novos donos do estabelecimento construíram uma nova casa.

Não podemos falar desta travessa sem se lembrar de dona Nadilza, que se tornou marca registrada do lugar devido à venda do tacacá, famoso em toda cidade desde anos atrás.

Ao longo de vários anos, a Travessa Vereador Turíbio Vieira passou por várias transformações e, como resultado, temos hoje uma das melhores vias trafegáveis do município. Inicia-se na Rua da Saudade e termina às margens do Lago Jará.

Escola Elza Albuquerque Lima, em 2012.

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Entrada do Hospital Municipal.

Casa de dona Paixão, uma das primeiras, ainda mantém as características originais.

Ruas do Bairro Bom Pastor1

1 - Texto produzido pelos estagiários dos anos de 2011, 2012 e 2013.

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Memórias de Rua

Rua da Saudade

A Rua da Saudade é uma das mais importantes da cidade de Juruti. No início, conforme relatam os antigos moradores, ela era apenas um caminho, cheio de lama, buracos e mato, era abundante em árvores frutíferas, por exemplo, tucumanzeiros e taperebazeiros. Não havia eletricidade, as pessoas utilizavam lampiões como fontes de luz.

Era um caminho de grande circulação dos moradores que iam para o Bairro da Terra Preta, sendo até mesmo apelidada por alguns como “Estrada da Terra Preta”. Esse bairro não existe mais, sendo hoje área que abriga o Terminal Portuário da Alcoa.

“Quando eu conheci isto aqui era apenas uma estrada! Caminho que vinha do centro da cidade de fora para essa área que é chamada de Terra Preta. Apenas um caminho”. (Ladimil Salgado).

A Rua da Saudade era conhecida como Doutor Moraes Jardim, que segundo os antigos moradores, morava em frente ao cemitério. Com o tempo, passou a ser chamada de Rua da Saudade, especificamente no período de administração do General Abbas Arruda (década de 1960), que determinou a substituição da cerca circundante do cemitério por um muro, a nomeação da necrópole como Cemitério da Saudade, a instalação de meio-fio e colocação de piçarra na via, que então ficou conhecida como Rua da Saudade.

“Só que nesse tempo (...) era Moraes Jardim, que era porque tinha um senhor antes, já em 1960, que morava em frente ao cemitério, seu sobrenome era Jardim, e eu acho que era por isso”. (Evilazio Maciel de Lima)

“O General Abbas Arruda, quando chegou aqui, existia apenas

Entrevista com senhor Ladimil Canto Salgado, em 15/4/2011.

A casa do senhor Evilázio Maciel de Lima, entrevistado em 25/4/2011, mantém a bela arquitetura antiga.

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Ruas do Bairro Bom Pastor

uns paus fincados, para os porcos não entrarem lá, nos defuntos. Ele mandou colocar esse muro, no tempo foi ele, obra dele, do Abbas de Arruda, o general, e ele colocou esse nome, na placa que tinha bem no portão, “Cemitério da Saudade, homenagem aos que partiram”. Eu acho que foi por isso, em homenagem aos que partiram, saudades daqueles que foram”. (Firmino Santarém Gomes)

A seguir, trecho do Jornal “Correio do Interior” do ano de 1966 que narrou o desenvolvimento tanto do cemitério como da referida Rua da Saudade.

Homenagem aos que partiram

O empiçarramento da Rua da Saudade no trecho compreendido entre a Rua Rui Barbosa e a Floriano Peixoto, foi terminado, tendo parcialmente resolvida, com os bueiros construídos no ano anterior, a questão do desmoronamento paulatino daquela artéria.

[...] na Travessa Américo Pereira Salgado, no trecho da área portuária, [as obras permitiram] visível elevação do nível dessa via pública [...].

O Cemitério Público da Saudade foi dividido em quadras, cimentado o passeio central e construído um Cruzeiro de cimento armado, em substituição à velha cruz de madeira existente ao centro daquela metrópole. A fachada de muros está praticamente terminada.

Por falta de recursos materiais e humanos, a praça da matriz não recebeu ainda a devida urbanização, sendo contemplada apenas com a necessária arborização, que muito benéfica será no futuro. (Fonte: Jornal Correio do Interior - Santarém Pará, 18 de outubro de 1966)

A Rua da Saudade teve diversos moradores pioneiros, pessoas que já moravam aqui na cidade de Juruti, e outras que vieram de fora. Um deles foi o senhor Júlio Arigó e dona Delina, sua esposa.

Outro foi o senhor Diquinho, que segundo alguns moradores, fora o homem mais rico da rua; dona Terência, que morava próximo da Celpa (fornecedora de energia elétrica da cidade de Juruti), e dona Pequi, uma senhora que foi assassinada, seu filho é um conhecido jornalista de Manaus, apelidado de “Formiguinha”. Outra senhora muito conhecida era a dona Zulmira, funcionária da prefeitura,

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Memórias de Rua

parteira, e uma das responsáveis pela limpeza da rua, morreu aos 110 anos de idade. Morava também nesta rua dona Maria, que morreu aos 100 anos de idade.

Outros nomes conhecidos são Antônio Rodrigues, João Pontes, dona Raimunda Torres, senhor Terilo, senhor Luiz, dona Perente, senhores Chico Maciel, Orlando, Aurélio, Democlis, Saviano, Zé Gomes, Donga, Perilo.

“Não estão mais vivos, já morreram todos eles, dona Catita, ‘seu’ Terilo, ’seu’ Luiz, dona Raimunda (Mundica Torres) todos esses já não existem mais. Lulu, que era também umas das antigas moradoras, também não existe mais”. (Raimunda da Silva Araújo).

O processo de ocupação da Rua da Saudade ocorreu de forma gradativa, muitas das pessoas que vieram para Juruti, moravam em regiões próximas.

“Foi chegando muita gente (...), que foi naquela enchente grande. Aí, muitos deles fizeram suas casas aqui, a maioria veio da Ilha do Vale (...). Foi tomado de casas, tudo por aqui cheio. Mas agora não existem mais, todos foram embora, outros morreram”. (Raimunda Rodrigues da Silva).

As casas antigas geralmente eram feitas de palha, madeira, taipa, “barriadas” como se diz por aqui, não eram comuns no município casas de alvenaria com telha de barro. A maioria das casas ficava localizada nas margens do rio, o que facilitava o acesso à água, pois naquele tempo não havia água encanada.

“A minha casa era outra, era diferente, ela era assoalhada, coberta de palha, feita de taipa, embarriada, como alguns chamam”. (Raimunda Rodrigues da Silva)

Porém, com o tempo, a situação começou a mudar, as casas que antes eram de taipa e madeira, passaram assim a ser de alvenaria,

Casa de senhor Firmino Santarém Gomes, entrevistado em 15/4/2011, é uma das casas

‘embarriadas’.

A lamparina e o ferro de passar são os antigos instrumentos que senhor Firmino Santarém

ainda guarda.

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Ruas do Bairro Bom Pastor

com telhas de barro. Muitas pessoas receberam ajuda do governo para reformar suas casas.

“Eu tinha um sonho de fazer uma casa de alvenaria, nós fizemos a segunda casa, era de varanda, tinha a calçada grande, larga, tinha a sala e dois quartos”. (Raimunda Rodrigues da Silva)

A Rua da Saudade possui algumas tradições que se mantêm até os dias de hoje, um exemplo disso são os “Encomendadores de Alma”, um grupo de pessoas que toda Quinta-feira e Sexta-feira Santas passam pela Rua da Saudade, em frente ao cemitério, rezando, costumam também rezar nas casas das pessoas. Quando é feita uma promessa, o rezador tem de rezar por sete anos, se não cumprir esse prazo, a promessa não se cumpre.

Conforme o relato de alguns moradores, os “Encomendadores de Alma” rezam pelas almas que não tiveram salvação e possuem muitos pecados, assim as orações têm o objetivo de entregar a alma dessas pessoas a Deus. As vestimentas dos “Encomendadores de Alma” são brancas e costumam usar um pano branco por cima da cabeça, cobrindo o rosto. Somente os homens podiam participar desta tradição e ainda hoje é desta forma.

Alguns relatos dizem que as velas deixadas nas casas pelos “Encomendadores de Alma”, para aquelas pessoas curiosas em ver as almas ou espíritos, no dia seguinte se transformavam em um osso, o que deixava as pessoas assombradas.

“Falavam que não podia olhar, não podia ver, então eu não conhecia as pessoas que faziam isso. Mas somente homens podiam trabalhar nisso, mulher não podia. (...) Deixavam a vela na casa das pessoas... mas às vezes as pessoas não viam que eles deixavam, mas eles deixavam! E de manhã a vela já estava lá, apagada”. (Raimunda da Silva Araújo)

Como em toda a Amazônia, Juruti é lugar de muitas lendas e contos, e na Rua da Saudade existem lendas conhecidas por muitas pessoas, e também ocorreram diversos casos de visagens vistas por poucas pessoas.

“Uma das lendas envolve o ‘seu’ João Pontes, diziam que ele se transformava em cavalo e várias pessoas corriam com medo de um cavalo. Eu na verdade andava nessa rua e não tinha hora, quando dava na cabeça, eu ia para o centro da cidade jogar baralho e chegava tarde em casa. Às vezes, eu saia de lá duas horas da madrugada e nunca encontrei com o João Pontes virando cavalo. Outra história que contavam, era de uma transformação de uma porca, que aparecia e corria atrás

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Memórias de Rua

das pessoas. Agora, uma das coisas que eu via era alguma coisa que passava andando aqui na rua, parecia uma coisa assim muito pesada que fazia ‘tum, tum, tum’, mas aquilo parecia assim... que eram passos! Inclusive certa noite, ainda não tinha televisão, e essa casa já existia, essa aqui não tinha, eles tinham um cachorro, ele vinha aqui para o portão onde a gente saía, então ele vinha aqui pro portão latir, enchia o saco, certo dia eu me aporrinhei e preparei um pedaço de pau com um pedaço de fio elétrico na ponta e disse: mas hoje eu vou espantar esse cachorro daí. E ai quando ele começou a latir, eu sai devagar, mas quando eu lambei eu não consegui pegar ele, mas eu lambei atrás dele e aquele troço saiu andando daqui, ai eu disse ‘Ah! Me espera que tu vai já pegar tua lambada’, aí a mulher gritou ‘Olha que tu tá fazendo... tá mexendo com coisas...’ Aí eu disse: ‘Sei lá o que é que vem aporrinhar a paciência da gente aqui’. Isso eu ouvi eu não vi, esse pisar que aparecia, que eu até rodei aqui para ver se eu via esse pisar, se ouvia”. (Ladimil Salgado)

Na Rua da Saudade ocorreram diversas mudanças, a rua melhorou sua infraestrutura, sendo parte da rua asfaltada, com sinalização adequada, hoje possui diversos comércios, lanchonetes, gráficas, farmácias etc. Também nesta rua se localiza a Colônia dos Pescadores Z-42. Apesar dessas mudanças, ainda encontram-se diversas características do passado, por exemplo, casas antigas, que mantêm sua estrutura de taipa e outras cobertas de palha, criação de galinhas e várias árvores nos quintais.

Rua Belém

“Um caminho cerrado de um lado e de outro, que a noite caía orvalho fazendo assim que na manhã seguinte ninguém conseguisse passar sem se molhar. Essa era a Rua Belém, rua de festa do Padroeiro Bom Pastor, das brincadeiras de roda

Aspecto da rua da Saudade, trecho do cemitério, 2017Sede da Colônia de Pescadores Z-42, em 2012.

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Ruas do Bairro Bom Pastor

das crianças, das festas juninas, rua esta que conta um pouco da história de Juruti, de seu povo forte e batalhador”. (Pedro Marturano, em entrevista em Juruti no dia 15 de março de 2012).

O caminho que chegava até a Escola Municipal Abdias de Arruda, agora Elza Albuquerque Lima, dá lugar a uma rua asfaltada e cheia de casas, moradores antigos e recentes juntos num só lugar, o antigo caminho transformou-se no que hoje é uma das ruas mais importantes de nossa cidade.

