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8/18/2019 McLuhan_Os Meios de Comunicação Como Extensão Do Homem
http://slidepdf.com/reader/full/mcluhanos-meios-de-comunicacao-como-extensao-do-homem 1/10
M A R S H A L L
M C L U H A N
OS MEIOS E
..
C O M U N I C ~ O
COMO EXTENSOES DO HOMEM
Traduc ao
de
EclO
PIGNATARI
E D I T R A C U L T R I X
S O
PA LO 19 A
8/18/2019 McLuhan_Os Meios de Comunicação Como Extensão Do Homem
http://slidepdf.com/reader/full/mcluhanos-meios-de-comunicacao-como-extensao-do-homem 2/10
PRIMEIR P RTE
1
o MEIO E
A MENSAGEM
Numa cultura como a nossa, ha muito acostumada a
dividir e estilha<;:ar todas as coisas como meio
de
contro
la-las, nao deixa, as vezes, de ser urn tanto chocante lem
brar que, para efeitos pniticos e operacionais, 0 meio e a
mensagem. Isto apenas significa que as consequencias so
CIalS e pessoais de qualquer meio - ou seja, de qualquer
uma das extens6es
de
nos mesmos - constituem 0 resuI
tado do novo estalao introduzido em nossas vidas por
uma
nova tecnologia ou extensao de nos mesmos. Assim, com
a automa<;:ao, por exemplo, os novos padroes da associa<; ao
humana tendem a eliminar empregos, nao
ha
duvida.
Tr a
ta-se de mn resultado negativo. Do Iado positivo, a auto
ma<; ao cria papeis
que
as pessoas devem desempenhar em
seu trabalho ou em suas reIa<; oes com os outros,
cOm aqu
e
Ie
profundo
sentido
de
participa<;:ao que a tecl1oIogia · meca
nica que a precedeu havia destruido. Muita gente es tarifl
inclinada a dizer que nao
era
a maquina ,
mas
qu s
fez com ela,
que
constitui
de
fato
0
seu significado ou
n s a g e m Em termos da mudan<;:a
que
a maquina intro
duziu
em
nossas relac;oes com outros e conosco mesmos ,
POLlCO
importava
que
ela produzisse £locos de miIho ou
Cadillacs. A reestruturac;ao da associa<; ao e do trabalho
humanos foi moldada peIa tecnica de fragmentac;ao, que
consLitui a essencia da tecnologia da maquina. 0 oposto e
fl
constitui a essencia da tecnoIogia da automac;ao. EIa
6 Inlogral e descentralizadora, em profundidade assim como
2
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a
maquina
era fragmentaria,
centralizadora
e . superficial
na
estruturagao clas relagoes humanas.
Neste passo, 0 exemplo da luz e l t ~ t r i c
pode
mostrar-se
esclarecedor. A luz eletr ica e informagao pura. E algo assim
como um meio sem mensagem, a menos que
seja
usada
para explicitar algum amincio verbal ou algum nome. Este
fato, caracteristico
de
todos os veiculos, significa
que 0
"conteudo"
de qualquer meio ou
veiculo e
sempre
urn outro
meio ou veiculo. 0 conteudo da escrita e a fala, assim
como a palavra escrita e 0 conteudo da imprensa e a pa
lavra impressa e 0 conteudo
do
teIegrafo. Se
alguem
per
guntar, Qual e 0 conteudo da fala?", necessario se torna
dizer: ''It urn processo de pensamento, real, nao-verbal em
si mesmo." Uma pintura abstrata representa
uma
mani
festagao direta dos processos do pensamento criativo, tais
como poderiam comparecer nos desenhos
de
urn computa-
dor. Estamos aqui nos referindo, contudo, as consequen
cias psicologicas e sociais dos desenhos e padroes, na me
dida em que ampliam ou aceleram os processos ja exis
tentes.
Pois a mensagem
de
qualquer meio ou tecnologia
e a mudanga de escala, cadencia ou padrao que esse meio
ou tecnologia introduz nas coisas humanas. A estrada de
ferro nao
introduziu
movimento, transporte, roda
ou
ca
minhos na sociedade humana, mas acelerou e. ampliou a
escala das
fungoes humanas anteriores, criando tipos de ci
dades, de
trabalho
e de lazer totalmente novos. Isto se deu
independentemente do fato
de
a ferrovia estar operando
numa regii'io tropical ou setentrional, sem nenhuma rela<;ao
com 0 frete ou conteudo do veicu lo ferroviario. 0 aviao,
de outro lado, acelerando 0 ritmo de transporte,
tende
a dis
solver a forma "ferroviaria"
da
cidade,
da
politica e das
associagoes,
independentemente
da finalidade para a qual e
utilizado.
Voltemos a luz eletrica. Pouca diferen<;a faz que seja
usada para uma intervengao cirurgica no cerebro ou para uma
partida noturna de beisebol. Poderia objetar-se
que
essas
atividades, de certa maneira, constituem 0 conteudo da
luz eletrica, uma vez que nao
poderiam
existir sem ela.
