Lei Nº 8429 - Lei de Improbidade Administrativa [Arts. 1º - 13]

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  • Gustavo Santanna Direito Administrativo [email protected]

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    LEI N 8.429, DE 2 DE JUNHO DE 1992.

    Dispe sobre as sanes aplicveis aos agentes pblicos nos casos de enriquecimento ilcito no exerccio de mandato, cargo, emprego ou funo na administrao pblica direta, indireta ou fundacional e d outras providncias.

    CAPTULO I Das Disposies Gerais

    Art. 1 Os atos de improbidade praticados por qualquer agente pblico, servidor ou no, contra a administrao direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes da Unio, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municpios, de Territrio, de empresa incorporada ao patrimnio pblico ou de entidade para cuja criao ou custeio o errio haja concorrido ou concorra com mais de cinqenta por cento do patrimnio ou da receita anual, sero punidos na forma desta lei.

    Pargrafo nico. Esto tambm sujeitos s penalidades desta lei os atos de improbidade praticados contra o patrimnio de entidade que receba subveno, benefcio ou incentivo, fiscal ou creditcio, de rgo pblico bem como daquelas para cuja criao ou custeio o errio haja concorrido ou concorra com menos de cinqenta por cento do patrimnio ou da receita anual, limitando-se, nestes casos, a sano patrimonial repercusso do ilcito sobre a contribuio dos cofres pblicos.

    Art. 2 Reputa-se agente pblico, para os efeitos desta lei, todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remunerao, por eleio, nomeao, designao, contratao ou qualquer outra forma de investidura ou vnculo, mandato, cargo, emprego ou funo nas entidades mencionadas no artigo anterior.

    Art. 3 As disposies desta lei so aplicveis, no que couber, quele que, mesmo no sendo agente pblico, induza ou concorra para a prtica do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma direta ou indireta.

    Art. 4 Os agentes pblicos de qualquer nvel ou hierarquia so obrigados a velar pela estrita observncia dos princpios de legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade no trato dos assuntos que lhe so afetos.

    Art. 5 Ocorrendo leso ao patrimnio pblico por ao ou omisso, dolosa ou culposa, do agente ou de terceiro, dar-se- o integral ressarcimento do dano.

    Art. 6 No caso de enriquecimento ilcito, perder o agente pblico ou terceiro beneficirio os bens ou valores acrescidos ao seu patrimnio.

    Art. 7 Quando o ato de improbidade causar leso ao patrimnio pblico ou ensejar enriquecimento ilcito, caber a autoridade administrativa responsvel pelo inqurito representar ao Ministrio Pblico, para a indisponibilidade dos bens do indiciado.

    Pargrafo nico. A indisponibilidade a que se refere o caput deste artigo recair sobre bens que assegurem o integral ressarcimento do dano, ou sobre o acrscimo patrimonial resultante do enriquecimento ilcito.

    Art. 8 O sucessor daquele que causar leso ao patrimnio pblico ou se enriquecer ilicitamente est sujeito s cominaes desta lei at o limite do valor da herana.

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    CAPTULO II Dos Atos de Improbidade Administrativa

    Seo I Dos Atos de Improbidade Administrativa que Importam Enriquecimento Ilcito

    Art. 9 Constitui ato de improbidade administrativa importando enriquecimento ilcito auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razo do exerccio de cargo, mandato, funo, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no art. 1 desta lei, e notadamente:

    I - receber, para si ou para outrem, dinheiro, bem mvel ou imvel, ou qualquer outra vantagem econmica, direta ou indireta, a ttulo de comisso, percentagem, gratificao ou presente de quem tenha interesse, direto ou indireto, que possa ser atingido ou amparado por ao ou omisso decorrente das atribuies do agente pblico;

    II - perceber vantagem econmica, direta ou indireta, para facilitar a aquisio, permuta ou locao de bem mvel ou imvel, ou a contratao de servios pelas entidades referidas no art. 1 por preo superior ao valor de mercado;

    III - perceber vantagem econmica, direta ou indireta, para facilitar a alienao, permuta ou locao de bem pblico ou o fornecimento de servio por ente estatal por preo inferior ao valor de mercado;

    IV - utilizar, em obra ou servio particular, veculos, mquinas, equipamentos ou material de qualquer natureza, de propriedade ou disposio de qualquer das entidades mencionadas no art. 1 desta lei, bem como o trabalho de servidores pblicos, empregados ou terceiros contratados por essas entidades;

    V - receber vantagem econmica de qualquer natureza, direta ou indireta, para tolerar a explorao ou a prtica de jogos de azar, de lenocnio, de narcotrfico, de contrabando, de usura ou de qualquer outra atividade ilcita, ou aceitar promessa de tal vantagem;

    VI - receber vantagem econmica de qualquer natureza, direta ou indireta, para fazer declarao falsa sobre medio ou avaliao em obras pblicas ou qualquer outro servio, ou sobre quantidade, peso, medida, qualidade ou caracterstica de mercadorias ou bens fornecidos a qualquer das entidades mencionadas no art. 1 desta lei;

    VII - adquirir, para si ou para outrem, no exerccio de mandato, cargo, emprego ou funo pblica, bens de qualquer natureza cujo valor seja desproporcional evoluo do patrimnio ou renda do agente pblico;

    VIII - aceitar emprego, comisso ou exercer atividade de consultoria ou assessoramento para pessoa fsica ou jurdica que tenha interesse suscetvel de ser atingido ou amparado por ao ou omisso decorrente das atribuies do agente pblico, durante a atividade;

    IX - perceber vantagem econmica para intermediar a liberao ou aplicao de verba pblica de qualquer natureza;

    X - receber vantagem econmica de qualquer natureza, direta ou indiretamente, para omitir ato de ofcio, providncia ou declarao a que esteja obrigado;

    XI - incorporar, por qualquer forma, ao seu patrimnio bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1 desta lei;

    XII - usar, em proveito prprio, bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1 desta lei.

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    Seo II Dos Atos de Improbidade Administrativa que Causam Prejuzo ao Errio

    Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa leso ao errio qualquer ao ou omisso, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriao, malbaratamento ou dilapidao dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1 desta lei, e notadamente:

    I - facilitar ou concorrer por qualquer forma para a incorporao ao patrimnio particular, de pessoa fsica ou jurdica, de bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1 desta lei;

    II - permitir ou concorrer para que pessoa fsica ou jurdica privada utilize bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1 desta lei, sem a observncia das formalidades legais ou regulamentares aplicveis espcie;

    III - doar pessoa fsica ou jurdica bem como ao ente despersonalizado, ainda que de fins educativos ou assistncias, bens, rendas, verbas ou valores do patrimnio de qualquer das entidades mencionadas no art. 1 desta lei, sem observncia das formalidades legais e regulamentares aplicveis espcie;

    IV - permitir ou facilitar a alienao, permuta ou locao de bem integrante do patrimnio de qualquer das entidades referidas no art. 1 desta lei, ou ainda a prestao de servio por parte delas, por preo inferior ao de mercado;

    V - permitir ou facilitar a aquisio, permuta ou locao de bem ou servio por preo superior ao de mercado;

    VI - realizar operao financeira sem observncia das normas legais e regulamentares ou aceitar garantia insuficiente ou inidnea;

    VII - conceder benefcio administrativo ou fiscal sem a observncia das formalidades legais ou regulamentares aplicveis espcie;

    VIII - frustrar a licitude de processo licitatrio ou dispens-lo indevidamente;

    IX - ordenar ou permitir a realizao de despesas no autorizadas em lei ou regulamento;

    X - agir negligentemente na arrecadao de tributo ou renda, bem como no que diz respeito conservao do patrimnio pblico;

    XI - liberar verba pblica sem a estrita observncia das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicao irregular;

    XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriquea ilicitamente;

    XIII - permitir que se utilize, em obra ou servio particular, veculos, mquinas, equipamentos ou material de qualquer natureza, de propriedade ou disposio de qualquer das entidades mencionadas no art. 1 desta lei, bem como o trabalho de servidor pblico, empregados ou terceiros contratados por essas entidades.

    XIV celebrar contrato ou outro instrumento que tenha por objeto a prestao de servios pblicos por meio da gesto associada sem observar as formalidades previstas na lei;

    XV celebrar contrato de rateio de consrcio pblico sem suficiente e prvia dotao oramentria, ou sem observar as formalidades previstas na lei.

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    Seo III Dos Atos de Improbidade Administrativa que Atentam Contra os Princpios da Administrao

    Pblica

    Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princpios da administrao pblica qualquer ao ou omisso que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade s instituies, e notadamente:

    I - praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competncia;

    II - retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofcio;

    III - revelar fato ou circunstncia de que tem cincia em razo das atribuies e que deva permanecer em segredo;

    IV - negar publicidade aos atos oficiais;

    V - frustrar a licitude de concurso pblico;

    VI - deixar de prestar contas quando esteja obrigado a faz-lo;

    VII - revelar ou permitir que chegue ao conhecimento de terceiro, antes da respectiva divulgao oficial, teor de medida poltica ou econmica capaz de afetar o preo de mercadoria, bem ou servio.

    CAPTULO III Das Penas

    Art. 12. Independentemente das sanes penais, civis e administrativas previstas na legislao especfica, est o responsvel pelo ato de improbidade sujeito s seguintes cominaes, que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade do fato: (Redao dada pela Lei n 12.120, de 2009).

    I - na hiptese do art. 9, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimnio, ressarcimento integral do dano, quando houver, perda da funo pblica, suspenso dos direitos polticos de oito a dez anos, pagamento de multa civil de at trs vezes o valor do acrscimo patrimonial e proibio de contratar com o Poder Pblico ou receber benefcios ou incentivos fiscais ou creditcios, direta ou indiretamente, ainda que por intermdio de pessoa jurdica da qual seja scio majoritrio, pelo prazo de dez anos;

    II - na hiptese do art. 10, ressarcimento integral do dano, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimnio, se concorrer esta circunstncia, perda da funo pblica, suspenso dos direitos polticos de cinco a oito anos, pagamento de multa civil de at duas vezes o valor do dano e proibio de contratar com o Poder Pblico ou receber benefcios ou incentivos fiscais ou creditcios, direta ou indiretamente, ainda que por intermdio de pessoa jurdica da qual seja scio majoritrio, pelo prazo de cinco anos;

    III - na hiptese do art. 11, ressarcimento integral do dano, se houver, perda da funo pblica, suspenso dos direitos polticos de trs a cinco anos, pagamento de multa civil de at cem vezes o valor da remunerao percebida pelo agente e proibio de contratar com o Poder Pblico ou receber benefcios ou incentivos fiscais ou creditcios, direta ou indiretamente, ainda que por intermdio de pessoa jurdica da qual seja scio majoritrio, pelo prazo de trs anos.

    Pargrafo nico. Na fixao das penas previstas nesta lei o juiz levar em conta a extenso do dano causado, assim como o proveito patrimonial obtido pelo agente.

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    CAPTULO IV Da Declarao de Bens

    Art. 13. A posse e o exerccio de agente pblico ficam condicionados apresentao de declarao dos bens e valores que compem o seu patrimnio privado, a fim de ser arquivada no servio de pessoal competente.