Seu povoamento começou a partir de uma invasão que houve na Rua Belém, a partir dela abriram-se pequenas ruas e o bairro Bom Pastor cresceu; nesse mesmo período, as pessoas, num puxirum, construíram a primeira igreja católica do bairro, prédio que mais tarde cedeu o lugar a uma escola, hoje denominada Casulo Alegria.

Há algum tempo, a Rua Belém possuía um evento muito importante, a chamada Festa do Padroeiro do bairro, o Bom Pastor. Era uma festa muito grande e acontecia no tempo em que a principal atividade econômica de Juruti era a plantação e comercialização da juta.

O nome desta rua é uma homenagem feita à capital do estado do Pará e sua fundação foi feita pelos seus primeiros moradores; não se encontraram registros que indiquem a data exata.

Antigamente, a Rua Belém se alagava por conta dos desníveis existentes em alguns trechos, fazendo com que seus moradores sofressem muito com a situação; essas condições afetavam diretamente a saúde das pessoas e ocasionavam a perda de bens materiais ou de animais de estimação. A seguir, um episódio ilustrativo desses fatos.

Minimercado num prédio que preserva a cultura tradicional e onde foi entrevistada, em 18/3/2011 a

senhora Raimunda da Silva Araújo, ‘dona Rai’.

Casa de dona Raimunda Rodrigues da Silva, entrevistada em 25/4/2011.

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Memórias de Rua

“O camarada ia andando com uma panerada de acari. O acari vai vivo no panero. Aí, ele escorregou e caiu na água, aí espalharam todos os acaris, e os curumins pegavam os acaris n’água. Quando passou uma semana, os acaris estavam ovados, e já tinha acarizinho aí”. (Relato de senhor Pedro Marturano).

A memória da Rua Belém traz também fatos sobrenaturais.

“Uns companheiros estavam andando bebendo cachaça juntos, e como tudo era cerrado naquele tempo. Aí eles estavam andando juntos bebendo, só que tem vez que a pessoa tem outra doutrina, muito ruim, né? A gente pode dizer assim da parte do demônio. Então esse camarada ficou porre junto com esse outro colega dele. Aí (um disse), ‘bom, já vou pra casa’, (e o outro respondeu) ‘também já vou’. Quando chegou numa parte lá, ele não aguentou com a cachaça, caiu no meio do caminho. Aí o parceiro dele, que ainda ficou bebendo umas duas lá na taberna, quando ele passou pelo mesmo caminho era certa hora da madrugada (duas horas). O companheiro dele estava deitado bem nesse caminhinho que a gente fala bem cerrado. Ele ficou com receio de alguém passar por lá e pisá-lo ou então uma bicicleta, que naquele tempo era mais bicicleta, não tinha carro, né? Lá era tudo escuro, não tinha poste, não tinha luz não é? E o que ele vai fazer? Ele foi ajudar o companheiro dele a sair do meio do caminho. Ele foi puxar (o companheiro) mais pra lateral do caminho, né? E rapaz, quando ele foi puxar, não saiu o braço do companheiro dele, rapaz? (risos) Ele ficou com medo, e deixou o companheiro dele lá, e colocou o braço lá do lado dele e foi embora pra casa. Mas chegando (em casa), passou a cachaça dele. Ele não dormiu mais, preocupado. Quando foi de manhã cedo ele ficou olhando pra onde é que o parceiro dele estava porre, quando ele viu, lá vem ele, ele vinha devagar sacudindo o braço. Quando ele chegou lá (falou): ‘e ai parceiro’, ‘e aí, poxa, rapaz, onde é que tu tava, rapaz?! Nós se perdemos, tu ficastes para lá’. ‘Ah, rapaz, eu fiquei bebendo e fiquei porre, eu caí ali’. ‘E o quê que está acontecendo contigo?’ ‘Mas rapaz, eu acho que eu deitei em cima do meu braço, porque eu estou com o braço doído rapaz, tudo isso aqui tá dolorido, acho que eu deitei em cima do meu braço!’ Era o braço que o parceiro dele tinha arrancado, e que já tinha colado de novo! (Risos) (senhor Pedro Marturano).

Como Juruti ainda era um vilarejo, as casas dos moradores eram bem simples, de palha, depois foram feitas casas de madeira e palha,

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Ruas do Bairro Bom Pastor

e logo em seguida casas de taipa. Com o passar dos anos, a cidade foi se estruturando melhor. Assim também aconteceu na Rua Belém do bairro Bom Pastor.

Rua Marechal Rondon

No início, esta rua era apenas um caminho que dava acesso às casas das pessoas que moravam floresta adentro, pois havia muito mato que os moradores denominavam “capoeirão”. Levando em consideração o pouco dinheiro que recebiam, as suas casas eram quase que improvisadas, feitas de palha, que com a temporada de chuva logo estragavam tendo de trocar periodicamente, segundo afirmam dona Edinilse e dona Maria do Carmo.

“Era palha. É palha, era de barro”. (dona Edinilse)

“Olha, ela era de palha, mas era uma casa velha de palha, pendurada a palha aqui, as crianças entravam pra lá entravam pra cá por baixo da palha sabe, que estava na parede, tinha parede de palha, (...)” (dona Maria do Carmo).

Segundo o depoimento de dona Maria do Carmo, a rua que conhecemos hoje como Marechal Rondon, era conhecida popularmente como “Cinco de Julho”, sendo que, ao assumir o seu mandato, o ex-prefeito Nilson Pinheiro, mudou o nome da rua para Marechal Rondon.

“Era Cinco de Julho, logo quando nós chegamos aqui, passaram, com esse negócio de muda prefeito, entra prefeito, sai prefeito. Aí passaram pra Marechal Rondon essa rua aqui. Isso eu sei bem”. (dona Maria do Carmo)

Entrevista com senhor Pedro Marturano, em 15/3/2012.

A casa do senhor Manuel Rocha, mantém a arquitetura tradicional.

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Memórias de Rua

Sendo o mesmo prefeito um dos grandes personagens desta rua, pois através dele o que era um simples caminho de acesso a lugares distantes passa a ser uma rua, que mais tarde abrigaria importantes prédios de Juruti.

“... só sei dizer que foi o velho Nilson, quando ele era prefeito, que se abriu essa travessa aí. Que isso aqui era um mato, uma capoeira grande aí. Que a gente andava por baixo do mato, era pra ali, o pessoal já tinha roçado (...)”. (dona Maria do Carmo)

Assim como em outras ruas do Bairro Bom Pastor, as primeiras edificações aconteceram por conta da instituição católica Cáritas, cuja principal responsável local foi Irmã Brunildes, por todos sempre bem falada na comunidade. Com a sua ajuda, foram construídas casas de barro conhecidas como taipa. Segundo os depoimentos de dona Zeruia e de dona Maria do Carmo, este projeto causou uma importante mudança na forma de viver dos moradores, pois as casas de taipa transmitiam mais segurança para os que nela moravam, do que as de palha.

A construção da casa de dona Maria do Carmo foi fotografada e ela cedeu gentilmente uma cópia.

“(...) era de barro, era cercado de barro, era coberto de telha, tinha piso, com terra boa. Quando as meninas se entenderam, ficaram moças já, professoras já, passagem pra ali foi que jogaram a casa velha embaixo e fizeram esta casa que nós estamos até hoje embaixo. É da década de noventa essa casa aqui”. (dona Maria do Carmo)

Não é tão simples saber quais foram os primeiros moradores nesta parte da rua, mas ao que tudo indica, foram dona Maria Rita, que ainda hoje tem sua casa conservada, apesar de não morar mais nela, e dona Maria do Carmo, que hoje mora em casa de alvenaria. Pelo que

indicam os relatos, essas foram também as primeiras moradoras a realizar modificações em suas casas.

A casa de dona Maria do Carmo, antes da reforma, e a Rua Marechal Rondon sendo modificada nos anos 2000. Acervo: Maria do Carmo e Ana Lúcia Batista Pereira.

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Ruas do Bairro Bom Pastor

A Rua Marechal Rondon era constituída por famílias tradicionais, que se reuniam para festejar datas comemorativas como as festas juninas e a festa da igreja do Bom Pastor, como relatam dona Edinilse e dona Ana Lúcia:

“É ali na igreja do Bom Pastor existe (...), parece que agora no mês de abril, (...) eu não sei muito bem dar detalhe da data, mas parece que é agora mês de abril essa festa deles, esse movimento que eles fazem aí. É todo ano nesse mês eles fazem isso aí.” (dona Edinilse)

“Ah! Nós fazíamos também ali na rua, sabe o que era? Nós fazíamos a Festa Junina da rua (...). Era feita pelas famílias daqui da rua, nós vendíamos, nós plantávamos, fazíamos uma festa pra todo mundo, a gente distribuía comida de graça, tudo de graça pra população (...)”. (dona Ana Lúcia)

Havia também uma festa realizada pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais, que era realizada em 1 de Maio e, pelos relatos, foi uma das primeiras festas realizadas nesta rua, e uma das mais importantes, como relata dona Ana Lúcia em sua entrevista:

“Acontecia uma vez por ano a Festa do Sindicato, a gente morava no interior e a gente vinha justamente na cidade no dia da festa do sindicato, no dia Primeiro de Maio. Aí vinha todo o povo do interior pra cidade, a cidade ficava movimentada nesse dia, daqui da rua né, da festa cultural. Todo povo do interior vinha pra cidade pra fazer festa. Então, isso daí era uma coisa importante que quando eu era criança todo mundo vinha, até nós vínhamos do interior pra cidade, todo mundo. Era muito divertido. O povo vinha e comprava roupa nova, se vestia com roupa nova né, e vinha pra cidade mostrar. Eu acredito que foi uma das coisas assim importantes da rua, foi a Festa do Sindicato que hoje acabou também. Pra mim era legal, naquela época pra mim tudo era bom”. (dona Ana Lúcia)

As senhoras Zeruia Bruce de Castro e Guilicia Castro foram entrevistadas em 15/3/2012, e compartilharam o objeto antigo que ainda guardam, e uma foto antiga onde se pode ver a casa

de madeira com telhado de palha e seus moradores.

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Memórias de Rua

Muitas dessas festividades ainda são realizadas nos dias de hoje, infelizmente algumas acabaram se perdendo, como a Festa dos Sindicalistas, as Festas Juninas e o desfile de 7 de Setembro, que hoje em dia são realizados no Tribódromo. É com muita saudade que dona Ana Lúcia ressalta a forma como as pessoas foram perdendo esses costumes.

“Só que essa tradição ela foi se perdendo, porque as pessoas não souberam valorizar, entendeu, aí foi, acabou com as culturas, e aí foi, acabou, simplesmente se perdeu”. (...)

Por ser uma das vias principais, a Rua Marechal Rondon ainda conta com importantes movimentos culturais e esportivos. A corrida realizada no aniversário de Juruti, as procissões das igrejas católicas do Bom Pastor e da Matriz. A abertura da Semana da Pátria é feita em frente à Prefeitura. Nesta festa, muito importante para a comunidade, as bandas marciais e representantes de todas as escolas do município se reúnem para cantar o Hino Nacional Brasileiro, sendo que nos anos 1970 a 1980 o desfile cívico era realizado no terreno onde hoje é a igreja católica do Bom Pastor.

Em Juruti, as pessoas são muito criativas quando se trata de criar uma história para assustar seus filhos, para que obedeçam mais aos pais e não fiquem tanto tempo nas ruas. E não existe ninguém na cidade que não tenha pelo menos ouvido falar, de seus avôs ou de qualquer pessoa que seja, sobre uma história de visagem.

Igreja Bom Pastor em momentos distintos. Acervo: Maria do Carmo e Ana Lúcia Batista Pereira.

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Ruas do Bairro Bom Pastor

Apesar de ser uma rua importante e muito movimentada, a Rua Marechal Rondon não esta livre de histórias de visagens, e há quem afirme já ter ouvido um homem passar nas proximidades de sua casa fazendo um enorme barulho como se fossem passos de um gigante, como relatou dona Ana Lúcia em sua entrevista.