Este fato apenas serve
para
destacar 0
ponto
de que
0
meio e a mensagem , porque e 0 meio que configura e
controla a proporgao e a forma das ag6es e associagoes hu
manas. 0 conteudo ou usos desses meios sao tao diversos
quao ineficazesna estruturagao da forma das associag6es
humanas. Na verdade nao deixa de ser bastante tipico que
o conteudo
de
qualquer meio nos cegue
para
a natu-
reza desse
mesmo
meio. Somente hoje as
industrias
se
tornaram
conscien tes das divers as especies
de
negocios
em
que estao mergulhadas. A IBM so comegou a navegar com
boa visibilidade depois que
descobriu
que nao estava
no
ramo da produ<;ao de maquinas e equipamentos
para
es
critorios e sim no de processamento da informagao. A
General Electric
aufere
uma boa
parte de
seus lucros das
lampadas eletricas e dos sistemas de iluminagao. Ela ainda
nao descobriu que, tanto quanto a A T. & T., ela esta no
negocio da informagao movel e em mudan<;:a.
Nao percebemos a luz eletrica como
meio de
comu
nicagao simplesmente porque ela nao possui conteudo .
E 0 quanto basta
para
exemplificar comb se falha no es
tudo
dos meios e veiculos. Somente
compreendemos
que
a luz e h ~ t r i c e urn meio
de
comunicagao
quando
utilizada
no r e g i s t ~ o do nome de algum produto. 0 que aqui nota
mos, porem, nao e a luz, mas 0
conteudo (ou
seja, aquilo
que
na
verdade e urn outro meio). A mensagem
da
luz
eletrica e como a
mensagem da
energia eletrica na indus
tria: totalmente radical, difusa e descentralizada. Embora
desligadas de seus usos, tanto a luz como a energia eIe
trica eliminam os fatores
de
tempo e espago da associagao
humana, exatamente como 0 fazem 0 radio 0 telearafo 0
telefone e a televisao, criando a p a r t i c i p a < a ~ em p o f u ~ d i -
dade. .
ri 7
Urn manual
bastante
completo para 0 estudo das ex
tensoes do homem poderia ser organizado compilando-se
cita<;oes de Shakespeare.
Nao
chegariamos a pensar na
televisao se alguem nos propusesse, como adivinha, estes
versos de Romeu e Julieta?
Mas, veja Que luz e aqueIa, que passa pela janeIa?
Ela fala - e nao diz nada.
3
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No Otelo, que, tanto quanta 0 Rei Lear, trata do tor
mento
de
pessoas transformadas por ilusoes, lemos estes
versos,
que
bern falam da intuic;ao de Shakespeare em
relac;ao aos poderes de transformac;ao dos novos meios:
Nao
h
encantos
Pe10s quais a virtude de
moc;:os
e moc;:as
Possa dar em desmandos? Voce, Roderigo,
Ja nao leu algo assim?
Em Troilo e Cressida, que e quase eompletamente dedi-
eado ao estudo tanto social como psicologico da comuni
cac;ao, Shakespeare reafirma a sua consciencia de que a
verdadeira navegac;ao poHtica e social
depende
da capaci
dade de antecipar as conseqiiencias da inovac;ao:
A providencia de um estado previdente
Distingue cad a grao do tesouro de Pluto,
Encontra 0 fundo das profundas insond:iveis,
Liga senso e lugar, e quase como os deuses
Descobre os pensamentos em seus berc;:os mudos.
A consciencia crescente
que
se tern
da
ac;ao dos meios,
independentemente de seu conteudo ou programac;ao, vern
indicada nesta
quadrinha
anonima e irritada:
No pensamento (e nos fatos) de hoje
Tudo induz e conduz ao ato e
ac;:ao
De forma que so e digno de elogio
Falar da queda e nao da contusao.
A mesilla especie de conhecimento total e configura
cional que revel a por que, socialmente falando, 0 meio e a
mensagem, e constatada tambem na mais recente e radical
das teorias medicas.
Em
sua
obra,
Stress
of
ife
( A
Ten-
sao da
Vida ),
Hans Selye fala da consternac;ao manifes
tada por
urn de seus colegas
de
pesquisa, ao ouvir a sua _
teoria:
24
"Quando me viu embarcado em mais uma descric;:ao extasiada do
que eu observara em animais tratados com este ou aquele material
impuro ou toxieo, olbou-me com olhos angustiosamente tristes e
disse, num desespero patente: "Mas, Selye, veja bern 0 que voce
esta fazendo, antes que seja tarde
o c ~
parece estar decidido a
dedicar tad a a sua vida ao estudo d a farmacologia da sujeira "
(Hans Selye, The Stress of Life
Assim como Selye trata da situac;ao
ambiental total
em
sua teoria
da
doenc;a baseada
no
stress, assim as mais re
centes abordagens ao estudo dos meios levam
em
conta
nao
apenas
0
conteudo ,
mas
0
proprio meio
e a
matriz
cultural em que urn meio ou velculo especHico atua. 0
antigo desconhecimento dos efeitos sociais e psicologicos dos
meios po de ser ilustrado praticamente
por
qualquer urn
dos pronunciamentos oficiais.
Ao aceitar urn grau honorHico
da Universidade
de Notre
Dame, ha alguns anos, 0 Gen. David Sarnoff declarou 0
seguinte: Estamos sempre inc in ados a transformar 0 ins
trumental
h ~ c n i c o em
bode expiatorio dos pecados prati-
cados por aqueles que os manejam. Os produtos
da
cien
cia moderna, em si mesmos, nao sao bons nem maus: e 0
modo com que sao empregados que determina 0 seu valor."