    1 A declarao compreender imveis, mveis, semoventes, dinheiro, ttulos, aes, e qualquer outra espcie de bens e valores patrimoniais, localizado no Pas ou no exterior, e, quando for o caso, abranger os bens e valores patrimoniais do cnjuge ou companheiro, dos filhos e de outras pessoas que vivam sob a dependncia econmica do declarante, excludos apenas os objetos e utenslios de uso domstico.

    2 A declarao de bens ser anualmente atualizada e na data em que o agente pblico deixar o exerccio do mandato, cargo, emprego ou funo.

    3 Ser punido com a pena de demisso, a bem do servio pblico, sem prejuzo de outras sanes cabveis, o agente pblico que se recusar a prestar declarao dos bens, dentro do prazo determinado, ou que a prestar falsa.

    4 O declarante, a seu critrio, poder entregar cpia da declarao anual de bens apresentada Delegacia da Receita Federal na conformidade da legislao do Imposto sobre a Renda e proventos de qualquer natureza, com as necessrias atualizaes, para suprir a exigncia contida no caput e no 2 deste artigo.

    CAPTULO V Do Procedimento Administrativo e do Processo Judicial

    Art. 14. Qualquer pessoa poder representar autoridade administrativa competente para que seja instaurada investigao destinada a apurar a prtica de ato de improbidade.

    1 A representao, que ser escrita ou reduzida a termo e assinada, conter a qualificao do representante, as informaes sobre o fato e sua autoria e a indicao das provas de que tenha conhecimento.

    2 A autoridade administrativa rejeitar a representao, em despacho fundamentado, se esta no contiver as formalidades estabelecidas no 1 deste artigo. A rejeio no impede a representao ao Ministrio Pblico, nos termos do art. 22 desta lei.

    3 Atendidos os requisitos da representao, a autoridade determinar a imediata apurao dos fatos que, em se tratando de servidores federais, ser processada na forma prevista nos arts. 148 a 182 da Lei n 8.112, de 11 de dezembro de 1990 e, em se tratando de servidor militar, de acordo com os respectivos regulamentos disciplinares.

    Art. 15. A comisso processante dar conhecimento ao Ministrio Pblico e ao Tribunal ou Conselho de Contas da existncia de procedimento administrativo para apurar a prtica de ato de improbidade.

    Pargrafo nico. O Ministrio Pblico ou Tribunal ou Conselho de Contas poder, a requerimento, designar representante para acompanhar o procedimento administrativo.

    Art. 16. Havendo fundados indcios de responsabilidade, a comisso representar ao Ministrio Pblico ou procuradoria do rgo para que requeira ao juzo competente a decretao do seqestro dos bens do agente ou terceiro que tenha enriquecido ilicitamente ou causado dano ao patrimnio pblico.

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    1 O pedido de seqestro ser processado de acordo com o disposto nos arts. 822 e 825 do Cdigo de Processo Civil.

    2 Quando for o caso, o pedido incluir a investigao, o exame e o bloqueio de bens, contas bancrias e aplicaes financeiras mantidas pelo indiciado no exterior, nos termos da lei e dos tratados internacionais.

    Art. 17. A ao principal, que ter o rito ordinrio, ser proposta pelo Ministrio Pblico ou pela pessoa jurdica interessada, dentro de trinta dias da efetivao da medida cautelar.

    1 vedada a transao, acordo ou conciliao nas aes de que trata o caput.

    2 A Fazenda Pblica, quando for o caso, promover as aes necessrias complementao do ressarcimento do patrimnio pblico.

    3o No caso de a ao principal ter sido proposta pelo Ministrio Pblico, aplica-se, no que

    couber, o disposto no 3o do art. 6

    o da Lei n

    o 4.717, de 29 de junho de 1965. (Redao dada pela

    Lei n 9.366, de 1996)

    4 O Ministrio Pblico, se no intervir no processo como parte, atuar obrigatoriamente, como fiscal da lei, sob pena de nulidade.

    5o A propositura da ao prevenir a jurisdio do juzo para todas as aes posteriormente

    intentadas que possuam a mesma causa de pedir ou o mesmo objeto.

    6o A ao ser instruda com documentos ou justificao que contenham indcios suficientes

    da existncia do ato de improbidade ou com razes fundamentadas da impossibilidade de apresentao de qualquer dessas provas, observada a legislao vigente, inclusive as disposies inscritas nos arts. 16 a 18 do Cdigo de Processo Civil.

    7o Estando a inicial em devida forma, o juiz mandar autu-la e ordenar a notificao do

    requerido, para oferecer manifestao por escrito, que poder ser instruda com documentos e justificaes, dentro do prazo de quinze dias.

    8o Recebida a manifestao, o juiz, no prazo de trinta dias, em deciso fundamentada,

    rejeitar a ao, se convencido da inexistncia do ato de improbidade, da improcedncia da ao ou da inadequao da via eleita.

    9o Recebida a petio inicial, ser o ru citado para apresentar contestao.

    10. Da deciso que receber a petio inicial, caber agravo de instrumento.

    11. Em qualquer fase do processo, reconhecida a inadequao da ao de improbidade, o juiz extinguir o processo sem julgamento do mrito.

    12. Aplica-se aos depoimentos ou inquiries realizadas nos processos regidos por esta Lei o disposto no art. 221, caput e 1

    o, do Cdigo de Processo Penal.

    Art. 18. A sentena que julgar procedente ao civil de reparao de dano ou decretar a perda dos bens havidos ilicitamente determinar o pagamento ou a reverso dos bens, conforme o caso, em favor da pessoa jurdica prejudicada pelo ilcito.

    CAPTULO VI Das Disposies Penais

    Art. 19. Constitui crime a representao por ato de improbidade contra agente pblico ou terceiro beneficirio, quando o autor da denncia o sabe inocente.

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    Pena: deteno de seis a dez meses e multa.

    Pargrafo nico. Alm da sano penal, o denunciante est sujeito a indenizar o denunciado pelos danos materiais, morais ou imagem que houver provocado.

    Art. 20. A perda da funo pblica e a suspenso dos direitos polticos s se efetivam com o trnsito em julgado da sentena condenatria.

    Pargrafo nico. A autoridade judicial ou administrativa competente poder determinar o afastamento do agente pblico do exerccio do cargo, emprego ou funo, sem prejuzo da remunerao, quando a medida se fizer necessria instruo processual.

    Art. 21. A aplicao das sanes previstas nesta lei independe:

    I - da efetiva ocorrncia de dano ao patrimnio pblico, salvo quanto pena de ressarcimento; (Redao dada pela Lei n 12.120, de 2009).

    II - da aprovao ou rejeio das contas pelo rgo de controle interno ou pelo Tribunal ou Conselho de Contas.

    Art. 22. Para apurar qualquer ilcito previsto nesta lei, o Ministrio Pblico, de ofcio, a requerimento de autoridade administrativa ou mediante representao formulada de acordo com o disposto no art. 14, poder requisitar a instaurao de inqurito policial ou procedimento administrativo.

    CAPTULO VII Da Prescrio

    Art. 23. As aes destinadas a levar a efeitos as sanes previstas nesta lei podem ser propostas:

    I - at cinco anos aps o trmino do exerccio de mandato, de cargo em comisso ou de funo de confiana;

    II - dentro do prazo prescricional previsto em lei especfica para faltas disciplinares punveis com demisso a bem do servio pblico, nos casos de exerccio de cargo efetivo ou emprego.

    CAPTULO VIII Das Disposies Finais

    Art. 24. Esta lei entra em vigor na data de sua publicao.

    Art. 25. Ficam revogadas as Leis ns 3.164, de 1 de junho de 1957, e 3.502, de 21 de dezembro de 1958 e demais disposies em contrrio.

    FERNANDO COLLOR

    IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

    Atualmente, a improbidade vem prevista no art. 37, 4 da CRFB/88, tendo

    sido regulada pela Lei n 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa LIA). uma norma de natureza eminentemente civil quando acarreta a indisponibilidade de bens, o ressarcimento ao errio, a multa civil, e poltica quando implica a suspenso de direitos polticos ou a perda da funo pblica.

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    Improbidade administrativa, para a Lei n 8.429/92, todo ato que importa

    em enriquecimento ilcito, causa prejuzo ao errio ou que atenta contra os princpios da Administrao Pblica.

    A Lei de Improbidade , tambm, considerada uma lei hbrida, no sentido de

    que apresenta artigos aplicveis ora de ordem nacional, ora de ordem federal. Os arts. 13 e 14, 3 da Lei n 8.429/92 aplicam-se (ou deveriam aplicar-se) somente aos servidores pblicos federais, o que a torna uma norma de mbito federal, pelo menos quanto a estes artigos. Os demais artigos expressos na Lei aplicam-se a todos os entes da federao, o que os tornam de ordem nacional.

    Sujeito Passivo Os sujeitos passivos indicados pela Lei de Improbidade (art. 1) so as

    pessoas jurdicas atingidas do ato de improbidade, a indicar:

    Pessoas da administrao direta (Unio, Estados, Distrito Federal e Municpios);

    Pessoas da administrao indireta (autarquias, fundaes, sociedades de economia mista, empresas pblicas, consrcios pblicos);

    Empresa incorporada ao patrimnio pblico ou entidade para cuja criao ou custeio o errio tenha concorrido ou concorra com mais de 50% do patrimnio ou da receita anual;

    Entidade que receba subveno, benefcio ou incentivo fiscal ou creditcio de rgo pblico. Neste caso a sano patrimonial deve limitar-se exclusivamente repercusso do ilcito sobre a parcela oriunda dos cofres pblicos; e

    Entidades para cuja criao ou custeio o errio tenha concorrido ou concorra com menos de 50% do patrimnio ou receita anual. Neste caso, igualmente, a sano patrimonial deve limitar-se exclusivamente repercusso do ilcito sobre a parcela oriunda dos cofres pblicos.

    As Organizaes Sociais (OS), Organizao da Sociedade Civil de

    Interesse Pblico (OSCIP), Servios Sociais Autnomos, Entidades de Apoio e qualquer outro tipo de entidade criada ou mantida com recursos do Poder Pblico, enquadram-se na modalidade prevista no pargrafo nico do art. 1 da Lei de Improbidade.1 Em sentido contrrio o posicionamento de Jos dos Santos Carvalho Filho2 e Emerson Garcia e Rogrio Pacheco Alves3 haja vista que no caso dos Servios Sociais Autnomos, para estes autores, praticamente todo o custeio destas entidades provm das contribuies (parafiscais) institudas por lei, o que as enquadrariam a responder pelo caput do art. 1 e no pelo seu pargrafo nico. J com relao as demais entidades paraestatais, o enquadramento entre o caput do art. 1 e seu pargrafo nico dependeria dos valores repassados pelos cofres pblicos e o percentual equivalente agregado a cada entidade (se maior ou menor de 50%).

    1 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 22.ed. So Paulo: Atlas, 2009, p. 814-5.

    2 CARVALHO FILHO, Jos dos Santos. Manual de direito administrativo. 20.ed. Rio de Janeiro: Lmen Jris,

    2008, p. 991. 3 GARCIA, Emerson; ALVES, Rogrio Pacheco. Improbidade administrativa. 4.ed. Rio de Janeiro: Editora

    Lumen Juris, 2008, p. 198.