“Quando eu era criança, eu e a Taiane, (...) ela estava com 40 dias de nascida. Ela estava querendo morrer, eu acho que com uns três meses eu acho, um mês e meio, ela queria (morrer), ela estava passando muito mal, com asma. Aí, o papai foi lá na casa de um homem pegar arruda pra fazer um remédio pra ela, era a única solução naquela época. Não tinha remédio nenhum, então, arruda era o remédio caseiro que tínhamos aqui. Então, nesse dia, vinha uma pessoa, a gente não sabe, vinha um barulho aí na rua, ela subia todas as noites da beira do Amazonas e ela ia embora ao rumo do (Bairro) do Maracanã, e de lá ela ia embora ‘pro’ (Lago do) Jará. Quando davam três horas da madrugada ela voltava, como era escuro, a lua não tinha luz suficiente, ela ia e voltava pra beira do Amazonas, ela vinha, assim vinha, igual quando soca pilão ‘Tooom! Tooom!’ Aquilo me dava medo dos pés à cabeça. Tu te embrulhava tudinho, ficava esperando. Aí, nessa noite, o papai queria ver quem era, e o papai já tava velho, ele queria ver quem que era essa, o que era, a mamãe não deixou ele olhar, e ele muito doido pra querer ver o que era esse barulho. Eu já me entendia. Olha que ela ficou aqui nessa rua, quando ela não passava quinta-feira, ela passava sexta-feira, mas ela passava. Eu lembro, ela vinha bem da beira do Amazonas, a gente escutava muito longe aquele barulho, tu sabes, como se tivesse carregando um fardo muito pesado e jogasse no chão, ‘Tuuum!’ Aí passava, ‘Bromm!’ Sabe aquele negócio assim, ‘Peeem!’ A gente escutava no fundo assim da terra, aquilo vinha, aquele medo vinha... Sabe aquele medo, medo, medo... A gente dormia de lamparina acesa, com medo mesmo. Isso aí ninguém contou, eu ouvi e eu já era grande, eu já devia ter o que, uns 10 anos, porque nossa rua não tinha energia, entendeu. Acho que foi uma das coisas, assim, que me marcou muito de visagem na rua de... sei lá! A gente não sabe o que era, mas segundo meu pai, isso já vinha há muito tempo. Eu me lembro dessas coisas, assim eu lembro.”

A grande riqueza está no segredo que essas histórias guardam por detrás das dúvidas. Há quem já tenha visto o Calça Molhada, o Cachorrão e até mesmo a Matinta Pereira naquela rua. Sobre a veracidade de suas histórias, só nos resta a ânsia de um dia termos o encontro com um desses personagens ilustres do nosso rico folclore

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Memórias de Rua

jurutiense.

O que era um estreito caminho, deu lugar a uma das mais movimentadas ruas de Juruti, que hoje comporta importantes prédios públicos e religiosos como a Prefeitura de Juruti, a Delegacia, a Secretaria Municipal de Educação, a Igreja do Bom Pastor, a Igreja Matriz, o Sindicato dos Trabalhadores entre outros prédios que a torna importante dentro do município.

Rua Joaquim Gomes do Amaral

Entre os anos de 1923 e 1930, Joaquim Gomes do Amaral ocupou o cargo de intendente do município, era o chefe do poder executivo municipal, nos dias de hoje conhecido como prefeito. Dizem que foi um próspero comerciante local.

Esta rua provavelmente é habitada desde o fim do século XIX. No início, não existia rua de fato, eram apenas caminhos que serviam de conexão entre as residências, as casas eram, em sua maioria, construídas de taipa ou palha. Vejamos os relatos de dona Francisca Ramos e de dona Valdelina Pinto, respectivamente:

“(...) a primeira nossa casa era coberta de palha (...)”,

“(...) é de barro mesmo.”

Contudo, a rua recebeu essa denominação apenas na década de 1960 quando o gestor do município, General Abbas Arruda, resolveu homenagear seu genro Joaquim. Os primeiros moradores dessa rua, no Bairro Bom Pastor, vieram da zona rural do município em busca de melhores condições de vida, como conta o senhor Pedro Alves, habitante dessa rua há 30 anos.

“Aí eu trabalhava no interior, comprei esse canto aí de um amigo, foi o começo daqui. Passei a família pra cidade, por causa da educação dos filhos, a mulher ficou trabalhando aqui na cidade, eu trabalhando no interior. Tudo pra mandar pra ela. Assim foi o começo da vida aqui na cidade. Antes disso, eu trabalhava em juta, mas não ganhei nada na juta, só ganhei doenças”.

A maioria das edificações dos bairros de Juruti, em especial no Bom Pastor, foi construída com o auxílio da instituição católica Cáritas. Essa confederação reúne mais de 162 organizações humanitárias, atua em mais de 200 países e objetiva construir um mundo melhor,

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Ruas do Bairro Bom Pastor

principalmente para os pobres e oprimidos. No município, essa associação tem como a principal responsável a Irmã Brunildes.

É difícil ter uma relação dos primeiros residentes desta rua no Bairro Bom Pastor, contudo, seus moradores mais antigos apontam os senhores Selino (conhecido como Jacaré), Raimundo Gato, Belarmino, Pedro Antônio Martins, como aqueles que fizeram as primeiras

edificações nesta rua.

Assim como nas demais ruas, aqui também pudemos identificar várias lendas e histórias de visagens aleatórias, que por vezes eram vistas apenas por um morador, mas também existem aquelas que realmente apavoravam os moradores da redondeza, é o caso da

Dona Valdelina Pinto foi entrevistada em 21/3/2012, e mostrou a antiga máquina de costura que ainda conserva.

Dona Francisca Ramos, entrevistada em 4/6/2012, guarda consigo as ferramentas de trabalhar: a juta, a foice, o remo e potes cerâmicos.

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Memórias de Rua

“mulher misteriosa”. Dona Francisca Ramos relata o caso:

“Vi, meu filho viu, ele enxergou uma mulher que vinha aqui no canto do açougue. Aquela mulher vinha toda coberta assim de pano e ela fazia assim ‘Tei! Tei! Tei! Tei!’ Ele disse: ‘Mamãe olhe, venha ver a mulher grande’... E eu disse: ‘Não quero saber de mulher grande, anda rapaz, entra pra dentro, fecha a porta’. Aí passou. Parecia que era só uma perna aquilo, era uma coisa encantada, ela encantou meu sobrinho pra lá. Quando chegou bem ali no canto, ele viu uma mulher (...) passou a mão no braço dele e levou ele. Meteu ele lá dentro da tiririca que cortou todo o braço dele. Ele é assim moreno da minha cor, ficou todo cortado (...) essa mulher deixou ele lá e ele subiu num pau.”

Com o passar dos anos, o pequeno caminho que ligava as residências foi dando lugar à rua propriamente dita. Novas gerações de pessoas surgiram e as visagens já não aparecem com frequência. A cultura de contar histórias na frente das casas foi perdendo-se ao longo dos anos, e hoje as histórias populares estão guardadas na memória de poucos moradores.

A rua Joaquim Gomes do Amaral, por ser uma via de acesso aos principais pontos da cidade, é rota de procissões de santos da igreja católica, como Nossa Senhora da Saúde, do Perpétuo Socorro e do padroeiro do bairro, o Bom Pastor. Anualmente, a prefeitura realiza as comemorações de aniversário da cidade na primeira semana do mês de abril e é quando esta rua abre espaço para a corrida de pedestres e a prática do ciclismo.

O pequeno caminho que cortava a pacata cidade de Juruti ao meio, com o passar dos anos, foi calçada com piçarra e, no ano de 2009, foi pavimentada com asfalto e ganhou sinalização, é a via de saída do município e considarada uma das mais importantes, pois liga a cidade no sentido leste-oeste e comporta um dos centros comerciais mais importantes de Juruti, a vila Nó Cego, onde estão localizados

Senhor Pedro Alves, entrevistado em 8/5/2012, guarda uma balança para juta e um toca-discos antigo.

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Ruas do Bairro Bom Pastor

supermercados, lojas, farmácias, sapatarias e outros estabelecimentos.

Rua Governador Fernando Guilhon

No início de sua formação, existia nesta rua somente três casas de madeira, cobertas por telhas, e essas, por incrível que pareça, vinham a ser de mulheres que tinham em comum o nome, todas se chamavam Maria, dando origem a uma segunda denominação, a rua das Três Marias.

Os tipos de casas mais correntes no começo da história deste logradouro foram casas de estruturas simples que, quase sempre, utilizavam materiais que a natureza podia oferecer: de taipa e cobertas por palhas.

A Rua Governador Fernando Guilhon começou com a chegada de famílias vindas das comunidades rurais e de outros lugares, que abriam picos (pequenos caminhos) para acesso às suas casas. A Rua Governador Fernando Guilhon começou com a chegada de famílias vindas das comunidades rurais e de outros lugares, que abriam picos (pequenos caminhos) para acesso às suas casas. A pesca era atividade importância para a alimentação familiar, e alguns moradores ainda a praticam. O Lago do Jará era o local preferido, já que era muito rico em peixes.

Hoje, o maior problema que assombra o Lago do Jará não é a sua famosa e temida Loira do Jará, é o avanço intensificado do assoreamento, transformando, assim, o lugar em que vivemos num ambiente inóspito, deixando somente vestígios na história daquele que, um dia, já foi um dos maiores mananciais de água doce da cidade, de onde todos da região retiravam alimento e utilizavam para lazer.

Segundo dados da Prefeitura de Juruti, essa rua foi nomeada oficialmente pelo prefeito Antônio Assunção Coelho, pelo Projeto de

Aspecto da rua Joaquim Gomes do Amaral, em 2012, na região conhecida como Nó Cego.

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Memórias de Rua

Lei nº 6, de 18 de setembro de 1981, documento que indicaria data da abertura. A via sofreu muitas alterações, como a divisão da sua extensão, pois antigamente esta e a rua Judith Barroso eram divididas somente por uma linha imaginária, denominada assim durante todo o seu comprimento, metade Judith Barroso, metade Governador Fernando Guilhon. A divisão realmente aconteceu com a construção do muro da Associação Folclórica Mundurucu.

Os moradores contam a presença de poucas lendas, a do Cachorrão e a do Calça Molhada.

No campo de futebol detrás da escola Deputado Américo Pereira Lima, para a formação de jovens no Ensino Fundamental, dizem que acontecia a lenda do Cachorrão: um homem se transforma em metade homem e metade lobo, dando origem assim ao lobisomem. Esse, por ser fruto de uma relação proibida entre pai e filha, fora amaldiçoado por um crime que não era seu, teve como castigo vagar pelas ruas em noite de lua cheia. Quando acontecia a transformação, ele saía para o seu passeio noturno e, se encontrasse alguma pessoa, atacava sem dó nem piedade, podendo até mesmo estuprar a pessoa. Mais horripilante mesmo era o seu uivo, e ao escutá-lo, todos se escondiam – era como se fosse o toque de recolher daquelas pessoas que, amedrontadas, nem sequer colocavam o pé para fora de casa ao cair da noite.

E quanto à história do Calça Molhada, esse era um pescador que, após perder uma filha afogada em um olho d’água, viveu o resto da sua vida lamentando e chorando a sua perda. Com isso, todas as noites saía para se embriagar até que num acidente fatal perdeu a vida. Ele sempre tomava umas e outras antes de sua pescaria e num certo dia exagerou, estava tão bêbado que caiu no rio e morreu afogado. Teve como sina vagar pelas ruas de Juruti, por onde havia passado momentos antes fazendo a trajetória que, nem ele mesmo sabia, seria o caminho que o levaria direto para a morte. Até hoje, nunca mais foi visto, apenas se ouve o barulho do roçar das pernas na sua calça molhada ao andar... Este é o motivo de seu nome.