Aqui temos a voz
do
sonambulismo
de
nossos dias. E
0
mesmo que dizer: Uma torta de maC;as em si mesma, nao
e boa nem rna: 0 seu valor
depende
do modo com que
e utilizada."
Ou
ainda: 0 virus
da
variola,
em
si mesmo,
nao e born nem mau: 0 modo como e usado e que deter-
min a 0 seu valor." E ainda: As armas de fogo, em si
mesmas, nao sao boas nem mas: 0 seu valor e
determinado
pelo modo como sao empregadas. Vale dizer: se os esti
lhac;os a ting em as pe s so as cer tas, as armas sao boas ; se
0
tubo de televisao detona a munic;ao certa e atinge 0 publico
certo,
entao
ele e born. Nao
estou querendo ser
maldoso.
N a afirmac;ao
de
Sarnoff praticamente nada resiste
a
ana
lise, pois ela ignora a natureza do meio, dos meios em
geral e
de
qualquer meio
em
particular, bern no estilo
narcisistico de alguem
que
se sente hipnotizado pela am
putac;ao e extensao de
seu
proprio ser numa
forma
teenica
nova. 0 General Sarnoff continuou a explicac;ao de sua
atitude frente
a
tecnologia da imprensa dizendo
que
era
verdade
que
a imprensa veiculava muita droga, mas,
em
compensac;ao, havia disseminado a Blblia e os pensamentos
25
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dos profetas e filosofos.
Nunca ocorreu
ao
General
Sarnoff
que qualquer
tecnologia
pode
fazer tudo, menos somar-se
ao que jli somos.
Economistas como Robert Theobald, W. W. Rostow e
John Kenneth Galbraith,
ha
anos vern expondo
por que
a
economia classiea nao consegue explicar as mudangas ou
o crescimento. E 0
paradoxo
da mecanizagao reside no
fato
de
ser,
ela
mesma, a
causa do
desenvolvimento e das
mudangas, enquanto que 0 princ:fpio da mecanizagao exclui
a
propria
possibilidade de crescimento ou a
compreensao
das transformag5es. Isto
porque
a mecanizagao se realiza
pela fragmentagao de urn processo, seguida da seriagao das
partes fragmentadas . Contudo, como David Hume mostrou
no seculo XVIII, nao ha principio
de
causalidade numa
mera sequencia. 0 fato de uma coisa seguir-se ' a outra
nao significa nada. A simples sucessao nao conduz a nada,
a nao ser
a
mudanga. Assim a
eletricidade
viria a causar
a maior das revolug5es, ao liquidar a sequencia e tornar
as coisas simultaneas. Com a velocidade instantanea , as
causas das coisas vieram
novamente
a
tona
da
consciencia,
o que nao ocorria com as coisas em sequencia e em con
sequente concatenagao.
Em
lugar
de
perguntar
0
que veio
primeiro,
0
ovo ou a galinha, comegou-se a desconfiar que
a galinha foi ideia do ovo para a produgao de mais ovos.
Antes
de 0
aviao romper a
barreira do
som, as ondas
sonoras ' se fizeram vislveis nas asas do aviao. A sub ta
visibilidade .do som, justo no momento ' em
que
ele termina
e urn exemplo adequado daquela grande estrutura
do ser
que
revel a form as novas e contradit orias
precisamente quan
do as formas anteriores atingem seu desempenho maximo.
A mecanizagao
nunc
a se revelou
tao
claram<mte
em sua
natureza fragmentada
ou
sequencial no nascimento do
c i n e ~
rna -
0
momenta em
que
fomos traduzidos,
para
alem
do mecanismo, em termos de urn
mundo
de crescimento e
de
inter-relagao organica. 0 cinema, pela
pura
aceleragao
mecanica, transportou-nos
do
mundo das sequencias e dos
encadeamentos para
0
mundo das
estruturas
e das
c o n f i ~
gurag5es criativas. A mensagem do cinema enquanto meio
26
e a mensagem da transi ao da sucessao linear para a con-
figuragao . Foi esta transic;ao que deu nascimento a obser
vagao, hoje perfeitamente
correta:
Se funciona,
entao
e
obsoleto. Quando a velocidade
e l ~ t r i c a
sucede
a
sequen
cia mecanica do cinema, as linhas
de
fOrga das estruturas
e dos meios se tornam audlveis e claras. Retornam os a
forma inclusiva do leone.
Para
uma
cultura itltamente mecanizada e letrada,
0
c i n e ~
surgiu
como
urn
mundo de
ilus5es
triunfantes
e
de
sonhos que 0 dinheiro podia comprar. Foi nesta fase do
cinema que
0
cubismo apareceu, e foi descrito
por
E H.
Gombrich Art and Illusion) como a mais radical tenta
tiva de extinguir a ambigiiidade e acentuar a leitura inte
gral do
quadro
-
que
se
torna uma
construgao
feita pelo
homem, uma
tela
colorida . 0
cubismo
substitui
0
ponto
de vista , ou faceta da ilusao perspectivista, por todas as
facetas do objeto apresentadas
simultaneamente. Em lugar
da
ilusao especializada
da terceira
dimensao,
0
cubismo eri
ge na tela urn jogo de pIanos contraditorios ou urn
drama
tieo
cOl flito
de estruturas, luzes e texturas, que for gam e
transmitem a
mensagem
par
envolvencia. E
ha
muitos
que
tern isto
como
exercfcio
praticado
no campo da pintura
- e nao no campo da ilusao.
