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IMAGENS SOBRE MATEMÁTICOS NA FORMAÇÃO DE ESTUDANTES DE
GRADUAÇÃO EM PEDAGOGIA
Ricardo SCUCUGLIA RODRIGUES DA SILVA, Universidade Estadual Paulista(UNESP), Campus de São José do Rio Preto
Eixo Temático 1: Formação Inicial de Professores da Educação BásicaAgência Financiadora: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (CNPq)[email protected]
1. Introdução
Neste artigo, discuto aspectos de uma pesquisa (em desenvolvimento) cujo
objetivo é investigar o papel da produção de Performances Matemáticas Digitais (PMDs)
na formação inicial de professores de matemática (licenciandos em matemática e
pedagogia) com relação a (des)construção de imagens sobre os matemáticos.
Especificamente, neste texto, discuto algumas imagens elaboradas por alunos de um
curso de graduação em pedagogia, buscando refletir sobre o papel educacional da
produção de PMDs nesse processo formativo de futuros professores (de matemática).
Contando com a participação de 20 alunos nessa etapa da pesquisa, cada um dos
participantes elaborou dois “desenhos”, os quais são considerados dados da pesquisa.
No primeiro desenho, os alunos expressaram (artisticamente) suas visões sobre como as
pessoas veem os matemáticos. Ou seja, eles buscaram responder (por meio das artes
visuais) o seguinte questionamento: qual a imagem pública dos matemáticos? No
segundo desenho, os estudantes expressaram uma “imagem ideal” sobre um
matemático, ou seja: como você gostaria que as pessoas vissem os matemáticos?
Os desenhos dos participantes foram organizados em dois “eixos”. O primeiro eixo
foi formado pelos desenhos referentes a imagem pública dos matemáticos na visão dos
estudantes. O segundo eixo diz respeito ao conjunto de imagens “ideais” dos
matemáticos criadas pelos alunos participantes.
Cabe mencionar que a imagem pública da matemática e dos matemáticos tem
sido uma temática em pesquisa realizadas por autores como Lim (1999) i e Picker e Berry
(2000). Mais recentemente, autores como Gadanidis e Scucuglia (2010) têm discutido
essa temática no âmbito da produção de PMDs (SCUCUGLIA, 2014).
Basicamente, PMD diz respeito ao uso integrado das artes (performáticas) de das
tecnologias digitais em Educação Matemática. Contudo, a expressão PMD é utilizada de
maneira plural, pois tem sido utilizada para se referir a uma recente linha de pesquisa em
Educação Matemática e como uma possibilidade para o ensino e aprendizagem de
matemática (BORBA; SCUCUGLIA; GADANIDIS, 2015).
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Além disso, PMD assume um significado semiótico, pois também pode ser
entendida enquanto texto/narrativa multimodal utilizada para comunicação/representação
matemática por meio das artes (SCUCUGLIA, 2012). Nesse contexto, o tipo mais comum
de PMDs são os vídeos digitais nos quais estudantes e professores comunicam ideias
matemáticas por meio da música, teatro, dança, cinema e outras expressões artísticas.
Tais vídeos podem ser acessados em ambientes online como o YouTube, por exemplo ou
plataformas/repositórios educacionais como o Portal do Professor (MEC) e o Currículo+,
da Secretaria de Educação do Governo do Estado de São Paulo.
Nesse sentido, dois aspectos devem estar claros ao leitor nesta introdução: (1)
PMD é uma temática central da pesquisa (em desenvolvimento) relatada neste artigo. Tal
perspectiva diz respeito ao uso “inovador” e integrado das artes e das tecnologias digitais
no ensino e aprendizagem de matemática; (2) O objetivo das atividades de pesquisa
discutidas neste texto é investigar imagem de futuros professores de matemática dos
Anos Iniciais do Ensino Fundamental, considerando um ambiente de aprendizagem no
qual se explora PMD enquanto possibilidade didático-pedagógica na formação de alunos
de graduação em pedagogia.