Como ocorre em diversas cidades brasileiras, em Juruti também há a presença marcante de personalidades que se destacaram na história de um logradouro por seus feitos e contribuições. Faz parte de um elemento cultural, guardado sobre os cuidados da memória oral, a estrada mãe na qual percorre e sobrevive a história do nosso povo. Pessoas desse cunho podem ser facilmente encontradas na Rua Governador Fernando Guilhon, como Maria Lúcia Pinheiro, carinhosamente conhecida pelo nome Lucita, uma mulher de 45 anos, mas que conhece esta terra como a palma da mão, como ela mesma cita.

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Ruas do Bairro Bom Pastor

Influenciou diversos acontecimentos na rua, principalmente durante a sua construção; ela organizou diversos mutirões e puxiruns que deram origem à rua, e também influenciou na formação cultural dos moradores incentivando a realização de projetos envolvendo jovens e crianças, e ainda participando do movimento do Boi Campineiro, organizado pelo senhor Nino Gonçalves e antecessor do Festribal.

A seguir, foto tendo ao fundo a Rua Governador Fernando Guilhon, antes das transformações em sua extensão e ainda apresentando características bem rústicas: a presença de casas no modelo de taipa – eram mais ou menos oito – e de madeira, com exceção a uma, que tinha sua estrutura feita de alvenaria.

Assim como a rua, os seus moradores também eram bem pacatos, costumavam sentar na frente de suas casas durante as tardes de domingo, conversando com seus vizinhos. E também havia pequenas vendas, que ofereciam o que de melhor sabiam fazer, como: berlindas, tacacá, chopinhos de frutas, saladas de frutas, o famoso cachorro-quente da região, o cascalho e muitos outros quitutes.

Travessa Vereador Turíbio Vieira

O nome dado à travessa, Vereador Turíbio Vieira, é em homenagem a uma ilustre personalidade ligada diretamente à história deste município, sendo o vereador Turíbio Vieira um dos primeiros jurutienses a ocupar uma cadeira na Câmara Municipal de Juruti.

A rua e o quintal da casa de dona Maria Lúcia Pinheiro, carinhosamente conhecida por Lucita. Acervo: Maria Lúcia Pinheiro Lima.

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Memórias de Rua

Não se sabe quem assim nomeou a via, porém os fundadores foram os primeiros habitantes do lugar, a maioria hoje já falecida.

Como relata dona Maria Magali “bem, não era nem rua, era um caminho. Na época em que eu comecei a estudar nesse colégio (Abdias de Arruda), essa rua era um caminho cercado de poucas casas”.

Esta travessa teve sua origem numa pequena estrada feita com o objetivo de ligar as residências ao porto, onde se concentrava a mais importante área comercial de Juruti, com farmácias, mercado, as chamadas baiucas e outros estabelecimentos.

Segundo a moradora Maria Magali: “todo ano no mês de junho faziam os eventos culturais, as festas juninas. São os eventos que tem na rua.”

“Em cada rua, em cada quarteirão tem um coordenador de catequese permanente, inclusive aqui eu coordeno um grupo com mais ou menos de 50 a 70 pessoas, meu grupo é muito grande em números de pessoas e de vez em quando nós fazemos confraternização, convidamos todos os vizinhos da rua, nós fazemos confraternização da Festa Junina, Dia das Mães, Dia dos Pais, e de vez em quando fazemos só religioso, com cantos de encontros, leituras e estudos bíblicos.”

Segundo a moradora Maria Magali, existia uma lenda que assustava os moradores naquela época.

“Eu ouvia falar, quando eu vim morar aqui, quando era um simples caminho, que aparecia o Curupira. Quem se perdia, fazia aqueles tecidozinhos para poder acertar o caminho de volta. Senão ficava rodando, rodando e quando dava, estava no mesmo lugar. Aparecia também um cachorro que fazia medo para as pessoas.

É bom conhecer, como os moradores e narradores de Juruti sabem bem, as maneiras adequadas de se livrar de uma visagem. Para distrair o Curupira, faça pequenos nós em um tecido ou palha e deixe pelo caminho. Assim que o Curupira vir, irá sentar e desatar os nós, e você terá tempo de achar novamente o caminho.

Não há relatos detalhados sobre essas lendas, mas fala-se de seres sobrenaturais que assustavam os moradores naquela época.

A Travessa Turíbio Vieira hoje está totalmente modificada: há anos a travessa era habitada por poucas pessoas e havia muitas árvores, hoje praticamente não se vê mais devido ao aumento da população e à construção de casas.

Hoje, na travessa encontram-se lojas comerciais, o Hospital

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Ruas do Bairro Bom Pastor

Municipal Francisco Barros; as sedes de algumas instituições do governo municipal, como a Secretaria de Meio Ambiente, o Conselho Municipal de Educação; a União Municipal de Estudantes Secundaristas (UMES), instituição que defende os direitos dos estudantes; duas unidades escolares, a Escola Municipal de Ensino Fundamental Elza Albuquerque de Lima e a Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Emanuel Salgado Vieira.

Travessa Dário Rodrigues

Devido ao acelerado processo de desenvolvimento de Juruti desde 1950, muitas pessoas se aventuravam em longas viagens pra chegar até esta saudosa cidade, para onde vinham em busca de uma vida melhor.

O desenvolvimento econômico de Juruti não atraía olhares somente de pessoas distantes, mas também das que moravam nos arredores da cidade. Quando os forasteiros chegavam de suas longas viagens, se deparavam com uma parte da cidade já desenvolvida, onde hoje é o centro, mas procuravam se estabelecer em áreas mais distantes, onde houvesse terrenos para construir suas casas, e assim se abriam novos caminhos e se iniciavam novos bairros.

Um desses caminhos originou a Travessa Dário Rodrigues. Com o tempo, foi se tornando uma estradinha cheia de mato onde foram se fixando os primeiros moradores, como afirma dona Raimunda.

Dona Maria Magali, entrevistada pela primeira vez em 5/5/2012, mostrou a imagem que guarda com amor e

carinho, denota sua fé.

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Memórias de Rua

“Que eu me lembro, ainda quando eu cheguei aqui, que nós viemos pra cá, isso aqui era uma estrada que passava gente, e aqui no canto era o Lafaiete, que era uma casa antiga também. Aí, passava estradinha bem por aqui por perto da minha casa e varava lá. Aí, pegava uma casa do Oscar, que tem bem aí. A única casa que tinha por aqui era o Lafaiete. Aqui em casa, ali a casa do meu irmão e da Maria Luiza, era tudo assim estrada, não era rua não, era mato tudo isso aqui, era mato.”

Com o passar do tempo, outros moradores foram se deslocando para esta travessa, o que gerou um rápido crescimento; muitas obras foram planejadas, como a “Praça da Saudade” que acabou se tornando um campinho de futebol, depois o local escolhido para construção do atual Hospital Municipal de Juruti.

Apesar de ficar entre as ruas mais importantes de Juruti, a travessa também tinha as suas tradições, as quadrilhas e outras festas realizadas nos barracões, que funcionavam como verdadeiros clubes populares. Jogos de futebol ocorriam numa pracinha, projetada para tornar-se a Praça da Saudade, mas no local foi posteriormente construído o atual Hospital Municipal de Juruti.

Hospital Municipal de Juruti.

As casas na atualidade.

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Ruas do Bairro Bom Pastor

“Não, agora não tem, mas já teve antes de nós, já tinha aqui isso aqui. Era um paraíso chamado Paraíso Verde, aí sempre tinha festa, era legal.” (dona Raimunda)

E era dessa forma que os moradores se divertiam, mas com o passar dos anos, o clube fechou e as tradicionais festas juninas foram aos poucos deixando de ser comemoradas. Atualmente, a Travessa Dário Rodrigues recebe eventos como as procissões de igrejas católicas, em dias santos, e corrida dos pedestres durante os festejos de aniversário de Juruti.

Segundo relatos dos moradores antigos entrevistados, uma visagem frequentava a travessa: na época da Quaresma, à noite, passavam pela rua pessoas vestidas de branco, cantando.

Essa lenda, provavelmente, não se dissocia da procissão dos Encomendadores de Almas – no entanto, constitui o tipo de histórias que foram enriquecendo o folclore jurutiense.

Com o constante processo de mudança no município de Juruti, a Travessa Dário Rodrigues foi ganhando nova configuração, o que era apenas uma estradinha cheia de buracos, que enchia de lama na época das chuvas e de poeira na temporada de seca, hoje se encontra pavimentada com asfalto, em parte. Hoje, a rua se inicia no bairro Bom Pastor e se estende até o bairro Maracanã, mas as mudanças geraram pontos de vistas diferentes em meio aos moradores quanto às transformações ocorridas na rua; para alguns melhorou, como afirma dona Raimunda.

“Eu me lembro que mudou, porque depois que veio essa Alcoa mesmo pra cá né, que mudou mais, ‘vixe’ mudou muito. Antes a gente sentava ali daquele lado da rua, a gente olhava pra ali a gente não enxergava o fim da rua, tudo era mato (...) vixe, melhorou muito. (dona Raimunda)

No início da ocupação da rua, as casas eram quase todas de palha, muitas sofreram grandes transformações.

Outras pessoas resolveram preservar ao máximo a estrutura de suas casas, pois guardam lembranças de seus familiares que já morreram, ou são heranças passadas dos pais para os filhos. No início, eram feitas de palha e com a ajuda da Igreja Católica, através do projeto “Casas de União e Progresso”, muitas passaram a ser feitas de barro.

“Ela é embarriada, primeiro assim com barro e depois ela foi rebocada com cimento por cima.” (dona Raimunda)

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Memórias de Rua

Travessa Raimundo Emídio Santarém

Localizada atualmente entre as Travessas Dário Rodrigues de Sousa e Boaventura Bentes, a Travessa Raimundo Emídio Santarém é uma das mais antigas do bairro Bom Pastor. Antigamente, era bem menor do que é hoje, iniciava-se próximo ao rio Amazonas e ia apenas até a Rua Marechal Rondon, conforme relatado pelo senhor Casimiro Moraes.

“Olha, nos anos 1970, quando eu cheguei aqui ela era da avenida Marechal Rondon para a beira do Amazonas, pra cá se existia, se tinha um ou dois morador, era muito (...)”.

Cheia de buracos, era apenas um caminho que dava acesso às poucas casas existentes no entorno do bairro. Com a ajuda dos poucos moradores, Raimundo Emídio Santarém foi tomando forma de rua: aos poucos a via foi sendo alargada, e os buracos originados pela passagem das pessoas e pelas chuvas iam sendo tampados com carradas de terra, até que se deu a cobertura com piçarra e depois com asfalto.

Juruti teve um processo de desenvolvimento muito acelerado nos últimos anos, e uma das consequências foi uma mudança significativa na estrutura das edificações. As casas de barro e taipa, por exemplo, foram substituídas por outras de alvenaria e madeira com fachadas bem mais modernas, em comparação com as que existiam no município há décadas.

Como no exemplo dos demais logradouros do bairro Bom Pastor, nesta travessa a maioria das edificações antigas foi construída com o apoio da associação católica Cáritas.

Casa de senhor Francisco Rodrigues. Casa de senhora Raimunda Rodrigues de Souza, entrevistada em 10/2/2012.

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Ruas do Bairro Bom Pastor

O município tem uma enorme diversidade cultural, com festas tradicionais de santos, quadrilhas juninas, comidas típicas como o famoso pato no tucupi, a maniçoba, o tacacá etc. A Travessa Emídio Santarém também tem suas peculiaridades culturais. É por ela que, anualmente, nos dois últimos dias da Semana Santa, os “Encomendadores de Alma” saem à noite para orar por aquelas almas que já se foram e por suas famílias. É também rota da famosa e tradicional Corrida do Aniversário de Juruti, que acontece sempre na primeira semana do mês de abril e que atualmente tem início em algumas das comunidades rurais e termina no centro cultural do município.

Não há uma lenda específica nesta rua, entretanto, a maioria dos moradores já presenciou alguma cena que consideraram ser do sobrenatural, uma alma penada. Dona Joana da Silva Souza,

Trecho da Travessa Raimundo E. Santarém na época da pesquisa.