- Em outras
palavras
,
0
cubismo, exibindo
0
dentro e
0
fora, 0 acima e 0 abaixo, a frente, as costas e
tudo
0 mais,
em duas dimensoes, desfaz a ilusao da perspectiva em favor
da apreensao sensoria instantanea do todo. Ao propiciar
a apreensao total instantanea,
0
cubismo como que de re
pente anunciou que
0
meio e a mensagem. Nao ' se torna,
pois, evidente que, a partir do momenta em que
0
sequen
cial cede ao simultaneo, ingressamos
no mundo da
estru
tura e .
da
configuragao? E nao foi isto que
aconteceu tanto
na
Flsica como
na
pintura,na
poesia
e
na
comunieagao?
Os segmentos especializados
da
atengao deslocaram-se
para
o campo total, e e
por
isso que
agora podemos
dizer,
da
maneira a mais natural possivel: 0 meio e a mensagem.
Antes
da
velocidade eletrica e do campo integral
ou
unifi
cado, que
0
meio
fOsse
a
mensagem era
algo que nao tinha
nada de obvio. Parecia, entao que a
mensagem era 0 conteu-
27
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do , como costumavam dizer as pes so as ao perguntarem
sabre 0 que significava urn quadro, ou de que coisa tratava.
Nunca se lembravam
de
perguntar do
que tratava
uma
melodia, ou
uma
casa ou urn vestido. Nestes assuntos as
pessoas sempre conservavam urn certo senso
de
integrali
dade, de forma e func;ao como unidade. Mas na
era
da
eletricidade, esta ideia integral
de
estrutura e configurac;ao
se tornou tao dominante que as teorias educacionais pas
saram a lanc;ar
mao
dela.
Em
lugar
de
operar
com
pro-
blemas particulares
de
aritmetica, a
abordagem
estrutural
agora segue as linhas de fOrc;a do campo dos nillneros -
e passamos
ver
crianc;as
meditando
sabre a teoria dos
nillneros e dos conjuntos.
o Cardeal Newman disse de Napoleao: Ele compre
endeu a gramatica da polvora. Napoleao dedicou alguma
atenc;ao a outros meios
tambem,
especialmente ao te18gra
fo semafOrico,
que
the
deu grande
vantagem sabre seus
inimigos. E os anais registram a sua declarac;ao de que
tn3s jornais hostis sao mais de
temer
do
que
mil baionetas .
, .Alexis Tocqueville foi
0
primeiro
a
dominar
a gra
mabca da lmprensa e da tipografia. Capacitou-se assim
a decifrar a mensagem das mudan<;as iminentes na Fran<;a
e na America, como se estivesse
lendo
em voz
alta
urn texto
que the tivessem passado as maos. De fa to 0 seculo XIX
na Fran<;a e na America, se apresentava ~ o m o um l v r ~
~ b e r t o a Tocqueville, pois havia aprendido a gramatica
da
Imprensa. E sabia tambem
quando
a gramatica nao fun
cionava. Perguntado
pOl
que nao escrevia urn livro sabre
a Inglaterra, uma vez que a conhecia e admirava tanto
respondeu : '
28
.Sbme,nte q u e ~ esti,:esse afetado. por urn elevado grau de deliria
f11os6flco acredltar-se-la capaz de )ulgar a Inglaterra em apenas seis
meses.
Urn
ana sempre pareceu urn tempo por demais breve para
c o n ~ e c e r
bern os Estados Unidos, e e muito mais tacH ter uma
noc;ao clara e precis a da
UnHio
Americana do que da Gra-Bretanha.
America, tadas as leis, num certo sentido, derivam da me ma
lmha de pensamento. A sociedade como urn to do
se
funda sabre
urn simples fato, por assim dizer; tudo brota de urn mesmo prin
dpio . Pode-se comparar a America a uma floresta atravessada pOl'
numerosas estradas retas, convergindo para urn mesmo ponto. Basta
encontrar urn centro e tudo 0 mais se revela, num relance. Na
Inglaterra,
os
caminhos se emaranham e 56 percorrendo urn por
urn
pode-se trac;ar urn quadro do todo.
Em
trabalho anterior sabre a Revoluc;ao Francesa, De
Tocqueville ja havia explicado como a palavra impressa, atin
gindo sua saturac;ao cultural no seculo XVIII, havia homo
gene izado a nac;ao francesa . Os franceses se tornaram a
mesma
especie
de gente
,
do norte
ao suI. Os princ ipios
tipogrMicos da uniformidade, da continuidade e da linea
ridade se haviam superposto as complexidades da antiga
sociedade feudal e oral. A
revolu<;ao foi empreendida pelos
novos literatos e bachareis.