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    Sujeito Ativo O sujeito ativo da improbidade administrativa o agente pblico (art. 2),

    que pratica o ato de improbidade, bem como aquele (terceiro) que induz, concorre ou se beneficia de qualquer forma direta ou indireta (art. 3).

    Agente pblico, para a Lei de Improbidade :

    Aquele que exerce cargo, emprego, mandato ou funo; Com vnculo permanente ou temporrio; Com ou sem remunerao; Por nomeao, contratao, designao, eleio ou qualquer outra forma de

    investidura ou vnculo; Em qualquer das entidades mencionadas no art. 1.

    Em deciso publicada no dia 18 de abril de 2008 (julgada em 2007) o STF, na Rcl n 2.138/DF, entendeu que a Lei n 8.429/92 no se aplicaria aos agentes polticos que j possussem normas especficas para sanes nesta modalidade (improbidade): crimes de responsabilidade como a Lei n 1.079/50 e o DL n 201/67.

    Tendo em conta a deciso do Supremo Tribunal Federal (Rcl n 2.138/DF)

    com relao aos agentes polticos salienta-se que tal restrio aplicao da Lei de Improbidade no alcana os agentes parlamentares. Isso se d pelo fato de que ao julgar a mencionada reclamao, os agentes polticos ali mencionados para que no sofressem bis in idem (incidncia de duas normas de mesma natureza bis pelo mesmo fato in idem) deveriam responder pelas normas especficas (que lhes imputavam crime de responsabilidade) e no pela Lei de Improbidade. Como no h lei prevendo crime de responsabilidade para parlamentares, (como senadores, deputados, vereadores) ainda que agentes polticos, continuam a responder perante a Lei 8.429/92.

    Modalidades A Lei n 8.429/92 dividiu os atos de improbidade em trs modalidades,

    como sendo aqueles que:

    Importam enriquecimento ilcito (art. 9); Causam prejuzo ao errio (art. 10); Atentam contra os princpios da Administrao Pblica (art. 11).

    Outro ponto relevante que das trs modalidades que definem as condutas

    mprobas somente no art. 10 da Lei de Improbidade que aparece o elemento subjetivo dolo ou culpa. No mesmo sentido o art. 5 da Lei refere-se ao elemento culpa somente nos casos em que ocorra leso ao patrimnio pblico. Nos demais, somente se processa mediante dolo. O STJ no REsp n 797.671/MG e REsp n 875.163/RS entendeu que para caracterizar o ato como mprobo, como atentador aos princpios constitucionais, (todos com status de improbidade), deve ao menos ter sido cometido com m-f pelo administrador. O Superior Tribunal de Justia j

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    teve oportunidade de se manifestar:: No se pode confundir ilegalidade com improbidade. A improbidade ilegalidade tipificada e qualificada pelo elemento subjetivo da conduta do agente. Por isso mesmo, a jurisprudncia dominante no STJ considera indispensvel, para a caracterizao de improbidade, que a conduta do agente seja dolosa, para a tipificao das condutas descritas nos artigos 9 e 11 da Lei 8.429/92, ou pelo menos culposa, nas do art. 10.

    Cominaes Primeiramente cumpre observar que a Constituio Federal, no art. 37, 4,

    no se refere s medidas aplicveis aos responsveis pelos atos de improbidade como sano, simplesmente afirmando importaro. E nem poderia mesmo, pois nesta norma h medidas de natureza cautelar, como a indisponibilidade de bens e tambm obrigao natural, como ressarcimento ao errio (aquele que causar dano a outrem deve ressarci-lo, art. 186 c/c art. 927, do Cdigo Civil). Da mesma forma o art. 12 da Lei n 8.429/92 reporta-se s medidas como cominaes. Previu o art. 37, 4, da CRFB/88 como cominaes aos responsveis pelos atos de improbidade:

    Suspenso dos direitos polticos; Perda da funo pblica; Indisponibilidade dos bens; Ressarcimento ao errio.

    O art. 12 da Lei n 8.429/92 ampliou o rol de cominaes estabelecido na

    Constituio alm de especificar para cada modalidade de improbidade a gradao das medidas ali impostas, sendo aplicadas de forma isolada ou cumulativa, de acordo com a gravidade do fato (Lei n 12.120, publicada em 15/12/2009, que alterou o caput do referido artigo).

    Ainda com relao s penas o art. 23 da Lei n 8.429/92 estabeleceu como

    prazo de prescrio 5 anos para a aplicao das sanes previstas aps o trmino do exerccio do mandato, de cargo em comisso ou funo de confiana.

    IMPROBIDADE. PRESCRIO. CARGO EFETIVO. FUNO COMISSIONADA.

    A matria trata da definio da norma prescricional aplicvel espcie quando o agente, ocupante de cargo pblico a quem se imputou ato mprobo, ocasio dos fatos, ocupava cargo efetivo e, concomitantemente, exercia cargo em comisso. Para o ajuizamento da ao de improbidade administrativa, duas situaes so bem definidas no tocante contagem do prazo prescricional: se o ato mprobo for imputado a agente pblico no exerccio de mandato, de cargo em comisso ou de funo de confiana, o prazo prescricional de cinco anos, com termo a quo no primeiro dia aps a cessao do vnculo. Em outro passo, sendo o agente pblico detentor de cargo efetivo ou emprego, havendo previso para falta disciplinar punvel com demisso, o prazo prescricional o determinado na lei especfica (art. 23 da Lei n. 8.429/1992). A Lei de Improbidade no cuida, no entanto, da hiptese de o mesmo agente praticar ato mprobo no exerccio cumulativo de cargo efetivo e de cargo comissionado. Por meio de interpretao teleolgica da norma, verifica-se que a individualizao do lapso prescricional associada natureza do vnculo jurdico mantido pelo agente pblico com o sujeito passivo em potencial. Partindo dessa premissa,

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    o art. 23, I, da referida lei associa o incio da contagem do prazo prescricional ao trmino de vnculo temporrio. Ao mesmo tempo, o art. 23, II, da mesma legislao, no caso de vnculo definitivo, no considera, para fins de aferio do prazo prescricional, o exerccio de funes intermdias como as comissionadas desempenhadas pelo agente, sendo determinante apenas o exerccio de cargo efetivo. Portanto, exercendo cumulativamente cargo efetivo e cargo comissionado ao tempo do ato reputado mprobo, h de prevalecer o primeiro para fins de contagem prescricional, pelo simples fato de o vnculo entre agente e Administrao Pblica no cessar com a exonerao do cargo em comisso, por esse ser temporrio. REsp 1.060.529-MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 8/9/2009. INFO 0406.

    de suma importncia lembrar que esse prazo prescricional de 5 anos no

    abrange todas as cominaes, mas to-somente a perda da funo pblica, a suspenso dos direitos polticos, o pagamento de multa civil, a perda de bens ou valores acrescidos ilicitamente e a proibio de contratar com o Poder Pblico ou dele receber benefcios, pois as aes de ressarcimento ao errio so imprescritveis, como enuncia o art. 37, 5, da CRFB/88.

    Procedimentos Procedimento administrativo Estabelecido nos arts. 14 a 16 da Lei de Improbidade, no apresenta

    particularidades inovadoras. O art. 14 da Lei n 8.429/92 repete o j estabelecido no art. 5, XXXIV, a da CRFB/88 que por sua vez expe o direito de petio, nele includo o direito de representao.

    A representao dever ser escrita ou reduzida a termo e assinada,

    contendo inclusive a assinatura do representante. Estes requisitos tm o objetivo de coibir acusaes levianas, sem qualquer indcio de prova. At mesmo porque como o exerccio do Poder Disciplinar , inicialmente, obrigatrio (a exemplo do art. 143 da Lei 8.112/90) caso se aceitasse qualquer hiptese de denncia annima, invivel e impraticvel se tornaria a funo da autoridade encarregada pela sua investigao. Por isso, a regra a no aceitao de representaes annimas. O art. 19 da Lei expe ser crime, passvel de deteno de 6 a 10 meses e multa, a representao por ato de improbidade contra agente pblico ou terceiro beneficirio, quando o autor da denncia o sabe inocente. Porm se estas representaes annimas apresentarem fortes indcios de veracidade e seriedade a autoridade administrativa pode instaurar a investigao e apurar a prtica do suposto ato de improbidade.