A mesma travessa finaliza na beira do Amazonas, próximo à casa de dona Joana. A área ainda sofre o

processo de terra caída.

Casa de senhor Clarito, foto do acervo pessoal. Entrevistado em 19/4/2012.

Casa de senhora Neidiege Vidinha, foto de seu acervo pessoal. Entrevistada, pela primeira vez,

em 15/2/2012.

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Memórias de Rua

que mora na travessa há mais de 18 anos, conta que ela e sua neta viram um homem que lhes perguntou o caminho do cemitério. Ela nos conta que o susto foi muito grande e que até hoje sua neta também se lembra do ocorrido.

“Vinha subindo um homem e era pra banda das dez, onze horas da noite. Vinha subindo lá na ribanceira, vinha, eu enxerguei assim, que minha vista ainda era muito boa, e ela também viu. Quando nós dobramos o canto que era uma casa lá do ‘seu’ Chico Souza, Francisco Souza lá, e aí eu enxerguei aquele homem vinha subindo na ribanceira, ai eu disse: ‘- Olha Nádia, lá vem o homem, subindo’. Ela disse: ‘É mesmo (...)’.

A gente ia e ele vinha, quando chegou bem em frente daquela casa grande que ‘tá do lado da minha, que é do Kokó (...). Aí, quando chegou bem em frente... Mas eu diferenciei aquele homem que vinha, assim, a roupa dele, o modo que ele tinha levantado da lama, sei lá... Ia suja, a calça dele era calça bem aqui tudo rasgado, a bainha por aqui, manga rasgada da roupa dele, chapéu velho, aí eu fui olhando... E a menina disse assim pra mim: ‘Mamãe, é visagem mamãe, mamãe é visagem...’. Aí ela me puxava pro lado da Celpa, a Celpa já estava lá. ‘Mamãe é visagem.’. Aí eu digo: ‘É... eu vi’.

E pela rua ele (andava e) não levantava a cabeça, não levantava o rosto pra olhar. Quando chegou bem defronte com essa casa lá, que eu tô falando [a casa do Kokó], ai ele meio parou, e nós (também). E ela me puxando pra lá, aí ele disse assim: ‘Você não sabe me dizer, pra onde fica o cemitério?’

Falou, mano!! Ele falou!! Ele falou!!

Aí eu disse, com medo já, que eu já estava... Eu disse: ‘O cemitério, fica ali, dobre essa esquina ali que o cemitério é logo ali.’ E ela me puxava pra lá e ela: ‘Mamãe! Vamos! Corre!’.

E aí pronto, foi só aquilo. Ele seguiu, e nós seguimos pra casa. Chegamos logo lá em casa, abrimos ligeiro. Antes de entrar pra casa, eu ainda olhei, e ele ia dobrando lá a esquina, aquela visagem feia do homem feio, isso eu vi lá.”

Essas e outras histórias fazem de Juruti um lugar fantástico, onde mitos, lendas e histórias de visagens estão presentes no cotidiano das pessoas, principalmente daquelas que moram no município há muitos anos e que lutam para que esses contos não caiam no esquecimento. Como a maioria da população do município é jovem, muitos não têm interesse em saber das histórias contadas pelos seus pais e avós. Mas

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Ruas do Bairro Bom Pastor

como nos contaram diversos narradores de Juruti, antes se podia ver e até falar com seres encantados. Por mais que assombrem a todos, e por vezes causem medo, a vida é muito mais exuberante e rica conhecendo estes seres mágicos, suas histórias e sabedoria.

Atualmente, a Travessa Raimundo Emídio Santarém está bem estruturada, conta com pavimentação, água encanada, luz elétrica, diferentemente do que se via há alguns anos e também existe uma grande satisfação dos moradores em ter suas residências naquele bairro e principalmente em Juruti. O senhor Casimiro Moraes demonstra bem isso em sua conversa.

“Com certeza houve um paraíso quando Deus enviou seu Filho a este mundo, quando ele mesmo governava isto aqui. E se ele foi destruído ou desaparecido, Juruti é um pedacinho deste paraíso”.

Aos moradores mais antigos só resta transmitir aos mais novos a riquíssima história desse logradouro e de todo o município de Juruti.

Travessa Boaventura Bentes

“A Travessa Boaventura Bentes era apenas uma estradinha que tinha assim, um roçado de um lado e de outro e que tinha uns matinhos bem no meio. Era muito feia essa travessa. Além dos matos e roçados, ela tinha muitas pedras, buracos e lama quando chovia, fazendo com que seus moradores se sentissem prejudicados no tempo de inverno, pois não podiam sair de suas casas com tanta lama”. (Relatos dos moradores Manuel Bruce Pimentel, Raimunda Dolzane da Silva, Raimunda dos Santos Sobrinho e Diana de Sousa Rego).

Momentos de lazer em Juruti. Acervo: Joana da Silva Souza, entrevistada em 10/2/2012.

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Memórias de Rua

Não foi possível identificar a família Boaventura Bentes, no entanto, vale dizer que nessa família havia muitos comerciantes. Não foi possível precisar também se o nome é Boaventura ou Boa Ventura. Na placa do logradouro o nome é escrito separado, mas não no Plano Diretor consultado em 2010.

O senhor Manuel Bruce Pimentel informou que os primeiros moradores da travessa pertenciam à família Canto; para a beira do rio Amazonas, ainda tem o senhor Ladimil e “eu aqui sou o mais velho, mas ainda tem pessoas que são mais velhas que eu aqui na travessa, como a dona Raimunda, ali tem o Álvaro, tem a Deusa”.

Tempos se passaram e a estradinha foi se modificando, a travessa foi melhorando, mais moradores começaram a povoá-la, e onde antes havia poucas casas hoje existem centenas delas.

Um problema que fazia parte da realidade dos moradores nessa época era a falta de água, e para suprir essa necessidade, na maioria das vezes, era necessário que se pegasse água na beira do rio Amazonas. Porém, além de não ser uma água potável, as pessoas também estavam sujeitas a situações arriscadas, já que para chegar ao rio teriam que descer um barranco íngreme.

A estrutura das ruas da cidade não era boa: elas ficavam cheias de lama no inverno e com muita poeira no verão, com muitas pedras, matos, espinhos, tocos de árvores e outros obstáculos; os moradores se sentiam lesados em seus direitos sociais.

Muitos moradores de Juruti sofriam com o desemprego, a falta de estudo e a baixa condição de vida, porque naquele tempo não havia escolas para acomodar todas as crianças. Isso fazia com que começassem a trabalhar precocemente, tanto para ajudar seus pais nas suas casas quanto para seu próprio sustento.

As moradias das pessoas eram muito simples, as casas de palha tanto o telhado quanto as paredes; depois mudaram para casas de madeira cobertas de palha ou telha. Posteriormente, vieram as casas

Foto antiga pintada à mão. Acervo: Manuel Bruce Pimentel.

Entrevista com dona Raimunda dos Santos, uma das moradoras pioneiras da travessa.

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Ruas do Bairro Bom Pastor

de taipa e barro, mais fortes contra a ação do tempo e, finalmente, as casas de alvenaria, indicadas pela população como as mais seguras.

A alimentação era basicamente obtida pelas plantações de feijão e mandioca, além da pesca e a caça. Muitas pessoas vinham do interior, andando horas e horas, trazendo nas costas paneiros cheios de alimentos para vender na cidade. As vendas se davam por dinheiro e/ou trocas de mercadoria, algumas coisas de precisão, para consumo dos comunitários e de suas famílias. Antigamente, não havia transporte para levar ou trazer as pessoas que moravam na roça, por isso andavam horas na estrada, conforme contou o senhor Manuel Bruce Pimentel, em um dos passeios de táxi pelas ruas da cidade de Juruti.

Com todos esses problemas sociais, o povo jurutiense ainda encontrava vontade de produzir festas para sua alegria e diversão, como as Festas Juninas, Festas de Barcas, a Festa do Boi Campineiro, algumas festas com violas e tambores, a Dança do Tipiti, a Festa do Padroeiro Bom Pastor e a de Nossa Senhora da Saúde.

Muitos moradores da travessa sentem falta da tranquilidade que tinham antigamente, da fartura de peixes, da paz e da amizade de um vizinho para com o outro, pois como a cidade era pequena, todos se conheciam.

A Travessa Boaventura Bentes mudou muito desde sua fundação: foi urbanizada, houve a abertura de comércios e isso facilita mais a vida dos moradores, construção de novas casas, infraestrutura do bairro em relação à água encanada; não existem mais transtornos por parte dos moradores em relação à poeira e à lama.

Travessa Marcos Belicha

A Travessa Marcos Belicha está situada no Bairro Bom Pastor. Seu nome homenageia um comerciante, descendente de judeus. A moradora Valdéia Gonçalves relatou que os primeiros moradores da travessa foram dessa família. Já o senhor Jander relatou que chegou a conhecer os primeiros moradores pessoalmente, os senhores Zé Diniz, Chico Gomes e Pedro. Segundo dados da Prefeitura de Juruti, essa rua foi nomeada oficialmente pelo Prefeito Antônio Assunção Coelho, pelo Projeto de Lei nº 6, de 18 de setembro de 1981, próximo da data da abertura da via.

As pessoas foram liberando os terrenos da mata para construir suas casas. Existiam pequenos comércios, segundo a moradora da travessa, senhora Valdéia Gonçalves. Todas as casas eram de barro e madeira, construídas pela equipe do grupo católico Cáritas em conjunto com a comunidade.

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Memórias de Rua

Antigamente, existiam as festividades tradicionais do Bom Pastor que passavam de geração em geração. Elas ainda acontecem todos os anos e delas participam toda comunidade católica local.

Embora não haja registros de algum morador antigo ter presenciado aparições e visagens, circulavam as histórias do Cachorrão, da Loira do Lago do Jará e do homem que se transformava em cavalo.

Hoje, a travessa está completamente transformada pela ação do homem. O que antes era só um caminho que alagava, hoje está asfaltado, possui rede de esgoto, coletor de lixo e comércios; existem poucas árvores e algumas casas ainda mantêm o mesmo estilo mais antigo, de madeira, e outras já sofreram modificações, com o uso da alvenaria.

Travessa Antônio Rodrigues Oliveira

O nome da Travessa Antônio Rodrigues de Oliveira foi dado em homenagem a um agricultor, senhor Antônio, marido de dona Lulu. Foi um dos primeiros moradores desta via, e trabalhava no interior, fazendo farinha e plantando tabaco. A nomeação oficial, conforme os dados da Prefeitura de Juruti, realizou-se na gestão do Prefeito Antônio Assunção Coelho, pelo Projeto de Lei nº 6, de 18 de setembro de 1981, data próxima da abertura da rua. Segundo o morador da travessa, senhor Selis Bentes Gomes, que chegou a conhecer os primeiros residentes, e segundo as informações da senhora Agací de Lima Santos, os moradores pioneiros do logradouro foram: Irmã Nair, dona Lulu, senhor Pedro Nunes, dona Rosa Araújo e dona Leonor.

O sr. Antonio Rodrigues Oliveira, cearense, veio para a Amazônia em busca de terra e de trabalho. Em Juruti, trabalhou algum tempo como agricultor enquanto a família residia na cidade, para que os filhos estudassem – a moradia era na rua da Saudade, no tempo em que ainda se chamava Estrada da Terra Preta. O nome do sr. Antonio foi dado à via na época em que a Prefeitura abria várias travessas nessa parte da cidade.

Uma das edificações de mais relevância foi a Igreja do Bom Pastor; as casas dos moradores eram de palha ou madeira, cobertas com palhas.

Uma das primeiras tradições existentes nesta travessa foi a festividade do padroeiro Bom Pastor, que acontecia todos os anos e ainda permanece; outros eventos eram realizados pela Igreja Evangélica Assembléia de Deus.