N a Inglaterr a, contudo, era tal a fOrc;a das antigas tra
dic;oes orais do direito costumeiro,
estribadas
na instituic;ao
medieval do Parlamento, que nenhuma uniformidade ou
continuidade da nova cultura impressa e visual poderia vir
a prevalecer completamente. 0 resultadp foi que 0 mais
h ~ p o r t n t e acontecimento da historia ingIesa simplesmente
nao houve - vale dizer, a Revoluc;ao Inglesa na trilha da
Revolu<;ao Francesa. A
parte
a
monarquia,
a Revoluc;ao
Americana nao teve
que
descartar ou desenraizar institui
c;oes legais medievais. E muitos tern sustentado que a
presidencia americana se tornou muito mais personalista e
monarquica do
que
qualquer monarquia europeia.
o contraste entre a Inglaterra e a America, estabele
cido por De Tocqueville, baseia-se claramente
na
criac;ao
da
u n i f ~ r m i d d e e
da
continuidade pela tipografia e pela
cultur a Impressa. A Inglaterra, diz ele, rejeitou esse prin
cipio, permanecendo fiel a tradigao oral e din&mica do
direito costumeiro. Dai a
qualidade
descontinua e impre
visivel
da
cultur a inglesa. A gramat ica
da
imprensa
nao
tern serventia
na
elaborac;ao da mensagem das instituigoes
e de uma cultura oral e nao escrita. A aristocr acia ingIesa
foi justamente classificada como
barbara
por Mathew Ar
nold,
porque
0 seu poder e 0 seu status nada tinham que
vel' com a cultura
letrada ou
com as formas culturais
da
tipografia. Dizia 0
Duque
de Gloucester a Edward Gibbon ,
por ocasiao do lanc;amento da DecHnio e
ueda
do Im
29
I
I
I
I
I
I
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perio Romano deste 61timo:
Mais
urn maldito tijolo,
hein
Sr. Gibbon? Escrevinhar, escrevinha r, escrevinhar, hein, Sr.
Gibbon? De Tocqueville era urn aristocrata altamente
letrado, mas perfeitamente capaz de desligar-se de valores
e pressupostos da tipografia. Eis por que so ele
entendeu
a gramatica
da
tipografia. E e somente assim,
permane
cendo
a
margem de qualquer estrutura ou meio,
que
os
seus princfpios e linhas de fon;a podem ser percebidos.
Pois os meios tern
0
poder de
impor
seus pressupostos e
sua propria adoc;ao aos incautos. A predic;ao e
0
controle
consistem
em
evitar este estado subliminar
de
transe
nard
sico. Mas
0 melhor
adjutorio
para
este fim consiste sim
plesmente em saber que
0
feitic;o pode ocorrer imediata
mente,
por
contato, como os primeiros compassos
de
'lIma
melodia.
Passagem para a India
de E
M. Forster, e urn estudo
dramatico da inabilidade das culturas orientais, intuitivas
e orais, de assimilar e compreender os
padroes de
experien
cia europeus, racionais e visuais.
Para os ocidentais, ha
muito tempo, racional , naturalmente significa seqiiencia
uniforme e contInua .
Em outras
palavras, confundimos
razao com instruc;ao
letrada
e racionalismo com
uma
tec
nologia isolada. Dessa forma,
na
era da eletricidade,
0
homem parece tornar-se irracional aos olhos do ocidental
comum. No romance de Forster,
0
momento
da
verdade
e da desalienac;ao do transe tipogrMico ocidental ocorre nas
Cavernas Marabar. A
fOrc;a de
argumentac;ao
de
Adela
Quested nao
pode
medir-se corn
0
carppo de ressonancia
total e inclusiva que e a fndia.
Oepois
das Cavernas,
a
vida continuou como sempre, mas sem conseqiiencias, isto
e
os sons nao tinham eco nem
0
pensamento se desenvolvia.
Tudo
parecia cortado
pela raiz e infectado
de
ilusao .
Passagem para a India
(a
expressao e
de Whitman,
que
viu
a America marchando
para 0
Oriente) e
uma
panibola dp .
homem ocidental na
era
da eletricidade e so incidental
mente se refere a Europa ou ao Oriente. 0 conflito llitimo
entre a visao e 0 som, entre as formas escritas e orais de
percepc;ao e organizaQao da existencia, esta ocorrendo agora.
Uma vez que a compreensao paralisa a
ac;ao
como obser-
30
vou Nietzsche, podemos moderar a rudeza desse conflito
pela compreensao dos meios que nos prolongam e que pro
vocam essas guerras dentro
de
nos.
A destribalizac;ao
pela
escrita e seus efeitos
trauma
ticos no homem tribal e 0
tema de
urn livro do psiquiatra
J
C. Carothers, The African
lJind in
Health and Disease
( A Mentalidade Africana, na Saude e na Doenc;a ), edi
tado
pela
Organizac;ao
de
Sa6de,
Genebra,
1959. A maior
parte
desse material
apareceu num
artigo
da
revista Psy-
chiatry intitulado A Cultura, a Psiquiatria e a Palavra Es
crita (novembro, 1959). Novamente aqui, vemos a velo
cidade
eIetrica revelando as linhas
de fOrc;a
que, a
partir
da tecnologia ocidental, operam nas mais remotas areas da
caatinga, da savana e do deserto. Urn exemplo e
0
beduIno
levando, no camelo, seu radio transIstor.
Submergir
os na
tivos com
torrentes de
conceitos
para
os quais nao
foram
preparados e a agao normal de toda a nossa tecnologia.
Mas com os meios eletricos,
0
proprio homem
ocidental
comega a sofrer
exatamente
a mesma inundagao
que atinge
o remoto nativo.
Nao
estamos
mais
bern
preparados
para
enfrentar
0
radio e a televisao
em
nosso ambiente letrado
do que 0 nativo de Gana em relac;ao a escrita, que 0 ex
pulsa de seu
mundo
tribal coletivo, acuando-o num isola
mento
individual. Estamos
tao
sonados
em
nosso novo
mUI1-
do
eletrico quanta
0
nativo envolvido
por
nossa cultura
escrita e medlnica.