    INFORMATIVO N 286 STF

    TTULO

    Delao Annima e Investigao Estatal

    PROCESSO

    MS - 24369

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    Delao Annima e Investigao Estatal MS 24.369-DF* RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO EMENTA: DELAO ANNIMA. COMUNICAO DE FATOS GRAVES QUE TERIAM SIDO PRATICADOS NO MBITO DA ADMINISTRAO PBLICA. SITUAES QUE SE REVESTEM, EM TESE, DE ILICITUDE (PROCEDIMENTOS LICITATRIOS SUPOSTAMENTE DIRECIONADOS E ALEGADO PAGAMENTO DE DIRIAS EXORBITANTES). A QUESTO DA VEDAO CONSTITUCIONAL DO ANONIMATO (CF, ART. 5, IV, "IN FINE"), EM FACE DA NECESSIDADE TICO--JURDICA DE INVESTIGAO DE CONDUTAS FUNCIONAIS DESVIANTES. OBRIGAO ESTATAL, QUE, IMPOSTA PELO DEVER DE OBSERVNCIA DOS POSTULADOS DA LEGALIDADE, DA IMPESSOALIDADE E DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA (CF, ART. 37, "CAPUT"), TORNA INDERROGVEL O ENCARGO DE APURAR COMPORTAMENTOS EVENTUALMENTE LESIVOS AO INTERESSE PBLICO. RAZES DE INTERESSE SOCIAL EM POSSVEL CONFLITO COM A EXIGNCIA DE PROTEO INCOLUMIDADE MORAL DAS PESSOAS (CF, ART. 5, X). O DIREITO PBLICO SUBJETIVO DO CIDADO AO FIEL DESEMPENHO, PELOS AGENTES ESTATAIS, DO DEVER DE PROBIDADE CONSTITUIRIA UMA LIMITAO EXTERNA AOS DIREITOS DA PERSONALIDADE? LIBERDADES EM ANTAGONISMO. SITUAO DE TENSO DIALTICA ENTRE PRINCPIOS ESTRUTURANTES DA ORDEM CONSTITUCIONAL. COLISO DE DIREITOS QUE SE RESOLVE, EM CADA CASO OCORRENTE, MEDIANTE PONDERAO DOS VALORES E INTERESSES EM CONFLITO. CONSIDERAES DOUTRINRIAS. LIMINAR INDEFERIDA. DECISO: O fundamento bsico em que se apia a presente impetrao mandamental reside na alegao, deduzida pelo Conselho Federal de Farmcia, de que o princpio constitucional que veda o anonimato, consagrado no art. 5, IV, da Carta Poltica, impede que o E. Tribunal de Contas da Unio conhea e faa processar denncia annima. A parte ora impetrante sustenta que o prprio Regimento Interno do Tribunal de Contas da Unio, aprovado pela Resoluo Administrativa TCU n. 15/93, dando execuo norma constitucional mencionada, exige que a denncia, dentre outros requisitos, contenha "o nome legvel do denunciante, sua qualificao e endereo (...)" (art. 213, caput), de tal modo que, no observados os requisitos e formalidades a que alude a norma em questo, impor-se-, ao Relator ou ao Tribunal, o no-conhecimento da denncia, com o conseqente arquivamento do processo (art. 213, pargrafo nico). Cabe referir, no obstante tais razes, que o eminente Ministro MARCOS VINICIOS VILAA, tendo em considerao que a denncia annima ora questionada revelava fatos graves (licitaes supostamente direcionadas e alegado pagamento de dirias exorbitantes), aptos a justificar a adoo das providncias legais pertinentes, determinou fosse instaurado procedimento com o objetivo de apurar tais "indcios de irregularidades graves" (fls. 27), realizando-se, em conseqncia, "uma inspeo junto ao Conselho Federal de Farmcia (CFF), para averiguao dos fatos citados" (fls. 28). O presente mandado de segurana foi impetrado contra essa deliberao, postulando, a entidade autrquica ora impetrante, seja determinado, aos rgos ora apontados como coatores, "que se abstenham de processar denncias ou representaes annimas, tendo em vista a falta de amparo legal para tal mister" (fls. 15). Formulou-se, no caso, pedido de medida liminar, objetivando a suspenso cautelar "da tramitao dos autos de processo da representao n. 014.784/2002-7, no qual se utiliza, indevidamente, (...) missiva apcrifa, recebida como representao, originando, assim, ilegalmente, a inspeo dessa Corte, nos quadros da Autarquia (...)" (fls. 15 - grifei). Passo a apreciar o pedido em questo. O veto constitucional ao anonimato, como se sabe, busca impedir a consumao de abusos no exerccio da liberdade de manifestao do pensamento, pois, ao exigir-se a identificao de quem se vale dessa extraordinria prerrogativa poltico-jurdica, essencial prpria configurao do Estado democrtico de direito, visa-se, em ltima anlise, a possibilitar que eventuais excessos, derivados da prtica do direito livre expresso, sejam tornados passveis de responsabilizao, "a posteriori", tanto na esfera civil, quanto no mbito penal. Essa clusula de vedao - que jamais dever ser interpretada como forma de nulificao das liberdades do pensamento - surgiu, no sistema de direito constitucional positivo brasileiro, com a primeira Constituio republicana, promulgada em 1891 (art. 72, 12), que objetivava, ao no permitir o anonimato, inibir os abusos cometidos no exerccio concreto da liberdade de manifestao do pensamento, viabilizando, desse modo, a adoo de medidas de responsabilizao daqueles que, no contexto da publicao de livros, jornais ou panfletos, viessem a ofender o patrimnio moral das pessoas agravadas pelos excessos praticados, consoante assinalado por eminentes intrpretes daquele Estatuto Fundamental (JOO BARBALHO, "Constituio Federal Brasileira - Comentrios", p. 423, 2 ed., 1924, F. Briguiet; CARLOS MAXIMILIANO, "Comentrios Constituio Brasileira", p. 713, item n. 440, 1918, Jacinto Ribeiro dos Santos Editor). V-se, portanto, tal como observa DARCY ARRUDA MIRANDA ("Comentrios Lei de Imprensa", p. 128, item n. 79, 3 ed., 1995, RT), que a proibio do anonimato tem um s propsito, qual seja, o de permitir que o autor do escrito ou da publicao possa expor-se s conseqncias jurdicas derivadas de seu comportamento abusivo: "Quem manifesta o seu pensamento atravs da imprensa escrita ou falada, deve comear pela sua

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    identificao. Se no o faz, a responsvel por ele a direo da empresa que o publicou ou transmitiu." Nisso consiste a ratio subjacente norma, que, inscrita no inciso IV do art. 5, da Constituio da Repblica, proclama ser "livre a manifestao do pensamento, sendo vedado o anonimato" (grifei). Torna-se evidente, pois, que a clusula que probe o anonimato - ao viabilizar, "a posteriori", a responsabilizao penal e/ou civil do ofensor - traduz medida constitucional destinada a desestimular manifestaes abusivas do pensamento, de que possa decorrer gravame ao patrimnio moral das pessoas injustamente desrespeitadas em sua esfera de dignidade, qualquer que seja o meio utilizado na veiculao das imputaes contumeliosas. Esse entendimento perfilhado por ALEXANDRE DE MORAES ("Constituio do Brasil Interpretada", p. 207, item n. 5.17, 2002, Atlas), UADI LAMMGO BULOS ("Constituio Federal Anotada", p. 91, 4 ed., 2002, Saraiva) e CELSO RIBEIRO BASTOS/IVES GANDRA MARTINS ("Comentrios Constituio do Brasil", vol. 2/43-44, 1989, Saraiva), dentre outros eminentes autores, cujas lies enfatizam que a proibio do anonimato - por tornar necessrio o conhecimento da autoria do pensamento exteriorizado ou da comunicao feita - visa a fazer efetiva, "a posteriori", a responsabilidade penal e/ou civil daquele que abusivamente exerceu a liberdade de expresso. Lapidar, sob tal perspectiva, o magistrio de JOS AFONSO DA SILVA ("Curso de Direito Constitucional Positivo", p. 244, item n. 15.2, 20 ed., 2002, Malheiros), que, ao interpretar a razo de ser da clusula constitucional consubstanciada no art. 5, IV, in fine, da Lei Fundamental, assim se manifesta: "A liberdade de manifestao do pensamento tem seu nus, tal como o de o manifestante identificar-se, assumir claramente a autoria do produto do pensamento manifestado, para, em sendo o caso, responder por eventuais danos a terceiros. Da porque a Constituio veda o anonimato. A manifestao do pensamento no raro atinge situaes jurdicas de outras pessoas a que corre o direito, tambm fundamental individual, de resposta. O art. 5, V, o consigna nos termos seguintes: assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, alm da indenizao por dano material, moral ou imagem. Esse direito de resposta, como visto antes, tambm uma garantia de eficcia do direito privacidade. Esse um tipo de conflito que se verifica com bastante freqncia no exerccio da liberdade de informao e comunicao." (grifei) A presente impetrao mandamental, nos termos em que deduzida, sustenta, com apoio na clusula que veda o anonimato, a existncia, em nosso ordenamento positivo, de impedimento constitucional formulao de delaes annimas. inquestionvel que a delao annima pode fazer instaurar situaes de tenso dialtica entre valores essenciais, igualmente protegidos pelo ordenamento constitucional, dando causa ao surgimento de verdadeiro estado de coliso de direitos, caracterizado pelo confronto de liberdades revestidas de idntica estatura jurdica, a reclamar soluo que, tal seja o contexto em que se delineie, torne possvel conferir primazia a uma das prerrogativas bsicas, em relao de antagonismo com determinado interesse fundado em clusula inscrita na prpria Constituio. O caso ora exposto pela parte impetrante - que entidade autrquica federal - pode traduzir, eventualmente, a ocorrncia, na espcie, de situao de conflituosidade entre direitos bsicos titularizados por sujeitos diversos. Com efeito, h, de um lado, a norma constitucional, que, ao vedar o anonimato (CF, art. 5, IV), objetiva fazer preservar, no processo de livre expresso do pensamento, a incolumidade dos direitos da personalidade (como a honra, a vida privada, a imagem e a intimidade), buscando inibir, desse modo, delaes annimas abusivas. E existem, de outro, certos postulados bsicos, igualmente consagrados pelo texto da Constituio, vocacionados a conferir real efetividade exigncia de que os comportamentos funcionais dos agentes estatais se ajustem lei (CF, art. 5, II) e se mostrem compatveis com os padres tico-jurdicos que decorrem do princpio da moralidade administrativa (CF, art. 37, caput). Presente esse contexto, resta verificar se o direito pblico subjetivo do cidado rigorosa observncia do postulado da legalidade e da moralidade administrativa, por parte do Estado e de suas instrumentalidades (como as autarquias), constitui, ou no, limitao externa aos direitos da personalidade (considerados, aqui, em uma de suas dimenses, precisamente aquela em que se projetam os direitos integridade moral), em ordem a viabilizar o conhecimento, pelas instncias governamentais, de delaes annimas, para, em funo de seu contedo - e uma vez verificada a idoneidade e a realidade dos dados informativos delas constantes -, proceder-se, licitamente, apurao da verdade, mediante regular procedimento investigatrio. Entendo que a superao dos antagonismos existentes entre princpios constitucionais h de resultar da utilizao, pelo Supremo Tribunal Federal, de critrios que lhe permitam ponderar e avaliar, "hic et nunc", em funo de determinado contexto e sob uma perspectiva axiolgica concreta, qual deva ser o direito a preponderar no caso, considerada a situao de conflito ocorrente, desde que, no entanto, a utilizao do mtodo da ponderao de bens e interesses no importe em esvaziamento do contedo essencial dos direitos fundamentais, tal como adverte o magistrio da doutrina (DANIEL SARMENTO, "A Ponderao de Interesses na Constituio Federal" p. 193/203, "Concluso", itens ns. 1 e 2, 2000, Lumen Juris; LUS ROBERTO BARROSO, "Temas de Direito Constitucional", p. 363/366, 2001, Renovar; JOS CARLOS VIEIRA DE ANDRADE, "Os Direitos Fundamentais na