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Ruas do Bairro Bom Pastor

Segundo a moradora Agací Santos, existia uma lenda que assustava os moradores mais antigos. Quando dava meia-noite, ouvia-se um barulho muito grande e aparecia um bicho que rolava pelo chão. Certa noite, o filho de um vizinho de dona Agací chegou de uma festa e quando foi se deitar ouviu um grande barulho. Espantado, levantou-se e foi ver o que era. Quando olhou, enxergou um bicho enorme, parecia um uruá [tipo de molusco]. Ao ver aquela cena, não aguentou o impacto e teve um desmaio, não se sabe ao certo o que era essa visagem.

O senhor Selis Bentes Gomes narrou que havia naquele tempo um morador chamado Solano, que gostava de sair tarde da noite. E certa noite, ele viu um grande fogo e várias pessoas vestidas de branco. Isto pode indicar um antigo trajeto feito pelos Encomendadores de Alma, tradição do povo de Juruti para expressar sua fé e devoção.

A travessa que se chama Antônio Rodrigues de Oliveira, com o passar dos anos foi sofrendo muitas modificações, o que era simplesmente uma travessa de chão batido, hoje está toda asfaltada e ainda possui muitos exemplares de casa antigas. A vegetação natural praticamente já não existe, algumas árvores foram plantadas pelos moradores, como mangueiras, jambeiros além de plantas de jardim. A travessa possui pouco comércio, pouco movimento de pessoas e de transportes.

Travessa Tugo Maruoka

A Travessa Tugo Maruoka é a penúltima rua do Bairro Bom Pastor, e seu nome foi dado em homenagem a um morador, falecido ainda jovem, que representa a imigração japonesa para a região. Segundo dados da Prefeitura de Juruti, essa rua foi nomeada oficialmente pelo Prefeito Antônio Assunção Coelho, pelo Projeto de Lei nº 6, de 18 de setembro de 1981, próximo da data da abertura.

A história relatada pelo senhor Paulo Cordeiro de Carvalho pode ser resumida desta maneira: duas famílias japonesas moravam nessa área, os Maruoka e os Kobayashi, que ainda têm descendentes no município. O filho do senhor Maruoka, Tugo Maruoka, faleceu depois de um acidente e a travessa manteve o seu nome, como lembrança para seus pais e amigos. Existiu uma escola com o mesmo nome, mas não se conseguiu precisar se era nesta mesma via.

A travessa, que atualmente se encontra asfaltada, antes era só um caminho cercado de matos altos, sem casas, e que deu lugar a uma travessa de terra batida, na qual pessoas vindas de outros locais foram adquirindo terrenos e construindo casas. Os filhos das pessoas mais velhas foram crescendo e também construíram suas casas e assim foi

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Memórias de Rua

se formando a Travessa Tugo Maruoka.

Outros fatores também contribuíram para o povoamento dessa rua, como o crescimento da malha urbana, o êxodo rural e a busca de melhoria de vida, conforme relatou dona Roseia Maria Pinto Sousa.

Na Travessa Tugo Maruoka não foi identificada nenhuma lenda. Será que ninguém reparou nelas? Passaram despercebidas?

Atualmente, existem três igrejas com suas congregações neste logradouro e o único evento religioso que ela possui são os cultos que as igrejas promovem.

Casa da família Kobayashi, na Terra Preta.

Acervo: Régia Pinheiro.

Escola Tugo Maruoka.

Acervo: Régia Pinheiro.

Ruas do Bairro Palmeiras1

1 - Texto produzido pelos estagiários de 2013 e 2014.

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Memórias de Rua

Travessa Mário das Neves Batista

A travessa Mário das Neves inicia-se às margens do rio Amazonas e prossegue por três bairros: Palmeiras, Santa Rita e São Marcos. Segundo relatos de moradores, foi fundada aproximadamente no ano de 1973. A data exata de sua fundação e o nome de seu fundador foi perdida no tempo, pois não existem registros históricos escritos, nem mesmo na Prefeitura ou na Câmara dos Vereadores.

Moradores locais relatam que a travessa era apenas um caminho em meio à mata muito intensa e bastante fechada. Não existia luz elétrica em todas as ruas na década de 1970, apenas nas principais da cidade, sendo assim, não havia luz neste logradouro. Havia alguns moradores ocupando terrenos no Bairro Palmeiras, mas ninguém sabe dizer sobre a origem do nome da via ou sobre o próprio homenageado.

Atualmente, permanecem na Travessa Mário das Neves Batista moradores pioneiros, entre outros as senhoras Amélia Tavares Cordeiro, Ana, Célia Maria da Silva, Júnia, Raimunda, Valdéia da Gama Batista, Teresa, Beca e os senhores Miguel, Benteco, Aurélio, Gil, Antônio Alves de Souza, Higino, Eliésio, Edson, José Gama, João. Alguns destes e outros pioneiros foram entrevistados durante o ano de 2014: Adelaide Santos Silva, Amélia Tavares Cordeiro, Célia Maria da Silva, Janderson Silva, José Arino de Souza Melo, Raimundo Nonato Farias de Souza, Rosemiro Silva e Valdeia da Gama Batista.

Esses depoimentos indicaram que naquela travessa não havia festa religiosa nos tempos mais antigos, pois as igrejas principais eram a Matriz (católica) e a Assembléia de Deus (pentecostal), que se localizam

A travessa no ano de 2014.

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Ruas do Palmeiras

mais ao centro da cidade. Havia, porém, algumas danças na rua como a Quadrilha, Pastorinha, Dança do Boi, Dança do Canarinho, Dança do Tambaqui.

Dois tipos de artesanatos eram elaborados por moradores: com o cipó de timbó (cipó amazônico usado nas pescarias, pois libera um veneno que é capaz de imobilizar o peixe para que os pescadores possam pegá-lo com as próprias mãos), e com a juta (fibra amazônica utilizada nas produções de tapetes, bonecas, roupas, em estofados para carros e sofás). Nos dias atuais, podemos indicar dona Valdéia como artesã de biojoias.

Na Travessa Mário das Neves Batista contavam-se algumas lendas

como a do Cachorrão, Porca Grande, Calça Molhada, a Mulher que se transformava em Égua, o Chupa-Chupa, Loira do Aningal.

A Loira do Aningal era um ser encantado que ficava nesta área, mas nunca viam seu rosto, ela encantava as pessoas que a viam de frente. Senhor Raimundo Nonato narrou o encontro entre a Loira e um parente, e os desdobramentos do fato.

“Eu tive um cunhado que contava que ele a seguiu, por trás, e conseguiu ver ela de frente. Ele até adoeceu, ficou 40 dias, depois foi benzido na cabeça, aí depois disso ficou normal. Era difícil de ver prova disso né, hoje em dia você tem o celular né, que uma coisa dessa não é mais novidade, era essas coisas que rolavam mais ou menos na época.”

Antigamente, a Travessa Mário das Neves Batista era bastante calma e de chão batido, e devido ao fato de ali não haver energia elétrica, as pessoas dormiam com a porta de sua casa aberta, por não ter violência na época. Hoje em dia, a movimentação de veículos mantém a via esburacada, o que coloca em risco a vida e a casa de muitos dos moradores, fato agravado pela ocorrência do fenômeno das terras caídas.

Entrevista com dona Valdéia Gama, artesã e pioneira na travessa.

Senhor Raimundo Nonato, durante a entrevista em 2013.

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Memórias de Rua

Travessa José Jacinto Vieira

A travessa José Jacinto Vieira era apenas um caminho cercado de matos, em sua origem. O nome homenageia José Jacinto Vieira (1888-1962), um importante morador de Juruti, que hoje descansa no Cemitério da Saudade. Segundo os moradores entrevistados, senhores Raimundo Pereira e Luiz Soares da Gama, ele desempenhou funções de oficial de justiça, promotor, juiz e prefeito.

Segundo dados da Prefeitura de Juruti, essa rua foi nomeada oficialmente pelo Prefeito Antônio Assunção Coelho, pelo Projeto de Lei nº 6, de 18 de setembro 1981, data provavelmente próxima à abertura da via. E ainda segundo o documento, o nome é Jacinto José Vieira.

Juruti tinha poucos moradores naquela época de abertura dos logradouros, as pessoas foram chegando com o tempo. Na travessa havia poucos comércios, as casas eram feitas de taipa, de palha e de madeira, materiais fáceis de se encontrar porque eram abundantes no local, e de modelo bem simples, construídos pelos moradores.

Hoje aumentou o número de moradores; algumas casas antigas permanecem, mas outras foram modificadas.

Nesta via há um campo de futebol onde times disputam torneios; posto de saúde e comércios. Uma parte da travessa é asfaltada, os moradores têm acesso à água encanada e à energia elétrica.

No bairro acontecia e persiste até hoje a festividade de São Francisco. É uma festa e tradição muito antiga dos católicos que se comemora todo ano, e na qual havia vários quadros: pastorinha, quadrilhas, dança de boi e de pássaro, mas hoje não fazem mais esses tipos de brincadeiras.

As lendas sempre fizeram parte da história de Juruti, e nesta travessa não é diferente, os entrevistados relatam diversas histórias de visagens, entre elas a da Loira do Jará, que atraía homens para a beira do lago.

Travessa Américo Pereira Lima

Trata-se de uma via que atinge o rio Amazonas.

A travessa foi nomeada em homenagem a um deputado que residia na cidade, Américo Pereira Lima, que chegou a ser intendente do município de 1948 a 1950, porém quando se tornou candidato e venceu as eleições para deputado estadual, foi para Belém com toda sua família.

A travessa surgiu por volta de 1940, a partir de pequenos caminhos que se interligavam e levavam ao bairro central. Às margens das vias poucas casas separadas por terrenos cobertos por matas.

Os pioneiros identificados foram Maria Régia, Izolina Lemos, João Fió e Manuel Tavares Cordeiro.

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Ruas do Palmeiras

A via tem estabelecimentos comerciais: um depósito de gás, um salão de beleza, lojas, bares. E nela se localiza a igreja de São Francisco. É asfaltada – apesar de um grande buraco que vem aumentando de tamanho devido à erosão; tem energia e água encanada.

No bairro acontecem vários eventos como festas juninas e festas de igrejas evangélicas.

Um dos fatos que ocorria na rua era as aparições de um ser que nunca foi identificado, mas que vinha de noite nas casas das pessoas para oferecer dinheiro e ouro, porém os moradores temiam tanto a tal aparição que chegavam a não sair mais à noite, com medo.

Vivências e memórias das ruas de Juruti

Gostaríamos de prestar uma homenagem aos Encomendadores de Alma, que nos convidaram até suas casas, concederam entrevistas, entoaram seus cânticos, e permitiram registrar um pouco de sua ação. Agradecemos, honrados por toda a confiança e esperamos retribuir com a tradição através da narrativa formulada a seguir, construída através do generoso diálogo com os praticantes desta fé de entrega ao próximo através da oração.

Encomendadores de Alma1

A prática de encomendar as almas é muito antiga, segundo Melo Moraes Filho (2002) esse culto traz consigo o jeito de pensar que nasceu do Cristianismo durante a Idade Média sobre o Inferno e o Purgatório, e desde então é realizado durante a Quaresma, tanto em Portugal quanto no Brasil. O autor explicou ainda, na página 192, que

foi sempre o Purgatório, no conceito dos padres da Igreja, um lugar de torturas, onde havia torrentes caudais de betume fervente, de lagoas de fogo e de enxofre fumegante, em que as almas submergiam-se com as formas corporais da Terra, e desatavam gritos, soltavam gemidos e vozes súplices, às vezes escutadas neste mundo.

Ainda segundo esse autor: “Constava da tradição que só homens podiam tomar parte nessas romarias em favor dos condenados de além-túmulo; sendo proibido, sob pena de morrerem assombradas, às mulheres e crianças, afrontar o preceito lendário” (MORAES

1 - Texto produzido pelos estagiários do ano de 2012.

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Memórias de Rua

FILHO, 2002:195). Jaime Lopes Dias, em sua obra Etnografia da Beira (1944:152), descreve que

“Em muitas localidades da Beira Baixa costumam, algumas mulheres, em determinadas noite da Quaresma, subir ao campanário da Igreja ou aos sítios mais elevados das povoações, a encomendar as almas ou a cantar, em toada própria, muito triste2” .