2. Perspectivas Teóricas
A expressão PMD surgiu a partir do desenvolvimento de uma pesquisa financiada
por uma agência de fomento canadenseii, a qual havia publicado um edital específico
para a submissão de propostas que promovessem a inovação em Ciências Sociais e
Humanas. Algumas das principais inquietações enunciadas sobre PMD foram:
O que aconteceria se os matemáticos e os educadores matemáticos semovessem além do domínio da avaliação e usassem uma lente artísticapara “realizar performance” matemática? Se nós olharmos a matemáticacomo expressão performática, o que veremos? Pensamento matemáticoe ensino e aprendizagem de matemática como performance podemajudar a desestabilizar e reorganizar nossa compreensão sobre o quesignifica fazer matemática com tecnologia (GADANIDIS; BORBA, 2006).
Nesse sentido, desde de sua concepção em 2006, os resultados de pesquisas
sobre PMD vêm ganhando espaço dialógico, aceitação e projeção na comunidade
acadêmica da Educação Matemática, tendo resultados de pesquisa publicados em
cenários de reconhecido prestígio na área (GADANIDIS; BORBA, 2008).
Ao analisarem retrospectivamente o uso de tecnologias digitais em Educação
Matemática no Brasil, Borba, Scucuglia e Gadanidis (2015) argumentam que vivenciamos
atualmente uma quarta fase. Nessa perspectiva, a primeira fase diz respeito ao uso de
calculadoras e uso do software LOGO. A segunda fase se refere ao uso de softwares de
geometria dinâmica, softwares gráficos e de computação algébrica.
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A terceira fase é caracterizada pelo surgimento da Internet e a educação a
distância online, que fomentou iniciativas importantes na formação continuada de
professores de matemática. Consequentemente,
A quarta fase, pode ser caracterizada pelos seguintes aspectos: (a)surgimento do software GeoGebra, que transformou qualitativamente asegunda fase ao integrar geometria dinâmica e software gráfico em umamesma plataforma computacional; (b) surgimento da Internet rápida, quepermitiu o suporte e compartilhamento de arquivos ou textosmultimodais, principalmente os vídeos digitais; (c) acessibilidade atecnologias digitais portáteis com acesso à Internet, como notebooks,tablets, telefones celulares, câmeras digitais, etc. (d) uso da Internet emsala de aula presencial (...) (e) surgimento da noção e produção de PMD(BORBA; SCUCUGLIA, 2015, p. 24).
Portanto, PMD pode ser considerada uma perspectiva atualmente destacada na
literatura em Educação Matemática no que se refere do uso de tecnologias digitais no
ensino e aprendizagem de matemática, incluindo a formação inicial e continuada de
professores (BORBA; GADANIDIS, 2008). Dentre diversificados aspectos, a literatura
sobre formação de professores destaca que poucas disciplinas têm como objetivo central
constituir ambientes formativos ao licenciando para o uso de tecnologias digitais.
De acordo com Nacarato (2007), parte da literatura sobre a formação inicial de
professores de matemática tende a enfatizar:
[o] conteúdo matemático específico, desconsiderando que o saberdisciplinar é apenas uma das dimensões do saber docente e que essesaber disciplinar, se desprovido de uma abordagem pedagógica ecurricular, não oferece ao futuro professor as condições mínimas para oexercício da profissão docente na escola básica (NACARATO, 2007, p.144).
Além disso, é pertinente destacar que,
O conhecimento profissional do docente emerge na e a partir da práticae se legitima em projetos de experimentação reflexiva e democrática nopróprio processo de construção e reconstrução da prática reflexiva. Emoutras palavras, o elemento fundamental na prática do docente, ocomponente básico do conhecimento especializado útil e relevante, é odesenvolvimento da reflexão (...), compreensão situacional (...), como umprocesso de reconstrução da própria experiência e do própriopensamento ao indagar as condições materiais, sociais, políticas epessoais que configuram o desenvolvimento da concreta situaçãoeducativa da qual participa o docente (GOMES, 2001, p.190).