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    Constituio Portuguesa de 1976", p. 220/224, item n. 2, 1987, Almedina; FBIO HENRIQUE PODEST, "Direito Intimidade. Liberdade de Imprensa. Danos por Publicao de Notcias", in "Constituio Federal de 1988 - Dez Anos (1988-1998)", p. 230/231, item n. 5, 1999, Editora Juarez de Oliveira; J. J. GOMES CANOTILHO, "Direito Constitucional", p. 661, item n. 3, 5 ed., 1991, Almedina; EDILSOM PEREIRA DE FARIAS, "Coliso de Direitos", p. 94/101, item n. 8.3, 1996, Fabris Editor; WILSON ANTNIO STEINMETZ, "Coliso de Direitos Fundamentais e Princpio da Proporcionalidade", p. 139/172, 2001, Livraria do Advogado Editora; SUZANA DE TOLEDO BARROS, "O Princpio da Proporcionalidade e o Controle de Constitucionalidade das Leis Restritivas de Direitos Fundamentais", p. 216, "Concluso", 2 ed., 2000, Braslia Jurdica). Parece registrar-se, na espcie em exame, uma situao de colidncia entre a pretenso mandamental de rejeio absoluta da delao annima, ainda que esta possa veicular fatos alegadamente lesivos ao patrimnio estatal, e o interesse primrio da coletividade em ver apuradas alegaes de graves irregularidades que teriam sido cometidas na intimidade do aparelho administrativo do Estado. Isso significa, em um contexto de liberdades em conflito, que a coliso dele resultante h de ser equacionada, utilizando-se, esta Corte, do mtodo - que apropriado e racional - da ponderao de bens e valores, de tal forma que a existncia de interesse pblico na revelao e no esclarecimento da verdade, em torno de supostas ilicitudes penais e/ou administrativas que teriam sido praticadas por entidade autrquica federal, bastaria, por si s, para atribuir, denncia em causa (embora annima), condio viabilizadora da ao administrativa adotada pelo E. Tribunal de Contas da Unio, na defesa do postulado tico-jurdico da moralidade administrativa, em tudo incompatvel com qualquer conduta desviante do improbus administrator. Na realidade, o tema pertinente vedao constitucional do anonimato (CF, art. 5, IV, in fine) posiciona-se, de modo bastante claro, em face da necessidade tico-jurdica de investigao de condutas funcionais desviantes, considerada a obrigao estatal, que, imposta pelo dever de observncia dos postulados da legalidade, da impessoalidade e da moralidade administrativa (CF, art. 37, caput), torna imperioso apurar comportamentos eventualmente lesivos ao interesse pblico. No por outra razo que o magistrio da doutrina admite, no obstante a existncia de delao annima, que a Administrao Pblica possa, ao agir autonomamente, efetuar averiguaes destinadas a apurar a real concreo de possveis ilicitudes administrativas, consoante assinala JORGE ULISSES JACOBY FERNANDES, eminente Professor e Conselheiro do E. Tribunal de Contas do Distrito Federal ("Tomada de Contas Especial", p. 51, item n. 4.1.1.1.2, 2 ed., 1998, Braslia Jurdica): "Ocorrendo de a Administrao vislumbrar razovel possibilidade da existncia efetiva dos fatos denunciados anonimamente, dever promover diligncias e, a partir dos indcios coligidos nesse trabalho, instaurar a TCE, desvinculando-a totalmente da informao annima." (grifei) Essa orientao tambm admitida, mesmo em sede de persecuo penal, por FERNANDO CAPEZ ("Curso de Processo Penal", p. 77, item n. 10.13, 7 ed., 2001, Saraiva): "A delao annima (notitia criminis inqualificada) no deve ser repelida de plano, sendo incorreto consider-la sempre invlida; contudo, requer cautela redobrada, por parte da autoridade policial, a qual dever, antes de tudo, investigar a verossimilhana das informaes." (grifei) Com idntica percepo da matria em exame, revela-se o magistrio de JULIO FABBRINI MIRABETE ("Cdigo de Processo Penal Interpretado", p. 95, item n. 5.4, 7 ed., 2000, Atlas): "(...) No obstante o art. 5, IV, da CF, que probe o anonimato na manifestao do pensamento, e de opinies diversas, nada impede a notcia annima do crime (notitia criminis inqualificada), mas, nessa hiptese, constitui dever funcional da autoridade pblica destinatria, preliminarmente, proceder com a mxima cautela e discrio a investigaes preliminares no sentido de apurar a verossimilhana das informaes recebidas. Somente com a certeza da existncia de indcios da ocorrncia do ilcito que deve instaurar o procedimento regular." (grifei) Esse entendimento tambm acolhido por NELSON HUNGRIA ("Comentrios ao Cdigo Penal", vol. IX/466, item n. 178, 1958, Forense), cuja anlise do tema - realizada sob a gide da Constituio republicana de 1946, que expressamente no permitia o anonimato (art. 141, 5), semelhana do que se registra, presentemente, com a vigente Lei Fundamental (art. 5, IV, "in fine") - enfatiza a imprescindibilidade de investigao, ainda que motivada por delao annima, desde que fundada em fatos verossmeis: "Segundo o 1. do art. 339, 'A pena aumentada de sexta parte, se o agente se serve de anonimato ou de nome suposto'. Explica-se: o indivduo que se resguarda sob o anonimato ou nome suposto mais perverso do que aqule que age sem dissimulao. le sabe que a autoridade pblica no pode deixar de investigar qualquer possvel pista (salvo quando evidentemente inverossmil), ainda quando indicada por uma carta annima ou assinada com pseudnimo; e, por isso mesmo, trata de esconder-se na sombra para dar o bote viperino. Assim, quando descoberto, deve estar sujeito a um plus de pena."(grifei) Pronuncia-se em igual sentido JOS FREDERICO MARQUES ("Elementos de Direito Processual Penal", vol. I/147, item n. 71, 2 ed., atualizada por Eduardo Reale Ferrari, 2000, Millennium), cujo magistrio - no obstante a vedao constitucional do anonimato, vigente quando da publicao de sua obra (CF/46, art. 141,

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    5) - coloca em relevo a impossibilidade de a autoridade pblica ignorar a comunicao, ainda que de origem no identificada, contanto que essa notcia veicule, de modo idneo, a suposta ocorrncia de atos revestidos de ilicitude: "No direito ptrio, a lei penal considera crime a denunciao caluniosa ou a comunicao falsa de crime (Cdigo Penal, arts. 339 e 340), o que implica a excluso do anonimato na notitia criminis, uma vez que corolrio dos preceitos legais citados a perfeita individualizao de quem faz a comunicao de crime, a fim de que possa ser punido, no caso de atuar abusiva e ilicitamente. Parece-nos, porm, que nada impede a prtica de atos iniciais de investigao da autoridade policial, quando delao annima lhe chega s mos, uma vez que a comunicao apresente informes de certa gravidade e contenha dados capazes de possibilitar diligncias especficas para a descoberta de alguma infrao ou seu autor. Se, no dizer de G. Leone, no se deve incluir o escrito annimo entre os atos processuais, no servindo ele de base ao penal, e tampouco como fonte de conhecimento do juiz, nada impede que, em determinadas hipteses, a autoridade policial, com prudncia e discrio, dele se sirva para pesquisas prvias. Cumpre-lhe, porm, assumir a responsabilidade da abertura das investigaes, como se o escrito annimo no existisse, tudo se passando como se tivesse havido notitia criminis inqualificada." (grifei) Essa mesma posio igualmente perfilhada por GUILHERME DE SOUZA NUCCI ("Cdigo de Processo Penal Comentado", p. 68, item n. 29, 2002, RT) e por DAMSIO E. DE JESUS ("Cdigo de Processo Penal Anotado", p. 9, 18 ed., 2002, Saraiva), cumprindo rememorar, ainda, por valiosa, a lio de ROGRIO LAURIA TUCCI ("Persecuo Penal, Priso e Liberdade", p. 34/35, item n. 6, 1980, Saraiva): "No deve haver qualquer dvida, de resto, sobre que a notcia do crime possa ser transmitida anonimamente autoridade pblica (...). (...) constitui dever funcional da autoridade pblica destinatria da notcia do crime, especialmente a policial, proceder, com mxima cautela e discrio, a uma investigao preambular no sentido de apurar a verossimilhana da informao, instaurando o inqurito somente em caso de verificao positiva. E isto, como se a sua cognio fosse espontnea, ou seja, como quando se trate de notitia criminis direta ou inqualificada (...)." (grifei) Cabe referir, finalmente, neste ponto, que o E. Superior Tribunal de Justia, ao apreciar a questo da delao annima, em face do art. 5, IV, in fine, da Constituio da Repblica, j se pronunciou no sentido de consider-la juridicamente possvel, desde que o Estado, ao agir em funo dessa comunicao no identificada, atue com cautela, em ordem a evitar a consumao de situaes que possam ferir, injustamente, direitos de terceiros: "CRIMINAL. RHC. NOTITIA CRIMINIS ANNIMA. INQURITO POLICIAL. VALIDADE. 1. A delatio criminis annima no constitui causa da ao penal que surgir, em sendo o caso, da investigao policial decorrente. Se colhidos elementos suficientes, haver, ento, ensejo para a denncia. bem verdade que a Constituio Federal (art. 5, IV) veda o anonimato na manifestao do pensamento, nada impedindo, entretanto, mas, pelo contrrio, sendo dever da autoridade policial proceder investigao, cercando-se, naturalmente, de cautela. 2. Recurso ordinrio improvido." (RHC 7.329-GO, Rel. Min. FERNANDO GONALVES - grifei) "CONSTITUCIONAL, PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANA. (...). PROCESSO ADMINISTRATIVO DESENCADEADO ATRAVS DE 'DENNCIA ANNIMA'. VALIDADE. INTELIGNCIA DA CLUSULA FINAL DO INCISO IV DO ART. 5 DA CONSTITUIO FEDERAL (VEDAO DO ANONIMATO). (...). RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO." (RMS 4.435-MT, Rel. Min. ADHEMAR MACIEL - grifei) V-se, pois, no obstante o carter apcrifo da denncia, que, tratando-se de comunicao de fatos revestidos de aparente ilicitude, existiria possibilidade de o E. Tribunal de Contas da Unio adotar medidas destinadas a esclarecer a idoneidade das alegaes de irregularidades que lhe foram transmitidas, em atendimento ao dever estatal de fazer prevalecer - consideradas razes de interesse pblico - a observncia do postulado tico-jurdico da moralidade administrativa e da legalidade. Note-se, por necessrio, que o eminente Ministro MARCOS VINICIOS VILAA limitou-se, na espcie, como Relator, a agir com extrema cautela e louvvel prudncia, determinando fosse instaurado procedimento com o nico objetivo de apurar os "indcios de irregularidades graves" (fls. 27) expostos na denncia annima, em ordem a promover a "averiguao dos fatos citados" (fls. 28), para, em funo de tais esclarecimentos, adotar, ento, as providncias reclamadas pelo ordenamento jurdico. De outro lado, e mesmo que se pudesse vislumbrar plausibilidade jurdica na pretenso mandamental deduzida pela parte impetrante, ainda assim no se revelaria presente, na espcie, o requisito pertinente ao periculum in mora, eis que a tramitao do procedimento ora questionado no basta, s por si, para tornar concreta qualquer situao de possvel frustrao da ordem mandamental, caso venha esta a ser deferida. que, eventualmente concedido, na espcie, o mandado de segurana impetrado, invalidar-se-, desde o incio, o referido procedimento administrativo, sem que resulte, da, uma situao apta a afetar, de modo irreversvel, o direito ora vindicado pela parte impetrante, que consistiria - segundo sustenta - no alegado direito de no sofrer fiscalizao com base em denncias annimas. Cabe assinalar, neste ponto, que o deferimento da medida liminar, em sede mandamental, somente se justifica, se,

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    de sua eventual recusa, puder resultar, de modo irreversvel, a frustrao da prpria sentena concessiva do mandado de segurana, comprometida, assim, sob tais circunstncias, em sua precpua funo de amparo integridade do direito por ela assegurado (Lei n 1.533/51, art. 7, II, in fine). Na realidade, dentre os requisitos legitimadores da outorga do provimento liminar, destaca-se, por seu relevo, a possibilidade de ocorrncia de leso irreparvel ou de difcil reparao, de tal modo que, em no se registrando tal hiptese, revelar-se- insuscetvel de acolhimento a pretenso de ordem cautelar. Isso significa, portanto, que, sem a cumulativa ocorrncia dos pressupostos a que alude o art. 7, II, da Lei n 1.533/51, no se justificar a concesso da medida liminar, em sede de mandado de segurana. Esse entendimento tem o beneplcito da jurisprudncia do Supremo Tribunal Federal: "Mandado de segurana. Liminar. Embora esta medida tenha carter cautelar, os motivos para a sua concesso esto especificados no art. 7, II da Lei n 1.533/51, a saber: a) relevncia do fundamento da impetrao; b) que, do ato impugnado, possa resultar a ineficcia da medida, caso seja deferida a segurana. No concorrendo estes dois requisitos, deve ser denegada a liminar." (RTJ 112/140, Rel. Min. ALFREDO BUZAID - grifei) Sendo assim, e tendo em considerao as razes expostas, indefiro, em sede de delibao, o pedido de medida liminar, sem prejuzo de oportuno reexame da questo ora veiculada nesta sede mandamental. 2. Requisitem-se informaes aos rgos ora apontados como coatores, encaminhando-se-lhes cpia da presente deciso. Publique-se. Braslia, 10 de outubro de 2002. Ministro CELSO DE MELLO Relator * deciso publicada no DJU de 16.10.2002

    MANDADO DE SEGURANA N 7.069 - DISTRITO FEDERAL

    RELATOR : MINISTRO FELIX FISCHER

    ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PBLICO. PROCESSO

    DISCIPLINAR. DEMISSO. NULIDADE. DENNCIA ANNIMA.