No Brasil, os Encomendadores de Almas atuam no interior do país. Há uma variedade de instrumentos usados para acompanhar as orações, por exemplo: matraca; alguns grupos usam túnicas brancas, outros apenas panos brancos cobrindo o corpo e a cabeça deixando apenas a boca e os olhos à mostra, dentre outros objetos.

Em Juruti, as entrevistas foram realizadas com os encomendadores de almas ou penitentes: Raimundo Tavares de Lima, Clariomar de Souza Toscano, Rosane da Silva Corrêa e Pedro Marturano; suas falas permitiram obter as informações que seguem.

A tradição da encomendação de almas, em Juruti, persiste há mais de meio século. Um grupo de suplicantes (cerca de 25 integrantes, entre homens e mulheres) reúne-se nas noites de Quinta e Sexta-feira Santa para rezar por aquelas pessoas que já faleceram e também pelos familiares dessas pessoas. Esse grupo é conhecido popularmente como “encomendadores de almas”, pois tem como objetivo amenizar o sofrimento das almas de pessoas que morreram de maneiras trágicas ou então daquelas que possam estar sofrendo no purgatório.

O ato de rezar pelas almas veio da zona rural do município e depois, com o passar dos anos, foi trazida para a sede urbana, onde ganhou força e reforçou a tradição.

Durante o ano, os encomendadores reúnem-se e fazem confraternizações, nesses momentos ocorrem orações e tentam estar em um universo espiritual e em comunhão com Deus. É também nesses momentos que dialogam sobre o grupo, sua manutenção e o trajeto que será feito nos dias que antecederão à Páscoa dos católicos.

Todos os encomendadores têm algo em comum: as suas missões. Todos afirmam ter como penitência o ato de rezar pelas almas como um agradecimento de fé. Há também aqueles que atuam por devoção às almas, isto é, como a maioria das pessoas tem devoção a santos.

Chegados os dias de Quinta e Sexta-feira Santa, os encomendadores de almas reúnem-se por volta das 20 horas para ficarem em concentração na casa de algum deles e em seguida dirigem-se ao 2 - DIAS, Jaime Lopes. 1944. Etnografia da Beira. Lendas, costumes, crenças e superstições”. Volume 1; 2ª edição. Empresa Nacional de Publicidade. Lisboa. 231p.

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cemitério, que é onde a caminhada tem início. Todos trajados com uma túnica branca amarrada pela cintura por um pedaço de pano também branco. No cemitério, todos ficam em volta do cruzeiro, nesse momento um pequeno sino, chamado de campa, é tocado dando início a um momento de reflexão e concentração, pois como diz um trecho de uma de suas orações, “a noite é de encomendar”. Daí então, começa a caminhada dos encomendadores pelas ruas da cidade, fazendo um trajeto pelas casas daquelas famílias que solicitaram as suas rezas e que têm um ente querido falecido. Os rezadores visitam cerca de dez casas por noite, e em toda essa caminhada procuram reviver todo o sofrimento de Jesus Cristo, e a dor das almas no Purgatório. As suas rezas retratam bem isso, todas são de uma grande melancolia, vejamos um trecho de uma delas cantada pelo senhor Pedro Marturano:

Sexta sexta... Sexta Santa

Três dias antes da Páscoa

Quando o Redentor veio ao mundo...

Pelos discípulos chamou...

Chamou... de um a um...

Dois a dois se alevantou...

Jesus Cristo perguntou

Quem por ele morreria...

Nenhum deles soube responder...

Se não São João Batista.

Quando vinha amanhecendo

Jesus Cristo caminhou...

Com uma cruz sobre os ombros...

Da madeira mais pesada

Com uma corda na cintura

Por onde os judeus puxavam...

Caaada puuuchão que eles davam

Jesus Cristo ajoelhava

Por onde Jesus Cristo ajoelhava

Gotas de sangue lançava...

Choravam as três Marias

Madalena e sua irmã...

Uma lhe lavava os pés

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Outra enxugava o rosto

Uma arrecadava... o sangue...

Dentro de um cálice sagrado.

Quem tomar daquele sangue

Será bem abençoado...

Neste mundo será rei...

No outro mundo recruado...

Quem não souber desta oração

Quem não souber deve aprender...

Que senão na hora de sua morte...

Haverá quem lhe condene...

Salvará... seu pai e sua mãe

Sua terça geração (...)

Em todas as residências visitadas, também é tradição logo ao fim da reza os encomendadores participarem de um banquete, este é servido pelos moradores das casas, onde todos participam, pois afinal, a caminhada pelas ruas da cidade é longa e cansativa. No final de cada noite voltam ao cemitério para, segundo eles, deixar as almas de onde as haviam retirado.

Dos rezadores mais antigos, apenas dois seguem firmes no grupo, os senhores Pedro Santarém Marturano e Raimundo Tavares de Lima, ambos lutam pela manutenção da cultura dos encomendadores de almas, tentando trazer para o grupo, novos integrantes, pois assim essa cultura jamais desaparecerá de Juruti.

Ao longo de décadas, a cidade de Juruti sofreu um processo de crescimento vagaroso, as ruas e a população aumentaram aos poucos, mas nos últimos dez anos esse crescimento ocorreu de forma mais acelerada. Com todo esse crescimento, novas gerações foram surgindo, consequentemente a mentalidade também mudou. Os encomendadores de almas sofrem um forte preconceito da população mais jovem, pois alguns pensam que o grupo usa magia negra, outros os apelidam de “visagens”. Por esses motivos, a caminhada do grupo tem que começar cada vez mais tarde, por volta de 22 horas, horário em que o fluxo de pessoas nas ruas é menor e os encomendadores são escoltados pela Polícia Militar em alguns momentos.

É importante respeitar este grupo, e qualquer outro representante da cultura local, pois é assim que entendemos melhor nossas origens, nossa própria história, e, devemos lembrar de que levam conforto

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espiritual para quem precisa. Independente de nossa fé, devemos respeitar as crenças dos demais. Vida longa aos Encomendadores de Almas e muitas gerações que virão!

As lendas de Juruti em teatro para todos3!

Três lendas narradas em Juruti foram adaptadas por João Carlos Gonçalves Melo, e serão transcritas aqui, pois sintetizam os acontecimentos locais e podem inspirar outros educadores a apresentar uma peça teatral em sala de aula.

João Carlos faz parte da vida cultural da cidade de Juruti, tendo conduzido o Grupo Teatro Inspiração, constituído por mais de 200 jovens. A inclusão dessas lendas serve para mostrar a criatividade local, o talento e a capacidade de homens e mulheres que conhecem esse pedaço de chão. No seu texto ele valoriza o sotaque, as expressões populares, a paisagem da região, as histórias. E tudo isso junto cria uma força que inspira.

As histórias aqui apresentadas tiveram cenários construídos, bem como ambientação com roupas e enfeites, mas com um pouco de empenho temos certeza que os educadores dão um banho de criatividade.

A Lenda do Cachorrão

Narrador: Há tempos atrás, em Juruti, aconteceu um dos maiores mistérios que até os dias de hoje intriga e amedronta a população. Populares falam que em uma determinada época, as noites ficaram diferentes, com algo assombrosamente pavoroso no ar. Informações levam a crer que tudo pode ter começado por pessoas da época que liam um livro que para os cristãos era proibido, por conter ensinamentos de maldade e abertura de um caminho de maldade e transformação em criaturas do mundo das trevas. Isso pode ter sido o fator primordial para o aparecimento do Cachorrão, por se acreditar que esse senhor teria lido certo livro. Porém, em uma noite escura, ao terminar de ler a obra, ele começou a ouvir vozes.

Vozes: Você é meu!!! Preciso te levar comigo!! A sua alma é minha!!! Nunca mais vai ficar longe de mim.

Senhor: Quem está ai? O que está querendo? Eu estou armado.

Narrador: O homem olha a sua volta e passa a ter visões distorcidas de várias coisas e tenta se defender.

3 - Texto produzido por João Carlos Melo através das lendas contadas ao longo de sua infância.

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Senhor: (tenta cortar como se visse algo). O que está acontecendo comigo, o que é isso que quer me pegar?! Vai embora, eu não te quero aqui.

Narrador: Numa dessas imagens, viu um cachorro grande e feroz que lhe atacou mordendo o seu braço esquerdo. Ele sangrou muito e desmaiou. No dia seguinte, não havia marca nenhuma, mas sentia que o seu corpo estava diferente.

Senhor: (levanta com a mão no braço esquerdo) E fala. Ai! Ai,ai, ai, o que aconteceu comigo, o que é está acontecendo.

Narrador: Desde então, o senhor e a comunidade não imaginavam que as noites nunca mais seriam as mesmas. Nas noites de lua cheia começava a agitação de diversos animais: gatos miando, cachorros rosnando e uivando, assim como coruja cantando como se estivessem vendo alguma coisa. Tudo parecia ficar diferente a cada nova noite de lua cheia que chegava. Só que na verdade, as pessoas passaram a se sentir inseguras temendo que algo pudesse aparecer e atacá-la. O medo tinha chegado à cidade, porque juntamente com o apagar das luzes, por volta da meia-noite, um senhor saía de sua casa passando por várias ruas até chegar a uma área de mata, próximo ao cemitério. Então ele entrava no cemitério e começava a rolar, rolar e rolar no meio dos capins. De repente, aparecia a temida fera que vinha rasgando as trevas na noite de lua cheia.

Cachorrão: Auuu! Uuuu! Auuu!! (homem transformado uiva e age como um verdadeiro Cachorrão feroz).

Narrador: O Cachorrão passou a atacar pessoas e entrar em residências promovendo um verdadeiro terror na cidade. Isso aconteceu durante muitos anos. Porém, os graves acontecimentos e prejuízos causados pelo desconhecido cachorro levou vários homens a tentar desvendar o mistério do Cachorrão.

Homem 1: Acho que já está na hora dar um jeito nesse endemoniado!

Homem 2: Mas como já, se este cão aparece em vários lugares ao mesmo tempo?

Homem 3: Se, se, será que ele na-na-não vai pegar a-a-a gente primeiro. (homem gago de tanto medo).

Homem 2: Mas como já, rapaz! Se nós vai tá todo armado.

Homem 3: É, é, va-vamos acre-acreditar que vai dar ce-certo.

Narrador: Eis que se armaram e saíram para preparar uma tocaia em um dos lugares que o Cachorrão aparecia, no campo de futebol onde hoje é a atual Escola Américo Pereira Lima.

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Cachorrão: Auuu! Auauauuu!

Homem 2: O bicho está vindo! Vamos nos preparar.

Narrador: Tudo pronto. Parecia que a tocaia ia dar certo, só que o Cachorro aparece do nada, sente o cheiro dos homens e parte para cima deles. Os homens estavam armados com pedaços de madeiras, e também partiram para cima do Cachorrão e lançaram fortes golpes contra ele, que ficou bastante machucado, caído no chão. Por fim, um dos homens armados, deu um tiro.

Homem 1: Agora acabou! Quero ver se ainda vai perturbar os outros.

Homem 3: Aaaainda

Homem 1: (bate nas costas e fala). Diga rapaz! Desembucha!

Homem 3: Aaainda bem que ele na-não pegou a gente.

Homem 2: Agora, finalmente teremos paz.

Narrador: Porém, o que os homens não sabiam era que o tiro tinha pegado de raspão e o Cachorrão, se arrastando, conseguiu escapar. No dia seguinte, os homens voltaram ao local para ver o cachorro morto, mas não havia nada ali.

Homem 1: Como pode ser? Eu dei um tiro nele! Não pode ser!

Homem3: Que-que se-será que po-pode ter acon-acontecido.

Homem 2: Será que era o Coisa Ruim, o Encardido?

Homem 1: Só pode ser! Nada justifica o sumiço daqui.