Além das perspectivas sobre PMD e formação (inicial) de professores
apresentadas, cabe ainda mencionar que autores como Picker e Berry (2001)
argumentam que investigações sobre as imagens que alunos têm sobre a matemática e
os matemáticos podem ajudar professores a “compreender as atitudes dos estudantes
em relação a matemática, seus equívocos e opiniões sobre a matéria”, (...) [e] uma
maneira de descobrir estas atitudes é solicitar aos alunos que desenhem um matemático”
(PICKER; BERRY, 2001, p. 202).
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Considera-se essa uma questão relevante no que se refere a multiplicidade de
saberes e/ou conhecimentos pertinentes na formação de licenciandos em matemática e
pedagogia bem como na prática docente (SCUCUGLIA; GREGORUTTI, 2015). Picker e
Berry (2000), baseado em desenhos produzidos por 476 alunos em uma pesquisa
internacional proposta em cinco países, comentam que “com pequenas diferenças
culturais certas imagens estereotipadas de matemáticos são comuns aos alunos” (...)
“essas imagens indicam que, para alunos entre 12 e13 anos, os matemáticos e o trabalho
que eles fazem são, praticamente, invisíveis” (PICKER; BERRY, 2000, p.65).
Rensaa (2006) problematiza o papel da mídia em apoiar a visão da matemática
como uma atividade exclusivamente masculina. Renssa (2006) entrevistou pessoas em
um terminal de aeroporto para investigar suas imagens sobre os matemáticos. A autora
criou um questionário para perguntar às pessoas como eles imagivam um matemático.
Em suas conclusões, ela destacou que muitas pessoas veem o matemático como um
homem que trabalha em um escritório ou ensina a matéria em sala de aula. Rensaa
(2006) sugere que a imagem esterotipada sobre a atividade profissional dos matemáticos
está associada a imagem negativa que as pessoas carregam sobre a matemática.
Rock e Shaw (2000) desenvolveram um estudo basedo no questionamento “o que
as crianças pensam sobre os matemáticos?” Os autores se concentraram em três
perguntas principais: (1) O que os matemáticos fazem? (2) Que tipos de problemas os
matemáticos resolvem? (3) Quais as ferramentas ou instrumentos que os matemáticos
usam? Rock e Shaw (2000) utilizaram estas perguntas para criar uma pesquisa voluntária
para alunos de diferentes níveis escolares (Educação Infantil e Ensino Fundamental).
3. Metodologia da Pesquisa
No âmbito geral da pesquisa em desenvolvimento, a metodologia é de natureza
qualitativa (DENZIN; LINCOLN, 2005). A produção e análise de dados envolve
diversificadas perspectivas como a realização e registro audiovisual de cursos de
extensão universitária, estudo de casos, análise de vídeos, análise de PMDs conceituais,
entrevistas semiestruturadas e elaboração de representações (artísticas) em atividades
de ensino. No caso específico dos dados discutidos neste artigo, a perspectiva
metodológica enfatizada é o estudo de caso qualitativo (STAKE, 2005).
De acordo com Ponte (2006), o estudo de caso:
É uma investigação que se assume como particularística, isto é, que sedebruça deliberadamente sobre uma situação específica que se supõeser única ou especial, pelo menos em certos aspectos, procurandodescobrir a que há nela de mais essencial e característico e, dessemodo, contribuir para a compreensão global de um certo fenómeno deinteresse (PONTE, 2006, p. 2).