    I - No h nulidade no processo disciplinar pela ausncia de instaurao prvia de sindicncia, pois esta mera medida preparatria daquele, sendo dispensvel se j h elementos suficientes para a deflagrao do processo. Precedente do c. STF.

    II - A portaria de instaurao do processo disciplinar que faz referncias genricas aos fatos imputados ao servidor, deixando de exp-los minuciosamente, no enseja a nulidade do processo, tendo em vista que tal exigncia deve ser observada apenas na fase de indiciamento, aps a instruo.

    III- O excesso de prazo verificado na concluso do processo administrativo no constitui irregularidade capaz de prejudicar a deciso. Precedentes.

    IV - Ao se intimar as testemunhas para depor no processo disciplinar, no h necessidade de inform-las acerca dos fatos atribudos aos servidores processados.

    V - Impossibilidade de se reconhecer a violao ao direito das impetrantes, em face da ausncia de provas, por no terem demostrado, de plano, a violao ao direito, no que tange s questes referentes ao cerceamento de defesa, vedao ao direito de nomear advogado, nulidade no processo por se iniciar com base em denncia annima e nulidade ocorrida na citao.

    Procedimento judicial A ao de improbidade poder ser promovida pelo Ministrio Pblico ou

    pela pessoa jurdica interessada (a Unio, um Municpio, uma Autarquia, por exemplo), tendo natureza de ao civil pblica, sendo aplicvel subsidiariamente as

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    normas constantes da Lei n 7.347/85 (lei que disciplina a ao civil pblica), no que no contrariar os dispositivos da Lei de Improbidade.

    de difcil aceitao que a Defensoria Pblica possa ingressar com uma

    ao civil pblica de improbidade administrativa.4 Entretanto o Tribunal Gacho (ainda que em deciso isolada) no Agravo de Instrumento N 70034602201, Julgado em 19/05/2010, entendeu ser a Defensoria Pblica legitimada para a propositura de ao civil pblica no apenas na defesa dos necessitados, em ateno s suas finalidades institucionais, mas tambm na tutela de todo e qualquer direito difuso, coletivo ou individual homogneo, na forma da lei.

    As aes de improbidade devero ser processadas na sede da pessoa

    jurdica lesada. Se houver interesse ou for parte, assistente ou oponente a Unio, Entidade autrquica ou empresa pblica federal, a ao dever ser proposta na Justia Federal (art. 109 da CRFB/88).

    O art. 84, 1 e 2, do Cdigo de Processo Penal (alterado pela Lei n

    10.628/06) instituiu o foro especial por prerrogativa de funo. Para exemplificar, caso o acusado fosse um Comandante da Marinha, a ao de improbidade deveria ser proposta perante o STF (art. 102, I, b da CRFB/88). No entanto, esta alterao foi declarada inconstitucional pelo STF na ADI n 2.797/DF, sob o argumento que somente a Constituio Federal poderia instituir foro privilegiado por prerrogativa de funo. Logo, a ao de improbidade administrativa deve ser proposta no juzo de primeiro grau de jurisdio (juiz de primeira instncia).

    Uma vez instaurado o processo, o requerido ser notificado para oferecer

    manifestao por escrito, no prazo de 15 dias (art. 17, 7, da Lei de Improbidade). Esta manifestao por escrito funciona como uma defesa prvia, preliminar, haja vista que a notificao do requerido no equivale citao, que somente ocorrer caso sua manifestao no seja convincente e a petio inicial seja recebida (art. 17, 9). Se convencido da inexistncia do ato de improbidade, o juiz deve extinguir o processo.

    Recebida a petio inicial, proceder-se- a citao do (agora sim) ru, para

    apresentar contestao, seguindo, ento, o rito da ao civil pblica. Da deciso que recebe a petio inicial cabe recurso de agravo de instrumento.

    Tanto a autoridade judicial quanto a autoridade administrativa podem

    (medida excepcional) determinar o afastamento (cautelar) do agente pblico do cargo, emprego ou funo, sem prejuzo da remunerao, quando a medida se fizer necessria instruo processual (art. 20, pargrafo nico), ou seja, quando for manifesta a sua indispensabilidade.

    JURISPRUDNCIA

    Rcl 2138 - Relator(a) p/ Acrdo: Min. GILMAR MENDES (ART.38,IV,b, DO RISTF)

    4 GARCIA, Emerson; ALVES, Rogrio Pacheco. Improbidade administrativa. 4.ed. Rio de Janeiro: Editora

    Lumen Juris, 2008, p. 630.

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    EMENTA: RECLAMAO. USURPAO DA COMPETNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. CRIME DE RESPONSABILIDADE. AGENTES POLTICOS. I. PRELIMINARES. QUESTES DE ORDEM. I.1. Questo de ordem quanto manuteno da competncia da Corte que justificou, no primeiro momento do julgamento, o conhecimento da reclamao, diante do fato novo da cessao do exerccio da funo pblica pelo interessado. Ministro de Estado que posteriormente assumiu cargo de Chefe de Misso Diplomtica Permanente do Brasil perante a Organizao das Naes Unidas. Manuteno da prerrogativa de foro perante o STF, conforme o art. 102, I, "c", da Constituio. Questo de ordem rejeitada. I.2. Questo de ordem quanto ao sobrestamento do julgamento at que seja possvel realiz-lo em conjunto com outros processos sobre o mesmo tema, com participao de todos os Ministros que integram o Tribunal, tendo em vista a possibilidade de que o pronunciamento da Corte no reflita o entendimento de seus atuais membros, dentre os quais quatro no tm direito a voto, pois seus antecessores j se pronunciaram. Julgamento que j se estende por cinco anos. Celeridade processual. Existncia de outro processo com matria idntica na seqncia da pauta de julgamentos do dia. Inutilidade do sobrestamento. Questo de ordem rejeitada. II. MRITO. II.1.Improbidade administrativa. Crimes de responsabilidade. Os atos de improbidade administrativa so tipificados como crime de responsabilidade na Lei n 1.079/1950, delito de carter poltico-administrativo. II.2.Distino entre os regimes de responsabilizao poltico-administrativa. O sistema constitucional brasileiro distingue o regime de responsabilidade dos agentes polticos dos demais agentes pblicos. A Constituio no admite a concorrncia entre dois regimes de responsabilidade poltico-administrativa para os agentes polticos: o previsto no art. 37, 4 (regulado pela Lei n 8.429/1992) e o regime fixado no art. 102, I, "c", (disciplinado pela Lei n 1.079/1950). Se a competncia para processar e julgar a ao de improbidade (CF, art. 37, 4) pudesse abranger tambm atos praticados pelos agentes polticos, submetidos a regime de responsabilidade especial, ter-se-ia uma interpretao ab-rogante do disposto no art. 102, I, "c", da Constituio. II.3.Regime especial. Ministros de Estado. Os Ministros de Estado, por estarem regidos por normas especiais de responsabilidade (CF, art. 102, I, "c"; Lei n 1.079/1950), no se submetem ao modelo de competncia previsto no regime comum da Lei de Improbidade Administrativa (Lei n 8.429/1992). II.4.Crimes de responsabilidade. Competncia do Supremo Tribunal Federal. Compete exclusivamente ao Supremo Tribunal Federal processar e julgar os delitos poltico-administrativos, na hiptese do art. 102, I, "c", da Constituio. Somente o STF pode processar e julgar Ministro de Estado no caso de crime de responsabilidade e, assim, eventualmente, determinar a perda do cargo ou a suspenso de direitos polticos. II.5.Ao de improbidade administrativa. Ministro de Estado que teve decretada a suspenso de seus direitos polticos pelo prazo de 8 anos e a perda da funo pblica por sentena do Juzo da 14 Vara da Justia Federal - Seo Judiciria do Distrito Federal. Incompetncia dos juzos de primeira instncia para processar e julgar ao civil de improbidade administrativa ajuizada contra agente poltico que possui prerrogativa de foro perante o Supremo Tribunal Federal, por crime de responsabilidade, conforme o art. 102, I, "c", da Constituio. III. RECLAMAO JULGADA PROCEDENTE.

    Rcl 3021 AgR / SP - SO PAULO AG.REG.NA RECLAMAO Relator(a): Min. CEZAR PELUSO Julgamento: 03/12/2008 rgo Julgador: Tribunal Pleno EMENTA: COMPETNCIA. Ratione muneris. Foro especial, ou prerrogativa de foro. Perda superveniente. Ao de improbidade administrativa. Mandato eletivo. Ex-prefeito municipal. Cessao da investidura no curso do processo. Remessa dos autos ao juzo de primeiro grau. Ofensa autoridade da deciso da Rcl n 2.381. No ocorrncia. Fato ocorrido durante a gesto. Irrelevncia. Reclamao julgada improcedente. Agravo improvido. Inconstitucionalidade dos 1 e 2 do art. 84 do CPP, introduzidos pela Lei n 10.628/2002. ADIs n 2.797 e n 2.860. Precedentes. A cessao do mandato eletivo, no curso do processo de ao de improbidade administrativa, implica perda automtica da chamada prerrogativa de foro e deslocamento da causa ao juzo de primeiro grau, ainda que o fato que deu causa demanda haja ocorrido durante o exerccio da funo pblica. Rcl 7339 MC / ES - ESPRITO SANTO MEDIDA CAUTELAR NA RECLAMAO Relator(a): Min. CARLOS BRITTO Julgamento: 12/12/2008