A velocidade eletrica mistura as
culturas da
pre-histo
ria com os detritos dos mercadologistas industriais; os anal
fabetos com os semiletrados e os pos-letrados. Crises
de
esgotamento nervoso e mental, nos mais variados graus,
constituem
0
resultado, bastante comum, do desarraigamen
.
o
e
da
inundagao
provocada pelas
novas informac;oes e
pelas novas e 'infindaveis
estruturas
informacionais.
Wyn
dham Lewis escolheu este tema para
0
seu ciclo
de
roman
ces chamado The uman Age ( A Era Humana ). 0 pri
meiro deles, The Childermass
( 0
Dia dos Santos Inocen
tes ) , aborda precisamente a questao da mudanc;a acele
rada dos meios, vista como
uma
especie
de
massacre dos
inocentes. Em nosso proprio
mundo, a medida
em que
81
8/18/2019 McLuhan_Os Meios de Comunicação Como Extensão Do Homem
http://slidepdf.com/reader/full/mcluhanos-meios-de-comunicacao-como-extensao-do-homem 8/10
ganhamos consclCncia dos efeitos da tecnologia na formaQao
e nas manifesta90es psiquicas, vamos perdendo toda a con
fianQa
em
nosso dire to de atribuir culpas. As antig as so
ciedades pre-historicas tern como patetico 0 crime violen
to.
0
assassino e encarado
da
mesma forma como enca
ramos
uma
vitima do cancer. Deve ser horrivel sentir-se
assim , dizem eles.
J
M.
Synge desenvolveu essa ideia de
maneira
bastante
conseqtiente
em sua
peQa
0
Playboy do
Mundo Ocidental.
Se 0 criminoso e visto como urn inconformista, incapaz
de atender aos ditames da tecnologia, no sentido
do
com
portamento segundo padr5es uniformes e continuos, 0 ho
mem
letrado se inclina a encarar pateticamente aqueles que
nao se enquadram nos esquemas. Mais especialmente, a
crianQa, 0 aleijado, a mulher e as pessoas
de
cor compa
recem como vitimas da injusti<;a,
no
mundo da tecnologia
tipognuica e visual.
Por
outro lado, numa cultura que dis
tribua papeis (sentido teatral) em lugar de empregos, 0
anao, 0 deformado e a crian<;a criam seus proprios espa<;os.
Deles nao se
espera
que venham a caber em nichos uni
formes e repetitivos - sempre fora
de medida
para os seus
tamanhos. Veja-se a frase: E urn
mundo
para homens.
Como observac;:ao quantitativa, infindavelmente repetida
numa
cultura homogeneizada, ela se refere a homens que
precis am ser
Dagwoods
em serie, se quiserem integrar-se
nela. E em nossos testes de Q.
1.
que produzimos a maior
enchente
de
padr5es
espurios. Inscientes de nossa
tenden
cia cultm:al tipografica, nossos pesquisadores partem do
principio de
que
habitos uniformes e continuos constituem
indices de inteligencia, dessa forma eliminando 0 homem
-ouvido e
0
homem-tato
.
C. P. Snow, resenhando urn livro de A. L Rowse The
ew York Times Book Review, 24-12-61), sobre 0 Apazi-
guamento e a estrada de Munique, tra<;a uma descric;:ao dos
cerebros e da experiencia dos ingleses, nos anos 30. Seu
Q.
1.
era
muito mais elevado do que 0 habitual entre os
proceres politicos. Como puderam chegar a urn
tal
fra
casso? . E Snow aprova a opiniao
de
Rowse:
Nao
davam
82
ouvido as advertencias pOl'que nao queriam ouvir.
0
fato
de serem anticomunistas tornava-lhes impossivel a leitura
da mensagem de Hitler. Mas 0 fracasso deles nao foi nada
em
compara<;ao com 0 nosso atual. Os padr5es americanos
fincados na escrita como tecnologia uniforme aplicavel a
todos os niveis - educac;:ao, gov.erno,
industria
e
vida
social
- esUio agora amea<;ados pela tecnologia eletrica. A amea
<;a
de Stalin ou
Hitler
era externa. A tecnologia eletrica
esta dentro
dos
muros
nos
somos insensiveis, surdos,
cegos e mudos, ante a sua confronta<;ao
com
a tecnologia
de Gutenberg, na e atraves da qual se formou 0
modo
americano
de
vida. Mas nao e 0
momenta de
sugerir estra
tegias, quando a existencia da ameaQa
sequer
foi reconhe
cida. Estou na
mesma
posi<;ao de Pasteur, ao dizer aos
doutores que seu maior inimigo era perfeitamente invisivel
- e perfeitamente irreconhedvel
pOl
eles. N ossa resposta
aos meios e veiculos de comunicac;:ao - ou seja, 0
que
con
ta e 0 modo como sao usados - tern muito da postura
alvar do idiota tecnologico. 0 conteudo de urn meio e
como a bola de carne
que
0 assaltante
leva
consigo para
distrair
0
cao
de
guard
a
da
mente.
0
efeito
de
urn meio
se torna mais forte e intense justamente
porque
0 seu con
teudo e urn outro meio. 0 conteudo de urn filme e urn
romance, uma pe9a de teatro ou uma opera. 0 efeito da
forma filmica nao
esta
relacionado ao conteudo de seu
programa.