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De modo geral, a principal pergunta de pesquisa explorada nesse artigo é: que
imagens alunos de graduação em pedagogia têm sobre os matemáticos? De maneira
específica e/ou exploratória, os seguintes questionamentos também são discutidos: Na
visão dos estudantes, qual a imagem pública dos matemáticos e qual seria uma imagem
“ideal”? Qual o papel formativo da produção de PMDs no processo de (des)construção
das imagens (públicas e ideais) dos estudantes de graduação em pedagogia? Qual o
papel didático-pedagógico da produção de PMDs na formação inicial de professores (da
Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental)?
Para a produção de dados neste estudo foi solicitado em sala de aula e via e-mail
institucional que os 36 alunos da disciplina intitulada “Conteúdo e Metodologia do Ensino
de Matemática” realizassem (voluntariamente) uma atividade de ensino que servia como
base para a produção de dados da presente pesquisa. Estando cientes na natureza da
atividade, foi proposto aos alunos elaborarem dois “desenhos”:
(1) No primeiro, o objetivo era representar a imagem pública dos matemáticos, ou
seja, representar artisticamente a imagem na qual, na visão do estudante, as
pessoas em geral veem os matemáticos. Os participantes foram engajados em
uma atividade na qual deveriam responder por meio das artes visuais o
seguinte questionamento: Qual a imagem pública dos matemáticos?
(2) No segundo, o objetivo era representar artisticamente uma imagem “ideal” de
um matemático, ou seja, uma imagem (alternativa) na qual eles gostariam que
as pessoas vissem os matemáticos.
É importante mencionar que os participantes estavam cientes de que seus
desenhos seriam utilizados como dados em uma pesquisa voltada a produção de uma
PMD sobre a imagem (pública) dos matemáticos, ou seja, os alunos concordaram com a
proposta de que seus desenhos seriam utilizados como dados de pesquisa: suas obras
seriam analisadas e publicadas; publicadas em relatórios e artigos, na elaboração de um
vídeo sobre a imagem dos matemáticos, e que o vídeo seria publicado na Internet, com
acesso público e gratuito. Cabe também mencionar que, PMD já havia sido um tema
discutido e explorado em sala de aula enquanto possibilidade metodológica para o ensino
de matemática fundamentado no uso integrado das artes e das tecnologias digitais.
4. Análise dos Dados
Dentre os 36 estudantes convidados, 20 participaram da pesquisa, enviando seus
desenhos ao presente autor via e-mail (documento digitalizado) ou entregando em mãos
em obra artística elaborada em folha de sulfite ou material similar.
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Os dados foram inicialmente organizados em um quadro de modo que na primeira
coluna foram inseridos a imagens públicas e na segunda coluna as “imagens ideais”
criadas pelos alunos. Essa organização “tabular” dos dados permitiu que fosse realizada
uma análise comparativa entre os desenhos de um mesmo participante e entre desenhos
de diferentes participantes em um mesmo eixoiii. A seguir, apresento os principais
aspectos analíticos das atividades de pesquisa discutidas neste artigo.
4.1. Imagens Públicas sobre os Matemáticos
Em termos de imagem pública dos matemáticos, dentre os 20 participantes, seis
(N = 6) demonstram uma imagem do tipo “efeito Einstein”, como denominam Picker e
Berry (2000). Um total de cinco imagens (N = 5), incluindo algumas do tipo “Einstein”,
enfatizaram o local fundamental de trabalho dos matemáticos como sendo a sala de aula.
Dentre essas imagens, a maioria demonstrou o ambiente de sala de aula associado a
algo negativo ou frio, com pessoas/alunos com semblantes “tristes” ou a presença de
objetos ao invés de pessoas. Duas imagens (N = 2) explicitaram os matemáticos como
pessoas/profissionais autoritários ou estressados. A imagem do matemático como
“louco”, “maluco” e/ou “nerd” esteve presente em seis desenhos (N = 6). Tais imagens
são comuns na mídia e em filmes como, por exemplo, “Uma mente brilhante”, que narra a
história de vida do matemático John Nash enfatizando aspectos de sua esquizofrenia.