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    Luiz Paulo Velloso Lucas, deputado federal eleito em 2006, ajuza reclamao contra atos do Juzo de Direito da Fazenda Pblica Municipal do Esprito Santo. Juzo em que ele, reclamante, figura no plo passivo de sete aes de improbidade administrativa. Afirma que era, poca dos fatos narrados nas aes civis pblicas de improbidade administrativa em questo, prefeito da Cidade de Vitria (grifei). 2. Alega, o autor, que este E. STF j decidiu, no julgamento da Reclamao n 2318, que os atos de improbidade administrativa so equiparados aos crimes de responsabilidade, de sorte que os agentes polticos no se submetem ao regime de responsabilidade da Lei de Improbidade [...]. Portanto, resta claro que o Reclamante detm prerrogativa de foro perante este E. STF para ser processado e julgado por crimes de responsabilidade em questo, sendo evidente a continuidade do exerccio, por ele, de cargo poltico, consubstanciado no mandato que ora exerce de deputado federal. Recorre, ainda, nossa deciso no Inq. n 2605/SP. 3. Requer, o acionante, a concesso de liminar para suspender as mencionadas aes de improbidade, fundando a plausibilidade jurdica do pedido nos precedentes deste Tribunal, acima citados. J o perigo da demora, evidencia-se na movimentao indevida da mquina judiciria e em prejuzos diversos ao Reclamante, que ser parte em processo cujos desdobramentos podem ser posteriormente anulados. Ao final, pede a declarao da incompetncia do Juzo reclamado para processar e julgar as aes de improbidade administrativa. 4. Este o relatrio, passo a decidir. Fazendo-o, inicio por averbar que a Rcl n 2.138, julgada em sesso do Pleno de 13/06/2007, versou sobre atos praticados por agente poltico (Ministro de Estado) durante o exerccio de cargo detentor de foro especial. Inexiste, destarte, completa similitude da orientao ali contida com a matria ora tratada, porquanto no figura entre nossas competncias o julgamento de atos de improbidade praticados por prefeito municipal (Pet. N 3401/GO Min. Ellen Gracie). Ademais, na ADI n 2.797, julgamos inconstitucional dispositivo do Cdigo de Processo Penal que estendia a este Tribunal competncia para processar aes de improbidade administrativa, quando os detentores de prerrogativa de funo tivessem neste STF o seu foro criminal. 5. primeira vista, para o caso destes autos de se aplicar o decidido na Pet-QO 3923/SP (julgada tambm em 13/06/2007), verbis: EMENTA: AO CIVIL PBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATVA. LEI 8.429/1992. NATUREZA JURDICA. CRIME DE RESPONSABILIDADE. PREFEITO POSTERIORMENTE ELEITO DEPUTADO FEDERAL. IMPOSSIBILIDADE. PRERROGATIVA DE FORO. INEXISTNCIA. PROCESSO EM FASE DE EXECUO. INCOMPETNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. REMESSA DOS AUTOS AO JUZO DE ORIGEM. [...] Deputado Federal, condenado em ao de improbidade administrativa, em razo de atos praticados poca em que era prefeito municipal, pleiteia que a execuo da respectiva sentena condenatria tramite perante o Supremo Tribunal Federal [...]. O pedido foi indeferido sob os seguintes fundamentos: 1) A lei 8.429/1992 regulamenta o art. 37, pargrafo 4 da Constituio, que traduz uma concretizao do princpio da moralidade administrativa inscrito no caput do mesmo dispositivo constitucional. As condutas descritas na lei de improbidade administrativa, quando imputadas a autoridades detentoras de prerrogativa de foro, no se convertem em crimes de responsabilidade. [...] (grifos meus) 6. Esclareo, por oportuno, que este ltimo precedente reflete o pensamento da atual composio deste Supremo Tribunal Federal. que na Rcl n 2.138 no votaram, quanto ao mrito, a Ministra Crmen Lcia, e os Ministros Lewandowski, Eros Grau e Carlos Ayres Britto, pois sucederem Ministros com votos j proferidos. 7. derradeira, o julgamento deste STF no Inq. n 2605, versante sobre processo penal, de todo inaplicvel s aes civis de improbidade. 8. Pelo exposto, nego a liminar, pois no vislumbro, ao menos por ora, o bom direito e no reconheo risco eficcia da jurisdio pelo simples fato de aes estarem no incio de seu curso normal.

    Informativo n 0414 - Perodo: 2 a 6 de novembro de 2009.

    Segunda Turma

    DECLARAO. INIDONEIDADE. LICITAO.

    Cuida-se da repercusso, nas diversas esferas de governo, da declarao de inidoneidade para contratar com a Administrao Pblica, prevista na Lei de Licitaes, como sano por descumprimento do contrato administrativo. No se trata da sano por ato de improbidade de agente pblico (art. 12 da Lei n. 8.429/1992), cujos efeitos a jurisprudncia do STJ limita esfera

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    municipal. A definio do que seja Administrao Pblica para esse especfico fim consta do art. 6, XI, da Lei n. 8.666/1993. V-se, ento, que o legislador conferiu-lhe grande abrangncia, e a consequncia lgica da amplitude do termo utilizado que a inidoneidade vale perante qualquer rgo pblico do pas. Assim, se uma sociedade empresria forneceu remdios adulterados a um municpio, declarada sua inidoneidade, no poder fornecer medicamentos Unio. Desponta o carter genrico da referida sano cujos efeitos irradiam por todas as esferas de governo. Precedentes citados: EDcl no REsp 1.021.851-SP, DJe 6/8/2009; REsp 174.274-SP, DJ 22/11/2004, e REsp 151.567-RJ, DJ 14/4/2003. REsp 520.553-RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 3/11/2009.

    Pet 3923 QO - Relator: Min. JOAQUIM BARBOSA

    EMENTA: AO CIVIL PBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATVA. LEI 8.429/1992. NATUREZA JURDICA. CRIME DE RESPONSABILIDADE. PREFEITO POSTERIORMENTE ELEITO DEPUTADO FEDERAL. IMPOSSIBILIDADE. PRERROGATIVA DE FORO. INEXISTNCIA. PROCESSO EM FASE DE EXECUO. INCOMPETNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. REMESSA DOS AUTOS AO JUZO DE ORIGEM. Deputado Federal, condenado em ao de improbidade administrativa, em razo de atos praticados poca em que era prefeito municipal, pleiteia que a execuo da respectiva sentena condenatria tramite perante o Supremo Tribunal Federal, sob a alegao de que: (a) os agentes polticos que respondem pelos crimes de responsabilidade tipificados no Decreto-Lei 201/1967 no se submetem Lei de Improbidade (Lei 8.429/1992), sob pena de ocorrncia de bis in idem; (b) a ao de improbidade administrativa tem natureza penal e (c) encontrava-se pendente de julgamento, nesta Corte, a Reclamao 2138, relator Ministro Nelson Jobim. O pedido foi indeferido sob os seguintes fundamentos: 1) A lei 8.429/1992 regulamenta o art. 37, pargrafo 4 da Constituio, que traduz uma concretizao do princpio da moralidade administrativa inscrito no caput do mesmo dispositivo constitucional. As condutas descritas na lei de improbidade administrativa, quando imputadas a autoridades detentoras de prerrogativa de foro, no se convertem em crimes de responsabilidade. 2) Crime de responsabilidade ou impeachment, desde os seus primrdios, que coincidem com o incio de consolidao das atuais instituies polticas britnicas na passagem dos sculos XVII e XVIII, passando pela sua implantao e consolidao na Amrica, na Constituio dos EUA de 1787, instituto que traduz perfeio os mecanismos de fiscalizao postos disposio do Legislativo para controlar os membros dos dois outros Poderes. No se concebe a hiptese de impeachment exercido em detrimento de membro do Poder Legislativo. Trata-se de contraditio in terminis. Alis, a Constituio de 1988 clara nesse sentido, ao prever um juzo censrio prprio e especfico para os membros do Parlamento, que o previsto em seu artigo 55. Noutras palavras, no h falar em crime de responsabilidade de parlamentar. 3) Estando o processo em fase de execuo de sentena condenatria, o Supremo Tribunal Federal no tem competncia para o prosseguimento da execuo. O Tribunal, por unanimidade, determinou a remessa dos autos ao juzo de origem.

    Informativo n 0418 - Perodo: 30 de novembro a 4 de dezembro de 2009.

    COMPETNCIA. IMPROBIDADE. GOVERNADOR.

    Trata-se de reclamao proposta por governador para extinguir, ante a suposta usurpao da competncia deste Superior Tribunal, ao civil pblica por improbidade administrativa referente a atos praticados durante sua gesto como prefeito. Sustenta que as condutas que lhe so atribudas esto descritas no DL n. 201/1967 como crimes de responsabilidade de prefeito, que no cabe ao de improbidade tendente a aplicar sanes por atos que, como no caso, tambm configuram crimes de responsabilidade e, como atualmente ocupa o cargo de governador, a competncia para apreciar os fatos que lhe so imputados do STJ. Isso posto, a Corte Especial julgou a reclamao procedente em parte ao entendimento de que, excetuada a hiptese de atos de improbidade praticados pelo presidente da Repblica (art. 85, V, da CF/1988), cujo julgamento se d em regime especial pelo Senado Federal (art. 86 da mesma carta), no h norma constitucional alguma que imunize os agentes polticos, sujeitos a crime de responsabilidade, de qualquer das sanes por ato de improbidade previstas no art. 37, 4, da CF/1988. Seria incompatvel com a Constituio eventual preceito normativo infraconstitucional que impusesse imunidade dessa natureza. O STF,

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    em 13/3/2008, com apenas um voto contrrio, declarou competir a ele julgar ao de improbidade contra seus membros (QO na Pet. 3.211-0, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, DJe 27/6/2008). Considerou, para tanto, que a prerrogativa de foro, em casos tais, decorre diretamente do sistema de competncias estabelecido na CF/1988, que assegura a seus ministros foro por prerrogativa de funo tanto em crimes comuns, na prpria Corte, quanto em crimes de responsabilidade, no Senado Federal. Por isso, seria absurdo ou o mximo do contrassenso conceber que ordem jurdica permita que um ministro possa ser julgado por outro rgo em ao diversa, entre cujas sanes est tambm a perda do cargo. Isso seria a desestruturao de todo o sistema que fundamenta a distribuio da competncia. Esses mesmos fundamentos de natureza sistemtica autorizam a concluir, por imposio lgica de coerncia interpretativa, que uma norma infraconstitucional no pode atribuir a juiz de primeiro grau o julgamento de ao de improbidade administrativa com possvel aplicao da pena de perda do cargo contra governador que, a exemplo dos ministros do STF, tambm tem assegurado foro por prerrogativa de funo tanto em crimes comuns (no STJ) quanto em crimes de responsabilidade (na respectiva Assemblia Legislativa). de se reconhecer que, por inafastvel simetria com o que ocorre em relao aos crimes comuns (art. 105, I, a, CF/1988), h, em casos tais, competncia implcita complementar do STJ. Precedentes citados do STF: ADI 2.860-DF, DJ 19/12/2006; do STJ: Rcl 591-DF, DJ 15/5/2000; Pet 2.588-RO, DJ 9/10/2006; Pet 2.639-RJ, DJ 25/9/2006; AgRg na MC 7.487-GO, DJ 17/4/2006; Pet 2.593-GO, DJ 6/11/2006, e Rcl 2.197-DF, DJe 9/3/2009. Rcl 2.790-SC, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, julgada em 2/12/2009.

    Informativo n 0416 - Perodo: 16 a 20 de novembro de 2009.

    IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. TCU.