0 conteudo
da escrita ou
da
imprensa e a
fala, mas 0 l i t ~ r permanece
quase
que
inteiramente
in
consciente, seja em relac;:ao a palavra impressa, seja em
rela<;ao a
palavra
falada. .
Arnold
Toynbee
ignora ate a inocencia a fun<;ao dos
meios na
forma<;ao
da
historia, mas contem muitos exem
plos Uteis ao estudante dos media. Em certa altura, chega
ate
a sugerir
que
a educa9iio
de
adu lt os - at rav es
da
Associa9ao Educacional dos Trabalhadores, na
Inglaterra
-
pode · constituir-se numa £Or9a eficaz contra a imprensa po
pular. Toynbee acha que,
embora
todas as sociedades orien
tais ja tenham aceitado a tecnologia industrial e suas con
seqtiencias politicas, no plano cultural, no entanto, nao se
observa
uma tendencia
uniforme
correspondente
( Somer-
2
83
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yell, I. 267). Esta e a voz do letrado que, aos tropeQoes
no mundo dos anuncios,
garganteia:
"Pessoalmente, nao
dou atenQao a anuncios." As reservas espirituais e cultu
rais que os povos orientais possam
ter
em relagao a nossa
tecnologia nao lhes poderao valer muito . Os efeitos da
tecnologia nao ocorrem aos niveis das opiniaes e dos con
ceitos: eles se manifestam nas relagaes entre os sentidos
e nas
estruturas da
percep9ao, num pass a firme e sem
qual
quer
resistencia. 0
artista
serio
e
a
unica
pessoa
capaz
de enfrentar, impune, a tecnologia, justamente porque ele
e urn
perito
nas
mudan9as da
percepgao.
A
opera
gao
do meio
monehirio no J
pao
do seculo XVII
produziu efeitos semelhantes aos da "operagao tipografia"
no Ocidente. A penetraQao da economia do dinheiro, es
creveu G. B. Sansom
Japan,
Cresset Press, Londres,
1931),
provocou uma revolugao, lenta mas irresistivel, que cul
minau com 0 esfacelamento do governo feudal e a retomada
do interca.mbio com paises estrangeiros, depois
de
mais
de
dois seculos de isolamento". 0 dinhei ro reorganizou a vida
dos sentidos dos povos precisamente porque ele e uma ex
tensao da vida de nossos sentidos. Esta mudanQa nao de
pende
da
aprovagao
ou
desaprovagao dos membros cons-
titutivos
da
sociedade.
Arnold
Toynbee
abordou
0 tema do poder de
transfor
magao dos meios, em seu conceito
da
"eterizagao", que ele
tern como
0
principio da simplificagao e
da
eficiencia pro-
gressivas em qualquer organiza9ao ou tecnologia. Mas e
significativo que ele ignore
0
efeito
do
desafio dessas for
mas sabre as reagaes
de
nossos sentidos. Acha que a res
posta expressa pOI nossas opiniaes e que e relevante
em
relagao aos efeitos dos meios e da tecnologia na sociedade
- urn
ponto de
vista"
claramente resultante do
feitigo tipo
grafico. 0 homem de uma sociedade letrada e homogenei
zada ja nao e sensivel
a
divers a e descontfnua vida . das
formas . Ele adquire a ilusao da terceira dimensao e do
ponto
de
vista pessoal" como
parte de
sua fixagao narci
sica, excluindo-se assim
da
consciencia
de
urn Blake ou do
Salmista, para os
quais
nos nos transformamos naquilo que
contemplamos.
84
I
:
i
I
i
I
I
[1
1
I
I
' j
:
' i
Hoje, se quisermos estabelecer os marcos de nossa pro
pria cultura, permanecendo a margem das tendencias e
pressaes exercidas
por
qualquer
forma tecnica de
expressao
humana, basta que visitemos uma sociedade onde uma certa
forma particular ainda nao foi sentida ou urn perfodo his
t6rico onde ela
ainda era
desconhecida. 0 Prof. Wilbur
Schramm
efetuou
essa manobra tatica, ao estudar a Tele-
vision in
the Lives
of
our Children
( A
Televisao
na
Vida
de N ossas Crian gas") . Encontrou areas onde a televisao
ainda nao havia penetrado 0 suficiente e efetuou alguns tes
tes. Como nao
havia
feito nenhum
estudo sabre
a
natu-
reza espedfica da imagem
televisada, seus testes versaram
sabre
preferencias de conteudo ,
tempo de
exposigao ao
video e levantamentos
de
vocabul:irio.
Numa
palavra, sua
abordagem do problema
foi
puramente
liteniria,
embora
inconsciente.
Em
conseqiiencia, nao teve
nada
a relataI'.
Tivesse
empregado
tais
metodos em
1500
para
descobrir os
efeitos do livro impressa sabre a vida de criangas e adul
tos, nada teria concluido sabre as mudangas provocadas
pela
tipografia
sabre
a psicologia
humana
e social. A im
prensa criou a individualismo e
0
nacionalismo no seculo
XVI. A analise de programas e "conteudos'" nao oferece
pistas para a magia desses meios ou sua carga subliminal'.