Quatro desenhos (N = 4) associaram a imagem dos matemáticos a algo
monstruoso ou a um vilão. Apenas um desenho (N = 1) associou a imagem do
matemático ao uso de calculadora e/ou a um cientista. Predominantemente, a imagem
pública do matemático foi associada pelos participantes a uma atividade profissional
realizada por indivíduos do sexo masculino (RENSAA, 2006). Apenas um desenho (N =
1) associou a imagem da mulher enquanto uma profissional em matemática.
Cabe mencionar que oito participantes (N = 8) não elaboraram suas próprias
imagens, ou seja, apresentaram imagens “prontas” ou de modo “adaptadas”, coletadas
provavelmente por meio de acesso a Internet; imagens cuja autoria artística não é do
próprio participante. No conjunto de imagens a seguir (Figura/s 1), apresento as
principais imagens que compilam a visão dos 20 estudantes com relação a imagem
pública dos matemáticosiv. Por uma questão de direitos autorais, a imagens que não são
de autoria dos próprios participantes não são apresentadas no quadro.
Figura(s) 1: Imagens públicas sobre os matemáticos elaboradas pelos graduandos em pedagogia
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Fonte: Dados de Pesquisa
Com base nos 20 desenhos apresentados pelos estudantes, argumenta-se que as
imagens públicas sobre os matemáticos não se diferenciam significativamente do
conjunto de imagens provenientes das pesquisas já realizadas na área, ou seja, o
presente estudo corrobora com resultados encontrados na literatura. Em termos de
resultados, o eixo 1 de dados não revela aspectos consideravelmente diferenciados.
Destaca-se “apenas” o talento artístico e criatividade peculiar de alguns dos alunos
participantes desta pesquisa, estudantes de graduação em pedagogia.
Picker e Berry (2000), por exemplo, propuseram sete categorias para identificar
semelhanças entre os desenhos de matemáticos de alunos de diferentes países:
(1) Matemáticos e coerção: os estudantes veem os matemáticos como
professores que usam intimidação, violência ou ameaças em sala de aula. Essa
imagem é também associada aos matemáticos enquanto “monstros ou vilões”.
(2) Matemáticos como “tolos ou nerds”: retratados como desprovidos de senso
comum, senso de moda, antissociais, individualistas.
(3) Matemáticos exaustos: descritos como impacientes, tensos e cansados.
(4) Matemáticos que não sabem ensinar: uma sala de aula é desenhada na qual o
professor de matemática não é capaz de “liderar” as aulas, ou não
conhece/domina o conteúdo.
(5) Matemáticos e arrogância: representados como sendo muito inteligentes, mas
frios e arrogantes. A imagem do vilão também está associada a esta categoria.
(6) Efeito Einstein: o físico Albert Einstein é representado como um “ícone” em
termos de um indivíduo com experrtise em termos conhecimento matemático e
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genialidade acadêmico-científica. Normalmente, essas imagens são influenciadas
pela mídia, incluindo livros, desenhos animados e filmes.
(7) Matemáticos com poderes especiais: por não compreenderem a explicação de
professores em sala de aula, o matemático é visto como um mágico, pois a
atividade matemática é associada a algum tipo de ilusionismo. Algo extraordinário
é necessário para compreender e realizar a atividade matemática.
Portanto, na presente pesquisa, pode-se concluir que as imagens públicas sobre
os matemáticos criadas pelos participantes não se diferenciaram significativamente das
categorias elaboradas no estudo de Picker e Berry (2000) e da literatura sobre essa
temática de modo geral (ROCK; SHAW, 2000; PICKER; BERRY, 2001; RENSAA, 2006).