    Na espcie, o Tribunal de Contas da Unio (TCU) concluiu que a operao de financiamento pelo banco empresa de sistema de transmisso foi regular e no resultou em nenhum prejuzo ao errio. Para o Min. Relator, o controle exercido pelo TCU no jurisdicional, e no h, portanto, vinculao da deciso proferida pelo rgo de controle, nem possibilidade de ser o ato impugnado no mbito de ao de improbidade administrativa, sujeita ao controle do Poder Judicirio, consoante expressa previso do art. 21, II, da Lei n. 8.429/1992. A atividade do TCU denominada de controle externo que auxilia o Congresso Nacional na fiscalizao contbil, financeira, oramentria, operacional e patrimonial da Unio e das entidades da administrao direta e indireta, quanto legalidade, legitimidade, economicidade, aplicao das subvenes e renncia de receitas revestida de carter opinativo, razo pela qual no vincula a atuao do sujeito ativo da ao civil de improbidade administrativa. Ressaltou o Min. Relator que a natureza do TCU de rgo de controle auxiliar do Poder Legislativo. Decorre da que sua atividade meramente fiscalizadora e suas decises tm carter tcnico-administrativo, no encerrando atividade judicante, o que resulta na impossibilidade de suas decises produzirem coisa julgada. Por consequncia, essas decises no vinculam a atuao do Poder Judicirio, sendo passveis de reviso por aquele Poder, mxime em face do princpio constitucional da inafastabilidade do controle jurisdicional, luz do art. 5, XXXV, da CF/1988. O Tribunal a quo, no caso sub judice, mediante cotejo das razes recursais e do contexto ftico engendrado nos autos, vislumbrando a ocorrncia de elementos de convices hbeis ao prosseguimento da ao de improbidade administrativa e a necessidade de anlise mais acurada dos fatos que ensejaram a ao de improbidade administrativa, entendeu pela manuteno da deciso que recebeu a inicial. Dessarte, a concluso do Tribunal acerca da existncia dos elementos essenciais viabilidade da ao de improbidade administrativa, em agravo de instrumento, fundado no art. 17, 10, da Lei n. 8.429/1992, decorre justamente da valorao da relevncia gravosa dos atos praticados contra a Administrao Pblica, mormente porque os 7 e 8 da mencionada legislao permitem o exame do prprio mrito da ao na fase preliminar, isto , existncia ou no de ato de improbidade administrativa, bem como fato impeditivo do exerccio de um direito, como soem ser a decadncia e a prescrio. REsp 1.032.732-CE, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 19/11/2009.

    Informativo n 0412 - Perodo: 19 a 23 de outubro de 2009.

    CRIME. PREFEITO. PRINCPIO. INSIGNIFICNCIA.

    A Turma, por maioria, denegou a ordem de habeas corpus por entender que a conduta do prefeito

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    que emitiu ordem de fornecimento de combustvel (20 litros) a ser pago pelo municpio para pessoa que no era funcionrio pblico, nem estava realizando qualquer servio pblico e, ainda, conduzia veculo privado estaria tipificada no art. 1, I, do DL n. 201/1967. O Min. Nilson Naves concedeu a ordem aplicando, ao caso, o princpio da insignificncia. Contudo o Relator entendeu que no se aplica tal princpio quando h crime contra a Administrao Pblica, pois o que se busca resguardar no somente o ajuste patrimonial, mas a moral administrativa. HC 132.021-PB, Rel. Min. Celso Limongi, julgado em 20/10/2009.

    Informativo n 0412 - Perodo: 19 a 23 de outubro de 2009. - Segunda Turma

    PREFEITA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.

    No REsp, o MP estadual sustenta configurar ato de improbidade administrativa, nos termos do art. 9, IV, da Lei n. 8.429/1992, a utilizao de procuradores municipais para defender mandatria municipal candidata reeleio perante a Justia eleitoral. Por outro lado, afirma que os procuradores tambm incidiram em ato de improbidade por colaborar com a conduta mproba como disposto nos arts. 10, XII e XIII, e 11, I, da citada lei. Para o Min. Relator, deve-se analisar, no caso concreto, se h interesse pblico que justifique a atuao dos procuradores municipais e, na hiptese, concluiu haver matria de fundo secundria, ou seja, o contrato administrativo impugnado, o que autorizaria a atuao dos procuradores. Porm, a tese vencedora, inaugurada pelo Min. Mauro Campbell Marques, dissentiu, considerando o interesse privado da ao de investigao judicial no mbito da Justia eleitoral que tem como objetivo apurar uso indevido de recursos pblicos, abusos de poder de autoridade, de poder poltico e econmico em benefcio prprio, cujos efeitos restringir-se-iam sempre pessoa do candidato e s pessoas que tenham, de algum modo, contribudo para a infrao. Assim, explica que no h como reconhecer a preponderncia do interesse pblico quando o agente poltico defende-se em uma ao dessa natureza, por isso a conduta da prefeita configura improbidade administrativa, mas, em relao aos procuradores, manteve a deciso recorrida de que eles estavam exercendo o seu mister, cumprindo suas funes legais de defender o chefe de poder municipal, no podendo caracterizar improbidade administrativa. Diante do exposto, a Turma, ao prosseguir o julgamento, deu parcial provimento ao julgamento do recurso para reconhecer, por maioria, ato de improbidade na utilizao da procuradoria municipal pela prefeita no perodo de eleies perante o TRE e determinou o retorno dos autos origem para aplicao de eventuais sanes cabveis. REsp 908.790-RN, Rel. originrio Min. Humberto Martins, Rel. para acrdo Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 20/10/2009.

    Informativo n 0411 - Perodo: 12 a 16 de outubro de 2009.

    ACP. IMPROBIDADE. SOMATRIO. PENAS.

    Trata-se de REsp em que a irresignao cinge-se possibilidade de soma das penas de suspenso de direitos polticos impostas ao demandado, ora recorrido, nos autos de trs aes civis pblicas (ACPs). Para o Min. Luiz Fux, voto vencedor, a concomitncia de sanes polticas por atos contemporneos de improbidade administrativa impe a detrao como consectrio da razoabilidade do poder sancionatrio. A soma das sanes infringe esse critrio constitucional, merc de sua ilogicidade jurdica. Ressaltou que os princpios constitucionais da razoabilidade e da proporcionalidade, corolrios do princpio da legalidade, so de observncia obrigatria na aplicao das medidas punitivas, como soem ser as sanes encartadas na Lei n. 8.429/1992, por isso da essncia do poder sancionatrio do Estado a obedincia aos referidos princpios. Assim, a sano de suspenso temporria dos direitos polticos, decorrente da procedncia de ao civil de improbidade administrativa ajuizada no juzo cvel, estadual ou federal, somente produz seus efeitos, para cancelamento da inscrio eleitoral do agente pblico, aps o trnsito em julgado do decisum, mediante instaurao de procedimento administrativo-eleitoral na Justia Eleitoral. Consectariamente, o termo inicial para a contagem da pena de suspenso de direitos polticos, independente do nmero de condenaes, o trnsito em julgado da deciso luz do que dispe o art. 20 da Lei n. 8.429/1992. Com esses argumentos, entre outros, a Turma, ao prosseguir o julgamento, por maioria, conheceu do recurso, mas lhe negou provimento. No entendimento vencido do Min. Relator originrio, tratando-se de sanes decorrentes de processos distintos contra o mesmo agente mprobo, as reprimendas impostas pelos atos de improbidade devem dar-se de forma cumulativa, tendo como termo inicial a data do mais antigo trnsito em julgado sob pena de diminuir

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    a fora decisria das sentenas condenatrias ou de estimular a prtica de atos de improbidade administrativa. REsp 993.658-SC, Rel. originrio Min. Francisco Falco, Rel. para o acrdo Min. Luiz Fux, julgado em 15/10/2009.

    Informativo n 0409 - Perodo: 28 de setembro a 2 de outubro de 2009

    IMPROBIDADE. MULTA. RESSARCIMENTO. Trata-se de ao civil pblica ajuizada contra prefeito em razo da prtica de improbidade administrativa consistente na contratao temporria de merendeiras sem o devido concurso pblico. certo que, caracterizado o prejuzo ao errio, o ressarcimento no deve ser considerado como propriamente uma sano, mas sim uma consequncia imediata e necessria do prprio ato combatido. Desse modo, no h como exclu-lo a pretexto de resguardo proporcionalidade das penas aplicadas apregoado no art. 12 da Lei n. 8.429/1992 (LIA). Esse mesmo artigo de lei prev a aplicao concomitante de diversas sanes e do ressarcimento, que, pelo que se entende de ressarcimento integral do dano, deve compreender unicamente os prejuzos efetivamente causados ao Poder Pblico, sendo providncia de ndole rgida, que sempre se impe. Ao contrrio, as sanes de carter elstico podem levar em considerao outras coisas que no a prpria extenso do dano, tais como a gravidade da conduta ou a forma pela qual foi praticado o ato mprobo. Elas podem ou no ser aplicadas e, caso o sejam, expem-se mensurao. A nica exceo feita elasticidade das sanes que pelo menos uma delas deve acompanhar o dever de ressarcimento. Essa diferenciao faz-se necessria porque, na seara da improbidade administrativa, h duas consequncias que possuem cunho pecunirio: a multa e o ressarcimento. Enquanto a primeira sanciona o agente mprobo, a segunda cauciona o prejuzo do ente pblico. No caso, a sentena imps, entre outras sanes, a condenao multa (com parmetro no valor da remunerao percebida pelo agente), mas com o equivocado fim de ressarcir o errio. J o Tribunal a quo apenas imps o ressarcimento, considerando-o como tal, mas mantendo o parmetro da remunerao para fix-lo. Para a soluo dessa confuso de conceitos, deve-se considerar que pelo menos o ressarcimento deve estar presente, visto que medida imediata e necessria condenao, ao contrrio da multa civil, que opcional. Da que, tanto o acrdo quanto a sentena enganaram-se ao fixar o valor a ser ressarcido em montante superior ao dano efetivamente suportado. Diante disso, poder-se-ia at cogitar que haveria certo benefcio ao recorrente, pois seria condenado apenas ao dever de ressarcir. Como isso no aceito pelo art. 12 da LIA nem pela jurisprudncia do STJ, mostra-se vivel manter a condenao pecuniria total imposta (cinco vezes a remunerao do prefeito), entendendo-a como ressarcimento integral do dano, mas, se ele for menor que o montante fixado, o que restar de saldo deve ser considerado como condenao multa civil. Precedentes citados: REsp 664.440-MG, DJ 8/5/2006, e REsp 1.019.555-SP, DJe 29/6/2009. REsp 622.234-SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 1/10/2009 REsp 831178 / MG Relator Ministro LUIZ FUX rgo Julgador T1 - PRIMEIRA TURMA Data do Julgamento 25/03/2008 PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AO CIVIL PBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI 8.429/92. LESO A PRINCPIOS ADMINISTRATIVOS. AUSNCIA DE DANO AO ERRIO. APLICAO DAS PENALIDADES. PRINCPIO DA PROPORCIONALIDADE. VIOLAO DO ART. 535, I e II, DO CPC. NO CONFIGURADA. 1. O carter sancionador da Lei 8.429/92 aplicvel aos agentes pblicos que, por ao ou omisso, violem os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, lealdade s instituies e notadamente: a) importem em enriquecimento ilcito (art. 9); b) causem prejuzo ao errio pblico (art. 10); c) atentem contra os princpios da Administrao Pblica (art. 11) compreendida nesse tpico a leso moralidade administrativa. 2. A exegese das regras insertas no art. 11 da Lei 8.429/92, considerada a gravidade das sanes e restries impostas ao agente pblico, deve se realizada cum granu salis, mxime porque uma interpretao ampliativa poder acoimar de mprobas condutas meramente irregulares, suscetveis de correo administrativa, posto ausente a m-f do administrador pblico, preservada a moralidade administrativa e, a fortiori, ir alm de que o legislador pretendeu.

  • Gustavo Santanna Direito Administrativo [email protected]

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