Narrador: E no Posto de Saúde aconteceu algo surpreendente! Pessoas que aguardavam pelo atendimento médico comentavam o fato ocorrido na noite anterior, e nesse momento apareceu um senhor com machucados e com um tiro que passou de raspão. Isso levou algumas pessoas a associarem ao fato ocorrido. Depois desse dia, as noites de lua cheia ficaram diferentes, mas sem tanto mistério e terror, pois ninguém sabe para onde foi o Cachorrão, moradores antigos ainda ficam com medo quando falam do assunto.

Voz do Cachorrão: auuu!

A Lenda da Loira do Jará

Entrada: Faixa 1, música de mistério tocando, e deve ser interrompida quando iniciar a narração.

Narrador: Há alguns anos, era comum durante o final de semana

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no município de Juruti, as famílias e jovens se reunirem para lavar roupas, tomar banho e se divertir no Lago do Jará. Havia também uma linda jovem de cabelos loiros e compridos, pele clara e olhos azuis, frequentadora ativa do lugar juntamente com seus amigos. Eis que num belo dia essa jovem escutou uma voz muito bonita que lhe chamava atenção.

Voz: (faixa 2, música de melodia suave e convidativa) Venha comigo! Venha comigo! Eu preciso de você.

Narrador: Achando estranho, a jovem comentou o fato com os amigos.

Loira: Eu ouvi uma voz estranha me chamando. Fiquei com medo, não sei o que isso quer dizer.

Amigo: Não era nada é impressão.

Amigos: É isso mesmo! Não é nada, vamos embora.

Narrador: Pena que ela não imaginou que a partir de então, nunca mais sua vida seria a mesma. A Loira passou a ouvir frequentemente a voz.

Voz: (faixa 2) Vem ao meu encontro! Preciso de você.

Narrador: Relatos levam a crer que na verdade a voz pertencia a um ser encantado do Lago do Jará. O ser encantado se encantou pela beleza da moça e queria ficar com ela, tirando o seu sossego e atraindo-a cada vez mais. Num determinado dia, mais precisamente num final de tarde, por volta das 18 horas, a jovem ouviu novamente a voz.

Voz: (faixa 2) Estou te aguardando! Venha comigo, você vai ser muito feliz.

Narrador: (faixa 3, melodia de encantamento) Nesse momento, a jovem não resistiu ao chamado e passou a seguir o som da voz. Ela não imaginava que a voz iria conduzi-la diretamente para as margens do lago. Lá chegando, olhou de um lado para outro, e não viu ninguém, foi então que entendeu que a voz vinha do fundo do lago. Não resistindo ao chamado, mergulhou nas águas escuras do lago, banhada pela lua prateada da noite misteriosa. O povo ainda acredita que ela viva encantada cuidando da sua beleza (ao final da fala, parar a música e aguardar a troca de roupa da Loira).

Mãe da Loira: Mas quando já, onde está minha ‘fia’? Meu ‘fio’, tu não viste minha ‘fia’? (a mãe deve ter um sotaque carregado).

Colega: Uh senhora, num vi não.

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Mãe: Mas meu senhor, onde será que esta moleca se enfiou? Será que esta menina já se enfiou por estes ‘matagar’ que ‘inté’ agora num me aparece? (manter o sotaque interiorano na mãe).

Narrador: A senhora mãe, preocupada com a filha, passou a ficar triste e chorar por causa dela durante muitos anos (a mãe deverá ficar um pouco mais no palco, demonstrando muita tristeza e angústia). Porém, um determinado dia, uma linda moça aparece em alguns lugares de Juruti. Todos ainda se lembravam da moça que tinha desaparecido, e se perguntavam se ela teria sido encantada, e estaria voltando para a cidade de Juruti. Como a moça era bem namoradeira e por gostar de festa, conseguia quebrar o encanto e sair do Lago do Jará para os seus passeios noturnos.

Rapaz: Égua, moleque... Olha, olha, olha vê só que loira mais bonita!

Moleque: Tu és um bucho! Corre, corre que essa já, não vai ficar contigo.

Narrador: A moça passou como se não estivesse vendo os jovens, passou pelas Ruas Marechal Rondon e Joaquim Gomes do Amaral, indo em direção ao baile que estava acontecendo no Chapéu de Palha, clube de festa que era muito conhecido em Juruti. (colocar faixa 4, com música animada de baile). Chegando lá, ela passou pela portaria e começou a expelir seu aroma sedutor e dançar como se estivesse flutuando. Os rapazes ficavam encantados com a linda moça.

Marcelo: Égua, peão, eu vou falar com essa gata.

Fernando: ‘Vixe’ peão, mas quando já que esta menina vai te dar confiança!? (Risos).

Narrador: O rapaz vai em direção à moça e tenta conversar com ela, que o ignorou, não aceitando a conversa. Isso aconteceu porque o rapaz não imaginava de quem se tratava, e que na verdade, era ela quem escolhia seu par. Um rapaz, encantado com tamanha beleza, ficou sem ação no momento em que foi abordado pela linda jovem com um convite para dançar. Ninguém nunca soube falar o que ela teria dito. Antes da meia-noite, horário em que a energia era desligada na época, os jovens saíram do clube andando por várias ruas como Joaquim Gomes do Amaral, Judite Barroso Pinheiro, Juscelino Kubitschek, Tancredo Neves e outras, indo em direção ao Lago do Jará. O jovem, sobre efeito do encantamento e deslumbrado com aroma penetrante da linda moça, ficou extasiado (parar a leitura por três segundos, para suspense). Sem entender, o jovem foi envolvido com a dança da moça, envolvido, envolvido, envolvido, até perder o sentido (pausar a leitura por dois segundos). A moça cheirava todo corpo do rapaz como se retirasse o seu cheiro para levar consigo e voltar para

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o Lago. No dia seguinte, sentindo o calor do sol no seu rosto, o rapaz recobrou os sentidos e perguntou.

Rapaz envolvido: Cadê a loira!!! Cadê a loira!!! Cadê? Como já, que eu vim parar aqui? Meu Deus, como eu cheguei já aqui? E a loira? Loira!!! Loira!!!.

Narrador: O rapaz não conseguia falar coisa com coisa, chegando ao ponto de passar mal, com febre e sem saber o que estava falando. Foi socorrido pelos familiares que o trouxeram para casa e deram-lhe remédio, porém a febre persistia, então só tinha uma alternativa, procurar um curandeiro para benzer e descobrir o que estava assombrando o rapaz.

Curandeiro: ileiaê, ileieiaê, eu vim aqui dizer, ileiae, ilaiaê o que fizeram com você. Eita, que o caboclo chegou, chegou, chegou cansado. Muito cansado. Cadê o fumo do caboclo? Tem uma pinguinha? O caboclo precisa recuperar as forças.

Narrador: O curandeiro defuma o jovem para afastar o espírito encantado que tinha se apossado do seu corpo.

Curandeiro: Afasta, afasta que esse corpo não te pertence, volta para teu lugar e deixa esse espírito em paz.

Narrador: O espírito, com a bendição e oração, se afasta do rapaz, o libertando do encanto. Importante lembrar de que fatos parecidos ocorreram com muitos jovens de Juruti, provocando medo e insegurança nos homens ao cair da noite. Inclusive, nos dias de hoje. Portanto, tome muito cuidado, pois pode ter uma Loira do Jará atrás de você.

(faixa 5, música de suspense, a música deve entrar alta e em seguida baixar a trilha).

Loira: Eu vou ficar com você.

(faixa 6, música de encantamento) momento do encantamento à beira do lago. O narrador espera a saída dos pais com o rapaz, em seguida fará o agradecimento.

Narrador: Senhoras e senhores, criançada que nos prestigiaram, essa noite agradecemos a presença de todos por terem ficado conosco até esse momento!

A Lenda do Calça Molhada

Mediador sem boneco: Vocês sabiam que tenho um amiguinho que não acredita na lenda?! O nome dele é Juquinha. Vamos crianças, me ajudem a chamá-lo: Juquinha!!!!

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Vivências e memórias das ruas de Juruti

Juquinha: Oiiiiii, nooossa, quanta gente pequena!!! Bom dia, criançada!? Tudo bem com vocês?! Oi minha querida amiga. Diga!

Mediador: Oi Juquinha, eu estava falando para as crianças que você não acredita na lenda do Calça Molhada!

Juquinha fala emburrado: É isso mesmo, eu não acredito não, deve ser mentira, isso é invenção de quem não tem o que fazer!

Mediador: Então tive uma ideia! Alguém poderia contar a lenda do Calça Molhada para o Juquinha, quem sabe assim ele acredita! (mediador instiga os participantes, caso alguém queiram contar. Deve-se perguntar o nome da criança, que levanta e conta a lenda).

Mediador: Muito bem, uma salva de palmas. E agora Juquinha, você acredita?

Juquinha: Humpf! Não sei não! Ainda não estou convencido! Tive uma grande ideia: vou perguntar para minha vozinha, ela é muita sábia e jamais me enganaria.

Mediador: Boa ideia, Juquinha! Tenho certeza que a sua ‘Vó’ tem muita história para contar!

(Juquinha some e mediador senta)

(A Vovó aparece cantando com a música de fundo, Juro te Amar, de Nilson Chaves)

Vovó: Eu juro, juro, juro meu amor... eu juro, juro juro te amar... Pra sempre, meu amor pra sempre... (vovó estará cantado a música Juruti Amar).

(Juquinha chega gritando e vovó se assusta)

Juquinha: Vovóóó, Vovóó, Vovóó!!!

Vovó: Oi meu netinho, mas o que aconteceu? Por que esse desespero?

Juquinha: Sabe o que é vovó, queria saber se a senhora já ouviu falar num tal de Calça Molhada daqui de Juruti?

Vovó: Mas é claro, é uma lenda muito conhecida daqui de Juruti. Senta que vou te contar como aconteceu... Há muitos e muitos anos, havia uma família que vivia tranquilamente em sua casa, até que um dia a filha do casal, foi tomar banho no rio Amazonas, na frente da cidade e morreu afogada. Seus pais ficaram muito tristes com a morte da filha.

Juquinha: Noossa vovó, que tristeza mesmo!

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(A vovó continua...)

Vovó: A partir desse dia, ‘seu’ José, pai da menina, passou a beber dia e noite, andava com a garrafa de cachaça debaixo dos braços e chamava pela filha.

(Personagem bêbado – futuro Calça Molhada – entra com a garrafa de cachaça debaixo do braço cambaleando e chamando: minha fiiilha, minha filhinha, por quê?)

Vovó: Certo dia, ‘seu’ José saiu para pescar como de costume no Lago do Jará e para seu azar, teve um acidente com sua embarcação. Caiu na água, tentou nadar, mas como estava bêbado, não conseguiu e morreu.

(Personagem bêbado simula a pesca e o afogamento)

Vovó: Desde esse dia, seu espírito saía à noite do Lago do Jará e vagava pelas ruas com passo firme e fazendo um barulho de calça molhada, assustando os moradores que viviam perto do lago e na cidade de Juruti. Dizem que José caminha todas as noites do Lago do Jará até a frente da cidade, em direção ao rio Amazonas, para encontrar com sua filha que havia morrido afogada.

(Personagem bêbado e sua filha dialogam).

_Filhinha, estava procurando por você!

_Papai!

(os dois se abraçam e a cena termina)

(enquanto é feita a cena do encontro, o boneco Juquinha apenas observa tudo com cara de assustado e treme de vez em quando com medo)

Vovó: E depois que o Calça Molhada encontra sua filha, ele retorna para o lago. E até hoje, existem pessoas que escutam o mesmo barulho da calça molhada pelas ruas de Juruti. Pois é meu netinho, essa foi a história do Calça Molhada. O que você achou?

Juquinha: Eu acredito vovó, eu acredito!!! Agora sei que as lendas são muito importantes para valorizar a cultura da nossa cidade!

Vovó: Venha querido, vou te contar muitas outras histórias que conheço! (os dois saem de cena)

Juquinha: É isso, amiguinhos! As histórias contadas são legais para nos ensinar sobre a nossa região!

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