Le
onard Doob, em
seu relatorio
Communication
in
Africa ( Comunica9ao na
Africa ),
conta
de
urn africano
que sofria urn bocado
para
ouvir, tadas as noites ,
0
noti
ciario
da
BBC - embora nao entendesse nada do que se
falava . Mas
estar
em presenga
daqueles
sons, as 7 horas
da
noite,
d i ~ t r i a m e n t e era importante para
ele. Sua ati·
tude para
com a fala
era
igual a nossa diante
da melodia:
a entonagao ressonante
ja
e
bastante
significativa. No
seculo XVII, nossos ancestrais
ainda
partilhavam dessa ati
tude
do nativo
ante
as formas dos meios,
como
bern nos
faz sentir a frances
Bernard
Lam, em
The rt of
Speaking
( A
Arte de Falar , Londres, 1697):
E
uma virtu de da sabedoria de Deus, que eriou
0
Romem para
a felicidade, que
0
que the e uti na
conversac;:ao
e no modo de
vida tambem the e agradavel . . . porque toda vitualha que prove
a
nutric;:ao e saborosa, enquanto insipidas se tornam outras
cois
as
35
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que nao podem set assimiladas e transformadas em nossa proprIa
substancia. Nao 'pode agradar ao Ouvinte urn Discurso que nao
flua £aeil da bOca do Orador, nem pode ser ele facilmente profe
rido
se
com deleite nao fOr ouvido.
Ha aqui
uma teo ria
do
equilibrio .
da
expressao e
da
diet a humanas, que so agora estamos tentando recuperar
em relac;ao aos meios - depois
de
seculos
de
fragmentac;ao
e especializac;ao.
o Papa Pio
XII preocupava-se profundamente
om 0
desenvolvimento de estudos serios sobre os atuais meios
de
comunicac;ao. Dizia ele, em 17 de fevereiro de
1950:
Nao e urn exagero dizer-se que 0 futuro da sociedade moderna,
bern como da estabilidade de sua vida interior, dependem em
grande parte da m n u t e n ~ o de urn equilfbrio entre a f o r ~ a das
tecnicas de
c o m u n i c a ~ a o
e a capacidade de
r e a ~ a o
do individuo.
Durante seculos,
0
fracasso da Humanidade a esse res
peito tern sido caracteristico e total. A aceitac;ao docil e
subliminal' do impacto causado pelos meios transformou-os
em
pris6es sem
muros para
seus usuarios. Como observoll
A.
J
Liebling
em
seu livro The Press ( A
Imprensa ),
urn
homem nao consegue ser livre se nao consegue enxergar
para onde vai, ainda que tenha urn revolver para ajuda-Io.
Todo meio ou veiculo
de comunicac;ao
tambem
.e uma arma
poderosa
para abater
outros meios e veiculos e outros gru-
pos. Resulta dai que os
tempos que correm
se tern carac
terizado
pqr
numerosas
guerras
civis, ·
que
nao se limitam
ao
mundo da arte
e
do entretenimento.
Em
War and Human
Progress ( A
Guerra e 0 Progresso
Humano ),
0 Prof. J.
V.
Nef declara:
As
guerras totais
de
nosso tempo tem
resultado
de
uma
serie
de
erros intelectuais . . . .
Como a
fOrc;a
plasmadora dos meios sao os p r o p r i ~
meios, questoes de largo alcance se impoem
a
nossa consi
derac;ao; embora merec;am volumes, nao podem aqui ser
senao mencionadas. Vma delas e que os meios tecnologicos
sao recursos
naturais ou
materias-primas, a mesmo titulo
que 0 carvao, 0 algodao e 0 petroleo. Todos concordarao
em que uma sociedade
cuja economia
depende de um ou
36
dois produtos basicos, algodao
ou
trigo,
madeira,
peixe
ou
gado, apresentara, como resultado, determinados e eviden
tes padroes sociais de organizac;ao. A enfase em certas
materias-primas basicas e responsavel pela extrema insta
bilidade
da
economia, mas
tambem pela maior capacidade
de resistencia
da
populac;ao. ()
pathos
e
0
humor
do
esta
dunidense do SuI se implantam numa economia desse tipo,
de produtos limitados. Vma sociedade configurada segun
do 0 apoio que Ihe fomecem alguns poucos bens
ten de
a
aceita-Ios
omo
liames ou elos sociais,
tal
como a metro
pole em relac;ao a imprensa. 0 algodao e
0
petroleo, como
o radio e a televisao, tomam-se tributos fixos para a
inteira vida psiquica da comunidade. E este fato que, per
meando
uma
sociedade, Ihe confere aquele peculiar sabor
cultural.
Cada
produto
que
molda
uma sociedade
acaba
por transpirar em todos e por todos os seus sentidos.
Que os nossos sentidos humanos,
de
que os meios sao
extensoes,
tambem
se constituem
em
tributos fixos sobre
as nossas energias pessoais e que tambern configuram a
consciencia e experiencia de
cada
urn
de
nos
pode
ser per
cebido naquela situac;ao mencionada pelo psicologo C. G.
Jung:
Todo Romano era cercado por escravos. Oescravo e a sua
psicologia inundaram a Italia antiga, e todo Romano
se
tornou in
teriormente - e, claro, inconscientemente - urn escravo. Viven
do constantemente na atmosfera dos escravos, ele se contaminou de
sua psicologia, atraves do inconsciente. Ninguem consegue evitar
essa influencia. (Contributions to Analytical ychology, Londres,
1928 .
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