4.2. Imagens Alternativas sobre os Matemáticos
O segundo conjunto de imagens criadas pelos alunos de graduação em
pedagogia – como você gostaria que as pessoas vissem os matemáticos? – é composto
por imagens que desconstroem, em sua maioria, as imagens negativas explicitadas no
primeiro eixo (imagem pública dos matemáticos), propondo a construção de imagens
alternativas “ideais”. Nesse contexto, os estudantes optaram em apresentar imagens
associadas a “boas” características ou qualidades como: o matemático como professor,
mas em uma sala de aula na qual as pessoas estão “felizes”, sorrindo, jogando, se
divertindo, realizando atividades prazerosas, humanas; esses aspectos puderam ser
identificados em, pelo menos, nove desenhos (N = 9).
Em três desenhos (N = 3), assim como na categoria anterior, o trabalho do
matemático foi associado ao de um cientista, ou seja, um profissional da área de
ciências naturais como física, biologia e química. Em contraste com a categoria anterior,
em oito desenhos (N = 8), a presença da mulher (RENSAA, 2006) esteve associada a
atividade matemática nas imagens “ideais” construídas pelos participantes.
Em quatro desenhos (N = 4), a imagem do matemático esteve associada a
performance musical e a imagem de um rock/pop star como Elvis Presley. A elaboração
de tais imagens pode estar associada ao fato dos participantes terem explorado em aula
questões sobre PMDs musicais enquanto possibilidade no ensino de matemáticav.
Em três desenhos (N = 3), a atividade do matemático foi associada ao trabalho
coletivo/colaborativo, em contraste com as imagens do matemático como um indivíduo
“antissocial”, “egoísta”, “solitário”, ou incapaz de realizar trabalhos interpessoais. Em um
desenho (N = 1), a imagem do matemático esteve associada ao mercado de trabalho,
ou seja, ao seu papel profissional na realização de atividades ligadas a economia,
produção industrial (engenharia) e desenvolvimento tecnológico/computacional.
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Finalmente, uma das imagens apresentadas (N = 1), foi a de uma fotografia na
qual os alunos participantes da pesquisa e seus colegas de disciplina aparecem em sala
de aula. Essa imagem é muito interessante, pois explicita a possibilidade dos próprios
alunos de pedagogia, (potencialmente) futuros professores de matemática dos Anos
Iniciais do Ensino Fundamental, estarem criando uma identidade enquanto matemáticos
(GADANIDIS, 2012).
No conjunto de imagens apresentadas a seguir (Figura/s 2), exponho algumas das
principais imagens elaboradas pelos participantes da pesquisa com relação a “imagem
ideal” sobre os matemáticos:
Figura(s) 2: Imagens “ideais” sobre os matemáticos elaboradas pelos graduandos em pedagogia
Fonte: Dados de Pesquisa
Portanto, com base na análise realizada na pesquisa relatada neste texto,
considera-se que o uso das artes e das tecnologias digitais, em especial a produção de
PMDs, oferece meios para que futuros professores descontruam imagens negativas
sobre os matemáticos e busquem elaborar e divulgar imagens alternativas, associadas a
“boas” qualidades ou características. Nesse sentido, além de se fomentar a formação de
ambientes nos quais são construídas imagens alternativas sobre os matemáticos – em
relação aquelas (estereotipadas/negativas) apontadas na literatura – é possível
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estabelecer relações relevantes entre as considerações emergentes na presente
pesquisa e perspectivas destacadas na formação de professores.
5. Conclusões
De acordo com Tardif (2002), o saber docente é um “saber plural, formado de
diversos saberes provenientes das instituições de formação, da formação profissional,
dos currículos e da prática cotidiana, o saber docente é, portanto, essencialmente
heterogêneo” (TARDIF, 2002, p. 54). Além disso, Tardif (2002) destaca a existência de
quatro tipos diferentes de saberes envolvidos atividade docente: formação profissional,
disciplinares, curriculares e experienciais.
Com base nessas perspectivas sobre formação de professores, visando explorar
tais aspectos no âmbito da pesquisa em PMD, Alencar e Scucuglia, (2014) propuseram
uma categorização considerando três tipos de conhecimentos significativos para prática
profissional docente: (1) curricular (2) especializado sobre o conteúdo e (3) pedagógico
sobre o conteúdo. Essa categorização compila e articula diferentes concepções,
nomenclaturas e autores presentes na literatura sobre formação de professores e oferece
fundamentação interpretativa ao desenvolvimento de pesquisas sobre formação de
professores envolvendo a produção de PMDs, incluindo a exploração de aspectos sobre
a imagem (pública e “ideal”) dos matemáticos na visão de licenciandos em matemática e
pedagogia, foco central da pesquisa relatada neste artigo.
O fato de se explorar em sala de aula PMD enquanto possibilidade didático-
pedagógica com relação a elaboração de imagens dessa natureza está em fase em
investigação na presente pesquisa, por meio da análise de entrevistas já realizadas e
outros procedimentos analíticos-metodológicos. No entanto, há evidencias iniciais com
relação ao papel significativo da produção de PMD na formação de professores no que
se referente a aprendizagem matemática e possibilidade metodológica didático-
pedagógica fundamentada no uso integrado das artes das tecnologias digitais (BORBA;
SCUCUGLIA, GADANIDIS, 2015).
Diversas limitações podem ser apontadas com relação à pesquisa em PMD
(SCUCUGLIA, 2015), principalmente devido ao fato de PMD ser uma linha de pesquisa
muito recente e em fase inicial de consolidação em Educação Matemática. Há grande
necessidade de se desenvolver estudos sobre essas temáticas. Contudo, o presente
estudo colabora com a elucidação de uma possibilidade na formação matemática de
alunos de graduação em pedagogia, especificamente no que se refere a construção de
imagens alternativas sobre a matemática e os matemáticos. Considera-se tal
possibilidade um aspecto relevante na formação inicial desses professores.
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Em breve (meados de janeiro/fevereiro de 2016), a PMD em fase de produção
com base nos dados apresentados neste artigo estará disponível online com acesso
gratuito por meio do canal YouTube. Ou seja, no atual momento da pesquisa, estou
produzindo um vídeo digital de caráter educacional, entendido como PMD no contexto do
presente estudo. Esse vídeo, dentre outras possibilidades, pode ser considerado uma
representação da inteligência coletiva em um processo colaborativo de formação inicial
de professores, no qual foram construídas, desconstruídas e reconstruídas imagens
sobre os matemáticos. Tal aspecto é considerado relevante na formação didático-
pedagógica-matemática de alunos de um curso de graduação em pedagogia.
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i “O termo “imagem da matemática” [ou “imagem dos matemáticos”] é conceituado como uma representaçãomental ou visão da matemática [ou dos matemáticos], presumivelmente construída como resultado socialdas experiências, mediadas pela escola, pelos pais, pelos colegas ou pela mídia de massa” (LIM, 1999, p.13).ii Social Sciences and Humanities Research Council of Canadaiii O quadro não é apresentado neste texto devido a sua extensão (tanto em termos de número de laudascomo ao fato de sua inserção tornar o arquivo .doc “muito pesado”).iv Do ponto de vista metodológico, é importante mencionar uma perspectiva apresentada por Marshall(1996), no que se refere a amostragem de dados na pesquisa qualitativa. De acordo com o autor, em umaabordagem do tipo amostra por julgamento, “o pesquisador deve selecionar ativamente a amostra maisprodutiva para responder à pergunta de pesquisa (...). Durante a interpretação dos dados é importanteconsiderar os sujeitos que dão suporte a explicações emergentes e, talvez mais importante ainda, ossujeitos que discordam” (MARSHALL, 1996, p. 532, tradução nossa).v Uma das PMDs (musicais) produzidas pelos estudantes, por exemplo, está disponível emhttps://youtu.be/guPVf1-v6cE.